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Ivan Furmann
bacharel em Direito pela UFPR, mestrando em Educação pela UFPR
Abstract: The academical extension in the field of the Law was always ruled in
assistancely ideas in which the students just supplied technical services to lacking
populations. Though starting from critical theories in Law and Education the extension
wins a new meaning could reach a more important paper, the education for the
citizenship. Like this, the Law stops being a theme for the scholars becoming an
instrument of political understanding.
1.Considerações iniciais
É possível observar que essa distinção está calcada no uso (ou não) do Poder
Judiciário. Enquanto a Assistência judiciária mantém-se ligada ao uso do Poder
Judiciário a Assistência jurídica aceita novas possibilidades de resolução de conflitos. A
primeira está ligada a uma concepção monista de Direito (o Direito é tudo que provém
do Estado), já a segunda a uma concepção utilitarista do Direito (o Direito é tudo que
resolve conflito). Além disso, ao se adotar essa terminologia proposta nos manuais,
adota-se a idéia de que interessa apenas distinguir o que ‘é’ ou ‘não é’ assistência
processual oficial, colocando-se todas as demais atividades de resolução de conflitos
dentro do mesmo balaio de gato.
Através das idéias de Paulo Freire, foi possível observar que as atividades de
extensão universitárias (nesse caso as relativas ao Direito) se revelam, via de regra,
como Assistência. Esse autor distingue duas possibilidades de Assistência: a intelectual
e a material. Na primeira o sujeito recebe informações que são depositadas em sua
mente, geralmente por meio de palestras (pelo que Freire chama de método bancário de
ensino), ignorando-se a cultura popular e a experiência do sujeito, não transformando
nem o "atendido" em sujeito do conhecimento (12) e muito menos a universidade. A
segunda possibilidade é mais autoritária ainda, apenas se fornecendo algum produto
pronto, como no caso de elaboração de petições sem a menor disposição ao diálogo.
Esses duas possibilidades de assistência pautam-se na centralidade do solvimento do
litígio pelo sujeito da universidade. O objetivo de ambas é a diminuição da litigiosidade.
Mesmo quando a ‘assistência intelectual’, pretensamente, quer estimular a educação
para autonomia e cidadania não o faz efetivamente porque atua como se o ‘atendido’
fosse apenas um ‘objeto’, um depósito a ser preenchido. Além disso, tanto a assistência
intelectual quanto a material se limitam ao legal instituído. Portanto não superam a
concepção monista de Direito, ignorando o pluralismo jurídico.
transmite algo além da informação nela contida. Foucault aprofunda a questão quando
afirma que: "(...) suponho que em toda sociedade a produção do discurso é ao mesmo
tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número de
procedimentos que têm por função conjurar seus poderes e perigos, dominar seu
acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível materialidade" (FOUCAULT, p.
09). O controle do discurso se faz através da linguagem. Linguagem dominada por
poucas pessoas. Domínio que se confunde com poder. Enfim, o que Foucault denomina
saber-poder. (23)
motivo. Essas atividades tenderam a adotar apenas uma metodologia. Isto ocorre face a
contradição finalística das metodologias, as quais caminharão para fins diversos. A
tendência, portanto, será a de se adotar apenas um método.
7. Considerações Finais
8. Notas
1
Diversas obras de Michel FOUCAULT trabalham esse conceito. Todavia,
recomenda-se a leitura de pequeno artigo que resume a percepção do Direito para
Foucault: LOSCHAK, Danièle. A questão do Direito. In: ESCOBAR, Carlos Henrique
de.(org.) Michel Foucault - Dossier. Rio de Janeiro: Taurus, 1984. (122-4)
2
Para maiores detalhes recomenda-se a leitura da primeira parte do livro:
FONSECA, Ricardo Marcelo. Modernidade e Contrato de Trabalho: do sujeito de
direito a sujeição jurídica. São Paulo: LTr, 2002.
3
"Art. 207 - As universidades gozam de autonomia didático-científica,
administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de
indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão." Constituição da República
Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 22ª ed. São Paulo: Saraiva,
1999.
4
"(...) sustentam que as academias de Direito foram responsáveis por uma prática
de tal modo comprometida com os processos de exploração econômica e de dominação
política que o bacharel não foi preparado para o exercício da função crítica"
(ADORNO, p.159).
5
Vide: CAMPILONGO e FARIA, p. 11.
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CORAJE
ENCORAJAMENTO – ASSESSORIA JURÍDICA
6
Cf. AZEVEDO, p. 62.
7
Perceba-se entretanto que não se propõe uma alternância de pólos de poder (uma
tragicômica ditadura dos estudantes) mas se postula uma nova forma de gestão
universitária, inclusive com a efetiva participação das entidades de representação
estudantil.
8
"Ao considerar – pela importância que tomou na época –, o núcleo inicial de uma
manifestação política preocupada com os meios populares em termos educativos, parece
ter-se constituído de quadros universitários". (BEZERRA, p. 22).
9
Como Freire já referia, a diferença na metodologia das atividades de extensão se
encontra no verbo estender/dialogar.
10
Interessante notar que a origem da Assistência judiciária provém das atividades
de caridade cristãs. "Oriundo das Ordenações Filipinas (...) esse amparo legal aos
necessitados não era de cunho processual, ou seja, como pressuposto de um devido
processo legal. A assistência estava pautada em princípios cristãos de caridade".
(WEINTRAUB, p. 242).
11
Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de
1988, p. 11.
12
Para comparação entre método bancário de ensino e invasão cultural na extensão
Vide: FREIRE, 1975, p. 80.
13
"(...) desconhecer, por exemplo, que temos direito à saúde, não significa deixar
de ter (ou perder) o reconhecimento formal desse direito. Ocorre que a ignorância pode
nos impedir de exercitar esse direito ou de reclamar por seu cumprimento. Por isso, a
educação entendida como o mecanismo de difusão dos direitos existentes, não forma ou
concede a cidadania, embora a faça mais consciente." (ALENCAR e GENTILI, p. 72).
14
Sobre o tema recomenda-se o livro: LÖWY, Michel. As aventuras de Karl Marx
contra o Barão de Münchhausen. Marxismo e positivismo na sociologia do
conhecimento. 6ª ed.. São Paulo: Cortez, 1998.
15
Nesse sentido Vide: (MALISKA, p. 282).
16
Para aprofundamento do tema: capítulo 2.III. da FURMANN, Ivan. Assessoria
Jurídica Universitária Popular: da utopia estudantil à ação política. Curitiba, 2003.
Monografia (graduação em Direito – Universidade Federal do Paraná)
17
"O conjunto destes estudos revelaram que a discriminação social no acesso à
justiça é um fenômeno muito mais complexo do que à primeira vista pode aparecer, já
que para além das condicionantes econômicas, sempre mais óbvias, envolve
condicionantes sociais e culturais resultantes de processos de socialização e de
interiorização de valores dominantes muito difíceis de transformar". (SANTOS, 1997
(1), p. 49).
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18
"(...) em muitas faculdades de direito, os serviços de assistência jurídica e
judiciária gratuita, que eram extracurriculares nos anos sessenta, foram integrados no
plano de estudos enquanto forma de ‘ensino aplicado’ (clinical education), isto é, de
trabalho prático de estudantes sob a orientação dos professores" (SANTOS, 1997, p.
207).
19
Cf. CAMPILONGO, p. 19-32.
20
Vide: CARVALHO, Eduardo, p. 37.
21
Para um conceito de comunidade Vide: BUBER, p. 50.
22
"Acesso à justiça significa, ainda, acesso à informação e à orientação jurídicas e
a todos os meios alternativos de composição de conflitos" (MARINONI, p. 28).
23
"Por mais que o discurso seja aparentemente bem pouca coisa, as interdições que
o atingem revelam logo, rapidamente, sua ligação com o desejo e com o poder. (...) o
discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação,
mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual nos queremos apoderar".
(FOUCAULT, p. 10).
24
Vide também: LYRA FILHO, 1994, p. 17-8.
25
Sobre o tema Vide: STRECK, p. 251 e Ss; e WARAT, p.76 e Ss.
26
"No momento em que você se torna simplista no seu relacionamento com os
camponeses, com os operários, ou com os alunos na sala de aula, isso significa que você
parte do princípio de que eles são inferiores a você. Você age como se eles fossem
incapazes de compreendê-lo. Temos que ser simples. Simplicidade, porém, não significa
caricaturar como se fossem simplórios". (FREIRE e SHOR, p. 183).
27
Vide: HABERMAS, passim; e PIOVESAN, passim.
28
"As assessorias acabam investindo menos na argumentação jurídica,
privilegiando o enfrentamento extralegal". (CARVALHO, Eduardo, p.148-9).
29
"A redução do campo da cidadania a uma questão meramente jurídica e, mais
especificamente, de direito positivo, acaba condenando a condição cidadã à esfera da lei
e ao compromisso por respeitá-la" (ALENCAR e GENTILI, p.71).
30
"Escrevendo no final do século XVIII, Schiller teme que o ídolo da utilidade
venha a matar a vontade de realização pessoal e coletiva. Por isso afirma no § 3 da Carta
8: ‘[A] razão realizou tudo o que pode realizar ao descobrir e ao apresentar a lei. A sua
execução pressupõe uma vontade resoluta e o ardor do sentimento. Para a verdade
vencer as forças que conflituam com ela, tem ela própria de tornar-se força (...) pois os
instintos são a única força motivadora no mundo sensível’. E conclui no § 7 da mesma
carta: ‘o desenvolvimento da capacidade do homem para sentir é, portanto, a
necessidade mais urgente de nossa época’." (SANTOS, 1997 (2), p. 332-3).
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31
Continua... "A promoção comunitária funda-se no direito radical da participação
política e alimenta-se do fenômeno emancipatório, ou seja, tem como meta crucial
combater e superar a pobreza política. Inclui, pois, a necessidade de elaboração da
consciência crítica, e, com base nesta, capacidade de intervenção autônoma, alternativa
e organizada. Uma das conquistas essenciais é desfazer dependências e poder exercer o
controle democrático sobre as elites e o Estado" (DEMO, p. 98). Note que a expressão
utilizada por DEMO que se identifica com a ‘Assessoria’ é "promoção comunitária".
32
Atente-se para a idéia de método de educação. Inverte-se a perspectiva da
Assistência Jurídica, que coloca a educação efeito reflexo nos Serviços Legais,
colocando-se a educação para a cidadania como objetivo principal da Assessoria
Jurídica.
33
A doutrina cita entre as entidades que desempenham serviços legais alternativos:
"o Serviço de Assessoria Jurídica Universitária da Faculdade de Direito da UFRGS
(SAJU–Porto Alegre/RS); Serviço de Apoio Jurídico Popular (SAJU–Universidade
Federal da Bahia)" (WOLKMER, p. 303).
34
"(...) tudo começou na década de 50, quando um punhado de estudantes da
Faculdade de Direito da UFRGS resolveu criar uma Secretaria do Centro Acadêmico
que prestasse assistência jurídica, possibilitando-se a prática jurídica" (Revista SAJU-
RS, p. 04).
35
Essa passagem do início da década de 90 demonstra esta influencia: "O
ordenamento jurídico na realidade, embora se defina como neutro, serve à ideologia da
classe dominante, e o profissional do direito, mesmo consciente e engajado na
transformação da sociedade, esbarra nos entraves do procedimento jurídico positivo. O
ensino jurídico reproduz este contexto, porém é possível buscar alternativas para
escapar desta situação dada a pensar um ‘novo direito’. Acreditamos que um serviço de
assistência jurídica (não mais ‘judiciária’) pode cumprir esse papel e investir neste
projeto". (Revista SAJU-RS, p. 05).
36
"O SAJU está alicerçado em uma visão pluralista, coletiva e multidisciplinar,
tanto da sociedade, quanto de si mesmo. É fundamental para o sajuano perceber que, ao
trabalhar pelo coletivo, está também trabalhando por si próprio" (KIDRICKI, p. 166).
9. Bibliografia
CARVALHO, Lucas Borges de. Idéias para uma nova assistência jurídica de
base estudantil: acesso à Justiça e crise do ensino jurídico. In: Revista de Processo, n.º
108, ano 27, pp. 221-34, out-dez 2002, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.
FREIRE, Paulo. Educação como prática da Liberdade. 2ª ed. São Paulo: Paz e
Terra, 1969.
_____________. Pedagogia do Oprimido. 17ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 1987.
FREIRE, Paulo & SHOR, Ira. Medo e Ousadia (O cotidiano do Professor). Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1986.
MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. 4ª ed. rev. e amp.
São Paulo: Malheiros Editores, 1998.
PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. 2ª ed. ver. e ampl. São Paulo:
Max Limonad, 2003.
STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) Crise. 3ª ed. rev. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2001.