Você está na página 1de 2

TEXTO ENCAMINHADO PARA O IX CIPA

Silvania Regina Pellenz Irgang


Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS
regina.uffs@gmail.com
Andrisa Kemel Zanella
Universidade Federal de Pelotas – UFPel
andrisa.kemel@ufpel.edu.br
Resumo

Este trabalho centra-se na narrativa de si e a nossa prática docente em cursos de licenciatura no campo das Ciências Humanas e das Artes em duas
instituições públicas federais do sul do Brasil. Ao longo de nosso trajeto pessoal e profissional, entrelaçado no Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação e
Imaginário Social (GEPEIS) na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) desde o ano de 2005, deparamos-nos com inúmeros desafios e foi, no diálogo, na
escrita, na partilha e nas problematizações que fomos nos constituindo e percebendo as professoras que somos e estamos nos tornando cotidianamente. Nesse
tempo de pandemia os diálogos se intensificaram sobre um assunto que muito nos mobiliza: a escrita de memoriais formativos, dos/as acadêmicos/as com os
quais atuamos, mas principalmente os nossos memoriais, foco desta escrita. A escrita do memorial faz parte de um processo de rememoração com a reflexão sobre
o vivido, seja de maneira oral ou escrita, por meio de uma narrativa de vida (ABRAHÃO, 2011). Há nessa narrativa, segundo a autora, uma intencionalidade de
ressignificar o vivido na própria formação. Ou seja, pela escrita selecionamos, organizamos e refletimos sobre as experiências vividas, a partir das marcas, dos
sentidos e das aprendizagens que elas provocaram em nós.
Com o desejo de aprofundar sobre este assunto, propusemos este trabalho com o intuito de amplificar as discussões sobre o memorial formativo
como um disparador para pensar e repensar o nosso trajeto e a nossa prática docente, tendo como ponto de partida, o exercício que fazemos desde que ingressamos
na pós-graduação e que se intensificou como professoras do Ensino Superior. A escrita de si no contexto formativo possibilita apreender os sentidos da docência,
de ser professor (ARENHALDT, 2010).
Atribuir importância ao Memorial Formativo como um elemento a integrar a nossa prática como professoras formadoras de outros professores
inspirou-se na ideia de caminhar para si de Marie-Christine Josso (2004), na perspectiva de que a apropriação e consciência de nossos saberes e fazeres passam
por um processo de conhecimento do que somos, valorizamos, fazemos, desejamos na relação do sujeito consigo mesmo, com os outros e o meio que está inserido
(JOSSO, 2004).
E, é exatamente isso que viemos nos perguntando nesse tempo de docência presencial e atualmente remota, online, de telas; que sentidos temos
atribuído à docência em nossos contextos profissionais? Nossa escrita vai ao encontro da ideia do sujeito adentrar à cena como autor de sua vida para assim,
pensar a existencialidade a partir de atividade que envolve uma auto-interpretação crítica e tomada de consciência tanto no aspecto social, histórico e cultural
(JOSSO, 2004, 60), com vistas à constituição da dimensão cognitiva da subjetividade.
Deste modo, apresentaremos fragmentos da escrita de nossos memoriais formativos buscando visibilizar os sentidos de ser professora desde nossas
escolhas profissionais até a docência no ensino superior. Assim, na convergência de nossas escritas, refletimos sobre o memorial formativo como elemento
fundamental de apropriação da prática docente e ação junto aos/as acadêmicos/as dos cursos de licenciatura com os quais atuamos.
Entre circunstâncias, ações, acontecimentos que polarizam nossos enredos (DELORY-MOMBERGER, 2014), identificamos sentidos que revelam um movimento
de tornar, ser e fazer cotidianamente. A partir desse entendimento destacamos alguns aspectos significativos em nossas escritas.
Da escolha profissional…
“Aos 22 anos decidi fazer Pedagogia e foi minha melhor escolha” (Professora Regina). “Aos 17 anos ingressei no Curso de Artes Cênicas Bacharelado. Conforme
acontecia minha formação, percebi que o contexto educacional me despertava interesse. Eu queria adentrar o espaço da escola, não apenas como artista mas
também professora” (Professora Andrisa).
Grupos de estudos e pesquisa e sua importância na constituição docente…
“Na graduação participei do GEPEIS e fui apresentada a pesquisadores/as sobre a Formação Docente, as Histórias de Vida, a Memória, o Imaginário Social, os
Saberes Docentes, dentre outros, onde iniciei a minha (auto)formação, o meu modo de ser professora” (Professora Regina). “Ao ingressar no GEPEIS no mestrado
e no (GEPIEM/UFPel) - Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Imaginário, Educação e Memória (GEPIEM/UFPel) - no doutorado, tive a oportunidade de viver
experiências sensíveis que contemplavam o trabalho colaborativo, o aprofundamento teórico, a criatividade, a imaginação entre tantas outras questões. A partir daí
nasceu o desejo de ser professora do Ensino Superior” (Professora Andrisa).
O ensino superior e os sentidos da docência…
“Há dois anos sou professora no Ensino Superior, na Universidade Federal da Fronteira Sul, campus Erechim/RS. É nesse lugar que agora me chama a
ressignificar meu lugar de professora formadora, de outra parte da professora da infância, que escuta, que compreende os/as acadêmicos/as e seus anseios, e que,
por vezes, também precisam encontrar seu lugar no mundo da profissão, nas angústias, nas conquistas e na potência que cada professor/a carrega dentro de si para
(trans)formar a educação de crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos.” (Professora Regina). "No decorrer de minha trajetória como professora nos Cursos
de Pedagogia, Dança e Teatro Licenciatura em três instituições públicas do Rio Grande do Sul percebo o quanto do que fui vivendo no decorrer de minha vida
reflete em minha prática docente. Uma prática que precisa de sentido, de partilha, de diálogo e constante aprendizado para existir. Que busca valorizar o potencial
de cada ser humano que ali se encontra, fugindo de rótulos, mas buscando a possibilidade, a inteireza, a inclusão. Um movimento não tão fácil, pois tantas vezes
questionei essa minha postura. Seria eu idealista demais por ter esperança de que a formação pode transformar vidas?” (Professora Andrisa).
Tais convergências percebidas em nossos memoriais, levam-nos a reconhecer a importância desta escrita e as possibilidades consideradas como
momentos charneiras (JOSSO, 2004) em situações específicas de nossas vidas. São essas mudanças que atribuem sentido a nossa prática docente, as continuidades
e descontinuidades, as inquietudes, expectativas, memórias e marcas que fomos constituindo nas professoras que somos e nas relações estabelecidas com os/as
licenciandos/as em seus processos de formação. Assim, a partir deste exercício, defendemos a importância da escrita do memorial como ação significativa para a
trajetória docente no ensino superior, uma vez que possibilita atribuir sentido e tomar consciência das experiências que vem acontecendo neste percurso. Olhar e
refletir sobre elas possibilita a apropriação e aprofundamento sobre o vivido, empreendendo outros movimentos, fazeres e saberes no contexto formativo.
Quando nos referimos à prática docente, adentramos não só no ensino, mas nos desafios que a profissão nos apresenta frente aos novos projetos e
parcerias. Podemos inferir que, ficamos no instituído por algum tempo, até que nestas escritas e diálogos nos encorajamos a produzir um elemento instituinte, de
rompimento ou ressignificação daquilo que nos é apresentado no contexto da docência. Foi pela escrita dos nossos memoriais que estes e outros diálogos foram
possíveis, onde a partilha de saberes e a experiência formadora (JOSSO, 2004) de uma e outra foi mobilizadora de reflexões tão profundas ao ponto de
transformarmos nossa prática docente, nossa maneira de estar na profissão e de encarar os desafios da formação no ensino superior.
Palavras-Chave: Memorial Formativo. Prática Docente. Formação de Professores.
Referências:
ABRAHÃO, Maria Helena Menna Barreto. Memoriais de formação: a (re)significação das imagens-lembranças/recordações-referências para a pedagoga em
formação. Educação, Porto Alegre, v. 34, n. 2, p. 165-172, maio-ago. 2011.
ARENHALDT, Rafael; MARQUES, Tania Beatriz Iwaszko. Escritas de memoriais: um dispositivo para a formação de professores. In: ARENHALDT, Rafael;
MARQUES, Tania Beatriz Iwaszko. Memórias e Afetos na Formação de Professores. Pelotas: Editora Universitária/UFPEL, 2010.
DELORY-MOMBERGER, Christine. Biografia e Educação – figuras do indivíduo-projeto. 2ª ed. Natal, RN: EDUFRN, 2014.
JOSSO, Marie-Christine. Experiência de Vida e Formação. São Paulo: Cortez, 2004.

Você também pode gostar