Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Colaboração:
SH, DC e AS
Diagramação e Capa: Vicente Júnior
Impressão: Brisa Editora Gráfica Ltda
SIG Sul Qd. 06 Nº 1265
CEP 70610-0460 - Brasília - DF
Introdução
“Onde houve um ser humano com uma tal mescla como essa
misteriosa, essa fascinante, essa portadora da luz que é HPB? Onde
podemos encontrar uma personalidade tão marcante e tão dramática;
alguém que tão claramente apresentava em seus lados opostos o
divino e o humano? O Carma me proíbe que eu lhe faça a mínima
injustiça, mas se alguma vez na História existiu uma pessoa que foi
um maior conglomerado de bem e de mal, luz e sombra, sabedoria e
indiscrição, percepção espiritual e falta de bom senso, eu não posso
me lembrar do nome, nem das circunstâncias ou da época. Tê-la
conhecido foi uma educação muito ampla, ter trabalhado com ela e
gozado de sua intimidade, uma experiência do tipo mais precioso. Ela
era uma ocultista demasiado grande para medirmos sua estatura
moral. Ela nos compelia a amá-la, por mais que conhecêssemos suas
faltas; a perdoá-la, por mais que ela pudesse ter quebrado suas
promessas e destruído nossa crença inicial em sua infalibilidade. E o
segredo desse poderoso encantamento eram seus inegáveis poderes
espirituais, sua evidente devoção aos Mestres, a quem ela descrevia
como personagens quase supranaturais, e seu zelo pela elevação
espiritual da humanidade, por meio do poder da Sabedoria Oriental.
Será que veremos alguém como ela novamente? Será que em nosso
tempo, a veremos novamente sob algum outro disfarce? O tempo nos
dirá.” (ODL I, x)
(p. 13)
Poucos anos após a morte de HPB a mistificação e “endeusamento”
de sua imagem já estava presente no movimento teosófico em geral. Olcott,
no prefácio de seu livro Old Diary Leaves (ODL), conta como recebeu
ameaças e censuras por relatar facetas não muito elogiosas de Madame
Blavatsky:
Helena Petrovna von Hahn era filha do coronel Peter von Hahn e
Helena Andreyevna, nascida Fadeyev, renomada escritora que faleceu ainda
jovem. Seus avós maternos eram o Conselheiro Andrey de Fadeyev e a
Princesa Helena Pavlovna Dolgorukov.
Sua irmã Vera nasceu em abril de 1835 e seu irmão Leonid em junho
de 1840. Nos primeiros dez anos de vida a família mudou várias vezes de
residência, por causa da saúde precária de sua mãe e também devido às
constantes transferências do batalhão de artilharia do pai. Dos seis aos nove
anos ela preferia a companhia dos soldados a das criadas, passando longos
períodos no batalhão do pai.
(p. 17)
A “História Oficial” do Casamento com Nikifor V. Blavatsky
A própria HPB e sua tia Nadya contaram para Sinnett que ela
resolvera se casar com o velho Blavatsky, que tinha três vezes a sua idade,
reagindo a uma provocação de sua governanta, Miss Jeffries, que teria dito
que, com seu gênio terrível, nenhum homem, nem mesmo o velho Blavatsky
se casaria com ela. (Sinnett 1886, 54)
É bom lembrar que quando Sinnett escreveu seu livro, HPB ainda era
viva, e não queria que fossem revelados muitos detalhes de sua vida anterior
à fundação da Sociedade Teosófica, época a partir da qual ela se tornou uma
pessoa mais amplamente conhecida. Muitos biógrafos têm simplesmente
repetido essa história, com poucas modificações, até mesmo em biografias
recentes, como é o caso de Sylvia Cranston, em seu livro The Extraordinary
Life and Influence of Helena Blavatsky (Helena Blavatsky: A Vida e a
Influência Extraordinária da Fundadora do Movimento Teosófico Moderno).
Madame Pissarev diz em seu livro que esses fatos lhe foram narrados
por Madame Yermolov, esposa do governador de Tiflis entre os anos de
1840 e 1850. Todos os Yermolovs eram íntimos amigos da família de HPB,
especialmente dos Fadeyevs, enquanto esses residiram em Tiflis.
(p. 19)
“... meu bisavô materno, Príncipe Paul Vasilyevitch Dolgurouki, tinha
uma estranha biblioteca contendo centenas de livros sobre alquimia,
magia e outras ciências ocultas. Eu os li com o maior interesse antes
dos 15 anos. Todas as artes e magias, tidas como diabólicas, da
Idade Média encontraram refúgio em minha cabeça e logo nem
Paracelsus, Kunrath nem C. Agrippa teriam tido alguma coisa para
me ensinar. Todos eles falavam do “casamento da Virgem vermelha
com o Hierofante”, e daquele do “mineral astral com a sibila”, da
combinação dos princípios feminino e masculino em certas
operações alquímicas e mágicas.” (HPB Speaks II, 62)
A Escolha de Nikifor
(p. 20)
As referências que HPB faz a respeito de seu casamento para o
príncipe Dondoukoff-Korsakoff reforçam essa ideia, pois ela relata que
anteriormente já compartilhava com Nikifor conversas sobre o oculto:
(p. 22)
“Helena P. Blavatsky, que tem cerca de quarenta anos de idade (*),
com dezessete anos casou-se com um nobre russo então em seu
septuagésimo terceiro ano de idade. Por muitos anos (**) eles
residiram juntos em Odessa, e finalmente uma separação legal (***)
foi efetuada. O marido morreu recentemente com 97 anos. (*) uma
lorota; (**) uma mentira – estive com ele por apenas três
semanas; (***) legal, porque ele morreu.” (CW I, 54)
Pouco antes do retorno de HPB à Rússia, sua tia havia escrito para
Nikifor, para saber como ele reagiria diante do retorno de HPB. Ele lhe
respondeu em 13 de novembro de 1858:
O que teria levado HPB para junto de seus familiares, após um longo
período de independência viajando pelo mundo? Como veremos, talvez um
dos principais motivos seja essa criança chamada Yury.
“... ela quis salvar a honra de uma amiga e adotou o filho dessa amiga
como seu próprio filho. Ela nunca se separava dele, educou-o ela
mesma e o chamava de filho diante do mundo. Agora ele estava
morto.” (Solovyoff, 141)
(p. 25)
Na carta seguinte para Sinnett ela reforça o pedido para que ele nada
mencionasse a respeito da criança:
O atestado médico a que HPB ser refere na carta acima havia sido
dado pelo Dr. Leon Oppenheimer, a quem ela fora consultar em Würzburg,
devido a um problema de bexiga. Está datado de 3 de novembro de 1885 e
diz:
“O abaixo assinado atesta, como solicitado, que Madame Blavatsky
de Bombay – Secretária Correspondente em Nova Iorque da
Sociedade Teosófica – está atualmente sob tratamento médico com
o abaixo assinado. Ela sofre de Anteflexio Uteri, muito
provavelmente desde o nascimento; porque, como provado por um
minucioso exame, ela nunca gerou uma criança, nem teve qualquer
doença ginecológica.” (Fuller, 189)
Na verdade o médico não podia atestar que HPB era virgem pelo
simples fato de que ela não o era, como a própria HPB explica numa carta
encontrada nos Arquivos em Adyar, junto com o segundo certificado. É uma
única folha, numerada como folha quatro. Aparentemente é uma carta de
HPB para Sinnett, na qual ela conta, com seu costumeiro exagero, que
“todas as suas entranhas, útero e tudo” haviam saído de seu corpo devido
a uma queda, causando a perda da virgindade:
“... aqui está seu estúpido atestado novo, com seus sonhos de virgo
intacta numa mulher que teve todas as suas entranhas postas para
fora, útero e tudo, devido à queda de um cavalo. E de novo o doutor
olhou, examinou três vezes, e disse o que o Professor Bodkin e
Pirogoff disse em Pskoff, em 1862. Eu nunca poderia ter tido relações
com qualquer homem sem uma inflamação, porque me falta algo e
o lugar está preenchido com algum pepino torto.” (Neff, 187)
O exame pelo Professor Bodkin e Pirogoff, em Pskoff, não deve ter
sido feito em 1862 pois nessa época, como veremos, ela estava no Cáucaso.
Esse exame deve ter sido realizado em 1859. Provavelmente é a ele que
HPB se refere ao contar para Sinnett sobre as desconfianças de seu pai:
“Quando lhe contei que até mesmo meu próprio pai suspeitava de
mim e que, não fosse pelo atestado médico, talvez nunca tivesse
(p. 27)
me perdoado. Depois, ele teve pena e afeiçoou-se àquela pobre
criança inválida. Ao ler esse livro Home, o médium, seria o primeiro a
reunir o remanescente de suas forças e me denunciar, dando nomes,
fatos e não sei mais o que.” (LBS, 151)
Isso implica que ela já deve ter chegado no início de 1859 com Yury,
fato que teria despertado desconfianças de seu pai com relação à
maternidade de Yury. Então, ainda em Pskov, ela teria se submetido ao
exame médico pelo Professor Bodkin e Pirogoff para acalmar o pai.
(p. 28)
Agardi Metrovitch: Pai de Yury?
Embora HPB tenha guardado segredo sobre quem era a mãe de
Yury, ela declara que o pai era o Barão Nikolai Meyendorff, da Estônia. No
entanto, para alguns biógrafos como Marion Meade, que consideram Yury
como filho biológico de HPB, o pai seria o seu velho amigo Agardi Metrovitch.
Isso porque havia um antigo falatório de que eles eram amantes e também
porque Metrovitch esteve em Tiflis durante a época em que HPB lá estava,
em 1863. (LBS, 189)
HPB realmente foi grande amiga de Metrovitch por muitos anos. Ele
era seu “mais fiel e devotado amigo desde 1850”, quando ela o ajudou a
escapar da prisão na Áustria “com a ajuda da Condessa Kisselev”. (LBS,
189). Madame Blavatsky atribui o falatório de que Metrovitch era seu amante
a Emma Coulomb. Isso porque, quando estavam juntas no Cairo, em 1872,
ela presenciou cuidados especiais que HPB dispensou a Metrovitch fazendo-
a:
Além de contar para Sinnett que Yury era filho do Barão Meyendorff,
Madame Blavatsky lhe fala de uma certa Nathalie Blavatsky, que teria tido
um romance com Meyendorff, dando a entender que Nathalie seria a mãe de
Yury:
Por que essas cartas estavam com Olcott é algo difícil de entender,
mas deve ser a elas que ele se refere quando escreve:
“... durante anos tive em minha posse um maço de cartas antigas que
provavam a sua inocência [de HPB], com relação a uma determinada
falta grave da qual ela havia sido acusada, enquanto que
deliberadamente sacrificou sua própria reputação para salvar a honra
de uma jovem senhora que havia caído em desgraça.” (ODL II, 135)
É bom lembrar que a reputação da própria HPB também não era nada
boa, uma vez que ela mesma fazia com que as pessoas inventassem
falatórios sujos a seu respeito: “desde meus dezoito anos, tentei fazer
com que as pessoas falassem de mim, e dissessem que esse e aquele
homem eram meus amantes, e centenas deles.” (Solovyoff, 178)
“Quem quer que seja que lhe contou sobre mim, lhe falou a verdade,
em essência, se não nos detalhes. Só Deus sabe o quanto tenho
sofrido por meu passado. É claramente meu destino não receber
absolvição na terra. Esse passado, como a mancha da maldição
sobre Caim, tem me perseguido toda a minha vida e me persegue até
mesmo aqui, na América [EUA], para onde vim para estar longe dele
e das pessoas que me conheceram em minha juventude. Tenho um
pedido para lhe fazer: Não me prive da boa opinião de Andrew J.
Davis. Não lhe revele aquilo que, se ele souber e estiver convencido
disso, me forçaria a escapar para os confins da terra. Tenho apenas
mais um refúgio no mundo, que é o respeito dos espíritas da América,
que desprezam o ‘amor livre’ mais do que qualquer outra coisa.”
(Solovyoff, 228-230)
(p. 31)
“... seus amigos ficaram tão surpresos quanto pesarosos ao ler anos
depois fragmentos de sua suposta biografia, que a mencionavam
como uma pessoa bem conhecida tanto na alta quanto na baixa
sociedade de Viena, Berlim, Varsóvia e Paris, e relacionavam seu
nome com eventos e historias que teriam acontecido nessas cidades,
em várias épocas, quando seus amigos tinham todas as provas
possíveis de que ela estava longe da Europa. Essas histórias se
referiam a ela indistintamente por nomes como Julie, Nathalie etc.,
que eram realmente nomes de outras pessoas com o mesmo
sobrenome; e atribuíam a ela várias aventuras extravagantes.”
(Sinnett 1886, 73)
“Ele diz que ele (S.) [Solovyoff] encontrou pessoalmente com o Barão
Meyendorff, que lhe confessou que esteve tão apaixonado por mim
(!!) que havia até mesmo insistido para que eu obtivesse o divórcio
do velho Blavatsky, e me casasse com ele, Barão Meyendorff. Mas
que felizmente eu recusei isso, e ele ficou muito feliz porque
descobriu mais tarde que mulher sem honra, LICENCIOSA eu era, e
que a criança era SUA E MINHA!!! E o atestado do médico de que
nunca dei à luz, não apenas a uma criança, mas nem mesmo a uma
doninha? No entanto ele [Solovyoff] mente, estou certa, pois sendo
covarde e fraco como sei que é Meyendorff, ele nunca poderia ter-lhe
dito uma coisa dessas.” (LBS, 207)
“Então, na segunda vez em que vim para Tiflis, para ver meu parente,
o Conselheiro André Mihailovich Fadeyev, em 1860, e fiquei por cerca
de um ano com meu marido Blavatsky (que era então um Conselheiro
de Estado). O endereço era na Avenida Golovinsky, na casa do Sr,
Dobrzhausky.” (HPB Speaks II, 156)
(p. 35)
“... em atendimento a uma petição apresentada por seu marido, para
efeito de que ela, Madame Blavatsky, acompanhada pela criança sob
a guarda deles, Yury, fosse para as províncias de Tauris, Cherson e
Pskov pelo período de um ano.” (CW I, xlvi)
“Alguém poderia acreditar que você não tem nem mesmo um kopek,
como outras pessoas pobres. E a pessoa ficaria muito surpresa
descobrindo que você recebe 100 rublos todo mês. Porque eu estou
bastante segura que você está recebendo, com a exceção de um
dos meses do inverno, quando Blavatsky também não recebeu seu
salário. Tenho uma carta de Alek. Fed. [Major Alexander Fyodorovitch
von Hahn] na qual ele diz que enviou minha carta e o dinheiro de
Blavatsky para você ... Isso aconteceu em julho; agora estamos em
agosto e Blavatsky novamente lhe enviou dinheiro alguns dias atrás,
na presença do marido de N___.” (Murphet 1988, 51)
Assim, fica claro que desde o início houve algum tipo de colaboração
entre os dois e que o relacionamento deles não se limitou apenas à birra de
uma adolescente com um “velho”, do qual teria fugido após três meses, e
nunca mais encontrado, conforme nos conta a “historia oficial”. Talvez em
gratidão àquele que lhe auxiliou no começo de sua jornada é que Helena
Petrovna nunca tenha deixado de ser H.P. Blavatsky.
“Sempre que era chamada pelo nome, abria os olhos quando ouvia o
chamado e era eu mesma, com minha própria personalidade em
todos os detalhes. Mas logo que me deixavam sozinha, no entanto,
recaía em minha habitual condição semi consciente e me tornava
uma outra pessoa (quem era, Madame B. não contará).
(p. 37)
(...) Quando acordada, e sendo eu mesma, lembrava-me
perfeitamente de quem eu era no meu segundo papel, e do que tinha
sido e estava fazendo.” (Sinnett 1886, 147-48)
(p. 38)
Viajando Nos Cárpatos (1867)
Jean O. Fuller, em seu livro Blavatsky and Her Teachers, acha que
HPB não estava com Metrovitch, mas que talvez ela mesma estivesse dando
alguns recitais de piano durante a viagem. (Fuller, 19) Porém, o fato de nas
anotações não existir qualquer menção a ele ou a qualquer outro
acompanhante, não quer necessariamente dizer que ela estivesse viajando
sozinha. Outros biógrafos acham que ela estava tanto com Metrovitch quanto
com Yury. (Meade, 90-91)
(p. 39)
Um local dado como certo que HPB esteve, entre 1865 e 1868 é na
batalha de Mentana, na Itália, que ocorreu em novembro de 1867.
Entretanto, o que ela fazia por lá é um mistério, que mesmo na época era
conhecido apenas por poucas pessoas: “Os Garibaldi (os filhos) são os
únicos que sabem de toda a verdade e mais alguns garibaldianos com
eles. O que eu fiz, você sabe parcialmente, não sabe de tudo.” (LBS,
144) Mas HPB garante que:
“Eu escrevo histórias sobre fatos que aconteceram aqui e acolá, com
pessoas vivas, apenas mudando seus nomes (não em ‘Pode o Duplo
Matar?’, onde fui tão tola que coloquei os personagens verdadeiros);
e isso me foi apresentado e arranjado por Illarion”. (LBS, 152)
(p. 40)
Morte de Yury (1867)
HPB contou para Sinnett que após Tiflis ela encontrou-se com
Metrovitch na Itália. Ela havia levado “a pobre criança para Bolonha, para
ver se poderia salvá-la”. (LBS, 144) Nessa ocasião:
“... ele fez tudo que pode por mim, mais do que um irmão. Então a
criança morreu; e como ela não tinha nenhum tipo de documento, e
eu não me importava em dar meu nome como alimento para os
falatórios amáveis, foi ele, Metrovitch, que assumiu todo o trabalho,
que enterrou o aristocrático filho do Barão – sob o seu próprio
nome, Metrovitch, dizendo que “não se importava”, numa pequena
cidade do sul da Rússia, em 1867. Depois disso, sem avisar meus
familiares que havia retornado à Rússia para trazer de volta o infeliz
menininho, que não consegui devolver com vida para a governanta
que o Barão escolhera para ele, simplesmente escrevi para o pai da
criança notificando-o sobre essa ocorrência agradável para ele e
voltei para a Itália com o mesmo passaporte.” (LBS, 144)
“Eu estava com 35 anos quando o vi pela última vez. Não vamos falar
dessa época terrível e eu lhe imploro que a esqueça para sempre.
Eu havia recém perdido o único ser que fazia a vida valer a pena ser
vivida, um ser a quem amei, parafraseando Hamlet, como “quarenta
mil pais e irmãos nunca amarão seus filhos e irmãs”.” (HPB
Speaks II, 19)
Para Dondoukoff ela dá outra versão: que aos 35 anos – isto é, 1866
ou no primeiro semestre de 1867, Yury havia recém morrido. Que ela estava
no Egito entre 1865 e 1868, e não na Itália e que, ao invés de ir para o Tibet,
voltou para a Rússia. E em Kiev, Yury teria morrido e sido enterrado.
Nele Coues diz que o Sr. W.E. Coleman recebeu uma carta de Daniel
D. Home, situando HPB “em Paris em 1857 ou 58, como uma mulher de
reputação suspeita, tendo um caso com o príncipe Emil de
Wittgenstein, de quem ela teve um filho deformado, que morreu em
Kiev, em 1868.” (Coues)
Essa afirmação fez com que HPB movesse uma ação contra Coues
e o jornal The Sun, na qual Judge atuou como seu advogado. Ao comunicar
à Sociedade Teosófica sua decisão de entrar com a ação judicial, HPB
escreve:
(p. 42)
Mas como nesse caso o jornal além de atacar sua moral, atacava a
de um velho amigo da família, já falecido, ela decidira entrar com um
processo por difamação. Ser chamada de uma mulher de reputação suspeita
era “tão ridículo que dá vontade de rir” (Judge 1999, iii), mas as outras
acusações não podiam ficar sem uma condenação. O caso acabou sendo
encerrado antes de ser concluído devido a morte de HPB, em 8 de maio de
1891.
“... ele diz que ela [HPB] estava em Paris em 1858. “Eu não tive
nenhum interesse especial nela”, diz o Sr. Home, “a não ser uma
estranha impressão que tive, na primeira vez que encontrei com um
jovem cavalheiro, que desde então tem sido como um irmão para
mim. Ele não seguiu meu conselho. Naquela época ele era seu
amante, e era por demais repulsivo para mim que ela, com o intuito
de chamar a atenção, fingisse ser uma médium. Meu amigo ainda
pensa que ela é mediúnica, mas também está plenamente
convencido de que ela é uma impostora.” (Coues)
“... em toda a minha vida nunca vi nem D.D. Home, nem sua esposa;
nunca estive na mesma cidade que ele por meia hora, em minha vida.
De 1851 a 1859 estava na Califórnia, Egito e Índia. Em 1856-58
estava no Kashmere e em outros lugares.” (Anonymous, fac-símile)
(p. 44)
Mas de outras fontes fica claro que HPB conhecia pelo menos a
primeira esposa de D.D. Home, a Condessa Alexandrine (Sasha) de Kroll. O
periódico Human Nature de abril de 1872, anunciava a formação da Société
Spirite no Cairo e publicava uma nota da própria HPB, onde ela se apresenta
como uma amiga da falecida esposa de D.D. Home:
“Presume-se que HPB foi via Índia para algumas partes do Tibet, e
que isso ocorreu em alguma época de 1868; há menções de sua
passagem cruzando as Montanhas Kuenlon e indo via Lago Palti
(Yamdok-Tso), embora isso seja geograficamente inconsistente. Foi
nessa viagem para o Tibet que ela encontrou o mestre KH pela
primeira vez, e morou na casa de sua irmã, em Shigadze. Esse pode
ter sido o período em que ela passou cerca de sete semanas nas
florestas não longe das Montanhas de Karakorum.” (CW I, xlviii)
(p. 46)
Tentativas de Entrar no Tibet (década de 1850)
Olcott ainda diz que o capitão Murray tinha ordens escritas de não
permitir que nenhum europeu atravessasse o rio Rungit, pois eles quase que
certamente seriam mortos pelas tribos selvagens daquele país. (Neff, 58)
Note-se que Murray declara que seu encontro com HPB aconteceu
em 1854 ou 1855, e não em 1853 como Sinnett relata. Se essa viagem foi
com o “inglês” norte americano Albert Rawson, uma época provável para a
viagem é a mencionada por Murray (1854 ou 1855).
(p. 47)
Outro aspecto que reforça a data dada por Murray é o fato de que ele
só foi apontado como comandante do Sapers and Miners em julho de 1854.
Apesar dele dizer que era capitão, sua patente era a de tenente. Ele só foi
promovido a capitão em 28 de dezembro de 1857, época em que Madame
Blavatsky já estaria fora da Índia, uma vez que ela diz ter deixado esse país
um pouco antes do motim em Meerut, que ocorreu em 10 de maio de 1857.
(Gilbert)
Supõe-se que HPB tenha ido, via Índia, para algumas partes do Tibet,
e que isso ocorreu em alguma parte do ano de 1868. Foi nessa viagem ao
Tibet que ela encontrou com o Mestre KH pela primeira vez e viveu na casa
de sua irmã em Shigatze. Ela relata um episódio dessa estadia em carta para
Sinnett, ao lhe contar sobre o método que o Mestre KH usara para lhe ensinar
a língua inglesa, que até então limitava-se ao que uma governanta havia lhe
ensinado na infância.
(p. 48)
“Fui para a cama e tive a visão mais extraordinária. Eu havia em vão
chamado os Mestres – que não vieram em meu estado de vigília, mas
agora no sono eu via a ambos. Eu estava novamente (uma cena de
muitos anos atrás), na casa do Mahatma KH. Eu estava sentada
sobre um tapete, num canto, e Ele andando pela sala em seu traje de
montaria e o Mestre falava com alguém atrás da porta. “Eu lembrar
não posso” – pronunciei em resposta à Sua pergunta sobre uma tia
falecida. – Ele sorriu e disse: “Que inglês engraçado que você usa”.
Então eu me senti envergonhada, ferida em minha vaidade, e
comecei a pensar (imagine você, em meu sonho ou visão que era a
exata reprodução do que ocorreu, palavra por palavra, há dezesseis
anos atrás) “agora que estou aqui e falando tão somente em inglês
em linguagem verbal fonética, posso talvez aprender a falar melhor
com Ele.” (Para deixar claro, com o Mestre eu também usava o inglês,
que fosse bom ou ruim dava no mesmo para Ele, uma vez que não
fala, mas compreende cada palavra que eu falo da minha cabeça e
eu consigo compreendê-Lo – o como eu nunca poderei dizer ou
explicar, mesmo que me matassem, mas eu compreendia.” (MLcr.,
454)
(p. 50)
Emma Coulomb também tinha algumas capacidades psíquicas, como
escreveu anos mais tarde o Mestre KH para Franz Hartmann: “Mad.
Coulomb é uma médium e, como tal, irresponsável por muitas coisas
que ela possa dizer ou fazer.” (LMW 2nd Series, 131)
“... ela entrou novamente em contato com seu velho amigo, o Copta
de fama misteriosa, cuja menção foi feita em conexão à sua primeira
visita ao Egito, no início de suas viagens. Por várias semanas ele foi
seu único visitante.” (Sinnett 1886, 160)
Ela ainda relata para Sinnett que nenhuma igreja quis enterrá-lo e
que os franco-maçons, a quem apelou, também ficaram com medo. Então,
com a ajuda de “um abissínio – um discípulo de Illarion – e com o
servente do hotel nós cavamos uma cova embaixo de uma árvore a
beira do mar (...) e enterramos seu pobre corpo.” (LBS, 190)
Capítulo 5
(p. 54)
Na última sessão em que Madame Blavatsky participou, na noite de
24 de outubro, um dos espíritos se dirigiu a ela dizendo que daria uma prova
concreta da genuinidade das manifestações que lá estavam ocorrendo:
“Colocarei em suas mãos o prendedor da medalha de honra usada em
vida por seu valente pai, e enterrada com seu corpo na Rússia.” Logo a
seguir, HPB emitiu uma exclamação e quando a luz foi jogada sobre ela
“todos nós vimos Mad. de B. segurando em suas mãos um prendedor
de prata de um tipo muito curioso, que ela olhava admirada e sem
palavras.” (Gomes 1987, 41)
A excitação foi grande e a notícia logo foi para os jornais. D.D. Home,
o médium, acusou-a então de fraude, com base no fato de que na Rússia
não era um hábito enterrar os mortos com suas medalhas. Explicando para
Aksakov, HPB lhe escreve que o “espírito” John King havia lhe dado a
medalha, trazendo-a do túmulo de seu pai em Stavrapol, dizendo: “a
trazemos como uma lembrança nossa, em quem você acredita e tem
fé.” (Neff, 203)
“Eu aprendi que não há como convencer pessoas apenas com fatos
suspeitos, e também que todo fenômeno genuíno sempre mostra um
ou outro lado fraco, sobre o qual é fácil os oponentes se apegarem.”
(Solovyoff, 248)
(p. 55)
Katie King era um espírito que costumava se materializar em sessões
com a médium Florence Cook, em Londres. William Crooks, que investigava
o caso na Europa, chegou a fazer fotografias de Katie King e Florence Cook.
Em maio de 1874 Katie King despediu-se das sessões em Londres dizendo
que não mais voltaria. Oito dias depois começou a materializar-se nos
Estados Unidos. Nessas aparições Katie King pediu ao Dr. Henry Child que
escrevesse a Robert Dale Owen relatando o que estava acontecendo.
O Dr. Henry Child passou atuar como uma espécie de promotor dos
Holmes e escreveu para o jornal de Chicago, Religio-Philosophical
Journal, uma biografia de Katie King em capítulos, onde dava detalhes de
quem havia sido o espírito, onde nascera etc. Para Child, ela teria sido Annie
Morgan, filha de Sir Henry Morgan, mais conhecido como John King. Após a
partida de Owen, os Holmes também deixaram a cidade.
Owen então escreveu para Olcott convidando-o para vir até Filadélfia
e investigar as aparições de Katie King. No início de dezembro de 1874
surgiram denúncias de que, na verdade, Katie King não era um espírito, mas
uma mulher viva, Eliza White, que se fazia passar pelo espírito.
Eliza White mostrou numa “sessão” particular para Owen e Child a
forma como fraudulentamente se fazia passar por Katie King. Embora Katie
King tenha se materializado na casa dos Holmes, do outro lado da cidade,
nesse exato momento, os dois, convencidos da farsa, desconsideraram essa
sincronicidade e retiraram imediatamente todo o apoio e credibilidade que
vinham dando aos Holmes.
(p. 57)
Em abril de 1875, HPB publicou duas cartas sobre essa questão, uma
intitulada The Philadelfia “Fiasco,” or Who is Who? (O “Fiasco” de
Filadélfia, ou Quem é Quem?) (CW I, 56), e a outra Who Fabricates? (Quem
Inventa?) (CW I, 75). Na primeira delas ela fala a respeito de quão pouco
esclarecida estava a história toda de Katie King.
Assim, HPB nesse artigo mostra que a situação era complexa e que
qualquer julgamento nesse momento poderia ser precipitado, havendo a
necessidade de maiores investigações. Porém, em seu Scrapbook, ao lado
do recorte de seu artigo, ela anotou:
(p. 58)
“Sim, eu sinto ter que dizer que tive que me identificar com os
espíritas durante aquele vergonhoso desmascaramento dos Holmes.
Tive que salvar a situação, pois fui enviada de propósito de Paris para
a América para provar os fenômenos e sua realidade e – mostrar a
falácia das teorias espíritas de ‘Espíritos’. Mas como poderia ter feito
melhor? Não queria que as pessoas em geral soubessem que poderia
produzir a mesma coisa à vontade. Eu havia recebido ORDENS
em contrário e, ainda assim, tinha que manter viva a realidade, o
caráter genuíno e a possibilidade de tais fenômenos nos corações
daqueles que de materialistas se tornaram espíritas e agora, devido
ao desmascaramento de vários médiuns, retrocederam novamente,
voltando para seu ceticismo. É por isso que, escolhendo alguns
poucos entre os confiáveis, fui à casa dos Holmes e, auxiliada por
M.:. e seu poder, mostrei as faces de John King e Katie King na luz
astral, produzi o fenômeno da materialização e – permiti que os
espíritas em geral acreditassem que isso havia sido feito através da
mediunidade da Sra. Holmes. Ela mesma estava terrivelmente
assustada porque sabia que dessa vez a aparição era real. Será que
agi mal? O mundo ainda não está preparado para compreender a
filosofia das Ciências Ocultas – deixe-os antes de tudo se
assegurarem de que existem seres em um mundo invisível, sejam
eles ‘Espíritos’ dos mortos ou Elementais; e de que há poderes
ocultos no homem que são capazes de transformá-lo em um Deus
na terra.” (CW I, 73)
Em março Olcott lança seu livro People from the Other World
(Gente do Outro Mundo) e vai novamente para Filadélfia visitar Madame
Blavatsky, que nessa ocasião estava morando no endereço de Betanelly. Ele
trabalhava com importação e exportação e era, tanto intelectual e quanto
socialmente falando, de um nível inferior ao de HPB.
(p. 60)
Capítulo 6
John King: Um Pedaço Não Digerido da Literatura Teosófica
“... o espírito John King gosta muito de mim e eu gosto mais dele do
que de qualquer outra coisa na terra. Ele é meu único amigo e se
estou em dívida com alguém pela mudança radical em minhas ideias
sobre a vida, meus esforços e assim por diante, é tão somente com
ele. Ele me transformou e eu estarei em dívida com ele quando ‘for
para o andar de cima’, por não ter que viver, talvez por séculos, na
escuridão e no desalento.” (Solovyoff, 247)
Como é que um ser com quem ela diz estar em dívida “pela
mudança radical em minhas ideias sobre a vida, meus esforços e assim
por diante” poderia ter uma importância pequena na vida de HPB? Como
alguém que “trouxe quatro dos Mestres” à atenção de Olcott poderia ter
uma importância menor? É claro que sua importância não é marginal, mas
sim decisiva!
“Ela manteve a ilusão por meses – pela distância dos anos, não
consigo me lembrar exatamente quantos – e eu vi muitos fenômenos
feitos, conforme se afirmava, por John King. (...) Primeiro ele era John
King, uma personalidade independente; depois era John King,
mensageiro e servo – nunca igualado – dos adeptos vivos e,
finalmente, era um elemental, puro e simples, empregado por HPB”.
(ODL I, 11)
Como Brown passava por uma fase financeira difícil, HPB pediu a
Olcott que escrevesse uma circular falando do jornal. Olcott diz ter escrito
toda a circular sem que ninguém tivesse lhe ditado uma palavra sequer.
Quando estava para ser publicada, Olcott perguntou a HPB, por carta, se a
circular deveria ser assinada por ele ou deveria ficar anônima.
(p. 65)
Então, ela revela que sua opinião era que, ao invés dessa carta,
Olcott deveria receber um pergaminho mágico para que, tendo um fenômeno
concreto em suas mãos, ele pudesse dissipar um pouco das dúvidas que os
“truques de John” certamente estavam lhe causando:
(p. 66)
John King como Advogado de HPB
HPB foi morar na fazenda mas logo entrou em litígio com a Sra.
Gerebko e voltou para Nova Iorque, buscando judicialmente ter seu dinheiro
de volta. A firma de advogados Bergen, Jacobs e Ivins de Nova Iorque
representou-a no caso, que foi a julgamento em 26 de abril de 1875.
“Eu ganhei mais uma ação judicial, e talvez possa recuperar $5.000
do que perdi. John me ajudou na minha ação judicial, isso é certo,
mas ele fez uma coisa muito feia, embora não do ponto de vista do
‘Summerland’ [morada dos espíritos], mas sim de acordo com o
código de honra humano, terreno.” (HPB Speaks I, 90)
(p. 67)
É provável que a “coisa muito feia” a que ela está se referindo seja
uma briga ocorrida entre os dois advogados, aparentemente insuflada por
John King, pois ela escreve ao general Lippitt:
“... Sr. John, em seu ardente desejo de me ajudar, levou seu zelo
longe demais. Ouça o que aconteceu. Após o veredicto, Marks, o
advogado da acusada, me insultou, dizendo que eu havia ganho a
causa através da falsificação de certos documentos. Se eu tivesse
ignorado o insulto, tudo estaria bem, mas eu não o fiz, e chamei meu
advogado para testemunhar o insulto. Meu advogado chamou Marks
de um maldito perjuro, um judeu e um mentiroso. O outro devolveu o
cumprimento, e meu advogado, instigado por John (pois ele diz que
não pode entender como ele fez isso), agarrou-o pelo pescoço e,
jogando-o no chão, lhe deu a mais espetacular surra para o deleite
da audiência e dos jurados, pois isso ocorreu na Sala da Corte, bem
diante do nariz do juiz.” (HPB Speeks II, 175)
(p. 68)
Diz ainda Betanelly que durante o dia John King “apenas dá batidas
e circula pela casa. Mas à noite ele se materializa e caminha pela casa
assustando os empregados.” (HPB Speaks I, 95) Betanelly conta também
um episódio em que John King queria que ele e HPB lhe dessem $50 cada
um:
“John sempre lhe pede dinheiro. Algumas vezes ela [HPB] lhe dá,
outras não, então ele rouba, e depois aparece e lhe conta para
provocá-la. Ele pediu a ela $50, mas ela não lhe deu, porque ele não
disse a razão. Então ele me pediu, e me disse que se eu lhe
prometesse os $50, ele faria um homem, que me devia $500, me
pagar. Então ele disse à Madame B. e barganhou com ela, que se ele
conseguisse $100 de um homem que devia a ela, e não queria pagar,
ela teria que lhe dar $50. John manteve sua palavra e no sábado ela
recebeu $100 do homem, sem lhe pedir, e eu recebi os meus $500.
John disse que ‘psicologizou’ aos dois; e isso deve ter acontecido,
pois ele conseguiu o dinheiro. Ela deu a John $50. E os meus $50,
ele disse, eu devo a ele, e pagarei quando ele me pedir. Nós
colocamos o dinheiro na escrivaninha de John, sua mesa particular,
com seus papéis e correspondências, que ninguém na casa ousa
tocar, pois ele pregará suas peças.” (HPB Speaks I, 94)
“Você ouviu falar do fenômeno que John fez para Olcott? Ele
realmente lhe escreveu uma longa carta e, ao que parece, ele próprio
postou-a, e nela lhe contou alguns segredos maravilhosos. Ele é um
ótimo sujeito, o meu John.” (HPB Speaks I, 63)
“... ele está tão poderoso que ele mesmo, de fato, escreve cartas sem
a ajuda de qualquer médium. Ele se corresponde com Olcott, com
Adams, com três ou quatro senhoras que eu nem mesmo conheço;
vem e me conta ‘o bom divertimento que ele teve com eles’, e como
ele os iludiu. Eu posso lhe dar o nome de dez pessoas com quem ele
se corresponde.” (HPB Speaks I, 85)
(p. 69)
A moça que trabalhava na casa era uma médium e muitas vezes “ela
gritou na escada ao encontrar ‘John King’ nos degraus ou no corredor;
com sua poderosa figura vestida de branco, contando que ele ‘a olhou
de forma penetrante’, com seus negros olhos de fogo. E mais de uma
vez o viu perto de mim, como ela contou aos meus visitantes.” (HPB
Speaks I, 242) Certa vez John King assustou-a terrivelmente quando chegou
a correspondência, pois ele:
“... abriu cada uma delas antes que o carteiro tivesse tempo de
entregá-Ias. Minha empregada, que é magnificamente mediunística –
talvez tanto quanto é estúpida – e que passa todo o dia em transe
desmaterializando tudo na cozinha, entrou correndo em meu quarto,
meio chorando e tão assustada que estava muito pálida, me dizendo
que “aquele espírito amigo, grandão, de barba preta, rasgou e
abriu os envelopes bem na minha mão” e, então, eu li sua carta
(de Lippitt).” (HPB Speaks I, 83)
O Clube de Milagres
“Ele me ama, eu sei, e faria por mim mais do que por qualquer outra
pessoa; [ainda assim] veja as peças que ele me prega quando
contrariado: à menor coisa que eu não faça como ele gostaria que eu
fizesse, ele começa a se fazer de velho Harry, fazendo travessuras –
e que travessuras. Ele me xinga horrivelmente, me chama dos nomes
mais assombrosos, ‘nunca antes ouvidos’; vai aos médiuns e lhes
inventa histórias sobre mim, dizendo-lhes que feri seus
sentimentos, que sou uma mentirosa maliciosa, uma ingrata e assim
por diante (...). Ele falsifica a letra das pessoas e cria problemas nas
famílias; ‘ele desaparece e aparece rápida e inesperadamente’ como
algum Deus ex machina infernal; ele esta em todo lugar ao mesmo
tempo,
(p. 71)
e mete seu nariz nos negócios de todo mundo. Ele me prega as mais
inesperadas peças – algumas vezes peças perigosas, me indispõe
com as pessoas e, então, vem rindo e me conta tudo o que fez, se
gabando e me provocando. (...)
“Há alguns dias ele queria que eu fizesse algo que eu não
queria fazer, pois eu estava doente e não achava aquilo correto;
[então] ele jogou em mim um cáustico pedaço de pedra ‘infernale’,
que estava chaveado num porta-joias dentro das gavetas, e queimou
minha sobrancelha direita e minha bochecha. E, na manhã seguinte,
quando minha sobrancelha se tornou preta como o azeviche, ele riu
e disse que eu parecia uma ‘bela moça espanhola’. Agora vou ficar
marcada pelo menos por um mês. Sei que ele me ama, eu sei disso,
ele é devotadamente ligado a mim, mas me xinga da maneira mais
vergonhosa, o miserável criador de problemas. Ele escreve longas
cartas para as pessoas sobre mim, faz elas acreditarem nas coisas
mais horríveis e, então. se gaba disso!” (HPB Speaks I, 85-86)
(p. 73)
Portanto, em julho de 1875, Olcott ainda não usava a “desculpa” de
um espírito desencarnado para justificar o comportamento atípico de John
King e revela que esse comportamento tinha a intenção de encobrir questões
sérias. Mas a verdade é que, apesar de Olcott demonstrar conhecer esse
lado de John King, em algumas ocasiões ele ainda se sentia confuso e
desconfiado com relação aos seus métodos. O Mestre Serapis lhe chama a
atenção por essa atitude, dizendo que:
(p. 74)
O Anel Duplicado Fenomenicamente por HPB em 1876
“Ela pegou-o entre suas mãos fechadas, sem dizer nada a ninguém
e sem atrair a atenção de qualquer um exceto a minha, esfregou as
mãos por um minuto ou dois, quando eu ouvi o tilintar de metal sobre
metal. Ela sorriu chamando a minha atenção e, abrindo suas mãos,
mostrou-me outro anel junto com o meu, igualmente grande, mas de
um padrão diferente: a placa do sinete sendo de uma jaspe
sanguínea (“bloodstone”) verde escuro, enquanto que a minha era
uma cornalina vermelha. Aquele anel ela usou até sua morte, e agora
é usado pela Sra. Annie Besant, e é familiar a milhares de pessoas.
A pedra quebrou-se na nossa viagem para a Índia e, se me lembro
corretamente, a do anel em questão foi esculpida e engastada em
Bombay.” (ODL I, 347)
É de se supor que esse anel duplicado por HPB fosse muito parecido
com o outro, o que teria causado a confusão de Olcott. Na verdade, Olcott
também pode não estar se recordando bem da data do fenômeno, pois há
uma foto, de setembro de 1875, onde Madame Blavatsky aparece com um
grande anel, bem arredondado, também com uma pedra escura onde,
contudo, só estava gravado o símbolo dos dois triângulos entrelaçados.
(Gomes 1987, 83)
Jinarajadasa relata ainda que HPB usou seu anel desde 1884 até o
dia de sua morte e que, algum tempo antes de seu falecimento, ela teria
deixado instruções ao Círculo Interno de que o anel deveria ser dado para
Annie Besant após a sua morte. Como nessa ocasião, em 8 de maio de 1891,
Besant estava nos EUA, o anel só lhe foi entregue depois, na sua volta.
Muitos acreditam que esse anel tem sido passado pelos presidentes
da Sociedade Teosófica (Adyar) para seus sucessores. Porém, há uma outra
versão defendida por aqueles que seguiram Judge quando ocorreu a
divergência entre ele e Besant – e a consequente criação de outra Sociedade
Teosófica (Point Loma), atualmente com sede em Pasadena (USA). De
acordo com eles, o anel que pertenceu a HPB não teria ficado com Besant,
mas sim com Judge. (Informativo HPB Nº 2)
O Autorretrato de John King (março de 1875)
(p. 77)
em sua capa. Na pilastra da sacada aparecem os símbolos do selo de
Salomão e da suástica. Diz Gomes que:
Olcott descreve numa carta para o general Lippitt como o retrato foi
feito. (HPB Speaks I, 78) HPB comprou um pedaço de um fino cetim branco
do tamanho requerido (0,91 m²), que foi colocado numa prancheta, junto com
pincéis, tintas e água. Todo esse material foi coberto com um pano e deixado
por toda a noite na sala especialmente dedicada aos “espíritos”.
“John Fez todo o restante ele mesmo – por partes, algumas vezes de
dia e algumas vezes à noite. Eu estava na casa durante a maior parte
desse tempo e em mais de uma ocasião sentei-me próximo dela
[HPB] enquanto pintava, e com ela saí da sala por alguns minutos
enquanto o espírito artista desenhava alguma parte da pintura,
embaixo do pano que cobria sua face. As palavras gregas e hebraicas
e os símbolos cabalísticos foram as últimas coisas a serem
colocadas.” (HPB Speaks I, 78)
“Eu ainda não a vi, pois ele não quer que ninguém a veja antes que
ele a termine completamente. (...) John levou embora seu próprio
retrato da moldura por duas vezes, ficou com ele por alguns dias e
trouxe-o de volta – e tudo tão rápido como um raio.” (HPB Speaks I,
59)
(p. 78)
No início de abril a pintura foi enviada para o general Lippitt, com o
pedido de que ele nunca se separasse dela, e que não “deixasse que
muitas pessoas a tocassem, ou até mesmo se aproximassem muito
dela.” (HPB Speaks I, 65) Madame Blavatsky comenta a reação de Lippitt
à pintura:
“Eu estou contente que você tenha gostado da pintura de Johny, mas
você não deve chamá-Io de turco, pois ele é um nobre e querido
espírito, e gosta muito de você. Não é culpa de ninguém se você
ainda não o viu, até agora, como ele é na realidade, e sempre o
imaginou parecido com o velho médico judeu meio materializado que
geralmente lhe era apresentado nos Holmes. Apenas em Londres ele
aparece como ele é; mas ainda trazendo, em suas queridas feições,
alguma semelhança com seus respectivos médiuns, pois é difícil para
ele mudar completamente as partículas extraídas por ele de vários
poderes vitais.” (HPB Speaks I, 65)
Ao enviar a pintura para Lippitt, Madame Blavatsky também lhe
escreveu:
“John pede que você dê atenção à figura do espírito que paira acima
– ‘a mãe e filho’. Diz que você vai reconhecê-la. Eu não a reconheci.
Johny quer que você tente e compreenda todos os símbolos e sinais
maçônicos colocados.” (HPB Speaks I, 64).
(p. 79)
“... e os símbolos e a joia que John King usa sobre seu peito são todos
símbolos Rosacruzes, tendo sido ele um irmão da Ordem, e sendo
esse o laço que o liga à nossa dotada amiga Madame de B.” (HPB
Speaks I, 79)
É importante notar que Olcott refere-se a John King como sendo “um
irmão da Ordem” e que esse é o “laço que o liga” à Madame Blavatsky.
“Se Madame de B. foi admitida para dentro do véu ou não [nos ramos
superiores da Magia Branca], pode-se apenas conjeturar, pois ela é
muito reticente sobre
(p. 80)
esse assunto, mas seus dons surpreendentes parecem impossíveis
de serem explicados com qualquer outra hipótese. Ela usa sobre seu
peito um emblema místico em forma de jóia, de uma Fraternidade
Oriental e é, provavelmente, a única representante nesse país dessa
irmandade, a qual (como Bulwer observa) ‘numa época mais antiga,
era a possuidora de segredos dos quias a Pedra Filosofal era o
menor; que se considerava a herdeira de tudo que os Caldeus,
os Magi, os Gimnosofistas e os Platônicos haviam ensinado; e
que diferiam de todos os filhos sinistros da Magia, pela virtude
de suas vidas, pela pureza de suas doutrinas e pela sua
insistência, como o fundamento de toda Sabedoria, na
subjugação dos sentidos e na intensidade de Fé Religiosa’.”
(Olcott 1875, 453)
“Não tenha medo de que eu esteja louca. Tudo o que posso dizer é
que alguém positivamente me inspira – ... mais do que isso: alguém
entra em mim. Não sou eu quem fala e escreve: é algo dentro de mim,
meu Eu superior e luminoso, que pensa e escreve
(p. 83)
por mim. Não me pergunte, minha amiga, o que eu experimento,
porque não poderia lhe explicar claramente. Eu mesma não sei! A
única coisa que sei é que agora, quando estou para alcançar a
velhice, me tornei uma espécie de depósito do conhecimento de outra
pessoa ... Alguém vem e me envolve como uma névoa, e de repente
me empurra para fora de mim mesma, e então não sou mais ‘eu’ –
Helena Petrovna Blavatsky – mas uma outra pessoa. Alguém forte e
poderoso, nascido numa região completamente diferente do mundo;
e, quanto a mim, é quase como se eu estivesse dormindo, ou deitada
não bem inconsciente – não em meu próprio corpo, mas perto dele,
presa apenas por um fio que me amarra a ele.” (Letters of H.P.
Blavatsky, I)
(p. 84)
Para sua tia Nadya ela reafirma tanto a cura quanto a dualidade que
ela vivenciava:
“Quando minha perna tinha que ser operada (eles queriam operar
quando a gangrena estava se desenvolvendo), o ‘dono da
hospedaria’ (‘host’) me curou. Ele estava todo o tempo de pé,
próximo a um velho negro, e ele pôs um pequeno prendedor branco
em minha perna. Você se lembra que eu lhe escrevi sobre esse
incidente? Agora, ele vai em breve me levar, a Olcott e a vários outros
para a Índia para sempre, nós apenas precisamos primeiro organizar
a Sociedade em Londres. Se ele ocupa outros corpos além do meu,
eu não sei. Mas sei que quando ele não está aqui – às vezes por
muitos dias – eu frequentemente ouço sua voz e lhe respondo
‘através do mar’; Olcott e outros também muitas vezes veem sua
sombra, algumas vezes ela é sólida como uma forma viva, várias
vezes como fumaça; ainda mais frequentemente não é vista, mas
sentida.
“Somente agora estou aprendendo a sair de meu corpo; tenho
medo de fazê-lo sozinha, mas com ele não tenho medo de nada.”
(HPB Speaks I, 224)
Observemos que HPB está dizendo para sua tia e para sua irmã que
esse “alguém”, “dono da hospedaria”, “Nº 2” ou “Sahib” – aquele que
ocupava o corpo dela, que a fazia passar por uma vida dupla, que a ensinava
“a sair do corpo” e em companhia de quem ela “não tinha medo de nada”
– havia sido também o responsável pela cura de sua perna!
“Não sou eu quem fala e escreve: é algo dentro de mim (...). A única
coisa que sei é que agora, quando estou para alcançar a velhice, me
tornei uma espécie de depósito do conhecimento de outra pessoa.”
(Letters of H.P. Blavatsky, I)
Quando HPB escreve, por exemplo, que: “Meu John King sozinho
é uma recompensa suficiente por tudo; ele é, em si mesmo, um dono
de hospedaria para mim. (...) John King é uma personalidade, uma
definida, viva, personalidade espiritual” (Solovyoff, 243), Solovyoff
interpreta essa como sendo a primeira “aparição” do Mestre Morya:
“O que ela diz é bem suficiente para que cada leitor de minha
narrativa reconheça imediatamente nesse John King a primeira
aparição no palco, de nosso velho conhecido, o famoso Mahatma
Tibetano Morya (...) mas ele já está incessantemente visitando nossa
heroína, e é ‘em si mesmo, um dono de hospedaria’ para ela. Ele já
manda Olcott para Havanna [localidade em Nova lorque]. Ele logo
será transfigurado e transformado no Mahatma Morya ou M., o
famoso ‘mestre’.” (Solovyoff, 244)
(p. 86)
Essa confusão entre John King (instrutor imediato de HPB) e o Mestre
Morya (Mestre ou Divino Guru de HPB), até hoje é predominante. Muitas das
ações de John King são atribuídas ao Mestre M. Isso ocorre pelo
desconhecimento de que a presença de um instrutor imediato, além da do
Mestre do discípulo, talvez seja uma prática usual – mais do que
normalmente se imagina.
“Conheço John há 14 anos. Não é de hoje que ele está comigo; ele
se fez conhecido de toda Petersburgo e metade da Rússia, sob o
nome de Janka, ou “Johny”; ele viajou comigo por todo o mundo.
Salvou minha vida por três vezes: em Mentana, num naufrágio e, na
última vez, próximo a Spezia, quando nosso vapor explodiu no ar em
átomos, e de 400 passageiros restaram apenas 16, em 21 de junho
de 1871.” (HPB Speaks I, 84)
Vamos examinar essas três ocasiões em que ela diz que John King
lhe salvou a vida. HPB primeiro fala da batalha de Mentana, que ocorreu em
02 de novembro de 1867. Observemos que ela está afirmando que quem a
salvou foi John King, e não o Mestre Morya, como tantas vezes se afirma. Já
a explosão do Eunomia ocorreu próximo à ilha de Spezzia em 1871, quando
Madame Blavatsky ia de Chipre para Alexandria. Mas, e quanto ao outro
naufrágio?
(p. 87)
HPB conta ao príncipe Dondoukoff que após sua primeira viagem à
Índia, em 1853, ela embarcou no “Gwalior, o qual naufragou próximo ao
Cabo, mas fui salva junto com umas outras 20 pessoas.” (HPB Speaks
II, 20). Que eu conheça, não há na literatura referência a qualquer outro
naufrágio. Assim, mesmo sem uma identificação mais segura, penso que
podemos assumir que é a esse naufrágio que HPB está se referindo. As
datas dessa época de sua vida são muito confusas, mas supõe-se que teria
ocorrido entre 1853 e 1854. Assim, ao mesmo tempo em que ela fala que
conhecia John King há 14 anos, portanto, desde 1860 ou 1861, ela cita um
acontecimento cujo registro é bem anterior. E, se ele a salvou em 1854, é
provável que já a conhecesse antes mesmo dessa data.
“Meu caro amigo, posso lhe contar apenas aquilo que lhe contei
desde o começo, quer o resto do mundo me acredite ou não. A
(p. 88)
pintura no cetim, com as exceções que coloquei, não foi feita por mim,
mas por aquele poder que chamei de John King; o poder que assumiu
as características e o nome genérico de John King; pois é um nome
genérico e é responsável pelas muitas afirmações contraditórias de e
sobre ele, o John King em diferentes partes do mundo. Com esse
poder, tenho estado familiarizada desde a minha infância, mas vi sua
face, como você diz, anos depois, numa viagem (quando o Sr.
Blavatsky era governador em Erivan, capital da Armênia, não em
Tiflis.) (HPB Speaks I, 237)
Paulos Metamon
Olcott, em seu livro Old Diary Leaves fala um pouco mais sobre
Paulos Metamon, relatando uma experiência que HPB lhe contara:
Lembremo-nos que Paulos Metamon era um mago copta; que ele era
“o sheik dos magos”; que “havia descoberto o segredo da pedra
filosofal”; e que ele havia “iluminado” tanto HPB quanto Albert Rawson.
Considerando todos esses dados, é muito provável que o mago branco
copta, que deveria permanecer sem ser nomeado, com quem HPB estava
viajando no deserto seja Paulos Metamon. E aqui ele é qualificado por Olcott
como sendo um “elevado adepto que possuía poderes muito grandes”.
Olcott ainda conta que soube por meio de uma testemunha ocular
[que só pode ser Albert Rawson] que enquanto HPB estava no Cairo os mais
extraordinários fenômenos ocorriam em qualquer sala que ela estivesse. Por
exemplo, a luminária que estava numa mesa mudaria para outra, passando
pelo ar, como se estivesse sendo carregada por uma mão invisível, e que:
(p. 92)
Viagens ao Peru (década de 1850)
Sinnett também relata que em 1852 ela foi para o México através do
Texas. Após suas andanças pelo México, ela resolveu que iria para a Índia:
“... ela logo verificou ser o que se chama de um ‘chela’, ou aluno dos
Mestres ou adeptos da ciência oculta oriental. Os três peregrinos do
misticismo foram, via o Cabo, para o Ceilão e, depois disso, num
veleiro, para Bombay onde, pelo que eu deduzi das datas devem ter
chegado quase no final de 1852.” (Sinnett 1886, 66)
(p. 93)
“Copau”, México, nunca foi identificada e muitos autores tendem a
crer que ela estivesse se referindo a Copán, que fica em Honduras, um
pouco ao sul do México. O grupo separou-se em Bombay. (Sinnett 1886,
64-66). Como já vimos, é bastante provável que esse “inglês” seja o
americano Albert Rawson, o companheiro de HPB no Cairo quando ambos
foram instruídos por Paulos Metamon.
Isso está nos indicando que o John King que instruía Olcott, que
atuava como seu intermediário nas correspondências com a “Loja” e que
aparecia nas sessões mediúnicas na casa dos Eddy, era o mesmo que, no
início da década de 1850, estava aconselhando HPB e seus companheiros
a “ponderar e discutir” sobre planos de viagens à América do Sul e,
portanto, já estava com HPB desde essa época! Como vimos, isso deve ter
ocorrido entre 1851 e 1855, novamente nos remetendo a um período de
conhecimento entre HPB e John King bem anterior a 1860.
Figura 1: Caligrafia de John King na nota sobre viagem para o Peru. (CW II,
320)
(p. 95)
Somente anos mais tarde, em 1884, é que HPB nos revela quem
realmente era John King. Arthur Lillie havia escrito um artigo chamado Koot
Hoomi Unveiled (Koot Hoomi Sem Véu), com muitas críticas à HPB e aos
Mestres. No artigo, Lillie afirmava: “Por catorze anos (1860 a 1875)
Madame Blavatsky foi uma espírita declarada, controlada por um
espírito chamado John King”. (CW VI, 269) Em agosto de 1884, Madame
Blavatsky responde:
“... Sr. Lillie afirma que eu conversei com esse ‘espirito’ (John King)
durante quatorze anos, ‘constantemente, na Índia e em outros
lugares.’ Para começar, eu aqui afirmo que nunca ouvi o nome de
John King antes de 1873. É verdade que falei ao Coronel Olcott e a
muitos outros, que a forma de um homem, com uma face pálida
morena, barba preta, roupas brancas flutuantes e turbante, que
alguns deles haviam encontrado pela casa e em meus aposentos, era
aquela de um ‘John King’. Eu tinha lhe dado aquele nome por razões
que serão completamente explicadas muito em breve, e ri muito ao
ver o modo fácil como o corpo astral de um homem vivo pode ser
confundido, e aceito como sendo um espírito. E eu lhes contei que eu
havia conhecido aquele ‘John King’ desde 1860; pois era a forma de
um adepto oriental, o qual, desde então foi para sua iniciação final.
nos visitando
(p. 96)
em seu corpo físico ao passar por Bombay em seu caminho. (...) Eu
tenho conhecido e conversado com muitos ‘John King’ em minha
vida – um nome genérico para mais de um espectro – mas, graças
aos céus, eu ainda nunca fui ‘controlada’ por um! Minha mediunidade
tem sido expurgada de mim por um quarto de século ou mais; e eu
desafio em voz alta todos os ‘espíritos’ do Kama-loka a se
aproximarem – que dizer me controlarem agora.” (CW Vl, 271)
Como vimos, John King assina o bilhete relacionado com o Peru, que
é de meados dos anos 1850. Portanto, não é verdade que HPB nunca havia
ouvido falar no nome John King antes de 1873. Mas Lillie volta a criticar a
resposta de HPB, interpretando que ela estava identificando o “adepto
oriental” (John King), como sendo o Mestre KH, afirmando: “que o Mestre
KH vinha constantemente vê-la com barba preta e longas vestes
brancas flutuantes”. Ela então volta ao assunto num segundo artigo, em
outubro de 1884, negando o que Lillie havia dito e desafiando-o a provar o
que estava afirmando, pois, em seu artigo anterior ela havia se referido a:
“... um ‘adepto oriental, o qual, desde então foi para sua iniciação
final’, que havia passado, en route do Egito para o Tibet, por Bombay
e nos visitou em seu corpo físico. Por que esse ‘Adepto’ deveria ser
o Mahatma em questão? Então, não há nenhum outro Adepto além
do Mahatma Koot Hoomi? Todo teosofista na sede sabe que eu
mencionava um cavalheiro grego a quem conheço desde 1860,
enquanto que nunca vi o correspondente do Sr. Sinnett antes de
1868.” (CW Vl, 291)
(p. 97)
A identificação conclusiva de quem era o Adepto oriental “John King”
vem do fato que Sinnett recebeu essa carta do Mestre KH no dia 20 de
fevereiro de 1881 e, nos diários de Olcott, há uma entrada na data de 19 de
fevereiro de 1881, escrita em Bombay, onde lemos:
“Por favor, não fale de Mentana e não fale do MESTRE [M.], eu lhe
imploro. Eu voltei da Índia num dos primeiros vapores. Mas primeiro
fui à Grécia e vi Illarion, em que lugar eu não posso e não devo dizer.”
(LBS, 153)
Note-se que ela está dizendo que primeiro foi à Grécia e viu Hillarion,
e não que foi à Grécia e pela primeira vez viu Hillarion. No original: “But I
first went to Greece and saw Illarion, in what place I can not and should
not say.” Além da tradução nesse caso não dar margens a dúvidas, já
identificamos que o Mestre Hillarion é John King e, conforme vimos acima,
ela já o havia encontrado bem antes de 1860.
(p. 98)
“Eu fui avisada por lliarion, então fisicamente no Egito – e fiz com
que Agardi Metrovich viesse diretamente até mim e não deixasse a
casa por dez dias. (...) Ele (...) foi para a Alexandria mesmo assim e
eu fui atrás dele (...) fazendo como Illarion me disse (...). Eu nunca o
deixei, pois sabia que ele iria morrer, como Illarion havia dito, e assim
aconteceu.” (LBS, 189-190)
Ela também relata para Sinnett que enterrou Metrovitch com a ajuda
do servente do hotel e de “um discípulo de Illarion”. (LBS, 190)
(p. 100)
“... o trabalho foi novamente retomado por um misterioso poder fora
de mim mesma, para quem eu era um instrumento escolhido, e foi
concluído da mesma maneira que os sete primeiros capítulos foram
escritos, sem que eu estivesse consciente de uma única palavra”.
(Sinnett 1987, 122)
“... viu diante dela, muitas vezes, a figura astral de um homem moreno
(um grego que pertence à Fraternidade de nossos Mestres), que a
instigou a escrever sob seu ditado. Era Hillarion, a quem Olcott
conhece bem. O resultado foi Luz no Caminho e outros.” (Gomes
1991, 194)
(p. 101)
Numa cópia de Luz no Caminho Mabel Collins escreveu que o livro
foi um trabalho feito sob “Sri Hilarion”, tendo começado em outubro de 1884
e, o pequeno ensaio sobre a Lei do Carma, que aparece como um apêndice,
foi escrito em 27 de dezembro de 1884. (CW VIII, 428) (Figura 4)
Observemos, nas duas citações acima, que HPB diz que não apenas
ela, mas também Olcott, reconheceram de imediato o “velho amigo grego”,
e que era “Hillarion, a quem Olcott conhece bem.” Isso é muito revelador
porque sabemos que era com John King que Olcott havia convivido mais
intensamente, desde seus primeiros passos no Ocultismo, em Filadélfia e
em Nova Iorque.
Sinnett, no artigo citado, também publica o fac-símile de uma página
do manuscrito original do Idílio, onde aparece “uma letra completamente
diferente da dela própria.” (Sinnett 1987, 119) [Comparar as letras nas
Figuras 3 e 4].
(p. 102)
Tudo isso nos indica que só pode haver um John King – que é difícil
de “digerir” – e cujos métodos e modos de ação se chocam com as noções
mundanas que temos do que deve ou não deve ser a conduta de um Adepto.
Mas, não nos esqueçamos de que, na verdade, conhecemos muito pouco
dos métodos deles. Como o Mestre KH escreveu:
(p. 104)
Capítulo 7
(p. 105)
Em seu artigo “Astral Projection or Liberation of the Double and
the Work of the Early Theosophical Society”, John Patrick Deveney
mostra como o trabalho inicial da ST estava voltado para instruções práticas
de seus poucos membros, como aprender a sair conscientemente do corpo
físico e fazer viagens astrais, com a utilização de espelhos mágicos e outras
técnicas.
Charles Sotheran
“... a Sociedade não era uma sociedade secreta (...) Mas ele
começou a atacar injuriosamente nossos experimentos e nos
denunciar
(p. 106)
aos espíritas e impedir o progresso da Sociedade e achou-se
necessário torná-la secreta.” (CW I, 194)
(p. 107)
Seis meses após toda essa confusão e troca de ameaças, Sotheran
voltou a fazer parte da Sociedade Teosófica, a frequentar a casa de HPB e
a auxiliar ativamente no trabalho, como se nada tivesse ocorrido. De acordo
com Laura Hollowav, havia uma grande amizade entre HPB e Sotheran, e
ela afirma que foi dele a sugestão da palavra “teosófica” para o nome da
Sociedade Teosófica. Ela também revela:
(p. 108)
“... uma excelente oportunidade para estudar o espírito interno da
esfinge. Calma como a Aboo Hool de Memphis num minuto, e no
seguinte uma tempestade de paixão que se expressava numa
torrente de palavras que feriam os ouvidos de seus ouvintes. Eu nem
mesmo tentarei dar uma amostra, pois as reticências omitiriam
maldições em várias línguas”. (Rawson 1988, 213)
(p. 109)
Quando William estava com 13 anos, a família emigrou para os
Estados Unidos, onde chegaram em 14 de julho de 1864. William começou
a trabalhar em Nova Iorque como escriturário e depois entrou para o
escritório de advocacia de George P. Andrews. Em abril de 1872 naturalizou-
se americano. Especializando-se em Direito Comercial, sua eficácia,
persistência e diligência conquistaram o respeito de patrões e clientes. Aos
23 anos, em 1874, ele casou-se com Ella M. Smith, com quem teve uma filha
que morreu ainda pequena, em setembro de 1878. (Niemand)
Esse primeiro encontro foi muito marcante para Judge. Ele relembra
suas impressões:
“Muito foi dito naquela primeira noite que prendeu minha atenção e
atraiu minha imaginação. Eu percebi meus pensamentos secretos
sendo lidos, minhas questões íntimas sendo conhecidas por ela. Sem
ser perguntada e certamente sem qualquer possibilidade de ter
pedido informações sobre mim, ela referiu-se a várias circunstâncias
privadas e peculiares de um modo que mostrou imediatamente que
tinha um perfeito conhecimento sobre minha família, minha história,
minhas circunstâncias e minhas idiossincrasias.” (Sinnett 1886, 186)
(p. 111)
Além dessas conversas, Judge também recebeu algumas
mensagens que vinham em cartas entregues pelo correio. Em carta para
HPB, de 5 de fevereiro de 1886, quando ela estava sendo acusada de ser
uma impostora pela SPR (Sociedade de Pesquisas Psíquicas), Judge sugere
que poderia usar essas cartas em seu favor:
“Tive o grande prazer de ler seu O Mundo Oculto, e nesse país tão
distante da Índia, ele tem sido uma fonte de grande proveito, bem
como de encorajamento. (...) Embora nunca tenham me dado o
nome, quando Madame Blavatsky estava aqui eu tive a honra de
receber comunicações de .:. viva você, eu quero dizer de Koot Hoomi
e também de outros. E eu daria muito para ver algumas das
caligrafias daquelas cartas para você, ainda que de apenas uma
palavra, porque eu tenho aqui uma caligrafia, num certo material azul,
com a qual gostaria de comparar.
“Você certamente tem sido honrado. Por que? Eles devem ter
algum motivo. Enquanto HPB estava aqui, eles vieram, muitos e
várias vezes, e falaram com Olcott e comigo. Mas suas identidades
foram protegidas porque nenhum de nós, naquela época, poderia
penetrar na parede de matéria e ver o verdadeiro ocupante.
Tínhamos que depender inteiramente das mudanças de expressão.
“Eu lhe agradeço o livro (...). Para mim, ele serve para manter
vívidos e frescos os fatos que certa vez testemunhei os quais, não
fosse isso, o tempo poderia tornar fracos e possivelmente
inacreditáveis.” (LBS, 312)
(p. 112)
No primeiro encontro da Sociedade Teosófica, Judge propôs Olcott
como presidente, e foi designado como secretário. Até essa época, conta
Judge:
“Olcott era bem conhecido como um homem que gostava da vida dos
clubes e ninguém jamais supôs que ele mostraria uma tal renúncia
como tem mostrado, desde então, com relação às coisas mundanas.
A sabedoria de sua escolha como presidente tem sido demonstrada
por nossa história. A Sociedade foi impopular desde seu início, e tinha
de fato tão pouco dinheiro que todos os primeiros diplomas foram
escritos à mão por um dos membros dessa cidade.” (Judge, em A
Servant of The Masters: Col. Henry S. Olcott)
(p. 113)
Olcott respondeu a Yarker em relação ao diploma da Sat Bhai, dando
testemunho de que HPB era proficiente em todas as ciências maçônicas. Em
agosto de 1877, Yarker recebeu um diploma de membro honorário da
Sociedade Teosófica. Em 24 de novembro, ele enviou a HPB um segundo
diploma, desta vez do Rito de Adoção de Memphis e Mizraim, conferindo-lhe
o mais alto grau desse Rito Adotivo, aquele da “Princesa Coroada 12°”.
(CW I, 312) A publicação desse segundo diploma gerou ataques e
questionamentos quanto a sua validade. Ao defender-se, HPB escreve:
A Ordem Sat Bhai (Sete Irmãos), era assim chamada porque cada
grupo era composto por sete pessoas. Se dizia que essa Ordem havia sido
iniciada, ou transmitida, por um Pandit brâmane de Benares. Aparentemente
alguns oficiais britânicos haviam sido iniciados e pretendia-se que eles
espalhassem os ideais da Sat Bhai pelo mundo. O Major J.H. Lawrence
Archer havia introduzido o ritual na Inglaterra, em torno de 1872. Yarker
escreve sobre a Sat Bhai:
(p. 116)
Os objetivos da ST agora eram vários, embora o incentivo ao
desenvolvimento prático ainda fosse uma nota dominante: “Ela influencia
seus membros a adquirir um íntimo conhecimento das leis naturais,
especialmente suas manifestações ocultas.” (CW I, 376) Para tanto, cada
membro deveria “estudar para desenvolver seus poderes latentes, e se
informar a respeito das leis do magnetismo, eletricidade e todas as
outras formas de forças, seja do universo visível ou invisível.” (CW I,
377) E continuava ressaltando que a Sociedade esperava que cada membro:
“... exemplifique pessoalmente a mais elevada moralidade e
aspiração religiosa; se oponha ao materialismo da ciência e a toda
forma de teologia dogmática, especialmente a Cristã, a qual os
Chefes da Sociedade consideram como particularmente perniciosa;
tornar conhecidos entre as nações ocidentais fatos há muito
suprimidos sobre as filosofias religiosas orientais, sua ética,
cronologia, esoterismo e simbolismo; opor-se, tanto quanto possível,
aos esforços dos missionários em iludir os assim chamados “infiéis”
e “pagãos” com relação à real origem e aos dogmas do Cristianismo
e os efeitos práticos desse último sobre o caráter público e privado,
nos assim chamados países civilizados; disseminar um
conhecimento dos sublimes ensinamentos daquele puro sistema
esotérico do período arcaico, que estão espelhados nos mais antigos
Vedas e nas filosofias de Gautama Buda, Zoroastro e Confúcio”. (CW
I, 377)
Capítulo 8
Em seu livro Old Diary Leaves, Olcott descreve com detalhes o dia
a dia da vida com Madame Blavatsky em Nova Iorque. O apartamento onde
moravam era conhecido como “A Lamaseria”. HPB não tinha nem mesmo
uma noção rudimentar de como cuidar de uma casa e seus repentes de
personalidade atrapalhavam o pobre Olcott e as várias empregadas que para
eles trabalharam.
(p. 118)
Hábitos Alimentares
“HPB sempre foi, mesmo em sua juventude, uma pessoa roliça e mais
tarde tornou-se bastante corpulenta. Isso parece que era uma
tendência familiar, porém em seu caso a tendência foi agravada por
seu modo de vida, pois ela quase não fazia exercícios e comia muito,
a não ser quando estava seriamente doente. Mesmo então, comia
grandes porções de carnes gordas e costumava colocar grandes
quantidades de manteiga derretida sobre seus ovos fritos no café da
manhã. Nunca tocou em vinhos ou bebidas alcoólicas, sendo suas
bebidas o chá e o café, preferivelmente esse último. Seu apetite, na
época em que a conheci, era extremamente caprichoso e ela era
praticamente rebelde a qualquer hora fixa para as refeições e,
portanto, um terror para todas as cozinheiras e o desespero de seu
colega.
“Lembro-me de uma ocasião em Filadélfia que mostrou essa
peculiaridade de um modo marcante. Ela tinha uma empregada para
todo o serviço e, nesse dia em particular, uma perna de carneiro
estava fervendo para o jantar. Subitamente, HPB lembrou-se de
escrever uma nota para uma senhora amiga que morava do outro
lado da cidade, a uma distância de uma hora de viagem dali, uma vez
que não haviam bondes ou outros meios de transporte público indo
diretamente de uma casa para outra. Ela chamou em tons de
trombeta a empregada, e lhe ordenou que fosse imediatamente com
a nota e voltasse com a resposta. A pobre moça lhe disse que o jantar
ficaria prejudicado e que não seria possível que ela estivesse de volta
antes de urna hora depois do horário normal da janta. HPB não lhe
deu ouvidos e disse que ela fosse imediatamente.
“Passados quarenta e cinco minutos, HPB começou a
reclamar que a estúpida e idiota garota ainda não havia retornado;
que ela estava com fome e queria seu jantar e mandou todos os
empregados da Filadélfia ao diabo em masse. Passados mais quinze
minutos, ela havia ficado desesperada, e então fomos para a cozinha
(p. 119)
dar uma olhada. Naturalmente, os potes de carne e vegetais estavam
guardados, o fogo apagado e a perspectiva de jantar extremamente
reduzida. A ira de HPB foi veemente, mas não havia o que fazer a
não ser nos virarmos e prepararmos o jantar. Quando a empregada
voltou, foi repreendida tão severamente que explodiu em lágrimas e
pediu demissão!
“(...) Ela nunca foi uma asceta, nem mesmo uma vegetariana, e
enquanto a conheci, a carne era indispensável para sua saúde e
conforto, assim como para tantos outros em nossa Sociedade,
incluindo a mim mesmo.” (ODL I, 449-451)
“... um dia ela saiu com minha irmã e foi se pesar: a balança deu que
ela estava com 111,1 kg, e então ela anunciou que pretendia reduzir
seu peso para algo apropriado para viajar o que ela fixou em 70,8 kg.
Seu método era muito simples; todos os dias, dez minutos após cada
refeição lhe traziam um copo cheio de água; então ela punha a palma
da mão sobre ele, olhava-o mesmericamente e bebia tudo. Eu me
esqueci por quantas semanas ela continuou esse tratamento, mas
finalmente ela pediu para minha irmã ir novamente com ela para se
pesar. Elas trouxeram e me mostraram o certificado do dono da
balança, atestando que o peso de Madame Blavatsky nessa data era
70,8 kg!” (ODL I, 453)
O Fumo
Um outro hábito que HPB cultivou por muitos anos foi o fumo.
Aparentemente ela sempre fumou algum tipo de cigarro que ela mesma
preparava e não o comprado pronto. Olcott diz a esse respeito:
(p. 120)
“HPB era, todo mundo sabe, uma fumante inveterada. Ela consumia
um número imenso de cigarros por dia e para enrolá-los possuía a
maior das destrezas. Ela podia até mesmo enrolá-los com a mão
esquerda enquanto ela estava “copiando” com a direita.” (ODL I, 452)
Mas Madame Blavatsky explica para sua irmã Vera que quem a fazia
ter o conhecimento de outras línguas, era a “Voz”, isto é, seu Sahib, o
Mestre Hillarion:
A Personalidade Explosiva
Ela era uma pessoa que falava franca e diretamente quando não
estava trocando delicadezas com um novo conhecido, em cujo caso ela era
uma grande dama. Não importando quão desalinhada ela estivesse vestida,
tinha a marca de seu alto nascimento e, se quisesse, poderia ser tão digna
quanto uma duquesa francesa.
Ela não tinha um bom olho para cores e proporções, e muito pouco
senso estético. Certa vez ela e Olcott foram ao teatro e ele imaginou que
toda a casa fosse se levantar quando eles se chegaram, pois:
Ninguém podia ser mais fascinante do que ela quando queria atrair
pessoas para seu trabalho público. Ela seria cuidadosa no tom e nos modos,
e faria a pessoa sentir-se como se fosse o melhor, senão o único amigo que
ela possuía. Olcott relata:
“Com as pessoas comuns como eu, não poderia dizer que ela fosse
leal ou fiel. Nós éramos, creio eu, nada mais que peões num jogo de
xadrez, por quem ela não tinha nenhum amor profundo. Ela me
repetia os segredos de pessoas de ambos os sexos – mesmo os mais
comprometedores – que lhe haviam confiado, e tratava os meus,
estou convencido, da mesma maneira. Mas ela era leal até o fim para
com sua tia, seus outros familiares e para com os Mestres, por cujo
trabalho ela sacrificaria não apenas uma, mas vinte vidas, e
calmamente veria toda a raça humana ser consumida no fogo, se
necessário fosse.” (ODL I, 462)
Essa devoção aos Mestres sempre foi a luz que guiou HPB por toda
a sua vida, uma característica reconhecida e admirada por todos aqueles
que com ela conviveram mais intimamente. Como diz Olcott:
“Ela era uma ocultista grande demais para que julguemos sua
estatura moral. Ela nos compelia a amá-Ia, por mais que pudéssemos
conhecer suas faltas; a perdoá-la, por mais que ela pudesse ter
quebrado suas promessas e destruído nossa primeira crença em sua
infabilidade. E o segredo desse encantamento poderoso era seus
inegáveis poderes espirituais, sua evidente devoção aos Mestres que
ela descrevia como personagens supranaturais, e seu zelo pela
elevação espiritual da humanidade através do poder da Sabedoria
Oriental.” (ODL I, x)
(p. 125)
O “Melhor Disponível”
“Julgo que é uma positiva vantagem para todos os demais que ela
seja da maneira que é, pois assim foi-lhes dado um maior estímulo
para realizar, apesar das dificuldades que você crê que ela tenha
criado. Eu não digo que a teríamos preferido, caso estivesse
disponível um agente mais tratável; mas ainda assim, no que diz
respeito a vocês, isso foi uma vantagem”. (MLcr., 435)
(p. 127)
“... em primeiro lugar para formar o elo de ligação necessário, o fio de
transmissão – e em segundo lugar como a garantia mais segura de
que certas coisas nunca serão divulgadas. Ela não é uma exceção à
regra, e você já viu um outro exemplo – um homem altamente
intelectual – que teve que deixar uma de suas peles para trás; assim,
ele é considerado altamente excêntrico. O comportamento e status
dos seis remanescentes depende de suas qualidades inerentes, das
peculiaridades psico-fisiológicas da pessoa, especialmente das
idiossincrasias transmitidas pelo que a ciência moderna chama de
“atavismo”.” (MLcr., 79)
“Muito esperto – mas suponha que não seja nenhum dos sete em
particular, mas todos? Cada um deles sendo um “mutilado” e
impedido do exercício de seus plenos poderes? E suponha que essa
seja a sábia lei de um poder com ampla capacidade de previsão!”
(LBS, 307)
(p. 128)
“... a tolice dos seres superiores que a mandaram para combater o
mundo armada apenas com uma parte de suas faculdades, e
cuidadosamente a envolveram com uma tal rede de fatos
contraditórios e comprometedores, de modo a tornar impossível que
o amigo que mais a ama, e de modo algum o menos inteligente, não
tenha às vezes graves dúvidas, não apenas quanto à existência
deles, mas também quanto à sua boa fé.” (LBS, 307)
(p. 129)
Capítulo 9
Olcott relata que tudo começou numa tarde do ano de 1877, quando
Ísis Sem Véu ainda estava sendo escrita. Um “viajante americano que
havia recentemente estado na Índia” (ODL I, 395) apareceu e reparou
numa fotografia pendurada na parede, onde Olcott aparecia com dois hindus.
(p. 130)
Esse “viajante americano” reconheceu um dos dois indianos que
aparecia na foto como sendo Moolji Thackersey, com quem ele se encontrara
recentemente em Bombay. Então Olcott escreveu para Moolji contando
sobre a Sociedade Teosófica e o amor que sentia pela Índia.
Aos 22 anos, quando seus pais resolveram que ele tinha que se
casar, Dayanand fugiu de casa e entrou para a Ordem dos Sanyasis. Mas
pouco tempo depois seus pais descobriram seu paradeiro e o levaram de
volta para casa.
(p. 132)
Na verdade Olcott e HPB não sabiam muito acerca da Arya Samaj.
Ainda em fevereiro, Olcott escreveu para Hurrychund Chintamon, líder da
Arya Samaj em Bombay, pedindo-lhe explicações sobre as diferenças entre
a Brahmo e a Arya Samaj. No seu entender a principal diferença era que a
Brahmo Samaj aceitava a doutrina de um Deus pessoal, enquanto que a
Arya Samaj pregava a existência de uma Essência Divina, eterna e ilimitada.
E lhe dizia:
“Com uma tal Samaj como a última (se for como a descrevi), a
Sociedade Teosófica tem a maior das afinidades. De fato, no que
diz respeito a seu departamento de trabalho no campo das religiões,
ela já é uma Arya Samaj sem o saber... Se a Arya Samaj é o que
imagino, ficarei orgulhoso de ser admitido como seu membro e
proclamar o fato para todo o público cristão. Mande-me todos os
documentos necessários para que eu possa compreender
exatamente o que ela ensina.” (Olcott)
(p. 133)
Nesse contexto, a aliança com Swami Dayanand Saraswati era muito
oportuna, pois HPB e Olcott reconheciam Dayanand como sendo um “Swami
Adepto”, como alguém que poderia dar instruções práticas aos membros.
Olcott escreve:
(p. 134)
Dois Krishnavarmas? (1878)
Há uma carta de HPB para sua tia onde ela fala sobre a existência
de dois Krishnavarmas. Não há dúvidas de que HPB está se referindo ao
Krishnavarma descrito acima quando escreve: “o segundo Krishnavarma
Sheyamaji, principal apóstolo e aluno de nosso Swami virá no próximo
inverno para nos ensinar”. (HPB Speaks I, 200)
HPB escreve para sua tia que esse outro misterioso Krishnavarma
tinha sido de grande auxílio para eles. Ele havia chegado há duas semanas
de Multan (Punjab, Índia) numa carroça (!!) e estava hospedado com eles.
Ela também relata que havia retornado a três dias de uma viagem com
Krishnavarma e Olcott, na qual foram até um local “quase tão distante
quanto a Califórnia”. (HPB Speaks I,198) HPB descreve a viagem:
“Todas as manhãs, seu velho servo (...) ia à cidade para trazer frutas
e arroz em suas próprias travessas de prata. Esse homem se diria ter
1000 anos de idade. Sua face é velha, velha como um pergaminho,
mas que força! Alguns dias atrás meninos e alguns adultos
aborreceram-no muito, seguindo-o por toda parte e provocando-o.
Ele segurou um deles pelo pescoço e jogou-o do outro lado da rua
numa vala com água suja e outro uns 50 passos mais adiante. A
multidão estava brava, mas Krishnavarma jogou no meio deles um
punhado de moedas de ouro e eles pularam sobre o dinheiro como
feras selvagens e gritavam para os dois Hurra! até que eles entraram
em nossa casa. Agora, para evitar escândalos, Olcott está indo com
o velho homem até o mercado, comprar provisões.” (HPB Speaks l,
199)
(p. 138)
No final de 1879 The Theosophist tinha 621 assinantes o que era
um grande número, pois os jornais de maior circulação na Índia tinham de
1500 a 2000 assinantes. O crescimento da revista trouxe muito trabalho, pois
havia poucos ajudantes e pouco dinheiro para contratar pessoas. Eles
tinham que fazer de tudo, do editorial ao empacotamento das revistas. (ODL
II, 137)
Em 1879, Damodar leu um livro que mudaria sua vida para sempre:
Ísis Sem Véu. Ao saber da presença da autora na Índia, foi imediatamente
para Bombay conhecê-la. Quando entrou na Sede da ST em Bombay, ficou
impactado ao ver o retrato do Ser que havia aparecido em suas visões.
Quando soube que Ele era um dos Mahatmas que estava por detrás de HPB
e da ST, esse reconhecimento “selou sua devoção à nossa causa, seu
discipulado a HPB.” (ODL II, 213)
“Um de nossos Irmãos me disse que uma vez que você está insistindo
tanto comigo, é melhor que eu lhe diga de uma vez por todas que,
sendo uma europeia, não tenho nenhum direito de lhe dar qualquer
informação sobre eles; mas que se você continuar perguntando para
indianos o que eles sabem sobre o assunto, você poderá saber por
eles; e um daqueles Elevados seres talvez possa se colocar em seu
caminho sem que você o conheça, e lhe dirá o que deve fazer.” (Eek
1978, 35)
Damodar seguiu suas instruções, embora achasse que só realizaria
seu objetivo por meio de HPB. Pouco depois, um conselheiro da ST,
escreveu para HPB sobre uma iogue que era sua Guru. Ela vivia em Benares
e chamava-se Mâji. Damodar ficou esperançoso: talvez essa fosse a pessoa
que poderia lhe dar as informações que tanto desejava.
“... disparou suas críticas sobre ele com excessivo rancor. Ao ouvi-la
voltar a falar sobre esse assunto, várias vezes durante a noite,
alguém poderia ter pensado que as aspirações de sua vida haviam
sido comprometidas, embora a reunião e a palestra (...) não fossem
importantes para o progresso da Sociedade de qualquer forma mais
séria. Col. Olcott suportou todos esses acessos de raiva com
maravilhosa firmeza, considerando-os todos como provações, a
serem atribuídas a seu chelado oculto; e apesar de todo esse
comportamento exasperante, Mad. Blavatsky tinha uma estranha
faculdade de conquistar afeição.” (Sinnett 1886, 229)
(p. 144)
“... fingia rir de mim por acreditar em poderes obtidos por um logue.
E quando lhe perguntei se conhecia uma mulher chamada “Mâji”, ele
respondeu – Se é que essa mulher existe por aqui, ela não é
conhecida. Sempre que lhe perguntava qualquer coisa com relação
a esses assuntos, me respondia com respostas evasivas. Fiquei
desapontado quando vi que todas as minhas expectativas ao ir a
Benares eram apenas castelos no ar.” (Eek 1978, 35)
Então, no dia seguinte, foram todos visitar Mâji. Ela vivia às margens
do rio Ganges, uma ou duas milhas distante de Benares, numa caverna
escavada na rocha. Além desse agradável local, ela havia herdado de seu
pai uma casa na cidade e uma extensa e valiosa biblioteca.
“... o encontrei num estado não usual, como o que ele sempre está,
quando está explicando o Ritual. E eu percebi que o fenômeno
correspondeu exatamente à hora em que vi Swamiji no estranho
estado de “Samadhi” que lhe descrevi acima: “Samadhi” sendo,
como você talvez saiba, aquele estado quando o adepto deixa seu
corpo. Portanto, para mim não havia dúvida do que e como isso havia
ocorrido.” (Eek 1978, 37)
(p. 146)
Depois de tentar sem sucesso que Damodar desistisse de seus
propósitos de busca, Mâji lhe disse que se ele quisesse progredir
espiritualmente e ver qualquer dos Irmãos, deveria para isso depender
inteiramente de HPB, pois:
Para Olcott, HPB contou que um Adepto, invisível para todos exceto
para ela mesma, é que havia feito a chama aumentar ou diminuir, quando
ela dava tais ordens. Outra explicação, dada em ocasiões semelhantes, era
que ela tinha poder sobre os elementais do fogo, que obedeciam a suas
ordens. Olcott comenta que o fenômeno era mais um de uma longa série:
(p. 150)
Capítulo 10
Ficou acertado que ficariam com HPB e Olcott até que conseguissem
arrumar emprego e moradia. Entretanto, o Sr. Coulomb não parava em
nenhum emprego e eles foram ficando por lá, sem quaisquer planos
definidos para o futuro. Como ele era muito habilidoso e ela uma excelente
dona de casa, os dois foram se integrando ao grupo de trabalhadores na
Sede, em troca de casa e comida. Emma Coulomb trabalhava como
governanta da casa e Alexis Coulomb, que era marceneiro, na manutenção.
(p. 153)
No dia 25 de maio, em Galle, HPB e Olcott declararam o pansil –
palavra Pali para pancha sila ou os cinco preceitos de compaixão,
honestidade, pureza, sinceridade e temperança – numa cerimônia oficiada
pelo venerável Bulatgama, sendo então formalmente reconhecidos como
budistas. Nessa cerimônia, o sacerdote recita os “Cinco Preceitos” e os “Três
Refúgios” em Pali, sendo repetidos pelos candidatos e presentes. Relata
Olcott:
“Eu a abri, e que grande alegria senti quando vi .:. novamente! Num
sussurro muito baixo, ele me ordenou que me vestisse e o seguisse.
Na porta dos fundos da pousada está o mar. Eu o segui,
(p. 154)
como ele me ordenou. Ele me levou para a porta dos fundos do local
e andamos por cerca de três quartos de hora pela beira do mar. Então
nos movemos em direção ao mar. Tudo à volta era água, exceto o
local por onde estávamos andando, que estava bem seco!! Ele
caminhava na frente e eu o seguia. Assim andamos por cerca de sete
minutos, quando chegamos a um local que parecia uma pequena ilha.
(...) Lá, num pequeno jardim em frente, encontramos um dos Irmãos
sentado. Eu o havia visto antes na Sala do Conselho, e é a ele que
esse lugar pertence. .:. sentou-se próximo dele e eu fiquei de pé em
frente a eles. Estivemos lá por cerca de meia hora. (...) O Mestre
desse local, cujo nome não sei, colocou sua abençoada mão sobre
minha cabeça, e .:. e eu fomos embora novamente. Voltamos para
perto da porta do quarto onde eu iria dormir e ele subitamente de lá
desapareceu, imediatamente.” (Eek 1978, 56-57)
O grupo viajou pela ilha encontrando e iniciando pessoas como
membros da ST, e com Olcott dando palestras. Em 8 de junho a ST de
Colombo foi organizada, com duas subdivisões – uma para leigos e outra só
para monges. Isso foi feito para atender a uma regra dos monges, que os
impedia de se associarem a leigos, em termos de igualdade, em questões
mundanas. Sumangala ficou como presidente da associação dos monges,
bem como vice-presidente honorário da ST como um todo. (ODL II, 179)
(p. 155)
“... fui chamado para arbitrar suas diferenças e sentei-me
imparcialmente, ouvindo suas absurdas alegações por duas tardes
inteiras e, finalmente, decidi em favor de Madame Coulomb no que
diz respeito à estúpida acusação de envenenamento, que não tinha
um único fato que a comprovasse. (...) HPB sentou-se perto enquanto
a arbitragem prosseguia, fumando ainda mais cigarros do que de
costume, fazendo comentários ocasionais cuja tendência era mais
aumentar do que apaziguar a excitação.” (ODL II, 207-8)
(p. 156)
“Por essa época estávamos passando por uma desagradável fase em
nossas relações com Swami Dayanand. Sem a menor causa sua
atitude para conosco se tornou hostil; ele nos escreveu cartas
exasperantes, depois as modificou, depois novamente mudou seu
tom e assim nos manteve permanentemente sob tensão. O fato é que
nossa revista não era de modo algum um órgão exclusivo da Arya
Samaj, nem nós consentiríamos em nos manter distantes dos
budistas ou dos parsis, como ele quase insistia que deveríamos fazer.
Evidentemente ele queria nos forçar a escolher entre a continuação
de seu apoio e a fidelidade ao nosso declarado ecletismo. E nós
escolhemos; pois de nossos princípios nós não abriríamos mão em
troca de quaisquer outros.” (ODL II, 150)
Apesar de Olcott dizer que estava tentando saber qual era a posição
do Swami quanto aos siddhis, ele a conhecia bem, pois em dezembro de
1879 Dayanand já se recusara a fazer qualquer exibição de fenômenos
(tamasha) para o casal Sinnett. E em 26 de julho de 1880, Dayanand lhe
escrevera:
“O que eu disse para o Sr. Sinnett está certo, pois eu não considero
apropriado ver e exibir tais questões de ‘tamasha’, sejam realizadas
por prestidigitação ou pelo poder ióguico, porque ninguém
(p. 157)
pode compreender a importância da Ioga e ter um verdadeiro amor
por ela, sem que ele mesmo a pratique e estude. Mas elas (as
testemunhas) são apenas levadas a um estado de dúvida e
perplexidade, e estão o tempo todo querendo examinar aqueles que
os demonstram, e vendo ‘tamasha’ deixam de lado questões do seu
próprio melhoramento. Eles não se empenham para adquiri-los. Eu
não mostrei nenhum fenômeno ao Sr. Sinnett, nem desejo que
qualquer coisa lhe seja mostrada, fique ele contente ou
descontente comigo, pois se eu estivesse disposto a fazer isso,
todos os tolos, assim como os Pandits, me pedirão para lhes
mostrar fenômenos similares pela Ioga, como eu poderia ter
mostrado a ele. E também porque eu teria sido importunado com
essa questão mundana de ‘tamasha’, assim como ocorre com
Madame H.P. Blavatsky. Ao invés de investigarem, e aceitarem suas
informações científicas e religiosas, por meio das quais a alma, sendo
purificada, alcança felicidade, todos os que se dirigem a ela pedem
pela exibição de ‘tamasha’. Por essas razões eu não encorajo tais
coisas, direta ou indiretamente. Mas se alguém desejar, posso
ensinar-lhe Ioga, de modo que por sua própria prática ele possa
experimentar os Siddhis.” (Olcott)
(p. 158)
O grupo em seguida foi para Amritsar e Lahore, onde ficava a sede
da Arya Samaj, sendo sempre bem recebidos. Nas discussões com os
samajistas o ponto crucial era a questão da natureza de Iswara e a
personalidade de Deus, sobre o que “HPB e eu nutríamos crenças muito
divergentes das deles”. (ODL II, 258)
(p. 159)
Após pedir várias vezes para conversar com Olcott e HPB, sem
resultados, em 26 de março de 1882, Swami Dayanand fez uma palestra
pública em Bombay denunciando a ST e os fundadores por mudanças em
suas atitudes e crenças, como o fato de antes terem se declarado membros
da Arya Samaj e agora se apresentarem como budistas. (Ransom, 169)
Olcott respondeu às acusações num artigo para o The Theosophist, em
julho de 1882.
Logo depois, em abril, Olcott foi para o Ceilão, onde ficou até
dezembro trabalhando em prol do Budismo. Sua principal meta era levantar
um fundo para educação, que se encontrava quase completamente nas
mãos dos missionários cristãos. Logo que chegou, Olcott editou dois
folhetos: “Por que não sou Cristão?” e “Por que sou Budista?”. Os
missionários logo contra-atacaram publicando artigos contra HPB e Olcott.
(Ransom, 158)
(p. 161)
Em 1880, havia na ilha apenas 4 escolas budistas, contra 805 cristãs.
Em 1900 já eram mais de duzentas escolas budistas. (Murphet 1972, 140)
Como já vimos, quando foi morar com HPB e Olcott, Damodar havia
renunciado à sua casta, com a autorização de seu pai, que dava todo o apoio
às buscas espirituais de seu filho. Nessa ocasião, seu pai, seu irmão e um
tio também ingressaram na Sociedade Teosófica. Entretanto, com sua
conversão ao Budismo o pai de Damodar, o tio e seu irmão mais velho,
Krishnarao, saíram da ST e se tornaram abertamente hostis a ela: Olcott
relata:
(p. 162)
“... uma carta maldosa dirigida contra a honestidade e retidão dos
fundadores da Sociedade Teosófica e jogando uma nódoa sobre os
Mahatmas, com referência a questões de minha própria família. De
fato, se fazia uma tentativa de induzir o público a acreditar que eles
haviam me feito de fantoche, para me trapacear e tirar minhas
propriedades.” (Eek 1978, 484)
(p. 163)
Mas se o ano de 1881 trouxe provações, preocupações e problemas
para Damodar, especialmente com sua família, também trouxe dádivas que
ele nunca esqueceria. Talvez uma das mais importantes tenha sido a visita
astral à casa de seu Mestre. Essa visita está descrita numa carta para Judge,
datada de 28 de junho de 1881.
Quando retomou a consciência, viu que estava num outro lugar, aos
pés dos Himalaias. No local, havia apenas duas casas, uma oposta à outra.
De uma delas saiu Aquele a quem Sinnett dedicou seu livro O Mundo
Oculto: o Mestre “Koot Hoomi .:.”. Então Damodar seguiu seu guia por cerca
de meia milha, até uma passagem subterrânea natural que fica sob os
Himalaias. (Eek 1978, 61)
(p. 165)
Capítulo 11
Subba Row divide com Damodar a honra de ter sido um dos mais
destacados membros indianos dos primeiros tempos da ST. Por seu intelecto
brilhante e seus conhecimentos ocultos, ele era carinhosa e respeitosamente
chamado de Swami (Instrutor) Subba Row.
(p. 167)
“Para lhe falar a verdade, minha “sincera crença” é que a Índia ainda
não perdeu seus adeptos e seu “NOME INEFÁVEL” – a Palavra
perdida! A Índia ainda não está espiritualmente morta embora esteja
rapidamente morrendo. Ainda temos homens serenos entre nós (...)
aqueles que quase alcançaram as praias do oceano do Nirvana. (...) É
apenas para os que crêem sinceramente na Yoga Vidya e na
existência de Adeptos, que esses austeros místicos estão acessíveis.
Mesmo se um teosofista inglês como o Sr. Hume, por acidente, se
encontrasse com um desses homens, ele logo colocaria sua filosofia
em prova. Sua aparência externa seria revoltante para o refinado gosto
de um cavalheiro inglês. Aparentemente – seu comportamento seria
aquele de um louco ou de um e idiota, e ele falaria bobagens
ininteligíveis de propósito, para afastar o visitante.” (LBS, 316)
Numa carta para HPB, em agosto de 1882, apenas quatro meses após
conhecê-la, falando de seus próprios conhecimentos, Subba Raw escreve:
(p. 169)
“O pouco de Ocultismo que ainda subsiste na Índia está centrado nessa
região de Madras (...). O grande reviver da Yoga Vydia na época de
nosso grande Sankaracharia teve sua origem nessa parte da Índia; e
desde aquela época até os dias de hoje, o sul da Índia nunca teve o
infortúnio de ser desertado por todos os seus iniciados.” (LBS, 31)
“Pobre Subba Row está “num dilema” – e é por isso que ele não lhe
responde. Por um lado ele tem a indomável HPB que atormenta a vida
de Morya para lhe recompensar e o próprio M. que, se pudesse,
gratificaria suas aspirações; de outro lado ele encontra a intransponível
muralha da China das regras e da Lei.” (MLcr., 156)
“... uma tarefa além de suas forças e capacidades; pois uma vez
compromissado se quebrar sua promessa, isso o afastaria por anos,
se não para sempre, de qualquer progresso futuro. Eu disse desde o
início para Rishi “M” que sua intenção era boa, mas seu projeto
precipitado. Como pode você, em sua posição, empreender qualquer
trabalho desse tipo? O Ocultismo não deve ser tomado sem a devida
seriedade. Ele exige tudo ou nada.” (MLcr., 155)
(p. 170)
“... se ordenado por Morya ele ensinará de Madras, i.e., corrigirá os
manuscritos, como M. fez, comentará sobre eles, responderá
perguntas e será muito, muito útil. Ele tem uma perfeita reverência e
adoração por HPB.” (MLcr., 158)
Esses sentimentos ficam claros numa carta que Subba Row escreveu
para HPB, quando ela estava na Europa:
“Várias vezes me foi solicitado nos últimos três meses, por Madame
Blavatsky, que lhe desse tais instruções práticas em nossa Ciência
Oculta, conforme me seja permitido dar para alguém em sua posição;
e agora sou ordenado por ... [M] a ajudá-lo, até certo ponto, a erguer
uma parte do primeiro véu de mistério.” (MLcr., 154)
Subba Row também diz que era necessário que Sinnett agisse
estritamente de acordo com essas instruções e alterasse seu modo de vida
para estar em conformidade com as mesmas. Esse era um ponto onde Subba
Row via grandes dificuldades, pois considerava que Sinnett não estava
preparado para esse compromisso. Ele escreve para HPB sobre essa questão,
revelando nessa carta sua apreensão bem como seu enorme conhecimento
de Ocultismo prático:
“Não creio que jamais tenha sido tão profundamente tocado, em toda
minha vida, por algo que testemunhei, como com o arroubo em êxtase
da pobre velha criatura, quando nos encontrou recentemente, ambos
em nossos corpos naturais (...) Mesmo nosso fleumático M. foi tirado
de seu equilíbrio, por uma tal exibição – da qual ele era o principal herói.
Ele teve que usar seu poder, e mergulhá-la num sono profundo, pois
de outro modo ela teria rompido algum vaso sanguíneo, incluindo rins,
fígado e seus “interiores” (...) em suas tentativas delirantes de achatar
seu nariz contra sua capa de montaria suja com a lama do Sikkim! Nós
dois rimos, mas como poderíamos deixar de nos sentir tocados? É
claro, ela é completamente inadequada para um verdadeiro adepto:
sua natureza é por demais apaixonadamente afetuosa e nós não temos
o direito de condescender em apegos e sentimentos pessoais.” (MLcr.,
297)
“Ela está melhor e nós a deixamos perto de Darjeeling. Ela não está a
salvo no Sikkim. A oposição dos Dugpas é tremenda e a menos que
nós devotemos todo o nosso tempo cuidando dela, a “Velha Senhora”
poderá ser prejudicada, uma vez que ela agora está incapaz de cuidar
de si mesma.” (MLcr., 286)
(p. 173)
O Santuário (janeiro de 1883)
(p. 174)
Olcott Encontra com Mestre KH em Lahore (novembro de 1883)
“Parece que Maha Sahib (o grande) é que insistiu com o Chohan para
que Olcott tivesse a permissão de encontrar pessoalmente dois ou três
dos adeptos além de seu guru M. Tanto melhor. Eu não serei, quem
sabe, a única a ser chamada de mentirosa, quando afirmar a realidade
de suas existências.” (LBS, 62)
“Eu lhe disse que faltavam poucos minutos para as seis da tarde. Ele
disse: “Eu recém estive na Sede” – querendo dizer no duplo [astral]
– “e aconteceu um acidente com Madame Blavatsky”. E lhe
perguntei se havia sido algo sério. Ele disse que não podia me dizer,
mas achava que ela havia tropeçado no tapete e caído pesadamente
sobre seu joelho direito.” (SPR Appendix I)
(p. 176)
“Desapareceu! Fiquei pensando e também tive medo, é estranho pois
faz apenas quatro anos que ele é um chela. KH é esperado por aqui
ou pela redondeza por dois chelas que vieram de Mysore para O
encontrar. Ele está indo para algum lugar, relacionado aos Budistas da
Igreja do Sul. Será que nós o veremos? Eu não sei. Mas aqui há uma
comoção entre os chelas. Bem, coisas estranhas andam acontecendo.
Terremotos, e sol azul e verde; Damodar raptado pelos Mestres e o
Mahatma vindo. E agora o que faremos no escritório sem Damodar!
Oh deuses e poderes do Céu e do Inferno, não tínhamos trabalho e
problemas suficientes! Bem, bem, SUAS vontades sejam feitas, não a
minha. Sua, sempre na água fervendo, HPB”. (LBS, 72)
(p. 177)
Capítulo 12
Anna Kingsford
(p. 178)
Em 1873 conheceu Edward Maitland o qual veio a ser, com o
consentimento do reverendo Algernon, o acompanhante de Anna durante o
tempo que estudou Medicina em Paris, a partir de 1874. Para evitar falatórios
os dois se apresentavam como tio e sobrinha.
Meu gênio se parece com Dante e, como ele, está sempre de vermelho.
E tem um cáctus em sua mão, o qual ele diz que é meu emblema. Ele me pede
para dizer que a melhor arma contra os astrais [seres, entidades astrais] é a
oração. Oração significa o intenso direcionar da vontade e do desejo em
direção ao Alto; um propósito imutável de conhecer tão somente o mais
Elevado. (...)
(p. 179)
“Devo informar-lhes que o gênio nunca “controla” o seu cliente,
nunca tolera que a alma saia do corpo para permitir a entrada de um
outro espírito. A pessoa controlada por um astral ou elemental, ao
contrário, não fala em seu próprio nome, mas naquele do espírito que
a controla (...).
“Outro sintoma, diz ele, por meio do qual distinguir espíritos
estranhos do seu próprio gênio, é o seguinte: – o gênio nunca está
ausente. Desde que a mente se encontre em condições de ver, ele está
sempre presente.” (Kingsford 1993, 36-37)
Cristo não é visto como uma pessoa, mas como o estado de um homem
regenerado no qual a alma se tornou “una com o Espírito Divino”. (Godwin
1994b, 338) E Jesus era um homem que havia realmente vivido e realizado
esse estado de união. Um iniciado cujo nome ela só conseguia ver a primeira
letra – a letra “M”. (Kingsford 1993, 85)
“Naturalmente, não é da minha conta porque ela não nos foi ensinada
(...) Não acredito que o mistério da incongruência dos ensinamentos de
Nova Iorque de 1875, e os posteriores na Índia possa ser explicado,
pelo menos a ponto de satisfazer àqueles que atacam o problema do
ponto de vista da crítica literária: para aqueles que têm o poder de
levantar o véu e estudar a questão a partir do interno, essa dificuldade
desaparece. Mas não se pode esperar que estudantes limitados ao
plano físico recebam como sendo conclusivas as explicações de alunos
avançados da Loja Branca. A conclusão que cheguei há muito tempo é
a de que essa questão deve simplesmente ser deixada como um
mistério.” (ODL V, 38)
Não há dúvidas de que Olcott realmente não havia sido ensinado sobre
a reencarnação. Mas, e com relação à Madame Blavatsky? William Judge
afirma que, embora ela realmente não ensinasse ao público a doutrina da
reencarnação durante essa época em Nova Iorque:
“... ela de fato a ensinou para mim e para outros, naquela época como
agora. (...) HPB me falou muitas vezes, pessoalmente, da real doutrina
da reencarnação, compelida pelo caso da morte de minha própria filha;
portanto, eu sei o que ela conhecia e acreditava”. (Judge 1989, 119)
Maitland diz que essa questão não foi adiante nesta época, mas depois
eles ficaram surpresos ao saber que Kingsford havia sido reconhecida pelos
misteriosos chefes da ST como “a maior mística natural de nossos dias, e
com incontáveis idades adiante da grande maioria da humanidade”.
(Kingsford 1916, 11-12)
A “Divina Anna”
Mas havia ainda outros pontos de atrito. Anna Kingsford era uma
pioneira na luta pelo vegetarianismo e pela defesa dos animais, enquanto
Madame Blavatsky não era nem mesmo vegetariana. Além disso, Kingsford se
considerava uma profetisa, porta-voz de uma nova era e de um novo
evangelho, e com um conhecimento que ela dizia ser superior àquele que HPB
recebia, uma vez que era obtido diretamente, sem intermediários, em suas
Iluminações, enquanto a Sociedade Teosófica:
“... afirmava que suas doutrinas eram derivadas de fontes que, mesmo
que tivessem existência real – uma questão da qual não tínhamos
nenhuma prova – não podiam ser comparadas com aquelas das quais
as nossas eram derivadas, enquanto que a doutrina em si mesma era
palpavelmente inferior, até o ponto em que havia sido revelada, e isso
tanto no conteúdo quanto na forma.” (Kingsford 1916, 11)
Talvez essa seja a origem do apelido irônico com que HPB se referia a
ela em suas cartas particulares para Sinnett: a “divina Anna”. (LBS, 44)
Embora publicamente Madame Blavatsky não demonstrasse seus sentimentos
em relação a Anna Kingsford, em suas cartas para Sinnett ela os extravasava
livremente, revelando suas críticas:
“Eu era, desde o começo, contra sua nomeação, mas tive que segurar
minha língua, uma vez que é a escolha de KH e que Ele percebe
sementes tão maravilhosas nela, que Ele até mesmo desconsidera
suas críticas pessoais arrogantes acerca Dele.” (LBS, 60).
“... não foi ele, e somente ele que propôs e a elegeu como a única
possível Salvadora da Sociedade Teos. Britânica? Bem, agora
agradeça a ele e fique com ela para que os transforme todos numa
geleia [um grupo amorfo, sem identidade]. É claro que ela irá lhe adular
mais do que nunca. Eu sei que isso irá acabar com um escândalo.”
(LBS, 22)
“Diga, por que ela estava usando um vestido que parecia com “o pelo
preto e amarelo das zebras da criação do Rajá do Kashmir?” E é
verdade que usava rosas em seu cabelo “o qual é como um pôr de sol
flamejante, amarelo dourado”? E por que – piedade! Por que ela tinha
“suas mãos e braços pintados de preto, bem preto – até os cotovelos?”
Ou eram luvas? E mais, é verdade que naquela noite ela trazia uma
bolsa de metal brilhante a sua frente, com fivelas e guizos e mais
alguma coisa, e “tilintantes brincos de lua crescente” – simbólicos do
crescente brilho da “Loja de Londres”? Essa lua tomou luz emprestada
do Satélite. Mas por que – por que ela, a “mística do século” tinha que
usar tantas joias! Como pode confabular com os deuses invisíveis
quando se parece “com uma vitrine de uma joalheria inglesa em Delhi”?
Bem, eu penso também tê-la visto, e gostaria de ter o seu retrato para
comparar. Pois ela me foi mostrada. Não é alta, fina na cintura
(p. 189)
mas larga nos ombros, e muito bonita, bochechas ligeiramente rosadas
e com lábios bem vermelhos, e um nariz que fica mais largo quando ela
fala, do que quando está em repouso? Seus olhos são azul claro. Ela
é fascinante; mas então, por que fazer seu lindo cabelo ficar parecido
com “a mitra de um Dugpa Dashata-Lama”? Bem, tudo isso é besteira.
Estou extremamente triste, e não tenho ânimo para brincar.” (LBS, 51-
52)
(p. 190)
Essas diferenças de postura começaram a criar uma situação difícil
dentro da Loja de Londres. Sinnett reclamava com HPB, a qual não podia
compreender como os Mestres tinham Kingsford em tão alta consideração,
uma vez que “a Sra. K. não acredita e, se acredita, não se importa nem um
pouco com os Irmãos.” (LBS, 48) Porém, Madame Blavatsky logo começou
a suspeitar que por detrás da escolha da “divina Anna” não estava apenas o
Mestre KH, mas também seu Superior, o Grande Chohan:
Anna Kingsford então escreveu uma longa carta a HPB, expondo seus
pontos de vista, e pedindo que os submetesse ao Mestre KH. Na carta ela se
posiciona contra o sentimento de idolatria e submissão sem questionamento,
que os membros, liderados por Sinnett, estavam nutrindo pelos Mestres. Ela
achava que esse tipo de sentimento estava criando para a Sociedade uma
aparência de seita, o que era prejudicial para um movimento que pretendia
atrair a atenção de líderes de pensamento:
Para HPB e outros chelas, como Subba Row, uma tal posição era um
desrespeito inaceitável em relação aos Mestres, que lhes causava indignação:
“Ontem recebi uma carta de três jardas de comprimento da Sra. K. com
sua comunicação confidencial; primeiro fruto da bondade de KH! Bem,
isso é Carma do Chohan. Seja lá como for, de Subba Row até Brown,
todos aqui estão indescritivelmente chocados com esse panfleto ou
essa crítica tão insolente e impertinente de Maitland. Ela pede que KH
a torne “o apóstolo na Europa da Filosofia Esotérica Oriental e
Ocidental” !!!!!” (LBS, 63)
HPB continua sua carta dizendo que, de acordo com o Mestre esse já
havia avisado a Sinnett que, a menos que ele criasse uma Seção secreta e
também a presidisse, “enquanto que a Sra. K seria o lindo e cintilante
cartaz da “Loja”, representando o Cristianismo Esotérico ou qualquer
outra tolice – eles (os Mahatmas) não teriam mais nada a ver membros
ingleses.” (LBS, 64) E que, sob ordens do Mestre M.,
(p. 192)
Subba Row estava se encarregando de escrever uma resposta às críticas de
Kingsford. Essa resposta, entretanto, só foi publicada três meses depois, no
final de janeiro de 1884. Enquanto isso, HPB não continha suas críticas e
continuava a reclamar junto a Sinnett e a seu Mestre, até que Ele ordenou que
ela ficasse quieta. HPB escreve para Sinnett, em novembro 1883:
Mas poucos dias depois, ela escreve para Sinnett: “Estamos fritos,
tanto você quanto eu. (...) Estamos fritos além de qualquer redenção”.
(LBS, 69) Seu plano de tirar de cena a “divina Anna” – “uma criatura
egoísta, fútil e mediunística, que gosta demais de adulação, vestidos e
jóias cintilantes para ser do tipo certo” (LBS, 69) – havia falhado
completamente, pois os Mestres haviam decidido que ela era necessária para
o movimento e deveria permanecer. Com esses sentimentos em relação à
“divina Anna”, HPB lhe respondeu com uma “longa, polida e, pelo que eu
imaginava, diplomática carta”. (LBS, 71) Porém, para sua tristeza:
“... eu mal havia acabado de copiar minha carta (inglês corrigido por
Mohini), uma operação realizada no meu melhor papel e com minha
caneta nova, que me tomou toda uma manhã, em detrimento de, e
negligenciando outros trabalhos, quando o seguinte ocorreu. Minha
carta de 8 páginas – foi silenciosamente rasgada, uma página após a
outra, por meu PATRÃO!! Sua grande mão aparecendo na mesa
debaixo do nariz de Subba Row (que queria que eu escrevesse de um
modo bem diferente) e Sua voz dizendo um cumprimento em Telugú, o
qual não devo traduzir, embora Subba Row parecesse me traduzir com
grande júbilo.
(p. 193)
“KH quer que eu escreva de um modo diferente” – era a ordem. Eles
(os Patrões) confabularam e decidiram que a “divina Anna” deve ser
agradada. Ela é necessária para eles; ela é um maravilhoso paliativo
(seja lá o que for nesse mundo que essa palavra signifique nesse caso!)
e eles pretendem usá-la. Ela deve ser levada a permanecer como a
presidente auréola, e você o presidente núcleo e (ou nucleático?).
Vocês devem ver um ao outro como os dois pólos, oportunidade guiada
por Mestres, traçando finalmente o verdadeiro meridiano entre vocês
dois, para [o bem da] a Sociedade. Agora, não imagine que eu ri ou
caçoei. Estou num estado de mudo e impotente desespero – pois dessa
vez estou perdida, se entendi o que eles pretendem!” (LBS, 71)
Como entender que uma mulher que se referia com pouca veneração
ao Mestre KH pudesse receber esse tratamento? A essas reclamações de
HPB, Djual Khool simplesmente lhe respondeu:
“As palavras de uma mulher ferida em sua vaidade física, brava por não
chamar a atenção do Mestre (KH) são menos que uma brisa
passageira. Ela pode dizer o que quiser. Os membros cumpriram seu
dever protestando, como fizeram, ela saberá melhor agora, mas ela
deve permanecer, e o Sr. Sinnett deve se tornar o líder e presidente do
círculo interno.” (LBS, 71)
Então Madame Blavatsky teve que “lhe escrever; e dizer para ela
todos os tipos de piedosas e mentirosas congratulações que não sinto”.
(LBS, 72) E, se o fez, foi apenas porque devia obediência a seu Mestre, pois
ela própria era claramente contrária, como escreve:
“Sinnett Sahib – você não deve estranhar. Nós temos o bem de todo o
Movimento e da Sociedade no coração. Mesmo os desejos da maioria
não devem prevalecer – os sentimentos da minoria
(p. 194)
menos iluminada também têm que ser consultados. Deve chegar o dia
em que tudo será melhor compreendido. Enquanto isso a akhu tenta
fascinar KH com seu retrato!” (LBS, 73) [Akhu: Inteligência, entre os
egípcios. (Glossário Teosófico, 27)]
Anna B. Kingsford.
(p. 195)
Capítulo 13
“... em uma das cartas apresentadas pelo Sr. Sinnett como tendo sido
transmitidas a ele por Koot Hoomi, na misteriosa maneira descrita, uma
passagem tirada quase que verbatim de um discurso sobre Espiritismo
feito por mim no Lago Pleasant, em agosto de 1880, e publicada no
mesmo mês pelo Banner of Light. Como o livro do Sr. Sinnett não
apareceu senão após um tempo considerável (cerca de um ano, eu
penso), é certo que não citei, consciente ou inconscientemente, de
suas páginas. Como, então, ela foi parar na misteriosa carta de Koot
Hoomi?” (Kiddle)
Ele diz que havia escrito para Sinnett pedindo explicações e incluindo
uma cópia de seu discurso com as partes usadas por KH marcadas.
Entretanto, como não recebeu resposta, Kiddle questionava: KH não seria, na
verdade, apenas uma ilusão? Será que existia mesmo uma fraternidade oculta
de adeptos? Se KH era de fato um adepto poderoso, por que precisaria “tomar
emprestado” qualquer coisa de um humilde estudante das questões
espirituais?
(p. 197)
A semelhança é óbvia e a suspeita estava lançada. Sinnett lhe
respondeu por meio de um artigo no mesmo jornal, dizendo que não se
lembrava de ter recebido sua carta anterior, o que lastimava, pois se ainda
estivesse na Índia seria bem mais fácil tratar a questão do aparente plágio de
seu Mestre Adepto. E uma vez que ainda levaria algum tempo para obter uma
explicação para o mistério, enquanto isso, ele apenas poderia salientar que:
(p. 198)
Como já vimos John King, embora conhecido no mundo espírita da
época como um espírito desencarnado, no caso de HPB, era um disfarce do
Adepto que estava exercendo o papel de seu instrutor: o Irmão Hillarion.
Harrison também argumenta que havia uma falta de coerência nos teosofistas:
“Dizem para os teosofistas que desejam entrar em comunicação com
os Irmãos dos Himalaias e entrar em sua fraternidade, que eles
precisam levar uma vida de severos ascetas, abstendo-se de vinho,
bebidas alcoólicas, carne e fumo, que eles devem purificar seus
pensamentos, e assim por diante, mas após muitos anos de uma tal
vida, não é garantido que irão obter o que desejam. Como é, então, que
Madame Blavatsky, que não é uma asceta, tem sido bem sucedida
quando aqueles que seguem as instruções, que ela não segue, podem
falhar?” (Harrison)
Madame Blavatsky, de fato, não era uma asceta no que diz respeito a
seus hábitos alimentares e ao fumo. Como já vimos, ela não ingeria bebidas
alcoólicas, mas apreciava a carne e fumava regularmente. A tentativa de
justificar esses hábitos de HPB alegando que ela precisava “densificar” seus
veículos não se sustenta diante de sua predileção por eles.
Por outro lado, sua completa dedicação e obediência aos Mestres; bem
como a renúncia voluntária de uma vida familiar comum, abrindo mão de sua
posição social, e abraçando uma vida de sacrifícios físicos e psicológicos,
certamente constituem elementos que caracterizam uma verdadeira ascese,
ou disciplina ascética (i.e., conducente à verdadeira edificação espiritual).
(p. 199)
A Explicação do Mestre KH
“Meu bom e fiel amigo – as explicações aqui contidas nunca teriam sido
feitas se não fosse pelo fato de ter ultimamente percebido como você
esteve em apuros, durante suas conversas sobre o assunto do ‘plágio’
com alguns amigos – particularmente com C.C.M. [Massey]. (...) negar
a você a verdade – seria crueldade; entretanto, dá-la ao mundo de
espíritas preconceituosos e maldosamente predispostos seria pura
insensatez. Assim sendo, precisamos firmar um compromisso: preciso
colocar tanto você quanto o Sr. Ware, que goza de minha confiança,
sob um juramento de nunca explicar a ninguém, sem permissão
especial de minha parte, os fatos daqui por diante expostos – nem
mesmo ao Sr. M.A. Oxon [Stainton Moses] e C.C. Massey (...). Se
pressionado por qualquer um deles, você pode simplesmente
responder que o ‘mistério psicológico’ foi esclarecido para você e
alguns outros; e – SE satisfeitos – você pode acrescentar que as
‘passagens paralelas’ não
(p. 200)
podem ser chamadas de plágio ou palavras com esse sentido.” (MLcr.,
396)
Ainda nas primeiras cartas entre Sinnett e o Mestre KH, esse havia
compreendido mal a caligrafia de Sinnett, trocando “out of tune” (fora de
sintonia) por “out of time” (fora de hora). Quando Sinnett percebeu a troca e
lhe falou a respeito, o Mestre respondeu:
“Você escreveu ‘tune’? Bem, bem; eu preciso lhe pedir que me compre
um par de óculos em Londres. (...) Mas você deveria adotar o meu
hábito antiquado de ‘pequenas linhas’ sobre os “m”. Aquelas barras são
úteis, muito embora estejam ‘fora de sintonia e fora de hora’ [out of
tune and time] com relação à caligrafia moderna. Além disso, tenha
em mente que essas minhas cartas não são escritas, mas impressas,
ou precipitadas, e depois é que todos os erros são corrigidos.” (MLcr.,
26)
(p. 202)
“É claro que eu tenho que ler cada palavra que você escreve; de outro
modo faria uma bela confusão com elas. E seja através de meus olhos
físicos ou espirituais, o tempo requerido para fazer isso é praticamente
igual. O mesmo pode ser dito de minhas respostas. Pois, quer eu as
‘precipite’, as dite ou as escreva eu mesmo, a diferença no tempo
economizado é mínima. Eu tenho que refletir sobre elas, fotografar
cada palavra e sentença cuidadosamente em meu cérebro, antes que
elas possam ser repetidas por meio da ‘precipitação’. Assim como a
fixação das imagens formadas pela câmara, sobre superfícies
quimicamente preparadas requer uma preparação prévia dentro do
foco do objeto a ser representado, pois do mesmo modo – como
frequentemente acontece em fotografias ruins – as pernas do modelo
podem parecer fora de proporção com relação à sua cabeça e assim
por diante – temos que primeiro arrumar nossas sentenças e imprimir
cada letra que irá aparecer no papel em nossas mentes, antes que elas
fiquem prontas para serem lidas. No presente, isso é tudo que posso
lhe contar.” (MLcr., 37)
(p. 205)
Poucos meses após o recebimento dessa carta Sinnett foi dispensado
do segredo e, caso se sentisse preparado para “enfrentar o fogo das
negações furiosas e críticas adversas”, ele estava autorizado a publicar a
carta com as explicações. (MLcr., 420) Ele assim fez, aproveitando o
lançamento da 4ª edição de seu livro, O Mundo Oculto.
“Em uma de suas cartas recentes para a “V.S.” [Velha Senhora, isto é,
HPB], você expressa sua prontidão em seguir meu conselho em quase
tudo que eu pudesse lhe pedir. Bem – o tempo chegou para você provar
sua boa vontade. E como, nesse caso específico, estou simplesmente
executando a vontade de meu Chohan, espero que você não
experimente demasiada dificuldade em compartilhar de meu destino,
agindo – como eu estou agindo. A “fascinante” Sra. K. tem que
permanecer como presidente – jusqu’au nouvel ordre [até nova
ordem]. Explicações detalhadas seriam uma tarefa por demais longa e
tediosa. É suficiente que você saiba que sua luta contra a vivissecção
e sua dieta estritamente vegetariana conquistaram completamente,
para o lado dela, nosso austero Mestre. Ele liga menos do que nós para
qualquer expressão ou sentimento de desrespeito externo – ou mesmo
interno – aos “Mahatmas”. Deixe-a cumprir seu dever para com a
Sociedade, ser verdadeira aos seus princípios e todo o resto virá no
seu devido tempo. Ela é muito jovem, e sua vaidade pessoal e outras
falhas femininas devem ser deixadas para o Sr. Maitland e o coro grego
de seus admiradores.” (MLcr., 406)
(p. 207)
E o Mestre anexa a essa uma outra carta, para ser lida numa o geral
reunião da Loja de Londres, a respeito da qual comenta Virginia Hanson: “É
uma das cartas mais importantes do livro, no que diz respeito à
Sociedade Teosófica – especialmente no Ocidente”. (MLcr., 409) O Mestre
começa dizendo que o fato de Kingsford permanecer como presidente não era
apenas o desejo dele e do Mestre M., mas a vontade expressa do próprio Maha
Chohan:
“... também é leal e verdadeira – àquilo que ela acredita ser a Verdade.
E como ela é assim leal e verdadeira às suas convicções, por menor
que seja a minoria que a apoie no presente momento, a maioria,
liderada pelo Sr. Sinnett, nosso representante em Londres, não pode,
com justiça, atribuir-lhe a culpa, a qual (...) assim o é apenas aos olhos
daqueles que forem por demais severos. Todo teosofista ocidental
deveria aprender e recordar, especialmente aqueles que pretendam ser
nossos seguidores – que em nossa Fraternidade todas as
personalidades submergem numa ideia – direito abstrato e absoluta
justiça prática para todos. E que, embora não possamos dizer como os
cristãos
(p. 210)
“retribua o mal com o bem” – repetimos com Confúcio “retribua o bem
com o bem; para o mal – JUSTIÇA”. Assim os teosofistas que pensam
do mesmo modo que a Sra. K. – mesmo que se opusessem, sem
tréguas, a algum de nós pessoalmente – são merecedores de tanto
respeito e consideração de nossa parte e de seus membros
companheiros com visões opostas (enquanto forem sinceros), quanto
aqueles que estão prontos, junto com o Sr. Sinnett, a seguir
incondicionalmente apenas nossos ensinamentos especiais.” (MLcr.,
412)
No início de fevereiro o telegrama foi mostrado à Loja e Anna Kingsford
confirmada na presidência. Como as duas facções não estavam conseguindo
chegar à harmonia pedida na carta, os membros decidiram postergar a eleição,
esperando a vinda de Olcott e Mohini a Londres, para ajudar a resolver a
questão, sobre a qual, o Mestre KH afirmou que, embora:
“... dolorosa para alguns, e cansativa para outros, ainda assim é melhor
isso do que se a velha calma paralítica tivesse continuado”. (MLcr.,
413)
Tentando achar uma solução que permitisse que ela continuasse seu
trabalho na Loja de Londres, Anna Kingsford propôs a criação de duas Seções.
Uma seria formada pelos membros que quisessem seguir os ensinamentos
dos Mahatmas, e também reconhecê-los como seus Mestres, com Sinnett
como presidente. A outra encorajaria o estudo do Cristianismo Esotérico e
também do Ocultismo ocidental, do qual ele surgiu. Essa última seria
conhecida como Seção Católica, e seria presidida por ela. Nessa proposta, os
membros poderiam atender livremente às reuniões das duas Seções.
(Ransom, 197)
(p. 211)
“Não sei o que é que o Mestre ordenou Olcott a fazer. Ele guardou
segredo sobre sua instrução e não diz nada. Mas estou certa de que
nem mesmo o Chohan a imporia à Sociedade contra a vontade da
maioria. Deixe que funde uma sociedade separada da sua (...). Agora
meu Patrão quer que ela permaneça como presidente – uma vez que
o Velho Chohan está apaixonado pelo seu vegetarianismo e seu amor
pelos animais – mas não necessariamente da sua Sociedade. O
Chohan a quer dentro da Sociedade, mas não consentiria em forçar a
opinião ou voto de um único membro da LL. Ele não influenciará o
último deles, pois então ele não seria melhor que o Papa, que pensa
que pode obrigar a uma obediência inquestionável e depois evitar que
caia sobre si mesmo os carmas da pessoa. Isso é o que o Patrão
acabou de me dizer para lhe escrever. Portanto, é melhor você se
preparar e buscar o conselho e a opinião de cada membro que pensa
como você, e estar pronto para se dividirem em duas Sociedades, pois
isso é o que o Coronel tem que fazer – me foi dito.” (LBS, 81-83)
“Não se surpreenda com nada que você possa ouvir de Adyar. Nem se
desencoraje. É possível – embora tentemos evitar isso, dentro dos
limites do carma – que vocês tenham que passar por grandes
aborrecimentos domésticos. Vocês abrigaram sob seu teto um traidor
e um inimigo por anos, e o grupo dos missionários está mais que
disposto a se aproveitar de qualquer auxílio que ela possa ser induzida
a prestar. Uma completa conspiração está a caminho. Ela está furiosa
com o aparecimento do Sr. Lane-Fox e com os poderes que você deu
ao Conselho de Controle.” (LMW 1st Series, 43)
“Não preciso, não devo e não irei a Londres. Faça o que quiser. Nem
mesmo vou me aproximar de lá. Mesmo que meu Patrão tivesse me
ordenado isso – penso que preferiria enfrentar seu desagrado – e
desobedecê-lo.” (LBS, 74)
“O altivo e sério Mohini veio correndo por aquela longa sala, na maior
velocidade e, assim que alcançou o corredor, jogou-se incontinente,
com sua face no chão, aos pés da senhora de preto.” (Leadbeater, 36)
Maitland diz que Olcott teria feito essa regra, que proibia a filiação
múltipla, seguindo conselhos de Sinnett. (Kingsford 1916, 24) Talvez
(p. 219)
seja a isso que o Mestre KH esteja se referindo nesta passagem abaixo, onde
repreende Sinnett:
“Então você nega que jamais tenha havido qualquer rancor em você
contra K. [Kingsford]. Muito bem; chame-o de qualquer outro nome que
quiser; ainda assim foi um sentimento que interferiu com a estrita
justiça, e fez O. [Olcott] cometer um erro ainda pior do que o que ele já
havia cometido – mas que foi permitido seguir seu curso, pois se
adequava aos nossos propósitos, e não causou nenhum grande mal, a
não ser para ele o mesmo – que foi tão mesquinhamente desdenhado
por isso.” (MLcr., 424)
(p. 222)
Capítulo 15
“... em seus métodos, ou melhor, nas coisas que são ditas e feitas em
nome deles, um tal desvio de nosso senso prosaico de verdade e honra
de modo a nos assegurar que algo está muito errado em algum lugar.
Pois isso não é de modo algum um caso isolado. A repetida
necessidade de explicações – que são sempre mais formidáveis do que
as coisas a serem explicadas – deve com o tempo extenuar a fé mais
paciente, exceto a fé que supera toda a inteligência, o credo quia
impossibile.
“Tenho apenas que acrescentar que, enquanto preservando
todos os interesses e muito da crença que me atraiu para a Sociedade
Teosófica, e que me mantiveram nela até agora, apesar de
(p. 226)
muitos e crescentes constrangimentos, eu não creio que a publicação
das conclusões acima expressas seja consistente com a filiação leal. A
constituição da Sociedade, sem dúvida, é ampla o suficiente para incluir
mentes mais céticas que a minha própria com relação às suas
pretensas fontes de vitalidade e influência. Mas deixe qualquer um
tentar exercer essa liberdade nominal, e ele se descobrirá, não apenas
um elemento destoante, mas numa atitude de controvérsia com seus
líderes ostensivos, com as forças motrizes da Sociedade.” (Massey)
Contudo, além do caso Kiddle há ainda um outro episódio que foi muito
importante na decisão de Massey. Ele é conhecido como “a carta britânica” e
acabou fazendo parte do relatório preliminar da SPR, como uma suspeita de
fraude de HPB.
A Carta Britânica
Em 1879, C.C. Massey havia achado uma carta de um Irmão dentro do
livro de atas da ST Britânica. Uma vez que os membros estavam desejosos de
que houvesse alguma manifestação dos Mahatmas para eles, a carta foi aceita
como tal. Porém, alguns anos mais tarde, o marido da Sra. Hollis Billing, uma
médium cujo “guia” era conhecido como Ski, mostrou a Massey uma carta de
HPB para sua esposa, onde a Madame lhe pedia que, através de Ski, ela
enviasse uma outra carta para Massey:
“Por favor, peça a ele para pegar a carta anexa e colocá-la em seu
bolso, ou em algum lugar ainda mais misterioso. Mas ele não deve
saber que é de Ski. Deixe-o pensar o que quiser, mas ele não deve
suspeitar que você esteve perto dele com Ski às suas ordens. Ele não
suspeita de você, mas sim de Ski. (Também seria bom se ele pudesse
dar à L.L. alguma prova de afeição oriental, mas nenhum deles deve
suspeitar que é de Ski, portanto será mais difícil para fazê-lo do que
seria se fosse produzido em uma de suas seancés.)” (Price 1985a, 58)
(p. 227)
Para Massey, o fato de HPB ter pedido à Sra. Hollis Billing para enviar
a carta de “um modo misterioso”, dando a impressão de que o próprio autor da
carta é que a havia enviado ocultamente era algo que, além de não ter
resposta, lançava suspeita de fraude sobre HPB. Essa suspeita foi ainda
reforçada pelo fato de que, numa das cartas atribuídas a Madame Blavatsky e
publicadas no Christian College Magazine, ela teria escrito a Emma Coulomb
algo semelhante: “Eu lhe imploro que envie essa carta (aqui anexa) para
Damodar de um modo miraculoso. É muito importante.” (CW VI, 301)
“Me é suficiente dizer que “Ski” por mais de uma vez tem servido como
portador e até mesmo porta-voz para vários de nós; e que no caso a
que o Sr. Massey se refere, a carta de um ‘Irmão Escocês’, havia
alguém genuíno para entregá-la, o que misteriosamente para ele, nós
terminantemente nos recusávamos a fazer – inclusive o irmão
‘Escocês’ – uma vez que, não obstante os pedidos exaltados de
Upasika de que fizéssemos umas poucas exceções em favor de C.C.
Massey, seu ‘melhor e mais querido amigo’, (...) não estávamos
autorizados a desperdiçar nossos poderes tão insensivelmente.
Madame B., portanto, foi deixada para despachá-la pelo correio ou, se
ela o preferisse, por meio de ‘Ski’ – tendo M. a proibido de exercer seus
próprios meios ocultos.” (MLcr., 352)
(p. 229)
“Em vista da recente renúncia do Sr. Massey e da razão dada para ela,
a saber, suspeita dos Mahatmas, e a inclinação que tem sido
demonstrada por alguns outros membros da Loja de Londres, de
desacreditar nos ensinamentos orientais e desconfiar de seus
Instrutores nós, os abaixo assinado membros da Loja de Londres,
estando convencidos de que nenhuma educação espiritual é possível
sem absoluta e simpática união entre os estudantes companheiros,
desejam formar um grupo interno. (...)
“O princípio fundamental do Novo Grupo é a confiança implícita
nos Mahatmas e em seus ensinamentos e uma resoluta obediência a
seus desejos em todas as questões relacionadas com o progresso
espiritual.
“Finalmente, submetendo essa súplica a nossos reverenciados
Mestres, nós sinceramente lhes pedimos, se ela tiver sua aprovação,
para confirmá-la com suas assinaturas e consentir em continuar seus
ensinamentos daqui por diante, enquanto permanecer um membro fiel
nesse grupo.” (CW VI, 255)
Porém Olcott não revelou à SPR o nome do pintor, justificando que ele
ocupava um cargo oficial e que não era recomendável que fosse divulgado que
ele era um teosofista e, assim sendo, essa evidência não foi mais investigada.
Vejamos, então, como é que esses retratos foram feitos.
Ele foi a uma loja próxima e comprou uma folha de papel e crayons
nas cores preto e branco, pagando-os com uma moeda de meio dólar. Ao
chegar em casa e abrir o pacote caíram no chão duas moedas de prata de um
quarto de dólar! Para Olcott foi um sinal de que o Mestre queria que o desenho
ficasse como um presente para ele. (ODL 1, 371)
(p. 231)
“... foi e sentou-se perto do artista e ficou quieta fumando. De tempos
em tempos ia vagarosamente atrás dele, como se estivesse
observando o progresso de seu trabalho, mas não falou até que
estivesse concluído, digamos uma hora mais tarde. Eu o recebi
agradecido, o emoldurei e o pendurei em meu pequeno dormitório. Mas
uma estranha coisa havia acontecido. Após termos dado uma última
olhada na imagem, enquanto ela estava à frente do artista, e enquanto
HPB a pegava para me entregar, a assinatura em forma de criptograma
de meu Guru apareceu no papel; assim fixando sobre ela, como se
fosse, seu imprimatur [permissão oficial para impressão], e
grandemente aumentando o valor de seu presente. Mas naquela época
eu não sabia se a imagem se parecia com o Guru ou não, pois ainda
não o havia visto. Quando o vi, mais tarde, descobri uma verdadeira
semelhança e, mais ainda, fui presenteado por ele com o turbante que
o artista amador havia desenhado na imagem cobrindo sua cabeça.”
(ODL I, 371)
Ela também relata que, embora HPB não pudesse ver o quadro no
cavalete, fazia algumas observações ao artista, como: “Cuidado
Schmiechen; não faça o rosto redondo demais, alongue o perfil e preste
atenção na grande distância entre o nariz e as orelhas.” (Caldwell 1991,
185) Numa carta para Sinnett, o Mestre KH comenta sobre seu quadro:
“Acredito que agora você esteja tão satisfeito com meu retrato pintado
por Herr Schmiechien, quanto descontente com o que você tem?
Entretanto todos possuem, a seu modo, semelhanças. Apenas
enquanto os outros são produções de chelas, o último foi pintado com
a mão de M. na mente do artista, e muitas vezes usando seu braço.”
(MLcr., 430)
Schmiechen fez duas ou mais cópias dos retratos, mas nenhuma delas
apresentava a mesma vida que a primeira. Olcott descreve a força que
emanava dos quadros:
“... por algum truque do pincel do artista, a aura brilhante ao redor das
duas cabeças parecia realmente estar num movimento trêmulo, bem
como ela é na natureza. Não surpreende que o visitante de mente
religiosa se sinta, como se fosse, tocado por um senso da sacralidade
da sala onde estão os dois retratos e a introspecção meditativa é mais
fácil lá do que em outro local. Embora grandiosos de dia, os quadros
são ainda mais impressionantes à noite, quando adequadamente
iluminados, e as imagens parecem como se prontas para sair de suas
molduras e se aproximar da pessoa.” (ODL III, 164)
“É claro que sem ver as cartas não posso ajudá-lo com nenhuma pista
para o mistério. Eu sei como foi feito, mas uma vez que não posso
prová-lo (...) de que adianta falar nisso? A caligrafia naquele cartão não
era idêntica à minha? Entretanto você sabe que não foi feito por mim.
A letra de Alexis Coulomb é naturalmente parecida com a minha. Todos
nós sabemos como Damodar foi certa vez enganado por uma ordem
escrita na minha caligrafia para subir ao andar de cima e me procurar
em meu quarto em Bombay, quando eu estava em Allahabad. Era um
truque do Coulomb, que pensou que seria um bom divertimento
enganar a
(p. 237)
ele, ‘um chela’ – preparou um disfarce parecido comigo deitado na
minha cama e, tendo surpreendido Damodar – riu dele por três dias.
Infelizmente aquele pedaço de nota não foi preservado. Não pretendia
parecer nenhum fenômeno, mas apenas ser uma ‘boa farsa’ (une
bonne farce) da parte de Coulomb, que preparou muitas. E se ele
podia imitar tão bem minha letra numa nota, por que não poderia ter
copiado (teve 4 anos para estudar e fazer isso) cada fragmento e nota
minha para Mad. Coulomb num papel idêntico e fazer as interpolações
que quisesse? Vi Coulomb copiando uma dessas minhas notas, em sua
mesa, numa cena que me foi mostrada pelo Mestre na luz astral.” (LBS,
115-116)
Outra pessoa que influenciou a SPR contra HPB foi o Sr. St. George
Lane-Fox, membro do Conselho de Controle em Adyar. Em 24 de setembro de
1884 ele voltou da Índia para passar o verão na Europa. Logo entrou em
contato com a SPR, da qual era membro, para expor seus pontos de vista com
relação ao que estava acontecendo em Adyar. Massey escreve para Myers,
em 17 de outubro de 1884:
“Tive uma longa conversa esta noite com Lane-Fox e, do que ele disse,
não há dúvidas de que Damodar é muito pouco confiável. L.F. estava
muito ansioso em fazer justiça às boas qualidades de Damodar, mas
deixou claro (em linguagem direta) que ele é um mentiroso, e do relato
geral sobre ele, não tenho dúvidas de que ele tem sido usado. Isso,
para minha mente, é bastante consistente com que ele tenha sido, por
sua vez, enganado, pois ele parece ser um jovem vaidoso e
convencido, usado devido à sua faculdade mediunística, e que lhe
fizeram acreditar que era um favorito dos Mahatmas.
“Lane-Fox diz que Mad. Coulomb fez alguns fenômenos
espúrios, os quais Mad. Blavatsky não teve a ‘coragem moral’ de
impedir! É claro que ele argumentou contra minha visão em geral, mas
seus fatos a apoiam. (...)
“Do relato de Lane-Fox eu inferi que a mentira e a fraude são
abundantes e habituais na Sede. O que mais, realmente, podemos
deduzir dos favores por longo tempo gozados pelos Coulombs? (...)
(p. 238)
“Você faria bem em mostrar essa carta para Sidgwick ou
Hodgson, se algum deles já não estiver a par dos fatos. Mas faça como
quiser.” (Price 1985b, 75)
(p. 240)
O Relatório Preliminar da SPR (dezembro de 1884)
(p. 242)
Capítulo 16
“Se eu fosse exigir que você fizesse uma ou outra coisa, ao invés de
simplesmente aconselhá-lo, seria responsável por cada efeito que
pudesse brotar desse passo e você adquiriria apenas um mérito
secundário. (...) O discipulado é um estágio tanto educacional quanto
probacionário (...). Chelas com uma ideia errada de nosso
(p. 243)
sistema muito freqüentemente ficam na expectativa e esperam por
ordens, desperdiçando um tempo precioso que deveria ser utilizado
com esforço pessoal. Nossa causa necessita missionários, devotos,
agentes, talvez até mesmo mártires. Mas ela não pode exigir de
nenhum homem que ele se torne qualquer dessas coisas.”
(Jinarajadasa 1941, 13)
“Os adúlteros destilam um aura venenosa que inflama toda paixão ruim
e enlouquece seus ardentes desejos. O único caminho para o sucesso
é a separação absoluta: não permitirei nem um encontro, uma olhada
à distância, uma palavra ou carta. No momento em que quebrar
qualquer uma dessas uma dessas ordens você terá deixado de ser meu
chela.” (LMW 2nd Series, 151)
“... é por eu confiar cegamente Nele, mesmo quando não entendo Sua
política e quando para todos os fins e propósitos Ele é o primeiro a me
sacrificar e a permitir que as coisas mais cruéis aconteçam comigo, que
eu sou o que sou: na visão dos cegos apenas uma velha mulher
caprichosa e ‘lamuriosa’, mas aos olhos daqueles ‘que sabem’, sempre
uma Upasika agindo sob ‘ordens’ e, por isso, sempre tão pouco
constante.” (HPB to Judge, 2)
(p. 245)
C.W. Leadbeater Encontra-se com HPB no Cairo
HPB, CWL e o casal Oakley foram para um hotel em Porto Said, onde
esperavam aguardar tranquilamente a chegada de um novo vapor. Porém,
quando se preparavam para dormir, HPB:
Naquela época não havia trens de Porto Said para o Cairo e a única
forma de lá chegar era descer pelo canal de Suez até Ismailia, onde havia um
trem para a capital. À meia noite eles embarcaram no único transporte
disponível: um pequeno, sujo e desconfortável vapor que mais parecia um
rebocador. A descrição que Leadbeater faz desse trajeto nos oferece um
vislumbre das dificuldades que HPB e seus companheiros passavam em suas
viagens.
Na popa do vapor ficava uma pequena cabana de cerca de 10 m2 que
era chamada de cabine geral. E junto dela, nos fundos, havia um
compartimento sem janelas, denominado “quarto das senhoras”, onde HPB
acomodou-se. O Sr. Oakley, exausto e algo aborrecido pela súbita alteração
dos planos, jogou-se num duro assento de madeira num canto, enquanto
Leadbeater e a Sra. Oakley, considerando o enorme exército de baratas que
tomava conta de ambas as peças, preferiram passar a
(p. 246)
noite andando – limitados pelo espaço de seis passos para cada lado do
convés – e parando ocasionalmente para olhar o Sr. Oakley que “dormia
calmamente, embora absolutamente coberto pelas repugnantes criaturas
já mencionadas – e outras.” (Leadbeater, 60)
(p. 247)
Foi então que eles viram uma espécie de bola de névoa branca se
formando num buraco do teto e se condensando num pedaço de papel
dobrado que caiu no chão do compartimento do trem. Leadbeater pegou-o e
entregou-o a HPB. Ao lê-lo ela ficou com a face vermelha e disse: “Umph!
Isso é o que ganho por tentar lhes avisar sobre os problemas que estão
à frente de vocês!” e passou o papel para CWL, que lhe perguntou se poderia
lê-lo. Ela respondeu: “Por que você pensa que lhe dei?”
Lendo-o, descobriu tratar-se de uma nota do Mestre KH sugerindo, de
um modo gentil, porém firme, que era uma pena que ela, tendo consigo
candidatos tão sérios e entusiastas, “lhes desse uma visão tão sombria de
um caminho que, por mais difícil que pudesse ser, estava destinado a
conduzi-los finalmente a uma alegria indizível. E a mensagem concluía
com algumas palavras de gentis elogios endereçados nominalmente a
cada um de nós.” (Leadbeater, 65)
(p. 251)
Richard Hodgson em Adyar
Richard Hodgson Jr., mais tarde conhecido “como ‘um dos maiores,
senão o maior pesquisador de fenômenos psíquicos’ entre os
fundadores da moderna parapsicologia” (Eek 1978, 613), nasceu na
Austrália, em 24 de setembro de 1855. Formou-se em Direito na universidade
de Melbourne, em 1871, e foi para Cambridge, onde se bacharelou em
Ciências Morais. Foi aluno Henry Sidgwick e aparece como um membro da
Society for Psychical Research desde sua fundação. (Eek 1978, 613)
Em abril de 1884 Hodgson ganhou prestígio como sendo o primeiro
investigador a desmascarar um caso encaminhado para análise da SPR, o de
uma jovem analfabeta que simulava clarividência.
Desaparecimento do Santuário
“... o Sr. Coulomb afirma que os tijolos foram retirados, de modo que
havia uma comunicação através da cômoda (no fundo da qual o Sr.
Coulomb fez uma abertura com dobradiças) com o espaço vazio, e daí,
através do buraco na parede de trás, com o santuário.” (Hodgson)
Alexis Coulomb também afirmava que pouco antes de HPB viajar para
a Europa o fundo do santuário fora substituído por uma peça inteira e o buraco
na parede tampado, pois ela receava “que algum exame pudesse ser feito
no santuário durante sua ausência.” (Hodgson)
(p. 253)
“Mas o painel era novo demais para funcionar bem e tinha que ser
violentamente golpeado para poder ser aberto. Tudo estava mal
planejado, sem lubrificação e não estava bem lixado. Ele havia sido
mandado embora antes de ter tido tempo de terminar.” (Cranston, 269)
“... que já havia confessado para a Sra. Oakley que havia sido ele quem
tinha queimado o santuário, ficou com medo e levando Hodgson para
seu quarto lhe mostrou as duas portas de veludo sob seu colchão, onde
as escondera por meses, dizendo que as tinha queimado porque o
santuário havia sido profanado. Ele disse a Hodgson que você [Judge],
ele e Bowajee é que tinham queimado o santuário. Bowajee o nega, e
diz que você entenderá o que isso significa.” (HPB to Judge, 2)
(p. 255)
Capítulo 17
Seus médicos disseram que era um milagre que ela não tivesse
morrido. Como Olcott escreve para Srta. Arundale, isso só ocorreu porque:
(p. 256)
Isabel Cooper-Oakley ficara cuidando de HPB, numa crescente
ansiedade e preocupação à medida que ela piorava. Ela relata que mesmo
com HPB aparentemente a ponto de morrer, sentia-se sempre segura. Para
ela:
“... apesar dos médicos (que proclamaram meus quatro dias de agonia
e a impossibilidade de minha recuperação) eu subitamente melhorei,
graças à mão protetora do Mestre. Carrego em mim duas doenças
mortais que não estão curadas – coração e rins. A qualquer momento
o primeiro pode ter ruptura e o último pode me levar embora em poucos
dias. Eu não verei mais um ano. E tudo isso é devido a cinco de anos
de constante angústia, preocupação e emoção reprimida.” (MLcr., 444)
(p. 257)
Hodgson e a Teoria da Espiã Russa (março de 1885)
Hodgson afirmou ao Sr. Oakley que havia visto, numa carta de HPB
para Chintamon, uma frase onde ela lhe pedia: “Encontre-me alguns
membros que não sejam leais, mas desleais” ao governo anglo-hindu.
(LBS, 76) Para ele era uma evidência de que ela era contra o governo. HPB
diz que sempre trabalhou para conciliar os hindus com os ingleses e, se foi ela
que escreveu essas palavras, as escreveu em algum tipo de brincadeira. Ela
lembrava que certa vez Chintamon lhe havia perguntado sobre o governo
russo, se ele era tão cruel quanto o inglês com os povos que conquistava, ao
que ela teria respondido:
Essa não era a primeira vez que HPB era acusada de ser uma espiã
russa. Assim que chegaram à Índia ela era constantemente vigiada por um
detetive, que a seguia por todos os lados. (ODL II, 82) Embora nada tenha sido
provado, essas acusações sempre acompanharam a vida de Madame
Blavatsky.
(p. 259)
“Apesar de aparecer durante o ano politicamente ambíguo de 1988, a
publicação dessa carta sensacional tem o seu lugar na mitologia que
cresceu à volta de Mad. Blavatsky; ela tem sua própria contribuição à
documentação contraditória e incongruente sobre a extraordinária vida
de Mad. Blavatsky. Tem havido considerável especulação, ao longo
dos anos, sobre o possível papel de espionagem na vida de Mad.
Blavatsky (era ela, ou não, uma espiã russa?), mas nada nunca foi
provado. Essa carta é a primeira indicação de que pode haver, de fato,
algum fundamento para a especulação, embora a oferta de seus
serviços aparentemente não foi aceita pela polícia secreta russa.”
(Carlson, 226)
Ela também ressalta que na publicação da carta não se fala nada sobre
a verificação da caligrafia, apenas que se encontrava nos arquivos da polícia
secreta. E também que há uma frase curta da polícia, datada de 27 de janeiro
de 1873, dizendo: “Nenhuma ação foi tomada com relação ao pedido de
Madame Blavatskaia.” (Carlson, 231)
“... pior do que isso, para meu coração, foi que HPB, de quem tenho
sido amigo leal através de todas as circunstâncias, pudesse
(p. 260)
fazer esse ato de traição comigo; e meramente para satisfazer sua
vaidade, como poderia parecer. Mas essa é a criatura contraditória que
ela era, em seu eu físico, e eram esses traços que na época tornavam
tão intensamente penoso para qualquer pessoa trabalhar com ela por
qualquer período de tempo. Tenho sempre dito que a dificuldade de se
dar bem com ela, como Helena Petrovna, era infinitamente mais difícil
do que superar todos os obstáculos externos, impedimentos e
oposições que se ergueram no caminho do progresso da Sociedade.”
(ODL III, 230)
Madame Blavatsky escreve para Sinnett que não negava que tivesse
escrito a Chintamon algo como:
“Não se preocupe com Olcott e com o que ele diz (sobre a fusão das
duas Sociedades), eu farei com que ele faça isso. Eu posso
‘psicologizar o velho o homem com um olhar’ etc. Alguma coisa do
tipo, de brincadeira, é claro. Isso é utilizado pelo Sr. Hodgson para
mostrar claramente, baseado em minha própria confissão, que desde
o início tenho iludido e psicologizado Olcott e que; portanto, seu
testemunho não tem valor. Pobre Olcott está pronto para cometer
suicídio.” (LBS, 75)
“... que havia assinado algo que eles lhe trouxeram em seu leito de
morte e que disseram que era muito importante para a Sociedade, mas
que ela nunca havia compreendido tratar-se do que eu lhe descrevi, e
que ela repudiava tal ingratidão. Ela me disse para rasgar os papéis,
mas eu disse que não, que deveria guardá-los como a memória de um
episódio que poderia ser útil para o historiador do futuro.” (ODL III, 218)
(p. 265)
“Apesar de Hume, do amigo deles, Hodgson, e de todas as evidências,
os Oakleys não acreditam que eu seja uma impostora. Eles têm total
confiança nos Mestres; nada, dizem eles, fará com que duvidem da
existência deles (...) e, como eles dizem, são seus melhores amigos.
(...) Como posso acreditar que qualquer um seja meu amigo nesse
momento? É apenas aquele que sabe, da mesma maneira que sabe
que vive e respira, que nossos Mahatmas existem e os fenômenos são
reais, é que pode se solidarizar comigo e olhar para mim como uma
mártir; mas quem o faz?” (MLcr., 447)
Em 1890, numa circular aos membros indianos, ela revela porque fizera
um voto de nunca mais voltar a Adyar, uma vez que a fragilidade de sua saúde
era apenas uma desculpa, pois: “Aqueles que me salvaram da morte em
Adyar, e mais duas vezes desde então, poderiam tão facilmente me
manter viva lá como Eles o fazem aqui.” (CW XII, 157) Ela escreve:
(p. 267)
Embora não falasse publicamente sobre o assunto, Subba Row nunca
deixou de reconhecer Madame Blavatsky como uma agente dos Mahatmas.
Contudo, considerava que a própria ST era mais importante do que HPB e,
portanto, tinha que estar acima das suspeitas que recaiam sobre ela. Numa
carta para Sivavadhanulu Garu, em julho de 1885, ele escreve:
Em carta para HPB, de outubro de 1885, Olcott lhe conta que Subba
Row havia declarado que “se HPB continuar com essa agitação (...), ele
não apenas sairá da Sociedade Teosófica, mas levará todos aqueles
sobre quem tiver influência a fazer o mesmo.” (Ransom, 228)
“Por alguma razão seus sentimentos com relação a ela haviam mudado
completamente; ele agora estava positivamente hostil, e protestou
dizendo que ela não deveria ser chamada por mais um ou dois anos,
de modo a dar tempo para que a animosidade pública amainasse e
evitar o escândalo que seria causado pelos missionários, incitando
novamente os Coulombs a processá-la por difamação.” (ODL Ill, 372)
Hodgson achou HPB “difícil” por perceber que ela não confiava nele.
(Ransom, 217) Suas conversas com Damodar, Subba Row e Bowajee
também foram “difíceis”, pois para eles era degradante ter que responder sobre
assuntos sagrados. Para os três era preferível calar-se,
(p. 268)
não defendendo HPB, pois divulgar qualquer coisa acerca dos Mestres seria
uma vulgar profanação.
Para Subba Row, Madame Blavatsky era culpada por revelar segredos
do Ocultismo e, por isso, seria melhor que as pessoas pensassem que ela não
estava mais relacionada com os Mestres, duvidando
(p. 269)
dela, para que assim ela não divulgasse mais conhecimentos. HPB escreve a
esse respeito para Francesca Arundale e sua mãe, em junho de 1885:
“Você deve ter entendido por agora, meu amigo, que a tentativa
centenária feita por nós de abrir os olhos do mundo cego quase falhou:
na Índia – parcialmente; na Europa, com umas poucas exceções –
completamente. Há apenas uma chance de salvação para aqueles que
ainda acreditam: unirem-se e enfrentarem a tempestade bravamente.
(...)
(p. 270)
“Assim, meu amigo, chegamos a um fim forçado para as
projetadas instruções ocultas. Tudo estava arrumado e preparado. O
Comitê secreto apontado para receber nossas cartas e ensinamentos
e transmiti-los ao grupo oriental estava pronto, quando alguns europeus
– por razões que prefiro não mencionar – tomaram a si mesmos a
autoridade de reverter a decisão de todo o Conselho. Eles declinaram
(embora a razão que deram seja uma outra) – a receber nossas
instruções através de Subba Row e Damodar, sendo o último odiado
pelos Srs. Lane-Fox e Hartmann. Subba Row renunciou e Damodar foi
para o Tibet. Deverão os nossos hindus ser censurados por isso?”
(MLcr., 449)
“É necessário uma cabeça fria e uma natureza justa para ficar do lado
da minoria, e quando o Sr. Hodgson chegou na Índia ele encontrou toda
a comunidade anglo-indiana armada contra Madame Blavatsky, por
dois pontos principais: (1) porque ela era uma espiã russa; (2) porque
ela ficava do lado dos hindus contra os anglo-indianos, se achasse que
eles eram injustamente tratados e, sobretudo, porque tinha a coragem
de dizer isso. Agora, a posição de um jovem homem que queria ao
mesmo tempo fazer a coisa certa e ser popular com a maioria era
necessariamente muito difícil, e uma contínua série de jantares não
tendia a esclarecer suas visões, pois ele tinha incessantemente em
seus ouvidos uma torrente de calúnias contra ela. As investigações do
Sr. Hodgson não foram conduzidas com uma mente imparcial, e de
ouvir todos dizendo que Madame Blavatsky era uma impostora ele
começou a acreditar: após umas poucas entrevistas com Mad.
Coulomb e os missionários, vimos que suas opiniões estavam se
voltando contra a minoria.” (Some of Her Pupils, 16)
(p. 271)
Capítulo 18
Todo esse trabalho só pode ser realizado porque HPB contou com a
ajuda de um pequeno grupo de pessoas que, não acreditando nas acusações
do relatório Hodgson, permaneceram a seu lado auxiliando-a com trabalho,
dinheiro e amizade.
“Aqui estou eu. Para onde irei em seguida, não sei mais do que um
homem no mundo da lua. O único amigo que tenho na vida e na morte
é o pobre pequeno Bowajee D. Nath exilado na Europa; e o pobre
querido Damodar – no Tibet. D. Nath fica ao pé de minha cama,
acordado por noites inteiras, me mesmerizando, como prescrito por seu
Mestre. Por que Eles ainda querem me manter com vida é algo
estranho demais para eu compreender; mas Seus modos são e sempre
têm sido – incompreensíveis.” (LBS, 100)
(p. 272)
No final de julho os três foram para a Alemanha, via Roma e St.
Cergues, na Suíça, de onde Mary Flynn retornou para a Inglaterra. Com a
saúde fragilizada, Madame Blavatsky mudou-se para Würzburg, na Alemanha,
onde chegou em 12 de agosto de 1885, acompanhada de Babajee. Ela
escreve para a Sra. Sinnett:
Quando Sinnett foi visitar HPB em setembro ela ainda não conseguira
retomar o trabalho da Doutrina Secreta. Mas em outubro ela lhe escreveu:
(p. 274)
Constance Wachtmeister (outubro de 1885)
“Meus hábitos provavelmente não são os seus. Se você viesse para cá,
eu sabia que você teria que suportar muitas coisas que poderiam lhe
parecer desconfortos intoleráveis. É por isso que decidi recusar sua
oferta e lhe escrevi nesse sentido; mas depois que minha carta foi
postada o Mestre falou comigo e disse que era para eu lhe dizer que
viesse. Eu nunca desobedeço uma palavra do Mestre e lhe telegrafei
imediatamente. Desde então estou tentando tornar o quarto mais
habitável. Comprei um grande biombo que dividirá o quarto, de modo
que você ficará com um lado e eu com o outro, e espero que você não
fique desconfortável demais.” (Wachtmeister, 13)
Sobre suas conclusões após esse primeiro contato pessoal com HPB,
bastaria dizer que ela morou e colaborou com Madame Blavatsky até sua
morte. Para a condessa HPB foi:
“... uma amiga e instrutora que fez mais por mim do que qualquer outra
pessoa no mundo, que ajudou a me mostrar a verdade, e que me
indicou o caminho para testar e conquistar o eu – com todas suas
pequenas fraquezas – e a viver mais nobremente para ser útil e para o
bem dos demais.” (Wachtmeister, 72)
Ainda em fevereiro surgiu mais uma razão para HPB pedir a Sinnett
que ele pelo menos postergasse a publicação das Memoirs. Um russo
conhecido de sua família, Solovyoff, que nessa época já se voltava contra ela,
começou ameaçá-la com a acusação de bigamia, pois ele dizia que:
O livro foi publicado logo depois com o título sugerido por HPB. Em
maio de 1886, HPB deixou Würzburg planejando ir para Ostende, na Bélgica.
Antes de viajar enviou o que havia escrito da Doutrina Secreta para Subba
Row, em Adyar. No caminho fez uma visita
(p. 277)
aos Gebhards, em Elberfeld, na Alemanha. Lá escorregou no assoalho do
quarto, torcendo o tornozelo e machucando a perna, sendo obrigada a ficar
com os Gebhards.
Mary Gebhard
A família Gebhard foi fundamental para o desenvolvimento do trabalho
teosófico na Alemanha. Gustav Gebhard tinha várias atividades: era
banqueiro, tinha uma fábrica de seda e também era cônsul da Pérsia. Sua
esposa, Mary, tinha uma genuína inclinação para o Ocultismo e foi uma
discípula de Eliphas Levi até a morte desse, em 1875. Nessa ocasião, Mary
começou a procurar outras conexões ocultas. Tendo ouvido sobre a Sociedade
Teosófica escreveu para Olcott e, após uma troca de cartas, filiou-se à ST.
(CW VI, 434) O casal Gebhard teve seis filhos e uma filha, e quase todos
entraram para a ST.
Entre as novidades estava a de que Babula, seu fiel servo, que não
conhecia uma única letra em inglês, era apontado como o autor das cartas do
Mestre de HPB. Outra era que Mohini, Babajee, Bawani Row,
(p. 280)
Damodar etc., eram todos apresentados como sendo seus cúmplices e
mentirosos. Para HPB a acusação foi um duro golpe. Ainda com a saúde
fragilizada, ela escreve para sua irmã que teria que voltar à Índia, para
defender-se:
“Tudo mudou. Um vento hostil está soprando sobre nós. Que cura, que
saúde será possível para mim? Terei que voltar rapidamente para o
clima que é fatal para mim. Não há como evitar. Ainda que eu pagasse
por isso com a morte, preciso esclarecer esses esquemas e calúnias
porque não é apenas a mim que eles prejudicam: eles abalam a
confiança das pessoas em nosso trabalho e na Sociedade, à qual eu
dei toda a minha alma. Então, como posso ligar para a minha vida?
Eles nos escrevem que em Madras, Bombay e Calcutá os muros das
ruas estão cobertos com milhares de cartazes: ‘Queda de Madame
Blavatsky; suas Intrigas e Fraudes Descobertas’ – e assim por diante.”
(Letters of H.P. Blavatsky, VII)
“Não; você está errado, se pensa que são os Mestres que querem que
as pessoas acreditem que sou culpada. Ao contrário; embora
incapazes de me ajudar diretamente, pois não ousam interferir com
meu carma, eles são justos demais para não desejar me ver defendida
por todos aqueles que honestamente sentem que sou inocente.
Aqueles que o fazem, apenas ajudam os seus carmas, aqueles que
não – colocam uma mancha nele. O que Eles querem é apenas mostrar
que fenômenos sem a compreensão das condições filosóficas e lógicas
que os produzem – são fatais e sempre se tornarão desastrosos.” (LBS,
113)
(p. 282)
O Pequeno Homem Falhou
A publicação do relatório pode ter sido um dos motivos que fez com
que Babajee alterasse sua conduta em relação a HPB. Quando a condessa foi
morar com HPB, ela encontrou Babajee muito infeliz, pensando em ir embora.
Ela percebeu que ele estava se sentindo ferido e com inveja de Mohini, que
estava em Londres fazendo vários trabalhos, enquanto ele estava isolado com
HPB. (LBS, 278) Então, por sugestão da condessa e com o consentimento de
HPB, Babajee foi passar algum tempo em Elberfeld, com os Gebhards.
(p. 283)
A condessa retornou a Würzburg, preocupada com a influência que
Babajee estava exercendo sobre os Gebhards e com a confusão que estava
ameaçando fazer. Após alguns dias ele escreveu para HPB, mostrando
arrependimento, chamando-a de “Querida e respeitada Mãe”. (LBS, 336)
“... não está no fato dele assumir o nome, pois era o nome de mistério
escolhido por ele quando se tornou chela do Mestre; mas em se
aproveitar de que meus lábios estavam fechados; das concepções
errôneas das pessoas sobre ele, de que ele, esse atual Babajee, era
um ELEVADO chela, quando era apenas um chela em provação (...)
Você fala de “fraudes” mistérios e ocultamentos nos quais você
“nunca deveria estar envolvido”. Muito fácil de falar por alguém que
não está sob o compromisso de qualquer juramento ou voto. Eu
gostaria que você, com suas noções europeias de veracidade e
“código de honra”, e mais isso e aquilo, fosse submetido à provação
por uma quinzena.” (LBS, 170)
(p. 285)
Logo após a morte de Walter, Babajee voltou para a Índia, sem
aparecer mais na história teosófica. O Mestre KH comenta a respeito dele para
Leadbeater: “O pequeno homem falhou e colherá sua recompensa.” (LMW
1st Series, 82)
George R. S. Mead.
(p. 286)
Capítulo 19
Archibald era quase um ano mais velho que o irmão de seu pai,
Bertram, que nasceu em Birkenhead, Inglaterra, em 4 de abril de 1860.
Bertram foi educado dentro do Cristianismo místico de Swedenborg e também
estudou em Cambridge, onde formou-se em Matemática. Ele sentia grande
atração por filosofia e ciência e, na época de Cambridge, estudou
mesmerismo, Eliphas Levi, os místicos medievais e os escritores
neoplatônicos. (CW IX, 427)
“... era uma série de ensaios com informações do maior interesse mas,
a meu ver, não tinha nenhum plano concatenado. Era um caos de
possibilidades, mas de nenhum modo um vazio, ainda que estivesse
sem forma. (...) eu começava a trabalhar nos manuscritos, enquanto
Mad. Blavatsky trabalhava em seu próprio quarto e ficava invisível até
o fim da tarde. Ela poderia aparecer para o seu jantar, mas suas
refeições eram o desespero da empregada que as preparava, pois
eram banquetes cujo horário era muito mutável. À noite ela emergia e
então conversávamos sobre a sua planejada visita à Inglaterra, o
trabalho a ser feito lá, a Doutrina Secreta e assuntos gerais. Na maior
parte da noite, enquanto conversávamos, ela jogava sua “paciência”,
conversando enquanto arrumava as cartas.” (Keightley)
HPB prometeu a Archibald que iria a Londres, mas que ainda não podia
fixar a data. Após dois ou três dias ele voltou à Inglaterra e começou a procurar
um local onde pudesse hospedá-la. Porém, dez dias após seu retorno,
chegaram notícias de que ela estava muito doente, com infecção nos rins. Dr.
Ellis, um médico que fazia parte do grupo de teosofistas de Londres, foi para
Ostende.
(p. 288)
Como os médicos acharam que dificilmente ela escaparia da morte,
HPB chegou a fazer um testamento, deixando suas poucas posses para a
condessa. Entretanto, após uma noite em que parecia que HPB iria morrer, ela
recuperou-se como por milagre. Madame Blavatsky contou à condessa que a
cura se dera novamente por intervenção de seu Mestre, que lhe permitiu
escolher seu destino:
HPB, então, lhes disse que ela lavava as mãos, e que eles tentassem
organizá-la o melhor que pudessem. Os dois estudaram os manuscritos e lhe
apresentaram uma organização com base no caráter do assunto, sugerindo
que o trabalho fosse feito em quatro volumes, cada qual dividido em três
partes: (1) as Stanzas e os Comentários; (2) Simbolismo e (3) Ciência.
Também sugeriram que, ao invés de começar o primeiro volume com
a história de alguns grandes ocultistas, ela seguisse a ordem natural de
exposição, começando com a evolução do Cosmos, passando depois para a
evolução do homem, para então lidar com a vida de grandes ocultistas. E
finalmente, num quarto volume, falaria de Ocultismo Prático. (Wachtmeister,
79) O plano foi aprovado, dotando a Doutrina Secreta de um ordenamento
lógico definido.
A tarefa tornava-se ainda mais difícil pelo fato de que HPB lhe dizia
para fazer como quisesse, enquanto que outros, que também haviam sido
chamados para ajudar, insistiam que a linguagem original devia ser mantida,
de modo que aqueles que fossem ler o livro pudessem ter a sua escolha sobre
o que a autora queria dizer. Enquanto isso:
(p. 291)
“... vinha tabaco e conversa, especialmente o primeiro, embora
houvesse bastante da segunda. Eu gostaria de ter a memória e o poder
para relatar aquelas conversas. Todas as coisas sob do sol, e algumas
outras também, eram discutidas. Com uma coisa Madame Blavatsky
era intolerante – simulação, falsidade e hipocrisia. Com esses ela não
tinha piedade; mas com o esforço genuíno, por mais que estivesse
errado, ela não poupava trabalho para dar conselho e reorientação. Eu
nunca soube dela afirmar o que não era verdade, mas soube que ela
algumas vezes teve que manter silêncio, porque aqueles que a
interrogavam não tinham direito à informação. Nesses casos, eu depois
soube, ela foi acusada de deliberada inverdade. Uma de suas tristezas
vem à minha mente enquanto escrevo: “pois então você saberá que
eu nunca, nunca enganei ninguém, embora tenha sido
frequentemente compelida a deixar que eles enganassem a si
mesmos.””(Keightley)
Em setembro de 1886 HPB havia mandado para Adyar mais uma parte
do manuscrito da Doutrina Secreta através da Sra. Gebhard, que fora visitá-
la. Os manuscritos só chegaram no início de dezembro de 1886. Por essa
época, Subba Row estava se posicionando cada vez mais contra a abertura
de ensinamentos esotéricos aos ocidentais e recusou-se a “fazer mais do que
lê-la, dizendo que estava tão cheia de erros que se ele a tocasse teria que
reescrevê-la completamente!” (ODL III, 398)
“Deixe S.R. [Subba Row] fazer o que ele quiser. Eu dou a ele carte
blanche. Confio em sua sabedoria muito mais do que na minha, pois
eu posso, em vários pontos, ter compreendido mal tanto o Mestre
quanto o Velho C. [Cavalheiro, ou o Mestre Narayan]. Eles me dão
apenas fatos e raramente ditam em sequência.” (Zirkoff, 38)
Subba Row não colaborou mais com a trabalho da Doutrina Secreta.
Em setembro de 1887, escrevendo para Subiah Chetty, HPB lhe diz:
(p. 292)
“Subba Row até mesmo se recusou, através de C. Oakley, a ler ou ter
qualquer coisa a ver com minha Doutrina Secreta. Eu gastei aqui 30
libras para datilografá-la, com o propósito de lhe enviar e agora, quando
tudo está pronto, ele se recusa a examiná-la. É claro que será um novo
pretexto para ele pichar e criticar quando ela de fato for editada. Por
esse motivo, eu retardarei sua publicação.” (Zirkoff, 45)
“... me ajudar e corrigir minha D.S. desde que eu tirasse dela todas as
referências aos Mestres! Agora, o que é isso? Será que ele quer dizer
que eu deveria negar os Mestres, ou que eu não Os compreendo e
mutilo os fatos que Eles me dão, ou que ele, S.R., conhece as doutrinas
do Mestre melhor que eu? Pois pode significar tudo isso.” (Zirkoff, 48)
(p. 293)
HPB noticiou a morte de Subba Row, na edição de agosto de 1890 de
Lucifer, dizendo que poucos membros da ST ou leitores da Doutrina não
conheciam o nome de Subba Row, o grande sábio vedantino. E acrescenta:
A casa na Lansdowne Road era bem maior e HPB pode ocupar todo o
andar de baixo. Tinha um pequeno dormitório que ligava-se a um escritório
grande, onde ela escrevia. Os Keightleys se preocupavam com pequenos
detalhes que pudessem contribuir com o bem-estar de HPB. Assim, no
escritório a mobília foi arrumada à volta de HPB de modo que ela pudesse
alcançar seus livros e papéis sem dificuldades. (Wachtmeister, 67)
(p. 294)
“Para Archibald Keightley, meu verdadeiramente amado amigo e irmão,
e um dos zelosos editores desse trabalho; e possam esses volumes,
quando a autora estiver morta e partido, lembrá-lo daquela cujo nome
na presente encarnação é H.P. Blavatsky. Meus dias são meus
Pralayas [períodos de dissolução, obscurecimento ou repouso],
minhas noites – meus Manvantaras. [o oposto de Pralaya, i.e.,
períodos de atividade] HPB.” (CW IX, 431)
(p. 295)
HPB escreve para sua irmã:
Após redigir a crítica foi visitar HPB, que a recebeu com um veemente
aperto de mãos, exclamando: “Minha querida Senhora Besant! Há quanto
tempo eu desejava conhecê-la”. (Caldwell, 268) Esse primeiro encontro
deixou uma forte impressão em Annie. Numa segunda visita, Besant
novamente lhe perguntou sobre a Sociedade Teosófica, “com desejo de
ingressar, mas lutando contra esse sentimento” (Caldwell, 268), pois essa
atitude implicaria numa completa mudança em sua vida. Ela estaria voltando-
se contra o Materialismo que até então defendera, e publicamente
confessando que estivera errada.
Essa profunda luta interna não se resolvia, e Besant mais uma vez foi
a Lansdowne Road para ter mais informações sobre a ST. Então Madame
Blavatsky olhou-a penetrantemente e lhe deu o relatório da SPR, dizendo
apenas: “Vá e leia-o; e se, após sua leitura, você voltar – muito bem.”
(Caldwell, 269) Annie leu o relatório e, no dia seguinte, formulou o pedido de
ingresso na Sociedade Teosófica. Ao receber seu diploma de membro, dirigiu-
se para Lansdowne Road, onde encontrou HPB sozinha. Ela relata o encontro:
“... aproximei-me dela, inclinei-me e beijei-a mas sem falar nada. “Você
ingressou na Sociedade?” “Sim.” “Leu o relatório?” “Sim” – “E então?”
Caí de joelhos diante dela e apertei suas mãos entre as minhas,
olhando direto em seus olhos. “Minha resposta é: você me aceitaria
como sua discípula e me daria a honra de proclamá-la ao mundo como
minha instrutora?” O seu austero semblante se suavizou e lágrimas
irreprimíveis lhe brotaram dos olhos;
(p. 297)
depois, com dignidade mais régia, colocou a sua mão sobre a minha
cabeça, dizendo: “Você é uma nobre mulher! Que o Mestre a
abençoe!”.” (Caldwell, 269)
Mead se encontrou com HPB pela primeira vez em 1887. Foi trabalhar
como seu secretário em agosto de 1889, cargo que ocupou até o final da vida
de HPB. Na ocasião ainda havia uma grande suspeita pública pairando no ar,
pois “o público em geral daquela época, acreditando na impossibilidade
de todos os fenômenos psíquicos, naturalmente condenou HPB sem
qualquer questionamento.” (Mead, 7) Entretanto, sua convivência com HPB
logo lhe mostrou uma imagem que contradizia completamente aquela que o
relatório da SPR apresentava. Mead relata que foi trabalhar com ela:
Outro aspecto que para Mead demonstrou a inocência de HPB foi como
ela o recebeu, pois quando foi trabalhar como seu secretário particular, ela mal
o conhecia. Se fosse uma impostora, seria arriscado empregar alguém assim,
pois muitas vezes ela era espionada pelos inimigos. Entretanto, ela não
apenas o admitiu à sua íntima convivência, mas o recebeu com total confiança:
Mead não somente tinha que ler toda a correspondência, mas também
responder às cartas, da melhor maneira que pudesse. HPB era muito lacônica
em suas orientações quanto a como responder às cartas, e gradualmente foi
ficando ainda mais silenciosa, de modo que:
(p. 300)
Sete de seus livros tratam especificamente do Gnosticismo ou textos
Gnósticos, começando com Simon Magus (“Simão Mago”) em 1892.
(Goodrick-Clarke, 138) Em 1890 Mead traduziu para o Inglês o texto Pistis-
Sophia, a partir da versão em Latim de M.G. Schwartze, que fora feita
diretamente do manuscrito copta original, no Museu Britânico. Após a morte
de HPB, Mead e Besant ficaram como editores de Lucifer. Em 1898, Mead
mudou o nome da revista para The Theosophical Review, passando a ser
seu único editor. Em 1899 ele casou-se com Laura Cooper, irmã de Isabel
Cooper-Oakley.
Num artigo de 1904, ele demonstra o quanto ela ainda estava viva
dentro dele, ao escrever:
“H.P.B. era uma guerreira, não uma sacerdotisa, era uma profetisa
mais do que uma vidente; ela era, além disso, muitas coisas que você
não esperaria como um instrumento para trazer de volta
(p. 301)
o conhecimento de muito do que havia de mais sagrado e sábio na
antiguidade. Ela era verdadeiramente como o símbolo vivo da aparente
insensatez desse mundo, pela qual a sabedoria é prenunciada. Nessa
vida, estou convencido, nunca sentirei novamente tanta consideração
por alguém quanto por ela; somente ela me deu um sentimento de estar
em contato com alguém colossal, titânico, às vezes quase cósmico.
Algumas vezes tenho me perguntado se esse estranho ser de fato
pertencia à nossa humanidade – e contudo ela era tão humana, tão
cativante. Teria ela fugido de algum outro planeta, por assim dizer?
Será que ela normalmente pertencia à evolução deles? Quien sabe?
“Para todas essas questões, nenhum de nós que a conheceu e
a amou pode dar qualquer resposta segura; ela permanece nossa
esfinge, nosso mistério, nossa ternamente amada Velha Senhora.”
(Mead, 19)
(p. 302)
Bibliografia
(p. 303)
Coues, E. – Blavatsky Unveiled! BSC.
www.blavatskyarchives.com/coues.htm
Godwin, J. – The Hidden Hand, Part III: The Parting of East and West. TH
3, N° 4, 107-117, outubro/1990.
––– Colonel Olcott Meets the Brothers: An Unpublished Letter. TH
5, N° 1, 5-10, janeiro/1994a.
––– The Theosophical Enlightment. State Univ. of New York Press,
Albany, 1994b.
(p. 304)
Hao Chin Jr., V. (ed.) – The Mahatma Letters (in Chronological Sequence).
(MLcr.), TPH, Quezon City, 1993.
Kingsford, A.B. – Clothed With the Sun. Sun Publ. Co., Santa Fe, 1993.
(p. 305)
Massey, C.C. – The Explanation of the Kiddle Incident in the Fourth
Edition of The Occult Word. BSC. www.blavatskyarchives.com/kiddle14.htm
Niemand, J. – William Quan Judge. [In Letters That Have Helped Me].
http://theosophytrust.org/Online_Books/Letters_V1.2.pdf
Olcott, H.S. – Old Diary Leaves. (ODL), 6 volumes. TPH, Adyar, 1974.
––– People from the Other Worlds (1875). Kessinger Publ. Co.,
Montana.
––– Swami Dayanand’s Charges. BSC.
www.blavatskyarchives.com/olcott1882.htm
Peebles, J.M. – Five Journeys Around the World. Peebles Publ. Co., Battle
Creek, 1910.
Ryan, C.J. – H.P. Blavatsky and the Theosophical Movement. TUP Online,
1997.
http://www.theosociety.org/pasadena/hpb-tm/hpbtm-hp.htm
(p. 307)
Spierenburg, H.J. – Dr. Rudolf Steiner on Helena Petrovna Blavatsky. TH
1, N° 7, 159-174, julho/1986.
Taylor, N.C. – The Mysterious Life and Transitions of the Cagliostro Jewel.
TH 3, N° 3, 79-87, julho/1990.