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DIREITO CONSTITUCIONAL
RESUMO DE PONTOS PARA A PROVA ORAL DA DPE-RS 2015

SUMÁRIO

1. DIREITO CONSTITUCIONAL: CONCEITO, OBJETO, ORIGEM, FORMAÇÃO, CONTEÚDO,


FONTES E MÉTODOS DE TRABALHO. A FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO. DO
SISTEMA CONSTITUCIONAL: A CONSTITUIÇÃO COMO UM SISTEMA DE NORMAS. OS
VALORES NA CONSTITUIÇÃO. OS PRECEITOS FUNDAMENTAIS. FINS E FUNÇÕES DO
ESTADO. OS OBJETIVOS FUNDAMENTAIS DE REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. OS
PRINCÍPIOS QUE REGEM AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA REPÚBLICA FEDERATIVA
DO BRASIL. OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS. 4

2. NEOCONSTITUCIONALISMO. JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL.


CONSTITUCIONALIZAÇÃO SIMBÓLICA: A CONSTITUCIONALIZAÇÃO, TEXTO
CONSTITUCIONAL E REALIDADE CONSTITUCIONAL. EFETIVIDADE DAS NORMAS
CONSTITUCIONAIS. CONCEITO DE CONSTITUIÇÃO. CLASSIFICAÇÃO DAS
CONSTITUIÇÕES. ELEMENTOS DAS CONSTITUIÇÕES. HISTÓRICO DAS CONSTITUIÇÕES
BRASILEIRAS. 18

3. HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL. APLICABILIDADE E INTERPRETAÇÃO DAS


NORMAS CONSTITUCIONAIS. MÉTODOS, CONCEITOS E PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO
CONSTITUCIONAL. NATUREZA E CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS.
LACUNAS NA CONSTITUIÇÃO, ESPÉCIES E CARACTERÍSTICAS, PRINCÍPIOS JURÍDICOS E
REGRAS DE DIREITO. EFICÁCIA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS E TUTELA DAS
SITUAÇÕES SUBJETIVAS. ORÇAMENTO E RESERVA DO POSSÍVEL. 30

4. PODER CONSTITUINTE. PERSPECTIVAS HISTÓRICAS. PODER CONSTITUINTE


ORIGINÁRIO. PODER CONSTITUINTE DERIVADO E DECORRENTE. PODER
CONSTITUINTE SUPRANACIONAL. NOVA CONSTITUIÇÃO E ORDEM JURÍDICA ANTERIOR:
RECEPÇÃO, REPRISTINAÇÃO, DESCONSTITUCIONALIZAÇÃO, RECEPÇÃO MATERIAL DE
NORMAS CONSTITUCIONAIS. APLICAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO NO TEMPO E NO ESPAÇO.
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5. OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS. DIREITOS INDIVIDUAIS E COLETIVOS.


CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. EFETIVIDADE DOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS. PERSPECTIVA SUBJETIVA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS.
DIREITOS A PRESTAÇÕES NEGATIVAS. DIREITOS A NÃO-IMPEDIMENTOS. DIREITOS A
NÃO-AFETAÇÃO DE PROPRIEDADES E SITUAÇÕES. DIREITOS A NÃO-ELIMINAÇÃO DE
POSIÇÕES JURÍDICAS. DIREITOS A PRESTAÇÕES POSITIVAS. 49
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6. PERSPECTIVA OBJETIVA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. CATÁLOGO DOS DIREITOS


FUNDAMENTAIS. SUJEITOS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. FUNCIONALIDADE DOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS. LIMITES E RESTRIÇÕES AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. A
PROIBIÇÃO DE RETROCESSO SOCIAL. CLÁUSULAS PÉTREAS. 67

7. TUTELAS CONSTITUCIONAIS. HABEAS CORPUS. HABEAS DATA. MANDADO DE


SEGURANÇA INDIVIDUAL E COLETIVO. DIREITO DE PETIÇÃO E DE CERTIDÃO.
MANDADO DE INJUNÇÃO. AÇÃO POPULAR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. 74

8. DIREITOS SOCIAIS E A ORDEM SOCIAL. NACIONALIDADE. DEFINIÇÕES. ESPÉCIES.


CRITÉRIOS E HIPÓTESES CONSTITUCIONAIS DE RECONHECIMENTO DA
NACIONALIDADE PRIMÁRIA. AQUISIÇÃO DA NACIONALIDADE SECUNDÁRIA. ESPÉCIES
DE NATURALIZAÇÃO. DIFERENÇAS ENTRE BRASILEIROS NATOS E NATURALIZADOS.
PERDA DA NACIONALIDADE. 86

9. DIREITOS POLÍTICOS. DIREITOS POLÍTICOS POSITIVOS. DIREITO AO SUFRÁGIO, AO


VOTO E AO ESCRUTÍNIO. PLEBISCITO E REFERENDO. ELEGIBILIDADE. DIREITOS
POLÍTICOS NEGATIVOS. INELEGIBILIDADES ABSOLUTAS E INELEGIBILIDADES
RELATIVAS. PERDA E SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS. PARTIDOS POLÍTICOS. 92

10. ORGANIZAÇÃO ESPACIAL DO ESTADO E DIVISÃO ESPACIAL DO PODER. A


FEDERAÇÃO E SUA ORIGEM. FEDERAÇÃO POR AGREGAÇÃO E POR DESAGREGAÇÃO. - OS
ENTES FEDERATIVOS E O MUNICÍPIO. REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS. COMPETÊNCIAS
EXCLUSIVAS, PRIVATIVAS, COMUNS E CONCORRENTES. 97

11. ORGANIZAÇÃO DOS PODERES. FUNDAMENTOS DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. AS


FUNÇÕES ESSENCIAIS À JUSTIÇA. O DEFENSOR PÚBLICO E O DEVIDO PROCESSO LEGAL.
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO E A DEFENSORIA PÚBLICA. 101

12. PODER LEGISLATIVO. COMPOSIÇÃO. ORGANIZAÇÃO DO CONGRESSO NACIONAL.


COMPETÊNCIAS PRIVATIVAS E EXCLUSIVAS. A MESA DO CONGRESSO NACIONAL.
SUCESSÃO DA MESA. COMISSÕES PARLAMENTARES DE INQUÉRITO. IMUNIDADES
PARLAMENTARES. PROCESSO LEGISLATIVO. ESPÉCIES NORMATIVAS. 107

13. PODER EXECUTIVO. SISTEMA DE GOVERNO. ELEIÇÃO. PRESIDENTE E VICE-


PRESIDENTE DA REPÚBLICA. CRIMES DE RESPONSABILIDADE E IMPEACHMENT.
PRERROGATIVAS DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA. PODER JUDICIÁRIO. PRINCÍPIOS.
GARANTIAS. ESTRUTURA. SÚMULAS VINCULANTES. 121
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14. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE. A SUPREMACIA CONSTITUCIONAL.


JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL. ESPÉCIES DE INCONSTITUCIONALIDADE.
INCONSTITUCIONALIDADE POR AÇÃO OU OMISSÃO. INCONSTITUCIONALIDADE
FORMAL OU MATERIAL. INCONSTITUCIONALIDADE ORIGINÁRIA E DERIVADA. ESPÉCIES
DE CONTROLE QUANTO AO MOMENTO E AO MODO DE REALIZAÇÃO. CONTROLE
PREVENTIVO E CONTROLE REPRESSIVO. CONTROLE DIFUSO DE
CONSTITUCIONALIDADE. CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE. 138

15. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. AÇÃO DECLARATÓRIA DE


CONSTITUCIONALIDADE. AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO. AÇÃO
INTERVENTIVA. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A
SÚMULA COM EFEITO VINCULANTE 147

16. A DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS. ESTADO DE DEFESA E


ESTADO DE SÍTIO. INTERVENÇÃO: FUNDAMENTOS, ESPÉCIES, COMPETÊNCIA,
REQUISITOS, CONTROLE POLÍTICO E JURISDICIONAL, DURAÇÃO, INTERVENTOR,
LEGITIMIDADE, HIPÓTESES DE INTERVENÇÃO FEDERAL E ESTADUAL. 166

17. SEGURANÇA PÚBLICA. A ORDEM TRIBUTÁRIA, ECONÔMICA E FINANCEIRA.


DIREITOS HUMANOS. TRATADOS INTERNACIONAIS. PREÂMBULO E ATO DAS
DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS. 176
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1. DIREITO CONSTITUCIONAL: CONCEITO, OBJETO, ORIGEM, FORMAÇÃO,


CONTEÚDO, FONTES E MÉTODOS DE TRABALHO. A FORÇA NORMATIVA DA
CONSTITUIÇÃO. DO SISTEMA CONSTITUCIONAL: A CONSTITUIÇÃO COMO UM
SISTEMA DE NORMAS. OS VALORES NA CONSTITUIÇÃO. OS PRECEITOS
FUNDAMENTAIS. FINS E FUNÇÕES DO ESTADO. OS OBJETIVOS FUNDAMENTAIS DE
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. OS PRINCÍPIOS QUE REGEM AS RELAÇÕES
INTERNACIONAIS DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. OS PRINCÍPIOS
FUNDAMENTAIS.

AUTORA: GABRIELA BAZANELLA DE OLIVEIRA


MATERIAL DE CONSULTA: DIRLEY DA CUNHA JR. CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL, JUSPODVIM (2012).
KILDARE GONÇALVES CARVALHO. DIREITO CONSTITUCIONAL (2008).
CADERNO LFG - MARCELO NOVELINO (2011).

1.1. Acerca do Direito Constitucional, responda:


1.1.1. Qual é seu conceito?
Ramo fundamental do Direito que investiga, estuda e sistematiza as normas e instituições que
dispõem sobre as bases e elementos fundamentais do Estado, determinando sua estrutura,
organização e seus fins, a composição e o funcionamento de seus órgãos superiores, disciplinando o
modo de aquisição e ascensão ao poder e os limites de sua atuação, assim como os direitos e as
garantias fundamentais do indivíduo e da coletividade.
Direito Constitucional: Superdireito, não só porque provém, como direito positivo, do Poder
Constituinte, mas também porque domina todos os ramos do Direito submetendo-os a seus
princípios, estabelecendo os seus fundamentos e condicionando a sua interpretação, aplicação e
validade. Pedra angular de toda a ordem jurídica.

1.1.2. Qual seu objeto?


Conhecimento científico e sistematizado da organização fundamental do Estado.

1.1.3. Qual sua origem e formação?


Ligado ao triunfo político das revoluções liberais do séc. XVIII (americana e francesa), cujo
propósito maior que as animou era a limitação do poder mediante a consagração de um sistema de
separação das funções estatais.

1.1.4. Qual é o seu conteúdo?


A doutrina costuma distinguir ou dividir o Direito Constitucional, relativamente ao conteúdo
científico, em três partes:
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1. Direito Constitucional Especial, Positivo ou Particular: Direito Constitucional de um determinado


Estado, que tem por objetivo o estudo e conhecimento de sua constituição em vigor.
2. Direito Constitucional Comparado: Estudo teórico das normas constitucionais positivas, mas não
obrigatoriamente vigentes, de vários estados, ou do mesmo Estado em épocas diferentes,
objetivando realçar as peculiaridades, os contrastes e as semelhanças entre elas.
 Comparação no TEMPO das Constituições de um mesmo Estado.
 Comparação no ESPAÇO das Constituições de diferentes Estados.

 É possível afirmar que um dos objetos do Direito Constitucional Comparado é o estudo das
normas jurídicas positivadas nos textos das Constituições de um mesmo Estado, em diferentes
momentos histórico-temporais? SIM.

3 – Direito Constitucional Geral: Teoria geral do Direito Constitucional, que tem por objeto a
identificação e sistematização, numa perspectiva unitária, dos princípios, conceitos e instituições
comuns a diversos ordenamentos constitucionais e que se acham presentes em várias constituições
de Estados diferentes, que revelam características equivalentes ou similares.

1.1.5. Quais são suas fontes e métodos de trabalho?


Métodos de trabalho (Kildare Carvalho): Metódica tridimensional.
A. Teoria da norma Constitucional: Saber como se estruturam as regras e princípios da
constituição positivamente vigente.
B. Captar todo o ciclo de realização das normas constitucionais desde o estabelecimento do texto da
norma (teoria do poder constituinte) até sua concretização pelo legislador ordinários e pelos
órgãos de aplicação do direito – administração e juízes – o que pressupõe uma teoria da legislação,
uma teoria da decisão administrativa e uma teoria da decisão judicial.
C. Teoria da interpretação, teoria da argumentação, hermenêutica: oferecer princípios
hermenêuticos e de argumentação de forma a possibilitar um procedimento concretizador racional e
objetivamente controlável.
A metódica constitucional, diferentemente da metodologia tradicional, não se concentra na
realização judicial do direito. Assume-se como metódica estruturante. Essa metódica assenta, desde
logo, a na ideia de que o trabalho de aplicação das normas constitucionais implica,
simultaneamente, o manejo de uma teoria da norma, teoria da Constituição e de uma Dogmática
Jurídica.
Fontes do Direito Constitucional: Modos de formação e revelação das normas jurídicas.
Fontes Formais: São os modos de manifestação do direito mediante os quais os juristas conhecem e
descrevem o fenômeno jurídico.
Fontes Materiais: São os elementos que emergem da própria realidade social e dos valores que
inspiram o ordenamento jurídico, como fatores naturais, demográficos, políticos, econômicos,
morais e outros.
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Lei  Triunfou.
Costume  Somente Inglaterra.
Os costumes podem vir a completar, integrar ou desenvolver as normas escritas da Constituição. Na
Constituição formal, o exame dos costumes não se situa no momento de sua elaboração originária,
mas quando da criação superveniente das normas constitucionais, como o processo de revisão,
emenda ou reforma da Constituição.
 Costumes secundum legem: É fonte. Respeita as práticas anteriores à CRFB.
 Praeter legem: Caráter supletivo. Possui papel interpretativo e integrativo.
 Contra legem: Seria inconstitucional essa modalidade de costume.
Jurisprudência

1.2. O que é “Supremacia da norma Constitucional”? É possível afirmar que a Supremacia


advém da ideia de rigidez constitucional? É possível falar em Supremacia em Constituições
não escritas?
Todas as normas constitucionais das Constituições Rígidas, independentemente de seu conteúdo,
têm estrutura e natureza de normas jurídicas, ou seja, são normas providas de juridicidade, que
encerram um imperativo [=obrigatoriedade de comportamento].
TODAS as normas constitucionais, SEM EXCEÇÃO, mesmo as permissivas, são dotadas de
imperatividade, por determinarem uma conduta positiva ou uma omissão, de cuja realização são
obrigadas todas as pessoas e órgãos às quais elas se dirigem.
NÃO EXISTE NORMA CONSTITUCIONAL DESTITUÍDA DE EFICÁCIA.
Todas as normas jurídicas são imperativas, mas as normas constitucionais têm a particularidade de
serem superiores às demais normas do ordenamento jurídico.
Demais normas devem se conformar:
 Material [Conteúdo]
 Formalmente [Maneira de elaboração]

Supremacia Constitucional advém da soberania da fonte que a produziu: PODER CONSTITUINTE


ORIGINÁRIO.
Lembrar da teoria clássica do escalonamento de Kelsen.
A Constituição é a base da ordem jurídica e o fundamento de sua validade.
Lei Suprema [Canotilho]:
Fonte de produção normativa [norma normarum];
 Superlegalidade formal justifica a tendencial rigidez das normas
constitucionais, pois as leis de revisão há exigências reforçadas.
Reconhecimento de valor normativo hierarquicamente superior
 Superlegalidade material
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A Superioridade da Constituição conduz à sua superioridade hierárquico-normativa relativamente


às outras normas do ordenamento jurídico. Isso ainda implica em que:
a) As normas constitucionais constituem uma lex superior que lhe recolhe o fundamento de
validade em si própria (autoprimazia normativa);
b) As normas da constituição são normas de normas (normae normarum), afirmando-se como
uma fonte de produção jurídica de outras normas;
c) Superioridade normativa das normas constitucionais gera o princípio da conformidade de
todos os atos dos poderes públicos com a Constituição.

A Superioridade jurídica da Constituição implica, na prática brasileira, a revogação de todas as


normas anteriores com ela materialmente contrastantes e a nulidade de todas as normas editadas
posteriormente à sua vigência.
A superioridade hierárquico-normativa da Constituição SÓ se coaduna com as CONSTITUIÇÕES
RÍGIDAS que se caracterizam por demandar um processo especial para alteração de suas normas,
ao contrário das flexíveis (processo igual às normas ordinárias).
Nestas, inexistem qualquer diferença formal entre norma constitucional e norma infraconstitucional.
Em face da Supremacia das Constituições rígidas, que pressupõe um escalonamento entre as
entidades normativas.
Uma das principais consequências da rigidez constitucional é a de reforçar, elevando-se ao máximo,
a ideia de supremacia constitucional, de modo que ao conteúdo político das Constituições escritas, a
rigidez acrescenta conteúdo jurídico. Assim, a Constituição passa a ser fonte primária e parâmetro
obrigatório do ordenamento jurídico.
Para José Afonso da Silva, o reconhecimento de uma supremacia material nas Constituições
Flexíveis e nas costumeiras só tem sentido do ponto de vista sociológico, assim como se pode
reconhecer a esta Constituições uma rigidez sócio-política. Porém, do ponto de vista jurídico, só é
concebível a supremacia formal, que se apoia na regra da rigidez, de que é o primeiro e principal
corolário.
A Supremacia Constitucional não só impõe que toda atuação do poder público se conforme,
material e formalmente, com os preceitos e diretrizes por ela estabelecidas, como também
determina – em face da hodierna categoria jurídico-constitucional da inconstitucionalidade por
omissão, o que só reforça mais ainda sua imperatividade – que o poder público obrigatoriamente
atue quanto para tanto foi exigido.
A supremacia constitucional ficaria comprometida – e, de resto, toda ordem jurídica – se as
imposições constitucionais não fossem realizadas. Em consequência disso, todos os órgãos do
Poder Político [PL, PE, PJ] acham-se vinculados e obrigados a satisfazer os fins e tarefas impostas
pela CF.
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1.3. O que é força normativa da Constituição?


Para explicar o conceito de força normativa da Constituição é necessário discorrer rapidamente
sobre as Concepções de Constituição:

1.3.1. Concepção Sociológica (Ferdinand Lassalle)


Foi defendida na Prússia em 1862 numa conferência para operários. A Constituição não era vista
como um documento jurídico, mas político. Não tinha a força normativa que tem hoje.
Para melhor entender essa concepção devemos fazer a seguinte distinção:
1) Constituição Escrita
2) Constituição Efetiva ou Real
Ao lado da Constituição Escrita [jurídica], existe a Constituição Real ou Efetiva, que é aquela
formada pela soma dos fatores reais de poder que regem uma determinada Nação (detentores do
Poder  são aqueles que efetivamente detêm o poder).
O documento constitucional é a constituição escrita.
Se a Constituição Escrita não corresponder à realidade, prevalecerá a Constituição Efetiva. Se
houver conflito entre as duas espécies de Constituição, prevalece a Constituição Efetiva ou real.
Se a Constituição Escrita não corresponder à realidade, ela não passará de uma folha de papel, ou
seja, ela não terá nenhum significado real para mudar os destinos daquele Estado.
Essa concepção hoje está ultrapassada.

1.3.2. Concepção Política (Carl Schmitt - 1928)


O fundamento da Constituição se encontra na decisão política fundamental que a antecede.
Ele fará a seguinte distinção:
A) Constituição Propriamente dita: São as normas que decorrem de uma decisão política
fundamental. Exemplo: Direitos Fundamentais, Estrutura do Estado e organização dos Poderes. São
as matérias propriamente ditas da Constituição.
Jamais podem ser reformadas, uma vez que correspondem à própria substância e essência da
Constituição. São imutáveis.
Não podem ser suspensas nas situações constitucionais de crises [E. de Sítio.]

B) Leis Constitucionais: tudo mais que está na Constituição que não decorre de uma decisão
política fundamental.

 Podem ser reformadas.


 Podem ser suspensas.
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As normas constitucionais propriamente ditas e as leis constitucionais são formalmente iguais


(ambas estão na Constituição), mas são materialmente distintas.
A Constituição é entendida como modo e forma de ser de uma unidade política, isto é de uma
Nação. A Constituição significa, essencialmente, decisão política fundamental, decisão concreta de
conjunto sobre o modo e a forma de existência da unidade política.
Para Schmitt, não é a Constituição que produz unidade política, mas, inversamente, é a unidade
política, ou seja, a Nação que gera a Constituição.
A Constituição só existe porque antes dela já existia uma unidade política, e somente a decisão
conjunta de um povo sobre o modo e a forma de sua existência é que confere a um conjunto de
normas o caráter de Constituição.

1.3.3. Concepção Jurídica (Hans Kelsen)


A Constituição é formada por um conjunto de normas e, portanto, é uma lei como todas as demais,
cujo fundamento se encontra no plano jurídico. O filósofo do direito não precisa recorrer a
sociologia, política para buscar o fundamento da Constituição. A constituição é uma lei e seu
fundamento deve ser no plano jurídico.
Kelsen faz a seguinte distinção:
a) Constituição em Sentido Lógico-Jurídico:
Onde está o fundamento da Constituição?
Devemos obedecer a Constituição, pois acima dela está a norma fundamental hipotética (que é a
Constituição em sentido Lógico-Jurídico). Por isso que ela é fundamental, pois a norma que é
fundamento da Constituição.
É uma norma hipotética porque não é uma norma posta, mas sim pressuposta. Pressuposta é aquela
que a sociedade pressupõe que existe, mas que não está escrita.
O conteúdo da norma fundamental hipotética é de que todos devem obedecer a Constituição. Se a
sociedade não partir do pressuposto que não existe essa norma, ninguém precisa seguir a
Constituição.
b) Constituição em Sentido Jurídico-Positivo:
É aquela feita pelo Poder Constituinte originário (CF/88).

1.3.4. Concepção Normativa (ou Culturalista ou Jurídica) (Konrad Hesse)


Sua obra foi publicada em 1959. A Constituição, após a 2ª Guerra Mundial, deixou de ser vista
como um documento político, mas como um documento normativo (conjunto de normas). Um dos
marcos para a mudança de concepção foi a obra de Konrad Hesse (Força Normativa da
Constituição).
Essa concepção foi desenvolvida para combater a tese do Ferdinand Lassalle.
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A ideia de Konrad Hesse pode ser resumida da seguinte forma: Ainda que seja inegável que muitas
vezes uma Constituição Jurídica possa sucumbir a realidade, deve-se atribuir a essa Constituição
uma força normativa capaz de modificar esta mesma realidade. Para isso, é necessário que exista
uma “vontade de Constituição” e não apenas uma “vontade de Poder”.
Se a Constituição não possuir uma força normativa, a Constituição, ao invés de modificar a
realidade, apenas descreverá o que acontece na prática. A força normativa pode modificar a
realidade.

1.4. O que significa dizer que a Constituição é um sistema de normas que possui unidade
normativa?
Um ordenamento jurídico só pode ser concebido com um conjunto de normas, pois é condição de
sua existência. Além disso, o ordenamento constitui uma UNIDADE, quer porque as normas
nascem da mesma fonte (ordenamento simples), quer porque suas normas, ainda que nascidas de
fontes distintas, têm o mesmo fundamento de validade (ordenamento complexo).
Toda Constituição deve ser compreendida como uma unidade e como um sistema que privilegia
determinados valores. Essa unidade normativa pressupõe inexistência de hierarquia normativa ou
formal entre as normas constitucionais.
A Constituição é formada por regras e princípios de diferentes graus de densidade normativa.
Postulados Normativos são normas que estabelecem um dever de segundo grau consistente em
estabelecer a estrutura de aplicação, prescrever modos de raciocínio em relação a outras normas.
Um dever de segundo grau significa que não se aplica o postulado para resolver o caso concreto,
mas sim para interpretar outra norma (como um princípio ou uma norma será aplicado). Vou
resolver um caso concreto com base na liberdade de expressão do pensamento (norma de 1° grau),
mas utilizarei o postulado normativo para explicar/aplicar essa norma.
A proporcionalidade é postulado normativo porque utilizaremos para definir como outros
princípios serão aplicados (segundo a teoria de Humberto Ávila).

▪ Distinção entre Princípios e Regras


Regras são mandamentos de definição, ou seja, normas que ordenam que algo seja cumprido na
medida exata de suas prescrições. A regra prevê uma hipótese de incidência; se ocorrer faticamente
essa hipótese, a regra deve ser aplicada de forma integral, na medida exata da prescrição.
A regra não permite extensão ou restrição. A regra, segundo Dworkin, obedece a lógica do “tudo
ou nada”. Se a regra for válida e a hipótese ocorrer, deve aplicar a regra àquela hipótese.
Em geral, as regras são aplicadas através da subsunção. H. Ávila diz que é possível ponderar regras,
mas na teoria de Alexy isso não é possível. Se A, então B; premissa maior, premissa menor.
Segundo Robert Alexy, princípios são mandamentos de otimização, ou seja, normas que ordenam
que algo seja cumprido na maior medida possível, de acordo com as possibilidades jurídicas e
fáticas existentes. A medida de cumprimento do princípio não é exata, depende das circunstâncias
fáticas e jurídicas.
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1.5. Quais são os fins e as funções do Estado?


O Estado, como forma de organização política, existe para satisfazer as necessidades humanas. A
investigação dos fins do Estado deve ser tratada não só no domínio dos valores e da realidade, como
também no campo da normatividade jurídica.

FINS DO ESTADO:
Jellinek foi o grande sistematizador das teorias dos fins do Estado, que assim os classificou:
a) fins objetivos: nesta teoria, o fim o Estado surge da própria natureza das coisas; não é a vontade
política que determina o fim do Estado. A natureza da ordem política é que dá objetivamente o fim
do Estado, o qual surge de uma ordem natural, sendo, portanto, transcendente e independente da
vontade humana. Investiga-se aqui o fim que cabe ao Estado em geral, abstrato e universal, e não a
cada um em particular.
Pode-se falar também na existência de fins particulares objetivos. Para os autores que defendem
esta teoria, cada Estado tem seus fins particulares, que resultam das circunstâncias em que eles
surgiram e se desenvolveram e que são condicionantes de sua história. Confundem-se nesta teoria
os fins do Estado com os interesses dos Estados e até de seus governos.
b) fins subjetivos: o fim do Estado não é um dado natural de ordem política, mas independe de
toda objetividade. Não há, assim, nenhum dado, mas um artifício. Os indivíduos que vivem em
comunidade política se propõem a um fim próprio, independente de toda objetividade.
c) fins particulares: são os que cabem a um Estado em um momento determinado, para os homens
que o constituem. Com os fins particulares, os Estados se vocações históricas a cumprir no mundo.
d) fins absolutos: consideram-se absolutos os fins do Estado que são determinados por uma
valoração axiológica. O Estado não pode, de nenhum modo, desviar-se do seu fim, que é ideal e
válido para todos os tempos e lugares.
e) fins relativos: esta teoria considera que o fim do Estado é limitado pela própria natureza. O
peculiar e próprio do Estado são as manifestações sistemáticas da vida solidária do homem. As três
grandes categorias a que se reduz a vida do Estado são: conservação, ordenação e ajuda.
g) fins universais: são os que correspondem ao Estado em abstrato, a qualquer Estado em todos os
tempos.
f) fins exclusivos e concorrentes: os fins exclusivos são aqueles privativos do Estado (segurança
externa e interna) e os concorrentes admitem participação ou colaboração de outras sociedades, com
as quais se identificam.

SÍNTESE: Pode-se dizer que o Estado, como sociedade política, existe para realizar a segurança, a
justiça e o bem-estar econômico e social, os quais constituem os seus fins.
A segurança, como fim do Estado, pode ser individual e coletiva.
A justiça possibilita que, nas relações entre os homens, seja substituído o arbítrio da violência
individual por um complexo de regras capazes de satisfazer o instinto natural da própria justiça.
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O conceito de justiça compreende:


a) justiça comutativa, cuja regra é a igualdade, nas relações entre os indivíduos, da equivalência
dos valores permutados (cada um deve receber, nas relações recíprocas, de acordo com a prestação
que efetuou aos indivíduos);
b) justiça distributiva, cuja regra é a desigualdade para remunerar cada qual segundo os seus
méritos, de acordo com o tipo de atividade produtiva que permanentemente presta à coletividade, ou
a situação social de carência em que se encontra. Projeta-se, assim, a justiça distributiva nas
políticas econômicas e socais do Estado.
O bem-estar econômico e social é outra finalidade do Estado. O que se objetiva é a promoção de
condições de vida dos indivíduos, garantindo-lhes o acesso aos bens econômicos que permitam a
elevação de camadas sociais mais pobres, contemplando-as com educação, habitação, entre outros
serviços.
No âmbito social, uma das tarefas essenciais do Estado consiste em salvaguardar a liberdade, a
possibilidade de desenvolvimento pessoal e a esfera privada do ser humano, apesar da amplidão das
intervenções sociais.
O bem comum consiste na finalidade legítima do Estado.

FUNÇÕES DO ESTADO
Pode-se definir a função do Estado como a atividade desenvolvida, no todo ou em parte, por um
ou vários órgãos do poder político, de modo duradouro, independentemente de outras atividades,
em particular na sua forma, e que visa à prossecução dos fins do Estado.
A determinação das funções do Estado resulta de três critérios: material, formal e orgânico.
a) Material: parte da análise do conteúdo dos diversos tipos de atos ou dos resultados em se traduz
a atividade do Estado, para chegar ao conceito de função.
b) Formal: atende às circunstâncias exteriores das atividades do Estado, distinguindo as funções
segundo a forma externa revestida para o exercício de cada uma delas.
c) Orgânico: relaciona intimamente as funções do Estado com os órgãos que as exercitam, e das
diversas características desses órgãos ou da sua posição na estrutura do poder político infere a
especialidade de suas atividades.
As funções jurídicas são as de criação e execução do Direito e compreendem a função legislativa,
cujo objeto direto e imediato é o de estatuir normas de caráter geral e impessoal inovadoras da
ordem jurídica, e a executiva, exercitável por meio do processo jurisdicional, caracterizado pela
imparcialidade e passividade, e pelo processo administrativo, com as características de
parcialidade e iniciativa.
Já as funções não jurídicas compreendem:
a) a função política, cuja característica é a liberdade de opção entre várias soluções possíveis, com
vistas à conservação da sociedade política e a definição e prossecução do interesse geral, por meio
da livre escolha de rumos e soluções consideradas preferíveis;
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b) a função técnica, cujo objeto direto e imediato consiste na produção de bens ou na prestação de
serviços destinados à satisfação das necessidades coletivas de caráter material ou cultural, de
harmonia com preceitos práticos tendentes a obter a máxima eficiência dos meios empregados.
O fim jurídico do Estado refere-se à criação e execução do Direito.
O fim cultural do Estado corresponde ao desenvolvimento das condições materiais para a vida dos
cidadãos, consoante a ideologia do Estado considerado.
Para atingir tais fins, o Estado atuaria através de dois tipos de meios: a criação de normas jurídicas
gerais e abstratas e a realização de atos concretos.
No primeiro caso, a função do Estado seria legislativa, e no segundo, a função seria administrativa
quando visasse a um fim cultural, ou jurisdicional, quando objetivasse um fim jurídico.
O ato jurídico, considerado como manifestação de vontade dirigida a modificação da ordem
jurídica, presente ou próxima futura, toma uma das seguintes formas:
a) ato-regra, o que é realizado com a intenção de modificar as normas jurídicas abstratas
constitutivas do direito objetivo;
b) ato-condição, o que torna aplicáveis a um sujeito determinadas regras abstratas, que, antes de
sua prática, lhe eram inaplicáveis;
c) ato-subjetivo, o que cria para alguém uma obrigação especial, concreta, individual e
momentânea, que nenhuma regra abstrata lhe impunha.

Definidos os atos jurídicos, as funções do Estado podem ser caracterizadas:


a) a função legislativa consiste na prática de atos-regra;
b) a função administrativa consiste na prática de atos-condição, dos atos subjetivos e das
denominadas operações materiais, sem caráter jurídico, realizadas pelos órgãos da Administração
Pública, destinadas a assegurar o funcionamento dos serviços;
c) a função jurisdicional conste na prática de atos jurisdicionais, que tanto podem ser atos-
condição como atos subjetivos. O que dos define não é o seu conteúdo, mas a circunstância de
provirem de um órgão dotado de imparcialidade, independência (Tribunal ou Juiz singular).
Para Kelsen, o Estado se reduz à unidade personificada de uma ordem jurídica e se confunde com a
própria ordem jurídica. As funções do Estado consistem, desta forma, na criação e na aplicação do
Direito.
Assinale-se que, embora sejam as funções do Estado abstratamente distintas umas das outras, os
atos que manifestam podem ter caráter misto.
Desta forma, pode haver atos que, embora tidos como legislativos, simultaneamente são
manifestações do Poder Executivo, e mesmo certos atos jurisdicionais que contêm elementos do
Poder Legislativo.
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Às funções clássicas do Estado, quais sejam, legislativa, executiva e jurisdicional, deve-se acrescer
outras necessárias para a garantia do processo democrático, e que são:
a) função de fiscalização ou de controle, a cargo do Ministério Público e dos Tribunais de Contas;
b) função legislativa constitucional de emendar e revisar a Constituição;
c) função simbólica, típica do chefe de Estado, voltada para a representação do Estado e dos
valores nacionais.

1.6. No que consistiriam os Princípios Fundamentais dispostos no título I de nossa CRFB?


Conceitue e discorra rapidamente sobre cada um deles.
Conceito: são princípios constitucionais politicamente conformadores do Estado, que explicitam as
valorações políticas fundamentais do legislador constituinte, revelando as concepções políticas
triunfantes numa Assembleia Constituinte, constituindo-se, assim, no cerne político da constituição
política.
São princípios fundamentais:
1 - Federação
Vem de foedus, foederis que significa aliança, pacto, união, visto que nasce da aliança entre os
Estados.
Seu cerne está na autonomia das entidades que compõem o Estado Federal, pois somente este detém
o poder soberano, que é um poder supremo e independente. As entidades integrantes não tem
soberania (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios). Nasceu com a Constituição
norte-americana de 1787, em razão do fracasso do modelo de Confederação anteriormente aplicado.
CRFB: Adotou modelo tricotômico ou de segundo grau, pois incluiu os Municípios na organização
federal, ao lado da União e dos Estados.

2 - República
O Princípio Republicano define a forma de Governo, ou seja, a forma como os governantes
ascendem ao Governo e como se dá a relação entre governantes e governados. É uma forma de
governo, fundada na igualdade formal entre as pessoas, na qual os detentores do poder político
exercem-no em caráter eletivo, de regra representativo, temporário e com responsabilidade.
Elementos:
a) É uma forma de Governo, que se contrapõe à Monarquia;
b) Fundada na igualdade formal entre as partes;
c) Em que os detentores do poder político exercem-no em caráter eletivo;
d) É Governo em regra representativo;
e) É Governo temporário;
f) É Governo exercido com responsabilidade;
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3 - Estado Democrático de Direito


Reúne os princípios do Estado de Direito e do Estado Democrático, não como simples reunião
formal de seus respectivos elementos, tendo em vista que revela um novo que os supera, mas como
providência de transformação do status quo e garantia de uma sociedade pluralista, livre, justa e
solidária, em que todo o poder emane do povo e seja exercido em benefício do povo, com o
reconhecimento e a afirmação dos direitos humanos fundamentais que possam realizar, na sua
plenitude, a dignidade da pessoa humana.

4 - Soberania Popular
Art. 1º. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Representantes eleitos = Democracia representativa


Povo exerce o poder diretamente = Democracia direta
Democracia representativa + direta = Democracia semidireta

5 - Separação de Poderes, com Independência e Harmonia entre eles


A separação de poderes, na verdade, é a distribuição e divisão de determinadas funções estatais a
diferentes órgãos do Estado.

6 - Princípios definidores dos fundamentos do Estado


Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.

Soberania: Estado supremo (em relação aos indivíduos e grupos que formam a população do
Estado) e independente (relativamente ao poder de outros Estados).
Aspecto interno: É o poder mais elevado do Estado.
Aspecto externo: nas relações recíprocas entre os Estados, não há subordinação nem dependência
entre eles, mas sim igualdade.
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Cidadania: Não é apenas gozo de direitos políticos. Visa qualificar todas as pessoas como titulares
de direitos frente ao Estado, reconhecendo o indivíduo como parte integrante e indissociável da
sociedade.
Dignidade da pessoa humana: É uma qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o
faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando,
neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra
todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições
existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e
co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres
humanos.
Os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa: Também é fundamento da ordem econômica.
Visa a assegurar a importância do trabalho humano, como valor social, e a liberdade de iniciativa
econômica, como valor de produção e desenvolvimento.
Pluralismo político: Fundamento que assegura a realização dos postulados democráticos,
garantindo a multiplicidade de opiniões, de crenças, de convicções e ideias, que se manifestam
normalmente por instituições como as associações, as entidades sindicais e, em especial, os partidos
políticos.

7 - Princípios definidores dos objetos fundamentais do Estado e os princípios regentes das


relações internacionais.
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
I - independência nacional;
II - prevalência dos direitos humanos;
III - autodeterminação dos povos;
IV - não-intervenção;
V - igualdade entre os Estados;
VI - defesa da paz;
VII - solução pacífica dos conflitos;
VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo;
IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;
X - concessão de asilo político.
Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural
dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.

Independência nacional = Soberania


Prevalência dos direitos humanos: Compromisso do BR com a sua proteção e efetividade.
Autodeterminação dos povos: repele a ideia de colonização ou tutela internacional dos povos de
uma nação livre.
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Não intervenção: rejeita qualquer intenção de o Estado brasileiro interferir nos negócios atinentes e
particulares de outro Estado, sem a permissão deste.
Igualdade entre os Estados: em razão do respeito recíproca que a noção de soberania impõe.
Defesa da Paz
Solução pacífica dos conflitos: Conexo com o princípio anterior. Destina-se a garantir o prévio
exaurimento das vias diplomáticas na tentativa de compor os conflitos internacionais sem o recurso
à guerra.
Repúdio ao terrorismo e ao racismo
Cooperação entre os povos para o progresso da humanidade
Concessão de asilo político: Proteção oferecida pelo Estado a estrangeiro perseguido por crime
político no país em que se encontra.
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2. NEOCONSTITUCIONALISMO. JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL.


CONSTITUCIONALIZAÇÃO SIMBÓLICA: A CONSTITUCIONALIZAÇÃO, TEXTO
CONSTITUCIONAL E REALIDADE CONSTITUCIONAL. EFETIVIDADE DAS NORMAS
CONSTITUCIONAIS. CONCEITO DE CONSTITUIÇÃO. CLASSIFICAÇÃO DAS
CONSTITUIÇÕES. ELEMENTOS DAS CONSTITUIÇÕES. HISTÓRICO DAS
CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS.
AUTORA: RENATA DAPPER SANTOS
MATERIAL DE CONSULTA: LUÍS ROBERTO BARROSO, “NEOCONSTITUCIONALISMO: O TRIUNFO TARDIO DO DIREITO
CONSTITUCIONAL NO BRASIL”; PEDRO LENZA, “DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO/2014”

2.1. O que é neoconstitucionalismo e quais as suas inovações em relação ao constitucionalismo


moderno?
Desenvolvido a partir do século XXI, o neoconstitucionalismo – também chamado de
constitucionalismo pós-moderno ou de pós-positivismo – é uma perspectiva doutrinária que busca a
eficácia da constituição com a concretização dos direitos fundamentais.
O neoconstitucionalismo se contrapõe ao constitucionalismo moderno, que atrelava o
constitucionalismo apenas à ideia de limitação do poder político.
As principais diferenças entre o constitucionalismo moderno e o posterior neoconstitucionalismo
podem ser percebidas na seguinte tabela:

Constitucionalismo Moderno Neoconstitucionalismo

Constituição serve somente para limitar o Constituição serve para concretizar


poder político. prestações materiais (direitos
fundamentais) e implantar um Estado
Democrático Social de Direito.

Hierarquia apenas formal entre normas Hierarquia não apenas formal, mas
constitucionais e normas também axiológica (de valor) entre
infraconstitucionais, pois o modelo normas constitucionais e normas
normativo é o descritivo (ou infraconstitucionais, pois o modelo
deontológico) normativo é o axiológico (constituição
como valor em si).

Estado Legislativo de Direito Estado Constitucional de Direito


(Constituição adquire o caráter de
“norma jurídica”, dotada, portanto, de
imperatividade. Constituição é o centro
do sistema e tudo deve ser interpretado a
partir dela).
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Por fim, a partir do neoconstitucionalismo ocorre a incorporação explícita de valores (especialmente


após a Segunda Guerra Mundial) e de opções política ao texto constitucional, seja de forma geral
(ex.: redução das desigualdades sociais – art. 3, III), seja de forma específica (ex.: prestação, por
parte do Estado, de serviços de educação – art. 23, V e 205).

2.2. Para Luís Roberto Barroso, quais os marcos que levaram ao “novo direito constitucional”
ou “neoconstitucionalismo”?
São 3 os marcos: histórico, filosófico e teórico.

a) Marco Histórico: foi o pós guerra, em que as constituições enfocam a redemocratização e o


surgimento do Estado Democrático de Direito. Ex.: Alemanha de 1949, Itália de 1947, Portugal de
1976, Espanha de 1978 e Brasil de 1988.

b) Marco Filosófico: é o pós-positivismo.


Veja-se: a partir do século XVI se desenvolve o “jusnaturalismo moderno”, o qual se funda na
crença em princípios de justiça universalmente válidos, serve de sustentáculo às revoluções liberais
e se consagra nas constituições escritas e codificações.
Posteriormente, no final do século XIX, o crescente “positivismo jurídico” equipara o “Direito” à
“Lei”, afastando-o da filosofia e de discussões sobre justiça, em busca de objetividade científica.
Ocorre que o fascismo da Itália e o Nazismo da Alemanha promoveram barbáries sob a proteção da
LEGALIDADE, de modo que a derrocada desses regimes autoritários foi emblematicamente
associada à decadência do positivismo jurídico.
Assim, ao fim da segunda guerra, a ética e os valores começam a retornar ao Direito e surge o “pós-
positivismo”, que busca ir além da legalidade estrita, sem desprezar, contudo, o direito posto.
Acontece a reaproximação entre direito e filosofia e o surgimento de uma nova hermenêutica
constitucional, pois é atribuída normatividade aos princípios e é desenvolvida uma teoria dos
direitos fundamentais, edificada sobre o fundamento da dignidade humana.

c) Marco Teórico: é a ideia de força NORMATIVA da constituição.


Isso porque, se a constituição tem força NORMATIVA (Konrad Hesse), consequentemente ela tem
status de NORMA jurídica, sendo dotada de imperatividade, o que permite o seu cumprimento
forçado em caso de descumprimento (assim como acontece com as demais normas jurídicas).
Além disso, com a constitucionalização dos direitos fundamentais, estes passaram a ficar
imunizados em relação ao processo político majoritário, e a sua proteção passou a caber ao
JUDICIÁRIO (o que pôs fim à Supremacia do Legislativo, substituída pela Supremacia da
Constituição).
Ademais, em razão das novas especificidades das normas constitucionais (dotadas de FORÇA
NORMATIVA), a doutrina e a jurisprudência tiveram de desenvolver uma nova dogmática de
interpretação constitucional, pois a interpretação jurídica tradicional não se mostrou suficiente para
20

confrontar REGRAS (enunciados descritivos, aplicados com regras de subsunção – enquadramento


do fato à norma) e PRINCÍPIOS (normas que consagram valores).
De referir que, com a constitucionalização de valores, aumentou a possibilidade de conflitos entre
normas constantes do próprio sistema constitucional, de modo que o neoconstitucionalismo trouxe
consigo um novo desafio: devem ser resguardadas as condições de dignidade ao menos em
patamares mínimos diante do choque dos valores constitucionalizados.
Daí que surgem os princípios de interpretação constitucional, que são princípios instrumentais (não
materiais) e metodológicos para a aplicação das normas constitucionais, quais sejam: supremacia da
constituição; presunção de constitucionalidade das normas e atos do poder público; interpretação
conforme a constituição; unidade; razoabilidade; efetividade.

2.3. Quais são as possíveis concepções (ou sentidos) a serem tomadas para conceituar o termo
“Constituição”?
a) Sentido Sociológico – Ferdinand Lassale: para esta acepção, a constituição somente é legítima se
representar o efetivo poder social. Do contrário, a constituição é ilegítima, caracterizando-se como
uma simples “folha de papel”. A constituição é, portanto, “a somatória dos fatores reais do poder
dentro de uma sociedade”.

b) Sentido Político – Carl Schmitt: ele distingue “constituição” de “leis constitucionais”.


“Constituição” é a decisão política do titular do poder constituinte, e abarca tão somente a decisão
política fundamental (estrutura do Estado, direitos individuais, vida democrática).
Os demais dispositivos inseridos na CF, mas que não tenham matéria de decisão política
fundamental, não são “constituição”, mas apenas “leis constitucionais”.

c) Sentido Material X Sentido Formal:


c1) Material: o que define se uma norma é constitucional, ou não, é o seu conteúdo, pouco
importando a forma pela qual essa norma ingressou no ordenamento jurídico. Constituição é,
portanto, a norma que define as estruturas da sociedade, mesmo que esta norma esteja fora do texto
constitucional. Se aproxima, de certa forma, do que Schmitt conceituou de “constituição”
c2) Formal: o que define se uma norma é constitucional ou não é a forma (em regra mais dificultosa,
pelo poder soberano) que a norma ingressou no ordenamento jurídico, pouco importando seu
conteúdo. Se aproxima, de certa forma, do que Schmitt conceituou de “leis constitucionais”.
OBS.: no direito brasileiro há uma tendência a se adotar um critério misto, em razão do art. 5º, § 3º,
da CF.

d) Sentido Jurídico – Hans Kelsen: Kelsen afasta totalmente a constituição do “ser”, alocando-a
totalmente no mundo do “dever ser”. Isso porque a constituição é fruto da vontade RACIONAL do
homem, e NÃO das leis naturais.
21

Assim, estando fora do mundo do “ser”, a constituição NÃO tem pretensão de fundamentação
sociológica, política ou filosófica, pois é fruto da RAZÃO, sendo “puro dever ser”, “norma pura”.
A constituição, para Kelsen, tem 2 sentidos:
(i) sentido “lógico-jurídico” – a constituição tem o seu fundamento de validade na norma hipotética
fundamental, a qual se situa no plano lógico (não no jurídico) e é o fundamento de validade de todo
o sistema. A NHF é uma norma “suposta”, pois não é uma norma posta.
(ii) sentido “jurídico-positivo” – a constituição é o fundamento de validade de todo o sistema
infraconstitucional. Há, portanto, um escalonamento de normas em verticalidade hierárquica. A
norma de hierarquia inferior busca sua validade na superior, até chegar na constituição que é o
fundamento de validade de todo o sistema infraconstitucional.

e) Sentido Culturalista: a constituição é um produto de um fato cultural, produzido pela sociedade


e que nela pode influir. A constituição é uma formação objetiva de cultura, que engloba elementos
históricos, sociais e racionais. Nela intervêm fatores reais (costume, tradição, etc.), espirituais
(sentimentos, moral, etc.), racionais (técnicas jurídicas, formas políticas, etc.) e voluntaristas
(vontade humana na adoção de alguma forma de convivência).
Assim, as constituições positivas são normas fundamentais condicionadas pela CULTURA TOTAL
e, ao mesmo tempo, condicionantes da CULTURA TOTAL.

f) Constituição Aberta – J. J. Gomes Canotilho: a ideia da constituição aberta serve para que a
constituição possa permanecer dentro de seu tempo, evitando-se o desmoronamento da sua FORÇA
NORMATIVA.

2.4. Qual a ideia central do estudo sobre a “legislação simbólica” e a “constitucionalização


simbólica”?
Este estudo discute a função simbólica de textos constitucionais ou legais que carecem de
concretização normativo-jurídica.
A “legislação/constitucionalização simbólica” aponta um predomínio (hipertrofia) da função
simbólica da atividade legiferante e da lei/constituição em detrimento da sua função jurídico-
instrumental.
Nota-se que o desenvolvimento doutrinário acerca da “legislação simbólica” também se aplica à
“constitucionalização simbólica”, razão pela qual a explanação pode ser conjunta
(“legislação/constitucionalização simbólica”).
Obs.: a introdução da ideia de “constitucionalização simbólica” se deve a MARCELO NEVES em
trabalho apresentado para a obtenção do cargo de Professor Titular da Universidade Federal de
Pernambuco, em 1992.
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2.5. Quais os tipos de conteúdo que a legislação/constituição simbólica pode apresentar?


Pode ser de 3 tipos:
a) Confirmação de valores sociais: um certo grupo da sociedade procura influenciar a atividade
legiferante para obter uma “vitória legislativa”, fazendo prevalecer os seus valores contra os do
grupo “adversário”.
Serve para caracterizar a prevalência dos valores daquele grupo sobre os demais, sendo secundária a
eficácia normativa da lei. Ex.: lei seca, nos EUA, caso em que os defensores da proibição do
consumo de álcool não estavam interessados na eficácia instrumental da lei, mas sobretudo em
adquirir maior respeito social, de modo que a lei se constitui em símbolo de status.
b) Legislação-álibi OU demonstração da capacidade do Estado de solucionar problemas sociais: a
lei/constituição simbólica, nesse caso, tem o objetivo de assegurar confiança nos sistemas jurídico e
político, pois é uma resposta pronta e rápida do governo e do Estado, que mascara a realidade.
A “legislação-álibi” é uma forma de manipulação que imuniza o sistema político contra outras
alternativas, desempenhando uma função ideológica que tem o poder de introduzir um sentimento
de bem-estar na sociedade, solucionando tensões, servindo à lealdade das massas.
Nota-se, contudo, que o uso exagerado da “legislação/constituição-álibi” leva à descrença no
sistema jurídico, pois o público se sente enganado e os atores políticos se tornam cínicos.
c) Adiamento da solução de conflitos sociais através de compromissos dilatórios: nesse caso, as
divergências entre grupos políticos não são resolvidas por meio do ato legislativo, o qual será,
contudo, aprovado consensualmente.
Isso porque as partes envolvidas já têm a perspectiva de que a lei/emenda constitucional será
ineficaz, de modo que o “acordo” não se funda no conteúdo do diploma normativo, mas na
transferência da solução do conflito para um futuro indeterminado. A lei/EC é aparentemente
progressista e aparentemente satisfaz a ambos os partidos, mas apenas adia a solução do conflito
social subjacente.

2.6. Quais são os efeitos indiretos (ou latentes, ou colaterais) da legislação/constituição


simbólica?
A legislação/constituição simbólica apresenta efeitos latentes que, muitas vezes, são mais relevantes
do que seriam os “efeitos manifestos” que lhe faltam. Isso porque, em que pese seu sentido negativo
(ineficácia normativa e ausência de efeitos jurídicos), ela apresenta um sentido positivo, que é a
produção de efeitos políticos.

2.7. O fenômeno da constitucionalização simbólica acontece igualmente nos países centrais e


nos periféricos?
Não. Nos países periféricos há uma preponderância do sistema político sobre o jurídico, havendo
uma hipertrofia da função político-simbólica. Assim, ante o bloqueio do sistema jurídico e a falta de
concretização normativo-jurídica do texto constitucional, a constituição é utilizada de acordo com
os interesses políticos.
23

2.8. Quais as possíveis classificações das constituições, quanto:


2.8.1. Quanto à origem:
a) Promulgada: fruto de assembleia constituinte eleita diretamente pelo povo;
b) Outorgada: imposta (chamada de “Carta”);
c) Cesarista/Bonapartista: formulada por meio de plebiscito ou referendo acerca do projeto de um
imperador ou ditador.
d) Pactuada: poder constituinte originário nas mãos de mais de um titular. Remete ao poder
repartido entre monarquia absoluta + nobreza + burguesia, na Idade Média

2.8.2. Quanto à forma:


a) Escrita/Instrumental: totalmente escrita e geralmente em um único código. (No Brasil, fala-se em
mais de um código em razão do art. 5º, § 3º, da CF, razão pela qual se fala em “constituição legal”).
b) Costumeira/consuetudinária: além dos costumes, há textos escritos, mas esparsos, reconhecidos
pela sociedade como fundamentais. Ex: Inglaterra.

2.8.3. Quanto à extensão:


a) Sintética: veiculam apenas os princípios estruturais do Estado. Ex.: EUA.
b) Analítica: abordam todos os assuntos fundamentais. Ex.: Brasil.

2.8.4. Quanto ao conteúdo:


a) Material: é constitucional aquele texto que se refere ao fundamento e à estrutura do Estado.
b) Formal: é constitucional toda a regra que passar pelo processo de criação constitucional. (A CF
do Brasil é “formal”, mas tende a “mista”, pelo art. 5º, § 3º, da CF).

2.8.5. Quanto ao Modo de Elaboração:


a) Dogmática: partem de teorias pré-concebidas, de planos e sistemas prévios, de ideologias bem
declaradas, de dogmas políticos. São sempre escritas, elaboradas “de um só jato”, por assembleia
constituinte. Ex.: Brasil, 1988.
b) Histórica: reúnem a história e a tradição de um povo, com lento e contínuo processo de
formação. Aproximam-se da costumeira.
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2.8.6. Quanto à alterabilidade:


a) Rígida: para sua alteração, exige processo legislativo mais árduo, solene e dificultoso do que o
processo de alteração das normas não constitucionais. (art. 60, CF).
b) Flexível: mesma dificuldade para alterar a constituição e as outras leis. Lei posterior altera norma
constitucional anterior.
c) Semirrígida / Semiflexível: algumas matérias exigem processos legislativos mais dificultosos,
enquanto que outras matérias, não. Ex.: Constituição Imperial Brasileira de 1824.
d) Fixa: somente podem ser alteradas por um poder de competência igual àquele que as criou. São
chamadas de silenciosas, pois não estabelecem procedimento para sua reforma. Ex. Carta Espanhola
de 1876.
e) Transitoriamente Flexíveis (para Uadi Lammêgo Bulos): são flexíveis por certo tempo. Depois,
passam a ser rígidas. O binômio rigidez/flexibilidade não coexiste simultaneamente.
f) Imutáveis: permanentes, graníticas, intocáveis.
g) Super-rígida: algumas matérias são imutáveis (cláusulas pétreas) e outras matérias exigem
processo legislativo diferenciado (rígida). Para Alexandre de Moraes, é a CF/88.

2.8.7. Quanto à sistemática:


a) Para Pinto Ferreira:
- reduzidas/unitárias: se materializam em um só código. Ex.: CF/88.
- variadas: materializam-se por meio de diversos textos. Ex.: Bélgica/1830; França/1875.

b) Para Paulo Bonavides:


-codificadas: se materializam em um só código.
-legais: materializam-se por meio de diversos textos.

2.8.8. Quanto à dogmática:


a) Ortodoxa: apresenta uma só ideologia. Ex.: Soviética de 1977.
b) Eclética: apresenta ideologias conciliatórias. Ex. CF/88; Índia/1949.
Obs.: Canotilho aproxima a eclética da compromissária (CF/88). Para ele, constituição é produto de
um pacto político e social. É barganha, argumentação, convergência de diferenças.
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2.8.9. Quanto à correspondência com a realidade (critério ontológico – essência) – critério de


Karl Loewenstein:
a) Releitura de Pinto Ferreira:
a’) Normativa: o processo de poder disciplinado na CF (limitação ao poder) se efetiva na prática,
pois, de fato, os agentes do poder se subordinam a ele. Representa a democracia.
a’’) Nominalista: há disposições de limitação de poder na CF, que, entretanto, não se implementam
na prática.
a’’’) Semântica: não há disposições de limitação de poder na CF, a qual se trata de mero
instrumento dos donos do poder. Ou seja, a CF confere legitimidade (formal) aos donos do poder.
Representa o autoritarismo.

b) Releitura de Guilherme Peña de Moraes: para o autor, a CF/88 “pretende ser normativa”.

c) Releitura de Marcelo Neves: para o autor, a CF/88 “é nominalista”. Ele denomina a “semântica”
de “instrumentalista”.

2.8.10. Quanto ao Sistema:


a) Principiológica: predominam os princípios. Ex. CF/88.
b) Preceitual: predominam as regras.

2.8.11. Quanto à Função:


a) Provisória: define o regime de elaboração/aprovação da CF futura e define a estruturação do
poder neste interregno. Erradica os resquícios do antigo regime.
b) Definitiva: é o produto final.

2.8.12. Critério de Manoel Gonçalves Ferreira Filho:


a) Constituição Garantia: garante a liberdade limitando o poder (clássica).
b) Constituição Balanço: é a soviética. Cada constituição da URSS reflete (faz um balanço) um
novo estágio na “marcha para o socialismo”.
c) Constituição Dirigente: traça um plano para a evolução política, pois contém normas
programáticas. Ex.: Constituição Portuguesa.

2.8.13. Critério de André Ramos Tavares:


a) Liberais/Negativas: protege as liberdades e a não intervenção, com absenteísmo estatal.
b) Sociais/Dirigentes: garante atuação positiva do Estado.
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2.8.14. Critério de Raul Machado Horta:


Diz que a CF de 1988 é expansiva por três razões:
a) em conteúdo anatômico estrutural: títulos, capítulos, seções, subseções, artigos, etc.
b) em comparação interna: as constituições brasileiras foram dilatando, se comparadas umas com as
outras.
c) em comparação externa: relaciona a CF de 1988 com as estrangeiras mais extensas.

Obs.: Então, a CF de 1988 é: promulgada; escrita (instrumental); analítica; formal (tende à mista);
dogmática; rígida (para Alexandre de Moraes é super-rígida); reduzida (unitária); eclética
(compromissária); pretende ser normativa; principiológica; definitiva; garantia e dirigente; social;
expansiva.

2.9. Para José Afonso da Silva, quais os elementos das Constituições?


a) elementos orgânicos: regulam a estrutura do Estado e do poder. Ex.: “Da Organização do
Estado”.
b) elementos limitativos: limitam os poderes estatais, manifestando-se nos direitos e garantias
fundamentais (a exceção dos direitos sociais que são socioideológicos).
c) elementos socioideológicos: revelam o compromisso da Constituição entre o Estado
individualista e o Estado social intervencionista. E.: “Dos Direitos Sociais”.
d) elementos de estabilização constitucional: asseguram a defesa da Constituição, do Estado, da
democracia. Ex.: ADI.
e) elementos formais de aplicabilidade: estabelecem regras de aplicação da Constituição. Ex.:
ADCT; Preâmbulo; art. 5º, §1º, CF.

2.10. Quais foram as constituições brasileiras, e quais os seus respectivos traços marcantes?
a) Constituição de 1824:
O “Conselho de Estado” elaborou o projeto desta constituição, que foi outorgada, pois vigorava o
absolutismo, que se revelou no quarto poder: o poder moderador.
A forma de governo era a monarquia hereditária; o território era unitário, com as províncias
subordinadas ao poder central; a religião oficial era a católica apostólica romana (outras religiões
eram permitidas, desde que dentro de seus respectivos templos); a capital do Império Brasileiro era
o Rio de Janeiro.
Poder executivo: exercido pelo imperador; poder legislativo: exercido pela “Assembleia Geral”,
(com a sanção do Imperador), composta pela Câmara dos Deputados e pelo Senado, com eleições
indiretas e voto censitário; poder judiciário: composto por juízes (aplicavam a lei) e por jurados
(apreciavam os fatos), tinha como órgão de cúpula o “Supremo Tribunal de Justiça”; poder
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moderador: criado por Benjamin Constant, era a chave de toda a organização política, e permitia ao
Imperador controlar, de certa forma, os outros 3 poderes.
Era semirrígida, continha rol de direitos Civis e Políticos (por influência da americana de 1776 e da
Francesa de 1789), mas manteve a escravidão até 1888.
Não tinha habeas corpus (que surgiu com o Código Criminal de 1830), mas tutelava, de certa forma,
a locomoção.

b) Constituição de 1981:
Foi a primeira constituição da República do Brasil. Foi promulgada e teve por relator o senador Rui
Barbosa.
Seus traços marcantes eram: presidencialismo; república (dos Estados Unidos do Brasil); federação,
sendo vedada a secessão; 3 poderes (fim do poder moderador); estado laico SEM a invocação de
Deus no preâmbulo e SEM religião oficial; prevê a construção da futura Capital Federal no planalto
central da república, mas a capital continua sendo o Rio de Janeiro.
Era rígida (com cláusulas pétreas); previu expressamente o habeas corpus; aboliu as penas de galés,
de banimento e de morte (salvo militar).
Obs.: em 1932, Getúlio Vargas decretou o Código Eleitoral, que instituiu a Justiça Eleitoral, e
passou a garantir o direito de sufrágio universal, direto e secreto, bem como o direito ao voto
feminino.

c) Constituição de 1934:
Sob a influência da constituição de Weimar, da Alemanha/1919, previu os Direitos Humanos de 2º
geração (estado social).
Seus traços marcantes eram: república; federação; 3 poderes; presidencialismo; os ministros
passaram a ter responsabilidade pessoal e solidária com o presidente; o estado é laico, mas COM a
previsão de Deus no preâmbulo, facultado o ensino religioso nas escolas e o casamento religioso
passou a gerar efeitos civis.
O legislativo deixa de ser bicamerado rígido (ou paritário) e passa a apresentar um “bicameralismo
desigual” ou “unicameralismo imperfeito”, pois o senado é colaborador da câmara.
Era “rígida” e previu expressamente o Mandado de Segurança e a Ação Popular.

d) Constituição de 1937:
A constituição “Polaca”, como ficou conhecida pela influência da constituição Polonesa fascista de
1953, foi elaborada por Francisco Campos e deveria ter sido submetida a um plebiscito, mas nunca
o foi.
O parlamento foi fechado e o legislativo, na prática, nunca chegou a se instalar; o executivo cabia
ao presidente da república, que era a “autoridade suprema do Estado”, eleito indiretamente; o
judiciário foi “esvaziado”, pois o presidente da república podia exercer seu juízo de valor sobre
28

certas decisões judiciais que, se decidido pelo parlamento, ficariam sem efeito. Além disso, a justiça
eleitoral foi extinta, bem como os partidos políticos.
Não foi previsto o mandado de segurança, nem a ação popular; foi ampliada a pena de morte,
podendo ser aplicada para crimes políticos, bem como em casos de homicídio praticado por motivo
fútil com extremos de perversidade. Ademais, foi proibida a greve e o lock-out.
Esta foi uma constituição “semântica”, pois não desempenhou papel algum.

e) Constituição de 1946:
Foi um texto promulgado por Assembleia Constituinte, que representou a redemocratização do
Brasil.
Foi restabelecido o mandado de segurança, a ação popular e o direito de greve. Além disso, foram
vedadas as penas de morte, banimento, confisco e perpétua.
Em 1960 foi transferida para Brasília a Capital Federal; em 1961 o congresso aprova o
parlamentarismo, após a renúncia de Jânio Quadros; em 1963, volta o presidencialismo, por
intermédio de referendo popular; em 1964, a constituição foi suplantada pelo golpe militar.

f) Constituição de 1967:
Na mesma linha da constituição de 1937, o poder foi concentrado no âmbito federal, esvaziando
estados e municípios, o que aproximou o estado do conceito de unitário (golpe no federalismo).
Teoricamente, permaneceu a tripartição de poderes, mas, na realidade, o executivo detinha todo o
poder.
Embora tenha trazido maior eficácia aos direitos dos trabalhadores, previa exageradas
possibilidades de suspensão dos direitos políticos por 10 anos, em seu art. 151.
Em 1968, com o AI-5, o habeas corpus foi suspenso para crimes políticos OU contra a segurança
nacional, ordem econômica e social e economia popular. Além disso, foi excluída da apreciação
judicial aquilo que estivesse de acordo com o AI-5, e o Congresso Nacional foi fechado por 10
meses.

1969: uma emenda constitucional constitucionalizou o AI-5. Época de milagre econômico (Médice)
que se sucedeu por inflação e crise (Geisel). Após, veio a “Lei Falcão”, que reduziu a propaganda
política, prejudicando a oposição, e o “Pacote de Abril de 1977”, quando Geisel dissolveu o
Congresso Nacional.
Foi flexibilizada a rigidez constitucional para aprovação de Emendas Constitucionais e estabelecida
a “avocatória”, que podia suspender os efeitos de decisões de quaisquer tribunais, pela avocação
pelo PGR, em causas relativas à ordem, saúde, segurança e finanças públicas. Além disso, um terço
dos senadores passou a ser eleito pelas Assembleias Legislativas (“Senadores Biônicos”).
“Pacote de Junho de 1978”: revogado o AI-5. Consequentemente, veio a Lei da Anistia
(6.683/1979) e o pluripartidarismo.
29

Apesar da pressão popular com as “Diretas já”, a PEC Dante de Oliveira foi rejeitada e a eleição de
Tancredo Neves foi indireta. Com a morte de Tancredo, assumiu Sarney que instituiu a “Comissão
Afonso Arinos”, que elaborou um anteprojeto de constituição, o qual foi rejeitado, dentre outros
motivos, por prever o parlamentarismo (o que diminuiria os poderes do presidente). Por esta razão,
foi convocada a Assembleia Nacional Constituinte, presidida por Ulysses Guimarães.

g) Constituição de 1988:
A “constituição cidadã” criou o STJ (órgão de convergência da justiça comum), o mandado de
injunção, a ADI por omissão, o mandado de segurança coletivo e o habeas data. Pela primeira vez
aparece um capítulo dedicado ao Meio Ambiente e a Defensoria Pública é alçada à condição de
função essencial à justiça.
30

3. HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL. APLICABILIDADE E INTERPRETAÇÃO DAS


NORMAS CONSTITUCIONAIS. MÉTODOS, CONCEITOS E PRINCÍPIOS DE
INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL. NATUREZA E CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS
CONSTITUCIONAIS. LACUNAS NA CONSTITUIÇÃO, ESPÉCIES E CARACTERÍSTICAS,
PRINCÍPIOS JURÍDICOS E REGRAS DE DIREITO. EFICÁCIA DAS NORMAS
CONSTITUCIONAIS E TUTELA DAS SITUAÇÕES SUBJETIVAS. ORÇAMENTO E RESERVA
DO POSSÍVEL.

AUTOR: GABRIELA LOPES PINTO


MATERIAL DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO-PEDRO LENZA (2014) E ANOTAÇÕES PESSOAIS

3.1. Que razões são apontadas para justificar a tese da especialidade da interpretação
constitucional?
As razões estão ligadas às seguintes características peculiares da constituição: superioridade no
âmbito da hierarquia normativa; fortíssima carga (e relevância) política de seus preceitos; caráter
programático (baixa ou baixíssima densidade normativa de muitos dispositivos constitucionais).

3.2. Quais são os métodos tradicionais de interpretação das normas?


A) Método gramatical – valoriza o sentido vocabular das palavras, a vontade expressa do legislador.
É o início, a primeira etapa da interpretação. O texto é o ponto de partida e o limite colocado ao
intérprete.
Esse método hoje na hermenêutica jurídica e constitucional deve ser apenas o ponto de partida no
momento da interpretação de uma norma, porque muitas vezes interpretando ao pé da letra,
podemos chegar a soluções hermenêuticas injustas (dura lex, sed lex);
B) Método sistemático – valoriza a coerência, a lógica e visa à harmonização e integração das
diversas normas consideradas em conjunto. É aquele método que busca correlacionar todos os
dispositivos normativos de uma Constituição, pois só conseguiremos elucidar a interpretação a
partir do conhecimento integrado
C) Método Histórico – também denominada teleológica subjetiva, tem como meta desvendar qual
foi a intenção do legislador em seu contexto histórico. Consiste na busca dos antecedentes remotos
e imediatos que interferiram no processo de interpretação constitucional. Para entendermos o
sentido atual precisamos entender o “passado” desses institutos, isto é a conjuntura na qual foram
pensados e editados.
D) Interpretação teleológica objetiva – Busca compreender a finalidade social da norma nas
circunstâncias atuais, a vontade abstrata da lei, realizar a finalidade das normas constitucionais,
muitas vezes superando a realidade descrita na norma.
A interpretação teleológica se desenvolve sobretudo sobre os princípios constitucionais Ex: no
sentido da expressão “casa” para a inviolabilidade do domicílio, pode ser estendida a qualquer
domicílio, inclusive profissional, ex: escritório de advocacia.
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E) Método Sociológico – interpreta a Constituição de acordo com a realidade social. Desenvolveu-


se no final do século XIX com o surgimento da Sociologia. No campo da interpretação
constitucional o método sociológico busca a efetividade, a eficácia social para que não se abra um
abismo entre a norma e conjunto dos fatos sociais.
O conceito de KELSEN passa a ser revisto, pois as mudanças na sociedade passam a ser
observadas. Um exemplo disso é a norma que fala que o salário mínimo deve prover as
necessidades básicas; essa norma poderia ser considerada inconstitucional no âmbito da
interpretação sociológica, pois não disse quanto é o valor desse salário, e evidentemente que hoje
temos normas regulando o valor do salário, o qual não consegue cumprir esse preceito de atender a
TODAS as necessidades básicas.

3.3. Quais são os métodos específicos da interpretação constitucional?


A) método científico espiritual - leva em conta a realidade social e os valores subjacentes ao texto
da constituição. Referido na obra de Smend busca potencializar a concretização de soluções
hermenêuticas conciliatórias, sugere, incentiva a busca de soluções que possam promover a coesão
político-social.
Mas às vezes esses métodos podem ser utilizados para promover soluções conciliatórias na
sociedade, para impedir “convulsões” entre grupos de nossa sociedade, ex: a delimitação contínua
das reservas indígenas, com a permissão para as forças armadas adentrarem a reserva para fins de
segurança nacional;
B) método normativo-estruturante - conjuga o elemento literal com os demais elementos dos
métodos clássicos de interpretação.
Criado por Müller, a ideia aqui é que o conceito de norma constitucional é um conceito muito mais
amplo, podendo ser visualizada sobre uma dúplice perspectiva: i) norma constitucional como texto
normativo (ou programa normativo – concretizando a Carta Magna como um produto da
interpretação, que é uma atividade mediadora e concretizadora de finalidades – pensamento de
Hesse = o texto da norma constitucional é a apenas a ponta do iceberg) e ii) norma constitucional
com âmbito normativo. Conceber a ideia de que o cidadão tem o direito de não aceitar atos abusivos
do poder público.
C) método hermenêutico conretizador - Parte da constituição para chegar até o problema, valendo-
se de pré-compreensões sobre o tema subjacente. Nos foi legado por Hesse o papel do intérprete da
Constituição seria um papel construtivo, ativo no desenvolvimento do processo hermenêutico.
Para HESSE, a norma é um produto da interpretação constitucional. Esse processo hermenêutico
seria conduzido pelo que ele denomina de pré-compreensão – conjunto de valores, visões de
mundo, crenças que o intérprete incorpora na sua própria consciência dentro de seu espaço
interpretador, mergulhado numa cultura, num conjunto de valores num dado contexto histórico-
cultural. Exemplo: o tema sobre O DIREITO À MORTE DIGNA – a doutrina e a jurisprudência
mesmo diante da proibição da eutanásia, estão diante de uma realidade histórico-social, que talvez
permita a realização da morte digna, reconhecendo que um paciente em estado terminal retire sua
própria vida em nome da dignidade, e como argumento a favor, poderia se utilizar da ideia de que
assim estaria realizando um direito mais justo;
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D) método tópico-problemático - Percorre o caminho inverso, ou seja, parte do problema, do caso


concreto, para chegar até a norma constitucional aplicável. nos foi legado pelo autor Viehweg
(século XX).
A Tópica é um estilo de pensamento voltado para a busca priorizada do exame do caso concreto,
para a partir daí, escolher uma das opções interpretativas, e posteriormente buscar fundamentar a
sua decisão. Visão totalmente contrária ao positivismo, pois segundo este método a conclusão seria
lógico-dedutiva, sendo que primeiro devemos observamos o caso concreto e depois buscar a norma
que se adequasse a ele;
E) Método concretista da Constituição aberta de Peter Haberle: prega uma interpretação da
Constituição não apenas por juristas, mas por todos e em qualquer lugar. A interpretação
constitucional não pode ser atribuída apenas a um círculo fechado de intérpretes. Todos que vivem
na realidade constitucional podem interpretar. A interpretação deve, portanto, ser democrática,
aberta.

3.4. Quais são os princípios específicos da interpretação constitucional?


A) Supremacia da constituição - O Estado de Direito é criado e regulado por uma constituição.
Assim, a constituição rígida está no topo do ordenamento jurídico, de modo que serve de
fundamento de validade, direta ou indiretamente, a todas as normas do sistema;
B) Presunção de constitucionalidade das leis - decorre do processo legislativo formalmente
concluído a presunção de que o legislador observou os mandamentos constitucionais na feitura da
lei. Tal presunção persiste até a declaração de inconstitucionalidade da lei pelo Judiciário.
Este princípio atribui um ônus argumentativo àquele que sustenta a inconstitucionalidade da lei
perante o Judiciário;
C) Máxima efetividade das normas constitucionais (força normativa da constituição) - a
constituição é vista, na contemporaneidade, como dotada de eficácia normativa, não se trata de
mero conselho ao legislador;
D) Unidade da constituição - a constituição deve ser compreendida como um todo uno, não se deve
interpretar as suas normas ou capítulos como se fossem estanques, de maneira isolada ou
desconectada das demais partes;
E) Proporcionalidade - para solucionar casos que envolvam restrição a direitos fundamentais, deve-
se sopesar os princípios constitucionais envolvidos no conflito por meio de uma análise que parte da
necessidade, verifica a adequação e pondera a proporcionalidade estrita da restrição;
F) Princípio da concordância prática/ harmonização - coordenação e combinação dos bens jurídicos
em conflito para evitar o sacrifício total de uns em relação a outros.
É um pressuposto da proporcionalidade e trabalha com a ideia de que inexiste hierarquia entre os
princípios constitucionais;
G) Princípio da correção funcional/ justeza - fiel observância à repartição constitucional de
competências e funções entre os Poderes;
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H) Princípio do efeito integrador - primazia dos critérios que favoreçam a integração política e
social e o reforcem a unidade política;
I) Princípio da interpretação conforme - diante de uma norma infraconstitucional que seja
plurissignificativa, deve-se privilegiar o sentido que mais se aproxima da constituição.

3.5. O que é a sociedade aberta dos intérpretes da constituição? Há institutos relacionados no


ordenamento jurídico brasileiro?
É a ideia, formulada por Peter Haberle, segundo a qual a interpretação constitucional não deve ser
monopólio do Poder Judiciário ou, ao menos, não deve ser monopólio de um único órgão público.
Pode-se admitir que o Judiciário (ou o tribunal constitucional) tenha a última palavra, mas não que
monopolize a discussão. Os cidadãos devem participar, órgãos públicos diversos também.
São institutos de direito positivo que exprimem tal abertura: o controle difuso, a ampliação da
legitimidade ativa para o controle concentrado, o amicus curiae, as audiências públicas.

3.6. O que se entende por criação judicial do Direito?


É o fenômeno do Direito contemporâneo, bastante aprofundado pela jurisdição constitucional, que
se manifesta pela transformação do papel atribuído aos juízes e tribunais na sociedade, de modo que
estes deixam de ser meros aplicadores das leis e assumem postura mais ativa com a função de criar
Direito, seja preenchendo os espaços deixados pela omissão legislativa, seja delimitando a
amplitude de direitos fundamentais.

3.7. Quais são as formas mais adotadas pela doutrina para classificar as constituições?
Quanto ao conteúdo – divide as constituições em (i) materiais e (ii) formais:
A constituição material é concebida em sentido amplo e em sentido estrito. No primeiro, identifica-
se com a organização total do Estado, com regime político. No segundo, designa as normas
constitucionais escritas e costumeiras que regulam a estrutura do Estado, a organização de seus
órgãos e os direitos fundamentais.
A constituição formal é o documento solenemente estabelecido pelo poder constituinte e somente
modificado por processos e formalidades previamente estabelecidos.
Quanto à forma – (i) constituição escrita, quando codificada e sistematizada num texto único,
elaborado por um órgão constituinte, encerrando todas as normas tidas como fundamentais sobre a
estrutura do Estado; (ii) não escrita, quando as normas não constam em um documento único e
solene, mas que se baseia essencialmente nos costumes, na jurisprudência e em convenções e em
textos constitucionais esparsos.
Quanto ao modo de elaboração – (i) constituição dogmática, escrita, é a elaborada por um órgão
constituinte, e sistematiza os dogmas ou ideias fundamentais da teoria política e do Direito
dominantes no momento. (ii) constituição histórica ou costumeira, não escrita, é resultante de lenta
transformação histórica, do lento evoluir das tradições, dos fatos sócio-políticos, que se cristalizam
como normas fundamentais de organização de determinado Estado.
34

Quanto à origem: (i) constituições populares, ou democráticas, são aquelas que se originam de um
órgão constituinte composto por representantes do povo, eleitos para o fim de elaborar a
constituição. (ii) outorgadas, são aquelas elaboradas e estabelecidas sem a participação do povo, ou
seja, impostas unilateralmente pelo governante. (iii) constituição cesarista é aquela formada por
plebiscito popular sobre um projeto elaborado pelo governador ou por um ditador. A participação
popular, nesses casos, não é democrática, pois visa apenas ratificar a vontade daquele de detém o
poder.
Quanto à estabilidade: (i) constituições rígidas somente são alteradas por processos formais
especiais e mais difíceis que os de formação das leis ordinárias e complementares. (ii) a constituição
flexível permite ser livremente modificada pelo legislador pelo mesmo processo de criação das leis
ordinárias. (iii) semi-rígida é a constituição que contém uma parte rígida e outra flexível.
Quanto à extensão: (i) sintética, aquele que veicula apenas os princípios fundamentais e estruturais
do Estado; (ii) analítica é aquela que aborda todos os assuntos que os constituintes entenderem por
fundamentais.

3.8. As constituições contemporâneas são compostas por quais elementos?


As constituições contemporâneas reúnem matérias diversas, entendidas como fundamentais para
coletividades. José Afonso da Silva divide tais elementos em cinco categorias:
(i) elemento orgânico: normas que regulam a estrutura e funcionamento do Estado;
(ii) elemento limitativo: normas que preveem os direitos e garantis fundamentais: direitos
individuais e suas garantias, direitos de nacionalidade e direitos políticos e democráticos. São
limitativos porque limitam a ação dos poderes estatais.
(iii) elementos sócio-ideológicos: revelam o caráter de compromisso das constituições modernas
entre o Estado individualista e o Estado social.
(iv) elementos de estabilização constitucional: destinados a assegurar a solução de conflitos
constitucionais, a defesa da constituição e das instituições democráticas.
(v) elementos formais de aplicabilidade: são as regras de aplicação da constituição, como o
preâmbulo e as disposições constitucionais transitórias.

3.9. Como as normas constitucionais podem ser classificadas em relação à sua eficácia e
aplicabilidade?
Segundo José Afonso da Silva, as normas constitucionais podem ser divididas, quanto a sua
capacidade de produzir efeitos jurídicos, em três categorias:
Normas constitucionais de eficácia plena são aquelas cuja aplicabilidade é direta, imediata e
integral, não dependendo de norma infraconstitucional.
Normas de eficácia contida possuem aplicabilidade direta e imediata, podendo, todavia, ter sua
abrangência restringida por norma infraconstitucional. Enquanto não editada a lei restritiva, a norma
constitucional de eficácia contida produzirá todos os seus efeitos.
35

Normas de eficácia limitada têm aplicação mediata e diferida. Necessitam de norma integrativa
infraconstitucional para produzir efeitos.
As normas de eficácia limitada ainda se dividem em:
(i) normas de princípio institutivo ou organizativo: traçam esquemas de estruturação de órgãos,
instituições ou entidades;
(ii) normas de princípios programáticos: estabelecem princípios e metas a serem cumpridos pelo
Estado.

3.10. Como se classifica a nossa atual Constituição?


A Constituição brasileira de 1988 pode ser classificada como sendo promulgada, pois é fruto de
debates políticos entre os representantes do povo.
É escrita, devendo ser alterada por meio de emendas constitucionais.
É analítica, pois aborda todos os temas considerados fundamentais pelos representantes do povo.
Trata-se de uma Constituição formal quanto ao conteúdo, elegendo como critério o processo de
formação e não o conteúdo das normas para defini-las como constitucional ou não.
É dogmática e também super-rígida, já que além de um processo de modificação mais dificultoso e
solene do que o processo de formação das leis possui cláusulas pétreas que são imutáveis.
É reduzida, já que se materializa em um único documento legislativo, apesar de alguns a intitularem
de variada, vez que também fazem parte da Constituição as Emendas Constitucionais que não
integraram o texto da Constituição e os tratados internacionais de direitos humanos aprovados com
quorum de 3/5, em dois turnos, pelas duas casas do Congresso Nacional.
É também eclética, pois é formada por diversas ideologias e pretende ser normativa.

3.11. O que se entende por “Constituição Plástica”?


Pinto Ferreira versa que o termo “Constituição Plástica” é sinônimo de Constituição flexível, que
pode, portanto, ser alterada pelo mesmo processo de formação das leis, ou até mesmo por um
processo ainda mais facilitado.
Já Raul Machado Horta entende que Constituição Plástica é aquela que tem capacidade de se
adaptar ao futuro sem a necessidade de emenda constitucional. Nesse sentido, a constituição deve
ser principiológica, não podendo ser muito detalhista. Um exemplo de Constituição Plástica nesse
sentido seria a Constituição dos EUA.

3.12. Qual a origem filosófica do direito ao mínimo existencial?


Na antiguidade, o mínimo existencial relacionava-se, especialmente nas sociedades grega e romana,
à ideia de vida própria, corpo, alimentação, roupas e ferramentas básicas de trabalho.
Quanto às sociedades de cunho escravocrata, houve um retrocesso, pois o mínimo existencial era
relacionado à propriedade privada( corpo do escravo pertencia ao seu dono).
36

O movimento jusnaturalista trouxe a primeira geração de direitos humanos, as liberdades públicas


alavancavam o direito ao mínimo existencial. Com a constituição mexicana de 1917 e a alemã de
1919 houve um avanço do caráter do mínimo existencial aos direitos sociais.

3.13. Qual a origem jurídica do direito ao mínimo existencial?


Seria o mínimo necessário que o indivíduo precisa para não morrer. Porém, a defensoria sustenta
que na verdade seria o mínimo necessário para se viver com dignidade. Haveria assim, uma
diferença fundamental entre o mínimo vital e o mínimo existencial.
O primeiro reconhecimento jurídico do que seria o mínimo existencial veio da Alemanha, em seu
Tribunal Federal Administrativo, em 24 de junho de 1954.
Ainda na Alemanha, o tribunal constitucional federal reconheceu status constitucional ao mínimo
existencial.

3.14. Qual a natureza jurídica e o conceito do mínimo existencial?


O mínimo existencial é o núcleo duro do princípio da dignidade da pessoa humana. Tudo o que é
mínimo existencial é dignidade, mas nem tudo que é dignidade é mínimo existencial.
O mínimo existencial é norma-regra (os outros efeitos que se irradiam da dignidade seriam normas-
princípio). Assim, por ser consenso (regra), o mínimo existencial está amplamente sujeito à
fiscalização judicial, enquanto que as questões periféricas da dignidade humana (princípio) estariam
sujeitas à deliberação de políticas públicas.
A norma, como sabemos, ou é regra (submete-se aos critérios de validade/aplicação) ou é princípio
(admite-se a colisão e a aplicação de um não exclui a aplicação de outro).
Destarte, podemos dizer quero mínimo existencial está para a regra assim como a dignidade está
para princípio. Não há nenhuma hipótese de ponderação do mínimo existencial, podendo o
judiciário tutela-lo.

3.15. Qual o objeto do mínimo existencial?


O mínimo existencial tem caráter universal (universalíssimo de confluência ou de chegada) e é
absoluto (não admite relativizações, até porque tem a natureza de regra). Há uma concepção
absoluto-dinâmica (embora o mínimo existencial não admita restrições –absoluto - o seu conteúdo
pode variar no tempo espaço-dinâmico).
Abrange direitos de primeira e segunda geração. Como não admite relativizações, só permite que as
condições mínimas sejam aumentas, nuca reduzidas (proibição do retrocesso).

3.16. Quem são os titulares do mínimo existencial?


As pessoas físicas, mas também se pode falar de mínimo existencial para a pessoa jurídica (ex:
acesso a justiça, direito fundamental baseado na dignidade, por se tratar de um elemento
instrumental do mínimo existencial, as pessoas jurídicas podem se valer da justiça gratuita, em
alguns casos).
37

3.17. Quem são os destinatários do mínimo existencial?


O destinatário principal é o Estado, como destinatários secundários, estão as pessoas físicas e as
jurídicas (ex: alimentos, crédito consignado).

3.18. O que é “Reserva do Possível”?


Alegada a partir da década de 1970 e criada pelo Tribunal Constitucional Federal Alemão – não
obsta, de maneira genérica, a concretização do direito fundamental.
De acordo com teoria alemã, a efetivação dos direitos sociais estaria limitada às possibilidades
orçamentárias do Estado, na medida em que os direitos prestacionais representam custos aos cofres
públicos. O STF em decisões reiteradas afirmou que a reserva do possível não pdoe ser oposta ao
mínimo existencial.

3.19. No que consiste o grau mínimo de eficácia de direitos sociais?


Com base no neoconstitucionalismo e no ativismo judicial, alguns tribunais pátrios, incluindo o
STF, vêm relativizando a teoria da aplicabilidade das normas constitucionais, defendendo a
aplicabilidade imediata (eficácia plena) de normas programáticas que digam respeito ao mínimo
existencial (grau mínimo de eficácia de direitos sociais) atrelado à dignidade da pessoa humana com
base no princípio da proporcionalidade.
Com isso, direitos como educação e saúde estão sendo aplicados de forma imediata com base no
mínimo existencial e o judiciário, nesses casos, vem relativizando a reserva do possível (limitações
orçamentárias) e suprindo omissões dos poderes públicos no que tange a direitos sociais.

3.20. (MPF CONCURSO 26) Fale sobre jurisdição constitucional e instância


contramajoritária. Nossa democracia é substantiva, não vale a mera regra por maioria.
A democracia (decisão tomada pela maioria) e o constitucionalismo (proteção de direitos e
limitação de poder) convivem. Vontade da maioria cede em razão do constitucionalismo, a vontade
da maioria não pode ferir direito fundamental.
No Estado Democrático de Direito deve ser preservado o direito das minorias: a vontade da maioria
não pode ferir direitos da minoria constitucionalmente assegurados. Assim, Judiciário (imparcial)
vai proteger o direito das minorias. Democracia exige o governo do povo (maioria), mas com
respeito aos direitos fundamentais.
A função contramajoritária que o STF desempenha no Estado Democrático de Direito, de modo a
conferir efetiva proteção às minorias, é exemplificado com a política de quotas e o reconhecimento
de união homoafetiva, por constituírem proteção ao direito das minorias.
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3.21. (MPF CONCURSO 26): Falar sobre ativismo judicial.


É uma postura mais ativa do Judiciário na implementação de direitos. O PJ deve ter uma postura
mais ativa quando os demais Poderes se omitem. Exemplo: direito de greve dos servidores públicos.
Em regra, quando a CF determina a implementação de políticas públicas, isso é dirigido ao
Legislativo e ao Executivo, poderes de natureza política, pois são eles que têm o controle do
orçamento e farão isso na medida do possível (reserva do possível). Porém, diante da inércia deles,
surge o ativismo judicial (possibilidade de concretização destes direito pelo Judiciário).
Ativismo judicial: ocorre quando Judiciário pode interpretar com mais liberdade, e não com apego
exacerbado ao texto. Por isso, o Judiciário atua em áreas que seriam ocupadas por órgãos políticos.
Ex: políticas públicas.
O oposto de ativismo judicial é o Self restraint (ou auto-contenção).

3.22. Qual a diferença entre ativismo judicial e self restraint (auto-contenção)?


Ativismo judicial: Judiciário faz aplicação direta da CF (exceto normas de eficácia limitada),
independente de intermediação de lei. É a filtragem constitucional: é a lei que deve estar em
conformidade com a CF e não o contrário.
Judiciário atua nos campos tradicionalmente reservados aos órgãos políticos. Ex: políticas públicas.
Controle de constitucionalidade com critérios menos rígidos: Judiciário declara quando
inconstitucionalidade for aparente. Ex: violou razoabilidade, proporcionalidade.
Self restraint: Não aplica CF em situações que não estejam expressamente em seu âmbito de
incidência. Redução do âmbito de aplicação da CF.
O Judiciário se autolimita e não interfere em matérias da competência de órgão político. Isso reduz
a aplicação da CF pelo Judiciário. Executivo e Legislativo é que concretizam a CF, são eles que
atuam nas políticas públicas.
Controle de constitucionalidade mais rígido: Judiciário só declara norma inconstitucional quando
tiver clara inconstitucionalidade. É o weak judicial review.

3.23. (Oral AGU 2009) Definir interpretavismo e não-interpretativismo; qual dos dois acima
"seria mais útil" para o ativismo judicial.
São correntes do direito americano.
Interpretativismo: a interpretação tem que seguir legislador constitucional originário, pois isso
respeita a vontade popular. Está mais ligado ao positivismo e Constitucionalismo liberal ou
clássico. Há um respeito absoluto ao texto da CF. Segue a vontade original de quem elaborou a CF.
Não interpretativismo: O Judiciário tem o dever de evoluir o texto constitucional (ativismo judicial),
cada geração interpreta a CF de uma forma, não pode ficar preso ao constituinte originário. Vai
além do que está expresso no texto.
Ativismo judicial: postura mais ativa do Judiciário na concretização dos direitos. Ex: greve dos
servidores públicos.
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3.24. Fale sobre as teorias dialógicas no contexto da interpretação constitucional:


As teorias dialógicas são um conjunto de teorias que se baseiam na ideia de que a proteção dos
Direitos Fundamentais não é monopólio do Judiciário.
A melhor maneira de proteger direitos fundamentais não é por decisão judicial, mas por meio de
dialogo entre Judiciário, Executivo, Legislativo e sociedade civil. Esta comunicação vai fortalecer
proteção dos direitos fundamentais, pois vai propiciar melhor debate.
Disso surge o diálogo institucional (acho que esta é uma das teorias dialógicas). O diálogo
institucional prega o diálogo entre as diversas instituições do Estado. Provoca a COMUNICAÇÃO
entre os Poderes; as decisões SÃO CONSTRUÍDAS por decisão comum e não impostas; não
importa quem tem a última palavra, pois sempre será possível uma reação a esta última palavra,
desde que nos limites da CF. Ex: decisão em ADI vincula Judiciário e Administração, mas não o
Legislativo, que pode reagir e elaborar norma de igual conteúdo. Isso provoca diálogo, pois STF irá
reapreciar a lei; audiências públicas. Tudo isso promove o debate entre os Poderes.
Críticas a ela:
a) CF dá pouca abertura ao diálogo, pois há um rígido sistema de controle de constitucionalidade.
As possibilidades são remotas. Ex: decisão em ADI não vincula Legislativo; o Senado pode ampliar
efeitos da decisão do STF, suspendendo a norma impugnada (art. 52, X).
b) O Legislativo está desacreditado devido à sua omissão. Então, como promover o diálogo?

3.25. O que se entende por eficácia vertical e eficácia horizontal dos direitos fundamentais?
A distinção diz respeito aos sujeitos que figuram nas relações jurídicas envolvendo direitos
fundamentais.
Assim, por eficácia vertical, entende-se o tipo de produção de efeitos da clássica relação entre
Estado e pessoas, em geral com o primeiro no pólo passivo.
Por eficácia horizontal temos a aplicação dos direitos fundamentais nas relações privadas, entre
particulares. Esta, por sua vez, subdivide-se em:
(i) eficácia horizontal mediata ou indireta, que abrange as situações em que os direitos
fundamentais se aplicam às relações privadas por meio de lei infraconstitucional. (Ex:
Código Civil, Código Penal, Consolidação das Leis Trabalhistas); e
(ii) eficácia horizontal imediata ou direta, pertinente às relações em que os direitos se aplicam
imediatamente nas relações privadas sem a necessidade lei infraconstitucional. Ex:
entendimento do STF de que para se excluir um associado de uma associação, deve-se
respeitar o contraditório e a ampla defesa (considerando assim princípios tipicamente de
relação vertical com o Estado em relações horizontais).
40

3.27. Qual a definição de lacuna constitucional e como estas podem ser sistematizadas?
Na definição elementar de Jorge Miranda, uma lacuna constitucional ocorre quando há uma
situação constitucionalmente relevante não prevista. A definição requer algumas observações.
Conforme Gilmar Mendes e Paulo Branco, primeiro, há que se discernir se não houve omissão
proposital, se o constituinte não deixou de disciplinar a matéria intencionalmente para que o fosse
em movimento oportuno, sem a rigidez constitucional. Gilmar Mendes denomina tais situações
como de “silêncio eloquente” do constituinte. Seria o exemplo da não menção a leis e atos
normativos municipais no artigo 102, I, a, da CFB.
Na hipótese em que há apenas um lapso do constintuinte, uma omissão não pretendida, tem-se uma
lacuna de formulação. Um exemplo seria a omissão do Governador do DF como legitimado a a
propor ADIN perante o STF até a EC 45/2004, muito embora o Governador de Estado tivesse essa
prerrogativa desde o início. A analogia é um método integrativo de grande valia nessas casos.
Pode ocorrer ainda que o constituinte não tenha se atentado à necessidade de disposição transitória,
de período de adaptação no plano da realidade, para que a norma que redigiu produza os fins
desejados. Assim, o intérprete entende pertinente que sejam incluídos, suprimidos ou modificados
alguns elementos estruturais da norma constitucional de modo que o caso concreto seja
pertinentemente regulado. Este tipo de lacuna recebe a designação de lacuna axiológica.
Note-se, que no caso da lacuna axiológica, há o pressuposto de um legislador racional e um
ordenamento ótimo, ambos ideais e coerentes, que servem ao menos de ponto de partida
hermenêutico. Desta premissa empodera-se o intérprete para lançar mão de recursos como a
descoberta de lacunas axiológicas para manter a integridade e unidade do sistema jurídico.
J. J. Gomes Canotilho aborda o assunto partindo da afirmação de que uma lacuna normativo-
constitucional só existe quando se verifica uma incompletude contrária à ordenação constitucional.
Assim, tem-se uma lacuna constitucional autônoma quando, a despeito da ausência de disciplina
jurídica no complexo normativo-constitucional, a solução par ao caso pode ser extraída a partir do
plano regulativo da constituição, bem como da teleologia da regulamentação constitucional. Esta
espécie de lacuna se diferencia, assim, das lacunas constitucionais heterônomas, que advém do não
cumprimento de ordens de legislar e das imposições constitucionais constitucionalmente expressas;
e das integrações corretivas, que se fundamentam na ideia de que a normatização constitucional, sob
o ponto de vista político, é incompleta, errada ou necessita de aprimoramento (à semelhança na
definição de lacuna axiológica de Gilmar Mendes e Paulo Branco).
41

4. PODER CONSTITUINTE. PERSPECTIVAS HISTÓRICAS. PODER CONSTITUINTE


ORIGINÁRIO. PODER CONSTITUINTE DERIVADO E DECORRENTE. PODER
CONSTITUINTE SUPRANACIONAL. NOVA CONSTITUIÇÃO E ORDEM JURÍDICA
ANTERIOR: RECEPÇÃO, REPRISTINAÇÃO, DESCONSTITUCIONALIZAÇÃO, RECEPÇÃO
MATERIAL DE NORMAS CONSTITUCIONAIS. APLICAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO NO
TEMPO E NO ESPAÇO.

AUTOR: JÚLIA ARAÚJO DE ABREU


MATERIAIS DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO – PEDRO LENZA (2014); CURSO DE DIREITO
CONSTITUCIONAL – GILMAR FERREIRA MENDES E PAULO GUSTAVO GONEL (2012); CURSO DE DIREITO
CONSTITUCIONAL – BERNARDO GONÇALVES FERNANDES (2011); CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL – DIRLEY DA
CUNHA JÚNIOR (2008).

4.1. O que se entende por Poder Constituinte?


O Poder Constituinte é aquele ao qual incumbe criar, alterar ou complementar uma Constituição.

4.2. A quem pertence a titularidade do Poder Constituinte?


Em uma perspectiva clássica, o Poder Constituinte pertence à NAÇÃO, entendida como elemento
sociológico formado por um compartilhamento homogêneo de tradições, língua, religião (Sieyès).
A versão moderna transmite a titularidade da Nação para o POVO, abarcando uma noção mais
pluralista. Nesse sentido, o parágrafo único do art. 1º da CF/88 estabelece que “todo poder emana
do povo”.

4.3. Quem exerce o Poder Constituinte?


O exercício do Poder Constituinte pode se dar de duas formas: democrática (poder constituinte
legítimo) ou autocrática (poder constituinte usurpado).
O exercício autocrático caracteriza-se pela outorga, isto é, o estabelecimento do Constituição pelo
indivíduo ou grupo líder do movimento revolucionário que chegou ao poder. É ato unilateral do
governante. Há o exercício do poder constituinte pela única vontade do detentor do poder. Temos,
neste caso, o poder constituinte usurpado.
O exercício democrático do poder constituinte ocorre pela Assembleia Nacional Constituinte ou
Convenção: o povo escolhe seus representantes (democracia representativa), que formam o órgão
constituinte, incumbido de elaborar a Constituição do tipo promulgada.

4.4. O que é “hiato constitucional”?


Também chamado de “revolução”, trata-se de expressão cunhada por Ivo Dantas. Ocorre quando se
verifica um choque entre o conteúdo da Constituição política e a realidade social.
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Diante desta interrupção de continuidade, vários fenômenos poderão surgir, dentre os quais: a)
convocação da Assembleia Nacional Constituinte e elaboração de nova Constituição; b) mutação
constitucional; c) reforma constitucional; d) hiato autoritário (ilegítima outorga constitucional).

4.5. O que é Poder Constituinte Originário?


O Poder constituinte originário também é chamado de inicial, inaugural, genuíno ou de primeiro
grau. Trata-se de uma prerrogativa extraordinária que ocorre em um momento extraordinário e
instaura uma nova ordem constitucional, rompendo por completo com a ordem jurídica anterior, se
existente. Pode ser subdividido em:
1.a) Histórico – estrutura, pela primeira vez, o Estado; ou
1.b) Revolucionário – posterior ao histórico, desconstitui a ordem anterior e constitui uma nova;
2.a) Formal – ato de criação propriamente dito, que confere o status constitucional à norma; ou
2.b) Material – estabelece o que é constitucional (perspectiva substancial).

4.6. Qual a natureza jurídica do Poder Constituinte Originário?


Existe uma pluralidade de teorias que buscam explicar a natureza jurídica do Poder Constituinte
Originário:
a) Trata-se de um poder DE DIREITO (ou poder jurídico), porque assentado no direito natural, que
é anterior e superior a qualquer direito posto (Manoel Gonçalves Ferreira Filho).
b) É um poder DE FATO (ou poder político). Ou seja, funda a si próprio, considerando que o
Direito se expressa de forma máxima na Constituição, primeira norma jurídica posta (Celso Bastos,
Raul Machado Horta) – Posição majoritária.
c) Possui natureza HÍBRIDA: como ruptura é um poder de fato; na elaboração de sua obra é poder
de direito (Canotilho, Paulo Bonavides).

4.7. Cite as características do Poder Constituinte Originário.


A doutrina dominante aponta as seguintes características do Poder Constituinte Originário:
a) INICIAL – marco inicial da ordem jurídica e do Estado;
b) AUTÔNOMO – só a ele cabe fixar os termos da nova Constituição;
c) ILIMITADO – não tem que respeitar os limites postos pelo direito anterior (há ressalvas);
d) INCONDICIONADO – soberano na tomada de suas decisões, não se submete a qualquer forma
prefixada para criação da nova ordem (ele mesmo estabelece as regras procedimentais para
elaboração da nova Constituição);
e) PERMANENTE – não se exaure com a elaboração da nova Constituição (há ressalvas);
f) INALIENÁVEL - não pode ser transferido e nem usurpado de seu verdadeiro titular.
43

4.8. O Poder constituinte Originário é ilimitado?


Sobre o tema, há três teorias:
a) Para a teoria POSITIVISTA, é ilimitado, tomando como ponto de vista do Direito Positivo
anterior (natureza jurídica de poder de fato).
b) Para a teoria JUSNATURALISTA, não é ilimitado, pois deve respeitar cânones do Direito
Natural, derivados da própria natureza humana.
c) Para a teoria SOCIOLÓGICA, é ilimitado em relação ao direito anterior, mas guarda um limite
no movimento revolucionário que o alicerçou (na ideia de direito que o fez surgir).
Há autores que indicam, ainda, outros limites ao Poder Constituinte Originário: a) valores sociais e
éticos de uma sociedade; b) direitos fundamentais conquistados por uma sociedade e sobre os quais
haja consenso profundo (proibição do retrocesso); c) normas de Direito Internacional, sobretudo
aquelas referentes a direitos humanos.

4.9. O Poder Constituinte Originário é permanente ou transitório?


Quanto a este ponto, é importante distinguir titularidade e exercício.
No que se refere à titularidade, pertencente ao Povo, entende-se que se trata de poder permanente,
eis que não se exaure com a edição da nova Constituição, podendo vir a se manifestar novamente.
Já quanto ao exercício, concernente ao agente propriamente dito que elaborou o novo texto (nas
democracias, a Assembleia Nacional Constituinte), o Poder Constituinte se extingue após a criação,
sendo, portanto, transitório.

4.10. O que é Poder Constituinte Derivado?


O Poder Constituinte Derivado também é chamado de instituído, constituído, secundário, de
segundo grau ou remanescente.
Trata-se de um poder jurídico, criado pelo Poder Constituinte Originário, sendo, portando, limitado
e condicionado aos parâmetros por este impostos. É, assim, uma competência constitucional
concedida pelo Poder Originário (o verdadeiro Poder Constituinte) a certos órgãos constituídos.

4.11. Discorra sobre o Poder Constituinte Derivado de Reforma.


Trata-se de um gênero que abarca duas espécies: Revisor e Reformador.
O Revisor relaciona-se à Revisão Constitucional, que é uma reforma global do texto por meio de
um procedimento simplificado (quórum de votação: maioria absoluta do Congresso Nacional).
Trata-se de via extraordinária, e foi prevista no art. 3º do ADCT. A revisão já ocorreu no ano de
1993 e, com base no referido dispositivo, não pode haver uma nova revisão constitucional no Brasil.
O Reformador, por seu turno, se manifesta por meio de emendas constitucionais (arts. 59, I e 60 da
CRFB/88), que requerem votação em dois turnos, por 3/5 de cada Casa do Congresso Nacional.
44

4.12. O Poder Constituinte Derivado Reformador é ilimitado?


NÃO. Podem ser impostos diversas espécies de limites ao Poder Reformador:
a) Limites TEMPORAIS – verifica-se quando o Poder Originário proíbe a sua manifestação em
determinado lapso temporal, possivelmente com o intento de buscar uma certa estabilização das
relações jurídicas durante um determinado momento no tempo. Conforme doutrina majoritária, a
Constituição de 1988 NÃO estabeleceu limitação temporal para o Poder Reformador (apenas para o
Revisor), embora o Min. Dias Toffoli já tenha entendido que a previsão do art. 60, §5º seria uma
limitação temporal (a doutrina entende que esta seria uma limitação formal).
b) Limites CIRCUNSTANCIAIS – o texto pode vedar sua alteração em determinados períodos de
agitação política extrema, em razão de fatores naturais ou sociais. Trata-se de períodos
excepcionais, nos quais a livre manifestação do Poder Derivado esteja ameaçada. A CRFB/88
previu três limitações circunstanciais: intervenção federal, estado de sítio e estado de defesa.
c) Limites FORMAIS ou PROCEDIMENTAIS - estabelecem determinados procedimentos a serem
observados no caso de alteração da Constituição. Podem ser de ordem subjetiva (trata da
competência para iniciar o processo legislativo de reforma) ou objetiva (trata do procedimento para
aprovação da proposta). A CRFB/88 prevê diversas limitações formais: art. 60, I, II e II (limitações
subjetivas) e §§2º, 3º e 5º (limitações objetivas).
d) Limitações MATERIAIS – impedem a inserção de matérias na Constituição (limites de cunho
inferior) ou a supressão de determinados temas previstos no texto (limites de cunho superior).
Podem ser expressas ou implícitas. A CRFB/88 previu limitações materiais expressas no art. 60, §4º
(cláusulas pétreas): forma federativa de Estado; voto direto, secreto, universal e periódico;
separação dos Poderes; direitos e garantias individuais.
A instituição de cláusulas pétreas se justifica pelas seguintes razões: a) preservar a intangibilidade
material da Constituição; b) proteger institutos e valores essenciais; c) assegurar a continuidade do
processo democrático.
Como limitações IMPLÍCITAS, a doutrina aponta:
a) o próprio art. 60 (o Poder Reformador não poderia alterar as próprias limitações explicitamente
impostas pelo Poder Originário);
b) titularidade do poder constituinte originário e derivado;
c) princípios fundamentais.

4.13. O que é teoria da dupla revisão? Ela é admitida no Direito brasileiro?


Segundo essa teoria, é possível primeiro fazer uma alteração na Constituição para afastar o limite ao
Poder Reformador e, em seguida, uma outra para modificar o texto constitucional originariamente
protegido. Seria o caso, por exemplo, de revogar o art. 60, §4º, inciso IV, para instituir a pena de
morte para qualquer crime.
Majoritariamente, a teoria da dupla revisão NÃO é admitida no Brasil, porquanto se revela, em
verdade, uma burla à Constituição.
45

4.14. O sistema presidencialista e a forma republicana são limitações materiais ao Poder


Reformador?
Em que pese não estarem previstos expressamente como cláusula pétreas, essa questão surge em
decorrência do plebiscito realizado para definir a forma e o sistema de governo.
Para uma primeira corrente, não são limitações implícitas, não havendo óbice para alteração.
Para outra corrente, são limitações, sob pena de violação à separação de poderes - isto porque o
Poder Constituinte Originário transferiu para o povo a decisão soberana sobre estes dois assuntos.

4.15. O que é Poder Constituinte Derivado Decorrente?


É aquele responsável pela estruturação ou modificação das Constituições dos Estados-Membros e
da Lei Orgânica do Distrito Federal, em virtude da capacidade de auto-organização atribuída a estes
entes pelo Poder Constituinte Originário. Pode ser:
a) inicial – responsável pela criação do texto (caráter de complementaridade em relação à CF); ou
b) de revisão – responsável por alterações no texto.
Se manifesta por meio de Assembleias Legislativas (Estados) ou Câmara Legislativa (DF).

4.16. O Poder Derivado Decorrente é ilimitado?


NÃO. São impostos os seguintes limites ao Poder Constituinte Derivado Decorrente:
a) Princípios constitucionais SENSÍVEIS (art. 34, VII, CRFB/88);
b) Princípios constitucionais EXTENSÍVEIS - aqueles que integram a estrutura da federação
brasileira (ex.: forma de investidura em cargos eletivos);
c) Princípios constitucionais ESTABELECIDOS (ou organizatórios), que são extraídos da
interpretação em conjunto de normas centrais dispersas no texto da CRFB/88, e podem ser de
quatro espécies:
c.1) Limites explícitos vedatórios - não pode estabelecer atos ou procedimentos contrários ao
constituinte originário (ex.: limitações ao poder de tributar);
c.2) Limites explícitos madatórios – são aqueles que restringem a liberdade de organização (ex.:
normas para criação de Municípios);
c.3) Limites inerentes – vedam a invasão de competência, podendo ser explícitos ou implícitos;
c.4) Limites decorrentes – advém de disposições expressas da CF (ex.: princípio republicano).

4.17. O que se entende por princípio da simetria?


De acordo com o princípio da simetria, o modelo estabelecido na CRFB/88 deve ser observado
pelas Constituições Estaduais, Leis Orgânicas Municipais e do Distrito Federal. É extraído dos arts.
25 e 29 da CRFB/88, bem como do art. 11 do ADCT.
46

4.18. Os Municípios se manifestam por meio de Poder Constituinte Derivado Decorrente?


NÃO. Enquanto o Poder Derivado Decorrente é de segundo grau, visto que extrai sua fonte de
legitimidade diretamente da CRFB/88, no caso dos Municípios se percebe um poder de terceiro
grau para criação de suas Leis Orgânicas, uma vez que mantêm relação de subordinação tanto com
o poder constituinte estadual quanto com o federal.

4.19. O que se entende por Poder Constituinte Difuso?


Trata-se de um poder de fato que fundamenta os mecanismos de MUTAÇÃO
CONSTITUCIONAL. Encontra-se em estado de latência e decorre de fatores sociais, políticos e
econômicos. É um procedimento informal de alteração da Constituição, pelo qual há mudança de
seu sentido e não o seu texto.

4.20. Existe um Poder Constituinte Supranacional?


Segundo Pedro Lenza, o Poder Constituinte Supranacional busca a sua fonte de validade na
cidadania universal, no pluralismo de ordenamentos jurídicos, na vontade de integração e em um
conceito remodelado de cidadania.
Marcelo Neves aponta uma tendência mundial de superação do “constitucionalismo provinciano ou
paroquial pelo transconstitucionalismo”, mais adequado para a solução de problemas referentes a
direitos humanos e de organização legítima de poder.
Nessa senda, Canotilho sugere a formulação de uma teoria da interconstitucionalidade; e Souza
Neto e Sarmento veem um processo de constitucionalização do Direito Comunitário europeu (mas
não se vislumbra, ainda, a existência de um poder constituinte neste continente).

4.21. O Poder Constituinte deve respeitar direitos adquiridos?


Segundo a jurisprudência do STF (RE 140.894), não se reconhece a invocação de direitos jurídicos
que sejam contrários à ordem constitucional em vigor, justamente porque só se entende como
direito aquele que é compatível com a Constituição e dela retira seu fundamento de validade.
As normas constitucionais originárias, em regra, têm retroatividade MÍNIMA (atingem os efeitos
dos fatos anteriores, verificados após sua entrada em vigor), mas podem ter retroatividade
MÁXIMA (atacar fatos consumados) ou MÉDIA (atingir efeitos pendentes de atos anteriores),
desde que assim prevejam expressamente.
Assim sendo, o Poder Originário NÃO é limitado por direitos dito adquiridos, e a incidência das
novas disposições constitucionais é imediata, embora o constituinte possa criar exceções ou regras
de transição, se entender conveniente.
No que se refere ao Poder Derivado, seja Reformador, seja Decorrente, há necessidade de respeito
ao direito adquirido (retroatividade mínima), entendo-se “lei” (art. 5º, XXXVI) em sentido amplo –
ADI 3133.
47

4.22. O que acontece com as normas infraconstitucionais editadas antes da nova Constituição?
Se compatíveis com a nova Constituição, serão recepcionadas. Caso contrário, serão revogadas por
ausência de recepção.
Ao fazer a análise da recepção, o Poder Judiciário deverá verificar a compatibilidade material da
norma anterior com a nova Constituição, podendo, inclusive, atribuir-lhe nova roupagem do ponto
de vista formal (como exemplo, cita-se o CTN – Código Tributário Nacional, que foi elaborado
conforme o procedimento de lei ordinária, mas foi recepcionado como lei complementar, diante de
nova exigência constitucional. Dessa forma, futuras alterações deverão respeitar quorum
qualificado).
Deverá, ainda, analisar se a lei era compatível formal e materialmente com a Constituição sob cuja
regência foi editada. Isso porque prevalece o entendimento de que a inconstitucionalidade gera
nulidade do ato normativo, que é, portanto, natimorto. Logo, se já era inconstitucional, não poderá
ser recepcionado.

4.23. Existe o fenômeno da inconstitucionalidade superveniente?


Parte da doutrina constitucional entende que a incompatibilidade de normas infraconstitucionais
anteriores não geraria o fenômeno da revogação, mas o da inconstitucionalidade superveniente.
Contudo, em virtude do princípio da contemporaneidade, segundo o qual uma lei só é constitucional
(ou inconstitucional) perante o paradigma de confronto em relação ao qual ela foi produzida, o STF
não admite a inconstitucionalidade superveniente (ADI 02).

4.24. A decisão de não recepção requer observância da cláusula de reserva de plenário?


NÃO, pois esta análise não é um exame de constitucionalidade. Segundo o STF, “a cláusula de
reserva de plenário (full bench) é aplicável somente aos textos normativos erigidos sob a égide da
atual Constituição. As normas editadas quando da vigência das Constituições anteriores se
submetem somente ao juízo de recepção ou não pela atual ordem constitucional, o que pode ser
realizado por órgão fracionário dos Tribunais sem que se tenha por violado o art. 97 da CF”
(AgIN 851.849 AgRg).

4.25. É possível modulação dos efeitos da decisão que entende pela revogação ou recepção?
Embora existam decisões em sentido contrário (RE 353.508-AgRg), entendimento mais recente
admitiu a modulação de efeitos de decisão não recepção, proferida em controle difuso (RE
600.885).
Embora ainda não esteja sedimentado no STF, este posicionamento pode ser aplicado, também, em
sede de ADPF (a ADPF é a única ação do controle concentrado que admite como objeto normas
anteriores à CRFB/88).
48

4.26. Na análise entre a ordem jurídica anterior e a nova constituição poderá ocorrer
repristinação?
Entende-se por repristinação o restabelecimento da norma revogada em razão da revogação da
norma revogadora. Nos termos da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, este
fenômeno, como regra, NÃO acontece, salvo se a nova norma assim se pronunciar. Este regramento
se aplica ao direito constitucional intertemporal.

4.27. O que é desconstitucionalização?


Trata-se da recepção de disposições da Constituição anterior pela nova ordem constitucional, desde
que com esta compatíveis, com o status de lei infraconstitucional. Enquanto as normas
materialmente constitucionais seriam revogadas, porquanto haveria nova disciplina, as normas
formalmente constitucionais seriam recepcionadas como leis infraconstitucionais, se compatíveis
com a nova ordem.
A maioria da doutrina entende que o fenômeno da desconstitucionalização só é admitido se houver
previsão expressa. Do contrário, ocorre uma revogação por normação geral, ou seja, a Constituição
anterior fica inteiramente revogada. Alguns autores defendem, todavia, que se trata de um
fenômeno automático, como Pontes de Miranda e Manoel Gonçalves Ferreira Filho. A CRFB/88
não previu o instituto.

4.28. O que se entende por recepção material de normas constitucionais?


Esse fenômeno da dinâmica constitucional consiste na possibilidade de normas de uma Constituição
anterior serem recepcionadas pelo novo ordenamento com o status de normas constitucionais, desde
que cumpridos os seguintes requisitos: a) compatibilidade com a nova Constituição; b) disposição
expressa do Poder Constituinte originário; c) prazo determinado, em razão do caráter precário.

4.29. O que ocorre com a norma produzida por um ente da Federação no regime
constitucional anterior em caso de transferência da competência, pela nova ordem, a ente
distinto?
Trata-se de uma incompatibilidade formal. Segundo Gilmar Mendes, a manutenção da norma só
seria possível em se tratando de lei federal no caso de alteração da competência para Estados ou
Municípios, admitindo, portanto, que a lei fosse estadualizada ou municipalizada. Não admite, por
outro lado, uma federalização de normas estaduais ou municipais, inclusive em razão da
impossibilidade prática de se federalizar simultaneamente tantas leis acaso não coincidentes.
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5. OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS. DIREITOS INDIVIDUAIS E


COLETIVOS. CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS.
EFETIVIDADE DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. PERSPECTIVA SUBJETIVA DOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS. DIREITOS A PRESTAÇÕES NEGATIVAS. DIREITOS A NÃO-
IMPEDIMENTOS. DIREITOS A NÃO-AFETAÇÃO DE PROPRIEDADES E SITUAÇÕES.
DIREITOS A NÃO-ELIMINAÇÃO DE POSIÇÕES JURÍDICAS. DIREITOS A PRESTAÇÕES
POSITIVAS.
AUTOR: DANIEL ANTONIAZZI FREITAG
MATERIAL DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO (PEDRO LENZA, 2009 E 2013). MANUAL DE
DIREITO CONSTITUCIONAL (MARCELO NOVELINO, 2014). CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL (INGO SARLET, 2011).
RESUMO DE PONTOS – CONCURSO MAGISTRATURA FEDERAL TRF1.
ARTIGO: “A CLASSIFICAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS EM VISTA DE SUA MELHOR ADEQUAÇÃO AOS PRINCÍPIOS
CONSTITUCIONAIS”. SITE “DIZER O DIREITO”.

5.1. Conceitue e diferencie direitos e garantias fundamentais:


No ordenamento jurídico pode ser feita uma distinção entre normas declaratórias, que estabelecem
direitos, e normas assecuratórias (GARANTIAS), que asseguram o exercício desses direitos.
Porém, convém ressaltar que as garantias de direito fundamental não se confundem com os
remédios constitucionais, pois aquelas são de conteúdo mais abrangente, incluindo todas as
disposições assecuratórias de direitos previstos na Constituição.
Alguns dispositivos constitucionais contêm direitos e garantias no mesmo enunciado (exemplo: art.
5º, X, estabelece a inviolabilidade do direito à intimidade, vida privada, honra e imagem das
pessoas, assegurando, em seguida, o direito à indenização em caso de dano material ou moral
provocado pela sua violação).
As GARANTIAS CONSTITUCIONAIS marcaram consideravelmente o ESTADO LIBERAL e até
hoje não perderam a serventia protetora tanto da Constituição como dos direitos fundamentais.
Sofreram alargamento, visto que não ficaram tão-somente circunscritas à guarda dos direitos
fundamentais na projeção clássica do liberalismo.
Com efeito, AMPLIARAM POR IGUAL O RAIO DE SEGURANÇA A FORMAS FUNCIONAIS
INSTITUCIONALIZADAS, que se prendem organicamente ao exercício constitucional das
atividades dos poderes públicos no regime de juridicidade imposto pelo próprio Estado de Direito.
A TEORIA DAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS, na PRIMEIRA METADE DO SÉCULO
XX passou a ser denominada de GARANTIAS INSTITUCIONAIS, por força da obra de CARL
SCHMITT.
As GARANTIAS INSTITUCIONAIS surgem com assento na 2ª GERAÇÃO DE DIREITOS
FUNDAMENTAIS, visando a PROTEGER CERTAS INSTITUIÇÕES que operam objetivando a
garantia dos próprios Direitos Fundamentais. A GARANTIA INSTITUCIONAL não pode deixar
de ser a proteção que a Constituição confere a ALGUMAS INSTITUIÇÕES, bem como a CERTOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS providos de um componente institucional que os caracteriza.
50

5.2. Diferencie direitos fundamentais e direitos humanos:


Direitos humanos são direitos reconhecidos no âmbito internacional, enquanto direitos
fundamentais são direitos reconhecidos no plano interno de um determinado Estado.
Preferencialmente, positivados na CF.
Para José Afonso da Silva: direitos fundamentais são as prerrogativas e instituições que o direito
positivo concretiza em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas, sendo
fundamentais porque sem eles não há vida humana digna.
Diz Norberto Bobbio que a afirmação dos direitos do homem deriva de uma radical inversão de
perspectiva. Os direitos fundamentais assumem posição de definitivo realce na sociedade quando se
inverte a tradicional relação entre Estado e indivíduo e se reconhece que o indivíduo tem, primeiro,
direitos, e, depois, deveres perante o Estado e que estes servem para melhor cuidar das necessidades
dos cidadãos.

5.3. Quais as gerações de direitos fundamentais apontadas pela doutrina?


(1) primeira geração: abrange os direitos referidos nas revoluções francesas e americanas:
pretendia-se fixar uma esfera de autonomia refrataria às expansões do poder, sendo tais direitos
traduzidos em postulados de abstenções dos governantes, criando obrigações de não fazer, de não
intervir sobre os aspectos da vida pessoal de cada indivíduo (liberdades de consciência, de culto, à
inviolabilidade de domicílio, liberdade de culto). Liberalismo: basta a eficácia vertical dos direitos
fundamentais. Exemplos: propriedade, liberdade de opinião, vida, associação, voto. Estado Liberal
de atuação mínima, vigia o laissez-faire na economia; é o Estado que não se intromete. O Estado
liberal é o Leviatã (Hobbes).
(2) segunda geração: decorreu dos problemas sociais e da industrialização, impondo ao Estado um
papel ativo na realização da Justiça Social, daí um progressivo estabelecimento pelos estados de
seguros sociais variados, importando intervenção intensa na vida econômica. Por meio deles se
intenta estabelecer um igualdade real e igual para todos, mediante ação corretiva dos Poderes
Públicos (assistência social, saúde, trabalho, lazer, etc.). Estado Social. Os direitos fundamentais
passam a ter uma outra natureza, são agora os direitos sociais, Manifesto do Partido Comunista
(Marx e Engels). Revolução Russa. Assim, o Estado assume um novo paradigma buscando o bem-
estar social, passando a ter obrigações de fazer.
(3) terceira geração: direitos de titularidade difusa e coletiva (solidariedade), uma vez que são
concebidos para a proteção não do homem isoladamente, mas de coletividades, de grupos (direito à
paz, ao desenvolvimento, à qualidade do meio ambiente, à conservação do patrimônio histórico e
cultural).
(4) quarta geração: Paulo Bonavides conceitua como sendo o direito à democracia, à informação e
ao pluralismo.
Para outros doutrinadores, na quarta geração, estão os direitos ligados a pesquisa genética, surgidos
da necessidade de se impor um controle a manipulação do genótipo dos seres, em especial o do ser
humano.
(5) quinta geração: segundo Bonavides, haveria o direito à paz.
51

5.4. Quais os principais marcos históricos na evolução dos direitos fundamentais?


• Magna Carta de João Sem Terra (1215) – é um marco histórico do
CONSTITUCIONALISMO e dos direitos fundamentais. Primeiro instrumento de limitação do
poder, foi um pacto entre o monarca e os barões do reino em latim, dirigida aos homens livres do
reino, únicos que dominavam a língua. Até hoje, é um dos documentos que integra a constituição
inglesa.
• Bill Of Rights (1689) – depois da revolução gloriosa, a monarquia inglesa passou a ser um
monarquia constitucional, esse foi a primeira manifestação legislativa.
• Declaração Dos Direitos Do Bom Povo Da Virgínia – foi documento que influenciou a
constituição americana (1776).
• Declaração Dos Direitos Do Homem e Do Cidadão (1789) – é o primeiro documento que,
apesar de francês, tem um plano universal, como se vê do artigo 16: toda a sociedade onde não há
garantia dos direitos e a separação de poderes não tem constituição, trata até mesmo do conceito
material de constituição.
• Declaração Universal Dos Direitos Do Homem (1948) – da Assembléia da ONU, trata-se de
mera RECOMENDAÇÃO da ONU (natureza jurídica), não impositiva, mas entende-se como
costume básico para a garantia da dignidade da pessoa humana. Assim, há uma corrente que diz que
ela é obrigatória, com esse fundamento. É um documento internacional.

5.5. Cite e contextualize as características dos direitos fundamentais:


Cada doutrinador tem o seu próprio rol de características. Robério (Jus Podium) fez um apanhado:
- historicidade – o que se entende por direitos fundamentais depende do entendimento de uma
sociedade em um determinado tempo, variam de acordo com o correr da história, não são conceitos
herméticos e fechados. Há uma variação no tempo e no espaço (lugar).
- inalienabilidade – são direitos sem conteúdo econômico patrimonial, não podem ser
comercializados ou permutados. Deve ser relativizada pelo mundo moderno. Exemplo: a imagem é
negociável para permitir uma exploração, mas não existe a possibilidade de venda do próprio direito
em si.
- imprescritibilidade – são sempre exigíveis, não deixam de pertencer ao indivíduo por não terem
sido utilizados. No entanto, alguns direitos são prescritíveis, como a propriedade, que pode ser
perdida pelo usucapião.
- irrenunciabilidade – o indivíduo pode não exercer os seus direitos, mas não pode renunciar a
eles. Também deve ser relativizada pela vida moderna, quando for de forma temporária. Exemplo:
modelo que assina contrato que não irá engravidar por determinado prazo e programa do BBB.
- relatividade/limitalidade – não são direitos absolutos. Havendo choque entre os direitos
fundamentais, serão relativizados um com o outro.
- personalidade – os direitos fundamentais não se transmitem. Exemplo: herança não é a mesma
propriedade do falecido.
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- concorrência e cumulatividade – os direitos fundamentais são direitos que podem ser exercidos
ao mesmo tempo. Exemplo: âncora de jornal quando dá uma informação e logo após dá a sua
opinião, está exercendo os seus direitos fundamentais: informação, opinião.
- universalidade – os direitos fundamentais são universais, independentemente de as nações terem
assinado a declaração, devem ser reconhecidos em todo o planeta, não importando a cultura,
política e sociedade.
Essa característica é polêmica, porque existem os relativistas culturais que afirmam que os direitos
fundamentais não podem ser universais porque devem ser reconhecidos na medida da cultura de
cada sociedade.
- proibição de retrocesso – não se pode retroceder nos avanços históricos conquistados. Segundo
Canotilho, o núcleo essencial dos direitos sociais já realizado e efetivado através de medidas
legislativas deve considerar-se constitucionalmente garantido, sendo inconstitucionais quaisquer
medidas que, sem a criação de outros esquemas alternativos e compensatórios, se traduzam na
prática numa “anulação”, “revogação” pura e simples.
Não tem aceitação universal na doutrina. Acentua-se que mesmo os que acolhem a tese da proibição
do retrocesso entendem que o princípio da proporcionalidade pode inspirar uma nova regulação do
direito fundamental que não destrua totalmente, sem alternativas, o direito antes positivado.
- constitucionalização – a locução direitos fundamentais é reservada aos direitos consagrados em
diplomas normativos de cada Estado, enquanto a expressão direitos humanos é empregada para
designar pretensões de respeito à pessoa humana, inseridas em documentos de direito internacional.
- Vinculação dos poderes públicos – o fato de os direitos fundamentais estarem previstos na
Constituição torna-os parâmetro de organização e de limitação dos poderes constituídos.
- Vinculação do Legislativo – Não somente a atividade legiferante deve guardar coerência com o
sistema de direitos fundamentais, como a vinculação aos direitos fundamentais pode assumir
conteúdo positivo, tornando imperiosa a edição de normas que dêem regulamentação aos direitos
fundamentais dependentes de concretização normativa.
- Vinculação do Executivo – a atividade discricionária da Administração não pode deixar de
respeitar os limites que lhe acenam os direitos fundamentais. Canotilho propõe que a Administração
se recuse a cumprir lei inconstitucional quando o direito fundamental agredido puser em risco a
vida ou integridade pessoal de alguém, resultando no cometimento de um delito.
- Vinculação do Poder Judiciário – Os Tribunais detêm a prerrogativa de controlar os atos dos
demais poderes, conferindo a tais direitos a máxima efetividade possível.
Observação: Os direitos fundamentais não são absolutos, pois podem sofrer limitações, quando
enfrentam outros valores de ordem constitucional, inclusive outros direitos fundamentais.
53

5.6. Em que consiste a teoria dos quatro status de Jellinek?


Tal teoria, elaborada no final do século XIX, aponta os quatro status do indivíduo perante o Estado:
a) Status passivo ou subjectionis: o indivíduo se encontra em posição de subordinação aos
poderes públicos, vinculando-se ao Estado por mandamentos e proibições. Aparece como
detentor de deveres perante o Estado.
b) Status negativo: o indivíduo, por possuir personalidade, goza de um espaço de liberdade
diante das ingerências dos Poderes Públicos. Pode-se dizer, portanto, que a autoridade do
Estado se exerce perante homens livres.
c) Status positivo ou status civitatis: o indivíduo tem o direito de exigir que o Estado atue
positivamente, realizando uma prestação a seu favor.
d) Status ativo: o indivíduo possui competências para influenciar a formação da vontade do
Estado, por exemplo, pelo exercício do direito do voto (exercício dos direitos políticos).

5.7. O que constituiu a eficácia horizontal dos direitos fundamentais? Quais as teorias que os
estruturam?
De acordo com a doutrina liberal clássica, os direitos fundamentais limitar-se-iam à regência das
relações públicas, que tinham o Estado como um dos seus pólos (eficácia vertical dos direitos
fundamentais).
O indivíduo diversamente do Estado é titular de direitos fundamentais, por isso surgiu a celeuma
sobre a eficácia horizontal dos direitos fundamentais. O indivíduo não pode simplesmente substituir
o Estado nas relações jurídicas, mas por outro lado é preciso dar maior efetividade aos direitos
fundamentais até mesmo na esfera privada.
A teoria de eficácia exclusivamente vertical, quando fundamenta que não cabe a eficácia horizontal,
praticamente desapareceu, no Brasil não é aplicada.
Cabimento da eficácia horizontal:
a) Teoria Negativista - rejeita a possibilidade de aplicação dos direitos fundamentais às relações
privadas em face da concepção liberal prevalecente neste regime jurídico.
b) Teoria da “State Action” - Para a doutrina estadunidense, o papel da Constituição seria o de
apenas oferecer direitos fundamentais de proteção aos indivíduos contra as interferências arbitrárias
do Estado, afastando a possibilidade de eficácia horizontal dos direitos fundamentais, salvo se o
particular estiver no desempenho de uma função ou atividade estatal.
c) Teoria da Eficácia Indireta ou Mediata dos Direitos Fundamentais (Konrad Hesse) – é uma
corrente intermediária entre aqueles que NEGAM a aplicação dos direitos fundamentais aos
particulares e os permitem.
Cabe ao legislador privado a tarefa de mediar a aplicação dos direitos fundamentais sobre os
particulares, estabelecendo uma disciplina das relações privadas que se revele compatível com os
valores constitucionais. Ao Judiciário sobraria o papel de preencher as cláusulas indeterminadas
criadas pelo Legislador, bem como o de rejeitar, por inconstitucionalidade, a aplicação das normas
privadas incompatíveis com tais direitos.
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Apenas em casos excepcionais de lacuna na ordem privada, e diante da total ausência de cláusulas
gerais, é que o juiz poderia aplicar diretamente o direito fundamental.
d) Teoria da Eficácia Direta ou Imediata dos Direitos Fundamentais a Terceiros (Alexy) – doutrina
alemã minoritária. Quando os direitos não forem suficientemente protegidos pelo legislador na
esfera privada, as normas constitucionais que os consagram produzirão efeito direto de
obrigatoriedade nas relações entre particulares, mas, ela não prega a desconsideração da liberdade
individual no tráfico jurídico-privado. É a teoria aplicada no Brasil.
A CF/88 é voltada para a promoção da igualdade substantiva (apesar de alguns discordarem), que
transmite a idéia de uma vinculação passiva universal dos direitos fundamentais. Só existe
efetivamente autonomia privada quando o agente desfrutar de mínimas condições materiais de
liberdade.
Não se pode falar em insegurança jurídica, principalmente, depois da JURISPRUDÊNCIA DOS
CONCEITOS (emprego de conceitos jurídicos indeterminados e de cláusulas gerais, que também
apresentam reduzido grau de determinação semântica). Muito importante é o estabelecimento de
STANDARDS para a aplicação de cada direito fundamental nas relações privadas, com a
identificação dos casos em que sua incidência deve prevalecer sobre a autonomia privada dos
particulares.
Há uma vinculação dos particulares aos direitos fundamentais, independentemente de uma
desigualdade entre as partes. A questão da desigualdade material torna-se relevante apenas no
momento em que se tiver de ponderar o direito em questão com a autonomia privada. Na
jurisprudência brasileira não são tão escassas as decisões judiciais utilizando diretamente os direitos
fundamentais para dirimir conflitos de caráter privado, mas raramente são precedidos de
fundamentos teóricos sobre a aplicação da teoria.
A aplicação dessa teoria é compatível com o chamado EFEITO DE IRRADIAÇÃO (eficácia
objetiva) dos direitos fundamentais. Daniel Sarmento defende a Eficácia Imediata, mas, para evitar
um “fundamentalismo dos direitos fundamentais”, propõe a utilização da técnica da ponderação de
interesses, baseada no princípio da proporcionalidade, além de outros parâmetros específicos de
ponderação: grau de desigualdade entre as partes (quanto maior, mais peso tem o direito
fundamental), a natureza da liberdade individual em jogo, o fomento ao pluralismo e o
fortalecimento da dignidade humana.
No Brasil, há a aplicação da Teoria da Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais. Exemplos:
artigo 205, CF; artigo 3o., IV. Todos os indivíduos são credores e devedores.
O STF reconheceu a aplicação direta de direitos fundamentais às relações privadas, mantendo
ordem judicial prolatada para determinar uma associação privada a reintegração de um associado
que havia sido excluído de seus quadros, por violação ao direito de defesa.
55

5.8. Quais as funções dos direitos fundamentais?


a) funções de defesa ou de liberdade – têm como função proteger os indivíduos contra o Estado.
Exemplo: não estabeleça pena de morte e não prenda sem enquadramento nas hipóteses legais.
Proíbe que o Estado elimine certas posições jurídicas concretas, vg, o direito de propriedade. A
afronta a um direito de defesa deve encontrar remédio na ordem jurídica com vistas a compelir o
Estado a se abster de praticar o ato incompatível com a ordem constitucional e ainda deve ensejar
uma compensação pecuniária
b) funções de prestação – exigem uma obrigação de fazer, uma prestação. Exemplos: educação e
moradia. O Estado deve agir para atenuar desigualdades, estabelecendo moldes para o futuro da
sociedade. Podem ser:
(i) prestações jurídicas (cujo objeto do direito será a normação pelo Estado do bem jurídico
tido como fundamental – ex: editar normas jurídicas penais ou de normas de organização e de
procedimento) ou
(ii) prestações materiais (consistem numa utilidade concreta – direito á educação, saúde,
trabalho, lazer, segurança, previdência social, assistência, proteção á infância, etc.).
c) funções de proteção perante terceiros – protegem os cidadãos dos demais indivíduos. Exemplos:
manter a ordem, manter polícia; manter um Judiciário capaz de proteger. O Estado teria a obrigação
não só de abster-se de violar os direitos fundamentais, mas também de protegê-los de potenciais
lesões e ameaças advindas de particulares no seio social. Isso pode ser atrelado ao direito
fundamental à efetividade penal: o indivíduo tem o direito de que o Estado o proteja dos outros
indivíduos, para isso, o Estado precisa ter um aparato judicial penal; os diretos fundamentais penais
do réu são indiscutivelmente importantes, mas além dessa visão, não se pode esquecer que existe
também o direito fundamental da vítima para uma repressão penal adequada, respeitando os direitos
fundamentais do investigado.
d) função de não-discriminação – protegem as minorias em relação ao Estado e em relação a
terceiros.
e) Função de ampliação da participação democrática: os direitos fundamentais de participação são
orientados a garantir a participação dos cidadãos na formação da vontade do País.

5.9. Em que consiste a Reserva do Possível e quais os principais critérios para aplicação na
jurisprudência brasileira?
Na doutrina de Sustein e Holmes, todos os direitos, desde os que dependem de atuação positiva até
aqueles negativos ou de defesa, implicam custos para o Estado.
Resp 1.185.474: A tese da reserva do possível (Der Vorbehalt des Möglichen) assenta-se na idéia
romana de que a obrigação impossível não pode ser exigida (impossibilium nulla obligatio est). Por
tal motivo, não se considera a insuficiência de recursos orçamentários como mera falácia.
Essa escassez, muitas vezes, é resultado de escolha, de decisão: quando não há recursos suficientes,
a decisão do administrador de investir em determinada área implica escassez de outra que não foi
contemplada.
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Por esse motivo, em um primeiro momento, a reserva do possível não pode ser oposta à efetivação
dos direitos fundamentais, já que não cabe ao administrador público preteri-la, visto que não é
opção do governante, não é resultado de juízo discricionário, nem pode ser encarada como tema que
depende unicamente da vontade política.
Nem mesmo a vontade da maioria pode tratar tais direitos como secundários. Isso porque a
democracia é, além dessa vontade, a realização dos direitos fundamentais. Portanto, aqueles direitos
que estão intimamente ligados à dignidade humana não podem ser limitados em razão da escassez,
quando ela é fruto das escolhas do administrador. Não é por outra razão que se afirma não ser a
reserva do possível oponível à realização do mínimo existencial.
Sendo assim, não fica difícil perceber que, entre os direitos considerados prioritários, encontra-se o
direito à educação. No espaço público, local em que são travadas as relações comerciais,
profissionais e trabalhistas, além de exercida a cidadania, a ausência de educação, de conhecimento,
em regra, relega o indivíduo a posições subalternas, torna-o dependente das forças físicas para
continuar a sobreviver, ainda assim, em condições precárias. Eis a razão pela qual os arts. 227 da
CF/1988 e 4º da Lei n. 8.069/1990 dispõem que a educação deve ser tratada pelo Estado com
absoluta prioridade.
Porém é preciso ressalvar a hipótese de que, mesmo com a alocação dos recursos no atendimento do
mínimo existencial, persista a carência orçamentária para atender a todas as demandas. Nesse caso,
a escassez não seria fruto da escolha de atividades não prioritárias, mas sim da real insuficiência
orçamentária. Em situações limítrofes como essa, não há como o Poder Judiciário imiscuir-se nos
planos governamentais, pois eles, dentro do que é possível, estão de acordo com a CF/1988, não
havendo omissão injustificável. Todavia, a real insuficiência de recursos deve ser demonstrada pelo
Poder Público, não sendo admitido que a tese seja utilizada como uma desculpa genérica para a
omissão estatal no campo da efetivação dos direitos fundamentais.

5.10. Classifique os direitos fundamentais:

CRITÉRIO CLASSIFICAÇÃO EXPLICAÇÃO


Quanto à DIGNIDADE DA MERAMENTE Não são essenciais à dignidade
PESSOA HUMANA FORMAIS da pessoa humana. Artigo 5o.
Há uma tese doutrinária, ainda não XXIX.
São essenciais à dignidade da
decidida pelo STF, mas, somente pessoa humana, que é o valor
MATERIALMENTE
seria cláusulas pétreas os direitos central da dignidade, é o direito
FUNDAMENTAIS
materialmente fundamentais que abstraído ameaça a vida
humana digna.
RUY BABOSA DIREITOS Disposições declaratórias
Desde SAMPAIO DORIA, essa
classificação é questionada, já que
pela supremacia da CF, o só fato de
declarar o direito ele já é uma
garantia, e ao mesmo tempo os GARANTIAS Instrumentos assecuratórias
instrumentos são direitos, ou seja, há
uma mistura entre direitos e
garantias.
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INDIVIDUAIS
CLASSIFICAÇÃO FORMAL DA
COLETIVOS
CF/88
Há também outros espalhados pela SOCIAIS
CF. NACIONALIDADE
POLÍTICOS

5.11. Quem são os destinatários dos direitos fundamentais?


Brasileiros e os estrangeiros residentes no Brasil: a disposição exposta no caput do artigo 5o, apesar
de generalista, viabiliza sejam estabelecidas diferenças entre os brasileiros. Exemplo: o brasileiro
nato nunca poderá ser extraditado e o brasileiro naturalizado somente pode ser extraditado por
crime comum praticado antes da naturalização ou por comprovado envolvimento com tráfico ilícito
de entorpecentes ou drogas a fim.
Outra distinção entre brasileiros reside na disposição do LXXIII, que permite o ajuizamento da
Ação Popular somente por cidadão (pleno gozo de direitos políticos) seja naturalizado ou nato.
Há direitos que somente estão voltados para as mulheres. Exemplo: direito da presa de amamentar
os filhos, idade menor para aposentadoria.
São estabelecidas também diferenças entre ricos e pobres: ASSISTÊNCIA JURÍDICA GRATUITA
AOS QUE PROVAREM INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS [art. 5º, LXXIV, CF] e
GRATUIDADE DO REGISTRO CIVIL DE NASCIMENTO E DA CERTIDÃO DE ÓBITO AOS
RECONHECIDAMENTE POBRES [art. 5º, LXXVI, CF].
Existem, ainda, direito fundamental destinado apenas aos estrangeiros: determinação constitucional
no sentido de vedar a concessão de extradição a estrangeiro por crime político ou de opinião não
atinge os brasileiros.
QUESTÃO ACERCA DOS ESTRANGEIROS NÃO RESIDENTES NO PAÍS: - questionamento
se o fato do dispositivo mencionar apenas os ESTRANGEIROS RESIDENTES NO PAÍS afastaria
a possibilidade dos ESTRANGEIROS NÃO RESIDENTES NO PAÍS serem titulares dos
DIREITOS FUNDAMENTAIS. Há divergência sobre o assunto:
1ª corrente: SOMENTE OS ESTRANGEIROS RESIDENTES: JOSE AFONSO DA
SILVA - SÓ OS ESTRANGEIROS RESIDENTES gozam dos direitos subjetivos relativamente aos
enunciados constitucionais dos direitos e garantias fundamentais. Os ESTRANGEIROS NÃO
RESIDENTES têm proteção em outras normas jurídicas do direito internacional e do direito
infraconstitucional [caso contrário a CF teria utilizado de palavras à toa].
2ª corrente: OS ESTRANGEIROS NÃO RESIDENTES TAMBÉM TÊM DIREITO: em
decorrência do fato da DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ser um dos FUNDAMENTOS da
República, não haveria como não se reconhecer a aplicabilidade de tais direitos também para os
ESTRANGEIROS NÃO RESIDENTES (posicionamento do STF).
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Observações sobre o tema:


i) a possibilidade de ESTRANGEIROS NÃO RESIDENTES titularizarem DIREITOS
FUNDAMENTAIS já era reconhecida sob a égide das Constituições anteriores.
ii) a VEDAÇÃO À EXTRADIÇÃO DE ESTRANGEIRO por CRIME POLÍTICO ou DE
OPINIÃO [art. 5º, LII, CF] aplica-se tanto aos ESTRANGEIROS RESIDENTES como
aos NÃO RESIDENTES.
iii) O STF não se permite a extradição indireta (ainda que o estrangeiro seja passível de
expulsão, o Governo brasileiro não poderá efetivar referida medida compulsória para o
mesmo país em que houver decisão de indeferimento de pedido de extradição).

5.12. Há a possibilidade de proteção dos direitos fundamentais à pessoa jurídica?


Também estão protegidas pelos direitos constantes no artigo, desde que sejam compatíveis com a
sua natureza, ou seja, poderão usufruir dentro do razoável. Exemplo: impetração de MS pode ser
feita por pessoa jurídica, já o HC não é compatível. Mas há incisos voltados para aplicação de
direitos das pessoas jurídicas (XXIX): proteção aos nomes de empresas.
Não haveria porque recusar às pessoas jurídicas as conseqüências do princípio da igualdade, do
direito de resposta, inviolabilidade do domicílio, garantias do direito adquirido, ao jurídico perfeito
e coisa julgada.

5.13. É possível a extensão dos direitos fundamentais aos entes públicos?


Toda a teoria dos direitos fundamentais está relacionada à proteção do cidadão, por meio dos
direitos fundamentais. Atualmente, a teoria deve ser temperada, para entender-se que alguns dos
incisos do artigo 5o são usufruídos pelo Estado (Gilmar Mendes). Exemplos: o Município pode
impetrar um MS contra uma autoridade federal; os entes políticos têm direito aos princípios do
contraditório, do devido processo legal, direito de ser ouvido em juízo, direito ao juiz
predeterminado por lei.
Assim, as pessoas jurídicas de direito público poderão em algumas situações invocar a tutela dos
direitos fundamentais, em que pese a história de formação dos direitos fundamentais, com
inspiração nitidamente individualista.
Há doutrina que defende que o ESTADO NÃO É TITULAR DE DIREITOS FUNDAMENTAIS,
mas PODERÁ SE VALER DA PROTEÇÃO DECORRENTE DESTES DIREITOS uma vez que
REPRESENTAM VALORES A SEREM PRESERVADOS. Tal situação não seria suficiente para
reconhecer a titularidade.

5.14. Qual a aplicabilidade do art. 5º, § 1º, da CF?


Estabelece o dispositivo que os direitos fundamentais têm aplicação imediata, ou seja, sem a
necessidade de atuação do legislador, trata-se de regra que se aplica a todos os direitos
fundamentais (sociais, coletivos e outros), conferindo a maior eficácia possível dos direitos
fundamentais.
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Essa é a regra geral (normas de eficácia plena ou contida), pois há direitos fundamentais que
demandam a atuação do legislador ordinário (normas de eficácia limitada). Dessa forma, em regra,
a tutela dos direitos fundamentais será feita por MS, porque em regra não se demanda a atuação do
legislador infra-constitucional, ou seja, fica afastado o mandando de injunção (regra).
Mas há direitos fundamentais que estão submetidos à atuação do legislador ordinário. O § 1o traz
uma presunção de que os direitos fundamentais serão normas de eficácia plena ou contida, mas na
tentativa de dar maior aplicabilidade a esse dispositivo, não se pode fugir do razoável, assim, há
casos em que os direitos fundamentais terão eficácia limitada.

5.15. Qual o instrumento jurídico adequado para a proteção dos direitos fundamentais?
Se as NORMAS DEFINIDORAS DE DIREITO FUNDAMENTAL não dependem de atuação do
legislador infraconstitucional para terem eficácia (NORMAS DE EFICÁCIA PLENA OU DE
EFICÁCIA CONTIDA) seria caso de DIREITO LÍQUIDO E CERTO: INSTRUMENTO =
MANDADO DE SEGURANÇA.
O art. 5°, §1°, da CF/88 estatui uma PRESUNÇÃO RELATIVA DE APLICABILIDADE
IMEDIATA E PLENA EFICÁCIA para as NORMAS DEFINIDORAS DE DIREITOS E
GARANTIAS FUNDAMENTAIS e sempre que possível as normas de direitos fundamentais serão
de EFICÁCIA PLENA ou de EFICÁCIA CONTIDA. EXCEPCIONALMENTE uma NORMA DE
DIREITO FUNDAMENTAL pode ter NATUREZA PROGRAMÁTICA. Assim, o instrumento a
ser utilizado em caso de violação de NORMA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS
PROGRAMÁTICA = MANDADO DE INJUNÇÃO.

5.16. Como o STF se posiciona acerca dos direitos humanos inseridos na legislação brasileira
via tratados e o art. 5º, § 3º, da CF?
Pela posição tradicional, equivalem à lei ordinário federal – art. 5º, § 2º, CF – não estaria tratando
de estatuto normativo, mas apenas pretendia completar o rol.
SEPULVEDA PERTENCE: a corrente tradicional nega vigência ao art. 5º, § 2º, CF, mas a corrente
Flávia Piovesan nega vigência ao art. 102, III, b, CF. O estatuto seria supralegal. Mesmo após a EC
45 os tratados podem ser aprovados por maioria simples, mas não terão nível constitucional
(considerar como lei ordinária federal).
Flávia Piovesan – EC 45 não pode ser interpretada isoladamente, deve ser interpretada em conjunto
com o § 2º.
Posicionamentos existentes sobre o status dos tratados internacionais de direitos humanos:
a) SUPRACONSTITUCIONAL;
b) CONSTITUCIONAL;
c) INFRACONSTITUCIONAL, MAS SUPRALEGAL;
d) INFRACONSTITUCIONAL, COM MESMO STATUS DE LEI FEDERAL.
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STF sobre o status dos tratados de direitos humanos:


POSICIONAMENTO ANTIGO: status de lei ordinária - não foi adotado a posição dos
doutrinadores que reconheciam a natureza constitucional.
POSICIONAMENTO ATUAL: [Gilmar Mendes – RE 466.343]
- SE APROVADOS DE ACORDO COM ART. 5º, § 3º da CF: EQUIVALENTES À EC.
- SE NÃO FOREM APROVADOS DE ACORDO COM O ART. 5º, § 3º da CF: STATUS
SUPRA-LEGAL. No RE 466343, o Min. Gilmar Mendes passou a defender que os tratados
internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil possuem status normativo supralegal, o
que torna inaplicável a legislação infraconstitucional com eles conflitantes, seja ela anterior ou
posterior ao ato de ratificação (idem no HC 90172 – caso do depositário infiel) – EFICÁCIA
PARALISANTE.

- TRATADOS DE DIREITOS HUMANOS COM STATUS CONSTITUCIONAL: doutrina que


reconhece o status constitucional: Antônio Augusto Cançado Trindade, Flávia Piovesan, Celso
Lafer, Valério de Oliveira Mazzuoli, André Ramos Tavares – CELSO DE MELLO (STF).
Argumentação contrária ao reconhecimento da natureza constitucional: a interpretação literal do art.
5º, § 3º da CF ensejaria uma mudança do quórum para alteração do texto constitucional. A
manifestação da maioria simples, quórum do decreto legislativo (instrumento utilizado para
aprovação do tratado), poderia gerar alteração do texto constitucional.
Reconhecimento de 3 situações distintas: [posição: Min. Celso de Mello; Celso Lafer]
i) tratados de DH celebrados antes da CF/88: status constitucional. [fundamento: assim
teriam sido recepcionados pelo art. 5º, § 2º, CF]
ii) tratados de DH celebrados entre 1.988 e EC 45: assumem caráter materialmente
constitucional, porque essa qualificada hierarquia jurídica lhes é transmitida por efeito de sua
inclusão no bloco de constitucionalidade.
iii) tratados de DH celebrados após EC 45: somente terão status constitucional se aprovados
pelo procedimento de EC [art. 5º, § 3º, CF].
LUIS ROBERTO BARROSO destaca 3 conseqüências decorrentes da disposição do art. 5º, § 3º,
CF:
a) em caso de conflito entre lei e tratado de direitos humanos, aprovado em conformidade
com o art. 5º, § 3º, da CF, prevalecerá sempre o tratado, em razão de sua equivalência com as
emendas constitucionais (e independentemente do critério cronológico);
b) os tratados de direitos humanos incorporados de acordo com o art. 5º, § 3º, da CF podem
servir de parâmetro para o controle de constitucionalidade das leis e atos normativos, ampliando o
chamado ‘bloco de constitucionalidade’;
c) tais tratados (FORMALMENTE) não podem ser objeto de denúncia do Presidente da
República, por força do art. 60, § 4º, da CF.
61

Observação: Constitucionalidade do Parágrafo 3º, do Artigo 5º - se for adotada a tese de que o § 2º


já reconhecia o status constitucional, a alteração presente no § 3º dificultou o ingresso desses
tratados (Piovesan). Se não se aceita a tese antiga ele foi um avanço.
Justificativa do art. 5º, § 3º da CF – a aplicação literal do art. 5º, § 2º da CF ensejaria alteração do
texto da constituição por maioria simples (maioria requerida para aprovação de decreto legislativo
que recepciona tratado na ordem jurídica interna).
Tratados de direitos humanos: Art. 5º, § 2º – doutrina minoritária sustentava a constitucionalidade
dos tratados incorporados sobre Dhs. STF sempre foi bem resistente a isso, principalmente por
conta da previsão do art. 102 e em razão do quórum previsto para a aprovação dos tratados.
Art. 5º, § 3º – Doutrina internacionalista: Tratados de DH: todos são materialmente constitucionais
(art. 5º, § 2º) e há tratados formal e materialmente constitucionais (art. 5º, § 3º). Consequência: o
tratado formalmente constitucional não poderia ser denunciado.
Mais: recepção formal – a legislação antecedente é considerada equivalente à nova espécie
normativa que rege a matéria por ela tratada. Há recepção dos tratados materialmente
constitucionais como emendas.
O problema é o texto: “que forem aprovados”. Criou dois regimes (RE 466.343)
O STF vai resgatar um voto do Sepúlveda Pertence, de 2000 (HC 79785 – Caso Jorgina) – num
obiter dictum, que trata do assunto.
Majoritário – duas categorias: TEORIA DO DUPLO ESTATUTO DOS TRATADOS DE DHS
• Supralegal: para os que não foram aprovados pelo rito especial do art. 5º, § 3º, quer sejam
anteriores ou posteriores à EC 45.
• Status equivalente ao de emenda constitucional: deve haver aprovação segundo o rito do art. 5º,
§3º.

5.17. Qual o procedimento a ser seguido em caso de colisão de direitos fundamentais?


Existem limites a tais direitos?
No conflito entre princípios, deve-se buscar a conciliação entre eles, uma aplicação de cada qual em
extensões variadas, segundo a respectiva relevância no caso concreto, sem que se tenha um dos
princípios como excluído do ordenamento jurídico.
A doutrina é uníssona em afirmar que não existe direito absoluto. Assim, os direitos fundamentais
não são absolutos nem ilimitados. Encontram limitações na necessidade de se assegurar o exercício
de outros direitos igualmente consagrados pela Carta Magna (Princípio da relatividade ou
convivência das liberdades públicas), bem como encontram limites externos, decorrentes da
necessidade de sua conciliação com as exigências da vida em sociedade, traduzidas na ordem
pública, ética social, autoridade do Estado etc, resultando, daí, restrições dos direitos fundamentais
em função dos valores aceitos pela sociedade.
Os direitos individuais, enquanto direitos de hierarquia constitucional somente podem ser limitados
por expressa disposição constitucional ou mediante lei ordinária com fundamento imediato na
62

própria constituição. Ex: liberdade de reunir-se, sem armas (XVI), liberdade de locomoção em
tempo de paz (XV).
Ainda quanto aos limites dos direitos fundamentais, vigem as teorias interna e externa para
justificar a possibilidade de limites e restrições.
a) Teoria externa: considera que as restrições a direitos fundamentais são externas ao conceito
desses mesmos direitos. Ex: existe direito de liberdade, que pode sofre restrições (externas) em
casos concretos. Gilmar Mendes, Dworkin, Alexy.
b) Teoria interna: o conteúdo de um direito só pode ser definido após ser confrontado com os
demais: não existem restrições a um direito, mas definições de até onde vai esse direito. Eros Grau,
Habermas.

5.18. Em que consiste a teoria dos limites dos limites?


Para garantir que a atividade do legislador ordinário não possa efetivamente esvaziar de conteúdo os
direitos fundamentais, surge a teoria segundo a qual as próprias limitações a tal classe de direitos
sofrem limitações.
É proibido proibir o exercício do direito além do necessário. Esses limites, que decorrem da própria
Constituição, referem-se tanto à necessidade de proteção de um núcleo essencial do direito
fundamental quanto à clareza, determinação, generalidade e proporcionalidade das restrições
impostas. Protegem o núcleo essencial do direito fundamental. São duas hipóteses: (a) proteção do
núcleo essencial; (b) proporcionalidade.
A) Proteção do núcleo essencial: Destina-se a evitar o esvaziamento do conteúdo do direito
fundamental decorrente de restrições descabidas, desmesuradas ou desproporcionais.
O STF entendeu que a exigência de diploma de jornalista para exercer a profissão é exagerada,
violando o próprio núcleo essencial do direito (liberdade de exercício de profissão). É incabível
emenda constitucional para modificar o núcleo essencial das cláusulas pétreas.
B) Princípio da Proporcionalidade: Reconhece-se ao legislador o poder de conformação dentro dos
limites estabelecidos pela Constituição. No entanto, o excesso de poder no âmbito da
discrionariedade legislativa pode ensejar a censura judicial.
A utilização do princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso envolve a apreciação da
necessidade e adequação da providência legislativa. O meio adequado se, com sua utilização, o
evento pretendido pode ser alcançado; é necessário se o legislador não dispõe de outro meio eficaz,
menos restritivo ao direitos fundamentais (inconstitucionalidade havendo medidas menos lesivas).
Ao lado da proibição do excesso tem a Corte Constitucional alemã apontado a lesão ao Princípio da
Proibição da Proteção Insuficiente, segundo o qual o Estado deve tomar medidas protetivas
adequadas e eficazes à defesa dos direitos fundamentais.
O princípio da proporcionalidade vem sendo utilizado pelo Supremo como instrumento para
solução de colisão entre direitos fundamentais
63

5.19. O que são direitos a prestações?


Também chamados de direitos prestacionais, são direitos que impõem um dever de agir ao Estado.
Objetivam a realização de condutas ativas por parte dos poderes públicos – status positivo ou status
civitatis -, seja para a proteção de certos bens jurídicos, seja para a promoção ou garantia das
condições de fruição de tais bens. Tais prestações podem ser de duas espécies: materiais
(oferecimento de bens ou serviços a pessoas que não podem adquiri-los ou o fornecimento universal
de serviços monopolizados pelo Estado) ou normativas/jurídicas (criação de normas jurídicas para a
tutela de interesses individuais).
São duas também as formas de efetivação: negativas ou positivas, relacionadas como a forma de
atuação – as prestações negativas se materializam com a tolerância e abstenção de atuação do Poder
Público para com os indivíduos, por exemplo, citem-se as ações referentes ao exercício dos
chamados direitos da liberdade – direitos fundamentais de primeira geração. Os direitos de
liberdade correspondem exatamente a direitos com caráter negativo e surgiram como expressão da
necessidade de abstenção do Estado de interferir na liberdade dos particulares.
Diferença entre Direitos a prestações negativas e direitos a prestações positivas. Os direitos a
prestações negativas significam, que o Estado não dificulta a vida do cidadão. O direito a prestação
positiva é dividida em dois, a prestação positiva normativa e a prestação positiva fática. Na primeira
o cidadão tem o direito de que o Estado regulamente algo, e no segundo, o cidadão tem o direito
que o Estado lhe da algo.

5.20. Em que constitui a dimensão subjetiva dos direitos fundamentais?


A noção de uma perspectiva subjetiva dos direitos fundamentais engloba a possibilidade do titular
do direito fazer valer judicialmente os poderes, as liberdades ou mesmo o direito à ação ou às ações
negativas ou positivas que lhe foram outorgadas pela norma consagradora do direito fundamental
em questão, ainda que tal exigibilidade seja muito variável e careça de uma apreciação à luz de cada
direito fundamental em causa, dos seus limites, entre outros aspectos a serem considerados. Direitos
subjetivos, portanto, são direitos exigíveis perante o Estado.
Os direitos fundamentais são, em primeira linha, direitos individuais, do que resulta a constatação
de que, encontrando-se constitucionalmente protegidos como direitos individuais, esta proteção dar-
se-á sob a forma de direito subjetivo.
Assim, quando nos referimos aos direitos fundamentais como direitos subjetivos, devemos ter em
mente a noção de que ao titular de um direito fundamental é aberta a possibilidade de impor
judicialmente seus interesses juridicamente tutelados perante o destinatário (obrigado).

5.21. Como se define a dimensão objetiva dos direitos fundamentais?


A função dos direitos fundamentais não se limita a serem direitos subjetivos, já que também
representam decisões valorativas de natureza jurídico-objetiva da Constituição, que se projetam em
todo o ordenamento jurídico. Em outras palavras, os direitos fundamentais passaram a apresentar-se
como um conjunto de valores objetivos básicos e fins diretivos da ação positiva estatal, e não
apenas garantias negativas (e positivas) dos interesses individuais.
64

Assim, as normas que preveem direitos subjetivos é outorgada função autônoma, que transcende a
perspectiva subjetiva, implicando, além disso, o reconhecimento de conteúdo normativos e,
portanto, de funções distintas aos direitos fundamentais. Trata-se de um reforço de juridicidade das
normas de direitos fundamentais. Passaram a integrar a assim denominada perspectiva objetiva da
dignidade humana.
Como um dos mais importantes desdobramentos, fala-se da eficácia irradiante ou efeito de
irradiação dos direitos fundamentais, no sentido de que estes, na sua condição de direito objetivo,
fornecem impulsos e diretrizes para a aplicação e interpretação do direito infraconstitucional,
implicando em uma interpretação conforme os direitos fundamentais de todo o ordenamento
jurídico.
Outra função que tem sido reconduzida à dimensão objetiva está vinculada ao reconhecimento de
que os direitos fundamentais implicam deveres de proteção do Estado, impondo aos órgãos estatais
a obrigação permanente de zelar pelos direitos fundamentais dos indivíduos, não somente contra os
poderes públicos, mas também contra agressões por parte dos particulares e até mesmo por parte de
outros Estados.
Por força dos deveres de proteção, aos órgãos estatais incumbe assegurar níveis eficientes de
proteção para os diversos bens fundamentais, o que implica não apenas a vedação de omissões, mas
também a proibição de uma proteção manifestamente insuficiente, tudo sujeito a controle por parte
dos órgãos estatais, inclusive por parte do poder judiciário.
Uma terceira função é a função organizatória e procedimental. A partir do conteúdo das normas de
direitos fundamentais é possível se extrair uma formatação do direito organizacional e
procedimental que auxilie na efetivação da proteção aos direitos fundamentais, evitando-se os riscos
de uma redução do seu significado e conteúdo material.
De qualquer modo, as funções vinculadas à dimensão objetiva influenciam a dimensão subjetiva,
isto é, a noção de direitos fundamentais como direitos subjetivos, contribuindo para o seu
alargamento e implicando em maior ou menor medida a possibilidade de invocar seus efeitos
jurídicos perante o poder judiciário.

5.22. O que são direitos a não impedimentos?


Também chamados direitos a não afetações, direitos a não eliminação de posições de vantagem
jurídica ou direitos de defesa, produzem efeitos que genericamente se podem identificar como
direito a não impedimento de ações – por exemplo, a liberdade religiosa, ao mesmo tempo em que é
assegurada enquanto direito, estabelece um direito ao não impedimento do que ali está estatuído (ou
seja, contém um direito à crença e um direito a não ser impedido de exercê-lo).
Inclui-se no âmbito da proteção da norma em seu aspecto negativo qualquer hipótese fática que
consubstancie ato de impedimento ao exercício da liberdade religiosa.
Nessa perspectiva, quando o Estado é responsável pela prática de qualquer ato de perturbação de
direito fundamental, a proteção jusfundamental se dera em termos de um direito de defesa, sob a
modalidade de criar ao pertubador um dever de não impedir o comportamento protegido.
65

Por outro lado, quando um indivíduo for o responsável pelo pela perturbação que protege o
exercício da liberdade protegida titulada por outro indivíduo, para o Estado surge, como
conseqüência do dever de proteção, o dever de prestar positivamente algo ao titular do direito
perturbado.

5.23. O que são direitos a não-afetações?


Também considerados direitos de defesa, são normas que estabelecem para o Estado obrigações de
não afetar propriedades ou situações do titular do direito. Segundo Alexy, são exemplos: direito à
vida, à saúde, à inviolabilidade do domicílio, inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e
imagem, inviolabilidade do sigilo de correspondência e comunicações telefônicas, respeito à
integridade física e moral dos presos.

5.24. Em que consistem os direitos a não eliminações de posições jurídicas?


Dentre os direitos fundamentais há aqueles que, além de estabelecerem em favor do titular uma
específica forma de proteção a um direito a algo, estatuem ao Estado um dever de não eliminar
aquelas determinadas posições, condições ou situações de vantagem jurídica, ou ainda, de prover
imediatamente, à cessação de uma lesão ou ameaça de direito especificamente incluído em seu
âmbito de proteção.
As garantias constitucionais oriundas dos direitos de defesa que se efetivam como direito a não
eliminação de posições, situações ou condições de vantagem jurídica tanto podem se referir ao
direito subjetivo, em proteção do direito individual, quanto do direito objetivo, em defesa do direito
coletivo, bem como à situações de direito público ou privado, erigidos à categoria de direito
constitucional. Como exemplos de garantia do direito objetivo, cite-se as garantias de rigidez
constitucional (art. 60, I, II e III, CF), separação de poderes (art. 2º), controle concentrado de
constitucionalidade e inalterabilidade da forma federativa (art. 60, § 4º, I). Como garantia a um
direito subjetivo, cite-se as garantias institucionais de propriedade (art. 5º, XXII), de herança (art.
5º. XXX e XXXI) e direitos autorais (art. 5º, XXVII).

5.25. O que são direitos a prestações positivas?


São direitos que se vinculam à idéia de que é incumbência do Estado disponibilizar os meios
materiais e os implementos das condições fáticas aptas a possibilitarem o exercício das liberdades.
Para alguns doutrinadores, têm esses direitos como principal objetivo assegurar tanto aos indivíduos
quanto aos grupos em que se inserem a participação na vida política, econômica, social e cultural.
Suas características marcantes seriam, do ponto de vista objetivo, o de se constituírem em um
conjunto de normas através das quais o Estado se desincumbe de sua tarefa de equilibrar as
desigualdades sociais; e do ponto de vista subjetivo, de serem faculdades atribuídas a indivíduos e
grupos de participarem dos benefícios da vida em comunidade, que corresponde a direitos a
prestações diretas e indiretas pelo poder público.
66

Por isso, Alexy define os direitos a prestações como sendo todos os direitos fundamentais a um ato
positivo, uma ação do Estado, identificando-os como contrapartida exara ao conceito de direitos de
defesa.
Segundo Canotilho, os direitos sociais prestacionais, no plano jurídico-dogmático, promovem uma
inversão relativamente ao objeto do direito subjetivo, na exata medida em que postulam uma
proibição de omissão estatal, impondo aos poderes públicos uma intervenção ativa traduzida no
dever de fornecimento de prestações positivas, embora o façam por intermédio de imposições
constitucionais que, em razão da vagueza e indeterminação, dependem sempre a interposição do
legislador ordinário e demais órgãos aptos à concretização da norma jusfundamental.
Dentre tais direitos, incluem-se o direito à saúde, à educação, à aposentadoria, à participação dos
partidos políticos nos recursos do fundo partidário, ao acesso à Justiça e à assistência judiciária
gratuita. Ressalte-se que entre o art. 5º da CF não se encontram somente direitos a prestações
negativas como também direitos a prestações positivas, tais como o mencionado direito à
assistência judiciária gratuita, o direito à informações de interesse particular, direito à obtenção de
certidões, direito das presas de amamentação de seus filhos, direito do preso à identificação dos
responsáveis por sua prisão, direito à indenização pelo erro judiciário, direito ao registro civil de
nascimento e certidão de óbito aos reconhecidamente pobres, direito à gratuidade de HC e HD, e
direito à razoável duração do processo.
Também se encaixam os direitos sociais, os quais o constituinte alinhou direitos tipicamente de
defesa; entretanto, não podem ser entendidas como sinônimos de dimensão prestacional positiva.
67

6. PERSPECTIVA OBJETIVA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. CATÁLOGO DOS


DIREITOS FUNDAMENTAIS. SUJEITOS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS.
FUNCIONALIDADE DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. LIMITES E RESTRIÇÕES AOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS. A PROIBIÇÃO DE RETROCESSO SOCIAL. CLÁUSULAS
PÉTREAS.

AUTOR: TIAGO BISCOLI DE PIZZOL


MATERIAL DE CONSULTA: CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL – INGO SARLET, MARINONI E MITIDIERO (2012).

6.1.1. O que significa compreender os direitos fundamentais a partir de sua perspectiva


objetiva?
Os direitos fundamentais passaram a apresentar-se, no âmbito da ordem constitucional, como um
conjunto de valores objetivos básicos e fins diretivos da ação positiva dos poderes públicos, e não
apenas garantias negativas (e positivas) dos interesses individuais.
Significa que às normas que preveem direitos subjetivos é outorgada função autônoma, que
transcende a perspectiva subjetiva. Isto é, apresentam um reforço da juridicidade das normas de
direitos fundamentais.

6.1.2. Quais são as consequências jurídicas do viés objetivo dos direitos fundamentais?
1) A compreensão objetiva dos direitos fundamentais tem como principais consequências: a
eficácia irradiante dos direitos fundamentais, na condição de que estes, como direitos objetivos,
fornecem impulsos e diretrizes para a aplicação e interpretação do direito infraconstitucional,
implicando uma interpretação conforme aos direitos fundamentais de todo o ordenamento jurídico.
2) Além disso, a perspectiva objetiva dos direitos fundamentais, aliada ao reconhecimento da
supremacia normativa da constituição e ao controle de constitucionalidade das leis, redunda no
fenômeno da Constitucionalização do Direito, incluindo a questão da eficácia dos direitos
fundamentais na esfera particular.
3) Outrossim, são oriundos da perspectiva objetiva dos direitos fundamentais os deveres de
proteção do Estado, impondo aos órgãos estatais a obrigação permanente de, inclusive
preventivamente, zelar pela proteção dos direitos fundamentais dos indivíduos, não somente contra
os poderes públicos, mas também contra agressões por parte de particulares e até mesmo por parte
de outros Estados. Por força dos deveres de proteção, aos órgãos estatais incumbe assegurar níveis
eficientes de proteção para os diversos bens fundamentais, o que implica não apenas a vedação de
omissões, mas também a proibição de uma proteção manifestamente insuficiente.
4) Por fim, vinculada à dimensão objetiva, surge também a designada função organizatória
procedimental, no sentido de que a partir das normas de direitos fundamentais extraem-se
consequências para a aplicação e a interpretação das normas procedimentais, e também para a
formatação do direito organizacional e procedimental, a bem de auxiliar na efetivação e na proteção
dos direitos fundamentais.
68

6.2. Qual é a diferença entre os conceitos de titular e de destinatário de um direito


fundamental?
O titular do direito é o sujeito do direito, é quem figura como sujeito ativo da relação de direito
subjetivo. Aqui incide o Princípio da Universalidade, no sentido de que toda pessoa, por ser pessoa,
são titulares de direitos e deveres fundamentais.
De outra banda, destinatário do direito é a pessoa (física ou mesmo jurídica ou ente
despersonalizado) em face da qual o titular pode exigir o respeito, proteção ou promoção do seu
direito. Uma observação importante é que a titularidade de direitos fundamentais não pode ocorrer
de modo prévio para os direitos fundamentais em geral, mas reclama identificação individualizada,
à luz de cada norma de direito fundamental e das circunstâncias do caso concreto e de quem figura
nos polos da relação jurídica.

6.3. Explique as funções que desempenham na ordem jurídica os direitos fundamentais.


Segundo Canotilho, há quatro funções: função de defesa ou de liberdade; função de prestação
social; função de proteção perante terceiros e função de não discriminação.
Gomes Canotilho ensina que a função de defesa ou de liberdade dos direitos fundamentais tem
dupla dimensão: (1) constituem, num plano jurídico-objectivo, normas de competência negativa
para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídica
individual; (2) implica, num plano jurídico-subjectivo, o poder de exercer positivamente direitos
fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar
agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa).
A função prestacional atribui à pessoa o direito social de obter um benefício do Estado, impondo-
se a este o dever de agir, para satisfazê-lo diretamente, ou criar as condições de satisfação de tais
direitos. Em regra, está relacionada aos direitos fundamentais à saúde, à educação, à moradia, ao
transporte coletivo etc.
Afirma Gomes Canotilho que "Muitos direitos impõem um dever ao Estado (poderes públicos) no
sentido de este proteger perante terceiros os titulares de direitos fundamentais". É a função de
proteção perante terceiros.
A função de não discriminação diz respeito a todos os direitos fundamentais. Refere-se, por
exemplo, aos direitos civis e políticos e aos direitos econômicos, sociais e culturais. Nenhuma
pessoa poderá ser privada de um direito fundamental em razão de discriminação
(texto adaptado do artigo de Zulmar Fachin disponível em JusBrasil).

6.4.1. O que significa o âmbito de proteção de um direito fundamental? Ele está sujeito a
intervenções?
Todo direito fundamental possui um âmbito de proteção, que nada mais é do que um campo de
incidência normativa ou suporte fático, e todo direito fundamental está sim sujeito a intervenções
neste âmbito de proteção.
69

6.4.2. Sabendo-se que não existem direitos fundamentais absolutos, sendo estes, portanto,
limitados, explique a distinção entre a teoria interna e a teoria externa dos limites aos direitos
fundamentais.
Segundo a Teoria Interna, um direito fundamental existe desde sempre com seu conteúdo
determinado, afirmando-se mesmo que o direito já “nasce” com o seus limites.
Neste sentido, fala-se na existência de “limites imanentes”, que consistem em fronteiras implícitas,
de natureza apriorísticas. Assim, correta a afirmação de que para a teoria interna o processo de
definição dos limites do direito é algo interno a ele. A teoria interna não admite restrições a direitos
fundamentais, pois eles já possuem restrições por eles próprios definidas.
A teoria externa considera que o direito fundamental é, inicialmente, ilimitado. Mediante eventuais
restrições, ele se converte num direito limitado. Tal construção parte do pressuposto de que existe
uma distinção entre posição prima facie e posição definitiva, a primeira correspondendo ao direito
antes de sua limitação, a segunda equivalente ao direito já limitado.
Segundo Ingo Sarlet, a teoria externa acaba sendo mais apta a proporcionar a reconstrução
argumentativa das colisões de direitos fundamentais, tendo em conta a necessidade de imposição de
limites a tais direitos.

6.4.3. O que significam e como ocorrem as limitações a direitos fundamentais?


Limites aos direitos fundamentais podem ser definidos como ações ou omissões dos poderes
públicos (Legislativo, Executivo e Judiciário) ou de particulares que dificultem, reduzam ou
eliminem o acesso ao bem jurídico protegido, afetando o seu exercício (aspecto subjetivo) e/ou
diminuindo deveres estatais de garantia e promoção (aspecto objetivo) que resultam dos direitos
fundamentais.
Todavia, nem toda disciplina normativa dos direitos fundamentais pode ser caracterizada como
constituindo uma limitação. Muitas vezes as normas legais se limitam a detalhar tais direitos a fim
de possibilitar o seu exercício, situações que correspondem aos termos configurar, conformar,
completar, regular, densificar ou concretizar.
Diferentemente, as limitações propriamente ditas reduzem o alcance de conteúdos prima facie
conferidos a posições de direitos fundamentais mediante a imposição de cargas coativas. Ademais,
há de se distinguir as normas que limitam bens jurídicos protegidos prima facie das que
fundamentam a competência estatal para realizar essas limitações.
Com efeito, enquanto as primeiras, as limitações propriamente ditas, consistem em mandados ou
proibições dirigidos aos cidadãos (titulares de direitos fundamentais), as últimas – chamadas
reservas legais – não configuram limitações na acepção mais rigorosa do termo, e sim autorizações
constitucionais que fundamentam a possibilidade de o legislador restringir direitos fundamentais.
No que diz respeito às espécies de limitações, registra-se substancial consenso quanto ao fato de que
os direitos fundamentais podem ser restringidos tanto por expressa disposição constitucional como
por norma legal promulgada com fundamento na Constituição. A restrição reclama, seja direta ou
indiretamente, um fundamento constitucional para ser válida.
70

6.4.4. O que significam as restrições indiretas?


São as restrições a direitos fundamentais estabelecidas por lei, com amparo constitucional.
Este amparo constitucional dá-se através das reservas legais, que nada mais são do que disposições
constitucionais que autorizam o legislador a intervir no âmbito de proteção dos direitos
fundamentais.

6.4.5. Qual é a distinção conceitual entre reservas legais simples e reservas legais qualificadas?
As reservas legais simples autorizam o legislador a intervir no âmbito de proteção de um direito
fundamental sem estabelecer pressupostos ou objetivos específicos a serem observados, implicando,
portanto, a atribuição de uma competência mais ampla de restrição.
As reservas legais qualificadas têm como traço distintivo o fato de estabelecerem pressupostos e/ou
objetivos a serem atendidos pelo legislador ordinário para limitar os direitos fundamentais.

6.4.6. No tema das reservas legais, o que significa o conceito de “reserva geral imanente de
ponderação”?
O conceito é apresentado por Jorge Reis Novais para explicar o fenômeno de direitos fundamentais
que não possuem limitações previstas no texto constitucional, mas que, eventualmente, em razão de
colisão com outros direitos fundamentais, poderão casuisticamente ser restringidos, sem que tal
restrição afigura-se abusiva.
Como salienta Ingo, a solução amplamente preconizada afirma a necessidade de se respeitar a
proteção constitucional dos diferentes direitos no quadro da unidade da constituição, buscando
harmonizar preceitos que apontam para resultados diferentes, muitas vezes contraditórios.

6.5.1. O que significa o princípio da proibição do retrocesso social?


O princípio possui conteúdos positivo e negativo. O conteúdo positivo encontra-se no dever de o
legislador manter-se no propósito de ampliar, progressivamente e de acordo com as condições
fáticas e jurídicas (incluindo as orçamentárias), o grau de concretização dos direitos fundamentais
sociais.
Não se trata de mera manutenção do status quo, mas de imposição da obrigação de avanço social.
O conteúdo negativo - subjacente a qualquer princípio - que, no caso, prevalece sobre o positivo,
refere-se à imposição ao legislador de, ao elaborar os atos normativos, respeitar a não-supressão ou
a não-redução, pelo menos de modo desproporcional ou irrazoável, do grau de densidade normativa
que os direitos fundamentais sociais já tenham alcançado por meio da legislação infraconstitucional,
isto é, por meio da legislação concretizadora dos direitos fundamentais sociais insertos na
Constituição.
Afirma-se, com efeito, que o princípio da proibição de retrocesso social é um princípio
constitucional, com caráter retrospectivo, na medida em que tem por escopo a preservação de um
estado de coisas já conquistado contra a sua restrição ou supressão arbitrárias.
71

No Brasil, o desbravamento do princípio sob estudo é atribuído a José Afonso da Silva, para quem
as normas constitucionais definidoras de direitos sociais seriam normas de eficácia limitada e
ligadas ao princípio programático, que, inobstante tenham caráter vinculativo e imperativo, exigem
a intervenção legislativa infraconstitucional para a sua concretização, vinculam os órgãos estatais e
demandam uma proibição de retroceder na concretização desses direitos. Logo, o autor reconhece
indiretamente a existência do princípio da proibição de retrocesso social.
O STF lançou o primeiro pronunciamento sobre a matéria por meio do acórdão prolatado na ADI nº
2.065-0-DF, na qual se debatia a extinção do Conselho Nacional de Seguridade Social e dos
Conselhos Estaduais e Municipais de Previdência Social. Não obstante o STF não tenha conhecido
da ação, por maioria, por entender ter havido apenas ofensa reflexa à Constituição, destaca-se o
voto do relator originário, Ministro Sepúlveda Pertence, que admitia a inconstitucionalidade de lei
que simplesmente revogava lei anterior necessária à eficácia plena de norma constitucional e
reconhecia uma vedação genérica ao retrocesso social.
O princípio tem sede material na Constituição brasileira de 1988, decorrendo dos princípios do
Estado social e democrático de direito, da dignidade da pessoa humana, da máxima eficácia e
efetividade das normas definidoras de direitos fundamentais, da segurança jurídica e da proteção da
confiança, do valor social do trabalho e da valorização do trabalho humano.
Além disso, o princípio decorre da imposição constitucional de ampliação dos direitos fundamentais
sociais, da redução das desigualdades sociais e da construção de uma sociedade marcada pela
solidariedade e pela justiça social. Levam-se em consideração, ainda, a tendência do direito
internacional de progressiva implementação efetiva da proteção social por parte dos Estados e o
argumento de que a negação do princípio significaria que o legislador dispõe do poder de
livremente tomar decisões, ainda que em flagrante desrespeito à vontade expressa do legislador
constituinte.
(Resposta elaborada com base no livro do Ingo e no artigo http://jus.com.br/artigos/12359/o-
principio-da-proibicao-de-retrocesso-social).
Em tempo, é importante mencionar que o Supremo Tribunal Federal em inúmeros julgados utiliza a
proibição do retrocesso constitucional como um fundamento jurídico bastante forte em suas
decisões. Colaciono a decisão a seguir, a título de exemplo:
DEFENSORIA PÚBLICA – DIREITO DAS PESSOAS NECESSITADAS AO ATENDIMENTO
INTEGRAL, NA COMARCA EM QUE RESIDEM, PELA DEFENSORIA PÚBLICA –
PRERROGATIVA FUNDAMENTAL COMPROMETIDA POR RAZÕES ADMINISTRATIVAS
QUE IMPÕEM, ÀS PESSOAS CARENTES, NO CASO, A NECESSIDADE DE CUSTOSO
DESLOCAMENTO PARA COMARCA PRÓXIMA ONDE A DEFENSORIA PÚBLICA SE
ACHA MAIS BEM ESTRUTURADA – ÔNUS FINANCEIRO, RESULTANTE DESSE
DESLOCAMENTO, QUE NÃO PODE, NEM DEVE, SER SUPORTADO PELA POPULAÇÃO
DESASSISTIDA – IMPRESCINDIBILIDADE DE O ESTADO PROVER A DEFENSORIA
PÚBLICA LOCAL COM MELHOR ESTRUTURA ADMINISTRATIVA – MEDIDA QUE SE
IMPÕE PARA CONFERIR EFETIVIDADE À CLÁUSULA CONSTITUCIONAL INSCRITA NO
ART. 5º, INCISO LXXIV, DA LEI FUNDAMENTAL DA REPÚBLICA – OMISSÃO ESTATAL
QUE COMPROMETE E FRUSTRA DIREITOS FUNDAMENTAIS DE PESSOAS
NECESSITADAS – SITUAÇÃO CONSTITUCIONALMENTE INTOLERÁVEL – O
72

RECONHECIMENTO, EM FAVOR DE POPULAÇÕES CARENTES E DESASSISTIDAS,


POSTAS À MARGEM DO SISTEMA JURÍDICO, DO “DIREITO A TER DIREITOS” COMO
PRESSUPOSTO DE ACESSO AOS DEMAIS DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS –
INTERVENÇÃO JURISDICIONAL CONCRETIZADORA DE PROGRAMA
CONSTITUCIONAL DESTINADO A VIABILIZAR O ACESSO DOS NECESSITADOS À
ORIENTAÇÃO JURÍDICA INTEGRAL E À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITAS (CF,
ART. 5º, INCISO LXXIV, E ART. 134) – LEGITIMIDADE DESSA ATUAÇÃO DOS JUÍZES E
TRIBUNAIS – O PAPEL DO PODER JUDICIÁRIO NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS
PÚBLICAS INSTITUÍDAS PELA CONSTITUIÇÃO E NÃO EFETIVADAS PELO PODER
PÚBLICO – A FÓRMULA DA RESERVA DO POSSÍVEL NA PERSPECTIVA DA TEORIA
DOS CUSTOS DOS DIREITOS: IMPOSSIBILIDADE DE SUA INVOCAÇÃO PARA
LEGITIMAR O INJUSTO INADIMPLEMENTO DE DEVERES ESTATAIS DE PRESTAÇÃO
CONSTITUCIONALMENTE IMPOSTOS AO ESTADO – A TEORIA DA “RESTRIÇÃO DAS
RESTRIÇÕES” (OU DA “LIMITAÇÃO DAS LIMITAÇÕES”) – CONTROLE JURISDICIONAL
DE LEGITIMIDADE SOBRE A OMISSÃO DO ESTADO: ATIVIDADE DE FISCALIZAÇÃO
JUDICIAL QUE SE JUSTIFICA PELA NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DE CERTOS
PARÂMETROS CONSTITUCIONAIS (PROIBIÇÃO DE RETROCESSO SOCIAL,
PROTEÇÃO AO MÍNIMO EXISTENCIAL, VEDAÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE E
PROIBIÇÃO DE EXCESSO) – DOUTRINA – PRECEDENTES – A FUNÇÃO
CONSTITUCIONAL DA DEFENSORIA PÚBLICA E A ESSENCIALIDADE DESSA
INSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO (AGR no RE
763667, Min, Celso de Mello, j. 22/10/2013).

6.5.2. O que significa o “efeito cliquet” dos direitos fundamentais?


Segundo Dirley da Cunha Jr., um dos postulados mais notáveis que informam a Teoria dos Direitos
Fundamentais é a “proibição do retrocesso”, também conhecido como efeito “cliquet” dos Direitos
Fundamentais, que busca a proteção máxima dos Direitos da Pessoa Humana contra qualquer
medida normativa ou política de supressão ou enfraquecimento.
A expressão “cliquet” é de origem francesa, empregada pelos alpinistas para significar que, a partir
de um determinado ponto da escalada, não é possível retroceder, devendo prosseguir sempre para
cima, designando um movimento em que só é permitida a subida no percurso.
Pois bem, o postulado da “proibição do retrocesso” orienta a evolução dos Direitos Fundamentais,
em especial os Direitos Sociais aos quais o postulado em tela está mais associado, no sentido de
que, uma vez reconhecidos na ordem jurídica, os Direitos não podem ser suprimidos ou
enfraquecidos, sob pena de inconstitucionalidade.

6.6.1. O que é uma cláusula pétrea?


A cláusula pétrea é uma disposição constitucional imutável por opção do legislador constitucional, a
bem de estabilizar certas matérias de maior importância social e jurídica. Não está sujeita ao poder
constitucional reformador, portanto.
73

As cláusulas pétreas encontram previsão constitucional no art. 60, com a seguinte redação:
§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
Observem que o próprio Artigo 60, §4º é considerado, indiretamente, também uma cláusula pétrea e
não pode ser suprimido. Ou seja, ele não pode ser objeto de uma proposta de emenda constitucional,
o que seria considerado uma burla ao sistema constitucional, através do que a doutrina chama de
"dupla revisão".
Defende-se a existência de cláusulas pétreas implícitas, como o Princípio Republicano. Vejamos:
As limitações materiais permitem que o núcleo essencial do Estado, previsto na Constituição, seja
resguardado de toda e qualquer emenda pleiteadora de modificação, de modo a preservar a
identidade do texto constitucional. Assim, as cláusulas pétreas, previstas expressamente no artigo
60, parágrafo 4º da CF/88, constituem matérias intocáveis.
Nesse contexto, merece destaque a forma de governo Republicana como limitação material
implícita que, embora não se localize diretamente no texto da Magna Carta, traz conteúdos
fundamentais, que se relacionam direta e indiretamente com as cláusulas pétreas e os princípios
constitucionais.
Se as cláusulas pétreas têm como função proporcionar a estabilidade do ordenamento jurídico, a
República também tem esse mesmo escopo. A sua inobservância como limitação material implícita
ao poder reformador resultar-se-á em violação à cláusula pétrea explícita, qual seja, o voto
periódico, conquanto a existência deste torna-se incompatível com os princípios mantenedores da
monarquia: a hereditariedade e a vitaliciedade.
Outrossim, transgredir-se-á o Princípio da Soberania Popular, visto que uma vez manifestada a
vontade popular favoravelmente à implantação do regime Republicano, por meio do plebiscito,
ocorrido em 21 de abril de 1993 (artigo 2º do Atos das Disposições Constitucionais Transitórias), há
que se respeitar tal decisão - fruto do poder emanado diretamente pelo povo.
Por fim, a natureza constitucional da República - princípio norteador de todo o sistema jurídico
brasileiro-, embora não prevista como cláusula pétrea, deve ser efetivamente reconhecida como uma
limitação material implícita ao poder de reforma, haja vista sua imprescindibilidade à estrutura
político-governamental atual do país.
74

7. TUTELAS CONSTITUCIONAIS. HABEAS CORPUS. HABEAS DATA. MANDADO DE


SEGURANÇA INDIVIDUAL E COLETIVO. DIREITO DE PETIÇÃO E DE CERTIDÃO.
MANDADO DE INJUNÇÃO. AÇÃO POPULAR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
AUTORA: MARIA APARECIDA ESTEVES AVILES.
MATERIAIS DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO – PEDRO LENZA (2013) E REVISAÇO
CARREIRAS JURÍDICAS DEFENSORIA PÚBLICA ESTADUAL – COORDENADORES ROGÉRIO SANCHES CUNHA E LUCIANO
ROSSATO (2013).

7.1. Cite algumas características do habeas corpus.


Previsto no artigo 5º, LXVIII da CRFB, a ser concedido sempre que alguém sofrer ou se achar
ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção (também denominada
ambulatorial), por ilegalidade ou abuso de poder, referida ação pode ser formulada sem advogado,
não tendo de obedecer a qualquer formalidade processual ou instrumental, sendo, por força do
artigo 5º, LXXVII, gratuita.
Pode ser impetrado para trancar ação penal ou inquérito policial, bem como em face de particular,
como no clássico exemplo de hospital psiquiátrico que priva o paciente de sua liberdade de ir e vir,
ilegalmente, atendendo a pedidos desumanos de filhos ingratos que abandonam os seus pais.
O impetrante poderá ser qualquer pessoa física (nacional ou estrangeira) em sua própria defesa, em
favor de terceiro, podendo ser o Ministério Público ou mesmo pessoa jurídica (mas, é claro, em
favor de pessoa física, pois não há que se falar em liberdade ambulatorial de pessoa jurídica).

7.2. Como se dá a competência para apreciação do habeas corpus?


O órgão competente para apreciar a ação de habeas corpus será determinado de acordo com a
autoridade coatora (que pratica a ilegalidade ou abuso de poder), sendo que a Constituição prevê
algumas situações em que atribui previamente a competência a tribunais, em razão do paciente (o
indivíduo em favor do qual se impetra o HC) ou da autoridade coatora. Por exemplo: artigo 102, I,
d; artigo 105, I, c; artigo 108, I, d.
No caso de HC impetrado em face de ato de Turma Recursal, o STF entendeu superada a Súmula
690, definindo a competência originária do TJ local para o julgamento de HC contra decisão de
turma recursal de juizados especiais criminais.

7.3. Quais são as espécies de habeas corpus?


Preventivo: quando alguém se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de
locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder (a restrição à locomoção ainda não se consumou).
Nessa situação, poderá obter um salvo-conduto, para garantir o livre trânsito de ir e vir.
Liberatório ou repressivo: quando a constrição ao direito de locomoção já se consumou; objetiva
cessar a violência ou coação. Exemplo: quando a pessoa estiver presa ou quando já tiver sido
expedido um mandado de prisão.
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7.4. O HC é medida idônea para impugnar decisão judicial que autoriza a quebra de sigilos
fiscal e bancário em procedimento criminal?
Sim, haja vista a possibilidade de a quebra desses sigilos resultar em constrangimento à liberdade
do investigado. (STF. AI 573623 QO/RJ, julgado em 2006 e relatado pelo Ministro Gilmar
Mendes).

7.5. É cabível HC em relação a punições disciplinares militares? Há exceção?


Em regra, segundo o §2º, do artigo 142 da CRFB, não caberá HC em relação a punições
disciplinares militares.
Trata-se da impossibilidade de se analisar o mérito de referidas punições, não abrangendo, contudo,
os pressupostos de legalidade (hierarquia, poder disciplinar, ato ligado à função e pena suscetível de
ser aplicada disciplinarmente). HC 70.648, Moreira Alves, e, ainda, RE 338.840-RS, Rel. Min.
Ellen Gracie, 19.08.2003.

7.6. Cite algumas hipóteses existentes na jurisprudência do STF em que não cabe HC.
Quando já extinta a pena privativa de liberdade (súmula 695, STF); contra a imposição da pena de
exclusão de militar ou de perda de patente ou de função pública (súmula 694, STF); contra decisão
condenatória a pena de multa, ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena
pecuniária seja a única cominada (súmula 693, STF).

7.7. A que se destina o habeas data?


A garantia constitucional do habeas data, regulamentada pela lei 9.507/1997, destina-se a
disciplinar o direito de acesso a informações, constantes de registros ou bancos de dados de
entidades governamentais ou de caráter público, para o conhecimento ou retificação (tanto
informações erradas como imprecisas, ou apesar de corretas e verdadeiras, desatualizadas), todas
referentes a dados pessoais, concernentes à pessoa do impetrante.

7.8. O habeas data se confunde com o direito de obter certidões (artigo 5º, XXXIV, b, CRFB)
ou informações de interesse particular, coletivo ou geral (artigo 5º, XXXIII, CRFB)?
Não. Havendo recusa no fornecimento de certidões (para a defesa de direitos ou esclarecimentos de
situações de interesse pessoal, próprio ou de terceiros) ou informações de terceiros, o remédio
próprio é o mandado de segurança, e não o habeas data. Se o pedido for para assegurar o
conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, o remédio será o habeas data.
O habeas data não pode ser confundido com o direito à obtenção de certidões em repartições
públicas. Ao pleitear a certidão, o solicitante deve demonstrar que o faz para defesa de direitos e
esclarecimentos de situações de interesse pessoal. No habeas data, basta o simples desejo de
conhecer as informações relativas à sua pessoa, independentemente da demonstração de que elas se
prestarão à defesa de direitos.
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7.9. De quem é a legitimidade ativa e a passiva para o habeas data?


Qualquer pessoa, física ou jurídica, poderá ajuizar a ação constitucional de habeas data para ter
acesso às informações a seu respeito.
O polo passivo será preenchido de acordo com a natureza jurídica do banco de dados. Em se
tratando de registro ou banco de dados de entidade governamental, o sujeito passivo será a pessoa
jurídica componente da administração direta e indireta do Estado.
Na hipótese de registro ou banco de dados de entidade de caráter público, a entidade que não é
governamental, mas, de fato, privada, figurará no polo passivo da ação. Exemplo: as empresas
privadas de serviço de proteção ao crédito (SPC): artigo 43, §4º do CDC.

7.10. Como é o procedimento do habeas data?


O artigo 8º da lei regulamentadora estabelece a necessária recusa de informações ou recusa em
fazer-se a retificação ou anotação no cadastro do interessado pela autoridade, sob pena de,
inexistindo pretensão resistida, a parte ser julgada carecedora da ação, por falta de interesse
processual.
O artigo 21 da lei do habeas data, em cumprimento ao dispositivo constitucional constante do artigo
5º, LXXVII, estabeleceu serem gratuitos o procedimento administrativo para acesso a informações
e retificação de dados e para anotações de justificação, bem como a ação de habeas data.

7.11. Qual é a natureza jurídica do mandado de segurança?


O mandado de segurança é uma ação constitucional de natureza civil, qualquer que seja a natureza
do ato impugnado, seja ele administrativo, seja ele jurisdicional, criminal, eleitoral, trabalhista, etc.

7.12. Qual é a abrangência do mandado de segurança?


Consoante o disposto no artigo 5º, LXIX, da CRFB, excluindo-se a proteção de direitos inerentes à
liberdade de locomoção (em que cabível o HC) e ao acesso ou retificação de informações relativas à
pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou
de caráter público (em que cabível o habeas data), através do MS busca-se a invalidação de atos de
autoridade ou a supressão dos efeitos da omissão administrativa, geradores de lesão a direito líquido
e certo, por ilegalidade ou abuso de poder.
Portanto, tanto os atos vinculados quanto os atos discricionários são atacáveis por mandado de
segurança, porque a Constituição Federal e a lei ordinária, ao aludirem ilegalidade, estão se
referindo ao ato vinculado, e ao se referirem a abuso de poder estão se reportando ao ato
discricionário.
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7.13. O que seria direito líquido e certo?


É aquele que pode ser demonstrado de plano mediante prova pré-constituída, sem a necessidade de
dilação probatória. Trata-se de direito manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e
apto a ser exercitado no momento da impetração.
Importante lembrar a correção feita pela doutrina em relação à terminologia empregada pela
Constituição, na medida em que todo direito, se existente, já é líquido e certo. Os fatos é que
deverão ser líquidos e certos para o cabimento do writ.

7.14. Quem possui legitimidade ativa e passiva no MS?


O legitimado ativo, sujeito ativo, impetrante é o detentor de direito líquido e certo não amparado
por habeas corpus ou habeas data.
Assim, incluem-se: pessoas físicas (brasileiras ou não, residentes e domiciliadas, ou não); jurídicas;
órgãos públicos despersonalizados, porém com capacidade processual (Chefias dos Executivos,
Mesas do Legislativo); universalidade de bens e direitos (espólio, massa falida, condomínio);
agentes políticos (governadores, parlamentares); o Ministério Público, etc.
Já o legitimado passivo, sujeito passivo, impetrado é a autoridade coatora, responsável pela
ilegalidade ou abuso de poder, autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de
atribuições do Poder Público. De acordo com o artigo 6º, §3º da lei 12.016/2009, considera-se
autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a
sua prática.
Nos termos do artigo 1º, §1º do referido ato normativo, equiparam-se às autoridades os
representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem
como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder
público, somente no que disser respeito a essas atribuições.

7.15. Discorra sobre a competência para processar e julgar o mandado de segurança e as


espécies de MS.
A competência dependerá da categoria da autoridade coatora e a sua sede funcional, sendo definida
nas leis infraconstitucionais, bem como na própria CF.
No tocante à competência do MS contra atos e omissões de Tribunais, a jurisprudência do STF
(súmula 624) e a do STJ (súmula 41) é pacífica em reafirmar a competência dos próprios Tribunais
para processarem e julgarem os MS impetrados contra seus atos e omissões.
Em relação às espécies, o MS pode ser repressivo de ilegalidade ou abuso de poder já praticados, ou
preventivo, quando estivermos diante de ameaça à violação de direito líquido e certo do impetrante.

7.16. Qual é a grande diferença entre o MS individual e o coletivo?


Reside em seu objeto e na legitimação ativa. O objeto no MS coletivo cuida de interesses
transindividuais, sejam os individuais homogêneos, sejam os coletivos (artigo 21, parágrafo único
da lei 12.016/2009).
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Já a legitimidade ativa para o MS coletivo vem prevista no artigo 5º, LXX da CRFB: partido
político com representação no Congresso Nacional; organização sindical, entidade de classe ou
associação.
No caso apenas da associação, segundo entendimento do STF (RE 198.919-DF, Rel. Min. Ilmar
Galvão, 15.06.1999, Inf. 154/STF), há o requisito de estarem em funcionamento há pelo menos um
ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados. (Vide súmulas 629 e 630 do STF,
bem como o artigo 21 da lei 12.016/2009).
Ao se referir à defesa dos interesses dos membros ou associados, a Constituição estabeleceu a
necessária existência de pertinência temática do objeto da ação coletiva com os objetivos
institucionais do sindicato, entidade de classe ou associação. Trata-se de verdadeira substituição
processual (legitimação extraordinária) das entidades representando direitos alheios de seus
associados.

7.17. Os partidos políticos poderão representar somente seus filiados e na defesa de, apenas,
direitos políticos?
Há controvérsia. Pedro Lenza entende que não, podendo defender qualquer direito inerente à
sociedade, pela própria natureza do direito de representação previsto no artigo 21, parágrafo único
da lei 12.016/2009. Para ele, entendimento contrário seria restritivo do previsto na CF, burlando o
objetivo maior de defesa da sociedade, já que o constituinte originário não colocou qualquer
limitação à atuação dos partidos políticos, a não ser a representação no Congresso Nacional.
Entretanto, essa não é a posição adotada pelo STJ (MS 197/DF, 20.08.1990, RSTJ, 12/215:
“Quando a Constituição autoriza um partido político a impetrar mandado de segurança coletivo,
só pode ser no sentido de defender os seus filiados e em questões políticas, ainda assim, quando
autorizado por lei ou pelo estatuto. Impossibilidade de dar a um partido político legitimidade para
vir a Juízo defender 50 milhões de aposentados, que não são, em sua totalidade, filiados ao partido
e que não autorizaram o mesmo a impetrar mandado de segurança em nome deles”.

7.18. Se um partido político ajuizar mandado de segurança coletivo, esta ação induzirá
litispendência caso algum cidadão ajuíze individualmente uma ação sobre o mesmo fato?
Não, de acordo com o artigo 22, §1º da lei 12.016/2009, mas os efeitos da coisa julgada não
beneficiarão o impetrante a título individual se não requerer a desistência de seu mandado de
segurança no prazo de trinta dias, a contar da ciência comprovada da impetração da segurança
coletiva.

7.19. Para que uma entidade de classe possa ajuizar MS coletivo, a pretensão veiculada deve
ser de interesse da totalidade da respectiva categoria? E esse ajuizamento dependerá da
autorização dos associados?
Em relação à primeira questão, não, segundo a súmula 630 do STF: “A entidade de classe tem
legitimação para o mandado de segurança ainda quando a pretensão veiculada interesse apenas a
uma parte da respectiva categoria”.
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A resposta da segunda pergunta também é negativa, nos termos da súmula 629 do STF: “A
impetração de mandado de segurança coletivo por entidade de classe em favor dos associados
independe da autorização destes”.

7.20. Qual é a definição de direito de petição?


Segundo José Afonso da Silva, o direito de petição define-se como o direito que pertence a uma
pessoa de invocar a atenção dos poderes públicos sobre uma questão ou situação, seja para
denunciar uma lesão concreta e pedir a reorientação da situação, seja para solicitar uma modificação
do direito em vigor no sentido mais favorável à liberdade. Há nele uma dimensão coletiva
consistente na busca ou defesa de direitos ou interesses gerais da coletividade.
Esse direito pode ser exercido por qualquer pessoa, física ou jurídica, nacional ou estrangeira,
independe do pagamento de taxas e está previsto no artigo 5º, XXXIV, a, da CRFB. Contudo, o
direito de petição não assegura, por si só, a possibilidade de o interessado – que não dispõe de
capacidade postulatória - ingressar em juízo, para, independentemente de advogado, litigar em
nome próprio ou como representante de terceiros.

7.21. Diferencie direito de petição e direito de ação.


O objetivo do direito de petição nada mais é do que, em nítido exercício das prerrogativas
democráticas, levar ao conhecimento do Poder Público a informação ou notícia de um ato ou fato
ilegal, abusivo ou contra direitos, para que este tome as medidas necessárias.
Nesse sentido, diferentemente do direito de ação, não tem o peticionário de demonstrar lesão ou
ameaça de lesão a interesse, pessoal ou particular. Trata-se de nítida participação política por
intermédio de um processo.

7.22. O artigo 5º, XXXIV, b, da CRFB prevê o direito de obtenção de certidões em repartições
públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal. Há algum
prazo legal para a expedição dessas certidões?
Sim. O artigo 1º da Lei 9.051/95 dispõe que “as certidões para a defesa de direitos e
esclarecimentos de situações, requeridas aos órgãos da administração centralizada ou autárquica, às
empresas públicas, às sociedades de economia mista e às fundações públicas da União, dos Estados,
do DF e dos Municípios, deverão ser expedidas no prazo improrrogável de quinze dias, contado do
registro do pedido no órgão expedidor”.

7.23. É cabível o pedido genérico de certidão?


Não. O artigo 2º da Lei 9.051/95 estabelece que “nos requerimentos que objetivam a obtenção das
certidões a que se refere esta lei, deverão os interessados fazer constar esclarecimentos relativos
aos fins e razões do pedido”. Assim, condenável o pedido genérico de certidão, devendo o
interessado discriminar o objeto de seu interesse.
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7.24. Qual é o remédio cabível em não sendo atendido o pedido de certidão, de forma ilegal ou
por abuso de poder?
Mandado de segurança, e não habeas data. Trata-se de direito líquido e certo de obter certidões
expedidas pelas repartições públicas seja para a defesa de direitos, seja para esclarecimentos de
situações de interesse pessoal, próprio ou de terceiros. Como exemplo, o direito de o funcionário
público obter certidão perante a autoridade administrativa para requerer a sua aposentadoria.

7.25. O direito de certidão é absoluto?


Não, podendo ser negado em caso de o sigilo ser imprescindível à segurança da sociedade ou do
Estado. Nesse sentido, regulando o artigo 23 da Lei 8.159/91, destaca-se o Decreto 4.553/2002.

7.26. Quais são os dois requisitos constitucionais para o mandado de injunção (artigo 5º,
LXXI, CRFB)?
O primeiro é a norma constitucional de eficácia limitada, prescrevendo direitos, liberdades
constitucionais e prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. O segundo é a
falta de norma regulamentadora, tornando inviável o exercício dos direitos, liberdades e
prerrogativas acima mencionados (omissão do Poder Público).
Dessa forma, assim como a ADO – ação direta de inconstitucionalidade por omissão, o mandado de
injunção serve para curar uma doença denominada síndrome de inefetividade das normas
constitucionais de aplicabilidade mediata e reduzida, dividindo-se em dois grandes grupos:
a) Normas de eficácia limitada, declaratórias de princípios institutivos ou organizativos:
normalmente criam órgãos (artigos 91, 125, §3º, 131, etc.);
b) Normas declaratórias de princípios programáticos: veiculam programas a serem
implementados pelo Estado (artigos 196, 215, 218, caput, etc.).

7.27. Diferencie mandado de injunção de ADO.


Dentre as várias distinções, Dirley da Cunha Júnior observa que “o mandado de injunção foi
concebido como instrumento de controle concreto ou incidental de constitucionalidade da omissão,
voltado à tutela de direitos subjetivos”.
“Já a ação direta de inconstitucionalidade por omissão foi ideada como instrumento de controle
abstrato ou principal de constitucionalidade da omissão, empenhado na defesa objetiva da
Constituição. Isso significa que o mandado de injunção é uma ação constitucional de garantia
individual, enquanto a ação direta de inconstitucionalidade por omissão é uma ação constitucional
de garantia da Constituição”.
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7.28. A quem pertence a legitimidade ativa e passiva para o mandado de injunção?


Qualquer pessoa poderá impetrar o MI, quando a falta de norma regulamentadora estiver
inviabilizando o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas inerentes à nacionalidade, à
soberania e à cidadania.
O STF, inclusive, admitiu o ajuizamento de mandado de injunção coletivo, sendo legitimados, por
analogia, as mesmas entidades do mandado de segurança coletivo. O requisito será a falta de norma
regulamentadora que torne inviáveis os direitos, liberdades ou prerrogativas dos membros ou
associados (indistintamente).
No tocante ao polo passivo, somente a pessoa estatal poderá ser demandada e nunca o particular
(que não tem o dever de regulamentar a CF). Ou seja, os entes estatais é que devem regulamentar as
normas constitucionais de eficácia limitada, como o Congresso Nacional.

7.29. Pessoa jurídica de direito público pode impetrar MI?


Trata-se de situação distinta do MI coletivo. Isso porque a pessoa jurídica de direito público
impetraria o MI em seu nome próprio e tendo por fundamento a falta de norma da Constituição que
inviabilize, para a entidade de direito público, o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas
inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.
Embora exista decisão não admitindo a legitimação ativa da pessoa jurídica de direito público para
a impetração do MI (MI 537/SC, DJ de 11.09.2001), o STF parece ter superado esse entendimento
anterior, nos termos do MI 725.
No caso concreto, entendeu o STF que “não se deve negar aos municípios, peremptoriamente, a
titularidade de direitos fundamentais (...) e a eventual possibilidade das ações constitucionais
cabíveis para a sua proteção”.
Assim, destacando que as pessoas jurídicas de direito público podem ser titulares de direitos
fundamentais, parece bastante razoável a hipótese em que o município, diante de omissão
legislativa inconstitucional impeditiva do exercício desse direito, veja-se compelido a impetrar
mandado de injunção. (cf. Inf. 466/STF – DJ de 28.05.2007).

7.30. Qual é o procedimento do MI?


O mandado de injunção previsto constitucionalmente, já decidiu o STF, é autoaplicável, sendo
adotado, analogicamente e no que couber, o rito do mandado de segurança (parágrafo único do
artigo 24 da lei 8.038/90).

7.31. Quais são os efeitos da decisão no MI?


Tanto a doutrina como a jurisprudência são controvertidas, destacando-se os seguintes
posicionamentos:
a) Posição concretista geral: através de normatividade geral, o STF legisla no caso concreto,
produzindo a decisão efeitos erga omnes até que sobrevenha norma integrativa pelo
Legislativo;
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b) Posição concretista individual direta: a decisão, implementando o direito, valerá somente


para o autor do mandado de injunção, diretamente;
c) Posição concretista individual intermediária: julgando procedente o mandado de injunção, o
Judiciário fixa ao Legislativo prazo para elaborar a norma regulamentadora. Findo o prazo e
permanecendo a inércia do Legislativo, o autor passa a ter assegurado o seu direito;
d) Posição não concretista: a decisão apenas decreta a mora do poder omisso, reconhecendo-se
formalmente a sua inércia.

A posição não concretista, por muito tempo, foi a dominante no STF (MI 107-DF). Esse
posicionamento sofreu diversas críticas, na medida em que se tornaria inviável o exercício de
direitos fundamentais na persistência da inércia legislativa. A providência jurisdicional, nesses
termos, mostra-se inócua.
Avançando, o STF adotou em alguns casos a posição concretista individual intermediária. (MI 232-
1-RJ, RDA 188/155).
Ocorre que, dependendo da situação, se passado período de tempo desarrazoado para que o
Legislativo suprisse o silêncio, o STF poderia, mesmo sem conceder prazo, de imediato
regulamentar o direito violado. (MI 721/DF).
Por fim, o STF, no julgamento dos MIs 670, 708 e 712, em importante decisão, por unanimidade,
declarou a omissão legislativa e, por maioria, determinou a aplicação, no que couber, da lei de greve
vigente no setor privado, Lei 7.783/89. A aplicação da lei não se restringiu aos impetrantes, mas a
todo o funcionalismo público. Assim, pode-se afirmar que o STF consagrou, em referido
julgamento, a teoria concretista geral.

7.32. Cabe liminar em mandado de injunção?


O entendimento atual do STF é de que não cabe liminar em mandado de injunção (vide MI 680,
julgado em 2008 e relatado pela Ministra Ellen Gracie).

7.33. Cite exemplos de instrumentos de democracia direta e participação política.


São exemplos desses instrumentos: o voto, a iniciativa popular, o plebiscito, o referendo e a ação
popular, corroborando o preceituado no artigo 1º, parágrafo único da CRFB. Com a ação popular,
busca-se a proteção da res publica, ou, utilizando uma nomenclatura mais atualizada, tem-se por
escopo a proteção dos interesses difusos.

7.34. Discorra sobre a legitimidade ativa e a passiva na ação popular.


Somente poderá ser autor da ação popular o cidadão, assim considerado o brasileiro nato ou
naturalizado, desde que esteja no pleno gozo de seus direitos políticos, provada tal situação (e como
requisito essencial da inicial) através do título de eleitor, ou documento que a ele corresponda
(artigo 1º, §3º da lei 4.717/65).
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Assim, excluem-se do polo ativo os estrangeiros, os apátridas, as pessoas jurídicas (vide súmula 365
do STF) e mesmo os brasileiros que estiverem com os seus direitos políticos suspensos ou perdidos
(artigo 15 da CRFB).
Aquele entre 16 e 18 anos, que tem título de eleitor, pode ajuizar a ação popular sem a necessidade
de assistência, porém, sempre por advogado (capacidade postulatória). Nesse sentido: AO 1.531-
AgR, voto da Min. Cármen Lúcia, DJE de 01º.07.2009).
Importante destacar que, embora apenas o cidadão tenha legitimidade para o ajuizamento da ação
popular, o Ministério Público pode, na hipótese de desistência da ação por parte do autor, promover
o respectivo prosseguimento do feito, nos termos do artigo 9º da lei.
No polo passivo, de acordo com o artigo 6º da lei, figurarão o agente que praticou o ato, a entidade
lesada e os beneficiários do ato ou contrato lesivo ao patrimônio público.

7.35. Como é a regra geral da competência na Ação Popular?


As regras de competência dependerão da origem do ato ou omissão a serem impugnados. Para
exemplificar, se o patrimônio lesado for da União, competente será a Justiça Federal (vide artigo 5º
da lei), e assim por diante.
Ademais, pode ser que, fugindo à regra geral da competência do juízo de primeiro grau, caracterize-
se a competência originária do STF para o julgamento da ação popular, como nas hipóteses das
alíneas f e n do artigo 102, I da CRFB.

7.36. É possível concessão de liminar na Ação Popular?


Sim, desde que presentes os requisitos legais (periculum in mora e fumus boni iuris), podendo a
Ação Popular ser tanto preventiva, visando evitar atos lesivos, como repressiva, buscando o
ressarcimento do dano, a anulação do ato, a recomposição do patrimônio público lesado,
indenização, etc.

7.37. Como se opera a coisa julgada na Ação Popular?


A coisa julgada se opera secundum eventum litis, ou seja, se a ação for julgada procedente ou
improcedente por ser infundada, produzirá efeito de coisa julgada oponível erga omnes.
No entanto, se a improcedência se der por deficiência de provas, haverá apenas a coisa julgada
formal, podendo qualquer cidadão intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova
prova (artigo 18 da lei), já que não terá sido analisado o mérito.
Julgada improcedente a ação (pelo artigo 267 ou 269 do CPC), só produzirá efeitos depois de passar
pelo duplo grau obrigatório de jurisdição. Julgada procedente, a apelação será recebida no seu duplo
efeito: devolutivo e suspensivo (artigo 19 da lei).
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7.38. Quais são os objetos tutelados na Ação Civil Pública?


Conforme contido nos incisos do artigo 1º da lei 7.347/85, os objetos tutelados são: meio ambiente;
consumidor; bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; qualquer
outro interesse difuso ou coletivo; ordem econômica; ordem urbanística; honra e dignidade de
grupos raciais, étnicos ou religiosos.

7.39. Como se fixa a competência na ACP?


Existem, regra geral, dois critérios legais.
O primeiro está disposto no artigo 2º da Lei 7.347/85 (“As ações previstas nesta lei serão propostas
no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a
causa”).
O segundo, complementar ao primeiro por força do princípio da integração (artigo 21 lei ACP c/c
artigo 90 do CDC), o qual fixa o foro da capital de um Estado ou do Distrito Federal quando o dano
for regional ou nacional (artigo 93, II CDC).

7.40. É correto afirmar que a ACP somente poderá ter por objeto a condenação em dinheiro
ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer?
Não. Diante do princípio da inafastabilidade da jurisdição (artigo 5º, XXXV, CRFB), o Estado se
obriga a prestar a tutela jurisdicional de forma célere e efetiva.
Sendo assim, quando se trata da defesa em juízo de direitos coletivos, não se permite que a
legislação infraconstitucional limite a priori e abstratamente quais as espécies de provimentos
jurisdicionais cabíveis para determinado direito difuso ou coletivo. Devem ser considerados
possíveis todos aqueles que se apresentem mais eficazes no caso concreto.
Destarte, diante de tal princípio, deve-se interpretar o artigo 3º da lei da ACP no sentido de que as
tutelas de fazer, não fazer e pecuniárias nele previstas não são excludentes, podendo ser
concomitantes diante da necessidade do caso concreto. Nesse sentido: Resp 592.693/MT, Rel.
Min.Teori Zavascki, DJ 27/08/2007).

7.41. A ACP induz litispendência para as ações individuais?


Não, de acordo com o artigo 104 do CDC: “As ações coletivas previstas nos incisos I e II do
parágrafo único do artigo 81 não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos
da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior não
beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de
trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva”.
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7.42. O artigo 5º da lei da ACP traz o rol dos legitimados para a propositura da ação principal
e da cautelar. Todos eles possuem legitimidade para firmar compromisso de ajustamento de
conduta? Qual é a natureza jurídica do TAC celebrado?
Não. Segundo dispõe o §6º do artigo 5º, somente os órgãos públicos legitimados para a propositura
da ação principal e da cautelar poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de
conduta às exigências legais, mediante cominações, o qual terá eficácia de título executivo
extrajudicial.

7.43. Disserte a respeito da eficácia da sentença prolatada em sede de ACP, informando o


atual entendimento do STJ.
Inobstante inúmeras críticas da doutrina, o STJ inicialmente entendia que a norma contida no artigo
16 da Lei 7.347/85 era válida e eficaz, ou seja, a sentença proferida em ação civil pública faria coisa
julgada erga omnes nos limites da competência do órgão prolator da decisão.
Ocorre que no julgamento do Resp. Nº 1.243.887 – PR, de dezembro de 2011, a Corte Especial do
STJ entendeu que as decisões tomadas em ações civis públicas devem ter validade nacional, não
tendo mais suas execuções limitadas aos municípios onde foram proferidas, afastando, assim, a
incidência dos limites impostos pelo artigo 16 da LACP.
O relator do caso foi o ministro Luis Felipe Salomão e a decisão se deu em julgamento submetido
ao rito dos recursos repetitivos (artigo 543-C do CPC).
86

8. DIREITOS SOCIAIS E A ORDEM SOCIAL. NACIONALIDADE. DEFINIÇÕES. ESPÉCIES.


CRITÉRIOS E HIPÓTESES CONSTITUCIONAIS DE RECONHECIMENTO DA
NACIONALIDADE PRIMÁRIA. AQUISIÇÃO DA NACIONALIDADE SECUNDÁRIA. ESPÉCIES
DE NATURALIZAÇÃO. DIFERENÇAS ENTRE BRASILEIROS NATOS E NATURALIZADOS.
PERDA DA NACIONALIDADE.
AUTOR: RENÊ BECKMANN JOHANN JÚNIOR

8.1. A que geração de direitos fundamentais correspondem os direitos sociais?


Os direitos sociais são classificados como direitos fundamentais de segunda geração, caracterizados
pela exigência de uma prestação positiva (facere) por parte do Estado, sendo uma nota marcante do
chamado Estado Social de Direito.
A consagração dos direitos sociais na CF relaciona-se diretamente com o postulado da igualdade
(material), já que buscam melhorar os padrões de vida das pessoas em situação mais vulnerável e,
nesse ponto, servem de instrumento para a concretização de objetivos fundamentais da República de
reduzir as desigualdades sociais (art. 3º, III), além de representar mais uma nuance da dignidade
humana (art. 1º, III).

8.2. No Direito comparado, quais são os diplomas que marcaram a positivação constitucional
dos direitos sociais? E no Brasil?
Em tema de Direitos Sociais, os diplomas apontados pela doutrina como marcos da positivação
constitucional são: Constituição Mexicana de 1917; Constituição Alemã de 1919 (Weimar). No
Brasil, o marco é a Constituição de 1934.

8.3. Os direitos sociais são considerados cláusulas pétreas?


No rol das cláusulas pétreas trazido pela Constituição Federal não há menção expressa dos direitos
sociais. No art. 60, §4º há apenas a sedimentação dos direitos e garantias individuais como cláusula
pétrea. Sabe-se que tanto os direitos individuais quanto os direitos sociais são espécies do gênero
direitos fundamentais.
Todavia, o Constituinte trouxe como cláusula pétrea apenas uma das espécies, e não o gênero.
Assim, pela interpretação gramatical os direitos sociais não sofreriam a imutabilidade
constitucional.
Entretanto, o tema não é pacífico na doutrina. Muitos autores divergem dessa interpretação,
sobretudo ao fundamento de que a interpretação gramatical não é a mais apropriada ao caso.
Não há manifestação do Plenário do STF sobre o tema. Parte da doutrina sustenta que os direitos
sociais de índole individual (como os do art. 7º da CF) devem ser considerados como cláusulas
pétreas, já que, embora sociais, não deixam de ser direitos fundamentais do indivíduo. Outra parcela
da doutrina entende que todos os direitos sociais compõem a cláusula pétrea, sobretudo por força do
princípio da vedação do retrocesso em matéria de direitos fundamentais conquistados.
87

8.4. Em que consiste a cláusula da reserva do possível? E a do Mínimo Existencial? Como


esses conceitos se relacionam?
A cláusula da reserva do possível, considerada princípio implícito da CF, tem como consequência o
reconhecimento de que os direitos sociais, embora devam ser efetivados pelo Poder Público, o
devem ser na medida das possibilidades financeiras, gerando uma concretização paulatina – e não
imediata – dos direitos. Isso porque, de um lado, as necessidades humanas são ilimitadas e, de
outro, os recursos financeiros são finitos.
Assim, a reserva do possível torna-se uma justificativa para a não efetivação imediata e ampla de
muitos direitos fundamentais, quando o Poder Público demonstra a impossibilidade financeira de
concretização do direito.
Já o postulado do Mínimo Existencial, corolário do princípio da dignidade humana, traz a ideia de
que há um núcleo mínimo de direitos sociais que precisam ser garantidos aos cidadãos, sob pena de
o Estado privá-los de uma vida digna.
Assim, o princípio do mínimo existencial traz um limite para a arguição da cláusula da reserva do
possível. Isso porque acaba não permitindo que o Poder Público argua a impossibilidade financeira
nas situações em que o direito versado relaciona-se com o mínimo de dignidade ao postulante.

8.5. Em que consiste o princípio da vedação do retrocesso social? Tal postulado foi
incorporado pela Constituição Federal?
Sustenta-se através do princípio da vedação do retrocesso social (evolução reacionária ou effet
cliquet) que não se poderia desconstituir o grau de concretização de direitos sociais já atingido pela
sociedade. Com isso, o legislador não poderia pura e simplesmente retroceder em relação aos
direitos sociais já regulamentados e consagrados.
Assim, o aludido princípio traz dimensão negativa aos direitos sociais, já que o Estado não apenas
estaria obrigado a prestá-los (dimensão positiva), como não estaria obrigado a não mais aboli-los
(dimensão negativa).
O postulado não consta expressamente do texto da CF, sendo apontado por alguns autores (não há
unanimidade) como um princípio constitucional implícito.
Uma exceção apontada pela doutrina à proibição do retrocesso social seria a adoção de medidas
compensatórias. Assim, poderia o legislador retroagir em algum direito social, desde que
compensasse com a ampliação de outro.
Por fim, resta mencionar que alguns juristas também entendem que a vedação do retrocesso social
não apenas seria de observância obrigatória ao legislador infraconstitucional, mas também ao
constituinte derivado, que não poderia emendar a Constituição para retroceder em matéria de direito
social.
88

8.6. Sobre o direito à educação, é permitido que as universidades públicas cobrem taxa de
matrícula aos estudantes?
Tal prática era recorrente entre as universidades públicas, sobretudo em razão dos inúmeros
problemas orçamentários que sofriam (e ainda sofrem). Assim, as universidades costumavam cobrar
tais taxas para fazer frente a gastos de pequena monta, como compra de materiais, pagamento de
energia elétrica etc.
Todavia, apesar da destinação pública que era dada ao dinheiro, a Constituição Federal, no art. 206,
IV, traz como um dos princípios da educação a sua gratuidade quando em instituições oficiais.
Assim, com base nesse dispositivo, o STF editou a súmula vinculante 12 deixando claro que a
cobrança da aludida taxa viola a Constituição Federal.

8.7. O direito à moradia é considerado um direito social? Ele já constava da redação


originária da CF? A penhora do bem de família do fiador nos casos de inadimplência do
locador nos contratos de locação de imóveis urbanos não violaria o direito social à moradia?
O direito à moradia é previsto expressamente pela CF como direito social fundamental (art. 6º).
Porém, tal direito não constava da redação originária do art. 6º, sendo incluído pela EC 26/2000.
Deve-se ressaltar que o direito à moradia não é um direito absoluto, já que a relatividade é uma nota
marcante no tema dos direitos fundamentais. Assim, há situações em que tal direito cede, em parte,
para que se garantam outros direitos.
No âmbito legislativo, deve-se destacar que a Lei 8009/90 excepcionou a impenhorabilidade do
bem de família no caso de obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação. Tal
disposição legal gerou muita polêmica na doutrina, sobretudo pelo fato de o fiador poder perder o
seu bem de família em razão de inadimplemento do locatário, sendo que este não perderia eventual
bem de família seu. Porém, atualmente o tema encontra-se pacificado pela jurisprudência, já que o
STF (RE 407688) consolidou o entendimento de que o fiador pode, sim, vir a perder o seu bem de
família na hipótese, sendo que a exceção legal não seria inconstitucional.

8.8. Qual a distinção entre seguridade social e as três figuras saúde, assistência e previdência
social? (Resposta elaborada pelos candidatos da prova oral do XIV concurso para juiz federal do
TRF1)
A seguridade social é um dos capítulos da ordem social. Enquanto gênero, a seguridade social
compreende três espécies: a saúde (não contributiva), a previdência social (contributiva) e a
assistência social (não contributiva).
A saúde volta-se para todos, indistintamente. A previdência, por sua vez, volta-se aos trabalhadores.
A assistência social, por fim, volta-se as desamparados (CF, art. 6º), donde se extrai que a
Constituição reconhece, na distinção entre previdência e assistência, a miserabilidade como critério
norteador desta.
89

8.9. A garantia ao direito à educação é de responsabilidade de todos os entes da federação? Há


divisão constitucional da atuação de cada ente federado acerca desse tema?
O art. 205 dispõe que o direito à educação é dever do Estado e da família. O “Estado” referido é o
Poder Público como um todo, motivo pelo qual se entende que todos os entes federados possuem
responsabilidade em garantir o acesso à educação.
Nessa linha, destaca-se que o art. 23, V da CF define como sendo de competência comum dos entes
federados proporcionar meios de acesso à educação.
Todavia, ainda que a matéria seja de competência comum, a própria Carta Constitucional já definiu
áreas para atuação prioritária de determinados entes. Nesse sentido, o art. 211, §2º determina que os
Municípios atuem prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil e determina que os
Estados e o Distrito Federal atuem prioritariamente nos ensinos fundamental e médio.

8.10. Quanto ao direito social ao desporto, há alguma peculiaridade trazida pela Constituição
Federal acerca do acesso ao Poder Judiciário?
Sim. Sabe-se que o artigo 5º, XXXV da CF traz o acesso à Justiça como direito fundamental,
impondo ao próprio legislador que não produza leis que excluam lesões ou ameaças a direitos da
apreciação do Poder Judiciário. Todavia, em matéria desportiva, há uma ressalva trazida pela
própria Carta Maior.
Trata-se da previsão do art. 217, §1º, segundo a qual o Poder Judiciário só admitirá ações relativas à
disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da própria justiça
desportiva. Entretanto, importante observar que a Constituição também estabelece o prazo máximo
de 60 dias para que a justiça desportiva profira decisão final sobre o caso.
Por fim, vale destacar que a chamada “Justiça Desportiva” não integra o Poder Judiciário, sendo
apenas um órgão de índole administrativa.

8.11. Sobre a propriedade de meios e canais de comunicação social, há alguma restrição


constitucional específica?
Sim. A Constituição estabelece que os meios de comunicação social não podem, direta ou
indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio (art. 220, §5º). Além disso, também determina
que a propriedade de empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens seja
privativa de brasileiros natos ou naturalizados há mais de 10 anos (art. 222).

8.12. Nos termos da Constituição Federal, há possibilidade de se remover os grupos indígenas


das terras que eles tradicionalmente ocupam?
A Carta Maior, no capítulo dedicado aos índios, reconhece aos grupos indígenas o direito originário
sobre as terras tradicionalmente ocupadas, assim como as utilizadas para as atividades produtivas,
para a preservação dos recursos ambientais e as necessárias ao bem-estar e a reprodução física e
cultural. Ademais, a CF também traz como regra geral a vedação da remoção dos grupos indígenas
de suas terras.
90

Entretanto, há exceções estipuladas no próprio texto constitucional. É o caso da ocorrência de


catástrofes ou epidemias que ponham em risco a população indígena. Nessa hipótese, a remoção
deve ser feita ad referendum do Congresso Nacional.
Outra situação em que a Constituição também autoriza a remoção dos índios de suas terras é quando
houver interesse da soberania do País, caso em que se exige deliberação do Congresso Nacional.
Deve-se destacar que, em qualquer das hipóteses, garante-se o retorno imediato dos grupos
indígenas às suas terras logo que cesso o risco (art. 231).

8.13. Defina nacionalidade:


Nacionalidade é o vínculo jurídico-político que une uma pessoa a um Estado. É o vínculo que faz
uma pessoa um dos elementos componentes da dimensão do Estado.

8.14. Qual relação entre o conceito de “cidadão” e o de “nacional”?


Cidadão é o nacional no gozo de direitos políticos. Assim, o conceito de cidadania é mais restrito
que o conceito de nacionalidade. Pode-se dizer que todo o cidadão é nacional; mas o inverso não é
verdadeiro.

8.15. Nacionalidade: Conceito, perda e aquisição. Discorra. (Resposta elaborada pelos


candidatos da prova oral do XIV concurso para juiz federal do TRF1)
Nacionalidade pode ser definida como um vínculo jurídico-político que une uma pessoa a um
Estado.
No Brasil, quanto à nacionalidade originária, adota-se tanto o modelo do jus solis como o do jus
sanguinis, razão pela qual é brasileiro tanto aquele que nasce no território nacional (salvo se um dos
seus pais estiverem a serviço do seu país), como o que nasce no exterior, filho de pai ou mãe
brasileira a serviço do Brasil ou filho de pai ou mãe brasileira, desde que registrado na
repartição brasileira competente no exterior ou que venha morar no Brasil e opte a qualquer
tempo, depois da maioridade, pela nacionalidade brasileira.
Já quanto à nacionalidade derivada, no Brasil é adquirida com a naturalização, é prevista na
Constituição, com requisitos de um ano de residência e idoneidade moral para os originários de
países de língua portuguesa e 15 anos de residência ininterrupta e ausência de condenação penal,
para os demais, e no Estatuto do Estrangeiro, que prevê a naturalização para o residente há
mais de quatro anos, mas com diversos requisitos (como boa saúde, profissão, conhecimento da
língua, etc.).
Quanto à perda, a Constituição a prevê nas hipóteses de adoção voluntária de outra nacionalidade
derivada, salvo se imposta como condição para a permanência no Estado estrangeiro ou o
exercício de direitos civis, ou ao que tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em
virtude de atividade nociva ao interesse nacional.
91

A perda, entretanto, depende de procedimento contraditório, em face de juiz federal competente,


razão pela qual não pode ser tida como automática toda vez que um nacional se natura-liza em outro
Estado, como acontece comumente com jogadores de futebol.

8.16. É possível existir tratamento diferenciado entre brasileiro nato e brasileiro


naturalizado?
Sim, é possível. Porém, a diferenciação só pode ser feita pela própria Constituição Federal, não se
admitindo que a lei infraconstitucional faça distinção (art. 12, §2º).

8.17. Quais são as diferenças entre brasileiros natos e brasileiros naturalizados previstas no
texto constitucional?
1) Há alguns cargos privativos de brasileiros natos (como de Presidente e Vice-Presidente da
República, Presidente da Câmara e do Senado, Ministros do STF etc)
2) Há vagas no Conselho da República que foram reservadas para brasileiros natos (art. 89, VII);
3) Apenas o brasileiro naturalizado pode vir a ser extraditado, o que pode ocorrer em caso de prática
de crime comum, antes da naturalização, ou em caso de comprovado envolvimento com tráfico
ilícito de drogas (art. 5º, LI).
4) O brasileiro naturalizado há menos de 10 anos não pode ser proprietário de empresa jornalística e
de radiodifusão sonora e imagens, tampouco pode ser sócio com mais de 30% do capital total e do
capital votante dessas empresas (art. 222).

8.18. O que significa a figura da “quase-nacionalidade”, conceito por vezes trazido pela
doutrina?
Quase-nacionalidade é um termo cunhado pela doutrina para se referir a situação de equiparação de
direitos entre brasileiros e portugueses, conforme art. 12, §1º da CF.
De imediato, deve-se destacar que não se trata de hipótese de naturalização. Se um nacional
Português quiser se naturalizar brasileiro, ele deverá se submeter aos requisitos da naturalização
para as pessoas originárias de países de língua portuguesa (residência por um ano ininterrupto e
idoneidade moral).
Porém, caso o português que tenha residência no Brasil queira continuar com a nacionalidade
portuguesa, há uma hipótese constitucional de equiparação de direitos com os brasileiros.
Para tanto, exige-se, além da residência permanente do português no Brasil, que haja reciprocidade
em favor dos brasileiros em Portugal. O tema é melhor elucidado no “Tratado de Amizade”,
celebrado entre Brasil e Portugal (Decreto 3927/2001).
Todavia, é relevante ressaltar que a CF concede ao Português equiparado todos os direitos inerentes
aos brasileiros, “salvo nos casos previstos nesta Constituição”. Com isso, entende-se que a
equiparação feita é aos brasileiros naturalizados, e não aos natos. Logo, o Português não poderá
ocupar os cargos privativos de brasileiros natos, por exemplo.
92

9. DIREITOS POLÍTICOS. DIREITOS POLÍTICOS POSITIVOS. DIREITO AO SUFRÁGIO,


AO VOTO E AO ESCRUTÍNIO. PLEBISCITO E REFERENDO. ELEGIBILIDADE. DIREITOS
POLÍTICOS NEGATIVOS. INELEGIBILIDADES ABSOLUTAS E INELEGIBILIDADES
RELATIVAS. PERDA E SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS. PARTIDOS POLÍTICOS.

AUTORA: BRUNA MINUSSI ZANINI


MATERIAL DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO – PEDRO LENZA; DIREITO CONSTITUCIONAL
TOMO II – JULIANO TAVEIRA BERNARDES E OLAVO AUGUSTO VIANNA ALVES FERREIRA (2014).

9.1. O que são Direitos Políticos?


Direitos Políticos nada mais são que instrumentos por meio dos quais a CF garante o exercício da
soberania popular, atribuindo poderes aos cidadãos para interferirem na condução da coisa pública,
seja direta, seja indiretamente.

9.2. Qual o regime democrático adotado pelo Brasil? De que forma se instrumentaliza a
soberania popular?
A CF 88 assimilou a democracia participativa ou semidireta, a qual consiste num sistema híbrido,
isto é, uma democracia representativa com peculiaridades e atributos da democracia direta.
Dessa forma, o exercício da soberania popular se instrumentaliza por meio do voto, plebiscito,
referendo, iniciativa popular, bem como pelo ajuizamento de ação popular e, até mesmo, pelo
exercício da função de jurado no Tribunal do Júri. Vale lembrar que os atos necessários ao exercício
da cidadania são gratuitos.

9.3. Diferencie plebiscito de referendo:


A semelhança entre o plebiscito e o referendo consiste no fato de ambos serem formas de consulta
ao povo para que delibere sobre matéria de acentuada relevância (de natureza constitucional,
legislativa ou administrativa).
Ambos são instrumentalizados por decreto legislativo, mas o plebiscito é convocado por meio dele,
já o referendo é autorizado.
O que difere os institutos é o momento da consulta, pois o plebiscito é realizado previamente ao ato
legislativo ou administrativo (condicionando o governante), enquanto o referendo submete à
apreciação do povo o ato legislativo ou administrativo, que poderá ser ratificado ou rejeitado. Como
exemplos na história brasileira, podemos citar o referendo para manutenção ou não do regime
parlamentarista (1963) e o referendo sobre o desarmamento (2005).
Segundo Ferreira Filho, são espécies de referendo: a.1) constituinte (apreciação popular de emenda
constitucional); a.2) legislativo (apreciação de leis); b.1) efeito constitutivo (quando aprova medida
legislativa); b.2) efeito ab-rogativo (rejeita medida); c.1) obrigatório (quando a Constituição exige);
c.2) facultativo (Constituição permite a consulta).
93

9.4. Diferencie sufrágio, voto e escrutínio:


Basicamente, sufrágio é o direito personalíssimo de votar e ser votado, enquanto voto é o ato por
meio do qual se exercita o sufrágio, ou seja, o direito de votar e ser votado. Já escrutínio consiste no
modo pelo qual se exercita o voto (público ou secreto).

9.5. Segundo a CF 88, como se dá a iniciativa popular?


Em âmbito federal, a iniciativa popular consiste na apresentação de projeto de lei (ordinária ou
complementar) à Camara dos Deputados, subscrito por, no mínimo, 1% do eleitorado nacional,
distribuído por, pelo menos, cinco Estados, com não menos de 0,3% dos eleitores de cada um deles.
Quanto à iniciativa popular no processo legislativo municipal, a Constituição prescreve que a lei
orgânica municipal disporá, mas que a manifestação deverá ser de pelo menos 5% do eleitorado do
município.

9.6. É possível a iniciativa popular em matéria de emenda constitucional?


Não há previsão constitucional, porém José Afonso da Silva e Pedro Lenza, por exemplo, defendem
a extensão da iniciativa popular em matéria de emenda constitucional, com base em interpretação
sistemática.
Entretanto, a doutrina majoritária sustenta que, como os mecanismos de reforma constitucional são
cláusulas pétreas implícitas, nem mesmo uma emenda constitucional poderia incluir o povo entre
aqueles legitimados a propor EC. Não sem criticar que o povo, o titular do poder soberano, teria
sido esquecido pelo Constituinte.
Assim, pelo princípio da simetria, também os Estados Membros e Municípios só poderiam prever
iniciativa popular para leis, mas algumas constituições estaduais previram a iniciativa popular
quanto à proposta de emenda à Constituição Estadual (Ex. Santa Catarina).

9.7. Discorra sobre os direitos políticos positivos, indicando as espécies em que eles se dividem
e suas características básicas:
Os direitos políticos positivos, que consistem no conjunto de normas que asseguram o direito
subjetivo de participação no processo político e nos órgãos governamentais, estão ligados à
capacidade eleitoral ativa (direito de votar, de se alistar como eleitor) e passiva (direito de ser
votado, de candidatar-se, ser elegível), além do exercício de outros direitos de participação popular.
A capacidade eleitoral ativa pressupõe, portanto, o alistamento eleitoral (obrigatório para os maiores
de 18 anos; facultativo para analfabetos, maiores de 70 anos e entre 16-18 anos), a nacionalidade
brasileira, não ser conscrito (militar durante o serviço obrigatório), bem como a idade mínima de 16
anos. Cumpre destacar que o voto é direto, secreto, universal, periódico (cláusulas pétreas), livre,
personalíssimo e com valor igual para todos. De outra banda, a capacidade eleitoral passiva,
consistente na possibilidade de concorrer a um mandato eletivo, pressupõe o preenchimento das
condições de elegibilidade, quais sejam: nacionalidade brasileira, pleno exercício dos direitos
políticos, alistamento eleitoral, domicílio eleitoral na circunscrição, filiação partidária e idade
mínima de acordo com o cargo.
94

9.8. Conceitue direitos políticos negativos, indique as espécies em que eles se dividem e
discorra sobre suas características básicas. (Prova Oral – Defensoria DF- Cespe)
Direitos políticos negativos são formulações constitucionais restritivas e impeditivas das atividades
político-partidárias, privando o cidadão do exercício de seus direitos políticos (capacidade eleitoral
ativa e passiva). São espécies as inelegibilidades (segundo Pedro Lenza), bem como as hipóteses de
perda e suspensão de direitos políticos (direitos políticos negativos em essência).
As inelegibilidades são as circunstâncias constitucionais ou legais (previstas na Lei Complementar
n. 64/90) que impedem o cidadão do exercício total ou parcial da capacidade eleitoral passiva (de
eleger-se). Elas buscam proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do
mandato, considerada a vida pregressa.
Subdividem-se em absolutas e relativas. Assim, de acordo com o art. 14, §4º, da CF 88, são
absolutamente inelegíveis (em relação a qualquer cargo eletivo) o inalistável (Ex.: estrangeiros,
conscritos, menores de 16 anos) e o analfabeto (pode votar, mas não pode ser votado).
Vale lembrar que a Lei Complementar n. 64/90, recentemente modificada pela LC nº 135/2010
(conhecida como Lei da Ficha Limpa), estabelece diversos casos de inelegibilidade (os quais,
considerando o perfil do edital – que não compreende direito eleitoral - e a extensão do resumo, não
serão abordados aqui).
Já a inelegibilidade relativa (impossibilidade de eleger-se apenas para alguns cargos) surge em
decorrência da função exercida, do parentesco ou do fato do candidato ser militar , e pode ser
ampliada por lei complementar (LC 64/90).
Nesse contexto, cumpre destacar a impossibilidade de reeleição para um terceiro mandato
sucessivo, nos casos de Presidentes, Governadores e Prefeitos. O vice somente quando sucede o
titular é que passa a exercer o seu primeiro mandato como titular do cargo, podendo, após,
concorrer a reeleição (STF).
Igualmente relevante ressaltar, no campo das inelegibilidades relativas, a necessidade de
desincompatibilização: para concorrerem a outros cargos (não para reeleição), o Presidente da
República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos
respectivos mandatos até seis meses antes do pleito (art. 14, §6º, CF).
Por fim, de suma relevância a inelegibilidade relativa em razão do parentesco, evitando-se a
perpetuidade de familiares no poder. Nestes termos: “São inelegíveis, no território de jurisdição do
titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do
Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou
de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato
eletivo e candidato à reeleição (art. 14, §6º, CF)”.
Aliás, sobre o tema, o STF já decidiu que parentes podem concorrer nas eleições, desde que o titular
do cargo tenha o direito à reeleição. A propósito, segue o teor da Súmula Vinculante n. 18: “A
dissolução da sociedade ou do vínculo conjugal, no curso do mandato, não afasta a inelegibilidade
prevista no § 7º do artigo 14 da Constituição Federal”.
No que tange à perda dos direitos políticos, são hipóteses excepcionais e que não admitem
interpretação extensiva nem ampliação: cancelamento da naturalização por sentença transitada em
julgado; recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa (divergência
95

doutrinária se seria espécie de perda ou de suspensão de direitos políticos); perda da nacionalidade


brasileira em razão de aquisição de outra, pois a nacionalidade é pressuposto para aquisição de
direitos políticos; anulação judicial da naturalização de estrangeiro.
De outra banda, a suspensão dos direitos políticos ocorre em razão de recrutamento para o serviço
militar obrigatório, incapacidade civil absoluta (interdição), de condenação criminal transitada em
julgado (efeito automático até a extinção da punibilidade), condenação por improbidade
administrativa (art. 37, §4º, CF), de exercício de direitos políticos no Estado de residência (cláusula
de reciprocidade - acarreta suspensão dos direitos políticos no Estado da nacionalidade) e de
procedimento que declara Deputado ou Senador incompatível com o decoro parlamentar.
Finalmente, ressalta-se que é vedada a cassação de direitos políticos.

9.9. O voto no Brasil pode deixar de ser obrigatório através de Emenda Constitucional?
Sim. Pela atual redação da Constituição, o direito de votar configura um poder-dever, ou seja, um
dever político-social, obrigatório (obrigação de comparecer para votação) a todos os cidadãos, com
exceção daqueles para os quais o alistamento é facultativo. Entretanto, a obrigatoriedade do voto
não está elencada no rol de cláusulas pétreas, apenas o voto direto, secreto, universal e periódico.
Possível, portanto, a reforma por meio de Emenda Constitucional.

9.10. Qual a natureza jurídica dos Partidos Políticos?


Os partidos políticos são pessoas jurídicas de direito privado (o que restringe as interferências do
Poder Público), necessitam ser registrados no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, tendo os seus
Estatutos arquivados posteriormente no TSE (artigo 17, §2º, da CF).
A propósito, segue dispositivo do Código Civil vigente: “Art. 44. São pessoas jurídicas de direito
privado: I - as associações; II - as sociedades; III - as fundações. IV - as organizações religiosas;
(Incluído pela Lei nº 10.825, de 22.12.2003) V - os partidos políticos. (Incluído pela Lei nº 10.825,
de 22.12.2003)”.

9.11. Qual o tratamento constitucional dado aos partidos políticos?


Primeiramente, a CF assegura o direito de organização e associação a partidos políticos, o qual pode
ser considerado um direito político. O constituinte dispôs ser livre a criação, fusão, incorporação e
extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o
pluripartidarismo e os direitos fundamentais.
O texto constitucional ainda determina que os partidos políticos tenham caráter nacional, prestem
contas à Justiça Eleitoral e funcionem de acordo com a lei, bem como veda a utilização de
organização paramilitar e o recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo
estrangeiros e a subordinação a estes.
Ademais, aos partidos políticos são garantidos os direitos de recebimento de recursos do fundo
partidário e de acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei (§ 3º do art. 17).
96

Por fim, cumpre destacar que os partidos políticos com representação no Congresso Nacional são
legitimados, consoante previsto na CF, a impetrar mandado de segurança coletivo e a propor a ação
direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade, dentre outras diversas
atribuições.

9.12. Segundo o texto constitucional, há obrigatoriedade de verticalização partidária?


Não. Consoante art. 17, §1º, da CF (redação dada pela EC 52/2006), é assegurado aos partidos
políticos a autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento e para adotar
os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação
entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos
estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária.

9.13. Conforme entendimento do STF, a cláusula de barreira é constitucional?

Não. O STF declarou que as normas que condicionam o funcionamento, a participação no Fundo
Partidário e o direito de acesso gratuito aos meios de comunicação ao desempenho eleitoral dos
partidos políticos (determinado percentual de votos) violam os princípios constitucionais do Estado
Democrático de Direito, como o pluripartidarismo.
Trata-se de preservar os direitos e liberdades fundamentais da minoria, tais como a liberdade de se
expressar, de se organizar, denunciar e de se fazer representar nas decisões que influem nos destinos
da sociedade como um todo.
97

10. ORGANIZAÇÃO ESPACIAL DO ESTADO E DIVISÃO ESPACIAL DO PODER. A


FEDERAÇÃO E SUA ORIGEM. FEDERAÇÃO POR AGREGAÇÃO E POR DESAGREGAÇÃO. -
OS ENTES FEDERATIVOS E O MUNICÍPIO. REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS.
COMPETÊNCIAS EXCLUSIVAS, PRIVATIVAS, COMUNS E CONCORRENTES.
AUTOR: VINICIUS FERRARIN HERNANDEZ
MATERIAL DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO – PEDRO LENZA E JURISPRUDÊNCIA, ALÉM DE
ALGUMAS AULAS.

*Neste ponto é importante a leitura dos artigos da Constituição Federal que tratam da organização
do estado (artigos 18 a 33), pois muitas questões são apenas sua literalidade.

10.1. Explique o início do federalismo, diferenciando-o de confederação e explicando a


história do federalismo brasileiro
O Federalismo atual teve início em 1787 nos Estados Unidos, partindo de um movimento de
agregação dos Estados independentes. Num primeiro momento, foi criada uma confederação, que é
marcada pela possibilidade de secessão. Por causa da forte pressão inglesa tentando reconquistar
suas colônias, a confederação foi substituída pela federação, cujo norte é a vedação à segregação.
No Brasil, o federalismo surge de influências americanas no mesmo momento da proclamação da
república, em 1889. Em um primeiro momento havia apenas dois níveis de entes autônomos, os
Estados e a União. Com a Constituição Federal de 1988, os Municípios também adquirem parte de
autonomia, sendo considerados entes federados pelo artigo 1º.

10.2. Defina os movimentos de formação do federalismo e os modelos de repartição de


competências.
Quanto à formação, o federalismo pode se originar de movimentos centrípetos ou centrífugos.
Aquele, também chamado de aglutinação ou agregação, é caracterizado pela presença de estados
independentes que cedem parte de sua autonomia para a formação de um estado federal entre si,
buscando uma maior solidez e força.
Já este, também conhecido como estado federado por desagregação, é marcado pela idéia
descentralizadora do poder central de um estado originalmente unitário.
Ou seja, como exemplo de estado centrípeto pode se citar os EUA, enquanto que de movimento
centrífugo, o Brasil.
Tal classificação não pode ser confundida com o modelo de repartição de competências do
federalismo, que é igualmente dividido como federalismo centrípeto e federalismo centrífugo. Ao
contrário da anterior, a base desta classificação se dá em saber qual o ente federado tem mais
competências. No caso, o federalismo centrípeto fortalece o ente central enquanto o centrífugo
(centralizador – caso do Brasil), os estados membros (descentralizador).
98

10.3. Qual a classificação quanto ao modo de separação de competências no federalismo?


Há duas classificações em relação ao modo de separação de competências:
O federalismo dual, em que há separação rígida das competências dos entes, sem cooperação ou
interpenetração entre eles e o federalismo cooperativo, mais moderno, em que as atribuições são
exercidas de modo comum e concorrente, com aproximação dos entes. Este é o caso do Brasil.

10.4. Quais são as características marcantes da federação?


A) Descentralização política com autonomia dos entes;
B) Repartição de competências;
C) Constituição rígida como base jurídica (serve para manter a estabilidade institucional);
D) Inexistências de direito de secessão (princípio da indissolubilidade do vínculo federativo);
E) Soberania do Estado federal;
F) Intervenção como instrumento para assegurar o equilíbrio federativo;
G) Auto-organização dos estados membros (Constituição Estadual);
H) Existência de órgão representativo dos estados membros (Senado);
I) Existência de órgão guardião da Constituição (STF);
J) Repartição das receitas.

10.5. Quais são as vedações constitucionais aos entes federados e à União?


Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou
manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da
lei, a colaboração de interesse público;
II - recusar fé aos documentos públicos;
III - criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si.

10.6. Sobre modelos de repartição de competências, explique os modelos clássico e moderno e


horizontal e vertical.
No modelo clássico a União possui poderes enumerados enquanto que os estados exercem os
residuais (caso americano). A enumeração taxativa dos poderes é flexibilizada pela teoria dos
poderes implícitos. Já no modelo moderno, a Constituição Federal elenca, além das competências
da União, as hipóteses de competência comum e concorrente.
O modelo horizontal de repartição de competências não cria concorrência entre os entes federados,
porque eles agem nos limites da Constituição Federal, sem subordinação ou hierarquia. Já o modelo
vertical, como a matéria acaba sendo partilhada entre os Entes, há determinada relação de
subordinação entre eles (caso do art. 24).
99

10.7. Entre os entes federativos o que se entende por competência concorrente cumulativa a
não cumulativa?
A doutrina classifica essa legislação concorrente de duas formas. Cumulativa, quando inexistir
limites prévios para o exercício da competência por parte de um ente, seja União, seja o Estado-
membro.
Não cumulativa, quando se reserva um nível superior ao ente federativo União, que se incumbe de
fixar os princípios e normas gerais, deixando-se ao Estado-membro a complementação.
A Constituição brasileira adotou a competência não cumulativa, também chamada de repartição
vertical, ou ainda, competência suplementar, como se vê em seu texto legal quando dita regras a
serem observadas para dirimir alguns conflitos:
1º) no âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas
gerais (artigo 24, § 1º, CF);
2º) a competência de normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados;
3º) inexistindo lei federal sobre a matéria de legislação concorrente, os Estados exercerão a
legislação suplementar para atender suas peculiaridades (artigo 24, § 3º, CF);
4º) surgindo lei federal superveniente que regule matéria desta competência, tornará ineficaz lei
estadual em seus aspectos conflitantes.

10.8. Uma lei estadual que obrigue empresas concessionárias de transporte coletivo
intermunicipal a promoverem adaptações em seus veículos, com o propósito de facilitar o
acesso e a permanência de pessoas com deficiência física, ofende a competência privativa da
União para legislar sobre trânsito e transporte? Resposta objetivamente fundamentada.
A lei estadual não ofende a competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte
prevista no art. 22, XI, da CF, na medida em que, apesar dessa previsão, como já decidiu o Supremo
Tribunal Federal, a lei questionada trata também sobre o direito à acessibilidade física das pessoas
com deficiência, que é de competência concorrente entre União, os Estados e o Distrito Federal, nos
termos do art. 24, XIV, da CF/88, razão pela a lei estadual é constitucional.
Cabe acrescentar que caso seja editada lei federal que trate do tema, a norma estadual embora
permaneça constitucional perderá a eficácia normativa naquilo que esteja em desconformidade com
a legislação geral de regência do tema.
100

10.9. Resumo de julgados recentes acerca da matéria.

É CONSTITUCIONAL a lei estadual que permite o comércio de ADI 4954/AC – agosto de


artigos de conveniência em farmácias e drogarias. 2014.
É CONSTITUCIONAL lei estadual que regula procedimento ADI 2922/RJ – abril de 2014
para homologação judicial de acordo sobre a prestação de
alimentos firmada com a intervenção da Defensoria Pública. Isso
porque tal legislação está inserida na competência concorrente
(art. 24, XI, da CF/88).
É INCONSTITUCIONAL lei estadual que preveja a tramitação ADI 2886/RJ – abril de 2014
direta do inquérito policial entre a polícia e o Ministério Público.
É CONSTITUCIONAL lei estadual que preveja a possibilidade ADI 2886/RJ – abril de 2014
de o MP requisitar informações quando o inquérito policial não
for encerrado em 30 dias, tratando-se de indiciado solto.
É INCONSTITUCIONAL lei estadual que prevê prioridade na ADI 3483/MA – abril de 2014
tramitação para processos envolvendo mulher vítima de (lei processual)
violência doméstica.
É CONSTITUCIONAL lei estadual que determine que as ADI 903/MG – maio de 2013
empresas concessionárias de transporte coletivo intermunicipal (prevalência do direito à
devam fazer adaptações em seus veículos a fim de facilitar o acessibilidade previsto na CF e
acesso e a permanência de pessoas com deficiência física ou com na Convenção Internacional)
dificuldade de locomoção.
É INCONSTITUCIONAL lei estadual que proíba a cobrança de ADI 4369/SP – outubro de
assinatura mensal pelas concessionárias de serviços de 2014 (serviços telefônicos –
telecomunicações. União)
Leis que proíbam o nepotismo na Administração Pública não são RE 570392/RS - dezembro de
de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo, podendo, 2014
portanto, ser propostas pelos parlamentares.

É INCONSTITUCIONAL lei estadual que crie, como requisito de ADI 4161/AL – outubro de 2014
admissibilidade para a interposição de recurso inominado no (viola a competência privativa
âmbito dos juizados especiais, o depósito prévio de 100% do valor da União para legislar sobre
da condenação. direito processual, além de
vulnerar os princípios do acesso
à jurisdição, do contraditório e
da ampla defesa).
É inconstitucional lei estadual que proíbe que o TCE, quando ADI 2361/CE – setembro de
estiver fazendo inspeções ou auditorias, tenha acesso a 2014
determinados documentos inerentes à Administração Pública.
É constitucional lei estadual, de iniciativa parlamentar, que obriga ADI 2444/RS – novembro de
o Poder Executivo do referido Estado-membro a divulgar, na 2014
imprensa oficial e na internet, a relação completa de obras
atinentes a rodovias, portos e aeroportos.
101

11. ORGANIZAÇÃO DOS PODERES. FUNDAMENTOS DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. AS


FUNÇÕES ESSENCIAIS À JUSTIÇA. O DEFENSOR PÚBLICO E O DEVIDO PROCESSO
LEGAL. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO E A DEFENSORIA PÚBLICA.
AUTORA: CARLA ROBERTA SOUZA NOGUEIRA
MATERIAL DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO (PEDRO LENZA, 2012 E 2013), DEFENSORIA
PÚBLICA (FREDERICO RODRIGUES VIANA DE LIMA, 2014), SITE “DIZER O DIREITO”, CADERNO LFG 2013.

11.1. As bases teóricas da “tripartição de Poderes” surgiram a partir de quando e de que


forma?
As primeiras bases teóricas surgiram na Antiguidade grega, lançadas por Aristóteles, em sua obra
Política, na qual percebe-se a existência de três funções distintas exercidas pelo poder soberano: a
de editar normas gerais a serem observadas por todos, a de aplicar as referidas normas ao caso
concreto (administrando) e a função de julgamento, dirimindo os conflitos oriundos da execução
das normas gerais nos casos concretos.
Em decorrência do momento histórico, nota-se a descrição de uma concentração do exercício de tais
funções na figura de uma única pessoa, o soberano, que detinha um poder “incontrastável de
mando”, uma vez que era ele quem editava o ato geral, aplicava -o ao caso concreto e,
unilateralmente, também resolvia os litígios eventualmente decorrentes da aplicação da lei.
A célebre frase de Luís XIV reflete tal descrição: “L’État c’est moi”, ou seja, “o Estado sou eu”, o
soberano. Assim, Aristóteles contribuiu no sentido de identificar o exercício de três funções estatais
distintas, apesar de exercidas por um único órgão.

11.2. Qual foi o grande avanço trazido por Montesquieu para a teoria da “tripartição de
Poderes”?
O grande avanço trazido por Montesquieu, na obra “O espírito das leis”, foi a ideia de que as três
funções estariam intimamente conectadas a três órgãos distintos, autônomos e independentes entre
si. Cada função corresponderia a um órgão, não mais se concentrando nas mãos únicas do soberano.
Essa teoria surge em contraposição ao absolutismo, servindo de base estrutural para o
desenvolvimento de diversos movimentos como as revoluções americana e francesa. Por meio dessa
teoria, cada Poder exercia uma função típica, inerente à sua natureza, atuando independente e
autonomamente.
Assim, cada órgão exercia somente a função que fosse típica, não mais sendo permitido a um único
órgão legislar, aplicar a lei e julgar, de modo unilateral, como se percebia no absolutismo.
Tais atividades passam a ser realizadas, independentemente, por cada órgão, surgindo, assim, o que
se denominou teoria dos freios e contrapesos, segundo a qual um poder controla a atuação do outro,
balizada pelo STF nos seguintes termos:
“Separação e independência dos Poderes: freios e contrapesos: parâmetros federais impostos ao
Estado -Membro. Os mecanismos de controle recíproco entre os Poderes, os ‘freios e contrapesos’
admissíveis na estruturação das unidades federadas, sobre constituírem matéria constitucional local,
102

só se legitimam na medida em que guardem estreita similaridade com os previstos na Constituição


da República: precedentes (...)” (ADI 1.905 -MC, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 19.11.98, DJ de
05.11.2004).
“Os dispositivos impugnados contemplam a possibilidade de a Assembleia Legislativa capixaba
convocar o Presidente do Tribunal de Justiça para prestar, pessoalmente, informações sobre assunto
previamente determinado, importando crime de responsabilidade a ausência injustificada desse
Chefe de Poder. Ao fazê-lo, porém, o art. 57 da Constituição capixaba não seguiu o paradigma da
Constituição Federal, extrapolando as fronteiras do esquema de freios e contrapesos — cuja
aplicabilidade é sempre estrita ou materialmente inelástica — e maculando o Princípio da
Separação de Poderes (...)” (ADI 2.911, Rel. Min. Carlos Britto, j. 10.08.2006, DJ de 02.02.2007).

11.3. O que são as funções típicas e atípicas?


Funções típicas são aquelas predominantes, inerentes e ínsitas à natureza de cada um dos Poderes.
Além destas, cada Poder exerce, também, outras duas funções atípicas (de natureza típica dos outros
dois Poderes).
Assim, o Legislativo, por exemplo, além de exercer uma função típica, inerente à sua natureza,
exerce, também, uma função atípica de natureza executiva e outra função atípica de natureza
jurisdicional.
Importante notar que, mesmo no exercício da função atípica, o órgão (ou Poder) exercerá uma
função sua, não havendo aí ferimento ao princípio da separação de Poderes, porque tal competência
foi constitucionalmente assegurada pelo poder constituinte originário.
Desse modo, o Legislativo tem como funções típicas: legislar, realizar a fiscalização contábil,
financeira, orçamentária e patrimonial do Executivo. Como funções atípicas de natureza executiva:
dispor sobre sua organização, provendo cargos, concedendo férias, licenças a servidores etc. Como
funções atípicas de natureza jurisdicional: o Senado julga o Presidente da República nos crimes de
responsabilidade (art. 52, I).
O Executivo tem como funções típicas: prática de atos de chefia de Estado, chefia de governo e atos
de administração. Como funções atípicas de natureza legislativa: o Presidente da República, por
exemplo, adota medida provisória, com força de lei (art. 62). Como funções atípicas de natureza
jurisdicional: o Executivo julga, apreciando defesas e recursos administrativos.
Por fim, o Judiciário tem como funções típicas: julgar (função jurisdicional), dizendo o direito no
caso concreto e dirimindo os conflitos que lhe são levados, quando da aplicação da lei. Como
funções atípicas de natureza legislativa: regimento interno de seus tribunais (art. 96, I, “a”). Como
funções atípicas de natureza executiva: administra, ao conceder licenças e férias aos magistrados e
serventuários (art. 96, I, “f”).

11.4. Tecnicamente, está correta a expressão “tripartição de Poderes”?


Não. Do ponto de vista técnico, há uma imprecisão.
Isso porque o poder é uno e indivisível, é um atributo do Estado, que emana do povo. O poder não
se triparte. O poder é um só, manifestando -se através de órgãos que exercem funções.
103

A função constitui, pois, um modo particular e caracterizado de o Estado manifestar a sua vontade.
Os órgãos são, em consequência, os instrumentos de que se vale o Estado para exercitar suas
funções.
Assim, todos os atos praticados pelo Estado decorrem de um só Poder, uno e indivisível. Esses atos
adquirem diversas formas, dependendo das funções exercidas pelos diferentes órgãos.
Desse modo, o órgão legislativo exerce uma função típica, inerente à sua natureza, além de funções
atípicas, conforme vimos no quadro anterior, ocorrendo o mesmo com os órgãos executivo e
jurisdicional.

11.5. Pode haver delegação das atribuições de um órgão (Poder) a outro?


Um órgão só poderá exercer atribuições de outro, ou da natureza típica de outro, quando houver
expressa previsão (e aí surgem as funções atípicas) e, diretamente, quando houver delegação por
parte do poder constituinte originário, como, por exemplo, ocorre com as leis delegadas do art. 68,
cuja atribuição é delegada pelo Legislativo ao Executivo.
Trata-se do princípio da indelegabilidade de atribuições.
Por fim, lembre-se que a CF/88 erigiu à categoria de cláusula pétrea a separação de Poderes,
conforme se observa pelo art. 60, § 4.º, III.

11.6. Quais são as funções essenciais à Justiça?


De acordo com a Constituição são: o Ministério Público (art. 127); a Advocacia Pública (art. 131); a
Advocacia Privada (art. 133) e a Defensoria Pública (art. 134).
*Nesse tema, é interessante a leitura dos artigos da Constituição que tratam do tema. (Art. 127 a
135).

11.7. Para a Constituição Federal, o que é a Defensoria Pública?


Nos termos do art. 134, caput, da CF/88 com a recente alteração promovida pela EC 80/2014, que
ampliou as funções da Defensoria Pública expressamente previstas na Constituição, a Defensoria
Pública é a instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, à qual compete,
como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a
promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos
individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do
art. 5º desta Constituição Federal.

11.8. A organização da Defensoria Pública nos estados deverá ser feita por meio de qual
espécie de lei? É permitido o exercício da advocacia, pelos membros da Defensoria Pública?
Conforme o art. 134, §1º, da CF/88, lei complementar prescreverá normas gerais para a organização
da Defensoria Pública nos Estados.
104

Trata-se da Lei Complementar 80/94. No âmbito dos próprios estados, em decorrência do princípio
da simetria, lei complementar deve trazer as normas de regência da Defensoria.
A organização se dá em cargos de carreira, providos, na classe inicial, mediante concurso público
de provas e títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício
da advocacia fora das atribuições institucionais.

11.9. Discorra sobre a autonomia da Defensoria Pública.


A Defensoria Pública, conforme o art. 134, §2º, da CF/88 possui autonomia funcional,
administrativa e financeira.
A autonomia funcional é a prerrogativa assegurada aos Defensores Públicos de, no exercício de
suas funções, não estarem subordinados tecnicamente a ninguém, devendo atuar de acordo com seu
convencimento técnico-jurídico e sempre no interesse do assistido, respeitando, obviamente, as leis
e a Constituição Federal.
A autonomia administrativa consiste na garantia conferida à Defensoria Pública de que ela própria é
quem irá se governar, tomando as decisões administrativas, sem necessidade de autorização prévia
ou ratificação posterior por parte de outros órgãos ou entidades.
A autonomia financeira consiste no fato de ser a própria Defensoria Pública quem, dentro dos
limites estabelecidos na LDO, decide qual será a proposta de seu orçamento que será encaminhada
ao Parlamento para lá ser votada.

11.10. A quem a Defensoria Pública deve enviar seu projeto de lei orçamentária? Pode haver
o envio direto ao Legislativo?
A Constituição não assegura à Instituição a possibilidade de envio direto ao Legislativo. O que a
CF/88 prevê é que a Defensoria Pública irá aprovar a sua proposta orçamentária e encaminhá-la ao
chefe do Poder Executivo.
Este irá consolidar, ou seja, reunir em um único projeto de Lei Orçamentária, as propostas
orçamentárias do Executivo, do Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria, encaminhando o
projeto para ser apreciado pelo Poder Legislativo.

11.11. Ao receber a proposta orçamentária da Defensoria, caso o Governador entenda que as


despesas ali previstas estão muito elevadas, ele pode tomar alguma providência?
Caso o Governador entenda que o orçamento da Defensoria está com números incompatíveis com
as capacidades atuais do Estado, ele deve encaminhar o projeto de Lei Orçamentária Anual à
Assembleia Legislativa, com a proposta orçamentária da Defensoria na íntegra (como órgão
autônomo e nos valores por ela aprovados) e, a partir daí, pleitear, de forma democrática e plural,
junto ao Poder Legislativo que ele promova as reduções orçamentárias na proposição da Instituição.
No Parlamento, após as discussões pertinentes, podem (ou não) ser aprovadas as reduções
sugeridas.
Não pode haver a alteração unilateral por parte do Governador.
105

Nesse sentido, o STF julgou procedente a ADPF 307, proposta pela ANADEP, para determinar que
a proposta orçamentária da Defensoria Pública do Estado da Paraíba seja submetida à Assembleia
Legislativa na forma como foi aprovada pela Instituição, ou seja, sem as alterações promovidas pelo
Governador do Estado.

11.12. Quais são os princípios institucionais da Defensoria Pública, previstos expressamente


pela Constituição Federal?
O art. 134, §4º, da CF/88, recentemente inserido pela EC 80/2014, prevê os princípios institucionais
da unidade, indivisibilidade e independência funcional.
A unidade consiste no fato de os membros da Instituição integrarem um só órgão, sob a direção
única, regidos pela mesma disciplina, por diretrizes e finalidades próprias, em cada ramo da
Defensoria Pública (União, Estados e Distrito Federal).
A indivisibilidade é consequência do princípio anterior, porque seus integrantes são membros da
Instituição, logo, podem ser substituídos uns pelos outros nos processos de que participam, sem que
haja prejuízo ao exercício das funções.
A independência funcional é a independência que os Defensores Públicos possuem no exercício de
suas funções, sujeitando-se apenas as disposições das Leis e da Constituição. É esse princípio que
elimina qualquer possibilidade de hierarquia diante dos demais agentes políticos do Estado,
incluindo os magistrados, promotores de justiça, parlamentares, secretários de estado e delegados de
polícia.
O referido art. 134, §4º, da CF/88 dispõe, também, que se aplica à Defensoria Pública o disposto no
art. 93 e no art. 96, II, da CF/88.
Desse modo, compete à própria Defensoria, propor ao Legislativo a alteração do número de
membros, a criação e a extinção de cargos, a remuneração de seus serviços auxiliares e o subsídio
de seus membros.
Além disso, devem ser adotados pela Defensoria os mesmos critérios de promoção na carreira da
magistratura. E, também, deve ser observada a necessidade de três anos de atividade jurídica para
ingresso à carreira. No tocante à forma de se exigir (se pode ser computada atividade realizada
durante a graduação) e ao momento em que deve haver a comprovação (se na posse ou no decorrer
do concurso público), tem havido posicionamentos diferentes entre as Defensorias Públicas dos
estados e muita polêmica cerca o assunto. Ainda não há decisões de Tribunais Superiores sobre o
tema.

11.13. Sabe-se que a Defensoria Pública conta com insuficiente número de membros, na
grande maioria dos estados brasileiros, fato que traz enormes prejuízos ao direito de acesso à
justiça de muitas pessoas. A fim de solucionar tal impasse, qual foi a norma posta pela EC
80/2014?
A EC 80/2014 incluiu no ADCT o art. 98, que dispõe que o número de defensores públicos, na
unidade jurisdicional, será proporcional à efetiva demanda e à respectiva população.
106

Nos termos do §1º do referido artigo, a União, os Estados e o Distrito Federal deverão contar com
defensores públicos em todas as unidades jurisdicionais, no prazo de oito anos.
E segundo o disposto no §2º, durante o decurso do prazo de oito anos, a lotação dos defensores
públicos deverá ocorrer, prioritariamente, nas regiões com maiores índices de exclusão social e
adensamento populacional.

11.14. A Defensoria Pública é uma instituição que conta com imenso volume de trabalho e que
ainda não está devidamente estruturada. A fim de garantir uma efetiva atuação processual
dos Defensores Públicos, com respeito aos princípios constitucionais do processo, foram
asseguradas prerrogativas aos membros da carreira. Discorra brevemente sobre elas.
Com o objetivo de assegurar o devido processo legal, contraditório, ampla defesa e, até mesmo, um
efetivo acesso à Justiça, os membros da Defensoria Pública contam com prerrogativas processuais.
No caso dos membros das Defensorias Públicas dos Estados, tais prerrogativas estão dispostas no
art. 128, da LC 80/94. Dentre estas, destacam-se as prerrogativas da intimação pessoal e da
contagem em dobro de todos os prazos processuais, no processo civil, penal, ou mesmo
administrativo.
A violação das prerrogativas autoriza que sejam utilizados os mais variados remédios processuais,
no intuito de corrigi-las, como o habeas corpus e o mandado de segurança.
Tais prerrogativas são válidas para qualquer processo e grau de jurisdição. Há entendimento
jurisprudencial majoritário em relação aos Juizados Especiais, no sentido de que o rito peculiar dos
juizados é incompatível com a intimação pessoal e contagem em dobro dos prazos, para a
Defensoria.
Outro argumento que reforça tal entendimento é o fato de a Lei dos Juizados Especiais ser especial
para esse rito, devendo prevalecer. No entanto, muito mais adequado é o entendimento minoritário,
de que tais prerrogativas são aplicáveis no âmbito dos Juizados.
Ora, deve ser considerada a especialidade da função da Defensoria, e não a especialidade da Lei.
Ademais, a Lei que prevê as prerrogativas é complementar, não podendo, portanto, ser derrogada
por lei ordinária, como a que rege os Juizados Especiais.
107

12. PODER LEGISLATIVO. COMPOSIÇÃO. ORGANIZAÇÃO DO CONGRESSO


NACIONAL. COMPETÊNCIAS PRIVATIVAS E EXCLUSIVAS. A MESA DO CONGRESSO
NACIONAL. SUCESSÃO DA MESA. COMISSÕES PARLAMENTARES DE INQUÉRITO.
IMUNIDADES PARLAMENTARES. PROCESSO LEGISLATIVO. ESPÉCIES NORMATIVAS.
AUTORA: CARLA ROBERTA SOUZA NOGUEIRA
MATERIAL DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO (PEDRO LENZA, 2012 E 2013), SITE “DIZER O
DIREITO”, CADERNO LFG 2013, ANOTAÇÕES PESSOAIS.

12.1. Na esfera federal, por quem é exercido o Poder Legislativo?


Nos termos do art. 44 da CF/88: “O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que se
compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal”.
Assim, diz -se que no Brasil vigora o bicameralismo federativo, no âmbito federal. Ou seja, o Poder
Legislativo é bicameral, composto por duas Casas: a Câmara dos Deputados e o Senado Federal. A
primeira composta por representantes do povo e a segunda formada por representantes dos estados-
membros e do Distrito Federal.

12.2. Como está estruturado o Poder Legislativo estadual?


O Poder Legislativo estadual – e também o distrital – possui estrutura unicameral, pois é constituído
por uma única Casa – a Assembleia Legislativa – composta pelos Deputados Estaduais.
O número de Deputados Estudais, nos termos do art. 27, caput, da CF/88, corresponderá ao triplo da
representação do Estado na Câmara dos Deputados e, atingido o número de trinta e seis, será
acrescido de tantos quantos forem os Deputados Federais acima de doze.
O mandato dos Deputados Estaduais será de quatro anos.
As regras da CF sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de
mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas serão aplicadas aos
parlamentares estaduais.
No tocante à remuneração, o subsídio dos Deputados Estaduais será fixado por lei de iniciativa da
Assembleia Legislativa, não podendo ser superior a 75% daquele estabelecido, em espécie, para os
Deputados Federais.

12.3. Como está estruturado o Poder Legislativo municipal?


O Poder Legislativo municipal possui estrutura unicameral, pois é constituído por uma única Casa –
a Câmara Municipal (Câmara dos Vereadores) – composta pelos Vereadores, representantes do
povo do Município.
O número de Vereadores será proporcional à população do Município, até os limites estabelecidos
no art. 29, IV, da CF/88 e o mandato dos Vereadores será de 4 anos.
108

Os Vereadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na
circunscrição do Município (art. 29, VIII).
O subsídio deles será fixado pelas respectivas Câmaras Municipais, em cada legislatura para a
subsequente, ou seja, fica vedada a fixação de subsídios numa mesma legislatura vigente. O STF já
decidiu que a fixação de subsídios na mesma legislatura caracteriza “ato lesivo não só ao
patrimônio material do poder público, como à moralidade administrativa, patrimônio moral da
sociedade” (STF, RE 172.212 -6/ SP, Rel. Min. Maurício Corrêa, 2.ª Turma, DJ 1, de 27.03.1998, p.
19)
Destaque-se que o limite máximo dos subsídios dos Vereadores é de 75% do subsídio dos
Deputados Estaduais, porém, variável de acordo com o número de habitantes de cada município,
não podendo o total da despesa com a remuneração dos Vereadores ultrapassar o montante de 5%
da receita do município e, ainda, os gastos da Câmara Municipal com folha de pagamentos,
incluídos os subsídios dos Vereadores, não pode ultrapassar a 70% de sua receita.
Além disso, deve ser observado que nos municípios nenhum subsídio pode ser superior ao do
Prefeito.

12.4. Para as matérias de competência exclusiva do Congresso Nacional, faz-se necessária a


sanção presidencial? Qual é a espécie normativa que materializa tal competência?
Para as referidas matérias não é necessária manifestação do Presidente da República, por sanção ou
veto.
Tais atribuições são materializadas por decreto legislativo.

12.5. Quais são os aspectos fundamentais da estrutura da Câmara dos Deputados?


A Câmara dos Deputados é composta por Deputados Federais, que são representantes do povo.
Os deputados federais são eleitos pelo povo segundo o princípio proporcional. Ou seja, o número de
deputados federais será proporcional à população de cada estado e do distrito federal, não podendo
um estado e o DF ter menos do que 8, nem mais do que 70 deputados federais.
Cabe lembrar que os territórios, se vierem a ser criados, elegerão um número fixo de 4 deputados —
art. 45, § 2.º. O número total de deputados federais foi fixado pela LC n. 78/93 em 513.
O mandato de cada deputado é de 4 anos, período que corresponde à legislatura (art. 44, parágrafo
único). Assim, a cada 4 anos serão renovados os deputados, sendo permitida a reeleição, sem limite
de vezes em que pode haver a reeleição.

12.6. Quais são os aspectos fundamentais da estrutura do Senado Federal?


O Senado Federal é composto por representantes dos estados e do distrito federal. Quando criados,
os territórios não terão representação no Senado Federal, na medida em que não terão autonomia
federativa.
109

Os senadores são eleitos pelo povo segundo o princípio majoritário, ou seja, não se trata mais de
estabelecer um número proporcional à população, mas, sim, de eleger ao Senado aquele candidato
que obtiver o maior número de votos.
Cada estado e o distrito federal elegerão o número fixo de 3 senadores e cada um deles será eleito
com 2 suplentes.
O mandato de cada senador é de 8 anos, portanto, duas legislaturas. A renovação, dos senadores
eleitos acontecerá de quatro em quatro anos, na proporção de 1/3 e 2/3, alternadamente.

12.7. É adequada a denominação “competência privativa” para as atribuições da Câmara dos


Deputados e do Senado Federal que são assim denominadas?
Não. Muito embora o texto da Constituição fale em competência privativa, tecnicamente, melhor
seria se tivesse dito competência exclusiva, em razão de sua indelegabilidade.

12.8. Por meio de qual espécie normativa as competências privativas dos deputados federais
materializam-se? E as competências privativas dos senadores?
As matérias de competência privativa dos deputados federais estão previstas no art. 51, da CF/88, as
dos senadores estão previstas no art. 52, da CF/88 e ambas não dependerão de sanção presidencial,
nos termos do art. 48, caput. Tais competências materializam-se por meio de resolução.

12.9. Além do subsídio, os membros do Congresso Nacional recebem outros valores?


Sim. Além do subsídio mensal, os parlamentares recebem outros valores a título de verba
indenizatória e para pagamento de despesas com passagens aéreas.
Apesar de a transparência começar a ser observada nos sites das Casas Legislativas, ainda falta uma
maior visibilidade e publicidade das informações.
Devemos estudar, também, a natureza jurídica dessas verbas para verificar se alguma delas tem
essência de remuneração, gerando problemas com a regra do teto fixada no art. 37, XI, da CF/88.
Há entendimento na doutrina de que incide imposto de renda sobre o total da remuneração do
deputado, inclusive sobre o auxílio-moradia, quando pago em espécie.

12.10. Discorra sobre as várias espécies de sessão legislativa.


Sessão legislativa é a reunião dos parlamentares. Ela pode ser de várias espécies: ordinária (art.57,
caput, CF/88), extraordinária (art. 57, §6º, CF/88), conjunta (art. 57, § 3ºCF/88) e preparatória (art.
57, § 4º).
A sessão legislativa ordinária é a reunião anual, em Brasília, do Congresso Nacional, de 2 de
fevereiro a 17 de julho e de 1.º de agosto a 22 de dezembro, de cada ano.
110

A sessão legislativa extraordinária é a reunião realizada mediante convocação do Congresso


Nacional durante o recesso parlamentar (de 18 a 31 de julho e de 23 de dezembro a 1º de fevereiro),
nas hipóteses descritas pela Constituição.
Cumpre destacar que é vedado o pagamento de parcela indenizatória em decorrência da convocação
extraordinária. E, ainda, cabe lembrar que o Congresso Nacional deliberará somente sobre a matéria
pela qual foi convocado, exceto se houver medidas provisórias em vigor na data da convocação,
caso em que elas serão automaticamente incluídas em pauta.
A sessão legislativa conjunta é a reunião da Câmara dos Deputados e do Senado Federal,
conjuntamente. Isso acontecerá, entre outros casos previstos na Constituição, para conhecer do veto
e sobre ele deliberar.
A sessão legislativa preparatória é a reunião de cada uma das Casas, a partir de 1º de fevereiro, do
primeiro ano da legislatura, para posse de seus membros e eleição das respectivas mesas. Nesse
caso, pode-se dizer que a sessão legislativa ordinária, no primeiro ano de cada legislatura, começa
em 1º de fevereiro e não no dia 2 de fevereiro.

12.11. Qual a diferença entre sessão legislativa ordinária e legislatura?


A sessão legislativa ordinária é a reunião anual em Brasília do Congresso Nacional, de 2 de
fevereiro a 17 de julho e de 1.º de agosto a 22 de dezembro. Já a legislatura consiste no período de 4
anos que corresponde ao mandato dos Deputados Federais. Assim, cada legislatura é composta por
4 sessões legislativas ordinárias.

12.12. Quais são as funções das Mesas diretoras de cada Casa Legislativa?
As Mesas diretoras de cada Casa exercem funções administrativas (de polícia, execução e
administração), devendo, no tocante à sua constituição, ser assegurada, tanto quanto possível, a
representação proporcional dos partidos ou dos blocos parlamentares que participam da respectiva
Casa, nos termos da Constituição.
Temos, então, a Mesa da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e a Mesa do Congresso
Nacional, sendo a esta última, de acordo com o art. 57, § 5º, CF/88 conta com algumas regras: a
presidência da Mesa do Congresso Nacional será exercida pelo Presidente do Senado Federal; os
demais cargos da Mesa do Congresso Nacional serão exercidos, alternadamente, pelos ocupantes de
cargos equivalentes na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Dessa forma, se a presidência é
ocupada por um membro do Senado Federal (no caso o Presidente do Senado Federal), a 1.ª Vice -
presidência será ocupada por um membro da Câmara; o 2.º Vice -presidente do Senado; o 1.º
Secretário por um membro da Câmara e assim por diante.

12.13. Discorra sobre as funções, poderes e forma de criação das Comissões Parlamentares de
Inquérito (CPIs).
As CPIs são comissões temporárias, destinadas a investigar fato certo e determinado. Esse papel de
fiscalização e controle da Administração é verdadeira função típica do Poder Legislativo, conforme
se entende pela leitura do art. 70, caput, CF/88.
111

Ainda, a função fiscalizadora exercida pelo Poder Legislativo consagra a perspectiva dos freios e
contrapesos, muito bem delimitada na Constituição de 1988.
O STF entende que as CPIs constituem-se verdadeiro direito público subjetivo das minorias. Após
ter sido efetivamente instalada a CPI do Apagão Aéreo, criada para investigar as causas, as
consequências e os responsáveis pela crise ocorrida no setor aéreo brasileiro, observados os
requisitos do art. 58, §3º, CF/88, o Plenário da Câmara dos Deputados desconstituiu o ato de criação
da CPI. Contra esse ato da Mesa e do presidente da Câmara dos Deputados, foi impetrado mandado
de segurança. O STF, seguindo o voto do Min. Celso de Mello, determinou a instauração da CPI,
sob pena de violação do direito público subjetivo das minorias, mesmo contra a vontade da maioria
da Casa.
De acordo com o art. 58, §3º, CF/88, as CPIs serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo
Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de 1/3 de seus membros.
Desse modo, para criação das CPIs, três requisitos são necessários: requerimento subscrito por, no
mínimo, 1/3 de Parlamentares; indicação, com precisão, de fato determinado a ser apurado na
investigação parlamentar; estabelecimento de prazo certo para o desenvolvimento dos trabalhos.
Em relação aos poderes, as CPIs terão poderes de investigação, próprios das autoridades judiciais,
além de outros previstos nos regimentos internos das Casas. A comissão parlamentar de inquérito
realiza, assim, verdadeira investigação, materializada no inquérito parlamentar. Em razão dos
poderes instrutórios que lhe foram conferidos, poderão as CPIs determinar as diligências que
reportarem necessárias e requerer a convocação de Ministros de Estado, tomar o depoimento de
quaisquer autoridades federais, estaduais ou municipais, ouvir os indiciados, inquirir testemunhas
sob compromisso, requisitar de repartições públicas e autárquicas informações e documentos e
transportar -se aos lugares onde se fizer mister a sua presença. O STF já decidiu que a CPI pode,
sem a necessidade de qualquer intervenção judicial, sempre por decisão fundamentada e motivada,
determinar: quebra do sigilo fiscal; quebra do sigilo bancário; quebra do sigilo de dados.
Cumpre destacar que ante o postulado de reserva constitucional de jurisdição, o que a CPI não tem
competência é para quebra do sigilo da comunicação telefônica (interceptação telefônica). No
entanto, pode a CPI requerer a quebra de registros telefônicos pretéritos, ou seja, com quem o
investigado falou durante determinado período pretérito.

12.14. Nas CPIs, em quais situações a testemunha pode fazer uso do direito ao silêncio?
Em regra, as testemunhas prestarão compromisso de dizer a verdade, sob pena de falso testemunho.
No entanto, resta assegurado o direito ao silêncio quando deva guardar o sigilo, em razão de função,
ministério, ofício ou profissão, salvo se, desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar o seu
testemunho (arts. 207 do CPP e 406, II, do CPC).
Outra hipótese é a da testemunha também investigada ou indiciada, que poderá deixar de responder
às perguntas que possam incriminá -la (HC 80.584 -PA, Rel. Min. Néri da Silveira, 08.03.2001).
Para se ter um exemplo, destacamos o voto da Ministra Ellen Gracie, que concedeu habeas corpus
preventivo ao publicitário Marcos Valério para depor na CPMI dos Correios, na Câmara dos
Deputados, na condição de investigado.
112

Situação peculiar é a do cônjuge do investigado. Nos termos do Código de Processo Penal, a


testemunha não pode se eximir da obrigação de depor, mas, sendo cônjuge de um dos investigados,
não é obrigada a firmar o compromisso de dizer a verdade.

12.15. Toda CPI pode quebrar sigilo bancário independentemente de autorização judicial?
Não. O entendimento que prevalece é de que CPIs federais e estaduais podem quebrar sigilo
bancário, independentemente de autorização judicial, por terem poderes de investigação próprios de
autoridade judicial. As CPIs municipais, contudo, dependem de autorização judicial para que
possam quebrar sigilo bancário.
E não há problema em diferenciar os Legislativos de nossa Federação, já que, no Brasil, vigora
aquilo que a doutrina denominou federalismo assimétrico, no qual o Município ocupa uma posição
bastante particular.
Assim, apesar de ser um ente federativo, e isso não se discute (arts. 1.º e 18, caput), a posição dos
Municípios não se confunde com a dos Estados e a do Distrito Federal. Os Municípios não elegem
Senador e, assim, não têm uma representação direta na Federação.
Ainda, o Município, dentro da ideia de autogoverno, não tem Judiciário próprio, apesar de existir,
naturalmente, a prestação jurisdicional nas comarcas e sessões judiciárias.
Ademais, a quebra de sigilo bancário é medida que restringe o direito fundamental à intimidade e
deve ser realizada apenas excepcionalmente.
Logo, ante tais peculiaridades, o tratamento dispensado à CPI municipal, no tocante à quebra de
sigilo bancário, pode e deve ser diferenciado.

12.16. Qual é a finalidade das imunidades parlamentares? Quais são as espécies de


imunidade?
As imunidades parlamentares visam, primordialmente, a assegurar a independência do Poder
Legislativo e a liberdade parlamentar de seus membros. É por meio das imunidades que os
membros do Legislativo podem exercer a sua função fiscalizatória sem se preocuparem com
possíveis sanções políticas, civis ou criminais.
Estas garantias são atribuídas ao Poder Legislativo, são garantias institucionais. Não são garantias
do Parlamentar. Por isso, elas são irrenunciáveis. É, também, por essa razão que quando o
Parlamentar afasta-se do cargo, as imunidades ficam suspensas, muito embora a prerrogativa de
foro reste mantida.
A imunidade pode ser: material, formal.
A imunidade material é uma proteção dada ao parlamentar para que ele possa emitir livremente
opiniões, palavras e votos.
As opiniões, palavras e votos proferidos dentro do Plenário independem de conexão com o
exercício das funções do parlamentar. É como se houvesse uma presunção de conexão entre a
manifestação e o exercício da função. Cumpre mencionar que eventuais abusos devem ser coibidos
pela Casa respectiva.
113

Já as opiniões, palavras e votos proferidos fora do Plenário devem ter conexão com o exercício da
função parlamentar. Manifestações estranhas a sua condição de parlamentar podem ensejar
responsabilidade civil.
De acordo com o STF, a imunidade material tem natureza jurídica de causa excludente de
tipicidade.
A imunidade formal refere-se tanto à prisão do Parlamentar, quanto ao processo.
Nos termos da Constituição, o Parlamentar não poderá ser preso desde a diplomação, salvo na
hipótese de flagrante delito de crime inafiançável (art. 53, §2º, CF/88). Uma vez efetuada a prisão,
deve haver a comunicação à respectiva Casa para que, pelo voto da maioria absoluta, decida sobre a
prisão. Se a Casa entender que a prisão é arbitrária, poderá deliberar que seja relaxada.
Segundo o STF, este dispositivo trata apenas da prisão cautelar e não impede a prisão decorrente de
decisão penal definitiva.
Em relação à prisão decorrente do inadimplemento da obrigação alimentar, o STF ainda não se
manifestou, mas a doutrina entende pela possibilidade dessa prisão.
Até a EC 32/01 os Deputados e Senadores só poderiam ser processados com a autorização da
respectiva casa. Atualmente, a autorização não é mais necessária. Caso o parlamentar pratique um
crime após a diplomação, a denúncia será enviada ao STF, que irá dar ciência à Casa respectiva do
parlamentar.
Pode ocorrer de um partido político que tenha representação na respectiva Casa, tomar iniciativa de
solicitar a suspensão do processo. Nesta situação, a Casa terá quarenta e cinco dias para deliberar.
Se a maioria absoluta dos membros da Casa decidir pela suspensão, antes do fim do processo, ele
será suspenso.
Observa-se que com a Suspensão do processo, suspende-se também a prescrição.

12.17. O veículo de comunicação que transmite denúncia feita por parlamentar protegido por
imunidade material pode ser responsabilizado?
O fato coberto pela inviolabilidade e divulgado pela imprensa não pode servir de causa para
responsabilização civil, administrativa ou criminal dos meios de comunicação, sob pena de se
esvaziar o instituto da imunidade material.

12.18. Diante de uma agressão verbal de parlamentar, aquele que revida, dentro ou fora do
Parlamento, mas em atividade ligada ao exercício do seu mandato, será responsabilizado?
O entendimento adotado pelo STF é no sentido de que a resposta imediata à injúria perpetrada por
parlamentar, coberta pela imunidade, também deve ficar imune.
114

12.19. Diante da condenação criminal de Parlamentar, a perda do cargo é automática ou


depende de deliberação da respectiva Casa?
Na AP 470, o entendimento inicial adotado pela maioria dos Ministros do STF foi de que a perda do
mandato seria uma consequência automática da condenação penal definitiva (Art. 55, IV, c/c Art.
55, §3º e com o Art. 15, III, da CF/88).
Afirmavam que como a condenação penal definitiva traz como consequência a suspensão dos
direitos políticos, cabe à mesa da respectiva Casa apenas declarar a perda do mandato.
No entanto, com a mudança de composição da corte, este entendimento inicial foi superado pela
decisão segundo a qual, no caso de decisão penal condenatória, a perda do mandato será decidida e
não apenas declarada pela mesa da Casa respectiva.

12.20. Qual foi a alteração realizada pela EC 76/2013? Pode-se dizer que todas as votações da
Câmara dos Deputados e do Senado Federal são, agora, abertas?
A EC 76/2013 acabou com o voto secreto em duas hipóteses: na votação para decidir sobre a perda
do mandato do parlamentar; e na apreciação de veto do Presidente da República.
Ainda existem situações em que há votação secreta. Algumas delas estão previstas na CF/88, por
exemplo no caso da escolha, pelo Senado, de alguns ocupantes de cargos públicos, como o
Procurador Geral da República, Ministros do STF, entre outros. A sessão em que os indicados são
arguidos também será secreta.

12.21. Os suplentes possuem as imunidades e prerrogativas do titular do mandato?


Não existe senador suplente, deputado suplente, nem vereador suplente. O que existe é suplente de
Senador, de Deputado ou de Vereador. Como são suplentes (e não parlamentares) não se aplicam a
eles nem as imunidades, nem a prerrogativa de foro.

12.22. Em que consiste a prerrogativa de foro? A partir de que momento ela é aplicável? Até
quando ela existe?
A prerrogativa de foro consiste no fato de os parlamentares, em caso de prática de crime comum,
serem julgados por órgão jurisdicional distinto do ordinário.
Segundo o Supremo Tribunal Federal, a expressão “crimes comuns” abrange os dolosos contra a
vida, os delitos eleitorais e as contravenções penais.
Novelino faz uma distinção entre imunidade formal e prerrogativa de foro. No entanto, muitos
autores tratam as expressões como sinônimas, entendendo que a prerrogativa de foro é uma espécie
de imunidade formal.
A prerrogativa de foro começa com a diplomação, nos termos do art. 53, §1º, CF/88, que estabelece
a competência do STF para julgar Deputados Federais e Senadores, a partir da expedição do
diploma.
115

Quando o parlamentar já responde a processos penais anteriormente, a partir do momento da


diplomação, esses processos passarão a ser de competência do STF, havendo a remessa.
A prerrogativa de foro, em regra, permanece até o fim do mandato. Com o fim do mandato os
processos retornam à instância ordinária.
Todavia, na jurisprudência do STF há duas exceções:
a) Quando o julgamento já tiver sido iniciado. Ou seja, quando os Ministros já começaram a
proferir seus votos. Neste caso, o julgamento prossegue até o final no STF. Foi o que o STF
decidiu no Inq. 2295.
b) Quando houver renúncia com abuso de direito, com a finalidade de alterar a competência e
adiar o julgamento. Em um caso concreto analisado pelo STF, AP 396/RO, o parlamentar
renunciou um dia antes de se iniciar o julgamento no STF e o processo foi mantido no
Supremo.

12.23. Qual o órgão jurisdicional competente para julgar exceção da verdade oposta contra
Deputados Federais ou Senadores?
Em regra, quando é oposta a exceção da verdade, ela é admitida, processada e julgada pelo mesmo
juiz que julga a ação. Todavia, esta regra geral não vale quando oposta contra Deputado ou
Senador. O STF adota o entendimento que no caso de exceção da verdade, quando oposta contra
autoridade com prerrogativa de foro no STF, tal exceção deve ser julgada pelo STF. Todavia, sua
admissibilidade e processamento serão de competência das instâncias ordinárias.

12.24. O processo do corréu, em regra, será atraído ao foro por prerrogativa de função de um
dos denunciados?
Quando for possível o desmembramento, o corréu, que não tem prerrogativa de foro, deverá ser
processado pelas instâncias ordinárias. Embora a decisão proferida no caso do “mensalão” tenha
determinado o julgamento de todos os corréus em um mesmo processo (Inq. 2245), a regra que o
STF vem adotando é: havendo prerrogativa de foro de um dos envolvidos, há o desmembramento
do processo, com base na conveniência da instrução e na racionalização dos trabalhos.
Entretanto, se houver conexão ou continência, entende-se que o deslocamento não viola quaisquer
garantias dos réus, conforme o disposto na S. 704, STF (Não viola as garantias do juiz natural, da
ampla defesa e do devido processo legal a atração por continência ou conexão do processo do
corréu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados).

12.25. No caso da prática de crime doloso contra a vida por Deputado Estadual, ele terá foro
por prerrogativa de função? E no caso da prática, por Deputado Estadual, de um crime
contra bens, interesses e serviços da União, Empresa Pública ou Autarquia Federal, haverá o
foro por prerrogativa de função?
De acordo com o entendimento adotado pelo STF (Rcl. 72936), a prerrogativa de foro dos
Deputados Estaduais está consagrada também na Constituição Federal (Art. 27, §1º), razão pela
qual não se aplica a estes parlamentares a súmula 721 do STF, em cujos termos a competência
116

constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido
exclusivamente pela Constituição Estadual.
No caso dos crimes dolosos contra a vida, cometidos pelos Deputados Estaduais, o julgamento será
realizado pelo Tribunal de Justiça.
Em relação aos crimes praticados por Deputado Estadual contra bens, interesses e serviços da
União, Empresa Pública ou Autarquia Federal, competência será do Tribunal Regional Federal. Se
praticado crime eleitoral, a competência será do Tribunal Regional Eleitoral.

12.26. Em que consiste o processo legislativo? Qual é o seu objeto?


Processo legislativo é o conjunto de normas que regulam a produção de atos normativos primários,
ou seja, aqueles que encontram na Constituição o seu fundamento direto de validade.
O objeto do processo legislativo é o ato normativo primário que será elaborado, conforme elencado
no art. 59, CF/88: emendas à Constituição, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas,
medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções.

12.27. Conceitue e caracterize o processo legislativo sumário.


Existem três espécies de processo legislativo: ordinário, sumário e especial. O ordinário é a base
dos outros processos. O que diferencia o sumário do ordinário é o prazo para apreciação deste
projeto de lei. Naquele, o Presidente da República pode solicitar urgência na apreciação de um
projeto de lei de sua iniciativa, de forma que a Câmara e o Senado terão um prazo a observar.
Tais projetos, de iniciativa do Presidente da República, começam sempre pela Câmara dos
Deputados, que terá quarenta e cinco dias para votar, e, não o fazendo, haverá o trancamento da
pauta até a votação.
Uma vez votado na Câmara, o projeto vai para o Senado, que também disporá de quarenta e cinco
dias para apreciá-lo, e não o fazendo, também acontecerá o trancamento da pauta.
Havendo alguma emenda ao projeto no Senado, esta alteração tem que ser apreciada pela Câmara,
no prazo de dez dias, sob pena de trancamento da pauta.
O processo legislativo sumário está regulado pelo art. 61 e parágrafos da Constituição.

12.28. Caso haja uma medida provisória e um processo sumário trancando a pauta da
Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, qual deve ser apreciado primeiro?
O art. 61, §2º, CF/88 dispõe que se a Câmara e o Senado não se manifestarem sobre o processo
legislativo sumário, sucessivamente, em até quarenta e cinco dias, haverá o trancamento da pauta,
com exceção das deliberações legislativas que tenham prazo constitucional determinado.
A medida provisória enquadra-se na exceção. Ou seja, possui prazo constitucional fixado para
votação, conforme o art. 62, §6º, CF/88. Assim, ela é que será apreciada em primeiro lugar.
117

12.29. Sabe-se que o processo legislativo possui três fases: iniciativa, constitutiva e
complementar. Há diferentes hipóteses de iniciativa. Como são classificadas essas hipóteses?
A iniciativa é classificada em: geral, concorrente, privativa, popular, conjunta, do art. 67 e a
parlamentar ou extraparlamentar.
A iniciativa geral é aquela disciplina no art. 61, caput, CF/88, que atribui competência, de maneira
ampla, a várias pessoas, para iniciar o processo legislativo: qualquer Deputado Federal ou Senador,
comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, Presidente da
República, Supremo Tribunal Federal, Tribunais Superiores, Procurador Geral da República,
cidadãos.
A iniciativa concorrente refere -se à competência atribuída pela Constituição a mais de uma pessoa
ou órgão para deflagrar o processo legislativo. Isso acontece, por exemplo, no caso da iniciativa
para elaborar leis complementares e ordinárias, concedida a qualquer membro ou Comissão da
Câmara, Senado ou Congresso, ao Presidente da República e aos cidadãos.
A iniciativa privativa é aquela que compete exclusiva e expressamente a determinadas pessoas, só
podendo o processo legislativo ser deflagrado por elas, sob pena de se configurar vício formal de
iniciativa, caracterizador da inconstitucionalidade do referido ato normativo.
A iniciativa popular é a possibilidade de o eleitorado nacional deflagrar processo legislativo de lei
complementar ou ordinária, mediante proposta de, no mínimo, 1% de todo o eleitorado nacional,
distribuído por pelo menos cinco Estados e, em cada um deles com não menos do que 0,3% dos
seus eleitores. Trata-se de importante instrumento de exercício direto do poder pelo povo, de forma
a implementar a soberania popular.
A iniciativa conjunta acontece quando a Constituição estabelece a competência de diversas pessoas
para, conjuntamente, darem início ao processo legislativo.
A iniciativa do art. 67, da CF/88 é aquela que compete à maioria da absoluta dos membros de
qualquer das Casas do Congresso Nacional, quando a matéria constante de projeto de lei rejeitado
for posta em votação, na mesma sessão legislativa.
A iniciativa parlamentar é a prerrogativa que a Constituição confere a todos os membros do
Congresso Nacional de apresentação de projetos de lei. Por outro lado, a iniciativa extraparlamentar
é aquela conferida ao Chefe do Poder Executivo, aos Tribunais Superiores, ao Ministério Público e
aos cidadãos.

12.30. O legitimado exclusivo pode ser compelido a deflagrar processo legislativo?


Em regra, não poderá o legitimado exclusivo ser forçado a deflagrar o processo legislativo, já que a
fixação da competência reservada traz, implicitamente, a discricionariedade para decidir acerca do
momento adequado para encaminhamento do projeto de lei.
No entanto, se a Constituição fixar um prazo, o legitimado exclusivo poderá ser compelido a
encaminhar o projeto de lei.
No caso de demora do legitimado exclusivo, observado o princípio da proporcionalidade, poderá ser
reconhecida a inconstitucionalidade por omissão se a lei a ser elaborada for regulamentadora de
artigos da Constituição de eficácia limitada.
118

12.31. Cabe emenda parlamentar em projetos de iniciativa reservada?


É cabível a emenda parlamentar, desde que respeitados os seguintes requisitos: os dispositivos
introduzidos por emenda parlamentar não podem estar destituídos de pertinência temática com o
projeto original; os dispositivos introduzidos por emenda parlamentar não podem acarretar aumento
de despesas ao projeto original.

12.32. O vício de iniciativa será convalidado pela sanção presidencial?


Não haverá a convalidação.
A S. 5 do STF estabelece que a sanção do projeto supre a falta de iniciativa do Poder Executivo,
contudo o seu conteúdo está superado e hoje o STF entende que a sanção presidencial não convalida
vício de iniciativa. Trata -se de vício formal insanável, incurável.

12.33. Cabe iniciativa popular de proposta de emenda à Constituição?


O ordenamento jurídico brasileiro não admitiu expressamente a iniciativa popular de proposta de
emenda à Constituição.
Na doutrina, o tema é polêmico. Para alguns autores, como José Afonso da Silva, é possível
iniciativa popular de emenda com fundamento em uma interpretação sistemática da Constituição,
aplicando-se por analogia a regra contida no Art. 61, §2º, CF/88.
Para outros autores, não é possível iniciativa popular no caso de Emenda, por se tratar de uma
norma excepcional e que, portanto, deve ter seu processo legislativo interpretado restritivamente.

12.34. Há hierarquia entre lei ordinária e lei complementar?


O entendimento atual do STF e do STJ é de que não existe hierarquia entre lei ordinária e lei
complementar. A diferença entre elas, é o campo material (RE 377.457) e também o quórum para
votação. Enquanto a lei ordinária precisa, para aprovação, do voto da maioria relativa dos
parlamentares (maioria dos presentes na votação), a lei complementar necessita, para ser aprovada,
do voto da maioria absoluta de cada Casa do Congresso Nacional (maioria dos membros da Casa).

12.35. Pode uma lei complementar tratar de matéria reservada a lei ordinária e vice-versa?
É possível que uma lei complementar trate de matéria de lei ordinária, que é uma matéria residual,
por uma questão de economia legislativa. Neste caso, a lei será formalmente complementar, mas
materialmente ordinária, ou seja, ela poderá futuramente ser revogada por uma lei ordinária.
Não se admite, entretanto, que lei ordinária trate de matéria de lei complementar em nenhuma
hipótese, pois além de o quórum para aprovação ser maior no caso das leis complementares, a
matéria de que elas tratam é expressamente reservada a elas pela Constituição.
119

12.36. Quais são as formas de sanção? E de veto? O veto é absoluto ou relativo?


A sanção pode ser:
a) Expressa: o Presidente manifesta-se expressamente pela sanção dentro do prazo de quinze
dias úteis;
b) Tácita: não há manifestação do Presidente, para sancionar ou vetar, expressamente, no prazo
de quinze dias úteis. Então, ocorre a sanção tácita;
c) Total: o Presidente sanciona integralmente determinado projeto de lei, sem vetar nenhum de
seus dispositivos;
d) Parcial: apenas alguns dispositivos do projeto de lei são sancionados. Alguns são vetados.

O Veto pode ser:


a) Total: o projeto de lei é integralmente vetado pelo Presidente;
b) Parcial: um ou alguns dispositivos de um projeto de lei são vetados. Conforme previsto no
art. 66, §2º, CF/88, só pode abranger texto integral de artigo, parágrafo, inciso ou alínea;
c) Político: o Presidente veta um projeto de lei por considera-lo contrário ao interesse público.
Há uma análise de caráter político da norma;
d) Jurídico: quando o Presidente veta um projeto por considera-lo inconstitucional.
Ainda sobre o veto, ele nunca será tácito, porque se o Presidente não se manifestar em quinze dias,
ocorrerá a sanção tácita.
Por fim, o veto não é absoluto e sim relativo, porque conforme o art. 66, §4º, CF/88, o Congresso
Nacional, em uma sessão conjunta, pode deliberar sobre o veto do Presidente e, caso a maioria
absoluta dos seus membros assim entenda, é possível haver a derrubada do veto.

12.37. Medida provisória pode regular direitos fundamentais? E lei delegada?


A medida provisória é uma espécie normativa regulada pelo art. 62, CF/88. Nos termos desse
artigo, em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas
provisórias, que terão força de lei. As medidas provisórias deverão ser submetidas de imediato ao
Congresso Nacional.
O §1º do referido artigo veda a edição de medida provisória sobre determinadas matérias, inclusive
sobre nacionalidade e direitos políticos, que são espécies de direitos fundamentais. Assim, sobre
esses direitos fundamentais, não é possível a edição de medida provisória. Já em relação aos direitos
sociais e aos direitos individuais e coletivos, que também são direitos fundamentais, é possível a
edição de medida provisória.
A lei delegada é um ato normativo primário elaborado pelo Presidente da República, após
delegação “externa corporis” pelo Congresso Nacional. Trata-se de exceção ao princípio da
indelegabilidade das atribuições.
É um instrumento muito pouco utilizado no Direito Brasileiro, pois o Presidente dispõe da medida
provisória para legislar.
120

O art. 68, §1º, II, CF/88 veda a edição de leis delegadas sobre nacionalidade, direitos políticos e
direitos individuais. Desse modo, a lei delegada não pode regular tais direitos, que são
fundamentais. No entanto, é possível edição de lei delegada para regular direitos coletivos e direitos
sociais, que também são fundamentais.

12.38. Os requisitos da relevância e urgência só se submetem à análise política ou também


podem submeter-se à análise jurídica?
A análise jurídica é possível, mas só deve ocorrer excepcionalmente, quando a
inconstitucionalidade for flagrante e objetiva. Essa é a posição do Supremo Tribunal Federal.
Um exemplo disso é a ADI 4029, em que foi discutida a medida provisória que criou o Instituto
Chico Mendes, que foi instituído para exercer algumas funções que atualmente são exercidas pelo
Ibama. A urgência foi questionada nessa ação.

12.39. Publicada uma medida provisória sobre matéria vedada, proposta ADI, e sendo
convertida em lei antes do julgamento, a ADI perde seu objeto?
Quando uma medida provisória objeto de uma ação direta de inconstitucionalidade é convertida em
lei antes do julgamento da ação, esta não perde o seu objeto. É necessário apenas que o requerente
emende a inicial.
121

13. PODER EXECUTIVO. SISTEMA DE GOVERNO. ELEIÇÃO. PRESIDENTE E VICE-


PRESIDENTE DA REPÚBLICA. CRIMES DE RESPONSABILIDADE E IMPEACHMENT.
PRERROGATIVAS DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA. PODER JUDICIÁRIO. PRINCÍPIOS.
GARANTIAS. ESTRUTURA. SÚMULAS VINCULANTES.
AUTOR: ANDRESSA V IDAL

MATERIAL DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO - PEDRO LENZA (2014) E DIREITO


CONSTITUCIONAL SISTEMATIZADO (2012) – RODRIGO PADILHA

13.1. Defina Poder Executivo.


Poder Executivo é desdobramento das teorias de Aristóteles e Montesquieu.
Aristóteles, em sua obra Política, vislumbrava a existência de três funções distintas exercidas pelo
poder soberano, quais sejam, a função de editar normas gerais a serem observadas por todos, a de
aplicar as referidas normas ao caso concreto (administrando) e a função de julgamento, dirimindo
os conflitos da execução das normas gerais nos casos concretos.
Montesquieu aprimorou a primeira teoria em O espírito das leis e inovou ao afirmar que tais
funções estariam intimamente conectadas a três órgãos distintos, autônomos e independente entre si,
não mais se concentrando nas mãos únicas do soberano.
Deste modo, Poder Executivo é a função essencial da estrutura do Estado, que concentra a função
típica de administrar, Chefia de Estado e Chefia de Governo, aplica a lei ao caso concreto,
administrando a coisa pública, além das funções atípicas como legislar e julgar.

13.2 Quais são as funções típicas e atípicas do Poder Executivo? Exemplifique.


A teoria da tripartição dos Poderes de Montesquieu foi adotada de forma abrandada, admitindo-se
interpenetração entre os Poderes, atenuando a teoria que pregava separação absoluta.
Dessa forma, cada órgão exerce funções típicas que são as inerentes e ínsitas à sua natureza, bem
como, funções atípicas de natureza típica dos outros.
O Poder Executivo tem como função típica a prática de atos de Chefia de Estado, Chefia de
Governo e atos de administração (art. 84 da CR/88), como, por exemplo, celebrar tratados,
convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo pelo Congresso Nacional, bem como, nomear
e exonerar os Ministros de Estado.
Como função atípica do Poder Executivo, é possível exemplificar, a adoção de Medida Provisória
pelo Presidente da República como forma de lei (art. 62, da CR/88), bem como a atuação do Poder
Executivo ao julgar e apreciar defesa em recursos administrativos.
122

13.3 Diferencie as funções de Chefe de Estado e Chefe de Governo.


A função de Chefe de Estado consiste na representação externa, defende a unidade nacional ao
manter relações com Estados estrangeiros, celebrar tratados, convenções e atos internacionais.
A função de Chefe de Governo consiste na direção superior da Administração Pública, condução
política do Estado internamente.

13.4. Em que consiste o denominado sistema de governo?


Sistema de governo é o grau de relacionamento entre os Poderes Executivo e Legislativo.

13.5. Quais são os principais sistemas de governo?


Os principais sistemas de governo são o PRESIDENCIALISMO e o PARLAMENTARISMO.

13.6. Quais são as características do sistema presidencialista?


São características do sistema presidencialista, criação norte-americana:
a) as funções de Chefe de Estado (representação externa) e Chefe de Governo (responsável pela
condução política do Estado internamente) encontram-se nas mãos de uma única pessoa, o
Presidente da República;
b) eleição do Presidente da República pelo povo para mandato determinado;
c) ampla liberdade para escolher os Ministros de Estado, que auxiliam e podem ser demitidos ad
nutum pelo Presidente, a qualquer tempo.
Neste sistema, fica mais caracterizada a separação de funções estatais, desenvolvem-se as técnicas
da independência orgânica e harmonia dos poderes. Os Poderes Executivo e Legislativo são
independentes.

13.7. Quais são as características do sistema parlamentarista?


São características do sistema parlamentarista:
a) a função de Chefe de Estado é exercida pelo Presidente da República (República parlamentarista)
ou Monarca (Monarquia parlamentarista), enquanto a função de Chefe de Governo, pelo Primeiro-
Ministro, chefiando gabinete;
b) o Primeiro-Ministro, que exerce, de fato, a função de Chefe de Governo, é apontado pelo Chefe
de Estado, só se tornando Primeiro-Ministro com a aprovação do Parlamento;
c) o Primeiro-Ministro não exerce mandato por prazo determinado, pois poderá ocorrer a queda de
governo se perder a maioria parlamentar pelo partido a que pertence, ou através do voto de
desconfiança, bem como, pela possibilidade de dissolução do Parlamento, declarando-se extintos os
mandatos pelo Chefe de Estado e convocando-se novas eleições. Aqui, há a denominada
colaboração de poderes, em que o governo depende da confiança do Parlamento. O Executivo e o
Legislativo são interdependentes.
123

13.8. Qual é o sistema de governo adotado CF/88?


O sistema de governo adotado pela CF/88, mantido pelo plebiscito previsto no art. 2º do ADCT, é o
PRESIDENCIALISTA.

13.9. O sistema presidencialista foi o único sistema de governo adotado no Brasil desde
proclamação da República?
O sistema de governo presidencialista é tradição do direito constitucional pátrio, vivenciado durante
toda a República, com exceção do período de 1961 a 1963.
A Emenda Constitucional n. 4, de 02.09.1961, à Constituição de 1946, instituiu o parlamentarismo,
sendo revogada pela Emenda n. 6, de 23.01.1963, restauradora do regime presidencialista, tendo em
vista o resultado do referendo realizado em 06 de janeiro de 1963.

13.10. Em que consiste o denominado executivo monocrático, executivo colegial, executivo


diretorial e executivo dual?
O EXECUTIVO MONOCRÁTICO é o exercido por uma única pessoa (Rei, Imperador, Ditador ou
Presidente).
O EXECUTIVO COLEGIAL é o exercido por dois homens com poderes iguais.
O EXECUTIVO DIRETORIAL é exercido por um grupo de homens em comitê.
O EXECUTIVO DUAL, próprio do parlamento, é constituído por um Chefe de Estado e um
Conselho de Ministros, ou seja, um indivíduo isolado e um comitê.

13.11. Com base na classificação acima, qual é o modelo de Poder Executivo adotado pela
CR/88?
O artigo 76 da CF/88 consagra o EXECUTIVO MONOCRÁTICO, na medida em que é exercido
por um só indivíduo, o Presidente da República.

13.12. Quais são as condições de elegibilidade para o cargo de Presidente e Vice-Presidente da


República?
São condições de elegibilidade:
a) ser brasileiro nato (art. 12, §3º, I da CR/88);
b) estar em pleno exercício dos direitos políticos (art. 14, §3º, I, da CR/88);
c) alistamento eleitoral (art. 14, §3º, III);
d) domicílio eleitoral na circunscrição (art. 14, §3º, IV da CR/88);
e) filiação partidária (arts. 14, §3º, V, e 77, §2º, todos da CR/88);
f) idade mínima de 35 anos (art. 14, §3º, VI, “a”, da CR/88);
124

g) não ser inalistável nem analfabeto (art. 14, §4º, da CR/88);


h) não ser inelegível nos termos do art. 14, §7º da CR/88).

13.13. Quais são as regras para eleição do Presidente e Vice-Presidente da República?


Segundo o artigo 77 da CF/88, a eleição ocorrerá no primeiro domingo de outubro, em primeiro
turno, e no último domingo de outubro, em segundo turno, se houver, do ano anterior ao do término
do mandato presidencial vigente.
As eleições de Presidente e Vice-Presidente da República são realizadas pelo SISTEMA
MAJORITÁRIO POR MAIORIA ABSOLUTA.
Havendo necessidade de segundo turno, se antes de realizado ocorrer a morte, desistência ou
impedimento legal de candidato, convocar-se-á, dentre os remanescentes, o de maior votação.
Se dentre os remanescentes houver dois candidatos com a mesma votação, o desempate será
empreendido levando-se em consideração a idade, sendo chamado o mais idoso (Art. 77, §§3º e 4º
da CF/88).
Se todos os candidatos desistirem do processo eleitoral, só restando um, a eleição para Presidente
deve ser anulada, porque não foi atingido o quorum de maioria absoluta exigido pela Constituição.
A eleição do Presidente implica na eleição de seu Vice (art. 77,§1 da CF/88).
Eleito o Presidente da República, juntamente com o Vice-Presidente (art. 77,§1º da CF/88), posse
ocorrerá em sessão do Congresso Nacional.

13.14. A eleição do Presidente sempre implicou na eleição do Vice-Presidente da República?


Não. A Constituição de 1946 autorizava eleição individual de Presidente e Vice-Presidente da
República.

13.15. Qual é o prazo do mandato da Presidente da República?


Quatro anos, tendo início em 1º de janeiro do ano seguinte ao da sua eleição (art. 82 da CF/88),
permitida a reeleição, para um único período subsequente, do Presidente da República e de quem o
houver sucedido ou substituído no curso do mandato (art. 14, §5º da CF/88).

13.16. Quem é o sucessor e substituto natural do Presidente da República?


O Presidente da República será sucedido pelo Vice-Presidente no caso de vaga, ou substituído, no
caso de impedimento (art. 79, da CR/88). A vacância confere a ideia de impossibilidade definitiva
para assunção do cargo (cassação, renúncia ou morte), enquanto a substituição tem caráter
temporário (doença, férias etc.). Assim, no caso de vacância o Vice-Presidente assumirá o cargo até
o final e, no caso de impedimento enquanto este durar.
125

13.17. E se houver impedimento ou vacância simultâneos dos cargos Presidente e Vice-


Presidente da República?
De acordo com o artigo 80 da CR/88, nas hipóteses de impedimento do Presidente e do Vice-
Presidente, ou de vacância dos respectivos cargos, serão SUCESSIVAMENTE chamados ao
exercício da Presidência: a) o Presidente da Câmara dos Deputados; b) o Presidente do Senado
Federal; c) o Presidente do Supremo Tribunal Federal. Tratam-se dos denominados substitutos
eventuais ou legais.

13.18. Os substitutos eventuais ou legais (art. 80 da CR/88) assumem o cargo por quanto
tempo?
A assunção do cargo é sempre temporária.
No caso de impedimento, tanto do Presidente como do Vice-Presidente da República, os substitutos
eventuais assumem a Presidência temporariamente, até o motivo do impedimento cessar.
No caso de vacância de ambos os cargos, definitiva, há duas situações:
a) vacância nos 2 primeiros anos do mandato: de acordo com o artigo 81, caput, far-se-á eleição 90
dias depois de aberta a última vaga. Trata-se de ELEIÇÃO DIRETA, pelo sufrágio universal e pelo
voto direto e secreto, com valor igual para todos.
b) vacância nos últimos 2 anos do mandato: eleição para ambos os cargos feita 30 dias depois da
última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei (art. 81, §1º, da CR/88). Ou seja, ELEIÇÃO
INDIRETA.

13.19. Defina mandato-tampão.


É o período após nova eleição (direta ou indireta), no caso de vacância dos cargos de Presidente e
Vice-Presidente, em que os eleitos deverão apenas completar o período do mandato faltante de seus
antecessores (art. 81, §2º da CR/88).

13.20. O que são crimes de responsabilidade?


São infrações político-administrativas, de natureza política, submetidos ao processo de
impeachment, tendo em vista a prática de atos que atentem contra a Constituição.

13.21. Quais atos praticados pelo Presidente da República serão considerados crimes de
responsabilidade?
O artigo 85 da CR/88 exemplifica os atos do Presidente da República que atentam contra a
Constituição que serão considerados crimes de responsabilidade.
Atos contra: a) a existência da União; b) o livre-exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário,
do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação; c) o exercício dos
direitos políticos, individuais e sociais; d) a segurança interna do País; e) a probidade na
administração; f) a lei orçamentária; g) o cumprimento das leis e das decisões judiciais.
126

13.22. É necessário lei que defina os crimes de responsabilidade?


A Constituição Federal exemplifica, porém, cabe a lei especial definir os crimes de
responsabilidade, que, também, estabelecerá normas de processo e julgamento (artigo 85, parágrafo
único, da CR/88).
Segundo o STF “a definição das condutas típicas configuradoras do crime de responsabilidade e o
estabelecimento de regras que disciplinem o processo e julgamento dos agentes políticos federais,
estaduais ou municipais envolvidos são da competência legislativa privativa da União e devem ser
tratados em lei nacional especial”.
Nesse sentido, Súmula nº 722 do STF “são da competência legislativa da União a definição dos
crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento”.
Assim, recepcionada, em grande parte, pela CR/88 a Lei nº 1.079 de 1950.

13.23. Como se desenvolve o processo de impeachment do Presidente da República?


Trata-se de procedimento bifásico, composto por uma fase preambular, denominada juízo de
admissibilidade do processo, na Câmara dos Deputados (Tribunal de Pronúncia – art. 80 da Lei nº
1.079 de 1950), e por uma fase final, em que o ocorrerão o processo propriamente dito e
julgamento, no Senado Federal (Tribunal de Julgamento).

13.24. Explique o desenvolvimento da primeira fase do processo de impeachment, juízo de


admissibilidade?
O juízo de admissibilidade (juízo de prelibação) é realizado pela Câmara dos Deputados. Antes da
apreciação pelo Plenário da Câmara dos Deputados (art. 52, I, da CR/88), conforme o art. 19 da Lei
nº 1.079 de 1950, cabe ao Presidente da Câmara dos Deputados, a competência para proceder o
exame liminar da idoneidade da denúncia popular, que não se reduz à verificação das formalidades
extrínsecas e da legitimidade, mas pode se estender à rejeição imediata da acusação patentemente
inepta ou despida de justa causa.
Após, o Plenário da Câmara dos Deputados poderá, pela maioria qualificada de 2/3, autorizar a
instauração do processo, admitindo a acusação que está sendo imputada ao Presidente da República.
A votação ocorre através do procedimento de ostensivo nominal, o Deputado Federal é chamado
nominalmente para proferir seu voto no microfone.
Neste caso, a Câmara dos Deputados profere juízo político, com base em critérios de conveniência e
oportunidade.

13.25. Explique o desenvolvimento da segunda fase do processo de impeachment.


Posteriormente, havendo autorização da Câmara dos Deputados, o Senado Federal deverá instaurar
o processo sob a presidência do Presidente do STF.
Comissão composta por ¼ dos Senadores Federais elabora o libelo (peça de acusação contra o
Presidente da República).
127

Eventual sentença condenatória materializar-se-á mediante resolução do Senado Federal, que


somente será proferida por 2/3 dos votos.
Instaurado o processo, o Presidente da República ficará suspenso de suas funções pelo prazo de 180
dias. Se o julgamento não estiver concluído no aludido prazo, cessará o afastamento do Presidente,
sem prejuízo do regular prosseguimento do processo (art. 86, §1º, II e §2º, da CR/88).
O Senado Federal no julgamento de mérito realiza julgamento de natureza política, levando em
consideração critérios de conveniência e oportunidade.

13.26. Em caso de condenação no processo de impeachment, quais serão as penas aplicadas ao


Presidente da República?
A condenação limita-se à perda do cargo e inabilitação para o exercício de qualquer função pública
(tanto decorrentes de concurso público como de confiança ou de mandato eletivo) por 8 anos, sem
prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis (art. 52, parágrafo único).

13.27. A autorização da Câmara dos Deputados obriga o Senado Federal a dar início ao
julgamento do processo de impeachment?
Sim. Contudo, não significa que deverá condenar.

13.28. O Presidente do Supremo Tribunal Federal vota no julgamento?


Não, uma vez que não é Senador.

13.29. A decisão do Senado (condenação ou absolvição) pode ser desafiada por mandado de
segurança?
Sim. A decisão do Senado pode ser desafiada por mandado de segurança perante o Supremo
Tribunal Federal.
No entanto, o Supremo Tribunal Federal não pode se imiscuir no mérito da questão, uma vez que o
Senado Federal realiza julgamento de natureza política, levando em consideração critérios de
conveniência e oportunidade, sob pena, de se violar o princípio da separação dos poderes. Assim, o
controle judicial restringe-se a análise à violação de princípios constitucionais, como a ampla defesa
(precedentes MS. 20.941-DF e MS 21.564).

13.30. A renúncia implica extinção do processo de impeachment?


Dispõe o artigo 15 da Lei nº 1.079/50 que “a denúncia só poderá ser recebida enquanto o
denunciado não tiver, por qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo”.
O STF, no MS 21.689-1, por maioria de votos, decidiu que a renúncia ao cargo não extingue o
processo quando já iniciado.
128

13.31. Quais são as prerrogativas concedidas ao Presidente da República?


São prerrogativas concedidas ao Presidente da República:
a) foro especial por prerrogativa de função: prática de infrações penais comuns (abrange delitos
eleitorais, crimes contra a vida e contravenções penais) serão processadas e julgadas perante o
Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, b, da CR/88).
Neste caso, a Câmara dos Deputados, fará um controle político de admissibilidade, autorizará ou
não o recebimento da denúncia ou queixa-crime pelo STF, através do voto de 2/3 de seus membros
(art. 86, caput). A denúncia, nos casos de ação penal pública, será ofertada pelo Procurador-Geral
da República. Nos casos de crime de ação privada, haverá necessidade de oferta da queixa-crime
pelo ofendido, ou de quem por lei detenha tem competência.
b) Imunidade temporária à persecução criminal: De acordo com a regra do art. 86, §4º, da CR/88, o
Presidente da República, durante a vigência do mandato, não poderá ser responsabilizado por atos
estranhos ao exercício de suas funções. Assim, as infrações penais praticadas antes do início do
mandato ou durante a sua vigência, porém sem qualquer relação com a função presidencial, não
poderão ser objeto da persecutio criminis, que ficará, provisoriamente, inibida, acarretando a
suspensão do prazo prescricional.
No tocante às infrações de natureza civil, política (crimes de responsabilidade), administrativa,
fiscal ou tributária, poderá o Presidente da República ser responsabilizado, pois a imunidade
relativa restringe-se apenas aos ilícitos penais.
c) imunidade temporária quanto à prisão: O Presidente da República não estará sujeito à prisão
enquanto não sobrevier sentença condenatória definitiva nas infrações penais comuns (art. 86, §3º
da CR/88).

13.32. A imunidade formal relativa à prisão e a cláusula de irresponsabilidade penal relativa


conferida ao Presidente da República se estendem aos demais chefes de Executivo?
Não. Consoante interpretação do STF, as regras sobre a imunidade formal em relação à prisão (art.
86, §3º da CR/88), bem como aquelas relacionadas à imunidade penal relativa (art. 86, §4º), não
podem ser estendidas aos Governadores de Estado e, no mesmo sentido, aos Governadores do DF e
Prefeitos, por atos normativo próprios, na medida em que as regras (que são derrogatórias do direito
comum) estão reservadas à competência exclusiva da União para disciplinar, nos termos do art. 22,
I (direito processual), da CR/88 (ADI 1.028).

13.33. Como se desenvolve o Poder Executivo no âmbito dos Territórios Federais?


A direção dos Territórios Federais dar-se-á por Governador, nomeado pelo Presidente da República,
após a aprovação pelo Senado Federal (art. 33, §3º; 52, III, “c”, e 84, XIV).

13.34. Quais são as funções típicas e atípicas do Poder Judiciário?


O Poder Judiciário é órgão estratégico na estrutura do Estado, pois eventuais lesões à Constituição,
atos supralegais, primários e secundários serão submetidos ao seu crivo.
129

O Poder Judiciário tem por função típica (inerente à sua natureza) a jurisdicional. Exerce, ainda,
funções atípicas, de natureza executivo administrativa (organização de suas secretarias – art. 96, I,
b; concessão de licença e férias a seus membros – art. 96, I, f), bem como de natureza legislativa
(elaboração do regimento interno – art. 96, I, a da CR/88). Assim, jurisdição é uma das funções do
Estado, mediante a qual este se substitui aos titulares dos interesses em conflito para,
imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve.

13.35. Como se compõe a estrutura do Poder Judiciário?


O artigo 92 da CR/88 determina que são órgãos do Poder Judiciário: a) o Supremo Tribunal
Federal; b) o Conselho Nacional de Justiça; c) o Superior Tribunal de Justiça; d) os Tribunais
Regionais Federais e Juízes Federais, e) os Tribunais e Juízes do Trabalho; f) os Tribunais e Juízes
Eleitorais; g) os Tribunais e Juízes Militares; h) os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito
Federal e Territórios.
O Tribunal Marítimo, Juízo Arbitral e Justiça Desportiva, como estão fora da organização e
estruturação do Poder Judiciário, não fazem parte deste órgão.

13.36. Em que consiste o reserva conhecida como quinto constitucional?


Um quinto dos Tribunais de Justiça, Tribunais Regionais Federais, Tribunais Regionais do Trabalho
será composto por membros do Ministério Público com mais de dez anos de carreira e advogados
que possuam dez anos de atividade profissional, notório saber jurídico e reputação ilibada.
A classe a que competir a vaga formará lista sêxtupla e encaminhará para o Tribunal que precisa ser
preenchido. Este, por sua vez, excluirá três nomes da lista e deixará os três que julgarem mais
capacitados para a função.
A lista com três nomes seguirá para o Chefe do Executivo escolher o novo magistrado.

13.37. Na hipótese de não existirem membros do Ministério Público que preencham os


requisitos constitucionais como compor a lista sêxtupla?
É possível compor ou complementar a lista sêxtupla com membros do Ministério Público que ainda
não tenham completado dez anos na carreira.
Esse foi o entendimento do STF ao declarar a constitucionalidade do item IV da Decisão Normativa
do CSMPT, que autoriza a complementação das listas.

13.38. O Tribunal pode rejeitar a lista sêxtupla?


O STF entendeu que o Tribunal pode recusar a lista sêxtupla, desde que fundada a recusa em razões
objetivas, declinadas na motivação da deliberação do órgão competente.
Nessa hipótese o Tribunal envolvido jamais há de reconhecer o poder de substituir a lista sêxtupla,
que deve ser refeita pela respectiva classe. (MS 25.624).
130

13.39. Como é composto o Superior Tribunal de Justiça?


Possui trinta e cinco Ministros, sendo dois terços composto de membros do judiciário oriundos da
2ª (segunda) instância, e um terço advindo da advocacia e Ministério Público através do mesmo
procedimento estabelecido para o quinto constitucional.
Os Ministros do STJ serão nomeados pelo Presidente da República, dentre os brasileiros com mais
de 35 anos e menos de 65 anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, depois de aprovada a
escolha pela maioria absoluta do Senado Federal (art. 104, CR/88).

13.40. Como é composto o Supremo Tribunal Federal?


Compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 anos e menos de 65 anos,
de notável saber jurídico e reputação ilibada.
Os Ministros do STF serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha
pela maioria absoluta do Senado Federal (art. 101, CR/88).

13.41. Em que consiste o princípio de acesso ao Poder Judiciário (princípio da


inafastabilidade da jurisdição ou do poder jurisdicional)? Diferencie o aspecto formal e
material.
Princípio insculpido no artigo 5º, XXXV, da CR/88. Através do princípio do acesso formal ao
Poder Judiciário, nenhuma lesão ou ameaça a direito pode ser subtraída da apreciação do Poder
Judiciário; complementado, pelo princípio do acesso material ao Poder Judiciário, isto é, garantia de
meios de efetivar o acesso a justiça.
Ou seja, a norma formal que prevê o direito de se dirigir ao Judiciário é complementada e
concretizada através de instrumentos que possibilitem este acesso.
São exemplos de expressão do acesso material ou substancial ao Poder Judiciário: a) Juizados
Especiais (art. 98, I); b) Justiça itinerante e sua descentralização c) Defensoria Pública.

13.41. Em que consiste o princípio do juiz natural?


O princípio do juiz natural consiste na predeterminação do juízo competente para o processo e
julgamento, proibindo qualquer forma de designação de Tribunais para casos determinados.
Desta forma, proíbe-se juízo ou tribunal de exceção e prevê que todos têm direito a julgamento por
juiz competente, pré-constituído na forma da lei e imparcial (art. 5º, XXXVII e LIII, da CR/88).

13.42. A convocação de juízes de primeiro grau para compor órgão julgador de Tribunal viola
o princípio do juiz natural?
Parte da doutrina entende que sim, uma vez que, a regra do art. 93, III, da CR/88 determina que o
acesso aos tribunais de segundo grau far-se-á por antiguidade e merecimento, alternadamente,
apurados na última ou única entrância, bem como, o art. 98, da CR/88, ao tratar dos juizados
especiais, admite a composição das Turmas Recursais por juízes de 1º grau.
131

Portanto, a atuação dos juízes de 1º grau seria constitucionalmente admitidas apenas nos Juizados,
não havendo previsão para os Tribunais.
Contudo, o STF (RE 597.133/RS) entende que a convocação de juízes de primeiro grau neste caso
não constitui violação ao princípio do juiz natural, com base na ideia de efetividade e celeridade
processual (art. 5º, LXXVIII, CR/88), ademais, a previsão do art. 96, I, a, da CR/88 permite aos
Tribunais disporem sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e
administrativos, além da regra, contida no art. 118 da LC 35/79 (LOMAN).

13.43. Qual a razão da exigência de motivação das decisões judiciais?


O dever de motivação das decisões judiciais encontra-se previsto no art. 93, IX, da CR/88, segundo
o qual “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas
as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às
próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito
à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação".
Trata-se de instrumento garantidor da imparcialidade do juiz, através do qual é possível aferir em
concreto a imparcialidade e a legalidade das suas decisões, cujos destinatários são as partes e a
sociedade.

13.44. Quais são os objetivos das garantias do Poder Judiciário no cenário da tripartição dos
poderes?
As garantias atribuídas ao Poder Judiciário asseguram a independência desse órgão, que poderá
decidir livremente, sem se abalar com qualquer tipo de pressão que venha dos outros poderes.

13.45. Quais são as garantias conferidas ao Poder Judiciário?


José Afonso da Silva divide as garantias do Poder Judiciário em:
a) Garantias Institucionais: protegem o Judiciário como um todo, como instituição. Subdividem-se
em:
a.1) Garantias de autonomia orgânico-administrativa;
a.2) garantias de autonomia financeira.

b) Garantias funcionais ou de órgãos: asseguram a independência (vitaliciedade, inamovibilidade e


irredutibilidade de subsídios) e a imparcialidade dos membros do Poder Judiciário (vedações),
previstas, tanto em razão do próprio titular, como em favor da própria instituição.
132

13.46. Como se manifesta a garantia orgânico-administrativa?


A garantia de autonomia orgânico-administrativa manifesta-se na estruturação e funcionamento dos
órgãos, na medida em que se atribui competência aos tribunais para:
a) Eleger seus órgãos diretivos, sem qualquer participação dos outros Poderes;
b) Elaborar seu regimento interno;
c) Organizar a estrutura administrativa interna de modo geral, como a concessão de férias,
licença, dentre outras atribuições.

13.47. E a autonomia financeira?


Com base na autonomia financeira (art. 99, da CR/88), os tribunais elaborarão suas propostas
orçamentárias dentro dos limites estipulados conjuntamente com os demais Poderes na lei de
diretrizes orçamentárias.
Tal procedimento será de competência dos Presidente do STF e dos Tribunais Superiores, com a
aprovação dos respectivos tribunais, no âmbito da União, e dos Presidentes dos Tribunais de
Justiça, com a aprovação dos respectivos tribunais, no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos
Territórios (art. 99, §§1º e 2º da CR/88).
Como garantia assecuratória da autonomia financeira, a CR/88 determina em seu art. 168 que
os recursos correspondentes às dotações orçamentárias, compreendidos os créditos suplementares e
especiais, destinados ao Poder Judiciário, serão entregues até o dia 20 de cada mês, em duodécimos,
na forma da lei complementar.
Dentro da ideia de fortalecimento da autonomia financeira do Judiciário a EC 45/05 fixou que as
custas e emolumentos serão destinados exclusivamente ao custeio dos serviços afetados às
atividades específicas da Justiça (art. 98, §2º, da CR/88).

13.48. Em que consistem as garantias funcionais do Poder Judiciário?


As garantias funcionais, na classificação proposta por José Afonso da Silva, dividem-se em dois
grupos. O primeiro engloba as garantias de independência dos magistrados, quais sejam: a
vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de subsídios (art. 95, I, II e III).
Prevista no art. 95, I, da CR/88, a vitaliciedade significa dizer que o magistrado só perderá o cargo
por sentença judicial transitada em julgado, sendo-lhe asseguradas todas as garantias inerentes ao
processo jurisdicional.
A vitaliciedade, em primeiro grau de jurisdição, só será adquirida após 2 anos de efetivo exercício
do cargo, desde que, naturalmente, o magistrado supere o denominado estágio probatório. Nos dois
primeiros anos, para o juiz, que ingressou na carreira, por meio de concurso de provas e títulos,
ocupa cargo de juiz substituto (art. 93, I), a perda do cargo dependerá de deliberação do tribunal a
que estiver vinculado (art. 95, I).
Pela regra da inamovibilidade (art. 95, II, da CR/88), garante-se ao juiz a impossibilidade de
remoção, sem seu consentimento, de um local para outro, de uma comarca para outra, ou mesmo
sede, cargo, tribunal, câmara ou grau de jurisdição.
133

Prevista no art. 95, III, da CR/88, segundo a garantia da irredutibilidade o subsídio dos magistrados
não poderá ser reduzido, garantindo-se, assim, o livre-exercício das atribuições jurisdicionais.
Trata-se de garantia nominal, e não real.
O segundo grupo da garantia funcional abarca as garantias da imparcialidade dos órgãos judiciários,
conforme vedações previstas no art. 95, parágrafo único da CR/88.
Essa garantia é materializada através das vedações (rol taxativo), delimitadas no parágrafo único do
artigo 95 da CR/88: a) exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de
magistério; b) receber a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo; c) dedicar-
se à atividade político-partidária; d) receber, a qualquer título ou pretexto, auxílio ou contribuições
de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei; e)
exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do
afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração (quarentena de saída).

13.49. Em que momento advogado ou membro do Ministério Público que ingressa na carreira
da Magistratura através da regra do quinto constitucional (art.94 da CR/88) adquire
vitaliciedade?
Adquirirá a vitaliciedade no exato momento da posse não tendo de passar por qualquer estágio
probatório.

13.50. A garantia da vitaliciedade admite exceções?


Sim. Primeira exceção, os Ministros do Supremo Tribunal Federal na hipótese de crime de
responsabilidade serão julgados pelo Senado Federal (art.52, II, da CR/88), estes magistrados
poderão perder o cargo em razão do julgamento político.
Segunda, os Conselheiros do Conselho Nacional de Justiça, conforme determina o art. 52, II, da
CR/88, também serão julgados pelo Senado Federal por crime de responsabilidade, e, de acordo
com o art. 11, §3º do Regimento Interno do CNJ, os Conselheiros não integrantes das carreiras da
magistratura terão os mesmos direitos, prerrogativas, deveres, impedimentos constitucionais e
legais, suspeições e incompatibilidades que regem a carreira da magistratura, no que couber,
enquanto perdurar o mandato.

13.51. É possível que o CNJ declare a perda do cargo de magistrados vitalícios?


Não. Uma vez adquirida a garantia da vitaliciedade os magistrados só poderão perder o cargo por
sentença judicial transitada em julgado e os atos do CNJ têm natureza administrativa.

13.52. A garantia da inamovibilidade é absoluta?


Essa garantia não é absoluta, pois, conforme estabelece o art. 93, VIII, da CR/88, o magistrado
poderá ser removido (além de colocado em disponibilidade e aposentado), por interesse público, tal
decisão é proferida por voto da maioridade absoluta do respectivo tribunal ou do Conselho Nacional
de Justiça, assegurada ampla defesa.
134

13.53. Juízes substitutos gozam da garantia da inamovibilidade, ou, em razão de sua natureza
(de substituir), poderão ser removidos de acordo com as necessidades discricionárias
apontadas pelos Tribunais?
Conforme decidiu o STF, MS 27.958, a inamovibilidade é, nos termos do art. 95, II, da CR/88,
garantia de toda a magistratura, alcançando não apenas o juiz titular como também o substituto.
A Constituição não fez nenhuma exigência em relação à garantia da inamovibilidade, exigindo o
prazo de 2 anos apenas para a vitaliciedade.
Assim, desde a posse, o juiz substituto deve ter a garantia de não ser removido para fora da unidade
judiciária em que está formalmente lotado. Dessa forma, o juiz substituto deverá exercer a sua
função dentro da sua circunscrição judiciária.

13.54. Defina órgãos de convergência e órgãos de superposição?


ÓRGÃOS DE CONVERGÊNCIA são aqueles que integram a cúpula de determinada justiça,
responsáveis pela última decisão, para o qual convertem as causas.
Os responsáveis por decidir cada uma das Justiças especiais da União (Trabalhista, Eleitoral e
Militar), tem por cúpula seu próprio Tribunal Superior, que é o responsável pela última decisão nas
causas de competência dessa Justiça, ressalvado o controle de constitucionalidade.
Quanto às causas processadas na Justiça Federal ou nas locais, em matérias infraconstitucional a
convergência conduz ao Superior Tribunal de Justiça, que é um dos Tribunais Superiores da União
embora não integre Justiça alguma; em matéria constitucional convergem diretamente ao Supremo
Tribunal Federal.
Todos os Tribunais Superiores convergem unicamente ao Supremo Tribunal Federal.
Por outro lado, na medida em que não pertencem a nenhuma justiça, é possível classificar o STF e o
STJ não só como órgãos de convergência, mas, também, como ÓRGÃOS DE SUPERPOSIÇÃO.
Isso porque, as suas decisões sobrepõem às decisões proferidas pelos órgãos inferiores das Justiças
comum e especial.

13.55. O que são súmulas? Quais são as espécies?


Súmulas são repositórios dos entendimentos dos Tribunais sobre questões em que haja controvérsia.
São espécies de súmulas:
a) Súmula persuasiva: são as súmulas editadas por qualquer Tribunal em que são publicados os
entendimentos daquele órgão, sem qualquer vinculação.
b) Súmula de repercussão geral: o art. 543-A, §7º, do CPC possibilita que o STF estabeleça súmula
de suas decisões sobre repercussão geral em recursos extraordinários.
c) Súmula Vinculante: introduzida pela EC n. 45/04, instrumento exclusivo do STF, o enunciado de
súmula vinculante, uma vez editado, produz efeitos de vinculação para os demais órgãos do Poder
Judiciário e para a Administração Pública.
135

13.56. Qual é a natureza jurídica da súmula vinculante?


Guilherme Pena apresenta a divergência, quando leciona as diferentes posições.
De um lado, Lênio Streck e Castanheira Neves entendem que a súmula vinculante teria
NATUREZA LEGISLATIVA, pois possibilitaria a produção de normas gerais e abstratas.
Por seu turno, Jorge Miranda concede interpretação segundo a qual as súmulas vinculantes seriam
revestidas de NATUREZA JURISDICIONAL, na medida em que necessitariam de provocação e
julgamento de diversos casos anteriores.
Já Mauro Cappelletti concede à súmula vinculante NATUREZA DE TERTIUM GENUS,
intermediário entre o abstrato dos atos legislativos e o concreto dos atos jurisdicionais.

13.57. Qual é o órgão competente para edição da Súmula Vinculante?


Conforme dispõe o art. 103-A da CR/88, somente o Supremo Tribunal Federal poderá editar súmula
que terá efeito vinculante.

13.58. Quais são os requisitos para edição de Súmula Vinculante?


Devem existir REITERADAS DECISÕES sobre MATÉRIA CONSTITUCIONAL em relação a
normas acerca das quais haja, entre órgãos judiciários ou entre estes e a Administração Pública,
controvérsia atual que acarrete insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre
idêntica questão. A Constituição exige quorum qualificado, DOIS TERÇOS dos membros do
Supremo Tribunal Federal.

13.59. Quais são os legitimados para propor edição, revisão ou cancelamento de súmula
vinculante?
O art. 103-A, §2º da CR/88 afirma (rol exemplificativo) que os legitimados para promover a ação
direta de inconstitucionalidade poderão propor processo de edição, revisão e cancelamento de
súmula vinculante.
O dispositivo constitucional foi regulado pelo artigo 3º Lei nº 11.417 de 2006, segundo o qual são
legitimados: a) o Presidente da República; b) a Mesa do Senado Federal; c) a Mesa da Câmara dos
Deputados; d) o Procurador-geral da República; e) o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil; f) o Defensor Público-Geral da União; g) partido político com representação no Congresso
Nacional; h) confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional; i) a Mesa de
Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; j) o Governador de Estado ou
do Distrito Federal; k) os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito
Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os
Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares.
136

13.60. Diferencie legitimados autônomos e legitimados incidentais para propor a edição,


revisão e cancelamento de Súmula Vinculante?
Os LEGITIMADOS AUTÔNOMOS não necessitam de um processo em andamento para propor a
edição, revisão e cancelamento de Súmula Vinculante. São legitimados autônomos os mesmos da
ADI e da ADC, previstos no art. 103 da CR/88, bem como, o Defensor Público-Geral da União e os
Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça dos Estados ou do DF e Territórios, os Tribunais
Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os
Tribunais Militares.
Os LEGITIMADOS INCIDENTAIS só podem propor a edição, a revisão ou o cancelamento no
curso de processo em que sejam partes, o que não autoriza a suspensão dos referidos processos. São
legitimados incidentais os Municípios.

13.61. É admissível a figura do amicus curiae no processo para edição, revisão ou


cancelamento de súmula vinculante?
O amicus curiae é admissível. Para tanto, o relator poderá admitir por decisão irrecorrível, a
manifestação de terceiros na questão, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal
Federal (art. 3º, §2º, da Lei nº 11.417 de 2006).

13.62. Quais são os efeitos da súmula vinculante?


A partir da publicação do enunciado da súmula, esta terá EFEITO VINCULANTE em relação aos
demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal,
estadual, distrital ou municipal.
Assim, a vinculação repercute somente em relação ao Poder Executivo e aos demais órgãos do
Poder Judiciário, não atingindo o Legislativo no exercício de sua função típica de legislar (no
exercício de sua função atípica jurisdicional há vinculação), sob pena de se configurar o fenômeno
da fossilização da Constituição, nem mesmo em relação ao próprio STF, sob pena de se inviabilizar,
a possibilidade de revisão e cancelamento de ofício e, portanto, a adequação da súmula à evolução
social.
Neste último caso, o Ministro do STF, monocraticamente, tem que observar a entendimento
materializado, até que a súmula venha a ser modificada ou cancelada.

13.63. É possível modular os efeitos da súmula vinculante?


O art. 4º da Lei nº 11.417 de 2006 estabelece que a súmula com efeito vinculante tem eficácia
imediata, mas o Supremo Tribunal Federal, por decisão de 2/3 dos seus membros, poderá restringir
os efeitos vinculante ou decidir que só tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista
razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse público.
137

13.64. Qual é o instrumento adequado contra decisão judicial ou ato administrativo que
contrariar enunciado de súmula vinculante?
Contra a decisão judicial ou ato administrativo que contrariar enunciado de súmula vinculante,
negar-lhe vigência ou aplicá-lo indevidamente caberá RECLAMAÇÃO ao Supremo Tribunal
Federal.
Em se tratando de omissão ou ato da Administração, o uso da reclamação só será admitido após o
esgotamento da via administrativa. Essa regra não viola o princípio do livre acesso ao Judiciário, na
medida em que o que se veda é somente o ajuizamento da reclamação e não de qualquer outra
medida cabível, como mandado de segurança, ação ordinária.
Julgando procedente a reclamação, o STF anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial
impugnada, determinando que outra seja proferida com ou sem aplicação da súmula, dependendo
do caso concreto.
138

14. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE. A SUPREMACIA CONSTITUCIONAL.


JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL. ESPÉCIES DE INCONSTITUCIONALIDADE.
INCONSTITUCIONALIDADE POR AÇÃO OU OMISSÃO. INCONSTITUCIONALIDADE
FORMAL OU MATERIAL. INCONSTITUCIONALIDADE ORIGINÁRIA E DERIVADA.
ESPÉCIES DE CONTROLE QUANTO AO MOMENTO E AO MODO DE REALIZAÇÃO.
CONTROLE PREVENTIVO E CONTROLE REPRESSIVO. CONTROLE DIFUSO DE
CONSTITUCIONALIDADE. CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE.

AUTOR: BRUNA SARTURI AQUINO


MATERIAL DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO – PEDRO LENZA (2014)

14.1. Explique supremacia constitucional de acordo com as suas dimensões material e formal.
A ideia da supremacia constitucional surgiu com as revoluções liberais que trouxeram à tona a
noção de Constituição escrita, formal e rígida. A rigidez de uma Constituição tem como principal
consequência o princípio da supremacia, do qual decorre o princípio da compatibilidade vertical das
normas do ordenamento jurídico.
 A SUPREMACIA MATERIAL é corolário do objeto clássico das Constituições, que trazem em
si os fundamentos do Estado de Direito. A Constituição possui conteúdo superior ao das demais
leis. Toda a Constituição é dotada de supremacia material.
 A SUPREMACIA FORMAL é atributo específico das Constituições rígidas e se manifesta na
superioridade hierárquica das normas constitucionais em relação às demais normas produzidas
no ordenamento jurídico.

14.2. A possibilidade de controle de constitucionalidade depende de dois requisitos


fundamentais e essenciais. Quais são eles e em que consistem?
 Existência de uma Constituição rígida;
 Atribuição de competência a um órgão para resolver os problemas de constitucionalidade.
A Constituição rígida é aquela que possui um processo de alteração mais dificultoso que o processo
legislativo de alteração das normas não constitucionais.
A ideia de controle, então, emanada da rigidez, pressupõe a noção de um escalonamento normativo,
ocupando a Constituição o grau máximo na aludida relação hierárquica, caracterizando-se como
norma de validade para os demais atos normativos do sistema. Reflete o princípio da supremacia da
Constituição.
Quanto ao órgão competente para o controle, esse variará de acordo com o sistema de controle
adotado. O sistema difuso de controle significa a possibilidade de qualquer juiz ou tribunal,
observadas as regras de competência, realizar o controle de constitucionalidade. No sistema
concentrado, como o nome já diz, o controle se "concentra" em um ou mais de um (porém em
número limitado) órgão.
139

14.3. Em relação à inconstitucionalidade das leis, quais as diferenças entre o sistema austríaco
(teoria da anulabilidade) e o sistema norte-americano (teoria da nulidade)? Qual predomina
no Brasil?
Sistema AUSTRIACO (Kelsen) Sistema NORTE-AMERICANO (Marshall)
Decisão tem eficácia CONSTITUTIVA Decisão tem eficácia DECLARATÓRIA de
(constitutiva-negativa) situação preexistente
Em regra, o vício é aferido no plano da Em regra, o vício é aferido no plano da
EFICÁCIA VALIDADE
Em regra efeitos EX NUNC Em regra efeitos EX TUNC
A lei inconstitucional é ato ANULÁVEL A lei inconstitucional é ato NULO
Lei provisoriamente válida Invalidação AB INITIO
O reconhecimento da ineficácia da lei produz A lei nasce morta, nunca chegando a produzir
efeitos a partir da decisão (ex nunc) e erga efeitos, apesar de existir, não chegou ao plano da
omnes, respeitados os efeitos da lei eficácia
produzidos até a decisão

No Brasil, predomina a TEORIA DA NULIDADE, mas de forma flexibilizada. Ao lado do


princípio da nulidade, que adquire, certamente, o status de valor constitucionalizado, tendo em vista
o princípio da supremacia da Constituição, outros valores, de igual hierarquia, destacam-se, por
exemplo, o princípio da segurança jurídica e o da boa-fé.
Assim, permite o direito brasileiro a modulação dos efeitos da decisão por razões de segurança
jurídica ou de excepcional interesse social. Essa técnica, que tem previsão legal em relação ao
controle concentrado, também vem sendo utilizada pelo STF em sede de controle difuso (exemplo:
decisão que reduziu o número de vereadores do Município de Mira Estrela com efeitos para as
legislaturas futuras).

14.4. Quais são os sistemas de controle de constitucionalidade existentes? Qual é o adotado no


Brasil?
Controle político: É exercido por um órgão de natureza política, distinto dos três poderes, que tem
como função garantir a supremacia da Constituição (exemplo: Conselho de Estado Francês).
Controle jurisdicional: É exercido pelo Poder Judiciário, seja através de um único órgão, por meio
de ação direta (controle concentrado), seja por qualquer juiz ou tribunal, em arguição incidenter
tantum (controle difuso). Esse controle jurisdicional, realizado de forma mista, foi adotado pelo
Brasil.
Obs1: o Brasil adota o CONTROLE JURISDICIONAL MISTO (por admitir o controle na forma
difusa e concentrada).
Obs2: Barroso entende que o veto do executivo (veto jurídico), bem como a rejeição a projeto de lei
na CCJ são exemplos de controle político.
Controle misto: É uma mistura dos dois sistemas, no qual algumas normas são levadas a controle
perante órgão distinto dos três poderes (controle político), e outras, a apreciação do Poder Judiciário
(controle jurisdicional).
140

14.5. Diferencie inconstitucionalidade por ação e inconstitucionalidade por omissão.


A INCONSTITUCIONALIDADE POR AÇÃO (positiva ou por atuação), pressupõe a existência de
normas inconstitucionais, isto é, a incompatibilidade vertical dos atos inferiores (leis ou atos do
Poder Público) com a Constituição. O Poder Público pratica uma conduta comissiva (ativa)
incompatível com o texto constitucional.
A INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO decorrente da inércia legislativa na
regulamentação de normas constitucionais de eficácia limitada. Segundo Canotilho, pressupõe a
"violação da lei constitucional pelo silêncio legislativo (violação por omissão)".

14.6. Porque a doutrina considera a inconstitucionalidade formal como nomodinâmica e a


inconstitucionalidade material como nomoestática? Quais as espécies de vício formal?
O VÍCIO FORMAL decorre de afronta ao devido processo legislativo de formação do ato
normativo, o que dá a ideia de dinamismo, de movimento. Por sua vez, o VÍCIO MATERIAL, por
ser um vício de matéria, de conteúdo, a ideia que passa é de vício de substância, estático.
As espécies de vício formal de constitucionalidade são as seguintes:
a) Inconstitucionalidade formal orgânica: decorre da inobservância da competência legislativa para
a elaboração do ato. Exemplo: norma que disciplina o uso de cinto de segurança trata de trânsito e a
competência é da União.
b) Inconstitucionalidade formal propriamente dita: decorre da inobservância do devido processo
legislativo, que pode ocorrer na fase de iniciativa (vício formal subjetivo) ou nas fases posteriores
(vício formal objetivo). Obs.: De acordo com o STF, o vício de iniciativa é insanável e a Súmula nº
5 encontra-se superada.
c) Inconstitucionalidade formal por violação a pressupostos objetivos do ato normativo: decorre de
elementos externos ao procedimento de formação das leis. Exemplo: criação de Municípios por lei
estadual sem a observância dos requisitos constitucionais.
Fala-se, atualmente, ainda, em outro tipo de vício, denominado de VÍCIO DE DECORO
PARLAMENTAR, presente quando há abuso das prerrogativas asseguradas a membro do
Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas, que maculariam a lei aprovada por
estes membros. Exemplo: ADIs ajuizadas para declarar inconstitucional a Reforma da Previdência
(EC 41/03), alegando aprovação mediante compra de votos de parlamentares, liderados pelos réus
condenados no Mensalão.

14.7. O STF admite a figura da inconstitucionalidade superveniente?


A inconstitucionalidade originária é aquela que ocorre quando o objeto impugnado surge após a
existência do parâmetro (a lei já nasce inconstitucional).
Na inconstitucionalidade superveniente, o ato é elaborado em conformidade com a Constituição,
mas a posterior alteração do parâmetro constitucional faz com ele se torne incompatível com ela.
141

O STF tem adotado o entendimento de que, neste caso, não se trata de inconstitucionalidade, mas de
hipótese de não recepção. Esta concepção se aplica tanto à hipóteses de surgimento de uma nova
Constituição quanto de uma emenda constitucional.

14.8. O que é inconstitucionalidade por arrastamento ou atração? Confunde-se com a


inconstitucionalidade reflexa?
A inconstitucionalidade por arrastamento também é chamada de inconstitucionalidade
CONSEQUENTE DE PRECEITOS NÃO IMPUGNADOS ou inconstitucionalidade
CONSEQUENCIAL ou inconstitucionalidade CONSEQUENTE ou DERIVADA.
Julgada inconstitucional determinada norma principal, em processo de controle concentrado de
constitucionalidade, poderá haver também declaração subsequente de inconstitucionalidade de
outras normas que com aquela guardam correlação, conexão ou interdependência.
E essa técnica de arrastamento poderá ser aplicada tanto em processos distintos (pela teoria dos
motivos determinantes impede-se que sejam julgadas posteriores pretensões relativas a essas
normas consequentes) quanto em um mesmo processo (no próprio dispositivo da decisão já se
definem quais normas são atingidas e, portanto, são declaradas também inconstitucionais).
Trata-se, sem dúvida, de verdadeira exceção à regra de que o juiz deve se ater aos limites da lide
fixados pelas partes.
Não se confunde com as hipóteses de INCONSTITUCIONALIDADE REFLEXA ou INDIRETA,
em que o vício verificado não decorre de violação direta da CF. O objeto impugnado é diretamente
ilegal e indiretamente inconstitucional, ou seja, entre ele e a Constituição existe um outro ato
normativo interposto. O STF equipara a chamada inconstitucionalidade indireta (ou reflexa) à mera
ilegalidade, não sendo caso de inconstitucionalidade propriamente dita (logo, não é objeto de ADI).

14.9. A inconstitucionalidade progressiva e a inconstitucionalidade circunstancial


caracterizam o mesmo fenômeno?
Não.
Inconstitucionalidade progressiva (lei ainda constitucional): Considera-se que uma lei, em virtude
das circunstâncias de fato, pode vir a ser inconstitucional, não o sendo, porém, enquanto essas
circunstâncias de fato não se apresentarem com a intensidade necessária para que se tornem
inconstitucionais. Exemplo: artigo 68 do CPP (ação civil ex delicto) e prazo em dobro para a
Defensoria no processo penal.
Inconstitucionalidade circunstancial (lei ainda inconstitucional): A lei é formalmente constitucional,
mas em determinadas circunstâncias a sua aplicação caracterizaria uma inconstitucionalidade.
Exemplo: ADI 223 (discussão da norma que proíbe tutela antecipada contra a fazenda pública).
142

14.10. É possível que o STF, ao julgar mandado de segurança impetrado por parlamentar,
exerça controle preventivo de constitucionalidade de projeto que tramita no Congresso
Nacional e o declare inconstitucional, determinando seu arquivamento? Qual a consequência
diante da perda superveniente do mandato parlamentar?
Em regra, o Judiciário só exerce o controle de constitucionalidade repressivo. Contudo, existem
duas exceções nas quais o STF pode determinar o arquivamento da propositura:
a) Proposta de EMENDA constitucional que viole cláusula pétrea;
b) Proposta de EMENDA constitucional ou PROJETO DE LEI cuja tramitação esteja ocorrendo
com violação às regras constitucionais sobre o processo legislativo.
O controle prévio ou preventivo de constitucionalidade a ser realizado pelo Poder Judiciário sobre
PEC ou projeto de lei em trâmite na Casa Legislativa busca garantir ao parlamentar o respeito ao
devido processo legislativo, vedando a sua participação em procedimento desconforme com as
regras da Constituição. Trata-se de controle exercido de modo incidental.
A legitimação para a impetração do MS é exclusiva do parlamentar, na medida em que o direito
público subjetivo de participar de um processo legislativo hígido (devido processo legislativo)
pertence somente aos membros do Poder Legislativo.
Segundo o STF, configurada a ausência de tal condição, em virtude da perda superveniente do
mandato parlamentar no Congresso Nacional, impõe-se a declaração de extinção do processo de
mandado de segurança, porque ausente a legitimidade ativa ad causam do impetrante. Outro
entendimento acarretaria a conversão do mandado de segurança, que não pode ser utilizado para a
impugnação de normas em tese, em ADI, situação essa não admitida em nosso ordenamento
jurídico.

14.11. É possível controle repressivo exercido pelo Executivo?


Antes da CF/88, doutrina e jurisprudência consolidaram o entendimento de que o Chefe do
Executivo poderia deixar de aplicar uma lei por entendê-la inconstitucional, já que o único
legitimado para o controle concentrado era o PGR.
Com a CF/88, surgiu a tese de que, como o Presidente da República e os Governadores passaram a
ser legitimados para a ADI, somente os prefeitos poderiam descumprir lei inconstitucional.
Esta tese não prevaleceu, pela desproporcionalidade de atribuições entre os chefes do Executivo.
Passou a prevalecer, então, a tese pela possibilidade de descumprimento da lei inconstitucional pelo
Chefe do Executivo, com base no princípio da supremacia da Constituição e na regra de que a
aplicação de lei inconstitucional é o mesmo que a negativa de aplicação da própria Constituição.
Há precedentes do STF e do STJ nesse sentido.
143

14.12. Qual a relação entre o caso Marbury v. Madison (1803) e o controle difuso de
constitucionalidade?
A noção e ideia de controle difuso de constitucionalidade, historicamente, deve-se ao famoso caso
julgado pelo Juiz John Marshall da Suprema Corte norte-americana, que, apreciando o caso
Marbury v. Madison, em 1803, decidiu que, havendo conflito entre a aplicação de uma lei em um
caso concreto e a Constituição, deve prevalecer a Constituição, por ser hierarquicamente superior.
Referido caso tem origem na nomeação de William Marbury para Juiz de Paz pelo Presidente John
Adams e na recusa do secretário de justiça do Presidente Thomas Jefferson, James Madison, a
entregar-lhe o diploma. Marbury apresentou um writ of mandamus perante a Suprema Corte Norte-
Americana exigindo a entrega do diploma.
O processo foi relatado pelo Presidente da Suprema Corte, Juiz John Marshall, que concluiu,
segundo interpretação própria, que a lei federal que dava competência à Suprema Corte para emitir
mandamus contrariava a Constituição Federal. Como a lei que dava competência a Suprema Corte
era inconstitucional, não cabia à Suprema Corte decidir o pedido do mandamus.

14.13. O que é a cláusula de reserva de plenário e qual sua natureza jurídica? Em que
hipóteses essa regra é mitigada?
Trata-se de regra prevista no art. 97 da CF/88, que estabelece que somente pelo voto da MAIORIA
ABSOLUTA de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os
TRIBUNAIS declarar a INCONSTITUCIONALIDADE de lei ou ato normativo do Poder Público.
Possui a natureza jurídica de CONDIÇÃO DE EFICÁCIA JURÍDICA da própria declaração de
inconstitucionalidade dos atos do Poder Público.
A mitigação da cláusula de reserva de plenário ocorre nas seguintes hipóteses (não há a necessidade
de se observar a regra do art. 97):
 Quando já houver pronunciamentos do Tribunal ou do plenário do STF sobre a questão (art.
481, CPC);
 Se o Tribunal mantiver a constitucionalidade do ato normativo, ou seja, não afastar a sua
presunção de validade (o art. 97 determina a observância do full bench para declarar a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público);
 Nos casos de normas pré-constitucionais, porque a análise do direito editado no ordenamento
jurídico anterior em relação à nova Constituição não se funda na teoria da inconstitucionalidade,
mas em sua recepção ou revogação;
 Quando o Tribunal utilizar a técnica da interpretação conforme a Constituição, pois não haverá
declaração de inconstitucionalidade;
 Nas hipóteses de decisão em sede de medida cautelar, já que não se trata de decisão definitiva.
144

14.14. A cláusula de reserva de plenário se aplica às Turmas do STF no julgamento de


Recurso Extraordinário? E às Turmas Recursais dos Juizados Especiais?
Há divergência na doutrina, mas prevalece que a cláusula de reserva de plenário NÃO se aplica às
Turmas do STF no julgamento do RE, pelas seguintes razões:
 O regimento interno do STF apenas prevê o encaminhamento do RE ao Plenário diante de
algumas hipóteses (exemplo: relevância da questão jurídica, divergência entre turmas etc.);
 O STF não se trata de "tribunal" no sentido fixado no art. 97;
 Tendo em vista ser função primordial e essencial da Corte a declaração de
inconstitucionalidade, é clara a possibilidade de afetação dessa atribuição aos seus órgãos
fracionários, no caso, as Turmas.
A cláusula de reserva de plenário também NÃO se aplica às Turmas Recursais. Embora órgão
recursal, as Turmas de Juizados não podem ser consideradas "tribunais", podendo, assim, declarar
incidentalmente a inconstitucionalidade de uma lei ou afastar a sua incidência no todo ou em parte
sem que isso signifique violação ao art. 97 da CF/88 e à SV 10/STF.

14.15. No controle difuso, quais os efeitos da decisão de inconstitucionalidade para as partes?


A decisão pode atingir terceiros? Se atingir, em que efeitos?
No momento que a sentença declara ser a lei inconstitucional (controle difuso realizado
incidentalmente), produz efeitos pretéritos, atingindo a lei desde a sua edição, tornando-a nula de
pleno direito. Produz, portanto, efeitos retroativos. Assim, no controle difuso, para as partes os
efeitos serão:
 Inter partes
 Ex tunc
Cabe alertar que o STF já entendeu que, mesmo no controle difuso, poder-se-á dar efeito ex nunc ou
pro futuro (leading case: redução do número de vereadores do Município de Mira Estrela só
atingindo a próxima legislatura).
Regra geral, os efeitos de qualquer sentença valem somente para as partes que litigaram em juízo,
não extrapolando os limites estabelecidos na lide. Contudo, pode a decisão proferida no controle
difuso atingir terceiros, por meio da suspensão, pelo Senado, da execução da lei declarada
inconstitucional pelo STF (art. 52, X, CF). Nesse caso, os efeitos para terceiros serão:
 Erga omnes
 Ex nunc
A suspensão pelo Senado Federal poderá dar-se em relação a leis federais, estaduais, distritais ou
mesmo municipais que forem declaradas inconstitucionais pelo STF, de modo incidental, no
controle difuso de constitucionalidade. Não pode o Senado ampliar, interpretar ou restringir a
extensão da decisão do STF. Com a suspensão, a decisão atingirá a todos (efeitos erga omnes),
porém valerá a partir do momento que a resolução do Senado for publicada na Imprensa Oficial
(efeitos ex nunc).
145

14.16. Quais são os fundamentos da teoria da abstrativização do controle difuso? Essa tese é
adotada pelo STF?
Respeitável parte da doutrina (Gilmar Mendes) e alguns julgados do STF ("Mira Estrela" e
"progressividade do regime de cumprimento de pena nos crimes hediondos") e do STJ rumam para
uma nova interpretação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade no controle difuso pelo
STF.
A teoria da abstrativização do controle difuso preconiza que, se o Plenário do STF decidir a
constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, ainda que em controle
difuso, essa decisão terá os mesmos efeitos do controle concentrado, ou seja, eficácia erga omnes e
vinculante. Para essa corrente, o art. 52, X, da CF/88 sofreu uma mutação constitucional, devendo
ser reinterpretado, no sentido de que o papel do Senado, atualmente, seria apenas o de dar
publicidade à decisão do STF. Em outras palavras, a decisão do STF, mesmo em controle difuso, já
é dotada de efeitos erga omnes e o Senado apenas confere publicidade a isso.
Os principais argumentos a justificar esse novo posicionamento podem ser assim resumidos:
 Força normativa da Constituição;
 Princípio da supremacia da Constituição e a sua aplicação uniforme a todos os destinatários;
 O STF enquanto guardião da Constituição e seu intérprete máximo;
 Dimensão política das decisões do STF.
Não se trata de um tema pacífico, mas prevalece que o STF não adota a teoria da abstrativização do
controle difuso (STF. Plenário. Rcl 4335/AC, rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 20/3/2014).
Para a maioria dos Ministros não houve mutação constitucional do art. 52, X, da CF/88 e a
resolução do Senado continua conferindo eficácia erga omnes à declaração de inconstitucionalidade
prolatada no controle concreto. As decisões do Plenário do STF proferidas em controle difuso de
constitucionalidade possuem FORÇA EXPANSIVA (nas palavras do Min. Teori Zavascki), mas
não se pode afirmar que possuam, em regra, eficácia erga omnes.
Pedro Lenza não se filia à teoria da abstrativização e sustenta a possibilidade de se conseguir o
objetivo pretendido mediante a edição de súmula vinculante, o que seria muito mais legítimo e
eficaz, além de respeitar a segurança jurídica, evitando o casuísmo.

14.17. É possível o controle difuso de constitucionalidade em sede de ação civil pública? Quais
os efeitos de eventual decisão de inconstitucionalidade?
Só será cabível o controle difuso em sede de ação civil pública se a controvérsia constitucional,
longe de identificar-se como objeto único da demanda, qualifique-se como simples questão
prejudicial, indispensável à resolução do litígio principal.
A ação civil pública não pode ser ajuizada como sucedâneo de ação direta de inconstitucionalidade,
pois, em caso de produção de efeitos erga omnes, estaria provocando verdadeiro controle
concentrado de constitucionalidade, usurpando competência do STF.
Assim, a declaração de inconstitucionalidade ocorrerá de modo incidental e restringindo-se os
efeitos inter partes.
146

14.18. Cite as cinco ações constitucionais em que se verifica o controle concentrado de


constitucionalidade.
O controle concentrado de constitucionalidade de lei ou ato normativo recebe tal denominação pelo
fato de "concentrar-se" em um único tribunal. Pode ser verificado em cinco situações:
 ADI: Ação Direta de Inconstitucionalidade Genérica.
 ADPF: Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.
 ADO: Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão.
 IF (Representação Interventiva): ADI Interventiva.
 ADC: Ação Declaratória de Constitucionalidade.
147

15. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. AÇÃO DECLARATÓRIA DE


CONSTITUCIONALIDADE. AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO. AÇÃO
INTERVENTIVA. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A
SÚMULA COM EFEITO VINCULANTE

AUTOR: DANIEL ANTONIAZZI FREITAG


MATERIAL DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO (PEDRO LENZA, 2009 E 2013)
RESUMO DE PONTOS – CONCURSO MAGISTRATURA FEDERAL TRF1
SITE “DIZER O DIREITO”

15.1. Em que consiste a Ação Direta de Inconstitucionalidade? Qual seu objetivo? Quem são
os legitimados em propô-la? É necessária alguma condição específica, por parte dos
legitimados, para a proposição da ADI?
A ação direta de inconstitucionalidade, prevista no art. 102, I, “a”, da CF, é a modalidade de
controle concentrado de constitucionalidade de ato normativo em tese abstrato, marcado pela
generalidade, impessoalidade e abstração. Somente o STF e os TJs possuem competência para
julgá-la, podendo este somente fazê-lo em confronto com a Constituição Estadual.
Podem ser alvos de ADI: leis, atos normativos que possuam indiscutível caráter normativo,
emendas constitucionais, medidas provisórias (excepcionalmente, inclusive os requisitos
constitucionais de relevância e urgência, conforme a ADI-MC 4029), decretos com conteúdo
normativo (quando se tratar de atos não revestidos de autonomia jurídica, trata-se de controle de
legalidade), tratados internacionais.
Afasta-se do controle: súmulas, normas constitucionais originárias, normas anteriores à
constituição, atos exauridos ou revogados.
Os legitimados para sua proposição estão previstos no art. 103 da CF e no art. 2º da Lei nº 9.868/99,
sendo os mesmos para a ADI, ADC, ADO e ADPF.

15.2. Em que consiste a pertinência temática? A qual (is) legitimado(s) é exigido o


preenchimento de tais requisitos?
Pertinência temática, também chamada “Legitimação especial”, significa que somente poderá
propor a ADI quando possuir alguma relação direta com o assunto debatido.
É um requisito exigido às Assembleias Legislativas e Câmara Distrital, Governadores de Estados e
DF e confederações sindicais.

15.3. Em relação aos partidos políticos, quais as particularidades a serem observadas quando
da propositura da ADI?
Segundo o STF, a representação do partido político é preenchida com a existência de apenas um
parlamentar, em qualquer das Casas Legislativas.
148

Ademais, a representação do partido político na ação dar-se-á pelo Diretório Nacional ou pela
Executiva do Partido, de acordo com a sua constituição, não se admitindo a legitimidade ativa ao
Diretório Regional ou Executiva Regional, na medida em que não podem agir nacionalmente.
Por sua vez, o novo entendimento do STF é no sentido de que a perda de representação política do
partido no Congresso Nacional posterior ao ajuizamento da ação - esse sim momento em que o
partido político deva estar devidamente representado - não mais extingue a sua legitimidade ativa,
não sendo, destarte, óbice ao prosseguimento da ação.
Há de se observar, ainda, que é exigida a representação de advogado (assim como às confederações
sindicais) para a propositura da ADI, ao contrário dos demais legitimados, que possuem capacidade
postulatória deferida pela CF e podem, em razão de seus próprios cargos, propor a ação – o
Governador do Estado pode propor, não podendo a PGE, por exemplo, se manifestar na ação em
nome do Governador.

15.4. É possível a propositura de ADI por “Associação de Associação”?


Sim. O STF, alterando entendimento anterior, passou a admitir sua legitimidade: “(...) ser entidade
de classe que atua na defesa da mesma categoria social, apesar de se reunir em associações
correspondentes a cada Estado. Vencidos os Ministros Celso de Mello, relator, e Carlos Britto que
mantinham a decisão agravada, salientando a orientação da Corte segundo a qual não se qualificam
como entidades de classe aquelas que, congregando exclusivamente pessoas jurídicas, apresentam-
se como verdadeiras associações de associações, nem tampouco as pessoas jurídicas de direito
privado, ainda que coletivamente representativas de categorias profissionais ou econômicas. (CF,
art. 103: "Podem propor a ação de inconstitucionalidade:... IX - confederação sindical ou entidade
de classe de âmbito nacional."). ADI 3153 AgR/DF, rel. Min. Celso de Mello, rel. p/ acordão Min.
Sepúlveda Pertence, 12.8.2004, Informativo 356 STF.

15.5. Em caso de alteração do parâmetro constitucional invocado, qual a conseqüência da


ADI?
O STF, anteriormente, entendia que a superveniente revogação total ou parcial do ato estatal
impugnado em sede de fiscalização normativa abstrata fazia instaurar, ante a decorrente perda de
objeto, situação de prejudicialidade, total ou parcial, da ADI, independentemente da existência ou
não de efeitos concretos que pudessem ter sido gerados pela aplicação do diploma questionado
(ADI 2.010-QO/DF, Rel. Min. Celso de Mello).
Entretanto, o STF mudou seu entendimento no julgamento das ADIs 2158 e 2159: “(...) Em nosso
ordenamento jurídico, não se admite a figura da constitucionalidade superveniente. Mais relevante
do que a atualidade do parâmetro de controle é a constatação de que a inconstitucionalidade persiste
e é atual, ainda que se refira a dispositivos da Constituição Federal que não se encontram mais em
vigor. Caso contrário, ficaria sensivelmente enfraquecida a própria regra que proíbe a convalidação.
2. A jurisdição constitucional brasileira não deve deixar às instâncias ordinárias a solução de
problemas que podem, de maneira mais eficiente, eficaz e segura, ser resolvidos em sede de
controle concentrado de normas. (ADI 2158, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno,
julgado em 15/09/2010).
149

15.6. Conceitue bloco de constitucionalidade:


Diz respeito à identificação do próprio conceito de Constituição, que servirá de parâmetro em
relação ao qual se realizará a confrontação das demais normas jurídicas do sistema, para se aferir a
sua constitucionalidade. Em suma: é tudo que pode servir de parâmetro no controle de
constitucionalidade.
Nesse sentido, duas posições podem ser encontradas. A ampliativa engloba não somente as normas
formalmente constitucionais, expressamente positivadas em documento formal, mas também os
princípios não escritos, bem como os valores suprapositivos, principalmente aqueles que norteiam e
fundamentam a própria Constituição. Por sua vez, a restritiva considera apenas as normas e os
princípios formalmente expressos na Constituição escrita e positivada.
A jurisprudência brasileira, incluindo o STF, tem adotado, por ora, apenas uma tímida tendência
ampliativa, utilizando, nesse sentido, como paradigma de confronto normas e princípios, que, ainda
que não expressamente contidos no texto constitucional, sejam dele diretamente decorrentes.
Por fim, com o advento da EC 45/2004, houve uma ampliação, no direito brasileiro, do bloco de
constitucionalidade, na medida em que se passa a ter um novo parâmetro de controle (norma formal
e materialmente constitucional), qual seja, os tratados internacionais de direitos humanos (art. 5º, §
3º, da CF), aprovados com quórum de emendas constitucionais.

15.7. Em que consiste a transcendência dos motivos determinantes? Adota-se tal teoria no
controle concentrado brasileiro?
Também é denominada de efeitos irradiantes ou transbordantes.
O STF vinha atribuindo efeito vinculante, produzido para fora do processo em que se foi decidido,
não só ao dispositivo da sentença, mas também aos fundamentos determinantes que deram suporte à
decisão, em alguns casos julgados pela Corte Suprema (aqui importa diferenciar ratio decidendi de
obter dictum, posto que esta significa “coisa dita de passagem”, quais sejam, comentários literais
que não influenciam na decisão, enquanto aquela seria a fundamentação essencial que ensejou
determinado resultado da ação). Isso implicaria a possibilidade de a razão da decisão influenciar
outros julgamentos.
Por exemplo, se o STF entender pela inconstitucionalidade da Lei/SC, há efeito vinculante em
relação à Lei/RS (idêntica)?
Gilmar Mendes explica, na RCL 4987 MC/PE, que tal controvérsia reside não na concessão de
efeito vinculante aos motivos determinantes das decisões em controle abstrato de
constitucionalidade, mas na possibilidade de se analisar, em sede de reclamação, a
constitucionalidade de lei de teor idêntico ou semelhante à lei que já foi objeto da fiscalização
abstrata de constitucionalidade perante o STF.
Ainda que não se empreste eficácia transcendente (efeito vinculante dos fundamentos
determinantes) à decisão, o Tribunal, em sede de reclamação contra aplicação de lei idêntica àquela
declarada inconstitucional, poderá declarar, incidentalmente, a inconstitucionalidade da lei ainda
não atingida pelo juízo de inconstitucionalidade.
150

Ressalte-se, mais uma vez, que não se está a falar, nesta hipótese, de aplicação da teoria da
“transcendência dos motivos determinantes” da decisão tomada no controle abstrato. Trata-se, isso
sim, de um poder ínsito à própria competência do Tribunal de fiscalizar incidentalmente a
constitucionalidade das leis e dos atos normativos. E esse poder é realçado quando a Corte se
depara com leis de teor idêntico àquelas já submetidas ao seu crivo no âmbito do controle abstrato
de constitucionalidade.
Assim, a partir de um ato concreto que aplica uma Lei Y, cujo teor é idêntico ao de uma lei X, já
declarada inconstitucional, pode ser analisado, em sede de reclamação, pelo STF, em controle
incidental.
IMPORTANTE: STF AFASTOU a teoria da transcendência na reclamação 10.604 de 2010: “no
julgamento da Rcl 4.219, esta nossa Corte retomou a discussão quanto à aplicabilidade dessa
mesma teoria da “transcendência dos motivos determinantes”, oportunidade em que deixei
registrado que tal aplicabilidade implica prestígio máximo ao órgão de cúpula do Poder Judiciário e
desprestígio igualmente superlativo aos órgãos da judicatura de base, o que se contrapõe à essência
mesma do regime democrático, que segue lógica inversa: a lógica da desconcentração do poder
decisório. Sabido que democracia é movimento ascendente do poder estatal, na medida em que
opera de baixo para cima, e nunca de cima para baixo.
No mesmo sentido, cinco ministros da Casa esposaram entendimento rechaçante da adoção do
transbordamento operacional da reclamação, ora pretendido. Sem falar que o Plenário deste
Supremo Tribunal Federal já rejeitou, em diversas oportunidades, a tese da eficácia vinculante dos
motivos determinantes das suas decisões (cf. Rcl 2.475-AgR, da relatoria do ministro Carlos
Velloso; Rcl 2.990-AgR, da relatoria do ministro Sepúlveda Pertence; Rcl 4.448-AgR, da relatoria
do ministro Ricardo Lewandowski; Rcl 3.014, de minha própria relatoria)”.

15.8. O que é a Reverberação Normativa?


Também chamada de teoria da inconstitucionalidade por “arrastamento” ou “atração”,
“inconstitucionalidade conseqüente de preceitos não impugnados”, “inconstitucionalidade
consequencial” ou “inconstitucionalidade conseqüente ou derivada”, significa que, julgada
inconstitucional determinada norma principal, em processo de controle concentrado de
constitucionalidade, poderá haver também declaração subseqüente de inconstitucionalidade de
outras normas que com aquela guardam correlação, conexão ou interdependência.
Essa técnica de arrastamento poderá ser aplicada tanto em processos distintos (pela teoria dos
motivos determinantes impede-se que sejam julgadas posteriores pretensões relativas a essas
normas conseqüentes) quanto em um mesmo processo (no próprio dispositivo da decisão já se
definem quais normas são atingidas e, portanto, são declaradas também inconstitucionais).
Lembre-se ainda que essa contaminação pode se dar também em relação a decreto que se fundava
em lei declarada inconstitucional. Trata-se, sem dúvida, de verdadeira exceção à regra de que o juiz
deve se ater aos limites da lide fixados pelas partes.
151

Fala-se, de outra forma, em:


a) Declaração de nulidade total em virtude de uma dependência unilateral: verifica-se
quando o Tribunal constata que uma parte da lei é inconstitucional e que a parte hígida,
por ser dependente, não pode subsistir.
b) Declaração de nulidade total em virtude de dependência recíproca: ocorre quando a
disposição inconstitucional é parte de um complexo normativo que perderia seu sentido e
sua justificação se determinada parte ou uma parte central fosse retirada ou subtraída.
Esses casos não são significativos – refere-se a um complexo normativo que forma
“unidade” insuscetível de ser dividida em partes autônomas. A preservação parcial de
uma lei, nesse caso, viria quebrar o equilíbrio interno do sistema de tal forma que a
declaração de nulidade parcial implicaria uma falsificação da “mens legislatoris” ou
constituiria uma intervenção indevida na vontade do legislador.

15.9. Qual a posição do STF acerca das leis ainda constitucionais ou da inconstitucionalidade
progressiva?
Também denominada declaração de constitucionalidade de norma em trânsito para a
inconstitucionalidade, considera-se que uma lei, em virtude das circunstâncias de fato, pode vir a
ser inconstitucional, não o sendo, porém, enquanto essas circunstâncias de fato não se apresentarem
com a intensidade necessária para que se tornem inconstitucionais.
Ex.: artigo 68 do CPP (ação civil ex delicto) e prazo em dobro para defensoria no processo penal:
leis ainda constitucionais e que estão, em trânsito, progressivamente, para a inconstitucionalidade, à
medida que as Defensorias Públicas forem sendo efetiva e eficazmente instaladas. Na verdade, o
caso do referido artigo 68 seria de recepção ou não pela Constituição de 1988 e, por conseguinte, de
sua revogação ou vigência, e não de inconstitucionalidade.
LEGITIMIDADE - AÇÃO "EX DELICTO" - MINISTÉRIO PÚBLICO - DEFENSORIA
PÚBLICA - ARTIGO 68 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CARTA DA REPÚBLICA
DE 1988. A teor do disposto no artigo 134 da Constituição Federal, cabe à Defensoria
Pública, instituição essencial à função jurisdicional do Estado, a orientação e a defesa, em
todos os graus, dos necessitados, na forma do artigo 5º, LXXIV, da Carta, estando restrita a
atuação do Ministério Público, no campo dos interesses sociais e individuais, àqueles
indisponíveis (parte final do artigo 127 da Constituição Federal).
INCONSTITUCIONALIDADE PROGRESSIVA - VIABILIZAÇÃO DO EXERCÍCIO DE
DIREITO ASSEGURADO CONSTITUCIONALMENTE - ASSISTÊNCIA JURÍDICA E
JUDICIÁRIA DOS NECESSITADOS - SUBSISTÊNCIA TEMPORÁRIA DA
LEGITIMAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Ao Estado, no que assegurado
constitucionalmente certo direito, cumpre viabilizar o respectivo exercício. Enquanto não
criada por lei, organizada - e, portanto, preenchidos os cargos próprios, na unidade da
Federação - a Defensoria Pública, permanece em vigor o artigo 68 do Código de Processo
Penal, estando o Ministério Público legitimado para a ação de ressarcimento nele prevista.
Irrelevância de a assistência vir sendo prestada por órgão da Procuradoria Geral do Estado,
em face de não lhe competir, constitucionalmente, a defesa daqueles que não possam
demandar, contratando diretamente profissional da advocacia, sem prejuízo do próprio
152

sustento. (RE 135328, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em
29/06/1994, DJ 20-04-2001 PP-00137 EMENT VOL-02027-06 PP-01164 RTJ VOL-00177-
02 PP-00879)

15.10. Em que consiste a inconstitucionalidade circunstancial ou lei ainda inconstitucional?


Em tais casos, a lei é formalmente constitucional, mas em determinadas circunstâncias a sua
aplicação caracterizaria uma inconstitucionalidade. Ou seja, em regra a lei é constitucional.
Todavia, levando em conta determinadas circunstâncias no caso concreto pode ser tida por
inconstitucional para aquela situação. E.g. ADI 223 (discussão da norma que proíbe tutela
antecipada contra a fazenda pública).

15.11. No que consiste o fenômeno da fossilização da Constituição?


Significa que as decisões de inconstitucionalidade não atingem o Legislativo, que, assim, poderá
inclusive legislar em sentido diverso da posição adotada pelo STF, ou até mesmo contrário, sob
pena de, em sendo vedada essa atividade, inegável petrificação da evolução social, pois se impediria
as constantes atualizações da Constituição, bem como dos textos normativos, sem falar na perda da
relação de equilíbrio entre os Poderes. (haveria a fossilização)

15.12. Qual o significado do princípio da proibição do atalhamento constitucional?


O artigo 2º da EC 52/2006, ao determinar que o fim da obrigatoriedade da verticalização das
coligações partidárias fosse aplicável desde as eleições do ano de 2002, já finda, para que, então,
pudesse já ser aplicada às próximas eleições de 2006, pretendia burlar a regra constitucional trazida
pelo artigo 16 da CF, que consagra o princípio da anualidade, segundo o qual a lei que altera o
processo eleitoral entra em vigor na data de sua publicação, porém não se aplica à eleição que
ocorra em até um ano da data de sua vigência.
Assim, o Ministro Ricardo Lewandowski entendeu que o constituinte reformador incorreu em
desvio de poder ou de finalidade, ou seja, expediente mediante o qual se busca atingir um fim ilícito
utilizando-se de um meio aparentemente legal. E, mais, afirmou o Ministro, nas palavras de Fábio
Konder Comparato, que buscou-se, no caso, o atalhamento da Constituição, utilizando o próprio
constituinte reformador de artifícios para abrandar, suavizar, abreviar, dificultar ou impedir a ampla
produção de efeitos dos princípios constitucionais.

15.13. O que é a inconstitucionalidade chapada?


É uma expressão utilizada pelo Ministro Sepúlveda Pertence quando queria caracterizar uma
inconstitucionalidade mais do que evidente, flagrante! Ayres Brito a chamava de
inconstitucionalidade desvairada ou enlouquecida.
153

15.14. Qual o papel do AGU e do Procurador Geral da República no processamento da ADI?


Eles estão de alguma maneira vinculados ao pedido ou possuem liberdade de manifestação no
processo?
Após as informações prestadas pelos órgãos ou entidades das quais emanaram a lei ou o ato
administrativo impugnado (art. 6º, Lei nº 9.868/99), são ouvidos, sucessivamente, o Advogado-
Geral da União e o Procurador-Geral da República, que devem se manifestar, cada qual, no prazo de
15 dias.
Sempre se entendeu que o AGU deveria, necessariamente, defender o ato impugnado, enquanto o
PGR poderia dar parecer tanto favorável quanto desfavorável. Contudo, o STF vem afirmando que
o AGU não está obrigado a defender tese jurídica sobre a qual o STF já se pronunciou pela sua
inconstitucionalidade.
Em relação ao AGU, conforme Gilmar Mendes, a CF diz que será citado para defender o ato
impugnado. Descobriu-se, posteriormente, que muitas vezes há conflito (Presidente ajuíza a ADI e o
AGU vai defender?).
Para ele, o AGU não deve ser entendido como parte, e sim como uma instituição que é chamada
para se manifestar, podendo dizer o que entende. Hoje isso se consolidou – há direito de
manifestação, sem obrigatoriedade de defesa do ato impugnado, notadamente quando há um
interesse da União na inconstitucionalidade da lei. É basicamente um parecer concorrente ao do
PGR.
O leading case: “exigir da AGU defesa em favor do ato impugnado em casos como o presente, em
que o interesse da União coincide com o interesse do autor, implicaria retirar-lhe sua função
primordial que é a defender os interesses da União (CF, art. 131). Além disso, a despeito de
reconhecer que nos outros casos a AGU devesse exercer esse papel de contraditora no processo
objetivo, constatou-se um problema de ordem prática, qual seja, a falta de competência da Corte
para impor-lhe qualquer sanção quando assim não procedesse, em razão da inexistência de previsão
constitucional para tanto”. (ADI 3916/DF, noticiado no Info 562).

15.15. É possível que a CE preveja, no controle concentrado em âmbito estadual, a


participação do PGE ou do Procurador da Assembleia Legislativa no processo, a fim de
defender a norma impugnada?
Segundo o STF, não é inconstitucional norma da Constituição do Estado que atribui ao Procurador
da Assembleia Legislativa ou, alternativamente, ao Procurador-Geral do Estado, a incumbência de
defender a constitucionalidade de ato normativo estadual questionado em controle abstrato de
constitucionalidade na esfera de competência do Tribunal de Justiça. Essa previsão não afronta o
art. 103, § 3º da CF/88 já que não existe, quanto a isso, um dever de simetria para com o modelo
federal. Ademais, essa norma estadual não viola o art. 132 da CF/88 uma vez que a atuação do
Procurador-Geral da ALE nos processos de controle de constitucionalidade não se confunde com o
papel de representação judicial do Estado, esse sim de exclusividade da Procuradoria-Geral do
Estado. STF. Plenário. ADI 119/RO, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/2/2014.
154

15.16. O STF admite, no processo de constitucionalidade, a figura do amicus curiae. Em que


consiste essa figura? Está prevista no ordenamento? Como o STF trata da figura na sua
jurisprudência?
Amicus curiae é alguém que, mesmo sem ser parte, em razão de sua representatividade, é chamado
ou se oferece para intervir em processo relevante com o objetivo de apresentar ao Tribunal a sua
opinião sobre o debate que está sendo travado nos autos, fazendo com que a discussão seja
amplificada e o órgão julgador possa ter mais elementos para decidir de forma legítima.
Como regra geral, é vedada a intervenção ordinária de terceiros nos processos de ação direta de
inconstitucionalidade.
Contudo, excepcionalmente, poderá o relator, considerando a relevância da matéria e a
representatividade dos postulantes, admitir, por despacho irrecorrível (alguns ministros estão
aceitando a interposição de recurso pelo amicus curiae contra a decisão que nega a entrada dele no
processo), a manifestação de outros órgãos ou entidades, nos termos do § 2º do artigo 7º da Lei nº
9.868/99 (amicus curiae). Trata-se de verdadeiro fator de legitimação social das decisões da
Suprema Corte, na medida em que democratiza o debate constitucional (Celso de Mello).
Sua natureza jurídica é distinta das modalidades ordinárias de intervenção de terceiro previstas no
Código de Processo Penal, já que atua o amicus curiae como mero colaborador, sendo considerado
modalidade sui generis de intervenção de terceiros, inerente ao processo objetivo de controle
concentrado de constitucionalidade, com características próprias e bem definidas. No novo CPC
(2015), entretanto, está prevista como modalidade de intervenção de terceiros.
O STF o admite até a entrada do processo na pauta (diferenciando-se do STJ, que o admite até o
julgamento - O STJ tem entendido que, segundo o § 4º do art. 543-C do CPC, bem como o art. 3º da
Resolução 8/2008 do STJ, admite-se a intervenção de amicus curiae nos recursos submetidos ao rito
dos recursos repetitivos somente antes do julgamento pelo órgão colegiado e a critério do relator
(EDcl no REsp 1.120.295-SP, Primeira Seção, DJe 24/4/2013).
A análise sobre o cabimento é atribuição do relator, verificando a presença dos requisitos
necessários, admitir ou não a intervenção do amicus curiae. Contudo, ressalte-se que mesmo sendo
admitido pelo relator, poderá o Tribunal deixar de referendá-lo, afastando a sua intervenção – a
decisão que o admite ou não, entretanto, é irrecorrível (alguns ministros vem aceitando o recurso.
Marco Aurélio aceita apenas os Embargos de Declaração e não o agravo. Tema ainda não pacífico)
A partir do julgamento da ADI 2777 QO/SP (j. em 27.11.2003), admite-se a sustentação oral do
amicus curiae — editando norma regimental para regulamentar a matéria —, salientavam que essa
intervenção, sob uma perspectiva pluralística, conferiria legitimidade às decisões do STF no
exercício da jurisdição constitucional. Observavam, entretanto, que seria necessário racionalizar o
procedimento, haja vista que o concurso de muitos amici curiae implicaria a fragmentação do tempo
disponível, com a brevidade das sustentações orais. Ressaltavam, ainda, que, tendo em vista o
caráter aberto da causa petendi, a intervenção do amicus curiae, muitas vezes, mesmo já incluído o
feito em pauta, poderia invocar novos fundamentos, mas isso não impediria que o relator, julgando
necessário, retirasse o feito da pauta para apreciá-los (...)” ADI 4071 AgR/DF, rel. Min. Menezes
Direito, 22.4.20099 (info543).
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Segundo o STF, não são cabíveis os recursos interpostos por terceiros estranhos à relação
processual nos processos objetivos de controle de ‘constitucionalidade (CASO DOS ESTADOS NA
ADI DOS GOVERNADORES) – só caberiam ED’s de sua não admissão, nesses incluídos os que
ingressam no feito na qualidade de amicus curiae.
Ressalte-se que a interposição por estranho não é cabível ainda que este seja um dos legitimados
para a ação: “Recurso interposto por terceiro prejudicado. Não cabimento. Precedentes. Embargos
de declaração opostos pela OAB. Legitimidade. Questão de ordem resolvida no sentido de que é
incabível a interposição de qualquer espécie de recurso por quem, embora legitimado para a
propositura da ação direta, nela não figure como requerente ou requerido.” (ADI 1.105-MC-ED-
QO).
Segundo a doutrina, admite-se a figura em todas as hipóteses de controle concentrado de
constitucionalidade, ainda que não expressamente previstos ou tendo sido vetados dispositivos que
tratavam do assunto.

15.17. É possível que parlamentar figure como amicus curiae em ADI?


Segundo Pedro Lenza, seria possível a admissão de parlamentar na condição de amicus curiae,
desde que, presente a situação de relevância da matéria, demonstre ele, designado por via eleitoral
para desempenhar função política na democracia representativa sobre o qual se funda o regime
democrático instituído no país, atuar como verdadeiro representante ideológico de uma
coletividade.
Lembre-se, porém, de que inexiste, por ora, um posicionamento do STF a esse respeito.
Alerte-se que o STF não vem aceitando a atuação de pessoa natural na condição de amicus curiae
ADI 4.178/GO, restringindo-o à pessoa jurídica: “Não assiste razão ao pleito de (...), que requerem
admissão na condição de amici curiae. É que os requerentes são pessoas físicas, terceiros
concretamente interessados no feito, carecendo do requisito de representatividade inerente à
intervenção prevista pelo art. 7º, § 2º, da Lei 9.868, de 10-11-99, o qual, aliás, é explícito ao admitir
somente a manifestação de outros "órgãos ou entidades" como medida excepcional aos processos
objetivos de controle de constitucionalidade." (ADI 4.178, rel. min. Cezar Peluso, decisão
monocrática, julgamento em 7-10-2009, DJE de 16-10-2009.)”

15.18. Em que consiste a causa de pedir aberta?


Tendo em vista da natureza objetiva da ação de controle concentrado de constitucionalidade, não
fica o STF condicionado à causa petendi apresentada pelo postulante, mas apenas ao seu pedido,
motivo pelo qual ele poderá declarar a inconstitucionalidade da norma impugnada por teses
jurídicas diversas.

15.19. Em sendo admitida a concessão de medida cautelar em ADI, quais as consequências da


decisão em relação à lei anterior?
A medida cautelar é dotada de eficácia contra todos (erga omnes) e será concedida com efeito ex
nunc, salvo se o Tribunal entender que deva conceder-lhe eficácia retroativa (ex tunc).
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O caráter vinculante da decisão cautelar será aferida pelo STF na análise do caso. Gilmar Mednes
defende a existência do efeito vinculante na Cautelar em ADI, eis que opera no plano da vigência da
lei atacada. Ademais, a concessão da medida cautelar torna aplicável a legislação anterior acaso
existente, EFEITO REPRISTINATORIO TÁCITO NA CAUTELAR salvo expressa
manifestação em sentido contrário. Artigo 11, §§ 1º e 2º, da Lei nº 9.868/99 (efeito repristinatório).

15.20. Quais os efeitos da decisão em ADI? Em que consiste a modulação de efeitos da


decisão?
Como regra geral, a decisão proferida na ADI possui os seguintes efeitos: erga omnes; ex tunc; com
efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Judiciário e à Administração DE TODOS OS
ENTES POLITICOS (obs: não vincula o Poder Legislativo quanto ao desempenho de sua atividade
legiferante, sob pena de fossilização constitucional).
Contudo, excepcionalmente, por motivos de segurança jurídica ou de excepcional interesse social,
poderá o STF, por manifestação qualificada de 2/3 de seus membros (8 Ministros), declarar a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo sem a pronúncia de sua nulidade, restringindo os
efeitos da referida declaração ou decidindo que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em
julgado ou de outro momento que venha a ser fixado, ou seja, atribuindo-lhe efeito ex nunc, nos
termos do artigo 27 da Lei nº 9.868/99 - nesse caso, os referidos efeitos só se iniciarão a partir do
trânsito em julgado da decisão (e não a partir da publicação da ata de julgamento no DJU).

15.21. Acerca do controle de constitucionalidade em âmbito estadual, pode a CE aumentar o


rol de legitimados para tanto, incluindo, por exemplo, o Defensor-Público Geral?
Segundo Pedro Lenza, a regra constitucional não especificou os legitimados, apenas proibiu que a
legitimação fosse conferida a um único órgão (art. 125, § 2º, CF). Dessa forma, cabe às CEs a
delimitação e, como conseqüência do poder constituinte derivado decorrente, deve-se respeitar, por
simetria, o art. 103 da CF, prevendo, no mínimo, os equivalentes. Em relação à ampliação, o STF já
admitiu a legitimação de Deputados Estaduais (RE 261.677, Rel. Min. Sepulveda Pertence) e
entendeu constitucional a ampliação operada pelo art. 162 da CE do Rio de Janeiro.
No caso do RS, a legitimação encontra-se prevista no art. 95, § 1º, IV (ADI de ato estadual) e art.
95, § 2º, VIII (ADI de ato municipal) da CE.

15.22. Há alguma possibilidade de a decisão tomada no controle concentrado de


constitucionalidade em âmbito estadual ser atacada via recurso? Quando? Qual o
procedimento a ser seguido?
De modo geral, não é admitido o manejo de recursos em controle concentrado deu
constitucionalidade, inadmitindo-se recurso ao STF. Contudo, quando o parâmetro da CE for uma
norma de observância obrigatória ou compulsória pelos Estados-membros, tem-se que a violação à
CE também representará violação à CF. Neste caso, abre-se a possibilidade de se interpor recurso
extraordinário contra o acórdão do TJ em controle abstrato estadual para que o STF diga, então,
qual a interpretação da norma perante a CF.
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Impende salientar que, neste caso, como uma lei municipal pode ser atacada via ADI em face da
CE, poder-se-á levar a questão ao STF, através da utilização de um recurso típico do controle
difuso, pela via incidental, no controle concentrado e abstrato estadual.
Neste caso, o recurso extraordinário será um mecanismo de se levar ao STF a análise da matéria, de
modo que a decisão neste caso produzirá os mesmos efeitos da ADI – ou seja, em regra, erga
omnes, ex tunc e vinculante, podendo, inclusive, nos termos do art. 27 da Lei nº 9.868/99, serem
modulados os efeitos da decisão. Desta maneira, neste caso, não se aplicará a regra do art. 52, X, da
CF, não tendo o Senado Federal qualquer participação.

15.22. Em relação ao processo de controle concentrado em âmbito estadual, aplica-se os


prazos duplicados à Fazenda Pública?
A Fazenda Pública possui prazo em dobro para interpor recurso extraordinário de acórdão proferido
pelo Tribunal de Justiça em sede de representação de inconstitucionalidade (art. 125, § 2o, da
CF/88).
Para o STF, deve ser aplicado, neste caso, o disposto no art. 188 do CPC. Não há razão para que
exista prazo em dobro no controle de constitucionalidade difuso e não haja no controle concentrado.
Segundo o Min. Dias Toffoli, o prazo em dobro é uma prerrogativa exercida pela Fazenda Pública
em favor do povo. STF. 1a Turma. ARE 661288/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 6/5/2014.

15.23. O que é a reclamação constitucional e qual a sua natureza jurídica?


Tem por finalidade garantir a autoridade da decisão proferida, em sede de ação direta de
inconstitucionalidade, pelo Supremo Tribunal Federal (serve também para reafirmar a competência
da Corte) e observância de súmulas vinculantes. Quando o ato que se alega ter desrespeitado a
decisão do Supremo Tribunal Federal for judicial, não poderá ele já ter transitado em julgado – pois
seria usada como sucedâneo de ação rescisória.
Após o julgamento da Reclamação nº 1.880, em 07.11.2002, ampliaram-se legitimados para a
propositura de reclamação, não mais se restringindo ao rol constante no artigo 103 da CF e no artigo
2º da Lei nº 9.868/99, para considerar legitimados todos aqueles que forem atingidos por decisões
dos órgãos do Poder Judiciário ou por atos da Administração Pública direta e indireta, nas esferas
federal, estadual, municipal e distrital contrários ao entendimento firmado pela Suprema Corte, em
julgamento de mérito proferido em ação direta de inconstitucionalidade, em decorrência da eficácia
vinculante atribuída as suas decisões (Artigo 28, parágrafo único da Lei nº 9.868/99 e artigo 102, §
2º, da CF, com redação dada pela EC 45/2004).
Nessa linha de ampliação do instituto da reclamação, foi introduzido, pela EC 45/2004, o § 3º do
artigo 103-A, a fim de se exigir também a observância das súmulas vinculantes editadas pela
Suprema Corte.
Em relação à natureza jurídica da reclamação, há controvérsia na doutrina: para Pontes de Miranda,
trata-se de ação; para Moacir Amaral e Alcides de Mendonça Lima, trata-se de sucedâneo de
recurso; para Orozimbo Nonato, trata-se de remédio incomum; para certos doutrinadores, trata-se
de incidente processual; outros o vêem como medida de Direito Processual Constitucional (José
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Frederico Marques); há aqueles que a tratam como medida processual de caráter excepcional; e há
também os que a vislumbram (STF) como instrumento de extração constitucional (de caráter
constitucional), com dupla finalidade: preservar a competência e garantir a autoridade das decisões;
Para Ada Pelegrini, trata-se de simples direito de petição (5º, XXXIV) - o Supremo adotou esse
entendimento ao permitir a reclamação no âmbito estadual (TJ)
Obs: como observa Fredie Didier Jr. essa linha de pensamento tem diversas implicações, entre elas:
em sendo direito de petição os Estados podem estabelecer em suas constituições a reclamação para
seus tribunais (não seria matéria de direito processual, competência privativa da União); os
TRFs/TJs poderiam receber reclamações ainda que não exista previsão na CF; não se pode exigir
custas e honorários (STJ, Rcl 2017); a decisão proferida não faz coisa julgada (entendimento
contrário ao do STF na Rcl 532); não se deve exigir capacidade postulatória para ajuizamento da
reclamação.

15.24. O que é a ação direta de constitucionalidade e quais são suas principais características?
É possível a ADC em âmbito estadual?
A ADC foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pela EC 03/93, a qual alterou a redação
dos arts. 102 e 103 da CF, sendo regulamentada pela Lei nº 9.868/99. Sua finalidade é declarar a
constitucionalidade de lei ou ato normativo federal (apenas federal), transformando uma presunção
relativa (iuris tantum) em absoluta (iure et iure) e, por conseguinte, afastando o quadro de incerteza
sobre a validade ou aplicação da aludida lei.
Muito embora o procedimento seja praticamente o mesmo seguido na ação direta de
inconstitucionalidade, possui algumas peculiaridades:
* A petição inicial deverá indicar: a) o dispositivo da lei ou do ato normativo questionado e
os fundamentos jurídicos do pedido; b) o pedido, com suas especificações; e c) a existência de
controvérsia judicial relevante sobre a aplicação da disposição objeto da ação declaratória. E ainda
deverá conter cópias do ato normativo questionado e dos documentos necessários para comprovar a
procedência do pedido de declaração de constitucionalidade(art. 14 da Lei nº 9.868/99).
* O AGU não será citado, uma vez que não há ato ou texto impugnado a ser defendido.
Pedro Lenza entende que o AGU deve ser citado, pois a ADC é uma ADI com sinal trocado, logo a
improcedência acarreta no reconhecimento da inconstitucionalidade da lei.
* Em caso de necessidade de esclarecimento de matéria ou circunstância de fato ou de
notória insuficiência das informações existentes nos autos, pode o relator requisitar informações
adicionais, inclusive, aos Tribunais Superiores, aos Tribunais federais e aos Tribunais estaduais
acerca da aplicação da norma questionada no âmbito de sua jurisdição, designar perito ou comissão
de peritos para que emita parecer sobre a questão ou fixar data para, em audiência pública, ouvir
depoimentos de pessoas com experiência e autoridade na matéria, a serem realizadas no prazo de 30
dias a contar da solicitação do relator (§§ 1º a 3º do art. 20 da Lei nº 9.868/99).
* A medida cautelar, em ADC, consistirá na determinação de que os juízes e os Tribunais
suspendam o julgamento dos processos que envolvam a aplicação da lei ou do ato normativo objeto
da ação até o seu julgamento definitivo (art. 21 da Lei nº 9.868/99). Essa suspensão perdurará
apenas por 180 dias, contados da publicação da parte dispositiva de decisão no DOU, sendo esse
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prazo definido pela lei para que o Tribunal julgue a ação declaratória. Para Gilmar Mendes e Ives
Gandra, a despeito da lei não prever a prorrogação do prazo da cautelar, se a questão não tiver sido
decidida no prazo prefixado, poderá o STF autorizar a prorrogação do prazo.
A doutrina entende possível a Constituição Estadual instituir ADC no tocante às leis estaduais em
face da respectiva Constituição Estadual. Contudo, seria necessário observar o modelo da CF, isto é
somente caberia em face de lei estadual, não de lei municipal (já que a ADC no âmbito federal só
abrange lei federal, e não estadual). Tal entendimento se mostra coerente com a noção de que ADI e
ADC são ações ambivalentes.

15.25. É possível a proposição de ADI, mesmo com a precedência de uma ADC julgada
procedente?
Sim. Em decorrência das mudanças de fatos (ADC/1, Min. Carlos Veloso), lei pode ser
constitucional no presente e no futuro pode ser inconstitucional.
Nesse sentido ocorreu a revisão do entendimento sobre o critério de miserabilidade contido na Lei
8742/93: “Aduziu-se ser possível que o STF, via julgamento da presente reclamação, pudesse
revisar o que decidido na ADI 1232/DF e exercer nova compreensão sobre a constitucionalidade do
§ 3º do art. 20 da Lei 8.742/93. Obtemperou-se que, hodiernamente, o STF disporia de técnicas
diversificadas de decisão para enfrentar problemas de omissão inconstitucional. Se fosse julgada
hoje, a norma questionada na ADI 1232/DF poderia ter interpretação diversa, sem necessidade de se
adotar posturas de autocontenção por parte da Corte, como ocorrera naquele caso. Frisou-se que, no
atual contexto de significativas mudanças econômico-sociais, as legislações em matéria de
benefícios previdenciários e assistenciais teriam trazido critérios econômicos mais generosos, com
consequente aumento do valor padrão da renda familiar per capita. Consignou-se a
inconstitucionalidade superveniente do próprio critério definido pelo § 3º do art. 20 da Loas. Tratar-
se-ia de inconstitucionalidade resultante de processo de inconstitucionalização em face de notórias
mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas
dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado)” .Rcl 4374, INFORMATIVO 702.

15.26. O que é a dupla revisão judicial ou duplo controle de constitucionalidade?


O Min. Gilmar Mendes leciona que na Alemanha se firma, atualmente, a tese da dupla revisão
judicial ou duplo controle de constitucionalidade. Segundo esta tese, é possível, mesmo após o
Tribunal Constitucional pronunciar-se acerca da inconstitucionalidade de determinada norma, as
instâncias inferiores poderem dela igualmente conhecer, tendo em vista o caso concreto e calcadas
no princípio da proporcionalidade.
Quer dizer, em outras palavras: mesmo após o controle concentrado de constitucionalidade, ainda
persiste espaço para controle difuso de constitucionalidade pelas instâncias judiciárias inferiores.
Isso, no sistema Brasileiro, seria possível no caso do julgamento de ADC; porém, em sendo adotada
a teoria da nulidade, uma vez que a decisão de ADI possui efeito vinculante, não seria possível
discutir-se uma norma retirada do ordenamento em razão da inconstitucionalidade reconhecida.
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Problemática: efeito vinculante das decisões de ADI e ADC!!!


Como exemplo, a ADC/04, que reconheceu a constitucionalidade da lei que proíbe a antecipação de
tutela contra a fazenda pública, mas os tribunais vêm entendendo que em determinados casos
concretos pode existir inconstitucionalidade pela proibição de antecipação de tutela contra a
fazenda.

15.27. O que é a ação direta de inconstitucionalidade por omissão e quais as suas principais
características? Quais as principais diferenças da ADO e do MI? É possível a fungibilidade
entre as duas figuras?
A ADI por omissão tem por finalidade tornar efetiva norma constitucional de eficácia limitada, não
regulamentada por omissão do Poder Público ou órgão administrativo. Essa omissão pode ser total,
quando não houver o cumprimento constitucional do dever de legislar (Ex.: Art. 37, inciso VII, da
CF); ou parcial, quando houver lei infraconstitucional integrativa, porém, regulamentando de forma
insuficiente.
A omissão parcial propriamente dita ocorre quando a lei existe, mas regula de forma deficiente o
texto (Ex.: Art. 7º, inciso IV, da CF); a omissão parcial relativa restará configurada quando a lei
existe, outorgando determinado benefício a uma certa categoria, porém deixando de conceder a
outra que deveria também ter sido contemplada (Ex.: Súmula nº 339 do STF) (chamada exclusão
de benefício incompatível com o princípio da igualdade - advém do direito alemão).
A ADO assemelha-se ao MI (Mandado de Injunção) porque também combate a síndrome de
inefetividade das normas constitucionais de eficácia limitada. Mas o controle é difuso. Não há
fungibilidade – diversidade de pedidos. O STF (MI 395 – QO) decidiu pela impossibilidade de
aplicação do princípio da fungibilidade entre a ADO e o MI, em razão de se tratarem de pedidos
diversos.

15.28. O que se entende por inercia deliberandi apta a ensejar o reconhecimento da omissão do
Poder responsável pela edição de norma inexistente?
A regra é que, desencadeado o processo legislativo, não há que se cogitar de omissão
inconstitucional do legislador. Contudo, essa orientação deve ser adotada com temperamentos. A
inercia deliberandi das Casas Legislativas pode ser objeto da ADI por omissão, sendo que o STF
reconhece a mora do legislador em deliberar sobre a questão, declarando, assim, a
inconstitucionalidade por omissão.
Em 2007, o STF, por unanimidade, julgou procedente a ADI 3682, ajuizada pela Assembléia
Legislativa do Estado do Mato Grosso contra o Congresso em razão da mora na elaboração da LC
federal a que se refere o § 4º do art. 18 da CR, na redação da EC n. 15/96 Asseverou-se, entretanto,
que não se poderia afirmar uma total inércia legislativa, haja vista os vários projetos de lei
complementar apresentados e discutidos no âmbito das Casas Legislativas.
Não obstante, entendeu-se que a inertia deliberandi (discussão e votação) também poderia
configurar omissão passível de vir a ser reputada morosa, no caso de os órgãos legislativos não
deliberarem dentro de um prazo razoável sobre o projeto de lei em tramitação.
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Aduziu-se que, na espécie, apesar dos diversos projetos de lei apresentados restaria configurada a
omissão inconstitucional quanto à efetiva deliberação da lei complementar em questão, sobretudo,
tendo em conta a pletora de Municípios criados mesmo depois do advento da EC 15/96, com base
em requisitos definidos em antigas legislações estaduais, alguns declarados inconstitucionais pelo
Supremo, ou seja, uma realidade quase que imposta por um modelo que, adotado pela aludida
emenda constitucional, ainda não teria sido implementado em toda sua plenitude em razão da falta
da lei complementar a que alude o mencionado dispositivo constitucional (info 466).

15.29. Quais os efeitos da decisão que reconhece a mora do Poder omitente?


A jurisprudência no STF sempre foi no sentido de que a ADI por omissão servia para comunicar ao
Congresso acerca do dever de legislar. Mas isso vem mudando um pouco, como no caso da criação
dos Municípios, em que se fixou um prazo para tanto. A decisão tem caráter mandamental,
constituindo em mora o poder competente que deveria ter elaborado a lei e não o fez. Quando a
omissão for de órgão administrativo, este terá o prazo de 30 dias para saná-la ou em prazo razoável
quando a excepcionalidade do caso assim recomendar.
Caso da criação dos Municípios (art. 18, § 4º): o Congresso não editou a LC necessária para a
criação dos Municípios. Muitos municípios foram criados de forma inconstitucional. Houve várias
ADIs contra as leis que criaram Municípios, e ADI por omissão em relação ao art. 18, § 4º da CF. O
STF declarou a omissão inconstitucional e inconstitucionalidade, sem pronúncia de nulidade, das
leis municipais (com modulação de efeitos). Fixou-se um prazo de 18 meses para a LC, e 24 meses
para a subsistência das leis municipais. Raciocínio: criada a LC, as leis municipais poderiam ser
criadas no prazo. O Congresso não criou a LC, mas fez EC para ratificar a criação dos Municípios.

15.30. O que são sentenças aditivas?


São decisões que integram ou complementam um regime previamente adotado pelo legislador ou,
ainda, quando a solução adotada pelo Tribunal incorpora solução constitucionalmente obrigatória. A
adição de textos de conteúdo normativo nessas sentenças representam mais do que uma
interpretação conforme. Há uma maior autonomia.
No passado, falava-se que não caberia a inconstitucionalidade por omissão, pois a
inconstitucionalidade só pode decorrer da extrapolação de limites por parte do legislador. Isso
porque, na concepção dominante do Estado Liberal clássico, a CF consagra os direitos
fundamentais enquanto direitos de caráter negativo, impondo ao legislador, em princípio, um dever
de abstenção. Assim, em caso de extrapolação dos limites, haveria declaração de nulidade da lei. A
teoria da nulidade era perfeita para resolver os problemas de extrapolação de limites pelo legislador.
Com o avanço do Estado Social, o panorama muda, em razão da necessidade de implementação de
direitos sociais: o legislador tem um dever de agir. Surge a necessidade do controle da omissão
legislativa. E mais: não vai existir só a omissão total, mas também a omissão parcial (atuação
incompleta, com proteção deficiente).
Nas situações de omissão, notadamente a parcial, a simples declaração de nulidade de uma lei pode
agravar o estado de inconstitucionalidade, criando um vácuo normativo. Ex: art. 7º, IV, da CF – lei
do salário mínimo que deve ser suficiente a atender às necessidades do trabalhador e de sua família.
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A lei não atende aos ditames da CF. Então é nula? Vamos fazer efeito repristinatório das leis
anteriores? Até chegar num salário mínimo negativo? Note-se que a técnica da nulidade não é
adequada para resolver o problema, pois não se trata de um excesso de poder, e sim de uma
proteção insuficiente.
Não há muito consenso sobre as técnicas de controle de normas em caso de omissão. Mas isso vem
melhorando. Com o surgimento da modulação de efeitos (art. 27 da Lei nº 9.868/99), pode ser feita
a declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade. Além disso, há a possibilidade da
sentença de perfil aditivo. Em 2009, a Lei nº 9.868 foi alterada para permitir um novo tratamento da
matéria.

15.30. O que se entende por preceito fundamental?


Tanto a Constituição como a lei infraconstitucional deixaram de conceituar preceito fundamental.
Nesse sentido, entende a doutrina que preceitos fundamentais seriam aqueles preceitos que
informam todo o sistema constitucional, estabelecendo os comandos basilares e imprescindíveis à
defesa dos pilares da manifestação constituinte originária e, por conseguinte, veiculando princípios
e servindo de vetores de interpretação das demais normas constitucionais. Como exemplo, são
citados os princípios fundamentais dos artigos 1º a 4º, as cláusulas pétreas do artigo 60, § 4º, os
princípios constitucionais sensíveis do artigo 34, inciso VII, os direitos e garantias individuais dos
artigos 5º a 17, os princípios gerais da ordem econômica e financeira do artigo 170 etc.
Por sua vez, o STF apenas tem resolvido, em cada caso concreto, se se trata ou não de preceito
fundamental, não definindo de forma ampla o que se entende por preceito fundamental. O veto não
pode ser contestado por meio de ADPF, já que se tratada de manifestação de ato político.

15.31. Em que consiste a ADPF? Quais suas espécies? Quais suas características principais?
Há alguma espécie de fungibilidade entre ADPF e ADI?
A Arguição de descumprimento de preceito fundamental encontra previsão no § 1º do art. 102 da
CF, com redação dada pela EC 03/93, regulamentado pela Lei nº 9.882/99, sendo, antes da
regulamentação legal, entendido pelo STF que o art. 102, § 1º, da CF encerrava norma
constitucional de eficácia limitada.
É um mecanismo de controle de constitucionalidade que necessita de uma controvérsia
constitucional relevante, emanada de lei ou ato do poder público (F, E, M), inclusive anteriores à CF
por expressa disposição legal.
São duas as espécies de ADPF: na hipótese de argüição autônoma, prevista no art. 1º, caput, da Lei
nº 9.882/99, tem-se por objeto evitar (preventivo) ou reparar (repressivo) lesão a preceito
fundamental, resultante de ato do Poder Público, qualquer que seja esse ato administrativo.
Já na hipótese de argüição INCIDENTAL, por equivalência ou equiparação, disciplinada pelo
parágrafo único do art. 1º da Lei nº 9.882/99, tem-se por objeto a existência de controvérsia
(divergência jurisprudencial) constitucional, com fundamento relevante, sobre lei ou ato normativo
federal, estadual, municipal e distrital, incluídos os anteriores à Constituição de 1988, violadores de
preceito fundamental.
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Em relação à segunda espécie, a previsão se deu por lei – competência originária do STF – há quem
diga que seria inconstitucional. (Para Gilmar Mendes, decorre da jurisdição constitucional).
Convém advertir ainda que, por ora, não cabe ADPF incidental (cisão funcional vertical), em
relação a controvérsias constitucionais concretamente já postas em juízo, salvo se vier a ser editada
emenda constitucional com previsão expressa a esse respeito.
Hoje, porém, se admite a impugnação de decisões judiciais por meio da ADPF, antes mesmo de
estarem maduras para um RE. Leva-se uma questão constitucional presente no debate de 1ª
instância para abreviá-lo. Nesse ponto, há uma certa semelhança com o incidente de
inconstitucionalidade do controle concreto europeu. Ex: importação de pneus usados. Admite-se
também o controle de leis revogadas e pré-constitucionais, analisando-se o fenômeno da recepção.
A argüição de descumprimento de preceito fundamental, ainda, possui caráter residual, sendo-lhe
aplicável, destarte, o princípio da subsidiariedade, segundo o qual somente será ela admitida quando
não houver qualquer outro meio eficaz capaz de sanar a lesividade indicada, compreendido no
contexto da ordem constitucional global, como aquele apto a solver a controvérsia constitucional
relevante de forma ampla, geral e imediata. Art. 4º, § 1º, da Lei nº 9.882/99.
Por subsidiariedade, deve-se entender que não pode haver outro meio de controle em processo
objetivo. Entretanto, se couber MS, RE, pode caber a ADPF mesmo assim, pois ela gera eficácia
geral, ao passo que os outros têm, em princípio, eficácia inter partes. Ex: ADPF 33 – piso salarial de
servidores – lei pré-constitucional revogada – decidiu-se que o princípio da subsidiariedade
legitimava a apreciação da ADPF, pois a existência de pendências judiciais não é bastante para
resolver o caso na amplitude da ADPF.
Há de se atentar, ainda, que, muito embora seja prevista a medida liminar em ADPF, a mesma, em
caso de recesso do STF, será apreciada pelo relator, e não pelo Presidente do STF (art. 5º, § 1º, da
Lei nº 9.882/99).
Os efeitos da ADPF são os mesmos da ADI/ADC. Ainda, entende-se que, conhecida a ocorrência de
outra espécie de controle de constitucionalidade concentrado, o STF poderá admitir o
processamento da ADPF como ADI/ADC, aplicando-se o princípio da fungibilidade.

15.32. Quais os legitimados à ADPF? Há alguma diferença em relação aos demais meios de
controle concentrado?
São os mesmos legitimados para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade - havia um
dispositivo no projeto de lei que legitimava qualquer pessoa pudesse levar a ADPF ao STF (vetado
pelo PR).
Assim, qualquer interessado, entendido esse como sendo qualquer pessoa lesada ou ameaçada por
ato do poder público (inciso II vetado do art. 2º da Lei nº 9.882/99), mediante representação,
solicitando a propositura da ação ao Procurador-Geral da República, que, examinando os
fundamentos jurídicos do pedido, decidirá acerca do cabimento de seu ingresso em juízo. (a
legitimada, na realidade, é a PGR).
164

15.33. No que consiste a ADI interventiva?


A ADI interventiva, prevista na Lei nº 12.562/2011, é pressuposto para a decretação de determinada
hipótese de intervenção da União nos Estados, no Distrito Federal ou nos Municípios localizados
em Território Federal, bem como dos Estados em seus respectivos Municípios, na medida em que,
através dela, é que se verificará a presença de seus pressupostos.
Há de se ressaltar que existem situações em que não se faz necessário o prévio ajuizamento e, por
conseguinte, a procedência de ADI interventiva para se decretar a intervenção federal ou estadual.
Trata-se de um controle concentrado de constitucionalidade de lei ou ato normativo em tese
realizado em um caso concreto.
Luis Roberto Barroso entende se tratar de um litígio constitucional, de uma relação processual
contraditória, contrapondo União e Estado-membro, cujo desfecho pode resultar em uma
intervenção federal.
A ADI interventiva depende de provimento do PGR ou PGJ, tendo por objeto uma lei ou ato
normativo, ou omissão, ou ato governamental estaduais ou distrital de natureza estadual, contrários
aos princípios sensíveis da CF; bem como lei federal cuja execução esteja sendo recusada.
São princípios sensíveis:
a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;
b) direitos da pessoa humana;
c) autonomia municipal;
d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta;
e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a
proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços
públicos de saúde. Art. 34, inciso VII, da CF

15.34. Quais as consequências jurídicas da decretação da ADI interventiva?


Julgada a ADI interventiva procedente, pela maioria absoluta de seus membros (art. 97 da CF),
requisitará o STF ao Presidente da República que decrete a intervenção.
O Presidente, por sua vez, limitar-se-á, através de Decreto, a suspender a execução do ato
impugnado e, apenas se essa medida não for suficiente para o restabelecimento da normalidade,
decretará a intervenção, nomeando interventor, bem como afastando as autoridades responsáveis de
seus cargos. §§ 1º e 3º do art. 36 da CF.
Quando ocorrer o afastamento do gestor estadual e nomeação de interventor, o decreto deve ser
enviado para apreciação do CN no prazo de 24 horas.
O mesmo procedimento ocorrerá em relação à intervenção estadual.
165

15.35. Qual a diferença entre as súmulas vinculantes e as stare decisions do sistema da


common Law?
Muito embora existam particularidades, segundo Pedro Lenza, o instituto das stare decisions
influenciou a criação das súmulas vinculantes, uma vez que, naquele sistema, o precedente
judiciário é fonte de direito, isto é, detém valor normativo. O chamado precedente (stare decisions)
utilizado no modelo judicialista, é o caso já decidido, cuja decisão primeira sobre o tema (leading
case) atua como fonte para o estabelecimento (indutivo) de diretrizes para os demais casos a serem
julgados. Esse precedente, como o princípio jurídico que lhe servia de pano de fundo, haverá de ser
seguido nas posteriores decisões como paradigma (ocorrendo, aqui, portanto, uma aproximação
com a idéia de súmula vinculante).

15.36. O que são as súmulas vinculantes e quais suas principais características?


É um instrumento exclusivo do STF que, uma vez editado, produz efeitos de vinculação para os
demais órgãos do Poder Judiciário e para a Administração Pública.
Tem por objeto a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, em que exista uma
controvérsia atual que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos
sobre idêntica questão. Foi inserida na CF através da EC 45/2004 (art. 103-A), e regulamentada pela
Lei nº 11.417/2006. Registra uma ampliação dos legitimados em face dos instrumentos de controle
concentrado de constitucionalidade, admitindo que o DPU, os Tribunais Superiores, os TJs, TRFs,
TRTs e TREs, além dos Tribunais Militares, proponham a edição de tal enunciado. Aos Municípios
é admitida a proposição apenas de forma incidental, no curso de processos em que sejam parte (art.
3º, § 1º).
Editada a súmula, a mesma vinculará os demais órgãos do Poder Judiciário e a Administração
Pública, mas não o Poder Legislativo, a fim de evitar o fenômeno da “fossilização da constituição”,
bem como possibilitará ao próprio STF, eventualmente, rever a posição e a decisão.

15.37. Quais as medidas que poderão ser tomadas em caso de descumprimento de súmula
vinculante?
Da decisão judicial ou do ato administrativo que contrariar enunciado de súmula vinculante, negar-
lhe vigência ou aplicá-lo indevidamente, caberá reclamação ao STF, sem prejuízo de outros recursos
ou meios de impugnação. A reclamação, entretanto, não será admitida caso a decisão judicial ou
administrativa for anterior à edição da súmula vinculante, tendo em vista que a vinculação somente
ocorrerá a partir da publicação da súmula na Imprensa Oficial.
Porém, em se tratando de ato Administrativo, a reclamação apenas será cabível quando do
esgotamento das vias administrativas – ainda, acolhida a reclamação, dar-se-á ciência à autoridade
administrativa para adequação das futuras decisões ao enunciado sumular, sob pena de
responsabilidade civil, criminal e administrativa (art. 64-B da Lei nº 9.784/99).Conforme o art. 103-
A, § 3º, da CF, “do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que
indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a
procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que
outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso”.
166

16. A DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS. ESTADO DE DEFESA


E ESTADO DE SÍTIO. INTERVENÇÃO: FUNDAMENTOS, ESPÉCIES, COMPETÊNCIA,
REQUISITOS, CONTROLE POLÍTICO E JURISDICIONAL, DURAÇÃO, INTERVENTOR,
LEGITIMIDADE, HIPÓTESES DE INTERVENÇÃO FEDERAL E ESTADUAL.

AUTOR: DIEGO RODRIGUES QUADROS


MATERIAL DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO – PEDRO LENZA (2010) / DIREITO
CONSTITUCIONAL – ALEXANDRE DE MORAES (2005)

16.1. O que se entende por sistema constitucional das crises?


A doutrina, em termos gerais, define o sistema constitucional das crises como o conjunto de
disposições normativas constitucionais, cujo objetivo é manter ou restabelecer a normalidade
constitucional diante de situações de crise.
Ressalta-se que o aludido sistema apoia-se em dois princípios: o princípio da necessidade, cuja
inobservância implicaria em arbítrio e golpe de estado, e o princípio da temporariedade, sem o qual
se configuraria uma ditadura.
Acerca do tema, Pedro Lenza aduz que o constitucionalismo pátrio experimentou estados de
exceção sem a observância dos princípios em referência durante o “Estado Novo” de Getúlio
Vargas (Constituição de 1937), e no governo da ditadura militar de 1964 até o seu fim (e durante o
período da ditadura militar, com a utilização do AI-5).

16.2. Quais são os instrumentos excepcionais constitucionalmente previstos para defesa do


Estado e das instituições democráticas?
A defesa do Estado compreende a defesa do território nacional contra invasões estrangeiras, a
defesa da soberania nacional e a defesa da pátria; já a defesa das instituições democráticas visa o
equilíbrio da ordem constitucional e entre os grupos de poder, mantendo ou restabelecendo a ordem
quando a competição entre grupos sociais extrapola os limites constitucionais, ensejando situação
de crise.
Neste sentido, a Constituição Federal de 1988 faz previsão de duas medidas de caráter excepcional
para restauração da ordem diante de momentos de anormalidade: o estado de defesa e o estado de
sítio, nos quais se substitui a legalidade normal por uma legalidade extraordinária, que irá conduzir
este estado de exceção.

16.3. Discorra acerca das medidas excepcionais previstas para defesa do Estado e das
instituições democráticas quanto às suas hipóteses de decretação e o respectivo procedimento.
O estado de defesa (modalidade mais branda) pode ser decretado, nos termos do art. 136 da CF/88,
para preservação ou restabelecimento da ordem pública ou paz social, em locais restritos e
determinados, que estejam ameaçados por grave e iminente instabilidade institucional ou que
tenham sido atingidos por calamidades de grandes proporções na natureza.
167

Por outro lado, o estado de sítio (pressupõe situação de maior gravidade) pode ser decretado nos
casos de comoção grave de repercussão nacional, ou em razão de fatos que comprovem a ineficácia
de medida adotada no estado de defesa (art. 137, I, da CF/88). Há, ainda, previsão constitucional
para o estado de sítio nos casos de declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada
estrangeira.
Em ambos os casos, a decretação caberá ao Presidente da República, no uso de sua
discricionariedade política, após serem ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa
Nacional, cujos pareceres não serão vinculativos.
Não obstante, no estado de sítio, diferente do que ocorre no estado de defesa, o Presidente da
República deve solicitar previamente autorização do Congresso Nacional, que então se manifestará
pela maioria absoluta de seus membros.
Cabe, também, distinguir as medidas quanto ao prazo de duração: o estado de defesa não terá
duração superior a 30 (trinta) dias, podendo ser prorrogado, uma vez, por igual período (art. 136,
§2°, CF/88), enquanto que o estado de sítio não poderá ser decretado por mais de 30 dias, nem
prorrogado, de cada vez, por prazo superior, sendo certo que em caso de declaração de estado de
guerra ou de resposta à agressão armada estrangeira, poderá ser decretado por todo o tempo que
estes perdurarem (art. 138, §1°, CF/88).

16.4. Em linhas gerais, qual será o conteúdo do decreto que instituir o estado de defesa? E o
estado de sítio?
No estado de defesa, a Constituição prevê que o decreto irá determinar o tempo de duração, as áreas
a serem abrangidas e, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem (art. 136, §1°,
CF/88).
Por outro lado, o art. 138, caput, da CF/88, dispõe que o decreto do estado de sítio além de indicar,
tal como no estado de defesa, o tempo de duração da medida, também especificará as normas
necessárias à sua execução, as garantias constitucionais que ficarão suspensas, e após a publicação,
o Presidente da República irá designar as áreas abrangidas bem como o executor das medidas
específicas.

16.5. No estado de defesa existe previsão constitucional para, através das medidas coercitivas
estabelecidas, supressão de direitos fundamentais?
Não. Com efeito, o art. 136, §1°, I, da CF/88, afirma que o decreto instituidor do estado de defesa
indicará medidas coercitivas que implicarão em restrições de direitos (e não em supressão destes).
O aludido dispositivo constitucional estabelece que poderão ser estabelecidas restrições ao direito
de reunião, ao sigilo de correspondência e ao sigilo de comunicação telegráfica e telefônica.
Acrescente-se, ainda, a possibilidade de restrição à garantia inserida no art. 5°, LXI, da CF/88, na
medida em que a prisão poderá ser determinada pelo executor da medida, e não pela autoridade
judicial competente (art. 136, §3°, CF/88).
Não obstante, o juiz competente deverá ser comunicado de forma imediata (deve acompanhar a
referida comunicação a declaração do estado físico e metal do detido por ocasião da autuação),
168

podendo relaxá-la, se não for legal, facultando-se ao preso requerer à autoridade policial a
realização de exame de corpo de delito.
Quanto ao tempo de duração, a prisão não poderá ser superior a 10 dias, salvo quando autorizada
pelo Judiciário, vedando-se, ademais, a incomunicabilidade do preso.
Por fim, cabe registrar a previsão constitucional para ocupação e uso temporário de bens e serviços
públicos durante o estado de defesa, no caso de calamidade pública, respondendo a União pelos
danos e custos decorrentes.

16.6. Em relação às hipóteses que viabilizam a decretação do estado de sítio, existe distinção
entre as medidas coercitivas possíveis de serem decretadas?
Sim. Em se tratando das hipóteses previstas no art.137, I, da CF/88, as medidas se encontram
taxativamente previstas no art. 139, I a VII, da Constituição Federal.
Por outro lado, na hipótese de declaração de estado de guerra ou resposta à agressão armada
estrangeira, a doutrina aduz que qualquer garantia constitucional poderá, em tese, ser suspensa,
desde que observados os princípios da necessidade e temporariedade; que tenha sido obtida prévia
autorização do Congresso Nacional, e que o decreto instituidor expressamente tenha indicado o
tempo de duração, as normas necessárias a sua execução e as garantias constitucionais que ficarão
suspensas.
No entanto, cabe ressaltar que, a despeito de não previsto expressamente na CF/88, pode-se aplicar,
em tese, na hipótese de decretação de estado de sítio, sobretudo por motivo de guerra ou resposta a
agressão armada estrangeira, as garantias previstas no Pacto de Direitos Civis e Políticos (art. 4, 1),
e na Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica - art. 27, 1 e 2),
visto que o §2º do art. 5º da CF prevê que os direitos e garantias expressos na Constituição “não
excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados
internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.
Com efeito, tais garantias encontram-se previstas nos referidos instrumentos, aos quais o Brasil
aderiu, e se referem a hipóteses como as do inciso II do art. 137, CF/88. Neste sentido, dispõe o
Pacto de Direitos Civis e Políticos e a Convenção Americana de Direitos Humanos,
respectivamente:
ARTIGO 4
Quando situações excepcionais ameacem a existência da nação e sejam proclamadas
oficialmente, os Estados Partes do presente Pacto podem adotar, na estrita medida
exigida pela situação, medidas que suspendam as obrigações decorrentes do presente
Pacto, desde que tais medidas não sejam incompatíveis com as demais obrigações que
lhes sejam impostas pelo Direito Internacional e não acarretem discriminação alguma
apenas por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião ou origem social.
Por sua vez, dispõe o art. 27, I, 1 e 2, da Convenção Americana de Direitos Humanos:
Artigo 27 - Suspensão de garantias
1. Em caso de guerra, de perigo público, ou de outra emergência que ameace a
independência ou segurança do Estado-parte, este poderá adotar as disposições que, na
169

medida e pelo tempo estritamente limitados às exigências da situação, suspendam as


obrigações contraídas em virtude desta Convenção, desde que tais disposições não
sejam incompatíveis com as demais obrigações que lhe impõe o Direito Internacional e
não encerrem discriminação alguma fundada em motivos de raça, cor, sexo, idioma,
religião ou origem social.
2. A disposição precedente não autoriza a suspensão dos direitos determinados nos
seguintes artigos: 3 (direito ao reconhecimento da personalidade jurídica), 4 (direito à
vida), 5 (direito à integridade pessoal), 6 (proibição da escravidão e da servidão), 9
(princípio da legalidade e da retroatividade), 12 (liberdade de consciência e religião),
17 (proteção da família), 18 (direito ao nome), 19 (direitos da criança), 20 (direito à
nacionalidade) e 23 (direitos políticos), nem das garantias indispensáveis para a
proteção de tais direitos.
Dessa forma, embora não reproduzidos de forma expressa na CF/88, pode-se defender a partir
destes instrumentos internacionais a limitação na restrição de direitos também na hipótese do inciso
II do art. 137.

16.7. Quais são as formas de controle relativas à decretação do estado de defesa e de sítio? Em
que momento esse controle será exercido?
No estado de defesa o controle será político e jurisdicional. O controle político será exercido: de
forma imediata, submetendo-se o decreto à apreciação do Congresso Nacional, que decidirá pela
maioria absoluta de seus membros, sendo certo que se rejeitar o decreto, o estado de defesa cessará
imediatamente (art. 136, §§ 4° ao 7°); concomitantemente, com a designação de comissão de
parlamentares para acompanhar e fiscalizar a execução das medidas (art. 140); posteriormente
(controle sucessivo), com o término dos efeitos do estado de defesa, as medidas aplicadas em sua
vigência serão relatadas pelo Presidente da República em mensagem ao Congresso, com
especificação e justificação dessas providências.
Se o Congresso recusá-las, poderá restar configurado algum crime de responsabilidade do
Presidente, especialmente o atentado a direitos individuais. No controle jurisdicional, o Poder
Judiciário realizará de forma concomitante à execução do decreto o controle das prisões realizadas
pelo executor da medida, sem prejuízo também da apreciação de qualquer outra lesão ou ameaça a
direito, podendo coibir os abusos e ilegalidades perpetrados durante a crise constitucional,
atentando-se, porém, aos limites constitucionalmente permitidos para as restrições impostas
(controle via HC, MS etc).
Posteriormente, o controle também será exercido pelo Judiciário, ao final do estado de defesa, em
relação à eventual responsabilidade dos executores e agentes pelos ilícitos cometidos no período
(art. 141, CF/88).
No estado de sítio, o controle também será político e jurisdicional. Em relação ao controle político,
este será exercido de forma prévia, visto que será necessária prévia autorização do Congresso
Nacional para sua decretação, sendo exercido também de forma concomitante e posterior, tal como
no estado de defesa.
170

Acerca do controle jurisdicional, este também será exercido de forma concomitante à execução da
medida, levando-se ao Judiciário (através de HC, MS etc) lesão ou ameaça a direito, abuso ou
excesso de poder (atentando-se, contudo, aos limites da legalidade extraordinária); e também de
forma posterior (sucessiva), nos termos do art. 141, caput, CF/88.

16.8. É correto afirmar que as imunidades parlamentares recebem o mesmo tratamento


constitucional no estado de defesa e no estado de sítio?
Não. Inexiste previsão constitucional para suspensão das imunidades parlamentares no estado de
defesa.
Por outro lado, o art. 53, §8°, da CF/88 afirma que no estado de sítio as imunidades irão subsistir,
mas poderão ser suspensas nos casos de atos praticados fora do Congresso Nacional, que sejam
incompatíveis com a medida. Referida suspensão se dará pelo voto de 2/3 dos membros da
respectiva casa.

FORÇAS ARMADAS
* Este item não se encontra expressamente previsto no Edital, mas na bibliografia consultada
insere-se no tópico “Defesa do Estado e das instituições democráticas”.

16.9. No Brasil, no que consistem as Forças Armadas?


As Forças Armadas são compostas pela Marinha, Exército e Aeronáutica, e, sob a autoridade
suprema do Presidente da República (art. 84, XIII, CF/88), constituem-se em instituições
permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e disciplina, com objetivo de defender
a Pátria, garantir os poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, a lei e a ordem (art.
142, caput, CF/88).
Ressalta-se que os membros das Forças Armadas são denominados militares e submetem-se, além
das disposições legais, àquelas dispostas no art. 142, §3°, I a X, da CF/88.

16.10. As punições disciplinares aplicadas aos militares podem ser atacadas via Habeas
Corpus?
O parágrafo segundo do art. 142 da CF/88 estabelece vedação expressa da garantia constitucional
do habeas corpus em relação a punições disciplinares militares.
A despeito disso, o STF tem interpretado o dispositivo reconhecendo a possibilidade de impetração
do writ para análise dos pressupostos de legalidade, excluindo-se, neste sentido, as questões
atinentes ao mérito administrativo da sanção.
171

16.11. A fixação de remuneração inferior ao salário mínimo às praças prestadoras de serviço


militar inicial se coaduna com a ordem constitucional?
Indicando as especificidades do regime jurídico dos militares, o STF já assentou entendimento no
sentido de que o estabelecimento de remuneração inferior ao salário mínimo para as praças
prestadoras de serviço militar inicial não viola a Constituição. (SV n° 06).

16.12. A prestação do serviço militar é obrigatória?


Nos termos do art. 143, caput, §§ 1° e 2°, da CF/88, a prestação do serviço militar é obrigatória. No
entanto, as mulheres e os eclesiásticos ficam isentos da referida prestação obrigatória em tempos de
paz, sujeitando-se, contudo, a outros encargos que a lei lhes atribuir.
Observe-se que, àqueles que alegarem imperativo de consciência (crença religiosa, convicção
política ou filosófica) para se eximirem das atividades de caráter essencialmente militar, será
atribuído serviço alternativo, cuja recusa no cumprimento terá por sanção a declaração da perda dos
direitos políticos.

INTERVENÇÃO FEDERAL E ESTADUAL


16.13. No atual ordenamento jurídico-constitucional existe previsão para o afastamento da
autonomia dos entes federativos?
Sim. A Constituição Federal de 1988 insere em seus artigos 34, 35 e 36 dispositivos acerca da
intervenção da União nos Estados e no Distrito Federal, bem como da intervenção dos Estados nos
Municípios e da União nos Municípios localizados em Território Federal.
Com efeito, a CF/88 prevê situações de caráter excepcional em que se afastará temporariamente a
autonomia de determinado ente federativo, visando preservar a unidade e a existência da própria
federação.
Dado o caráter excepcional da medida, esta se dará somente nas hipóteses taxativamente previstas
no texto constitucional, se aperfeiçoará através de decreto do Presidente da República (art. 84, X),
no caso de intervenção federal, ou dos Governadores dos Estados, na intervenção estadual (ato
privativo do Chefe do Poder Executivo).
Consigne-se, ainda, que há previsão de oitiva do Conselho da República e do Conselho de Defesa
Nacional, cujos pareceres não serão vinculativos, e que o decreto de intervenção indicará seu prazo,
amplitude, condições de execução e nomeará interventor, sendo o caso.

16.14. Discorra acerca das hipóteses de intervenção federal, relacionando-as às respectivas


espécies.
Inicialmente, cumpre afirmar que a intervenção federal traduz propriamente a intervenção da União
nos Estados e no Distrito Federal. Neste sentido, é como se todos os Estados estivessem intervindo
de forma conjunta, atuando a União, na hipótese, em nome da própria Federação.
172

Passado este ponto, relacionar as hipóteses interventivas às respectivas espécies significa agrupar o
elenco constitucional taxativo das possibilidades de intervenção segundo o procedimento que lhes
será comum.
Assim, as hipóteses de intervenção federal previstas no art. 34 da CF/88 (por questões didáticas,
cabe aqui a transcrição do aludido artigo) são:

Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:
I - manter a integridade nacional;
II - repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra;
III - pôr termo a grave comprometimento da ordem pública;
IV - garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação;
V - reorganizar as finanças da unidade da Federação que:
a) suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo
motivo de força maior;
b) deixar de entregar aos Municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição,
dentro dos prazos estabelecidos em lei;
VI - prover a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial;
VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:
a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;
b) direitos da pessoa humana;
c) autonomia municipal;
d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.
e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais,
compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do
ensino e nas ações e serviços públicos de saúde. (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 29, de 2000).

Nas hipóteses dos incisos I, II, III e V, a intervenção se dará de forma espontânea, agindo o
Presidente da República de ofício. Nas demais hipóteses, a intervenção será provocada, cumprindo
diferenciá-las, contudo.
Quando o objetivo for garantir o livre exercício dos Poderes Executivo e Legislativo na unidade da
federação (art. 34, IV, c/c art. 36, I, primeira parte), a intervenção será provocada por solicitação
daquele Poder coacto ou impedido.
Caso a coação esteja sendo exercida contra o Poder Judiciário daquela unidade federativa, a
intervenção será provocada por requisição do STF (art. 34, IV, c/c art. 36, segunda parte), sendo
certo que no caso do art. 34, VI, quando a intervenção se se der por desobediência de ordem ou
decisão judicial, a decretação também necessitará de requisição do STF, STJ ou TSE (art. 36, II).
173

Por outro lado, em se tratando de ofensa aos princípios constitucionais sensíveis apontados nas
alíneas do inciso VII, a intervenção terá como condição para sua decretação o provimento pelo STF
de representação do PGR, através do manejo de ADI interventiva, sendo então provocada,
dependendo do provimento de representação, consignando-se que a aludida representação será
também necessária nos casos em que houver recusa à execução de lei federal (ação de
executoriedade de lei federal).

16.15. O ato do Presidente da República que decreta a intervenção terá sempre natureza
discricionária?
Não. Na hipótese de requisição do Judiciário, o ato será vinculado, devendo ser decretada a
intervenção.

16.16. Existe controle político sobre o decreto interventivo?


Na intervenção federal existe o controle político, e este será exercido pelo Congresso Nacional, ao
qual será submetido o decreto para apreciação no prazo de 24 horas, procedendo-se à convocação
extraordinária do Congresso em igual prazo de 24 horas, caso este não esteja em funcionamento.
Caso rejeite o decreto, o Presidente da república deverá fazê-lo cessar de forma imediata, sob pena
de incorrer em crime de responsabilidade.
Ressalta-se, no entanto, que a própria CF/88 excepciona a necessidade de controle político nos
casos previstos em seu art. 36, §3°.

16.17. Como se dá a intervenção dos Estados nos Municípios?


A intervenção estadual se dá através de decreto do Governador do Estado, onde este, tal como
ocorre na intervenção federal, apontará prazo, amplitude, condições de execução, nomeará
interventor se necessário, e afastará as autoridades envolvidas (que ao fim poderão retornar salvo
impedimento legal – art. 36, § 4°, CF/88).
As hipóteses que ensejam a decretação da intervenção estadual (e também da União nos municípios
localizados em território federal) encontram-se taxativamente elencadas no art. 35 da CF/88.
O controle político se realiza na intervenção estadual nos mesmos termos da intervenção federal,
sendo aqui realizado pela Assembleia Legislativa, conforme previsto no art. 36, §2, da CF/88.
Não obstante, o §3° do art. 36, excepciona a necessidade de controle no âmbito estadual nos casos
em que o Tribunal de Justiça der provimento a representação para assegurar a observância de
princípios indicados na Constituição Estadual, ou para prover a execução de lei, de ordem ou de
decisão judicial.
Consigne-se, igualmente, que caso a suspensão da execução do ato impugnado não for bastante para
restabelecer a normalidade, será decretada a intervenção no município, submetendo o respectivo
decreto à apreciação da Assembleia Legislativa.
174

Por fim, cabe aduzir que, especificamente no caso do Estado do Rio Grande do Sul, os princípios
cuja inobservância poderá ensejar a intervenção encontram-se elencados no art. 15, IV, da
Constituição Estadual, e são: a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático; b)
direitos da pessoa humana; e c) probidade administrativa.

16.18. Acerca do entendimento do STF, o não pagamento de precatório pelo Estado viabiliza a
decretação da intervenção federal?
Dado o caráter de medida extrema da intervenção, o Supremo Tribunal Federal entende que a
ausência de pagamento de valores requisitados em precatórios enseja a intervenção quando
demonstrada a atuação estatal voluntária e dolosa com objetivo de descumprir decisão judicial
transitada em julgado, erigindo-se esta em pressuposto indispensável ao acolhimento de pleito de
intervenção federal (neste sentido, ver IF 5101/RS, noticiado no INFO 660).
A despeito desse entendimento, em sede de julgamento de questão de ordem (ADI 4425/DF QO e
ADI 4357/DF QO), o relator, ministro Luiz Fux, sinalizou a necessidade de revisão do aludido
posicionamento, ponderando que a prova do dolo inviabilizaria qualquer pedido de intervenção.
(INFO 725).

Súmula e jurisprudência aplicável


Súmula 637 do STF – Não cabe recurso extraordinário contra acórdão de tribunal de justiça que
defere pedido de intervenção estadual em município.
“O instituto da intervenção federal, consagrado por todas as Constituições republicanas, representa
um elemento fundamental na própria formulação da doutrina do federalismo, que dele não pode
prescindir – inobstante a expecionalidade de sua aplicação –, para efeito de preservação da
intangibilidade do vínculo federativo, da unidade do Estado Federal e da integridade territorial das
unidades federadas. A invasão territorial de um Estado por outro constitui um dos pressupostos de
admissibilidade da intervenção federal. O Presidente da República, nesse particular contexto, ao
lançar mão da extraordinária prerrogativa que lhe defere a ordem constitucional, age mediante
estrita avaliação discricionária da situação que se lhe apresenta, que se submete ao seu exclusivo
juízo político, e que se revela, por isso mesmo, insuscetível de subordinação à vontade do Poder
Judiciário, ou de qualquer outra instituição estatal. Inexistindo, desse modo, direito do Estado
impetrante à decretação, pelo chefe do Poder Executivo da União, de intervenção federal, não se
pode inferir, da abstenção presidencial quanto à concretização dessa medida, qualquer situação de
lesão jurídica passível de correção pela via do mandado de segurança.” (MS 21.041, Rel. Min.
Celso de Mello, julgamento em 12-6-1991, Plenário, DJ de 13-3-1992.)

“Intervenção federal. Inexistência de atuação dolosa por parte do Estado. Indeferimento.


Precedentes. Decisão agravada que se encontra em consonância com a orientação desta Corte, no
sentido de que o descumprimento voluntário e intencional de decisão judicial transitada em julgado
é pressuposto indispensável ao acolhimento do pedido de intervenção federal.” (IF 5.050-AgR, Rel.
Min. Presidente Ellen Gracie, julgamento em 6-3-2008, Plenário, DJE de 25-4-2008.)
175

No mesmo sentido: IF 4.979-AgR, Rel. Min. Presidente Ellen Gracie, julgamento em 6-3-2008,
Plenário, DJE de 25-4-2008.)

Precatórios judiciais. Não configuração de atuação dolosa e deliberada do Estado de São Paulo com
finalidade de não pagamento. Estado sujeito a quadro de múltiplas obrigações de idêntica
hierarquia. Necessidade de garantir eficácia a outras normas constitucionais, como, por exemplo, a
continuidade de prestação de serviços públicos. A intervenção, como medida extrema, deve atender
à máxima da proporcionalidade. Adoção da chamada relação de precedência condicionada entre
princípios constitucionais concorrentes.” (IF 298, Rel. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, julgamento em
3-2-2003, Plenário, DJ de 27-2-2004.) No mesmo sentido: IF 5.101, IF 5.105, IF 5.106, IF 5.114,
rel. min. Cezar Peluso, julgamento em 28-3-2012, Plenário, DJE de 6-9-2012.

"Representação do procurador-geral da República. Distrito Federal. Alegação da existência de largo


esquema de corrupção. Envolvimento do ex-governador, deputados distritais e suplentes.
Comprometimento das funções governamentais no âmbito dos Poderes Executivo e Legislativo.
Fatos graves objeto de inquérito em curso no STJ. Ofensa aos princípios inscritos no art. 34, VII, a,
da CF. (...) Enquanto medida extrema e excepcional, tendente a repor estado de coisas
desestruturado por atos atentatórios à ordem definida por princípios constitucionais de extrema
relevância, não se decreta intervenção federal quando tal ordem já tenha sido restabelecida por
providências eficazes das autoridades competentes." (IF 5.179, Rel. Min. Presidente Cezar Peluso,
julgamento em 30-6-2010, Plenário, DJE de 8-10-2010.)
176

17. SEGURANÇA PÚBLICA. A ORDEM TRIBUTÁRIA, ECONÔMICA E FINANCEIRA.


DIREITOS HUMANOS. TRATADOS INTERNACIONAIS. PREÂMBULO E ATO DAS
DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS.
AUTORA: MARIA APARECIDA ESTEVES AVILES.
MATERIAIS DE CONSULTA: DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO – PEDRO LENZA (2013); MATERIAL DA
PROFESSORA E DEFENSORA PÚBLICA DO RJ PATRÍCIA MAGNO (2014) E ARTIGO DA FLÁVIA PIOVESAN “TRATADOS
INTERNACIONAIS DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS: JURISPRUDÊNCIA DO STF”.

17.1. Qual é o objetivo fundamental da segurança pública?


De acordo com o caput, do artigo 144 da CRFB, o objetivo fundamental da segurança pública,
dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio.

17.2. O que é a Força Nacional de Segurança Pública?


De acordo com a Lei 11.473/2007, a União poderá firmar convênio com os Estados-membros e o
DF para executar atividades e serviços imprescindíveis à preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio.
Referida cooperação federativa compreende operações conjuntas, transferência de recursos e
desenvolvimento de atividades de capacitação e qualificação de profissionais, no âmbito da Força
Nacional de Segurança Pública, sendo que as atividades terão caráter consensual e serão
desenvolvidas sob a coordenação conjunta da União e do ente federativo que firmar o convênio.
Nessa linha de medidas, o Decreto 5.289/2004, disciplinando a organização e o funcionamento da
Administração Pública federal, desenvolveu um programa de cooperação federativa denominado
Força Nacional de Segurança Pública, em atenção ao princípio da solidariedade federativa.
Inspirada nas forças de paz da Organização das Nações Unidas (ONU), a Força Nacional de
Segurança Pública foi criada pelo governo federal para apoiar os estados em momentos de crise.

17.3. Qual a diferença entre polícia administrativa e polícia judiciária?


A atividade policial se divide em duas grandes áreas:
A) Polícia administrativa (polícia preventiva, ou ostensiva), que atua preventivamente, evitando
que o crime aconteça, e
B) Polícia judiciária (de investigação), a qual atua repressivamente, depois de ocorrido o ilícito
penal.
177

17.4. Quais órgãos compõem a polícia no âmbito federal? E no estadual?


A polícia administrativa é composta, no âmbito federal, pelos seguintes órgãos: polícia federal,
polícia rodoviária federal e polícia ferroviária federal.
Já no âmbito estadual, a polícia administrativa compõe-se de: polícia militar e corpo de bombeiros,
organizados e mantidos pelos Estados (ao contrário da regra fixada para o Distrito Federal, que são
organizados e mantidos pela União – artigo 21, XIV).
Quanto à polícia judiciária, o órgão federal é a polícia federal e o órgão estadual é a polícia civil.

17.5. Nos Municípios em que o Departamento de Polícia Civil não contar com servidor de
carreira para o desempenho das funções de delegado de polícia de carreira, o atendimento nas
delegacias de polícia poderá ser realizado por subtenente ou sargento da polícia militar?
O STF entendeu que a polícia de investigação só pode ser exercida pela polícia civil, e não pela PM,
sob pena de se caracterizar desvio de função e ofensa ao artigo 144, caput, IV e V e §§ 4º e 5º da
CRFB. (ADI 3.614)

17.6. Os policiais civis e militares possuem direito de greve?


Nos termos do artigo 142, §3º, IV da CRFB, ao militar é proibida a greve.
Assim, os membros das Forças Armadas (Marinha, Exército e Aeronáutica), bem como os militares
dos Estados, do DF e dos Territórios (membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros
Militares – artigo 42, §1º, que determina a aplicação do artigo 142, §3º) estão proibidos de exercer o
direito de greve, o que comprova que referido direito fundamental não é absoluto.
No que toca aos integrantes da polícia civil, em tese, por serem servidores públicos (e não
militares), teriam o direito de greve, aplicando-se o artigo 37, VII, especialmente diante das
decisões proferidas pelo STF nos MIs 670, 708 e 712 que, adotando a posição concretista geral,
assegurou o direito de greve a todos os servidores públicos, determinando a aplicação da lei do setor
privado, qual seja, a Lei 7.783/89, até que a matéria seja regulamentada por lei própria.
Contudo, entendeu o STF que alguns serviços públicos, em razão de sua essencialidade para a
sociedade, deverão ser prestados em sua totalidade, como é o caso do serviço de segurança pública,
determinando, por analogia, a aplicação da vedação para os militares e, assim, proibindo o seu
exercício pelas polícias civis. (Rcl 6.568, Rel. Min. Eros Grau. DJE de 25.09.2009)

17.7. Cite quatro exemplos de limitações constitucionais ao poder de tributar da União, dos
Estados, do DF e dos Municípios.
Há no artigo 150 da CRFB diversas limitações, dentre elas: a vedação à exigência ou ao aumento de
tributo sem lei que o estabeleça; a vedação à instituição de tratamento desigual entre contribuintes
que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação
profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos
rendimentos, títulos ou direitos; a vedação à cobrança de tributos em relação a fatos geradores
178

ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado; a vedação à
utilização do tributo com efeito de confisco.

17.8. Qual é a natureza jurídica das limitações constitucionais ao poder de tributar?


De acordo com o caput, do artigo 150 da CRFB, são garantias do contribuinte.

17.9. Cite dois impostos de competência para a instituição de cada ente federativo.
Além de outros previstos no artigo 153 da CRFB, compete à União instituir impostos sobre: renda e
proventos de qualquer natureza e propriedade territorial rural.
Segundo o artigo 155, compete aos Estados e ao DF instituir impostos sobre a transmissão causa
mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos, e propriedade de veículos automotores.
Por sua vez, o artigo 156 estabelece que compete aos Municípios instituir impostos sobre
propriedade predial e territorial urbana e transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso,
de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de
garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição.

17.10. O que representa a proibição constitucional do confisco em matéria tributária?


Nada mais representa senão a interdição, pela Carta Política, de qualquer pretensão governamental
que possa conduzir, no campo da fiscalidade, à injusta apropriação estatal, no todo ou em parte, do
patrimônio ou dos rendimentos dos contribuintes, comprometendo-lhes, pela insuportabilidade da
carga tributária, o exercício do direito a uma existência digna, a prática de atividade profissional
lícita ou de regular satisfação de suas necessidades vitais (educação, saúde, habitação, etc.).

17.11. Tratando-se de inadimplemento pelo contribuinte de obrigação tributária, é possível


que uma norma estipule multa fiscal de 300%?
Segundo decisão do STF no RE 455.017, julgado em 2009 e relatado pela Ministra Carmen Lúcia,
ofende o princípio da não confiscatoriedade hipótese normativa que estipule multa fiscal de 300%,
ainda que se trate de inadimplemento pelo contribuinte de obrigação tributária.

17.12. Pode o STF, em sede de controle normativo abstrato, examinar se determinado tributo
ofende o princípio constitucional da não confiscatoriedade?
A jurisprudência do STF entende cabível, em sede de controle normativo abstrato, a possibilidade
de a Corte examinar se determinado tributo ofende ou não o princípio constitucional da não
confiscatoriedade, consagrado no artigo 150, IV, da CRFB. Precedente: ADI 2.010-MC/DF, Relator
Min. Celso de Mello.
179

17.13. Discorra a respeito da tributação como meio de efetivação dos direitos fundamentais.
A tributação é um importantíssimo instrumento de viabilização de políticas públicas. Isso porque o
tributo é a principal fonte de financiamento do Estado, mormente para a implementação de políticas
públicas, que visam ao atendimento dos direitos fundamentais de liberdade e sociais, no que tange
ao mínimo existencial.
Indubitavelmente, há uma vinculação entre a atividade tributária e os direitos fundamentais, na qual
a proteção desses direitos é fator essencial para a solidificação de um Estado verdadeiramente
democrático. Nesta visão contemporânea, a tributação existe como forma de realização de justiça
social, com o propósito de se alcançar uma vida digna para todos.
Para a efetivação dos direitos fundamentais, torna-se absolutamente relevante a observância de que,
para que haja uma sociedade de livres e iguais, um determinado nível de direitos fundamentais,
sejam os clássicos direitos e liberdades, sejam os mais modernos direitos sociais, não podem deixar
de ter custos compatíveis com essa liberdade. Assim, o dever de pagar tributos é correspectivo à
liberdade e aos direitos fundamentais.

17.14. Disserte sobre a evolução do Estado e a ordem econômica.


Partindo da ideia de Estado de Direito, podemos identificar, segundo a doutrina, uma tríplice
vertente: liberal, social e pós-social.
No Estado Liberal, percebe-se uma evidenciação do indivíduo, delineando-se um Estado não
intervencionista, dentro da perspectiva de “intervenção mínima”, considerando a liberdade
contratual um direito natural do indivíduo.
Diante das novas necessidades sociais, surge a teorização do Estado Social, evidenciando-se o
grupo e colocando a questão social como preocupação principal do Estado.
Norberto Bobbio assevera que a proteção dos direitos sociais requer uma atuação estatal, de forma
ativa, diferente da solicitada (ou não solicitada) durante o Estado Liberal, produzindo tal
organização dos serviços públicos, que teria sido a responsável pelo surgimento do próprio Estado
Social.
Finalmente, o Estado Pós-Social (seguindo a classificação proposta por C. F. Campilongo), cujos
atores sociais evidenciados são os novos movimentos sociais, sem, contudo, é claro, como pondera
o autor, “... eliminar os problemas interindividuais nem ignorar a relevância da conflituosidade de
classes...”.
Partindo-se dessa brevíssima evolução, em um primeiro momento, pode-se afirmar que os institutos
clássicos do direito de propriedade e a autonomia da vontade privada eram suficientes para
regulamentar a atividade econômica, até porque o capitalismo primitivo pregava a autorregulação,
sem qualquer interferência do Estado na economia.
A partir do século XX, contudo, a situação começa a ser repensada, especialmente diante das
constantes situações de abuso do poder econômico. Surge, então, um ambiente propício para a
constitucionalização da economia. Nesse sentido, o artigo 170, caput da CRFB estabelece que a
ordem econômica, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça
social, funda-se em dois grandes pilares: valorização do trabalho humano e livre iniciativa.
180

17.15. Quais são os meios de atuação do Estado na ordem econômica?


O Estado pode interferir na ordem econômica de modo direto ou indireto. Quando se fala em
atuação direta, o próprio Estado atua na economia de um país, seja em regime de monopólio, seja de
participação com as empresas do setor privado.
Por sua vez, quando se identifica a atuação indireta, o Estado busca fazer prevalecer o princípio da
livre concorrência e evitar abusos, como os decorrentes de carteis, dumping, etc.

17.16. Quais são os princípios da ordem econômica?


De acordo com os incisos I a IX do artigo 170 da CRFB, são: soberania nacional; propriedade
privada; função social da propriedade; livre concorrência; defesa do consumidor; defesa do meio
ambiente; redução das desigualdades regionais e sociais; busca do pleno emprego e tratamento
favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua
sede e administração no País.

17.17. Discorra sobre as normas orçamentárias e o entendimento do STF sobre a matéria,


abordando os seguintes pontos:
A) cabimento de ação direta de inconstitucionalidade que tenha por objeto normas
orçamentárias e correspondente fundamentação;
O STF, há algum tempo, entendia pela impossibilidade de ser ajuizada ADI contra lei orçamentária,
pois esta seria uma lei de efeitos concretos. Logo, não se revestiria de generalidade e abstração.
Porém, o STF vem admitindo ADI contra leis de efeitos concretos, especialmente quando elas
tratarem de algum tema abstrato constitucionalmente controvertido.

B) cabimento da redução, pelo chefe do Poder Executivo, do valor da proposta orçamentária


da Defensoria Pública e correspondente fundamentação.
É indevida a redução feita unilateral e diretamente pelo chefe do Poder executivo, pois a proposta
orçamentária feita pela Defensoria Pública deveria ser encaminhada à análise da Assembleia
legislativa, visto ser o Poder Legislativo o competente para proceder a possíveis alterações em tal
proposta orçamentária.
Em razão da autonomia orçamentária da Defensoria Pública, prevista expressamente no artigo 134,
§2º da CRFB, esta instituição poderá elaborar sua proposta orçamentária dentro dos limites
estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias, sendo ilícita a conduta do Chefe do poder
Executivo de alterar a proposta, especialmente quando a mesma se encontrar de acordo com a Lei
de diretrizes orçamentárias.

17.18. O que é política de desenvolvimento urbano?


Nos termos do caput, do artigo 182 da CRFB, a política de desenvolvimento urbano, executada pela
Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o
pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.
181

Nesse sentido, o plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais
de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão
urbana.

17.19. Quando a propriedade urbana cumpre sua função social? Quais são as consequências
do seu não atendimento?
A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de
ordenação da cidade expressas no plano diretor.
Dessa forma, estabelece a CRFB, no §4º, do artigo 182 que é facultado ao Poder Público municipal,
mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do
proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado
aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:
I – parcelamento ou edificação compulsórios,
II – imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo,
III – desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente
aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e
sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

17.20. Quais são os requisitos da usucapião especial urbana?


Estão previstos no artigo 183 da CRFB:
Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados,
por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua
família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a
ambos, independentemente do estado civil.
§ 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.
§ 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

17.21. Discorra acerca da desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária.
Segundo o artigo 184 da CRFB, compete à União referida desapropriação, de imóvel rural que não
esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida
agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir
do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.
182

17.22. Quando a propriedade rural atende à sua função social?


Conforme estabelece o artigo 186 da CRFB, a função social é cumprida quando a propriedade rural
atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes
requisitos: I - aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais
disponíveis e preservação do meio ambiente; III - observância das disposições que regulam as
relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos
trabalhadores.

17.23. Quais são os requisitos da usucapião especial rural?


São aqueles previstos no artigo 191 da CRFB:
Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por
cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a cinquenta
hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia,
adquirir-lhe-á a propriedade.
Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

17.24. Qual é o conceito de direitos humanos?


Os direitos humanos são o conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico,
concretizam as exigências de dignidade, liberdade e igualdade humanas, as quais devem ser
reconhecidas positivamente pelos ordenamentos jurídicos em nível nacional e internacional.
Assim, os direitos humanos são reconhecidos em documentos internacionais e, quando entram no
ordenamento jurídico brasileiro, passam a ser considerados direitos fundamentais.

17.25. Quais são as fontes dos direitos humanos?


Tratados internacionais (=Convenção, =Pacto, que já nascem com força coercitiva, ius cogens);
Declarações (=carta de intenções, promessa de comportamento futuro, soft law); costume (que, no
direito internacional, vincula; é norma cogente).
OBS: A Declaração Universal de Direitos Humanos e a Declaração Americana de Direitos
Humanos são consideradas costumes. Logo, normas cogentes); princípios gerais do direito
internacional (os mais importantes têm força cogente).
183

17.26. Quais são e em que consistem os princípios informadores do direito internacional dos
direitos humanos?
a) Princípio da interpretação pro homine ou pro persona: impõe a necessidade de que a
interpretação normativa seja feita sempre em prol da proteção dada aos indivíduos.
b) Princípio da máxima efetividade (effet utile): assegura às disposições convencionais seus
efeitos próprios, evitando-se que sejam consideradas meramente programáticas:
b.1) Princípio da interpretação autônoma: preconiza a possibilidade de que os conceitos
e termos inseridos nos tratados de direitos humanos possuam sentidos próprios, distintos
dos sentidos a eles atribuídos pelo direito interno, para dotar de maior efetividade os
textos internacionais de direitos humanos e
b.2) Princípio da interpretação evolutiva dos tratados de direitos humanos: reconhece
que o instrumento internacional de direitos humanos deve ser interpretado de acordo
com o sistema jurídico do momento de sua aplicação.

c) Princípio da primazia da norma mais favorável ao indivíduo: assevera que nenhuma norma
de direitos humanos pode ser invocada para limitar, de qualquer modo, o exercício de
qualquer direito ou liberdade já reconhecida por outra norma internacional ou nacional.

17.27. Disserte sobre a “teoria da margem de apreciação”, abordando se a sua acolhida pela
Corte Interamericana contribuiria para o fortalecimento ou o enfraquecimento dos direitos
humanos.
Esta teoria é utilizada na Corte europeia, quando ela se autolimita de seu poder jurisdicional no
campo dos direitos humanos, deixando certas questões para o próprio Estado resolver.
Referida teoria é um verdadeiro disfarce teórico para o relativismo no campo dos direitos humanos.
Tendo em vista que a teoria contribui para o enfraquecimento dos direitos humanos, deve-se rebatê-
la e afastar a sua aplicação na Corte Interamericana.

17.28. Como se dividem as Cortes Internacionais de direitos humanos?


Há um sistema global, em que não existe Corte de DH, formado pela Corte Internacional de Justiça
(possui um papel secundário na proteção de DH), pelo Tribunal Penal Internacional (é tribunal de
DH, mas tem competência ratione materiae específica para crimes) e pelo Tribunal ad hoc para Ex
Iugoslávia, Ruanda (também é tribunal penal).
Ademais, há os sistemas regionais: Corte Interamericana de DH, Corte Europeia de DH e Corte
Africana de DH.
184

17.29. O Tribunal Penal Internacional pode ser considerado um tribunal internacional de


direitos humanos?
Sim, sendo certo que as regras constantes no Estatuto de Roma evidenciam a preocupação da
comunidade internacional em evitar que a impunidade dos agentes responsáveis pelas condutas lá
tipificadas possa servir de estímulo a novas violações.
Assim, não podemos reduzir o Estatuto de Roma a um conjunto de regras instituidoras de uma
Corte internacional permanente.
Pelo contrário, desde o seu preâmbulo, o Estatuto faz menção a uma missão de proteção às vítimas
de graves atrocidades, que têm o direito a exigir justiça, sendo certo que os crimes elencados no
Estatuto protegem bem jurídicos considerados, por seu turno, direitos humanos mencionados em
diversos textos internacionais.

17.30. Como são chamados os crimes de competência do TPI?


Os crimes de competência do Tribunal Penal Internacional são crimes de jus cogens, chamados de
crimes contra a humanidade ou crimes de lesa-humanidade.
São aqueles que afetam valores essenciais da comunidade internacional, como os crimes de
agressão, os crimes contra a humanidade, os crimes de guerra e o crime de genocídio.

17.31. Cite as características dos DH.


Universalidade, nos planos da: titularidade, temporalidade e da culturalidade. Lembrar que, em vez
de relativismo cultural, o entendimento moderno é pelo interculturalismo.
Indivisibilidade: 1ª faceta) o direito protegido possui uma unidade incindível em si. 2ª faceta) não é
possível proteger apenas alguns dos DH. Por isso, deve-se afastar a ideia de separação dos direitos
em gerações e sustentar a proteção dos DH de forma conjunta.
Interdependência: e não independência.

17.32. O que seria a doutrina da quarta instância?


É a tese defensiva e utilizada pelos Estados que são acionados no Sistema Interamericano de DH, a
qual deve ser combatida. Isso porque a jurisdição internacional é sempre complementar à jurisdição
interna, havendo uma separação entre as esferas do controle de constitucionalidade e o de
convencionalidade.
Nesse sentido, o controle de constitucionalidade é feito pelos órgãos judiciais internos, que
analisam a compatibilidade da norma com a Constituição nacional, tendo o STF, no Brasil, a última
palavra nele.
Já no controle de convencionalidade a última palavra é da Corte Interamericana de DH. Nele não se
pretende a revisão das sentenças internas (logo, não há uma quarta instância), e sim o
pronunciamento da Corte quanto à compatibilidade dos atos estatais (dentre os quais se incluem os
judiciais) com a Convenção Americana de DH.
185

17.33. Quais são as espécies do controle de convencionalidade?


Em verdade, o controle de convencionalidade pode se dividir em duas subcategorias ou espécies,
quais sejam, o controle de convencionalidade de matriz internacional, também denominado de
“autêntico ou definitivo”, atribuído a organismos judiciais internacionais, e o controle de matriz
nacional, “provisório ou preliminar”, incumbido tanto ao STF (modalidade concentrada), como aos
demais juízes e tribunais internos (modalidade difusa).

17.34. Acerca dos procedimentos cabíveis em caso de violação de direitos humanos no sistema
interamericano, responda:
A. Qual a legitimidade ativa e passiva para submissão de violações de direitos?
Qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou entidade não governamental legalmente reconhecida em
um ou mais Estados-membros da OEA, ou mesmo um Estado-parte (comunicação interestatal)
possuem legitimidade ativa para apresentar à Comissão Interamericana de Direitos Humanos
petições que contenham denúncias ou queixas de violação à Convenção Americana de Direitos
Humanos por um Estado-parte.
Logo, a Defensoria Pública não possui legitimidade ativa, mas o defensor público pode atuar, na
representação da vítima, a qual possui a legitimidade ativa.
Já a legitimidade passiva é do Estado-parte da OEA (ex: Brasil), e nunca do ente federativo (União,
Estados, DF e Municípios, pois estes não têm personalidade jurídica externa, apenas interna).

B. Como funciona o trâmite de um procedimento na Comissão Interamericana?


Admitindo uma petição ou uma comunicação, a Comissão solicitará informações ao governo do
Estado acusado de violar a Convenção, as quais deverão ser prestadas num prazo razoável.
Recebidas as informações ou transcorrido o prazo em in albis, a Comissão analisará se subsistem os
motivos da acusação. Não subsistindo, será arquivada.
Não sendo caso de arquivamento, a Comissão procederá ao exame do caso, podendo promover uma
investigação in locu, se entender necessário. Lembrando que o Brasil, ao depositar a Convenção, fez
um reserva no sentido de que a Comissão só pode realizar visitas e inspeções in locu mediante
anuência expressa do Estado brasileiro.
Ocorrendo uma solução amistosa, a Comissão redigirá um relatório, com uma breve exposição dos
fatos e a solução adotada. Esse relatório será enviado ao autor da petição, aos Estados-parte na
Convenção e ao Secretário-Geral da OEA.
Não sendo alcançada uma solução amistosa, a Comissão recomendará ao Estado adotar as medidas
necessárias para remediar a situação, com um prazo para cumprimento.
Transcorrido esse prazo, a Comissão decidirá pelo voto da maioria absoluta de seus membros, se o
Estado tomou ou não as medidas adequadas, se publica ou não o relatório e se submete o caso à
Corte Interamericana de DH ou não.
186

C. Quais os requisitos de admissibilidade de uma petição ou comunicação pela Comissão


Interamericana de Direitos Humanos?
O artigo 46 da Convenção traz os requisitos de admissibilidade das petições e comunicações e, para
que sejam admitidas pela Comissão, é necessário o seguinte:
1. Devem ter sido interpostos e esgotados os recursos de jurisdição interna, salvo se: no âmbito
interno do Estado não existir mecanismo adequado para a proteção do direito; quando existir o
mecanismo, mas ao prejudicado não for possível o acesso a ele e quando houver demora
injustificada na decisão sobre os recursos internos interpostos.
2. A petição ou comunicação seja apresentada à Comissão dentro do prazo de 6 (seis) meses a partir
da data em que o prejudicado tenha sido notificado da decisão definitiva.
3. A matéria não esteja sendo objeto de outro processo de solução internacional (“impossibilidade
de litispendência internacional”).
4. A petição não pode ser anônima, devendo conter toda a qualificação da pessoa ou entidade que a
propõe.

D. Como é apresentado um caso perante a Corte interamericana de DH?


De acordo com a Convenção Americana, só os Estados-Partes e a Comissão têm direito a submeter
um caso à decisão da Corte. Em consequência, o Tribunal não pode atender petições formuladas por
indivíduos ou organizações, os quais devem encaminhar suas petições à Comissão interamericana
de DH.

17.35. Discorra sobre os papeis dos órgãos competentes para conhecer dos assuntos
relacionados com o cumprimento dos compromissos assumidos pelos Estados-Partes na
Convenção Americana de DH.
O Sistema Regional Interamericano de Direitos Humanos tem como documento jurídico mais
importante a Convenção Americana de Direitos Humanos (também conhecida como Pacto de San
José da Costa Rica). Esse tratado elenca os direitos humanos a serem protegidos pelo sistema e os
órgãos (Comissão e Corte Interamericanas de Direitos Humanos) competentes para monitorar e
assegurar a implementação desses direitos.
Cabe ressaltar que os direitos arrolados na Convenção têm caráter de direitos civis e políticos, tais
como o direito à personalidade jurídica, à vida, de não ser submetido à escravidão, à liberdade,
direitos processuais em geral, etc.
Quanto aos direitos culturais, sociais e econômicos, há apenas a determinação para que os estados
membros alcancem progressivamente a plena realização desses direitos. Naturalmente, o consenso a
respeito da garantia de direitos de prestação é mais difícil de se conseguir.
A comissão interamericana é composta por sete membros de “alta autoridade moral e reconhecido
saber em matéria de direitos humanos” e sua competência alcança todos os Estados signatários da
Convenção com relação aos direitos nela elencados. À comissão compete promover a observância e
a proteção dos direitos humanos na América.
187

No exercício dessa competência, a comissão pode fazer recomendações aos estados signatários,
indicar medidas a serem adotadas na proteção desses direitos, preparar relatórios, solicitar aos
governos informações e submeter um relatório anual à Assembleia Geral da OEA.
Já a Corte Interamericana, órgão consultivo e jurisdicional do sistema, é composta por sete juízes
nacionais dos estados membros da OEA, eleitos pelos países que fazem parte da Convenção. Sobre
a competência jurisdicional da Corte Interamericana de Justiça, Piovesan assevera: “a decisão da
Corte tem força vinculante e obrigatória, cabendo ao Estado seu imediato cumprimento. Se a Corte
fixar uma compensação à vítima, a decisão valerá como título executivo, em conformidade com os
procedimentos internos relativos à execução de sentença desfavorável ao Estado”.
Porém, tanto a Comissão quanto a Corte só exercerão plenamente os seus misteres perante os
Estados-parte da Convenção, se estes aderirem à cláusula facultativa de reconhecimento e aceitação
da competência desses órgãos do sistema, o que é duramente criticado pela doutrina.

17.36. O que é a figura do defensor interamericano?


É uma pessoa ou grupo de pessoas designadas de ofício por parte do Tribunal em casos em que as
supostas vítimas não têm representação legal devidamente acreditada.
Essa figura surge, pois a Corte acredita que para a eficaz defesa dos direitos humanos e a
consolidação do Estado de Direito é necessário que se assegure a todas as pessoas as condições
indispensáveis para que possam acessar à justiça, tanto nacional como internacional, a fim de que
façam valer efetivamente seus direitos e liberdades.

17.37. A respeito das violações de direitos humanos ocorridas no período da ditadura militar
no Brasil, disserte acerca da Lei de Anistia brasileira, mencionando o entendimento da Corte
Interamericana de Direitos Humanos sobre as leis de anistia, bem como o entendimento do
Supremo Tribunal Federal sobre o tema. Ao responder, cite precedente julgado pela Corte
Interamericana de Direitos Humanos que enfrentou o assunto.
Anistia é o esquecimento de determinado crime, o que acarreta a extinção da punibilidade em
relação ao fato criminoso. É um fenômeno objetivo, que incide sobre os fatos e não sobre pessoas.
A Lei federal nº 6.683/79 concedeu, de maneira ampla e objetiva, anistia política a todos aqueles
que cometeram crimes políticos e conexos a eles no Brasil entre 02 de setembro de 1961 e 15 de
agosto de 1979.
Em virtude dessa lei, o Estado brasileiro não investigou, processou ou sancionou penalmente os
responsáveis pelas violações de direitos humanos cometidas durante o regime militar, inclusive as
situações denunciadas no caso GOMES LUND, analisado pela Corte Interamericana de DH.
Na ADPF 153, o STF, analisando a lei da anistia à luz da CF/88, considerou-a válida. Importante
salientar que não houve qualquer discussão acerca do direito à verdade histórica e à reparação civil,
tendo sido uma análise estritamente penal, não repercutindo no plano civil.
Ademais, os Ministros que votaram a favor da lei da anistia deixaram claro que não eram a favor da
tortura, sequestro, homicídios e outros abusos cometidos durante o período militar; apenas
analisaram o objeto da ADPF.
188

A despeito do entendimento do STF, a Corte IDH, no julgamento do Caso Gomes Lund (Guerrilha
do Araguaia), certamente o caso mais importante envolvendo o Brasil, responsabilizou o Estado
brasileiro pela não apuração da violação de direitos humanos decorrente de detenção arbitrária,
tortura e desaparecimento forçado de 70 pessoas resultantes de operações do Exército Brasileiro
empreendidas entre 1972 e 1975 com o objetivo de erradicar a Guerrilha do Araguaia.
Em linhas gerais, a sentença da Corte estabeleceu que:
a) As disposições da Lei da Anistia brasileira que impedem a investigação de graves violações de
direitos humanos são incompatíveis com a Convenção Americana;
b) O Estado brasileiro é responsável pelo desaparecimento forçado e, portanto, pela violação dos
direitos ao reconhecimento da personalidade jurídica, à vida, à integridade pessoal e à liberdade
individual;
c) O Estado brasileiro deve realizar todos os esforços para determinar o paradeiro das vítimas
desaparecidas e, se for o caso, identificar e entregar os restos mortais a seus familiares;
d) O Estado deve adotar, em um prazo razoável, as medidas que sejam necessárias para tipificar o
delito de desaparecimento forçado de pessoas;
e) O Estado deve indenizar as famílias das vítimas;
f) O Estado deve oferecer o tratamento médico e psicológico ou psiquiátrico para as vítimas que
requeiram, dentre outras.

17.38. Rodrigo Uprimny, perito, afirmou durante a audiência do caso Gomes Lund x Brasil,
na Corte IDH, que “o Brasil é uma democracia, mas ainda não é um Estado de Direito (...) No
Brasil foi realizada transição sem justiça transicional”. Nesse contexto, em que consiste a
Justiça transicional?
A justiça de transição consiste no conjunto de esforços, abordagens, mecanismos (judiciais e
extrajudiciais) e estratégias adotado pelas sociedades que saem de ditaduras ou guerras, para:
enfrentar o legado de violência em massa ocorrido no passado, atribuir responsabilidades, exigir a
efetividade do direito à memória e à verdade, fortalecer as instituições com os valores democráticos,
garantir a não repetição das atrocidades e reparar os direitos das vítimas das graves violações de
direitos humanos.
A justiça de transição pode ser efetivada pelos Estados por variadas formas, sendo as mais
aplicadas: adoção de medidas para prevenção de violação a direitos humanos, mecanismos e
instrumentos para elucidação de casos de violência a direitos humanos, aparato legal para punição
dos agentes violadores e garantia de reparação material e simbólica às vítimas de violência.
Como resposta brasileira a decisões da Corte Interamericana que efetivavam o direito à memória e à
informação, foi instituída a Comissão da Verdade, por meio da Lei 12.528/11, e ainda aprovada a
Lei 12.527/11, que garante o direito à informação, sendo a publicidade a regra e o sigilo a exceção.
Esses passos demonstram o avanço e o fortalecimento da democracia e dos direitos humanos no
Brasil.
189

17.39. No tocante à justiça transicional, qual é o papel da Defensoria Pública brasileira?


Defesa dos militares nos processos criminais que punirão os abusos; atuação como assistente de
acusação; ações declaratórias impulsionadas pelos familiares das vítimas para obter a verdade;
atuação perante as Comissões da verdade criadas pelo Executivo; assessoramento das vítimas;
difusão e educação em direitos humanos, que demanda atuação em rede com os movimentos de
DH, nos conselhos nacionais e regionais, nas escolas, etc.

17.40. Discorra sobre a importância da implantação da “audiência de custódia” no


ordenamento jurídico pátrio.
O Conselho Nacional de Justiça, o Tribunal de Justiça de São Paulo e o Ministério da Justiça
lançaram, em 06 de Fevereiro de 2015, o Projeto Audiência de Custódia, que prevê a apresentação
do autuado em flagrante perante o juiz, no prazo de 24 horas, para análise da legalidade, da
necessidade da prisão e das condições físicas do preso. Tal projeto encontra previsão no art. 7º, item
5 do Pacto de San José da Costa Rica.
Com isso, a implantação da audiência de custódia no direito brasileiro colaborará para uma análise
mais qualificada da legalidade e da necessidade da prisão preventiva, inibindo a prática de tortura e
maus tratos contra pessoas presas e podendo diminuir, consideravelmente, a superlotação carcerária
que aumenta o ciclo de violência no país.
Oportuno ressaltar que atualmente a Lei Processual Penal Nacional apenas prevê a obrigação de
comunicação imediata à família, ao juiz, ao Ministério Público ou outra pessoa indicada, da prisão
efetivada, sendo que o auto de prisão em flagrante deverá ser remetido em até 24 horas para o juiz
(art. 306, CPP).
Essa previsão normativa tem se mostrado insuficiente para o controle das prisões cautelares
realizadas, sendo certo que a implantação da audiência de custódia representará significativo avanço
na efetivação dos direitos fundamentais constantes no art. 5º, LXV e LXVI da CF, pois no modelo
atual o primeiro encontro entre o preso e o magistrado geralmente ocorre apenas na audiência de
instrução e julgamento, que ocorrerá meses, ou mesmo anos, depois da prisão em flagrante.

17.41. Discorra sobre as eficácias direta, interpretativa e negativa do princípio da dignidade


da pessoa humana.
Consoante classificação trazida por Ana Paula de Barcellos, as normas constitucionais classificam-
se em normas de eficácia positiva (ou direta), negativa e interpretativa. Como norma constitucional
que é, a dignidade da pessoa humana pode ser vista sob cada um desses três prismas.
A eficácia direta é aquela que permite reconhecer, na norma, um direito subjetivo. Desta feita, a
dignidade da pessoa humana é um direito invocável por seu titular, protegido contra eventuais
lesões ou ameaças de lesões por parte de pessoas privadas ou mesmo do poder público.
A eficácia interpretativa exige a interpretação do ordenamento com base na norma constitucional.
Assim, a dignidade da pessoa humana irradia seus efeitos (eficácia irradiante dos direitos
fundamentais) perante todo o ordenamento, influenciando a atividade do intérprete em sua missão.
190

Por fim, a eficácia negativa tem como função invalidar normas ou atos normativos contrários à
dignidade da pessoa humana. Isso fundamenta o controle de constitucionalidade e serve como
baliza à discricionariedade do executor e do legislador, que não podem criar espécies normativas
em descompasso com o ordenamento constitucional e o postulado aqui exposto.

17.42. O que são os Princípios de Yogyakarta?


Em novembro de 2006, em Yogyakarta, Indonésia, foi realizada conferência organizada por uma
coalizão de organismos internacionais coordenada pela Comissão Internacional de Juristas e o
Serviço Internacional de Direitos Humanos. Tal reunião, que contou com especialistas de 29 países,
teve o objetivo de desenvolver um conjunto de princípios jurídicos internacionais sobre a aplicação
da legislação internacional às violações de direitos humanos baseadas na orientação sexual e
identidade de gênero, com intuito de dar mais clareza e coerência às obrigações de direitos humanos
dos Estados no tocante a essa temática. Ao fim dessa conferência, foi aprovada uma carta de
princípios sobre a aplicação da legislação internacional de direitos humanos em relação à orientação
sexual e identidade de gênero, os chamados Princípios de Yogyakarta.
Sendo todos os direitos humanos universais, interdependentes, indivisíveis e interrelacionados, a
orientação sexual e a identidade de gênero se apresentam como essenciais para a dignidade e
humanidade de cada pessoa, não devendo ser motivos de discriminação e abuso.
Por fim, cumpre ressaltar que a carta de Princípios de Yogyakarta já foi adotada e mencionada pelo
STF no emblemático caso de reconhecimento da união estável homoafetiva, pelo direito à busca da
felicidade.

17.43. A Emenda Constitucional 80 de 2014 constitucionalizou a legitimidade da Defensoria


Pública para atuar em demandas coletivas? Caso positivo, é possível que futura Emenda
Constitucional suprima referida legitimação? Fundamente.
A Emenda Constitucional 80 de 2014 fez constar expressamente na Constituição Federal a
capacidade de a Defensoria Pública atuar em demandas coletivas, como, por exemplo, por meio do
ajuizamento de Ações Civis Públicas (Artigo 134 da CF/88).
Antes disso, já havia a previsão na Lei 7.347 (Lei da Ação Civil Pública), em razão da alteração
promovida pela lei 11.448/2007, e, posteriormente, na Lei Complementar 80/94, por força de
alteração promovida pela LC 132 de 2009.
A previsão contida no artigo 134 faz expressa referência ao inciso LXXIV do art. 5º da Constituição
Federal. Trata-se, portanto, de direito fundamental relacionado ao acesso à justiça (LXXIV - o
Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de
recursos).
Pela teoria da proibição de retrocesso, também conhecida como efeito cliket (ou ainda princípio do
não-retrocesso social, expressão usada por Canotilho), os avanços perpetrados pelo legislador no
campo dos direitos sociais e demais direitos prestacionais não podem sofrer retrocesso.
Esse entendimento se coaduna perfeitamente com a teoria liberal dos direitos fundamentais quando
se reconstrói a proibição de retrocesso como proibição de intervenções não justificadas em posições
191

jusfundamentais sociais consolidadas. Restando vedado o retrocesso e verificando-se que a previsão


contida no artigo 134 da Constituição faz parte do avanço perpetrado no âmbito de alcance do
direito fundamental albergado pelo inciso LXXIV, do artigo 5º da Constituição, chega-se à
conclusão de que não é possível que futura Emenda Constitucional suprima a legitimidade da
Defensoria Pública.

17.44. Qual é a natureza jurídica dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos?


A CRFB prevê no §3º do artigo 5º que os tratados e convenções internacionais sobre direitos
humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três
quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.
De acordo com o entendimento do STF, os tratados internacionais que não passarem pelo trâmite
acima terão natureza jurídica de norma supralegal, ou seja, estariam abaixo da Constituição Federal,
mas acima da legislação infraconstitucional.

17.45. Na elaboração de tratados internacionais, a soberania dos Estados torna-se mitigada?


Não. Isso porque a elaboração de tratados, em qualquer tema, inclusive na seara de direitos
humanos, não pode ser vista como amesquinhamento da soberania, mas sim como a sua plena
manifestação, pois a celebração de um tratado é justamente um dos mais importantes exercícios de
soberania por parte do Estado (André de Carvalho Ramos).
Em verdade, a noção tradicional de soberania é revista.
A respeito, destaca-se a afirmação do Secretário Geral das Nações Unidas, no final de 1992: “Ainda
que o respeito pela soberania e integridade do Estado seja uma questão central, é inegável que a
antiga doutrina da soberania exclusiva e absoluta não mais se aplica e que esta soberania jamais foi
absoluta, como era então concebida teoricamente. Uma das maiores exigências intelectuais de nosso
tempo é a de repensar a questão da soberania (...). Enfatizar os direitos dos indivíduos e os direitos
dos povos é uma dimensão da soberania universal, que reside em toda a humanidade e que permite
aos povos um envolvimento legítimo em questões que afetam o mundo como um todo. É um
movimento que, cada vez mais, encontra expressão na gradual expansão do Direito Internacional”.
(BOUTROS-GHALI, Boutros. Empowering the United Nations. Foreign Affairs, v. 89, p. 98-99,
1992/1993, apud HENKIN, Louis, et al, International law: cases and materials, op. cit., p. 18).
Transita-se, assim, de uma concepção “hobbesiana” de soberania, centrada no Estado, para uma
concepção “kantiana” de soberania, centrada na cidadania universal.

17.46. Discorra a respeito do Direito Internacional dos direitos humanos, citando Tratados
Internacionais voltados à proteção de direitos humanos ratificados pelo Brasil.
A partir da aprovação da Declaração Universal de Direitos Humanos, em 1948, e da concepção
contemporânea de direitos humanos por ela introduzida, começa a se desenvolver o Direito
Internacional dos Direitos Humanos, mediante a adoção de inúmeros tratados internacionais
voltados à proteção de direitos fundamentais. Os instrumentos internacionais de proteção refletem,
192

sobretudo, a consciência ética contemporânea compartilhada pelos Estados, na medida em que


invocam o consenso internacional acerca de temas centrais aos direitos humanos.
No que se refere à posição do Brasil em relação ao sistema internacional de proteção dos direitos
humanos, observa-se que somente a partir do processo de democratização do país, deflagrado em
1985, é que o Estado brasileiro passou a ratificar relevantes tratados internacionais de direitos
humanos.
Assim, a partir da Carta de 1988, importantes tratados internacionais de direitos humanos foram
ratificados pelo Brasil. Dentre eles, destaque-se a ratificação: a) da Convenção Interamericana para
Prevenir e Punir a Tortura, em 20 de julho de 1989; b) da Convenção contra a Tortura e outros
Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, em 28 de setembro de 1989; c) da Convenção
sobre os Direitos da Criança, em 24 de setembro de 1990; d) do Pacto Internacional dos Direitos
Civis e Políticos, em 24 de janeiro de 1992; e) do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais, em 24 de janeiro de 1992; f) da Convenção Americana de Direitos Humanos,
em 25 de setembro de 1992; g) da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a
Violência contra a Mulher, em 27 de novembro de 1995; h) do Protocolo à Convenção Americana
referente à Abolição da Pena de Morte, em 13 de agosto de 1996; i) do Protocolo à Convenção
Americana referente aos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de San Salvador), em
21 de agosto de 1996; j) da Convenção Interamericana para Eliminação de todas as formas de
Discriminação contra Pessoas Portadoras de Deficiência, em 15 de agosto de 2001; k) do Estatuto
de Roma, que cria o Tribunal Penal Internacional, em 20 de junho de 2002; l) do Protocolo
Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher,
em 28 de junho de 2002; m) do Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança
sobre o Envolvimento de Crianças em Conflitos Armados, em 27 de janeiro de 2004; n) do
Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança sobre Venda, Prostituição e
Pornografia Infantis, também em 27 de janeiro de 2004; e o) do Protocolo Facultativo à Convenção
contra a Tortura, em 11 de janeiro de 2007.

17.47. Qual é a natureza jurídica do preâmbulo?


Três são as posições adotadas pela doutrina:
a) tese da irrelevância jurídica (STF, ADI 2076-AC): o preâmbulo não se situa no âmbito do
Direito, mas no domínio da política, refletindo posição ideológica do constituinte, sem
relevância jurídica.
b) tese da eficácia plena: tem a mesma eficácia jurídica das normas constitucionais.
c) tese da relevância jurídica indireta: ponto intermediário entre as duas, já que, muito embora
possua características jurídicas da Constituição, não deve ser confundido com as demais
normas jurídicas da Constituição.
193

17.48. É possível a declaração de inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo com base
do preâmbulo?
Como consequência da divergência em relação à natureza jurídica do preâmbulo, há duas correntes.
a) Não (posição majoritária), tendo em vista que ele possui natureza meramente informativa,
consultiva, sendo a sua eficácia política, e não normativa.
b) Sim, considerando a sua força normativa.

17.49. O preâmbulo é norma de reprodução obrigatória na Constituição dos Estados-


membros?
Não. O preâmbulo não constitui norma central da Constituição, de reprodução obrigatória na
Constituição do Estado-membro.
O que acontece é que o preâmbulo contém, de regra, proclamação ou exortação no sentido dos
princípios inscritos na Carta: princípio do Estado democrático de Direito, princípio republicano,
princípio dos direitos e garantias, etc.
Esses princípios sim, inscritos na Constituição, constituem normas centrais de reprodução
obrigatória, “ou que não pode a Constituição do Estado-membro dispor de forma contrária, dado
que, reproduzidos, ou não, na Constituição estadual, incidirão na ordem local”. (ADI 2.076-AC).
Nesse sentido, a invocação de Deus: “sob a proteção de Deus”, contida no preâmbulo da CRFB, não
constitui norma de reprodução obrigatória nas Constituições estaduais e leis orgânicas do DF e dos
Municípios.

17.50. A expressão “sob a proteção de Deus”, contida no preâmbulo da CRFB, enfraquece a


laicidade do Estado brasileiro?
Não. Isso porque, desde o advento da República, existe total separação entre o Estado e a Igreja,
sendo o Brasil um país leigo, laico ou não confessional, não existindo, portanto, qualquer religião
oficial da República Federativa do Brasil.

17.51. Laicidade é sinônimo de laicismo?


Laicidade não se confunde com laicismo. Laicidade significa neutralidade religiosa por parte do
Estado, independência em relação a todas as concepções religiosas, em respeito ao pluralismo
existente em sua sociedade, enquanto laicismo significa uma atitude de intolerância e hostilidade
estatal em relação às religiões.
Portanto, a laicidade é marca da República Federativa do Brasil, e não o laicismo, mostrando-se o
Estado brasileiro indiferente ao conteúdo das ideias religiosas.
Importante destacar que, de acordo com Daniel Sarmento e o Ministro Marco Aurélio (ADPF 54:
anencefalia), Estado laico não significa Estado ateu (ausência de crença religiosa e espiritual), pois
o ateísmo não deixa de ser uma concepção religiosa. O Brasil é um Estado secular tolerante, ou seja,
“o Estado não é religioso, tampouco é ateu. O Estado é simplesmente neutro”.
194

17.52. O artigo 19, I, da CRFB dispõe que “é vedado á União, aos Estados, ao DF e aos
Municípios estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o
funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança,
ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público”. Cite exemplo dessa
colaboração de interesse público.
A decretação de ponto facultativo para os servidores municipais de São Paulo, quando, em 11 de
Maio de 2007, o Papa Bento XVI esteve em São Paulo para celebrar a missa de canonização de Frei
Galvão.

17.53. Qual é a finalidade do ADCT?


Estabelecer regras de transição entre o antigo ordenamento jurídico e o novo, instituído pela
manifestação do poder constituinte originário, providenciando a acomodação e a transição do antigo
para o novo direito edificado.
Segundo Luís Roberto Barroso, “destinam-se as normas dessa natureza a auxiliar na transição de
uma ordem jurídica para outra, procurando neutralizar os efeitos nocivos desse confronto, no tempo,
entre regras de igual hierarquia – Constituição nova versus Constituição velha – e de hierarquia
diversa – Constituição nova versus ordem ordinária preexistente, interligando-se, portanto, nesse
sentido, com o instituto da recepção”.
OBS: Historicamente, algumas constituições, em outros países, não estabeleceram regras de
transição, especialmente quando o novo regime apresentava-se totalmente desvinculado da
organização político-jurídica que até então vigorava, rompendo-se de modo revolucionário. Ex:
Constituição norte-americana de 1787 e a francesa de 1791.

17.54. Como se classificam as disposições do ADCT?


Analisando o seu conteúdo durante o ano inicial de sua vigência, Raul Machado Horta identificou
as seguintes categorias normativas:
a) Normas exauridas: aquelas que já desapareceram, em razão da realização da condição ou do
ato nela previstos, como, por exemplo, os artigos 1º; 4º, §4º; 15, etc.
b) Normas dependentes de legislação e de execução: artigos 10, §1º; 12, §1º; 14, §§1º, 2º e 4º.
c) Normas dotadas de duração temporária expressa: artigo 40, que manteve, por 25 anos, a
partir da promulgação da Constituição, a Zona Franca de Manaus (prazo esse acrescido de
10 anos pela E.C. nº 42/2003, nos termos do artigo 92 do ADCT); artigo 42, também
alterado por Emenda, modificando as regras de transição.
d) Normas de recepção: artigo 34, §5º; artigo 66, etc.
e) Normas sobre benefícios e direitos: artigos 53 e 54, que asseguram direitos. Neste ponto,
cumpre ressaltar que, para Cláudio Pereira de Souza Neto e Daniel Sarmento, determinados
institutos abrangidos no ADCT podem ser considerados cláusulas pétreas “desde que
estejam diretamente relacionados a algum outro limite material ao poder de reforma, dando-
se como exemplo o artigo 68 do ADCT”.
195

f) Normas com prazos constitucionais ultrapassados: nessa classificação, o autor identificou à


época (no primeiro ano de vigência do ADCT), todos os artigos que dependiam de
legislação para sua implementação, como o artigo 29, §1º, que fixava prazo para o
encaminhamento de projeto de lei complementar dispondo sobre a organização e o
funcionamento da AGU, e o artigo 48 do ADCT, que estabelecia prazo para que o
Congresso Nacional elaborasse o Código de defesa do consumidor. Muitos dispositivos,
como os citados, já foram regulamentados.

Por sua vez, Barroso, identificando espécies distintas de disposições transitórias, estabeleceu três
categorias distintas:
a) Disposições transitórias propriamente ditas: são as disposições típicas que regulam de modo
transitório determinadas relações, estando sujeitas à condição resolutiva ou termo. Como
exemplo: artigo 10, §1º e o artigo 23, caput.
b) Disposições de efeitos instantâneos e definitivos: essas disposições não aguardam uma
condição ou termo, operando imediatamente ou no prazo estabelecido. Nesse sentido,
podemos lembrar o artigo 13, caput do ADCT, que criou o Estado de Tocantins, ou o artigo
15, que extinguiu o Território Federal de Fernando de Noronha, reincorporando a sua área
ao Estado de Pernambuco.
c) Disposições de efeitos diferidos: são aquelas que “sustam a operatividade da norma
constitucional por prazo determinado ou até a ocorrência de um determinado evento.” Como
exemplo, o autor lembra o artigo 5º, caput, do ADCT, que determinou a não aplicação do
disposto no artigo 16 e das regras do artigo 77 do corpo da Constituição às eleições previstas
para 15.11.1988.

17.55. Qual é a natureza jurídica das disposições do ADCT?


O ADCT tem natureza jurídica de norma constitucional e poderá, portanto, trazer exceções às regras
colocadas no corpo da Constituição.
Também em razão de sua natureza jurídica, as disposições do ADCT servirão de parâmetro ou
paradigma de confronto para a análise da constitucionalidade dos demais atos normativos.
Por óbvio, inexistem entre as normas inscritas no ADCT e os preceitos constantes da Carta Política
quaisquer desníveis ou desigualdades quanto à intensidade de sua eficácia ou à prevalência de sua
autoridade.

17.56. De que forma são alteradas as regras contidas no ADCT?


Em razão de sua natureza constitucional, a alteração das normas do ADCT ou a inclusão de novas
regras dependerão da manifestação do poder constituinte derivado reformador, ou seja,
necessariamente por meio de emendas constitucionais que, por sua vez, deverão observar os limites
ao poder de reforma, sendo que essas disposições novas estabelecidas por emenda serão suscetíveis
ao controle de constitucionalidade.
196

17.57. Sobre o que dispõe o artigo 98 do ADCT, incluído pela Emenda Constitucional 80 de
2014?
Art. 98. O número de defensores públicos na unidade jurisdicional será proporcional à efetiva
demanda pelo serviço da Defensoria Pública e à respectiva população.
§ 1º No prazo de 8 (oito) anos, a União, os Estados e o Distrito Federal deverão contar com
defensores públicos em todas as unidades jurisdicionais, observado o disposto no caput deste
artigo.
§ 2º Durante o decurso do prazo previsto no § 1º deste artigo, a lotação dos defensores públicos
ocorrerá, prioritariamente, atendendo as regiões com maiores índices de exclusão social e
adensamento populacional.

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