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MECÂNICA DOS

FLUIDOS

Germano Scarabeli Custódio Assunção


Turbinas de Sistemas de
Geração de Energia Elétrica
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Definir turbinas.
„„ Identificar as aplicações das turbinas.
„„ Analisar o tipo de escoamento de fluido em turbinas.

Introdução
Hoje em dia, a demanda por energia elétrica é cada vez maior, seja para
uso em residências, indústrias ou até mesmo para transporte por meio dos
carros elétricos. O conjunto responsável por gerar essa energia consiste na
junção entre turbina e gerador. A turbina é o equipamento responsável
por extrair energia de algum fluido (água, ar, vapor, gás, etc.) para gerar
energia mecânica (rotação de um eixo). Esse eixo é acoplado a um gerador
que, a partir da variação de campo magnético, produz corrente elétrica.
Além de serem fundamentais para geração de energia elétrica, as
turbinas também são usadas para propulsão de aviões, navios e trens.
Além disso, podem ser usadas para movimentar qualquer outro equipa-
mento mecânico rotativo, como bombas, compressores ou ventiladores.
Ou seja, nos mais variados contextos do nosso dia a dia, as turbinas estão
presentes.
Neste capítulo, você aprenderá sobre as turbinas: os diferentes tipos,
suas características construtivas, os equacionamentos da mecânica dos
fluidos que explicam seu funcionamento e as aplicações em diferentes
contextos da engenharia.
2 Máquinas de fluxo — turbinas

Máquinas de fluido
Máquinas de fluido são equipamentos cuja função é trocar energia entre um
sistema mecânico e um fluido. Por sua ampla aplicação na engenharia, esses
equipamentos são usualmente subclassificados em três grandes categorias,
quanto:

„„ à forma de transformação de energia;


„„ ao fluido escoado;
„„ à maneira de interação com a energia.

Com relação à primeira categoria, as máquinas de fluido podem ser classi-


ficadas em dois grupos: máquinas volumétricas (ou deslocamento positivo)
e máquinas de fluxo (ou máquinas dinâmicas). O que difere uma da outra
é basicamente a forma de receber ou realizar trabalho mecânico, conforme
Bistafa (2016). Nas máquinas volumétricas, o fluido fica confinado em alguma
porção do equipamento, e a transferência de energia é feita por variações do
volume do fluido nessa porção. Já as máquinas de fluxo são as que transfor-
mam energia através de lâminas ou pás que direcionam o fluxo num elemento
rotativo, e a troca de energia ocorre por essa interação, ou seja, há um fluxo
contínuo através da máquina.
A segunda categoria consiste em separar máquinas que trabalham com
fluidos incompressíveis (máquinas hidráulicas) de máquinas que trabalham
com fluidos compressíveis (máquinas térmicas). No primeiro caso, considera-
-se que a massa específica do fluido não se altera ao longo do escoamento,
o que gera consideráveis simplificações no equacionamento que descreve o
funcionamento dos equipamentos. No segundo caso, considera-se que a massa
específica do fluido altera-se, e as complexidades que esse processo gera não
podem ser desconsideradas nos estudos.
A terceira e última categoria consiste em separar as máquinas em máquinas
geratrizes — que transformam energia mecânica em energia para os fluidos —
e as máquinas motrizes — que fazem o contrário, transformando a energia
do fluxo dos fluidos em energia mecânica. Para maiores detalhes sobre essas
classificações, sugere-se consultar Souza (2012) e White (2018).
É importante perceber que não há um nível hierárquico entre essas classi-
ficações, pois são categorias complementares. Como exemplo de como essa
classificação é aplicada, podemos pensar nas turbinas usadas em hidrelétricas
para produção de energia elétrica.
Máquinas de fluxo — turbinas 3

Tais máquinas são de fluido, pois há interação entre um conjunto mecâ-


nico e um fluido (neste caso, a água); é uma máquina de fluxo, visto que o
fluido não fica confinado em seu interior, apenas flui através dos rotores; é
uma máquina hidráulica, pois a massa específica durante o escoamento é
considerada constante e uma máquina motriz, pois produz energia elétrica a
partir da energia do fluxo de água. Uma bomba de engrenagens usada para
transportar o fluido do taque até o motor de um automóvel é outro exemplo de
máquina de fluido incompressível (hidráulica). Entretanto, nesse caso, é uma
máquina volumétrica — pois o fluido fica confinado entre as engrenagens
e as carcaças — e é uma máquina geratriz — pois utiliza energia mecânica
para bombear o fluido. Çengel e Cimbala (2015) apresentam mais exemplos
de diferenciação entre esses equipamentos.

Turbinas
O foco do presente capítulo são as turbinas, que são máquinas de fluxo que
geram energia mecânica na forma de torque. Há diversos tipos de turbinas
que utilizam diferentes tipos de fluidos para gerar energia elétrica ou energia
mecânica, tais como: turbinas hidráulicas (hidrelétricas), turbinas a vapor
(plantas industriais), turbinas a gás (indústria aeronáutica) e turbinas eólicas
(empresas geradoras e distribuidoras de energia).

Em um contexto mais amplo, existem turbinas que são máquinas volumétricas (deslo-
camento positivo) e as que são máquinas de fluxo. Entretanto, conforme apresentado
por Çengel e Cimbala (2015), as turbinas volumétricas, em geral, são usadas somente
para medir vazão de escoamentos (como os hidrômetros residenciais), e não são
aplicadas para gerar trabalho. Assim, a maioria dos autores considera as turbinas, por
praticidade, somente como máquinas de fluxo, pois são elas que geram, de fato, energia.

As turbinas se subdividem em duas categorias principais: turbinas de ação


(ou impulsão) e turbinas de reação. Em turbinas de ação (impulso), conforme
Çengel e Cimbala (2015), o fluido é forçado através de um bocal, e, pelo
princípio de Bernoulli, grande parte da energia disponível no fluido (energia
de pressão ou potencial) é convertida em cinética. Esse fluido com alta energia
4 Máquinas de fluxo — turbinas

cinética atinge, na forma de jato, palhetas que transferem energia para o eixo da
turbina, ou seja, o jato de fluido impulsiona o movimento rotativo da turbina.
As turbinas de reação utilizam as energias de pressão e potencial do fluido,
além da energia cinética para gerar energia mecânica (ou elétrica) dentro de um
espaço fechado (voluta) que canaliza o fluido para o rotor. À medida que esse fluido
com alta pressão e alta energia cinética atravessa o rotor, seu momento angular é
reduzido e impõe um torque ao rotor que, por sua vez, aciona o eixo da turbina.
A Figura 1a ilustra o princípio de funcionamento das turbinas de ação
(impulsão), e a Figura 1b, das turbinas de reação, sendo que as setas em ver-
melho indicam o sentido do movimento do fluido. É importante salientar que
diversas turbinas modernas empregam ambos os princípios e não funcionam
isoladamente, tais como as turbinas a vapor.

Vapor

Força

W
a)

Vapor

Força

W
b)

Figura 1. Princípio de funcionamento das turbinas: (a) de ação ou impulso e (b) de reação.
Fonte: Adaptada de Fontes (2007, p. 9).
Máquinas de fluxo — turbinas 5

Além do seu princípio de funcionamento, as turbinas também podem ser


subdivididas de acordo com a trajetória do fluido no rotor, como:

„„ axiais;
„„ tangenciais;
„„ radiais;
„„ mistas.

Nas turbinas axiais, a trajetória do fluido ocorre essencialmente em paralelo


ao eixo (coaxiais) de rotação do rotor. Nas turbinas tangenciais, o fluido tangen-
cia o eixo do rotor. Nas máquinas de fluxo radiais, o fluido percorre trajetórias
num plano perpendicular ao eixo do rotor, de modo que há componentes de
velocidade em direções radiais. Nas turbinas mistas, as trajetórias percorridas
pelo fluido estão numa direção intermediária entre a radial e a axial.

Elementos construtivos das turbinas


Há diversos elementos construtivos das turbinas, como: eixos, mancais, elemen-
tos de vedação, etc. Todos esses elementos mecânicos são fundamentais para
o correto funcionamento do equipamento. Entretanto, há dois fundamentais
que são encontrados nas turbinas:

„„ o rotor;
„„ o elemento direcionador do fluxo do fluido.

O rotor é a parte principal da turbina: um elemento que gira quando em


contato com o fluido, extraindo, assim, energia deste e transformando em
trabalho útil (energia mecânica). Ele é constituído de pás que são fixadas a
ele, permitindo o contato efetivo do fluido de trabalho.
O elemento direcionador de fluxo, além da função básica de guiar a traje-
tória do fluido, evitando, assim, o máximo de perdas de energia por choques,
tem o papel fundamental de transformar energia potência e de pressão em
energia cinética do fluido antes de contato com o rotor, que transforma essa
energia cinética em energia de mecânica. É usualmente encontrado em diversas
turbinas, com algumas exceções, como turbinas eólicas, que estão em contato
direto com o ambiente e não usam esse recurso de direcionamento do fluido.
6 Máquinas de fluxo — turbinas

Agora que vimos o que é uma turbina e seus critérios de classificação, a


próxima seção apresenta algumas características construtivas dessas máquinas
e aplicações de algumas categorias específicas de turbinas que são comumente
usadas em diferentes contextos.

Aplicações das turbinas


Nesta seção, veremos o princípio de funcionamento e as aplicações de quatro
tipos de turbinas amplamente aplicadas em projetos: hidráulicas, a vapor, a
gás e eólicas.

Turbinas hidráulicas
As turbinas hidráulicas são máquinas de fluxo que usam água como fluido de
trabalho. Nessa situação, elas são classificadas também como uma máquina
incompressível, pois a água não tem alteração significativa da sua massa
específica. Originaram-se a partir da evolução das rodas d’água, que até hoje
podem ser encontradas em casas de engenho. Foi o engenheiro francês Benoît
Fourneyron, no século XIX, o principal responsável por melhorar a eficiência
dessas rodas, cunhando o nome de turbina para o equipamento desenvolvido.
Nos dias atuais, existem variados tipos de turbinas hidráulicas, cada uma com
sua aplicação, seu rendimento e histórico.
As principais representantes dessa categoria de turbinas são:

„„ turbinas de ação — Pelton, Turgo, Jonval, Michell-Blanki, Parafuso de


Arquimedes, Roda d’água;
„„ turbinas de reação — Francis, Kaplan, Hélice, Tyson e Gorlov.

Entre esses diversos exemplos, as mais usadas são as turbinas: Pelton,


Francis e Kaplan, que, portanto, serão estudadas em detalhes nas subseções
seguintes.
Máquinas de fluxo — turbinas 7

Turbina Pelton

A turbina Pelton é de ação (impulsão), recebendo esse nome em homenagem


a Lester A. Pelton, que a inventou por volta de 1880. O funcionamento dessa
turbina é relativamente simples, similar ao das rodas d’água, extraindo energia
cinética de um jato d’água que entra em contato tangencialmente ao eixo de
rotação. Muitas turbinas com esse mesmo princípio de funcionamento foram
usadas antes de 1880, mas a Pelton apresentou melhor eficiência, devido ao
formato de concha, peculiar das pás, que permite o máximo de aproveitamento
da energia dinâmica do jato.
A Figura 2a, a seguir, ilustra as vistas frontal e lateral de uma turbina Pelton,
em que se pode ver seu princípio de funcionamento, bem como a geometria
das pás. São turbinas usadas frequentemente em locais com grandes quedas
e pequenas vazões.

Turbina Francis

A turbina Francis é de reação de fluxo interno, recebendo esse nome em


homenagem a James B. Francis, que a inventou por volta de 1850. Seu funcio-
namento combina tanto o fluxo radial quanto o axial da água, sendo similar ao
de uma bomba centrífuga na direção contrária. O fluido entra usualmente de
forma mista (radial e axialmente), sendo direcionado pelas palhetas até seu
interior. Para ajustes de sazonalidade, essa turbina é dotada de palhetas móveis
e fixas, para modificar o ângulo de entrada da água conforme a demanda,
aumentando não só o rendimento como a faixa de operação. À medida que
ocorre o contato do fluido com o rotor, a quantidade de movimento e pressão
do fluido reduz, transferindo essa energia ao equipamento.
A Figura 2b, a seguir, ilustra as características construtivas dessa turbina
em vistas superior e lateral. Por suas características de funcionamento, são
extremamente versáteis, apresentando eficiências da ordem de 95%, sendo a
turbina mais usada na construção de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs).
Sua faixa de operação é intermediária, tanto para quedas quanto para vazões.
8 Máquinas de fluxo — turbinas

Turbina Kaplan

A turbina Kaplan é de reação de fluxo interno, recebendo esse nome em


homenagem a Victor Kaplan, que a desenvolveu em 1912, a partir do aper-
feiçoamento da turbina Hélice. A principal diferença entre as duas é que, na
Kaplan, as pás acopladas ao rotor são móveis, enquanto que, na Hélice, elas são
fixas. A entrada de água é similar à turbina Francis, entretanto ela é defletida
para escoar axialmente antes de encontrar o rotor da máquina. Portanto, é
uma máquina de fluxo axial.
A Figura 2c ilustra as características construtivas dessa turbina em vista
lateral. São adequadas para condições em que as quedas disponíveis são baixas,
mas as vazões disponíveis são altas, podendo apresentar eficiências similares
às das turbinas Francis, entre 90% e 95%, sendo também boas opções para
instalações de PCHs. Existem algumas variações em detalhes construtivos
da turbina Kaplan, sendo as mais conhecidas: Kaplan vertical, Kaplan “S”,
Turbina Bulbo e Turbina Open Pit. Essas não serão abordadas aqui em detalhes,
mas podem ser encontrados em Souza (2012).

(a) (b) (c)


Entrada

Cubo
ω
ω
Saída
Eixo ω
Bocal

rω Pás do
r2 ω rotor
r1 Eixo
Divisor

β Saída

Figura 2. Características construtivas de turbinas hidráulicas: (a) turbina Pelton, (b) turbina
Francis e (c) turbina Kaplan.
Fonte: Adaptada de Çengel e Cimbala (2015, p. 835–839).
Máquinas de fluxo — turbinas 9

A Figura 3 ilustra de maneira sintética os três tipos de turbina acima


estudados, por faixa de aplicação: Kaplan (baixa carga e alta vazão), Francis
(média vazão e carga) e Pelton (alta carga e baixa vazão).

100
50

10

5
30.0
Vazão (m3/2)

00
kW
15.0
0
10.0 0 kW
1 00
kW
5.00
0,5 0 kW

1.50
0 kW
0,1
0,05 500
kW

0,01 100
20 k
1 2 5 10 20 50 100 200 kW 500 1.000 W

Carga (m)

Figura 3. Tipo de turbina por faixa de operação: Kaplan (baixa carga e alta vazão), Francis
(média vazão e carga) e Pelton (alta carga e baixa vazão).
Fonte: Adaptada de Tipos... (2018, documento on-line).

Turbinas a vapor
As turbinas a vapor são equipamentos que extraem energia térmica do vapor
pressurizado, usando essa energia para gerar energia mecânica. Seu funcio-
namento consiste basicamente de um conjunto em série de duas fileiras de
pás — uma fixa e outra móvel: o vapor à alta pressão entra pelas pás fixas
que o redirecionam ao encontro das pás móveis, gerando torque sobre elas,
que é transferido ao eixo. A trajetória do vapor é essencialmente paralela ao
eixo girante, portanto é uma máquina axial. Quanto ao modo de atuação do
vapor, este pode ser: de ação (Laval, Curtis, Rateau), de reação (Parsons, mas
menos usado) ou misto. A Figura 4a, a seguir, apresenta um exemplo de uma
turbina a vapor desmontada para a manutenção.
10 Máquinas de fluxo — turbinas

Essas turbinas não trabalham isoladas, mas acopladas a outros três com-
ponentes básicos: um condensador, um compressor e uma caldeira. Esses
quatro elementos, quando agrupados, funcionam em um ciclo, chamado Ciclo
Rankine, que, na termodinâmica, é amplamente estudado e pode ser conferido
em mais detalhes em Çengel e Boles (2013) e Moran et al. (2018).
São equipamentos versáteis, sendo amplamente utilizados em termelétricas,
indústrias navais e indústrias de processos em geral, principalmente onde se
requer energia elétrica ou energia térmica para aquecimento. Para termos
uma ideia da relevância desse equipamento, 24% da energia elétrica gerada
no Brasil, em 2019, é produzida por centrais termelétricas, que utilizam as
turbinas a vapor, ficando atrás somente das turbinas hidráulicas em termos
quantitativos.

Turbinas a gás
As turbinas a gás são equipamentos que extraem energia a partir da combustão
para gerar energia mecânica. Em termos construtivos, é similar às turbinas a
vapor, com pás fixas e móveis, que são as responsáveis por transferir a energia
do gás à alta pressão e temperatura (são as que trabalham com as maiores
temperaturas) ao eixo. São classificadas como máquinas axiais (embora haja
alguns exemplos de radiais) e podem ser de ação ou reação.
É importante ressaltar que o nome faz referência ao fluido de trabalho,
ou seja, ao gás que percorre as pás, não necessariamente porque o fluido
comburente seja um gás (pode ser, por exemplo, querosene ou óleo diesel).
Operam em conjunto com mais dois componentes — o compressor e a
câmara de combustão —, seguindo usualmente o assim chamado ciclo Brayton.
Maiores detalhes sobre o funcionamento desse ciclo podem ser encontrados
em Çengel e Boles (2013) e Moran et al. (2018).
Esses equipamentos têm diversas aplicações, podendo prover energia para
funcionamento de trens, navios, bombas, compressores, planas elétricas e
aeronaves. A Figura 4b apresenta um exemplo de uma turbina a gás usada
em plataformas de petróleo.
Máquinas de fluxo — turbinas 11

Figura 4. Exemplos de turbinas: (a) turbina a vapor passando por reparo e (b) turbina
a gás, usada em uma plataforma de processamento de óleo e gás.
Fonte: Adaptada de arogant/Shutterstock.com e Mr.PK/Shutterstock.com.

Turbinas eólicas
As turbinas eólicas usam a energia do fluxo de ar para gerar energia mecânica
na forma de rotação de eixos que são acoplados aos geradores para produzir
energia elétrica. Atualmente, essas turbinas têm ganhado notoriedade por
12 Máquinas de fluxo — turbinas

possibilitar uma fonte de energia alternativa, juntamente com a energia foto-


voltaica, aos equipamentos que utilizam energia fóssil, como: turbinas a vapor
(que usam combustão para vaporização da água) e turbinas a gás (que usam
combustão para gerarem os gases a altas pressões e temperatura).
Em termos de classificação, as turbinas eólicas são máquinas de fluxo
axiais de ação. Seu princípio de funcionamento é bem simples, similar aos
moinhos da antiguidade: pás aerodinamicamente construídas são acopladas
a eixo em contato com um gerador. O fluxo de ar, ao passar pela pá, perde
energia e gera momento, que é transferido ao eixo na forma de rotação.
A turbina eólica, na atualidade, é o equipamento que desponta, juntamente
com as placas solares, como máquina do futuro em termos de geração de
energia. No Brasil, seu uso já é uma realidade, correspondendo a 9% da
geração de toda energia elétrica em 2018.

Escoamento de fluido em turbinas


Apresentaremos os equacionamentos básicos usados para descrever o funcio-
namento de turbinas hidráulicas e eólicas. Essas duas turbinas usam conceitos
da mecânica dos fluidos e, por isso, serão estudadas. Tanto turbinas a vapor
quanto a gás utilizam conceitos mais complexos da termodinâmica e, con-
sequentemente, não serão apresentadas neste capítulo. Para detalhes sobre o
funcionamento dessas duas últimas turbinas, recomendo a leitura de Moran
et al. (2018).

Turbinas hidráulicas
A Figura 5 mostra uma configuração básica de um sistema com uma turbina
Francis acoplada a uma represa. A energia máxima disponível na represa é
representada pela carga bruta (H bruta), que corresponde à diferença entre as
cotas máxima (ZA) e mínima (ZE). Entretanto, não é toda energia disponível da
água que se transforma em energia mecânica na turbina: há perdas por atrito
ao longo do escoamento na represa e nos canais, além de perdas volumétricas
devido à fuga do fluido por frestas e conexões.
Assim, a energia de fato disponível para a turbina — energia líquida (ou
carga líquida H) — corresponde à diferença entre as energias da água no ponto
B e C, conforme apresentado na equação (1):

H = EGLentrada – EGLsaída (1)


Máquinas de fluxo — turbinas 13

onde EGLentrada representa a energia líquida na entrada (ponto B), e EGLsaída


representa a energia líquida na saída (ponto C).

Conduto Carga
forçado bruta
Comporta EGLentrada Hbruta
(aberta)

Usina de força Carga


Gerador líquida zA
. H
V Eixo

Turbina E
Represa C

Tubo de sucção D EGLsaída zE

Canal de rejeição
Plano de referência arbitrário (z = 0)

Figura 5. Configuração básica de uma usina com turbina Francis.


Fonte: Çengel e Cimbala (2015, p. 841).

Portanto, a carga líquida disponível (H) é toda energia disponível (H bruta)


descontada das perdas no sistema da usina. Assim, a máxima potência que a
turbina conseguiria produzir pode ser calculada pela equação (2):
.
Ẇhidráulica = ρgHV (2)

onde ρ representa massa específica da água em metros, g, a aceleração


.
da gravidade, H, a energia líquida disponível, e V a vazão de água que escoa
pelo conduto forçado da represa.
A eficiência da turbina (ηturbina) pode ser calculada pela razão da potência
que de fato é transferida ao eixo na forma de energia mecânica (Ẇeixo) e da
potência hidráulica disponível (Ẇ hidráulica), conforme apresentado na equação (3):
Ẇeixo
ηturbina = (3)
Ẇhidráulica
14 Máquinas de fluxo — turbinas

A eficiência da turbina representa sua capacidade de produzir energia


“nobre” (mecânica) em relação a outros tipos de energia, como calor e energia
interna ao fluido. Em um sistema ideal, toda energia disponível, conforme equa-
ção (2), geraria movimento do eixo, e ηturbina seria igual a 100%. Entretanto, há
perdas por atrito entre o fluido e as paredes da máquina, dissipação de energia
devido às mudanças de direção repentina dos fluidos, perdas volumétricas por
frestas na turbina, perdas devido ao atrito entre diversos componentes, etc.
Os valores médios da eficiência média das turbinas usualmente variam
entre 80% (para turbinas pequenas), 85% (para turbinas médias) e 93% (para
turbinas grandes).
É importante notar que a energia disponível no sistema hidráulico usual-
mente é representada pelo equivalente em metros de coluna de água (m.c.a.).
Entretanto, em sistemas como o apresentado na Figura 5, a água apresenta
tanto energia potencial como cinética e de pressão. Portanto, H, nesse caso,
corresponde à soma dos seguintes valores:

P V2
H= + + z (4)
γ 2g
onde P é a pressão da água no ponto especificado, γ é o peso específico,
V é a velocidade da água, g é a aceleração da gravidade, e z é a altura em
relação a uma referência.
Convencionou-se usar o H (em m.c.a), pois, para sistemas hidráulicos, a
fonte primordial de energia é a energia potencial, que depende da diferença
entre a altura entre dois pontos. À medida que a água escoa pelo sistema, parte
dessa energia potencial transforma-se em pressão ou energia cinética, que são
posteriormente absorvidas pela turbina.

Turbinas eólicas
Para as turbinas eólicas, a fonte fundamental de energia é a energia cinética,
diferentemente das turbinas hidráulicas, em que a energia potencial é usu-
almente a fonte básica de energia. Observe, na Figura 6, que, ao passar pelo
disco da turbina, há uma redução substancial da velocidade do vento, visto
que parte de sua energia cinética foi absorvida pelo rotor.
Máquinas de fluxo — turbinas 15

Posição do disco
V ou P V da turbina

3 4

1 P
2
Patm

0
0 Distância ao longo da
direção do escoamento, x
Figura 6. Representação da variação de pressão e da velocidade do vento
ao longo do escoamento por um disco de turbina.
Fonte: Adaptada de Çengel e Cimbala (2015, p. 852).

Por conveniência, usa-se um fator para relacionar a velocidade do disco


(V3) com a do vento a montante (V1). Esse fator é conhecido como fator de
indução de fluxo axial e é calculado conforme a equação (5):

V1 – V3 (5)
a=
V1

Aplicando a equação do balanço de massa entre os pontos (1) e (3) e con-


siderando que ρ representa a densidade, A, a área, e V, a velocidade, temos o
seguinte sistema:

ρ1A1V1 = ρ3A3V3

Como, nesse escoamento, as velocidades não são tão elevadas, podemos


considerar que o ar é incompressível, ou seja, a massa específica é conservada.
Do equacionamento acima e considerando a variável “a” da equação (5),
podemos relacionar as áreas a montante e do disco:
A1
A3 = (6)
(1 – a)
16 Máquinas de fluxo — turbinas

Como o fator de indução de fluxo radial (“a”) é sempre menor que 1,


temos, pela equação (6), consequência do balanço de massa, que A3 é sempre
maior que A1. Ou seja, a redução da velocidade no disco gera um aumento
proporcional da área, conforme ilustrado na Figura 7.

Figura 7. Representação da variação de área do volume de controle ao redor de


um disco de turbina eólica.
Fonte: Lima ([20--?], documento on-line).

A variação da velocidade do vento gera uma variação da quantidade de


movimento das pás da turbina. Partindo desse princípio e usando álgebra en-
volvendo a equação de Bernoulli, podemos relacionar a área das pás da turbina
com a velocidade a montante, para calcular a potência de um gerador eólico:

Ẇéolica = 2ρA3V32a(1 – a)2 (7)

Essa equação é também escrita da seguinte maneira:


1
Ẇéolica = C ρAV3
2 P

onde CP é chamado de coeficiente de potência, que representa a fração


máxima de energia contida no vento, que poderia ser extraída pela turbina,
podendo ser calculado conforme a equação (9):

CP = 4a(1 – a)² (9)


Máquinas de fluxo — turbinas 17

BISTAFA, S. R. Mecânica dos fluidos: noções e aplicações. 2. ed. São Paulo: Blucher,
2016. 348 p.
ÇENGEL, Y. A.; BOLES, M. A. Termodinâmica. 7. ed. Porto Alegre: AMGH; Bookman,
2013. 1048 p.
ÇENGEL, Y. A.; CIMBALA, J. M. Mecânica dos fluidos: fundamentos e aplicações. 3. ed.
Porto Alegre: AMGH; Bookman, 2015. 1016 p.
FONTES, O. H. P. M. Turbinas a Vapor. Rio de Janeiro: Fundação Técnico Educacional
Souza Marques, 2. sem. 2007. 92 p. (Notas de aula da disciplina Tecnologia do Calor II
– MEC 4028-2). Disponível em: https://eletricistamazinho.files.wordpress.com/2011/08/
turbinas-a-vapor.pdf. Acesso em: 19 mar. 2019.
LIMA, A. G. G. Turbinas Eólicas. Geração de Energia Elétrica, Rio de Janeiro, [20--?]. Dis-
ponível em: http://www.antonioguilherme.web.br.com/Arquivos/eolica_turbina.php.
Acesso em: 19 mar. 2019.
MORAN, M. J. et al. Princípios de termodinâmica para engenharia. 8. ed. Rio de Janeiro:
LTC, 2018. 872 p.
SOUZA, Z. Projeto de máquinas de fluxo: tomo IV: turbinas hidráulicas com rotores axiais.
Rio de Janeiro: Interciência, 2012. 152 p.
TIPOS... de Turbinas Hidráulicas. Hidroenergia Engenharia e Automação, Ijuí, 21 jun.
2018. Disponível em: http://www.hidroenergia.com.br/tipos-de-turbinas-hidraulicas/.
Acesso em: 19 mar. 2019.
WHITE, F. M. Mecânica dos fluidos. 8. ed. Porto Alegre: AMGH; Bookman, 2018. 864 p.

Leituras recomendadas
BRASIL, A. N. Teoria geral das máquinas de fluxo. In: BRASIL, A. N. Hidráulica básica e má-
quinas de fluxo. Itaúna: Faculdade de Engenharia, Universidade de Itaúna, 2013. cap. 2. p.
22–63. Disponível em: http://www.alexbrasil.com.br/_upload/dfc35dabbfd367395c3e-
9b103dc80eb7.pdf. Acesso em: 19 mar. 2019.
FOX, R. W.; MCDONALD, A. T.; PRITCHARD, P. J. Introdução à mecânica dos fluidos. 8. ed.
Rio de Janeiro: LTC, 2014. 871 p.
POTTER, M. C.; WIGGERT, D. C. Mecânica dos fluidos. Porto Alegre: Bookman, 2018. 258 p.

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