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APOSTILA DE LÓGICA,

ARGUMENTAÇÃO E COMUNICAÇÃO I

Curso: Ciências Contábeis

Profa. Ms. Rejane da Silva Marques

JUIZ DE FORA
2011.1

UNIDADE I - ESTUDO DE LÓGICA

1 INTRODUÇÃO À LÓGICA : A LÓGICA E O PENSAMENTO

Todas as disciplinas têm um objeto de estudo. O objeto de estudo de uma


disciplina é aquilo que essa disciplina estuda. Então, qual é o objeto de estudo da lógica?
O que é que a lógica estuda?

A lógica estuda e sistematiza a validade ou invalidade da argumentação. Também


se diz que estuda inferências ou raciocínios. Podes considerar que argumentos,
inferências e raciocínios são termos equivalentes.

Lógica: é a disciplina que trata das formas de pensamento, da linguagem descritiva do


pensamento, das leis da argumentação e raciocínio corretos, dos métodos e princípios
que regem o pensamento humano.

Ela é importante, porque nos ajuda a distinguir os argumentos válidos dos


inválidos, permite-nos compreender por que razão uns são válidos e outros não e ensina-
nos a argumentar corretamente.

A lógica faz parte do nosso cotidiano. Na família, no trabalho, no lazer, na política,


enfim, sempre que nos dispomos a conversar com as pessoas, usamos argumentos para
expor e defender nossos pontos de vista. Os pais discutem com seus filhos adolescentes
sobre o que podem ou não fazer, e eles rebatem com outros arrazoados. Nos encontros
entre amigos nem sempre todos têm opinião idêntica a respeito de assuntos tais como: se
a fidelidade é importante nas relações amorosas, se a política é ou não importante na vida
de todos, se o aborto é uma maneira adequada de resolver uma gravidez não desejada,
se clonar humanos é uma prática eticamente correta, e assim por diante. Se os assuntos
são debatidos, a capacidade de argumentação de cada um é colocada em teste.

Em algumas situações, nos vemos tentando persuadir alguém a respeito de nossas


ideias e opiniões. Por exemplo, um político que deseja o voto do eleitor, um advogado que
quer convencer o juiz ou o promotor da inocência do seu cliente, o gerente que defende a
implantação de uma estratégia a ser avaliada pelos proprietários da empresa, entre outros
exemplos. Nesses casos, não se trata apenas de simples exposição de um raciocínio, em
que predominam elementos racionais, mas apela-se também para a emoção, a fim de
melhor convencer o ouvinte. Essas técnicas são conhecidas da retórica, a arte do
discurso persuasivo.

Não é esse aspecto persuasivo que nos interessa, mas o estudo da lógica,
importante instrumento para organizarmos nossas ideias de forma mais rigorosa, de
maneira a não tirarmos conclusões inadequadas a partir de enunciados dados.

Veja a tira a seguir:

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1.1 A lógica aristotélica

O objeto da lógica não é determinar se as conclusões são verdadeiras ou falsas,


mas determinar se o que se afirma como conclusões são conclusões.
Augustus de Morgan
Definição e princípios

Embora os sofistas e também Platão tenham se ocupado com o que poderíamos


chamar de questões lógicas, nenhum deles o fez com a amplitude e o rigor alcançados
por Aristóteles (séc. IV a.C.) na sua obra intitulada Analíticos. Como o próprio nome diz,
trata-se de uma análise do pensamento nas suas partes integrantes. Essa e outras obras
sobre o assunto foram denominadas mais tarde, em conjunto, Organon, que significa
“instrumento” (instrumento para se proceder corretamente no pensar). O próprio
Aristóteles não usou a palavra lógica, que só apareceu mais tarde. Aristóteles (384-322
a.C.) filósofo grego. Seu sistema lógico foi considerado perfeito e completo por muito
tempo. Foi criador da teoria do silogismo.

Etimologicamente, a palavra lógica vem do grego logos, que significa “palavra”,


“expressão” “pensamento”, “conceito”, “discurso”, “razão”. Podemos defini-la como:

a) o estudo dos métodos e princípios da argumentação. Ou, então, como


b) a investigação das condições em que a conclusão de um argumento se segue de suas
premissas.

Por exemplo, vejamos as seguintes argumentações:

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(1)
Toda estrela brilha com luz própria.
Ora, nenhum planeta brilha com luz própria.
Logo, nenhum planeta é estrela.

(2)
Todos os cães são mamíferos.
Ora, todos os gatos são mamíferos.
Portanto, todos os gatos são cães.

As premissas são as proposições iniciais – nos exemplos, as duas primeiras a


partir das quais tiramos a conclusão. O primeiro exemplo é considerado um raciocínio
válido. No segundo exemplo, logo percebemos que o argumento não é válido, mas nem
sempre isso é visto com tanta clareza, porque, em outras vezes, a argumentação nos
parece correta, sem o ser. Por isso precisamos nos instruir sobre regras que possam nos
orientar. Mais adiante, voltaremos a esses conceitos para melhor compreendê-los.

A divisão aristotélica da lógica

Segundo Aristóteles, a lógica se subdivide em:

• lógica formal (ou menor), que estabelece a forma correta das operações do
pensamento. Se as regras forem aplicadas adequadamente, o raciocínio é considerado
válido. Na lógica formal, a validade do argumento é definida pela sua forma (esquema) e
não pelo seu conteúdo.

• lógica material (ou maior), que trata da aplicação das operações do pensamento
segundo a matéria ou natureza dos objetos a conhecer. Enquanto a lógica formal se
ocupa com a estrutura do pensamento, a lógica material investiga a adequação do
raciocínio à realidade. E também chamada metodologia, e como tal procura o método
próprio de cada ciência.

Uma das mais duradouras contribuições da lógica aristotélica está no


estabelecimento dos primeiros princípios que, por serem anteriores a qualquer raciocínio,
servem de base a todos os argumentos. São eles:

Princípio de não-contradição
¬ (P Ù ¬ P) – Não é possível que algo seja e não seja o caso numa mesma
circunstância.

Princípio de identidade
A = A – Algo é sempre semelhante a si mesmo.

Princípio do terceiro excluído


P Ú ¬P – Algo é ou não o caso (não há terceira opção lógica).

Na simbologia, temos:
¬ (negação).
Ù (conjunção = “e”).
Ú (disjunção = “ou”).
P (uma proposição qualquer)

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É assim que Aristóteles formula, na sua obra Metafísica, o princípio de não-
contradição: “É impossível que o mesmo (o mesmo determinante) convenha e não
convenha ao mesmo ente ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto”. Isso significa que
duas proposições contraditórias não podem ser verdadeiras, que não é possível afirmar e
negar simultaneamente a mesma coisa, isto é, nenhum enunciado pode ser verdadeiro e
falso.

Por exemplo: se for verdade que “alguns seres humanos não são justos”, é falso
que “todos os seres humanos sejam justos”.

Segundo o princípio de identidade, se um enunciado é verdadeiro, então ele é


verdadeiro (é um princípio auto-evidente).

O princípio do terceiro excluído afirma que um enunciado ou é verdadeiro, ou é


falso (e não há uma terceira possibilidade lógico, do tipo “meio verdadeiro” ou “meio
falso”).

Em resumo, temos:

Não-contradição: duas proposições contraditórias (P e ¬P) não podem ter valores-


verdade iguais.
Identidade: duas proposições idênticas (P e P) têm necessariamente o mesmo valor-
verdade.
Terceiro excluído: uma proposição P só pode assumir dois valores-verdade: verdadeiro ou
falso, não havendo terceira possibilidade.

2 PROPOSIÇÃO E ARGUMENTO

Um argumento é um conjunto de proposições que utilizamos para justificar (provar,


dar razão, suportar) algo. A proposição que queremos justificar tem o nome de conclusão;
as proposições que pretendem apoiar a conclusão ou a justificam têm o nome de
premissas.

Supõe que queres pedir aos teus pais um aumento da "mesada". Como justificas
este aumento? Recorrendo a razões, não é? Dirás qualquer coisa como:

Os preços no bar da escola subiram; como eu lancho no bar da escola, o lanche


fica-me mais caro. Portanto, preciso de um aumento da "mesada".

Temos aqui um argumento, cuja conclusão é: "preciso de um aumento da


'mesada'". E como justificas esta conclusão? Com a subida dos preços no bar da escola e
com o fato de lanchares no bar. Então, estas são as premissas do teu argumento, são as
razões que utilizas para defender a conclusão.

Este exemplo permite-nos esclarecer outro aspecto dos argumentos, que é o


seguinte: embora um argumento seja um conjunto de proposições, nem todos os
conjuntos de proposições são argumentos. Por exemplo, o seguinte conjunto de
proposições não é um argumento:

Eu lancho no bar da escola, mas o João não. A Joana come pipocas no cinema. O
Rui foi ao museu.

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Neste caso, não temos um argumento, porque não há nenhuma pretensão de
justificar uma proposição com base nas outras. Nem há nenhuma pretensão de
apresentar um conjunto de proposições com alguma relação entre si. Há apenas uma
sequência de afirmações. E um argumento é, como já vimos, um conjunto de proposições
em que se pretende que uma delas seja sustentada ou justificada pelas outras — o que
não acontece no exemplo anterior.

Um argumento pode ter uma ou mais premissas, mas só pode ter uma conclusão.

Exemplos de argumentos com uma só premissa:

Exemplo 1

Premissa: Todos os portugueses são europeus.

Conclusão: Logo, alguns europeus são portugueses.

Exemplo 2

Premissa: O João e o José são alunos do 11.º ano.

Conclusão: Logo, o João é aluno do 11.º ano.

Exemplos de argumentos com duas premissas:

Exemplo 1

Premissa 1: Se o João é um aluno do 11.º ano, então estuda filosofia.

Premissa 2: O João é um aluno do 11.º ano.

Conclusão: Logo, o João estuda filosofia.

Exemplo 2

Premissa 1: Se não houvesse vida para além da morte, então a vida não faria sentido.

Premissa 2: Mas a vida faz sentido.

Conclusão: Logo, há vida para além da morte.

Exemplo 3:

Premissa 1: Todos os minhotos são portugueses.

Premissa 2: Todos os portugueses são europeus.

Conclusão: Todos os minhotos são europeus.

Observando-se os exemplos acima, há certas expressões que nos ajudam a


perceber qual é a conclusão do argumento e quais são as premissas. São os indicadores.

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Um indicador é um articulador do discurso, é uma palavra ou expressão que
utilizamos para introduzir uma razão (uma premissa) ou uma conclusão. O quadro
seguinte apresenta alguns indicadores de premissa e de conclusão:

Indicadores de premissa Indicadores de conclusão

Pois por isso


porque por conseguinte
dado que implica que
como foi dito logo
visto que portanto
devido a então
a razão é que daí que
admitindo que segue-se que
sabendo-se que pode-se inferir que
assumindo que consequentemente

É claro que nem sempre as premissas e a conclusão são precedidas por


indicadores. Por exemplo, no argumento:

O Mourinho é treinador de futebol e ganha mais de 100000 euros por mês.


Portanto, há treinadores de futebol que ganham mais de 100000 euros por mês.

A conclusão é precedida do indicador "Portanto", mas as premissas não têm


nenhum indicador.

Por outro lado, aqueles indicadores (palavras e expressões) podem aparecer em


frases sem que essas frases sejam premissas ou conclusões de argumentos. Por
exemplo, se eu disser:

Depois de se separar do dono, o cão nunca mais foi o mesmo. Então, um dia ele
partiu e nunca mais foi visto. Admitindo que não morreu, onde estará?

O que se segue à palavra "Então" não é conclusão de nenhum argumento, e o que


segue a "Admitindo que" não é premissa, pois nem sequer tenho aqui um argumento. Por
isso, embora seja útil, deves usar a informação do quadro de indicadores de premissa e
de conclusão criticamente e não de forma automática.

2.1 PROPOSIÇÕES E FRASES

Um argumento é um conjunto de proposições. Quer as premissas quer a conclusão


de um argumento são proposições. Mas o que é uma proposição?

 Uma proposição é o pensamento que uma frase declarativa exprime literalmente.

Não deves confundir proposições com frases. Uma frase é uma entidade
linguística, é a unidade gramatical mínima de sentido. Por exemplo, o conjunto de

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palavras "Braga é uma" não é uma frase. Mas o conjunto de palavras "Braga é uma
cidade" é uma frase, pois já se apresenta com sentido gramatical.

Há vários tipos de frases: declarativas, interrogativas, imperativas e exclamativas.


Mas só as frases declarativas exprimem proposições. Uma frase só exprime uma
proposição quando o que ela afirma tem valor de verdade.

Por exemplo, as seguintes frases não exprimem proposições, porque não têm valor
de verdade, isto é, não são verdadeiras nem falsas:

1. Que horas são?

2. Traz o livro.

3. Prometo ir contigo ao cinema.

4. Quem me dera gostar de Matemática.

Mas as frases seguintes exprimem proposições, porque têm valor de verdade, isto
é, são verdadeiras ou falsas, ainda que, acerca de algumas, não saibamos, neste
momento, se são verdadeiras ou falsas:

1. Braga é a capital de Portugal.

2. Braga é uma cidade minhota.

3. A neve é branca.

4. Há seres extraterrestres inteligentes.

A frase 1 é falsa, a 2 e a 3 são verdadeiras. E a 4? Bem, não sabemos qual é o seu


valor de verdade, não sabemos se é verdadeira ou falsa, mas sabemos que tem de ser
verdadeira ou falsa. Por isso, também exprime uma proposição.

Uma proposição é uma entidade abstrata, é o pensamento que uma frase


declarativa exprime literalmente. Ora, um mesmo pensamento pode ser expresso por
diferentes frases. Por isso, a mesma proposição pode ser expressa por diferentes frases.
Por exemplo, as frases "O governo demitiu o presidente da TAP" e "O presidente da TAP
foi demitido pelo governo" exprimem a mesma proposição. As frases seguintes também
exprimem a mesma proposição: "A neve é branca" e "Snow is white".

2.2 VALIDADE E VERDADE

A verdade é uma propriedade das proposições. A validade é uma propriedade dos


argumentos. É incorreto falar em proposições válidas. As proposições não são válidas
nem inválidas. As proposições só podem ser verdadeiras ou falsas. Também é incorreto
dizer que os argumentos são verdadeiros ou que são falsos. Os argumentos não são
verdadeiros nem falsos. Os argumentos dizem-se válidos ou inválidos.

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Quando é que um argumento é válido? Por agora, referirei apenas a validade
dedutiva. Diz-se que um argumento dedutivo é válido quando é impossível que as suas
premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa. Repara que, para um argumento ser
válido, não basta que as premissas e a conclusão sejam verdadeiras. É preciso que seja
impossível que sendo as premissas verdadeiras, a conclusão seja falsa.

Considera o seguinte argumento:

Premissa 1: Alguns treinadores de futebol ganham mais de 100000 euros por mês.

Premissa 2: O Mourinho é um treinador de futebol.

Conclusão: Logo, o Mourinho ganha mais de 100000 euros por mês.

Neste momento (Julho de 2004), em que o Mourinho é treinador do Chelsea e os


jornais nos informam que ganha muito acima de 100000 euros por mês, este argumento
tem premissas verdadeiras e conclusão verdadeira e, contudo, não é válido. Não é válido,
porque não é impossível que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa.
Podemos perfeitamente imaginar uma circunstância em que o Mourinho ganhasse menos
de 100000 euros por mês (por exemplo, o Mourinho como treinador de um clube do
campeonato regional de futebol, a ganhar 1000 euros por mês), e, neste caso, a
conclusão já seria falsa, apesar de as premissas serem verdadeiras. Portanto, o
argumento é inválido.

Considera, agora, o seguinte argumento, anteriormente apresentado:

Premissa: O João e o José são alunos do 11.º ano.

Conclusão: Logo, o João é aluno do 11.º ano.

Este argumento é válido, pois é impossível que a premissa seja verdadeira e a


conclusão falsa. Ao contrário do argumento que envolve o Mourinho, neste não podemos
imaginar nenhuma circunstância em que a premissa seja verdadeira e a conclusão falsa.
Podes imaginar o caso em que o João não é aluno do 11.º ano. Bem, isto significa que a
conclusão é falsa, mas a premissa também é falsa.

Repara, agora, no seguinte argumento:

Premissa 1: Todos os números primos são pares.

Premissa 2: Nove é um número primo.

Conclusão: Logo, nove é um número par.

Este argumento é válido, apesar de quer as premissas quer a conclusão serem


falsas. Continua a aplicar-se a noção de validade dedutiva anteriormente apresentada: é
impossível que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa. A validade de um
argumento dedutivo depende da conexão lógica entre as premissas e a conclusão do
argumento e não do valor de verdade das proposições que constituem o argumento.
Como vês, a validade é uma propriedade diferente da verdade. A verdade é uma

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propriedade das proposições que constituem os argumentos (mas não dos argumentos) e
a validade é uma propriedade dos argumentos (mas não das proposições).

Como podes determinar se um argumento dedutivo é válido? Podes seguir esta


regra:

Mesmo que as premissas do argumento não sejam verdadeiras, imagina que são
verdadeiras. Consegues imaginar alguma circunstância em que, considerando as
premissas verdadeiras, a conclusão é falsa? Se sim, então o argumento não é válido. Se
não, então o argumento é válido.

LEMBRA-TE: num argumento válido, se as premissas forem verdadeiras, a


conclusão não pode ser falsa.

2.3 ARGUMENTOS DEDUTIVOS E INDUTIVOS

De acordo com a lógica formal, o argumento dedutivo parte do geral ao particular,


enquanto o indutivo, do particular ao geral.

Argumento dedutivo: O tipo de argumento em que a conclusão se segue das premissas


de tal modo que é impossível as premissas serem verdadeiras e a conclusão falsa é
denominado argumento dedutivo. Exemplo:

Havia 30 alunos nesta sala.

Agora, há 29 alunos nesta sala.

Logo, um aluno saiu da sala.

Argumento indutivo: O tipo de argumento no qual mesmo as premissas sendo


verdadeiras não podemos ter certeza absoluta que a conclusão é verdadeira. Em outras
palavras, é possível as premissas serem verdadeiras e a conclusão falsa, ainda que a
probabilidade da conclusão ser verdadeira seja muito grande. Exemplo:

Esta vacina funcionou bem com macacos. Por esse motivo, esta vacina vai
funcionar bem em seres humanos.

2.4 O SILOGISMO

Silogismo: etmologicamente significa “reunir com o pensamento”. É um termo filosófico


com o qual Aristóteles designou a argumentação lógica perfeita, constituída de três
proposições declarativas que se conectam de tal modo que a partir das primeiras duas,
chamadas premissas, é possível deduzir uma conclusão.

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Estrutura formal do silogismo:

ANTECEDENTE Todo carioca é brasileiro. - Premissa maior

Paulo é carioca. - Premissa menor

___________________________________

CONSEQUENTE Paulo é brasileiro. - Conclusão

Veja outros exemplos de silogismo:

1) PREMISSA MAIOR: Todo cachorro é mamífero.

PREMISSA MENOR: Todo mamífero é vertebrado.

CONCLUSÃO: Logo, todo cachorro é vertebrado.

2) PREMISSA MAIOR: Todo homem é mortal.

PREMISSA MENOR: Pedro é homem.

CONCLUSÃO: Pedro é mortal.

REGRAS DO SILOGISMO

A validade de um silogismo depende do respeito às regras de estruturação. Tais


regras, em número de oito, permitem verificar a correção ou incorreção do silogismo. As
quatro primeiras regras são referentes aos termos e as quatro últimas são referentes às
premissas. São elas:

1) Todo silogismo contém somente três termos: maior, médio e menor;

2) Os termos da conclusão não podem ter extensão maior que os termos das premissas;

3) O termo médio não pode entrar na conclusão;

4) O termo médio deve ser universal ao menos uma vez;

5) De duas premissas negativas, nada se conclui;

6) De duas premissas afirmativas não pode haver conclusão negativa;

7) A conclusão segue sempre a premissa mais fraca;

8) De duas premissas particulares, nada se conclui.


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EXERCÍCIOS

1) Identifique se os argumentos abaixo são dedutivos ou indutivos:

a) ABC é um triângulo reto.


O menor ângulo do triângulo ABC mede 30 graus.
Logo, o outro ângulo agudo mede 60 graus.

b) 99,5% dos testes de Aids do laboratório X têm resultado correto.


O teste de Aids de Icabod foi feito no laboratório X e o resultado foi negativo.
Logo, Icabod não tem Aids.

c) Se o Flamengo vencer todos os jogos que restam, não é rebaixado.


O Flamengo vence todos os jogos.
Logo, o Flamengo não é rebaixado.

d) Há fumaça. Logo, há um incêndio.

e) 75% dos entrevistados declarou que vai votar no candidato X. Logo, o candidato X
vencerá as eleições.

f) A prata é um bom condutor de eletricidade.


A platina é um bom condutor de eletricidade.
O cobre é um bom condutor de eletricidade.
Todos os metais são bons condutores de eletricidade.

g) Todo mamífero tem um coração.


Todos os cavalos são mamíferos.
Então, todos os cavalos têm coração.

h) Não existem registros de seres humanos com mais de cinco metros de altura. Logo,
seres humanos com essa altura não existem.

i) Frequentemente quando chove fica nublado. Está chovendo hoje, portanto está
nublado.

2) Muitas vezes ocorre de um argumento não apresentar explicitamente todas as


premissas que sustentam a conclusão, deixando “subentendidas” uma ou mais
premissas. Tal como é enunciado, o argumento é incompleto, mas as premissas que
faltam podem ser facilmente encontradas. Identifique as premissas subentendidas nos
exemplos a seguir:

a) Luísa é brasileira, posto que é carioca.

b) Pedro é cidadão brasileiro, logo deve se apresentar ao serviço militar.

c) O aborto é condenável porque é um assassinato.

3) Leia este pequeno texto, que é um diálogo:

João — Este quadro é horrível! É só traços e cores! Até eu fazia isto!

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Adriana — Concordo que não é muito bonito, mas nem toda a arte tem de ser bela.

João — Não sei... por que razão dizes isso?

Adriana — Porque nem tudo o que os artistas fazem é belo.

João — E depois? É claro que nem tudo o que os artistas fazem é belo, mas daí não se
segue nada.

Adriana — Claro que se segue! Dado que tudo o que os artistas fazem é arte segue-se
que nem toda a arte tem de ser bela.

Perante este diálogo, isole o argumento e formulê-o na sua forma canônica


(premissas e conclusão):

4) Analise a presença de silogismos nos enunciados abaixo, indicando a premissa 1, a


premissa 2 e a conclusão.

CASO 1

Provérbios

"Deus ajuda quem cedo madruga".

"Quem não arrisca, não petisca".

“Quem tudo quer tudo alcança”.

"Quem não chora não mama".

CASO 2

Natal é época de estar em família. Não vá longe na hora de comprar seus presentes.

CASO 3

Não é só o seu time que faz grandes jogadas.

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do mundo dos negócios você encontra aqui. Para conquistar grandes vitórias pessoais,
consulte e assine o Jornal do Commercio do Rio de Janeiro

CASO 4

Brasileiro não vive sem chope e sem Technos.

No Dia dos Namorados, comemore dando um Technos de presente.

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CASO 5

Slogan: "Nina. Prática como você."

CASO 6

“Quem usa produtos do Boticário leva a vida com mais humor.”

CASO 7

Slogan: “Unibanco: o melhor da vida feito para você.”

CASO 8

“Todo funcionário responsável deve ser pontual”

CASO 9

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3 LÓGICA E ARGUMENTAÇÃO

Os textos argumentativos têm por finalidade principal persuadir o leitor sobre o


ponto de vista do autor a respeito do assunto. Quando o texto, além de explicar, também
persuade o interlocutor e modifica seu comportamento, temos um texto dissertativo-
argumentativo.

O texto argumentativo tem uma estrutura convencional, formada por três partes
essenciais.

1) Introdução

Que apresenta o assunto e o posicionamento do autor. Ao se posicionar, o autor


formula uma tese ou a ideia principal do texto.

Teatro e escola, em princípio, parecem ser espaços distintos, que desenvolvem


atividades complementares diferentes. Em contraposição ao ambiente normalmente
fechado da sala de aula e aos seus assuntos pretensamente “sérios”, o teatro se
configura como um espaço de lazer e diversão. Entretanto, se examinarmos as origens
do teatro, ainda na Grécia antiga, veremos que teatro e escola sempre caminharam
juntos, mais do que se imagina.(tese)

2) Desenvolvimento

Formado pelos parágrafos que fundamentam a tese. Normalmente,  em cada


parágrafo, é apresentado e desenvolvido um argumento. Cada um deles pode estabelecer
relações de causa e efeito ou comparações entre situações, épocas e lugares diferentes,
pode também se apoiar em depoimentos ou citações de pessoas especializadas no
assunto abordado, em dados estatísticos, pesquisas, alusões históricas.

O teatro grego apresentava uma função eminentemente pedagógica. Com sua


tragédias, Sófocles e Eurípides não visavam apenas à diversão da plateia mas também, e
sobretudo, pôr em discussão certos temas que dividiam a opinião pública naquele
momento de transformação da sociedade grega. Poderia um filho desposar a própria
mãe, depois de ter assassinado o pai de forma involuntária (tema de Édipo Rei)? Poderia
uma mãe assassinar os filhos e depois matar-se por causa de um relacionamento
amoroso (tema de Medeia e ainda atual, como comprova o caso da cruel mãe americana
que, há alguns anos, jogou os filhos no lago para poder namorar livremente)?

Naquela sociedade, que vivia a transição dos valores místicos, baseados na


tradição religiosa, para os valores da polis, isto é, aqueles resultantes da formação do
Estado e suas leis, o teatro cumpria um papel político e pedagógico, à medida que
punha em xeque e em choque essas duas ordens de valores e apontava novos caminhos
para a civilização grega. “Ir ao teatro”, para os gregos, não era apenas uma diversão, mas
uma forma de refletir sobre o destino da própria comunidade em que se vivia, bem como
sobre valores coletivos e individuais.

Deixando de lado as diferenças obviamente existentes em torno dos gêneros


teatrais (tragédia, comédia, drama), em que o teatro grego, quanto a suas intenções,
diferia do teatro moderno? Para Bertold Brecht, por exemplo, um dos mais significativos
dramaturgos modernos, a função do teatro era, antes de tudo, divertir. Apesar disso,

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suas peças tiveram um papel essencial pedagógico voltadas para a conscientização
de trabalhadores e para a resistência política na Alemanha nazista dos anos 30 do século
XX.

O teatro, ao representar situações de nossa própria vida – sejam elas engraçadas,


trágicas, políticas, sentimentais, etc. – põe o homem a nu, diante de si mesmo e de seu
destino. Talvez na instantaneidade e na fugacidade do teatro resida todo o encanto e sua
magia: a cada representação, a vida humana é recontada e exaltada. O teatro ensina, o
teatro é escola. É uma forma de vida de ficção que ilumina com seus holofotes a
vida real, muito além dos palcos e dos camarins.

3) Conclusão

Que geralmente retoma a tese, sintetizando as ideias gerais do texto ou propondo


soluções para o problema discutido. Mais raramente, a conclusão pode vir na forma de
interrogação ou representada por um elemento-surpresa. No caso da interrogação, ela é
meramente retórica e deve já ter sido respondida pelo texto. O elemento surpresa
consiste quase sempre em uma citação científica, filosófica ou literária, em uma
formulação irônica ou em uma ideia reveladora que surpreenda o leitor e, ao mesmo
tempo, dê novos significados ao texto.

Que o teatro seja uma forma alternativa de ensino e aprendizagem, é


inegável. A escola sempre teve muito a aprender com o teatro, assim como este, de
certa forma, e em linguagem própria, complementa o trabalho de gerações de
educadores, preocupados com a formação plena do ser humano.  (conclusão)

(Teatro e escola: o papel do educador: Ciley Cleto, professora de Português).

Atenção: a linguagem do texto dissertativo-argumentativo costuma ser impessoal,


objetiva e denotativa. Mais raramente, entretanto, há a combinação da objetividade com
recursos poéticos, como metáforas e alegorias. Predominam formas verbais no presente
do indicativo e emprega-se o padrão culto e formal da língua.

ANOTAÇÕES:

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3.1 A DISSERTACÃO ARGUMENTATIVA E SEU ENSINO

A Relação Tese I Argumento

Pela argumentação provocamos nosso interlocutor a concordar conosco. Não


custa lembrar que a estrutura textual argumentativa liga-se a uma tese, esta
filosoficamente entendida como "o primeiro momento do processo dialético" (dicionário do
Aurélio). A tese constitui-se de uma proposição que expressa aquilo de que alguém
deseja convencer o outro (ou seja, "o primeiro momento do processo dlalético"), usando
para tanto uma série de proposições, de conhecimento comum sobre o mundo, e
buscando persuadir o interlocutor do seu ponto de vista, pela tessitura de um raciocínio
lógico, trabalhado sobre valores comungados por ambas as partes - locutor e interlocutor.
Também pode acontecer que alguém vá elaborar um raciocínio contrário, de interlocutor
que não se convenceu do ponto de vista do locutor.

A argumentação é a arte da palavra por excelência, já que, como forma de


persuasão, só tem existência no ato de comunicação que a constrói. E o argumento se
define como "raciocínio pelo qual se tira uma consequência ou dedução" (Aurélio). A série
de proposições sobre supostas verdades constitui, portanto, os argumentos que se
ordenam numa estrutura com vistas a um objetivo. As supostas verdades encerram
conhecimento do mundo, leis sociais e outros preceitos aceitos pela sociedade.

Resumindo a estrutura do texto argumentativo:

 a proposta ou tese a ser defendida;


 uma (série de) proposição(ões) que constitui(em) o arrazoado que sustenta a tese;
 a "lei de passagem", ou "ponte", entre a proposição de chegada e a conclusão,
constituída de um universo de valores partilhados pelo meio social dos
interlocutores, de forma a fazer aceitável, ou não, as proposições da estrutura
argumentativa.

A argumentação, como técnica de persuasão, difere da proibição: no primeiro caso


procuramos alcançar o convencimento pela apresentação de razões que convençam
nosso interlocutor, enquanto que a proibição pura e simples dispensa tal arrazoado.
Vejamos, por exemplo, a diferença entre o pai que proíbe o filho de andar de motocicleta
e o pai que aconselha o filho a não andar nesse veículo, pelo perigo a que se exporá etc.
etc.

Ainda nesse texto, uma palavrinha sobre argumentação indireta, aquela em que
não se confessa o desejo de convencer o outro, ou seja, aquela em que as razões ficam
implícitas, subentendidas, fato comum, por exemplo, numa descrição que vise a
convencer alguém de nosso ponto de vista. Vejamos, a título de exemplificação, o texto
seguinte:

Encontrei ontem na praia Fulana de Tal, aquela famosa artista de televisão que
você admira. Vou descrevê-Ia para você, em poucas palavras: em nada se aproxima da
beleza que vemos na telinha, possui pele sem vida e cheia de manchas, trajava roupas
de profundo mau gosto, mais isso,mais aquilo etc.

Explicitamente teríamos o seguinte texto argumentativo:

17
A Fulana de Tal, artista de televisão, não merece sua admiração porque não é
bonita de fato, por ter a pele cheia de manchas, não saber vestir-se etc ....

ou

A Fulana de Tal, artista de televisão que você admira, não é de fato bela:
pessoalmente é feia, com a pele cheia de manchas, além de não saber trajar-se com
gosto etc. etc.

EXERCÍCIOS

1) Qual o conhecimento comum aos participantes do ato de comunicação, presente na


afirmação que se segue?

"Este carro não é nenhum automóvel Brastemp, mas me auxilia muito, nas minhas idas
e vindas diárias, aqui no Rio: além de ser econômico no que se refere a combustível,
pago por ele taxas mais baratas, por ser carro velho; e não desperta cobiça de ladrões de
carro".

2) Destaque a tese e explicite argumentos, no texto argumentativo do exercício anterior.

3) A tradicional relação causa/efeito (ou explicação/motivo) é frequente numa


argumentação, e a ordem poder ser efeito/causa ou causa/efeito. Marque nos parênteses
que precedem os textos que se seguem, CE ou EC, conforme a ordem de surgimento dos
argumentos e da conclusão:

( )Se você andar mais depressa, chegará a tempo na escola.

( )Quem muito quer tudo perde.

( ) Água mole em pedra dura tanto dá até que fura.

( ) As ruas ficaram alagadas: choveu muito à noite.

4)Quais os argumentos que justificam o estudo do latim no texto a seguir?

O estudo da língua latina é de muita importância para nós, visto ser a "língua mãe" da
portuguesa. O latim é nosso berço cultural; nossa lei se fundamenta nas leis romanas e,
especialmente, a análise da sintaxe latina enseja o desenvolvimento mental, aptidão de
raciocínio e espírito de análise e de síntese. (Tradução adaptada de trecho do exemplo
colhido em Charoles, 1980)

18
5) Assinale a diferença entre argumentar e simplesmente proibir, nos textos que se
seguem:

a) Não
saia de casa resfriado!
b) Como
você está resfriado, não deve sair de casa, pois está chovendo e ventando muito. Este é
o segundo resfriado que o acomete em quinze dias, você parece estar com baixa
resistência imunológica e, ainda por cima, precisa estar com boa saúde na próxima
semana, para enfrentar os exames de vestibular.

6)Leia o texto que se segue e assinale o que se pede a seguir:

No momento em que seu filho inicia o segundo segmento do primeiro grau (quinta
série), convém que V Sa. fique atento(a) à necessidade de ele conhecer uma segunda
língua. Acontece frequentemente nos colégios da zona sul do Rio de Janeiro o jovem
iniciar cursos de inglês, francês, alemão ou espanhol ainda criança. Nesse caso a
lembrança da necessidade de uma segunda língua não se faz necessária. Mas para
aqueles pais cujos filhos ainda desconhecem outra língua, comunicamos que nesta
escola todos devem cursar pelo menos uma das línguas estrangeiras citadas, a partir da
quinta série. É muito importante, especialmente nos dias de hoje, que conheçamos outro
(melhor seria que conhecêssemos outros) idioma, pois é comum na vida profissional a
necessidade de dominarmos pelo menos uma língua estrangeira. Às vezes um bom
profissional perde oportunidade de crescer na sua empresa por desconhecer o inglês, por
exemplo. Assim sendo, vimos comunicar-lhe que seu filho deverá inscrever-se num curso
de língua estrangeira (ou mais de um, se o desejar), optando entre as quatro línguas
citadas. Para um curso, não haverá acréscimo de mensalidade; se desejar cursar mais de
uma língua estrangeira, cobraremos uma adicional de R$50,OO (cinquenta reais) mensais
para cada idioma.

No aguardo de sua manifestação, subscrevemo-nos.

Atenciosamente,

a) Qual o
objetivo da carta?
b) Quais
os interlocutores?
c) Que
argumento(s) se emprega(m) para a proposta feita?
d) Que
teses podem ser propostas?

7) Redija dois períodos, um a favor, outro contra a "manutenção de cachorros em


apartamentos".

19
8) Explique a argumentação indireta no texto que se segue:

A boa apresentação no ambiente de trabalho é de grande auxílio. É mais prazerosa


a convivência com pessoas bem trajadas, limpas, de linguajar de bom nível cultural e
com frases bem estruturadas, dedicadas e com expressão tranqüila. Parece que as
coisas se resolvem de melhor forma, e até os eventuais problemas se minimizam!

9) Quais seriam as estruturas argumentativas com argumentos explícitos, no texto do


exercício anterior?

20
UNIDADE II – A ESTRUTURA DO PARÁGRAFO

Além da estrutura global do texto dissertativo-argumentativo, é importante conhecer


a estrutura de uma de suas unidades básicas: o parágrafo.

1.Parágrafo: é uma unidade de texto organizada em torno de uma ideia-núcleo, que é


desenvolvida por ideias secundárias. O parágrafo pode ser formado por uma ou mais
frases, sendo seu tamanho variável. No texto dissertativo-argumentativo, os parágrafos
devem estar todos relacionados com a tese ou ideia principal do texto, geralmente
apresentada na introdução.

Embora existam diferentes formas de organização de parágrafos, os textos


dissertativo-argumentativos e alguns gêneros jornalísticos apresentam uma estrutura-
padrão. Essa estrutura consiste em três partes: a ideia-núcleo, as ideias secundárias
(que desenvolvem a ideia-núcleo), a conclusão. Em parágrafos curtos, é raro haver
conclusão.

1.1 AS QUALIDADES DO PARÁGRAFO:

O parágrafo, em geral, apresenta as mesmas qualidades de um texto escrito de


acordo com a norma culta. São elas:

1) Clareza: consiste na expressão exata de um pensamento. Um texto é claro quando


suas ideias apresentam coerência e evidência tal que é impossível deixar de atendê-lo.

A clareza deve ser a qualidade básica de todo texto oficial. Para ela concorrem:

a) a impessoalidade, que evita a duplicidade de interpretações que poderia decorrer de


um tratamento personalista dado ao texto;

b) o uso do padrão culto de linguagem, em princípio, de entendimento geral e por


definição avesso a vocábulos de circulação restrita, como a gíria e o jargão;

c) a formalidade e a padronização, que possibilitam a imprescindível uniformidade dos


textos;

d) a concisão, que faz desaparecer do texto os excessos linguísticos que nada lhe
acrescentam.

2) Objetividade: é a qualidade daquilo que é objetivo, externo à consciência, resultado de


observação imparcial, independente das preferências individuais.

3) Concisão: qualidade pela qual o texto consegue transmitir um máximo de informações


com um mínimo de palavras.

4) Precisão: rigor na elaboração de um texto, ou seja, passar as informações de forma


clara, objetiva.

5) Coerência: é a relação lógica entre as ideias, pois essas devem se complementar, é o


resultado da não-contradição entre as partes do texto. A coerência de um texto inclui
fatores como o conhecimento que o produtor e o receptor têm do assunto abordado no

21
texto, conhecimento de mundo, o conhecimento que esses têm da língua que usam e
intertextualidade.

6) Unidade: Segundo Bastos (2007, p.340) é a qualidade de um texto que tem em vista
um objetivo único. Todas as partes interligadas entre si concorrem para o mesmo fim,
para esclarecer o sentido e completar a meta pré-estabelecida.

7) Ênfase: significa força, vigor que se consegue com a disposição coerente e


balanceada, com a colocação estratégica das palavras na frase.

Observação: Para conseguir a unidade do parágrafo, deve-se:

1)Dar atenção ao que é essencial, enunciando claramente a ideia-núcleo em tópico frasal;

2)Não se afastar, por descuido, do desenvolvimento, da ideia predominante expressa no


tópico frasal;

3)Evitar pormenores impertinentes e acumulações redundantes, que nada esclarecem e


ainda “abafam” a ideia-núcleo;

4)Evitar a fragmentação da mesma ideia-núcleo em diversos parágrafos;

5) Pôr em parágrafos diferentes ideias igualmente relevantes, relacionando-as por meio


de expressões adequadas à transição.

1. 2 TÓPICO FRASAL

A ideia central do parágrafo é enunciada através do período denominado tópico


frasal. Esse período orienta ou governa o resto do parágrafo; dele nascem outros
períodos secundários ou periféricos; ele vai ser o roteiro do escritor na construção do
parágrafo; ele é o período mestre, que contém a frase-chave. Como o enunciado da tese,
que dirige a atenção do leitor diretamente para o tema central, o tópico frasal ajuda o leitor
a agarrar o fio da meada do raciocínio do escritor; como a tese, o tópico frasal introduz o
assunto e o aspecto desse assunto, ou a ideia central com o potencial de gerar ideias-
filhote; como a tese, o tópico frasal é enunciação argumentável, afirmação ou negação
que leva o leitor a esperar mais do escritor (uma explicação, uma prova, detalhes,
exemplos) para completar o parágrafo ou apresentar um raciocínio completo. Assim, o
tópico frasal é enunciação, supõe desdobramento ou explicação.

A ideia central ou tópico frasal geralmente vem no começo do parágrafo, seguida


de outros períodos que explicam ou detalham a ideia central.

Exemplos:

Ao cuidar do gado, o peão monta e governa os cavalos sem maltratá-los. O modo


de tratar o cavalo parece rude, mas o vaqueiro jamais é cruel. Ele sabe como o animal foi
domado, conhece as qualidades e defeitos do animal, sabe onde, quando e quanto exigir
do cavalo. O vaqueiro aprendeu que paciência e muitos exercícios são os principais

22
meios para se obter sucesso na lida com os cavalos, e que não se pode exigir mais do
que é esperado.

1. 3 TIPOS DE TÓPICOS FRASAIS

De Garcia (op. cit., p. 194 -199) destacamos algumas formas de se iniciar um


parágrafo, as quais enriquecemos com exemplos:

a) declaração inicial

A Zona Sul teve ontem um dia marcado pela violência. Em Copacabana, três assaltos
tumultuaram a Avenida Nossa Senhora de Copacabana. Em Botafogo, ladrões invadiram
uma farmácia e três assaltantes entraram num apartamento fazendo-se passar por
entregadores. Apesar da série de crimes para investigar, a Polícia Civil sofre com a falta
de pessoal: há 13.500 cargos vazios.

O GLOBO, 05/5/98, p. 02

b) definição

O trabalhador braçal do Rio, em sua maioria, levanta-se às quatro da manhã; toma café
requentado, come pão dormido. Pega um trem no subúrbio, viaja de pé, aos solavancos,
até a Central do Brasil. Salta, pega um ônibus lotado: mais solavancos, cansaço antes
mesmo de começar a trabalhar, às vezes altercações pela falta de espaço.
Frequentemente, baldeação extraordinária, por estrago do ônibus. Chega ao serviço, nem
sempre na hora, o que lhe valem repreensões, nem sempre de forma polida. Trabalha as
oito ou nove horas, almoça marmita em que geralmente falta carne, sai novamente
para casa, enfrentando de novo um ou dois ônibus, e o trem: novos solavancos, mais
altercações e chega a casa, pensando na madrugada do dia seguinte. Pois, gente, "Viver
é lutar" I ....

Obs.: A definição apareceu no final do parágrafo.

c) divisão

O mundo divide-se em honestos e desonestos. Não entendo um honesto em


determinados assuntos e desonesto em outros. Você é honesto com sua família, com
seus amigos e com seus colegas de trabalho; é honesto na rua, nas compras que faz; é
honesto com você mesmo, nas decisões que toma e na autocrítica dos seus atos. E o
desonesto? Em qualquer oportunidade será desonesto, em tudo e com todos.

d) alusão histórica

Já dizia o poeta Gonçalves Dias que "Viver é lutar" . O trabalhador braçal do Rio, em sua
maioria, levanta-se às quatro da manhã; toma café requentado, come pão dormido. Pega
um trem no subúrbio, viaja de pé, aos solavancos, até a Central. Salta, pega um ônibus
lotado: mais solavancos, cansaço antes mesmo de começar a trabalhar, às vezes
altercações por falta de espaço. Frequentemente baldeações que não estavam no
programa, por estrago do ônibus. Chega ao serviço, nem sempre na hora, o que lhe
valem repreensões, nem sempre de forma polida. Trabalha as oito ou mais horas,
come mal. Sai novamente para casa: novos solavancos, outras altercações, baldeações
...E chega a casa, preparando-se para a madrugada do dia seguinte.

23
e) omissão de dados

Você desconhece as vantagens deste produto que vai ser lançado no próximo mês pela
Empresa X.Sabe-se que teve boa aceitação nos Estados Unidos, quem o experimenta
não quer saber de outro produto, é mais barato do que os demais à venda no Brasil, não
polui o meio ambiente e poderá ser adquirido em qualquer mercado e farmácia de bairro.
Procurado em todas as boas lojas do ramo. Não decepciona. Você devia conhecê-lo.

f) interrogação

Até que ponto é proporcional o aumento do efetivo policial e a diminuição da violência?


Como podemos afirmar que aumentando-se o número de policiais vão diminuir os
assaltos e os roubos na cidade? Policiais que vêm de fora, que não conhecem nada da
nossa cidade, despreparados e desavisados, lançados à tarefa de proteger o povo, nas
emergências. Não há um preparo, nada é programado. Este sistema de inchar o
contingente nas emergências já faliu no mundo inteiro! ...

(Texto alterado, a partir de uma carta de leitora, em O GLOBO DE 02/5/98, p.6).

Nos exemplos vistos, a maioria apresenta tópico frasal constituído de um só


período e no início do parágrafo; duas exceções apenas: o item b, com tópico no final, e o
item f, em que o tópico abrange os dois primeiros períodos.

Merecem destaque também as formas de desenvolvimento do parágrafo, que,


conforme Othon Garcia (op. cit.), podem ser:

a) por descrição de detalhes

O exercício da autoridade é uma constante nela. Assim, embora possa conceder férias a
um empregado no período conveniente a ele, como o período que concilia as férias
escolares de um filho, aquela Chefe prefere postergar por um mês a concessão, só para
não atender ao pedido que lhe foi feito. Evita fazer concessões, cita constantemente as
leis, nunca faz um elogio. Apenas 'ordena', esperando obediência.

b) por confronto

Pedro ou Paulo será o novo presidente? Pedro é inteligente, honesto e arrojado nos
negócios. Paulo é igualmente inteligente e honesto, mas não tão arrojado. Pedro é
conhecido no meio empresarial por seu dinamismo e também por algumas decisões
tempestivas que lhe foram adversas; Paulo também é conhecido nos meios empresariais,
respeitado por sua cautela, que já lhe rendeu êxito em negócios, mas também já o fez
perder boas oportunidades.

c) por analogia

A raiva é como mar turbulento em dia de tempestade. Os trovões no céu e os borbotões


d'água se avolumando no mar lembram o rebentar da raiva no peito, abafando e
torturando o coração. As nuvens se condensando no céu se assemelham ao
embotamento mental causado pela raiva, obscurecendo nosso raciocínio lógico, nossas
decisões conscientes. Finalmente, e como consequência da alteração de saúde mental, a

24
raiva faz de nós indivíduos irascíveis, mal humorados, vingativos,destruidores como as
águas turbulentas do mar.

d) por citação de exemplos

Crase é fusão de sons idênticos. Assim, em "Vou à Bahia", temos dois "aa": o primeiro é a
preposição ‘da", pedida pelo verbo "ir", porque "quem” vai, vai a algum lugar"; o segundo
"a" é o artigo definido feminino singular, pedido pelo consequente, no caso o substantivo
locativo "Bahia''. Essa fusão é marcada em língua portuguesa pelo acento grave. Outra
fusão de sons idênticos pode ser vista na expressão “livre e contente”, agora sem marca
de acento gráfico: a vogal final da primeira palavra pronuncia-se /i/, da mesma forma que
a conjunção, donde a pronúncia /livri contente/. Em ambos os casos temos a crase.

e) por relação de motivo e causa

Você precisa alimentar-se bem. Está provado que a boa alimentação, sem exageros,
balanceada e adequada, previne doenças. Do alimento nosso organismo retira as
proteínas e as vitaminas necessárias ao bom funcionamento do nosso corpo etc. etc.

Observe agora a construção do texto abaixo:

Chegando ao terceiro milênio, o homem ainda não conseguiu resolver os


graves problemas que preocupam a todos, pois existem populações imersas em
completa miséria, a paz é interrompida frequentemente por conflitos internacionais e,
além do mais, o meio ambiente encontra-se ameaçado por sério desequilíbrio
ecológico.

  Embora o planeta disponha de riquezas incalculáveis – estas, mal distribuídas,


quer entre Estados, quer entre indivíduos – encontramos legiões de famintos em pontos
específicos da Terra. Nos países do Terceiro Mundo, sobretudo em certas regiões da
África, vemos com tristeza, a falência da solidariedade humana e da colaboração entre as
nações.

Além disso, nestas últimas décadas, temos assistido, com certa preocupação, aos
conflitos internacionais que se sucedem. Muitos trazem na memória a triste lembrança
das guerras do Vietnã e da Coreia, as quais provocaram grande extermínio. Em nossos
dias, testemunhamos conflitos na antiga Iugoslávia, em alguns membros da Comunidade
dos Estados Independentes, sem falar da Guerra do Golfo, que tanta apreensão nos
causou.

Outra preocupação constante é o desequilíbrio ecológico, provocado pela


ambição desmedida de alguns, que promovem desmatamentos desordenados e poluem
as águas dos rios. Tais atitudes contribuem para que o meio ambiente, em virtude de
tantas agressões, acabe por se transformar em local inabitável.

 Em virtude dos fatos mencionados, somos levados a acreditar que o homem está
muito longe de solucionar os graves problemas que afligem diretamente uma grande
parcela da humanidade e indiretamente a qualquer pessoa consciente e solidária. É
desejo de todos nós que algo seja feito no sentido de conter essas forças ameaçadoras,

25
para podermos suportar as adversidades e construir um mundo que, por ser justo e
pacífico, será mais facilmente habitado pelas gerações vindouras.

Nota: Se vocês seguirem a orientação dada pelo esquema, desde o 1º


parágrafo, verão que não há como se perder na redação, nem fazer a introdução maior
que o desenvolvimento, já que a introdução apresenta, de forma embrionária, o que será
desenvolvido no corpo do texto. E lembre-se de que a conclusão sempre retoma a ideia
apresentada na introdução, reafirmando-a, apresentando propostas, soluções para o caso
apresentado. Com essa noção clara, de estrutura de texto, também é possível melhorar o
seu desempenho nas provas de compreensão e interpretação de textos.

Análise do texto:

TEMA:

1º parágrafo:

2° parágrafo :

3° parágrafo:

4° parágrafo:

5° parágrafo:

EXERCÍCIOS

1) Identifique a que tipo de tópico frasal pertence cada trecho abaixo:

a) A televisão, apesar das críticas que recebe, tem trazido muitos benefícios às pessoas,
tais como: informação, por meio de noticiários que mostram o que acontece de importante
em qualquer parte do mundo; diversão, através de programas de entretenimento (shows,
competições esportivas); cultura, por meio de filmes, debates, cursos.

b) Era o casarão clássico das antigas fazendas negreiras. Assobradado, erguia-se em


alicerces o muramento, de pedra até meia altura e, dali em diante, de pau-a-pique (...) À
porta da entrada ia ter uma escadaria dupla, com alpendre e parapeito desgastado.
(Monteiro Lobato)

c) Embora a vida real não seja um jogo, mas algo muito sério, o xadrez pode ilustrar o fato
de que, numa relação entre pais e filhos, não se pode planejar mais que uns poucos
lances adiante. No xadrez, cada jogada depende da resposta à anterior, pois o jogador
não pode seguir seus planos sem considerar os contra-ataques do adversário, senão será
prontamente abatido. O mesmo acontecerá com um pai que tentar seguir um plano
preconcebido, sem adaptar sua forma de agir às respostas do filho, sem reavaliar as
constantes mudanças da situação geral, na medida em que se apresentam. (Bruno
Betelheim, adaptado)

d) As adivinhações agradam particularmente às crianças. Por que isso acontece de


maneira tão generalizada? Porque, mais ou menos, representam a forma concentrada,
quase simbólica, da experiência infantil de conquista da realidade. Para uma criança, o
mundo está cheio de objetos misteriosos, de acontecimentos incompreensíveis, de figuras

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indecifráveis. A própria presença da criança no mundo é, para ela, uma adivinhação a ser
resolvida. Daí o prazer de experimentar de modo desinteressado, por brincadeira, a
emoção da procura da surpresa. (Gianni Rodari, adaptado)

e) Quatro funções básicas têm sido atribuídas aos meios de comunicação: informar,
divertir, persuadir e ensinar. A primeira diz respeito à difusão de notícias, relatos e
comentários sobre a realidade. A segunda atende à procura de distração, de evasão, de
divertimento por parte do público. A terceira procura persuadir o indivíduo, convencê-lo a
adquirir certo produto. A quarta é realizada de modo intencional ou não, por meio de
material que contribui para a formação do indivíduo ou para ampliar seu acervo de
conhecimentos. (Samuel P. Netto, adaptado)

f) A imaginação utópica e inerente ao homem, sempre existiu e continuará existindo. Sua


presença é uma constante em diferentes momentos históricos: nas sociedades primitivas,
sob a forma de lendas e crenças que apontam para um lugar melhor; nas formas do
pensamento religioso que falam de um paraíso a alcançar; nas teorias de filósofos e
cientistas sociais que, apregoando o sonho de uma vida mais justa, pedem-nos que
"sejamos realistas, exijamos o impossível". (Teixeira Coelho, adaptado).

2) Desenvolva um parágrafo padrão onde se enquadra os itens a seguir, usando como


tópico frasal o primeiro item e fazendo uso de conectores, na estruturação do parágrafo.

ATENÇÂO: Você vai usar as ideias dos itens, podendo fazer ligeiras alterações na
morfossintaxe empregada no texto primitivo: tempos verbais, omissão de dados repetidos,
junção de itens etc.

a) A prefeitura do Rio decidiu cadastrar mendigos.

b) Calcula-se que o Rio tenha atualmente, junho de 98, cinco mil mendigos nas ruas.

c) Muitas famílias que esmolam nas ruas, têm casa, mas a renda familiar é insuficiente.

d) Essas famílias colocam seus velhos e suas crianças na mendicância.

e) A prefeitura vai incentivar essas famílias a abandonarem as ruas.

3) Selecione, dentre as frases que se seguem aquelas que você usaria no


desenvolvimento de um pequeno texto, com um só parágrafo, cujo tema fosse “Pessoas
que possuem famílias constituídas, não devem vagar pelas ruas”. Você tem as seguintes
opções:

a) A prefeitura do Rio decidiu cadastrar mendigos porque comprovou que nem todos os
pedintes de rua são pessoas abandonadas, sem família.

b) O sociólogo Betinho idealizou a Agenda Social para melhorar a qualidade de vida e


integrar moradores das favelas.

c) Calcula-se que o Rio possa ter hoje, junho/98, cinco mil mendigos nas ruas.

d) Muitas pessoas que mendigam, têm família, mas a renda familiar é insuficiente.

e) Algumas famílias colocam seus velhos e suas crianças na mendicância.

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f) A prefeitura está programando meios de incentivar essas famílias a abandonarem as
ruas.

g) A Agenda Social foi uma iniciativa do Betinho, falecido em 1997.

h) A prefeitura espera poder resolver de outra forma o problema dessas famílias que
incentivam seus velhos e suas crianças à mendicância, para aumentar sua renda familiar.

i) Betinho foi um cidadão consciente, porque buscou minorar os problemas sociais.

Pede-se que você cite as letras correspondentes aos períodos que você empregou.

4) Releia o texto que você estruturou e responda, a seguir, por que abandonou alguns dos
sete itens acima.

5) Veja se consegue formular um silogismo em que se apliquem as ideias das frases não
utilizadas no exercício 3.

6) Leia atentamente os textos abaixo e responda às questões propostas:

a) Quais são as questões abordadas pelos autores em cada texto?

b) Explique, com suas palavras, qual o posicionamento que os autores assumem diante
dos temas abordados.

c) Retire de cada um dos textos dois argumentos usados e explique por que o autor os
teria empregado para defender seu ponto de vista.

TEXTO 1

Castigos viscerais

Por Hélio Schwartsman1 em 25/02/2010

Definitivamente, eu estou me tornando um populista. Pela segunda semana consecutiva,


deixo-me pautar por apelos de leitores. Assim, a pedidos, comento hoje a soltura de um
dos assassinos do garoto João Hélio, brutalmente morto durante um assalto no Rio de
Janeiro três anos atrás. As circunstâncias do caso, para quem não se lembra, foram as
piores possíveis.

Na noite da quarta-feira 7 de fevereiro de 2007, João Hélio estava no carro com sua mãe,
a irmã e uma amiga da família, quando foram abordados por três bandidos, que, armados,
1
Hélio Schwartsman, 44, é articulista da Folha. Bacharel em filosofia, publicou "Aquilae Titicans - O Segredo de
Avicena - Uma Aventura no Afeganistão" em 2001. Escreve para a Folha Online às quintas.

28
ordenaram ao grupo que abandonasse o veículo. Antes que a mãe pudesse desafivelar o
cinto de segurança do garoto para retirá-lo, os assaltantes aceleraram. João Hélio foi
arrastado por sete quilômetros. Durante a fuga, motoristas e passantes alertavam
desesperadamente os criminosos por meio de gestos e sinais para o fato de que o
menino estava sendo esfolado vivo. Os ladrões, entretanto, segundo relato que um deles
teria depois feito à polícia, debochavam, dizendo que o que estava sendo arrastado não
era uma criança, mas um mero "boneco de Judas". Após cruzar vários bairros do Rio, os
assassinos acabaram abandonando o carro. O corpo de João Hélio já era uma massa
amorfa, sem dedos, joelhos e cabeça.

Como não poderia deixar de ser, a libertação de um dos bandidos, após apenas três anos
de medida socioeducativa (o rapaz era menor de 18 anos na época do crime), causa
revolta. No que muitos consideram uma provocação, a ONG Projeto Legal, que trabalha
com menores infratores, ainda requereu e por alguns dias conseguiu que o jovem fosse
inscrito no Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte
(Ppcaam), o que lhe daria direito a uma nova identidade e auxílio material do poder
público.

O tratamento que se deve dispensar a criminosos é uma daquelas questões viscerais que
separam a esquerda da direita, as pessoas com inclinações liberais de seus homólogos
mais conservadores. Como sempre, o que está atuando aqui são dois modos ligeiramente
diferentes de colocar-se no mundo. E a razão para as diversas "Weltanschauungen" tem
origem cerebral.

Não há indivíduo psiquicamente saudável que não se comova com a história de João
Hélio. A fim de promover e facilitar a vida em sociedade, a evolução nos dotou com uma
série de mecanismos como neurônios espelho e descargas de oxitocina que fazem com
que nos identifiquemos com outros seres humanos. Ao ler a descrição do crime,
automaticamente nos colocamos no lugar de seus pais. Experimentamos um lampejo de
sua dor e da raiva que sentem dos assassinos. O impulso de querer ver os criminosos
castigados é não apenas uma emoção genuína como também necessária para a
estabilidade social. Se não tivéssemos o desejo de punir os que tentam se aproveitar de
nossos esforços conjuntos, não conseguiríamos viver nem em clãs, quanto menos em
cidades de milhões de habitantes.

Só que o circuito emocional da empatia, embora extremamente vívido, não é o único a


atuar em nossas cacholas. Também fomos dotados de sistemas capazes de analisar atos
e suas consequências e projetá-las no futuro. Ainda que muito mais frias do que a
empatia, considerações racionais podem inibir nossos impulsos sociais mais primitivos e
modulá-los um bocadinho. Gostemos ou não, a capacidade de refrear impulsos e
emoções permitindo a interveniência do mais ponderado cálculo é a grande responsável
pelo sucesso evolutivo da humanidade, que logrou transformar a natureza e assenhorar-
se de todos os nichos ecológicos em que se instalou.

Evidentemente, os dois sistemas (e muitos outros que não cabe aqui enumerar) convivem
lado a lado em cada indivíduo. Se fôssemos apenas instinto, não nos diferenciaríamos de
outros mamíferos sociais como lêmures e babuínos. Se, alternativamente, não
contássemos com emoções gregárias como a empatia, não passaríamos de sociopatas
que, por não confiar no próximo, provavelmente nem teríamos descido das árvores.

Quanto cada pessoa se deixa guiar por cada qual desses circuitos independentes mas
interligados é que vai definir seu posicionamento político em relação a criminosos. Os

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que, mesmo sem estar pessoal e diretamente envolvidos com um caso qualquer, dão
mais peso às emoções e se inclinam pela punição tão dura quanto possível dos bandidos
podem classificar-se como conservadores. Já os que adotam uma linha pragmática, que
vê a sanção mais como uma forma de manter a coesão social do que de "fazer justiça"
(na verdade, a própria noção de justiça é um conceito para lá de problemático), são o que
consideramos de esquerda.

Subjaz a cada uma dessas posições uma visão mais ou menos pessimista da natureza
humana. Para os direitistas, um sujeito com propensão a cometer crimes manterá essa
característica por toda a sua vida. A sociedade que decide eliminá-lo através de institutos
como a pena de morte está apenas exercendo seu direito de autodefesa. Já para os
liberais, a natureza humana é pelo menos um pouco maleável. Embora muitos bandidos
reincidam, alguns deles, ao final de suas sentenças, se tornaram bons cidadãos ou pelo
menos inofensivos. De mais a mais, existe sempre a possibilidade de erro judicial, o que
basta para nos acautelar contra respostas irreversíveis como a sanção capital.

Pessoalmente, me enquadro na segunda categoria. Compreendo perfeitamente os que


estão agora com vontade de esganar com as próprias mãos os assassinos de João Hélio
porque consigo imaginar-me no lugar dos pais do garoto. A lógica das instituições não
pode, contudo, pautar-se unicamente por nossos hormônios sociais. A impessoalidade
que se cobra do Estado exige que ele seja bem mais frio. O máximo que se pode fazer,
como concordarão todos os que se dispuserem a fazer uma análise racional e
desapaixonada, é aplicar a regra previamente acordada ("nulla poena sine lege" não
haverá pena sem lei anterior que a defina). E, neste caso, a maior sanção cabível a
menores de 18 anos, por mais bárbaros que tenham sido seus delitos, são três anos de
medida socioeducativa.

Podemos mudar essa norma? Sim, poderíamos, no âmbito de uma nova Constituição ou
de uma ampla reforma da Carta, que não ocorreria sem contestações judiciais. Embora
eu não seja um desses militantes de direitos humanos que veem a preservação da
maioridade penal aos 18 anos como um fim em si mesmo, tenho um certo receio de dar a
primeira mexida nesse vespeiro.

Vamos supor que baixemos a idade mínima para o encarceramento para 16 anos, como
muitos defendem. Seria uma questão de tempo até que um jovem de 14 ou 15 cometesse
um crime sanguinário que geraria uma onda de protestos por nova redução. Logo
estaríamos, como nos EUA e no Reino Unido, condenando a longas penas de prisão
crianças de 10 ou 11 anos o que é sempre menos chocante no sistema de "common law"
anglo-saxão do que no Direito codificado que herdamos da Europa continental.

Parece-me mais correto e honesto colocar a questão da seguinte forma: concordamos ou


não com o princípio que norteia o Direito brasileiro de que jovens, por estarem em
formação, merecem sanções mais brandas e com propósitos pedagógicos, na esperança,
por vezes vã, de que eles se emendem? Se respondemos afirmativamente, tudo o que
nos resta é definir de modo mais ou menos arbitrário a fronteira da maioridade e os limites
das penas aceitar as consequências. Sempre haverá crimes abaixo da linha traçada que
nos deixarão de mãos amarradas. Podemos, é verdade, recusar esse princípio. Fazê-lo
nos permitiria punir exemplarmente adolescentes assassinos, aplacando nossa sede de
vingança. A contrapartida, porém, é que estaríamos nos colocando em alguma medida
contra aqueles mesmos instintos gregários que fazem com que nos importemos com a
educação dos jovens.

30
Um bom sistema penal é aquele que consegue, sempre seguindo as exigências da
manutenção do Estado de Direito, dar uma resposta que satisfaça parcialmente o desejo
de "fazer justiça" da sociedade. No Brasil, infelizmente, não estamos cumprindo
minimamente nenhum dos dois quesitos.

Retirado de http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/. Acesso em 25 de fevereiro de


2010.

TEXTO 2

Sem limites

Marcia Tiburi2 (Publicado em Vida Simples em 2008)

Critica-se por aí a falta de limite das crianças. Reclama-se dos adolescentes criados sem
limites. No quarto escuro do caos, esperamos que a luz do limite venha por a bagunça em
ordem. Nem adultos escapam da exigência geral. Impõem-se leis rígidas contra o
consumo do álcool, fecham-se as casas de jogo, grita-se contra as drogas. Um submundo
de tensões mais clandestinas aqui, menos ali, atrapalha a expectativa de um mundo
ordenado. Tudo o que se diz contra os excessos destrutivos é em nome de limites.

De tanto gritar limites ficamos surdos para nossos próprios gritos. Onde foi parar o bom-
senso é questão que é preciso retomar. Quem para pra pensar no porquê de tantas
imposições? A rigidez das atitudes é a resposta fácil no desespero. O desespero é o
descaminho que se explica pela falta de limites e pela tentativa de criá-los, a cada vez,
pela força. É o limite que ficou sem limite. A excessiva proibição nos torna incompetentes
para a vida.

Onde estão os limites?

Para muitos basta dar “limites” para realizar uma boa educação. Como se a experiência

do limite sozinha pudesse ser a salvação para alguém que se perdeu. Um não dito em
tom solene aqui, ou acolá, e estaria feita a mágica. Sabemos que não funciona assim.
Professores contam com soluções vindas de casa. Pais desatentos ou ocupados esperam
que os limites sejam produzidos na escola como se encontrar o “limite” fosse tarefa da
educação formal. Nem uma coisa nem outra. Parece que o limite tornou-se uma palavra
mágica a carregar a culpa para o lado oposto onde cada um está. A tarefa de dar limite é
uma das tantas que esperamos dos outros. Todos sabemos que ela dá muito trabalho.
Muitas vezes nem sabemos, os responsáveis, do que se trata. Mas no fundo, talvez a
preguiça de agir demonstre mais do que cansaço ou descaso. Talvez não confiemos na
possibilidade de que um limite seja a resposta para nossos problemas na educação, nos
relacionamentos, pois nós mesmos não nos damos limites. Somos autoindulgentes,
autopiedosos, sempre prontos a perdoar as nossas falhas. A revolta contra as leis é sinal
de que não vemos vantagem dos limites para nós mesmos. A culpa – e o problema – é
dos outros.

Limite para tudo

2
Márcia Tiburi é filósofa, graduada em filosofia e artes e mestre e doutora em filosofia pela UFRGS.

31
Os filósofos antigos usavam o termo “peras” para expressar os limites. Tanto nos pré-
socráticos, quanto em Platão e Aristóteles, este conceito tinha uma função metafísica, ou
seja, servia para explicar como as coisas existiam, porque elas eram o que eram e não
diferentes. Por exemplo, Aristóteles dizia que qualquer coisa não existe para além do
limite. Tudo o que existe precisava de um limite para existir. Para saber o que algo é e
onde está se usa a noção do limite. Limite é sinônimo de forma. Afinal não podemos
saber o que é uma casa se não reconhecemos seus limites concretos, arquiteturais, que
são, afinal, formais. Até a beleza era entendida como uma espécie de limite. Se
pensarmos bem, toda a nossa forma de ver o mundo, de pensar, de entender as coisas,
depende deste conceito.

Em termos éticos, aparentemente menos abstratos para a nossa mentalidade atual, os


antigos entendiam o limite como autodomínio, capacidade de controlar as próprias
paixões (mais tarde chamadas de pecados), de viver no meio-termo. Limite era tudo que
tanto impedia como possibilitaria movimentos. Qualquer ação dependia de limites no
espaço e no tempo. Mas também dos limites externos ou internos de que agia.

Respeito ilimitado

Todo limite é uma experiência que se formula na relação com o outro. Entre eu e o outro
há sempre um espaço imponderável. Neste vazio entre “eu e tu” a melhor coisa a ser
colocada é o respeito. Se o limite é a experiência que permite saber até onde se pode
chegar e, com sorte, a protetora dor de saber aonde não se deve ir, o respeito é a única
de todas as experiências que não pode ter limite.  Por que respeito é o modo de olhar
para o outro como algo positivo, ver nele sua potência de ser, como alguém que, mesmo
me sendo próximo, carrega em si algo que não pode dizer sobre si mesmo para mim, e,
por isso mesmo, sempre será intocável.

Nenhum respeito

A total ausência de respeito pelo outro é o que caracteriza a figura do perverso. O


perverso é aquele que, por algum motivo que apenas pode ser ponderado caso a caso,
rompeu com o limite. Ele vive da crença de que é capaz de submeter o outro. No entanto,
mesmo quando destrói o outro, não deixa de enganar a si mesmo. Ele vive da crença de
que tomou posse de sua vítima, mas é apenas uma crença e, como tal, não se sustenta
na negação de quem não crê. A crença é sustentável apenas enquanto a vítima sustenta
a posição do perverso. Em momento algum, no entanto, ele atingirá o âmago da outra
pessoa. O perverso é um eterno logrado. Um frustrado que ilude o outro pelo medo.
Quem se deixa levar é também iludido. E frustrado porque é impossível atingir o fundo
irreconhecível de cada pessoa. Aquilo que justifica que somos seres humanos e que
podemos sempre chamar de dignidade. Só esta convicção pode aniquilar um olhar e uma
atitude perversas. Limite é, no fundo, o lugar intangível de cada um. 

Retirado de http: //www.marciatiburi.com.br. Acesso em 17 de março de 2009.

TEXTO 3

Ineficiência do sistema penal confirma impunidade

32
Por Raphael Boldt de Carvalho3em 12/02/2011

O discurso da impunidade permeia toda e qualquer análise da atual conjuntura jurídico-


penal, sobretudo no contexto dos países periféricos (especialmente os latino-americanos),
notórios por um quadro político-econômico que tem propiciado o surgimento de políticas
criminais sustentadas no medo e na exclusão de longos contingentes populacionais.

Todavia, imprecisões terminológicas à parte, a tão propalada impunidade não se trata de


um fenômeno novo ou exclusivamente latino-americano, mas está intimamente ligada a
problemas estruturais do Direito Penal, equivocadamente concebido como instrumento de
salvaguarda da humanidade de sua destruição.

Não obstante a incapacidade do Direito Penal de prevenir – seja em caráter geral ou


especial – a prática de novas infrações e de assegurar a tutela de bens jurídicos,
verificamos hodiernamente uma tendência à expansão do poder punitivo estatal que, em
contrapartida, aprofunda a crise de legitimidade do próprio Direito Penal.

Assim, se de um lado presenciamos o poder criminalizador das agências penais, no plano


da eficácia inexiste correspondência entre o processo de criminalização primária –
seleção de condutas criminalizadas no âmbito da atividade legiferante – e o de
criminalização secundária, consistente na atuação dos aparelhos repressivos na
dissuasão de delitos[1].

Nesse sentido, torna-se possível falar nas cifras ocultas da criminalidade, fenômeno que
se refere à “lacuna existente entre a totalidade dos eventos criminalizados ocorridos em
determinado tempo e local (criminalidade real) e as condutas que efetivamente são
tratadas como delito pelos aparelhos de persecução penal (criminalidade registrada)”[2].

A ineficiência do sistema penal acaba por confirmar o mencionado discurso da


impunidade; contudo, a partir de uma rápida observação da realidade social, percebemos
que, se a impunidade afigura-se como a regra, o sistema punitivo opera seletivamente,
alcançando os grupos excluídos do mercado de trabalho e de consumo, altamente
vulneráveis e identificados com o biótipo ideal do homo criminalis construído pelas
escolas etiológicas e socialmente reproduzido.

Na prática, percebemos que o discurso da impunidade tem sido instrumentalizado em prol


do acirramento da intervenção penal que, por sua vez, contribui decisivamente para a
deterioração dos direitos humanos dos grupos que, conforme mencionamos, compõem o
público-alvo do sistema penal. Com isso, o Direito Penal expõe uma de suas facetas mais
perversas, pois não só deixa de tutelar os direitos da “coletividade”, como viola os direitos
de um amplo contingente populacional.

Paralelamente à intensa atuação das agências de punitividade contra as pessoas que se


adequam ao estereótipo do delinquente, os crimes contra a administração pública
praticados por funcionários públicos se inserem nas cifras ocultas, uma vez que são

3
Raphael Boldt de Carvalho é advogado, professor de Direito Processual Penal da Faculdade de
Direito de Vitória, professor convidado da Escola Superior da Advocacia do Espírito Santo,
professor de Direito Penal no Centro de Evolução Profissional, mestre em Direitos e Garantias
Fundamentais pela FDV.

33
cometidos por sujeitos que possuem um baixo grau de vulnerabilidade e não compõem a
clientela do sistema penal.

Para ilustrar o que ora afirmamos, basta mencionar que o relatório do Departamento
Penitenciário Nacional (Depen)[3] indica a existência de aproximadamente 417.112
presos nas penitenciárias brasileiras, dos quais apenas 1.366 foram condenados por
crimes contra a administração pública, enquanto 217.777 praticaram delitos contra o
patrimônio. Algo surreal, se considerarmos que o nosso país foi classificado como o 17º
país mais corrupto do mundo em pesquisa realizada pela Transparência Internacional[4].

O panorama apresentado não só desmascara o discurso oficial acerca da suposta


neutralidade do Direito Penal, como nos permite compreender o significado político desse
setor do ordenamento jurídico, “centro da estratégia de controle social nas sociedades
contemporâneas”[5].

Ao atuar seletivamente, direcionando sua programação para os “selvagens”, antítese do


homem moderno civilizado, o sistema penal realiza as funções reais – encobertas pelas
funções declaradas – do Direito Penal, ou seja, garantir a reprodução da realidade social
desigual das sociedades contemporâneas[6].

Conforme assinalamos, embora empiricamente seja possível atestar a ocorrência


frequente de crimes como corrupção passiva (artigo 317 do CP), concussão (artigo 316
do CP), prevaricação (artigo 319 do CP), advocacia administrativa (artigo 321 do CP),
peculato (artigo 312 do CP), emprego irregular de verbas ou rendas públicas (artigo 315
do CP), para citar apenas alguns, notamos o déficit da criminalização secundária que,
concomitantemente, reforça o caráter meramente simbólico do Direito Penal, produzido,
neste caso, tão somente para satisfação retórica da opinião pública. Em decorrência
disso, aumenta-se o descrédito do Direito Penal e aprofunda-se a crise na qual se
encontra mergulhado.

Outrossim, ainda que se sustente ser o Direito Penal uma “amarga necessidade de uma
sociedade de seres imperfeitos”[7], não podemos deixar de considerar suas funções reais
(e ocultas), bem como a violência que lhe é inerente, responsável pela violação
sistemática dos direitos humanos dos setores subalternos.

Em outros termos, é possível afirmar que a realidade operativa do sistema penal – um


sistema desigual por excelência – encontra respaldo no discurso jurídico-penal oficial,
afigurando-se como um autêntico mecanismo de (re)produção da violência e manutenção
do status quo. Do ponto de vista jurídico, disfunções do direito penal; da perspectiva
criminológica crítica, funções realmente cumpridas por um apêndice do direito que vive de
(des)ilusões.

[1] CARVALHO, Salo de. Antimanual de criminologia. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2008.
[2] CARVALHO, Salo de. Antimanual de criminologia. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2008, p. 81.
[3] BATISTA, Eurico. Maior parte dos presos responde por tráfico e roubo. Conjur, 03 abr.
2010. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2010-abr-03/maior-parte-presos-
brasileiros-reponde-trafico-roubo-qualificado#autores#autores>. Acesso em: 03 jun. 2010.
[4] ALMEIDA, Gevan de. O crime nosso de cada dia. Rio de Janeiro: Impetus, 2004, p.
27.

34
[5] SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal: Parte Geral. Curitiba: Lumen Juris/ICPC,
2006, p. 06.
[6] BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do Direito Penal. Rio de
Janeiro: Revan, 2002.
[7] QUEIROZ, Paulo de Souza. Funções do direito penal: legitimação versus deslegitimação do
sistema penal. São Paulo: RT, 2005, p. 116.

Retirado de www.conjur.com.br. Acesso em 12 de fevereiro de 2011.

Texto 4

A tragédia da irresponsabilidade

Por Gilberto Dimenstein4 em 13/01/2011

A tragédia na região serrana do Rio mistura a catástrofe natural com a irresponsabilidade


pública e a ignorância --é, aliás, algo comum nas catástrofes brasileiras. Basta ver o que
fala o Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do Rio (CREA-RJ).

A entidade afirma que há pelo menos dois anos adverte as cidades da região serrana
sobre as ocupações irregulares, mas, na maioria das vezes, sem nenhum efeito. Nem
resposta tiveram.

Falta, segundo a entidade, qualquer planejamento urbanístico, o que contraria interesses


econômicos de condomínios de alto luxo. Ou a disposição de arrumar briga com os mais
pobres.

Soma-se a isso a ignorância: prefeituras, de acordo com o CREA-RJ, não teriam


profissionais qualificados para evitar a construção de casas em áreas de risco.

Daí se vê, como sempre, como o descaso é uma tragédia permanente no Brasil.

Retirado de http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/. Acesso em 12 de fevereiro de


2011.

TEXTO 5

SP: a cidade mais interessante do Brasil

Por Gilberto Dimenstein5 em 25/01/2011

4
Gilberto Dimenstein, 52, é membro do Conselho Editorial da Folha e criador da ONG Cidade Escola
Aprendiz. Coordena o site de jornalismo comunitário da Folha. Escreve para a Folha Online às segundas-
feiras.

35
Não é bairrismo, apenas uma simples constatação: São Paulo não é apenas uma das
cidades mais interessantes do Brasil, mas do mundo. Assim como também poderia ser
classificada como uma das cidades mais estressantes, talvez a mais estressantes do
Brasil.

Na minha visão, a melhor cidade não é aquela mais bonita ou mais agradável. É aquela
em que existe efervescência de seu capital humano, gente criando e renovando por todos
os lados, sempre como um projeto na cabeça.

É um lugar em que se sentem desafios cotidianos, tem sempre um pé no futuro e as


pessoas se imaginam capazes de desenhar amanhã. Daí o borbulhar.

Por isso, a cidade não é só dos que nasceram nela. É mais daquele que chegam para
fazer algo de novo.

São Paulo é tudo isso. E cada vez. O que não a faz mais civilizada. Vivemos uma
barbárie diária.

Mas para gostar de São Paulo (e eu gosto muito) só gostando muito de viver no meio de
gente com tantos projetos na cabeça.

Retirado de http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/. Acesso em 12 de fevereiro de


2011.

UNIDADE III – TIPOS DE FALÁCIAS

DEFEITOS DE ARGUMENTAÇÃO: FALÁCIAS E ERROS DE RACIOCÍNIO

Cuidado com as palavras! Cuidado com o que você ouve, lê ou escreve. Você não
deve acreditar em tudo o que ouve ou lê. Você deve ter habilidade para lidar com
discursos, com textos, com o que lhe dizem, com argumentos que lhe apresentam nos
5
Gilberto Dimenstein, 52, é membro do Conselho Editorial da Folha e criador da ONG Cidade Escola
Aprendiz. Coordena o site de jornalismo comunitário da Folha. Escreve para a Folha Online às segundas-
feiras.

36
debates do dia-a-dia. Deve distinguir o que o vulgo confunde. Deve ter critérios para
aceitar ou rejeitar enunciados, argumentos, declarações feitas. Muitas carecem de
fundamentação. São ardilosas. Enganadoras. Fraudulentas. Falsas. Falaciosas.
Como você reagiria, por exemplo, aos enunciados abaixo? Quais você aceitaria?
Como você argumentaria para rejeitar os que devem ser rejeitados? Tente.

1. Se eu abrir uma exceção para você, deveria abrir também para João. Se abrir para
João, devo abrir para André. E para Marcos também. Depois para Maria,
Madalena, etc.

2. Você deve votar de acordo com o partido! Ou será expulso!


3. A professora chamou a atenção de Joãozinho na semana passada (duas vezes) e
nesta (segunda, quarta e sexta). Não adianta mais chamar a atenção dele. Vamos
suspendê-lo.
4. Os brasileiros gostam de praia, café, carnaval e futebol.
5. A lei que reduz o porte de armas de fogo deve ser abolida, pois, desde que entrou
em vigor, a criminalidade aumentou.

Todos os enunciados acima devem ser rejeitados. São falácias. São enunciados ou
tentativas de persuadir o leitor mediante em raciocínio errôneo, mediante um argumento
fraudulento, enganoso.

Essas falácias, como você pode constatar, estão em todos os discursos: na


publicidade, na política, nas religiões, na economia, no comércio, etc.

Falácia é, pois, todo o raciocínio aparentemente válido, mas, na realidade


incorreto, que faz cair em erro ou engano.

Tradicionalmente, distinguem-se dois tipos de falácias: o paralogismo e o sofisma.


O paralogismo é uma falácia cometida involuntariamente, sem má-fé; o sofisma, uma
falácia cometida com plena consciência, com a intenção de enganar.

Essa distinção não é, no entanto, aceitável, pois introduz um critério exterior à


lógica - a ética. Dito de outro modo, não compete à lógica apreciar as intenções de quem
argumenta. Por isso, tornam-se como sinônimos os termos falácia e sofisma.

A seguir, apresentam-se os principais tipos de falácias.

2. TIPOS DE FALÁCIAS

2.1 ____________________________________

Definição:
Consiste em ameaçar com consequências desagradáveis se não for aceita ou acatada a
proposição apresentada.

37
Exemplo:
- Você deve se enquadrar nas novas normas do setor. Ou quer perder o emprego?
- É melhor exterminar os bandidos: você poderá ser a próxima vítima.

Contra-argumentação:
Argumente que apelar à força não é racional, não é argumento, que a emoção não tem
relação com a verdade ou a falsidade da proposição.

2.2 _____________________________________

Definição:
Consiste em apelar à piedade, à misericórdia, ao estado ou virtudes do autor.

Exemplo:
Ele não pode ser condenado: é bom pai de família, contribuiu com a escola, com a igreja,
etc.

Contra-argumentação:
Argumente que se trata de questões diferentes, que o que é invocado nada tem a ver com
a proposição. Quem argumenta assim ignora a questão, foge do assunto.

2.3 ____________________________________

Definição:
Consiste em sustentar uma proposição por ser defendida pela população ou parte dela.
Sugere que quanto mais pessoas defendem uma ideia mais verdadeira ou correta ela é.
Incluem-se aqui os boatos, o "ouvi falar", o "dizem", o "sabe-se que".

Exemplo:
Dizem que um disco voador caiu em Minas Gerais, e os corpos dos alienígenas estão
com as Forças Armadas.

Contra-argumentação:
Os educadores, os professores, as mães têm o argumento: se todos querem se atirar em
alto mar, você também quer? O fato de a maioria acreditar em algo não o torna
verdadeiro.

2.4 ___________________________________

Definição:
Consiste em citar uma autoridade (muitas vezes não - qualificada) para sustentar uma
opinião.

Exemplo:
Segundo Schopenhauer, filósofo alemão do séc. XIX, "toda verdade passa por três

38
estágios: primeiro, ela é ridicularizada; segundo, sofre violenta oposição; terceiro, ela é
aceita como auto-evidente". (De fato, riram-se de Copérnico, Galileu e outros. Mas nem
todas as verdades passam por esses três estágios: muitas são aceitas sem o ridículo e a
oposição. Por exemplo: Einstein).

Contra-argumentação:
Mostre que a pessoa citada não é autoridade qualificada. Ou que muitas vezes é perigoso
aceitar uma opinião porque simplesmente é defendida por uma autoridade. Isso pode nos
levar a erro.

2.5 ______________________________________

Definição:
Consiste no erro de afirmar que algo é melhor ou mais correto porque é novo, ou mais
novo.

Exemplo:
Saiu a nova geladeira Pólo Sul. Com design moderno, arrojado, ela é perfeita para sua
família, sintonizada com o futuro.

Contra-argumentação:
Mostre que o progresso ou a inovação tecnológica não implica necessariamente que algo
seja melhor.

2.6 ______________________________________

Definição:
É o erro de afirmar que algo é bom, correto apenas porque é antigo, mais tradicional.

Exemplo:
Essas práticas remontam aos princípios da Era Cristã. Como podem ser questionadas?

Contra-argumentação:
Argumenta que o fato de um grande número de pessoas durante muito tempo ter
acreditado que algo é verdadeiro não é motivo para se continuar acreditando.

2.7 ______________________________________

Definição:
Consiste em apresentar apenas duas opções, quando, na verdade, existem mais.

Exemplos:
- Brasil: ame-o ou deixe-o.
-Você prefere uma mulher cheirando a alho, cebola e frituras ou uma mulher sempre
arrumadinha?

39
Contra-argumentação:
Simples. Mostre que há outras opções.

2.8 ______________________________________

Definição:
Um axioma é uma verdade autoevidente sobre a qual outros conhecimentos devem se
apoiar. Por exemplo: duas quantidades iguais a uma terceira são iguais entre si. Outro
exemplo: a educação é a base do progresso. Muitas vezes atribuímos, no entanto,
"status" de axioma a muitas sentenças ou máximas que são, na realidade, verdades
relativas, verdades aparentes.

Exemplo:
Quem cedo madruga Deus ajuda.

Contra-argumentação:
Mostre que muitas frases de efeito, impactantes, bombásticas, retóricas, muito
respeitadas podem ser meras estratégias mediantes as quais alguém tenta convencer,
persuadir o ouvinte/leitor em direção a um argumento. No caso dos provérbios, mostre
que se contradizem:
- Ruim com ele, pior sem ele X Antes só do que mal acompanhado.
-Depois da tempestade vem a bonança X Uma desgraça nunca vem sozinha.
- Longe dos olhos, perto do coração X O que os olhos não veem o coração não sente.

2.9 _____________________________________

Definição:
É uma afirmação ou proposição de caráter geral, radical e que, por isso, encerra um juízo
falso em face da experiência.

Exemplo:
A prática de esportes é prejudicial à saúde.

Contra-argumentação:
Mostre que é necessário especificar os enunciados. Othon Garcia (Comunicação em
Prosa Moderna, FGV, 1986, p. 169) ilustra como se pode especificar a falácia acima,
dada como exemplo: A prática indiscriminada de certos esportes violentos é prejudicial à
saúde dos jovens subnutridos.

2.10 _____________________________________

Definição:
Trata-se de tirar uma conclusão com base em dados ou em evidências insuficientes. Dito
de outro modo, trata-se de julgar todo um universo com base numa amostragem reduzida.

Exemplos:
- Todo político é corrupto.
- Os padres são pedófilos.

40
Contra-argumentação:
Argumente que dois professores ruins não significam uma escola ruim; que em ciência é
preciso o maior número de dados antes de tirar uma conclusão; que não se pode usar
alguns membros do grupo para julgar todo o grupo. Faça ver que se trata, na maioria das
vezes, de estereótipo: imagem preconcebida de alguém ou de um grupo. Faça ver
também que são fonte de inspiração de muitas piadas racistas, como as piadas de judeus
(visto como avarento), de negro (vista como malandro ou pertencente a uma classe
inferior), de português (visto no Brasil como sem inteligência), etc. É por isso que essa
falácia está intimamente relacionada ao preconceito.

2.11 _____________________________________

Definição:
Consiste em atacar, em desmoralizar a pessoa e não seus argumentos. Pensa-se que, ao
se atacar a pessoa, pode-se enfraquecer ou anular sua argumentação.

Exemplo:
- Não deem ouvidos ao que ele diz: ele é um beberrão, bate na mulher e tem amantes.
Observação: Uma variação de "argumentum ad homimem" é o "tu quoque" (tu também):
Consiste em atribuir o fato a quem faz a acusação. Por exemplo: se alguém lhe acusa de
alguma coisa, diga-lhe "tu também"! Isso, evidentemente, não prova nada.

Contra-argumentação:
Mostre que o caráter da pessoa não tem relação com a proposição defendida por ela.
Chamar alguém de corrupto, nazista, comunista, ateu, pedófilo, etc. não prova que suas
ideias estejam erradas.

2.12 ______________________________________

Definição:
Consiste em tirar de uma proposição uma série de fatos ou consequências que podem ou
não ocorrer. É um raciocínio levado indevidamente ao extremo, às últimas consequências.

Exemplos:
- Mãe, cuidado com o Joãozinho. Hoje, na escolinha, ele deu um beijo na testa de
Mariazinha. Amanhã, estará beijando o rosto. Depois.... Quando crescer, vai estar
agarrando todas as meninas.
- O álcool e uma dieta pobre também são grandes assassinos. Deve o governo regular o
que vai à nossa mesa? A perseguição à indústria de fumo pode parecer justa, mas
também pode ser o começo do fim da liberdade. (Veja, agosto 2000, p.36)

Contra-argumentação:
Argumente dizendo que as consequências, os fatos, os eventos podem não ocorrer.

2.13 _________________________________________

41
Definição:
É o erro de acreditar que em dois eventos em sequência um seja a causa do outro. No
extremo, é uma forma de superstição: eu estava com gravata azul e meu time ganhou;
portanto, vou usá-la de novo.

Exemplo:
- O chá de quebra-pedra é bom para cálculos renais. Tomei e dois dias depois expeli a
pedra.
Observação: uma variação deste sofisma é o chamado "non sequitur" (não se segue,
"nada a ver") em que uma conclusão nada tem a ver com a premissa: Venceremos, pois
Deus é bom. (Deus é bom, mas não está necessariamente a seu lado; os inimigos podem
dizer a mesma coisa).

Contra-argumentação:
Mostre que correlação não é causação: o fato de que dois eventos aconteçam em
sequência não significa que um seja a causa do outro. Diga que pode ter sido apenas
uma coincidência.

2.14 ________________________________

Definição:
Consiste em comparar objetos ou situações que não são comparáveis entre si, ou
transferir um resultado de uma situação para outra.

Exemplos:
- Minhas provas são sempre com consulta a todo tipo de material. Os advogados não
consultam os códigos? Os médicos não consultam seus colegas e livros? Não levam as
radiografias para as cirurgias? Os engenheiros, os pedreiros não consultam as plantas?
Então?
- Os empregados são como pregos: temos que martelar a cabeça para que cumpram
suas funções.

Contra-argumentação:
Argumente que os dois objetos ou situações diferem de tal modo que a analogia se torna
insustentável. Mostre que o que vale para uma situação não vale para outra.

2.15 ______________________________________

Definição:
Consiste em transferir ao ouvinte o ônus de provar um enunciado, uma afirmação.

Exemplo:
Se você não acredita em Deus, como pode explicar a ordem que há no universo?

42
Contra-argumentação:
Mostre que o ônus da prova, isto é, a responsabilidade de provar um enunciado cabe a
quem faz a afirmação.

2.16 __________________________________

Definição:
Consiste em concluir que algo é verdadeiro por não ter sido provado que é falso, ou que
algo é falso por não ter sido provado que é verdadeiro.

Exemplos:
- Ninguém provou que Deus existe. Logo, Deus não existe.
- Não há evidências de que os discos voadores não estejam visitando a Terra; portanto,
eles existem.

Contra-argumentação:
Argumente que algo pode ser verdadeiro ou falso, mesmo que não haja provas.

2.17 _________________________________

Definição:
É o erro de reivindicar apenas a solução perfeita para qualquer plano.

Exemplo:
A automação cada vez maior dos elevadores desemprega muitas pessoas. Isso, portanto,
é ruim, economicamente desaconselhável.

Contra-argumentação:
Argumente que planos, medidas ou soluções não devem ser vistos como integralmente
perfeitos ou prejudiciais. Mostre que podem existir objeções para qualquer medida. Que
as desvantagens de um plano são suplantados pelas vantagens.

2.18 _________________________________________

Definição:
Consiste em apresentar duas proposições conectadas como se fossem uma única
proposição, pressupondo-se que já se tenha dado uma resposta a uma pergunta anterior.

Exemplos:
- Você já abandonou seus maus hábitos?
- Você já deixou de roubar no mercado onde trabalha?

43
Contra-argumentação:
Mostre que existem duas proposições e que uma pode ser aceita e outra não.

EXERCÍCIOS

1) Indique qual o tipo de falácia encontrado em cada trecho abaixo:

a) É perigoso viajar em carro dirigido por mulher.

b) Deve-se coibir usos como estes: "Me dá um cigarro", "eu vi ele", "tu foi", etc.,
porque, com essa permissividade, vamos reduzir a língua de Camões a uma
falação de brutos, a uma língua pobre, de poucas palavras e alguns grunhidos.
c) Sabia que o casal X está se separando? Mas cuidado: em briga de marido e
mulher ninguém põe a colher.
d) Aqui se faz, aqui se paga.
e) Você confia num dentista que foi aprovado com média cinco no vestibular?
f) Crentes, muçulmanos, são todos uns fanáticos.
g) Os padres são pedófilos, os padres são mulherengos, os padres só pensam em
dinheiro, os advogados são uns enroladores, os políticos são corruptos, os
médicos uns açougueiros, os alunos são uns deitados, etc.
h) O elo perdido entre o homem e o macaco não foi encontrado: por isso a teoria da
evolução está errada e a Bíblia está certa.
i) A ingestão de vinho faz bem.
j) O vinho é uma bebida saudável, que faz bem ao coração. É estimulante. Assim foi
reconhecido por todos os povos antigos. Inclusive o Apóstolo São Paulo
recomendava vinho em suas epístolas.
k) Tratava-se de discutir e eleger o perfil do professor ideal: ele seria autoritário ou
deveria dar plena liberdade aos alunos?
l) A egiptóloga Fulana de Tal é uma principiante, obteve o doutorado há pouco
tempo, tem limitada experiência: não pode julgar um descobrimento tão importante.
m) Não vou votar nele para presidente: ele bebe.
n) Todo nordestino é hábil, L. é nordestino, L. é hábil - Toda pessoa hábil é bom
político. Ele é hábil. Ele é bom político, - Todo bom político é bom administrador.
Ele é bom político. Ele é bom administrador. - Todo bom administrador merece ser
eleito. Ele é bom administrador. Ele merece ser eleito.
o) Dez milhões de pessoas não podem estar erradas. Junte-se a nossa igreja você
também.
p) Isso é uma verdade tão sublime que um milhão de pessoas já a aceitaram como
regra de fé.
q) A Astrologia é uma arte adivinhatória praticada há milhares de anos no Oriente.
Conta-se que os antigos reis da Babilônia teriam feito uso dela para saberem os
dias mais propícios para as batalhas. Até os antigos imperadores chineses
recorriam aos astros para guiarem seus passos no governo. É inadmissível que
ainda hoje não a considerem uma ciência.
r) Essas práticas remontam aos primeiros séculos de nossa igreja. Como você pode
questioná-las?
s) Milhares de pessoas acreditam no poder das pirâmides. Sem dúvida, elas devem
ter algo especial.
t) Os índices de analfabetismo têm aumentado muito depois do advento da televisão.
Obviamente ela compromete a aprendizagem.

44
u) A grande maioria das pessoas deste país são favoráveis à pena de morte como
meio de reduzir a violência. Ser contra a pena de morte é, pois, ridículo.
v) Não acredite nos linguistas: eles estão a serviço de uma ideologia de esquerda;
são liberais, revolucionários e populistas.
w) Não é preciso conhecer matemática para vencer na vida. Meus conhecimentos
dessa matéria não vão além das quatro operações e das frações ordinárias; no
entanto tenho um salário maior do que o de muitos engenheiros.
x) O senhor não tem autoridade para criticar nossa política educacional, pois nunca
concluiu uma faculdade.
y) Espero que o senhor aceite o portfólio e dê uma ótima nota, pois passei cinco
noites sem dormir e ainda por cima cuidando de minha avó, que está muito doente.

UNIDADE IV – PRONOMES E FORMAS DE TRATAMENTO


E SUAS RESPECTIVAS ABREVIATURAS

PRONOMES DE TRATAMENTO

1. AUTORIDADES DE ESTADO

Civis
Pronome de tratamento Abreviatura Usado para
Presidente da República, Senadores da
República, Ministro de Estado, Governadores,
Deputados Federais e Estaduais, Prefeitos,
Embaixadores, Vereadores, Cônsules, Chefes
das Casas Civis e Casas Militares
Reitores de Universidade
Diretores de Autarquias Federais, Estaduais e
Municipais

Judiciárias
Pronome de tratamento Abreviatura Usado para
Desembargador da Justiça, curador, promotor
Juízes de Direito

Militares

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Pronome de tratamento Abreviatura Usado para
Oficiais generais (até coronéis)
Outras patentes militares

2. AUTORIDADES ECLESIÁSTICAS

Pronome de tratamento Abreviatura Usado para


Papa
Cardeais, arcebispos e bispos
Abades, superiores de conventos, outras
autoridades eclesiásticas e sacerdotes em geral

3. AUTORIDADES MONÁRQUICAS

Pronome de tratamento Abreviatura Usado para


Reis e Imperadores
Príncipes

4. OUTROS TÍTULOS

Pronome de tratamento Abreviatura Usado para


Dom
Doutor
Comendador
Professor
Homem, rapaz
Mulher mais velha ou casada (no Brasil).
Mulher de qualquer idade ou estado civil (em
Portugal)
Menina, moça solteira (no Brasil)
Pessoas importantes , como autoridades de
uma cidade, como prefeito, algum secretário da
prefeitura
Usado para pessoas comuns, no mesmo
sentido de Senhoria, delegados, diretores de
alguma autarquia
Usado para pastores de igrejas protestantes

Observações:

Também são pronomes de tratamento o senhor, a senhora e você, vocês. "O senhor"
e "a senhora" são empregados no tratamento cerimonioso; "você" e "vocês", no
46
tratamento familiar. Você e vocês são largamente empregados no português do Brasil;
em algumas regiões, a forma tu é de uso frequente, em outras, é muito pouco
empregada. Já a forma vós tem uso restrito à linguagem litúrgica, ultraformal ou literária.

Observações:

a) Vossa Excelência X Sua Excelência : Os pronomes de tratamento com "Vossa(s)"


são empregados em relação à pessoa com quem falamos:

Por exemplo:

Espero que V. Ex.ª, Senhor Ministro, compareça a este encontro.

Com Sua(s) são empregados, quando falamos a respeito da pessoa:

Ex: Todos os membros da C.P.I. afirmaram que Sua Excelência, o Presidente da


República, agiu com propriedade.

- Os pronomes  de tratamento representam uma forma indireta de nos dirigirmos aos


nossos interlocutores. Ao tratarmos um deputado por Vossa Excelência, por exemplo,
estamos nos endereçando à excelência que esse deputado supostamente tem para poder
ocupar o cargo que ocupa.

b) 3ª pessoa: Os pronomes de tratamento são da 2ª pessoa, mas os verbos, os


pronomes possessivos e os pronomes oblíquos empregados em relação a eles devem
ficar na 3ª pessoa.

Por exemplo:

Basta que V. Ex.ª cumpra a terça parte das suas promessas, para que seus
eleitores lhe fiquem reconhecidos.

c) Uniformidade de Tratamento: Quando escrevemos ou nos dirigimos a alguém, não é


permitido mudar, ao longo do texto, a pessoa do tratamento escolhida inicialmente. Assim,
por exemplo, se começamos a chamar alguém de "você", não poderemos usar "te" ou
"teu". O uso correto exigirá, ainda, verbo na terceira pessoa.

Por exemplo:

Quando você vier, eu te abraçarei e enrolar-me-ei nos teus cabelos. (errado)

Quando você vier, eu a abraçarei e enrolar-me-ei nos seus cabelos. (correto)

Quando tu vieres, eu te abraçarei e enrolar-me-ei nos teus cabelos. (correto)

47
EXERCÍCIOS

1)Complete com as formas de tratamento adequadas:

a) _____________________, o príncipe da Inglaterra, comemorou ontem seu


aniversário.
b) _____________________, o papa, visitará o Brasil.
c) _____________________, o Ministro da Fazenda, garantiu que o custo de vida
não subirá mais até o fim do ano.
d) _____________________, Cardeal-Arcebispo de São Paulo, fará sua conferência
na próxima terça-feira.
e) _____________________, a rainha da Inglaterra, parte para o Oriente.
f) _____________________, o Cardeal de Montevidéu, fará uma grande campanha
para auxiliar os exilados.
g) _____________________, o Reitor da Universidade Mackenzie, fará uma palestra
hoje.
h) _____________________, senhor pároco de nossa igreja, rezará a missa das sete
horas?
i) _____________________, o Sr. Presidente da República, veio a São Paulo.
j) Pedimos a _____________________, gerente da seção, que solucione nosso
problema.

2) Substitua as palavras grifadas pelos pronomes oblíquos átonos correspondentes:

a) Não vimos o menino, porque estava escondido atrás da cortina.

b) Fizemos os trabalhos, conforme a orientação que foi dada a nós.

c) Alguém chamou Pedro.

d) Todos fizeram as compras no sábado à tarde.

e) Disseram a verdade a mim e a você.

f) Disseram a verdade a mim e a você.

g) Coloquem os livros na estante.

h) Precisamos visitar nossa tia, pois está muito doente.

i) Propõe novas atividades aos funcionários todos os dias.

j) É preciso por o automóvel na garagem para evitar que seja roubado.

3) Assinale a opção que apresenta o emprego correto do pronome, de acordo com a


norma culta:

a) O diretor mandou eu entrar na sala.

48
b) Preciso falar consigo o mais rápido possível.

c) Cumprimentei-lhe assim que cheguei.

d) Ele só sabe elogiar a si mesmo.

e) Após a prova, os candidatos conversaram entre eles.

4) Assinale a opção em que houve erro no emprego do pronome pessoal em relação ao


uso culto da língua:

a) Ele entregou um texto para mim corrigir.

 b) Para mim, a leitura está fácil.

 c) Isto é para eu fazer agora.

 d) Não saia sem mim.

 e) Entre mim e ele há uma grande diferença.

5) Assinale o tratamento dado ao reitor de uma Universidade:

a) Vossa Senhoria d) Vossa Magnificência

b) Vossa Santidade e) Vossa Paternidade

c) Vossa Excelência

6) Numa das frases, está usado indevidamente um pronome de tratamento. Assinale-a:

a) Os Reitores das Universidades recebem o título de Vossa Magnificência.

b) Sua Excelência, o Senhor Ministro, não compareceu à reunião.

c)  Senhor Deputado, peço a Vossa Excelência que conclua a sua oração.

d) Sua Eminência, o Papa Paulo VI, assistiu à solenidade.

e) Procurei o chefe da repartição, mas Sua Senhoria se recusou a ouvir as minhas


explicações.

7) "Se é para ....... dizer o que penso, creio que a escolha se dará entre ....... ."

a) mim, eu e tu d) eu, mim e tu

b) mim, mim e ti e) eu, eu e ti

c) eu, mim e ti

49
8) Suponha que você deseje dirigir-se a personalidades eminentes, cujos títulos são:
papa, juiz, cardeal, reitor e coronel. Assinale a alternativa que contém a abreviatura
certa da "expressão de tratamento" correspondente ao título enumerado:

a) Papa ............... V. Sa d) Reitor ............... V. Maga

b) Juiz ................. V. Ema e) Coronel ............ V. A.

c) Cardeal ........... V.M.

 9) Assinale o item em que há erro quanto ao emprego dos pronomes se, si ou consigo:

a) Feriu-se quando brincava com o revólver e o virou para si.

b) Ele só cuidava de si.

c) Quando V. S.a vier, traga consigo a informação pedida.

 d) Ele se arroga o direito de vetar tais artigos.

e) Espere um momento, pois tenho de falar consigo.

10) Estamos certos de que V. Exa. .......... merecedor da consideração que.........


dispensam .......... funcionários.

 a) é - lhe - vossos d) sois - lhe - seus

b) é - lhe - seus e) sois - vos - vossos

c) é - vos - vossos

11) Indique a opção incorreta:

a) Receba Vossa Excelência os cumprimentos de seus subordinados.

b) Sua Excelência, o Ministro da Justiça, chegou acompanhado de outras autoridades.

c) Reiteramos nosso apreço a Vossa Senhoria e vossos subordinados.

d) Solicitamos a Sua Senhoria que encaminhasse suas sugestões por escrito.

e) Concordamos com Vossa Excelência e com seus subordinados.

12) Quando V. Senhoria .......... que .......... auxilie, bastar chamar-me pelo interfone que
está sobre a .......... mesa.

a) desejardes - vos - vossa d) desejar - vos - vossa

50
b) desejar - o - vossa e) desejar - o - sua

c) desejardes - vos - sua

UNIDADE V – VÍCIOS DE LINGUAGEM

1.1 CONCEITO:

Vícios de linguagem são, segundo Napoleão Mendes de Almeida, palavras ou


construções que deturpam, desvirtuam ou dificultam a manifestação do pensamento, seja
pelo desconhecimento das normas cultas, seja pelo descuido do emissor.

1.2 LISTA DE VÍCIOS DE LINGUAGEM

1.2.1Ambiguidade

É a possibilidade de uma mensagem ter dois sentidos. Ela geralmente é provocada


pela má organização das palavras na frase. A ambiguidade é um caso especial de
polissemia, a possibilidade de uma palavra apresentar vários sentidos em um contexto.

Ex:

51
 "A mãe encontrou o filho em seu quarto." (No quarto da mãe ou do filho?)
 "Onde está a cachorra da sua mãe?" (Que cachorra? A mãe ou a cadela criada
pela mãe?)
 "Este líder dirigiu bem sua nação"("Sua"? Nação da 2ª ou 3ª pessoa (o líder)?).

Obs: O pronome possessivo "seu(ua)(s)" Gera muita confusão por ser geralmente
associado ao receptor da mensagem.

A ambiguidade normalmente é indesejável na comunicação unidirecional, em


particular na escrita, pois nem sempre é possível contactar o emissor da mensagem para
questioná-lo sobre sua intenção comunicativa original e assim obter a interpretação
correta da mensagem.

1.2.2 Barbarismo

Barbarismo, peregrinismo, idiotismo ou estrangeirismo (para os latinos qualquer


estrangeiro era bárbaro) é o uso de palavra, expressão ou construção estrangeira no
lugar de equivalente vernácula.

De acordo com a língua de origem, os estrangeirismos recebem diferentes nomes:

 galicismo ou francesismo, quando provenientes do francês (de Gália, antigo


nome da França);
 anglicismo, quando do inglês;
 castelhanismo, quando vindos do espanhol;
 etc.

Ex:

 Mais penso, mais fico inteligente (galicismo; o mais adequado seria "quanto mais
penso, (tanto) mais fico inteligente");
 Comeu um roast-beef (anglicismo; o mais adequado seria "comeu um rosbife");
 Havia links para sua página (anglicismo; o mais adequado seria "Havia ligações
(ou vínculos) para sua página".
 Eles têm serviço de delivery. (anglicismo; o mais adequado seria "Eles têm serviço
de entrega").
 Premiê apresenta prioridades da Presidência lusa da UE (galicismo, o mais
adequado seria Primeiro-ministro)

Há quem considere barbarismo também divergências de pronúncia, grafia,


morfologia, etc., tais como "adevogado" ou "eu sabo", pois seriam atitudes típicas de
estrangeiros, por eles dificilmente atingirem alta fluência no dialeto padrão da língua.

1.2.3 Cacofonia

A cacofonia é um som desagradável ou obsceno formado pela união das sílabas


de palavras contíguas. Por isso temos que cuidar quando falamos sobre algo para não
ofendermos a pessoa que ouve. São exemplos desse fato:

 "Ele beijou a boca dela."

52
 "Bata com um mamão para mim, por favor."
 "Ela se disputa para ele."
 "Deixe ir-me já, pois estou atrasado."
 "Eu amo ela demais !!!"
 "Não tem nada de errado a cerca dela"
 "Vou-me já que está pingando."
 "Instrumento para socar alho."
 "Eu vi ela."

Como cacofonias são muitas vezes cômicas, elas são algumas vezes usadas de
propósito em certas piadas, trocadilhos e "pegadinhas".

1.2.4 Plebeísmo

O plebeísmo normalmente utiliza palavras de baixo calão, gírias e termos


considerados informais. Exemplos:

 "Ele era um tremendo mané!"


 "Tô ferrado!"
 "Tá ligado nas quebradas, meu chapa?"
 "Esse bagulho é 'radicaaaal'!!! Tá ligado mano?"

Por questões de etiqueta, convém evitar o uso de plebeísmos em contextos sociais


que requeiram maior formalismo no tratamento comunicativo.

1.2.5 Prolixidade

É a exposição fastidiosa e inútil de palavras ou argumentos e a sua


superabundância. É o excesso de palavras para exprimir poucas ideias. Ao texto prolixo
falta objetividade, o qual quase sempre compromete a clareza e cansa o leitor.

A prevenção à prolixidade requer que se tenha atenção à concisão e precisão da


mensagem. Concisão é a qualidade de dizer o máximo possível com o mínimo de
palavras. Precisão é a qualidade de utilizar a palavra certa para dizer exatamente o que
se quer.

1.2.6 Pleonasmo vicioso

É uma figura de linguagem que consiste numa redundância inútil e desnecessária


de significado em uma sentença.

Ex:

53
 "Ele vai ser o protagonista principal da peça".
 "Meninos, entrem já para dentro!"
 "Estou subindo para cima."
 "Não deixe de comparecer pessoalmente."
 "As palavras são de baixo calão".

O pleonasmo nem sempre é um vício de linguagem, mesmo para os exemplos


supracitados, a depender do contexto. Em certos contextos, ele é um recurso que pode
ser útil para se fornecer ênfase a determinado aspecto da mensagem.

Especialmente em contextos literários, musicais e retóricos, um pleonasmo bem


colocado pode causar uma reação notável nos receptores (como a geração de uma frase
de efeito ou mesmo o humor proposital). A maestria no uso do pleonasmo para que ele
atinja o efeito desejado no receptor depende fortemente do desenvolvimento da
capacidade de interpretação textual do emissor. Na dúvida, é melhor que seja evitado
para não se incorrer acidentalmente em um uso vicioso.

1.2.7 Solecismo

É uma inadequação na estrutura sintática da frase com relação à gramática


normativa do idioma. Há três tipos de solecismo:

a) De concordância:

 "Fazem três anos que não vou ao médico." (Faz três anos que não vou ao médico.)
 "Aluga-se salas nesse edifício." (Alugam-se salas nesse edifício.)

b) De regência:

 "Ontem eu assisti um filme de época." (Ontem eu assisti a um filme de época.)

c) De colocação:

 "Me empresta um lápis, por favor." (Empresta-me um lápis, por favor.)


 "Me parece que ela ficou contente." (Parece-me que ela ficou contente.)
 "Eu não respondi-lhe nada do que perguntou." (Eu não lhe respondi nada do que
perguntou.)

1.2.8 Eco

O Eco(ou rima) ocorre quando há na frase terminações iguais ou semelhantes,


provocando dissonância.

 "Falar em desenvolvimento é pensar em alimento, saúde e educação."

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 "O aluno repetente mente alegremente."
 O presidente tinha dor de dente constantemente.

1.2.9 Colisão

O uso de uma mesma vogal ou consoante em várias palavras é denominado


aliteração. Aliterações são preciosos recursos estilísticos quando usados com a intenção
de se atingir efeito literário ou para atrair a atenção do receptor. Entretanto, quando seus
usos não são intencionais ou quando causam um efeito estilístico ruim ao receptor da
mensagem, a aliteração torna-se um vício de linguagem e recebe nesse contexto o nome
de colisão. Exemplos:

 "Eram comunidades camponesas com cultivos coletivos."


 "O papa Paulo VI pediu a paz."

Uma colisão pode ser remediada com a reestruturação sintática da frase que a
contém ou com a substituição de alguns termos ou expressões por outras similares ou
sinônimas.

EXERCÍCIOS

1) Identifique os vícios de linguagem dos trechos a seguir:

a) A mãe estava falando com a menina de braços cruzados.

b) Não faço questão da promoção, da qual já sabia de antemão.

c) Minha mãe lava casa com detergente.

d) A boca dela está suja de chocolate!

e) Ele não dá ponto sem nó.

f) Vou ligar no tel dele.

g) Em uma casa, o fogão fica na cozinha.

h) Em breve, mais cedo do que cogitamos, estaremos sofrendo as consequências do que


praticamos.

i) As pessoas da terceira idade acreditam que podem ensinar muitas coisas aos jovens,
mas esses, por sua vez, não acreditam muito.

j)Cheguei no Brasil em 1923.

k) "O fulvo e voluptoso Rajá celeste derramará além os fugitivos esplendores da sua
magnificência astral e rendilhara d’alto e de leve as nuvens da delicadeza, arquitetural,
decorativa, dos estilos manuelinos."

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2) Dentre as seguintes frases, assinale aquela que não contém ambiguidade:

a) Peguei o ônibus correndo.

b) Esta palavra pode ter mais de um sentido.

c) O guarda deteve o suspeito em sua casa.

d) O menino viu o incêndio do prédio.

e) Deputado fala da reunião do Canal 2.

3) Assinalar a frase gramaticalmente correta:

a) Quando ele vir esse documento, reagirá imediatamente.

b) Quando ele ver esse documento, reagirá imediatamente.

c) Quando ele vir este documento, reagirá imediatamente.

 d) Quando ele ver este documento, reagirá imediatamente.

 e) Quando ele vir esse documento, reajirá imediatamente.

4) A alternativa com melhor redação, considerando correção, clareza e concisão, é:

a) A única medida para melhorar o desempenho linguístico do aluno é que deveria ser
exigido em todos os níveis aulas práticas de língua portuguesa.

b) Deveria ser exigido, em todos os níveis, aulas práticas de língua portuguesa. Esta seria
a única medida para melhorar o desempenho linguístico dos alunos.

c) Ministrar aulas práticas de língua portuguesa em todos os níveis é a única medida para
melhorar o desempenho linguístico dos alunos.

d) Aulas práticas de língua portuguesa deveriam ser ministradas como única medida em
todos os níveis para melhorar o desempenho linguístico dos alunos.

e) Para melhorar o desempenho linguístico dos alunos em todos os níveis deveriam ser
ministradas aulas práticas de língua portuguesa. Esta seria a única medida.

5) Esta questão apresenta cinco propostas diferentes de redação. Assinale a letra que
corresponde à melhor redação, considerando correção, clareza e concisão:

a) Mesmo que me peçam não vou, pois, tenho mais que fazer.

b) Mesmo que me peçam, não vou, pois tenho mais que fazer.

c) Mesmo que me peçam, não vou, pois tenho: mais que fazer.

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 d) Mesmo que me peçam: não vou pois tenho mais, que fazer.

e) Mesmo que me peçam não vou pois tenho mais que fazer.

6) Emprega-se o termo solecismo para indicar o uso errado da concordância, regência


ou colocação. Aponte a única alternativa em que tal erro não ocorre:

a) Faz cinco anos completos que não visito o Rio.

b) Devem haver explicações satisfatórias para este fato.

 c) Haviam vários objetos espalhados sobre a mesa.

 d) Se lhe amas, deves declarar-te depressa.

e) Fazem já vinte minutos que começaste a prova.

7) Nas alternativas, procurou-se reestruturar o período inicial (I) em outro (II) que
conservasse a mesma ideia. Assinale a alternativa em que o período II não conservou a
idéia do período I:

a) I - Não é que fosses ruim, porém tinha seus carnegões.

     II - Embora tivesse seus carnegões, não era ruim.

b) I - Percebendo que os outros abusavam do Tino, não deixava mais que o irmão se
empregasse isolado.

      II - Percebeu que os outros abusavam do Tino, por isso não deixava mais que o irmão
se empregasse isolado.

c) I - Alguém pede continuadamente uma flor, e essa flor não existisse mais para lhe ser
dada.

     II - Alguém pede continuadamente uma flor que não existe mais para lhe ser dada.

d) I - Naquele dia escutei, certamente porque era a amiga quem falava.

     II - Naquele dia escutei, certamente, então, era a amiga quem falava.

 e) I - Toda hora está passando enterro, e a gente acaba por se interessar por ele.

     II - Toda hora está passando enterro, pelo qual a gente se acaba por se interessar.

57
UNIDADE VI – REVISÃO GRAMATICAL

1) Na série dos exercícios que se seguem as lacunas devem ser preenchidas com
porque, porquê, por que, ou então com por quê.  

a)  ________ na vida não achei razão, resolvi sair por aí, procurando ________ viver.

b) Sem quê nem ________ , foi saindo.

c)  Qual o ________ de tudo isso?

d)  Este foi o livro ________ estudei o assunto.

e)  As razões ________ falhei são inexplicáveis.

f)  Se eu disser ________ saí, você para de chorar?

g) Você acha que eu sei este assunto ________?

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h)  ________ tanto atropelo, meu Deus?

i) A garota ________ se apaixonara não quis lhe dizer ________ tinha de deixar o país.

j) ________ caminhos foram levados, eu nunca fiquei sabendo.

k) ________ quiseram que eu me ausentasse, eu não pude saber o que aconteceu.

l) Não sabe ainda o ________?

2) Empregue as palavras mal ou mau:

a) _____ respondo quando um indivíduo me interpela com _____ intuito.

b) _____ dia aquele em que o conheci, pois o _____ que ele me fez foi muito grande.

c) Se _____ gosto de tangerinas por causa de seu _____ gosto, _____ suporto
mexericas, cujo _____ sabor é mais acentuado.

d) Se não é _____ , _____ não fará, não exercerá o _____.

e) É um ______ sujeito, muito ______ visto, _____ disposto sempre, sempre com má
disposição.

f) Era _____ encarado, por isso _____ quisto.

g) Se _____ o conhecesse, diria que seu _____ está na sua educação pouco esmerada.

h) _____ chegou, já avisou que o doente estava _____ .

i) Não costumo dormir _____ ; a insônia é um _____ que _____ conheço.

3) Complete com o particípio adequado dos verbos a seguir:

a) A urna foi _________________ em frente a todos. (abrir)

b) A firma tem __________________ o estádio com telhas plásticas. (cobrir)

c) Foi __________________ o cadáver de um homem de uns 60 kg. (descobrir)

d) Tinha-lhe ____________________ muitas cartas. (escrever)

e) Muitas cartas haviam sido _____________________ . (escrever)

f) Tinha sido ___________________ um bom deputado. (eleger)

g) Tinham-no ___________________ senador. (eleger)

h) Se a secadora tivesse ______________ bem o tecido, o lençol já estaria


_______________. (enxugar - enxugar)

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i) _____________________ o cabeça da gangue, a situação melhorou. (matar)

j) Haviam-se ______________________ menos cópias que o necessário. (trazer)

k) Eles tinham-se ___________________ de estudar. (matar)

l) Aprecio muito vinho ___________________, mas este está horrível:


é____________________. (tingir - tingir)

4) Reescreva as orações, usando um pronome relativo (que, o/a qual, cujo, onde):

a) As ruas estavam desertas; percorremos essas ruas.

b) As ruas estavam desertas; passamos por estas ruas.

c) O canário é maravilhoso; compraste o canário.

d) O canário é maravilhoso; falas do canário.

e) O clube é o melhor do país; frequentamos esse clube.

f) O clube é o melhor do país; nós nos associamos a esse clube.

g) A praça é a principal da cidade; vimos esta praça ontem.

h) A praça é a principal da cidade; estivemos nesta praça ontem.

i) A fábrica de sapatos é imensa; sua produção é totalmente exportada.

j) A fábrica de sapatos é imensa; falamos de sua produção.

k) O diretor estava com a razão; os alunos revoltaram-se contra as suas ordens.

l) O jacaré brasileiro está em extinção; fazem-se bolsas de sua pele.

m) Comprei aquele pássaro; tanto gostas de seu canto.

n) Gostaríamos de rever a matéria; temos dúvida sobre a matéria.

o) Gostaríamos de rever a matéria; sua extensão nos intranquilizou.

5) Complete as lacunas com a, à, as, às:

a) Não havia problema referente ______ garotas citadas.

b) Fique _____ distância do fogo.

c) Tudo foi ontem _____ noite.

d) Nunca se refere _____ hábitos domésticos.

60
e) Adoro bife _____ cavalo.

f) ____ três da tarde irei lá.

6) Corrija a oração que apresentar erro. Se julgar correta, simplesmente a recopie: 

a) Os jovens preferem mais o lazer do que o estudo.  

b) Uma mãe com vários filhos sempre os quer bem. 

c) Assistiu a luta pela tevê. 

d) Aspiramos sua posição na empresa. 

e) Entre você e eu nunca haverá discórdia.

f) Sempre o desobedeceu.

 
7) Complete com um dos parônimos dos parênteses:

a) Quando vou a um _______ sinfônico (conserto, concerto), _______ (cumprimento,


comprimento) todos antes de que se toque a primeira _______ (área, ária).

b) Com _______ (discrição, descrição) ela fez o pedido, mas não _______ (cerrou,
serrou) a boca até que _______ (imergisse, emergisse) de dentro de mim um sim.

c) Tenha bom _______ (censo, senso) ao criticar a _______ (cessão, sessão) deste
salão para os convidados; simplesmente _______ (retifique, ratifique) o ato generoso
porque aqui há muitas pessoas _______ (iminentes, eminentes).

8) Complete com o pronome adequado:

a) Diga-me logo o que é para _______ trazer. (eu/mim)

b) Para _______ , bastam dois copos. (eu/mim)

c) Entre _______ e ela sempre houve interesse mútuo. (eu/mim)

d) Era hábito que só pensasse em _______ mesmo. (ti/si)

e) Sem _______ nada será assinado. (eu/mim)

9) Assinale a opção que completa corretamente as lacunas da frase seguinte.

O controle biológico de pragas, _________ o texto faz referência, é certamente o mais


eficiente e adequado recurso _________ os lavradores dispõem para proteger a lavoura
sem prejudicar o solo.

a) do qual, com que d) ao qual, cujos


b) de que, que e) a que, de que
c) que, o qual

61
10) Assinale a opção que completa corretamente as lacunas do texto abaixo.

Há endereços na Internet que trazem respostas às dúvidas sobre finanças pessoais e


mostram as razões _________ todos devem fazer um orçamento de seus gastos. O
usuário _________ interesse é investir no exterior, como a moeda _________ são
calculados os ganhos e o país _________ pertencem os fundos. O que ainda atrapalha os
brasileiros é a lentidão _________ os dados são transmitidos.

a) por que – cujo – com que – onde – na qual


b) pelas quais – cujo – em que – a que – com que
c) com que – em que o – na qual – a quem – em que
d) porque – por cujo – em que – ao qual – na qual
e) do porquê – para quem o – com que – a que – com que

11) Escolha a alternativa que preencha corretamente as lacunas das frases a seguir.

1. Por acaso, não é este o livro _________ o professor se refere?


2. As Olimpíadas __________ abertura assistimos foram as de Tóquio.
3. Herdei de meus pais os princípios morais __________ tanto luto.
4. É bom que você conheça antes as pessoas __________ vai trabalhar.
5. A prefeita construirá uma estrada do centro ao morro __________ será construída a
igreja.
6. Ainda não foi localizada a arca __________ os piratas guardavam seus tesouros.

a) de que – cuja – para que – com os quais – sobre que – em que.


b) que – de cuja – com que – para quem – no qual – que.
c) em que – cuja – de que – para os quais – onde – na qual.
d) a que – a cuja – em que – com que – que – em que.
e) a que – a cuja – por que – com quem – sobre o qual – onde.

12) Assinale a alternativa que completa adequadamente as lacunas do seguinte período.

“Algumas pessoas não determinam ____ provém sua insatisfação, porque não sabem
_____ vão os sentimentos, nem _____ mora a consideração pelo próximo.”

a) donde – onde – onde


b) donde – aonde – onde
c) aonde – onde – aonde
d) aonde – aonde – aonde
e) donde – aonde – aonde

13) Em todos os períodos, deve existir “à”, exceto:

a) A vista do acontecido, João de Oliveira receou dizer o que pensava.


b) Ao chegar ela a esquina da rua transversal, indagavam os moleques: para onde?
c) Distraiu-se a contemplar as montanhas, os primeiros reflexos da lua na água.
d) Nalguns quintais latiam os cães a passagem do barco invisível.
e) Tudo o que acontecera a mulher foragida pareceu ter sido com outra Helena.

62
UNIDADE VII – REDAÇÃO TÉCNICA: CONSIDERAÇÕES GERAIS

Documentos mal-escritos na mesma empresa causam:


- os leitores desmotivados, o que gera a famosa troca oral de informações. A partir disso,
devemos nos lembrar que quem conta um conto, acrescenta um ponto.
- falta de credibilidade, pois passa a impressão que se passa é que "querem nos
enrolar".
- transmissores de mensagens deformadas, o que gera conflito interno e falta de
confiança do cliente.

Conclusão: em termos de mercados mundiais e luta por sobrevivência na era da


globalização, não basta investir em globalização e tecnologia, mas sim naquilo que numa
sociedade humana é valor de troca: a comunicação.

63
1 PRINCIPAIS PROBLEMAS DA REDAÇÃO EMPRESARIAL

a) Na empresa, a escrita é coletiva, isto é, você não escreve em seu próprio nome, mas
em nome da empresa para a qual trabalha. Por isso, deve pensar não em "eu", mas em
"nós", a empresa.

b) Mesmo na comunicação interna, você deve considerar que se trata da empresa


interagindo verbalmente com seus funcionários.

c) Apenas alguns relatórios ou notas serão assinados por você correspondendo a um


compromisso pessoal, mas a maioria dos documentos diz respeito à empresa e exigem
que você respeite os posicionamentos de sua empresa diante dos fatos relativos à
correspondência, porque você está transmitindo uma mensagem no lugar de outrem, sua
empresa.

d) Isso exige de você um esforço duplo: ao mesmo tempo em que você precisa apropriar-
se da mensagem, colocando-se no lugar do locutor real, você não pode se esquecer do
interlocutor, da outra empresa, preocupando-se com o modo como ela pensa, a forma
como ela vai reagir ao conteúdo do texto produzido por você e enviado por sua empresa.

e) É preciso lembrar ainda que o texto empresarial não reflete apenas o trabalho de quem
o redigiu, mas sim toda a empresa.

f) É por isso que uma carta mal escrita, rasurada, mal formatada, sem clareza nem
correção, por exemplo, representa uma empresa pouco confiável.

g) Daí a importância de você se preocupar com a clareza, concisão e correção ao redigir


em nome de sua empresa, a fim de evitar uma imagem negativa de sua empresa.

2 A EFICÁCIA DE UM TEXTO NO ÂMBITO EMPRESARIAL

Na empresa, sabemos quando o texto é bom quando ele é eficaz. Sabemos que
ele é eficaz quando a resposta a ele é rápida e correta. Para obter a melhor resposta, o
texto empresarial moderno deve ser persuasivo, convincente.

O texto empresarial privilegiará a linguagem formal escrita - a que tem a


preocupação com a norma gramatical vigente - porque, ao contrário de todas as

64
variantes, só ela evitará:
 o uso de termos compreendidos por apenas uma das partes envolvidas na
comunicação;

 o uso de expressões informais, adequadas ao contexto familiar ou situações


emocionais, cujo uso acarreta na possibilidade de descrédito da mensagem;

 ocorrência de quebra de regras gramaticais que constroem a imagem de


letramento (grau de escolaridade que propicia confiança).

3 MITOS E VERDADES SOBRE REDAÇÃO EMPRESARIAL

MITO: você deve usar linguagem formal erudita.


VERDADE: você deve usar linguagem formal, mas simples.

MITO: você deve apresentar todas as informações.


VERDADE: você deve apresentar apenas as informações pertinentes.

MITO: as pessoas querem ler seu documento.


VERDADE: as pessoas prefeririam fazer outra coisa.

DICAS:

a)Você deve usar linguagem simples

Os textos que circulam no meio empresarial, normalmente, têm uma função prática; eles
não são construídos para comover o leitor, nem para distraí-Io, mas para informá-Io a
respeito de um tema específico. Por isso, use uma linguagem formal, correta do ponto de
vista gramatical, mas direta, recorrendo a palavras do dia-a-dia, que facilitam da
compreensão do leitor.

b)Você deve apresentar apenas as informações pertinentes

Um texto longo, cheio de detalhes, desvia a atenção do leitor dos pontos mais
importantes e não atinge seu real objetivo. Tenha em mente o que pretende com o
documento e atenha-se às informações pertinentes a seus objetivos.

c)As pessoas prefeririam fazer outra coisa

65
A vida empresarial exige muito de todos os envolvidos nela. Em função disso, não sobra
muito tempo para leituras extensas. Além disso, o leitor de um documento que circula na
área empresarial nem sempre conhece o autor do texto e pouco interesse tem no texto; lê

porque precisa ler, não porque quer. A leitura de uma correspondência obriga o leitor a
interromper seu trabalho. Se ela não for direto ao assunto, o leitor a arquiva ou a
descarta. Por isso, não se estenda e seja direto.

4 CINCO ESTRATÉGIAS PARA CHAMAR A ATENÇÃO DO LEITOR

- Apresente o ponto principal no início. Assim, o objetivo do documento fica claro desde o
princípio;

- Utilize subtítulos descritivos, uma vez que eles orientam a leitura do documento;

- Seja claro, a falta de clareza compromete a compreensão de seu texto;

- Escreva com frases curtas, pois elas são fáceis de processar;

- Empregue palavras simples, elas são facilmente compreendidas;

Retirado de http://www.bauete.com.br/colunasDetalhes.ph ?id=2145, Acesso em 24 de


janeiro de 2008.

5 IMPORTÂNCIA DA ADEQUAÇÃO DA LINGUAGEM NO CONTEXTO EMPRESARIAL

Compare as duas cartas a seguir:

Compare as duas cartas a seguir:

CARTA 1

439/200 Belo Horizonte, 15 de maio de 2005

Ilmo. Srs.
J.J. Martins
Caixa Postal 974
Curitiba – PR

Prezados Senhores:

66
Desejamos acusar o recebimento do seu prezado favor datado de 12 de outubro
próximo passado, junto ao qual V.Sas. tiveram a gentileza de nos encaminhar os
documentos relativos às mercadorias por nós encomendadas.

Informamos, outrossim, que as mercadorias em referência chegaram em perfeitas


condições, nada nos sendo lícito reclamar nesse sentido. Lamentamos, no entanto, ter de
externar-lhes a nossa estranheza ante o fato de constar, na fatura que nos foi remetida
por V.Sas., vencimento para 30 dias, quando o que havia combinado com o
representante de sua conceituada empresa foi de 90 dias.

Solicitamos, pois, esclarecimento a respeito, deixando claro que não poderemos


aceitar a duplicata, caso não nos seja concedido o prazo previamente combinado.

Cientes de que esta nossa justa pretensão será acolhida por V.Sas., firmamo-nos,
com estima e apreço.
atenciosamente,

MERCANTIL TEIXEIRA & CIA


JOSÉ LINS
diretor

CARTA 2

DIR- 439 Belo Horizonte, 15 de maio de 2005

À
J.J. Martins

Prezados Senhores:

Informamos que recebemos as mercadorias encomendadas, assim como os documentos


a elas relativos, anexos à sua carta de 09-05-2005.

Porém, causou-nos estranheza o fato de constar em sua fatura o vencimento para 30


dias, quando já havíamos combinado com seu representante um prazo de 90 dias.

Solicitamos, portanto, esclarecimentos, deixando claro que não poderemos aceitar a


duplicata, caso não nos seja concedido o prazo previamente combinado.

Atenciosamente,

José Lins

Diretor

67
6 PRINCIPAIS EMPECILHOS NA COMUNICAÇÃO EMPRESARIAL: OS VÍCIOS DE
LINGUAGEM

Conceituação: vício é um hábito que se tomou padrão, adquirindo um caráter negativo; o

vício não ter a força da eficácia para atingir o destinatário.

Verbosidade: é dizer de forma complexa o que pode ser dito de forma simples. Rebusca-

se, para impressionar e para ostentar uma linguagem culta.

Ex: Como resultante de persistente e continuado suprimento insatisfatório do componente


J-7 (arruela de equilíbrio do rotor interno), foi determinado pela autoridade competente
que adicionais e/ou novos fornecedores do componente acima mencionado deveriam ser
procurados com vistas a aumentar o número de peças que deveriam ser mantidas
disponíveis no armazém de depósito.

Erros do texto:

- monótono e repetitivo: persistente e continuado


- impreciso: autoridade competente
- prolixo: com vistas de aumentar o número de peças que deveriam ser mantidas no
armazém de depósito

Obs: O rebuscamento deve ser necessariamente evitado em nome de um contexto


mercado lógico que exige uma informação de mais rápido entendimento e maior agilidade
de resposta. Também não convém o uso de um vocabulário tido como sofisticado, que
cria uma linguagem artificial aos padrões do texto empresarial.

EXEMPLOS DE VERBOSIDADE:

A) Vocabulário sofisticado

Exemplo de erro:

Solicitamos o pagamento das mensalidades nas datas aprazadas no dito carnê,


colaborando destarte para a manutenção precípua deste sodalício na orientação e
assistência dos seus associados.

Exemplo de correção:

Solicitamos o pagamento das mensalidades até as datas de vencimento constantes no


carnê.

68
B) Frases e parágrafos longos:

Exemplo com erro:

A média de produção para o último ano fiscal é maior do que a do ano anterior, porque
aquele foi a ano em que se instalaram as novas prensas de estamparia, automáticas e
hidráulicas, portanto, aumentando o número de peças estampadas durante o período,
assim como também foi ano em que se produziram novos métodos de economia de
tempo e economia de mão-de-obra, e que também contribuíram para uma média maior de
produção.

Exemplo de correção:

A média de produção do último ano fiscal foi maior que a do ano anterior. Instalaram-se
novas máquinas hidráulicas, automáticas, de alta velocidade, para estamparia e
introduziram-se novos métodos de economia de tempo e trabalho.

Se você verifica em seu texto a tendência a períodos longos, siga a seguinte orientação:

ESCREVA UMA IDEIA EM CADA PARÁGRAFO

A delimitação de cada parágrafo é fundamental para que haja clareza na informação a ser
transmitida.

C) Construções intercaladas e ou invertidas:

Exemplo com erro:

Queremos, neste momento, observar que o aceite àquela condição não deve ser
entendido como uma aprovação à mesma, não no que diz respeito ao valor, que, apesar
de ter ultrapassado a importância de R$ 350,00, que achávamos justa, dela não se
afastou em demasia, mas, sim, quanto ao prazo de reajuste, qual seja, semestral,
contrariando o relacionamento comercial passado, calcado no prazo de um ano, não nos
dando sequer a chance de contra-argumentação.

Exemplo corrigido:

Porém, gostaríamos de registrar nossa insatisfação com a mudança do prazo de reajuste


que, ao se tornar semestral, sem a possibilidade de negociação, contraria nosso
relacionamento comercial passado, calcado no prazo de um ano.

LISTA DE VERBOSIDADES:

Expressões Evitáveis Substituir Por

Supracitado Citado...

69
Acima citado Citado...

Temos em nosso poder Recebemos

Temos a informar que Informamos

Tendo em vista o assunto Tendo em vista o


em epígrafe assunto citado...

Levamos a seu conhecimento Informamos

Consternou-nos profundamente Lamentamos profundamente

Devido ao fato de que Devido a/ Por causa de

Para dirimir dúvidas Para esclarecer dúvidas

Destarte Dessa forma/ dessa maneira

Referenciado Referido

Aproveitando o ensejo, Anexamos


anexamos

As palestras já estão inseridas no As palestras já estão


contexto da programação na programação

Via de regra, os procedimentos Geralmente, os procedimentos

Devemos concluir, de acordo com Concluímos que


o que dissemos acima

D) Chavões

Expressões antiquadas, porém já condicionadas a pertencer ao estilo empresarial,


denominam-se chavões. Chama-se chavão a um vício de estilo já incorporado como
linguagem do texto empresarial.

Exemplos de chavões:

a) Outrossim, anexamos a este ofício cópia do comprovante de ...


b) Outrossim, informamos que não será possível...
c) Debalde nossos esforços, esclarecemos que não ...

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Essas palavras, embora expressivas, denotam o uso de um padrão de linguagem que, por
ser muito culto, extrapola a qualidade valorizada nos dias de hoje: a simplicidade.

Chavões em introdução

a) Vimos, através desta, solicitar...

Ninguém consegue vir através de algo. A palavra através significa atravessar, fazer
travessia. Portanto, pode-se ver através da vidraça, pode-se enriquecer através dos
anos, mas não se pode, por exemplo, “aprovar o aumento através do decreto 33 ..” Pode,
sim, “aprovar o decreto por meio do decreto 33...”
Logo, não use através desta carta...

b) Venho, pela presente, solicitar a V.Sa...


Alguém pode solicitar algo pela ausente? Expressão inútil...

c) Solicitamos a V.Sa. a inclusão de...


V.Sa. = usado apenas quando o destinatário exigir tal formalidade, ou se houver
orientação dentro da empresa para tratamento de alguém de hierarquia superior ou por se
tratar de destinatário externo em que se deseja manter tal formalidade.
No caso de colegas de mesmo nível hierárquico, desnecessário.

d) Acusamos o recebimento de seu ofício...


Não se usa mais o termo acusar em frases empresariais.

e) Em resposta ao contrato referenciado...


Não existe a palavra referenciado. Substitua-a por mencionado, referido ou citado.

Chavões em fechos

a) Reiteramos os protestos de elevada estima e consideração.

Incoerência: estima e consideração se adquirem pela convivência, não por desejos.


Recomenda-se apenas dois tipos de fecho:
 para autoridades superiores, inclusive o presidente da República:
Respeitosamente
 para autoridades de mesma hierarquia ou de hierarquia inferior: Atenciosamente

b) Sem mais para o momento.


Só deve ser utilizada em comunicações em que não se pretenda encerrar de forma
polida, como cobrança e similares.

E) Coloquialismo excessivo

Coloquialismo é o nome dado à maneira informal de nos comunicarmos; é o registro de


linguagem que usamos em família.
Simplicidade sim, excesso de informalidade, não.

71
Coloquialismo excessivo = falta de credibilidade

F) Jargão técnico fora do contexto

Dá-se o nome de jargão à maneira característica e específica de um determinado


grupo se comunicar. Porém, toda linguagem de um grupo fechado deve sofrer
adequação quando o grupo de destinatários se amplia, pois a linguagem deverá atingir
também as pessoas que não dominam o jargão do grupo.

Leia o exemplo de um memorando do setor jurídico de uma empresa enviado a diversos


chefes de setores.

Exemplo com erro:

Visando ajudar os órgãos no entendimento da Circular nº 44.522/05, esclarecemos que,


no âmbito interno, há uma delegação subentendida da direção da Companhia aos
superintendentes de órgãos e chefes de serviço, via tabela de limites de competência,
para definir que contratos devem ter prosseguimento nas bases pactuadas e quais os que
deverão ser objeto de reavaliação.

Exemplo corrigido:

Visando ajudar os órgãos no entendimento da Circular nº ...., informamos que a Tabela de


Limite de Competência em vigor na Companhia é válida para estabelecer quais os
contratos que devem prosseguir nas bases pactuadas e quais os que deverão ser objetos
de reavaliação.

A linguagem técnica e os jargões devem ser usados apenas em situações que os exijam.

G) TAUTOLOGIA: repetições viciadas


 

É o termo usado para definir um dos vícios de linguagem. Consiste na repetição de uma
ideia, de maneira viciada, com palavras diferentes, mas com o mesmo sentido.

O exemplo clássico é o famoso 'subir para cima' ou o 'descer para baixo'. Mas há outros,
como você pode ver na lista a seguir:

- elo de ligação - anexo junto   à carta


- acabamento final - de sua livre escolha
- certeza absoluta - superávit positivo
- quantia exata - todos foram unânimes
- nos dias 8, 9 e 10, inclusive - conviver junto
- juntamente com - fato real
- expressamente proibido - encarar de frente
- em duas metades iguais - multidão de pessoas
- sintomas indicativos - amanhecer o dia
- há anos atrás - criação nova
- vereador da cidade - retornar de novo
- outra   alternativa - empréstimo temporário
- detalhes minuciosos - surpresa inesperada
- a razão é porque - escolha opcional

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- planejar antecipadamente - gritar bem alto
- abertura inaugural - propriedade característica
- continua a   permanecer - demasiadamente   excessivo
- a última versão definitiva - a seu critério pessoal
- possivelmente poderá ocorrer - exceder em muito . 
- comparecer em pessoa

EXERCÍCIO

Corrija os vícios das sentenças a seguir:

1. Sob o nosso ponto de vista, a decisão do Departamento de Contas a pagar está


correta.
2. Os reparos não foram executados pro causa que está chovendo.
3. Encaminhamos a V.Sa. o relatório de custos, para que apresente vossa apreciação.
4. Informo que não poderei tomar parte da reunião marcada para amanhã.
5. Estranhamos o motivo da duplicata acima referenciada.
6. Face ao novo decreto, não podemos mais utilizar funcionários contratados.
7. Após algumas entrevistas,pudemos constatar que, a nível gerencial, não há nenhum
tipo de problema.

UNIDADE VIII – REDAÇÃO TÉCNICA

1 ATA

2 CIRCULAR

3 MEMORANDO

4 RELATÓRIO

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Bibliografia utilizada nesta unidade:

MEDEIROS, João Bosco. Português instrumental: para cursos de contabilidade,


economia e administração. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2009.

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