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Nome fictício: Rosa

Idade: quando iniciou o tratamento, 39 anos

Filhos: dois (6 e 11 anos)

Estado civil: divorciada

Reside: morava com a mãe, um irmão e os dois filhos

Rosa veio encaminhada pela assistente social do banco onde trabalhava e pelo psiquiatra
que tratava dela havia cinco anos. Passou por cinco tentativas de suicídio antes de chegar
ao meu consultório, e teve um acompanhante terapêutico que a ajudou a voltar para sua
rotina e, posteriormente, a sair sozinha.

Rosa namorou por quatro anos e ficou seis anos casada, tendo vários conflitos com o
marido que, depois do nasci-mento das crianças, passou a maltratá-la, a beber e a traí-la.
Tudo piorou com o nascimento da filha menor. Rosa entrou em depressão profunda após
o parto. E, em menos de um ano, o marido abandonou a família. Nesse momento, ela
passou pela primeira tentativa de suicídio utilizando-se de remédios que tinha em casa.
Após esse episódio, foi morar com a mãe, pois não tinha suporte para viver sozinha.
Seguiram-se mais quatro tentativas...

Rosa falava muito. Na maioria das sessões, revelava uma confusão de histórias. Percebi
que era incapaz de fixar o olhar, não ouvia, falava continuamente, não conseguia
comunicar seu sofrimento. Rosa tomava uma quantidade bem elevada de antidepressivos
e antipsicóticos, além de calmantes. Não conseguia ficar sozinha, demonstrava apego às
relações que a faziam se sentir dependente e verbalizava que lhe “faltava sexo”.

Mesmo nessa condição, Rosa tentava arrumar parceiros, sobretudo homens complicados,
pessoas que a usavam. As crianças ficavam praticamente aos cuidados da avó e do tio.
Ela tinha muita dificuldade de me ouvir. Qualquer pergunta ou observação que eu tentava
fazer parecia instalar uma parede entre nós. Que desafio... Nem pensar em frustrá-la, pois
eu acreditava que uma pessoa com ajustamento do tipo psicótico já está suficientemente
frustrada. Em contrapartida, entendo que a necessidade tem uma função orientadora,
direciona e norteia. Por esse motivo, evitava em minhas intervenções a pergunta “O que
você quer?”, pois parecia não funcionar com Rosa. “O que você quer?” talvez fosse uma
das questões às quais ela não conseguia responder porque tinha dificuldade de traduzir
seus sentimentos confusos, sensações difusas e de nomear tantos sentimentos sem nome.
Passei meses só ouvindo com muita atenção. Às vezes, solicitando que repetisse o que
contava na tentativa de que ela mesma se ouvisse. Eu dizia: “Não entendi, me explica
melhor”.

O elemento recorrente era a dificuldade de falar de si mesma, sobretudo quando se tratava


de suas emoções. Ela se queixava de dores de cabeça e impaciência; demonstrava muita
ansiedade e dificuldade de parar, repousar e principalmente de prestar atenção. Mesmo
com toda aquela medicação, Rosa permaneceu por meses na dificuldade de se expressar.
Minha direção terapêutica foi a de confiar que seria por meio do vínculo de confiança que
daríamos base para uma relação ge-nuína e mais profunda. Ela queria amar e ser amada...
Com o tempo (e um longo tempo), Rosa foi se aproximando dos filhos e tomando posse
do seu lugar de mãe. Eu sentia por ela uma imensa compaixão. Rosa é sensível, ingênua,
sem maldades. Dificilmente colocava a raiva para fora.

Eu percebia o tempo todo nela um “desassossego no coração”, e por esse motivo


compreendi que seria importante entrar na fase da confirmação de seus sentimentos e de
aceitação de como ela estava na condição em que poderia estar.

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