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Métodos Matemáticos Avançados em Física
Inclui bibliografia.
ISBN 978-65-998244-0-1
Copyright © 2022 by Daniel H.T. Franco. Todos os direitos reservados. Qualquer parte destas
notas pode ser baixada e impressa apenas para uso pessoal ou educacional, desde que citada a
fonte. Nenhuma parte destas notas pode ser reproduzida, alterada, ou transmitida de qualquer
forma para fins comerciais.
Versão: 12 de Julho de 2022
Para Pedro, Lu e meus pais, dedico.
“Feliz aquele que transfere o que sabe e
aprende o que ensina.”
Cora Coralina
Conteúdo
Prefácio i
3 Espaços de Hilbert 87
3.1 Espaços Pré-Hilbert . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87
3.2 Espaços de Hilbert . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 94
3.3 Complementos Ortogonais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100
3.4 O Teorema da Projeção . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
3.5 Convergência Fraca em Espaços de Hilbert . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105
3.6 Sobre a Existência de Bases Ortonormais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 107
3.7 Teorema de Hahn-Banach em Espaços de Hilbert . . . . . . . . . . . . . . . . . 118
3.8 Sobre a Compacidade da Bola Unitária em Espaços de Hilbert de Dimensão
Infinita . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121
3.8.1 Não-Compacidade (Forte) da Bola Unitária em Espaços de Hilbert . . . 121
3.8.2 Compacidade (Fraca) da Bola Unitária em Espaços de Hilbert . . . . . . 125
3.9 O Espaço L2 (Rn ) e a Mecânica Quântica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 127
Apêndice 3A: Caracterização Topológica de um Espaço de Hilbert . . . . . . . . . . . 133
Referências 797
Prefácio
“Não é de surpreender que nossa linguagem seja incapaz de descrever processos que ocorrem dentro de
átomos, pois, como foi observado, ela foi inventada para descrever as experiências da vida cotidiana . . . Felizmente,
a matemática não está sujeita a essa limitação, e foi possível inventar um esquema matemático – a teoria quântica
– que parece inteiramente adequado para o tratamento de processos atômicos.”
Werner Heisenberg
em “The Physical Principles of the Quantum Theory”
A revolução quântica teve início no final do Século XIX e início do Século XX com a desco-
berta de uma miríade de fenômenos naturais, muitos deles contra-intuitivos, que não podiam
ser explicados pelos paradigmas científicos da época. A teoria quântica descreve o comporta-
mento de partículas nas menores escalas de tamanho, portanto, a descrição da estrutura de
átomos e sua interação com outros átomos, bem como o comportamento de núcleos atômi-
cos. No entanto, nós, seres humanos, estamos mal “aparelhados” para observar diretamente
o microcosmo. Por exemplo, os elétrons, frequentemente usados como objetos de estudo, são
imperceptíveis pelos nossos orgãos sensoriais. Nós simplesmente não são somos capazes de
observar o movimento de um elétron. É por isso que a matemática torna-se crucial quando
nossa intuição falha; ou seja, o melhor que podemos fazer é tentar entender o elétron e seu
movimento como abstrações matemáticas. Portanto, a teoria quântica é um modelo matemático
do mundo físico na escala microscópica. De fato, a teoria quântica foi considerada a primeira
teoria da física que exigiu estruturas matemáticas abstratas, como a álgebra linear, os espaços
de Hilbert de dimensão infinita, a teoria espectral dos operadores auto-adjuntos, as álgebras dos
operadores e, mais fundamentalmente, a análise funcional. Todos esses campos da matemática
são hoje parte integrante da física-matemática.
A física-matemática refere-se ao desenvolvimento de métodos matemáticos para aplicação a
problemas na física. Ela remonta um longo tempo, mas no Século XX, ela passou a girar em
torno de métodos matemáticos utilizados na teoria quântica, tanto relativística e não-relativística,
incluindo as principais áreas como a teoria quântica dos campos e a mecânica estatística
quântica. Cada uma dessas áreas, por sua vez, implica noções de dinâmica, sistemas dinâmicos,
teoria de espalhamento, estudo das interações e teorias rigorosas de transição de fase. Por causa
dos fundamentos da teoria quântica, e do quadro sugerido por John von Neumann e Paul Dirac,
os problemas e os modelos estudados na física-matemática se baseiam na teoria de operadores
lineares em espaços de Hilbert e nas álgebras desses operadores. Relacionado a isso está a teoria
de problemas de medição quântica. No caso da teoria quântica dos campos existem os sistemas
i
Prefácio
ii
Prefácio
iii
Prefácio
são abordados no texto. A falta de tal conhecimento, no entanto, não vai impedir que os leitores
captem a essência dos principais assuntos.
A tarefa de escrever um texto como este é uma operação complexa que requer numerosas ve-
rificações no texto, nas imagens e nas relações estabelecidas entre eles. A experiência sugere que
é impossível escrever um livro livre de erros. Apesar de todas as tentativas de eliminá-los, alguns
sempre escapam à revisão. Qualquer observação, sugestão e correção dos leitores serão bem-
vindas, basta enviá-las para os seguintes endereços eletrônicos: daniel.franco@ufv.br,
dhtfranco@gmail.com.
Estas notas surgiram dos cursos e tópicos de métodos matemáticos em Física que lecionei
na Universidade Federal de Viçosa. Por isso, meus agradecimentos vão em primeiro lugar para
os vários estudantes dos cursos de graduação e pós-graduação do Departamento de Física
da UFV que leram as versões preliminares do texto e contribuíram significativamente para
o melhoramento de um número considerável de detalhes e, em especial, aos Profs. Magno
B. Alves, Olivier Piguet e Oswaldo M. Del Cima por terem apontado algumas imprecisões
no texto (naturalmente, eventuais imprecisões ou obscuridades remanescentes são de minha
responsabilidade). Por último, eu gostaria de agradecer a todos aqueles que me ajudaram e
incentivaram de uma forma ou de outra durante a preparação deste texto. Quero aqui renovar
meus agradecimentos aos meus amigos, Afrânio R. Pereira, Emmanuel A. Pereira, José A. Helayël-
Neto, Magno B. Alves, Marcelo L. Martins, Olivier Piguet, Orlando P.F. Rodrigues e Oswaldo M.
Del Cima, pelo apoio recebido durante esta empreitada.
Boa caminhada! E lembre-se que uma caminhada de mil milhas inicia-se com um passo.
iv
Primeira Parte:
Elementos de Análise e Espaços Vetoriais
1
Capítulo 1
Noções sobre Conjuntos e Topologia
3
Noções sobre Conjuntos e Topologia
quaisquer atributos de membros individuais. Por exemplo, “um grande bando de pássaros” não
é o mesmo que “um bando de grandes pássaros.”
A abordagem da teoria dos conjuntos em que se tentou definir um conjunto e postular uma
série de axiomas sobre conjuntos, de modo a evitar paradoxos, é conhecida como a teoria
axiomática dos conjuntos. Tal análise pertence propriamente aos fundamentos da matemática
e da lógica matemática, e não é nosso propósito iniciar o estudo desses campos. Adotaremos,
como a maioria dos matemáticos, o ponto de vista ingênuo em relação à teoria dos conjuntos.
Assumiremos que o que se entende por um conjunto de objetos é intuitivamente claro e
procederemos com base nisso sem analisar mais profundamente o conceito em si.
Denotamos conjuntos por letras maiúsculas comuns A, B, C, . . ., e elementos ou objetos de
conjuntos por letras minúsculas a, b, c, . . .. Por exemplo, escrevemos
! "
A = a, b, c ,
x∈
/A.
1
Se f (x) é uma função contínua em um certo domínio Ω ⊆ Rn , escrevemos f ∈ C(Ω). Se todas as derivadas
parciais de f de ordem ℓ existem e são contínuas, escrevemos f ∈ C ℓ (Ω). Quando as derivadas parciais de f
de todas as ordens existem e são contínuas, dizemos que f é infinitamente diferenciável ou suave e escrevemos
f ∈ C ∞ (Ω).
4
Noções sobre Conjuntos e Topologia
A⊂B ou B⊃A.
Esta definição implica que todo conjunto deve ser considerado como contendo a si mesmo, ou
seja A ⊂ A.
Nota 1.1. O símbolo A ⊂ B indica que A é um subconjunto próprio de B, isto é, A é um
subconjunto próprio de B se, e somente se, A é um subconjunto de B e B contém um ou
mais elementos que não pertencem ao conjunto A. Ocasionalmente, para indicar que A é um
subconjunto de B, porém não necessariamente um subconjunto próprio, escrevemos A ⊆ B
ou B ⊇ A. Neste caso, existe a possibilidade que os dois conjuntos sejam iguais. Diz-se que
dois conjuntos são iguais se, e somente se, eles têm os mesmos elementos. Em outras palavras,
se A e B são dois conjuntos, então eles são iguais se, e somente se, A ⊂ B e B ⊂ A. Neste
caso, escrevemos que A = B.
Também é necessário considerar um conjunto que não possui membros. Uma vez que um
conjunto é determinado por seus elementos, existe apenas um conjunto que é chamado de
conjunto vazio, que é denotado pelo símbolo ∅. Qualquer conjunto, A, consistindo de um ou
mais elementos é considerado não vazios. Se A não for vazio, escrevemos A ̸= ∅.
Nota 1.2 (Alerta sobre o conjunto ∅). Pela definição de subconjunto, o conjunto vazio é um
subconjunto de qualquer conjunto A por vacuidade. Para se provar que algo é verdadeiro para
o conjunto vazio, costuma-se recorrer à demonstração por vacuidade. Na demonstração por
vacuidade mostra-se que a sentença p ⇒ q é verdadeira quando sabemos que p é falsa. Assim,
por exemplo, como afirmar ser falso que ∅ ⊂ A? Seria verdade dizer que é falso que ∅ ⊂ A
somente se ∅ tivesse um elemento que não pertencesse a A. Dado que o conjunto ∅ não
possui nenhum elemento, tem-se um absurdo. Conclusão: ∅ ⊂ A não é falso, e portanto
∅ ⊂ A para todo conjunto A.
Nota 1.3 (Conjuntos de Números). Os vários conjuntos númericos usados ao longo do texto
são:
5
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Nota 1.4. Deve-se enfatizar que o significado matemático de “ou” no símbolo acima não é
exclusivo, como na linguagem corrente. Assim, x pode pertencer simultaneamente a A e a B.
A união de um número de conjuntos A1 , A2 , . . . , An é o conjunto
n
& ! "
A1 ∪ A2 ∪ · · · ∪ An = Ai = x | x ∈ A1 ou x ∈ A2 · · · ou x ∈ An .
i=1
* Conjuntos Disjuntos: Dois conjuntos A e B são disjuntos se eles não têm elementos em
comum. Neste caso, a interseção entre A e B é o conjunto vazio ∅, ou seja A ∩ B = ∅.
* Diferença: A diferença de dois conjuntos A e B, denotada por A − B, é o conjunto
formado por todos os elementos que pertencem a A mas não a B, ou seja
! "
A − B = x | x ∈ A, x ∈/B .
!A B = A − B ou A′ = A − B ou Ac = A − B .
A ∆ B = (A − B) ∪ (B − A) .
* Famílias: Os conjuntos cujos elementos são eles próprios conjuntos, são chamados famílias
e são representados pelas letras A , B, C , D, etc. Exemplo: se A, B e C são, respectivamente,
os conjuntos A = {0, 1}, B = {a, b, c} e C = {∅}, então A = {{0, 1}, {a, b, c}, {∅}} é
uma família.
6
Noções sobre Conjuntos e Topologia
• Leis Idempotentes
A∪A=A ; A∩A=A .
• Leis Comutativas
A∪B =B∪A ; A∩B =B∩A .
• Leis Associativas
A ∪ (B ∪ C) = (A ∪ B) ∪ C ,
A ∩ (B ∩ C) = (A ∩ B) ∩ C .
• Leis Distributivas
A ∪ (B ∩ C) = (A ∪ B) ∩ (A ∪ C) ,
A ∩ (B ∪ C) = (A ∩ B) ∪ (A ∩ C) .
• Leis de Identidade
A∪∅=A ; A∩U =A ,
A∪U = U ; A∩∅= ∅ .
Aqui U representa um conjunto universal, ou seja A ⊂ U.
• Leis de Morgan
A − (B ∪ C) = (A − B) ∩ (A − C) ,
A − (B ∩ C) = (A − B) ∪ (A − C) .
E ainda,
n
' n
&
U− Ai = (U − Ai ) ,
i=1 i=1
7
Noções sobre Conjuntos e Topologia
• Leis do Complemento
A ∪ Ac = U ; A ∩ Ac = ∅ ,
(Ac )c = A ; U c = ∅ ; ∅c = U .
Nota 1.5. Com relação à álgebra de conjuntos, as leis acima são teoremas que podem ser
provados pelo uso direto das definições sobre subconjuntos e igualdades de conjuntos. Por
exemplo, a primeira lei de Morgan pode ser provada
! da seguinte forma: comecemos " com o
caso em que n = 2. Defina Bi = U − Ai = x | x ∈ U, x ∈ Ai , i = 1, 2 . Então,
∀ x ∈ U − (A1 ∩ A2 ) ⇒ x ∈ / A1 ∩ A2 ⇒ x ∈ / A1 ou x ∈ / A2 ⇒ x ∈ B1 ou x ∈
B2 ⇒ x ∈ B1 ∪ B2 . Assim, U − (A1 ∩ A2 ) ⊂ (U − A1 ) ∪ (U − A2 ). Agora, note
que ∀ x ∈ B1 ∪ B2 ⇒ x ∈ B1 ou x ∈ B2 ⇒ x ∈ / A1 ou x ∈ / A2 . Se x ∈/ A1 ⇒
x ∈/ A1 ∩ A2 ⇒ x ∈ U − (A1 ∩ A2 ). *Assim, (U − A1 )*∪ (U − A2 ) ⊂ U − (A1 ∩ A2 ).
Passemos para o caso geral; ∀ x ∈ U − ni=1 Ai ⇒ x n
+n∈ i=1 Ai ⇒ x ∈ a no mínimo*n um
U − Ai ⇒ x ∈ (U − A1 ) ∪ · · ·+∪ (U − An ) = x ∈ i=1 (U − Ai ). Assim, U − i=1 Ai ⊂
+ n n
i=1 (U*− Ai ). Agora, ∀ x ∈
* i=1 (U − A+i) ⇒ x ∈/ a no mínimo*n um Ai , i = 1, . . . , n
n n n
⇒x∈ / i=1 Ai ⇒ x ∈ U − i=1 Ai . Logo, i=1 (U − Ai ) ⊂ U − i=1 Ai .
8
Noções sobre Conjuntos e Topologia
regra conveniente e auto-consistente para a distância de acordo com a natureza das sequências,
conjuntos e espaços em consideração. Portanto, conceitos fundamentais como continuidade,
convergência e inclusão terão significados diferentes. Quando isso acontece, dizemos que
estamos “introduzindo uma topologia no espaço matemático (ou conjunto).”
Exemplo 1.2 (Distância entre números reais). Considere o conjunto dos números reais, R, e
d(x, y) = |x−y|. Logo d(x, y) é uma métrica em R. De fato, temos que d(x, y) = |x−y| " 0
pela definição de valor absoluto de um número real. Além disso, d(x, y) = 0 se, e somente se,
|x − y| = 0. Isto acontece se, e somente se, x − y = 0. Portanto, x = y. Agora, de |x| = | − x|
segue que, |x − y| = | − (x − y)| = |y − x|. Logo, d(x, y) = d(y, x). Por fim, como para
x, y ∈ R vale que |x + y| # |x| + |y|, então |x − z| = |(x − y) + (y − z)| # |x − y| + |y − z|,
para todo x, y, z ∈ R.
Exemplo 1.3 (Distância entre funções contínuas). Seja C[a, b] o espaço que consiste de todas
as funções contínuas definidas no intervalo fechado [a, b]. Para um par de elementos f e g no
espaço C[a, b], é possível definir a distância d1 (f , g) entre eles como
No entanto, esta não é a única definição de distância entre funções no espaço C[a, b]; podemos
definir outras regras para a distância entre esses elementos da seguinte forma:
$ b ,$ b -1/2
2
d2 (f , g) = dx |f (x) − g(x)| e d3 (f , g) = dx |f (x) − g(x)| .
a a
Não faz sentido dizer que d1 é mais correta que d2 ou d3 . As três regras são bem definidas e
só precisamos escolher qual delas é mais conveniente para um certo problema. A natureza de
um espaço de funções depende da nossa escolha de distância entre seus elementos. Mesmo
que dois espaços sejam compostos por elementos idênticos, isso não significa que eles sejam o
mesmo espaço. Os dois espaços irá diferir se forem dotados de regras diferentes para determinar
a distância entre os elementos. Esta é a razão pela qual diferentes notações são necessárias
para espaços dotados de diferentes regras de distância.
Nota 1.6 (Alguns poucos fatos sobre métrica). Uma métrica é chamada de ultramétrica
(ou métrica não-Arquimediana) se ela satisfaz a seguinte versão mais forte da desigualdade
triangular, em que os pontos nunca podem estar “entre” outros pontos:
. /
d(x, z) # max d(x, y), d(y, z) , ∀ x, y, z ∈ M .
d(x, y) = d(x + a, y + a) , ∀ x, y ∈ M .
9
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Nota 1.7 (Métricas sobre espaços vetoriais). Veremos no Capítulo 2 que normas sobre espa-
ços vetoriais são equivalentes a determinadas métricas, especificamente sobre aqueles espaços
vetoriais homogêneos e invariantes por translações. Em outras palavras, uma norma determina
uma métrica se dado um espaço vetorial normado (X , ∥ · ∥) podemos definir uma métrica
em X por d(x, y) = ∥x − y∥. Neste caso, a métrica d é dita ser induzida pela norma
∥ · ∥. Inversamente, se uma métrica d num espaço vetorial X satisfaz as propriedades (veja o
Teorema 2.5)
então podemos definir uma norma em X por ∥x∥ = d(x, 0). Da mesma forma, uma semi-
norma induz um pseudométrica (ver nota acima).
DEFINIÇÃO 1.2. Seja M um espaço métrico. Se x0 ∈ M e r " 0, então:
* O conjunto ! "
B(x0 ; r) = y ∈ M | d(x0 , y) < r ,
é chamado uma bola aberta de centro x0 e raio r.
* O conjunto ! "
B[x0 ; r] = y ∈ M | d(x0 , y) # r ,
é chamado uma bola fechada de centro x0 e raio r.
* O conjunto ! "
S(x0 ; r) = y ∈ M | d(x0 , y) = r ,
é chamado uma esfera de centro x0 e raio r.
Evidentemente, da definição acima, temos que B[x0 ; r] = B(x0 ; r) ∪ S(x0 ; r), o que repre-
senta uma união disjunta.
Exemplo 1.4. Seja d : M × M → R+ = {x ∈ R | x " 0} definida por
⎧
⎨0 , se x = y
d(x, y) =
⎩1 , se x ̸= y
Se x0 ∈ M e r > 1, então
B[x0 ; r] = B(x0 ; r) = M ,
e
S(x0 ; r) = ∅ .
Se 0 < r < 1, então
B[x0 ; r] = B(x0 ; r) = {x0 } ,
e
S(x0 ; r) = ∅ .
Se r = 1, então
B[x0 ; r] = M ; B(x0 ; r) = {x0 } ,
e
S(x0 ; r) = M − {x0 } .
10
Noções sobre Conjuntos e Topologia
DEFINIÇÃO 1.3. Seja A um subconjunto de um conjunto M sobre o qual está definida uma
métrica. O conjunto A é dito limitado quando existir uma constante c > 0 tal que d(x, y) # c
para quaisquer x, y ∈ A.
Da definição acima segue que um conjunto A é limitado se, e somente se, A ⊂ B[x0 ; r],
para algum x0 ∈ A. De fato, se A ⊂ B[x0 ; r], então para algum x0 ∈ A e r > 0, tomando-se
y, z ∈ A segue que
Logo, se A ⊂ B[x0 ; r], então A é limitado. Por outro lado, se A é limitado, isto é, se existe
uma constante c > 0 tal que d(x, y) # c, para todo x, y ∈ A, então dado um x0 ∈ A,
podemos tomar r = c de tal forma que d(x0 , y) # c = r, para todo y ∈ A. Isto significa que
A ⊂ B[x0 ; r].
Exemplo 1.5. Seja A = B[x0 ; r] uma bola fechada em R2 . Então existe
max d(x, y) = 2r
x,y∈A
que define o diâmetro da bola fechada. Por outro lado, seja B = B(x0 ; r) uma bola aberta
em R2 . Neste caso, não existe o máximo dos números x, y ∈ B. Com efeito, para todo
x, y ∈ B ⊂ R2 e diametralmente opostos, podemos tomar um ε > 0, arbitrário, tal que
d(x + ε, y + ε) é sempre menor que 2r. Assim, não podemos definir o diâmetro de bolas
abertas pelo maxx,y∈B d(x, y). Esta dificuldade é contornada através de um conceito que
generaliza a ideia de máximo: o supremo de um conjunto. Para isso, precisaremos da noção de
ordem sobre conjuntos.
DEFINIÇÃO 1.4. Seja X um conjunto não-vazio. Uma relação de ordem parcial em o conjunto
X é uma relação denotada por “≺” satisfazendo as seguintes propriedades:
Nota 1.8. Um conjunto X munido com a ordem ≺ é chamado um conjunto ordenado parci-
almente. Neste caso, a relação x ≺ y pode ser entendida dizendo que x precede y.
Exemplo 1.6. Os conjuntos N, Z, Z+ , Q e R são exemplos fundamentais de conjuntos ordena-
dos parcialmente pela relação “#”: x ≺ y significa x # y. Já o conjunto de todos os números
complexos z = x + iy, w = u + iv é ordenado parcialmente pela convenção z ≺ w se, e
somente se, x # u e y # v.
Exemplo 1.7. Se P é o conjunto de todos os subconjuntos de um dado conjunto X, então
por convenção, A ≺ B se, e somente se, A ⊂ X, B ⊂ X e A ⊂ B. Esta ordem é chamada
relação de inclusão de conjuntos. Às vezes é útil considerar a ordem oposta: A ≺ B significa
que A ⊃ B. Essa relação, chamada de relação de inclusão inversa de conjuntos, aparece
frequentemente, sendo a ordem “natural” imposta sobre o conjunto de vizinhanças de qualquer
ponto em um espaço topológico, como teremos a oportunidade de ver mais adiante.
11
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Exemplo 1.8. A relação de ordem pode ser definida por diagramas. Com efeito, podemos indicar
os membros de um dado conjunto X por símbolos apropriados, conectando-os através de uma
seta, ou seja, se x e y são membros de X, então conectamo-os por uma seta se, e somente se,
x ≺ y e se não existir um z ∈ X tal que x ≺ z ≺ y. Por exemplo, tome X = {u, v, x, y, z}.
Então o diagrama
z
y x
u v
Nota 1.9. Neste ponto é importante esclarecer a diferença entre um conjunto parcialmente
ordenado e um conjunto totalmente ordenado. No caso de um conjunto parcialmente ordenado,
X, o termo “parcial” é adotado porque pode haver elementos em X que não são comparáveis
de acordo com a ordenação ≺ dada. Por outro lado, o termo “total” será empregado quando os
elementos de um dado conjunto com a ordenação parcial ≺ dada forem comparáveis. Com
efeito, a ordem definida sobre o conjunto X do Exemplo 1.8 não é total uma vez que u e v não
são comparáveis: nem u ≺ v e nem v ≺ u!
A noção de um elemento maximal nos leva à um axioma de fundamental importância na
demonstração de vários teoremas da Análise Funcional, conhecido como
LEMA 1.1 (Lema de Max Zorn). Todo conjunto ordenado indutivamente tem no mínimo um
elemento maximal.
Em outras palavras, o Lema de Zorn estabelece que se cada cadeia em um conjunto ordenado
parcialmente tiver um majorante, esse conjunto conterá um elemento maximal. Esse elemento
maximal não precisa ser único!
O Lema de Zorn é equivalente2 ao
2
Isto significa que o Axioma da Escolha e o Lema de Zorn podem ser deduzidos um do outro.
12
Noções sobre Conjuntos e Topologia
! "
AXIOMA 1 (Axioma da Escolha). Seja A =+ A1 , A2 , . . . uma coleção de conjuntos disjuntos.
Então existe um conjunto A tal que A ⊆ i Ai e, para cada i, A ∩ Ai tem exatamente um
elemento.
Note que o axioma da escolha afirma que se A é um conjunto não-vazio de conjuntos e
se não existe quaisquer dois membros distintos de A que tenham um elemento em comum,
então existe um conjunto que consiste exclusivamente de um único elemento tomado de cada
conjunto de A.
Retornemos ao conceito de supremo. Vamos mostrar como a noção de ordem parcial torna
possível precisar a ideia de supremo de um conjunto. Seja X um conjunto parcialmente
ordenado. Um subconjunto A de X é majorado se existe x0 ∈ X tal que x ≺ x0 , para todo
x ∈ A. Se x0 ≺ y0 , então y0 também é um majorante de A.
DEFINIÇÃO 1.7. O menor dos majorantes de A é chamado o supremo de A, denotado por sup A.
De maneira semelhante definimos o ínfimo de um conjunto. Seja X um conjunto ordenado.
Um subconjunto A de X é minorado se existe x0 ∈ X tal que x0 ≺ x, para todo x ∈ A. Se
y0 ≺ x0 , então y0 também é um minorante de A.
DEFINIÇÃO 1.8. O maior dos minorantes de A é chamado o ínfimo de A, denotado por inf A.
Exemplo 1.10. Seja X = {t, u, v, x, y, z, w} e tome X ⊃ Y = {x, y, z}. Defina uma ordem
em X como representada no diagrama abaixo:
t w
y x
u v
13
Noções sobre Conjuntos e Topologia
cA = {y ∈ R | y = cx para algum x ∈ A} .
Se c " 0, então sup cA = c sup A e inf cA = c inf A. Se c < 0, então sup cA = c inf A e
inf cA = c sup A.
Demonstração. O resultado é óbvio se c = 0. Se c > 0, então cx # M se, e somente se,
x # M/c, o que mostra que M é um limite superior de cA se, e somente se M/c é um limite
superior de A; logo sup cA = c sup A. Se c < 0, então cx # M se, e somente se, x " M/c.
Assim, M é um limite superior de cA se, e somente se, M/c é um limite inferior de A; logo
sup cA = c inf A. Para provar os resultados restantes usamos raciocínio análogo.
PROPOSIÇÃO 1.4. Sejam A e B subconjuntos de R. (a) Se A ⊂ B e A ̸= ∅, então sup A #
sup B e inf B # inf A. (b) Se C = A + B = {x + y | x ∈ A, y ∈ B}, então sup C =
sup A + sup B e inf C = inf A + inf B.
Demonstração. (a) Uma vez que sup B é um limite superior de B e A ⊂ B, então sup B é
um limite superior de A; logo sup A # sup B. A prova para o ínfimo é similar. (b) O conjunto
A + B é limitado superiormente se, e somente se, A e B são limitados superiormente. Logo
sup(A + B) existe se, e somente se, tanto sup A e sup B existem. Nesse caso, se x ∈ A e
y ∈ B, então x + y # sup A + sup B; assim sup A + sup B é um limite superior de A + B
14
Noções sobre Conjuntos e Topologia
e, portanto, sup(A + B) # sup A + sup B. Para obter a desigualdade na direção oposta, tome
um ε > 0. Então existem x ∈ A e y ∈ B tais que
ε ε
x > sup A − e y > sup B − .
2 2
Então, x + y > sup A + sup B − ε, para todo ε > 0, o que implica que sup(A + B) "
sup A + sup B. Consequentemente, sup(A + B) = sup A + sup B.
DEFINIÇÃO 1.9 (Diâmetro de um Conjunto). Seja A ⊂ B, tal que sobre B está definida uma
métrica. Sendo A limitado, o diâmetro de A é o supremo dos números d(x, y), com x, y ∈ A,
isto é,
diam(A) = sup d(x, y) .
x,y∈A
COROLÁRIO 1.1. O diâmetro de uma bola aberta, B(x0 ; r), de centro x0 e raio r > 0 é
sup d(x, y) = 2r .
x,y∈B(x0 ;r)
Exemplo 1.13. Suponha que A seja a reta ligando os pontos y, z ∈ M, tal que sobre M está
definida uma métrica. Seja x um ponto de M que não pertence à reta A. Então d(x, A) é o
comprimento de reta perpendicular ligando x a A (veja a figura abaixo).
M
z
y x
15
Noções sobre Conjuntos e Topologia
R = [−∞, ∞] = R ∪ {−∞, ∞} .
16
Noções sobre Conjuntos e Topologia
* Conjunto Finito: Diz-se que um conjunto A é finito se, e somente se, existe um n ∈ N tal
que A ∼ In . Se A tem zero elementos ele é vazio, e, portanto, é também finito; caso contrário
n ∈ N é o número de elementos de A.
* Conjunto Infinito: Diz-se que um conjunto A é infinito se ele não é finito.
* Conjunto Enumerável: Diz-se que um conjunto A é enumerável se, e somente se, A ∼ N.
Em outras palavras, um conjunto A diz-se enumerável quando seus elementos podem ser
nomeados “o primeiro elemento,” “o segundo elemento,” · · · , “o n-ésimo elemento,” e assim
por diante. Isto significa que os elementos do conjunto A podem ser postos em correspondên-
cia bijetiva com o conjunto dos naturais N, isto é, os elementos do conjunto A podem ser
sistematicamente contados. A bijeção f : N → A chama-se uma enumeração dos elementos de
A. Evidentemente, N é um conjunto infinito.
* Conjunto Contável: Diz-se que um conjunto A é contável se, e somente se, A é finito ou
enumerável.
Nota 1.10. Alguns autores dizem que um conjunto A é enumerável quando é finito ou existe
uma aplicação biunívoca f : A → N de A sobre o conjunto N. Outros chamam enumeráveis
apenas os conjuntos que estão em correspondência biunívoca com N. Muitas vezes a estes
conjuntos chama-se conjuntos infinitos enumeráveis.3
Se A e B são dois conjuntos equivalentes, diz-se que eles tem a mesma cardinalidade.
Cardinalidade, em teoria dos conjuntos, é uma forma de “medir” a quantidade de elementos de
um conjunto. Para quantificar a noção de cardinalidade, introduzimos o conceito do número
cardinal de um conjunto. O cardinal indica o número ou quantidade dos elementos constituintes
de um conjunto. É interessante destacar que o cardinal se diferencia do ordinal, porque o ordinal
introduz ordem e dá ideia de hierarquia: primeiro, segundo, terceiro, etc. O cardinal, por sua
vez, nomeia o número de elementos constituintes e esse é o nome do conjunto correspondente.
Geralmente, o símbolo ℵ0 (alef zero) é usado para indicar o número cardinal dos conjuntos
enumeráveis. O conjunto vazio ∅ é associado ao número cardinal 0. Números cardinais finitos
1, 2, 3, . . . estão associados aos conjuntos {∅}, {∅, {∅}}, {∅, {∅}, {∅, {∅}}}, . . ., etc. O
intervalo unitário A = {x ∈ R | 0 # x # 1} é não-contável no sentido que é infinito e com
cardinalidade superior a ℵ0 – diz-se que ele é um continuum e está associado à cardinalidade
c. Nesse sentido, diz-se que ℵ0 é a menor das cardinalidades infinitas.
O fato de não existir qualquer subconjunto dos reais com cardinalidade estritamente maior
que ℵ0 e estritamente menor que c é conhecida como a hipótese do continuum. Por isso,
ocasionalmente se usa a notação c = ℵ1 .
Prova usando o Método Diagonal de Cantor. A prova de que a cardinalidade do conjunto dos
reais R é ℵ1 é realizada por contradição. Assuma que o intervalo unitário [0, 1] é um intervalo
infinito contável. Se assim, podemos obter uma sequência de números reais (rn )n∈N ⊂ [0, 1].
Por outro lado, sabe-se que os números reais existentes entre 0 e 1 podem ser representados
univocamente na forma decimal. Organizemos esses números em uma lista, que não precisa,
necessariamente, de estar em ordem. Logo, uma sequência de números reais entre [0, 1] pode
ser r1 = 0, 6341582 . . ., r2 = 0, 4272125 . . ., r3 = 0, 9159821 . . ., r4 = 0, 1251074 . . .,
r5 = 0, 9341323 . . ., r6 = 0, 3627194 . . ., r7 = 0, 1253126 . . ., etc. Em seguida, se constrói
3
Alguns resultados sobre conjuntos finitos, infinitos e enumeráveis podem ser encontrados no livro do Elon L.
Lima, “Curso de Análise,” Volume 1, IMPA, 2014.
17
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Portanto, esse argumento mostra que existe uma correspondência direta de um-para-um entre
N e todos os racionais ao longo da sequência
1/1, 2/1, 1/2, 1/3, 2/2, 3/1, 4/1, 3/2, 2/3, 1/4, 1/5, . . . ,
18
Noções sobre Conjuntos e Topologia
e assim por diante, ad infinitum. Logo, nesse sentido, os racionais formam um conjunto infinito
do mesmo tamanho que os números naturais.
1.1.8 Funções
Uma função f de um conjunto A em um conjunto B é um tripleto ordenado de conjuntos
(f , A, B), representada por f : A → B (que se lê “f definida da A a B”) ou por f : x 3→ f (x)
(que se lê “f associa f (x) ∈ B a x ∈ A”), tal que
(i) f ⊆ A × B,
(ii) para cada elemento x ∈ A existe um elemento y ∈ B tal que (x, y) ∈ f ,
(iii) para cada elemento x ∈ A e y1 , y2 ∈ B, se (x, y1 ) ∈ f e (x, y2 ) ∈ f , então y1 = y2 .
Quando (x, y) ∈ f , escreve-se y = f (x). Note que, (ii) e (iii) implicam que f é uma
regra4 que associa a cada elemento x de um conjunto A um, e somente um, elemento y de
um conjunto B. Dito de outra forma, se f é uma função e y1 = f (x1 ), y2 = f (x2 ), então
x1 = x2 =⇒ y1 = y2 . O conjunto A é chamado o domínio (ou campo de definição) da
função f , enquanto que B, o conjunto em que f toma valores, é chamado o contradomínio
de f . Deve-se enfatizar que o domínio de uma função nunca pode ser o conjunto vazio!
Nota 1.11 (Conjuntos Conexos). Ao longo destas notas, teremos que lidar frequentemente com
funções em subconjuntos do Rn . Como tais subconjuntos podem apresentar-se sob as mais
variadas formas, vamos procurar fixar o tipo de subconjuntos do Rn que nos interessará.
Estaremos interessados em subconjuntos do Rn mais particulares. Em primeiro lugar, estes sub-
conjuntos deverão possuir pontos interiores. Em segundo lugar, por simplicidade, assumiremos
que estes subconjuntos sejam constituídos de um só pedaço. Em termos técnicos isto significa
que assumiremos que os subconjuntos são conexos. Um subconjunto A ⊂ Rn diz-se conexo
quando quaisquer dois elementos x1 , x2 ∈ A podem ser ligados por um caminho contido em
A. Subconjuntos do Rn que mais aparecerão daqui para frente são abertos e conexos. Além
disso, um subconjunto do Rn pode ainda ser limitado ou não-limitado. Um conjunto A ⊂ Rn
é limitado quando a distância da origem a qualquer dos seus pontos não pode exceder um
valor fixo. Neste caso, existe uma bola aberta B(0; R) de centro na origem e raio R tal que
A ⊂ B(0; R).
Deve-se ter em mente que (i) implica que f é um conjunto. De fato, f : A → B é o um
conjunto de pares ordenados (x, y), x ∈ A, y ∈ B, com o assim chamado gráfico de f sendo
precisamente o conjunto
3 4
G(f ) = (x, f (x)) ∈ A × B | x ∈ A, f (x) ∈ B .
19
Noções sobre Conjuntos e Topologia
o conjunto imagem. Pode acontecer de existir elementos de B que não são a imagem de
qualquer elemento de A. Por outro lado, elementos distintos do conjunto domínio A podem
ter como imagem um mesmo elemento de B. Propriedades especiais de f são listadas pela
seguinte
Exemplo 1.14. Sejam R o conjunto dos números reais e R+ o conjunto dos números reais
não-negativos, isto é, R+ = {x ∈ R | x " 0}. Seja f a regra f (x) = x2 . Então considere as
seguintes funções:
Note que, embora a regra f (x) = x2 definindo cada uma das funções f1 , f2 , f3 e f4 seja a
mesma, as quatro funções são completamente diferentes.
Seja C um subconjunto de A. A função f |C : C → B é a restrição de f ao subconjunto
C. O conjunto ! "
f (C) = f (x) ∈ B | x ∈ C ⊂ A ,
é a imagem direta de C. Naturalmente, o conjunto imagem de C está contido no conjunto
imagem de A. Por outro lado, suponha que D seja um subconjunto de B. Então, o conjunto
! "
f −1 (D) = x ∈ A | f (x) ∈ D ⊂ B ,
C ⊂ f −1 (f (C)) e f (f −1 (D)) ⊂ D .
A primeira inclusão é uma igualdade se f é injetiva, enquanto que a segunda inclusão é uma
igualdade se f é sobrejetiva.
20
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Uma função f é limitada superiormente sobre A se supA f é finito, e limitda inferiormente sobre
A se inf A f é finito, e limitada sobre A se ambos os limites são finitos.
Desigualdades e operações sobre funções são definidas considerando-se cada valor de f (x)
de uma função f . Por exemplo, se f , g : A → R, então f # g significa que f (x) # g(x) para
todo x ∈ A, e f + g : A → R é definido por (f + g)(x) = f (x) + g(x).
sup f # sup g ,
A A
inf f # inf g .
A A
Note que, f # g não implica que supA f # inf A g; para se chegar a essa conclusão, é
necessário saber se f (x) # g(y) para todo x, y ∈ A e usar a Proposição 1.4.
21
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Exemplo 1.15. Considere f , g : [0, 1] → R tais que f (x) = 2x e g(x) = 2x + 1. Então f < g
e
sup f = 2 , inf f = 0 , sup g = 3 , inf g = 1 .
[0,1] [0,1] [0,1] [0,1]
logo,
sup f − sup g # sup |f − g| .
A A A
22
Noções sobre Conjuntos e Topologia
então
sup f − inf f # sup g − inf g .
A A A A
com a última igualdade sendo obtida da Proposição 1.3 tomando-se c = −1. Disso segue o
resultado que era para ser provado.
23
Noções sobre Conjuntos e Topologia
A
y B
TEOREMA 1.2. Seja A um conjunto sobre o qual esteja definida uma métrica. Se B ⊂ A, então
x0 ∈ ∂B se d(x0 , B) = d(x0 , B c ) = 0.
Demonstração. Para x0 ∈ ∂B, dizer que d(x0 , B) = d(x0 , B c ) = 0 é o mesmo que dizer que
para cada ε > 0, arbitrário, existem x ∈ B e y ∈ B c tal que d(x0 , x) < ε e d(x0 , y) < ε.
De fato,! por definição, d(x"0 , x) " 0 !e d(x0 , y) " 0, para
" todo x ∈ B e y ∈ B c . Sejam
D1 = d(x0 , x) | x ∈ B e D2 = d(x0 , y) | y ∈ B c conjuntos de números reais não-
negativos, formados pelas distâncias de x0 aos diversos pontos de B e B c , respectivamente.
Note que 0 é um limite inferior para D1 e D2 . Assim, nenhum ε > 0 é o limite inferior para
D1 e D2 . Isto significa que, para todo x ∈ B e y ∈ B c , não existe ε > 0 tal que d(x0 , x) " ε
e d(x0 , y) " ε. Portanto, para todo ε > 0, arbitrário, existem x ∈ B e y ∈ B c tal que
d(x0 , x) < ε e d(x0 , y) < ε quando x0 ∈ ∂B.
DEFINIÇÃO 1.16. Um conjunto A diz-se aberto se, e somente se, A ∩ ∂A = ∅; ou seja, quando
todo elemento x ∈ A é interior a A.
TEOREMA 1.3. Toda bola aberta B(x0 ; ε), de centro x0 e raio ε > 0 arbitrário, contida em um
conjunto A sobre qual esteja definida uma métrica é um conjunto aberto.
Demonstração. Para todo x ∈ B(x0 ; ε) segue que d(x0 , x) < ε. Seja ε′ = ε − d(x0 , x) > 0.
Então, B(x; ε′ ) ⊂ B(x0 ; ε). Com efeito, para todo y ∈ B(x; ε′ ), segue que d(x, y) <
ε − d(x0 , x). Portanto,
24
Noções sobre Conjuntos e Topologia
DEFINIÇÃO 1.17. Um conjunto A diz-se fechado se, e somente se, seu complemento Ac é aberto.
Em outras palavras, A é fechado se ele contém todos os seus pontos de fronteira.
Nota 1.13. Nas definições de conjuntos abertos e fechados, os conjuntos A e Ac são sempre
considerados como subconjuntos de um conjunto universal U, também chamado conjunto
suporte.
6
Aqui, podemos recorrer à demonstração por vacuidade (veja a Nota 1.2) para afirmar que é verdade que o
conjunto vazio é aberto, pois é impossível encontrar um elemento x ∈ ∂∅ tal que a bola aberta B(x; ε), de centro
x e raio ε > 0, arbitrário, contenha pelo menos um elemento de ∅ e um elemento de ∅c .
25
Noções sobre Conjuntos e Topologia
*n
Logo, i=1 Aié aberto pelo Lema 1.2.
+
(iii) Seja A = i∈I Ai , em que I é um conjunto de índices. Tome um elemento x qualquer
de A. Por definição, x deve pertencer a pelo menos um dos conjuntos Ai . Sendo cada conjunto
Ai aberto, segue que a bola aberta B(x; ε) ⊂ Ai . Assim, B(x; ε) ⊂ A. Logo A é aberto.
COROLÁRIO 1.3. Seja A um conjunto sobre o qual está definida uma métrica. Um subconjunto
C de A é aberto se, e somente se, é união de bolas abertas.
Mas, a menos que x seja um ponto isolado, {x} não é um conjunto aberto de A.
DEFINIÇÃO 1.18. Seja A um conjunto sobre o qual existe definida uma métrica. O elemento
x ∈ A chama-se um ponto isolado de A quando existe um ε > 0, arbitrário, tal que B(x; ε) =
{x}, ou seja, quando a bola aberta B(x; ε) consiste unicamente do elemento {x}.
Exemplo 1.17. Considere o conjunto dos números inteiros Z. Sabemos que Z ⊂ R. Sendo
d(x, y) = |x − y| a métrica usual em R, podemos definir a distância entre dois elementos
x, y ∈ Z como a mesma distância entre eles considerados como elementos de R, ou seja, se
x, y ∈ Z, então d(x, y) = |x − y|. Neste caso, dizemos que a métrica d(x, y) = |x − y|
definida em Z foi induzida pela métrica usual de R. Com esta métrica induzida, não é difícil
ver que todo elemento de Z é um ponto isolado, portanto, todo elemento de Z é aberto em Z.
De fato, basta tomarmos bolas abertas de raios ε < 1. Por outro lado, os elementos de Z vistos
agora como elementos de R não são abertos em R.
DEFINIÇÃO 1.19. Seja E um conjunto. Diz-se que o conjunto E está munido de uma estrutura
τ
topológica se é dada uma família de subconjuntos de E satisfazendo as seguintes propriedades:
(A.1) o conjunto vazio, ∅, e o espaço todo, E, pertencem a ;τ
τ
(A.2) a interseção de um número finito de elementos de pertence a ; τ
26
Noções sobre Conjuntos e Topologia
τ
(A.3) a união de uma família qualquer de elementos de pertence a . τ
Os conjuntos dessa família τ τ
chamam-se abertos, e o par (E, ) é chamado um espaço
topológico.
Nota 1.16. A Propriedade (A.2), na definição acima, é equivalente a dizer que a interseção de
dois abertos é um aberto.
Nota 1.17. Qualquer propriedade de E que seja inteiramente expressa em termos dos conjuntos
abertos de E (isto é, em termos da topologia de E) é chamada uma propriedade topológica
de E. Por exemplo, um conjunto E ser limitado não é uma propriedade topológica, pois isso
depende em particular da métrica que é definida em E.
Exemplo 1.18. Se sobre um conjunto E existe definida uma métrica d, então sobre E podemos
definir uma topologia induzida pela métrica d. Com efeito, como a família de abertos de τ
é composta de subconjuntos abertos
! Ci ⊂ E, então" para todo x ∈ Ci , existe ε > 0 tal que
para a bola aberta B(x; ε) = y | d(x, y) < ε , com centro + x e raio ε > 0, temos que
B(x; ε) ⊂ Ci ⊂ E. Logo, pelo Corolário 1.3, cada aberto Ci = x∈C B(x; ε) ⊂ E.
1.2.3 Bases
Notamos que no Exemplo 1.18 cada aberto Ci ⊂ E, em que E é equipado com uma métrica,
pode ser escrito como a união de bolas abertas. Esse exemplo é generalizado pela seguinte
τ
DEFINIÇÃO 1.20. Uma família B ⊂ é chamada uma base se, e somente se, qualquer aberto
+
τ
A ∈ é da forma A = i∈I Bi para alguma família {Bi }i∈I ⊂ B .
Uma definição alternativa de uma base para um espaço topológico segue da seguinte
PROPOSIÇÃO 1.9. Uma família de conjuntos {Bi }i∈I forma uma base aberta para um espaço
τ
topológico (E, ) se, e somente se, cada x ∈ E está contido em algum Bi , e se x ∈ Bi1 ∩ Bi2
então existe Bi3 tal que x ∈ Bi3 ⊂ Bi1 ∩ Bi2 .
+
Demonstração. Como o próprio conjunto E é aberto, por definição, então E = i∈I Bi para
alguma família {Bi }i∈I ⊂ B . Assim, para todo x ∈ E existe pelo menos um Bi tal que
x ∈ Bi , o que demonstra a primeira condição. Agora, se Bi1 ∩ Bi2 ̸= ∅, como Bi1 ∩ Bi2 é
a interseção de dois conjuntos abertos, será um aberto. Logo, Bi1 ∩ Bi2 deve ser representado
como a união de conjuntos abertos {Bi }i∈I para alguma família {Bi }i∈I ⊂ B , de modo
que para todo x ∈ Bi1 ∩ Bi2 existe pelo menos um B tal que x ∈ B = Bi3 . Portanto,
x ∈ Bi3 ⊂ Bi1 ∩ Bi2 . Isto demonstra a segunda condição. Reciprocamente, suponha que a
família de conjuntos {Bi }i∈I satisfaz as condições acima. Se
! "
τ = Aj | ∀x ∈ Aj , ∃Bi ∈ B de tal forma que x ∈ Bi ⊂ Aj ,
+ + 8+ 9 +
então τ ∋ j∈J Aj = j∈J i∈I Bi j = k∈K Bk , devido às propriedades elementares da
união de conjuntos.
+ Pela primeira condição, como!cada x pertence
" a pelo menos um Bi , segue
τ
que E = i∈I Bi . Logo E ∈ . Considere! a "∪ x | x ∈ ∅ . Desde que o conjunto ∅ não
possui nenhum elemento, tem-se ∪ x | x ∈ ∅ = ∅. Em outras palavras, a união vazia, ∪∅,
τ
de conjuntos da base é um subconjunto vazio de E. Portanto, ∅ ∈ . Resta mostrar que a
interseção de dois conjuntos Aj1 ∩ Aj2 em τ τ
pertence a . Com efeito, tome x ∈ Aj1 ∩ Aj2 ;
então existem conjuntos Bi1 e Bi2 que pertencem à família {Bi }i∈I tais que x ⊂ Bi1 ⊂ Aj1 e
x ⊂ Bi2 ⊂ Aj2 . Pela segunda condição, existe Bi3 tal que x ∈ Bi3 ⊂ Bi1 ∩ Bi2 . Ora, mas isso
τ
implica que x ∈ Bi3 ⊂ Aj1 ∩ Aj2 ; assim Aj1 ∩ Aj2 ∈ , por definição.
27
Noções sobre Conjuntos e Topologia
1.2.4 Vizinhanças
DEFINIÇÃO 1.21. Sejam E um espaço topológico e x ∈ E. Um subconjunto V de E é chamado
uma vizinhaça de x ∈ E se existe um subconjunto aberto U de E tal que x ∈ U ⊂ V .
De acordo com esta definição, uma vizinhança pode ser aberta ou fechada, já que a única
coisa que é exigida é que V contenha um subconjunto aberto U de E tal que x ∈ U ⊂ V ,
para todo x ∈ E. Se V é aberto então dizemos que V é uma vizinhança aberta de x, caso
contrário dizemos que V é uma vizinhança fechada de x.
TEOREMA 1.5. Seja E um espaço topológico e V ⊂ E. As seguintes condições são equivalentes:
(1) V é aberto;
(2) V é uma vizinhança de cada um de seus elementos.
Demonstração. (1) ⇒ (2). Suponha que V é aberto. Seja x ∈ V . Então x ∈ V ⊂ V , assim V é
uma vizinhança de x.
(2) ⇒ (1). Suponha que a condição (2) seja satisfeita. Então, +
para cada x ∈ V existe um
′ ′
subconjunto aberto Ux de E tal que x ∈ Ux ⊂ V . Seja V = x∈V Ux . Então + V é aberto
′ ′
pelo Teorema 1.4. Devemos provar que V = V . Com efeito, ∀ x ∈ V ⇒ x ∈ x∈V Ux ⇒ x ∈
a pelo menos um Ux . Como cada Ux ⊂ V ⇒ x ∈+V ⇒ V ′ ⊂ V . Reciprocamente, como
∀ x ∈ V existe um Ux tal que x ∈ Ux ⊂ V ⇒ x ∈ x∈V Ux ⇒ x ∈ V ′ ⇒ V ⊂ V ′ . Logo V
é aberto.
Se o espaço E é equipado com uma métrica, podemos trocar U na Definição 1.21 acima por
uma bola aberta. Dessa foma temos a
DEFINIÇÃO 1.22. Sobre um conjunto E sobre o qual esteja definida uma métrica, diz-se que um
conjunto V é uma vizinhaça de x ∈ E se, e somente se, V contém, inteiramente, uma bola
aberta B(x; ε), de centro x e raio ε > 0, arbitrário.
Nota 1.19. De acordo com o Lema 1.2 e com o Exemplo 1.19, todo conjunto aberto na definição
de topologia é uma vizinhança de cada um de seus elementos (ou pontos). Assim, toda família
de bolas abertas é uma base de vizinhanças de x, uma vez que pelo Teorema 1.3 toda bola
aberta é um conjunto aberto. Isso é interessante, pois nos permite tomar vizinhanças de x tão
pequenas quanto se queira. Este fato é importante na definição de continuidade de uma função.
28
Noções sobre Conjuntos e Topologia
e 3 4
τ 2 = E, ∅, {1}, {2}, {1, 2} ,
são duas topologias em E. Isso nos permite comparar as topologias τ eτ
1 2. De fato, observe
τ τ
que todo aberto de 2 é um aberto de 1 . Isso nos leva à seguinte
τ τ
DEFINIÇÃO 1.23. Dado um conjunto E com topologias 1 e 2 , diz-se que 1 é mais finaτ
τ τ
que 2 se, para qualquer elemento x ∈ E, todo aberto contendo x segundo 2 é também um
τ τ τ
aberto segundo 1 . Ou seja, dado um A ⊂ E, A ∈ 2 implica que A ∈ 1 . Isto implica que
τ 2 ⊂ τ
1 – ou que τ
1 tem mais conjuntos abertos que 2. τ
Nota 1.20. Esta definição merece um comentário. Veja o que diz Munkres em seu livro “Topo-
τ τ
logy,” pg. 77, a respeito disso: “If ′ ⊃ , some mathematicians would say that ′ is larger τ
τ τ τ
than , and is smaller that ′ . This is certainly acceptable terminology, if not as vivid as the
words “finer” and “coarser.” Many mathematicians use the words “weaker” and “stronger” in this
τ
context. Unfortunately, some of them – particularly analysts – are apt to say that ′ is stronger
than τ τ τ τ
if ′ ⊃ , while others – particularly topologists – are apt to say that ′ is weaker
than τ in the same situtation! If you across the terms “stronger topology” or “weak topology” in
some book, you will have to decide from the context which inclusion is meant.” Fique atento!
τ τ
TEOREMA 1.6. Sejam B 1 e B 2 bases para as topologias 1 e 2 , respectivamente, sobre E.
τ τ
Então para que 1 seja mais fina que 2 é necessário e suficiente que para cada x ∈ E e para
cada B ∈ B 2 contendo x, exista um elemento de base B ′ ∈ B 1 tal que x ∈ B ′ ⊂ B.
τ
Demonstração. Suficiência. Dado um elemento U ∈ 2 , queremos mostrar que U ∈ 1 . Uma τ
τ
vez que B 2 gera 2 , existe B ∈ B 2 tal que x ∈ B ⊂ U. Assuma a existência de B ′ ∈ B 1
tal que B ′ ⊂ B. Isto imediatemente implica que x ∈ B ′ ⊂ U ∈ 1 . τ
Necessidade. Tome um x ∈ E e um B ∈ B 2 tal que x ∈ B. Como B ∈ 2 , por τ
τ τ τ τ
definição, B ∈ 1 pela hipótese que 2 ⊂ 1 . Uma vez que 1 é gerada por B 1 , B pode
ser escrito como uma união de elementos de B 1 . Isto implica que, para x ∈ E, existe um
elemento B ′ ∈ B 1 tal que x ∈ B ′ ⊂ B.
DEFINIÇÃO 1.24. Dadas duas métricas d1 e d2 no mesmo conjunto E, diz-se que d1 é mais fina
do que d2 , e escreve-se d1 ≻ d2 se, e somente se, toda bola aberta segundo d2 contém uma bola
aberta, de mesmo centro, segundo d1 ; isto é, se
3 4 3 4
Bd2 (x; ε) = y ∈ E | d2 (x, y) < ε ⊃ Bd1 (x; δ) = y ∈ E | d2 (x, y) < δ < ε .
Da Definição 1.24 e do Teorema 1.6 temos o seguinte
τ τ
COROLÁRIO 1.4. Sejam d1 e d2 duas métricas sobre E. Sejam 1 e 2 as topologias induzidas
τ τ
pelas métricas d1 e d2 , respectivamente, sobre E. Então 1 é mais fina do que 2 se, e somente
se, para cada x ∈ E e para cada ε > 0, existe um δ > 0 tal que Bd1 (x; δ) ⊂ Bd2 (x; ε).
29
Noções sobre Conjuntos e Topologia
τ τ
Demonstração. Se 1 é mais fina que 2 , então todo aberto A ⊂ E pertencente a 2 tambémτ
τ τ
pertence a 1 , por definição. Seja B 1 uma base para 1 formada por bolas abertas Bd1 (x; δ),
de centro x ∈ A e raio δ = 1/m, em que m é um inteiro positivo. Seja B 2 uma base para 2 τ
formada por bolas abertas Bd2 (x; ε), de centro em x ∈ A e raio ε = 1/n, em que n também
é um inteiro positivo. Tome m < n; então Bd1 (x; δ) ⊂ Bd2 (x; ε). Logo, x ∈ A implica que
{x} ⊂ Bd1 (x; δ) ⊂ Bd2 (x; ε) ⊂ A. Reciprocamente, sejam Bd1 (x; δ) um elemento da base
τ τ
B 1 ⊂ 1 e Bd2 (x; ε) um elemento da base B 2 ⊂ 2. Se Bd1 (x; δ) ⊂ Bd2 (x; ε), assim
para todo aberto A ⊂ E temos que, se x ∈ A então x ∈ Bd1 (x; δ) ⊂ Bd2 (x; ε) ⊂ A. Logo,
τ τ
A ∈ 2 implica que A ∈ 1 . Isto resulta em 2 ⊂ 1 . τ τ
DEFINIÇÃO 1.25. Sejam d1 e d2 duas métricas no mesmo conjunto E. Diz-se que d1 e d2 são
equivalentes, e escreve-se d1 ∼ d2 , quando d1 ≻ d2 , e ao mesmo tempo d2 ≻ d1 .
Das Definições 1.24 e 6.42 segue o seguinte
COROLÁRIO 1.5. Sejam d1 e d2 duas métricas no mesmo conjunto E. Afim que se tenha d1 ∼ d2
em E, é necessário e suficiente que toda bola aberta segundo uma dessas métricas contenha uma
bola aberta de mesmo centro segundo a outra métrica.
PROPOSIÇÃO 1.10. Para que duas métricas d1 e d2 no mesmo conjunto E sejam equivalentes
deve existir uma constante c > 0 tal que d1 (x, y) # c · d2 (x, y) e d2 (x, y) # c · d1 (x, y)
quaisquer que sejam x, y ∈ E.
Demonstração. Sejam m e n números inteiros positivos tais que Bd1 (x; ε/n) ⊂ Bd2 (x; ε) e
Bd2 (x; ε/m) ⊂ Bd1 (x; ε), para todo x ∈ E e ε > 0. Note que a primeira inclusão mostra
que d2 # n · d1 . De fato, d2 # n · d1 < n · (ε/n). Da mesma forma, a segunda inclusão
mostra que d1 # m · d2 . Tomando-se c = sup {m, n}, segue que d1 (x, y) # c · d2 (x, y) e
d2 (x, y) # c · d1 (x, y).
Nota 1.21. A condição da Proposição 1.10 (a existência da constante c) é suficiente porém não
é necessária para que duas métricas sejam equivalentes. Para tornar isto claro, vamos tomar o
seguinte exemplo do livro do Elon, “Espaços Métricos,” pg. 47: seja d uma métrica no conjunto
E. Defina
d(x, y)
d1 (x, y) = .
1 + d(x, y)
Assuma que d é ilimitada. Então, não pode existir uma constante c > 0 tal que d(x, y) #
c · d1 (x, y), para quaisquer x, y ∈ E. Com efeito,
d(x, y)
d(x, y) # c · d1 (x, y) =⇒ d(x, y) # c · =⇒ 1 + d(x, y) # c ,
1 + d(x, y)
quando x ̸= y. Isto contradiz o fato que d é ilimitada.
PROPOSIÇÃO 1.11. Para que duas métricas d1 e d2 no mesmo conjunto E definam a mesma
topologia, é necessário e suficiente que elas sejam equivalentes.
τ τ
Demonstração. Se 1 e 2 são as topologias definidas por d1 e d2 , respectivamente, então
τ 1 = τ2 se, e somente se, τ1 ⊂ τ 2 e τ2 ⊂ τ
1 . Pelo Corolário 1.4, existem números
reais m e n tais que Bd1 (x; ε/n) ⊂ Bd2 (x; ε) e Bd2 (x; ε/m) ⊂ Bd1 (x; ε), para todo x ∈
E e ε > 0, e pela Proposição 1.10 estas inclusões implicam que d1 (x, y) # c · d2 (x, y) e
d2 (x, y) # c · d1 (x, y). Logo, d1 e d2 são equivalentes. Reciprocamente, assuma que d1 e d2
30
Noções sobre Conjuntos e Topologia
são equivalentes. Então dado que d1 (x, y) # c · d2 (x, y), segue que Bd2 (x; ε/c) define um
τ
elemento da base B 2 ⊂ 2 , enquanto Bd1 (x; ε) define um elemento da base B 1 ⊂ 1 . τ
Como Bd2 (x; ε/c) ⊂ Bd1 (x; ε), logo para todo aberto A ⊂ E segue que x ∈ A implica
τ τ
x ∈ Bd2 (x; ε/m) ⊂ Bd1 (x; ε) ⊂ A. Disso resulta que 2 ⊂ 1 . Analogamente, como ao
τ τ τ
mesmo tempo temos d2 (x, y) # c · d1 (x, y), então 1 ⊂ 2 . Portanto, segue que 1 = 2 τ
como era para ser provado.
31
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Figura 1.1: Espaços Hausdorff, regular e normal, respectivamente. Figura retirada, e adptada, do
livro-texto de J.R. Munkres, “Topology,” Second Edition, Prentice Hall, 2000. Todos os Direitos
Reservados.
Nota 1.23. Note que, devido ao fato de termos incluído a condição que conjuntos singletos {x}
sejam fechados como parte da definição dos espaços T3 e T4 , segue que T4 ⇒ T3 ⇒ T2 ⇒ T1 .
A letra “T ” usada para rotular os espaços T1 (Tychonoff), T2 (Hausdorff), T3 (regular) e T4
(normal) vem do alemão “Trennungsaxiom,” que significa “axioma de separação.”
32
Noções sobre Conjuntos e Topologia
x1 x2
xn0
ε
x
TEOREMA 1.7. Seja E um espaço munido com uma métrica. Então, se uma sequência (xn )n∈N ⊂
E é convergente, ela é limitada.
TEOREMA 1.8. Sejam E um espaço munido com uma métrica e (xn )n∈N uma sequência con-
vergente em E, com x sendo seu limite. Então, toda subsequência de (xn )n∈N converge para x.
Demonstração. Seja (xnk )k∈N uma subsequência. Então, para qualquer bola aberta B(x; ε), de
centro x e raio ε, existe, por definição, um n0 ∈ N tal que todos os termos da sequência (xn )n∈N
com n > n0 pertencem à bola B(x; ε). Ora, neste caso, todos os termos da subsequência
(xnk )k∈N , como nk > n0 também pertencem a B(x; ε). Logo limk→∞ xnk = x.
33
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Nota 1.25. A recíproca do Teorema 1.8 não é verdadeira. Podemos ter subsequências conver-
gentes sem que a sequência,
! da qual as"subsequências foram geradas, convirja. Tome como
exemplo a sequência 2, 0, 2, 0, 2, 0, . . . , cujo n-ésimo termo é xn = 1 + (−1)n+1 . Esta
sequência não é convergente, pois tem os pontos 0 e 2 como pontos aderentes. No entanto,
as subsequências constantes (x2n−1 )n∈N e (x2n )n∈N , cujos os n-ésimos termos são x2n−1 =
1 + (−1)2n e x2n = 1 + (−1)2n+1 , respectivamente, são convergentes, com limn→∞ x2n−1 = 2
e limn→∞ x2n = 0. Notamos, desse exemplo, que toda subsequência pode ser vista como uma
sequência. Para tanto, basta definir yk = xnk .
O próximo conceito está intimamente relacionado com o fato do conjunto dos reais ser
totalmente ordenado.
DEFINIÇÃO 1.30 (Sequências monótonas). Diz-se que a sequência (xn )n∈N de números reais
é monótona não-decrescente se xn # xn+1 para todo n ∈ N. Analogamente, diz-se que a
sequência (xn )n∈N é monótona não-crescente se xn " xn+1 para todo n ∈ N.
A nomenclatura não-decrescente (ou não-crescente) é usada para enfatizar que alguns termos
da sequência podem ser iguais. Os nomes crescente e decrescente são reservados para os casos
em que todos os termos são diferentes: x1 < x2 < · · · e x1 > x2 > · · · , respectivamente.
TEOREMA 1.9. Seja (xn )n∈N uma sequência de números reais monótona não-decrescente,
tal que o conjunto {xn } tem uma cota superior. Então, (xn )n∈N é convergente e seu limite é
o supremo do conjunto {xn }. Analogamente, seja (xn )n∈N uma sequência de números reais
monótona não-crescente, tal que o conjunto {xn } tem uma cota inferior. Então, (xn )n∈N é
convergente e seu limite é o ínfimo do conjunto {xn }.
Demonstração. Seja a o supremo do conjunto {xn }. Dado um ε > 0 arbitrário, pela definição
de supremo, existe um elemento do conjunto {xn }, digamos xn0 , tal que a − ε < xn0 # a.
Como a sequência é monótona não-decrescente, segue-se que xn > a − ε para todo n > n0 .
Logo, |xn − a| < ε para todo n > n0 , o que prova que a sequência (xn )n∈N converge
para a = sup {xn }. Evidentemente, raciocínio análogo vale para uma sequência monótona
não-crescente.
DEFINIÇÃO 1.31 (Critério de Cauchy). Uma sequência (xn )n∈N converge se para todo ε > 0,
existe n0 ∈ N tal que para todo m, n > n0 temos que d(xm , xn ) < ε.
Para que uma sequência (xn )n∈N respeite o critério de Cauchy, é preciso que seus termos
xm e xn , para valores suficientemente grandes dos índices m e n se aproximem arbitrariamente
uns dos outros. Ou seja, se impõe uma condição sobre os termos da própria sequência. Uma
sequência de Cauchy também é chamada sequência fundamental.
34
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Demonstração. Se limn→∞ xn = x, então dado um ε > 0, existe n0 tal que para todo n > n0
temos que d(x, xn ) < ε/2. Isto implica que se tomarmos m, n > n0 , teremos que d(xm , xn ) #
d(xm , x) + d(x, xn ) < ε/2 + ε/2 = ε. Assim, limn→∞ xn = x é de Cauchy.
COROLÁRIO 1.6. Toda sequência de Cauchy é limitada.
PROPOSIÇÃO 1.15. Em um espaço Hausdorff, E, limites de sequências são únicos.
Demonstração. Dado que E é Hausdorff, existem vizinhanças Vx de x e Vy de y tais que
Vx ∩ Vy = ∅. Suponha, por absurdo, que limn→∞ xn = x e limn→∞ xn = y, com x ̸= y.
Então, existem n′0 , n′′0 ∈ N, tais que xn ∈ Vx para todo n > n′0 e xn ∈ Vy para todo n > n′′0 .
Seja n0 um inteiro maior que n′0 e n′′0 . Então, xn ∈ Vx ∩ Vy , para todo n > n0 , contradizendo
a hipótese que E é Hausdorff.7
Nota 1.26. Note que a proposição acima não estabelece que em um espaço Hausdorff toda
sequência tem um limite. Ela somente estabelece que o limite, se ele existe, é único.
Nota 1.27. O fato de que em um espaço Hausdorff os limites de sequências são únicos, não
garante que o inverso seja verdade. Ou seja, o conceito de limite de uma sequência não é
forte o bastante para caracterizar espaços Hausdorff. Esta “inadequabilidade” de sequências
ocorre porque a convergência de sequências em um espaço não é suficiente para determinar
univocamente propriedades topológicas de um espaço. Para assegurar que propriedades topoló-
gicas importantes, como ser Hausdorff, possam ser caracterizadas em termos de convergência,
uma generalização apropriada de sequências deve ser usada. Essa generalização é conhecida
como Rede, com o conjunto de índices N sendo substituído por conjuntos direcionados arbitrá-
rios. Outro conceito que permite caracterizar propriedades topológicas através de convergência
é conhecido como Filtros. Tanto o conceito de Rede como o conceito de Filtros não serão
abordados aqui.
Exemplo 1.21 (Caso particular). Espaços munidos de uma métrica são casos particulares para
os quais o inverso da Proposição 1.15 acontece. Com efeito, se limn→∞ xn = x, então xn ∈
B(x; r) para todo n > n0 . Para x ̸= y, tome r = d(x, y)/3, isto implica que d(y, xn ) > r
para todo n > n0 . Logo, xn ∈/ B(x; r) ∩ B(y; r). Assim, B(x; r) ∩ B(y; r) = ∅, de onde se
conclui que E é Hausdorff.
Nota 1.28. O fato de que em espaços munidos de uma métrica o inverso da Proposição 1.15
acontece, se deve, em particular, ao fato de bolas abertas formarem um sistema fundamental
de vizinhanças que satisfazem a um axioma chamado Primeiro Axioma da Enumerabilidade
(PAE). Vamos mostrar, mais adiante, que se um espaço topológico E satisfaz o PAE em que toda
sequência convergente possui um único limite, então E é Hausdorff.
35
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Note que, pela definição acima, dizer que um elemento x ∈ M é um ponto aderente de
E ⊂ M, significa dizer que existem pontos de E arbitrariamente próximos de x, ou seja, para
cada ε > 0, podemos encontrar sempre um elemento y ∈ E tal que d(x, y) < ε.
Exemplo 1.22. Se E é um subconjunto de um conjunto M sobre o qual esteja definida uma
métrica, então todo elemento pertencente a E é aderente a E, basta tomarmos x = limn→∞ xn ,
com xn = x para todo n ∈ N.
Exemplo 1.23. Se E for um subconjunto de R que é limitado por cima, então, o sup E é
aderente a E.
Exemplo 1.24. Um subconjunto E de um espaço métrico M contém todos os seus pontos
aderentes se, e somente se, E é fechado em M. Intuitivamente, isto significa que, sendo E um
conjunto aberto que delimita o interior de uma área (não incluindo os pontos de fronteira), os
pontos aderentes de E são os próprios pontos de E mais os pontos de fronteira.
PROPOSIÇÃO 1.16. Seja M um conjunto sobre o qual esteja definida uma métrica. Então, um
elemento x ∈ M é um ponto aderente de E ⊂ M se, e somente se, toda bola aberta de centro x
contém algum elemento de E.
DEFINIÇÃO 1.33. Seja M um conjunto sobre o qual esteja definida uma métrica. O fecho de
um subconjunto E ⊂ M, denotado por E, é o conjunto de todos os pontos de aderência de E
em M. Equivalentemente, o fecho E de E é o menor conjunto fechado que contém E, ou seja, é
a interseção de todos os conjuntos fechados que contêm E.
Exemplo 1.25. Seja M um conjunto sobre o qual esteja definida uma métrica. Então, ∅ = ∅,
M = M, E ⊂ E para todo E ⊂ M e se E ⊂ F =⇒ E ⊂ F .
DEFINIÇÃO 1.34. Seja M um conjunto sobre o qual esteja definida uma métrica. Diz-se que
um elemento x ∈ M é um ponto de acumulação, ou ponto limite, de E ⊂ M se existe uma
sequência (xn )n∈N de elementos de E \ {x}, dois a dois distintos, tal que limn→∞ xn = x.
Equivalentemente, diz-se que um elemento x ∈ M é um ponto de acumulação de E ⊂ M
quando toda
. bola de /centro x contém algum ponto de E diferente do ponto x, isto é, se tivermos
B(x; ε) ∩ E − {x} ̸= ∅.
Deve-se ressaltar que o ponto x pode situar-se em E, ou não; pela definição acima isto não
importa! O conjunto de todos os pontos de acumulação de E é, muitas vezes, representado por
E ′ , sendo denominado o derivado do conjunto E. Ainda, de acordo com a Definição 1.34, a
união E ∪ E ′ não é necessariamente disjunta. De fato, se x ∈ E ∪ E ′ , ou x ∈ E ou x ∈ / E;
então toda bola de centro x deve conter um ponto y ∈ E que, necessariamente, é diferente de
x; portanto, x ∈ E ′ .
TEOREMA 1.10. Seja M um conjunto sobre o qual esteja definida uma métrica e E ⊂ M. Se x
é um ponto de acumulação de E, então toda bola aberta de raio arbitrário ε e centrada em x
contém uma infinidade de pontos de E.
36
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Demonstração. Provaremos. o /teorema por contradição.8 Assuma que exista uma bola aberta
tal que B(x; ε) ∩ E − {x} ̸= ∅ e que esta bola contenha um número finito de pontos
x1 , x2 , . . . , xn de E. Seja r = mini=1,2,...,n {d(x, xi )}. Como ε é arbitrário, podemos tomar
ε = r/2; no entanto,
. a bola
/ aberta B(x; r/2) não conterá pontos de E distintos de x, ou seja,
B(x; r/2) ∩ E − {x} = ∅. Isto, com certeza, é uma contradição, de forma que o teorema
está provado.
De acordo com o teorema acima, um conjunto E com um número finito de elementos
não pode ter qualquer ponto de acumulação. Entretanto, podem existir conjuntos infinitos que
também não têm pontos de acumulação. O exemplo mais simples desse fato é representado
pelo conjunto dos inteiros, Z. Com efeito, se x é um inteiro, a bola aberta B(x; 1) não contém
outros inteiros além do próprio x.
Existe uma outra forma de descrever o fecho de um conjunto, uma forma que envolve o
conceito de pontos de acumulação, como mostra a seguinte
DEFINIÇÃO 1.35. Seja M um conjunto sobre o qual esteja definida uma métrica. O fecho de um
subconjunto E ⊂ M, denotado por E, é o conjunto de todos os pontos de E mais os pontos de
acumulação de E em M.
Nota 1.29. As Definições 1.33 e 1.35 podem dar margem para a interpretação que “pontos de
aderência = pontos de acumulação.” Apesar desses conceitos serem muito próximos, existe
uma sutil diferença entre eles. Primeiro já deve ficar claro que, dado um conjunto M sobre o
qual esteja definida uma métrica, a definição de ponto aderente difere daquela de um ponto
de acumulação, uma vez que para um ponto x ser um ponto de acumulação é necessário
que cada bola aberta contendo x contenha pelo menos um ponto de E diferente de x, ou
seja, que xn ̸= x para todo n ∈ N. Sem essa condição, qualquer ponto seria um ponto de
acumulação. Para ver isso, bastaria tomar uma sequência constante igual a x que, naturalmente,
converge sempre para x. Noutros termos, o conjunto de pontos que são limites em E de
sequências não-constantes em E são os pontos de acumulação de E. Assim, E, o fecho
de E em M é E ∪ {limites de todas as sequências não-constantes em E}. Segundo, pode
ocorrer de um elemento x ser aderente a um conjunto E sem pertencer a esse conjunto.
Neste caso, x é um ponto de acumulação. Por exemplo, tome E = B(0; 1) ⊂ Rn , isto é,
E é a bola aberta de centro na origem e raio 1 em Rn . O ponto e1 = (1, 0, . . . , 0) ∈ / E;
no entanto, tomando xn = (1 − 1/n, 0, . . . , 0), vemos que xn ∈ E para todo n ∈ N e
limn→∞ xn = e1 . Logo e1 é aderente a E. Este exemplo nos mostra que cada ponto de
acumulação é um ponto aderente. Por outro lado, a recíproca não é verdadeira. Um ponto
aderente que não é um ponto de acumulação é um ponto isolado. Por exemplo, considere o
8
Uma prova direta pode ser encontrada no livro-texto do Elon L. Lima, “Espaços Métricos,” Projeto Euclides,
IMPA, Terceira Edição, 1993, pg.79.
37
Noções sobre Conjuntos e Topologia
! "
subconjunto E = x | x ∈ (0, 1) ou x = 2 = (0, 1) ∪ {2} ⊂ R. O conjunto de todos
os pontos de acumulação de E é composto pelo intervalo fechado [0, 1]; ou seja, 0 e 1 são
pontos de acumulação de E, uma vez que toda vizinhança de 0 e 1, isto é, os intervalos abertos
(0 − ε, 0 + ε) e (1 − ε, 1 + ε), em que ε é arbitrário, contêm sempre pontos de E. Já o conjunto
de todos os pontos aderentes é [0, 1] ∪ {2}. Nesse caso, 2 é um ponto isolado em E, uma
vez que (2 − 1/2, 2 + 1/2) ∩ E contém unicamente o elemento {2}. Portanto, 2 é um ponto
aderente, mas não é um ponto de acumulação. Claramente, E não é fechado, uma vez que os
pontos de acumulação 0 e 1 não pertencem à E. Contudo os intervalos abertos (0 − ε, 0 + ε)
e (1 − ε, 1 + ε) contêm !uma infinidade de pontos" de E (veja o Teorema 1.10 abaixo). O fecho
de E é o conjunto E = x | x ∈ [0, 1] ou x = 2 = [0, 1] ∪ {2}. Portanto, de acordo com o
exemplo acima, a aderência de um conjunto E ⊂ M é o conjunto E formado pelos pontos de
E e por seus pontos de acumulação!
Já foi definido anteriormente que se E é um subconjunto de M, então E é fechado em M
se M − E é aberto em M. Queremos, agora, provar a seguinte
!
Demonstração. Seja Nx a coleção (ou família) de vizinhanças de x. Seja B = x ∈ M | U ∈
"
Nx ⇒ U ∩E ̸= ∅ . Temos que mostrar que E = B, o que significa mostrar que E ∪E ′ = B.
Tome x ∈ E ∪ E ′ . Se x ∈ E então, certamente, toda vizinhança de x intercepta E, no mínimo
no ponto x, e assim x ∈ B. Se x ∈ E ′ então também toda vizinhança de x contém um ponto
38
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Nota 1.30. O Teorema 1.11 nos fornece uma forma para “testar” se um ponto particular pertence
ao fecho de um conjunto. Em certo sentido, ele diz que o fecho E de E consiste de todos
pontos que estão próximos a E. Por exemplo, seja M um espaço equipado com uma métrica e
E um subconjunto não-vazio !de M. Lembre-se"que para x ∈ M a distância de x a E é dada
pela expressão d(x, E) = inf d(x, y) | y ∈ E . Logo, d(x, E) é a menor distância do ponto
! "
x ao conjunto E. Assim, E é precisamente o conjunto x ∈ M | d(x, E) = 0 .
DEFINIÇÃO 1.37. Diz-se que um conjunto E é completo se, e somente se, toda sequência de
Cauchy em E tem como limite um elemento x ∈ E.
Exemplo 1.26 (Completude do conjunto R). Já vimos que o conjunto Q dos números ra-
cionais não é completo, visto que existem sequências de números racionais que conver-
gem
! para números irracionais. " Por exemplo, o √ limite da sequência dos números racionais
1; 1, 4; 1, 41; 1, 412;
! . . . é o número irracional
" 2, enquanto que o limite da sequência dos
números racionais 3; 3, 1; 3, 14; 3, 141; . . . é o número irracional π. Já o limite da sequência
dos números racionais (xn )n∈N , em que xn = (1 + 1/n)n , é o número neperiano e, um número
irracional aproximadamente igual a 2, 71828.
Por outro lado, o conjunto dos reais R, sendo a união dos conjuntos dos números racionais
e irracionais, é completo: o limite de toda sequência de Cauchy de números reais é um número
real. Assim, o conjunto R é um resultado do completamento de Q.
39
Noções sobre Conjuntos e Topologia
O exemplo acima sugere o que precisamos fazer para tornar completo um espaço incompleto
E: devemos ampliar o espaço E adicionando-lhe todos os possíveis limites de sequências de
Cauchy de forma a obter um conjunto completo. Neste caso, o espaço original E deve ser
denso no espaço maior obtido pela ampliação de E. Isto nos leva à noção de completude de
um espaço!
DEFINIÇÃO 1.38 (Conjunto denso em espaços métricos). Seja M um conjunto sobre o qual
esteja definida uma métrica. Considere dois subconjuntos E, F de M tais que E ⊂ F . Diz-se
que o conjunto E é denso em F se, para todo y ∈ F e todo ε > 0 arbitrário, existe um elemento
x ∈ E tal que d(x, y) < ε.
Nota 1.31. De acordo com a definição acima todo elemento de F pode ser aproximado (no
sentido da métrica) arbitrariamente por elementos do conjunto E. Em outras palavras, para
todo elemento y ∈ F existe uma sequência (xn )n∈N ∈ E tal que limn→∞ xn = x. Note ainda
que, o fecho de E contém F : E ⊃ F . Em particular, se E = F , diz-se que E é denso em
toda parte em F (ou everywhere dense em F ). Trivialmente, um conjunto é sempre denso
em si próprio. Um subconjunto E de M que é tanto fechado e denso em si próprio é chamado
conjunto perfeito. Se o exterior de E é denso em M, então E é dito ser denso em nenhum
lugar em M (ou nowhere dense em M).
Exemplo 1.27. O conjunto dos racionais Q é denso em toda parte em R, visto que Q = R.
Informalmente, podemos dizer que todo ponto em R está em Q, ou arbitrariamente “próximo”
de um elemento de Q. Assim, em certo sentido, o conjunto Q está “bem próximo” do conjunto
R, embora R contenha um número infinito de elementos que não estão em Q. Por outro lado,
Z é nowhere dense em R.
Combinando as observações feitas na Nota 1.30 com o conceito de conjunto denso, temos
uma interpretação geométrica concreta para o caso de espaços métricos. Com efeito, se E é
denso em M, em que M é um espaço equipado com uma métrica, toda sequência (xn )n∈N ∈ E
tem um limite x ∈ E = M. Isto significa que, para todo ε > 0 escolhido arbitrariamente,
d(xn , x) < ε, para n suficientemente grande, quando xn ∈ E. Reciprocamente, se d(x, x0 ) <
ε, tal que x0 ∈ E, então escolhendo-se valores de ε cada vez menores, obtemos uma sequência
de elementos de E convergindo para um ponto em M. Isto prova o seguinte
TEOREMA 1.12. Seja M é um espaço equipado com uma métrica e E ⊂ M. Então, E é denso
em toda parte em M se, e somente se, para todo ε > 0, escolhido arbitrariamente, e todo x ∈ M
existe um elemento x0 ∈ E tal que d(x, x0 ) < ε.
Exemplo 1.28 (Incompletude do espaço C[0, 1]). Considere uma sequência infinita (fn )n∈N
de funções contínuas definidas por
⎧
⎪
⎪ 0, se 0 # x # 21 − n+2
1
⎪
⎨ . /
fn (x) = (n + 2) x − 21 + n+2
1
, se 21 − n+21
# x < 21 .
⎪
⎪
⎪
⎩
1, se 21 # x # 1
A sequência (fn )n∈N é uma sequência de Cauchy contida no espaço C[0, 1]. Os elementos
vizinhos fn e fn+1 ficam infinitamente próximos um do outro à medida que n aumenta. A
figura abaixo mostra o comportamento de aproximação dos elementos da sequência (fn )n∈N ,
onde estão representados os elementos f1 , f2 e f18 , respectivamente.
40
Noções sobre Conjuntos e Topologia
fn (x)
···
1 1 9 1
x
6 4 20 2 1
Note que para um n arbitrário, os elementos fn são contínuos durante todo o intervalo [0, 1].
O limite desta sequência de Cauchy é escrito como
⎧
⎨0 , se 0 # x < 21
f (x) = lim fn (x) = .
n→∞ ⎩1 , se 1 # x # 1
2
Este limite é uma função descontínua, mostrando um salto discreto em x = 1/2. Devido à
descontinuidade, este limite não pertence ao espaço de funções contínuas C[0, 1]. Portanto,
C[0, 1] é um espaço incompleto.9 Embora a sequência infinita (fn )n∈N esteja completamente
contida em C[0, 1], seu limite está fora de C[0, 1].
O exemplo acima nos leva à seguinte questão: que tipo de espaço de função obtemos
a partir do completamento de C[0, 1]? A resposta é um espaço de Lebesgue, comumente
representado por L1 [0, 1]. Em outras palavras, ao realizarmos o completamento do espaço
C[0, 1], adicionando ao espaço C[0, 1] as funções limites que são excluídas de C[0, 1], geramos
um novo espaço mais amplo de funções, chamado L1 [0, 1]. O espaço L1 [0, 1] é um espaço de
funções no qual a distância entre seus elementos é quantificada pela métrica d2 do Exemplo 1.3.
Deve-se ressaltar que, no completamento de C[0, 1], a distância d2 do Exemplo 1.3 é escolhida
em vez de d1 porque esta distância é aplicável a funções descontínuas.
TEOREMA 1.13 (Completamento de um espaço métrico). Seja M um espaço métrico in-
completo. Então, M pode ser estendido para um espaço métrico completo M adicionando-se
elementos apropriados, de modo que M seja um subconjunto denso de M .
Demonstração. O procedimento utilizado é análogo ao procedimento de Cantor ao estender o
sistema dos números racionais ao sistema dos números reais. Seguiremos a prova de G. Hellwig,
apresentada no livro “Differential Operators of Mathematical Physics,” Addison-Wesley, 1967. A
prova será dividida em quatro etapas.
Etapa 1. Seja x1 , x2 , . . . uma sequência de Cauchy em M. Denote por M a totalidade de
todas as sequências de Cauchy, isto é, defina x = (xn )n∈N , y = (yn )n∈N , . . . com xn , yn ∈ M.
Dois elementos x e y em M são assumidos iguais se, e somente se,
lim dM (xn , yn ) = 0 ,
n→∞
41
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Este limite sempre existe. Com efeito, sendo (xn )n∈N e (yn )n∈N sequências de Cauchy
com elementos xn , yn ∈ M, segue que para um ε > 0 arbitrário dM (xm , xn ) < ε/2 e
dM (ym , yn ) < ε/2. Logo,
Portanto,
De
segue que
logo,
42
Noções sobre Conjuntos e Topologia
= dM (x, w) + dM (w, y) .
Portanto, para todo x ∈ M existe uma sequência (xn )n∈N ⊂ M para a qual o limite
limn→∞ xn = x existe. Consequentemente, M é denso em M .
Etapa 4. Finalmente, precisamos mostrar que M é completo. Seja (xn )n∈N uma sequência
de Cauchy arbitrária em M . Como o conjunto M é denso em M , segue que para todo xℓ ∈ M
existe um xℓ ∈ M tal que
1
dM (xℓ , xℓ ) < para ℓ ∈ N . (1.2.9)
ℓ
Para dM (xn , xm ), temos a estimativa
para todo n ∈ N(ε). Isto implica que limn→∞ xn = x, que é equivalente à completeza de
M.
O próximo teorema é um resultado importante na topologia geral e na análise funcional. O
teorema fornece condições suficientes para que em um espaço topológico a interseção enume-
rável de abertos densos ainda seja densa.
43
Noções sobre Conjuntos e Topologia
TEOREMA 1.14 (Teorema de Baire). Seja M um espaço métrico completo. Toda interseção
enumerável de abertos densos é um subconjunto denso de M.
Isto é possível porque uma interseção finita de conjuntos abertos é um aberto (veja o Teorema
1.4) e, portanto, uma bola aberta centrada em xn pode ser encontrada dentro desta interseção.
Como xn ∈ B(xm , rm ) quando n > m, temos que xn é Cauchy e, portanto, xn converge para
algum limite x pela completude de M. Para qualquer n, por fechamento, x ∈ B(xn , rn ), isto
é, x ∈ ∩∞ n=1 B(xn , rn ) (isto é possível já que a interseção de uma família infinita de fechados é
um conjunto fechado; veja a Nota 1.15). Portanto, x ∈ A e x ∈ An para todo n.
Exemplo 1.29. Todo espaço E sobre o qual esteja definida uma métrica satisfaz o PAE. Para se
verificar isto, basta tomarmos !
uma coleção"de bolas abertas B(x; 1/n), de centro x e raio 1/n,
n ∈ N. Isto gera a sequência B(x; 1/n) n∈N .
LEMA 1.3. Se o PAE é satisfeito em um ponto x, então de um conjunto E qualquer que tem x
como ponto de acumulação, é possível selecionar uma sequência x1 , x2 , . . . que converge para x.
Demonstração. Primeiro notamos que podemos sempre considerar uma coleção de vizinhanças
decrescentes satisfazendo o PAE, isto é, tais que V!1 ⊃ V2 ⊃ · · · . De " fato, se este axioma
não é satisfeito por uma coleção de vizinhanças V1 , V2 , . . . , Vn , . . .! basta substituir cada
"
Vn por Wn = V1 ∩ V2 ∩ · · · ∩ Vn ,. A nova coleção de vizinhanças W1 , W2 , . . . , Wn , . . .
assim gerada satisfaz o PAE. Se x é um ponto de acumulação de algum conjunto E, podemos
escolher um ponto xn ∈ E em cada vizinhança Vn (assumindo que V1 ⊃ V2 ⊃ · · · ); então
limn→∞ xn = x. Na verdade, para qualquer vizinhança U de x existe alguma vizinhança
Vn ⊂ U tal que xn ∈ Vn . Visto que Vn+r ⊂ Vn , segue que xn+r ∈ Vn+r ⊂ U, para qualquer
r. Logo, qualquer vizinhança de x contém todos os pontos x1 , x2 , . . . partindo-se com algum
ponto, como exigido.
Podemos agora explorar o conceito de um sistema fundamental de vizinhanças para provar
um inverso da Proposição 1.15.
44
Noções sobre Conjuntos e Topologia
PROPOSIÇÃO 1.20. Se E é um espaço topológico que satisfaz o PAE, em que toda sequência
convergente possui um único limite, então E é Hausdorff.
Demonstração. Suponha que os limites de todas as sequências em E são únicos. Se E não é
Hausdorff, então existem dois pontos distintos x, y ∈ E que não têm vizinhanças mutualmente
disjuntas em E. Sejam Nx e Ny sistemas de vizinhanças de x e y, respectivamente. Seja
D = Nx × Ny e para (Un , Vn ) ∈ D e (Un+1 , Vn+1 ) ∈ D, defina (Un , Vn ) ≺ (Un+1 , Vn+1 )
se, e somente se, Un ⊃ Un+1 e Vn ⊃ Vn+1 . Isto torna D um conjunto ordenado, com a
ordem de inclusão inversa. Para qualquer Un ∈ Nx e Vn ∈ Ny , sabemos que Un ∩ Vn ̸= ∅.
Seja (xn )n∈N uma sequência em E. Tome xn ∈ Un ∩ Vn . Seja W uma vizinhança aberta
de x. Então, (W , E) ∈ D. Se (W , E) ≺ (Un , Vn ) em D, então Un ⊂ W e, assim,
xn ∈ Un ∩ Vn ⊂ Un ⊂ W . Logo, xn converge para x. Pelo mesmo raciocínio, pode-se mostrar
que xn converge para y também, contradizendo a hipótese. Portanto, E é T2 .
Vamos finalizar esta seção introduzindo um conceito importante relacionado à noção de
enumerabilidade de um conjunto.
DEFINIÇÃO 1.40 (Espaço Separável). Diz-se que um espaço topológico E é separável se existe
um conjunto D ⊂ E finito, ou enumerável, que é denso em E.
Exemplo 1.30. Um espaço M munido de uma métrica é separável se ele contém um subcon-
junto enumerável denso em toda parte. Do Teorema 1.12 segue
! que, se M é separável, " então,
para cada x ∈ M existe um conjunto enumerável de pontos x1 , x2 , . . . , xn , . . . tal que para
cada ε > 0, existe um elemento xn neste conjunto tal que d(x, xn ) < ε.
1.2.11 Continuidade
Os conceitos fundamentais da topologia, mais especificamente, a continuidade e a conver-
gência podem facilmente ser estabelecidos em termos de vizinhanças como mostra a seguinte
DEFINIÇÃO 1.41. Sejam E e F espaços topológicos, f um mapeamento de E para F e x0 ∈ E.
Diz-se que mapeamento f é contínuo em x0 se a seguinte condição é satisfeita: para toda
vizinhança B de f (x0 ) em F , existe uma vizinhança A de x0 em E tal que f (A) ⊂ B. Diz-se
que mapeamento f é contínuo sobre E se f é contínuo em todo ponto de E.
Exemplo 1.31 (Continuidade e limite). Sejam E e F espaços munidos com uma métrica, f
um mapeamento de E para F e x0 ∈ E. O mapeamento f é contínuo em x0 se para todo
ε > 0, existe δ(ε) > 0 tal que f (B(x0 ; δ)) ⊂ B(f (x0 ); ε). Isto é, qualquer bola B(f (x0 ); ε)
centrada na imagem f (x0 ) de qualquer ponto x0 ∈ E, contém a imagem de uma bola centrada
em x0 . Note que se E = F = R, então para x0 ∈ R e ε > 0 existe um δ > 0 tal que
6! "7 3 4
f y | |x0 − y| < δ ⊂ f (y) | |f (x0 ) − f (y)| < ε .
Isto é o mesmo que dizer que para x0 ∈ R e ε > 0, existe um δ > 0 tal que para 0 <
|x0 − y| < δ ⇒ |f (x0 ) − f (y)| < ε, que é a forma da definição de continuidade com a qual
o leitor talvez esteja mais familiarizado. A ideia está ilustrada na parte (a) da figura abaixo;
isto é, se y está suficientemente próximo de x0 , f (y) = a pode ser tomado tão próximo de
f (x0 ) quanto desejarmos. Por outro, lado, a parte (b) da mesma figura mostra o caso em que
f (x) é descontínua em x0 . Claramente, se tomamos um ε > 0 suficientemente pequeno, não
existe nenhum ponto a no contra-domínio e nenhum δ para os quais |f (x0 ) − a| < ε quando
45
Noções sobre Conjuntos e Topologia
|x0 − y| < δ. Se escolhermos x < x0 , então |f (x) − a1 | < ε quando |x0 − x| < δ; por outro
lado, se escolhermos x > x0 , então |f (x) − a2 | < ε quando |x0 − x| < δ. Então, a1 é chamado
o limite à esquerda de f (x) em x0 , enquanto a2 é chamado o limite à direita de f (x) em x0 .
f (x) f (x)
a+ε a2
a
a−ε a 2δ
a1
2δ
x0 x x0 x
(a) (b)
Observa-se que as duas métricas na definição acima podem ser diferentes, com a primeira
sendo a métrica euclidiana em Rn e a segunda métrica euclidiana sobre Rm , com a possibili-
dade de que m ̸= n.
Deve ficar claro que, a essência da noção de continuidade está realmente amarrada ao
conceito de vizinhança, em vez do conceito de limites ou do conceito do argumento ε–δ. De
fato, as Definições 1.41 e 1.42 são equivalentes!
Cada uma das três condições do teorema seguinte é uma possível definição de continuidade
de funções em espaços munidos com uma métrica.
TEOREMA 1.15 (Conceito de Continuidade). Sejam E e F espaços munidos com uma métrica,
f um mapeamento de E para F . As seguintes condições são equivalentes:
(a) Se A é aberto em F , então f −1 (A) é aberto em E.
(b) Para todo x ∈ E, e dado ε > 0, existe um δ > 0 tal que f (B(x; δ)) ⊂ B(f (x); ε).
Isto é, qualquer bola B(f (x); ε) centrada na imagem f (x) de qualquer ponto x ∈ E, contém a
imagem de uma bola centrada em x.
(c) xn → x ⇒ f (xn ) → f (x).
Demonstração. (a) ⇒ (b). Suponha (a) e sejam x ∈ E e ε > 0. Sendo que B(f (x); ε)
é aberto, temos por (a) que f −1 (B(f (x); ε)) é aberto. Uma vez que x ∈ f −1 (B(f (x); ε)),
existe um δ > 0 tal que, pelo Lema 1.2, é possível interpor entre x e f −1 (B(f (x); ε)) uma
bola aberta; isto é, {x} ⊂ B(x; δ) ⊂ f −1 (B(f (x); ε)), o que também pode ser escrito como
x ∈ B(x; δ) ⊂ f −1 (B(f (x); ε)). Portanto, do fato que A = f (f −1 (A)), para todo A ⊂ f (E),
segue que f (B(x; δ)) ⊂ B(f (x); ε).
46
Noções sobre Conjuntos e Topologia
(b) ⇒ (c). Suponha (b). Seja x o limite da sequência (xn )n∈N . Tome ε > 0. Escolha
δ(ε) > 0 tal que f (B(x; δ)) ⊂ B(f (x); ε). Como xn → x, existe N tal que para todo
n > N ⇒ xn ∈ B(x; δ) ⇒ f (xn ) ∈ B(f (x); ε). Portanto, f (xn ) → f (x).
(c) ⇒ (a). Suponha (c) e seja A ⊂ F aberto. Suponha por absurdo que f −1 (A) não seja
aberto, ou seja, f −1 (A) ∩ ∂f −1 (A) ̸= ∅. Sendo assim, tome x ∈ ∂f −1 (A). Naturalmente, a
bola aberta B(x; δ) ̸⊂ f −1 (A). Escolha xn ∈ B(x; δ) − f −1 (A), para todo inteiro n maior
que um inteiro n0 . Evidentemente, xn → x. Entretanto f (xn ) ̸∈ A, para todo n > n0 . Assim,
a bola aberta B(f (x); ε) não pode conter os elementos f (xn ); portanto, f (xn ) ̸→ f (x). Isto
contradiz (c).
Nota 1.32. Existe o risco de se confundir a condição (a) do Teorema 1.15 com a seguinte
condição: (a′ ) a imagem direta de um subconjunto aberto de E é um subconjunto aberto de
F . Esta confusão deve ser evitada. Mapeamentos satisfazendo a condição (a′ ) são chamados
mapeamentos abertos. Em outras palavras, a condição (a′ ) implica que f é contínuo se, e
somente se, a imagem inversa de cada conjunto aberto for novamente aberta (equivalentemente,
a imagem inversa de cada conjunto fechado será fechada). Se a imagem de cada conjunto
aberto for aberta, f será chamada de mapeamento aberto. Uma bijeção f é chamada de
homeomorfismo se a função f e sua inversa f −1 são contínuas. Note que se f é uma bijeção,
então, f −1 é contínua se, e somente se, f for um mapeamento aberto.
Nota 1.33. As expressões cobertura aberta e cobertura fechada, naturalmente, referem-se aos
casos em que todo conjunto Cλ ∈ C é aberto ou fechado, respectivamente. Uma cobertura C
é finita quando a coleção C+= {Cλ }λ∈L contém apenas um número finito de conjuntos. Se
existir L′ ⊂ L tal que F ⊂ λ∈L′ Cλ , diremos que C ′ = {Cλ}λ∈L′ é uma subcobertura de
C para F .
Nota 1.34. A definição acima pode ser imediatamente transformada numa propriedade de con-
juntos fechados de E, considerando-se os complementos (fechados) dos conjuntos abertos Cλ .
47
Noções sobre Conjuntos e Topologia
48
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Combinando os resultados acima com o fato que todo espaço topológico munido de uma
métrica é Hausdorff, temos o
COROLÁRIO 1.10. Todo subconjunto compacto de um espaço topológico munido de uma métrica
é fechado e limitado.
DEFINIÇÃO 1.46. Seja E um espaço topológico. Diz-se que E é localmente compacto se, e
somente se, todo ponto x ∈ E tem uma vizinhança compacta. Em outras palavras, um espaço
topológico é localmente compacto se todo ponto tem uma vizinhança cujo fecho é compacto.
Existe uma série de propriedades topológicas que são equivalentes à compacidade em espaços
métricos (mas não são equivalentes em espaços topológicos mais gerais). Entre estas se inclue
a seguinte
1. Cada cobertura aberta de F tem uma subcobertura finita. Esta é a definição topológica.
2. Cada sequência convergente tem uma subsequência convergente, que converge para o
mesmo ponto em F .
49
Noções sobre Conjuntos e Topologia
DEFINIÇÃO 1.48. Diz-se que uma família F de funções f definida em um intervalo fechado
[a, b] é uniformemente limitada se existe um número K > 0 tal que |f (x)| # K para todo
x ∈ [a, b] e toda função f ∈ F .
DEFINIÇÃO 1.49. Diz-se que uma família F de funções f definida em um intervalo fechado
[a, b] é equicontínua se, dado qualquer ε > 0, existe um número δ > 0 tal que |x′ − x′′ | < δ
implica que |f (x′ ) − f (x′′ )| < ε para todo x′ , x′′ ∈ [a, b] e toda função f ∈ F .
A prova do próximo teorema pode ser encontrada no livro de A.N. Kolmogorov & S.V. Fomin,
“Introductory Real Analysis,” pg.102, Dover, 2017.
TEOREMA 1.17 (Teorema de Arzelà). Uma condição necessária e suficiente para uma família
F de funções contínuas f definida em um intervalo fechado [a, b] ser relativamente compacta
em C[a, b], é que F seja uniformemente limitada e equicontínua.
DEFINIÇÃO 1.50. Seja {Ω1 , . . . , Ωm } uma cobertura aberta indexada e finita de um espaço E
munido de uma métrica. Uma família indexada de funções contínuas Φk : E → [0, 1], para
k = 1, . . . , m, é dita ser uma partição
;mda unidade subordinada à cobertura {Ω1 , . . . , Ωm } se:
(1) supp Φk ⊂ Ωk para todo k; (2) k=1 Φk = 1.
TEOREMA 1.18 (Existência de partições finitas da unidade). Seja {Ω1 , . . . , Ωm } uma cober-
tura aberta finita de um espaço normal E munido de uma métrica.10 Então, existe uma partição
da unidade subordinada à cobertura {Ωk }mk=1 .
50
Noções sobre Conjuntos e Topologia
contínuas com valor real em um espaço normal E. Em outras palavras, o Lema de Urysohn é
um lema que estabelece que um espaço topológico é normal se, e somente, se dois subconjuntos
fechados disjuntos podem ser separados por uma função contínua. O Lema de Urysohn é uma
ferramenta crucial usada para provar vários teoremas importantes da Topologia e da Análise.
Evidentemente, se dois conjuntos abertos se sobrepõem, eles devem se sobrepor por uma
fronteira, e a fronteira sempre pode ser reduzida um pouco sem alterar a união dos conjuntos
(cf. a Figura 1.2). Este fato pode ser adequadamente generalizado como mostra o lema a seguir.
A B A B
Ω1
Ω2
Figura 1.3: Uma cobertura aberta de um conjunto compacto. Figura retirada, e adptada, do livro-
texto de Robert D. Richtmyer, “Principles of Advanced Mathematical Physics,” Vol. 1, Springer-
Verlag, 1978. Todos os Direitos Reservados.
+
Demonstração. Primeiro, note que a interseção de A com o complemento de ∞ k=2 Ωk (aqui,
Ω1 foi omitido) é um conjunto fechado e limitado K1 situado em Ω1 (isto é, K1 é a parte de
A que foi coberta por Ω1 , mas não por qualquer outro Ωk – cf. a Figura 1.4.
51
Noções sobre Conjuntos e Topologia
K1
Ω1
Ω′1
Então, sempre é possível encontrar um conjunto aberto intermediário Ω′1 que também contém
K1 tal !que o fecho Ω′1 de Ω′1"está contido no correspondente ! Ω1 . Com efeito, o conjunto "
Ω′1 = x | dist(x, K1 ) # 21 d , em que dist(x, K1 ) = inf ∥x − y∥ | x ∈ K1 , y ∈ / Ω1 ,
tem a propriedade necessária. Em outras palavras, se K1 é um conjunto limitado e fechado
em Rn contido no conjunto aberto Ω1 , então a distância d de K1 ao complemento de Ω1 é
positiva. Ou seja, existe uma margem em torno de K1 em Ω1 , cuja largura não é inferior a
d. Consequentemente, existe um conjunto aberto Ω′1 que contém K1 e cujo fecho está em Ω1 .
Claramente, Ω′1 pode substituir Ω1 na cobertura. Agora suponha que {Ω′1 ∪· · ·∪Ω′k−1 , Ωk ∪. . .}
seja uma cobertura obtida encolhendo-se os primeiros k − 1 conjuntos abertos. Então, a
interseção de A com o complemento de {Ω′1 ∪ · · · ∪ Ω′k−1 , Ωk+1 ∪ . . .} (agora Ωk foi omitido)
é um conjunto fechado e limitado Kk contido em Ωk . Então, Ω′k pode ser construído como foi
Ω′1 e uma indução em k prova o teorema.
LEMA 1.5 (Lema de Urysohn). Sejam K1 e K2 subconjuntos fechados disjuntos de um espaço
normal E munido de uma métrica. Então, existe uma função contínua f : E → [0, 1] tal que
f é 0 em K2 e 1 em K1 . Em particular, se E é localmente compacto e K1 é compacto, pode-se
escolher f com suporte compacto.
52
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Demonstração do Teorema 1.18. Nossa demonstração foi tomada do livro do Munkres, Topology,
Second Edition, Prentice Hall, 2000, pg.225.
Etapa 1. Primeiro, provamos que é possível “encolher” a cobertura {Ω1 , . . . , Ωm } para uma
cobertura aberta {Ω′1 , . . . , Ω′m } de E, de modo que Ω′k ⊂ Ωk para cada k. Prosseguimos por
indução. Primeiro, observe que o conjunto
A = E − (Ω2 ∪ · · · ∪ Ωm ) ,
é um subconjunto fechado de E. Como {Ω1 , . . . , Ωm } cobre E, o conjunto A está contido
no conjunto aberto Ω1 . Usando a normalidade de E, escolha um conjunto aberto Ω′1 contendo
A de modo que Ω′1 ⊂ Ω1 . Então, a coleção {Ω′1 , Ω2 , . . . , Ωm } cobre E. Em geral, dados os
conjuntos abertos {Ω′1 , . . . , Ω′k−1 }, de modo que a coleção
{Ω′1 , . . . , Ω′k−1 , Ωk , Ωk+1 , . . . , Ωm } ,
cobre E, tome 8 9
A = E − (Ω′1 ∪ · · · ∪ Ω′k−1 ) − (Ωk+1 ∪ · · · ∪ Ωm ) .
Então, A é um subconjunto fechado de E que está contido no conjunto aberto Ωk . Escolha Ω′k
para ser um conjunto aberto contendo A, de modo que Ω′k ⊂ Ωk . Logo, a coleção
{Ω′1 , . . . , Ω′k−1 , Ω′k , Ωk+1 , . . . , Ωm } ,
cobre E. No k-ésimo passo da indução, nosso resultado é comprovado.
53
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Nota 1.36. Devido ao fato de termos assumido em toda análise acima que E é um espaço
topológico munido de uma métrica, de acordo com a Nota 1.23, nós temos a seguinte relação:
T4 ⇒ T3 ⇒ T2 ⇒ T1 , em que T1 significa Tychonoff, T2 Hausdorff, T3 regular e T4 normal,
respectivamente. Isto significa que, o Lema de Urysohn poderia ser enunciado na seguinte
versão:
LEMA 1.6 (Versão do Lema de Urysohn para Espaços Hausdorff). Seja E localmente com-
pacto e Hausdorff. Se K ⊂ Ω ⊂ E, com K compacto e Ω aberto, então, existe uma função
contínua Φ : E → [0, 1] com suporte compacto tal que f (x) = 1 para todo x ∈ K e f (x) = 0
para todo x ∈ E \ Ω.
54
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Se, e somente se é uma forma de expressão para um teorema. Com uma certa frequência,
encontramos teoremas que afirma que uma certa condicão A é verdadeira se, e somente se, uma
certa condição B acontece. O correspondente símbolo lógico é ⇔. Equivalentemente, algumas
vezes afirma-se que uma condição necessária e suficiente para que A seja verdadeira é que B
aconteça, ou ainda que A é equivalente a B (a condição A é válida exatamente nas mesma
circunstâncias em que a condição B é). Sobre as condições de A e B, elas podem ser, cada
uma delas, verdadeira ou falsa, havendo assim, quatro possibilidades. Se a afirmação A se, e
somente se, B é verdadeira, temos:
condição A condição B ////
verdadeira verdadeira possível
verdadeira falsa impossível
falsa verdadeira impossível
falsa falsa possível
• Se (Suficiência) – Assuma que a condição B aconteça; então mostre que isto implica que
a condição A é verdadeira.
• Somente se (Necessidade) – Assuma que a condição A aconteça; então mostre que a
condição B segue como uma consequência.
Exemplo 1.34. Se x e y são números reais e y ̸= 0, podemos considerar a condição A como
sendo x ÷ y = 3. Uma condição suficiente para que A seja verdadeira é que x = 6 e y = 2.
Chamamos isto de condição B. Obviamente, se assumimos a condição B, então A é verdadeira.
Contudo, se a condição A é assumida como verdadeira, a condição B não necessariamente
segue como uma consequência. Assim, A é verdadeira se B é verdadeira e não somente se.
Por outro lado, assuma que B é a condição que afirma que x = 3y. Então B é uma condição
necessária e suficiente para que A aconteça. De fato, assuma que B aconteça, então isto implica
que a condição A é verdadeira. A seguir assuma que a condição A aconteça, então a condição
B segue como uma consequência.
55
Noções sobre Conjuntos e Topologia
I. 1 ∈ N,
Assuma que nos seja dada uma proposição P (n) que é verdadeira para todo n ̸= n̂, n ∈ N.
Seja M ⊂ N o conjunto dos números naturais para os quais P (n) é verdadeira. Então, pelo
Postulado I 1 ∈ N e 1̂ ̸= 1 (Postulado III); assim 1 ∈ M, isto é, P (1) é verdadeira. A seguir,
assuma que k ∈ M e que P (k), k̂ ̸= k, é verdadeira. Será que k̂ ∈ M? Vejamos. Se k1
é o sucessor de k̂, então k = k̂. Portanto, k̂ ∈ M. Logo, pelo Postulado V, M = N. Estas
observações nos leva à seguinte
1. P (1) é verdadeira,
2. se, para cada n = k, pode-se mostrar que P (k) é verdadeira, então o mesmo vale para
n = k + 1, isto é, P (k + 1) é verdadeira.
Em resumo, esse método funciona provando que o enunciado é verdadeiro para um valor
inicial, e então provando que o processo usado para ir de um valor para o próximo é valido. Se
ambas as coisas são provadas, então qualquer valor pode ser obtido através da repetição desse
processo.
Exemplo 1.35. Considere a soma
Sn = 1 + 2 + 3 + · · · + n . (1A.1)
n(n + 1)
Sn = , para n ∈ N . (1A.2)
2
56
Noções sobre Conjuntos e Topologia
Suponha que M é o conjunto dos números naturais para os quais a afirmação (1A.2) é verdadeira.
Usando a definição (6.2), vemos que
1(1 + 1)
S1 = 1 = .
2
Logo, 1 ∈ M. A seguir, suponha que (A.2) é verdadeira, isto é, suponha que n ∈ M. Então,
n(n + 1)
Sn+1 = Sn + n + 1 = +n+1
2
(n + 1)[(n + 1) + 1]
= .
2
Portanto, n + 1 ∈ M e, pelo princípio da indução matemática, M = N. Isto conclui a prova.
A prova por contradição é muito usada em teoremas de existência. Neste caso, é usada
para provar a existência de um elemento com determinada característica, sem no entanto
mostrar tal elemento. Por esta razão, alguns matemáticos a evitam quando possível, preferindo
métodos de prova construtivos. O fato é que existem teoremas para os quais só se conhece
prova por contradição, como o argumento de diagonalização de Cantor para demonstrar a
não-enumerabilidade dos números reais.
√
Exemplo 1.36. A prova que 2 √ não é um racional é um exemplo clássico de uma prova por
contradição. De fato, tome x = 2 e assuma que x é racional. Então, x = p/q, com p e q
escolhidos de modo que sejam ambos números inteiros ímpares. Assim, x2 = 2 = p2 /q 2 , o que
implica que p2 = 2q 2 . Portanto, p é par (se p fosse ímpar, p2 seria ímpar). Logo, p2 é divisível
por 4 e, dessa forma, q 2 é par, √
o que resulta ser q par. Isto contradiz a hipótese que p e q são
ambos ímpares. Assim, se x = 2, x é irracional.
57
Capítulo 2
Espaços Vetoriais Normados
S. Banach
59
Espaços Vetoriais Normados
1. fechamento: x + y ∈ X
2. associatividade: (x + y) + z = x + (y + z),
3. comutatividade: x + y = y + x,
4. vetor nulo: existe um vetor 0 ∈ X , o vetor nulo ou vetor zero, tal que x + 0 = x para
todo x ∈ X ,
1. fechamento: λx ∈ X
Em várias situações, estaremos interessados não somente com o espaço X em sua totalidade,
mas também em certos subsistemas chamados subespaços.
DEFINIÇÃO 2.2 (Subespaços Vetoriais). Um subconjunto não-vazio Y de um espaço vetorial
X sobre um corpo K é chamado um subespaço vetorial de X se Y é fechado com respeito às
operações de adição vetorial e multiplicação por um elemento de K definidas sobre X , isto é,
Y + Y ⊆ Y e αY ⊆ Y , para todo α ∈ K. Dito de outra forma, Y ⊂ X é um subespaço
vetorial de X se αx + βy ∈ Y , para todo x, y ∈ Y e α, β ∈ K.
60
Espaços Vetoriais Normados
TEOREMA 2.1. X = Y ⊕ Z se, e somente se, todo vetor x ∈ X tem uma única representação
x = y + z, para algum y ∈ Y e z ∈ Y .
DEFINIÇÃO 2.3. Por espaço quociente, denotado por X /Y , entendemos o conjunto de classes
de equivalência para a relação x − y ∈ Y . Isto é, x está relacionado a y se um pode ser obtido
do outro adicionando-se um elemento de Y . A classe de elementos equivalentes a x modulo Y
é muitas vezes denotada por [x] = x + Y , a translação de Y por x, uma vez que ela é dada
por ! "
[x] = x + n | n ∈ Y .
PROPOSIÇÃO 2.1. Defina por α[x] = [αx], para todo α ∈ K, e por [x] + [y] = [x + y] as
operações de multiplicação de uma classe por um escalar e a adição de classes, respectivamente.
Então, X /Y tem uma estrutura de um espaço vetorial sobre K.
61
Espaços Vetoriais Normados
da classe [x] com elementos da classe [y] tem como resultado um elemento da classe [x + y].
Da mesma forma, seja α ∈ K; então α(x + n) = αx + αn. Novamente, sob o argumento que
Y é um subespaço vetorial de X , segue αn = n′ ∈ Y . Assim, (αx) + n′ é um elemento de
[αx]. Devemos agora checar que estas operações não dependem dos representantes escolhidos.
Por exemplo, para mostrar que soma [x] + [y] é definida sem ambiguidades, basta mostrar que
[x+y] = [u+v] se [x] = [u] e [y] = [v]. Sejam x, y, u e v vetores fixos e x+n1 , y+n2, u+n3 e
v+n4 elementos quaisquer de [x], [y], [u] e [v], respectivamente. Se [x] = [u] e [y] = [v]; então
cada elemento de [x] é um elemento de [u], o mesmo acontecendo para [y] e [v]. Suponha que
x + n1 = u + n3 e que y + n2 = v + n4 . Logo, x − u = n1 − n2 ∈ Y e y − v = n2 − n4 ∈ Y .
Note que (x+y)−(u+v) = (x−u)+(y−v). Portanto, (x+y)−(u+v) ∈ Y . Da mesma forma,
para a multiplicação por escalares αx + αn1 = αu + αn3 . Logo, αx − αu = αn3 − αn1 ∈ Y ,
que é o mesmo que α(x − u) = α(n3 − n1 ) ∈ Y . Assim, provamos que [x + y] = [u + v] e
que [αx] = [αu].
Nota 2.2. O span linear é também denominado o envelope linear de Y , ou o hull linear,
ou a cobertura linear, ou ainda a envoltória linear de Y .
PROPOSIÇÃO 2.2. Sejam X um espaço vetorial sobre um corpo K e Y = {x1 , . . . , xn } um
subconjunto de vetores do espaço vetorial X . Então, o span(Y ) é um subespaço de X .
;n ;n
Demonstração. Se u = i=1 αi xi e w = i=1 βi xi são elementos do span(Y ), então
qualquer combinação linear de u e w também pertence ao span(Y ). Com efeito, para todo
γ, µ ∈ K, segue que
6<
n 7 6<
n 7
γu + µw = γ αi xi + µ βi xi
i=1 i=1
n
< n
<
= γαi xi + µβi xi
i=1 i=1
n
<
= (γαi + µβi )xi ∈ span(Y ) .
i=1
62
Espaços Vetoriais Normados
Nota 2.3. Em geral, um espaço vetorial possui muitos spans diferentes e muitas vezes é im-
portante termos um span linear que seja o menor possível. No caso particular do Exemplo 2.1,
deve-se notar uma diferença importante entre os spans lineares de R2 : enquanto o conjunto Y
é linearmente dependente, os conjuntos Z e Y ′ (menores que o conjunto Y ) são linearmente
independentes. Isto pode ser generalizado, imediatamente, para o espaço Rn da seguinte forma:
seja Y = {y1 , y2 , y3 , . . .} um conjunto de vetores de Rn , nem todos linearmente independen-
tes, então excluindo-se de Y qualquer vetor yn+1 que seja linearmente dependente, obtém-se
um novo conjunto menor Y ′ de vetores linearmente independentes que gera o mesmo espaço
que Y ; ou seja, span(Y ) = span(Y ′ ). Apesar de gerarem o mesmo espaço, o conjunto Y ′
tem uma vantagem em relação ao conjunto Y : todo elemento de Rn se escreve de maneira
única como uma combinação linear dos elementos de Y ′ . Assim, por trás dessa minimidade de
Y ′ comparada com Y está o conceito de base. Portanto, os spans linearmente independentes
de um espaço vetorial desempenham um papel especial uma vez que eles fornecem uma base
para o espaço.
Combinando a noção de span linear com a noção de independência linear, temos o seguinte
importante
Demonstração. Assuma que para ;cada w ∈ span(Y ) exista uma lista de escalares αi ∈ K,
com i = 1, 2, . . ., tal que w = ni=1 αi xi . Isto implica, em particular, que w = 0 somente se
α1 = α2 = · · · = αn = 0. Isto mostra que Y é linearmente independente. Reciprocamente,
63
Espaços Vetoriais Normados
y = β1 w1 + β2 w2 + · · · + βm wm .
Ainda, deve-se enfatizar que uma base de Hamel é meramente um de muitos tipos de bases
encontradas no estudo de vários sistemas matemáticos. Ela retrata uma propriedade puramente
algébrica de espaços vetoriais lineares. Ao estudarmos espaços de Hilbert no Capítulo 3,
novamente falaremos de bases, no entanto estaremos interessados nas propriedades topológicas
de tais espaços, e a estrutura de bases topológicas é muito diferente daquela de uma base de
Hamel.
Demonstração. Faça com que M = {Mα }α∈A seja o conjunto de todos os subconjuntos de
vetores linearmente independentes em X . Podemos ordenar M pela inclusão. De fato, por
64
Espaços Vetoriais Normados
2.2 Convexidade
Um exemplo de combinação linear muito importante em um espaço vetorial está baseada no
conceito de convexidade.
Exemplo 2.3. O conjunto vazio é convexo. Com efeito, para mostrar que ∅ não é convexo
é preciso encontrar elementos x, y ∈ ∅ tais que a combinação z = αx + βy ∈ / ∅, com
α + β = 1. No caso do conjunto vazio é impossível encontrar tais elementos. Logo, diz-se
que o conjunto vazio é convexo por vacuidade. Também é convexo por vacuidade o conjunto
consistindo de um único ponto.
Nota 2.5.!Da Definição 2.8 segue que αx" + βy = αx + (1 − α)y, com α ∈ [0, 1]. O conjunto
[x, y] = αx + (1 − α)y | α ∈ [0, 1] é chamado o segmento de reta fechado unindo x e
y. Os pontos x e y são os pontos extremos (ou finais) de [x, y]. O conjunto [x, y] é chamado
! próprio se x ̸= y. Se"x = y, então [x, y] = {x}. Por sua vez, o
um segmento de reta
conjunto (x, y) = αx + (1 − α)y | α ∈ (0, 1) é chamado o segmento de reta aberto unindo
x e y. Se x = y, então (x, y) = ∅; ou seja, o segmento de reta aberto não tem pontos
extremos. Um z é chamado ponto interior dos segmentos de reta fechado e aberto quando
0 < α < 1. O ponto (1/2)x + (1/2)y é chamado o ponto médio das retas [x, y] e (x, y), e
está entre x e y para x ̸= y. Assim, um conjunto X é convexo se, e somente se, [x, y] ⊂ X ,
" X é estritamente convexo se o segmento de reta
quando x,!y ∈ X . Além disso, diz-se que
[x, y] = αx + (1 − α)y | α ∈ [0, 1] intercepta a fronteira de X possivelmente somente
em seus pontos extremos. Por exemplo, em R2 um círculo é estritamente convexo, mas um
65
Espaços Vetoriais Normados
quadrado não é. No caso do quadro, observa-se que o segmento de reta conectando quaisquer
dois vértices do quadrado está contido inteiramente na fronteira do quadrado. A natureza
geométrica do conceito de convexidade está representada na Figura 2.1:
y
y
z z
x x
! "
Demonstração. Seja Xi i∈I uma família de conjuntos convexos, em que I é um conjunto de
índices. Selecione x, y ∈ ∩i Xi . Por hipótese, temos que αx + (1 − α)y ∈ Xi , para todo i ∈ I
e para todo α ∈ [0, 1]. Então, αx + (1 − α)y ∈ ∩i Xi . Portanto, ∩i Xi é convexo. A prova
da segunda parte segue do seguinte raciocínio: sendo X e Y conjuntos convexos, segue pelo
Lema 2.2 que αX e βY são conjuntos convexos, para todo α, β ∈ R. Pelo mesmo lema, segue
que a soma de dois conjuntos convexos é um conjunto convexo. Por último, defina λ = α + β,
para todo α, β ∈ R. Isto implica que λ ∈ R. Logo,(α + β)X = λX é convexo, pelo Lema
2.2, dado que X é convexo.
Menos evidente é o
66
Espaços Vetoriais Normados
;n
Demonstração. Queremos mostrar
;n que todo elemento x = i=1 αi xi ∈ Y , se xi ∈ Y ,
αi ∈ [0, 1] (para cada i) e i=1 αi = 1. A prova segue por indução com respeito a n. Para
n = 1 a afirmativa do teorema é certamente verdadeira. Com efeito, se n = 1, segue que
x = α1 x1 ; mas isto implica que α1 = 1 e x ∈ Y , visto que xi ∈ Y . Para n > 2, assuma que
αn ̸= 1 e que ;o teorema é verdadeiro com n substituído por n − 1. Tome βi = αi /(1 − αn ),
n−1
i < n. Então, i=1 βi = 1. De fato,
αi αi
= ,
(1 − αn ) α1 + · · · + αn−1
e
α1 αn−1
+···+ =1.
α1 + · · · + αn−1 α1 + · · · + αn−1
;n−1
Assim, i=1 βi xi ∈ Y pela hipótese de indução. Portanto,
n−1
<
x = (1 − αn ) βi xi + αn xn ∈ Y ,
i=1
;n−1
uma vez que (1 − αn ) i=1 βi + αn = 1.
67
Espaços Vetoriais Normados
Ch(Y )
TEOREMA 2.4. Ch(Y ) é convexo, e igual à interseção de todos os conjuntos convexos contendo
Y.
Demonstração. Vamos dividir a prova em duas etapas: na primeira etapa provamos que Ch(Y )
é um conjunto convexo. Na segunda etapa mostramos que esse conjunto é na verdade a
interseção de todos os conjuntos convexos contendo Y .
3 n
< n
< 4
Ch(Y ) = y | y = αi xi ; xi ∈ Y ; αi " 0; αi = 1 ,
i=1 i=1
6<
n 7 6<
n 7 n
<
z=β αi xi + (1 − β) γi xi = µi xi ,
i=1 i=1 i=1
6<
n 7 6<
n 7
=β αi + (1 − β) γi ≡ 1 .
i=1 i=1
Portanto, z ∈ Ch(Y ).
Segunda Etapa. Para provar que Ch(Y ) é na verdade a interseção de todos os conjuntos
convexos contendo Y , precisamos do seguinte
LEMA 2.3. Seja Y um subconjunto no espaço vetorial X . Então Y ⊂ Ch(Y ). Além disso, se
Z é qualquer subconjunto convexo de X contendo Y , então Z ⊃ Ch(Y ).
68
Espaços Vetoriais Normados
69
Espaços Vetoriais Normados
Essa noção de distância nos permite medir a proximidade entre os elementos e examinar a
convergência de sequências em um espaço.
Nesta seção, vamos discutir um dos conceitos centrais da análise funcional: o conceito de
espaços vetoriais normados.
DEFINIÇÃO 2.10. Um espaço vetorial normado X é um espaço vetorial X sobre K, equipado
com uma função ∥ · ∥ valorada nos reais não-negativos, isto é, ∥ · ∥ : x ∈ X → R+ , tal que
quaisquer que sejam x, y ∈ X e para todo α ∈ K as seguintes propriedades são satisfeitas:
4. ∥x∥ = 0 ⇒ x = 0 (separação).
Nota 2.6. Um espaço vetorial equipado com uma norma é também chamado um espaço pré-
Banach.
Nota 2.7. A Propriedade 4 pode ser derivada da Propriedade 3. Para ver isto, tome α = 0, a
Propriedade 3 nos dará ∥0∥ = 0, então a Propriedade 4 pode ser assim anunciada: ∥x∥ = 0
equivale a x = 0 (deve-se ressaltar que se ∥x∥ = 0 ̸⇒ x = 0, então a função ∥ · ∥ é chamada
seminorma). Além disso, tomando α = −1 na Propriedade 3, segue que ∥x∥ = ∥ − x∥; em
particular, tem-se ∥x − y∥ = ∥y − x∥. Por fim, note que a Propriedade 1 pode ser derivada das
Propriedades 2 e 3. De fato, tome y = −x na Propriedade 2; então segue da Propriedade 3 que
0 = ∥x − x∥ # ∥x∥ + ∥x∥ = 2∥x∥. Portanto, ∥x∥ " 0.
PROPOSIÇÃO 2.4 5(Segunda desigualdade
5 triangular). Se x, y são elementos de um espaço
vetorial X , então 5∥x∥ − ∥y∥5 # ∥x − y∥.
70
Espaços Vetoriais Normados
5 5
∥x∥ ∈ R+ , segue da definição de valor absoluto de um número real que 5∥x∥ − ∥y∥5 " 0.
Além disso, ∥x − y∥ = 0 se, e somente se, x − y = 0. Portanto, x = y. Que ∥x − y∥ = ∥y − x∥
segue, como já vimos, da Propriedade 3 da norma. Com efeito, ∥x − y∥ = ∥ − (y − x)∥ =
| − 1|∥y − x∥ = ∥y − x∥. Por fim, a desigualdade triangular d(x, z) # d(x, y) + d(y, z), resulta
imediatamente do fato que ∥x − z∥ = ∥(x − y) + (y − z)∥ # ∥x − y∥ + ∥y − z∥. A Propriedade
(a) segue imediatamente da definição d(x, y) = ∥x − y∥, tomando y = 0. Já a Propriedade
(b), também é imediata: d(x + z, y + z) = ∥(x + z) − (y + z)∥ = ∥x − y∥ = d(x, y). Para
provar a Propriedade (c), note que d(αx, αy) = ∥αx − αy∥ = ∥α(x − y)∥ = |α|∥x − y∥ =
|α|d(x, y).
Nota 2.8 (Alerta). Existem espaços vetoriais métricos cuja a métrica não resulta de nenhuma
norma. Para mais detalhes, veja, por exemplo, o livro do A.E. Taylor, “Introduction to Functional
Analysis,” pg. 155, e o Exercício 2.11, no final deste capítulo!
Exemplo 2.4. Os espaços Rn e Cn são exemplos clássicos de espaços vetoriais normados.
Eles se tornam espaços vetorias normados de várias formas. Vamos tomar Rn . Considerando
uma base ortonormal {ei }i∈N em Rn , todo vetor x ∈ Rn pode ser representado pela lista
x = (a1 , . . . , an ) ∈ Rn , que são as coordenadas de x na base ortonormal {ei }i∈N ; logo
definimos
6<
n 71/p
∥x∥ = |ai |p , p"1. (2.3.1)
i=1
Quando Rn é considerado como um espaço vetorial normado, com a norma (2.3.1), denotamos
esse espaço por ℓp (n). Podemos tornar o espaço complexo Cn um espaço vetorial normado da
mesma forma.
Exemplo 2.5 (Espaços de sequências infinitas). Análogo aos espaços ℓp (n) temos os espaços
de sequências infinitas, denotados;por ℓp , em que p " 1. Estes espaços consistem de todas as
sequências x = (ai )i∈N tais que ∞ p
i=1 |ai | < ∞. A norma de ℓp é definida por
( ∞
)1/p
<
∥x∥ = |ai |p (2.3.2)
i=1
Para o caso particular em que p = 2, nos temos o espaço ℓ2 que foi primeiro estudado por
Hilbert. O espaço ℓ2 é o protótipo clássico de uma variedade de espaços de Hilbert. Com efeito,
será mostrado no Capítulo 3, Teorema 3.16, que todo espaço de Hilbert de dimensão infinita é
isomorfo ao espaço ℓ2 . Espaços de Hilbert são espaços vetoriais com uma estrutura métrica
especial, com a métrica sendo oriunda do produto interno.
71
Espaços Vetoriais Normados
Por uma questão de completeza, os conceitos topológicos tratados no Capítulo 1 são estendi-
dos, a seguir, para os espaços vetoriais normados. Começamos com a seguinte
DEFINIÇÃO 2.11 (Bolas e vizinhanças). Sejam X um espaço vetorial normado, x0 ∈ X e
R ∋ r " 0. Então,
* o conjunto ! "
B(x0 ; r) = x ∈ X | ∥x − x0 ∥ < r ,
é chamado uma bola aberta de centro x0 e raio r,
* o conjunto ! "
B[x0 ; r] = x ∈ X | ∥x − x0 ∥ # r ,
é chamado uma bola fechada de centro x0 e raio r,
* o conjunto ! "
S(x0 ; r) = x ∈ X | ∥x − x0 ∥ = r ,
é chamado uma esfera de centro x0 e raio r e
(i) Y é fechado;
(ii) Para qualquer sequência convergente de vetores (xn )n∈N em Y , o limite x = limn→∞ xn
também pertence a Y .
Demonstração. Para provar que (i) =⇒ (ii), suponha que Y é fechado, ou seja, que Y c é
aberto. Seja (xn )n∈N uma sequência convergente de vetores em Y . Tome x = limn→∞ xn .
Vamos mostrar que x ∈ Y . Para isso, suponha o oposto, ou seja, que x ∈ Y c . Então, existe
um δ > 0 tal que B(x; δ) ⊂ Y c ; mas isso implica que xn ∈ Y c para n suficientemente
grande, o que é uma contradição. Assim, x ∈ Y , o que prova (ii).
72
Espaços Vetoriais Normados
Para provar que (ii) =⇒ (i), assuma que (ii) acontece. Vamos mostrar que Y é fechado,
mostrando que o complemento Y c é aberto. Tome x ∈ Y c . Queremos provar que para n ∈ N
suficientemente grande, B(x; 1/n) ⊂ Y c . Na verdade, se isso não é o caso, poderíamos para
uma infinitamente de muitos n ∈ N escolher xn ∈ B(x; 1/n) ∩ Y . Isto geraria uma sequência
de vetores xn ∈ Y convergindo para x ∈ Y c . Mas, isto contradiz a hipótese (ii)! Isto prova
que para δ > 0 suficientemente pequeno, a bola B(x; δ) está contida em Y c . Assim, Y c é
aberto, e, portanto, Y é fechado.
DEFINIÇÃO 2.13 (Conjunto denso). Diz-se que um subconjunto Y de um espaço vetorial nor-
mado X é denso em X se para todo x ∈ X e todo ε > 0 existe um vetor y ∈ Y tal que
∥x − y∥ < ε.
Segue, imediatamente, do Lema 2.4 que Y é um conjunto fechado; de fato, ele é o menor
conjunto fechado em X contendo Y .
Demonstração. Uma vez que temos à nossa disposição a noção de bolas abertas para espaços
normados, sendo ∥x − y∥ uma métrica, (i) segue imediatamente do item (b) do Teorema 1.15.
Com efeito, basta mostrar que, dado ε > 0, existe um δ > 0 tal que se ∥x − x0 ∥ < δ e
∥y − y0 ∥ < δ, então ∥(x − y) − (x0 − y0 )∥ < ε. Tome δ = ε/2. Por meio das propriedades
da norma, segue que
5 5 5 5
5 5 5 5
5d(x, y) − d(x0 , y0 )5 = 5∥x − y∥ − ∥x0 − y0 ∥5
# ∥(x − x0 ) − (y − y0 )∥
# ∥x − x0 ∥ + ∥y − y0 ∥
73
Espaços Vetoriais Normados
Por sua vez, (ii) segue de (i) bastando para isso tomar y = 0. Este resultado trata da
propriedade de que uma aplicação contínua de duas variáveis é parcialmente contínua em cada
variável.
O próximo resultado nos mostra que para a topologia da norma tem-se que as operações
de adição + : (x, y) ∈ X × X → x + y ∈ X e de multiplicação · : (α, x) ∈ K × X →
α · x ∈ X são contínuas.
TEOREMA 2.6. Se X é um espaço vetorial normado, então são contínuas as seguintes aplicações:
(i) (x, y) ∈ X × X 3→ x + y ∈ X ,
(ii) (α, y) ∈ K × X 3→ αx ∈ X .
# ∥x − x0 ∥ + ∥y − y0 ∥
= δ (δ + |α0 | + ∥x0 ∥)
# δ (1 + |α0 | + ∥x0 ∥) .
74
Espaços Vetoriais Normados
Muitas vezes encontraremos situações em que teremos definidas sobre um espaço vetorial
normado mais de uma norma. Como todo espaço normado é um espaço sobre o qual podemos
definir uma métrica (a métrica derivada da norma), então podemos também definir, de acordo
com as Proposições 1.10 e 6.2, a equivalência entre normas.
DEFINIÇÃO 2.16. Duas normas ∥ · ∥1 e ∥ · ∥2 no mesmo espaço vetorial X são equivalentes
se existir uma constante c > 0 tal que ∥ · ∥1 # c · ∥ · ∥2 e ∥ · ∥2 # c · ∥ · ∥1 .
75
Espaços Vetoriais Normados
Exatamente como para o caso de sequências em um espaço métrico, dizemos que uma
sequência em um espaço vetorial normado X é de Cauchy se dado ε > 0, existe um N ∈ N
tal que para todo m, n > N, temos ∥xm − xn ∥ < ε.
Demonstração. Seja (xn )n∈N uma sequência de vetores em X . Assuma que esta sequência
converge para um vetor x ∈ X , isto é, limn→∞ xn = x. Então, dado um ε > 0, existe um N
tal que para todo n > N temos que ∥x − xn ∥ < ε/2. Isto implica que se tomarmos m, n > N
teremos que ∥xm − xn ∥ # ∥xm − x∥ + ∥x − xn ∥ < ε/2 + ε/2 = ε. Assim, limn→∞ xn = x
é de Cauchy.
COROLÁRIO 2.4. Seja X um espaço vetorial normado. Então, toda sequência de Cauchy em
X é limitada.
Demonstração. Com exceção de um número finito de vetores, que são no máximo os vetores
x1 , x2 , . . . , xN , para todos os outros vetores da sequência (xn )n∈N segue que ∥xm − xn ∥ < ε
para todo m, n > N. Tome ε = 1. Pela segunda desigualdade triangular, temos que ∥xm ∥ <
1 + ∥xn ∥, e para m > N, segue que, ∥xm ∥ < 1 + ∥xn ∥ < 1 + ∥xN ∥. Portanto, para todo m
DEFINIÇÃO 2.18. Diz-se que um espaço vetorial normado X é completo, se toda sequência de
Cauchy (xn )n∈N em X converge para um elemento x ∈ X . Um espaço vetorial normado
completo é chamado um espaço de Banach, B.
Exemplo 2.6. A reta é um espaço vetorial normado unidimensional completo. Com efeito,
sendo R = Q, então o limite de toda sequência de Cauchy (xn )n∈N em R converge para
um elemento x ∈ R. O espaço Euclidiano Rn é um espaço vetorial normado n-dimensional
completo. Para ver isto, lembremos que Rn é o produto cartesiano de n fatores R, sendo
que cada fator R é um espaço vetorial normado completo. Agora, tome uma sequência de
pontos xk = (xk1 , . . . , xkn ) ∈ Rn . Cada uma das sequências de coordenadas (xki )k∈N ,
i = 1, . . . , n, é de Cauchy em cada fator R. Logo, existem os limk→∞ xki = ai . Pondo
a = (a1 , . . . , an ) ∈ R × · · · × R, temos que limk→∞ xk = a. Assim, Rn é completo. Por fim,
em virtude do fato de podermos identificar o conjunto dos números complexos C com R2 , via
a correspondência (x, y) ↔ x + iy, segue que mapamento Rn × Rn → Cn implica que Cn é
um espaço vetorial normado complexo n-dimensional completo.
76
Espaços Vetoriais Normados
método descrito no Teorema 1.13, X se torna um espaço métrico completo X . Portanto, resta
provar que a adição x + y, a multiplicação αx por um número complexo arbitrário α e a norma
∥x∥ de X podem ser continuados de X para X de forma que X se torne um espaço de
Banach.
Etapa 1. Sejam x, y dois vetores em X . Assuma que (xn )n∈N e (yn )n∈N sejam sequências
de Cauchy em X . Então, de
# ∥xn − xm ∥ + ∥yn − ym ∥ ,
segue que (αxn )n∈N e (xn + yn )n∈N também são sequências de Cauchy. Os vetores do espaço
X que são definidos por estas sequências serão denotados por αx e x + y (pelo Teorema 1.13
estas definições são independentes das sequências de Cauchy escolhidas, que são consideradas
iguais em X ). Definimos, portanto, a adição e a multiplicação por número complexo em X ,
e é fácil mostrar que com estas definições X é um espaço vetorial.
Etapa 2. Para definir uma norma em X , primeiro observe que para todo x, y, z ∈ X
As relações d(αx, αy) = |α|d(x, y) e d(x + z, y + z) = d(x, y) podem ser facilmente com-
provadas como válidas em X por um processo de passar ao limite. Agora nós definimos
Então, os três axiomas da norma são satisfeitos. Isso é óbvio para os dois primeiros; a
desigualdade triangular segue de
Um critério útil para saber se um espaço vetorial normado é completo segue da seguinte
DEFINIÇÃO 2.19. Seja; X um espaço vetorial normado. Se (xn )n∈N é uma sequência em X ,
diz-se que a série ∞ n=1 xn converge para x, se x ∈ X e se a sequência de somas parciais
;N
sn = n=1 xn converge para x, quando N → ∞, ;∞isto é, ∥x − sn ∥ → 0, quando N → ∞.
Além disso, a série é absolutamente convergente se n=1 ∥xn ∥ < ∞.
77
Espaços Vetoriais Normados
TEOREMA 2.8. Um espaço vetorial normado X é completo se, e somente se, toda série absolu-
tamente convergente em X converge para um elemento em X .
;∞
Demonstração. Assuma que X é completo e que n=1 xn é uma série absolutamente conver-
gente de elementos em X . Visto que
∞
< N
< ∞
<
∥xn ∥ = ∥xn ∥ + ∥xn ∥ < ∞ ,
n=1 n=1 n=N
;∞ ;m
existe para cada ε > 0;um N tal que n=N ∥xn ∥ < ε. Tome sm = n=1 xn como sendo a
soma parcial da série ∞ n=1 xn . Então, para ℓ > m > N, segue que
?<ℓ m
< ? ?< ℓ ? < ℓ ∞
< ∞
<
? ? ? ?
∥sℓ − sm ∥ = ? xn − xn ? = ? xn ? # ∥xn ∥ # ∥xn ∥ # ∥xn ∥ < ε .
n=1 n=1 n=m n=m n=m n=N
Portanto, a sequência (sm )m∈N de somas parciais é uma sequência de Cauchy que converge
para um elemento x ∈ X , já que X é assumido ser completo.
Demonstração. Primeiro note que, pelo teste de razão, também conhecido como critério de
D’Alembert 5 −(n+1) 5
52 5 1
lim 55 −n 55 = .
n→∞ 2 2
Assim, a série é absolutamente convergente.2 Uma vez que concluímos que a série
<∞
1 1 1 1 1
n
= + + +···+ ℓ +··· ,
n=1
2 2 4 8 2
converge, vamos provar que s = 1. Para isto, formemos a seguinte sequência de somas parciais:
1 3 7 1 1 1 2n − 1
s1 = , s2 = , s3 = ..., sn = + +···+ n = .
2 4 8 2 4 2 2n
Logo, , - , -
2n − 1 1
s = lim sn = lim = lim 1− n =1,
n→∞ n→∞ 2n n→∞ 2
o que completa a prova.
2
;∞
Pelo teste da razão, dada uma série n=1 an se existir um r tal que
5 5
5 an+1 5
lim 5 5=r ,
n→∞ 5 an 5
então, se r < 1 a série é absolutamente convergente. Se r > 1, a série diverge. Se r = 1, o teste de razão não é
conclusivo e a série pode convergir.
78
Espaços Vetoriais Normados
Retornemos à prova do Teorema 2.8. Assuma, reciprocamente, que toda série absolutamente
convergente em X converge para um elemento x ∈ X , e que (xn )n∈N é de Cauchy em X .
Então, para cada inteiro positivo j, existe um inteiro positivo nj tal que ∥xn − xm ∥ < 2−j para
todo n, m > nj . Escolha os inteiros nj de tal forma que nj+1 > nj . Para esta escolha, geramos
uma subsequência (xnk )k∈N de (xn )n∈N . Considerando y1 = xn1 e yj = xnj − xnj−1 , para
;
j > 1, obtemos uma série cuja a k-ésima soma parcial é xnk , isto é, kj=1 yj = xnk . Note que,
yj = xnj − xnj−1 implica que ∥yj ∥ < 2−j+1, se j > 1. Além disso, temos que a subsequência
(xnk )k∈N convergente. Com efeito, fazendo k → ∞, segue que
?<∞ ? < ∞ ∞
<
? ?
lim ∥xnk ∥ = ? yj ? # ∥yj ∥ = ∥y1 ∥ + ∥yj ∥
k→∞
j=1 j=1 j=2
∞
<
< ∥y1 ∥ + 2−j
j=1
= ∥y1 ∥ + 1 < ∞ .
; ; ;∞
Estamos usando o fato que ∞ j=2 2
−j+1
= ∞ −j
j=1 2 . Assim, o limk→∞ xnk = j=1 yj existe,
e por hipótese este limite é um elemento x em X . Resta mostrar que xn → x. Visto que
(xn )n∈N é assumida ser de Cauchy, dado ε > 0, existe um N tal que ∥xn − xm ∥ < ε/2
para todo n, m > N. Uma vez que xnk → x, existe K tal que para todo k > K temos
∥x − xnk ∥ < ε/2. Tomando nk > N, então
Assim, para todo n > N, temos ∥x − xn ∥ < ε, e portanto xn → x. Isto completa a prova.
DEFINIÇÃO 2.20. Diz-se que um espaço vetorial topológico X é um espaço localmente convexo
se existe uma base de vizinhanças em X constituida de conjuntos convexos.
Nota 2.9. Em geral, a estrutura topológica na teoria dos espaços vetoriais topológicos é defi-
nida especificando-se vizinhanças da origem ao invés de conjuntos abertos.3 Aprendemos da
Proposição 2.8 que, para cada elemento x0 em um espaço vetorial X , o operador translação
Tx0 (x) = x + x0 é um homeomorfismo de X sobre X . Como consequência disso, toda topo-
logia τ sobre um espaço vetorial é invariante sob translações: um conjunto C ⊂ X é aberto
se, e somente se, cada um de seus transladados x0 + C é aberto. Assim, τ
é completamente
determinada por qualquer base local. No contexto de um espaço vetorial o termo base local
significará sempre uma base local da origem. De fato, por causa da invariância por translações
3
Lembre-se que uma vizinhança de um ponto não precisa ser necessariamente um conjunto aberto: V é uma
vizinhança de x se V contém um conjunto aberto U tal que x ∈ U ; equivalentemente, lembramos que, V é uma
vizinhança de x se x é um ponto interior de V .
79
Espaços Vetoriais Normados
τ
de , se C é uma vizinhança da origem, x0 + C é a correspondente vizinhança de x0 , e
x ∈ x0 + C se, e somente se, x − x0 ∈ C. Com isso, a definição acima pode ser substituída
pela seguinte
DEFINIÇÃO 2.20a. Diz-se que um espaço vetorial topológico X é um espaço localmente convexo
se toda vizinhança da origem contém uma vizinhança convexa da origem. Ou seja, para todo
V ∈ N0 , em que N0 é uma família de vizinhanças do vetor 0, existe U ∈ N0 , com U sendo
convexo, tal que U ⊂ V .
DEFINIÇÃO 2.21. Seja X um espaço vetorial sobre K.
(i) M ∋ 0,
(iv) M é absorvente: para todo x ∈ X e para todo α " 1, segue que α−1 x ∈ M,
! "
(v) ∥x∥ = inf αc | α " 1, α−1x ∈ M .
# αc + (1 − α)c = c .
80
Espaços Vetoriais Normados
O próximo teorema mostra que podemos sempre encontrar uma base de vizinhanças da
origem (ou do vetor nulo) de tal forma que uma topologia pode ser construida para um espaço
vetorial normado.
TEOREMA 2.9. Seja X um espaço vetorial normado. Sejam a ∈ X e Na , N0 famílias de vizi-
nhanças de a e do vetor nulo, respectivamente. Então, as seguintes propriedades são satisfeitas:
(a) Na = a + N0 .
(f ) Todo V ∈ N0 é absorvente.
Antes de provarmos o Teorema 2.9, vamos tornar mais precisa a definição de vizinhanças
dada no Capítulo 1.
DEFINIÇÃO 2.22. Seja X um conjunto. Um sistema de vizinhanças de um elemento x ∈ X é
uma família Nx não-vazia de subconjuntos de X satisfazendo as seguintes propriedades:
(ii) Se U ∈ Nx e V ⊃ U, então V ∈ Nx .
Demonstração do Teorema 2.9. Vamos começar lembrando, do Teorema 2.5, que todo espaço
vetorial normado é um espaço métrico. Então, como definido no Capítulo 1, toda vizinhança V
do vetor nulo contém uma bola aberta
3 4
B∥ · ∥ (0; ε) = y ∈ X | ∥y∥ < ε .
81
Espaços Vetoriais Normados
Portanto, definimos
3 4
N0 = V ⊂ X | V ⊃ B∥ · ∥ (0; ε), para algum ε > 0 .
Propriedade (a). Em primeiro lugar, observamos que, pela Proposição 2.8, a translação
x 3→ x + a estabelece um homeomorfismo de B∥ · ∥ (0; ε) sobre B∥ · ∥ (a; ε), em que
3 4
B∥ · ∥ (a; ε) = y ∈ X | ∥y − a∥ < ε .
Em outras palavras, ao “enviármos” o vetor nulo para o vetor a por uma translação, “enviamos”
também toda vizinhança V ∈ N0 para uma vizinhança U ∈ Na . Então, segue que a família
de vizinhanças do vetor a, definida por
3 4
Na = U = a + V ⊂ X | U ⊃ B∥ · ∥ (a; ε), para algum ε > 0 ,
!
é composta precisamente
" por translações das vizinhanças do vetor nulo, em que U = y ∈
X | y = x + a, x ∈ V . Isto naturalmente implica que Na = a + N0
Propriedade (e). Pela Proposição 2.8, a homotetia x → (ε′ /ε)x estabelece um homeomor-
fismo entre as bolas abertas B∥ · ∥ (0; ε) e B∥ · ∥ (0; ε′ ) em V ⊂ X . Isto significa multiplicar
todos os vetores por ε′ /ε de modo que todos vetores de comprimento < ε passem a ter
comprimento < ε′ . De fato,
Propriedade (g). (g) segue do fato que uma bola B∥ · ∥ (0; 1) é balanceada. Com efeito,
assuma que B∥ · ∥ (0; 1) ⊂ V . Tome λ = 1 − ∥x∥ para todo x ∈ B∥ · ∥ (0; 1). Assim, se x ∈ X ,
então λx ∈ B∥ · ∥ (0; 1) ⊂ V .
TEOREMA 2.10. Suponha que X seja um espaço vetorial normado. Assuma que N0 seja uma
família de vizinhanças do vetor nulo satisfazendo as propriedades do Teorema 2.9. Então, existe
uma única topologia para X tal que X é um espaço vetorial topológico com N0 , como uma
base em 0.
82
Espaços Vetoriais Normados
Demonstração. Para provar que X é um espaço vetorial topológico, basta verificar que N0 é um
sistema de vizinhanças de 0, uma vez que pelo Teorema 2.6 a soma de vetores e a multiplicação
de vetores por escalares são aplicações contínuas. Vamos mostrar que as propriedades provadas
no Teorema 2.9 implicam que as propriedades da Definição 2.22 são satisfeitas.
(a) ⇒ (iv). Se U ∈ Na ⇒ U ⊃ B∥ · ∥ (a; ε); assim B∥ · ∥ (a; ε) ∈ Na . Por outro lado, para
todo y ∈ B∥ · ∥ (a; ε) temos que U ⊃ B∥ · ∥ (y; δ), desde que δ < ε − d(a, y). Logo, U ∈ Ny .
. /
Da mesma forma, para todo y − a ∈ B∥ · ∥ (0; ε) temos U − a ⊃ B∥ · ∥ (y − a); δ , desde que
. /
δ < ε − d 0, (y − a) . Assim, U − a ∈ Ny−a se U − a ∈ N0 .
Finalmente, a unicidade segue dos seguintes fatos: primeiro, sendo N0 uma base em 0 ∈ X ,
a família de conjuntos x0 + V , em que V varia sobre N0 , é uma base em x0 ; segundo, uma
vez que temos à nossa disposição uma base, esta determina sua topologia univocamente, já que
todo aberto da topologia pode ser escrito como a união de elementos da base.
TEOREMA 2.11. Seja X um espaço vetorial topológico. Então as seguintes condições são equi-
valentes:
(ii) ⇒ (iii). Devemos mostrar que para todo y ∈ X , y ̸= 0, existe U ∈ N0 tal que
U ∩ (y + U) = ∅. Se (ii) acontece, então existe V ∈ N0 tal que y ∈ / V . Por ser X um
espaço vetorial topológico, existe U ∈ N0 , U balanceada, tal que U + U ⊂ V . Suponha que
U ∩ (y + U) ̸= ∅; então existe x ∈ U ∩ (y + U) de modo que x ∈ U e x = y + z, com
z ∈ U. Logo, y = x − z ∈ U − U = U + U ⊂ V , por ser U balanceada. Mas isto contradiz o
83
Espaços Vetoriais Normados
fato que y ∈
/ V . Portanto, X é T2 (ou Hausdorff).
(iii) ⇒ (i). Por hipótese, para todo y ∈ X , y ̸= 0, existe U ∈ N0 tal que U ∩(y+U) = ∅.
Mas isto implica que y ∈
/U e0∈ / (y + U). Logo, X é T1 (ou Tychonoff).
DEFINIÇÃO 2.23. Diz-se que o conjunto X é absolutamente convexo se ele é convexo e
balanceado; isto é, para todo x, y ∈ X , αx + βy ∈ X , quando |α| + |β| # 1.
(i) 0 ∈ X .
Demonstração. A prova é imediata, basta tomar uma família de vizinhanças V de 0 como sendo
bolas abertas B∥ · ∥ (0; ε), para algum ε > 0.
84
Espaços Vetoriais Normados
No Capítulo 3 (Teorema 3.15) mostraremos que todo espaço vetorial topológico localmente
convexo, X , é localmente compacto, se X tem dimensão finita. Em particular, apesar de não
serem compactos (cf. Exercício 1.40), os espaços euclidianos Rn e Cn são localmente compactos,
já que a bola unitária é compacta em Rn e Cn .
85
Capítulo 3
Espaços de Hilbert
D. Hilbert
Até agora, em ordem crescente de especialização, falamos sobre espaços topológicos, espaços
métricos, espaços vetoriais normados e espaços de Banach. Nosso objetivo neste capítulo
é estudar classes de espaços que são equipados, além das estruturas topológica e algébrica,
com uma estrutura adicional, principalmente de natureza geométrica, o que permite abstrações
de termos como direção e ortogonalidade de vetores. Estaremos interessados no estudo dos
espaços de Hilbert, um caso particular de espaços de Banach. Espaços de Hilbert representam
a generalização natural do conceito de espaços euclidianos. Assim como no caso dos espaços
de Banach, veremos que a estrutura topológica de um espaço de Hilbert é derivada a partir de
uma norma, que por sua vez é derivada de um produto interno. Isto faz com que os espaços
de Hilbert desempenhem um papel de destaque na Física-Matemática, em particular na Física
Quântica.
DEFINIÇÃO 3.1 (Produto interno). Seja H um espaço vetorial sobre o corpo K. A função ⟨ · , · ⟩
valorada em K, isto é, ⟨ · , · ⟩ : (x, y) ∈ H × H → K é chamada um produto interno se as
seguintes propriedades são satisfeitas:
87
Espaços de Hilbert
(P I1) Condição de positividade. ⟨x, x⟩ " 0 para todo x ∈ H e ⟨x, x⟩ = 0 se, e somente
se, x = 0.
(P I2) Condição de linearidade. ⟨z, αx + βy⟩ = α⟨z, x⟩ + β⟨z, y⟩, para todo x, y, z ∈ H
e para todo α, β ∈ K.
Nota 3.2. Por causa das condições (P I2) e (P I2′), convenciona-se dizer que o produto interno
é linear no segundo argumento e conjugado linear (ou anti-linear) no primeiro argumento. Esta
é a convenção usualmente adotada pelos físicos. Entre os matemáticos, a linearidade é assumida
ser no primeiro argumento.
Exemplo
;n 3.1. Sobre o espaço euclidiano Kn o produto interno;n é definido por ⟨x, y⟩ =
n n
i=1 xi yi . Em particular, se K = R temos que ⟨x, y⟩ = i=1 xi yi .
Exemplo 3.2. Sobre o espaço vetorial C(I, K), composto pelas funções contínuas sobre o
intervalo I = [a, b] com valores em K, o produto interno é definido por:
$ b
⟨f , g⟩ = f (x)g(x) dx .
a
= α ⟨f , g⟩ + β ⟨f , h⟩ .
88
Espaços de Hilbert
DEFINIÇÃO 3.2. Seja H um espaço pré-Hilbert. Diz-se que dois vetores x, y ∈ H são orto-
gonais (condição denotada por x ⊥ y) se, e somente se, ⟨x, y⟩ = 0. Diz-se que uma família
{xi }i∈I de vetores em H é ortonormal se, e somente se, ⟨xi , xj ⟩ = δij , para todo i, j perten-
cendo ao conjunto de índices I. Aqui, δij é o delta de Kronecker, isto é, δij = 1 se i = j e δij = 0
se i ̸= j.
1
DEFINIÇÃO 3.3. Seja H um espaço pré-Hilbert. A função x 3→ ∥x∥ = ⟨x, x⟩ 2 é o comprimento
do vetor x ∈ H . Por causa de (P I1), ∥x∥ ∈ [0, ∞[.
n
<
= ⟨xi , x⟩ − ⟨xj , x⟩⟨xi , xj ⟩
j=1
n
<
= ⟨xi , x⟩ − ⟨xj , x⟩ δij = ⟨xi , x⟩ − ⟨xi , x⟩ = 0 .
j=1
Portanto, o vetor z, definido por (3.1.1), é ortogonal a cada um dos vetores ortonormais do
conjunto {x1 , x2 , . . . , xn } em H .
89
Espaços de Hilbert
Pelo Lema 3.1 z ⊥ y. Além disso, o vetor x é igual à soma do vetor y, que está contido no
espaço gerado pela família {xi }i∈I de vetores ortonormais em H , e do vetor z que é ortogonal
à este espaço. Logo,
∥x∥2 = ⟨(y + z), (y + z)⟩
= ∥y∥2 + ∥z∥2
@6<
n 7 6<
n 7A ? n
< ?2
? ?
= ⟨xi , x⟩, xi , ⟨xj , x⟩, xj + ?x − ⟨xi , x⟩xi ?
i=1 j=1 i=1
n <
< n ? n
< ?2
? ?
= ⟨xi , x⟩⟨xj , x⟩ δij + ?x − ⟨xi , x⟩xi ?
i=1 j=1 i=1
n
< 5 52 ?
?
n
< ?2
?
= 5 5
⟨xi , x⟩ + ?x − ⟨xi , x⟩xi ? .
i=1 i=1
@6<
n 7 6<
n 7A
= ⟨x1 , x1 ⟩ + xi , xi
i=2 i=2
?<n ?2
2? ?
= ∥x1 ∥ + ? xi ? .
i=2
90
Espaços de Hilbert
A prova de (ii) é imediata, bastando-se para isto combinar (i) e o Corolário 3.2. De fato,
para ∥xi ∥ = 1, i = 1, . . . , n, segue que
?< n ?2
? ?
? xi ? = B1 + 1 + 1CD+ · · · + 1E = n · 1 = n .
i=1
n fatores 1
Isto completa a prova.
PROPOSIÇÃO 3.1. Sejam H um espaço pré-Hilbert e {xi }i∈I uma família (enumerável ou
não) de vetores ortonormais em H . Então, {xi }i∈I é uma família de vetores linearmente
independentes.
Demonstração. Basta tomar um conjunto finito desta família de;vetores. Com efeito, seja {αi }i∈I
uma família de elementos de K. Para um conjunto finito, se ni=1 αi xi = 0, então
?<n ?2 n
<
? ?
0=? αi xi ? = ⟨(α1 x1 + · · · + αn xn ), (α1 x1 + · · · + αn xn )⟩ = |αi |2 .
i=1 i=1
PROPOSIÇÃO 3.2 (Desigualdade de Bessel). Sejam H um espaço pré-Hilbert e {xi }i∈I uma
família contável (isto é, I é finito ou I = N) de vetores ortonormais em H . Então, para todo
x ∈ H a seguinte estimativa acontece:
n
< 5 5
5⟨xi , x⟩52 # ∥x∥2 .
i=1
91
Espaços de Hilbert
92
Espaços de Hilbert
⟨x, y⟩
cos θ(x, y) = .
∥x∥∥y∥
⟨x, y⟩
−1 # #1.
∥x∥∥y∥
⟨x, y⟩
cos θ(x, y) = .
∥x∥∥y∥
PROPOSIÇÃO
H 3.4. Todo espaço pré-Hilbert H é um espaço normado, com a norma dada por
∥x∥ = ⟨x, x⟩.
H
Demonstração. Pela Propriedade (P I1) temos que ∥x∥ = ⟨x, x⟩ " 0, para todo x ∈ H e
que ∥x∥ = 0 ⇒ x = 0. Pelas Propriedades (P I2) e (P I2′) temos que ∥αx∥2 = ⟨αx, αx⟩ =
αα⟨x,
H x⟩ = |α|2 ∥x∥2 . Assim, ∥αx∥ = |α|∥x∥. Finalmente, precisamos mostrar que ∥x∥ =
⟨x, x⟩ satisfaz a desigualdade triangular. Sejam x, y ∈ H . Então,
93
Espaços de Hilbert
Nota 3.3. É interessante observar que na desigualdade triangular acima, a igualdade acontece
. /2
se, e somente se, ∥x + y∥2 = ∥x∥ + ∥y∥ . Isto implica que ∥x∥2 + 2 Re ⟨x, y⟩ + ∥y∥2 =
∥x∥2 + 2 ∥x∥∥y∥ + ∥y∥2, ou que 2 Re ⟨x, y⟩ = ∥x∥∥y∥. Como ∥ · ∥ ∈ [0, ∞[, isto implica que
Re ⟨x, y⟩5 ∈ [0,5 ∞[. Ora, mas então, podemos representar esta última igualdade da seguinte
forma: 5⟨x, y⟩5 = ∥x∥∥y∥. Isto por sua vez representa a igualdade na desigualdade de
Cauchy-Schwarz-Bunjakowski, que acontece se, e somente se, os vetores x, y são linearmente
dependentes. Mas cuidado, pois se tomarmos y = λx, com λ ∈ R, então a igualdade
∥x + λx∥ = ∥x∥ + ∥λx∥ não implica que |1 + λ|∥x∥ = (1 + |λ|)∥x∥, a não ser que λ " 0!
Como todo espaço normado é também um espaço métrico, segue da Proposição 3.4 o
seguinte
COROLÁRIO 3.5. Todo espaço pré-Hilbert H é um espaço métrico, com a métrica dada por:
H
d(x, y) = ⟨(x − y), (x − y)⟩ .
(c) O espaço pré-Hilbert H é completo se, e somente se, toda sequência de Cauchy em H
converge para um elemento de H .
PROPOSIÇÃO 3.5. Seja H um espaço pré-Hilbert. Equipe H com a topologia da norma. Então,
toda sequência convergente em H é de Cauchy. Além disto, se a sequência (xn )n∈N converge
para x ∈ H , então limn→∞ ∥xn ∥ = ∥x∥.
Demonstração. A prova da Proposição 1.14 se aplica, sem modificações, à primeira parte, uma
vez que H sendo um espaço normado, é também um espaço métrico, com a métrica induzida 5
pela5norma. Para provar a segunda parte, recorremos à segunda desigualdade triangular 5∥x∥ −
∥y∥5 # ∥x − y∥ (veja Proposição 2.4) que é válida ∀ x, y ∈ H . Assim, temos que
5 5
5∥x∥ − ∥xn ∥ 5 # ∥x − xn ∥ .
H H H
5Logo, se ∥x − xn5∥H → 0 (que significa dizer que limn→∞ ∥x − xn ∥H = 0), segue que
5∥x∥ − ∥xn ∥ 5 → 0, ou que limn→∞ ∥xn ∥ = ∥x∥ .
H H H H
94
Espaços de Hilbert
DEFINIÇÃO 3.6 (Convergência forte). Seja H um espaço pré-Hilbert. Considere uma sequência
de vetores (xn )n∈N ⊂ H . Se esta sequência converge para um vetor x em H , isto é, se, para
todo ε > 0, existe um inteiro n0 > 0 tal que ∥xn − x∥ < ε, quando n > n0 – ou que
limn→∞ ∥xn − x∥H = 0, então dizemos que a sequência (xn )n∈N converge fortemente para o
vetor x, e escrevemos s−limn→∞ xn = x.
Nota 3.4. A convergência limn→∞ d(x, xn ) = 0 em um espaço normado é muitas vezes
representada por s−limn→∞ xn = x para enfatizar a convergência forte. O adjetivo “forte” é
introduzido para distinguir a convergência forte da convergência “fraca” que será introduzida
mais tarde.
DEFINIÇÃO 3.7 (von Neumann, 1925). Um espaço de Hilbert é um espaço pré-Hilbert completo.
Em outras palavras, um espaço pré-Hilbert é um espaço de Hilbert se toda
H sequência de Cauchy
converge neste espaço segundo a topologia gerada pela norma ∥ · ∥ = ⟨ · , · ⟩.
A necessidade da completeza dos espaços Hilbert fica clara quando, por exemplo, resolvemos
a equação de Schrödinger na teoria quântica. Determinar a solução da equação de Schrödinger
para um certo sistema quântico em um único “golpe” pode ser difícil. Em vez disso, uma
solução inicial é frequentemente aproximada e depois refinada conforme aproximações repetidas
da solução aumentam sua precisão. A solução final, obtida repetindo as aproximações infinitas
vezes, é a solução para a equação de Schrödinger.2 Por ser um limite, devemos determinar se
a solução final está contida no conjunto de funções em consideração (ou seja, é um espaço de
funções). Se existe uma solução em nosso espaço de funções, podemos criar uma discussão
auto-consistente sobre as propriedades da equação de Schrödinger usando a norma do espaço e
a classe de funções contidas no espaço. Neste caso, a completeza do espaço de Hilbert garante
que a solução final existe dentro do espaço. Por outro lado, se o espaço de Hilbert não fosse
completo, nossa discussão sobre convergência poderia perder o significado apropriado.
TEOREMA 3.2 (Completamento de um espaço pré-Hilbert). Seja H um espaço pré-Hilbert
incompleto. Então, H pode ser estendido para um espaço de Hilbert H adicionando-se vetores
apropriados, de forma que H seja um subespaço denso de H .
H
Demonstração. O espaço H , com a norma ∥x∥ = ⟨x, x⟩, é um espaço de Banach. Portanto,
de acordo com o Teorema 2.7, H pode ser estendido para um espaço de Banach pela a adição
de novos elementos. Então, usando o método de extensão do Teorema 2.7 basta provar (veja o
Exercício 3.5) que o produto escalar ⟨x, y⟩ (mais as leis algébricas para
H o produto escalar, como
descritas pelas propriedades na Definição 3.1) e a norma ∥x∥ = ⟨x, x⟩ em H podem ser
estendidos e comprovados como válidos em H por um processo de passar ao limite.
Nota 3.5. Segue da Definição 3.7 que todo espaço de Hilbert é um espaço de Banach, ou seja, é
um espaço vetorial normado completo, com a norma derivada do produto interno. Entretanto, a
recíproca não é verdadeira. Portanto, é importante termos um critério que nos informe quando
um espaço de Banach é um espaço de Hilbert, isto é, quando sua norma é induzida por um
produto interno. Responderemos esta questão construtivamente, partindo-se da seguinte
2
Esse método de aproximação sucessiva na teoria quântica é conhecido como teoria da perturbação. Na
teoria quântica, o estado de uma partícula quântica é descrito usando-se uma combinação linear das soluções
da equação de Schrödinger. Entretanto, determinar a solução exata para essa equação é praticamente impossível.
A teoria de perturbação nos permite encontrar uma solução aproximada usando aproximações sucessivas, o que
aumenta a precisão e também pode truncar os termos de ordem superior na equação de Schrödinger.
95
Espaços de Hilbert
96
Espaços de Hilbert
De acordo com a Proposição 3.7, a lei do paralelograma é uma condição necessária para que
uma norma seja induzida por um produto interno.
Exemplo 3.3 (Contra-exemplos). (i) Seja C([0, 3]) o conjunto de funções contínuas sobre o
intervalo fechado [0, 3]. Defina
⎧ ⎧
⎪
⎨1 se 0 # x # 1 ⎪
⎨0 se 0 # x # 1
f (x) = 2 − x se 1 # x # 2 e g(x) = x − 1 se 1 # x # 2
⎪
⎩ ⎪
⎩
0 se 2 # x # 3 1 se 2 # x # 3
Tomando ∥f ∥ = supx∈[0,3] |f (x)|, segue que ∥f ∥ = ∥g∥ = ∥f + g∥ = ∥f − g∥ = 1. Logo,
∥f + g∥2 + ∥f − g∥2 ̸= 2(∥f ∥2 + ∥g∥2). Portanto, C([0, 3]) não é um espaço de Hilbert. (ii)
Como segundo exemplo, denote por X o espaço ℓ2 (veja Exemplo 2.5) equipado com a norma
∥x∥ = ∥x∥2 + ∥x∥∞ . Então X é isomorfo ao espaço ℓ2 uma vez que a nova norma satisfaz
∥x∥2 # ∥x∥ # 2∥x∥2 . É fácil checar que a lei do paralelograma também não é respeitada.
Com efeito, tome, por exemplo, x = (1, 0, 0, 0, . . .) e y = (0, 1, 0, 0, . . .). Portanto, X não é
um espaço de Hilbert. Este dois exemplos nos ensina que não basta ter um produto interno bem
definido, nem mesmo uma norma que se aproxima de uma norma de um espaço de Hilbert
conhecido, como é o caso do espaço ℓ2 . O próximo teorema mostra que, na verdade, a Lei
do Paralelograma não é somente necessária, mas também suficiente para que um espaço de
Banach seja um espaço de Hilbert.
97
Espaços de Hilbert
TEOREMA 3.3. Um espaço de Banach B é também um espaço de Hilbert se, e somente se, a Lei
do Paralelograma é satisfeita pela norma definida em B.
Demonstração. A parte “somente se” foi provada na Proposição 3.6. Para provar a parte “se”,
assuma que a lei do paralelograma é satisfeita. Seja B um espaço de Banach real (o caso em
que o espaço de Banach é complexo fica a cargo do leitor). Se um produto interno está definido
em B, devemos ter satisfeito as seguintes propriedades:
∥x + y∥2 = ∥x∥2 + 2⟨x, y⟩ + ∥y∥2 e ∥x − y∥2 = ∥x∥2 − 2⟨x, y⟩ + ∥y∥2 .
Isto sugere a seguinte definição
13 4
⟨x, y⟩ = ∥x + y∥2 − ∥x − y∥2 . (3.2.5)
4
Temos que verificar se (3.2.5) satisfaz as seguinte propriedades:
Note que (c) e (d) são satisfeitas imediatamente por (3.2.5). Vamos verificar (b). Com efeito,
temos que
13 4
⟨x, y⟩ + ⟨x, z⟩ = ∥x + y∥2 − ∥x − y∥2 + ∥x + z∥2 − ∥x − z∥2
4
1 36 7 6 74
= ∥x + y∥2 + ∥x + z∥2 − ∥x − y∥2 + ∥x − z∥2
4
1 36 1 ? 1 ?2 7 6 1 ? 1 ?2 74
? ? ? ?
= ∥y − z∥2 + 2?x + (y + z)? − ∥y − z∥2 + 2?x − (y + z)?
4 2 2 2 2
1 3? 1 ?2 ? 1 ?2 4
? ? ? ?
= ?x + (y + z) ? − ? x − (y + z) ? . (3.2.6)
2 2 2
Aqui, usamos a identidade de Apollonius. Olhando para (3.2.5), observe que o lado direito de
(3.2.6) pode ser escrito da seguinte forma:
1 3? 1 ?2 ? 1 ?2 4 @ 1 A
? ? ? ?
?x + (y + z)? − ?x − (y + z)? = 2 x, (y + z) .
2 2 2 2
Logo,
@ 1 A
⟨x, y⟩ + ⟨x, z⟩ = 2 x, (y + z) . (3.2.7)
2
Tomando y = 0 em (3.2.7), segue que
@ 1 A
⟨x, z⟩ = 2 x, z ,
2
98
Espaços de Hilbert
uma vez que ⟨x, 0⟩ = 0, pela Eq.(3.2.5). Aplicando este resultado no lado esquerdo da Eq.(3.2.7),
obtemos que
@ 1 A @ 1 A @ 1 A
2 x, y + 2 x, z = 2 x, (y + z) ,
2 2 2
ou que
@ 1 A @ 1 A @ 1 A
x, y + x, z = x, (y + z) .
2 2 2
Isto prova (b).
Para provar a propriedade (a), primeiro note que pela aplicação de (b) repetidas vezes,
obtemos que n⟨x, y⟩ = ⟨x, ny⟩, em que n ∈ Z+ . De fato, tome z = y em (b). Logo,
⟨x, 2y⟩ = ⟨x, y⟩ + ⟨x, y⟩ = 2⟨x, y⟩ .
Seguindo, temos que
⟨x, 3y⟩ = ⟨x, 2y + y⟩ = ⟨x, 2y⟩ + ⟨x, y⟩
= 2⟨x, y⟩ + ⟨x, y⟩
= 3⟨x, y⟩ .
Assim, para n ∈ Z+ , com n > 1, segue que
⟨x, ny⟩ = ⟨x, (n − 1)y + y⟩ = ⟨x, (n − 1)y⟩ + ⟨x, y⟩
= (n − 1)⟨x, y⟩ + ⟨x, y⟩
= n⟨x, y⟩ .
Se m, n ∈ Z+ , então
(n/m)⟨x, y⟩ = (n/m)⟨x, m(y/m)⟩ = (n/m) · m⟨x, (y/m)⟩
= n⟨x, (y/m)⟩
= ⟨x, (n/m)y⟩ .
Assim, (a) acontece para os números racionais α positivos. Além disso, tomando z = −y em
(b), segue que
⟨x, (y + (−y))⟩ = 0 = ⟨x, y⟩ + ⟨x, −y⟩ .
Isto implica que
⟨x, −y⟩ = −⟨x, y⟩ ,
o que mostra que (a) acontece para todos os racionais α. Agora, se α é um número real,
e considerando que Q é denso em R, segue que existe uma sequência (αn )n∈N em Q que
converge para α. Logo,
α⟨x, y⟩ = lim αn ⟨x, y⟩ = lim ⟨x, αn y⟩ = ⟨x, αy⟩ .
n→∞ n→∞
99
Espaços de Hilbert
Existem algumas consequências importantes derivadas a partir desta definição, como mostra
o
LEMA 3.2. Seja H um espaço de Hilbert. Então o seguinte acontece:
1. H ⊥ = {0} e {0}⊥ = H .
3. Se M ⊂ N, então, N ⊥ ⊂ M ⊥ .
4. Se 0 ∈ M ⊂ H , então M ∩ M ⊥ = {0}.
100
Espaços de Hilbert
M⊥
x w
z M
A prova do Teorema 3.4 exige alguns resultados preliminares. Começamos com a seguinte
PROPOSIÇÃO 3.8. Sejam H um espaço de Hilbert e M um subespaço de H . Então, o fecho M
de M é um subespaço de H .
Demonstração. Sejam x, y ∈ M . Logo, existem sequências (xn )n∈N e (yn )n∈N em M tal que
xn → x e yn → y. Então, xn + yn ∈ M e xn + yn → x + y, pelo Teorema 2.6. Portanto,
x + y ∈ M. Por outro lado, se α ∈ K, então αxn ∈ M e αxn → αx. Logo, αx ∈ M . Isto
completa a prova.
DEFINIÇÃO 3.9. Diz-se que o subespaço M de um espaço de Hilbert H é fechado se x ∈ M,
quando existe uma sequência (xn )n∈N ⊂ M que converge para x em M. Em outras palavras,
M é fechado em H se, e somente se, M contém todos os seus pontos limites.
PROPOSIÇÃO 3.9. Sejam H um espaço de Hilbert e M um subespaço fechado de H . Então,
M é completo.
Demonstração. Seja (xn )n∈N uma sequência de Cauchy em M. Ela também é de Cauchy em
H . Logo xn → x ∈ H . Visto que xn ∈ M, para todo n, segue que x ∈ M = M, uma vez
que M é fechado. Assim, toda sequência de Cauchy tem limite em M. Logo, M é completo.
101
Espaços de Hilbert
Demonstração. Seja x ∈ M ; então existe uma sequência (xn )n∈N 5⊂ M tal que xn → x. Visto 5
que H é um espaço métrico, assim o é M, com a métrica d(x, y)5 = ⟨(x−y), (x−y)⟩1/2 5 .
M M
Logo, (xn )n∈N é de Cauchy (veja Proposição 1.14). Assim, (xn )n∈N tem limite em M, já que M
foi assumido ser completo. Por outro lado, já que H é Hausdorff, (xn )n∈N tem limite único.
Portanto, se xn → x′ ∈ M, pela unicidade do limite x′ = x ∈ M ⇒ M ⊂ M. Logo, M = M
(lembre-se que por definição M ⊂ M ).
PROPOSIÇÃO 3.11. Seja H um espaço de Hilbert. Então, o complemento ortogonal M ⊥ de um
subconjunto M ⊂ H é um subespaço fechado.
Sabemos que, por definição, Fx ⊂ Fx . Seja y ∈ Fx . Logo, existe uma sequência (yn )n∈N ⊂ Fx
tal que yn → y. Como ⟨yn , x⟩ = 0 para todo n, segue que ⟨y, x⟩ = limn→∞ ⟨yn , x⟩, por causa
da continuidade do produto interno (veja a Proposição 3.13). De fato, este resultado segue da
continuidade da aplicação d(x−y) = ∥x−y∥ = ⟨(x−y), (x−y)⟩1/2 (veja Proposição 2.6), e da
identidade de polarização (lembre-se, a Proposição 3.7 e Teorema 3.3 nos garantem que o produto
interno é expresso em termos da norma). Assim, ⟨y, x⟩ = 0 ⇒ y ∈ Fx ⇒ Fx ⊂ Fx . Portanto,
Fx = Fx , e isto implica que Fx é fechado. Agora, M ⊥ = ∩x∈M Fx . Consequentemente, pelo
Exercício 1.25, M ⊥ é fechado.
Exemplo 3.4. Sejam M uma reta em um plano e x um ponto fora desse plano, como mostra
a figura abaixo.
y M
y0
102
Espaços de Hilbert
d = lim ∥x − yn ∥ = ∥x − y0 ∥ .
n→∞
Demonstração do Teorema 3.4. Pelo Lema 3.3, existe um único elemento y ∈ M mais próximo
de x ∈ H . Evidentemente, y ̸= 0 ⇒ x ̸= z, dado que y = x − z. Temos que mostrar que
z ∈ M ⊥ (que é o mesmo que dizer que z é ortogonal a todo elemento de M). Para tanto, seja
w qualquer elemento de M. Para α ∈ K, segue que y + αw ∈ M. Note que pelo Lema 3.3,
d2 # ∥x − (y + αw)∥2 = ∥z − αw∥2
103
Espaços de Hilbert
ou
1
d2 # ∥x − y∥2 − 2
|⟨w, z⟩|2 ,
∥w∥
ou
1
d2 # d2 − 2
|⟨w, z⟩|2 .
∥w∥
Assim, temos que
1
0#− |⟨w, z⟩|2 .
∥w∥2
Esta estimativa implica que ⟨w, z⟩ = 0. Finalmente, devemos mostrar a unicidade da repre-
sentação de x ∈ H . Assuma que x = y ′ + z ′ seja uma outra representação de x ∈ H .
Logo, temos que y + z = y ′ + z ′ , ou que y − y ′ = z ′ − z. Naturalmente, y − y ′ ∈ M e
z ′ − z ∈ M ⊥ . Isto implica que y − y ′ = z ′ − z ∈ M ∩ M ⊥ . Pelo Lema 3.2, podemos concluir
que y − y ′ = z ′ − z = 0 ∈ H . Isto finaliza a prova.
Nota 3.7. O Teorema 3.4 estabelece um isomorfismo natural H ∼
= M ⊕ M ⊥ . Na verdade,
mostraremos a seguir que H = M ⊕ M ⊥ .
LEMA 3.4. Sejam M
! e N subespaços fechados
" do espaço de Hilbert H . Suponha que M ⊥ N.
Então, M + N = x + y | x ∈ M e y ∈ N é um subespaço fechado.
Pela Proposição 3.9, as sequências (xn )n∈N ⊂ M e (yn )n∈N ⊂ N são de Cauchy. Se wn →
w ′ ∈ M + N, então usando o fato que w ′ ∈ H e que H é Hausdorff, devemos ter
w ′ = w pela unicidade do limite (veja Proposição 1.15). Logo, w ∈ M + N e isto implica que
M + N ⊂ M + N. A prova está completa.
TEOREMA 3.5. Se M é um subespaço fechado do espaço de Hilbert H ; então H = M ⊕ M ⊥ .
104
Espaços de Hilbert
DEFINIÇÃO 3.10 (Convergência fraca). Sejam H um espaço de Hilbert e (xn )n∈N uma sequên-
cia de vetores em H .
1. Diz-se que a sequência (xn )n∈N ⊂ H converge fracamente para o vetor x ∈ H se,
para um vetor y ∈ H e para todo ε > 0 arbitrário, existe um inteiro n0 ∈ N tal que
|⟨y, xn⟩ − ⟨y, x⟩| < ε, quando n > n0 – ou que limn→∞ |⟨y, xn ⟩ − ⟨y, x⟩| = 0. Neste caso,
escrevemos w−limn→∞ xn = x ou xn ⇀ x.
/ que a sequência (xn )n∈N é de Cauchy fraca se, e somente se, a sequência numérica
. 2. Diz-se
⟨y, xn ⟩ n∈N é de Cauchy.
105
Espaços de Hilbert
PROPOSIÇÃO 3.12. Uma sequência (xn )n∈N em um espaço de Hilbert H que converge forte-
mente para o vetor x também converge fracamente para o mesmo vetor.
Uma diferença essential entre a convergência forte e a convergência fraca é que a primeira
implica
enquanto que esta relação não segue da convergência fraca. Pela convergência forte, a Eq.(3.5.1)
é uma consequência imediata das desigualdades
Dessa forma, em geral, o inverso da Proposição 3.12 não acontece. Em outras palavras, uma
sequência (xn )n∈N em um espaço de H que converge fracamente para o vetor x pode não
convergir segundo a topologia da norma, como mostra o seguinte
Exemplo 3.5. Sejam H um espaço de Hilbert e (xn )n∈N uma sequência de vetores ortonormais
em H . Tal sequência converge fracamente para zero, mas não fortemente. Com efeito, segue
da desigualdade de Bessel que para qualquer y ∈ H
∞
< 5 5
5⟨y, xn ⟩52 # ∥y∥2 .
n=1
; 5 5
Assim, a série ∞ 5⟨y, xn ⟩52 é majorada por ∥y∥2 , e, portanto, é convergente. Logo, ⟨y, xn ⟩ →
n=1
0. Isto mostra que a sequência de vetores ortonormais (xn )n∈N converge fracamente para zero.
Por outro lado, uma vez que ∥xn ∥ = ∥xn −0∥ = 1, (xn )n∈N não converge para zero fortemente.
Contudo, se adicionarmos à convergência fraca a hipótese que a relação (3.5.1) seja válida,
obtemos a convergência forte. Assim, a relação entre os conceitos de convergência forte e
convergência fraca fica completamente entendida via o seguinte
TEOREMA 3.6. Sejam H um espaço de Hilbert e (xn )n∈N uma sequência de vetores em H . Tal
sequência converge fortemente para x ∈ H se, e somente se, ela converge fracamente para x e
limn→∞ ∥xn ∥H = ∥x∥H .
106
Espaços de Hilbert
Condição de suficiência (se). Assuma que a sequência (xn )n∈N converge fracamente para
x ∈ H e que a sequência de normas converge para a norma de x (limn→∞ ∥xn ∥H = ∥x∥H ).
Visto que a norma é definida em termos do produto interno, segue que
Por outro lado, uma vez que assumimos que limn→∞ ∥xn ∥H = ∥x∥H , deduzimos que ∥x −
xn ∥2H → 0, quando n → ∞, que implica na convergência forte.
PROPOSIÇÃO 3.13 (Continuidade do Produto Interno). Sejam H um espaço de Hilbert e
(xn )n∈N , (yn )n∈N duas sequências em H . Se xn → x e yn → y, então ⟨xn , yn ⟩ → ⟨x, y⟩.
5 5
5∥y∥ − ∥yn ∥ 5 # ∥y − yn ∥ < ε ∀n > n2 . (3.5.3)
H H H
# ∥x − xn ∥H ∥yn ∥H + ∥x∥H ∥y − yn ∥H
. /
< ∥yn ∥H + ∥x∥H ε ,
e como ∥yn ∥H é limitada pela Eq.(3.5.3), isto implica que ⟨xn , yn ⟩ → ⟨x, y⟩, concluindo a
prova da continuidade do produto interno.
Nota 3.9. No caso da convergência fraca existe uma classe de semi-continuidade que permanece
válida, mais especificamente, se ∥xn ∥H # C, então, ∥x∥H # C. Com efeito,
107
Espaços de Hilbert
de bases ortonormais. Mas a questão é saber se todos os espaços de Hilbert têm bases
ortonormais. Vamos mostrar que se um espaço de Hilbert é separável, então ele contém um
sistema ortonormal completo de vetores que define uma base. Tal base desempenha o mesmo
papel que um sistema de coordenadas em um espaço vetorial de dimensão finita.
DEFINIÇÃO 3.11. Diz-se que um espaço de Hilbert H é separável se ele contém um subconjunto
denso contável. Em outras palavras, diz-se que H é um espaço de Hilbert separável se existe uma
sequência de vetores x1 , x2 , . . . ∈ H tal que para todo vetor x ∈ H e todo ε > 0, arbitrário,
podemos encontrar um vetor xn na sequência para o qual ∥x − xn ∥ < ε acontence.
A relação entre a classe de espaços de Hilbert separáveis com o conceito de bases ortonormais
será o foco desta seção.4
Nota 3.10. Na literatura mais antiga sobre espaços de Hilbert sempre se assumiu a separabili-
dade como parte integrante da definição de um espaço de Hilbert, com a separabilidade sempre
sendo usada para provar vários teoremas importantes. Entretanto, mais tarde, descobriu-se que
vários desses teoremas poderiam ser provados sem a hipótese da separabilidade. Atualmente,
invocamos a separabilidade sempre que necessário, como é feito usualmente na literatura de
física-matemática. Com efeito, todos os espaços de Hilbert da Mecânica Quântica e da Teo-
ria Quântica dos Campos são sempre assumidos serem separáveis. Assim, salvo menção em
contrário, estaremos assumindo daqui por diante que todo espaço de Hilbert é separável.
O leitor não deve confundir o conceito de completo na definição acima com o conceito de
espaço de Hilbert completo, que é válido no sentido topológico.
Nota 3.11. Sistemas (ou sequências, ou coleções) ortonormais completos(as) são também cha-
mados(as) bases hilbertianas.
TEOREMA 3.7. Seja H um espaço de Hilbert não-trivial, isto é, H ̸= {0}. Então, H possui
um sistema ortonormal completo.
108
Espaços de Hilbert
= ⟨(x0 − xn ), x0 ⟩
# ∥x0 − xn ∥∥x0 ∥ .
Logo, x0 ≡ 0 e M ⊥ = {0}.
Só resta provar que M = H . Do Teorema 3.5 e das conclusões acima temos que H =
M ⊕ M ⊥ = M ⊕ M ⊥ ⇒ M ⊂ H . Sejam x ∈ H e (xn )n∈N uma sequência em M tal que
xn → x. Como M é fechado, x ∈ M ⇒ H ⊂ M. Portanto, M é denso em H .
Nota 3.12. De acordo com a Proposição 3.9, o fato do conjunto M ser denso em H na
Proposição 3.14, implica que M é completo. Esta hipótese é essencial na prova do Teorema 3.7,
uma vez que ser completo implica na maximalidade de M. Contudo, pode acontecer de termos
um espaço pré-Hilbertiano H com um conjunto ortonormal M ⊂ H tal que M ̸= H (veja,
por exemplo, o artigo de J. Dixmier, “Sur les bases orthonormales dans les espaces préhilbertiens,
Acta Sci. Math. Szeged 15 (1953) 29).
109
Espaços de Hilbert
define uma relação de ordem parcial em H . Note que, se H ̸= {0}, então M é não-vazio,
uma vez que para 0 ̸= x ∈ H temos que (x/∥x∥) é um conjunto ortonormal e, portanto,
pertence a pelo menos um subconjunto
+ Mα . Além disso, se M = {Mα }α∈A é uma família
totalmente ordenada, então a união α∈A Mα é um conjunto ortonormal que contém cada Mα
e é, portanto, um limite superior para a cadeia de conjuntos {Mα }α∈A . Pelo Lema de Zorn,
existe um elemento maximal Mm ∈ M . Vamos verificar que Mm é de fato denso em H . De
⊥
acordo com a Proposição 3.14, Mm é denso em H se, e somente se, Mm = {0}. Suponha
⊥
que ∃ x0 ∈ Mm , com x0 ̸= 0. Então, Mm ⊂ Mm ∪ {(x0 /∥x0 ∥)}. Porém isto contradiz a
maximalidade de Mm em M , isto é, nenhum outro sistema ortonormal pode conter Mm como
um subconjunto próprio. Isto conclui a prova do teorema.
COROLÁRIO 3.7. Todo espaço de Hilbert não-trivial tem uma base ortonormal.
Nota 3.13. É importante enfatizar que, em geral, uma base em um espaço de Hilbert não é
uma base algébrica. A base de Hamel, que é um conceito puramente algébrico, não é muito
apropriada no tratamento de espaços de Hilbert de dimensão algébrica infinita, uma vez que
uma base de Hamel para um espaço de Hilbert de dimensão infinita é não-contável. De fato,
cada subespaço de dimensão finita de um espaço de Hilbert H de dimensão infinita tem
interior vazio, e não é denso em toda parte em H .5 Segue-se então, como consequência do
Teorema de Categoria de Baire, que H nunca pode ser a união de um número contável desses
subespaços de dimensão finita. Portanto, esses subespaços de dimensão finita não podem servir
de base.6 Ao final deste capítulo damos uma prova (veja Proposição 3.17) que um conjunto
ortonormal completo infinito nunca é uma base de Hamel em um espaço de Hilbert.
DEFINIÇÃO 3.13 (Base de Schauder). Uma sequência (xn )n∈N em um espaço de Hilbert H
é uma base de Schauder se para todo vetor x ∈ H existe uma única sequência de escalares
(αn )n∈N ⊂ K tal que
<∞
x= αn xn ,
n=1
Diz-se que a base de Schauder (xn )n∈N é normalizada quando todos os vetores da base têm
norma 1.
5
Veja a Definição 1.38 onde se define um conjunto denso em toda parte.
6
Para detalhes sobre o Teorema de Categoria de Baire veja M. Reed and B. Simons, “Methods of Modern
Mathematical Physics. Functional Analysis,” Vol. I, Academic Press, 1980, pg.80.
110
Espaços de Hilbert
Em outras palavras, para qualquer ε > 0, arbitrário, existe um número positivo N(ε) tal
que ∥y − yn ∥ < ε parar todo n > N(ε). Mas, como H é completo, a definição acima é
equivalente à afirmação de que y1 , y2, . . . é uma sequência de Cauchy.
TEOREMA 3.8. Sejam (xn )n∈N uma sequência de vetores de norma ;1 em um espaço de Hilbert
de números complexos. Então, a série ∞
H e (αn )n∈N uma sequência ; n=1 αn xn converge para
∞ 2
um elemento de H se a série n=1 |αn | é convergente.
;
Demonstração. Seja (sm )m∈N a sequência de somas parciais sm = m n=1 αn xn . Note que para
m > k > 0, temos que
? ?2
?< m ? <m <m
? ?
∥sm − sk ∥2 = ? αn xn ? # ∥αn xn ∥2 = |αn |2 = |σm − σk |2 . (3.6.1)
? ?
n=k n=k n=k
;∞ 2
Então,
;m se n=1 |αn | < ∞ temos de (3.6.1) que a sequência de somas parciais sm =
n=1 αn xn é uma sequência de Cauchy, de modo que dado ε > 0, existe N ∈ N tal
que, para todo m, k > N,
111
Espaços de Hilbert
Nota 3.15 (Convergência comutativa). A igualdade (3.6.2) indica que a soma do lado direito
converge para x ∈ H independentemente de reordenações, como consequência do Teorema
3.8. De fato, toda série absolutamente convergente é convergente independentemente de re-
ordenações. Isto é similar à noção de convergência incondicional de números reais, uma
convergência forte o bastante para garantir que nenhum rearranjo na ordem dos termos de uma
série convergente possa alterar o valor da sua soma. Esta última observação motiva a adoção
do termo convergência comutativa.
Nota 3.16. É importante enfatizar que na igualdade (3.6.2), os coeficientes ⟨xi , x⟩ são diferentes
de zero somente num conjunto contável de índices i ∈ I. De fato, se N é um inteiro positivo
maior que n∥x∥2 , então não é possível que |⟨xi , x⟩|2 " 1/n se n > N. Para vermos isto,
considere o conjunto
3 1 4
Fn = xi | |⟨xi , x⟩|2 " , em que n " 1 ,
n
e suponha que x1 , x2 , . . . , xk ∈ Fn . Então, pela desigualdade de Bessel e pela definição de Fn ,
temos
k
1 <
k· # |⟨xi , x⟩|2 # ∥x∥2 .
n i=1
Antes de provarmos o Teorema 3.9, lembremos do Corolário 3.7 que todo espaço de Hilbert
H tem uma base ortonormal. Mas, dado uma coleção de vetores quaisquer em H como
podemos obter um conjunto ortonormal a partir dessa coleção? O próximo resultado mostra
que é sempre possível obter um conjunto ortonormal a partir de uma coleção contável de
vetores linearmente independentes em H (de fato, a coleção não precisa ser necessariamente
composta só por vetores linearmente independentes!).
112
Espaços de Hilbert
PROPOSIÇÃO 3.15 (Ortonormalização de Gram-Schmidt). Seja {xi }i∈I uma coleção contável
linearmente independente em H . Então, existe uma coleção ortonormal {ei }i∈I em H , com a
mesma cardinalidade de {xi }i∈I , de forma que para todo n,
span({x1 , . . . , xn }) = span({e1 , . . . , en }) .
ou seja, o vetor v2 é obtido a partir do vetor x′2 retirando-se de x′2 sua componente ao longo de
e1 (isto é, subtraimos de x′2 sua projeção sobre o subespaço gerado por e1 ; veja a figura abaixo).
v2 x′2
e2
e1 ⟨e1 , x′2 ⟩e1
A seguir, normalizamos o vetor v2 : e2 = v2 /∥v2 ∥. Pelo Lema 3.1 o vetor v2 (e, portanto, e2 )
é ortogonal ao vetor e1 ; então, {e1 , e2 } é ortonormal e {x′1 , x′2 } e {e1 , e2 } geram o mesmo
subespaço (neste caso bi-dimensional). A seguir, tomamos o vetor não-nulo
ou seja, o vetor v3 é obtido a partir do vetor x′3 retirando-se de x′3 suas componentes ao longo
de e1 e e2 (isto é, subtraimos de x′2 sua projeção sobre span{e1 , e2 }). A seguir, normalizamos
o vetor v3 : e3 = v3 /∥v3 ∥. Novamente, pelo Lema 3.1 o vetor v3 (e, portanto, e3 ) é ortogonal aos
vetores e1 e e2 (e, portanto, ao subespaço gerado por {e1 , e2 }). Logo, {e1 , e2 , e3 } é ortonormal
e {x′1 , x′2 , x′3 } e {e1 , e2 , e3 } geram o mesmo subespaço (neste caso tri-dimensional).
ou seja, o vetor vn é obtido a partir do vetor x′n retirando-se de x′n suas componentes
ao longo de e1 , e2 , . . . , e en−1 (isto é, subtraimos de x′n sua projeção sobre o conjunto
span{e1 , e2 , . . . , en−1 }; veja a figura abaixo).
113
Espaços de Hilbert
;n−1
− i=1 ⟨ei , x′n ⟩ei
vn x′n
en
;n−1
i=1 ⟨ei , x′n ⟩ei
A seguir, normalizamos o vetor vn : en = vn /∥vn ∥. Como antes, pelo Lema 3.1 o vetor vn
(e, portanto, en ) é ortogonal aos vetores e1 , e2 , . . . , e en−1 (e, portanto, ao subespaço gerado
por {e1 , e2 , . . . , en−1 }). Assim, o conjunto {e1 , e2 , . . . , en } é um sistema ortonormal completo
(de fato, se n fosse o menor subescrito para o qual vn = 0, então x′n seria uma combina-
ção linear de e1 , e2 , . . . , en−1 , e, portanto, de x′1 , x′2 , . . . , x′n−1 , contradizendo a hipótese que
{x′1 , x′2 , . . . , x′n } é linearmente independente).
Demonstração do Teorema 3.9. Estamos assumindo que I é finito ou igual a N. (i) ⇒ (ii). Se
{xi }i∈I é um sistema ortonormal completo, então, pelo Teorema 3.7, nenhum outro sistema
ortonormal pode conter {xi }i∈I como um subconjunto próprio. Logo, pela Proposição 3.14,
segue que
span({xi }i∈I ) = H ,
e para todo x ∈ H temos <
x= ⟨xi , x⟩xi .
i∈I
(ii) ⇒ (iii). Assuma que ⟨xi , x⟩ = 0, para todo i ∈ I, implica que x = 0. Então,
? ?2 I J
? < n ? < n n
<
? ?
?x − αi xi ? = x − αi xi , x − αi xi
? ?
i=1 i=1 i=1
I n
J I n J n
< < <
2
= ∥x∥ − x, αi xi − αi xi , x + |αi |2 ∥xi ∥2
i=1 i=1 i=1
n
< n
< n
<
= ∥x∥2 − αi ⟨xi , x⟩ − αi ⟨xi , x⟩ + |αi |2
i=1 i=1 i=1
n
< n
5 52 < 5 5
= ∥x∥ − 2 5 5
⟨xi , x⟩ + 5⟨xi , x⟩ − αi 52 , (3.6.4)
i=1 i=1
114
Espaços de Hilbert
Como, pela hipótese (i), {xi }i∈I é um sistema ortonormal completo, então, pelo Teorema 3.8,
o lado esquerdo da Eq(3.6.5) converge para zero, quando n → ∞. Logo,
? ?2 ( )
? <n ? < n
5 5
? ? 5⟨xi , x⟩52
0 = lim ?x − ⟨xi , x⟩xi ? = lim ∥x∥2 −
n→∞ ? ? n→∞
i=1 i=1
<5 5
= ∥x∥2 − 5⟨xi , x⟩52 .
i∈I
(iv) ⇒ (i). Assuma a validade da identidade de Parseval e que ⟨xi , x⟩ = 0, para todo
i ∈ I. Logo, x = 0 e isto implica que ({xi }i∈I )⊥ = {0}. Logo, span({xi }i∈I ) = H , ou seja,
{xi }i∈I um sistema ortonormal completo para H .
115
Espaços de Hilbert
DEFINIÇÃO 3.12a. Diz-se que um sistema ortonormal {xi }i∈I em um espaço de Hilbert H é
completo se todo x ∈ H tem uma única representação
<
x= αi xi ,
i∈I
é obviamente contável, já que, de acordo com o argumento nas páginas 18 e 18, existe uma
correspondência direta um-a-um entre N e todos os racionais. Uma vez que, pelo Teorema 3.9,
item (iii), para todo x ∈ H e ⟨xi , x⟩ ∈ C, temos
? ?
? <n ?
? ?
?x − ⟨xi , x⟩xi ? → 0 quando n → ∞ ,
? ?
i=1
então, S é denso em H .
De acordo com o teorema acima podemos concluir que em um espaço de Hilbert separável
existem duas alternativas: (i) qualquer sistema ortonormal completo tem um número infinito
de elementos ou (ii) então existe um sistema ortonormal completo com um número finito n
de elementos. No último caso, tal sistema é uma base (no sentido do espaço vetorial) de H .
Portanto, H é um espaço vetorial de dimensão finita, e qualquer sistema de elementos n + 1
é linearmente dependente. Consequentemente, todo sistema ortonormal pode ter no máximo n
elementos nele contido. Daí resulta que todo sistema ortonormal completo deve ter n elementos.
Provamos, assim, que em um espaço Hilbert separável todo sistema ortonormal completo tem o
mesmo número de elementos. Chamamos este número a dimensão de H . Assim, se H tem
um sistema ortonormal completo infinito contável, dizemos dim H = ℵ0 .
116
Espaços de Hilbert
Neste ponto, lembremos que dois espaços vetoriais de dimensão finita são isomórfos se,
e somente se, eles tiverem a mesma dimensão. Da mesma forma, os espaços de Hilbert
são caracterizados, a menos de uma isomorfia, pela cardinalidade de sua base. Com efeito,
um isomorfismo U de um espaço de Hilbert H1 sobre um espaço de Hilbert H2 é um
mapeamento linear um-para-um de H1 sobre H2 tal que ⟨Uy, Ux⟩ = ⟨y, x⟩. Exemplos
clássicos de isomorfismos entre espaços de Hilbert aparecem na seguinte
Demonstração. (a) Suponha que dim H = ℵ0 e que H é separável. Então, pelo Teorema
3.10, existe um sistema ortonormal completo e contável de vetores S = {e1 , e2 , e3 , . . .} em H
tal que para todo vetor x ∈ H temos
∞
<
x= ⟨en , x⟩en , ⟨en , x⟩ ∈ C .
n=1
Defina Ux = (αn )n∈N , em que αn = ⟨en , x⟩, com n ∈ N. Pelo Exemplo 2.5 (com p = 2) e
pelo Teorema 3.8 (veja também o Teorema 3.9, item (iv)), U é um mapeamento um-para-um
de H para ℓ2 . É, também, claramente um mapeamento linear. Com efeito, se Ux = (αn )n∈N
e Uy = (βn )n∈N , então,
∞ @
I∞ J
< A <
= ⟨en , y⟩en , x = ⟨en , y⟩en , x = ⟨y, x⟩ .
n=1 n=1
Como último resultado desta seção, vamos mostrar que um sistema ortonormal que é “pró-
ximo o suficiente” de uma base ortonormal também é uma base ortonormal.
TEOREMA 3.11 (Estabilidade de bases ortonormais). Seja {xj }Jj=1 (J finito ou infinito) uma
ortonormal para um espaço de Hilbert H . Se {uj }Jj=1 é um sistema ortonormal em H tal
base;
que j∈J ∥xj − uj ∥2 < ∞, então, {uj }Jj=1 é uma base ortonormal para H .
117
Espaços de Hilbert
Demonstração. Suponha que {uj }Jj=1 não seja uma base ortonormal para H . Então, pelo
Teorema 3.9, existe um vetor u0 ∈ H tal que ∥u0∥ = 1 e ⟨u0 , uj ⟩ = 0, j = 1, 2, . . . Escolha
um inteiro N tal que
J
<
∥xj − uj ∥2 < 1 . (3.6.6)
j=N +1
A seguir, vamos levar em conta o resultado do Exercício 3.14 que estabelece que se M e
N são subespaços de H e dim M < dim N, então, M ⊥ ∩ N ̸= {0}. Na proposição em
questão, este resultado garante a existência de um vetor w ̸= {0} no espaço gerado pelos
vetores {u0 , . . . , uN } (isto é, w ∈ span{u0 , . . . , uN }) tal que w ⊥ xj para 1 # j # N. Visto
que {xj }Jj=1 é uma base ortonormal para H e w ⊥ uj , para j > N,
< J
<
0 < ∥w∥2 = |⟨xj , w⟩|2 = |⟨xj , w⟩|2
j∈J j=N +1
J
<
= |⟨(xj − uj ), w⟩|2
j=N +1
J
<
2
# ∥w∥ ∥xj − uj ∥2 ,
j=N +1
que contradiz (3.6.6). Assim, {uj }Jj=1 é uma base ortonormal para H .
DEFINIÇÃO 3.15. Seja X um espaço vetorial. O funcional p(x) sobre X é chamado funcional
sublinear se
p(x + y) # p(x) + p(y) , ∀ x, y ∈ X ,
e
p(αx) = αp(x) , ∀x ∈ X ,α " 0 .
118
Espaços de Hilbert
M1 = M + {x0 } .
µ1 # µ # µ2 ,
em que 3 6 x7 6 x 74
µ1 = sup g − − p − − x0 ,
−(x/α)∈M α α
119
Espaços de Hilbert
e 3 6x 7 6 x 74
µ2 = inf p + x0 − g .
(x/α)∈M α α
Com efeito, como
6 x7 6 x 7 6x 7 6x7
g − − p − − x0 # p + x0 − g ;
α α α α
então se fixarmos y = −(x/α) deixando z = (x/α) variar através de todos elementos de M,
temos 6 x7 6 x 7 3 6x 7 6 x 74
g − − p − − x0 # inf p + x0 − g ≡ µ2 .
α α (x/α)∈M α α
Como isto acontece para todo y ∈ M, temos
3 6 x7 6 x 74 6x 7 6x7
µ1 ≡ sup g − − p − − x0 #p + x0 − g .
−(x/α)∈M α α α α
A seguir fazemos uso da separabilidade assumida de H . Neste caso, existe uma sequência
(xn )n∈N que é densa em H . Construa subespaços lineares da forma Mn+1 = {xn } + Mn ,
com (n = 1, 2, . . .). Repetindo os mesmos argumentos usados acima prova-se a existência de
funcionais lineares f1 , f2 , f3 , . . . sobre os subespaços lineares M = M0 ⊂ M1 ⊂ M2 ⊂ · · ·
tais que, fn (x) # p(x), com (n = 1, 2, . . .). Claramente, fn coincide fn−1 sobre Mn−1 .
Desta forma, podemos obter um funcional linear sobre um subconjunto denso V de H .
Como V = H , existe uma sequência (xn )n∈N em V que converge para x em H . Defina
F (x) = limn→∞ F (xn ). Este limite existe uma vez que K é completo. Portanto, F é uma
extensão de fn e coincide com fn sobre Mn .
Demonstração. Tome
p(x) = ∥g∥∥x∥ , x∈M .
120
Espaços de Hilbert
Pelo Teorema de Hahn-Banach existe um funcional F definido sobre todo H tal que F (x) =
g(x) para todo x ∈ M e
F (x) # p(x) , x ∈ H .
Como
−F (x) = F (−x) # p(−x) = ∥g∥∥ − x∥ , x∈H ,
temos
|F (x)| # ∥g∥∥x∥ , x∈H .
Assim, ∥F ∥ # ∥g∥. Mas, como F é uma extensão de g, devemos ter ∥g∥ # ∥F ∥. Logo,
∥F ∥ = ∥g∥.
F
H −−−→ K |F (x)| # ∥F ∥∥x∥H
K
⏐
⏐
g
M −−−→ K |g(x)| # ∥g∥∥x∥M .
TEOREMA 3.13. Seja H um espaço de Hilbert de dimensão infinita. Então a bola unitária
fechada, de centro em zero, definida por
! "
B[0; 1] = x ∈ H | ∥x∥ # 1 ,
121
Espaços de Hilbert
não é compacta.
Para provar este teorema, precisamos de alguns resultados auxiliares. Vamos começar mos-
trado que quando um espaço de Hilbert H tem dimensão finita, o isomorfismo de H sobre
Cn do Teorema 3.16 é, na verdade, um homeomorfismo. Assim, podemos dizer que a topologia
de Cn é a única topologia vetorial que um espaço de Hilbert complexo de dimensão finita pode
ter.
Demonstração. Veja o livro de A.E. Taylor, “Introduction to Functional Analysis,” John Wiley,
1958, Theorem 3.12-A, pg.95.
LEMA 3.7. Sejam H um espaço de Hilbert (de qualquer dimensão) e M ⊂ H . Suponha que
M tenha dimensão finita. Então, M é fechado.
Demonstração. Pela Proposição 4.4 e pelo Lema 3.6 segue que M é completo. Então, pela
Proposição 3.10 M é fechado.
TEOREMA 3.14 (Lema de Riesz para Espaços de Hilbert). Sejam M e N subespaços vetoriais
de um espaço de Hilbert H (de qualquer dimensão). Suponha que M seja um subespaço vetorial
fechado de N. Então, para cada número real α no intervalo (0, 1) existe um z ∈ N tal que
∥z∥ = 1 e ∥z − y∥ " α, para todo y ∈ M.
r
x
y0
M
N
H
Defina
x − y0
z= .
∥x − y0 ∥
Então, ∥z∥ = 1. Note que z ∈ N − M. Com efeito, assuma que z ∈ M, então ∥x − y0 ∥z ∈ M,
visto que M é um subespaço vetorial de H . Isto implica que x − y0 ∈ M, e a soma de vetores
(x − y0 ) + y0 também deve pertencer a M. Mas (x − y0 ) + y0 = x. Isto implicaria que x ∈ M,
o que contradiz a hipótese de x ∈ N − M.
1 ? ?
? ?
= · ?x − (y0 + ∥x − y0 ∥ · y)? .
∥x − y0 ∥
? ?
? ?
Dado que y0 + ∥x − y0 ∥ · y ∈ M, temos que ?x − (y0 + ∥x − y0 ∥ · y)? " r; ou seja,
r
∥z − y∥ " .
∥x − y0 ∥
Porém,
r α
" · r =⇒ ∥z − y∥ " α .
∥x − y0 ∥ r
Uma vez que y é assumido ser arbitrário, isto completa a prova.
Demonstração do Teorema 3.13. A ideia é usar o lema acima repetidamente com r = 1/2.
Primeiro, assuma que B[0; 1] é compacta. Escolha qualquer vetor x1 de norma 1. Para espaços
de Hilbert este vetor pode ser qualquer vetor da base ortonormal {e1 , e2 , . . . , en , . . .}, em que
para cada n ∈ N, en = (0, . . . , 0, 1, 0, . . .). Assim, escolhemos x1 = e1 . O vetor e1 gera
um subespaço próprio M1 uni-dimensional de H , que é fechado pelo Lema 3.7. Pelo Lema
de Riesz d(e2 , M1 ) " 1/2. Por sua vez, os vetores e1 , e2 geram um subespaço próprio M2
bi-dimensional de H , que também é fechado pelo Lema 3.7. Aplicando mais uma vez o Lema
de Riesz, temos que d(e3 , M2 ) " 1/2. Note que o conjunto de vetores {e1 , e2 , e3 } ∈ B[0; 1].
Prosseguindo por indução, encontraremos uma sequência (en )n∈N de elementos en ∈ B[0; 1] e
uma sequência de subespaços fechados Mn tal que d(en+1 , Mn ) " 1/2. Em particular, segue
que para quaisquer √ dois elementos da base ortonormal {e1 , e2 , . . . , en , . . .}, teremos sempre
que ∥em − en ∥ = 2, para todo m ̸= n ∈ N. Consequentemente, a sequência (en )n∈N
não pode ter uma subsequência convergente, contradizendo a hipótese de compacidade de
B[0; 1].
Nota 3.18. Uma outra prova do Teorema 3.13 está baseada no Problema 4, do Capítulo V, do
livro de Reed-Simons, “Methods of Modern Mathematical Physics. Functional Analysis,” Vol. I,
(veja também o livro do Blanchard-Brüning, “Mathematical Methods in Physics. Distributions,
Hilbert Space Operators and Variational Methods,” Teorema 18.1.1). O objetivo é provar que todo
espaço vetorial topológico localmente convexo (pelo Teorema 2.12 um espaço de Hilbert é um
espaço vetorial topológico localmente convexo), é localmente compacto (veja Definição 2.24) se
ele for de dimensão finita.
123
Espaços de Hilbert
Tome r = 1/2. Portanto, B[0; 1] ⊂ M + 12 B[0; 1]. Isto implica 12 B[0; 1] ⊂ 12 (M + 21 B[0; 1]),
e porque M é subespaço vetorial de H , segue que λM = M, para todo escalar λ ̸= 0. Assim,
1
2
B[0; 1] ⊂ M + 41 B[0; 1] ⇒ B[0; 1] ⊂ M + (M + 14 B[0; 1]) = M + 41 B[0; 1]. Prosseguindo
por indução, vemos que
1
B[0; 1] ⊂ M + B[0; 1] , (3.11)
2k
para todo k ∈ N. Agora, fixe um y ∈ B[0; 1]. Então, para cada k existem xk ∈ M e
yk ∈ B[0; 1] tais que y = xk + 21k yk ; isto implica que xk = y − 21k yk . Como B[0; 1] é
compacta, existe uma subsequência (ykr )r∈N da sequência (yk )k∈N tal que limk→∞ ykr = z em
H . Assim, tomando o limite k → ∞, temos
, -
1
lim xkr = lim y − k yk
k→∞ k→∞ 2
1
= y − lim yk
k→∞ 2k
1
= y − lim · lim yk
k→∞ 2k k→∞
= y − 0z = y .
Mas, M é um subespaço fechado. Logo y ∈ M ⇒ B[0; 1] ⊂ M. Por fim, note que
H = ∪∞r=1 rB[0; 1]. Portanto,
∞
& ∞
&
H ⊂ rM = M =M .
r=1 r=1
124
Espaços de Hilbert
Um primeiro passo importante para mostrar que a bola unitária fechada de um espaço
de Hilbert é compacta na topologia fraca é mostrar que sequências fortemente limitadas têm
subsequências fracamente convergentes. Começamos com a seguinte
DEFINIÇÃO 3.16 (Vizinhança fraca). Para um espaço de Hilbert H , uma base de vizinhanças
para a topologia fraca é
Observe que, o produto interno é, devido às suas propriedades, invariante por translações;
portanto, podemos tomar x0 = 0 na definição acima.
LEMA 3.8. Seja (yn )n∈N uma sequência limitada de vetores em um espaço de Hilbert H , no
sentido que ∥yn ∥ # C para n ∈ N. Então, esta sequência converge fracamente para um vetor
y ∈ H se a sequência numérica ⟨yn , x⟩ converge para ⟨y, x⟩ quando x é qualquer vetor de um
conjunto denso contável M de H .
Demonstração. A hipótese que ∥yn ∥ # C, para n ∈ N, implica que |⟨yn , x⟩| # C∥x∥; isto
é, para todo vetor x dado, o produto escalar ⟨yn , x⟩ forma uma sequência numérica limitada.
Além disso, dado um ε > 0 arbitrário, escolha κ grande o suficiente tal que ∥x − xκ ∥ # ε,
com xκ ∈ M (isto é possível já que xκ → x). Então,
|⟨yn , x⟩ − ⟨ym , x⟩| # |⟨yn , x⟩ − ⟨yn , xκ ⟩| + |⟨yn, xκ ⟩ − ⟨ym , xκ ⟩| + |⟨ym , x⟩ − ⟨yn , x⟩|
o que garante a convergência da sequência (⟨yn , x⟩)n∈N para todo x ∈ M. Com efeito,
podemos tomar o lado direito da desigualdade acima tão pequeno quanto desejarmos, tomando
ε suficientemente pequeno no primeiro termo e n, m suficientemente grande no segundo termo
(já que pela hipótese xκ ∈ M). Visto que M é um conjunto denso contável em H , de acordo
com Definição 3.11, podemos sempre encontrar um vetor xκ ∈ M para o qual ∥x−xκ ∥ < ε para
todo vetor x ∈ H e todo ε > 0, arbitrário. Assim, concluímos que limn→∞ ⟨yn , x⟩ = ⟨y, x⟩
para todo vetor x ∈ H . Portanto, (yn )n∈N é fracamente convergente.
TEOREMA 3.16. De toda sequência limitada (yn )n∈N em um espaço de Hilbert H separável,
no sentido que ∥yn ∥ # C para n ∈ N, nós podemos extrair uma subsequência fracamente
convergente.
125
Espaços de Hilbert
é limitada e, portanto, pelo clássico Teorema de Bolzano-Weierstrass (yn )n∈N contém uma
subsequência (yn1k )k∈N de modo que a sequência numérica
⟨yn11 , x1 ⟩, ⟨yn12 , x1 ⟩, . . . ,
converge. Da mesma forma, a subsequência (yn1k )k∈N contém uma subsequência (yn2k )k∈N de
modo que a sequência
converge. Continuando esta construção, obtemos um sistema de subsequências (ynjk )j,k∈N tal
que (i) (yn(j+1)k )j,k∈N é uma subsequência de (ynjk )j,k∈N e (ii) (ynjk )j,k∈N converge para todo
vetor x ∈ M. Portanto, tomando a “sequência diagonal”
que converge para todo n. Mas, então, pelo Lema 3.8, essa sequência converge para todo vetor
x∈H.
d(y + w, z + w) = d(y, z) .
! "
Portanto, precisamos apenas verificar que cada “bola aberta” B(0; ε) = x | d(x, 0) < ε
contém a interseção de B[0; 1] com alguma vizinhança fraca de zero em H . Com efeito, seja
N tal que 2−N < ε/2, e considere a vizinhança fraca de zero
3 4
U(0; x1 , . . . , xn ; ε) = y ∈ H | |⟨y, xi ⟩| < ε/2 , i = 1, . . . , N .
126
Espaços de Hilbert
N ∞
ε < −n <
# 2 + 2−n < ε ,
2 n=1 n=N +1
Demonstração. Uma vez que a topologia fraca é metrizável nessa bola, é suficiente mostrar a
compacidade sequencial. Dada qualquer sequência (xn )n∈N ⊂ B[0; 1], podemos extrair dela
uma subsequência fracamente convergente pelo Teorema 3.9 e o limite fraco dessa subsequência
pertence à bola B[0; 1] por causa do Lema 3.8. Isso prova compacidade sequencial.
Nota 3.19. Na verdade, as bolas fechadas em qualquer espaço de Banach reflexivo, não apenas
em espaços de Hilbert, são fracamente compactas.
define a norma em L2 (Rn ). Tecnicamente, afirmar que a norma L2 é positiva, isto é, que
∥Ψ∥2 > 0, a não ser que Ψ = 0, não é completamente correto. Aqui, devemos entender que
127
Espaços de Hilbert
enquanto que, da desigualdade de Minkowski (veja tb. o Lema 6.9), pode-se mostrar que quando
Ψ, Φ ∈ L2 (Rn ), então Ψ + Φ ∈ L2 (Rn ) e
e $ $
⟨λΨ, Φ⟩ = dx , λ Ψ(x)Φ(x) = λ dx Ψ(x)Φ(x) = λ⟨Ψ, Φ⟩ .
Ω Ω
Portanto,
$ $
∥λΨ∥22 = dx λ Ψ(x)λΨ(x) = |λ| 2
dx Ψ(x)Ψ(x) = |λ|2∥Ψ∥22 .
Ω Ω
Tudo isto evidencia a caráter vetorial do espaço L2 (Rn ). A diferença é que L2 (Rn ) não é um
espaço de Hilbert de dimensão finita, já que seus elementos não são combinações lineares de
um dado número finito de elementos. De fato, L2 (Rn ) é um exemplo de um espaço de Hilbert
de dimensão infinita, o que significa que qualquer base para o conjunto L2 (Rn ) exigirá um
número infinito de funções de base.
128
Espaços de Hilbert
Dada uma sequência (Ψn )n∈N ⊂ L2 (Ω), com Ω ⊆ Rn , e um elemento Ψ ∈ L2 (Ω), diz-se
que a sequência (Ψn )n∈N converge fortemente para Ψ se
lim ∥Ψ − Ψn ∥2 = 0 .
n→∞
Em outras palavras, se existe uma sequência (Ψn )n∈N de funções em L2 (Ω) tal que ∥Ψm −
Ψn ∥2 → 0, quando m, n → ∞, então existe uma função Ψ ∈ L2 (Ω) tal que ∥Ψ − Ψn ∥2 → 0,
quando n → ∞. A sequência (Ψn )n∈N de funções em L2 (Ω) que satisfaz esta propriedade é
chamada, como já vimos, sequência de Cauchy. Isto nos leva ao seguinte
TEOREMA 3.18 (Completeza de L2 ). Dada uma sequência (Ψn )n∈N ⊂ L2 (Ω), então para que
exista um elemento Ψ ∈ L2 (Ω) em direção ao qual a sequência converge fortemente, é necessário
e suficiente que ∥Ψm − Ψn ∥2 → 0, quando m, n → ∞.
Para mostrar que esta condição também é suficiente, assuma que a sequência (Ψn )n∈N ⊂
L2 (Ω) é Cauchy, isto é, para qualquer ε > 0, existe um N(ε) tal que se m, n > N(ε), então,
∥Ψm − Ψn ∥2 < ε. Seja mk = N(2−k ); então a subsequência (Ψmk )mk ∈N ⊂ L2 (Ω) satisfaz a
condição
∥Ψmk+1 − Ψmk ∥2 # 2−k .
Defina a função Ψ por
∞
< . /
Ψ(x) = Ψm1 (x) + Ψmk+1 (x) − Ψmk (x) , ∀x ∈ Ω .
k=1
N
< −1
? ?
# ∥Ψm1 ∥2 + ?Ψm − Ψm ?
k+1 k 2
k=1
N
< −1
# ∥Ψm1 ∥2 + 2−k .
k=1
129
Espaços de Hilbert
Isto mostra que as normas ∥ΨmN ∥2 são majoradas por ∥Ψm1 (x)∥2 + 1 ou, equivalentemente,
que as integrais de |ΨmN |2 permanecem limitadas. Agora, note que,
? ?
?<∞
. / ?
? ?
∥Ψ − ΨmN ∥2 = ? Ψmk+1 (x) − Ψmk (x) ?
? ?
k=N 2
∞
< ? ?
# ?Ψm − Ψm ?
k+1 k 2
k=N
∞
<
# 2−k
k=N
∞
< ′
= 2−(k +N ) = 2−N → 0 quando N → ∞ .
k ′ =0
Isto prova a condição de suficiência. Além disso, se Ψ∗ fosse também o limite da mesma
sequência, então,
ou seja, ∥Ψ − Ψ∗ ∥2 = 0 ⇒ Ψ = Ψ∗ !
Vamos, agora, considerar uma sequência ortonormal completa (Φn )n∈N ⊂ L2 (Rn ) e um
elemento arbitrário Ψ ∈ L2 (Rn ). Pela desigualdade de Bessel temos que
∞
< 5 5
5⟨Φn , Ψ⟩52 # ∥Ψ∥22 .
n=1
Uma vez que a série à esquerda da desigualdade de Bessel converge para um número menor ou
igual a ∥Ψ∥22 , então,
? m ?
?< ? <m
5 5
? ? 5⟨Φn , Ψ⟩52 → 0 quando ℓ, m → ∞ .
? ⟨Φn , Ψ⟩Φn ? =
? ?
n=ℓ 2 n=ℓ
converge fortemente para algum elemento Λ de L2 (Rn ).9 No entanto, pela Proposição 3.12, a
convergência forte implica a convergência fraca; logo,
( m ) ( m )
< <
⟨Φk , Λ⟩ = lim ⟨Φn , Ψ⟩⟨Φn , Φk ⟩ = lim ⟨Φn , Ψ⟩δnk = ⟨Φk , Ψ⟩ .
m→∞ m→∞
n=1 n=1
9
Note que, na convergência da série (3.9.1) usamos o fato que o quadrado dos módulos dos seus coeficientes
forma uma série convergente, de acordo com o Teorema 3.8.
130
Espaços de Hilbert
Assim,
⟨Φk , Ψ − Λ⟩ = 0 .
Isto implica que Ψ −Λ é perpendicular a todos os elementos da sequência ortonormal completa
(Φn )n∈N e, consequentemente, a todas as combinações lineares dos elementos dessa sequência.
Mas, como a sequência ortonormal (Φn )n∈N é completa, pelo Teorema 3.9, isto implica que
Ψ − Λ = 0 ⇒ Ψ = Λ. Também pelo Teorema 3.9, esta última condição implica que
∞
<
Ψ(x) = ⟨Φn , Ψ⟩Φn (x) , ⟨Φn , Ψ⟩ ∈ C ,
n=1
TEOREMA 3.19 (Teorema de Riesz-Fischer). Dados uma sequência arbitrária de números com-
plexos (cn )n∈N tal que
<∞
|cn |2 < ∞ ,
n=1
Nota 3.20. Já tínhamos estabelecido anteriormente, na Proposição 3.16, que qualquer espaço
de Hilbert separável de dim H = ℵ0 é isomorfo a ℓ2 . Assim, quaisquer dois desses espa-
ços são isomórfos e, em certo sentido, existe apenas um espaço complexo e um espaço de
Hilbert separável de dim H = ℵ0 (o mesmo é verdade para os espaços de Hilbert reais;
qualquer espaço de Hilbert separável real de dim H = ℵ0 é isomórfo ao espaço real ℓ2 ).10
Portanto, o Teorema 3.19 pode ser visto como um caso particular da Proposição
; 3.16. De fato,
a sequência arbitrária de números complexos (cn )n∈N , tal que a série ∞ 2
n=1 n | converge,
|c
é um elemento do espaço ℓ2 . Assim, pelo Teorema de Riesz-Fischer, a sequência ortonormal
completa (Φn )n∈N ⊂ L2 (Rn ) estabelece uma correspondência um-para-um entre os elementos
10
Mas, então, por que é importante estudar outros espaços de Hilbert separáveis além do espaço de sequências
ℓ2 ? É porque esses outros espaços de Hilbert separáveis têm, assim como o espaço L2 (Rn ), uma estrutura
adicional que é perdida se forem tratados como espaços de sequências. Enquanto os operadores diferenciais
parciais lineares, por exemplo os operadores de Schrödinger, podem ser estudados convenientemente no espaço
L2 (Rn ), isto não é em geral o caso no espaço de sequências.
131
Espaços de Hilbert
;
Ψ ∈ L2 (Rn ) e os elementos x = (cn )n∈N ∈ ℓ2 por meio da fórmula Ψ = ∞ n=1 cn Φn , que
expressa que os números complexos cn são as “coordenadas” de Ψ no sistema ortonormal for-
mado pelos Φn . Esta correspondência preserva a estrutura linear, já qua combinações lineares
dos Ψ correspondem a combinações lineares dos {cn }, e também preserva a estrutura métrica,
já que pela identidade de Parseval produtos escalares e normas dos elementos de L2 (Rn ) são
iguais àqueles dos correspondentes elementos em ℓ2 . Em resumo, os espaços L2 (Rn ) e ℓ2 têm
as mesmas estruturas linear e métrica, e, consequentemente, podem ser considerados como
realizações do mesmo espaço abstrato, que é definido precisamente pelas propriedades comuns:
linearidade, existência de produtos escalares e normas, e também pela validade do critério de
Cauchy para a convergência forte.
Neste novo cenário, a visão determinista da mecânica clássica (posição exata da partícula a cada
instante) foi substituída pela visão estatística da mecânica quântica (probabilidade de encontrar a
partícula em um ponto no espaço). Consequentemente, do ponto de vista da mecânica quântica,
a escolha de L2 (Ω) como o espaço de estados de uma partícula “localizável” é consistente com
a interpretação probabilística da função-de-onda Ψ. Se H é o espaço de Hilbert de funções de
quadrado integrável Ψ, então podemos dizer que toda função-de-onda situa-se sobre a esfera
unitária no espaço H . Portanto, nós não consideramos H = L2 (Ω) como um espaço abstrato,
mas sim como o conjunto de funções-de-onda da mecânica quântica de quadrado integrável
definidas no espaço de configuração 3-dimensional.
11
Por este motivo, Ψ é chamada função de estado da partícula.
132
Espaços de Hilbert
Existem vários resultados na literatura que caracterizam um espaço com produto interno em
termos de uma dada norma.13 Um destes resultados, conhecido como Teorema de Jordan-von
Neumann de 1935, é a combinação das Proposições 3.6 e 3.7.
Nota 3.21. É importante que seja enfatizado que se uma dada norma não satisfaz as pro-
priedades que caracterizam um espaço com produto interno, isto de forma alguma exclui a
possível existência de uma outra norma com uma topologia equivalente que possa induzir um
produto interno sobre o espaço. Isso é o que acontece com seguinte exemplo. Seja X o plano
euclidiano. Normas equivalentes podem ser definidas sobre X por
. /1/p
∥x∥p = |a|p + |b|p
em que x = (a, b). Pode-se facilmente verificar, através das Proposições 3.6 e 3.7, que, se p = 2
a norma ∥x∥2 induz um produto interno sobre X , enquanto que para p = 1 isto não ocorre.
TEOREMA 3.20 (Teorema 12 de Lambert). Seja X um espaço vetorial topológico para o qual
existe uma base de Hamel H, tal que o conjunto
n
< n
<
! "
C= x∈X |x= αi xi , xi ∈ H, |αi |2 < 1, n arbitrário ,
i=1 i=1
n
< . /
= tαi + (1 − t)βi xi .
i=1
12
H.B. Lambert, “Topological Characterization of an Inner Product Space,” Dissertation in Mathematics, Graduate
Faculty of Texas Technological College, 1968.
13
Uma coletânea destes resultados pode ser encontrada no livro de V.I. Istrǎtescu, “Inner Product Structures:
Theory and Applications,” Series: Mathematics and Its Applications, Vol. 25, Springer, 1987.
133
Espaços de Hilbert
6<
n
5 2 71/2 6<
n
5 52 71/2
=t 5 αi | + (1 − t) 5βi 5
i=1 i=1
< t + (1 − t) = 1 .
;n 5 52
Portanto, 5 5 < 1.
i=1 tαi + (1 − t)βi
∥x∥ é chamado funcional de Minkowski de M. Note que ∥x∥ < ∞ para todo x ∈ X , visto
que C é absorvente. A norma sobre X será precisamente o funcional de Minkowski.
;n
Observe que se x = i=1 αi xi e ∥x∥ = u, então
?<n ?
−1 ? −1 ?
1 = u ∥x∥ = ? u αi xi ? .
i=1
Isto significa que u−1 x está sobre a fronteira de C (lembre-se que os elementos da fronteira
de um conjunto não precisam necessariamente pertencer ao conjunto,
;n se ele é um conjunto
aberto, como é o caso de C). Por sua vez, isto implica que i=1 |u αi |2 = 1. Portanto,
;
−1
n 2 2
i=1 |αi | = u = ∥x∥ .
;n
Tome
;x, y ∈ X tais que x ̸= 0, y ̸= 0 e x = ±y. Como antes, assuma que x = i=1 αi xi
n
e y = i=1 βi xi , para x ∈ H, então
n
< n
<
2 2 2
∥x + y∥ + ∥x − y∥ = |αi + βi | + |αi − βi |2
i=1 i=1
n 6
< 7
= |αi + βi |2 + |αi − βi |2 .
i=1
= αi αi ± αi β ± β i αi + β i βi ,
134
Espaços de Hilbert
então,
n 6
< 7 n 6
< 7
2 2
|αi + βi | + |αi − βi | = 2 |αi |2 + |βi |2 .
i=1 i=1
Consequentemente,
n 6
< 7 6 7
2 2 2 2 2 2
∥x + y∥ + ∥x − y∥ = 2 |αi | + |βi | = 2 ∥x∥ + ∥y∥ .
i=1
Pela Proposição 3.6, X é um espaço com produto interno. Isto completa a prova do teorema.
COROLÁRIO 3.9. Se X é um espaço vetorial topológico com um produto interno induzido pelo
conjunto C do Teorema 3.20, então o conjunto H do mesmo teorema é uma base ortonormal
com respeito à este produto interno.
;n
Por outro lado, do Teorema 3.20, ∥x∥2 = i=1 |αi |2 . Logo,
n <
< n n
<
αi αj ⟨xi , xj ⟩ = |αi |2 =⇒ ⟨xi , xj ⟩ = δij .
i=1 j=1 i=1
PROPOSIÇÃO 3.17. Um conjunto ortonormal completo infinito nunca é uma base de Hamel em
um espaço de Hilbert.
135
Espaços de Hilbert
x = α1 x1 + · · · + αn xn ,
1 @ < 1 A ∞
= xj , xi = ⟨xj , α1 x1 + · · · + αn xn ⟩ = 0 ,
j2 i=1
i2
136
Segunda Parte:
Elementos de Teoria de Operadores Lineares
137
Capítulo 4
Operadores Lineares em Espaços de
Hilbert
I.M. Gel’fand
A teoria dos operadores lineares é um campo muito amplo, com numerosas facetas e uma
série de aplicações. Existem conexões profundas dessa teoria com a análise funcional, a física
matemática e a análise complexa, só para citar algumas. Podemos definir a teoria dos operadores
lineares como sendo o estudo das operações entre espaços vetoriais topológicos, sendo estes
em geral (mas não exclusivamente) os espaços de Banach, de Hilbert ou de Fréchet (e seus
duais). No presente capítulo, examinaremos a teoria dos operadores lineares em espaços de
Hilbert. Essa classe de operadores desempenha um papel fundamental na formulação da teoria
quântica. Faremos uma apresentação das ferramentas mais importantes e métodos da teoria de
operadores em espaços de Hilbert, focando, em particular, a existência dos operadores auto-
adjuntos. Naturalmente, em nossa escolha de temas, tentamos refletir a diversidade subjacente,
e qualquer escolha de tópicos necessariamente deixa de lado alguns aspectos da teoria.
139
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
espaço-alvo carregam uma estrutura linear, podemos considerar os mapeamentos que respeitam
essa estrutura. Tais mapeamentos são chamados lineares.
e aditivo
A(x + y) = Ax + Ay , ∀ x, y ∈ Dom(A) .
Equivalentemente, A : X → Y é linear se, e somente se,
Observe que um operador anti-linear é distinto de um operador linear apenas para espaços
vetoriais complexos ou, mais geralmente, para espaços vetoriais sobre corpos K para os quais
uma operação de involução é definida por um mapeamento a 3→ a, para a, a ∈ K, obedecendo
às condições que a = a, a+b → a+b e ab → ba. Como o caso de espaços vetoriais complexos
é de generalidade suficiente para a mecânica quântica, ignoramos as possibilidades mais gerais.
É fácil verificar que Ran(A) não é apenas um subconjunto de Y , mas também é um su-
bespaço de Y . A dimensão de Ran(A) é chamada de rank de A; nós a denotamos por
rank(A).
DEFINIÇÃO 4.2. Sejam X , Y dois espaços vetoriais sobre o mesmo corpo K. Diz-se que A é
um funcional linear (ou forma linear) sobre X se, em particular, Y = K.
DEFINIÇÃO 4.3. Sejam X , Y espaços vetoriais. Por La (X , Y ) representamos o conjunto de
todos os operadores lineares A de X em Y .
140
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Nota 4.2. O índice “a” nas definições acima representa a inicial de algébrico; significa que não
se exige a noção de continuidade.
Nota 4.3. Os conjuntos dos operadores lineares La (X , Y ), La (X ) e X ∗ são espaços
vetoriais se definimos a adição de operadores e a multiplicação de operadores por escalares da
forma natural, isto é
(A1 + A2 )x = A1 x + A2 x , ∀ x ∈ Dom(A1 + A2 ) ,
Ker(A) é um subespaço de X .
141
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
De acordo com a definição acima, podemos dizer que o operador A tem um inverso se a
equação vetorial
Ax = y . (4.1.1)
tem solução única para todo y ∈ Ran(A); ou seja, se Ax1 = Ax2 , então, x1 = x2 . Dessa
forma, se o operador A tem um inverso, podemos associar a única solução de (4.1.1) com cada
y ∈ Ran(A). Isto dá um operador, com domínio Ran(A), chamado o inverso de A e
denotado por A−1 .
LEMA 4.1. Sejam X e Y espaços vetoriais. Suponha que A seja um operador linear com
domínio Dom(A) ⊂ X e conjunto imagem Ran(A) ⊂ Y . O inverso do operador A existe
se, e somente se, Ax = 0 implica que x = 0. Quando A−1 existe ele é um operador linear.
Demonstração. Pela Definição 4.7, o operador inverso A−1 existe se, e somente se, Ax1 = Ax2
implica que x1 = x2 . Suponha que Ax = 0 e que Ax1 = Ax2 . Então, pela linearidade
de A, segue que A(x1 − x2 ) = 0; portanto x1 − x2 = 0, ou x1 = x2 . Assim, A−1 existe.
Reciprocamente, suponha que A−1 existe. Seja x um vetor tal que Ax = 0. Então, x =
A−1 (Ax) = A−1 0 ⇒ x = 0, já que A−1 também tem um inverso, o operador A, e isto
é garantido provando-se que A−1 é linear. Com efeito, assuma que A−1 (αy1 + βy2 ) ̸=
αA−1 y1 + βA−1 y2 . Usando a linearidade de A e o fato que yi = Axi (i = 1, 2) é equivalente
a xi = A−1 yi , então
. A−1 (αy1 + βy /
−1 −1 −1
2 ) ̸= αA y1 + βA y2 ⇒ A (αAx1 + βAx2 ) ̸=
αx1 + βx2 ⇒ A−1 A(αx1 + βx2 ) ̸= αx1 + βx2 ⇒ αx1 + βx2 ̸= αx1 + βx2 , que é um
absurdo. Assim, A−1 é necessariamente linear. Isto conclui a prova do lema.
(AB)x = A(Bx) .
142
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
De tudo que foi dito até agora sobre os operadores lineares, um ponto precisa ser desta-
cado (principalmente porque isto às vezes é ignorado, especialmente nos livros sobre mecânica
quântica): deve ficar claro que um operador linear A : X → Y não pode ser considerado
como totalmente especificado até que o seu domínio de definição esteja caracterizado – ou seja,
até que o conjunto de todos os vetores x ∈ X , para os quais Ax tem significado, tenha sido
identificado. Uma mesma regra1 definirá operadores diferentes quando os domínios de definição
forem diferentes (isso já acontece mesmo no caso de funções mais simples do Cálculo, como
vimos no Exemplo 1.14).
Exemplo 4.1. Sejam H = L2 ([0, 1]) um espaço de Hilbert e A uma regra que multiplica
vetores Ψ ∈ H por 1/x. Considere os conjuntos
3 4
Ω1 = Ψ : (0, 1) → C | Ψ é contínua, supp Ψ ⊂ (0, 1) ,
3 4
Ω2 = Ψ ∈ H | Ψ = xα Φ, Φ ∈ H com α " 1 ,
3 4
Ω3 = Ψ ∈ H | x1 Ψ ∈ H .
Esses três conjuntos são subespaços lineares de H = L2 ([0, 1]) e eles são todos diferentes:
Ω1 " Ω2 " Ω3 .
143
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
De fato, a função Ψ = 1 é de quadrado integrável no intervalo [0, 1], enquanto que x1 · 1 não é
de quadrado integrável no mesmo intervalo. Portanto, devemos ter em mente que é fundamental
especificar claramente qual subespaço é escolhido como o domínio de um operador.
Nota 4.4. Neste ponto, é importante destacar o quanto é delicada a questão do domínio
de um operador. No Exemplo 4.1, assumimos como operador a regra multiplicar por 1/x
funções Ψ ∈ L2 ([0, 1]) e tomamos três domínios diferentes Ωj (j = 1, 2, 3). Afirmamos que
1
x
Ψ ∈ L2 [0, 1] nos três casos. No caso particular do Dom(A1 ) = Ω1 , assumimos que Ψ
é contínua e com supp Ψ ⊂ (0, 1). Esta última condição é fundamental para garantir que
1
x
Ψ ∈ L2 [0, 1]. Com efeito, se em Ω1 tivéssemos assumido que supp Ψ ⊆ [0, 1], então,
1
x
Ψ∈/ L2 [0, 1] como mostra o seguinte exemplo: considere a função
⎧
⎨1 se 0 # x # 1/2
Ψ(x) = .
⎩2 − 2x se 1/2 # x < 1
Usando esta terminologia temos que para o Exemplo 4.1 a seguinte situação acontece:
A1 ⊂ A2 ⊂ A3 .
O Exemplo 4.1, discutido acima, mostra algumas características sobre os operadores lineares
que são muito importantes e que merecem ser destacadas:
144
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
3. Se ou não um operador linear A pode ser definido em todo espaço de Hilbert H pode
ser decidido investigando-se o conjunto
# %
∥Ax∥
| x ∈ H , x ̸= 0 .
∥x∥
145
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
DEFINIÇÃO 4.9. Sejam X e Y espaços vetoriais normados. Diz-se que um operador A mape-
ando X em Y é limitado se ele mapea conjuntos limitados em X em conjuntos limitados em
Y.
Em outras palavras, diz-se que um conjunto M ⊂ X é limitado quando ele tem “uma ordem
de grandeza 2C,” se seu diâmetro é menor do que 2C: para todo x, y ∈ M, ∥x − y∥ < 2C,
ou equivalentemente, x − y ∈ B(0; C), com B(0; C) sendo a bola de centro 0 e raio C (veja
a figura abaixo)2
Isto significa que ∥x∥X # C para todo x ∈ M ⊂ X . Assim, dizemos que um operador
A : X → Y é limitado se existir uma constante M > 0 tal que a norma dos vetores Ax ∈ Y
é limitada por M, isto é, ∥Ax∥Y # M, para todo x ∈ M.
A noção de um operador linear ser limitado pode ser descrita em termos relativamente
simples através da seguinte
DEFINIÇÃO 4.10. Um operador linear A : X → Y é limitado se, e somente se, existe um
número real M não-negativo tal que
∥Ax∥Y # M∥x∥X , ∀ x ∈ Dom(A) ⊂ X , (C1)
2
Sem perda de generalidade, usamos a vizinhança de 0 para caracterizar a limitação de M ⊂ X .
146
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Por construção, um operador limitado é Lipschitz contínuo.3 Com efeito, de acordo com a
Definição 4.10, podemos sempre associar com qualquer operador linear limitado uma coleção
de números positivos M de forma a termos satisfeita a condição (C1). Se tomarmos o menor de
tais M’s, isto é, Mmin , então nós, efetivamente, estabelecemos uma correspondência N entre
o operador A e o conjunto dos números reais positivos, R+ : N(A) = Mmin . A função N
determinada desta forma satisfaz todas as propriedades de uma norma, e, portanto, denotamos
N(A) por ∥A∥ e nos referimos a ela como a norma do operador A. Assim,
3 4
∥A∥ = inf M " 0 | ∥Ax∥Y # M∥x∥X , ∀ x ∈ X
∥Ax∥Y
= sup . (N0)
x∈X −{0} ∥x∥X
Logo, ∥Ax∥Y # ∥A∥∥x∥X . Note que a condição ∥Ax∥Y # M∥x∥X é satisfeita por uma
constante M " 0, qualquer que seja x ∈ Dom(A) ⊂ X se, e somente se, M " ∥A∥.
Nota 4.5. Em um espaço de Hilbert, existem expressões para ∥A∥ em termos do produto
interno, isto é,
5 5
5⟨y, Ax⟩5 Re ⟨y, Ax⟩
∥A∥ = sup = sup . (4.2.1)
x∈X −{0} ∥x∥X ∥y∥Y x∈X −{0} ∥x∥X ∥y∥Y
y∈Y −{0} y∈Y −{0}
3
Lembre-se que, se X e Y são espaços normados e Ω ⊂ X um aberto não vazio, então a aplicação
Ψ : Ω → Y é dita ser lipschitziana em Ω se
∥Ψ(x1 ) − Ψ(x2 )∥ # M ∥x1 − x2 ∥ .
Em geral, a desigualdade é (trivialmente) satisfeita se x1 = x2 . Caso contrário, pode-se definir equivalentemente
uma aplicação para ser Lipschitz contínua se, e somente se, existir uma constante M " 0 tal que, para quaisquer
x1 , x2 ∈ Ω, com x1 ̸= x2 ,
∥Ψ(x) − Ψ(y)∥
#M .
∥x − y∥
A constante M é chamada constante de Lipschitz da aplicação (ou módulo de continuidade uniforme). Disso resulta
que Ψ é contínua. Ainda, se Ψ é diferenciável em Ω, então
∥Ψ(x1 ) − Ψ(x2 )∥
sup " sup ∥DΨ(x)∥ .
x1 ̸
=x 2 ∥x1 − x2 ∥ x
A igualdade vale quando Ω é convexo (verifique!). Em tal caso, Ψ é lipschitziana se, e somente se, DΨ for limitada
em Ω. A continuidade segundo Lipschitz é uma forma forte de continuidade uniforme de funções. A seguinte
cadeia de inclusões para funções definidas sobre um subconjunto fechado e limitado acontece: continuamente
diferenciável ⊆ Lipschitz contínua ⊆ uniformemente contínua. Também temos, Lipschitz contínua ⊆ absolutamente
contínua.
147
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
∥Ax∥Y ∥Bx∥Y
# sup + sup = ∥A∥ + ∥B∥ .
x∈X −{0} ∥x∥X x∈X −{0} ∥x∥X
148
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Existem outras formas de definir a norma de um operador linear limitado A, como mostra
o seguinte
TEOREMA 4.1. Seja A um operador linear limitado de X para Y . Então, as normas
∥A∥1 = sup ∥Ax∥Y , (N1)
∥x∥X =1
149
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
segue que
∥A∥3 = sup ∥Ax∥Y # sup ∥Ax∥Y = ||A||2 .
∥x∥X <1 ∥x∥X #1
λ∥A∥ # ∥A∥3 .
De fato,
? , -?
∥Ax∥Y ∥A(λx)∥Y ? x ?
λ∥A∥ = λ sup = sup = sup ? ?A λ ?
x∈X −{0} ∥x∥X x∈X −{0} ∥x∥X x∈X −{0} ∥x∥X ?Y
# sup ∥Ax∥Y
∥x∥X <1
= ∥A∥3 .
150
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
em que 3 4
B∥·∥ (x0 ; δ) = x ∈ X | ∥x − x0 ∥X < δ
X
e 3 4
B∥·∥ (Ax0 ; ε) = Ax ∈ Y | ∥Ax − Ax0 ∥Y < ε .
Y
3 4
= A(x + a) ∈ Y | ∥Ax + Aa − Ax0 − Aa∥Y < ε
3 4
= Ax ∈ Y | ∥Ax − Ax0 ∥Y < ε .
151
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
(b) Existe um C > 0 tal que ∥Ax∥Y # C∥x∥X para todo x ∈ Dom(A).
(d) A é contínuo.
(c) ⇒ (d). Isto é imediato pela Definição 4.11 e pelo Corolário 4.1.
Nota 4.7. O teorema acima estabelece uma relação de equivalência entre operadores limitados
e operadores lineares contínuos. Assim, um operador linear entre espaços normados é contínuo
se, e somente se, ele é limitado. No entanto, deve-se ressaltar que na teoria dos espaços
vetoriais topológicos apesar de termos definidos os conceitos de operadores lineares contínuos
e operadores lineares limitados, nem sempre se tem a equivalência entre estes conceitos. De
fato, operadores lineares podem ou não ser limitados, e operadores limitados podem ou não
ser lineares. No entanto, a linearidade de um operador A fornece uma ponte conceitual entre
a continuidade e a limitação: os dois conceitos se tornam equivalentes se, e somente se, A é
linear.
Nota 4.8. Os Teoremas 4.1 e 4.2 aplicam-se sem modificações no caso em que A é um funcional
linear limitado. A única mudança que deve ser feita nos enunciados e nas provas é a substituição
152
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
do símbolo de norma ∥Ax∥Y pelo símbolo de valor absoluto |Ax|K . No caso do Teorema 4.1
teremos
∥A∥1 = sup |Ax|K ,
∥x∥X =1
Nota 4.9. O índice “b” nas definições acima representa a inicial de bounded; significa que a
noção de continuidade é levada em consideração. Note que
Lb (X , Y ) ⊂ La (X , Y ) .
Nota 4.10. Em espaços de dimensão finita os conceitos de dual algébrico e dual topológico
coincidem (Por que? Veja Proposição 4.4).
s
2. fortemente para o operador A se para cada x ∈ H , An x −→ Ax, quando n → ∞; ou
seja,
s− lim An = A ⇐⇒ lim ∥An x − Ax∥ = 0 , ∀ x ∈ H .
n→∞ n→∞
153
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Por outro lado, note que, para todo x ∈ H , segue pela desigualdade Cauchy-Schwarz-
Bunjakowski que
Deve ficar claro que a convergência forte não implica a convergência uniforme, como nos
mostra o seguinte
Exemplo 4.2 (Operadores de projeções ortogonais). Seja H um espaço de Hilbert. Um
idempotente em H é um operador linear limitado P : H → H tal que P 2 = P . Uma
projeção é um idempotente P se Ker(P ) = Ran(P )⊥ . Além disso, se P é auto-adjunto, isto
é, P = P ∗ , então, P é chamado operador de projeção ortogonal. Vamos usar esta definição
para generalizar a decomposição H = M ⊕ M ⊥ no Teorema 3.5. Com efeito, se escrevemos
<
H = Mi , Mi ∩ Mj = {0} , i ̸= j , (4.2.4)
i∈I
(a soma acima é finita ou infinita contável), então, a decomposição (4.2.4) nos permite definir,
naturalmente, operadores de projeções ortogonais, Pi , sobre cada subespaço Mi ,
Pi : H → Mi , Pi (H ) = Mi ,
154
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
1I = P1 + · · · + Pn ,
e dizemos que isto define a resolução da identidade. Por outro lado, se o conjunto de
subespaços fechados é infinito contável, podemos ainda escrever
∞
<
1I = Pi ,
i=1
mas, nesse caso, a soma parcial da série de operadores Pi deve convergir para 1I segundo a
topologia forte dos operadores. Esse é um exemplo de uma série de operadores que converge
fortemente, mas não converge uniformemente. De fato, se definirmos Pi x = ⟨xi , x⟩xi , em que
{xi }i∈I é um sistema ortonormal completo em H , e tomarmos a soma parcial
n
<
Sn = Pi ,
i=1
Logo, ∥(1I−Sn )∥ = 1 para todo n. Consequentemente, não é verdade que a sequência (Sn )n∈N
converge segundo a topologia uniforme para o operador identidade 1I. Assim, podemos dizer que
a sequência de operadores (Pi )i∈N em um espaço de Hilbert H é uma resolução da identidade
se é verdade que (i) cada Pi é uma projeção ortogonal, (ii) a composição Pi Pj = O, se i ̸= j
e (iii)
<∞
1I = s− Pi .
i=1
155
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Por (4.2.5), cada x ∈ X pertence a algum Xn . Portanto, X = ∪∞ n=1 Xn . Uma vez que X
é completo, o Teorema de Baire (Teorema 1.14) implica que algum Xn contém uma bola aberta,
digamos,
Então, ∥y − x0 ∥X < r, de modo que z ∈ B∥·∥X (x0 ; r). Por (4.2.7) e da definição de Xn0
temos, portanto, ∥Aα y∥Y # n0 para todo α ∈ J. Também temos que ∥Aα x0 ∥Y # n0 , já que
x0 ∈ B∥·∥X (x0 ; r). De (4.2.8) obtemos
1
x= (y − x0 ) .
γ
1 16 7 2 4
∥Aα x∥Y = ∥Aα (y − x0 ))∥Y # ∥Aα y∥Y + ∥Aα x0 ∥Y # n0 = n0 .
γ γ γ r
4
∥Aα ∥ = sup ∥Aα x∥Y # n0 ,
∥x∥X =1 r
156
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
O princípio da limitação uniforme foi publicado pela primeira vez em 1927 por Stefan Banach
e Hugo Steinhaus, e por isso é também chamado Teorema Banach-Steinhaus.4
Uma forma especial do princípio da limitação uniforme que é bastante útil é o seguinte
TEOREMA 4.4 (Teorema de Banach-Steinhaus para espaços de Hilbert). Se H1 e H2 são
espaços de Hilbert e (An )n∈N é uma sequência em Lb (H1 , H2 ) com a propriedade que para
cada x ∈ H1 existe um y ∈ H2 tal que ∥An x − y∥ → 0, então, existe um operador A ∈
Lb (H1 , H2 ) tal que ∥An x − Ax∥ → 0 para todo x ∈ H1 e sup ∥An ∥ < ∞.
De acordo com o próximo teorema, dado dois espaços vetoriais normados X e Y , então um
operador linear limitado A : X → Y pode ter seu domínio de definição Dom(A) estendido
para seu fecho Dom(A) sem aumentar sua norma. Em particular, se Dom(A) é denso em
X , então Dom(A) = X . Esse teorema, às vezes chamado de Teorema BLT (abreviação em
inglês para “bounded linear transformation”), tem muitas aplicações no estudo de operadores
lineares.
TEOREMA 4.5 (Teorema de Extensão). Sejam X um espaço vetorial normado, Y um espaço
de Banach e A : X → Y um operador linear limitado com domínio denso Dom(A) em X .
N definido sobre todo o espaço X que estende
Então, existe um único operador linear limitado A
N = ∥A∥.
A e tal que ∥A∥
quando n, m → ∞, já que como (xn )n∈N converge para x, está sequência é de Cauchy. Se,
N como sendo o limite de Axn , quando n → ∞, então, é
para cada x ∈ X , definirmos Ax
N # ∥A∥, porque
claro que ∥A∥
N
∥Ax∥ = ∥ lim Axn ∥Y # ∥A∥∥ lim xn ∥X = ∥A∥∥x∥X .
Y
n→∞ n→∞
4
S. Banach & H. Steinhaus, “Sur le Principe de la Condensation de Singularités,” Fundamenta Mathematicae 9
(1927) 50.
157
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Note que esta definição é boa, pois ela não depende da sequência (xn )n∈N em Dom(A). Com
efeito, se (x′n )n∈N é uma outra sequência em Dom(A) que converge para x então a estimativa
confirma que limn→∞ Axn = limn→∞ Ax′n . Por outro lado, como por hipótese A ⊂ A, N isto
é, como A N é uma extensão de A, segue que Dom(A) N = Dom(A) = X ⊃ Dom(A) e
N = Ax para todo x ∈ Dom(A). Logo, ∥A∥
Ax N " ∥A∥. Isto implica que ∥A∥ N = ∥A∥. Para
N é um outro operador linear limitado A
provar a unicidade, assuma que A′ N definido sobre todo
o espaço X que estende A. Se (xn )n∈N é uma sequência em Dom(A) que converge para
x ∈ X = Dom(A), então,
N′ x − Axn ∥ = ∥A
∥A N′ x − A
N′ xn ∥ # ∥A
N′ ∥∥x − xn ∥ .
Y Y X
N 1 + β Ax
αAx N 2 = α lim Axn + β lim Ax′ = lim A(αxn ) + lim A(βx′ )
n n
n→∞ n→∞ n→∞ n→∞
6 7
= lim A(αxn ) + A(βx′n )
n→∞
6 7
′
= lim A αxn + βxn .
n→∞
. /
Mas, pelo Teorema 2.6, a sequência αxn + βx′n n∈N converge para αx1 + βx2 . Além disso,
αxn + βx′n ∈ Dom(A), para todo n ∈ N, pois Dom(A) . é subespaço
/ .vetorial de /X .
′ N
Portanto, αx1 + βx2 ∈ Dom(A) = X . Logo, limn→∞ A αxn + βxn = A αx1 + βx2 , o
N
que prova a linearidade de A.
Nota 4.11. O Teorema 4.5 nos permite assumir no futuro, sempre que desejarmos e sem perda
de generalidade, que todo operador linear limitado A, com domínio denso Dom(A) em um
espaço vetorial normado X , pode ser assumido como sendo definido em toda parte em X , já
que A sempre pode ser estendido por A,N que é definido em todo o espaço X . É por esta razão
que nada se perde ao supor que tais operadores sejam definidos inicialmente em todo o espaço,
basta tomar A igual a sua extensão A! N Consequentemente, só é útil considerar operadores
densamente definidos quando o operador é ilimitado. Por outro lado, é possível que o inverso
de um operador, A−1 , mesmo sendo limitado, não tenha um domínio definido em toda parte.
Por exemplo, o operador linear A : ℓ2 → ℓ2 definido por
A(x1 , x2 , . . .) = (0, x1 , x2 , . . .) ,
indica que A−1 é definido somente para aqueles vetores em ℓ2 cuja a primeira componente é
zero.
TEOREMA 4.6. Sejam X , Y espaços vetoriais normados. Então, Lb (X , Y ) é completo se Y
é um espaço de Banach.
158
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
= lim An x + lim An y = Ax + Ay .
n→∞ n→∞
Aqui, usamos o fato que An é linear e que a adição é uma aplicação contínua para espaços
normados.
Se x ∈ X e α ∈ K, então
. /
A(αx) = lim An (αx) = lim αAn x
n→∞ n→∞
= α lim An x = αAx .
n→∞
Para mostrar que A é limitado, observe que, para x ∈ X tomado arbitrariamente, porém
fixo, An x = (An − Am )x + Am x, e isso implica que ∥An x∥Y # ∥An x − Am x∥Y + ∥Am x∥Y .
Logo, para todo m > N ∈ N, obtemos que ∥An x∥Y < ∥AN x∥Y + ε · ∥x∥X . Então,
. /
∥Ax∥Y = lim ∥An x∥Y # lim ∥An ∥ · ∥x∥X
n→∞ n→∞
. /
< ∥AN ∥ + ε ∥x∥X .
Assim, prova-se que o operador A é limitado (portanto, contínuo).
159
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
No teorema anterior usamos a noção de convergência forte de uma sequência (An )n∈N de
operadores em Lb (X , Y ).
DEFINIÇÃO 4.13. Sejam X , Y espaços vetoriais normados – sobre o mesmo corpo. Diz-se que
X e Y são isomorfos se existe um operador linear A cujo domínio é X , cujo conjunto imagem
é todo Y , e cujo inverso A−1 (que é necessariamente linear) existe.
160
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
TEOREMA 4.8. Seja A um operador linear limitado atuando em um espaço de Hilbert H , tal que
∥A∥ < |λ|, em que λ é um escalar. Então, (a) (A − λ1I) é invertível, (b) Ran(A − λ1I) = H ,
(c) (A − λ1I)−1 é limitado e ∥(A − λ1I)−1 ∥ # (|λ| − ∥A∥)−1 e (d) (A − λ1I)−1 é dado pela
seguinte série uniformemente convergente:
∞
<
−1 −1 −2 −3 2
(A − λ1I) = −λ 1I − λ A − λ A − · · · = − λ−(n+1) An . (4.2.9)
n=0
Demonstração. Primeiro, vamos mostrar que a série (4.2.9) é uniformemente convergente. Com
efeito, como A é limitado, então, pelas Proposições 4.1 e 4.2 segue que
? ∞ ? (∞ )
? < ? < ∞ <
? ? n
?− λ−(n+1) An x? # |λ−(n+1) | ∥An x∥ # |λ−1 | |λ−n | ∥A∥ ∥x∥ .
? n=0 ? n=0 n=0
∞
<
= (λ−n An − λ−(n+1) An+1 )
n=0
= 1I .
Para provar que (A − λ1I)−1 é limitado e que ∥(A − λ1I)−1 ∥ # (|λ| − ∥A∥)−1 , tome um
161
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
. /
vetor y ∈ Dom (A − λ1I)−1 . Então, observe que
∞
< ∞
<
−1 −1 −n n −1
∥(A − λ1I) y∥ # |λ | |λ |∥A y∥ # |λ | |λ−n |∥An ∥∥y∥
n=0 n=0
, -
1 1
= ∥y∥
|λ| 1 − ∥A/λ∥
, -
1
= ∥y∥ .
|λ| − ∥A∥
Note que ∥A∥ < |λ| é uma condição suficiente para garantir que (A − λ1I)−1 existe e é
contínuo (portanto, limitado).
Finalmente, note que (A − λ1I)−1 (A − λ1I)x = x para todo x ∈ Dom(A − λ1I) e isto
implica que . /
Ran (A − λ1I)−1 = Dom(A − λ1I) = H .
Por outro lado, (A − λ1I)(A − λ1I)−1 y = y, para todo y ∈ Ran(A − λ1I). Isto implica que
. /
Ran(A − λ1I) = Dom (A − λ1I)−1 .
1. X é linearmente homeomorfo a Rn ;
2. X é um espaço de Banach;
4. X é localmente compacto.
∥Ax∥X # M · ∥x∥Rn ,
∥x∥Rn # M · ∥Ax∥X ,
162
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
e1 = (1, 0, 0, . . . , 0)
e2 = (0, 1, 0, . . . , 0)
..
.
en = (0, 0, . . . , 0, 1)
Ax = A(x1 e1 + · · · + xn en )
= A(x1 e1 ) + · · · + A(xn en )
= x1 Ae1 + · · · + xn Aen .
∥Ax∥X # C1 · ∥x∥Rn .
Como próximo passo na continuação da prova, devemos! obter uma constante C2"tal que
∥x∥Rn # C2 · ∥Ax∥X , para todo x ∈ Rn . Seja B[x0 ; 1] = x ∈ Rn | ∥x − x0 ∥ # 1 a bola
unitária em Rn . De acordo com o Teorema 3.15, Capítulo 3, a bola unitária em Rn é compacta.
Logo, a imagem dessa bola unitária sob A é compacta. Com efeito, seja yn ∈ A(B) ⊂ X .
Temos que yn = Axn para algum xn ∈ B[x0 ; 1]. Visto que B[x0 ; 1] é compacta, pela
definição de compacidade, (xn )n∈N contém uma subsequência (xnk )k∈N que converge em
B[x0 ; 1]. A imagem de (xnk )k∈N é uma subsequência de (yn )n∈N que converge em u(B).
De fato, pela continuidade de A, se xnk → x, então ∥Ax − Axnk ∥X = ∥A(x − xnk )∥X #
C1 · ∥x − xnk ∥Rn → 0, quando k → ∞. Na sequência, precisaremos do seguinte
LEMA 4.2. Seja M um subconjunto compacto de um espaço vetorial normado X . Então, todo
funcional linear contínuo A : M → R assume seus valores máximo e mínimo em M.
Demonstração. Pela análise acima, segue que u(M) ⊂ R é compacto, e pelo Corolário 1.10
u(M) ⊂ R é limitado e fechado. Isto implica que α = inf A(M) ∈ A(M) e β =
sup A(M) ∈ A(M); ou seja, existem x0 , x1 ∈ M tais que Ax0 = α e Ax1 = β. Logo,
α # Ax # β para todo x ∈ M.
163
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Note que pelo lema acima existe um γ > 0 tal que ∥Ax∥X " γ, para todo x ∈
B[x0 ; 1]. Certamente, para todo x ̸= 0 em Rn , segue que x/∥x∥Rn ∈ B[x0 ; 1]. Logo,
∥A(x/∥x∥Rn )∥X " γ ⇒ ∥Ax∥X · (1/∥x∥Rn ) " γ ⇒ ∥Ax∥X " γ · ∥x∥Rn , para todo
x ∈ Rn . Escolhendo γ = 1/C2 , temos que ∥Ax∥X · C2 " ·∥x∥Rn . Finalmente, tomando
M = sup{C1 , C2 } completamos a prova do item 1.
2. Deve ficar claro que, em um contexto mais geral, se X e Y são espaços vetoriais
normados linearmente homeomorfos (ou topologicamente isomorfos) e se um deles é completo
(como um espaço métrico), então o outro também é completo. Com efeito, sejam X um espaço
vetorial normado e A um operador linear contínuo com domínio Rn e conjunto imagem todo
X . Se (xn )n∈N é uma sequência de Cauchy em Rn que converge para x, então
quando m, n → ∞, implicando que (Axn )n∈N é uma sequência de Cauchy que converge para
Ax ∈ X , já que A é um mapeamento sobrejetivo. Consequentemente, como Rn é completo,
isto é, como toda sequência de Cauchy em Rn converge para um elemento de Rn , então X
também é completo.
4. Lembremos que, por definição, X é localmente compacto se, e somente se, todo ponto
x ∈ X tem uma vizinhança compacta. Como bolas fechadas definem vizinhanças compactas
em Rn , segue que Rn é localmente compacto e do item 1 que X também o é.
164
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
! "
Demonstração. Seja Ker(ϕy ) = x ∈ H | ϕy (x) = 0 . Ker(ϕy ) é um subespaço fe-
chado. De fato, se x ∈ Ker(ϕy ), então existe (xn )n∈N ⊂ Ker(ϕy ) tal que xn → x. Pela
continuidade de ϕy (vide Proposição 4.3) segue que ϕy (x) = limn→∞ ϕy (xn ) = 0. Assim,
x ∈ Ker(ϕy ) ⇒ Ker(ϕy ) ⊂ Ker(ϕy ). Como, por definição, Ker(ϕy ) ⊂ Ker(ϕy ), logo
conclui-se que Ker(ϕy ) = Ker(ϕy ). Assuma que Ker(ϕy ) = H , então ϕy (x) = 0 = ⟨0, x⟩,
para todo x; isto implica que ϕy é trivial, ou seja y = 0. Por outro lado, assuma que Ker(ϕy )
não é todo o espaço H . Pelo Teorema 3.5, existe um vetor não-nulo x0 ∈ Ker⊥ (ϕy ) tal que
ϕy (x0 ) ̸= 0. Neste caso, para todo x ∈ H podemos escrever x = z + x0 , em que z = z(x).
Definindo
α
z = x − x0 ,
β
def def
em que α = ϕy (x) e β = ϕy (x0 ), obtemos que z ∈ Ker(ϕy ). Com efeito, usando a
linearidade de ϕy , segue que
, -
α α
ϕy (z) = ϕy x − x0 = α − β = 0 .
β β
Assim,
O , -P O P
α α
⟨x0 , z⟩ = x0 , x − x0 = ⟨x0 , x⟩ − x0 , x0
β β
α
= ⟨x0 , x⟩ − ⟨x0 , x0 ⟩
β
α
= ⟨x0 , x⟩ − ∥x0 ∥2 = 0 ,
β
para todo x ∈ H . Consequentemente,
I, - J
β β
ϕy (x) = ⟨x0 , x⟩ = x0 , x = ⟨y, x⟩ ,
∥x0 ∥2 ∥x0 ∥2
165
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
A unicidade segue do seguinte argumento: seja y ′ um outro elemento de H tal que ϕy′ (x) =
⟨y ′, x⟩, para todo x ∈ H . Então, temos que
⟨y ′, x⟩ = ⟨y, x⟩ =⇒ ⟨y ′, x⟩ − ⟨y, x⟩ = 0 .
Logo, pelo Lema 3.2, temos que y ′ − y ∈ H ⊥ = {0}; portanto ϕy′ (x) = ϕy (x) =⇒ y ′ = y.
Por outro lado, pelo fato da igualdade ϕy (x) = ⟨y, x⟩ ser assumida válida para todo x ∈ H ,
então se tomarmos x = y, segue que ϕy (y) = ⟨y, y⟩ = ∥y∥2H . Ou seja,
, -
1 y
∥y∥H = ϕ (y) = ϕy .
∥y∥H y ∥y∥H
A última igualdade segue da homogeneidade de ϕy . Pelo Teorema 4.1, temos que
5 , -5 5O P5
5 y 5 5 y 5 ⟨y, y⟩
5
∥ϕy ∥H ′ = sup |ϕy (x)|K " 5ϕy 5 5
= 5 y, 5=
∥y∥ 5 ∥y∥ 5 ∥y∥ = ∥y∥H .
∥x∥H #1 H H H
Daí, segue que ∥ϕy ∥H ′ " ∥y∥H ; isto implica a igualdade ∥ϕy ∥H ′ = ∥y∥H . Portanto,
provamos o
TEOREMA 4.10. Qualquer vetor y ∈ H define um funcional linear limitado ϕy ∈ H ′ tal que
ϕy (x) = ⟨y, x⟩, para todo x ∈ H . Além disso, ∥ϕy ∥ = ∥y∥.
166
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Na definição acima, apesar da conjugação complexa em (b), note que ∥V x∥Y = ∥x∥X para
qualquer x ∈ X , isto é, V preserva a norma. Além disso, V é bijetivo.
LEMA 4.3. Seja J : H → H ′ ; então,
Demonstração. (i) Tome ϕy = Jy, em que para cada ϕy ∈ H ′ , tem-se ϕy (x) = ⟨y, x⟩,
para todo x ∈ H . Da anti-linearidade do produto interno, segue que ⟨αy + βz, x⟩ =
α⟨y, x⟩ + β⟨z, x⟩. Logo, J(αy + βz) = αJy + βJz, para todo α, β ∈ K e para todo
y, z ∈ H . (ii) Visto que ∥Jy∥H ′ = ∥ϕy ∥H ′ , então, pelo Teorema de Representação de
Riesz-Fréchet, ∥Jy∥H ′ = ∥y∥H . Note que, como um mapeamento isométrico é injetivo, e pelo
Teorema de Representação de Riesz-Fréchet sabemos que J é sobrejetivo, logo J é bijetivo.
Nota 4.15. Segue do Lema 4.3 que espaços de Hilbert e seus duais são indistinguíveis metrica-
mente e “quase” indistinguíveis algebricamente (ou seja, “quase” indistinguíveis como espaços
vetoriais), visto que a correspondência ϕy ↔ yϕ é conjugada linear:
αϕy1 + βϕy2 ↔ αyϕ1 + βyϕ2 .
Se o mapeamento J fosse linear ao invés de conjugado linear, os espaços seriam congruentes
e poderíamos remover a palavra “quase” da frase acima! Isso torna claro a afirmação anterior
que H ′ pode ser identificado com H como um conjunto abstrato.
O dual topológico H ′. de /um espaço de Hilbert H tem ele próprio um espaço dual
′
associado, denotado por H ′ , ou simplesmente H ′′ . H ′′ é chamado o bidual (ou o
segundo dual) do espaço H .
DEFINIÇÃO 4.16. Seja X um espaço vetorial normado. Considere o mapeamento JN : X →
X ′′ , em que X ′′ é o bidual do espaço X . Diz-se que X é reflexivo se JN é bijetivo.
TEOREMA 4.11. H é reflexivo.
167
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Um operador ilimitado não respeita as condições (C1) e (C2) da Definição 4.10 como mostra
o seguinte
Exemplo 4.3. Sejam C([0, 1]) o espaço das funções contínuas definidas no intervalo fechado
[0, 1] e C 1 ([0, 1]) o espaço das funções continuamente diferenciáveis definidas também no
d
mesmo intervalo. Considere o operador diferencial dx : C 1 ([0, 1]) → C([0, 1]) definido pela
fórmula usual: , -
d u(x + h) − u(x)
u (x) = lim , ∀ x ∈ [0, 1] .
dx h→0 h
Toda função continuamente diferenciável é contínua; logo, C 1 ([0, 1]) ⊂ C([0, 1]). O operador
d
dx
: C 1 ([0, 1]) → C([0, 1]) é um operador ilimitado. Com feito, considere o conjunto de
funções diferenciáveis com norma ∥u∥ = sup |u(x)|, com x ∈ [0, 1]. Por exemplo, tome
, -
d
un (x) = sin(nx) =⇒ un (x) = n cos(nx) .
dx
Claramente,
?, - ?
? d ?
∥un ∥ = sup |un (x)| = 1 e ? u (x) ?=n, ∀ x ∈ [0, 1] .
? dx n ?
x∈[0,1]
?. d / ?
Como ∥un ∥ = 1 e ??.dx un /(x)?? cresce indefinidamente quando n → ∞, não existe uma
constante C tal que ? d
u (x)? # C∥un ∥ para todo un ∈ C([0, 1]). Assim, o operador
dx n
d 1
dx
: C ([0, 1]) → C([0, 1]) é ilimitado. Ele não pode nem mesmo ser definido em toda parte
em C([0, 1]) (lembre-se, por exemplo, que a função u(x) = |x|, com x ∈ [0, 1], é contínua,
mas não tem derivada bem definida em x = 0). Um operador diferencial só pode ser definido
em um domínio denso!
168
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
DEFINIÇÃO 4.17 (Operador fechado). Sejam X e Y espaços vetoriais normados sobre o mesmo
corpo e A : Dom(A) ⊂ X → Ran(A) ⊂ Y um operador linear. Considere as sequências
(xn )n∈N ⊂ Dom(A) e (Axn )n∈N ⊂ Ran(A) para as quais a realização simultânea das
relações
lim xn = x e lim Axn = y ,
n→∞ n→∞
acontece. Então, diz-se que o operador A é fechado se, e somente se, x ∈ Dom(A) e a imagem
por A de x é y, isto é, y = Ax ∈ Ran(A).
Nota 4.17 (Operador fechado vs. mapa fechado). É importante enfatizar neste ponto que, as
noções de operador fechado e de mapa fechado não são equivalentes. Acontece, frequentemente,
que duas áreas diferentes da matemática usam a mesma palavra para definir duas coisas
diferentes. No caso de um mapa fechado, um mapeamento entre espaços topológicos mapeia
conjuntos fechados em conjuntos fechados. Em outras palavras, dados dois espaços topológicos
X e Y , diz-se que um mapa A é fechado se .seu domínio / Dom(A) é subconjunto fechado
de X e seu conjunto imagem Ran(A) = A Dom(A) é fechado em Y . Por outro lado,
na definição de operador fechado, dados dois espaços vetoriais topológicos X e Y e um mapa
A : X → Y , não se exige que Dom(A) e Ran(A) sejam fechados; deve ficar bem claro
que, a única coisa que se assume é que para toda sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A) tal que
xn → x ∈ X e para a qual a sequência de imagens Axn → y ∈ Y , então exigimos que
x ∈ Dom(A) e que a imagem por A de x seja y.
Demonstração. Tome uma sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A) que converge para algum vetor
x ∈ X . Como Dom(A) é um subespaço fechado de X , segue que, necessariamente,
x ∈ Dom(A), enquanto que Axn → y ∈ Y , quando n → ∞. Como A é linear e limitado,
então,
Nota 4.18 (Operador contínuo vs. operador fechado). Em certo sentido, a propriedade de
ser fechado é uma forma fraca de continuidade. Por exemplo, pela Proposição 4.5, sendo A
um operador contínuo e assumindo que a sequência (xn )n∈N em Dom(A) converge para
x ∈ Dom(A), então, Ax = A(limn→∞ xn ) = limn→∞ Axn . Ou seja, podemos aplicar
A termo-a-termo e a sequência de imagens resultante será de Cauchy: ∥A(xm − xn )∥ =
∥Axm − Axn ∥ # C∥xm − xn ∥ → 0, quando m, n → ∞. Por outro lado, assuma que A é
169
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
meramente fechado e que a sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A) converge para x ∈ Dom(A). Se
A é aplicado termo-a-termo e a sequência de imagens resultante (Axn )n∈N é de Cauchy (não
precisa), então Ax = A(limn→∞ xn ) = limn→∞ Axn . Em outras palavras, podemos comutar
operadores contínuos e limites, mas só podemos comutar operadores fechados e limites se a
sequência de imagens obtida pela ação do operador termo-a-termo é de Cauchy. Portanto,
preste bem atenção à diferença entre um operador contínuo e um operador fechado: um
operador A é contínuo se para xn → x em Dom(A), então necessariamente Axn → Ax.
Em contrapartida, para que A seja fechado exige-se que ambas as sequências (xn )n∈N ⊂
Dom(A) e (Axn )n∈N ⊂ Ran(A) sejam convergentes e, caso o sejam, então necessariamente
x ∈ Dom(A) e Axn → Ax ∈ Ran(A).
Exemplo 4.4 (Limitado e não-fechado). Considere o seguinte exemplo ilustrativo: Tome X =
Y . Seja 1I : Dom(1I) ⊂ X → X , com Dom(1I) um subespaço próprio denso de X , o
operador identidade, isto é, 1Ix = x para todo x ∈ Dom(1I); assim 1I é limitado! Tome uma
sequência (xn )n∈N em Dom(1I) tal que xn → x ∈ / Dom(1I). Podemos assumir isto uma
vez que o domínio do operador identidade não é um subespaço fechado de X . Assim, como
xn → x e 1Ixn → x, mas x ∈ / Dom(1I), então, o operador identidade não é fechado.
Nota 4.19. O leitor deve ficar atento para não confundir o resultado apresentado na Proposição
4.5 com aquele apresentado no Exemplo 4.4. Deve ficar claro que no Exemplo 4.4 o domínio do
operador identidade não é um subespaço fechado de X . Portanto, apesar de ser um exemplo
artificial, o Exemplo 4.4 ilustra bem a diferença entre operador linear limitado e fechado. Por
outro lado, se X é um espaço vetorial normado, Y um espaço de Banach e A : X → Y
um operador linear limitado com domínio denso Dom(A) em X , então, de acordo com
o Teorema 4.5, a única extensão linear limitada A N : Dom(A) → Y , definida no fecho de
Dom(A), é um operador fechado. Neste caso, diz-se que A é um operador fechável (veja a
Definição 4.18).
Exemplo
. / 4.5 (Ilimitado e fechado: Exemplo 4.3 revisitado). Assuma que X = Y =
C [0, 1] , o espaço das funções contínuas no intervalo [0, 1], com ∥u∥ = sup{|u(x)| | 0 #
x # 1}. Considere. o operador
/ linear d/dx. Claramente, se Ran(d/dx) ⊂ X , então
1
Dom(d/dx) = C [0, 1] , o espaço das funções com derivadas contínuas no intervalo [0, 1].
Vimos que o operador d/dx não .é limitado;
/ portanto, não é contínuo.
. Por /outro lado,. d/dx/
é fechado. De fato, suponha que un (x) n∈N ⊂ Dom(d/dx), d/dx un (x) → d/dx u(x)
. / . /
e d/dx u(x) = v(x). Então d/dx un (x) converge uniformemente para v(x) e v(x) é
contínua no intervalo [0, 1].
PROPOSIÇÃO 4.6. Sejam X e Y espaços vetoriais normados sobre o mesmo corpo, A um
operador linear fechado, não necessariamente limitado, de X em Y e λ ∈ C. Suponha que
existe uma constante κ > 0 tal que
∥(A − λ1I)x∥ " κ∥x∥ , (4.4.1)
para todo x ∈ Dom(A). Então, o Ran(A − λ1I) é um subespaço fechado de Y . Além disso, o
inverso do operador (A − λ1I) existe, com ∥(A − λ1I)−1 ∥ # 1/κ, isto é, (A − λ1I)−1 é limitado.
Demonstração. Suponha que (yn )n∈N é uma sequência em Ran(A − λ1I) que converge para
algum y. Então, yn = (A − λ1I)xn , para alguma sequência (xn )n∈N no Dom(A) (aqui,
tomamos o domínio do operador (A − λ1I) coincidindo com o domínio de A).8 Aplicando (4.4.1)
8
De fato, por definição, Dom(A − λ1I) = Dom(A) ∩ Dom(1I) = Dom(A)!
170
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Axn = λxn + yn → λx + y .
Já vimos que existem operadores lineares que não são fechados. Todavia, alguns desses
operadores lineares podem ter extensões fechadas. Isto nos leva à seguinte
DEFINIÇÃO 4.18. Sejam X e Y espaços vetoriais normados. Um operador linear A de X
em Y é chamado fechável se, e somente se, A tem uma extensão B que é um operador linear
N é a menor extensão
fechado de X em Y . O fecho de um operador linear A, denotado por A,
fechada de A – quando essa existir.
A noção de operador fechado (ou fechável) é útil porque dá conta de uma parte da arbitrari-
edade na escolha de um domínio de um operador. Se considerarmos, por exemplo, o operador
A = −id/dx como um operador ilimitado em L2 (R), existem muitas opções diferentes para
o domínio Dom(A), incluindo (i) o espaço C0∞ (Rn ) das funções infinitamente diferenciáveis
de suporte9 compacto, (ii) o espaço de Schwartz, S (Rn ), isto é, o espaço das funções infini-
tamente diferenciáveis que, juntamente com todas suas derivadas, vão mais rápido para zero do
9
Lembremos da Definição 1.12 que o suporte de uma função é o subconjunto do seu domínio que contém
os elementos que não são mapeados a zero. Em outras palavras, suponha que X é um espaço topológico e
Ψ : X → R é uma função de valor real cujo domínio é X . Então, o suporte de Ψ, denotado por supp(Ψ), é o
fecho do conjunto de pontos em X que têm a imagem por Ψ diferente de zero, ou seja,
! "
supp Ψ = x ∈ X | Ψ(x) ̸= 0 .
171
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
que qualquer potência inversa de |x|, quando |x| → ∞, (veja a Definição 6.7, no Capítulo 6)
e (iii) o espaço das funções continuamente diferenciáveis Ψ para as quais Ψ e Ψ′ pertencem
a L2 (R). Como se verifica, cada uma destas três escolhas para o domínio Dom(A) conduz
ao mesmo operador A. N É importante enfatizar que isto não significa que toda escolha para
o domínio Dom(A) leva ao mesmo fechamento; entretanto, muitas vezes, muitas escolhas
razoáveis podem levar ao mesmo fechamento.
e a norma
6 71/2
∥(x, y)∥H1×H2 = ∥x∥2H + ∥y∥2H , x ∈ Dom(A) . (4.4.2)
1 2
que podem ser considerado como a soma direta de dois espaços uni-dimensionais.
172
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
mas isto implica que xn → x e Axn → y. Como A é assumido ser fechado, então, x ∈
Dom(A) e y = Ax. Logo, podemos escrever
173
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
De maneira inversa, assuma que G(A) é fechado, e que xn → x, com xn ∈ Dom(A), para
todo n ∈ N, e Axn → y. Devemos mostrar que x ∈ Dom(A) e que y = Ax. Isto implica
que
(xn , Axn ) → (x, y) ∈ G(A) .
Mas, como G(A) é assumido ser fechado, então, G(A) = G(A), e (x, y) ∈ G(A). Pela
definição de G(A), isto implica que x ∈ Dom(A) e y = Ax. Consequentemente, A é
fechado.
Nota 4.21. Em vista da equivalência estabelecida pelo Teorema 4.12, torna-se apenas uma questão
de preferência pessoal tomar como propriedade definidora de um operador linear fechado o seu
gráfico. No entanto, essa relação, mutuamente vantajosa entre a noção de operador fechado e
a noção de gráfico fechado, pode ser perdida se ocorrer uma das seguintes situações:
1a¯ se existir pelo menos uma sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A) que converge para algum
x ∈ Dom(A), quando n → ∞, e para a qual a sequência de imagens (Axn )n∈N ⊂ H2 não
converge para imagem por A de x;
2a¯ pode ocorrer também que uma sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A) converge para algum
/ Dom(A), enquanto que (Axn )n∈N ⊂ H2 converge para um y.
x∈
Para contornar estas situações, podemos formular uma condição para a existência do fecho de
A da seguinte forma: adicionamos a Dom(A) todos os vetores x ∈ Dom(A) que são limites
de sequências (xn )n∈N ⊂ Dom(A) que geram sequências de Cauchy (Axn )n∈N ⊂ H2 , isto
é, sequências que convergem para um y ∈ Ran(A) ⊂ H2 . No entanto, isto só fará sentido
se y não depender da sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A). Portanto, um operador A admitirá
um fecho A N se, e somente se, as relações (xn )n∈N ⊂ Dom(A), (x′n )n∈N ⊂ Dom(A),
xn → x, x′n → x, Axn → y e Ax′n → y ′ implicam que y = y ′. Então, o domínio de
definição do fecho Dom(A) N deve consistir dos vetores x para os quais existe uma sequência
(xn )n∈N ⊂ Dom(A) satisfazendo as condições: as sequências (xn )n∈N e (Axn )n∈N convergem
quando n → ∞, e para os vetores x obtidos pelas sequências (xn )n∈N ⊂ Dom(A) o operador
AN é definido por Ax
N = limn→∞ Axn . Colocado de outra forma, se (xn )n∈N ⊂ Dom(A) é tal
que xn → 0 e Axn → y, devemos ter y = 0. Assim, o conjunto G(A), que deve ser o gráfico
de um certo operador A, consiste dos elementos da forma (x, Ax), com x ∈ Dom(A) e de
seus pontos limites que satisfazem as relações acima.
Uma outra forma de se formular uma condição para a existência de um fecho, usando o
conceito de gráfico, seria tomar o fecho do gráfico de A no espaço produto H1 × H2 . O
problema é que
3 4
G(A) = (x, y) ∈ H1 × H2 | x ∈ Dom(A), Ran(A) ∋ y = Ax ,
pode não ser o gráfico de um operador. Com efeito, G(A) pode conter pontos que não são
univocamente determinados por x ∈ H1 , isto é, G(A) pode conter dois valores distintos
Ax para um único x. Dito de outra forma, pode acontecer de duas sequências distintas em
Dom(A), (xn )n∈N e (x′n )n∈N , convergirem
. ′ / para o mesmo x ∈ Dom(A), enquanto ′que suas
sequências de imagens (Axn )n∈N e Axn n∈N convergem para um y e para um y em Y ,
174
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Por outro lado, suponha que A é fechável. Seja {Bκ } uma família de extensões de A,
composta por operadores lineares fechados; isto é, Ax = Bκ x para todo x ∈ Dom(A) e para
todo índice κ. Então, por definição,
N = ∩κ Dom(Bκ ) ,
Dom(A) ⊂ Dom(A) ⊂ Dom(A)
e 3 4
N = (x, y) ∈ H1 × H2 | x ∈ Dom(A),
G(A) N ∩κ Ran(Bκ ) ∋ y = Bκ x .
Note que, todo elemento y ∈ Ran(A) ⊂ Ran(A) ⊂ ∩κ Ran(Bκ ). Logo, todo elemento
de G(A) é elemento de G(A);N ou seja, G(A) ⊂ G(A).
N
N Mostraremos
É óbvio que todo operador A é fechado se, e somente se, A é fechável e A = A.
na próxima seção que os operadores mais importantes para mecânica quântica, os operadores
auto-adjuntos, são sempre fechados.
175
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Heisenberg se limitou a olhar com um mal disfarçado desdém para Friedrichs. Então, Friedrichs
salientou que foi um matemático, John von Neumann, que esclareceu a diferença entre um
operador auto-adjunto e um operador que é meramente hermitiano. Com certa ironia Heisen-
berg retrucou: “E qual é a diferença? ” É isto que esclareceremos a partir de agora: a relação
entre operadores simétricos e auto-adjuntos, ou mais precisamente, o problema de quando um
operador simétrico é auto-adjunto é o principal tema desta seção e fundamental para teoria
quântica.
Para iniciarmos nossa discussão sobre a diferença entre um operador hermitiano e um ope-
rador auto-adjunto, vamos primeiro introduzir a noção de operador adjunto de um operador
limitado. Para isto, consideramos a seguinte
PROPOSIÇÃO 4.8. Seja A : H → H um operador linear limitado, com domínio sendo todo
H , isto é, Dom(A) = H . Então, existe um único operador linear A∗ limitado que satisfaz as
seguintes propriedades:
(i) Dom(A∗ ) = H ,
Logo, ϕy é um funcional linear limitado. Por outro lado, de acordo com o Teorema de
Representação de Riesz-Fréchet, existe um único um vetor A∗ y ∈ H tal que ϕy (x) = ⟨A∗ y, x⟩,
para todo x ∈ H . Como y é um vetor arbitrário, porém fixo, em H , segue que Dom(A∗ ) =
H . Para mostrar que ∥A∗ ∥ = ∥A∥, primeiro reescrevemos a Eq.(4.5.1) da seguinte forma:
Consequentemente, ∥A∗ ∥ # ∥A∥. O mesmo argumento, com A e A∗ trocados (por que posso
fazer está troca?), mostra que ∥A∥ # ∥A∗ ∥. Assim, segue que ∥A∗ ∥ = ∥A∥.
Para provar a unicidade, assuma que A∗1 é um outro operador linear limitado, tal que
⟨y, Ax⟩ = ⟨A∗1 y, x⟩ para todo x, y ∈ H . Então, isto implica que ⟨A∗ y, x⟩ = ⟨A∗1 y, x⟩. Logo,
⟨(A∗ − A∗1 )y, x⟩ = 0 para todo x ∈ H ; porém, isto implica que (A∗ − A∗1 )y = 0 para todo
y ∈ H . Portanto, A∗ = A∗1 . A linearidade de A∗ é provada na Proposição 4.11 abaixo.
176
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
∞
<
= 0x1 + y n xn+1
n=1
= ⟨Sy, x⟩ .
O próximo resultado estabelece sob quais condições operadores lineares fechados são limita-
dos. A prova será dada para o caso particular de espaços de Hilbert, mas ele vale no caso mais
geral de espaços de Banach.
12
Enquanto que para matrizes, ser simétrica e hermitiana são duas propriedades diferentes (embora similares),
para operadores limitados em um espaço de Hilbert (complexo) é costume usar-se o conceito de ser simétrico no
mesmo sentido que hermitiano.
177
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Demonstração. Pelo Teorema 4.12, uma vez que o operador A é fechado, então, seu gráfico é um
subespaço fechado em H1 ×H2 . Em outras palavras, isto significa que G(A) é completo, isto é,
toda sequência de Cauchy (xn , Axn )n∈N ⊂ G(A) converge para um elemento (x, y) ∈ G(A).
Como, por hipótese, Dom(A) é fechado em H1 , então, Dom(A) também é completo. Agora,
considere o mapeamento
π : G(A) −→ H1 ,
a projeção sobre a primeira componente do par ordenado (x, Ax) ∈ G(A). Logo,
Assim, π é linear. Para mostrar que π é bijetivo precisamos somente provar que ele é injetivo, já
que nitidamente π é sobrejetivo. Para isto, suponha que π(x, Ax) = 0, então, portanto, x = 0.
Assim, pelo Lema 4.1, π −1 existe e é linear. Isto prova que π é bijetivo, e π −1 é
π −1 : H1 −→ G(A) ,
Como G(A) e Dom(A) são completos e A fechado, então π −1 xn = (xn , Axn )n∈N , com
xn ∈ Dom(A), converge para π −1 x = (x, y), com y = Ax. Logo, π −1 é contínuo e,
portanto, limitado. Isto implica a existência de uma constante, C, tal que ∥π −1 x∥ # C∥x∥H1
Consequentemente,
ou
∥Ax∥H2 # C∥x∥H1 ,
para todo x ∈ Dom(A).
Uma segunda demonstração do Teorema 4.13 (Royden). Defina uma nova norma em H1 por
Q
∥|x|∥H1 = ∥Ax∥2H + ∥x∥2H , ∀ x ∈ Dom(A) .
2 1
178
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
nosso teorema, como A é fechado, segue do Teorema 4.12 que o gráfico de A é um subespaço
fechado em H1 × H2 . Isto implica que y = Ax. Assim, ∥|xn − x|∥H1 → 0 e H1 é completo
segundo a norma ∥| · |∥H1 . De acordo com a Definição 2.16 (veja também a Proposição 1.10), as
normas ∥ · ∥H1 e ∥| · |∥H1 são equivalentes, logo existe uma constante C > 0 tal que
Consequentemente,
∥Ax∥H2 # C∥x∥H1 ,
para todo x ∈ Dom(A).
Nota 4.23. O Teorema 4.13 poderia também ter sido enunciado da seguinte forma:
TEOREMA 4.11a. Sejam H1 e H2 espaços de Hilbert e A um operador linear de H1 em H2 ,
com Dom(A) ⊂ H1 . Então, A é limitado se, e somente se, o gráfico de A é fechado.
Demonstração. Para mostrar que A é limitado basta mostrar que A possui um gráfico fechado.
Aqui, o domínio Dom(A) é, naturalmente, fechado, já que, por hipótese, Dom(A) = H .
Seja xn → x uma sequência convergente em H tal que Axn → y para algum y ∈ H . Então,
a condição de que G(A) é fechado é equivalente a mostrar que Ax = y. Para um z ∈ H
arbitrário, temos
⟨z, y⟩ = lim ⟨z, Axn ⟩ = lim ⟨Az, xn ⟩ = ⟨Az, x⟩ = ⟨z, Ax⟩ .
n→∞ n→∞
Dessa forma, obtém-se que ⟨z, Ax − y⟩ = 0 para todo z ∈ H . Isto implica que Ax − y = 0;
portanto, Ax = y. Consequentemente, G(A) é fechado e, pelo Teorema 4.12, A é fechado
também. Logo, pelo Teorema 4.13 A é limitado. Por outro lado, pela Proposição 4.8, uma vez que
A é limitado, segue que Dom(A) ⊂ Dom(A∗ ) = H . Mas, por hipótese, Dom(A) = H .
Logo, Dom(A) = Dom(A∗ ) e isto implica que A é auto-adjunto.
179
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
;
Logo, para x = ni=1 λi ei ∈ Cn , em que λi = ; ⟨ei , x⟩ ∈ C são as coordenadas de x com
respeito à base ortonormal ei , segue que Ax = ni=1 λi Aei . Portanto,
n
< n
<
⟨ej , Ax⟩ = λi ⟨ej , Aei ⟩ = λi aij .
i=1 i=1
Desta forma, todo operador A atuando no espaço Cn é representado por uma matriz n × n,
com os elementos aij = ⟨ej , Aei ⟩ obtidos com respeito à base ortonormal canônica em Cn .
Inversamente, toda matriz n × n define um operador em Cn . Consequentemente, temos uma
correspondência um-para-um entre operadores em espaços vetoriais n-dimensionais e matrizes
n × n.
DEFINIÇÃO 4.20. Seja H o espaço de Hilbert complexo Cn , com produto interno ⟨y, x⟩ =
; n ∗
i=1 y i xi . Então, a matriz adjunta de A é a transformação linear A : H → H tal que,
n
para todo x, y ∈ C , se tenha
n
< n
<
⟨y, Ax⟩ = y i aij xj = yi aij xj = ⟨A∗ y, x⟩ .
i=1 i=1
t
Na definição acima a matriz adjunta A∗ é tal que (A∗ )ij = aij , isto é, A∗ = A é a matriz
transposta conjugada, ou seja, é a matriz formada pelo complexo conjugado de cada elemento
da matriz transposta At . Lembre-se que a matriz transposta At de uma matriz A tem como
linhas as colunas de A e como colunas as linhas de A, na mesma ordem. Isto mostra que para
qualquer matriz n × n complexa A existe uma única matriz adjunta A∗ , tal que para todo
x, y ∈ Cn , tem-se ⟨y, Ax⟩ = ⟨A∗ y, x⟩.
DEFINIÇÃO
;n 4.21. Seja H o espaço de Hilbert complexo Cn , com produto interno ⟨y, x⟩ =
i=1 y i xi . A transformação linear A : H → H chama-se matriz auto-adjunta – ou matriz
hermitiana – quando A = A∗ , ou seja, quando para todo x, y ∈ Cn , tem-se ⟨y, Ax⟩ = ⟨Ay, x⟩.
Para uma matriz auto-adjunta (ou matriz hermitiana), A, devemos ter aij = aji , para
i, j = 1, . . . , n. Em particular, aii = aii para todo i = 1, . . . , n; portanto a diagonal de uma
matriz auto-adjunta, ou matriz hermitiana, só possui números reais.
Nota 4.24. Na definição acima, se H fosse tomado com sendo o espaço de Hilbert real Rn , o
termo matriz auto-adjunta, ou matriz hermitiana, é o mesmo que matriz simétrica.
180
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
linear A sobre um espaço de Hilbert H de dimensão finita pode ser representado por uma
matriz, o domínio desses operadores é todo o espaço de Hilbert. Com efeito, se dim H = Cn ,
x é um vetor qualquer em Cn e {e1 , e2 , . . . , en } é a base ortonormal padrão em Cn , então
I n n
J n
< < <
⟨Ax, Ax⟩ = λi Aei , λj Aej = λi λj ⟨Aei , Aej ⟩ ,
i=1 j=1 i,j=1
Isto mostra que ∥Ax∥ # M∥x∥, para todo x ∈ Cn ; além disso, se o operador A é definido
pelos elementos de matriz (aij ), então
R
S<
S n
∥A∥ = T |aij |2 .
i,j=1
Isto implica que todo operador em Cn , e assim todo operador em qualquer espaço Hilbert de
dimensão finita, é limitado. Consequentemente, auto-adjunto e hermitiano são sinônimo!
Nota 4.25. Na Definição 4.20 poderíamos ter considerado uma transformação linear do tipo
A : H1 → H2 , com H1 = Cn e H2 = Cm . Neste caso, a adjunta da matriz A deve ser uma
matriz A∗ : H2 → H1 tal que, para x ∈ H1 e y ∈ H2 quaisquer se tenha ⟨y, Ax⟩ = ⟨A∗ y, x⟩.
Portanto, a imagem z = A∗ y ∈ H1 de um vetor arbitrário y ∈ H2 é, por definição, aquele vetor
de H1 tal que o produto interno de qualquer vetor x ∈ H1 por ele é igual a ⟨y, Ax⟩ = ⟨z, x⟩.
Demonstração. Seja (ei )i∈N uma sequência ortonormal completa em H . Precisamos mostrar
que A pode ser representado em termos da matriz infinita
⎛ ⎞
a11 a12 a13 · · ·
⎜a21 a22 a23 · · ·⎟
⎜ ⎟
⎜a31 a32 a33 · · ·⎟
⎝ ⎠
.. .. .. ..
. . . .
181
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
∞
<
= ⟨ei , x⟩Aei .
i=1
Portanto,
I ∞
J ∞ ∞
< < <
⟨ej , Ax⟩ = ej , ⟨ei , x⟩Aei = ⟨ei , x⟩⟨ej , Aei ⟩ = aji ⟨ei , x⟩ .
i=1 i=1 i=1
Desta forma, todo operador linear limitado A atuando sobre um espaço de Hilbert, H , separável
de dimensão infinita, é representado por uma matriz n × n infinita, com os elementos aij =
⟨ej , Aei ⟩ obtidos com respeito à uma sequência ortonormal completa em H .
PROPOSIÇÃO 4.9. Seja A um operador linear, definido em toda parte em um espaço de Hilbert,
H , separável de dimensão infinita. Assuma que A admite uma representação matricial com
respeito à uma sequência ortonormal completa em H . Então A é limitado.
Demonstração. Seja (ei )i∈N uma sequência ortonormal completa em H com respeito à qual o
operador A admite uma representação em termos de uma matriz infinita. Para todo vetor
∞
< ∞
<
H ∋x= ⟨ei , x⟩ei = xi ei ,
i=1 i=1
a série ∞
<
⟨ej , Ax⟩ = aji xi , ∀j ∈ N ,
i=1
;∞ 2
converge se i=1 |aji | < ∞. Com efeito, considere a sequência de números complexos
(σ
;j,n )n∈N , para todo j ∈ N arbitrário, porém fixo, formada pelas somas parciais σj,n =
n
i=1 aji xi . Então, para n > m temos
5 52
5 <
n 5 n
< n
<
5 5
|σj,n − σj,m |2 = 5 aji xi 5 # |aji xi |2 # |aji |2 |xi |2 .
5 5
i=m+1 i=m+1 i=m+1
182
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
;∞ 2
;∞ 2
Pelo Teorema
;n 3.8, i=1 |xi | < ∞; assim se i=1 |aji | < ∞ a sequência de somas parciais
σj,n = i=1 aji xi é uma sequência de Cauchy, de modo que dado ε > 0, existe N ∈ N tal que,
para todo;n, m > N, |σj,n − σj,m |2 < ε2 =⇒ |σj,n − σj,m | < ε. Isto implica a convergência
da série ∞ n=1 aji xi por causa da completeza de H ; isto é, a sequência (σj,n )n∈N possui um
limite em H , para todo j ∈ N arbitrário, porém fixo.
;
Defina ϕj (x) = ⟨ej , Ax⟩ o funcional linear de x = ∞ i=1 xi ei . Então, pela desigualdade de
Bessel,
<n < n
5 5 5 5
5ϕj (x)52 = 5⟨ej , Ax⟩52 # ∥Ax∥2 .
j=1 j=1
Note que (ϕj (x))j∈N é uma sequência crescente monótona, limitada por ∥Ax∥2 , para todo
x ∈ H . Sejam E o conjunto de valores de (ϕj (x))j∈N e ϕ(x) = supj ϕj (x), o supremo de
E. Então, para cada ε > 0 (arbitrário) existe um inteiro N tal que ϕ(x) − ε < ϕ(x)N # ϕ(x),
pois, em caso contrário, ϕ(x) − ε seria uma cota superior de E. Como (ϕj (x))j∈N é uma
sequência crescente, temos que para j " N, ϕ(x) − ε < ϕN (x) # ϕ(x), o que prova que essa
sequência converge para um número menor ou igual a ϕ(x). Assim,
R
S<
S∞5 52
ϕ(x) = sup ϕj (x) = lim ϕj (x) = T 5ϕj (x)5 = ∥Ax∥ .
j j→∞
j=1
183
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Para um operador linear limitado A sobre um espaço de Hilbert H o seu adjunto foi
definido, na Proposição 4.8, através da relação
⟨A∗ y, x⟩ = ⟨y, Ax⟩ .
Se exigirmos que está relação seja preservada no caso de operadores ilimitados, uma noção
mais geral do adjunto de um operador linear A deve levar em conta que A não precisa
estar definido em todo H , mas é necessário apenas que A seja um operador linear com o
domínio Dom(A) denso em H . De fato, como mostrará a Proposição 4.10 abaixo, somente
para operadores lineares densamente definidos é possível garantir que seus adjuntos estão bem
definidos, porque, caso contrário, A∗ y não seria univocamente determinado pelos valores de
⟨A∗ y, x⟩ quando x varia sobre o domínio Dom(A).
184
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
De acordo com essa definição, para encontrar o operador A∗ , é preciso encontrar todos os
pares (z, y), com z ∈ H1 e y ∈ H2 , que satisfazem a relação
Ao se assumir que ⟨y, Ax⟩H2 é limitado na Definição 4.22a entende-se que, explicitamente,
existe uma constante Cy tal que |⟨y, Ax⟩H2 | # Cy ∥x∥H1 para todo x ∈ Dom(A). Por
outro lado, pela Definição 4.22, dado um vetor y ∈ H2 , se existe um vetor z ∈ H1 tal que
⟨y, Ax⟩H2 = ⟨z, x⟩H1 para todo x ∈ Dom(A), então y pertence ao domínio Dom(A∗ ) e
A∗ y = z. Mas, pelo Teorema de Representação de Riesz-Fréchet, tal z existirá se, e somente se,
⟨y, Ax⟩H2 for limitado, o que mostra que, de fato, as Definições 4.22 e 4.22a são equivalentes!
tal que
⟨y, Ax⟩H2 = ⟨z, x⟩H1 , ∀ x ∈ Dom(A) ⊂ H1 .
Logo, pela linearidade do produto interno
185
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Isto implica que w − z ∈ Dom(A)⊥ ; mas como, por hipótese, Dom(A) é denso em H1 ,
então, pela Proposição 3.14, w − z é identicamente igual ao vetor nulo. Portanto, w = z e
é univocamente determinado por y ∈ Dom(A∗ ). Consequentemente, o operador A∗ é bem
definido. Por outro lado, se A não for densamente definido em H1 , então Dom(A) ̸= H1 , e
o complemento ortogonal de Dom(A) em H1 contém pelo menos um vetor não-nulo w1 tal
que ⟨w1 , x⟩H1 = 0, para todo x ∈ Dom(A). Logo,
Nota 4.26. O domínio Dom(A∗ ) do operador A∗ na Definição 4.22 pode não ser denso. Com
efeito, é possível que Dom(A∗ ) = {0}!
Para dois escalares α e β considere a combinação linear αy1 + βy2. Então, pela condição
de adjunção de A, segue que
Aqui, usamos a linearidade do produto interno na primeira linha, o Corolário 3.1 na segunda
linha e a condição de adjunção de A na terceira linha. Logo, (αy1 + βy2 ) ∈ Dom(A∗ ) ⊂ H2
e A∗ (αy1 + βy2 ) = αA∗ y1 + βA∗ y2 = αz1 + βz2 . Isto completa a prova.
Demonstração. Assuma que (yn )n∈N é uma sequência de vetores em Dom(A∗ ) ⊂ H2 , tal que
yn → y e A∗ yn → z. Então, para cada n, segue que
186
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Portanto,
lim ⟨yn , Ax⟩H2 = lim ⟨zn , x⟩H1 ,
n→∞ n→∞
Note que, de acordo com as Proposições 4.8 e 4.12, se A é um operador limitado, então nós
temos o seguinte
TEOREMA 4.16. Sejam H1 e H2 espaços de Hilbert e A : Dom(A) ⊂ H1 → H2 um operador
N Além
linear limitado, com domínio denso em H1 e norma ∥A∥. Então, A admite um fecho A.
disso, Dom(A) N = Dom(A) = H1 e ∥A∥ N = ∥A∥.
Demonstração. Para mostrar que (A−1 )∗ = (A∗ )−1 , devemos mostrar que
. / . /
Dom (A−1 )∗ = Dom (A∗ )−1 .
. /
Para isto, assuma que x ∈ Dom(A) e que y ∈ Dom (A−1 )∗ . Assim,
Então, por definição, segue que (A−1 )∗ y ∈ Dom(A∗ ) e que A∗ (A−1 )∗ y = y. Mas, esta
última igualdade mostra que se A∗ (A−1 )∗ y = 0, então y = 0. Logo, pelo Lema 4.1, o operador
(A∗ )−1 existe. Isto implica
. −1 que
/ (A∗ )−1 A∗ (A−1 )∗ y = (A∗ )−1 y, ou que (A−1 )∗ y = (A∗ )−1 y,
para todo
. −1y ∈ /Dom (A )∗ . Em outras palavras, todo . elemento
/ que pertence.ao conjunto
/
Dom.(A ) / também pertence ao conjunto Dom (A ) , ou seja, Dom (A−1 )∗ ⊂
∗ ∗ −1
Existe uma relação simples (bastante útil em muitas aplicações) entre o conjunto imagem de
um operador linear A, densamente definido, e o espaço nulo de seu adjunto, A∗ , como mostra
a seguinte
187
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Demonstração. Uma vez que Ax ∈ Ran(A), então y ∈ Ran(A)⊥ se, e somente se,
⟨y, Ax⟩H2 = 0 para todo x ∈ Dom(A). Mas, por definição, nós temos que ⟨y, Ax⟩H2 =
⟨A∗ y, x⟩H1 para todo x ∈ Dom(A) e y ∈ Dom(A∗ ). Logo, segue que ⟨A∗ y, x⟩H1 = 0
para todo y ∈ Dom(A∗ ). Por outro lado, uma vez que Dom(A) é denso em H1 , pela
Proposição 3.14, Dom(A)⊥ = {0}. Assim, y ∈ Ran(A)⊥ se, e somente se, A∗ y = 0, ou
seja, y ∈ Ker(A∗ ).
188
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Observe que
0 = ⟨(y, z), (Ax, −x)⟩H2 ×H1 = ⟨(y, z), U(x, Ax)⟩H2 ×H1 .
B CD E
U G(A)
. /⊥
Isto implica que G(A∗ ) = UG(A) . Por outro lado,
0 = ⟨(y, z), U(x, Ax)⟩H2 ×H1 = −⟨(z, −y), (x, Ax)⟩H1 ×H2
. /⊥ . / . /⊥ . /
ou seja, UG(A) = U G(A)⊥ . Portanto, G(A∗ ) = UG(A) = U G(A)⊥ . Contudo,
uma vez que G(A) é o gráfico do operador A, pelo Lema 4.4, se a sequência (xn )n∈N ⊂
Dom(A) é tal que xn → 0, então Axn → 0 também. Logo, U(xn , Axn ) = (Axn , −xn ) →
(0, 0). Isto implica que UG(A) é um subespaço fechado em H2 × H1 , ou seja, UG(A) =
UG(A). Obviamente, UG(A) = UG(A). Portanto, pelo Teorema 3.5, segue que
G(A∗ ) = (H2 × H1 ) ⊖ UG(A) .
Isto prova a proposição e mostra que y ∈ Dom(A∗ ) e que z = A∗ y.
TEOREMA 4.17. Sejam H1 e H2 espaços de Hilbert e A : Dom(A) ⊂ H1 → H2 um operador
linear. Se A é fechado e seu domínio é denso em H1 , então, o domínio de A∗ é denso em H2 .
N
Portanto, (A∗ )∗ = A∗∗ existe; além disso, A∗∗ = A = A.
189
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
é o conjunto de todos os pontos que satisfazem a relação ⟨y, Ax⟩H2 = ⟨u, x⟩H1 = ⟨A∗ y, x⟩H1 ,
para todo x ∈ Dom(A), já que A∗ existe. Em outras palavras, este conjunto consiste de todos
os elementos em H1 × H2 que satisfazem a relação
para todo x ∈ Dom(A), isto é, que são ortogonais ao gráfico, G(A), de A. Mas, pelo Teorema
4.12, sendo A fechado G(A) é um subespaço fechado de H1 × H2 . Logo, o conjunto de pares
ordenados (4.5.3) pertence ao complemento ortogonal G(A)⊥ do subespaço fechado G(A) de
H1 × H2 . De (4.5.2), (0, v) ∈ G(A). Isto implica que v = A0, isto é, v = 0, contradizendo
a hipótese que v ̸= 0. Isto estabelece que Dom(A∗ ) é denso em H2 . Como A∗ é denso em
H2 , (A∗ )∗ = A∗∗ existe pela Proposição 4.10.
. /⊥
A seguir, considere A∗ no lugar de A na Proposição 4.15. Então, G(A∗∗ ) = UG(A∗ ) .
. /⊥
Mas, G(A∗ ) = UG(A) . Portanto,
. . / ⊥ /⊥ . 2 . /⊥ /⊥
G(A∗∗ ) = U UG(A) = U G(A) .
. /⊥
Isto implica que G(A∗∗ ) = G(A)⊥ = G(A), já que G(A) é um subespaço fechado de
H1 × H2 . Mas, se os gráficos de quaisquer dois operadores são iguais, os operadores devem
ser idênticos; logo, A∗∗ = A e como A é fechado, segue que A∗∗ = A = A. N
(a) diz-se que A é hermitiano se ⟨Ay, x⟩ = ⟨y, Ax⟩ para todo x, y ∈ Dom(A).
190
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
= ⟨x, Ay⟩ (A ⊂ B) ,
de onde se conclui que
= ⟨(A∗ − λ1I)y, x⟩ .
Aqui, usamos o fato que, por definição, ⟨y, Ax⟩ = ⟨A∗ y, x⟩ para todo x ∈ Dom(A) e
y ∈ Dom(A∗ ). Logo, segue que ⟨(A∗ − λ1I)y, x⟩ = 0 para todo x ∈ Dom(A) e y ∈
Dom(A∗ ). Por outro lado, uma vez que Dom(A) é denso em H , pela Proposição 3.14,
Dom(A)⊥ = {0}. Assim, y ∈ Ran(A − λ1I)⊥ se, e somente se, (A∗ − λ1I)y = 0, ou seja,
y ∈ Ker(A∗ − λ1I). Da mesma forma, prova-se que Ran(A − λ1I)⊥ = Ker(A∗ − λ1I).
191
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
N é auto-adjunto.
(b) A é essencialmente auto-adjunto se seu fecho A
PROPOSIÇÃO 4.17. Se A é um operador auto-adjunto, então, A não possui uma extensão própria
que seja auto-adjunta.
Observe que pela Proposição 4.16 uma extensão de um operador simétrico A não somente
amplia o conjunto Dom(A), mas também reduz o conjunto Dom(A∗ ). Isto implica que
quanto maior for o domínio de um operador simétrico, menor será o domínio do seu adjunto.
Assim, escolhendo-se um domínio de B adequadamente podemos obter uma extensão B de
A tal que B = B ∗ . Neste caso, B é auto-adjunto e pela Proposição 4.17 o operador B não
possuirá uma extensão própria que seja auto-adjunta. Portanto, um problema fundamental é
entender sob quais condições um operador simétrico tem uma extensão auto-adjunta. Isto será
discutido na Seção 4.8.
Neste ponto, deve ficar claro que no caso de operadores ilimitados, a hermiticidade e a auto-
adjunção são duas propriedades bem distintas. A auto-adjunção é uma propriedade mais forte
e será necessária como premissa em muitos resultados importantes na teoria quântica, como na
dinâmica quântica discutida no Capítulo 8. Hermiticidade geralmente é uma suposição muito
fraca. Assim, as Definições 4.23 e 4.24 nos permite definir a seguinte ordem de “intensidade”
para um operador linear:
Por outro lado, para operadores limitados que têm todo o espaço de Hilbert H como domínio
e que são simétricos, o Teorema de Hellinger-Toeplitz garante que as duas noções coincidem,
isto é, a ordem de intensidade acima colapsa, implicando a relação
Exemplo 4.7. Seja H um espaço de Hilbert. Tome o operador identidade 1I definido num
domínio denso, mas não-fechado, Dom(1I) ⊂ H . Obviamente, o operador 1I é simétrico e
limitado, mas não é auto-adjunto. Se fosse auto-adjunto, coincidiria com seu adjunto que é
fechado, donde se concluiria que seu domínio Dom(1I) seria fechado. Assim, mesmo quando
falamos em operadores limitados, dizer que o operador é simétrico não garante automatica-
mente que o mesmo seja auto-adjunto. Em contrapartida, se tivéssemos assumido o operador
identidade definido em todo o espaço de Hilbert H ele seria, de acordo com o Teorema de
Hellinger-Toeplitz, naturalmente auto-adjunto.
192
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
É importante estarmos cientes das diferenças entres as várias classes de operadores lineares
que introduzimos. O resultado a seguir traz mais estrutura para as Definições 4.23 e 4.24 e
fornece uma fonte útil para se entender o que é um operador linear A densamente definido.
PROPOSIÇÃO 4.18. Um operador simétrico A em um espaço de Hilbert H é sempre fechável.
Além disso, as seguintes afirmações acontecem:
N = A∗∗ ⊂ A∗ .
1. A é simétrico se, e somente se, A ⊂ A
N = A∗∗ ⊂ A∗ .
2. A é simétrico e fechado se, e somente se, A = A
N = A∗∗ = A∗ .
3. A é auto-adjunto se, e somente se, A = A
N = A∗∗ = A∗ .
4. A é essencialmente auto-adjunto se, e somente se, A ⊂ A
Teorema 4.17, isto implica que (A)N ∗ = (A∗∗ )∗ = (A∗ )∗∗ . Novamente usando o Teorema 4.17,
! !
segue que (A∗ )∗∗ = (A∗ ) e como A∗ é fechado, então, (A∗ ) = A∗ . Portanto, nós temos a
seguinte sequência de igualdades:
N = (A) !
N ∗ = (A∗∗ )∗ = (A∗ )∗∗ = (A
A∗∗ = A ∗
) = A∗ .
193
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Isto prova a ida de (4). A volta, como nos outros casos, é imediata.
COROLÁRIO 4.3. Um operador simétrico fechado A em um espaço de Hilbert H é auto-adjunto
se, e somente se, A∗ é simétrico.
N é denso, o operador A
Como Dom(A) N é simétrico.
Uma observação simples, mas útil, sobre a relação entre fecho e adjunto é dada na seguinte
N
PROPOSIÇÃO 4.19. Seja A um operador simétrico em um espaço de Hilbert H , com fecho A.
N ∗ ∗
Então, o adjunto do fecho é igual ao adjunto: (A) = A .
!
Demonstração. Como A∗ é fechado, segue que A∗ = (A∗ ) = (A∗ )∗∗ = (A∗∗ )∗ . Mas, como
N que, pelo Teorema 4.17, é igual a A∗∗ . Logo, temos
A é fechável, ele admite um fecho, A,
! N ∗.
A∗ = (A∗ ) = (A∗ )∗∗ = (A∗∗ )∗ = (A)
194
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Pelo Teorema 4.17, uma vez que AN é fechado e seu domínio é denso em H , o domínio de A∗
N Logo,
é denso em H . Portanto, (A∗ )∗ = A∗∗ existe e A∗∗ = A.
N y⟩ ,
⟨x, A∗ y⟩ = ⟨A∗ x, y⟩ = ⟨A∗∗ x, y⟩ = ⟨Ax, ∀ y ∈ Dom(A∗ ) .
N
Isto implica que x ∈ Dom(A).
PROPOSIÇÃO 4.21. Assuma que A : Dom(A) ⊂ H → H é um operador simétrico. Então, se
A1 e A2 são extensões auto-adjuntas de A tal que Dom(A1 ) ⊂ Dom(A2 ), então A1 = A2 .
N é a única extensão auto-
Se A é um operador essencialmente auto-adjunto, então seu fecho A
adjunta de A.
Naturalmente, de acordo com a proposição acima, todo operador que já é auto-adjunto sobre
seu domínio de definição também é essencialmente auto-adjunto!
TEOREMA 4.19. Sejam A um operador simétrico fechado e x, y vetores em Dom(A∗ ). Suponha
que a condição ⟨y, A∗x⟩ = ⟨A∗ y, x⟩ falhe, para todo y ∈ Dom(A∗ ). Então, x, y ∈ / Dom(A).
Além disso, se ⟨x, A∗ x⟩ e ⟨A∗ y, y⟩ são reais, então, x, y são linearmente independentes em
Dom(A∗ ) \ Dom(A).
195
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Portanto, a condição ⟨y, A∗x⟩ = ⟨A∗ y, x⟩ acontece, para todo y ∈ Dom(A∗ ). O caso para
η = 1 é similar. Assim sendo, se ⟨x, A∗ x⟩ e ⟨A∗ y, y⟩ são reais, para que a condição ⟨y, A∗x⟩ =
⟨A∗ y, x⟩ falhe, para todo y ∈ Dom(A∗ ), x, y devem ser linearmente independentes em
Dom(A∗ ) \ Dom(A).
A importância desse conceito é óbvia quando estão envolvidos mais de um operador ilimi-
tado, como no caso do operador de Schrödinger da mecânica quântica. O método padrão para
provar a auto-adjunção de um operador da forma A + B, em que A é auto-adjunto, é baseado
em um resultado provado por Kato-Rellich (veja o Teorema 4.35 mais adiante), para qual a noção
de core do operador é relevante. No entanto, deve-se enfatizar que um mesmo operador pode
ter muitos cores.
x1 + x2 + · · · + xn = 0 , xj ∈ Mj , j = 1, 2, . . . , n ,
196
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Demonstração. Pela definição do operador adjunto, segue que ⟨y, Ax⟩ = ⟨A∗ y, x⟩, para todo
[x ∈ 5Dom(A)
\ e para todo y ∈ Dom(A∗ ). Por hipótese, como Ω ⊂ Dom(A), então,
y, A5Ω x = ⟨A∗ y, x⟩, para todo x ∈ Ω e para todo y ∈ Dom(A∗ ). Isto implica que,
@ . 5 /A @ . 5 /A
∗ 5
0 = (y, A y), A Ω x, −x = (y, A y), U x, A5Ω x
∗
,
H ×H B .CD5 / E H ×H
U G A5
Ω
ou seja,
6 . 5 /7⊥ 6. 5 / 7
∗
G(A∗ ) = G(A) = UG A5Ω = G A5Ω .
A primeira igualdade segue do fato do operador A ser auto-adjunto, enquanto que a terceira
5 . 5 /∗ ! 5
segue da Proposição 4.15. Agora, se A5Ω é essencialmente auto-adjunto, então, A5Ω = A5Ω .
!5
Logo, A = A5 e Ω é um core para A. Reciprocamente, se Ω é um core para A, o fecho de
5 Ω 5
A5Ω é auto-adjunto porque coincide com o operador auto-adjunto A. Pela Definição 4.24 A5Ω
é essencialmente auto-adjunto.
Demonstração. Basta mostrar que Dom(A) = Dom(A∗ ). Por definição, sabemos que
Dom(A) ⊂ Dom(A∗ ). Logo, com base na hipótese acima, basta mostrar que Dom(A) ⊃
Dom(A∗ ). Efetivamente, se y ∈ Dom(A∗ ) e z = A∗ y, então em virtude da condição
Ran(A) = H existe pelo menos um vetor w ∈ Dom(A) para o qual z = Aw. Assim, para
um vetor arbitrário x ∈ Dom(A) nós temos que
Assim, y − w ∈ Ran(A)⊥ . Mas, por hipótese Ran(A) = H ; logo, pelo Lema 3.2 (Item 1)
segue que Ran(A)⊥ = {0}, ou seja, y − w = 0 =⇒ y = w ∈ Dom(A). Consequentemente,
Dom(A) ⊃ Dom(A∗ ), o que prova o teorema.
Demonstração. Novamente, uma vez que A é simétrico, basta mostrar que o domínio do adjunto
está contido no domínio de A, já que Dom(A − λ1I) = Dom(A − λ1I) = Dom(A).
197
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
= ⟨A∗ y, x⟩ − λ⟨y, x⟩
= ⟨A∗ y, x⟩ − ⟨λy, x⟩
= ⟨(A∗ − λ1I)y, x⟩
= ⟨z, x⟩
= ⟨(A − λ1I)w, x⟩ .
Da primeira para a segunda linha usamos o fato que, por definição, ⟨y, Ax⟩ = ⟨A∗ y, x⟩ para
todo x ∈ Dom(A) e y ∈ Dom(A∗ ). Mas, como A ⊂ A∗ , segue que (A − λ1I)w =
(A∗ − λ1I)w para w ∈ Dom(A); portanto, temos que
5
5
⟨(A∗ − λ1I)w, x⟩5 = ⟨z, x⟩ = ⟨w, (A − λ1I)x⟩ = ⟨y, (A − λ1I)x⟩ .
Dom(A)
⟨y − w, (A − λ1I)x⟩ = 0 .
Assim, y − w ∈ Ran(A − λ1I)⊥ . Mas, por hipótese Ran(A − λ1I) = H , e isto implica que
Ran(A − λ1I)⊥ = {0}, ou seja, y − w = 0, isto é, y = w ∈ Dom(A). Consequentemente,
Dom(A) ⊃ Dom(A∗ ). A mesma análise se aplica ao conjunto Ran(A − λ1I).
198
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Vamos finalizar esta seção retornando ao diálogo entre Heisenberg e Friedrichs, tentando
justificar ainda mais a importância de se compreender a diferença entre operadores hermitianos,
simétricos e auto-adjuntos na mecânica quântica. A quantização de sistemas físicos deve incluir
uma definição correta dos observáveis físicos (como o hamiltoniano e o momentum) como
operadores auto-adjuntos em um espaço de Hilbert, H , apropriado e sua análise espectral
adequada. Uma solução deste problema não é um procedimento direto e livre de ambiguidades
para sistemas quânticos não-triviais, mesmo os mais simples (veja a discussão do operador
momentum na Seção 4.7). No caso da análise espectral, veremos que para operadores meramente
simétricos o espectro não é composto exclusivamente por números reais. Em contrapartida, o
espectro de um operador auto-adjunto é sempre composto por números reais (veja o Teorema
5.4). Lembremos que na mecânica quântica toda grandeza física mensurável está associada
com um certo operador A. O espectro de A é, então, composto pelo conjunto dos possíveis
valores de medição do observável, e os valores medidos devem ser reais. Lembremos, ainda,
que na mecânica quântica, os estados de um sistema físico são vetores em um espaço de
Hilbert, H , e que a dinâmica do sistema é descrita por um operador H em H , chamado
operador hamiltoniano (ou operador energia). A evolução temporal do sistema é descrita pela
equação diferencial de Schrödinger, com a solução sendo descrita pelo semi-grupo unitário
uni-paramétrico t !→ eitH , gerado por H. A exponenciação de H só é possível se H for
auto-adjunto, isto é, pode-se afirmar que a existência da dinâmica na mecânica quântica é
“equivalvante” a provar que o operador hamiltoniano é auto-adjunto (isto será abordado no
Capítulo 8). E mais, no estudo da dinâmica quântica, toda vez que você precisar levar em conta
a imposição de condições de contorno diferentes, você está, efetivamente, se preocupando com
diferentes extensões auto-adjuntas sem se dar conta disso. As extensões auto-adjuntas de um
operador hamiltoniano simétrico é um problema relevante, pois extensões distintas definem leis
dinâmicas distintas. Portanto, apesar de todo desdém de Heisenberg (talvez receando que a
essência “etérea” da matemática pudesse macular-se no simples contato com as “realidades” da
mecânica quântica), a distinção entre operadores hermitianos, simétricos e auto-adjuntos é, sim,
crucial para a mecânica quântica!
199
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
1 1 i i
⟨U y, U x⟩ = ∥U y + U x∥2 − ∥U y − U x∥2 − ∥U y + iU x∥2 + ∥U y − iU x∥2
4 4 4 4
1 1 i i
= ∥U (y + x)∥2 − ∥U (y − x)∥2 − ∥U (y + ix)∥2 + ∥U (y − ix)∥2
4 4 4 4
1 1 i i
= ∥y + x∥2 − ∥y − x∥2 − ∥y + ix∥2 + ∥y − ix∥2
4 4 4 4
= ⟨y, x⟩ .
Para ver que as definições acima são equivalentes, observe que devido à identidade de
polarização, U preserva o produto interno e isto é equivalente a preservar a norma. Com
efeito, se y = x, então ∥U x∥ = ∥x∥. Isto implica que U é também um operador isométrico
(portanto, um operador linear limitado ∥U ∥ = 1). O fato de que o Ran(U ) é denso em H
assegura que U tem um inverso limitado U −1 . Neste caso, denotamos U −1 = U ∗ . Assim,
um operador unitário é um automorfismo de espaços de Hilbert, isto é, ele conserva a estrutura
(neste caso, a estrutura de espaço linear, o produto interno, e, portanto, a topologia) do espaço
sobre o qual ele atua.
Nota 4.27. A condição da linearidade na definição de um operador unitário pode ser omitida
sem alterar o significado, porque ela pode ser derivada da linearidade e positividade-definida
200
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
do produto escalar:
=0.
Analogamente, obtemos
∥U (y + x) − (U y + U x)∥ = 0 .
e (A − λ1I)x = z ,
(A − λ1I)x = y
. /
em que, y ∈ Ran(A − λ1I) = (A − λ1I) Dom(A) e z ∈ Ran(A − λ1I) = (A −
. /
λ1I) Dom(A) .
PROPOSIÇÃO 4.23. Seja A um operador simétrico fechado em um espaço de Hilbert complexo
H ̸= {0} e λ um elemento de C \ R. Suponha que existe ε > 0 tal que
∥(A − λ1I)x∥ " ε∥x∥ e ∥(A − λ1I)x∥ " ε∥x∥ , ∀ x ∈ Dom(A) . (4.6.1)
∥(A − λ1I)x∥2 = ⟨Ax, Ax⟩ − ⟨Ax, λx⟩ − ⟨λx, Ax⟩ + ⟨λx, λx⟩
Aqui, levamos em conta o fato que ⟨x, Ax⟩ = ⟨Ax, x⟩ = ⟨x, Ax⟩, para todo x ∈ Dom(A).
Isto mostra que se (A − λ1I)x = 0, então x = 0. Logo, pelo Lema 4.1, o inverso (A − λ1I)−1
existe. Além disso, o operador (A − λ1I)−1 é limitado; com efeito, segue, imediatamente do
desenvolvimento acima, que
201
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
O mesmo raciocínio se aplica ao operador (A − λ1I). Em outras palavras, isto implica que
por meio das relações (A − λ1I)x = y e (A − λ1I)x = z, o conjunto Dom(A) é mapeado
injetivamente sobre Ran(A − λ1I) e Ran(A − λ1I), respectivamente. Ou seja, para cada
y ∈ Ran(A − λ1I) existe um, e somente um, elemento x ∈ Dom(A) que satisfaz a
relação (A − λ1I)x = y. Por sua vez, tendo encontrado este elemento x, determinamos o
elemento z pela relação (A − λ1I)x = z. Desta forma, todo elemento z ∈ Ran(A − λ1I)
está associado a um único elemento y ∈ Ran(A − λ1I). Isto implica a existência de um
operador V que relaciona esses elementos, isto é, V z = y, com V tendo como domínio
Dom(V ) = Ran(A − λ1I) e conjunto imagem Ran(V ) = Ran(A − λ1I). Assim, segue
que (A − λ1I)−1 z = x. Isto implica que (A − λ1I)(A − λ1I)−1 z = (A − λ1I)x, que por sua
vez implica que (A − λ1I)(A − λ1I)−1 z = y. Consequentemente, temos que
V = (A − λ1I)(A − λ1I)−1 .
Isto nos mostra que ∥V z∥ = ∥z∥, ou seja que o operador V é isométrico. Além disso,
segue das relações V z = (A − λ1I)x e z = (A − λ1I)x que, para todo x ∈ Dom(A),
(V − 1I)z = (λ − λ)x. Portanto,
, -
1
Dom(A) = Ran(V − 1I) ,
λ−λ
ou seja, o conjunto Ran(V −1I) formado por todos os vetores (V −1I)z, com z ∈ Dom(V ),
coincide com o conjunto Dom(A) que é denso em H . Estas propriedades do operador V
provam o seguinte
TEOREMA 4.21. Seja A um operador simétrico em um espaço de Hilbert complexo H ̸= {0}.
A transformada de Cayley de A é um operador isométrico. Além disso, o conjunto de todos os
vetores (V − 1I)z, com z ∈ Dom(V ), é denso em H .
Por causa do teorema acima, em muitas situações podemos reduzir o estudo de um operador
não limitado a um operador limitado utilizando a transformada de Cayley.
= 1I + (λ − λ)(A − λ1I)−1 .
202
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Logo,
1
V − 1I = (λ − λ)(A − λ1I)−1 =⇒ (A − λ1I)−1 = (V − 1I) .
(λ − λ)
Assim,
1
V = (A − λ1I)(V − 1I) ,
(λ − λ)
ou,
ou seja,
⟨(V − 1I)z ′ , z⟩ = ⟨V z ′ , z⟩ − ⟨z ′ , z⟩ = ⟨V z ′ , V z⟩ − ⟨z ′ , z⟩ = 0 ,
uma vez que V é uma isometria e, portanto, preserva o produto interno. Isto implica que z
seria ortogonal ao conjunto Ran(V − 1I) que é denso em H , pelo Teorema 4.21, o que é
impossível. Logo, devemos ter z = 0. Portanto, pelo Lema 4.1, o operador (V − 1I)−1 existe.
Consequentemente,
A = (λV − λ1I)(V − 1I)−1 .
Exemplo 4.9. No caso particular em que λ = i, segue que
V = (A − i1I)(A + i1I)−1 ,
e
A = −i(V + 1I)(V − 1I)−1 .
A(V z − z) = λV z − λz .
203
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Isto implica que o vetor V z − z ∈ Dom(A). Mas, por hipótese, o conjunto composto por
todos os vetores (V − 1I)z, com z ∈ Dom(V ), é denso em H . Isto implica que Dom(A)
é denso em H . Além disso, para Dom(A) ∋ x = V z − z, segue que
Ax = λV z − λz .
Portanto,
Ax − λx = (λ − λ)z e Ax − λx = (λ − λ)V z .
Mas, como Dom(A) é denso em H , então o único vetor ortogonal ao conjunto Dom(A) é
o vetor nulo. Logo, para operador (A − λ1I), nó temos que (A − λ1I)x = 0 se, e somente se,
x = 0; assim, pelo Lema 4.1, o operador (A − λ1I)−1 existe. Consequentemente,
Da mesma forma
Consequentemente,
Demonstração. Assuma que V é fechado. Logo, por definição, toda sequência (zn )n∈N ⊂
Dom(V ) = Ran(A−λ1I) converge para um vetor z ∈ Dom(V ), enquanto que a sequência
de imagens (V zn )n∈N ⊂ Ran(V ) = Ran(A − λ1I) converge para um vetor y = V z ∈
204
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Ran(V ). Mas, isto implica que z ∈ Ran(A − λ1I) e y ∈ Ran(A − λ1I), isto é, existe um
vetor x ∈ Dom(A) tal que z = (A − λ1I)x e y = (A − λ1I)x. Para isto ser verdade deve
existir uma sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A) tal que xn → x. Assim,
Axn = yn + λxn → y + λx = Ax .
Reciprocamente, assuma que A é fechado. Logo, toda sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A)
converge para um vetor x ∈ Dom(A), enquanto que a sequência de imagens (Axn )n∈N ⊂
Ran(A) converge para um vetor u = Ax ∈ Ran(A). Obviamente, λxn → λx e λxn → λx.
Assim, se definirmos zn = (A − λ1I)xn ⊂ Ran(A − λ1I), então a sequência (zn )n∈N converge
para um vetor z = (A−λ1I)x ∈ Ran(A−λ1I), enquanto que a sequência (Axn −λxn )n∈N ⊂
Ran(A − λ1I) converge para um vetor y = (A − λ1I)x ∈ Ran(A − λ1I). Mas, por
definição, Ran(A − λ1I) = Dom(V ) e Ran(A − λ1I) = Ran(V ). Assim, a sequência
(zn )n∈N ⊂ Dom(V ) converge para z ∈ Dom(V ) e V zn → y = V z ∈ Ran(V ). Logo,
V é fechado.
= (A − λ1I)−1 (A − λ1I) .
Logo,
Uma vez que Dom(A − λ1I) = Dom(A − λ1I) = Dom(A), os operadores (A − λ1I) e
(A − λ1I) comutam;16 portanto, obtém-se que V ∗ V = 1I. Por outro lado,
e
(A − λ1I)(A − λ1I)x = (AA − λA − λA + |λ|2 )x .
Logo, (A − λ1I) e (A − λ1I) comutam!
205
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Por sua vez, os operadores (A − λ1I)−1 e (A − λ1I)−1 são limitados e têm como o domínio
Ran(A−λ1I) e Ran(A−λ1I), respectivamente. Mas, de acordo com o Corolário 4.5, sendo A
auto-adjunto, então, Ran(A − λ1I) = Ran(A − λ1I) = H , isto é, os operadores (A − λ1I)−1
e (A − λ1I)−1 têm todo o espaço de Hilbert H como domínio. Logo, eles comutam e isto
implica que V V ∗ = 1I. Assim, a transformada de Cayley, V , é unitária.
Nota 4.28 (Breve comentário sobre o teorema acima). Observe que, pela Definição 4.22’, o
operador limitado V é unitário se ele é sobrejetivo e preserva o produto interno do espaço de
Hilbert H . Uma vez que A é auto-adjunto, então, Ran(V ) = Ran(A − λ1I) = H , pelo
Corolário 4.5. Portanto, V é sobrejetivo. Além disso, preservar o produto interno é equivalente
a preservar a norma, e como V é uma aplicação isométrica, o operador V preserva a norma.
Logo, de acordo com a Definição 4.22’, o operador V é unitário. Em resumo, o Teorema 4.24 é
apenas uma consequência do critério fundamental de que A é auto-adjunto se, e somente se,
Ran(A − λ1I) = Ran(A − λ1I) = H .
X : Dom(X) → L2 (−∞, ∞)
Esta função não pertence ao domínio Dom(X). Em contrapartida, Dom(X) contém todas
as funções Ψ ∈ L2 (−∞, ∞) que se anulam fora de um intervalo compacto e este conjunto de
funções é denso em L2 (−∞, ∞). Portanto, Dom(X) é denso em L2 (−∞, ∞).
206
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
n n+1 x
Este resultado também mostra que X1 Ψ ∈ L2 [a, b], para toda função Ψ ∈ L2 [a, b]. Portanto,
Dom(X1 ) = L2 [a, b], ou seja, o operador X1 está definido em todo o espaço L2 [a, b]. Isto
reflete um fato já enfatizado algumas vezes ao longo deste capítulo: a mesma regra formal con-
siderada em domínios diferentes pode representar operadores diferentes em domínios diferentes.
No caso em questão, a regra XΨ = x Ψ pode representar um operador ilimitado no domínio
L2 (−∞, ∞), ou pode representar um operador limitado no domínio L2 [a, b].
Exemplo 4.10 (Operador posição na mecânica quântica). Se Ω = [a1 , b1 ] × · · · × [an , bn ]
é um subconjunto próprio e compacto de Rn , então, o operador Xj , com j = 1, . . . , n, é
definido para toda função Ψ ∈ L2 (Ω) pela equação
Xj : Dom(Xj ) → L2 (Ω)
207
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Neste caso, Xj é um operador auto-adjunto limitado, com a norma ∥Xj ∥ sendo dada pelo
maior dos números |aj | e |bj |. Se cada intervalo [aj , bj ], com j = 1, . . . , n, é infinito, então
Ω = Rn e Xj é definido pela Eq.(4.7.3) com domínio de definição
! "
Dom(Xj ) = Ψ ∈ L2 (Rn ) | xj Ψ(x1 , . . . , xn ) ∈ L2 (Rn ) . (4.7.4)
O domínio acima é certamente denso em H pois contém o espaço C0∞ (Rn ) das funções
infinitamente diferenciáveis de suporte compacto e também o espaço das funções de Schwartz
S (Rn ) (esses espaços são tratados com detalhes no Capítulo 6), ambos densos em L2 (Rn ).17
Assim, o operador Xj admite um adjunto. Por definição de Xj e seu domínio, temos que
⟨Φ, Xj Ψ⟩ = ⟨Xj Φ, Ψ⟩ se Ψ, Φ ∈ Dom(Xj ). Por conseguinte, Xj é simétrico. Vamos
mostrar que ele é auto-adjunto também.
Seja Λ ∈ Dom(Xj∗ ) tal que Λ = Xj∗ Φ. Então, para toda função Ψ no domínio (4.7.4),
segue que
⟨Φ, Xj Ψ⟩ = ⟨Λ, Ψ⟩ ,
ou seja, isto é equivalente à relação
$ ∞] n $ ∞ n
]
dxj Φ(x1 , . . . , xn )xj Ψ(x1 , . . . , xn ) = dxj Λ(x1 , . . . , xn )Ψ(x1 , . . . , xn ) ,
−∞ j=1 −∞ j=1
Naturalmente, a equação acima acontece para toda função Ψ ∈ L2 (Rn ) que desaparece fora
de qualquer conjunto compacto [α1 , β1 ] × · · · × [αn , βn ] ⊂ Rn ,
$ βj ]n 6 7
dxj xj Φ(x1 , . . . , xn ) − Λ(x1 , . . . , xn ) Ψ(x1 , . . . , xn ) = 0 .
αj j=1
Logo, para todo xj ∈ [αj , βj ], segue que Λ(x1 , . . . , xn ) = xj Φ(x1 , . . . , xn ). Isto implica que
xj Φ(x1 , . . . , xn ) ∈ L2 (Rn ), Φ ∈ Dom(Xj ) e Λ = Xj∗ Φ. Isto mostra que Dom(Xj∗ ) ⊂
Dom(Xj ). Como, por definição, Dom(Xj ) ⊂ Dom(Xj∗ ), então Dom(Xj∗ ) = Dom(Xj )
e Xj é auto-adjunto.
Ran(Xj ± i) = L2 (Rn ) ,
208
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Φ(x1 , . . . , xn )
Ψ(x1 , . . . , xn ) = .
(xj + i)
($ n
)1/2
∞ ]
= dxj |Ψ(x1 , . . . , xn )|2
−∞ j=1
= ∥Ψ∥2 .
dΨ(x)
P Ψ(x) = −i# , (4.7.5)
dx
para cada função Ψ em seu domínio Dom(P ).18 Uma função Ψ pertencerá ao domínio
Dom(P ) se certas condições são satisfeitas. Como já enfatizado, um operador não pode ser
considerado como totalmente caracterizado até que o seu domínio de definição fique estabele-
cido. No caso do operador momentum (ou mesmo no caso do operador hamiltoniano) devemos
ficar atentos para mais um detalhe sobre o domínio: P é um operador diferencial, e como tal
gerará uma equação diferencial. Entretanto, uma equação diferencial não estará completamente
estabelecida até que especifiquemos as condições de contorno que as soluções devem satisfa-
zer. Assim, para uma função Ψ pertencer ao domínio Dom(P ), não apenas a expressão P Ψ
deve ser definida, mas também as condições de contorno que Ψ deve satisfazer. Se as condi-
ções de contorno são muito restritivas, então podemos ter Dom(P ) ⊂ Dom(P ∗ ), mas com
Dom(P ) ̸= Dom(P ∗ ), de modo que o operador momentum P não pode ser auto-adjunto.
18
Aqui,
h
#= = 1, 05457 × 10−34 Js ,
2π
em que h = 6, 62608 × 10−34 Js é a constante de Planck.
209
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
em que AC[0, 1] é o espaço das funções absolutamente contínuas Ψ no intervalo [0, 1].19 Então,
tanto Ψ como dΨ/dx pertencem ao espaço L2 (0, 1). Queremos investigar se P é auto-adjunto.
Primeiro, vamos mostrar que P = −i#d/dx é simétrico. De fato, para Φ, Ψ ∈ Dom(P ),
segue que
$ 1 , - $ 1 , -
# dΨ(x) # dΦ(x)
⟨Φ, P Ψ⟩ − ⟨P Φ, Ψ⟩ = dx Φ(x) − dx Ψ(x)
0 i dx 0 i dx
$ ( , - )
# 1 dΨ(x) dΦ(x)
= dx Φ(x) + Ψ(x)
i 0 dx dx
$
# 1
d . / #. /551
= dx Φ(x)Ψ(x) = Φ(x)Ψ(x) 5 = 0 .
i 0 dx i 0
Para tais funções, usando o Teorema Fundamental do Cálculo (veja nota de roda-pé na página 211), segue que
dΨ/dx = Φ em quase-toda-parte (q.t.p.). Em resumo, se Ψ é absolutamente contínua em [a, b], então Ψ é
diferenciável em q.t.p., dΨ/dx ∈ L1 [a, b], e Ψ é a integral indefinida de dΨ/dx. Em outras palavras, ao
assumirmos o espaço das funções absolutamente contínuas garantimos que a operação de integração por partes
está sempre bem definida. Além disso, o subespaço AC[a, b] é denso em L2 (a, b).
210
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
A seguir, vamos mostrar que P é também fechado. De acordo com o Teorema 4.17, a
menor extensão fechada P ∗∗ de P deve estar contida em P ∗ , ou seja, P ⊂ P ∗∗ ⊂ P ∗ .
Consequentemente, P será um operador simétrico fechado se P = P ∗∗ . Como P ∗∗ representa
uma extensão fechada de P , então P ⊂ P ∗∗ . As funções Φ ∈ Dom(P ∗∗ ) são funções
absolutamente contínuas no intervalo [0, 1] e
dΦ(x)
P ∗∗ Φ(x) = −i# ∈ L2 (0, 1) .
dx
Portanto, para toda função Ψ ∈ Dom(P ∗), segue que
$ 1 , - $ 1 , -
∗∗ ∗ # dΦ(x) # dΨ(x)
⟨Ψ, P Φ⟩ − ⟨P Ψ, Φ⟩ = dx Ψ(x) − dx Φ(x)
0 i dx 0 i dx
$ ( , - )
# 1 dΦ(x) dΨ(x)
= dx Ψ(x) + Φ(x)
i 0 dx dx
$
# 1
d . / #. /551
= dx Ψ(x)Φ(x) = Ψ(x)Φ(x) 5 = 0 .
i 0 dx i 0
Uma vez que os valores de Ψ(0) e Ψ(1) são arbitrários, a equação acima será satisfeita se, e
somente se, Φ(0) = Φ(1) = 0, mas isto implica que Φ ∈ Dom(P ). Isto mostra que P ∗∗ ⊂ P .
Como, pelo Teorema 4.17, P ⊂ P ∗∗ ; logo P = P ∗∗ e, portanto, P é fechado!
Vamos, agora, mostrar que P ̸= P ∗. Para isto, devemos encontrar os pares (Ω, Φ) de
elementos de AC[0, 1] ⊂ L2 (0, 1) de tal forma que
⟨Φ, P Ψ⟩ = ⟨Ω, Ψ⟩ .
Esta relação pode ser escrita da seguinte forma:
$ 1 , - $ 1
# dΨ(x)
dx Φ(x) = dx Ω(x)Ψ(x) , (4.7.7)
0 i dx 0
para toda função Ψ ∈ Dom(P ) e para toda função Φ ∈ Dom(P ∗ ). Para Φ ∈ Dom(P ∗ ),
segue que Ω = P ∗ Φ ∈ L2 (0, 1) ⊂ L1 (0, 1). Considere a função
$ x
Λ(x) = dy Ω(y) + C , (C é uma constante arbitrária) .
0
211
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
para toda função Ψ ∈ Dom(P ). Fazendo uma integração por partes, levando em conta a
condição de contorno (4.7.6), obtemos
$ 1 , $ -, -
i x i # dΨ(x)
dx Φ(x) − dy Ω(y) − C = 0 , ∀ Ψ ∈ Dom(P ) .
0 # 0 # i dx
dΦ(x) dΛ(x)
−i# = = Ω(x) .
dx dx
Dado que Ω = P ∗Φ, com P ∗ = −i#d/dx, mostramos que o domínio do operador P ∗ é
Dom(P ∗ ) = AC[0, 1], ou seja, é o conjunto de todas as funções Φ absolutamente contínuas
e que P ∗ Φ = −i#dΦ/dx. Por outro lado, as funções no domínio Dom(P ) além de terem
sido assumidas serem absolutamente contínuas, elas devem também satisfazer a condição de
contorno (4.7.6), enquanto que as funções no domínio Dom(P ∗ ) devem satisfazer somente a
condição de serem absolutamente contínuas. Desta análise fica evidente que
P ̸= P ∗ =⇒ P não é auto-adjunto!
Mas, por que o operador P é apenas simétrico? Como a condição de contorno (4.7.6)
influencia neste resultado? Para responder estas questões, primeiro observamos que, de acordo
com o Corolário 4.5, sendo P apenas simétrico, então, Ran(P + i1I) ̸= H e também
Ran(P − i1I) ̸= H . Isto significa que existe pelo menos uma função Φ ∈ Ran(P + i1I)⊥ =
Ker(P ∗ − i1I) não nula, tal que
Logo, P ∗Φ = iΦ. Da mesma forma, para uma função Φ ∈ Ran(P − i1I)⊥ = Ker(P ∗ + i1I)
não nula, segue que
e P ∗ Φ = −iΦ. Portanto, a ação do operador P ∗ sobre o domínio AC[0, 1], representado pela
equação diferencial
# dΦ(x)
P ∗ Φ(x) = = ±iΦ(x) ,
i dx
−1
tem soluções Φ(x) = Ce±# x , em que C é uma constante, com auto-valores ±i. A única
maneira da equação diferencial acima satisfazer as condições de contorno (4.7.6) é se C = 0;
isto implica que Φ é a função identicamente nula. Assim, P ∗ não possuiria auto-funções.
Além disso, como já vimos, tomar o fecho de P não ajuda, porque as condições de contorno
sobrevivem tomando-se o fecho. Podemos entender isto, em termos práticos, como uma falha do
teorema espectral. Com efeito, operadores auto-adjuntos têm um espectro puramente real (veja
212
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
o Teorema 5.4). Assim, os auto-valores imaginários, ±i, estão em desacordo com a condição de
auto-adjunção. Não é difícil ver que aqui Dom(P ∗ )\Dom(P ) é bidimensional e, portanto, os
dois “auto-espaços imaginários” são responsáveis pela diferença entre os domínios Dom(P ∗ )
e Dom(P ). De fato, a análise realizada na Seção 4.8 nos mostrará que
Dom(P ∗ ) = Dom(P ) ⊕ K+ ⊕ K− ,
213
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Uma vez que a relação (4.7.10) é satisfeita, obviamente, para Φ = Ψ0 , devemos ter |α| = 1.
Isto implica que toda função Φ ∈ Dom(P ′ ) deve satisfazer a condição (mais fraca) de ser
quase-periódica:
|Φ(1)|2 − |Φ(0)|2 = 0 =⇒ Φ(1) = eiβ Φ(0) , para algum β ∈ [0, 2π) . (4.7.11)
Defina
Φ(x) = Ψ(x) − λΨ0 (x) ,
com λ sendo uma constante. Podemos selecionar a constante λ exigindo que
Ψ(0) − λΨ0 (0) = 0 .
Então, é fácil ver que, com esta definição e escolha de λ, Φ satisfaz a condição (4.7.6); portanto,
Φ ∈ Dom(P ). Por outro lado, como Dom(P ) ⊂ Dom(P ′ ), temos que Φ ∈ Dom(P ′ ), de
maneira que a função
Ψ(x) = Φ(x) + λΨ0 (x) ,
também pertence ao domínio Dom(P ′ ).
Vamos, agora, mostrar que P ′ = P ′∗ . Faremos isto aplicando o mesmo raciocínio usado
anteriormente, isto é, partimos considerando a relação
⟨Φ, P ′Ψ⟩ = ⟨Ω, Ψ⟩ , ∀ Ψ ∈ Dom(P ′ ) e ∀ Φ ∈ Dom(P ′∗ ) ,
ou seja, temos
$ 1 , - $ 1
# dΨ(x)
dx Φ(x) = dx Ω(x)Ψ(x) . (4.7.12)
0 i dx 0
é absolutamente contínua e satisfaz dΛ/dx = Ω em quase toda parte. Assim, a Eq.(4.7.12) pode
ser escrita da seguinte forma
$ 1 , - $ , ,$ x --
# dΨ(x) i 1 # d
dx Φ(x) =− dx dy Ω(y) + C Ψ(x) ,
0 i dx # 0 i dx 0
para toda função Ψ ∈ Dom(P ′ ). Integrando por partes o lado direito da equação acima,
obtemos
$ 1 , ,$ x -- , $ x - 51
# d # 5
5
dx dy Ω(y) + C Ψ(x) = dy Ω(y) + C Ψ(x)5
0 i dx 0 i 0 5
0
$ , $ x
1 -, -
# dΨ(x)
− dx dy Ω(y) + C
0 i 0 dx
51 $ 1 , -
# 5 # dΨ(x)
5
= − Λ(x)Ψ(x)5 + dx Λ(x) .
i 0 0 i dx
214
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Λ(1) = e−iβ Λ(0) =⇒ Λ(1) = eiβ Λ(0) , para algum β ∈ [0, 2π) .
Por sua vez, isto implica que o lado esquerdo da Eq.(4.7.13) será nulo se
i i
Φ(x) + Λ(x) = 0 =⇒ Φ(x) − Λ(x) = 0 ,
# #
e
dΦ(x) dΛ(x)
−i# = = Ω(x) ,
dx dx
Uma vez que Ω = P ′∗ Φ, em que P ′∗ = −i#d/dx, mostramos que P ′∗ foi definido de
tal forma que toda função Φ ∈ Dom(P ′∗ ) deve satisfazer a condição que sua derivada
dΦ/dx ∈ L2 (0, 1), mais a condição de fronteira Φ(1) = eiβ Φ(0), para algum β ∈ [0, 2π). Ou
seja, toda função Φ ∈ Dom(P ′∗ ) deve também ser uma função quase-periódica. Dessa forma,
Dom(P ′ ) e Dom(P ′∗ ) coincidem; isto implica que P ′ é auto-adjunto sobre a classe de
funções quase-periódicas, para alguma fase eiβ . Note que a escolha da fase tem consequências
observáveis, uma vez que P ′ tem auto-valores Z + β/2π, que são os possíveis resultados das
medições do observável P ′ . Assim, cada fase eiβ corresponde a um tipo diferente de extensão
auto-adjunta de P e, portanto, temos uma infinidade delas, que denotamos por Pβ′ ao invés de
P ′ , com domínio (de funções absolutamente contínuas)
! "
Dom(Pβ′ ) = Φ ∈ AC[0, 1] ⊂ L2 (0, 1) | Φ(1) = eiβ Φ(0) . (4.7.14)
para algum β ∈ [0, 2π). Note que, quando β = 0, recuperamos as condições de contorno
periódicas (4.7.6).
Assim, vimos que as condições de contorno sobre as funções no domínio Dom(P ) são tão
∗
fortes que nenhuma condição
. de contorno sobre
/ as funções no domínio Dom(P ) é necessária
para assegurar que Φ(1)Ψ(1) − Φ(0)Ψ(0) = 0. Então, vimos que é possível estender
o conjunto das funções no domínio Dom(P ) para um domínio Dom(Pβ′ ) ⊃ Dom(P ),
.
permitindo condições de contorno mais gerais, de tal forma que a igualdade Φ(1)Ψ(1) −
/
Φ(0)Ψ(0) = 0 seja satisfeita com mesmas condições de contorno sobre as funções no domínio
Dom(Pβ′∗ ). Isto significa que a fase β em (4.7.14) deve ser a mesma para as funções no
domínio Dom(Pβ′ ) e no domínio Dom(Pβ′∗ ). Isto responde como a condição de contorno
(4.7.6) influencia na não auto-adjunção do operador P !
Note que, efetivamente, pela análise acima, nós temos um círculo completo de diferentes
extensões auto-adjuntas, Pβ′ , cada uma vindo precisamente da imposição de uma condição de
215
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
contorno quase-periódica da forma Φ(1) = eiβ Φ(0), escolhendo-se um β ∈ [0, 2π). Além
disso, de acordo com as Proposições 4.16 e 4.21, segue que
Por sua vez, cada operador Pβ′ é estendido por P ∗ . As extensões do operador momentum P
no intervalo [0, 1] estão representadas na figura abaixo:
P∗
Pβ′
O operador Pβ′ discutido acima não é essencialmente auto-adjunto, porque, para cada valor
do parâmetro β utilizado para definir Dom(Pβ′ ∗ ) obtemos uma extensão auto-adjunta diferente.
Assim, P possui infinitas extensões que são auto-adjuntas, porém, de acordo com a Proposição
4.17, cada uma delas não possui nenhuma extensão própria que seja auto-adjunta. Isto significa
que os resultados físicos que obtemos para diferentes valores de β são diferentes. Em outras
palavras, diferentes extensões auto-adjuntas nos dão resultados físicos diferentes. Ao invés de
ser um problema, isso faz com que a estrutura da mecânica quântica seja muita mais rica em
possibilidades. A escolha de qual dessas extensões é a mais apropriada para o sistema sob
investigação não pertence ao domínio da matemática, mas ao domínio da física!
Exemplo 4.12 (Segundo Caso – O Semi-Eixo R+ ). Esta situação descreve uma partícula
confinada à semi-reta (0, ∞) por uma barreira de potencial infinitamente alta em x = 0.
Neste caso, vamos tomar o operador momentum P em L2 (R+ ) com o domínio Dom(P ) =
S (R+ ) ⊂ L2 (R+ ), em que S (R+ ) é o espaço de todas as funções que vão a zero, juntamente
com todas as suas derivadas, mais rápido do que qualquer potência inversa de |x|, quando
x → ∞, isto é,21 5 β 5
5 5
α 5 d Ψ(x) 5
sup |x| 5 <∞.
x∈R+ dx 5
O espaço S (R+ ) é denso em L2 (R+ ). Com esta escolha, segue que limx→∞ Ψ(x) = 0, para
toda função Ψ ∈ Dom(P ). Como uma segunda condição sobre Dom(P ), vamos assumir
que Ψ(0) = 0, para toda função Ψ ∈ Dom(P ). Portanto, se Φ, Ψ ∈ Dom(P ), então,
$ ∞ , -- $ ∞ ,
# dΨ(x)
# dΦ(x)
⟨Φ, P Ψ⟩ − ⟨P Φ, Ψ⟩ = dx Φ(x) − dx Ψ(x)
0 0 i dx
i dx
$ ( , - )
# ∞ dΨ(x) dΦ(x)
= dx Φ(x) + Ψ(x)
i 0 dx dx
$
# ∞
d . / #. /55∞
= dx Φ(x)Ψ(x) = Φ(x)Ψ(x) 5 = 0 .
i 0 dx i 0
21
Este espaço é também conhecido como espaço de Schwartz. Ele será rigorosamente definido no Capítulo 6.
216
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Em comparação com o caso do intervalo finito, o operador diferencial sobre o semi-eixo não
tem uma extensão simétrica própria. Para mostrar isso vamos usar o fato do espaço S (R+ )
ser fechado sob a operação de multiplicação: se Φ, Ψ ∈ S (R+ ), então, ΦΨ ∈ S (R+ ). Agora,
suponha que P ′ seja uma extensão simétrica de P . Logo, o conjunto Dom(P ′ ) deve conter
pelo menos uma função Φ que é diferente de zero quando x = 0. Mas isto implicaria que
$ ∞ , - $ ∞ , -
′ ′ # dΦ(x) # dΦ(x)
⟨Φ, P Φ⟩ − ⟨P Φ, Φ⟩ = dx Φ(x) − dx Φ(x)
0 i dx 0 i dx
$ ( , - )
# ∞ dΦ(x) dΦ(x)
= dx Φ(x) + Φ(x)
i 0 dx dx
$ ∞
# d . /
= dx Φ(x)Φ(x)
i 0 dx
#. /55∞
= Φ(x)Φ(x) 5 = |Φ(0)|2 ̸= 0 ,
i 0
Assim, o conjunto Dom(P ) é definido por esta única exigência e não é difícil mostrar que P
é auto-adjunto.
217
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
acordo com a Proposição 4.18, a menor extensão fechada A∗∗ de A deve estar contida em A∗ .
Consequentemente, para operadores simétricos, temos que A ⊂ A∗∗ ⊂ A∗ , para operadores si-
métricos fechados, A = A∗∗ ⊂ A∗ e para operadores auto-adjuntos, A = A∗∗ = A∗ . Por causa
disso, ao estudarmos o problema da extensão auto-adjunta de um operador simétrico podemos
nos concentrar, sem perder a generalidade, na análise das extensões de operadores simétricos
fechados, já que todo operador simétrico densamente definido tem um fecho, e o operador e seu
fecho têm as mesmas extensões. Nesta seção, estudamos o problema da existência de extensões
auto-adjunta de um operador simétrico.
1. A é auto-adjunto;
3. Ran(A ± i1I) = H .
Demonstração. De fato, este teorema é uma versão particular do Corolário 4.5. Vamos começar
mostrando que (1) =⇒ (2). Assuma que A é auto-adjunto. Uma vez que o operador A∗ é
sempre fechado e A = A∗ , então A é fechado. A seguir, tome um vetor x ∈ Dom(A∗ ) =
Dom(A), tal que A∗ x = ix. Então, x ∈ Ker(A∗ − i1I) e como A é auto-adjunto segue que
Ax = ix. Assim,
(2) =⇒ (3). Primeiro, devemos observar que Dom(A ± i1I) = Dom(A). Agora, assuma
que A é fechado e que Ker(A∗ ∓ i1I) = {0}; então, pelo Teorema 4.18, Ker(A∗ ∓ i1I) =
Ran(A ± i1I)⊥ . Assim, Ran(A ± i1I) são densos em H , pela Proposição 3.14; ou seja
Ran(A ± i1I) = H . Agora, basta mostrar que os conjuntos Ran(A ± i1I) são fechados.
Para isto, considere as sequências (xn )n∈N e (yn )n∈N no Dom(A). Como A é fechado, as
sequências (xn )n∈N e (yn )n∈N devem convergir para um x e um y no Dom(A), enquanto que
as a sequências de imagens (Axn )n∈N e (Ayn )n∈N devem convergir para w1 = Ax e w2 = Ay
no Ran(A). Obviamente, ixn → ix e −ixn → −ix. Agora, assuma que (A + i1I)xn → z1 e
que (A − i1I)yn → z2 . Logo,
218
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
e
(A − i1I)yn = Ayn − ixn → z2 = w2 − iy = (A − i1I)y .
Isto prova que z1 ∈ Ran(A + i1I) e z2 ∈ Ran(A − i1I) e que os conjuntos Ran(A + i1I)
e Ran(A − i1I) são fechados; ou seja, Ran(A ± i1I) = Ran(A ± i1I) = H .
(3) =⇒ (1). Isto é apenas uma reafirmação do Corolário 4.5 de que A é auto-adjunto se
Ran(A + i1I) = Ran(A − i1I) = H .
1. A é auto-adjunto;
2. V é unitária;
3. Dom(V ) = H = Ran(V );
1. A é essencialmente auto-adjunto;
Demonstração. (1) =⇒ (2). Assuma que A é essencialmente auto-adjunto, de modo que seu
N é auto-adjunto. Então, pela Proposição 4.18, segue que A∗ = (A)
fecho A N∗=A
N e assim
N + i1I) = {0} ,
Ran(A − i1I)⊥ = Ker(A∗ + i1I) = Ker(A
uma vez que, pelo Teorema 5.4, o espectro de A está contido no conjunto R. A mesma análise
se aplica ao conjunto Ran(A + i1I).
(2) =⇒ (3). Assuma que Ker(A∗ ∓ i1I) = {0}. Então, pelo Teorema 4.18, Ker(A∗ ∓ i1I) =
Ran(A ± i1I)⊥ . Logo, Ran(A ± i1I) são densos em H , pela Proposição 3.14.
(3) =⇒ (1). Assuma que Ran(A + i1I) é denso em H ; logo, Ran(A + i1I) = H .
Então, pela definição de conjunto denso, para todo y = (A + i1I)x ∈ H , com x ∈ Dom(A),
existe uma sequência yn = (A + 1I)xn em Ran(A + i1I), para alguma sequência (xn )n∈N no
Dom(A), que converge para y. Isto implica que
Axn = yn − ixn → y − ix .
219
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Demonstração. De acordo com o Teorema 4.26 temos que mostrar que os conjuntos Ran(A ±
i1I) são densos em H . Sejam x1 , x2 , . . . os auto-vetores de A em Dom(A), com xj associado
ao auto-valor λj ; portanto, Axj = λj xj . Uma vez que A é assumido ser simétrico, então, todo
λj é real (veja a Proposição 5.3). De acordo com a Definição 3.11a, na página 115, um sistema
ortonormal {xj }j∈I em H é completo se todo x ∈ H tem uma única representação
<
x= αj xj ,
j∈I
em que C ∋ αj = ⟨xj , x⟩. Assuma que I = N.22 Defina uma sequência (yn )n∈N ⊂ Dom(A)
tal que
<n
αj
yn = xj .
λ +1
j=1 j
o que implica que Ran(A + i1I) é denso em H . Da mesma forma, mostra-se que o conjunto
Ran(A − i1I) é denso em H .
Os Teoremas 4.25 e 4.26 estabeleceram os critérios básicos que devem ser satisfeitos por um
operador para que ele seja auto-adjunto. Mas isto não nos dá informações suficientes para
responder a seguinte questão fundamental: quando um operador simétrico tem uma extensão
22
Naturalmente, o teorema permanecerá verdadeiro para um sistema ortonormal finito!
220
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
auto-adjunta? Para tratar com esta questão recorremos aos conceitos, introduzidos por von
Neumann, de espaços de deficiência e índices de deficiência de um operador simétrico. A
ideia é a seguinte, pelos Teoremas 4.25 e 4.26, um operador simétrico A é auto-adjunto se
Ran(A ± i1I) = H ou essencialmente auto-adjunto se os subespaços Ran(A ± i1I) são
densos em H , respectivamente. Sendo assim, isto nos dá uma indicação que os complementos
ortogonais Ran(A ± i1I)⊥ dos espaços Ran(A ± i1I) podem, de certa forma, indicar em que
medida um operador simétrico A não pode ser auto-adjunto. Com base nisso, iniciamos com a
seguinte
DEFINIÇÃO 4.28. Seja A um operador simétrico sobre um espaço de Hilbert H . Defina
Deve-se enfatizar que é possível que os índices de deficiência sejam qualquer par de número
de inteiros não-negativos e, além disso, é possível que m ou n (ou ambos) sejam iguais a
infinito.
Além disso, temos que Kλ = Ker(A∗ − λ1I) e Kλ = Ker(A∗ − λ1I), respectivamente, pelo
Teorema 4.18. Isto nos leva à seguinte
PROPOSIÇÃO 4.25. Os espaços de deficiência Kλ e Kλ são os espaços das soluções linearmente
independentes do operador A∗ associados aos auto-valores λ e λ, respectivamente.
⟨y, (A − λ1I)x⟩ = 0 ,
Isto implica que ⟨y, (A−λ1I)x⟩ = 0, isto é, y ∈ Kλ . A análise para o espaço Kλ é análoga.
TEOREMA 4.28 (Primeira fórmula de von Neumann). Seja A um operador simétrico fechado,
então os subespaços Dom(A), Kλ e Kλ são linearmente independentes e
221
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Resta provar a Eq.(4.8.1). Uma vez que Dom(A) ⊂ Dom(A∗ ) e as inclusões Ker(A∗ −
λ1I) ⊂ Dom(A∗ ) e Ker(A∗ − λ1I)) ⊂ Dom(A∗ ) são óbvias, segue que
Dom(A) ⊕ Kλ ⊕ Kλ ⊂ Dom(A∗ ) .
Temos, agora, de provar a inclusão inversa. Para isto, usando o mesmo raciocínio usado no
Teorema 4.25 para provar que os conjuntos Ran(A + i1I) e Ran(A − i1I) são fechados,
mostra-se que os conjuntos Ran(A − λ1I) e Ran(A − λ1I) são fechados. Por outro lado,
como Ran(A − λ1I)⊥ = Ker(A∗ − λ1I) e Ran(A − λ1I)⊥ = Ker(A∗ − λ1I), então,
por exemplo, qualquer vetor v ∈ H pode ser escrito como a soma v = v1 + v2 , em que
v1 ∈ Ran(A − λ1I) e v2 ∈ Ran(A − λ1I)⊥ , já que
H = Ran(A − λ1I) ⊕ Ran(A − λ1I)⊥ .
Então, assuma que, v = (A∗ −λ1I)w, para w ∈ Dom(A∗ ). Uma vez que v1 ∈ Ran(A−λ1I),
segue que v1 = (A − λ1I)x, para x ∈ Dom(A). Também assuma que v2 = (λ − λ)y, para
y ∈ Ran(A − λ1I)⊥ = Ker(A∗ − λ1I) = Kλ . Portanto, segue que
(A∗ − λ1I)w = (A − λ1I)x + (λ − λ)y
222
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
(A∗ − λ1I)(w − x − y) = 0 ,
ou seja, o vetor (w − x − y) ∈ Ker(A∗ − λ1I) = Kλ . Defina esse vetor com sendo z; logo,
w = x + y + z. Isto prova a inclusão inversa e que todo vetor w ∈ Dom(A∗ ) pode ser escrito
como uma combinação única do tipo w = x + y + z, com x ∈ Dom(A), y ∈ Kλ e z ∈ Kλ .
Aém disso, é imediato ver que
A∗ w = A∗ (x + y + z) = Ax + λy + λz .
Note que, pelo Teorema 4.28, se assumirmos que A = A∗ , então se x ∈ Ker(A∗ − λ1I), com
Im λ ̸= 0, segue que A∗ x = λx e isto implica que ⟨A∗ x, x⟩ = ⟨Ax, x⟩ = ⟨x, Ax⟩ = λ∥x∥2 .
Como, pela Proposição 5.3, ⟨x, Ax⟩ é real, nesse caso ∥x∥ = 0; ou seja, Ker(A∗ − λ1I) = {0}.
Portanto, m = dim Kλ = 0. Raciocínio análogo mostra que Ker(A∗ − λ1I) = {0} e isto
implica que n = dim Kλ = 0. Assim, os índices de deficiência de A são (0, 0).
Por outro lado, assuma que A é simétrico fechado e que seus índices de deficiência sejam
(0, 0). Uma vez que m = dim Kλ = 0 e n = dim Kλ = 0, então Ran(A − λ1I) =
Ran(A − λ1I) = H . Assim, para todo x1 , x2 ∈ Dom(A∗ ) podemos encontrar vetores
y1 , y2 ∈ Dom(A) tais que
Nesse caso, (y1 − x1 ) ∈ Ker(A∗ − λ1I) = {0} e (y2 − x2 ) ∈ Ker(A∗ − λ1I) = {0}, já que
m = dim Kλ = 0 e n = dim Kλ = 0. Consequentemente, y1 = x1 ∈ Dom(A) e y2 =
x2 ∈ Dom(A). Isto prova que Dom(A∗ ) ⊂ Dom(A); assim, Dom(A∗ ) = Dom(A) e
A = A∗ .
Neste ponto, queremos responder as seguintes questões fundamentais: (i) quando opera-
dores simétricos têm extensões auto-adjuntas e (ii) como essas extensões, quando existirem,
podem ser caracterizadas? Estas questões podem ser respondidas observando-se que o estudo
223
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
de operadores simétricos pode ser reduzido ao estudo das isometrias. Em outras palavras,
vamos mostrar que a questão sobre as extensões simétricas de operadores simétricos fechados
pode ser reduzida à questão sobre as extensões isométricas de suas transformadas de Caley, o
que define uma correspondência entre as respectivas extensões. Isto vai nos permitir caracteri-
zar completamente todas as extensões simétricas fechadas de um operador simétrico fechado.
Começamos com o seguinte
VNz = V ′ z , ∀z ∈ M .
224
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Dom(A′ )
+
A′ − λ Dom(A) A′ − λ
A−λ A−λ
Dom(V ) Ran(V )
V
+
+
Dom(V ′ ) Ran(V ′ )
′
V
V
VN
TEOREMA 4.30 (Segunda fórmula de von Neumann). Sejam M e N como definidos acima.
Então, toda extensão simétrica fechada A′ de um dado operador simétrico fechado A é determi-
nada por um certo operador isométrico VN cujo domínio de definição é M ⊂ Kλ e cujo conjunto
imagem é N ⊂ Kλ . O conjunto Dom(A′ ) consiste de todos os vetores
x′ = x + VNz+ − z+ ,
A′ x′ = Ax + λVNz+ − λz+ .
Kλ′ = Kλ − M e Kλ′ = Kλ − N ,
respectivamente.
VNz = V ′ z , ∀z ∈ M .
225
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
V ′ z = V ′ (z0 + z+ ) = V z0 + VNz+ .
De acordo com o Teorema 4.29, o conjunto Dom(A′ ) consiste de todos os vetores da forma
x′ = V ′ z − z = V ′ (z0 + z+ ) − (z0 + z+ )
= V z0 + VNz+ − (z0 + z+ )
= V z0 − z0 + VNz+ − z+ .
Mas, pelo Teorema 4.21, o conjunto Ran(V − 1I) formado por todos os vetores x = V z0 − z0 ,
com z0 ∈ Dom(V ), coincide com o conjunto Dom(A). Portanto, o conjunto Dom(A′ )
consiste de todos os vetores
segue que
A′ x′ = Ax + λVNz+ − λz+ .
e como Dom(A) ⊂ Dom(A′ ), a igualdade entre os conjuntos acima implica que devemos
ter
Kλ′ ⊕ Kλ′ ⊂ Kλ ⊕ Kλ .
Em particular, isso implica que os espaços de deficiência do operador A′ são
Kλ′ = Kλ − M e Kλ′ = Kλ − N ,
m′ = m − q e n′ = n − q ,
226
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Com base nos conceitos de espaços de deficiência e índices de deficiência, o Teorema 4.25
pode ser refraseado da seguinte forma:
TEOREMA 4.32 (Versão II do critério fundamental para a auto-adjunção). Um operador
simétrico fechado, A, é auto-adjunto se, e somente se, seus dois espaços de deficiência são cons-
tituídos apenas pelo vetor nulo do espaço H , ou seja, se seus índices de deficiência são (0, 0).
COROLÁRIO 4.7. Um operador simétrico, A, é essencialmente auto-adjunto se, e somente se, seus
dois espaços de deficiência são constituídos apenas pelo vetor nulo do espaço H , ou seja, se seus
índices de deficiência são (0, 0).
O próximo resultado nos fornece um critério útil e simples para um operador simétrico ter
extensões auto-adjuntas.
23
Em certos textos anteriores à 1960, o que chamamos de auto-adjunto era chamado simétrico hipermaximal,
um termo que foi cunhado por J. von Neumann.
227
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Demonstração. Por hipótese, temos que C[Dom(A)] ⊂ Dom(A), uma vez que C : Dom(A) →
Dom(A). Além disso, já que C 2 = 1I, segue que
8 9
Dom(A) = C 2 [Dom(A)] = C C[Dom(A)] ⊂ C[Dom(A)] .
O formalismo até agora descrito tem-se revelado bastante abstrato. Vamos, então, ilustrar, em
exemplos, como funciona na prática essa teoria revisitando os casos já estudados, na Seção 4.7,
sobre os operadores posição e momentum na mecânica quântica. Comecemos com o Exemplo
4.10. Lá o operador posição Xj foi definido pela Eq.(4.7.3) com domínio de definição
3 4
Dom(Xj ) = Ψ ∈ L2 (Rn ) | xj Ψ(x1 , . . . , xn ) ∈ L2 (Rn ) .
Para tornar as coisas compatíveis com os Teoremas 4.25 e 4.26, vamos tomar λ = i. Assim,
de acordo com a Proposição 4.25, os espaços de deficiência Ki e K−i são os espaços das
soluções linearmente independentes do operador Xj∗ que pertencem aos auto-valores −i e i,
respectivamente. Logo, as equações
têm as formas
Suas soluções são Ψ ≡ 0. Consequentemente, Ki = {0} e K−i = {0}, isto é, seus índices de
deficiência são (0, 0). Logo, Xj é auto-adjunto.
Passemos para o operador momentum. Vamos mostrar como a maquinaria desta seção nos
leva aos mesmos resultados encontrados nos Exemplos 4.11, 4.12 e 4.13. Considere o espaço
24
Tomamos o conjugado complexo do produto interno apenas por conveniência técnica!
228
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Hilbert L2 (a, b). No subespaço das funções absolutamente contínuas, defina o operador P ,
como antes, por
dΨ(x)
P Ψ(x) = −i# .
dx
A integração por partes mostrou que P é simétrico. No caso do Exemplo 4.11, em que 0 #
x # 1, impusemos a condição de contorno de Dirichlet, Ψ(0) = Ψ(1) = 0. Além disso,
mostramos que o adjunto P ∗ , com P ∗ = −i#d/dx, tem como domínio o conjunto das funções
absolutamente contínuas Ψ que satisfazem a condição −i#dΨ/dx ∈ L2 (0, 1), sem precisar
satisfazer a condição de fronteira Ψ(0) = Ψ(1) = 0. Vimos que P é também fechado.
A seguir, veremos que toda extensão P ′ de P representa uma modificação das condições de
contorno, ampliando o conjunto Dom(P ) e reduzindo o conjunto Dom(P ∗ ), até que os dois
domínios coincidam. Considere as equações
. ∗ / . /
P − i1I Ψ(x) = 0 , P ∗ + i1I Ψ(x) = 0 ,
ou seja,
dΨ(x) dΨ(x)
−i# = iΨ(x) , −i# = −iΨ(x) ,
dx dx
que têm como soluções
−1 x −1 x
Ψ1 (x) = C e−# ∈ K−i , Ψ2 (x) = C e# ∈ Ki ,
−1 −1
Isto implica que κ = e−# . Portanto, se definirmos κ = βe−# com |β| = 1, existirá uma
extensão Pβ′ de P para cada valor β, com domínio
3 6 −1 −1
7 4
Dom(Pβ′ ) = Φ(x) = Ψ(x) + α βC e# (x−1) − C e−# x | Ψ ∈ Dom(P ), β ∈ C ,
Para todas as funções Φ, Ψ ∈ Dom(Pβ′ ), uma integração por partes nos fornece a seguinte
relação:
#. /
⟨Φ, Pβ′ Ψ⟩ − ⟨Pβ′ Φ, Ψ⟩ = Φ(1)Ψ(1) − Φ(0)Ψ(0) . (4.8.3)
i
229
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Mas, como toda extensão Pβ′ é um operador simétrico, o lado direito da equação acima deve
satisfazer a relação
. /
Φ(1)Ψ(1) − Φ(0)Ψ(0) = 0 . (4.8.4)
Uma vez que a relação (4.8.5) é satisfeita, naturalmente, para Φ = Ψβ , devemos ter |γ(β)| = 1.
Isto implica que γ(β) = eiξ(β) , com ξ(β) ∈ [0, 2π) (os valores de ξ podem ser determinados
pelos valores de β). Assim, toda função Φ ∈ Dom(Pβ′ ) deve satisfazer a condição (mais fraca)
dΨ(x) 6 −1 −1
7
= −i# − i#α βC e# (x−1) − C e−# x ,
dx
de forma que
dΦ(x) d
Pβ′ Φ(x) = −i# =⇒ Pβ′ = −i# .
dx dx
Ou seja, as extensões Pβ′ têm a mesma ação do operador P , mas com domínio dado por
# %
dΦ(x)
Dom(Pβ′ ) = Φ ∈ AC[0, 1] ⊂ L2 (0, 1) | Φ(1) = e iξ(β)
Φ(0) , ∈ L2 (0, 1) ,
dx
ou seja,
dΦ(x)
−i#− iΦ(x) = 0
dx
6 −1 −1
7 6 −1 −1
7
−i#α βC e# (x−1) − C e−# x − iα βC e# (x−1) − C e−# x = 0 ,
230
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Vejamos os casos restantes. Considere o Exemplo 4.13 primeiro. Neste caso, para −∞ <
x < ∞, as funções Ψ1 e Ψ2 pertencem a L2 (−∞, ∞) somente se C = 0, ou seja, se
Ψ1 = Ψ2 ≡ 0. Consequentemente, Ki = {0} e K−i = {0}, isto é, os índices de deficiência
são (0, 0). Logo, P é auto-adjunto (e maximalmente simétrico). Por outro lado, no caso do
Exemplo 4.12, para 0 # x < ∞, segue que Ψ1 ∈ L2 (0, ∞), enquanto que Ψ2 ∈ / L2 (0, ∞).
Portanto, neste caso, os índices de deficiência são (0, 1). Assim, P é maximalmente simétrico
e não tem qualquer extensão auto-adjunta.
Para operadores simétricos positivos, pode-se construir uma extensão auto-adjunta "menor",
DEFINIÇÃO 4.29. Diz-se que um operador A é não-negativo (ou é positivo) – denotado por
A " 0 – se, se somente se, ⟨x, Ax⟩ " 0 para todo x ∈ Dom(A). Diz-se que A majora B
– denotado por A " B – se, e somente se, ⟨x, (A − B)x⟩ " 0 para todo x ∈ Dom(A) ∩
Dom(B).
DEFINIÇÃO 4.30. Um operador linear A : Dom(A) ⊂ H → H é limitado inferiormente
se, e somente se, existe um número γ ∈ R tal que A − γ1I é um operador positivo, isto é, se
⟨x, Ax⟩ " γ∥x∥2 , para todo x ∈ Dom(A). O maior número γ com esta propriedade é o limite
inferior de A.
231
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
A = B + γ1I ou A = −B + γ1I .
Este produto escalar e esta norma satisfazem as propriedades usuais do produto escalar e da
norma (verifique!). Em particular, ∥|x|∥ = 0 se, e somente se, x é o vetor nulo. Note que,
∥|x|∥2 = ⟨⟨x, x⟩⟩ = ⟨x, Ax⟩ " ⟨x, x⟩ = ∥x∥2 =⇒ ∥|x|∥ " ∥x∥ .
232
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
O domínio Dom(A) com o novo produto escalar satisfaz todos os axiomas para um espaço de
Hilbert,25 exceto talvez o axioma da completeza. No entanto, como sabemos, podemos sempre
completá-lo adicionando certos elementos ideais, x∗ , obtidos por certas sequências de Cauchy
(xn )n∈N ⊂ Dom(A) que não tem como limite um elemento em Dom(A). Por conveniência
do leitor, repetimos brevemente este procedimento: seja (xn )n∈N uma sequência de Cauchy em
Dom(A), isto é, ∥xm − xn ∥ → 0 quando m, n → ∞. Se em Dom(A) existe um elemento
x∗ para o qual limn→∞ ∥xn − x∗ ∥ = 0, então, x∗ é o limite (determinado univocamente de
acordo com a Proposição 1.15) da sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A). Se não existe tal elemento
x∗ ∈ Dom(A), então, associamos à esta sequência de Cauchy um elemento ideal x∗ , de forma
que este elemento é o limite de uma sequência de Cauchy equivalente. Lembramos que duas
sequências (xn )n∈N e (x′n )n∈N são ditas equivalentes com respeito a nova norma∥| · |∥ se
lim ∥|xn − x∗ |∥ = 0 .
n→∞
lim ∥xn − x∥ = 0 ,
n→∞
25
Este espaço de Hilbert não é necessariamente separável, mas, isto não é importante aqui.
233
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
No caso geral, se a sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A) é de Cauchy segundo a nova norma
∥| · |∥, com elemento limite x∗ ∈ H ′ , isto é, limn→∞ ∥|xn − x∗ |∥ = 0, e se x ∈ H0 é o
correspondente elemento associado a x∗ , então, para todo x′ ∈ Dom(A), segue que
Dom(A) ⊂ H0 ⊂ H ,
234
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
⟨y, Bx′ ⟩ = ⟨⟨By, Bx′ ⟩⟩ = ⟨⟨Bx′ , By⟩⟩ = ⟨x′ , By⟩ = ⟨By, x′⟩ ,
é possível para todo y ∈ Dom(A) somente se BAx = x. Isto mostra que x pertence ao
domínio de A N e que AxN = Ax. Assim, provamos que Dom(A) ⊂ Dom(A) N e que Ax
N = Ax
para todo x ∈ Dom(A). Portanto, A N é uma extensão de A. Além disso, como B é simétrico e
limitado, tendo todo o espaço de Hilbert H como domínio, ele é auto-adjunto pelo Teorema de
N = B −1 é simétrico e Ran(B −1 ) = H ,
Hellinger-Toeplitz (Teorema 4.14). Além disso, como A
pelo Teorema 4.20 segue que B −1 também é auto-adjunto.
N = ⟨Ax,
⟨x, Ax⟩ N x⟩ = ⟨y, By⟩ = ⟨⟨By, By⟩⟩
235
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Demonstração do Teorema 4.34. Precisamos tratar somente o caso quando γ # 0. Isto implica
que A + γ1I " 0. Defina B = A + (1 + γ)1I em Dom(A). Então,
Então,
⟨y, (A + B)x⟩ = ⟨y, Ax⟩ + ⟨y, Bx⟩ = ⟨y, Ax⟩ + ⟨By, x⟩ = ⟨z, x⟩ .
Logo, segue que ⟨y, Ax⟩ = ⟨z − By, x⟩, para todo x ∈ Dom(A). Pela definição de operador
adjunto, uma vez que z − By ∈ H , então y ∈ Dom(A∗ ) = Dom(A) e A∗ y = z − By.
Assim, a propriedade de ser auto-adjunto é estável sob a soma de um operador auto-adjunto
limitado B e um operador auto-adjunto A (não necessariamente limitado). No entanto, em
muitas situações encontradas na mecânica quântica considera-se a soma de um operador auto-
adjunto A e um operador ilimitado B. Mesmo que separadamente A e B sejam auto-adjuntos,
o operador soma A + B, em geral, não será necessariamente auto-adjunto (será só simétrico).
Portanto, é importante conhecer os critérios que implicam a auto-adjunção da soma A+B. Esta
seção é dedicada a este assunto. A princípio poderíamos, em determinadas situações, pensar em
considerar B como uma “perturbação” de A; isso significa que, em um certo sentido, B deve
ser pequeno em comparação com A. Mas isto, levanta a seguinte questão: em que condições
a auto-adjunção é preservada sob uma “pequena” perturbação? Em outras palavras, sob qual
236
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Neste caso, B é chamado A-limitado. O maior limite inferior dos números a satisfazendo (4.9.1),
para algum b, é chamado o limite relativo de B em relação a A. Se o limite relativo é zero, B
é dito infinitesimalmente pequeno em relação a A.
Geralmente, na Definição 4.31, b deve ser escolhido tanto maior, quanto menor for a. Isto
significa que, podemos aumentar b se diminuirmos a, mas não podemos tomar a = 0 para
qualquer b finito, a menos que B seja um operador limitado (neste caso b = ∥B∥). Por esse
motivo, escrevemos b = b(a).
LEMA 4.6. A seguinte desigualdade é equivalente à desigualdade (4.9.1):
237
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Nota 4.31. Para verificar (4.9.1) ou (4.9.2), basta fazê-lo para todo vetor x que pertence a um core
de A!
LEMA 4.7. Sejam A e B dois operadores lineares densamente definidos em um espaço de Hilbert
H . Se A é um operador auto-adjunto e B é um operador simétrico, tal que Dom(A) ⊂
Dom(B), então, B é A-limitado.
Demonstração. Uma vez que o operador A é auto-adjunto, ele é também fechado. Logo, segue
da Nota 4.20, na página 172, que Dom(A) é um espaço de Hilbert segundo a norma do gráfico
6 71/2
∥(x, Ax)∥H ×H = ∥x∥2H + ∥Ax∥2H .
A razão pela qual operadores relativamente limitados são tão importantes se deve ao cele-
brado
238
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Consequentemente,
1
∥Ax∥ # ∥(A + iβ1I)x∥ e ∥x∥ # ∥(A + iβ1I)x∥ .
|β|
. /−1
Agora, observe que, o operador resolvente de A em β é Rβ (A) = A + iβ1I . Uma vez
que A é auto-adjunto, segue, do Teorema 4.25, que Ran(A + iβ1I) = H . Como o conjunto
Ran(A + iβ1I), que é o domínio de Rβ (A), é denso em H , então, Ker(A + iβ1I) = {0}.
Lembre-se que
3 4
Ker(A + iβ1I) = x ∈ Dom(A) | (A + iβ1I)x = 0 .
Neste caso, como Ker(A + iβ1I) = {0}, isto implica que −iβ não é um auto-valor de A. Logo,
. / . /−1
−iβ ∈ ρ(A) e A+iβ1I admite um inverso. Assim, tomando x = A+iβ1I y ∈ Dom(A)
para algum y ∈ H e inserindo esse x em (4.9.3), obtemos
, -
−1 b
∥B(A + iβ1I) y∥ # a + ∥y∥ , y ∈ H . (4.9.4)
|β|
Note que, se tomarmos um |β| = |β0 | > b/(1 − a), então a + b/|β0 | < 1. Dessa forma,
def. . /−1
∥B(A + iβ0 1I)−1 ∥ < 1. Assim, C = B A + iβ0 1I é um operador limitado com ∥C∥ < 1
e, portanto, o operador 1I +;
C tem inverso, com o operador inverso sendo obtido pela série
de Neumann (1I + C)−1 = ∞ n
n=0 (−C) . Isto significa, em particular, que o operador 1I + C
tem como conjunto imagem todo H , isto é Ran(1I + C) = H . Além disso, para qualquer
x ∈ Dom(A) temos
. /
(A + B + iβ0 1I)x = 1I + B(A + iβ0 1I)−1 (A + iβ0 1I)x .
No lado direito da equação acima temos a composição de dois operadores sobrejetivos; portanto,
(A + B + iβ0 1I) é sobrejetivo também. Isto implica que, Ran(A + B + iβ0 1I) = H .
Usando o mesmo argumento, mostra-se que (A + B − iβ0 1I) também é sobrejetivo, isto é,
Ran(A + B − iβ0 1I) = H . Portanto, pelo Teorema 4.25, temos que A + B é auto-adjunto.
239
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
240
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
ou que
∥(A + t)x∥ " (M + t)∥x∥ , ∀x ∈ Dom(A) .
. /−1
Assim, para x = A + t1I y ∈ Dom(A), segue que
Consequentemente, temos
1
∥(A + t1I)−1 y∥ # ∥y∥ ,
M +t
e
# %
−1 2t2 + 2tM
∥A(A + t1I) y∥ # 1 − ∥y∥2
(M + t)2
⎧
⎨∥y∥2 se t2 + 2tM " 0
# ,
⎩ M 2 ∥y∥2 se t2
+ 2tM < 0
(M +t)2
ambas relações valendo para algum y ∈ H . Combinando estes resultados com (4.9.1), obtemos
? ? ? ?
∥B(A + t1I)−1 y∥ # a?A(A + t1I)−1 y ? + b?(A + t1I)−1 y ?
⎧. /
⎨ a + Mb+t ∥y∥2 se t2 + 2tM " 0
# . .
⎩ aM + b / ∥y∥2 se t 2
+ 2tM < 0
M +t M +t
? ?
Dessa relação podemos concluir que ?B(A + t1I)−1 ? < 1 se
b
M− > −t para t2 + 2tM " 0 ,
1−a
ou
M − (aM + b) > −t para t2 + 2tM < 0 .
Portanto, 1I + C é invertível se
# %
b
−t < M − max , aM + b .
1−a
Para tal t, Ran(A + B + t1I) = H e (A + B + t1I)x = (1I + C)(A + t1I)x, para todo
x ∈ Dom(A); isto implica que −t ∈ ρ(A + B).
241
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
242
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
= ⟨z, (A + tB + B − B + iβ1I)xt ⟩
243
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
Consequentemente, (1−t)∥Bxt ∥ e, portanto, ∥yy ∥ são limitados para 0 < t < 1. Para finalizar,
tome um vetor w ∈ Dom(A). Então,
Como Dom(A) é denso em H , o limite acima vale para todo w ∈ H . Pela Propriedade 1 do
Lema 3.2, necessariamente devemos ter yt − z = 0 para todo w ∈ H , quando t → 1− . Mas,
então, ⟨z, z⟩ = limt→1− ⟨yt , z⟩ = 0, já que yt ⊥ z. Logo, z = 0. Desse modo, provamos que
Ran(A + B + iβ1I) é denso em H . Usando a mesma linha de raciocínio acima, mostra-se
que (A + B − iβ0 1I) também é denso em H . Portanto, pelo Teorema 4.26, temos que A + B
é essencialmente auto-adjunto.
O método de Kato tratou o caso em que dois operadores A e B têm um domínio comum
no qual a soma A + B é bem definida e auto-adjunta. Um processo alternativo para o estudo
de perturbações relativamente limitadas de operadores auto-adjuntos baseia-se no conceito de
formas quadráticas, uma ferramenta poderosa e muito utilizada na construção de operadores
auto-adjuntos, em particular em situações em que a estratégia natural falha (por exemplo, para
a adição de operadores lineares via o método de Kato), mas ainda é possível adicionar as
formas quadráticas correspondentes. Nesta subseção, desenvolvemos a teoria de perturbação
de operadores lineares deste ponto de vista. Nosso objetivo é mostrar que sob condições
adequadas, a forma-soma quadrática de A e B dará origem a um operador auto-adjunto via a
extensão de Friedrichs. Iremos denotar a forma-soma por A+̇B quando quisermos enfatizar o
caráter da forma-soma, caso contrário, escreveremos A + B. Normalmente, na teoria quântica,
a construção da forma-soma é usada na teoria dos operadores de Schrödinger e Dirac nos
casos em que o potencial V tem uma singularidade local muito forte que impede que V seja
localmente de quadrado integrável.
DEFINIÇÃO 4.32. Seja H um espaço de Hilbert complexo com produto interno. Uma forma
quadrática q com domínio forma Quad(q) = D, em que D é um subespaço linear de H é
um mapeamento q : D × D → C que é anti-linear no primeiro argumento e linear no segundo
argumento. Uma forma quadrática q em H é chamada
(a) simétrica se, e somente se, q(x, y) = q(y, x) para todo x, y ∈ Quad(q);
(b) densamente definida se, e somente se, seu domínio forma Quad(q) é denso em H ;
(c) semi-limitada (inferiormente) se, e somente se, houver um γ ∈ R tal que para todo
x ∈ Quad(q)
244
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
(e) contínua se, e somente se, houver uma constante C tal que
Nota 4.33. Em vários textos, exceto pelo item (c), o termo usado na definição acima é forma
sesquilinear. O termo forma quadrática é usado somente para o item (c). Neste caso, muitas
vezes se escreve q(x) = q(x, x) para enfatizar isto. No entanto, vários autores não fazem
distinção entre formas sesquilineares e formas quadráticas e chamam indiferentemente uma
forma quadrática ambas as funções q(·, ·) e q(·). Estamos adotando esta prática.
Com base na Definição 4.32, introduzimos vários outros conceitos importantes: (i) podemos
associar um produto escalar
e norma-forma
H
∥|x|∥q = q(x, x) + (1 − γ)∥x∥2 . (4.9.7)
O produto escalar ⟨ · , · ⟩q garante que sequências que são de Cauchy em relação a este produto
escalar, também são de Cauchy em relação ao nosso produto escalar original, já que a norma-
forma (4.9.7) satisfaz ∥|x|∥q " ∥x∥. Chamaremos q fechável se para cada sequência de Cauchy
(xn )n∈N ⊂ Quad(q) com respeito à norma ∥| · |∥q , ∥|xn |∥q → 0 implica que ∥xn ∥ → 0.
Neste caso, temos Hq ⊂ H , em que Hq é o completamento de Quad(q) com respeito
à norma ∥| · |∥q . Então, segue que Quad(q) ⊂ Hq ⊂ H . Chamamos a extensão de q
para Hq o fecho de q. Em particular, uma forma quadrática q limitada inferiormente, com
limite inferior γ é chamada fechada se, e somente se, o domínio forma Quad(q) é completo
quando for equipado com a norma-forma (4.9.7), isto é, se Quad(q) = Hq . (ii) Uma forma
quadrática q 1 com domínio Quad(q 1 ) é chamada de extensão de uma forma quadrática q
com domínio Quad(q) se, e somente se, Quad(q) ⊂ Quad(q 1 ) e q 1 (x, y) = q(x, y) para
todo x, y ∈ Quad(q). (iii) Uma forma quadrática é chamada de fechável se, e somente se,
tiver uma extensão fechada. (iv) Um subconjunto D ′ ⊂ Quad(q) do domínio de uma forma
quadrática fechada q é chamado de core se, e somente se, D ′ for denso no domínio forma
Quad(q) equipado com a forma norma ∥| · |∥q .
Vamos agora introduzir as formas quadráticas que nos interessam. Suponha que A seja um
operador linear no espaço de Hilbert complexo H com domínio Dom(A). De uma forma
natural, podemos associar com A duas formas quadráticas com o domínio forma sendo o
próprio domínio Dom(A):
245
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
TEOREMA 4.37 (Teorema KLMN). Suponha que A seja auto-adjunto e limitado inferiomente e
que B seja simétrico e A-limitado, com um limite forma < 1. Então,
(i) a soma das formas quadráticas de A e B é uma forma quadrática simétrica fechada em
Quad(A) e limitada inferiormente;
(ii) Existe um único operador auto-adjunto associado a esta forma, que chamamos a forma-
soma de A e B.
Demonstração. Sem perda de generalidade, consideramos apenas o caso q A (x, x) " 0. Uma
estimativa direta usando (4.9.8) mostra que
27
Veja também J.T. Cannon, “Quantum Field Theoretic Properties of a Model of Nelson: Domain and Eigenvector
Stability for Perturbed Linear Operators,” J. Func. Anal 8 (1971) 101.
246
Operadores Lineares em Espaços de Hilbert
ou seja, q A + q B é limitada inferiormente por −b. Além disso, por (4.9.7) e (4.9.8), temos
# (1 + a) q A (x, x) + (1 + 2b)∥x∥2
# (1 + 2b) ∥|x|∥2qA ,
1 . /
# q A (x, x) + q B (x, x) + b ∥x∥2 + ∥x∥2
1−a
1 . /
= q A (x, x) + q B (x, x) + (1 + b) ∥x∥2 − ∥x∥2 + ∥x∥2
1−a
1 a
= ∥|x|∥2qA +qB − ∥x∥2
1−a 1−a
# ∥|x|∥2qA +qB .
247
Capítulo 5
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
“Se as pessoas não acreditam que a matemática é simples, é só porque elas não percebem o quão complicado é a
vida.”
J. von Neumann
249
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
y = Ax .
O elemento zero é deixado invariante por A. Existem outros elementos invariantes? Via de
regra não, mas se exigirmos apenas que
Ax = λx . (5.1.1)
para alguma constante λ e algum vetor x com ∥x∥ = 1, então, surge uma situação mais
favorável e interessante. Vamos escrever a Eq.(5.1.1) da seguinte forma:
(A − λ1I)x = 0 . (5.1.2)
Assim, escrita dessa forma, descobrimos que a matriz A − λ1I deve “aniquilar” um vetor x
diferente de zero e isso pode acontecer se a matriz for singular. Agora, se A − λ1I é singular,
então, seu determinante é zero,
def.
∆(λ) = det (A − λ1I) = 0 ,
A expansão fornece uma equação algébrica em λ de grau n que tem um número total de n
raízes complexas. Suponha; que existam p raízes distintas
_p λ1 , λ2 , . . .k,j λp e que a multiplicidade
p
de λj é kj . Aqui, p # n, j=1 kj = n e ∆(λ) = j=1 (λ − λj ) . Segue-se que o número
λ em (5.1.1) deve ser uma das raízes λj . A Eq.(5.1.3) é conhecida como a equação característica
da matriz A. Observe que estamos tratando com matrizes e vetores sobre Cn . Sobre Rn e
para n par (5.1.3) pode não ter nenhuma raiz. As raízes são conhecidas por vários nomes:
raízes características, valores característicos e auto-valores são os mais comuns. Adotaremos
este útimo. O conjunto de raízes para o qual (5.1.2) tem uma solução não-trivial é chamado de
espectro de A e será denotado por σ(A).
Se λ tem um valor distinto de todas as raízes, então, A − λ1I é regular, ou seja, tem um
inverso e definimos
Rλ (A) = (A − λ1I)−1 ,
250
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
conhecido como o resolvente de A. Sabemos como formar o inverso de uma matriz regular.
Aplicado ao presente caso, isso dá como o elemento do resolvente no local (j, k)
Akj (λ)
rjk (λ) =
∆(λ)
em que Ajk (λ) é o cofator de ajk − λδjk no determinante ∆(λ). Assim, Akj (λ) é um
polinômio em λ com coeficientes complexos e de grau # n − 1. Segue-se que rjk (λ) é uma
função racional de λ com pólos incluídos no conjunto de zeros de ∆(λ) e rjk (λ) → 0 quando
λ → ∞. Portanto,
P(A; λ)
Rλ (A) = ,
∆(λ)
em que P(A; λ) é um polinômio em λ de grau # n − 1 cujos coeficientes são matrizes
constantes.
PROPOSIÇÃO 5.1. Para valores grandes de |λ|
Rλ (A) = λ−1 1I + λ−2 A + . . . + λ−k−1Ak + . . . .
Em particular, a série converge e a expansão acima é válida para |λ| > ∥A∥.
que dá ∥1I∥ = 1. Vamos usar essas normas para mostrar que a norma do produto de duas
matrizes é no máximo igual ao produto das normas. Com efeito, usando a norma ∥ · ∥1 , segue
que
5 5
<n 5< n 5 <n n
<
5 5
∥AB∥1 = max 5 a b
jm mk 5 # max |a jm | |bmk |
j 5 5 j
k=1 k=m k=1 k=m
n
<
# max |ajm |∥B∥1
j
k=1
= ∥A∥1 ∥B∥1 .
251
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Logo, temos ∥Ak ∥ # ∥A∥k (este resultado é válido tanto para a norma (5.1.5) bem como para a
norma (5.1.4)). Isso prova a afirmação sobre a convergência da série para |λ| > ∥A∥. Para tais
valores, podemos multiplicar a série convergente a esquerda ou a direita por A − λ1I e reunir
os termos. Todos eles se cancelam, exceto o termo constante, que é 1I, como deveria ser.
Deve-se ressaltar que o lema não afirma que o raio de convergência da série é ∥A∥, uma
expressão que tem pelo menos dois significados diferentes. Na verdade, a série converge para
|λ| > maxj |λj |, e este é sempre o raio exato de convergência (consulte o livro de Einar Hille,
“Methods in Classical and Functional Analysis,” Addison-Wesley, 1972).
A seguir, vamos estender a apresentação acima para o caso de um operador linear atuando
sobre um espaço de Hilbert qualquer.
Ax = λx , ∀ x ∈ Dom(A) , (5.2.1)
O formalismo resolvente é uma técnica que aplica conceitos de análise complexa no estudo
do espectro de operadores em espaços de Hilbert e em espaços mais gerais. O resolvente
captura as propriedades espectrais de um operador com base na estrutura analítica do funci-
onal. Especificamente, dados um operador linear A em um espaço de Hilbert complexo e um
parâmetro complexo λ, escrevendo
(A − λ1I)x = y ,
1
Um termo antigo denomina x de vetor-característico e λ de valor-característico.
2
Veja a definição de multiplicidade de um auto-valor no rodapé da pg.276.
252
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
um valor de λ será chamado regular se (A − λ1I)−1 existir. Neste caso, chamamos (A − λ1I)−1
o operador resolvente de A em λ. Os valores não-regulares de λ são chamados singulares. O
conjunto de singularidades do operador resolvente foi chamado de “espectro” por Hilbert, porque
ele viu uma semelhança entre os valores singulares discretos e as linhas espectrais atômicas. A
seguir, vamos introduzir algumas propriedades do operador resolvente e suas relações com o
espectro de um operador auto-adjunto em um espaço de Hilbert.
Dado um ponto λ ∈ C, em geral não é fácil decidir quando o operador (A − λ1I) tem um
inverso. O conceito auxiliar de um ponto regular é uma boa ajuda.
DEFINIÇÃO 5.1. Seja A um operador linear em um espaço de Hilbert complexo H com domínio
Dom(A). O conjunto de pontos regulares de A é o conjunto
3 4
ρr (A) = λ ∈ C | ∃ C(λ) tal que ∥(A − λ1I)x∥ " C(λ)∥x∥, ∀ x ∈ Dom(A) . (5.2.2)
Demonstração. Inicialmente, suponha que λ ∈ ρr (A). Então, Ker(A − λ1I) = {0} por (5.2.2),
uma vez que (A − λ1I)x = 0 implica que x = 0. Logo, pelo Lema 4.1, o inverso (A − λ1I)−1
existe. Seja y ∈ Dom(A − λ1I)−1 = Ran(A − λ1I). Então, temos y = (A − λ1I)x para
algum x ∈ Dom(A) e, portanto,
por (5.2.2), isto é, (A − λ1I)−1 é limitado e ∥(A − λ1I)−1 ∥ # C −1 (λ). A seguir, suponha que
(A − λ1I) tem um inverso limitado. Então, com x e y como definidos acima, segue que
∥x∥ = ∥(A − λ1I)−1 y∥ # ∥(A − λ1I)−1 ∥∥y∥ = ∥(A − λ1I)−1 ∥∥(A − λ1I)x∥ .
253
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Nota 5.1. Das Definições 5.1 e 5.2 fica óbvia a relação entre pontos regulares e pontos do
conjunto resolvente: ρ(A) ⊆ ρr (A). Com efeito, se λ ∈ ρ(A), então o resolvente é um
operador linear limitado Rλ (A) : H → Dom(A) tal que x = Rλ (A)(A − λ1I)x para todo
x ∈ Dom(A); portanto ∥x∥ # ∥Rλ (A)∥∥(A − λ1I)x∥ para todo x ∈ Dom(A). Para um
. /−1
ε > 0 arbitrário defina C(λ) = ∥Rλ (A)∥ + ε . Com esta escolha de C(λ) segue que
λ ∈ ρr (A). Em síntese, o conjunto resolvente não faz parte do espectro de A e, portanto, o
conjunto resolvente compõe o conjunto de pontos regulares.
Nota 5.2. De acordo com da Definição 5.2, a correspondência entre os conjuntos Dom(A) e
Ran(A − λ1I), determinada pelo operador (A − λ1I), é um-para-um se, e somente, λ não
é um auto-valor do operador A. Com efeito, se o operador (A − λ1I) não é injetivo, então
existem elementos x1 , x2 ∈ Dom(A) tais que x1 ̸= x2 , (A − λ1I)x1 = y e (A − λ1I)x2 = y.
Logo, (A − λ1I)x = 0, em que x = x1 − x2 ̸= 0, de maneira que λ é um auto-valor do
operador A. Reciprocamente, a equação (A − λ1I)x = 0 tem solução se x ≡ 0, ou se dado
dois elementos x1 , x2 ∈ Dom(A), com x1 ̸= x2 , nós temos que x = x1 − x2 = 0. Neste
último caso, (A − λ1I)x1 = (A − λ1I)x2 , ou seja, (A − λ1I) não seria injetivo e, portanto, não
teria um inverso. Assim, se λ não é um auto-valor do operador A, então, (A − λ1I)−1 y = 0 se,
e somente se, y = 0 (veja o Lema 4.1).
PROPOSIÇÃO 5.3. Seja A um operador auto-adjunto, não necessariamente limitado, em um
espaço de Hilbert complexo H . Logo, (i) para todo x ∈ Dom(A), a quantidade ⟨x, Ax⟩ é
real. Em geral, se os vetores x, Ax, . . . , Am−1 x ∈ Dom(A), então ⟨x, Am x⟩ é real. (ii) Se
x ∈ Dom(A) é um auto-vetor de A, isto é, Ax = λx, então λ ∈ R.
⟨x, Ax⟩ = ⟨Ax, x⟩ = ⟨x, Ax⟩ ⇒ ⟨x, Ax⟩ é real para todo x ∈ Dom(A) .
254
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Mas, isto implica que x ⊥ Ran(A − λ1I). Porém, como x ̸= 0, pela Proposição 3.14 isto é
possível somente se Ran(A − λ1I) ̸= H .
Reciprocamente, assuma que Ran(A − λ1I) ̸= H . Então, existe um vetor não-nulo x que
é ortogonal ao conjunto Ran(A − λ1I). Assim, para todo y ∈ Dom(A)
⟨x, (A − λ1I)y⟩ = 0 .
Pelo Teorema 4.18, segue que x ∈ Ker(A∗ − λ1I); ou seja, (A∗ − λ1I)x = 0, ou A∗ x = λx. No
entanto, A∗ = A, de forma que Ax = λx, isto é, λ é um auto-valor do operador A. Mas, pela
Proposição 5.3, λ = λ. Isto finaliza a prova da proposição.
255
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
= Rλ (A)x − Rλ (B)x ,
Portanto, ∥(A − λ1I)x∥ " |Im λ|∥x∥. Por outro lado, sendo A auto-adjunto, de acordo com
o Corolário 4.5, temos que Ran(A − λ1I) = H e Ran(A − λ1I)⊥ = {0}. Logo, pelo
Lema 4.1, (A − λ1I) tem um inverso (veja também a Nota 5.2). Assim, podemos assumir que
x = (A − λ1I)−1 y. Dessa forma, a desigualdade ∥(A − λ1I)x∥ " |Im λ|∥x∥ implica que
|Im λ|∥(A − λ1I)−1 y∥ # ∥y∥. Visto que esta relação é válida para todo y ∈ Ran(A − λ1I), o
operador Ran(A − λ1I)−1 é limitado e definido em todo espaço H , ou seja,
1
∥(A − λ1I)−1 ∥ # , ∀λ ∈ C \ R .
|Im λ|
256
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Demonstração. De acordo com o Lema 1.2, Capítulo 1, o conjunto ρ(A) é aberto se, e somente se,
todo λ0 ∈ ρ(A) é centro de um disco aberto D(λ0 ; |Im λ0 |), com ε > 0 arbitrário, inteiramente
contido em ρ(A). Para isso, tome um λ ∈ C tal que |λ − λ0 | < ε, com ε < |Im λ0 |. Agora,
suponha que x ∈ Dom(A). Então,
. / . /
(A − λ1I)x = A − λ1I + λ0 1I − λ0 1I x = (A − λ0 1I)x − λ − λ0 1Ix .
Portanto, 5 5
∥(A − λ1I)x∥ " ∥(A − λ0 1I)x∥ − 5λ − λ0 5∥x∥ .
Como λ0 ∈ ρ(A), segue que A − λ0 1I tem inverso e
1
∥x∥ = ∥(A − λ0 1I)−1 (A − λ0 1I)x∥ # ∥(A − λ0 1I)x∥ ,
|Im λ0 |
de acordo com a Proposição 5.6. Consequentemente,
. 5 5/
∥(A − λ1I)x∥ " |Im λ0 | 1 − |Im λ0 |−1 5λ − λ0 5 ∥x∥ .
Esta última desigualdade nos mostra que x = 0 se (A − λ1I)x = 0. Logo, pelo Lema 4.1,
. / . /−1
A − λ1I tem um inverso. Assim, se escrevemos y = A − λ1I x, ou x = A − λ1I y, temos
que
. 5 5/−1
∥(A − λ1I)−1 y∥ # |Im λ0 |−1 1 − |Im λ0 |−1 5λ − λ0 5 ∥y∥ .
Isto mostra que (A − λ1I)−1 é limitado, uma vez que |λ − λ0 ||Im λ0 |−1 < 1. Logo, se
λ ∈ D(λ0 ; ε), com ε < |Im λ0 |, isto implica que λ ∈ ρ(A). Assim, ρ(A) é aberto.
COROLÁRIO 5.2. Seja A um operador auto-adjunto, não necessariamente limitado, em um
espaço de Hilbert complexo H . Então, o conjunto σ(A) é um subconjunto fechado de C.
COROLÁRIO 5.3. A norma de Rλ (A) é uma função contínua de λ em todo ponto regular λ0 .
então,
. 5 5/−1
∥Rλ (A)∥ # ∥Rλ0 (A)∥ 1 − ∥Rλ0 (A)∥5λ − λ0 5 .
Logo,
5 5 5. 5 5/ 5
5∥Rλ (A)∥ − ∥Rλ0 (A)∥5 # ∥Rλ0 (A)∥ 55 1 − ∥Rλ0 (A)∥5λ − λ0 5 −1 − 155
5 5 . 5 5/−1
= 5λ − λ0 5∥Rλ0 (A)∥2 1 − ∥Rλ0 (A)∥5λ − λ0 5 .
257
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
∞
<
= (λ − λ0 )n (A − λ0 1I)−n−1 ,
n=0
ou seja,
∞
<
Rλ (A) = (λ − λ0 )n Rλn+1
0
(A) . (5.2.3)
n=0
3
Com efeito, temos a seguinte
DEFINIÇÃO 5.3. Seja (H , ∥ · ∥) um espaço de Hilbert sobre C e Ω ⊂ C um conjunto aberto não vazio. Uma
função f : Ω → H é chamada analítica se para qualquer z0 ∈ Ω existe ε > 0 tal que
∞
<
f (z) = an (z − z0 )n , para todo z ∈ B(z0 ; ε) ,
n=0
em que B(z0 ; ε) é uma bola aberta de centro z0 e raio ε contida em Ω, an ∈ H para qualquer n ∈ N e a série
converge segundo a norma ∥ · ∥.
258
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
;
A última série converge porque |λ − λ0 ||Im λ0 |−1 < 1. Consequentemente, a série ∞
n=0 |λ −
λ0 |n ∥Rλ0 (A)∥n+1 também converge. Assim, Rλ (A) tem uma expansão em série de potências,
isto é, Rλ (A) é uma função analítica na vizinhança de qualquer λ0 ∈ ρ(A). Isto conclui a
prova.
Nota 5.3. De acordo com o teorema acima, como Rλ (A) é holomorfa em λ, então,
dn Rλ (A)
= n! Rλn+1 (A) n = 1, 2, 3, . . . . (5.2.4)
dλn 0
Nota 5.4. Observe que nos Teoremas 5.1 e 5.2 assumimos que A é um operador auto-adjunto
em um espaço de Hilbert complexo. Se tivéssemos assumido que A é um operador em um
espaço de Hilbert complexo, não necessariamente auto-adjunto, as provas dos dois teoremas
seriam as mesmas, bastando para isto assumir que |λ − λ0 |∥Rλ0 (A)∥ < 1. Isto significa que,
se λ0 ∈ ρ(A) e |λ − λ0 |∥Rλ0 (A)∥ < 1, então, λ ∈ ρ(A). Por outro lado, se λ ∈ σ(A)
necessariamente |λ − λ0 |∥Rλ0 (A)∥ " 1, isto é,
1
∥Rλ0 (A)∥ " , ∀ λ ∈ σ(A) .
|λ − λ0 |
Se o resto acima converge para zero, em algum sentido, quando n → ∞, então (5.2.5) nos
fornece um meio de calcular Rλ (B) quando Rλ (A) é conhecido:
259
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Sabemos que, de acordo com a Nota 4.13, o resto acima convergirá para zero se ∥CRλ (A)∥ < 1,
quando n → ∞. Em outras palavras, o operador 1I + CRλ (A) admite um inverso, pela série
de Neumann, quando ∥CRλ (A)∥ < 1. Neste caso, segue que
∞
<
Rλ (B) = Rλ (A) (−1)k (CRλ (A))k = Rλ (A)(1I + CRλ (A))−1 .
k=0
• σpont (A) (espectro pontual): λ ∈ σpont (A) se (A−λ1I) não é injetivo, isto é, (A−λ1I)−1
não existe. Assim, (A − λ1I)x = 0 tem solução não-trivial; λ é então chamado um auto-
valor de A e x um auto-vetor.
• σcont (A) (espectro contínuo): λ ∈ σcont (A) se (A − λ1I) é injetivo e Ran(A − λ1I) =
H , mas (A − λ1I)−1 não é limitado.
• σres (A) (espectro residual): λ ∈ σres (A) se (A−λ1I) é injetivo e Ran(A − λ1I) ̸= H ,
isto é, (A − λ1I)−1 existe, mas Dom(A − λ1I)−1 = Ran(A − λ1I) não é denso em
toda parte em H , isto é, o fecho de Ran(A − λ1I) é um subconjunto próprio de H .
A última afirmação implica que existe pelo menos um vetor x em H e uma vizinhança-ε
de x, denotada por Vε , tal que (A − λ1I)y nunca está em Vε .
Além disso, os conjuntos σpont (A), σcont (A) e σres (A) são mutuamente disjuntos e
σ(A) = σpont (A) ∪ σcont (A) ∪ σres (A) .
Pode-se mostrar que para uma ampla classe de operadores (incluindo aqueles de interesse
na mecânica quântica) o conjunto σres (A) é vazio. Por exemplo, na mecânica quântica o
hamiltoniano, H, é um operador auto-adjunto ilimitado sobre um espaço de Hilbert com o
conjunto σres (H) = ∅. Por outro lado o conjunto σpont (H) corresponde aos níveis de energia
dos estados ligados do sistema descrito por H, enquanto que o conjunto σcont (H) desempenha
um papel importante na teoria de espalhamento do sistema.
260
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
det(aij − λδij ) = 0 .
Neste caso, σ(A) = σpont (A), isto é, σcont (A) = σres (A) = ∅!
Aµ ϕ(x) = µ(x)ϕ(x) .
é injetivo se, e somente se, para toda função ϕ ∈ C[0, 1] temos que (µ(x) − λ)ϕ(x) = 0. Isto
implica que ϕ(x) = 0 se, e somente se, (µ(x) − λ) ̸= 0. Portanto,
! "
σpont (Aµ ) = λ ∈ C | µ(x) = λ ,
isto é, o espectro pontual de Aµ consiste de todo λ tal que a diferença µ(x) − λ é zero
para algum x ∈ [0, 1]. Assim, o espectro pontual é o conjunto imagem da função µ(x). Se
λ ∈ C \ σpont (Aµ ), então, Aµ − λ1I tem um operador inverso, que agora determinamos:
, -
1
(Aµ − λ1I)ϕ(x) = Ψ(x) ⇐⇒ (µ(x) − λ)ϕ(x) = Ψ(x) ⇐⇒ ϕ(x) = Ψ(x) .
µ(x) − λ
1
Sendo assim, (Aµ − λ1I)−1 é o operador multiplicação por µ(x)−λ
, isto é,
, -
−1 1
(Aµ − λ1I) Ψ(x) = Ψ(x) ,
µ(x) − λ
261
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
com domínio
# , - %
−1 1
Dom(Aµ − λ1I) = Ψ ∈ C[0, 1] | Ψ(x) ∈ C[0, 1] .
µ(x) − λ
1
Este é um operador limitado se, e somente se, existir uma constante K > 0 tal que |µ(x)−λ|
#
K. Assim,
! "
ρ(Aµ ) = λ ∈ C | ∃ ε > 0 tal que |µ(x) − λ| " ε .
Desejamos determinar se o conjunto Ran(Aµ − λ1I) = Dom(Aµ − λ1I)−1 é denso. Para isto,
precisamos definir uma norma para o espaço C[0, 1]. Vamos assumir a norma do supremo, isto
é,
Essa norma também é chamada de norma uniforme, norma de Chebyshev ou norma do infinito.5
A convergência de funções na norma do supremo equivale à convergência uniforme, isto é, uma
sequência de funções (ϕn )n∈N converge para uma função ϕ sob a métrica derivada da norma
do supremo se, e somente se, ϕn convergir para ϕ uniformemente.
De acordo com a topologia gerada pela norma ∥ · ∥∞ não é difícil ver que a função constante
Ψ(x) = 1, que pertence ao espaço C[0, 1], não está no fecho do domínio Dom(Aµ − λ1I)−1 .
Com efeito, para todo λ ∈ / Ran(µ) e para toda função ϕ ̸= 0 em C[0, 1] podemos tomar
|µ(x) − λ| # 2∥ϕ∥∞ . Por conseguinte, isto implica que |1 − (µ(x) − λ)ϕ| " 12 e que o conjunto
1
Por outro lado, de acordo com o Exemplo 1.3, podemos definir uma outra norma em C[0, 1]
pela fórmula
$ 1
∥ϕ∥1 = dx |ϕ(x)| .
0
Vamos mostrar que, de acordo com a topologia gerada pela norma ∥ · ∥1 , o conjunto
Ran(Aµ − λ1I) é denso em toda parte em X . Para isto, escolha uma função qualquer ϕ ∈
C[0, 1]. Temos que mostrar que ϕ é o limite
! de uma sequência (ϕn )n∈N
" ∈ Ran(Aµ − λ1I).
Para cada n ∈ N, tome o conjunto En = x ∈ [0, 1] | |µ(x)−λ| " 1/n . Note que o conjunto
Ran(Aµ − λ1I) contém {χEn ϕ | ϕ ∈ C[0, 1], n ∈ N}, pois para toda função ϕ ∈ C[0, 1] e
1
todo n ∈ N, χEn ϕ é a imagem sob Aµ − λ1I de (µ(x)−λ) χEn ϕ ∈ C[0, 1]. Além disso, temos
que χEn ϕ → ϕ segundo a norma ∥ · ∥1 , quando n → ∞.
5
Como C[0, 1] é um espaço composto por funções contínuas no intervalo fechado [0, 1], que é um conjunto
compacto, então as funções em C[0, 1] são limitadas e o supremo na definição acima é alcançado pelo Teorema
do Valor Extremo de Weierstrass, em vista disso podemos substituir o supremo pelo máximo na Eq.(5.2.6) (veja o
Exemplo 1.3).
262
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
⎧! "
⎨ λ ∈ C | $ ε > 0 tal que |µ(x) − λ| " ε \ σpont (Aµ ) , se ∥ · ∥1
σcont (Aµ ) = .
⎩∅ , se ∥ · ∥∞
Para finalizar este exemplo, note que se tomamos µ(x) = x, então, o espectro é exatamente
todo o intervalo [0, 1]. Por outro lado, obviamente não existem auto-valores. Assim, o operador
A definido por Aϕ(x) = xϕ(x) é um exemplo de um operador com um espectro puramente
contínuo. Abordaremos com mais detalhes este caso na Seção 5.5.
Nota 5.5 (Sobre as topologias geradas pelas normas ∥ · ∥∞ e ∥ · ∥1 ). Suponha que duas
funções ϕ e Ψ em C[0, 1] estejam suficientemente próximas uma da outra usando a norma
∥ · ∥∞ . Diz-se que Ψ está localizada na vizinhança de ϕ. A vizinhança-ε de ϕ, denotada por
[∞]
Vε (ϕ), é um conjunto de funções vizinhas a ϕ, usando a norma ∥ · ∥∞ , e é expressa como
! "
Vε[∞] (ϕ) = Ψ ∈ C[0, 1] | ∥ϕ − Ψ∥∞ = sup |ϕ(x) − Ψ(x)| < ε . (5.2.7)
x∈[0,1]
[∞]
A Figura 5.1 dá uma explicação gráfica de Vε (ϕ). Observe que no gráfico todas as funções
Ψ devem estar contidas na região entre as duas curvas y = ϕ(x) ± ε para qualquer x arbitrário
[∞]
em [0, 1]. Para que Ψ pertença a Vε (ϕ), mesmo uma pequena porção da curva y = Ψ(x)
não pode se desviar da região ±ε.
ϕ(x)
Ψ(x)
Figura 5.1: Na convergência uniforme para ϕ(x), qualquer função Ψ(x) deve estar contida
na região entre as duas curvas y = ϕ(x) ± ε. Figura retirada, e adptada, do livro-texto de
Hiroyuki Shima, “Functional Analysis for Physics and Engineering: An Introduction,” CRC Press,
2016. Todos os Direitos Reservados.
263
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Considere agora a norma ∥ · ∥1 . Neste caso, dizemos que Ψ está próximo de ϕ com a
[1]
distância definida pela norma ∥ · ∥1 , queremos dizer que Ψ ∈ Vε (ϕ) ou, equivalentemente,
$ 1
∥ϕ − Ψ∥1 = dx |ϕ(x) − Ψ(x)| < ε .
0
Essa desigualdade implica que a área da região entre as curvas y1 = ϕ(x), y2 = Ψ(x) e as
linhas verticais x = 0 e x = 1 é menor que ε. Deve ser enfatizado que, neste caso, a distância
entre as funções é medida usando integração. Esta regra para distância é completamente
diferente daquela no caso da distância gerada pela norma ∥ · ∥∞ . Assim, a função constante
[∞] [1]
Ψ(x) = 1, que foi excluída da Vε (ϕ) em C[0, 1], pode ser um membro de Vε (ϕ).
PROPOSIÇÃO 5.9. Seja A um operador auto-adjunto em um espaço de Hilbert complexo e
λi ∈ σpont (A), i = 1, 2 são dois auto-valores. Se λ1 ̸= λ2 , então os espaços Ker(A − λ1 1I) e
Ker(A − λ2 1I) são ortogonais.
Demonstração. Se λ ∈ ρ(A), é suficiente mostrar que Ran(A − λ1I) = H . Com efeito, uma
vez que (A − λ1I)−1 é contínuo, existe um C > 0 tal que ∥(A − λ1I)−1 y∥ # C∥y∥ para todo
y = (A − λ1I)x ∈ Ran(A − λ1I). Assim, para qualquer x ∈ Dom(A), segue que
∥x∥ # C∥(A − λ1I)x∥ . (5.2.8)
Como, por definição, Ran(A − λ1I) = H , então, se y ∈ H existe uma sequência (xn )n∈N ⊂
Dom(A) tal que (A − λ1I)xn → y, quando n → ∞. Aplicando (5.2.8) com x = xn − xm
mostra que ∥xn − xm ∥ # C∥yn − ym ∥ concluimos que (xn )n∈N é uma sequência de Cauchy
e, assim, admite um limite x ∈ H . Sendo A um operador fechado, x ∈ Dom(A) e
(A − λ1I)x = y; portanto, y ∈ Ran(A − λ1I). Consequentemente, Ran(A − λ1I) = H ,
como afirmado.
Nota 5.6. O Teorema 5.3 também pode ser enunciado da seguinte forma: Sejam A um operador
fechado em um espaço de Hilbert complexo H ̸= {0} e λ um elemento de C. Suponha que
exista um C > 0 tal que
∥x∥ # C∥(A − λ1I)x∥ .
para todo x ∈ Dom(A). Então, o Ran(A − λ1I) é um subespaço fechado de H .
264
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
TEOREMA 5.4. Seja A um operador simétrico fechado em um espaço de Hilbert complexo H . (i)
Então, o espectro de A é uma das seguintes possibilidades, mutuamente excludentes: σ(A) = C,
ou σ(A) = C+ , ou σ(A) = C− , ou σ(A) ⊂ R. (ii) O operador A é auto-adjunto se, e somente
se, seu espectro σ(A) é um subconjunto de R.
Destas desigualdades e do fato que A é fechado, segue, da Proposição 4.23, que os subespaços
Ran(A − λ1I) e Ran(A − λ1I) são fechados no espaço de Hilbert H . Então, pelo Teorema
3.5, segue que
Além disso, como os inversos dos operadores A − λ1I e A − λ1I existem e são limitados, isto é,
∥(A − λ1I)−1 ∥ = ∥(A − λ1I)−1 ∥ # |µ|−1 , segue que (A − λ1I)−1 e (A − λ1I)−1 estão definidos
em toda parte em H se, e somente se, Ker(A∗ − λ1I) = {0} e Ker(A∗ − λ1I) = {0}.
Portanto, cada um dos semi-planos C+ e C− está inteiramente no espectro de A, ou está
inteiramente no conjunto resolvente de A em λ. Isto prova a primeira parte.
Para provar a segunda parte, assuma que A é auto-adjunto e que existe um x ∈ Dom(A)
tal que A∗ x = λx, com C ∋ λ = ν + iµ, tal que µ ̸= 0. Logo, Ax = λx e
O próximo resultado pode ser visto como uma consequência direta do Teorema 5.4.
265
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Demonstração. Por definição, λ ∈ σres (A) se (A − λ1I) é injetivo e Ran(A − λ1I) ̸= H , isto
é, (A−λ1I)−1 existe, mas não é denso em H . Tome um λ ∈ σ(A) tal que Ker(A−λ1I) = {0};
mas pelo Teorema 4.18, isto implica que
Ran(A − λ1I)⊥ = Ker(A∗ − λ1I) = Ker(A∗ − λ1I) = Ker(A − λ1I) = {0} ,
de maneira que Ran(A − λ1I) é denso em H . Logo, λ ∈
/ σres (A).
Assim, com base no resultado estabelecido na proposição acima, a maneira pela qual o re-
solvente Rλ (A) = (A − λ1I)−1 de um operador auto-adjunto A depende do valor do parâmetro
λ pode ser resumida na tabela a seguir:
Para todo operador auto-adjunto limitado, a norma do operador pode expressar o “tamanho”
do seu espectro de acordo com o seguinte
TEOREMA 5.5. Um operador auto-adjunto A em8 um espaço de 9 Hilbert complexo H é limitado
se o seu espectro é limitado. Neste caso, σ(A) ⊂ −∥A∥, ∥A∥ .
Demonstração. Tome λ ∈ C e assuma que |λ| > ∥A∥, então λ está no conjunto resolvente de
A. Com efeito, como por hipótese ∥λ−1 A∥ < 1, escrevendo-se
A − λ1I = −λ(1I − λ−1 A) ,
a série de Neumann pode ser usada para encontrar o inverso limitado do operador A − λ1I,
isto é,
<∞
−1 −1 −1 −1 −1
Rλ (A) = (A − λ1I) = −λ (1I − λ A) = −λ An λ−n .
n=0
Em outras palavras, para todo λ ∈ C tal que |λ| > ∥A∥, segue que o resolvente Rλ (A) é
limitado, isto é,
<∞
1
∥Rλ (A)∥ # ∥A∥n |λ|−1−n = .
n=0
|λ| − ∥A∥
266
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Assim, λ ∈ ρ(A). Além disso, note que, ∥Rλ (A)∥ → 0, quando λ → ∞. Isto estabelece
que se |λ| # ∥A∥, então σ(A) ⊂ {λ ∈ C | |λ| # ∥A∥} e mostra que o espectro σ(A)
de A é um subconjunto fechado, limitado e não-vazio de C. Portanto, o raio espectral de
A, denotado por r(A), é o raio do menor disco centrado em zero que contém σ(A), isto é,
r(A) = sup {|λ| | λ ∈ σ(A)}. Neste caso, r(A) = ∥A∥.
Demonstração. Se |λ| < 1, então escrevemos U − λ1I = U (1I − λU −1 ). Uma vez que o
operador λU −1 tem norma menor do que 1, usamos novamente a série de Neumann para
determinar o inverso limitado de U − λ1I. Da mesma forma, para |λ| > 1, escrevemos
U − λ1I = −λ(1I − λ−1 U ). Desta vez, é a série de Neumann para o operador λ−1 U que
permite-nos determinar o inverso limitado de U − λ1I. Consequentemente, todo elemento
λ ∈ C com |λ| < 1 ou |λ| > 1 pertence ao conjunto resolvente de A e o espectro de A está
contido no círculo unitário {λ ∈ C | |λ| = 1}.
Uma vez que os pontos regulares têm uma caracterização simples, gostaríamos de saber
quando um ponto regular pertence ao conjunto resolvente. A resposta é dada pelo seguinte
Pela Proposição 5.3, segue que λ = λ; em outras palavras, temos que Ax = λx, ou que
(A − λ1I)x = 0. Mas, isto contradiz a hipótese que λ ∈ ρr (A). Portanto, devemos ter x = 0.
Isto, mais a análise na Nota 5.1, prova o teorema.
Com base no resultado acima e no conceito de índices de deficiência, o Teorema 5.4 pode
ser resumido da seguinte forma: seja A um operador simétrico fechado. Se m = 0, então
Ran(A − λ1I) = H para todo λ, com Im λ > 0; portanto o semi-plano superior do plano
complexo pertence ao conjunto resolvente ρ(A). Em contrapartida, se m > 0, todo o semi-plano
superior do plano complexo C pertence ao espectro de A. Resultados semelhantes acontece
para n e pontos λ no semi-plano inferior do plano complexo C. Assim, isto nos leva à seguinte
caracterização do espectro de um operador simétrico fechado A – lembrando que o espectro é
um subconjunto fechado do plano complexo C:
267
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
O objetivo desta subseção é ressaltar o papel desempenhado pelo operador resolvente na teo-
ria de evolução de um sistema físico, particularmente sua relação com a conhecida aproximação
de Yosida.
1. ∥T (t)∥ < ∞, isto é, sup {∥T (t)x∥ | x ∈ H , ∥x∥ # 1} < ∞ para todo t " 0;
2. T (t + s)x = T (t)T (s)x, para todo x ∈ H e para todo t, s " 0;
3. T (0)x = x, para todo x ∈ H ;
4. t 3→ T (t)x é contínuo para t " 0, para todo x ∈ H ;
5. Além disso, se ∥T (t)x∥ # ∥x∥, para todo x ∈ H e para todo t " 0, indicando que
∥T (t)∥ # 1, T é chamado de semi-grupo de contração.
6
Mais detalhes sobre um semi-grupos-C0 de contração aparecerá no Capítulo 8.
268
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
O Teorema 5.7 nos leva ao seguinte questionamento: Que operadores A geram semi-grupos-
C0 ? Para responder esta questão, partimos com o caso mais simples de um operador linear
limitado, A, e então generalizamos. Considere a fórmula
$ ∞
1
= dt e−λt etA ,
λ−A 0
que é válida quando A é um número real e λ > A. Esta fórmula sugere a seguinte versão
operatorial no caso de A ser um operador limitado, com Re λ > ∥A∥:
$ ∞
−1
(λ1I − A) x = dt e−λt etA x , ∀ x ∈ H . (5.2.10)
0
O vetor x na expressão acima torna o integrando contínuo e limitado na norma pela função
integrável e−λt ∥x∥. De fato, como (λ1I − A)−1 = −Rλ (A), segue da Proposição 5.6 que o
operador (λ1I − A)−1 é limitado. Assim, a estimativa
?$ ∞ ? $ ∞
? ? ? ?
−1
∥(λ1I − A) x∥ = ? ? −λt tA ?
dt e e x? # dt e−Re λt ?etA x?
0 0
$ ∞
∥x∥
# dt e−Re λt ∥x∥ = ,
0 Re λ
sugere que
⎧
⎪
⎪para todo Re λ > 0 ,
⎪
⎨
(A − λ1I) mapea o domínio de A em todo H , (5.2.11)
⎪
⎪
⎪
⎩
e ∥(A − λ1I)−1 x∥ # (Re λ)−1 ∥x∥ para todo x ∈ H .
Nota 5.8 (O resolvente do semi-grupo). Observe que a partir da Eq.(5.2.10) podemos ver que
$ ∞ $ ∞
−λt tA
(A − λ1I) dt e e x = dt (A − λ1I)e(A−λ1I)t x
0 0
$ r
d . (A−λ1I)t /
= lim dt
e x
r→∞ 0 dt
. /
= lim e(A−λ1I)r x − 1Ix , ∀ x ∈ H .
r→∞
269
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
O termo e(A−λ1I)r x → 0, quando r → ∞, uma vez que Re λ > ∥A∥. Com efeito,
? (A−λ1I)r ? ? (A−λ1I)r ?
?e x? # ?e ? ∥x∥ # e(∥A∥−Re λ)r ∥x∥ → 0 ,
Portanto, se A é um operador linear limitado, então, para Re λ > ∥A∥ o resolvente do semi-
grupo de contração T é dado pela seguinte expressão:
$ ∞
Rλ (A) = − dt e−λt etA . (5.2.12)
0
Com efeito, das expansões em série de potências para a exponencial eλt e para o resolvente
Rλ (A) (veja o Teorema 4.8), a integral de contorno acima assume a forma:
∞ ∞ ` ∞ ∞ `
1 < tk < k −(n+1) n
< tk < n 1
dλ λ λ A = A dλ λk−n−1 .
2πi k=0 k! n=0 C k=0
k! n=0
2πi C
1
a
Pela Fórmula Integral de Cauchy, 2πi C
dλ λk−n−1 = 0, a não ser que n = k e neste caso a
integral é 1. Logo, segue que
<∞
tA (tA)n
e = .
n=0
n!
270
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
<n
tA 1
(I) e = lim (tA)ℓ ;
n→∞
ℓ=0
ℓ!
, -n
tA t
(II) e = lim 1 + A ;
n→∞ n
, -−n
t
(III) etA = lim 1 − A ;
n→∞ n
Para operadores limitados a exponencial etA está bem definida pelas foŕmulas (I) e (II).
No entanto, nem todos os operadores são limitados. É aqui que entram em cena as fórmulas
(III) (usada por Hille) e (IV ) (usada por Yosida). A fórmula (IV ) está relacionada à chamada
aproximação de Yosida. Vamos usar (IV ) para definir a exponencial etA quando A é um
operador ilimitado e Aλ ∈ Lb (H ). Neste caso, dizemos que um operador ilimitado A em um
espaço de Hilbert H pode ser “regularizado” por meio da aproximação de Yosida, através dos
operadores limitados Aλ definidos em termos do operador resolvente Rλ (A) e que convergem
para A no domínio deste último. Para mostrarmos isto, primeiro, preparamos o seguinte7
Demonstração. A condição que λ2 ∥x∥2 # ∥(A − λ1I)x∥2 = ∥Ax∥2 − 2λ⟨x, Ax⟩ + λ2 ∥x∥2
2
H − 2λ⟨x, Ax⟩ " 0, usando-se a simetria de A. Isto, por sua vez, implica
implica que ∥Ax∥
que ∥Ax∥ " 2λ⟨x, Ax⟩. Por definição, ∥Ax∥ " 0. Logo, como λ > 0 e ⟨x, Ax⟩ ∈ R,
segue que ⟨x, Ax⟩ " 0. A seguir, considere a equação (A − λ1I)x = y. Como λ ∈ / σ(A) o
inverso do operador (A − λ1I) existe e está bem definido. Isto implica que (A − λ1I)−1 y = x.
Consequentemente, a condição que λ∥x∥ # ∥(A−λ1I)x∥ implica que λ∥(A−λ1I)−1 y∥ # ∥y∥;
ou seja, ∥(A − λ1I)−1 ∥ # λ−1 para λ > 0.
7
No restante desta subseção, consideramos somente o caso de operadores auto-adjuntos.
271
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
De fato,
Rλ (A) = −λ−1 1I + λ−1 ARλ (A)
= Rλ (A) .
Agora, assuma que A é positivo (veja a Definição 4.29). Então, de acordo com o Lema
5.1, para todo x ∈ Dom(A) e para todo 0 < λ ∈ R que não pertence ao espectro de A,
∥Rλ (A)∥ # λ−1 .
def.
A seguir, defina o operador Bλ = −Rλ (A) = (λ1I − A)−1 e multiplique a Eq.(5.2.14) por
2
λ . Logo, a decomposição (5.2.14) assume a seguinte forma:
λ2 Bλ = λ1I + λABλ . (5.2.15)
Naturalmente, ∥Bλ ∥ = ∥Rλ (A)∥ # λ−1 !
DEFINIÇÃO 5.4. Seja A um operador auto-adjunto positivo, não necessariamente limitado, atu-
ando em um espaço de Hilbert complexo H . Para todo λ > 0, definimos a aproximação de
Yosida, ou regularização de Yosida, de A por Aλ = λABλ .
Note que, o primeiro termo sempre é igual a −λ−1 . Como A é limitado, em primeira ordem
em A, o operador resolvente Rλ (A) é frequentemente escrito como Rλ (A) = −λ−1 1I − λ−2 A.
def.
Logo, segue que A = −λ2 Rλ (A) − λ1I e definido Bλ = −Rλ (A), obtemos que o operador
auto-adjunto limitado A pode ser escrito como
A = λ2 Bλ − λ1I , (5.2.17)
272
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
similar à Eq.(5.2.16). É importante observar que aqui assumimos que A é limitado para mostrar
a similaridade entre as Eq.(5.2.16) e Eq.(5.2.17)! Com efeito, na Proposição 5.11 abaixo coletamos
alguns fatos sobre Aλ ; provaremos que Aλ é limitado independentemente se o operador auto-
adjunto A é limitado ou não!
6. Aλ é auto-adjunto.
Demonstração. Prova do item 1. Primeiro, lembremos que como A foi assumido ser auto-
adjunto, sabemos do Corolário 4.5 que Ran(λ1I − A) = Ran(A − λ1I) = H . Além disso,
Ran(Bλ ) = Ran(Rλ (A)) = Dom(A − λ1I) = Dom(A). Tudo isto implica que
Aλ x = λABλ x .
Por outro lado, para todo x ∈ Dom(A) e para todo λ > 0, obtemos que
Aλ x = λ2 Bλ x − λ1Ix
= λ2 Bλ x − λBλ Bλ−1 x
6 7
= λBλ λ1I − (λ1I − A) x
= λBλ Ax .
Finalmente,
5 como Dom(A) ⊂ H , isto implica que Dom(A) ⊂ Dom(Bλ ). Logo, para
Bλ 5Dom(A) , obtemos
8 9
Aλ x = λBλ Ax = λABλ x =⇒ A, Bλ x = 0 .
273
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Suponha agora que x é um elemento qualquer em H . Então, existe sempre uma sequência
(xn )n∈N ⊂ Dom(A) tal que xn → x quando n → ∞, uma vez que Dom(A) é denso em
H . Logo,
∥λBλ x − x∥ = ∥λBλ x − x + λBλ xn − λBλ xn + xn − xn ∥
# ∥λBλ (x − xn )∥ + ∥λBλ xn − xn ∥ + ∥x − xn ∥
# ∥λBλ xn − xn ∥ + 2∥x − xn ∥
1 1
# ∥Axn ∥ + 2∥x − xn ∥ → ∥Ax∥ quando n→∞.
λ λ
Aqui, usamos o fato que A é fechado (já que todo operador auto-adjunto é fechado, veja a
Proposição 4.12). Assim,
lim ∥λBλ x − x∥ = 0 , ∀x ∈ H .
λ→∞
Prova do item 3. Basta aplicar os itens 1 e 2; ou seja, para todo x ∈ Dom(A), segue que
6 7
lim Aλ x = lim λBλ Ax = lim λABλ x = A lim λBλ x = Ax .
λ→∞ λ→∞ λ→∞ λ→∞
Prova do item 4.
⟨x, Aλ x⟩ = ⟨(x + λBλ x − λBλ x), Aλ x⟩
= ⟨λ−1 Aλ x, Aλ x⟩ + ⟨λBλ x, Aλ x⟩
274
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Como Aλ é positivo, pelo item 4, segue que R ∋ ⟨x, Aλ x⟩ = ⟨Aλ x, x⟩ = ⟨Aλ x, x⟩, para todo
x ∈ H . Assim, comparando as partes real e imaginária do lado direito das Eqs.(5.2.18) e (5.2.19),
podemos concluir que ⟨y, Aλx⟩ = ⟨Aλ y, x⟩ para todo x, y ∈ H . Logo, Aλ é simétrico. Além
disso, como Aλ é um operador que tem todo o espaço de Hilbert H como domínio, então, Aλ
é necessariamente auto-adjunto, pelo Teorema 4.14.
Os itens 3 e 5 da Proposição 5.11 estabelecem que {Aλ }λ>0 é uma família de operadores
limitados que “aproximam” o operador auto-adjunto A quando λ → ∞, mesmo que A seja
ilimitado. É esse tipo de aproximação que será usada para resolver o problema da existência
da dinâmica quântica no Capítulo 8, representado pela equação de Schrödinger ∂Ψ∂t
= HΨ,
com t ∈ [0, +∞), submetida à condição inicial Ψ(0) = Ψ0 , em que H é o operador energia.
De fato, essa aproximação é usada com muita frequência para resolver também vários outros
problemas de evolução dΨdt
= AΨ, com t ∈ [0, +∞) e condição inicial Ψ(0) = Ψ0 , em que A
é um operador ilimitado.
Para responder as questões acima algumas observações se fazem necessárias. Vimos que a
Proposição 5.10 estabeleceu que para um operador A auto-adjunto o espectro residual é vazio.
Neste caso, o espectro de A divide-se na união do espectro pontual e contínuo: σ(A) =
σpont (A) ∪ σcont (A). No entanto, a terminologia espectro contínuo é um tanto inapropriada
uma vez que ela é bastante enganosa como nos mostra o seguinte
Exemplo 5.3 (Blanchard-Brüning). Sejam en , com n ∈ N uma base ortonormal do espaço
de Hilbert complexo, H , e {λn | n ∈ N} ⊂ C alguma sequência de números complexos.
Considere o conjunto
b ∞
c
<
2 2
D= x∈H | |λn | |⟨en , x⟩| < ∞ .
n=1
275
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
σ(A) = {λn | n ∈ N} .
. /
Com efeito, assuma que λ0 ∈ C e que λ0 ∈
/ {λn | n ∈ N}; logo, d λ0 , σ(A) = inf λn ∈σ(A) |λn −
λ0 | > 0 e para todo x ∈ D
∞
<
2
∥(A − λ0 1I)x∥ = |λn − λ0 |2 |⟨en , x⟩|2
n=1
∞
. . //2 <
" d λ0 , σ(A) |⟨en , x⟩|2
n=1
. . //2
= d λ0 , σ(A) ∥x∥2 .
Portanto, o espectro contínuo é apenas um ponto: σcont (A) = σ(A) \ σpont (A) = {0}.
O Exemplo 5.3 revela o quão é inapropriado a terminologia espectro contínuo. Por este
motivo, vamos introduzir um outra maneira de decompor o espectro de um operador auto-
adjunto.
276
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
DEFINIÇÃO 5.5. Seja A um operador auto-adjunto. Denota-se por σdisc (A) o conjunto dos
pontos isolados de σ(A) que são auto-valores de multiplicidade finita. Este conjunto é cha-
mado espectro discreto. O conjunto restante σess (A) = σ(A) \ σdisc (A) é chamado espectro
essencial de A. Ele é composto por todos os pontos de acumulação de σ(A) junto com os
auto-valores de A de multiplicidade infinita.
Obviamente σdisc (A) e σess (A) são disjuntos e σ(A) = σdisc (A) ∪ σess (A) por definição.
Se σess (A) = ∅, então, diz-se que A tem espectro puramente discreto; se σdisc (A) = ∅, então,
diz-se que A tem espectro puramente essencial. Na mecânica quântica, em certo sentido,
os pontos do conjunto σdisc (A) corresponderiam melhor à noção de estados ligados do que
os pontos do conjunto σpont (A). Por sua vez, matematicamente, o espectro essencial é mais
fácil de manusear do que o espectro contínuo, pois é bastante “insensível” à perturbação (ver
Teorema 5.37 mais adiante). Mas, σess (A) e σcont (A) coincidem em muitos casos de interesse
prático.
TEOREMA 5.9. Sejam A um operador auto-adjunto e λ um ponto isolado de σ(A). Se para
algum ε > 0 existe algum x ∈ Dom(A) tal que
uma vez que ρ(A) é aberto e , portanto, d(λ, σ(A)) > ε. Para qualquer y ∈ H , defina
x = Rλ (A)y. Então, x ∈ Dom(A) e (5.3.2) implica que
ou seja,
∥x∥ # ε−1 ∥(A − λ1I)x∥ ,
para todos x ∈ Dom(A). Isso contradiz (5.3.1), e como λ é um ponto isolado, pela noção de
sequências e limites, um elemento λ de σ(A) é um ponto isolado de σ(A) se, e somente se,
não for um ponto limite de σ(A). Isto implica que σ(A) ∩ (λ − ε, λ + ε) = {λ}.
Nota 5.11. Pelo Teorema 5.9, λ é um ponto isolado do conjunto σ(A) se para tal elemento existe
uma vizinhança que não contém outros pontos de σ(A). Por sua vez, por multiplicidade de um
auto-valor, λ, entende-se o número de auto-vetores linearmente independentes correspondente
a esse auto-valor. Isto é, diz-se que o auto-valor λ tem multiplicidade n se existe n, porém
não n + 1, vetores linearmente independentes x1 , . . . , xn ∈ Dom(A) tal que Axj = λxj ,
j = 1, . . . , n. Se n = 1, nós chamamos o auto-valor
! λ de "simples. Em resumo, se λ é um
auto-valor de multiplicidade finita, então, dim x | Ax = λx < ∞.
De acordo com a Definição 5.5 e a Nota 5.11, um ponto λ0 ∈ σess (A) se λ0 é um ponto
limite de σ(A) e um auto-valor de multiplicidade infinita de A; mais precisamente, λ é um
277
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
! "
ponto limite de σpont (A) e dim x | Ax = λx = ∞. Note que, a Definição 5.5 não entra em
conflito com o Exemplo 5.3, pois 0 é um ponto limite de σ(A). Portanto, o espectro essencial
de um operador consiste de todos os pontos do espectro, exceto os auto-valores isolados de
multiplidade finita. Dessa forma, adicionamos ao espectro contínuo (1) quaisquer auto-valores
contidos no ou nas fronteiras do espectro contínuo (2) quaisquer pontos limites do espectro e (3)
auto-valores, se houver, de multiplicidade infinita. Isto deixa claro a diferença entre o “espectro
pontual” e o “espectro contínuo” de “espectro discreto” e “espectro essencial.”
Vamos caracterizar o espectro essencial de forma mais explícita. Para isto, observamos que
existe uma outra condição para o operador A − λ1I não ter inverso como mostra o seguinte
Exemplo 5.4 (Sequências de auto-vetores aproximados – Shima). Assuma que R ∋ λ > 0
por conveniência. Embora não exista um vetor x ̸= 0 que satisfaça exatamente Ax = λx,
podemos encontrar um vetor x ̸= 0 que satisfaça
não importa quão pequeno ε seja. Em outras palavras, é possível fazer Ax ser quase (não
exatamente) idêntico a λx, dentro da margem de erro de ε∥x∥. Um exemplo é uma função
x(t) ∈ L2 [0, 1] definida por
⎧
⎨̸= 0 se λ − ε # t # λ
x(t) = .
⎩= 0 caso contrário
x(t)
λ−ε λ t
Figura 5.2: Perfil de um exemplo de função x(t) que se desvia de zero somente dentro de um
intervalo [λ − ε, λ]. Figura retirada, e adptada, do livro-texto de Hiroyuki Shima, “Functional
Analysis for Physics and Engineering: An Introduction,” CRC Press, 2016. Todos os Direitos
Reservados.
ou seja, ∥(A − λ1I)x∥ # ε∥x∥. Portanto, a função x(t) que se desvia do zero apenas na
vizinhança de t = λ se comporta efetivamente como uma auto-função do operador contínuo
A : x(t) ∈ L2 [0, 1] → tx(t) ∈ L2 [0, 1].
278
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
De acordo com o exemplo acima, podemos afirmar que (A − λ1I)x é quase zero. Isto
significa que λ ∈ R deve pertencer ao espectro de A se, e somente se, λ é “quase um auto-
valor,” no sentido que existe um vetor x ̸= 0 para o qual Ax é igual a λx mais um erro que é
pequeno comparado à norma de x. Assim, com base no exemplo acima, usaremos a seguinte
caracterização do espectro de um operador auto-adjunto:
Demonstração. Por definição, se λ não pertence ao espectro de A então, pela Proposição 5.6, o
operador (A − λ1I)−1 existe e é limitado, de maneira que
Logo, se ∥xn ∥ = 1, segue que ∥(A − λ1I)xn ∥ " |Im λ| e não pode se aproximar de zero.
Portanto, se existe uma (xn )n∈N ⊂ Dom(A) para A e λ tal que ∥xn ∥ = 1 e ∥(A−λ1I)xn ∥ →
0 quando n → ∞, então λ deve pertencer ao espectro de A.
Por outro lado, assuma que tal sequência não existe. Então, pelo Teorema 5.3, Eq.(5.2.8), deve
existir uma constante C > 0 tal que
Caso contrário, deveria existir uma sequência (yn )n∈N de elementos não-nulos de Dom(A),
com
∥(A − λ1I)yn ∥
→0.
∥yn ∥
Substituindo yn por xn = yn /∥yn ∥ obtemos uma sequência de vetores unitários em Dom(A)
com ∥(A − λ1I)xn ∥ → 0. Isto estabelece (5.3.4).
De volta ao Exemplo 5.4, podemos aplicar a proposição acima ao operador A visto como um
operador multiplicação por t. De fato, se λ " 0, vimos que podemos encontrar, para qualquer
ε > 0, uma função limitada x(t) com suporte na região |t − λ| # ε com ∥x∥ = 1. Deste modo,
∥(A − λ1I)x∥ # ε. Então, tomando ε = 1/n obtemos xn correspondente como na proposição.
Portanto, a proposição implica que [0, ∞) está no espectro do operador multiplicação A.
Vamos refinar um pouco mais o resultado estabelecido na Proposição 5.12. Para isto, assuma
que λ é um ponto isolado do espectro do operador A. Defina por Hλ o subespaço de H com
auto-valor λ. De acordo com a Definição 5.5, Hλ dever ter dimensão finita. Decomponha H
na soma direta
H = Hλ ⊕ Hλ⊥ .
Para ε > 0 arbitrário, o intervalo (λ − ε, λ + ε) situa-se no conjunto resolvente da restrição
de A ao espaço Hλ⊥ . Portanto, a restrição de (A − λ1I) ao espaço Hλ⊥ tem inverso limitado.
Logo, se (xn )n∈N ⊂ Dom(A) é uma sequência de elementos de H tal que ∥xn ∥ = 1 e
∥(A − λ1I)xn ∥ → 0, então as componentes-Hλ⊥ dos elementos xn da sequência acima devem
tender a zero. Por conseguinte, as componentes-Hλ formam uma sequência limitada em um
279
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
espaço de dimensão finita. Isto implica que podemos extrair uma subsequência convergente
(xnκ )k∈N da sequência (xn )n∈N que também converge para zero. Consequentemente, com base
na Proposição 5.12 e na discussão acima, estabelecemos o seguinte
TEOREMA 5.10. Seja A um operador auto-adjunto em um espaço de Hilbert H . Então o número
real λ ∈ σess (A) se existe uma sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A) de elementos de H para A e λ
tal que
A segunda condição no teorema acima pode ser substituída por uma condição mais fraca:
a convergência fraca para zero da sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A). De fato, se a sequência
w
(xn )n∈N ⊂ Dom(A) satisfaz as condições ∥xn ∥ = 1 e xn −→ 0, então ela não pode conter
uma subsequência (fortemente) convergente porque o limite forte de qualquer subsequência
dever ser igual ao limite fraco, isto é, igual a zero. Mas isto contradiz a hipótese que ∥xn ∥ = 1.
w
Assim, se xn −→ 0 devemos suspeitar que λ ∈ σess (A). Isto é o que está por trás da ideia do
critério de Weyl para o espectro essencial. Ele é baseado na seguinte noção:
DEFINIÇÃO 5.6. Diz-se que a sequência (xn )n∈N ⊂ H é uma sequência de Weyl para A e λ,
se as seguintes condições são satisfeitas:
3. (xn )n∈N converge fracamente para zero, isto significa que ⟨y, xn ⟩ → 0 para todo y ∈ H .
Demonstração. Seja (xn )n∈N ⊂ Dom(A) uma sequência de Weyl. Assuma que λ pertence ao
conjunto resolvente ρ(A). Como A é auto-adjunto, segue que A é fechado. Logo, pelo Teorema
5.3, Eq.(5.2.8), temos que
Mas isto é um absurdo. Portanto, se (xn )n∈N ⊂ Dom(A) é uma sequência de Weyl, devemos
ter λ ∈ σess (A). Reciprocamente, assuma que λ um é ponto em σ(A). Como A é auto-adjunto,
lembre-se que σ(A) é um subconjunto fechado de R. Além disso, .como ρ(A) = / C \ σ(A),
então, ρ(A) ̸= ∅. Portanto, não é difícil ver que C ∋ B(λ; ε) ∩ σ(A) − {λ} ̸= ∅. Isto
implica, de acordo com a Definição 1.34, que todo ponto λ ∈ σ(A) é um ponto de acumulação
280
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
do plano complexo (mesmo que λ seja um ponto isolado em σ(A), veja Nota 1.29, na página
37). Assim, porque λ é um ponto de acumulação, toda bola aberta B(λ; ε) no plano complexo,
C, centrada em λ e de raio ε contém pontos de ρ(A) (veja a figura abaixo).
λ1 λ2
λn0
λ Re λ
Logo, para toda bola centrada em λ com raio ε = 1/n, selecionamos pontos λn ∈ ρ(A)
que estão dentro dessa bola de tal forma a obter uma sequência (λn )n∈N ⊂ ρ(A). A sequência
resultante convirgirá para λ. Com esta escolha os operadores (A − λn 1I) são invertíveis. Então,
como A é um operador fechado, pelo Teorema 5.3, (A − λn 1I) é uma bijeção de Dom(A)
em H e pela Proposição 5.7, para todo y ∈ H , temos que ∥(A − λn 1I)−1 y∥ → ∞ quando
λn → λ. A seguir, tome uma sequência (yn )n∈N ⊂ H e associe com cada vetor dessa
sequência o vetor xn da sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A) da seguinte forma:
(A − λn 1I)−1 yn
xn = .
∥(A − λn 1I)−1 yn ∥
Naturalmente, o vetor xn assim definido tem norma ∥xn ∥ = 1. Então,
∥yn ∥
= + |λn − λ| → 0 quando n→∞.
∥(A − λn 1I)−1 yn ∥
281
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Demonstração. Como λ ∈ σ(A) existe, de acordo com a Proposição 5.12, uma sequência
(xn )n∈N ⊂ Dom(A) tal que ∥xn ∥ = 1 e ∥(A − λ1I)xn ∥ → 0. Essa sequência deve ter
uma subsequência (xnκ )κ∈N convergente; caso contrário, teríamos λ ∈ σess (A) (Teorema 5.10).
Então, xnκ → x. Como A é fechado, x ∈ Ker(A − λ1I). Além disso, x ̸= 0 já que ∥x∥ = 1.
Portanto, λ é um auto-valor de A.
Em resumo, levando em conta as Definições 5.5 e 5.6, o Teorema 5.11 e o Corolário 5.5
podemos afirmar que (i) λ é um auto-valor de A com multiplicidade finita se, e somente
se, existe um número finito de vetores linearmente independentes xn ∈ Dom(A) tal que
(A − λ)xn = 0; (ii) λ é um auto-valor de A com multiplicidade infinita se, e somente
se, existe uma sequência de vetores linearmente independentes (xn )n∈N ∈ Dom(A) tal que
(A − λ)xn = 0. Naturalmente, se em (i) formarmos uma sequência infinita, os vetores não
serão linearmente independentes. Podemos usar este fato para separar σdisc (A) de σ(A). Já no
caso (ii) é possível pelo procedimento de Gram-Schmidt escolher elementos xn da sequência
que sejam ortonormais. Então, se y é um vetor qualquer no espaço de Hilbert H , pela
desigualdade de Bessel temos que
∞
<
|⟨y, xn ⟩|2 < ∞ ,
n=1
e, portanto,
lim |⟨y, xn ⟩| = 0 .
n→∞
Isto implica que a sequência (xn )n∈N ∈ Dom(A) converge fracamente para zero.
Observe que, de acordo com a Definição 4.30 e o Teorema 5.4, como ⟨x, Ax⟩ é real se A
é auto-adjunto, então, se A é limitado inferiormente, isto é, existe um número γ ∈ R tal que
⟨x, Ax⟩ " γ∥x∥2 , para todo x ∈ Dom(A), (−∞, γ) ∈ ρ(A). Isto implica que σ(A) ⊂
[γ, +∞). Com efeito, suponha que A é limitado inferiormente por inf x∈Dom(A) ⟨x, Ax⟩ = γ e
que λ é um ponto no espectro de A. Se (xn )n∈N é uma sequência de Weyl, então
Consequentemente, ⟨xn , Axn ⟩ converge para λ quando n → ∞. Uma vez que A é limitado
inferiormente por γ, devemos ter λ " γ. De fato, se x é um auto-vetor associado ao auto-valor
λ, então
282
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
d
(A + λ1I)−1 = −(A + λ1I)−2 < 0 .
dλ
Assim, para qualquer 0 < λ1 < λ
$ λ
−1 −1
(A + λ1 1I) = (A + λ1I) + dµ (A + µ1I)−2 ,
λ1
e, dessa forma, (A + λ1 1I)−1 > (A + λ1I)−1 > 0. Agora qualquer x ∈ Dom(A) pode ser
escrito na forma x = (A + λ1 1I)−1 y para algum y ∈ H . Uma vez que
para qualquer λ1 > 0, concluímos que ⟨x, Ax⟩ " 0 para todo x ∈ Dom(A), conforme
desejávamos mostrar.
Para passar para o caso dos operadores ilimitados, procedemos da seguinte forma. Sejam
λ1 > 0 e B = (A + λ1 1I)−1 um operador limitado, já que −λ1 ∈ / σ(A). Para qualquer λ ̸= 0,
temos
Portanto, para λ > 0, o operador B + λ é invertível e, então, σ(B) ⊂ [0, ∞) (de fato, pode-se
ver em (5.3.5) que B + λ também é invertível se λ < −λ−1 −1
1 e, então, σ(A) ⊂ [0, λ1 ]). Pela
prova acima, B = (A + λ1 1I)−1 " 0. Repetindo o argumento no final desta prova, descobrimos
que A + λ1 1I " 0. Como o último é verdadeiro para qualquer λ1 > 0, concluímos que
A " 0.
283
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Demonstração. Uma vez que λ0 é um auto-valor discreto e σ(A) \ {λ0 } ⊂ [β, ∞), segue que
(A − λ0 1I)(A − β1I) " 0. Assim,
8 9
Nota 5.12. Na prática, β = inf σ(A) \ {λ0 } pode não ser conhecido e,8 portanto, é comum
9
ver este teorema afirmado para β qualquer número menor ou igual a inf σ(A) \ {λ0 } , mas
maior do que λ0 . Um β mais baixo dá uma desigualdade mais fraca.
Tosio Kato, no artigo “On the Upper and Lower Bounds of Eigenvalues,” J. Phys. Soc. Japan 4
(1949) 334, encontrou uma generalização da desigualdade de Temple para auto-valores arbitrários,
que tem a virtude adicional de ser simétrica nos limites superior e inferior. A prova da versão
seguinte desse teorema enfatiza a ideia geométrica que também é a chave para a generalização.
A versão a seguir é devido E.M. Harrell II, “Generalizations of Temple’s Inequality,” Proceedings
of the American Mathematical Society 69 (1978) 271.
284
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
O próximo resultado mostra que para cada λ ∈ ρ(A) existe uma relação canônica entre o
espectro de um operador auto-adjunto A e o espectro do operador resolvente Rλ (A).
TEOREMA 5.15 (Teorema do Mapeamento Espectral para o Resolvente). Seja A um operador
auto-adjunto em um espaço de Hilbert complexo H ̸= {0}, com conjunto resolvente ρ(A) não
vazio. Então,
3 4
1
(i) σ(Rµ (A)) \ {0} = (µ − σ(A))−1 = µ−λ | λ ∈ σ(A) para todo µ ∈ ρ(A),
(ii) afirmações análogas são válidas para os espectros discreto e essencial de A e Rµ (A).
285
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
e que
Logo, vemos que λ ∈ σdisc (A) se, e somente se, (µ − λ)−1 ∈ σdisc (Rµ (A)) e da mesma forma
para o espectro de auto-valores aproximados. Isto prova a afirmação (ii) e, portanto, (i).
2. O lado esquerdo tem um minimizador x se, e somente se, Ax = λx, com λ = inf σ(A),
LEMA 5.2. Defina S(x) = ⟨x, Ax⟩ para x ∈ Dom(A), com ∥x∥ = 1. Então, inf σ(A) =
inf S. Além disso, λ = inf σ(A) é um auto-valor de A se, e somente se, existir um minimizador
para S(x) entre os vetores x ∈ Dom(A), com a restrição que ∥x∥ = 1.
Como na prova da Proposição 5.6, isso mostra que o operador A − µ1I é invertível e, portanto,
/ σ(A). Assim, inf S # inf σ(A). Agora, defina λ = inf σ(A). Pelo Teorema 5.12,
µ ∈
286
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
⟨x, Ax⟩ " λ∥x∥2 para qualquer x ∈ Dom(A). Logo, inf S " λ = inf σ(A) e, portanto,
inf S = inf σ(A) conforme exigido.
para algum λ. Como S ′ (x) = 2Ax, isso significa que x0 é um auto-vetor de A com auto-valor
λ. Além disso,
Como S(x0 ) = inf S = inf σ(A), conclu ımos que λ = inf σ(A) é um auto-valor de A, com
auto-vetor x0 .
Demonstração do Teorema 5.16. O Lema 5.2 dá a prova das duas primeiras partes do teorema -
o princípio variacional de Ritz: para qualquer x ∈ Dom(A),
Para obter a terceira parte do teorema, afirmando que se podemos encontrar x com ∥x∥ = 1
e ⟨x, Ax⟩ < inf σess (A), então, sabemos que A tem pelo menos um auto-valor abaixo de seu
espectro essencial, notamos que, pelo Lema 5.2,
inf σ(A) = inf S < ⟨x, Ax⟩ < inf σess (A) ,
O princípio variacional acima pode ser estendido para auto-valores mais altos (cf. os Teoremas
5.29 e 5.39).
287
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Exemplo 5.5 (Espectro do operador posição X). Vamos mostrar que o operador posição X
em H = L2 (R) não tem auto-valores e que σ(X) é todo R. Por questão de completeza,
vamos primeiro mostrar que X é auto-adjunto.
Para qualquer x ∈ R, assuma que XΨ(x) = xΨ(x), com domínio natural de X sendo o
subespaço
# $ ∞ %
2 2
Dom(X) = Ψ ∈ L2 (R) | dx x |Ψ(x)| < ∞ , (5.5.1)
−∞
que é denso em L2 (R). De fato, para qualquer Ψ ∈ L2 (R) tome Φ ∈ C0∞ (R) tal que Φ(x) = 1,
quando x ∈ [−1, 1], e desaparece fora desse intervalo. Considere Ψn (x) = Ψ(x)Φ(x/n); então
é claro que Ψn ∈ Dom(X). Por outro lado,
$
5 . /52
2
∥Ψ − Ψn ∥2 = dx 5Ψ(x) 1 − Φ(x/n) 5 = 0 .
|x|#n
= ⟨XΦ, Ψ⟩ ,
Em particular, a Eq.(5.5.2) acontece para qualquer função Ψ ∈ L2 (R) que desaparece fora de
um intervalo finito [−n, n],
. já que toda função
/ de suporte compacto é um elemento de S (R).
Logo, tomando Ψ(x) = x Φ(x) − Φ1 (x) Ω(x/n), em que Ω(x/n) = 1 quando |x| # n, e
desaparece se |x| > n, então
$ n 5 52
5 5
0= dx 5x Φ(x) − Φ1 (x)5 .
−n
Assim, Φ1 (x) = x Φ(x) em quase toda parte em [−n, n], e, portanto, em quase toda parte
em R, uma vez que n pode ser tomado arbitrariamente grande. Isto significa que x Φ(x) é
8
Isto é, Dom(X) ⊂ Dom(X ∗ )!
288
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Finalmente, para mostrar que o operador posição X, em H = L2 (R), não tem auto-
valores e que σ(X) é todo R, assuma, para qualquer λ ∈ R, que Ψ ∈ Dom(X) tal que
XΨ(x) = λΨ(x). Isto implica que (X − λ1I)Ψ(x) = 0. Portanto, pela definição de X
$ ∞
2
0 = ∥(X − λ1I)Ψ(x)∥2 = dx |x − λ|2 |Ψ(x)|2 .
−∞
Uma vez que |x − λ| > 0, para todo λ ̸= x, temos que Ψ = 0 para quase todo x ∈ R, isto
é, Ψ = 0. Isto mostra que Ψ não é um auto-vetor, e λ não é um auto-valor de X. Como λ é
arbitrário, X não tem auto-valores!
Para mostrar que σ(X) é todo R, tomamos uma sequência de funções contínuas Ψn : R →
R, com as seguintes propriedades:
1. Ψn (x) " 0;
$ ∞
2. dx Ψn (x) = 1;
−∞
$
3. dados ε > 0 e δ > 0, existe um n0 tal que, para n " n0 , dx Ψn (x) > ε.
|x|>δ
Não é difícil mostrar (verifique isso!) que a sequência composta pelas funções
2 (x−λ)2 /2
Ψn (x) = C(n)e−n ∈ S (R) ⊂ L2 (R) ,
com C(n) = n1/2 π −1/4 satisfaz as condições exigidas para ser um núcleo de Dirac.9 Note que
Ψn ∈ Dom(X). Além disso,
$ ∞
2
∥(X − λ1I)Ψn ∥2 = dx |(X − λ1I)|2 |Ψn (x)|2
−∞
$ ∞
2 (x−λ)2
= C(n) dx (x − λ)2 e−n
−∞
$ ∞
2 y2
= C(n) dy y 2e−n = 2−1 n−5/2 π 1/4 ;
−∞
ou seja, ∥(X − λ1I)Ψn ∥22 = 2−1 n−5/2 π 1/4 → 0, quando n → ∞. Assim, (Ψn )n∈N é uma
sequência de Weyl e como λ é número real qualquer, segue do Teorema 5.11 que o espectro de
X consiste na totalidade dos números reais: σ(X) = σess (X) = R.
9
É sempre importante enfatizar que o espaço S (R) é denso em L2 (R).
289
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Isto significa que, no espaço de Fourier, o operador P^ se comporta como um operador multi-
plicação com domínio natural
# $ ∞ %
Dom(P^) = Ψ ^ ∈ L2 (R) | 2 ^
dk k |Ψ(k)| 2
<∞ ,
−∞
que é denso em L2 (R). Logo, podemos usar toda a análise adotada anteriormente no estudo do
espectro do operador posição para concluir que σ(P ) = σess (P )R. De fato, se considerarmos,
como antes, uma sequência composta pelas funções
^ n (k) = C(n)e−n2 (k+λ)2 /2 ∈ S (R) ⊂ L2 (R) ,
Ψ
^ n ∥2 = 1 e ∥(k + λ)Ψ
com C(n) = n1/2 π −1/4 , segue que ∥Ψ ^ n ∥2 → 0, quando n → ∞. Então,
2
tomando α = n /2 na segunda parte do Lema 6.6, segue que no espaço das coordenadas
2 /2n2
Ψn (x) = C(n)n−1 (2π)−1/2 e−(x+λ) → 0 quando n→0.
Por outro lado, pelo Teorema 6.14 (Teorema de Parseval-Plancherel) nós temos que ∥Ψn ∥2 =
∥Ψ^ n ∥2 = 1. Assim, ∥(P − λ)Ψn ∥2 = ∥(k + λ)Ψ ^ n ∥2 → 0. Isto mostra que (Ψn )n∈N é uma
sequência de Weyl e que o espectro de P também consiste na totalidade dos números reais:
σ(P ) = σess (P ) = R. Além disso, assim como na análise do espectro do operador posição,
podemos concluir que P não tem auto-valores.
A seguir, vamos determinar o espectro do operador P na situação quando ele atua no espaço
H = L2 (0, 2π). Considere a equação
dΨ(x)
−i# = λΨ(x) . (5.5.3)
dx
sujeita à condição de fronteira Ψ(0) = Ψ(2π). Podemos, facilmente, concluir que a solução da
equação de auto-valor (5.5.3) tem como solução a função
1
Ψ = Ψm = √ eimx , m∈Z.
2π
Portanto, λ = λm = m. Não é difícil verificar que para λ ̸= λm a equação (P − λ1I)Ψ = Φ
ou, equivalentemente,
dΨ(x)
−i# − λΨ(x) = Φ(x) , com Ψ(0) = Ψ(2π) ,
dx
tem solução para toda função Φ ∈ L2 (0, 2π). Neste caso, σess (P ) = ∅.
290
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
#2 d 2
H0 = − ,
2m dx2
atuando em H = L2 (R). Para estudar seu espectro, considere a equação
(H0 − λ)Ψ(x) = 0 .
d2 Ψ(x)
+ γ 2 Ψ(x) = 0 ,
dx2
cuja solução geral é
Ψ(x) = C1 eiγx + C2 e−iγx .
É evidente que esta solução não pertence ao domínio Dom(H0 ), uma vez que |e±iγx | = 1,
a não ser que as constantes C1 = C2 = 0, caso em que Ψ(x) ≡ 0. Portanto, H0 não tem
auto-valores.
(H0 − λ)Ψ(x) = 0 ,
da seguinte forma:
#2 6 √ 76 √ 7
(H0 − λ1I)Ψ(x) = − P + 2m#−1 λ1I P − 2m#−1 λ1I Ψ(x) = 0 .
2m
Note
√ que, neste caso, o domínio de ambos operadores é Dom(H0 ). Note também que,
± 2m#−1 λ pertencerá ao conjunto resolvente de P a não ser que λ " 0. No entanto, já
vimos no Exemplo 4.13, na página 217, que o operador P é auto-adjunto em L2 (R). Isto implica,
pelo Teorema 5.4, que λ deve ser " 0. Desta forma, λ ∈ ρ(H0 ) se λ é negativo!
dΨn (x) . /
= iγ − 2n−2 x Ψn (x) ,
dx
e
d2 Ψn (x) . 2 /
2
= −γ − 2n−2 − i4γn−2 x + 4x2 n−4 Ψn (x) .
dx
291
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Aqui, devemos ressaltar que como Φn ∈ S (R), então, xα Φn ∈ S (R), para qualquer potência
α de x, devido às propriedades do espaço de Schwartz (veja detalhes no Capítulo 6). Logo, isto
mostra que
∥(H0 − λ)Ψn ∥ → 0 quando n → ∞ .
Portanto, (Ψn )n∈N é uma sequência de Weyl e λ ∈ σ(H0 ). Visto que λ > 0, podemos concluir
que o eixo real positivo está contido em σ(H0 ). Em contrapartida, como pelo Corolário 5.2,
σ(H0 ) é um conjunto fechado, o valor λ = 0 deve também estar em σ(H0 ), mas não pode
ser um auto-valor já que H0 Ψ = 0 implica que Ψ = 0. Isto prova que o espectro do operador
energia, H0 , consiste dos números reais não-negativos: σ(H0 ) = σess (H0 ) = [0, ∞).
O operador adjunto P ∗ é uma extensão de P e, como já vimos, seu domínio inclui elementos
de S (R+ ) que não satisfazem a condição de contorno; isto é,
3 4
Dom(P ∗) = Ψ ∈ S (R+ ) ⊂ L2 (R+ ) | Ψ′ (x) ∈ L2 (R+ ) .
Isto implica que P , apesar de ser simétrico, não é auto-adjunto e, como vimos, não tem extensão
auto-adjunta.
Logo,
−1 x
Ψ = Ceiλ# ,
é uma auto-função de P ∗ , para Im λ > 0, mas não de P , pois não pertence ao domínio
Dom(P ) a menos que a constante C seja zero, caso em que Ψ(x) ≡ 0. No entanto, λ está
no conjunto resolvente ρ(P ) de P , como pode ser visto resolvendo a equação
dΨ(x)
−i# − λΨ(x) = Φ(x) ,
dx
para uma dada função Φ ∈ S (R+ ). A solução da equação acima é
$ x
−1
Ψ(x) = dy eiλ# (x−y) Φ(y) ,
0
como se pode verificar. Com efeito, usando-se a fórmula de Leibnitz, obtemos que
$ x $ x
d iλ#−1 (x−y) −1
−i# dy e Φ(y) = λ dy eiλ# (x−y) Φ(y) + Φ(x) .
dx 0
B CD E B0 CD E
Ψ(x) Ψ(x)
Além disso, essa solução é única, devido à condição de contorno Ψ(0) = 0. A função Ψ é
contínua, e como Φ ∈ S (R+ ) e Im λ > 0, então, Ψ ∈ S (R+ ) também, portanto está em
L2 (R+ ). As funções em S (R+ ) são densas em L2 (R+ ), logo (P − λ1I)−1 existe e possui
domínio denso. Consequentemente, a desigualdade
1
∥Rλ (P )Φ∥ # ∥Φ∥ ,
Im λ
aplica-se, porque P é simétrico, portanto (P − λ1I)−1 é limitado. A conclusão é que o semi-
plano superior do plano complexo está no conjunto resolvente ρ(P ) de P , mas no espectro
discreto σdisc (P ∗ ) de P ∗ .
293
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
(a soma acima é finita ou infinita contável), então, a decomposição (5.6.1) nos permite definir,
naturalmente, operadores de projeções ortogonais, Pi , sobre cada subespaço Mi ,
Pi : H → Mi , Pi (H ) = Mi ,
10
Observações históricas sobre algumas provas do teorema Espectral podem ser encontradas no livro-texo de
César R. de Oliveira, “Intermediate Spectral Theory and Quantum Dynamics,” Progress in Mathematical Physics 54,
Birkhäuser, 2009, na pag.225.
294
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
2
(ii) PM é limitado, com ∥PM ∥ = 1, e PM = PM (idempotente), com PM |M = 1I (identidade
em M),
(vi) PM é auto-adjunto,
∗ ∗
(vii) PM é normal, isto é, PM PM = PM PM ,
PM (x1 + x2 ) = y1 + y2 = PM x1 + PM x2 .
Analogamente, temos que para qualquer número complexo α, PM (αx) = αPM x. Além disso,
ou seja, ∥x∥ " ∥y∥ = ∥PM x∥, de forma que ∥PM ∥ # 1. Se x ∈ M, então, a decomposição
x = x + 0 acontece; portanto, ∥x∥ = ∥PM x∥. Consequentemente, para ∥x∥ " ∥PM x∥ a
igualdade acontece se x ∈ M. Assim, mostramos que ∥PM ∥ = 1.
Item (iii). Temos que mostrar M = PM H é um subespaço fechado. Seja (yn )n∈N uma
sequência arbitrária em M, tal que limn→∞ yn = y. Devemos mostrar que y ∈ M. Como
295
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
PM y − yn = PM y − PM yn = PM (y − yn ) .
∥PM y − yn ∥ # ∥y − yn ∥ .
Item (iv). Sabemos que cada vetor x ∈ H escreve-se de maneira única como x = y + z,
com y ∈ M e z ∈ M ⊥ . Logo,
x = y + z = PM x + PM ⊥ x = (PM x + PM ⊥ )x =⇒ PM x + PM ⊥ = 1I .
Item (v). Como todo vetor não-nulo x ∈ H pode ser escrito de maneira única como
x = y + z, com y ∈ M e z ∈ M ⊥ , então,
0 = ⟨y, z⟩ = ⟨PM x, PM ⊥ x⟩ .
Item (vi). Como PM é simétrico, limitado e tem como domínio todo o espaço de Hilbert
H , então, de acordo com o Teorema de Hellinger-Toeplitz (Teorema 4.14), PM é auto-adjunto.
Item (vii). Isto é uma consequência imediata do fato de PM ser idempotente e auto-adjunto.
296
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
(i) P1 # P2 ,
(iii) M1 = P1 H ⊂ M2 = P2 H ,
(iv) P1 P2 = P2 P1 = P1 .
Demonstração. Item (i) =⇒ Item (ii). Por serem idempotentes P1 e P2 , segue imediatamente
que (i) implica (ii). Com efeito, temos que ⟨x, P1 x⟩ # ⟨x, P2 x⟩, para todo x ∈ H . Logo,
seguindo o mesmo desenvolvimento da demonstração do Item (viii), do Teorema 5.17, segue
que ∥P1 x∥ # ∥P2 x∥, para todo x ∈ H .
Item (iii) =⇒ Item (iv). Para todo x, y ∈ H segue que P2 P1 x = P1 x. Com efeito,
⟨y, P2P1 x⟩ = ⟨P2 y, P1x⟩ = ⟨P1 P2 y, x⟩| = ⟨P1 y, x⟩ = ⟨y, P1x⟩ .
Item (iv) =⇒ Item (i). Observamos que 1I−P1 também é uma projeção ortogonal, portanto
positiva. Para x ∈ H resulta que
⟨x, (P2 − P1 )x⟩ = ⟨x, P2 x⟩ − ⟨x, P1 x⟩ = ⟨x, P2 x⟩ − ⟨x, P2 P1 x⟩ = ⟨x, P2 (1I − P1 )x⟩ " 0 ,
pois P2 comuta com 1I − P1 e ambos são positivos.
COROLÁRIO 5.6. Sejam H um espaço de Hilbert e P1 , P2 e P3 operadores de projeções ortogo-
nais. Assuma que P1 x + P2 x = P3 x, para todo x ∈ H . Então, P1 H ⊕ P2 H = P3 H . Esta
igualdade implica que P1 H ⊂ P2 H ⊂ P3 H .
297
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
= ⟨x, P1 x⟩ + ⟨x, P2 x⟩
= ⟨P1 x, P1 x⟩ + ⟨P2 x, P2 x⟩
∥P1 y∥2 " ∥P1 P1 y∥2 + ∥P2 P1 y∥2 = ∥P1 y∥2 + ∥P2 P1 y∥2 ,
TEOREMA 5.19. Sejam H um espaço de Hilbert e (Pn )n∈N uma sequência de operadores de pro-
jeções ortogonais em H , com ⟨x, Pm x⟩ # ⟨x, Pn x⟩ ou ⟨x, Pm x⟩ " ⟨x, Pn x⟩, respectivamente,
para todo m # n, com m, n ∈ N. Então, para todo x ∈ H existe um operador de projeção
ortogonal P em H tal que limn→∞ Pn x = P x e ⟨x, Pn x⟩ # ⟨x, P x⟩ ou ⟨x, Pn x⟩ " ⟨x, P x⟩,
respectivamente, para n ∈ N.
Demonstração. O segundo caso, quando ⟨x, Pm x⟩ " ⟨x, Pn x⟩, pode ser reduzido ao primeiro
simplesmente considerando a sequência 1I − P1 , 1I − P2 , . . . Portanto, basta considerarmos o
primeiro caso. Logo, para todo m # n, obtemos, pelo Teorema 5.18, que ∥Pm x∥ # ∥Pn x∥. A
seguir, vamos primeiro mostrar que Pn − Pm atuando em H é um operador de projeção. A
simetria de Pn − Pm em H é óbvia. Com efeito, sendo Pm e Pn projetores ortogonais segue
que
Resta somente mostrar que Pn − Pm é idempotente. Como ∥Pm x∥ # ∥Pn x∥, para todo
x ∈ H , então, definindo x = (1I − Pn )y, com y ∈ H arbitrário, então,
(Pn − Pm )2 = Pn − Pn Pm − Pm Pn + Pm = Pn − Pm .
Observe que, a sequência numérica (∥Pn x∥)n∈N é limitadad e monótona crescente, já que
∥Pn x∥ # ∥x∥ e ∥Pm x∥ # ∥Pn x∥. Assim, limn→∞ ∥Pn x∥ existe. Como Pn − Pm é um
298
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
= ⟨(Pn − Pm )x, x⟩
= ⟨Pn x, x⟩ − ⟨Pm x, x⟩
= ∥Pn x∥2 − ∥Pm x∥2 < ε2 para todo m, n > N(ε) e n " m .
Como H é completo, para todo x ∈ H existe um y ∈ H tal que limn→∞ Pn x = y. Se
assumirmos que y = P x, vemos imediatamente que P em H é um operador linear simétrico
que satisfaz a condição P 2 = P . A simetria de P segue da relação
⟨z, P x⟩ = lim ⟨z, Pn x⟩ = lim ⟨Pn z, x⟩ = ⟨P z, x⟩ ,
n→∞ n→∞
para todo x, z ∈ H . Além disso, temos que
⟨z, P 2 x⟩⟨P z, P x⟩ = lim ⟨Pn z, Pn x⟩ = lim ⟨Pn2 z, x⟩ = lim ⟨Pn z, x⟩ = ⟨P z, x⟩ ,
n→∞ n→∞ n→∞
Para finalizar, precisamos garantir que P é auto-adjunto. Usando o mesmo raciocínio apli-
cado ao Item (ii), do Teorema 5.17, mostra-se que ∥P ∥ = 1. Então, como P é simétrico,
limitado e tem como domínio todo o espaço de Hilbert H , então, de acordo com o Teorema
de Hellinger-Toeplitz (Teorema 4.14), P é auto-adjunto. Dessa forma, o teorema está demons-
trado.
Exemplo 5.10 (Espaços de Hilbert de dimensão finita). Considere um operador auto-adjunto
limitado A atuando em um espaço de Hilbert complexo H de dimensão finita. Neste
caso, existe uma base ortonormal {xi }ni=1 consistindo de auto-vetores do operador A cor-
n
respondente;naos auto-valores reais λi . Visto que {xi }i=1 é uma base ortonormal temos
que x = i=1 ⟨xi , x⟩xi , para todo x ∈ H . Note que, se definirmos o operador Pi por
Pi x = ⟨xi , x⟩xi , então, segue que
<n n
< n
<
x= ⟨xi , x⟩xi = Pi x =⇒ 1I = Pi . (5.6.2)
i=1 i=1 i=1
Como já enfatizado, a expressão na implicação acima é chamada resolução da identidade.
Verifica-se facilmente que Pi ;é um operador de projeção. Além disso, o operador auto-adjunto
A tem a representação A = ni=1 λi Pi . Com efeito,
< n n
<
Ax = ⟨xi , Ax⟩xi = ⟨Axi , x⟩xi
i=1 i=1
n
<
= λi ⟨xi , x⟩xi
i=1
n
< n
<
= λi Pi x =⇒ A = λi Pi . (5.6.3)
i=1 i=1
299
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Este teorema é um caso especial do análogo para operadores auto-adjuntos limitados ou não
que discutiremos a partir de agora.
300
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Demonstração. Se A em H não é limitado, então, deve existir uma sequência (xn )n∈N ⊂ H ,
com ∥xn ∥ # C, para alguma constante C > 0 e para todo n, tal que ∥Axn ∥ > n∥x∥. Vamos
definir yn = xn /∥xn ∥. Então, ∥yn ∥ = 1 e ∥Ayn ∥ > n. Logo, ∥Ayn ∥ → ∞ quando n → ∞.
Deste modo, a sequência (yn )n∈N não pode conter uma subsequência (ynk )k∈N para qual o
limite limk→∞ Aynk existe, o que contradiz a Definição 5.7. Portanto, A deve ser limitado.
Nota 5.15. Ao contrário do que ocorre em um espaço de Hilbert de dimensão finita em que a
noções de um operador ser limitado ou compacto coincidem, como mencionado acima, no caso
de um espaço de Hilbert de dimensão infinita isto não é verdade. De fato, o Teorema 5.21 não
tem um inverso, isto é, se um operador linear A em espaço de Hilbert complexo H é limitado,
ele não é necessariamente compacto. Curiosamente, o operador identidade é um dos exemplos
mais típicos de operadores limitados que não é compacto. Com efeito, considere o espaço ℓ2
(veja Exemplo 2.5) e um sistema ortonormal infinito de vetores {x1 , x2 , . . .} ⊂ ℓ2 . Seja 1I o
operador identidade em ℓ2 . Uma vez que 1Ixn = xn para qualquer n, certamente√1I é limitado,
uma vez que ∥1I∥ = 1. Entretanto, como ∥1Ixn − 1Ixm ∥ = ∥xn − xm ∥ = 2, para todo
n, m (com n ̸= m), é impossível extrair uma subsequência convergente da sequência (1Ixn )n∈N .
Assim, 1I não é compacto. É interessante observar que a ausência dessa subsequência é apenas
uma outra forma de estabelecer o Teorema 3.13, que afirma que a bola unitária fechada em
espaços de Hilbert de dimensão infinita não é compacta. Portanto, em espaços de Hilbert de
dimensão infinita, operadores compactos preenchem uma posição que é totalmente contrária à
do operador identidade.
Uma outra definição (equivalente à Definição 5.7) que exibe uma propriedade importante
dos operadores compactos, e muitas vezes mais conveniente em certas aplicações, é dada pela
seguinte
w
Demonstração. Suponha que xn −→ x. Logo, ∥xn ∥ # C, para alguma constante C > 0 e para
todo n. Seja yn = Axn . Então, segue que
Isto implica que limn→∞ |⟨A∗ z, (xn − x)⟩| = 0. Assim, a sequência (yn )n∈N converge fraca-
mente para y = T x em H . Suponha que a sequência (yn )n∈N não converge para y na norma.
Então, existe um ε > 0 e uma subsequência (ynk )k∈N de (yn )n∈N tal que ∥ynk − y∥ " ε.
Mas, como a sequência (xn )n∈N é limitada e A é compacto, pela Definição 5.7, a sequência
(yn )n∈N dever conter uma subsequência que converge fortemente para algum vetor y1 ∈ H ,
com y1 ̸= y. Como, pela Proposição 3.12, a convergência forte implica na convergência fraca,
esta subsequência deve convergir fracamente para y1 . Mas, isto é impossível já que a sequência
(yn )n∈N converge fracamente para y. Portanto, como todo espaço de Hilbert é Hausdorff, pela
301
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Proposição 1.15, limites de sequências devem ser únicos, ou seja, devemos ter y1 = y. Logo, a
sequência (yn )n∈N converge para y na norma.
A teoria dos operadores compactos tem muitas utilidades na teoria quântica, algumas das
quais nós vamos encontrar no Capítulo 7. Por esse motivo, alguns resultados relacionados com
os operadores compactos merecem atenção especial. Comecemos com o seguinte
Demonstração. (a) Se (xn )n∈N é qualquer sequência limitada em H , existe uma constante
C > 0 tal que ∥xn ∥ # C para todo n ∈ N. Logo, uma vez que A1 é compacto, existe
uma subsequência (xnk )k∈N da sequência (xn )n∈N tal que a sequência (A1 xnk )k∈N converge
(fortemente) para algum vetor x1 ∈ H . Além disso, a sequência (xnk )k∈N também é limitada e
deve conter uma subsequência (xnℓ )ℓ∈N , tal que a sequência (A2 xnℓ )ℓ∈N converge (fortemente)
para um vetor x2 ∈ H , visto que A2 é compacto. Consequentemente, a sequência αA1 xn1 +
βA2 xn1 + · · ·+ αA1 xnk + βA2 xnk + · · · é convergente. Assim, pela linearidade dos operadores
A1 , A2 , obtemos que αA1 +βA2 é compacto e que o espaço dos operadores lineares compactos
é um espaço vetorial.
w
(b) Pela Proposição 5.13, se xn −→ x, então, ∥BAj xn − BAj x∥ = ∥B(Aj xn − Ax)∥ #
∥B∥∥Aj xn − Aj x∥ → 0, para j = 1, 2. Logo, Aj B é compacto. Da mesma forma, como B
é limitado, a sequência (Bxn )n∈N é limitada em H , isto é, temos que ∥Bxn ∥ # C1 , para
alguma constante C1 > 0 e para todo n, já que a sequência (xn )n∈N é limitada. Mas, pela
w
Proposição 5.13, isto implica que Bxn −→ Bx e ∥Aj Bxn −Aj Bx∥ → 0, para j = 1, 2. Assim,
BAj é compacto.
Demonstração. Seja (xn )n∈N uma sequência limitada em H , isto é, ∥xn ∥ # C, para uma
constante C > 0 e para todo n. Então, existe uma subsequência (xnk )k∈N tal que a sequência
(A∗ Axnk )k∈N converge (fortemente) para algum vetor x ∈ H . Visto que
302
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Então,
lim ∥Axn − Axm ∥ = 0 ,
n,m→∞
de maneira que a sequência (Axnk )k∈N é de Cauchy em H . Mas, como H é completo, existe
um vetor y ∈ H tal que limn,m→∞ ∥Axn − y∥ = 0. Logo, A é compacto.
Demonstração. Uma vez que A é compacto, segue que ele é limitado. Então, pela Proposição
4.8, uma vez que A é limitado, segue que Dom(A) ⊂ Dom(A∗ ) = H . Mas, por hipótese,
Dom(A) = H . Logo, Dom(A) = Dom(A∗ ), e como Ax = A∗ x para cada x no domínio
comum, isto implica que A é auto-adjunto. Portanto, pelo teorema que acabamos de provar,
segue que
lim ∥A∗ xn − A∗ xm ∥ = lim ∥Axn − Axm ∥ = 0 .
n,m→∞ n,m→∞
O seguinte teorema é muitas vezes usados para provar que um dado operador é compacto e
desempenhará um papel fundamental no Capítulo 7, em particular, na prova da estabilidade do
espectro essencial do operador de Schrödinger.
TEOREMA 5.24 (Critério de compacidade de um operador). Dado uma sequência (Am )m∈N
de operadores lineares compactos e um um espaço de Hilbert H tal que Am : H → H ,
suponha que (Am )m∈N converge uniformemente para um operador A, isto é, suponha que ∥A −
Am ∥ → 0 quando m → ∞. Então, A é compacto.
Demonstração. Para provar que A é compacto, precisamos somente mostrar que a sequência
(Axn )n∈N contém uma subsequência convergente, quando a sequência for (xn )n∈N ⊂ H for
limitada, isto é, quando ∥xn ∥ # C, para alguma constante C > 0 e para todo n. Deste
modo, suponha que a sequência (xn )n∈N converge a para um vetor x ∈ H e que (xnk1 )k1 ∈N
seja uma subsequência da sequência (xn )n∈N . Então, pelo Teorema 1.8, para qualquer bola
aberta B(x; ε), de centro x e raio ε, existe, por definição, um n0 ∈ N tal que todos os
termos da sequência (xn )n∈N com n > n0 pertencem à bola B(x; ε). Ora, neste caso,
todos os termos da subsequência (xnk1 )k1 ∈N , com nk1 > n0 também pertencem a B(x; ε).
Logo, limk→∞ xnk1 = x. Da mesma forma, seja (xnk2 )k2 ∈N uma subsequência da sequência
(xnk1 )k1 ∈N . Usando o mesmo raciocínio acima, mostra-se que limk→∞ xnk2 = x. Continuando
este processo recursivamente, obtemos uma sequência infinita de sequências (xnkℓ )kℓ ∈N , de
modo que cada uma seja uma subsequência da precedente. Isto implica que
Pela condição de compacidade dos elementos Am da sequência (Am )m∈N , para toda subsequên-
cia (xnkℓ )kℓ ∈N a sequência (Am xnkℓ )kℓ ∈N converge fortemente. Sendo assim, assuma que para
o elemento A1 a subsequência (xnk1 )k1 ∈N seja mapeada por A1 em uma sequência fortemente
303
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
convergente, que para o elemento A2 a subsequência (xnk2 )k2 ∈N seja mapeada por A2 em uma
sequência fortemente convergente, e assim por diante. Então, da desigualdade
inferimos que a sequência (Axnki )ki ∈N é fortemente convergente. Com feito, dado que ∥(A −
Am )∥ → 0, podemos escolher um m suficientemente grande tal que ∥(A − Am )∥ < ε/(4C),
para qualquer ε > 0 arbitrário. Da mesma forma, como todo operador Am é compacto, portanto,
é limitado, segue que podemos tomar ∥Am ∥ # 1/m. Logo, para o mesmo m suficientemente
grande, podemos tomar ∥Am ∥ < ε/(4C). Portanto, temos que
A teoria espectral de operadores compactos tem muitas similaridades com a teoria espectral
de operadores atuando em um espaço de Hilbert de dimensão finita. A seguir, vamos explorar
estas similaridades. Iniciamos dando uma expressão para a norma de um operador auto-adjunto
limitado A operando em um espaço de Hilbert complexo H que será útil na sequência.
Demonstração. Assuma que M = sup∥x∥=1 |⟨x, Ax⟩| sobre a bola ∥x∥ = 1. Então, pela
desigualdade de Cauchy-Schwarz-Bunjakowski, segue que
304
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
∥A∥ = sup |⟨y, Ax⟩| = sup |⟨αx, Ax⟩| = |α| sup |⟨x, Ax⟩| " M .
∥x∥=∥y∥=1 ∥x∥=1 ∥x∥=1
Assim, ∥A∥ = M. Note que este resultado vale mesmo se A não é auto-adjunto!
∥A∗ ∥ = sup |⟨y, A∗x⟩| = sup |⟨Ay, x⟩| = sup |⟨x, Ay⟩| = ∥A∥ .
∥x∥=∥y∥=1 ∥x∥=∥y∥=1 ∥x∥=∥y∥=1
Enquanto isso, ∥A∗ A∥ # ∥A∗ ∥∥A∥ = ∥A∥2 . Por outro lado, como antes, tomando y = αx,
segue que
∥A∗ A∥ = sup |⟨y, A∗Ax⟩| = sup |⟨Ay, Ax⟩| = |α| sup |⟨Ax, Ax⟩| " ∥A∥2 .
∥x∥=∥y∥=1 ∥x∥=∥y∥=1 ∥x∥=1
Isto prova que ∥A∗ A∥ = ∥A∥2 . Mas, dado que A∗ = A, temos que ∥A2 ∥ = ∥A∥2 .
Nota 5.16. De acordo com o lema acima,
Podemos tornar a desigualdade acima mais fraca escolhendo dois números m, M de forma que
m(A) < −∥A∥ e M(A) > ∥A∥. Assim,
TEOREMA 5.25. Seja A um operador auto-adjunto. Sejam m = inf ∥x∥=1 ⟨x, Ax⟩ e M =
sup∥x∥=1 ⟨x, Ax⟩, respectivamente, os limites inferior e superior de A. Então, m1I # A # M1I.
Observe que sendo ∥A∥ = sup∥x∥=1 |⟨x, Ax⟩|, pelo Lema 5.3, ∥A∥ é o maior dos dois
números |m| e |M|.
305
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Demonstração. Assuma que M = sup∥x∥=1 |⟨x, Ax⟩| sobre a bola ∥x∥ = 1. Claramente
M > 0. Da definição de supremum deve existir uma sequência de vetores (xn )n∈N , com
∥xn ∥ = 1 para todo n, tal que o limite
existe e é igual a +M ou −M.12 Denotemos este limite por λ. Como A é compacto, a sequên-
cia de vetores normalizados (xn )n∈N , que obviamente é limitada, contém uma subsequência
(ynk )k∈N para a qual a sequência (Aynk )k∈N converge para algum x ∈ H , isto é,
Da equação
∥Aynk − λynk ∥2 = ∥Aynk ∥2 − 2λ⟨ynk , Aynk ⟩ + λ2 ∥ynk ∥ ,
segue que
Logo, a Eq.(5.6.7) implica que ∥w∥ # |λ|. Mas, o membro esquerdo da Eq.(5.6.8) não é negativo
e isto, por sua vez, implica que ∥w∥ = |λ|. Assim, a Eq.(5.6.8) torna-se
Das Eqs.(5.6.7) e (5.6.9) segue que o limite limk→∞ ynk existe e é igual w/λ. Redefinindo
λ = λ1 , w = x1 e x N1 = x1 /λ1 , então, ∥N
x1 ∥ = 1. Finalmente, como A foi assumido ser
compacto, podemos deduzir da Eq.(5.6.9) que13
. /
lim Aynk − λynk = lim Aynk − lim λynk
k→∞ k→∞ k→∞
6 7 6 7
= A lim ynk − λ lim ynk
k→∞ k→∞
= AN N1 = 0 ,
x1 − λ1 x
306
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
isto é, o espectro de p(A) consiste precisamente nos números da forma p(λ), com λ no espectro
de A.
Demonstração. Obviamente, podemos supor que n = deg p > 0. Primeiro mostraremos que
p(σ(A)) ⊂ σ(p(A)). Então, assuma que λ ∈ σ(A). Observe que
Assim, podemos extrair um fator de (A−λ1I) de cada termo diferente de zero para p(A)−p(λ)1I,
dando
p(A) − p(λ) = (A − λ1I)q(A) ,
em que q é um polinômio (dependendo de λ). Como (A − λ1I) não tem inverso e como
(A − λ1I) comuta com q(A), (A − λ1I)q(A) também não tem inverso e, portanto, também
p(A) − p(λ)1I. Isto implica que p(λ) ∈ σ(p(A)).
Agora, mostraremos que σ(p(A)) ⊂ p(σ(A)). Assuma que γ ∈ σ(p(A)). Pelo teorema
fundamental da álgebra, existem números complexos λ1 , . . . , λn que são as raízes da equação
Então,
Exemplo 5.11. A Proposição 5.14 tem um análogo bem conhecido se H = Cn , que é o teorema
sobre a diagonalização de uma matriz auto-adjunta. Neste caso, Dom(A) = Cn e podemos
representar A por uma matriz n × n auto-adjunta. Então, A − λ1I também é representado por
uma matriz e σ(A) é composto por escalares λ que são raízes da Eq.(5.1.3). Como discutido
na Seção 5.1, o determinante da matriz A − λ1I é um polinômio de grau n em λ. Portanto, se
os escalares associados com H são complexos, então σ(A) contém pelo menos um ponto, ou
pode conter tantos quanto, mas não mais que, n pontos distintos.14
14
Se os escalares são reais pode acontecer de σ(A) ser vazio!
307
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Nota 5.17 (Um comentário sobre o Teorema do Mapeamento Espectral). Como consequência
da representação espectral de A em (5.6.11), em geral, pode-se fazer uma definição razoável para
A 3→ f (A) se f for analítica em uma vizinhança de σ(A). Isso foi elaborado em toda a sua
generalidade por N. Dunford no artigo “Spectral Theory I, Convergence to Projections,” Trans.
Amer. Math. Soc. 54 (1943) 185. Dunford mostrou que, dado um operador auto-adjunto A
sobre um espaço de Hilbert H , existe um mapeamento contínuo f : σ(A) → C tal que entre
o espectro de A e sua “função” f (A) existe a relação
f (λ) − f (ζ)
g(λ) = , para λ ̸= ζ ,
λ−ζ
é analítica em uma vizinhança de σ(A). De g(λ)(λ − ζ) = f (λ) − f (ζ) segue, portanto, que
g(A)(A − ζ1I) = f (A) − f (ζ)1I. Se µ estivesse em ρ(f (A)), então teríamos
8 9 8 9
(f (A) − µ1I)−1 g(A) (A − ζ1I) = (A − ζ1I) (f (A) − µ1I)−1 g(A) = 1I .
Logo, A − ζ1I teria uma inversa, especificamente (f (A) − µ1I)−1 g(A), o que é impossível
porque por hipótese ζ está em σ(A). Portanto, µ ∈ σ(f (A)) o que implica que temos também
f (σ(A)) ⊂ σ(f (A)). Isto completa a prova.
Demonstração. Assuma que λ ∈ / σ(A). Então, pela Proposição 5.6, o resolvente (A − λ1I)
do operador auto-adjunto A tem um inverso limitado, isto é, ∥(A − λ1I)−1 ∥ # |Im λ|−1 .
Assim, para um operador auto-adjunto e compacto o operador (A − λ1I)−1 é contínuo se
λ ∈/ σ(A). No caso particular em que λ = 0 isto não se aplica. Com efeito, suponha que
−1
A é limitado, então, se (en )n∈N é uma sequência ortonormal arbitrária em H , pelo Teorema
s
5.22(b), nós teríamos que A−1 Aen −→ 0 e isto implicaria, por sua vez, que o operador
s
identidade A−1 Aen = 1Ien −→ 0 deveria ser compacto. Mas, isto é impossível como discutido
na Nota 5.15. Consequentemente, A não é continuamente invertível e, portanto, 0 ∈ σ(A).
308
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
com a soma sendo estendida sobre a sequência inteira, se finita ou infinita. Isto implica que
< <
A= λi Pi = λi Pi , (5.6.14)
λi ∈σ(A) i∈I
!
Seja M1 o subespaço
" gerado por todos vetores ortogonais ao vetor N
x1 , isto é, M1 = y|y∈
N1⟩ = 0 . O subespaço M1 = H ⊖ x
H , ⟨y, x N1 é invariante sob a ação de A. Na prática, como
A é auto-adjunto segue que
N1⟩ = ⟨y, AN
⟨Ay, x N1 ⟩ = 0 ∀ y ∈ M1 .
x1 ⟩ = λ1 ⟨y, x
e AN xn ∥ = 1. Isto implica que |λ1 | " |λ2 | " |λ3 | " · · · , com
Nn e ∥N
xn = λn x
15
Lembre-se que, se corresponder a λj auto-vetores linearmente independentes x1 , x2 , . . . , xn , então, dizemos
que λj tem multiplicidade n, e devemos escrever nλj vezes na ordenação acima.
309
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
uma vez que H ⊃ M1 ⊃ M2 ⊃ · · · Se este processo pára com λn+1 , xn+1 e Hn devido ao
fato da restrição de A a Mn ser zero, então, a Ran(A) situa-se no subespaço gerado pelos
vetores x Nn , associados aos auto-valores não-nulos
N1 , . . . , x
λ1 , λ2 , . . . , λn ,
em que
|λ1 | " |λ2 | " · · · " |λn | ,
e
|λj | = sup |⟨y, Ay⟩| .
∥y∥=1,y∈Hk
Portanto, ⟨N
xi , y⟩ = 0 se i = 1, . . . , n, de forma que Ay = 0, ou
n
<
Ax = ⟨N
xi , x⟩N
xi .
i=1
Isto acontece, mesmo que H seja de dimensão infinita. Efetivamente, se o processo não chegar
ao fim após um número finito de etapas, então, o resultado é um sistema ortonormal infinito e
limn→∞ |λn | = 0 pela seguinte razão: se isto não fosse verdade, então, x N2 , . . . seria uma
N1 , x
sequência infinita em H com
? ?
? xn ? 1
xn ∥ = ?
∥N ?
? λn ? = |λn | ∥xn ∥ = 1 .
Uma vez que A é compacto, esta sequência deveria conter uma subsequência (N ynk )k∈N para
a qual a sequência (AN ynk )k∈N converge para vetor x em H . Isto é um absurdo,√ uma vez
que a ortonormalidade do sistema yNn1 , yNn2 , . . . implica que ∥N
ynk − yNnℓ ∥ = 2 para todo
k ̸= ℓ. Note que, um auto-valor não pode ter um multiplicidade infinita na sequência de
auto-valores (λn )n∈N por causa do limite limn→∞ |λn | = 0. De fato, suponha que λk tem uma
multiplicidade r. Então, o subespaço formado pelos auto-vetores correspondentes ao auto-valor
λk tem dimensão finita r. Esse subespaço não pode ter uma dimensão maior que r pois isto
implicaria a existência de um vetor x tal que Ax = λk x, com ∥x∥ = 1 e ⟨x, x Ni ⟩ = 0, para
todo i. Mas, isto é impossível pelos mesmos argumentos usados acima.
Ainda assumindo que o processo não chega ao fim após um número finito de etapas, pela
Eq.(5.6.15) segue que
<n
2 2
∥y∥ = ∥x∥ − xi , x⟩|2 # ∥x∥2 .
|⟨N
i=1
310
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Vamos provar que a sequência (N xn )n∈N forma um sistema ortonormal completo se, e somente
16
se, 0 não é um auto-valor de A. Primeiro, vamos mostrar que o método acima só produz
auto-valores de A em H que são diferentes de zero. Para isto, assuma que λ∗ é um auto-valor
não-nulo que não está presente na sequência (λn )n∈N , então, existe um correspondente auto-
vetor z de norma um, e este vetor deve ser ortogonal a todos os auto-vetores x Ni , para todo i
(pela Proposição 5.9). Colocando x = z na série (5.6.13), obtemos que Az = 0, contradizendo a
hipótese que Az = λ∗ z ̸= 0. Levando em conta este fato, admita que o subespaço
<
M= ⊕ Ker(A − λi 1I)
λi ∈σdisc (A)
λi ̸=0
Só resta provar (5.6.14). Uma vez que a família {Ker(A − λi 1I)}λj ∈σdisc (A)⊂R é uma família
ortogonal, se definirmos o operador de projeção ortogonal Pi sobre cada subespaço Ker(A −
λi 1I) por Pi x = ⟨N xi , então, podemos escrever
xi , x⟩N
<
A= λi Pi .
i∈I
Precisamos garantir que a série acima converge fortemente se I = N0 . Mais do que isso, vamos
mostrar que essa série converge uniformemente. Como o sistema ortonormal construído acima
é completo, pela Definição 3.11a, todo vetor x ∈ H pode ser escrito na forma
∞
<
x = α0 x0 + Ni
αi x com α∈C,
i=1
16
Neste caso, como 0 não é um auto-valor de A, então, dizemos que matematicamente 0 é um ponto de
acumulação do espectro de A (veja a definição de ponto de acumulação na pg.36).
311
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Defina
n
<
An = λi Pi .
i=1
Vamos provar que An converge fortemente para A. Para isto, começamos computando Ax e
An x:
∞
< ∞
<
Ax = 0 + αi AN
xi = Ni ,
αi λ i x
i=0 i=0
e
∞ ∞
( n
) n
< < < <
An x = 0 + Ni =
αi An x αi Ni
λi Pi x = Ni ,
αi λ i x
i=0 i=0 i=1 i=0
Logo,
∞
<
∥An x − Ax∥ = |αi |2 |λi |2 ,
i=n+1
Uma vez que a sequência (|λi |)i∈N converge monotonicamente para zero, podemos escolher um
N tal que para i > N segue que |λi | < ε, para um ε > 0 arbitário. Tomando n maior que N
na expressão acima, podemos garantir que
∞
<
2
∥An x − Ax∥ # ε |αi |2 ,
i=n+1
# ∥(An − A)∥∥x∥
Portanto, de acordo com o Corolário 4.2, se uma sequência de operadores converge uniforme-
mente (ou converge na norma do operador), então, ela converge fortemente. Isto finaliza a prova
do teorema.
312
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Se a soma (5.6.13) é finita o operador A é dito ser de rank finito, isto é, se Ran(A) é de
dimensão finita; nesse caso, de acordo com o Capítulo 4, a dimensão de Ran(A) é denotada
por rank(A). Com esta definição, podemos reunir os resultados estabelecidos no Lema 5.4 e
no Teorema 5.27 no teorema a seguir, que é verdadeiro para um operador compacto arbitrário,
mas o provamos aqui para operadores compactos auto-adjuntos.
TEOREMA 5.28. Suponha que A seja o limite na norma de operadores auto-adjuntos An tal que
rank(An ) < ∞. Então, σess (A) ⊂ {0} com a igualdade se, e somente se, H for de dimensão
infinita.
Demonstração. Já vimos na prova do Teorema 5.27 que σ(A) = σdisc (A)∪{0} (veja a Eq.(5.6.16).
Como para um operador auto-adjunto σ(A) = σdisc (A)∪σess (A), basta mostrar que σess (A) =
{0}. Com efeito, se λ0 ̸= 0 é um ponto de acumulação de auto-valores de A, então, pela
Definição 5.5, λ0 ∈ σess (A). Assuma que λ ∈ σess (A). Logo, pelo Critério de Weyl, Teorema
w
5.11, existe uma sequência de Weyl (xn )n∈N para A e λ, ou seja, xn −→ 0, ∥xn ∥ = 1 e
s s s
(A − λ1I)xn −→ 0. Como A é compacto, Axn −→ 0 e, portanto, λ1Ixn −→ 0. Mas,
∥xn ∥ = 1; assim, λ = 0 e σess (A) ⊂ {0}. Por outro lado, se H for dimensão infinita, pelo
Lema 5.4, 0 ∈ σ(A), e pelo Teorema 5.27, 0 ∈ / σdisc (A); dessa forma, {0} ⊂ σess (A). Isto
implica que σess (A) = {0}.
Nota 5.18. Neste ponto, é interessante destacar que no Teorema 5.27, na Eq.(5.6.13), os auto-
valores são univocamente determinados por A, mas não os auto-vetores. Com efeito, se xi é
um auto-vetor correspondente ao auto-valor λi , então, ao invés de xi , podemos também usar
Ni = eiϕ xi , com 0 # ϕ < 2π, como um auto-vetor. A situação fica mais nítida ainda se λ é
x
um auto-valor múltiplo. Se xi , xj são auto-vetores de A, com ∥xi ∥ = ∥xj ∥ = 1 e ⟨xi , xj ⟩ = 0,
correspondentes a λ, então, ao invés de xi , xj , poderíamos também usar os auto-vetores x Ni , x
Nj
que obtemos de xi , xj através de uma transformação unitária
⎧ 2
( ) ( )( ) ⎪
⎪ |a| + |b|2 = 1
Ni
x a b xi ⎪
⎨
= com |c|2 + |d|2 = 1 .
Nj
x c d xj ⎪
⎪
⎪
⎩
ac + bd = 0
313
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
<<
= λi λj Pi Pj x
i∈I j∈I
<
= λ2i Pi x .
i∈I
Assim,
<
A−s = λ−s
i Pi .
i∈I
Tudo isto sugere que quando um operador auto-adjunto compacto A é representável como
uma soma ponderada de projeções, é possível desenvolver um “cálculo operacional” através de
um conjunto apropriado de operações sobre os pesos λi . De fato, para levar essa ideia mais
adiante, denotamos (vamos ver no Capítulo 8 que está expansão é bem definida porque A é
limitado)
<∞
A A2 A3 An
e = 1I + A + + +··· = .
2! 3! n=1
n!
Então,
∞
< ∞
< ∞ ∞
1 < 2 1 < 3
eA = Pn + λn Pn + λn Pn + λ Pn + · · ·
n=1 n=1
2! n=1 3! n=1 n
<∞ , - <∞
λ2n λ3n
= 1 + λn + + + · · · Pn = eλn Pn .
n=1
2! 3! n=1
Consequentemente,
∞
< ∞
<
sin A = (sin λn )Pn cos A = (cos λn )Pn .
n=1 n=1
314
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
A prova do Teorema 5.27 estabelece a existência e algumas das propriedades dos auto-
valores de um operador auto-adjunto compacto. No entanto, os auto-valores são notoriamente
difíceis de computar. A maneira mais simples de estimar os auto-valores é através do princípio
clássico do minimax de Courant-Weyl-Fischer-Poincaré-Rayleigh-Ritz que agora descrevemos. O
Teorema Minimax é um resultado que fornece uma caracterização variacional dos auto-valores
de operadores auto-adjuntos compactos em espaços de Hilbert. Pode ser visto como o ponto de
partida de muitos resultados de natureza semelhante.
TEOREMA 5.29 (Teorema minimax). Sejam H um espaço de Hilbert separável e A um operador
auto-adjunto positivo em H com espectro σ(A) = {λj | j ∈ N} ordenado de acordo com o
tamanho, λj # λj+1 e contando a multiplicidade. Para n = 1, 2, . . . denote por Xn a família
de todos os subespaços n-dimensionais Xn de H . Então,
, -
λn = min max⟨y, Ay⟩ .
Xn ∈Xn y∈Xn
315
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
X : Dom(X) → L2 [α, β]
com Dom(X) = L2 [α, β]. Então, note que, podemos escrever x Ψ(x) = 1Ix Ψ(x). Como 1I
não é compacto, segue que X também não o é. A não compacidade de X torna-se mais clara se
tomamos uma base de vetores de L2 [α, β] composta por funções normalizadas {Ψn (x)}n∈N .
Através do operador X, os vetores dessa base são mapeados em xΨn (x). Uma vez que
a # x # b, temos que √
∥xΨn − xΨm ∥ " ∥Ψn − Ψm ∥ = 2 ,
para quaisquer pares de n e m (com n ̸= m). Portanto, é impossível extrair uma subsequência
convergente de {xΨn (x)}n∈N . Uma consequência notável da não compacidade do operador X
é que nenhum número real λ pode ser um auto-valor de X. Em outras palavras, ao contrário
do caso dos operadores compactos, não existem suficientes auto-vetores para o operador X.
Este exemplo deixa claro que os métodos usados na análise do espectro de operadores não
compactos devem ser bem diferentes daqueles usados para os operadores compactos, pois agora
não assumimos a compacidade dos operadores e o espectro pode ser muito mais complicado.
Esta função é obviamente descontínua. Dessa forma, podemos fazer corresponder a ela uma
função eµ (A) do operador A que é uma projeção e que denotaremos por E(µ). Uma vez
que eµ (λ)eν (λ) = eµ (λ) se µ < ν, segue que E(µ)E(ν) = E(ν)E(µ) = E(µ) e, portanto,
E(µ) # E(ν). Além disso, uma vez que sobre o intervalo a # λ # b, eµ (λ) = 0 se µ < a e
eµ (λ) = 1 se µ " b, temos que E(µ) = O e µ < a e E(µ) = 1I se µ " b. Tudo isto nos leva
à seguinte
DEFINIÇÃO 5.8 (Família espectral). Seja λ um número real variando através de um inter-
valo finito ou infinito [α, β]. Uma resolução da identidade em um espaço de Hilbert H é
316
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
(ii) Continuidade forte pela direita: E(λ + 0)x = lim+ E(λ + ε)x = E(λ)x, para todo
ε→0
x ∈ H , λ ∈ R e ε > 0 arbitrário; isto é,18
Como os operadores E(λ) são projeções ortogonais, pelo Teorema 5.18, a propriedade (i) na
Definição 5.8 equivale à propriedade
Da propriedade (i′ ) segue que duas projeções E(λ) e E(µ), para λ, µ ∈ R, comutam.
Além disso, se λ = µ, então, E 2 (λ) = E(λ) e Ker(E) = Ran(E)⊥ . A propriedade (ii) é
apenas uma condição de normalização. Além disso, poderíamos ter exigido uma continuidade
forte pela esquerda, em vez de uma continuidade forte pela direita. De fato, a propriedade (ii)
não é essencial, sendo necessária apenas no estabelecimento da unicidade da medida espectral
(meramente representando uma normalização da função espectral). A continuidade pela direita
pode ser substituída pela continuidade pela esquerda; então, temos que substituir limε→0+
por limε→0− na prova da unicidade (veja a nota abaixo). Por fim, a propriedade (iii) é uma
condição de completeza. Se (iii) não é satisfeita, então temos uma resolução da identidade no
. / def.
espaço de Hilbert E(+∞) − E(−∞) H , em que E(±∞) = s−limλ→±∞ E(λ).
Nota 5.20 (Sobre a continuidade lateral da família espectral). Para qualquer família espectral
{E(λ)}λ∈R também existe o limite forte pela esquerda em λ ∈ R,
É fácil ver que E(λ − 0) é uma projeção. É possível que E(λ − 0) ̸= E(λ), e o motivo é
o seguinte: sabemos que E : R → R é uma função monótona limitada; uma vez que toda
18
Esta propriedade poderia também ser escrita da seguinte forma: E(λ + 0)x = lim E(µ)x = E(λ)x, com
µ→λ+0
µ → λ + 0 indicando que µ se aproxima de λ pela direita.
317
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
sequência limitada crescente ou decrescente de números reais tem um limite, todos os seguintes
limites existem (λ ∈ R):
E E
E
E
Agora, formulamos uma definição que será importante para o que vamos estudar.
318
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Então,
Pode-se ver a partir do exemplo acima que a ϱ-medida de um intervalo leva em consideração
um salto no valor de ϱ em um ponto final se, e somente se, esse ponto final estiver incluído
no intervalo. Observe também que são os limites esquerdo e direito de ϱ nos pontos finais
que determinam a medida, não o valor de ϱ nos pontos finais. Observe finalmente que, como
ilustram os exemplos a seguir, um intervalo que tem um ou ambos os pontos finais infinitos
319
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Com base nas observações acima, podemos deduzir várias propriedades envolvendo os mem-
bros da família espectral {E(λ)}λ∈R . Com efeito, se −∞ < α < β < +∞ e se I é um dos
intervalos (α, β), [α, β), (α, β], [α, β], podemos definir em analogia com a Definição 5.9 os
operadores P(I)
Em virtude da condição (ii) da Definição 5.8, esses operadores podem também ser escritos da
seguinte forma:
Claramente, se (α, β] e (β, λ] são dois intervalos adjacentes, então, P (α, µ] = P (α, β] +
P (β, λ]. Se (α, β] e (λ, µ] são dois intervalos arbitrários, então, a propriedade (i′ ) implica que
8 98 9
P(α,β] P(λ,µ] = E(β) − E(α) E(µ) − E(λ)
Disto, temos que se (α, β] ∩ (λ, µ] = ∅, por exemplo, se α < β # λ < µ, então,
Além disso, se (α, β] e (λ, µ] se sobrepõem sem que um deles seja um subconjunto do outro,
por exemplo, se α < λ < β < µ, então,
As fórmulas (5.6.18), (5.6.19) e (5.6.20) podem ser combinadas na seguinte (com a convenção
de que P (∅) = O):
320
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Finalmente, observe que (i) se P(λ,µ] = O e (α, β] ⊆ (λ, µ], então, P(α,β] = O; (ii) P(α,β] é
uma projeção, já que P(α,β] é auto-adjunta porque E(α) e E(β) são auto-adjunto, e a relação
2
P(α,β] = P(α,β] é obtida tomando-se α = λ e β = µ em (5.6.19).
Nota 5.21. Note que, se tomarmos α = β − ε e o limite ε → 0+ , obtemos a projeção P{β} =
E(β) −E(β −0) associada ao conjunto {β} consistindo no único ponto β – equivalentemente,
podemos tomar α = β em P[α,β] = E(β) − E(α − 0). P{β} é uma projeção, uma vez que é o
limite forte de uma sequência de projeções (cf. o Teorema 5.19). Tem-se:
1. P{β} = O (medida espectral do ponto β igual a zero) se, e somente se, a família espectral
{E(λ)}λ∈R é (fortemente) contínua no ponto λ = β;
2. P{β} ̸= O (medida espectral do ponto β diferente de zero) se, e somente se, a família
espectral {E(λ)}λ∈R é descontínua no ponto λ = β.
Demonstração. (i) Primeiro observamos que operadores de projeção ortogonais são lineares e
têm como domínio todo o espaço de Hilbert H . Então, se x é um vetor em H , segue que x
pode ser escrito univocamente na forma x = E(λ)x + (x − E(λ)x), com E(λ)x ∈ Ran(E)
e x − E(λ)x ∈ Ran(E)⊥ . Assim, ∥x∥2 = ∥E(λ)x∥2 + ∥(x − E(λ)x)∥2 " ∥E(λ)x∥2 .
Isto implica que ∥x∥ " ∥E(λ)x∥, para x ∈ H ; portanto, ∥E(λ)∥ # 1. Por outro lado, se
y ∈ Ran(E), então, existe um x ∈ H tal que
Nós podemos utilizar o mesmo raciocínio para y para mostrar que ⟨E ∗ (λ)y, x⟩ = ⟨y2, x2 ⟩.
Logo, encontramos ⟨E ∗ (λ)y, x⟩ = ⟨y, E(λ)x⟩ para x, y ∈ H . Portanto, como E(λ) é
limitado e Dom(E) = H , segue do Teorema de Hellinger-Toeplitz (Teorema 4.14) que E(λ) é
auto-adjunto.
321
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Demonstração. Para todo λ, µ ∈ R, com µ # λ, pela Propriedade (i′ ) da Definição 5.8 e pelo
Teorema 5.17, segue que
ϱ(µ) = ⟨x, E(µ)x⟩ = ⟨x, E(µ)E(µ)x⟩ = ⟨E(µ)x, E(µ)x⟩ = ∥E(µ)x∥2 = ∥E(µ)E(λ)x∥2
# ∥E(µ)∥2 ∥E(λ)x∥2 # ∥E(λ)x∥2 = ⟨E(λ)x, E(λ)x⟩ = ⟨x, E(λ)E(λ)x⟩ = ⟨x, E(λ)x⟩ = ϱ(λ) .
Portanto, ϱ(µ) # ϱ(λ). Além disso, pela linearidade do produto interno, pela desigualdade de
Cauchy-Schwarz-Bunjakowski e pela Propriedade (ii) da Definição 5.8, temos
Logo, a função ϱ é monótona crescente e contínua pela direita. As outras propriedades seguem
imediatamente da Propriedade (iii) da Definição 5.8. Com efeito, pela continuidade do produto
interno, segue que limλ→−∞ ϱ(λ) = limλ→−∞ ⟨x, E(λ)x⟩ = ⟨x, limλ→−∞ E(λ)x⟩ = 0 e
limλ→∞ ϱ(λ) = limλ→∞ ⟨x, E(λ)x⟩ = ⟨x, limλ→∞ E(λ)x⟩ = ∥x∥2 .
PROPOSIÇÃO 5.17. Para qualquer x, y ∈ H , a função ϱ(λ) = ∥E(λ)x∥2 = ⟨x, E(λ)x⟩ é,
como uma função de λ, de variação limitada.
19
Se E for uma projeção ortogonal, então, ∥E(λ)x∥2 = ⟨E(λ)x, E(λ)x⟩ = ⟨x, E ∗ (λ)E(λ)x⟩ =
⟨x, E(λ)E(λ)x⟩ = ⟨x, E(λ)x⟩.
20
Detalhes sobre funções de variação limitada podem ser encontrados no livro de A. N. Kolmogorov e S. V.
Fomin “Introductory Real Analysis,” Dover Publications, 1975.
322
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
A função ϱ tem variação limitada mesmo que o intervalo [a, b] seja infinito. Isto é uma
consequência imediata da noção de variação total de ϱ em [a, b] definida como sendo
b n c
<5 5
V b (ϱ) = sup 5ϱ(λk ) − ϱ(λk−1 )5 | P = {λ0 , λ1 , . . . , λn } é uma partição de [a, b] .
a
k=1
Logo, quando o intervalo [a, b] é infinito ϱ será de variação limitada se existir uma constante C
tal que Vab (ϱ) # C para qualquer par de números a e b, com a < b. Assim, não é difícil ver
que a quantidade
lim Vab (ϱ) = ϱ(∞) − ϱ(−∞) = ∥x∥2 .
a→−∞
b→∞
∞
Logo, a variação total de ϱ no intervalo (−∞, ∞), denotada por V−∞ (ϱ), é limitada; isto
implica que ϱ é de variação limitada. Em particular, uma função de variação limitada pode ter
descontinuidades, mas no máximo enumeráveis. A capacidade das funções de variação limitada
para lidar com descontinuidades tornou seu uso importante na teoria espectral.
Demonstração da Proposição 5.17. Seja a = λ0 < λ1 < · · · < λn−1 < λn = b. Então, pela
propriedade (i′ ), E(a, b] = E(b) − E(a) é uma projeção. Assim, pela desigualdade de Cauchy-
Schwarz-Bunjakowski, temos
n
< n
<
|⟨y, E((λj−1 − λj ])x⟩| = |⟨E((λj−1 − λj ])y, E((λj−1 − λj ])x⟩|
j=1 j=1
n
<
# ∥E((λj−1 − λj ])y∥∥E((λj−1 − λj ])x∥
j=1
( n
)1/2 ( n
)1/2
< <
2 2
# ∥E((λj−1 − λj ])y∥ ∥E((λj−1 − λj ])x∥
j=1 j=1
. /1/2 . /1/2
= ∥E((λ1 − λn ])y∥2 ∥E((λ1 − λn ])x∥2 # ∥y∥∥x∥ .
Pela ortogonalidade
E((λj−1 − λj ]) · E((λk−1 − λk ]) = 0 , para j ̸= k ,
implícita em (i′ ), temos, para n > m,
n−1
<
2 2
∥x∥ " ∥E((λm − λn ])x∥ = ∥E((λj − λj+1])x∥2 .
j=m
323
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Defina
ϱ2 (λ) = ϱpont (λ) − ϱ1 (λ) .
Então, ϱ2 é uma função contínua de variação limitada tal que
$ λ
d
ϱ′2 (λ) = ϱ′acont (λ) − dµ ϱ′acont (µ) = 0 ,
dλ λ0
em quase toda parte. Uma função contínua de variação limitada é considerada singular se
sua derivada se anula em quase toda parte. Por exemplo, a função de Cantor é singular.21
Combinando estas observações, descobrimos que uma função ϱ monótona pode ser representada
como uma soma
de uma função descontínua por saltos ϱpont , uma função absolutamente contínua ϱacont e
função singular ϱscont . A fórmula (5.6.24) é conhecida como decomposição de Lebesgue. Observe
que, derivando a fórmula (5.6.24), obtemos
em quase toda parte. Assim, a integração da derivada de uma função monótona não restaura
a própria função, mas apenas sua “componente” absolutamente contínua, enquanto as outras
duas componentes, ou seja, a função singular e a função descontínua por saltos, “desaparecem
sem deixar vestígios.”
Vamos finalizar esta nota com um resultado importante relacionado com ⟨x, E(λ)x⟩.
TEOREMA 5.30. Como a função ϱ(λ) = ∥E(λ)x∥2 = ⟨x, E(λ)x⟩ é monótona crescente, então,
o conjunto de pontos em que ϱ é descontínua é vazio, finito ou infinito contável.
Demonstração. Seja Ω o conjunto de pontos nos quais ϱ é descontínua e suponha que Ω não
é vazio. Então, para λ ∈ Ω temos ϱ(λ − 0) < ϱ(λ + 0), então, existe um número racional rλ
tal que ϱ(λ − 0) < r < ϱ(λ + 0). Agora, pela Proposição 5.16 temos que µ < λ implica que
ϱ(µ + 0) # ϱ(λ − 0), e segue que se µ, λ ∈ Ω são tais que µ < λ, então, rµ < rλ ; assim,
associamos a cada λ ∈ Ω um número racional distinto. Uma vez que o conjunto de todos os
números racionais pode ser listado como uma sequência, segue que o conjunto {rλ | λ ∈ Ω}
também pode ser listado como uma sequência (finita ou infinita). Dessa forma, podemos então
listar os elementos de Ω na mesma ordem que seus números racionais associados. Assim, Ω
(se não for vazio) é finito ou infinito contável.
21
Cf. os detalhes no livro de A. N. Kolmogorov e S. V. Fomin “Introductory Real Analysis,” Dover Publications,
1975.
324
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Com estes preparativos, estamos agora em posição de discutir o Teorema Espectral para
um operador auto-adjunto limitado (não necessariamente compacto). Como mencionado ante-
riormente, existem várias provas desse teorema disponíveis na literatura, com muitas nuances
espalhadas entre diferentes apresentações da prova. Aqui, como estratégia, em vez de uma
prova detalhada do teorema espectral (que pode ser encontrada em qualquer texto sobre análise
espectral em espaços de Hilbert), faremos uma discussão de ideias envolvidas na prova através
de dois exemplos. Iniciamos com o
Exemplo 5.13 (Uma nova versão da decomposição espectral de operadores compactos).
Vamos considerar o caso de um operador A auto-adjunto e compacto. Primeiro, note que a
série (5.6.13) permanece convergente, com a mesma soma, independentemente da ordem de
como estão arranjados os termos da série. De acordo com o Teorema 5.27, se A é auto-adjunto
e compacto, mas de dimensão infinita, ele deve ter um espectro discreto infinito de pontos.
Sabemos que σdisc (A) ⊂ σ(A) e 8que σ(A) é um 9 conjunto limitado – pelo Teorema 5.5 ele se
situa dentro do intervalo fechado −∥A∥, ∥A∥ . Além disso, vimos também que zero deve ser
um ponto limite de σdisc (A). Logo, vamos arranjar os termos da série (5.6.13) de tal forma que
os auto-valores de A estejam organizados numa ordem decrescente de seus valores absolutos;
isto é, escrevemos λ1 , λ2 , . . . , λn , . . ., com
|λ1 | " |λ2 | " · · · " |λn | " · · · .
Seja (Pi )i∈N uma sequência de projeções ortogonais6 no espaço 7 de Hilbert H , tal que Pi x =
;∞
⟨xi , x⟩xi , Pi Pi x = Pi x, Pi Pj x = 0 para i ̸= j e i=1 Pi x = 1Ix (lembre-se do Exemplo
4.2 que qualquer soma infinita de projeções mutuamente ortogonais converge fortemente). Se
usamos a decomposição H ; = M ⊕ Ker(A) e escrevemos x = y + z, y ∈ M e z ∈ Ker(A),
temos Pi x = Pi y e y = ′ Pi x. Definindo por P0 a projeção ortogonal de H sobre o núcleo
de A, isto é, P0 x = z, segue que P0 Pi = Pi P0 = O se j ̸= 0. Logo, temos
<′
x = P0 x + Pi x .
Com isto, introduzimos a família de operadores E(λ) em H , com m(A) < λ < M(A) (veja
a Nota 5.16), definida por
⎧<
⎪
⎪ Pi x se λ < 0
⎪
⎪
⎨λi #λ
E(λ)x = com x ∈ H . (5.6.25)
⎪
⎪ <
⎪
⎪x − Pi x se λ " 0
⎩
λi >λ
Neste caso, E(λ) é, como função de λ, constante entre dois auto-valores consecutivos de A,
igual ao operador nulo O quando λ é menor do que todos os auto-valores, e igual ao operador
identidade 1I quando λ é maior do que o último auto-valor. O salto de E(λ) quando λ passa
por um auto-valor µ, mais especificamente E(µ) = E(λ) − E(λ − 0), é a projeção sobre o
auto-espaço associado a µ.
<
E(µ)x = Pi x , para µ ̸= 0 ,
λi =µ
<
E(0)x = x − Pi x .
λi >µ
325
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Além disso, nas somas acima devemos contar cada auto-valor quantas vezes forem exigidas pela
sua multiplicidade. Note que, no caso particular em que x = xk , a condição ⟨xi , xk ⟩ = δik ,
implica que a Eq.(5.6.25) assume a seguinte forma simples:
⎧
⎨xk se λk # λ < 0
E(λ)xk = . (5.6.26)
⎩0 se λ > λ " 0
k
A prova da linearidade de E(λ) para λ " 0 é similar. Para mostrar que E(λ) é simétrico
usamos o fato que qualquer vetor x ∈ H pode ser escrito como a combinação
< < <
x= Pi x = Pi x + Pi x . (5.6.27)
i∈I λi #λ λi >λ
Uma vez que os auto-valores λi > λ correspondem aos auto-vetores que são ortogonais àqueles
auto-vetores correspondentes aos auto-valores λi # λ, segue que para λ < 0
I J I J
< < < < <
⟨y, E(λ)x⟩ = Pi y + Pi y, Pi x = Pi y, Pi x .
λi #λ λi >λ λi #λ λi #λ λi #λ
Agora, vamos provar que a família de operadores E(λ) satisfaz os postulados da Definição
5.8. Partimos observando que, em conformidade com a Eq.(5.6.6), E(λ) será o operador nulo
se λ # m(A) e será o operador identidade se λ " M(A) (aqui, pela Nota 5.16, m(A) e M(A)
são os limites de A). Agora, separamos os casos quando λ < 0 e λ " 0. É fácil verificar que
em ambos os casos E(λ) # E(µ) se λ # µ. Com efeito, se λ # µ < 0, então,
8 9 < 8 9 <
E(µ) − E(λ) x = Pi x =⇒ E(µ) − E(λ) = Pi " 0 .
λ<λi #µ λ<λi #µ
Se 0 # λ # µ, então,
8 9 < <
E(µ) − E(λ) x = x − Pi x − x + Pi x
λi >µ λi >λ
326
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Isto, por sua vez, implica que a propriedade (ii) é satisfeita para λ < 0 e da mesma forma para
λ > 0. Por outro lado, se λ = 0, segue que
<
E(0)x = x − Pi x ,
λi >0
e para λ > 0
< < <
∥E(λ)x − E(0)x∥2 = ∥Pi x∥2 # ∥Pi x∥2 + ∥Pi x∥2 .
λ"λi >0 λ"λi >0 −λ#λi <0
;∞
Novamente, devido ao fato da série i=1 ∥Pi x∥2 ser convergente e da sequência (|λi |)i∈N
convergir monotonicamente para zero, existe para λ > 0 arbitrário um N ∈ N tal que para
i > N todos os elementos λi da sequência de auto-valores estão no intervalo [−λ, λ] e
< <
ε2 > ∥Pi x∥2 + ∥Pi x∥2 ,
λi >0 λi <0
em que ε > 0 é arbitrário. Logo, quando λ → 0+ , ∥E(λ)x − E(0)x∥ → 0. Isto implica que a
propriedade (ii) também é satisfeita para λ = 0.
A prova que a propriedade (iii) é satisfeita pela família de operadores E(λ) é alcançada
usando-se um argumento análogo ao da prova da existência do limite forte pela direita. Com
efeito, se λ, λ′ ∈ R são escolhidos de tal modo que λ1 , . . . , λN (ε) < λ e λ′ < λ1 , . . . , λN (ε) ,
então, para todo i > N(ε), segue que
< <
∥x − E(λ)x∥2 = ∥Pi x∥2 < ε2 e ∥E(λ′ )x∥2 = ∥Pi x∥2 < ε2 .
λi >λ λi #λ′
327
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Computemos E(λ)Ax.
(∞ ) ( )
< < <
E(λ)Ax = E(λ) λi ⟨xi , x⟩xi = E(λ) λi ⟨xi , x⟩xi + λi ⟨xi , x⟩xi
i=1 λi #λ λi >λ
<
= λi ⟨xi , x⟩xi ,
λi #λ
por causa de (5.6.26). Logo, AE(λ)x = E(λ)Ax, para λ < 0. Para o caso em λ " 0, segue
que
( ) ∞
< < <
AE(λ)x = A x − Pi x = λi ⟨xi , x⟩xi − λi ⟨xi , x⟩xi
λi >λ i=1 λi >λ
<
= λi ⟨xi , x⟩xi .
λi #λ
A seguir, para m(A) # λ # M(A) (veja a Nota 5.16) e usando a decomposição (5.6.27),
vamos considerar a função
I J
< < <
ϱ(λ) = ⟨x, E(λ)x⟩ = ⟨xi , x⟩xi + ⟨xi , x⟩xi , ⟨xi , x⟩xi
λi #λ λi >λ λi #λ
I J
< < <5 5
= ⟨xi , x⟩xi , ⟨xi , x⟩xi = 5⟨xi , x⟩52 ,
λi #λ λi #λ λi #λ
definida para todo x ∈ H e λ < 0. Por sua vez, se λ " 0, não é difícil verificar que
<5 5
ϱ(λ) = ∥x∥2 − 5⟨xi , x⟩52 , ∀ x ∈ H .
λi >λ
Note que, de acordo com a Proposição 5.16, para o intervalo m(A) # λ # M(A), devido ao
fato já verificado que E(λ)x = 0 para λ # m(A) e E(λ)x = x para λ " M(A), temos
que ϱ(λ) = 0 para λ # m(A) e ϱ(λ) = ∥x∥2 para λ " M(A). Além disso, vale destacar
328
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Portanto, inversamente,
P1 = E(λ1 ) e Pj = E(λj ) − E(λj−1 ) , para j = 2, 3, . . . .
Uma vez que E(λ) permanece o mesmo para λ no intervalo [λj−1 , λj ), pela Nota 5.21, isso
pode ser escrito como Pj = E(λj ) − E(λj−0 ). Assim, segue que para x ∈ Dom(A)
< <
x= Pj x = (E(λj ) − E(λj−0))x ,
j∈J j∈J
com esta igualdade sendo garantida pela convergência na;norma do operador. Se escrevemos
δE(λ) = E(λj ) − E(λj−0 ), então, temos que A = j∈J λj δE(λ). Esta representação
espectral do operador auto-adjunto compacto A mostra que para qualquer x ∈ Dom(A),
temos
<
⟨x, Ax⟩ = λj ⟨x, δE(λ)x⟩ .
j∈J
Antecipando uma definição rigorosa da integral de Riemann-Stieltjes com uma função inte-
gradora com valor de operador, a representação espectral acima nos leva ao principal resultado
deste exemplo:
329
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
TEOREMA 5.31. Para todo operador auto-adjunto compacto A operando em um espaço de Hilbert
complexo H , com limites inferior e superior iguais a m e M, definidos de acordo com o Teorema
5.25, podemos associar uma família espectral {E(λ)}λ∈R de tal forma que para σ(A) ⊆ [m, M]
e para todo x ∈ Dom(A), nós temos a seguinte representação:
$ $ M $ M
⟨x, Ax⟩ = dϱ(λ) λ = dϱ(λ) λ = d⟨x, E(λ)x⟩ λ .
σ(A) m−0 m−0
Nota 5.24. Aqui, m − 0 significa um número arbitrário menor do que m; é escrito para indicar
que deve-se levar em consideração uma contribuição em λ = µ < m. Assim, usando qualquer
µ < m, podemos escrever simbolicamente
$ M $ M $ M
A= dE(λ) λ = dE(λ) λ = (m − 0)E(m − 0) + dE(λ) λ .
µ m−0 m
Em outras palavras, trata-se de fato de uma integral de m até M, mas com respeito à função
E(λ) que foi modificada no ponto m pela substituição de E(m) por E(m − 0), ou seja, pelo
operador nulo O. Se a condição de continuidade pela direita for omitida, podemos assumir
E(m) = O por definição.
uma partição do intervalo [a, b] por pontos de subdivisão λ0 , λ1 , . . . , λn−1 , λn . Tome um ponto
arbitrário ξk em cada subintervalo [λk , λk+1] e forme a soma
n−1
< . /
ZP = ϱ(λk+1 ) − ϱ(λk ) f (ξk ) . (5.6.29)
k=0
22
Sejam P = {λ0 , λ1 , . . . , λn−1 , λn } e P ′ = {λ′0 = λ0 , λ′1 , . . . , λ′n−1 , λ′n = λn } partições do mesmo
intervalo [a, b]. Então, dizemos que P ′ é um refinamento de P se todo ponto de P é ponto de P ′ .
330
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
A expressão (5.6.30) significa que para cada ε > 0 arbitrário existe um número η(ε) tal que
5 $ b 5
5 5
5 ZP − dϱ(λ) f (λ) 5<ε,
5 5
a
para toda partição P do intervalo [a, b] com norma ∥P∥ < η(ε) e cada escolha admissível
de ξk . Observe que para ϱ(λ) = λ, a integral (5.6.30) é a familiar integral de Riemann de f
sobre [a, b]. Além disso, se f é contínua em [a, b] e ϱ tem uma derivada que é integrável em
[a, b], então
$ b $ b
dϱ(λ) f (λ) = dλ ϱ′ (λ)f (λ) ,
a a
em que ϱ′ denota a diferenciação em relação a λ.
Então,
⎛ ⎞
n−1
< < 5 5
′
|ZP − ZP |# ⎝ 5⟨xi , x⟩52 ⎠ |ξk − λk |
k=0 µk <λi #µk+1
n−1
< < <5
5 5 5
#η 5⟨xi , x⟩52 = η 5⟨xi , x⟩52 = η∥x∥2 .
k=0 µk <λi #µk+1 i∈I
331
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
⎛ ⎞
n−1
< < 5 5
′
= lim ZP = lim ⎝ 5⟨xi , x⟩52 ⎠ λk
∥P∥→0 ∥P∥→0
k=1 µk <λi #µk+1
<5 5
= 5⟨xi , x⟩52 λi = ⟨x, Ax⟩ .
i∈I
dM
Um outro esquema de como proceder com a prova da expressão A = m−0 dE(λ) λ pode
ser encontrado no livro de F. Riesz e B. Sz-Nagy, “Functional Analysis,” Dover, 1990, pg. 272. O
método parece produzir a abordagem mais elementar do Teorema Espectral e, portanto, por uma
questão de completeza, vamos apresentá-la. Novamente, tome uma partição P do intervalo
[m − 0, M]:
e assuma que
n
∥P∥ = max(µk − µk−1) .
k=1
Por λk denotamos pontos intermediários de forma que µk−1 # λk # µk . Exigimos que λ1 > m.
Sejam f uma função de valor real em [m − 0, M], E(λ) a família espectral de A e suponha
que existe um operador compacto B tal que o seguinte vale: para um ε > 0 arbitrário existe
um η > 0 tal que
? ?
? <n ?
? ?
? B − f (λ k )(E(µ k ) − E(µ k−1 ? # ε ,
))
? ?
k=1
para cada partição P, com ∥P∥ < η, e cada escolha de pontos intermediários λk . Se
aumentarmos indefinidamente o número n de intervalos de ; decomposição (µk−1 , µk ), de tal
n
modo que seu comprimento máximo tenda a 0, a soma k=1 f (λk )(E(µk ) − E(µk−1 ))
tenderá, portanto, a B na norma dos operadores limitados de H . Como E(λ) é constante
dM
para λ " M e para λ < m, dizemos, então, que a integral de Stieltjes m−0 dE(λ) f (λ) existe
e é igual a B.
µk−1(eµk (λ) − eµk−1 (λ)) # λk (eµk (λ) − eµk−1 (λ)) # µk (eµk (λ) − eµk−1 (λ)) ,
µk−1(eµk (λ) − eµk−1 (λ)) # λ(eµk (λ) − eµk−1 (λ)) # µk (eµk (λ) − eµk−1 (λ)) ,
332
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
que são válidas para todo λ ∈ R. Dessas desigualdades obtemos imediatamente as desigualda-
des
µk−1(E(µk ) − E(µk−1 )) # λk (E(µk ) − E(µk−1)) # µk (E(µk ) − E(µk−1 )) ,
n
<
S= λk (E(µk ) − E(µk−1)) ,
k=1
n
<
T = µk (E(µk ) − E(µk−1)) ,
k=1
obtemos que
R#S#T e R#A#T . (5.6.32)
Para um ε > 0 tomado arbitrariamente, defina η = ε/2. Para toda partição P do intervalo
[m − 0, M] com ∥P∥ < η temos
n
<
T −R= (µk − µk−1 )(E(µk ) − E(µk−1))
k=1
n
<
#η (E(µk ) − E(µk−1 ))
k=1
= η(E(µn ) − E(µ0 ))
= η(1I − O) = η1I .
Logo, segue que O # T − R # η1I. Neste ponto, observe que como E(m) nem sempre é igual
ao operador nulo, para obter o resultado acima precisamos que E(µ0 ) = O; por esta razão
somos obrigados a trabalhar no intervalo [m − 0, M] como enfatizado na Nota 5.24. Agora, por
causa das desigualdades (5.6.32), segue que
O # T − S # η1I e O # T − A # η1I ,
portanto,
∥T − S∥ # η e ∥T − A∥ # η ,
(cf. a Nota 5.16). Consequentemente,
∥A − S∥ # ∥A − T ∥ + ∥T − S∥ # η + η = ε ,
dM
e assim A = m−0
dE(λ) λ. Com isto finalizamos a prova do teorema e do Exemplo 5.13.
333
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
TEOREMA 5.32. Se o intervalo I é uma união de um número finito de intervalos disjuntos aos
pares I = I1 ∪ I2 ∪ · · · ∪ In , então,
$ n $
<
dϱ(λ) f (λ) = dϱ(λ) f (λ) ,
I j=1 Ij
no sentido de que, se um lado existe, o outro também existe, e os dois são iguais.
e $ $
dϱ(λ) f (λ) = dϱ(λ) f (λ) ,
[a,b) (a,b)
no sentido de que, se um lado da equação existe, o outro também existe, e os dois são iguais.
e $ $
dϱ(λ) f (λ) = dϱ(λ) f (λ) ,
(a,b] (a,b)
no sentido de que, se um lado da equação existe, o outro também existe, e os dois são iguais.
334
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Obviamente, E(λ) é um subespaço de L2 [a, b]. Além disso, E(λ) é um espaço fechado. Com
efeito, o fechamento de E(λ) é provado usando como auxílio a função característica χ(λ,b]
associada ao intervalo (λ, b], isto é,
⎧
⎨1 se x ∈ (λ, b]
χ(λ,b] (x) = .
⎩0 se x ∈
/ (λ, b]
Suponha que a sequência (Ψn )n∈N ∈ E(λ) converge para Ψ quando n → ∞. Então, segue
que ∥χ(λ,b] Ψn − χ(λ,b] Ψ∥ # ∥Ψn − Ψ∥ → 0 quando n → ∞. Além disso, χ(λ,b] Ψn = 0 q.t.p,
como facilmente se vê representado na Figura 5.5 (com a parte de cima da figura mostrando
um conjunto de funções que estão contidas no espaço E(λ) enquanto a parte de baixo da
mesma figura está mostrando uma função degrau Ψλ (x) com um salto descontínuo em λ).
Isso significa que χ(λ,b] Ψ = 0 q.t.p. Portanto, Ψ ∈ E(λ). Como (Ψn )n∈N ∈ E(λ) implica que
Ψ ∈ E(λ), segue que E(λ) é fechado.
E(λ)
a x
λ b
Ψλ (x)
1
x
a λ b
Figura 5.5: Na parte de cima, temos um conjunto de funções que estão contidas no espaço
definido pelo conjunto (5.6.33). Na parte de baixo, temos a função-degrau Ψλ (t) com um salto
descontínuo em λ. Figura retirada, e adptada, do livro-texto de Hiroyuki Shima, “Functional
Analysis for Physics and Engineering: An Introduction,” CRC Press, 2016. Todos os Direitos
Reservados.
Ao contrário do caso de um operador auto-adjunto compacto, para o operador posição X, os
membros da família espectral, E(λ), como função de λ, podem crescer de maneira contínua.
Então, assuma que λ cresce de a até b de maneira contínua. Esse aumento provoca uma
23
H. Shima,“Functional Analysis for Physics and Engineering: An Introduction,” CRC Press, 2016, pg. 214.
335
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
mudança gradual nos espaços E(λ). Todos os espaços produzidos pelo aumento contínuo em
λ resultam em uma família de subespaços fechados, {E(λ)}λ∈[a,b] . Os elementos dessa família
satisfazem as relações de inclusão
{0} = E(a) ⊂ · · · ⊂ E(µ) ⊂ · · · ⊂ E(λ) ⊂ · · · ⊂ E(b) = L2 [a, b] . (5.6.34)
Estamos assumido que µ < λ. A Figura 5.6 fornece uma ilustração esquemática dessa relação
de inclusão. Observe que na figura, Ψ pertence a E(λ), mas não pertence a E(µ).
E(λ)
E(µ)
Ψ(x)
a µ λ b x
A relações de inclusão da família {E(λ)}λ∈[a,b] , dada por (5.6.34), implicam que E(λ) pode
ser decomposto da seguinte forma:
E(λ) = E(µ) ⊕ E ⊥ (λ) , (5.6.35)
em que E ⊥ (λ) é o espaço ortogonal ao espaço E(µ). A seguir, defina o operador
def.
(E(λ)Ψ) (x) = χ[a,λ] (x)Ψ(x) para x ∈ [a, b] , λ ∈ R , Ψ ∈ L2 [a, b] ,
isto é, E(λ) é o operador de multiplicação pela função característica do intervalo [a, λ]. Pode-se
mostrar que {E(λ)}λ∈R é uma resolução da identidade. Com efeito, se λ # µ, então, pela
definição de função característica, temos que
. /
(E(µ)E(λ)Ψ) (x) = χ[a,µ] (x) χ[a,λ] (x)Ψ(x) = (E(λ)Ψ) (x) ,
para toda função Ψ ∈ L2 [a, b]. Isto também implica que
(E(µ)E(λ)Ψ) (x) = (E(min{λ, µ})Ψ) (x) ,
Ainda, se λ = µ, segue que (E 2 (λ)Ψ) (x) = (E(λ)Ψ) (x); isto implica que E(λ) é idempo-
tente. Sendo idempotente, E(λ) é uma projeção.
Com essa definição, segue que a Eq.(5.6.35) pode ser equacionada da seguinte forma:
8 9
χ[a,λ] (x)Ψ(x) = χ[a,µ] (x)Ψ(x) + χ[a,λ] (x) − χ[a,µ] (x) Ψ(x) , (5.6.36)
336
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
para toda função Ψ ∈ L2 [a, b]. A implicação geométrica de (5.6.36) é plotada na Figura 5.7.
a µ x
λ b
E(λ)Ψ
a µ x
λ b
8 9
E(λ) − E(µ) Ψ
E(µ)Ψ
a µ x a µ x
λ b λ b
8 9
Se definirmos Φ = χ[a,λ] (x) − χ[a,µ] (x) Ψ, uma discussão paralela que nos levou a (5.3.3),
no Exemplo 5.4, produzirá ∥(X − λ1I)Φ∥ # (λ − µ)∥Φ∥. Ou seja, a função “pontiaguda” Φ,
que é produzida pela operação χ[a,λ] (x) − χ[a,µ] (x) em Ψ, se comporta como uma auto-função
aproximada para o auto-valor efetivo λ. Para melhorar a precisão da aproximação, temos apenas
que diminuir o valor do intervalo [µ, λ], ou equivalentemente, aproximar µ de λ. Para refinar
esta ideia, vamos introduzir uma sequência de pontos {λk }0#k#n no intervalo fechado de [a, b]
de forma que a = λ0 < · · · < λk−1 < λk < · · · < λn = b. Isto nos leva à decomposição da
função Ψ mostrada na Figura 5.8.
a = λ0 λ1 λ2 λ3 λ4 λ5 λk−1 λk λn = b x
Usando a família de operadores de projeção {E(λk )}λ∈[a,b] , uma dada função Ψ ∈ L2 [a, b]
337
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Consequentemente,
8 quando o9 máximo das amplitudes λk − λk−1 tende para zero, o operador
X χ[a,λk ] (X) − χ[a,λk−1] (X) que aparece no lado direito da equação acima torna-se próximo
8 9
o suficiente de λk χ[a,λk ] (X) − χ[a,λk−1] (X) . Este fato nos motiva a escrever
n
< $ b
8 9
X≈ λk χ[a,λk ] (X) − χ[a,λk−1] (X) −→ dE(λ) λ , para a, b ∈ R . (5.6.37)
k=0 a
Demonstração. A monotonicidade já foi provada. Vamos provar a continuidade forte pela direita:
sejam λ ∈ R, Ψ ∈ L2 [a, b] e (εn )n∈N uma sequência nula de números positivos.24 Então,
$ b
. / 2
8 9
∥ E(λ + εn ) − E(λ) Ψ∥ = dx χ[a,λ+εn] (x) − χ[a,λ] (x) |Ψ(x)|2 .
a
Por causa das relações 0 # χ[a,λ+εn] (x) − χ[a,λ] (x) # 1 e χ[a,λ+εn] (x) − χ[a,λ] (x) → 0 quando
n → ∞ para todo x ∈ [a, b], segue pelo Teorema de Lebesgue que
. /
E(λ + εn ) − E(λ) Ψ → 0 quando n → ∞ .
24
Lembremos que, uma sequência (xn )n∈N é uma sequência nula se, para cada intervalo aberto contendo 0, a
sequência estiver, em última análise, nesse intervalo. Em símbolos: para todo ε > 0 existe um N tal que |xn | < ε
quando n " N . Em linguagem simples, uma sequência nula é toda aquela que converge para zero.
338
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Como isso vale para toda sequência nula (εn )n∈N , a propriedade de continuidade forte pela
direita segue. Podemos provar a última propriedade de forma semelhante, uma vez que temos
Levando em conta o conjunto de ideias discutidas nos Exemplos 5.13 e 5.14 o teorema
anunciado é o seguinte:
ou simbolicamente $ M
A= dE(λ) λ .
m−0
No teorema acima, a família {E(λ)}λ∈R satisfaz a condição que λ < m ⇒ E(λ) = O e λ "
dM dM
M ⇒ E(λ) = 1I. Note que, x = 1Ix = m−0 dE(λ) x e ∥x∥2 = ⟨x, x⟩ = m−0 d⟨x, E(λ)x⟩.
Nota 5.26. Neste ponto é interessante destacar a importância da representação espectral via as
integrais de Riemann-Stieltjes.
; Estas integrais não são senão a soma de certas séries particulares,
como a série Ax = i∈I λi ⟨xi , x⟩xi . Como os números λi são reais, estão em um intervalo
finito e podem ter como ponto limite apenas um único ponto, o ponto 0, enumerá-los na ordem
de magnitude crescente ou decrescente só é possível se eles forem finitos em número, ou se
todos têm um sinal. Portanto, os termos da série acima seguem não em sua ordem natural, mas
na ordem determinada
; pela enumeração do conjunto de auto-valores. Este defeito da repre-
sentação Ax = i∈I λi ⟨xi , x⟩xi pode ser removido usando-se a integral de Riemann-Stieltjes.
Além disso, a representação integral generaliza-se para operadores auto-adjuntos arbitrários (não
necessariamente compactos) em H . Mais do que isto, para operadores auto-adjuntos ilimitados,
que por causa do Teorema de Hellinger-Toeplitz não podem ser definidos em todo o espaço de
Hilbert H , pode-se também construir uma família E(λ) de projetores ortogonais, que é defi-
nida para todo λ real, monótona crescente e contínua à direita, qued ∞tende a O para λ → −∞
e a 1I para λ → ∞, e com a qual a decomposição espectral A = −∞ dE(λ) λ acontece (cf. a
Seção 5.10).
339
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Note que, se a desigualdade (5.7.2) não se mantiver, seria possível encontrar uma sequência
(xn )n∈N ⊂ Dom(A) com ∥xn ∥ + ∥Axn ∥ = 1 e ∥Bxn ∥ → ∞; logo a sequência (Bxn )n∈N
não teria uma subsequência (Bxnk )k∈N que converge em H . Assim, de acordo com a definição
acima, a compacidade de B : Dom(A) → H é garantida se para cada sequência (xn )n∈N ⊂
Dom(A) tivermos ∥xn ∥ + ∥Axn ∥ < C ′ , para uma outra constante C ′ = 1/C, já que
isto garante que ∥Bxn ∥ < 1 e, portanto, que a sequência (Bxn )n∈N tem uma subsequência
(Bxnk )k∈N que converge em H . Por exemplo, se B é um operador compacto em H com
Dom(B) = H , então B é, obviamente, A-compacto para qualquer operador fechado A.
25
Veja a Nota 4.20, Eq.(4.4.3), na pg.172.
340
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Demonstração. Suponha que (5.7.3) seja falsa. Então, para algum a > 0 e para cada número
inteiro positivo n, existe uma sequência (xn )n∈N ⊂ Dom(A) tal que
Agora, ∥yn ∥A = 1 e B é A-compacto. Portanto, existe uma subsequência (ynk )k∈N de (yn )n∈N
tal que (Bynk )k∈N converge em H . Como ∥ynk ∥ < ∥Bynk ∥/n e a sequência (∥Bynk ∥)k∈N
é limitada (veja a Definição 5.7), ynk → 0 no domínio Dom(A). Partindo do pressuposto de
que B é fechado, segue-se que Bynk → 0. Assim, pela Eq.(5.7.4) segue que Aynk → 0. Mas
isso é impossível, já que 1 = ∥ynk ∥A = ∥ynk ∥ + ∥Aynk ∥ → 0.
para toda sequência (xn )n∈N ⊂ H com a seguinte propriedade: ∥xn ∥ # 1. Com efeito, como
B é compacto, ele é limitado pelo Teorema 5.21. Também é limitado o operador (A − λ1I)−1 , de
acordo com a Proposição 5.6. Assim, a Eq.(5.7.5) segue se tomarmos ε = M/|Im λ|. Portanto,
para qualquer x ∈ Dom(A), temos
# ε∥Ax∥ + ε|λ|∥x∥ .
341
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Demonstração. Como B é compacto, ele é limitado pelo Teorema 5.21. Logo, A + B é definido
em Dom(A + B) = Dom(A) e B é obviamente A-limitado pelo Teorema 5.36. Assim, o
critério de Kato (4.9.1) é satisfeito com a = 0 e b = ∥B∥, isto é, B é infinitesimalmente pequeno
em relação a A. Portanto, pelo teorema de perturbação de Kato-Rellich, A + B é auto-adjunto
para B simétrico e relativamente A-compacto.
Passemos agora à questão sobre a estabilidade do espectro essencial sob perturbações rela-
tivamente compactas. Nosso primeiro resultado importante é estabelecido no seguinte
LEMA 5.6. Sejam A e B operadores auto-adjuntos em um espaço de Hilbert H . Assuma que
µ ∈ ρ(A) ∩ ρ(B). Se Rµ (A) − Rµ (B) é compacto, então, σess (A) = σess (B).
Demonstração. Primeiro, observamos que a seguinte identidade acontece para o operador resol-
vente:
Rλ (A)(A − µ1I) = Rλ (A)(A − µ1I + λ1I − λ1I) = 1I + (λ − µ)Rλ (A) .
Assuma que µ ∈ σess (A). Portanto, existe uma sequência de Weyl (xn )n∈N para A e µ, tal que
(A − µ1I)xn converge para zero fortemente. Isto implica que
?8 9 ?
? 1I + (λ − µ)Rλ (A) xn ? → 0 .
Para provar que µ ∈ σess (B), basta mostrar que existe uma sequência de Weyl (yn )n∈N para
B e µ, tal que (B −µ1I)yn converge para
8 zero fortemente.
9 Como, por hipótese, Rλ (A)−Rλ (B)
é compacto, sabemos que limn→∞ ∥ Rλ (A) − Rλ (B) xn ∥ = 0; logo
?8 9 ? ?8 9 ?
? 1I + (λ − µ)Rλ (A) xn ? → 0 =⇒ ? 1I + (λ − µ)Rλ (B) xn ? → 0 .
342
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
e
Rλ (B) − Rλ0 (B) = (λ − λ0 )Rλ (B)Rλ0 (B) .
Destas identidades obtemos que
8 9 8 9
Rλ (A) − Rλ (B) = 1I + (λ − λ0 )Rλ (A) Rλ0 (A) − 1I + (λ − λ0 )Rλ (B) Rλ0 (B) .
Agora, suponha que a sequência (xn )n∈N ⊂ H converge fracamente para zero. Vamos
assumir, além disso, que ∥xn ∥ → 0. Então, considere as sequências (yn )n∈N ⊂ Dom(A) e
(zn )n∈N ⊂ Dom(B) (apropriadamente normalizadas) como definidas abaixo:
O fato da sequência (xn )n∈N convergir fracamente para zero implica que (xn )n∈N é limitada em
H (pelo Teorema 1.7). Por outro lado, de acordo com a Proposição 5.6 os operadores Rλ0 (A)
e Rλ0 (B) são limitados. Portanto, as sequências (yn )n∈N e (zn )n∈N também são limitadas em
H e convergem fracamente para zero em H . Efetivamente, tome a sequência (yn )n∈N e note
que para todo w ∈ H temos que
1
⟨w, yn⟩ = ⟨w, Rλ0 (A)xn ⟩
∥Rλ0 (A)xn ∥
1
# ∥w∥∥xn ∥ → 0 quando n→∞.
|Im λ|∥Rλ0 (A)xn ∥
O mesmo raciocínio se aplica à sequência (zn )n∈N . Logo, as sequências (yn )n∈N e (zn )n∈N
convergem fracamente.
Prosseguindo, admita que λ0 ∈ σess (A), então, λ0 ∈ σess (B), pelo Lema 5.6. Logo, as
sequências (yn )n∈N e (zn )n∈N são sequências de Weyl para A e B em λ0 , pois
e
∥xn ∥ = ∥(B − λ0 1I)Rλ0 (B)xn ∥ = ∥(B − λ0 1I)zn ∥ → 0 ,
já que ∥xn ∥ → 0. Portanto, usando um raciocínio análogo ao usado no Lema 5.6, segue que
8 9 8 9 8 9
∥ Rλ (A) − Rλ (B) xn ∥ = ∥ 1I + (λ − λ0 )Rλ (A) yn − 1I + (λ − λ0 )Rλ (B) zn ∥
8 9 8 9
# ∥ 1I + (λ − λ0 )Rλ (A) yn ∥ + ∥ 1I + (λ − λ0 )Rλ (B) zn ∥
→ 0 quando n→∞.
Isto prova que Rλ (A) − Rλ (B) é compacto para todo λ ∈ ρ(A) ∩ ρ(B).
343
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Demonstração. Vamos mostrar que (xn )n∈N é uma sequência de Weyl para A e λ se, e somente
se, (xn )n∈N é uma sequência de Weyl para A + B e λ. Seja (xn )n∈N ⊂ Dom(A) =
Dom(A + B) uma sequência com ∥xn ∥ = 1, xn → 0 (fracamente) e (A − λ)xn → 0
(fortemente). Como B é compacto, Bxn → 0 (fortemente) e, portanto, (A + B − λ)xn → 0
(fortemente), isto é, (xn )n∈N é uma sequência de Weyl para A+B e λ. A outra direção é provada
da mesma forma. Portanto, mostramos que λ ∈ σess (A) ⇐⇒ existe uma sequência de Weyl
para A e λ ⇐⇒ existe uma sequência de Weyl para A + B e λ ⇐⇒ λ ∈ σess (A + B).
Nesta seção, vamos desenvolver um método para obter informações sobre cada auto-valor
λ de um operador auto-adjunto A, limitado inferiormente, situado em σdisc (A) (naturalmente
abaixo do limite inferior do espectro essencial de A) a partir do conhecimento dos valores
esperados da forma quadrática ⟨x, Ax⟩ em certos subespaços de um espaço de Hilbert H .
A integral do lado direito da expressão acima é chamada integral de Riesz para A e Cλ0 ,
enquanto que o operador Pλ0 a esquerda é chamado de projetor de Riesz.
Neste ponto, devemos fazer algumas observações preliminares sobre a técnica de integração
acima (as observações seguem diretamente da Análise Complexa). Diz-se que uma região
Ω ⊂ C é admissível (em relação a A) se o seguinte for válido: (a) σ(A) ⊂ Ω; (b) Ω é aberta
e limitada; (c) a fronteira ∂Ω de Ω consiste de um número grande, porém finito, de curvas
de Jordan retificáveis C1 , . . . , Cn que são mutuamente disjuntas e (d) a orientação (positiva)
de ∂Ω é dada pela orientação de cada C: descreveremos Cj no sentido anti-horário se os
pontos de Ω adjacentes a Cj estiverem no interior de Cj , caso contrário, Cj será orientado no
sentido horário (veja a Figura 5.9). É fácil ver que os pontos de Cj não podem se aproximar
arbitrariamente do espectro de A. Assim Cj está completamente no conjunto resolvente ρ(A).
344
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
C3
C1 C1
C2
Figura 5.9: Exemplos de domínios admissíveis Ω, suas fronteiras Cj e suas orientações. Nas
figuras acima, Ω é hachurado simplesmente, enquanto σ(A) é hachurado duplamente. Figura
retirada, e adptada, do livro-texto de Harro G. Heuser, “Functional Analysis,” Wiley, 1982. Todos
os Direitos Reservados.
Na Definição 5.13, se o operador A além de ser fechado for também auto-adjunto (lembre-se
que todo operador auto-adjunto é fechado), as projeções de Riesz têm a propriedade adicional
de serem ortogonais e projetarem sobre o subespaço gerado pelos auto-vetores de A para um
determinado auto-valor discreto como mostra o seguinte
σ(A) =
R
λ0 λ1 λ2 Σ = inf σess (A)
Figura 5.10: Disco aberto em C de raio r centrado em λ1 . Note que o disco D(λ1 ; r) separa o
ponto λ1 ∈ σ(A) do resto do espectro discreto.
existe e é independente de r1 ;
345
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Demonstração. Item (i). Tome µ ∈ ρ(A). Pelo Teorema 5.2, sabemos que Rµ (A) é uma função
analítica em C \ σ(A) = ρ(A). Assim, a integral existe como uma integral valorada em um
espaço de Hilbert (veja a Definição 5.3, na nota da página 258). Que a integral é independente de
r1 é uma consequência do Teorema Integral de Cauchy. De fato, na integral de Riesz tomamos
um círculo C = |µ − λ| = r1 , mas poderíamos ter tomado qualquer curva orientada retificável
fechada simples. De acordo com o Teorema da Integral de Cauchy tomar qualquer um destes
caminhos fechados nos dá o mesmo resultado, já que a integral sobre qualquer curva orientada
retificável fechada simples é igual à mesma integral obtida sobre um círculo arbitrariamente
pequeno em torno de λ.
Item (ii). Primeiro, vamos provar que Pλ é idempotente, isto é, que Pλ2 = Pλ . Para isto,
usando a primeira identidade do resolvente Rµ (A)Rν (A) = (µ − ν)−1 Rµ (A) − Rν (A), se
µ ̸= ν, escolhemos, repectivamente, para r1 < R < r dois círculos C1 = {µ | |µ − λ| = r1 } e
C2 = {ν | |ν − λ| = R} (veja a Figura 5.11).
Im µ, ν
r1
R
λ Re µ, ν
C1
C2
, -2 ` `
1 Rµ (A) − Rν (A)
= dµ dν
2πi C1 C2 (µ − ν)
⎧ ⎫
, ⎪
-2 ⎪ F` G ` F` G⎪
⎪
1 ⎨` 1 1 ⎬
= dµ Rµ (A) dν − dν Rν (A) dµ .
2πi ⎪ ⎪ C1 C2 (µ − ν) C2 C1 (µ − ν) ⎪
⎪
⎩ B CD E B CD E⎭
=2πi =0
Observe que a integral interna do segundo termo desaparece pelo Teorema de Cauchy, pois
346
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
ν está fora do círculo C1 . Por outro lado, pela Fórmula Integral de Cauchy, a integral interna do
primeiro termo é 2πi. Logo, obtemos que
`
2 1
Pλ = dµ Rµ (A) = Pλ
2πi C1
A seguir, temos que mostrar que Pλ = Pλ∗. Isso pode ser obtido diretamente através de uma
parametrização µ(s) = λ + r1 eis em que −π # s # π e r1 é o raio do círculo. Assim, a
expressão para o integral de Riesz assume a seguinte forma:
$ π
1
Pλ = ds r1 eis (A − λ + r1 eis )−1 .
2π −π
Finalmente, temos que mostrar que Ran(Pλ ) = Ker(A − λ1I). Para isto, assuma que
x ∈ Ker(A − λ1I) =⇒ (A − λ1I)x = 0; logo λ é um auto-valor. Então, para µ ̸= λ, existe um
vetor y ∈ Ran(A − µ1I) tal que y = (A − µ1I)x. Logo, x = (A − µ1I)−1 y = Rµ (A)y. Além
disso, observe que
= Rν (A)y = x .
Aqui, usamos o fato que Rµ (A) é uma função analítica em C \ σ(A) = ρ(A). Em outras
palavras, como Rµ (A) é holomorfa para cada ν no interior do círculo |µ − λ| = r1 , centrado
em λ, segue, pelo Teorema Integral de Cauchy, que
`
1 Rµ (A)
Rν (A) = dµ .
2πi |µ−λ|=r1 ν −µ
347
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Portanto,
,` -
1
(A − λ1I)Pλ x = (A − λ1I) dµ Rµ (A) x
2πi |µ−λ|=r1
, ` -
1 1
= (ν − λ) dµ x=0.
2πi |µ−λ|=r1 ν −µ
Logo, pelas Eqs.(5.8.2) e (5.8.3), segue que Ran(Pλ ) = Ker(A − λ1I). Isto finaliza a prova do
lema.
Nota 5.27. No lema acima, se o operador A fosse apenas fechado, ao invés de ser auto-adjunto,
o operador de Riesz Pλ ainda seria um projetor, mas não necessariamente ortogonal!
Agora aplicamos o resultado obtido acima e provamos que os operadores de rank-finito são
densos na norma no conjunto de operadores compactos.
TEOREMA 5.38 (Hislop-Sigal, Teorema 9.15). Os operadores de rank-finito formam um subcon-
junto denso dos operadores compactos; ou seja, qualquer operador compacto pode ser aproximado
arbitrariamente por um operador de rank-finito.
348
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
(2) (1)
Cε Cε
−∥A∥ ∥A∥
(1) (2)
Cε = Cε ∪ Cε
Figura 5.12: O espectro de A. Figura retirada, e adptada, do livro-texto de P.D. Hislop e I.M.
Sigal, “Introduction to Spectral Theory,” Springer, 1996. Todos os Direitos Reservados.
Uma vez que A é auto-adjunto, segue do Lema 5.7 que Ran(Pε ) é o span dos auto-espaços
de A correspondendo a todos os auto-valores em σε . Este espaço é de dimensão finita e,
portanto, Pε é um operador de rank-finito.
⟨x, Ax⟩
λ1 = inf ,
x∈Dom(A)∩K0⊥ ⟨x, x⟩
e para j " 2,
⟨x, Ax⟩
λj = inf ,
⊥
x∈Dom(A)∩Kj−1 ⟨x, x⟩
em que Ki = ∪0#j#i Ker(A − λj 1I), com Ker(A − λj 1I) sendo os auto-espaços de A para os
auto-valores λj . O ínfimo é todo vetor x não-nulo.
349
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
σ(A) =
R
λ0 λ1 λ2 Σ = inf σess (A)
Demonstração. Lembremos que uma condição necessária e suficiente para λj ser um auto-valor
de A é que exista em H um vetor x ̸= 0 com (A − λj 1I)x = 0, ou seja, Ax = λj x. O
espaço Ker(A − λj 1I) é chamado de auto-espaço de A correspondente ao auto-valor λj e
dim Ker(A − λj 1I) é a multiplicidade de λj (neste caso, por definição, necessariamente finita).
Claramente Ker(A − λj 1I) \ {0} é o conjunto de todos os auto-vetores de A correspondentes
ao auto-valor λj . Levando em conta estas observações, considere o auto-valor mais baixo λ0 .
Observe que para qualquer y ∈ Dom(A)
⟨x, Ax⟩ ⟨y, Ay⟩
µ0 = inf # . (5.8.4)
x∈Dom(A) ⟨x, x⟩ ⟨y, y⟩
Seja x0 um elemento de Ker(A − λ0 1I); isto implica que Ax0 = λ0 x0 . Então, por (5.8.4),
segue que µ0 # λ0 . Para mostrar o inverso, observe que se λ0 ∈ σ(A), então, existe um
x ∈ Dom(A) tal que Ax = λ0 x. Consequentemente, ⟨x, (A − λ0 1I)x⟩ " 0 e, portanto,
A − λ0 1I " 0. Deste modo, obtemos um limite inferior,
⟨x, (A − λ0 1I)x⟩ ⟨x, Ax⟩
inf = inf − λ0 " 0 ,
x∈Dom(A) ⟨x, x⟩ x∈Dom(A) ⟨x, x⟩
já que Ran(Pλ0 ) = Ker(A − λ0 1I). Por outro lado, tome um vetor y1 ∈ Dom(A) tal que
Ay1 = λ1 y1 . Então, pela Proposição 5.9, Ker(A − λ1 1I) ⊥ Ker(A − λ0 1I). Assim, o princípio
em (5.8.4) implica que
⟨z, Az⟩ ⟨y1, Ay1 ⟩
inf # = λ1 .
z∈Ker(A−λ0 1I) ⟨z, z⟩ ⟨y1 , y1 ⟩
350
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
⟨x, Ax⟩
λ0 # ,
⟨x, x⟩
⟨x, Ax⟩
λj # ,
⟨x, x⟩
⊥
para qualquer x ̸= 0 em Dom(A) ∩ Kj−1 .
No Capítulo 10, nós usaremos o resultado acima para estimar a energia do estado funda-
mental dos átomos do hidrogênio e do hélio.
Nós podemos, no entanto, obter uma expressão para a projeção no auto-espaço em termos
do resolvente de A. Seguiremos a apresentação de P.D. Hislop e I.M. Sigal, em “Introduction to
Spectral Theory with Applications to Schrödinger Operators,” Springer Verlag, 1996. Uma vez que
o operador A é auto-adjunto, a projeção Pλ , correspondendo a um auto-valor imerso de A, é
uma projeção ortogonal. Vamos denotar a projeção ortogonal a Pλ por Pλ⊥ = 1I − Pλ .
351
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
5
e A5E = λ, segue que Pε Pλ = Pλ . Portanto, para qualquer vetor x ∈ H temos que
λ
para todo x ∈ H . Assim, pela ortogonalidade das projeções Pλ e Pλ⊥ segue do limite acima e
da condição Pε Pλ = Pλ que
⎧
⎨1 em Eλ
s − lim Pε = .
ε→0 ⎩0 em P ⊥ H
λ
Talvez seja importante ressaltar que a fórmula para Pλ no teorema acima é independente do
sinal de ε (verifique!).
Nota 5.28 (O papel dos auto-valores imersos na teoria quântica). Os auto-valores imersos
desempenham um papel importante na teoria das ressonâncias quânticas. Ao contrário dos auto-
valores isolados, que são relativamente estáveis sob perturbações (como veremos na próxima
seção), em geral, os auto-valores imersos no espectro essencial são instáveis e desaparecem do
espectro de um operador auto-adjunto sob pequenas perturbações. A ausência de tais auto-
valores imersos foi provada para uma grande classe de potenciais “fisicamente aceitáveis” (o
leitor deve consultar os Capítulos 16-23 do livro de Hislop-Sigal citado acima e os seguintes
artigos e as referências contidas nos mesmos: S. Agmon, I. Herbst e E. Skibsted, “Perturbation
of Embedded Eigenvalues in the Generalized N-Body Problem,” Commun. Math. Phys. 122
(1989) 411 e J. Cruz-Sampedro, I. Herbst e R. Martínez-Avendaño, “Perturbations of the Wigner-von
Neumann Potential Leaving the Embedded Eigenvalue Fixed,” Ann. Henri Poincaré 3 (2002)
331.
352
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
operador simétrico tal que Dom(A) ⊂ Dom(B). Vamos considerar os efeitos sobre o espec-
tro discreto de A causados pela adição de uma pequena correção εB, para ε suficientemente
def.
pequeno. Portanto, somos levados a considerar uma família de operadores Aε = A + εB,
quando ε varia de ε = 0 (onde temos muita informação) até ε = ε0 (onde desejamos obter infor-
mações). Assim, nossa primeira tarefa é dar um critério para a “pequenez” de uma perturbação
εB em relação a A, para ε suficientemente pequeno. Para isto, defina {Bε = εB}, com ε ∈ R,
como sendo uma família de operadores simétricos tal que Dom(A) ⊂ Dom(Bε ), de forma
que para algum λ0 ∈ ρ(A) os operadores Bε (A − λ0 1I)−1 sejam limitados e continuamente
dependentes de ε e que
O mesmo vale para qualquer λ ∈ ρ(A)! Segue do Teorema de Kato-Rellich que, para
ε suficientemente pequeno, os operadores Aε = A + Bε são auto-adjuntos no domínio
Dom(Aε ) = Dom(A). Um exemplo canônico é quando Bε = εB com B sendo simé-
trico e A-limitado.
PROPOSIÇÃO 5.21. Suponha que Ω ⊂ ρ(A) é compacto. Então, Ω ⊂ ρ(Aε ) para ε suficiente
pequeno e
Pela Proposição 5.6, sabemos que ∥(A − λ)−1 ∥ # |Im λ|−1 . Por outro lado, de acordo com a
Nota 5.4, como λ0 ∈ ρ(A), então, para qualquer λ ∈ Ω ⊂ ρ(A) temos que
para todo λ ∈ Ω. Devido à hipótese (5.9.1), pode-se encontrar um ε0 > 0 tal que para
ε ∈ (−ε0 , ε0 ) nós temos
def.
dε = sup ∥Cε + (λ − λ0 )Cε (A − λ1I)−1 ∥ # 1 ,
λ∈Ω
353
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
e segue de (5.9.3) que, para o mesmo ε, o operador Aε − λ1I tem um inverso limitado para todo
λ ∈ Ω, dado por
= >−1
(Aε − λ1I)−1 = (A − λ1I)−1 1I + Cε + (λ − λ0 )Cε (A − λ1I)−1 .
Definindo
Dε = Cε + (λ − λ0 )Cε (A − λ1I)−1 ,
e usando a série de Neumann para o operador (1I + Dε )−1 obtemos, para ε ∈ (−ε0 , ε0 ), que
(Aε − λ1I)−1 − (A − λ1I)−1 = (A − λ1I)−1 (1I + Dε )−1 − (A − λ1I)−1
∞
<
−1
= (A − λ1I) (−Dε )−n − (A − λ1I)−1
n=0
∞
<
−1
= (A − λ1I) (−Dε )−n .
n=1
354
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
A integral acima será justificada no Teorema 5.42, enquanto que o Dom(A) no Teorema 5.43.
TEOREMA 5.42. Sejam A um operador auto-adjunto ilimitado em um espaço de Hilbert H .
Então, existe uma famíla apropriada de operadores de projeções ortogonais {E(λ)}λ∈R em H
tal que para todo x ∈ Dom(A) temos que
$ ∞
Ax = dE(λ) λ x , (5.10.1)
−∞
ou simbolicamente $ ∞
A= dE(λ) λ .
−∞
Justificando a integral (5.10.1). Uma maneira clássica para se chegar à decomposição espectral
de A acima é obtida reduzindo-se o estudo do espectro de A ao caso de um operador limitado
V , representando a transformada de Cayley de A, obter a decomposição espectral de V e,
então, usar a transformada inversa de Cayley para traduzir isto de volta para uma decomposição
espectral para o operador A (veja por exemplo, F. Riesz e B. Sz-Nagy. “Functional Analysis,”
Dover, 1990, Seção 121, pg.320). Foi desta maneira que J. von Neumann provou pela primeira vez
a decomposição espectral de operadores auto-adjuntos ilimitados. Em vez disso, vamos usar
o conceito de uma aproximação tipo-Yosida de A para dar uma argumentação que sustenta
a validade da decomposição (5.10.1). Com efeito, seja Aµ uma aproximação de Yosida de A.
Então, pela Proposição 5.11, Aµ é um operador auto-adjunto limitado e ⟨x, Aµ x⟩ " 0 para
todo x ∈ Dom(A) e µ > 0. Se tomarmos µ = n, com n ∈ N, e n = sup∥x∥=1 ⟨x, An x⟩,
então, pela Proposição 5.11, −n1I < 01I # An # n1I. Portanto, pelo Teorema 5.35, An tem uma
355
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
família espectral no intervalo finito [0, n]; ou seja, existe uma medida auto-adjunta En ( · ) que
desaparece em R− , de modo que podemos escrever (trata-se de fato de uma integral de 0 até
n, como explicado na Nota 5.24)
$ n
⟨x, An x⟩ = d⟨x, En (λ)x⟩ λ .
−n
Pela Proposição 5.11, Item 3, limn→∞ ⟨x, An x⟩ = ⟨x, Ax⟩, para todo x ∈ Dom(A). Por outro
lado, pelo Teorema 5.19, limn→∞ dEn (λ)x = dE(λ)x (com λ fixado), para todo x ∈ H . Logo,
$ n $ ∞
n→∞
⟨x, An x⟩ = d⟨x, En (λ)x⟩ λ −−−→ ⟨x, Ax⟩ = d⟨x, E(λ)x⟩ λ .
−n −∞
em que E(λ) é uma família de projetores ortogonais, definida para todo λ real, monótona
crescente e contínua pela direita, que tende E(λ) → O quando λ → −∞ e E(λ) → 1I
quando λ → ∞. Isto completa o esboço da demonstração da validade da fórmula fundamental
(5.10.1).
Nota 5.29. A integral (5.10.1) é entendida como uma integral imprópria de Riemann-Stieltjes,
isto é, existem os seguinte limites em H :
$ µ $ β
lim dE(λ) λ x e lim dE(λ) λ x ,
α→−∞ α β→∞ µ
$ ∞
d∥E(λ)x∥2 λ2 < ∞ , (5.10.3)
−∞
$ ∞
⟨y, Ax⟩ = d⟨y, E(λ)x⟩ λ , ∀ x ∈ Dom(A) , ∀ y ∈ H . (5.10.4)
−∞
356
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Observe que aqui a notação dλ foi adotada para evitar ambiguidades, uma vez que não estaria
claro se d é com respeito a λ ou µ. Daqui para frente, em todos esses casos, usaremos a
variável correspondente como índice em d. Assim,26
$ ∞ ,$ λ - $ ∞ $ ∞
2 2
∥Ax∥ = dλ dµ ⟨x, E(µ)x⟩ µ = d⟨x, E(λ)x⟩ λ = d∥E(λ)x∥2 λ2 .
−∞ −∞ −∞ −∞
(5.10.3) =⇒ (5.10.2).
?$ ?2 $
? ∞ ? ∞
∥Ax∥ = ?
?
2
dE(λ) λ x?
? = d∥E(λ)x∥2 λ2 ,
−∞ −∞
d∞ d∞
como acima. Portanto, se −∞
d∥E(λ)x∥2 λ2 < ∞, isto implica que −∞
dE(λ) λ x existe.
26
Estamos usando o Teorema Fundamental do Cálculo. Defina
$ λ ($ )
λ
2 dΦ(λ) d 2
Φ(λ) = dµ |Ψ(µ)| =⇒ = dµ |Ψ(µ)| = |Ψ(λ)|2 =⇒ dΦ(λ) = dλ |Ψ(λ)|2 .
a dλ dλ a
357
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
d ∞Observe que pelos Teoremas 5.42 e 5.43 segue imediatamente que se A = 1I, então, x =
−∞
dE(λ) x e
$ ∞ $ ∞
d⟨x, E(λ)x⟩ = d∥E(λ)x∥2
−∞ −∞
$ β
= lim lim d∥E(λ)x∥2 (5.10.5)
α→−∞ β→∞ α
= >
= lim lim ∥E(β)x∥ − ∥E(α)x∥ = ∥x∥2 .
2 2
α→−∞ β→∞
Nota 5.30. A decomposição espectral (5.10.1) para operadores auto-adjuntos no espaço de Hilbert
resulta em uma “diagonalização” de A, em analogia às transformações dos eixos principais
para matrizes simétricas. Além disso, uma aplicação importante do teorema espectral para
operadores auto-adjuntos em um espaço de Hilbert é a opção de estudar funções de operadores
auto-adjuntos:27 para certas classes de funções f , a fórmula de decomposição espectral nos dá
$ ∞
f (A) = dE(λ) f (λ) , (5.10.6)
−∞
com domínio
# $ ∞ %
2
Dom(f (A)) = x∈H | d⟨x, E(λ)x⟩ |f (λ)| < ∞ .
−∞
A fórmula (5.10.6) pode também ser aplicada, em particular, quando f (λ) é uma função a
valores complexos. Neste caso, dois exemplos importantes são os operadores
$ ∞ $ ∞
iA iλ −1 λ+i
e = dE(λ) e e (A + i1I)(A − i1I) = dE(λ) ,
−∞ −∞ λ−i
27
Veja K. Yosida, “Functional Analysis,” Springer Verlag, 1980, pg.338.
358
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
são unitários. Veremos no Capítulo 8 que eitH , t ∈ R, gera um grupo fortemente contínuo
de operadores unitários e que Ψ(t) = e−itH Ψ0 resolve a equação de Schrödinger desde que
H = −∇2 + V seja auto-adjunto. Por outro lado, e−tH , t " 0 e H " 0, é um semi-grupo
fortemente contínuo de operadores e Ψ(t) = e−tH Ψ0 é uma solução para a equação do calor
desde que H seja uma extensão auto-adjunta de −∇2 . Por sua vez, como já vimos, as funções
características χ(a, b](H) = P (a, b] = E(b) − E(a) produzem projeções espectrais associadas
a intervalos.
Um outra outra aplicação do Teorema 5.43 é a possibilidade que nós temos de definir a raiz
quadrada de um operador não-negativo. Com efeito, seja A " 0 auto-adjunto com a família
espectral {E(λ)}λ∈R . Defina um operador B da seguinte forma:
# $ ∞ %
Dom(B) = x ∈ H | d⟨x, E(λ)x⟩ λ < ∞ .
0
e
$ ∞ √
def.
B = dE(λ) λ,
0
isto é,
$ ∞ √
⟨y, Bx⟩ = d⟨y, E(λ)x⟩ λ, ∀ x ∈ Dom(B) , ∀ y ∈ H .
0
2
Então, B é um operador
√ não-negativo auto-adjunto com B = A e B é a raiz quadrada de A,
denotado como B = A.
Exemplo 5.15 (O operador posição X em L2 (−∞, ∞)). É fácil verificar que o doperador mul-
∞
tiplicação XΨ(x) = xΨ(x) em L2 (−∞, ∞) admite a resolução espectral X = −∞ dE(λ) λ,
em que
⎧
⎨Ψ(λ) se µ # λ
[E(λ)Ψ](µ) = eλ (µ)Ψ(λ) = .
⎩0 se µ > λ
Com efeito,
$ ∞ $ ∞ ,$ λ - $ ∞
2 2 2 2
d∥E(λ)Ψ∥ λ = dλ dx |Ψ(x)| λ = dλ |Ψ(λ)|2 λ2 = ∥XΨ∥2 ,
−∞ −∞ −∞ −∞
e
$ ∞ $ ∞ ,$ λ - $ ∞
d⟨Ψ, E(λ)Ψ⟩ λ = dλ dx Ψ(x)Ψ(x) λ = dλ Ψ(λ)Ψ(λ) λ = ⟨Ψ, XΨ⟩ .
−∞ −∞ −∞ −∞
359
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Assim, {M(λ)}λ∈R é contínua pela direita se, e somente se, {E(λ)}λ∈R é contínuo fortemente
pela direita.
em que P(I) é a projeção no subespaço M(I) = M(λ′′ ) ⊖ M(λ′ ).28 Se dois desses intervalos
I1 e I2 não têm ponto em comum, M(I1 ) e M(I2 ) são ortogonais; pois, se I1 está à esquerda
de I2 ,
Isto pode ser verificado usando a propriedade E(λ)E(µ) = E(min{λ, µ}) para λ, µ ∈ R.
360
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
P{λ} ̸= O se, e somente se, E(λ) é descontínua em λ (cf. a Nota 5.21). Neste caso, pode-se
associar ao ponto λ um subespaço M({λ}) de dimensão diferente de zero, isto é,
3 4
M({λ}) = x ∈ H | P{λ} x = x = Ran(P{λ} ) . (5.11.3)
A interpretação deste subespaço será discutida mais a frente. Vamos lembrar aqui que, pelo
Teorema 5.30, as descontinuidades de uma família espectral formam um subconjunto contável de
R. Dessa forma, se λ ̸= µ são dois pontos de descontinuidade, então, P{λ} P{µ} = O por (5.6.21);
portanto, M({λ}) é ortogonal a M({µ}). Se escolhermos em cada ponto de descontinuidade
λ um vetor não-nulo x(λ), obteremos uma família {x(λ)} de vetores diferentes de zero que
são ortogonais aos pares; esta família é contável uma vez que o espaço de Hilbert é assumido
como separável. Assim, existe no máximo um número contável de pontos de descontinuidade
de E(λ) em um espaço separável.
DEFINIÇÃO 5.14. Seja A um operador auto-adjunto em um espaço de Hilbert complexo H e
{E(λ)}λ∈R , sua família espectral.
4. Pontos de continuidade que ao mesmo tempo são pontos de crescimento são chamados
pontos de crescimento contínuo.
Muitas vezes encontra-se famílias espectrais que são limitadas por baixo. Isto é, uma família
espectral {E(λ)}λ∈R é limitada por baixo se existir um número µ ∈ R tal que E(λ) = O para
todo λ < µ. Tal número µ é um limite inferior para {E(λ)}λ∈R , e o supremo de todos os
números µ com esta propriedade é chamado de limite inferior de {E(λ)}λ∈R .
361
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Para todo y ∈ Dom(A), E(µ)y ∈ Dom(A); portanto, podemos tomar x = E(µ)y, e usar a
propriedade E(λ)E(µ) = E(min{λ, µ}), para obter
$ µ $ ∞
0#= dλ ⟨E(µ)y, E(λ)E(µ)y⟩ (λ − µ) + dλ ⟨E(µ)y, E(λ)E(µ)y⟩ (λ − µ)
−∞ µ
$ µ $ ∞
= dλ ⟨E(µ)y, E(λ)y⟩ (λ − µ) + dλ ∥E(µ)y∥2 (λ − µ) .
−∞ µ
B CD E
se anula pelo Teorema 5.34, item (ii)
Logo, temos
$ µ $ µ
0# dλ ⟨E(λ)E(µ)y, y⟩ (λ − µ) = dλ ⟨E(λ)y, y⟩ (λ − µ)
−∞ −∞
$ µ−0
= dλ ∥E(λ)y∥2 (λ − µ) .
−∞
Uma vez que λ < µ, devemos ter ∥E(λ)y∥ = const. (já que a função integradora é monótona
crescente como função de λ de acordo com a Proposição 5.16), caso contrário teríamos
$ µ−0
0# dλ ∥E(λ)y∥2 (λ − µ) < 0 .
−∞
Logo, para ∥E(λ)y∥ = const. segue que E(λ) é independente de λ para λ < µ. Dessa forma,
o espectro é vazio para λ < µ.
362
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Demonstração. Suponha que existe um ε > 0 tal que P = E(λ + ε) − E(λ − ε) = O. Então,
pela Definição 5.14 E( · ) deve ser constante sobre os intervalos (λ − ε, λ) e [λ, λ + ε) e para
todo x ∈ Dom(A) com ∥x∥ = 1 encontramos pelo Teorema 5.43 que
$ ∞
2
∥(A − λ1I)x∥ = d⟨x, E(µ)x⟩ |µ − λ|2
−∞
,$ $ -
= + d⟨x, E(µ)x⟩ |µ − λ|2
∥µ−λ∥<ε ∥µ−λ∥"ε
,$ λ−ε $ λ+ε $ ∞-
= + + d⟨x, E(µ)x⟩ |µ − λ|2
−∞ λ−ε λ+ε
,$ λ−ε $ ∞-
2
"ε + d⟨x, E(µ)x⟩
−∞ λ+ε
= >
= ε2 ⟨x, E(λ − ε)x⟩ + ε2 ∥x∥2 − ⟨x, E(λ + ε)x⟩
= . / >
= ε2 ∥x∥2 − ε2 ⟨x, E(λ + ε) − E(λ − ε) x⟩
= ε2 ∥x∥2 = ε2 > 0 .
Aqui, usamos o fato que limµ→−∞ ∥E(µ)x∥ = 0 e limµ→∞ ∥E(µ)x∥ = ∥x∥, para todo
x ∈ Dom(A). Assim, nenhuma sequência de vetores unitários em Dom(A) pode satisfazer
o critério estabelecido pela Proposição 5.12, portanto, λ ∈
/ σ(A). De fato, isso pode ser visto
substituindo-se x por xn na equação acima e tomando-se o limite.
Por outro lado, assuma que Pn = E(λ + 1/n) − E(λ − 1/n) ̸= O, para todo n ∈ N e
que (xn )n∈N é uma sequência em Dom(A), com ∥xn ∥ = 1, tal que xn = Pn xn . Para esta
sequência temos pelo Teorema 5.43
$ ∞
2
∥(A − λ1I)xn ∥ = d⟨xn , E(µ)xn ⟩ |µ − λ|2
−∞
,$ $ -
= + d⟨xn , E(µ)xn ⟩ |µ − λ|2
∥µ−λ∥<1/n ∥µ−λ∥"1/n
$
1 1
= d⟨xn , E(µ)xn ⟩ |µ − λ|2 # 2
∥xn ∥2 = 2 .
∥µ−λ∥<1/n n n
Assim, esta sequência satisfaz o critério estabelecido pela Proposição 5.12 e, portanto, λ pertence
ao espectro de A.
TEOREMA 5.47. Seja A um operador auto-adjunto no espaço de Hilbert H com a família
espectral {E(λ)}λ∈R .
363
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
1. Para λ ∈ R, λ ∈ ρ(A) se, e somente se, existe ε > 0 tal que E(λ + ε) = E(λ − ε).
2. Para λ ∈ ρ(A)
1
∥(A − λ1I)−1 ∥ = .
dist(λ, σ(A))
$ λ0 +ε
" d⟨xε , E(µ)xε ⟩ (|λ0 − λ| + ε)−2
λ0 −ε
$ λ0 +ε
−2
= (|λ0 − λ| + ε) d∥E(µ)xε ∥2
λ0 −ε
= >
= (|λ0 − λ| + ε)−2 ∥E(λ0 + ε)xε ∥2 − E(λ0 + ε)xε ∥2
. /
= (|λ0 − λ| + ε)−2 ∥ E(λ0 + ε) − E(λ0 + ε) xε ∥2 (verifique!)
PROPOSIÇÃO 5.22. Tome λ < µ. Se E(µ) − E(λ) ̸= O, então, (λ, µ] ∩ σ(A) ̸= ∅. Além disso,
(λ, µ) ∩ σ(A) ̸= ∅ se, e somente se, E(µ − 0) − E(λ) ̸= O
Demonstração. Suponha que (λ, µ] ⊂ ρ(A). Então, pelo Teorema 5.46, a família espectral
{E(λ)}λ∈R é constante em alguma vizinhança de η para cada η ∈ (λ, µ]. Consequentemente,
{E(λ)}λ∈R é constante em (λ, µ] , e, portanto,
. /
E(µ) − E(λ) = s − lim+ E(µ) − E(λ + ε) = O .
ε→0
364
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Por outro lado, se (λ, µ) ∩ σ(A) ̸= ∅, então, podemos provar, como acima, que {E(λ)}λ∈R é
constante em (λ, µ), ou seja, que
. /
E(µ − 0) − E(λ) = s − lim+ E(µ − ε) − E(λ + ε) = O .
ε→0
Se η ∈ (λ, µ) ∩ σ(A) e ε > 0 é tão pequeno que (η − ε, η + ε] ⊂ (λ, µ), então, E(η − ε) −
E(η + ε) ̸= O de modo que E(µ − 0) − E(λ) ̸= O.
O próximo resultado refina o Teorema 5.46. Ele mostra que as descontinuidades de uma
família espectral correspondem ao espectro de pontos do operador auto-adjunto associado,
enquanto a continuidade forte dos E(λ) em λ0 ∈ σ(A) implica λ0 ∈ σcont (A) (e vice-versa).
365
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
= ε∥E(µ − ε)x∥2 ,
e
$ ∞ $ ∞
2
0= dλ ∥E(λ)x∥ (µ − λ) " dλ ∥E(λ)x∥2 (µ − λ)
µ µ+ε
$ ∞
"ε dλ ∥E(λ)x∥2
µ+ε
= >
= ε ∥x∥2 − ∥E(µ + ε)x∥2
Portanto, as estimativas acima implicam que E(µ + ε)x = x e E(µ − ε)x = 0, e por causa da
continuidade pela direita, temos, para ε → 0, E(µ)x = x. Assim, E(µ) − E(µ − ε) ̸= O e
µ é um ponto de descontinuidade por salto de E(λ), pela Definição 5.14. Observamos que isto
prova que E(λ)x = x para λ " µ e E(λ) = O para λ < µ, uma vez que ε é arbitrário.
366
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Dessa forma, y/∥y∥ é um auto-vetor de A associado com o auto-valor µ. Isso prova a Parte 1.
Obviamente, E(λ) é fortemente contínuo em µ se, e somente se, E(µ + ε) = E(µ − ε), ou
seja, se, e somente se, E(λ) = E(λ − 0). Isto prova a Parte 2.
PROPOSIÇÃO 5.23. Qualquer ponto isolado λ do espectro de um operador auto-adjunto A é um
auto-valor de A.
Demonstração. Pelo Teorema 5.9 existe um ε > 0 tal que [λ −ε, λ + ε] ∩σ(A) = {λ}. Portanto,
pela Proposição 5.22, E é constante em [λ − ε, λ) e em (λ, λ + ε]. Como λ ∈ σ(A), pelo
Teorema 5.46, temos
E(λ) − E(λ − 0) = E(λ + ε) − E(λ − ε) ̸= O ,
isto é, λ é um auto-valor de A.
Nota 5.31 (Partes espectrais de um operador auto-adjunto). Pelo Teorema 5.48, o conjunto
! "
D = x ∈ Dom(A) | x ̸= 0, Ax = λx para algum λ ∈ R ,
de todos os auto-vetores do operador auto-adjunto A gera o subespaço fechado Hpont ⊂ H
⊥
chamado o subespaço descontínuo de A. Seu complemento ortogonal Hpont é o subespaço
contínuo Hcont de A, e, portanto, temos a decomposição
H = Hpont ⊕ Hcont ,
do espaço de Hibert H . O subespaço Hpont é caracterizado pela seguinte relação:
x ∈ M({λ}) ⇐⇒ x ∈ Dom(A) e Ax = λx . (5.11.7)
A relação (5.11.7) expressa o fato de que um número λ ∈ R é um auto-valor de A se, e
somente se, dim M({λ}) ̸= 0, e neste caso M({λ}) é o subespaço de H gerado pelo
conjunto de auto-vetores de A associados ao auto-valor λ. Uma vez que o conjunto de pontos
de descontinuidade de uma família espectral {E(λ)}λ∈R é contável, os auto-valores de um
operador auto-adjunto formam um subconjunto contável de R.29 Na sequência, nós denotamos
os auto-valores por {λ1 , λ2 , . . .}. O conjunto de todos os auto-valores de A compõe o espectro
de pontos de A. Assim, define-se Hpont como o subespaço de H gerado pelo conjunto de
todos os auto-vetores de A, isto é,
h
Hpont = M({λj }) , (5.11.8)
367
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
O leitor pode encontrar uma discussão mais detalhada sobre esta decomposição nos seguintes
textos: M. Reed e B. Simon, “Methods of Modern Mathematical Physics. Functional Analysis,” Vol.
I, Academic Press, Second Edition, 1980; P. Blanchard e E. Brüning, “Mathematical Methods in
Physics. Distributions, Hilbert Space Operators and Variational Methods,” Birkhäuser, 2003; W.O.
Amrein, “Hilbert Space Methods in Quantum Mechanics,” CRC Press, 2009.
Na teoria quântica, a decomposição do espaço de Hilbert na forma (5.11.9) nos leva ao conceito
de estados ligados e estados de espalhamento. Com efeito, se H é o operador hamiltoniano
de Schrödinger com a família espectral {E(λ)}λ∈R , os elementos Ψ ∈ H = L2 (Rn ) para
os quais ⟨Ψ, E(λ)Ψ⟩ é absolutamente contínuo correspondem aos estados de espalhamento,
enquanto que os elementos Ψ ∈ H tais que ⟨Ψ, E(λ)Ψ⟩ é uma função descontínua por saltos
correspondem aos estados ligados.
Já vimos que existe uma outra maneira de decompor o espectro de um operador auto-adjunto
em duas partes: remova do espectro σ(A) todos os pontos isolados que são auto-valores com
multiplicidade finita; isto dá σdisc (A), o espectro discreto de A. O conjunto restante, contendo
os auto-valores de multiplicidade infinita e os pontos de acumulação do espectro, é σess (A),
o espectro essencial de A. Pode-se caracterizar os pontos no espectro discreto e aqueles no
espectro essencial da seguinte forma em termos da família {M(λ)}λ∈R de subespaços fechados
de H associados à família espectral de A:
368
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
. /
(i) λ ∈ σdisc (A) se, e somente se, existe ε0 > 0 tal que dim M (λ − ε, λ + ε) < ∞ para
todo ε ∈ (0, ε0).
. /
(ii) λ ∈ σess (A) se, e somente se, dim M (λ − ε, λ + ε) = ∞ para todo ε > 0.
Além disso, λ ∈ σess (A) se, e somente se, dim Ran(E(λ + ε) − E(λ − ε)) = ∞ para todo
ε > 0.
Demonstração. O Item 1 segue imediatamente das Proposições 5.22 e 5.23. Para provar o Item
2, basta mostrar que se λ < µ e dim Ran(E(µ − 0) − E(λ)) = m (m ∈ N), então,
(λ, µ) ∩ σ(A) consiste apenas de auto-valores isolados de multiplicidade finita. A soma das
multiplicidades desses auto-valores sendo igual a m. Com efeito, se (λ, µ) ∩ σess (A) = ∅,
segue que (λ, µ) ∩ σ(A) = σdisc (A). Seja γ1 , γ2 , . . . os auto-valores de A em (λ, µ) – existe
no máximo um número contáveis deles, uma vez que eles não podem se acumular no interior
de (λ, µ). Então,
n
< . /
E(µ − 0) − E(λ) " E(λj ) − E(λj − 0) , para todo n ∈ N .
j=1
Para provar a segunda parte, suponha que σess (A) ∩ [λ − ε, λ + ε] = ∅; então, para todo
γ ∈ [λ −ε, λ + ε] deve existir um δ > 0 tal que dim Ran(E(γ + δ) −E(γ −δ)) < ∞. Assim,
γ é um auto-valor de multiplicidade finita que é um ponto isolado de σ(A). Portanto, pela
primeira parte, o intervalo [λ − ε, λ + ε] poderia ser coberto por um número finito de intervalos
desse tipo, o que implica que dim Ran(E(λ + ε) − E(λ − ε)) < ∞. Consequentemente, se
dim Ran(E(λ + ε) − E(λ − ε)) = ∞, então, σess (A) ∩ [λ − ε, λ + ε] ̸= ∅.30
30
A segunda parte poderia também ser justificada observando que se dim Ran(E(λ) − E(λ − 0)) = ∞,
então, pela primeira parte, λ é um auto-valor de multiplicidade infinita. Portanto, λ ∈ σess (A). Suponha que
dim Ran(E(λ) − E(λ − 0)) < ∞, mas que dim Ran(E(λ + ε) − E(λ − ε)) = ∞, para todo ε > 0. Logo,
o conjunto (λ − ε, λ) ∪ (λ, λ + ε] contém pelo menos um ponto espectral para cada ε > 0 pela Proposição 5.22;
portanto, λ é um ponto de acumulação de σ(A).
369
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
em que
;3λ1 , λ2 e λ3 são números reais e λ1 < λ2 < λ3 . Esta matriz pode ser escrita como
A = i=1 λi Pi , tal que
⎛ ⎞ ⎛ ⎞ ⎛ ⎞
1 0 0 0 0 0 0 0 0
⎜ ⎟ ⎜ ⎟ ⎜ ⎟
P1 = ⎜ ⎟ ⎜ ⎟ ⎜ ⎟
⎝0 0 0⎠ , P2 = ⎝0 1 0⎠ , P3 = ⎝0 0 0⎠ .
0 0 0 0 0 0 0 0 1
E(λ) = P1 + P2 + P3 = 1I para λ2 # λ .
Portanto, a função monótona crescente ϱ(λ) = ⟨x, E(λ)x⟩ tem três descontinuidades de
magnitude ⟨x, P1 x⟩, ⟨x, P2 x⟩ e ⟨x, P3 x⟩, respectivamente, nos pontos λ1 , λ2 e λ3 e constantes.
Disto segue a fórmula
$ λ3
dϱ(λ) = λ1 ⟨x, P1 x⟩ + λ2 ⟨x, P2 x⟩ + λ3 ⟨x, P3 x⟩ = ⟨x, Ax⟩ .
λ1 −0
Neste caso, dizemos que o espectro de A é discreto, e entenderemos por isso que o operador
E(λ) ainda é contínuo pela direita, mas é descontínuo pela esquerda nos pontos λ1 , λ2 e λ3 .
Diremos que esses pontos formam o espectro discreto de A.
Exemplo 5.17 (Operador com espectro de ponto puro). Pela Proposição 5.23 σdisc (A) é o
conjunto daqueles auto-valores de multiplicidade finita que são pontos isolados de σ(A). Diz-
se que A tem um espectro discreto puro se σess (A) é vazio. Veremos no Capítulo 10 que
o hamiltoniano do oscilador harmônico H = P 2 + X 2 em L2 (R) tem espectro puramente
discreto. Os auto-valores (cada um deles de multiplicidade 1) são os números λn = 2n + 1 com
n = 0, 1, 2, . . .
370
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Exemplo 5.18 (O operador posição X em L2 [a, b] mais uma vez). Observe que, o operador
E(λ) coincide com o operador de multiplicação por eλ (µ), isto é,
⎧
⎨Ψ(λ) se µ # λ
[E(λ)Ψ](µ) = eλ (µ)Ψ(λ) = .
⎩0 se µ > λ
Então, temos
$ b
⟨Ψ, XΨ⟩ = dλ |Ψ(λ)|2 λ
a
$ b ,$ λ -
2
= d dµ |Ψ(µ)| λ (pelo Teorema Fundamental do Cálculo)
a a
$ b ,$ b -
2
= d dµ eλ (µ)|Ψ(µ)| λ
a a
$ b
= d⟨Ψ, E(λ)Ψ⟩ λ .
a
O número real λ, que aparece na expressão acima, varia continuamente dentro do intervalo
[a, b] (por isto entendemos que o operador E(λ) é contínuo também pela esquerda), tem
multiplicidade infinita e, assim, pertence ao espectro essencial do operador X. A continuidade
de λ está em contraste com a discretização dos auto-valores de uma matriz finito dimensional,
como a que encontramos no Exemplo 5.16.
Exemplo 5.19 (Parte do Teorema de Kato-Rellich revisitado – cf. o Teorema 4.35). Seja A
um operador auto-adjunto ilimitado; então, seu espectro σ(A) é um conjunto ilimitado. No
entanto, o conjunto σ(A) ⊂ R pode ainda ser limitado inferiormente. Neste caso, denotamos
por MA o maior limite inferior do conjunto σ(A): MA = inf λ∈σ(A) λ. Lembramos de passagem
que A é limitado por baixo se, e somente se, o conjunto
3 4
⟨x, Ax⟩/∥x∥2 | x ∈ Dom(A), x ̸= 0 , (pela Definição 4.30)
é limitado inferiormente, com o mesmo maior limite inferior. Suponha que A e B sejam dois
operadores auto-adjuntos com domínios de definição idênticos, que A é limitado inferiormente
e que para 0 # a < 1 e b > 0 temos
371
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
temos ∥CRξ (A)∥ < 1 e, consequentemente, de acordo com a Proposição 5.8, tal ξ pertence ao
conjunto resolvente de B. Isso significa que o espectro de B contém apenas os pontos que não
satisfazem (5.11.12); isto é, B é limitado inferiormente e seu maior limite inferior MB satisfaz
(5.11.11).
Uma vez que σ(A) ⊂ [MA , ∞), para qualquer y ∈ H , x ∈ Dom(A) e ξ < MA , segue
que
Para provar que ∥CRξ (A)∥ < 1 usamos os fatos acima em (5.11.10) para derivar a desigualdade
Levando em conta que pelo Teorema 5.45 o espectro de A é vazio para ξ < MA , segue que
E(λ) é independente de ξ, para ξ < MA ; isto é, E(λ) = O para ξ < MA . Assim, assumindo
que ξ < MA , temos que ξ ∈ σ(Rξ (A)), e de acordo com as Notas 5.24 e 5.30, obtemos
$ ∞
2 1
∥Rξ (A)y∥ = d∥E(λ)y∥2
−∞ (λ − ξ)2
$ β
1
= lim d∥E(λ)y∥2
β→∞ MA −0 (λ − ξ)2
$ β
1
# lim d∥E(λ)y∥2
(MA − ξ)2 β→∞ MA −0
1
= ∥y∥2 (pelo Teorema 5.43 - cf. a Equação (5.10.5)) .
(MA − ξ)2
Assim,
, -
1
∥Rξ (A)y∥ # ∥y∥ .
MA − ξ
ou seja,
, - # %
λ MA
∥ARξ (A)y∥ # sup ∥y∥ # max 1, ∥y∥ .
MA #λ<∞ λ − ξ MA − ξ
372
Análise Espectral em Espaços de Hilbert
Aqui, para provar que ∥CRξ (A)∥ < 1, temos duas situações para serem analisadas. Primeira,
se
1 b
a+b <1 =⇒ ξ < MA − .
MA − ξ 1−a
Segunda, se
aMA 1
+b <1 =⇒ ξ < MA − (aMA + b) .
MA − ξ MA − ξ
Portanto, é facilmente visto que ∥CRξ (A)∥ < 1 quando ξ satisfaz (5.11.12), e pela Proposição
5.8 tal ξ está no conjunto resolvente de B. Consequentemente, B é limitado inferiormente pela
expressão do lado direito de (5.11.11).
Exemplo 5.20 (Operador hamiltoniano atômico). Outro hamiltoniano que analisaremos em
detalhes no Capítulo 10 é o hamiltoniano atômico. Por exemplo, veremos que o espectro do
hamiltoniano do átomo do hidrogênio H = −∇2 + e/∥x∥ em L2 (R3 ) (em que ∇2 é o
laplaciano) contém uma parte absolutamente contínua igual a [0, ∞) e, se e < 0, um número
infinito de auto-valores negativos λj = −e2 /(4j 2 ), onde j = 1, 2, 3, . . . Esses auto-valores se
acumulam em λ = 0, e cada um deles é de multiplicidade finita. Assim, temos: (i) se e > 0,
então, σ(H) = σacont (H) = σess (H) = [0, ∞) e σpont (H) = σscont (H) = σdisc (H) = ∅;
(ii) se e < 0, então, σ(H) = [0, ∞) ∪ {λj | j = 1, 2, 3 . . .}, σacont (H) = σess (H) = [0, ∞),
σpont (H) = σdisc (H) = {λj | j = 1, 2, 3 . . .} e σscont (H) = ∅.
Nota 5.32 (O papel da família espectral na teoria quântica). Como comentário final, gosta-
ríamos de destacar o papel desempenhado pela família espectral na teoria quântica. Veremos
no Capítulo 7 que a teoria quântica está fundamentada sobre um conjunto de postulados.31
Um dos postulados exige que um operador A, que é atribuído à uma quantidade λ da teoria
deve ser auto-adjunto. A importância desta exigência reside no fato de que se pode descrever
as grandezas da mecânica quântica por meio dos operadores de projeções E(λ). Portanto, a
probabilidade que a desigualdade α # λ # β aconteça é dada por ⟨x, (E(β) − E(α))x⟩. Além
disso, um outro postulado estabelece que a expectativa matemática Ex (λ) desta quantidade λ
no estado x é expressa na forma
$ ∞
Ex (λ) = ⟨x, Ax⟩ = d⟨x, E(λ)x⟩ λ ,
−∞
31
O conjunto de postulados é apresentado de formas diferentes, por diferentes autores. No Capítulo 7 são
destacados aqueles postulados que formam os pilares centrais da teoria.
373
Terceira Parte:
Elementos de Teoria de Distribuições
375
Capítulo 6
Teoria de Distribuições e Análise de
Fourier
“Se um método tem sido utilizado pelos físicos, sem muitos erros por um longo período de tempo, então deve ser
matematicamente justificável de uma forma ou de outra.”
Este capítulo é devotado a uma introdução às noções básicas sobre distribuições, trans-
formada de Fourier e análise microlocal, onde são apresentados muitos resultados importantes.
Mesmo que esses resultados não capacitem imediatamente o leitor a computar melhor os efeitos
físicos, a apresentação dos conceitos ligados com a teoria da distribuição é fundamental para
todo o mecanismo da mecânica quântica.
377
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
d
médio de f sobre uma vizinhança de x0 , que é uma integral da forma dx f (x)ϕ(x), em
que ϕ é uma função que caracteriza o aparelho de medição e “manuseia” de alguma forma a
vizinhança de x0 . Isto nos obriga a abandonar completamente a ideia de encarar f como uma
função que representa uma quantidade física, como o campo eletromagnético, e considerar, em
vez disso, f como um funcional linear, atribuindo a cada função teste ϕ o número
$ ∞
f (ϕ) = dx f (x)ϕ(x) .
−∞
O conceito de distribuição apareceu pela primeira vez no final da década de 1920 no trabalho
de P.M.A. Dirac sobre Mecânica Quântica, quando ele usou sistematicamente o conceito da
função δ definida como
R ∋ x 3−→ δ(x − x0 ) ∈ R ∪ {∞} ,
satisfazendo as seguintes propriedades:
⎧
⎨ 0 se x ̸= x0
δ(x − x0 ) = , (6.1.1)
⎩+∞ se x = x
0
e
$ ∞
dx δ(x − x0 )f (x) = f (x0 ) . (6.1.2)
−∞
Como, então, podemos dar sentido à expressão (6.1.2), que funciona tão bem na Mecânica
Quântica? Isto é estabelecido de modo satisfatório, e rigoroso, através da Teoria das Distribuições,
criada por Laurent Schwartz2 nos anos de 1940,3 que também explica outras expressões formais
como (6.1.2) envolvendo as derivadas de δ
$
dx δ (n) (x)f (x) = f (n) (0) .
1
Justiça seja feita; estava claro para Dirac, desde o início, que a função delta não podia ser uma função no
sentido clássico. O mais importante, Dirac, como um eminente físico e matemático, sabia que a função delta
atuava como um operador (mais precisamente, como um funcional) que relaciona, por meio das fórmulas (6.1.1) e
(6.1.2), a cada função contínua f um número f (x0 ), que é o seu valor no ponto x0 .
2
Laurent-Moïse Schwartz foi um matemático francês. Seu trabalho sobre a teoria das distribuições lhe rendeu
a Medalha Fields em 1950.
3
Os fundamentos matemáticos da teoria das distribuições parecem ter sido primeiro formulados pelo matemático
russo Sergei Sobolev nos anos de 1930, quando este estudava soluções fracas de EDP’s. Os russos denominam a
teoria de Sobolev de Funções Generalizadas.
378
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Neste sentido, a Teoria das Distribuições é uma generalização da noção de função, permitindo
tornar preciso várias manipulações matemáticas que não seriam possíveis via cálculo diferencial
usual, como, por exemplo, a operação de diferenciação: o espaço das distribuições é, essencial-
mente, a menor extensão do espaço de funções contínuas onde a diferenciação é sempre bem
definida.
Neste ponto, cabe ressaltar que as propriedades das funções teste devem refletir as proprie-
dades das distribuições. Como uma regra, é suficiente analisar o comportamento da distribuição
no infinito. Quanto mais “crítico” for o comportamento de uma distribuição no infinito, mais
bem comportada deve ser a função teste. Por exemplo, se considerarmos o espaço das distri-
buições formado por funções sem qualquer restrição ao seu crescimento no infinito, então esse
espaço é o dual (ou o conjugado) do espaço composto por funções teste ϕ ∈ C0∞ (Rn ), isto é, o
espaço das funções infinitamente diferenciáveis sobre Rn e que se anulam fora de alguma região
limitada. O espaço das distribuições pertencendo a esta classe é simbolizado por D ′ (Rn ), e
por D(Rn ) representamos o espaço das funções de suporte compacto ϕ ∈ C0∞ (Rn ).4
Uma classe mais ampla de funções teste, simbolizada por S (Rn ), é formada por funções
ϕ(x) que, ao invés de serem identicamente nulas fora de uma região limitada, decaem rapida-
mente a zero quando x → ∞. Os correspondentes funcionais são chamados de distribuições
temperadas. O espaço das distribuições temperadas é simbolizado por S ′ (Rn ). Deve-se res-
saltar que o nome distribuição “temperada” é motivado por um teorema de estrutura (veja o
Teorema 6.2) que diz que toda distribuição em S ′ (Rn ) pode ser representada por uma soma
finita de derivadas de funções contínuas limitadas polinomialmente.
Por outro lado, se consideramos o espaço das distribuições de suporte compacto, simbolizado
por E ′ (Rn ), então, o espaço sobre o qual essas distribuições atuam é composto por funções
teste infinitamente diferenciáveis sobre Rn . Representamos o espaço dessas funções por E (Rn ).
Assim, por definição temos E ′ ⊂ S ′ ⊂ D ′ e D ⊂ S ⊂ E .
4
Veja na Nota 6.2 a definição de suporte de uma função.
379
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
• Soma e diferença
α ± β = (α1 ± β1 , α2 ± β2 , . . . , αn ± βn ) .
• Ordem parcial
α#β ⇐⇒ αi # βi ∀ i ∈ {1, . . . , n} .
• Fatorial
α! = α1 ! · α2 ! · · · αn ! .
• Coeficiente binomial , - , -, - , -
α α1 α2 αn
= ··· ,
β β1 β2 βn
em que
, -
αi αi !
= , ∀ i = 1, . . . , n .
βi βi !(αi − βi )!
• Soma e diferença
x ± y = (x1 ± y1 , x2 ± y2 , . . . , xn ± yn ) .
• Potência
xα = xα1 1 xα2 2 · · · xαnn .
• Produto interno
def.
⟨x, y⟩ = xy = x1 y1 + · · · + xn yn
380
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Exemplo 6.1. A notação multi-índices permite a extensão de muitas fórmulas do cálculo elemen-
tar no caso de muitas variáveis, como mostram os exemplos abaixo. Em todos eles x, y, h ∈ Rn
(ou Cn ), α, β, ν ∈ Nn0 e f , aα : Rn → R (ou Cn → C).
Teorema Binomial. α , -
< α β α−β
α
(x + y) = x y .
β=0
β
Regra de Leibniz (regra do produto generalizado). Para funções suaves f , g, segue que
< ,α-
α
D (f g) = D β f D α−β g . (6.1.4)
β#α
β
De fato, para uma função suave, temos uma expansão de Taylor similar
< D α f (x)
f (x + h) = hα + Rn (x, h) ,
α!
|α|#n
em que o último termo (o resto) depende da versão exata da fórmula de Taylor. Por exemplo,
para a fórmula de Cauchy, segue que
< hα $ 1
Rn (x, h) = (n + 1) dt (1 − t)n D α f (x + th) .
α! 0
|α|=n+1
Integração por partes. Para funções suaves de suporte compacto em um domínio limitado
Ω ⊂ Rn tem-se $ $
α |α|
dx u(D v) = (−1) dx (D α u)v .
Ω Ω
Esta fórmula é usada para a definição de distribuição e derivada fraca!
381
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
∂ |α|
α β
D x = α1 α1 α
xβ1 1 xβ2 2 · · · xβnn
∂x1 ∂x2 · · · ∂xn n
∂ α1 β1 ∂ αn βn
= α1 x1 · · · αn xn ,
∂x1 ∂xn
Para cada i ∈ {1, . . . , n}, a função xβi i só depende de xi . Logo, como acima, cada derivada
parcial ∂/∂xi reduz-se à correspondente derivada ordinária d/dxi . Portanto, da equação (*),
segue que D α xβ desaparece se αi > βi para no mínimo um i ∈ {1, . . . , n}. Se este não é o
caso, isto é, se α # β como multi-índice, então
dαi βi βi !
αi xi = xβi i −αi
dxi (βi − αi )!
Ainda definimos
R
S n n
S< <
∥x∥ = T x2i , |x| = |xi | .
i=1 i=1
2
;n 2
Note que,
; ∥x∥ # |x|. Com
; efeito, prova-se isto notando que ∥x∥ = i=1 xi , enquanto que
|x|2 = ni=1 x2i + 2 i̸=j |xi | · |xj |. Usaremos este fato em várias oportunidades ao longo
deste capítulo.
Por fim, um elemento de volume em Rn será denotado por dx = dx1 dx2 · · · dxn , de
forma que a integral múltipla (de Riemann) de uma função f em Rn será muitas vezes escrita
abreviadamente como
$ $
dx f (x) = dx1 dx2 · · · dxn f (x1 , x2 , . . . , xn ) .
382
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
A união dos espaços DK (Ω) é o espaço de funções teste D(Ω) = ∪DK (Ω), em que
Ω = ∪Ki , i = 1, 2, 3, . . ., com a condição que Ki situa-se no interior de K1+i .6 Portanto, o
espaço D(Ω) consiste de todas as funções infinitamente diferenciáveis e de suporte compacto
em Ω.
A topologia de D(Ω) pode ser definida com a ajuda da base de vizinhanças de zero definida
acima. Para cada função em D(Ω), existe um índice j tal que para todo j " i a função tem
suporte em Kj . Assim, uma sequência (fn (x))n∈N converge para f ∈ D(Ω), se existe um
conjunto compacto K ⊂ Ω tal que supp fn ⊂ K, supp f ⊂ K e todas as derivadas de fn
convergem uniformemente em K com respeito a x. Desta forma, o espaço de funções teste
D(Ω) de funções de classe C ∞ de suporte compacto é definido como o limite indutivo dos
epaços DK (Ω), com K ⊂ Ω sendo compacto.
Exemplo 6.2. Um exemplo de uma função teste pertencendo ao espaço D é dado por
⎧ 6 7
⎨ exp − 2 α2 2 se ∥x∥ # α
α −∥x∥
fα (x) = ,
⎩ 0 se ∥x∥ > α
H
em que ∥x∥ = x21 + · · · + x2n e α é um número real.
DEFINIÇÃO 6.1. Diz-se que uma distribuição T pertence ao espaço dual topológico de D se
1. T é linear, isto é, se T (αf1 + βf2 ) = αT (f1) + βT (f2) para todo α, β ∈ C e para todo
f1 , f2 ∈ D,
5
I.M. Ge’fand e G.E. Shilov, “Generalized Functions. Spaces of Fundamental and Generalized Functions,” Vol.2,
Academic Press, 1968.
6
Por exemplo, podemos tomar
# %
1
Ki = x ∈ Ω | |x| # i e dist(x, !Ω) " .
i
383
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
= 1 · ∥fn − f ∥K,∞ ,
D
se x0 ∈ K. Mas como fn −→ f , então, ∥fn −f ∥K,∞ → 0 quando n → ∞. Portanto, “função”
delta de Dirac define uma distribuição em D ′ .
DEFINIÇÃO 6.3 (Funções em Lloc 1 (Ω)). Seja Ω um subconjunto não vazio e aberto de R
n
n
com fecho Ω e fronteira ∂Ω; em particular Ω pode ser o próprio R . Diz-se que uma função
f : Ω ⊆ Rn → C é localmente integrável, se f é absolutamente integrável em qualquer
subconjunto compacto K de Ω. Equivalentemente, o espaço Lloc
1 (Ω) consiste de funções que são
absolutamente integráveis em qualquer bola fechada em Ω ⊆ Rn , mas não necessariamente em
todo o conjunto Ω.
Nota 6.1. Em geral, dado um conjunto aberto Ω ⊆ Rn , diz-se que uma função f : Ω ⊆ Rn → C
é localmente p-integrável ou p-localmente integrável se
,$ -1/p
p
dx |f (x)| < ∞ , ∀0 # p < ∞ ,
K
7
Observe que os limites de integração podem ser alterados para valores finitos, uma vez que f tem suporte
compacto!
384
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Funções em Lloc n ′
1 (R ) definem, naturalmente, distribuições em D . De fato, seja f ∈
Lloc n
1 (R ) e defina Tf : D → C pela equação
$
Tf (ϕ) = dx f (x)ϕ(x) , ∀ ϕ ∈ D(Rn ).
Rn
A linearidade de Tf é clara, novamente pela linearidade da integral. Temos que mostrar que Tf
é um funcional contínuo. Para isto, fixe um conjunto compacto K em Rn . Agora, tome toda
função ϕ ∈ D(Rn ) tal que supp ϕ ⊆ K. Então, temos que
5$ 5 $
5 5 5 5
5Tf (ϕ)5 = 5 dx f (x)ϕ(x)5 # dx |f (x)||ϕ(x)|
5 5
K K
,$ -
# dx |f (x)| sup |ϕ(x)|
K x∈K
= MK ∥ϕ∥K,∞ .
Portanto, Tf é um funcional contínuo e define uma distribuição em D ′ .
Uma distribuição sobre um aberto Ω ⊂ Rn foi definida como um funcional linear contínuo
sobre o espaço de funções teste D(Ω) sobre Ω, porém não diretamente em pontos de Ω, isto é,
a distribuição não toma qualquer valor em um ponto fixo de Ω. Contudo, podemos falar sobre
a localização de uma distribuição, como ficará claro abaixo.
385
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
A Definição 6.4 reflete uma propriedade da teoria das distribuições: embora não possamos
falar do valor de uma distribuição em um dado ponto x de seu argumento, podemos discutir
suas propriedades locais em qualquer vizinhança arbitrariamente pequena de x. Não podemos,
por exemplo, dizer que uma distribuição T é igual a zero em x0 . Contudo, podemos dizer que
uma distribuição é igual a zero em uma vizinhança U de x0 . Isso significa que, se T ∈ D ′ (Ω),
U é um subconjunto aberto de Ω e se T (f ) = 0 para cada f ∈ D(Ω) com suporte em
U, então T anula-se em U. Por exemplo, a distribuição T correspondendo a uma função
ordinária g desaparecerá na vizinhança U de x0 se a própria g se anula, em quase toda parte,
nessa vizinhança. A distribuição δ(x − x0 ) desaparece na vizinhança de todo ponto x ̸= x0 .
Dizer que uma distribuição T desaparece sobre algum conjunto aberto Ω significa dizer que
ela desaparece na vizinhança de cada ponto desse conjunto. Se T é uma distribuição que não
desaparece na vizinhança de x0 , então x0 é chamado ponto essencial do funcional T . Assim,
o ponto x0 = x é o ponto essential do funcional δ(x − x0 ). O conjunto de todos os pontos
essenciais de uma distribuição é chamado o seu suporte.
DEFINIÇÃO 6.5. Sejam Ω ⊆ Rn um conjunto aberto e T ∈ D ′ (Ω). O suporte de T é o conjunto
de todo x ∈ Ω para os quais não existe uma vizinhança U de x tal que T = 0 em U.
Nota 6.2. Neste ponto, lembramos que no estudo das funções o suporte de uma função f é o
menor subconjunto fechado do domínio de f em que f assume valores diferentes de zero,
isto é, se f : X → Y é uma função definida em um espaço X com imagem em um espaço Y ,
então definimos o suporte de f como:
! "
supp f = x ∈ X | f (x) ̸= 0 .
386
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
f ∈D
f∈
/D
f∈
/D
Figura 6.1: A primeira função está em D, pois ela se anula na vizinhança de 0 e 1. A segunda
não está em D, pois ela não se anula na vizinhança de 0 e 1. A terceira também não está em
D, pois não é diferenciável em 3 pontos.
Uma distribuição é determinada univocamente por suas propriedades locais como mostra o
LEMA 6.1. Sejam Ω ⊆ Rn um conjunto aberto e T ∈ D ′ (Ω). Se T se anula sobre cada conjunto
aberto Uj ⊂ Ω, j = 1, . . . , n, então T se anula sobre o conjunto W = ∪nj=1 Uj .
Demonstração. Temos que mostrar que T (f ) = 0 para toda f cujo suporte está contido em
W . Assuma que f = f1 + · · · + fn tal que supp fj ⊂ Uj , com j = 1, . . . , n. Visto que cada
ponto x ∈ supp f pertence ao menos a um dos conjuntos Uj , construimos a função auxiliar
ηx com as seguintes propriedades:
• ηx é de classe C ∞ ,
• ηx (x) > 0,
O conjunto em que ηx > 0 é um conjunto aberto contendo x. A união desses abertos cobre o
suporte de f . Por sua vez, a compacidade do suporte de f , nos permite tomar uma subcobertura
finita desses abertos que também cobre o suporte de f .8 Denote por ηj a soma de ;todas as
n
funções ηx dessa cobertura finita cujo suporte situa-se em Uj . Então, a soma j=1 ηj é
positiva sobre o suporte de f . Defina
ηj
fj = f .
η1 + · · · + ηn
8
Lembramos ao leitor que todo subconjunto Y de um espaço topológico X é compacto se, e somente se, toda
cobertura de Y por conjuntos abertos em X contém uma subcobertura finita cobrindo Y .
387
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
;n
Note que, o supp fj ⊂ Uj , fj ∈ C0∞ e j=1 fj = f . Então, pela linearidade, segue que
T (f ) = T (f1 + · · · + fn ) = T (f1 ) + · · · + T (fn ) = 0 + · · · + 0 ,
já que T é assumido ser zero em cada conjunto aberto Uj .
LEMA 6.2. Sejam Ω ⊆ Rn um conjunto aberto e T ∈ D ′ (Ω). Se η ∈ C ∞ (Ω) e η = 1 sobre um
conjunto aberto contendo o supp T , então, T = ηT .
Uma sequência (ϕn )n∈N converge para zero em E (Rn ) se, e somente se, toda ϕn ∈ E e,
para cada inteiro α " 0, {D α ϕn }n∈N converge para zero uniformemente sobre todo conjunto
compacto K em Rn . Note que a convergência em D(Rn ) implica a convergência em E (Rn ).
Dito de outra forma, vemos que o espaço DK (Rn ) é equipado com a topologia relativa como
um subconjunto de E (Rn ). O espaço E (Rn ) é completo.
DEFINIÇÃO 6.6. O espaço dual de E (Rn ), denotado por E ′ (Rn ), consiste de todos funcionais
lineares tal que T : E (Rn ) → C, com T 3→ T (ϕ). Os elementos de E ′ (Rn ) são chamados
distribuições de suporte compacto.
O espaço E ′ (Rn ) pode ser visto como um subespaço de D ′ (Rn ). De fato, se T ∈ D ′ (Rn )
tem suporte compacto, então existe um único elemento de E ′ (Rn ) cuja restrição a D(Rn ) é
igual a T .
388
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
ϕ
1
1
2
ϕ(x) = e−αx
0.5
0
0 x 0
−2 0 2 4 6 −5
Figura 6.2: Função gaussiana em 2D a esquerda e em 3D a direita. Por causa de sua forma, a
gaussiana também é conhecida como função “sino.”
Segue da Definição 6.7 que o espaço S é uma álgebra fechada sob a derivação e a multi-
plicação por xα , isto é,
f (x) ∈ S =⇒ D α f (x) ∈ S ,
389
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Demonstração. Para ver que a condição (6.2.2) implica a condição (6.2.3), tomamos em (6.2.2)
def.
uma constante C = C(α + γ, β), para todo α, γ, β ∈ Nn0 , tal que
5 α+γ β 5
5x D f (x)5 # C ,
Demonstração. Seja C(P , Q) uma constante tal que |Q(x)P (D)f (x)| # C(P , Q). Então,
observe que Q(x)P (D)f (x) é a soma de termos da forma que satisfazem a Eq.(6.2.4).
2
Exemplo 6.7 (Função gaussiana revisitada). Se ϕ(x) = e−ax , com a > 0, então ϕ ∈ S (R).
2
É óbvio que ϕ(x) = e−ax é infinitamente diferenciável. Usando um β ∈ N0 , podemos escrever
2
D β ϕ(x) = Pβ (x)e−ax ,
em que Pβ (x) é um polinômio de x de grau β. Esta expressão implica
|Pβ (x)| # C(β)|x|β ,
com C(β) sendo uma constante positiva (que depende de β) apropriadamente escolhida. Logo,
combinando os dois resultados acima, obtemos
2 2
|xα D β ϕ(x)| = |xα Pβ (x)|e−a|x| # C(β)|x|α+β e−a|x| ,
que vale para α, β ∈ N0 arbitrários. Além disso, considerando que a taxa de crescimento de
2
ex é extremamente grande e excede a taxa de crescimento para funções de potência |x|n para
qualquer n, segue trivialmente que
2
lim |x|α+β e−a|x| = 0 .
|x|→∞
390
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Em geral, as melhores constantes possíveis em (6.2.2) são dadas por uma família de semi-
normas em S (Rn )
3 5 5 4
∥f ∥α,β = inf C(α, β) | sup 5xα D β f (x)5 < ∞ , ∀ α, β ∈ Nn0 , m ∈ N0 . (6.2.5)
x∈Rn
|β|#m
Nota 6.4. Na literatura, muitas vezes encontramos definido que a topologia do espaço S (Rn )
é gerada pelas semi-normas
5 5
|∥f ∥|α,β = sup (1 + |x|)α 5D β f (x)5 < ∞ , ∀ α, β ∈ Nn0 , m ∈ N0 . (6.2.6)
x∈Rn
|β|#m
Naturalmente, as semi-normas (6.2.5) e (6.2.6) são equivalentes. Com efeito, basta provar que
as quantidades |xα | e (1 + |x|)α são comparáveis, isto é, que cada uma é limitada por uma
constante que multiplica a outra. De fato, temos que
Portanto,
(1 + |x1 | + · · · + |xn |)α # C(α)2nα|x1 |α1 · · · |xn |αn = C(α)2nα |x|α = C(α)2nα |xα | .
Isto implica que |∥f ∥|α,β # C2 (α)∥f ∥α,β , em que C2 (α) = C(α)2nα. Consequentemente, isto
prova que as semi-normas ∥f ∥α,β e |∥f ∥|α,β são equivalentes.9
Uma topologia ou noção de convergência no espaço S (Rn ) é definida pelo conjunto das
semi-normas (6.2.5) ou (6.2.6). Neste caso, diz-se que uma sequência de Cauchy (fk )k∈N em
S (Rn ) converge com respeito a todas as semi-normas (6.2.5) se
5 . /5
∥fk − fℓ ∥α,β = sup 5xα D β fk (x) − D β fℓ (x) 5 < ε . (6.2.7)
x∈Rn
|β|#k
391
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
O espaço vetorial S (Rn ) torna-se um espaço métrico completo quando munido da distância
< ∥f − g∥α,β
d(f , g) = 2−(|α|+|β|) ,
α,β
1 + ∥f − g∥α,β
porém, esta métrica não provém de uma norma (veja o Exercício 6.5).
Escreva fk (x) = f ( xk ) com (k = 1, 2, . . .). Logo, se ϕ ∈ S (Rn ), a função ϕfk ∈ C0∞ (Rn ).10
Vamos mostrar que a sequência (ϕfk )k∈N converge para ϕ segundo a topologia do espaço
S (Rn ). Para isso, considere a função do tipo
b
1 se |xi | # k para i = 1, . . . , n
fk (x) = .
0 se |xi | > k para i = 1, . . . , n
Para um α ∈ Nn0 arbitrário, segue que |xα ϕ(x)| é limitada sobre todo Rn , de acordo com
a Definição 6.7. Logo, as funções |xα ϕ(x)fk (x)| são uniformemente limitadas com respeito
a k sobre todo Rn e, quando k → ∞, estas funções convergem uniformemente sobre todo
subconjunto compacto K ⊂ Rn para |xα ϕ(x)|, isto é,
5 8 95
sup 5(1 + |x|)α ϕ(x)fk (x) − ϕ(x) 5 → 0 quando k → ∞ .
x∈K⊂Rn
. /
Além disso, se 1 # |β| # m, então, D β ϕ(x)fk (x) é uma soma de termos, um dos quais é
fk (x)D β ϕ(x) e todos os outros termos, pela regra de Leibniz, sendo do tipo D κ ϕ(x)D γ fk (x),
α β n
com |κ| + |γ| = |β|. Uma vez
β
. que |x D / ϕ(x)| é limitada sobre todo R , de acordo com a
Definição 6.7, as funções D ϕ(x)fk (x) são uniformemente limitadas com respeito a k sobre
todo Rn e, quando k → ∞, estas funções convergem uniformemente sobre todo subconjunto
compacto K ⊂ Rn para |xα D β ϕ(x)|, isto é,
5 8 . / 95
sup 5(1 + |x|)α D β ϕ(x)fk (x) − D β ϕ(x) 5 → 0 quando k → ∞ .
x∈K⊂Rn
|β|#m
392
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Nota 6.5. Por causa do lema acima, a convergência no espaço S (Rn ) pode ser definida da
seguinte forma: se f e fk , com n ∈ N, são funções teste em C0∞ (Rn ) ou em S (Rn ), então
S
fk −→ f se, para todo α e β,
5 . /5
sup 5(1 + |x|)α D β fk (x) − D β f (x) 5 → 0 quando k → ∞ .
x∈Rn
|β|#m
DEFINIÇÃO 6.8. Diz-se que uma distribuição T ∈ S ′ (Rn ) é um funcional linear contínuo
sobre o espaço S (Rn ) se o seguinte acontece:
Nota 6.6. O termo temperado é usado para indicar que os elementos de S ′ crescem de
forma controlada quando |x| → ∞, isto é, ao se evocar o crescimento lento (ou crescimento
polinomial) no infinito. Isto significa
d que para uma função f definir uma distribuição em
S (R ) pelo mapeamento ϕ 3→ f ϕ, com ϕ ∈ S (Rn ), f deve (em adição a ser localmente
′ n
D S
Como para funções em C0∞ (Rn ), a convergência fk −→ f implica a convergência fk −→ f ,
então, se T é uma distribuição temperada, a restrição de T (f ) a C0∞ (Rn ) é uma distribuição.
Se duas distribuições temperadas concordarem sobre C0∞ (Rn ), elas concordam sobre S (Rn ).
Portanto, para uma distribuição temperada T , nenhuma distinção seré feita entre o funcional
T (f ) e sua restrição a C0∞ (Rn ), e uma distribuição T será chamada de “temperada” se T (f )
tiver uma extensão a S (Rn ) que seja contínua em relação à convergência em S (Rn ).
DEFINIÇÃO 6.9. Diz-se que um funcional T ∈ S ′ (Rn ) é limitado se, e somente se, existir uma
constante C tal que |T (f )| # C∥f ∥α,β para todo f ∈ S (Rn ).
LEMA 6.4. Um funcional linear T sobre S (Rn ) é contínuo se, e somente se, ele é limitado.
Demonstração. Suponha que T seja limitado. Considere uma sequência (fk )k∈N em S (Rn )
que converge para f segundo a topologia de S . Então, ∥fk ∥α,β → ∥f ∥α,β . Portanto, |T (fk )| #
Ck ∥fk ∥α,β → |T (f )| # C∥f ∥α,β , quando k → ∞. Assim, T é contínuo. Por outro lado,
considere T contínuo. Assuma que T não seja limitado. Então, para cada k pode-se achar uma
sequência de funções (fk )k∈N tal que |T (fk )| > k∥fk ∥α,β . Portanto, |T (fk )|/(k∥fk ∥α,β ) > 1
e não tende a zero quando k → ∞, o que é uma contradição. Isto prova que T é limitado.
393
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Exemplo 6.8. A função f (x)5 = ex sin (e5x ), com x ∈ R, não pode ser dominada no infinito
por um polinômio P , isto é, 5f (x)/P (x)5 → ∞, para todo x ∈ R, quando x → ∞. Contudo,
se ϕ ∈ S (R), então
5$ 5 5$ 5 5$ 5
5 5 5 5 5 . / 5
5 dx f (x)ϕ(x)5 = 5 dx ex sin (ex )ϕ(x)5 = 5 d − cos (ex ) ϕ(x)5
5 5 5 5 5 5
5$ 5
5 5
= 55 dx cos (e )ϕ (x)55
x ′
$
# dx |ϕ′ (x)|
$
1
= dx |(1 + |x|)α ϕ′ (x)|
(1 + |x|)α
$
1
# dx |(1 + |x|)α ϕ′ (x)|
(1 + ∥x∥)α
# C∥ϕ∥α,1 ,
em que (levando em conta o Lema 6.5, pg.394)
$
1
C = dx <∞,
(1 + ∥x∥)α
para α > 1. Isto estabelece que f ∈ S ′ (R).
De acordo com a Nota 6.6, o Exemplo 6.8 e o Lema 6.4, podemos caracterizar as distribuições
temperadas pelo seguinte
TEOREMA 6.1. Para uma distribuição T ∈ D5′ pertencer5 ao espaço S ′ (Rn ) é necessário que
exista um polinômio P definido em R tal que 5T /P 5 seja limitado, e suficiente se que para toda
n
ϕ ∈ S (Rn ) existe uma constante positiva C tal que T seja contínuo, isto é, |T (ϕ)| # C∥ϕ∥α,β .
TEOREMA 6.2 (Teorema de estrutura das distribuições temperadas). Seja T ∈ D ′ , tal que
T é a derivada de ordem finita de uma função contínua, g, limitada polinomialmente, isto é,
|g(x)| # CN (1 + |x|)N ,
com CN > 0, N ∈ N0 . Então, T = D β g ∈ S ′ (Rn ), em que β é um multi-índice.
Para provarmos o Teorema 6.2 precisaremos de um resultado que nos será útil em várias
ocasiões.11
H
LEMA 6.5. Uma função f definida em Rn e dependendo só de r = x21 + · · · + x2n é somável
se, e somente se, r n−1 f (r) é somável sobre (0, ∞); então
$ $ ∞
dx1 dx2 · · · dxn f (x1 , . . . , xn ) = ωn−1 dr r n−1 f (r) ,
Rn 0
n−1 n 12
ωn−1 sendo a área da esfera unitária S em R .
11
Para detalhes veja L. Schwartz, “Mathematics for the Physical Sciences,” Teorema 32, pg.39.
12
A área ωn−1 da esfera unitária S n−1 em Rn é determinada no Apêndice 6A.
394
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Demonstração do Teorema 6.2. Primeiro, depois de integrações por parte, temos que mostrar a
convergência da integral
$
|β|
T (f ) = (−1) dx g(x)D β f (x) , ∀ f ∈ S (Rn ) .
Com efeito,
5$ 5 $ $
5 5 5 5 5 5
5 dx g(x)D β f (x)5 # dx 5g(x)D β f (x))5 = dx |g(x)| (1 + |x|)α 5D β f (x)5
5 5 (1 + |x|)α
$ 5 5
5(1 + |x|)α+N D β f (x)5
# CN dx
(1 + |x|)α
$ 5 5
5(1 + |x|)α+N D β f (x)5
# CN dx
(1 + ∥x∥)α
# C2 (α)∥f ∥α′,β ,
em que α′ = α + N e C2 (α) = CN C1 (α), com
$ $ ∞
1 r n−1
C1 (α) = dx = ω n−1 dr ,
(1 + ∥x∥)α 0 (1 + r)α
que é finita se, e somente se, α > n, uma vez que o integrando “grosseiramente” vai com
r −α+n−1 para r muito grande. Note que, nos argumentos de prova, usamos o fato que ∥x∥ #
|x|, segundo nossas notações definidas no início deste capítulo e também o Lema 6.5. Isso
prova a convergência da integral. Que T é contínuo segue diretamente do Lema 6.4.
Nota 6.7. Nem toda distribuição temperada é da forma descrita no Teorema 6.2. O exemplo
mais conhecido deste fato é a distribuição delta de Dirac concentrada no ponto x ∈ Rn , isto é,
δx (ϕ) = ϕ(x), em que ϕ ∈ S (Rn ).
n
Seja OM o conjunto de funções infinitamente diferenciáveis sobre Rn que junto com suas
n
derivadas são polinomialmente limitadas, isto é, f ∈ OM significa que f é de classe C ∞ , e
para cada N ∈ N0 existe uma constante positiva CN tal que
5 α 5
5D f (x)5 # CN (1 + |x|)N ,
n
quando |x| → ∞. Então, OM ⊂ S ′ (Rn ).
Distribuições que são concentradas em um ponto são temperadas, e podem sempre ser
escritas como uma combinação linear finita de derivadas de δ, como mostra o
TEOREMA 6.3. Seja T ∈ S ′ (Rn ) uma distribuição que é concentrada no ponto x0 , isto é, o
suporte de T é especificado por supp T = {x0 }. Então T é uma combinação linear finita de
derivadas da função delta de Dirac,
<
T = cα D α δ (x − x0 ) , (6.2.8)
|α|#m
para m = 0, 1, 2, . . . e cα apropriados.
395
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Demonstração. Sendo T um funcional linear contínuo sobre S (Rn ), existe uma constante
positiva C tal que
|T (ϕ)| # C ∥ϕ∥α,β ,
em que 5 5
∥ϕ∥α,β = sup 5xα D β ϕ(x)5 .
x∈Rn
De acordo com o teorema de Taylor, todo ϕ ∈ S (Rn ) pode ser representado por
< (x − x0 )α
ϕ (x) = D α ϕ (x0 ) + χ (x) ,
α!
|α|#m
com a função χ(x) (o resto da aproximação por polinômios de Taylor de grau m de ϕ(x)
centrada em x0 ) tendo derivadas até a ordem m igual a zero em x = x0 .
∞ n
Multiplicando essa decomposição por uma! função "η(x) ∈ C0 (R ) que é igual a 1 na
vizinhança aberta de x0 , tal que supp η ⊂ x | |x| # 1 , obtemos uma nova decomposição
< (x − x0 )α
η(x)ϕ(x) = η(x) D α ϕ(x0 ) + η(x)χ(x) .
α!
|α|#m
Pelo Lema 6.2 temos que, T (ηϕ) = T (ϕ).! Para cada k" > 0, escrevemos ηk (x) = η(kx) e
ψk (x) = η(kx)χ(x), em que supp ψk (x) ⊂ x | |x| # k1 . Então,
5 5
|T (ψk )| # C sup 5xα D β ψk (x)5 → 0 quando k → ∞ .
|x|# k1
Por outro lado, para cada k, T ηk = T , novamente usando o Lema 6.2, uma vez que ηk = 1
na vizinhança aberta de x0 . Portanto,
< ,$ (x − x0 )α
-
T (ϕ) = dx T (x) D α ϕ(x0 ) .
α!
|α|#m
Escrevendo $
(−1)|α|
cα = dx T (x)(x − x0 ) ,
α!
segue que
< < $
|α| α
T (ϕ) = (−1) cα D ϕ (x0 ) = cα dx D α δ(x − x0 )ϕ(x) .
|α|#m |α|#m
396
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
É quase óbvio das definições que D ⊂ S ⊂ E . Vamos mostrar que estas relações também
acontecem topologicamente. A primeira inclusão já foi provada no Lema 6.3, ao mostrarmos
que D é denso em S . No entanto, vamos provar o mesmo resultado por outro argumento.
são contínuas.
As restrições destas semi-normas a qualquer DK (Ω) ⊂ D(Ω) induz a mesma topologia sobre
DK (Ω) gerada pelas semi-normas
Para provar que a aplicação ı : D(Ω) → S (Ω) é contínua, basta mostrar que ela é limitada.
Note que, para todo ϕ ∈ DK (Ω), temos que
∥ı(ϕ)∥α,β # C∥ϕ∥K,m ,
397
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
também são injeções contínuas. Com efeito, se quisermos considerar uma topologia em D ′ , S ′
ou E ′ , normalmente será a topologia fraca, que é a mais fraca topologia em relação ao qual
todos os mapas lineares
são contínuos. Como já visto, isto significa que, por exemplo, para toda distribuição u ∈ E ′ (Ω)
e para toda ϕ ∈ E (Ω), devemos ter
5 . / 5
#C sup (1 + |x|)α 5D β ψϕ (x)5 .
x∈K
|β|#m(K)
tȷ
Isto mostra que u é contínuo em S (Ω). Logo, a aplicação transposta S ′ ←− E ′ é contínua.
Por outro lado, se tomamos uma distribuição u ∈ S ′ (Ω) e uma ϕ ∈ DK (Ω), em que K é
uma bola fechada de raio R contida em Ω, então
em que C ′ = C(1 + R)α . Isto mostra que u é contínuo em D(Ω). Logo, a aplicação transposta
tı
D ′ ←− S ′ é contínua. Em resumo, temos que
D :→ S :→ E :→ E ′ :→ S ′ :→ D ′ ,
398
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
2
palavras, as funções f (x) = ex e g(x) = ex não podem ser estendidas como um funcional
contínuo de S (R) em C. Vamos mostrar isto para a função f (x) = ex . Com efeito, tome a
função Ψ ∈ C0∞ (R) tal que Ψ(x) " 0 e
⎧
⎨1 , se x ∈ [−1, 1]
Ψ(x) = .
⎩0 , se x ∈ (−∞, −2) ∪ (2, ∞)
Ψk (x)
−2k −k 0 k 2k x
Observe que,
dβ α
−k/2 x d
β
e−k/2 6 x 7α dβ
xα Ψ k (x) = e Ψ(x/k) = Ψ(x/k) .
dxβ k β dxβ k β−α k dxβ
Logo, 5 5
5 α dβ 5 e−k/2
5x 5#
5 dxβ Ψ k (x) 5 k β−α ∥Ψ∥α,β , x ∈ R , α, β ∈ N0 .
Portanto, ∥Ψk ∥α,β → 0 quando k → ∞, quaisquer que sejam α, β ∈ N0 . Agora, usando (6.2.9),
segue que
$ $ 2k
x
T (Ψk ) = dx e Ψk (x) = dx ex e−k/2 Ψ(x/k)
R −2k
$ k
" dx ex e−k/2 Ψ(x/k)
−k
$ k
= dx ex e−k/2
−k
. /
= e−k/2 ek − e−k → ∞ quando k→∞.
Isto prova que f (x) = ex não pode ser estendida como um funcional contínuo de S (R) em
C. Fica a cargo do leitor mostrar que, de forma similar, o mesmo acontece para a função
2
g(x) = ex .
Por fim, note que, de acordo com o Teorema 6.2, uma função constante pertence ao espaço
S , mas não ao espaço E ′ , já que não tem suporte compacto.
′
399
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
OT = T ◦ O ′ ,
(OT )(f ) = T (O ′ f ) ,
= T1 (f ) + T2 (f ) .
OPERAÇÃO 6.2 (Multiplicação por funções). Distribuições podem ser multiplicadas por fun-
ções contínuas infinitamente diferenciáveis (muitas vezes chamadas funções suaves) de acordo
com a seguinte regra:
$
(gT )(f ) = dx (gT )(x)f (x)
$
= dx T (x)(gf )(x)
= T (gf ) .
Observe que o lado direito está bem definido, pois D α f (x) também pertence a S (Rn ).
Portanto todo funcional linear em S (Rn ) possui derivadas neste sentido. Com efeito, a Eq.(6.3.1)
reflete o fato que uma distribuição é tão diferenciável quanto as funções teste correspondentes.
As mesmas conclusões acima também se aplicam aos espaços D ′ (Rn ) e E ′ (Rn ).
400
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
A Eq.(6.3.1) segue, portanto, da integração por partes das variáveis restantes, ou seja,
$ $ , -
α |α| ∂ |α|
dx (D T ) (x) f (x) = (−1) dx T (x) f (x) .
Rn Rn ∂xα1 1 . . . ∂xαnn
Assim qualquer distribuição tem derivadas que são também distribuições.
Exemplo 6.9. Considere a função
b
0 se x < 0
f (x) = , x∈R.
x se x " 0
Note que f é contínua, mas não é diferenciável, no sentido clássico, em x = 0. Não é difícil
provar que f define uma distribuição temperada através da fórmula
$ ∞
T (ϕ) = dx xϕ(x) , ∀ ϕ ∈ S (R) .
0
Com efeito,
5$ 5 $
5 5 5 ∞ 5 ∞
5T (ϕ)5 = 5 dx xϕ(x)55 # dx |xϕ(x)| # C∥ϕ∥1,0 .
5
0 0
Logo, T é um funcional contínuo. Portanto, a função f acima define uma distribuição temperada
T ∈ S ′ (R). Além disso, f como elemento de S ′ (R) também tem derivada em S ′ (R). Com
efeito, aplicando a Definição (6.3.1) e integrando por partes, segue que
$ ∞
′ ′
T (ϕ) = (−1)T (ϕ ) = − dx xϕ′ (x)
0
5∞ $ ∞
5
= −xϕ(x)5 + dx ϕ(x)
0 0
$ ∞
= dx θ(x)ϕ(x) ,
−∞
14
O Teorema de Clairaut-Schwarz é uma condição suficiente para a igualdade das derivadas parciais cruzadas
de uma função de várias variáveis. O teorema estabelece que, se as derivadas parciais cruzadas existem e são
contínuas, então, são iguais. O nome do teorema é uma referência aos não-contemporâneos Alexis Claude de
Clairaut e Hermann Amandus Schwarz. Por sua vez, o Teorema de Fubini, provado por Guido Fubini em 1907 no
caso de uma integral dupla, é um resultado que dá condições sob as quais é possível calcular uma integral de
uma função de n-variáveis usando a integral iterada. Pode-se mudar a ordem de integração se a integral der uma
resposta finita quando o integrando for substituído por seu valor absoluto. Como consequência, podemos mudar
a ordem das integrações na integral iterada. O teorema original de Fubini implica que duas integrais iteradas são
iguais à integral dupla correspondente em seus integrantes.
401
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
que tem uma descontinuidade em x = 0. Apesar dessa descontinuidade, θ também tem uma
derivada em S ′ (R). De fato, sua derivada como uma distribuição é dada por:
$ ∞ 5∞
′ ′ 5
θ (f ) = −θ(f ) = − dx f ′ (x) = −f (x)5 = f (0) .
0 0
Assim, θ′ = δ, e δ também tem uma derivada em S ′ (R) (verifique!). Este exemplo nos mostra
que a “função” delta de Dirac pode ser entendida como a derivada segunda de uma função
contínua, ou a derivada primeira da função degrau de Heaviside. Do ponto de vista das funções
isso não faz muito sentido pois a função degrau não é diferenciável no zero. Mas do ponto
de vista das distribuições esse conceito é bem definido. Logo, podemos concluir que θ′ = δ
somente no sentido das distribuições.
Exemplo 6.10. Como é possível tomar a derivada de uma distribuição para obter uma outra
distribuição, consequentemente, elas podem satisfazer uma equação diferencial parcial. Neste
caso, a distribuição é chamada solução fraca. Por exemplo, dada qualquer função localmente
integrável f , faz sentido procurar soluções u da equação de Poisson somente exigindo que a
equação aconteça no sentido das distribuições, ou seja, que
$ $
dx (∇ u(x))ϕ(x) = dx f (x)ϕ(x) , ∀ ϕ ∈ S (Rn ) .
2
= T (Uσ−1 f ) .
Exemplo 6.11 (Distribuições invariantes por uma transf. de Lorentz). Um ponto sobre a
variedade do espaço-tempo 4-dimensional é, geralmente, representado por xµ = (x0 , x1 , x2 , x3 ),
402
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
x′ µ = Λµ ν xν ,
Portanto,
g = Λt gΛ ,
ou mais especificamente
gαβ = gµν Λµ α Λν β , (6.3.3)
em que gµν = diag(1, −1, . . . , −1) é o tensor métrico15 que funciona como um abaixador de
índices, enquanto o tensor inverso g µν funciona como um levantador de índices.
5 5
Os vínculos det Λ = ±1 e 5Λ0 0 5 " 1 definem quatro classes de transformações desconexas
no espaço dos parâmetros. Com efeito, o determinante de um produto de matrizes é o produto
dos determinantes. Portanto, tomando o determinante de (6.3.3) obtemos
ou, . 0 /2 . /2
Λ 0 = 1 + Λi i .
Portanto, . 0 /2
Λ 0 " 1 −→ Λ0 0 " 1 ; Λ0 0 # −1 .
403
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Λµ ν = δ µ ν + ω µ ν + O(ω 2) . (6.3.5)
gαβ = gµν Λµ α Λν β
. /
= gµν (δ µ α + ω µ α ) δ ν β + ω ν β
portanto, isso implica que ωαβ = − ωβα , isto é, os parâmetros infinitesimais ω são anti-
simétricos nos índices α e β.
em que R é uma matriz 3 × 3, tal que RRt = Rt R = 1I. Por exemplo, uma representação
matricial explícita de uma rotação espacial no plano x1 x2 é dada por
⎛ ⎞
1 0 0 0
⎜ 0 cos u sin u 0 ⎟
Λ(12, u) = ⎜⎝ 0 − sin u cos u 0 ⎠ .
⎟
0 0 0 1
logo,
⎛ ⎞
0 0 0 0
⎜ 0 0 1 0 ⎟
Σ12 =⎜
⎝ 0
⎟ .
−1 0 0 ⎠
0 0 0 0
404
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Todos os outros geradores infinitesimais para as rotações espaciais, Σij , são obtidos de maneira
semelhante.
= T (f ) ,
DEFINIÇÃO 6.10a. Uma distribuição T (x) sobre R4n é invariante sob transformações de Lorentz
infinitesimais se temos
<n
∂
xti Σt T (x1 , . . . , xn ) = 0 .
i=1
∂xi
405
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
A proposição abaixo é trivial, mas é de grande utilidade na teoria quântica dos campos pois
estabelece uma condição necessária e suficiente para que uma distribuição seja invariante sob
transformações de Lorentz infinitesimais.
PROPOSIÇÃO 6.3. Uma distribuição T (x) sobre R4 é invariante sob transformações de Lorentz
infinitesimais se, e somente se, ela satisfaz o sistema de equações
<n , -
0 ∂ k ∂
xi k + xi 0 T (x1 , . . . , xn ) = 0 , k = 1, 2, 3,
i=1
∂xi ∂xi
<n , -
ℓ ∂ k ∂
xi k − xi ℓ T (x1 , . . . , xn ) = 0 , 1#k<ℓ#3.
i=1
∂xi ∂xi
Diz-se que uma sequência de funções (fk )k∈N ⊂ C ∞ (Rn ) é fracamente convergente se o
limite $
lim dx fk (x)ϕ(x) ,
k→∞
existir para toda função teste ϕ ∈ S (Rn ) – ou mesmo qualquer função contínua limitada.
Duas sequências de funções fracamente convergentes fk e hk são equivalentes se
$
lim dx (fk (x) − hk (x))ϕ(x) → 0 .
k→∞
DEFINIÇÃO 6.11 (G. Temple). Uma distribuição temperada T , é uma classe de equivalência de
sequências de funções (fk )k∈N em S (Rn ) fracamente convergente, se o limite
$
T (ϕ) = lim dx fk (x)ϕ(x) , (6.4.1)
k→∞
existir para toda função teste ϕ(x) ∈ S (Rn ). Em outras palavras, toda distribuição temperada
pode ser aproximada, no sentido de S ′ (Rn ), por uma sequência em S ′ (Rn ) proveniente de
funções em S (Rn ).
De acordo com a definição acima, qualquer sequência (fk )k∈N da classe é dita ser uma
representação de T ∈ S ′ (Rn ), e escrevemos T ∼ (fk )k∈N . Qualquer representação particular
17
G. Temple, “The Theory of Generalized Functions,” Proc. Roy. Soc. A228 (1955) 175.
406
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Como já enfatizado, o lado esquerdo da expressão simbólica acima não tem outro significado
além do dado pelo lado direito. Existem duas maneiras de como entender esta expressão.
Uma maneira, como já mencionado, é ampliando a definição de função como foi feito por L.
Schwartz, através da noção de distribuição (ou função generalizada). A outra forma é aproximar
a delta por funções ordinárias em algum sentido. A ideia é substituir a única “função” δ por
uma coleção de funções ordinárias {fk }k tal que para toda função ϕ ∈ S (Rn ),
$
lim dx fk (x − y)ϕ(x) = ϕ(y) .
k→∞ Rn
com o limite sendo interpretado em algum sentido. No caso da “função” δ, uma sequência de
funções admissíveis fk definirá a distribuição δ, desde que tal sequência convirja fracamente
para a “função” δ.
DEFINIÇÃO 6.12. Uma sequência de funções (fk )k∈N ⊂ C ∞ (Rn ) é chamada de Identidade
Aproximada se satisfaz as seguintes condições:
1. fk (x) " 0 , x ∈ Rn , k ∈ N ;
$
2. dx fk (x) = 1 ;
Rn
$
3. dx fk (x) → 0 , quando k → ∞ ∀ α > 0 .
|x|"α
Observe que, por definição, uma identidade aproximada é uma família de funções integráveis.
18
Na literatura matemática, as identidades aproximadas são também chamadas mollifers!
407
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Nota 6.9. Por razões que ficarão óbvias logo abaixo, uma sequência de funções que satisfaz as
Condições 1, 2 e 3 da definição acima é chamada, algumas vezes, de sequência de núcleos de
Dirac.
Demonstração. Uma vez que f (x) " 0, para todo x ∈ Dom(f ), segue que fk (x) " 0, para
todo k > 0. A seguir, aplicando a mudança de variável y = kx, obtemos que
$ $ $
n
dx fk (x) = k dx f (kx) = dy f (y) = 1 .
Rn Rn Rn
Para demonstrar a Condição 3 tudo que temos que fazer é mostrar que para todo ε > 0
(arbitrário) existem um α > 0 e um k0 , tal que para todo k > k0 temos
$
dx fk (x) < ε .
|x|"α
(i) i
$ ∞
−αx2 π
dx e = ,
−∞ α
408
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
(ii)
$ ∞
i , -
−αx2 ikx π 1 2
dx e e = exp − k .
−∞ α 4α
Demonstração. (i) Denotando por I(α) a integral a ser calculada, podemos escrever
,$ ∞ -2 ,$ ∞ - ,$ ∞ -
. /2 −αx2 −αx2 −αy 2
I(α) = dx e = dx e dy e ,
−∞ −∞ −∞
com a variável muda x sendo substituída por y na última integral. O produto de duas integrais
pode ser expresso como uma integral dupla:
$ ∞$ ∞
. /2 2 2
I(α) = dxdy e−α(x +y ) .
−∞ −∞
Integração sobre θ dá um fator 2π. A integral sobre r pode ser realizada facilmente após a
mudança de variável u = αr 2 , du = 2αr dr. Logo,
$ ∞ $
. /2 −αr 2 π ∞ −u π −u 55∞ π
I(α) = 2π dr r e = du e = − e 5 = .
0 α 0 α 0 α
H
Portanto, I(α) = απ . Isto prova a primeira parte do lema.
Para prova a segunda parte do lema, denote por I(k) a integral a ser calculada
$ ∞
2
I(k) = dx e−αx eikx .
−∞
Ou seja,
$ ∞ 2 F 5∞ $ ∞ G
′ i de−αx ikx i −αx2 ikx 5 −αx2 ikx
I (k) = − dx e =− e e 5 − ik dx e e ,
2α −∞ dx 2α −∞ −∞
409
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
com a última igualdade sendo obtida via integração por partes. Como eikx oscila entre −1 e 1
em módulo, a contribuição do termo de fronteira é zero. Logo, I(k) satisfaz a relação:
dI(k) k
= − I(k) , k ∈ R . (6.4.2)
dk 2α
Note que, pela primeira parte do lema,
i
π
I(0) = . (6.4.3)
α
Assim, a única solução da Eq.(6.4.2), que satisfaz a Eq.(6.4.3), é
i , -
π 1 2
I(k) = exp − k .
α 4α
A prova do lema está agora completa.
provando o corolário.
O Lema 6.6 pode ser generalizado para o caso em que α > 0, x ∈ Rn e k ∈ Rn , como
mostra o seguinte
COROLÁRIO 6.3. Para todo α > 0, x ∈ Rn e k ∈ Rn , segue que
(i) ,i -n
$
−α∥x∥2 π
dx e = ,
Rn α
(ii) ,i -n , -
$
−α∥x∥2 ikx π 1 2
dx e e = exp − ∥k∥ .
Rn α 4α
410
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
,i -n ]n , - ,i -n , -
π 1 2 π 1 2
= exp − kj = exp − ∥k∥ .
α j=1
4α α 4α
Nota 6.10. No Corolário 6.3, no item (i) se trocarmos α por (4t)−1 , com t representando o
tempo, obtemos uma família de funções
(i )n , -
def. 1 1
ft (x) = K(t, x) = exp − ∥x∥ " 0 , com t > 0 , x ∈ Rn .
2
4πt 4t
Esta família de funções é chamada núcleo do calor, pois está associada com o problema da
equação do calor.19 A família do núcleo do calor também define uma identidade aproximada.
Mais precisamente, quando tomamos o limite t → 0+ , já que
$ $
dx K(t, x) = 1 e dx K(t, x) → 0 , quando t → 0+ ∀ α > 0 .
Rn |x|"α
O próximo resultado justifica porque uma sequência de funções que satisfaz as Condições 1,
2 e 3 da Definição 6.12 é chamada, algumas vezes, de sequência de núcleos de Dirac.
19
Veja uma bela e didática apresentação deste problema no excelente texto de R. Iório Jr. e V.M. Iório, “Equações
Diferenciais Parciais: Uma Introdução,” Projeto Euclides, IMPA, 1988.
411
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
TEOREMA 6.5 (Sequência tipo-delta). Seja fk uma família de funções como aquela da Propo-
sição 6.4. Então, para a família transladada
. /
fk (x − a) = k n f k(x − a) ,
Logo,
5$ 5 $
5 . /5 5 5
5 dy f (y) ϕ(k x + a) − ϕ(a) 55 #
−1
dy |f (y)|5ϕ(k −1 x + a) − ϕ(a)5
5
Rn Rn
$
? ?
# ?ϕ(k −1 x + a) − ϕ(a)?0,0 dy f (y)
Rn
? ? k→∞
= ?ϕ(k −1 x + a) − ϕ(a)?0,0 · 1 −→ 0 .
existe quando k → ∞.
Observe que
d no Exemplo 6.3 já tinhamos provado (formalmente porque assumimos, na
ocasião, que K dx δ(x − x0 ) = 1) que δ ∈ D ′ . O resultado acima prova também que δ ∈ S ′ .
Isto não é novidade, já que toda distribuição em D ′ com um suporte limitado é uma distribuição
temperada. Assim, a distribuição delta e suas derivadas estão em S ′ .
Exemplo 6.12 (Sequência de funções de Breit-Wigner). A sequência de funções
1 n
fn (x) = , x∈R, n∈N,
π 1 + n2 x2
chamada de sequência de funções de Breit-Wigner, converge fracamente para δ. Com efeito,
tome g ∈ S (R) e separe a integral
$ ∞
1 n
dx g(x) ,
−∞ π 1 + n2 x2
412
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
√ √
assumindo que g não muda de sinal no intervalo [−1/ π, 1/ π]. A primeira e a terceira
integrais vão para zero quando n → ∞. De fato,
5$ 5 $ ∞
5 ∞ 1 n 5 1 n
5 5
5 dx g(x)5 # ∥g∥0,0 dx
5 √1 π1+n x 2 2 5 √1 π 1 + n2 x2
π π
, -
1 1 √ n→∞
= ∥g∥0,0 − arctan n −→ 0 .
2 π
Para computar a segunda integral usamos o Segundo Teorema do Valor Médio para integrais
2 2 −1
definidas.√De acordo
√ com esse teorema, como a função fn (x) = (n/π)(1 + n x ) √é contínua
√
em [−1/ π, 1/ π], para cada n, e g é integrável e não muda√de sinal
√ em [−1/ π, 1/ π],
então existe um número ξ no domínio de integração ξ ∈ [−1/ π, 1/ π] tal que
$ √1 $ √1
π 1 n π 1 n
dx g(x) = g(ξ) dx
− √1π π 1 + n2 x2 − √1π π 1 + n2 x2
2 √ n→∞ √ √
= g(ξ) arctan n −→ g(0) , (−1/ π # ξ # 1/ π) .
π
Desta forma, o limite fraco da sequência de funções de Breit-Wigner, quando n → ∞, associa
a cada função teste g ∈ S (R) o número g(0), o valor da função no ponto x = 0. Portanto,
fn → δ, quando n → ∞, no sentido que para qualquer função teste g ∈ S (R) o resultado
limite $
1 n
dx g(x) → δ(g) ,
π 1 + n2 x2
existe quando n → ∞.
Nota 6.11. Uma sequência fracamente convergente pode ser ou deixar de ser convergente se-
gundo qualquer outra noção de convergência. Por exemplo, a sequência de funções de Breit-
Wigner fn (x) = (n/π)(1 + n2 x2 )−1 converge fracamente para a distribuição δ, mas não
converge ponto-a-ponto, se tomamos x = 0
n
lim fn (0) = lim =∞.
n→∞ n→∞ π
Consequentemente, segundo o exemplo acima, não faz sentido falar sobre o valor de uma
distribuição em um determinado ponto x. Uma distribuição pode somente ser localizada em
uma vizinhança de x e ter seu valor avaliado nessa vizinhança, se a multiplicarmos por uma
função teste com suporte nessa região.
Exemplo 6.13 (Ponto material de massa 1). Vamos analisar em detalhes um outro exemplo
interessante discutido por Vladimirov20 sobre a noção idealizada de densidade criada por um
ponto material de massa unitária. Considere que este ponto material coincida com a origem de
20
V.S. Vladmirov, “Equations of Mathematical Physics,” Marcel Dekker, 1971, pg.64.
413
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
coordenadas. Denote por δ esta densidade. A seguir, distribua esta massa uniformente dentro
de uma esfera de raio n. Como resultado, temos que
b 1
4
πn3
se |x| < n
fn (x) = 3
.
0 se |x| > n
Assuma que a densidade δ é o ponto limite da sequência de densidades fn (x), isto é,
b
∞ se x = 0
δ(x) = lim fn (x) = . (6.4.4)
n→0
0 se x ̸= 0
Naturalmente, devemos exigir que a integral da densidade δ sobre qualquer volume V dê como
resultado a massa contida neste volume, isto é,
$ b
1 se 0 ∈ V
dx δ(x) = . (6.4.5)
V 0 se 0 ∈/V
Contudo, como já enfatizado, resultados elementares da teoria de integração mostra que as
condições (6.4.4) e (6.4.5) são contraditórias. Com efeito, por (6.4.4), δ(x) = 0 para quase todo
x (com respeito à medida de Lebesgue) e, assim, a integral de Lebesgue do lado esquerdo de
(6.4.5) é de fato sempre igual a zero. Isto claramente contradiz a condição (6.4.5). Portanto, a
contradição aqui mostra que o ponto limite da sequência fn (x), quando n → 0, não pode ser
tomado como a densidade δ(x). Vamos então calcular o limite fraco da sequência de funções
fn (x), quando n → 0, isto é, queremos mostrar que
$
lim dx fn (x)g(x) = g(0) .
n→0
De fato, levando em conta a continuidade de g(x), segue que para qualquer η > 0, existe um
n0 tal que |g(x) − g(0)| < η quando |x| < n0 . Então, para todo n # n0 , obtemos que
5,$ - 5 5$ 5
5 5 1 5 . /5
5 dx fn (x)g(x) − g(0)55 = 5 dx g(x) − g(0) 55
5 4πn3 /3 5 |x|<n
$
1 5 5
# dx 5g(x) − g(0)5
4πn3 /3 |x|<n
$
1
<η dx = η .
4πn3 /3 |x|<n
Assim, como no exemplo anterior, a sequência fn → δ, neste caso quando n → 0, no sentido
que para qualquer função contínua limitada g o resultado limite
$
dx fn (x)g(x) → δ(g) ,
é válido quando n → 0. Finalmente, para recuperar a massa completa, é necessário atuar com
o funcional (densidade) δ sobre a função constante g(x) = 1.
Nota 6.12. Se a massa m está concentrada no ponto x = 0, a correspondente densidade é
igual a mδ(x). Se a massa m está concentrada no ponto x = x0 , a correspondente densidade
é igual a mδ(x − x0 )!
414
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
H 2
Exemplo 6.14. A sequência de funções απ e−αx (veja a Figura ??) no Corolário 6.2 define a
distribuição-δ. Com efeito, tome ϕ ∈ S (R); então,
5F$ i G 5 5$ i >55
5
5 α −αx2 5 5
5 5 α −αx2 =
5 dx e ϕ(x) − ϕ(0)5 = 5 dx e ϕ(x) − ϕ(0) 55
R π R π
$ i
α −αx2
# sup |ϕ′ (x)| dx e |x|
x∈R R π
i F $ 0 $ ∞ G
α −αx2 −αx2
= ∥ϕ∥0,1 − dx e x+ dx e x .
π −∞ 0
Agora, considere o espaço quociente com respeito ao kernel M de todas as classes de equiva-
lência 3 4
L2 (Rn ) = L2 (Rn )/M = [Ψ] = Ψ + M | Ψ ∈ L2 (Rn ) .
415
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Isto implica que a diferença Ψ(x) − Φ(x) desaparece em q.t.p., isto é, Ψ(x) ∼ Φ(x). Este
conceito está fundamentado na teoria de integração de Lebesgue.
! Mais precisamente, definimos
"
n
Ψ ∼ Φ se, e somente se, Ψ = Φ em q.t.p., ou seja, [Ψ] = Φ ∈ L2 (R ) | Ψ ∼ Φ denota
uma classe de equivalência que são os elementos do espaço quociente L2 (Rn ) = L2 (Rn )/M.
Esta construção apenas formaliza o fato de que identificamos duas funções que são iguais em
q.t.p. O espaço L2 (Rn ) assim definido é um espaço vetorial com as operações de linearidade e
homogeneidade
α[Ψ] + β[Φ] = [αΨ + βΦ] , ∀ α, β ∈ C ,
enquanto que
⟨[Ψ], [Φ]⟩ = ⟨Ψ, Φ⟩ ,
com Ψ, Φ ∈ L2 (Rn ) representando suas respectivas classes de equivalência, é um produto
interno em L2 (Rn ), com ∥[Ψ]∥2 = ∥Ψ∥2 definindo uma norma em L2 (Rn ). Pode-se ve-
rificar que estes conceitos estão bem definidos, isto é, independem da escolha particular do
representante de uma classe de equivalência.
mente necessária para tratar a teoria L2 (Rn ). Portanto, todas as integrações são entendidas no
sentido de Riemann e realizadas ao longo de todo o espaço Rn , se o domínio de integração
não for especificado de outro modo. Seguiremos a abordagem realizada por Peter Werner.22 A
essência desta abordagem é que, ao se abandonar o conhecimento das funções em conjuntos
de medida de Lebesgue zero (conjuntos de medida zero em geral não tem apelo físico), abrimos
as portas para a definição correta do espectro contínuo de um operador auto-adjunto (veja a
seção sobre o tripleto de Gel’fand).
416
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
$
1 5
2α 5
52
= dx (1 + |x|) ϕ k (x) − ϕ(x) 5
(1 + |x|)2α
⎡ ⎤2
,$ -
1 5 5
# dx ⎣ sup (1 + |x|)α 5ϕk (x) − ϕ(x)5⎦
(1 + |x|)2α x∈Rn
|β|#m
⎡ ⎤2
,$ -
1 5 5
# dx ⎣ sup (1 + |x|)α 5ϕk (x) − ϕ(x)5⎦ .
(1 + ∥x∥)2α x∈Rn
|β|#m
O resultado segue observando-se que a integral entre parênteses é finita (na verdade é uma
constante C(α) determinada da mesma forma como na prova do Teorema 6.2), enquanto
que o fator entre colchetes representa uma combinação linear finita de semi-normas do tipo
∥ϕk − ϕ∥α,0 . Logo, segue que
H
∥ϕk − ϕ∥2 # C(α) ∥ϕk − ϕ∥α,0 → 0 , quando k → ∞ .
417
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Nós vamos nos referir ao espaço L2 (Ω) como o espaço dual do espaço linear S (Ω), agora
munido da norma
,$ -1/2
1/2 2
∥ϕ∥2 = ⟨ϕ, ϕ⟩ = dx |ϕ(x)| . (6.5.2)
De acordo com a Definição 6.11, se a sequência (ψk )k∈N em S (Ω) é de Cauchy em relação à
norma acima, então, pela desigualdade de Hölder
|⟨(ψk − ψℓ ), ϕ⟩| # ∥ψk − ψℓ ∥2 ∥ϕ∥2 → 0 ,
para toda ϕ ∈ S (Ω). Portanto, a integral
$
TΨ (ϕ) = lim dx ψk (x)ϕ(x) = lim Tψk (ϕ) , ∀ ϕ ∈ S (Ω) ,
k→∞ k→∞
define um elemento Ψ ∈ S ′ (Ω). Note que, por causa desse resultado, se Ψ, Φ ∈ S ′ (Ω) e se
as as sequências (ψk )k∈N , (ϕk )k∈N em S (Ω) são de Cauchy em relação à norma ∥ · ∥2 , então,
Ψ = Φ ⇐⇒ limk→∞ ∥ψk − ϕk ∥2 = 0. Com efeito, considere a integral
$
. /
[TΨ − TΦ ](ϕ) = lim dx ψk (x) − ϕk (x) ϕ(x) .
k→∞
418
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
e
lim ∥ψk − ϕℓ ∥2 = 0 .
k,ℓ→∞
Além disso, para todo ϕ ∈ S (Ω) segue, pela desigualdade de Hölder, que |TΨ (ϕ)| #
∥Ψ∥2 ∥ϕ∥2 ; portanto, TΨ ∈ L2 (Ω) e ∥TΨ ∥ # ∥Ψ∥2 . Observe que, tomando ϕ = Ψ/∥Ψ∥2
em (6.5.1), segue que ∥TΨ ∥ = ∥Ψ∥2 . Em particular, TΨ = 0 implica que Ψ = 0. Isto mostra
que Ψ → TΨ é um mapeamento linear isométrico, um-para-um, de S (Ω) para L2 (Ω). Esta
observação nos permite identificar cada Ψ ∈ S (Ω) com um funcional linear TΨ definido por
(6.5.1). Tudo isto nos leva à seguinte
DEFINIÇÃO 6.13. L2 (Ω) é o espaço vetorial de todos os funcionais lineares a valores complexos
TΨ em S (Ω) que podem ser aproximados por sequências (ψk )k∈N ⊂ S (Ω) que são de Cauchy
em relação à norma ∥ · ∥2 , tal que
3 4
∥TΨ ∥ = sup |TΨ (ϕ)| | ϕ ∈ S (Ω), ∥ϕ∥2 = 1 < ∞ , (6.5.3)
Assuma que Ψ, Φ ∈ L2 (Ω) e que as sequências (ψk )k∈N e (ϕk )k∈N em S (Ω) convergem
para Ψ e Φ, respectivamente, segundo a norma ∥ · ∥2 . Então, um produto interno ⟨Ψ, Φ⟩ pode
ser definido por
$
⟨Ψ, Φ⟩ = lim ⟨ψk , ϕk ⟩ = lim dx ψ k (x)ϕk (x) . (6.5.4)
k→∞ k→∞
O limite do lado direito existe uma vez que, pela desigualdade de Hölder
419
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Suponha que as sequências (ψk′ )k∈N e (ϕ′k )k∈N em S (Ω) também convergem para Ψ e Φ,
respectivamente, segundo a norma ∥ · ∥2 . Então, ∥ψk − ψk′ ∥2 → 0 e ∥ϕk − ϕ′k ∥2 → 0 quando
k → ∞. Portanto,
k→∞
|⟨ψk , ϕk ⟩ − ⟨ψk′ , ϕ′k ⟩| # ∥ψk ∥2 ∥ϕk − ϕ′k ∥2 + ∥ψk − ψk′ ∥2 ∥ϕℓ ∥2 −→ 0 .
Isso mostra que o limite (6.5.4) é independente das sequências escolhidas (ψk )k∈N e (ϕk )k∈N
em S (Ω) convergindo para Ψ e Φ, respectivamente. Assim, a definição do produto interno
(6.5.4) é justificada para Ψ, Φ ∈ S (Ω).
Deve-se enfatizar que o espaço S (Ω) munido da norma ∥ · ∥2 não é completo, enquanto
que o espaço vetorial normado L2 (Ω) é completo quando munido da norma (6.5.3). Isto será
mostrado na Proposição 6.6 abaixo. Antes, provaremos o seguinte
TEOREMA 6.6. Os espaços C0∞ (Ω) e S (Ω) são densos em L2 (Ω).
Demonstração. De acordo com o Lema 6.3 e com a Nota 6.5, basta provar que C0∞ (Ω) é denso
em L2 (Ω), já que a densidade de S (Ω) em L2 (Ω) segue do fato que C0∞ (Ω) é denso em
S (Ω). Para mostrar que C0∞ (Ω) é denso em L2 (Ω), introduzimos o espaço vetorial C0∞ (Ω)
consistindo de todos os funcionais-L2 , TΨ , com a propriedade de que existe uma sequência
(ψk )k∈N em C0∞ (Ω) tal que ∥TΨ − Tψk ∥ → 0, quando k → ∞.
A seguir, vamos dividir os detalhes da prova da densidade de C0∞ (Ω) em L2 (Ω) em dois
passos:
(1) No primeiro passo mostraremos que C0∞ (Ω) é completo. Com efeito, considere uma
sequência (Φk )k∈N em C0∞ (Ω) tal que ∥TΦk − TΦℓ ∥ → 0, quando k, ℓ → ∞, isto é,
5$ 5
5 . / 5
∥TΦk − TΦℓ ∥ = sup 55 dx Φk (x) − Φℓ (x) ϕ(x)55
∥ϕ∥2 =1
Pela definição de C0∞ (Ω), podemos escolher funções ψk ∈ C0∞ (Ω) tais que ∥TΦk − Tψk ∥ <
1/k para todo k. Então, pela desigualdade triangular, segue que
∥Tψk − Tψℓ ∥ = ∥Tψk − Tψℓ + TΦk − TΦk + TΦℓ − TΦℓ ∥
1 1
< + + ∥TΦk − TΦℓ ∥ → 0 quando k, ℓ → ∞ .
k ℓ
Assim, a sequência (ψk )k∈N é convergente em L2 (Ω), já que o resultado acima implica que
5$ 5
5 . / 5
∥Tψk − Tψℓ ∥ = sup 55 dx ψk (x) − ψℓ (x) ϕ(x)55
∥ϕ∥2 =1
420
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
1
< ∥TΨ − Tψk ∥ + → 0 quando k→∞.
k
Isto prova a completeza de C0∞ (Ω).
Como C0∞ (Ω) é denso em C0∞ (Ω), o produto interno em C0∞ (Ω) definido por (6.5.4) pode
ser estendido para C0∞ (Ω). De fato, suponha que Ψ e Φ pertençam a C0∞ (Ω) e que (ψk )k∈N e
(ϕk )k∈N são sequências em C0∞ (Ω) convergindo para Ψ e Φ, respectivamente. Então, seguindo
a mesma linha de raciocínio logo abaixo da Eq.(6.5.4), mostra-se que o limite em (6.5.4) é
independente das sequências escolhidas (ψk )k∈N e (ϕk )k∈N em C0∞ (Ω) convergindo para Ψ e
Φ, respectivamente. Assim, o produto interno (6.5.4) é justificado para Ψ, Φ ∈ C0∞ (Ω). Entre
outras coisas, isto mostra que a norma (6.5.3) e o produto interno (6.5.4) estão relacionados por
(2) No segundo passo mostraremos que L2 (Ω) = C0∞ (Ω). Para isso, assuma que TΨ
pertence a L2 (Ω), isto é, que TΨ é um funcional linear limitado no espaço vetorial C0∞ (Ω)
normalizado por (6.5.2). Como C0∞ (Ω) é denso em C0∞ (Ω), TΨ pode ser estendido para um
funcional linear limitado em C0∞ (Ω) definindo
$
TΨ (Φ) = ⟨TΨ , Φ⟩ = lim ⟨TΨ , ϕk ⟩ = lim dx Ψ(x)ϕk (x) , (6.5.5)
k→∞ k→∞
em que Φ ∈ C0∞ (Ω), ϕk ∈ C0∞ (Ω) e ∥Φ − ϕk ∥2 → 0 quando k → ∞. Note que, por causa
da norma 3 4
∥TΨ ∥ = sup |TΨ (ϕ)| | ϕ ∈ C0∞ (Ω), ∥ϕ∥2 = 1 < ∞ ,
o limite em (6.5.5) existe e é independente da escolha da sequência (ϕk )k∈N convergindo para
Φ. Por outro lado, como C0∞ (Ω) é um espaço de Hilbert, o Teorema de Representação de
421
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Riesz-Fréchet (Teorema 4.9) estabelece que existe um funcional UΨ ∈ C0∞ (Ω) tal que
$
UΨ (Φ) = ⟨Ψ, Φ⟩ dx Ψ(x)Φ(x) para todo Φ ∈ C0∞ (Ω) . (6.5.6)
Isto, por sua vez, implica, pela definição de C0∞ (Ω), que uma sequência ψk ∈ C0∞ (Ω) deve
gerar uma sequência de funcionais Uψk tal que ∥UΨ − Uψk ∥ → 0, quando k → ∞. Pela
continuidade do produto interno, Proposição 3.13, e por (6.5.6), obtemos que TΨ deve concordar
com UΨ para todo ϕ ∈ C0∞ (Ω), isto é,
$
TΨ (ϕ) = UΨ (ϕ) = lim ⟨ψk , ϕ⟩ = lim dx ψk (x)ϕ(x) para todo ϕ ∈ C0∞ (Ω) .
k→∞ k→∞
Portanto,
5 $ 5
5 5
∥TΨ − Uψk ∥ = sup 55TΨ (ϕ) − dx ψk (x)ϕ(x)55
∥ϕ∥=1
5 5
5 5
= sup 5 lim ⟨(ψℓ − ψk ), ϕ⟩55
5
∥ϕ∥=1 k,ℓ→∞
Isso prova que TΨ é o limite da sequência ψk ∈ C0∞ (Ω) e, portanto, pertence a C0∞ (Ω). Isto
conclui a prova do teorema.
No primeiro passo da prova do Teorema 6.6 nos assumimos que o espaço L2 (Ω) era completo
de acordo com o Teorema 3.18. De fato o espaço L2 (Ω) é completo de acordo com a topologia
gerada pela norma (6.5.3) como mostra a seguinte
PROPOSIÇÃO 6.6. Como o conjugado de uma espaço vetorial normado, o espaço dos funcionais-
L2 é completo.
Demonstração. Assuma que a sequência (ψk )k∈N ⊂ S (Ω) gera uma sequência (Tψk )k∈N de
funcionais-L2 , isto é,
$
Tψk (ϕ) = dx ψk (x)ϕ(x) ∀ ϕ ∈ S (Ω) .
Assuma também que a sequência (ψk )k∈N ⊂ S (Ω) converge para a função Ψ ∈ L2 (Ω)
segundo a norma ∥ · ∥2 e que ∥Tψk − Tψℓ ∥ → 0 quando k, ℓ → ∞, segundo a norma (6.5.3),
então o funcional TΨ definido por
422
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
TEOREMA 6.7 (Peter Werner, Teorema 2.1). Ao identificar uma função Ψ de S (Ω) com
o funcional TΨ , definido por (6.5.1), o espaço vetorial S (Ω) munido da norma (6.5.2) está
isometricamente contido no espaço vetorial L2 (Ω) introduzido pela Definição 6.13 e munido
da norma (6.5.3). S (Ω) é um subespaço denso de L2 (Ω) com respeito à norma (6.5.3). Um
produto interno pode ser introduzido em L2 (Ω) pela fórmula (6.5.4), em que ψk , ϕk ∈ S (Ω) e
∥Ψ − ψk ∥2 → 0, Φ − ϕk ∥2 → 0 quando k → ∞. A norma (6.5.3) e o produto interno (6.5.4)
estão relacionados pela fórmula
∥TΨ ∥ = ⟨Ψ, Ψ⟩1/2 , ∀ Ψ ∈ L2 (Ω) .
O teorema acima estabelece que L2 (Ω) é o completamento do espaço com produto interno
S (Ω). Isto implica, por resultados familiares da teoria de Lebesgue, que L2 (Ω) é isométrico
ao espaço clássico de classes de equivalência de funções de quadrado integrável no sentido de
Lebesgue.
Na mecânica quântica não existe propriedade mais importante das funções que descrevem
os possíveis estados de um sistema físico do que eles formarem um conjunto completo. Por isto,
apresentamos abaixo alguns dos conjuntos ortonormais completos de funções mais frequentes
na mecânica quântica: os polinômios de Hermite, Laguerre e Legendre. Esses polinômios são
exemplos particulares de espaços L2 . Vamos começar com a seguinte
DEFINIÇÃO 6.14. Um conjunto de funções {Ψn } é ortonormal com respeito à função peso w
sobre qualquer intervalo I = [a, b], com −∞ # a < b # ∞, se
$ b
⟨Ψm , Ψn ⟩ = dx w(x)Ψm (x)Ψn (x) = δmn ,
a
sendo que sobre o intervalo I, a função peso w é estritamente positiva, isto é, w(x) > 0, para
todo x ∈ I. Se o intervalo não é limitado, então existem duas constantes positivas α e C tais
que w(x)eα|x| # C, para todo x ∈ I.
423
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
2 2
6.5.1.1 Polinômios de Hermite: I = R, w(x) = e−x Evidentemente, a função w(x) = e−x
é uma função peso para a linha real (veja o gráfico da função gaussiana em 1D representado
2
na Figura 6.2). Portanto, pelo Lema 6.8, o sistema de funções wn (x) = xn e−x gera o espaço
2
de Hilbert L2 (R, e−x dx). A ortonormalização de Gram-Schmidt produz uma base ortonormal
{hn : n = 0, 1, 2, . . .}, cujos os elementos têm a forma (fórmula de Rodrigues)
2 dn −x2
hn (x) = (−1)n cn e−x e = cn Hn (x) , (6.5.7)
dxn
com constantes de normalização
. √ /−1/2
cn = 2n n! π , n = 0, 1, 2, . . .
y ′′ − 2xy ′ + 2ny = 0 .
Na teoria quântica, estas relações mostram que as funções Hermite hn são as auto-funções
do oscilador harmônico quântico representado pelo hamiltoniano H = 12 (P 2 + X 2 ), tendo os
auto-valores n + 21 , isto é,
, -
1
Hhn (x) = n + hn (x) , n = 0, 1, 2, . . .
2
Como última observação, note que as funções Hermite pertencem ao espaço de funções teste
de Schwartz S (R).
6.5.1.2 Polinômios de Laguerre: I = R+ , w(x) = e−x Sobre a linha real positiva, a função
exponencial w(x) = e−x certamente é uma função peso. Portanto, isto nos permite definir um
sistema de funções, denominado sistema de funções de Laguerre {ℓn : n = 0, 1, 2, . . .} que
é construído através do processo de ortonormalização de Gram-Schmidt do sistema {xn e−x },
para n = 0, 1, 2, . . ., em L2 (R+ , e−x dx) para se obter uma base ortonormal. As funções de
Laguerre têm a seguinte forma (fórmula de Rodrigues):
1 x dn . −x n / 1
ℓn (x) = e n
e x = Ln (x) . (6.5.8)
n! dx n!
23
Os polinômios de Hermite foram definidos por Pierre-Simon Laplace em 1810, embora em forma um pouco
diferente, e estudados detalhadamente por Pafnuty Chebyshev em 1859. O trabalho de Chebyshev foi esquecido, e
eles foram nomeados depois de Charles Hermite por polinômios de Hermite, que escreveu sobre os polinômios em
1864, descrevendo-os como novos. Portanto, eles não eram novos, embora Hermite tenha sido o primeiro a definir
os polinômios multi-dimensionais em suas publicações posteriores de 1865.
424
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
xy ′′ + (1 − x)y ′ + ny = 0 .
Para qualquer intervalo finito I = [a, b], com −∞ # a < b # ∞, podemos assumir qualquer
constante positiva como uma função peso. Assim, o sistema de potências {xn : n = 0, 1, 2, . . .}
é um sistema total de funções no espaço de Hilbert L2 ([a, b], dx). Segue-se que todo elemento
Ψ ∈ L2 ([a, b], dx) é o limite de uma sequência de polinômios, na norma L2 .24
425
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
em que y = Pn (x).
Na teoria quântica, devido a simetria esférica relacionada ao grupo de Lie SO(3), os po-
linômios de Legendre estão associados com a quantização do momento angular orbital (veja os
detalhes no Capítulo 7, Seção 9.2.2).
Um espaço Lp (Rn ) pode ser definido como um espaço de funções para o qual a p-ésima
potência do valor absoluto é integrável. Mais geralmente, se 1 # p < ∞, então a função
,$ -1/p
p
∥Φ∥p = dx |Φ(x)| , ∀ Φ ∈ Lp (Rn ) , (6.5.10)
Rn
é a norma-L∞ .
Os espaços Lp (Rn ) formam uma “escala” útil de espaços. Podemos avaliar a utilidade de
um operador linear em análise determinando quais dos espaços Lp ele preserva.
É um fato interessante e útil que os duais dos espaços Banach Lp (Rn ) possam ser calculados,
como estabelece o seguinte
TEOREMA 6.8. Seja 1 # p < ∞. Então, o dual do espaço de Banach Lp (Rn ) é Lq ((Rn )), em
que q = p/(p − 1).
Omitiremos a prova deste resultado. Não existe uma descrição simples do dual de L∞ (Rn ).
TEOREMA 6.9. Os espaços C0∞ (Ω) e S (Ω) são densos em Lp (Rn ), 1 # p < ∞.
O prova deste teorema será omitida já que basta usar os mesmos argumentos usados na
prova do Teorema 6.6.
Duas propriedades básicas dos espaços Lp (Rn ) muito usadas ao longo destas notas são
estabelecidas no seguinte
25
P. Werner, “Bemerkungen zur Theorie der Lp -Räume,” J. Reine Angew. Math. 34 (1969) 401.
426
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Demonstração. (i) Para provar a desigualdade de Hölder, primeiro precisamos de uma outra
desigualdade elementar de W.H. Young:27
1 ap/r bq/r
ab # + para a, b " 0 .
r p q
Com efeito, se
1 1 1 1 p+q
= + =⇒ = .
r p q r pq
Disto segue que
pq
=p+q ,
r
e a partir disso obtemos que 6p 7 6q 7
−1 −1 =1 .
r r
′ ′
Defina p′ = p/r e q ′ = q/r e considere a função y = xp −1 . Então, x = y 1/(p −1) e usando a
′ ′
identidade (p′ − 1)(q ′ − 1) = 1, temos x = y q −1 . Agora vamos desenhar a curva y = xp −1 ou
′
x = y q −1 no primeiro quadrante e provar a desigualdade tipo-Young. Observe que, no gráfico
′
da Figura 6.4, a área da Região I é a área delimitada pela reta y = b e a curva y q −1 de y = 0
db ′
até y = b. Isto é, 0 dy y q −1 . Por sua vez, a área da Região II é a área delimitada pela curva
′ da ′
xp −1 de x = 0 até x = a e a reta x = a; ou seja, 0 dx xp −1 . Logo, a área do retângulo de
lados a e b representado no gráfico satisfaz a desigualdade
$ a $ b ′ ′
p′ −1 ′ ap bq ap/r bq/r
ab # dx x + dy y q −1 = + = + ,
0 0 p′ q′ p/r q/r
Portanto,
1 ap/r bq/r
ab # + ,
r p q
para a, b " 0. Isto prova a desigualdade tipo-Young.
26
A desigualdade de Hölder foi provada pela primeira vez em 1888 por L. J. Rogers. Ela foi descoberta indepen-
dentemente em 1889 por Otto Hölder. Originalmente, a desigualdade de Hölder foi provada para r = 1.
27
Assim como no caso da desigualdade de Hölder, originalmente, a desigualdade de Young foi provada para
r = 1.
427
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
y
′
y = xp −1
I II
a x
′ ′
Figura 6.4: O gráfico de xp −1 , y q −1 .
(ii) Para p = 1, a desigualdade é facilmente obtida pela desigualdade triangular. Para provar
−(p−1)
a desigualdade para p > 1, defina a função Ψ∗ = |Ψ|p−1∥Ψ∥p . Note que com esta
definição, segue que
$ $ $
∗ ∗ |Ψ(x)|p ∥Ψ∥pp
dx |Ψ(x)Ψ (x)| = dx |Ψ(x)||Ψ (x)| = dx = = ∥Ψ∥p .
∥Ψ∥p−1
p ∥Ψ∥p−1p
= ∥Ψ(x)∥p + ∥Φ(x)∥p .
A prova do lema está completa.
428
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Nota 6.14. O primeiro dos resultados acima é um dispositivo útil para estimar o produto interno
de duas funções. Em particular, se r = 1, então p = q = 2; neste caso a desigualdade de
Hölder é exatamente a desigualdade de Cauchy-Schwarz-Bunjakowski para integrais. O segundo
destes resultados dá uma desigualdade triangular nos espaços de Banach Lp . Se p = 2 a
desigualdade de Minkowski é igual a desigualdade triangular, já provada no caso de espaços de
Hilbert.
Em virtude das duas desigualdades discutidas acima, podemos provar a completeza dos
espaços Lp (Rn ); isto é, se (Ψn )n∈N é uma sequência de Cauchy em Lp (Rn ), então a sequência
tem um limite em Lp (Rn ) (veja o Exercício 2.13 ). Além disso, todo espaço Lp (Rn ) é localmente
convexo (verifique!).
Vamos iniciar nosso tratamento sobre a transformada de Fourier com a seguinte análise:
para x = (x1 , . . . , xn ) ∈ Rn e k = (k1 , . . . , pn ) ∈ Rn , denote por kx = k1 x1 + · · · + kn xn o
produto interno euclidiano; então, dada uma função f (x) : Rn → C, associe à função f (x) a
função f^(k), para todo k ∈ Rn , através da seguinte expressão:
$
8 9 def. ^
F (f ) (k) = f (k) = dx f (x)eikx . (6.6.1)
Rn
Naturalmente, na expressão acima a n-upla de números k ∈ Rn está fixa, mas ao mesmo tempo
é arbitrária. Isto nos leva ao seguinte questionamento: para quais tipos de funções f a integral
(6.6.1) está bem-definida? Resposta: para funções que são absolutamente integráveis, isto é, para
funções f ∈ L1 (Rn ).28 Com efeito, se f é absolutamente integrável, então, para toda n-upla
de números k ∈ Rn fixa, a integral imprópria
$ $ m1 $ mn
ikx
dx f (x)e = lim dx1 · · · dxn f (x1 , . . . , xn )ei(k1 x1 +···+kn xn ) ,
Rn mj ,pj →∞ p1 pn
existe, visto que para x ∈ Rn tem-se |eikx | = 1 e, portanto, todas as funções x 3→ eikx f (x),
com f ∈ L1 (Rn ), são absolutamente integráveis. Efetivamente, a hipótese de que f ∈ L1 (Rn )
garante que a integral (6.6.1) converge para cada n-upla de números k ∈ Rn e esta conver-
gência acontece porque para cada n-upla de números k ∈ Rn fixa, porém arbitrária, podemos
estabelecer uma condição de Cauchy sobre os números
$ m1 $ mn
+
sm (k) = dx1 · · · dxn f (x1 , . . . , xn )ei(k1 x1 +···+kn xn )
0 0
28
Lembre-se que L1 (Rn ) denota o espaço (de classes de equivalência) de funções mensuráveis que são absolu-
tamente integráveis.
429
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
e $ $
0 0
s−
m (k) = dx1 · · · dxn f (x1 , . . . , xn )ei(k1 x1 +···+kn xn )
−m1 −mn
=0.
Exemplo 6.15. Seja L1 (R) ∋ f (x) = χ[−1/2,1/2] (x), com χ[−1/2,1/2] (x) sendo a função carac-
terística associada ao intervalo [−1/2, 1/2]. Não difícil ver que f^(k) = sin(k/2)/(k/2). Este
exemplo mostra que o espaço L1 (Rn ) não é invariante sob uma transformação de Fourier.
Além disso, f tem suporte compacto, enquanto que suppf^ = R. Isto ilustra o fato que quanto
mais “concentrada” uma função é, mais “espalhada” sua transformada de Fourier será. Esta pro-
priedade chamada princípio de incerteza de Heisenberg tem consequências profundas na teoria
quântica.
Note que por causa da Eq.(6.6.1), f^(k) é limitada para toda n-upla de números k ∈ Rn .
Além disso, f^ é uniformemente contínua, como mostra a seguinte
Demonstração. Escreva
5$ 5 $
5 5 5 5 5 5
5f^(k + h) − f^(k)5 = 5 dx (e i(k+h)x
−e ikx
)f (x)55 # dx 5(ei(k+h)x − eikx )5 |f (x)|
5
Rn Rn
$ 5 i(k+h)x 5
5 (e − eikx ) 55
= |h| 5
dx 5
h 5 |f (x)| .
R n
430
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
podemos, então, aplicar o Teorema da Convergência Dominada, usando |x||f (x)| como nossa
função dominante, para obter a estimativa
5 5
5f^(k + h) − f^(k)5 # |h||x||f (x)| → 0 quando |h| → 0 .
Demonstração. Primeiro suponha que f (x) = χ(a,b) (x), a função característica de um intervalo
aberto. Então,
$ $ b
ikx eikb − eika
dx f (x)e = dx eikx = → 0 quando |k| → ∞ .
a ik
Por aditividade de limites, o mesmo vale para uma função simples arbitrária. Ou seja, para
qualquer função f da forma
n
<
f= ci χ(ai ,bi ) , ci ∈ R , ai # bi ∈ R ,
i=1
nós temos, usando o Teorema de Fubini, que cada fator pode ser calculado explicitamente,
dando como resultado $
lim dx f (x)eikx = 0 .
|k|→∞ Rn
;
Como as funções do tipo f = ni=1 ci χ(ai ,bi ) são densas em L1 (Rn ) (verifique!), vai existir
sempre uma função arbitrária g ∈ L1 (Rn ) tal que
$
dx |g(x) − f (x)| < ε ,
Rn
431
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
para um ε > 0 arbitrário. Pelo nosso argumento anterior e pela definição de um limite de uma
função complexa, sabemos que existe N ∈ N tal que para todo |k| > N
5$ 5
5 5
5 dx f (x)eikx 5<ε.
5 5
Rn
Para todo |k| > N, o lado direito é limitado por 2ε pelos nossos argumentos anteriores. Visto
que ε é arbitrário, isto estabelece que
$
lim dx g(x)eikx = 0 .
|k|→∞ Rn
Esperamos que a transformada de Fourier inversa possa ser definida pela função
$
8 −1 9 def. 1
F (f ) (x) = f (x) = n
dk f^(k)e−ikx . (6.6.2)
(2π) Rn
em que (2π)−n é um fator de normalização na transformada de Fourier inversa (veja a Nota 6.17
abaixo). No entanto, a Eq.(6.6.2) requer algumas hipóteses adicionais, uma vez que a hipótese
que f ∈ L1 (Rn ) não implica, necessariamente, que f^ ∈ L1 (Rn ). Vimos no Exemplo 6.15 que
se
f (x) = χ[−1/2,1/2] (x) então f^(k) = sin(k/2)/(k/2) ,
432
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Aqui, trocamos a ordem de integração na integral dupla. Este cálculo formal não é válido,
estritamente falando, porque a integral
$
dk eik(x−y) , (6.6.3)
Rn
não converge para qualquer valor particular de x ou y. No entanto, este cálculo fornece um
ponto de partida para investigar (6.6.2). A ideia será introduzir um “fator de convergência” em
(6.6.3) para que a integral convirja para cada valor de x e y; isto é, escrevemos em vez de (6.6.3),
$
^
dk K(k)e ik(x−y)
, (6.6.4)
Rn
para alguma função K(x) escolhida de modo que sua transformada de Fourier, K(k), ^ force
a integral em (6.6.4) a convergir e assim a igualdade se mantém em (6.6.2) para K(x). Isto é,
queremos que
$ ,$ - $
f (y) = dx f (x) ^
dk K(k)e ik(x−y)
= dx f (x)K(x − y) . (6.6.5)
Rn Rn Rn
Também pelo Corolário 6.3, item (i), segue que Kα ∈ L1 (Rn ), para cada α ∈ N.
433
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
trocando a ordem de integração na integral dupla. Como já enfatizado, este cálculo formal não
é válido, estritamente falando, porque a integral
$
1
dk eik(y−x) ,
(2π)n Rn
não converge para qualquer valor particular de x ou y. No entanto, procedendo com cautela,
2
introduzimos um fator gaussiano e−α∥k∥ na integral, obtendo
$ $ $
1 ^ −α∥k∥2 −ikx 1 2
n
dk f (k)e e = n
dk dy f (y)eiky e−α∥k∥ e−ikx
(2π) Rn (2π) Rn Rn
$ , $ -
1 −α∥k∥2 ik(y−x)
= dy f (y) dk e e
Rn (2π)n Rn
$ (i )n
1 1 2
= dy f (y) e− 4α ∥y−x∥
Rn 4πα
$
= dy f (y)Kα (y − x) .
Rn
6Q 7n 1
1 2
Mas, como a sequência de funções Kα (y − x) = 4πα
e− 4α ∥y−x∥ é uma identidade
aproximada (veja a Nota 6.10), segue que
$ $
1
dk f^(k)e−α∥k∥ 2 −ikx
lim e = lim+ dy f (y)Kα(y − x) = f (x) .
α→0+ (2π)n Rn α→0 Rn
d 8 9
O limite do lado esquerdo é (2π) 1
n Rn
dk f^(k)e−ikx que é exatamente F −1 F (f ) (k). Já o
d
limite do lado direito é f (x) porque a integral Rn dy f (y)Kα (y − x) é a convolução com uma
identidade aproximada. Isto finaliza a prova do teorema.
Nota 6.15 (O uso informal da delta de Dirac). Neste ponto, pode ser interessante chamar
a atenção para um desenvolvimento formal para a transformada inversa de Fourier que é
comumente encontrado na literatura de engenharia e física teórica. Deixando a cautela de lado,
é comum encontrarmos as seguintes definições:
$ $
1 ik(x−y) ′ 1 ix(k−k ′ )
δ(x − y) = dk e e δ(k − k ) = dx e . (6.6.8)
(2π)n Rn (2π)n Rn
De acordo com essas definições, é costume afirma-se que
$ $ ,$ -
1 ^ −iky 1 ikx
dk f (k)e = dk dx f (x)e e−iky
(2π)n Rn (2π)n Rn Rn
$ ,$ -
1 ik(x−y)
= dx f (x) dk e
(2π)n Rn Rn
$
1
= dx f (x)(2π)n δ(x − y) = f (y) .
(2π)n Rn
É desnecessário dizer que essas manipulações simbólicas de modo algum constituem um ar-
gumento rigoroso. No entanto, uma prova nesse sentido ainda pode ser construída se essas
expressões simbólicas forem tratadas como distribuições!
434
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Nota 6.16 (Linearidade do operador F ). Uma vez que a integração é um operador linear,
assim o é a transformada de Fourier. Isto é, se f , g ∈ L1 (Rn ) e se α, β ∈ C, então,
F (αf + βg) = αF f + βF g .
Cada escolha tem alguma vantagem e alguma desvantagem, mas, independentemente da escolha
feita, seja coerente ao usá-la!
Até agora, assumimos que uma função f deve ser L1 em Rn para que sua transformada
de Fourier seja bem definida. Como vimos, isso garante que a integral em (6.6.1) converge
absolutamente para cada n-upla de números k ∈ Rn . No entanto, a transformada de Fourier
não pode ser definida em L2 (Rn ) através da integral (6.6.1) uma vez que essa integral não faz
sentido em geral se f ∈ L2 (Rn ). Especificamente, vimos no Exemplo 6.15 que se
A função f (x) = χ[−1/2,1/2] (x) é L1 em R, mas f^(k) = sin(k/2)/(k/2) não o é, e para que
a igualdade seja válida em ambas as partes das integrais (6.6.1) e (6.6.2), gostaríamos de poder
fazer a afirmação de que se
isto é, que
$
sin(x/2) ikx
dx e = χ[−1/2,1/2] (k) . (6.6.9)
R (x/2)
Ou seja, precisamos expandir a definição da transformada de Fourier para uma classe maior de
funções. A questão é: como interpretamos a integral em (6.6.9), uma vez que ela não converge
absolutamente? Em outras palavras, o Teorema 6.11 não cobre todos os casos que serão de
interesse para nós neste livro, já que a função f (x) = χ[−1/2,1/2] (x) é L1 em R, mas não é
contínua. Além disso, f^(k) = sin(k/2)/(k/2) é L2 em R! Portanto, o Teorema 6.11 não se
aplica. Neste caso, temos o seguinte
435
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Demonstração. A prova é análoga à prova do Teorema 6.11. Só precisamos garantir que os limites
a esquerda e a direita da expressão
$ $
1 ^ −α∥k∥2 −ikx
lim dk f (k)e e = lim+ dy f (y)Kα(y − x) = f (x) .
α→0+ (2π)n Rn α→0 Rn
estão bem definidos em L2 (Rn ). Mas isto é garantido pelo seguinte fato: por hipótese, f ∈
L2 (Rn ), f^ ∈ L2 (Rn ); além disso, e−α∥k∥ ∈ S (Rn ) e e− 4α ∥y−x∥ ∈ S (Rn ). Isto implica que,
2 1 2
com o Teorema 6.6, S (Rn ) é denso em L2 (Rn ). Logo, f^∗e−α∥k∥ → f^ e f ∗e− 4α ∥y−x∥ → f ,
2 1 2
quando α → 0+ , segundo a topologia do espaço L2 (Rn ). Com efeito, para a expressão à direita,
temos que
$
(f ∗ Kα )(x) − f (x) = dy f (y)Kα(y − x) − f (x)
Rn
(i )n $
1 1 2
= dy f (y)e− 4α ∥y−x∥ − f (x)
4πα Rn
(i )n $
1 . / 1 2
= dy f (y) − f (x) e− 4α ∥y−x∥ .
4πα Rn
1
Então, fazendo a mudança de variável √
2 α
(y − x) = z, segue que
(i )n $
1 . √ / 2
(f ∗ Kα )(x) − f (x) = dz f (x + 2 αz) − f (x) e−∥z∥ .
π Rn
n(i )n $ o
√ 1 −∥z∥2
# ∥(f (x + 2 αz) − f (x)∥2 dz e .
π Rn
B CD E
=1
436
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Os termos de fronteira são evidentemente nulos. Como h(x) = xα f (x) ∈ S (Rn ), uma vez
que f (x) ∈ S (Rn ), o mesmo deve acontecer com sua derivada de ordem β + 1, e a integral
do lado direito convergirá. Disso, segue-se imediatamente que
5 β α 5
5k D f^(k)5 # C(α, β) .
k
Logo,
5 5
lim 5k β D α f^(k)5 = 0 ,
k→±∞
Para provar a continuidade, partimos de (6.6.10), integrando por partes, β vezes, para obter:
$
. /
k D f^(k) = i|α|+|β|
β α
dx eikx Dxβ xα f (x) . (6.6.11)
437
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Assim,
$
5 5 5 . /5
∥f^∥α,β = sup 5k β D α f^(k)5 # dx 5Dxβ xα f (x) 5
k∈Rn
$
(1 + |x|)γ 55 β . α /5
= dx γ
Dx x f (x) 5
(1 + |x|)
$
(1 + |x|)γ 55 β . α /5
# dx γ
Dx x f (x) 5
(1 + ∥x∥)
# Cγ ∥h∥η,β , (6.6.12)
Exemplo 6.16. Para x ∈ Rn , a função gaussiana f (x) = exp(− 21 ∥x∥2 ) é um ponto fixo da
transformada de Fourier; isto é, a função gaussiana é uma auto-função do operador F com
auto-valor igual a (2π)n/2 . Com efeito, basta tomar α = 1/2 na segunda parte do Corolário 6.3
para obter
, -
1
f^(k) = (2π) exp − ∥k∥
n/2 2
,
2
para k ∈ Rn . Aqui cabe a seguinte observação: de acordo com a Nota 6.17, se, por exemplo,
estivéssemos adotando a convenção da transformada de Fourier
$ $
^ 1 1
f (k) = dx f (x)eikx
e f (x) = dk f^(k)e−ikx ,
(2π)n/2 (2π)n/2
então, a função gaussiana f (x) = exp(− 12 ∥x∥2 ) seria uma auto-função do operador F com
auto-valor igual a um. Existem ainda outros auto-valores dependendo da convenção adotada!
438
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Demonstração. A demonstração é imediata, uma vez que ambos os lados da expressão acima
são iguais a uma integral dupla
$ ∞ $ ∞
dx dk eikx f (k)g(x) ,
−∞ −∞
então trocando-se a ordem de integração (uma vez que o integrando é bem comportado),
chega-se ao resultado afirmado acima.
TEOREMA 6.14 (Teorema de Parseval-Plancherel). A transformada de Fourier F : S (Rn ) →
S (Rn ) estende-se de forma única a um isomorfismo isométrico
e ∥f ∥2 = ∥f^∥2 .
$ ,$ -
1 −ikx
= dk dx f (x)e ^
g (k)
(2π)n Rn Rn
$ ,$ -
1
= dk dx f (x)eikx g^(k)
(2π)n Rn Rn
$
1
= dk f^(k)^
g (k) .
(2π)n Rn
O Lema 6.10 nos permite definir diretamente a transformada de Fourier dos elementos de
S (Rn ). Se consideramos ϕ(x) como um elemento de S ′ (Rn ),29 então, é natural definir a
′
439
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
S S
Demonstração. Se ϕn −→ ϕ; então pelo Teorema 6.13, ϕ ^ Assim, T (ϕ
^n −→ ϕ. ^n ) −→ T (ϕ)
^
′ n ^ ^ ^
para cada T ∈ S (R ). Portanto, T (ϕn ) −→ T (ϕ), isso que mostra que T é um funcional
linear contínuo sobre S (Rn ). Além disso, se Tn −→ T fracamente; então T^n −→ T^
fracamente, pois T (ϕ ^ implica que T^n (ϕ) −→ T^(ϕ), que mostra que T 3→ T^ é
^n ) −→ T (ϕ)
fracamente contínuo.
Como já enfatizado no Capítulo 3, Seção 3.9, uma função Ψ ∈ S (R3 ), com ∥Ψ∥2 = 1,
pode descrever a distribuição de probabilidade da posição
d de uma partícula, de modo que
a probabilidade de a partícula estar em Ω ⊆ R é Ω dx |Ψ(x)|2 . Neste caso, Ψ
3 ^ dá uma
distribuição de probabilidade do momentum da partícula. Aqui o princípio de incerteza de
Heisenberg afirma que se a distribuição da posição Ψ estiver fortemente localizada em uma
^ é forçado a se “espalhar” por um grande intervalo.
posição, então a distribuição de momentum Ψ
Note que se pensarmos em Ψ ∈ L2 (R3 ), com ∥Ψ∥2 = 1, como nos ddando uma probabili-
dade de distribuição para a posição de uma partícula, então, ∥XΨ∥2 = R3 dx |x|2 |Ψ(x)|2 dá
a expectativa da distância ao quadrado em relação à origem, em que X é o operador posição.
Se essa expectativa for pequena, então, Ψ certamente está bem localizada em torno da origem.
Similarmente, ∥P Ψ∥2 mede o quanto Ψ ^ está localizada em torno do momentum zero, em que
P é o operador momentum como definido pela Eq.(4.7.5).
#
∥XΨ∥2 ∥P Ψ∥2 " ∥Ψ∥22 .
2
440
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Logo, temos
$ $
∥Ψ∥22 = 2
dx |Ψ(x)| = dx Ψ(x)Ψ(x)
R3 R3
5∞ $
5 6 ′ 7
5
= xΨ(x)Ψ(x)5 − dx x Ψ (x)Ψ(x) + Ψ(x)Ψ′ (x)
5 R3
B CD −∞E
= 0 pois Ψ ∈ S (R3 )
$ 6 ′ 7
= −2 dx xRe Ψ (x)Ψ(x) .
R3
# 2∥XΨ∥2 ∥Ψ′ ∥2
2
= ∥XΨ∥2∥P Ψ∥2 ,
#
provando o teorema.
Um espaço de Sobolev é um espaço vetorial de funções, equipado com uma norma que é uma
combinação de normas-Lp da própria função, bem como de suas derivadas até uma determinada
ordem. As derivadas são entendidas no sentido das distribuições, o que é adequado para tornar
o espaço completo, portanto, um espaço de Banach. A importância desses espaços vem do fato
de que as soluções de equações diferenciais parciais são, naturalmente, encontradas em espaços
de Sobolev, em vez de em espaços de funções contínuas e com as derivadas entendidas no
sentido clássico.
Apesar do espaço L2 (Rn ) não ser fechado em relação à diferenciação (convidamos o leitor
a dar um exemplo), nesta seção estaremos interessados nos espaços de Sobolev com p = 2,
isto é, consideraremos espaços lineares consistindo de funcionais-L2 com a propriedade de
que suas derivadas até uma determinada ordem também são funcionais-L2 . Estes espaços são
especialmente importantes para teoria quântica devido à sua relação com a transformada de
Fourier e porque eles formam um espaço de Hilbert.
441
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
DEFINIÇÃO 6.17. Seja s um número real arbitrário. Define-se o espaço de Sobolev Hs (Rn )
de ordem s como sendo o espaço de todas as distribuições u ∈ S ′ (Rn ) cuja transformada de
^ é uma função de quadrado integrável com respeito à medida (2π)−n (1 + |k|2 )s/2 dk,
Fourier u
isto é,
3 4
s n ′ n 2 s/2 n
H (R ) = u ∈ S (R ) | (1 + |k| ) u ^ ∈ L2 (R ) . (6.7.1)
Obviamente, da Eq.(6.7.1) fica claro que o espaço Hs (Rn ) decresce à medida que s cresce.
′
Com efeito, se s′ " s, então, (1 + |k|2 )s/2 # (1 + |k|2 )s /2 e se u ∈ Hs (Rn ), segue que
, $ -1/2
1 2 s 2
∥u∥Hs (Rn ) = dk (1 + |k| ) |^ u(k)|
(2π)n Rn
, $ -1/2
1 2 s′ 2
# dk (1 + |k| ) |^
u(k)| = ∥u∥ <∞ .
(2π)n Rn
′
Hs (Rn )
Assim, se a sequência un → 0 segundo a norma ∥ · ∥Hs (Rn ) e visto que ∥ · ∥Hs (Rn ) # ∥ · ∥Hs′ (Rn ) ,
′
quando s < s′ , isto implica que ∥un ∥Hs′ (Rn ) → 0. Isto prova que Hs (Rn ) ⊆ Hs (Rn ), se
s′ " s. Em particular, os elementos de Hs (Rn ), com s " 0, são funções de quadrado integrável
uma vez que Hs (Rn ) ⊆ H0 (Rn ) = L2 (Rn ). Mas cuidado! Se s < 0, não é sempre verdade
que os elementos de Hs (Rn ) são funções de quadrado integrável (veja o Exercício 6.21).
Nota 6.18. Poderíamos ter definido Hs (Rn ) da seguinte forma:
3 4
Hs (Rn ) = u ∈ S ′ (Rn ) | (1 + ∥k∥2 )s/2 u
^ ∈ L2 (Rn ) , (6.7.2)
442
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
As normas ∥u∥Hs (Rn ) e ∥|u|∥Hs (Rn ) são equivalentes. Com efeito, como ∥k∥2 # |k|2 , então
(1 + ∥k∥2 ) # (1 + |k|2 ); logo
$ $
2 s 2
dk (1 + ∥k∥ ) |^ u(k)| # dk (1 + |k|2 )s |^
u(k)|2 ,
Rn Rn
Assim, existe uma constante C1 tal que ∥|u|∥Hs (Rn ) # C1 ∥u∥Hs (Rn ) . Por outro lado, pelo
Teorema Binomial,
s
< s
<
2 s 2α
(1 + |k| ) = Cα |k| # Cα (1 + ∥k∥2 )α .
α=0 α=0
Consequentemente, existe uma constante C2 tal que ∥u∥Hs (Rn ) # C2 ∥|u|∥Hs (Rn ) . Portanto,
ambas definições de Hs (Rn ) são equivalentes. Assim, ao longo do texto usamos indistintamente
as definições acima.
Nós também podemos descrever o espaço Hs (Rn ) sem fazer qualquer referência à u^. De
2 s 2 2 s 2 s 2
fato, se ;
expandirmos (1 + ∥k∥ ) = (1 + k1 + · · · + kn ) , ou (1 + |k| ) = (1 + k1 + · · · +
kn + 2 i̸=j ki kj )s , então
2
, $ -1/2
1 2 s 2
∥|u|∥Hs (Rn ) = dk (1 + ∥k∥ ) |^
u(k)|
(2π)n Rn
, $ -1/2
1 2 2 s 2
= dk (1 + k1 + · · · + kn ) |^
u(k)| (6.7.3)
(2π)n Rn
< ? ?
= cα ?D α u?L2 (Rn ) < ∞ ,
|α|#s
ou
, $ -1/2
1 2 s 2
∥u∥Hs (Rn ) = dk (1 + |k| ) |^
u(k)|
(2π)n Rn
( $ )1/2
1 6 < 7s
= dk 1 + k12 + · · · + kn2 + 2 ki kj |^u(k)|2 (6.7.4)
(2π)n Rn i̸=j
< ? ?
= dα ?D α u?L2 (Rn ) < ∞ ,
|α|#s
443
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
TEOREMA 6.17. Seja s ∈ N. Então, u ∈ Hs (Rn ) se, e somente se, D α u ∈ L2 (Rn ) para todo
multi-índice α tal que |α| # s, com as derivadas sendo calculadas no sentido das distribuições.
Demonstração. Basta mostrar que as normas ∥ · ∥Hs (Rn ) e ∥| · |∥Hs (Rn ) são equivalentes à norma
||| · |||Hs (Rn ) . Da relação (6.7.3), segue que para u ∈ Hs (Rn ) existe um c > 0 tal que
∥u∥Hs (Rn ) # c|||u|||Hs (Rn ) . Por outro lado, pela Definição 6.16 segue que, se u ∈ S ′ (Rn ),
então
D α u(ϕ)
^ = (−i)|α| k α u
^(ϕ) ∀ ϕ ∈ S (Rn ) .
Considerando que,
|k α | = |k1α1 · · · km
α1
| # (1 + |k|2 )α1 /2 · · · (1 + |k|2 )αm /2 # (1 + |k|2 )|α|/2 ,
então, se u ∈ Hs (Rn ) e |α| # s, segue que
$ $
α 2
dk |k u^(k)| # dk | # (1 + |k|2 )|α| |^
u(k)|2
Rn Rn
$
# dk | # (1 + |k|2 )s |^
u(k)|2 < ∞ ,
Rn
e existe uma constante C > 0 tal que |||u|||Hs (Rn ) # C∥u∥Hs (Rn ) . Logo, as normas ∥ · ∥Hs (Rn )
e ||| · |||Hs (Rn ) são equivalentes. A equivalência entres as normas ∥| ·
|Hs (Rn ) e ||| · |||Hs (Rn ) é provada de forma análoga.
Exemplo 6.17. Seja ∇2 o laplaciano em Rn . Pela Operação 6.3 segue que, se u ∈ S ′ (Rn ),
então
−∇2 u(ϕ) = −u(∇2 ϕ) ∀ ϕ ∈ S (Rn ) .
Além disso, pela Definição 6.16 segue que, se u ∈ S ′ (Rn ), então
−∇2 u(ϕ)
^ = ∥k∥2 u
^(ϕ) ∀ ϕ ∈ S (Rn ) .
Na teoria quântica, define-se o operador −#/2m∇2 como sendo o hamiltoniano da partícula
quântica livre, denotando-o por H0 . Assim, de acordo com o Teorema 6.17, podemos definir
3 4
Dom(H0 ) = H2 (Rn ) = Ψ ∈ L2 (Rn ) | ∇2 Ψ ∈ L2 (Rn ) ,
ou 3 4
^ ∈ L2 (Rn ) .
Dom(H0 ) = H2 (Rn ) = Ψ ∈ L2 (Rn ) | ∥k∥2 Ψ
Em outras palavras, se Ψ e ∇2 Ψ são elementos de L2 (Rn ), então as outras derivadas com
|α| # 2 têm esta mesma propriedade.
444
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
TEOREMA 6.18. Hs (Rn ) forma um espaço de Hilbert com respeito ao produto interno (6.7.5).
Demonstração. Considere uma sequência (uj )j∈N em Hs (Rn ) de forma que |||uj −uk |||Hs (Rn ) →
0, quando j, k → ∞. Isto implica que as sequências (D α uj )j∈N , com |α| # s, convergem em
L2 (Rn ), quando j, k → ∞. Pela completeza de L2 (Rn ), existe um funcional u(α) ∈ L2 (Rn )
tal que ∥D α uj − u(α)∥L2 (Rn ) → 0, quando j → ∞. Tome u = u(0). Queremos mostrar que
u(α) = D α u. Pela Operação 6.3 segue que, se u ∈ S ′ (Rn ), então
Assim,
# ∥u(α) − D α uj ∥L2 (Rn ) ∥ϕ∥L2 (Rn ) + ∥uj − u∥L2 (Rn ) ∥D α ϕ∥L2 (Rn ) → 0 ,
quando j → ∞. Portanto, u(α)(ϕ) = D α u(ϕ) para todo ϕ ∈ S (Rn ). Isto implica que
u(α) = D α u ∈ L2 (Rn ) se |α| # s. Isto mostra que u ∈ Hs (Rn ). Além disso, temos que
∥u(α)−D α uj ∥L2 (Rn ) = ∥D α u−D α uj ∥L2 (Rn ) → 0 e, portanto, |||uj −u|||Hs (Rn ) → 0, quando
j → ∞. Isto mostra que Hs (Rn ) é completo com respeito à norma ||| · |||Hs (Rn ) .
terá solução não-trivial. Neste caso, o número real λ ∈ σdisc (A) foi chamado um auto-valor de
A e Ψ um auto-vetor de A associado ao auto-valor λ. Infelizmente, a relação simples (6.8.1) não
existe para todo operador auto-adjunto. De fato, as equações correspondentes a (6.8.1) para os
operadores auto-adjuntos X (posição) e P (momentum), definidos em L2 (R), nos mostraram
que os operadores X e P (veja os Exemplos 5.5 e 5.6) não têm auto-valores e, portanto, não têm
auto-vetores associados. Como já enfatizado, isto ilustra o fato que os auto-vetores associados
com o espectro contínuo de um operador auto-adjunto não pertencem ao espaço de Hilbert.
Este inconveniente pode ser remediado tratando os espaços de funções de quadrado integrável
do ponto de vista da teoria das distribuições. Como mostrado no Seção 6.5, a teoria das
distribuições lida, de fato, com a seguinte cadeia de espaços:
445
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
O papel do espaço L2 (Rn ) é reduzido ao fato de que o produto interno ⟨Ψ, Φ⟩ pode ser
estendido por continuidade à forma bilinear que determina a ação de uma distribuição Ψ ∈
S ′ (Rn ) sobre uma função teste ϕ ∈ S (Rn ), esta forma bilinear sendo denotada por ⟨Ψ, ϕ⟩ =
TΨ (ϕ) em L2 (Rn ). Note que, S ′ (Rn ) é o fecho de L2 (Rn ) em uma certa topologia. Dizemos
que o espaço L2 (Rn ) na cadeia acima é “manipulado” pelos espaços lineares topológicos
S (Rn ) e S ′ (Rn ). Na mecânica quântica, o método de investigação de distribuições baseado
na construção da cadeia acima é bastante eficiente. Isto nos leva ao conceito de tripleto
de Gel’fand (também chamado de espaço de Hilbert rigged),30 uma construção idealizada por
Gel’fand que conecta a teoria das distribuições ao espaço L2 (Rn ). Isto nos permite estudar a
teoria espectral em um sentido mais amplo. Em outras palavras, o tripleto de Gel’fand é uma
estrutura que equipa um espaço de Hilbert com um subespaço vetorial topológico denso de
“boas funções teste,” permitindo que o dual do subespaço de funções teste amplie o espaço
de Hilbert, incorporando-o em um espaço vetorial topológico maior cujos elementos podem
ser considerados auto-vetores generalizados para o caso do espectro contínuo de operadores
lineares (possivelmente não-limitados).
Ω ⊂ H ⊂ Ω′ .
Uma vez que S (Rn ) é um subespaço denso de L2 (Rn ), seu dual S ′ (Rn ) contém o dual
de L2 (Rn ), que é o próprio L2 (Rn ), devido ao Teorema de representação de Riesz-Fréchet
(Teorema 4.9). Como já vimos, toda função Ψ ∈ L2 (Rn ) define uma distribuição TΨ ∈ S ′ (Rn )
da seguinte forma:
TΨ : S (Rn ) −→ C ,
$
ϕ 3−→ TΨ (ϕ) = ⟨Ψ, ϕ⟩ = dx Ψ(x)ϕ(x) ∀ ϕ ∈ S (Rn ) . (6.8.2)
30
Lembre-se que, na mecânica quântica, quantidades observáveis são representadas por operadores lineares
auto-adjuntos atuando em H . Os auto-valores de um operador representam os valores possíveis da medida
do correspondente observável. Estes auto-valores, que matematicamente correspondem ao espectro do operador,
podem ser discretos (como as energias de uma partícula numa caixa), contínuo (como as energias de, uma partícula
livre), ou uma combinação de discreta e contínua (conforme as energias do átomo de hidrogênio). Quando o
espectro de um observável A é discreto e A é limitado, então A é definido em todo H e os auto-vetores de A
pertencem a H . Neste caso, A pode ser essencialmente considerado como uma matriz. Isto significa que não há
necessidade de se ampliar H . No entanto, observáveis quânticos são, em geral, ilimitados e o seus espectros têm,
em geral, uma parte contínua. A fim de lidar com um espectro contínuo, muitos livros-texto seguem o formalismo
bra-kets de Dirac, que é uma generalização heurística da álgebra linear de matrizes hermitianas utilizadas para
o espectro discreto. Acontece que os métodos matemáticos dos espaços de Hilbert não são suficientes para dar
sentido ao formalismo de Dirac, razão pela qual devemos estender o espaço de Hilbert para o espaço de Hilbert
rigged.
446
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Note que sobre o lado esquerdo Ψ é um funcional linear sobre o espaço S (Rn ), enquanto
que sobre o lado direito Ψ aparece como uma função mensurável (nenhuma confusão deve
surgir disso). Ainda, é importante enfatizar que S ′ (Rn ) também contém distribuições, como
a distribuição delta de Dirac e a função eip·x , que não podem ser representadas por meio de
uma função Ψ ∈ L2 (Rn ) de acordo com (6.8.2).
Exemplo 6.18 (Exemplo 5.5 revisitado). Sejam Tδx = δ(x − λ) a distribuição delta de Dirac,
com suporte em λ, e X o operador posição sobre L2 (R). Então, para qualquer Ψ ∈ S (R) ⊂
Dom(X), segue que
$ 6 7
8 9
XTδx (Ψ) = dx Xδ(x − λ) Ψ(x)
$
= dx x δ(x − λ)Ψ(x)
$
= dx δ(x − λ) x Ψ(x) = Tδx (XΨ) .
Logo, de acordo com a definição acima, a equação de auto-valor XΨ(x) = λΨ(x) admite uma
solução distribucional Ψ para todo λ ∈ R, com a “função” delta de Dirac desempenhando o
papel de um auto-vetor generalizado do operador posição X.
Exemplo 6.19 (Exemplo 5.6 revisitado). Seja P o operador momentum sobre L2 (R). Então,
d
−i# Ψ(x) = λΨ(x) .
dx
−1
Como já mencionado, a família de funções Ψλ (x) = eiλ# x , indexada pelo parâmetro λ ∈ R,
é solução da equação de auto-valor acima, mas não pertence ao espaço S (R), nem mesmo ao
espaço L2 (R). No entanto, ela define uma distribuição TΨλ de acordo com
TΨλ : S (R) −→ C ,
$
ϕ 3−→ TΨλ (ϕ) = dx Ψλ (x)ϕ(x) . (6.8.3)
447
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Assim,
$ , -
8 9 d
P TΨλ (ϕ) = dx −i# Ψλ (x)ϕ(x)
dx
$
=λ dx Ψλ (x)ϕ(x)
= λTΨλ (ϕ) .
Note que, por uma integração por partes,
$ , - $ , -
d d
dx −i# Ψλ (x)ϕ(x) = dx Ψλ (x) −i# ϕ(x) = TΨλ (P ϕ) .
dx dx
Portanto, segue que
8 9
P TΨλ (ϕ) = TΨλ (P ϕ) = λTΨλ (ϕ) , ∀λ ∈ R .
−1
Logo, as funções Ψλ = eiλ# x , com λ ∈ R, são auto-vetores generalizados do operador
momentum P considerado no espaço S (R).
Como uma última observação, é importante enfatizar que, de acordo com a transformada de
Fourier de S (Rn ) e S ′ (Rn ), o tripleto de Gel’fand é preservado pela transformada de Fourier.
6.9 Convolução
Vamos considerar rapidamente o conceito de convolução e algumas de suas aplicações.
DEFINIÇÃO 6.20. Considere f (x), g(x) ∈ S (Rn ). A operação convolução é definida como um
produto de f (x) e g(x), representada pela função integral
$
(f ∗ g)(x) = dy f (x − y)g(y) , (6.9.1)
2. Equipado com a operação de convolução ∗ como produto, o espaço S (Rn ) é uma álgebra
de Banach comutativa.
448
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Se escolhermos α + γ > n, a integral à direita é finita (veja o Lema 6.5). Portanto, neste caso
a convolução (D β f ) ∗ g está bem definida. Por outro lado, é fácil mostrar que D β (f ∗ g) =
(D β f ) ∗ g (veja Exercício 6.16); logo, podemos deduzir que f ∗ g ∈ C ∞ (Rn ). Resta provar que
xα D β (f ∗ g)(x) é limitada. Para isto, vamos usar o seguinte:
α
<
α
. /α
x = (x − y) + y = Cγ (x − y)γ y α ,
γ=0
.α/
em que Cγ = γ
. Assim,
$
5 α β 5 5 . / 5
sup 5x D (f ∗ g)(x)5 = sup dy 5xα D β f (x − y) g(y)5
x∈Rn ;|β|#m x∈Rn ;|β|#m
α
< $
C(γ + µ, β) C ′ (α + τ , 0)
# Cγ dy
γ=0
|x − y|µ |y|τ
α
< $
′ 1
# Cγ C(γ + µ, β)C (α + τ , 0) dy .
γ=0
∥x − y∥µ∥y∥τ
Novamente, se escolhermos µ+τ > n, a integral à direita será finita. Logo (f ∗g)(x) ∈ S (Rn ).
A estimativa acima também mostra que a convolução é contínua sobre S (Rn ).
A ágebra acima não tem uma identidade, pois não existe g ∈ S (Rn ) tal que f ∗ g = f
para toda f ∈ S (Rn ), mas tem identidades aproximadas. Mais precisamente, suponha que f
S
e Kα pertencem a S (Rn ) para todo α ∈ N; então, f ∗ Kα −→ f . De acordo com o Corolário
6.2, uma identidade aproximada Kα ∈ S (Rn ) é representada pela sequência de funções
,i -n
α 2
Kα (x) = e−α∥x∥ , com α ∈ N , x ∈ Rn .
π
(a) (f&
∗ g)(k) = f^(k)^
g (k),
449
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Prova de (a).
$
(f&
∗ g)(k) = dx eikx (f ∗ g)(x)
$ $
ikx
= dx e dy f (x − y)g(y)
$ $
ik(x−y)
= dx e f (x − y) dy eiky g(y)
,$ -
ik(x−y)
= d(x − y) e f (x − y) ^
g (k)
= f^(k)^
g (k) .
Prova de (b).
$
(f^ ∗ ^
g )(k) = dp f^(k − p)^
g (p)
$
= dp dx dny ei(k−p)x f (x)eipy g(y)
$ ,$ -
n ikx ip(y−x)
= dx d y e f (x)g(y) dp e
B CD E
(2π)n δ(y − x) (veja a Nota 6.15)
$
n
= (2π) dx eikx f (x)g(x)
= (2π)n (fpg)(k) .
Sob algumas circunstâncias, é possível definir a convolução de uma função com uma dis-
tribuição, ou de duas distribuições. Neste caso, algumas condições de integrabilidade devem
ser satisfeitas. Muitas vezes estas condições de integrabilidade são realizadas pela propriedade
de suporte das funções. Se f é uma função (ou distribuição) de suporte compacto e g é uma
distribuição, então, f ∗ g é uma função suave definida distribucionalmente por uma fórmula
análoga à Eq.(6.9.1), isto é,
$
8 9
(f ∗ g) (ϕ) = dx (f ∗ g)ϕ(x)
$ $
= dx dy f (x − y)g(y)ϕ(x) (6.9.2)
$ $
= dx dy f (x)g(y)ϕ(x + y) .
450
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Note que o resultado acima é equivalente a aplicar o funcional f (x)g(y), que pode ser consi-
derado como o produto direto de f (x) e g(y), à função ϕ(x + y).
supp ϕ(x)
a b x
Figura 6.5: Se o supp ϕ(x) é o intervalo [a, b], o suporte de ϕ(x + y) é a faixa sombriada
a # x + y # b que é ilimitada.
Assim, em geral, o lado direito da Eq.(6.9.2) não está definido. No entanto, existe uma maneira
natural para assegurar a validade do lado direito. Suponha que supp (T ⊗ S) ∩ supp ϕ(x + y)
é compacto em Rn × Rn para todo ϕ(x) ∈ D(Rn ). Então, seria de se esperar que a definição
funcione.
DEFINIÇÃO 6.21 (Condição de Suporte). Duas distribuições T , S ∈ D ′ (Rn ) são ditas satisfazer
a condição de suporte se, e somente se, para cada conjunto compacto K ⊂ Rn o conjunto
3 4
KT ,S = (x, y) ∈ Rn × Rn | x ∈ supp T , y ∈ supp S, x + y ∈ K ,
é compacto em Rn × Rn .
451
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Nota 6.19. A restrição 0 < α < n é necessária para garantir que ∥x − y∥−n+α e ∥k∥−α sejam
localmente integráveis para que a identidade acima faça sentido.
Demonstração do Teorema 6.20. Nosso ponto de partida é a fórmula elementar (veja I.S. Gradsh-
teyn e I.M. Ryzhik, “Table of Integrals, Series, and Products,” Seventh Edition, Elsevier (Academic
Press), 2007, fórmula 3.381, 4., pg.346)
$ ∞
1
dx xα−1 e−µx = α Γ(α) , [Re µ > 0, Re α > 0] . (6.10.2)
0 µ
Usando a fórmula acima, escrevemos
$ ∞
−α 1 2
∥k∥ = dλ λα/2−1 e−λ∥k∥ .
Γ(α/2) 0
Na segunda igualdade da expressão acima usamos o Teorema de Fubini, uma vez que ∥k∥−α ϕ(k)
^
é integrável.
1 Γ((n − α)/2)
cα = ,
π n/2 2α Γ(α/2)
452
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Iα ϕ = (−∇2 )−α/2 ϕ ,
com ∇2 sendo o operador laplaciano. Aqui, (−∇2 )−α/2 é definido usando-se a análise de
Fourier. Isto é, para toda função ϕ ∈ S (Rn ) sabemos que (−∇ ' 2 )β/2 ϕ = ∥k∥β ϕ.
^ Então,
de especial significado são as potências negativas β no intervalo, −n < β < 0. Para estas
potências existe uma realização formal do operador (−∇2 )−α/2 como um operador integral
dado pela integral (6.10.3). Ou seja, com uma ligeira mudança de notação, a identidade Iα ϕ =
(−∇2 )−α/2 ϕ equivale ao fato de que a transformada de Fourier de ∥x − y∥α−n é precisamente
c−1
α ∥k∥
−α
no sentido provado no Teorema 6.20. Resulta imediatamente que qualquer função
n
ψ ∈ S (R ) pode ser escrita como um potencial de Riesz (no sentido distribucional), isto é,
Como última observação, cabe destacar que uma extensão natural de Iα : S ′ (Rn ) →
S ′ (Rn ) é definida por dualidade da seguinte forma: para u ∈ S ′ (Rn ), segue que
453
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
para todo ϕ ∈ S (Rn ). Aqui podemos assumir qualquer expoente α ∈ R (ou mesmo α ∈ C),
uma vez que a função G ^α (k) = (1 + ∥k∥2 )−α/2 pode ser identificada com uma distribuição
em S ′ (Rn ) para todo α. Além disso, se ϕ ∈ S (Rn ), então, claramente G ^α ϕ
^ ∈ S (Rn ).
Resulta imediatamente que qualquer função ψ ∈ S (Rn ) pode ser escrita como um potencial
de Bessel (no sentido distribucional), isto é,
PROPOSIÇÃO 6.9. Quando α > 0, o Kernel do potencial de Bessel, Gα , em Rn pode ser repre-
sentado pela fórmula integral
$ ∞
1 1 2
Gα (x) = n n/2 dλ λα/2−n/2−1 e− 4λ ∥x∥ e−λ . (6.11.1)
2 π Γ(α/2) 0
Demonstração. Partimos observando que pela fórmula elementar (6.10.2) temos que
$ ∞
^α (k) = (1 + ∥k∥ ) 2 −α/2 1 2)
G = dλ λα/2−1 e−λ(1+∥k∥ .
Γ(α/2) 0
Procedendo como na prova do Teorema 6.20, pela transformada de Fourier inversa, segue que
454
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
^ ∈ S (Rn )
para todo ϕ
= > $
−1 ^ 1 ^α (k)ϕ(k)e−ikx
^ (x) =
F (Gα (k)ϕ) dk G ^
(2π)n Rn
$ , $ ∞ -
1 1 α/2−1 −λ(1+∥k∥2 ) −ikx
= dk dλ λ e ^
ϕ(k)e
(2π)n Rn Γ(α/2) 0
$ ∞ , $ -
1 α/2−1 −λ 1 −λ∥k∥2 −ikx
= dλ λ e dk e ^
ϕ(k)e
Γ(α/2) 0 (2π)n Rn
$ ∞ ,$ -
1 α/2−n/2−1 −λ 1
− 4λ ∥x−y∥2
= n n/2 dλ λ e dy e ϕ(y)
2 π Γ(α/2) 0 Rn
$ ,$ ∞ -
1 1
α/2−n/2−1 −λ − 4λ ∥x−y∥2
= n n/2 dy dλ λ e e ϕ(y)
2 π Γ(α/2) Rn 0
$
= dy Gα (x − y)ϕ(y) .
Rn
Assim, a primeira afirmação está demonstrada. Para demonstrar a segunda afirmação, usamos
o fato que
$
1 2
dx e− 4λ ∥x∥ = (4λπ)n/2 = 2n π n/2 λn/2 (pelo Corolário 6.3) .
Rn
Nota 6.20. A ideia de substituir o potencial de Riesz pelo potencial de Bessel apareceu no artigo
de J. Deny, “Les Potentiels d’Energie Finie,” Acta Math. 82 (1950) 107, pg.129. Os potenciais de
Bessel foram introduzidos sistematicamente no artigo de N. Aronszajn e K. T. Smith, “Theory of
Bessel Potentials, I ” Ann. Inst. Fourier 11 (1961) 385. Aronszajn-Smith mostraram que a função
Gα , para α > 0, é essencialmente uma função de Bessel, isto é,
1 α−n
Gα (x) = K n−α (∥x∥) ∥x∥ 2 , (6.11.2)
2(n+α−2)/2 π n/2 Γ(α/2) 2
em que K n−α é a função de Bessel modificada do terceiro tipo (também conhecida como função
2
de Bessel-Macdonald) de ordem n−α2
. Com efeito, de acordo com a tabela de integrais de I.S.
455
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Gradshteyn e I.M. Ryzhik, “Table of Integrals, Series, and Products,” Seventh Edition, Elsevier
(Academic Press), 2007, fórmula 8.432, 6.11 , pg.917, a função K n−α (∥x∥) tem a seguinte
2
representação integral:
, - n−α $ ∞
1 ∥x∥ 2 1 2
K n−α (∥x∥) = dλ λα/2−n/2−1 e−λ e− 4λ ∥x∥ .
2 2 2 0
Existe uma outra representação para a função Gα , com α > 0, em termos de outra função
de Bessel. Essa outra representação usa a relação
π n−α+2 (1)
K n−α (∥x∥) = i 2 H n−α (i∥x∥) ,
2 2 2
(1) n−α
em que H n−α (i∥x∥) denota a função de Hankel de primeiro tipo de ordem 2
. Com isso a
2
Eq.(6.11.2) assume a seguinte forma:
n−α+2
i 2 (1) α−n
Gα (x) = (n+α)/2 (n−2)/2 H n−α (i∥x∥) ∥x∥ 2 . (6.11.3)
2 π Γ(α/2) 2
Assim, a maioria das fórmulas e propriedades de Gα são quase consequências imediatas das
(1)
correspondentes fórmulas e propriedades de K n−α , ou H n−α . Citamos abaixo algumas dessas
2 2
propriedades (que podem ser encontradas no artigo de Aronszajn-Smith):
(iv) Existe c > 0 tal que para todo x ∈ Rn e todo 0 < α < n
Gα (x) ≃ ∥x∥α−n e−c∥x∥ .
456
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
A forma mais extrema de decaimento no infinito é ter suporte compacto. Este é o conteúdo
de um teorema clássico, conhecido como Teorema de Paley-Wiener, que caracteriza funções
inteiras do tipo exponencial (de uma variável complexa), cuja restrição ao eixo dos reais é
exatamente a transformada de Fourier de uma função L2 com suporte compacto. A extensão da
transformada de Fourier para o domínio complexo é chamada transformada de Fourier-Laplace.
Abaixo, vamos apresentar dois teoremas análogos (em várias variáveis), um para funções de
classe C ∞ com suporte compacto, e outro para distribuições com suporte compacto.
TEOREMA 6.21 (Teorema Paley-Wiener para C0∞ ). Seja {x ∈ Rn | |x| # R} uma bola em
Rn . As seguintes propriedades são equivalentes:
(i) f (x) é uma função de classe C ∞ com suporte na bola {x ∈ Rn | |x| # R}.
Demonstração. (i) implica (ii). Suponha que f (x) ∈ C0∞ (Rn ) tem suporte em uma bola
{x | |x| # R}. Então, para todo ζ = (ζ1 , . . . , ζn ) ∈ Cn , a integral
$
^
f (ζ) = dx f (x)eiζx ,
|x|!R
é bem definida. Além disso, f^(ζ) é uma função analítica inteira das n variáveis complexas
ζ1 , . . . , ζn , uma vez que ∂ f^(ζ)/∂ ζ̄i = 0, em que ζ̄i = ki − iηi – veja o Apêndice C para
detalhes.
457
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
ou $
ζ f^(ζ) = i|α|
α
dx eiζx (Dxα f (x)) . (6.12.2)
|x|!R
Tomando o valor absoluto de ambos os lados da Eq.(6.12.2) e usando o fato que f^(ζ) é limitada
sobre o conjunto {ζ | |η| < ε}, temos
5$ 5
5 5
5 5
|ζ α||f^(ζ)| = 5 dx eiζx (Dxα f (x))5
5 |x|!R 5
$
R|η|
#e dx |Dxα f (x)| = Cα eR|η| .
|x|!R
Isto prova a estimativa (6.12.1) – lembre-se que |ζ α| e (1 + |ζ|)α são comparáveis (veja Nota 6.4).
Isto mostra que f^(ζ) ∈ C ∞ (D(r1 , . . . , rn )), visto que a diferenciação sob o sinal da integral
é legitima. Ela também mostra que as derivadas Dζα f^(ζ) satisfazem as condições de Cauchy-
Riemann, e são assim analíticas em D(r1 , . . . , rn ).32 Uma vez que Ω pode ser coberto por
tais polidiscos, conclui-se que, se f^(ζ) é analítica sobre Ω, então f^(ζ) ∈ C ∞ (Ω), e que suas
derivadas de todas as ordens são também analíticas sobre Ω. Isso nos mostra que toda derivada
de f^(ζ), Dζα f^(ζ), também satisfaz a estimativa (6.12.1), possivelmente com uma constante CN
diferente (na verdade, esta constante dependerá de α). Desse fato, se tomarmos ζ = k real,
isto é, η = 0, concluímos que toda função |Dkα f^(k)| decrescerá no infinito mais rápido do que
qualquer potência de 1/|k|. Em outras palavras, isto significa que f^(k) ∈ S (Rn ). Portanto,
f (x) ∈ S (Rn ) e pela fórmula de reciprocidade
$
1
f (x) = dk e−ikx f^(k) .
(2π)n Rn
Note que (por diferenciação)
$ n
]
1
β
D f (x) = dk e −ikx
(ikj )βj f^(k) ,
(2π)n Rn j=1
e fazendo-se uso da estimativa (6.12.1) quando restrita a Rn (e recorrendo ao Lema 6.5), vemos
que f ∈ C ∞ (Rn ).
31
Veja o Teorema 2.2.1, pg.26, em L. Hörmander, “An Introduction to Complex Analysis in Several Variables,” Van
Nostrand, 1966.
32
Veja no Apêndice B a definição de funções analíticas em um subconjunto aberto Ω de Cn .
458
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Usando o fato que f^(ζ) é uma função analítica inteira, podemos integrá-la, considerando f^(ζ)
como uma função de ζ1 somente, sobre o caminho fechado C do plano complexo, como mostra
a Figura 6.6.
Im ζ1
η1
Re ζ1
−M +M
459
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
A extensão do Teorema 6.21 para a linguagem de distribuições foi realizada por Laurent
Schwartz.
TEOREMA 6.22 (Teorema Paley-Wiener-Schwartz). Seja u ∈ S ′ (Rn ) com suporte na bola
{x ∈ Rn | |x| # R}. Então sua tranformada de Fourier é uma função que tem um prolonga-
mento para valores complexos ζ = (ζ1 , . . . , ζn ) de k = (k1 , . . . , kn ) de tal modo que u
^(ζ) é
uma função analítica inteira que satisfaz, para um N ∈ N e uma constante C, a estimativa
u(ζ)| # C(1 + |ζ|)N eR|Im ζ|
|^ ∀ ζ ∈ Cn , (6.12.4)
^ é polinomialmente limitada em Rn .
Em particular, u
460
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Demonstração. De acordo com a Definição 6.5, uma distribuição temperada u tem suporte em
um conjunto fechado K se, e somente se, u(ϕ) = 0 para toda função teste ϕ com suporte em
Rn \ K. Se K é compacto, então u tem suporte compacto. Vamos tomar K como sendo a bola
fechada {x ∈ Rn | |x| # R}.
Isto mostra que a transformada de Fourier definida pela dualidade é a função suave dada por
u(eikx ). Como u e eikx são funções suaves, então a expressão acima faz sentido para qualquer
ζ ∈ Cn . Aplicamos a ela os operadores de Cauchy-Riemann ∂/∂ ζ¯i , (i = 1, . . . , n). Logo, u ^
tem um prolongamento para valores complexos ζ = (ζ1 , . . . , ζn ) de k = (k1 , . . . , kn ) de tal
modo que u ^(ζ) é uma função analítica inteira de ζ, cuja restrição a Rn é u
^.
Resta provar a estimativa. Para isto, tome a função suave auxiliar h ∈ D(Rn ), tal que
h(t) = 1 se t # 1 e h(t) = 0 se t > 2. Associe com cada ζ ∈ Cn , com ζ =
̸ 0, a função
ϕζ (x) = eiζx h(|ζ||x| − |ζ|R) , (x ∈ Rn ) . (6.12.5)
Logo, ϕζ (x) ∈ D(Rn ) e, portanto, ϕζ (x) ∈ S (Rn ).34 Sobre o suporte de ϕζ , |x| # R + 2/|ζ|,
de forma que
|eiζx | = e|Im ζ||x| # e2+R|Im ζ| .
Agora, aplicando a regra de Leibniz (6.1.4) em (6.12.5), obtemos
6 7 < ,α -. /. /
α iζx
D e h(|ζ||x| − |ζ|R) = D β eiζx D α−β h(|ζ||x| − |ζ|R)
β
β#α
6 7
= |i|−1 αn|ζ|ζ −1 h′ (|ζ||x| − |ζ|R) + h(|ζ||x| − |ζ|R) |i|α ζ α eiζx .
(6.12.6)
Como supp h ⊂ [−2, 2], então supp h′ ⊂ [−2, 2] (veja o Exercício 6.1). Logo, temos que (6.12.6)
é majorado por
6 7
|i| αn|ζ|ζ + 1 4|i|α ζ α eiζx .
−1 −1
# (1 + |ζ|)|α| ,
34
Em geral, se h ∈ D e se ψ é uma função infinitamente diferenciável cujo suporte não é necessariamente
limitado, então hψ ∈ D e o suporte de hψ está contido na interseção dos suportes de h e ψ.
461
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
obtemos que
56 7 5
5 −1 α α iζx 5
5 |i| αn|ζ|ζ + 1 4|i| ζ e 5 # 4(αn + 1)(1 + |ζ|)|α|e2+R|Im ζ| .
−1
^ é polinomialmente limitada em Rn .
Portanto, u
Vamos agora estudar certas funções analíticas em certos domínios complexos, chamados
tubos, que satisfazem uma condição de crescimento temperado35 e provar que o valor limite
u dessas funções sobre os reais admite u ^ como sua transformada de Fourier no sentido das
distribuições temperadas. Antes disso, a fim de definir um domínio tubo, precisamos de alguns
fatos simples a respeito de cones.
DEFINIÇÃO 6.23. Seja C ⊂ Rn um cone convexo, aberto e próprio. O tubo com base C, denotado
por T (C), é definido por:
3 4
def
T (C) = Rn + iC = z = x + iy ∈ Cn | x ∈ Rn , y ∈ C .
35
Várias outras condições de crescimento podem ser encontradas nos Capítulos 5 e 6 no tratado de R.D.
Carmichael and D. Mitrović, “Distributions and Analytic Functions,” Longman Scientific & Technical, 1989.
462
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Nota 6.21. Na definição acima se C é somente aberto, T (C) é chamado um cone tubular; se
C é aberto e conexo, T (C) é chamado um domínio radial tubular. Vamos sempre considerar
o domínio tubo da seguinte forma:
3 4
T (C) = z = x + iy ∈ Cn | x ∈ Rn , y ∈ C, |y| < δ ,
ε
B[0; ε]
0
Dado um cone convexo, aberto e próprio C com vértice na origem no espaço das coordenadas
x, associamos a C o cone dual convexo fechado C◦ no espaço dos momenta k, representado
pelo conjunto (veja a Figura 6.8)
3 4
C◦ = k ∈ Rn | ky " 0, ∀ y ∈ C .
C◦
ky = 0
Da mesma forma, todo cone convexo fechado C◦ é o cone dual de precisamente um cone
convexo, aberto e próprio C, representado pelo conjunto
3 4
C = y ∈ Rn | ky > 0, ∀ k ∈ C◦ \ {0} .
463
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
◦
Nota 6.23. Um cone é chamado auto-dual se C◦ = C. Temos que C◦ = C = Ch(C)◦ e
C◦◦ = Ch(C), em que Ch(C) denota o envelope convexo de C.36 Os cones-de-luz do futuro,
V+ , e do passado, V− = −V+ , respectivamente, com seus interiores sendo representado por V+
3 4
V+ = x ∈ R4 | x2 > 0, x0 > |⃗x| ,
hC (k) = sup(−ky) , k ∈ Rn ,
y∈C
DEFINIÇÃO 6.25. Seja u ∈ S ′ (Rn ) e suponha que T (x + iy) seja uma função analítica no
tubo T (C) = Rn + iC, para algum cone convexo, aberto e próprio C. Diz-se que T (x + iy)
admite a distribuição temperada u como seu valor limite sobre os reais, se para toda função teste
ϕ ∈ S (Rn ) tem-se $
dx T (x + iy)ϕ(x) −→ u(ϕ) ,
Rn
DEFINIÇÃO 6.26 (Função espectral). Seja f (z) analítica no domínio tubo T (C) = Rn + iC.
Diz-se que a distribuição g ∈ D ′ (Rn ) é a função espectral da função f (z) se as seguintes
propriedades são satisfeitas:
464
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
DEFINIÇÃO 6.27. Seja Z uma vizinhança complexa de Rn ⊂ Cn . Diz-se que uma função
analítica f (z) ∈ O(Z ∩ T (C)) é de crescimento temperado se existem um inteiro α e uma
constante M, que depende de C, tais que
5 5
5f (x + i y)5 # M(C) |y|−α , (6.12.7)
Distribuições que são valores limite de funções analíticas de crescimento temperado surgem
naturalmente para uma classe especial de distribuições temperadas como mostra o seguinte
com cada Tj (x+iy) ∈ O(Z∩T (C′j )) sendo de crescimento temperado, e em que bC′j (Tj (x+iy))
denota o valor limite em S ′ (Rn ) e C′j um cone compacto arbitrário contido em Cj . Além disso,
u admite u
^ como sua transformada de Fourier no sentido das distribuições temperadas.
Demonstração. Prova que (i) implica (ii). Seja C′ um cone compacto arbitrário contido em C
(veja a Figura 6.9). Assuma que C é da forma C = ∪m j=1 Cj , m < ∞, com cada Cj sendo um
cone convexo, aberto e próprio. Se C % C, então C = ∪m
′ ′ ′ ′
j=1 Cj com Cj % Cj .
C′
C
C \ B[0; 1]
C◦
prC
prC′
465
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
com Tj (x + iy) ∈ O(Z ∩ T (C′j )). Como u ^(k) ∈ S ′ (Rn ) (e assim u ^ ⊂ D ′ (Rn )), segue da
−ky
Definição 6.26 que e u ^(k) é uma distribuição temperada de decrescimento rápido. Escolha
um Y ∈ Cj arbitrário, porém fixo. Então para esta escolha existe δ(Y ) > 0 tal que ky =
|k||y| cos β " δ|k||Y | para k ∈ C◦ . Logo,
5 5
5 ik(x+iy) 5
5e 5 = e−|k||y| cos β # e−δ|k||Y | .
Agora, como por hipótese u ∈ Hs (Rn ), então o quadrado de (1+|k|)s |^ u(k)| pode ser estimado
2(s+N ) 37
pela função (1 + |k|) , em que s ∈ R e N ∈ Z"0 , que é integrável se 2(s + N) < −n
(prove isto com a ajuda do Lema 6.5), isto é, s < − n2 −N. Isto implica que existe uma constante
M tal que
Usando o teorema binomial, a estimativa (6.12.9) acima pode ser reescrita da seguinte forma:
N
<
u(k)| # M
|^ dα |k|α .
α=0
Como C′j é um cone tal que C′j % Cj , então existe c > 0 de maneira que ky " c|k||y|, para
todo k ∈ C◦ e para todo y ∈ C′j . Portanto, para x + iy ∈ Rn + iC′j ,
$ N
< $
−ky
|Tj (x + iy)| # dk |^
u(k)|e #M dα dk |k|α e−c|k||y| .
C◦ α=0 C◦
37
Estamos levando em conta que 1 + |k|2 # (1 + |k|)2 .
466
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
em que ωn−1 é a área da esfera unitária em Rn . Isto prova que Tj (x + iy) é de crescimento
temperado.
! "
Demonstração. Defina C◦j = k ∈ Rn | ky " 0, ∀y ∈ Cj os cones duais de Cj , tal que o
seguinte acontece:
Rn \ (∪m ◦
j=1 Cj ) e C◦j ∩ C◦k , j ̸= k , j, k = 1, . . . , m , (6.12.10)
são conjuntos de medida zero. Pelo Teorema 6.15 existe um elemento v ∈ S ′ (Rn ) tal que
v = F (u), e, portanto, u = F −1 (v). Denote por λj (k) a função característica de C◦j ,39 j =
1, . . . , m e defina vj = λj (k)v. Então, cada vj ∈ S ′ (Rn ) e supp vj ⊂ C◦j , com j = 1, . . . , m.
Para cada j = 1, . . . , m, tome uj = F −1 (vj ) e pelo Teorema 6.15, uj ∈ S ′ (Rn ) para cada j.
Seja ϕ ∈ S (Rn ) e ψ = ϕ ^ ∈ S (Rn ), então, pela Definição 6.16 e a hipótese (6.12.10), temos
que
m m
n m o
< 8 9 < 8 9 <
u(ϕ) = v(ψ) = vj (ψ) = uj (ϕ) = uj (ϕ) ,
j=1 j=1 j=1
;m
Assim u(x) = j=1 uj (x).
Voltando à prova do teorema, tome ϕ ∈ S (Rn ), então com a ajuda do Lema 6.12 temos
$
8 9
bCj (Tj (x + iy)) (ϕ) = ′ lim
′ dx Tj (x + iy)ϕ(x)
Cj ∋y→0 Rn
$ ($ )
= ′ lim dx u(k)eik(x+iy) ϕ(x)
dk λj (k)^
Cj ∋y→0 Rn C◦j
$
−ky
= ′ lim dk λj (k)^ ^
u(k)ϕ(−k)e
Cj ∋y→0 C◦j
$
= dk λj (k)^ ^
u(k)ϕ(−k)
C◦j
= uj (ϕ) .
38
Para detalhes veja L. Schwartz, “Mathematics for the Physical Sciences,” Capítulo 1, Seção 2.
39
Lembre-se que a função característica de um conjunto é a função que é igual a 1 em todo o conjunto e zero
fora do conjunto.
467
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
página 358, do livro de F. Treves, “Topological Vector Spaces, Distributions and Kernels,” a última
implica uma convergência forte visto que S (Rn ) é um espaço Montel.40 Isto completa a prova
da primeira parte do teorema.
A prova que (ii) implica (i) é obtida a partir das definições de suporte e transformada de
Fourier de uma distribuição. Com efeito,
$
^(ϕ) = dk u
u ^(k)ϕ(k) .
^(k) ⊂ C◦ , quando
Temos, então, que mostrar que a integral acima se anula se o supp u
◦ !
supp ϕ(k) ⊂ (C ) . Assim,
$ $
1
^(ϕ) =
u ^(k)ϕ(k) =
dk u dkdx u(x)ϕ(k)e−ikx .
(2π)n
Trocando x por x + iy, com y fixo tomado dentro do cone C,41 e assumindo que ϕ tem suporte
compacto contido em (C◦ )! , segue que
$ $
1
^(ϕ) =
u ^(k)ϕ(k) =
dk u dkdx T (x + iy)ϕ(k)e−ik(x+iy)
(2π)n
$
1 ky y→∞
= ^
dx T (x + iy)ϕ(x)e −−−→ 0 ,
(2π)n
quando ky < 0, o que implica que k ∈ supp ϕ(k) ⊂ (C◦ )! (veja a Figura 6.10). Logo, u
^(k)
decresce exponencialmente fora do cone C◦ . Isto prova que supp u
^(k) ⊂ C◦ .
C◦
C◦
C (C◦ )" ky = 0
y
C◦
supp ϕ
k
468
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
então F1 e F2 têm uma extensão holomorfa comum para uma vizinhança complexa Ω de
W + ∪ E ∪ W −.
Nota 6.25. Naturalmente, em (6.12.11) é importante especificar em que sentido os valores limites
são considerados. Na versão de Bogoliubov estes valores limites foram tomadas segundo a
topologia das distribuições de Schwartz. Notamos também que, para n = 1 e quando os valores
limites são tomados no sentido de funções contínuas, este resultado é facilmente demonstrado
usando o Teorema de Morera para funções de uma variável complexa.
469
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
TEOREMA 6.25 (Versão do Teorema “Edge of the Wedge” de Epstein). Seja C um cone aberto
da forma C = C1 ∪ C2 , em que cada Cj , com j = 1, 2, é um cone convexo, aberto e próprio.
Denote por Ch(C) o envelope convexo do cone C. Assuma que os valores limites distribucionais
de duas funções analíticas fj (z) ∈ O(Z ∩ T (Cj )) de crescimento temperado, com j = 1, 2,
coincidam, isto é, u = bC1 (f1 (z)) = bC2 (f2 (z)), em que u ∈ S ′ (Rn ) de acordo com o Teorema
6.23. Então existe uma função F (z) ∈ O(Z ∩ T (Ch(C))) de crescimento temperado tal que
F (z) = fj (z) sobre o domínio de definição de cada fj (z), j = 1, 2.
Demonstração. Por hipótese bC1 (f1 (z)) = bC2 (f2 (z)) em S ′ (Rn ), e chamamos este valor
comum u. Denote por SC′◦ (Rn ) o subespaço de S ′ (Rn ) de distribuições temperadas com
suporte no cone C◦ :
3 4
SC′◦ (Rn ) = v ∈ S ′ (Rn ) | supp v ⊆ C◦ .
Pelo Teorema 6.15, existe um único vj ∈ SC′◦ (Rn ) tal que bCj (fj (z)) = F [vj8], com j =91, 2, e
isto
d implica que vj = F −1 [bCj (fj (z))]. Pela Definição 6.26 cada fj (z) = F vj (k)e−ky (x) =
dk vj (k)eikz para todo z ∈ Z ∩ T (C), e pelo Teorema 6.23 cada fj (z) é de crescimento
′ n
temperado. Usando estes fatos temos que v1 = v2 em ! SC◦ (R ). Chamamos este
" valor
! comum
v e assim " u = F [v]. Visto que supp vj ⊆ C = k !∈ R | ky " 0, y ∈ C"j = k ∈ Rn |
◦ n
hC (k) # 0 , j = 1, 2, então v desaparece sobre ∪2j=1 k ∈ Rn | hCj (k) > 0 . De fato, tome
Da Definição 6.24, temos hCh(C) (k) # ρC hC (k), com 1 # ρC < ∞. Assim, por (6.12.12)
! " ! "
Considere agora o conjunto k ∈ Rn | hCh(C) (k) > 0 . Se k ∈ k ∈ Rn | hCh(C) (k) > 0 ,
! " !
então por (6.12.13), k ∈ k ∈ Rn | maxj=1,2 hCj (k) > 0 . Portanto, k ∈ ∪2j=1 k ∈ Rn |
" !
hCj (k) > 0 , e sobre esse conjunto v desaparece. Logo, v desaparece se k ∈ k ∈ Rn |
" ! " !
hCh(C) (k) > 0 , e isto implica que supp v ⊆ C◦ = k ∈ Rn | ky " 0, y ∈ Ch(C) = k ∈
"
Rn | hCh(C) (k) # 0 .
′
com v ∈ SCh(C) ◦
(Rn ). Já que Ch(C) é um cone convexo aberto, temos exatamente pela prova
do Teorema 6.23 que F (z) ∈ O(Z ∩ T (Ch(C))) e é de crescimento temperado. Além disto,
usando o fato que v1 = v2 = v, da Definição 6.26
8 9 8 9
fj (z) = F vj (k)e−ky (x) = F v(k)e−ky (x) , z ∈ Z ∩ T (C) . (6.12.15)
Finalmente, combinando (6.12.14) e (6.12.15) segue que F (z) coincide com fj (z), j = 1, 2, sobre
o domínio de definição de cada fj (z).
470
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
COROLÁRIO 6.6. Suponha que as hipóteses do Teorema 6.25 sejam válidas com C1 e C2 opostos
um ao outro. Então F (z) é um polinômio em z ∈ Cn , e portanto uma função analítica inteira
em Cn .
n
Demonstração. Como C2 = −C1 , então Ch(C1 ∪ −C ! 1 ) = R , T (Ch(C)) =
" Cn e isto implica
que k ∈ C◦1 ∩ −C◦1 , que por sua vez implica que k ∈ Rn | hCh(C) (k) # 0 = {0}, em que 0
indica a origem de Rn . Aplicando o Teorema
8 6.25 obtemos
9 um elemento v ∈ S ′ (Rn ) que tem
suporte na origem tal que F (z) = F −1 v(k)e−ky (x). Pelo Teorema 6.3 v é uma combinação
linear finita de derivadas distribucionais da função delta de Dirac. Assim, F (z) definida por
(6.12.14) é um polinômio em z ∈ Cn .
O seguinte teorema é uma consequência imediata do Teorema “Edge of the Wedge” e reflete
um dos princípios mais importantes que regem o comportamento de funções analíticas, ou seja,
a determinação de uma função a partir de seus valores em um conjunto não-vazio, aberto e
real. Antes vamos definir o que entendemos por um conjunto simétrico com respeito a Rn .
DEFINIÇÃO 6.28. Seja U um subconjunto de Cn . Dizemos que U é simétrico com respeito a
Re Cn , se para todo z ∈ U seu conjugado z̄ ∈ U. Neste caso, U+ e U− denotarão os conjuntos
{x + iy ∈ U | y " 0} e {x + iy ∈ U | y # 0}, respectivamente (veja a Figura 6.11 ).
U+
z
Re Cn
z̄
U−
TEOREMA 6.26. Seja C um cone convexo aberto. Tome f (z) ∈ O(Z ∩ T (C)) de crescimento
temperado de acordo com o Teorema 6.23. Se o valor limite distribucional bC (f (z)) de f (z) no
sentido das distribuições temperadas desaparece, então a função f (z) ≡ 0.
= a(x, y) + ib(x, y) ,
em que a(x, y) = u(x, −y) e b(x, y) = −v(x, −y). Decorre da equação acima e das relações
de Cauchy-Riemann que
∂a(x, y) ∂u(x, −y) ∂v(x, −y) ∂b(x, y)
= = =
∂x ∂x ∂y ∂y
471
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Existe uma extensão do Teorema “Edge of the Wedge” para o caso quando existem vários
wedges em vez de dois, como mostra o
P2 . Denote por Ch(Cj ∪ Cℓ ) o envelope convexo de Cj ∪ Cℓ . Para cada par de índices (j, ℓ),
1 # j, ℓ # m, existe uma função holomorfa gjℓ (z) ∈ O(Z ∩ T (Ch(Cj ∪ Cℓ ))) de crescimento
temperado tal;que gjℓ (z) + gℓj (z) = 0, ∀ j, ℓ = 1, . . . , m – logo gjj (z) = 0, ∀ j = ℓ – e tal
que fj (z) = m ′
ℓ=1 gjℓ (z) sobre Z ∩ T (Cj ), para cada j = 1, . . . , m.
Então,
6<
m 7
bCj (fj (z)) = bCj gjℓ (z) quando C′j ∋ y → 0 .
ℓ=1
Portanto, levando em conta a anti-simetria das funções gjk (z), segue que
m 6
m
< < m
.< /7 6<
m <
m 7
bCj (fj (z)) = bCj gjℓ (z) = bCj gjℓ (z) ≡ 0 .
j=1 j=1 ℓ=1 j=1 k=1
3 4
SC′◦ (Rn ) = v ∈ S ′ (Rn ) | supp v ⊆ C◦ .
472
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Pelo Teorema 6.15, existe um único vj ; ∈ SC′◦ (Rn ) tal;que uj = F [vj ], com
;m j = 1, . . . , m, e isto
−1 −1 m m −1
implica
;m que vj = F [u j ] = F [
;m ℓ=1 jℓ;mu ] = F [u;jℓ ] = vjℓ . Uma
ℓ=1 ; vez que
m ;m
ℓ=1
−1 −1 m
j=1 uj ≡ 0, segue que F [ j=1 uj ] = j=1 F [uj ] = j=1 vj = j=1 ℓ=1 vjℓ ≡
0. Logo, vjℓ + vℓj = 0.
$ m
<
= dk vjℓ (k)eikz (6.12.16)
ℓ=1
m 6$
< 7
ikz
= dk vjℓ (k)e
ℓ=1
para todo z ∈ Z ∩ T (C′j ), e pelo Teorema 6.23 cada fj (z) é de crescimento temperado.
Tome agora $
gjℓ (z) = dk vjℓ (k)eikz , (6.12.17)
Uma condição suficiente para um produto de distribuições ser bem definido segue de um
teorema de Hörmander (veja o Teorema 6.30). Um conceito importante na prova do teorema
é a noção do conjunto de frente de ondas (W F ) de uma distribuição.43 Este conceito, que
representa um refinamento no estudo da estrutura das singularidades de distribuições, fornece
uma descrição detalhada das singularidades de uma distribuição em termos do comportamento
assintótico de sua transformada de Fourier44 (isto dá uma formulação precisa do fato que as
singularidades de uma distribuição podem ser localizadas assintoticamente no espaço de fase,
isto é, simultaneamente no espaço das posições e assintoticamente no espaço dos momenta).
43
Usaremos a abreviação W F para o Conjunto de Frente de Ondas (do inglês Wavefront Set).
44
A definição do conjunto de frente de ondas é motivada pelo Teorema de Paley-Wiener (Teorema 6.21), que
caracteriza uma função suave (ou de C ∞ ) com suporte compacto por uma condição de crescimento sobre sua
transformada de Fourier.
473
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
TEOREMA 6.28. u ∈ E ′ (Rn ) é suave se, e somente se, para todo N ∈ N existe uma constante
CN tal que
u(k)| # CN (1 + |k|)−N < ∞ ,
|^ ∀ N ∈ N; k ∈ Rn . (6.13.1)
E se u ∈ E ′ (Rn ) não é suave? Neste caso, pode ocorrer que em certas direções k sua
transformada de Fourier u ^(k) ainda seja assintoticamente limitada. Nesse caso, o conjunto
formado pelos k ′ s para os quais a transformada de Fourier u ^(k) ainda satisfaz a estimativa
(6.13.1) é chamado conjunto de direções regulares de u(x). As direções ao longo das quais u
^(k)
não decai suficientemente rápido servem para caracterizar as singularidades de u(x).
DEFINIÇÃO 6.29. Nós definimos o conjunto Σ(u) ∈ Rn \ {0}, dizendo que k ∈ Σ(u) se existe
uma vizinhança cônica C de k de tal forma que a estimativa (6.13.1) acontece em C para todo
N ∈ N.
Nota 6.26. Segue imediatamente da definição que Σ(u) é um conjunto cônico fechado. Além
disso, observe que uma distribuição u(x) é induzida por uma função suave se, e somente se,
Σ(u) = ∅!
Demonstração. Primeiro, tome φ ∈ C0∞ (Rn ). Escolha um k, tal que k ∈ / Σ(u), e uma
vizinhança cônica C de k onde a estimativa (6.13.1) acontece. Agora, tome uma vizinhança
474
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
cônica menor C′ de k tal que C′ % C; então provaremos que a estimativa (6.13.1) é satisfeita
para o produto φu ∈ C′ . Para isto, escolha uma constante c tal que, para todo k̃ ∈ C′ , a
bola fechada de raio c|k̃|, centrada em k̃, situa-se completamente em C (veja a Figura 6.12).
Com efeito, tome c < d(C′ ∩ S n−1 , C! ). Então a desigualdade |k − k̃| < c|k̃| implica que
|(k/|k̃|) − (k̃/|k̃|)| < c; logo (k/|k̃|) ∈ C′ e k ∈ C′ visto que C′ é um cone.
C′
k̃ C
C"
S n−1
visto que, segunda desigualdade triangular, temos que |k| − |k̃| " −|k − k̃| " −c|k̃|, e isto
implica que |k| " (1 − c)|k̃|. Consequentemente,
$
′
|I1 | # CN (1 + |k̃|) −N ^ k̃ − k)| .
dk |φ( (6.13.4)
Para estimar a integral I2 , note que para |k − k̃| > c|k̃|, novamente pela segunda desigualdade
triangular, temos que |k − k̃| " |k| − |k̃| " |k| − c−1 |k − k̃|, e isto implica que
c
|k − k̃| " |k| , (6.13.5)
1+c
475
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
|I2 | # C2 (1 + |k̃|)−N .
p k̃) # C3 (1 + |k̃|)−N .
φu(
Isto prova a proposição no caso em que φ ∈ C0∞ . Por outro lado se a função φ não é de
suporte compacto, então podemos encontrar uma função φ′ ∈ C0∞ que coincide com φ na
vizinhança do suporte de u. Neste caso, claramente temos que φu = φ′ u, o que completa a
prova.
No caso em que a distribuição u não é de suporte compacto, ainda assim podemos verificar
se sua transformada de Fourier decai rapidamente em uma certa região V , recorrendo-se à
técnica da localização. A técnica consiste em multiplicar a distribuição u por uma função suave
φ com suporte contido na região V , isto é, φ(x) ̸= 0, para todo x ∈ V . A distribuição φu
pode, então, ser vista como uma distribuição sobre Rn de suporte compacto. Nesse caso, a
transformada de Fourier φup é bem definida como uma distribuição sobre Rn se a estimativa
(6.13.1) é satisfeita.
p
(i) φu(k) = u(φeikx );
p
(ii) Se u|V é suave, segue que |φu(k)| # C(φ, N)(1 + |k|)−N < ∞ para todo N ∈ N e
n
k∈R .
Demonstração. Para provar (i) usamos o fato que a transformada de Fourier de um produto é
a convolução das transformadas de Fourier. Logo,
$
p −n ^
φu(k) = (2π) (φ ∗ u ^)(k) = (2π) −n ^ − p)^
dp φ(k u(p)
$
= dx u(x)φ(x)eikx
= u(φeikx ) .
476
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
A prova de (ii) é análoga, em argumentos, àquela do Teorema 6.21. Por integrações por
partes, obtemos:
$ |α| $
p ikx (−i)
φu(k) = dx φu(x)e = α
dx φu(x)(Dxαeikx ) ,
x∈V
k x∈V
ou $
αp |α|
k φu(k) = i dx eikx (Dxα φu(x)) . (6.13.6)
x∈V
Se pudermos definir o produto do tipo u pv = u^ ∗ v^, então podemos esperar que o produto da
forma uv seja bem definido. De fato, assumindo-se que a operação de convolução de duas
distribuições u
^ e v^ está definida, podemos tomar a transformada de Fourier inversa como a
definição do produto das distribuições. Vamos, consequentemente, computar a transformada de
Fourier de u e v. É fácil mostrar que suas transformadas de Fourier são dadas por:
^(k) = −2πiθ(−k)
u e ^
v (k) = 2πiθ(k) , (6.13.7)
em que ⎧ ⎧
⎨1 se k > 0 ⎨0 se k " 0
θ(k) = e θ(−k) = .
⎩0 se k # 0 ⎩1 se k < 0
477
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Da mesma forma, podemos mostrar que o produto u ^∗u ^ existe, mas não o produto u^ ∗ v^. É
fácil ver que a razão para que isto aconteça está relacionada com o suporte de u
^ e v^. Portanto,
devemos esperar que os produtos uu and vv existem, mas não o produto uv.
Então, o conjunto de frente de ondas W F (u) da distribuição u consiste dos pares ordenados
p não decai suficientemente
(x, k) ∈ Rn × (Rn \ {0}) para os quais a transformada de Fourier φu
rápido ao longo da direção k, para |k| → ∞.
O conjunto de frente de ondas W F (u) é cônico no sentido que ele fica invariante quando
multiplicamos a segunda variável por um escalar positivo; isto é, se k ∈ W F (u) então λk ∈
W F (u) para todo λ > 0. Assim, (x, k) é um ponto descrevendo uma direção regular se a
“localização” φu de u próximo a x tem transformada de Fourier decaindo mais rápido do que
qualquer potência inversa de |k| em um cone em torno de k.
Exemplo 6.21. O conjunto de frente de ondas da distribuição δ ∈ S ′ (R) é
3 4
W F (δ) = (0, k) | k ∈ R \ {0} .
que não decai rapidamente qualquer que seja a direção k. Isto significa que a transformada de
Fourier da distribuição δ não satisfaz a condição de decaimento de suavidade do Teorema 6.28.
Em outras palavras, no espaço-k todas as direções são direções de propagação de singularidades!
Exemplo 6.22. (Exemplo 6.20 revisitado) As distribuições u(x) = 1/(x + i0) e v(x) = 1/(x −
i0) têm conjunto de frente de ondas
3 4 3 4
W F (u) = (0, k) | k ∈ R− \ {0} e W F (v) = (0, k) | k ∈ R+ \ {0} ,
478
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
= −kθ(k) = (2π)−1ik^
v (k) .
Em resumo, este exemplo nos revela que, ao contrário da distribuição δ, o conjunto de frente
de ondas nem sempre contém o espaço de Fourier completo para todos os pontos do suporte
singular de uma distribuição.
2. Da definição do conjunto de frente de ondas W F (u), segue que a projeção sobre a pri-
meira coordenada π1 (W F (u)) → x, consiste daqueles pontos que não têm vizinhanças
onde u é uma função suave. A projeção sobre a segunda coordenada π2 (W F (u)) →
Σx (u) é o cone em torno de k (Figura 6.13) ligado a tal ponto, indicando o conjunto de
direções no espaço dos momenta responsáveis pelo aparecimento de uma singularidade
naquele ponto.
479
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
4. Para toda função suave φ com suporte compacto temos que (cf. Proposição 6.10)
W F (φu) ⊂ W F (u) .
W F (P u) ⊆ W F (u) .
Nota 6.27. Entre os anos de 1969 e 1972 houve uma “competição” acirrada no desenvolvimento
da análise microlocal entre duas escolas distintas: a escola de Mikio Sato e a escola Lars Hör-
mander. O resultado dessa competição culminou com trabalhos monumentais de Hörmander e
Duistermaat-Hörmander, por um lado, e Sato-Kawai-Kashiwara, por outro (cada artigo contendo
mais de 150 páginas, ou mais). O ponto fundamental dos artigos foi a formulação matemati-
camente rigorosa do princípio de Christiaan Huygens sobre propagação de ondas. No entanto,
as suas definições de conceitos fundamentais e suas provas dos mesmos resultados são, essen-
cialmente, diferentes. Sato et al. empregaram o conceito de espectro de singularidade SS(u),
enquanto Hörmander et al. empregaram o conceito de conjunto de frente de onda W F (u).
O conjunto de frente de ondas analítico, W Fa (u), introduzido por Hörmander mais tarde, de
fato, coincide com o espectro de singularidade SS(u) para distribuições u, mas a prova dessa
equivalência foi extremamente difícil. Uma razão é que Sato et al. empregaram conceitos de
grupos de cohomologia.
não contenha qualquer elemento da forma (x, 0). Então o produto uv existe. Além disso
480
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Note que, pelo Critério de Hörmander, o produto de duas distribuições u e v está bem
definido em x se u, ou v, ou ambas distribuições são regulares em x. Se u e v são singulares
em x, o produto existe se a soma da segunda componente dos conjuntos de frente de ondas
de u e v em x é diferente de zero. Ou seja, de acordo com o teorema acima, podemos
multiplicar distribuições, mesmo que tenham um overlapping de singularidades, desde que os
seus conjuntos de frentes de ondas estejam em direções favoráveis. Com base nisso, fica claro
que o produto δ 2 (x) = δ(x)δ(x) não está bem definido, pois a condição de suficiência do
Teorema 6.30 que garante a existência do produto de distribuições não é respeitada. Por outro
lado, a n-ésima potência das distribuições u(x) = 1/(x + i0) e v(x) = 1/(x − i0) está bem
definida, apesar da singularidade em x = 0, enquanto que o produto uv não existe, pois não
respeita o critério de Hörmander.
O Teorema 6.30 é frequentemente usado para garantir que o produto pontual de determinadas
distribuições existe, ou, mais geralmente, para garantir que certos mapeamentos lineares com o
kernel distribuicional tem uma ação bem definida sobre determinadas distribuições. Operações
com distribuições não são contínuas (mesmo que sejam bem definidas) na topologia usual de
distribuições. No entanto, são contínuas na pseudo-topologia de Hörmander definida como
segue: seja C um conjunto cônico fechado em Rn × (Rn \ {0}) e DC′ (Rn ) o conjunto de todas
as distribuições u sobre Rn com W F (u) ⊂ C. Dizemos que uma sequência (uj )j∈N ⊂ DC′ (Rn )
converge para u na pseudo-topologia de Hörmander se uj → u no sentido distribucional e se,
para qualquer vizinhança aberta Ω ⊂ Rn e qualquer cone V ⊂ Rn tal que Cx ⊂ V ∀x ∈ Ω e
qualquer f ∈ D(Ω) o seguinte acontece:
sup |(fq
uj − fpu)(k)|(1 + |k|)N → 0 ∀N ∈ N.
k ∈V
/
Esta noção pode ser generalizada de uma forma invariante para variedades suaves X, em que
C é agora um subconjunto cônico fechado de T ∗ X.
Pelo que vimos no Teorema 6.23, uma distribuição u ∈ S ′ (Rn ) é obtida como uma soma
finita de valores limite de funções analíticas Tj (x + iy), com j = (1, . . . , m), com uma condi-
ção de crescimento temperado sendo imposta para caracterizar tais valores limite. Vamos agora
traduzir essa condição de crescimento em termos do conjunto de frente de ondas analítico. Hör-
mander introduziu a noção do conjunto de frente de ondas analítico baseada sobre estimativas
usando uma sequência de funções cut-off, o que a torna mais difícil em aplicações. Nesta seção,
apresentamos uma definição do conjunto de frente de ondas analítico em termos dos valores
limite de funções analíticas. Neste caso, as singularidades de uma distribuição temperada são
descritas pela falta de analiticidade no sentido das funções complexas.
DEFINIÇÃO 6.31. Seja u ∈ S ′ (Rn ), tal que u = bC (T (x + iy)), em que bC (T (x + iy)) denota o
valor limite no sentido forte em S ′ (Rn ) de uma função analítica T (x + iy). Seja q = (x0 , k0 ).
Então q ∈ / W Fa (u) se, e somente se, existem M(C′ ) e N para os quais a seguinte estimativa é
satisfeita: 5 5
5T (x + iy)5 # M(C′ )|y|−N , z = x + iy ∈ Z ∩ T (C′ ) .
481
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
5 ! . / "
Demonstração. Seja W Fa (u)5x0 = k ∈ Rn \ {0} | (x0 , k) ∈ W Fa (u) a fibra sobre x0 .
Faça com que {C◦j }j∈L seja uma cobertura finita de C◦ composta de cones convexos, fechados
e próprios. Decomponha u ^(k) da seguinte forma:
m
<
^(k) =
u λj (k)^
u(k) , (6.13.12)
j=1
em que λj (k) denota a função característica de C◦j , j ∈ L. Então, pelo Teorema 6.23, a
decomposição (6.13.12) induzirá uma representação de u na forma de uma soma de valores
limite de funções analíticas Tj (x + iy), tal que Tj (x + iy) → uj na topologia forte de S ′ (Rn )
quando y → 0, y ∈ C′j % Cj . De acordo também com o Teorema 6.23, a família de funções
Tj (x + iy) satisfaz a estimativa
5 5
5Tj (x + iy)5 # M(C′ )|y|−N , z = x + iy ∈ Z ∩ T (C′j ) ,
a não ser que kY < 0 para k ∈ C◦j e Y ∈ −C′j . Logo, os cones responsáveis pelas direções
“ruins” associadas às singularidades destes valores limites estão contidos nos cones duais dos
cones base Cj . Portanto, temos a inclusão
. /
W Fa (u) ⊂ Rn × ∪j C◦j . (6.13.13)
Finalmente, fazendo um refinamento da cobertura e contraindo-a (shrinking) para o cone C◦ ,
obtemos o resultado desejado.
com Tj (x+iy) ∈ O(Z ∩T (C′j )) sendo de crescimento temperado, tal que bC′j (Tj (x+iy) ∈ C ∞
! "
próximo a x0 para cada j, com C′j ⊂ y | k0 y " 0 .
45
K. Nishiwada, “On the local surjectivity of analytic partial differential operators in the space of distributions
with given wave front sets,”Surikaiseki-kenkyusho kokyuroku, RIMS, Kyoto Univ. 239 (1975) 19 e “On local
characterization of wave front sets in terms of boundary values of holomorphic functions,” Publ. RIMS, Kyoto Univ.
14 (1978) 309.
482
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Demonstração. Assuma que a Eq.(6.13.14) é válida para a família {Cj } de tais!cones convexos,
"
abertos e próprios. Tome uma subfamília {κ} ⊂ {j} de índices tal.;que C′κ ∩ y | k0 y < 0 / =
m
∅. Então, pela Proposição 6.11, nós temos que (x0 , k0 ) ∈
/ W Fa κ=1 bC′κ (Tκ (x + iy)) e,
portanto, (x0 , k0 ) ∈
/ W F (u).
Vamos revisitar o Teorema “Edge of the Wedge” e apresentar uma prova alternativa desse
teorema baseada no desenvolvimento acima sobre o conjunto de frente de ondas analítico. Para
isto, começamos com o seguinte
LEMA 6.13. Seja Cm a família de todos os cones convexos, abertos e próprios em Rm . Se
C1 , C2 ∈ Cm , então C1 + C2 ∈ Cm . Além disto, se C pertence a Cm e y ∈ C, então −y ∈
/ C.
em que W Fa′ (u) denota a imagem de W Fa (u) sob a simetria (x, k) → (x, −k). Se Ω ⊂ Rn é
um subconjunto aberto não-vazio e u|Ω = 0, então u ≡ 0.
Demonstração. Assuma que (x, k) ∈ N(supp u); consequentemente, pela Definição 6.32,
(x, −k) ∈ N(supp u). Pelo Lema 6.15, (x, k) e (x, −k) estão em W Fa (u), o que contradiz a
hipótese. Isto implica que N(supp u) é vazio e portanto ∂(supp u) é vazio também pelo Lema
6.14. Como supp u não é todo o Rn , segue da conexidade de Rn que supp u = ∅ → u ≡ 0.
483
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
5
PROPOSIÇÃO 6.13. Seja u ∈ S ′ (Rn ). Se W Fa (u)5x0 ⊂ C◦ , para um cone convexo, aberto e
próprio C em Rn \ {0}, então existe uma função analítica f (z) ∈ O(Z ∩ T (C)) de crescimento
temperado, em que Z é uma vizinhaça complexa de x0 , tal que u = bC (f (z)).
N.N. Bogoliubov
Na primeira metade do Século XX, em um ramo da física, a teoria quântica dos campos (a
unificação da mecânica quântica com a relatividade especial), os físicos com base em métodos
puramente intuitivos obtiveram sucesso no cálculo de taxas de emissão e absorção de partículas,
mas somente pela supressão arbitrária de certas quantidades que assumiam valores infinitos. Na
década de 1950, vários físicos começaram a levar a sério a eliminação desses infinitos pela intro-
dução de novos axiomas precisos,46 e uma grande quantidade de novos resultados interessantes
apareceram – como o Lamb-shift, o momento magnético anômalo do elétron, etc. Do ponto
de vista matemático, esses infinitos têm origem nas singularidades não-integráveis associadas
a certos diagramas de Feynman no espaço-x. Nosso objetivo nesta seção é exatamente mos-
trar como tratar rigorosa e matematicamente este problema através da noção de distribuições
homogêneas.
484
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Logo, uma função homogênea pode ser descrita como uma função com um comportamento
de escala multiplicativo: se o argumento é multiplicado por um fator, então o resultado é
multiplicado por uma potência desse fator. Mais precisamente, se f : X → Y é uma função
entre dois espaços vetoriais e s é um número inteiro, então diz-se que f é homogênea de grau
s se f (λx) = λs f (x) para todo escalar λ diferente de zero e x ∈ X . Isto implica que f tem
invariância de escala!
Exemplo 6.23. A função f (x, y) = x2 + y 2 é homogênea de grau 2, já que temos f (λx, λy) =
(λx)2 + (λy)2 = λ2 (x2 + y 2 ) = λ2 f (x, y).
Exemplo 6.24. Qualquer função linear f : R → R é homogenênea de grau 1, já que pela
definição de linearidade f (λx) = λf (x) para todo escalar λ diferente de zero e x ∈ R.
Similarmente, qualquer função multilinear f : Rn → R é homogênea de grau n, já que
pela definição de multilinearidade f (λx1 , . . . , λxn ) = λn f (x1 , . . . , xn ) para todo escalar λ
diferente de zero e (x1 , . . . , xn ) ∈ Rn .
Exemplo 6.25 (Um contra-exemplo). A função logarítmo natural f (x) = ln x escala aditiva-
mente e, portanto, não é homogênea. Isto pode ser provado notando que f (λx) = ln λx =
ln λ + ln x = ln λ + f (x). Consequentemente, não existe um s tal que f (λx) = λs f (x).
Exemplo 6.26. Considere a função f (x) = xs com s ∈ R. Se s > 0, podemos naturalmente
assumir que a função f (x) = xs define uma distribuição, dada pela integral
$
T (ϕ) = dx xs ϕ(x) , ∀ ϕ ∈ S (R) .
R
A função f (x) = xs é homogênea de grau s. Isto significa que para λ > 0, f (λx) = λs f (x).
Explicitamente, temos
$ $
s s −n
Tλ (ϕ) = dx λ x ϕ(x) = λ dx xs ϕ(λ−1 x) = λ−n T (ϕλ ) , (6.14.1)
Em geral, se f ∈ Lloc n s
1 (R ) tal que f (λx) = λ f (x), para todo s ∈ R e λ > 0, então f
define uma distribuição homogênea de grau s, dada pela integral
$ $
s
Tλ (ϕ) = dx f (λx)ϕ(x) = λ dx f (x)ϕ(x) = λs T (ϕ) , (6.14.2)
ou, equivalentemente,
$ $
−n −n −1 s
T (λ ϕ ◦ µλ ) = λ dx f (x)ϕ(λ x) = λ dx f (x)ϕ(x) = λs T (ϕ) , (6.14.3)
Distribuições homogêneas também podem ser definidas para os espaços vetoriais com a
origem excluída. Neste caso, uma função contínua (não-trivial) homogênea de grau s que define
uma distribuição em Rn \ {0} pode ser estendida continuamente para Rn se, e somente se,
s > 0. Entretanto, se s < 0, a situação é mais delicada, e pode ser um problema não-trivial
estender uma dada distribuição homogênea a partir de Rn \ {0} a uma distribuição em Rn .
Tal extensão existe na maioria dos casos, embora possa não ser única.
485
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Exemplo 6.27. A distribuição δ tem grau de homegeneidade −n. Com efeito, temos
Logo, s = −n.
TEOREMA 6.31. Se uma distribuição T ∈ S ′ (Rn ) é homogênea de grau s para qualquer λ > 0,
então D α T é homogênea de grau s − |α|.
Logo,
Vamos chamar uma distribuição homogênea t sobre Rn regular quando ela é suave fora da
origem; a função suave sobre Rn \{0} associada a t é homogênea de mesmo grau. Distribuições
homogêneas de todos os tipos são temperadas e, portanto, possuem transformadas de Fourier.
486
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Questão 1: Suponha que f seja uma função suave sobre Rn \ {0} (isto é, uma função de
classe C ∞ fora de uma vizinhança arbitrária da origem) e homogênea de grau s que define
uma distribuição homogênea regular t ∈ S ′ (Rn \ {0}). Como ela pode ser estendida para
uma distribuição homogênea regular T em S ′ (Rn ) e de grau s tal que f seja a sua função
associada?
Questão 2: Se tal distribuição existir, até que ponto ela é univocamente determinada por f ?
O problema da renormalização na teoria quântica dos campos pode ser reformulado como
sendo um problema de estender distribuições definidas em Rn \{0} para distribuições definidas
em Rn . Por isso, recordaremos os ingredientes básicos da construção de extensões de distri-
buições. Essencialmente, seguiremos o formalismo de extensões de distribuições homogêneas
como descrito por Gel’fand-Shilov-Hörmander.
Para começar, lembremos que se f é uma função contínua sua identificação com uma
distribuição é imediata. No entanto, a continuidade de f não é realmente necessária para
identificá-la com uma distribuição. De fato, uma função f pode definir uma distribuição se
ela contém um número finito de descontinuidades localizadas nos pontos x1 , x2 , . . . , xn (veja
o Exemplo 6.9) ou se ela se torna infinita em certos pontos, mas desde que essas singularidades
sejam integráveis. Por outro lado, se uma função f tem singularidades não-integráveis a
identificação de f com uma distribuição não é imediata. Nesse caso, f pode estar associada a
várias distribuições diferentes, como explicaremos abaixo quando falarmos sobre a extensão de
distribuições. Antes de estudarmos este caso, vamos analisar um exemplo simples relacionado
com a situação onde uma função f tem uma singularidade integrável.
Exemplo 6.28 (Potencial coulombiano em dimensão
H n " 2). Considere a função f (x) =
1/∥x∥ em dimensões n " 2, em que ∥x∥ = x1 + · · · + x2n . Queremos mostrar que esta
2
Em outras palavras, queremos mostrar que a função f (x) = 1/∥x∥ tem uma singularidade
integrável na origem e, portanto, pode ser identificada univocamente com uma distribuição
T ∈ S ′ (Rn ), para n " 2. Para vermos isto, devemos mostrar que T é um funcional linear
n
contínuo sobre S 5 (R ).5 Lembre-se que isto é equivalente à existência de uma semi-norma
5 5 n
∥ · ∥α,β tal que T (ϕ) # C∥ϕ∥α,β para todo ϕ ∈ S (R ). Neste caso, usando coordenadas
esféricas, obtemos
5$ 5 5$ $ ∞ 5
5 5 5 1 5 5 5
n−1 ϕ(rω) 5
5T (ϕ)5 = 5 5 5
5 n dx ∥x∥ ϕ(x)5 = 5 dω dr r
r 5
R ∥ω∥=1 0
$ $ ∞
5 5
# dω dr 5r n−2 ϕ(rω)5 .
∥ω∥=1 0
487
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Considerando que ϕ ∈ S (Rn ), então, por definição, existe uma constante C = C(n − 2, 0)
tal que 5 n−2 5
5r ϕ(rω)5 # C ,
se n " 2 (já que os índices α e β que aparecem na semi-norma ∥ · ∥α,β devem pertencer ao
conjunto N0 ). Aqui, C1 = ωn−1 é a área da esfera unitária S n−1 (veja os detalhes no Apêndice
6A). Logo, T é um funcional contínuo. Portanto, a função f (x) = 1/∥x∥ em dimensão n " 2
define uma distribuição T ∈ S ′ (Rn ).
Vamos, agora, considerar a situação quando uma função f tem singularidades não-integráveis.
O problema básico na nossa análise será o da regularização das singularidades de f em pontos
isolados.49 Assim, se V é uma vizinhança de um ponto isolado x0 ∈ Rn e f é uma função
(localmente integrável) sobre V \ {x0 }, desejamos estender f a uma distribuição sobre V . Efe-
tivamente, a regularização de distribuições refere-se ao problema de estender distribuições que
são definidas a priori sobre um conjunto menor para um conjunto maior. No entanto, isto não
é sempre possível, se a singularidade de f em x0 for muito “violenta.” Por outro lado, f será
sempre regularizável se sua singularidade em x0 for do tipo algébrica.50
DEFINIÇÃO 6.35 (Gel’fand-Shilov). Diz-se que uma função f tem uma singularidade algé-
brica em x0 se ela não cresce mais rápido do que qualquer potência de 1/|x − x0 |, quando x se
aproxima do ponto singular x0 .
488
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
É importante ressaltar, como já mencionado, que na teoria quântica dos campos o processo
de regularização de produtos de propagadores de Feynman é também conhecido como “re-
normalização.” Por causa disso, daqui para frente os aspectos técnicos da regularização de
distribuições serão denominados renormalização de distribuições.
Exemplo 6.29 (Renormalização de 1/x). Considere a função f (x) = 1/x, definida para x
real com x ̸= 0. Esta função não define, inicialmente, uma distribuição sobre R porque não é
localmente integrável na vizinhança da origem. No entanto, f (x) = 1/x define uma distribuição
regular t em Rn \{0}, homogênea de grau -1, para toda função teste ϕ ∈ S (R\{0}). Queremos
mostrar que existe uma extensão da distribuição t que pode ser naturalmente associada à função
f (x) = 1/x. Ela é definida da seguinte forma: como f (x) = 1/x é absolutamente integrável
fora de qualquer vizinhança da origem, isto é, para ε < |x| d< +∞, com ε > 0 escolhido
∞
arbitrariamente, definimos o valor principal da integral v.p. −∞ dx 1/x como o limite de
d −ε d∞
−∞
dx 1/x + ε dx 1/x quando ε → 0 (assumindo a existência desse limite).52
em que uma vizinhança simétrica da singularidade tendendo a zero foi removida. Observamos
primeiro que o limite acima existe para qualquer função ϕ ∈ S (R) e, portanto, P(1/x) é de
fato uma distribuição. Assuma que ε < 1. Então, podemos escrever
$ $ $
1 1 1
dx ϕ(x) = dx ϕ(x) + dx ϕ(x)
|x|"ε x 1"|x|"ε x |x|>1 x
$ −ε $ 1 $ −1 $ ∞
1 1 1 1
= dx ϕ(x) + dx ϕ(x) + dx ϕ(x) + dx ϕ(x) .
−1 x ε x −∞ x 1 x
52
Para ver o que isto significa, considere o exemplo simples da integral
$ 5
1
dx .
0 x−3
Essa integral não é bem definida uma vez que o integrando diverge em x = 3. Você pode ver que as duas integrais
d3 d5
0
dx/(x − 3) e 3 dx/(x − 3) são divergentes, dando −∞ e +∞, respectivamente. No entanto, existe uma
maneira de “renormalizar” a integral acima. Considere a seguinte expressão:
$ 3−ε $ 5 = >3−ε = >5
1 1
dx + dx = ln |x − 3| + ln |x − 3|
0 x−3 3+ε x−3 0 3+ε
= ln | − ε| − ln | − 3| + ln |2| − ln |ε| .
489
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
As duas últimas integrais claramente convergem por causa do decaimento rápido de ϕ(x)
quando |x| → ∞. Quanto às duas primeiras integrais, podemos escrevê-las como
$ $ $
1. / 1. / 1
dx ϕ(x) − ϕ(0) + ϕ(0) = dx ϕ(x) − ϕ(0) + ϕ(0) dx .
1"|x|"ε x 1"|x|"ε x 1"|x|"ε x
A segunda integral ns expressão acima é zero devido ao fato de 1/x ser uma função ímpar
que está sendo integrada em uma vizinhança simétrica da singularidade. Por outro lado, na
avaliação da primeira integral se levarmos em conta que ϕ é C ∞ , então, pelo Teorema do Valor
Médio, existe um certo ξ entre 0 e x tal que ϕ(x) − ϕ(0) = xϕ′ (ξ). Logo,
$ $
1. / ′
dx ϕ(x) − ϕ(0) = ϕ (ξ) dx = 2ϕ′ (ξ)(1 − ε) .
1"|x|"ε x 1"|x|"ε
Assim, o limite quando ε → 0 no lado direito de (6.14.5) existe. Além disso, é evidente que
58 $ 1 5$ ∞ 5
5 9 55 5 1 5
5 P(1/x) (ϕ)5 # 2 dx |ϕ (ξ)| + 55
′
dx 2 xϕ(x)55 # 2∥ϕ∥0,1 + ∥ϕ∥1,0 .
0 1 x
existe. Essa integral, que converge para todo ϕ ∈ S (R), representa uma “renormalização” (ou
uma extensão) da função 1/x, que inicialmente definia um funcional somente para funções
teste ϕ ∈ S (R \ {0}).
Por fim, observe que para qualquer ϕ ∈ S (R \ {0}), isto é, se ϕ(0) = 0, então
$ ∞ $ ∞
1 1
v.p. dx ϕ(x) = dx ϕ(x) .
−∞ x −∞ x
490
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Note que a segunda integral é exatamente a sequência de funções de Breit-Wigner que apareceu
no Exemplo 6.12 com n = 1/ε. Logo,
$ ∞
ε ϕ(x)
∓i lim dx 2 = ∓iπϕ(0) .
ε→0 −∞ x + ε2
Por outro lado, a primeira integral pode ser escrita da seguinte forma
$ ∞ ,$ $ -
x ϕ(x) x ϕ(x) x ϕ(x)
lim dx 2 = lim dx 2 + dx 2
ε→0 −∞ x + ε2 ε→0 |x|<1 x + ε2 |x|>1 x + ε2
($ . / $ )
x ϕ(x) − ϕ(0) x ϕ(x)
= lim dx 2 2
+ dx 2 .
ε→0 |x|<1 x +ε |x|>1 x + ε2
d
já que a integral |x|<1 dx xx2ϕ(0)
+ε2
x
= 0 devido ao fato de x2 +ε 2 ser uma função ímpar. Portanto,
Aqui, transformamos a variável independente no lado esquerdo de acordo com x/λ → x. Note
que os limites existem para as duas integrais e são iguais. Logo, P(1/x) é homogênea de grau
-1. De acordo com a Proposição 6.14 abaixo, segue que (x + i0)−1 e (x − i0)−1 também têm
grau de homogeneidade -1. Isto responde (parcialmente) a Questão 1 formulada anteriormente.
Por outro lado, fica claro que a renormalização de 1/x não é única: várias distribuições
correspondem à função não-integrável 1/x. Isto responde a Questão 2! A diferença entre
quaisquer duas renormalizações de 1/x é simplesmente cδ(x), em que c = ±iπ ou c = ±2iπ.
491
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Vimos no Exemplo 6.26 que a função f (x) = xs é homogênea de grau s e define, natu-
ralmente, uma distribuição se s > 0. Em particular, de acordo com a Definição 6.33, a toda
função f homogênea de grau s > −n, contínua para x ̸= 0, corresponde uma distribuição
dada pela integral $
T (ϕ) = dx f (x)ϕ(x) ,
Como, por hipótese, todos sκ são diferentes, temos que cκ tκ (ϕ) = 0 para todo κ e toda ϕ. Se
tκ ̸= 0, podemos escolher ϕ tal que tκ (ϕ) ̸= 0. Portanto, cκ = 0 para todo κ. Isto prova a
proposição.
Vamos explorar a Definição 6.33 de forma a obtermos um critério razoável para medir a
ordem de singularidade de uma distribuição. Primeiro, note que se tomarmos o limite λ → 0
no lado esquerdo da Eq.(6.14.4), o argumento de ϕ(λ−1 x) vai para infinito. Mas, por definição,
no infinito a função ϕ é zero e, assim, o lado esquerdo da Eq.(6.14.4) vai para zero nesse limite.
Por outro lado, o lado direito só será zero se s > −n.
Assuma que f é uma função homogênea de grau s # −n com uma singularidade não-
integrável no ponto x0 . Logo, o lado direito da Eq.(6.14.4) não vai para zero quando λ → 0.
Apesar disso, f é localmente integrável fora de qualquer vizinhança do ponto x0 ∈ Rn e define
uma distribuição regular t sobre Rn \ {x0 }. Então, multiplique f (x) por (x − x0 )m . Se a
função (x − x0 )m f (x) tem agora grau de homogeneidade m + s > −n, para um certo valor
53
A função f (x) = 1/∥x∥ do Exemplo 6.28 tem grau de homogeneidade -1 e para dimensões n " 2 sua
singularidade no zero é integrável, como já mostrado.
54
Na teoria quântica de campos também algumas simetrias devem ser preservadas no processo de renormaliza-
ção, como a simetria de Lorentz e/ou simetrias de calibre. Caso contrário, falamos de uma anomalia.
492
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
PROPOSIÇÃO 6.15. Seja f uma função suave sobre Rn \ {0} e homogênea de grau s; logo, f
define uma distribuição homogênea t ∈ S ′ (Rn \ {0}) também de grau s. Se s # −n, então t
tem uma extensão homogênea T ∈ S ′ (Rn ) de grau s se, e somente se,
$
dx f (x)xα = 0 .
|x|#1
Demonstração. Inicialmente, assumiremos que s = −n. Então, de acordo com a Definição 6.36,
f tem ordem singular 0. Logo,
$ $ $
. /
T (ϕ) = dx f (x) ϕ(x) − ϕ(0) + ϕ(0) dx f (x) + dx f (x)ϕ(x) ,
|x|#1 |x|#1 |x|>1
para toda ϕ(x) ∈ S (Rn ). Dado o rápido decrescimento de ϕ no infinito, a integral sobre
|x| > 1 é convergente. Por outro lado, visto que ϕ é infinitamente diferenciável, então, pelo
Teorema do Valor Médio, ϕ(x) − ϕ(0) = xϕ′ (ξ), para um um certo ξ entre 0 e x. Portanto,
para a primeira integral obtemos
$
′
ϕ (ξ) dx xf (x) .
|x|#1
Mas a integral acima é convergente já que xf (x) tem grau de homogeneidade s > −n e,
portanto, é localmente integrável em qualquer vizinhança de 0. Para analisar a segunda integral,
vamos levar em conta o fato que toda função homogênea de grau s pode ser escrita na forma
493
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
que esta condição também garante que a distribuição T será homogênea de grau −n. Neste
caso, por definição, devemos ter
T (ϕλ ) = T (ϕ) . (6.14.7)
Considere a integral
$ $ $
. −1
/ −1
T (ϕλ ) = dx f (x) ϕ(λ x) − ϕ(0) + dx f (x)ϕ(λ x) + ϕ(0) dx f (x) ,
|x|#1 |x|>1 |x|#1
$
= ln λ dω f (ω) .
∥ω∥=1
$
+ dx f (x)ϕ(x) ,
|x|>1
para toda ϕ(x) ∈ S (Rn ). Novamente, dado o rápido decrescimento de ϕ no infinito, a integral
sobre |x| > 1 é convergente. Por outro lado, o polinômio
< xα
ϕ(x) = D α ϕ(0) ,
α!
|α|#[ℓ]
494
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
tem como principal propriedade o fato que ele passa pelo ponto (0, ϕ(0)) ∈ R2n e possui as
mesmas derivadas até a ordem ω = [ℓ] que a função ϕ. O polinômio acima desenvolvido numa
vizinhança de 0 aproxima a função ϕ nesta vizinhança. É importante sabermos estimar o erro
que cometemos ao se realizar esta aproximação. Faremos isto com ajuda do seguinte
LEMA 6.17 (Teorema de Taylor). Seja ϕ : Rn → R uma função diferenciável ω vezes no ponto
a ∈ Rn . Então, existe um mapeamento χα : Rn → R tal que
< D α ϕ(a) <
ϕ(x) = (x − a)α + χα (x)(x − a)α and lim χα (x) = 0 .
α! x→a
|α|#ω |α|=ω
em que
$ 1
|α| . /
χα (x) = dt (1 − t)|α|−1 D α ϕ a + t(x − a) .
α! 0
Logo,
< $ 5 5 < 1
$
5 5
dx 5f (x)χα (x)xα 5 # ∥ϕ∥0,α dx 5f (x)xα 5 < ∞ .
|x|#1 α! |x|#1
|α|=[ℓ]+1 |α|=[ℓ]+1
< 1 $
α 1
= D ϕ(0) dω f (ω)ω α .
α! n + s + |α| ∥ω∥=1
|α|#[ℓ]
495
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
O funcional T (ϕ) tem polos em s = −n−|α|. De novo,d para a distribuição T não ter polos em
s = −n − |α| é necessário e suficiente que a integral ∥ω∥=1 dω f (ω)ω α = 0, o que também
garante que a distribuição T será homogênea de grau −n − |α|. Neste caso, obteremos que
⎛ ⎞
$ < xα $
⎝
dx f (x) ϕ(x) − α
D ϕ(0) +⎠ dx f (x)ϕ(x)
|λx|#1 α! |λx|>1
|α|#[ℓ]
⎛ ⎞
$ < xα $
= ⎝
dx f (x) ϕ(x) − α ⎠
D ϕ(0) + dx f (x)ϕ(x)
|x|#1 α! |x|>1
|α|#[ℓ]
< 1 ,$ $ -
α
+ D ϕ(0) − dx f (x)xα .
α! |x|#1 |λx|#1
|α|#[ℓ]
$
= ln λ dω f (ω)ω α .
∥ω∥=1
já que 51
$ $ 1 5
1 1 5
ϕ(0) dx = ϕ(0) dx = ϕ(0) ln |x|5 = 0 .
|x|#1 x −1 x 5
−1
Nota 6.29 (Nem tudo são flores). Na Proposição 6.15 nós ignoramos um fato importante:
⎛ ⎞
< xα
⎝ϕ(x) − D α ϕ(0)⎠ , (6.14.8)
α!
|α|#ω
496
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
1. 0 # ϑε # 1,
2. ϑε (x) = 1 se x ∈ Kε ,
3. ϑε (x) = 0 se x ∈
/ K3ε ,
5 α 5
4. 5D ϑε 5 # Cα ε−|α| , em que Cα é uma constante que depende de α e de n.
∥x − y∥ " 4ε quando x ∈ K, y ∈ !Ω .
497
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
H
em que ∥x∥ = x21 + · · · + x2n , Mε é uma constante e ε é um número real positivo. Note
que, a função ωε é positiva para todo y ∈ Kε e tem suporte na bola fechada
d B[y; ε] de raio ε
com centro em y. Nós escolhemos a constante Mε de tal forma a obter dx ωε (x − y) = 1,
isto é, $ 6 1 7
n
Mε ε dξ exp − =1.
B[0;1] 1 − ∥ξ∥2
Considere a função ϑε = ωε ∗ χK2ε que é positiva, por definição. Note que,
$ $
. /
ϑε (x) = ωε ∗ χK2ε (x) = dy ωε (x − y)χK2ε (y) = dy ωε (x − y) .
Ω K2ε
55
Por exemplo, em R a primeira derivada de ωε é
⎧ 6 7
⎨ −Mε 2ξ2 2 exp − 1 2 se |ξ| < 1
(1−ξ ) 1−ξ
ωε′ (ξ) = , com ξ = x/ε ,
⎩
0 se |ξ| " 1
e também está bem definida em toda parte: limx→1+ ωε′ (ξ) = 0 = limx→1− ωε′ (ξ).
498
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
com a função ϱ sendo o resto da aproximação por polinômios de Taylor de grau ω de ϕ centrada
em x = 0. Na equação acima subtraímos, na primeira integral, um número suficiente de termos
de uma série de Taylor (modificada pela introdução da função ϑε (x)), de grau determinado pela
ordem singular de t. Seguindo o mesmo raciocínio usado na prova do Teorema 6.3, é imediato
mostrar que T (ϑε ϱ) → 0. Com efeito, escreva para cada ε > 0, ψε (x) = ϑε (x)ϱ(x), em que
supp ψε (x) ⊂ {x | |x| # 1/ε}. Então,
5 5
|T (ψε )| # C sup 5xα D β ψε (x)5 → 0 quando ε → ∞ .
|x|# ε1
Por outro lado, para cada ε, T ϑε = T , pelo Lema 6.2, uma vez que ϑε (x) = 1 na vizinhança
de x = 0. Portanto,
T (ψε ) = T (ϑε ϱ) = T ϑε (ϱ) = T (ϱ) ,
que é independente de ε. Como, T (ψε ) = 0 =⇒ T (ϱ) = 0.
499
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
A integral (6.14.11) converge para todo ϕ ∈ S (Rn ) e define um funcional linear contínuo.
Isso pode ser justificado da seguinte forma: observe que os termos individuais da integral são
divergentes se x = 0; formalmente esses infinitos se cancelam ao extraírmos a “parte principal”
da diferença entre as integrais divergentes. Se o suporte de ϕ não inclue odponto x = 0, então
ϕ(0) = ϕ′ (0) = · · · = ϕ(n) (0) = 0, de forma que (6.14.11) concorda com dx t(x)ϕ(x) para
toda função ϕ ∈ S (Rn \ {0}). Note que essa é uma forma muito natural de “renormalizar”
uma integral divergente.
Exemplo 6.32 (Exemplo 6.29 mais uma vez). Se f (x) = 1/x; então, de acordo com a
proposição acima, segue que
$
1. /
dx ϕ(x) − ϑε (x)ϕ(0) ,
x
com a função ϑε representada na Figura 6.15, em que tomamos ε = 1.
ϑ(x)
−1 0 1 x
<
= T1 (ϕ) + (−1)|α| cα δ(D α ϕ)
|α|#ω
= T1 (ϕ) ,
para todo ϕ ∈ S (Rn \ {0}), dado que supp δ ∩ supp D α ϕ = ∅. Isto prova a proposição.
500
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Nota 6.30. Observamos que as constantes cα satisfazendo (6.14.12) são únicas. Com efeito, se
<
T2 = T1 + c′α D α δ , ω∈N,
|α|#ω
<
(cα − c′α )D α δ = 0 .
|α|#ω
< $
|α|
= (−1) (cα − c′α ) dx δ(x)D α xβ .
|α|#ω
⎧
β!
⎨ (β−α)! xβ−α se α # β ,
D α xβ =
⎩ 0 caso contrário .
Logo, temos
< $ < $
|α| β!
(−1) (cα − c′α ) α β
dx δ(x)D x = (−1) |α|
(cα − c′α ) dx δ(x)xβ−α ,
(β − α)!
|α|#ω |α|#ω
não será identicamente zero se, e somente se, β = α. Portanto, segue que
⎛ ⎞
<
⎝ (cα − c′α )D α δ ⎠ (ϕ) = (−1)|β| β!(cβ − c′β ) = 0 .
|α|#ω
Repare que, pela Proposição 6.17, a não-unicidade tem origem no fato de podermos escolher
duas funções ϑε1 , ϑε2 ∈ D(Rn ) como no Teorema 6.33, construidas, por exemplo, a partir das
duas funções ωε1 , ωε2 ∈ D(Rn ) mostradas na Figura 6.16.
501
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
ωε1 (x)
ωε2 (x)
−ε2 −ε1 0 ε1 ε2 x
Figura 6.16: Duas possíveis funções ωε1 , ωε2 ∈ D(Rn ) a partir das quais podemos construir
duas funções ϑε1 , ϑε2 ∈ D(Rn ) como no Teorema 6.33.
< (−1)|α| ,$ . / α
- ,$ -
α
= dx t(x) ϑε2 (x) − ϑε1 (x) x dy D δ(y)ϕ(y)
α!
|α|#ω
⎛ ⎞
<
=⎝ cα D α δ ⎠ (ϕ) ,
|α|#ω
em que $
(−1)|α| . /
cα = dx t(x) ϑε2 (x) − ϑε1 (x) xα .
α!
Exemplo 6.33 (Exemplos 6.29 e 6.30 revisitados). A Proposição 6.17 justifica o resultado já
encontrado anteriormente, isto é, a renormalização de 1/x não é única. A diferença entre
quaisquer duas renormalizações de 1/x é simplesmente cδ(x), em que c = ±iπ ou c = ±2iπ.
502
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Portanto, a extensão T ∈ S ′ (Rn ) de t ∈ S ′ (Rn \ {0}) será homogênea de grau s se, e somente
se, $
dω t(ω)ϑε (ω)ω α = 0 .
∥ω∥=1
Nota 6.31. Em geral, na teoria quântica dos campos, um comportamento homogêneo não
pode ser mantido na renormalização. O fato da homogeneidade nem sempre ser mantida no
processo da extensão, devido aos termos contendo o ln λ, é a origem matemática da violação
da invariância de escala na teoria quântica dos campos. Isto é conhecido como “anomalia de
escala” (também chamada de “anomalia de dilatação”) na renormalização perturbativa.
O método de extensão de distribuições que discutimos nesta seção, com o objetivo de definir
integrais de funções com singularidades algébricas não-integráveis, desempenha um papel im-
portante no cálculo de distribuições. O método também é aplicado (com sucesso) no problema
da extensão de distribuições de Feynman na teoria quântica dos campos. É precisamente esta
ideia que está por trás da abordagem da renormalização de toda a combinatória e integra-
bilidade de gráficos de Feynman que encontramos nos livros-texto sobre teoria quântica dos
campos. De fato, o cálculo de múltiplos loops pode ser considerado como um problema de
estender as distribuições de Feynman (recursivamente) para a diagonal. Este procedimento está
associado aos nomes de Epstein e Glaser.56
Nota 6.32. Observe que o Teorema 6.34 considera a extensão de S ′ (Rn \ {0}) para S ′ (Rn ),
portanto, podemos usar a transformada de Fourier. Neste caso, obtemos
< pα
T^(p) = ^
t(p) − D α^
t(0) .
α!
|α|#[ℓ]
Vamos encerrar este capítulo discutindo uma importante aplicação do processo de renorma-
lização discutico acima no cálculo da energia potencial eletrostática.58 Para iniciar, lembramos
brevemente alguns resultados conhecidos.
A primeira das equações acima, derivada diretamente do teorema da divergência, diz que o
fluxo do campo elétrico através de uma superfície fechada, S, é proporcional à densidade de
56
H. Epstein e V. Glaser, “The Role of Locality in Perturbation Theory,” Ann. Inst. Henri Poincaré 19A (1973) 211.
57
Veja uma breve discussão do método BPHZ no livro de O. Piguet e S.P. Sorella, “Algebraic Renormalization:
Perturbative Renormalization, Symmetries and Anomalies,” Springer, Lect. Notes Phys. M28, 1995.
58
Este exemplo foi discutido por D. Prange, “Epstein-Glaser Renormalization and Differential Renormalization,”
J.Phys. A32 (1999) 2225. Veja também, J.M. Gracia-Bondía and S. Lazzarini, “Connes-Kreimer-Epstein-Glaser Renor-
malization,” hep-th/0006106.
503
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
E = −∇Φ . (6.14.14)
∇2 Φ = −4πρ , (6.14.15)
em que
∂2 ∂2 ∂2
∇2 = + + ,
∂x2 ∂y 2 ∂z 2
é o operador diferencial de Laplace. A equação (6.14.15) é exatamente a equação de Poisson da
eletrostática. Nas regiões do espaço em que não há densidade de cargas, o potencial escalar
satisfaz a equação de Laplace
∇2 Φ = 0 . (6.14.16)
Isto nos permite identificar o potencial escalar Φ
Q
Φ= . (6.14.17)
r
;
em que r = (x2 + y 2 + z 2 )1/2 e Q = i qi , é um conjunto discreto de cargas puntiformes.
Com efeito,59 , -
Q Q
E = −∇ = 3r. (6.14.18)
r r
Embora o valor do campo E em um ponto não seja um observável bem definido, o campo
suavizado com uma função teste é bem definido. Na verdade, pode-se mostrar (veja a prova
do Teorema 6.35) que E ∈ S ′ (R3 ), portanto o espaço de funções teste sobre o qual ele deve
atuar é composto por funções ϕ ∈ S (R3 ).
Agora, suponha que queiramos determinar a energia total armazenada no campo elétrico E.
Na eletrostática clássica, considerando o campo como uma distribuição, essa energia é dada
pela integral $
1
U(ϕ) = d3 r |E(r)|2 ϕ(r) , (6.14.19)
8π
em que
Q2
|E|2 = 4 ,
r
representa a densidade total de energia.
59
Lembre-se que o operador ∇ em coordenadas esféricas é dado por
∂ 1 ∂ 1 ∂
∇= er + eθ + e ,
∂r r ∂θ r sinθ ∂ϕ ϕ
504
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Sendo E ∈ S ′ (R3 ), o produto |E|2 não é bem definido, a priori, devido à singularidade
não-integrável em r = 0. Fisicamente, isso é interpretado como sendo um efeito da “auto-
energia” do campo elétrico. |E|2 só faz sentido como um elemento de S ′ (R3 \ {0}), isto
é, omitindo a contribuição da “auto-energia.” Insistindo na computação da energia potencial
eletrostática em todo R3 , devemos, então, estender o domínio de definição de |E|2 de S ′ (R3 \
{0}) → S ′ (R3 ) via o processo de renormalização (extensão). Para isto, precisamos primeiro
determinar a ordem singular de |E|2 em r = 0 multiplicando |E|2 por r m . Nesse8 caso,2 9o grau
m 2 m−4+3 m
de homogeneidade de r |E| é igual a m − 4. Isso implica que para λ r |E| → 0,
2
quando λ → 0, devemos ter [m] = 1. Portanto, a ordem singular de |E| , em r = 0, é 1. Logo,
a expressão da energia potencial eletrostática renormalizada é dada por:
$ =
1 . />
URen (ϕ) = d3 r |E(r)|2 ϕ(r) − ϑ(r) ϕ(0) + xi ∂xi ϕ(0) , (6.14.20)
8π
= . />
em que ϕ(r) − ϑ(r) ϕ(0) + xi ∂xi ϕ(0) ∈ S (R3 ).
505
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
segue que o vetor ω = (ω1 , . . . , ωn ) tem norma ∥ω∥ = 1. Esse vetor representa o sistema
de coordenadas dos pontos sobre a esfera unitária em n dimensões. Logo, compactamente,
podemos escrever
x = rω , r ∈ [0, ∞) , ω ∈ S n−1 ,
em que S n−1 denota a esfera de raio um centrada na origem de Rn , lembrando que dx =
r n−1 drdω. Portanto,
dω = J(θ1 , . . . , θn−1 )dθ1 , . . . , dθn−1 ,
com J(θ1 , . . . , θn−1 ) = sinn−2 θn−1 sinn−3 θn−2 · · · sin θ2 . Denote por ωn−1 a área da esfera
unitária S n−1 em Rn . Logo,
$ 2π $ π $ π
ωn−1 = ··· dθ1 , . . . , dθn−1 J(θ1 , . . . , θn−1 ) .
0 0 0
506
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Para calcular ωn−1 , podemos usar a forma explícita de J. No entanto, um método mais fácil
e elegante segue, imediatamente, da primeira parte do Lema 6.6. Com efeito, para α = 1,
obtemos
$ $ $ ∞
n 2 +···+x2 ) 2
−(x
π2 = dx e 1 n
= dω dr r n−1 e−r
Rn S n−1 0
$ ∞
2
= ωn−1 dr r n−1e−r
0
$ ∞
1 n
= ωn−1 dt t 2 −1 e−t
2 0
1 6n7
= ωn−1 Γ .
2 2
Logo,
n
2π 2
ωn−1 = .n/ .
Γ 2
Isto finaliza a prova.
em que Γ(n + 1) = nΓ(n), lembrando que Γ(n) = (n − 1)!. Isto implica que
⎧
⎪ 1 n
⎪
⎪ . / 2π 2 se n é par
⎨ n −1 !
2
ωn−1 = . 1 / .
⎪
⎪ (n − 1) ! n 1 (n−1)
⎪
⎩ 2
2 π2 se n é ímpar
(n − 1)!
Nota 6.33. Para derivar o volume, Vn (R), de uma bola n de raio R a partir do cálculo da área
da esfera unitária, basta integrar a área da superfície de uma esfera de raio r, com 0 # r # R,
e aplicar a equação funcional Γ(a + 1) = aΓ(a):
$ R n n n
n−1 2π 2π 2 π2
2
n
Vn (R) = dr r .n/ = .n/R = .n / Rn , (6A.2)
0 Γ 2
nΓ 2
Γ 2
+ 1
em que
⎧ n
⎪
⎪ π2
π2
n ⎨ . n /!
⎪ se n é par
.n /= 2 ,
Γ 2 +1 ⎪
⎪ ⌊n ⌋ ⌈n ⌉
⎩π 2
⎪ 2 2
se n é ímpar
n!!
com n!! sendo o fatorial duplo. Na fómula acima os símbolos ⌊ · ⌋ e ⌈ · ⌉ denotam as funções
floor e ceiling, respectivamente. A função floor é a função que assume como entrada um
507
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
número real x e fornece como saída o maior número inteiro menor ou igual a x. Da mesma
forma, a função ceiling é a função que assume como entrada um número real x e fornece como
saída o menor número inteiro maior ou igual a x.
Por sua vez, se ωn−1 (R) é a área da superfície da n-esfera de raio R, então
n
d 2π 2
Vn (R) = ωn−1 (R) = . n / Rn−1 . (6A.3)
dR Γ 2
508
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Se f (x) é uma dada distribuição, e podemos achar uma solução fundamental u(x) =
(E ∗ f )(x), então
P (D)u(x) = P (D)(E ∗ f )(x) = (P (D)E ∗ f )(x) = (δ ∗ f )(x) = f (x) . (6B.2)
Isto acontece porque δ faz o papel da identidade do produto de convolução.
def.
Para uma ilustração, suponha que P (D) = ∇2 em Rn , seja o operador laplaciano, isto é,
∂2 ∂2
∇2 = + · · · + . (6B.4)
∂x21 ∂x2n
A equação de Poisson
∇2 u(x) = f (x) , (6B.5)
está associada aos fenômenos estacionários (aqueles independentes do tempo) como, por exem-
plo, os potênciais eletrostáticos gerados por distribuições fixas de cargas.
60
Veja J.D. Jackson, “Eletrodinâmica Clássica,” Editora Guanabara Dois, 1983.
509
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
TEOREMA 6.35. Seja u(x) = 1/∥x∥ ∈ R3 , em que ∥x∥ = (x2 + y 2 + z 2 )1/2 . Então
(i) ∇2 u(x) = 0 se x ̸= 0,
LEMA 6.18 (As identidades de Green). Seja Ω ⊂ R3 uma região limitada e φ, ψ funções de
classe C 2 . Então,
Esse teorema converte uma integral no volume Ω, em uma integral sobre a superfície que encerra
Ω. n é a normal exterior a ∂Ω em um certo ponto. Para provar a parte (a) do lema, substitua
f = φ∇ψ no teorema da divergência. Note então que ∇ · (φ∇ψ) = φ∇2 ψ + ∇φ · ∇ψ. Para
provar (b), troque ψ por φ na primeira identidade de Green e subtraia a identidade resultante
de (a), os termos ∇φ · ∇ψ se cancelam e se tem a segunda identidade de Green.
Demosntração do Teorema 6.35. Para provar (i), é conveniente trabalhar com coordenadas es-
féricas. Neste caso, obtemos que ∇2 (1/r) = 0 para r ̸= 0. Então, uma aplicação direta do
correspondente laplaciano em coordenadas esféricas resulta
, -
21 1 ∂ 2 ∂ 1
∇ = 2 r =0.
r r ∂r ∂r r
510
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
# 4π C∥ϕ∥α,0 ,
Para provar (iv), observe que graças à operação (6.3.1) podemos escrever
$
2 2
∇ u(ϕ) = u(∇ ϕ) = dx u(x)∇2 ϕ(x) .
R3
$ , -c
1 ∂ ∂ 1
+ dσ ϕ(x) − ϕ(x) ,
∂Ω ∥x∥ ∂n ∂n ∥x∥
61
Na prova acima, novamente usamos o fato que ∥x∥ # |x|, segundo nossas notações definidas no início deste
capítulo.
511
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Uma vez que 1/∥x∥ satisfaz a equação de Laplace ∇2 (1/∥x∥) = 0 em todos os pontos
excluindo a origem, temos $
1
dx ϕ(x)∇2 =0.
ε#|x|#R ∥x∥
∂ ∂
Observando que em coordenadas esféricas podemos escrever ∂n = ∂r , então a integral que
resta ser avaliada, aquela sobre ∂Ω, torna-se
$ , -
1 ∂ ∂ 1
lim lim dσ ϕ(x) − ϕ(r) .
R→∞ ε→0 ∂Ω r ∂r ∂r r
Essa integral divide-se na soma de duas outras. A primeira dessas, sobre r = ε, tende a
∂ ∂
−4πϕ(0) nos limites acima. Note que, neste caso ∂n = − ∂r . Por (6.2.5), a derivada da função
teste ϕ é limitada 5 5
5∂ 5
5 ϕ(r)5 # M ,
5 ∂r 5
logo,
5$ 5
5 1 ∂ 5 M
5 dσ ϕ(r)55 # 4πε2 = 4πεM → 0 quando R → ∞, ε → 0 ,
5 r ∂r ε
r=ε
512
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
f (z) − f (z0 )
f ′ (z0 ) = lim ,
z→z0 z − z0
existir. Este limite se toma aqui sobre todas as sequências de números complexos que se
aproximam de z0 , e para todas essa sequências o quociente de diferenciais tem que resultar no
mesmo número f ′ (z0 ). Intuitivamente, se f é diferenciável complexa em z0 e nas proximidades
ao ponto z0 da direção r, então as imagens se aproximarão ao ponto f (z0 ) a partir da
direção f ′ (z0 )r, com o último produto sendo a multiplicação de números complexos. Este
conceito de diferenciabilidade no caso complexo compartilha várias propriedades da noção de
diferenciabilidade no caso real: é linear e obedece a regra do produto, a regra do quociente e a
regra da cadeia.
Nota 6.35. Uma função que seja analítica sobre todo o espaço complexo Cn é chamada função
inteira de n variáveis complexas.
Considere uma função de uma variável complexa z = x + iy, mais especificamente, f (z) =
2
z . Podemos escrever
Aqui, deve ser entendido que u e v são funções reais das variáveis reais x e y.
62
A palavra “holomorfa” foi introduzida por dois estudantes de Cauchy, Briot (1817-1882) e Bouquet (1819-1895), e
deriva do grego (holos) que significa “inteiro,” e (morphe) que significa “forma” ou “aparência.”
513
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
1 6 ∂u ∂u 7 i 6 ∂v ∂v 7
= −i + −i ,
2 ∂xj ∂yj 2 ∂xj ∂yj
ou seja,
∂ def. 1 6 ∂ ∂ 7
= −i .
∂zj 2 ∂xj ∂yj
514
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
TEOREMA 6.36 (Teorema Looman-Menchoff). Uma função contínua a valores complexos de-
finida em um conjunto aberto do plano complexo é analítica se, e somente se, ela satisfaz as
equações de Cauchy-Riemann.
A existência de uma derivada no sentido complexo é uma condição muito forte, pois implica
que qualquer função analítica é realmente infinitamente diferenciável e igual á sua própria série
de Taylor. Isto nos leva à uma outra definição de uma função analítica.
em que
1 ∂ |α| f ((z0 )1 , . . . , (z0 )n )
aα1 ,...,αn = .
α1 ! · · · αn ! ∂z1α1 · · · ∂znαn
515
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
No cálculo de certas integrais, através do Teorema dos Resíduos, muitas vezes vamos encon-
trar integrais do tipo $ ∞
dz eikz f (z) .
−∞
516
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Antes de apresentarmos a prova do Lema de Jordan, vamos precisar do seguinte lema auxiliar:
Como, pelo Lema 6.20, sin θ " 2θ/π no intervalo 0 # θ # π/2, então:
$ π
πM(R)
|IR | # 2RM(R) dθ e−2kRθ/π = (1 − e−kR ) −R→∞
−−→ 0 .
0 k
A integral do lado direito da equação acima pode ser tratada como parte da integral complexa
`
eikz
lim dz ,
ε→0
C
z − iε
que tem pólo simples no ponto z = iε. Aqui, usamos, como tradicionalmente é feito em Física,
o expediente de deslocar para cima o pólo original em z = 0, por meio de uma quantidade
infinitesimal ε. Isto corresponde ao contorno C1 , com o contorno sendo fechado por meio
517
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Logo, temos que o lado esquerdo dá como resultado 2πi limε→0 eikε = 2πi. Levando em conta
que a integral sobre CR tende a zero, pelo Lema de Jordan, obtemos:
$ ∞
^ eikx
f (k) = lim dx = 2πiθ(k) .
ε→0 −∞ x − iε
Note que θ(k) garante que k > 0, já que CR corresponde ao semi-círculo de raio R contido
no semi-plano superior do plano complexo.
518
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
; α
Se p(x, D) = |α|#m aα (x)Dx é um operador diferencial com coeficientes dependendo de
x ∈ Rn , então
$
1
p(x, D)u(x) = n
p(x, D) dk eikx u ^(k)
(2π)
$
1
= n
dk p(x, k)eikx u
^(k) , (6E.1)
(2π)
;
em que u(x) ∈ S (Rn ), u
^(k) é transformada de Fourier, p(x, k) = |α|#m aα (x)k α .
Vamos usar a representação da integral de Fourier (6E.1) para definir operadores pseudo-di-
ferenciais, tomando a função p(x, k) como pertencendo à uma classe geral de símbolos, que
agora definimos.
DEFINIÇÃO 6.40. Dado um conjunto aberto X ⊂ Rn , define-se o espaço de símbolos Sρ,δ
m
(X ×
s s
R ), sobre X × R de ordem m e tipo (ρ, δ), em que m ∈ R, 0 < ρ # 1 e 0 # δ < 1,
como sendo o espaço composto por funções suaves a(x, k) (funções C ∞ sobre X × Rs ), tal que
para qualquer conjunto compacto Ω ⊂ X, sobre o qual as funções a(x, k) tomam valores, e
multi-índices α ∈ Nn , β ∈ Ns , existe uma constante Cα,β,Ω com
5 5
5 α β 5
5Dx Dk a(x, k)5 # Cα,β,Ω (1 + |k|)m−ρ|β|+δ|α| ∀ x ∈ Ω; k ∈ Rs . (6E.2)
Em aplicações de interesse nesta seção, precisaremos tratar somente com símbolos (e ope-
radores pseudo-diferenciais) do tipo (1,0). Um polinômio com respeito a k de grau m, com
m
coeficientes constantes, é com certeza um símbolo S1,0 .
519
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
m
DEFINIÇÃO 6.41. Dado um símbolo a em Sρ,δ (X × X × Rs ), com a variável k ∈ Rs sendo
considerada o dual das variáveis xi ∈ X, o operador pseudo-diferencial é um operador integral
de Fourier
$
1
Au(x) = dkdn y eik(x−y) a(x, y, k)u(y) ∀ u ∈ S (X) . (6E.4)
(2π)n
Representamos por Lm m
ρ,δ (X) o espaço desses operadores e dizemos que A ∈ Lρ,δ (X) é de ordem
# m e do tipo (ρ, δ).
∂ 2 ∂ 2
Exemplo 6.34. O inverso de (1 − ∇2 ) : S (Rn ) → S (Rn ), em que ∇2 = ∂x 2 + · · · + ∂x2 é
1 n
o operador laplaciano, é dado por
$
2 −1 1 1
Au(x) = (1 − ∇ ) u(x) = n
dk eikx ^(k) ,
u (6E.5)
(2π) (1 + k 2 )
;
com k 2 = ni=1 ki2 . Portanto, A ∈ L−2 n
1,0 (R ).
2. Im ϕ(x, k) " 0,
; ;
3. dϕ = ni=1 ∂x∂ϕ
i
dxi + si=j ∂ϕ
∂kj
dkj ̸= 0, isto é, ϕ não tem pontos críticos em Γ. Isto
∂ϕ ∂ϕ
significa que em cada ponto em Γ, alguma das derivadas ∂xi
ou ∂kj
nunca se anulam.
520
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Para provar que a integral acima representa o kernel de A, inserimos χ(εk) na integral (6E.6),
tal que χ ∈ C0∞ é igual a 1 na vizinhança de zero. Assim a integral oscilatória é o limite da
integral
$ $
1 ε−n x−y
n
dkd y eik(x−y)
χ(εk)a(x, k)u(y) = dkdn y eik( ε ) χ(k)a(x, εk)u(y)
(2π)n (2π)n
$ , -
ε−n x−y
= ^
dy χ a(x, εk)u(y) (6E.9)
(2π)n ε
$
1
= ^(y)a(x, εk)u(yε + x) .
dy χ
(2π)n
Assim,
$ $
1 1
dy χ ε→0
^(y)a(x, εk)u(yε + x) −−−−→ a(x)u(x) ^(y) = a(x)u(x) .
dy χ (6E.10)
(2π)n (2π)n
B CD E
χ(0)
que define a distribuição δ de Dirac. Pode-se provar que a distribuição δ é dada pela a integral
acima, considerando o limite da integral dubla
$ $
1 −ikx 1 kx
n
dkdx χ(εk)u(x)e = n n
dkdx χ(k)u(x)e−i ε
(2π) ε (2π)
$
1
= n dx χ ^(x/ε)u(x)
ε (2π)n
$
1
= dx χ^(x)u(εx)
(2π)n
$
1
ε→0
−−−→ u(0) (2π)n dx χ ^(x) = u(0) ,
521
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Demonstração. A prova pode ser alcançada fazendo-se integrações por partes repetidas, usando
o operador L = iλ|ϕ1 ′ |2 ϕ′xi Dxi . Com efeito,
$
I(λ) = dx eiλϕ(x) u(x)
$
(−i)|α| ′ α . iλϕ(x) /
= dx ϕ D e u(x)
λ|α| |ϕ′ |2|α| xi xi
$
i|α| . /
= dx |α| ′ 2|α|
eiλϕ(x) Dxαi ϕ′xi u(x) .
λ |ϕ |
Logo, para todo compacto Ω ⊂ X e N ∈ N, existe uma constante Cα = CΩ,ϕ,N tal que
⎛ ⎞
1 <
|I(λ)| # N ⎝ Cα ∥u∥α⎠ , λ > 0, supp u ⊂ Ω ,
λ
|α|#N
O método da fase estacionária aplica-se quando dϕ(x) tem pontos críticos. Nesse caso
assume-se a hipótese que os pontos críticos 6
de ϕ são7 não-degenerados. Isto significa que, se
∂2ϕ
dϕ(x0 ) = 0, a matriz Hessiana de ϕ em x0 , ∂xj ∂xk , é necessariamente não-singular.
1#j,k#n
Portanto, se ϕ ∈ C ∞ (X) tal que Im ϕ " 0 e u ∈ C0∞ (X), o comportamento assintótico de
I(λ) → ∞ é determinado por ϕ e u na vizinhança do conjunto de pontos críticos de ϕ, isto
é, quando dϕ = 0. Assim, as contribuições essênciais devem sempre vir de pontos onde a fase
ϕ é real e estacionária.
522
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Prova do Teorema 6.38. Primeiro assumimos que (x, k) ∈ X × (Rs \ {0}) \ Λϕ . Considere
u ∈ C0∞ (Ω), em que Ω ⊂ X representa um conjunto compacto, com u(x) ̸= 0 para todo
x ∈ Ω. Então, a integral
$
'
Iϕ (au)(p) = dkdx eiϕ(x,k,p)
!
N k, p) = ϕ(x, k) − xp ,
a(x, k)u(x) , ϕ(x,
Usando a homogeneidade da função fase, então ϕ(x, N λk, λp) = λϕ(x, N k, p) se (x, k, p)
s
pertence a um cone aberto Γ em X × (R \ {0}) para todo λ > 0. Pelo Lema 5 (pg.105) em
Reed-Simon, Volume II, existe um operador diferencial, L, tal que t L eiλϕ! = eiλϕ!, (em que t L é
seu adjunto) cujo os coeficientes são homogêneos de grau −1 em k, p. Este operador é dado
por
, - , -2
1 ∂ϕ(x, k) ∂ϕ(x, k)
L= − p i Dx i , Φ(x, k, p) = − pi .
iλΦ(x, k, p) ∂xi ∂xi
Consequentemente,
$
I'
ϕ (au)(λp) =λ
−n
dkdx (t L)α eiλϕ!a(x, λk)u(x)
$
−n
=λ dkdx eiλϕ! Lα (a(x, λk)u(x)) .
decai rapidamente por (6E.2) se m − (1 − δ)|α| − n < 0. Pela hipótese, como δ < 1, e visto
que |α| pode assumir valores arbitrariamente grandes, então Iϕ (au) decai rapidamente quando
λ → ∞ em um cone aberto em X × (Rs \ {0}). Se m é arbitrariamente negativo, Iϕ (au)
decai rapidamente mesmo que |α| seja igual a zero. Deduzimos que (x, k) ∈ / W F (Iϕ (a)). Isto
completa a prova.
523
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Uma solução fraca (também chamada de solução generalizada) para uma equação diferencial
ordinária ou parcial é uma função para a qual nem todas as derivadas existem, mas que, no
entanto, é considerada como satisfazendo a equação em algum sentido precisamente definido.
Existem muitas definições diferentes de solução fraca, apropriadas para diferentes classes de
equações. Um dos mais importantes baseia-se na noção de distribuições. Lembre-se de que
as distribuições são infinitamente diferenciáveis. Essa propriedade é amplamente usada para
resolver equações diferenciais, que modelam vários tipos de fenômenos. Para entender a ideia
básica de resolver equações diferenciais usando distribuições, considere a equação diferencial
linear representada por
Esta é a nossa equação chave. Suponha que não exista solução para a equação original
L f (t) = 0, mas existe um f apropriado que satisfaça a relação
6 7 $ d2 ϕ(t)
Tf L ϕ = dt f (t) =0.
dt2
Nesse caso, dizemos que f é uma solução fraca (em alguns textos, esta solução é também
chamada solução distribucional) da equação diferencial L f (t) = 0.65 Esse conceito de
solução fraca permite incluir funções descontínuas como soluções para equações diferenciais.
Um exemplo simples disso é dado pelo seguinte
Exemplo 6.36. Considere a equação diferencial parcial no espaço euclidiano R2
∂ 2 f (t, x) ∂ 2 f (t, x)
− =0, (6F.1)
∂t2 ∂x2
65
Mesmo em situações em que uma equação possui soluções diferenciáveis, muitas vezes é conveniente primeiro
provar a existência de soluções fracas e somente mais tarde mostrar que essas soluçẽs são, na verdade, suaves o
suficiente.
524
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
Aqui, g e h são funções suaves e contínuas. A Eq.(6F.1) sujeita às condições iniciais (6F.2) é
conhecida por ter uma solução suave e contínua descrita por
$
g(x + t) + g(x − t) 1 x+t
f (t, x) = + dy h(y) ,
2 2 x−t
conhecida como solução de D’Alembert. Em geral, as soluções clássicas da Eq.(6F.1) são todas
as funções da forma
f (x, y) = g(x + y) + h(x − y) ,
com g e h duas vezes continuamente diferenciáveis, e elas têm como limites uniformes todas
as funções da forma acima com g e h contínuas. Todas essas funções devem, portanto, ser
reconhecidas como soluções de (6F.1), de modo que a definição de uma solução clássica é muito
restritiva.
525
Teoria de Distribuições e Análise de Fourier
A ideia geral que se segue do exemplo acima é que, ao resolver uma equação diferencial em
f , pode-se reescrevê-la usando a assim chamada função de teste ϕ, de modo que quaisquer
derivadas em f que apareçam na equação são “transferidas” via integração por partes para
ϕ. Desta forma, obtém-se soluções para a equação original que não são necessariamente
diferenciáveis. Esta abordagem funciona para equações mais gerais do que a equação de onda.
De fato, considere um operador diferencial linear em um conjunto aberto Ω ⊆ Rn
<
P (x, ∂)f (x) = aα1 ,α2 ,...,αn (x) ∂ α1 ∂ α2 · · · ∂ αn f (x) ,
A equação diferencial P (x, ∂)f (x) = 0 pode, após ser multiplicada por uma função teste
suave ϕ com suporte compacto em Ω e integrada por partes, ser escrita como
$
dx f (x)Q(x, ∂)ϕ(x) = 0 , (6F.6)
Ω
Lembre-se que o número (−1)|α| = (−1)α1 +α2 +···+αn aparece porque é necessário integrar
α1 + α2 + · · · + αn por partes para transferir todas as derivadas parciais de f para ϕ em cada
termo da equação diferencial, e cada integração por partes implica uma multiplicação por −1.
Em resumo, se o problema original (forte) fosse encontrar uma função |α|-vezes diferenciável
f definida no conjunto aberto Ω tal que
(a chamada solução forte), então uma função integrável f seria uma solução fraca se a Eq.(6F.6)
for satisfeita para toda função suave ϕ com suporte compacto em Ω.
Nota 6.36. A noção de solução fraca baseada na teoria de distribuições é às vezes inadequada.
Por exemplo, no caso de sistemas hiperbólicos, a noção de solução fraca baseada em distribui-
ções não garante a unicidade, e é necessário complementá-la com outras condições chamadas
condições de entropia. No caso de equações diferenciais parciais não-lineares, como a equação
de Hamilton-Jacobi, há uma definição muito diferente de solução fraca chamada solução de vis-
cosidade. Todos os detalhes podem ser encontrados no livro do L. C. Evans, “Partial Differential
Equations,” American Mathematical Society, Providence, 1998.
526
Quarta Parte:
Elementos de Teoria Quântica
não-Relativística
527
Capítulo 7
Aspectos Matemáticos da Mecânica
Quântica
S. Hawking
A mecânica quântica representa uma das mais profundas revoluções ocorridas na física do
século XX. Neste capítulo, apresentamos alguns resultados importantes da análise funcional,
enfatizando a profunda relação desses resultados com a mecânica quântica (não-relativística).
Qualquer sistema físico é descrito por três ingredientes básicos: estados, observáveis e
dinâmica. Na física newtoniana, o estado de um sistema é caracterizado pela posição e o
momento de todas as partículas; isto corresponde à um único ponto do espaço de fase. Por sua
vez, observáveis são quantidades mensuráveis, como a energia ou momento angular. Finalmente,
529
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
A mecânica quântica é considerada a primeira teoria da física que exigiu estruturas matemá-
ticas bem abstratas, como espaços de Hilbert de dimensão infinita e operadores auto-adjuntos
definidos sobre eles. Na mecânica quântica os possíveis resultados de qualquer experimento
realizado por um observador sobre um sistema físico são expressos em termos de relações ocor-
rendo entre os elementos do espaço de Hilbert. Assim, a teoria final deve ser um modelo cuja
sobrevivência depende absolutamente do seu sucesso na produção de “números” que concordam
com os experimentos. Isto significa que o “caminho” a ser seguido deve estar fundamentado
em postulados fisicamente razoáveis. De acordo com esse padrão, a descrição de um sistema
quântico comporta os seguintes elementos básicos:
I. Noção de Estado: Os estados físicos do sistema são descritos por vetores num espaço
de Hilbert separável H . Na teoria quântica H é um espaço vetorial complexo de dimensão
finita ou infinita (com os vetores sendo denotados Φ, Ψ, . . .), munido com um produto escalar
⟨Φ, Ψ⟩ linear em Ψ e anti-linear em Φ. Além disso, H é completo com respeito à norma
∥Φ∥ = ⟨Φ, Φ⟩1/2 , isto é, toda sequência (Φn )n∈N de vetores em H que é de Cauchy com
respeito à norma converge em H . Vetores Φ e Ψ definem o mesmo estado se, e somente se,
existe α ∈ C, com |α| = 1, tal que Φ = αΨ. Isto justifica a afirmação frequentemente feita
que “um estado de um sistema quântico (em qualquer dado instante) é um raio no espaço de
Hilbert.”
II. Noção de Observáveis: Para cada observável físico na teoria quântica corresponde no
espaço de Hilbert H um operador auto-adjunto, A, que tem um conjunto completo de auto-
vetores {Ψn } com os correspondentes auto-valores {λn } tal que
AΨn = λn Ψn , n = 1, 2, 3, . . .
Inversamente, a cada operador em H está associado algum observável físico. Os únicos valores
possíveis de um observável físico são os seus vários auto-valores.
Em geral, a medição de um observável físico não tem a priori um valor definido. Qualquer
um dos possíveis auto-valores do operador A pode ser obtido, porém com probabilidades
diferentes. Conhecendo-se o estado Ψ e considerando-se a interpretação dada por Born, segue
1
Átomos individuais estão o mais perto da extremidade superior da escala em termos de tamanho.
530
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
que o valor esperado, ⟨A⟩Ψ (resultado da medição de A), é dado pela expressão
$
dV Ψ(t, x)AΨ(t, x)
⟨Ψ, AΨ⟩ R 3
⟨A⟩Ψ = = $ , para todo t ∈ R ,
⟨Ψ, Ψ⟩
dV Ψ(t, x)Ψ(t, x)
R3
ou simplesmente
$
⟨A⟩Ψ = ⟨Ψ, AΨ⟩ = dV Ψ(t, x)AΨ(t, x) , para todo t ∈ R ,
R3
se considerarmos que, por hipótese, os vetores de estado são normalizados, isto é, se ∥Ψ∥ = 1.
Note que, ⟨A⟩Ψ reflete o caráter inerentemente estatístico da teoria quântica. A função Ψ denota
o vetor de estado do sistema no momento da medição. Naturalmente, esta expressão é válida
se Ψ pertence ao domínio de definição Dom(A) ⊆ H do operador A. Como queremos que
A seja definido para pelo menos a maioria dos estados, exigimos que Dom(A) seja denso.
III. Evolução Temporal: Dado um estado inicial Ψ(0) de um sistema quântico, deve existir
um único vetor Ψ(t) representando o estado do sistema no instante t ∈ R. Vamos escrever
Ψ(t) = U (t)Ψ(0) .
Resultados de experimentos físicos mostram que o princípio da superposição de estados conti-
nua válido no nível quântico; isto é,
U (t)(α1 Ψ(0) + α2 Ψ2 (0)) = α1 Ψ(t) + α2 Ψ2 (t) .
Em outras palavras, U (t) deve ser um operador linear. Ainda, como Ψ(t) é um estado
normalizado (ou seja, ∥Ψ(t)∥ = 1), temos
∥Ψ∥ = ∥U (t)Ψ∥ .
Assim, U deve ser um operadore unitário, e como devemos assumir soluções únicas para o
problema de valor inicial, precisamos ter
U (0) = 1I e U (t + s) = U (t)U (s) .
Uma família de operadores unitários U com essas propriedades é chamada de grupo unitário de
um parâmetro (ou uni-paramétrico). Além disso, é natural supor que esse grupo seja fortemente
contínuo. Cada um desses grupos possui um gerador infinitesimal, chamado hamiltoniano, que
corresponde à energia do sistema. Estes conceitos serão discutidos em detalhes na Seção 8.
531
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
Para esta formulação ser verdadeira, temos que assumir que H não depende explicitamente
do tempo. Mais geralmente, para vetores Ψ(0) ∈ Dom(H), a forma diferencial da evolução
temporal é dada pela Equação de Schrödinger:
d
i# (U (t)Ψ(0)) = H(U (t)Ψ(0)) .
dt
1. Quais propriedades dos vértices que permitem isto? O que torna um vértice um vértice?
2. Assumindo que alguma generalização da noção de vértice foi escolhida, para quais
conjuntos E, é E o envelope convexo de seus “vértices”?
A primeira questão pode ser respondida observando-se que um vértice ν do quadrado (ou
de qualquer polígono convexo em R2 , ou ainda de qualquer poliedro convexo em R3 ) não está
entre quaisquer dois pontos do quadrado (ou de qualquer polígono convexo em R2 , ou ainda de
qualquer poliedro convexo em R3 ) no sentido que ν ∈/ (x, y) para quaisquer dois pontos x e y
no quadrado (ou de qualquer polígono convexo em R2 , ou ainda de qualquer poliedro convexo
em R3 ). A resposta para a segunda parte da primeira questão é agora imediata: um vértice é
um ponto extremo do quadrado!
532
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
Exemplo 7.1. Nas figuras abaixo, os pontos extremos do triângulo fechado são seus vértices,
enquanto que os pontos extremos do disco fechado são todos os pontos sobre a fronteira.
E
E
A resposta para segunda questão fica completa através do Teorema de Krein-Milman que
afirma que, se X é um espaço vetorial topológico e se E é um conjunto convexo compacto em
X , então E é envelope convexo fechado do conjunto de seus pontos extremos. Isto é mostrado
em detalhes a partir de agora, de forma construtiva. Partimos com a seguinte
DEFINIÇÃO 7.1. Sejam X um espaço vetorial sobre K e E um subconjunto convexo e não-vazio
de X . Então, a ∈ E é um ponto extremo se E \ {a} é convexo. O conjunto de pontos extremos
de E será denotado por Ext (E).
Demonstração. Considere z = (2α − 1)x + 2(1 − α)y, com x, y ∈ E e α " 1/2. z é uma
combinação convexa de x e y; logo z ∈ E. Observe que
x+z
a= = αx + (1 − α)y .
2
;
Disso pode-se concluir que (a) ⇒ (b) ⇒ (c). Agora, escreva y = ni=2 βi xi ,;com xi ∈ E,
> 0, para i = 2, . . . , n. É fácil provar (veja Teorema 2.3) que ni=2 βi = 1 e
βi = αi /(1 − α) ;
que α + (1 − α) ni=2 βi = 1 (estamos assumindo que α1 = α). Logo,
n
< n
< n
<
a = αx + (1 − α)y = a = αx + (1 − α) βi xi = αx + αi xi = αi xi .
i=2 i=2 i=1
Note
;n que, para a igualdade acima ser verdadeira para xi ∈ E, αi > 0, com i = 1, . . . , n e
i=1 αi = 1, devemos ter a = x1 = · · · = xn . Portanto, temos que (c) ⇒ (d). Que (d) ⇒ (e)
é imediato.
533
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
Exemplo 7.2. Em geral, o conjunto de pontos extremos de um conjunto convexo não precisa
ser fechado e nem mesmo convexo. Por exemplo, em R3 o conjunto E, representado pela figura
abaixo a esquerda, pode ser visto como dois objetos do tipo-cone unidos pelas suas bases, de
modo que uma única linha reta conecte os dois pontos do cone no conjunto convexo resultante.
Os pontos extremos, mostrados a direita da figura, são as duas extremidades junto com todos
menos um ponto do círculo central. Portanto, o conjunto de pontos extremos do conjunto E
não é fechado e nem convexo.
Ext (E)
Exemplo 7.3. Em R2 o conjunto E representado pela figura abaixo tem por conjunto de pontos
extremos o conjunto ao centro da figura, enquanto o conjunto mais à direita da figura representa
a face do conjunto E.
E Ext (E)
Frt (E)
x y x y x y
Como o cerne deste capítulo repousa sobre os aspectos matemáticos da mecânica quântica,
no restante desta seção vamos assumir que X é um espaço de Hilbert H .
534
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
O conjunto de todos os vetores x ∈ H tal que ⟨y, x⟩ " c será chamado um semi-espaço fechado
determinado pelo hiperplano, e assim será o conjunto de todos vetores x tal que ⟨y, x⟩ # c. Da
mesma forma, definimos os semi-espaços abertos, determinados pelas desigualdades ⟨y, x⟩ > c e
⟨y, x⟩ < c, respectivamente.
Demonstração. Assuma que x0 ∈ / E; então, de acordo com Lema 3.3, existe em E um único
elemento y0 que está mais próximo de x0 , tal que a função distância d = d(x0 , E) =
inf y∈E ∥x0 − y∥ = ∥x0 − y0 ∥. Tome z0 = x0 − y0 . Uma vez que x0 ∈ / E, temos que
z0 ̸= 0. Mostraremos que o hiperplano H que passa por y0 , perpendicular a z0 , satisfaz nossos
requisitos. A equação desse hiperplano é ⟨z0 , y0 ⟩ = c. Seja y ̸= y0 qualquer outro vetor de E;
isto significa que ∥x0 − y∥ " d. Para todo t, com 0 # t # 1, segue que
0 # 2⟨z0 , (y − y0 )⟩ + t∥y − y0 ∥2 .
E H
y0
x0
Isso prova que E está contido no semi-espaço fechado definido por ⟨z0 , y⟩ " c, para todo
y ∈ E, provando assim o fato de que o hiperplano H separa E e x0 .
LEMA 7.2. Seja E um subconjunto não-vazio, convexo e compacto de H . Então, existe pelo
menos um ponto extremo em E.
535
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
Mas, por definição, ⟨y0 , x⟩ = c. Isto implica que ⟨y0 , x1 ⟩ = ⟨y0 , x2 ⟩ = c e que x1 , x2 ∈ F (de
acordo com a propriedade adicional (i)). Mas isso contradiz o fato de que E0 é um elemento
mínimo em F . Logo, existe x0 ∈ E tal que E0 = {x0 }. Portanto, pela Proposição 7.1, x0 é um
ponto extremo em E.
TEOREMA 7.1 (Teorema de Krein-Milman). Sejam H um espaço de Hibert e K um subconjunto
compacto e convexo de H . Seja S o conjunto de pontos extremos de K. Então, K é o menor
conjunto convexo fechado contendo todos os elementos de S, isto é, K é a interseção de todos os
conjuntos convexos fechados contendo S.
x0 = βz1 + (1 − β)z2 .
536
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
Portanto,
⟨z0 , x0 ⟩ = β⟨y0, z1 ⟩ + (1 − β)⟨y0, z2 ⟩ .
Mas, ⟨z0 , z1 ⟩ # c, ⟨z0 , z2 ⟩ # c. Como ⟨z0 , x0 ⟩ = c e o produto interno ⟨ · , · ⟩ é linear, segue
que ⟨z0 , z1 ⟩ = ⟨z0 , z2 ⟩ = c. Então, z1 , z2 ∈ K1 . Mas, x0 é um ponto extremo de K1 . Logo,
z1 = z2 = x0 . Portanto, x0 é um ponto extremo de K.
em que Ψ1 e Ψ2 são dois estados diferentes. O estado Ψ assim representado com a ajuda
de dois outros estados é dito ser um estado misturado. Os estados Ψ1 e Ψ2 podem ser
concretamente dados especificando-se o procedimento de preparação de cada estado. Vamos
primeiro escolher 1 ou 2 com probabilidade λ e (1−λ), respectivamente, usando-se para isto um
método aleatório de seleção (como jogar dados). Então, de acordo com o resultado, preparamos
Ψ1 ou Ψ2 . Ao se preparar um estado desta forma seremos capazes de produzir exatamente a
mistura dada acima. Neste sentido, assumimos que o conjunto Σ de todos os estados é fechado
sob a operação de tomar uma mistura. Assim, assumimos que para qualquer dois elementos
Ψ1 , Ψ2 ∈ Σ e qualquer número real λ, com 0 # λ # 1, um estado Ψ representando a mistura
de Ψ1 e Ψ2 também está no conjunto Σ. Portanto, o conjunto Σ forma um conjunto convexo.
Note que a forma geral acima de uma mistura pode ser reproduzida pelo uso repetido da
mistura de dois estados. Com efeito, pelo Teorema 2.3,
n−1
<
Ψ = λ1 Ψ1 + · · · + λn Ψn = (1 − λn ) γ i Ψ i + λn Ψ n ,
i=1
;n−1
em que γi = λi /(1 − λn ), i < n. Então, i=1 γi = 1. Logo,
Ψ = (1 − λn )Φ + λn Ψn ,
;n−1
em que Φ = i=1 γi Ψi . Naturalmente, segue que o estado Ψ ∈ Σ.
Queremos agora definir um estado puro. Primeiro note que, para qualquer estado Ψ, a
combinação linear convexa Ψ = λΨ1 + (1 − λ)Ψ2 , com 0 # λ # 1, acontece trivialmente em
três casos:
537
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
Para estes três casos, dizemos que a mistura é uma mistura trivial. Se um estado Ψ não
pode ser escrito como uma mistura Ψ = λΨ1 + (1 − λ)Ψ2 , em que 0 # λ # 1, exceto por
uma mistura trivial, então dizemos que o estado Ψ é um estado puro. Em outras palavras, se
Ψ não é uma mistura dos estados Ψ1 e Ψ2 , ambos diferentes de Ψ, então Ψ é um estado puro.
Desta forma somos levados à seguinte
DEFINIÇÃO 7.4. Um estado Ψ é puro se ele não pode ser escrito como uma combinação linear
convexa de dois outros estados.
De acordo com isso, segue, da Proposição 7.1 e do Teorema de Krein-Milman, que estados
puros pertencem ao conjunto de pontos extremos do conjunto de estados Σ.
Nota 7.1. Como os estados físicos de um sistema quântico são descritos por vetores de norma 1
num espaço de Hilbert separável
! H , o conjunto de" todos esses vetores pode ser representado
por uma bola unitária B = Ψ ∈ H | ∥Ψ∥ # 1 e os pontos sobre a superfície de B são
exatamente os pontos extremos de B. Assim, estados puros da Mecânica Quântica têm uma
representação geométrica: são aqueles que estão sobre a superfície de B. Por exemplo, para
um espaço de Hilbert em duas dimensões isto é muito bem ilustrado pela esfera de Bloch. Na
mecânica quântica, a esfera Bloch é uma representação geométrica do espaço de estados puros
de um sistema de dois níveis. A esfera de Bloch é um 2-esfera de raio unitário, com cada par
de pontos antípodas representando vetores de estado mutuamente ortogonais. Os pólos norte
e sul da esfera Bloch normalmente são escolhidos corresponder aos vetores da base canônica
|0⟩ e |1⟩, respectivamente, que por sua vez podem corresponder, por exemplo, aos estados de
spin-up e spin-down de um elétron. No entanto, esta escolha é arbitrária. Os pontos sobre
a superfície da esfera correspondem aos estados puros do sistema, enquanto que os pontos
interiores correspondem aos estados mistos. A esfera de Bloch pode ser generalizada para um
sistema quântico de n níveis, mas sua visualização é mais difícil.
Demonstração. Diz-se que um estado Φ domina um estado Ψ se existe um número real α > 1
tal que ∥αΦ − Ψ∥ " 0. Seja Φ = λΨ1 + (1 − λ)Ψ2 um estado misturado. Então, note que Φ
domina cada um5 de seus componentes.
5 De fato, da segunda desigualdade triangular, segue que
∥αΦ − Ψi ∥ " 5∥αΦ∥ − ∥Ψi ∥5, para i = 1, 2. Logo, ∥αΦ∥ " ∥Ψ∥.
538
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
obtain an exact determination of the simultaneous values of two variables, but rather that there is a lower limit to
the accuracy with which they can be known.”
Werner Heisenberg
PROPOSIÇÃO 7.2. Se A é um operador auto-adjunto sobre H , então, para todo vetor unitário
Ψ ∈ Dom(A), temos ∆Φ (A) = 0 se, e somente se, Φ é um auto-estado de A.
Seja Ψ um vetor de estado tal que Ψ ∈ Dom(AB) ∩ Dom(BA). Considere três medições
sucessivas dos observáveis A e B na seguinte ordem: ABA.4 Diz-se que A e B são compatíveis
se, após as três medições sucessivas ABA, a segunda medição do observável A for igual à
primeira medição, isto é, se a primeira medição produziu o valor an a segunda medição deve
produzir o mesmo valor. Em outras palavras, o vetor de estado após a primeira medição de A
é o mesmo vetor de estado após a segunda medição de A. Este resultado pode ser expresso no
seguinte
TEOREMA 7.3. Sejam A e B dois observáveis tendo um domínio denso comum. As seguintes
propriedades são equivalentes:
539
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
Em outras palavras, o teorema acima afirma que observáveis compatíveis podem ser medidos
simultaneamente com uma precisão arbitrária!
Exemplo 7.5. Dois observáveis que são sempre compatíveis são A e f (A), em que f (A) é
qualquer função do operador A.
DEFINIÇÃO 7.6. Um conjunto de operadores auto-adjuntos, A, B, C, . . . é chamado de conjunto
completo de operadores comutantes se os operadores comutam mutuamente, e se o conjunto
de seus auto-estados comuns é completo e não degenerado – ou seja, é único.
Agora, suponha que A e B não são compatíveis. Isto significa que existe pelo menos um
vetor de estado Φ ∈ Dom(AB) ∩ Dom(BA) tal que
em que c ∈ R.5 Isto implica que Φ não é um auto-vetor comum de A e B, e, portanto, eles
não podem ser medidos com uma precisão arbitrária. Em outras palavras, A e B não podem
ser medidos simultaneamente, a ordem em que eles são medidos passa a ser determinante!
TEOREMA 7.4 (Princípio da Incerteza). Sejam A e B dois operadores lineares auto-adjuntos,
não compatíveis. Então, para todo vetor unitário Ψ ∈ Dom(AB) ∩ Dom(BA), temos que
1
∆Ψ (A)∆Ψ (B) " c .
2
C = AB − BA = ST − T S .
= ⟨SΨ, T Ψ⟩ − ⟨T Ψ, SΨ⟩ .
Os dois últimos produtos são iguais em valor absoluto. Logo, pelas desigualdades triangular e
de Cauchy-Schwarz-Bunjakowski, temos que
540
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
e
H
∥T Ψ∥ = ⟨Ψ, (B − c2 1I)2 Ψ⟩ = ∆Ψ (B) .
Assim,
1
|⟨C⟩Ψ | # ∆Ψ (A)∆Ψ (B) .
2
Mas,
Nota 7.3 (Um contra-exemplo). Na prova do Teorema 7.4 assumiu-se a hipótese que Ψ ∈
Dom(AB) ∩ Dom(BA). Naturalmente, isto nos leva a questionar se o resultado ainda seria
válido se assumíssemos que Ψ ∈ Dom(A) ∩ Dom(B). Primeiro, deve-se enfatizar que,
mesmo que Dom(A) e Dom(B) sejam densos em H , pode acontecer que Dom(AB) não
seja denso em H . Com efeito, pode muito bem ocorrer de termos Ran(A) ∩ Dom(B) =
{0}; neste caso o produto AB não tem significado algum. Por exemplo, considere H =
L2 (0, 2π) e os operadores
e
dΨ(x)
BΨ = i ,
dx
Note que, A é limitado, porque restringimos x ao intervalo aberto (0, 2π), ou seja, (∥A∥ = 2π).
Assim, A está definido sobre todo H , isto é, Dom(A) = H e, portanto, é auto-adjunto. Por
outro lado, vamos assumir que
# %
dΨ(x)
Dom(B) = Ψ ∈ L2 (0, 2π) | Ψ(0) = Ψ(2π), ∈ L2 (0, 2π) .
dx
Para verificarmos que B é auto-adjunto, notemos que para quaisquer funções Ψ e Φ de classe
C 1 , segue que
$ 2π , - $ 2π , -
dΨ(x) dΨ(x)
dx Φ(x) i =i dx Φ(x)
0 dx 0 dx
$ , -
52π 2π
dΦ(x)
= i Φ(x)Ψ(x)5 − i
0
dx Ψ(x)
0 dx
$ , -
52π 2π
dΦ(x)
= i Φ(x)Ψ(x)5 + 0
dx i Ψ(x) .
0 dx
Note que, a expressão
. /
Φ(2π)Ψ(2π) − Φ(0)Ψ(0) = Ψ(0) Φ(2π) − Φ(0) ,
541
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
vai se anular se Φ também satisfizer uma condição de contorno periódica Φ(0) = Φ(2π), isto
é, se as funções Φ obedecerem as mesmas condições obedecidas pelas funções Ψ. Então, com
argumentos similares àqueles usados para provar que o operador momentum associado à uma
partícula restrita a mover-se dentro do intervalo (0, a) é auto-adjunto, podemos mostrar que
Dom(B) = Dom(B ∗ ). Assim, B é auto-adjunto!
A seguir, vamos assumir que o sistema está no estado representado pelo vetor
def. 1
Ψ(x) = Ψm (x) = √ eimx , m∈Z.
2π
Q . /2
Logo, ∆Ψ (B) = ⟨Ψm , B 2 Ψm ⟩ − ⟨Ψm , BΨm ⟩ = m2 −m2 = 0. Em outras palavras, como
Ψm é um auto-estado de B, a incerteza de B no estado Ψm é zero! Por outro lado, como A é
limitado, a incerteza de A é bem definida e finita. Portanto, ∆Ψ (A) e ∆Ψ (B) estão definidas
sem qualquer ambiguidade e ∆Ψ (A)∆Ψ (B) = 0. Isto contradiz o Teorema 7.4. Este aparente
paradoxo é solucionado notando-se que Ψ ∈ Dom(BA) somente se AΨ(0) = AΨ(2π),
isto é, somente se, 0 · Ψ(0) = 2π · Ψ(2π). Isto implica que Ψ(0) = Ψ(2π) = 0; mas as
funções Ψm não satisfazem esta condição e, consequentemente, a expressão ⟨Ψm , BAΨm ⟩
não tem significado: AΨm ∈ / Dom(B). Podemos concluir dizendo que a forma forte do
princípio da incerteza não acontece, em geral, para dois operadores quaisquer A e B sobre
Dom(AB) ∩ Dom(BA), mesmo que o domínio Dom(AB) ∩ Dom(BA) seja denso em
H.
O contra-exemplo acima nos sugere quais as condições que devemos impor sobre dois
operadores auto-adjuntos A e B para que o número ⟨Ψ, [A, B]Ψ⟩ faça sentido: devemos tomar
3 4
Dom([A, B]) = Ψ ∈ Dom(A) ∩ Dom(B) | BΨ ∈ Dom(A) e AΨ ∈ Dom(B) .
Vale destacar, contudo, que ainda é possível dar sentido ao número ⟨Ψ, [A, B]Ψ⟩, para todo
Ψ ∈ Dom(A) ∩ Dom(B), se usarmos a auto-adjunção dos operadores A e B para obter a
versão fraca do princípio da incerteza:
Segunda demonstração do Teorema 7.4. Primeiro, note que para dois operadores auto-adjuntos
A e B, não compatíveis, e com Ψ ∈ Dom(A) ∩ Dom(B), segue o seguinte resultado:
542
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
#
# ∆Ψ (X)∆Ψ (P ) , (7.3.5)
2
com # = h/2π, com h = 6, 6260695729 × 10−34 kg m2 /s sendo a constante de Planck.
d. /
P XΨ = −i# xΨ(x)
dx
d
= −i#Ψ(x) − i#x Ψ(x)
dx
= −i#Ψ(x) + XP Ψ .
#
|⟨Ψ, [X, P ]Ψ⟩| = |⟨Ψ, i#Ψ⟩| = # =⇒ ∆Ψ (X)∆Ψ (P ) " .
2
6
Lembre-se da nota de rodapé na prova da Proposição 3.3.
543
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
544
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
= ∥XΨ∥2 − #α + α2 ∥P Ψ∥2 .
Portanto, de acordo com a Definição 7.5, temos que
. / . /
0 = ∥XΨ∥2 − a2 − #α + α2 ∥P Ψ∥2 − b2
545
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
Demonstração.
AB − BA = ic1I , (7.3.10)
segue que A e B não podem ser operadores nulos e nem constantes. Portanto, devemos ter
∥A∥ ≠ 0 e ∥B∥ =
̸ 0. Da relação acima, pode-se mostrar que
AB m − B m A = icmB m−1 , com m > 1 .
Um método simples e direto de provar isto é por indução. Com efeito, assuma que AB m −
B m A = cmB m−1 acontece para m = k (note que isto acontece para m = 1, isto é, AB −
BA = ic1I),
AB k − B k A = ickB k−1 .
Vamos mostrar que a relação acontece para m = k + 1. Primeiro, note que7
8 9 8 9 8 9 8 9
A, B k+1 = A, BB k = A, B B k + B A, B k
8 9
Logo, como A, B = ic1I, então
8 9
A, B k+1 = icB k + ickBB k−1 = ic(k + 1)B k
Finalmente, tomando k = m − 1, obtemos
AB m − B m A = icmB m−1 , com m > 1 ,
como queríamos provar.
Continuando, assuma que A e B são operadores limitados, com normas ∥A∥ e ∥B∥.
Tomando as normas de ambos os lados da relação acima, para m = 1, 2, 3, . . ., obtemos
|c|m∥B m−1 ∥ = ∥AB m − B m A∥
# ∥AB m ∥ + ∥B m A∥
# 2∥A∥∥B m ∥
546
Aspectos Matemáticos da Mecânica Quântica
De acordo com a relação de comutação (7.3.10), ∥B∥ > 0. Por sua vez, a relação [A, B 2 ] =
2icB implica que ∥B 2 ∥ > 0, e por indução, segue que ∥B m ∥ > 0 para todo m ∈ N. Portanto,
podemos dividir a estimativa (7.3.11) por ∥B m−1 ∥ para obter
2
m# ∥A∥∥B∥ .
|c|
para todo m ∈ N, o que contradiz a estimativa (7.3.12). Logo, ou A ou B, ou ambos, devem ser
ilimitados.
Nota 7.6. O Teorema 7.5 foi provado pela primeira vez por Aurel Wintner, no artigo “The
Unboundedness of Quantum-Mechanical Matrices,” Phys. Rev. 71 (1947) 738. A prova de
Wintner em 1947, baseou-se diretamente na relação de comutação canônica de Heisenberg:
XP − P X = i#. Analisando os espectros de XP e P X, ele concluiu que pelo menos um
entre os operadores X e P não pode ser limitado. O teorema foi novamente provado por
Helmut Wielandt, no artigo “Über die Unbeschränktheit der Operatoren der Quantenmechanik,”
Math. Ann. 121 (1949) 21,8 com o argumento algébrico usado na prova acima. O famoso
matemático John von Neumann mostrou que os únicos pares de operadores que satisfazem a
d
relação de comutação de Heisenberg são operadores do tipo A = −i# dµ e B = µ, atuando
sobre o espaço de Hilbert L2 .
8
Tradução do título: “Sobre a natureza ilimitada dos operadores da mecânica quântica.”
547
Capítulo 8
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo
na Mecânica Quântica
“É impossível explicar honestamente as belezas das leis da Natureza sem uma compreensão profunda da
matemática.”
R.P. Feynman
Neste capítulo, discutimos a existência da dinâmica quântica e como ela está relacionada ao
Teorema de Stone sobre grupos unitários contínuos uni-paramétrico. O assunto deste capítulo é
fundamental para a mecânica quântica. Com efeito, grupos unitários contínuos uni-paramétrico
e o Teorema de Stone formam a base matemática para a descrição da evolução temporal
de sistemas quânticos conservativos e reversíveis. Mais precisamente, o Teorema de Stone é
essencial no estudo da dinâmica de sistemas quânticos fechados com um número finito de
partículas
8.1 Introdução
A evolução de um sistema físico no tempo é geralmente descrita por um problema de valor
inicial para uma equação diferencial ordinária ou parcial. A versão quântica da dinâmica clássica
sobre a evolução temporal de um vetor de estado, Ψ, descrevendo uma partícula não-relativística
no espaço euclidiano n-dimensional, é determinada pela equação de Schrödinger
∂Ψ
i# = HΨ , ∀ Ψ ∈ Dom(H) e t ∈ R , (8.1.1)
∂t
549
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
em que
#2 2
H = H0 + V (x) = − ∇ + V (x) , (8.1.2)
2m
é o operador hamiltoniano de Schrödinger. Aqui, H0 é o hamiltoniano livre e V é uma função
potencial valorada no conjunto dos reais, representando um campo de força conservativa ao
qual a partícula está submetida. Suplementamos a Eq.(8.1.1) com a condição inicial
5
5
Ψ5 = Ψ0 , (8.1.3)
t=0
E mais, para termos uma solução única para (8.1.1), o operador de evolução deve satisfazer a
condição que para todo s, t ∈ R,
UH (s)UH (t) = UH (s + t) . (8.1.6)
Observe que, se definirmos t = −t em (8.1.6), obtemos a relação
UH (−t) = UH−1 (t) , (8.1.7)
que reflete o princípio da invariância sob reversão temporal.
Estas condições que operador de evolução UH (t) deve satisfazer são equivalentes à proprie-
dade fundamental de auto-adjunção do operador de Schrödinger H em (8.1.1). A auto-adjunção
de H é uma condição necessária e suficiente para garantir a existência e unicidade de uma
solução para o problema de Cauchy associado à equação de Schrödinger (8.1.1) satisfazendo
(8.1.3), (8.1.4), (8.1.5), (8.1.6) e (8.1.7). A auto-adjunção do operador de Schrödinger H garante
que o operador de evolução UH (t) forma um grupo uni-paramétrico fortemente contínuo de
operadores unitários, chamado simplesmente de grupo-C0 unitário.
550
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
básicos da teoria dos semi-grupos-C0 que são essenciais para o entendimento das técnicas de
resolução do problema da existência da dinâmica quântica. A maior parte da exposição será
centrada na caracterização dos geradores dos semi-grupos-C0 em espaços de Hilbert.1 Nosso
objetivo é mostrar que todo semi-grupo-C0 possui um gerador infinitesimal.
Podemos também dizer que o operador T é fortemente contínuo se, para cada x ∈ Ω e para cada
Ψ ∈ H , tem-se
lim ∥T (y)Ψ − T (x)Ψ∥ = 0 .
y→x
y∈Ω
1
Alguns resultados, como o Teorema de Hille-Yosida, foram obtidos em um ambiente mais geral, isto é, em
espaços de Banach. Aqui, estamos considerando o ambiente como sendo espaços de Hilbert por causa da teoria
quântica.
551
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
552
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
As duas primeiras propriedades são algébricas, com T sendo uma representação do semi-
grupo (R+ , +), enquanto que as duas últimas propriedades são topológicas.
Nota 8.2. Na definição de semi-grupo-C0 assumimos que t ∈ [0, ∞). Por outro lado, se assu-
mirmos que t ∈ (−∞, ∞), então, temos um grupo uni-paramétrico fortemente contínuo, ou
simplesmente grupo-C0 . Do ponto de vista da mecânica quântica, a dinâmica quântica é des-
crita por um caso particular dos grupos-C0 , mais especificamente por um grupo uni-paramétrico
fortemente contínuo de operadores unitários em um espaço de Hilbert H . Utilizaremos o termo
“grupo de evolução temporal” apenas para um grupo que dá a evolução no tempo de um sistema
quântico, com o gerador infinitesimal do grupo devendo ser o hamiltoniano do sistema. Como
veremos, a existência a dinâmica quântica não dependerá da forma particular do operador H,
mas somente de uma propriedade básica que ele deve respeitar: a auto-adjunção do operador
H.
Para verificar que (c) =⇒ (b), definimos K = {tn | n ∈ N} ∪ {0} para uma sequência 5
arbitrária (tn )n∈N ⊂ R + convergindo para t = 0 . Então, K ∈ [0, ∞) é compacto, T (·) 5 é
5 K
limitado e T (·)5K Ψ é contínuo para todo Ψ ∈ D. Portanto, segue do princípio da limitação
uniforme que T (·) é uniformemente limitado em K, uma vez que os mapeamentos t 3→ T (t)Ψ
são contínuos, logo limitados no conjunto compacto K. Assim,
lim T (tn )Ψ = Ψ ,
n→∞
para todo x ∈ H . Como (tn )n∈N ⊂ R+ foi escolhido arbitrariamente, isso prova (b).
Para mostrar que (b) =⇒ (a), tome t0 > 0 e Ψ ∈ H . Então, pelas propriedades de
semi-grupo e as propriedades da norma do operador, segue que
553
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
provando a continuidade a direita. Por outro lado, se assumirmos que h é estritamente positivo,
isto é, se h > 0, então,
lim ∥T (t0 − h)Ψ − T (t0 )Ψ∥ # lim+ ∥T (t0 − h)∥ · lim+ ∥Ψ − T (h)Ψ∥
h→0+ h→0 h→0
implica a continuidade a esquerda desde que ∥T (t)∥ seja uniformemente limitado para todo
t ∈ [0, t0 ]. Isso, no entanto, segue como acima primeiro para algum intervalo pequeno [0, s]
pelo princípio da limitação uniforme e, em seguida, em cada intervalo compacto graças às
propriedades de semi-grupo.
O conjunto Dom(A) é não-vazio, já que ele contém pelo menos o vetor nulo. Mais do que
isso, pode-se mostrar que de fato Dom(A) é denso em H . Dom(A) é um subespaço e A
é linear sobre Dom(A). O operador A é fechado, embora não necessariamente limitado.
554
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
d+ Ψ(t + h) − Ψ(t)
Ψ(t) = lim+
dx h→0 h
Ψ(h + t) − Ψ(t)
= lim+ (pela Nota 8.1) .
h→0 h
d+ T (t + h)Ψ − T (t)Ψ
T (t)Ψ = lim+
dx h→0 h
T (h + t)Ψ − T (t)Ψ
= lim+ ,
h→0 h
ou que
555
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
ou ainda que
d+ T (h)Ψ − 1IΨ
T (t)Ψ = lim+ T (t) · lim+
dx h→0 h→0 h
T (h) − 1I
= lim+ · lim+ T (t)Ψ .
h→0 h h→0
+ −
Como resultado nós temos que as derivadas ddt T (t)Ψ e ddt T (t)Ψ são iguais. Isto nos permite
concluir que para todo Ψ ∈ Dom(A) o mapeamento [0, ∞) ∋ t 3→ T (t)Ψ ∈ C 1 (R+ , H )6
(isto é, T (t) é continuamente diferenciável) e
d
T (t)Ψ = AT (t)Ψ = T (t)AΨ . (8.2.4)
dt
Portanto, para Ψ ∈ Dom(A), segue que
$ t
d
T (t)Ψ − Ψ = ds T (s)Ψ
0 ds
$ t
=A ds T (s)Ψ se Ψ ∈ H (8.2.5)
0
$ t
= ds T (s)AΨ se Ψ ∈ Dom(A) .
0
6
C 1 (R+ , H ) denota as funções continuamente diferenciáveis de R+ em H .
556
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
A seguir, assuma que AΨ = λΨ, com Ψ ∈ Dom(A), tal que ∥Ψ∥ = 1. Defina
def.
g(t) = ⟨Ψ, T (t)Ψ⟩ .
Pelos resultados acima, sabemos que g é uma função diferenciável de t e satisfaz a equação
diferencial
g ′(t) = ⟨Ψ, T (t)AΨ⟩ = ⟨Ψ, T (t)λΨ⟩ = λ⟨Ψ, T (t)Ψ⟩ = λg(t)
e que g(0) = 1. Logo, segue que g(t) = eλt . Mas, isto é impossível já que g, por definição,
como função de t é limitada, enquanto que eλt não é limitada para t " 0 uma vez que
Re λ > 0. Portanto, (A − λ1I)Ψ = 0 =⇒ Ψ = 0.
Pelo Teorema Fundamental do Cálculo, como T (·) é fortemente contínuo, segue que Φ é
diferenciável e Φ′s = T (s)Ψ, isto é,
$
d s
dt T (t)Ψ = T (s)Ψ .
ds 0
Assim,
, $ s $ -
18 9 1 1 s
lim+ T (r) − 1I Φs = lim+ dt T (r + t)Ψ − dt T (t)Ψ
r→0 r r→0 r 0 r 0
, $ r+s $ -
1 1 r
= lim+ dt T (t)Ψ − dt T (t)Ψ
r→0 r s r 0
= T (s)Ψ − Ψ .
Dessa forma, para todo Ψ ∈ H e s > 0, Φs ∈ Dom(A). Uma vez que lims→0+ s−1 Φs = Ψ,
A é densamente definido.
557
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Para mostrar que A é fechado, assuma que a sequência (Φn )n∈N ⊂ Dom(A) converge
para Φ e que a sequência (AΦn )n∈N converge para Ψ. Então, temos que
18 9 18 9
AΦ = lim+ T (r) − 1I Φ = lim+ lim T (r) − 1I Φn
r→0 r r→0 n→∞ r
$ r
= lim+ lim dt T (t)AΦn (por (8.2.5))
r→0 n→∞ 0
$ r
1
= dt T (t)Ψ
r 0
=Ψ.
Esta fórmula para Rλ (A) é chamada de representação integral do resolvente. É claro, que essa
integral deve ser entendida como uma integral de Riemann imprópria, ou seja,
$ s
Rλ (A) = − lim dt e−λt T (t) .
s→∞ 0
Tendo isso mente, escreveremos Rλ (A) frequentemente com na Eq.(8.2.6). Logo, para todo
Ψ ∈ H , temos
$ $
1 1 ∞ −λt 1 ∞
(T (h) − 1I)Rλ (A)Ψ = − dt e T (h)T (t)Ψ + dt e−λt T (t)Ψ
h h 0 h 0
$ $
1 ∞ −λt 1 ∞
=− dt e T (h + t)Ψ + dt e−λt T (t)Ψ
h 0 h 0
$ $
1 ∞ −λ(t−h) 1 ∞
=− dt e T (t)Ψ + dt e−λt T (t)Ψ
h h h 0
$ ∞ $
1 λh −λt 1 h
= − (e − 1) dt e T (f )Ψ + dt e−λt T (t)Ψ .
h h h 0
558
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
existe como um limite de somas de Riemann. Consequentemente, pelo Teorema do Valor Médio
para Integrais, existe r ∈ [0, h] tal que
$ h
dt e−λt T (t)Ψ = he−λr T (r)Ψ .
0
559
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
dΨ
= AΨ , com t > 0 , (8.2.9)
dt
e
Ψ(0) = Ψ0 , (8.2.10)
No entanto, a princípio, isso não parece fazer muito sentido dentro do atual quadro. Primeiro,
A é um operador e, portanto, deve operar sobre alguma coisa. Segundo, que interpretação
podemos dar para a exponencial etA ? Vamos analisar o segundo ponto em primeiro lugar,
assumindo o caso mais simples quando A é um operador limitado, e então generalizamos.
<∞
tA 1 n n
e = t A , (8.2.13)
n=0
n!
converge para cada A finito, para qualquer t. Por outro lado, se a convergência se dá de
acordo com a topologia da norma de H , então, a série (8.2.13) faz sentido se A é um operador
limitado. Neste caso, a solução do problema de Cauchy é Ψ(t) = Ψ0 etA , já que para qualquer
560
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
operador limitado A a função exponencial etA é definida por sua séria de potência. Isto segue,
imediatamente, a partir do fato de que a série
<∞ <∞
1 n n 1 n n
|t| ∥A∥ # |t| C ,
n=0
n! n=0
n!
é limitada por uma série convergente. Com efeito, lembre-se que, A : Dom(A) ⊂ H → H
é um operador limitado se existe uma contante (finita) C > 0 tal que ∥AΨ∥ # C∥Ψ∥, e a
menor constante que satisfaz esta desigualdade define a norma de A, isto é, ∥A∥. Assim sendo,
defina T (t) = etA , para t " 0, com A sendo um operador limitado. Neste caso, podemos
justificar esta definição da seguinte forma: escreva
1 n n
Sn = 1I + tA + · · · + t A .
n!
Observe que, quando t = 0, temos que T (0) = e0A = 1I e para t > 0, temos
? ?
? tA ? ? ?<∞ ℓ ℓ?
tA ? <1 ℓ
∞
? ?
∥T (t) − 1I∥ = e − 1I = ? ?# |t| ∥A∥ℓ = e|t|∥A∥ − 1 → 0 ,
? ℓ! ? ℓ!
ℓ=1 ℓ=1
quando t → 0+ . Portanto, o operador T (t) = etA é uniformemente contínuo! Isto implica que
a Propriedade 3, na Definição 8.3, também é satisfeita, já que se tomarmos um vetor Ψ ∈ H ,
então,
∥T (t)Ψ − 1IΨ∥ # ∥T (t) − 1I∥ ∥Ψ∥ → 0 , quando t → 0+ .
561
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
k
< <k
k! k!
(t + s)k = tk−m sm = sk−m tm = (s + t)k
m=0
m!(k − m)! m=0
m!(k − m)!
na série
<∞
1
e(t+s)A = (t + s)n An ,
n=0
n!
pode-se mostrar, facilmente, que e(t+s)A = etA · esA . Com efeito, uma vez que as séries
envolvidas são convergentes na norma, tem-se
<∞
1 < k! m m n n
= t A s A
k=0
k! m+n=k
m!n!
<∞ k
1 < k!
= tm Am sk−m Ak−m
k=0
k! m=0 m!(k − m)!
∞
< 1
= (s + t)k Ak = e(s+t)A
k!
k=0
<∞
1
= (t + s)k Ak = e(t+s)A .
k=0
k!
Além disso, pode-se mostrar também que a função operatorial t 3→ etA é diferenciável (na
topologia uniforme) e que
d tA e(t+h)A − etA
(e ) = lim+ = A · etA = etA · A .
dt h→0 h
Uma vez que agora entendemos o significado da exponencial etA no caso de um opera-
dor limitado, podemos resolver a outra dificuldade olhando para a Eq.(8.2.12). Mas, (8.2.12) é
realmente solução das Eqs.(8.2.9) e (8.2.10)? Para responder esta questão, vamos examinar a
expressão
F sA G F sA G
Ψ(t + s) − Ψ(t) e − 1I tA e − 1I
− AΨ(t) = − A e Ψ0 = − A Ψ(t) .
s s s
Note que
∞
esA − 1I < 1 n−1 n
= s A ,
s n=1
n!
562
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
? sA ? ∞
? e − 1I ? < 1 n−1 es∥A∥ − 1
? − A? # s ∥A∥ n
= − ∥A∥ → 0 , quando s → 0+ .
? s ? n! s
n=2
Isto mostra que, para todo Ψ ∈ Dom(A), o limite (8.2.11) existe e que a derivada de Ψ, para
todo s > 0, é igual a AΨ. Consequentemente, (8.2.9) é satisfeita. Portanto, (8.2.12) é realmente
uma solução do problema de Cauchy descrito pelas Eqs.(8.2.9) e (8.2.10) e A é o gerador de T .
Em resumo, a análise que acabamos de realizar sobre operadores limitados prova a seguinte
b ∞ ℓ ℓ
c
< tA
T = T (t) = etA = | t ∈ R+
ℓ!
ℓ=0
Conforme mostrado pela Proposição 8.2, todo operador linear limitado em H é o gerador de
um semi-grupo-C0 que satisfaz a propriedade de continuidade uniforme, isto é, (∥T − 1I∥ → 0
quando t → 0). Por outro lado, a recíproca também é verdadeira, ou seja, se um semi-
grupo-C0 satisfaz a propriedade de continuidade uniforme, então, seu gerador infinitesimal A
é necessariamente um operador linear limitado (consulte o Exercício 8.5).
Nota 8.4. Deve-se sempre ter em mente que, nas considerações acima, assumimos que A
é um operador limitado. Neste caso, como vimos, podemos usar a série de potências para
exponenciar A. Além disso, é importante enfatizar que na Proposição 8.2 a limitação do
operador A também determinou o tipo de continuidade do semi-grupo gerado: a condição
de continuidade uniforme. Por sua vez, isto igualmente implica a convergência forte do semi-
grupo gerado. Portanto, este resultado sugere que os semi-grupos-C0 que satisfazem a condição
de continuidade forte da Definição 8.3, mas não a condição de continuidade uniforme da
Proposição 8.2, são precisamente os que têm geradores ilimitados; esses são os semi-grupos-C0
que estamos interessados.
Como vimos, pela Proposição 8.2, um semi-grupo-C0 , T (t), é “igual” em algum sentido a
exponencial etA , em que A é o gerador infinitesimal de T (t). A igualdade acontece se A
for um operador linear limitado. No caso em que A é ilimitado a fórmula T (t) = etA deve
admitir alguma interpretação que tenha fundamento. Neste caso, como podemos garantir que
T (t) é “igual” a etA ? A Proposição 8.2 nos aponta que é razoável tentar basear a prova da
parte de suficiência do Teorema de Hille-Yosida em uma das fórmulas clássicas para a função
563
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Cada uma dessas fórmulas pode ser generalizada para operadores atuando em espaços de
Hilbert (e, em geral, para espaços de Banach); em particular, para operadores ilimitados. As
fórmulas (I) e (II) envolvem limites de operadores A que são limitados. Quando se tenta
substituir A por operadores ilimitados nas duas primeiras fórmulas nos deparamos com um
problema relacionado com os domínios das potências dos operadores envolvidos. Por exemplo,
quando A é ilimitado é difícil definir etA por (I), pois o domínio de An torna-se mais estreito
com o aumento de n e, portanto, a série raramente convergirá. Na realidade, um resultado
muito mais forte é necessário; mais especificamente, se A é o gerador infinitesimal do semi-
grupo-C0 , T (t), em um espaço de Hilbert H e se Dom(An ) é o domínio de An , então,
∩∞ n ∞
n=1 Dom(A ) deve ser denso em H . Mas, pode acontecer de ∩n=1 Dom(A ) = {0} e,
n
desse modo, não teremos a densidade exigida. A fórmula (II) também não é útil pela mesma
razão. Por outro lado, as fórmulas (III) ou (IV ) são mais promissoras e podem ser usadas
como base para os semi-grupos-C0 com geradores infinitesimais que . sãot operadores
/−n ilimitados.
Com efeito, na fórmula (III), pode-se mostrar que a expressão 1 − n A está relacionada
com o resolvente de A, a menos de um fator constante. Por consequência, isso resulta em uma
fórmula envolvendo apenas potências de operadores limitados, e pode ser iterada mesmo quando
A é ilimitado. Foi ideia de Hille usar esta fórmula e provar que, em condições apropriadas,
o limite existe e define um semi-grupo fortemente contínuo. Por sua vez, como resultado
da Proposição 8.2, podemos tentar aproximar A por uma sequência (Aλ )λ∈N de operadores
limitados. Neste caso, na fórmula (IV ), o limite etA = limλ→∞ etAλ , em que limλ→∞ Aλ = A,
existe e também pode ser usada para definir um semi-grupo fortemente contínuo. Esta foi
a ideia de Yosida, que está relacionada com a aproximação discutida no Capítulo 5 que leva
seu nome. Seguindo Hille, vamos usar (III) na prova da suficiência do Teorema de Hille-
Yosida. Quando estudarmos o Teorema de Stone e sua relação com a existência da dinâmica na
mecânica quântica usaremos a fórmula (IV ), com uma aproximação tipo-Yosida.
Nota 8.5 (Fato hitórico). Foi Leonhard Euler (1707-1783) que mostrou que7
<∞ ℓ , -n , -n
t t t 1
e = = lim 1 + , com e = lim 1 + .
ℓ=0
ℓ! n→∞ n n→∞ n
564
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
palavras, queremos provar que para todo elemento fixo Ψ ∈ Dom(A) o limite (uniforme)
, -−n
t
T (t)Ψ = lim 1I − A Ψ. (8.2.15)
n→∞ n
existe em todo intervalo finito 0 # t # s. Seguiremos a prova desenvolvida por T. Kato no seu
livro “Perturbation Theory for Linear Operators, Second Edition, Springer, 1980, pg.480. Primeiro,
observe que a Eq.(8.2.15) pode ser reescrita da seguinte forma:
, -−n F Gn
t n6 n 7−1
T (t)Ψ = lim 1I − A Ψ = lim − A − 1I Ψ.
n→∞ n n→∞ t t
Assim, embutido na fórmula (8.2.15) temos o negativo do operador resolvente (A − λ1I)−1
. /−1
tomando λ = n/t. Além disso, o comportamento de nt nt 1I − A para n → ∞ é o mesmo
−1
de λ(λ1I − A) para λ → ∞.
Defina
, -−n
t
Tn (t) = 1I − A , ∀t " 0 e n ∈ N .
n
Para Ψ ∈ Dom(A), n ∈ N e t > 0, segue que
?, -−1 ? ? ?
? t ? ?n 6n 7−1 ?
? ? ?
? 1I − A Ψ − Ψ? = ? 1I − A Ψ − Ψ?
?
? n ? t t
?6 7−1 = n 6n 7 >?
? n ?
?
= ? 1I − A Ψ− 1I − A Ψ ?
t t t ?
?6 7−1 ?
? n ?
?
= ? 1I − A AΨ?
t ?
?6 7−1 ?
? n ?
#?? t 1
I − A ? ∥AΨ∥
?
t
# ∥AΨ∥ ,
n
. /−1
que tende a zero quando t → 0+ . Mas, como Dom(A) é denso em H e ∥ nt nt 1I − A ∥#
s
1, segue que ∥Tn (t)∥ # 1, de maneira que Tn (t) é uniformemente limitado e Tn (t) −→ T (0)
quando t → 0+ , isto é,
, -−n ] , -−1
t t
lim Tn (t)Ψ = lim+ 1I − A Ψ= lim 1I − A Ψ=Ψ. (8.2.16)
t→0+ t→0 n n
t→0+ n
para todo Ψ ∈ H .
Para provar a existência do limite limn→∞ Tn (t), estimamos Tn (t)Ψ − Tm (t)Ψ. Para isso,
notamos que, para t > 0, a diferenciação em relação a t produz
, -−n−1
′ d t
Tn (t) = Tn (t) = 1I − A A ∈ Lb (H ) , (8.2.17)
dt n
565
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Note que, por causa de (8.2.16), este integrando é contínuo para 0 # s # t. E mais, pelo fato
de ∥Tn (t)∥ # 1, segue que
$ t , - , -
2 t−s s t2 1 1
∥Tn (t)Ψ − Tm (t)Ψ∥ # ∥A Ψ∥ ds − = − ∥A2 Ψ∥ .
0 n m 2 n m
Assim, Tn (t)Ψ forma uma sequência de Cauchy e limn→∞ Tn (t)Ψ existe, uniformemente em
t em qualquer intervalo finito, desde que Ψ ∈ Dom(A2 ) ⊆ Dom(A), com Dom(A2 )
representando o conjunto
6 n 7−1
2
Dom(A ) = A − 1I Dom(A) , ∀t > 0 e n ∈ N .
t
Mas, lembre-se que ,6 -
n 7−1
Ran A − 1I = Dom(A) ,
t
que é denso em H . Logo, Dom(A2 ) é denso em H . Consequentemente, Tn (t)Ψ forma
uma sequência de Cauchy e limn→∞ Tn (t)Ψ existe!
Finalmente, por causa da limitação uniforme dos Tn (t), segue pelo Corolário 4.2 que o limite
forte
, -−1
t
T (t)Ψ = s− lim Tn Ψ = s− lim 1I − A Ψ, (8.2.20)
n→∞ n→∞ n
566
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
existe e (8.2.15) segue para todo Ψ ∈ H . Resta mostrar que T (t) é de fato um semi-grupo-C0
de contração e que A é seu gerador infinitesimal. Em outras palavras, resta mostrar que T (t)
obtido como o limite forte na Eq.(8.2.20) tem as propriedades esperadas da função exponencial.
Isto é provado no Exercício 8.7. Portanto, T (t) é igual a etA .
Demonstração. Assuma que existe um outro semi-grupo fortemente contínuo S(t) com o
mesmo gerador (A, Dom(A)). Defina a função Ψ : [0, s] → H por Ψ(t) = T (t)S(s − t)Ψ.
Esta função é diferenciável e podemos obter sua derivada pela regra Leibniz:
d d d
Ψ(t) = T (t) · S(s − t)Ψ + T (t) · S(s − t)Ψ
dt dt dt
= AT (t)S(s − t)Ψ + T (t)(−A)S(s − t)Ψ = 0
Até agora, nossa principal preocupação foi mostrar que semi-grupos fortemente contínuos
possuem geradores e, inversamente, que certos operadores geram semi-grupos fortemente con-
tínuos. Estabelecido a existência de um semi-grupo fortemente contínuo, voltamos agora nossa
atenção para a seguinte questão: seja A o gerador de um semigrupo-C0 de contração, T (t).
Visto que pensamos em T (t) como a exponencial etA , podemos concluir que o espectro de
T (t) satisfaz σ[T (t)] = etσ(A) ? Vamos responder esta questão através de alguns resultados
conhecidos como Teoremas do Mapeamento Espectral.8
8
O leitor vai encontrar uma discussão mais detalhada sobre este tema no livro de K.-J. Engel & R. Nagel,
“One-Parameter Semigroups for Linear Evolution Equations,” Springer-Verlag, 2000, Cap. IV.
567
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Demonstração. Primeiro, não é difícil mostrar que para todo λ e t fixos, Bλ (t) definido por
(8.2.21) é um operador limitado; mais precisamente, temos que
e(Re λ)t − 1
∥Bλ (t)Ψ∥ # ∥Ψ∥ .
Re λ
Além disso, para todo Ψ ∈ H , temos
$ $
1 1 t λ(t−s) 1 t
(T (h) − 1I)Bλ (t)Ψ = ds e T (h)T (s)Ψ − ds eλ(t−s) T (s)Ψ
h h 0 h 0
$ $
1 t λ(t−s) 1 t
= ds e T (h + s)Ψ − ds eλ(t−s) T (s)Ψ
h 0 h 0
$ $
eλh h+t λ(t−s) 1 t
= ds e T (s)Ψ − ds eλ(t−s) T (s)Ψ
h h h 0
$ $
eλh t λ(t−s) eλh h+t
= ds e T (s)Ψ + ds eλ(t−s) T (s)Ψ
h h h t
$ $
1 h λ(t−s) 1 t
− ds e T (s)Ψ − ds eλ(t−s) T (s)Ψ
h 0 h h
$ t $
1 λh λ(t−s) eλh h+t
= (e − 1) ds e T (s)Ψ + ds eλ(t−s) T (s)Ψ
h h h t
$
1 h
− ds eλ(t−s) T (s)Ψ . (8.2.24)
h 0
568
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
A seguir, lembremos, de acordo com T. Kato, “Perturbation Theory for Linear Operators,”
Second Edition, Springer, 1980, pg.171, que como A não é necessariamente limitado, então,
A comuta com Bλ (t) se Bλ (t)A ⊂ ABλ (t), o que significa que quando Ψ ∈ Dom(A),
Bλ (t)Ψ também pertence ao domínio Dom(A) e ABλ (t)Ψ = Bλ (t)AΨ. Portanto, para
Ψ ∈ Dom(A), segue-se que A e Bλ (t) comutam. Além disso, todo operador em H comuta
com o operador escalar λ1I. Logo, estes fatos reunidos provam (8.2.23).
TEOREMA 8.2 (Teorema de Inclusão Espectral). Seja A auto-adjunto e o gerador de um
semi-grupo-C0 de contração, T (t), em um espaço de Hilbert H . Então,
. / ! "
σ T (t) ⊃ etσ(A) = etλ | λ ∈ σ(A) , (8.2.25)
para todo t ∈ R+ .
569
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
λt
Essas relações mostram, junto com a Eq.(8.2.23), .que (T
/ (t) − e ) não é bijetivo se (A − λ1I)
λt
falha de ser bijetivo. Consequentemente, e ∈ ρ T (t) implica que λ ∈ ρ(A),
A seguir, estudamos as relações entre cada parte do espectro de A e sua parte correspondente
do espectro de T (t) = etA . Começamos com o espectro discreto, Lembremos, como enfatizado
no Capítulo 5, que se A é um operador auto-adjunto, então, λ ∈ R está no espectro discreto de
A se, e somente se, λ for um ponto isolado em σ(A) e se λ for um auto-valor de multiplicidade
finita. O espectro discreto não é um conjunto fechado! Se considerarmos em R3 , o operador de
Schrödinger com potencial coulombiano (veja mais detalhes no Capítulo 10), o espectro discreto
é uma sequência de auto-valores tendendo a 0, mas 0 não pertence ao espectro discreto.
TEOREMA 8.3 (Teorema do Mapeamento Espectral para o Espectro Discreto). Seja A auto-
adjunto e o gerador de um semi-grupo-C0 de contração, T (t), em um espaço de Hilbert H .
Então,
. /
etσdisc (A) ⊂ σdisc T (t) ⊂ etσdisc (A) ∪ {0} ,
. /
para.todo /t ∈ R+ . Mais precisamente, se λ ∈ σdisc (A), então, eλt ∈ σdisc T (t) e se eλt ∈
σdisc T (t) existe um inteiro k tal que λk = λ + i2πk/t ∈ σdisc (A).
Demonstração. A primeira inclusão segue trivialmente do Lema 8.1. Com efeito, se λ ∈ σdisc (A),
então, existe Ψ ∈ Dom(A), com Ψ ̸= 0, tal . que/ (A − λ1I)Ψ = 0. Logo, de (8.2.23) segue que
(T (t) − eλt )Ψ = 0 e, portanto, eλt ∈ σdisc T (t) , o que comprova a primeira inclusão.
. /
Para provar a segunda inclusão, para t > 0, assuma que eλt ∈ σdisc T (t) , isto é, assuma
que (T (t) − eλt )Ψ = 0, com Ψ ̸= 0. Observe que, podemos escrever (T (t) − eλt )Ψ =
eλt (e−λt T (t) − 1I)Ψ = 0. Isso implica que a função contínua t 3→ S(t) = e−λt T (t) define um
semi-grupo-C0 reescalonado, cujo gerador é B = A−λ1I com domínio Dom(B) = Dom(A)
e S(t)Ψ = 1IΨ. De fato, basta aplicar à função S(t) a mesma argumentação que nos levou à
Eq.(8.2.5) para obter
$ t
−λt d . −λs /
e T (t)Ψ − Ψ = ds
e T (s) Ψ
0 ds
$ t
= (A − λ1I) ds e−λs T (s)Ψ se Ψ ∈ H
0
$ t
= ds e−λs T (s)(A − λ1I)Ψ se Ψ ∈ Dom(A) .
0
A condição S(t)Ψ = 1IΨ implica que S(t)Ψ = S(0)Ψ, indicado que S(t)Ψ é periódica com
o período t, isto é, os expoentes em e−λt T (t)Ψ não são únicos uma vez que e−λt T (t)Ψ =
e−(λ+i2πk/t)t T (t)Ψ. Portanto, S(t)Ψ = e−i2πk S(t)Ψ. Como S(·)Ψ ∈ C(R+ , H ) é diferente
570
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
de zero e periódica, podemos usar a função exponencial complexa como base para escrever
S(·)Ψ na seguinte forma
<∞
S(s)Ψ = Φk ei2πks/t ,
k=−∞
Naturalmente, pelo menos um de seus coeficientes de Fourier, Φk , deve ser diferente de zero.
Ou seja, existe um k tal que
$
−i2πks/t 1 t
⟨e , S(s)Ψ⟩ = Φk = ds e−i2πks/t e−λs T (s)Ψ ̸= 0 , para k = 0, ±1, ±2, . . .
t 0
Mostraremos que Φk ∈ Dom(A) e que λk = λ + i2πk/t é um auto-valor de A. Defina
γ = i2πk/t, então, seguindo o mesmo desenvolvimento da Eq.(8.2.24), temos que
$ $
1 1 t −(γ+λ)s 1 t
(S(h) − 1I)Φk = ds e S(h)T (s)Ψ − ds e−(γ+λ)s T (s)Ψ
h ht 0 ht 0
$ $
eγh t −(γ+λ)(h+s) 1 t
= ds e T (h + s)Ψ − ds e−(γ+λ)s T (s)Ψ
ht 0 ht 0
$ $
eγh h+t −(γ+λ)s 1 t
= ds e T (s)Ψ − ds e−(γ+λ)s T (s)Ψ
ht h ht 0
$ $
eγh t −(γ+λ)s eγh h+t
= ds e T (s)Ψ + ds e−(γ+λ)s T (s)Ψ
ht h ht t
$ $
1 h −(γ+λ)s 1 t
− ds e T (s)Ψ − ds e−(γ+λ)s T (s)Ψ
ht 0 ht h
$ t $
1 γh −(γ+λ)s eγh h+t
= (e − 1) ds e T (s)Ψ + ds e−(γ+λ)s T (s)Ψ
ht h ht t
$
1 h
− ds e−(γ+λ)s T (s)Ψ . (8.2.26)
ht 0
Novamente, levando em conta que os mapeamentos [0, h] ∋ s 3→ T (s)Ψ ∈ H e [t, t + h] ∋
s 3→ T (s)Ψ ∈ H são fortemente contínuos pela Propriedade 3 da Definição 8.3, as integrais
$ h+t $ h
−(γ+λ)s
ds e T (s)Ψ e ds e−(γ+λ)s T (s)Ψ ,
t 0
existem como um limite de somas de Riemann. Consequentemente, pelo Teorema do Valor
Médio para Integrais, existem r ∈ [t, t + h] e u ∈ [0, h] tais que
$ h+t $ h
−(γ+λ)s −(γ+λ)r
ds e T (s)Ψ = he T (r)Ψ e ds e−(γ+λ)s T (s)Ψ = he−(γ+λ)u T (u) .
t 0
Assim, se agora tomarmos o limite h → 0+ na expressão (8.2.26), obtemos
1
BΦk = γΦk + (e−(γ+λ)t T (t)Ψ − 1IΨ) = γΦk + (e−γt S(t)Ψ − S(0)Ψ)
t
= γΦk + (e−γt S(t)Ψ − S(t)Ψ)
= γΦk .
571
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Demonstração. Assuma que (Ψn )n∈N ⊂ Dom(A) é uma sequência de Weyl para A e λ.
Temos que mostrar que (Ψn )n∈N também desempenha o papel de uma sequência de Weyl para
T (t) e eλt , para todo t ∈ R+ . Através da Eq.(8.2.23), defina uma nova sequência
$ t
λt
Φn = (T (t) − e )Ψn = ds eλ(t−s) T (s)(A − λ1I)Ψn .
0
Obviamente, pelo Lema 8.1, esses vetores satisfazem, para alguma constante c > 0, a estimativa
?$ t ?
? ?
? λ(t−s)
T (s)(A − λ1I)Ψn ?
∥Φn ∥ = ? ds e ? # c∥(A − λ1I)Ψn ∥ → 0 , quando n → ∞ .
0
Portanto, eλt é um auto-valor aproximado de T (t) e (Ψn )n∈N ⊂ Dom(A) serve como a
mesma sequência de Weyl para todo t " 0.
9
Em particular, o tempo não é um observável no sentido por nós atribuído aos observáveis físicos posição,
momentum e energia, isto é, como sendo operadores auto-adjuntos.
572
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
evolução temporal
Ψ(x, t0 ) −−−−−−−−−−−−→ Ψ(x, t) .
Assuma que os dois vetores de estado Ψ(x, t0 ) e Ψ(x, t) estão relacionados da seguinte
forma:
Ψ(x, t) = U (t, t0 )Ψ(x, t0 ) ,
em que U (t, t0 ) é um operador chamado operador de evolução temporal.
Outra propriedade que exigimos que o operador de evolução temporal satisfaça é a proprie-
dade de composição:
Isto significa que, se quisermos obter a evolução temporal de t0 para t2 , obteríamos o mesmo
resultado se considerássemos primeiro a evolução temporal de t0 para t1 e depois de t1 para
t2 . Isto implica que, o operador de evolução temporal satisfaz a propriedade de composição
de grupo. Note também que, em particular, U (t0 , t0 ) = 1I. De fato, se tomamos t2 = t0 na
Eq.(8.3.1), obtemos
573
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Nota 8.6. Note que a condição de unitariedade U ∗ (t)U (t) = U (t)U ∗ (t) = 1I implica
que U ∗ (t) = U −1 (t) = U (−t), para todo t ∈ R. Além disso, deve ficar claro que, na
condição de continuidade forte é suficiente assumir s = 0 e Ψ em um subconjunto denso
de H . Além disso, uma vez que os operadores U (t) são unitários, é suficiente assumir
que limt→0 ⟨Ψ, U (t)Ψ⟩ = ⟨Ψ, Ψ⟩, para Ψ em um subconjunto denso de H . Se o espaço
de Hilbert H é separável, a condição de continuidade forte pode ser substituída por uma
condição mais fraca, isto é, exigindo-se que para Ψ, Φ ∈ H a função t 3→ ⟨Φ, U (t)Ψ⟩ sobre
R seja mensurável a Lebesgue (veja Reed-Simon, Volume I, Teorema VIII.9). Finalmente, como
∥U (t)∥ = 1 para todo t ∈ R, o grupo-C0 é naturalmente um grupo unitário.
Muitas vezes, é mais conveniente considerar o operador evolução temporal infinitesimal, isto
é,
Ψ(x, t0 + ∆t) = U (t0 + ∆t, t0 )Ψ(x, t0 ) .
Por causa da continuidade, expressa pelo limite
o operador evolução temporal infinitesimal deve ser igual ao operador identidade quando ∆t →
0:
lim U (t0 + ∆t, t0 ) = 1I .
∆t→0
Note que, o limite acima nos permite propor o seguinte ansatz em primeira ordem em ∆t:
Aqui, o termo de ordem (∆t)2 foi desprezado. Isto nos leva à seguinte
DEFINIÇÃO 8.7. Seja U (t) um grupo-C0 unitário; então, o gerador infinitesimal de U (t) é o
operador A dado por
5
U (t)Ψ − Ψ dU (t) 55
AΨ = i lim =i Ψ5 , (8.3.2)
t→0 t dt 5
t=0
com Dom(A) sendo o conjunto formado por todos os Ψ ∈ H para os quais o limite (8.3.2) é
bem definido.
574
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Estamos agora em condições de deduzir uma equação diferencial fundamental para o opera-
dor U (t, t0 ). Para tanto, exploramos a propriedade de composição, considerando as evoluções
temporais t0 → t e t → t + ∆t:
, -
i
U (t + ∆t, t0 ) = U (t + ∆t, t)U (t, t0 ) = 1I − H∆t U (t, t0 ) ,
#
em que a diferença entre os tempos (t + ∆t) − t0 não precisa ser infintesimal. Logo,
i
U (t + ∆t, t0 ) − U (t, t0 ) = − H∆t U (t, t0 ) ,
#
e se U (t, t0 ) como uma função de t é diferenciável sobre R, então, por um processo de passar
ao limite, segue que
∂ U (t + ∆t, t0 ) − U (t, t0 )
i# U (t, t0 ) = i# lim = H U (t, t0 ) , (8.3.3)
∂t ∆t→0 ∆t
que é uma equação tipo-Schrödinger para o operador U (t, t0 ). Para sistemas conservativos,
isto é, para os quais H não depende explicitamente do tempo, a Eq.(8.3.3) pode ser formalmente
integrada sem dificuldades. Impondo a condição inicial U (t0 , t0 ) = 1I, obtém-se a expressão
U (t, t0 ) = e−i(t−t0 )H/# .
Note que a Eq.(8.3.3) nos diz que a curva Ψ(t, x) = U (t)Ψ0 (t0 , x) ∈ H satisfaz a equação
diferencial
∂
i# Ψ(t, x) = HΨ(t, x) . (8.3.4)
∂t
dado que Ψ0 ∈ Dom(H). A maioria dos livros-texto sobre mecânica quântica resolve formal-
mente a Eq.(8.3.4) estabelecendo que Ψ(t, x) = e−itH/# Ψ0 (t0 , x). Além disso, os livros-texto
costumam sustentar que um hamiltoniano hermitiano H é capaz de gerar uma evolução tem-
poral unitária e−itH/# para todo t real. É bem verdade que para um hamiltoniano hermitiano
limitado e−itH/# é de fato unitário para todo t. No entanto, o hamiltoniano de Schrödinger,
Eq.(8.1.2), é ilimitado. Neste caso, o resultado chave para a questão sobre quando a evolução
temporal é bem definida, é respondida pelo seguinte
TEOREMA 8.5. e−itH/# é unitário se, e somente se, o operador H for auto-adjunto.
575
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
dU (t)
i = AU (t) = U (t)A ; (8.4.1)
dt
576
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
? ? ? ? 1
λ?(A ± iλ1I)−1 Φ? # ∥Φ∥ =⇒ ?(A ± iλ1I)−1 Φ? # ∥Φ∥ .
λ
Isto prova a estimativa (8.4.5). Consequentemente, explorando a estimativa (8.4.5), segue que
? > ?
? ? ? 1 2= ?
?Aλ Ψ? = ? λ (A + iλ1I) + (A − iλ1I) Ψ?
−1 −1
?2 ?
1 2 =?
?
? ?
−1 ? ?
?>
−1 ?
# λ (A + iλ1I) Ψ + (A − iλ1I) Ψ
2
F G
1 2 ∥Ψ∥ ∥Ψ∥
# λ + = λ∥Ψ∥ .
2 λ λ
def. i = >
Bλ = λ (A + iλ1I)−1 − (A − iλ1I)−1 .
2
i = >
Bλ A = λ (A + iλ1I)−1 − (A − iλ1I)−1 A
2
i = −1 −1
>
= λ (A + iλ1I) A − (A − iλ1I) A
2
i = −1 −1
>
= λ (A + iλ1I) (A + iλ1I − iλ1I) − (A − iλ1I) (A − iλ1I + iλ1I)
2
i = >
= λ 1I − (A + iλ1I)−1 (iλ1I) − 1I − (A − iλ1I)−1 (iλ1I)
2
1 = >
= λ2 (A + iλ1I)−1 + (A − iλ1I)−1 = Aλ .
2
577
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
1
# ∥AΦ∥ → 0 quando λ→∞.
λ
Observe que a convergência acima não é uniforme; ela é uma convergência ponto-a-ponto, pois
depende do vetor Φ ∈ Dom(A)! Uma vez que Dom(A) é denso e ∥Bλ ∥ # 1, temos que
Bλ Φ → Φ, quando λ → ∞, para qualquer Φ ∈ H . Finalmente, tomando Φ = AΨ, para
qualquer Ψ ∈ Dom(A), obtemos que
Bλ Φ → Φ =⇒ Bλ AΨ → AΨ =⇒ Aλ Ψ → AΨ , (8.4.6)
quando λ → ∞. Isto confirma que o operador A pode ser aproximado pelos operadores
limitados Aλ !
Continuando, uma vez que os operadores Aλ são limitados, podemos definir a exponencial
iAλ
e por séries de potência. Vamos mostrar que a família eiAλ , para λ > 0, é uma família de
Cauchy, no sentido que
? iA ′ ?
lim ?(e λ − eiAλ )Ψ? = 0 , (8.4.7)
′
λ,λ →∞
para todo Ψ ∈ Dom(A). Para provar este fato, representamos o operador dentro da norma da
seguinte forma:
$ 1
iAλ′ iAλ ∂ . isAλ′ i(1−s)Aλ /
e −e = ds e e .
0 ∂s
578
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Uma vez que Aλ é simétrico e limitado, ele é auto-adjunto pelo Teorema 4.14 (Teorema Hellinger-
Toeplitz). Logo,
= ⟨Ψ, Ψ⟩
= ∥Ψ∥2 .
Isto implica que ∥eiAλ Ψ∥ = ∥Ψ∥, ou seja, eiAλ é unitário. Assim, usando a unitariedade de
eiAλ e o fato que Aλ e Aλ′ comutam, obtemos
?$ ?
? iA ′ ? ? 1 ∂ . isAλ′ i(1−s)Aλ / ?
?(e λ − eiAλ )Ψ? = ? ds e e Ψ?
? ∂s ?
0
?$ 1 ?
? . / ?
=? ?
isA
ds e λ e′ i(1−s)A λ
i Aλ′ − Aλ Ψ?
?
0
$ 1 ? . / ?
# ds ?eisAλ′ ei(1−s)Aλ i Aλ′ − Aλ Ψ?
0
$ 1 ?. / ? ?. / ?
# ds ? Aλ′ − Aλ Ψ? = ? Aλ′ − Aλ Ψ? .
0
A passagem da segunda para terceira linha na expressão acima, onde aparece a desigualdade,
pode ser provada escrevendo a integral como um limite de somas de Riemann e usando a
desigualdade triangular (veja, por exemplo, W. O. Amrein, “Non-Relativistic Quantum Dynamics,”
D. Reidel Publishing Company, 1981, Proposição 1.21, pg.23). Dessa forma, a Eq.(8.4.6) implica
que (8.4.7) é satisfeita.
A propriedade de Cauchy (8.4.7) indica que, para qualquer Ψ ∈ Dom(A), os vetores eiAλ Ψ
convergem para um elemento do espaço de Hilbert quando λ → ∞. Assim, mesmo que A seja
ilimitado, em um conjunto denso de vetores Dom(A) ⊂ H , o operador eiA pode ser obtido
através do limite
def.
eiA Ψ = lim eiAλ Ψ , ∀ Ψ ∈ Dom(A) . (8.4.9)
λ→∞
Além disso, como já mostramos que o teorema vale para operadores limitados, temos que
∥eiA Ψ∥ # ∥Ψ∥, para todo Ψ ∈ Dom(A), que é denso em H , ou seja, o operador eiA é
limitado também. Com efeito, segue que
? iA ? ? iA ?
?e Ψ? = ?(e − eiAλ )Ψ + eiAλ Ψ?
? ? ? ?
# ?(eiA − eiAλ Ψ? + ?eiAλ Ψ?
? ?
= ?(eiA − eiAλ )Ψ? + ∥Ψ∥ (eiAλ é unitário, pois Aλ é limitado) .
579
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
qualquer que seja Ψ ∈ Dom(A). Portanto, de acordo com o teorema de extensão, Teorema
4.5, a definição acima pode ser estendida para todo Ψ ∈ H . Isso define a função exponencial
eiA para qualquer operador auto-adjunto A ilimitado. Além disso, temos também que
∗
= lim ⟨Ψ, e−iAλ eiAλ Ψ⟩
λ→∞
= ⟨Ψ, Ψ⟩
= ∥Ψ∥2 .
? ?
Isto prova que de fato ?eiA ? = 1. Em particular, isso nos permite definir a função exponencial
e−itA , para todo Ψ ∈ Dom(A) e todo t ∈ R. Com isto provamos a Eq.(8.4.4)!
Vamos provar a propriedade de grupo (8.4.3). Para isso, usamos mais uma vez a Eq.(8.4.9) e
a Nota 8.3, já que Aλ é um operador limitado:
[ \
⟨Φ, U (t1 )U (t2 )Ψ⟩ = lim Φ, e−it1 Aλ e−it2 Aλ Ψ
λ→∞
[ \
= lim Φ, e−i(t1 +t2 )Aλ Ψ
λ→∞
[ \
= Φ, e−i(t1 +t2 )A Ψ = ⟨Φ, U (t1 + t2 )Ψ⟩ .
Para provar (8.4.1), tome Ψ ∈ Dom(A) e use a propriedade de grupo (8.4.3) para computar
, -
U (s + t)Ψ − U (t)Ψ U (s)Ψ − Ψ
= U (t) .
s s
dU (t)
i Ψ = U (t)AΨ .
dt
580
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Por outro lado, usando a propriedade de grupo (8.4.3) e comutatividade de U (s) e U (t),
podemos escrever
. / . /
U (s + t)Ψ − U (t)Ψ U (s) U (t)Ψ − U (t)Ψ
= .
s s
Portanto, novamente, o limite
. / . /
dU (t) U (s + t)Ψ − U (t)Ψ U (s) U (t)Ψ − U (t)Ψ
i Ψ = i lim = i lim ,
dt s→0 s s→0 s
. /
existe e é igual A U (t)Ψ no lado direito, pela Eq.(8.3.2). Logo, se Ψ ∈ Dom(A), então
e−itA Ψ ∈ Dom(A). Consequentemente,
d −itA
i e Ψ = Ae−itA Ψ , ∀ Ψ ∈ Dom(A) .
dt
Logo, para t = 0, segue que U (0)Ψ = Ψ =⇒ U (0) = 1I. Além disso, se usarmos (8.4.1),
então,
dU (t)
i = AU (t) = U (t)A ,
dt
dU (t)
i Ψ0 = U (t)AΨ0 ,
dt
em que Ψ0 = Ψ0 (t0 ), com t0 arbitrário, porém fixo. Então, de acordo com a Eq.(8.2.5), segue
que
$ s $ s $ s
d
U (s)Ψ0 − Ψ0 = dt U (t)Ψ0 = dU (t)Ψ0 = −i dt U (t)AΨ0 .
0 dt 0 0
581
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
O teorema acima tem como consequência imediata o fato que, sendo o hamiltoniano, H,
auto-adjunto, o problema de Cauchy (8.1.1) - (8.1.3) tem uma solução única que conserva a
probabilidade. De fato, Ψ(t) = U (t)Ψ0 é a única solução de (8.1.1) - (8.1.3), uma vez que
se5 existirem duas soluções Ψ1 e Ψ2 , então, a diferença, ΨN = Ψ1 − Ψ2 , resolve (8.1.1) com
N5
Ψ = 0, e, portanto, pela conservação da probabilidade (uma consequência da simetria de
t=0
N
H), ∥Ψ(t)∥ N
= ∥Ψ(0)∥ N ≡ 0. Logo, conclui-se que, neste
= 0 para todo t. Isso implica que Ψ
caso, o problema de Cauchy (8.1.1) - (8.1.3) é bem-posto.
Voltamos, agora, nossa atenção para o principal resultado deste capítulo: o Teorema de
Stone, que é o inverso do Teorema 8.6. Note que se {U (t) = e−itA }t∈R para um operador
auto-adjunto A, então, pela Definição 8.7 podemos recapturar A. Esta é a rota seguida na prova
do Teorema de Stone.
TEOREMA 8.7 (Teorema de Stone). 10 Seja {U (t) = e−itA }t∈R um grupo-C0 de operadores
unitários sobre um espaço de Hilbert H , em que A é o gerador infinitesimal do grupo. Então, A
é um operador auto-adjunto.
$ 5∞
∞
i(z−x)t ei(z−x)t 55 1
i dt e = = se Im z > 0 .
0 z − x 50 x−z
(ii) Vamos mostrar que Ran(A − z1I)−1 é denso em H . Para isto, devemos mostrar que
se ⟨Φ, (A − z1I)−1 Ψ⟩ = 0, para todo Ψ ∈ H , então Φ = 0. Com efeito,
O $ ∞ P $ ∞
−1 izt
0 = ⟨Φ, (A − z1I) Ψ⟩ = Φ, i dt e U (t)Ψ =i dt eizt ⟨Φ, U (t)Ψ⟩ .
0 0
10
Marshall Stone formulou e provou o teorema que leva seu nome em 1932.
582
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
1
# ∥Φ∥∥U (t)Ψ∥
Im z
1
= ∥Φ∥∥Ψ∥ .
Im z
Aqui, a passagem do módulo do produto interno sob o sinal integral é justificada pelo fato de
Im z > 0 e U (t) ser fortmente contínuo. Isto implica que, para qualquer Ψ ∈ H , devemos
ter ∥Φ∥ = 0; mas pela definição de norma (Definição 2.10), isto implica que Φ = 0.
(iii) Vamos mostrar que A é um operador fechado. Com efeito, suponha que Ψn ∈
Dom(A), Ψn → Ψ e Φn → Φ em que Φn = AΨn . Devemos mostrar que Ψ ∈ Dom(A) e
AΨ = Φ. Tome
Λn = (A − z1I)Ψn =⇒ Λn → Φ − zΨ .
Como (A − z1I)−1 é um operador limitado, concluímos que
Logo, (A − z1I)Ψ = Φ − zΨ; isto implica que Ψ ∈ Dom(A) = Dom(A − z1I) e que
AΨ = Φ. Logo, A é fechado.
segue que (A − z1I)−1 Ψ ∈ Dom(A − z1I) = Dom(A) e isto implica que Dom(A) é denso
em H uma vez que Ran(A − z1I)−1 é denso. Em particular, tomando z = i em (8.4.10),
obtemos que Ran(A − i1I) é denso em H . Por sua vez, pela Proposição 3.14 e pelo Teorema
4.18, isto implica que {0} = Ran(A − i1I)⊥ = Ker(A∗ + i1I).
(v) Definindo
$ 0
−1
(A − z1I) = −i dt eizt U (t) para Im z < 0 ,
−∞
podemos repetir os argumentos das etapas (i), (ii) e (iii) e concluir que a relação (8.4.10)
continua válida para Im z < 0. Em particular, tomando z = −i, obtemos que Ran(A + i1I)
é denso em H . Novamente, pela Proposição 3.14 e pelo Teorema 4.18, isto implica que
{0} = Ran(A + i1I)⊥ = Ker(A∗ − i1I).
583
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
= ⟨AΦ, Ψ⟩ ,
para todo Φ, Ψ ∈ Dom(A) para os quais o limite existe.11 Isto mostra que A é simétrico.12
Por outro lado, como A é fechado, Ker(A∗ ± i1I) = {0} e Ran(A ± i1I) = H , então,
pelo Teorema 4.25, A é auto-adjunto.
TEOREMA 8.1a. A dinâmica quântica existe se, e somente se, o operador hamiltoniano H é
auto-adjunto.
Por conta do Teorema de Stone e do Teorema 8.6, existe uma correspondência de um-para-
um entre operadores auto-adjuntos e grupos unitários uni-paramétricos fortemente contínuos.
Assim, deve ser possível caracterizar certas propriedades de um grupo em termos de seu
gerador infinitesimal e vice-versa. Por exemplo, entre outras aplicações importantes do Teorema
de Stone está a teoria da representação de grupos de Lie de simetrias contínuas. De fato, um
grupo unitário uni-paramétrico fortemente contínuo não é senão uma representação unitária do
grupo de Lie R.
11
Na penúltima linha definimos τ = −t!
12
Poderíamos ter chegado à mesma conclusão a partir da Definição 8.7 considerando a seguinte relação:
Dessa forma, atuando na expressão acima com o operador id/dt e tomando t = 0, obtemos:
584
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Nota 8.7. Neste ponto, chamamos a atenção para o seguinte fato importante: se o hamiltoniano
H associado a um sistema quântico é um operador auto-adjunto e se assumirmos que A = iH,
então, (A − λ1I)−1 = i(H − iλ1I)−1 e as hipóteses do Teorema de Hille-Yosida seguem das
propriedades bem conhecidas dos operadores auto-adjuntos. Neste caso, o semi-grupo-C0 é
unitário, sendo denotado por U (t) = e−iHt . Desse modo, em um espaço de Hilbert H ,
em certo sentido, o Teorema de Stone é um caso especial no quadro mais amplo criado pelo
Teorema de Hille-Yosida.
Nota 8.8 (Estados estacionários e constantes do movimento). Em geral, se o hamiltoniano
H de um determinado sistema possui um espectro discreto σdisc (H), todo auto-vetor Ψ de
H associado ao auto-valor E ∈ σdisc (H), tem uma evolução trivial. Em outras palavras, para
um sistema conservativo, ou seja, aquele para o qual o operador hamiltoniano não depende
explicitamente do tempo, se Ψ(t0 ) é um auto-estado de H com auto-valor E, então,
Neste caso, diz-se que o estado Ψ(t0 ) é um estado estacionário e, de acordo com o Teorema
de Stone e o Teorema 8.3, sua evolução temporal é dada por
Dessa forma, o estado varia apenas em sua fase ao longo do tempo, e em um instante arbitrário
de tempo, Ψ(t) é um auto-estado de H com auto-valor E. Neste caso, E pertence ao espectro
discreto de H e a função Ψ(t0 ) solução da Eq.(8.4.11) é chamada de estado ligado. Para os
estados ligados, as energias possíveis são valores E ∈ σdisc (H). Por outro lado, se E pertence
ao espectro essencial de H, Ψ(t0 ) é chamado de estado espalhado. De acordo com a discussão
sobre o Tripleto de Gelf’and no Capítulo 6, Seção 6.8, tal estado pertence ao auto-subespaço
generalizado associado ao operador para o auto-valor E. Em muitos casos de interesse, H será
um operador diferencial e, ao encontrar soluções de (8.4.11), condições terão que ser impostas
a essas soluções para garantir que Ψ(t0 ) pertença a σdisc (H) (estados ligados) ou σess (H)
(estados espalhados).
585
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
#2 d 2
H = H0 = − .
2m dx2
isto é, Ψ deve ser duas vezes diferenciável. Entretanto, muitas vezes, olhar só para esta condição
pode nos levar à um resultado inesperado, com as funções Ψ’s podendo não estar entre as Ψ’s
para as quais H foi definido. Por exemplo, no livro de Griffiths,13 assume-se que
i
30
Ψ(x) = x(ℓ − x) para 0 # x # ℓ (e Ψ(x) = 0 caso contrário) ,
ℓ5
é uma função de onda normalizada representando o estado da partícula quântica em um
determinadoHinstante. Vamos computar a incerteza na medida da energia da partícula, isto é,
∆Ψ (E) = ⟨H 2 ⟩Ψ − (⟨H⟩Ψ )2 . O cálculo do valor esperado da energia é imediato e nos dá o
seguinte resultado:
$ ℓ
⟨H⟩Ψ = ⟨Ψ, HΨ⟩ = dx Ψ(x) (HΨ)(x)
0
$ ℓ
30 #2 d2
=− 5 dx x(ℓ − x) x(ℓ − x)
ℓ 2m 0 dx2
5#2
= .
mℓ 2
#4 d4 Ψ
Como H 2 Ψ = 4m2 dx4
= 0, o valor médio do operador H 2 no estado Ψ desaparece
$ ℓ
2 2
⟨H ⟩Ψ = ⟨Ψ, H Ψ⟩ = dx Ψ(x) (H 2 Ψ)(x) = 0 . (8.5.1)
0
Por outro lado, lembremos que qualquer partícula quântica confinada no poço de potencial
infinito, seja qual for seu estado, é convenientemente descrita por um pacote de ondas, que
pode ser sintetizado por meio da soma de ondas senoidais.14 Especificar a lista completa
de ondas senoidais fornece uma descrição completa da partícula. Em outras palavras, se
especificarmos exatamente que ondas senoidais são necessárias para construir um pacote de
13
D.J. Griffiths, “Introduction to Quantum Mechanics,” Prentice-Hall, 1995, pg.30.
14
De acordo com a Análise de Fourier, qualquer onda, de extensão e formato arbitrariamente complexos, pode
ser representada por meio de uma série formada de ondas senoidais. Todos os dias você deve usar tecnologia
baseada na Análise de Fourier, uma vez que a decomposição de uma onda em suas ondas senoidais constituintes
é a base da tecnologia de compressão de áudio e vídeo. Para detalhes matemáticos sobre o assunto, veja os
excelentes livros de D.G. Figueiredo, “Análise de Fourier e Equações Diferenciais Parciais,” Projeto Euclides, IMPA,
2007 e R. Iório Jr. e V.M. Iório, “Equações Diferenciais Parciais: Uma Introdução,” Projeto Euclides, IMPA, 1988.
586
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
ondas e exatamente quanto de cada onda senoidal precisamos combinar para ter o formato
exato, chegaremos a uma representação do pacote de ondas, porém totalmente equivalente.
Por exemplo, assumindo ℓ = 20, na Figura 8.1 a curva pontilhada representa o resultado
da soma das duas ondas representadas pelos dois primeiros gráficos na Figura 8.2, a curva
tracejada é formada pela soma das quatro ondas mostradas na mesma figura, enquanto que a
linha sólida mostra o que ocorre quando se soma as dez primeiras ondas. Quanto mais ondas
senoidais somamos, mais pronunciado fica o pico central.
Figura 8.1: Representação de pacotes de ondas. O pacote de ondas representado pela linha
pontilhada contém menos ondas do que a curva tracejada, que, por sua vez, contém menos
ondas do que a curva em linha sólida (figura retirada, e adptada, do livro de Brian Cox e Jeff
Forshaw, “The Quantum Universe,” DaCapo Press, 2011. Todos os Direitos Reservados).
Figura 8.2: As primeiras quatro ondas estacionárias, com n ímpar, usadas para montar os
pacotes de ondas na Figura 8.1 (figura retirada, e adptada, do livro de Brian Cox e Jeff Forshaw,
“The Quantum Universe,” DaCapo Press, 2011. Todos os Direitos Reservados).
Em termos gerais, o fato da partícula quântica estar confinada no poço implica que o pacote
de ondas que representa a partícula, bem como todas as ondas senoidais, estão também presas
dentro do poço. Isso faz com que surja um fenômeno conhecido como “ondas estacionárias,”
isto é, ondas que não mudam suas formas. Uma onda estacionária é um estado quântico puro,
com todos os observáveis a ele associado sendo independentes do tempo. As ondas estacionárias
587
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
descrevem uma partícula que só pode ter certos valores de energia bem definida (em vez de
uma superposição quântica de diferentes energias). Esse estado é também chamado auto-vetor
de energia ou auto-função de energia. Assim, qualquer pacote de ondas pode ser constituído
por uma combinação linear de ondas estacionárias, as auto-funções de H. Vamos aplicar esta
ideia de modo a calcular o valor médio acima a partir dos auto-valores e das auto-funções de
H,
i 6 πnx 7
2 π 2 #2 2
HΦn (x) = En Φn (x) com Φn = sin e En = n (n ∈ N) .
ℓ ℓ 2mℓ 2
Nota 8.9. As auto-funções de H têm algumas propriedades importantes: (i) elas são, alternada-
mente, pares e ímpares com respeito ao centro do poço; (ii) elas são mutuamente ortogonais
e (iii) de acordo com a Nota 8.8, uma auto-função, Φn , evolui no tempo na forma simples
U (t)Φn (x) = Φ(t, x) = e−iEn t/# Φn (x). Com isso, podemos construir uma solução mais geral
da forma
∞
<
Ψ(t, x) = an e−iEn t/# Φn (x) . (8.5.2)
n=1
588
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Assim, qual dos dois resultados acima está correto? De onde vem esta inconsistência?
Estas perguntas são importantes e merecem uma resposta, mas a resposta não pode ser dada
sem o rigor matemático necessário. O ponto é: se alguém quer realmente entender essas
questões, devemos desistir das discussões intuitivas-formais e usar as ferramentas matemáticas
apropriadas. Caso contrário, tudo permanecerá vago e indefinido.
Note que, na integral dupla a variável de integração t varia entre 0 # t # s. Como resultado
desta integral obtemos uma função do parâmetro s que, por sua vez, de acordo com a segunda
integral, varia entre 0 # s # r. Portanto, temos que 0 # t # s # r.
t t
r r
Ω ≃ Ω
r s r s
⎧ ⎧
⎪
⎪0#s#r ⎪
⎪0#t#r
⎪
⎨ ⎪
⎨
Ω: & Ω: &
⎪
⎪ ⎪
⎪
⎪
⎩ ⎪
⎩
0#t#s t#s#r
589
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Consequentemente,
$ r
#. / 1 2# r
∥HΨ∥ # ∥U (r)Ψ∥ + ∥Ψ∥ + dt (r − t)∥U (t)H 2 Ψ∥ = ∥Ψ∥ + ∥H 2 Ψ∥ .
r r# 0 r 2#
4#2 r2
∥HΨ∥2 # ∥Ψ∥ 2
+ 2∥Ψ∥∥H 2
Ψ∥ + ∥H 2 Ψ∥2 . (8.5.5)
r2 4#2
O valor mínimo para o lado direito da desigualdade acima ocorre para o instante de tempo
r = 2#∥Ψ∥1/2 ∥H 2 Ψ∥−1/2 .15 Assim, inserindo este valor de r na Eq.(8.5.5), obtemos que
∥HΨ∥2 # 4 ∥H 2Ψ∥∥Ψ∥, como queríamos provar.
Nota 8.10. A Proposição 8.4 apareceu no artigo de Daniel H.T. Franco e Lázaro S. Lima, “A
Simple Application of the Time Evolution Operator in the Solution of a Paradox in Quantum
Mechanics,” Quantum Stud.: Math. Found. 5 (2018) 273. Ela é uma adaptação, para o presente
caso, de uma desigualdade conhecida na literatura como Desigualdade de Landau-Kolmogorov-
Kallman-Rota (veja, por exemplo, K.-J. Engel & R. Nagel, “One-Parameter Semigroups for Linear
Evolution Equations,” Springer-Verlag, 2000, Cap. II, pg.59 e E. Hille, “Methods in Classical and
Functional Analysis,” Addison-Wesley, 1972, Cap. 5, pg.167).
∂Ψ
i# = HΨ , ∀ Ψ ∈ Dom(H) e t ∈ R ,
∂t
15
Observe que, claramente, o parâmetro r tem unidade de tempo!
16
Na verdade, a função Ψ é quase igual ao estado fundamental, Φ1 , visto que |a1 |2 = 0, 998555 . . .! Assim,
como seria de esperar, a energia associada com o estado representado por Ψ é muito próximo de E1 . De fato, o
valor é ligeiramente superior devido à mistura dos estados excitados.
590
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
em que Ψ0 ∈ Dom(H). Esse caminho não é universal; ele requer que o estado inicial e a
evolução do estado no tempo pertençam ao domínio Dom(H) do hamiltoniano. Nos casos
em que a equação de Schrödinger tem a forma de equações diferenciais parciais, esse requisito
significa que uma solução do problema de Cauchy é buscada sob certas condições de contorno
especificando o hamiltoniano auto-adjunto, caso contrário, a solução do problema de Cauchy
não será única (lembre-se que quando a solução é única o problema de Cauchy é chamado
bem-posto). A segunda forma consiste em avaliar o operador de evolução unitária
e, em seguida, aplicá-lo ao estado inicial. Esta forma é universal, é aplicável a qualquer estado
inicial porque o operador U (t, t0 ) é limitado e definido em todo o espaço de Hilbert H , o
estado Ψ(t)
O operador de evolução unitária U (t, t0 ) determina uma lei de evolução integral, que é
global, enquanto que a equação de Schrödinger determina uma lei de evolução diferencial, que
é local. A equação de Schrödinger pode convencionalmente ser derivada de uma lei de evolução
integral, diferenciando a última com respeito ao tempo t. Mas, de acordo com o Teorema
8.6, a derivada i dUdt(t)Ψ = HU (t)Ψ = U (t)HΨ existe se, e somente se, o estado inicial
(e então também o estado Ψ(t) = e−i(t−t0 )H/# Ψ0 (t0 )) pertencer ao domínio Dom(H). Em
outras palavras, a derivada i dUdt(t) do operador de evolução existe e é igual a HU (t) apenas
no domínio Dom(H) do hamiltoniano H. E mais, a diferenciação sucessiva do operador
de evolução temporal implica também que Ψ0 (t0 ) deve pertencer aos domínios de todas as
potências de H. No entanto, os conjuntos Dom(H n ) decrescem à medida que n;cresce. Por
sua vez, as Eqs.(8.5.2) e (8.5.3) aplicadas ao exemplo acima, indicam que se Ψ = ∞ n=1 an Φn ,
em que Φn é um sistema; ortonormalizado completo de auto-vetores de H, então, a condição
∥HΨ∥2 = ∥HΨ(t)∥2 = ∞ 2
n=1 |an |E < ∞ deve ser respeitada pela função Ψ(t) dada pela
Eq.(8.5.2) para que a equação de Schrödinger seja satisfeita. Portanto, para um hamiltoniano H
independente do tempo a simples aplicação da Proposição 8.4 esclarece o paradoxo: somente
certas combinações lineares das auto-funções de H produzem funções Ψ’s que pertencem ao
domínio de H 2 .
591
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
Além disso, a propriedade de grupo nos diz que T (t)T (−t) = T (−t)T (t) = T (0) = 1I para
todo t ∈ R. Assim, obtemos que o operador T (t) : H → H é bijetivo e T −1 (t) = T (−t)
para todo t ∈ R. Portanto, Ψ(−t) = T −1 (t)Ψ0 . Isto nos leva à seguinte interpretação:
592
O Teorema de Stone e o Fluxo do Tempo na Mecânica Quântica
593
Capítulo 9
O Teorema de Stone e as Simetrias na
Mecânica Quântica
“Symmetry is what we see at a glance; based on the fact that there is no reason for any difference. . .”
B. Pascal
595
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
9.1 Simetrias
A palavra simetria1 na Grécia antiga era sinônimo de algo bem proporcionado, bem equili-
brado e, portanto, estava relacionado com o antigo conceito de beleza. Mais tarde, o conceito de
simetria adquiriu um outro significado, mais restrito, que é exatamente o mais importante para
a ciência: diz-se que um sistema possui uma simetria sob uma operação se ele é invariante sob
essa operação.
O fato de alguns processos na Natureza apresentarem certas simetrias, nos leva a supor que
as simetrias estejam relacionadas com certas leis da Natureza. No caso da mecânica quântica as
simetrias são descritas por grupos de transformações que preservam as suas estruturas essenci-
ais. Esses grupos desempenham um papel fundamental no estudo das propriedades do sistema
quântico e revelam aspectos fundamentais da teoria que não estão presentes nem na dinâ-
mica envolvida, nem nas interações. Simetrias relacionadas com a estrutura do espaço-tempo,
denominadas “simetrias externas” (responsáveis, por exemplo, pela conservação da energia e
do momentum linear), “simetrias internas” (responsáveis, por exemplo, por governar como as
partículas podem mudar de “identidade”), o estudo dos estados invariantes ou simetrias quebra-
das espontaneamente são ingredientes padrão na descrição das teorias quânticas. Em muitos
casos, os números quânticos, ou regras de superseleção, são caracterizados por representações
de grupos de simetria.
Qualquer sistema quântico pode, em princípio, ser investigado por diferentes indivíduos, e
cada um deve, eventualmente, converter seus resultados observacionais para uma descrição
do sistema ao longo das linhas já discutidas: um espaço de Hilbert deve ser escolhido para
descrever os estados puros, e certos operadores devem ser associados com os observáveis, etc.
Naturalmente, exige-se que tudo isso permita uma tradução para a linguagem de um outro
indivíduo, ou equipe, que tenha observado o mesmo objeto, de tal forma que os resultados
estejam de pleno acordo. Por exemplo, se movemos ou giramos o nosso referencial de laboratório
isso não deve alterar as leis da Natureza observadas no laboratório. Isto não significa que uma
transformação de simetria não muda os estados físicos, mas apenas que os novos estados após
uma transformação de simetria deverão satisfazer as mesmas leis da Natureza como os outros
estados. Em particular, a probabilidade de transição entre qualquer par de estados deve ser a
mesma para dois observadores.
Portanto, simetria e invariância são sinônimo na física; o primeiro conceito está relacionado
com as estruturas intrínsecas da Natureza, enquanto o último está relacionado com a forma
matemática das equações de movimento. Como consequência disso, somos capazes de encontrar
quantidades que são conservadas. Assim, uma cadeia lógica pode ser estabelecida:
princípio de simetria ⇒ invariância da teoria ⇒ lei de conservação .
596
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
Seja G um grupo de Lie, cujos elementos g(t) têm uma dependência contínua do parâmetro
t ∈ R. Então, os elementos g(t) têm uma lei de composição simples:
e
. /
U g(0) = 1I .
O mapeamento g 3→ U (g(t))Ψ de G em H é contínuo para cada vetor Ψ ∈ H . Enquanto
G é o gerador de um grupo contínuo uni-paramétrico pelo Teorema de Stone, e e−iGt é o
equivalente a esse grupo uni-paramétrico no grupo de Lie. O mapeamento g 3→ U (g(t))Ψ de
G em H diz que esses dois grupos são mapeados um no outro pela representação g.
3
A representação anti-unitária de uma simetria aparece em aplicações relacionadas com os grupos discretos de
simetria, como a simetria de reversão do tempo e, ou simetria de paridade.
597
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
observadores estão investigando a mesma partícula, é natural assumir que eles descrevam seu
estado por funções de quadrado integrável Ψ e Ψ′ que estão relacionadas por Ψ′ (x′ ) = Ψ(x),
ou equivalentemente por
. /
Ua (t)Ψ (x) = Ψ(x + ta) , ∀ x ∈ R3 . (9.2.1)
Ou seja, o operador de translação Ua (t) desloca a função Ψ(x) ∈ L2 (R3 ) para a esquerda por
uma quantidade ta.
PROPOSIÇÃO 9.1. Sejam H = L2 (R3 ) e Ua (t) o operador de translação definido pela Eq.(9.2.1).
Então, Ua (t) é um grupo unitário uni-paramétrico fortemente contínuo.
Demonstração. Primeiro vamos provar que Ua (t) é unitário. Com efeito, para Ψ, Φ ∈ L2 (R3 ),
temos
$ ∞
[ . /\
Φ, Ua (t)Ψ = dx Φ(x)Ψ(x + ta)
−∞
$ ∞
= dx Φ(x − ta)Ψ(x)
−∞
[. / \
= U−a (t)Φ , Ψ .
Aqui, fizemos a troca de variáveis x + ta → x. Logo, Ua∗ (t) = U−a (t); por outro lado, Ua (t)
tem inverso dado por Ua−1 (t) = U−a (t). Portanto, Ua (t) é unitário, já que Ua−1 (t) = Ua∗ (t).
598
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
Para provar que Ua (t) é fortemente contínuo, tome uma função Φ em C0∞ (R3 ). A prova
vai usar um argumento-ε/3. Com efeito, como C0∞ (R3 ) é denso em L2 (R3 ), então, é sempre
possível encontrar um ε > 0 tal que para Ψ ∈ L2 (R3 ) temos ∥Φ − Ψ∥L (R3 ) # ε/3. Escolha
?. / ? 2
um δ tal que ? Ua (t)Φ − Φ? 3 < ε/3 quando |t| < δ. Então, dados t, s ∈ R tais que
L2 (R )
|t − s| < δ, obtemos
?. / . /? ?. / . /? ?. / . /?
? Ua (t)Ψ − Ua (s)Ψ ? # ? Ua (t)Ψ − Ua (t)Φ ? + ? Ua (t)Φ − Ua (s)Φ ?
?. / . /?
+ ? Ua (s)Φ − Ua (s)Ψ ?
?. /? ? 8. / 9?
= ? Ua (t)(Ψ − Φ) ? + ?Ua (s) Ua (t − s)Φ − Φ ?
?. /?
+ ? Ua (s)(Φ − Ψ) ?
Agora, lembre-se que Ua (t) e Ua (s) são operadores unitários e, portanto, preservam a norma.
Assim, podemos concluir que cada termo da última linha da equação acima é menor do que
ε/3. Isto prova a proposição.
Uma vez que mostramos que uma translação constitui um grupo unitário uni-paramétrico
fortemente contínuo, pelo Teorema de Stone existe um gerador infinitesimal auto-adjunto A, tal
que Ua (t) = eita·A .
com Dom(Pj ) sendo o conjunto de todos os Ψ ∈ H = L2 (R3 ) para os quais o limite (9.2.2)
existe. A ideia é explorar o conceito de tripleto de Gel’fand. Para isso, considere Ψ(x + tax )
uma translação na direção do eixo e1 por uma quantidade ax e assuma que o limite à direita
da Eq.(9.2.2) existe. Vamos denotar este limite por Φ ∈ L2 (R3 ). Seja Θ ∈ C0∞ (R3 ). Então,
uma vez que C0∞ (R3 ) é um subespaço denso de L2 (R3 ), seu dual D ′ (R3 ) contém o dual de
L2 (R3 ), que é o próprio L2 (R3 ). Além disso, a função Φ ∈ L2 (R3 ) define uma distribuição
TΦ ∈ D ′ (R3 ) da seguinte forma:
TΦ : C0∞ (R3 ) −→ C ,
$
Θ 3−→ TΦ (Θ) = dx Φ(x)Θ(x) = ⟨Φ, Θ⟩ , ∀ Θ ∈ C0∞ (R3 ) .
599
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
Portanto, uma vez que Θ ∈ C0∞ (R3 ), obtemos que ponto a ponto
ou seja, Φ e ∂Ψ/∂x são a mesma distribuição, isto é, o mesmo elemento de L2 (R3 ). Con-
sequentemente, identificamos o gerador infinitesimal de uma translação na direção do eixo e1
como sendo , -
i ∂Ψ i
−i# = Px Ψ(x) ,
# ∂x #
com seu domínio sendo todas as funções para as quais, no sentido das distribuições, existe o
limite em (9.2.3) e que estão novamente em L2 (R2 ). A análise é a mesma para as translações na
direção dos eixos e2 e e3 . Assim, os geradores infinitesimais do grupo unitário uni-paramétrico
das translações são os operadores Pj .
De acordo com o teorema acima, podemos afirmar que o domínio de P pode ser definido
com sendo
b . / c
U a (t)Ψ (x) − Ψ(x)
Dom(P ) = Ψ ∈ L2 (R3 ) | lim existe e está em L2 (R3 ) ,
t→0 t
Já vimos no Capítulo 4 que o operador momentum sobre o sem-eixo R+ não tem qualquer
extensão auto-adjunta. Assim, a exponenciação de P , U (a) = e−iaP não pode definir um
operador unitário, uma vez que
,$ ∞ -1/2 ,$ ∞ -1/2 ,$ ∞ -1/2
2 2 2
∥U (a)Ψ∥2 = dx |Ψ(x − a)| = dx |Ψ(x)| ̸= dx |Ψ(x)| .
0 −a 0
Portanto, ao operarmos com o operador U (a) = e−iaP sobre a função de onda Ψ perdemos a
normalização e, assim, a unitariedade. Em outras palavras, a translação da coordenada x para
a direita nunca levará a função de onda Ψ além de um ponto final à direita. Por outro lado,
ao considerarmos translações para a esquerda nos deparamos com uma barreira de potencial
infinitamente alta na origem e a função Ψ deve se anular neste ponto. No entanto, a função de
onda Ψ não pode simplesmente desaparecer, porque se não U (a) não seria unitário. Portanto,
ela deveria reaparecer no ∞, em um intervalo de tempo finito, para conservar a probabilidade.
Mas isto, mesmo para a teoria quântica, é impossível! Logo, P não pode ser auto-adjunto e
nem possuir extensões auto-adjuntas em L2 (0, ∞). Dessa forma, U (a) = e−iaP não pode
definir um operador unitário em L2 (0, ∞). Por outro lado, isso também explica porque P já
é essencialmente auto-adjunto em L2 (−∞, ∞). Com efeito, como, agora, é possível transladar
livremente a função de onda Ψ para ambos os lados em R, o gerador de infinitesimal de
translações está bem posto, isto é,
,$ ∞ -1/2 ,$ ∞ -1/2
2 2
∥U (a)Ψ∥2 = dx |Ψ(x − a)| = dx |Ψ(x)| = ∥Ψ∥2 .
−∞ −∞
Logo, U (a) = e−iaP define um operador unitário e a probabilidade é conservada em L2 (−∞, ∞).
Finalmente, no caso do intervalo limitado [0, 1], o operador momentum em L2 ([0, 1]) não pode
ser auto-adjunta pelo seguinte motivo: se fosse, geraria um grupo uni-paramétrico representado
pelo operador U (a). Suponha que Ψ seja uma função (digamos contínua) com suporte no su-
bintervalo [α, β] ⊂ [0, 1]. Então, Ψ não pode fornecer informação suficiente para nos dizer se
ela é um elemento de L2 ([0, 1]) ou de L2 (R). Portanto, para valores suficientemente pequenos
de |a| (dependendo do suporte de Ψ), devemos ter U (a)Ψ(x) = Ψ(x − a). Agora, o que
acontece quando o suporte de Ψ(x − a) cruza o ponto 1? Usando o mesmo raciocínio do caso
o operador P em L2 (0, ∞), a função Ψ não pode simplesmente desaparecer, pois então U (a)
não seria unitário. Portanto, ela deve reaparecer em 0. Mas, deve reaparecer como ela mesmo,
com um sinal de menos ou sendo multiplicada por eiθ , por algum θ? Qualquer escolha desse
tipo estaria OK, mas isso não é determinado pelo operador P sozinho. Algumas “condições
de fronteira” devem ser especificadas. Em outras palavras, suponha que Ψ ∈ C0∞ (0, 1). Um
exemplo de tal função é
⎧ 6 7
⎨ exp − 1 − 1 se α#x#β
α−x β−x
Ψ(x) = .
⎩ 0 se x # α < 0 , x " β > 1
Se a > 1 − β parte do pacote de onda, Ψ(x), “desaparece” além do barreira infinita à direita.
Para conservar a probabilidade é necessário que o que desaparece à direita reapareça à esquerda.
601
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
É evidente que a fase da função Ψ pode ser alterada fazendo com que Ψ reapareça à esquerda.
Além disso, qualquer função deve experimentar a mesma mudança de fase. Assim, se Ψ1 e Ψ2
são duas dessas funções e se suas mudanças de fase são diferentes, digamos θ1 e θ2 , então a
translação da função Ψ = Ψ1 + Ψ2 eventualmente produziria a função Ψ′ = eiθ1 Ψ1 + eiθ2 Ψ2 .
Isto implicaria que
,$ 1 -1/2 ,$ 1 -1/2
2 2
∥U (a)Ψ∥2 = dx |Ψ(x − a)| ̸= dx |Ψ(x)| = ∥Ψ∥2 ,
0 0
Queremos descrever rotações em R3 . Elas são descritas pelo grupo ortogonal especial SO(3),
composto por todas as matrizes 3 × 3 com determinate 1.4 Como se sabe, para toda rotação em
R3 pode-se encontrar um eixo que passa através da origem e que deixa invariante a rotação.
Então, escolhendo-se os eixos corretos, o problema se reduz ao estudo de uma rotação em
R2 . De fato, para todo eixo que passa através da origem, existe associado um grupo unitário
uni-paramétrico fortemente contínuo que descreve todas as rotações entorno desse eixo, com
o parâmetro sendo o ângulo. Além disso, podemos descrever uma rotação geral qualquer pela
composição de todas as rotações através de cada um dos eixos e1 , e2 e e3 . Essa rotação geral
é chamada Rotação de Euler, e os três parâmetros associados ângulos de Euler. É importante
enfatizar que, enquanto as rotações através de um eixo comutam, a composição de todas as
rotações entorno de cada um dos eixos e1 , e2 e e3 , em geral não comutam.
⎛ ⎞
cos θ sin θ 0
⎜ ⎟
M3 (θ) = ⎜
⎝− sin θ cos θ 0 ⎟ .
⎠
0 0 1
602
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
temos as seguintes expansões de M1 (ϕ), M2 (β) e M3 (θ), próximas à matriz identidade 1I3×3 ,
respectivamente:
em que
⎛ ⎞ ⎛ ⎞
5 00 0 5 0 0 −1
dM1 (ϕ) 55 ⎜ ⎟ 5 ⎜ ⎟
⎟ , iJ2 = dM2 (β) 55 = ⎜0 0 0 ⎟ ,
iJ1 = 5 =⎜
⎝ 0 0 1⎠ ⎝ ⎠
dϕ 5 dβ 5
ϕ=0 β=0
0 −1 0 1 0 0
⎛ ⎞
5 0 1 0
dM3 (θ) 55 ⎜ ⎟
iJ3 = 5 =⎜
⎝−1 0 0 ⎟ .
⎠
dθ 5
θ=0
0 0 0
0 i 0 −i 0 0 0 0 0
Note que as matrizes Ji são hermitianas. Elas satisfazem as seguintes regras de comutação:
8 9
Ji , Jj = iεijk Jk ,
em que
⎧
⎪
⎪ +1 se (i, j, k) é uma permutação par de (1, 2, 3)
⎨
εijk = −1 se (i, j, k) é uma permutação ímpar de (1, 2, 3) . (9.2.4)
⎪
⎪
⎩
0 se pelo menos dois dos índices (i, j, k) forem iguais
PROPOSIÇÃO 9.3. Cada rotação entorno dos eixos e1 , e2 e e3 é representada por um operador
unitário uni-paramétrico fortemente contínuo.
Demonstração. Primeiro, note que podemos exponenciar facilmente os geradores Ji para obter
operadores Ui (ϕ) = eiϕJi , com i = 1, 2, 3. A ação desses operadores é definida da seguinte
forma: . /
Ui (ϕ)Ψ (x) = Ψ(Mi (ϕ)x) , ∀ Ψ ∈ L2 (R3 ) .
603
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
Ele gira a função Ψ em entorno do eixo ei por um ângulo de ϕ. Note que o operador de
rotação é unitário para todo ϕ uma vez que é uma isometria. Com efeito,
$ $
? ?2 5 52 5 52
?Ui (ϕ)Ψ? = d x 5Ui (ϕ)Ψ5 =
2
d2 x 5Ψ(Mi (ϕ)x)5
R2 R2
$
5 55 52
= d2 y 5det(Mi−1 (ϕ))55Ψ(y)5
R2 B CD E
=1
$
5 52 ? ?2
= d2 y 5Ψ(y)5 = ?Ψ? .
R2
Aqui, fizemos a troca de variáveis x → y = Mi (ϕ)x. Além disso, o operador de rotação é uma
bijeção, isto é,
. / . /. /
Ui (−ϕ)Ui (ϕ)Ψ (x) = Ui (−ϕ)Ψ Mi (ϕ)x
. /
= Ψ Mi (−ϕ)Mi (ϕ)x
= Ψ(x)
. /
= Ui (ϕ)Ui (−ϕ)Ψ (x) .
Consequentemente,
. / . /. /
Ui (θ)Ui (ϕ)Ψ (x) = Ui (θ)Ψ Mi (ϕ)x
. /
= Ψ Mi (θ)Mi (ϕ)x
. /
= Ψ Mi (θ + ϕ)x
. /
= Ui (θ + ϕ)Ψ (x) .
Aqui, usamos a propriedade bem conhecida que Mi (θ)Mi (ϕ) = Mi (θ + ϕ), que pode ser
facilmente demonstrada usando-se teoremas de adição trigonométricas. Então, se pudermos
mostrar que ϕ 3→ Ui (ϕ) é fortemente contínuo, nós mostramos que o operador Ui (ϕ) forma
um grupo unitário uni-paramétrico fortemente contínuo. Para isso, precisamos mostrar que
Ui (ϕ)Ψ → Ψ em L2 (R3 ) quando ϕ → 0 para todo Ψ ∈ L2 (R3 ). Como as rotações são
limitadas (com norma 1) será suficiente mostra que Ui (ϕ)Ψ → Ψ quando ϕ → 0 para todo
Ψ ∈ C0∞ (R3 ). Vamos usar o fato que toda função em C0∞ (R3 ) é lipschitziana.5 Desse fato,
segue que
?. / ?
? Ui (ϕ)Ψ − Ψ? = ∥Ψ(Mi (ϕ)x) − Ψ(x)∥ # C ∥Mi (ϕ)x − x∥ .
Como Ψ tem suporte compacto, existe um r > 0 tal que supp Ψ ⊆ B(0; r). Assim,
∥Mi (ϕ)x − x∥ # rϕ. Para ϕ muito pequeno, podemos escolher ϕ < ε/Cr. Logo, obte-
mos que
?. / ?
? Ui (ϕ)Ψ − Ψ? = ∥Ψ(Mi (ϕ)x) − Ψ(x)∥ < ε .
604
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
= (x1 p2 − x2 p1 )
= ℓ3
Nosso próximo passo é quantizar o sistema acima. Para isso, devemos obter operadores
L1 , L2 , L3 associados às componentes ℓ1 , ℓ2 , ℓ3 do momento angular. O colchete de Poisson
deve ser substituído por comutadores. Devido à Eq.(9.2.5), consideramos que
3 <
< 3 3 <
< 3
∂
Li = εijk Xj Pk = −i# εijk xj . (9.2.6)
j=1 k=1 j=1 k=1
∂xk
605
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
;3
LEMA 9.1. [Li , Lj ] = i# k=1 εijk Lk , em que i, j, k = 1, 2, 3.
3 <
< 3 <
3 <
3 3 4
= εikℓ εjmn Xk [Pℓ , Xm Pn ] + [Xk , Xm Pn ]Pℓ
k=1 ℓ=1 m=1 n=1
3 <
< 3 <
3 <
3 3
= εikℓ εjmn Xk [Pℓ , Xm ]Pn + Xk Xm [Pℓ , Pn ]
k=1 ℓ=1 m=1 n=1
4
+ [Xk , Xm ]Pn Pℓ + Xm [Xk , Pn ]Pℓ
3 <
< 3 <
3 <
3 3 4
= εikℓ εjmn −i#δℓm Xk Pn + i#δkn Xm Pℓ
k=1 ℓ=1 m=1 n=1
3 <
< 3 < 3 3
3 < 4
= i# −εikℓ εjmn δℓm Xk Pn + εikℓ εjmn δkn Xm Pℓ .
k=1 ℓ=1 m=1 n=1
3 <
< 3 3
3 < 4
= i# −εimk εjkℓ + εikℓ εjmk Xm Pℓ
k=1 ℓ=1 m=1
3 <
< 3 3
3 < 4
= i# εkim εkjℓ − εkiℓ εkjm Xm Pℓ
k=1 ℓ=1 m=1
3 3
3 <
< 4
= i# δij δmℓ − δiℓ δmj − δij δℓm + δim δℓj Xm Pℓ
ℓ=1 m=1
. /
= i# Xi Pj − Xj Pi .
606
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
Da mesma forma, pode-se mostrar que [L2 , L3 ] = i#L1 e [L3 , L1 ] = i#L2 . Assim, podemos
concluir que
3
<
[Li , Lj ] = i# εijk Lk , em que i, j, k = 1, 2, 3 . (9.2.7)
k=1
Note que podemos pensar o processo de quantização do momento angular como dando
origem à uma representação da álgebra de Lie de SO(3) para operadores auto-adjuntos atuando
em algum espaço de Hilbert, com os geradores sendo mapeados em operadores Li satisfazendo
a relação (9.2.7).
A seguir, estaremos interessados na propriedade espectral dos operadores Li . Para isso, será
conveniente considerar o operador
3
<
2
L = Li Li .
i=1
Demonstração. Vamos usar novamente a identidade [AB, C] = A[B, C] + [A, C]B. Logo,
3
< 3 6
< 7 < 3 6
3 < 7
[Li Li , Lj ] = Li [Li , Lj ] + [Li , Lj ]Li = εijk Li Lk + εijk Lk Li
i=1 i=1 i=1 k=1
3 6
3 <
< 7
= εijk Li Lk + εkji Li Lk
i=1 k=1
3 6
3 <
< 7
= εijk Li Lk − εijk Li Lk
i=1 k=1
=0.
607
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
O Lema 9.2 mostra que L2 comuta com todos os elementos da álgebra de Lie gerada pelos
operadores Li ; por isso L2 é chamado operador de Casimir da álgebra gerada pelos operadores
momentum angular. Portanto, L2 deve ser um múltiplo da identidade: L2 = β1I, para algum
β " 0 (lembre-se que L2 é um operador positivo). A possibilidade de que β = 0 pode ser
descartada, já que isso indicaria que a representação seria trivial. Assim, podemos assumir que
β > 0.
LEMA 9.3. Os operadores Li , com i = 1, 2, 3, são limitados.
Demonstração. Isto segue facilmente a partir do fato que os operadores L2i , com i = 1, 2, 3, são
2 2
operadores positivos e do fato que
√ L √ " Li . Isto por sua vez mostra que o espectro de cada
Li está contido no intervalo [− β, β], e, por conseguinte, os operadores Li , com i = 1, 2, 3,
são limitados.
PROPOSIÇÃO 9.4. Os operadores Li são auto-adjuntos.
Demonstração. Com efeito, a prova é análoga à prova do Proposição 9.2. Isto é, queremos
mostrar que os geradores infinitesimais de Ui (ϕ) são os operadores Li dados por
i Ψ(Mi (ϕ)x) − Ψ(x)
Li Ψ(x) = lim , (9.2.8)
# ϕ→0 ϕ
com Dom(Li ) sendo o conjunto de todos os Ψ ∈ H = L2 (R3 ) para os quais o limite (9.2.8)
existe, recorrendo-se mais uma vez ao conceito do tripleto de Gel’fand. Para isso, tome M3 (ϕ)
a matriz de rotação entorno do eixo e3 por um ângulo de ϕ e assuma que o limite à direita
da Eq.(9.2.2) existe. Vamos denotar este limite por Φ ∈ L2 (R3 ). Seja Θ ∈ C0∞ (R3 ). Então,
uma vez que C0∞ (R3 ) é um subespaço denso de L2 (R3 ), seu dual D ′ (R3 ) contém o dual de
L2 (R3 ), que é o próprio L2 (R3 ). Além disso, a função Φ ∈ L2 (R3 ) define uma distribuição
TΦ ∈ D ′ (R3 ) da seguinte forma:
TΦ : C0∞ (R3 ) −→ C ,
$
Θ 3−→ TΦ (Θ) = dx Φ(x)Θ(x) = ⟨Φ, Θ⟩ , ∀ Θ ∈ C0∞ (R3 ) .
608
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
Portanto, uma vez que Θ ∈ C0∞ (R3 ), obtemos que ponto a ponto
Θ(x1 + x2 ϕ, −x1 ϕ + x2 , x3 ) − Θ(x1 , x2 , x3 ) ∂Θ ∂Θ
lim = x2 − x1 ,
ϕ→0 ϕ ∂x1 ∂x2
lembrando que estamos tomando as derivadas em ϕ = 0. No sentido das distribuições, o limite
ponto a ponto acima implica que
O , -P O, - P
∂Θ ∂Θ ∂Ψ ∂Ψ
⟨Φ, Θ⟩ = − Ψ, x2 − x1 = x2 − x1 ,Θ ,
∂x1 ∂x2 ∂x1 ∂x2
para todo Θ ∈ C0∞ (R3 ). Logo, no sentido de derivadas fracas
Ψ(M3 (ϕ)x) − Ψ(x) ∂Ψ ∂Ψ
lim = Φ = x2 − x1 , (9.2.9)
ϕ→0 ϕ ∂x1 ∂x2
. /
ou seja, Φ e x2 ∂Ψ/∂x1 − x1 ∂Ψ/∂x2 são a mesma distribuição, isto é, o mesmo elemento
de L2 (R3 ). Consequentemente, identificamos o gerador infinitesimal de uma rotação entorno
do eixo e3 como sendo
, -
i ∂Ψ ∂Ψ i
−i#x2 + i#x1 = L3 Ψ(x) ,
# ∂x1 ∂x2 #
com seu domínio sendo todas as funções para as quais existe o limite em (9.2.9) e que estão
novamente em L2 (R2 ). A análise é a mesma para as rotações entorno dos eixos e1 e e2 . Assim,
os geradores infinitesimais do grupo unitário uni-paramétrico das rotações são os operadores
Li .
ei2πLi /# = eiθ 1I .
609
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
em que
def. 1 θ
Φ = Li − 1I .
# 2π
Novamente, lembre-se que U (t) satisfaz uma equação diferencial do tipo Schrödinger
∂
i# U (t) = ΦU (t) = U (t)Φ .
∂t
Logo, para qualquer auto-função Ψ0 do operador Li ,7 temos que
dU (t)
i# Ψ0 = U (t)ΦΨ0 ,
dt
em que Ψ0 = Ψ0 (t0 ), com t0 arbitrário, porém fixo. Disso, segue que
,$ s - ,$ s -
i
dU (t) Ψ0 = − dt U (t)Φ Ψ0 .
0 # 0
i
= − (eisλ − 1I)Ψ0 .
#
Note que, U (s)Ψ0 − Ψ0 → 0 quando s → 2π. Consequentemente, σ(Φ) ⊆ Z; isso, por sua
vez, implica que #, - %
θ
σ(Li ) ⊆ n+ #|n∈Z .
2π
Isto prova a proposição.
Podemos descrever o espectro de cada Li mais explicitamente. Vamos fazer isso para i = 3.8
Tome α ∈ σ(L3 ) e Ψ um auto-vetor, com auto-valor α. Como os operadores L3 e L2 comutam,
Ψ também é auto-vetor de L2 . Então, tome β ∈ σ(L2 ) e redefina Ψ como Ψβ,α , em que os
subscritos α e β fazem menção os auto-valores de L2 e L3 , respectivamente. Logo, iremos
7
Naturalmente Ψ0 ∈ Dom(Li ).
8
Não existe nenhuma razão especial para isso; poderíamos ter escolhido i = 1, ou i = 2.
610
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
denotar a ação dos operadores L3 e L2 sobre o espaço H = L2 (R3 ) através das seguintes
regras:
L3 Ψβ,α (x) = α#Ψβ,α(x) ,
(i)
[L3 , L± ] = [L3 , (L1 ± iL2 )]
= [L3 , L1 ] ± i[L3 , L2 ]
= i#L2 ± i(−i)#L1
= ±#(L1 ± iL2 )
= ±#L± ,
(ii)
[L+ , L− ] = [(L1 + iL2 ), (L1 − iL2 )]
= i[L2 , L1 ] − i[L1 , L2 ]
= i(−i)#L3 − i(i)#L3
= 2#L3 ,
(iii)
[L2 , L± ] = [L2 , (L1 ± iL2 )]
= i[L2 , L1 ] ± i[L2 , L2 ] = 0 .
L3 (L± Ψβ,α (x)) = L± (L3 Ψβ,α (x)) ± #L± Ψβ,α (x) (9.2.10)
611
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
Note que, podemos obter o estado Ψβ,αmin depois de n aplicações sucessivas do operador
L− ao estado Ψβ,αmax . Logo,
αmax = αmin + n ,
e como αmin = −αmax , inferimos que
n
αmax = .
2
Portanto, αmax pode ser um inteiro, ou um semi-inteiro, dependendo se n é par ou ímpar.
Resumindo, a ação dos operadores L3 e L2 sobre o espaço H = L2 (R3 ) pode ser re-escrita
da seguinte forma:
L3 Ψℓ,m (x) = m#Ψℓ,m (x) ,
612
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
ou
#, - %
1
σ(L3 ) = m+ # | m = −n, . . . , −1, 0, 1, . . . , n . (9.2.14)
2
Ainda,
! "
σ(L2 ) = ℓ(ℓ + 1)#2 | ℓ = 0, 1/2, 1, 3/2 . . . . (9.2.15)
Como ficará claro logo abaixo, a segunda possibilidade para o espectro do operador L3 será
descartada quando introduzirmos os harmônicos esféricos associados às funções de Legendre.
Entretanto, a expressão (9.2.14) ainda é importante: ela está associada com o espectro dos
operadores de momento angular de spin S1 , S2 , S3 . Eles surgem a partir de representações
unitárias do grupo de Lie SU(2).
ℓ(ℓ + 1) − m(m + 1) = ℓ2 + ℓ − m2 − m
= (ℓ2 − m2 ) + (ℓ − m)
= (ℓ + m)(ℓ − m) + (ℓ − m)
= (ℓ − m)(ℓ + m + 1) .
Como as rotações só agem sobre as variáveis angulares, sendo independentes do raio, pode-
mos definir a ação dos geradores das rotações sobre H = L2 (S 2 ), em que
! "
S 2 = (x, y, z) ∈ R3 | x2 + y 2 + z 2 = 1 ,
em que m e ℓ(ℓ + 1) são números reais. Lembre-se que, como L2 é um operador positivo,
devemos ter ℓ(ℓ + 1) " 0. Será conveniente escrever L3 e L± em coordenadas esféricas.
613
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
Para isto, vamos relembrar brevemente algumas propriedades relacionadas à esse sistema de
coordenadas.
er
eϕ
P
eθ
r cos θ
r
θ
y
ϕ r sin θ
Note que, r representa a distância da origem até o ponto P e, portanto, o módulo do vetor
posição r. Por sua vez, θ é o ângulo formado por r e o eixo-z (positivo) e ϕ é o ângulo formado
pela projeção de r sobre o plano-xy e o eixo-x (positivo). As relações entre as coordenadas
retangulares e as coordenadas esféricas são, como se pode observar
de forma que
(x2 + y 2 )1/2 y
r = (x2 + y 2 + z 2 )1/2 , tan θ = , tan ϕ = .
z x
er · er = eθ · eθ = eϕ · eϕ = 1
er · eθ = eθ · eϕ = eϕ · er = 0 (9.2.16)
er × eθ = eϕ , eθ × eϕ = er , eϕ × er = eθ .
614
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
A = Ar er + Aθ eθ + Aϕ eϕ .
eϕ = − sin ϕ ei + cos ϕ ej .
Portanto, temos
ek = cos θ er − sin θ eθ .
r = r er ,
com sua diferencial podendo ser obtida diretamente, usando-se (9.2.17) e (9.2.18), isto é,
dr = dr er + r dθ eθ + r sin θ dϕ eϕ . (9.2.19)
Seja u uma quantidade escalar que é função da posição, de maneira que podemos escrever
u = u(r, θ, ϕ). Neste caso, u é chamado campo escalar. Então, em algum outro ponto P ′ que
está deslocado de P por dr, o valor de u mudará para u + du. De fato,
∂u ∂u ∂u
du = dr + dθ + dϕ , (9.2.20)
∂r ∂θ ∂ϕ
615
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
com as derivadas sendo avaliadas no ponto P , isto é, ∂u/∂r = (∂u/∂r)|P , e assim por diante.
Logo, comparando (9.2.19) e (9.2.20), podemos expressar du como o produto escalar de dr e o
vetor
∂u 1 ∂u 1 ∂u
∇u = er + eθ + e , (9.2.21)
∂r r ∂θ r sin θ ∂ϕ ϕ
em que
∂ 1 ∂ 1 ∂
∇= er + eθ + e ,
∂r r ∂θ r sin θ ∂ϕ ϕ
é o operador gradiente em coordenadas esféricas. Ou seja,
du = ∇u · dr .
LEMA 9.5. Em coordenadas esféricas os operadores L2 , L3 e L± são dados pelas seguintes ex-
pressões: , , - -
2 2 1 ∂ ∂ 1 ∂2
L = −# sin θ + ,
sin θ ∂θ ∂θ sin2 θ ∂ϕ2
∂
L3 = −i# ,
∂ϕ
e , -
±ϕ ∂ ∂
L± = #e ± + i cot θ .
∂θ ∂ϕ
Demonstração. Vamos começar, pela sequência, provando a expressão para L2 . Partimos com-
putando diretamente a expressão
( 3 < 3
)( 3 < 3
)
< ∂ < ∂
L2 = i# εijk xj i# εimn xm
j=1 k=1
∂xk ℓ=m n=1
∂xn
3 <
< 3 <
3 <
3 , -
2 ∂ ∂
= −# (δjm δkn − δjn δkm ) xj xm
j=1 k=1 ℓ=m n=1
∂x k ∂xn
( 3 3 3 3 3 < 3
)
< ∂ < < ∂ ∂ < ∂ < ∂ ∂
2
= −# xj + xj xj −3 xj − xj xk .
j=1
∂xj j=1 k=1
∂xk ∂xk j=1
∂xj j=1 k=1
∂xj ∂xk
616
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
Note que o último termo da equação acima pode ser escrito da seguinte forma:
3 <
< 3 <3 3 3
∂ ∂ ∂ < ∂ < ∂
xj xk = xj xk − xj .
j=1 k=1
∂xj ∂xk j=1
∂xj k=1 ∂xk j=1
∂xj
Assim,
( 3 3 < 3 3 3
)
< ∂ < ∂ ∂ < ∂ < ∂
L2 = −#2 − xj + xj xj − xj xk
j=1
∂xj j=1 k=1
∂xk ∂xk j=1
∂xj k=1 ∂xk
6 7
= −#2 −(1 + r · ∇)r · ∇ + r 2 ∇2 .
617
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
e
6 7 ,∂ 1 ∂
-
L2 = ej · L = −i# sin θ sin ϕ er + cos θ sin ϕ eθ + cos θ eϕ · e − e
∂θ ϕ sin θ ∂ϕ θ
, -
∂ ∂
= i# − cos θ + cot θ sin ϕ ,
∂θ ∂ϕ
Portanto,
F6 7∂ 6 7 G
∂
L± = i# sin ϕ ∓ i cos ϕ + cos ϕ ± i sin ϕ cot θ
∂θ ∂ϕ
, - , -
±iϕ ∂ ±iϕ ∂ ±iϕ ∂ ∂
= i# ∓ie + e cot θ = #e ± + i cot θ .
∂θ ∂ϕ ∂θ ∂ϕ
A prova está completa.
A equação de auto-valores
L3 Yℓm = m#Yℓm ,
em coordenadas esféricas assume a seguinte forma:
∂
Yℓm (θ, ϕ) = imYℓm (θ, ϕ) .
∂ϕ
Neste ponto, deve-se enfatizar que a unicidade de Φm (ϕ) ao longo do intervalo [0, 2π] exige
que m seja um número inteiro.10 Como já antecipado, isso descarta a possibilidade (9.2.14) do
espectro do operador L3 .
10
Φm (ϕ) deve ser periódica em ϕ, com período 2π, isto é, Φm (ϕ + 2π) = Φm (ϕ).
618
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
A forma explícita de Yℓm (θ, ϕ) pode ser encontrada da seguinte forma: a partir da equação
de auto-valores
L2 Yℓm (θ, ϕ) = ℓ(ℓ + 1)#2 Yℓm (θ, ϕ) ,
segue que
, -
#2 ∂2 ∂ 1 ∂2 ℓ(ℓ + 1)#2
−√ + cot θ + Θℓm (θ)eimϕ = √ Θℓm (θ)eimϕ .
2π ∂θ2 ∂θ sin2 θ ∂ϕ2 2π
segue que
∂ ∂2
Yℓm (θ, ϕ) = imYℓm (θ, ϕ) =⇒ 2
Yℓm (θ, ϕ) = −m2 Yℓm (θ, ϕ) .
∂ϕ ∂ϕ
Esta equação é conhecida como a equação diferencial de Legendre. Suas soluções podem ser
expressas em termos das funções de Legendre Pℓm (cos θ):
em que
d|m|
Pℓm (cos θ) = (1 − cos2 θ)|m|/2 Pℓ (cos θ) .
d(cos θ)|m|
1 dℓ
Pℓ (cos θ) = (cos2 θ − 1)ℓ .
2ℓ ℓ! d(cos θ)ℓ
619
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
Esta relação é conhecida como a condição de normalização dos harmônicos esféricos. Conse-
quentemente, obtemos
M, - b
2ℓ + 1 (ℓ − m)! ℓ"0
Cℓm = (−1)m , .
2 (ℓ + m)! |m| # ℓ
Concluindo, temos que os harmônicos esféricos normalizados são dados pela seguinte ex-
pressão:
M, - b
2ℓ + 1 (ℓ − m)! ℓ"0
Yℓm (θ, ϕ) = (−1)m Pℓ (cos θ)eimϕ , .
2 (ℓ + m)! |m| # ℓ
Uma outra operação simples que podemos considerar é a transformação de escala. Claro
que ela tem de ser definida de uma maneira que seja unitária.
Naturalmente,
/ . /
(Us (µ)Us (λ)Ψ (x) = eµ/2 eλ/2 Ψ eµ (eλ x)
= e(µ+λ)/2 Ψ(e(µ+λ) x)
/
= (Us (µ + λ)Ψ (x) , Ψ∈H .
Aqui, fizemos a troca de variáveis eλ x → x. Logo, Us∗ (λ) = Us (−λ); por outro lado, Us (λ)
tem inverso dado por Us−1 (λ) = Us (−λ). Portanto, Us (λ) é unitário, já que Us−1 (λ) =
620
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
Us∗ (λ). Note que, o operador Us (λ) de fato preserva a norma. Com efeito,
$ ∞
?. /?2 8 9
? Us (λ)Ψ ? = dx Ψ(x)Us−1 (λ) eλ/2 Ψ(eλ x)
−∞
$ ∞
= dx Ψ(x)e−λ/2 eλ/2 Ψ(e−λ (eλ x))
−∞
? ?2
= ?Ψ? .
eλ/2 − 1 ? ?
= λ
∥Ψ(x)∥ + ?Ψ(eλ x) − Ψ(x)? .
e
O primeiro termo, obviamente, vai para zero como λ → 0. Por isso, vamos estudar o segundo
termo. Como no caso das rotações, é suficiente mostrar que o segundo termo vai a zero,
quando λ → 0, para todo Ψ ∈ C0∞ (R). Vamos usar novamente o fato que toda função
em C0∞ (R) é lipschitziana. Assim, como Ψ tem suporte compacto, existe um r > 0 tal que
supp Ψ ⊆ B(0; r), e para λ muito pequeno, então
? ? ? ?
?Ψ(eλ x) − Ψ(x)? # C ?eλ x − x? # Cλr < ε .
com λ ∈ R e Ψ ∈ L2 (Rn ).
PROPOSIÇÃO 9.6. O gerador infinitesimal do grupo das transformações de escala é o operador
i 1 1! "
Λs = − 1I + XP = X, P ,
2 # 2#
! "
em que X, P = XP + P X é o anti-comutador dos operadores X e P .
621
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
622
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
O próximo exemplo descreve um tipo diferente de operador unitário. Sabemos que para uma
função Ψ, solução da equação de Schrödinger, |Ψ(x)|2 é interpretado como a densidade de
probabilidade de encontrarmos uma partícula (como o elétron) no ponto x. A função de onda
Ψ não representa uma quantidade mensurável. Isto significa que, de acordo com o primeiro
postulado da mecânica quântica, podemos multiplicar Ψ por uma fase sem mudar a realidade
física. Tal operação é chamada transformação de calibre. Aqui tentaremos descrever os aspectos
particulares que envolvem este tipo de transformação.
Vamos iniciar considerando o caso simples da equação de Schrödinger para uma partícula
livre
#2 2 ∂Ψ
− ∇ Ψ = i# . (9.2.27)
2m ∂t
∂ ′ ∂ ∂
Ψ (t, x) = eiϑ(t,x) Ψ(t, x) + ieiϑ(t,x) Ψ(t, x) ϑ(t, x)
∂t ∂t ∂t
os termos extras nas equações acima quebram o caráter covariante da equação de Schrödinger.
Vemos, assim, que a invariância sob uma transformação de fase local não é uma propriedade
compartilhada pela equação de onda da partícula livre. Para recuperarmos a invariância perdida,
a equação de onda da partícula livre deve ser modificada. No entanto, a nova equação não
descreverá mais uma equação de onda de uma partícula livre, mas uma partícula movendo-se
sob a ação de algum campo de força. No caso da Eq.(9.2.27) a invariância sob a transformação
de fase local (9.2.29) é obtida definindo-se novos operadores diferenciais chamados derivadas
covariantes. Eles são definidos da seguinte forma:
∂
D = ∇ − iqA , Dt = + iqϕ . (9.2.30)
∂t
623
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
É uma tarefa fácil checar que a Eq.(9.2.31) é invariante sob a transformação (9.2.29), se os
novos campos introduzidos, A e ϕ, também se transformarem da seguinte forma:
1 1 ∂ϑ
A → A′ = A + ∇ϑ , ϕ → ϕ′ = ϕ − . (9.2.32)
q q ∂t
Demonstração. Novamente, voltamos a olhar para o conjunto das funções Ψ ∈ L2 (R) para o
qual o limite
. /
U (τ )Ψ ( · ) − Ψ( · ) eiτ ϑ( · ) Ψ( · ) − Ψ( · )
−i lim = −i lim = AΨ( · ) ,
τ →0 τ τ →0 τ
existe no sentido L2 . Este será o domínio Dom(A) de A. Naturalmente, se o limite existe, ele
é dado por
. /
U (τ )Ψ ( · ) − Ψ( · )
−i lim = ϑ( · )Ψ( · ) .
τ →0 τ
Por outro lado, um cálculo simples mostra que, para cada função Ψ tal que ϑΨ ∈ L2 (R),
o limite realmente existe. Logo, interpretamos A como sendo o operador de multiplicação
A = Tϑ , maximalmente definido, que atua em uma função Ψ multiplicada ponto a ponto pela
função ϑ.
624
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
A fim de motivar como uma simetria pode ser implementada no nível de operadores ili-
mitados, considere um hamiltoniano auto-adjunto H no espaço de Hilbert H e assuma que
i
U (t) = e− ! tH define um grupo fortemente contínuo a um parâmetro implementando a evo-
lução unitária do sistema quântico. Então, se G é uma simetria de um sistema quântico,
representada pela representação unitária U de G sobre um espaço de Hilbert H , isto é,
g 3→ U (g(λ)) = e−iλG , em que G são os geradores infinitesimais, é natural exigir que
U (g(λ)) e U (t) comutem, ou seja,
U (t)U (g(λ)) = U (g(λ))U (t) , t, λ ∈ R , g ∈ G . (9.3.1)
Recordando que o domínio de H é dado por
b . / c
U (t) − 1I Ψ
Dom(H) = Ψ ∈ H | −i lim existe ,
t→0 t
625
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
ou,
i i
−iGe−iλG e− ! tH Ψ(0) = −ie− ! tH e−iλG GΨ(0) .
Logo,
6 i
7
e−iλG GΨ(t) − e− ! tH GΨ(0) = 0 .
i
Portanto, GΨ(t) = e− ! tH GΨ(0), para todo t. Isto implica que
i i
⟨G⟩Ψ(t) = ⟨Ψ(t), GΨ(t)⟩ = ⟨e− ! tH Ψ(0), e− ! tH GΨ(0)⟩ = ⟨Ψ(0), GΨ(0)⟩ = ⟨G⟩Ψ(0) .
O teorema está provado.
Nota 9.4. É importante que seja enfatizado que o Teorema de Noether não tem um análogo
para simetrias discretas!
A noção de uma corrente de probabilidade é útil na mecânica quântica, pois, associada com
a equação de Schrödinger, ela pode ser usada para derivar uma lei de conservação de uma
quantidade física expressa como uma equação de continuidade, como mostra a seguinte
PROPOSIÇÃO 9.9. Se Ψ ∈ Dom(H), então j satisfaz a equação da continuidade
∂
|Ψ(t, x)|2 = ∇ · j(t, x) = 0 .
∂t
∂Ψ(t, x) #2 2
−i# =− ∇ Ψ(t, x) + V (x)Ψ(t, x) . (9.4.2)
∂t 2m
Então, tomando Ψ(t, x) × (9.4.1) − Ψ(t, x) × (9.4.2), obtemos:
∂ . / i# . /
Ψ(t, x)Ψ(t, x) = − ∇ · Ψ(t, x)∇Ψ(t, x) − ∇Ψ(t, x)Ψ(t, x) .
∂t 2m
Isso prova a proposição.
626
O Teorema de Stone e as Simetrias na Mecânica Quântica
627
Capítulo 10
Operadores de Schrödinger
B. Simon
629
Operadores de Schrödinger
então, sob quais hipóteses impostas sobre V , H0 + V é auto-adjunto? Aqui, estaremos inte-
ressados em analisar essa questão. Existe uma vasta literatura que discute este assunto. Um
aspecto importante aqui diz respeito à invariância da auto-adjunção de H0 sob perturbações.
Com efeito, uma vez que H0 é um operador auto-adjunto, se V for um operador limitado, então
é fácil ver que H0 + V é auto-adjunto no domínio Dom(H0 + V ) = Dom(H0 ). Entretanto,
em muitas situações de interesse o potencial V é um operador ilimitado, e é importante co-
nhecer um critério que garanta a auto-adjunção de H0 + V . Se H0 + V é limitado por baixo,
a extensão de Friedrichs produz uma extensão auto-adjunta H de H0 + V . Por outro lado, em
muitas aplicações, V é limitado em relação a H0 com limite < 1. Neste caso, podemos aplicar
o critério de perturbação de Kato e o Teorema de Kato-Rellich para deduzir que o operador
H0 + V é bem definido e auto-adjunto. Este cenário contempla praticamente todos os casos de
interesse da mecânica quântica.
(H0 + V )Ψ = H0 Ψ + V Ψ .
Note que Dom(H0 + V ) é o maior conjunto sobre o qual a soma H0 + V faz sentido e
Dom(H0 + V ) é um espaço vetorial. Assim, para se obter o operador de Schrödinger, H0 + V ,
nós temos que “meramente” dar sentido à soma de dois operadores auto-adjuntos ilimitados.
Esta tarefa, no entanto, torna-se mais difícil do que poderia ser esperado.1 Em particular, se V é
uma função muito singular, então H0 + V pode deixar de ser auto-adjunto, ou essencialmente
auto-adjunto, em qualquer domínio natural. Em particular, vamos examinar quais os critérios
que o operador V deve satisfazer para que o operador de Schrödinger H0 +V seja auto-adjunto,
ou essencialmente auto-adjunto, em algum domínio natural dentro L2 (Rn ).
630
Operadores de Schrödinger
• o outro domínio razoável é denominado domínio mínimo, no sentido de que ele tenha o
menor domínio possível. Ele definido como sendo o conjunto
Nota 10.1. É mais natural considerar o negativo do laplaciano −∇2 , já que, como um operador,
ele não é negativo (veja o Teorema 10.29). Com relação ao domínio máximo do operador
−∇2 , deve ficar claro para o leitor porque se afirmou que −∇2 Ψ ∈ L2 (Rn ) no sentido
das distribuições. Com efeito, as funções que aparecem na mecânica quântica nem sempre
são diferenciáveis no sentido clássico. Por isso, é importante entender o que é uma derivada
distribucional.
5 5
PROPOSIÇÃO 10.1. Denote por Tmax = −∇2 5 e Tmin = −∇2 5 . Então,
Dommax Dom
min
^
(i) Ψ ∈ Dommax (−∇2 ) se, e somente se, ∥k∥2 Ψ(k) ∈ L2 (Rn ) e neste caso
6 7
Tmax Ψ(x) = F −1 ∥k∥2 Ψ(k)^ ;
^
−∇ 2
T = ∥k∥2 T^ ,
que é válida para qualquer distribuição temperada. Pela Proposição 10.2 abaixo, a multiplicação
por ∥k∥2 é auto-adjunta no conjunto
3 4
^
Ψ ∈ L2 (Rn ) | ∥k∥2 Ψ(k) ∈ L2 (Rn ) .
∗
Para provar que Tmin é essencialmente auto-adjunto basta mostrar que Tmin = Tmax , uma
N ∗∗ ∗
vez que Tmin = Tmin = Tmax . Para isto, assuma que Ψ ∈ Dom(Tmin ). Então,
631
Operadores de Schrödinger
E mais, de acordo com Exemplo 6.17, Dommax (−∇2 ) = H2 (Rn ), que é exatamente o espaço
de Sobolev de ordem 2. Além disso, como o hamiltoniano livre, H0 é auto-adjunto, então são
também auto-adjuntos as potências do hamiltoniano livre, H0m , visto que H0m = F −1 ∥k∥m F .
Assim, o domínio de H0m é o espaço de Sobolev de * ordem 2m. Isto, imediatamente, implica
que um vetor Ψ ∈ L2 (Rn ) está em C ∞ (H0 ) = ∞ m
m=1 Dommax (H0 ) se, e somente se,
Ψ ∈ C ∞ (Rn ) e D α Ψ ∈ L2 (Rn ) para todo α. Neste capítulo, os espaços mais relevantes
são L2 (Rn ) (por motivo já explicado no Capítulo 3) e H1 (Rn ), que consiste de funções de
quadrado integrável, cujas derivadas distribucionais também são funções de quadrado integrável.
Isto se deve aos seguintes fatos óbvios: (i) como já explicado no Capítulo 6, os espaços de
Sobolev H1 (Rn ) e H2 (Rn ) respeitam a inclusão H2 (Rn ) ⊂ H1 (Rn ) e (ii) temos que
$ $ $
2
− dx Ψ(x)∇ Ψ(x) = dx ∇Ψ(x)∇Ψ(x) = dx |∇Ψ(x)|2 . (10.1.3)
Rn Rn Rn
Q;
n
Aqui, ∇Ψ = (∂1 Ψ, . . . , ∂n Ψ) é o gradiente de Ψ e |∇Ψ| = j=1 |∂j Ψ|
2 é o comprimento
euclidiano do gradiente.
Agora, suponha que Ω é um subconjunto não vazio e aberto de Rn com fecho Ω e fronteira
∂Ω; em particular Ω pode ser o próprio Rn . Sabemos que C0∞ (Ω) é um subespaço denso
no espaço L2 (Ω). Em C0∞ (Ω), uma forma quadrática q E é bem definida pela Eq.(10.1.3). Essa
forma quadrática é chamada de forma de Dirichlet em Ω. É densamente definida e positiva,
mas não fechada. No entanto, o forma de Dirichlet tem uma extensão fechada. De fato, se Ω for
limitado,2 com fronteira ∂Ω suave, o completamento de C0∞ (Ω) com respeito à norma-forma
∥ · ∥H1 (Ω)
$ 6 7
2 2 2
∥Ψ∥H1 (Ω) = dx |Ψ(x)| + |∇Ψ(x)| ,
Ω
632
Operadores de Schrödinger
Suponha que v : Rn → R é uma função contínua, porém não necessariamente limitada, tal que
3 4
Dom(V ) = Ψ ∈ L2 (Rn ) | v(x)Ψ(x) ∈ L2 (Rn ) .
ou $
8 9
dx Ψ(x)v(x) − Λ(x) Φ(x) = 0 ,
Rn
para todo Φ ∈ Dom(V ). Tomando Φ = (Ψv − Λ)χEm , vemos que Ψv − Λ é zero em quase
toda parte em Em , para todo m; logo, é zero em quase toda parte em Rn . Assim, Ψv é igual
à Λ como um elemento de L2 (Rn ). Isto mostra que Ψ ∈ Dom(V ). Consequentemente,
Dom(V ) = Dom(V ∗ ). Uma vez que V ∗ é uma extensão de V , concluímos que V é
auto-adjunto em Dom(V ).
PROPOSIÇÃO 10.3. Seja V um operador multiplicação em L2 (Rn ), com domínio
3 4
n n
Dom(V ) = Ψ ∈ L2 (R ) | v(x)Ψ(x) ∈ L2 (R ) .
633
Operadores de Schrödinger
Assim,
$ $
2 2 2
∥V Ψ∥ = dx |v(x)| |Ψ(x)| # ∥v∥∞ dx |Ψ(x)|2 = ∥v∥2∞ ∥Ψ∥2 .
Rn Rn
Portanto, se v ∈ L∞ (Rn ), então ∥V ∥ # ∥v∥∞ . Por outro lado, tome ε > 0, arbitrariamente
pequeno, e 3 4
Fε = x ∈ Rn | |v(x)| > ∥v∥∞ − ε .
Se Ψ ∈ L2 (Rn ) é tal que ∥Ψ∥ ≠ 0 para todo x ∈/ Fε , então, ∥V Ψ∥/∥Ψ∥ " ∥v∥∞ − ε. Como
ε é arbitrariamente pequeno, isto implica que ∥V ∥ " ∥v∥∞ . Assim, ∥V ∥ = ∥v∥∞ .
Isto mostra que ∥V Ψm ∥/∥Ψm ∥ " m. Como m é arbitrário, o operador V não pode ser
limitado.
A seguir, vamos ver como o critério de Kato, discutido na Seção 4.9, nos permite estabelecer
a auto-adjunção dos operadores de Schrödinger
#2 2
H=− ∇ +V .
2m
3
Compare esta definição com a Definição 4.31.
634
Operadores de Schrödinger
O próximo resultado apresenta alguns exemplos de potenciais de Kato-Rellich que são im-
portantes na teoria quântica.
TEOREMA 10.1 (Perturbação de H0 : exemplos de potenciais de Kato-Rellich). Se n #
3, então o operador de Schrödinger H = H0 + V em L2 (Rn ) é auto-adjunto no domínio
Dom(H0 ), em qualquer das seguintes circunstâncias:
(i) V ∈ L∞ (Rn );
(ii) V ∈ L2 (Rn );
(iv) V ∈ Lloc n 2
2 (R ), Dom(−∇ ) ⊂ Dom(V ) e
$
M = sup dx |V (x)|2 < ∞ ,
c∈Rn B[c;1]
! "
em que B[c; 1] = x ∈ Rn | ∥x − c∥ # 1 é a bola unitária fechada centrada em c.
Demonstração. Por simplicidade, vamos ignorar as constantes físicas, isto é, vamos usar uni-
dades atômicas com #2 = 2m = 1. Tecnicamente, a ideia básica do argumento é pegar uma
constante arbitrária α > 0 e considerar que para n # 3, para toda Ψ ∈ Dom(H0 ) ⊂ L2 (Rn ),
a função k 3→ (α2 + ∥k∥2 )−1 ∈ L2 (Rn ), pelo Lema 6.5.4 Além disso, L2 (Rn ) ∋ (α2 +
^
∥k∥2 )Ψ(k) = F (α2 Ψ + H0 Ψ). Logo, pela desigualdade de Hölder,
^
(α2 + ∥k∥2 )−1 (α2 + ∥k∥2 )Ψ(k) ∈ L1 (Rn ) ,
e, portanto
$
^ 1=
∥Ψ∥ ^
dk (α2 + ∥k∥2 )−1 (α2 + ∥k∥2 )|Ψ(k)|
Rn
,$ -1/2 ,$ -1/2
# 2
dk (α + ∥k∥ ) 2 −2 2 ^
dk (α + ∥k∥ ) |Ψ(k)|2 2
2
.
Rn Rn
635
Operadores de Schrödinger
em que ωn−1 é a área da esfera unitária S n−1 em Rn . Na integral acima fizemos a troca de
variável k → αk. Por sua vez, a integral
$ ∞
dk k 2 (1 + k 2 )−2 ,
0
pode ser “facilmente” calculada realizando-se mais uma troca de variável: k → tan ϕ. Neste
caso,
$ ∞ $ π/2 $
2 2 −2 2 1 π/2
dk k (1 + k ) = dϕ sin ϕ = dϕ (1 − cos 2ϕ)
0 0 2 0
5π/2 5π/2
1 55 1 5
5 π
= ϕ 5 − sin 2ϕ 5 = .
2 5 4 5 4
0 0
^ 1# ωn−1 π −1/2 ^ 2
∥Ψ∥ α ∥(α2 + ∥k∥2 )Ψ∥
4
ωn−1 π 6 3/2 ^ 7
^ 2 .
# α ∥Ψ∥2 + α−1/2 ∥∥k∥2 Ψ∥
4
Pela transformada de Fourier inversa segue que
$
1 ^
Ψ(x) = dk e−ikx Ψ(k) .
(2π)n Rn
^ ∈ S (Rn ). Além disso, da
Claramente, pela Proposição 6.7, Ψ é uma função contínua se Ψ
mesma proposição, a estimativa
$
1 5 5
sup |Ψ(x)| # n
dk 5e−ikx Ψ(k)
^ 5
x∈Rn (2π) Rn
$
1 5 5
= n
dk 5^
Ψ(k)5
(2π) Rn
1 ^ 1,
= ∥Ψ∥
(2π)n
^ ∈ L1 (Rn ) uma vez que
mostra que Ψ é uma função contínua para uma função arbitrária Ψ
n n
S (R ) é denso em L1 (R ). Logo,
1 ^ 1
∥Ψ∥∞ # ∥Ψ∥
(2π)n
ωn−1 π 6 3/2 ^ −1/2 2^
7
# α ∥Ψ∥2 + α ∥∥k∥ Ψ∥2
4(2π)n
ωn−1π 6 3/2 −1/2
7
= α ∥Ψ∥ 2 + α ∥H 0 Ψ∥ 2 , ∀n # 3 .
4(2π)n
Na última passagem foi usado o Corolário 6.14. Isto completa a prova.
636
Operadores de Schrödinger
Prova do Teorema 10.1. (i) Se V ∈ L∞ (Rn ), então, pela desigualdade de Hölder (veja Lema 6.9),
segue que ∥V Ψ∥2 # ∥V ∥∞ ∥Ψ∥2 . Consequentemente, o critério de perturbação de Kato será
satisfeito tomando-se a = 0 e b = ∥V ∥∞ . Assim, V ∈ L∞ (Rn ) é infinitesimalmente pequeno
em relação ao operador H0 . Logo, H = H0 + V é auto-adjunto no domínio Dom(H0 ).
(ii) Assuma V ∈ L2 (Rn ). Novamente, pela desigualdade de Hölder, segue que ∥V Ψ∥2 #
∥V ∥2 ∥Ψ∥∞ . Assim, pelo Lema 10.1, temos
ωn−1 π . 3/2 −1/2
/
∥V Ψ∥2 # ∥V ∥2 α ∥Ψ∥ 2 + α ∥H 0 Ψ∥ 2 .
4(2π)n
∥V Ψ∥2 = ∥(V1 + V2 )Ψ∥2 # ∥V1 Ψ∥2 + ∥V2 Ψ∥2 # ∥V1 ∥2 ∥Ψ∥∞ + ∥V2 ∥∞ ∥Ψ∥2 ,
ou seja,
ωn−1 π . 3/2 /
∥V Ψ∥2 # ∥V1 ∥2 n
α ∥Ψ∥2 + α−1/2 ∥H0 Ψ∥2 + ∥V2 ∥∞ ∥Ψ∥2
4(2π)
, -
∥V1 ∥2 ωn−1 π ∥V1 ∥2 ωn−1 π
= n 3/2
+ ∥V2 ∥∞ ∥Ψ∥2 + ∥H0 Ψ∥2 .
4(2π) α 4(2π)n α1/2
∥V1 ∥2 ωn−1 π
n
< α1/2 ,
4(2π)
as hipóteses do Teorema de Kato-Rellich são satisfeitas (pois isto implica que a < 1). Portanto,
H = H0 + V é auto-adjunto no domínio Dom(H0 ).
Nota 10.3. Neste ponto, uma observação importante com relação ao item (iii) deve ser feita.
Para Rn , n " 4, o Teorema 10.1 vale para V ∈ Lp (Rn ) + L∞ (Rn ), com p > 2 se n = 4 e
p " n/2 se n " 5 (veja, por exemplo, o Teorema X.29, em M. Reed e B. Simon, “Methods of
Modern Mathematical Physics. Fourier Analysis, Self-Adjointness,” Vol.II, Academic Press, 1975).
637
Operadores de Schrödinger
(iv) Como −∇2 e V são dois operadores lineares densamente definidos em um espaço de
Hilbert H , com −∇2 sendo um operador auto-adjunto e V um operador simétrico, tal que
Dom(−∇2 ) ⊂ Dom(V ), então, de acordo com Lema 4.7, segue que V é −∇2 -limitado. Isto
implica que existem constantes positivas a e b tais que
Escolha Ψ ∈ C0∞ (Rn ) tal que Ψ(x) = 1 para todo x na bola unitária fechada B[0; 1]. Para
c ∈ Rn , considere a função transladada Ψc (x) = Ψ(x − c). Então, Ψc = 1 sobre B[c; 1], e
$ $ $
2 2
dx |V (x)| = dx |V (x)Ψc (x)| # dx |V (x)Ψc (x)|2
B[c;1] B[c;1] Rn
= ∥V Ψc ∥22
. /2
# a∥ − ∇2 Ψc ∥2 + b∥Ψc ∥2
. /2
= a∥ − ∇2 Ψ∥2 + b∥Ψ∥2 ,
com a e b dados por (4.9.1). Como o lado direito não depende de c, o supremo do lado esquerdo
com c ∈ Rn é finito, isto é, M < ∞. Assim,
pertence à uma classe de potenciais chamada classe Stummel. Um potencial V sobre Rn é dito
ser da classe de Stummel se a seguinte condição local é satisfeita: fixe n " 4 e 0 < α < 4 e
(n)
assuma que Sα é o conjunto de funções, V , sobre Rn obedecendo
$
sup dx ∥x − c∥−(n−4+α) |V (x)|2 < ∞ . (10.1.6)
c∈Rn ∥x−c∥#α
638
Operadores de Schrödinger
(n)
O resultado acima estabelece que se V ∈ Sα , então, V é infinitesimalmente pequeno em
relação ao operador H0 , já que a constante a pode ser tomada arbitrariamente próxima de zero.
Nota 10.5 (Um pouco mais sobre o Teorema 10.1, item (iv)). No Teorema 10.1, item (iv), a
condição (10.1.5) é necessária para que uma função V em Rn seja relativamente H0 -limitada.
Com uma prova um pouco mais complexa, usando estimativas de Sobolev, pode-se se provar
que esta condição também é suficiente em dimensões n # 3. As estimativas de Sobolev
estabelecem que se definirmos q = ∞ para n # 3 e assumirmos que 2 # q < ∞ para n = 4
e 2 # q < 2n/(n − 4) para d " 5, então, para cada a > 0, existe uma constante b > 0,
dependendo de a, n e q, tal que Ψ ∈ Lq (Rn ) e
∥Ψ∥q # a∥ − ∇2 Ψ∥2 + b∥Ψ∥2 , ∀ Ψ ∈ Dom(−∇2 ) .
A prova deste resultado pode ser encontrada no livro de K. Schmüdgen, “Unbounded Self-Adjoint
Operators on Hilbert space,” Springer, 2012, Lema 8.9 e no livro de M. Reed e B. Simon, “Methods
of Modern Mathematical Physics II. Fourier Analysis and Self-Adjointness,” Academic Press, New
York 1975, Theorema IX.28. A seguir, defina p tal que p−1 + q −1 = 2−1 , com p = 2 se n # 3,
p > 2 se n = 4 e p > n/2 se n " 5. Então, qualquer função de valor real V em Rn que
satisfaça a condição
,$ -1/p
p
∥V ∥p = sup |V (x)| dx < ∞ (diz-se que V é localmente uniformemente Lp ) ,
y∈Rn ∥x−y∥#1
639
Operadores de Schrödinger
Nota 10.6 (Classe de potenciais de Rollnik). Do ponto de vista das formas quadráticas, uma
grande classe de potenciais em R3 para a qual a forma-soma −∇2 +̇V existe pelo Teorema
KLMN (Teorema 4.37) é a classe R de Rollnik, ou seja, o conjunto de funções reais V em R3
satisfazendo a condição
$ $
2 |V (y)||V (x)|
∥V ∥R = dxdy <∞. (10.1.7)
R3 R3 ∥x − y∥2
A classe de potenciais de Rollnik com a norma ∥·∥R é um espaço vetorial normado completo.
Pode-se mostrar que se V ∈ R+L∞ (R3 ), então, V é relativamente uma forma (−∇2 )-limitada
com a (−∇2 )-forma limitada por zero. Portanto, a forma-soma −∇2 +̇V existe pelo Teorema
KLMN. Além disso, temos L3/2 (R3 ) ⊂ R (veja o Apêndice 10.A). Por exemplo, se γ ∈ R e α < 2,
então, V (x) = γ∥x∥−α ∈ L3/2 (R3 ) ⊂ R e, portanto, a forma-soma −∇2 +̇V existe. Por outro
lado, pelo Teorema 10.1, o operador −∇2 + V é auto-adjunto em L2 (R3 ) quando α < 3/2 (veja
o Exercício 10.5). Ou seja, o Teorema KLMN permite tratar potenciais com “singularidades mais
fortes” do que aqueles potenciais considerados no Teorema 10.1. Um tratamento detalhado da
classe de potenciais de Rollnik pode ser encontrado no texto de B. Simon, “Quantum Mechanics
for Hamiltonians Defined as Quadratic Forms,” Princeton Series in Physics 68, 1971.
Nosso primeiro resultado fundamental estabelece que o operador H0 não possui auto-valores.
Em outras palavras, o espectro de H0 é puramente contínuo (já mostramos isto no caso
unidimensional no Exemplo 5.7, na pg.291).
640
Operadores de Schrödinger
(−∇2 − λ1I)G = δ .
=δ∗Φ
=Φ
Note que, pela transformada de Fourier, F [−∇2 − λ1I] = ∥k∥2 − λ, e este operador não tem
zeros, uma vez que λ ∈ ρ(−∇2 ). Portanto, F [G] = (2π)−3 (∥k∥2 − λ)−1 é uma distribuição
temperada bem-definida. Portanto, se pudermos encontrar uma expressão para G, então teremos
uma representação explícita para o resolvente do operador −∇2 . Vamos ver como obter esta
representação.
ou
$ $
1 2 ^ 1 ^
dk (∥k∥ − λ)Ψ(k) e−ik·x = dk Φ(k) e−ik·x .
(2π)3 (2π)3
Definimos,
$
1
def.
G(x − y; λ) = dk (∥k∥2 − λ)−1 e−ik·(x−y) ,
(2π)3
641
Operadores de Schrödinger
como sendo a função de Green em L2 (R3 ). Vamos computar a integral acima usando coorde-
nadas esféricas. Com efeito,
$
1
G(x − y; λ) = dk (∥k∥2 − λ)−1 e−ik·(x−y)
(2π)3
$ ∞ $ π $ 2π
1
= 3
dκ dθ dφ κ2 sin θ (κ2 − λ)−1 e−iκ∥x−y∥ cos θ
(2π) 0 0 0
$ ∞ $ 1 $ 2π
1
= dκ dγ dφ κ2 sin θ (κ2 − λ)−1 e−iκ∥x−y∥γ
(2π)3 0 −1 0
$ ∞
i . /
= 2
dκ κ(κ2 − λ)−1 e−iκ∥x−y∥ − eiκ∥x−y∥ ,
(2π) ∥x − y∥ 0
$
+ dω ω(ω 2 − λ)−1 eiω∥x−y∥
CR
A função √ √
f (ω) = ω(ω 2 − λ)−1 eiω∥x−y∥ , com ω ∈ C \ {− λ, λ} ,
satisfaz a condição√do Lema de Jordan (Lema
√ 6.19, aqui com ∥x − y∥ no lugar de k) para todo
R > 0 com R ̸= λ. Note que, para R > λ,
|Reiθ | R R→∞ 0 .
M(R) = max = 2
2
θ∈[0,2π] |R e2iθ − λ| R − λ −−−→
√ √
Como, para Im λ > 0, a única singularidade de f no semi-plano superior é ω = λ, a
aplicação do Teorema dos Resíduos produz
$ ∞ √
dκ κ(κ2 − λ)−1 eiκ∥x−y∥ = 2πi Res f ( λ) .
−∞
642
Operadores de Schrödinger
√ √ √
Uma vez que ω = λ é um pólo simples de f e ω 2 − λ = (ω − λ)(ω + λ), então
√ √ √ −1 iω∥x−y∥ 1 i√λ∥x−y∥
Res f ( λ) = lim
√ (ω − λ)f (ω) = lim
√ ω(ω + λ) e = e .
ω→ λ ω→ λ 2
Por conta
√ disso, para um número complexo λ ∈
/ [0, ∞), com o ramo da raiz quadrada dado
por Im λ > 0, segue que
$
. 2
/ 1 1 √
Rλ (−∇ )Φ (x) = dy ei λ∥x−y∥ Φ(y) , ∀ Φ ∈ L2 (R3 ) .
4π ∥x − y∥
Note que, para Φ ∈ L2 (R3 ), novamente usando coordenadas esféricas, segue que
, $ -1/2
? ? 1 1 √
?Rλ (−∇2 )Φ? = dy e−2Im λ∥x−y∥
|Φ(y)|2
2 16π 2 ∥x − y∥2
, $ ∞ $ π $ 2π √
-1/2
1 1
# ∥Φ∥2 dr dθ dφ r sin θ 2 e−2Im λr
2
16π 2 0 0 0 r
, $ ∞ √
-1/2
1 −2Im λr
= ∥Φ∥2 dr e
4π 0
( 5∞ )1/2
1 √ 5
5
= ∥Φ∥2 − √ e−2Im λr 5
8πIm λ 5
0
1
= H √ ∥Φ∥2 .
2 2πIm λ
643
Operadores de Schrödinger
é puramente essencial. Isto prova que σdisc (−∇2 ) = ∅ e σess (−∇2 ) = [0, ∞). Portanto,
σ(−∇2 ) = σess (−∇2 ) = [0, ∞).
Finalmente, como pela transformada de Fourier o operador diferencial −∇2 torna-se uma
multiplicação por ∥k∥2 se Ψ ∈ S (R3 ), então, pela Proposição 10.3, H0 é ilimitado, uma vez
que a função ∥k∥2 é estritamente crescente e ilimitada!
A seguir vamos apresentar a segunda prova do Teorema 10.3 usando o Critério de Weyl. A
prova é baseada na estratégia seguida por Kohlmann.8
Para concluir a prova, mostraremos que σess (H0 ) ⊃ [0, ∞). Para esse propósito, construímos,
para qualquer λ ∈ [0, ∞), uma sequência de Weyl adequada. Escolha um k ∈ Rn tal que
k · k = λ e considere a onda plana ω(x) = eik·x , com x ∈ Rn . Naturalmente, ω ∈ / L2 (Rn ),
mas temos no sentido pontual, considerando cada valor ω(x) da função ω,
Como próximo passo, assuma que B(0; ε) = {x ∈ Rn | ∥x∥ < ε} é a bola aberta com
raio N ∋ ε > 0 em torno de zero em Rn . De acordo com o Teorema 6.33, existe uma função
positiva ϑε ∈ C0∞ (B(0; 2ε)), com as seguintes propriedades:
1. 0 # ϑε # 1,
3. ϑε (x) = 0 se x ∈
/ B(0; 2ε),
5 5 5 5
4. 5∇ϑε 5 # C1 ε−1 e 5∇2 ϑε 5 # C2 ε−2 , em que C1 e C2 são constantes que dependem de
n.
8
M. Kohlmann, “Schrödinger Operators and their Spectra,” Lecture Notes, curso ministrado na Universidade de
Göttingen, no inverno de 2017/2018.
644
Operadores de Schrödinger
Agora, defina
Vamos mostrar que sequência (Φε )ε∈N é uma sequência de Weyl. Claramente, ∥Φε ∥2 = 1.
Para mostrar que Φε → 0 fracamente, escolhemos ϕ ∈ C0∞ (Rn ), escrevemos Qε = B(0; 2ε) \
B(0; ε) e observamos que
5$ 5
5 ηε (x) 55
⟨ϕ, Φε ⟩ # |⟨ϕ, Φε ⟩| = 55 dx ϕ(x)
B(0;2ε) ∥ηε ∥2 5
5$ 5 5$ 5
5 1 5 5 η (x) 5
# 55 5+5 5
ε
dx ϕ(x) 5 5 dx ϕ(x) (10.2.5)
B(0;ε) ∥ηε ∥2 Qε ∥ηε ∥2 5
5$ 5
∥ϕ∥2 55 ηε (x) 55
# + dx ϕ(x) → 0 quando ε → ∞ .
∥ηε ∥2 5 Qε ∥ηε ∥2 5
Aqui, usamos a desigualdade de Hölder da segunda para a terceira linha para a primeira integral
e o fato que
$ $
∥ηε ∥22 = dx |ϑε (x)ω(x)| "2
dx |ω(x)|2 = |B(0; ε)| → ∞ quando ε→∞.
Rn B(0;ε)
Além disso, o segundo termo no lado direito de (10.2.5) desaparece para ε0 " ε e supp ϕ ⊂
B(0; ε). Como C0∞ (Rn ) ⊂ L2 (Rn ) é denso, concluímos que ⟨ϕ, Φε ⟩ → 0 para qualquer
ϕ ∈ L2 (Rn ).
Resta mostrar que ∥(H0 − λ)Φε ∥2 → 0, quando ε → ∞. Para ϕ ∈ C0∞ (Rn ), consideramos
a identidade
<n <n , 2 -
2 ∂2 ∂ Φε ∂Φε ∂ϕ ∂2ϕ
−∇ (Φε ϕ) = − (Φε ϕ) = − ϕ+2 + Φε 2
j=1
dx2j j=1
dx2j dxj dxj dxj
$ 5 52 $
5 η (x) 5 1 5 5
∥(H0 − λ)Φε ∥22 = 5 2
dx 5(−∇ − λ)
ε 5 = dx 5(−∇2 − λ)eik·x 52
Rn ∥ηε ∥2 5 ∥ηε ∥22 B(0;ε)
$
1 5 . /5
+ dx 5(−∇2 − λ) ϑε (x)ω(x) 52 . (10.2.7)
2
∥ηε ∥2 Qε
O primeiro termo no lado direito de (10.2.7) desaparece de acordo com (10.2.4). Usando mais
645
Operadores de Schrödinger
Demonstração. Para Ψ ∈ Dom(H0 ), assuma que Ran(H0 − λ1I) ∋ Φ = (H0 − λ1I)Ψ, e que
λ = µ + iν, com µ, ν ∈ R. Sendo H0 auto-adjunto em seu domínio, de acordo com o Corolário
4.5, temos que Ran(H0 − λ1I) = H e que Ran(H0 − λ1I)⊥ = {0}. Assim, pelo Lema 4.1,
(H0 − λ1I) tem um inverso e, portanto, para todo Ψ ∈ Dom(H0 ) existe um Φ ∈ L2 (Rn ) tal
que Ψ = (H0 − λ1I)−1 Φ. Por sua vez, pela Proposição 5.7, segue que
. /
∥(H0 − λ1I)Ψ∥ " d λ, σ(H0) ∥Ψ∥ , para λ ∈ ρ(H0 ) ,
. /
em que. d λ, σ(H/0 ) = inf µ∈σ(H0 ) |λ − µ|. Pelo Teorema 10.3, sabemos que σ(H0 ) = [0, ∞);
logo, d λ, [0, ∞) = |λ|. Assim, temos que
∥(H0 − λ1I)Ψ∥ " |λ|∥Ψ∥ .
646
Operadores de Schrödinger
Dessa forma, a desigualdade acima implica que |λ|∥(H0 − λ1I)−1 Φ∥ # ∥Φ∥, ou seja,
1
∥(H0 − λ1I)−1 ∥ # , ∀ λ ∈ C \ [0, ∞) .
|λ|
1 b
(1 − a)∥H0 Ψ∥ # ∥HΨ∥ + b∥Ψ∥ =⇒ ∥H0 Ψ∥ # ∥HΨ∥ + ∥Ψ∥ .
1−a 1−a
o que finaliza a prova.
O resultado estabelecido no Teorema 10.4 garante que não existem auto-valores do operador
H indo para −∞ se V é um potential do tipo Kato-Rellich. Na literatura, isso é conhecido
como “estabilidade da matéria.” Para o caso do átomo do hidrogênio isto significa que o
elétron não pode “cair” sobre o núcleo. Na Seção 10.9 provaremos, usando uma desigualdade
devido ao matemático inglês Hardy, que todos os auto-valores do átomo do hidrogênio são
" −2µe4 #−2 . Do ponto de vista matemático, investigações rigorosas sobre a estabilidade da
matéria em sistemas quânticos iniciaram-se com os clássicos trabalhos de Dyson e Lenard,9
culminando com o trabalho monumental de Lieb e Thirring,10 entre vários outros. Aqui, deve-se
enfatizar que, no estudo da estabilidade da matéria, o princípio de exclusão de Pauli revela-se
não apenas suficiente para a estabilidade, mas também necessário.
647
Operadores de Schrödinger
|x| → ∞. Vamos discutir primeiro esta segunda classe, nos concentrando nos potenciais
relativamente limitados (em relação a H0 ) com limite relativo < 1. O exemplo mais proeminente
nesta classe é o operador de Schrödinger atômico que será analisado em detalhes mais a frente.
Os potenciais contínuos e limitados por partes com suporte compacto em Rn também pertencem
à classe discutida aqui, como o potencial do poço quadrado.
Para provar o teorema acima vamos introduzir outro conceito muito útil.
! "
DEFINIÇÃO 10.2. Seja B[0; κ] = x ∈ Rn | ∥x∥ # κ, com κ ∈ N a bola fechada de centro
em zero e raio κ. Diz-se que uma sequência (Ψκ )κ∈N é uma sequência Zhislin !para um
.operador /" A e λ ∈ C se (Ψκ )κ∈N ⊂ Dom(A), ∥Ψκ ∥ = 1, supp Ψκ (x) ⊂ x | x ∈
fechado
Rn \ B[0; κ] e ∥(A − λ)Ψκ ∥ → 0 quando κ → ∞.
Se (Ψκ )κ∈N for uma sequência de Zhislin, então Ψκ tem suporte no complemento da bola
fechada B[0; κ]. Observe que, por causa disso, a sequência (Ψκ )κ∈N converge fracamente para
zero. Além disso, pelo Critério de Weyl (Teorema 5.11) é claro que, se A é auto-adjunto e se
existe uma sequência de Zhislin para A e λ, então, λ ∈ σess (A).
Suponha que (Ψκ )κ∈N seja uma sequência de Zhislin. Então, o termo
,$ -1/2
2
∥V Ψκ ∥ = dx |V (x)Ψκ (x)| .
Rn \B[0;κ]
vai a zero quando κ → ∞ porque V vai a zero no infinito e ∥Ψκ ∥ = 1 para todo κ. Deste
modo, λ está no espectro essencial de H0 + V se, e somente se, λ ∈ σess (H0 ). Mas, de acordo
com o Teorema 10.3, o espectro do operador H0 é σess (H0 ) = [0, ∞). Consequentemente,
σess (H0 + V ) = [0, ∞).
Potenciais contínuos por partes e limitados, com suporte compacto em Rn , também perten-
cem à classe discutida acima, por exemplo os chamados potenciais de poço quadrado.
TEOREMA 10.6. Assuma que V pertence à classe de potenciais de Kato-Rellich. Então, σess (H0 +
V ) = σess (H0 ) = [0, ∞).
Demonstração Fraca. Pela segunda identidade do resolvente, para λ ∈ ρ(H) ∩ ρ(H0 ) (portanto,
em particular, para qualquer λ < −b/(1 − a) pelo Teorema de Kato-Rellich), em que ρ(H) e
ρ(H0 ) são, respectivamente, os conjuntos resolventes de H e H0 , segue que
648
Operadores de Schrödinger
O lado esquerdo de (10.2.8) é compacto como vamos mostrar. Primeiro, tome uma sequência
s
(Φℓ )ℓ∈N ⊂ L2 (Rn ) tal que Φℓ −→ 0 na norma L2 (é por assumir a convergência forte que
tornamos a demonstração mais fraca). Sem perda de generalidade, considere a sequência de
funções (Φℓ )ℓ∈N ⊂ L2 (Rn ) definida
⎧ 1
⎨∥x∥− 2 (n+1) se ℓ # ∥x∥ # ℓ + 1 , ℓ = 1, 2, 3, . . .
Φℓ (x) = . (10.2.9)
⎩ 0 caso contrário
Introduzindo coordenadas esféricas x = rω, com r ∈ [0, ∞) e ω ∈ S n−1 , em que S n−1 denota
a esfera de raio um centrada na origem de Rn , segue que
,$ -1/2
−(n+1)
∥Φℓ ∥ = dx ∥x∥
ℓ#∥x∥#ℓ+1
,$ $ ℓ+1 -1/2
n−1 −(n+1)
= dω dr r r
S n−1 ℓ
, $ -1/2 M , -
ℓ+1
n−1 −2 1 1
= ωn−1 dr r r = ωn−1 − ,
ℓ ℓ ℓ+1
s
em que ωn−1 é a área da esfera unitária S n−1 em Rn . Portanto, Φℓ −→ 0 quando ℓ → ∞ na
norma L2 . Isto implica que Φℓ converge fracamente para zero.
1 ? ?
?V (H0 − λ1I)−1 Φℓ ? .
#
|Im λ|
Por outro lado, nossa hipótese sobre V implica que existem números reais 0 # a < 1 e b > 0
tais que
? ? ? ?
?V (H0 − λ1I)−1 Φℓ ? # a ?H0 (H0 − λ1I)−1 Φℓ ? + b∥(H0 − λ1I)−1 Φℓ ∥
? ?
= a ?(H0 − λ + λ)(H0 − λ1I)−1 Φℓ ? + b∥(H0 − λ1I)−1 Φℓ ∥
649
Operadores de Schrödinger
Em particular, isso abrange o caso das interações coulombianas, ou potenciais da forma ∥x∥−α
se α < 3/2.
TEOREMA 10.7. Tome V ∈ L2 (Rn ) + L∞ (Rn )ε . Então, σess (H0 + V ) = σess (H0 ) = [0, ∞).
pela Eq.(10.2.8) é compacta como um operador atuando sobre L2 (Rn ), para λ ∈ ρ(H) ∩ ρ(H0 )
(portanto, em particular, para qualquer λ < −b/(1 − a) pelo Teorema de Kato-Rellich), em que
ρ(H) e ρ(H0 ) são, respectivamente, os conjuntos resolventes de H e H0 . Tendo em vista a
auto-adjunção de H segue que (H − λ1I)−1 é limitado por
(cf. a Proposição 5.6). Portanto, resta-nos mostrar que V (H0 − λ1I)−1 é compacto. Para isso,
precisaremos do Teorema de Rellich que diz que a injeção canônica H10 (Ω) :→ L2 (Ω) é um
operador compacto (Ω é um domínio limitado).
TEOREMA 10.8 (Teorema de Rellich). Seja Ω ⊂ Rn um conjunto aberto e limitado. Assuma
que H10 (Ω) é o fecho de C0∞ (Ω) no espaço de Sobolev H1 (Ω). Então, para qualquer sequência
limitada (Ψℓ )ℓ∈N em H10 (Ω) existe uma subsequência (Ψℓk )k∈N ⊂ (Ψℓ )ℓ∈N tal que (Ψℓk )k∈N
converge fortemente em L2 (Ω).
Nota 10.7. (1) Aqui lembramos que se Ω é um conjunto aberto em Rn , diz-se que a função
Ψ : Ω → C está em H1 (Ω) se Ψ ∈ L2 (Ω) e se seu gradiente distribucional, ∇Ψ =
650
Operadores de Schrödinger
(∂1 Ψ, . . . , ∂j Ψ), é uma função que também está em L2 (Ω). De acordo com o desenvolvimento
realizado no Capítulo 6, ∇Ψ ∈ L2 (Ω) significa que existem funções Φ1 , . . . , Φn em L2 (Ω),
coletivamente denotadas por ∇Ψ, tal que para todo Θ ∈ C0∞ (Ω)
$ $
∂
dx Ψ(x) Θ(x) = − dx Φj (x)Θ(x) , j = 1, . . . , n .
Ω ∂xj Ω
O espaço H10 (Ω) ⊂ L2 (Ω), com produto escalar ⟨ · , · ⟩H1 (Ω) definido por
⟨Ψ, Φ⟩H1 (Ω) = ⟨Ψ, Φ⟩L2 (Ω) + ⟨∇Ψ, ∇Φ⟩L2 (Ω) , (10.2.10)
(2) O subespaço H10 (Ω) gera o ambiente natural para se discutir equações diferenciais
com condições de fronteira nula, já que as funções em H10 (Ω) são aquelas de H1 (Ω) que
desaparecem em ∂Ω.
(3) Quando Ω = Rn , então, C0∞ (Rn ) é denso em H1 (Rn ). Portanto, neste caso, H10 (Rn ) =
H (Rn ). Caso contrário, se Ω é limitado, então, H10 (Ω) ̸= H1 (Ω) (veja a Nota 10.2).
1
Vamos dar uma prova do teorema da compacidade de Rellich que pode ser vista como sendo
a versão para espaços de Hilbert do Teorema de Arzelà. Para isto, o seguinte lema será crucial.
def.
LEMA 10.2. Sejam Q = (0, 2π)n ⊂ Rn e (Φn )n∈N ⊂ C0∞ (Q) uma sequência limitada, no
sentido que ∥Φn ∥ < C para todo n ∈ N. Então, existe uma subsequência (Φnk )k∈N ⊂ (Φn )n∈N
e Φ ∈ H10 (Q) tal que (Φnk )k∈N converge fortemente para Φ ∈ L2 (Q) e (Φnk )k∈N converge
fracamente para Φ ∈ H10 (Q).
Passo 1: Como L2 (Q) e H10 (Q) são espaços de Hilbert separáveis, de acordo com o
Teorema 3.16, existem subsequências (Φn1k )k∈N ⊂ (Φn )n∈N e (Φn2k )k∈N ⊂ (Φn1k )k∈N e vetores
Φ ∈ L2 (Q) e Ψ ∈ H10 (Q) tais que
w w
Φn1k −→ Φ ∈ L2 (Q) e Φn2k −→ Ψ ∈ H10 (Q) ,
quando k → ∞. Vamos mostrar que Φ = Ψ. Para este propósito, podemos assumir sem
N n = Φn − Ψ. Para
perda de generalidade que Ψ = 0, pois caso contrário, consideraríamos Φ
1
Θ ∈ L2 (Q), definimos um funcional linear ℓΘ : H0 (Q) → C definindo
651
Operadores de Schrödinger
Como ℓΘ (Φ) # ∥Θ∥2 ∥Φ∥2 # ∥Θ∥2 ∥Φ∥H1 (Q) , segue, pelo Teorema de Representação de Riesz-
N ∈ H1 (Q) tal que
Fréchet (Teorema 4.9), que existe um único vetor Θ 0
N Φ⟩H1 (Q) ,
⟨Θ, Φ⟩ = ⟨Θ, ∀ Φ ∈ H10 (Q) .
w
de maneira que Φn2k −→ 0 em L2 (Q) e, portanto, Φ = Ψ. Para simplificar a notação,
escrevemos daqui em diante
w w
Φn −→ Φ ∈ L2 (Q) e Φn −→ Φ ∈ H10 (Q) ,
quando n → ∞.
A família {Ψk }k∈Zn é uma base ortonormal de L2 (Q) (série de Fourier). Pelo Teorema de
Parseval,
<
|⟨Φn , eikx ⟩|2 = (2π)n ∥Φn ∥22 # C1 .
k∈Zn
Considerando que
w
Passo 3: Como Φn −→ Φ, quando n → ∞, temos que
de forma que a sequência numérica (⟨Φn , eikx ⟩)n∈N ⊂ C é uma sequência de Cauchy para
todo k ∈ Zn .
Passo 4: Afirmamos que (Φn )n∈N é uma sequência de Cauchy em L2 (Q). Para isto, tome
um ε > 0 arbitrário e R = (C3 /ε)−1/2 . Observamos que existe somente uma quantidade
652
Operadores de Schrödinger
finitamente grande de k ∈ Zn tal que ∥k∥2 # R2 . Logo, de acordo com o Passo 2, existe
Nε ∈ N tal que
< <
(2π)−n (1 + ∥k∥2 )|⟨Φn − Φm , eikx ⟩|2 # (2π)−n (1 + R2 )|⟨Φn − Φm , eikx ⟩|2 # C3 .
∥k∥#R ∥k∥#R
< ∥k∥2
# ε + (2π)−n |⟨Φn − Φm , eikx ⟩|2
R2
∥k∥>R
< ∥k∥2
# ε + (2π)−n 2
|⟨Φn − Φm , eikx ⟩|2
k∈Zn
R
< ∥k∥2 6 7
# ε + 2(2π)−n |⟨Φn , eikx 2
⟩| + |⟨Φm , eikx 2
⟩|
k∈Zn
R2
# ε + 4(2π)−n C3 R−2
# 2ε .
w
Como Φn −→ Φ, a propriedade de Cauchy mostra que ∥Φn − Φ∥2 → 0. Isto finaliza a prova
do lema.
Demonstração do Teorema 10.8. Assuma que (Φn )n∈N ⊂ H10 (Ω) é uma sequência limitada,
no sentido que ∥Φn ∥H1 (Ω) < C1 para todo n ∈ N. Seja Q ⊂ Rn um cubo (aberto) tal
que Ω ⊂ Q. Como C0∞ (Ω) é denso em H10 (Ω), então, para todo Φn ∈ H10 (Ω), existe
Ψn ∈ C0∞ (Ω) ⊂ C0∞ (Q) tal que ∥Φn − Ψn ∥H1 (Ω) # n−1 . Como ∥Ψn ∥H1 (Ω) < C2 , pelo Lema
10.2, existe uma subsequência (Ψnk )k∈N ⊂ (Ψn )n∈N e Φ ∈ H10 (Q) tais que
s w
Ψnk −→ Ψ ∈ L2 (Q) e Ψnk −→ Ψ ∈ H10 (Q) , (10.2.12)
5
quando k → ∞. Seja Ψ′ = Ψ5Ω ; então, Ψ′ ∈ L2 (Q) e Ψnk −→ Ψ′ ∈ L2 (Q). Mas, por
w
653
Operadores de Schrödinger
Portanto, (Ψnk )k∈N converge fracamente em H10 (Ω). Como os espaços de Hilbert são fraca-
w
mente sequencialmente fechados, existe Θ ∈ H10 (Ω) com Ψnk −→ Θ ∈ H10 (Ω). Agora, a
w
Eq.(10.2.13) implica que Θ = Ψ′ , em particular Ψ′ ∈ H10 (Ω) e Ψnk −→ Ψ′ ∈ H10 (Ω). Mas,
s w
então, Φnk −→ Ψ′ ∈ L2 (Ω) e Φnk −→ Ψ′ ∈ H10 (Ω).
Retornando à demonstração do Teorema 10.7. Selecione uma sequência (Φℓ )ℓ∈N ⊂ L2 (Rn )
w
tal que Φℓ −→ 0. Assuma que
Ψℓ = (H0 − λ1I)−1 Φℓ ,
em que Ψℓ ∈ Dom(H0 ). Considerando que a sequência (Φℓ )ℓ∈N converge fracamente, então
(Φℓ )ℓ∈N é limitada em L2 (Rn ). Como (H0 − λ1I)−1 é limitado, a sequência (Ψℓ )ℓ∈N também
é limitada no domínio Dom(H0 ) e converge fracamente para zero em Dom(H0 ) ⊂ L2 (Rn ).
# ε|Im λ|−1∥Φℓ ∥2
# ε∥Φℓ ∥2 . (10.2.14)
Isto implica que ∥V2 (H0 − λ1I)−1 ∥ # ε. A seguir, observe que como V1 é limitado, existe
K " 0 tal que |V1 (x)| # K, para todo x ∈ Rn . Tome BR = {x ∈ Rn | |x| < R} como sendo
n ∞
5 raio R > 0 em torno do zero em R . Assuma que θR ∈1C0 (B2R ) é tal que
a bola aberta com
0 # θR # 1, θR 5B = 1. Então, a sequência (θR Ψℓ )ℓ∈N é limitada em H (B2R ). Lembramos
R
que o Teorema de Rellich para a compacidade nos dá que a inclusão
H1 (B2R ) :→ L2 (B2R ) ,
é compacta. Isso significa que existe uma subsequência (θR Ψℓk )k∈N ⊂ (θR Ψℓ )ℓ∈N tal que
(θR Ψℓk )k∈N converge fortemente em L2 (B2R ). Vamos mostrar que ∥V1 Ψℓ ∥ converge para zero.
Com a ajuda da função θR definida acima, segue-se que
O primeiro termo pode ser tomado como sendo menor que ε escolhendo ℓ grande, uma vez
que V1 é limitado, isto é, existe ℓ0 ∈ N tal que ∥θR Ψℓ ∥ # ε/K para todo ℓ " ℓ0 . Como Ψℓ
converge fracamente para zero, existe uma constante positiva M tal que ∥Ψℓ ∥2 # M. Portanto,
por hipótese, o segundo termo pode ser tomado como sendo menor que ε vezes uma constante
positiva escolhendo-se R grande. Consequentemente, para ℓ grande o bastante, o lado direito
de (10.2.15) é menor do que ε vezes uma constante positiva. Isto implica que V1 Ψℓ → 0 em
L2 (Rn ) quando ℓ → ∞, visto que ε é arbitrário. Logo, V1 (H0 − λ1I)−1 é compacto.
654
Operadores de Schrödinger
Dessa forma, pelo Teorema 5.24, sendo V (H0 − λ1I)−1 aproximado por operadores compactos
é ele próprio compacto. Logo, temos que (H − λ1I)−1 − (H0 − λ1I)−1 é igual ao produto de
um operador compacto e de um operador limitado. Como, pelo Teorema 5.22(b), o produto de
um operador compacto com um operador limitado é compacto, isso comprova a compacidade
em L2 (Rn ). Isto significa que H e H0 têm o mesmo espectro essencial pelo Lema 5.6, isto é,
σess (H) = σess (H0 ) = [0, ∞).
PROPOSIÇÃO 10.5. Se Re λ < 0 e se V ∈ L2 (R3 ) + L∞ (R3 )ε , então,
Demonstração. Como V ∈ L2 (R3 ) + L∞ (R3 )ε , então para todo Ψ ∈ Dom(H0 ) nós temos
que Ψ ∈ Dom(V ). Pela Proposição 10.4, podemos assumir que Ψ = (H0 − λ1I)−1 Φ. Assim,
de forma similar à prova do Teorema 10.6, nossa hipótese sobre V implica que, para Re λ < 0,
existem números reais 0 # a < 1 e b > 0 tais que
, -
? ?
?V (H0 − λ1I)−1 Φ? # 2a + b ∥Φ∥2 .
2 |λ|
Portanto, temos que
? ?
?V (H0 − λ1I)−1 ? # 2a + b .
|λ|
Como a pode ser escolhido arbitrariamente pequeno, concluímos que
Apresentaremos, a seguir, uma segunda prova do Teorema 10.7 usando a teoria de equações
integrais com kernels de Hilbert-Schmidt. Para isto, precisamos de alguns resultados auxiliares.
Começamos com a seguinte
DEFINIÇÃO 10.3. Seja Ω ⊆ Rn um aberto e K ∈ L2 (Ω × Ω). Então, o operador integral K
definido por $
KΨ(x) = dy K (x, y)Ψ(y) ,
Ω
é chamado operador integral de Hilbert-Schmidt se
,$ $ -1/2
2
dxdy |K (x, y)| <∞. (10.2.16)
Ω Ω
655
Operadores de Schrödinger
De acordo com a definição acima, K é um operador que mapeia todo elemento de L2 (Ω)
em um elemento de L2 (Ω). Com efeito, pela desigualdade de Hölder,
5$ 5 ,$ -1/2 ,$ -1/2
5 5
5 dy K (x, y)Ψ(y)5 # dy |K (x, y)| 2
dy |Ψ(y)| 2
,
5 5
Ω Ω Ω
ou
,$ - ,$ -
2 2 2
|KΨ(x)| # dy |K (x, y)| dy |Ψ(y)| .
Ω Ω
Consequentemente,
$ ,$ $ -
∥KΨ∥22 = dx |KΨ(x)| # 2
dxdy |K (x, y)| 2
∥Ψ∥22 ,
Ω Ω Ω
pelo Teorema de Fubini, uma vez que a integral acima é finita pela Eq.(10.2.16). Logo, ∥KΨ∥2 é
finito, como afirmamos acima. A Eq.(10.2.16) também fornece uma estimativa útil para a norma
de K. A partir dela, concluímos que
,$ $ -1/2
2
∥KΨ∥2 # dxdy |K (x, y)| ∥Ψ∥2 ,
Ω Ω
Dessa forma, isto mostra que o domínio Dom(H) = L2 (Ω) e que K é um operador limitado
em L2 (Ω).
TEOREMA 10.9. Seja Ω ⊆ Rn um aberto. Se K é um operador de Hilbert-Schmidt, com kernel
integral K ∈ L2 (Ω × Ω), então, K é compacto e
∞
< $ $
∥KΨn ∥22 # dxdy |K (x, y)|2 , (10.2.17)
n=1 Ω Ω
Demonstração. Nós já provamos acima que K é limitado. Para provar que K é compacto, basta
mostrar que K é o limite na norma de uma sequência de operadores de rank finito. Seja
{Ψn } um sistema ortonormal completo em L2 (Ω). Então, pelo Teorema 3.9, para qualquer
Ψ ∈ L2 (Ω),
< < ,$ -
Ψ(x) = ⟨Ψn , Ψ⟩Ψn (x) = dy Ψn (y)Ψ(y) Ψn (x) ,
n n Ω
e
< < ,$ -
KΨ(x) = ⟨Ψn , Ψ⟩KΨn (x) = dy Ψn (y)Ψ(y) KΨn (x) .
n n Ω
656
Operadores de Schrödinger
Então,
< < <$
∥KΨn ∥22 = ⟨KΨn , KΨn ⟩ = dx KΨn (x)KΨn (x)
n n n Ω
<$ $
= dxdy K (x, y)Ψn (y)K (x, y)Ψn (y)
n Ω Ω
<$ $
= dxdy |K (x, y)Ψn (y)|2
n Ω Ω
$ ( )
<$
= dx dy |K (x, y)Ψn (y)|2
Ω n Ω
$ ( )
<
= dx |KΨn (x)|2
Ω n
,$ $ -
2
# dxdy |K (x, y)| .
Ω Ω
Aqui, usamos a desigualdade de Bessel na última etapa, uma vez que K ( · , y) ∈ L2 (Ω) como
função de y. Isto prova a Eq.(10.2.17). Agora, introduzimos uma família de operadores de rank
finito Km por
m
<
Km Ψ(x) = ⟨Ψn , Ψ⟩KΨn (x) .
n=1
( )1/2 ( )1/2
< <
2
# |⟨Ψn , Ψ⟩| ∥KΨn ∥22 ,
n"m+1 n"m+1
obtemos que
( )1/2
<
∥KΨ − Km Ψ∥2 # ∥Ψ∥2 ∥KΨn ∥22 .
n"m+1
;m 2
Pela
; a Eq.(10.2.17), a série n=1 ∥KΨn ∥2 converge quando m → ∞ e, portanto, a soma
2
n"m+1 ∥KΨn ∥2 → 0 quando m → ∞. Consequentemente, dado um ε > 0 arbitário, existe
657
Operadores de Schrödinger
Portanto, segue que ∥V2 (H0 −√λ1I)−1 ∥ # ε. A seguir, com a ajuda da Eq.(10.2.2), observamos
que V1 (H0 − λ1I)−1 , com Im λ ̸= 0, é um operador integral com o kernel dado por
1 √
K (x, y) = V1 (x) ei λ∥x−y∥
4π∥x − y∥
Portanto, pelo Teorema 10.9, o operador V1 (H0 − λ1I)−1 é compacto. Agora, como na parte
final da primeira prova, temos que
Dessa forma, pelo Teorema 5.24, sendo V (H0 − λ1I)−1 aproximado por operadores compactos
é ele próprio compacto. Logo, temos que (H − λ1I)−1 − (H0 − λ1I)−1 é igual ao produto de
um operador compacto e de um operador limitado. Como, pelo Teorema 5.22(b), o produto de
um operador compacto com um operador limitado é compacto, isso comprova a compacidade
em L2 (R3 ). Isto significa que H e H0 têm o mesmo espectro essencial pelo Lema 5.6, isto é,
σess (H) = σess (H0 ) = [0, ∞).
PROPOSIÇÃO 10.6. Seja H = H0 + V , em que V pertence à classe de potenciais de Kato-Rellich.
Se existe uma função Ψ ∈ Dom(H), com ⟨Ψ, HΨ⟩ < 0, então H possui pelo menos um
auto-valor negativo.
658
Operadores de Schrödinger
De acordo com o Teoremas 10.6 e a Proposição 10.6 podemos concluir que os auto-valores
negativos do espectro de H0 + V são auto-valores com multiplicidade finita, com H0 + V
podendo ter apenas auto-valores negativos isolados (e eles são de importância na física quântica
quando se pensa em espectroscopia), possivelmente acumulando-se em 0 (veja a representação
gráfica baixo).
0
σ(H0 + V ) =
B CD E B CD E R
σdisc (A) σess (A)
659
Operadores de Schrödinger
em que ℓ é o momento angular de Ψ. Observe que, neste caso, as informações sobre o operador
BS 2 são independentes do potencial V .
Agora, assuma que Ωℓ é o subespaço gerado pelas funções Yℓm (θ, ϕ) e que Lℓ = L2 ((0, ∞); r 2dr)⊗
Ωℓ . Então, h
L2 (R2 ) = Lℓ .
ℓ∈Z
Se 1Iℓ é o operador
5 identidade em Ωℓ , a restrição do operador hamiltoniano H a Dℓ = D ∩ Lℓ
é dada por H 5D = Hℓ ⊗ 1Iℓ , nos dá uma equação diferencial ordinária (chamada Equação
ℓ
Diferencial de Bessel) para ψ ∈ C0∞ (0, ∞) ⊂ L2 ((0, ∞); r 2dr),
F , 2 - G
d 2 d ℓ(ℓ + 1) 1
Hℓ ψnℓ (r) = − + + − ψnℓ (r) = λn ψ(r) .
dr 2 r dr r2 r
660
Operadores de Schrödinger
centrífuga. Especialmente para a física nuclear, esse termo desempenha um papel importante
para lidar com o problema de espalhamento. Quando o momento angular orbital, ℓ, torna-se
grande, a barreira centrífuga causa um grande efeito no espalhamento, já que à medida que
o momento angular da partícula aumenta, a partícula se torna cada vez menos ligada. Se a
energia de espalhamento for inferior a 10 mega-elétron-volts, E < 10 MeV , o espalhamento
nucleon-nucleon é essencialmente dado pela onda-s; ou seja, ℓ = 1. Em outras palavras, a
barreira centrífuga não faz diferença devido ao pequeno valor da energia. Por isto, devido ao fato
do potencial Veff ser contínuo e Veff (r) → 0 quando r → ∞ e como V (r) = −1/r pertence à
classe de potenciais de Kato-Rellich, pelo Teorema 10.7, segue que σess (−∇2 + V ) = [0, +∞).
Nota 10.9. Observe que embora (10.2.19) possua a estrutura de uma equação de auto-valor uni-
dimensional, ela difere da equação de Schrödinger unidimensional em um aspecto importante:
a variável r não pode ter valores negativos, pois varia de r = 0 a r → ∞. Portanto, devemos
exigir que a função de onda Ψnℓm (x) seja finita para todos os valores de r entre 0 e ∞,
notadamente para r = 0. Mas, se ψnℓ (0) for finito, rψnℓ (r) deve desaparecer em r = 0, ou
seja,13
lim rψnℓ (r) = 0 .
r→0
σ(−∇2 − 1/∥x∥) =
−13, 6 eV R
0 eV
661
Operadores de Schrödinger
Para simplificar, vamos assumimos (sem perda de generalidade) que V (x) " 0, com x ∈ Rn .
Seja H10,V (Rn ) o completamento do espaço pré-Hilbert (C0∞ (Rn ), ⟨ · , · ⟩H1V (Rn )) , em que
$
⟨Φ, Ψ⟩H1V (Rn ) = ⟨Φ, Ψ⟩H1 (Rn ) + dx Φ(x)V (x)Ψ(x) .
Rn
5
A extensão de Friedrichs de H0 + V 5C ∞ (Rn ) é caracterizada pela seguintes propriedades:
0
(i) Rλ0 (H) = (H − λ0 1I)−1 é um operador compacto para algum λ0 ∈ ρ(H) e, portanto,
λ ∈ ρ(H);
(iii) existe uma base ortonormal {Φn }n de L2 (Rn ) construída de auto-vetores de H, HΦn =
λn Φn , para todo n, com auto-valores reais µn , contando suas multiplicidades, satisfazendo
limn→∞ |λn | = ∞ e, portanto, cada um deles de multiplicidade finita.
662
Operadores de Schrödinger
A seguir, vamos tomar θ5R ∈ C0∞ (B2R ), em que B2R é a bola aberta de centro zero em Rn
e raio 2R. Assuma que θR 5B = 1 e 0 # θR # 1. Observamos que por causa da desigualdade
R
(10.2.20), temos
$
2 2
∥θR Ψn ∥H1 (Rn ) = ∥θR Ψn ∥2 + dx |∇(θR Ψn )(x))|2
Rn
$
# ∥Ψn ∥22 dx |∇(θR Ψn )(x))|2 # C3 .
Rn
Consequentemente, (θR Ψn )n∈N é uma sequência limitada em H10 (B2R ). Assim, pelo Teorema
de Rellich para a compacidade, existe uma subsequência (θR Ψnk )k∈N ⊂ θR (Ψn )n∈N tal que
(θR Ψnk )k∈N converge fortemente em L2 (B2R ). Isto significa que podemos escolher um k0 ∈ N
para o qual ∥θR Ψn ∥22 # ε para todo k " k0 . Dessa forma, obtemos que
Observe que, para todo Ψ ∈ Dom(H), temos que (H − λ0 1I) é injetivo. Mais do que
isso, como H é auto-adjunto, pelo Corolário 4.5, temos que Ran(H − λ0 1I) = H . Dessa
forma, (H − λ0 1I) : Dom(H) → L2 (Rn ) é bijetivo com inverso compacto (H − λ0 1I)−1 .
Isso implica que (H − λ0 1I)−1 é .limitado (veja /o Teorema 5.21) e tem todo espaço de Hilbert
L2 (Rn ) como domínio; logo, Ker (H − λ0 1I)−1 = {0} e, portanto, de acordo com o Teorema
3.9, as auto-funções Φn de (H − λ0 1I)−1 formam uma base ortonormal de L2 (Rn ), cujo os
correspondentes auto-valores µn são de multiplicidade finita.
663
Operadores de Schrödinger
Consequentemente, como
Vamos escolher como domínio Dom(H) = S (Rn ) ⊂ L2 (R3 ), em que S (Rn ) é o espaço
de Schwartz. Obviamente, C0∞ (Rn ) ⊂ S (Rn ). Além disso, H é essencialmente auto-adjunto
em S (Rn ). As auto-funções de H são da forma
2 /2
Ψn (x) = Cn Pn (x)e−∥x∥ , x ∈ R3 .
Aqui, Pn = (1 + |x|)n = (1 + |x1 |)n1 (1 + |x2 |)n2 (1 + |x3 |)n3 é um polinômio de grau n ∈ N30 e
Cn é uma constante. A família {Ψn }n é uma base ortonormal de do espaço de Hilbert L2 (Rn ).
664
Operadores de Schrödinger
Nossos resultados podem ser generalizados para H em L2 (R3 ), nos dando o seguinte
TEOREMA 10.11. O oscilador harmônico H é essencialmente auto-adjunto em S (Rn ) e tem
uma base ortonormal de auto-funções
Ψn1 ,n2 ,n3 (x) = Ψn1 (x1 )Ψn2 (x2 )Ψn3 (x3 ) ,
com cada Ψnk sendo do tipo (10.2.22). O espectro é dado por
! "
σdisc (H) = (2n + 3)ω | n ∈ N0 .
665
Operadores de Schrödinger
10.2.4 Resumo
Para concluir nossa análise sobre o espectro dos operadores de Schrödinger, gostaríamos
de destacar os seguintes pontos importantes: no Teorema 10.10 vimos que o efeito de uma
perturbação por um potencial positivo crescente, embora preserve a auto-adjunção, pode alterar
drasticamente o espectro essencial do operador não-perturbado H0 , já que neste caso σess (H0 +
V ) = ∅. Tal perturbação não é relativamente limitada. Por outro lado, os Teoremas 10.6 e
10.7 nos mostraram que o efeito de uma perturbação por um potencial real V da classe de
Kato-Rellich preserva o espectro essencial do operador não-perturbado H0 . Este é um exemplo
do que chamamos de estabilidade espectral.
(3) O que se pode dizer sobre a impossibilidade de se ter estados ligados com energia
positiva?
Uma discussão relacionada com a primeira questão pode ser encontrada Subseção 10.3.1
abaixo. A segunda questão é o tema Subseção 10.3.2. As estimativas do número de estados
ligados, especialmente os limites superiores, são de suma importância para a mecânica quântica.
Entre os vários limites superiores do número de estados ligados encontrados na literatura, nós
vamos discutir a prova da celebrada Desigualdade de Cwikel-Lieb-Rozenbljum,14 que impõe uma
estimativa superior em Rn , com n " 3. A terceira questão será respondida pelo Subseção 10.7.3,
na pg.727, enquanto que a quarta questão será respondida na Seção 10.4.
14
Este teorema é assim chamado em homenagem a M. Cwikel, E.H. Lieb e G. Rozenbljum, que provaram uma
desigualdade de forma independente e por métodos muito diferentes nos artigos M. Cwikel, “Weak Type Estimates
for Singular Values and the Number of Bound States of Schrödinger Operators,” Ann. Math. 106 (1977) 93, E.H. Lieb,
“Bounds on the Number of Eigenvalues of Laplace and Schrödinger Operators,” Bull. Am. Math. Soc. 82 (1976)
751 e G. Rozenbljum, “The Distribution of the Discrete Spectrum for Singular Differential Operators,” Soviet Math.
Dokl. 13 (1972) 245. Observe que os nomes são listados em ordem alfabética, mas em ordem cronológica inversa
de descoberta.
666
Operadores de Schrödinger
e
$ $
−α −α −3
⟨Ψλ , ∥x∥ Ψλ ⟩ = dx Ψλ (x)∥x∥ Ψλ (x) = λ dx Ψ(λ−1 x)∥x∥−α 2Ψ(λ−1 x)
R3 R3
$
−α
=λ dx Ψ(x)∥x∥−α Ψ(x)
R3
Uma vez que supp Ψλ ⊂ {x | α < ∥x∥ < 2α}, para α > R0 , segue de (10.3.1), (10.3.2) e (10.3.3)
que
⟨Ψλ , HΨλ ⟩ = ⟨Ψλ , H0 Ψλ ⟩ + ⟨Ψλ , V Ψλ ⟩ # λ−2 ⟨Ψ, H0Ψ⟩ − Cλ−α ⟨Ψ, ∥x∥−α Ψ⟩
= >
= λ−2 ⟨Ψ, H0 Ψ⟩ − Cλ−α+2 ⟨Ψ, ∥x∥−αΨ⟩ .
667
Operadores de Schrödinger
Defina Φn = Ψ2n γ . Claramente, (Φn )n∈N é uma sequência ortonormal de funções com
suportes disjuntos, de modo que ⟨Φm , HΦn ⟩ = 0 para m ̸= n. Portanto, dado um N e
tomando EN = span{Φ1 , . . . , ΦN } segue pelo Teorema 5.39 que
Note que, pelo Exemplo 10.1, a Eq.(10.3.1) é satisfeita com α = 1 e R0 = 1. Portanto, pela
Proposição 10.7, o operador H0 + V tem infinitos auto-valores negativos. Pode-se mostrar que
estes são precisamente os auto-valores −C/n2 , em que n ∈ N, com multiplicidades n2 e as
auto-funções correspondentes sendo construídas a partir dos harmônicos esféricos e funções
de Laguerre. Isso é realizado em detalhes em livros padrão de mecânica quântica (veja, por
exemplo, Williams, F., “Topics in Quantum Mechanics,” PMP 27, Birkhäuser, 2003). Mais detalhes
sobre o espectro do átomo do hidrogênio podem ser encontrados na Subseção 10.7.4.
Nota 10.11. A condição α < 2 é crucial na Proposição 10.7. Acontece que o potencial V (x) =
∥x∥−2 é o caso limite para que tenhamos infinitos auto-valores negativos. Com efeito, H escala
como uma função homogênea de grau −2 sob a escala Ψ(x) → Ψλ (x) = λ−3/2 Ψ(λ−1 x).
Assim, se V escala em grandes distâncias com grau −2 + ε, ele vence; e se escalar com o grau
−2 − ε, a energia cinética vence e os estados não podem ter energia negativa, ou seja, não
podem formar estados ligados. Além disso, pode-se mostrar que se V ∈ L2 (R3 ) + L∞ (R3 )ε e
se existirem constantes positivas R0 e C1 tais que C1 < 1/4 e
então, H tem apenas um número finito de auto-valores negativos (veja Apêndice 10A e o texto
de M. Reed e B. Simon, “Methods of Modern Mathematical Physics. Analysis of Operators,” Vol.
IV, Academic Press, 1978, Teorema XIII.6).
Agora nos voltamos para a estimativa do número de auto-valores negativos dos operadores
de Schrödinger (contando sua mutiplicidade). Nesta subseção, nos limitaremos ao caso geral do
número de estados ligados entre duas partículas.15 Começamos observando que entre outras
aplicações importantes do Princípio Min-Max estão as estimativas dos números de auto-valores
negativos dos operadores de Schrödinger. Este assunto é tratado em grande detalhe em M. Reed
e B. Simon, “Methods of Modern Mathematical Physics. Analysis of Operators,” Vol. IV, Academic
Press, 1978. Primeiro, afirmamos o teorema sobre o limite de Birman-Schwinger, cuja prova será
apresentada no Apêndice 10A:
15
Uma discussão geral de quando um sistema quântico de N -partículas terá finitos ou infinitos estados ligados
apareceu no artigo de B. Simon, “On the Infinitude or Finiteness of the Number of Bound States of an N -Body
Quantum System, I.,” Helv. Phys. Acta 43 (1970) 607.
668
Operadores de Schrödinger
Nota 10.12. Observe que o Teorema 10.12 limita o número de estados ligados pela integral de
V− , a parte negativa de V , que é puramente atrativa. Lembremos que qualquer função V pode
ser escrita como
V (x) = V+ (x) − V− (x) ,
em que a parte positiva de V é definida pela fórmula
⎧
⎨V (x) , se V (x) > 0
V+ (x) = max{V (x), 0} = ,
⎩0 , caso contrário
Com esta convenção V+ e V− são funções não-negativas, isto é, V+ " 0 e V− " 0; além disso,
temos que |V | = V+ +V− . Assim, o que a desigualdade (10.3.4) está nos mostrando é que para se
obter o número de estados ligados do operador H0 +V em L2 (R3 ) basta levar em conta a parte
do potencial V que é puramente atrativa, isto é, assumindo apenas os valores não-positivos de
V . Com efeito, qualquer discussão sobre o número de estados ligados do operador H0 + V tem
como fundamento o fato elementar que uma diminuição do potencial em alguma região deve
diminuir as energias dos estados ligados no sentido que ⟨Ψ, (H0 + V )Ψ⟩ " ⟨Ψ, (H0 − V− )Ψ⟩,
para todo Ψ ∈ Dom(H0 ). Portanto, N(H0 + V ) # N(H0 − V− ) e podemos omitir o termo
V+ em V .
669
Operadores de Schrödinger
V (x)
0
x
λj
Figura 10.1: Representação dos níveis de energia negativas En dentro de um poço de potencial.
Este limite é chamado limite semi-clássico assintótico (que corresponde a tomar # → 0). Além
disso, a hipótese que n " 3 é crucial, como ficará evidente no desenvolvimento da prova do
teorema.
Nota 10.14 (Desigualdades de Lieb-Thirring). A Desigualdade de Cwikel-Lieb-Rozenbljum é um
caso particular de um conjunto de desigualdades mais gerais, que dependem de um parâmetro
γ, chamadas Desigualdades de Lieb-Thirring (veja o Apêndice 10B). Estas desigualdades foram
obtidas por E.H. Lieb e W.E. Thirring em 1975 em conexão com a prova da estabilidade da
matéria.16 Lieb-Thirring mostraram que para o operador hamiltoniano de Schrödinger H0 + V
16
E.H. Lieb e W.E. Thirring, “Bound for the Kinetic Energy of Fermions which Proves the Stability of Matter,” Phys.
Rev. Lett. 35 (1975) 687. Errata ibid. (1975) 1116. Veja também E.H. Lieb e W.E. Thirring, “Inequalities for the
Moments of the Eigenvalues of the Schrödinger Hamiltonian and Their Relation to Sobolev Inequalities,” in Studies
in Mathematical Physics, E.H. Lieb, B. Simon, A.S. Wightman, eds., Princeton University Press, 1976, pg.269. Ensaios
em honra de Valentine Bargmann.
670
Operadores de Schrödinger
de modo que
< $
γ γ+n/2
|λj | # Cγ,n dx V− (x) . (10.3.6)
j≥0 Rn
Note que, no caso em que γ = 0 e n " 3 o lado esquerdo das desigualdades (10.3.6) é
simplesmente o número de auto-valores negativos e concorda com a desigualdade (10.3.5).
O leitor interessado vai encontrar uma discussão completa e detalhada sobre as desigualdades
(10.3.6) no livro-texto de E.H. Lieb e R. Seiringer, “The Stability of Matter in Quantum Mechanics,”
Cambridge University Press, 2010.
Antes de demonstrar o Teorema 10.13, uma série de resultados auxiliares (não menos impor-
tantes na análise funcional) são necessários. Comecemos com o
$
n
LEMA 10.3. Seja Ω um domínio limitado em R com o volume |Ω| = dx.18 Então, para
Ω
n " 2, 0 < α < n e todo x ∈ Rn ,
$ , -(n−α)/n
1 ωn−1 n|Ω|
dy # ,
Ω ∥x − y∥α n−α ωn−1
em que ωn−1 = 2π n/2 /Γ(n/2) é a área da superfície da esfera unitária S n−1 em Rn .19
671
Operadores de Schrödinger
Ω x
Aqui, levamos em conta que B(x; R) tem o mesmo volume que Ω e que |B(x; R) ∩ Ω| é o
volume de B(x; R) ∩ Ω. Por outro lado, considerando que para todo y ∈ Ω \ (B(x; R) ∩ Ω)
temos que ∥x − y∥ " R (veja novamente a Figura 10.2), então, R−α " ∥x − y∥−α. Logo,
$ $ $
1 1 1
dy = dy + dy
Ω ∥x − y∥α B(x;R)∩Ω ∥x − y∥α Ω\(B(x;R)∩Ω) ∥x − y∥α
$
1 1 . /
# dy + |Ω| \ |B(x; R) ∩ Ω| , (10.3.8)
B(x;R)∩Ω ∥x − y∥α Rα
672
Operadores de Schrödinger
Demonstração. É suficiente provar o resultado quando Ψ ∈ C0∞ (Ω), já que toda função em
H10 (Ω) pode ser aproximada por uma sequência de funções em C0∞ (Ω), uma vez que C0∞ (Ω)
é denso em H10 (Ω). Podemos assumir que Ψ é estendida por 0 em Rn \ Ω; isto é, definindo
Ψ(x) ≡ 0 fora de Ω, podemos supor que Ψ ∈ C0∞ (Rn ). Para provar a estimativa (10.3.9),
partimos usando a fórmula
$ ∞
∂
Ψ(x) = − dr Ψ(x + rω) ,
0 ∂r
válida para todo x ∈ Ω e ω ∈ S n−1 . Vamos trabalhar a expressão acima, definindo y = x + rω.
Então, levando em conta que x+rω = (x1 +rω1 , . . . , xn +rωn ) e o desenvolvimento realizado
no Apêndice 6A, segue que ω = (y − x)/∥y − x∥ é um vetor unitário em Rn . A seguir, observe
que, usando a diferencial da função Ψ(y1 , . . . , yn ),
∂ ∂
dΨ(y1, . . . , yn ) = Ψ(y1 , . . . , yn ) dy1 + · · · + Ψ(y1 , . . . , yn ) dyn ,
∂y1 ∂yn
e considerando que dyj = ωj dr, com j = 1, . . . , n, a seguinte identidade acontece:
∂ ∂
Ψ(x + rω) = Ψ(x1 + rω1 , . . . , xn + rωn )
∂r ∂r
n
< ∂
= ωj Ψ(y1 , . . . , yn )
j=1
∂yj
= ω · ∇Ψ(y)
, -
x−y
=− · ∇Ψ(y) .
∥x − y∥
673
Operadores de Schrödinger
Se B(x; R) é uma bola aberta de centro x e raio R e volume igual a |Ω|, então, pelo Lema
10.3, segue que
$ $ , -1/n
1 1 n|Ω|
dy # dy = ωn−1 .
Ω ∥x − y∥n−1 B(x;R) ∥x − y∥n−1 ωn−1
Isto implica que
$ n , -1/n op−1 $ ,$ -
p 1 n|Ω| 1−n p
dx |Ψ(x)| # p ωn−1 dx dy ∥x − y∥ |∇Ψ(y)|
Ω ωn−1 ωn−1 Ω Ω
n, -1/n op $
n|Ω|
= dy |∇Ψ(y)|p .
ωn−1 Ω
Consequentemente,
, -1/n
n|Ω|
∥Ψ∥p,Ω # ∥∇Ψ∥p,Ω ,
ω
B n−1
CD E
C(Ω,n)
como afirmado.
TEOREMA 10.15 (Desigualdade de Poincaré-Sobolev). O Teorema 10.14, juntamente com a
desigualdade de Hölder, produz a desigualdade
∥Ψ∥q,Ω # C(Ω, n, p)∥∇Ψ∥p,Ω , (10.3.10)
para toda função Ψ ∈ H10 (Ω) dado que 1 # p < n e q ∈ [1, np/(n − p)].
674
Operadores de Schrödinger
Demonstração. Um primeiro e importante passo para entender (10.3.10) é notar que os expoentes
q ∈ [1, np/(n − p)] são os únicos expoentes para os quais essa desigualdade pode ser mantida.
Com efeito, sob dilatações de Ω
x 3→ βx e Ψ(x) 3→ Ψ(x/β) ,
como desejado.
Nota 10.15. A desigualdade (10.3.10), com Ω = Rn , foi estabelecida, para 1 < p < n, por
Sobolev no artigo “On a Theorem of Functional Analysis,” Mat. Sb. (N.S.) 4 (1938) 471; English
transl. in Am. Math. Soc. Transl. II Ser. 34 (1963) 39, sendo o caso p = 1 posteriormente
provado por E. Gagliardo em “Proprietà di Alcune Classi di Funzionidi piu Variabili,” Ricerche
Mat. 7 (1958) 102 e por L. Nirenberg em “On Elliptic Partial Differential Equations,” Ann. Sc.
Norm. Pisa 13 (1959). Foi provado por G. Talenti no artigo “Best Constant in Sobolev Inequality,”
Ann. Mat. Pura Appl. 110 (1976) 353, que o melhor valor possível da constante C em (10.3.10),
quando Ω = Rn , é
, -(p−1)/p F G1/n
1 p−1 Γ(1 + n/2)Γ(n)
C(n, p) = 1/2 1/p . (10.3.11)
π n n−p Γ(n/p)Γ(1 + n − n/p)
675
Operadores de Schrödinger
Note que não existe perda de generalidade se assumirmos no enunciado do teorema acima
o espaço C0∞ (Rn ), já que um simples argumento de densidade mostra que podemos nos
restringir ao caso de Ψ ∈ C0∞ (Rn ), uma vez que C0∞ (Rn ) é denso em H1 (Rn ).
Demonstração. Existem várias maneiras de provar este teorema. Aqui, escolhemos apresentar
uma prova diferente e mais independente (sem a constante ótima) tirada do livro de L. Saloff-
Coste, “Aspects of Sobolev-Type Inequalities,” Cambridge University Press, 2002. Começamos
considerando o caso p = 1. A prova devida a Gagliardo-Nirenberg estabelece que para p = 1
O próximo passo é mostrar que p = 1 implica p " 1. Suponha que (10.3.13) seja válida para
p = 1, ou seja,
Fixe p > 1. Para qualquer α > 1 e Ψ ∈ C0∞ (Rn ), observe que |Ψ|α é de classe C 1 , tem suporte
compacto e satisfaz |∇|Ψ|α | = α|Ψ|α−1 |∇Ψ|. Como podemos aproximar |Ψ|α por uma
sequência (Ψκ )κ∈N de funções suaves com suporte compacto de forma que ∇Ψκ → ∇|Ψ|α , a
desigualdade (10.3.14) permanece válida com a função Ψ substituída por |Ψ|α . Isso produz (via
desigualdade de Hölder)
$
1/2 α
2n ∥Ψ∥αn/(n−1) # α dx |Ψ(x)|α−1 |∇Ψ(x)|
Rn
,$ -1/q ,$ -1/p
(α−1)q p
#α dx |Ψ(x)| dx |∇Ψ(x)| ,
Rn Rn
676
Operadores de Schrödinger
O próximo teorema é devido a Li-Yau. O teorema fornece um limite superior para o número
de auto-valores do operador laplaciano em um domínio limitado em Rn , submetido a uma
condição de fronteira de Dirichlet. Em outras palavras, vamos considerar um domínio limitado
Ω em Rn e tomar
⎧
⎨∞ , se x ∈ /Ω
V (x) = ,
⎩0 , se x ∈ Ω
como nosso potencial. Isto significa que tomamos Ψ ≡ 0 fora de Ω. Estamos interessados no
problema de auto-valor
−∇2 Ψ(x) = λΨ(x) ,
em Ω, com a condição de fronteira de Dirichlet
5
5
Ψ5 ≡ 0 ,
∂Ω
TEOREMA 10.17 (Li-Yau, 1983). 20 Seja Ω um domínio limitado no Rn . Suponha que λj denota
o j-enésimo auto-valor de −∇2 para o problema de fronteira de Dirichlet. Se |Ω| é o volume de
Ω, então,
N
< , -, -2/n
1 1
λj " N 1+2/n .
j=1
n+2 |Ω|ωn−1
N
< N $
< N $
<
λj = dx |∇Φj (x)| = 2 ^ j (k)|2 ,
dk ∥k∥2 |Φ
j=1 j=1 Rn j=1 Rn
N $
< N $
<
2
dx |Φj (x)| = ^ j (k)|2 = N ,
dk |Φ
j=1 Rn j=1 Rn
20
P. Li e S.-T. Yau, “On the Schrödinger Equation and the Eigenvalue Problem,” Commun. Math. Phys. 88 (1983)
309.
677
Operadores de Schrödinger
^ 2
;N ^ 2
Logo, de definirmos |Ψ(k)| = j=1 |Φj (k)| , então,
N
< ∞
< ∞
< $
^
|Ψ(k)|2
= ^ j (k)| #
|Φ 2 ^ j (k)| =
|Φ 2 2
|⟨ek , Φj ⟩| = ⟨ek , ek ⟩ = dx = |Ω| .
j=1 j=1 j=1 Ω
Assuma que
N
< $
λj = ^
dk ∥k∥2 |Ψ(k)| 2
#C .
j=1 Rn
Então, defina |Θ(k)|2 = |Ω| quando ∥k∥ < R e |Θ(k)|2 = 0 quando ∥k∥ " R, em que R é
escolhido de forma que $
dk ∥k∥2 |Θ(k)|2 = C .
Rn
^
Assim, (∥k∥2 − R2 )(|Ψ(k)| 2
− |Θ(k)|2) " 0. Portanto,
$ $
. / . /
R 2 ^ 2
dk |Ψ(k)| − |Θ(k)| # 2 ^
dk ∥k∥2 |Ψ(k)| 2
− |Θ(k)|2 # C − C = 0 .
Rn Rn
Agora, temos
$ $ R , -
2 2 2 n+1 1
C= dk ∥k∥ |Θ(k)| = |Ω| ωn−1 dr r = |Ω|ωn−1 Rn+2 , (10.3.15)
Rn 0 n+2
e
$ $
N= ^
dk |Ψ(k)| 2
# dk |Θ(k)|2 = |Ω|ωn−1 Rn . (10.3.16)
Rn Rn
N
< , -, -2/n
1 1
λj " N 1+2/n .
j=1
n+2 |Ω|ωn−1
como afirmado.
678
Operadores de Schrödinger
Demonstração. Naturalmente, uma vez que estamos assumindo que os auto-valores são ordena-
dos monotonicamente, λ1 < λ2 # λ3 # · · · # λj # · · · , temos
N
< , -, -2/n
1 1
NλN " λj =⇒ NλN " N 1+2/n ,
j=1
n+2 |Ω|ωn−1
em que Ω é qualquer domínio limitado do Rn (lembremos que Rn pode ser expresso como a
união de domínios limitados).
N
<
Ψ(x) = ⟨Φj , Ψ⟩Φj (x) .
j=1
679
Operadores de Schrödinger
N
<
= λj ⟨Φj , Ψ⟩Φj (x)
j=1
N
<
= λj Pλj Ψ(x) .
j=1
;N
Note que, (H0 + V ) = j=1 λj Pλj . Logo, para todo j = 1, . . . , N, segue que para a
correspondente forma quadrática
$ $
def.
E(Ψ) = ⟨Ψ, (H0 + V )Ψ⟩ = dx ∇Ψ(x)∇Ψ(x) + dx V (x)|Ψ(x)|2 ,
Ω Ω
temos
N <
< N
E(Ψ) = λj ⟨Pλj Ψ, Pλk Ψ⟩
j=1 j=k
N <
< N
= λj ⟨Φj , Ψ⟩⟨Φk , Ψ⟩⟨Φj , Φk ⟩
j=1 j=k
N <
< N $
= λj ⟨Φj , Ψ⟩⟨Φk , Ψ⟩ dx Φj (x)Φk (x)
j=1 j=k Ω
N
<
= λj |⟨Φj , Ψ⟩|2 ,
j=1
por causa da ortonormalidade das auto-funções Φj . Portanto, |⟨Φj , Ψ⟩|2 é a probabilidade que
no estado Ψ a quantidade E(Ψ) seja igual a λj .
Isto significa que, se o espectro de (H0 + V ) é discreto e {Φj }N j=1 uma base ortonormal
N
de auto-funções, com auto-valores {λj }j=1 , então, Pλj é a projeção no subespaço de L2 (Ω)
680
Operadores de Schrödinger
gerado por todas as auto-funções Φj com λj < 0. Segue-se que N(−∇2 + V ) é o número de
auto-valores λj < 0, contados com a multiplicidade. Isto implica que, a seguinte identidade é
verdadeira:
3 4
N(H0 + V ) = sup dim F | F ⊂ C0∞ (Ω), E(Ψ) < 0, ∀ Ψ ∈ F \ {0} . (10.3.18)
De fato, basta restringir o sup a sub-espaços F dimensionalmente finitos. Por exemplo, a
condição E(Ψ) < 0 será satisfeita trivialmente para Ψ = Φk dado que λk < 0, porque
N
<
E(Φk ) = λj |⟨Φj , Φk ⟩|2 = λk < 0 . (10.3.19)
j=1
Isto indica que N(−∇2 + V ) = N(−∇2 (µ)). Esta última identidade é chamada de Princípio
de Birman-Schwinger (veja a Nota 10.16).
,$ -2/n $
n/2
# C(Ω, n, 2) dx V (x) dx |∇Φj (x)|2
Ω Ω
,$ -2/n $
n/2
= −C(Ω, n, 2) dx V (x) dµ(x) Φj (x)∇2 (µ)Φj (x)
Ω Ω
,$ -2/n
n/2
= C(Ω, n, 2) dx V (x) ⟨Φj , −∇2 (µ)Φj ⟩µ .
Ω
681
Operadores de Schrödinger
e
⟨Φj , −∇2 (µ)Φj ⟩µ
<1,
⟨Φj , Φj ⟩µ
segue que
, - ,$ -2/n
⟨Φj , −∇2 (µ)Φj ⟩µ n/2
1 # C(Ω, n, 2) dx V (x)
⟨Φj , Φj ⟩µ Ω
,$ -2/n
n/2
< C(Ω, n, 2) dx V (x) .
Ω
Lembremos que, podemos definir os auto-valores de −∇2 (µ) da maneira óbvia. De acordo
com o Teorema 5.39, o auto-valor mais alto de −∇2 (µ) é obtido por
em que Ki = ∪0#j#i Ker(−∇2 (µ) − λj 1I), com Ker(−∇2 (µ) − λj 1I) sendo os auto-espaços
de −∇2 (µ) para os auto-valores λj . Pelo Corolário 5.10, temos que para qualquer auto-valor de
−∇2 (µ)
⟨Ψ, −∇2 (µ)Ψ⟩µ
" λj ,
⟨Ψ, Ψ⟩µ
para qualquer Ψ em C0∞ (Ω) ∩ Kj−1
⊥
. A seguir, definimos λj como o maior auto-valor menor
que 1. Dessa forma, obtemos
, -, -2/n ,$ -2/n
1 1 2 2/n n/2
N(−∇ (µ)) # λN < 1 < C(Ω, n, 2) dx V (x) ,
n+2 |Ω|ωn−1 Ω
ou seja,
$
2 2
N(−∇ + V ) = N(−∇ (µ)) # C dx V n/2 (x) ,
Ω
em que
C = C(Ω, n, 2)(n + 2)n/2 (|Ω|ωn−1)2/n .
Para finalizar, uma vez que V " −V− , em que V (x) = V+ (x) − V− (x), pela Nota 10.12,
segue que N(H0 + V ) # N(H0 − V− ). Consequentemente, temos que
$ $
2 n/2 n/2
N(−∇ + V ) # C dx V− (x) # C dx V− (x) .
Ω Rn
682
Operadores de Schrödinger
Portanto, o subespaço no qual o lado esquerdo da equação acima é negativo tem dimensão
igual à dimensão do subespaço no qual a forma quadrática
$
dx |∇Ψ(x)|2
$ Ω ,
dx |V (x)||Ψ(x)|2
Ω
é menor que 1. No entanto, esta forma quadrática está associada ao operador −∇2 (µ). Isto
prova o Princípio de Birman-Schwinger (veja os detalhes no Apêndice 10A) que estabelece a
identidade N(−∇2 + V ) = N(−∇2 (µ)).
Nota 10.17. O melhor valor para a constante C na estimativa (10.3.5) ainda não é conhecido.
Tentativas foram feitas para se obter a melhor constante C, mas os resultados são bastante
inconclusivos. Lieb conjecturou que o melhor valor possível de C deveria ser
n, -n/2 o−1
n(n − 2) Γ(1/2)Γ(1/2n)
C= ωn−1 .
4 Γ((n + 1)/2)
Essa conjectura permanece aberta! A estimativa (10.3.5) falha no caso R2 . Assim, a questão
de se obter limites superiores ideais para N(H) em R2 também permanece aberta e é muito
discutida na literatura atual. Na Seção 10.6, aplicamos uma estimativa no tratamento do operador
de Schrödinger em R2 , conhecida como estimativa de Setô.
Nota 10.18 (Bônus: Comparação das desigualdades CLR e Poincaré-Sobolev). A desigualdade
CLR pode ser vista como sendo uma consequência da desigualdade de Poincaré-Sobolev. A
seguir, vamos mostrar que a desigualdade de CLR implica a desigualdade de Poincaré-Sobolev.
Portanto, as desigualdades CLR e de Poincaré-Sobolev podem ser vistas como sendo equivalentes!
Demonstração. A prova foi tomada do livro de A.A. Balsinky, W.D. Evans e R.T. Lewis, “The
Analysis and Geometry of Hardy’s Inequality,” Springer, 2015. Assuma que a desigualdade CLR é
satisfeita. Então, $
C dx V n/2 (x) < 1 ,
Rn
683
Operadores de Schrödinger
para todo Ψ ∈ H1 (Rn ). Seja W um elemento arbitrário de Ln/2 (Rn ), com ∥W ∥n/2 = 1 e
assuma que
N−2/n |W (x)| ,
V (x) = C
para qualquer
N > C = C(Ω, n, 2)(n + 2)n/2 (|Ω|ωn−1 )2/n .
C
Portanto, $ $
n/2 C
C dx V (x) = dx W n/2 (x) < 1 ,
Rn N
C Rn
e 5$ 5 $ $
5 5
5 dx W (x)|Ψ(x)| 5 # 25 N2/n
dx |W (x)||Ψ(x)| # C 2
dx |∇Ψ(x)|2 ,
5
R n Rn Rn
para todo Ψ ∈ H1 (Rn ). Por outro lado, pela desigualdade de Hölder, temos que
5$ 5 ,$ - n−2
5 5 n n
5 25
dx W (x)|Ψ(x)| 5 # ∥W ∥n/2 dx |Ψ(x)| 2 n−2
.
5
R n Rn
684
Operadores de Schrödinger
Sob essas condições, H admite, pelo Teorema de Friedrichs, uma única realização auto-adjunta
em L2 (Rn ) (seja a Seção 10.7). O espectro essencial, σess (H), de H é limitado inferiormente
(veja o Teorema 10.25). Definimos
685
Operadores de Schrödinger
Demonstração do Teorema 10.19. Primeiro, lembremos alguns fatos sobre a solução fundamental
de −∇2 + k 2 , isto é, uma solução de
−∇2 Ψk + k 2 Φk = δ(x) .
Existe uma solução (fraca) com a propriedade que Φk ∈ C0∞ (Rn \ {0}) e o comportamento
assintótico
1
Φk (x) = C|x| 2 (n−1) e−k|x| (1 + O(1)) , quando x→∞,
HΨ = λΨ , com λ < λ0 .
Por uma questão de simplicidade, vamos supor que V seja suave o suficiente para |x| muito
grande. Então, devido à regularidade elíptica,21 Ψ é suave para o mesmo x, isto é, Ψ é uma
solução clássica. Segue que
Portanto, . /
−∇2 (Ψ2 ) = 2 λ − V (x) Ψ2 − 2(∇Ψ)2 .
Logo, adicionando 2(b − λ)Ψ2 aos dois lados, obtemos
. / . /
−∇2 + 2(b − λ) Ψ2 = −2 V (x) − b Ψ2 − 2(∇Ψ)2 .
Assumimos aqui que b < λ0 e, portanto, o lado direita é não-negativo para |x| grande o
suficiente. Defina
Θ(x) = Ψ2 (x) − MΦk (x) ,
H
com k = 2(b − λ) (aqui λ < b < λ0 ). Escolha um R tal que Φk (x) " 0, V (x) > b e Ψ(x)
é suave para |x| " R. Em seguida, escolha M > 0, de modo que
686
Operadores de Schrödinger
Aqui, . /
Γ = −2 V (x) − b Ψ2 − 2(∇Ψ)2 .
Defina $
Θε (x) = dy Θ(x − y)ϕε(y) ,
Rn
(−∇2 + k 2 )Θε = Γ # 0 .
e
Mρ (ε) = max |Θε (x)| .
|x|=ρ
|Ψ(x)| # Cα e−α|x| ,
687
Operadores de Schrödinger
para qualquer α > 0 em que ρ(x) é alguma função que tende ao infinito quando |x| > ∞
e que reflete o comportamento diferente do potencial V em diferentes direções. O estudo
de estimativas como (10.4.4) para soluções da equação de Schrödinger em domínios ilimitados
pode ser encontrado no livro de Shmuel Agmon, “Lectures on Exponencial Decay of Solutions of
Second Order Elliptic Equations, Princeton Universty Press, 1982.
Nota 10.19. Suponha que o potencial V tenha um crescimento do tipo-potência no infinito, isto
é,
V (x) " C|x|α − C1 ,
em que C > 0, C1 ∈ R e α > 0. Então, para toda auto-função Ψ tem-se
α +1
|Ψ(x)| # C2 e−γ|x| 2 ,
V (x)
−a a
x
−V0
688
Operadores de Schrödinger
Shlomo Stenberg.22 Mostraremos que no caso de a partícula ter uma energia −V0 < E < 0,
existem soluções para a equação de Schrödinger para apenas alguns valores da energia (es-
tados ligados). Assim sendo, o espectro de H consiste de um número finito de pontos
σdisc (H) = [−V0 , 0) (pelo menos um), juntamente com σess (H) = [0, ∞); além disso,
(−∞, −V0 ) ∈ ρ(H). Os auto-vetores (ou as auto-funções) para os auto-valores negativos
decaem exponencialmente para |x| > a (veja a Figura 10.4).
∥Ψ∥2
−a 0 a
O modelo do poço de potencial finito é bastante simplificado e pode ser resolvido por
métodos elementares. No entanto, apesar de ser simples, o modelo incorpora muitos aspectos
matemáticos que são analisados em qualquer curso de mecânica quântica elementar, de acordo
com Shlomo Sternberg, “por meio de definições e métodos que não são convincentes para os
matemáticos.”23 Por exemplo, como já enfatizado várias vezes ao longo deste texto, é muito
comum nos livros sobre mecânica quântica iniciar-se a análise das soluções da equação de
Schrödinger independente do tempo, HΨ(x) = (H0 + V )Ψ(x) = EΨ(x), sem nem mesmo
se fazer menção ao domínio do operador H. Ao se determinar um domínio para o operador
de Schrödinger H devemos decidir, antes de tudo, qual é o domínio do operador potencial V .
Como já vimos, a escolha mais simples, e natural, para um domínio para V é o conjunto de
todas as funções Ψ ∈ L2 (R) tal que V Ψ ∈ L2 (R). Uma vez feita esta escolha, precisamos
determinar se H é auto-adjunto. Se V é uma perturbação de Kato de H0 , então, o Teorema
4.35 (Teorema de Kato-Rellich) nos dá uma forma muito útil de determinar se H = H0 + V
é auto-adjunto. Contudo, para cada caso, devemos saber quando um potencial V satisfaz o
Teorema 4.35 (algumas classes de potenciais já apareceram no Teorema 10.1). Felizmente, no
caso do poço de potencial finito existe um critério simples, como mostra o seguinte
LEMA 10.4. Seja V uma função contínua em um intervalo I ∈ R. Então, as seguintes proprie-
dades são equivalentes:
$ a+1/2
1. C = sup dx |V (x)|2 < ∞.
a∈R a−1/2
2. Para cada ε > 0 arbitrário existem constantes a(ε) e b(ε) tais que
689
Operadores de Schrödinger
3. Dom(H0 ) ⊂ Dom(V ).
Demonstração. Assuma que 1 seja verdade. Tome uma função Ψ ∈ Dom(H0 ) tal que Ψ seja
real valorada, que Ψ ∈ C 1 (I), que Ψ′ ∈ AC(I) e que Ψ′′ ∈ L2 (I). A seguir, note que para
x, y ∈ [a − 1/2, a + 1/2], temos
$ x $ a+1/2 , -2 $ a+1/2
2 2 dΨ(z) dΨ(z) −1
Ψ (x) − Ψ (y) = dx 2Ψ(z) #ε dz +ε dx Ψ2 (z) .
y dz a−1/2 dz a−1/2
Aqui, usamos a desigualdade 2ab # εa2 + ε−1 b2 . Como Ψ foi assumida ser real valorada,
então, pelo Teorema do Valor Médio para integrais definidas,24 podemos concluir que f alcança
seu valor médio em algum ξ em (a, b). podemos escolher um x2 ∈ [a − 1/2, a + 1/2] tal que
$ a+1/2
2
Ψ (y) = dz Ψ2 (z). Logo, temos
a−1/2
$ 5 5 $ a+1/2
a+1/2 5 dΨ(z) 52
2
|Ψ(x)| # ε 5
dz 5 5 −1
+ (1 + ε ) dz |Ψ(z)|2 ,
a−1/2 dz 5 a−1/2
Como o intervalo [a − 1/2, a + 1/2] tem comprimento 1 e como a reta real é a união de
intervalos de comprimento 1, obtemos que
$ ∞ $ ∞ 5 5 $ ∞
5 dΨ(z) 52
2
dx |V (x)Ψ(x)| # εC dz 55 5 −1
dz |Ψ(z)|2 . (10.5.1)
dz 5 + (1 + ε )C
−∞ −∞ −∞
2m2 1
= ∥H0 Ψ∥2 + ∥Ψ∥2 .
# 4 2
24
Lembre-se que, de acordo com o Teorema do Valor Médio para integrais, se f é uma função contínua no
intervalo [a, b], então, existe ξ ∈ [a, b], tal que
$ b
dx f (x) = (b − a)f (ξ) .
a
690
Operadores de Schrödinger
2 4 −1 −1
HFinalmente, definindo a(ε) = 2m εC/# , b(ε) = (1 + ε + 2 ε) C, adicionando o termo
2 a(ε)b(ε)∥H0 Ψ∥∥Ψ∥ do lado direito de (10.5.2) e tomando a raíz quadrada dos dois lados,
obtemos que
∥V Ψ∥ # a(ε)∥H0 Ψ∥ + b(ε)∥Ψ∥ , Ψ ∈ Dom(H0 ) .
Note que, se tomarmos εC < #4 /(2m2 ) para garantir que a(ε) seja menor que 1, o critério
de perturbação de Kato estará satisfeito e, portanto, H = H0 + V é auto-adjunto. Além disso,
a desigualdade acima diz que V Ψ ∈ L2 (R) quando Ψ ∈ Dom(H0 ). Isto significa que
Dom(H0 ) ⊂ Dom(V ). Portanto, isto prova que 2 =⇒ 3. Que 3 =⇒ 1 segue do Teorema
10.1 item (iv).
COROLÁRIO 10.3. O operador H = H0 + V em L2 (R), em que V é o poço de potencial finito,
é auto adjunto no domínio Dom(H0 ).
Demonstração. Suponha primeiro que Ψ satisfaça as condições (1) e (2). Então, não é difícil
ver que a derivada segunda de Ψ, no sentido distribucional, é simplesmente a função d2 Ψ/dx2
computada no sentido ordinário em todos os pontos x ̸= ±a. (A segunda derivada pode não
existir em x = ±a, mas simplesmente deixamos d2 Ψ/dx2 indefinido nesses dois pontos, que
formam um conjunto de medida zero.) Assim, d2 Ψ/dx2 , calculado no sentido distribucional, é
um elemento de L2 (R).
691
Operadores de Schrödinger
derivada da função-δ, em um desses pontos (veja o Exemplo 6.9). Mas, nem a função-δ nem a
derivada da função-δ são funções de quadrado integrável.
ou
∥Ψ∥ # C∥(H + λ1I)Ψ∥ ,
com C = |−V01+λ| . Isto mostra que não existe uma sequência satisfazendo a Definição 5.6. De
fato, provamos (veja o Teorema 5.11) que se −λ não pertence ao espectro essencial de H não
pode existir uma tal sequência. Se −λ ∈ ρ(H), então, (H + λ1I)−1 é limitado e nenhuma
sequência com ∥Ψn ∥ = 1 e (H + λ1I)Ψn → 0 pode existir, enquanto que se −λ é um ponto
isolado do espectro nenhuma tal sequência satisfazendo as condições do Teorema 5.11 também
não pode existir. Assim, de acordo com o Teorema 5.11, −λ está no conjunto resolvente de
H.
Nota 10.20. Deve ficar claro que a Proposição 10.9 é válida para qualquer dimensão!
As duas proposições acima estabelecem que (i) o espectro essencial de H é igual ao espectro
essencial de H0 , isto é, σess (H) = σess (H0 ) = [0, ∞) e que não existem auto-valores na região
[0, ∞), (ii) não existe espectro abaixo de −V0 e (iii) o espectro discreto de H consiste de
auto-valores de multiplicidade finita, com σdisc (H) = [−V0 , 0), isto é, H tem auto-valores
692
Operadores de Schrödinger
discretos na região −V0 < E < inf σess (H), de maneira que HΨ = EΨ. Esses auto-valores
podem ser determinados resolvendo-se a equação de Schrödinger independente do tempo
, -
#2 d
− + V (x) Ψ(x) = EΨ(x) .
2m dx
Ψ(x) = Ce−βx ,
enquanto que para x < −a, a única solução da equação acima que pertence a L2 (R) é da
forma
Ψ(x) = Ceβx .
e
Ψ(x) = B sin αx (solução ímpar) .
Para completar a solução, por causa da continuidade, de acordo com o Lema 10.5, temos que
combinar as funções de onda Ψ e suas derivadas nos pontos x = −a e x = a. Em vez de
combinar Ψ e dΨ/dx separadamente, uma simplificação que pode ser usada é a combinação da
chamada derivada logarítmica (1/Ψ)(dΨ/dx). Em virtude do Lema 10.5, essas derivadas devem
ser iguais nos pontos x = −a e x = a. Assim, ao combinarmos as derivadas logarítmicas para
as soluções pares nos limites x = ±a, obtemos
α tan αa = β ,
enquanto que, oo combinarmos as derivadas logarítmicas para as soluções ímpares nos mesmos
limites, obtemos
α cot αa = −β .
693
Operadores de Schrödinger
Note que,
ξ 2 + η2 = γ 2 , (10.5.5)
Q
2
em que γ = 2mV 0a
#2
. O parâmetro γ é muitas vezes denominado parâmetro de intensidade.
A Eq.(10.5.5) é a equação de um círculo no plano-(ξ, η).
η
ξ tan ξ −ξ cot ξ ξ tan ξ
η 2 + ξ2 = γ 2
π π 3π ξ
2 2
Figura 10.5: Valores reais de E obtidos pelas interseções devem ser obtidos numericamente.
De π a 3π/2, obtemos a curva original transladada. Em outras palavras, isto implica que
obteremos as curva original transladada por multiplicações de π na direção ξ. Assim que nπ
excede o raio do círculo (10.5.5), não podemos mais ter uma interseção. Isso mostra que existem
apenas um número finito auto-valores correspondentes a auto-função par. Com efeito, o número
de auto-valores pares é o inteiro n tal que
2mV0 a2
nπ # < (n + 1)π .
#2
Por fim, observe que a continuidade de Ψ em x = ±a exige que Ce−βa = A cos αa, o que
mostra que cada auto-valor par tem multiplicidade finita.
694
Operadores de Schrödinger
De forma análoga, podemos computar os auto-valores ímpares (esta situação também está
representada na Figura 10.5). Neste caso, o número de auto-valores pares é o inteiro n tal que
π 2mV0 a2 π
n # < (n + 1) ,
2 # 2 2
com a continuidade de Ψ em x = ±a exigindo que Ce−βa = B sin αa, o que mostra que
cada auto-valor ímpar também tem multiplicidade finita.
Na Figura 10.5, vemos duas interseções, o que significa dois estados ligados. A primeira
interseção ocorre perto de ξ = π/2. Esta interseção representa o estado fundamental, ou o
estado ligado com a maior energia de ligação. A segunda interseção ocorre entre π/2 e 3π/2.
À medida que o raio do círculo se torna maior, temos mais e mais interseções; o parâmetro
de intensidade γ controla o número de estados ligados. Finalmente, note que há sempre uma
solução par, não importa quão pequena seja γ, porque o arco do círculo sempre irá cruzar a
primeira curva do gráfico η = ξ tan ξ. Assim, existe sempre pelo menos um estado ligado,
associado a auto-função par, por menos profundo que possa ser o poço finito!
Ψ3
x
Ψ2
x
Ψ1
−a a x
Na Figura 10.6 nós esboçamos as auto-funções que são soluções da equação de Schrödinger,
independente do tempo, para o poço de potencial quadrado associadas com os três primeiros
estados ligados, com energias E1 < E2 < E3 . Algumas características dessa auto-funções
merecem ser destacadas: elas se alternam como par e ímpar. Elas têm zero, um e dois nodos,
respectivamente (quanto maior o número de nodos das auto-funções, menor será o valor da
energia de ligação). A derivada segunda de cada auto-função Ψ é negativa para |x| < a e
positiva para |x| > a (na verdade é descontínua em x = ±a). O decaimento exponencial na
região |x| > a é mais rápido para o estado fundamental e vai ficando mais lento à medida que
a energia do estado ligado vai diminuindo.
Nota 10.21 (Tunelamento). Observe que, embora as auto-funções estejam decaindo exponen-
cialmente, elas não são zero fora do poço. Isto está em contraste com uma partícula clássica
aprisionada em um poço do qual ela não pode escapar; ou seja, existe uma probabilidade da
partícula ser encontrada fora do poço de potencial finito. Em outras palavras, a função de onda
Ψ penetra a região classicamente proibida. Este efeito é chamado de tunelamento quântico.
695
Operadores de Schrödinger
#2 2
H = H0 + V = − ∇ (x) − αK0 (β∥x∥) . (10.6.1)
2µ
Aqui, µ representa a massa reduzida e α é o parâmetro de acoplamento considerado, sem
perda de generalidade, não-negativo. As constantes α e β dependem dos parâmetros de cada
modelo, como o valor esperado do vácuo de algum campo, a carga do elétron, as constantes
de acoplamento, os comprimentos característicos, a massa dos campos (exemplo do bóson
mediador), etc.
nas partes radial e angular, segue que a parte radial assume a forma
F 2, 2 - G
# d 1 d #2 m2
− + + − αK0 (βr) Ψ(r) = EΨ(r) , (10.6.2)
2µ dr 2 r dr 2µr 2
d2 Θ(θ)
= −m2 Θ(θ) . (10.6.3)
dθ2
O operador d2 /dθ2 , com domínio C0∞ (S 1 ), é essencialmente auto-adjunto. Seus auto-vetores
Θm (θ) = (2π)−1/2 eimθ , com m ∈ Z, constituem uma base ortonormal de L2 (S 1 , dθ).
26
A discussão abaixo foi retirada do artigo Wellisson B. De Lima, Oswaldo M. Del Cima, Daniel H.T. Franco e
Bruno C. Neves, “On the Two-Dimensional Schrödinger Operator with an Attractive Potential of the Bessel-Macdonald
Type,” Annals of Physics 427 (2021) 168385 e da Monografia de Conclusão do Curso de Física de Wellisson B. De
Lima, “Estados Ligados Elétron-Elétron na Eletrodinâmica Quântica Planar.” Depto. de Física, UFV, 2016.
696
Operadores de Schrödinger
Nota 10.22. Pode-se mostrar que a função-de-onda (10.6.4) associada à um estado ligado, com
energia negativa se comporta com27
⎧ 1
⎨O(r m+ 2 ) for r → 0
Φ(r) = .
⎩O(e−kr ) for r → ∞; k = (−2µE) #
1
2
−1
Portanto, segue que tal função Φ pertence a H = L2 ((0, ∞); |V (r)|dr), assim como a
L2 ((0, ∞); dr).
Nota 10.23. Da expressão V (r) = −αK0 (βr) podemos ver que α tem dimensão de energia e
nos dá uma escala de energia para a interação entre duas partículas. Por sua vez, o parâmetro
β tem dimensão de inverso de comprimento, fixando assim uma escala de comprimento, um
intervalo de interação, que está relacionado à massa do bóson mediador (Mb ) trocado durante
o espalhamento de duas partículas. Isso pode ser verificado se considerarmos o comprimento
de onda Compton do campo mediado pelo bóson, 2π#(Mb c)−1 , portanto β ∼ Mb . Além
disso, se tomarmos a constante, #2 β 2 (2µ)−1, que tem dimensão de energia, juntamente com
a relação entre β e Mb , uma escala de energia também é corrigida. Assim, introduzimos uma
constante adimensional C = 2µα(#β)−2 que dá uma noção de quão forte é a interação entre
os dois quanta (α) quando comparado com a energia do bóson mediador (Mb c2 ). Ao levar em
27
Veja N. Setô, “Bargmann’s inequalities in spaces of arbitrary dimension,” Publ. RIMS, Kyoto Univ. 9 (1974) 429.
697
Operadores de Schrödinger
consideração essa análise, reescrevemos o potencial efetivo de uma maneira mais conveniente,
isto é,
(m2 − 1/4)
veff. (s) = − CK0 (s) . (10.6.6)
s2
em que definimos
2µα
s = βr , C= .
#2 β 2
Portanto,
2µ
veff. (s) = Veff. (s) .
#2 β 2
Vejamos, agora, como o Critério de Kato e o Teorema de Kato-Rellich nos permitem estabe-
lecer a auto-adjunção do operador de Schrödinger (10.6.1).
PROPOSIÇÃO 10.10. O operador hamiltoniano (10.6.1) em L2 (R2 ) é auto-adjunto no domínio
Dom(H0 ).
Demonstração. Seguindo o mesmo raciocínio do Lema 10.1, usando uma constante arbitrária
λ > 0, considere que para n # 3 e para cada Ψ ∈ Dom(H0 ) ⊂ L2 (Rn ), a função
^
k 3→ (λ2 + (2µ)−1 ∥k∥2 )−1 ∈ L2 (Rn ). Além disso, L2 (Rn ) ∋ (λ2 + (2µ)−1 ∥k∥2 )Ψ(k) =
2 29
F (λ Ψ + H0 Ψ). Portanto, pela desigualdade de Hölder,
^
(λ2 + (2µ)−1 ∥k∥2 )−1 (λ2 + (2µ)−1 ∥k∥2 )Ψ(k) ∈ L1 (R2 ) ,
28
Aqui, estamos repetindo propositalmente a prova do Lema 10.1, pois estamos levando em conta explicitamente
todos os parâmetros.
29
Aqui, estamos adotando a seguinte convenção para a transformada de Fourier:
$
8 9
^
F Ψ (k) = Ψ(k) = dn x ei! k·x Ψ(x) ,
−1
Rn
$
8 −1 9 1
F Ψ^ (x) = Ψ(x) = dn k e−i!
−1
k·x ^
Ψ(k) .
(2π#)n Rn
698
Operadores de Schrödinger
e
$
^ 1= d2 k 2 ^
∥Ψ∥ (λ + (2µ)−1 ∥k∥2 )−1 (λ2 + (2µ)−1 ∥k∥2 )|Ψ(k)|
R2 #2
,$ -1/2 ,$ -1/2
d2 k 2 d2 k 2 ^
# (λ + (2µ)−1 ∥k∥2 )−2 (λ + (2µ)−1 ∥k∥2 )2 |Ψ(k)| 2
.
R2 #2 R2 #2
A primeira
√ integral pode ser facilmente calculada. De fato, aplicando a troca de variável
k → ( 2µλ) k e usando a Tabela de Integrais de Gradshtein-Ryzhik (fórmula 3.241, 4.11 , pg.
−1
^ 1# (2πµ)1/2 ?
? 2 ^?
?
∥Ψ∥ ?(λ + (2µ)−1 ∥k∥2 )Ψ ?
#λ 2
(2πµ)1/2 6 2 ^ ? ?7
−1 ? 2^?
# λ ∥Ψ∥2 + (2µ) ?∥k∥ Ψ? .
#λ 2
µ1/2 6 2 ^ ? ?7
−1 ? 2^?
∥Ψ∥∞ # λ ∥Ψ∥2 + (2µ) ?∥k∥ Ψ?
(2π)3/2 #λ 2
µ1/2 . 2 /
= λ ∥Ψ∥2 + ∥H0 Ψ∥2 ,
(2π) #λ
3/2
uma vez que a transformada de Fourier é um operador unitário. Isso completa a prova.
Demonstração da Proposição 10.10. Primeiro, mostramos que V (x) = −αK0 (β∥x∥) ∈ L2 (R2 ).
Com efeito, usando a Tabela de Integrais em Gradshteyn-Ryzhik (fórmula 6.521, 6.∗ , pg.665),
obtemos que
⎛ ⎞1/2
, $ -1/2 ⎜ $ ∞ ⎟
⎜ ⎟ π 1/2 α
∥V ∥2 = α2 2
dx K02 (β∥x∥) = ⎜2πα 2
dr rK02 (βr)⎟ = .
R2 ⎝ ⎠ β
B0 CD E
1/2β 2
699
Operadores de Schrödinger
//// ^ |Ψ|
Ψ ^2 #−2 d2 k λ2 α β µ ^ 1
∥Ψ∥ ∥Ψ∥∞ ∥V ∥2 a(λ) b(λ)
Dim. L L2 L−2 E E L−1 M L−1 L−1 EL ∅ E
^ e tutto il resto.
Tabela 10.1: Dimensões of Ψ
µ1/2 α . 2 /
= λ ∥Ψ∥ 2 + ∥H 0 Ψ∥ 2 .
23/2 π#λβ
Definimos
µ1/2 α µ1/2 αλ
a(λ) = e b(λ) = . (10.6.7)
23/2 π#λβ 23/2 π#β
Uma vez que λ é uma constante positiva arbitrária, basta assumir que
µ1/2 α
<λ,
23/2 π#β
para o fator a(λ) ser menor do que 1. Isto prova que o potencial V (x) = −αK0 (β∥x∥) é
H0 -limitado, de maneira que o Teorema 4.35 se aplica e comprova a auto-adjunção do operador
de Schrödinger (10.6.1).
Nota 10.25. Neste ponto, lembre-se de que a interpretação física da função de onda é aquela
que afirma que d2 x |Ψ(x)|2 dá a probabilidade de encontrar a partícula quântica em uma
região d2 x em torno da posição x. Probabilidade é uma quantidade adimensional. Portanto,
|Ψ(x)|2 deve ter dimensão inversa de área L−2 enquanto Ψ tem dimensão L−1 . Da mesma
^
forma, a interpretação física da função de onda no espaço dos momenta é que #−2 d2 k |Ψ(k)| 2
−2 2
dá a probabilidade de encontrar a partícula quântica em uma região # d k em torno do
^
momento k. Portanto, |Ψ(k)| 2
deve ter dimensão de comprimento ao quadrado L2 e Ψ ^ tem
dimensão L. As dimensões de todas as quantidades envolvidas nas provas do Lema 10.1 e da
Proposição 10.10 são coletadas na Tabela 10.1.
Como já mencionado, muitas vezes é importante determinar o ponto mais baixo do espectro
de um operador auto-adjunto. Esse problema só faz sentido se o operador for limitado por
baixo, pois, caso contrário, o espectro se estende para −∞. A limitação por baixo do operador
de Schrödinger com potencial K0 é analisada a seguir.
TEOREMA 10.20. O operador de Schrödinger (10.6.1) é limitado inferiormente por −Cα/4π, em
que C = 2µα(#β)−2 é uma constante adimensional, enquanto α tem dimensão de energia e
nos fornece uma escala de energia para a interação entre as duas partículas.
700
Operadores de Schrödinger
Assim, H0 é limitado por baixo por zero e pelo Teorema 4.35 e pela Proposição
. 10.10/ obtemos
que o operador de Schrödinger (10.6.1) é limitado por baixo por −b(λ)/ 1 − a(λ) , em que
a(λ) e b(λ) são dados por (10.6.7).
Para procurar os pontos extremos da função acima (máximo ou mínimo), primeiro é neces-
sário identificar os pontos críticos da função e depois verificar o sinal da derivada segunda de
f . A primeira e a segunda derivada de f são, respectivamente,
2Aλ Aλ2
f ′ (λ) = − ; (10.6.8)
λ − A (λ − A)2
Deste modo, o operador de Schrödinger (10.6.1) é limitado inferiormente por −Cα/4π, como
queríamos provar. Esse resultado garante a estabilidade de possíveis estados ligados de duas
quase-partículas.
# 2
COROLÁRIO 10.4. Para H = − 2µ ∇2 (x) − αK0 (β∥x∥) segue que σ(H) = [−Cα/4π, +∞).
Demonstração. Naturalmente, de acordo com o Teorema 10.20, não existe pontos do espectro
abaixo de −Cα/4π. Em outras palavras, o fato do operador H ser limitado inferiormente
implica que existe um valor de energia E0 = −Cα/4π (negativo no caso considerado aqui), de
modo que ⟨Ψ, HΨ⟩ " E0 ⟨Ψ, Ψ⟩ para toda função Ψ ∈ Dom(H), ou equivalentemente, que
todo o espectro esteja em E " −Cα/4π. Isto corresponde à existência de estados ligados, com
#2
o estado de menor energia sendo −Cα/4π no espectro de H = − 2µ ∇2 (x) − αK0 (β∥x∥).
Dessa forma, σ(H) = [−Cα/4π, +∞).
701
Operadores de Schrödinger
No limite inferior do espectro essencial ou acima deste valor, qualquer energia afetará o
estado ligado de dois quanta porque E > 0. O par de dois quanta não será mais localizado,
ou seja, as quasi-partículas se moverão livremente. Portanto, o operador de Schrödinger (10.6.1)
pode ter apenas auto-valores discretos em [−Cα/4π, 0). Em particular, sob certas condições
existe exatamente somente um estado ligado de dois quanta, isto é, um auto-estado abaixo do
parte inferior do espectro essencial, conforme mostrado a seguir.
# 2
PROPOSIÇÃO 10.12. Em relação à parte discreta do espectro do operador H = − 2µ ∇2 (x) −
αK0 (β∥x∥), se 0 < C < 2, para m ! C = 2m, para m " 1, em que m é o valor do
= 0, ou se "
momento angular, então, σdisc (H) = −Cα/4π , com a multiplicidade do estado fundamental
sendo um.
A prova desta proposição será apresentada no final desta seção. Primeiro, obtemos uma
estimativa para o número de estados ligados de dois quanta. Para o caso m = 0 (momento
angular zero) não é difícil ver que o potencial será unicamente atrativo, como podemos ver
através de uma inspeção direta da Eq.(10.6.6) (veja a Figura 10.7).
s
veff (s)
C<1
C=1
C>1
caso m = 0
702
Operadores de Schrödinger
o estado do momento angular zero (m = 0) (ou onda-s como é mais conhecido), uma vez
que o potencial é exclusivamente atrativo. Observe que, se mantivermos o parâmetro C fixo
e aumentarmos o momento angular em uma unidade, o termo centrífugo positivo dá uma
contribuição repulsiva ao potencial efetivo e pode até exceder o termo atrativo (veja a Figura
10.8).
caso m = 1
veff (s)
Figura 10.8: Potencial efetivo para o caso m = 1 e os mesmos valores de C da Figura 10.7.
Por outro lado, uma análise um pouco mais minuciosa da função potencial efetivo (10.6.6)
sugere que, aumentando o valor de C, para um determinado valor de m, a contribuição atrativa
pode ser maior que a repulsiva (isso é mostrado na Figura 10.9 para C > 1).
C<1
C=1
C>1
Figura 10.9: Potencial efetivo para o caso m = 1 e valor de C maior que os anteriores para a
situação C > 1.
703
Operadores de Schrödinger
Antes de tudo, precisamos ter cuidado no cálculo da estimativa acima devido ao cumprimento
da condição imposta de consistência dimensional; portanto, realizaremos a seguinte substituição:
$ ∞ $
2µ ∞
dr r|V (r)| −→ 2 dr r |V (r)| .
0 # 0
Assim, podemos avaliar a expressão (10.6.10) adequadamente para d = 2 e m > 0 (momento
angular nulo), obtendo:
$ $
m 1 2µ ∞ 1 2µα ∞ C
N2 < dr r |V (r)| = ds s K0 (s) = .
2m # 0
2 2m # β 0
2 2 2m
B CD E
1
Vamos agora considerar o caso do momento angular zero, m = 0. Neste caso, o Teorema
10.21 não se aplica. Portanto, temos que recorrer ao seguinte
TEOREMA 10.22 (Segunda desigualdade de Setô). 31 O número de estados ligados, N20 , produ-
zido pelo potencial V , satisfazendo a condição
$ ∞ 6 5 r 57
5 5
dr r 1 + 5ln 5 |V (r)| < ∞ , (10.6.11)
0 R
no estado de onda-0 no espaço bidimensional satisfaz a desigualdade
$ ,$ ∞ 5 r5 -
1 ∞ 5 5
dr r |V (r)| ds s 5ln 5 |V (s)|
0 2 0 0 s
N2 < 1 + $ ∞ . (10.6.12)
dr r |V (r)|
0
30
Veja N. Setô, “Bargmann’s Inequalities in Spaces of Arbitrary Dimension,” Publ. RIMS, Kyoto Univ. 9 (1974)
429, Teorema 3.2
31
Veja N. Setô, “Bargmann’s Inequalities in Spaces of Arbitrary Dimension,” Publ. RIMS, Kyoto Univ. 9 (1974)
429, Teorema 5.1
704
Operadores de Schrödinger
Verificaremos se o potencial K0 satisfaz a condição (10.6.11). Para isso, novamente, com base
na consistência dimensional, fazemos a seguinte substituição:
$ ∞ 6 5 r 57 $ ∞
5 5
dr r 1 + 5ln 5 |V (r)| −→ C ds s (1 + | ln s|)K0 (s) .
0 R 0
Agora, temos o endosso para determinar o limite do número de estados ligados para o
caso em que m = 0. Novamente, mudando para uma forma dimensionalmente consistente,
reescrevemos a segunda parte de (10.6.12) da seguinte forma:
⎡ $ ∞ ,$ ∞ 5 r5 -⎤
1 5 5
⎢ 2 0 dr r K0 (r) 0 ds s 5ln s 5 K0 (s) ⎥
C⎢⎣ $ ∞ ⎥ .
⎦
dr r K0 (r)
0
705
Operadores de Schrödinger
706
Operadores de Schrödinger
Com a estimativa (10.6.15) podemos agora provar a Proposição 10.12. Precisaremos do seguinte
teorema (cf. o Teorema 11.8 no livro de E.H. Lieb e M. Loss, “Analysis,” Second Edition, American
Mathematical Society, Providence, 2001).
TEOREMA 10.23 (Unicidade dos minimizadores). Suponha que Ψ0 ∈ C0∞ (Rn ) seja um mini-
mizador para E, ou seja, E(Ψ0 ) = E0 > −∞ e ∥Ψ0 ∥ = 1. Assuma que V ∈ Lloc. n
1 (R ) e que V
é localmente limitado por cima (não necessariamente limitado por baixo). Além disso, assuma
que V |Ψ0 |2 é somável. Então, Ψ0 satisfaz a equação de Schrödinger
com Ψ = Ψ0 e E = E0 . Ainda, Ψ0 pode ser escolhido como sendo uma função estritamente
positiva e, o mais importante, Ψ0 é o único minimizador a menos de uma fase constante.
Demonstração da Proposição 10.12. Só precisamos provar que não existe outro auto-valor abaixo
de inf σess (H). A unicidade do estado fundamental é garantida pelo Teorema 10.23. De fato,
o potencial V (r) = −αK0 (βr) satisfaz todas as hipóteses do teorema acima, que assegura a
existência de um único minimizador, Ψ0 , a menos de uma fase constante. Por outro lado, de
acordo com a Eq.(10.6.15), a constante C afeta diretamente o número de estados ligados e, para
0 < C < 2, se m = 0, ou para C = 2m, se m " 1, existirá exatamente um único estado
ligado, com um auto-valor simples. Isso será encontrado apenas no estado de onda-s, isto é,
para momento angular zero, m = 0. Como o espectro do operador Schrödinger (10.6.1) começa
em −Cα/4π, concluímos que H tem no máximo um auto-valor isolado (exatamente um), o
que prova a proposição.
707
Operadores de Schrödinger
e2 e2 Z
Vαβ (xα − xβ ) = e VαZ (xα − x) = − ,
∥xα − xβ ∥ ∥xα − x∥
yα = xα − x , com α = 1, . . . , Ne .
Essas coordenadas são denominadas coordenadas atômicas. Como o nome sugere, essas coor-
denadas são particularmente úteis na física atômica, onde geralmente algumas partículas são
“privilegiadas,” por exemplo, por serem muito mais pesadas que as demais. No caso que iremos
tratar a partícula “privilegiada” será núcleo.
Nota 10.26. De maneira análoga, podemos separar o movimento do centro-de-massa de um
sistemas de N-partículas usando as coordenadas de Jacobi
( α
)
1 <
yα = α xα+1 − mβ xβ com α = 1, . . . , N − 1 .
<
β=1
mβ
β=1
HNatom
e
atom
= Hcm + HNrele ,
34
Aqui, Lsim
2 (R
3N
) é um subespaço de simetria de L2 (R3N ) refletindo o fato de que os elétrons e alguns dos
núcleos são partículas idênticas.
708
Operadores de Schrödinger
em que
atom #2
Hcm =− ∇2 , (10.7.2)
2Mtotal ycm
é o hamiltoniano associado ao centro-de-massa e
Ne Ne <
Ne Ne <Ne Ne
#2 < #2 < < <
HNrele =− 2
∇ − ∇ yα · ∇ yβ + Vαβ (yαβ ) + VαZ (yα ) ,
2µ α=1 yα M α=1 α<β α=1 α<β α=1
(10.7.3)
A Eq.(10.7.2) indica que o centro-de-massa do sistema move-se como uma partícula livre,
enquanto que o movimento relativo dos elétrons é governado pelo hamiltoniano (10.7.3). Isto
implica que as auto-funções de H podem ser assumidas da forma
Em outras palavras, o espaço de Hilbert do sistema acima pode ser escrito como o produto
atom
tensorial H = Hcm ⊗ Hrel , em que os operadores Hcm e HNrele agem não-trivialmente
somente sobre os fatores Hcm e Hr , respectivamente, da seguinte forma:
5 5
atom 5 atom atom 5
H Ne 5 = Hcm ⊗ 1Irel e HNe 5 rel
= 1Icm ⊗ HNrele ,
atom )
Dom(Hcm Dom(HNe )
Para simplificar as coisas um pouco mais, vamos adotar uma aproximação comum usada na
física atômica que atribui à massa nuclear um valor infinitamente grande e fixa na origem. Com
efeito, já que prótons e neutrons constituem o núcleo dos átomos, com a massa do neutron
ligeiramente maior que a de um próton, que por sua vez tem uma massa aproximadamente 1800
vezes maior que a massa do elétron, a localização do centro-de-massa do sistema acima quase
que coincide com a localização do núcleo. Além disso, a massa reduzida do sistema é muito
próxima da massa do elétron. Assim, numa primeira aproximação, o centro-de-massa pode
ser “removido,” supondo que o núcleo está “congelado” em sua localização, com os elétrons
“orbitando” em torno dessa localização. Em outras palavras, podemos fixar um referencial ao
centro-de-massa de um átomo isolado e, em relação a esse referencial, o centro-de-massa estará
em repouso. Isso é chamado de referencial do centro-de-massa. Com isto, só o movimento dos
elétrons relativo ao referencial do centro-de-massa pode ser considerado para efeito de análise.
Portanto, o operador resultante, após a remoção do centro-de-massa, usando coordenadas atô-
micas e tomando-se a massa nuclear infinitamente grande e fixa na origem, é simplemente o
hamiltoniano HNrele .
709
Operadores de Schrödinger
PROPOSIÇÃO 10.13. Denote por H0 o operador hamiltoniano livre associado com o operador
HNrele , isto é,
Ne
#2 < 2
H0 = − ∇ . (10.7.4)
2µ α=1 yα
Então,
(ii) H0 é um operador ilimitado positivo; seu espectro é σ(H0 ) = σess (H0 ) = [0, ∞),
. /
(iii) H0 + 1I é um mapeamento sobrejetivo de S (R3Ne ) em S (R3Ne ).
Demonstração. (i) Primeiro note que, Dom(H0 ) = Dom(−∇2yα ). Agora, de acordo com o
Teorema 6.13, S (R3Ne ) é invariante sob a transformada de Fourier. Logo, se Ψ ∈ S (R3Ne ),
então Ψ^ ∈ S (R3Ne ). Também de acordo com o Teorema 6.13, ∇2 Ψ ∈ S (R3Ne ) =⇒
yα
^ ∈ S (R3Ne ) ⊂ L2 (R3Ne ), α = 1, . . . , Ne . Portanto, pela Proposição 10.1, item (i),
∥kα ∥2 Ψ
Ψ ∈ Dommax (−∇2yα ) =⇒ Ψ ∈ Dom(H0 ).
(ii) Isto segue imediatamente do Teorema 10.3, devido à energia cinética do movimento
relativo livre dos Ne -elétrons.
; e 2 n^
(iii) É claro da definição de S (R3Ne ) que se Ψ ∈ S (R3Ne ), então N
α=1 (1+∥k
. α ∥/ ) Ψ ∈
3Ne
S (R ) para todo n ∈ N0 . Portanto, tomando n = 1, obtém-se que H0 + 1I é um
mapeamento sobrejetivo de S (R3Ne ) em S (R3Ne ).
Sendo do tipo-coulombiano, cada potencial Vαβ , VαZ ∈ L2 (R3 ) + L∞ (R3 )ε , isto é, a compo-
nente L∞ (R3 ) de cada potencial nas somas acima pode ser escolhida arbitrariamente pequena,
no sentido da norma-L∞ . Com efeito, de acordo com o Exemplo 10.1, nos podemos decompor
cada potencial acima da seguinte forma:
1 1
Vαβ = Vαβ,1 + Vαβ,2 = 1I∥yαβ ∥#R · + 1I∥yαβ ∥>R · ,
∥yαβ ∥ ∥yαβ ∥
em que
⎧ ⎧
⎨1 se ∥yαβ ∥ # R ⎨1 se ∥yαβ ∥ > R
1I∥yαβ ∥#R = e 1I∥yαβ ∥>R = .
⎩0 se ∥yαβ ∥ > R ⎩0 se ∥yαβ ∥ # R
710
Operadores de Schrödinger
Então,Vαβ,1 ∈ L2 (R3 ),
1
∥V2 ∥∞ = sup |V2 (yαβ )| # ,
yαβ ∈R3 R
e (trivialmente)
lim sup |V2 (yαβ )| = lim sup |V2 (yαβ )| = 0 ,
yαβ →∞ y→∞ yαβ "y
quando olhamos cada vez mais longe para R < y # yαβ . Portanto, cada potencial Vαβ
desaparece quando ∥yαβ ∥ → ∞ no sentido fraco representado pela condição que Vαβ , VαZ ∈
L2 (R3 ) + L∞ (R3 )ε , com ε > 0 e arbitrariamente pequeno.
TEOREMA 10.24 (Kato, 1951). O operador hamiltoniano HNrele é essencialmente auto-adjunto em
C0∞ (R3Ne ).
Demonstração. Como,
Ne <
< Ne Ne
<
V = Vαβ (yαβ ) + VαZ (yα ) ,
α=1 α<β α=1
a estratégia é considerar cada função potencial nas somas acima separadamente. Como
observado previamente, podemos decompor Vαβ = Vαβ,1 + Vαβ,2 , com Vαβ,1 ∈ L2 (R3 ) e
Vαβ,2 ∈ L∞ (R3 )ε . Então,
1 6 3/2 7
# λ ∥Ψ∥2 + λ−1/2 ∥H0 Ψ∥2 ∥Vαβ,1 ∥2 + ε∥Ψ∥2 .
8π
Aqui, usamos o Lema 10.1 para n = 3. Lembramos que λ > 0. Definindo,
λ−1/2 λ3/2
a= ∥Vαβ,1 ∥2 e b= ∥Vαβ,1 ∥2 + ε ,
8π 8π
obtemos que
Ne <
< Ne Ne
<
# ∥Vαβ Ψ∥2 + ∥VαZ Ψ∥2
α=1 α<β α=1
6 7
# 2Ne b∥Ψ∥2 + a∥H0 Ψ∥2 , ∀ Ψ ∈ C0∞ (R3Ne ) .
711
Operadores de Schrödinger
Como a pode ser escolhido tão pequeno quanto desejarmos, o potencial total V será infi-
nitesimalmente pequeno com relação ao hamiltoniano livre, H0 . Portanto, pelo Teorema de
Kato-Rellich, H0 + V é essencialmente auto-adjunto em C0∞ (R3Ne ). Isto significa que não
existe ambiguidade sobre o operador auto-adjunto a ser considerado, uma vez que o operador
HNrele , definido em C0∞ (R3Ne ), tem pela Proposição 10.1 o seu fecho como a única extensão
auto-adjunta que satisfaz
! !
Dom(HNrele ) = Dommin (H0 ) = C0∞ (R3Ne ) = Dommax (H0 ) ,
em L2 (R3Ne ).
Nota 10.27. Observamos que a mesma prova acima funciona se adicionarmos núcleos adicionais
em locais fixos. Ou seja, também podemos tratar moléculas se assumirmos que os núcleos estão
fixos no espaço. No entanto, deve-se enfatizar que a análise da auto-adjunção do operador
hamiltoniano atômico representa uma aproximação por várias razões; por exemplo, ignoramos o
spin dos elétrons. Um tratamento mais realista dos hamiltonianos atômicos e moleculares exige
que o spin dos elétrons seja levado em consideração, a razão é que os elétrons obedecem ao
princípio de exclusão de Pauli. Também ignoramos o movimento dos núcleos, tratando-os como
fixos. E, por fim, o modelo não é relativístico, ou seja, não estamos levando em conta possíveis
efeitos relativíticos.
No caso de 2-partículas um papel chave foi desempenhado pela condição que V (x) → 0
pelo menos no sentido fraco implicado pela condição que V ∈ L2 (R3 ) + L∞ (R3 )ε , como nos
revelou o Teorema 10.7. Acontece que no caso de operadores de Schrödinger de N-partículas,
isso não é mais absolutamente verdade. O ponto central é que
N <
< N
V (x) = Vαβ (xα − xβ ) ,
α=1 α<β
712
Operadores de Schrödinger
Com respeito ao espectro discreto do hamiltoniano atômico, pode-se mostrar que ele contém
uma infinidade de muitos níveis de energia (com λNe −1 como um possível ponto de acumu-
lação), desde que Ne = Z (átomos neutros), ou 0 < Ne < Z (íons carregados positivamente).
Fisicamente, isso não é muito surpreendente, pois Ne − 1 elétrons não blindam completamente
a carga nuclear, e sobre o último elétron atua ainda a grandes distâncias um potencial atrativo
de longo alcance. Para Ne > Z este argumento não se aplica, e Lieb elegantemente mostrou
que se desprezarmos o termo de Hughes-Eckart, o número máximo Ne de elétrons que po-
dem ser ligados a um núcleo de carga positiva +Ze necessariamente satisfaz a desigualdade
Nemax # 2Z + 1 (vamos provar este resultado no Teorema 10.32).
Infelizmente, a prova do Teorema HVZ não é apenas longa, como também requer um conhe-
cimento sobre a noção de clusters.
10.7.2.1 Decomposições em Clusters Para levar em conta o fato que algumas partículas
podem permanecer próximas umas das outras, enquanto outras se afastam, introduzimos a
noção de clusters.
DEFINIÇÃO 10.4. Se indexarmos os canais com um subscrito ℓ, para algum ℓ # N, então, uma
partição Cℓ do conjunto {1, . . . , N} nos subconjuntos disjuntos C1 , C2 , . . . , Cℓ é chamada de
decomposição em clusters. Cada +ℓ Ck é chamado de cluster e a união desses clusters é todo o
conjunto, isto é,{1, . . . , N} = k=1 Ck .
713
Operadores de Schrödinger
“livres”
Figura 10.10: À medida que grupos de partículas são separadas, as interações com as demais
desaparecem. σess (H) “deveria” conter pontos correspondentes aos clusters que se afastam
“lentamente” da origem.
1 − {{1}, {2}, {3}, {4}} 2 − {{1, 2}, {3}, {4}} 3 − {{1, 3}, {2}, {4}}
4 − {{1, 4}, {2}, {3}} 5 − {{2, 3}, {1}, {4}} 6 − {{2, 4}, {1}, {3}}
7 − {{3, 4}, {1}, {2}} 8 − {{1}, {2, 3, 4}} 9 − {{2}, {1, 3, 4}}
10 − {{3}, {1, 2, 4}} 11 − {{4}, {1, 2, 3}} 12 − {{1, 2}, {3, 4}}
13 − {{1, 3}, {2, 4}} 14 − {{1, 4}, {2, 3}} 15 − {1, 2, 3, 4}
714
Operadores de Schrödinger
C1 = {1, . . . , N} ,
CN = {{1}, . . . , {N}} ,
No Exemplo 10.4 estas situações estão representadas pelo canal-15 e pelo canal-1, respectiva-
mente.
Assim, VCℓ é a soma dos potenciais entre partículas que pertencem ao mesmo cluster, enquanto
que ICℓ é soma de interações entre partículas de diferentes clusters!
σ(HCℓ ) ⊂ σ(H) .
Governado pelo hamiltoniano HCℓ os clusters {C1 , C2, . . . , Cℓ }, com ℓ " 2, ainda podem se
mover livremente um em relação ao outro; portanto σ(HCℓ ) é contínuo, estendendo-se de um
número real ΣCℓ até +∞.
715
Operadores de Schrödinger
e a energia do sistema restante. Em particular, se λNe < λNe −1 dizemos que Ne elétrons
estão ligados ao núcleo e o operador de Schrödinger atômico tem um estado fundamental
(pelo Princípio Min-Max). A energia de ionização de um átomo com Ne elétrons (isto é, a
energia necessária para remover um elétron do átomo em seu estado fundamental) é dada por
λNe − λNe −1 > 0 (não se pode remover nenhum elétron sem pagar alguma energia positiva).
Assim, se denotarmos o hamiltoniano (10.7.3) (com os termos de Hughes-Eckart omitidos) por
HNrele e o hamiltoniano com um elétron removido por HNrele −1 , do ponto de vista físico, deve-se
esperar que
. / . /
σess HNatom
e
= [λ N e −1 , ∞) , λ N e −1 = min σ(H atom
N e −1 ) <0,
sempre que se tem λNe # λNe −1 . Em outras palavras, diz-se que o intervalo [λNe −1 , ∞)
representa estados livres porque corresponde à situação em que um dos elétrons está livre, ou
seja, possui energia para se afastar dos outros. Assim, esperamos que o espectro essencial do
hamiltoniano (10.7.3) comece na energia do estado fundamental do hamiltoniano do átomo com
(Ne − 1) elétrons. Dessa forma, λNe , o ínfimo do espectro de um átomo com Ne elétrons, está
abaixo do espectro essencial e, portanto, é um auto-valor, isto é, existe um Ψ ∈ L2 (R3Ne ) tal
que HNrele Ψ = λNe Ψ. De fato, isto é provado através do seguinte
TEOREMA 10.25 (Teorema HVZ). Seja HNrele o operador auto-adjunto dado em (10.7.3). Então,
HNrele é limitado inferiormente e
. /
σess HNrele = [λNe −1 , ∞) ,
em que 6 .
rel
/7
λNe −1 = min σ HNe −1 .
. / . /
Além disso, a parte de σ HNrele no complemento de σess HNrele consiste apenas de auto-valores
de multiplicidade finita, possivelmente acumulando-se em λNe −1 .
Demonstração da Primeira Parte do Teorema 10.25: Parte Fácil. A prova do Teorema HVZ é divi-
dida
. em/ duas partes em. um /sentido natural: primeiro, devemos mostrar que [λNe −1 , ∞) ⊂
σ HNrele e, então, que σ HNrele ∩(−∞,
. rel /λNe −1 ) é discreto. Começamos pela parte mais fácil que
é mostrar que [λNe −1 , ∞) ⊂ σess HNe . Para isto, faremos uma análise mais geral seguindo a
versão de Hunziker36 e depois aplicamos esta análise no caso particular do operador HNrele .
716
Operadores de Schrödinger
que serão denotadas por (xαβ , xκ ). Isto significa que as auto-funções Ψ ∈ L2 (R3N −3 ) podem
ser assumidas da forma
Ψ(xαβ , xκ ) = Φ(xαβ )Θ(xκ ) ,
com Φ ∈ L2 (R3 ) e Θ ∈ L2 (R3N −6 ). A norma no espaço L2 (R3N −3 ) é então dada por
($ )1/2
]
∥Ψ∥ = d3 xκ d3 xαβ |Ψ(xαβ , xκ )|2 .
κ̸=α,β
Com base no Exemplo 10.5, para pares que pertencem a clusters distintos podemos definir
|s| = minα̸=β |sαβ |. Logo, quando |s| → ∞, os clusters se tornam cada vez mais separados
um do outro, e a interação entre eles desaparece como mostra o seguinte
LEMA 10.7. Defina Ψa (xαβ ) = Us (a)Ψ(xαβ ). Então, sob as hipóteses do Teorema 10.25
lim ∥ICℓ Ψa ∥ = 0 , (10.7.7)
|s|→∞
717
Operadores de Schrödinger
Demonstração. Consideramos apenas um único termo Vαβ ∈ ICℓ . Assim, para qualquer ε > 0
arbitrário, podemos decompor Vαβ = Vαβ,1 + Vαβ,2 , com Vαβ,1 ∈ L2 (R3 ) e Vαβ,2 ∈ L∞ (R3 )ε .
Então, ∥Vαβ,2 Ψa ∥ # ε∥Ψa ∥ = ε∥Ψ∥ para todo s, uma vez que Us (a) é uma isometria, isto
é, ∥Us (a)Ψ∥ = ∥Ψ∥. Portanto, basta provar (10.7.7) sob a hipótese de que Vαβ ∈ L2 (R3 ). O
operador Us (a) é unitário e comuta com H0 no domínio Dom(H0 ). Dessa forma, segue que
∥Vαβ Ψa ∥ # a∥H0 Ψa ∥ + b∥Ψa ∥
= a∥H0 Ψ∥ + b∥Ψ∥ ,
para todo Ψ ∈ Dom(H0 ). Assim, vemos que Vαβ Us (a) é um operador H0 -limitado. É
suficiente, portanto, provar (10.7.7) em um conjunto denso em Dom(H0 ), por exemplo, em
S (R3N −3 ). Podemos nos restringir aos estados Ψ da forma
Ψ(xαβ , xκ ) = Φ(xαβ )Θ(xκ ) ,
com Φ ∈ S (R3 ) e Θ ∈ S (R3N −6 ), uma vez que as combinações lineares finitas de tais
produtos são densos em S (R3N −3 ). Logo,
$ ]
2
∥Vαβ Ψa ∥ = d3 xκ d3 xαβ |Vαβ (xαβ )Ψa (xαβ , xκ )|2
κ̸=α,β
$ ]
= d3 xκ d3 xαβ |Θ(xκ )|2 |Vαβ (xαβ )Φa (xαβ )|2
κ̸=α,β
$
= ∥Θ∥ d3 xαβ |Vαβ (xαβ )Φ(xαβ + aα − aβ )|2 .
Agora é simples mostrar que σess (H) ⊂ σ(H). Primeiro, assuma que λ ∈ σ(HCℓ ). A
seguir, escolha uma sequência (Ψn )n∈N ⊂ Dom(H0 ) para HCℓ e λ, com ∥Ψn ∥ = 1, cujo os
elementos Ψn são estados para os quais os clusters de uma dada decomposição Cℓ estão cada
vez mais separados um do outro. Então, de acordo com a Proposição 5.12, λ ∈ σ(HCℓ ) se, e
somente se,
lim ∥(HCℓ − λ1I)Ψn ∥ = 0 , (10.7.8)
n→∞
718
Operadores de Schrödinger
Agora, note que, de acordo com a Eq.(10.7.8) e o Lema 10.7, o lado direito pode ser tomado
arbitrariamente pequeno, escolhendo primeiro n e depois |s| grande o suficiente. Dessa forma,
temos que
para qualquer ε > 0 arbitrariamente pequeno. Lembrando que H = H0 + VCℓ + ICℓ , que
Us (a)Ψn ∈ Dom(H0 ) e que ∥Us (a)Ψn ∥ = ∥Ψn ∥ = 1, segue, de acordo com a Proposição
5.12, que λ ∈ σ(H). Ou seja, mostramos que σ(HCℓ ) ⊂ σ(H). Mas, o espectro de HCℓ é
puramente essencial (devido ao fato dos clusters em Cℓ se moverem livremente)
em que λCk é a energia mais baixa do cluster Ck ⊂ Cℓ , com k = 1, . . . , ℓ, (ΣCℓ sendo o limiar
para que ocorra a ruptura da decomposição Cℓ ). Em outras palavras, σ(HCℓ ) = [ΣCℓ , ∞).
Assim, de fato, mostramos que [Σ, ∞) ⊂ σ(H). Por outro lado, fisicamente, estados no
espectro contínuo devem ser aqueles que podem ser divididos em pelo menos dois clusters
espacialmente separados. Assim, é de se esperar que a parte inferior do continuum seja
determinada da seguinte forma: primeiro considere a divisão de {1, . . . , N} em dois conjuntos
disjuntos C1 , C2 . Seja HCj o hamiltoniano do cluster Cj (de modo que HC1 + HC2 seja H
menos a interação entre C1 e C2 ). Em seguida, tome inf σ(HCj ) = λCj . Espera-se que
. /
Σ= min λC1 + λC2 .
C1 ∩C2 =∅
C1 ∪C2 ={1,...,N }
Em outras palavras, é suficiente tomar a energia mínima necessária para separar o sistema de
N-partículas em pelo menos dois clusters independentes, isto é,
. /
Σ = min ΣCℓ , com ΣCℓ = min σ(HCℓ ) .
#Cℓ "2
Neste ponto é importante enfatizar que, usando-se as hipóteses do Teorema HVZ, pode-se provar
indutivamente que37
min ΣCℓ " min ΣCℓ ,
#Cℓ "m+1 #Cℓ "m
Com efeito, qualquer que seja a decomposição em clusters de ℓ componentes, Cℓ = {C.1 , . . . , C/ℓ },
existe
. uma decomposição
/ em clusters de 2 componentes, C2 = {C1′ , C2′ }, tal que min σ(HC2 ) #
ℓ−1
min σ(HCℓ ) , porque tomando C2′ = Cℓ e C1′ = ∪j=1 Cj , obtemos a desigualdade necessária.
. / . /
De fato, se ℓ > 2, min σess (HC2 ) # min σ(HCℓ ) . Ou seja, este resultado estabelece que o
mínimo Σ do espectro essencial de H é sempre definido pela decomposição em clusters de 2
componentes. Consequentemente, se agora assumirmos que H = HNrele e separarmos o átomo
em (Ne − 1) elétrons mais um único elétron, então, com base na análise acima, obtemos que
. /
[λNe −1 , ∞) ⊂ σess HNrele ,
37
Veja M. Reed e B. Simon, “Methods of Modern Mathematical Physics. Analysis of Operators,” Vol.IV, Acade-
mic Press, 1978, Problema 42, ou B. Simon, “Quantum Mechanics for Hamiltonians Defined as Quadratic Forms,”
Princeton Series in Physics 68, 1971, Capítulo VII.
719
Operadores de Schrödinger
em que 6 . /7
λNe −1 = min σ HNrele −1 .
Isto finaliza a prova da primeira parte do Teorema HVZ!
Demonstração da Segunda Parte do Teorema 10.25: Parte Difícil. A parte mais difícil é. mostrar /
que HNrele tem espectro discreto apenas abaixo de λNe −1 ; isto é, vamos mostrar que σess HNrele ⊂
[λNe −1 , ∞). A principal ferramenta para provar a segunda parte do Teorema 10.25 é baseada
no conceito de partição da unidade (veja a Subseção 1.2.13). A importância das partições da
unidade no problema de muitos corpos na teoria quântica foi percebida em vários trabalhos na
literatura. Abaixo, usaremos a partição da unidade introduzida por Simon (uma partição análoga
foi usada por Ruelle na teoria quântica dos campos). Para referências completas e comentários
detalhados, consulte o Vol.IV da coleção de Reed-Simon ou o texto de H.L. Cycon, R.G. Froese,
W. Kirsch e B.Simon, “Schrödinger Operators with Application to Quantum Mechanics and Global
Geometry,” Second Edition, Springer, 2007.
Assim como fizemos na primeira parte, faremos uma análise mais geral e depois a aplicamos
no caso particular do operador HNrele . Suponha que H é um hamiltoniano qualquer associado
a um sistema de N-partículas (que serão agrupadas em clusters) atuando sobre o espaço de
Hilbert L2 (R3N ), depois de separar o centro-de-massa e fixá-lo na origem. Levando em conta a
observação feita no final da prova da primeira parte (baseda no Problema 42, Vol.IV, da coleção
de Reed-Simon), somente as decomposições em clusters com #Cℓ = 2 serão necessárias. Neste
(k)
caso, definimos C2 , em que k = 1, 2, . . . , 2N −1 − 1 rotula todas as formas distintas de de-
(k) (k)
composição de N-partículas em dois conjuntos não-vazios C1 e C2 (no caso particular com
N = 4, na Tabela 10.2, estas decomposições em dois conjuntos não-vazios estão representadas
pelo canal-8 até o canal-14).
3 4
(k) (k)
|x|k = min |xα − xβ | | xα ∈ C1 , xβ ∈ C2 .
Demonstração. Começamos observando que para todo par (α, β), C(N, 2) nos dá o número
de combinações de tamanho 2 de N-partículas, isto é,
N(N − 1)
C(N, 2) = .
2
Assim, para um dado x
, -
N 1/2 (N − 1)1/2
|x|0 # √ max |xα − xβ | .
2
720
Operadores de Schrödinger
|xα − xβ | # (N − 1)|xj+1 − xj | ,
(k) (k)
em que |xj+1 − xj | é a distância entre dois planos adjacentes. Se escolhermos C1 e C2
como sendo as partículas sobre cada lado dos planos passando
3 por xα e xβ , então, |x|k 4
=
(k) (k)
(N − 1)|xj+1 − xj |. Tomando max |xα − xβ | = min |xα − xβ | | xα ∈ C1 , xβ ∈ C2 ,
√
segue que |x|k " dN |x|0 , em que dN = 2N −1/2 (N − 1)−3/2 .
DEFINIÇÃO 10.5 (Ruelle-Simon). Uma partição da unidade Ruelle-Simon é uma partição da
unidade composta por uma família {Jk } de funções suaves indexada por todas as decomposições
em dois clusters, isto é, #Cℓ = 2, com as seguintes propriedades:
(i) Jk é uma função homogênea de grau zero fora da esfera unitária, ou seja, Jk (sx) = Jk (x)
para todo s ∈ (0, ∞) e |x|0 = 1;
√
(ii) para |x|k " dN |x|0 , em que dN = 2N −1/2 (N − 1)−3/2 (a Figura 10.11 pode ajudar a
visualizar esta situação para x ∈ R),
3 4 3 4
supp Jk ∩ x ∈ R3N | |x|0 " 1 ⊆ x ∈ R3N | |x|k " dN |x|0 ;
;m
(iii) k=1 Jk2 (x) = 1.
Jk (x)
] [
−2 −1 −d 0 d 1 2 x
B CD E
Ωk
!
" A! função Jk , com supp Jk ⊂ Ωk "= (−2, 2) e a condição supp Jk ∩ x ∈ R |
Figura 10.11:
|x|0 " 1 ⊆ x ∈ R | |x|k " d|x|0 , 0 < d < 1 .
Nota 10.28. Exige-se a homogeneidade (i) apenas fora da esfera unitária para evitar uma
singularidade na origem, onde todas as partículas estão próximas. A condição (ii) é assumida
(k)
para garantir que as partículas em diferentes clusters de C2 estão distantes umas das outras.
(k) (k)
Em outras palavras, os clusters C1 e C2 desempenham o papel dos subconjuntos fechados
disjuntos de R3N no Lema de Urysohn (Lema 1.5). Observe que no supp Jk , duas partículas
pertencentes ao mesmo
; cluster não precisam estar próximas uma da outra. Além disso, em (iii)
assumimos ; que m 2
k=1 k (x) = 1 que é diferente da condição que aparece na Definição 1.50,
J
m
que requer k=1 Jk (x) = 1. No entanto, para nós a construção acima será mais conveniente.
PROPOSIÇÃO 10.14. Existe uma partição da unidade Ruelle-Simon.
721
Operadores de Schrödinger
Demonstração. Para todo x ∈ K existe algum εk > 0 arbitrário e algum k tais que B(x; εk ) ⊂
B(x; εk ) ⊂ Ωk . Pela compacidade de K, um número finito de muitas dessas bolas B(x; εk )
cobrem K. Pelo Teorema 6.33 existem funções hk ∈ C0∞ (Ωk ) tais que 0 # hk # 1, hk (x) ≡ 1
para x ∈ B(x; εk ) e hk (x) ≡ 0 para x ∈ R3N \ Ωk (a Figura 10.12 pode ajudar a visualizar
esta situação para x ∈ R).
hk (x)
[ ]
−2εk −εk 0 εk 2εk x
B CD E
B(x;εk )
B CD E
Ωk
gk = (1 − h1 )(1 − h2 ) · · · (1 − hk ) .
8 9
Para k > 1, gk−1 − gk = (1 − h1 )(1 − h2 ) · · · (1 − hk−1 ) 1 − (1 − hk ) = jk ; portanto
m
< m
<
jk = j1 + (gk−1 − gk ) = j1 + g1 − gm = 1 − gm .
k=1 k=2
+ +
Visto que K ⊂ k B(x; εk ) ⊂ k B(x; εk ) e jk (x) ≡ 1 para x ∈ B(x; εk ), gm ≡ 0 para
x ∈ K, pois para x ∈ B(x; εk ), para algum k = 1, . . . , m, temos que;
algum hk (x) = 1, o
m
que faz com que o produto na definição de gk desapareça. Portanto, k=1 jk = 1 em K,
completando a prova.
722
Operadores de Schrödinger
Demonstração da Proposição 10.14. O primeiro passo para se obter a família {Jk } deve ser dado
em direção à construção de uma cobertura aberta indexada finita do espaço R3N em relação a
qual a partição da unidade Ruelle-Simon estará subordinada. Por causa da homegeneidade, no
presente caso, basta construir a partição da unidade na esfera unitária, pois podemos estendê-la
para exterior e para interior de uma
! maneira (quase) arbitrária
" variando o parâmetro s ∈ (0, ∞).
3N −1 3N
Portanto, basta tomar S ≡ x ∈ R | |x|0 = 1 e os conjuntos {Ω}#C2 definidos por
3 4
Ωk = x ∈ R3N | |x|0 = 1, |x|k " dN ,
que pelo resultado do Lema 10.8 cobre S 3N −1 (veja uma ilustração idealizada desta situação na
figura abaixo no caso de S 1 ).
x1 x1
Ω1 Ω2
x2 x2
Uma vez que temos uma cobertura (localmente) finita {Ω}#C2 de toda a esfera unitária
S 3N −1 , pelo Lema 10.9, o procedimento padrão é construir uma partição da unidade {Jk },
com supp Jk ⊂ Ωk (Figura 10.11), isto é, uma partição da unidade subordinada a esta cobertura.
Assim, para cada k, seja jk ∈ C0∞ (Ωk ) uma função que é igual a 1 em um conjunto Ω′k
um pouco menor (de modo que esses conjuntos menores ainda cubram S 3N −1 ). Portanto,
supp jk ⊂ Ω′k ⊂ Ωk . Então,
m
<
jk (x)
Jk (x) = H;m 2 =⇒ Jk2 (x) = 1 ,
k=1 jk (x) k=1
723
Operadores de Schrödinger
Por causa do Lema 10.10, podemos usar {Jk } para decompor H em “partes localizadas” nos
suportes das funções Jk , além de um termo de “erro de localização:”
<m , -
#2 2
H= Jk (x)HJk (x) + |∇Jk (x)| .
k=1
2µ
O gradiente, associado ao erro de localização, é homogêneo de graus −1, pois Jk (sx) = Jk (x)
para s ∈ (0, ∞) e |x|0 " 1, o que implica ∇Jk (sx) = s−1 ∇Jk (x). Assim, ele tende a zero
no infinito. Portanto, o segundo termo à direita na equação acima é compacto em relação a H.
Por sua vez, no primeiro termo H = HC(k) + IC(k) , ou seja, podemos escrever
2 2
m
< . /
H= Jk (x) HC(k) + IC(k) Jk (x) .
2 2
k=1
Note que, como cada função Jk tem suporte compacto, segue que cada termo na soma
m
<
Jk (x)IC(k) Jk (x) ,
2
k=1
tem suporte compacto (apesar de IC(k) não ter suporte compacto). Logo, cada termo Jk (x)IC(k) Jk (x)
2 2
é um potencial da classe Kato-Rellich em relação à HC(k) que desaparece no infinito e, portanto,
2
é compacto em relação à HC(k) . Consequentemente, pelo Teorema de Weyl (Teorema 5.37), segue
2
que ( m )
<
σ(H) = σ Jk (x)HC(k) Jk (x) .
2
k=1
Como H é limitado inferiormente, pelo Corolário 4.8, H " (inf σ(H))1I e para todo Ψ ∈
Dom(H) temos que
⟨Ψ, Jk HC(k) Jk Ψ⟩ = ⟨Jk Ψ, HC(k) Jk Ψ⟩ " ΣC(k) ∥Jk Ψ∥2 " ΣC(k) ∥Ψ∥2 .
2 2 2 2
;m
Note que ΣC(k) # 0. Assim, Jk HC(k) Jk " ΣC(k) e, portanto, k=1 Jk (x)HC(k) Jk (x) " Σ. Isto
2 2 2 2
implica que ( m )
<
σ Jk (x)HC(k) Jk (x) ⊂ [Σ, ∞) ,
2
k=1
e, conseqüentemente, σess (H) ⊂ [Σ, ∞). Se agora assumirmos que H = HNrele e separarmos o
átomo em (Ne − 1) elétrons mais um único elétron, então, com base na análise acima, obtemos
que
. /
[λNe −1 , ∞) ⊃ σess HNrele .
724
Operadores de Schrödinger
Sob essas premissas, lembramos que os auto-valores do operador HNrele são caracterizados pelo
Teorema 5.13. Como HNrele é auto-adjunto, o Teorema 5.13 estabelece que se λ1 , λ2 , λ3 , . . . são
auto-valores de HNrele abaixo do espectro essencial, cada auto-valor λj possui multiplicidade
finita, possivelmente acumulando-se em λNe −1 . Isto conclui a prova da segunda parte do
Teorema HVZ, e do próprio teorema.
Para finalizar nossa discussão sobre o limite inferior do espectro essencial do operador de
Schrödinger atômico, vamos mencionar um resultado de A. Persson, publicado no artigo “Bounds
for the Discrete Part of the Spectrum of a Semi-bounded Schrödinger Operator,” Math. Scand. 8
(1960) 153. Persson descobriu uma interessante descrição geométrica para a parte inferior do
espectro essencial de um operador de Schrödinger limitado inferiormente.
TEOREMA 10.26 (Teorema de Persson). Sejam V um potencial real valorado na classe de
Kato-Rellich e H = H0 + V o correspondente operador de Schrödinger auto-adjunto e limitado
inferiormente, com domínio H2 (Rn ). Então, a parte inferior do espectro essencial é dada por
# = >%
−2 ∞ n
inf σess (H) = sup inf ⟨Ψ, HΨ⟩∥Ψ∥ | Ψ ∈ C0 (R \ K) ,
K⊂Rn Ψ̸=0
A prova do Teorema de Persson pode ser encontrada no livro de P.D. Hislop e I.M. Sigal,
“Introduction to Spectral Theory with Applications to Schrödinger Operators,” Springer Verlag,
1996, Teorema 14.11, pg.145.
Existe um argumento fisicamente aceitável e atraente que nos garante que um potencial indo
para zero no ∞ não pode ter estados ligados (ou seja, auto-funções de quadrado integráveis)
em energias positivas. A questão é, então, encontrar as condições que excluem a ocorrência
desses estados ligados de energia positiva. Nossa primeira proposição contém um critério para
essa inexistência.
PROPOSIÇÃO 10.15. Seja V uma função real valorada Rn que é relativamente H0 -limitada com
limite relativo < 1. Suponha que exista um número β ∈ (0, 2) tal que
V (αx) = α−β V (x) , (10.7.9)
para α ∈ (0, 1) e x ∈ Rn , com x ̸= 0. Então, o operador auto-adjunto H0 + V não tem
auto-valor contido em [0, +∞).
725
Operadores de Schrödinger
= ⟨H0 Ψ, Ψα ⟩
= −⟨V Ψ, Ψα ⟩ + λ⟨Ψ, Ψα ⟩
= −⟨Ψ, V Ψα ⟩ + λ⟨Ψ, Ψα ⟩ ,
Como ⟨Ψ, H0Ψ⟩ > 0 e β(2 − β)−1 < 0, segue de (10.7.10) que λ < 0.
De acordo com a Proposição 9.5, U (s) é fortemente contínuo, e pela Proposição 9.6 o gerador
infinitesimal do grupo das transformações de escala é o operador
3Ne 1 1! "
Λs = −i 1I + XP = X, P ,
2 # 2#
! "
em que X, P = XP + P X é o anti-comutador dos operadores X e P . Agora, vamos
investigar a ação de U (s) em HNrele :
em que V é o potencial total que aparece no hamiltoniano (10.7.3) (lembramos que os ter-
mos de Hughes-Eckart estão sendo desprezados). Como todos os potenciais na Eq.(10.7.3) são
coulombianos, segue que
HNrele (s) = e−2Ne s H0 + e−Ne s V .
726
Operadores de Schrödinger
. /
Como Dom HNrele = Dom(H0 ) e U (s)Dom(H0 ) = Dom(H0 ), para todo s ∈ R,
suponha que HNrele Ψ = λΨ, então,
@ 8 9 A @ A @ A
rel rel rel
Ψ, U (s), HNe Ψ = Ψ, U (s)HNe Ψ − Ψ, HNe U (s)Ψ
[ \ [ \
= U (−s)Ψ, λΨ − λΨ, U (s)Ψ
[ \ [ \
= λ U (−s)Ψ, Ψ − λ U (−s)Ψ, Ψ
=0.
Portanto,
O P
1@ 8 rel
9 A HNrele − HNrele (s)
0 = lim Ψ, U (s), HNe Ψ = lim U (−s)Ψ, Ψ
s→0 s s→0 s
Isto prova o seguinte teorema sobre a inexistência de auto-valores imersos no espectro essencial:
TEOREMA 10.27 (Teorema Virial). Se λ é um auto-valor do operador de Schrödinger atômico,
HNrele e Ψ é a correspondente auto-função normalizada, ou seja, HNrele Ψ = λΨ, ∥Ψ∥ = 1, então,
1
λ = − ⟨Ψ, H0 Ψ⟩ = ⟨Ψ, V Ψ⟩ .
2
Em particular, como ⟨Ψ, H0 Ψ⟩ > 0, todos os auto-valores devem ser negativos.
O método virial é um caso particular de uma técnica mais geral que você pode encontrar
na literatura chamada Estimativa de Mourre. Mais detalhes sobre o Teorema Virial podem ser
obtidos nos Exercícios 10.18 e 10.19.
727
Operadores de Schrödinger
10.7.4.1 O Átomo do Hidrogênio “O átomo do hidrogênio é tão simples que uma análise matemática completa
pode ser realizada. Essa análise foi um divisor de águas da física atômica.”
Walter Thirring
Ignorando possíveis correções relativísticas e efeitos devido ao spin das partículas, o operador
de Schrödinger para o átomo do hidrogênio no espaço L2 (R3 ) tem a seguinte forma (levando-se
em conta a separação do centro-de-massa do sistema):
#2 #2 2 Ze2
H1atom = − ∇2xcm − ∇ − ,
2(me + mp ) 2µ ∥x∥
em que µ = me mp /(me + mp ) é massa reduzida e x = xe − xp é a posição relativa entre o
elétron e o núcleo. Observe que a equação acima mostra que o centro-de-massa se comporta
como se fosse uma partícula livre de massa M = me + mp .
Como observado anteriormente, dado que a massa do próton é aproximadamente 1800 vezes
maior que a massa do elétron, a localização do centro-de-massa do sistema elétron-próton
38
Walther Heinrich Wilhelm Ritz (22 de fevereiro de 1878 – 7 de julho de 1909) foi um físico teórico suíço. Ele é
mais famoso por seu trabalho com Johannes Rydberg sobre o Princípio da Combinação Rydberg-Ritz. Ritz também
é conhecido pelo método variacional que recebeu o seu nome, o Método de Ritz. O método variacional de Ritz é
também conhecido na literatura como Método de Rayleigh-Ritz, apesar de uma certa polêmica, como relata Shlomo
Sternberg no Capítulo 14 do seu livro “A Mathematical Companion to Quantum Mechanics,” Dover Publications,
2019.
728
Operadores de Schrödinger
quase que coincide com a localização do próton. Além disso, a massa reduzida do sistema é
muito próxima da massa do elétron, isto é, µ ≈ 0, 995me . Assim, numa primeira aproximação,
“removemos” o centro-de-massa, supondo que o próton está “congelado” em sua localização,
com o elétron “orbitando” em torno dessa localização. Com isto, só o movimento relativo pode
ser considerado para efeito de análise. Portanto, o hamiltoniano do sistema é simplemente
#2 2 Ze2
H1atom = − ∇ − .
2µ ∥x∥
Ψ(r) = e−cr .
729
Operadores de Schrödinger
Pode-se provar que este é também o auto-valor mais baixo do espectro de H1atom e, portanto,
a energia do estado fundamental do átomo do hidrogênio. Deve-se enfatizar que isso se deve
à nossa escolha da função exponencial como função trial. No Exercício 10.20 convidamos o
leitor a provar que se tivéssemos escolhido uma gaussiana como função trial, estaríamos fora
do valor mínimo cerca de 15%.
µe4
En = − , n∈N, (10.7.13)
2#2 n2
n−1
< n−1
< n−1
<
gn = (2ℓ + 1) = 2 ℓ+ 1 = n(n − 1) + n = n2 . (10.7.14)
ℓ=1 ℓ=1 ℓ=1
Consequentemente, de acordo com o Teorema 10.7, a Proposição 10.6 e o Exemplo 10.2, podemos
concluir que os auto-valores negativos do espectro do átomo do hidrogênio são auto-valores com
multiplicidade finita, com H1atom podendo ter apenas auto-valores negativos isolados. Em outras
palavras, o espectro σ(H) do operador de Schrödinger do átomo do hidrogênio está contido
em [−2−1 µe4 #−2 , ∞) e divide-se da seguinte forma: σ(H1atom ) = {En }n=1,2,... ∪ [0, ∞),
4
com o espectro discreto, σdisc (H1atom ) = {En }n=1,2,... , em que En = − 2#µe2 n2 , sendo que
E1 < E2 < E3 < · · · , En → 0 quando n → ∞ e σess (H1atom ) = [0, ∞) é o espectro
essencial. Enquanto o espectro discreto corresponde aos níveis de energia do estados ligados
próton-elétron, o espectro essencial desempenha um papel importante na teoria dos estados
espalhados do sistema. Além disso, de acordo com a Proposição 10.13, o operador de Schrödinger
do átomo do hidrogênio é essencialmente auto-adjunto em C0∞ (R3 ). Note que, pela Proposição
10.7, a Eq.(10.7.13) nos revela que no intervalo [−2−1 µe4 #−2 , 0) o átomo do hidrogênio tem um
número infinito de auto-valores isolados, de multiplicidade finita, que se acumulam em zero.
Por este motivo, o espectro discreto não é um conjunto fechado, já que neste caso o espectro
discreto é uma sequência de auto-valores tendendo a 0, mas 0 não pertence ao espectro discreto.
Nota 10.29. É interessante notar que o resultado da teoria espectral do átomo do hidrogênio
é um caso especial do Teorema HVZ. Qualquer sistema de dois corpos que se aproxime do
limiar do continuum será separado exclusivamente nas duas partículas (neste caso o próton e o
elétron). O limiar contínuo de H1atom (o menor valor do espectro essencial) é, portanto, a soma
da energia do estado fundamental de duas partículas livres e independentes, que é zero.
Nota 10.30. Quando o spin é levado em conta, o experimento Stern-Gerlach estabelece que a
40
Por exemplo, este cálculo, com todos os detalhes, pode ser encontrado no livro de F. Williams, “Topics in
Quantum Mechanics,” PMP 27, Birkhäuser, 2003, no Capítulo 5.
730
Operadores de Schrödinger
uma vez que, além da degenerescência (10.7.14), cada nível é duplamente degenerado em relação
ao grau de liberdade do spin. Portanto, para acomodar os dois graus de liberdade associado
ao spin do elétron, os elementos do espaço de estado do elétron são, agora, expressos por um
spinor do tipo:
( )
Ψ1/2 (x)
Ψnℓm,±1/2 (x) = ,
Ψ−1/2 (x)
com mesma energia −13, 6 eV . Da mesma forma, o primeiro estado excitado é oito vezes
degenerado (2(2)2 = 8) porque os oito estados Ψ200,±1/2 , Ψ211,±1/2 , Ψ210,±1/2 e Ψ21−1,±1/2
correspondem à mesma energia −13, 6/4 eV = −3, 4 eV .
Nota 10.31 (Fato histórico). Foi Weyl quem primeiro ajudou Schrödinger no cálculo dos auto-
valores do átomo do hidrogênio, En . Posteriormente, a concordância desse cálculo com as
linhas espectrais experimentais do átomo do hidrogênio foi muito importante para validar a
proposta de Schrödinger para seu operador de energia quântica.
10.7.4.2 Átomos do Tipo Hélio “Embora a equação de Schrödinger para átomos do tipo-hélio não
seja exatamente solúvel, é possível fazer afirmações sobre ela com precisão arbitrariamente boa. Por esse motivo, tem
sido um princípio básico para avaliar a qualidade da mecânica quântica.”
Walter Thirring
731
Operadores de Schrödinger
−e
z
x21
x1 −e
x2
+Ze y
Sabemos que σess (Hj ) = [0, ∞); por outro lado, de acordo com o Teorema HVZ
n , 2 - ) n )
atom # 2 Ze2 µZ 2 e4
σess (H2 ) = inf σ − ∇x − ,∞ = − ,∞ ,
2µ ∥x∥ 2#2
732
Operadores de Schrödinger
Observe que o espectro essencial de H2atom não é influenciado pelo potencial V21 , já que um
elétron permanece no estado fundamental enquanto o outro “vai para o infinito.” Em outras
8 2 4 /
palavras, diz-se que o intervalo − µZ2#2e , ∞ representa estados livres porque corresponde à
situação em que um dos elétrons está livre, ou seja, possui energia para se afastar dos outros.
De fato, isto pode ser justificado a partir de toda argumentação relacionada ao Teorema HVZ:
heuristicamente, os estados no espectro essencial não devem ser estados ligados e, portanto,
devem envolver clusters de partículas distantes umas das outras. Assim, tomando-se como base
o Exemplo 10.4, podemos tomar um espaço de configuração apropriado que especifica o movi-
mento relativo dos 2 elétrons nos átomos do tipo hélio, e, neste caso, existem 5 possibilidades
representadas pelos seguintes canais:
* Canal-2 – C2 = {{+Ze, e1 }, {e2 }}: Neste canal o elétron 1 permanece ligado ao núcleo,
enquanto o elétron 2 se desliga completamente do sistema
2
#2 < 2
H2atom =− ∇ + V C 2 + IC 2 ,
2µ j=1 xj
* Canal-3 – C2 = {{+Ze, e2}, {e1 }}: Neste canal o elétron 2 permanece ligado ao núcleo,
enquanto o elétron 1 se desliga completamente do sistema
2
#2 < 2
H2atom =− ∇ + V C 2 + IC 2 ,
2µ j=1 xj
733
Operadores de Schrödinger
* Canal-5 – C3 = {{+Ze}, {e1 }, {e2 }}: Neste canal todas as partículas estão separadas, o
que é obviamente uma configuração que não gera um átomo. Nesse caso,
2
#2 < 2
H2atom =− ∇ + V C 3 + IC 3 ,
2µ j=1 xj
O Teorema HVZ nos diz que o continuum começa em Σ = min#Cℓ "2 ΣCℓ , em que ΣCℓ =
{λC1 , . . . , λCℓ }, com λCk sendo a energia mais baixa do cluster Ck ⊂ Cℓ , para k = 1, . . . , ℓ.
Veja que nos canais acima, por exemplo, no canal-2 o elétron 1 permanece ligado ao núcleo,
+Ze, enquanto o elétron 2 vai para o infinito. No canal-3 nós temos a mesma situação, com
os elétrons 1 e 2 trocados. Para esses canais
, 2 - , 2 -
# 2 Ze2 # 2
ΣC2 = inf σ − ∇x1 − + inf σ − ∇x2 ,
2µ ∥x1 ∥ 2µ
ou , - , 2 -
#2 Ze2 # 2
ΣC2 = inf σ − ∇2x2 − + inf σ − ∇x1 .
2µ ∥x2 ∥ 2µ
Já para o canal-1
, 2 -
# 2 #2 2 Ze2 Ze2 e2
ΣC1 = inf σ − ∇x1 − ∇ − − + ,
2µ 2µ x2 ∥x1 ∥ ∥x1 ∥ ∥x1 − x2 ∥
Para o canal-4
, 2 -
# 2 #2 2 e2
ΣC2 = inf σ − ∇x1 − ∇ + ,
2µ 2µ x2 ∥x1 − x2 ∥
e para o canal-5 , - , 2 -
#2 # 2
ΣC3 = inf σ − ∇2x1 + inf σ − ∇x2 .
2µ 2µ
Observe que levamos em consideração o fato de termos assumido que o núcleo está fixo na
2 4
origem. Portanto, da análise acima, os canais-2 e 3 terão ΣC2 começando com a energia − µZ2#2e ,
#2 2
a energia do estado fundamental do operador hidrogenóide, − 2µ ∇2x − Ze
∥x∥
. Considerando as
outras possibilidades, percebe-se, então, que é esperado em termos físicos que σess (H2atom ) =
8 µZ 2 e4 /
− 2#2 , ∞ , como estabelecido pelo Teorema HVZ (Teorema 10.25).
Por sua vez, o espectro de H2atom tem uma parte discreta dada pela soma λ1 + λ2 das
energias dos elétrons. Assim, podemos concluir que
# # %∞ %
atom µe4
σ(H2 ) = λ1 + λ2 | λ1 , λ2 ∈ − 2 2 ∪ [0, ∞)
2# n n=1
# , -%∞ n )
µZ 2 e4 1 µZ 2 e4
= − 1+ 2 ∪ − ,∞ .
2#2 n n=1 2#2
734
Operadores de Schrödinger
Um dos resultados mais intrigantes relacionado ao átomo do hélio diz respeito ao fato
de σdisc (H2atom ) ter infinitos auto-valores abaixo do infimum do seu espectro essencial, mais
8 2 4 2 4/
especificamente no intervalo − µZ#2e , − µZ2#2e (ou seja, um sistema de três corpos com duas
forças coulombianas atrativas de magnitude 2 e uma força coulombiana repulsiva de magnitude
1 tem infinitos estados ligados). Que isso pode ser mostrado é uma prova do poder dos métodos
qualitativos da análise funcional. Os primeiros resultados sobre este problema foram obtidos por
T. Kato,41 que mostrou que se os termos de Hughes-Eckart fossem ignorados (a chamada massa
nuclear infinita), então existia infinitos estados ligados. Quando os termos de Hughes-Eckart
foram contabilizados e as massas físicas usadas, Kato mostrou que havia pelo menos 25.585
estados ligados. A única razão pela qual Kato não obteve um número infinito de estados ligados
foi que ele foi incapaz de mostrar que o continuum estava localizado onde é determinado pelo
Teorema de HVZ. Considerando o Teorema HVZ, o argumento original de Kato implica, de fato,
que o hamiltoniano do átomo do hélio (com as massas físicas) tem uma infinidade de estados
ligados.
Vamos agora analisar os níveis de energia do hamiltoniano H0 dos três estados mais baixos.
Neste caso idealizado, no qual os dois elétrons ignoram-se um ao outro, a energia mais baixa
é E1,1 = −27, 2Z 2 eV . No primeiro estado excitado, um elétron ocupa o nível mais baixo
n = 1 e o outro elétron ocupa o nível n = 2 ou vice-versa. A energia pode assim ser deduzidas
de (10.7.16): E1,2 = −17, 0Z 2 eV . Finalmente, a energia do segundo estado excitado, que
corresponde aos dois elétrons ocupando o segundo nível n = 2, pode também ser inferida
a partir de (10.7.16): E2,2 = −6, 8Z 2 eV . Obviamente, não se espera que esses resultados
sejam precisos porque, ao se desprezar a interação coulombiana entre os elétrons, fizemos
uma aproximação grosseiramente imprecisa. Por exemplo, o valor numérico da energia no
teor
estado fundamental obtido de (10.7.16) para o átomo do hélio E1,1 = −108, 8 eV , enquanto o
exp
valor experimental é E1,1 = −78, 975 eV ; isto é, o valor teérico é 378% menor que o valor
experimental.
σ(H0) =
−1 − 12 R
41
Veja a prova da Proposição de Kato no livro-texto de M. Reed e B. Simon, “Methods of Modern Mathematical
Physics. Analysis of Operators,” Vol.IV, Academic Press, 1978, pg.89.
735
Operadores de Schrödinger
Quando se “liga” a interação elétron-elétron, V (x21 ), espera-se que os estados ligados pre-
sentes no continuum de H0 se dissolvam. Isto realmente acontece, mas, no caso do átomo do
hélio observa-se um efeito de “memória” desses auto-valores (veja mais detalhes no texto de M.
Reed e B. Simon, “Methods of Modern Mathematical Physics. Analysis of Operators,” Vol.IV, Aca-
demic Press, 1978). Uma boa discussão (resumida) das implicações da existência de auto-valores
acima do limiar de ionização pode também ser encontrada no texto de S. Gasirorowicz, “Física
Quântica,” Guanabara Dois, 1979, na pg.280.
Para finalizar nossa discussão sobre átomos de dois elétrons, vamos estimar, usando o método
variacional de Ritz, o valor mais baixo do espectro de H2atom .
TEOREMA 10.28. Para o valor mais baixo λ do espectro de H2atom nós temos que
3µe4
λ#− (2Z − 8)2 .
#2
Demonstração. Por analogia com o caso do átomo do hidrogênio, podemos escolher uma função
trial como sendo a produto de duas funções de onda hidrogenóides, isto é, assumimos que
Ψ(x, y) = e−c(∥x∥+∥y∥) , com 0 < c < ∞ .
Com isto, computamos
⟨Ψ, H2atom Ψ⟩
, Ψ ̸= 0 e γ = inf f (c)
⟨Ψ, Ψ⟩ 0<c<∞
π 2 Ze2
= .
c5
736
Operadores de Schrödinger
Aqui, desta vez, usamos as duas últimas integrais da Eq.(10.7.12). A seguir, considere a integral
$ $
e2 2 2 e−2c(∥x∥+∥y∥)
dxdy |Ψ(x, y)| = e dxdy
R6 ∥x − y∥ R6 ∥x − y∥
$ ,$ -
2 −2c∥x∥ e−2c∥y∥
=e dx e dy .
R3 R3 ∥x − y∥
Vamos isolar o único termo que depende dos ângulos entre x e y, isto é,
1 1
= 2 2
,
∥x − y∥ (r1 + r2 − 2r1 r2 cos θ)1/2
Aqui, usamos a Tabela de Integrais de Gradshtein-Ryzhik (fórmulas 3.351, 1.8 e 2.11 , pg.340) e o
fato que
8 9 8 9
γ(3, 2cr1 ) = −e−2cr1 2 + 4cr1 + 4c2 r22 e Γ(2, 2cr1) = e−2cr1 1 + 2cr1 ,
737
Operadores de Schrödinger
também usando a Tabela de Integrais de Gradshtein-Ryzhik, pg.901. Seguindo, nós temos que
computar as integrais
$ ∞ , -
2 r1 3r12 r13 −4cr1 8π 2
−8π dr1 + + e = − .
0 c3 2c2 c c5
Consequentemente,
$
e2 8π 2 e2
dxdy |Ψ(x, y)|2 = − 5 .
R6 ∥x − y∥ c
#2 π 2
= .
12µc4
Resumindo, obtemos
⟨Ψ, H2atom Ψ⟩ # 2 c2
= − e2 (2Z − 8)c .
⟨Ψ, Ψ⟩ 12µ
O lado direito da igualdade acima atinge seu mínimo quando
6µe2
c= (2Z − 8) .
#2
Deste modo, segue que
⟨Ψ, H2atom Ψ⟩ 3µe4
= − 2 (2Z − 8)2 ,
⟨Ψ, Ψ⟩ #
o que encerra a prova do teorema.
Para o átomo do hélio, pode-se provar que o valor mais baixo de λ do espectro de H2atom é
um auto-valor e, portanto, o Teorema 10.28 nos dá uma estimativa do menor auto-valor. Como
738
Operadores de Schrödinger
HNatom
e
atom
= Hcm + HNrele ,
atom
em que Hcm é dado pela Eq.(10.7.2) e HNrele é dado pela Eq.(10.7.3). Isto implica que existem
três termos para a energia cinética: a energia cinética do centro-de-massa, com a massa
total; a energia cinética dos elétrons, com massas reduzidas dependendo da massa nuclear; e
finalmente uma correção na ordem de 1/M, conhecida como termo de Hughes-Eckart. Como
é obviamente limitado em relação ao segundo termo, nada impede que este termo seja tratado
como uma perturbação analítica. Além disso, como o termo Hughes-Eckart não é compacto
em relação a H0 , uma pergunta razoável é se ele influencia o espectro essencial. Vimos que,
sem esse termo, o espectro essencial de HNe começa no ponto mais baixo do espectro de
HNe −1 . Isso é fisicamente razoável e é interpretado como o limiar da ionização. Expressos de
maneira diferente, provamos que, sem o termo de ordem de 1/M, o inf σess (H0 + VNe ) =
inf σ(H0 + VNe −1 ), em que VNe −1 é o potencial desprezando-se o último elétron. Mas esse
estado de coisas não deve ser afetado pela presença dos termos de Hughes-Eckart. De fato,
a compacidade dos termos individuais não é destruída por uma perturbação relativamente
limitada. Nosso objetivo agora é mostrar porque os termos de Hughes-Eckart não afetam o
Teorema HVZ. Reproduziremos nesta seção a prova de B. Simon, publicada no artigo “On the
Infinitude or Finiteness of the Number of Bound States of an N-Body Quantum System, I.,” Helv.
Phys. Acta 43 (1970) 607.
42
Considerando a função trial Ψ(x, y) = π −1 a−3 c3 e−c(∥x∥+∥y∥)/a, em que a = #2 /(me e2 ). Aqui, considera-
se me em vez de µ pois o núcleo é tomado como tendo massa infinita. Veja os detalhes no texto de N. Zettili
“Quantum Mechanics Concepts and Applications,” Second Edition, John Wiley and Sons, Ltd., Publication, 2009,
pg.559.
739
Operadores de Schrödinger
ηj = rj − rn , coordenadas relativas a rn .
De
n−1
< n−1
< n−1
<
mj ηj = mj rj − mj rn = MRcm − Mrn ,
j=1 j=1 j=1
obtemos que
n−1
< n−1
<
−1
rn = Rcm − M mj ηj e rj = Rcm + ηj − M −1 mj ηj .
j=1 j=1
Vamos definir
n−1
<
ξ= M −1 mj ηj
j=1
n−1
<
= 2
M Ṙcm + mj η̇j2 − M ξ˙2 .
j=1
∂ ξ˙
Pcm = M Ṙcm e Pj = mj η̇j − M ξ˙ ˙ .
= mj (η̇j − ξ)
∂ η̇j
n−1
< n−1
< n−1
<
. /
ξ˙ = M −1
mj η̇j = M −1
mj m−1 ˙
j Pj + ξ =⇒ ξ˙ = m−1
n Pj ,
j=1 j=1 j=1
740
Operadores de Schrödinger
O Teorema HVZ nos diz explicitamente que obtemos o limite do contínuo dividindo {1, 2, 3}
em aglomerados e considerando a energia do estado fundamental dos hamiltonianos com os
potenciais dos interclusters descartados. Da análise feita anteriormente, vimos que para o
4
átomo do hélio os canais-2 e 3 terão ΣC2 começando com a energia − 2µe #2
. Portanto, o
hamiltoniano (10.8.1) tem espectro contínuo começando na energia do estado fundamental do
operador hidrogenóide,
Ze2
HHe+ = (2µ)−1p2 − .
∥x∥
Assim, o continuum para o HHe começa na parte inferior do espectro de
2
N He+ = (2µ)−1(p21 + p22 ) + M −1 p1 · p2 − Ze
H (contando o termo de Hughes-Eckart) .
∥x1 ∥
Dessa forma, precisamos mostrar que inf σ(H N He+ ) = inf σ(HHe+ ). Na superfície, uma vez que
descartamos os potenciais dos interclusters, mas não dos interclusters dos termos de Hughes-
Eckart, não está claro que essa igualdade deva ser mantida. Seja P o momento do centro-
de-massa, me a massa do elétron, K o momento do núcleo e kj o j-ésimo elétron. Sejam
x0 , x1 , x2 as posições do núcleo e dos dois elétrons, respectivamente. Então,
N He+ + (2M + 4µ)P 2 = H
H ^ He+ ,
B CD E
Hcm
741
Operadores de Schrödinger
em que
^ He+ = (2me )−1 (k 2 + k 2 ) + (2M)−1 k 2 − 2e2 ∥x1 − x0 ∥2 .
H 1 2 0
Além disso, como k22 e H^ He+ − (2me )−1 k 2 = H ′ + também envolvem coordenadas indepen-
2 He
dentes, segue que
. /
^ He+ ) = inf σ(H ′ + ) + inf σ (2me )−1 k22 = inf σ(H ′ + ) .
inf σ(H He He
′ −1
Finalmente, dado que HHe + = HHe+ + (2me + 2M) (k1 + K)2 , temos que inf σ(HHe
′
+) =
N
inf σ(HHe+ ). Logo, inf σ(HHe+ ) = inf σ(HHe+ ), como desejávamos provar.
Órbita
Núcleo
Elétron
Figura 10.16: De acordo com a Física Clássica, uma partícula carregada que orbita em torno de
um centro deve continuamente perder energia e seguir uma órbita espiral que a transporta ao
núcleo.
742
Operadores de Schrödinger
Desta forma, deveria ocorrer uma aniquilação completa do átomo do hidrogênio.43 Mas este
é um resultado da mecânica clássica que não corresponde à realidade. O hidrogênio é um dos
elementos mais abundantes no universo e é um fato observacional que este é estável. Então, o
que está errado? Quem responde é a mecânica quântica. Assim, imediatamente surge a questão:
como a mecânica quântica define limites inferiores para a energia dos elétrons nos átomos? Ou
seja, se
! " #
2
λ0 = inf E(Ψ) | |Ψ(x)| dx = 1 , (10.9.1)
Rn
é finito, qual é o seu valor? Observe que se o ínfimo for um mínimo (ou seja, λ0 = EΨ0 para
alguma função Ψ0 , então λ0 é o valor mais baixo da energia que o sistema pode atingir e,
portanto, é chamado de energia do estado fundamental. Neste caso, a função Ψ0 é chamada
de estado fundamental. O mínimo não é atingido se houver muitos elétrons em um átomo
(veja o Capítulo 12, do livro de E.H. Lieb and R. Seiringer, “The Stability of Matter in Quantum
Mechanics,” Cambridge University Press, 2010.). A finitude de λ0 é referida como estabilidade
de primeiro tipo. Por outro lado, quando a finitude de λ0 é limitada pelo número de partículas
nos referimos a ela como estabilidade do segundo tipo. Essa última noção é mais complicada
e está relacionada à energia de sistemas macroscópicos. Os átomos ou moléculas individuais
são sistemas relativamente pequenos, com alguns graus de liberdade. A matéria macroscópica,
entretanto, consiste em uma enorme quantidade de átomos, ou seja, é formada por um número
macroscópico de núcleos e elétrons.
n2
⟨Ψ, p2 Ψ⟩ ! ⟨Ψ, x2 Ψ⟩−1 , (10.9.2)
4
ou (assumindo que ! = 2m = 1),
n2 n2
⟨Ψ, −∇2 Ψ⟩ ! ⟨Ψ, x2 Ψ⟩−1 =⇒ ∥∇Ψ∥22 ∥xΨ∥22 ! ,
4 4
isto é
$" % $" %
2 2 2 n2
|∇Ψ(x)| dx x |Ψ(x)| dx ! .
Rn Rn 4
Esta formulação do príncípio da incerteza é a original e mais conhecida; ela nos diz que se
o estado Ψ está localizado em torno da origem, o lado direito da desigualdade (10.9.2) tende
ao infinito, implicando um momentum grande. No entanto, como salientado por E.H. Lieb e R.
43
Com efeito, essa interpretação se baseava na invenção do radiotransmissor por Heinrich Hertz em 1887, funda-
mentada na Teoria Eletromagnética Clássica de Maxwell, dentro do qual elétrons são “agitados” e, como resultado,
ondas eletromagnéticas são emitidas. Portanto, não havia dúvidas quanto à teoria de cargas em movimento e a
emissão de energia. O que deixava os físicos desconcertados era explicar como os elétrons conseguiam manter a
órbita ao redor do núcleo.
743
Operadores de Schrödinger
Seiringer, no livro “The Stability of Matter in Quantum Mechanics,” Cambridge University Press,
2010, página 2, a desigualdade (10.9.2), infelizmente, não é suficiente para provar a estabilidade
do átomo do tipo hidrogênico. Ela permite apenas dar uma explicação heurística do poder da
mecânica quântica para se entender o não-colapso do átomo. Com efeito, o valor esperado
⟨Ψ, x2 Ψ⟩ é uma medida pobre para se avaliar o quão localizado é um estado, pois é possível
tornar esse valor muito grande sem alterar muito a energia cinética. Para vermos isto, considere,
por exemplo, o estado
√
Ψy (x) = 1 − ε2 Ψ1 (x) + εΨ2 (x − y) ,
com ε ∈ !(0, 1), Ψ1 , Ψ2 ∈ C0∞ (B(0; 1)), normalizadas em L2 (Rn ), e ∥y∥ > 2. Então,
∥Ψy ∥2 = Rn |Ψy |2 = 1. Com efeito,
√ √
∥Ψy ∥2 = (1 − ε2 )∥Ψ1 ∥2 + ε 1 − ε2 ⟨Ψ1 , Ψ2 ⟩ + ε 1 − ε2 ⟨Ψ2 , Ψ1 ⟩ + ε2 ∥Ψ2 ∥2 .
" # "
Agora, observe que o supp Ψ#1 = x ∈ Rn | ∥x∥ < 1 , enquanto que o supp Ψ2 = x ∈ Rn |
∥x − y∥ < 1, com ∥y∥ > 2 . Portanto, a interseção entre essas duas funções é o conjunto
vazio. Logo, ⟨Ψ1 , Ψ2 ⟩ = ⟨Ψ2 , Ψ1 ⟩ = 0. Como ∥Ψ1 ∥2 = ∥Ψ2 ∥2 = 1, segue que ∥Ψy ∥2 = 1.
Além disso, imediatamente, temos que
$ $ $
2 2 2 2 2 2
dx x |Ψy (x)| = (1 − ε ) dx x |Ψ1 (x)| + ε dx (y + x)2 |Ψ2 (x)|2
Rn B(0;1) B(0;1)
! (1 − ε2 ) + ε2 (∥y∥ + 1)2 .
Isto implica que
$
dx x2 |Ψy (x)|2 " ε2 (∥y∥ + 1)2 " ε2 (∥y∥ − 1)2 ,
Rn
enquanto que
$ $ $
2 2 2 2
dx |∇Ψy (x)| = (1 − ε ) dx |∇Ψ1 (x)| + ε dx |∇Ψ2 (x)|2 .
Rn B(0;1) B(0;1)
744
Operadores de Schrödinger
isto é,
$ $
(n − 2)2
2 1
dx |∇Ψ(x)| " dx |Ψ(x)|2 . (10.9.5)
Rn 4 Rn x2
745
Operadores de Schrödinger
Lembremos que, em geral, como Ψ ∈ C0∞ (Rn ) e r n−2 é uma função diferenciável, cujo suporte
não é necessariamente limitado, então, r n−2 Ψ ∈ C0∞ (Rn ) e o suporte de r n−2Ψ está contido
na interseção dos suportes de r n−2 e Ψ. Assim, a integral do lado esquerdo na Eq.(10.9.7) é
zero. Portanto, em módulo, temos que
5$ ∞ 5 5$ ∞ , -5
5 5 2 5 ∂Ψ 5
5 dr r Ψ 55 =
n−3 2 5 n−2
dr r Ψ 5 . (10.9.8)
5 5
(n − 2) 0 ∂r 5
0
Note que o lado direito da Eq.(10.9.8) pode ser reescrito da seguinte forma:
5$ ∞ , -5 5$ ∞ , -5
2 5 ∂Ψ 5 2 5 ∂Ψ 5
5 n−2
dr r Ψ 5= 5 dr r (2n−4)/2
Ψ 5
(n − 2) 05 ∂r 5 (n − 2) 05 ∂r 5
5$ ∞ , -5
2 5 ∂Ψ 5
= 5 dr r (n−1)/2
r (n−3)/2
Ψ 5 .
(n − 2) 5 0 ∂r 5
Assim, usando a desigualdade de Cauchy-Schwarz-Bunjakowski para integrais na Eq.(10.9.8),
obtemos que
$ ∞ $ ∞ 5 , -5
n−3 2 2 5
(n−1)/2 (n−3)/2 5 ∂Ψ 55
dr r |Ψ| = dr r r 5Ψ ∂r 5
0 (n − 2) 0
,$ -1/2 ($ 5, -52 )1/2
2 ∞ ∞ 5 ∂Ψ 5
# dr r n−3|Ψ|2 dr r n−1 55 5 .
(n − 2) 0 0 ∂r 5
No lema acima, a constante (n − 2)2 /4 na Eq.(10.9.4) é a melhor possível para toda função
Ψ ∈ C0∞ (Rn ), com a igualdade acontecendo se, e somente se, Ψ = 0. Observe que a
desigualdade de Hardy é muito semelhante à desigualdade de Heisenberg, com uma diferença
importante: no lado direito, tem-se o valor esperado do inverso de x2 em vez do inverso do
valor esperado de x2 .
746
Operadores de Schrödinger
Nota 10.32. A desigualdade de Hardy foi provada pela primeira vez pelo famoso matemático
britânico Godfrey Harold Hardy no artigo “Note on a Theorem of Hilbert,” Math. Z. 6 (1920)
314.44 De uma forma um pouco diferente, a desigualdade de Hardy estabelece que qualquer
Ψ ∈ C0∞ (R), com Ψ(0) = 0, satisfaz
$ ∞ $
′ 2 1 ∞
dx |Ψ (x)| " dx x−2 |Ψ(x)|2 .
−∞ 4 −∞
É importante enfatizar que a situação é diferente em duas dimensões; dado qualquer potencial
não-trivial V (x) " 0, nenhuma estimativa da forma
$ $
2
dx |∇Ψ(x)| " dx V (x)|Ψ(x)|2 ,
R2 R2
pode acontecer para qualquer Ψ ∈ C0∞ (R2 ). Isso se deve ao fato do laplaciano em duas
dimensões ser um operador crítico, o que significa que subtrair qualquer potencial não-negativo
criará imediatamente um espectro negativo (veja, por exemplo, o caso discutido na Subseção
10.6).
em que $ , -
#2 e2
E(Ψ) = ⟨Ψ, H1atom Ψ⟩ = dx |∇Ψ(x)|2 − |Ψ(x)|2 .
R3 2µ ∥x∥
Então, usando-se a versão refinada do Princípio da Incerteza obtemos
#2 e2
H1atom " − .
8µ∥x∥2 ∥x∥
Isto implica que o lado direito da desigualdade acima atinge seu mínimo quando ∥x∥−1 =
4µ2 #−2 e assim H1atom " −2µe4 #−2 . Logo, a energia do átomo do hidrogênio é limitada
inferiormente; ela estará sempre acima de −2µe4 #−2 . Consequentemente, o elétron não colapsa
sobre o núcleo e, portanto, o átomo do hidrogênio é estável!
44
Hardy foi tutor de outro famoso matemático, o indiano Srinivasa Ramanujan.
747
Operadores de Schrödinger
Vamos, agora, discutir brevemente como estender o argumento acima para um átomo qual-
quer, considerando por simplicidade o núcleo de carga Z > 0 fixo na origem. O operador
Schrödinger deste sistema é dado por
<Ne , -
#2 2 e2 Z
HNatom " − ∇x α − .
e
α=1
2µ ∥xα ∥
Usando, para cada termo da direita da desigualdade acima, o limite inferior H1atom " −2µe4 #−2 ,
com e2 substituído por e2 Z, obtemos
2µe4 Z 2
HNatom " −Ne .
e
#2
Esse limite funciona, mas é bastante grosseiro: ignoramos que os elétrons são férmions, além
da repulsão elétron-elétron. Os detalhes de como levar em consideração esses fatos podem ser
encontrados no livro de E.H. Lieb e R. Seiringer, “The Stability of Matter in Quantum Mechanics,”
Cambridge University Press, 2010.
748
Operadores de Schrödinger
Como antes, partimos com o modelo atômico assumindo que o núcleo de carga Z > 0 está
fixo na origem e “circundado” por uma quantidade Ne de elétrons não-relativísticos interagindo
entre si e com o próprio núcleo por meio de uma interação de Coulomb. Este modelo é descrito
pelo operador de Schrödinger atômico46
< Ne , - < Ne <Ne
atom 2 Z 1
H Ne = −∇xα − + .
α=1
∥xα ∥ α=1 α<β
∥xα − xβ ∥
Neste ponto é importante destacar que a questão do espaço de estados para sistemas de
muitas partículas é realmente mais sutil do que o que apareceu até agora. Diferentemente da
física clássica, partículas idênticas são indistinguíveis na física quântica. Para tornar isso mais
preciso, precisamos levar em consideração o spin das partículas. No caso que temos Ne -elétrons
de spin s = 1/2, o operador HNatom e
atua em funções da forma
ΨNe (x1 , s1 , . . . , xNe , sNe ) ∈ L2 (R3 , C2 )⊗Ne ≡ L2 (R3Ne , C2Ne ) , (10.10.1)
com s1 = · · · = sNe = 1/2, em que o termo no meio é o produto tensorial de Ne espaços de
Hilbert L2 (R3 , C2 ), definido como o espaço de Hilbert gerado pelos produtos de elementos de
bases ortonormais em cada L2 (R3 , C2 ).
749
Operadores de Schrödinger
temos
para qualquer permutação π dos Ne índices, isto é, π : (1, . . . , Ne ) → (π(1), . . . , π(Ne )),
refletindo a natureza anti-simétrica dos elétrons relacionados ao princípio de exclusão de Pauli.
Observe que, em (10.10.2) estamos desprezando o spin dos elétrons, uma vez que o operador
HNatom não atua nas variáveis de spin (que, no entanto, pode ser facilmente incluído, permitindo
e
t e t
que HNe atue em N
atom
1 L2 (R
3Ne
, C2Ne ), em que o símbolo representa o produto tensorial
anti-simétrico). Entretanto, chamamos a atenção para o fato que, o que realmente é necessário
na prova para a ionização máxima é a simetria do quadrado absoluto das funções-de-onda, ou
seja,
o que também ocorre no caso bosônico quando a Eq.(10.10.2) é satisfeita sem levar em conta
o sinal da permutação. A prova, portanto, é válida tanto para férmions quanto para bósons!
Lembre-se que, |ΨNe (x1 , . . . , xNe )|2 é a densidade de probabilidade para encontrar a partícula
1 em x1 , a partícula 2 em x2 , etc. Essa interpretação faz sentido em vista da condição
$
2
∥ΨNe ∥ = dx1 , . . . , dxNe |ΨNe (x1 , . . . , xNe )|2 = 1 .
R3Ne
σess (HNatom
e
) = [λNe −1 , ∞) ,
Foi mostrado por Zhislin48 que a desigualdade estrita de ligação ocorre pelo menos se
Ne < Z + 1, como mostra o seguinte
TEOREMA 10.31 (Teorema da existência de Zhislin). Seja HNatom e
o operador de Schrödinger
3Ne 49
atômico com a carga nuclear fixa na origem e atuando em L2 (R ). Para qualquer 1 # Ne <
Z + 1, temos a desigualdade estrita de ligação λNe < λNe −1 . Consequentemente, o hamiltoniano
HNatom
e
tem um estado fundamental.
48
G. Zhislin, “Discussion of the Spectrum of Schrödinger Operator for System of Many Particles,” Trudy. Mosk.
Mat. Obs. 9 (1960) 81.
49
As modificações necessárias para se levar em conta a estatística das partículas podem ser encontradas no
livro de S.J. Gustafson e I.M. Sigal, “Mathematical Concepts of Quantum Mechanics,” Seção 10.2, Second Edition,
Springer, 2011.
750
Operadores de Schrödinger
Demonstração. Nós provaremos que λNe < λNe −1 por indução. Tome Ne = 1; este é o caso
do átomo do hidrogênio
Z
H1atom = −∇2 − .
∥x∥
Sabemos que inf σ(H1atom ) = λ1 = −1/2 (veja a Eq.(10.7.13)). Logo, λ1 < λ0 = 0. A seguir,
suponha que tenhamos provado que λNe −1 < λNe −2 para algum Ne < Z. Agora, mostraremos
que λNe < λNe −1 . Pelo princípio variacional, precisamos encontrar uma função-de-onda ΨNe
tal que
⟨ΨNe , HNatom
e
ΨNe ⟩ < λNe −1 .
A partir da hipótese de indução que λNe −1 < λNe −2 e do Teorema HVZ, sabemos que HNatom
e −1
possui um estado fundamental ΨNe −1 ∈ L2 (R3(Ne −1) ). Tome uma função suave Φ : R3 → R
com supp Φ ⊂ {x ∈ R3 | 1 < |x| < 2} e ∥Φ∥L2 (R3 ) = 1. Para R ∈ N, definimos
1 6x7
ΦR (x) = 3/2 Φ .
R R
Logo, as funções acima são ortonormais e têm suportes disjuntos, isto é,
! "
supp ΦR ⊂ x ∈ R3 | R < |x| < 2R , ∥ΦR ∥L2 (R3 ) = 1 .
Assim, as funções trial ΨNe ,R ∈ L2 (R3Ne ) definidas por ΨNe ,R = ΨNe −1 ⊗ ΦR , isto é,
Portanto,
$
|ΦR (xNe )|2
⟨ΨNe ,R , HNatom ΨNe ,R ⟩ = λNe −1 + ∥∇ΦR ∥2L2 (R3 ) −Z dxNe
e
R3 ∥xNe ∥
N
< e −1 $
|ΨNe −1 (x1 , . . . , xNe −1 )|2 |ΦR (xNe )|2
+ dx1 · · · dxNe .
α=1 R3Ne ∥xα − xNe ∥
751
Operadores de Schrödinger
Além disso, uma vez que |ΦR (xNe )|2 é a densidade de probabilidade de se encontrar o Ne -
elétron em xNe , podemos, de acordo com a unidades adotadas, interpretar
N
< e −1 $
|ΦR (xNe )|2
V (x1 , . . . , xNe −1 ) = dxNe , (10.10.4)
α=1 R3 ∥xα − xNe ∥
é a energia eletrostática de interação dos (Ne − 1)-elétrons com esse potencial. Podemos avaliar
a integral em (10.10.4) usando o Teorema de Newton que estabelece que fora de uma distribuição
de carga que é esfericamente simétrica em torno de um ponto (que pode ser tomado como sendo
a origem), o potencial coulombiano se comporta como se toda a carga estivesse concentrada
nesse ponto. Com efeito, assuma que ΦR é radial50
$ $ ∞ $
|ΦR (xNe )|2 2 |ΦR (rNe ω)|2
dxNe = drNe rN dω .
R3 ∥xα − xNe ∥ 0
e
s2 ∥xα − rNe ω∥
Vamos isolar o único termo que depende dos ângulos entre xα e xNe , isto é,
1 1
= 2 2
,
∥xα − xNe ∥ (rα + rNe − 2rα rNe cos θ)1/2
752
Operadores de Schrödinger
N
! e −1 " #" $
2 |ΦR (xNe )|2
= dx1 · · · dxNe −1 |ΨNe −1 (x1 , . . . , xNe −1 )| dxNe
α=1 R3(Ne −1) R3 ∥xα − xNe ∥
N
! e −1 " # " $
2 1 |Φ(xNe )|2
! dx1 · · · dxNe −1 |ΨNe −1 (x1 , . . . , xNe −1 )| dxNe
α=1 R3(Ne −1) R R3 ∥xNe ∥
# $"
Ne − 1 |Φ(xNe )|2
= dxNe .
R R3 ∥xNe ∥
Em resumo, obtemos que
# $"
1 Ne − 1 − Z |Φ(xNe )|2
⟨ΨNe ,R , HNatom ΨNe ,R ⟩ ! λNe −1 + 2 ∥∇Φ∥2L2 (R3 ) + dxNe .
e
R R R3 ∥xNe ∥
O fato de termos assumido que Φ é suave e de suporte compacto implica que Φ ∈ C0∞ (R3 ) ⊂
S (R3 ) ⊂ L2 (R3 ). E mais, pelo Exemplo 6.28, a função 1/∥xNe ∥ define uma distribuição em
S ′ (R3 ). Portanto, a última integral acima é bem comportada do ponto de vista distribucional.
Dessa forma, sob a condição que Z < Ne − 1, ou seja, que Ne − 1 − Z < 0, segue que para
R > 0 suficientemente grande, temos
# $"
1 2 Ne − 1 − Z |Φ(xNe )|2
∥∇Φ∥ 3
L2 (R ) + dxNe →0,
R2 R R3 ∥xNe ∥
o que implica a desigualdade estrita de ligação
753
Operadores de Schrödinger
Multiplicando a equação acima por ∥xNe ∥ΨNe (em que xNe é o vetor posição do Ne -ésimo
elétron) e integrando, obtemos
Observe que
⟨∥xNe ∥ΨNe , (HNatom
e −1
− λNe )ΨNe ⟩ " 0 .
Com efeito, pelo Teorema HVZ, para um sistema com (Ne − 1)-partículas, segue que HNatom
e −1
"
λNe −1 " λNe . A seguir, defina
Logo,
O , -P
ΦNe
⟨∥xNe ∥ΨNe , −∇2xNe ΨNe ⟩ = ΦNe , −∇2xNe
∥xNe ∥
O , -P
1 1
= ∇ΦNe , ΦNe ∇ + ∇ΦNe
∥xNe ∥ ∥xNe ∥
O P O P
1 1
= ∇ΦNe , ΦNe ∇ + ∇ΦNe , ∇ΦNe . (10.10.5)
∥xNe ∥ ∥xNe ∥
Note que, como ⟨∥xNe ∥ΨNe , −∇2xNe ΨNe ⟩ é um número real, o primeiro termo na soma acima
pode ser escrito da seguinte forma:
O P O P O P
1 1 1 1 1
∇ΦNe , ΦNe ∇ = ∇ΦNe , ΦNe ∇ + ∇ΦNe , ΦNe ∇
∥xNe ∥ 2 ∥xNe ∥ 2 ∥xNe ∥
O P O P
1 1 1 1
= ∇ΦNe , ΦNe ∇ + ΦNe ∇ , ∇ΦNe .
2 ∥xNe ∥ 2 ∥xNe ∥
Assim, segue que
O P $
1 1 . /
∇ΦNe , ΦNe ∇ = dxNe ∇ΦNe (xNe )ΦNe (xNe ) + ΦNe (xNe )∇ΦNe (xNe )
∥xNe ∥ 2 R3Ne
1
×∇
∥xNe ∥
$
1 . / 1
= dxNe ∇ ΦNe (xNe )ΦNe (xNe ) ∇
2 R3Ne ∥xNe ∥
$
1 1
=− dx |ΦNe (xNe )|2 ∇2xNe
2 R3Ne ∥xNe ∥
$
= 2π dxNe |ΦNe (xNe )|2 δ(xNe ) .
R3Ne
754
Operadores de Schrödinger
Na última passagem usamos o fato, já provado no Teorema 6.35, que ∇2xNe (1/∥xNe ∥) =
−4πδ(xNe ) no sentido distribucional. Como ΨNe ∈ L2 (R3Ne ), temos que ΦNe (0) = 0 e,
portanto, o primeiro termo da soma na Eq.(10.10.5) desaparece. Por sua vez, para o segundo
termo da soma temos
O P $
1 1
∇ΦNe , ∇ΦNe = dxNe |∇ΦNe (xNe )|2 " 0 .
∥xNe ∥ R 3Ne ∥x N e ∥
Consequentemente, podemos concluir que ⟨∥xNe ∥ΨNe , −∇2xNe ΨNe ⟩ " 0. Dessa forma, segue
que
0 = ⟨∥xNe ∥ΨNe , (HNatom
e
− λNe )ΨNe ⟩
I n , - N
o J
< e −1
Z 1
= ∥xNe ∥ΨNe , HNatom
e −1
− λNe + −∇2xNe − + Ψ Ne
∥xNe ∥ α=1
∥xα − xNe ∥
I n , - N
o J
< e −1
Z 1
" ∥xNe ∥ΨNe , λNe −1 − λNe + −∇2xNe − + Ψ Ne
∥xNe ∥ α=1
∥xα − xNe ∥
I n N
o J
< e −1
Z 1
> ∥xNe ∥ΨNe , − + Ψ Ne .
∥xNe ∥ α=1
∥xα − xN e ∥
$ (N −1 )
<e
∥xNe ∥
= −Z + dx |ΨNe (x1 , . . . , xNe )|2 ,
R3Ne α=1
∥xα − xNe ∥
Para finalizar, vamos levar em conta a simetria (10.10.3).52 Com efeito, tome Ne = 2, então,
observe que por causa da simetria do quadrado absoluto da função-de-onda
∥x2 ∥ 1 ∥x2 ∥ 6 7
|Ψ2 (x1 , x2 )|2 = |Ψ2 (x1 , x2 )|2 + |Ψ2 (x2 , x1 )|2 .
∥x1 − x2 ∥ 2 ∥x1 − x2 ∥
Troque x1 por x2 no segundo termo a direita. Logo, segue que
, -
∥x2 ∥ 2 1 ∥x2 ∥ 2 ∥x1 ∥ 2
|Ψ2 (x1 , x2 )| = |Ψ2 (x1 , x2 )| + |Ψ2 (x1 , x2 )|
∥x1 − x2 ∥ 2 ∥x1 − x2 ∥ ∥x2 − x1 ∥
, -
1 ∥x1 ∥ + ∥x2 ∥ 2
= |Ψ2 (x1 , x2 )| .
2 ∥x1 − x2 ∥
52
E também a simetria de ∥xα − xβ ∥!
755
Operadores de Schrödinger
1 < ∥x3 ∥ 6
2
< 2
∥x3 ∥ 2
|Ψ3 (x1 , x2 , x3 )| = |Ψ3 (x1 , x2 , x3 )|2 + |Ψ3 (x1 , x3 , x2 )|2
α=1
∥xα − x3 ∥ 3 α=1 ∥xα − x3 ∥
7
+ |Ψ3 (x3 , x2 , x1 )|2 .
Como no caso anterior, trocando x3 por x2 no segundo termo, x3 por x1 no terceiro termo e
abrindo o somatório, obtemos
2
< , -
∥x3 ∥ 1 ∥x1 ∥ + ∥x2 ∥ ∥x1 ∥ + ∥x3 ∥ ∥x2 ∥ + ∥x3 ∥
|Ψ3 (x1 , x2 , x3 )|2 = + +
α=1
∥xα − x3 ∥ 3 ∥x1 − x2 ∥ ∥x1 − x3 ∥ ∥x2 − x3 ∥
Portanto, procedendo de acordo com os dois casos analisados acima, no caso de Ne -elétrons,
por causa da simetria (10.10.3), nós temos uma invariância ao trocar xNe com qualquer outra
variável xβ , com β ̸= α. Dessa forma, podemos reescrever a soma
N
< e −1 Ne Ne
∥xNe ∥ 2 1 < < ∥xα ∥ + ∥xβ ∥
|ΨNe (x1 , . . . , xNe )| = |ΨNe (x1 , . . . , xNe )|2 .
α=1
∥xα − xNe ∥ Ne α=1 β=1,β̸=α ∥xα − xβ ∥
Além disso, usando a desigualdade triangular ∥xα ∥ + ∥xβ ∥ " ∥xα − xβ ∥, o que implica que
∥xα ∥ + ∥xβ ∥
"1,
∥xα − xβ ∥
Como essa desigualdade é estrita em R3Ne , obtemos a desigualdade estrita desejada, isto é,
Nemax < 2Z + 1.
Nota 10.33 (Fatos importantes relacionados com o Teorema de Lieb). (i) Para Z = 1 (átomo
de hidrogênio), o Teorema de Lieb implica que o íon negativo H −− (um sistema de um próton
e três elétrons) não existe, enquanto se sabe (matematicamente) que H − existe. (ii) Para Z
maior, o fator 2 no limite de Lieb não é optimum. De fato, por um longo tempo, o Teorema
de Lieb era o resultado rigoroso mais conhecido, sem o uso de modelos de aproximação (como
a teoria de Thomas-Fermi ou Hartree-Fock), mas, em um artigo publicado em 2012, P.T. Nam
melhorou o limite superior de Lieb para Z " 6, mostrando que Nemax # 1, 22Z + 3Z 1/3 .53
(iii) Quando Z → ∞, a inexistência de estados fundamentais fermiônicos é conhecida quando
Ne " (1 + ε)Z, para qualquer ε > 0. Isto é chamado neutralidade assintótica, provada
pela primeira vez por Lieb-Sigal-Simon-Thirring.54 (iv) A inexistência de estados fundamentais
53
P.T. Nam, “New Bounds on the Maximum Ionization of Atoms,” Commun. Math. Phys. 312 (2012) 427.
54
E.H. Lieb, I.M. Sigal, B. Simon e W. Thirring, “Asymptotic Neutrality of Large-Z Ions,” Phys. Rev. Lett. 52
(1984) 994.
756
Operadores de Schrödinger
55
R. Benguria e E.H. Lieb, “Proof of the Stability of Highly Negative Ions in the Absence of the Pauli Principle,”
Phys. Rev. Lett. 50 (1983) 1771.
757
Operadores de Schrödinger
A partir de agora vamos considerar apenas a parte negativa de V , como definimos na Nota
10.12, na pg.671. Para V− " 0, suponha que V− ∈ Ln/2 (Rn ) + L∞ (Rn )ε , se n " 3, em que
ε indica que para qualquer ε > 0 podemos decompor V− = V1 + V2 , com V1 ∈ Ln/2 (Rn )
e V2 ∈ L∞ (Rn ), tal que ∥V2 ∥∞ < ε. Em outras palavras, o potencial V− é Lloc n
n/2 (R ) e
desaparece no infinito, isto é, existem constantes R e ε tais que
$
dx |V1 (x)|n/2 < ∞ e ∥V2 ∥∞ = sup |V (x)| < ε (com |x| > R) .
|x|#R x∈Rn
Nota 10.34. A condição que n " 3 ao assumirmos que V− ∈ Ln/2 (Rn ) + L∞ (Rn )ε segue
diretamente do
TEOREMA 10.33 (Desigualdade de Hardy-Littlewood-Sobolev). Assuma que 1 < p, r < ∞ e
que 0 < α < n, tal que 1/p + α/n + 1/r = 2. Sejam Ψ ∈ Lp (Rn ) e Φ ∈ Lr (Rn ). Então,
existe uma constante C(n, α, p, r), independente de Ψ e Φ, tal que
$ $
|Ψ(x)||Φ(y)|
dydx # C(n, α, p, r)∥Ψ∥p∥Φ∥r . (10A.1)
Rn Rn ∥x − y∥α
A melhor constante C(n, α, p, r) satisfaz
n, -α/n , -α/n o
n 6 ωn−1 7α/n 1 α α
C(n, α, p, r) # + ,
n−α n pr n(1 − 1/p) n(1 − 1/r)
para algum A ∈ C, 0 ̸= β ∈ R e a ∈ Rn .
A prova deste teorema pode ser encontrada no livro do E.H. Lieb e M. Loss, “Analysis,”
Second Edition, American Mathematical Society, Providence, 2001.
56
Outra vez, estamos ignorando as constantes físicas, isto é, estamos assumindo que # = 2m = 1.
758
Operadores de Schrödinger
com a constante C(n, 2) sendo dada pelo seu melhor valor através da Eq.(10.3.11). Da mesma
forma, aplicando a desigualdade de Hölder na segunda integral, segue que
$ $
1/2 2 1/2 2
∥V2 Ψ∥2 = dx |V2 (x)Ψ(x)| # dx |V2(x)Ψ(x)|2 # ∥V2 ∥2∞ ∥Ψ∥22 < ε2 ∥Ψ∥22 .
Rn Rn
Assim, Φ ∈ L2 (Rn ). Por conseguinte, nossa equação de auto-valor implica que (−∇2 +λ1I)Ψ =
1/2
V− Ψ = V− Φ. Uma vez que −λ está no conjunto resolvente do operador −∇2 (lembre que
pelo Teorema 10.3 temos que σ(−∇2 ) = [0, ∞)), podemos inverter (−∇2 + λ1I) para obter
1/2
Ψ = (−∇2 + λ1I)−1 V− Φ, ou equivalente, Φ = Kλ Φ, com o operador integral Kλ definido
por
$ = >
1/2 1/2
Kλ Φ(x) = dy V− (−∇2 + λ1I)−1 V− (x, y)Φ(y) . (10A.2)
Rn
em que G(x − y; λ) é o kernel integral (ou função de Green) para o inverso do operador
positivo (−∇2 + λ1I)−1 . Assim, a maioria das propriedades do operador Kλ (x, y) são quase
759
Operadores de Schrödinger
Isto mostra que o operador Kλ é um operador limitado em L2 (Rn ). Mais do que isso, Kλ é
de fato compacto pelo Teorema 10.9.
O fato de que Ψ ∈ L2 (Rn ) segue da desigualdade operatorial (−∇2 + λ1I)−2 # λ−1 (−∇2 +
λ1I)−1 , que pode ser verificada através da representação de Fourier. Logo,
1/2 1/2
∥Ψ∥22 = ⟨Ψ, Ψ⟩ = ⟨(−∇2 + λ1I)−1 V− Φ, (−∇2 + λ1I)−1 V− Φ⟩
1/2 1/2
= ⟨V− Φ, (−∇2 + λ1I)−2 V− Φ⟩
1/2 1/2
# λ−1 ⟨V− Φ, (−∇2 + λ1I)−1 V− Φ⟩
1/2 1/2
= λ−1 ⟨Φ, V− (−∇2 + λ1I)−1 V− Φ⟩
Existem outras observações importantes sobre (10A.2) e (10A.3). Primeiro, é bem conhecido
que a função de Green G(x − y; λ) é dada pela transformada de Fourier inversa
$
1 1
G(x − y; λ) = n
dk 2
e−ik(x−y)
(2π) Rn ∥k∥ + λ
$
1 1 1 ′ ′ ′
= (2−n)/2 n
dk ′ ′ 2
e−ik (x −y ) , (forma mais conveniente)
λ (2π) Rn ∥k ∥ + 1
′
√ ′ ′
√
em que
√ k = k/ λ
√ 2 e (x − y ) = λ(x − y). Pela Proposição 6.9 (com α = 2), a função
^ −1
G(k/ λ) = (∥k/ λ∥ + 1) pode ser representada pela integral
√ $ ∞ √ 2
^
G(k/ λ) = dδ e−δ(1+∥k/ λ∥ ) .
0
760
Operadores de Schrödinger
√
Isto implica que a função de Green G(x − y; λ) = λ−(2−n)/2 G( λ(x − y)) tem a seguinte
representação integral:
$ ∞
1 1 λ 2
G(x − y; λ) = (2−n)/2 n n/2 dδ δ −n/2 e−δ e− 4δ ∥x−y∥ , (10A.4)
λ 2 π 0
∂Kλ (x − y)
<0, ∀λ > 0 .
∂λ
E mais, se λ < λ′ , então, Kλ − Kλ′ < 0. De fato, pela Primeira Identidade do Resolvente (veja
a Proposição 5.5), segue que
= >
1/2 1/2
Kλ (x, y) − Kλ′ (x, y) = V− (−∇2 + λ1I)−1 − (−∇2 + λ′ 1I)−1 V−
= >
′ 1/2 2 −1 2 ′ −1 1/2
= (λ − λ ) V− (−∇ + λ1I) (−∇ + λ 1I) V− <0,
761
Operadores de Schrödinger
Pelo Princípio
! Min-Max, podemos definir
" os auto-valores
! de Kλ da maneira óbvia, definindo
"
µ1 (λ) = sup ⟨Φ, Kλ Φ⟩ | ∥Φ∥2 = 1 , µ2 (λ) = sup ⟨Φ, Kλ Φ⟩ | ∥Φ∥2 = 1, ⟨Φ, Φ1 ⟩ = 0 ,
etc. Todos esses supremos são alcançados e satisfazem, para ℓ = 1, 2, . . ., Kλ Φℓ = µℓ Φℓ .
Reciprocamente, uma solução L2 (Rn ) para esta equação corresponde a um dos auto-valores
listados. Podemos escolher os auto-vetores como ortonormais.
O gráfico na Figura 10.17 leva-nos imediatamente à seguinte conclusão: para cada número
λ > 0 podemos definir
1 1 √ √ 2−n
G(x − y; λ) = (2−n)/2 n/2 n/2
K n−2 ( λ∥x − y∥) ( λ∥x − y∥) 2 ,
λ 2 π 2
57
Lembre-se de que a multiplicidade de um aut-ovalor é o número de auto-vetores linearmente independentes
correspondentes a esse auto-valor.
762
Operadores de Schrödinger
em que K n−α é a função de Bessel modificada do terceiro tipo. Para n = 3, segue que
2
λ1/2 √ 1 1
G(x − y; λ) = K 1( λ∥x − y∥) .
23/2 π 3/2 2 λ1/4 ∥x − y∥1/2
De acordo com a tabela de integrais de I.S. Gradshteyn e I.M. Ryzhik, “Table of Integrals, Series,
√ Seventh Edition, Elsevier (Academic Press), 2007, fórmula 8.469, 3., pg.925, a
and Products,”
função K 1 ( λ∥x − y∥) tem a seguinte representação:
2
√ π 1/2 1 1 √
− λ∥x−y∥
K 1 ( λ∥x − y∥) = 1/2 1/4 e .
2 2 λ ∥x − y∥1/2
Logo,
1 1 √
G(x − y; λ) = e− λ∥x−y∥ . (10A.5)
4π ∥x − y∥
Como terceiro e último passo, levamos em conta o fato estabelecido pelo Teorema 10.34 que
<
N(λ; (−∇2 + V )) = 1
µℓ (λj ) = 1 a.v. Kλ
<
# µ2ℓ (0)
µℓ (0) a.v. K0
<
= ∥K0 Φℓ ∥22
µℓ (0) a.v. K0
$ $
# dxdy |K0 (x, y)|2 (pelo Teorema 10.9) .
R3 R3
como desejado.
763
Operadores de Schrödinger
Nota 10.35. Na prova do Teorema 10.34, enquanto o operador (−∇2 +λ1I)−1 em três dimensões
tem o Kernel integral dado pela função de Green (10A.5), que converge quando λ → 0 para
x ̸= y, o que implica que uma estimativa para N(λ; (−∇2 + V )) pode ser obtida ao final
tomando λ → 0, o mesmo não funciona
√ em duas dimensões, pois neste caso o Kernel integral
2 −1
de (−∇ + λ1I) contém ln(− λ∥x − y∥) que diverge quando λ → 0.
Exemplo 10.6. Com este exemplo, abordamos a questão de saber se o operador de Schrödinger
−∇2 + V tem um número finito (incluindo possivelmente o valor 0) ou infinito de auto-valores
negativos. Suponha que V (x) = −C∥x∥−α para alguma constante C. Invocando a Proposição
10.7, sabemos que se α < 2 e C > 0, então, o operador −∇2 + V tem um número infinito
de estados ligados. A prova da finitude do espectro discreto para α > 2 segue diretamente do
Teorema 10.12, isto é, sob nossa hipótese sobre o potencial V , com α > 2,
$ $
V− (x)V− (y)
dxdy <∞,
R3 R3 ∥x − y∥2
764
Operadores de Schrödinger
$
n
classical
= Cγ,n dx V− (x)γ+ 2 , (10B.1)
Rn
em que
classical Γ(γ + 1)
Cγ,n = (4π)−n/2 . / .
Γ γ + 1 + n2
765
Operadores de Schrödinger
dado que
⎧
1
⎨γ " 2 ,
⎪ se n=1,
γ>0, se n=2, (10B.3)
⎪
⎩
γ"0, se n"3,
em que
que é facilmente verificado realizando uma integração por partes. Neste ponto, antes de avançar-
mos com a prova, vamos abrir um parêntese para lembrar, de forma breve, uma caracterização
mais geral de um operador integral do tipo Hilbert-Schmidt usando a noção do traço de um
operador. Começamos com a
DEFINIÇÃO 10.6. Um operador; linear K definido no espaço de Hilbert separável H é deno-
minado classe traço se a série ℓ ⟨Φℓ , KΦℓ ⟩ converge e tem o mesmo valor em qualquer base
ortonormal {Φℓ }ℓ∈N de H . A soma
<
Tr K = ⟨Φℓ , KΦℓ ⟩ , (10B.5)
ℓ
é chamada o traço de K.
766
Operadores de Schrödinger
Lembremos que a fórmula do traço para matrizes finitas afirma que se A é uma matriz
;n n com autovalores
n × ;n λ1 , . . . , λn , contado de acordo com a multiplicidade, então, Tr A =
j=1 Ajj = j=1 λj . O traço de um operador linear K é uma generalização da noção usual
da soma dos elementos diagonais de uma matriz, mas como somas infinitas estão envolvidas,
nem todo operador tem um traço.
Nota 10.36. Deve-se ressaltar que todo operador linear K em um espaço de Hilbert H n-
dimensional tem um traço; isto é, se {Φ1 , . . . , Φn } e {Φ′1 , . . . , Φ′n } são quaisquer duas bases
ortonormais, a soma em (10B.5) é finita e a mesma em ambas as bases (verifique!). Entretanto,
no caso de dimensão infinita não podemos estabelecer, imediatamente, que a soma em (10B.5)
não depende da base empregada. A razão é que, ao lidar com múltiplas somas infinitas, a troca
da ordem das somas só é legítima se soubermos que a convergência das múltiplas somas é
incondicional. Este é o caso quando K é positivo-definido, ou seja, quando ⟨Φ, KΦ⟩ " 0 para
todo Φ ∈ H .
o que é heuristicamente uma extensão para o caso de dimensão infinita da definição usual do
traço de uma matriz como a soma de seus elementos diagonais. Todavia, esta fórmula não
segue imediatamente da expressão
$
KΦ(x) = dy K (x, y)Φ(y) . (10B.7)
Rn
Parte do folclore da física para se usar a Eq.(10B.6) como o análogo contínuo da fórmula do
traço para operadores integrais é assumir que |K (x, x)| é integrável, o que não é um fato geral.
Aqui, existe um ponto técnico que deve ser observado. A Eq.(10B.7) não define a função kernel
sobre a diagonal, em que x = y. A razão é que o conjunto de pontos sobre a diagonal em
Rn ×Rn é meramente um conjunto de medida zero.58 Para contornar este problema, exatamente
como no caso de dimensão finita, suponha que {λj }Jj=1 e {Φj }Jj=1 (J finito ou infinito) são os
auto-valores positivos, organizados em ordem de magnitude decrescente λ1 " λ2 " λ3 " · · · ,
e as auto-funções ortonormais, respectivamente, do operador de Hilbert-Schmidt K, com kernel
integral K ∈ L2 (Ω × Ω). Pelo Teorema 10.9, sabemos que o operador K é compacto. Então,
pelo Teorema 5.27, em termos dos auto-valores e das auto-funções ortonormais acima, pode-se
mostrar que o kernel tem a expansão canônica
J
< J
<
K (x, y) = λj Φj (x) ⊗ Φj (y) = λj Φj (x)Φj (y) , (10B.8)
j=1 j=1
58
Medida é uma generalização matemática precisa de comprimento, área e volume. Portanto, neste sentido, um
conjunto de medida zero é aquele com volume zero, quase sem interior. Você pode compreender intuitivamente
que na reta real um intervalo [a, b] tem medida b − a, enquanto, por comparação, um único ponto tem medida
zero, embora o intervalo seja composto de um conjunto de pontos. Um conjunto com medida de Lebesgue zero é
tão pequeno que tem menos medida do que qualquer intervalo. Do ponto de vista da integral de Lebesgue, isso
significa que quando você integra funções, tais conjuntos não contribuem, no sentido de que se você modificar o
domínio de integração por um conjunto de medida zero, a integral permanece inalterada.
767
Operadores de Schrödinger
A prova da Proposição 10.16 pode ser encontrada no livro de D. Borthwick, “Spectral Theory:
Basic Concepts and Applications,” Springer, 2020, pg.94.
O seguinte teorema estabelece em que condições a Eq.(10B.6) pode ser considerada o análogo
contínuo da fórmula do traço para operadores integrais.
TEOREMA 10.36. Suponha que Ω ⊂ Rn seja um domínio limitado e K um operador integral
em L2 (Ω) definido por
$
KΦ(x) = dy K (x, y)Φ(y) ,
Ω
em que K (x, y) é uma função contínua em Ω × Ω. Suponha que K (x, y) satisfaz as seguintes
condições:
Sejam {λj }Jj=1 e {Φj }Jj=1 os auto-valores positivos e as auto-funções ortonormais de K, respec-
tivamente. Então,
$ <J
Tr K = dx K (x, x) = λj ,
Ω j=1
Demonstração. Sejam {λj }Jj=1 e {Φj }Jj=1 os auto-valores positivos e as auto-funções ortonor-
mais de K, respectivamente. Uma vez que λℓ " 0, o teorema da convergência monótona
implica que
$ ( J ) J J
< < <
2 2
dx λj |Φj (x)| = λj ∥Φj ∥2 = λj .
Ω j=1 j=1 ℓ=1
768
Operadores de Schrödinger
Assim, os valores singulares do operador integral não-negativo K coincidem com seus auto-
valores.
Nota 10.37. O inverso do Teorema 10.36 não é verdadeiro. De fato, mesmo quando a integral
em (10B.6) é absolutamente convergente, essa fórmula não é suficiente para garantir que K
seja de classe traço. Consequentemente, qualquer tentativa de prova que faça tal suposição
deve ser tratada com extrema cautela. Do lado positivo, no entanto, B. Simon observa em seu
livro “Trace Ideals and Their Application,” Second Edition, Math. Survey sand Monographs 120,
Amer.
d Math. Soc., 2005, que se um operador de classe traço K tem kernel K satisfazendo
Rn
dx K (x, x) < ∞, então estamos “quase certos” (embora às vezes apenas após algum
esforço considerável) de que a fórmula (10B.6) é válida. Claro que esta afirmação, embora tran-
quilizadora, não é uma carta em branco que permite-nos fazer cálculos despreocupadamente!
Voltando à prova do Teorema 10.35, observamos que de acordo com o Princípio de Birman-
Schwinger e o Teorema 10.36
< $
2 α α
N(λ; (−∇ − V )− ) # µℓ (λ) # (Tr Kλ ) = dx Kλα (x, x) .
µℓ a.v. Kλ Rn
Portanto, temos
α/2 α/2
N(λ; (−∇2 − V− )) # Tr V− Gα V−
$
= dx V−α (x)Gα (0; λ) (10B.9)
Rn
, $ -$
1 1
= dk dx V−α (x) .
(2π)n Rn (∥k∥ + λ)α
2
Rn
Usando $ $ ∞
2π n/2
dk = dk k n−1 ,
Rn Γ(n/2) 0
segue que
$ $ ∞
1 1 1 1 2π n/2 1
dk = dk k n−1 .
(2π)n Rn (∥k∥2 + λ)α (2π)n λ(2α−n)/2 Γ(n/2) 0 (k 2 + 1)α
59
Veja o Teorema 4.5 no livro de E.H. Lieb e R. Seiringer, “The Stability of Matter in Quantum Mechanics,”
Cambridge University Press, 2010, pg.86.
769
Operadores de Schrödinger
Da Tabela de Integrais Gradshteyn-Ryzhik, Sétima Edição, Fórmula 3.241, 4.11 , pg.322, a última
integral é finita se, e somente se, α > n/2. Neste caso, obtemos
$ ∞
1 1 Γ(n/2)Γ(α − n/2)
dk k n−1 2 α
= .
0 (k + 1) 2 Γ(α)
Logo,
$
1 1 1 π n/2 Γ(α − n/2)
dk = .
(2π)n Rn (∥k∥2 + λ)α (2π)n λ(2α−n)/2 Γ(α)
Assim,
$
2 1 π n/2 Γ(α − n/2)
N(λ; (−∇ − V− )) # dx V−α (x) . (10B.10)
(2π)n λ(2α−n)/2 Γ(α) Rn
770
Operadores de Schrödinger
Consequentemente,
< $ 2V− $
2(2α−n)/2 π n/2 Γ(α − n/2)
λαj #γ dλdx λγ−α−1+n/2 (V− (x) − λ/2)α .
j"0
(2π)n Γ(α) 0 Rn
que é exatamente o que queríamos, exceto pela escolha de α. Aqui, notamos que para que a
integração na variável λ em (10B.11) seja finita, precisamos exigir que α < γ + n/2, enquanto
para que a integração na variável k em (10B.9) seja finita, temos que exigir que α > n/2.
Resumindo, precisamos que n/2 < α < γ + n/2. Ao escolher α = (γ + n)/2 quando n > 1
ou n = 1, γ " 1, e α = 1 quando n = 1, os valores dados no teorema são obtidos para
todos os casos, exceto para os casos críticos n = 1, γ = 1/2 e n " 3, γ = 0. O caso
especial γ = 0, correspondendo à Desigualdade CLR (Teorema 10.13), não é coberto diretamente
no desenvolvimento acima. A prova para γ = 1/2, n = 1 veio muito depois, dada por T. Weidl,
no artigo “On the Lieb-Thirring Constants Lγ,1 for γ " 1/2,” Commun. Math. Phys. 178 (1996)
135.
60
Isto é possível pelo Teorema de Fubini.
771
Lista de Exercícios
Exercícios do Capítulo 1
773
Lista de Exercícios
& Exercício 1.10 (Distância entre funções contínuas). Seja C[0, 1] o espaço que consiste de
todas as funções contínuas definidas no intervalo fechado [0, 1]. Prove que as regras d1 , d2 e d3
definidas no Exemplo 1.3 satisfazem os axiomas de métrica. Sugestão: Se necessário, consulte a
bibliografia no final do livro!
& Exercício 1.11. Quais das seguintes funções são métricas em R?
a) d(x, y) = |x + y|;
A − B = {z | z = x − y para algum x ∈ A e y ∈ B} .
Mostre que
& Exercício 1.19. Seja M um conjunto sobre o qual está definida uma métrica e A e B
subconjuntos limitados de M. Mostre que diam (A ∪ B) # diam A + diam B + d(A, B).
774
Lista de Exercícios
& Exercício 1.20. Seja M um conjunto sobre o qual está definida! uma métrica e A e " B
subconjuntos limitados e não vazios de5 M. Ponha α(A, B)
5 = sup d(x, y) | x ∈ A, y ∈ B .
5 5
Mostre que, para todo z ∈ M tem-se d(z, A) − d(z, B) # α(A, B).
& Exercício 1.21. Seja M um conjunto abstrato e A ⊂ E. Prove que intA ∪ ∂A ∪ extA = E.
& Exercício 1.22. Dados A, B ⊂ M, mostre que:
a) B1 ⊂ B2 ⇒ f −1 (B1 ) ⊂ f −1 (B1 );
(i) ∅ ∈ F e U ∈ F ,
775
Lista de Exercícios
& Exercício 1.30. Uma coleção F de partes de um conjunto abstrato E (não necessariamente
espaço topológico) é um filtro se
a) ∅ ∈
/ F;
b) U, V ∈ F , então U ∩ V ∈ F ;
c) U ∈ F , então V ⊃ U, então V ∈ F .
n
< 5 5
′
d (x, y) = 5xi − yi 5 ,
i=1
5 5
d (x, y) = max 5xi − yi 5 ,
′′
1#i#n
definem a distância entre dois pontos. Mostre que para quaisquer x, y ∈ Rn tem-se
776
Lista de Exercícios
& Exercício 1.37. Demonstre que se xn ̸→ x, então existe uma bola aberta B(x; ε), de centro
x e raio ε > 0, tal que xn ∈/ B(x; ε) para um número infinito de índices n. Sugestão: Veja a
Proposição 1 e seu Corolário, no livro do Elon, “Elementos de Topologia Geral,” pg.108.
& Exercício 1.38. Prove a implicação inversa do Teorema 1.16.
& Exercício 1.39. Assuma que F é um subconjunto compacto do espaço Euclidiano Rn , então
prove a equivalência aludida no Exemplo 1.32.
& Exercício 1.40. Prove que Rn e Cn não são compactos.
& Exercício 1.41. Prove que um espaço métrico discreto (veja Exercício 1.9) consistindo de uma
infinidade de pontos não é compacto.
Exercícios do Capítulo 2
777
Lista de Exercícios
& Exercício 2.9. Mostre que um espaço vetorial X , munido com a métrica discreta
⎧
⎨0 se x = y
d(x, y) =
⎩1 se x = ̸ y
|a + b| |a| |b|
# + .
1 + |a + b| 1 + |a| 1 + |b|
Por exemplo, a classe de todas as sequências x = (xn )n∈N torna-se um espaço vetorial métrico,
chamado espaço-S, se definimos
<∞
1 |xn − yn |
d(x, y) = n 1 + |x − y |
.
n=1
2 n n
Mostre que: (i) o espaço-S é um espaço vetorial, (ii) o espaço-S é um espaço métrico e (iii)
o espaço-S não é um espaço normado. Sugestão: Use o fato que a função f (x) = x/(1 + x)
é monótona crescente para x " 0.
& Exercício 2.12. Com base nos Exs. 2.9-2.11 e no Teorema 2.5, em que situação um espaço
vetorial sobre o qual esteja definida uma métrica, tem a métrica obtida de uma norma?
& Exercício 2.13. Espaços Lp (Rn ) são classes de espaços de Banach cuja as normas são
definidas por integrais
F$ G1/p
p
∥f ∥p = |f | dµ ,
com 1 # p < ∞. Mostre que os espaços Lp (Rn ) são completos. Sugestão: Veja o livro do
Royden, “Real Analysis,” Third Edition, pg. 125!
& Exercício 2.14. Mostre que as funções definidas pelas Equações (2.3.1) e (2.3.2) satisfazem as
propriedades da norma.
& Exercício 2.15. Mostre que as propriedades (d), (f ) e (g) do Teorema 2.9 implicam que as
aplicações + e · são contínuas.
& Exercício 2.16. Sejam X um espaço vetorial sobre R e S um conjunto convexo em X .
Mostre que S é balanceado se, e somente se, ele é simétrico.
& Exercício 2.17 (Generalização do Teorema 4.7). Nem sempre um par de espaços vetoriais
topológicos n-dimensionais são homeomorfos. Se X é um espaço vetorial topológico n-
dimensional, uma topologia pode ser definida sobre X de tal forma que os únicos conjuntos
abertos sejam ∅ e X , e certamente X não é homeomorfo a ℓ2 (n) (verifique!). Contudo, esta
situação anômala é evitada se tratamos com espaços do tipo-Tychonoff, ou espaços-T1 . Mostre
que espaços vetoriais topológicos do tipo-Tychonoff n-dimensionais, sobre o mesmo corpo de
escalares, são homeomorfos.
778
Lista de Exercícios
Exercícios do Capítulo 3
& Exercício 3.1. Mostre que a norma em um espaço de Hilbert é estritamente convexa; isto é,
se ∥x∥ = ∥y∥ = 1 e x ̸= y, então ∥x + y∥ # 2.
& Exercício 3.2. Mostre que em um espaço de Hilbert ∥x − y∥ + ∥y − z∥ = ∥x − z∥ se, e
somente se, y = αx + (1 − α)z para algum α ∈ [0, 1].
& Exercício 3.3. Seja X um subconjunto de Rn . Tome, para η ∈ Rn ,
HX (η) = sup ⟨η, x⟩ .
x∈X
! " !
Tome X ′ = η ∈ Rn | HX (η) # 1 e X ′′ = x ∈ Rn | supη∈X ′ ⟨η, x⟩ # 1}. Prove que
X ′ é convexo, que X ′′ é o envelope convexo de X e que HX ′′ (η) = HX (η).
& Exercício 3.4. Sejam X1 , . . . , Xn espaços vetoriais com um produto interno. Mostre que
[ \
[x1 , . . . , xn ], [y1 , . . . , yn ] = ⟨x1 , y1⟩ + · · · + ⟨xn , yn ⟩ ,
define um produto interno em X = X1 × · · · × Xn . Se X1 , . . . , Xn são espaços de Hilbert,
mostre que X é um espaço de Hilbert com a norma definida por
H
∥[x1 , . . . , xn ]∥ = ∥x1 ∥2 + · · · + ∥xn ∥2 .
& Exercício 3.5. Complete a prova do Teorema 3.2 mostrando que o produto escalar ⟨x, y⟩
(mais as leis algébricasH
para o produto escalar, como descritas pelas propriedades na Definição
3.1) e a norma ∥x∥ = ⟨x, x⟩ em H podem ser estendidos e comprovados como válidos em
H por um processo de passar ao limite.
& Exercício 3.6. Prove o Teorema 3.3 para o caso em que H é um espaço de Banach complexo.
& Exercício 3.7. Seja M um subespaço fechado do espaço de Hilbert H . Prove que H /M
é isomorfo a M ⊥ = {0}.
& Exercício 3.8. Prove que o Teorema da Projeção não vale se M não é um subespaço fechado
do espaço de Hilbert H .
& Exercício 3.9. Mostre que em um espaço de Hilbert de dimensão finita a convergência fraca
implica a convergência forte.
& Exercício 3.10. Se (an )n∈N é uma sequência ortonormal em um espaço de Hilbert H e
(αn )n∈N é uma sequência em ℓ2 , mostre que existe x ∈ H tal que
? ?
⟨x, an ⟩ = αn e ?(αn )n∈N ? = ∥x∥ ,
? ?
onde ?(αn )n∈N ? denota o norma em ℓ2 .
& Exercício 3.11. Seja {e1 , . . . , en } um conjunto ortonormal em um espaço de Hilbert H ,
onde n é fixo. Seja x ∈ H qualquer elemento fixo e y = α1 e1 + · · · + αn en . Então, ∥x − y∥
depende dos coeficientes α, . . . , αn . Mostre, por cálculo direto, que ∥x − y∥ é mínimo se, e
somente se, αj = ⟨ej , x⟩, onde j = 1, . . . , n.
& Exercício 3.12. Seja (en )n∈N uma sequência ortonormal em um espaço de Hilbert H .
Mostre que para quaisquer x, y ∈ H a relação de completeza
<
⟨x, y⟩ = ⟨x, ei ⟩⟨ei , y⟩ ,
i∈I
779
Lista de Exercícios
& Exercício 3.13. Seja (en )n∈N uma sequência ortonormal em um espaço de Hilbert H .
Mostre que para quaisquer x, y ∈ H
<5 5
5⟨x, ei ⟩⟨ei , y⟩5 # ∥x∥∥y∥ .
i∈I
Exercícios do Capítulo 4
& Exercício 4.1. Sejam X , Y dois espaços vetoriais sobre o mesmo corpo K e A um operador
linear de X para Y . Mostre que, Ker(A) é um subespaço linear de Dom(A) e que Ran(A)
é um subespaço linear de Y .
& Exercício 4.2. Seja X um espaço vetorial. Associe com cada a ∈ X e cada escalar λ ̸= 0
o operador de translação Ta e o operador multiplicação Mλ pelas fórmulas
Ta (x) = x + a , Mλ (x) = λx (x ∈ X ) .
Mostre que o operador Mλ é linear, enquanto que o operador Ta não, exceto quando a = 0.
& Exercício 4.3 (Outra forma de descrever operadores lineares limitados). Seja A um
operador linear mapeando o espaço vetorial normado X no espaço vetorial normado Y .
Mostre que A é limitado se, e somente se, A mapea conjuntos limitados em X em conjuntos
limitados em Y .
& Exercício 4.4. Seja A : X → R um funcional linear contínuo no espaço vetorial normado
X . Mostre que A é limitado em toda bola aberta
! "
B(x0 ; r) = x ∈ X | ∥x − x0 ∥ < r ⊂ X ,
mas não atinge seu inf nem seu sup em B(x0 ; r).
& Exercício 4.5. Sejam H = L2 (0, 1),√ o espaço de funções de quadrado integrável definidas
no intervalo I = (0, 1) e φn (x) = 2 sin nπx, n = 1, 2, 3, . . .. Mostre que φn converge
fracamente para zero, mas não fortemente. Sugestão: Como L2 (0, 1) é auto-dual, qualquer
função f caracteriza um funcional linear limitado sobre L2 (0, 1).
& Exercício 4.6. Mostre que se um operador A é invertível e os vetores x1 , . . . , xn são
linearmente independente, então Ax1 , . . . , Axn são linearmente independentes. Mostre que se
os operadores A e B são invertíveis, então o operador AB é invertível e temos (AB)−1 =
B −1 A−1 .
& Exercício 4.7. Seja (en )n∈N um sistema ortonormal completo em um espaço de Hilbert H
e (λn )n∈N uma sequência de escalares. Mostre que (i) existe um único operador T sobre H
tal que T en = λn en ; (ii) que T é limitado se, e somente se, a sequência (λn )n∈N é limitada.
780
Lista de Exercícios
& Exercício 4.8. Mostre que se {e1 , e2 , . . .} é uma base ortonormal em um espaço de Hilbert
H e U um operador unitário em H , então, {U e1 , U e2 , . . .} também é uma base ortonor-
mal. Reciprocamente, mostre que se {e1 , e2 , . . .} e {e′1 , e′2 , . . .} são duas bases ortonormais
em H , então, existe um único operador unitário U tal que e′κ = U eκ , com κ ∈ N.
& Exercício 4.9. Prove as seguintes propriedades do operador adjunto (é assumido que os
domínios de todos os operadores considerados são densos em H e que A e B são operadores
de H1 em H2 ):
781
Lista de Exercícios
Suponha agora que A é 5um operador simétrico em H cujo domínio contém a soma direta
finita dos Hj e tal que A5Hj = Aj . Mostre que A é essencialmente auto-adjunto, Dom(A)
N =
∗
Dom(A ) = V , e
N = A∗ Ψ = (A1 ψ1 , A2 ψ2 , . . .) ,
AΨ ∀ Ψ = (ψ1 , ψ2 , . . .) ∈ V .
& Exercício 4.17 (Fórmula de von Neumann). Sabemos do Teorema 4.28 que todo vetor
w ∈ Dom(A∗ ) pode ser unicamente representável da forma
Mostre que
Im ⟨A∗ w, w⟩ = ∥y∥2 − ∥z∥2 .
Com base nesse resultado, decomponha o conjunto Dom(A∗ ) nos subconjuntos E0 , E− e E+
para os quais Im ⟨A∗ w, w⟩ é igual, menor, ou maior que zero. Então, mostre que um vetor
w ∈ Dom(A∗ ) situa-se em E0 , E− e E+ se Im ⟨A∗ w, w⟩ é igual, menor, ou maior que zero.
Esta afirmação segue da seguintes relações:
#2 d 2
H0 = − ,
2m dx2
definido no intervalo (a, b). Estude este operador em três situações distintas: num intervalo
finito, no semi-eixo e na reta real completa. Sugestão: Expresse as condições de contorno sobre
uma função Ψ ∈ Dom(H) em termos de quantidades de duas componentes
, - , -
Ψ(a) Ψ(b)
F (a) = e F (b) = ,
Ψ′ (a) Ψ′ (b)
com domínio
3 4
Dom(A) = Ψ ∈ L2 (a, b) | AΨ(x) ∈ L2 (a, b), Ψ(a) = Ψ(b) = 0 ,
é auto-adjunto.
& Exercício 4.20. Mostre que todo operador simétrico A é A2 -limitado, com limite relativo
igual a zero.
& Exercício 4.21. Considere o operador A = px2n+1 + x2n+1 p, onde p = −i#d/dx e n ∈ N.
Encontre os auto-valores e as auto-funções de A. Quais os índices de deficiência de A? O
espaço de Hilbert neste caso é L2 (−∞, ∞).
782
Lista de Exercícios
Exercícios do Capítulo 5
& Exercício 5.1. Seja A um operador linear limitado em um espaço de Hilbert complexo H .
Mostre que o espectro de A∗ é o complexo conjugado do espectro de A, isto é, σ(A∗ ) = {λ |
λ ∈ σ(A)}.
& Exercício 5.2. Seja X = C[0, 1] o espaço vetorial formado pelas funções complexas con-
tínuas no intervalo 0 # x # 1, com a norma do supremo. Considere o operador linear
A : X → X definido por
$ x
Aϕ(x) = dy f (y) , 0 # x # 1 .
0
Mostre que σ(A) = σres (A) = {0}. Sugestão: Consulte o livro do Nivaldo A. Lemos, “Convite
à Física Matemática,” pg.402.
& Exercício 5.3. Use a primeira identidade do resolvente junto com a expressão (5.2.13) para
mostrar que se A é um operador limitado, então, e(s+t)A = esA · etA . Sugestão: Escolha dois
círculos C1 e C2 em torno do origem, com C1 dentro de C2 , de raios R1 e R2 , respectivamente,
maiores que ∥A∥ e use a fórmula integral de Cauchy.
& Exercício 5.4. Seja H um espaço de Hilbert complexo. Mostre que para um operador A
comutar com um operador limitado B que está definido em todo H , é necessário que B
comute com o resolvente Rλ (A) = (A − λ1I)−1 para todo valor regular λ, e é suficiente que
B e Rλ (A) comutem pelo menos para um valor regular λ.
& Exercício 5.5. Assuma que ϕn é uma auto-função normalizada de um operador auto-adjunto
A com σ(A) = σd (A), isto é, o espectro de A é puramente discreto. Mostre que o operador
Pn Ψ = ⟨ϕn , Ψ⟩ϕn é um operador projeção e que A pode ser escrito da seguinte forma:
<$ <
AΨ = dx λn ϕn (x)Ψ(x)ϕ(x) = λn Pn Ψ .
n n
& Exercício 5.6. Mostramos no Exemplo 5.7 que quando V = 0 o espectro do operador
hamiltoniano
#2 d 2
H0 = − ,
2m dx2
atuando em H = L2 (R) é σ(H0 ) = [0, ∞). Agora, queremos determinar o espectro de
H = H0 + V em algumas situações particulares. Assumindo que Dom(H) = Dom(H0 ),
mostre que
(i) se V (x) " b para todo x, então todo λ < b pertence ao conjunto ρ(H), isto é,
(−∞, b) ⊂ ρ(H);
(ii) se V (x) = b, uma constante, sobre um intervalo ilimitado I ∈ R, então todo λ " b
pertence ao conjunto σ(H), isto é, [b, ∞) ⊂ σ(H).
& Exercício 5.7. Use o exercício anterior para determinar os conjuntos ρ(H) e σ(H) no caso
quando
⎧
⎨b1 se x < a
V (x) = .
⎩b se x > a
2
783
Lista de Exercícios
& Exercício 5.8. Use o Teorema Minimax para mostrar que se A " B " 0 para operadores
compactos A e B, então, λn (A) " λn (B) for each n, em que λn (A) e λn (B) são os
auto-valores de A e B, respectivamente.
& Exercício 5.9. Suponha que Ax = νx. Mostre que
⎧
` ` ⎨x se ν = λ
1 1 −1
Pλ x = dµ Rµ (A)x = dµ (ν − µ) x = .
2πi |µ−λ|=r 2πi |µ−λ|=r ⎩0 se ν ̸= λ
(i)
$
1= > 1 λ2 = >
P [λ1 , λ2 ] + P (λ1 , λ2 ) = s − lim+ dλ Rλ+iε (A) − Rλ−iε (A) ,
2 ε→0 2πi λ1
(ii)
$ λ2 −δ = >
1
P (λ1 , λ2 ) = s − lim+ s − lim+ dλ Rλ+iε (A) − Rλ−iε (A) ,
δ→0 ε→0 2πi λ1 +δ
784
Lista de Exercícios
Exercícios do Capítulo 6
& Exercício 6.1. Mostre que o suporte da derivada de uma distribuição T está contido no
suporte de T .
& Exercício 6.2. Mostre que o espaço D(Rn ) é denso em E (Rn ).
2 2
& Exercício 6.3. Verifique que as funções e−x , P (x)e−x , onde P (x) é um polinômio, e
2 4
(1 − x5 )ecos x −x são elementos de S (R).
& Exercício 6.4. Verifique se a função e−t|x| , t > 0, é um elemento de S (R).
& Exercício 6.5. Prove que S (Rn ) é um espaço métrico completo quando munido da distância
< ∥f − g∥α,β
d(f , g) = 2−(|α|+|β|) ,
α,β
1 + ∥f − g∥ α,β
(ii) De posse dessa particular representação, mostre que os geradores satisfazem à seguinte
relação de comutação
[Σαβ , Σµν ] = gαν Σβµ + gβµ Σαν − gαµ Σβν − gβν Σαµ , (10.10.2)
que corresponde à álgebra de Lie do grupo SO(1, 3).
785
Lista de Exercícios
(i) Comutatividade: f ∗ g = g ∗ f ;
(ii) Associatividade: f ∗ (g ∗ h) = (f ∗ g) ∗ h;
∂ ∂f ∂g
(v) Diferenciação: ∂xi
(f ∗ g)(x) = ∂xi
∗g =f ∗ ∂xi
.
& Exercício 6.17. Mostre que se duas distribuições de T , S ∈ D ′ (Rn ) satisfazem a condição
de suporte, então, o produto de convolução T ∗ S é uma distribuição em Rn , bem definida pela
fórmula (6.9.2).
& Exercício 6.18. Mostre que as convoluções δ ∗ f e (Dδ) ∗ f são bem definidas. Isto segue
do fato que δ e Dδ são concentradas em um ponto. Com base sobre o que sabemos sobre
o produto de funcionais, mostre que a convolução para duas distribuições é comutativa (no
mínimo sob as circunstâncias acima).
& Exercício 6.19. Mostre que a convolução não é uma operação associativa para distribuições.
Sugestão: Calcule (1 ∗ δ) ∗ θ e 1 ∗ (δ ∗ θ) e mostre que (1 ∗ δ) ∗ θ ̸= 1 ∗ (δ ∗ θ). (Este
exercício deixa claro que a operação de associatividade é válida para distribuições se duas das
três distribuições são de suporte compacto, ou se as três têm suporte compacto.)
S
& Exercício 6.20. Mostre que se a sequência (ϕk )k∈N ⊂ S (Rn ) é tal que ϕk −→ ϕ, então
S
^k −→ ϕ.
ϕ ^
& Exercício 6.21. Mostre que a distribuição delta de Dirac pertence ao espaço de Sobolev
Hs (Rn ) se s < − n2 .
& Exercício 6.22. Mostre que e−|x| ∈ Hs (R) se s < 32 .
& Exercício 6.23. Seja a > 0. Mostre que χ[−a,a] ∈ Hs (R) se s < 12 . Aqui χ[−a,a] é a função
característica associada ao intervalo fechado [−a, a].
& Exercício 6.24. Seja Ω um subconjunto aberto em Rn . Mostre que se u ∈ D ′ (Ω) e
−∞ < s < ∞, então ψu ∈ Hs (Rn ) para todo ψ ∈ D(Ω).
& Exercício 6.25. Sejam r, s números reais arbitrários, com s > r. Mostre que S ⊂ Hs ⊂
Hr ⊂ S ′ e que os mapeamentos identidade S → Hs → Hr → S ′ são contínuos. Mostre
também que S é denso em Hs , para todo s ∈ R.
& Exercício 6.26 (Propriedades essenciais do operador potencial de Riesz). Considere o
operador potencial de Riesz definido na Seção 6.10. Mostre que, para todo ϕ ∈ S (Rn ), (i)
Iα (Iβ ϕ) = Iα+β ϕ para α, β > 0, com α + β < n, (ii) ∇(Iα ϕ) = Iα (∇ϕ) = −Iα−2 ϕ, para
2 # α < n.
786
Lista de Exercícios
& Exercício 6.27 (Inverso do Teorema 6.22). Mostre que se (6.12.4) acontece, então o suporte
de u está contido na bola de raio R.
& Exercício 6.28. Encontre o conjunto de frente de ondas da seguinte função:
b
1 para |x1 | # 1, |x2 | # 1
u(x1 , x2 ) = .
0 em toda parte
& Exercício 6.29. Mostre que W F (P u) ⊆ W F (u) se P é um operador diferencial linear,
isto é, que a diferenciação não “aumenta” o conjunto de frente de ondas de u.
& Exercício 6.30. Mostre que, do ponto de vista das distribuições,
d ln |x|
= P(1/x) .
dx
& Exercício 6.31. Seja T uma distribuição temperada em Rn , que é homogênea de grau a.
Mostre que sua transformada de Fourier é homogênea de grau −n − a.
& Exercício 6.32. Seja t uma distribuição temperada em Rn \ {0}, que é homogênea de grau
s = ℓ. Mostre que sua extensão T para Rn é dada por
< <
Tλ = λℓ+n T + cα λℓ+n (1 − λℓ−|α| )D α δ + ln λ dα D α δ ,
|α|#ℓ |α|#ℓ
onde definimos Tλ como sendo o funcional T atuando sobre a função teste ϕλ . Sugestão:
Consulte o livro do L. Hörmander, “The Analysis of Linear Partial Differential Operators I,”
Springer Verlag, Second Edition, 1990, pg.76.
& Exercício 6.33. Mostre que
$ ∞
^ eikx
f (k) = lim dx = −2πiθ(−k) .
ε→0 −∞ x + iε
Sugestão: Observe que neste caso, o pólo foi deslocado para baixo por meio de uma quantidade
infinitesimal ε, e que para o Lema de Jordan valer devemos ter k < 0 e CR no semi-plano
inferior Imz < 0. Além disso, a orientação da curva C deve ser tomada no sentido negativo,
isto é, no sentido horário.
Exercícios do Capítulo 7
787
Lista de Exercícios
Exercícios do Capítulo 8
& Exercício 8.1. Mostre que um semi-grupo fortemente contínuo T (t), com t " 0, em espaço
de Hilbert H tem a seguinte propriedade: para todo ω > ω0 , existe uma constante Mω tal que
para cada t " 0 temos ∥T (t)∥ # Mω eωt . A constante ω0 é chamada de limite de crescimento
do semi-grupo. Quando Mω = 1 e ω = 0 nós temos o semi-grupo de contração. Mostre que a
desigualdade ∥T (t)∥ # Mω eωt não precisa ser válida para ω = Ω0 .
& Exercício 8.2. Seja T (t), com t " 0, um semi-grupo-C0 em espaço de Hilbert H . (a) Seja
λ ∈ C. Mostre que eλt T (t) também é um semi-grupo-C0. Qual é o limite de crescimento deste
semi-grupo? (b) Prove que o gerador infinitesimal de eλt T (t) é λ1I + A, onde A é o gerador
infinitesimal de T (t).
& Exercício 8.3. Seja A0 um operador auto-adjunto e não-negativo em um espaço de Hilbert
H . Prove que −A0 é o gerador infinitesimal de um semi-grupo de contração em H .
& Exercício 8.4. Seja A o gerador infinitesimal do semi-grupo-C0 T (t), com t " 0, em espaço
de Hilbert H . Prove que T (t) é um semi-grupo de contração se, e somente se,
788
Lista de Exercícios
∥HΨ∥2 # 2 ∥H 2Ψ∥∥Ψ∥ ,
para algum λ ∈ R+ . Sugestão: Veja o livro de J. Goldstein “Semigroups of Linear Operators and
Aplications, Dover Edition, 2017, pg.65.
& Exercício 8.11. Mostre que A gera um grupo-C0 de isometria se, e somente se, A e −A
geram semigrupos-C0 de contração em um espaço de Hilbert H . Para tal A e para Ψ ∈
Dom(A2 ), mostre que
∥AΨ∥2 # ∥A2 Ψ∥∥Ψ∥ .
Exercícios do Capítulo 10
& Exercício 10.1. Mostre que o operador momentum P definido sobre S (R) é essencialmente
auto-adjunto.
& Exercício 10.2. Seja B um campo magnético em R3 dado por um potencial vetor A : R3 →
R3 , com A ∈ C 1 (R3 ), tal que B = ∇ × A. Considere uma partícula no campo magnético
B. O hamiltoniano do sistema é dado pela expressão (bem conhecida)
1 6 e 72
H= −i#∇ − A .
2m c
Suponha que A e todas as suas derivadas são funções limitadas. Mostre que o hamiltoniano
acima é auto-adjunto no domínio Dom(H0 ).
& Exercício 10.3. Seja B um campo magnético constante em R2 dado por um potencial vetor
A : R2 → R2 , com A ∈ C 1 (R2 ), tal que B = ∇ × A. Assuma que B > 0. Mostre que o
hamiltoniano
1 6 e 72
H= −i#∇ − A ,
2m c
∞ 2
restrito ao espaço C0 (R ) satisfaz a desigualdade
$
⟨Ψ, HΨ⟩ " dx B(x)|Ψ(x)|2 , ∀ Ψ ∈ C0∞ (R2 ) .
R2
789
Lista de Exercícios
1. Potencial de Hulthén
1
VH (x) = .
e∥x∥−1
2. Potencial de Morse
VM (x) = −2e−2∥x∥ + e∥x∥ .
790
Lista de Exercícios
& Exercício 10.13. Em R3 , seja V uma função da classe R de Rollnik – ver Nota 10.6. Mostre
1/2
que se Ψ ∈ Dom(H0 ) ⊂ Dom(|V |1/2 ), então, existe um a < 1 tal que
1/2
∥|V |1/2 Ψ∥ # a∥H0 Ψ∥ + aλ∥Ψ∥ .
& Exercício 10.14. Seja p = 2 se n # 3, p > 2 se n = 4 e p > n/2 se n " 5. Assuma que V
em Rn satisfaz as seguintes condições:
791
Lista de Exercícios
& Exercício 10.19. Seja V uma função valorada no conjunto dos reais e H0 -limitada, com
limite relativo menor que 1. Mostre que H0 + V não tem auto-valores positivos se no mínimo
uma das seguintes condições são satisfeitas:
(i) V satisfaz as hipóteses do Exercício 10.18 e V é repulsivo, isto é, V (αx) # V (x) para
todo x ∈ Rn e todo α > 1;
(ii) V é homogêneo de grau −s, onde 0 < s < 2, isto é, V (αx) = α−s V (x);
(iii) V satisfaz as hipóteses do Exercício 10.18 e para algum b > 0, segue que
1
H0 − (1 + b)W − bV " 0 .
2
Enfatizamos que os potenciais neste exercício não requerem em nenhum momento que
V → 0 no infinito, Logo, este exercício pode ser aplicado para operadores de Schrödinger de
N-partículas. De fato, o Teorema 10.27 é um caso particular deste exercício, uma vez que o
potencial coulombiano tem grau de homogeneidade −1.
& Exercício 10.20 (Estado d’arte da função-trial). Determine a energia do estado fundamental
de um átomo de hidrogênio supondo que a função trial seja uma gaussiana da forma Ψ(r) =
2
Ne−(r/c) , onde N é a constante de normalização e c é um parâmetro variacional. Compare
o valor dessa energia com a energia exata do estado fundamental e verifique que o valor
encontrado é cerca de 2, 04 eV maior que a energia exata. Em outras palavras, este valor está
fora do valor mínimo em cerca de 15%.
& Exercício 10.21. Vimos que a Desigualdade de Cwikel-Lieb-Rozenbljum dá uma estimativa do
número de auto-valores negativos do operador de Schröndinger em Rn , para n " 3. Na outra
direção nós temos a seguinte situação: mostre que em Rn , para n = 1, 2, se
$
dx V (x) < 0 ,
Rn
para Φ ∈ Dom(H). Use que a derivada de ⟨Φε , HΦε ⟩ com respeito a ε é zero em ε = 0.
& Exercício 10.23. Considere o operador de Schrödinger H1atom para o átomo do hidrogênio.
Escolha uma função, Ψ ∈ C0∞ (R3 ) que satisfaz
3 4
∥Ψ∥ = 1 e supp Ψ ⊂ x ∈ R3 | 1 < ∥x∥ < 2 .
792
Lista de Exercícios
A seguir, considere (Ψn )n∈N uma sequência de funções trial normalizadas, com
! "
onde Ω = Ψ ∈ L2 (R3 ) | ∇2 Ψ, ∥ · ∥−1 Ψ ∈ L2 (R3 ) . Lembre-se de que E1 = −1/2 (o estado
fundamental é Ψ(x) = e−c∥x∥ ). (i) Prove que E2 # E1 − be−c∥x0 ∥ , para todo x0 ∈ R3 ; (ii)
determine b. Sugestão: escolha uma função trial adequada. (iii) Prove que existem constantes
d, R > 0 tais que E2 " E1 − d∥x0 ∥−1 , para todo ∥x0 ∥ " R. Sugestão: use a fórmula IMS.
& Exercício 10.26. Considre H = −∇2 + V em L2 (R3 ), e suponha que V− ∈ L5/2 (R3 ).
Sejam −λj , com λj > 0, os auto-valores negativos de H. Use o Limite de Birman-Schwinger
(10.3.4), a Desigualdade de Hardy-Littlewood-Sobolev (10A.1) com p = r = 2 e a Eq.(10B.4) para
mostrar que $
< 5/2
λj # C dx V− (x) ,
j R3
em que C é uma constante a ser determinada. Compare o valor de C encontrado com o valor
LT
de Cγ,n nas desigualdades de Lieb-Thirring.
& Exercício 10.27. Suponha que K seja um operador de Hilbert-Schmidt, com kernel integral
K ∈ L2 (Ω × Ω). Sejam {λj }j∈J e {Φj }j∈J os auto-valores positivos, organizados em
ordem de magnitude decrescente λ1 " λ2 " λ3 " · · · , e as auto-funções ortonormais de K,
respectivamente. Pelo Teorema 10.9, sabemos que o operador K é compacto. Use o Teorema
5.27 para mostrar que em termos dos auto-valores e das auto-funções ortonormais, o kernel tem
a expansão canônica
∞
<
K (x, y) = λj Φj (x)Φj (y) ,
j=1
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