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Informativo 998-STF
Márcio André Lopes Cavalcante
ÍNDICE
DIREITO CONSTITUCIONAL
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
▪ Viola a liberdade de expressão a decisão de retirar da Netflix o especial de Natal do Porta dos Fundos porque seu
conteúdo satiriza crenças e valores do cristianismo.
LIBERDADE PROFISSIONAL
▪ É válida a norma da CVM que impõe a rotatividade de auditores independentes.
DIREITOS SOCIAIS
▪ Não é possível atrelar-se ao salário mínimo o valor alusivo a benefício social e os respectivos critérios de admissão.
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
▪ É possível que uma emenda constitucional seja julgada formalmente inconstitucional se ficar demonstrado que ela
foi aprovada com votos “comprados” dos parlamentares e que esse número foi suficiente para comprometer o
resultado da votação.
COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS
▪ É inconstitucional norma de iniciativa parlamentar que preveja a criação de órgão público e organização
administrativa.
DIREITO ADMINISTRATIVO
SERVIDORES PÚBLICOS
▪ Lei estadual não pode prever paridade e integralidade para os policiais civis nem conceder a eles adicional de final
de carreira para que recebam aposentadoria em classe superior ao que estavam na ativa.
▪ A vedação da SV 37 se aplica tanto para as verbas remuneratórias como também para as parcelas de caráter
indenizatório.
▪ Judiciário não pode obrigar que o chefe do Poder Executivo encaminhe o projeto de lei para revisão geral anual dos
servidores.
DIREITO CONSTITUCIONAL
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
Viola a liberdade de expressão a decisão de retirar da Netflix o especial de Natal do Porta dos
Fundos porque seu conteúdo satiriza crenças e valores do cristianismo
A questão foi apreciada pela 2ª Turma do STF? O que foi decidido? O filme pode continuar na Netflix?
SIM.
Retirar de circulação produto audiovisual disponibilizado em plataforma de “streaming” apenas porque
seu conteúdo desagrada parcela da população, ainda que majoritária, não encontra fundamento em
uma sociedade democrática e pluralista como a brasileira.
STF. 2ª Turma. Rcl 38782/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 3/11/2020 (Info 998).
Liberdade de expressão
A obra não incita a violência contra grupos religiosos. Trata-se de mera crítica, realizada por meio de sátira
a elementos do Cristianismo.
Por mais questionável que possa vir a ser a qualidade da produção artística, não se identifica, em seu
conteúdo, fundamento que justifique qualquer tipo de ingerência estatal.
A liberdade de expressão artística está em posição preferencial em relação às demais liberdades. Eventual
colisão entre ela e outros direitos constitucionalmente garantidos deve levar em conta o fato de que o
conceito de arte tem sentido amplo, incluindo-se aí obras provocativas, que pretendem atingir fins
políticos ou religiosos também por meio de sátiras.
Somente seria possível proibir a exibição do conteúdo se fosse caracterizado ato ilícito de incitação à
violência ou violador de direitos humanos, o que não se verificou no caso.
Há diversas formas de indicar descontentamento com determinada opinião e de manifestar-se contra
ideais com os quais não se concorda — o que, em verdade, nada mais é do que a dinâmica do chamado
“mercado livre de ideias”. A censura, com a definição de qual conteúdo pode ou não ser divulgado, deve-
se dar em situações excepcionais, para que seja evitada, inclusive, a ocorrência de verdadeira imposição
de determinada visão de mundo.
Classificação indicativa
Vale ressaltar, ainda, que a Netflix cumpre as exigências das normas de classificação indicativa e apresenta,
de forma clara ao seu público, aviso etário, de gênero e demais informações que permitem a escolha
individual da programação, conforme o art. 76 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e as
recomendações contidas na ADI 2404.
Censura
A censura, com a definição de conteúdos que podem ser divulgados, deve se dar em situações
excepcionais, para evitar verdadeira imposição de determinada visão de mundo.
Retirar de circulação material apenas porque seu conteúdo desagrada parcela da população, ainda que
majoritária, não encontra fundamento em uma sociedade democrática e pluralista como a brasileira.
Atos estatais, de qualquer de suas esferas de Poder, praticados sob a justificativa da moral e dos bons
costumes ou do politicamente correto, apenas servem para inflamar o sentimento de dissenso, de ódio
ou de preconceito.
LIBERDADE PROFISSIONAL
É válida a norma da CVM que impõe a rotatividade de auditores independentes
A Confederação Nacional do Comércio (CNC) ajuizou ADI contra alegando que esse o art. 31 atenta contra
os princípios constitucionais da livre iniciativa, da livre concorrência e da liberdade de exercício de
qualquer profissão ou atividade econômica.
A rotatividade dos auditores independentes visa assegurar os princípios constitucionais que regem a
ordem econômica (art. 170) e insere-se no âmbito de competência da CVM para regular e fiscalizar o
mercado de valores mobiliários.
A CVM tem poder de polícia em relação às atividades dos auditores independentes no mercado de valores
mobiliários, competência concedida pela Lei nº 6.385/76, que versa sobre o mercado de valores
mobiliários e cria a CVM.
A rotatividade não inviabiliza o exercício profissional, mas o regula, com base em decisão técnica adequada
à atividade econômica por ela regulamentada.
A norma é medida adequada para resguardar a idoneidade do auditor, “resguardando a imparcialidade
do trabalho de auditoria e protegendo os interesses dos investidores, do mercado de capitais e da ordem
econômica”.
Vale ressaltar, por fim, que o STF, ao julgar caso análogo, considerou constitucionais restrições impostas
aos auditores independentes por outros dispositivos da Instrução 308. Confira trechos da ementa desse
outro julgado:
(...) 1. O cerne da controvérsia diz respeito aos limites do poder regulamentar da CVM para editar, no
âmbito do mercado de valores mobiliários, normas que envolvem o exercício da atividade profissional de
auditor independente e das pessoas físicas e jurídicas a eles vinculadas.
2. O art. 23, II, e parágrafo único, e o art. 27, ambos da Instrução CVM 308/1999, vedam, ao auditor
independente e às pessoas físicas e jurídicas a ele ligadas, a prestação de consultoria às mesmas empresas
em que estejam realizando auditoria.
3. A Comissão de Valores Mobiliários - CVM, criada pela Lei 6.385/1976, tem natureza de entidade
autárquica em regime especial, vinculada ao Ministério da Fazenda, e é legalmente responsável pela
supervisão, disciplina e fiscalização do mercado brasileiro de valores mobiliários.
4. A Lei 6.385/1976 conferiu à CVM competência para o exercício do poder de polícia, no âmbito do
mercado de valores mobiliários, inclusive no que tange às atividades de auditoria e aos serviços de
consultoria. Essa competência específica da CVM de regular os serviços de auditoria e consultoria, que se
extrai da própria Lei 6.385/1976, inclui necessariamente a de definir, por meio de critérios técnicos e de
segurança, regras que preservem a objetividade e a independência da atuação do auditor no âmbito do
mercado de valores mobiliários.
5. As regras da IN 308/1999, antes de configurar qualquer afronta ao direito de livre exercício da profissão
ou da livre iniciativa, revelam medidas preventivas, adotadas no estrito cumprimento da função normativa
e reguladora da CVM, em benefício da sociedade, tudo em observância aos princípios que regem a ordem
econômica previstos no art. 170 da CF.
6. Recurso Extraordinário a que se dá provimento, para denegar a segurança pleiteada. Tema 969, fixada
a seguinte tese de repercussão geral:
“Os artigos 23 e 27 da Instrução 308/1999, da Comissão de Valores Mobiliários, ao estabelecerem
restrições razoáveis, proporcionais e adequadas ao exercício da atividade de auditoria independente,
prestada às companhias sujeitas à sua fiscalização, são constitucionais, à luz dos arts. 5º, incs. II e XIII, 84,
incs. II e VI, 87, parágrafo único e inc. II, 88, 170 e 174 da Constituição Federal de 1988 ".
STF. Plenário. RE 902261, Rel. Marco Aurélio, Relator p/ Acórdão: Alexandre de Moraes, julgado em
22/09/2020 (Repercussão Geral – Tema 969).
DIREITOS SOCIAIS
Não é possível atrelar-se ao salário mínimo o valor alusivo
a benefício social e os respectivos critérios de admissão
Lei estadual criou um benefício assistencial e previu que seu valor seria o do salário mínimo
vigente. Tal previsão, em princípio, viola o art. 7º, IV, da CF/88, que proíbe que o salário
mínimo seja utilizado como referência (parâmetro) para outras finalidades que não sejam a
remuneração do trabalho. No entanto, o STF afirmou que seria possível conferir interpretação
conforme a Constituição e dizer que o dispositivo previu que o valor do benefício seria igual
Informativo 998-STF (12/11/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 4
Informativo
comentado
ao salário mínimo vigente na época em que a lei foi editada (R$ 545). Após isso, mesmo o
salário mínimo aumentando nos anos seguintes, o valor do benefício não pode acompanhar
automaticamente os reajustes realizados sobre o salário mínimo, considerando que ele não
pode servir como indexador. Em suma, o STF determinou que a referência ao salário mínimo
contida na lei estadual seja considerada como um valor certo que vigorava na data da edição
da lei, passando a ser corrigido nos anos seguintes por meio de índice econômico diverso. Com
isso, o benefício continua existindo e será necessário ao governo do Amapá apenas reajustar
esse valor por meio de índices econômicos.
STF. Plenário. ADI 4726/AP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 10/11/2020 (Info 998).
Não é possível atrelar-se ao salário mínimo o valor alusivo a benefício social e os respectivos critérios
de admissão.
STF. Plenário. ADI 4726/AP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 10/11/2020 (Info 998).
No entanto, o STF, a fim de evitar que fosse declarada a inconstitucionalidade do dispositivo, conseguiu
“salvá-lo”, conferindo à lei uma interpretação conforme a Constituição.
Em outras palavras, o STF afirmou que, para que a lei do AP seja compatível com o art. 7º, IV, da CF/88
devemos interpretá-la da seguinte forma: na época em que foi instituído o benefício (em 2011), o valor
do auxílio era igual a metade do salário mínimo (metade de R$ 545). No entanto, mesmo o salário mínimo
aumentando nos anos seguintes, o valor do benefício não pode acompanhar automaticamente os
reajustes realizados sobre o salário mínimo, considerando que ele não pode servir como indexador.
Em suma, o STF determinou que a referência ao salário mínimo contida na lei estadual seja considerada
como um valor certo que vigorava na data da edição da lei, passando a ser corrigido nos anos seguintes
por meio de índice econômico diverso.
Com isso, o benefício continua existindo e será necessário ao governo do Amapá apenas reajustar esse
valor por meio de índices econômicos.
Alguns de vocês podem estar se perguntando: mas eu conheço um benefício assistencial, chamado de
LOAS (amparo assistencial), que é pago aos deficientes e idosos miseráveis e que é no valor de um salário
mínimo. Este benefício é previsto no art. 20 da Lei n. 8.742/93. Essa Lei viola o art. 7º, IV, da CF/88?
NÃO. Isso porque é a própria CF/88, em seu art. 203, V, que determina que esse benefício será pago no
valor de um salário mínimo. Veja:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família, conforme dispuser a lei.
Assim, não há problema se a própria CF/88 estabelecer vinculações a salário mínimo. Quem não pode
fazer isso é a lei sem respaldo constitucional.
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
É possível que uma emenda constitucional seja julgada formalmente inconstitucional se ficar
demonstrado que ela foi aprovada com votos “comprados” dos parlamentares e que esse
número foi suficiente para comprometer o resultado da votação
“Mensalão”
“Mensalão” foi um escândalo político segundo o qual, durante o primeiro mandato do Presidente Lula, o
Partido dos Trabalhadores (PT) teria pago a vários Deputados Federais a quantia mensal de R$ 30 mil para
que votassem os projetos da Câmara dos Deputados em favor do Governo Federal.
Em outras palavras, teria havido “compra de votos” ou “compra de apoio parlamentar”.
O esquema teria começado em 2002 e sido descoberto em 2005.
O Procurador-Geral da República ofereceu denúncia (AP 470) contra os envolvidos e diversas pessoas
foram condenadas.
Em suma, durante os anos de 2002 e 2005 alguns Deputados Federais foram “subornados” para votarem
medidas provisórias, projetos de lei e propostas de emenda constitucional.
Diante dessa constatação, indaga-se: eventual lei ou emenda constitucional aprovada nesse período e
que teve, para a sua aprovação, o cômputo de votos “comprados”, estaria maculada por vício formal a
ensejar a sua inconstitucionalidade?
Na doutrina, o primeiro a tratar sobre o assunto foi Pedro Lenza. Escreveu o autor:
“6.3.4. Vício de decoro parlamentar
Como se sabe e foi publicado em jornais, revistas etc., muito se falou em um esquema de compra
de votos, denominado “mensalão”, para votar de acordo com o governo ou em certo sentido.
(...)
O grande questionamento que se faz, contudo, é se, uma vez comprovada a existência de compra
de votos, haveria mácula no processo legislativo de formação das emendas constitucionais a
ensejar o reconhecimento da sua inconstitucionalidade.
Entendemos que sim, e, no caso, trata-se de vício de decoro parlamentar, já que, nos termos do
art. 55, § 1.º, “é incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento
interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção
de vantagens indevidas”.
Dito isso, cabe lembrar que, no julgamento da AP 470 (conhecida como “mensalão”), ficou
demonstrado o esquema de corrupção para compra de apoio político. (...)” (LENZA, Pedro. Direito
Constitucional Esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2020, p. 195-196).
ADI
A Associação dos Delegados de Polícia do Brasil – ADEPOL, invocando a argumentação acima exposta,
ajuizou ADI no STF pedindo a declaração de inconstitucionalidade formal de dispositivos da EC 41/2003 e
da EC 47/2005.
A autora alegou que as normas impugnadas estão maculadas pelo:
“vício insanável de violação de decoro parlamentar (CF, art. 55, § 1º) (…) [porque] a PEC 40/03 que
foi promulgada sob o n. 41/03 (Reforma da Previdência) somente foi aprovada em razão de um
conluio criminoso praticado por membros do Poder Executivo e do Poder Legislativo, conforme ficou
demonstrado de forma clara na Ação Penal n. 470.
(...)
A inconstitucionalidade formal estaria evidenciada “em razão da afronta ao princípio da moralidade
(CF, art. 37, caput, tendo em conta que o processo legislativo foi, inequivocadamente, imoral e
fraudado, como já ficou demonstrado nos presentes autos (venda de votos). Maculada, destarte, ‘a
essência do voto e o conceito de representatividade popular (CF, art. 1º, parágrafo único).”
Para o STF, em tese, é possível reconhecer a inconstitucionalidade com base nesse argumento?
Na teoria, sim.
Em tese, é possível o reconhecimento de inconstitucionalidade formal no processo constituinte
reformador quando eivada de vício a manifestação de vontade do parlamentar no curso do devido
processo constituinte derivado, pela prática de ilícitos que infirmam a moralidade, a probidade
administrativa e fragilizam a democracia representativa.
STF. Plenário. ADI 4887/DF, ADI 4888/DF e ADI 4889/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 10/11/2020
(Info 998).
Para que se tenha um “devido processo constituinte reformador”, é necessário que se respeite não apenas
as exigências expressas no art. 60 da Constituição Federal, sendo indispensável também que se observem
os princípios que legitimam a atuação das casas congressuais brasileiras.
Inclui-se, no devido processo legislativo, a observância dos princípios da moralidade e da probidade,
voltados a “impedir que os dispositivos constitucionais sejam objeto de alteração através do exercício de
um poder constituinte derivado distanciado das fontes de legitimidade situadas nos fóruns de uma esfera
pública que não se reduz ao Estado”.
Nesse sentido, o vício de corrupção da vontade do parlamentar e de seu compromisso com o interesse
público subverte o regime democrático e deliberativo adotado pela Constituição e ofende o devido
processo legislativo por contrariar o princípio da representação democrática que deve, obrigatoriamente,
nortear a produção de normas jurídicas.
Demonstrada a interferência ilícita na fase de votação pela prevalência de interesses individuais do
parlamentar, admite-se o reconhecimento de inconstitucionalidade formal de emenda constitucional ou
norma infraconstitucional.
Como se adota a presunção de legitimidade, deve-se comprovar o vício e sua influência na votação
Entretanto, de acordo com o princípio da presunção de inocência e da legitimidade dos atos legislativos,
há de se comprovar que a norma tida por inconstitucional não teria sido aprovada, se não houvesse o
grave vício a corromper o regime democrático pela “compra de votos”. Sem a demonstração inequívoca
de que sem os votos viciados pela ilicitude o resultado do processo constituinte reformador ou legislativo
teria sido outro, com a não aprovação da proposta de emenda constitucional ou com a rejeição do projeto
de lei, não se há declarar a inconstitucionalidade de emenda constitucional ou de lei promulgada.
COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS
É inconstitucional norma de iniciativa parlamentar que
preveja a criação de órgão público e organização administrativa
ADI
O Governador do Estado ajuizou ADI alegando que essa lei possuía um vício de iniciativa considerando que
não poderia ter sido proposta por um Deputado já que trata sobre estruturação e atribuições de órgãos
da administração pública, matéria que é de iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo, nos termos
do art. 61, § 1º, II, “e”, da CF/88.
Argumento contrário
Em defesa do ato normativo, a Assembleia Legislativa alegou que a lei que disponha sobre a estrutura e
atribuições de órgãos da administração pública não é mais de iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo.
Para a ALE isso mudou com a EC 32/2001, que alterou o art. 61, § 1º, II, “e”, da CF/88. Confira a mudança:
Antes da EC 32/2001 Depois da EC 32/2001
Art. 61. (...) Art. 61. (...)
§ 1º - São de iniciativa privativa do Presidente da § 1º - São de iniciativa privativa do Presidente da
República as leis que: República as leis que:
(...) (...)
II - disponham sobre: II - disponham sobre:
e) criação, estruturação e atribuições dos e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da
Ministérios e órgãos da administração pública. administração pública, observado o disposto no
art. 84, VI;
Perceba, portanto, que a EC 32/2001 retirou da alínea “e”, a expressão “estruturação e atribuições”.
Isso significa que a tese da ALE está correta? A EC 32/2001 acabou com a exigência de que o projeto de
lei que trate sobre estruturação e atribuições dos órgãos seja de iniciativa do chefe do Poder Executivo?
NÃO. O objetivo da EC 32/2001, ao retirar a expressão “estruturação e atribuições” não foi o de acabar
com a iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo para tratar sobre esses assuntos. Ao contrário.
A EC 32/2001 alterou também o art. 84, VI, da CF/88 passando a dizer que o chefe do Poder Executivo
pode dispor sobre estruturação e atribuições dos órgãos públicos por meio de DECRETO, desde que isso
não ocasione aumento de despesa. Veja a redação do art. 84, VI, da CF/88 dada pela EC 32/2001:
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
(...)
VI - dispor, mediante decreto, sobre:
a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de
despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos;
Desse modo, a intenção do constituinte reformador ao retirar a expressão “estruturação e atribuições” do art.
61, § 1º, II, “e” foi a de permitir que o chefe do Poder Executivo tratasse sobre esse tema sem a exigência de
lei, tanto que ele acrescentou, na alínea “e” a seguinte frase: “observado o disposto no art. 84, VI”.
Mas a lei pode continuar tratando sobre “estruturação e atribuições” dos órgãos públicos?
SIM. Não há nenhum problema. Mesmo com a previsão do art. 84, VI, da CF/88, a lei pode continuar
versando sobre esses assuntos. O que a EC 32/2001 fez foi dar a faculdade (possibilidade) de o chefe do
Poder Executivo editar um decreto, facilitando a tramitação do tema.
Ocorre que, se a lei for tratar sobre “estruturação e atribuições” dos órgãos públicos, essa lei deve ser de
iniciativa do Poder Executivo.
Em suma, para o STF, a correta interpretação que deve ser dada ao art. 61, § 1º, II, “e” c/c o art. 84, VI, da
CF/88 é a de que a iniciativa para leis que disponham sobre “estruturação e atribuições” dos órgãos
públicos continua sendo do Poder Executivo, não tendo a EC 32/2001 tido a intenção de retirar essa
iniciativa privativa. Ao contrário, tais matérias tanto são de interesse precípuo do Executivo que podem
ser tratadas por meio de Decreto.
Logo, a referida Lei do Amapá é inconstitucional por violar essa iniciativa privativa.
Em suma:
É inconstitucional, na acepção formal, norma de iniciativa parlamentar que prevê a criação de órgão
público e organização administrativa, levando em conta iniciativa privativa do Chefe do Executivo – arts.
25 e 61, § 1º, II, alíneas “b” e “e”, da CF/88.
STF. Plenário. ADI 4726/AP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 10/11/2020 (Info 998).
(Analista TRF1 2017 CEBRASPE) Lei estadual, de iniciativa parlamentar, que crie atribuições para
determinada secretaria do estado, deverá ser declarada inconstitucional por vício de iniciativa. (certo)
DIREITO ADMINISTRATIVO
SERVIDORES PÚBLICOS
Lei estadual não pode prever paridade e integralidade para os policiais civis
nem conceder a eles adicional de final de carreira para que recebam
aposentadoria em classe superior ao que estavam na ativa
Paridade
Um dos pontos polêmicos dessa lei foi que ela previu a paridade de vencimentos entre os policiais civis
ativos e inativos.
Princípio da paridade era uma garantia que os servidores públicos aposentados possuíam segundo a qual
todas as vezes que havia um aumento na remuneração percebida pelos servidores da ativa, esse
incremento também deveria ser concedido aos aposentados.
Ex.: João é servidor aposentado do Ministério da Fazenda, tendo se aposentado com os proventos do
cargo de técnico A1. Quando fosse concedido algum reajuste na remuneração do cargo técnico A1, esse
aumento também deveria ser estendido aos proventos de João.
No dicionário paridade significa a qualidade de ser igual. Assim, o princípio da paridade enunciava que os
proventos deveriam ser iguais à remuneração da ativa.
Os pensionistas, ou seja, os dependentes dos servidores públicos falecidos beneficiados com pensão por
morte também tinham direito à paridade. Ex.: João, quando faleceu, era servidor aposentado do
Ministério da Fazenda ocupante do cargo de técnico A1. Sua esposa passou a receber pensão por morte
em valor igual à remuneração do cargo de técnico A1. Se fosse concedido algum reajuste para o cargo de
técnico A1, esse aumento também deveria ser estendido à pensão por morte.
A regra da paridade estava prevista no art. 40, § 8º, da CF/88, incluído pela EC 20/1998.
Art. 40 (...)
§ 8º É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o
valor real, conforme critérios estabelecidos em lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº
41/2003)
A Constituição Federal garantia, até o advento da EC 41/2003, a paridade entre servidores ativos e
inativos, o que significava exatamente a revisão dos proventos de aposentadoria, na mesma proporção e
na mesma data, sempre que se modificasse a remuneração dos servidores em atividade, sendo também
estendidos aos aposentados e aos pensionistas quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente
concedidos aos servidores em atividade.
O § 8º do art. 40 da CF/88, na redação que lhe conferiu a EC 41/2003, substituiu a paridade pela
determinação quanto ao reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o
valor real, conforme critérios estabelecidos em lei.
De igual modo, a integralidade, que se traduz na possibilidade de o servidor aposentar-se ostentando os
mesmos valores da última remuneração percebida quando em exercício no cargo efetivo por ele
titularizado no momento da inativação, foi extinta pela mesma EC 41/2003.
É inconstitucional norma que preveja a concessão de “adicional de final de carreira” a policiais civis.
STF. Plenário. ADI 5039/RO, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 10/11/2020 (Info 998).
O art. 40, § 2º, da CF//, na redação dada pela EC 41/2003, dispõe que os proventos de aposentadoria e as
pensões, quando de sua concessão, “não poderão exceder a remuneração do respectivo servidor, no cargo
efetivo em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão”.
Assim, a remuneração do cargo efetivo no qual se der a aposentadoria é o limite para a fixação do valor
dos proventos.
É verdade que esse benefício existe para os policiais militares. No entanto, policiais civis e militares
possuem regimes de previdência distintos e, portanto, o fato de alguns deles conterem previsão quanto à
possibilidade de aposentadoria dos militares em classe imediatamente superior à que ocupava, quando
em atividade, não é fundamento legal para a extensão dessa vantagem aos policiais civis.
SERVIDORES PÚBLICOS
A vedação da SV 37 se aplica tanto para as verbas remuneratórias
como também para as parcelas de caráter indenizatório
Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar qualquer verba de
servidores públicos de carreiras distintas sob o fundamento de isonomia, tenham elas caráter
remuneratório ou indenizatório.
A vedação da Súmula Vinculante 37 se aplica tanto para as verbas remuneratórias como
também para as parcelas de caráter indenizatório. Logo, a SV 37 também proíbe que Poder
Judiciário equipare o auxílio-alimentação, ou qualquer outra verba desta espécie, com
fundamento na isonomia.
Súmula vinculante 37-STF: Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa,
aumentar vencimentos de servidores públicos sob fundamento de isonomia.
STF. Plenário. RE 710293, Rel. Luiz Fux, julgado em 16/09/2020 (Repercussão Geral – Tema 600)
(Info 998 – clipping).
João recorreu afirmando que o magistrado se equivocou. Isso poque a SV 37 fala em “aumentar
vencimentos”. Ocorre que o auxílio-alimentação não pode ser considerado “vencimentos” porque não
tem natureza remuneratória. Trata-se, ao contrário, de verba de caráter indenizatório.
A tese do autor foi acolhida pelo STF? É possível equiparar o auxílio-alimentação de servidores públicos
pertencentes a carreiras distintas com fundamento no princípio da isonomia?
NÃO.
Informativo 998-STF (12/11/2020) – Márcio André Lopes Cavalcante | 13
Informativo
comentado
A remuneração dos servidores está adstrita ao princípio da reserva legal, previsto no art. 37, X, da CF/88,
que exige lei específica para a fixação e alteração da remuneração dos servidores públicos:
Art. 37 (...)
X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente
poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso,
assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;
O princípio da separação dos poderes impõe competir ao legislador concretizar o princípio da isonomia,
vedado ao Judiciário atuar como legislador positivo (SV 37).
O auxílio-alimentação é verba de caráter indenizatório, que não se incorpora à remuneração. A despeito
disso, também deve se submeter ao princípio da reserva legal, assim como as demais verbas
indenizatórias.
O Poder Legislativo, detentor da função de legislar, deve observar diretrizes trazidas pela Constituição
para a fixação de todos os componentes do sistema remuneratório.
A equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço
público encontra óbice no art. 37, XIII, da CF/88:
Art. 37 (...)
XIII - é vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito
de remuneração de pessoal do serviço público;
Além disso, a Administração Pública depende da existência de recursos orçamentários para pagar seus
servidores e tem a despesa com pessoal limitada pela Lei de Responsabilidade Fiscal, conforme art. 169,
da CF/88, além de necessitar de prévia dotação orçamentária e autorização na lei de diretrizes
orçamentárias.
Assim, a jurisprudência do STF tem entendido que, independentemente da natureza, não cabe ao
Judiciário equiparar verbas com fundamento na isonomia.
Em suma:
Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar qualquer verba de servidores
públicos de carreiras distintas sob o fundamento de isonomia, tenham elas caráter remuneratório ou
indenizatório.
A vedação da Súmula Vinculante 37 se aplica tanto para as verbas remuneratórias como também para
as parcelas de caráter indenizatório. Logo, a SV 37 também proíbe que Poder Judiciário equipare o
auxílio-alimentação, ou qualquer outra verba desta espécie, com fundamento na isonomia.
STF. Plenário. RE 710293, Rel. Luiz Fux, julgado em 16/09/2020 (Repercussão Geral – Tema 600) (Info 998
– clipping).
(Analista PGE/PE 2019 CEBRASPE) Por força do princípio da isonomia, o Poder Judiciário poderá, por
meio de decisão judicial devidamente fundamentada, estender reajustes e aumentar vencimentos de
servidores públicos. (errado)
SERVIDORES PÚBLICOS
Judiciário não pode obrigar que o chefe do Poder Executivo
encaminhe o projeto de lei para revisão geral anual dos servidores
Importante!!!
O Poder Judiciário não possui competência para determinar ao Poder Executivo a
apresentação de projeto de lei que vise a promover a revisão geral anual da remuneração dos
servidores públicos, tampouco para fixar o respectivo índice de correção.
STF. Plenário. RE 843112, Rel. Luiz Fux, julgado em 22/09/2020 (Repercussão Geral – Tema 624)
(Info 998).
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que não viola o princípio
constitucional da isonomia, nem da revisão geral anual, a concessão de reajustes salariais setoriais com o
fim de corrigir eventuais distorções remuneratórias.
STF. 1ª Turma. ARE 993058 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 17/02/2017.
Aumento impróprio
“A revisão geral anual tem o objetivo, ao menos teoricamente, de recompor o poder de compra da
remuneração do servidor, corroído em variável medida pela inflação. Não se trata de aumento real da
remuneração ou do subsídio, mas apenas de um aumento nominal – por isso chamado, às vezes, ‘aumento
impróprio’” (ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo descomplicado. 25ª ed., São
Paulo: Método, 2017, p. 365).
A revisão geral anual deve ser efetivada mediante lei. De quem é a iniciativa para apresentar o projeto
de lei?
O projeto de lei prevendo a revisão geral anual deve ser apresentado pelo chefe do Poder Executivo de
cada ente federado (art. 61, § 1º, II, “a”, da CF/88).
Caso esses deveres fossem descumpridos, o Poder Público poderia ser condenado a pagar uma
indenização aos servidores públicos.
Ok, entendi que não cabe indenização se o chefe do Poder Executivo não enviar o projeto de lei. Vamos
para uma outra dúvida: o Poder Judiciário pode, então, obrigar o chefe do Poder Executivo a encaminhar
o projeto de lei com a revisão geral anual?
Também não.
O Poder Judiciário não possui competência para determinar ao Poder Executivo a apresentação de
projeto de lei que vise a promover a revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos,
tampouco para fixar o respectivo índice de correção.
STF. Plenário. RE 843112, Rel. Luiz Fux, julgado em 22/09/2020 (Repercussão Geral – Tema 624) (Info 998).
A Constituição não estabelece um dever específico de que a remuneração dos servidores seja objeto de
aumentos anuais. Também não estabelece que eventual revisão seja feita em determinado percentual
que corresponda, obrigatoriamente, à inflação apurada no período.
O papel do Poder Judiciário na concretização do direito à revisão geral anual da remuneração dos
servidores públicos não permite a colmatação da lacuna por decisão judicial. Isso porque não se pode
extrair do art. 37, X, da CF/88 um significado inequívoco para a expressão “revisão geral”, dotada de baixa
densidade normativa.
A reposição das perdas inflacionárias não pode ser considerada “constitucionalmente obrigatória”.
A delimitação das condições da concessão do direito constitucional pressupõe uma considerável expertise
técnica e financeira, a exemplo do eventual parcelamento e da necessidade de se compatibilizar a revisão
com restrições orçamentárias, ajustes fiscais subsequentes e eventual compensação frente a outras
formas de aumento.
A definição do índice cabe aos poderes políticos, em consonância com outras limitações constitucionais,
até mesmo para prestigiar a expertise técnica desses poderes em gerir os cofres públicos e o funcionalismo
estatal.
As regras prudenciais e a relação entre as formas de aumento remuneratório revelam os elevados custos
de erro da fixação do índice de revisão geral anual por quem não detém a expertise necessária.
O princípio democrático impede a transferência do custo político ao Judiciário, porquanto o povo deposita
nas urnas expectativas e responsabilidades, o que justifica a posterior prestação de contas dos poderes
eleitos e impede que maiorias ocasionais furtem-se de obrigação imposta pelo constituinte.
EXERCÍCIOS
OUTRAS INFORMAÇÕES
desvinculação pari passu do índice inflacionário, consoante exegese prestigiada por esta Corte. O direito à reposição do
valor real por perdas inflacionárias foi afastado por este Plenário ao interpretar e aplicar a garantia da irredutibilidade de
vencimentos, prevista no artigo 37, XV, da CRFB. Precedentes: ADI 2.075-MC, Rel. Min. Celso de Mello, Plenário, DJ
de 27/6/2003; e RE 201.026, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, DJ de 6/9/1996. 3. A Constituição não estabelece
um dever específico de que a remuneração dos servidores seja objeto de aumentos anuais, menos ainda em percentual
que corresponda, obrigatoriamente, à inflação apurada no período, embora do artigo 37, X, da Constituição decorra o
dever de pronunciamento fundamentado a respeito da impossibilidade de reposição da remuneração dos servidores
públicos em dado ano, com demonstração técnica embasada em dados fáticos da conjuntura econômica. Precedente: RE
565.089, Redator do acórdão Min. Roberto Barroso, Plenário, DJe de 28/4/2020, Tema 19 da Repercussão Geral. 4. As
sentenças aditivas, porquanto excepcionais, pressupõem a observância de algumas balizas, tais como (i) a solução esteja
presente no sistema legislativo em vigor, ao menos em estado latente (ZAGREBELSKY, Gustavo. La giustizia
costituzionale. vol. 41. Mulino, 1988. p. 158-159); (ii) a norma análoga se adeque ao direito previsto constitucionalmente;
(iii) a norma constitucional possua densidade normativa tal que conceda inequivocamente determinado direito a seus
destinatários (BRANDÃO, Rodrigo. O STF e o Dogma do Legislador Negativo. Direito, Estado e Sociedade, n. 44, p.
206, jan./jun. 2014); (iv) sejam observados “o critério da vontade hipotética do legislador e o critério da solução
constitucionalmente obrigatória” (MEDEIROS, Rui. A decisão de inconstitucionalidade. Lisboa: Universidade Católica,
1999, p. 501-505); (v) avalie-se os reflexos das sentenças normativas nas contas públicas, consoante a “observância da
realidade histórica e dos resultados possíveis”, (PELICIOLI, Angela Cristina. A sentença normativa na jurisdição
constitucional: o Supremo Tribunal Federal como legislador positivo. São Paulo: LRT, 2008. p. 223); (vi) a intervenção
se legitime na natureza do direito constitucional, mormente quando em jogo os direitos materialmente fundamentais e
demais condições de funcionamento da democracia (SOUSA FILHO, Ademar Borges. Sentenças Aditivas na Jurisdição
Constitucional Brasileira. Belo Horizonte: Forum, 2016. p. 233). 5. In casu, o papel do Poder Judiciário na concretização
do direito à revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos não permite a colmatação da lacuna por decisão
judicial, porquanto não se depreende do artigo 37, X, da CRFB um significado inequívoco para a expressão “revisão
geral”, dotada de baixa densidade normativa. A reposição das perdas inflacionárias não pode ser considerada
“constitucionalmente obrigatória”, embora inegavelmente se insira na moldura normativa do direito tutelado, que atribuiu
ao servidor público o direito a ter sua remuneração anualmente revista. 6. A delimitação das condições da concessão do
direito constitucional pressupõe uma considerável expertise técnica e financeira, a exemplo do eventual parcelamento e
da necessidade de se compatibilizar a revisão com restrições orçamentárias, ajustes fiscais subsequentes e eventual
compensação frente a outras formas de aumento. Precedente: ADI 2.726, Plenário, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de
29/8/2003. 7. A revisão remuneratória dos servidores públicos pressupõe iniciativa do Poder Executivo. Precedentes: ADI
3.599, Rel. Min. Gilmar Mendes, Plenário, DJ de 14/9/2007; e ADI 2.061, Rel. Min. Ilmar Galvão, Plenário, DJ de
29/6/2001. 8. A definição do índice cabe aos poderes políticos, em consonância com outras limitações constitucionais,
máxime por prestigiar a expertise técnica desses poderes em gerir os cofres públicos e o funcionalismo estatal. As regras
prudenciais e a relação entre as formas de aumento remuneratório revelam os elevados custos de erro da fixação do índice
de revisão geral anual por quem não detém a expertise necessária (SUNSTEIN; VERMEULE. Interpretation and
Institutions. Michigan Law Review, v. 101, p. 885, 2002. p. 38). 9. O princípio democrático impede a transferência do
custo político ao Judiciário, porquanto o povo deposita nas urnas expectativas e responsabilidades, o que justifica a
posterior prestação de contas dos poderes eleitos e impede que maiorias ocasionais furtem-se de obrigação imposta pelo
constituinte. 10. A Lei federal 10.331/2001, assim como a Lei Complementar 592/2011 do Município do Leme, que
regulamentam o artigo 37, X, da CRFB, estabelecendo condições e parâmetros para a revisão geral anual, não suprem a
omissão, o que, consectariamente, revela sua insuficiência em tutelar a garantia constitucional que impõe manifestações
anuais, não havendo que se cogitar de perda de objeto. 11. A omissão do Poder Executivo na apresentação de projeto de
lei que preveja a revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos configura mora que cabe ao Poder Judiciário
declarar e determinar que se manifeste de forma fundamentada sobre a possibilidade de recomposição salarial ao
funcionalismo. 13. In casu, o tribunal a quo, ao conceder a injunção “para determinar que o Prefeito do Município de
Leme envie, no prazo máximo de trinta dias, projeto de lei que vise promover - a revisão anual dos vencimentos de todos
os servidores públicos municipais”, exorbitou de suas competências constitucionais, imiscuindo-se em matéria de
iniciativa do Poder Executivo, a quem cabe a autoadministração do funcionalismo público e a gestão de recursos
orçamentários destinados a despesas de custeio com pessoal. 13. Recurso Extraordinário PROVIDO para reformar o
acórdão recorrido e, via de consequência, cassar a injunção concedida. Tese de repercussão geral: O Poder Judiciário não
possui competência para determinar ao Poder Executivo a apresentação de projeto de lei que vise a promover a revisão
geral anual da remuneração dos servidores públicos, tampouco para fixar o respectivo índice de correção.
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