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Mulungu

Erythrina velutina

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Japaratuba, SE

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Fotos: Paulo Ernani Ramalho Carvalho
Mulungu
Erythrina velutina

Taxonomia e Nomenclatura Nomes vulgares por Unidades da Federação:


no Ceará, bucaré, mulungu, mulungu-da-flor-
De acordo com o sistema de classificação baseado vermelha e mulungu-da-flor-amarela; em Minas
no The Angiosperm Phylogeny Group (APG) II Gerais, muchôco e mulungá; na Paraíba, em
(2003), a posição taxonômica de Erythrina Pernambuco, no Rio Grande do Norte, no Estado
velutina obedece à seguinte hierarquia: de São Paulo e em Sergipe, mulungu.
Divisão: Angiospermae Etimologia: o nome genérico Erythrina vem do
Clado: Eurosídeas I grego erythros, que significa “vermelho”, em
alusão à cor das flores; o epíteto específico
Ordem: Fabales (em Cronquist (1981), é classificada
em Rosales) velutina vem do latim, devido ao fato da folha
apresentar indumento de delicados e macios pêlos
Família: Fabaceae (Em Cronquist (1981), (RIZZINI, 1955).
é classificada em Leguminosae)
O nome vulgar mulungu vem do tupi, mussungú
Subfamília: Faboideae (Papilionoideae)
ou muzungú e do africano mulungu, significando
Gênero: Erythrina “pandeiro”, talvez pela batida no seu tronco oco
Subgênero: Erythraster Barneby & Krukoff emitir som (TIGRE, 1970).
Seção 26: Erythraster
Espécie: Erythrina velutina Willdenow Descrição Botânica
Publicação: in Gest. At Freunde Berlin Neue Forma biológica: árvore aculeada ou espinhenta
Schr. 3:426. 1801
e decídua. As árvores maiores atingem dimensões
Sinonímia botânica: Chirocalyx velutinus Walp., próximas a 15 m de altura e 80 cm de DAP
Corallodendron velutinum (Willd.) Kuntze, Erythrina (diâmetro à altura do peito, medido a 1,30 m do
aculeatissima Desf., Erythrina splendida Diels. solo) na idade adulta.

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Tronco: é reto a levemente tortuoso. O tronco e os Dispersão de frutos e sementes: anemocórica
ramos são pouco aculeados. O fuste é geralmente (pelo vento) e zoocórica, principalmente por aves.
curto, medindo até 5 m de comprimento.
Ramificação: é dicotômica, com a copa ampla,
aberta e arredondada. Ocorrência Natural
Casca: mede até 25 mm de espessura (LIMA, Latitudes: de 3º45’S, no Ceará, a 16º45’S, em
1982). A casca externa ou ritidoma é lisa a
Minas Gerais.
levemente áspera.
Folhas: são compostas trifoliadas, sustentadas Variação altitudinal: de 25 m, no Ceará, a
por pecíolo de 6 cm a 14 cm de comprimento; 1.200 m de altitude, no Distrito Federal.
os folíolos são orbiculares, oval-rômbeos ou Distribuição geográfica: Erythrina velutina
triangulares, de consistência cartácea, com a face
ventral apenas pulverulenta e dorsal, de cor verde ocorre, de forma natural, no Brasil, nas seguintes
mais clara revestida por densa pilosidade feltrosa, Unidades da Federação (Mapa 47):
medindo de 6 cm a 12 cm de comprimento por • Bahia (ALVIM; ALVIM, 1978; PINTO;
5 cm a 14 cm de largura. BAUTISTA, 1990; LIMA; LIMA, 1998;
Inflorescências: ocorrem em fascículos axilares, CARVALHO; MARCHINI, 1999; LORENZI,
medindo de 12 cm a 20 cm de comprimento e com 2002).
três flores.
• Ceará (DUCKE, 1959; TAVARES et al., 1974b;
Flores: o vexilo é alaranjado ou vermelho-rutilante, MARTINS et al., 1982; GOMES; FERNANDES,
com lâmina quase orbicular e cálice espatáceo.
1985).
Fruto: legume um tanto curvo, de ápices e bases
agudas, internamente não-septado, com 1 a 3 • Minas Gerais (RATTER et al., 1978;
sementes. MAGALHÃES; FERREIRA, 1981; BRANDÃO,
1993; GAVILANES et al., 1996a; BRANDÃO
Sementes: são bicolores, denominadas miméticas
(BARROSO et al., 1999), de coloração vermelho- et al., 1998b; SANTOS; VIEIRA, 2005).
escura e vermelho-alaranjada. São também • Paraíba (FEVEREIRO et al., 1982; LACERDA
subquadrangulares ou oblongas, com um hilo curto et al., 2003; PEGADO et al., 2006).
de posição mediana.
• Pernambuco (CAMPELO, 1976; ANDRADE-
LIMA, 1979; BATISTELLA, 1996; FERRAZ
Biologia Reprodutiva et al., 2006).
e Eventos Fenológicos • Piauí (CASTRO et al., 1982; EMPERAIRE, 1984).

Sistema sexual: Erythrina velutina é uma espécie • Rio Grande do Norte (ANDRADE-LIMA, 1976).
hermafrodita. • Sergipe (SOUZA, 1983; SOUZA et al., 1993).
Vetor de polinização: essa espécie é visitada pela
abelha-européia ou africanizada – Apis mellifera
(CARVALHO; MARCHINI, 1999) – e pelas abelhas
Aspectos Ecológicos
mamangavas (Xylocopa spp.) como fonte de néctar
(FREITAS; OLIVEIRA FILHO, 2001). Grupo ecológico ou sucessional: essa espécie
é pioneira (SIQUEIRA; RIBEIRO, 2001).
Floração: de julho a agosto, em Minas Gerais
(BRANDÃO et al., 2002), de julho a dezembro, na Importância sociológica: Erythrina velutina
Bahia (ALVIM; ALVIM, 1978), de agosto a ocorre preferencialmente nas formações
setembro, no Estado de São Paulo (ENGEL; secundárias, apresentando dispersão bastante
POGGIANI, 1985), de setembro a novembro, no irregular e descontínua.
Estado do Rio de Janeiro (SANTOS, 1979), de
outubro a dezembro, em Pernambuco (ANDRADE-
LIMA, 1954; CARVALHO, 1976), de novembro a
Biomas (IBGE, 2004a) / Tipos
dezembro, em Sergipe e de janeiro a fevereiro no de Vegetação (IBGE, 2004b) e
Ceará. Outras Formações
Frutificação: frutos maduros ocorrem de Vegetacionais
setembro a novembro, no Estado de São Paulo
(ENGEL; POGGIANI, 1985), em outubro, no
Bioma Mata Atlântica
Estado do Rio de Janeiro (SANTOS, 1979), de
dezembro a fevereiro, em Minas Gerais • Floresta Estacional Semidecidual (Floresta
(BRANDÃO et al., 2002) e de janeiro a março, em Tropical Subcaducifólia), no Ceará (MARTINS
Pernambuco (CARVALHO, 1976). et al., 1982) e em Minas Gerais.

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Mapa 47. Locais identificados de ocorrência natural de mulungu (Erythrina velutina), no Brasil.

Bioma Caatinga • Brejos de altitude nordestinos ou disjunções da


Floresta Ombrófila Aberta (VELOSO et al.,
• Caatinga, no sudoeste do Ceará, no chamado
Sertão dos Inhamuns (GOMES; FERNANDES, 1991), no Ceará e na Paraíba (FEVEREIRO
1985), em Minas Gerais (BRANDÃO; et al., 1982), com freqüência de um indivíduo
GAVILANES, 1994b), na Paraíba (PEGADO por hectare (TAVARES et al., 1974b).
et al., 2006), no Piauí (CASTRO et al., 1982), • Campo rupestre, em Minas Gerais
no Rio Grande do Norte (ANDRADE-LIMA, (GAVILANES et al., 1996a).
1976) e em Sergipe (SOUZA, 1983).
• Furados, em Minas Gerais (BRANDÃO et al.,
Bioma Cerrado 1998b).
• Savana ou Cerrado stricto sensu, em Minas
Gerais (SANTOS; VIEIRA, 2005).
Clima
Outras Formações Vegetacionais
Precipitação pluvial média anual: de 316 mm,
• Ambiente fluvial ou ripário, na Paraíba
no Sertão dos Inhamuns, no sudoeste do Ceará, a
(LACERDA et al., 2005), em Pernambuco
2.500 mm, em Pernambuco.
(FERRAZ et al., 2006) e no Rio Grande do Norte
(ANDRADE-LIMA, 1976). Regime de precipitações: chuvas periódicas.
• Área de Tensão Ecológica, Caatinga versus Deficiência hídrica: de pequena a moderada,
Floresta Estacional Decidual, no Sertão de na faixa costeira de Sergipe. Forte no interior do
Canudos, BA (PINTO; BAUTISTA, 1990). Nordeste e no norte de Minas Gerais.

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Temperatura média anual: 21,2 ºC (Brasília, Produção de Mudas
DF) a 26,6 ºC (Fortaleza, CE).
Temperatura média do mês mais frio: 19,1 ºC Semeadura: recomenda-se semear duas sementes
(Brasília, DF) a 25,7 ºC (Fortaleza, CE). em sacos de polietileno com dimensões mínimas
de 20 cm de altura e 7 cm de diâmetro, ou em
Temperatura média do mês mais quente:
tubetes de polipropileno de tamanho médio. Se
22,5 ºC (Brasília, DF) a 27,3 ºC (Fortaleza, CE).
necessária, a repicagem pode ser feita de 1 a 2
Temperatura mínima absoluta: 1,6 ºC semanas após a germinação.
(Brasília, DF).
Germinação: é epígea ou fanerocotiledonar. A
Número de geadas por ano: ausentes. emergência tem início entre 7 e 16 dias após a
Classificação Climática de Koeppen: Am semeadura, com 19 % a 87 % de germinação
(tropical chuvoso com chuvas do tipo monção, com (CARVALHO, 1976; CARVALHO, 2000;
uma estação seca de pequena duração) no RIBEIRO; SIQUEIRA, 2001).
Arquipélago de Fernando de Noronha e em Associação simbiótica: apresenta nódulos
Pernambuco. Aw (tropical quente com estação seca
bacterianos do tipo Rhizobium (CAMPELO,
de inverno) no Ceará, no Distrito Federal, no norte
1976). O mulungu apresentou alta atividade de
de Minas Gerais, em Pernambuco e no Rio Grande
assimilação de nitratos (MUTHUCHELIAN,
do Norte. As (tropical chuvoso com verão seco, a
1993). Esse sistema incomum de redução de
estação chuvosa se adiantando para o outono) na
nitratos parece estar restrito ao gênero Erythrina.
Paraíba e em Sergipe. BSwh (tropical quente e
seco, típico do Semi-Árido nordestino) na Paraíba, Propagação vegetativa: propaga-se muito mal
em Pernambuco, no sudeste do Piauí, no Sertão de por estacas (TIGRE, 1970).
Canudos e na Chapada Diamantina, BA, no Rio
Grande do Norte e em Sergipe.
Características Silviculturais
Solos Erythrina velutina é uma espécie heliófila,
intolerante ao frio.
Erythrina velutina prefere solos coluviais de
Hábito: não apresenta derrama natural. As podas
natureza úmida e aluvionais com textura arenosa
devem ser apenas de formação ou eliminação de
ou argilosa.
brotos-ladrões.
Métodos de regeneração: o mulungu pode ser
Tecnologia de Sementes plantado em plantio misto, associado com
espécies pioneiras e secundárias iniciais,
Colheita e beneficiamento: os frutos devem ser principalmente para corrigir sua forma. Essa
colhidos diretamente da árvore, quando iniciarem espécie brota intensamente da touça ou cepa.
a abertura e a queda espontâneas. Por sua vez, as
Sistemas agroflorestais (SAFs): segundo Braga
sementes também podem ser recolhidas do chão,
(1960), no Ceará, Erythrina velutina já foi
após a queda. Caso se colham os frutos, estes
cultivada como árvore de sombra em cafezais.
devem ser expostos ao sol, para completar a
Na Bahia, é usada para sombrear cacaueiros e,
abertura e soltar as sementes.
em Minas Gerais, tem função de cerca-viva, por
Número de sementes por quilo: 1.000 (TIGRE, ser espinhenta (ÁRVORES, 1997; BRANDÃO
1970); 2.850 (LORENZI, 2002) a 3.700 et al., 2002).
(CARVALHO, 1976).
Tratamento pré-germinativo: quando intactas, Crescimento e Produção
as sementes de mulungu apresentam baixo índice
de embebição. Independentemente da coloração, Há poucos dados de crescimento sobre o
essas sementes apresentam dormência causada mulungu, em plantios (Tabela 32).
pela impermeabilidade do tegumento à água e
provavelmente pela presença de inibidores da
germinação (SILVA; MATOS, 1993). Características da Madeira
Longevidade e armazenamento: em
Massa específica aparente (densidade): a
armazenamento, a viabilidade dessa espécie é
superior a 10 meses. As sementes de mulungu madeira do mulungu é muito leve.
apresentam comportamento intermediário com Cor: a madeira dessa espécie apresenta cor
relação ao armazenamento (CARVALHO, 2000). esbranquiçada.

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Características gerais: a madeira de E. velutina casca propriedades sudorífica, calmante,
é porosa, mole e de baixa durabilidade natural. emoliente e peitoral, e ao seu fruto seco, ação
anestésica local, quando usado na forma de cigar-
ro, como odontálgico.
Produtos e Utilizações
A infusão da casca é empregada como sedativo e
Aproveitamento alimentar: cruas ou cozidas, calmante de tosses e de bronquites, bem como no
as flores dessa espécie são comestíveis (TIGRE, combate a verminoses e no tratamento de
1970). hemorróidas; o cozimento (decocto) é indicado
Artesanato: por seu belo colorido, as sementes para agilizar a maturação dos abcessos nas
dessa espécie são ornamentais. Com elas, pode-se gengivas (BRAGA, 1960; TIGRE, 1970; BARROS,
confeccionar colares, pulseiras e brincos (TIGRE, 1982). É curativa nas picadas de lacraia
1970). Contudo, as sementes têm ação venenosa (Scolopendra morsitans) ou de escorpião (Tytius
quando em quantidade suficiente, causando a bahiensis).
morte. Paisagístico: como árvore ornamental, é usada
Celulose e papel: a madeira de E. velutina é para sebes, cercas-vivas, grupos vegetais
inadequada para esse uso. arquitetônicos e arborização de ruas e de
avenidas.
Constituintes fitoquímicos: o alcalóide eritrina,
contido na casca e na semente do mulungu, tem Plantios com finalidade ambiental: é
poderosa ação nos nervos, causando sua paralisia; recomendada para plantios mistos destinados à
quando macerada, a casca tem ação hipnótica e restauração de áreas degradadas de preservação
narcótica, tal qual o tingui (Magonia pubescens) permanente.
age na pesca (TIGRE, 1970). A análise
fitoquímica mostrou também a presença de diver- Substâncias tanantes: a casca dessa espécie
sos alcalóides do tipo comumente encontrado nas produz uma tintura amarela e tem propriedade
espécies de Erythrina (FERRO et al., 1988). tanínica (TIGRE, 1970).

Corante: quando maceradas, as flores do


mulungu produzem uma tinta amarelo- Espécies Afins
avermelhada, que pode ser usada para tingir pa-
nos (TIGRE, 1970). O gênero Erythrina L. compreende cerca de 115
espécies distribuídas em todas as regiões tropicais
Energia: produz lenha de baixo poder calorífico.
do mundo, estendendo-se nas áreas quente-
Madeira serrada e roliça: por ser leve e porosa, temperadas, como no Sul da África, na
a madeira dessa espécie quase não tem aplicação. Cordilheira do Himalaia e no sudeste dos Estados
Contudo, os sertanejos se servem dela para fazer Unidos.
cavaletes, com os quais atravessam os rios no
As espécies de Erythrina ocorrem numa ampla
Nordeste, quando há cheias (BRAGA, 1960).
variedade de habitats, desde o bosque tropical
Também é usada como bóia, pau-de-jangada,
chuvoso de terras baixas e desertos subtropicais
balsa, cocho para pôr alimento para animais, faca
muito áridos até bosques montanos de coníferas
de cortar papel, forma de modelação, molduras,
acima de 3.000 m de altitude.
caixotaria, brinquedos e tamancos (TIGRE, 1970).
Atualmente, são reconhecidos cinco subgêneros e
Medicinal: a casca e os frutos dessa espécie são
26 seções na subdivisão taxonômica de Erythrina:
empregados na medicina popular em algumas
70 espécies são conhecidas nas Américas, 31 na
regiões do Nordeste, embora a eficácia e a segu-
África e 12 na Ásia e na Oceania (NEILL, 1993).
rança do seu uso ainda não tenham sido compro-
vadas cientificamente (LORENZI; MATOS, 2002). No Brasil, são encontradas cerca de 12 espécies
Assim, seu uso vem sendo feito com base na tradi- (KRUKOFF; BARNEBY, 1974), das quais oito
ção popular. São atribuídas às preparações de sua ocorrem no Nordeste (BARBOSA et al., 2006).

Tabela 32. Crescimento de Erythrina velutina em plantio misto, no Estado de São Paulo.
Idade Espaçamento Plantas Altura média DAP médio Classe de
Local
(anos) (m x m) vivas (%) (m) (cm) solo (a)

Garça, SP(1) 2 5x5 100,0 2,00 4,0 LVdf


(a) LVdf = Latossolo Vermelho distroférrico.
Fonte: (1) Embrapa Florestas / Tropical Flora

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