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Supremo Tribunal Federal

Ementa e Acórdão

Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 208

30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

RELATORA : MIN. ROSA WEBER


REQTE.(S) : PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA
ADV.(A/S) : CLAUDIO OLIVEIRA SANTOS COLNAGO
INTDO.(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
INTDO.(A/S) : CONGRESSO NACIONAL
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES E
ADVOGADOS PÚBLICOS FEDERAIS - ANPPREV
ADV.(A/S) : HUGO MENDES PLUTARCO
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO DE SINDICATOS DE TRABALHADORES
TÉCNICOS-ADMINISTRATIVOS EM INSTITUIÇÕES
PÚBLICAS DE ENSINO SUPERIOR NO BRASIL E
OUTRO(A/S)
ADV.(A/S) : CLAUDIO SANTOS DA SILVA
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DOS POLICIAIS FEDERAIS
- FENAPEF
ADV.(A/S) : RUDI MEIRA CASSEL
ADV.(A/S) : ANTONIO RODRIGO MACHADO DE SOUSA
AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DA
PREVIDÊNCIA E DA SEGURIDADE SOCIAL -
ANASPS
ADV.(A/S) : ANTONIO TORREAO BRAZ FILHO
AM. CURIAE. : CONFEDERACAO DOS TRABALHADORES NO
SERVICO PUBLICO FEDERAL - CONDSEF
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES NO SERVIÇO
PÚBLICO FEDERAL - FENADSEF
AM. CURIAE. : SINDICATO NACIONAL DOS SERVIDORES
FEDERAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA, PROFISSIONAL
E TECNOLÓGICA - SINASEFE NACIONAL
ADV.(A/S) : JOSE LUIS WAGNER
AM. CURIAE. : SINDICATO DOS TRABALHADORES FEDERAIS DA
SAÚDE, TRABALHO E PREVIDÊNCIA NO ESTADO
DO RIO GRANDE DO SUL (SINDISPREV /RS)

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ADI 5755 / DF

ADV.(A/S) : GLENIO LUIS OHLWEILER FERREIRA


ADV.(A/S) : THIAGO CECCHINI BRUNETTO
AM. CURIAE. : CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS
ADVOGADOS DO BRASIL - CFOAB
ADV.(A/S) : MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO
ADV.(A/S) : LUIZ GUSTAVO ANTONIO SILVA BICHARA
ADV.(A/S) : EDUARDO DE SOUZA GOUVEA
ADV.(A/S) : OSWALDO PINHEIRO RIBEIRO JUNIOR
ADV.(A/S) : LIZANDRA NASCIMENTO VICENTE
ADV.(A/S) : GUILHERME DEL NEGRO BARROSO FREITAS
ADV.(A/S) : CLAUDIA PAIVA CARVALHO
AM. CURIAE. : SINTRAJUSC - SINDICATO DOS TRABALHADORES
NO PODER JUDICIÁRIO FEDERAL EM SANTA
CATARINA
ADV.(A/S) : PEDRO MAURICIO PITA DA SILVA MACHADO
AM. CURIAE. : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS
TRABALHADORES EM SEGURIDADE SOCIAL
¿ CNTSS/CUT
ADV.(A/S) : RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO
ADV.(A/S) : RODRIGO CAMARGO BARBOSA
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DA
JUSTIÇA FEDERAL E DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA
UNIÃO ¿ FENAJUFE
ADV.(A/S) : RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO
ADV.(A/S) : RODRIGO CAMARGO BARBOSA
AM. CURIAE. : ASSOCIACAO DOS ADVOGADOS DE SAO PAULO
ADV.(A/S) : ANTONIO CARLOS DE ALMEIDA AMENDOLA
ADV.(A/S) : MARIO LUIZ OLIVEIRA DA COSTA
ADV.(A/S) : ANDRE ALMEIDA GARCIA
ADV.(A/S) : DANIEL NUNES VIEIRA PINHEIRO DE CASTRO

EMENTA

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.


PRECATÓRIOS. CONVERSÃO DE RITO. JULGAMENTO
DEFINITIVO DA AÇÃO. ART. 2º, CAPUT E § 1º, DA LEI Nº

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ADI 5755 / DF

13.463/2017, QUE DETERMINA O CANCELAMENTO DOS


PRECATÓRIOS E REQUISIÇÕES DE PEQUENO VALOR (RPV)
FEDERAIS EXPEDIDOS E CUJOS VALORES NÃO TENHAM SIDO
LEVANTADOS PELO CREDOR E ESTEJAM DEPOSITADOS HÁ
MAIS DE DOIS ANOS EM INSTITUIÇÃO FINANCEIRA OFICIAL.
TRANSFERÊNCIA PARA A CONTA ÚNICA DO TESOURO
NACIONAL. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 2º, 5º, CAPUT, XXII, XXXV,
XXXVI, LIV E LV, E 100 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.
PROCEDÊNCIA.
1. Conversão do rito do art. 10 para o rito do art. 12 da Lei nº
9.868/1999. Julgamento definitivo do mérito em razão: (i) da postulação
formalizada; (ii) da plena coleta das informações jurídicas; e (iii) da
apresentação dos argumentos necessários para a solução do problema
constitucional posto, com respeito aos direitos fundamentais processuais.
Perfectibilização do contraditório efetivo e presença de elevado grau de
instrução processual.
2. A lei impugnada consubstancia ato normativo oriundo do
Congresso Nacional, por iniciativa do Presidente da República. Exercício
de competência legislativa concorrente sobre direito financeiro, uma vez
que precatório e requisição de pequeno valor (RPV) destinam-se à
realização de despesas públicas decorrentes de sentenças judiciais
transitadas em julgado. Não configuração de inconstitucionalidade
formal: a apreciação da natureza do disciplinamento da matéria e do
desbordamento das balizas constitucionais expressamente previstas pelo
texto da Carta Magna situa-se na seara de eventual inconstitucionalidade
material da atuação legislativa quanto ao trâmite operacional de
pagamento de valores por meio de precatórios e requisições de pequeno
valor.
3. A Lei nº 13.463/2017 criou verdadeira inovação ao disciplinar o
pagamento de montantes por precatórios e requisições de pequeno valor
por meio da determinação de um limite temporal para o exercício do
direito de levantamento do importe do crédito depositado. A
transferência automática, pela instituição financeira depositária, dos

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ADI 5755 / DF

valores depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional sem prévia


ciência do interessado ou formalização de contraditório (art. 5º, LV, CF)
afronta o devido processo legal (CF, art. 5º, LIV) no que atine ao respeito
ao contraditório e à ampla defesa.
4. Tal lei desloca a prévia ciência e o exercício do contraditório para
momento posterior ao cancelamento automático, procedimento que viola
a Constituição Federal. A mera possibilidade de novo requerimento do
credor não desfigura a inconstitucionalidade material em razão da não
observância do contraditório e da ampla defesa.
5. Impossibilidade de edição de medidas legislativas para
condicionar e restringir o levantamento dos valores a título de
precatórios. Precedente: ADI 3453 (Relatora: Min. Cármen Lúcia, Tribunal
Pleno, DJ 16.3.2007). Violação da separação dos Poderes: a Constituição
Federal desenhou o regime de pagamento de precatório e conferiu
atribuições ao Poder Judiciário sem deixar margem limitativa do direito
de crédito ao legislador infraconstitucional. Devem ser prestigiados o
equilíbrio e a separação dos Poderes (art. 2º, CF), bem como a garantia da
coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CF) mediante a satisfação do crédito a
conferir eficácia às decisões. A lei impugnada transfere do Judiciário para
a instituição financeira a averiguação unilateral do pagamento e autoriza,
indevidamente, o cancelamento automático do depósito e a remessa dos
valores à Conta Única do Tesouro Nacional. Configurada uma verdadeira
burla aos freios e contrapesos indispensáveis ao bom funcionamento dos
Poderes.
6. A mora do credor em relação ao levantamento dos valores
depositados na instituição financeira deve ser apurada no bojo do
processo de execução, sem necessidade de cancelamento automático das
requisições em ausência de prévia ciência ao interessado. Violação do
devido processo legal (art. 5º, LIV, CF) e do princípio da
proporcionalidade. Revela-se desproporcional a imposição do
cancelamento automático após o decurso de dois anos do depósito dos
valores a título de precatório e RPV. A atuação legislativa não foi pautada
pela proporcionalidade em sua faceta de vedação do excesso.

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ADI 5755 / DF

7. Ao determinar o cancelamento puro e simples, imediatamente


após o biênio em exame, a Lei nº 13.463/2017 afronta, outrossim, os
incisos XXXV e XXXVI do art. 5º da Constituição da República, por violar
a segurança jurídica, a inafastabilidade da jurisdição, além da garantia da
coisa julgada e de cumprimento das decisões judiciais. Precedentes.
8. A lei impugnada imprime um tratamento mais gravoso ao credor,
com a criação de mais uma assimetria entre a Fazenda Pública e o
cidadão quando ocupantes dos polos de credor e devedor. Manifesta
ofensa à isonomia, seja quanto à distinta paridade de armas entre a
Fazenda Pública e os credores, seja no que concerne a uma diferenciação
realizada entre os próprios credores: aqueles que consigam fazer o
levantamento no prazo de dois anos e os que assim não o façam,
independentemente da averiguação prévia das razões. Distinção
automática e derivada do decurso do tempo entre credores sem a
averiguação das razões do não levantamento dos valores atinentes aos
precatórios e requisições de pequeno valor, que podem não advir
necessariamente de mero desinteresse ou inércia injustificada. Ofensa à
sistemática constitucional de precatórios como implementação da
igualdade (art. 5º, caput, CF). Precedentes.
9. O manejo dos valores de recursos públicos depositados e à
disposição do credor viola o direito de propriedade (art. 5º, XXII, CF).
Ingerência sobre o montante depositado e administrado pelo Poder
Judiciário, que passa a ser tratado indevidamente como receita pública e
alvo de destinação.
10. A ação direta conhecida e pedido julgado procedente.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do


Supremo Tribunal Federal em conhecer da ação direta e julgar procedente
o pedido, para declarar a inconstitucionalidade material do art. 2º, caput e
§ 1º, da Lei nº 13.463/2017, nos termos do voto da Relatora e por maioria
de votos, vencidos os Ministros Roberto Barroso, Gilmar Mendes, André

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ADI 5755 / DF

Mendonça, Nunes Marques e Luiz Fux (Presidente), que julgavam


parcialmente procedente o pedido, conferindo interpretação conforme
aos dispositivos, em sessão Plenária de 30 de junho de 2022, na
conformidade da ata do julgamento.

Brasília, 30 de junho de 2022.

Ministra Rosa Weber


Relatora

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Extrato de Ata - 24/02/2021

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PLENÁRIO
EXTRATO DE ATA

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755


PROCED. : DISTRITO FEDERAL
RELATORA : MIN. ROSA WEBER
REQTE.(S) : PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA
ADV.(A/S) : CLAUDIO OLIVEIRA SANTOS COLNAGO (11113/ES)
INTDO.(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
INTDO.(A/S) : CONGRESSO NACIONAL
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES E ADVOGADOS
PÚBLICOS FEDERAIS - ANPPREV
ADV.(A/S) : HUGO MENDES PLUTARCO (DF025090/)
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO DE SINDICATOS DE TRABALHADORES TÉCNICOS-
ADMINISTRATIVOS EM INSTITUIÇÕES PÚBLICAS DE ENSINO SUPERIOR NO
BRASIL E OUTRO(A/S)
ADV.(A/S) : CLAUDIO SANTOS DA SILVA (10081/DF)
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DOS POLICIAIS FEDERAIS - FENAPEF
ADV.(A/S) : RUDI MEIRA CASSEL (22256/DF)
ADV.(A/S) : ANTONIO RODRIGO MACHADO DE SOUSA (00034921/DF)
AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DA PREVIDÊNCIA E
DA SEGURIDADE SOCIAL - ANASPS
ADV.(A/S) : ANTONIO TORREAO BRAZ FILHO (09930/DF, 154525/MG)
AM. CURIAE. : CONFEDERACAO DOS TRABALHADORES NO SERVICO PUBLICO
FEDERAL - CONDSEF
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES NO SERVIÇO PÚBLICO
FEDERAL - FENADSEF
AM. CURIAE. : SINDICATO NACIONAL DOS SERVIDORES FEDERAIS DA
EDUCAÇÃO BÁSICA, PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA - SINASEFE NACIONAL
ADV.(A/S) : JOSE LUIS WAGNER (1235-A/AP, 17183/DF, 18061/PR,
125216/RJ, 18097/RS, 15111/SC)
AM. CURIAE. : SINDICATO DOS TRABALHADORES FEDERAIS DA SAÚDE,
TRABALHO E PREVIDÊNCIA NO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (SINDISPREV/
RS)
ADV.(A/S) : GLENIO LUIS OHLWEILER FERREIRA (23021/RS, 328901/SP)
ADV.(A/S) : THIAGO CECCHINI BRUNETTO (51519/RS)
AM. CURIAE. : CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL -
CFOAB
ADV.(A/S) : MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO (18958/DF, 167075/MG,
2525/PI)
ADV.(A/S) : LUIZ GUSTAVO ANTONIO SILVA BICHARA (21445/DF,
10503/ES, 139419/MG, 112310/RJ, 303020/SP)
ADV.(A/S) : EDUARDO DE SOUZA GOUVEA (067378/RJ, 311792/SP)
ADV.(A/S) : OSWALDO PINHEIRO RIBEIRO JUNIOR (16275/DF)
ADV.(A/S) : LIZANDRA NASCIMENTO VICENTE (39992/DF)
ADV.(A/S) : GUILHERME DEL NEGRO BARROSO FREITAS (48893/DF)
ADV.(A/S) : CLAUDIA PAIVA CARVALHO (129382/MG)
AM. CURIAE. : SINTRAJUSC - SINDICATO DOS TRABALHADORES NO PODER
JUDICIÁRIO FEDERAL EM SANTA CATARINA
ADV.(A/S) : PEDRO MAURICIO PITA DA SILVA MACHADO (29543/DF, 24372/

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Extrato de Ata - 24/02/2021

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RS, 12391/SC)
AM. CURIAE. : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES EM
SEGURIDADE SOCIAL ¿ CNTSS/CUT
ADV.(A/S) : RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO (32147/DF, 140251/MG,
1190/SE, 439314/SP)
ADV.(A/S) : RODRIGO CAMARGO BARBOSA (34718/DF)
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DA JUSTIÇA FEDERAL
E DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO ¿ FENAJUFE
ADV.(A/S) : RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO (32147/DF, 140251/MG,
1190/SE, 439314/SP)
ADV.(A/S) : RODRIGO CAMARGO BARBOSA (34718/DF)
AM. CURIAE. : ASSOCIACAO DOS ADVOGADOS DE SAO PAULO
ADV.(A/S) : ANTONIO CARLOS DE ALMEIDA AMENDOLA (225356/RJ, 154182/
SP)
ADV.(A/S) : MARIO LUIZ OLIVEIRA DA COSTA (01934/A/DF, 117622/SP)
ADV.(A/S) : ANDRE ALMEIDA GARCIA (184018/SP)
ADV.(A/S) : DANIEL NUNES VIEIRA PINHEIRO DE CASTRO (223677/SP)

Decisão: Após o voto da Ministra Rosa Weber, Relatora, que


conhecia da ação direta e julgava procedente o pedido, para
declarar a inconstitucionalidade material do art. 2º, caput e §
1º, da Lei nº 13.463/2017, pediu vista dos autos o Ministro
Roberto Barroso. Falaram: pelos interessados, o Dr. Adriano
Martins De Paiva, Advogado da União; pelo amicus curiae Federação
de Sindicatos de Trabalhadores Técnicos-Administrativos em
Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil, o Dr. Claudio
Santos; pelo amicus curiae Federação Nacional dos Servidores da
Justiça Federal e do Ministério Público da União – FENAJUFE, o Dr.
Paulo Francisco Soares Freire; pelo amicus curiae Associação
Nacional dos Procuradores e Advogados Públicos Federais – ANPPREV,
o Dr. Hugo Mendes Plutarco; pelo amicus curiae Associação dos
Advogados de São Paulo, o Dr. Antonio Carlos De Almeida Amendola;
pelo amicus curiae Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil – CFOAB, a Dra. Manuela Elias Batista; pelo amicus cuiae
SINTRAJUSC - Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário
Federal em Santa Catarina, o Dr. Pedro Mauricio Pita Machado; e,
pelo amicus curiae Confederação dos Trabalhadores no Serviço
Público Federal – CONDSEF, o Dr. Bruno Conti Gomes da Silva.
Plenário, Sessão Virtual de 12.2.2021 a 23.2.2021.

Composição: Ministros Luiz Fux (Presidente), Marco Aurélio,


Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Dias Toffoli,
Rosa Weber, Roberto Barroso, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e
Nunes Marques.

Carmen Lilian Oliveira de Souza


Assessora-Chefe do Plenário

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29/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

RELATORA : MIN. ROSA WEBER


REQTE.(S) : PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA
ADV.(A/S) : CLAUDIO OLIVEIRA SANTOS COLNAGO
INTDO.(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
INTDO.(A/S) : CONGRESSO NACIONAL
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES E
ADVOGADOS PÚBLICOS FEDERAIS - ANPPREV
ADV.(A/S) : HUGO MENDES PLUTARCO
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO DE SINDICATOS DE TRABALHADORES
TÉCNICOS-ADMINISTRATIVOS EM INSTITUIÇÕES
PÚBLICAS DE ENSINO SUPERIOR NO BRASIL E
OUTRO(A/S)
ADV.(A/S) : CLAUDIO SANTOS DA SILVA
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DOS POLICIAIS FEDERAIS
- FENAPEF
ADV.(A/S) : RUDI MEIRA CASSEL
ADV.(A/S) : ANTONIO RODRIGO MACHADO DE SOUSA
AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DA
PREVIDÊNCIA E DA SEGURIDADE SOCIAL -
ANASPS
ADV.(A/S) : ANTONIO TORREAO BRAZ FILHO
AM. CURIAE. : CONFEDERACAO DOS TRABALHADORES NO
SERVICO PUBLICO FEDERAL - CONDSEF
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES NO SERVIÇO
PÚBLICO FEDERAL - FENADSEF
AM. CURIAE. : SINDICATO NACIONAL DOS SERVIDORES
FEDERAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA, PROFISSIONAL
E TECNOLÓGICA - SINASEFE NACIONAL
ADV.(A/S) : JOSE LUIS WAGNER
AM. CURIAE. : SINDICATO DOS TRABALHADORES FEDERAIS DA
SAÚDE, TRABALHO E PREVIDÊNCIA NO ESTADO
DO RIO GRANDE DO SUL (SINDISPREV /RS)

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Relatório

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ADI 5755 / DF

ADV.(A/S) : GLENIO LUIS OHLWEILER FERREIRA


ADV.(A/S) : THIAGO CECCHINI BRUNETTO
AM. CURIAE. : CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS
ADVOGADOS DO BRASIL - CFOAB
ADV.(A/S) : MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO
ADV.(A/S) : LUIZ GUSTAVO ANTONIO SILVA BICHARA
ADV.(A/S) : EDUARDO DE SOUZA GOUVEA
ADV.(A/S) : OSWALDO PINHEIRO RIBEIRO JUNIOR
ADV.(A/S) : LIZANDRA NASCIMENTO VICENTE
ADV.(A/S) : GUILHERME DEL NEGRO BARROSO FREITAS
ADV.(A/S) : CLAUDIA PAIVA CARVALHO
AM. CURIAE. : SINTRAJUSC - SINDICATO DOS TRABALHADORES
NO PODER JUDICIÁRIO FEDERAL EM SANTA
CATARINA
ADV.(A/S) : PEDRO MAURICIO PITA DA SILVA MACHADO
AM. CURIAE. : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS
TRABALHADORES EM SEGURIDADE SOCIAL
¿ CNTSS/CUT
ADV.(A/S) : RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO
ADV.(A/S) : RODRIGO CAMARGO BARBOSA
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DA
JUSTIÇA FEDERAL E DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA
UNIÃO ¿ FENAJUFE
ADV.(A/S) : RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO
ADV.(A/S) : RODRIGO CAMARGO BARBOSA
AM. CURIAE. : ASSOCIACAO DOS ADVOGADOS DE SAO PAULO
ADV.(A/S) : ANTONIO CARLOS DE ALMEIDA AMENDOLA
ADV.(A/S) : MARIO LUIZ OLIVEIRA DA COSTA
ADV.(A/S) : ANDRE ALMEIDA GARCIA
ADV.(A/S) : DANIEL NUNES VIEIRA PINHEIRO DE CASTRO

RELATÓRIO

A Senhora Ministra Rosa Weber: 1. Trata-se de ação direta de


inconstitucionalidade proposta pelo Partido Democrático Trabalhista

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Relatório

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ADI 5755 / DF

(PDT) em face do art. 2º, caput e § 1º, da Lei nº 13.463/2017, que


determina o cancelamento dos precatórios e requisições de pequeno valor
(RPV) federais expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo
credor e estejam depositados há mais de dois anos em instituição
financeira oficial.
Eis o teor dos dispositivos impugnados:

“Lei nº 13.463/2017.
Art. 2° - Ficam cancelados os precatórios e as RPV federais
expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo
credor e estejam depositados há mais de dois anos em
instituição financeira oficial.
§ 1º O cancelamento de que trata o caput deste artigo será
operacionalizado mensalmente pela instituição financeira
oficial depositária, mediante a transferência dos valores
depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional.”

2. O autor alega a existência de inconstitucionalidade formal e


material dos arts. 2º, 5º, caput, XXXV e XXXVI, e 100, caput e §§ 5º, 6º e
7º, da Constituição da República, ao argumento de que visa a “postergar
e, eventualmente, impedir a eficácia de sentenças judiciais transitadas em
julgado, instrumentalizadas no respectivo precatório federal”.
Argumenta, em síntese, que:

(a) não cabe ao legislador ordinário estabelecer nova


condição – prazo de validade – para o pagamento de
precatórios, matéria exaustivamente tratada na Constituição e,
por isso, sujeita a nítida reserva de emenda constitucional;
(b) não cabe à lei ordinária transferir a instituições
financeiras controladas pelo Poder Executivo a competência
para gerir os precatórios, atribuída pela Constituição
exclusivamente ao Poder Judiciário;
(c) a lei atacada promove verdadeira alteração do direito
subjetivo já assegurado em sentença transitada em julgado,
agredindo os postulados da segurança jurídica, da isonomia, do

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Relatório

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ADI 5755 / DF

devido processo legal, da coisa julgada material e


inafastabilidade da jurisdição sob o prisma da efetividade das
decisões judiciais;
(d) a norma impugnada estimula questionamentos
protelatórios com o único intuito de evitar o levantamento no
período de dois anos, findo o qual o precatório será cancelado.

3. Busca, em pedido cautelar, a suspensão da eficácia do art. 2º,


caput e § 1º, da Lei nº 13.463/2017 até o julgamento final da ação, ao
entendimento de que presentes o fumus boni juris, face à perfeita
adequação do caso, na esteira dos precedentes desta Corte, às
inconstitucionalidades apontadas. Indica, também, o periculum in mora,
por serem seus efeitos imediatos, ao registro de que as instituições
financeiras depositárias já estão indevidamente cancelando precatórios
que aguardam levantamento.
4. No mérito, requer a “declaração da inconstitucionalidade seja formal,
seja material, da íntegra da Lei 13.463, de 6 de julho de 2017 (sendo o artigo 2º,
caput e § 1º por inconstitucionalidade e os demais por arrastamento), por clara
violação aos artigos 2º, 5º, caput e incisos XXXV e XXXVI e 100, caput e §§ 5º a
7º da Constituição da República, nos termos da fundamentação”.
Subsidiariamente, solicita seja conferida interpretação conforme a
Constituição para que o cancelamento se limite aos credores
comprovadamente inertes.
5. Sopesados os requisitos legais à concessão da tutela de urgência,
submeti a tramitação da presente ação direta ao rito do art. 10 da Lei nº
9.868/1999.
6. A Presidência da República defende a constitucionalidade formal
e material da lei impugnada, destacando que o legislador buscou
prestigiar o princípio da eficiência na utilização de recursos públicos e
que o legislador ordinário detém poder de conformação para
regulamentar a sistemática dos precatórios, desde que não contrariado o
delineamento constitucional. Sustenta que os dispositivos questionados
versam sobre matéria atribuída à competência concorrente da União,
Estados e Distrito Federal, bem como que a Constituição não reserva ao

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ADI 5755 / DF

Poder Judiciário a atribuição de dispor sobre os precatórios.


Quanto à constitucionalidade material, ressalta que “a situação de
demora no saque do valor depositado pela Fazenda Pública em instituição
financeira”, delimitada pela Lei n° 13.463/2017, está fora do quadro das
normas constitucionais. Nessa linha, defende que o Congresso Nacional
agiu “dentro dos limites dados pelo âmbito de proteção da garantia
constitucional do regime de precatórios”.
Nega violação dos princípios da isonomia, da inafastabilidade da
jurisdição, da segurança jurídica e da proteção à coisa julgada, ao
argumento de que “bastará o requerimento do credor para que o precatório seja
novamente expedido, garantindo-se a ordem cronológica anterior e a
remuneração de todo período”, conforme o art. 3º, parágrafo único, da Lei nº
13.463/2017.
7. A Câmara dos Deputados afirma que a Lei nº 13.463/2017 foi
aprovada em conformidade com os trâmites constitucionais e regimentais
inerentes à espécie.
8. O Senado Federal pronuncia-se pela constitucionalidade formal
da lei questionada, por adequadamente editada no exercício da
competência prevista pelos arts. 24, II, e 48, da Constituição Federal.
Assevera, também, a constitucionalidade material do dispositivo,
enquanto “preserva o direito do credor ao prever que, se eventual
precatório/RPV relativo a ele for cancelado, basta a ele peticionar para que
obtenha novo precatório/RPV que herdará a ordem e a remuneração relativas ao
original que foi cancelado”.
9. A Advocacia-Geral da União ressalta que a lei questionada não
gera “redução da quantia devida pela Fazenda ou prejuízo à efetivação do
crédito, razão pela qual não subsistem as alegações de afronta à segurança
jurídica, à inafastabilidade da jurisdição e à proteção da coisa julgada, na medida
em que o direito reconhecido por sentença judicial segue integralmente
preservado”.
10. A Procuradoria-Geral da República apresenta parecer pela
procedência parcial do pedido, registrando em sua ementa:

“1. A gestão dos recursos destinados ao cumprimento das

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condenações da Fazenda Pública é realizada pelo Presidente do


Tribunal, de maneira que cabe ao Judiciário a regulamentação
da matéria, a fim de dar cumprimento aos ditames
constitucionais (CF, art. 100-§§6.º e 7.º).
2. A definição de prazo para o levantamento de precatório,
sob pena de seu cancelamento, configura restrição ao exercício
do direito de precatório que não encontra previsão na ordem
constitucional, de maneira que afronta a sistemática do art. 100
da Constituição.
3. O cancelamento das requisições por determinação de lei
federal de iniciativa do Presidente da República,
independentemente de determinação do juiz da execução e do
Presidente do Tribunal competente não se coaduna com a
sistemática constitucional da matéria (CF, art. 100-§§6.º e 7.º) e
com o princípio da separação dos Poderes (CF, art. 2.º).
4. O art. 2.º da Lei 13.463/2017 ofende a coisa julgada
material (CF, art. 5.º, XXXVI) e embaraça a efetividade da
jurisdição (CF, art. 5.º, XXXV), porque torna indisponível o
valor devido pela Fazenda Pública reconhecido por decisão
judicial transitada em julgado, impedindo o acesso do cidadão a
direito consignado por coisa julgada.”

11. Deferida a admissão no feito, na qualidade de amici curiae: (i) da


Associação Nacional dos Procuradores e Advogados Públicos Federais
(ANPREV); (ii) da Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnicos-
Administrativos em Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil
(FASUBRA-SINDICAL); (iii) da Federação Nacional dos Sindicatos de
Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social
(FENASPS); (iv) da Federação Nacional dos Policiais Federais -
FENAPEF; (v) da Associação Nacional dos Servidores da Previdência e da
Seguridade Social (ANASPS); (vi) da Confederação dos Trabalhadores no
Serviço Público Federal (CONDSEF); (vii) da Federação dos
Trabalhadores no Serviço Público Federal (FENADSEF); (viii) do
Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica,

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ADI 5755 / DF

Profissional e Tecnológica (SINASEFE NACIONAL); (ix) a Associação dos


Advogados de São Paulo (AASP); (x) da Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS/CUT); (xi) da Federação
Nacional dos Servidores da Justiça Federal e do Ministério Público da
União (FENAJUFE); (xii) do Sindicato dos Trabalhadores no Poder
Judiciário Federal em Santa Catarina (SINTRAJUSC); (xiii) do Conselho
Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB) e (xiv) do Sindicato
dos Trabalhadores Federais da Saúde, Trabalho e Previdência no Estado
do Rio Grande do Sul (SINDISPREV/RS).
Incluído o processo no Plenário Virtual houve pedido de vista do
Ministro Luís Roberto Barroso, que abriu divergência parcial, e
subsequente pedido de destaque do Ministro Gilmar Mendes.
É o relatório.

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29/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

VOTO

A Senhora Ministra Rosa Weber (Relatora): Senhor Presidente,


renovo meus cumprimentos a todos, agradecendo aos senhores
advogados públicos e privados que ocuparam a tribuna pelas belas
sustentações orais, que tanta contribuição trazem ao devido
equacionamento de matéria tão sensível e a comportar olhares diversos.
1. Como visto, trata-se de ação direta de inconstitucionalidade
proposta pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) em face do art. 2º,
caput e § 1º, da Lei nº 13.463/2017. Tais dispositivos determinam o
cancelamento dos precatórios e requisições de pequeno valor (RPV)
federais expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo
credor a despeito do depósito há mais de dois anos em instituição
financeira oficial.

2. Imprimi de início à tramitação desta ação de controle concentrado


de constitucionalidade o rito do art. 10 da Lei nº 9.868/1999, mas vim a
entender cabível o imediato julgamento do mérito e, nessa linha, houve
sua inclusão no plenário virtual.
Isso diante da perfectibilização do contraditório efetivo, uma vez (i)
devidamente formalizada a postulação, (ii) coletadas de forma
abrangente as informações jurídicas e (iii) apresentados pelos envolvidos
os argumentos necessários para a solução do problema constitucional
posto, com respeito aos direitos fundamentais processuais.
Por isso, e em prestígio à celeridade, proponho a conversão do rito
do art. 10 no rito do art. 12 da Lei nº 9.868/1999, consoante a prática
jurisdicional desta Suprema Corte, nos termos dos seus precedentes.

3. A ação revela-se admissível, uma vez atendidos os pressupostos


formais, sendo o requerente, enquanto partido político com

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Voto - MIN. ROSA WEBER

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ADI 5755 / DF

representação no Congresso Nacional, legitimado universal para sua


propositura, nos termos do inciso VIII do art. 2º da Lei nº 9.868/1999.
Dela conheço e passo ao exame do mérito.

4. Transcrevo os dispositivos impugnados:

“Lei nº 13.463/2017.
Art. 2° - Ficam cancelados os precatórios e as RPV federais
expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo
credor e estejam depositados há mais de dois anos em
instituição financeira oficial.
§ 1º O cancelamento de que trata o caput deste artigo será
operacionalizado mensalmente pela instituição financeira
oficial depositária, mediante a transferência dos valores
depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional.”

5. Eis os parâmetros de controle indicados:

Constituição Federal - Art. 2º São Poderes da União,


independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo
e o Judiciário.
(...)
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos
termos seguintes:
(...)
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito;
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato
jurídico perfeito e a coisa julgada;
(...)
Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas
Federal Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de
sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem

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ADI 5755 / DF

cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos


créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de
pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais
abertos para este fim.
(...)
§ 5º É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades
de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus
débitos, oriundos de sentenças transitadas em julgado,
constantes de precatórios judiciários apresentados até 1º de
julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte,
quando terão seus valores atualizados monetariamente.
§ 6º As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão
consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao
Presidente do Tribunal que proferir a decisão exequenda
determinar o pagamento integral e autorizar, a requerimento do
credor e exclusivamente para os casos de preterimento de seu
direito de precedência ou de não alocação orçamentária do
valor necessário à satisfação do seu débito, o sequestro da
quantia respectiva.
§ 7º O Presidente do Tribunal competente que, por ato
comissivo ou omissivo, retardar ou tentar frustrar a liquidação
regular de precatórios incorrerá em crime de responsabilidade e
responderá, também, perante o Conselho Nacional de Justiça”.

6. Quanto à inconstitucionalidade formal, a tese do autor é a de


usurpação da competência de gestão dos precatórios confiada pela
Constituição Federal ao Judiciário. Nessa linha de raciocínio, apontada a
existência de violação do art. 100, caput e parágrafos, da Carta Magna, em
sua previsão exaustiva dos critérios condicionantes da expedição e do
pagamento de precatórios.
Digo eu que, de fato, nos termos do delineamento constitucional do
regime de precatórios estabelecido no art. 100, incumbe ao Poder
Judiciário efetuar a gestão dos recursos que lhe são diretamente
consignados, bem como a determinação do pagamento e o controle dos
seus consectários. Destaco e reproduzo os seguintes parágrafos do

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aludido dispositivo constitucional:

“Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas


Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de
sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem
cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos
créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de
pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais
abertos para este fim.
(...)
§ 5º É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades
de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus
débitos, oriundos de sentenças transitadas em julgado,
constantes de precatórios judiciários apresentados até 1º de
julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte,
quando terão seus valores atualizados monetariamente.
§ 6º As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão
consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao
Presidente do Tribunal que proferir a decisão exequenda
determinar o pagamento integral e autorizar, a requerimento do
credor e exclusivamente para os casos de preterimento de seu
direito de precedência ou de não alocação orçamentária do
valor necessário à satisfação do seu débito, o sequestro da
quantia respectiva.
§ 7º O Presidente do Tribunal competente que, por ato
comissivo ou omissivo, retardar ou tentar frustrar a liquidação
regular de precatórios incorrerá em crime de responsabilidade e
responderá, também, perante o Conselho Nacional de Justiça.”

Assim, consagrado regime específico de pagamento dos créditos


contra a Fazenda Pública, diretamente consignados ao Poder Judiciário, a
fim de garantir o adimplemento das condenações judiciais, em harmonia
com a impenhorabilidade de bens públicos e com observância da ordem
cronológica. Nesse sentido preleciona José Afonso da Silva: “(...) não se
admite a execução forçada por quantia certa contra a Fazenda Pública, porque
seus bens são imunes a penhora, por serem públicos, indisponíveis e inalienáveis.

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Daí por que a execução se faz mediante a expedição de precatórios em que


consta a importância que deve ser paga, a fim de que o orçamento consigne
dotação correspondente”1.
No sistema estabelecido, cabe ao Presidente do Tribunal a tarefa
constitucional de efetuar a gestão direcionada a conferir a força
normativa dos regime de precatórios, inclusive com possibilidade de
incorrer em crime de responsabilidade e de responder perante o Conselho
Nacional de Justiça (CNJ).
Trata-se, portanto, do exercício de atividades de natureza
administrativa voltadas a assegurar o pagamento devido em
cumprimento de decisões judiciais. Nesse sentido a Súmula 311 do
Superior Tribunal de Justiça, in verbis: “Os atos do Presidente do Tribunal
que disponham sobre processamento e pagamento de precatório não têm caráter
jurisdicional”.
Na mesma linha, a jurisprudência desta Casa, consentânea com o
enunciado da Súmula 733: “Não cabe recurso extraordinário contra decisão
proferida no processamento de precatórios”. Colho precedentes:

“(...) O Tribunal a quo reconheceu a preclusão do pedido


de atualização do crédito relativamente ao valor do salário
mínimo vigente à época da expedição da RPV - Requisição de
Pequeno Valor, uma vez que postulou a atualização após o
pagamento do requisitório. O exame da alegada ofensa
constitucional exigiria prévia análise da legislação
infraconstitucional aplicada à espécie e da moldura fática
delineada no acórdão de origem. Na hipótese verifica-se, de
plano, que a impugnação mediante recurso extraordinário atrai
o óbice da Súmula 733/STF: "Não cabe recurso extraordinário
contra decisão proferida no processamento de precatórios."
Precedentes. As razões do agravo regimental não se mostram
aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão
agravada, mormente no que se refere à conformidade entre o
conteúdo do acórdão recorrido e a jurisprudência desta Corte, a

1 SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo:


Malheiros, 2009, p. 522.

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inviabilizar o trânsito do recurso extraordinário” (ARE 832.348


AgR, sob minha relatoria, 1ª T, j. 28.10.2014, DJe 11.11.2014).

“Por fim, o Plenário desta Corte, no julgamento da


Reclamação 2.425/ES, Rel. Min. Dias Toffoli, assentou a
"natureza administrativa das decisões da presidência dos
Tribunais no cumprimento dos precatórios judiciais, caráter que
se estende também às decisões colegiadas dos recursos internos
contra elas interpostos". (...) O tema também é objeto da
jurisprudência sumulada do Supremo Tribunal Federal, como
se infere do Verbete 733: "Não cabe recurso extraordinário
contra decisão proferida no processamento de precatórios"
(ARE 759.979 AgR, Relator: Min. Ricardo Lewandoswki, 2ª T, j.
9.9.2014, DJe 26.9.2014).

“Ademais, correta a decisão recorrida, ao aplicar a Súmula


733. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que não
cabe recurso extraordinário para impugnar decisão de natureza
administrativa proferida no processamento de precatórios.
Nesse sentido, trago os seguintes julgados, de ambas as turmas:
Recursos extraordinários. Reclamação correicional. 2. Ato
praticado pelo Juiz Presidente do Tribunal Regional do
Trabalho da Sétima Região. Sequestro de valor existente em
conta corrente do Estado para saldar débitos trabalhistas do
Departamento de Estradas de Rodagens e Transportes - DERT.
3. Medida liminar deferida pelo Ministro Corregedor-Geral da
Justiça do Trabalho. Suspensão do ato impugnado e liberação
do dinheiro do Estado do Ceará. 4. Agravo regimental de
ambas as partes improvido pelo Órgão Especial do TST. 5.
Recursos extraordinários interpostos sob alegação de ofensa aos
arts. 100 e 5º, LIV e LV, da Constituição Federal. 6. Recursos
interpostos de decisão referente a processo de Precatório, tendo,
originariamente, como base ato do Presidente do TRT de ordem
de sequestro de valores para atender ao montante do
Precatório. Natureza administrativa. 7. 'Não cabe recurso
extraordinário contra decisão proferida no processamento de

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precatórios já que esta tem natureza administrativa e não


jurisdicional'. Precedente da Corte. 8. Recursos extraordinários
não conhecidos. (RE 229.786, Relator: Min. Néri da Silveira,
Segunda Turma, DJ 18.5.2001)” (AI 734.499 AgR, Relator: Min.
Gilmar Mendes, 2ª T, j. 14.8.2012, DJe 27.8.2012).

“PRECATÓRIO - OBJETO. Os preceitos constitucionais


direcionam à liquidação dos débitos da Fazenda. O sistema de
execução revelado pelos precatórios longe fica de implicar a
perpetuação da relação jurídica devedor-credor. PRECATÓRIO
- TRAMITAÇÃO - REGÊNCIA. Observadas as balizas
constitucionais e legais, cabe ao Tribunal, mediante dispositivos
do Regimento, disciplinar a tramitação dos precatórios, a fim de
que possam ser cumpridos. PRECATÓRIO - TRAMITAÇÃO -
CUMPRIMENTO - ATO DO PRESIDENTE DO TRIBUNAL -
NATUREZA. A ordem judicial de pagamento (§ 2º do artigo
100 da Constituição Federal), bem como os demais atos
necessários a tal finalidade, concernem ao campo
administrativo e não jurisdicional. A respaldá-la tem-se
sempre uma sentença exeqüenda. PRECATÓRIO - VALOR
REAL - DISTINÇÃO DE TRATAMENTO. A Carta da República
homenageia a igualação dos credores. Com ela colide norma no
sentido da satisfação total do débito apenas quando situado em
certa faixa quantitativa. PRECATÓRIO - ATUALIZAÇÃO DE
VALORES - ERROS MATERIAIS - INEXATIDÕES -
CORREÇÃO - COMPETÊNCIA. Constatado erro material ou
inexatidão nos cálculos, compete ao Presidente do Tribunal
determinar as correções, fazendo-o a partir dos parâmetros do
título executivo judicial, ou seja, da sentença exeqüenda.
PRECATÓRIO - ATUALIZAÇÃO - SUBSTITUIÇÃO DE
ÍNDICE. Ocorrendo a extinção do índice inicialmente previsto,
o Tribunal deve observar aquele que, sob o ângulo legal, vier a
substituí-lo. PRECATÓRIO - SATISFAÇÃO - CONSIGNAÇÃO -
DEPÓSITO. Não se há de confundir a consignação de créditos,
a ser feita ao Poder Judiciário, com o depósito do valor do
precatório, de responsabilidade da pessoa jurídica devedora à

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qual são recolhidas, materialmente, ‘as importâncias


respectivas’ (§ 2º do artigo 100 da Constituição Federal). (ADI
1098, Relator: Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJ
25.10.1996, destaquei).

Como integrantes da organização judiciária do país, estão os


aludidos Tribunais sujeitos a regramentos administrativos específicos no
que atine aos precatórios, elaborados sempre à luz da Constituição. São
editados, nessa trilha, os regimentos internos com pormenores
procedimentais indispensáveis ao fluxo administrativo do regime de
precatórios. Saliento, também, a possibilidade de exercício da
competência normativa do Conselho Nacional de Justiça quanto ao tema
dos precatórios, a fim de conferir uniformidade e efetividade aos
procedimentos. Em suma: há toda uma disciplina formulada com o
escopo de operacionalizar o procedimento de pagamento de precatórios.
Nada obstante, a lei impugnada consubstancia ato normativo
oriundo do Congresso Nacional, por iniciativa do Presidente da
República, no exercício de competência legislativa concorrente sobre
direito financeiro, uma vez que precatório e RPV se destinam à
realização de despesas públicas decorrentes de sentenças judiciais
transitadas em julgado.
Como explica Marcus Abraham:

“(...) Estamos falando do pagamento que a Fazenda


Pública é condenada a realizar após o trânsito em julgado de
uma medida judicial promovida pelo particular em face do
Estado. Tais condenações ocorrem constantemente e geram para
o Estado uma despesa pública. Se fossem pagas imediatamente
após o encerramento do processo judicial haveria um
desequilíbrio orçamentário, já que o seu valor e o momento do
seu pagamento são, como já dito, incertos e imprevisíveis. Para
resolver esse problema, criou-se o mecanismo do pagamento
através do denominado precatório.
A origem advém da ‘precatória de vênia1, instituto criado
no final do século XIX pela legislação processual civil brasileira,

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ADI 5755 / DF

para requisitar ao Tesouro recursos para o pagamento nas


condenações da Fazenda Pública, diante da impenhorabilidade
dos bens públicos.
De maneira simplificada, podemos dizer que Precatório é
a requisição formal de pagamento que a Fazenda Pública é
condenada judicialmente a realizar. Assim, diversamente do
particular que, quando condenado, é obrigado a realizar o
pagamento imediatamente em dinheiro ao vencedor da
demanda judicial, a Fazenda Pública condenada em uma ação
realiza o respectivo pagamento apenas no exercício financeiro
seguinte, após a inclusão de tal despesa no orçamento, desde
que apresentada até 1º de julho do ano anterior.”2

Sobre o direito constitucional financeiro, ensina Regis Fernandes de


Oliveira: “Basicamente, o direito constitucional financeiro cuida das receitas e
despesas dos entes federativos e entidades estatais, dos meios de arrecadação, da
disciplina orçamentária, da fiscalização financeira e orçamentária, do controle do
gasto público, da dívida e do endividamento (operações de crédito) dos entes
federativos e de entidades por eles criadas e do pagamento dos débitos do Poder
Público. Sobre tal massa de informações recai a responsabilidade fiscal,
pressuposto de tudo isso”3.
Fernando Facury Scaff, por sua vez, identifica normas de direito
financeiro distribuídas pelo texto constitucional:

“O Direito Financeiro encontra-se espraiado em várias


partes da Constituição de 1988. Pode-se encontrar disposições
relativas a este ramo jurídico, por exemplo, no Titulo IV (Da
Organização dos Poderes), Capítulo I (Do Poder Legislativo),
Seção IX (Da Fiscalizaçao Contábil, Financeira e Orçamentária)
ao tratar dos Tribunais de Contas. Pode-se também encontrá-lo
ainda nesse Título, no Capítulo III (Do Poder Judiciário) ao

2 ABRAHAM, Marcus. Curso de Direito Financeiro Brasileiro. Rio de Janeiro:


Forense, 2017, p. 227.
3 OLIVEIRA, Regis Fernandes. Curso de Direito Financeiro. São Paulo: Malheiros,
2019, p. 214.

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tratar de precatórios.”4

Desse modo, não há vedação de exercício legislativo quanto ao tema,


que é regido pelo direito financeiro. No art. 100 da Constituição existem,
inclusive, referências específicas a leis formais para regular aspectos
peculiares, como estabelecido nos parágrafos 3º5, 4º6, 117, 158 e 169.
Rejeito, pois, a inconstitucionalidade formal do art. 2º, caput e § 1º,
da Lei nº 13.463/2017.

7. Outra, contudo, minha compreensão no tocante à


inconstitucionalidade material, que reputo presente nos dispositivos
impugnados ao determinarem o cancelamento dos precatórios e das
requisições de pequeno valor federais expedidos e com valores não
levantados pelo credor em depósito há mais de dois anos em instituição

4 SCAFF, Fernando Facury. O que são normas gerais de direito financeiro. In:
MARTINS, Ives Gandra da Silva; MENDES, Gilmar Ferreira; NASCIMENTO, Carlos Valder
do. Tratado de Direito Financeiro. São Paulo: Saraiva, 2013 p. 37.
5 Com o teor a saber: “§ 3º O disposto no caput deste artigo relativamente à expedição
de precatórios não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em leis como de
pequeno valor que as Fazendas referidas devam fazer em virtude de sentença judicial
transitada em julgado”.
6 Assim redigido: “§ 4º Para os fins do disposto no § 3º, poderão ser fixados, por leis
próprias, valores distintos às entidades de direito público, segundo as diferentes
capacidades econômicas, sendo o mínimo igual ao valor do maior benefício do regime geral
de previdência social”.
7 Confira-se: “§ 11. É facultada ao credor, conforme estabelecido em lei da entidade
federativa devedora, a entrega de créditos em precatórios para compra de imóveis públicos
do respectivo ente federado”.
8 In verbis: “§ 15. Sem prejuízo do disposto neste artigo, lei complementar a esta
Constituição Federal poderá estabelecer regime especial para pagamento de crédito de
precatórios de Estados, Distrito Federal e Municípios, dispondo sobre vinculações à receita
corrente líquida e forma e prazo de liquidação”.
9 Com a seguinte redação: “§ 16. A seu critério exclusivo e na forma de lei, a União
poderá assumir débitos, oriundos de precatórios, de Estados, Distrito Federal e Municípios,
refinanciando-os diretamente”.

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financeira oficial. No ponto, com a vênia dos que entendem de forma


diversa, reputo que o legislador desbordou do seu espaço de atuação.
A Lei nº 13.463/2017 criou verdadeira inovação ao disciplinar o
pagamento de montantes por precatórios e requisições de pequeno valor
por meio da determinação de um limite temporal para o exercício do
direito de levantamento do importe do crédito depositado, comandando,
ainda, à instituição financeira depositária a transferência automática dos
valores depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional sem prévia
ciência do interessado ou formalização de contraditório (art. 5º, LV, CF).
De valia, no ponto, o art. 9º do Código de Processo Civil de 2015: “Não se
proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida”.
Não cabia ao legislador estabelecer uma forma de cancelamento
automático realizado diretamente pela instituição financeira sem a
anterior oitiva da parte interessada em prestígio ao contraditório
participativo. Imprescindível o respeito ao “binômio informação-reação,
com a ressalva de que, embora a primeira seja absolutamente necessária,
sob pena de ilegitimidade do processo e nulidade dos seus atos, a
segunda é somente possível”10. Afrontado foi o devido processo legal (CF,
art. 5º, LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido
processo legal), no que atine ao respeito ao contraditório e à ampla defesa.
Expressiva, a respeito, a manifestação da Procuradoria-Geral da
República: “Ressalta-se, ainda, ofensa aos princípios do contraditório e da
ampla defesa (CF, art. 5.º LV), uma vez que o cancelamento do precatório ocorre
independentemente de intimação e manifestação da parte interessada. Previsão
desse teor não se coaduna, inclusive, com a racionalidade do novo Código de
Processo Civil, que, no art. 9.º, consignou o princípio do contraditório
participativo, assegurando que a parte seja cientificada de todos os atos do
processo e que as manifestações das partes sejam devidamente apreciadas pelo
magistrado”.
Já quanto aos princípios da isonomia, da inafastabilidade da
jurisdição, da segurança jurídica e da proteção à coisa julgada, a
Presidência da República, nas informações prestadas, argumenta que não
10 DINAMARCO, Cândido Rangel; LOPES, Bruno Vasconcelos Carrilho. Teoria Geral
do Novo Processo Civil. São Paulo: Malheiros, 2017, p. 63.

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houve a respectiva violação, pois “bastará o requerimento do credor para que


o precatório seja novamente expedido, garantindo-se a ordem cronológica
anterior e a remuneração de todo período”.
Com efeito, os § 2º a 4º do art. 2º e o art. 3º da Lei nº 13.463/2017, não
impugnados na presente ação direta, preveem a comunicação do
cancelamento ao Juízo da execução, bem como a possibilidade de
expedição de novo ofício requisitório a requerimento do credor.
Confiram-se:

Ҥ 2o Do montante cancelado:
I - pelo menos 20% (vinte por cento) deverá ser aplicado
pela União na manutenção e desenvolvimento do ensino;
II - pelo menos 5% (cinco por cento) será aplicado no
Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de
Morte(PPCAAM).
§ 3o Será dada ciência do cancelamento de que trata o
caput deste artigo ao Presidente do Tribunal respectivo.
§ 4o O Presidente do Tribunal, após a ciência de que trata
o§ 3o deste artigo, comunicará o fato ao juízo da execução, que
notificará o credor.
Art. 3o Cancelado o precatório ou a RPV, poderá ser
expedido novo ofício requisitório, a requerimento do credor.
Parágrafo único. O novo precatório ou a nova RPV
conservará a ordem cronológica do requisitório anterior e a
remuneração correspondente a todo o período.”

Entendo, porém, que a lei, ao deslocar a prévia ciência e o exercício


do contraditório para momento posterior ao cancelamento automático,
consagra procedimento que viola a Constituição. A mera possibilidade de
novo requerimento do credor não desfigura a inconstitucionalidade
material em razão da não observância do contraditório e da ampla
defesa.
Sobre o tema, colho da doutrina:

“Note-se bem: a norma cancela, ipso facto, o ofício

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requisitório por decurso de prazo. Tal cancelamento não


dependerá de qualquer ato administrativo posterior que declare
a invalidez do precatório ou da RPV, mas decorre
imediatamente da norma que, assim, passou a definir o prazo
de eficácia dos precatórios: 2 (dois) anos. Depois disso e devido
à inércia do credor, o precatório (ou a RPV) perderá validade e
eficácia e a instituição financeira depositária terá o dever de
transferir imediatamente os valores para a Conta Única do
Tesouro Nacional (art. 3º, § 1º). O documento expedido pelo
juízo competente de nada valerá, portanto. Isso ao contrário do
crédito por ele representado, que perderá a eficácia, mas
permanecerá válido.
Isto é, o crédito perante a respectiva entidade federal
permanecerá bom e valioso, mas a sua efetividade – ou seja, o
seu saque – dependerá da expedição de novo precatório, que
ingressará no mesmo lugar da fila ocupado pelo precatório
cancelado, com a remuneração correspondente a todo o período
(previsões expressas do art. 3º e respectivo parágrafo único).
Eis o maior defeito da lei: se o pagamento da dívida
judicial far-se-á ‘exclusivamente na ordem cronológica de
apresentação dos precatórios’ (art. 100 da CFRB), o novo precatório
(art. 3º da Lei 13.463/2017) será, efetivamente, novo? (...)11”

A simples previsão da faculdade posterior de requerimento de novo


ofício requisitório a ser expedido com a conservação da ordem
cronológica anterior não sana os vícios ínsitos ao cancelamento em si, que
de inopino torna indisponível o valor devido e cria percalço consistente
no novo percurso a ser trilhado pelo credor em busca da satisfação do seu
crédito, em verdadeira via cruxis de todos conhecida a frustar a
efetividade da jurisdição, entendida esta não só como o poder de dizer o
Direito, mas também de realizá-lo com plena eficácia vinculativa, na
solução das lides processuais e materiais, como aprendi ainda na

11 MOREIRA, Egon Bockmann; GRUPENMACHER, Betina Treiger; KANAYAMA,


Rodrigo Luís; AGOTTANI, Diogo Zelak. Precatório: o seu novo regime jurídico. São Paulo:
Thomson Reuters Brasil, 2019, p. 163.

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Faculdade de Direito com o saudoso Professor Galeno Lacerda.


Como aponta a Procuradoria-Geral da República, ao se manifestar
sobre o teor do art. 3º da lei impugnada:

“Além de desrespeitar a separação de Poderes, o art. 2.º da


Lei 13.463/2017 ofende a coisa julgada material (CF, art. 5.º-
XXXVI) e embaraça a efetividade da jurisdição (CF, art. 5.º-
XXXV). Isso porque, torna indisponível o valor devido pela
Fazenda Pública reconhecido por decisão judicial transitada em
julgado, impedindo o acesso do cidadão a direito consignado
por coisa julgada. Caso o credor objetive sacar o valor de
precatório cancelado, deverá ser expedido novo ofício
requisitório, conforme previsto no art. 3.º da Lei 13.463/2017.
Em outras palavras, deverá ser iniciado novo procedimento
administrativo, que dependerá, para sua efetivação, de nova
previsão orçamentária.”

Observo que, uma vez vigente a Lei nº 13.463/2017, e na esteira do


decidido ao julgamento da questão de ordem na ADI 4425 ( “Atribui-se
competência ao Conselho Nacional de Justiça para que monitore e supervisione o
pagamento dos precatórios pelos entes públicos na forma da presente decisão”
(ADI 4425 QO, Relator: Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, DJe 04/08/2015), o
CNJ editou a Resolução nº 303/2019, disciplinando o cancelamento
determinado na lei impugnada, nos seguintes termos:

“Art. 33. Informado aos Presidentes dos Tribunais


Regionais Federais e do Trabalho, pela instituição financeira, o
cancelamento de requisições de pagamento de que trata a Lei
no 13.463, de 6 de julho de 2017, e comunicado o fato ao juízo
da execução, este cientificará o credor.
§ 1o Efetuado o cancelamento, e havendo requerimento do
credor para a emissão de nova requisição de pagamento, além
dos requisitos obrigatórios, deverá ser observado o seguinte:
I – para fins de definição da ordem cronológica, o juízo da
execução informará o número da requisição cancelada;

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II – será considerado o valor efetivamente transferido pela


instituição financeira para a Conta Única do Tesouro Nacional;
III – será considerada a data-base da requisição de
pagamento e a data da transferência a que alude o inciso II
deste parágrafo, conforme indicado pela instituição financeira;
IV – a requisição será atualizada pelo indexador previsto
na Lei de Diretrizes Orçamentárias, desde a data-base até o
efetivo depósito; e
V – não haverá incidência de juros nas requisições,
quando o cancelamento decorrer exclusivamente da inércia da
parte beneficiária.
§ 2o Desde que comunicada à instituição financeira,
consideram-se excluídos do cancelamento de que trata este
artigo os depósitos sobre os quais exista ordem judicial
suspendendo ou sustando a liberação dos respectivos
valores a qualquer título.
§ 3o Aplica-se no que couber o disposto neste artigo aos
demais tribunais.”

Em qualquer hipótese, contudo, a gestão de recursos destinados ao


pagamento de precatórios incumbe ao Judiciário por decorrência do texto
constitucional, sem que tenha sido dada margem ao legislador para
alterar o desenho constitucional de forma restritiva e tampouco para
estabelecer formas de condicionamento do pagamento sem respeito aos
ditames constitucionais, como a ampla defesa e o contraditório (art. 5º,
LV).
No que atine à impossibilidade de edição de medidas legislativas
para condicionar e restringir o levantamento dos valores depositados a
título de precatórios, assim já se pronunciou esta Casa:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.


PRECATÓRIOS. ART. 19 DA LEI NACIONAL Nº 11.033, DE 21
DE DEZEMBRO DE 2004. AFRONTA AOS ARTS. 5º, INC.
XXXVI, E 100 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. 1. O
art. 19 da Lei n. 11.033/04 impõe condições para o

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levantamento dos valores do precatório devido pela Fazenda


Pública. 2. A norma infraconstitucional estatuiu condição para
a satisfação do direito do jurisdicionado -
constitucionalmente garantido - que não se contém na norma
fundamental da República. 3. A matéria relativa a precatórios
não chama a atuação do legislador infraconstitucional, menos
ainda para impor restrições que não se coadunam com o
direito à efetividade da jurisdição e o respeito à coisa julgada.
4. O condicionamento do levantamento do que é devido por
força de decisão judicial ou de autorização para o depósito em
conta bancária de valores decorrentes de precatório judicial,
estabelecido pela norma questionada, agrava o que vem
estatuído como dever da Fazenda Pública em face de obrigação
que se tenha reconhecido judicialmente em razão e nas
condições estabelecidas pelo Poder Judiciário, não se
mesclando, confundindo ou, menos ainda, frustrando pela
existência paralela de débitos de outra fonte e natureza que,
eventualmente, o jurisdicionado tenha com a Fazenda Pública.
5. Entendimento contrário avilta o princípio da separação de
poderes e, a um só tempo, restringe o vigor e a eficácia das
decisões judiciais ou da satisfação a elas devida. 6. Os requisitos
definidos para a satisfação dos precatórios somente podem ser
fixados pela Constituição, a saber: a requisição do pagamento
pelo Presidente do Tribunal que tenha proferido a decisão; a
inclusão, no orçamento das entidades políticas, das verbas
necessárias ao pagamento de precatórios apresentados até 1º de
julho de cada ano; o pagamento atualizado até o final do
exercício seguinte ao da apresentação dos precatórios,
observada a ordem cronológica de sua apresentação. 7. A
determinação de condicionantes e requisitos para o
levantamento ou a autorização para depósito em conta bancária
de valores decorrentes de precatórios judiciais, que não aqueles
constantes de norma constitucional, ofende os princípios da
garantia da jurisdição efetiva (art. 5º, inc. XXXVI) e o art. 100 e
seus incisos, não podendo ser tida como válida a norma que, ao
fixar novos requisitos, embaraça o levantamento dos

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precatórios. 8. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada


procedente” (ADI 3453, Relatora: Min. Cármen Lúcia, Tribunal
Pleno, DJ 16.03.2007, destaquei).

Vislumbro também violação do princípio da separação dos Poderes,


uma vez que a Constituição Federal desenhou o regime de pagamento de
precatório sem deixar margem limitativa do direito de crédito ao
legislador infraconstitucional.
Devem ser prestigiados o equilíbrio e a separação dos Poderes (art.
2º, CF), assim como a garantia da coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CF)
mediante a satisfação do crédito a conferir eficácia às decisões. A lei
impugnada transfere do Judiciário para a instituição financeira a
averiguação unilateral do pagamento e autoriza, indevidamente, o
cancelamento automático do depósito e a remessa dos valores à Conta
Única do Tesouro Nacional. Configurada, pois, uma verdadeira burla aos
freios e contrapesos indispensáveis ao bom funcionamento dos Poderes.
A mora do credor em relação ao levantamento dos valores
depositados na instituição financeira deve ser apurada no bojo do
processo de execução, sem imposição de cancelamento automático das
requisições em ausência de prévia ciência ao interessado. Configurada
violação do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF) e do princípio da
proporcionalidade.
Revela-se desproporcional o estabelecimento do cancelamento
automático após o decurso de dois anos do depósito dos valores a título
de precatório e RPV. A atuação legislativa não foi pautada pela
proporcionalidade em sua faceta de vedação do excesso. Afrontado, por
isso, o art. 5º, LIV, da Constituição Federal: “ninguém será privado da
liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Ausente o respeito ao
devido processo legal, na perspectiva material ou substantiva, concluo
pela inconstitucionalidade do dispositivo legal em exame.
Ao determinar o cancelamento puro e simples, imediatamente após
o biênio subsequente à data do depósito dos valores não levantados, a Lei
nº 13.463/2017 afronta, igualmente, os incisos XXXV e XXXVI do art. 5º
da Constituição da República, violando os princípios da segurança

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jurídica, da inafastabilidade da jurisdição, além da garantia da coisa


julgada e de cumprimento das decisões judiciais. Veja-se o seguinte
precedente:

“MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE


INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 2º DA EMENDA
CONSTITUCIONAL Nº 30, DE 13 DE SETEMBRO DE 2000,
QUE ACRESCENTOU O ART. 78 AO ATO DAS DISPOSIÇÕES
CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS. PARCELAMENTO DA
LIQUIDAÇÃO DE PRECATÓRIOS PELA FAZENDA
PÚBLICA. 1. O precatório de que trata o artigo 100 da
Constituição consiste em prerrogativa processual do Poder
Público. Possibilidade de pagar os seus débitos não à vista, mas
num prazo que se estende até dezoito meses. Prerrogativa
compensada, no entanto, pelo rigor dispensado aos
responsáveis pelo cumprimento das ordens judiciais, cujo
desrespeito constitui, primeiro, pressuposto de intervenção
federal (inciso VI do art. 34 e inciso V do art. 35, da CF) e,
segundo, crime de responsabilidade (inciso VII do art. 85 da
CF). 2. O sistema de precatórios é garantia constitucional do
cumprimento de decisão judicial contra a Fazenda Pública,
que se define em regras de natureza processual conducentes à
efetividade da sentença condenatória trânsita em julgado por
quantia certa contra entidades de direito público. Além de
homenagear o direito de propriedade (inciso XXII do art. 5º da
CF), prestigia o acesso à jurisdição e a coisa julgada (incisos
XXXV e XXXVI do art. 5º da CF). 3. A eficácia das regras
jurídicas produzidas pelo poder constituinte (redundantemente
chamado de ‘originário’) não está sujeita a nenhuma limitação
normativa, seja de ordem material, seja formal, porque provém
do exercício de um poder de fato ou suprapositivo. Já as
normas produzidas pelo poder reformador, essas têm sua
validez e eficácia condicionadas à legitimação que recebam da
ordem constitucional. Daí a necessária obediência das emendas
constitucionais às chamadas cláusulas pétreas. 4. O art. 78 do
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, acrescentado

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pelo art. 2º da Emenda Constitucional nº 30/2000, ao admitir a


liquidação “em prestações anuais, iguais e sucessivas, no prazo
máximo de dez anos” dos “precatórios pendentes na data de
promulgação” da emenda, violou o direito adquirido do
beneficiário do precatório, o ato jurídico perfeito e a coisa
julgada. Atentou ainda contra a independência do Poder
Judiciário, cuja autoridade é insuscetível de ser negada,
máxime no concernente ao exercício do poder de julgar os
litígios que lhe são submetidos e fazer cumpridas as suas
decisões, inclusive contra a Fazenda Pública, na forma
prevista na Constituição e na lei. Pelo que a alteração
constitucional pretendida encontra óbice nos incisos III e IV do
§ 4º do art. 60 da Constituição, pois afronta “a separação dos
Poderes” e “os direitos e garantias individuais”. 5. Quanto aos
precatórios “que decorram de ações iniciais ajuizadas até 31 de
dezembro de 1999”, sua liquidação parcelada não se
compatibiliza com o caput do art. 5º da Constituição Federal.
Não respeita o princípio da igualdade a admissão de que um
certo número de precatórios, oriundos de ações ajuizadas até
31.12.1999, fique sujeito ao regime especial do art. 78 do ADCT,
com o pagamento a ser efetuado em prestações anuais, iguais e
sucessivas, no prazo máximo de dez anos, enquanto os demais
créditos sejam beneficiados com o tratamento mais favorável do
§ 1º do art. 100 da Constituição. 6. Medida cautelar deferida
para suspender a eficácia do art. 2º da Emenda Constitucional
nº 30/2000, que introduziu o art. 78 no ADCT da Constituição
de 1988”(ADI 2356 MC, Relator: Min. Néri da Silveira, Redator
p/ Acórdão: Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, DJe 19.5.2011,
destaquei).

Também ao julgamento das ADIs nº 4357 e 442512, que versaram

12 Cuja ementa transcrevo na fração de interesse: “DIREITO CONSTITUCIONAL.


REGIME DE EXECUÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA MEDIANTE PRECATÓRIO. EMENDA
CONSTITUCIONAL Nº 62/2009. (...) INCONSTITUCIONALIDADE DA SISTEMÁTICA DE
COMPENSAÇÃO DE DÉBITOS INSCRITOS EM PRECATÓRIOS EM PROVEITO
EXCLUSIVO DA FAZENDA PÚBLICA. EMBARAÇO À EFETIVIDADE DA JURISDIÇÃO

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sobre a inconstitucionalidade do regime de compensação de débitos


inscritos em precatório, criado pela Emenda Constitucional nº 62/2009,
esta Casa entendeu que houve violação da efetividade da jurisdição,
desrespeito à coisa julgada material, ofensa à separação dos poderes e
afronta ao devido processo legal. A brilhante fundamentação do voto
condutor do julgamento, da lavra do Min. Ayres Britto, tem inteira
aplicação ao caso em exame:

“23. Como se vê, as normas jurídicas atacadas chancelam


uma compensação obrigatória do crédito a ser inscrito em
precatório com débitos perante a Fazenda Pública.
Compensação que se opera ‘antes da expedição dos precatórios’ e
mediante informação da Fazenda devedora, no prazo de 30
(trinta) dias. Dando-se que o objetivo da norma é, nas palavras
do próprio Advogado-Geral da União, precisamente este:
‘impedir que os administrados (especialmente os que devem valores
vultosos à Fazenda) recebam seus créditos sem que suas dívidas
perante o Estado sejam satisfeitas’. E se é assim, o que se tem –
penso – é um acréscimo de prerrogativa processual do Estado,
como se já fosse pouco a prerrogativa do regime em si do
precatório. Mas uma ‘super’ ou sobre-prerrogativa que, ao
menos quanto aos créditos privados já reconhecidos em decisão
judicial com trânsito em julgado, vai implicar violação da res
judicata. Mais até, vai consagrar um tipo de superioridade
processual da parte pública sem a menor observância da

(CF, ART. 5º, XXXV), DESRESPEITO À COISA JULGADA MATERIAL (CF, ART. 5º XXXVI),
OFENSA À SEPARAÇÃO DOS PODERES (CF, ART. 2º) E ULTRAJE À ISONOMIA ENTRE
O ESTADO E O PARTICULAR (CF, ART. 1º, CAPUT, C/C ART. 5º, CAPUT). (...) 4. A
compensação dos débitos da Fazenda Pública inscritos em precatórios, previsto nos §§ 9º e
10 do art. 100 da Constituição Federal, incluídos pela EC nº 62/09, embaraça a efetividade da
jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), desrespeita a coisa julgada material (CF, art. 5º, XXXVI),
vulnera a Separação dos Poderes (CF, art. 2º) e ofende a isonomia entre o Poder Público e o
particular (CF, art. 5º, caput), cânone essencial do Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º,
caput). (...) 9. Pedido de declaração de inconstitucionalidade julgado procedente em parte”.
(ADI 4357, Relator: Min. Ayres Britto, Redator p/ Acórdão: Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno,
DJe 26.09.2014)

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ADI 5755 / DF

garantia do devido processo legal e seus principais


desdobramentos: o contraditório e a ampla defesa.
(...)
25. Em síntese, esse tipo unilateral e automático de
compensação de valores, agora constante dos §§ 9º e 10 da
Magna Carta (redação dada pela Emenda Constitucional nº
62/2009), embaraça a efetividade da jurisdição e desrespeita a
coisa julgada. (...)
26. Com efeito, esse tipo de conformação normativa,
mesmo que veiculada por emenda à Constituição, também
importa contratura no princípio da separação dos Poderes. No
caso, em desfavor do Poder Judiciário. Como ainda se
contrapõe àquele traço ou àquela nota que, integrativa da
proporcionalidade, demanda a observância obrigatória da
exigibilidade/necessidade para a restrição de direito. Isso
porque a Fazenda Pública dispõe de outros meios igualmente
eficazes para a cobrança de seus créditos tributários e não-
tributários.”

Nessa linha, também a Lei nº 13.463/2017, ao determinar o


cancelamento automático em questão, aparta-se da Constituição da
República, descumprindo, reitero, os princípios da separação dos
Poderes, do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, da
efetividade da jurisdição e do respeito à coisa julgada material.
A isso acresço, sublinho, a sistemática constitucional de regime de
precatórios em momento algum fixou prazo específico para o
levantamento de valores, que, em regra, é efetivado após um longo
trâmite processual e com a obediência a critérios de ordem cronológica. A
parte credora aguarda o decurso de tempo até finalmente obter a
satisfação do seu crédito, a mais das vezes sem a observância sequer do
princípio da razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, CF). No
entanto, segundo a lei impugnada, o beneficiário não pode deixar
transcorrer in albis o prazo de dois anos, sob pena de cancelamento do
depósito sem que lhe seja conferida a prévia oportunidade de
manifestação.

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Noutro giro, cumpre mencionar, dentre algumas prerrogativas


conferidas à Fazenda Pública no regime de precatório, a existência do
denominado “período de graça constitucional”, durante o qual não há
configuração de inadimplência e, portanto, não correm juros para os
precatórios apresentados até 1º de julho, e que devem ser pagos até o final
do exercício seguinte. O tema é objeto da Súmula Vinculante 17 desta
Suprema Corte: “Durante o período previsto no parágrafo 1º do artigo 100 da
Constituição, não incidem juros de mora sobre os precatórios que nele sejam
pagos”. Colho, quanto à sua aplicação, o precedente abaixo:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO


GERAL. TEMA 1037. CONSTITUCIONAL.
ADMINISTRATIVO. JUROS DE MORA. INCIDÊNCIA NO
PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE A DATA DA
EXPEDIÇÃO DO PRECATÓRIO OU DA REQUISIÇÃO DE
PEQUENO VALOR (RPV) E O EFETIVO PAGAMENTO.
IMPOSSIBILIDADE. 1. Em 10/11/2009, a jurisprudência do
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL no sentido de que, ‘durante
o período previsto no parágrafo 1º do artigo 100 da
Constituição, não incidem juros de mora sobre os precatórios
que nele sejam pagos’ atingiu o mais elevado grau de
consolidação, consubstanciando o Enunciado 17 da Súmula
Vinculante desta CORTE. 2. Pouco após, em 9/12/2009, foi
promulgada a Emenda Constitucional 62, que promoveu ampla
reformulação no art. 100 da Constituição, o qual versa sobre o
regime de precatórios. 3. Não obstante a norma à qual se refere
a SV 17 tenha sido deslocada do parágrafo 1º para o parágrafo
5º do art. 100, tal modificação não altera o sentido do enunciado
sumular - que, aliás, não foi afetado por qualquer disposição da
Emenda 62. 4. O período previsto no art. 100, parágrafo 5º, da
Constituição (precatórios apresentados até 1º de julho, devendo
ser pagos até o final do exercício seguinte) costuma ser
chamado de ‘período de graça constitucional’. 5. Nesse
interregno, não cabe a imposição de juros de mora, pois o ente
público não está inadimplente. 6. Caso não haja o pagamento
integral dentro deste prazo, os juros de mora passam a correr

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apenas a partir do término do “período de graça”. 7. Recurso


extraordinário a que se nega provimento. Tese de repercussão
geral: "O enunciado da Súmula Vinculante 17 não foi afetado
pela superveniência da Emenda Constitucional 62/2009, de
modo que não incidem juros de mora no período de que trata o
§ 5º do art. 100 da Constituição. Havendo o inadimplemento
pelo ente público devedor, a fluência dos juros inicia-se após o
'período de graça'" (RE 1169289, Relator: Min. Marco Aurélio,
Redator p/ Acórdão: Min. Alexandre de Moraes, DJe 01.7.2020).

Entendo, nessa linha de raciocínio jurídico, que a lei impugnada


imprime um tratamento mais gravoso ao credor, com a criação de mais
uma assimetria entre a Fazenda Pública e o cidadão ocupantes dos polos
devedor e credor nas relações jurídicas. Há manifesta ofensa à isonomia,
seja quanto à distinta paridade de armas entre a Fazenda Pública e os
credores, seja no que concerne à diferenciação realizada entre os
próprios credores: aqueles que logram fazer o levantamento no prazo de
dois anos e os que não o fazem, independentemente da averiguação
prévia das razões. Aqui, a título meramente exemplificativo, lembro,
como também se fez da tribuna, as ações coletivas em que há a
substituição processual, em especial em processos trabalhistas e de
servidores públicos, com toda a dificuldade muitas vezes existente, na
execução, para a localização dos substituídos beneficiários, muitos já
falecidos depois de anos e anos de tramitação dos feitos.
Especialmente quanto à sistemática constitucional de precatórios
como implementação da igualdade, observe-se o seguinte julgado:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE -


CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARANA (ART. 245) -
RETENÇÃO, PELO PODER JUDICIARIO LOCAL, DAS
QUANTIAS PAGAS PELA UNIÃO FEDERAL AO ESTADO, A
TÍTULO DE INDENIZAÇÃO OU ADIMPLEMENTO DE
OBRIGAÇÕES FEDERAIS - PAGAMENTO PREFERENCIAL
DE DETERMINADOS CRÉDITOS - APARENTE OFENSA AO
PRINCÍPIO DA IGUALDADE E A REGRA

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CONSUBSTANCIADA NO ART. 100 DA CONSTITUIÇÃO


FEDERAL - POSSIVEL COMPROMETIMENTO DA
ADMINISTRAÇÃO EXECUTIVA DAS FINANCAS PUBLICAS
DO ESTADO - SUSPENSÃO CAUTELAR DEFERIDA. - A
Regra inscrita no art. 245 da Constituição do Parana prescreve
que os créditos estaduais decorrentes do recebimento de
indenizações ou de pagamento de débitos federais deverão
custear, respectivamente, o pagamento de indenizações ou de
débitos do Estado para com terceiros, sempre que oriundos de
condenações judiciais. - A norma consubstanciada no art. 100
da Carta Política traduz um dos mais expressivos postulados
realizadores do princípio da igualdade, pois busca conferir, na
concreção do seu alcance, efetividade a exigência
constitucional de tratamento isonômico dos credores do
Estado. A vinculação exclusiva das importâncias federais
recebidas pelo Estado-membro, para o efeito específico referido
na regra normativa questionada, parece acarretar o
descumprimento de quanto dispõe do art. 100 da Constituição
Federal, pois, independentemente da ordem de precedência
cronológica de apresentação dos precatórios, institui, com
aparente desprezo ao princípio da igualdade, uma preferência
absoluta em favor do pagamento de ‘determinadas’
condenações judiciais” (ADI 584 MC, Relator: Min. Celso de
Mello, Tribunal Pleno, DJ 22.5.1992, destaquei).

Igualmente, em campo doutrinário:

“A norma constitucional em análise tem como finalidade


assegurar a isonomia entre os credores da Fazenda Pública,
impedindo qualquer espécie de favorecimento ou privilégios,
por razões políticas ou pessoais, em consonância com o
Princípio Republicano, que preside nossa Constituição, bem
como os da Administração Pública, constantes do art. 37 da
CF.”13

13 SCAFF, Fernando Facury; SCAFF, Luma Cavaleiro de Macedo. Art. 100. In: GOMES
CANOTILHO, J. J. et. al. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva

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No que tange à isonomia entre o Poder Público e o particular,


confira-se, novamente, a ADI 4357:

“DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE


EXECUÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA MEDIANTE
PRECATÓRIO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 62/2009.
INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL NÃO
CONFIGURADA. INEXISTÊNCIA DE INTERSTÍCIO
CONSTITUCIONAL MÍNIMO ENTRE OS DOIS TURNOS DE
VOTAÇÃO DE EMENDAS À LEI MAIOR (CF, ART. 60, §2º).
CONSTITUCIONALIDADE DA SISTEMÁTICA DE
‘SUPERPREFERÊNCIA’ A CREDORES DE VERBAS
ALIMENTÍCIAS QUANDO IDOSOS OU PORTADORES DE
DOENÇA GRAVE. RESPEITO À DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA E À PROPORCIONALIDADE. INVALIDADE
JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DA LIMITAÇÃO DA
PREFERÊNCIA A IDOSOS QUE COMPLETEM 60 (SESSENTA)
ANOS ATÉ A EXPEDIÇÃO DO PRECATÓRIO.
DISCRIMINAÇÃO ARBITRÁRIA E VIOLAÇÃO À ISONOMIA
(CF, ART. 5º). INCONSTITUCIONALIDADE DA
SISTEMÁTICA DE COMPENSAÇÃO DE DÉBITOS
INSCRITOS EM PRECATÓRIOS EM PROVEITO EXCLUSIVO
DA FAZENDA PÚBLICA. EMBARAÇO À EFETIVIDADE DA
JURISDIÇÃO (CF, ART. 5º, XXXV), DESRESPEITO À COISA
JULGADA MATERIAL (CF, ART. 5º XXXVI), OFENSA À
SEPARAÇÃO DOS PODERES (CF, ART. 2º) E ULTRAJE À
ISONOMIA ENTRE O ESTADO E O PARTICULAR (CF, ART.
1º, CAPUT, C/C ART. 5º, CAPUT). (...) PEDIDO JULGADO
PROCEDENTE EM PARTE. 1. A aprovação de emendas à
Constituição não recebeu da Carta de 1988 tratamento
específico quanto ao intervalo temporal mínimo entre os dois
turnos de votação (CF, art. 62, §2º), de sorte que inexiste
parâmetro objetivo que oriente o exame judicial do grau de
solidez da vontade política de reformar a Lei Maior. A

Educação, 2018, p. 1445.

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ADI 5755 / DF

interferência judicial no âmago do processo político, verdadeiro


locus da atuação típica dos agentes do Poder Legislativo, tem
de gozar de lastro forte e categórico no que prevê o texto da
Constituição Federal. Inexistência de ofensa formal à
Constituição brasileira. 2. Os precatórios devidos a titulares
idosos ou que sejam portadores de doença grave devem
submeter-se ao pagamento prioritário, até certo limite, posto
metodologia que promove, com razoabilidade, a dignidade da
pessoa humana (CF, art. 1º, III) e a proporcionalidade (CF, art.
5º, LIV), situando-se dentro da margem de conformação do
legislador constituinte para operacionalização da novel
preferência subjetiva criada pela Emenda Constitucional nº
62/2009. 3. A expressão ‘na data de expedição do precatório’,
contida no art. 100, §2º, da CF, com redação dada pela EC nº
62/09, enquanto baliza temporal para a aplicação da preferência
no pagamento de idosos, ultraja a isonomia (CF, art. 5º, caput)
entre os cidadãos credores da Fazenda Pública, na medida em
que discrimina, sem qualquer fundamento, aqueles que
venham a alcançar a idade de sessenta anos não na data da
expedição do precatório, mas sim posteriormente, enquanto
pendente este e ainda não ocorrido o pagamento. 4. A
compensação dos débitos da Fazenda Pública inscritos em
precatórios, previsto nos §§ 9º e 10 do art. 100 da Constituição
Federal, incluídos pela EC nº 62/09, embaraça a efetividade da
jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), desrespeita a coisa julgada
material (CF, art. 5º, XXXVI), vulnera a Separação dos Poderes
(CF, art. 2º) e ofende a isonomia entre o Poder Público e o
particular (CF, art. 5º, caput), cânone essencial do Estado
Democrático de Direito (CF, art. 1º, caput). 5. (...). 9. Pedido de
declaração de inconstitucionalidade julgado procedente em
parte” (ADI 4357, Relator: Min. Ayres Britto, Redator p/
Acórdão: Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, DJe 26.9.2014,
destaquei).

No mesmo sentido:

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“RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO


GERAL. DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE
EXECUÇÃO PECUNIÁRIA DA FAZENDA PÚBLICA.
COMPENSAÇÃO DE DÉBITOS PERANTE A FAZENDA
PÚBLICA COM CRÉDITOS SUJEITOS A REQUISIÇÃO DE
PEQUENO VALOR. IMPOSSIBILIDADE. JULGAMENTO DAS
ADI’S 4357 E 4425 PELO PLENÁRIO DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº
62/2009. INCONSTITUCIONALIDADE DA SISTEMÁTICA DE
COMPENSAÇÃO EM PROVEITO EXCLUSIVO DA FAZENDA
PÚBLICA. EMBARAÇO À EFETIVIDADE DA JURISDIÇÃO
(CRFB, ART. 5º, XXXV), DESRESPEITO À COISA JULGADA
MATERIAL (CRFB, ART. 5º XXXVI), OFENSA À SEPARAÇÃO
DOS PODERES (CRFB, ART. 2º) E ULTRAJE À ISONOMIA
ENTRE O ESTADO E O PARTICULAR (CRFB, ART. 1º,
CAPUT, C/C ART. 5º, CAPUT). ENTENDIMENTO QUE SE
APLICA NA MESMA EXTENSÃO ÀS REQUISIÇÕES DE
PEQUENO VALOR. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE
NEGA PROVIMENTO. 1. A compensação de tributos devidos à
Fazenda Pública com créditos decorrentes de decisão judicial
caracteriza pretensão assentada em norma considerada
inconstitucional (art. 100, §§ 9º e 10, da Constituição da
República, com redação conferida pela EC nº 62/2009). 2. O
Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar as ADIs nº
4.357 e 4.425, assentou a inconstitucionalidade dos §§ 9º e 10 do
art. 100 da Constituição da República, com redação conferida
pela EC nº 62/2009, forte no argumento de que a compensação
dos débitos da Fazenda Pública inscritos em precatórios
embaraça a efetividade da jurisdição (CRFB, art. 5º, XXXV),
desrespeita a coisa julgada material (CRFB, art. 5º, XXXVI),
vulnera a Separação dos Poderes (CRFB, art. 2º) e ofende a
isonomia entre o Poder Público e o particular (CRFB, art. 5º,
caput), cânone essencial do Estado Democrático de Direito
(CRFB, art. 1º, caput). 3. Destarte, não se revela
constitucionalmente possível a compensação unilateral de
débitos em proveito exclusivo da Fazenda Pública mesmo que

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os valores envolvidos estejam sujeitos ao regime de pagamento


por requisição de pequeno valor (RPV). 4. Recurso
extraordinário a que se nega provimento” (RE 657.686, Relator:
Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, Dje 05.12.2014, destaquei).

Em relação à isonomia entre os credores, é cediço que, dentro da


organização do pagamento dos precatórios, há ordens de preferência.
Além disso, a considerar as requisições de pequeno valor – também
abrangidas pela lei impugnada –, e submetidas a uma metodologia de
pagamento mais célere, como explicita a doutrina:

“Além dos créditos ordinários que são pagos regularmente


através da metodologia de precatórios, podemos dizer que
existem outras duas espécies de pagamentos decorrentes de
condenação judicial da Fazenda Pública, que possuem
especificidades próprias nas regras dos precatórios. São os
créditos de natureza alimentar e os créditos de pequeno valor.
Os primeiros são pagos antes dos demais precatórios e os
segundos ficam fora da metodologia de pagamento por
precatórios. Podemos, portanto, dizer que para o pagamento de
condenações judiciais da Fazenda Pública existem três métodos:
a) os precatórios comuns, pagos segundo as regras ora analisadas,
sem qualquer preferência ou prioridade; b) os precatórios
alimentares, que preferem aos comuns; c) os créditos de pequeno
valor, que não se submetem às regras de precatórios.”14

É de grande valia a síntese elaborada por José Afonso da Silva:

“Agora, contudo, são duas ordens para os precatórios


judiciais: uma ordem cronológica especial, para os pagamentos
dos créditos de natureza alimentícia, e uma ordem geral e
ordinária, referente aos demais pagamentos devidos pela
Fazenda Pública em virtude de sentença judiciária. Foi a

14 ABRAHAM, Marcus. Curso de Direito Financeiro Brasileiro. Rio de Janeiro:


Forense, 2017, p. 232-232.

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Constituição de 1934 que criou esse sistema de pagamento dos


débitos da Fazenda Pública segundo a ordem cronológica dos
precatórios, dando-lhe um sentido ético, porque afastou o
protecionismo. Com a separação dos débitos, pela natureza
alimentícia ou não, aperfeiçoou-se o sistema ético,
possibilitando o pagamento de pequenos créditos de quem
supostamente mais precisa, com preferência aos demais. Desse
modo, têm-se duas formas de preferência: a que se manifesta na
ordem de apresentação dos precatórios em qualquer das classes
de crédito e a que se realiza entre créditos alimentícios e os
demais. Há ainda os pagamentos definidos em lei como de
pequeno valor que a Fazenda Pública deve fazer em virtude de
sentença judicial, independentemente de precatório.”15

Como preleciona o eminente constitucionalista, o estabelecimento


das preferências e os pagamentos de pequeno valor dissociados do
regime de precatório aperfeiçoam o sistema ético e, por consequência, a
igualdade material, à luz, sempre, das normas constitucionais.
Sobre o tema, colho também o magistério de Fernando Facury Scaff:

“Como previsto pelo art. 100 da Constituição, precatórios


são ordens judiciais para inclusão na previsão orçamentária do
ente público devedor, de créditos decorrentes de decisões
judiciais transitadas em julgado, que se refiram a obrigações de
pagar. São decisões proferidas em favor de pessoas, físicas ou
jurídicas, de direito público ou privado, que são
obrigatoriamente incluídas no projeto de lei orçamentária em
favor dos credores. Tais créditos são reunidos pelo tribunal de
cúpula, e remetidos para inclusão no projeto de lei
orçamentária, sem identificação dos reais credores. Logo, o
legislador orçamentário não tem nenhuma discricionariedade
sobre tais valores, que devem ser incluídos na lei orçamentária
do ente público competente, e transferidos ao referido tribunal,
que pagará os credores na ordem cronológica correspondente

15 SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo:


Malheiros, 2009, p. 523.

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ADI 5755 / DF

ao seu recebimento na vara de origem. Existem peculiaridades


que beneficiam as pessoas que têm doenças, os idosos e os
créditos de pequeno valor, que é financeiramente
16
republicano, pois isonômico (destaquei).

A lei impugnada, como visto, cria distinção automaticamente


derivada do decurso do tempo entre credores sem a averiguação das
razões do não levantamento dos valores atinentes aos precatórios e
requisições de pequeno valor, que podem, por exemplo, inclusive advir
de entraves processuais, de deficiência de representação, de imperativos
de direito sucessório, dentre outras causas que não necessariamente
denotem desinteresse ou inércia injustificada.
Incabível, pois, afastar-se da necessária isonomia por meio de
criação de situação de discrímen não contemplada pela Constituição.
A isso acresce que o manejo dos valores de recursos públicos
depositados e à disposição do credor revela também violação do direito
de propriedade (art. 5º, XXII, CF). Com efeito, nesse momento processual
da tutela executiva, não há mais falar em titularidade dos valores pela
Fazenda Pública, que já efetuou o pagamento, ainda que pendente o
levantamento pelo credor. Há, assim, ingerência sobre o montante
depositado em pagamento e administrado pelo Poder Judiciário, que
passa a ser tratado indevidamente como receita pública e alvo de
destinação, nos termos da lei impugnada.
Acerca das origens das receitas públicas, Marcus Abraham:

“As receitas públicas podem se originar: a) do patrimônio


estatal: da exploração de atividades econômicas por entidades
estatais ou do seu próprio patrimônio, tais como as rendas do
patrimônio mobiliário e imobiliário do Estado, receitas de
aluguel e arrendamento dos seus bens, de preços públicos,
compensações financeiras da exploração de recursos naturais e
minerais (royalties), de prestação de serviços comerciais e de
16 SCAFF, Fernando Facury. O Orçamento Republicano e Liberdade Igual: Ensaio
sobre Direito Financeiro, República e Direitos Fundamentais no Brasil. Belo Horizonte:
Fórum, 2018, p. 378-379.

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Voto - MIN. ROSA WEBER

Inteiro Teor do Acórdão - Página 46 de 208

ADI 5755 / DF

venda de produtos industriais e agropecuários; b) do patrimônio


do particular: pela tributação, aplicação de multas e penas de
perdimento, recebimento de doações, legados, heranças
vacantes etc.; c) das transferências intergovernamentais: relativa à
repartição das receitas tributárias transferidas de um ente
diretamente para outro ou por meio de fundos de investimento
ou de participação; d) dos ingressos temporários: mediante
empréstimos públicos, ou da utilização de recursos transitórios
em seus cofres, como os depósitos em caução, fianças,
operações de crédito por antecipação de receitas etc.”17

Observo que deve ser mantido, sem desvirtuamentos, o


enquadramento do precatório como despesa pública, efetivada após o
regular trâmite da metodologia de inclusão de previsão orçamentária no
prazo previsto (1º de julho), para pagamento no exercício financeiro
seguinte.
Senhor Presidente, sem prejuízo da respeitabilidade dos
fundamentos contrários aos que encampo, e o resultado prático que se
pretende alcançar com o possível reforço no caixa da União, reputo
inviável o endosso da premissa que dá suporte às posições divergentes.
Além de questionável a assertiva de ser, o credor, entre o depósito e
o momento imediatamente anterior ao saque dos valores destinados ao
pagamento da requisição, mero beneficiário dessas quantias, e não seu
efetivo titular, nos moldes que acima expus, penso que a regência da
matéria não se amolda, à perfeição, ao disciplinamento do Direito Civil e
aos institutos jurídicos pertinentes a contratos e transmissão da
propriedade.
A questão, em essência, não está somente atrelada ao direito público,
como também qualificada pela particularíssima disciplina constitucional
dos precatórios.
Compreendo, nesse diapasão, que não se está diante da tradicional
figura do depósito de valores em determinada instituição financeira, na

17 ABRAHAM, Marcus. Curso de Direito Financeiro Brasileiro. Rio de Janeiro:


Forense, 2017, p. 87.

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Voto - MIN. ROSA WEBER

Inteiro Teor do Acórdão - Página 47 de 208

ADI 5755 / DF

qual se firma o vínculo jurídico estritamente entre depositante e


depositário, de forma a autorizar a ingerência daquele, in casu, a União,
sobre este, o Banco depositário, o qual, em caráter temporário, recebe
coisa móvel em depósito, a fim de que, oportunamente, a devolva ou
entregue a quem o depositante indicar.
Tal dinâmica em absoluto retrata o iter do adimplemento das dívidas
da Fazenda Pública, por meio dos precatórios. A premissa adotada, a meu
juízo, deixa de considerar a presença de relevante player, a saber, o Poder
Judiciário, a quem as dotações orçamentárias e os créditos abertos serão
consignados diretamente, nos exatos termos do § 6º do art. 100 da Lei
Maior.
Em matéria de precatórios, o vínculo firmado entre depositante e
depositário não ostenta a mesma relevância que o vínculo constitucional
formado, por ocasião do depósito dos valores, entre os Poderes Executivo
e Judiciário, a este último cabendo, pelo Presidente do respectivo
Tribunal, liquidar a dívida da Fazenda Pública (art. 100, § 7º),
anteriormente reconhecida em sentença judicial transitada em julgado.
A arquitetura constitucional é complexa, sem dúvida, dado que
também o credor estabelece vínculo direto com o Poder Judiciário no
curso da liquidação do precatório - não com o depositante/devedor ou
com o depositário/instituição bancária -, consoante bem demonstra a
responsabilidade a que fica sujeito o Presidente do Tribunal, na hipótese
de retardar ou tentar frustrar a liquidação regular de precatórios,
autoridade a quem o credor deve se dirigir para tratar de assuntos
correlatos ao seu crédito, a exemplo das hipóteses da quebra da ordem
cronológica do pagamento e do exercício do direito de cessão do crédito a
terceiros, o qual, diga-se de passagem, independe da concordância do
devedor, a desautorizar seja declarada a constitucionalidade do art. 2º,
caput e § 1º, da Lei nº 13.463/2017.
Em suma, à luz da fundamentação expendida, é forçoso concluir que
o legislador não observou o regramento da Lei Fundamental e produziu,
por conseguinte, normas eivadas do vício de inconstitucionalidade
material.

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Voto - MIN. ROSA WEBER

Inteiro Teor do Acórdão - Página 48 de 208

ADI 5755 / DF

8. Ante o exposto, conheço da presente a ação direta e julgo


procedente o pedido, para declarar a inconstitucionalidade material do
art. 2º, caput e § 1º, da Lei nº 13.463/2017.
É o voto.

33

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Extrato de Ata - 29/06/2022

Inteiro Teor do Acórdão - Página 49 de 208

PLENÁRIO
EXTRATO DE ATA

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755


PROCED. : DISTRITO FEDERAL
RELATORA : MIN. ROSA WEBER
REQTE.(S) : PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA
ADV.(A/S) : CLAUDIO OLIVEIRA SANTOS COLNAGO (11113/ES)
INTDO.(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
INTDO.(A/S) : CONGRESSO NACIONAL
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES E ADVOGADOS
PÚBLICOS FEDERAIS - ANPPREV
ADV.(A/S) : HUGO MENDES PLUTARCO (DF025090/)
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO DE SINDICATOS DE TRABALHADORES TÉCNICOS-
ADMINISTRATIVOS EM INSTITUIÇÕES PÚBLICAS DE ENSINO SUPERIOR NO
BRASIL E OUTRO(A/S)
ADV.(A/S) : CLAUDIO SANTOS DA SILVA (10081/DF)
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DOS POLICIAIS FEDERAIS - FENAPEF
ADV.(A/S) : RUDI MEIRA CASSEL (22256/DF)
ADV.(A/S) : ANTONIO RODRIGO MACHADO DE SOUSA (00034921/DF)
AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DA PREVIDÊNCIA E
DA SEGURIDADE SOCIAL - ANASPS
ADV.(A/S) : ANTONIO TORREAO BRAZ FILHO (09930/DF, 154525/MG,
238265/RJ)
AM. CURIAE. : CONFEDERACAO DOS TRABALHADORES NO SERVICO PUBLICO
FEDERAL - CONDSEF
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES NO SERVIÇO PÚBLICO
FEDERAL - FENADSEF
AM. CURIAE. : SINDICATO NACIONAL DOS SERVIDORES FEDERAIS DA
EDUCAÇÃO BÁSICA, PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA - SINASEFE NACIONAL
ADV.(A/S) : JOSE LUIS WAGNER (1235-A/AP, 17183/DF, 18061/PR,
125216/RJ, 18097/RS, 15111/SC)
AM. CURIAE. : SINDICATO DOS TRABALHADORES FEDERAIS DA SAÚDE,
TRABALHO E PREVIDÊNCIA NO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (SINDISPREV/
RS)
ADV.(A/S) : GLENIO LUIS OHLWEILER FERREIRA (23021/RS, 328901/SP)
ADV.(A/S) : THIAGO CECCHINI BRUNETTO (51519/RS)
AM. CURIAE. : CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL -
CFOAB
ADV.(A/S) : MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO (18958/DF, 167075/MG,
2525/PI, 463101/SP)
ADV.(A/S) : LUIZ GUSTAVO ANTONIO SILVA BICHARA (21445/DF,
10503/ES, 139419/MG, 112310/RJ, 303020/SP)
ADV.(A/S) : EDUARDO DE SOUZA GOUVEA (067378/RJ, 311792/SP)
ADV.(A/S) : OSWALDO PINHEIRO RIBEIRO JUNIOR (16275/DF)
ADV.(A/S) : LIZANDRA NASCIMENTO VICENTE (39992/DF)
ADV.(A/S) : GUILHERME DEL NEGRO BARROSO FREITAS (48893/DF)

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Extrato de Ata - 29/06/2022

Inteiro Teor do Acórdão - Página 50 de 208

ADV.(A/S) : CLAUDIA PAIVA CARVALHO (129382/MG)


AM. CURIAE. : SINTRAJUSC - SINDICATO DOS TRABALHADORES NO PODER
JUDICIÁRIO FEDERAL EM SANTA CATARINA
ADV.(A/S) : PEDRO MAURICIO PITA DA SILVA MACHADO (29543/DF, 24372/
RS, 12391/SC)
AM. CURIAE. : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES EM
SEGURIDADE SOCIAL ¿ CNTSS/CUT
ADV.(A/S) : RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO (32147/DF, 140251/MG,
234932/RJ, 1190/SE, 439314/SP)
ADV.(A/S) : RODRIGO CAMARGO BARBOSA (34718/DF)
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DA JUSTIÇA FEDERAL
E DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO ¿ FENAJUFE
ADV.(A/S) : RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO (32147/DF, 140251/MG,
234932/RJ, 1190/SE, 439314/SP)
ADV.(A/S) : RODRIGO CAMARGO BARBOSA (34718/DF)
AM. CURIAE. : ASSOCIACAO DOS ADVOGADOS DE SAO PAULO
ADV.(A/S) : ANTONIO CARLOS DE ALMEIDA AMENDOLA (225356/RJ, 154182/
SP)
ADV.(A/S) : MARIO LUIZ OLIVEIRA DA COSTA (01934/A/DF, 117622/SP)
ADV.(A/S) : ANDRE ALMEIDA GARCIA (184018/SP)
ADV.(A/S) : DANIEL NUNES VIEIRA PINHEIRO DE CASTRO (223677/SP)

Decisão: Após o voto da Ministra Rosa Weber, Relatora, que


conhecia da ação direta e julgava procedente o pedido, para
declarar a inconstitucionalidade material do art. 2º, caput e §
1º, da Lei nº 13.463/2017, pediu vista dos autos o Ministro
Roberto Barroso. Falaram: pelos interessados, o Dr. Adriano
Martins De Paiva, Advogado da União; pelo amicus curiae Federação
de Sindicatos de Trabalhadores Técnicos-Administrativos em
Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil, o Dr. Claudio
Santos; pelo amicus curiae Federação Nacional dos Servidores da
Justiça Federal e do Ministério Público da União – FENAJUFE, o Dr.
Paulo Francisco Soares Freire; pelo amicus curiae Associação
Nacional dos Procuradores e Advogados Públicos Federais – ANPPREV,
o Dr. Hugo Mendes Plutarco; pelo amicus curiae Associação dos
Advogados de São Paulo, o Dr. Antonio Carlos De Almeida Amendola;
pelo amicus curiae Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil – CFOAB, a Dra. Manuela Elias Batista; pelo amicus cuiae
SINTRAJUSC - Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário
Federal em Santa Catarina, o Dr. Pedro Mauricio Pita Machado; e,
pelo amicus curiae Confederação dos Trabalhadores no Serviço
Público Federal – CONDSEF, o Dr. Bruno Conti Gomes da Silva.
Plenário, Sessão Virtual de 12.2.2021 a 23.2.2021.

Decisão: (Processo destacado do Plenário Virtual) Após o voto


da Ministra Rosa Weber (Relatora), que conhecia da ação direta e
julgava procedente o pedido, para declarar a inconstitucionalidade
material do art. 2º, caput e § 1º, da Lei nº 13.463/2017, o
julgamento foi suspenso. Falaram: pelo requerente, o Dr. Marco

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Extrato de Ata - 29/06/2022

Inteiro Teor do Acórdão - Página 51 de 208

André Dunley Gomes; pelo interessado Presidente da República, o


Dr. Adriano Martins Paiva, Advogado da União; pelo amicus curiae
Associação Nacional dos Procuradores e Advogados Públicos Federais
– ANPPREV, o Dr. Hugo Mendes Plutarco; pelos amici curiae
Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnicos-Administrativos
em Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil e Federação
Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho,
Previdência e Assistência Social – FENASPS, o Dr. Cláudio Santos
da Silva; pelos amici curiae Confederação dos Trabalhadores no
Serviço Público Federal - CONDSEF, Federação dos Trabalhadores no
Serviço Público Federal - FENADSEF e Sindicato Nacional dos
Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica
- SINASEFE Nacional, o Dr. Bruno Conti Gomes da Silva; pelo amicus
curiae Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – CFOAB,
o Dr. Márcio Brotto de Barros; pelos amici curiae Confederação
Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social - CNTSS/CUT e pela
Federação Nacional dos Servidores da Justiça Federal e do
Ministério Público da União – FENAJUFE, o Dr. Raimundo Cézar
Britto Aragão; e, pela Procuradoria-Geral da República, o Dr.
Antônio Augusto Brandão de Aras, Procurador-Geral da República.
Ausentes, justificadamente, os Ministros Gilmar Mendes e Ricardo
Lewandowski. Presidência do Ministro Luiz Fux. Plenário,
29.6.2022.

Presidência do Senhor Ministro Luiz Fux. Presentes à sessão os


Senhores Ministros Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Rosa Weber, Roberto
Barroso, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Nunes Marques e André
Mendonça.

Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Gilmar


Mendes e Ricardo Lewandowski.

Procurador-Geral da República, Dr. Antônio Augusto Brandão de


Aras.

Carmen Lilian Oliveira de Souza


Assessora-Chefe do Plenário

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 52 de 208

30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

VOTO–VOGAL

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (VOTO-VOGAL): Cuida-se de


ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar, em
face do art. 2°, caput e § 1°, da Lei 13.463/2017, ajuizada pelo Partido
Democrático Trabalhista (PDT), alegando ofensa aos arts. 2º; 5º, caput,
XXXV e XXXVI; e 100, caput, §§§ 5º, 6º e 7º, todos da Constituição Federal
de 1988.
Defende o requerente que:

“Porém, tanto o contexto dos processos judiciais contra o


citado ente federativo quanto a amplitude dos enunciados
impugnados permitem concluir que as normas atacadas
concedem indevida abertura para a postergação do
cumprimento de obrigações que já se encontram abarcadas pelo
manto protetivo da coisa julgada material, aplicando mais um
calote nos jurisdicionados.
(...) Com efeito, o conjunto normativo impugnado, ao
determinar que precatórios sejam cancelados e que o
cancelamento seja feito diretamente pelas instituições
financeiras controladas pela União, viola uma série de
enunciados constitucionais, abaixo transcritos, sobretudo
aqueles que consagram a Separação de Poderes (artigo 2º), a
segurança jurídica (artigo 5º, caput), a igualdade (artigo 5º,
caput), a inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV), a qual
pressupõe a efetividade das decisões judiciais, com respeito à
coisa julgada (artigo 5º, XXXVI). A norma vulnera, ainda, a
reserva constitucional para estabelecimento de condições para o
pagamento dos precatórios (nos termos da ADI 3453, Rel. Min.
Cármen Lúcia) e a competência constitucionalmente confiada
ao Poder Judiciário (artigo 100, § 6º) para a gestão do
pagamento dos requisitórios.
(...)

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Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 53 de 208

ADI 5755 / DF

A inconstitucionalidade formal se manifesta em dois


pontos: a) a Lei 13.463/2017 estabelece novas condições ao
pagamento dos precatórios, ao impor prazo de validade não
concebido pelo Constituinte, além de b) usurpar a competência
de gestão dos precatórios, confiada pela Constituição ao
Judiciário, mas indevidamente delegada, quanto à medida
drástica do cancelamento, a Instituições Financeiras controladas
pelo Poder Executivo.
No que toca à primeira inconstitucionalidade formal,
consiste ela em violação pura e simples do artigo 100, caput e
seus parágrafos (com especial destaque para os parágrafos 5º a
7º), já que a Constituição estabeleceu, de forma exaustiva, todas
as condições necessárias tanto à expedição quanto ao efetivo
pagamento do precatório. Logo, há uma nítida reserva de
constitucionalidade no trato da matéria, o que impede a atuação
do legislador ordinário sobre o tema.
(...)
Referido argumento encaminha o segundo ponto acerca
da inconstitucionalidade formal: ao delegar às instituições
financeiras controladas pela União Federal a atribuição de,
independentemente de ordem judicial, cancelarem qualquer
precatório emitido há mais de dois anos e ainda não levantado,
o Legislador passa por cima de clara norma de competência
estabelecida na Constituição Federal. A Lei Maior, no ponto, é
claríssima em conferir tais atribuições exclusivamente ao Poder
Judiciário, descabendo o Legislador modificar, por lei ordinária,
decisão soberanamente consagrada pelo Constituinte no texto
da Constituição da República.
(...)
Há, também, vícios de inconstitucionalidade material no
conjunto normativo impugnado. É certo que, ao usurpar a
competência judicial conferida pela Constituição, o Legislador
também viola o princípio fundamental da Separação de Poderes
(art. 2º), haja vista que a concessão da gestão dos requisitórios
ao Judiciário é norma originária da Constituição cujo objetivo é
exatamente evitar indevidas interferências dos Poderes

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 54 de 208

ADI 5755 / DF

Executivo e Legislativo sobre a independência do Judiciário. (...)


(...)
Como se não fosse suficiente a indevida intromissão
legislativa em matéria afeita ao Poder Judiciário, a transferência
de competência de cancelamento de precatórios a instituição
financeira oficial, controlada pela União, fere da mesma forma o
princípio constitucional da isonomia (artigo 5º, caput),
materializado, no caso, na necessária paridade de armas
processual. É certo que o fato de uma das partes exercer
controle acionário sobre uma das instituições financeiras
depositárias do precatório, somada à possibilidade de seu
cancelamento direto por essa mesma instituição financeira,
confere à referida parte um indevido e odioso privilégio
processual.
(...)
Ao pretender cancelar precatórios pelo mero decurso do
prazo de dois anos, a lei em comento golpeia o princípio
constitucional da segurança jurídica, plasmado no caput do
artigo 5º da Constituição que, na dicção da Suprema Corte,
consiste em ‘...projeção objetiva do princípio da dignidade da
pessoa humana e elemento conceitual do Estado de Direito’. (...)
(...)
Ademais, não é necessário um esforço descomunal para
perceber que uma instituição financeira oficial, controlada pela
União, será muito mais suscetível a cometer abusos (como o
cancelamento indevido de precatórios) do que o Poder
Judiciário, vinculado que está à observância dos princípios do
contraditório, da ampla defesa e da proporcionalidade.
(...)
Logo, há notória inconstitucionalidade nas normas
atacadas, seja (1) porque o cancelamento de precatórios
determinado pelo legislador, com operacionalização
diretamente por instituição financeira, implica em clara
inconstitucionalidade formal, tanto por criar novos requisitos
ao adimplemento do precatório, quanto por usurpar
competência constitucionalmente atribuída ao Poder Judiciário,

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 55 de 208

ADI 5755 / DF

seja (2) em razão da crassa inconstitucionalidade material


decorrente da violação aos princípios da Separação de Poderes,
da Isonomia, da Segurança Jurídica, da Coisa Julgada a da
Inafastabilidade da Jurisdição”. (eDOC 1)

A relatora adotou o rito previsto no art. 10 da Lei 9.868/99. (eDOC 9)


A Presidência da República expressou-se pelo indeferimento da
concessão da medida cautelar pleiteada e, no mérito, pela
constitucionalidade dos dispositivos questionados. (eDOC 13)
A Câmara dos Deputados informou que a Lei 13.463/2017 teve o
processo legislativo decorrido "dentro dos estritos trâmites constitucionais e
regimentais inerentes à espécie". (eDOC 18)
O Senado Federal, em suas informações, defendeu que "não há que se
falar em inconstitucionalidade formal, pois obedecidas todas as prescrições
relativas ao processo legislativo para transformação do projeto de lei em lei
ordinária".
Referiu que:

“Assim, não há qualquer sentido na afirmação do autor de


que haveria alteração de direito subjetivo, pois é patente que o
direito subsiste, bastando ao credor que tiver o precatório/RPV
cancelado peticionar para que ele seja novamente expedido,
conservando a ordem e a remuneração daquele original (que foi
cancelado).
Pelo mesmo motivo não há que se falar em nova condição
para pagamento de precatórios, pois ele poderá ser pago nos
termos descritos na Constituição, bastando petição do
interessado caso tenha havido eventual cancelamento.
Não há sentido em falar que a lei estimularia
questionamentos protelatórios para que seja cancelado o
precatório/RPV, pois mesmo se houver tal atitude ele será
inócua, pois basta ao credor, repita-se, peticionar para que novo
precatório/RPV seja expedido, mantendo a ordem e toda a
remuneração original.
Por fim, não há que se falar em transferência de controle

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 56 de 208

ADI 5755 / DF

da gerência de precatórios, mas sim de racionalização do


sistema, ao permitir que o Poder Judiciário possa gerir os
recursos de precatórios/RPVs eventualmente não levantados,
utilizando-os para melhorar a eficácia do próprio Poder
Judiciário, o que concretiza o principio constitucional da
eficiência. Em boa hora, nunca é demais repetir, o eventual
cancelamento pode ser revertido por simples petição do credor,
mantendo-se a ordem e as remunerações inerentes ao original
que foi cancelado, não havendo, então, perda para o credor
diligente.
(...)
O Parecer aprovado pela Comissão de Constituição,
Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados concluiu no
sentido de não haver qualquer inconstitucionalidade, formal ou
material, bem como destacou favoravelmente a oportunidade
do então projeto de lei. (...)
O Parecer aprovado pela Comissão de Constituição,
Justiça e Cidadania do Senado Federal também conclui no
mesmo sentido. Eis trecho do parecer:
‘A constitucionalidade material também resulta
incólume, não se divisando, na forma de a proposição
reger o tema, qualquer afronta à ordem constitucional
vigente.
(...) Quanto ao mérito, temos para nós que a
proposição reúne elementos para atrair o posicionamento
favorável desta relatoria. Efetivamente, num cenário como
o atual, de enorme carência de recursos financeiros pelo
Poder Público federal, impõe-se a busca de mecanismos
que direcionem a gestão de tais recursos públicos a uma
eficiência maior, e que impeçam a sua indisponibilidade
por não utilização.
A proposição que temos em exame pretende,
exatamente, essas duas finalidades, autorizando a
reversão para o Poder Judiciário dos rendimentos da
gestão financeira dos recursos de precatórios e de RPV e,
também, o levantamento de valores paralisados por dois

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anos’.
Em resumo, o art. 3º preserva o direito do credor ao prever
que, se eventual precatório/RPV relativo a ele for cancelado,
basta a ele peticionar para que obtenha novo precatório/RPV
que herdará a ordem e a remuneração relativas ao original que
foi cancelado". (eDOC 19)

A Advocacia-Geral da União manifestou-se pela improcedência da


cautelar e, consequentemente, dos pedidos, em peça a seguir ementada:

“Regime de pagamento por precatórios e por requisições


de Pequeno Valor. Artigo 2º, caput e § 1°, da Lei n° 13.46312017.
Previsão de cancelamento dos precatórios e Requisições
federais cujos valores não tenham sido levantados pelo credor e
estejam depositados há mais de dois anos. Embora a Carta de
1988 discipline o sistema de pagamento de débitos judiciais por
precatórios e Requisições de Pequeno Valor, não há, em seu
texto, impedimento à atuação do legislador infraconstitucional
sobre o tema. Inexistência de reserva constitucional quanto à
matéria. A Constituição confere ao Poder Judiciário a atribuição
administrativa de gerir o pagamento de precatórios, mas não
lhe confere competência privativa para dispor acerca do
assunto. Observância aos limites da atribuição legislativa
assegurada à União. Previsão de expedição de novo
requisitório, mediante requerimento do credor, com a
conservação da ordem cronológica e da remuneração
correspondente a todo o período. Ausência de fumus boni iuris e
de periculum in mora. Manifestação pelo indeferimento do
pedido de medida cautelar”. (eDOC 27)

A Procuradoria-Geral da República manifestou-se pela procedência


parcial dos pedidos, em parecer a seguir ementado:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.


PRECATÓRIO. ART. 2.º DA LEI 13.463/2017.
CANCELAMENTO DE PRECATÓRIOS E REQUISIÇÕES DE

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PEQUENO VALOR NÃO LEVANTADOS E DEPOSITADOS


HÁ MAIS DE DOIS ANOS. INCONSTITUCIONALIDADE
FORMAL. ATRIBUIÇÃO DO JUDICIÁRIO.
INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. OFENSA À
SEPARAÇÃO DE PODERES, AO REGIME CONSTITUCIONAL
DOS PRECATÓRIOS, À COISA JULGADA MATERIAL E À
EFETIVIDADE DE JURISDIÇÃO. 1. A gestão dos recursos
destinados ao cumprimento das condenações da Fazenda
Pública é realizada pelo Presidente do Tribunal, de maneira que
cabe ao Judiciário a regulamentação da matéria, a fim de dar
cumprimento aos ditames constitucionais (CF, art. 100-§§6.º e
7.º). 2. A definição de prazo para o levantamento de precatório,
sob pena de seu cancelamento, configura restrição ao exercício
do direito de precatório que não encontra previsão na ordem
constitucional, de maneira que afronta a sistemática do art. 100
da Constituição. 3. O cancelamento das requisições por
determinação de lei federal de iniciativa do Presidente da
República, independentemente de determinação do juiz da
execução e do Presidente do Tribunal competente não se
coaduna com a sistemática constitucional da matéria (CF, art.
100, §§6.º e 7.º) e com o princípio da separação dos Poderes (CF,
art. 2.º). 4. O art. 2.º da Lei 13.463/2017 ofende a coisa julgada
material (CF, art. 5.º, XXXVI) e embaraça a efetividade da
jurisdição (CF, art. 5.º, XXXV), porque torna indisponível o
valor devido pela Fazenda Pública reconhecido por decisão
judicial transitada em julgado, impedindo o acesso do cidadão a
direito consignado por coisa julgada. - Parecer pela procedência
parcial do pedido”. (eDOC 98)

Foram admitidos (eDOC 29, 44, 56, 65, 112 e 113), na condição de
amici curiae, a Associação Nacional dos Procuradores e Advogados
Públicos Federais (ANPPREV – eDOC 21); a Federação de Sindicatos de
Trabalhadores Técnicos-Administrativos em Instituições Públicas de
Ensino Superior no Brasil (FASUBRA-SINDICAL), em conjunto com a
Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Saúde,
Trabalho, Previdência e Assistência Social (FENASPS – eDOC 30); a

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Federação Nacional dos Policiais Federais (FENAPEF – eDOC 45); a


Associação Nacional dos Servidores da Previdência e da Seguridade
Social (ANASPS – eDOC 49); a Confederação dos Trabalhadores no
Serviço Público Federal (CONDSEF), em conjunto com a Federação dos
Trabalhadores no Serviço Público Federal (FENADSEF) e o Sindicato
Nacional dos Servidores Federais da Edução Básica, Profissional e
Tecnológica (SINASEFE NACIONAL – eDOC 57); a Associação dos
Advogados de São Paulo (eDOC 66); a Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS/CUT), em conjunto com a
Federação Nacional dos Servidores da Justiça Federal e do Ministério
Público da União (FENAJUFE – eDOC 71); o Sindicato dos Trabalhadores
no Poder Judiciário Federal em Santa Catarina (SINTRAJUSC – eDOC 90);
o Conselho Federal da Ordem do Advogados do Brasil (CFOAB – eDOC
99); e o Sindicato dos Trabalhadores Federais da Saúde, Trabalho e
Previdência no estado do Rio Grande do Sul (SINDISPREV/RS – eDOC
107).
O julgamento foi iniciado em ambiente virtual, na sessão de
12.2.2021 a 23.2.2021, oportunidade em que a relatora, Min. Rosa Weber,
votou pela conversão do rito do art. 10 pelo estabelecido no art. 12 da Lei
9.868/1999, em razão do estágio processual da presente ADI.
No mérito, a relatora afastou a pretensa inconstitucionalidade
formal, ao argumento de se tratar de matéria sobre direito financeiro – de
competência concorrente entre os Entes Federados (art. 24, I, da CF),
todavia, quanto à inconstitucionalidade material, acolheu o pleito autoral,
declarando a incompatibilidade com a Constituição do art. 2º, caput e §1º,
da Lei 13.463/2017, por violação: à separação de poderes, ao direito à
propriedade, ao devido processo legal (contraditório e ampla defesa),
além da proporcionalidade e da isonomia.
Naquela oportunidade, o Min. Roberto Barroso pediu vistas, com
posterior devolução e continuidade de julgamento na sessão virtual de
7.5.2021 a 14.5.2021. O voto-vista posicionou-se pela interpretação
conforme à Constituição do art. 2º, caput e §1º, da Lei 13.463/2017,
baseando-se nas seguintes premissas:

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a) “Entre o depósito e o momento imediatamente anterior


ao saque dos valores destinados ao pagamento da requisição, o
credor é mero beneficiário dessas quantias, e não seu efetivo
titular”;
b) “O prazo bienal fixado em lei não é manifestamente
irrazoável, devendo o Judiciário, nesse caso, prestar deferência
à liberdade de conformação do legislador. O ordenamento
admite modalidades extintivas mais gravosas, tais como a
prescrição da pretensão executória. No presente caso, o direito
subjetivo do credor se mantém hígido mesmo após o
cancelamento”;
c) “Dada a crise econômica e fiscal vivenciada pelo país,
agravada pela situação calamitosa de combate à pandemia da
COVID-19, não seria razoável manter bilhões de reais em
verbas públicas paralisadas ad aeternum por inércia do credor”;
d) “Salvo em situações excepcionais, as partes devem ter
oportunidade de influenciar previamente a formação do
resultado do processo e não podem ser afetadas por decisões-
surpresa”; e
e) “Necessidade de assegurar a destinação originalmente
prevista na lei orçamentária aos recursos públicos depositados
pela União (art. 165, § 10, CF). Valores que só podem ser
transferidos à Conta Única do Tesouro Nacional se o ente
federado estiver em dia com o pagamento das requisições
judiciais”.

Ao fim, votou no sentido da:

“(...) Procedência parcial do pedido, conferindo-se


interpretação conforme à Constituição ao art. 2º, caput e §1º, da
Lei nº 13.463/2017, para que (i) o procedimento de cancelamento
de precatório e requisição de pequeno valor nele previsto seja
precedido de intimação pessoal do credor, pelo juízo da
execução (aplicação, por analogia, do art. 485, II e III e § 1º, do
CPC); e (ii) a transferência de recursos para a Conta Única do
Tesouro Nacional pressuponha a ausência de mora da União no

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pagamento de tais requisições”.

No intuito de aprofundar o debate, pedi destaque para julgamento


na modalidade presencial.
Em suma, o tema controvertido consiste em definir se a norma
impugnada usurpa competência privativa do Poder Judiciário para
dispor sobre precatórios, bem ainda se há vilipêndio ao postulados da
separação dos poderes, da proporcionalidade e da coisa julgada, além da
disciplina do regime constitucional de pagamento das dívidas de valor da
Fazenda Pública e do direito de propriedade.
Adianto que comungo da imensa maioria da posição externada pelo
voto-vista do Min. Roberto Barroso, com apenas uma diferenciação: após
as Emendas Constitucionais 113 e 114, ambas de 2021, essa exigência de
“ausência de mora da União no pagamento de tais requisições” é de difícil
constatação e traria enormes dificuldades operacionais, em decorrência
da multiplicidade de formas de quitação que exsurgiram após as recentes
reformas constitucionais, conforme passo a expor.

1) Dispositivos objurgados e normas constitucionais tidas como


violadas

Eis as normas questionadas da Lei 13.463/2017:

“Art. 2º. Ficam cancelados os precatórios e as RPV federais


expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo
credor e estejam depositados há mais de dois anos em
instituição financeira oficial.
§ 1º. O cancelamento de que trata o caput deste artigo será
operacionalizado mensalmente pela instituição financeira
oficial depositária, mediante a transferência dos valores
depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional”.

Por sua vez, transcrevam-se os dispositivos constitucionais tidos


como violados, na ordem sequencial e na atual redação:

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“Art. 2º. São Poderes da União, independentes e


harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
(...)
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos
termos seguintes:
(...)
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito;
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato
jurídico perfeito e a coisa julgada;
(...)
Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas
Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de
sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem
cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos
créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de
pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais
abertos para este fim.
(...)
§ 5º. É obrigatória a inclusão no orçamento das entidades
de direito público de verba necessária ao pagamento de seus
débitos oriundos de sentenças transitadas em julgado
constantes de precatórios judiciários apresentados até 2 de abril,
fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte,
quando terão seus valores atualizados monetariamente.
§ 6º. As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão
consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao
Presidente do Tribunal que proferir a decisão exequenda
determinar o pagamento integral e autorizar, a requerimento do
credor e exclusivamente para os casos de preterimento de seu
direito de precedência ou de não alocação orçamentária do
valor necessário à satisfação do seu débito, o sequestro da

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quantia respectiva.
§ 7º. O Presidente do Tribunal competente que, por ato
comissivo ou omissivo, retardar ou tentar frustrar a liquidação
regular de precatórios incorrerá em crime de responsabilidade e
responderá, também, perante o Conselho Nacional de Justiça”.

Argui-se a pretensa inconstitucionalidade formal da lei em questão,


diante do fato de que foram criadas novas “condições ao pagamento dos
precatórios, ao impor prazo de validade não concebido pelo Constituinte”, bem
ainda por vulnerar a “competência de gestão dos precatórios, confiada pela
Constituição ao Judiciário, mas indevidamente delegada, quanto à medida
drástica do cancelamento, a Instituições Financeiras controladas pelo Poder
Executivo".
Defende-se que “cabe ao Judiciário determinar todos os trâmites inerentes
aos requisitórios, nos termos do quanto decidido na ADI 1098-SP, não havendo,
sobre o ponto, qualquer espaço para conformação legislativa”.
Em relação à inconstitucionalidade formal, acompanho a relatora e o
Min. Roberto Barroso, ao entendimento de que a dívida reconhecida
judicialmente, com trânsito em julgado (precatório ou RPV), é espécie de
despesa pública, situando-se no campo do direito financeiro, cuja
competência é concorrente entre os entes federativos, na forma do art. 24,
I, da Constituição Federal de 1988, a saber:

“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito


Federal legislar concorrentemente sobre:
I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e
urbanístico”.

Além disso, a tecitura constitucional do regime dos precatórios, com


incumbência a cargo do Poder Judiciário, não impede o Legislador
ordinário de estipular algumas especificidades no campo da regulação
formal e material do procedimento envolvendo os precatórios e as RPVs,
por se tratar de matéria de cunho administrativo, desde que,
evidentemente, não se conflite diretamente com a Constituição Federal.

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Relembre-se que esta Corte tem permitido aos entes federativos


estipularem o valor do teto para fins de pagamento de RPV, de acordo
com sua capacidade de pagamento, caso não desrespeitem as balizas
previstas na Constituição e conquanto não haja retroação para abarcar
processos transitados em julgado antes da alteração do teto.
Ao apreciar alterações legislativas, que modificavam o teto das
requisições de pequeno valor (passando para o rito dos precatórios), o
STF entendeu que era inconstitucional a incidência da novel disposição
aos processos transitados em julgado, por força da observância do direito
adquirido e da coisa julgada, no RE 729.107, Rel. Min. Marco Aurélio,
Tribunal Pleno, DJe 15.9.2020 (tema 796 da RG).
Eis a tese do tema 796 da sistemática da repercussão geral:

“Lei disciplinadora da submissão de crédito ao sistema de


execução via precatório possui natureza material e processual,
sendo inaplicável a situação jurídica constituída em data que a
anteceda”.

No mesmo sentido:

“AGRAVO INTERNO EM RECURSO


EXTRAORDINÁRIO. EXECUÇÃO CONTRA FAZENDA
PÚBLICA. LEI LOCAL DISCIPLINADORA DE
REQUISITÓRIO DE PEQUENO VALOR – RPV. APLICAÇÃO A
TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL CONSTITUÍDO POR
EXECUÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. REPERCUSSÃO
GERAL DA MATÉRIA RECONHECIDA PELO PLENÁRIO
DESTA SUPREMA CORTE NA ANÁLISE DO RE 729.107/DF,
MINISTRO MARCO AURÉLIO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM
DESCONFORMIDADE COM ENTENDIMENTO FIRMADO
PELO PLENÁRIO DESTE SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
RECURSO DEDUZIDO EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA
SOB A ÉGIDE DO CPC/75. VERBA HONORÁRIA INCABÍVEL.
AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. I – O Plenário desta
Suprema Corte, ao apreciar o RE 729.107/DF, tema 792, Ministro

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Marco Aurélio, fixou a seguinte tese: ‘Lei disciplinadora da


submissão de crédito ao sistema de execução via precatório
possui natureza material e processual, sendo inaplicável a
situação jurídica constituída em data que a anteceda’. II – O
acórdão recorrido diverge do entendimento firmado pelo
Plenário desta Corte Suprema. III – Ao amparo do § 11 do art.
85 do CPC, incabível verba honorária no presente caso, por se
tratar de recurso interposto em face de decisão publicada sob a
égide do CPC/73. IV – Agravo interno desprovido”. (RE 861.115
AgR, Rel. Min. Nunes Marques, Segunda Turma, DJe 23.4.2021)

Entretanto, ao permitir que cada ente pudesse disciplinar o tema


doravante, esta Corte assim o fez com base na compreensão de que se
cuida de matéria de competência legislativa concorrente, constante do art.
24, XI, da Constituição Federal (competência para legislar sobre
procedimentos em matéria processual) e não norma sobre processo.
Reforce-se que, após a expedição da RPV (ou do precatório), cuida-
se de procedimento de pagamento na fase administrativa (despida de
conteúdo jurisdicional), o que também atrai a incidência do inciso XI do
art. 24 da CF (procedimento em matéria processual). Afasto, portanto,
eventual inconstitucionalidade formal.

2) Inconstitucionalidade material

O argumento central da petição inicial é de que a norma questionada


violaria a coisa julgada, o direito de propriedade e a separação de
poderes, além do regime do art. 100 da CF de pagamento de dívidas da
Fazenda Pública.
Sobre a coisa julgada, tive oportunidade de registrar em sede
doutrinária:

“A referência ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito


e à coisa julgada, constante dos textos constitucionais
brasileiros, remete à necessidade de conceituação doutrinária,
jurisprudencial e, para alguns, também de índole legal.

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É verdade que a adoção de um conceito tríplice acaba por


gerar perplexidades. Alguns autores afirmam que suficiente
seria a referência a direito adquirido, uma vez que os conceitos
de ato jurídico perfeito e coisa julgada nele se inserem.
Reconheça-se que a tripartição conceitual tem a vantagem,
talvez, de tornar mais explícitas determinadas situações muito
comuns e embaraçosas, como a separação entre as mudanças
relativas à constituição (forma) e ao conteúdo. A referência ao
ato jurídico perfeito permite definir com maior clareza a lei
aplicável a dadas situações jurídicas, que somente produzirão
efeitos no futuro, eventualmente no regime de uma lei nova. É o
caso das controvérsias a propósito da capacidade para prática
de ato jurídico ou da forma que se deva adotar em
determinados atos. A alteração posterior (exigência de escritura
pública na lei nova para, v. g., elaboração de testamento,
quando sob a lei anterior, tal forma era dispensável) não afeta o
ato jurídico perfeito já efetivado. Neste sentido, a alteração
posterior não pode repercutir no plano de sua validade, tendo
em vista o ato jurídico perfeito.
(...)
As duas principais teorias sobre a aplicação da lei no
tempo – a teoria do direito adquirido e a teoria do fato
realizado, também chamada do fato passado – rechaçam, de
forma enfática, a possibilidade de subsistência de situação
jurídica individual em face de uma alteração substancial do
regime ou de um estatuto jurídico.
Assim, sustentava Savigny que as leis concernentes aos
institutos jurídicos outorgam aos indivíduos apenas uma
qualificação abstrata quanto ao exercício do direito e uma
expectativa de direito quanto ao ser ou ao modo de ser do
direito. O notável jurisconsulto distinguia duas classes de leis: a
primeira, concernente à aquisição de direito; a segunda, relativa
à existência de direitos.
A propósito, registre-se a lição de Savigny:
‘A primeira, concernente à aquisição de direitos,
estava submetida ao princípio da irretroatividade, ou seja,

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à manutenção dos direitos adquiridos. A segunda classe


de normas, que agora serão tratadas, relacionam-se à
existência de direitos, onde o princípio da irretroatividade
não se aplica. As normas sobre a existência de direitos são,
primeiramente, aquelas relativas ao contraste entre a
existência ou a não existência de um instituto de direito:
assim, as leis que extinguem completamente uma
instituição e, ainda, aquelas que, sem suprimir
completamente um instituto modificam essencialmente
sua natureza, levam, desde então, no contraste, dois
modos de existência diferentes. Dizemos que todas essas
leis não poderiam estar submetidas ao princípio da
manutenção dos direitos adquiridos (a irretroatividade);
pois, se assim fosse, as leis mais importantes dessa espécie
perderiam todo o sentido’.
Deveriam ser, portanto, de imediata aplicação, as leis que
abolissem a escravidão, redefinissem a propriedade privada,
alterassem o estatuto da vida conjugal ou da situação dos filhos.
Essa orientação foi retomada e desenvolvida por Gabba,
segundo o qual somente existia direito adquirido em razão dos
institutos jurídicos com referência às relações deles decorrentes,
jamais, entretanto, relativamente aos próprios institutos.
(...)
O tema é contemplado, igualmente, por Roubier, que
distingue, em relação às leis supressivas ou modificativas de
institutos jurídicos, aquelas leis que suprimem uma situação
jurídica para o futuro sem afetar as relações jurídicas perfeitas
ou consolidadas daqueloutras que não só afetam a situação
jurídica como também os próprios efeitos:
“Ora, as regras que nos guiaram até aqui, nos
conduzirão facilmente à solução: ou a lei é uma lei de
dinâmica jurídica, que visa mais os meios de alcançar uma
determinada situação do que a própria situação em si,
nesse sentido, é uma lei de constituição – ela respeitará as
situações já estabelecidas; ou a lei é uma lei de estática
jurídica, que visa mais o estado ou a situação em si do que

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os meios pelos quais ela se constitui, assim, é uma lei


relativa aos efeitos de uma situação jurídica, ela se aplica
desde o dia da entrada em vigor, sem se aplicar
retroativamente às situações já existentes’.

Adiante, ressalta o mestre de Lyon:


‘As leis que aboliram a escravidão ou os direitos
feudais puderam aplicar-se às situações existentes, sem
que tenham sido retroativas. E, com efeito, pouco
importava o modo de aquisição do direito: o que a lei
censurava era o regime jurídico do escravo, o conteúdo do
direito feudal: a lei era, então, relativa aos efeitos da
situação jurídica, e não à sua constituição; sem retroagir,
ela atingiu as situações já constituídas’

Sistematizando esse entendimento, Roubier formula a


seguinte tese:

‘Em suma, diríamos que as leis que suprimem uma


situação jurídica podem visar ou o meio de alcançar esta
situação – e aí são assimiláveis pelas leis que governam a
constituição de uma situação jurídica –, ou, ao contrário,
podem visar os efeitos e o conteúdo dessa situação – logo,
elas são assimiláveis pelas leis que regem os efeitos de
uma situação jurídica; no primeiro caso, as leis não
poderiam atingir sem retroatividade situações já
constituídas; no segundo, elas se aplicam, de imediato, às
situações existentes para pôr-lhes fim’.

O problema relativo à modificação das situações


subjetivas em virtude da mudança de um instituto de direito
não passou despercebido a Carlos Maximiliano, que assinala, a
propósito, no clássico Direito intertemporal:
‘Não há direito adquirido no tocante a instituições,
ou institutos jurídicos. Aplica-se logo, não só a lei
abolitiva, mas também a que, sem os eliminar, lhes

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

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ADI 5755 / DF

modifica essencialmente a natureza. Em nenhuma


hipótese granjeia acolhida qualquer alegação de
retroatividade, posto que, às vezes, tais institutos
envolvam certas vantagens patrimoniais que, por
equidade, o diploma ressalve ou mande indenizar’.

No conhecido voto proferido na ADI 493 destaca Moreira


Alves a lição de Mattos Peixoto sobre os três graus de
retroatividade – máxima, média e mínima:
‘Dá-se a retroatividade máxima (também chamada
restitutória, porque em geral restitui as partes ao ‘status
quo ante’), quando a lei nova ataca a coisa julgada e os
fatos consumados (transação, pagamento, prescrição). Tal
é a decretal de Alexandre III que, em ódio à usura,
mandou os credores restituírem os juros recebidos. À
mesma categoria pertence a célebre lei francesa de 2 de
novembro de 1793 (12 brumário do ano II), na parte em
que anulou e mandou refazer as partilhas já julgadas, para
os filhos naturais serem admitidos à herança dos pais,
desde 14 de julho de 1789. A carta de 10 de novembro de
1937, artigo 95, parágrafo único, previa a aplicação da
retroatividade máxima, porquanto dava ao Parlamento a
atribuição de rever decisões judiciais, sem excetuar as
passadas em julgado, que declarassem inconstitucional
uma lei.
A retroatividade é média quando a lei nova atinge os
efeitos pendentes de ato jurídico verificados antes dela,
exemplo: uma lei que limitasse a taxa de juros e fosse
aplicada aos vencidos e não pagos.
Enfim a retroatividade é mínima (também chamada
temperada ou mitigada), quando a lei nova atinge apenas
os efeitos dos atos anteriores produzidos após a data em
que ela entra em vigor. Tal é, no direito romano, a lei de
Justiniano (C. 4, 32, ‘de usuris’, 26, 2 e 27 pr.), que,
corroborando disposições legislativas anteriores, reduziu a

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ADI 5755 / DF

taxa dos juros vencidos após a data da sua


obrigatoriedade. Outro exemplo: o Decreto- Lei
n. 22.626, de 7 de abril de 1933, que reduziu a taxa de juros
e se aplicou, ‘a partir da sua data, aos contratos existentes,
inclusive aos ajuizados (art. 3º)’
A doutrina portuguesa moderna também adota a distinção
da retroatividade em três graus:
a) A retroatividade de grau máximo seria aquela em que a
lei nova nem sequer respeitasse as situações definitivamente
decididas por sentença transitada em julgado ou por qualquer
outro título equivalente (sentença arbitral homologada,
transação etc.) ou aquelas causas em que o direito de ação já
havia caducado. Ou seja, não seriam respeitadas as causae
finitae.
b) Na lição de Baptista de Machado, o segundo caso, que
podemos chamar de retroatividade média, está representado
por aquela situação que, ‘respeitando embora as causae finitae,
não se detém sequer perante efeitos jurídicos já produzidos no
passado, mas que não chegaram a ser objecto de uma decisão
judicial, nem foram cobertos ou consolidados por um título
equivalente’; nesse sentido, observa-se que tal retroatividade
viria a se verificar se, v. g., uma lei nova viesse a reduzir a taxa
legal de juros máximos e estabelecesse a sua aplicação
retroativa em termos de obrigar a restituir os próprios juros
vencidos sob a lei anterior (e em face desta perfeitamente
legais).
c) Finalmente, mencione-se a também chamada
retroatividade mínima ou normal, que respeita os efeitos de
direito já produzidos pela situação jurídica sob a lei anterior;
seria o caso se lei nova viesse a estabelecer prazo mínimo mais
longo para arrendamento rural e mandasse aplicar esse prazo
aos contratos em curso no momento do início de vigência ou,
ainda, se a lei nova viesse reduzir o máximo da taxa legal de
juros e se declarasse aplicável aos juros dos contratos de mútuo
em curso no momento do seu início de vigência, relativamente
aos juros que viessem a vencer no futuro”. (MENDES, Gilmar

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

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ADI 5755 / DF

Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito


Constitucional. 16ª ed. Saraiva: São Paulo, 2021, p. 387, 391/392
e 395, grifo nosso)

Repiso as palavras de Carlos Maximiliano: “Não há direito adquirido


no tocante a instituições, ou institutos jurídicos”, de sorte que é possível que
o instituto jurídico dos precatórios sofra modificações, sob pena de se
compreender que o rito do art. 100 da CF é cláusula imutável e que todas
as Emendas Constitucionais posteriores seriam inconstitucionais – o que
se revela inadmissível.
Especificamente sobre as alterações normativo-processuais
envolvendo processos judiciais em curso, transcrevo o magistério de
Galeno Lacerda, in verbis:

“Ensina o clássico Roubier, em sua magnífica obra Les


Conflits de Lois dans le Temps (I/371, que a base fundamental do
direito transitório reside na distinção entre o efeito retroativo e
o efeito imediato da lei. Se ela atinge facta praeterita é retroativa;
se facta pendentia, será necessário distinguir entre situações
anteriores à mudança da legislação, que não podem ser
atingidas sem retroatividade, e situações posteriores, para as
quais a lei nova, se aplicável, terá efeito imediato.
Como o processo compreende uma sequência complexa
de atos que se projetam no tempo, preordenados para um fim,
que é a sentença, deve ele ser considerado, em termos de direito
transitório, como um fato jurídico complexo e pendente, sobre o
qual a normatividade inovadora há de incidir.
A aplicação imediata será sempre a regra de direito
comum (Roubier, I/558). A retroatividade, ao contrário, não se
presume; decorre de disposição legislativa expressa, exceto no
direito penal, onde constitui princípio a retroação da lei mais
benéfica.
Estudando a aplicação da lei nova aos fatos pendentes,
distingue Roubier na situação jurídica três momentos: o da
constituição, o dos efeitos e o da extinção. O primeiro e o último
representam a dinâmica, o segundo a estática da situação.

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

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ADI 5755 / DF

Quando a constituição (ou extinção) da situação jurídica se


operou pela lei antiga, a ela será estranha a lei nova, salvo
disposição retroativa, se permitida pelo sistema jurídico.
Quando a constituição estiver pendente, a regra será a
aplicação imediata, respeitado o período de vigência da lei
anterior.
Quanto aos efeitos da situação jurídica constituída, a
norma é que a lei nova não pode, sem retroatividade, atingir os
já produzidos sob a lei anterior.
O processo não se esgota na simples e esquemática relação
jurídica angular, ou triangular, entre as partes e juiz, este como
autoridade representativa do Estado. Razão inteira assiste a
Carnelutti quando considera o processo um feixe de relações
jurídicas, onde se vinculam não só esses sujeitos principais,
senão que também todas aquelas pessoas terceiros
intervenientes, representante do Ministério Público, servidores
da Justiça, testemunhas, peritos que concorrem com sua
atividade para a obra comum da Justiça em concreto, todas elas
concomitantemente, sujeitos de direitos e deveres, em razão
dessa mesma obra. Nem é por outro motivo que forte corrente,
liderada por processualistas do tomo de Guasp e Couture,
considera o processo uma instituição, isto é, um relacionamento
jurídico complexo, polarizado por um fim comum.
Isso significa que podemos e devemos considerar a
existência de direitos adquiridos processuais, oriundos dos
próprios atos ou fatos jurídicos processuais, que emergem, em
cada processo, do dinamismo desse relacionamento jurídico
complexo. (...) Acontece que os direitos subjetivos processuais
se configuram no âmbito do direito público e, por isto, sofrem o
condicionamento resultante de grau de indisponibilidade dos
valores sobre os quais incidem.
Em regra, porém, cumpre afirmar que a lei nova não pode
atingir situações processuais já constituídas ou extintas sob o
império da lei antiga, isto é, não pode ferir os respectivos
direitos processuais adquiridos. O princípio constitucional de
amparo a esses direitos possui, aqui, também, plena e integral

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 73 de 208

ADI 5755 / DF

vigência”. (LACERDA, Galeno. O novo direito processual civil


e os feitos pendentes. Rio de Janeiro: Forense, 1974, p. 12/13)

Extrai-se das lições do processualista que podemos e devemos


considerar a existência de direitos adquiridos processuais, oriundos dos
próprios atos ou fatos jurídicos processuais, que emergem, em cada
processo, do dinamismo desse relacionamento jurídico complexo, os
quais se configuram no âmbito do direito público e, por isto, sofrem o
condicionamento resultante de grau de indisponibilidade dos valores
sobre os quais incidem.
A faticidade da norma reside na desídia de o credor do precatório ou
da requisição de pequeno valor (RPV) em não realizar o saque do
numerário – colocado à disposição em instituição financeira oficial –, em
um prazo de até 2(dois) anos.
É importante mencionar que, após o depósito em conta bancária
aberta em nome do credor, este é intimado pelo juízo da execução (ou da
fase cumprimento de sentença), por meio de seu advogado, para que
tenha ciência e promova o levantamento dos valores, visando à satisfação
da obrigação reconhecida pelo título executivo judicial transitado em
julgado.
Na situação em que o jurisdicionado vencedor efetue o saque da
quantia antes do decurso do prazo bienal, a norma não possui incidência,
de sorte que o valor permanece à sua disposição, mediante a
remuneração oficial dos depósitos judiciais (idêntica remuneração da
caderneta de poupança).
Caso o credor não tenha atuado, visando ao recebimento do que lhe
fora reconhecido judicialmente como devido, após o transcurso dos dois
anos, a norma em questão autoriza que a instituição financeira devolva o
numerário à Fazenda Pública federal.
Aqui, cumpre enaltecer que a falta de iniciativa do credor em
impulsionar o processo executivo (ou fase executiva) pode configurar
situação em seu desfavor, seja com atraso do andamento da marcha
processual, seja com o arquivamento provisório da execução (ou fase de
cumprimento de sentença).

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 74 de 208

ADI 5755 / DF

Em quaisquer dessas situações, o credor pode corrigir seu lapso e


voltar a promover o andamento processual para a satisfação de seu
crédito, todavia o devedor não pode ser penalizado com tal desídia, a
qual não concorreu.
Ora, se a União ou seus órgãos descentralizados depositam em conta
bancária aberta os valores que lhe são cobrados em feitos executivos e o
credor mantém-se inerte, sem efetuar o saque daqueles no prazo de mais
de dois anos, é de se presumir – assim como no âmbito processual – sua
desídia, constatação a qual não lhe socorre.
Primeiro, porque a remuneração dessas contas judiciais é
extremamente desvantajosa para o credor, eis que incide apenas a TR
(taxa referencial) do Banco Central do Brasil (Bacen) como índice de
correção monetária, ao invés do IPCA-E – como reconhecido por esta
Corte nas ADIs 4.357, redator p/ acórdão Min. Luiz Fux, Pleno, DJe
26.9.2014, e 4.425, redator p/ acórdão Min. Luiz Fux, Pleno, DJe
19.12.2013, com reforço do item 2 da tese fixada no tema 810 da
sistemática da repercussão geral. (RE 870.947, Rel. Min. Luiz Fux, Pleno,
DJe 20.11.2017) – e pela Selic, no período posterior à Emenda
Constitucional 113/2021.
Não há razão financeira (suposta alegação de vislumbrar boa
rentabilidade para o credor), tampouco jurídica para se interpretar que a
União estaria invadindo esfera de atribuição do Poder Judiciário ou
desrespeitando a coisa julgada, a exemplo da situação descrita na ADI
1.933, na qual o STF manteve a possibilidade de levantamento de
numerário pela União em depósitos judiciais, tal como disciplinado pela
Lei 9.703/1998. A conferir:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI


FEDERAL N. 9.703/98, QUE DISPÕE SOBRE DEPÓSITOS
JUDICIAIS E EXTRAJUDICIAIS DE VALORES REFERENTES A
TRIBUTOS E CONTRIBUIÇÕES FEDERAIS. MEDIDA
LIMINAR ANTERIORMENTE CONCEDIDA. ALEGAÇÃO DE
OFENSA AO DISPOSTO NOS ARTIGOS 2º, 5º, CAPUT E
INCISO LIV, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. NÃO

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 75 de 208

ADI 5755 / DF

CARACTERIZAÇÃO. AÇÃO DIRETA JULGADA


IMPROCEDENTE. 1. Ausência de violação do princípio da
harmonia entre os poderes. A recepção e a administração dos
depósitos judiciais não consubstanciariam atividade
jurisdicional. 2. Ausência de violação do princípio do devido
processo legal. O levantamento dos depósitos judiciais após o
trânsito em julgado da decisão não inova no ordenamento. 3.
Esta Corte afirmou anteriormente que o ato normativo que
dispões sobre depósitos judiciais e extrajudiciais de tributos não
caracteriza confisco ou empréstimo compulsório. ADI/MC n.
2.214. 4. O depósito judicial consubstancia faculdade do
contribuinte. Não se confunde com o empréstimo compulsório.
5. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada improcedente”.
(ADI 1.933, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, DJe 3.9.2010)

É de bom alvitre destacar que apenas o saque pelo credor equivale à


satisfação da dívida, com a consequente extinção do processo executivo,
na forma do art. 924, II, do CPC, com a norma de extensão do art. 513 do
CPC para a fase de cumprimento de sentença, a saber, respectivamente:

“Art. 513. O cumprimento da sentença será feito segundo


as regras deste Título, observando-se, no que couber e conforme
a natureza da obrigação, o disposto no Livro II da Parte
Especial deste Código.
(...)
Art. 924. Extingue-se a execução quando:
(...)
II - a obrigação for satisfeita;
(...)
Art. 925. A extinção só produz efeito quando declarada
por sentença”.

Ou seja, o depósito judicial em conta aberta em nome do credor é


uma etapa necessária para que ocorra pagamento efetivo da dívida da
Fazenda Pública, que somente ocorre com o alvará de levantamento e o

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 76 de 208

ADI 5755 / DF

saque ou transferência daquele do numerário correspondente. Todavia, o


depósito não se confunde com a quitação.
Seguindo essa premissa, o ato de o credor permanecer inerte pelo
prazo de 2 (dois) anos transparece seu desinteresse em prosseguir com a
execução, sem que tal circunstância interfira no fundo do direito, cuja
cobrança pode ser novamente acionada por aquele, desde que não
superado o prazo prescricional.
No âmbito processual, o desinteresse em prosseguir com a execução
pode equivaler ao arquivamento provisório desta. Não poderia ser
diferente na fase administrativa de pagamento do precatório ou da RPV.
Não se pode descuidar que a própria Lei 13.463/2017, ora
questionada, prevê que o credor será intimado pelo juiz da execução,
após a instituição financeira comunicar ao Presidente do Tribunal que
expediu o precatório. Ou seja, ele terá a possibilidade de solicitar novo
ofício requisitório, o qual manterá a cronologia do primitivo, além de
assegurar a remuneração de todo o período. Senão vejamos:

“Art. 2º. Omissis.


(...)
§ 3º. Será dada ciência do cancelamento de que trata o
caput deste artigo ao Presidente do Tribunal respectivo.
§ 4º. O Presidente do Tribunal, após a ciência de que trata
o § 3º deste artigo, comunicará o fato ao juízo da execução, que
notificará o credor.
Art. 3º. Cancelado o precatório ou a RPV, poderá ser
expedido novo ofício requisitório, a requerimento do credor.
Parágrafo único. O novo precatório ou a nova RPV
conservará a ordem cronológica do requisitório anterior e a
remuneração correspondente a todo o período”. (grifo nosso)

Dito de outra forma: o credor não será onerado ou prejudicado


financeiramente (pelo contrário, será beneficiado, eis que seu crédito
voltará a ser corrigido, ao invés da TR (taxa referencial), pelo IPCA-E e,
no período posterior à EC 113/2021, pela Selic, além de aguardar mais
tempo para receber o que lhe é devido, fato este decorrente de sua

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 77 de 208

ADI 5755 / DF

própria desídia, haja vista que não realizou o saque após o numerário
ficar à sua disposição por dois anos, motivo pelo qual não vislumbro
qualquer desproporcionalidade na imposição legislativa.
Isso porque, diviso que a medida legal apresenta-se: (i) necessária
para se evitar a perpetuação da desídia do credor que, apesar de
comunicado do depósito, quedou-se inerte por prazo razoável; (ii)
adequada para se solucionar o impasse de manter depósito de numerário
em conta sem a remuneração que recomponha o processo inflacionário,
além de reverter dispêndio de recursos públicos, em favor de quem não
demonstrou interesse em efetuar o saque do dinheiro, que se encontra em
conta judicial aberta para a finalidade de promover a quitação de dívida
reconhecida judicialmente, após prazo razoável (dois anos); e (iii)
proporcional em sentido estrito, ao estabelecer prazo para que o saque
ocorra, não ofendendo o direito de propriedade, tampouco a coisa
julgada, haja vista que o credor poderá requerer novo pagamento, com a
expedição de nova requisição, mantendo a ordem daquela primeira e
recebendo a remuneração mais benéfica durante todo o período, sem
qualquer perda do poder aquisitivo.
Consequentemente, apesar de ocorrer o atraso na quitação, o credor
não ostenta qualquer violação ao seu patrimônio jurídico do direito
adquirido, da coisa julgada ou do ato jurídico perfeito, com todas as
vênias, muito menos do direito à propriedade, diante da reposição da
inflação no novo pedido requisitório e presente sua situação de inércia
prejudicial a todos os atores processuais.
Concordo com a posição do vistor, Min. Roberto Barroso, no sentido
de que a norma tela necessita ser conformada com o devido processo
legal (art. 5º, LV, da CF), consubstanciado no contraditório e na ampla
defesa, oportunizando a intimação do credor antes do cancelamento do
precatório ou da RPV e do estorno do numerário à Fazenda Pública
devedora, possibilitando-o comprovar eventuais entraves no saque e
impedir a devolução.
Divirjo de Sua Excelência tão somente na parte que condiciona o
cancelamento do precatório (ou da RPV) e a transferência de recursos

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 78 de 208

ADI 5755 / DF

para a conta única do Tesouro Nacional à ausência de mora da União no


pagamento de tais requisições, diante da profunda mudança realizada
pelas Emendas Constitucionais 113 e 114/2021, no fluxo de pagamento
das dívidas federais reconhecidas judicialmente.
Sinteticamente, coexistiram, pelo menos, 6 (seis) formas de
pagamento das dívidas vencidas da Fazenda Pública reconhecidas em
processo transitado em julgado (pelo menos até 2010): a regra geral do
art. 100 da CF; as verbas alimentícias; as verbas alimentícias de titulares
com 60 (sessenta) anos de idade ou mais; as requisições de pequeno valor
(RPV, incluindo verbas alimentícias até o limite legal); as parcelas do art.
33 do ADCT (temporalmente provisória); e as dívidas descritas no art. 78
do ADCT (até a suspensão cautelar da vigência pelo STF nas ADIs 2.356 e
2.362, em 2010), cada uma com suas especificidades.
As ordens de pagamento (com lista própria) das RPVs são
destinadas a pagamento de quantias de pequeno valor: no caso da União,
equivalente a sessenta salários mínimos; e nos Estados, Distrito Federal e
Municípios, provisoriamente correspondem a quarenta e trinta salários
mínimos, respectivamente, até que haja a escolha de cada Ente
Federativo, observadas as balizas contidas no art. 87 do ADCT c/c § 4º do
art. 100 da CF.
Em relação aos créditos de natureza alimentícia que superem os
limites de pagamento por RPV, existe a fila própria para pagamento
daqueles que se qualificam como tal ordem preferencial de pagamento,
cuja conceituação está prevista no § 1º do art. 100 da CF (à exceção dos
precatórios alimentares de titulares com sessenta anos ou mais):

“§ 1º. Os débitos de natureza alimentícia compreendem


aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos,
pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e
indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em
responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial
transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre
todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º
deste artigo”.

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 79 de 208

ADI 5755 / DF

Vê-se que, no regime ordinário de pagamento dos precatórios do art.


100 da CF, existe um tripé a ser observado para o pagamento das dívidas
da Fazenda Pública reconhecidas com trânsito em julgado: 1)
“exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios”, isto é,
seguindo a ordem de precedência e de prioridades constitucionais
(dívidas de pequeno valor, pagamentos superpreferenciais, créditos
alimentares etc.); 2) “à conta dos créditos respectivos”, ou seja, de acordo
com o fluxo de liberação que for realizado pelo devedor; e 3)
obrigatoriedade de inclusão no orçamento do ano subsequente.
Hodiernamente, no âmbito federal, a Emenda Constitucional
94/2016 e suas alterações subsequentes (Emendas Constitucionais 99/2017,
113 e 114/2021) resolveram estabelecer que, a par das formas de
pagamento já existentes (listas de pagamentos e preferências entre os
credores), haveria uma sistemática de o Poder Público destinar recursos
para pagamento de suas dívidas pretéritas e futuras, com base na receita
corrente líquida e no teto de despesas estabelecido no art. 107-A do
ADCT, além possibilitar a realização de compensação entre o credor e o
devedor, acordos, entre outras soluções, a qualquer tempo.
Tal situação está prevista nos §11, 17 a 22 do art. 100 da CF, in
litteris:

“ § 11. É facultada ao credor, conforme estabelecido em lei


do ente federativo devedor, com auto aplicabilidade para a
União, a oferta de créditos líquidos e certos que originalmente
lhe são próprios ou adquiridos de terceiros reconhecidos pelo
ente federativo ou por decisão judicial transitada em julgado
para:
I - quitação de débitos parcelados ou débitos inscritos em
dívida ativa do ente federativo devedor, inclusive em transação
resolutiva de litígio, e, subsidiariamente, débitos com a
administração autárquica e fundacional do mesmo ente;
II - compra de imóveis públicos de propriedade do mesmo
ente disponibilizados para venda;
III - pagamento de outorga de delegações de serviços

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 80 de 208

ADI 5755 / DF

públicos e demais espécies de concessão negocial promovidas


pelo mesmo ente;
IV - aquisição, inclusive minoritária, de participação
societária, disponibilizada para venda, do respectivo ente
federativo; ou
V - compra de direitos, disponibilizados para cessão, do
respectivo ente federativo, inclusive, no caso da União, da
antecipação de valores a serem recebidos a título do excedente
em óleo em contratos de partilha de petróleo.
(...)
§ 17. A União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios aferirão mensalmente, em base anual, o
comprometimento de suas respectivas receitas correntes
líquidas com o pagamento de precatórios e obrigações de
pequeno valor.
§ 18. Entende-se como receita corrente líquida, para os fins
de que trata o § 17, o somatório das receitas tributárias,
patrimoniais, industriais, agropecuárias, de contribuições e de
serviços, de transferências correntes e outras receitas correntes,
incluindo as oriundas do § 1º do art. 20 da Constituição Federal,
verificado no período compreendido pelo segundo mês
imediatamente anterior ao de referência e os 11 (onze) meses
precedentes, excluídas as duplicidades, e deduzidas:
I - na União, as parcelas entregues aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios por determinação constitucional;
II - nos Estados, as parcelas entregues aos Municípios por
determinação constitucional;
III - na União, nos Estados, no Distrito Federal e nos
Municípios, a contribuição dos servidores para custeio de seu
sistema de previdência e assistência social e as receitas
provenientes da compensação financeira referida no § 9º do art.
201 da Constituição Federal.
§ 19. Caso o montante total de débitos decorrentes de
condenações judiciais em precatórios e obrigações de pequeno
valor, em período de 12 (doze) meses, ultrapasse a média do
comprometimento percentual da receita corrente líquida nos 5

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 81 de 208

ADI 5755 / DF

(cinco) anos imediatamente anteriores, a parcela que exceder


esse percentual poderá ser financiada, excetuada dos limites de
endividamento de que tratam os incisos VI e VII do art. 52 da
Constituição Federal e de quaisquer outros limites de
endividamento previstos, não se aplicando a esse financiamento
a vedação de vinculação de receita prevista no inciso IV do art.
167 da Constituição Federal.
§ 20. Caso haja precatório com valor superior a 15%
(quinze por cento) do montante dos precatórios apresentados
nos termos do § 5º deste artigo, 15% (quinze por cento) do valor
deste precatório serão pagos até o final do exercício seguinte e o
restante em parcelas iguais nos cinco exercícios subsequentes,
acrescidas de juros de mora e correção monetária, ou mediante
acordos diretos, perante Juízos Auxiliares de Conciliação de
Precatórios, com redução máxima de 40% (quarenta por cento)
do valor do crédito atualizado, desde que em relação ao crédito
não penda recurso ou defesa judicial e que sejam observados os
requisitos definidos na regulamentação editada pelo ente
federado.
§ 21. Ficam a União e os demais entes federativos, nos
montantes que lhes são próprios, desde que aceito por ambas as
partes, autorizados a utilizar valores objeto de sentenças
transitadas em julgado devidos a pessoa jurídica de direito
público para amortizar dívidas, vencidas ou vincendas:
I - nos contratos de refinanciamento cujos créditos sejam
detidos pelo ente federativo que figure como devedor na
sentença de que trata o caput deste artigo;
II - nos contratos em que houve prestação de garantia a
outro ente federativo;
III - nos parcelamentos de tributos ou de contribuições
sociais; e
IV - nas obrigações decorrentes do descumprimento de
prestação de contas ou de desvio de recursos.
§ 22. A amortização de que trata o § 21 deste artigo:
I - nas obrigações vencidas, será imputada primeiramente
às parcelas mais antigas;

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 82 de 208

ADI 5755 / DF

II - nas obrigações vincendas, reduzirá uniformemente o


valor de cada parcela devida, mantida a duração original do
respectivo contrato ou parcelamento”.

Igualmente, foi instituído subteto de gastos orçamentários, no


âmbito federal, para quitação de dívidas reconhecidas judicialmente, com
trânsito em julgado, na forma do art. 107-A do ADCT, in verbis:

“Art. 107-A. Até o fim de 2026, fica estabelecido, para cada


exercício financeiro, limite para alocação na proposta
orçamentária das despesas com pagamentos em virtude de
sentença judiciária de que trata o art. 100 da Constituição
Federal, equivalente ao valor da despesa paga no exercício de
2016, incluídos os restos a pagar pagos, corrigido na forma do §
1º do art. 107 deste Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias, devendo o espaço fiscal decorrente da diferença
entre o valor dos precatórios expedidos e o respectivo limite ser
destinado ao programa previsto no parágrafo único do art. 6º e
à seguridade social, nos termos do art. 194, ambos da
Constituição Federal, a ser calculado da seguinte forma:
I - no exercício de 2022, o espaço fiscal decorrente da
diferença entre o valor dos precatórios expedidos e o limite
estabelecido no caput deste artigo deverá ser destinado ao
programa previsto no parágrafo único do art. 6º e à seguridade
social, nos termos do art. 194, ambos da Constituição Federal;
II - no exercício de 2023, pela diferença entre o total de
precatórios expedidos entre 2 de julho de 2021 e 2 de abril de
2022 e o limite de que trata o caput deste artigo válido para o
exercício de 2023; e
III - nos exercícios de 2024 a 2026, pela diferença entre o
total de precatórios expedidos entre 3 de abril de dois anos
anteriores e 2 de abril do ano anterior ao exercício e o limite de
que trata o caput deste artigo válido para o mesmo exercício.
§ 1º. O limite para o pagamento de precatórios
corresponderá, em cada exercício, ao limite previsto no caput
deste artigo, reduzido da projeção para a despesa com o

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 83 de 208

ADI 5755 / DF

pagamento de requisições de pequeno valor para o mesmo


exercício, que terão prioridade no pagamento.
§ 2º. Os precatórios que não forem pagos em razão do
previsto neste artigo terão prioridade para pagamento em
exercícios seguintes, observada a ordem cronológica e o
disposto no § 8º deste artigo.
§ 3º. É facultado ao credor de precatório que não tenha
sido pago em razão do disposto neste artigo, além das hipóteses
previstas no § 11 do art. 100 da Constituição Federal e sem
prejuízo dos procedimentos previstos nos §§ 9º e 21 do referido
artigo, optar pelo recebimento, mediante acordos diretos
perante Juízos Auxiliares de Conciliação de Pagamento de
Condenações Judiciais contra a Fazenda Pública Federal, em
parcela única, até o final do exercício seguinte, com renúncia de
40% (quarenta por cento) do valor desse crédito.
§ 4º. O Conselho Nacional de Justiça regulamentará a
atuação dos Presidentes dos Tribunais competentes para o
cumprimento deste artigo.
§ 5º. Não se incluem no limite estabelecido neste artigo as
despesas para fins de cumprimento do disposto nos §§ 11, 20 e
21 do art. 100 da Constituição Federal e no § 3º deste artigo,
bem como a atualização monetária dos precatórios inscritos no
exercício.
§ 6º. Não se incluem nos limites estabelecidos no art. 107
deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias o
previsto nos §§ 11, 20 e 21 do art. 100 da Constituição Federal e
no § 3º deste artigo.
§ 7º. Na situação prevista no § 3º deste artigo, para os
precatórios não incluídos na proposta orçamentária de 2022, os
valores necessários à sua quitação serão providenciados pela
abertura de créditos adicionais durante o exercício de 2022.
§ 8º. Os pagamentos em virtude de sentença judiciária de
que trata o art. 100 da Constituição Federal serão realizados na
seguinte ordem:
I - obrigações definidas em lei como de pequeno valor,
previstas no § 3º do art. 100 da Constituição Federal;

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 84 de 208

ADI 5755 / DF

II - precatórios de natureza alimentícia cujos titulares,


originários ou por sucessão hereditária, tenham no mínimo 60
(sessenta) anos de idade, ou sejam portadores de doença grave
ou pessoas com deficiência, assim definidos na forma da lei, até
o valor equivalente ao triplo do montante fixado em lei como
obrigação de pequeno valor;
III - demais precatórios de natureza alimentícia até o valor
equivalente ao triplo do montante fixado em lei como obrigação
de pequeno valor;
IV - demais precatórios de natureza alimentícia além do
valor previsto no inciso III deste parágrafo;
V - demais precatórios”.

A situação constitucional atual acerca do ritmo de quitação dos


precatórios federais não deixa de ser uma espécie de alongamento do
pagamento, no que se denomina de postergação de adimplemento para
observar o trinômio: especialidade da lista; anterioridade da inclusão ; e
fluxo de pagamento de acordo com capacidade financeiro-arrecadatória
do Ente devedor – observada a receita corrente líquida (RCL) e o limite
de despesa de gastos.
Presente esse cenário de drástica mudança no fluxo de pagamentos
de dívidas federais, reconhecidas em processo judicial com trânsito em
julgado, operadas pelas Emendas Constitucionais 113 e 114/2021, aliada à
multiplicidade de vias e possibilidades que se descortinam de pagamento
(compensação, cessão, acordo etc.), sem que seja possível aferir essa
regularidade de quitação dos precatórios e RPVs de forma clara,
considero temerário condicionar que “a transferência de recursos para a
Conta Única do Tesouro Nacional pressuponha a ausência de mora da União no
pagamento de tais requisições”, razão pela qual divirjo, unicamente no
ponto, com a proposta do Min. Roberto Barroso, acompanhando-o no
restante da fundamentação de seu voto-vista.

3) Voto

Ante o exposto, voto pela procedência, em parte, dos pedidos,

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 85 de 208

ADI 5755 / DF

procedendo à interpretação conforme à Constituição do art. 2º, caput e §


1º, da Lei 13.463/2017 para que o cancelamento da ordem de pagamento
(precatório ou RPV), com o estorno do numerário à Fazenda Pública
devedora, somente ocorra após a obrigatória intimação do credor para se
manifestar, a ser realizada pelo juízo da execução.
É como voto.

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Antecipação ao Voto

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30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

ANTECIPAÇÃO AO VOTO

O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO - Boa tarde,


Presidente! Boa tarde, Ministra Rosa, Ministra Cármen, todos os Colegas,
Ministro Gilmar, que acabou de votar, Senhora Secretária, Senhor
Representante do Ministério Público.
Eu só queria compreender e deixar pontuada a divergência menor
com o voto do Ministro Gilmar. Ambos estamos de acordo com a
validade da norma e com a exigência apenas do devido processo legal
para intimação pessoal do credor que se tenha omitido. Acho que essa é a
parte mais importante dessa matéria, pedindo todas as vênias à eminente
Ministra Rosa Weber.
A divergência que o Ministro Gilmar suscita é no tocante à
transferência dessa verba para a conta do Tesouro, prevista na lei, com o
que também estou de acordo, salvo - e essa foi a exceção que abri - se a
União estiver em mora com pagamentos, porque, então, esse dinheiro do
precatório que não foi levantado, em lugar de ir para a conta do Tesouro,
continuaria à disposição na conta do Tribunal de Justiça para pagamentos
de outros precatórios que estejam na fila, mantendo, portanto, a
destinação da verba. Estou pontuando aqui a pequena divergência para
os Colegas que ainda vão votar.
Concordo com a transferência para o Tesouro, salvo se a União, o
que, na verdade, é até menos comum, estiver em mora. Se ela estiver em
mora, esse dinheiro já destinado ao pagamento de precatórios continuaria
à disposição do Tribunal para pagamentos de outros precatórios na fila.
Acho que é essa a pequena divergência ou pequena diferença que
nos separa, a mim e ao Ministro Gilmar, nessa questão.
Presidente, só queria deixar clara essa matéria para os Colegas que
vão votar posteriormente.

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Voto - MIN. ROBERTO BARROSO

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30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

VOTO:

O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO:

Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E


FINANCEIRO. AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE. CANCELAMENTO
DE PRECATÓRIOS E RPVS POR INÉRCIA DO
CREDOR.
1. Ação direta contra o art. 2º, caput e §1º, da
Lei federal nº 13.463/2017, que determina o
cancelamento de precatórios e requisições
de pequeno valor (RPVs) expedidos e
depositados sem levantamento pelo credor
há pelo menos dois anos em instituição
financeira oficial.
2. Ausência de inconstitucionalidade
formal. O precatório é espécie de despesa
pública, inserindo-se no campo do direito
financeiro, matéria de competência
concorrente entre os entes federados (art.
24, I, CF/1988). A Constituição não exaure a
disciplina do sistema constitucional de
precatórios, sendo possível que a lei crie
novas regras, desde que, evidentemente,
não vulnere preceitos constitucionais.
3. Ausência de ofensa à segurança jurídica, à
coisa julgada e ao direito de propriedade.
Entre o depósito e o momento
imediatamente anterior ao saque dos
valores destinados ao pagamento da

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Voto - MIN. ROBERTO BARROSO

Inteiro Teor do Acórdão - Página 88 de 208

ADI 5755 / DF

requisição, o credor é mero beneficiário


dessas quantias, e não seu efetivo titular.
Além disso, em caso de cancelamento da
ordem de pagamento, ele pode requerer, a
qualquer tempo, a expedição de novo ofício
requisitório para o levantamento dos
valores. Em tais hipóteses, é assegurada,
além da remuneração do período, a posição
do requisitório que havia sido cancelado na
ordem cronológica mantida pelo Tribunal.
4. Inexistência de afronta à
proporcionalidade. O prazo bienal fixado
em lei não é manifestamente irrazoável,
devendo o Judiciário, nesse caso, prestar
deferência à liberdade de conformação do
legislador. O ordenamento admite
modalidades extintivas mais gravosas, tais
como a prescrição da pretensão executória.
No presente caso, o direito subjetivo do
credor se mantém hígido mesmo após o
cancelamento.
5. Dada a crise econômica e fiscal
vivenciada pelo país, agravada pela
situação calamitosa de combate à pandemia
da COVID-19, não seria razoável manter
bilhões de reais em verbas públicas
paralisadas ad aeternum por inércia do
credor. Necessidade de observância do
princípio da eficiência na gestão de recursos
públicos escassos.
6. Sem embargo, impõe-se a intimação
pessoal do beneficiário, sob pena de ofensa
aos princípios do contraditório e da ampla

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Voto - MIN. ROBERTO BARROSO

Inteiro Teor do Acórdão - Página 89 de 208

ADI 5755 / DF

defesa. Salvo em situações excepcionais, as


partes devem ter oportunidade de
influenciar previamente a formação do
resultado do processo e não podem ser
afetadas por decisões-surpresa.
7. Necessidade de assegurar a destinação
originalmente prevista na lei orçamentária
aos recursos públicos depositados pela
União (art. 165, § 10, CF). Valores que só
podem ser transferidos à Conta Única do
Tesouro Nacional se o ente federado estiver
em dia com o pagamento das requisições
judiciais.
8. Possibilidade de interpretação conforme a
Constituição para preservar a validade da
lei questionada.
9. Procedência parcial do pedido,
conferindo-se interpretação conforme a
Constituição ao art. 2º, caput e §1º, da Lei nº
13.463/2017, para que (i) o procedimento de
cancelamento de precatório e requisição de
pequeno valor nele previsto seja precedido
de intimação pessoal do credor, pelo juízo
da execução (aplicação, por analogia, do art.
485, II e III e § 1º, do CPC); e (ii) a
transferência de recursos para a Conta
Única do Tesouro Nacional pressuponha a
ausência de mora da União no pagamento
de tais requisições.

1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade proposta


pelo Partido Democrático Trabalhista – PDT em face do art. 2º, caput e §1º,

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ADI 5755 / DF

da Lei nº 13.463/2017, que determina o cancelamento de precatórios e


requisições de pequeno valor (RPVs) expedidos e depositados sem
levantamento pelo credor há pelo menos dois anos em instituição
financeira oficial. Eis o teor do dispositivo impugnado:

Art. 2º Ficam cancelados os precatórios e as RPV federais


expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo
credor e estejam depositados há mais de dois anos em
instituição financeira oficial.
§ 1º O cancelamento de que trata o caput deste artigo será
operacionalizado mensalmente pela instituição financeira
oficial depositária, mediante a transferência dos valores
depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional.

2. O autor suscita inconstitucionalidade formal e material


desse dispositivo em face dos arts. 2º; 5º, caput, XXXV e XXXVI; e 100,
caput, §§ 5º, 6º e 7º, todos da Constituição Federal de 1988. Na sua
perspectiva, o cancelamento automático dos precatórios e das RPVs
invade a competência do Poder Judiciário para disciplinar a gestão
administrativa dos requisitórios e viola os princípios da separação dos
poderes, da segurança jurídica, da inafastabilidade da jurisdição e da
igualdade, além de ferir a garantia constitucional da proteção à coisa
julgada. Desse modo, requer a declaração de inconstitucionalidade da
norma questionada. Por eventualidade, requer seja conferida
interpretação conforme a Constituição para que o cancelamento seja
limitado aos credores comprovadamente inertes.

3. Após a adoção do rito dos arts. 10 e seguintes da Lei nº


9.868/1999 pela Min. Rosa Weber, relatora da ADI, a Presidência da
República manifestou-se pela constitucionalidade total da norma
impugnada. Quanto ao aspecto formal, afirma que o legislador ordinário
é competente para regulamentar a sistemática dos precatórios, desde que
não contrarie a moldura posta pela Constituição. Quanto ao aspecto
material, a Presidência salienta que a Lei nº 13.463/2017 configura opção

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Voto - MIN. ROBERTO BARROSO

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ADI 5755 / DF

legislativa legítima do Congresso Nacional, realizada nos limites do


âmbito de proteção da garantia constitucional do regime de precatórios.
Por fim, alega não haver violação aos princípios da isonomia, da
segurança jurídica ou da proteção à coisa julgada, pois não há a extinção
definitiva do direito ao crédito assegurado pela sentença judicial,
bastando “requerimento do credor para que o precatório seja novamente
expedido, garantindo-se a ordem cronológica anterior e a remuneração de
todo período”.

4. A Câmara dos Deputados, por sua vez, ressalta que o


projeto de lei que deu origem ao diploma normativo impugnado foi
processado nos estritos trâmites constitucionais e regimentais aplicáveis à
espécie. No mesmo sentido, o Senado Federal defende a
constitucionalidade formal e material do dispositivo questionado e
sustenta subsistir o direito subjetivo do credor em caso de cancelamento,
porquanto a legislação assegura a expedição de novo precatório ou RPV
na hipótese de novo pedido por parte do titular do crédito. Sendo assim,
não vislumbra contrariedade à Constituição, especialmente pelo cenário
de escassez de recursos públicos.

5. A Advocacia-Geral da União, em sua manifestação, aduziu


que a lei, em ponderação legislativa legítima, tão somente privilegiou o
princípio da eficiência na gestão de recursos públicos escassos, visto que
o impacto financeiro estimado supera R$ 8,6 bilhões de reais paralisados
em instituições financeiras oficiais. Ademais, a AGU frisa a proteção ao
direito subjetivo do credor pela lei federal, pois basta ao titular do crédito
requerer a expedição de novo requisitório, que conservará a ordem
cronológica anterior e a remuneração correspondente a todo o período.

6. A Procuradoria-Geral da República apresentou parecer


pela procedência parcial do pedido, com a seguinte ementa:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.


PRECATÓRIO. ART. 2.o DA LEI 13.463/2017.

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Voto - MIN. ROBERTO BARROSO

Inteiro Teor do Acórdão - Página 92 de 208

ADI 5755 / DF

CANCELAMENTO DE PRECATÓRIOS E REQUISIÇÕES DE


PEQUENO VALOR NÃO LEVANTADOS E DEPOSITADOS
HÁ MAIS DE DOIS ANOS. INCONSTITUCIONALIDADE
FORMAL. ATRIBUIÇÃO DO JUDICIÁRIO.
INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. OFENSA À
SEPARAÇÃO DE PODERES, AO REGIME CONSTITUCIONAL
DOS PRECATÓRIOS, À COISA JULGADA MATERIAL E À
EFETIVIDADE DE JURISDIÇÃO.
1. A gestão dos recursos destinados ao cumprimento das
condenações da Fazenda Pública é realizada pelo Presidente do
Tribunal, de maneira que cabe ao Judiciário a regulamentação
da matéria, a fim de dar cumprimento aos ditames
constitucionais (CF, art. 100-§§6.º e 7.º).
2. A definição de prazo para o levantamento de precatório,
sob pena de seu cancelamento, configura restrição ao exercício
do direito de precatório que não encontra previsão na ordem
constitucional, de maneira que afronta a sistemática do art. 100
da Constituição.
3. O cancelamento das requisições por determinação de lei
federal de iniciativa do Presidente da República,
independentemente de determinação do juiz da execução e do
Presidente do Tribunal competente não se coaduna com a
sistemática constitucional da matéria (CF, art. 100-§§6.º e 7.º) e
com o princípio da separação dos Poderes (CF, art. 2.º).
4. O art. 2.º da Lei 13.463/2017 ofende a coisa julgada
material (CF, art. 5.º-XXXVI) e embaraça a efetividade da
jurisdição (CF, art. 5.º-XXXV), porque torna indisponível o valor
devido pela Fazenda Pública reconhecido por decisão judicial
transitada em julgado, impedindo o acesso do cidadão a direito
consignado por coisa julgada.
5. Parecer pela procedência parcial do pedido.

7. Foram deferidos os pedidos de admissão no feito, na


qualidade de amici curiae, das seguintes entidades: (i) a Associação
Nacional dos Procuradores e Advogados Públicos Federais –ANPREV;
(ii) a Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnicos-Administrativos

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Voto - MIN. ROBERTO BARROSO

Inteiro Teor do Acórdão - Página 93 de 208

ADI 5755 / DF

em Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil (FASUBRA-


SINDICAL); (iii) a Federação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores
em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social (FENASPS); (iv) a
Federação Nacional dos Policiais Federais - FENAPEF; (v) a Associação
Nacional dos Servidores da Previdência e da Seguridade Social –
ANASPS; (vi) a Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público
Federal – CONDSEF; (vii) a Federação dos Trabalhadores no Serviço
Público Federal – FENADSEF; (viii) o Sindicato Nacional dos Servidores
Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica – SINASEFE
NACIONAL; (ix) a Associação dos Advogados de São Paulo – AASP; (x) a
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social –
CNTSS/CUT; (xi) a Federação Nacional dos Servidores da Justiça Federal
e do Ministério Público da União – FENAJUFE; (xii) o Sindicato dos
Trabalhadores no Poder Judiciário Federal em Santa Catarina –
SINTRAJUSC; (xiii) o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil – CFOAB e (xiv) o Sindicato dos Trabalhadores Federais da Saúde,
Trabalho e Previdência no Estado do Rio Grande do Sul - SINDISREV/RS.

8. A Ministra Relatora converteu a apreciação do pedido


cautelar em julgamento definitivo de mérito, afastou a alegada
inconstitucionalidade formal e votou pela procedência do pedido de
declaração de inconstitucionalidade, por entender configurada a violação
ao contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV, CF/1988); ao devido processo
legal (art. 5º, LIV , CF/1988); à separação de poderes (art. 2º, CF/1988); à
proporcionalidade (art. 5º, § 2º , CF/1988); à segurança jurídica e coisa
julgada (art. 5º, XXXVI, CF/1988); à inafastabilidade da jurisdição (art. 5º,
XXXV, CF/1988); e ao direito de propriedade (art. 5º, XXII, CF/1988).

9. É o breve relatório.

10. Afasto, inicialmente, a inconstitucionalidade formal


suscitada pelo autor, nos moldes defendidos pela relatora.

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11. O precatório é a requisição formal de pagamento de


determinada quantia, devida pela Fazenda Pública, em virtude de
condenação judicial, criado em razão da impenhorabilidade dos bens
públicos e da necessária observância do princípio da isonomia entre os
credores. Tal sistema de pagamentos foi confiado ao Poder Judiciário, na
pessoa do Presidente de cada Tribunal[1]. Por se tratar de um ato de
requisição formal de pagamento ao Poder Executivo, é uma atividade de
caráter administrativo, regulamentada pelo Conselho Nacional de Justiça
[2] e, em parte, pelos regimentos internos de cada tribunal, com vistas a
detalhar a gestão dos precatórios e respectivos procedimentos
operacionais no âmbito do Poder Judiciário. Essa regulamentação
administrativa não se confunde com o poder normativo do Parlamento de
regular aspectos materiais do regime de precatórios.

12. Esse sistema, por impor despesa pública ao Estado, qual


seja, a “aplicação de certa quantia, em dinheiro, por parte da autoridade
ou agente público competente dentro de uma autorização legislativa, para
execução de fim a cargo do governo”[3], é matéria de direito financeiro.
Insere-se, portanto, na competência concorrente dos entes federativos
(art. 24, I, CF/1988). A Constituição não exaure a disciplina do sistema
constitucional de precatórios, sendo possível que a lei crie novas regras,
desde que, evidentemente, não vulnere preceitos constitucionais. O
próprio art. 100 da Constituição explicita hipóteses de regulamentação
legal do regime constitucional de precatórios[4]. Não há, portanto,
vedação absoluta à disciplina legal de precatórios.

13. Quanto ao aspecto material, rejeito, igualmente, a alegada


inconstitucionalidade por ofensa aos princípios da segurança jurídica, da
separação de poderes e da proporcionalidade, além das normas
constitucionais de proteção ao direito de propriedade e à coisa julgada.

14. Em primeiro lugar, não há ofensa ao princípio da


segurança jurídica, à coisa julgada e ao direito de propriedade. Após a

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expedição do precatório e a sua inclusão na lista de credores pelo


Presidente do Tribunal, o valor é depositado em conta bancária
individualizada junto à instituição financeira, conforme o art. 31, caput e
§1º, da Resolução nº 303/2009 do CNJ[5]. Entre o depósito e o momento
imediatamente anterior ao saque dos valores destinados ao pagamento da
requisição, o credor é mero beneficiário dessas quantias, e não seu efetivo
titular. Desse modo, é plenamente possível o cancelamento do pagamento
até o momento do efetivo saque, como há muito ocorre por meio de
decisões judiciais nas quais se discute a titularidade do crédito e nos
termos da própria regulamentação do CNJ[6]. Como bem explicado nas
informações prestadas pela Advocacia-Geral da União – AGU, que aqui
transcrevo:

“no intervalo de tempo existente entre o deposito e o


saque, as verbas continuam sendo publicas e, nessas situaçoes,
o patrimonio da Fazenda Publica é confiado à instituiçao
bancaria por meio de contrato de deposito atipico, em que o
depositante (Fazenda Publica) entrega o bem ao depositario
(banco oficial) para que este o transfira a um terceiro
(beneficiario da açao judicial), que nao foi parte no negocio
juridico "deposito". O deposito realizado permanece mantido,
exclusivamente, entre a Uniao e a instituiçao financeira. (...)
Ainda sobre esse ponto, é pertinente deixar consignado que o
saque é tradução de um ato de aceitação do credor em levantar
as quantias que lhe foram autorizadas, no depósito atípico, e
não é obrigatório, consoante o princípio da disponibilidade que
vigora em sede de execução. Quer dizer, apenas o titular do
direito, ou aquele por ele autorizado (cessionário), pode adotar
a conduta positiva de requerer a entrega, a partir da qual ocorre
a efetiva translação da propriedade dos valores, que passam a
ser de natureza privada, pelo ingresso na esfera particular. Em
reforço ao entendimento no sentido de que as verbas
permanecem públicas até o momento do saque, vale destacar
que ocorrendo eventual requerimento de terceiro credor do
beneficiário para constrição judicial do precatório, haverá

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afetação apenas do direito creditório”.

15. O depósito “é o contrato pelo qual uma pessoa,


denominada depositante, entrega uma coisa móvel para que outra
pessoa, denominada depositária, a guarde com obrigação de devolvê-la
ao depositante ou alguém que este designe”[7], sendo temporário e
realizado no interesse primordial do depositante. Como afirmado pela
AGU, as verbas possuem natureza pública até o saque pelo beneficiário –
que, com o advento da lei questionada, passa a ter um prazo para realizá-
lo –, visto que a regulação se dá por meio de um contrato atípico de
depósito no qual o credor é mero beneficiário.

16. Além disso, o direito subjetivo do credor, em caso de


cancelamento, é garantido em sua totalidade, cabendo a ele requisitar a
qualquer momento a expedição de novo ofício requisitório para realizar o
levantamento dos valores. Em tais casos, é importante ressaltar que é
assegurada, além da totalidade da remuneração correspondente ao
período, a posição do requisitório que havia sido cancelado na ordem
cronológica mantida pelo Tribunal. Não há, portanto, afronta à coisa
julgada material, na medida em que o título executivo judicial se mantém
intacto.

17. O direito brasileiro, em prestígio ao princípio da segurança


jurídica, admite pacificamente a existência de prescrição executiva e de
prescrição intercorrente. As duas modalidades de prescrição acarretam a
perda da pretensão executória e sinalizam a inviabilidade de o exercício
de um direito ficar pendente indefinidamente no tempo. Não se cogita, a
toda evidência, de que nenhuma delas ofenda a proteção à coisa julgada.
No caso concreto, o legislador ficou aquém: resguardou o direito do
credor em caso de novo requerimento de expedição de precatório ou RPV
ao juízo competente. Incide, aqui, a velha máxima hermenêutica de que
“àquele a quem se permite o mais, não se deve negar o menos”[8].

18. A norma impugnada também não afronta o princípio da

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separação de poderes. O Poder Legislativo não se imiscuiu na gestão


administrativa dos precatórios, a cargo do Poder Judiciário. Embora haja
inovação no sistema de gestão de precatórios, a legislação tem caráter
suplementar, não impondo novos requisitos para o adimplemento dos
precatórios, mas tão somente regulando uma fase posterior ao disposto
no art. 100, caput e parágrafos, da Constituição Federal de 1988. Trata-se
de opção legítima do Congresso Nacional, em respeito aos limites
definidos no âmbito da garantia de constitucional do regime de
precatórios, com vistas a racionalizar o emprego de recursos financeiros
finitos e primar pela eficiência na administração.

19. Segundo informações contidas no ofício nº CJF-OFI-


2017/00370, de 17 de fevereiro de 2017, havia R$ 8.643.438.148,75 (oito
bilhões, seiscentos e quarenta e três milhões, quatrocentos e trinto oito
mil, cento e quarenta e oito reais e setenta e cinco centavos) depositados
em contas referentes a pagamento de precatórios e RPVs, em instituições
financeiras oficiais, paralisados há mais de dois anos. Assim, dada a crise
econômica e fiscal vivenciada pelo país, agravada pela situação
calamitosa de combate à pandemia da COVID-19, deve-se considerar
imperativa a observância do princípio da eficiência na gestão de recursos
públicos escassos. Afinal, não seria razoável manter bilhões de reais em
verbas públicas paralisadas ad aeternum, nos casos em que o credor está
inerte ou não atende aos requisitos legais para o levantamento do seu
crédito.

20. No mesmo sentido, a norma questionada não infringe o


princípio da proporcionalidade. Essa norma, em sua tríplice dimensão,
evoluiu como mecanismo instrumental para aferir a legitimidade das
restrições a direitos fundamentais, tendo na vedação ao excesso uma
importante manifestação[9]. A fixação de um prazo para levantamento
dos valores é medida (i) adequada, por impedir que vultosos recursos
públicos fiquem sem qualquer destinação, (ii) necessária, por não haver
meio menos gravoso para se atingir o mesmo resultado e (iii) proporcional

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em sentido estrito, uma vez que os ganhos com o emprego de verbas até
então paralisadas em finalidades públicas, de relevo para a sociedade,
superam os custos oriundos da restrição ao direito subjetivo do credor.
Ademais, o prazo bienal fixado em lei não é manifestamente irrazoável,
devendo o Judiciário, nesse caso, prestar deferência à liberdade de
conformação do legislador. Não há desproporcionalidade aqui pelo fato
de o direito subjetivo do credor se manter hígido. Como já visto, ao
contrário do que ocorre na hipótese de pretensão prescrita, que não mais
pode ser oposta ao devedor, subsiste, na espécie, a possibilidade de o
beneficiário do crédito requerer, a qualquer tempo, a expedição de novo
requisitório.

21. A relatora também fundamentou seu voto na ofensa à


isonomia. Todavia, com todas as vênias, esse argumento também não
deve ser acolhido, na medida em que o legislador promoveu distinção
razoável entre os credores ativos na busca pelo levantamento de seus
créditos e aqueles omissos e inertes. Eventual inércia da Fazenda Pública
no pagamento dos precatórios judiciais é sancionada com os
instrumentos jurídicos previstos no ordenamento, tais como os juros de
mora e o sequestro de verbas públicas.

22. É importante distinguir, ainda, a presente hipótese dos


julgados em que esta Corte declarou a inconstitucionalidade de leis
estaduais que dispunham sobre a utilização de recursos de depósitos
judiciais pelos estados da Federação (v., por todos, ADI 5.392, Rel. Min.
Rosa Weber, j. em 16.09.2020; e (ii) ADI 5.072, Rel. Min. Gilmar Mendes, j.
em 22.06.2020). Em primeiro lugar, as leis estaduais têm sido invalidadas
por usurpação da competência da União para legislar sobre: (i) o Sistema
Financeiro Nacional (art. 21, VIII, CF); (ii) política de crédito e
transferência de valores (art. 22, VII e 192, CF); (iii) direito civil e
processual (art. 22, I); e (iv) normas gerais de direito financeiro (art. 24, I,
CF). O vício de competência, no presente caso, inexiste. A
inconstitucionalidade material, a seu turno, restou reconhecida pela

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apropriação, pelos estados, de depósitos judiciais efetuados por terceiros,


o que afronta, no entender da Corte, o direito de propriedade e as regras
constitucionais relativas à criação de empréstimos compulsórios. Na
presente ADI, os depósitos judiciais foram realizados pela própria União,
razão pela qual a distinção é impositiva e os fundamentos são
inaplicáveis à espécie.

23. Sem embargo, penso que o dispositivo legal questionado


ofende os princípios do contraditório e da ampla defesa. A sistemática
prevista na Lei nº 13.463/2017 é incompatível com a imposição
constitucional de contraditório efetivo (art. 5º, LV, CF/1988), recentemente
prestigiada pelo Código de Processo Civil de 2015[10]. A ordem
constitucional brasileira condiciona a legitimidade das decisões judiciais à
plena observância do devido processo legal. Salvo em situações
excepcionais, as partes devem ter oportunidade de influenciar
previamente a formação do resultado do processo e não podem ser
surpreendidas por decisões dissociadas do debate travado nos autos.

24. O cancelamento automático dos precatórios e RPVs pela


instituição bancária oficial destoa, evidentemente, do conceito de
contraditório participativo. A legislação não dá sequer oportunidade de o
credor comprovar fato obstativo legítimo à extinção da ordem de
depósito. Com efeito, é plausível a hipótese de o credor não estar inerte,
havendo discussões em curso perante (i) o juízo da execução ou (ii) o
gestor de precatórios do respectivo tribunal. Nesses casos, pela
sistemática legal, a parte não terá oportunidade de se manifestar
previamente ao cancelamento do seu precatório, o que caracteriza
inequívoca contrariedade ao texto constitucional.

25. Nada obstante, essa conclusão não conduz à procedência


integral do pedido. É que, em deferência ao princípio democrático,
considero adequado o recurso à interpretação conforme a Constituição
para preservar a validade da lei questionada, excluindo-se apenas a

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possibilidade de a instituição financeira depositária cancelar


automaticamente os requisitórios, sem prévia ciência do credor
alegadamente inerte pelo juízo competente. A meu ver, o cancelamento
do requisitório deve ser precedido de intimação pessoal prévia do credor
(aplicação, por analogia, do art. 485, II e III e § 1º, do CPC)[11], em ato
processual expedido pelo juízo da execução, para que o titular do crédito
possa, eventualmente, apresentar fundamento razoável que afaste a sua
inércia. Essa foi, inclusive, a sistemática adotada pela Resolução nº
405/2016, do Conselho da Justiça Federal, nos seguintes termos:

Art. 45. No caso de requisições cujos valores estejam


depositados há mais de dois anos, o presidente do tribunal
comunicará ao juízo da execução para que os credores sejam
intimados.
Parágrafo único. A instituição financeira depositária
deverá fornecer periodicamente, por solicitação do tribunal, as
informações necessárias ao cumprimento do caput.
Art. 46. Com base nas informações fornecidas pelo
tribunal, o juízo da execução adotará as providências que
entender cabíveis para a ocorrência do saque.
Art. 47. Decidindo o juízo pelo cancelamento da
requisição, o fato deverá ser comunicado ao tribunal para que
este adote as providências necessárias.
Parágrafo único. Cancelada a requisição, poderá ser
expedido novo ofício requisitório, a requerimento do
interessado.

26. Por fim, uma observação pertinente: a transferência dos


valores depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional só pode ser
efetivada na hipótese de a União Federal não estar em mora com o
pagamento de precatórios judiciais. Caso contrário, os recursos devem ser
destinados ao pagamento de outros requisitórios inscritos na fila de
precedência do respectivo tribunal. Embora fosse legítimo, em linha de
princípio, que a União aplicasse tais verbas em outras finalidades
públicas, considero necessário assegurar que elas sejam efetivamente

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carreadas ao pagamento de precatórios e RPVs, por ser essa a destinação


originariamente prevista na lei orçamentária (art. 165, § 10, CF).

27. Pelo exposto, julgo parcialmente procedente o pedido,


conferindo interpretação conforme ao art. 2º, caput e 1º, da Lei
13.463/2017, para que (i) o procedimento de cancelamento de precatório e
requisição de pequeno valor nele previsto seja precedido de intimação
pessoal do credor, pelo juízo da execução; e (ii) a transferência de
recursos para a Conta Única do Tesouro Nacional pressuponha a ausência
de mora da União no pagamento de tais requisições.

28. É como voto.

[1] Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas


Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença
judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de
apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida
a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos
créditos adicionais abertos para este fim.
(...)
§ 6º As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão
consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do
Tribunal que proferir a decisão exequenda determinar o pagamento
integral e autorizar, a requerimento do credor e exclusivamente para os
casos de preterimento de seu direito de precedência ou de não alocação
orçamentária do valor necessário à satisfação do seu débito, o sequestro
da quantia respectiva.
[2] Resolução nº 303/2019.
[3] Aliomar Baleeiro, Direito tributário brasileiro, 2004, p. 65.
[4] Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas
Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença
judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de

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apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida


a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos
créditos adicionais abertos para este fim.
(...)
§ 3º O disposto no caput deste artigo relativamente à expedição de
precatórios não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em
leis como de pequeno valor que as Fazendas referidas devam fazer em
virtude de sentença judicial transitada em julgado.
§ 4º Para os fins do disposto no § 3º, poderão ser fixados, por leis
próprias, valores distintos às entidades de direito público, segundo as
diferentes capacidades econômicas, sendo o mínimo igual ao valor do
maior benefício do regime geral de previdência social.
§ 11. É facultada ao credor, conforme estabelecido em lei da
entidade federativa devedora, a entrega de créditos em precatórios para
compra de imóveis públicos do respectivo ente federado.
§ 15. Sem prejuízo do disposto neste artigo, lei complementar a esta
Constituição Federal poderá estabelecer regime especial para pagamento
de crédito de precatórios de Estados, Distrito Federal e Municípios,
dispondo sobre vinculações à receita corrente líquida e forma e prazo de
liquidação.
§ 16. A seu critério exclusivo e na forma de lei, a União poderá
assumir débitos, oriundos de precatórios, de Estados, Distrito Federal e
Municípios, refinanciando-os diretamente.
[5] Art. 31. Realizado o aporte de recursos na forma do capítulo
anterior, o presidente do tribunal disponibilizará o valor necessário ao
pagamento do precatório em conta bancária individualizada junto à
instituição financeira.
§ 1º O pagamento será realizado ao beneficiário ou seu procurador,
cientificadas as partes e o juízo da execução:
I – mediante saque junto à conta bancária indicada no caput deste
artigo, observando-se, no que couber, o rito de levantamento dos
depósitos bancários; ou
II – por meio de alvará, mandado ou guia de pagamento.

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[6] Resolução nº 303/2019.


Art. 33. Informado aos Presidentes dos Tribunais Regionais Federais
e do Trabalho, pela instituição financeira, o cancelamento de requisições
de pagamento de que trata a Lei nº 13.463, de 6 de julho de 2017, e
comunicado o fato ao juízo da execução, este cientificará o credor.
§ 1º Efetuado o cancelamento, e havendo requerimento do credor
para a emissão de nova requisição de pagamento, além dos requisitos
obrigatórios, deverá ser observado o seguinte:
I – para fins de definição da ordem cronológica, o juízo da execução
informará o número da requisição cancelada;
II – será considerado o valor efetivamente transferido pela
instituição financeira para a Conta Única do Tesouro Nacional;
III – será considerada a data-base da requisição de pagamento e a
data da transferência a que alude o inciso II deste parágrafo, conforme
indicado pela instituição financeira;
IV – a requisição será atualizada pelo indexador previsto na Lei de
Diretrizes Orçamentárias, desde a data-base até o efetivo depósito; e
V – não haverá incidência de juros nas requisições, quando o
cancelamento decorrer exclusivamente da inércia da parte beneficiária.
§ 2º Desde que comunicada à instituição financeira, consideram-se
excluídos do cancelamento de que trata este artigo os depósitos sobre os
quais exista ordem judicial suspendendo ou sustando a liberação dos
respectivos valores a qualquer título.
[7] Paulo Lôbo, Direito civil: volume 3: contratos, 2018, p. 390.
[8] Trata-se do velho brocardo: In eo quod plus est semper inest et
minus. Carlos Maximiliano, Hermenêutica e Aplicação do Direito, 2009, p.
200.
[9] Luís Roberto Barroso, Curso de direito constitucional contemporâneo,
2021, p. 253.
[10] Art. 9º Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que
ela seja previamente ouvida.
Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica:
I - à tutela provisória de urgência;

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II - às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II


e III;
III - à decisão prevista no art. 701.
Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com
base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes
oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual
deva decidir de ofício.
[11] Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:
II - o processo ficar parado durante mais de 1 (um) ano por
negligência das partes;
III - por não promover os atos e as diligências que lhe incumbir, o
autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias;
§ 1º Nas hipóteses descritas nos incisos II e III, a parte será intimada
pessoalmente para suprir a falta no prazo de 5 (cinco) dias.

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Observação

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30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

RELATORA : MIN. ROSA WEBER


REQTE.(S) : PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA
ADV.(A/S) : CLAUDIO OLIVEIRA SANTOS COLNAGO
INTDO.(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
INTDO.(A/S) : CONGRESSO NACIONAL
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES E
ADVOGADOS PÚBLICOS FEDERAIS - ANPPREV
ADV.(A/S) : HUGO MENDES PLUTARCO
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO DE SINDICATOS DE TRABALHADORES
TÉCNICOS-ADMINISTRATIVOS EM INSTITUIÇÕES
PÚBLICAS DE ENSINO SUPERIOR NO BRASIL E
OUTRO(A/S)
ADV.(A/S) : CLAUDIO SANTOS DA SILVA
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DOS POLICIAIS FEDERAIS
- FENAPEF
ADV.(A/S) : RUDI MEIRA CASSEL
ADV.(A/S) : ANTONIO RODRIGO MACHADO DE SOUSA
AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DA
PREVIDÊNCIA E DA SEGURIDADE SOCIAL -
ANASPS
ADV.(A/S) : ANTONIO TORREAO BRAZ FILHO
AM. CURIAE. : CONFEDERACAO DOS TRABALHADORES NO
SERVICO PUBLICO FEDERAL - CONDSEF
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES NO SERVIÇO
PÚBLICO FEDERAL - FENADSEF
AM. CURIAE. : SINDICATO NACIONAL DOS SERVIDORES
FEDERAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA, PROFISSIONAL
E TECNOLÓGICA - SINASEFE NACIONAL
ADV.(A/S) : JOSE LUIS WAGNER
AM. CURIAE. : SINDICATO DOS TRABALHADORES FEDERAIS DA
SAÚDE, TRABALHO E PREVIDÊNCIA NO ESTADO
DO RIO GRANDE DO SUL (SINDISPREV /RS)

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Observação

Inteiro Teor do Acórdão - Página 106 de 208

ADI 5755 / DF

ADV.(A/S) : GLENIO LUIS OHLWEILER FERREIRA


ADV.(A/S) : THIAGO CECCHINI BRUNETTO
AM. CURIAE. : CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS
ADVOGADOS DO BRASIL - CFOAB
ADV.(A/S) : MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO
ADV.(A/S) : LUIZ GUSTAVO ANTONIO SILVA BICHARA
ADV.(A/S) : EDUARDO DE SOUZA GOUVEA
ADV.(A/S) : OSWALDO PINHEIRO RIBEIRO JUNIOR
ADV.(A/S) : LIZANDRA NASCIMENTO VICENTE
ADV.(A/S) : GUILHERME DEL NEGRO BARROSO FREITAS
ADV.(A/S) : CLAUDIA PAIVA CARVALHO
AM. CURIAE. : SINTRAJUSC - SINDICATO DOS TRABALHADORES
NO PODER JUDICIÁRIO FEDERAL EM SANTA
CATARINA
ADV.(A/S) : PEDRO MAURICIO PITA DA SILVA MACHADO
AM. CURIAE. : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS
TRABALHADORES EM SEGURIDADE SOCIAL
¿ CNTSS/CUT
ADV.(A/S) : RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO
ADV.(A/S) : RODRIGO CAMARGO BARBOSA
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DA
JUSTIÇA FEDERAL E DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA
UNIÃO ¿ FENAJUFE
ADV.(A/S) : RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO
ADV.(A/S) : RODRIGO CAMARGO BARBOSA
AM. CURIAE. : ASSOCIACAO DOS ADVOGADOS DE SAO PAULO
ADV.(A/S) : ANTONIO CARLOS DE ALMEIDA AMENDOLA
ADV.(A/S) : MARIO LUIZ OLIVEIRA DA COSTA
ADV.(A/S) : ANDRE ALMEIDA GARCIA
ADV.(A/S) : DANIEL NUNES VIEIRA PINHEIRO DE CASTRO

OBSERVAÇÃO

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES - Presidente, só para


também deixar claro que, inicialmente, não teria dificuldades em
subscrever a posição do Ministro Barroso.

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Observação

Inteiro Teor do Acórdão - Página 107 de 208

ADI 5755 / DF

Como já disse, o problema é como saber que a União está em mora


diante desse conundrum que virou o sistema. Isso que me parece
complicado. Por isso que, ao fim e ao cabo, parece-me que a proposta de
Sua Excelência acaba sendo de difícil exequibilidade. Eu me limitaria à
questão da intimação como necessária, só isso, porque, de fato, o sistema
se tornou uma tessitura de tapete persa, uma coisa muito complicada.
O Doutor André Mendonça, que era Advogado-Geral da União até
recentemente, pode-nos dar depois o testemunho de quão complexo se
tornou esse sistema e quão difícil será dizer se a União está em mora e em
que condições está em mora.

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Voto - MIN. ANDRÉ MENDONÇA

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30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

VOTO-VOGAL

AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE.
PRECATÓRIOS. ART. 2º, CAPUT E § 1º, DA
LEI Nº 13.463, DE 2017: CANCELAMENTO
DE PRECATÓRIOS E REQUISIÇÕES DE
PEQUENO VALOR (RPV). GESTÃO DE
RECURSOS FINANCEIROS. AUSÊNCIA
DE PREJUÍZO AO CREDOR. AÇÃO
CONHECIDA E JULGADA
IMPROCEDENTE.

O SENHOR MINISTRO ANDRÉ MENDONÇA:

1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, com pedido


liminar, ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) em face do
art. 2º, caput e §1º, da Lei nº 13.463, de 2017, que dispõe sobre os recursos
destinados aos pagamentos decorrentes de precatórios e de Requisições
de Pequeno Valor (RPV) federais.

2. Eis o teor do objeto impugnado:

“Art. 2º Ficam cancelados os precatórios e as RPV federais


expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo
credor e estejam depositados há mais de dois anos em
instituição financeira oficial.
§ 1º O cancelamento de que trata o caput deste artigo será
operacionalizado mensalmente pela instituição financeira
oficial depositária, mediante a transferência dos valores
depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional.”

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Voto - MIN. ANDRÉ MENDONÇA

Inteiro Teor do Acórdão - Página 109 de 208

ADI 5755 / DF

3. Em sessão virtual do Tribunal Pleno realizada entre 12 a 23 de


fevereiro de 2021, a e. Ministra Relatora Rosa Weber conheceu da ação e,
no mérito, julgou-a procedente. Por brevidade, reproduzo a ementa
proposta por Sua Excelência:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.


PRECATÓRIOS. CONVERSÃO DE RITO. JULGAMENTO
DEFINITIVO DA AÇÃO. ART. 2º, CAPUT E § 1º, DA LEI Nº
13.463/2017, QUE DETERMINA O CANCELAMENTO DOS
PRECATÓRIOS E REQUISIÇÕES DE PEQUENO VALOR (RPV)
FEDERAIS EXPEDIDOS E CUJOS VALORES NÃO TENHAM
SIDO LEVANTADOS PELO CREDOR E ESTEJAM
DEPOSITADOS HÁ MAIS DE DOIS ANOS EM INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA OFICIAL. TRANSFERÊNCIA PARA A CONTA
ÚNICA DO TESOURO NACIONAL. VIOLAÇÃO DOS ARTS.
2º, 5º, CAPUT, XXII, XXXV, XXXVI, LIV, LV, E 100 DA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PROCEDÊNCIA.
1. Conversão do rito do art. 10 para o rito do art. 12 da Lei
9.868/99. Julgamento definitivo do mérito em razão: (i) da
postulação formalizada; (ii) da completa coleta das informações
jurídicas; e (iii) da apresentação dos argumentos necessários
para a solução do problema constitucional posto, com respeito
aos direitos fundamentais processuais. Perfectibilização do
contraditório efetivo e presença levado grau de instrução
processual.
2. A lei impugnada consubstancia ato normativo oriundo
do Congresso Nacional, por iniciativa do Presidente da
República. Exercício de competência legislativa concorrente
sobre direito financeiro, uma vez que precatório e requisição de
pequeno valor (RPV) destinam-se à realização de despesas
públicas decorrentes de sentenças judiciais transitadas em
julgado. Não configuração de inconstitucionalidade formal: a
apreciação da natureza do disciplinamento da matéria e do
desbordamento das balizas constitucionais expressamente
previstas pelo texto da Carta Magna situa-se na seara da

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Voto - MIN. ANDRÉ MENDONÇA

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ADI 5755 / DF

eventual inconstitucionalidade material da atuação legislativa


quanto ao trâmite operacional de pagamento de valores por
meio de precatórios e requisições de pequeno valor.
3. A Lei nº 13.463/2017 criou verdadeira inovação no
disciplinamento do pagamento de montantes por precatórios e
requisições de pequeno valor ao determinar um limite temporal
para o exercício do direito de levantamento do importe do
crédito depositado. Transferência automática, pela instituição
financeira depositária, dos valores depositados para a Conta
Única do Tesouro Nacional sem prévia ciência do interessado
ou formalização de contraditório (art. 5º, LV, CF). Afronta ao
devido processo legal (CF, art. 5º, LIV) no que atine ao respeito
ao contraditório e à ampla defesa.
4. A lei desloca a prévia ciência e o exercício do
contraditório para momento posterior ao cancelamento
automático, procedimento que viola a Constituição. A mera
possibilidade de novo requerimento do credor não desfigura a
inconstitucionalidade material em razão da não observância do
contraditório e da ampla defesa.
5. Impossibilidade de edição de medidas legislativas para
condicionar e restringir o levantamento dos valores a título de
precatórios. Precedente: ADI 3453 (Relatora: Min. Cármen
Lúcia, Tribunal Pleno, DJ 16.03.2007). Violação da separação dos
Poderes: a Constituição Federal desenhou o regime de
pagamento de precatório e conferiu atribuições ao Poder
Judiciário sem deixar margem limitativa do direito de crédito
ao legislador infraconstitucional. Devem ser prestigiados o
equilíbrio e a separação dos Poderes (art. 2º, CF), bem como a
garantia da coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CF) mediante a
satisfação do crédito a conferir eficácia às decisões. A lei
impugnada transfere do Judiciário para a instituição financeira
a averiguação unilateral do pagamento e autoriza,
indevidamente, o cancelamento automático do depósito e a
remessa dos valores à Conta Única do Tesouro Nacional.
Configurada uma verdadeira burla aos freios e contrapesos
indispensáveis ao bom funcionamento dos Poderes.

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Voto - MIN. ANDRÉ MENDONÇA

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ADI 5755 / DF

6. A mora do credor em relação ao levantamento dos


valores depositados na instituição financeira deve ser apurada
no bojo do processo de execução, sem imposição de
cancelamento automático das requisições em ausência de
prévia ciência ao interessado. Violação do devido processo legal
(art. 5º, LIV, CF) e do princípio da proporcionalidade. Revela-se
desproporcional a imposição do cancelamento automático após
o decurso de dois anos do depósito dos valores a título de
precatório e RPV. A atuação legislativa não foi pautada pela
proporcionalidade em sua faceta de vedação do excesso.
7. Ao determinar o cancelamento puro e simples
imediatamente após o biênio em exame, a Lei nº 13.463/2017
afronta, outrossim, os incisos XXXV e XXXVI do art. 5º da
Constituição da República, por violar a segurança jurídica, a
inafastabilidade da jurisdição, além da garantia da coisa julgada
e de cumprimento das decisões judiciais. Precedentes.
8. A lei impugnada imprime um tratamento mais gravoso
ao credor, com a criação de mais uma assimetria entre a
Fazenda Pública e o cidadão quando ocupantes dos polos de
credor e de devedor. Manifesta ofensa à isonomia, seja quanto à
distinta paridade de armas entre a Fazenda Pública e os
credores, seja no que concerne a uma diferenciação realizada
entre os próprios credores: aqueles que consigam fazer o
levantamento no prazo de dois anos e os que assim não o
façam, independentemente da averiguação prévia das razões.
Distinção automaticamente derivada do decurso do tempo
entre credores sem a averiguação das razões do não
levantamento dos valores atinentes aos precatórios e
requisições de pequeno valor, que podem não advir
necessariamente de mero desinteresse ou inércia injustificada.
Ofensa à sistemática constitucional de precatórios como
implementação da igualdade (art. 5º, caput, CF). Precedentes.
9. O manejo dos valores de recursos públicos depositados
e à disposição do credor viola o direito de propriedade (art. 5º,
XXII, CF). Ingerência sobre o montante depositado e
administrado pelo Poder Judiciário, que passa a ser tratado

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Voto - MIN. ANDRÉ MENDONÇA

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ADI 5755 / DF

indevidamente como receita pública e alvo de destinação.


10. A ação direta conhecida e pedido julgado procedente.”

4. A e. Ministra Relatora afastou a alegação quanto ao vício formal de


inconstitucionalidade, uma vez que se cuida de matéria própria de direito
financeiro, nos termos do art. 24, I, da Constituição da República.

5. Em seguida, acolheu uma série de argumentos relativos a


inconstitucionalidades materiais. Em seu entender, o Poder Legislativo
teria desbordado de seu espaço de atuação, porque criou inovação na
disciplina dos precatórios, limitando temporalmente o exercício de um
direito. Ao fazê-lo sem a prévia ciência do interessado, o objeto teria
afrontado as garantias processuais do contraditório e da ampla defesa,
pois “a lei desloca a prévia ciência e o exercício do contraditório para momento
posterior ao cancelamento automático, procedimento que viola a Constituição.”

6. À luz da separação dos poderes, defendeu que a gestão financeira


dos precatórios incumbe ao Poder Judiciário. Assim, não haveria margem
de conformação disponível à instância legiferante para alterar o desenho
constitucional dessa sistemática, seja para restringi-la, seja para
condicionar o pagamento das condenações pecuniárias em face do
Estado.

7. Aludiu, ainda, que:

“A mora do credor em relação ao levantamento dos


valores depositados na instituição financeira deve ser apurada
no bojo do processo de execução, sem imposição de
cancelamento automático das requisições em ausência de
prévia ciência ao interessado. Configurada violação do devido
processo legal (art. 5º, LIV, CF) e do princípio da
proporcionalidade.
(...)
Ao determinar o cancelamento puro e simples

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imediatamente após o biênio em exame, a Lei nº 13.463/2017


afronta, outrossim, os incisos XXXV e XXXVI do art. 5º da
Constituição da República, por violar a segurança jurídica, a
inafastabilidade da jurisdição, além da garantia da coisa julgada
e de cumprimento das decisões judiciais.”

8. Apontou que o regime constitucional dos requisitórios não prevê


prazo específico para o levantamento de valores, logo os dispositivos
impugnados teriam ofendido o princípio da isonomia. Isso porque
estabeleceram situação desigual entre (i) os próprios credores e (ii) a
Fazenda Pública e o particular. Por conseguinte, “a lei impugnada (...) cria
distinção automaticamente derivada do decurso do tempo entre credores sem a
averiguação das razões do não levantamento dos valores atinentes aos precatórios
e requisições de pequeno valor”.

9. O e. Ministro Roberto Barroso requereu vista dos autos em


Gabinete, apresentando voto-vista na sessão virtual de 7 a 14 de maio de
2021, no qual divergiu parcialmente da Relatora para fins de propor a
procedência parcial do pedido, apenas para conferir interpretação
conforme a Constituição ao objeto impugnado. Eis o teor da ementa
proposta pelo Ministro Roberto Barroso:

“Ementa: Direito constitucional e financeiro. Ação direta


de inconstitucionalidade. Cancelamento de precatórios e RPVs
por inércia do credor.
1. Ação direta contra o art. 2º, caput e §1º, da Lei federal nº
13.463/2017, que determina o cancelamento de precatórios e
requisições de pequeno valor (RPVs) expedidos e depositados
sem levantamento pelo credor há pelo menos dois anos em
instituição financeira oficial.
2. Ausência de inconstitucionalidade formal. O precatório
é espécie de despesa pública, inserindo-se no campo do direito
financeiro, matéria de competência concorrente entre os entes
federados (art. 24, I, CF/1988). A Constituição não exaure a
disciplina do sistema constitucional de precatórios, sendo

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ADI 5755 / DF

possível que a lei crie novas regras, desde que, evidentemente,


não vulnere preceitos constitucionais.
3. Ausência de ofensa à segurança jurídica, à coisa julgada
e ao direito de propriedade. Entre o depósito e o momento
imediatamente anterior ao saque dos valores destinados ao
pagamento da requisição, o credor é mero beneficiário dessas
quantias, e não seu efetivo titular. Além disso, em caso de
cancelamento da ordem de pagamento, ele pode requerer, a
qualquer tempo, a expedição de novo ofício requisitório para o
levantamento dos valores. Em tais hipóteses, é assegurada,
além da remuneração do período, a posição do requisitório que
havia sido cancelado na ordem cronológica mantida pelo
Tribunal.
4. Inexistência de afronta à proporcionalidade. O prazo
bienal fixado em lei não é manifestamente irrazoável, devendo
o Judiciário, nesse caso, prestar deferência à liberdade de
conformação do legislador. O ordenamento admite
modalidades extintivas mais gravosas, tais como a prescrição
da pretensão executória. No presente caso, o direito subjetivo
do credor se mantém hígido mesmo após o cancelamento.
5. Dada a crise econômica e fiscal vivenciada pelo país,
agravada pela situação calamitosa de combate à pandemia da
COVID-19, não seria razoável manter bilhões de reais em
verbas públicas paralisadas ad aeternum por inércia do credor.
Necessidade de observância do princípio da eficiência na gestão
de recursos públicos escassos.
6. Sem embargo, impõe-se a intimação pessoal do
beneficiário, sob pena de ofensa aos princípios do contraditório
e da ampla defesa. Salvo em situações excepcionais, as partes
devem ter oportunidade de influenciar previamente a formação
do resultado do processo e não podem ser afetadas por
decisões-surpresa.
7. Necessidade de assegurar a destinação originalmente
prevista na lei orçamentária aos recursos públicos depositados
pela União (art. 165, § 10, CF). Valores que só podem ser
transferidos à Conta Única do Tesouro Nacional se o ente

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Voto - MIN. ANDRÉ MENDONÇA

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ADI 5755 / DF

federado estiver em dia com o pagamento das requisições


judiciais.
8. Possibilidade de interpretação conforme a Constituição
para preservar a validade da lei questionada.
9. Procedência parcial do pedido, conferindo-se
interpretação conforme a Constituição ao art. 2º, caput e §1º, da
Lei nº 13.463/2017, para que (i) o procedimento de cancelamento
de precatório e requisição de pequeno valor nele previsto seja
precedido de intimação pessoal do credor, pelo juízo da
execução (aplicação, por analogia, do art. 485, II e III e § 1º, do
CPC); e (ii) a transferência de recursos para a Conta Única do
Tesouro Nacional pressuponha a ausência de mora da União no
pagamento de tais requisições.”

10. Nesse momento processual, o Ministro Gilmar Mendes solicitou


destaque do feito para que a presente deliberação se desse de maneira
síncrona no Plenário presencial da Suprema Corte.

I
Passo a votar.

11. Inicialmente, mesmo tendo o presente julgamento se iniciado em


data anterior à minha posse no cargo de Ministro do Supremo Tribunal
Federal, declaro-me suficientemente esclarecido da controvérsia
constitucional posta em juízo, nos termos do art. 134, § 2º, do RISTF. Do
mesmo modo, não se configura o caso de aplicação do que decidido na
Questão de Ordem formulada na ADI nº 5.399/SP, Rel. Min. Roberto
Barroso, pois os únicos Ministros a votarem no Plenário virtual foram a
Relatora e o Vistor.

12. Ademais, em sede de preliminar, conheço da presente ação, por


comungar do entendimento da Ministra Relatora no sentido de reputar
preenchidos todos os requisitos de admissibilidade presentes nos arts. 3º
e 4º da Lei nº 9.868, de 1999.

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Voto - MIN. ANDRÉ MENDONÇA

Inteiro Teor do Acórdão - Página 116 de 208

ADI 5755 / DF

13. Concordo, ainda, com a conversão desta deliberação colegiada


originariamente pensada para apreciar a medida cautelar suscitada,
conforme o art. 10 do citado diploma legal, em julgamento definitivo de
mérito. Afinal, a causa encontra-se madura para receber resolução
definitiva por esta Corte na esteira de remansosa jurisprudência.

II
Passo a examinar o mérito.

14. Com as mais respeitosas vênias à Ministra Relatora, encaminho


o presente voto no sentido de acompanhar substancialmente a
manifestação lançada pelo Ministro Roberto Barroso, com pontual
divergência em relação à interpretação conforme aventada por sua
Excelência.

15. Em consonância ao que já tratado de forma exauriente tanto pela


Relatora quanto pelo Ministro Roberto Barroso, também eu rejeito a
alegação em prol da existência de vício formal de
inconstitucionalidade. Por se cuidar de matéria de direito financeiro,
com alguma interface às lindes do ramo processual civil, reputo viável ao
Presidente da República iniciar proposição legislativa destinada a
introduzir no ordenamento jurídico pátrio diploma legal que disponha
sobre verbas públicas destinadas aos pagamentos decorrentes de
precatórios e de Requisições de Pequeno Valor (RPV) federais.

16. Em abono a esse entendimento, recorro ao comentário


doutrinário de José Maurício Conti:

“No que se tange aos órgãos ou pessoas que podem dar


início ao processo legislativo, a iniciativa pode ser geral (ou
comum, ou concorrente), reservada )também denominada de
privativa ou exclusiva) ou vinculada. A regra é da iniciativa geral,
ou seja, a iniciativa legislativa compete concorrentemente a
vários órgãos e pessoas, tais como o chefe do Poder Executivo,

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Voto - MIN. ANDRÉ MENDONÇA

Inteiro Teor do Acórdão - Página 117 de 208

ADI 5755 / DF

qualquer parlamentar, comissão ou casa legislativa, e também


aos cidadãos, por iniciativa popular. Há iniciativa reservada
quando a apresentação de projetos de lei em determinadas
matérias fique restrita a apenas alguns órgãos ou pessoas. A
iniciativa é vinculada quando há disposição expressa no sentido
de quem deva apresentar o projeto de lei, associada à
obrigatoriedade de fazê-lo no prazo e condições especificadas
na lçei (como ocorre com o plano plurianual, lei de diretrizes
orçamentárias e lei orçamentária anual).
(...)
O mesmo raciocínio e argumentos já expostos podem ser
aplicados a outros temas correlatos à matéria orçamentária: não
havendo texto expresso estabelecendo reserva de iniciativa ao
Poder Executivo ou a outro Poder ou órgão da Administração
Pública, prevalece a regra de iniciativa legislativa geral.”
(CONTI, José Maurício. Iniciativa legislativa em matéria
financeira. CONTI, José Maurício; SCAFF, Fernando Facury
(coord.). Orçamentos Públicos e Direito Financeiro. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2011, p. 290-291 e 296)

17. Em sentido até mais favorável às prerrogativas constitucionais do


Chefe do Poder Executivo, na ADI nº 2.447/MG, Rel. Min. Joaquim
Barbosa, Tribunal Pleno, j. 04/03/2009, p. 04/12/2009, esta Corte assentou
que viola a reserva de iniciativa dessa autoridade a norma jurídica que
verse, diretamente, sobre a vinculação ou a destinação específica de
receitas orçamentárias. Eis a ementa desse julgado:

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. FINANCEIRO. NORMA


CONSTITUCIONAL ESTADUAL QUE DESTINA PARTE DAS
RECEITAS ORÇAMENTÁRIAS A ENTIDADES DE ENSINO.
ALEGADO VÍCIO DE INICIATIVA. CONSTITUIÇÃO DO
ESTADO DE MINAS GERAIS, ARTS. 161, IV, F, E 199, §§ 1º E
2º. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
PEDIDO DE INTERVENÇÃO COMO ASSISTENTE SIMPLES.
Ação Direita de Inconstitucionalidade em que se discute a
validade dos arts. 161, IV, f e 199, §§ 1º e 2º da Constituição do

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Voto - MIN. ANDRÉ MENDONÇA

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ADI 5755 / DF

Estado de Minas Gerais, com a redação dada pela Emenda


Constitucional Estadual 47/2000. Alegada violação dos arts. 61,
§ 1º, II, b, 165, III, 167, IV e 212 da Constituição. Viola a reserva
de iniciativa do Chefe do Executivo para propor lei
orçamentária a norma que disponha, diretamente, sobre a
vinculação ou a destinação específica de receitas orçamentárias
(art. 165, III, da Constituição). A reserva de lei de iniciativa do
Chefe do Executivo, prevista no art. 61, § 1º, II, b, da
Constituição somente se aplica aos Territórios federais.
Inexistência de violação material, em relação aos arts. 167, IV e
212 da Constituição, na medida em que não há indicação de que
o valor destinado (2% sobre a receita orçamentária corrente
ordinária) excede o limite da receita resultante de impostos do
Estado (25% no mínimo) Ação Direta de Inconstitucionalidade
julgada procedente.”

18. Concluo, portanto, não haver vício formal na espécie.

III

19. Em relação aos vícios materiais de inconstitucionalidade,


renovando vênias ao pensamento diverso, sustento que nenhum deles
merece acolhida.

20. Não constato na espécie extrapolamento pelo Congresso


Nacional de suas competências legislativas para dispor sobre o regime
jurídico dos requisitórios federais. Nesse sentido, não se demonstra
adequado considerar existir nesse tema uma reserva de Constituição ou
do Poder Judiciário.

21. No esquadro de repartições de competências legislativas,


administrativas e jurisdicionais na Federação brasileira, observo que há
ampla liberdade conferida ao Poder Legislativo, incluso de entes
federados diversos da União, para conformarem a sistemática dos
precatórios e das Requisições de Pequeno Valor – RPV.

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Voto - MIN. ANDRÉ MENDONÇA

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ADI 5755 / DF

22. Justamente por isso, o Pleno deste Supremo Tribunal assentou


que é dado tanto ao Estado-membro quanto ao Município definirem
limites inferiores aos previstos no art. 87 do ADCT quanto às obrigações
de pequeno valor, conforme se vê na ADI nº 2.868/PI, Rel. Min. Ayres
Britto, Red. do Acórdão Min. Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, j.
02/06/2004, p. 12/11/2004.

23. Veja-se o que argumentado, em sede doutrinária, por Egon


Bockmann, Betina Grupenmacher, Rodrigo Kanayama e Diogo Agottani:

“Concomitantemente às mudanças realizadas pela via


legislativa constitucional, o Poder Judiciário também tem tido
atuação de destaque no âmbito da execução em face da Fazenda
Pública, especialmente com o controle concentrado de
constitucionalidade e com o exercício de alguma competência
reguladora, atuações nas quais se destacam o STF e o CNJ.
(...)
Conforme acima narrado, o regime dos precatórios tem
sede primária na CRFB. Lá estão definidos os imprescindíveis
limites à sua incidência. Contudo, fato é que a efetiva
aplicabilidade das normas constitucionais que o disciplinam
é delineada pelo Poder Legislativo ordinário, pelo Conselho
Nacional de Justiça – CNJ e por decisões do Supremo
Tribunal Federal – STF.
Isto é, muito embora no caso dos precatórios a
Constituição tenha dispositivos cuja leitura determina sua
aplicação imediata, sendo desnecessária qualquer
complementação infraconstitucional, fato é que a riqueza de
alternativas e minúcias – tanto do texto constitucional como
dos desafios fáticos na prática enfrentados – resultou na
atividade legiferante plurrisubjetiva das instituições públicas.
O que importa dizer que as fronteiras constitucionais são, na
prática, desenhadas pelos órgãos infraconstitucionais.”
(MOREIRA, Egon Bockmann et al. Precatórios: o seu novo regime

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jurídico: a visão do direito financeiro, integrada ao direito tributária e


ao direito econômico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 44
e 47, grifos nossos)

24. Tenho que, além de inexistirem razões jurídicas para tanto,


concluo que não tende a ser um boa diretiva constitucional ou política
judiciária indicar que referida matéria possui suposta “reserva de
Constituição”, sob pena de magistrados, Fazenda Pública e
jurisdicionados viverem em estado permanente de instabilidade, em
contrariedade ao ideal de segurança jurídica. Nessa linha, recorro ao
pensamento doutrinário do Ministro Presidente Luiz Fux e de Bruno
Bodart:

“Nessa linha, a Economia abrange a análise de todas as


questões conexas ao problema da alocação eficiente de recursos
limitados para a melhor satisfação dos interesses dos
integrantes do grupo analisado, dentre elas o modo como
agentes tomam decisões e a forma como interagem entre si.
Á luz do conceito ora apresentado, não é difícil deduzir o
motivo pelo qual a análise do Direito é de fundamental
importância para a Economia. Toda determinação imposta
pelas fontes do Direito influencia a forma como os indivíduos
se comportam na busca pelos seus interesses. A alteração dos
mandamentos legais gera modificações, intencionais ou não, na
forma como recursos são alocados na sociedade. Essas
mudanças decorrentes da configuração do ordenamento
jurídico podem constituir um resultado socialmente
indesejados ou que não confere a melhor satisfação possível ao
interesse dos envolvidos. Uma das principais características da
análise econômica do Direito, portanto, é concentrar o exame
das normas jurídicas exclusivamente nas suas consequências
(...) Sob a análise econômica, o Direito é uma política pública,
sendo que o raciocínio analítico teórico e a pesquisa empírica
são utilizados para torná-la mais eficiente no cumprimento dos
objetivos eleitos pela sociedade.” (FUX, Luiz; BODART, Bruno.
Processo Civil e Análise Econômica. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense,

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2021, p. 1-2)

25. A partir de exame atento da atual redação da Constituição da


República, desde a Emenda Constitucional nº 99, de 2017, extraio que o
cancelamento de precatórios não vindicados por credores inertes do
Poder Público em moldes semelhantes aos previstos na Lei nº 13.463, de
2017, ora atacada possui expressa previsão no texto constitucional. Eis o
teor do art. 101, §§ 2º, IV, do ADCT:

“Art. 101 (...)


§ 2º O débito de precatórios será pago com recursos
orçamentários próprios provenientes das fontes de receita
corrente líquida referidas no § 1º deste artigo e, adicionalmente,
poderão ser utilizados recursos dos seguintes instrumentos:
IV - a totalidade dos depósitos em precatórios e
requisições diretas de pagamento de obrigações de pequeno
valor efetuados até 31 de dezembro de 2009 e ainda não
levantados, com o cancelamento dos respectivos requisitórios e
a baixa das obrigações, assegurada a revalidação dos
requisitórios pelos juízos dos processos perante os Tribunais, a
requerimento dos credores e após a oitiva da entidade
devedora, mantidas a posição de ordem cronológica original e a
remuneração de todo o período.”

26. Veja-se que a legislação aqui impugnada fora promulgada em 6


de julho de 2017, ao passo que a Emenda Constitucional nº 99, em 14 de
dezembro do mesmo ano, referindo-se unicamente aos entes devedores –
Estados, Distrito Federal e Municípios – aptos a ingressarem no regime
especial de pagamento de requisitórios vencidos instaurado pela Emenda
Constitucional nº 94, de 2016. A meu sentir, cuida-se de experimentalismo
institucional perfectibilizado pelo Poder Constituinte Reformador a partir
dos posicionamentos proferidos por esta Corte.

27. A fim de evitar o retorno do argumento referente à “reserva de


constituição”, registro que a necessidade sentida pelo Poder Constituinte

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Reformador de positivar no ADCT o cancelamento de precatórios na


hipótese de inércia do credor como fonte de recursos do regime especial
para as unidades federadas inadimplentes diversas da União encontra
razão de ser na imprescindibilidade de um patamar mínimo de
uniformidade federativa nessa seara.

28. Em julgamento correlato a respeito do uso das disponibilidades


financeiras dos depósitos judiciais, colho da exposição inicial do e.
Ministro Relator Gilmar Mendes em Audiência Pública convocada por
Sua Excelência na ADI nº 5.072/RJ o seguinte:

“Embora o objeto da ação seja apenas a lei do Rio de


Janeiro - refiro-me à Lei Complementar nº 147 -, é evidente que
a questão constitucional em debate não diz respeito apenas à
norma deste Estado-membro. O desafio dos precatórios
atravessa várias fronteiras da nossa Federação, e as boas ou más
soluções construídas por alguns entes federados naturalmente
tendem a ser replicadas. Aliás, é de conhecimento público a
proliferação de legislações estaduais que regulamentam o uso
de depósitos judiciais tributários ou não para pagamento de
precatórios judiciais e outros pagamentos. As informações hoje
colhidas e o desfecho desse feito haverão de servir, não tenho
dúvidas, como parâmetro e norte para muitos outros estados.”

29. Ante essas razões, conjuntamente aos argumentos já esposados


em assentada anterior pelo e. Ministro Luís Roberto Barroso, deixo de
acolher o que sustentado pelo requerente sobre esses vícios materiais.

30. Quanto à alegação de afronta à igualdade entre os credores e


entre esses e o Poder Público, também a rejeito, pois há razão idônea
para diferenciar as situações em questão.

31. Sabe-se que nos dizeres do caput e do inciso I do art. 5º do texto


constitucional, “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 123 de 208

ADI 5755 / DF

natureza,” enquanto “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações,


nos termos desta Constituição.” No âmbito da atividade tributante do
Estado, temos que “é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios (....) instituir tratamento desigual entre contribuintes que se
encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de
ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da
denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos,” por força do inciso
II do art. 150 da Constituição de 1988.

32. Do pensamento doutrinário de Humberto Ávila, depreendo que


a igualdade é uma relação entre dois ou mais sujeitos a partir de um
critério que deve servir a uma finalidade. Então, a análise jurídica levada
a efeito abrange quatro elementos essenciais: (i) os sujeitos relacionais, (ii)
um critério ou uma medida de comparação, (iii) um elemento indicativo
dessa medida e (iv) uma finalidade (ÁVILA, Humberto. Teoria da
Igualdade Tributária. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 43-77)

33. No caso dos autos, na comparação entre um credor ativo e outro


inerte, o critério de comparação é justamente o exercício de um ônus
processual imputado ao exequente pelo direito processual pátrio, ou
mesmo ao credor de uma dívida quesível no direito obrigacional. O
elemento indicativo é razoável, isto é, lapso bienal, desde a efetiva
disponibilização do numerário em instituição financeira para saque em
favor do beneficiário do requisitório. Por fim, nos dizeres do Ministro
Roberto Barroso, a finalidade consiste em observar o princípio da
eficiência na gestão de recursos públicos escassos.

34. Assim, não consigo verificar a propalada desproporcionalidade


ou sequer o prejuízo perpetrado pelo mecanismo em tela ao patrimônio
jurídico de eventual afetado pelo cancelamento do requisitório. Isso
porque, segundo critérios temporais e impessoais de índole objetiva e
subjetiva, todos os jurisdicionais do Poder Público em juízo estão
submetidos às mesmas oportunidades para receber seus créditos.

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Conforme posto pelo Ministro Octavio Gallotti na ADI nº 47/SP, de sua


relatoria, Tribunal Pleno, DJ 13/06/1997, os fundamentos do regime dos
precatórios são de duas ordens:

“A regra da ordenação dos créditos resultantes de


condenação da Fazenda, em precatórios dispostos por ordem
cronológica, que advém das Constituições anteriores, tem dois
objetivos bem distintos a tutelar: um deles é a boa ordem da
elaboração e da execução orçamentárias; outro é o respeito da
igualdade entre os credores.”

35. A meu juízo, ambas as finalidades do regime constitucional de


precatórios estão satisfeitas na legislação hostilizada, caso comparados
dois credores nas situações narradas pela Ministra Relatora.

36. Igualmente, a situação parece ser de mais simples equalização se


considerado credor vis-à-vis União, porquanto é consabido que o regime
dos requisitórios consiste em uma prerrogativa institucional da Fazenda
Pública em juízo, sob a perspectiva do processo civil, conquanto na visão
do direito financeiro representa uma despesa pública, conversível em
dívida, derivada de condenação judicial a qual exige adequado
tratamento no ciclo orçamentário. Logo, de acordo com Francisco Wildo
Dantas, embora se trate de verdadeira execução, as características do
sistema dos requisitórios comportam matização em relação ao processo
executivo ordinário, porque de um lado substitui a sub-rogação pela
coação como meio executório e, de outro, obedece a um procedimento
específico e peculiar, marcado, por exemplo, pela impenhorabilidade dos
bens públicos (DANTAS, Francisco Wildo Lacerda. Execução contra a
Fazenda Pública: regime do precatório. Brasília: Brasília Jurídica, 1999, p. 61-
64).

37. De toda forma, caso desconsiderássemos essa plêiade de


prerrogativas processuais da Fazenda Nacional e comparássemos o
credor inerte com a União segundo as regras civilistas, ainda assim não

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visualizaríamos afronta à igualdade.

38. No caso de um devedor não conseguir localizar o credor para


proceder o pagamento de uma obrigação de quantia certa em dinheiro, o
caminho natural aos olhos do direito civil seria intentar uma ação de
consignação em pagamento, ex vi arts. 334 e ss. do Código Civil.
Reproduzo parcela dos dispositivos, no que interessa:

“Art. 334. Considera-se pagamento, e extingue a


obrigação, o depósito judicial ou em estabelecimento bancário
da coisa devida, nos casos e forma legais.
Art. 335. A consignação tem lugar:
I - se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar
receber o pagamento, ou dar quitação na devida forma;
II - se o credor não for, nem mandar receber a coisa no
lugar, tempo e condição devidos;
III - se o credor for incapaz de receber, for desconhecido,
declarado ausente, ou residir em lugar incerto ou de acesso
perigoso ou difícil;
IV - se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente
receber o objeto do pagamento;
V - se pender litígio sobre o objeto do pagamento.
Art. 336. Para que a consignação tenha força de
pagamento, será mister concorram, em relação às pessoas, ao
objeto, modo e tempo, todos os requisitos sem os quais não é
válido o pagamento.
Art. 337. O depósito requerer-se-á no lugar do
pagamento, cessando, tanto que se efetue, para o depositante,
os juros da dívida e os riscos, salvo se for julgado
improcedente.
Art. 338. Enquanto o credor não declarar que aceita o
depósito, ou não o impugnar, poderá o devedor requerer o
levantamento, pagando as respectivas despesas, e subsistindo
a obrigação para todas as consequências de direito.
Art. 339. Julgado procedente o depósito, o devedor já não
poderá levantá-lo, embora o credor consinta, senão de acordo

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com os outros devedores e fiadores.” (grifos nossos)

39. Convém rememorar que, quanto aos depósitos judiciais de


natureza tributária e não-tributária referentes à União, existem as Leis nº
9.703, de 1998, e nº 12.099, de 2009. No que toca ao último diploma, em
seu art. 3º, há comando que determina à Caixa Econômica Federal o
repasse dessas disponibilidades financeiras em favor de conta única do
Tesouro Nacional.

40. No art. 33 da Resolução nº 303, de 2019, do Conselho Nacional de


Justiça, se dispõe acerca do hodierno procedimento de cancelamento dos
requisitórios, de forma semelhante ao referido na Lei nº 13.463, de 2017:

“Art. 33. Informado aos Presidentes dos Tribunais


Regionais Federais e do Trabalho, pela instituição financeira, o
cancelamento de requisições de pagamento de que trata a Lei nº
13.463, de 6 de julho de 2017, e comunicado o fato ao juízo da
execução, este cientificará o credor.
§ 1º Efetuado o cancelamento, e havendo requerimento do
credor para a emissão de nova requisição de pagamento, além
dos requisitos obrigatórios, deverá ser observado o seguinte:
I – para fins de definição da ordem cronológica, o juízo da
execução informará o número da requisição cancelada;
II – será considerado o valor efetivamente transferido
pela instituição financeira para a Conta Única do Tesouro
Nacional;
III – será considerada a data-base da requisição de
pagamento e a data da transferência a que alude o inciso II
deste parágrafo, conforme indicado pela instituição
financeira;
IV – a requisição será atualizada pelo indexador previsto
na Lei de Diretrizes Orçamentárias, desde a data-base até o
efetivo depósito; e
V – não haverá incidência de juros nas requisições,
quando o cancelamento decorrer exclusivamente da inércia da

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ADI 5755 / DF

parte beneficiária.
§ 2º Desde que comunicada à instituição financeira,
consideram-se excluídos do cancelamento de que trata este
artigo os depósitos sobre os quais exista ordem judicial
suspendendo ou sustando a liberação dos respectivos valores a
qualquer título.
§ 3º Aplica-se no que couber o disposto neste artigo aos
demais tribunais.” (grifos nossos)

41. Em resumo, submetida a Fazenda Nacional ao regime previsto


no Código Civil, o estado de coisas seria imensamente mais benéfico a
esta e desfavorável ao credor, notadamente aquele que, de fato, tivesse
razões diversas da inércia para não levantar o alvará em função da
requisição judicial decorrente de processo ou fase de execução. Afinal,
mediante a ação consignatória, a União usufruiria imediatamente das
parcelas por si depositadas em juízo, ver-se-ia livre dos efeitos da mora,
independentemente dos motivos do exequente, repassaria parcialmente a
responsabilidade de citar o credor para o Estado-juiz e caso a demanda
fosse julgada improcedente, poderia levantar os valores ao final.

42. Então, com as devidas vênias, não há como encampar o


argumento no sentido da existência de uma afronta ao princípio da
igualdade na espécie.

43. Por fim, o último vício material acolhido pela Ministra Relatora e,
de certa forma, também pelo Ministro Roberto Barroso, refere-se à
necessidade de observância a prévia ciência do interessado para somente
em seguida proceder-se o cancelamento do precatório.

44. Conforme visto no já transcrito caput do art. 33 da Resolução CNJ


nº 303, de 2019, a ordem de trabalho prevista é diversa. Na verdade,
cuida-se de reprodução de comandos constantes nos §§ 3º e 4º do art. 2º
da Lei nº 13.463, de 2017, como assim se dispõe:

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“Art. 2º (...)
§3º Será dada ciência do cancelamento de que trata o
caput deste artigo ao Presidente do Tribunal respectivo.
§4º O Presidente do Tribunal, após a ciência de que trata o
§ 3º deste artigo, comunicará o fato ao juízo da execução, que
notificará o credor.”

45. Repise-se que, em consonância ao que posto em seu voto pela


Ministra Relatora, referidos dispositivos não foram impugnados na
petição inicial. Assim, sob pena de incorrer em pronunciamento
judicial extra petita ou violar o postulado básico de que o pedido na
ação direta não é aberto, as alternativas viáveis a este juízo eram (i) não
conhecer desta parcela da demanda em razão da não impugnação de
todo o complexo normativo ou (ii) desconhecer desse argumento, em
observância ao princípio da congruência ou da adstrição.

46. De toda forma, a metodologia de trabalho no mecanismo ora


discutido traduz-se nas seguintes fases: (i) a instituição financeira verifica
a fluência in albis do prazo bienal, após múltiplas tentativas de localizar o
patrono da causa ou o beneficiário do requisitório; (ii) cancelará e dará
ciência desse expediente à autoridade requisitante, ou seja, o Presidente
do Tribunal respectivo; (iii) a Chefia desse órgão jurisdicional comunicará
esse fato ao juízo da execução; e (iv) este notificará ou cientificará o
credor.

47. Compreendo que esse procedimento não viola o devido


processo legal ou a segurança jurídica por duas razões. Primeira, o
expediente em tela tem natureza eminentemente administrativa,
conforme bem destacado pela própria Relatora ao início de seu voto, ao
evocar o enunciado nº 311 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça e o
enunciado nº 733 da Súmula do STF. No mais, fala-se aqui da última fase
da realização dessa despesa pública, a de pagamento, após o transcurso a
contento de um processo judicial em face da Fazenda Pública
caracterizado, por vezes, em fases cognitivas, cautelares e executivas.

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ADI 5755 / DF

48. Nos termos do art. 58 da Lei nº 4.320, de 1964, o empenho inicia a


fase administrativa da execução da despesa pública, criando a obrigação
de realizar uma determinada parcela da dotação orçamentária. Depois,
segue-se com a liquidação, que consiste na verificação do direito
adquirido pelo credor, com base nos títulos e documentos
comprobatórios do respectivo crédito, em conformidade ao art. 63 da
mesma lei. Posteriormente, ex vi art. 64 desse diploma, há a ordem de
pagamento na qual se determina que a despesa seja paga. Enfim, a
execução da despesa encerra-se com o pagamento, o qual se realiza
apenas quando a autoridade competente atesta a regular liquidação da
despesa, sendo posteriormente feita ordem bancária ou cheque
nominativo, nos termos do art. 74 do Decreto-Lei nº 200, de 1967.
Segundo Haber, Christopoulos e Torres, “cabe ressalvar que a ordem jurídica
de pagamento não se confunde com o ato do depósito bancário na conta do credor.
A fase de pagamento possui dois momentos: aquele em que se manda pagar, e
aquele em que se paga efetivamente” (HABER, Michel; CHRISTOPOULOS,
Basile Georges Campos; TORRES, Ricardo Ezequiel. Despesa Pública.
OLIVEIRA, Regis Fernandes de et al (coord.). Lições de Direito Financeiro.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 47).

49. A despeito de serem concebíveis inúmeras razões que esculpem


um credor que tenha movido o maquinário estatal para obter uma
prestação jurisdicional em seu favor condenando o Estado a pagar-lhe
quantia certa em dinheiro, mas posteriormente não tenha levantado esse
valor, embora a si disponibilizado por dois anos em instituição financeira
oficial, estamos a tratar de ato administrativo na última fase da execução
de despesa pública, e não propriamente de ato processual no curso de
um feito. Assim, com as devidas vênias, mostra-se inteiramente
inaplicável o art. 9º do Código de Processo Civil na espécie, segundo o
qual “não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja
previamente ouvida.” Cumpre reavivar que os pronunciamentos do juiz
estão taxativamente dispostos no CPC em seus arts. 203 e 204 – sentenças,

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 130 de 208

ADI 5755 / DF

acórdãos decisões interlocutórias e despachos –, portanto não é disso que


se trata na presente hipótese.

50. Segunda razão que me leva a discordar de solução pela


declaração de inconstitucionalidade do objeto impugnado ou pelo
emprego de interpretação conforme diz respeito à eficiência
administrativa da atual metodologia de trabalho, em detrimento da
alternativa proposta, a saber, trazer a intimação pessoal do exequente
inerte para o primeiro momento do algoritmo de cancelamento do
precatório.

51. Na verdade, parece-me um exercício pouco producente imaginar


que uma instituição financeira com alcance nacional, dotada de
instrumentos de localização e cobrança, robustecida recentemente com o
open banking, tenha por dois sucessivos anos procurado sem sucesso um
advogado profissional a receber honorários advocatícios sucumbenciais e
um jurisdicionado credor da União, porém se acredite que o juízo de
execução terá maiores chances de êxito, informado por citações por edital,
oficiais de justiça e expedientes correlatos.

52. Pelo contrário, na minha humilde prognose, respectiva


proposição tenderá a incrementar a taxa de congestionamento dos
processos judiciais em fase executiva, além de caminhar em direção
diametralmente oposta à política judiciária de desjudicialização das
execuções cíveis promovida pelo Conselho Nacional de Justiça. Como
indício empírico disso, rememoro estudo conduzido pelo IPEA, a pedido
do CJF, no qual se constatou que um quarto das execuções fiscais da
Justiça Federal não vence a citação do contribuinte (INSTITUTO DE
PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. CONSELHO NACIONAL DE
JUSTIÇA. Custo-Unitário do Processo de Execução Fiscal na Justiça Federal:
Relatório de Pesquisa. Brasília/DF: IPEA/CNJ, 2011. INSTITUTO DE
PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Custo e Tempo do Processo de
Execução Fiscal Promovido pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

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ADI 5755 / DF

Brasília/DF: IPEA, Nov. 2011).

53. Convém rememorar que essa realidade empírica não é alheia aos
raciocínios jurídicos deste Supremo Tribunal, como se verifica no juízo de
proporcionalidade levado a efeito, com maestria, na ADI nº 5.135/DF, Rel.
Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, DJe 07/02/2018, assim ementado:

“Ementa: Direito tributário. Ação direta de


inconstitucionalidade. Lei nº 9.492/1997, art. 1º, parágrafo único.
Inclusão das certidões de dívida ativa no rol de títulos sujeitos a
protesto. Constitucionalidade. 1. O parágrafo único do art. 1º da
Lei nº 9.492/1997, inserido pela Lei nº 12.767/2012, que inclui as
Certidões de Dívida Ativa - CDA no rol dos títulos sujeitos a
protesto, é compatível com a Constituição Federal, tanto do
ponto de vista formal quanto material. 2. Em que pese o
dispositivo impugnado ter sido inserido por emenda em
medida provisória com a qual não guarda pertinência temática,
não há inconstitucionalidade formal. É que, muito embora o
STF tenha decidido, na ADI 5.127 (Rel. Min. Rosa Weber, Rel. p/
acórdão Min. Edson Fachin, j. 15.10.2015), que a prática,
consolidada no Congresso Nacional, de introduzir emendas
sobre matérias estranhas às medidas provisórias constitui
costume contrário à Constituição, a Corte atribuiu eficácia ex
nunc à decisão. Ficaram, assim, preservadas, até a data daquele
julgamento, as leis oriundas de projetos de conversão de
medidas provisórias com semelhante vício, já aprovadas ou em
tramitação no Congresso Nacional, incluindo o dispositivo
questionado nesta ADI. 3. Tampouco há inconstitucionalidade
material na inclusão das CDAs no rol dos títulos sujeitos a
protesto. Somente pode ser considerada “sanção política”
vedada pelo STF (cf. Súmulas nº 70, 323 e 547) a medida
coercitiva do recolhimento do crédito tributário que restrinja
direitos fundamentais dos contribuintes devedores de forma
desproporcional e irrazoável, o que não ocorre no caso do
protesto de CDAs. 3.1. Em primeiro lugar, não há efetiva
restrição a direitos fundamentais dos contribuintes. De um

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lado, inexiste afronta ao devido processo legal, uma vez que (i)
o fato de a execução fiscal ser o instrumento típico para a
cobrança judicial da Dívida Ativa não exclui mecanismos
extrajudiciais, como o protesto de CDA, e (ii) o protesto não
impede o devedor de acessar o Poder Judiciário para discutir a
validade do crédito. De outro lado, a publicidade que é
conferida ao débito tributário pelo protesto não representa
embaraço à livre iniciativa e à liberdade profissional, pois não
compromete diretamente a organização e a condução das
atividades societárias (diferentemente das hipóteses de
interdição de estabelecimento, apreensão de mercadorias, etc).
Eventual restrição à linha de crédito comercial da empresa
seria, quando muito, uma decorrência indireta do instrumento,
que, porém, não pode ser imputada ao Fisco, mas aos próprios
atores do mercado creditício. 3.2. Em segundo lugar, o
dispositivo legal impugnado não viola o princípio da
proporcionalidade. A medida é adequada, pois confere maior
publicidade ao descumprimento das obrigações tributárias e
serve como importante mecanismo extrajudicial de cobrança,
que estimula a adimplência, incrementa a arrecadação e
promove a justiça fiscal. A medida é necessária, pois permite
alcançar os fins pretendidos de modo menos gravoso para o
contribuinte (já que não envolve penhora, custas, honorários,
etc.) e mais eficiente para a arrecadação tributária em relação ao
executivo fiscal (que apresenta alto custo, reduzido índice de
recuperação dos créditos públicos e contribui para o
congestionamento do Poder Judiciário). A medida é
proporcional em sentido estrito, uma vez que os eventuais
custos do protesto de CDA (limitações creditícias) são
compensados largamente pelos seus benefícios, a saber: (i) a
maior eficiência e economicidade na recuperação dos créditos
tributários, (ii) a garantia da livre concorrência, evitando-se que
agentes possam extrair vantagens competitivas indevidas da
sonegação de tributos, e (iii) o alívio da sobrecarga de processos
do Judiciário, em prol da razoável duração do processo. 4. Nada
obstante considere o protesto das certidões de dívida

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constitucional em abstrato, a Administração Tributária deverá


se cercar de algumas cautelas para evitar desvios e abusos no
manejo do instrumento. Primeiro, para garantir o respeito aos
princípios da impessoalidade e da isonomia, é recomendável a
edição de ato infralegal que estabeleça parâmetros claros,
objetivos e compatíveis com a Constituição para identificar os
créditos que serão protestados. Segundo, deverá promover a
revisão de eventuais atos de protesto que, à luz do caso
concreto, gerem situações de inconstitucionalidade (e.g.,
protesto de créditos cuja invalidade tenha sido assentada em
julgados de Cortes Superiores por meio das sistemáticas da
repercussão geral e de recursos repetitivos) ou de ilegalidade
(e.g., créditos prescritos, decaídos, em excesso, cobrados em
duplicidade). 5. Ação direta de inconstitucionalidade julgada
improcedente. Fixação da seguinte tese: ‘O protesto das
Certidões de Dívida Ativa constitui mecanismo constitucional e
legítimo, por não restringir de forma desproporcional
quaisquer direitos fundamentais garantidos aos contribuintes e,
assim, não constituir sanção política’.”

54. Na mesma linha, em obiter dictum, verifica-se argumentação


favorável desenhada pelo Ministro Roberto Barroso em relação à
securitização da dívida ativa dos entes públicos nas ADIs Nº 3.786/DF e
Nº 3.845/DF, ambas Rel. Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, DJe
18/12/2019.

55. Por fim, igual e ponderável cotejo foi realizado na ADI nº


5.886/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. do Acórdão Min. Roberto
Barroso, Tribunal Pleno, DJe 05/04/2021, a respeito da averbação de
Certidão de Dívida Ativa em órgãos de registro e indisponibilidade de
bens do devedor em fase pré-executória.

56. Em suma, rejeito também neste tópico quaisquer ofensas às


garantias fundamentais pertinentes ao processo, notadamente o
contraditório, a ampla defesa, o devido processo legal e a

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ADI 5755 / DF

inafastabilidade jurisdicional.

IV

57. Conforme já anunciado no preâmbulo deste voto-vogal, além


desta diminuta divergência com relação ao voto-vista elaborado pelo e.
Ministro Roberto Barroso, peço, ainda, escusas para discordar da posição
adotada por Sua Excelência quanto ao emprego de interpretação
conforme à Constituição no objeto desta ação direta para fins de
assentar que “a transferência de recursos para a Conta Única do Tesouro
Nacional pressuponha a ausência de mora da União no pagamento de
tais requisições.”

58. Pauto mencionada dissonância basicamente no fato de que,


desde a sessão virtual realizada em maio de 2021 na qual Sua Excelência
devolvera os autos para prosseguir com o julgamento, houve a
promulgação da Emenda Constitucional nº 114, em 16 de dezembro de
2021. Por meio dela, acresceu-se no Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias o art. 107-A no âmbito do Novo Regime Fiscal da União, no
qual se dispõe:

“Art. 107-A. Até o fim de 2026, fica estabelecido, para cada


exercício financeiro, limite para alocação na proposta
orçamentária das despesas com pagamentos em virtude de
sentença judiciária de que trata o art. 100 da Constituição
Federal, equivalente ao valor da despesa paga no exercício de
2016, incluídos os restos a pagar pagos, corrigido na forma do §
1º do art. 107 deste Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias, devendo o espaço fiscal decorrente da diferença
entre o valor dos precatórios expedidos e o respectivo limite ser
destinado ao programa previsto no parágrafo único do art. 6º e
à seguridade social, nos termos do art. 194, ambos da
Constituição Federal, a ser calculado da seguinte forma:
I - no exercício de 2022, o espaço fiscal decorrente da
diferença entre o valor dos precatórios expedidos e o limite

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estabelecido no caput deste artigo deverá ser destinado ao


programa previsto no parágrafo único do art. 6º e à seguridade
social, nos termos do art. 194, ambos da Constituição Federal;
II - no exercício de 2023, pela diferença entre o total de
precatórios expedidos entre 2 de julho de 2021 e 2 de abril de
2022 e o limite de que trata o caput deste artigo válido para o
exercício de 2023; e
III - nos exercícios de 2024 a 2026, pela diferença entre o
total de precatórios expedidos entre 3 de abril de dois anos
anteriores e 2 de abril do ano anterior ao exercício e o limite de
que trata o caput deste artigo válido para o mesmo exercício.
§ 1º O limite para o pagamento de precatórios
corresponderá, em cada exercício, ao limite previsto no caput
deste artigo, reduzido da projeção para a despesa com o
pagamento de requisições de pequeno valor para o mesmo
exercício, que terão prioridade no pagamento.
§ 2º Os precatórios que não forem pagos em razão do
previsto neste artigo terão prioridade para pagamento em
exercícios seguintes, observada a ordem cronológica e o
disposto no § 8º deste artigo.
§ 3º É facultado ao credor de precatório que não tenha
sido pago em razão do disposto neste artigo, além das hipóteses
previstas no § 11 do art. 100 da Constituição Federal e sem
prejuízo dos procedimentos previstos nos §§ 9º e 21 do referido
artigo, optar pelo recebimento, mediante acordos diretos
perante Juízos Auxiliares de Conciliação de Pagamento de
Condenações Judiciais contra a Fazenda Pública Federal, em
parcela única, até o final do exercício seguinte, com renúncia de
40% (quarenta por cento) do valor desse crédito.
§ 4º O Conselho Nacional de Justiça regulamentará a
atuação dos Presidentes dos Tribunais competentes para o
cumprimento deste artigo.
§ 5º Não se incluem no limite estabelecido neste artigo as
despesas para fins de cumprimento do disposto nos §§ 11, 20 e
21 do art. 100 da Constituição Federal e no § 3º deste artigo,
bem como a atualização monetária dos precatórios inscritos no

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exercício.
§ 6º Não se incluem nos limites estabelecidos no art. 107
deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias o
previsto nos §§ 11, 20 e 21 do art. 100 da Constituição Federal e
no § 3º deste artigo.
§ 7º Na situação prevista no § 3º deste artigo, para os
precatórios não incluídos na proposta orçamentária de 2022, os
valores necessários à sua quitação serão providenciados pela
abertura de créditos adicionais durante o exercício de 2022.
§ 8º Os pagamentos em virtude de sentença judiciária de
que trata o art. 100 da Constituição Federal serão realizados na
seguinte ordem:
I - obrigações definidas em lei como de pequeno valor,
previstas no § 3º do art. 100 da Constituição Federal;
II - precatórios de natureza alimentícia cujos titulares,
originários ou por sucessão hereditária, tenham no mínimo 60
(sessenta) anos de idade, ou sejam portadores de doença grave
ou pessoas com deficiência, assim definidos na forma da lei, até
o valor equivalente ao triplo do montante fixado em lei como
obrigação de pequeno valor;
III - demais precatórios de natureza alimentícia até o valor
equivalente ao triplo do montante fixado em lei como obrigação
de pequeno valor;
IV - demais precatórios de natureza alimentícia além do
valor previsto no inciso III deste parágrafo;
V - demais precatórios."

59. Nessa linha, diante desse novel bloco de constitucionalidade, a


interpretação conforme a Constituição proposta terminaria por
suspender na prática a eficácia da legislação em questão até 2026, a
título de “preservar a validade da lei questionada” conforme consta no item 8
do voto-vista.

60. Na doutrina constitucionalista, é possível encontrar algumas


considerações críticas a esse expediente na forma como vem sendo
utilizado pela Corte em algumas oportunidades, conforme se depreende

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de argumentação desenvolvida por Virgílio Afonso da Silva:

“A interpretação conforme a constituição, na forma como


definida pela doutrina, não tem como resultado excluir casos ou
destinatários da aplicação da norma, enquanto esse é o
resultado por excelência da declaração de nulidade parcial sem
modificação de texto. Isso significa que a declaração de
nulidade não pretende salvar a lei mudando seu significado,
mas excluindo sua aplicação para determinados casos ou
determinados destinatários (...) Com isso, fica clara uma terceira
diferença metodológica: a interpretação conforme a constituição
tem como objetivo evitar, em abstrato, a inconstitucionalidade
de uma norma. Já a nulidade parcial sem modificação de texto
não se refere à definição do conteúdo da norma em abstrato,
mas de sua aplicação em concreto.
(...)
A falha da interpretação conforme a constituição reside
justamente no fato de não conseguir nem ao menos
desempenhar essa função, porquanto aponta para uma direção
completamente equivocada, que se baseia no dever de tentar
salvar toda e qualquer lei que, ainda que minimamente, possua
alguma fagulha de constitucionalidade. Nesse sentido, o topos
‘interpretação conforme a constituição’ é, na minha opinião,
equivocado.” (SILVA, Virgílio Afonso da. Interpretação
conforme a Constituição: entre a trivialidade e a centralização
judicial. Revista Direito GV, São Paulo, v. 2, n. 1, p. 191-210, jan.-
jun. 206, p. 201-202 e 204)

61. No caso dos autos, cuida-se de potencial efeito temeroso da


prestação jurisdicional por este Supremo Tribunal, uma vez que, nos
termos da Emenda Constitucional nº 114, de 2021, o espaço fiscal gerado
pelo parcelamento dos precatórios federais até o exercício de 2026 será
parcialmente destinado a programas de assistência social. Isso inclui
atender à seguinte ordem do Supremo Tribunal Federal, presente no MI
nº 7.300/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. do Acórdão Min. Gilmar

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Voto - MIN. ANDRÉ MENDONÇA

Inteiro Teor do Acórdão - Página 138 de 208

ADI 5755 / DF

Mendes, Tribunal Pleno, DJe 23/08/2021:

“7. Determinação para que o Poder Executivo Federal


implemente, no exercício fiscal seguinte ao da conclusão do
julgamento do mérito (2022), a fixação do valor disposto no art.
2º da Lei 10.835/2004 para o estrato da população brasileira em
situação de vulnerabilidade socioeconômica. Art. 8º, I, da Lei
13.300/2016. 8. Apelo aos Poderes Legislativo e Executivo para
que adotem as medidas administrativas e/ou legislativas
necessárias à atualização dos valores dos benefícios básicos e
variáveis do programa Bolsa Família (Lei 10.836/2004), isolada
ou conjuntamente, e, ainda, para que aprimorem os programas
sociais de transferência de renda atualmente em vigor,
mormente a Lei 10.835/2004, unificando-os, se possível. 9.
Concessão parcial da ordem injuncional.”

62. Mesmo antes disso, verifico que o § 2º do art. 2º da Lei nº 13.463,


de 2017, destinava os recursos decorrentes do cancelamento de
precatórios dos entes federais não vindicados para as seguintes
finalidades:

“§ 2º Do montante cancelado:
I - pelo menos 20% (vinte por cento) deverá ser aplicado
pela União na manutenção e desenvolvimento do ensino;
II - pelo menos 5% (cinco por cento) será aplicado no
Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados
de Morte (PPCAAM).” (grifos nossos)

63. Portanto, sob o risco de inviabilizar a aplicabilidade da legislação


ora atacada até o ano de 2026, caso se interprete que, por força da
Emenda Constitucional nº 114, de 2021, a União esteja inadimplente com
os pagamentos de seus requisitórios, ouso divergir da proposta do
Ministro Roberto Barroso no sentido de refutar a interpretação
conforme sugerida.

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Voto - MIN. ANDRÉ MENDONÇA

Inteiro Teor do Acórdão - Página 139 de 208

ADI 5755 / DF

63. Pelo exposto, conheço da ação direta de inconstitucionalidade e,


no mérito, após a conversão da apreciação da medida cautelar em
julgamento definitivo do mérito, voto pela improcedência do pedido.

Ministro ANDRÉ MENDONÇA

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Confirmação de Voto

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30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

CONFIRMAÇÃO DE VOTO

O SENHOR LUÍS MINISTRO ROBERTO BARROSO - Presidente,


Vossa Excelência me permite um momentinho? É só para dizer que o meu
voto, como observado pelos Colegas que me antecederam, é anterior a
essa modificação.
Então, para ser sincero e pessoalmente, não julgo uma dificuldade
assim extremada. Porém, se a maioria dos Colegas entender que, com a
superveniência da emenda constitucional, ficaria complexa a não
transferência para o Tesouro, esse é um ponto menor, e se o Ministro
Gilmar, que divergiu, estiver de acordo, eu reajusto meu voto para
acompanhar a maioria.
Só para dizer, eu mantenho o meu voto. Mas, em prevalecendo o
entendimento diverso da Relatora coincidente com a parte principal do
meu voto, eu não teria dificuldade de reajustar, se estiver bem para todos.
Só para fazer esse registro.

Documento assinado eletronicamente pelo(a) Min. Roberto Barroso, conforme o Art. 205, § 2º, do CPC. O documento pode ser acessado pelo endereço
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Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 141 de 208

30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

VOTO

O SENHOR MINISTRO NUNES MARQUES: O Partido


Democrático Trabalhista (PDT) ajuizou esta ação direta de
inconstitucionalidade contra o art. 2º, caput e § 1º, da Lei federal n. 13.463,
de 6 de julho de 2017. Eis o teor do dispositivo:

Art. 2º Ficam cancelados os precatórios e as RPV federais


expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo
credor e estejam depositados há mais de dois anos em
instituição financeira oficial.
§ 1º O cancelamento de que trata o caput deste artigo será
operacionalizado mensalmente pela instituição financeira
oficial depositária, mediante a transferência dos valores
depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional.

O proponente afirma que o cancelamento de precatórios e RPVs


conforme previsto na norma impugnada, a ser feito diretamente pelas
instituições financeiras oficiais depositárias, vulnera o postulado da
separação e independência entre os poderes da República (CF, art. 2º); os
princípios da igualdade, da segurança jurídica (CF, art. 5º, caput) e da
inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV); bem assim a garantia da
coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI).

Remetendo ao precedente firmado na ADI 3.453, da relatoria da


ministra Cármen Lúcia, aponta violação também à reserva constitucional
para o estabelecimento das condições necessárias ao pagamento dos
precatórios, além de desrespeito ao papel confiado ao Poder Judiciário
para a gestão dos requisitórios (CF, art. 100, § 6º).

Em sessão plenária virtual, a ministra Rosa Weber, Relatora, votou


pelo conhecimento da ação e pela procedência do pedido nela formulado,

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Voto - MIN. NUNES MARQUES

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ADI 5755 / DF

declarando a inconstitucionalidade do dispositivo legal em tela. Concluiu


Sua Excelência:

[...]
Desse modo, à luz da fundamentação expendida, é forçoso
concluir que o legislador não observou o regramento da Lei
Fundamental e produziu, por conseguinte, normas eivadas do
vício de inconstitucionalidade.
8. Ante o exposto, conheço da presente a ação direta e
julgo procedente o pedido, para declarar a
inconstitucionalidade material do art. 2º, caput e § 1º, da Lei nº
13.463/2017.

Na ocasião, o ministro Roberto Barroso abriu divergência,


entendendo que a melhor solução consistiria em assentar-se a
constitucionalidade da norma desde que a ela se desse interpretação
conforme à Carta da República nos termos que propôs.

O feito veio ao Plenário presencial por força de pedido de destaque


do ministro Gilmar Mendes.

Esse o contexto, passo ao voto.

Antes de tudo, é preciso anotar que, a despeito de o arcabouço


normativo atinente ao regime de pagamento dos precatórios judiciais ter
as diretrizes definidas na Constituição Federal (hoje no art. 100), segundo
longa tradição brasileira (CF/1934, art. 182; CF/1937, art. 95; CF/1946, art.
204; CF/1967, art. 112; CF/1967 com a redação da Emenda Constitucional
n. 1/1969, art. 117), não há óbice algum a que norma infraconstitucional
disponha sobre minúcias orçamentárias e financeiras em torno do tema,
tanto mais porque a Carta da República, nem a atual, nem as anteriores,
jamais descreveu, em seus mais recônditos pormenores, o procedimento
de liquidação orçamentária dessas despesas públicas.

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Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 143 de 208

ADI 5755 / DF

Está claro, todavia, que não é dado ao legislador infraconstitucional


contrariar as regras e os princípios consagrados no Texto Constitucional.
Logo, o cerne da controvérsia posta nestes autos está em saber se a
previsão legal do cancelamento de precatórios não reclamados após certo
tempo de espera é compatível com o disposto no art. 100 da Lei Maior.

Em diversas passagens, a própria Carta Magna indica a necessidade


de atuação do legislador com a finalidade de colmatar a disciplina do
processamento dos precatórios (a título ilustrativo, nos §§ 2º, 3º, 4º e 11 do
art. 100 da CF/1988). Por óbvio, ao Poder Constituinte, originário ou
mesmo derivado, não poderia ser entregue o ônus de esgotar a matéria, a
qual apresenta inúmeras vicissitudes de ordem burocrática.

Resulta insubsistente, portanto, a ideia de inconstitucionalidade tão


somente por estar o regime dos precatórios precipuamente definido na
Constituição de 1988 (art. 100 da parte principal e alguns outros do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias).

A gestão da verba confiada ao Poder Judiciário, por sua vez, deve ser
exercida de acordo com a legislação existente, e aí se inserem sobretudo
os mandamentos constitucionais, mas não apenas eles.

Não há base para afirmar que as importâncias afetadas aos


requisitórios, mesmo aquelas já depositadas à disposição da Presidência
do Tribunal (CF, art. 100, caput), integram o patrimônio da pessoa, quer
física, quer jurídica, que tenha litigado contra a Fazenda Pública. De fato,
a propriedade do numerário apenas se transfere para o credor com a
tradição, isto é, quando o recurso estiver em conta pessoal do credor, ou
for por este sacado em espécie, momento em que, por consequência,
ocorrerá a quitação do débito.

As quantias, até que sejam recebidas pelos credores, mantêm-se


públicas. É dizer, durante o interregno que vai do depósito à disposição

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Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 144 de 208

ADI 5755 / DF

do Judiciário até antes da transferência para conta pessoal do credor, ou


de saque por este, permanecem como recursos da Fazenda Pública,
embora comprometidas com o pagamento de condenações judiciais
transitadas em julgado. A maior prova disso é que, se eventualmente, por
algum erro sistêmico, ou em razão de alguma fraude praticada por
terceiro, esse dinheiro viesse a desaparecer, ainda quando sob a
responsabilidade da Presidência do Tribunal, não se poderia dizer que a
perda deveria ser suportada pelo credor da Fazenda. Este ainda não seria
o “dono” do numerário, que ainda não estaria à sua disposição – e,
conforme o brocardo milenar do direito privado, a coisa perece contra o
dono (res perit domino).

Revela tudo isso aspectos peculiares da atuação estatal no campo


financeiro, ou seja, no capítulo do pagamento de débitos decorrentes de
decisões judiciais definitivas. Tais despesas, embora fixadas por meio de
decisão judicial transitada em julgado, precisam receber o prévio e
necessário tratamento orçamentário-financeiro típico dos desembolsos
estatais.

É fácil concluir, portanto, que o dispositivo legal ora impugnado se


insere na esfera do direito financeiro. Eis por que é perfeitamente
legítimo a União haver legislado sobre a matéria (CF, art. 24, I).

Também regras infraconstitucionais, volto a dizer, podem disciplinar


a gestão dos precatórios, a cargo dos presidentes dos tribunais (CF, art.
100, principalmente os §§ 6º e 7º).

Feita essa explanação, calha uma pequena retificação ao que disse o


proponente.

Inexiste previsão a autorizar que instituições financeiras procedam


ao cancelamento de precatórios ou requisições de pequeno valor (RPVs)
federais. A lei não retira poderes dos presidentes dos tribunais

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Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 145 de 208

ADI 5755 / DF

transferindo-os aos bancos.

Em verdade, eventuais cancelamentos, com a devolução de valores


aos cofres da União, segundo a lei impugnada, têm natureza ipso jure.
Decorrem, pois, de expressa previsão legal, num procedimento
automático, sem mínima margem de discricionariedade para quem quer
que seja. Não é dado ao presidente de tribunal nem ao agente bancário
o poder de decidir a respeito.

Sendo assim, na dicção da lei, às instituições financeiras oficiais


caberá apenas, e de maneira vinculada, realizar os procedimentos
bancários pertinentes, depositando de volta, na Conta Única do Tesouro
Nacional, a importância não resgatada pelo credor da União.

Desse modo, tenho como ausente a alegada inconstitucionalidade


formal.

Sob a ótica material, para bem investigar a existência de ofensa à


Carta da República, permito-me, de início, uma indagação de abordagem
inversa: seria constitucional que recursos públicos pudessem permanecer
indefinidamente depositados em conta bancária, à espera de que um dia
o credor comparecesse para resgatá-los?

A resposta há de ser negativa. Dentre tantos fundamentos para ela,


exsurge o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, a
desautorizar que recursos estatais fiquem imobilizados sine die, até que
certa pessoa decida recebê-los.

A paralisia de recursos públicos, mormente em tempos de escassez e


dificuldade fiscal, retrata nítido exemplo de ineficiência administrativa,
ao arrepio dos princípios consagrados no art. 37, caput, da Constituição
Federal.

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 146 de 208

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Ainda, não se pode perder de vista os aspectos práticos da questão:


recursos públicos imobilizados, sem qualquer utilização, representam
prejuízo ao Estado e à sociedade, favorecendo, ademais, a prática de
fraudes contra o erário.

Por esse ângulo, não vislumbro na norma em tela ofensa ao núcleo


essencial da propriedade, consagrada na Lei Maior como direito
fundamental de primeira geração e princípio norteador da ordem
econômica (CF, arts. 5º, caput, e 170, II).

Recordo-me que, numa situação até mais delicada (quando o


depósito à disposição da Justiça era indubitavelmente da parte adversa, e
não da Fazenda), o Tribunal, em decisão unânime, teve ocasião de
declarar a constitucionalidade de lei que autorizava a movimentação,
pela Fazenda, dos depósitos judiciais. Confira-se:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI


FEDERAL N. 9.703/98, QUE DISPÕE SOBRE DEPÓSITOS
JUDICIAIS E EXTRAJUDICIAIS DE VALORES REFERENTES A
TRIBUTOS E CONTRIBUIÇÕES FEDERAIS. MEDIDA
LIMINAR ANTERIORMENTE CONCEDIDA. ALEGAÇÃO DE
OFENSA AO DISPOSTO NOS ARTIGOS 2º, 5º, CAPUT E
INCISO LIV, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. NÃO
CARACTERIZAÇÃO. AÇÃO DIRETA JULGADA
IMPROCEDENTE. 1. Ausência de violação do princípio da
harmonia entre os poderes. A recepção e a administração dos
depósitos judiciais não consubstanciariam atividade
jurisdicional. 2. Ausência de violação do princípio do devido
processo legal. O levantamento dos depósitos judiciais após o
trânsito em julgado da decisão não inova no ordenamento. 3.
Esta Corte afirmou anteriormente que o ato normativo que
dispões sobre depósitos judiciais e extrajudiciais de tributos
não caracteriza confisco ou empréstimo compulsório.
ADI/MC n. 2.214. 4. O depósito judicial consubstancia
faculdade do contribuinte. Não se confunde com o empréstimo

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 147 de 208

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compulsório. 5. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada


improcedente.
(ADI 1.933, Relator o ministro Eros Grau, julgamento em
14 de abril de 2010 – grifei)

Como já fiz ver, a importância consignada a certo precatório, mesmo


se depositada à disposição do Judiciário (CF, art. 100, caput), não é ainda
propriedade do credor, com todos os atributos previstos na legislação
civil (Código Civil, art. 1.228, caput). Para isso, é necessário que o credor
antes proceda ao recebimento da quantia, seja em alguma conta de sua
titularidade, seja por meio de saque em espécie.

Há mais. A propriedade, ainda que já estivesse configurada, com


todas as prerrogativas que lhe são próprias, poderia até mesmo ser
perdida pelo abandono, e, por maioria de razão, é permitido ao legislador
criar prazos preclusivos, fazendo o processo retroagir a fases anteriores
caso a parte interessada permaneça inerte em algum momento crucial do
feito.

A busca pela efetividade da jurisdição e a garantia da coisa julgada


também estão sujeitas à relativização, nos quadrantes da razoabilidade e
da proporcionalidade, em favor da realização de outros direitos
constitucionais. Desse modo, os postulados da jurisdição efetiva e da
coisa julgada não podem servir de justificativa para que dinheiros
públicos fiquem indefinidamente paralisados, à espera de que algum dia
os credores do Estado compareçam para recebê-los.

A suposta inconstitucionalidade surgiria se a norma impugnada


transbordasse dos limites da razoabilidade, em ofensa à cláusula do due
process of law em seu aspecto material (CF, art. 5º, LIV).

Todavia, o prazo de 2 anos assinado para o credor receber o que lhe


é devido parece-me até um pouco mais que o bastante. O art. 1.820 do
Código Civil, por exemplo, estipula o limite de 1 ano, contado da

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 148 de 208

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expedição dos editais respectivos, sem qualquer reclamação, para que


uma herança seja declarada vacante. Ora, aqui estamos falando de 2 anos
após o depósito dos valores em conta à disposição do Judiciário. É
bastante tempo para que o credor ou seus sucessores possam reclamar o
valor depositado.

Acresce que o cancelamento dos precatórios e das RPVs não revoga


a coisa julgada nem elimina o direito de crédito do litigante contra a
Fazenda Pública. Tal crédito, se não prescrito, pode ser novamente
lançado em orçamento, a requerimento do credor, inclusive com correção
monetária e respeitada a sua ordem cronológica original, conforme
declara a própria lei impugnada (Lei n. 13.643/2017, art. 3º), assim como o
art. 31, §§ 2º e 3º, da Lei n. 14.116/2020:

Art. 31. [...]


[...]
§ 2º Os precatórios e as RPVs cancelados nos termos do
disposto na Lei nº 13.463, de 6 de julho de 2017, que
eventualmente venham a ser objeto de novo ofício requisitório,
inclusive os tributários, conservarão a remuneração
correspondente a todo período em que estiveram depositados
na instituição financeira.
§ 3º Os precatórios e RPVs expedidos nos termos do
disposto no § 2º deste artigo serão atualizados da data da
transferência dos valores cancelados para a Conta Única do
Tesouro Nacional até o novo depósito, observada a
remuneração referida no caput e no § 1º.

Assim, descarto o argumento de afronta à jurisdição efetiva e à


garantia da coisa julgada, as quais estão plenamente asseguradas pelo
procedimento legal ora impugnado.

Entretanto, no que tange às garantias individuais do contraditório e


da ampla defesa, parece-me que o legislador, de fato, se houve com
descuido.

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 149 de 208

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Com efeito, quase que invariavelmente, na prática, o credor é


notificado da importância depositada pelo poder público e
disponibilizada para saque em instituição financeira. Talvez por
considerar que essa notificação inicial, sobre a existência do depósito,
supriria plenamente o direito de informação da parte credora, o
legislador não tenha definido bem o procedimento de contraditório para
o cancelamento do precatório, atribuindo-lhe caráter unilateral. Ora, o
transcurso de 2 anos exige que se renove a oportunidade para que a parte
ou seu sucessor possa falar nos autos. O silêncio da lei sobre tal ponto
precisa ser visto em um contexto mais amplo, de interpretação conforme
à Constituição.

De fato, a despeito desse silêncio, a lei não chega a ser


inconstitucional completamente. E isso basicamente por três razões: (i) o
dispositivo não intencionou derrogar as prerrogativas constitucionais,
apenas calou sobre elas; (ii) os cânones do contraditório e da ampla
defesa são fortemente arraigados na cultura jurídica e no ideário popular,
a partir da força normativa da Constituição Federal; e (iii) a Lei n.
9.784/1999, que regula o processo administrativo no âmbito da
Administração Pública federal, impõe expressamente a observância do
contraditório e da ampla defesa.

Quanto à última razão, importa lembrar que, conforme


entendimento sedimentado neste Tribunal, os atos insertos no sistema de
pagamento por precatório não têm natureza judicial, mas se encontram
na seara administrativa. Por todos os precedentes, cito o revelado pela
ADI 1.098, ministro Marco Aurélio, DJe de 25 de outubro de 1996, de cujo
acórdão transcrevo a ementa:

PRECATÓRIO – OBJETO. Os preceitos constitucionais


direcionam à liquidação dos débitos da Fazenda. O sistema de
execução revelado pelos precatórios longe fica de implicar a
perpetuação da relação jurídica devedor-credor. PRECATÓRIO-

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 150 de 208

ADI 5755 / DF

TRAMITAÇÃO – REGÊNCIA. Observadas as balizas


constitucionais e legais, cabe ao Tribunal, mediante dispositivos
do Regimento, disciplinar a tramitação dos precatórios, a fim de
que possam ser cumpridos. PRECATÓRIO – TRAMITAÇÃO –
CUMPRIMENTO – ATO DO PRESIDENTE DO TRIBUNAL –
NATUREZA. A ordem judicial de pagamento (§ 2º do artigo 100
da Constituição Federal), bem como os demais atos necessários
a tal finalidade, concernem ao campo administrativo e não
jurisdicional. A respaldá-la tem-se sempre uma sentença
exequenda. PRECATÓRIO – VALOR REAL – DISTINÇÃO DE
TRATAMENTO. A Carta da República homenageia a igualação
dos credores. Com ela colide norma no sentido da satisfação
total do débito apenas quando situado em certa faixa
quantitativa. PRECATÓRIO – ATUALIZAÇÃO DE VALORES –
ERROS MATERIAIS – INEXATIDÕES – CORREÇÃO –
COMPETÊNCIA. Constatado erro material ou inexatidão nos
cálculos, compete ao Presidente do Tribunal determinar as
correções, fazendo-o a partir dos parâmetros do título executivo
judicial, ou seja, da sentença exequenda. PRECATÓRIO –
ATUALIZAÇÃO – SUBSTITUIÇÃO DE ÍNDICE. Ocorrendo a
extinção do índice inicialmente previsto, o Tribunal deve
observar aquele que, sob o ângulo legal, vier a substituí-lo.
PRECATÓRIO – SATISFAÇÃO – CONSIGNAÇÃO –
DEPÓSITO. Não se há de confundir a consignação de créditos,
a ser feita ao Poder Judiciário, com o depósito do valor do
precatório, de responsabilidade da pessoa jurídica devedora à
qual são recolhidas, materialmente, “as importâncias
respectivas” (§ 2º do artigo 100 da Constituição Federal).

Consequentemente, tratando-se de procedimento de índole


administrativa, a gestão do pagamento das dívidas da Fazenda Pública
por meio do sistema de precatórios e RPVs deve submeter-se, no que for
cabível, aos ditames da norma de regência, nada obstante esteja essa
gestão a cargo do Poder Judiciário (Lei n. 9.784/1999, art. 1º, § 1º).

A propósito, assim se encontram redigidos os arts. 2º, caput, e 28 da

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 151 de 208

ADI 5755 / DF

Lei n. 9.784/1999:

Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros,


aos princípios da legalidade, finalidade, motivação,
razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa,
contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Art. 28. Devem ser objeto de intimação os atos do processo


que resultem para o interessado em imposição de deveres,
ônus, sanções ou restrição ao exercício de direitos e atividades e
os atos de outra natureza, de seu interesse.

Por fim, convém lembrar que a mora do credor em receber pode


decorrer de motivos vários, muitos dos quais aptos a desfazer a
presunção de simples desídia. Exemplo disso é a hipótese de enfermidade
ou falecimento não informados ao Poder Judiciário, ausência,
incapacitação superveniente, mudança de endereço não informada nos
autos, etc. Podem pender controvérsias sucessórias, fiscais, criminais, etc.
sobre a titularidade ou a eventual indisponibilidade do crédito. Nesses
casos, caberá ao juiz da execução deliberar, após ouvir as partes ou seus
sucessores, sobre a conveniência de se cancelar ou não o precatório/RPV.

Se a ratio legis está claramente em superar a desidiosa mora do


credor, que implique a estagnação de recursos públicos, é necessário que
haja plena certeza de que o verdadeiro motivo de o depósito não ter sido
reclamado é pura desídia, contumácia. Portanto, a prévia notificação da
parte interessada servirá não apenas à formalização do contraditório e da
ampla defesa mas também à possível confirmação do desinteresse em
receber o valor do requisitório.

O legislador pode estabelecer a presunção de que dinheiro não


reclamado por 2 anos é dinheiro abandonado. Mas essa presunção não
pode ser absoluta nem pode contrariar os fatos. Daí a necessidade de que,
antes do cancelamento do precatório, o credor, tido como desidioso,

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 152 de 208

ADI 5755 / DF

tenha a oportunidade de ser ouvido. Só assim a presunção legal se torna


justa e proporcional em vez de uma draconiana regra de decadência.

Por esses motivos, a correta aplicação do art. 2º, caput e § 1º, da Lei n.
13.463/2017, combinada com a de n. 9.784/1999, tudo em estrita
observância à Lei Maior, reclama que o cancelamento previsto na norma
impugnada seja precedido de notificação da parte interessada, que então
disporá de 5 dias para manifestar-se.

Em resumo, a instituição financeira oficial, passado o biênio previsto


na norma, não pode automaticamente cancelar o depósito e devolver o
recurso à Fazenda, pois, se assim fosse, haveria realmente
inconstitucionalidade, por ofensa ao contraditório – já que se estaria
tomando como verdadeiro um fato (desídia do credor) sem se permitir a
contraprova.

Para que a norma possa ter aplicação compatível com a Constituição,


é necessário que, passado o biênio, a instituição financeira depositária
informe à Presidência do Tribunal responsável pelo precatório sobre a
situação de não reclamo do depósito, a qual, em vista do ocorrido,
promoverá a notificação da parte interessada, e esta, no prazo de 5 dias,
poderá simplesmente comparecer para receber o valor disponível, ou
apresentar os motivos pelos quais não recebe o depósito. Em não
comparecendo, nem se justificando, a parte ou seu sucessor no prazo
estipulado, proceder-se-á, aí, sim, ao cancelamento do precatório/RPV,
nos termos da lei impugnada.

Deve ficar ressalvada também a competência do juiz da execução


para manter o precatório ou a RPV, sempre que o não pagamento dentro
do prazo de 2 anos esteja relacionado a dúvida ou controvérsia,
devidamente judicializada, acerca da titularidade ou do montante do
crédito.

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Voto - MIN. NUNES MARQUES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 153 de 208

ADI 5755 / DF

Com esses ajustes hermenêuticos, a lei mostra-se constitucional.

De todo o exposto, conheço da ação e julgo parcialmente procedente


o pedido nela formulado, para assentar a constitucionalidade do art. 2º,
caput e §§ 1º e 4º, da Lei n. 13.463/2017, dando ao dispositivo interpretação
conforme à Constituição de maneira a condicionar o cancelamento de
precatório ou RPV, nos termos da norma, à desídia do exequente, após
prévia intimação (no endereço de intimação informado nos autos) para
manifestar-se no prazo de 5 dias.

A norma impugnada, numa interpretação conforme à Constituição,


também não deve ser aplicada se houver ordem judicial em contrário
expedida pelo juiz da execução.

É como voto.

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Voto - MIN. DIAS TOFFOLI

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30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

VOTO

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:


Senhor Presidente, cumprimento Vossa Excelência e, na pessoa de
Vossa Excelência, a todos os presentes. Também agradeço a gentileza dos
Ministros Alexandre de Moraes e Luiz Edson Fachin, que consentiram
em ouvir o adiantamento de meu voto.
Rapidamente, digo que acompanho a Relatora, com a vênia de estilo,
julgando procedente a ação.
É como voto, Senhor Presidente.

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Supremo Tribunal Federal
Antecipação ao Voto

Inteiro Teor do Acórdão - Página 155 de 208

30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

ANTECIPAÇÃO AO VOTO
O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES - Boa tarde,
Presidente, Ministro Luiz Fux! Cumprimento Vossa Excelência,
cumprimento a Ministra-Relatora e nossa Vice-Presidente, Ministra Rosa
Weber, a Ministra Cármen Lúcia e os Ministros.
Presidente, antecipo já, pedindo todas as vênias às divergências
expostas, que também acompanho a eminente Ministra-Relatora, Rosa
Weber.
Afasto, como Sua Excelência fez, a alegação de inconstitucionalidade
formal que, segundo o arguente, decorreria de pretensa usurpação de
competência de gestão dos precatórios, atribuídas pela Constituição
Federal ao Poder Judiciário. Obviamente, em que pese a Constituição
Federal estabelecer o regramento do precatório, não dispôs de maneira
exaustiva sobre o sistema de precatórios, possibilitando que, de acordo
com a legislação constitucional, o legislador ordinário possa
regulamentar para detalhar mais o cumprimento dos mandamentos
constitucionais. Dessa forma, não me parece que exista
inconstitucionalidade formal.
Presidente, assim como fez a eminente Ministra Rosa Weber,
entendo que, ao estabelecer o cancelamento de precatórios e requisições
de pequeno valor expedidos cujos valores não tenham sido levantados
pelo credor e ainda estejam depositados há mais de dois anos em
instituição financeira oficial, a alteração da Lei nº 13.463 criou verdadeira
restrição temporal ao exercício do direito de recebimento do precatório,
inovando, a meu ver, indevidamente, a disciplina constitucional sobre o
pagamento dessas despesas.
Ressalto, no voto, o bem lançado parecer da Procuradoria-Geral da
República que também realçou que essa espécie de cancelamento pelo
mero decurso de tempo vai de encontro ao dogma da separação de
Poderes, na medida em que o mero decurso de prazo repercute
negativamente na própria prestação da tutela jurisdicional. Seria mais um

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Antecipação ao Voto

Inteiro Teor do Acórdão - Página 156 de 208

ADI 5755 / DF

obstáculo para o cumprimento das condenações judiciais.


Lembro - obviamente, não é isso que se discute na presente hipótese,
até porque é previsão constitucional - que a própria previsão de
precatórios e a própria letargia no pagamento de precatórios acabam
sendo um obstáculo à prestação da tutela jurisdicional em um país em
que, após a decisão, ainda há um segundo turno para que as decisões
judiciais sejam cumpridas, ou seja, ainda se entra em uma fila de
precatórios que, em inúmeros municípios e em vários estados, não anda.
A decisão judicial fica sem efetividade alguma e, aqui, a legislação
colocou mais um obstáculo em relação a isso.
Entendo, pedindo novamente todas as vênias às posições
divergentes em contrário, que há uma sequência de decisões dessa
Suprema Corte de censura à edição de atos normativos semelhantes,
sempre tendentes a condicionar, restringir ou obstaculizar o
levantamento dos valores depositados a título de precatórios.
Cito o julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, em que o Supremo
Tribunal Federal assentou a inconstitucionalidade do regime de
compensação de débitos inscritos em precatórios criado pela Emenda nº
62. Relembro o julgamento da ADI 3.453, em que também se entendeu
inconstitucional norma que colocava mais um obstáculo no cumprimento
dos precatórios e, consequentemente, na efetividade da prestação
jurisdicional. Na ADI 3.453, relatada pela eminente Ministra Cármen
Lúcia, Sua Excelência até destacou que: "(...) a decisão judicial não pode
ter a sua efetividade e o seu respeito condicionados a exigência que venha
a ser imposta pelo legislador infraconstitucional, em detrimento do
julgado e da satisfatividade da prestação jurisdicional".
Assim como digo eu e ressalta a Procuradoria-Geral da República, a
Ministra Cármen Lúcia, naquela oportunidade, ressaltou que esse
obstáculo feriria o: "(...) princípio da separação de poderes e estaria agravado
pelo preceito infraconstitucional que restringe o vigor e a eficácia das decisões
judiciais ou da satisfação a elas devidas na formulação constitucional
prevalecente no ordenamento jurídico."
Assim, Presidente, com essas observações e pedindo novamente

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Antecipação ao Voto

Inteiro Teor do Acórdão - Página 157 de 208

ADI 5755 / DF

vênia às divergências inauguradas tanto pelo Ministro Luís Roberto


Barroso quanto pelo Ministro Gilmar Mendes, acompanho integralmente
o voto da eminente Ministra Rosa Weber, julgando procedente o pedido
para declarar a inconstitucionalidade material do art. 2º, caput e § 1º, da
Lei nº 13.463/2017.
É o voto, Presidente.

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 158 de 208

30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

VOTO

O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Trata-se de Ação


Direta de Inconstitucionalidade, com pedido cautelar, proposta pelo
Partido Democrático Trabalhista – PDT, tendo por objeto a Lei
13.463/2017, que “dispõe sobre os recursos destinados aos pagamentos
decorrentes de precatórios e de Requisições de Pequeno Valor (RPV) federais”.
Eis o teor dos dispositivos impugnados:

Art. 1º. A gestão dos recursos destinados aos pagamentos


decorrentes de precatórios e de Requisições de Pequeno Valor
(RPV) federais será realizada pelo Poder Judiciário, que
contratará, com dispensa de licitação, instituições financeiras
integrantes da administração pública federal para a
operacionalização da gestão dos recursos.
Parágrafo único. Os valores correspondentes à
remuneração das disponibilidades dos recursos depositados,
descontada a remuneração legal devida ao beneficiário do
precatório ou da RPV, constituirão receita e deverão ser
recolhidos em favor do Poder Judiciário, o qual poderá destinar
até 10% (dez por cento) do total para o pagamento de perícias
realizadas em ação popular.
Art. 2º. Ficam cancelados os precatórios e as RPV
federais expedidos e cujos valores não tenham sido
levantados pelo credor e estejam depositados há mais de dois
anos em instituição financeira oficial.
§ 1º O cancelamento de que trata o caput deste artigo será
operacionalizado mensalmente pela instituição financeira
oficial depositária, mediante a transferência dos valores
depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional.
§ 2º Do montante cancelado:
I - pelo menos 20% (vinte por cento) deverá ser aplicado
pela União na manutenção e desenvolvimento do ensino;

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 159 de 208

ADI 5755 / DF

II - pelo menos 5% (cinco por cento) será aplicado no


Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de
Morte (PPCAAM).
§ 3º Será dada ciência do cancelamento de que trata o
caput deste artigo ao Presidente do Tribunal respectivo.
§ 4º O Presidente do Tribunal, após a ciência de que trata o
§ 3º deste artigo, comunicará o fato ao juízo da execução, que
notificará o credor.
Art. 3º. Cancelado o precatório ou a RPV, poderá ser
expedido novo ofício requisitório, a requerimento do credor.
Parágrafo único. O novo precatório ou a nova RPV
conservará a ordem cronológica do requisitório anterior e a
remuneração correspondente a todo o período.
Art. 4º. (VETADO).
Art. 5º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Em síntese, o requerente aduz ofensa aos arts. 2º; 5º, caput, XXXV e
XXXVI; e 10, caput e §§ 5º, 6º e 7º, da Constituição Federal.
Sustenta a inconstitucionalidade formal da norma, argumentando
que a determinação de cancelamento dos precatórios e requisições de
pequeno valor depositados há mais de dois anos e não levantados pelo
credor (a) representaria o estabelecimento de “novas condições ao
pagamento de precatórios, ao impor prazo de validade não concebido pelo
Constituinte”, e (b) usurparia a competência de gestão dos precatórios,
“confiada pela Constituição ao Judiciário, mas indevidamente delegada, quanto à
medida drástica do cancelamento, a Instituições Financeiras controladas pelo
Poder Executivo”.
Também aponta sua inconstitucionalidade material, por ofensa aos
princípios (a) da Separação de Poderes, “haja vista que a concessão da gestão
dos requisitórios ao Judiciário é norma originária da Constituição cujo objetivo é
exatamente evitar indevidas interferências dos Poderes Executivo e Legislativo
sobre a independência do Judiciário”; e (b) da isonomia, pois “o fato de uma
das partes exercer controle acionário sobre uma das instituições financeiras
depositárias do precatório, somada à possibilidade de seu cancelamento direto por
essa mesma instituição financeira, confere à referida parte um indevido e odioso

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 160 de 208

ADI 5755 / DF

privilégio processual”.
Ainda, assevera a ocorrência de desrespeito ao princípio da
segurança jurídica e à coisa julgada material, pois a lei impugnada
viabilizaria “uma alteração inconstitucional do direito subjetivo já assegurado
em sentença transitada em julgado”.
Com base nesses argumentos, pede, em sede cautelar, a suspensão
da eficácia da integralidade da Lei 13.463/2017 até o julgamento final da
demanda, sendo o artigo 2º, caput e § 1º por inconstitucionalidade e os
demais dispositivos por arrastamento. No mérito, postula a declaração de
inconstitucionalidade do referido diploma.
Adotado o rito do art. 10 da Lei 9.868/1999, a Presidência da
República defendeu a constitucionalidade formal e material da lei
impugnada. Em essência, argumentou que o legislador pretendeu
materializar o princípio da eficiência na utilização de recursos públicos,
sobretudo considerado o cenário de crise econômica que assola o País.
Também aduziu que: (a) os dispositivos não fixariam qualquer
condição para que o credor realize o saque dos valores disponibilizados,
mas apenas disciplinam o respectivo cancelamento em caso de não
levantamento; (b) a lei impugnada cuidaria de matéria de competência
concorrente entre a União, os Estados e o Distrito Federal, inexistindo
reserva constitucional ao Poder Judiciário para dispor sobre precatórios;
(c) a situação de demora no saque de valor depositado pela Fazenda
Pública em instituição financeira não seria albergada pelo quadro
delimitado pelas normas constitucionais, tendo o Congresso Nacional,
assim, agido dentro dos limites conferidos pelo âmbito de proteção da
garantia constitucional do regime de precatórios; e (d) disso não
decorreria qualquer violação aos princípios da isonomia, da
inafastabilidade da jurisdição, da segurança jurídica e da proteção à coisa
julgada, na medida em que bastaria o requerimento do credor para que o
precatório fosse novamente expedido, com resguardo da ordem
cronológica anterior e da remuneração de todo o período correspondente.
A Câmara dos Deputados noticiou que a aprovação da Lei
13.463/2017 se deu de acordo com os trâmites constitucionais e

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 161 de 208

ADI 5755 / DF

regimentais inerentes à espécie.


O Senado Federal, por sua vez, defendeu a constitucionalidade
formal e material das normas, que, adequadamente editadas em
consonância com a competência prevista nos arts. 24, II, e 48, da
Constituição Federal, preservaria o direito do credor ao estabelecer que
“se eventual precatório/RPV relativo a ele for cancelado, basta a ele peticionar
para que obtenha novo precatório/RPV que herdará a ordem e a remuneração
relativas ao original que foi cancelado”.
A Advocacia-Geral da União manifestou-se pelo indeferimento da
medida cautelar, em parecer assim ementado:

Regime de pagamentos por precatórios e por Requisições


de Pequeno Valor. Artigo 2º, caput e § 1º, da Lei nº 13.463/2017.
Previsão de cancelamento dos precatórios e Requisições
federais cujos valores não tenham sido levantados pelo credor e
estejam depositados há mais de dois anos. Embora a Carta de
1988 discipline o sistema de pagamento de débitos judiciais por
precatórios e Requisições de Pequeno Valor, não há, em seu
texto, impedimento à atuação do legislador infraconstitucional
sobre o tema. Inexistência de reserva constitucional quanto à
matéria. A Constituição confere ao Poder Judiciário a atribuição
administrativa de gerir o pagamento de precatórios, mas não
lhe confere competência privativa para dispor acerca do
assunto. Observância aos limites da atribuição legislativa
assegurada à União. Previsão de expedição de novo
requisitório, mediante requerimento do credor, com a
conservação da ordem cronológica e da remuneração
correspondente a todo o período. Ausência de fumus boni iuris e
de periculum in mora. Manifestação pelo indeferimento do
pedido de medida cautelar.

A Procuradoria-Geral da República, por fim, opinou pela


procedência parcial do pedido, sustentando a necessidade de ser
declarada a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 13.463/2017, conforme
a seguinte ementa:

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ADI 5755 / DF

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.


PRECATÓRIO. ART. 2º DA LEI 13.463/2017. CANCELAMETO
DE PRECATÓRIOS E REQUISIÇÕES DE PEQUENO VALOR
NÃO LEVANTADOS E DEPOSITADOS HÁ MAIS DE DOIS
ANOS. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL.
ATRIBUIÇÃO DO JUDICIÁRIO.
INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. OFENSA À
SEPARAÇÃO DE PODERES, AO REGIME CONSTITUCIONAL
DOS PRECATÓRIOS, À COISA JULGADA MATERIAL E À
EFETIVIDADE DE JURISDIÇÃO.
1. A gestão dos recursos destinados ao cumprimento das
condenações da Fazenda Pública é realizada pelo Presidente do
Tribunal, de maneira que cabe ao Judiciário a regulamentação
da matéria, a fim de dar cumprimento aos ditames
constitucionais (CF, art. 100-§§ 6º e 7º).
2. A definição de prazo para o levantamento de precatório,
sob pena de seu cancelamento, configura restrição ao exercício
do direito de precatório que não encontra previsão na ordem
constitucional, de maneira que afronta a sistemática do art. 100
da Constituição.
3. O cancelamento das requisições por determinação de lei
federal de iniciativa do Presidente da República,
independentemente de determinação do juiz da execução e do
Presidente do Tribunal competente não se coaduna com a
sistemática constitucional da matéria (CF, art. 100-§§ 6º e 7º) e
com o princípio da separação dos poderes (CF, art. 2º).
4. O art. 2º da Lei 13.463/2017 ofende a coisa julgada
material (CF, art. 5º-XXXVI) e embaraça a efetividade da
jurisdição (CF, art. 5º-XXXV), porque torna indisponível o valor
devido pela Fazenda Pública reconhecido por decisão judicial
transitada em julgado, impedindo o acesso do cidadão a direito
consignado por coisa julgada.
- Parecer pela procedência parcial do pedido.

Na Sessão Virtual de 12/02/2021 a 23/02/2021, a eminente Relatora,

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 163 de 208

ADI 5755 / DF

Min. ROSA WEBER, propôs a conversão do rito do art. 10 para o rito do


art. 12 da Lei 9.868/99, com o consequente julgamento definitivo do
mérito da controvérsia, e apresentou voto pela procedência do pedido,
assim ementado:

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE


INCONSTITUCIONALIDADE. PRECATÓRIOS. CONVERSÃO
DE RITO. JULGAMENTO DEFINITIVO DA AÇÃO. ART. 2º,
CAPUT E § 1º, DA LEI Nº 13.463/2017, QUE DETERMINA O
CANCELAMENTO DOS PRECATÓRIOS E REQUISIÇÕES DE
PEQUENO VALOR (RPV) FEDERAIS EXPEDIDOS E CUJOS
VALORES NÃO TENHAM SIDO LEVANTADOS PELO
CREDOR E ESTEJAM DEPOSITADOS HÁ MAS DE DOIS
ANOS EM INSTITUIÇÃO FINANCEIRA OFICIAL.
TRANSFERÊNCIA PARA A CONTA ÚNICA DO TESOURO
NACIONAL. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 2º, 5º, CAPUT, XXII,
XXXV, XXXVI, LIV, LV E 100 DA CONSTITUIÇÃO DA
REPÚBLICA. PROCEDÊNCIA.
1. Conversão do rito do art. 10 para o rito do art. 12 da Lei
9.868/99. Julgamento definitivo do mérito em razão: (i) da
postulação formalizada; (ii) da completa coleta das informações
jurídicas; e (iii) da apresentação dos argumentos necessários
para a solução do problema constitucional posto, com respeito
aos direitos fundamentais processuais. Perfectibilização do
contraditório efetivo e presença elevado grau de instrução
processual.
2. A lei impugnada consubstancia ato normativo oriundo
do Congresso Nacional, por iniciativa do Presidente da
República. Exercício de competência legislativa concorrente
sobre direito financeiro, uma vez que precatório e requisição de
pequeno valor (RPV) destinam-se à realização de despesas
públicas decorrentes de sentenças judiciais transitadas em
julgado. Não configuração de inconstitucionalidade formal: a
apreciação da natureza do disciplinamento da matéria e do
desbordamento das balizas constitucionais expressamente
previstas pelo texto da Carta Magna situa-se na seara da

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 164 de 208

ADI 5755 / DF

eventual inconstitucionalidade material da atuação legislativa


quanto ao trâmite operacional de pagamento de valores por
meio de precatórios e requisições de pequeno valor.
3. A Lei nº 13.463/2017 criou verdadeira inovação no
disciplinamento do pagamento de montantes por precatórios e
requisições de pequeno valor ao determinar um limite temporal
para o exercício do direito de levantamento do importe do
crédito depositado. Transferência automática, pela instituição
financeira depositária, dos valores depositados para a Conta
Única do Tesouro Nacional sem prévia ciência do interessado
ou formalização do contraditório (art. 5º, LV, CF). Afronta ao
devido processo legal (CF, art. 5º, LIV) no que atine ao respeito
ao contraditório e à ampla defesa.
4. A lei desloca a prévia ciência e o exercício do
contraditório para momento posterior ao cancelamento
automático, procedimento que viola a Constituição. A mera
possibilidade de novo requerimento do credor não desfigura a
inconstitucionalidade material em razão da não observância do
contraditório e da ampla defesa.
5. Impossibilidade de edição de medidas legislativas para
condicionar e restringir o levantamento dos valores a título de
precatórios. Precedente: ADI 3453 (Relatora: Min. Cármen
Lúcia, Tribunal Pleno, DJ 16.03.2007). Violação da separação dos
Poderes: a Constituição Federal desenhou o regime de
pagamento de precatório e conferiu atribuições ao Poder
Judiciário sem deixar margem limitativa do direito de crédito
ao legislador infraconstitucional. Devem ser prestigiados o
equilíbrio e a separação dos Poderes (art. 2º, CF), bem como a
garantia da coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CF) mediante a
satisfação do crédito a conferir eficácia às decisões. A lei
impugnada transfere do Judiciário para a instituição financeira
a averiguação unilateral do pagamento e autoriza,
indevidamente, o cancelamento automático do depósito e a
remessa dos valores à Conta Única do Tesouro Nacional.
Configurada uma verdadeira burla aos freios e contrapesos
indispensáveis ao bom funcionamento dos Poderes.

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 165 de 208

ADI 5755 / DF

6. A mora do credor em relação ao levantamento dos


valores depositados na instituição financeira deve ser apurada
no bojo do processo de execução, sem imposição de
cancelamento automático das requisições em ausência de
prévia ciência ao interessado. Violação do devido processo legal
(art. 5º, LIV, CF) e do princípio da proporcionalidade. Revela-se
desproporcional a imposição do cancelamento automático após
o decurso de dois anos do depósito dos valores a título de
precatório e RPV. A atuação legislativa não foi pautada pela
proporcionalidade em sua faceta de vedação do excesso.
7. Ao determinar o cancelamento puro e simples
imediatamente após o biênio em exame, a Lei nº 13.463/2017
afronta, outrossim, os incisos XXXV e XXXVI do art. 5º da
Constituição da República, por violar a segurança jurídica, a
inafastabilidade da jurisdição, além da garantia da coisa julgada
e de cumprimento das decisões judiciais. Precedentes.
8. A lei impugnada imprime um tratamento mais gravoso
ao credor, com a criação de mais uma assimetria entre a
Fazenda Pública e o cidadão quando ocupantes dos polos de
credor e de devedor. Manifesta ofensa à isonomia, seja quanto à
distinta paridade de armas entre a Fazenda Pública e os
credores, seja no que concerne a uma diferenciação realizada
entre os próprios credores: aqueles que consigam fazer o
levantamento no prazo de dois anos e os que assim não o
façam, independentemente da averiguação prévia das razões.
Distinção automaticamente derivada do decurso do tempo
entre credores sem a averiguação das razões do não
levantamento dos valores atinentes aos precatórios e
requisições de pequeno valor, que podem não advir
necessariamente de mero desinteresse ou inércia injustificada.
Ofensa à sistemática constitucional de precatórios como
implementação da igualdade (art. 5º, caput, CF). Precedentes.
9. O manejo dos valores de recursos públicos depositados
e à disposição do credor viola o direito de propriedade (art. 5º,
XXII, CF). Ingerência sobre o montante depositado e
administrado pelo Poder Judiciário, que passa a ser tratado

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 166 de 208

ADI 5755 / DF

indevidamente como receita pública e alvo de destinação.


10. A ação direta conhecida e pedido julgado procedente.

O caso foi objeto de vista do eminente Ministro ROBERTO


BARROSO, que, na Sessão Virtual 07/05/2021 a 14/05/2021 apresentou
voto divergente assim ementado:

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E


FINANCEIRO. AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE. CANCELAMENTO DE
PRECATÓRIOS E RPVS POR INÉRCIA DO CREDOR.
1. Ação direta contra o art. 2º, caput e §1º, da Lei federal nº
13.463/2017, que determina o cancelamento de precatórios e
requisições de pequeno valor (RPVs) expedidos e depositados
sem levantamento pelo credor há pelo menos dois anos em
instituição financeira oficial.
2. Ausência de inconstitucionalidade formal. O precatório
é espécie de despesa pública, inserindo-se no campo do direito
financeiro, matéria de competência concorrente entre os entes
federados (art. 24, I, CF/1988). A Constituição não exaure a
disciplina do sistema constitucional de precatórios, sendo
possível que a lei crie novas regras, desde que, evidentemente,
não vulnere preceitos constitucionais.
3. Ausência de ofensa à segurança jurídica, à coisa julgada
e ao direito de propriedade. Entre o depósito e o momento
imediatamente anterior ao saque dos valores destinados ao
pagamento da requisição, o credor é mero beneficiário dessas
quantias, e não seu efetivo titular. Além disso, em caso de
cancelamento da ordem de pagamento, ele pode requerer, a
qualquer tempo, a expedição de novo ofício requisitório para o
levantamento dos valores. Em tais hipóteses, é assegurada,
além da remuneração do período, a posição do requisitório que
havia sido cancelado na ordem cronológica mantida pelo
Tribunal.
4. Inexistência de afronta à proporcionalidade. O prazo
bienal fixado em lei não é manifestamente irrazoável, devendo

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o Judiciário, nesse caso, prestar deferência à liberdade de


conformação do legislador. O ordenamento admite
modalidades extintivas mais gravosas, tais como a prescrição
da pretensão executória. No presente caso, o direito subjetivo
do credor se mantém hígido mesmo após o cancelamento.
5. Dada a crise econômica e fiscal vivenciada pelo país,
agravada pela situação calamitosa de combate à pandemia da
COVID-19, não seria razoável manter bilhões de reais em
verbas públicas paralisadas ad aeternum por inércia do credor.
Necessidade de observância do princípio da eficiência na gestão
de recursos públicos escassos.
6. Sem embargo, impõe-se a intimação pessoal do
beneficiário, sob pena de ofensa aos princípios do contraditório
e da ampla defesa. Salvo em situações excepcionais, as partes
devem ter oportunidade de influenciar previamente a formação
do resultado do processo e não podem ser afetadas por
decisões-surpresa.
7. Necessidade de assegurar a destinação originalmente
prevista na lei orçamentária aos recursos públicos depositados
pela União (art. 165, § 10, CF). Valores que só podem ser
transferidos à Conta Única do Tesouro Nacional se o ente
federado estiver em dia com o pagamento das requisições
judiciais.
8. Possibilidade de interpretação conforme a Constituição
para preservar a validade da lei questionada.
9. Procedência parcial do pedido, conferindo-se
interpretação conforme a Constituição ao art. 2º, caput e §1º, da
Lei nº 13.463/2017, para que (i) o procedimento de cancelamento
de precatório e requisição de pequeno valor nele previsto seja
precedido de intimação pessoal do credor, pelo juízo da
execução (aplicação, por analogia, do art. 485, II e III e § 1º, do
CPC); e (ii) a transferência de recursos para a Conta Única do
Tesouro Nacional pressuponha a ausência de mora da União no
pagamento de tais requisições.

Ato contínuo, a ação foi objeto de destaque por parte do Ministro

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 168 de 208

ADI 5755 / DF

GILMAR MENDES.
É o relatório.

Acompanho as conclusões a que chegou a eminente Relatora, Min.


ROSA WEBER.
Inicialmente, afasto a alegação de inconstitucionalidade formal, que
decorreria da pretensa usurpação da competência de gestão dos
precatórios atribuída, pela Constituição Federal, ao Poder Judiciário.
Ao contrário do pretendido pelo requerente, a Constituição Federal
não dispôs de maneira exaustiva sobre o sistema de precatórios, de modo
que, em tese, e evidentemente desde que respeitados os princípios
constitucionais pertinentes, mostra-se possível a criação de novas regras
por meio de lei. Veja-se, inclusive, que o próprio art. 100 da Constituição
Federal comete ao legislador ordinário a regulamentação específica de
determinados aspectos da questão, como se constata dos seus §§ 3º, 4º, 11,
15 e 16.
Precatórios e RPV são instrumentos destinados à realização de
despesas públicas decorrentes de condenação judicial transitada em
julgado, cujos fundamentos remontam à impenhorabilidade dos bens
públicos e ao imperioso tratamento isonômico a ser conferido aos
credores. Dessa perspectiva, os dispositivos impugnados caracterizam o
exercício de competência legislativa concorrente sobre direito financeiro,
a teor do que dispõe o art. 24, I, da Constituição Federal
Ausente, portanto, qualquer vício formal de inconstitucionalidade.
De outra perspectiva, contudo, reconheço o vício de
inconstitucionalidade material.
Nos moldes desenvolvidos pela eminente Relatora, Ministra ROSA
WEBER, entendo que, ao estabelecer o cancelamento de precatórios e
requisições de pequeno valor expedidos e cujos valores não tenha sido
levantados pelo credor e estejam depositados há mais de dois anos em
instituição financeira oficial, a Lei 13.463/2014 criou verdadeira restrição
temporal ao exercício do direito de precatório, inovando indevidamente
na disciplina constitucional incidente sobre o pagamento dessas despesas.

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 169 de 208

ADI 5755 / DF

De fato, como bem realçado pela Procuradoria-Geral da República


em seu parecer, essa espécie de cancelamento pelo mero decurso do
tempo vai de encontro ao dogma da Separação de Poderes, na medida em
que, repercutindo negativamente na prestação da tutela jurisdicional,
obstaculiza o cumprimento das condenações judiciais, vulnerando sua
eficácia, e desrespeita a garantia da coisa julgada material. Confira-se:

Além de desrespeitar a separação de Poderes, o art. 2º da


Lei 13.463/2017 ofende a coisa julgada material (CF, art. 5º-
XXXVI) e embaraça a efetividade da jurisdição (CF, art. 5º-
XXXV). Isso porque, torna indisponível o valor devido pela
Fazenda Pública reconhecido por decisão judicial transitada em
julgado, impedindo o acesso do cidadão a direito consignado
por coisa julgada. Caso o credor objetive sacar o valor de
precatório cancelado, deverá ser expedido novo ofício
requisitório, conforme previsto no art. 3º da Lei 13.463/2017. Em
outras palavras, deverá ser iniciado novo procedimento
administrativo, que dependerá, para sua efetivação, de nova
previsão orçamentária.
Assim, o credor que tem seu direito reconhecido por
sentença judicial transitada em julgado e executado de acordo
com as normas processuais e procedimentais pertinentes não
terá o acesso devido a imediato ao crédito, em virtude do
cancelamento previsto na lei impugnada, efetivado pela
instituição financeira, independentemente da atuação do
Presidente do Tribunal e do juízo da execução. O diploma legal
permite que a Fazenda Pública devedora de título executivo
judicial descumpra a decisão que inicialmente havia cumprido,
em evidente desrespeito à coisa julgada e à efetividade da
jurisdição.

Em outras oportunidades, a jurisprudência desta SUPREMA CORTE


censurou a edição de atos normativos congêneres, tendentes a
condicionar ou restringir o levantamento de valores depositados a título
de precatórios.

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 170 de 208

ADI 5755 / DF

Cito, como exemplo, o julgamento das Ações Diretas de


Inconstitucionalidade 4357 e 4425, em que o TRIBUNAL assentou a
inconstitucionalidade do regime de compensação de débitos inscritos em
precatório, criado pela Emenda Constitucional 62/2009. Transcrevo a
ementa dessa última:

Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE


EXECUÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA MEDIANTE
PRECATÓRIO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 62/2009.
INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL NÃO
CONFIGURADA. INEXISTÊNCIA DE INTERSTÍCIO
CONSTITUCIONAL MÍNIMO ENTRE OS DOIS TURNOS DE
VOTAÇÃO DE EMENDAS À LEI MAIOR (CF, ART. 60, §2º).
CONSTITUCIONALIDADE DA SISTEMÁTICA DE
“SUPERPREFERÊNCIA” A CREDORES DE VERBAS
ALIMENTÍCIAS QUANDO IDOSOS OU PORTADORES DE
DOENÇA GRAVE. RESPEITO À DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA E À PROPORCIONALIDADE. INVALIDADE
JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DA LIMITAÇÃO DA
PREFERÊNCIA A IDOSOS QUE COMPLETEM 60 (SESSENTA)
ANOS ATÉ A EXPEDIÇÃO DO PRECATÓRIO.
DISCRIMINAÇÃO ARBITRÁRIA E VIOLAÇÃO À ISONOMIA
(CF, ART. 5º, CAPUT). INCONSTITUCIONALIDADE DA
SISTEMÁTICA DE COMPENSAÇÃO DE DÉBITOS
INSCRITOS EM PRECATÓRIOS EM PROVEITO
EXCLUSIVO DA FAZENDA PÚBLICA. EMBARAÇO À
EFETIVIDADE DA JURISDIÇÃO (CF, ART. 5º, XXXV),
DESRESPEITO À COISA JULGADA MATERIAL (CF, ART. 5º
XXXVI), OFENSA À SEPARAÇÃO DOS PODERES (CF, ART.
2º) E ULTRAJE À ISONOMIA ENTRE O ESTADO E O
PARTICULAR (CF, ART. 1º, CAPUT, C/C ART. 5º, CAPUT).
IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE
DE REMUNERAÇÃO DA CADERNETA DE POUPANÇA
COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA.
VIOLAÇÃO AO DIREITO FUNDAMENTAL DE
PROPRIEDADE (CF, ART. 5º, XXII). INADEQUAÇÃO

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 171 de 208

ADI 5755 / DF

MANIFESTA ENTRE MEIOS E FINS.


INCONSTITUCIONALIDADE DA UTILIZAÇÃO DO
RENDIMENTO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO
ÍNDICE DEFINIDOR DOS JUROS MORATÓRIOS DOS
CRÉDITOS INSCRITOS EM PRECATÓRIOS, QUANDO
ORIUNDOS DE RELAÇÕES JURÍDICO-TRIBUTÁRIAS.
DISCRIMINAÇÃO ARBITRÁRIA E VIOLAÇÃO À ISONOMIA
ENTRE DEVEDOR PÚBLICO E DEVEDOR PRIVADO (CF,
ART. 5º, CAPUT). INCONSTITUCIONALIDADE DO REGIME
ESPECIAL DE PAGAMENTO. OFENSA À CLÁUSULA
CONSTITUCIONAL DO ESTADO DE DIREITO (CF, ART. 1º,
CAPUT), AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES (CF,
ART. 2º), AO POSTULADO DA ISONOMIA (CF, ART. 5º,
CAPUT), À GARANTIA DO ACESSO À JUSTIÇA E A
EFETIVIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL (CF, ART. 5º,
XXXV) E AO DIREITO ADQUIRIDO E À COISA JULGADA
(CF, ART. 5º, XXXVI). PEDIDO JULGADO PROCEDENTE EM
PARTE. 1. A Constituição Federal de 1988 não fixou um
intervalo temporal mínimo entre os dois turnos de votação para
fins de aprovação de emendas à Constituição (CF, art. 62, §2º),
de sorte que inexiste parâmetro objetivo que oriente o exame
judicial do grau de solidez da vontade política de reformar a
Lei Maior. A interferência judicial no âmago do processo
político, verdadeiro locus da atuação típica dos agentes do
Poder Legislativo, tem de gozar de lastro forte e categórico no
que prevê o texto da Constituição Federal. Inexistência de
ofensa formal à Constituição brasileira. 2. O pagamento
prioritário, até certo limite, de precatórios devidos a titulares
idosos ou que sejam portadores de doença grave promove, com
razoabilidade, a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III) e
a proporcionalidade (CF, art. 5º, LIV), situando-se dentro da
margem de conformação do legislador constituinte para
operacionalização da novel preferência subjetiva criada pela
Emenda Constitucional nº 62/2009. 3. A expressão “na data de
expedição do precatório”, contida no art. 100, §2º, da CF, com
redação dada pela EC nº 62/09, enquanto baliza temporal para a

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 172 de 208

ADI 5755 / DF

aplicação da preferência no pagamento de idosos, ultraja a


isonomia (CF, art. 5º, caput) entre os cidadãos credores da
Fazenda Pública, na medida em que discrimina, sem qualquer
fundamento, aqueles que venham a alcançar a idade de
sessenta anos não na data da expedição do precatório, mas sim
posteriormente, enquanto pendente este e ainda não ocorrido o
pagamento. 4. O regime de compensação dos débitos da
Fazenda Pública inscritos em precatórios, previsto nos §§ 9º e
10 do art. 100 da Constituição Federal, incluídos pela EC nº
62/09, embaraça a efetividade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV),
desrespeita a coisa julgada material (CF, art. 5º, XXXVI),
vulnera a Separação dos Poderes (CF, art. 2º) e ofende a
isonomia entre o Poder Público e o particular (CF, art. 5º,
caput), cânone essencial do Estado Democrático de Direito
(CF, art. 1º, caput). 5. A atualização monetária dos débitos
fazendários inscritos em precatórios segundo o índice oficial de
remuneração da caderneta de poupança viola o direito
fundamental de propriedade (CF, art. 5º, XXII) na medida em
que é manifestamente incapaz de preservar o valor real do
crédito de que é titular o cidadão. A inflação, fenômeno
tipicamente econômico-monetário, mostra-se insuscetível de
captação apriorística (ex ante), de modo que o meio escolhido
pelo legislador constituinte (remuneração da caderneta de
poupança) é inidôneo a promover o fim a que se destina
(traduzir a inflação do período). 6. A quantificação dos juros
moratórios relativos a débitos fazendários inscritos em
precatórios segundo o índice de remuneração da caderneta de
poupança vulnera o princípio constitucional da isonomia (CF,
art. 5º, caput) ao incidir sobre débitos estatais de natureza
tributária, pela discriminação em detrimento da parte
processual privada que, salvo expressa determinação em
contrário, responde pelos juros da mora tributária à taxa de 1%
ao mês em favor do Estado (ex vi do art. 161, §1º, CTN).
Declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução da
expressão “independentemente de sua natureza”, contida no
art. 100, §12, da CF, incluído pela EC nº 62/09, para determinar

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 173 de 208

ADI 5755 / DF

que, quanto aos precatórios de natureza tributária, sejam


aplicados os mesmos juros de mora incidentes sobre todo e
qualquer crédito tributário. 7. O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com
redação dada pela Lei nº 11.960/09, ao reproduzir as regras da
EC nº 62/09 quanto à atualização monetária e à fixação de juros
moratórios de créditos inscritos em precatórios incorre nos
mesmos vícios de juridicidade que inquinam o art. 100, §12, da
CF, razão pela qual se revela inconstitucional por arrastamento,
na mesma extensão dos itens 5 e 6 supra. 8. O regime “especial”
de pagamento de precatórios para Estados e Municípios criado
pela EC nº 62/09, ao veicular nova moratória na quitação dos
débitos judiciais da Fazenda Pública e ao impor o
contingenciamento de recursos para esse fim, viola a cláusula
constitucional do Estado de Direito (CF, art. 1º, caput), o
princípio da Separação de Poderes (CF, art. 2º), o postulado da
isonomia (CF, art. 5º), a garantia do acesso à justiça e a
efetividade da tutela jurisdicional (CF, art. 5º, XXXV), o direito
adquirido e à coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI). 9. Pedido de
declaração de inconstitucionalidade julgado procedente em
parte (ADI 4425, Rel. Min. AYRES BRITTO, Redator do acórdão
Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, DJe de 26/09/2014).

No mesmo sentido, compartilhando fundamentos jurídicos muito


próximos, cabe destacar o julgamento da Ação Direta de
Inconstitucionalidade 3453, assim ementada:

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE


INCONSTITUCIONALIDADE. PRECATÓRIOS. ART. 19 DA
LEI NACIONAL Nº 11.033, DE 21 DE DEZEMBRO DE 2004.
AFRONTA AOS ARTS. 5º, INC. XXXVI, E 100 DA
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. 1. O art. 19 da Lei n.
11.033/04 impõe condições para o levantamento dos valores do
precatório devido pela Fazenda Pública. 2. A norma
infraconstitucional estatuiu condição para a satisfação do
direito do jurisdicionado - constitucionalmente garantido -
que não se contém na norma fundamental da República. 3. A

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 174 de 208

ADI 5755 / DF

matéria relativa a precatórios não chama a atuação do


legislador infraconstitucional, menos ainda para impor
restrições que não se coadunam com o direito à efetividade da
jurisdição e o respeito à coisa julgada. 4. O condicionamento
do levantamento do que é devido por força de decisão judicial
ou de autorização para o depósito em conta bancária de valores
decorrentes de precatório judicial, estabelecido pela norma
questionada, agrava o que vem estatuído como dever da
Fazenda Pública em face de obrigação que se tenha reconhecido
judicialmente em razão e nas condições estabelecidas pelo
Poder Judiciário, não se mesclando, confundindo ou, menos
ainda, frustrando pela existência paralela de débitos de outra
fonte e natureza que, eventualmente, o jurisdicionado tenha
com a Fazenda Pública. 5. Entendimento contrário avilta o
princípio da separação de poderes e, a um só tempo, restringe o
vigor e a eficácia das decisões judiciais ou da satisfação a elas
devida. 6. Os requisitos definidos para a satisfação dos
precatórios somente podem ser fixados pela Constituição, a
saber: a requisição do pagamento pelo Presidente do Tribunal
que tenha proferido a decisão; a inclusão, no orçamento das
entidades políticas, das verbas necessárias ao pagamento de
precatórios apresentados até 1º de julho de cada ano; o
pagamento atualizado até o final do exercício seguinte ao da
apresentação dos precatórios, observada a ordem cronológica
de sua apresentação. 7. A determinação de condicionantes e
requisitos para o levantamento ou a autorização para depósito
em conta bancária de valores decorrentes de precatórios
judiciais, que não aqueles constantes de norma constitucional,
ofende os princípios da garantia da jurisdição efetiva (art. 5º,
inc. XXXVI) e o art. 100 e seus incisos, não podendo ser tida
como válida a norma que, ao fixar novos requisitos, embaraça o
levantamento dos precatórios. 8. Ação Direta de
Inconstitucionalidade julgada procedente (ADI 3453, Rel. Min.
CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, DJe de 16/03/2007).

Na oportunidade, a eminente Relatora, Min. CÁRMEN LÚCIA, em

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 175 de 208

ADI 5755 / DF

voto acompanhado à unanimidade pelo TRIBUNAL, explicitou os vícios


de normas condicionantes e/ou restritivas ao exercício do direito de
precatório nos seguintes termos:

Ademais, a decisão judicial não pode ter a sua efetividade


e o seu respeito condicionados a exigência que venha a ser
imposta pelo legislador infraconstitucional, em detrimento do
julgado e da satisfatividade da prestação jurisdicional.
Nesse sentido, o princípio da separação de poderes estaria
agravado pelo preceito infraconstitucional, que restringe o
vigor e a eficácia das decisões judiciais ou da satisfação a elas
devidas na formulação constitucional prevalecente no
ordenamento jurídico.
[…]
A frustração dos precatórios pelos entes do Poder Público
tem merecido atenção, cuidados e insatisfação tanto do Poder
Judiciário quanto dos cidadãos em geral, que se veem às voltas
com débitos judiciais pendentes, não poucas vezes, há mais de
uma de´cada. E a norma questionada, ao contrário de todas as
tentativas de resolver e diminuir os prazos, as condições e todas
as formas de se desburocratizar e facilitar o pagamento dos
precatórios, estabelece mais dificuldades e, o que é mais grave,
em perfeita contradição com as normas constitucionais relativas
à matéria.
[…]
Assim, a estatuição de condicionantes e requisitos para o
levantamento ou a autorização para depósito em conta bancária
de valores decorrentes de precatórios judiciais, que não aqueles
constantes de norma constitucional, ofendem os princípios da
garantia da jurisdição efetiva (art. 5º, inc. XXXVI), o art. 100 e
seus incisos, não podendo ser tida como válida. A norma que,
ao fixar novas requisitos embaraça o levantamento dos
precatórios contraria a Constituição.

Além disso, uma vez que nos termos da legislação impugnada, o


cancelamento do precatório se dá automaticamente pela instituição

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Voto - MIN. ALEXANDRE DE MORAES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 176 de 208

ADI 5755 / DF

financeira, independentemente de qualquer intimação e manifestação do


interessado, há patente ofensa aos princípios do contraditório e ampla
defesa e do devido processo legal. Disso redunda, igualmente, uma
injustificável assimetria entre a Fazenda Pública e o cidadão, a quem se
reserva tratamento anti-isonômico mais gravoso, e, tão grave quanto,
entre os próprios cidadãos-credores, tudo com base em critério aleatório
(o mero decurso temporal), incapaz de, por si só, denotar qualquer inércia
injustificável, a servir de fator de discrímen.
Diante do exposto, ACOMPANHO as conclusões da eminente Min.
ROSA WEBER, e julgo PROCEDENTE o pedido para declarar a
inconstitucionalidade material do art. 2º, caput e § 1º, da Lei 13.463/2017.
É o voto.

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Antecipação ao Voto

Inteiro Teor do Acórdão - Página 177 de 208

30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

ANTECIPAÇÃO AO VOTO
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN - Cumprimento Vossa
Excelência, Presidente, e os eminentes Pares; cumprimento as eminentes
Ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia; cumprimento o Senhor
Procurador-Geral da República, Doutor Augusto Aras; também expresso
cumprimento aos advogados que assomaram à tribuna, quer
presencialmente, quer também por videoconferência.
Senhor Presidente, estou a verificar que com a Relatora já votaram os
eminentes Ministros Dias Toffoli e Alexandre de Moraes, declarando a
inconstitucionalidade material da norma impugnada, vale dizer, art. 2º,
caput e § 1º, da Lei 13.463/2017. De minha parte, Senhor Presidente,
eminentes Pares e eminentes Ministros, ao pedir vênia às divergências,
estou votando no sentido de acompanhar integralmente a eminente
Ministra Rosa Weber, a quem cumprimento pelo acutíssimo voto que
aqui traz à colação, pedindo, como já disse e reitero, vênias à divergência.
Irei juntar, Senhor Presidente, declaração de voto, mas permito-me
trazer dois ou três elementos contidos nessa declaração, que vão ao
encontro do voto proferido por Sua Excelência a Relatora, a eminente
Ministra Rosa Weber, nossa Vice-Presidente.
O primeiro desses elementos é até mesmo a compreensão literal do
dispositivo impugnado no caput do art. 2º, eis que ali se diz, com todas as
letras, que são valores depositados em favor do credor.
Ora, lembremo-nos apenas de uma lição elementar do direito das
obrigações que esse depósito tem efeito de pagamento e, se tem efeito de
pagamento, ingressa na esfera jurídico-patrimonial do credor. Ao
ingressar na esfera jurídico-patrimonial do credor, faz parte daquilo que
se denomina de titularidades ou, em sentido estrito, de propriedade.
Logo, é disso que, a rigor, se trata.
Nunca é demais lembrar, embora seja bastante óbvio, que o direito
de propriedade está garantido constitucionalmente e as únicas hipóteses
de confisco estão naquele parágrafo do art. 243, mas aqui não há

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Supremo Tribunal Federal
Antecipação ao Voto

Inteiro Teor do Acórdão - Página 178 de 208

ADI 5755 / DF

nenhuma daquelas duas hipóteses. Ao contrário, o que há aqui é um


direito de crédito, portanto, direito adquirido, que não se confunde com
direito consumado, porque o respectivo crédito não foi consumado pelo
não levantamento. Isso não significa que o direito já não ingressou na
esfera jurídico-patrimonial do credor, e, portanto, trata-se de um direito
adquirido. Com a devida vênia, essa é a primeira heterodoxia que se
depreende até mesmo da dicção literal da lei.
A segunda, que restou explicitada de maneira percuciente pelo voto
da eminente Ministra-Relatora, diz respeito à circunstância de que o
cancelamento dos precatórios e das requisições de pequeno valor será
operacionalizado mediante a transferência dos valores em conta do
devedor que cumpriu a obrigação e depositou. Isso far-se-á ipso facto, ou
seja, viola-se, sem dúvida alguma, em meu modo de ver, o princípio
constitucional do contraditório e do devido processo legal, quando
menos, como está bem posto no voto da eminente Ministra Rosa Weber e
também no parecer da douta Procuradoria-Geral da República, o devido
processo legal, que está no inciso LIV do artigo 5º da Constituição.
Esses dois elementos e essa transferência de forma automática - o
segundo desses elementos -, já, em meu modo de ver, são suficientes para
julgamento integralmente procedente da ação.
Mas há um terceiro e derradeiro elemento que menciono, suscitado
também no voto de Sua Excelência o Ministro Alexandre de Moraes e que
está no parecer da Procuradoria-Geral da República, que é a violação do
princípio da separação de Poderes - também ali se aditou a efetividade da
jurisdição. De modo que, na expressão da eminente Ministra-Relatora, há
uma burla aos freios e contrapesos indispensáveis ao bom funcionamento
dos Poderes.
De modo que, Senhor Presidente, com essa breve manifestação,
juntarei declaração de voto e, reiterando as mais respeitosas vênias às
divergências ou à divergência, estou integralmente votando com a
eminente Ministra-Relatora.
É como voto, Presidente.

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Voto - MIN. EDSON FACHIN

Inteiro Teor do Acórdão - Página 179 de 208

30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN: Senhor Presidente,


cumprimento Vossa Excelência, Ministro Luiz Fux, a eminente Ministra
Relatora Rosa Weber, a eminente Ministra Cármen Lúcia e os eminentes
pares.
Saúdo as sustentações orais que fizeram aportar os advogados e
advogadas e também o e. Sr. Procurador-Geral da República.
Adoto, Senhor Presidente, o relatório apresentado pela e. Ministra
Relatora para esta ADI 5755. Permito-me, contudo, relembrar que se trata
de de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Partido
Democrático Trabalhista (PDT) em que se questiona o art. 2º, caput e § 1º
da Lei nº 13.463/2017, que determina o cancelamento dos precatórios e
requisições de pequeno valor (RPV) federais expedidos e cujos valores
não tenham sido levantados pelo credor e estejam depositados há mais de
dois anos em instituição financeira oficial, cuja redação reproduzo:

“Lei nº 13.463/2017.
(...)
Art. 2° - Ficam cancelados os precatórios e as RPV federais
expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo
credor e estejam depositados há mais de dois anos em
instituição financeira oficial.
§ 1º O cancelamento de que trata o caput deste artigo será
operacionalizado mensalmente pela instituição financeira
oficial depositária, mediante a transferência dos valores
depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional”.

Consigno desde logo, Senhor Presidente, que tenho a honra de


acompanhar as conclusões da e. Ministra Rosa Weber neste julgamento.
Tal como Sua Excelência, afasto a inconstitucionalidade formal alegada,
na medida em que não se verifica a alegada “reserva de
constitucionalidade” sobre o tema. Tal como salientou a e. Ministra
Relatora em seu acutíssimo voto, a matéria em questão se refere ao

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Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. EDSON FACHIN

Inteiro Teor do Acórdão - Página 180 de 208

ADI 5755 / DF

Direito Financeiro e não há óbice à sua disciplina pela via da lei formal.
Quanto aos argumentos relativos à inconstitucionalidade material
arguida, estou de acordo com a premissa eleita pela e. Ministra Relatora,
no sentido de que o legislador formal “desbordou de seu espaço de
atuação”, ao estipular o cancelamento dos precatórios e das requisições
de pequeno valor federais cujos valores não tenham sido levantados pelos
credores respectivos no prazo de dois anos.
A lei objurgada violou, dentre outros, o princípio constitucional do
contraditório, na medida em que previu que, extrapolado o prazo de dois
anos, a instituição financeira depositária transfira, de forma automática,
os valores depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional sem
prévia ciência do interessado.
Vale ressaltar que, tal como consta da fundamentação do voto da e.
Ministra Relatora, “não cabia ao legislador estabelecer uma forma de
cancelamento automático realizado diretamente pela instituição financeira sem a
anterior oitiva da parte interessada em prestígio ao contraditório participativo”.
Enfoco, assim, violação ao art. 5º, LIV, da Constituição da República,
reconhecendo a afronta ao devido processo legal.
Merece destaque, também, o parecer da d. Procuradoria-Geral da
República, que argumentou pela violação do princípio da separação de
poderes (art. 5º, XXXVI, CRFB) e da efetividade da jurisdição (art. 5º,
XXXV, CRFB), na medida em que o procedimento previsto pela lei objeto
da presente ação direta “torna indisponível o valor devido pela Fazenda
Pública reconhecido por decisão judicial transitada em julgado, impedindo o
acesso do cidadão a direito consignado por coisa julgada. Caso o credor objetive
sacar o valor de precatório cancelado, deverá ser expedido novo ofício requisitório,
conforme previsto no art. 3.º da Lei 13.463/2017. Em outras palavras, deverá ser
iniciado novo procedimento administrativo, que dependerá, para sua efetivação,
de nova previsão orçamentária”.
Ao diferir a prévia ciência e o exercício do contraditório para
momento posterior ao do cancelamento automático, verifica-se que a lei
violou a Constituição.
Ademais, a autorização conferida pelo legislador para que a

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Voto - MIN. EDSON FACHIN

Inteiro Teor do Acórdão - Página 181 de 208

ADI 5755 / DF

instituição financeira realize a averiguação unilateral do pagamento e o


cancelamento automático do depósito, com a consequente remessa dos
valores à conta única do Tesouro Nacional configura, como também
concluiu a e. Ministra Relatora, “burla aos freios e contrapesos
indispensáveis ao bom funcionamento dos poderes”.
Acrescento, ainda, Senhor Presidente, que também se verifica
violação ao direito de propriedade, constitucionalmente protegido. A
partir do pagamento realizado pela Fazenda Pública, ainda que pendente
o levantamento, os valores já são de propriedade do credor, não podendo
ser confundidos com receitas públicas.
Ante o exposto, Senhor Presidente, homenageando conclusões
diversas, acompanho a e. Ministra Relatora Rosa Weber e julgo
procedente o pedido contido na presente ação direta, de modo a declarar
a inconstitucionalidade material do art. 2º, caput e § 1º, da Lei nº
13.463/2017.
É como voto.

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Esclarecimento

Inteiro Teor do Acórdão - Página 182 de 208

30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

ESCLARECIMENTO

O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO - Permite-me


uma breve intervenção, Presidente?
Veja, Presidente e eminente Ministro Luiz Edson Fachin, na posição
defendida pela divergência, o credor não perde o crédito, ele continua
com o crédito. Apenas a sua inércia em receber, em levantar o dinheiro,
permite que esse dinheiro, em vez de ficar parado, seja destinado à
satisfação de outro crédito ou de outra obrigação. Assim que esse credor
se reapresentar, ele volta para o seu lugar na fila e poderá receber.
Se uma inércia prolongada pode levar até mesmo à prescrição, essa
inércia limitada leva apenas à utilização do recurso para outro fim, mas
não à perda do crédito. E, assim que ele se reapresente, ele pode levantar
o crédito.
Não há aqui uma afetação ao direito de propriedade, com todas as
vênias. Há apenas uma sanção relativamente leve para a inércia, como
observou o Ministro Nunes Marques. Em momento de recursos escassos,
esse recurso vai ser utilizado para outra coisa em vez de ficar parado, mas
sem pena de o credor, quando se reapresentar, voltar a ter o direito de
estar na fila.
Era só esse esclarecimento.

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Observação

Inteiro Teor do Acórdão - Página 183 de 208

30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

OBSERVAÇÃO
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN - Senhor Presidente,
Vossa Excelência me permite? Apenas por amor ao debate.
Eu tenho dificuldade, com toda vênia ao eminente Ministro Luís
Roberto Barroso, de aplicar aqui a teoria da equivalência das janelas, que
está em Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis. Ou seja,
faz-se o depósito, é como se, portanto, fosse aberta uma janela de
reconhecimento do crédito materializado com o pagamento, mas o poder
depositante retira esse valor e reconhece que esse direito continua
existindo. Quem dera chegasse a esse ponto! Porque aí não seria apenas
confisco. Na verdade, a violação seria ainda mais superlativada. Mas aqui
há um esvaziamento concreto do conteúdo de um direito subjetivo
adquirido. Não é uma janela que fecha e outra que abre; aqui, as duas
janelas continuam fechadas.
O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO - Ministro
Fachin, só relembrando que a posição que adotamos na divergência
envolve uma intimação pessoal. Ora, se o sujeito não quiser levantar o
dinheiro, pode-se usar para outra coisa. Mas respeito todos os pontos de
vista.

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Supremo Tribunal Federal
Antecipação ao Voto

Inteiro Teor do Acórdão - Página 184 de 208

30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

ANTECIPAÇÃO AO VOTO

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Senhor

Presidente, Senhora Ministra Rosa Weber, Vice-Presidente e Relatora

deste caso, Senhores Ministros, Senhor Procurador-Geral da República,

Senhores Advogados - minhas saudações muito especiais àqueles que

assomaram à tribuna e contribuem tanto com seus pareceres -, Senhores

Servidores, na pessoa da Doutora Carmen Lilian, demais servidores e a

imprensa que nos acompanha.

Senhor Presidente, eu acho que a cidadania brasileira

merece realmente que julgamentos como esse aconteçam com essa

exposição das diferentes compreensões do tema, porque não é fácil a

cidadania brasileira em seu exercício pleno, menos ainda do

jurisdicionado. A demora que nós temos na prestação jurisdicional, as

dificuldades de acesso e, depois, a dificuldade de efetivação daquilo que

foi conquistado como direito de alguém - o que o Ministro Alexandre

lembrou -, de um precatório, que é uma realidade que quem advoga,

principalmente, tanto no seu escritório quanto na esfera pública, sabe que

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Antecipação ao Voto

Inteiro Teor do Acórdão - Página 185 de 208

ADI 5755 / DF

são temas difíceis até de explicar ao cidadão que acorre, que acha que o

direito fundamental ao acesso à Justiça não é acesso físico ao foro, mas

acesso à jurisdição, à efetividade daquilo que foi afirmado como seu

direito, dá de encontro com situações como esta posta nesta norma.

O Estado tem de ser responsável, o Estado

constitucional, o Estado democrático em relação ao cidadão, porque

existe para ele. Se o Estado demorar, nós não temos alternativa. Se o

cidadão demorar dois anos para receber aquilo que foi reconhecido

judicialmente como devido, pode-se tomar uma providência como essa?

E isso é realmente uma conformação constitucional nos termos dos

princípios fundamentais e do art. 5º? Não consigo, Presidente, com todas

as vênias da divergência, que eu respeito e sei que há exposição dos

fundamentos válidos, corretos, sérios dos eminentes Colegas que

expõem, não consigo.

Em primeiro lugar, porque, como dizia Bobbio, neste

século XXI, não bastaria ter direitos, mas ter a efetividade jurídica e social

dos direitos que foram postos em cada sistema. Neste caso, o Poder

Judiciário adquiriu uma importância fundamental para a garantia

daquilo que foi conquistado, e o Ministro Seabra Fagundes não se cansou

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Antecipação ao Voto

Inteiro Teor do Acórdão - Página 186 de 208

ADI 5755 / DF

de escrever sobre o direito ao acesso à Justiça, hoje posto formalmente na

Constituição brasileira. O acesso à Justiça é o direito de poder aceder a

um espaço no qual haja um juízo, um órgão do Poder Judiciário, de ter

uma resposta em tempo de razoável duração do processo e de ter a

efetividade da resposta dada. O precatório já é, em si, algo que o Brasil

precisa resolver. Quem foi e é Procurador, e aqui temos o Ministro

Barroso, o Ministro Fachin, o Ministro Gilmar, o Ministro Dias Toffoli, o

Ministro André, nós todos que fomos Procuradores de Estado,

Advogados Públicos, sabemos bem as dificuldades que temos para fazer

com que haja a lisura democrática neste processo de garantir a cada um

aquilo que lhe é devido e que foi reconhecido judicialmente.

Em segundo lugar, tenho para mim que aqui se tem

não a ruptura do princípio da separação de Poderes, que foi argumentado

pelos advogados que defendiam tese contrária à do autor dessa ação, da

parte do autor, sobre quebra do princípio da separação de Poderes não ter

havido. Na minha compreensão, há, porque o Poder Judiciário atuou,

determinou, deu-se a sequência do precatório para disponibilizar o valor

que adentra o patrimônio de bens jurídicos daquele que teve reconhecido,

como sua propriedade, o que lhe foi entregue. Se não lhe foi entregue no

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Antecipação ao Voto

Inteiro Teor do Acórdão - Página 187 de 208

ADI 5755 / DF

sentido de ele, recolhendo, ter também a posse, eu estou com a Ministra-

Relatora, Ministra Rosa Weber, também o Ministro Fachin, em que houve,

sim, o bem a compor o patrimônio do que era credor.

Por isso, Senhor Presidente, farei juntada de voto, mas

tenho para mim que, neste caso, tem-se uma inconstitucionalidade na

forma que foi reconhecida pelo voto da eminente Relatora, com todas as

vênias daqueles que votaram no sentido diferente.

Estou acompanhando o voto de Sua Excelência e,

também, os votos dos Ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e

Edson Fachin.

É como voto: pela procedência da ação.

Publicado sem revisão. Art. 95 do RISTF.

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Voto - MIN. RICARDO LEWANDOWSKI

Inteiro Teor do Acórdão - Página 188 de 208

30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

VOTO

O Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Vogal): Em primeiro


lugar, peço vênia para adotar o relatório distribuído pela relatora do feito,
Ministra Rosa Weber, ressaltando apenas que se trata de ação direta de
inconstitucionalidade ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista –
PDT contra o art. 2º, caput e §1º, da Lei 13.463/2017, que determina o
cancelamento de precatórios e requisições de pequeno valor – RPVs
expedidos e depositados sem levantamento pelo credor há pelo menos 2
anos em instituição financeira oficial.

Eis o teor do dispositivo impugnado:

“Art. 2º Ficam cancelados os precatórios e as RPV federais


expedidos e cujos valores não tenham sido levantados pelo
credor e estejam depositados há mais de dois anos em
instituição financeira oficial.
§ 1º O cancelamento de que trata o caput deste artigo será
operacionalizado mensalmente pela instituição financeira
oficial depositária, mediante a transferência dos valores
depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional.”

Iniciado o julgamento no Plenário Virtual, na Sessão de 12 a


23/2/2021, a relatora converteu a apreciação do pedido cautelar em
julgamento definitivo de mérito, afastou a alegada inconstitucionalidade
formal e votou pela procedência do pedido de declaração de
inconstitucionalidade, uma vez configurada a violação ao contraditório e
ampla defesa (art. 5º, LV, CF/1988); ao devido processo legal (art. 5º, LIV,
CF/1988); à separação de poderes (art. 2º); à proporcionalidade (art. 5º, §
2º); à segurança jurídica e coisa julgada (art. 5º, XXXVI); à inafastabilidade
da jurisdição (art. 5º, XXXV); e ao direito de propriedade do credor (art.
5º, XXII).

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Voto - MIN. RICARDO LEWANDOWSKI

Inteiro Teor do Acórdão - Página 189 de 208

ADI 5755 / DF

O Ministro Roberto Barroso apresentou pedido de vista e inaugurou


a divergência, votando pela procedência parcial do pedido, a fim de
conferir-se interpretação conforme à Constituição ao art. 2º, caput e §1º, da
Lei 13.463/2017, para que “(i) o procedimento de cancelamento de
precatório e requisição de pequeno valor nele previsto seja precedido de
intimação pessoal do credor, pelo juízo da execução (aplicação, por
analogia, do art. 485, II e III e § 1º, do CPC);” e “(ii) a transferência de
recursos para a Conta Única do Tesouro Nacional pressuponha a ausência
de mora da União no pagamento de tais requisições”.

Na Sessão de 7 a 14/5/2021, o Ministro Gilmar Mendes retirou o caso


do Plenário Virtual, após pedido de destaque.

De saída, assento que estou de acordo com a relatora e a divergência


inaugurada pelo Ministro Roberto Barroso quanto à ausência de
inconstitucionalidade formal dos dispositivos impugnados, pois a Lei
13.463/2017 consubstancia ato normativo do Congresso Nacional, por
iniciativa do Presidente da República, em exercício da competência
concorrente em matéria de direito financeiro (art. 24, I, CF/1988) – uma
vez que os precatórios e RPVs se destinam à realização de despesas
públicas em virtude de condenação judicial.

Entendo, ainda, tal como já notaram meus pares, que a norma


questionada ofende os princípios do contraditório e da ampla defesa (art.
5º, LV, CF/1988) quando prever a transferência automática, pela
instituição financeira depositária, dos valores depositados em favor do
jurisdicionado independentemente de prévia cientificação do interessado
ou formalização do contraditório.

Na prática, a inércia do credor no levantamento dos valores pode


não advir necessariamente de desinteresse, mas de outras razões, como,
até mesmo, o desconhecimento da disponibilidade do crédito. Assim, a

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Voto - MIN. RICARDO LEWANDOWSKI

Inteiro Teor do Acórdão - Página 190 de 208

ADI 5755 / DF

intimação pessoal prévia dos credores (art. 485, II e III, §1º, do Código de
Processo Civil de 2015) é necessária e está prevista na Resolução 405/2016,
do Conselho da Justiça Federal.

Nesse sentido, em sua divergência, o Ministro Roberto Barroso


pondera o seguinte:

“Nada obstante, essa conclusão não conduz à procedência


integral do pedido. É que, em deferência ao princípio
democrático, considero adequado o recurso à interpretação
conforme a Constituição para preservar a validade da lei
questionada, excluindo-se apenas a possibilidade de a
instituição financeira depositária cancelar automaticamente os
requisitórios, sem prévia ciência do credor alegadamente inerte
pelo juízo competente. A meu ver, o cancelamento do
requisitório deve ser precedido de intimação pessoal prévia do
credor (aplicação, por analogia, do art. 485, II e III e § 1º, do
CPC), em ato processual expedido pelo juízo da execução, para
que o titular do crédito possa, eventualmente, apresentar
fundamento razoável que afaste a sua inércia.
Essa foi, inclusive, a sistemática adotada pela Resolução nº
405/2016, do Conselho da Justiça Federal, nos seguintes termos:
‘Art. 45. No caso de requisições cujos valores estejam
depositados há mais de dois anos, o presidente do tribunal
comunicará ao juízo da execução para que os credores
sejam intimados.
Parágrafo único. A instituição financeira depositária
deverá fornecer periodicamente, por solicitação do
tribunal, as informações necessárias ao cumprimento do
caput.
Art. 46. Com base nas informações fornecidas pelo
tribunal, o juízo da execução adotará as providências que
entender cabíveis para a ocorrência do saque.
Art. 47. Decidindo o juízo pelo cancelamento da
requisição, o fato deverá ser comunicado ao tribunal para
que este adote as providências necessárias.

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Voto - MIN. RICARDO LEWANDOWSKI

Inteiro Teor do Acórdão - Página 191 de 208

ADI 5755 / DF

Parágrafo único. Cancelada a requisição, poderá ser


expedido novo ofício requisitório, a requerimento do
interessado.’
Por fim, uma observação pertinente: a transferência dos
valores depositados para a Conta Única do Tesouro Nacional só
pode ser efetivada na hipótese de a União Federal não estar em
mora com o pagamento de precatórios judiciais. Caso contrário,
os recursos devem ser destinados ao pagamento de outros
requisitórios inscritos na fila de precedência do respectivo
tribunal. Embora fosse legítimo, em linha de princípio, que a
União aplicasse tais verbas em outras finalidades públicas,
considero necessário assegurar que elas sejam efetivamente
carreadas ao pagamento de precatórios e RPVs, por ser essa a
destinação originariamente prevista na lei orçamentária (art.
165, § 10, CF).”

Embora as soluções e o raciocínio constantes do voto divergente


sejam escorreitos, parece-me que, ao assim decidir, o Supremo Tribunal
Federal estaria, a rigor, criando uma nova lei, tarefa que cabe,
precipuamente, ao Poder Legislativo.

Portanto, por entender que a Lei 13.463/2017, tal como posta, não
comporta a interpretação proposta pela divergência, acompanho a
relatora, no sentido da inconstitucionalidade dos dispositivos
impugnados.

Ante o exposto, voto pela procedência do pedido.

É como voto.

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Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. LUIZ FUX

Inteiro Teor do Acórdão - Página 192 de 208

30/06/2022 PLENÁRIO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755 DISTRITO FEDERAL

VOTO

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX: Eminentes pares, ilustre


representante do Ministério Público, senhores advogados, senhoras
advogadas e demais presentes.

Ab initio, acolho o minucioso relatório disponibilizado pela eminente


Ministra Relatora e a congratulo pela hercúlea tarefa de analisar
pormenorizadamente o presente feito.

I.
OBJETO DA AÇÃO E PRELIMINARES:

In casu, verifico que a controvérsia sub examine cinge-se ao exame de


constitucionalidade do art. 2º, caput e §1º, da Lei federal 13.463/2017 que:

(a) CANCELOU os pagamentos decorrentes de


precatórios e de Requisições de Pequeno Valor (RPV) federais,
“cujos valores não tenham sido levantados pelo credor e estejam
depositados há mais de dois anos em instituição financeira oficial”
(caput); bem como
(b) DETERMINOU que esses valores fossem repassados
mensalmente pelas instituições financeiras à União “mediante
transferência (...) para a Conta Única do Tesouro Nacional” (§1º).

Preliminarmente, comungo do entendimento adotado pela eminente


Ministra Relatora (Rosa Weber) no sentido de:

(I) CONHECER da ação, e


(II) CONVERTER a apreciação de sua medida cautelar

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Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. LUIZ FUX

Inteiro Teor do Acórdão - Página 193 de 208

ADI 5755 / DF

(artigo 10, da Lei 9.868/99) em julgamento definitivo de mérito


(artigo 12 da Lei 9868/99), porquanto verifico que já há
instrução processual suficiente para solucionar a controvérsia
constitucional destes autos.

Passo ao exame de mérito da controvérsia constitucional travada


nestes autos.

II.
FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS:

(B) EXAME DAS INCONSTITUCIONALIDADES FORMAIS:

Em primeiro lugar, afasto os argumentos voltados à


inconstitucionalidade formal do dispositivo impugnado por usurpação
de competência do Poder Judiciário para gestão dos precatórios (art. 100,
caput c/c §§§ 5º, 6º e 7º, CF/88) e rechaço a alegação de afronta ao
princípio da separação de poderes (art. 2º, CF/88) por suposta intrusão do
Congresso Nacional em atividade de competência dos Tribunais
nacionais, afrontando a própria inafastabilidade da jurisdição (art. 5º,
XXXV, CF/1988).

Deveras, o precatório consiste em requisição formal decorrente de


decisão judicial transitada em julgado que tenha condenado a Fazenda
Pública ao pagamento de determinada quantia à parte contrária do litígio.

Como é cediço, a disciplina dos precatórios e das Requisições de


Pequeno Valor (RPV) consiste em matéria eminentemente de Direito

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Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. LUIZ FUX

Inteiro Teor do Acórdão - Página 194 de 208

ADI 5755 / DF

Financeiro, adstrita à competência concorrente dos entes federativos (art.


24, I, CF/1988) e à iniciativa legislativa geral dos Poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário. Desse modo, inexiste – in casu – qualquer vício de
inconstitucionalidade formal no dispositivo impugnado.

Com efeito, o pagamento dos precatórios ocorre exclusivamente na


ordem cronológica de apresentação e à conta dos créditos respectivos, sob
a tutela do Poder Judiciário na figura do Presidente de cada Tribunal
(artigo 100, caput, §§§ 5º, 6º e 7º).

Ocorre que “os atos do presidente do tribunal que disponham sobre


processamento e pagamento de precatório não tem caráter jurisdicional”
(Súmula 311 do Superior Tribunal de Justiça), tendo em vista que “a
ordem judicial de pagamento (2º do artigo 100 da Constituição Federal), bem
como os demais atos necessários a tal finalidade, concernem ao campo
administrativo e não jurisdicional” (ADI 1.098/SP, Rel. Min. Marco Aurélio,
PLENO, DJ 25/10/1996). Confira-se:

“Por fim, o Plenário desta Corte, no julgamento da


Reclamação 2.425/ES, Rel. Min. Dias Toffoli, assentou a
"natureza administrativa das decisões da presidência dos
Tribunais no cumprimento dos precatórios judiciais, caráter
que se estende também às decisões colegiadas dos recursos
internos contra elas interpostos” (...)
O tema também é objeto da jurisprudência sumulada do
Supremo Tribunal Federal, como se infere do Verbete 733: "Não
cabe recurso extraordinário contra decisão proferida no
processamento de precatórios"
(ARE 759.979 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski,
SEGUNDA TURMA, DJe 26.9.2014)

Por consequência, essa atividade administrativa é regulamentada e


fiscalizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), além de
pormenorizada pelos regimentos internos dos respectivos Tribunais que

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ADI 5755 / DF

detalham os procedimentos para gestão e operacionalização dos


precatórios, ao lado de decisões do Supremo Tribunal Federal que
moldaram o regime jurídico dos precatórios no Brasil.

O referido poder normativo do Judiciário não se confunde com a


atividade legislativa do Congresso Nacional de estabelecer normas sobre
o tema, sendo legítima desde que respeite as balizas contidas no artigo
100 da CF/88, isto é, limitando-se a regulamentar aspectos de sua
aplicabilidade. Em síntese, inexiste uma “reserva de Constituição” para
tratar da matéria e o legislador ordinário exerceu a sua competência
autorizada para discipliná-lo.

Sendo assim, passo a avaliar as alegações de inconstitucionalidade


material do dispositivo impugnado referentes a sua compatibilidade com
a segurança jurídica, a coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CF/1988); o direito de
propriedade (art. 5º, XXII, CF/1988) e o princípio da proporcionalidade
(art. 5º, § 2º, CF/1988); o devido processo legal, o contraditório e a ampla
defesa (art. 5º, LIV e LV, todos da CF/1988).

(B) EXAME DAS INCONSTITUCIONALIDADES MATERIAIS:

Em segundo lugar, rememoro que o caput do artigo 5º da


Constituição Federal prevê que o direito de propriedade é inviolável,
porquanto trata-se de direito fundamental expressamente garantido no
ordenamento constitucional brasileiro (artigo 5º, inciso XXII, da CF/88).

Deveras, a propriedade privada consiste em princípio da ordem


econômica nacional (artigo 170, inciso II, da CF/88) devido a relevância
de sua alocação para a garantia de eficiência nas relações negociais típicas
de uma economia de mercado capitalista.

Não por acaso, o próprio Ronald Coase (Prêmio Nobel de Economia

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ADI 5755 / DF

em 1991) propôs um de seus principais teoremas a respeito da alocação


eficiente dos direitos de propriedade para minimizar os chamados custos
de transação incidentes.
(COASE, Ronald. The Nature of the Firm. In Coase, R. The Firm, the
Market and the Law. Chicago: The University of Chicago Press, 1988).
COASE, Ronald. The Problem of Social Cost. In COASE, R. The Firm,
the Market and the Law. Chicago: The University of Chicago Press, 1988).

No entanto, para além da Análise Econômica do Direito, a própria


vertente da constitucionalização do direito civil demonstra cabalmente que
não há se falar em caráter absoluto e estritamente individualista do
direito de propriedade.
(FACHIN, Luiz Edson. Direito Civil: sentidos, transformações e fim.
Renovar: Rio de Janeiro, 2015);
(TEPEDINO, Gustavo. Premissas metodológicas para a
constitucionalização do direito civil. Temas de Direito Civil. Rio de Janeiro:
Editora Renovar, 2004).

Ao revés, os próprios artigos 5º, inciso XXIII, c/c 170, inciso III, da
CF/88 condicionam o gozo desse direito fundamental ao atendimento de
sua função social. O proprietário de bens móveis, imóveis e intelectuais
deve exercer o seu direito subjetivo à luz do interesse coletivo, gerando
proveito e bem-estar sociais.
Destarte, no direito constitucional brasileiro, além dos usuais deveres
negativos de não interferência, o proprietário também possui obrigações
positivas em relação a sua propriedade privada. Ou seja, para além de se
abster, o proprietário também deve agir.
(GOMES, Orlando. Direitos Reais. Rio de Janeiro: Editora Forense,
2012).

A título de exemplo, o exercício desse direito no âmbito urbano


demanda o atendimento “às exigências fundamentais de ordenação da cidade
expressas no plano diretor” (artigo 182, §2º, CF/88). Caso contrário, nas

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hipóteses de não edificação, subutilização ou não utilização, o Poder


Público possui legitimidade para exigir do proprietário que promova
ações em prol do adequado aproveitamento do solo urbano sob pena das
sanções previstas no artigo 182, §4º, da CF/88, a saber:

“I - Parcelamento ou edificação compulsórios;


II - Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana
progressivo no tempo;
III - Desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida
pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com
prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e
sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais”.

O mesmo ocorre com a propriedade rural: o exercício do direito de


propriedade é condicionado ao preenchimento de certos pressupostos
jurídicos simultâneos previstos no artigo 186, da CF/88. Por exemplo, caso
o imóvel rural seja improdutivo (carecendo de um aproveitamento
racional e adequado), a União poderá desapropriá-lo, para fins de
reforma agrária e interesse social, mediante prévia e justa indenização em
títulos da dívida agrária (artigo 184, caput, da CF/88).

Portanto, existindo falhas de mercado ou desatendimento dos


parâmetros constitucionais, o Estado brasileiro está constitucionalmente
autorizado para interferir no exercício do direito de propriedade.

Ocorre que as ingerências nesse direito fundamental devem ser


delineadas de modo estritamente proporcional, sob pena de
configurarem verdadeira regulação estatal expropriatória, definidas
como:

“Regulações cujo feitio de legítimas normas limitadoras


da atividade econômica encobrem um ato de inconstitucional
esvaziamento da propriedade privada, entendida em seu
sentido amplo, enquanto garantia de proteção de bens e direitos

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Voto - MIN. LUIZ FUX

Inteiro Teor do Acórdão - Página 198 de 208

ADI 5755 / DF

contra o confisco”
(CYRINO, André R. Regulações expropriatórias:
apontamentos para uma teoria. Revista de Direito Administrativo,
Rio de Janeiro, 267, p. 199-235, set./dez. 2014, p. 203).

No julgamento da ADI 6482, de relatoria do eminente Ministro


Gilmar Mendes (DJe 08/10/2021), o Plenário deste Supremo Tribunal
Federal assentou que a revisão judicial de restrições estatais ao direito
fundamental de propriedade privada deve analisar “a compatibilidade das
restrições estabelecidas com o princípio da proporcionalidade”, mercê de a
moderna doutrina constitucional determinar não somente o atendimento
ao princípio da reserva legal (Gesetzesvorbehalt), mas também observância
ao princípio da reserva legal proporcional (Vorbehalt des verhaltnismassigen
Gesetzes), segundo o qual:

(i) Os meios utilizados devem ser adequados (Geeignetheit)


para a consecução dos fins perseguidos pelo legislador, os quais
devem ser por si só constitucionalmente legítimos;
(ii) A medida restritiva deve ser necessária (Notwendigkeit
oder Erforderlichkeit), não havendo outro meio menos gravoso
para alcançar os objetivos perseguidos pelo legislador;
(iii) A restrição legal deve ser estritamente proporcional,
de modo que apresente salvaguardas e garantias para não
inviabilizar os demais direitos fundamentais precedidos no
deslinde da controvérsia, tornando positivo o exame de custo-
benefício (ganhos da medida x custos aos demais direitos e
interesses envolvidos).

In casu, entendo que a finalidade do dispositivo legal impugnado é


constitucionalmente legítima, porquanto pretende tornar mais eficiente a
gestão dos recursos destinados aos pagamentos decorrentes de
precatórios e de RPVs federais (artigo 37, caput, CF/88).

Deveras, a medida legal restritiva é também adequada, tendo em


vista que o levantamento dos recursos federais paralisados em razão da

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inércia do particular garante à União capital de giro para prestação de


serviços públicos e a consecução de políticas públicas em áreas centrais
como educação, saúde, infraestrutura etc.

Não por outro motivo, o próprio artigo 2º, §2º, da legislação


impugnada teve o cuidado de determinar que pelo menos 20% do
montante cancelado seja aplicado pela União na “manutenção e
desenvolvimento do ensino”, além de que pelo menos 5% seja aplicado “no
Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte”.

Em sentido convergente, entendo que o dispositivo legal impugnado


atende ao subprincípio da necessidade, mercê de não desbordar do
quanto necessário para a consecução do objetivo público almejado.

Com efeito, o estabelecimento de prazo bienal para levantamento do


montante expedido em sede de precatório ou de RPV representa medida
necessária para desobstruir vultuosas quantias paralisadas por inércia do
credor.

O dispositivo legal permite que a União aloque essas quantias de


modo mais eficiente para o bem-estar social sem, contudo, inviabilizar a
posterior expedição de novo ofício requisitório a requerimento do credor,
com conservação da ordem cronológica anterior de requisição e
remuneração correspondente a todo o período (artigo 3º, caput e
parágrafo único da Lei n. 13.463/2017).

Entretanto, forçoso concluir que o dispositivo legal impugnado


NÃO É estritamente proporcional, porquanto deixa de prever
salvaguardas para garantir o respeito à segurança jurídica e não assegura
aos particulares os princípios do devido processo legal, do contraditório e
da ampla defesa no procedimento previsto.

Como é cediço, o preceito fundamental da segurança jurídica é

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corolário do Estado de Direito (rule of law) e instrumento crucial para o


próprio nível de desenvolvimento econômico de uma nação.

Em verdade, o preceito da segurança jurídica exige que o Poder


Público não só se abstenha de adotar comportamentos contraditórios e
surpreendentes, como também garanta as condições necessárias pelas
quais os cidadãos possam livremente agir no presente e autodeterminar o
futuro de suas relações jurídicas – sempre com previsibilidade, confiança
e racionalidade. Conforme destaca Humberto Ávila, trata-se de:

“Norma-princípio que exige dos Poderes Legislativo,


Executivo e Judiciário, a adoção de comportamentos que
contribuam (...) [com] um estado de confiabilidade e de
calculabilidade jurídica (...) [Nesse sentido, a segurança
jurídica atua] como instrumento garantidor do respeito à
capacidade [dos cidadãos] de - sem engano, frustração,
surpresa e arbitrariedade - plasmar digna e responsavelmente
o seu presente e fazer um planejamento estratégico
juridicamente informado do seu futuro
[Em síntese, a segurança jurídica] permite que o cidadão
[saiba] aquilo que ‘pode ou não fazer de acordo com o direito”
(ÁVILA, Humberto. Teoria da Segurança Jurídica. 6ª edição.
Salvador: JusPodivm, 2021, grifos nossos).

Por essa razão, já assentei doutrinariamente que “a segurança jurídica


figura como um dos valores mais caros ao processo civil, já que é o elemento
responsável por lhe conferir legitimidade [democrática]. As partes não se
submeteriam a um processo judicial, que, sabidamente, demanda tempo e
dinheiro, se a decisão proferida não lhe fosse, em alguma medida, definitiva” e
capaz de pacificar a controvérsia travada nos autos.
(FUX, Luiz. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Editora
Forense, 2022, p. 55).

In casu, o próprio caput do artigo 100, da CF/88, o qual rege o regime


de precatórios, determina que essa pacificação social das controvérsias

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ADI 5755 / DF

jurídicas ocorra mediante “sentença judiciária”.

Consectariamente, a segurança jurídica é cristalizada


processualmente por meio da perfectibilização da coisa julgada (artigo 5º,
XXXV), a qual garante (i) a imutabilidade da resposta jurisdicional que
condenou a Fazenda Pública, porquanto fixa o momento em que ela
transita em julgado por se tornar irrecorrível; e (ii) a imperatividade da
decisão judicial condenatória, que se torna exigível pela parte
“vencedora” da contenda de acordo com a ordem cronológica prevista
constitucionalmente:

[Não obstante os limites subjetivos e objetivos dessa


garantia processual], o fundamento substancial da coisa julgada
(...) visa à preservação da estabilidade e segurança sociais.
A imutabilidade da decisão é fator de equilíbrio social
na medida em que os contendores obtêm a última e decisiva
palavra do Judiciário acerca do conflito intersubjetivo. A
imperatividade da decisão completa o ciclo necessário de
atributos que permitem ao juiz conjurar a controvérsia pela
necessária obediência ao que foi decidido”
(FUX, Luiz. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro:
Editora Forense, 2022, p. 456-458).

No caso sub examine, todavia, verifico que o cancelamento imediato


de precatório ou RPV regularmente expedidos em nome do particular
frustra – de modo surpreendente e arbitrário – a legítima expectativa do
titular do crédito de recebê-lo dentro das balizas jurídicas estipuladas à
época de sua expedição.

Nesse sentido, a norma impugnada inviabiliza frontalmente o


planejamento pessoal do credor – no presente e no futuro – acerca do que
será feito com o valor recebido decorrente de decisão judicial definitiva
que reconheceu seu direito contra a Fazenda Pública.

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Destarte, conclui-se que o dispositivo legal impugnado vulnera


claramente os pressupostos da previsibilidade, da calculabilidade e da
confiabilidade ínsitos ao preceito constitucional da segurança jurídica.

Demais disso, o dispositivo impugnado também vulnera


substancialmente os preceitos do contraditório, da ampla defesa (art. 5º,
LV, CF/1988) e do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF/1988), porquanto
não prevê salvaguardas para assegurá-los no procedimento instituído.

Em trabalho acadêmico apresentado ao Departamento de Direito


Processual da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Antônio
Augusto Pires Brandão corretamente destaca a necessidade de
democratização do direito processual civil por meio da materialização do
princípio do contraditório, verbis (grifei):

“As bases do regime democrático precisam ser


espalhadas através do processo. Pode até mesmo ser
considerado um ‘microcosmos democrático’ do Estado de
Direito, colocando como vértices a liberdade, a igualdade e a
participação (...)
O ambiente democrático do processo [exige] uma real
possibilidade de diálogo direto entre partes, juiz e terceiros
(...)
A evolução do sistema [processual] vem prestigiar a
atuação das partes e a democratização do direito processual,
conformando-o com a exigência do devido processo legal (...)
[e do] contraditório”
(BRANDÃO, Antônio Augusto Pires. O Incidente de
Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR): do contexto à
otimização. Curitiba: Editora CRV, 2019, p. 31-40).

Em linha com os arts. 7°, 9° e 10, do Código de Processo Civil de


2015, Newton Pereira Ramos Neto acertadamente destaca que o
magistrado contemporâneo deve atuar para permitir o contraditório
efetivo não só nos procedimentos essenciais para sua posterior decisão,

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mas sobretudo na construção e na fundamentação do decisum proferido.


Apesar das dificuldades de se operacionalizar o contraditório
efetivo, incumbe ao juízo empreender esforços para que as partes
participem efetivamente no próprio processo de construção da decisão
judicial, proferindo decisões cujos fundamentos foram extraídos de
discussões em que ambas tiveram oportunidade de se manifestar e –
consequentemente - de exercer real influência sobre o resultado.
(RAMOS, Newton. Poderes do juiz no processo civil e sua conformação
constitucional. Salvador: JusPodivm, 2021, p. 180-197).

Não por acaso, também já destaquei doutrinariamente que a história


do processo civil está intimamente vinculada ao próprio princípio do
contraditório, sob a máxima de que a “alegação de um só homem não é
alegação”.
Deveras, o princípio do contraditório é reflexo da legalidade
democrática por meio de duas dimensões. A primeira é a dimensão
formal, segundo a qual todo indivíduo no processo tem fala digna de
consideração e tem, por conseguinte, o direito de ser ouvido no processo.
Por sua vez, a segunda dimensão é substancial, atribuindo à parte o
definitivo poder de influenciar a decisão estatal. Essas previsões
garantem aos cidadãos e ao próprio Poder Público o direito de
participação democrática no processo decisório estatal.
(FUX, Luiz. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense,
2022 p. 39 e 56-57).

Em síntese, o ordenamento constitucional e as balizas processuais


estabelecem expressamente que as partes devem ter a oportunidade de
influenciar previamente a formação do resultado do processo. Sendo
assim, in casu, não podem ser surpreendidas por decisões que cancelam
precatórios ou RPVs automaticamente.

Afinal, além do conhecimento prévio sobre os atos do processo


decisório estatal, é preciso oportunizar aos cidadãos a possibilidade de se

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manifestarem a respeito das razões de sua inércia (v.g. podem sequer ter
conhecimento sobre a expedição do precatório ou podem estar em
processo de negociação da cessão do crédito público). Em verdade, é
plausível até que o credor não esteja inerte persistindo eventual discussão
jurídica ou inviabilidade prática perante o juízo de execução ou do gestor
de precatórios do respectivo tribunal.

No caso sub examine, portanto, o dispositivo legal impugnado


inviabiliza – a um só tempo – os preceitos fundamentais da segurança
jurídica, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa
na medida em que cancela automaticamente – de modo abrupto e
surpreendente - os precatórios e RPVs expedidos regularmente em
nome do particular.

Por conseguinte, a primeira hipótese de interpretação conforme


proposta pelo eminente Ministro Luís Roberto Barroso resta exatamente
adequada para o deslinde da controvérsia travada nestes autos, qual seja:
“interpretação conforme ao art. 2º, caput e 1º, da Lei 13.463/2017, para que o
procedimento de cancelamento de precatório e requisição de pequeno valor nele
previsto seja precedido de intimação pessoal do credor, pelo juízo da execução”.

De um lado, essa interpretação preserva a vigência e os efeitos


positivos da legislação federal ora impugnada, homenageando o
princípio da deferência democrática. Porém, de outro, compatibiliza o
dispositivo legal impugnado com os preceitos fundamentais que ele viria
a vulnerar, em especial o princípio do contraditório.

III.
DISPOSITIVO:

Ex positis, CONHEÇO da ação e, no mérito, julgo-a


PARCIALMENTE PROCEDENTE, assentando INTERPRETAÇÃO

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ADI 5755 / DF

CONFORME ao artigo 2º, caput e § 1º, da Lei nº 13.463/2017, apenas para


determinar que “o procedimento de cancelamento de precatório e requisição de
pequeno valor nele previsto seja precedido de intimação pessoal do credor, pelo
juízo da execução”, nos termos da divergência aberta pelo voto do
eminente Min. Luís Roberto Barroso.

É como voto.

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Extrato de Ata - 30/06/2022

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PLENÁRIO
EXTRATO DE ATA

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 5.755


PROCED. : DISTRITO FEDERAL
RELATORA : MIN. ROSA WEBER
REQTE.(S) : PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA
ADV.(A/S) : CLAUDIO OLIVEIRA SANTOS COLNAGO (11113/ES)
INTDO.(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
INTDO.(A/S) : CONGRESSO NACIONAL
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROCURADORES E ADVOGADOS
PÚBLICOS FEDERAIS - ANPPREV
ADV.(A/S) : HUGO MENDES PLUTARCO (DF025090/)
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO DE SINDICATOS DE TRABALHADORES TÉCNICOS-
ADMINISTRATIVOS EM INSTITUIÇÕES PÚBLICAS DE ENSINO SUPERIOR NO
BRASIL E OUTRO(A/S)
ADV.(A/S) : CLAUDIO SANTOS DA SILVA (10081/DF)
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DOS POLICIAIS FEDERAIS - FENAPEF
ADV.(A/S) : RUDI MEIRA CASSEL (22256/DF)
ADV.(A/S) : ANTONIO RODRIGO MACHADO DE SOUSA (00034921/DF)
AM. CURIAE. : ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DA PREVIDÊNCIA E
DA SEGURIDADE SOCIAL - ANASPS
ADV.(A/S) : ANTONIO TORREAO BRAZ FILHO (09930/DF, 154525/MG,
238265/RJ)
AM. CURIAE. : CONFEDERACAO DOS TRABALHADORES NO SERVICO PUBLICO
FEDERAL - CONDSEF
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES NO SERVIÇO PÚBLICO
FEDERAL - FENADSEF
AM. CURIAE. : SINDICATO NACIONAL DOS SERVIDORES FEDERAIS DA
EDUCAÇÃO BÁSICA, PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA - SINASEFE NACIONAL
ADV.(A/S) : JOSE LUIS WAGNER (1235-A/AP, 17183/DF, 18061/PR,
125216/RJ, 18097/RS, 15111/SC)
AM. CURIAE. : SINDICATO DOS TRABALHADORES FEDERAIS DA SAÚDE,
TRABALHO E PREVIDÊNCIA NO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (SINDISPREV/
RS)
ADV.(A/S) : GLENIO LUIS OHLWEILER FERREIRA (23021/RS, 328901/SP)
ADV.(A/S) : THIAGO CECCHINI BRUNETTO (51519/RS)
AM. CURIAE. : CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL -
CFOAB
ADV.(A/S) : MARCUS VINICIUS FURTADO COÊLHO (18958/DF, 167075/MG,
2525/PI, 463101/SP)
ADV.(A/S) : LUIZ GUSTAVO ANTONIO SILVA BICHARA (21445/DF,
10503/ES, 139419/MG, 112310/RJ, 303020/SP)
ADV.(A/S) : EDUARDO DE SOUZA GOUVEA (067378/RJ, 311792/SP)
ADV.(A/S) : OSWALDO PINHEIRO RIBEIRO JUNIOR (16275/DF)
ADV.(A/S) : LIZANDRA NASCIMENTO VICENTE (39992/DF)
ADV.(A/S) : GUILHERME DEL NEGRO BARROSO FREITAS (48893/DF)

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Supremo Tribunal Federal
Extrato de Ata - 30/06/2022

Inteiro Teor do Acórdão - Página 207 de 208

ADV.(A/S) : CLAUDIA PAIVA CARVALHO (129382/MG)


AM. CURIAE. : SINTRAJUSC - SINDICATO DOS TRABALHADORES NO PODER
JUDICIÁRIO FEDERAL EM SANTA CATARINA
ADV.(A/S) : PEDRO MAURICIO PITA DA SILVA MACHADO (29543/DF, 24372/
RS, 12391/SC)
AM. CURIAE. : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES EM
SEGURIDADE SOCIAL ¿ CNTSS/CUT
ADV.(A/S) : RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO (32147/DF, 140251/MG,
234932/RJ, 1190/SE, 439314/SP)
ADV.(A/S) : RODRIGO CAMARGO BARBOSA (34718/DF)
AM. CURIAE. : FEDERAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES DA JUSTIÇA FEDERAL
E DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO ¿ FENAJUFE
ADV.(A/S) : RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO (32147/DF, 140251/MG,
234932/RJ, 1190/SE, 439314/SP)
ADV.(A/S) : RODRIGO CAMARGO BARBOSA (34718/DF)
AM. CURIAE. : ASSOCIACAO DOS ADVOGADOS DE SAO PAULO
ADV.(A/S) : ANTONIO CARLOS DE ALMEIDA AMENDOLA (225356/RJ, 154182/
SP)
ADV.(A/S) : MARIO LUIZ OLIVEIRA DA COSTA (01934/A/DF, 117622/SP)
ADV.(A/S) : ANDRE ALMEIDA GARCIA (184018/SP)
ADV.(A/S) : DANIEL NUNES VIEIRA PINHEIRO DE CASTRO (223677/SP)

Decisão: Após o voto da Ministra Rosa Weber, Relatora, que


conhecia da ação direta e julgava procedente o pedido, para
declarar a inconstitucionalidade material do art. 2º, caput e §
1º, da Lei nº 13.463/2017, pediu vista dos autos o Ministro
Roberto Barroso. Falaram: pelos interessados, o Dr. Adriano
Martins De Paiva, Advogado da União; pelo amicus curiae Federação
de Sindicatos de Trabalhadores Técnicos-Administrativos em
Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil, o Dr. Claudio
Santos; pelo amicus curiae Federação Nacional dos Servidores da
Justiça Federal e do Ministério Público da União – FENAJUFE, o Dr.
Paulo Francisco Soares Freire; pelo amicus curiae Associação
Nacional dos Procuradores e Advogados Públicos Federais – ANPPREV,
o Dr. Hugo Mendes Plutarco; pelo amicus curiae Associação dos
Advogados de São Paulo, o Dr. Antonio Carlos De Almeida Amendola;
pelo amicus curiae Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil – CFOAB, a Dra. Manuela Elias Batista; pelo amicus cuiae
SINTRAJUSC - Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário
Federal em Santa Catarina, o Dr. Pedro Mauricio Pita Machado; e,
pelo amicus curiae Confederação dos Trabalhadores no Serviço
Público Federal – CONDSEF, o Dr. Bruno Conti Gomes da Silva.
Plenário, Sessão Virtual de 12.2.2021 a 23.2.2021.

Decisão: (Processo destacado do Plenário Virtual) Após o voto


da Ministra Rosa Weber (Relatora), que conhecia da ação direta e
julgava procedente o pedido, para declarar a inconstitucionalidade
material do art. 2º, caput e § 1º, da Lei nº 13.463/2017, o
julgamento foi suspenso. Falaram: pelo requerente, o Dr. Marco

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Extrato de Ata - 30/06/2022

Inteiro Teor do Acórdão - Página 208 de 208

André Dunley Gomes; pelo interessado Presidente da República, o


Dr. Adriano Martins Paiva, Advogado da União; pelo amicus curiae
Associação Nacional dos Procuradores e Advogados Públicos Federais
– ANPPREV, o Dr. Hugo Mendes Plutarco; pelos amici curiae
Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnicos-Administrativos
em Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil e Federação
Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho,
Previdência e Assistência Social – FENASPS, o Dr. Cláudio Santos
da Silva; pelos amici curiae Confederação dos Trabalhadores no
Serviço Público Federal - CONDSEF, Federação dos Trabalhadores no
Serviço Público Federal - FENADSEF e Sindicato Nacional dos
Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica
- SINASEFE Nacional, o Dr. Bruno Conti Gomes da Silva; pelo amicus
curiae Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – CFOAB,
o Dr. Márcio Brotto de Barros; pelos amici curiae Confederação
Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social - CNTSS/CUT e pela
Federação Nacional dos Servidores da Justiça Federal e do
Ministério Público da União – FENAJUFE, o Dr. Raimundo Cézar
Britto Aragão; e, pela Procuradoria-Geral da República, o Dr.
Antônio Augusto Brandão de Aras, Procurador-Geral da República.
Ausentes, justificadamente, os Ministros Gilmar Mendes e Ricardo
Lewandowski. Presidência do Ministro Luiz Fux. Plenário,
29.6.2022.

Decisão: O Tribunal, por maioria, conheceu da ação direta e


julgou procedente o pedido, para declarar a inconstitucionalidade
material do art. 2º, caput e § 1º, da Lei nº 13.463/2017, nos
termos do voto da Relatora, vencidos os Ministros Roberto Barroso,
Gilmar Mendes, André Mendonça, Nunes Marques e Luiz Fux
(Presidente), que julgavam parcialmente procedente o pedido,
conferindo interpretação conforme aos dispositivos. Plenário,
30.6.2022.

Presidência do Senhor Ministro Luiz Fux. Presentes à sessão os


Senhores Ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Cármen
Lúcia, Dias Toffoli, Rosa Weber, Roberto Barroso, Edson Fachin,
Alexandre de Moraes, Nunes Marques e André Mendonça.

Procurador-Geral da República, Dr. Antônio Augusto Brandão de


Aras.

Carmen Lilian Oliveira de Souza


Assessora-Chefe do Plenário

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