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Tentativa de definição
A definição de filosofia não pode ser dada de uma forma conclusiva, pois não existe uma definição
universalmente aceite por todos os filósofos. Enquanto disciplinas como a Química, a Física, a Geologia e a
Matemática têm uma definição geral de si próprias, já na filosofia essa possibilidade revela-se, por natureza,
problemática. Existem portanto varias definições de filosofia, pois cada filósofo que tenta definir este saber, fá-
lo a partir do seu modo de ver a vida, o mundo e a própria filosofia. Porém a única definição totalmente aceite
de filosofia é a etimológica. No âmbito etimológico, filosofia significa Filo (amor, amigo, o que gosta) + Sofia
(sabedoria, saber). Portanto filosofia é amor à sabedoria. A demanda da verdade e não a sua posse, o estar a
caminho, implica uma posição de humildade perante a sabedoria.
A conceção que temos hoje da filosofia não é igual à que existia no passado. A filosofia já não tem um papel
central na busca do conhecimento. Ela é apenas um saber entre tantos outros para ajudar a explicar o mundo.
Assim sendo, a filosofia tem o papel de participante no debate sobre as questões contemporâneas, no meio de
várias áreas do conhecimento. Desta forma, a conceção etimológica de filosofia deve ser substituída por outra
forma de entender esta disciplina. Numa perspetiva mais atual, podemos, pois, definir filosofia como uma
área do saber que reflete sobre problemas gerais e fundamentais como a existência, o bem, a justiça e a
liberdade, ou como uma área que faz uma abordagem concetual e crítica da realidade baseada em
argumentos racionais.
O objeto e método da filosofia
O objeto da filosofia é o real como um todo. A filosofia não se debruça sobre um objeto em particular mas
sobre a totalidade do real. Ao contrário do que acontece com outras disciplinas, cujo o objetivo corresponde a
uma particularização da realidade, o objeto da filosofia é geral, isto é, a filosofia interessa-se por problemas
fundamentais que têm a ver com o todo. Enquanto o método das ciências se baseia na verificação experimental,
o método da filosofia baseia-se no exercício reflexivo, na investigação concetual e na argumentação racional.
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Isto porque os problemas da filosofia não podem ser resolvidos experimentalmente. Portanto, o método da
filosofia é a reflexão e a argumentação. O filósofo reflete sobre as questões fundamentais da vida e utiliza a
argumentação para justificar aquilo que defende. Um exemplo de argumentação na filosofia é o método
socrático. Como sistema de ensinamento usava o diálogo em sintonia com a razão. Estabelece um diálogo que
consiste numa procura critica e cooperativa da verdade universal.
Diferenças entre a filosofia e a ciência
No princípio da Filosofia não havia distinção entre esta e a Ciência. Isso é evidente ao observarmos, por
exemplo, filósofos como Tales de Mileto, Pitágoras, Demócrito e Aristóteles. Esses pensadores clássicos
privilegiavam, sobretudo, a Matemática e as Ciências naturais. A ciência e a filosofia separaram-se na idade
moderna. Atualmente a filosofia é um entre múltiplos saberes. Distingue-se da ciência pelo seu objeto e
método. A ciência utiliza o método experimental e justifica o seu conhecimento nos factos. Já a filosofia
consiste num estudo de carácter crítico e concetual que recorre ao método reflexivo e justifica as suas respostas
com recurso à razão e à argumentação. Quer a ciência quer a filosofia interrogam, no entanto as suas questões
são diferentes. A filosofia apresenta questões mais gerais e profundas, dirigidas à totalidade da vida e ao amago
da existência humana. Por outro lado, a ciência questiona de forma objetiva, especifica e concreta. Canaliza e
direciona as suas questões para aspetos específicos da realidade. Um exemplo de questão da filosofia é: qual o
sentido da vida. Já um exemplo de uma questão da ciência pode ser: qual a constituição do átomo. Recorrendo
a uma metodologia apropriada, é possível responder às questões da ciência de forma a que seja aceite por todos.
Pelo contrário, as questões da filosofia envolvem diferentes formas de perspetivar a realidade e de responder.
Com recurso à tecnologia é possível encontrar uma resposta para a constituição do átomo que seja objetiva e
por consequência unânime, mas não é possível fazer o mesmo em relação à questão do sentido da vida.
Lógica: Não há consenso quanto à definição da lógica. Alguns autores definem-na como o estudo dos
processos válidos e gerais pelos quais atingimos a verdade, outros como a ciência das leis do pensamento, ou
somente como o estudo dos princípios da inferência válida. Esta pluralidade de definições dá-nos conta da
diversidade de estudos que são abrangidos pela Lógica.
Lógica natural e científica: A lógica pode ser natural ou científica. Consideramos como natural a lógica que
surge da atividade espontânea e instantânea da razão humana no exercício da sua atividade. Assim sendo, é
intuitiva e não refletida. É utilizada no dia a dia e não afasta completamente o ser humano do erro. É uma
lógica limitada. Já a lógica científica apresenta um sistema de princípios que permite distinguir um argumento
válido de um argumento não válido. Resultando de um estudo apurado dos princípios do pensamento, garante-
nos maior fiabilidade na avaliação dos argumentos.
A lógica tem a sua importância: vai contribuir para apurar as competências que permitem avaliar a validade
do argumento. A lógica ajuda-nos a raciocinar com maior precisão; a exprimirmo-nos de forma mais adequada
e coerente; a distinguir um argumento elaborado corretamente de um que não seja; a compreender o que é
essencial e o que é acessório; a desenvolver ideias de forma clara; a organizar o nosso raciocínio, etc.
Argumento: A definição de argumento na lógica é muito específica. Um argumento é um conjunto de uma ou
mais sentenças declarativas, também conhecidas como proposições, onde as primeiras são chamadas de
premissas e a última de conclusão. São as premissas que suportam a conclusão. O processo de extração da
conclusão a partir das premissas tem o nome de inferência. Um argumento possível é: sendo que todos os
alunos da escola Francisco Franco são estudiosos e o Alexandre é aluno da escola Francisco Franco, então o
Alexandre é estudioso. A conclusão "O Alexandre é estudioso" resulta e é sustentada pelas duas premissas
anteriores. As premissas justificam a conclusão. Um argumento é válido ou inválido.
Os argumentos podem aparecer na forma de texto e é necessário conhecer os indicadores de conclusão e de
premissas para passá-los para a forma padrão. Indicadores de premissa: sendo que, dado que, porque, pois, na
medida em que…. Indicadores de conclusão: logo, então, portanto, por conseguinte, assim, infere-se que,
consequentemente… Um exemplo: dado que não há abelhas que não façam o mel, consequentemente as
abelhas são trabalhadoras. Todos os que fazem mel são trabalhadores. Este texto na sua forma padrão será da
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seguinte forma: Todos os que fazem o mel são trabalhadores/ Todas as abelhas fazem o mel/ Todas as abelhas
são trabalhadoras. Para fazer a transição devemos ter em conta: procurar primeiro a conclusão e saber que o
temo que é sujeito na conclusão deve sempre aparecer na segunda premissa.
Portanto, um argumento tem sempre uma conclusão, isto é, uma proposição que é suportada por outra ou outras
proposições - premissas – que se constituem a favor da conclusão. Entre as proposições que constituem os
argumentos existe um nexo de implicação lógica, isto é, as premissas conduzem a uma conclusão que delas
deriva logicamente, caso contrário não estamos na presença de um argumento.
Proposição: Uma proposição é uma noção básica da lógica e refere-se ao que se declara ou indica (frases
declarativas ou indicativas). A proposição exprime um juízo. "A matemática é uma disciplina importante" é
uma proposição. "Tens de estudar para o teste de matemática" não é uma proposição. Não indica nem declara
nada, ordena. Uma proposição é verdadeira ou falsa. Existem três tipos de proposição: Categóricas- declaram
algo (S é P); disjuntivas – apresentam uma disjunção (ou); e condicionais- apresentam-se na seguinte forma.
Se…então…
Validade e verdade: O que importa para apurarmos a validade é a estrutura do argumento. Enquanto uma
proposição é verdadeira se corresponder à realidade e falsa se não se adequar ao real, já do argumento dizemos
que é válido se a conclusão for uma consequência lógica das premissas e inválido quando a conclusão não é
sustentada pelas premissas. Por outras palavras, enquanto a verdade assenta no conteúdo da proposição, a
validade foca-se na forma do raciocínio. Assim sendo, um argumento válido não depende da verdade das
proposições. A virtude essencial de um argumento não reside no facto das premissas serem verdadeiras ou
falsas, mas na necessidade da conclusão ser uma consequência lógica das premissas. No entanto, há uma
exceção à regra. Quando as premissas são verdadeiras e a conclusão falsa o argumento será sempre inválido. É
por esta razão que dizemos que num argumento dedutivo válido se as premissas forem verdadeiras, então a
conclusão também tem de ser. Em todos os outros casos pode ser válido ou inválido.
Recapitulando, tendo em conta a sua forma, o raciocínio é válido ou inválido. Mas se atendermos à sua
matéria, as proposições podem ser verdadeiras ou falsas.
Exemplo: Nenhum homem sabe dançar
Os jovens são homem
Nenhum jovem sabe dançar
Este raciocínio é formalmente correto, uma vez que a conclusão foi corretamente deduzida das premissas. Mas
a conclusão é falsa, uma vez que é falsa a primeira proposição ("Nenhum homem sabe dançar"). Estamos
perante um raciocínio que tem validade formal, mas não tem “validade material” isto é verdade.
Argumento sólido: Como já foi visto, um argumento válido pode ter uma conclusão falsa desde que pelo
menos uma das suas premissas seja falsa. Mas, dado que o que interessa na argumentação é chegar a conclusões
verdadeiras, os argumentos meramente ou apenas válidos não têm interesse. É por isso importante compreender
a noção de argumento sólido. Um argumento sólido obedece a duas condições: é válido e as suas premissas são
verdadeiras. É impossível que um argumento dedutivo sólido tenha uma conclusão falsa. Vejamos o seguinte
exemplo:
Todos os animais ladram.
Os pardais são animais.
Logo, os pardais ladram.
Este argumento é válido, mas não é sólido – a primeira premissa é falsa porque nem todos os animais ladram.
Na argumentação é muito importante usar premissas verdadeiras e argumentos válidos, pois só estas duas
condições garantem conclusões verdadeiras. E se um dado argumento for válido mas a sua conclusão falsa,
pelo menos uma das suas premissas é falsa.
extensão (todo homem é mortal) e particulares, quando o sujeito é tomado em parte de sua extensão (alguns
homens são brasileiros). Relacionando qualidade e quantidade temos:
1-Proposições universais afirmativas- tipo A (Todos os S são P)
2-Proposições universais negativas- tipo E (Nenhum S é P)
3- Proposições particulares afirmativas- tipo I (Alguns S são P)
4-proposições particulares negativas- tipo O (Alguns S não são P)
A proposição nem sempre aparece na forma canónica. Exemplos disso são: os gatos são felinos (A), nem todos
os homens comem carne(O), existem jovens que são irresponsáveis(I).
Quadrado da oposição:
A negação de proposições é um processo relativamente simples mas muito útil e podemos recorrer ao
quadrado lógico das oposições para compreender como se negam proposições. As proposições são compostas
por uma determinada quantidade e qualidade. Quando desejamos negar uma proposição temos de ter em
atenção quer o seu quantificador, quer a qualidade da sua relação. A negação de uma proposição com a
forma «Todo o F é G», não é «Nenhum F é G». Se assim fosse, estaríamos a manter o quantificador
universal. A negação correcta é: «Alguns F não são G». «Duas proposições são a negação uma da outra se,
e só se, são ambas contraditórias – e não contrárias. A contraditória de uma proposição de tipo A é uma
proposição de tipo O – e não uma proposição de tipo E.»
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Perante a proposição «Todos os homens são portugueses», a sua negação não é «Nenhum homem é
português». Seriam ambas falsas. A sua negação é: «Algumas homens não são portugueses». Para negarmos
correctamente uma proposição, temos de estender a negação à totalidade da frase e não só a parte dela. Caso
particularmente interessante é a negação de condicionais. Vejamos a seguinte proposição:
2-Considere o argumento seguinte. «Alguns futebolistas ganham muito dinheiro. Outros, porém, ganham
pouco. No entanto, o futebol é um desporto bastante igualitário. Se o compararmos com a natação, o
basquetebol ou o râguebi, percebemos porquê. Qualquer um pode jogar futebol, mas, para jogar
basquetebol ou râguebi, poucos atletas são suficientemente altos ou musculosos. E pode-se jogar futebol
em qualquer lugar, desde que alguém tenha uma bola, ao passo que a natação exige instalações
desportivas muito dispendiosas. Na verdade, só um grande investimento permite dispor de uma piscina.»
A conclusão do argumento é ´
(A) «só um grande investimento permite dispor de uma piscina».
(B) «alguns futebolistas ganham muito dinheiro».
(C) «pode-se jogar futebol em qualquer lugar».
(D) «o futebol é um desporto bastante igualitário»
R: D, porque podemos reparar que a seguir à frase «o futebol é um desporto bastante igualitário»
aparece um indicador de premissa “porque”. Assim sendo, a conclusão está antes das premissas.
3. O argumento «Alguns minhotos são portugueses; portanto, alguns portugueses são minhotos» é
(A) válido, porque a conclusão se segue da premissa.
(B) válido, porque a conclusão é verdadeira.
(C) inválido, porque a premissa é falsa.
(D) inválido, porque a premissa não apoia a conclusão.
R: A, pois há uma derivação lógica.
4. A proposição «os gatos têm asas» não pode fazer parte de um argumento…
(A) não sólido.
(B) inválido.
(C) sólido.
(D) válido.
R: C, pois não se trata de uma proposição verdadeira. Um argumento sólido pressupõe a validade e a
verdade.
Lógica proposicional
Proposição simples e complexa: A proposição simples não tem nenhuma conectiva ou operador lógico. Já a
complexa apresenta uma conectiva. As proposições complexas são as que possuem conectivas ou operadores
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de formação de frases. A lógica proposicional clássica lida apenas com conectivas verofuncionais. Um
exemplo de uma proposição simples é: a vida é bela. Por outro lado, uma proposição complexa pode ser: a
filosofia é enigmática e misteriosa; a vida não é um mistério desvendado. As conectivas verofuncionais são:
«e», «ou», «se…então», «se e só se» e «não».
As conjuntas são as proposições simples que antecedem e sucedem ao «e». Exemplos de conjunções são: As
mudanças climáticas são reais e consciencializar-se disso faz sentido; É difícil mudar hábitos mas devemos nos
esforçar por isso; embora ser vegetariano exija grande esforço, é uma que beneficia o planeta; muitas mudanças
já foram feitas em nome do ambiente apesar da resistência.
2-A disjunção exclusiva: ou…ou
A disjunção é exclusiva se não for possível que ambas as disjuntas sejam verdadeiras. Um exemplo é: O Mário
nasceu ou em Junho ou em Julho.
3-A disjunção inclusiva: ou
As disjuntas são as proposições simples que antecedem e sucedem o conector «ou». Por exemplo: sou filósofo
ou poeta. Outras formas de apresentar a disjunção são: A proteção da natureza é um dever de todos a não ser
que algumas instituições o cumpram; A proteção da natureza é um dever de todos a menos que algumas
instituições o façam.
4-A condicional: se ... então
São proposições complexas formadas por um antecedente e um consequente. A proposição que está depois do
«se» chama-se antecedente e a que está depois do «então» chama-se consequente. Na linguagem natural, a
antecedente nem sempre está no início da proposição condicional. São formadas por: se…então… Há
alternativas a esta forma: Basta que Kant defenda o imperativo categórico para que defenda um critério
absoluto; Defender o imperativo categórico é condição suficiente para defender um critério absoluto; Kant
não defende o imperativo categórico a menos que defenda um critério absoluto; Defender um critério absoluto
é necessário para que defenda o imperativo categórico; Kant defende um critério absoluto desde que defenda
o imperativo categórico; Kant defende um critério absoluto se defende o imperativo categórico.
5-A bicondicional: se e só se
A proposição formada pelo conector «se, e só se» é a conjunção de duas condicionais. Quer isto dizer que as
duas proposições implicam uma a outra. Para além da forma convencional (a filosofia é interessante se e só se
despertar o questionamento) temos: Se o António vai a Paris, então passou no exame de Filosofia e vice-versa;
Uma condição necessária e suficiente para o António ir a Paris é passar no exame de filosofia.
Conectiva unária
Negação: não
Uma conectiva é unitária caso se aplique apenas a uma proposição. Exemplos: a filosofia não é uma ciência; é
falso dizer que a filosofia é uma ciência; não é verdade que a filosofia seja uma ciência.
Atenção que também podemos fazer o processo contrário: passar para a linguagem natural uma proposição
formal. Por exemplo, a proposição ~ Q à ( ~ P v ~ R ), partindo do dicionário P Sócrates questiona, Q
Sócrates é filósofo, R Sócrates argumenta, ficaria da seguinte forma: se Sócrates não é filósofo, então não
questiona ou não argumenta.
Formalizar é diferente de pôr na forma padrão. Pôr na forma padrão não envolve o recurso a símbolos,
apenas colocar a proposição complexa na forma padronizada, mantendo a linguagem natural. Um exemplo:
para colocar na forma padrão a proposição “ usar o autocarro é condição suficiente para melhorara a
qualidade do ar” devemos substituir “condição suficiente” pela forma padrão “se…então”, ficando da seguinte
forma “se usarmos o autocarro então melhorará a qualidade do ar”. Já a formalização consiste em recorrer a
símbolos. O exemplo apresentado ficaria - Dicionário: P usar o autocarro Q melhorar a qualidade do ar
Formalização: P→Q.
“Controlamos os paraísos fiscais e quebramos o poder do narcotráfico, ou não controlamos os paraísos fiscais
e o combate à droga é inútil” fica (P ˄ Q) v (~P˄R) .
P Q PàQ
VV V
VF F
FV V
FF V
6-Bicondicional: numa bicondicional, a fórmula só é verdadeira quando as componentes têm o mesmo valor
lógico.
PQ P↔Q
vv v
VF F
FV F
FF V
Em suma:
tendo em conta unicamente a sua forma lógica. A tabela de verdade indicará se a proposição é: 1) uma
tautologia: todos os valores lógicos finais são V; 2) uma contradição: todos os valores lógicos finais são F;
3)uma contingência: existe pelo menos uma circunstância em que o valor lógico é F.
Conclusão: a forma lógica da proposição complexa é tautológica. Isso significa que, qualquer que seja a
combinação de valores de verdade de P e Q, a fórmula é sempre verdadeira. Assim sendo, a verdade da
proposição pode ser determinada tendo em conta unicamente a sua forma lógica.
Vejamos um exemplo com três proposições: Se não há determinismo, o livre arbítrio existe e as ações não
são causadas.
Dicionário: P Há determinismo Q O livre arbítrio existe R As ações são causadas
~Pà(Q˄~R)
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~ ~ Q˄~ ~P(Q˄~
P Q R
V V V PF R
F RF RV)
V V F F V V V
V F V F F F V
V F F F V F V
F V V V F F F
F V V V V V
F F F
V V F F F
F F F V V F F
Conclusão: Trata-se de uma proposição contingente, pois a coluna sob o operador principal tem pelo menos
um valor verdadeiro e um valor falso.
1-« Se treinar com disciplina diariamente, vou melhorar o meu desempenho nos testes de matemática. Treino
com disciplina diariamente. Logo, vou melhorar o meu desempenho nos testes de matemática.»
Premissa1: Se treinar com disciplina diariamente, vou melhorar o meu desempenho nos testes de matemática.
Premissa 2: Treino com disciplina diariamente.
Conclusão: Logo, vou melhorar o meu desempenho nos testes de matemática.
Dicionário: P treinar com disciplina diariamente; Q vou melhorar o meu desempenho nos testes de
matemática
Formalização: P à Q
P
⸫Q
P à Q, P ⸫ Q
Conclusão: O argumento é válido dado que, na única circunstância em que as premissas são verdadeiras, a
conclusão também é verdadeira. Não ocorre nenhuma circunstância em que as premissas sejam verdadeiras e a
conclusão falsa.
2- “Se o governo não alterar as medidas de austeridade, o povo irá revoltar-se. O governo alterou as medidas
de austeridade. Logo, o povo não se revoltou.”
Premissa 1: Se o governo não alterar as medidas de austeridade, o povo irá revoltar-se.
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Conclusão: O argumento é inválido porque há uma circunstância (a primeira circunstância) em que é possível
todas as premissas serem verdadeiras e a conclusão falsa.
3- «Ou o determinismo tem razão ou há livre arbítrio e as ações não são causadas. É certo que o determinismo
tem razão. Por conseguinte, não há livre arbítrio e as ações são causadas.»
Premissa 1: Ou o determinismo tem razão ou há livre arbítrio e as ações não são causadas.
Premissa 2: É certo que o determinismo tem razão.
Conclusão: Não há livre arbítrio e as ações são causadas.
Dicionário: P o determinismo tem razão; Q há livre arbítrio; R ações são causadas.
Formalização: P V ( Q ˄ ~ R)
P
⸫~Q˄R
P V (Q ˄ ~R), P ⸫ ~ Q ˄ R
Q˄ PV ⸫ ~
R ~ ~ P
P
V Q
V V F F
Q
~R
F (Q˄~R)
V V Q˄R
F
V V F R
V F V F V F
V F V F V F V V V
V F F V V F V V F
F V V F F F F F F
F V F V F V V F F
F F V F V F F F V
F F F V V F F F F
Conclusão: O argumento é inválido uma vez que há duas circunstâncias em que é possível todas as premissas
serem verdadeiras e a conclusão falsa.
⸫Q˅R
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O modus ponens é uma forma válida de argumento. A primeira premissa de um argumento modus ponens é um
condicional. Há uma afirmação do antecedente na segunda premissa, ou seja, afirma-se que o antecedente é
verdadeiro. Disso, conclui-se que o consequente também é verdadeiro. Eis um exemplo de argumento na forma
modus ponens: Se alguém desligar este interruptor, a lâmpada apaga. / Eu desliguei este interruptor/. A
lâmpada apagou. Para sermos rigorosos, podemos abreviar o condicional da seguinte forma P → Q / P / Q
Essa é a forma que o argumento seria escrito na linguagem da lógica.
P-»Q
Q
Logo P
⸫ P
O modus tollens é outra forma válida. Eis um exemplo de argumento na forma modus tollens: Se alguém
desligar este interruptor, a lâmpada apaga. / A lâmpada não se apagou./ Eu não desliguei este interruptor. E
aqui está a forma geral dos argumentos modus tollens: Se P, então Q. / Não Q. / Não P. Ou, na lógica
simbólica: P → Q / ¬Q / ¬P No argumento por modus tollens, há uma negação do consequente na segunda
premissa e conclui-se a negação do antecedente.
3- Silogismo Disjuntivo
PVQ PVQ
~P ~Q
⸫Q ⸫P
O silogismo disjuntivo, também conhecido historicamente como modus tollendo ponens, é uma forma de
argumento válido, do tipo: P ou Q Não P Logo Q. Um exemplo: Ele tem mais que 16 anos ou ele é criança. Ele
não tem mais que 16 anos. Logo, ele é criança. Também poderá ser PVQ, NãoQ, Logo P.
4-Silogismo hipotético
PàQ
QàR
⸫PàR
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O silogismo hipotético é uma demonstração de regras na lógica clássica que pode ou não ser avaliada em uma
lógica não-clássica. O silogismo hipotético é um argumento válido da seguinte forma: Premissa: P → Q
Premissa: Q →R Conclusão: P → R Simbolicamente, esta inferência é expressa por:(P->Q)/\( Q->R)->(P-
>R). Por exemplo:, Se eu não despertar, então não posso ir ao trabalho. Se eu não puder ir ao trabalho, então eu
não vou receber o salário. Portanto, se eu não despertar, então eu não vou receber o salário.
5-Contraposição
PàQ
⸫~Qà~P
Em lógica, contraposição é uma lei que diz que, para toda sentença condicional, há uma equivalência lógica
entre a mesma e sua contrapositiva. Na contrapositiva de uma sentença, o antecedente e o consequente são
invertidos e negados: a contrapositiva de P → Q é, portanto, ¬ Q → ¬ P . Por exemplo, a proposição "Todos
os morcegos são mamíferos" pode ser reescrita em sua forma condicional "Se algo é morcego, então é
mamífero". Por fim, a lei diz que a sentença é idêntica à sua contrapositiva "Se algo não é mamífero, então
não é morcego."
6-Leis de De Morgan
6.1. A lei da «negação da conjunção»
Se dizemos “É falso que Descartes é empirista e Hume é racionalista” ~ ( P ˄ Q ), “ logo, Descartes não é
empirista ou Hume não é racionalista.” ⸫ ~ P ˅ ~ Q. Também acontece ao contraio: se temos ~ P ˅ ~ Q , então
⸫ ~ ( P ˄ Q ).
Em linguagem simples podemos dizer o seguinte: negar duas proposições ligadas com “e”,ou seja, uma
conjunção , é o mesmo que negar duas proposições e ligá-las com “ou” ( disjunção). Considere que “p” e “q”
são duas proposições. Então teremos: ~ (p ∧ q) = (~ p∨~ q) Para ficar mais claro: Não (p e q) é igual a (não p)
ou (não q). Vamos a um exemplo prático: Sendo “p” igual a “Pedro é marinheiro” e sendo “q” igual a “Maria é
artista”, então, podemos ter como exemplo da primeira Lei de Morgan o seguinte: Não é verdade que
“Pedro é marinheiro e Maria é artista” é o mesmo que afirmar que “Ou Pedro não é marinheiro ou Maria não
é artista”. 2) negar duas proposições ligadas por “ou” é o mesmo que negar duas proposições e juntá-las
com “e”.Cconsiderando “p” e “q” duas proposições, temos a seguinte representação simbólica: ~ (p ∨ q) = (~
p) ∧ (~ q). Para ficar mais claro: Não (p ou q) é igual a (não p) e (não q). Assim temos: “não é verdade que
Pedro é marinheiro ou Maria é artista” é o mesmo que “Pedro não é marinheiro e Maria não é artista”.
1. Atente na proposição complexa expressa pela frase seguinte. Quer Schubert quer Schumann eram
compositores. Identifique a conectiva que liga as duas proposições simples que a constituem.
Resposta: Conjunção
3. Mostre que a forma argumentativa seguinte é inválida, recorrendo ao método das tabelas de verdade.
A V B, A ⸫ ¬B
A B AV B A ¬B
V V V V F
V F V V V
F V V F F
F F F F V
Interpretação da tabela: na linha da tabela assinalada (sublinhado), as premissas são todas verdadeiras e a
conclusão é falsa; uma forma argumentativa é inválida quando existe a possibilidade de as premissas serem
todas verdadeiras e a conclusão ser falsa.
4. Traduza as fórmulas seguintes para a linguagem natural, com base no dicionário apresentado. a) ¬Q → ¬P
b) P Ʌ Q Dicionário: P: A Sandra tem bons hábitos alimentares. Q: A Sandra come legumes com regularidade.
Resposta: A resposta integra os aspetos seguintes, ou outros equivalentes. Tradução das duas fórmulas para a
linguagem natural: a) Se a Sandra não come legumes com regularidade, (então) (a Sandra) não tem bons
hábitos alimentares; b) A Sandra tem bons hábitos alimentares e (a Sandra) come legumes com regularidade
6. Construa um argumento, com a forma modus ponens, cuja conclusão seja «O Luís vai ao cinema».
7. Admitindo que a proposição «A Joana está sentada» é verdadeira, será possível determinar o valor de
verdade da proposição seguinte? :Se a Joana não está sentada, então está a correr.
Apresente a justificação completa da sua resposta.
Resposta:. Sé é verdade que “A Joana está sentada”, então é falso a proposição “A Joana não está sentada”.
Assim sendo, ao integrarmos esta proposição simples na proposição complexa “ Se a Joana não está sentada,
então está a correr”, podemos concluir que é verdadeira. Isto porque na implicação, se o P é falso, quer o Q seja
verdadeiro ou falso, o valor de verdade da implicação é sempre verdadeiro.
8. 15-No texto seguinte, encontra-se um argumento que tem uma das formas lógicas válidas estudadas.
Tomé da Fonseca, um velho general reformado, revive com frequência a atividade militar. À sua maneira, foi
desde a infância uma pessoa sociável e enérgica, e o universo militar sempre lhe deu muito prazer. Ora, o velho
general não revive com frequência a atividade militar se não jogar muitas vezes jogos de estratégia. Portanto,
Tomé da Fonseca joga muitas vezes jogos de estratégia.
Formalize o argumento que se encontra no texto, indicando o dicionário utilizado.
Resposta:
Dicionário:
P- Tomé da F revive com frequência a atividade militar.
Q- Tomé da Fonseca joga muitos jogos de estratégia.
P
~Q -> ~P
Q
P é a primeira premissa;
~Q -> ~P é a segunda premissa;
Q é a conclusão.
Lógica informal
Lógica formal e informal:
A lógica formal estuda as condições de validade dos argumentos dedutivos, isto é, estuda as condições formais
que esses argumentos devem cumprir para serem considerados corretos. Por outro lado, a lógica informal é o
estudo dos argumentos apresentados na linguagem comum, em contraste com as apresentações de argumentos
numa linguagem artificial, formal ou técnica. A lógica informal é o estudo dos aspetos lógicos da
argumentação que não dependem exclusivamente da forma lógica, contrastando assim com a lógica
formal, que estuda apenas esses aspetos. Quer isto dizer que na lógica informal partimos do conteúdo do
raciocínio e portanto a validade tem a ver com o conteúdo (já na lógica formal a validade tem a ver
apenas com a forma). A lógica informal foca-se também no potencial persuasivo do discurso. A firma
Perelman: enquanto a lógica formal é a lógica da demonstração, a lógica informal é a da argumentação.
A lógica informal é importante: alarga a investigação ao conteúdo dos argumentos; abrange muitos dos
argumentos que utilizamos na argumentação do dia a dia, coisa que não acontece com a lógica formal.
Argumento: A definição de argumento na lógica é muito específica. Um argumento é um conjunto de uma ou
mais sentenças declarativas, também conhecidas como proposições, onde as primeiras são chamadas de
premissas e a última de conclusão. São as premissas que suportam a conclusão. O processo de extração da
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conclusão a partir das premissas tem o nome de inferência. As premissas justificam a conclusão. Um argumento
é válido ou inválido.
Argumentos dedutivos:
A dedução é uma inferência onde de uma ou mais premissas se conclui necessariamente uma conclusão. A
conclusão está implícita nas premissas. Sendo assim, no argumento dedutivo não se acrescenta nada ao
conhecimento. Os argumentos dedutivos são válidos ou inválidos.
Todos os metais (x) são bons condutores de eletricidade (y);
O mercúrio (A) é um metal (x);
Portanto, o mercúrio (A) é bom condutor de eletricidade (y).
Nesta inferência a conclusão encontra-se implicita nas premissas e não se aprendeu mais nada do que ela já
refere. Não ampliou o conhecimento. É um raciocínio demonstrativo.
Argumentos não dedutivos:
Os principais argumentos não dedutivos são: indução, analogia e argumento com recurso a uma autoridade.
1) Um argumento indutivo é aquele em que a validade não depende exclusivamente da sua forma lógica.
Depende também da verdade das premissas. Num argumento indutivo válido, a conclusão, embora não sendo
absolutamente garantida pelas premissas, é fortemente apoiada por elas. A indução divide-se em generalização
e previsão. A generalização, como o próprio nome indica, consiste em generalizar, isto é, em atribuir a
todos os elementos de uma classe aquilo que só vimos ou conhecemos em alguns (fórmula: observamos
até hoje que A é B, logo todos os A são B). Este raciocínio leva-nos a dizer de todos aquilo que só sabemos de
alguns. É evidente que quando atribuímos a todos os casos possíveis aquilo que só observámos em alguns,
estamos a tirar uma conclusão geral a partir de premissas particulares ou menos gerais. È preciso ter em atenção
que a generalização pode ser para casos futuros- quando de uma amostra concluímos que no futuro ocorrerá
em todos os casos (não confundir com previsão que envolve concluir para um ou alguns casos futuros). A
previsão é um tipo de argumento que parte de casos passados para obter uma conclusão que se refere a
casos particulares ainda não observados (fórmula: observamos que até hoje os A são B, logo o próximo A
será B). A previsão é um tipo de raciocínio em que se espera que o que ocorreu até agora venha também a
ocorrer no futuro, prevendo-se, deste modo, que a realidade e os fenómenos se mantenham constantes ou
permanentes. Exemplos de previsão são a meteorologia e a sismologia. Quando é que podemos dizer que uma
generalização e previsão são fortes? Em primeiro lugar, devem partir de uma amostra ampla e relevante.
Em segundo lugar, não haver ocultação de informação importante (contra-exemplos).
2) A analogia consiste em atribuir uma propriedade a um objeto ou a uma situação, por tal propriedade ocorrer
num objeto ou numa situação semelhante. Um argumento por analogia baseia-se pois numa comparação . O
raciocínio analógico tem a seguinte estrutura: perante duas realidades que se assemelham fortemente e
tendo uma delas uma certa característica, concluímos que também a outra tem essa mesma característica
(fórmula: A é semelhante a B, A tem a caraterística C, logo B tem a caraterística C). A analogia é forte
quando existe um número significativo de semelhanças, quando existe relevância nas semelhanças (são
relevantes para a conclusão) e não haver grandes diferenças entre aquilo que se compara.
3) O argumento da autoridade consiste em apoiar-nos no trabalho ou na opinião de especialistas para
justificar a nossa tese (fórmula: A afirma que B é verdade, logo B é verdade). Pode ser uma pessoa, uma
organização ou instituição. Para que este tipo de argumento seja considerado forte, é preciso que a fonte seja
credível, imparcial e também qualificada (especialista)- saiba o que diz. Também tem de haver consenso entre
os cientistas em relação ao assunto.Defendermos que a vacinação é fundamental recorrendo à OMS é sem
dúvida um argumento forte, mas justificar a necessidade da vacinação com base em Stephan Hawkings não fará
mito sentido.
Falácias informais:
Uma falácia informal consiste num erro no conteúdo do raciocínio, não obstante aparentar ser válido.
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1. Ad hominem ou contra a pessoa: É o tipo de argumento que pretende mostrar que uma afirmação é falsa,
atacando e desacreditando a pessoa que a emite em vez de focar a atenção no argumento em si.. Ex:O João
defende que podemos confiar em todos os políticos. Mas o Joã, quando era presidente da Junta de Freguesia
chegou a desviar fundos várias vezes. Portanto, não podemos confiar nos políticos.
2. Petição de princípio ou Raciocínio circular: consiste em argumentos onde a conclusão já esta contida nas
premissas. Ex: A melatonina provoca o sono(conclusão), porque tem propriedades ligadas ao sono
(premissa).
3. Derrapagem ou bola de neve: O autor para mostrar que uma crença é falsa, aponta as consequências
desagradáveis que advirão da sua defesa, consequências essas encadeadas de forma exagerada. Ex: Se
permitirmos o aborto nas primeiras 10 semanas, então acabaremos por permitir às 12, e daí permitimos aos 5
meses, depois aos 8 e, por fim, no nascimento.Portanto, não devemos permitir o aborto.
4. Falsa causa: É uma falácia cometida quando o autor assume que, por uma coisa se seguir a outra, a primeira
provocou a segunda. No entanto, não há na verdade uma relação causal entre ambas. Ex:Dois dias depois de eu
ter comido morangos a constipação passou. Logo os morangos curam mesmo a constipação.
5. Falso dilema: Consiste em reduzir as opções a apenas duas quando existem mais. Ex: Ou estás comigo ou
contra mim.Não estás comigo. Portanto, estás contra mim.
6. Apelo à ignorância: Apresentar como verdade ou falso algo pelo facto de não se ter ainda conseguido
demonstrar o contrário. Ex: Deus existe (conclusão) porque nunca ninguém provou que não existe (premissa).
7. Falácia do boneco de palha: Consiste em distorcer a opinião oposta para que assim seja mais fácil refutá-
la.Ex: Os defensores da eutanásia o que pretende, na verdade, é que os médicos possam matar os pacientes.
Portanto, não podemos permitir a eutanásia,
8. Falácia da generalização precipitada: consiste em partir de uma amostra insuficiente para justificar uma
determinada afirmação. Ex: uma pessoa concluir que nenhuma mulher sabe conduzir pelo facto das mulheres
da sua família conduzirem com pouca perícia.
9. Falácia da amostra não representativa: consiste em concluir que uma afirmação é verdadeira partindo do
estudo de uma amostra que não representa a totalidade da população. Ex: concluir que o partido X ganhará as
eleições, após realizar contactos apenas a pessoas de um concelho do país (o problema é que um concelho não
representa a totalidade da população).
10. Falsa analogia: na falsa analogia, o interlocutor compara duas realidades e conclui algo a partir das suas
semelhanças, sem ter em consideração que há uma diferença substancial. Ex: Os alunos deveriam poder
recorrer aos apontamentos durante um teste. Pois… tal como um cirurgião pode consultar uma radiografia
durante uma cirurgia, um arquiteto pode consultar um projeto durante a construção de uma casa e um advogado
recorre aos seus papéis durante um julgamento, faz sentido que os estudantes também possam usar manuais e
cadernos num teste.
11. Falsa autoridade: quando o interlocutor recorre a uma autoridade questionável, ou seja, que não é
especialista na área, para justificar uma determinada afirmação, está a incorrer na falácia da falsa autoridade.
Ex: utilizar uma figura pública, como é o caso de um jogador de futebol, para sustentar a afirmação de que
determinado produto tem qualidade e é eficaz (Ronaldo diz que a Linic elimina definitivamente a caspa, logo a
Linic elimina definitivamente a caspa.
12. Ad populum: cosnsiste em partir do pressuposto de que uma afirmação é verdadeira pelo facto da maioria
das pessoas defender essa crença (apelo à quantidade). Ex: É claro que Deus existe (conclusão), pois a maioria
das pessoas acredita em Deus (premissa). Com toda a certeza que a homossexualidade é uma doença
(conclusão)… é o que a maioria das pessoas dizem (premissa).
algo, não reconhecendo à capacidade do interlocutor de decidir por si mesmo. É uma prática abusiva do
discurso – abusiva na medida em que obriga o recetor a aderir a uma dada mensagem (que um dado emissor
deseja impor). A manipulação pode ser dos afetos (Centrada no apelo à emoção e aos sentimentos do recetor)
ou cognitiva (Opera por falsificação do conteúdo do discurso). A argumentação/persuasão, pelo contrário,
pressupõe atos de comunicação livres entre emissor e recetor, devendo permitir a posição e não a imposição.
Prática do discurso que tem como finalidade levar alguém a mudar de ideias, mas pressupondo a livre adesão
do auditório à tese que o orador pretende que seja acolhida por ele. A persuasão tem como caraterísticas;
dirige-se a um auditório racional, isto é, reconhece nele capacidade de decisão, assenta na verdade e na
procura da verdade, entrega ao auditório o poder de escolher aderir ou não à tese e tem como princípio a
honestidade. A manipulação carateriza-se por: impor uma tese, visa controlar o auditório, não reconhece
no auditório poder de decisão e falta-lhe honestidade.
A manipulação constitui um perigo real quando a encontramos associada, nas
sociedades modernas mediáticas, à propaganda política, às ideologias e à publicidade. Ao negar a liberdade de
pensamento e a sua expressão, a manipulação faz do indivíduo mero peão de um jogo manipulador,
comprometendo a sua autonomia e a sua identidade.
proclamar a descoberta do vosso país.» In A. Weston, A Arte de Argumentar, Lisboa, Gradiva, 1996, p.
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No texto anterior, Adam Nordwell argumenta contra o direito de Cristóvão Colombo a proclamar a
descoberta da América. De que tipo é o argumento apresentado por Adam Nordwell? Justifique.
4. «Ou te divertes, aproveitando a juventude, ou te dedicas aos estudos, desperdiçando os melhores anos
da tua vida. Por isso, deves divertir-te tanto quanto possas.»
Identifique e explique a falácia em que incorre o orador que apresenta o argumento anterior.
pessoa não foi consciente, mas é consciente o esforço de chegar a tempo. É da sua vontade chegar a horas ao
exame.
Temos ainda o conceito de “motivo” que é a razão da ação. Por vezes confundimos motivo e intencionalidade,
mas na verdade são conceitos que dizem respeitos a aspetos diferentes da ação. Assim, enquanto o motivo diz
respeito à razão da nossa ação - o que nos levou a agir de determinada forma -, a intencionalidade tem a ver
com a intenção ou objetivo da nossa ação. Assim, posso ajudar outrem por compaixão (motivo) e com a
pretensão de contribuir para a sua recuperação (intenção).
Outro conceito fundamental na compreensão da ação é o de livre arbítrio: capacidade de escolher.
Portanto toda a ação pressupõe: um agente, uma intenção, um motivo, uma finalidade, consciência e livre
arbítrio.
Ação e Acontecimento:
É importante referir que atos são coisas que fazemos que implicam uma causalidade ou iniciativa da nossa
parte, indicando sempre um sujeito que é o agente ou o autor da ação. Ou seja, a ação pressupõe sempre
intencionalidade e vontade. Acontecimentos, por outro lado, são coisas que nos acontecem e, portanto, somos
apenas recetores dos efeitos que não iniciamos. Indica um sujeito que sofre uma ação e que não é o autor da
mesma. No acontecimento não existe intencionalidade nem vontade.
Por exemplo, uma tempestade é um acontecimento mas não uma ação, porque não tem carácter voluntário
nem intencional. Mas se um aluno estuda para um exame de filosofia já se trata de uma ação, pois é algo que
ocorre devido à vontade e intenção consciente de um sujeito. Outro exemplo é se alguém deixa cair um copo
de água sobre os seus livros, não podemos dizer que foi um ato intencional. Trata-se de um acontecimento já
que não envolveu uma escolha pessoal. No caso de alguém dedicar uma tarde à leitura de um livro, então se
trata de um ato intencional. Isto porque envolve uma intenção ou propósito.
Alguns filósofos defendem que faz sentido dizer que todas as ações são acontecimentos, mas nem todos os
acontecimentos são ações. Todas as nossas ações são algo que ocorre, ou seja, acontecimentos. Porém, há
acontecimentos que não são ações, como é o caso de um trovão numa manhã de chuva.
Atos voluntários e não voluntários:
Os atos dividem-se em voluntários e não voluntários. Os atos involuntários não dependem da vontade
humana, por exemplo respirar. Assim, o que fazemos involuntariamente, de forma consciente ou inconsciente,
está excluído da ação humana. Só é uma ação humana o que fazemos de forma voluntária e consciente, isto é,
aquilo que queremos efetivamente fazer por exercício da vontade e de que realmente temos consciência. Por
exemplo, estudar para o exame de filosofia é um ato voluntário porque depende da nossa vontade e consciente
pois sabemos o que estamos a fazer.
2-Considere as afirmações seguintes. 1. Todas as ações são acontecimentos. 2. Se uma ação tem
consequências que o agente não previu, então não é intencional. É correto afirmar que
(A) 1 e 2 são verdadeiras.
(B) 1 é falsa e 2 é verdadeira.
(C) 1 e 2 são falsas.
(D) 1 é verdadeira e 2 é falsa
R: D, pois, em primero lugar, qualquer ação que o homem pratique é algo que ocorre ou acontece (todas
as ações são acontecimentos. Mas nem todos os acontecimentos são ações) e, em segundo lugar, uma ação
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pode advir de uma determinada intenção do agente e no entanto conduzir a consequências inesperadas
(ex: tenho a intenção de ajudar a Ana, mas ao ajudá-la acabei por ainda a prejudicar mais).
Determinismo e liberdade
O problema da liberdade:
O problema do determinismo e da liberdade é um dos mais importantes problemas filosóficos sobre a ação.
Podemos coloca-lo da seguinte forma: será o homem inteiramente determinado por fatores que o controlam ou
dotado de liberdade? Será que podemos conciliar a liberdade com os condicionalismos?
A expressão utilizada pela filosofia para abordar o tema da liberdade é livre arbítrio. Livre arbítrio é a
capacidade para decidir sobre as nossas ações apesar das condicionantes.
Há teóricos que defendem que toda e qualquer ação é, como os acontecimentos, inteiramente determinados por
fatores que os agentes não controlam. Trata-se da conceção determinista. Por outro lado temos quem defenda
que somos dotados de livre arbítrio e que, portanto, pelo menos algumas das nossas ações são parcialmente
livres.
A tese do livre arbítrio não invalida a existência de condicionantes da nossa Acão. Somos livres mas existem
fatores que limitam o campo daquilo que podemos escolher. São eles: físico-biológicas, psicológicas
(inteligência, memória); histórico; socioculturais; e ambientais. Os corpos que possuímos, a integridade dos
nossos órgãos internos, o equilíbrio do nosso sistema nervoso e o bom funcionamento do nosso sistema
glandular são decisivos na medida em que condicionam a energia psicossomática em muitas das nossas ações
(condicionantes físico- biológicas). Sabe-se que também agimos por razões de ordem afetiva: sentimentos de
inquietação, euforia, receio ou medo são exemplos de estados afetivos capazes de motivar o comportamento. A
ação é fortemente influenciada por fatores intelectuais. Todos temos experiências de que uma boa memória
assim como engenho e criatividade fornecem atuações variadas (condicionantes psicológicas). Nós somos uma
construção que resulta também duma ambivalência social constituída por um sistema de regras, padrões morais,
normas jurídicas dentro de um enquadramento histórico. Consequentemente, a nossa personalidade é
fortemente influenciada pela cultura e pela sociedade em que se desenvolve. Os padrões culturais exteriores e
anteriores a nós são capazes de atuar sobre nós, moldando-nos segundo formas que nós próprios não
escolhemos (condicionantes histórica e sociocultural). Os fatores ambientais, desde o espaço geográfico ao
clima também se refletem na nossa ação, limitando-a ou potenciando-a(condicionante ambiental)
Teorias da liberdade:
Determinismo radical (incompatibilismo):
Tese: esta teoria defende a ausência de liberdade. A liberdade é uma ilusão. Pensamos ser livres quando na
verdade não o somos.
Argumentos:
1) tudo o que acontece na natureza obedece a um conjunto de leis naturais, de onde se destaca a lei da
causalidade ( causa-efeito). Ora, o sujeito não escapa a essas leis. Assim, tudo o que fazemos resulta de causas,
ou seja, tudo o que fazemos é causado por forças que não controlamos.
2) O facto do homem ser um ser racional não o liberta das teias da causalidade. Todas as ações humanas
resultam de acontecimentos anteriores.
3)As provas a favor do determinismo baseadas na vida diária parecem ser bastante fortes. Quando pomos
açúcar no café, esperamos que o café saiba a doce e ficaríamos muito surpreendidos se tal não acontecesse.
Quando andamos, o solo suporta-nos sempre. A verdade é que nós não podemos fazer um movimento sem
confiar em pelo menos algo que funcione como funcionou no passado. Assim, cada experiência que temos
parece apoiar a tese geral de que tudo o que acontece neste universo é causado ou determinado pelo que
aconteceu no passado.
4)Além disso, há as provas decisivas da ciência. O corpo humano e a mente não são realidades autónomas. Os
cientistas assumem que as leis da natureza aplicam-se até nas minúsculas partículas que constituem o cérebro e
o sistema nervoso humanos. Assim, quando escolhemos fazer algo, impulsos elétricos viajam do cérebro para
os músculos apropriados do corpo. Há provas científicas de que estes impulsos são causados por outros
impulsos no cérebro, que em última instância são causados por interações químicas algures no corpo. Assim, a
noção de uma vontade não livre parece ser justificada por princípios científicos.
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5) O comportamento humano é produto de crenças, da educação, de desejos, dos mecanismos do ADN, etc.
Todos estes aspetos determinam o que o homem faz. E fazem com que o homem não possa agir de outra
forma.
O determinismo opõe-se ao indeterminismo que defende que nada pode ser justificado através do princípio da
causalidade. Todo o comportamento é aleatório.
Críticas: Uma consequência do determinismo é que reduz o ser humano a um veículo por onde passam cadeias
de causas e efeitos. Outra é que não diferencia o homem do mundo natural. Além disso, levanta o problema da
desresponsabilização do ser humano pelas suas ações.
Libertismo:
Tese: Defende que o determinismo é falso quando aplicado à ação humana. No mundo natural pode fazer
sentido mas não no mundo humano.
Argumentos:
1) Os seres humanos têm livre arbítrio para iniciar livremente cadeias causais novas. A ação humana
resulta de escolhas racionais que podem alterar os acontecimentos no mundo. A defesa tradicional do
libertismo recorre ao dualismo mente – corpo, em que é a mente que dita as regras. Esta ideia sustenta a
evidência de que as intenções, as crenças e as deliberações que determinam as nossas ações se verificam no
domínio do mental, enquanto o nosso corpo tem a mesma natureza física da matéria.
2)Outro argumento criado para fundamentar o libertismo é o argumento da experiência. O argumento da
experiência esclarece que todo o ser humano no seu dia a dia apercebe-se de que é livre na medida em que faz
escolhas. Face a uma circunstância onde se apresentam várias alternativas, ele sente que é livre.
3) O argumento da responsabilidade parte do pressuposto que no quotidiano tendemos a louvar as boas ações e
a penalizar as más, isto é, responsabilizamos as ações dos outros, o que significa que os consideramos livres.
O libertismo do século xx aponta para o facto de sermos aquilo que fazemos de nós, ou seja, somos nós que
definimos a nossa vida e o nosso ser. O libertismo responsabiliza o ser humano em relação às suas ações.
4) O argumento da deliberação explicita que no ato de deliberar reconhecemos a nossa liberdade, Ao
avaliarmos alternativas, refletindo sobre as mesmas, compreendemos que somos nós que escolhemos e portanto
somos livres.
Críticas: O libertismo levanta alguns problemas: a questão da necessidade de existir interação entre a mente e
o corpo para que a ação ocorra; a questão da dualidade mente-corpo não justificar que a mente não seja
determinada.
causa para o seu comportamento (causa política, por exemplo) e a liberdade deve-se ao facto de miguem estar a
coagi-la a agir de tal forma (determinada e não constrangida).
Críticas: O compatibilismo é criticado por ser uma forma camuflada de determinismo, já que diz que nas
mesmas condições o homem não poderia ter agido de maneira diferente. Isto é, perante a pergunta” pode o
homem agir de forma diferente perante as mesmas condições?” o compatibilismo responde que não, levando a
concluir que não há liberdade mas apenas determinismo. Outro problema é que o determinismo diz que somos
livres quando agimos em função das nossas crenças e desejos e não das crenças e desejos dos outros, mas estas
nossas crenças e desejos não serão determinados pela cultura de tal forma que nos coage a agir de certa forma?
– a experiência de fazermos escolhas genuínas / «sensação interior de liberdade» é muito intensa, gerando uma
convicção muito forte de que temos livre-arbítrio;
–– para negarmos que temos livre-arbítrio, seriam precisos argumentos ainda mais fortes do que a convicção
gerada pela intensidade da experiência de fazermos escolhas genuínas.
OU
– o facto de as nossas crenças e os nossos desejos serem causados por acontecimentos anteriores não exclui a
intervenção da vontade;
– ponderamos as nossas crenças e os nossos desejos e escolhemos aqueles em função dos quais agimos; essa
escolha resulta da intervenção da vontade.
Valores:
Os valores são qualidades potenciais que resultam da apreciação que um sujeito ou sociedade faz das coisas,
pessoas e ações.
não são factos, mas o mesmo já não acontece se tivermos em conta o objetivismo (segundo este os valores são
factos).
O Objetivismo moral: Os objetivistas acreditam que os juízos de valor podem ser verdadeiros ou falsos – têm valor de
verdade – e que essa verdade ou falsidade não depende dos pontos de vista, de sentimentos ou de gostos, sejam estes
individuais ou coletivos. Esse valor de verdade é independente da opinião ou ponto de vista de cada pessoa ou de cada
cultura. Há verdades morais universais. As verdades morais são independentes de qualquer ponto de vista particular, seja
ele o de um indivíduo ou o de uma sociedade. O racismo, para dar mais um exemplo, é objetivamente errado, isto é, não se
trata de uma questão de opinião ou ponto de vista. Quem pensar o contrário está errado. Para o objetivista, podemos
encontrar critérios transubjetivos e transculturais de avaliação, que ultrapassam as perspetivas individuais ou culturais.
Mediante esses critérios é possível avaliar imparcialmente a moralidade de costumes e práticas. No caso do apedrejamento,
uma avaliação imparcial e racional concluirá que se trata de uma prática injusta que nenhum indivíduo nem nenhuma
sociedade deve admitir e tolerar. Apresentam como argumentos: 1-que os valores não dependem de convições, mas
impõem-se por si mesmos Assim se considerarmos os juízos “A eutanásia é moralmente errada” e “A eutanásia é
moralmente correta” temos, segundo os objetivistas, de reconhecer que um dos juízos é falso. Suponhamos que um
objetivista defende que a eutanásia é objetivamente errada. O que está ele a dizer? Que essa prática é em si mesma errada.
Não é errada apenas para mim. 2- os juízos de valor são válidos para qualquer ser racional ou, por outras palavras,
qualquer ser que use a sua razão reconhece a universalidade dos valores. 3-o objetivismo garante a universalidade dos
valores. A grande crítica que se faz ao objetivismo é o facto da realidade mostrar precisamente o contrário do que aquilo
que esta teoria refere. A experiencia mostra diversidade de opiniões relativamente aos valores.
O subjetivismo moral: Os subjetivistas defendem que os juízos de valor podem ser verdadeiros ou falsos, ou seja, têm
valor de verdade. Contudo, a sua verdade não é objetiva. Varia de acordo com o ponto de vista. Nenhum de nós está
objetivamente certo ou objetivamente errado no que respeita aos juízos mediante os quais avaliamos atos, pessoas e
objetos. Os nossos juízos de valor baseiam-se nos nossos sentimentos. E, como os sentimentos são subjetivos, nenhum
juízo de valor é objetivamente certo ou errado. Se uma prática ou costume desperta em mim um sentimento de reprovação
(“Sinto que é errado fazer isto”), então essa prática é censurável. Se desperta em mim um sentimento de aprovação(“sinto
que é correto fazer isto”), então essa prática é moralmente correta. Cada indivíduo é, para o subjetivista moral, a
autoridade suprema em questões morais e ninguém tem o direito de lhe dar “lições de moral”. A cada um a sua verdade.
Eu não estou errado e tu não estás errado mesmo quando avaliamos de modo oposto. Temos simplesmente sentimentos
diferentes. Se quando avaliamos composições musicais, pinturas e esculturas dizemos que “gostos não se discutem”, no
que respeita a assuntos morais devemos, na perspetiva subjetivista, dizer que sentimentos não se discutem.
Os seus argumentos são: 1-Existe claramente discordância em relação aos valores Assim, dizer “Roubar é errado” significa
dizer “Eu desaprovo o roubo”. Se a pessoa que faz este juízo realmente desaprova o roubo, então esse juízo é verdadeiro
pelo menos para ela. Mas outra pessoa já considera que o roubo pode ão ser errado em algumas circunstâncias. 2- O
subjetivismo reduz os juízos de valor a opiniões e sentimentos e pode resumir-se nesta simples fórmula “A cada um a sua
verdade”. (…) A cada qual a sua opinião de acordo com aquilo em que acredita, e em nenhum caso o juízo de valor de
uma pessoa é mais correto ou razoável do que o de outra.3-o sujetivismo promove o respeito e a tolerância pelo outro.
A grande crítica que se faz ao subjetivismo é que se esta teoria está certa então deixa de fazer sentido o debate e a
discussão. Se ambas as pessoas estão certas então não faz sentido discutir.
Relativismo moral: O relativista cultural defende que a moralidade ou imoralidade de uma certa prática ou costume
depende do que uma dada sociedade aprova ou desaprova. Se aprova um dado costume, então este é moralmente correto
(certo). Se a sociedade A aprova o apedrejamento de mulheres até à morte, então será verdadeiro o juízo “Apedrejar
mulheres adúlteras até à morte é moralmente correto(certo)”. Se não aprova então este é moralmente incorreto (errado). Se
a sociedade A reprova o apedrejamento de mulheres até à morte, então será falso o juízo “Apedrejar mulheres adúlteras até
à morte é moralmente correto(certo)”. Quando aqui se fala em sociedade fala-se da maioria dos membros que a
compõem. A tese ou ideia central do relativismo cultural pode ser descrita desta forma: Moralmente correto é igual a
socialmente aprovado pela maioria dos membros de uma dada sociedade. «X é moralmente correto» significa «A
maioria dos membros da sociedade A aprova X».Moralmente incorreto é igual a socialmente desaprovado pela maioria dos
membros de uma dada sociedade. «X é moralmente errado» significa «A maioria dos membros da sociedade A reprova
X». Assim, a verdade ou falsidade dos juízos morais varia conforme o que cada sociedade considera certo ou errado. Umas
sociedades aprovam ou consideram certo o que outras reprovam ou consideram errado. Não há juízos morais objetivos.
Todos os juízos morais são relativos aos padrões culturais (modos de pensar e de sentir dominantes) da maioria dos
membros de uma sociedade. São culturalmente relativos. Cada sociedade é, para o relativista cultural, a autoridade
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suprema em questões morais e nenhuma sociedade tem o direito de dar “lições de moral” a outra. Podem divergir sobre o
que é certo e errado, mas nenhuma sociedade pode legitimamente dizer a outra “Nós é que temos razão. Vocês estão
errados.” Há que respeitar as diferenças. Nenhuma sociedade é melhor do que outra em termos morais. Mas os críticos vão
chamar a atenção para o seguinte problema: poderemos aceitar padrões culturais que colocam em causa a dignidade
humana? Será correto aceitar e respeitar a violência sobre a mulher na cultura árabe, por exemplo? Além disso, se
pensarmos bem, esta teoria contradiz-se pois ao dizer que não há padrões absolutos de moral, está a estabelecer um padrão
absoluto que é o de não haver padrões absolutos.
Identifica corretamente o juízo de valor expresso no texto. Justifica, parcialmente ou com imprecisões, a
identificação feita. Apresenta a resposta com falhas na seleção e na estruturação dos conteúdos relevantes. 10
Identifica incorretamente o juízo de valor expresso no texto, ou não faz a identificação solicitada. Caracteriza
corretamente os juízos de valor, ou refere corretamente aspetos da distinção entre juízos de facto e juízos de
valor. Apresenta conteúdos irrelevantes ou incorretos, mas que não contradizem os conteúdos relevantes e
corretos apresentados. OU Apenas identifica corretamente o juízo de valor expresso no texto.-5
2- É um facto que há diferenças culturais e que há pessoas com opiniões muito diferentes em relação a
valores.
Será que este facto mostra que não há valores objetivos?
Na sua resposta, deve:
‒ identificar inequivocamente a perspetiva que defende;
‒ argumentar a favor da perspetiva que defende.
3- Leia o texto.
Na Europa, ao contrário de noutras partes do mundo, a grande maioria das pessoas julgaria o castigo
por apedrejamento como horrendo e profundamente errado. Para algumas pessoas isso mostra que estas
questões são relativas. [...]
A respeito do apedrejamento, os relativistas [morais] por vezes concluem enganadoramente que é errado
interferirmos nas práticas de outro país. Se essa conclusão é apresentada como uma afirmação não
relativa, nomeadamente a de que interferir é errado, [...] então contradiz a afirmação relativista de que
todos os juízos morais são relativos. Tais relativistas não podem manter consistentemente a sua posição.
Essa é uma razão clara para rejeitar o seu relativismo.
P. Cave, Duas Vidas Valem Mais Que Uma?, Alfragide, Academia do Livro, 2008, pp. 85-87 (adaptado)
O autor do texto apresenta um argumento contra o relativismo moral. Explique esse argumento.
O filósofo está ciente de que a vontade humana não é perfeita, que ela se deixa influenciar pelos apelos dos
sentidos e das emoções. Ora, quando a nossa vontade se deixa conduzir pelas inclinações sensíveis, a ação daí
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proveniente não tem validade moral. Quando é que, então, uma ação é verdadeiramente boa e moral? Para
responder a esta questão, Kant distingue diferentes tipos de ação: existem as ações contrárias ao dever que são
imorais e ilegais pelo facto de não cumprirem as normas morais e por seguirem as inclinações sensíveis;
as ações conforme ao dever que são aqueles que cumprem as regras ou normas morais, mas não se
encontram desligadas de um interesse pessoal, vantagem ou qualquer outro sentimento, sendo pois ações
legais mas não morais (cuidado: não se deve dizer que são imorais); as ações por dever que são aqueles
que cumprem as regras por total respeito pela lei moral e que decorrem de uma exigência puramente
racional, sendo portanto morais. Legalmente, roubar ou matar são considerados crimes puníveis por lei.
Contudo, em termos morais, não roubar ou não matar apenas por medo de ir para a prisão não são ações que
nos dignifiquem. Seguir a lei não é suficiente, apenas torna a nossa ação legal. Isto porque pode haver
motivações sensíveis por de trás. Trata-se de uma ação conforme ao dever É por isso que Kant sublinha que o
valor de uma ação reside na intenção que deve ser pura, destituída de inclinações e portanto racional. Só
assim estaremos a agir por dever. Portanto, para Kant, mais importante do que a legalidade é a
moralidade.
Tendo em conta o que foi dito, a autonomia será uma caraterística da vontade que age por dever . Uma
vontade autónoma é puramente racional, não reconhecendo qualquer valor às inclinações sensíveis na
realização de uma ação nem a mera obediência a leis externas. O homem autónomo age de determinada
maneira porque é seu dever assim fazê-lo. Pelo contrário, quando a ação é orientada pela obediência a outrem
ou leis sociais, ou ainda apresenta motivações egoístas ou estão viradas para a obtenção de algo, então estamos
perante uma ação heterónoma. A heteronomia é pois uma característica da vontade que não age de acordo
com a razão.
Kant não procura elaborar um conjunto de regras concretas, mas encontrar o princípio universal de todas as
normas e regras morais. Não se trata de definir o que para cada sujeito está correto fazer em cada caso
particular, mas antes encontrar a forma segundo a qual todo e qualquer ser racional deve agir. Ora, se só a razão
pode ser a origem da intenção pura, então é nela que devemos procurar esse princípio ou critério.
À fórmula que nos diz o que devemos fazer Kant chama de imperativo categórico. Este imperativo é um
mandamento que nos indica universalmente a forma como proceder. Assim, o imperativo categórico não
nos diz o que fazer em situações concretas, indica-nos apenas, de forma absoluta e incondicional, a forma
a que devem obedecer todas as ações. E essa forma diz: “faças o que fizeres, que seja sempre por
reconhecimento de que esse é o teu dever”. Portanto, o imperativo categórico deve ser seguido pelos seres
humanos seja quais forem as suas circunstâncias ou desejos, simplesmente porque são seres racionais. Ele deve
ser o critério pela qual devemos orientar a nossa ação. Ao seguirmos imperativo categórico deixamos de estar
subjugados às leis externas pois é a razão que dá a lei a si mesma.
As máximas são princípios particulares e subjetivos que o sujeito formula e que devem ser sujeitos à avaliação
do imperativo categórico. Devemos questionar se a nossa máxima é universalizável ou não antes de agir.
Assim, se estou a pensar em mentir, devo ponderar, à luz do imperativo categórico, se essa máxima poderá se
tornar numa lei universal.
Ao contrário do imperativo categórico que exprime a dignidade e a racionalidade do ser humano, o imperativo
hipotético, diz Kant, ordena que se cumpra determinadas ações tendo em conta a nossa vantagem
pessoal. Ora, para o filósofo, seguir esta forma de imperativo retira ao ser humano a sua dignidade. Só o
imperativo categórico realça verdadeiramente a natureza racional do ser humano.
O imperativo categórico apresenta várias formulas. A primeira diz: age de tal modo que possas desejar que
a máxima da tua ação se torne universal (“ age de tal forma que a máxima da tua ação devesse, através da
tua vontade, tornar-se numa lei universal”). Esta fórmula ordena-nos que quando estamos a deliberar sobre se
devemos ou não praticar uma ação, pensemos na máxima a usar e se desejaríamos que todas as pessoas
tivessem para si essa tal máxima de ação. Assim, se alguém coloca a hipótese de vir a roubar e toma como
máxima que justifique a sua ação “rouba quando isso te traz proveito”, deve confrontar-se com o imperativo
categórico e perceber que essa máxima sendo válida para si também será para todos. Face a essa hipótese de
universalização, deve por sua vez questionar se é desejável para todo o ser racional que essa máxima se aplique.
E neste caso a resposta será não. Uma máxima só se torna válida universalmente se concordássemos com uma
situação em que todos considerassem bom agir desse modo. Neste caso, a ideia de roubar anula-se a si
mesma.
A segunda diz: age de tal modo que trates sempre as pessoas como fins em si e nunca e apenas como um
meio. Tratar o outro como um meio é usá-lo como um objeto que nos pode trazer vantagens futuras,
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desconsiderando que se trata de uma pessoa. Tratar o outro como um fim em si é relacionar-se com ele
reconhecendo que se trata de uma pessoa com ideias e liberdades individuais.
A filosofia moral de Kant identifica-se com as éticas deontológicas, uma vez que dá prioridade à conformidade
da ação ao dever, em detrimento das consequências. E o dever corresponde à necessidade de agir por respeito à
lei moral que a razão dá a si mesma.
Boa vontade: Segundo o pensamento de Imannuel Kant, a boa vontade é a única coisa que pode ser
considerada como boa em si mesma, absoluta e incondicionada, pois já dizia o pensador em seu livro
Fundamentação da Metafísica dos Costumes: "De todas as coisas que podemos conceber neste mundo ou
mesmo, de maneira geral, fora dele, não há nenhuma que possa ser considerada como boa sem restrição, salvo
uma 'boa vontade'" (KANT, 1991). Isto porque a boa vontade, enquanto princípio que orienta as ações
humanas, não vai buscar o seu valor num ato de caridade praticado com a intenção de obter benefícios pessoais.
Por isso, o valor de uma boa vontade consiste, apenas, na pura intenção de praticar o bem. Quando a
mesma intenção se afirma como um valor em si mesmo, independentemente das consequências, ela surge para
nós como um bem absoluto e incondicionado. Na obra Fundamentação da Metafísica dos costumes Kant diz:”A
boa vontade não é boa pelo que produz e realiza, nem por facilitar o alcance de um fim que nos proponhamos,
mas apenas pelo querer mesmo; isto quer dizer que ela é boa em si e que, considerada em si mesma, deve ser
tida em preço infinitamente mais elevado que tudo quanto possa realizar-se por seu intermédio em proveito de
alguma inclinação, ou mesmo, se se quiser, do conjunto de todas as inclinações” (KANT, 1991). Portanto, a
boa vontade é uma vontade que age de forma moralmente correta, isto é, de acordo com a razão.
A teoria moral de Kant apresenta alguns problemas: 1)não resolve conflitos entre deveres, isto é, o imperativo
categórico não permite decidir nas situações em que duas opções incompatíveis entre si são ambas baseadas em
máximas válidas universalmente. Por exemplo, face à situação de abrigarmos um preso político, iremos nos
confrontar com a escolha entre a máxima que diz para proteger um inocente da tortura e a máxima que afirma
para dizermos sempre a verdade. 2)a ética kantiana ignora as consequências das ações, o que se torna
problemático quando consideramos ações cujo agente, apesar de ter uma intenção boa- cumprimento do
dever-, é, no entanto, tão descuidado que origina consequências nefastas. 3)ignora o papel das emoções na
moralidade, como por exemplo a piedade e a generosidade. Mesmo quando somos motivados por essas
emoções a praticar o bem, isso não é correto, pois devemos praticá-lo apenas por dever.
sofrimento não são úteis ao homem porque o impedem de alcançar a felicidade. Assim sendo não podem ser
ações morais. Desta forma, o utilitarismo apresenta como critério de avaliação moral das ações a sua utilidade.
Mas a novidade de Mill está em dizer que há prazeres superiores e inferiores, o que significa que há prazeres
intrinsecamente melhores do que outros. E o que quer isto dizer? Simplesmente que há prazeres que têm mais
valor do que outros devido à sua natureza. Mill defende que os tipos de prazer que têm mais valor são os
prazeres do pensamento, sentimento e imaginação; tais prazeres resultam da experiência de apreciar a beleza, a
verdade, o amor, a liberdade, o conhecimento e a criação artística. Qualquer prazer destes terá mais valor e fará
as pessoas mais felizes do que a maior quantidade imaginável de prazeres inferiores. Quais são os prazeres
inferiores? Os prazeres ligados às necessidades físicas, como beber, comer e sexo. Tal como diz Mill: Mais vale
um porco satisfeito do que um homem satisfeito.
O hedonismo de Mill não é egoísta. Pelo contrário, está muito próximo do altruísmo já que diz que o ser
humano ao valorizar os prazeres superiores e espirituais não poderá senão desejar o bem-estar comum. Claro
que o sujeito deve valorizar o seu bem estar, mas dentro do bem estar comum. E no caso de haver um
conflito entre o seu bem estar e o bem comum, deve optar pelo segundo. Outro aspeto a ter em conta é que o
que de facto importa é a qualidade do prazer e não a sua intensidade.
A teoria de Mill não contempla a existência de uma tabela de valores universais. Não existem valores absoluto
que se impõem a todo o ser racional. Mill constrói uma moral das circunstâncias, onde se torna possível
recorrer a um determinado valor na medida em que traz benefícios para a maioria, mas numa outra situação
esse valor pode ser completamente desvalorizado. Um exemplo disso é quando salvaguardamos o valor vida
numa circunstância em que salvar muitas vidas é um benefício para a maioria e numa outra situação anulamos
esse valor pelo facto de matar um grupo de pessoas traz uma consequência positiva para a maioria. Não é sem
razão que se chama à moral de Mill uma moral das circunstâncias.
A teoria de Mill apresenta alguns problemas/objeções:1)considera correto provocar sofrimento a uma pessoa se
daí resultar a possibilidade de evitar igual sofrimento a várias outras, pondo assim em causa os direitos
individuais e a dignidade; 2) a felicidade consiste no que as pessoas consideram desejável, mas nem tudo o que
uma maioria deseja é de facto desejável 3)agir apenas em função da utilidade e das consequências pode pôr em
causa valores fundamentais. 4)o facto de não valorizar a definição de princípios universais orientadores da
ação, relativiza perigosamente os conceitos de bem e de mal.5) é muito exigente das prioridade à felicidade da
maioria.
Kant e Mill:
Segundo Stuart Mill o que permite definir se uma ação é boa ou má são as suas consequências: se as
consequências são positivas, isto é se trouxerem vantagem, então a ação é boa, mas se as consequências são
negativas, por trazerem desvantagem, então a ação é má. Quer isto dizer que agir não pressupõe um dever e que
a moral não depende de valores universais. Enquanto Kant nos diz que só podemos agir por dever( é a única
intenção legítima para agir), independentemente do fim da ação, Mill valoriza o fim da ação e negligencia a
ideia de dever. A ação em kant tem como fundamento a racionalidade, já em Mill o fundamento é a felicidade.
O princípio determinante da ação em Kant é o imperativo categórico e em Mill o princípio da maior felicidade.
Enquanto no primeiro temos sempre de questionar se a nossa máxima é universalizável- se pode se tornar
universal-, no segundo devemos questionar se a nossa ação traz a maior felicidade possível ao maior número de
pessoas. Assim, no exemplo de se Truman deve ou não lançar a bomba atómica sobre Hiroxima, segundo kant
não o deve fazer por uma questão de dever (neste caso o dever de respeitar a vida humana) e segundo Mill deve
fazê-lo porque traz uma boa consequência para o mundo- terminar com a guerra. De acordo com o imperativo
categórico de Kant, é impensável usar alguns seres humanos como meios, ou meros objetos, para alcançar um
fim, assim lançar a bomba atómica é uma ação não moral. Já o princípio da maior felicidade, ao colocar o bem
da maioria à frente do bem de alguns, torna legitimo o lançamento da bomba.
[…] No caso de a ação ser apenas boa como meio para qualquer outra coisa, o imperativo é hipotético;
se a ação é representada como boa em si, por conseguinte, como necessária numa vontade em si conforme
à razão, como princípio dessa vontade, então o imperativo é categórico.
I. Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Lisboa, Edições 70, 2011
. A partir do texto, mostre por que razão, para Kant, a ação com valor moral se fundamenta no
imperativo categórico e não em imperativos hipotéticos.
Na sua resposta, integre, de forma pertinente, informação do texto.
seja muito relevante para o valor do agente, é irrelevante para a moralidade da ação. Aquele que salva
um semelhante de se afogar faz o que está moralmente certo, seja o seu motivo o dever, seja a esperança
de ser pago pelo incómodo; aquele que trai um amigo que confia em si é culpado de um crime, mesmo
que o seu objetivo seja servir outro amigo relativamente ao qual tem maiores obrigações.
J. S. Mill, Utilitarismo, Porto, Porto Editora, 2005, pp. 58-59 (adaptado)
. No texto, lê-se que «Compete à ética dizer-nos quais são os nossos deveres, ou por meio de que teste
podemos conhecê-los». Segundo Kant, esse teste é o do imperativo categórico.
Explique como funciona o teste proposto por Kant. Na sua resposta, recorra a um exemplo.
Refere corretamente aspetos da ética de Kant, mas não explica como funciona o teste, nem apresenta um exemplo, ou
apresenta um exemplo inadequado.
Apresenta conteúdos irrelevantes e incorretos, que não contradizem os conteúdos relevantes e corretos apresentados.
O ser humano é um ser social que necessita do outro para se construir como pessoa. A convivência com os
outros é não só uma realidade como um desafio. E o grande desafio da experiência em conjunto é a construção
de uma sociedade organizada e justa. É aqui que entra a filosofia do direito e a filosofia política que,
juntamente com a ética, tentam responder a questões como: como organizar a sociedade? O que é uma
sociedade justa?
Se bem que haja uma tendência para associar a ética à esfera privada e o direito à esfera pública, a verdade é
que ética e direito dizem respeito à nossa vida em sociedade e estão interligados. A ética é uma reflexão
filosófica sobre os princípios universais onde deve assentar o nosso comportamento, ou seja a ética reflete
sobre o direito e a justiça das leis existentes na sociedade. E o direito diz respeito às leis codificadas que a
nossa consciência ético-moral deve nos levar a cumprir. Ou seja, o direito por si só não determina a nossa
conduta, é necessário que a nossa consciência reconheça a importância de cumprir as leis e nos conduza a agir
de acordo com elas. Portanto, o direito sem a ética torna-se limitado. É importante ainda referir que a nossa
consciência, por vezes, nos leva a agir contra as regras. Tal acontece quando estas são injustas e colocam em
causa direitos fundamentais. Um exemplo é Aristides de Sousa Mendes que agiu contra as determinações do
governo português, durante a segunda guerra mundial, em nome do valor vida e dignidade humana, ao passar
vistos para os judeus fugirem para os EUA. Neste exemplo, direito e ética apresentam-se inconciliáveis.
direitos e liberdades pelo facto de serem todos moralmente iguais e, ao mesmo tempo, da existência de
um ajustamento entre essa igualdade e as liberdades individuais. Assim, uma sociedade justa será aquela
que garante um tratamento igual para todos e um ajustamento entre liberdades individuais e a
igualdade.
O ideal de Rawls é uma sociedade onde exista a menor desigualdade possível e não a existência de igualdade
económica e social. Uma sociedade onde exista uma desigualdade grande na distribuição da riqueza é uma
sociedade injusta.
Rawls recusa a conceção utilitarista que defende que o que de facto importa são as consequências das ações em
termos de bem-estar e prazer para a maioria. Isto porque considera que esta ideia leva a situações sociais e
económicas entre as pessoas que são injustas(o utilitarismo não tem em consideração a forma justa ou injusta
como a felicidade é distribuída na medida em que permite que se sacrifique o bem de alguns em nome da
maioria). Rawls, ao contrário do utilitarismo, defende a necessidade de beneficiar todo o ser humano,
inclusive as minorias. Tal acontece através do princípio da diferença.
Mas recupera a tradição das teorias que defendem o contrato social. Assim, para Rawls, a organização
política justifica-se por resultar de um acordo entre todos, ainda que hipotético, em obedecer a um poder
político em troca de benefícios como segurança, justiça, etc. Não se trata pois, em Rawls, de um acordo real,
como nas teorias contratualistas do passado. Trata-se de um cenário imaginário em que todos os indivíduos,
apesar de todas as diferenças existentes entre si, vão negociar a partir da posição original.
A posição original é uma situação imaginária em que os parceiros são sujeitos morais, racionais, livres e
iguais, colocados sob um véu de ignorância. Este véu de ignorância consiste no desconhecimento da
condição social, económica, etc. de si mesmos. Ora, é nessa situação fictícia que terão de escolher os
princípios que devem fundamentar e organizar uma sociedade. E como estão cobertos pelo véu de
ignorância que os impossibilita de ver as suas características particulares, não poderão escolher em
função dos seus interesses particulares. Nesta situação, a tendência seria serem imparciais e escolher
para os outros o que querem para si.
É como se estivéssemos na posição de jogadores entrando em acordo quanto às regras antes de sabermos o jogo
que nos iria calhar. E com a consciência que nos poderia sempre calhar a pior sorte. Assim escolheríamos sem
favorecermo-nos a nós mesmos, pois esse favorecimento poderia não nos calhar a nós.
Colocados na posição original, os seres humanos escolheriam os seguintes princípios fundamentais:
Princípio da liberdade igual: a sociedade deve garantir a máxima liberdade para cada pessoa compatível com
a liberdade igual para todos. Este princípio garante que não hajam pessoas com mais liberdade do que outras e
que não haja interferências na liberdade de outrem em benefício próprio. As liberdades básicas são: liberdade
política, de religião, de reunião, de pensamento, de expressão, etc.
Princípio da igualdade de oportunidade: as desigualdades económicas e sociais devem estar ligadas a postos
e posições acessíveis a todos em condições de justa igualdade de oportunidades. No entanto, segundo este
princípio, é aceitável que haja desigualdades pois os indivíduos têm diferentes interesses e prioridades, o que
leva a que uns consigam alcançar uma melhor condição social e económica do que outros. Para Rawls isto não
é injusto, o que a sociedade tem de garantir é que todos partam de uma base igual, como por exemplo dando
oportunidades a todos de estudar. (o princípio da liberdade tem prioridade sobre este)
Princípio da diferença: diz respeito à distribuição justa da riqueza e considera que essa distribuição deve ser
equitativa. A única razão para aceitar que alguns tenham mais é que isso possa funcionar como
compensação para os mais pobres. Portanto, segundo este princípio, uma sociedade justa deve garantir a
máxima proteção para os mais desfavorecidos. Temos assim que este princípio subdivide-se em três
pressupostos fundamentais: o princípio da vantagem mútua que diz que uma sociedade deve promover a
distribuição igual de riqueza, exceto se a existência de desigualdades beneficiar os mais desfavorecidos; o
princípio da fraternidade que defende as contribuições dos mais ricos; e o princípio da compensação que diz
que a sociedade deve dar especial atenção aos menos favorecidos, corrigindo desigualdades. Rawls entende
como desfavorecidos todos aqueles que apresentam desvantagens económicas, sociais ou naturais.
Rawls estabelece o princípio ou regra maximin. O princípio maximin é uma estratégia de decisão que pessoas
razoáveis seguem, numa situação de incerteza – o véu de ignorância. É a estratégia do menor mal. São
preferíveis princípios de justiça que estejam na base de uma sociedade em que o pior não será muito mau do
que uma sociedade em que, por exemplo, haja muita pobreza e muita riqueza. A sociedade preferível é aquela
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em que a pobreza e a riqueza sejam moderadas. O Princípio Maximin é, segundo Rawls, aquele que melhor
expressa o conceito da justiça equitativa, pois, ao garantir, genericamente, a maximização do benefício
mínimo, asseguraria que a sociedade preferível fosse aquela que conseguisse distribuir mais riqueza
pelos mais desfavorecidos. A ideia de fundo é a de que é preferível uma sociedade desigual, capaz de
distribuir mais riqueza, a uma sociedade com mais igualdade, mas com menos riqueza..
Críticas:
A crítica comunitarista de Michael Sandel
Comunitaristas como o filósofo Michael Sandel não concordam com a ideia liberal de que o bem comum seja
simplesmente o resultado da combinação das preferências individuais. (…) Só a comunidade permite encontrar,
em conjunto, o modo de vida que define uma vida boa, que é afinal o bem comum. (…) Uma consequência
disto é que as pessoas não se autodeterminam, visto haver escolhas que decorrem de laços comunitários
preexistentes que moldam as nossas preferências. . É, pois, no âmbito da vida social comunitária que se
constrói a nossa própria identidade, pelo que pertencemos em grande parte não só a nós próprios, mas à
comunidade em que estamos enraizados. Mas o que segue daí, relativamente à teoria da justiça de Rawls? Na
opinião de Sandel, segue-se que o modo proposto por Rawls para encontrarmos os princípios da justiça falha
completamente. Sandel está a referir-se à posição original e, em particular, ao véu de ignorância. É certo que
esta situação visa garantir a imparcialidade na escolha dos princípios da justiça. Só que não bastas as nossas
escolhas serem imparciais para serem boas, diz Sandel. Porquê? Porque avaliar uma escolha como boa ou como
má é uma questão moral, mas o véu de ignorância coloca as pessoas numa situação anterior a qualquer moral,
pois exige que as escolhas sejam feitas por seres racionais que têm em conta os seus interesses pessoais.
Mesmo que as pessoas cheguem a acordo, ele não é justo só por as partes terem livremente acordado nisso. Um
acordo é justo quando é bom, pelo que a noção do que é bom é anterior à noção do que é justo. Ora. Sublinha
Sandel, a noção do que é bom não pode ser dada pelas preferências individuais de seres completamente
desenraizados de uma comunidade concreta. Mas o véu de ignorância transforma-nos em fantasmas
desprendidos de qualquer laço social. Assim, escolhas feitas por hipotéticos seres desprendidos não são sequer
moralmente credíveis, pois qualquer noção do que é bom ou não bom decorre, como se viu, do nosso
enraizamento prévio numa comunidade concreta.
A crítica libertista de Robert Nozick
«Robert Nozick defende o liberalismo. Sendo liberal, Nozick aceita quase completamento o princípio da [igual]
liberdade de Rawls. Contudo, critica o princípio da diferença. Nozick acredita que este princípio visa
estabelecer o seguinte padrão na distribuição dos bens: distribuir a riqueza de modo a que os menos favorecidos
fiquem na melhor situação possível. Porque visa estabelecer um padrão de distribuição, Nozick pensa que a
teoria da justiça de Rawls assenta numa conceção padronizada de justiça. Ora, todas as conceções padronizadas
de justiça sofrem do mesmo problema: não conseguem manter uma distribuição dos bens segundo o padrão
adotado, a não ser à custa da intervenção constante do Estado e do sacrifício intolerável dos direitos das
pessoas. Que quer isto dizer? (…) Se o estado cobrar em impostos 25% daquilo que uma pessoa ganha
mensalmente para distribuir por outros, estará na prática a obriga-la a dar uma semana do seu trabalho aos
outros. Ora, isso equivale, defende Nozick, a trabalho escravo: (…) pois é como se roubassem parte da sua vida
e a pusessem ao serviço de outrem. Isto é trata-las como meros meios e não como fins, como diria Kant. Ora
isto é uma intromissão abusiva do Estado na vida individual, tratando os bens das pessoas como se não fossem
delas. Assim, se o Estado retirar parte desses bens aos seus justos titulares sem o seu consentimento, está a
violar os seus direitos de propriedade.
2. Rawls defende que, na posição original, a escolha dos princípios da justiça seguiria a estratégia
maximin. Suponha que há 100 unidades de bem-estar para distribuir por três pessoas. Selecione a opção
que apresenta o modelo de distribuição que está mais de acordo com a estratégia maximin.
(A) Na melhor das hipóteses, pode receber-se 65 unidades de bem-estar e, na pior, pode receber-se 15.
(B) Na melhor das hipóteses, pode receber-se 60 unidades de bem-estar e, na pior, pode receber-se 20.
(C) Na melhor das hipóteses, pode receber-se 80 unidades de bem-estar e, na pior, pode receber-se 5.
(D) Na melhor das hipóteses, pode receber-se 45 unidades de bem-estar e, na pior, pode receber-se 15
R: B, porque o princípio maximin pressupõe a maximização dos bens a dar aos mais desfavorecidos e a
alternativa B é aquela que apresenta um maior beneficio no pior dos casos.
estável, a não ser que aqueles que sofrem os sacrifícios maiores se identifiquem com interesses mais
amplos do que os que lhes são próprios. Tal não é fácil de obter.
J. Rawls, Uma Teoria da Justiça, Lisboa, Editorial Presença, 2001, p. 149 (adaptado)
No texto anterior, Rawls apresenta razões a favor dos dois princípios da justiça por si defendidos e
contra o princípio de utilidade. Explicite as razões de Rawls.
Empirismo
Para o empirismo a experiência é a fonte de todo o conhecimento, mas também o seu limite. Os empiristas
negam a existência de ideias inatas, como defendiam Platão e Descartes. A mente está vazia antes de receber
qualquer tipo de informação proveniente dos sentidos (nada está na razão que não tenha antes passado
pelos sentidos). Todo o conhecimento sobre as coisas, mesmo aquele em que se elabora leis universais,
provém da experiência, por isso mesmo, só é válido dentro dos limites do observável. Os empiristas reservam
para a razão a função de uma mera organização de dados da experiência sensível, sendo as ideias ou conceitos
da razão simples cópias ou combinações de dados provenientes da experiência. Quando à possibilidade do
conhecimento, admitem que não é possível conhecer para lá do que a experiência nos pode dar e garantir e
reconhecem que a ciência não pode assentar em verdades incontestáveis. Dado que o método de aquisição
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do conhecimento é a indução, apenas podemos aceder a verdades prováveis. Entre os filósofos que assumiram
uma perspetiva empirista destacam-se John Locke (1632 -1704) e David Hume (1711-1776).
- Descartes e o Racionalismo
Descartes teve um papel importante na história do pensamento ao estabelecer os princípios da ciência
moderna. Viveu no séc, XVII, período em que a igreja insistia em manter a tradição, não obstante os novos
conhecimentos emergentes realçarem novas verdades e novas realidades.
Descartes refletiu sobre o problema da origem e possibilidade do conhecimento. O seu objetivo foi
encontrar uma evidência irrefutável, o fundamento do conhecimento, de onde pudesse deduzir logicamente
verdades incontestáveis. Inspirado pelas ciências matemáticas, Descartes parte do pressuposto de que seria
possível construir um sistema sólido e fundamentado assente em princípios indubitáveis que nos
permitem aceder a um conhecimento válido e universal.
A dúvida: A dúvida metódica é uma ferramenta metodológica ( instrumento de trabalho) com que
Descartes procurou chegar à prova da existência de verdades absolutas, logicamente necessárias e
universalmente reconhecidas. Daí ser tão importante. Para atingir um conhecimento absoluto, é preciso
eliminar tudo o que seja suscetível de dúvida. Nesse sentido, Descartes começa por suspender todos os
conhecimentos suscetíveis de serem postos em causa para os analisar. Descobre que os sentidos o podem
eenganar. E a razão também. Então põe tudo em causa para, a partir da dúvida, encontrar a verdade.
Campos onde a dúvida recai: Descartes vai aplicar a dúvida a tudo o que possa causar incerteza,
nomeadamente: as informações dos sentidos; as nossas opiniões, crenças e juízos precipitados; as
realidades físicas e corpóreas e, duma maneira geral, tudo o que julgamos real; os conhecimentos
matemáticos; também Deus é submetido à prova rigorosa da dúvida, uma vez que Descartes coloca a
hipótese de Deus poder ser enganador ou um génio do mal.
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Primeira Evidência: Ao pôr tudo em dúvida, e enquanto o faz, descobre que a única coisa que resiste à
própria duvida é o pensamento. Esta seria a primeira verdade absoluta da filosofia. "Eu penso, logo existo"
(cogito ergo sum).
Descartes afirmava que, para conhecer a verdade, é preciso, de início, colocar todos os nossos conhecimentos
em dúvida. É necessário questionar tudo e analisar criteriosamente se existe algo na realidade de que
possamos ter plena certeza. Fazendo uma aplicação metódica da dúvida, o filósofo percebeu que a única
verdade totalmente livre de dúvida era que ele pensava. O ato de duvidar pressupõe necessariamente o
pensamento. E se pensa é porque existe. Percebeu então que, se pensava, existia ("Penso, logo existo").
Para Descartes, essa seria uma verdade absolutamente firme, certa e segura, que, por isso mesmo, deveria ser
adotada como princípio básico de toda sua filosofia. Trata-se de um conhecimento claro e distinto que irá
servir de modelo para todas as verdades que a razão possa alcançar. É preciso ressaltar que o termo
pensamento é utilizado por Descartes em um sentido bastante amplo, abrangendo tudo o que afirmamos,
negamos, sentimos, imaginamos, cremos e sonhamos. Assim, o ser humano era, para ele, uma substância
essencialmente pensante. A verdade «eu penso, logo, existo» é uma evidência. Trata-se de um conhecimento
claro e distinto que irá servir de modelo para todas as verdades que a razão possa alcançar. Este tipo de
conhecimento deve-se exclusivamente ao exercício da razão, não existe qualquer ligação com os sentidos. O
cogito corresponde a uma ideia inata adquirida intuitivamente. É uma ideia, portanto, racional, a priori,
evidente e indubitável.
Descartes mostrou que a razão, só por si, é capaz de produzir conhecimentos verdadeiros, pois ela alcançou
uma verdade inquestionável. Mas, apesar da razão ter chegado ao conhecimento verdadeiro, ainda não está
excluída a hipótese do Deus enganador. Continua a questionar tudo, à exceção de que existe.
A primeira evidência conduz ao solipcismo.Do latim solus, só, e ipse, ele mesmo. Termo de sentido negativo
e até mesmo pejorativo, designa o isolamento da consciência individual em si mesma, tanto em relação ao
mundo externo quanto em relação a outras consciências. Pode-se dizer que a certeza do cogito cartesiano leva
ao solipsismo ( o eu sabe que existe, mas está só face ao mar de dúvidas que ainda prevalece) que só é
superado apelando-se para a existência de Deus.
Segunda evidência: Deus existe A primeira evidência não garante o conhecimento, não permite a Descartes
dizer que conhece com clareza. Então o que vai garantir que uma ideia seja verdadeira? A resposta está em
Deus. A partir da primeira evidência, Descartes descobre que possuímos ideias, como a ideia de perfeição,
que se impõem à razão como verdadeiras, mas que não derivam da experiência, nem foram por nós criadas.
Atribui a sua criação a Deus. Estas ideias são pois inatas. Esta ideia de perfeição é fundamental. Descartes,
pela aplicação da dúvida metódica, assumiu a existência do cogito, isto é, da sua existência como ser pensante.
Contudo, levantava-se a questão de existência do mundo. A negação do valor dos sentidos como meio de
acesso ao conhecimento verdadeiro colocava-o, de facto, perante a situação de ter que duvidar da existência da
árvore que estava naquele momento a ver. Descartes precisa, pois, de uma garantia e suporte de verdades
como a da existência do mundo. Onde encontrar esse suporte? Em Deus. Mas, como saber se Deus existe ou
não? Como provar a sua existência se apenas podia ter a certeza da existência do cogito?
1- Argumento da causalidade: olhando para o seu próprio ‘eu’, que é tudo o que lhe resta neste momento,
Descartes descobre que tem uma ideia de perfeição. Argumenta, então, que uma tal ideia implica uma causa.
Percebe que ele próprio, um ser imperfeito, não pode ser a causa da ideia de perfeição. Só um ser perfeito
pode ser a causa da ideia de perfeição. Isto implica que só uma causa perfeita, isto é, Deus, pode servir. Por
isso, Deus existe e legou-nos a ideia de perfeição como um sinal inato da sua ação nas nossas mentes, assim
como um artesão deixa a sua marca gravada no seu trabalho.
2- Argumento ontológico: De acordo com o argumento ontológico, Deus define-se como o ser mais perfeito
que é possível imaginar. A existência seria um dos aspetos desta perfeição ou grandiosidade. Um ser perfeito
não seria perfeito se não existisse. Consequentemente, da definição de Deus seguir-se-ia que Deus existe
necessariamente, tal como se segue da definição de um triângulo que a soma dos seus ângulos internos será de
180 graus.
3- Argumento da causalidade/criação: o ser pensante não pode ter sido o criador de si próprio, pois se assim
fosse ter-se-ia criado perfeito. Só a perfeição divina pode ter sido a criadora do ser imperfeito e finito que é o
homem e de toda a realidade.
Deus é pois uma garantia de que podemos conhecer com verdade. Sendo a bondade um dos atributos de Deus,
certamente que Ele não nos engana, logo as ideias inatas são verdadeiras. Deus é assim, a garantia da
possibilidade do acesso à verdade. Por outras palavras se Deus é perfeito e criador do homem e da realidade,
então é também o criador das verdades incontestáveis e o fundamento da certeza. Segundo Descartes, é Deus
que garante a adequação entre o pensamento evidente (verdadeiro) e a realidade, conferindo assim validade ao
conhecimento.
Terceira evidência: ideia de extensão: Deus garante então a existência do mundo assim como outras
verdades derivadas da existência do mundo. Descartes divide o ser em três substâncias. Deus, ser perfeito e
infinito corresponde à res divina ou substância divina. A primeira evidência ou ideia evidente corresponde à
rescogitans, isto é, àrazão ou substância pensante ("pensamento", "espírito", "alma" ou "entendimento").
Apresenta-se como inextensa, finita e imperfeita. Já o corpo e o mundo material corresponde à res extensa,
isto é, ao mundo exterior. Segundo o filósofo, os corpos são determinados pela sua extensão, movimento,
forma, tamanho, quantidade, lugar e tempo. Estes são os aspetos objetivos da substância material, aqueles que
são passíveis de conhecer porque são matematizáveis. Considerar a cor ou o paladar é ficar-se por aspetos
subjetivos que não conduzem ao conhecimento.
Descartes distingue três tipos de ideias: inatas, adventícias e factícias: As ideias adventícias são aquelas
que nos chegam a partir dos sentidos, as factícias são provenientes da nossa imaginação, uma combinação de
imagens fornecidas pelos sentidos e retidas na memória cuja combinação nos permite representar (imaginar)
coisas que nunca vimos. A grande questão porém é a de saber se todas as nossas ideias se podem explicar
destes dois modos. Será o triângulo uma ideia adventícia? Como explicar então a sua perfeição? Será uma
ideia factícia? Como explicar nesse caso a sua universalidade? E a ideia de Deus? Como explicar que seres
finitos e imperfeitos como os homens são, possam ter a ideia de um ser infinito e absolutamente perfeito? A
resposta de Descartes é a de que para além das ideias adventícias e factícias os homens possuem ideias inatas,
ideias que, nascidas connosco, são como que a marca do criador no ser criado à sua imagem e semelhança.
Estas ideias inatas, claras e distintas, não são inventadas por nós mas produzidas pelo entendimento sem
recurso à experiência. Elas subsistem no nosso ser, em algum lugar profundo da nossa mente, e somos nós que
temos liberdade de as pensar ou não. Representam as essências verdadeiras, imutáveis e eternas, razão pela
qual servem de fundamento a todo o saber científico.
Operações do espírito: A intuição é uma operação que consiste na apreensão direta e imediata de noções
simples e evidentes. Já a dedução diz respeito ao ato de encadear as intuições.
Em suma, Descartes resolve o problema da origem do conhecimento ao assumir a razão como a fonte de todas
as proposições verdadeiras da ciência e a resposta que dá ao problema da possibilidade do conhecimento é que
a razão permite aceder a verdades indubitáveis, ou seja, é possível conhecer com certeza.
Criticas a Descartes:
Descartes foi considerado:
1-Exclusivista: considera a razão a única forma de conhecer, negando completamente o papel dos sentidos.
2-Dogmático: a sua filosofia realça uma fé inabalável na existência de verdades indubitáveis, absolutas. Não
reconhece a verdade como um ideal a alcançar e a ciência como um processo evolutivo.
3-Raciocínio circular: segundo o pensador é o conceito de ideia clara e distinta que leva a mente a reconhecer
a existência de Deus, mas, por outro lado, é Deus que garante a verdade das ideias claras e distintas, ou seja,
ambos são premissa e conclusão. Estamos perante um raciocínio circular.
4-Afirma a existência como predicado: a ideia de perfeição pressupõe a existência, diz Descartes. Assim
sendo, a existência é apenas um predicado da perfeição. Mas Kant critica Descartes dizendo que a existência é
uma condição e não um predicado.
Impressões e ideias: Hume utiliza o termo ‘perceção’ para referir quaisquer conteúdos da mente (…). As
perceções ocorrem quando o indivíduo observa, sente, recorda, sente, recorda, imagina, e assim por diante,
sendo que o uso atual da palavra cobre um leque muito menos vasto de atividades mentais. Para Hume,
existem dois tipos básicos de perceções: impressões e ideias.
Os conteúdos da mente são pois as impressões e as ideias. Impressões e ideias são as unidades básicas do
conhecimento. As impressões são a matéria primitiva do conhecimento. Através da experiência as impressões
são captadas. A experiência das impressões é sempre fortemente vivida, isto é, são mais intensas do que as
ideias. Dividem-se em impressões dos sentidos (sensações) e os sentimentos. Por outro lado, segundo o
princípio da cópia, as ideias são cópias das impressões. As cópias são menos intensas e vívidas do que as
impressões que estão na sua origem. As ideias são cópias de impressões e são por isso causadas por estas.
Têm uma origem empírica. As nossas ideias formam-se todas a partir da experiência. Se as ideias não fossem
cópias das impressões, quem não possuísse a capacidade de ter a experiência da cor não formaria a ideia de
cores. Uma pessoa cega de nascença não poderá ter a ideia de branco porque nunca terá a impressão de
branco. Do que não há impressão não há ideia. Segundo Hume, não existem ideias inatas, todas as ideias
humanas são cópias de impressões. Só conhecemos aquilo de que temos experiência. O conhecimento
começa com a experiência e daquilo de que não há experiência não há conhecimento.
As ideias dividem-se em simples e complexas. As ideias simples são aquelas que não podem ser
decompostas. As complexas resultam da ligação de ideias simples. As ideias simples resultam de impressões
simples e as ideias complexas de impressões complexas. Essa ligação decorre do pensamento e da
imaginação.
Não existe uma diferença de natureza entre impressões e ideias. A diferença é de grau. É o grau de
força e de vivacidade que as distingue.
A ideia de Deus: Todos os nossos pensamentos ou ideias resultam de impressões; até mesmo as ideias mais
compostas, que parecem à primeira vista afastadas das impressões (como por exemplo a ideia de Deus), são
derivadas ou decompostas em ideias simples, que por sua vez são copiadas de impressões (sentimentos ou
sensações). Por exemplo a ideia de Deus como um ser infinitamente inteligente, sábio e bom deriva da
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associação e maximização das ideias de inteligência, bondade e sabedoria, que por sua vez se baseiam
em impressões que se referem à sabedoria e à bondade (à experiência que o homem tem quanto à sua
inteligência, quando conhece alguma coisa ou quando pratica boas ações). É assim que Hume explica como o
homem chega à ideia de Deus. Mas, como ainda nos diz o filósofo, esta ideia em si mesma não tem uma base
empírica- a experiência não justifica a ideia de Deus. David Hume cai assim num ceticismo metafísico.
Princípios da conexão de ideias: Temos três princípios de conexão entre as ideias: semelhança,
contiguidade de tempo ou lugar, causa e efeito.
1.Semelhança. Exemplo: uma foto de um familiar remete para a pessoa real. Uma ideia remete para outra em
função da semelhança.
2.Contiguidade. Exemplo: uma sala de aula de uma escola me faz pensar nas outras (salas) que compõe toda a
escola. Uma ideia remete para outra devido à relação que existe entre elas em termos de espaço ou tempo.
3.Causa e Efeito. Exemplo: um braço partido remete para o motivo do acidente. A ideia de causa leva-nos de
imediato para a ideia de efeito e vice-versa.
O problema da causalidade: Para Descartes as relações de causa e efeito são conhecidas por intuição ou por
dedução, o que é uma garantia absoluta da sua verdade. Quando temos uma ideia clara e distinta da causa
podemos saber imediatamente, por intuição, que efeitos resultam necessariamente dela. Quando não somos
capazes de intuir a conexão necessária entre a causa e o efeito, temos de derivar o efeito por uma cadeia de
raciocínios que o liguem à causa. Em qualquer dos casos, para Descartes, a razão, por si só, a priori, é capaz
de conhecer as relações causais com absoluta certeza. Embora tendo consciência da importância que o
princípio de causalidade teve na história da humanidade, Hume vai submetê-la a uma crítica rigorosa. Vai
então perceber que se fosse possível conhecer exclusivamente pela razão as conexões necessárias entre
objetos, seria preciso que as relações causais fossem relações de ideias, que a mera análise da ideia da causa
revelasse todos os seus efeitos. Assim, para sabermos que uma coisa causa outra bastaria refletir nela. Mas o
problema da causalidade diz respeito às questões de facto e pressupõe a avaliação com base na experiência.
Segundo David Hume, o nosso conhecimento dos factos restringe-se às impressões atuais e às recordações de
impressões passadas. Ora, há muitos factos que esperamos que se verifiquem no futuro pelo facto de
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relacionarmos uma causa com um efeito. Por exemplo, esperamos que um papel se queime se o atirarmos ao
fogo. Esta certeza que julgamos ter (que o papel se queima), tem por base a noção de causa (nós realizamos
uma inferência causal), ou seja, atribuímos ao fogo a causa de o papel se queimar. Sucede que, segundo
Hume, não dispomos de qualquer impressão da ideia de causalidade necessária entre os fenómenos.
Hume afirma que só a partir da experiência é que se poderia conhecer a relação entre a causa e o efeito. Mas a
experiência não nos dá esse conhecimento ( tal como a razão).Para o autor escocês, não se pode ultrapassar o
que a experiência nos permite. A experiência é, pois, a única fonte de validade dos conhecimentos de factos.
Quer dizer que só podemos ter um conhecimento a posteriori. Mas a única coisa que sabemos é que entre dois
fenómenos se verificou, no passado, uma sucessão constante, ou seja, que a seguir a um determinado facto
ocorreu sempre um mesmo facto.
Conexão necessária e conjunção constante; A ideia resulta sempre, diz Hume, de uma impressão (princípio
da cópia). Mas não temos a impressão da ideia de conexão necessária entre fenómenos. Só da impressão de
cada um dos fenómenos. A conexão necessária não pode ser observada. Só podemos observar a
conjunção constante entre fenómenos: um acontecimento de tipo (A) é seguido por um acontecimento
de outro tipo (B),criando a expectativa que sempre que ocorra (A) se siga (B), ou seja, sabemos que
existe uma sucessão no tempo de dois acontecimentos- primeiro vem A e depois B- e cremos que como
tem sido assim até agora também será no futuroA impressão de conexão necessária consiste apenas
num sentimento de expectativa produzido pelo hábito de observar a conjunção constante entre
fenómenos. A conexão necessária não é um conhecimento porque não temos a experiência da ligação ou
conexão entre os fenómenos. Segundo David Hume é mesmo um erro. Observemos um exemplo e como
Hume explica esse exemplo: duas bolas de bilhar chocam (conjunção constante entre (A) e (B), em que (B)
sucede a (A). Como consequência da conjunção constante ou sucessão regular de (A) e (B) nasce na
nossa mente a ideia de relação causal ou conexão necessária. Dizemos então: Sempre que se dá (A)
acontece (B).Mas quando dizemos esta proposição estamos a falar de um facto futuro. É aqui que Hume diz
que ultrapassamos o que a experiência – a única fonte de validade dos conhecimentos de facto – nos permite.
Para Hume o conhecimento dos factos reduz-se às impressões atuais e passadas. Não podemos ter
conhecimento de factos futuros porque não podemos ter qualquer impressão sensível ou experiência do que
ainda não aconteceu. A ideia de relação causal, de uma conexão necessária entre dois fenómenos, é uma ideia
da qual não temos qualquer impressão sensível. Como o critério de verdade do conhecimento é que a uma
ideia corresponda uma impressão sensível, não temos legitimidade para falar de uma relação causal entre os
dados da nossa experiência. É o hábito ou o costume, o responsável pela inferência causal, e não a razão
nem a experiência, pois estas não têm legitimidade para tal: isto porque a razão não pode justificar a
conexão e a experiência só nos revela o como os fenómenos se sucedem, mas não nos dá a conexão
necessária que os torna causa e efeito, ou seja, o porquê dessa sucessão.
A indução: Acreditamos que no futuro o movimento de uma bola de bilhar fará outra mover-se e que o pão
nos alimentará, porque vimos estes acontecimentos ocorrerem sempre juntos no passado. Mas o que nos
autoriza a fazer estas inferências acerca do futuro com base no nosso conhecimento do presente e do passado?
Esta questão só se coloca pelo facto de a nossa ideia de causa e efeito não ter origem a priori, mas na
experiência. Se a razão fosse capaz de demonstrar a existência de conexões necessárias entre acontecimentos
(isto é, que o efeito resulta necessariamente da causa), isso seria suficiente para estarmos certos de que as
nossas crenças sobre acontecimentos futuros são verdadeiras, porque bastaria observarmos a ocorrência da
causa para sabermos que o efeito se iria inevitavelmente seguir. Mas, como a nossa ideia de relação causal
resulta da experiência, é legítimo perguntar de que modo a experiência permite justificar as nossas crenças
acerca de acontecimentos de que não temos experiência, isto é, de que modo a experiência permite justificar a
crença em que as relações causais observadas no passado se manterão no futuro. Analisemos um exemplo: se
sempre que como fico bem nutrido, concluo que a próxima vez que voltar a comer ficarei nutrido. Mas qual é
a explicação para esta inferência? Como vimos acima, Hume pensa que não existe uma explicação adequada
para ela. Não é possível passar diretamente da premissa para a conclusão. A conclusão não se segue da
premissa. Não se segue do facto de no passado o pão sempre me ter alimentado que me irá alimentar da
próxima vez que o comer. O facto de o pão me ter alimentado no passado e o facto, suposto, de me alimentar
no futuro, quando o voltar a comer, são dois acontecimentos distintos e, por isso, não posso inferir o segundo
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a partir do primeiro. Outro aspeto é que qualquer argumento indutivo, tal como a ideia de conexão necessária,
pressupõe a ideia de uniformidade da natureza, que a natureza se comporta sempre do mesmo modo ou que
é previsível. Mas essa ideia não pode ser provada nem a priori nem a posteriori. Recorrendo à indução para
justificar a uniformidade da natureza acabamos por cair numa falácia, pois o que se pretende provar e a prova
são o mesmo (No passado a natureza tem sido sempre regular/ A natureza é regular/ A natureza é regular) o
que consiste numa petição de princípio.
Hume diz que no dia a dia o ser humano tende a recorrer ao raciocínio indutivo por uma questão de
hábito e necessidade psicológica de acreditar que uma causa conduzirá a determinado efeito. Quer dizer
então que o filósofo reconhece que a indução não é uma garantia de conhecimento universal, mas sabe
também que só através deste método podemos conhecer algo.
Em suma, Hume atribui à experiência o papel de destaque na obtenção da ciência, resolvendo assim o
problema da origem do conhecimento. E, ao contrário de Descartes, defende que a experiência é o limite do
nosso conhecimento, para lá dela nada se pode conhecer, e que todas as verdades da ciência nunca poderão ser
absolutas.
Críticas a Hume
Hume foi considerado um cético. Além do mais, reduziu o conhecimento aos sentidos.
1-O Ceticismo: segundo Hume o conhecimento necessário do mundo não é possível. Formamos ideias acerca
do modo como as coisas do mundo são ou funcionam, mas não podemos pretender alcançar verdades
indiscutíveis. O nosso conhecimento do mundo não é constituído por certezas. Não possuímos crenças
verdadeiras objetivamente justificadas. As nossas inferências indutivas e a crença na conexão necessária
entre fenómenos baseiam-se no hábito. O hábito é o conhecimento transformado em crença indispensável.
Assim, o empirismo de Hume é, de certa forma, um ceticismo pois não podemos provar que conhecemos
os factos do mundo, mas não podemos deixar de acreditar que conhecemos. O conhecimento é uma
crença em cuja verdade podemos confiar mesmo que não a possamos justificar. Chamamos assim ao
ceticismo de Hume ceticismo mitigado- só podemos aceder a conhecimentos prováveis e contingentes. O
ceticismo em Hume é também metafísico pois nega a possibilidade de conhecer realidades como Deus,
já que o conhecimento resulta da impressão.
2-Reducionismo: Hume reduziu a origem do conhecimento à experiência, desvalorizando o potencial da
razão na obtenção de conhecimento.
3-Fenomenismo: o conhecimento em Hume reduz-se às impressões que temos no mundo. Mas não sabemos
se o mundo existe de facto (só conhecemos a impressão não o mundo em si) e não sabemos se o eu existe (o
eu pressupõe algo que permanece e não temos a impressão de nós mesmos enquanto uma entidade que
prevalece no tempo).
fundamento e garantia da verdade de todas as ideias claras e distintas), enquanto Hume põe claramente em
causa a existência das realidades suprassensíveis (tudo o que não é físico) pelo facto de não podermos ter a
impressão delas.
2014 - 2ª Fase
Grupo IV
2. Leia o texto seguinte.
Se perguntar a mim próprio «Estou a beber?» ou «Está ele a pensar?», a resposta pode ser «Sim», «Não» ou
«Talvez». Mas se perguntar a mim próprio «Estou a pensar?», a resposta apenas pode ser «Sim». Fazer essa
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pergunta a mim próprio é o mesmo que eu pensar. Seria autorrefutante perguntar a mim próprio «Estou a
pensar?» e responder «Não».
T. Chappell, The Inescapable Self – An introduction to Western philosophy,
London, Weidenfeld&Nicolson, 2005, pp. 28-29 (adaptado)
2.1. Explique o argumento de Descartes para duvidar dos seus raciocínios matemáticos mais evidentes.
2016 - 1ª Fase
3. Leia o texto.
Desde há muito notara eu que, no tocante aos costumes, é necessário às vezes seguir, como se fossem
indubitáveis, opiniões que sabemos serem muito incertas […]. Mas, porque agora desejava dedicar-me apenas
à procura da verdade, pensei que era forçoso que eu fizesse exatamente ao contrário e rejeitasse, como
absolutamente falso, tudo aquilo em que pudesse imaginar a menor dúvida [...].
R. Descartes, Discurso do Método, Lisboa, Edições 70, 2000, p. 73 (adaptado)
3.1-Descartes decide rejeitar «tudo aquilo em que pudesse imaginar a menor dúvida». Partindo do texto,
exponha as razões que justificam esta decisão.
. 2017 - 2ª Fase
4. Leia o texto seguinte.
O senhor Hume tem defendido que só temos esta noção de causa: algo que é anterior ao efeito e que, de
acordo com a experiência, foi seguido constantemente pelo efeito. [...] Seguir-se-ia desta definição de causa
que a noite é a causa do dia e o dia a causa da noite. Pois, desde o começo do mundo, não houve coisas que se
tenham sucedido mais constantemente. [...] Seguir-se-ia [também] desta definição que tudo o que seja singular
na sua natureza, ou que seja a primeira coisa do seu género, não pode ter uma causa.
T. Reid, Essaysonthe Active Powersof Man, Edinburgh UniversityPress, 2010, pp. 249-250
4.1. Neste texto, apresenta-se e critica-se a noção de causa considerada por Hume. Explique as falhas
apontadas no texto a essa noção de causa.
O conhecimento científico
O problema da demarcação do conhecimento científico: como distinguir uma proposição científica de uma
que não é?
Karl Popper e o falsificacionismo
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Popper é um filósofo da ciência que considera que o principal poder da racionalidade humana assenta na
consciência da sua falibilidade.O reconhecimento da nossa ignorância e a recusa em aceitar certezas absolutas
funcionam como o motor de todo o conhecimento científico. Assim sendo, Popper defende que em ciência
o método que vigora é o método falsificacionista.
Critério de demarcação: Um critério de demarcação consiste num critério que nos permite distinguir uma
proposição científica de uma não científica. Segundo Popper o critério fundamental que permite distinguir
uma teoria científica de uma teoria não científica é a falsificabilidade. Assim, uma teoria para poder ser
científica tem que se prestar a ser testável ou refutável (uma proposição só é científica se for passível de ser
falsificada). Se a teoria ao ser submetida a testes resistir então será corroborada, se não resisti será refutada.
Em suma, podemos então definir o critério de demarcação de Popper da seguinte forma: as afirmações que
não podem ser falsificadas pela experiência não podem constituir-se como conhecimento científico.
Críticas à indução: fonte de toda a investigação e verificação científica, a indução parte dos seguinte
pressupostos:1. Há uma observação neutra e pura; 2. É possível registar todo o tipo de dados empíricos. Ora,
Popper refuta estes pressupostos dizendo que não há observação neutra e pura, porque o cientista seleciona e
privilegia na realidade os fenómenos que quer observar e não dá valor a outros. Ou seja, toda a observação já
tem uma finalidade, já está sujeita a um critério de escolha, a uma hipótese previamente estabelecida. Além
disso, a forma como se classifica os factos está sujeita a um método prévio de classificação. O sujeito afeta e
seleciona o objeto a observar, logo não há observação neutra, toda a observação já obedece a um problema e a
uma teoria prévia. Outra crítica de Popper à Indução é que as teorias científicas como são universais não
podem ser empiricamente verificáveis. O método indutivo não é suficiente para provar a universalidade
porque por mais casos que se verifiquem é impossível verificar todos e a teoria refere-se a todos.
prever o que pode acontecer se a sua conjetura for verdadeira ; 3) Experimentação, ou seja, é necessário
descobrir se as previsões que o cientista fez estão certas .Se a hipótese não supera os testes, será
falsificada, refutada, e exigirá uma nova reformulação do problema e da hipótese. Será
conhecida como teoria refutada.Por outro lado, se superar os testes rigorosos, estará
corroborada, ou seja, confirmada provisoriamente, não definitivamente como querem os
indutivistas. Será conhecida como teoria corroborada. É apenas nesta fase que o cientista recorre à
observação.
Críticas a Popper: Popper foi criticado pelo facto de o processo de refutação e falsificação não ser o
procedimento mais comum entre os cientistas. A tendência dos cientistas é se concentrarem em confirmar o
que a teoria propõe e não falsificar. Outra crítica é que considerando a história da ciência, não parece que ela
possa evoluir por um processo assente em refutações porque a realidade demonstra o contrário: cientistas
como Galileu não abandonaram as sua teorias ao encontrar factos que aparentemente as poderiam
falsificar .Uma outra dificuldade óbvia que se pode levantar ao falsificacionismo é a sua aceitação da ideia de
que não temos qualquer justificação para supor qualquer teoria científica como verdadeira. Esta ideia é, no
mínimo, altamente contraintuitiva.
Thomas Kuhn:
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Thomas Kuhn debruça-se sobre o problema da progressão da ciência. Levanta a questão: como progride a
ciência? Para entendermos como se dá o desenvolvimento da ciência, há que entender os seguintes dois
conceitos: comunidade científica e paradigma.
A comunidade científica para Thomas Kuhn seria integrada por indivíduos que, além de compartilharem do
mesmo paradigma, estariam comprometidos com uma maneira coletiva de se praticar ciência. Por outras
palavras, segundo Kuhn, é impossível desenvolver a prática científica de modo solitário. A ciência só existe,
se existir uma comunidade científica.
O paradigma diz respeito aos pressupostos básicos das ciências, o mapa que orienta os cientistas no seu
trabalho diário. Por outras palavras, os paradigmas correspondem ao conjunto de conceitos, teorias,
metodologias e instrumentais compartilhados pelos cientistas dentro da comunidade científica, isto é,
um sem número de crenças, valores e técnicas definidos cognitivamente, que em determinado momento
são adequados para a resolução do conjunto de problemas existentes.
Para Kuhn, a ciência é um tipo de atividade que consiste em resolver problemas (como um quebra-cabeça)
dentro de uma unidade metodológica chamada paradigma. O paradigma, apesar da sua grande abertura,
delimita os problemas a serem resolvidos. É ele que estabelece o padrão de racionalidade aceite numa
comunidade científica sendo, portanto, o modelo que fundamenta o trabalho dos cientistas.
O paradigma determina os procedimentos na Ciência Normal. A Ciência Normal ocorre enquanto
prevalece um paradigma e após a ruptura e substituição de um paradigma. Por vezes, dentro de um modelo
ocorrem anomalias ou contraexemplos que podem colocar em dúvida a validade do paradigma. Ora, se
modelo vigente é insuficiente para resolver as anomalias, ocorre o que Kuhn denomina de Ciência
Extraordinária ou Revolucionária, que nada mais é do que trabalhar à margem da comunidade científica no
sentido de estabelecer um novo paradigma, isto é, uma nova visão do mundo. Esta ciência extraordinário
pode conduzir a uma revolução científica. Mas pode também acontecer que os cientistas tentem resolver as
anomalias com base no paradigma existente ou deixem a resolução das mesmas para os cientistas futuros.
Pré-ciência: Período marcado pela ausência de consenso, dado não haver um paradigma partilhado.
partir de um novo ponto de vista. A crise pode levar então às seguintes respostas: 1) resolve-se a
anomalia dentro do paradigma vigente; 2) adia-se a resolução da anomalia e o paradigma se mantém;
3) mudança de paradigma de forma a dar conta dos problemas para os quais o paradigma anterior não
tinha resposta.
Ciência extraordinária: Período de crise do paradigma vigente, onde se criam novos paradigmas
que competem entre si tentando impor-se como o mais adequado para resolver as anomalias. É um
momento importante e que envolve a busca de novas respostas fora do paradigma- os cientistas
rompem com os padrões vigentes e buscam novos fundamentos.
Novo período de ciência normal: Estabelecida uma nova forma de fazer ciência e dotados de um
novo «mapa» para explorar e investigar a natureza, os cientistas regressam a uma atividade
relativamente rotineira marcada pela preocupação em consolidar o novo paradigma e em ampliar a
sua aplicação.
Sendo que os paradigmas da ciência não se podem avaliar como superiores ou inferiores uns aos
outros, os paradigmas são incomensuráveis. Sendo incomensuráveis, não há acima ou fora de cada
paradigma um critério ou medida comum que permita considerar que um é mais verdadeiro do que
outro ou que é um espelho mais fiel da realidade. Assim sendo, não se pode falar de progresso
científico se por este entendermos um progresso contínuo e cumulativo em direção à verdade.
Se pudermos falar de progresso, este é descontínuo, feito de algumas ruturas ou
descontinuidades, de mudanças de paradigmas e não de transformação de um paradigma
noutro.
Critérios de objetividade: os critériosde objetividade são:precisão( deve haver acordo entre a teoria
e a experiência), consistência ( deve existir coerência), fecundidade, simplicidade e abrangência
( deve abranger o maior número de casos possível). Estes critérios não garantem a objetividade na
ciência.
Criticas a Kuhn: Uma crítica que se faz a Kuhn é que não reconhece o valor da racionalidade e
crítica no âmbito do trabalho científico. Outra crítica é que o compromisso dos cientistas com o
paradigma vigente parece ser mais importante do que o comprometimento com a própria descoberta
da verdade. Por fim, se a teoria de Kuhn não admite a existência de objetividade e parte do
pressuposto de que os paradigmas são incomensuráveis então as teorias da ciência caiem no
relativismo.
Comparação Popper| Kuhn: Podemos comparar Popper e Kuhn relativamente a duas questões, a
questão da objetividade e a questão da progressão da ciência.
1)Progressão: Para Popper as teorias que substituem as teorias refutadas estão mais próximas da
verdade e constituem um progresso relativamente a essas teorias. São teorias mais resistentes que
passaram nos testes de falsificação. Neste sentido, o filósofo defende a progressão nas ciências como
uma permanente aproximação da verdade. Por outras palavras, Popper defende que há progresso na
ciência pois as novas teorias corrigem os erros das anteriores e desta forma se aproximam da verdade.
Por outro lado, ao passarem nos testes de falsificabilidade, revelam maior resistência do que as
anteriores e alargam o seu campo de aplicação. Kuhn não defende, pelo contrário, a progressão na
ciência. Segundo ele, o desenvolvimento ocorre por revoluções científicas, mas o novo paradigma
não constitui uma evolução em relação ao anterior. Apenas são diferentes. Há mudanças de
paradigmas, mas nada nos permite afirmar que o novo paradigma constitui um progresso
relativamente ao antigo paradigma. Isto é, a tese da incomensurabilidade dos paradigmas científicos,
defendida por Kuhn, permite concluir que os paradigmas atualmente em vigor não estão mais
próximos da verdade do que os anteriores. Este facto põe em causa a tese do progresso da ciência e a
evidência de que as aplicações científicas atuais são mais eficazes do que as do passado. No entanto,
dentro de um determinado paradigma podemos falar em progressão por acumulação de novos
conhecimentos.2) Objetividade: Quanto à objetividade na ciência, Popper defende que há critérios
objetivos que determinam a cientificidade de uma teoria (o critério da falsificabilidade). Segundo
Popper existem padrões racionais, estabelecidos no método científico, que permitem comparar as
teorias e determinar qual é mais verosímil. Há que referir ainda que a objetividade em Popper não
está ligada à existência de verdades absolutas. As teorias são sempre passíveis de ser refutadas, mas
isso não lhes retira objetividade já que existem critérios que permitem determinar quando uma teoria
é corroborada. As teses corroboradas estão mais próximas da verdade do que as teses em que se
identificaram erros, e isto por si só garante que o conhecimento científico apesar de nunca
poder ser considerado verdadeiro, é objetivo, isto é, está sempre submetido à realidade, a testes
empíricos rigorosos. Mas não existe objetividade entendida como adequação absoluta da teoria à
55
realidade. Por outro lado, Kuhn aponta para a existência de fatores subjetivos associados ao
paradigma e cientistas que fazem parte da comunidade científica que não permitem a objetividade no
conhecimento científico (o prestigio, a ideologia, as expetativas e a forma como se interpreta o
mundo são elementos que dificultam a existência de objetividade). No entanto, há que referir que
Kuhn estabeleceu algumas regras para garantir a objetividade na escolha de um paradigma:
consistência, fecundidade, simplicidade, exatidão e abrangência. Só que a presença de elementos não
objetivos retira à ciência a sua objetividade.
2. Segundo Popper, a prática científica não é afetada pelo problema da indução levantado por Hume. Porquê?
Na sua resposta, comece por apresentar o problema da indução levantado por Hume.
– segundo a perspetiva falsificacionista defendida por Popper, os cientistas submetem as teorias a testes que
visam falsificá-las, e não confirmá-las;
– o raciocínio usado na falsificação das teorias é dedutivo, apenas permitindo mostrar conclusivamente que as
teorias são falsas.
3. Tanto Descartes como Popper consideram que a submissão das nossas crenças ou opiniões a um severo
exame crítico é um aspeto central do método de procura da verdade. Porém, Descartes e Popper divergem
quanto aos resultados da aplicação desse método.
3.1-Justifique as afirmações anteriores.
Na sua resposta, explicite os aspetos relevantes do método defendido por Descartes e do método defendido por
Popper.
5. Leia o texto.
[Para uns,] a comunidade científica avança com base em argumentação sólida sustentada por indícios
empíricos sólidos. De acordo com eles, o estilo de raciocínio promovido pela ciência, modelado pelo método
científico, é o estilo que melhor contribui para o conhecimento. [...]
[Outros, porém,] comparam [...] a substituição de uma teoria científica dominante numa área de investigação
a uma conversão religiosa. A comunidade científica não é um agente racional coletivo que, de uma maneira
objetiva, pesa razões a favor e contra teorias concorrentes.
L. Bortolotti, Introdução à Filosofia da Ciência, Lisboa, Gradiva, 2008, pp. 210-211 (adaptado)
Compare, a partir do texto, as perspetivas de Popper e de Kuhn acerca da objetividade da ciência.
Comparação, a partir do texto, das perspetivas de Popper e de Kuhn acerca da objetividade da ciência:
− Popper é um dos que defendem a perspetiva indicada no primeiro parágrafo do texto, apoiando a objetividade
da ciência; Kuhn defende a perspetiva exposta no segundo parágrafo do texto, pondo em causa a objetividade
da ciência;
− Popper considera que as teorias científicas têm uma justificação objetiva, ou seja, dependem de
«argumentação sólida sustentada por indícios empíricos sólidos»; Kuhn entende que a adesão da «comunidade
científica» a uma teoria em detrimento de outra depende também de fatores subjetivos dos cientistas,
comparando-a a «uma conversão religiosa»;
− na perspetiva de Popper, as teorias são submetidas a sucessivos testes empíricos e são avaliadas de acordo
com critérios lógicos objetivos (independentes de fatores subjetivos); na perspetiva de Kuhn, nenhum conjunto
de critérios objetivos assegura que diferentes cientistas adotem as mesmas teorias, pois a interpretação e a
aplicação desses critérios dependem de fatores subjetivos, ou seja, «a comunidade científica não é um agente
racional coletivo que, de uma maneira objetiva, pesa razões a favor e contra teorias concorrentes»;
− Popper defende que da aplicação do método científico resulta a substituição das teorias falsificadas por outras
melhores, num processo de contínua aproximação à verdade; Kuhn defende que os paradigmas rivais (as teorias
em confronto) são incomensuráveis, e que a substituição de um paradigma por outron(de uma teoria por outra)
não representa uma aproximação à verdade.
Descritores do nível de desempenho no domínio Descritores
específico
do nível
da de desempenho Pontuação
disciplina no domínio da comunicação escrita em língua portuguesa
Compara, com clareza e precisão, as perspetivas de Popper e de Kuhn acerca da objetividade da ciência.
Integra
5 adequadamente a informação do texto. 23 24 25
Estrutura adequadamente os conteúdos relevantes.
Compara,
4 com algumas imprecisões, as perspetivas de Popper e de Kuhn acerca da objetividade da ciência.
Integra adequadamente a informação do texto. 18 19 20
Apresenta a resposta com falhas na seleção ou na estruturação dos conteúdos relevantes.
Compara, parcialmente ou com imprecisões, as perspetivas de Popper e de Kuhn acerca da objetividade da ciência.
Mostra
3 compreensão da informação do texto. 13 14 15
Apresenta a resposta com falhas na seleção e na estruturação dos conteúdos relevantes.
Explicita, com clareza e precisão, as duas perspetivas indicadas, mas não as compara.
Mostra compreensão da informação do texto.
Estrutura adequadamente os conteúdos relevantes.
Apresenta,
2 parcialmente ou com imprecisões, as duas perspetivas indicadas, não as comparando.
Mostra alguma compreensão da informação do texto. 8 9 10
Apresenta conteúdos irrelevantes ou incorretos, mas que não contradizem os conteúdos relevantes e corretos
apresentados.
Apresenta conteúdos irrelevantes e incorretos, mas que não contradizem os conteúdos
relevantes
1 e corretos apresentados. 3 4 5
Refere, com imprecisões, aspetos de apenas uma das duas perspetivas indicadas.
Não mostra compreensão da informação do texto.
Apresenta conteúdos irrelevantes e incorretos, mas que não contradizem os conteúdos
relevantes e corretos apresentados.
A dimensão estética
pode experimentar estados emotivos profundos. A experiência estética depende da nossa sensibilidade estética
ou seja da capacidade de perceber e apreciar as formas em termos de sentimentos de agrado e desagrado. Esta
sensibilidade ou sentido estético tem de ser cultivada para ser possível apreciar a arte em toda a sua
profundidade.
Embora pessoal, a experiencia estética pode ser comunicada através de juízos estéticos. O que é um juízo
estético? Quando experienciamos a beleza de algo, essa vivência desperta uma emoção e, ao mesmo tempo,
apela à atividade intelectual, nascendo assim um juízo. Desta forma, um juízo estético é um juízo de valor ou
de apreciação de algo.Assim temos como juízos estéticos por exemplo “Os quadros de Van Gogh são de uma
beleza magnífica” e “ A nossa via látea é de uma beleza incalculável”.
Kant distingue ainda belo de sublime. Enquanto o belo é um sentimento de comprazimento suscitado pela
contemplação de um objeto, o sublime é um estado interior em que nos sentimos superados e que implica temor
e respeito.
O objetivismo estético faz depender os juízos de critérios objetivos, por isso, quando se trata de apreciar arte, o
que deve ser determinante são as características formais do objeto. Então coloca-se a questão: como distinguir a
boa da má arte?Beardsley responde a esta questão ao identificar as qualidades estéticas gerais, independentes
da forma e estilos, exigidas para se poder falar de arte. O juízo estético vai depender então das características
formais da obra que desencadeiam a experiencia do prazer. E são elas: unidade (tem a ver com harmonização
das várias partes que constituem a obra de arte), intensidade ( tem a ver com a força própria que a obra
transmite) e complexidade ( tem a ver com a diversidade de recursos utilizados pelo artista).
A questão da natureza da Arte, a questão de saber o que é a arte, interpela-nos de diversas formas. Quando
Platão caracterizava os objectos artísticos como imitações não estava certamente a indicar condições
necessárias e suficientes para que algo seja arte. Quanto muito, encontramos em Platão uma definição
extensional de arte que apresenta uma propriedade que todas as obras de arte tinham até aí e que partilhavam
com outras realidades. Obviamente, este tipo de definição não fornece nem um critério de identificação nem
uma essência que permita identificar as obras de arte. Mas nem Platão nem os gregos precisavam de um tal
critério e este só viria a ser imprescindível bem mais tarde na história da civilização. A emergência da arte
contemporânea trouxe obras que prescindiam de características que até aí tinham sido uma constante na história
da arte: obras sem beleza, sem representação, sem recurso a técnicas especializadas e sem diferenças em
relação aos objectos comuns. Perante este rumo criativo da produção artística, a necessidade de uma definição
que permitisse simultaneamente a identificação de objectos como obras de arte e o esclarecimento da sua
essência tornou-se clara.
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Teorias essencialistas e não essencialistas: As três primeiras teorias referidas acima são chamadas de
essencialistas. As restantes de não essencialistas. Mas o que significa essencialista e não essencialista?
Teorias não essencialistas: Os não essencialistas não esperam que a definição sirva para determinar os
méritos ou a qualidade das obras de arte, o que eles procuram é uma definição que permita simplesmente
classificar corretamente certos objetos como arte, sem qualquer preocupação de caráter valorativo. Além
disso, focam-se nas propriedades extrínsecas ou exteriores que permitem classificar a arte. Um exemplo é
o contexto em que a obra se integra- os indíviduos que integram o meio artístico é que decidem o que é a
arte.
Critérios valorativos e classificativos: É preciso entender ainda dois conceitos antes de apresentar as teorias:
critérios classificativos e critérios valorativos. A definição da arte, segundo as teorias, pode pressupor critérios
classificativos e valorativos.
Critérios classificativos: Um critério classificativo tem a ver com a definição em si de arte. Um exemplo de um
critério classificativo é as emoções (dizemos que um objeto é arte se e só se exprimir sentimentos).
Critérios valorativos: Já um critério valorativo tem a ver com a distinção entre uma boa e uma má obra de arte.
Por exemplo, dizer que uma obra de arte é má porque não exprime sentimentos.
Teorias da arte:
1-Teoria da Representação: A teoria da imitação ou da representação é a mais antiga das três e a que
vigorou durante mais tempo. Remonta à antiguidade e tem como seus mais antigos defensores Platão e
Aristóteles. Segundo esta teoria a arte consiste na imitação da natureza ou da ação- mimesis. Não se trata
apenas de imitar com precisão a aparência dos objetos físicos, mas também, através de artes como o teatro, de
imitar comportamentos humanos e até conceitos como o “justo”. Esta teoria prolongou-se no tempo e foi aceite
por muitos pensadores e artistas que consideravam a arte como uma espécie de espelho da natureza e cujo valor
está na fidelidade da representação. Esta teoria oferece um critério classificativo muito claro e rigoroso: só é
arte um artefato que represente a realidade. Isto permite-nos distinguir facilmente o que é arte do que não é arte
Se não representar, então não é arte. E também realça um critério valorativo que nos possibilita distinguir as
boas das más obras de arte. Assim, quando mais fielmente uma obra reproduz a realidade, melhor será.
A é arte; (P)
Para ser sólido o argumento tem de ser válido e as premissas verdadeiras. Já sabemos que é válido. Mas
serão as premissas e a conclusão verdadeiras? Para analisarmos a verdade, podemos recorrer à lógica formal:
Que o argumento só poderá ser aceite se estivermos perante uma bicondicional onde tem de ser verdade
que a arte implique a representação e verdade que a representação implique a arte. Relembrando: dizer
que P<->Q (bicondicional) é o mesmo que dizer que P-> Q e, ao mesmo tempo, Q->P, e ambos têm de
ser verdade. Por outras palavras, o ser arte e a representação terão de ser ambos razão suficiente e razão
necessária. Só que isso não acontece. A representação é uma condição necessária para que algo seja arte
segundo esta teoria(P->Q é verdade). Mas isto é questionável, pois há arte que não representa a realidade
( assim, P->Q é falso). E o ser arte não é condição necessária para que algo seja uma representação (Q-
>P é falso). Há representações que não são arte.
Vejamos: “A é arte se e só se for uma representação de algo” ou seja “ ser arte implica que seja uma
representação de algo” e, ao mesmo tempo “ser uma representação implica ser arte”. Mas estas
premissas são FALSAS.
Também podemos dizer desta forma: “É arte se e só se for uma representação” (P<->Q) e” É uma
representação se e só se for arte”(Q<->P). Mas ser arte não é necessário para ser uma representação e
ser uma representação não é necessário para ser arte. Ambas as premissas são falsas.
As objeções a esta teoria são: 1)há várias formas de arte e objetos artísticos que simplesmente não imitam nada
e por isso não deixam de ser arte- por exemplo a música clássica ou a pintura abstrata; 2) uma obra de arte
nunca é uma simples correspondência de propriedades entre a obra e a coisa imitada.
2-Teoria da expressão: Insatisfeitos com a teoria da arte como imitação (ou representação), muitos filósofos e
artistas românticos do século XIX propuseram uma definição de arte que procurava libertar-se das limitações
da teoria anterior, ao mesmo tempo que deslocava para o artista, ou criador, a chave da compreensão da
arte. Trata-se da teoria da arte como expressão. Teoria que, ainda hoje, uma enorme quantidade de pessoas
aceita sem questionar. A teoria da expressão defende que uma obra é arte quando:
4) a arte favorece a clarificação de sentimentos ( este aspeto foi introduzido por Collingwood)
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Quer isto dizer que um artefato só é arte se e só se a obra expressar as emoções sentidas pelo artista,
emoções essas que devem ser partilhadas pelo público, e não é arte se o público não sentir qualquer
emoção ou quando a emoção do artista e do espetador não coincidirem.
Esta teoria parte do pressuposto que são válidos os testemunhos de artistas que reconhecem a importância de
certas emoções sem as quais as suas obras não teriam certamente existido. Mais do que isso, se é verdade, como
parece ser, que a arte provoca em nós determinadas emoções ou sentimentos, então é porque tais sentimentos e
emoções existiram no seu criador e deram origem a tais obras.
Um dos defensores desta teoria é o escritor russo Leon Tolstoi. Mas é só no séc. XX que esta teoria encontra
uma sistematização sólida com filósofos como Collingwood.
O critério de classificação desta teoria vai mais além do que a teoria da imitação. Tem como vantagem
acrescida classificar como arte todas as obras que não imitam nada, o que acontece frequentemente na
literatura e quase sempre na música e na arte abstracta. O seu critério de classificação é pois o recurso ao
sentimento para distinguir a arte da não arte. Também oferece um critério valorativo: uma obra é tanto melhor
quanto melhor conseguir exprimir os sentimentos do artista que a criou.
Uma teoria como esta manifesta-se frequentemente em juízos como “Este é um livro exemplar em que o autor
nos transmite o seu desespero perante uma vida sem sentido”
1) podemos facilmente encontrar exemplos de expressão emocional na poesia, na ópera ou no teatro, mas há
obras de arte que seriam excluídas do mundo da arte à luz do expressionismo: a arte abstrata, por exemplo,
deixaria de ser arte;
2) muitas vezes é difícil aceder aos estados mentais do artista e, além disso, o espetador pode interpretar a obra
de forma diferente da intenção original do criador, o que segundo alguns especialistas enriquece o mundo da
arte;
3) muitas vezes os críticos conseguem descobrir numa obra sentidos que o autor não colocou lá
intencionalmente e que são importantes para a história da arte, mas se seguirmos os pressupostos da teoria da
expressão esses aspetos deixam de fazer sentido.
3- Teoria da Forma Significante: A teoria da forma significante (formalista) é defendido por Clive Bell. Ao
contrário da teoria da imitação, que centra a sua atenção na obra de arte, e da teoria da expressão, focada no
artista, a teoria da forma significante coloca ênfase no espetador, quem contempla a obra de arte.
Segundo a teoria da forma significante aquilo que define a obra de arte não deve ser procurado na obra em si
mas no sujeito que aprecia. A caraterística comum a todas obras de arte é a emoção estética- emoção que só as
obras de arte provocam no ser humano. Assim, esta teoria define arte da seguinte forma: um artefato é arte
se e só se provocar emoções estéticas no espetador. As emoções estéticas é pois a condição necessária e
suficiente da arte. O seu critério de classificação é, pois, a capacidade que uma obra tem de suscitar emoções
nos espetadores. E o seu critério valorativo resulta desta classificação, ou seja, se uma obra provocar emoções
no espetador então será considerada boa. A avaliação das obras de arte depende do que o espetador sente.
Mas coloca-se a questão: o que faz com que uma obra de arte desperte emoções no espetador? Existe
alguma propriedade na arte que provoque as emoções?
Esta teoria considera que o que faz de algo uma obra de arte e suscite emoções no espetador é o facto de
possuir uma característica formal especial, a forma significante. Esta característica da arte provém do modo
como os elementos de uma obra estão relacionados entre si. Tomando o exemplo da pintura, o que mostra a
forma significante num quadro são as relações entre as cores, as linhas, as figuras e o seu equilíbrio. Na
música é a organização sonora, o equilíbrio e a graciosidade entre os sons. Na literatura é a estrutura narrativa.
A vantagem desta teoria é não fazer depender o estatuto da arte de fatores demasiado subjetivos, mas de
critérios que têm a ver com propriedades objetivas da obra.
Quando dizemos “Este livro é muito bom porque está muito bem escrito” ou “ aquela pintura é fenomenal pois
apresenta uma profunda harmonia na conjugação das formas e das cores”, no fundo estamos a apelar à forma
significante para avaliar a obra.
Segundo esta teoria, se é arte, então provoca emoções e não, como diz a teoria da expressão, se provoca
emoções então é arte.
Objeções:
1) o conceito de forma significante é vago, indefinido, podendo praticamente ser aplicado a quase tudo. Uma
possível saída para esta indefinição é afirmar que a forma significante é aquilo que é captado por um espectador
com sensibilidade estética. Mas isto não clarifica pois se perguntarmos o que faz com que essa experiencia seja
estética a resposta é a forma significante (círculo vicioso). Por outras palavras: a forma significante provoca a
emoção estética, mas é a emoção estética que justifica a forma significante..
2) a teoria da forma significante contempla apenas as obras que apresentam equilíbrio e põe de lado as obras
desconcertantes, aquelas que não apresentam traços de equilíbrio, por exemplo as obras de Duchamp.
4-Teoria Institucional: A teoria institucional, tal como a histórica, é não essencialista ou contextualista.
Ambas procuram encontrar uma definição de arte fora do objeto artístico, isto é, no contexto. Elas partem do
pressuposto que uma obra pode servir muitas funções: entreter, comunicar ideias, criticar a sociedade, explorar
emoções…É importante ainda realçar que as teorias contextualistas desvalorizam a existência de um critério
valorativo.
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A Teoria institucional foi definida por George Dickie. Dickie começa por aderir à ideia de que o projeto
tradicional de encontrar uma definição essencialista de arte deve ser abandonado. O objetivo de Dickie é o de
apresentar uma definição verdadeira capaz de resolver o problema: como distinguir arte de não-arte? O que ele
procura é uma definição em “sentido classificativo” de arte, que indique condições necessárias e suficientes.
Dickie apresentou então a seguinte definição institucionalista: Algo é uma obra de arte no sentido
classificativo se, e só se, 1) for um artefacto e 2) alguém agir sobre ele em nome de uma dada
instituição (o mundo da arte), propondo-o como candidato a apreciação.
E quais são as condições para, no plano institucional, algo ser considerado arte?
4-avaliação.
Uma das características mais salientes desta definição é que qualquer coisa pode ser uma obra de arte,
desde que alguém a proponha como candidata para apreciação de acordo com o procedimento descrito.
Analisemos a definição que Dickie dá de arte. O primeiro critério é ser um artefacto. Assim, objetos
completamente diferentes, sem qualquer semelhança percetível, podem adquirir o estatuto de obras de arte. A
noção de artefacto de Dickie é alargada de modo a incluir objetos que não são físicos, como, por exemplo,
poemas. A ideia é que um artefacto é tudo o que é feito por seres humanos. Pode ser o conjunto de movimentos
coordenados que constituem uma dança ou o que resulta do ato de apanhar um pedaço de madeira à deriva nas
águas de um rio para ser exibido numa galeria de arte.
Quanto à segunda condição, pertencer ao mundo da arte, Dickie esclarece que as pessoas aptas a propor um
dado artefacto para candidato a apreciação são geralmente os artistas, os galeristas, os críticos de arte ou
agentes ligados a museus, revistas de arte, faculdades de artes, casas de espetáculos, etc. Essa é a instituição,
genericamente designada ‘mundo da arte’, em nome da qual se confere a esse artefacto o estatuto de candidato
para apreciação. Estamos, portanto, perante um conjunto de condições necessárias e suficientes para afirmar
que algo é arte.
1) O que é ser “candidato a apreciação”? E quem exatamente tem autoridade para “agir em nome de uma
determinada instituição”? E em que sentido se diz que o chamado ‘mundo da arte’ é uma instituição, dado que
não exibe a formalidade – hierarquias, regulamentos escritos, cerimónias oficiais – característica das outras
instituições como as instituições religiosas, militares, académicas, etc?;
2)Os entendidos em arte decidem o que deve ser considerado uma obra de arte com base em razões ou fazem-
no arbitrariamente? Se eles o fazem com base em razões, essas razões constituem uma teoria da arte que não é a
teoria institucional. Assim, alguém poderá dizer que os quadros de determinada pessoa apresentam excelentes
combinações de cores aliadas à simplicidade formal. Mas essa é uma maneira de dizer, por exemplo, que eles
possuem forma significante. Nesse caso a teoria institucional esbarra com outras conceções da arte;
3)O problema mais notório da definição de Dickie é a sua manifesta circularidade: as obras de arte são
definidas como objetos que são aceites como tais pelas pessoas que entendem de arte; e as pessoas que
entendem de arte são definidas como as que aceitam certos objetos como sendo obras de arte .E agora?
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5.- Teoria histórica: A Teoria Histórica é defendida pelo americano Levinson e apresenta uma definição real
de arte recursiva (enquadramento numa tradição histórica) . Levinson defende que a natureza da arte reside em
determinadas propriedades não visíveis que são necessárias e suficientes para haver arte em qualquer
circunstância possível. Segundo Levinson, a arte é necessariamente retrospectiva (integra-se na história), uma
vez que a criação artística estabelece uma relação apropriada com a atividade e o pensamento humanos que se
traduziram na história da arte.
A definição histórica de arte é formulada por Levinson do seguinte modo : X é uma obra de arte se, e só
se, x é um objeto acerca do qual uma pessoa, possuindo a propriedade apropriada sobre X, têm
a intenção não-passageira de que este seja perspectivado como uma obra de arte, e,
perspectivado de qualquer modo como foram ou são perspectivadas correctamente obras de
arte anteriores. A definição histórica indica as condições necessárias e suficientes para haver arte,
aplicando-se assim a toda a arte possível. Fornece ainda um critério de identificação que permite distinguir as
obras de arte dos meros objectos comuns que não são arte. Para que possamos avaliá-la convenientemente,
consideremos cada uma das condições apontadas:
1) A primeira condição é a do direito de propriedade: o artista não pode transformar em arte objectos que
não lhe pertençam ou em relação aos quais não esteja devidamente autorizado a agir pelos seus
proprietários. Quer isto dizer que nem tudo pode ser arte: por exemplo a pintura mural (o artista pinta em
muros da rua que não são seus)
2) A segunda condição é a existência de um certo tipo de intenção que relaciona a arte do presente com a arte
do passado. Ter uma intenção, neste caso, é ter um propósito ou uma finalidade em mente, e desenvolver
uma acção para o atingir. Esta pode consistir em fazer, apropriar-se ou conceber algo. Embora possamos
não ter acesso às intenções do artista, que são, obviamente, estados psicológicos, é possível conhecê-las
através de pistas, como o contexto de criação, o género a que a obra pertence, etc. Inferimos as intenções do
artista através de aspectos concretos da obra porque a obra, ela própria, não é mental.
3) A terceira condição tem a ver com a história da arte. Uma obra de arte enquadra-se sempre no âmbito da
história da arte. Este critério é recursivo pois integra a obra dentro de uma tradição. A obra não pode existir
fora do contexto do que foi a arte no passado e do que é considerado arte no presente.
Críticas:
1. O direito de propriedade não pode ser apontado como uma condição necessária para haver arte. Podemos
imaginar contra-exemplos que mostram o contrário do que a teoria propõe. Se soubéssemos hoje que Boticelli
ou Da Vinci tinham roubado os materiais com que criaram as suas obras, estaríamos dispostos a rever o estatuto
de obras de arte atribuído a obras como O Nascimento de Vénus ou A Virgem e o Menino com Santa Ana?
Certamente que não.
2. A condição da intencionalidade não é necessária para haver arte. O melhor contra-exemplo é fornecido por
Kafka. Os manuscritos de O Processo e O Castelo deveriam ter sido destruídos a pedido do autor aquando da
sua morte. Contudo, as obras foram publicadas e ninguém questiona que são arte enquanto obras literárias,
apesar do autor ter formulado exactamente a intenção contrária àquele que Levinson supõe ser necessária para
haver arte.
3. Levinson deixa por resolver o problema da indefinição do estatuto das obras primordiais e das obras
primitivas que se lhe seguiram. Se toda a arte, para o ser, tem de relacionar-se com a sua história, as obras
primordiais não podem ser arte porque antes delas não há arte. Mas se não o são, como podem as obras
seguintes – a arte primitiva – ser arte?
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Será possível definir realmente o que é a arte? Há autores que consideram a arte como um conceito aberto, ou
seja, um conceito que vai sendo alargado e integrando novas ideias, conceções e características à medida que o
tempo passa. No mundo da arte, confrontamo-nos constantemente com obras originais que não se ajustam à
ideia vigente do que a arte, exigindo o alargamento do conceito para incluir essas obras inovadoras. Assim
temos, por exemplo, que no passado os ideais de originalidade e criatividade eram inconcebíveis para a
mentalidade fechada e presa às regras das escolas de arte, mas, com o tempo e o surgimento de novas formas de
criar arte, esses ideais foram integrados no conceito.
Apresenta uma posição, indicando que a beleza é uma questão de gosto pessoal / os juízos estéticos são subjetivos ou
indicando
1 que a beleza não é uma questão de gosto pessoal / os juízos estéticos são objetivos. 3 5 6
Justifica de modo incipiente a posição defendida, referindo, com imprecisões, uma razão que apoia a posição
defendida ou uma objeção à posição contrária.
Apresenta conteúdos irrelevantes e incorretos, que não contradizem os conteúdos relevantes e corretos apresentados.
A dimensão religiosa
cadeias causais completas e nesses casos não temos quaisquer dúvidas de que tiveram começo. Mas, há muitas
cadeias das quais só conhecemos um pequeno fragmento ― aquele constituído pelas causas e efeitos que
pudemos observar ―, e nestes casos é impossível ter a certeza, com base apenas na experiência, que a cadeia
teve um começo. Por este motivo, a experiência é insuficiente para fundamentar a segunda premissa e São
Tomás tem de recorrer a um argumento. Este argumento é uma redução ao absurdo com a seguinte forma:
Primeira premissa: Se não houvesse uma causa primeira (isto é, se houvesse uma regressão infinita nas causas),
não existiriam causas subsequentes nem, por consequência, os efeitos que actualmente existem.
Segunda premissa (premissa subentendida): Existiram as causas subsequentes e os efeitos actuais existem.
Conclusão: Portanto, não pode haver uma regressão infinita de causas.
Estabelecida, desta forma, a segunda premissa, a conclusão segue-se naturalmente dela e da primeira. Assim, o
argumento completo é o seguinte:
Primeira premissa: Tudo o que acontece tem uma causa ou agente activo e esta causa ou agente também tem
uma causa.
Segunda premissa (primeira premissa da redução ao absurdo): Se não houvesse uma causa primeira, não
existiriam causas subsequentes nem, portanto, os efeitos actualmente existentes.
Terceira premissa (segunda premissa da redução ao absurdo — premissa subentendida): Existiram as causas
subsequentes e os efeitos actuais existem.
Conclusão (da redução ao absurdo): Não pode haver uma regressão infinita de causas.
Conclusão: Portanto, tem de existir uma “causa primeira”, isto é, Deus.
Críticas: Se este argumento tem tido muitos defensores, tem tido também muitos críticos. A ciência e a teoria
do big bang põem em causa este argumento. É de realçar que a causa primeira pode não existir e que podemos
regredir ao infinito- a verdade é que uma série infinita da cadeia causal é igualmente possível. Este argumento
levanta também o seguinte problema: quando este argumento refere a causa primeira de todas as cadeias
causais aponta como sendo Deus. Mas não há razões para pensar que essa causa primeira se identifique com
Deus. Por fim, este argumento é contraditório: defende ao mesmo tempo que não há causa que não tenha sido
causada e que existe uma causa que não foi causada.
indícios de desígnio nos organismos e nos órgãos naturais e, em particular no olho humano. Estas entidades
naturais revelam um nível de organização, de ajustamento e de complexidade ainda maior que o do relógio,
pelo que, tal como o relógio, devem a sua existência a um ser inteligente, Deus, que os criou.
Podemos resumir o argumento de Paley da seguinte forma:
Primeira premissa: O relógio tem as suas diversas partes organizadas e ajustadas de modo a atingir um
dado fim ou propósito, revela, portanto, desígnio, pelo que tem de ter um criador inteligente, o relojoeiro
que o fez.
Segunda premissa: O universo e os organismos vivos são muito semelhantes aos relógios, isto é, também
revelam desígnio.
Conclusão: Portanto, também o universo e os organismos vivos têm um criador inteligente, que é Deus.
Na primeira premissa, Paley limita-se a afirmar algo que todos nós aceitamos sem dificuldade: o relógio, dada a
sua complexidade e organização, revela desígnio e o desígnio, por sua vez, implica a existência de um autor
inteligente. Na segunda premissa, Paley compara favoravelmente o universo com o relógio ou, de uma forma
mais geral, os objectos naturais com os objectos fabricados pelos homens: os objectos naturais, tal como os
objectos fabricados pelos homens, revelam desígnio. Uma vez isto estabelecido, a conclusão segue-se com
naturalidade: tal como o desígnio dos objectos fabricados pelos homens exige um autor inteligente, também o
desígnio dos objectos naturais exige um autor inteligente, que é Deus.A premissa crucial deste argumento é a
segunda. É ela que, ao comparar os objectos fabricados pelos seres humanos com os objectos naturais, permite
concluir que também estes objectos têm um criador. Não é de admirar, portanto, que uma das críticas ao
argumento se centre nesta premissa.
Críticas: os críticos deste argumento apontam o facto de ser uma analogia fraca- a comparação entre a natureza
e os objetos produzidos pelo ser humanos é fraca pois não se faz uma comparação entre aspetos relevantes.
Comparar Deus com um relojoeiro e a natureza com um relógio é muito vago. Além disso, a teoria da
evolução de Darwin mostra a incongruência deste argumento. A teoria darwiniana mostra que a adaptação dos
seres vivos ao meio depende da seleção natural e da sobrevivência dos mais aptos. Isto põe em causa o
argumento. Para terminar, o argumento teleológico, ainda que possa demonstrar a existência de um criador, não
garante que esse criador é Deus.
Em suma, a simples reflexão sobre Deus permite concluir que existe porque a hipótese da sua inexistência é
incoerente.
Descartes fez a mesma coisa, mas pressupondo a ideia de um ser perfeito: sendo Deus um ser perfeito e que a
perfeição pressupõe a existência, então Deus existe.
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Críticas: 1)Os críticos apoiam-se na tese de que a existência não é um predicado real ou não é um predicado
de primeira ordem e que, portanto, não pode ser uma propriedade dos objetos, embora possa ser uma
propriedade dos conceitos. A existência, em vez de um predicado, é a condição de possibilidade para que algo
tenha esta ou aquela propriedade. 2)Este argumento pode ainda nos conduzir a pensar que só pelo facto de
termos o pensamento de uma ilha perfeita então ela existe. Esta critica foi feita por Gaunilo e assenta no
seguinte raciocínio: A-a ilha paradisíaca é a mais perfeita que qualquer outra; B-a ilha paradisíaca como a mais
perfeita existe na consciência; C- se a ilha não existisse faltaria um predicado fundamental, a existência, pelo
qual já não seria a ideia de ilha paradisíaca mais perfeita; D- então se temos a ideia de ilha paradisíaca é porque
ela existe, pois de outra forma entramos em contradição. 3)Petição de princípio: na verdade a conclusão de que
Deus existe já se encontra subentendida nas premissas.
podemos com certeza dizer que a felicidade dos que não acreditam em Deus é menor relativamente aos que
acreditam. Podemos ainda dizer que o argumento de Pascal reduz as possibilidades apenas a duas, crer ou não
crer em deus, excluindo outras possibilidade como a crença no politeísmo. Por fim, é discutível defender a
existência de Deus só com base na fé.
Os dois raciocínios são válidos, e a primeira premissa é igual. Por isso, tudo depende da plausibilidade da
segunda premissa. Os agnósticos consideram que a existência da divindade teísta é apenas uma hipótese entre
outras, e que é muitíssimo mais evidente que há males gratuitos. Por isso, concluem que não existe tal
divindade. Talvez até exista alguma divindade, mas não a teísta: ou não é omnisciente e por isso não sabe que o
mal gratuito existe, ou não é sumamente boa e por isso não quer eliminá-lo, ou não é omnipotente e por isso
não consegue acabar com ele. Em contraste, os teístas consideram evidente que Deus existe, ou pelo menos que
a sua existência está muitíssimo bem comprovada, pelo que concluem que não há realmente males gratuitos —
ainda que assim o pareça superficialmente.
Na versão agnóstica do problema do mal considera-se que os males gratuitos são indícios, provas ou razões
adequadas para concluir que não existe uma divindade teísta. Diz-se por isso que este é o problema probatório
do mal: trata-se de invocar os males aparentemente gratuitos para tentar provar (talvez indutivamente) que não
existe, ou é improvável que exista, uma divindade teísta. A versão agnóstica do problema do mal só surgiu mais
recentemente; durante muito tempo, porque os filósofos eram teístas e não duvidavam seriamente da existência
de Deus, era o problema lógico do mal que os preocupava. Este problema é a dificuldade de explicar como a
existência da divindade teísta é logicamente compatível com a existência de males aparentemente gratuitos.
Quando duas ou mais proposições são logicamente incompatíveis, pelo menos uma delas é falsa. Ora, as
seguintes cinco proposições parecem incompatíveis:
Os pensadores religiosos não-teístas rejeitam uma ou mais das proposições 1, 2, 3 ou 4. Os teístas, ao invés,
mantêm essas proposições e rejeitam a 5: defendem que não há afinal males gratuitos, ainda que assim o
pareça.
E é precisamente assim que Leibniz encara o problema do mal.
Leibniz introduziu o termo “teodiceia” a partir das raízes gregas teo, “Deus”, e dikê, “justiça”. Uma teodiceia é
uma tentativa de mostrar que a justiça divina é compatível com o mal. Ora, Leibniz considera que da concepção
teísta de Deus se conclui correctamente que esta é uma divindade absolutamente perfeita: é maximamente
grandioso, como Anselmo também pensava. Leibniz considera que a divindade teísta tem no máximo grau
todas as características que é logicamente possível ter nesse grau. Não tem no máximo grau a característica de
ter a maior dimensão, porque é contraditório pensar que uma entidade seja a maior de todas as possíveis — há
sempre outra entidade possível ainda maior. Porém, Deus tem o poder, o conhecimento e a bondade no maior
grau porque, pensa Leibniz, não é contraditório imaginar tal coisa. Precisamente porque Deus é perfeito,
pensa Leibniz, o Universo que criou é o melhor de todos os possíveis. É isso que significa a sua conhecida
expressão “O melhor de todos os mundos possíveis”. Leibniz pensa que o Universo que Deus criou é o
melhor que poderia ser criado precisamente porque Deus é perfeito: é omnipotente, e por isso pôde criar o
melhor Universo; é omnisciente, e por isso sabia como criá-lo; e é sumamente bom, e por isso queria criar o
melhor Universo. E, portanto, criou-o.
Como explicar, porém, a existência de males aparentemente gratuitos? Leibniz considera que os males que nos
parecem gratuitos não o são de facto. São características indissociáveis de bens que Deus promove. Do mesmo
modo que Deus não pode fazer o maior número par — porque isso é logicamente impossível — também não
pode criar um universo maximamente perfeito sem criar ao mesmo tempo coisas que, aos nossos olhos, nos
parecem males gratuitos, apesar de não o serem de facto. Leibniz usa duas analogias para explicar o que tem
em mente. Uma é a ideia de que quando os seres humanos vêem apenas uma parte insignificante da realidade,
ficam com a ilusão de estar a ver males gratuitos; na verdade, são componentes fundamentais de bens mais
grandiosos que Deus criou. O mesmo acontece se um ser humano estiver perante uma pintura maravilhosa, mas
que mede tantos quilómetros que os seres humanos só são capazes de ver as partes que têm sombras e outros
aspectos que não parecem belos — mas que fazem parte de uma totalidade de beleza superlativa. Em suma,
Leibniz considera que não há afinal qualquer mal gratuito. Os muitos males que parecem fazer parte do
Universo são afinal constituintes de bens muitíssimo mais importantes. Leibniz admite, pois, que existem
males, mas nega que sejam gratuitos — e é por isso que são compatíveis com a bondade, omnipotência e
omnisciência de uma pessoa divina que criou o Universo e tudo o que ele contém. Contudo, o conhecimento
imperfeito dos seres humanos não lhes permite ver a totalidade do Universo, e por isso não vêem os bens
associados aos males a que assistem; e é por isso que lhes parece erradamente que são gratuitos.
Críticas: A primeira dificuldade da posição de Leibniz é que a sua resposta ao problema lógico do mal limita-
se a explicar genericamente, mas não em particular, como os males são compatíveis com a divindade teísta.
Considere-se um caso particular de sofrimento: uma criança de cinco anos, com uma doença grave e incurável,
morre, depois de dois anos de sofrimento intenso. Não só sofreu ela, como sofreram os pais e familiares da
criança, assim como os seus amigos; além disso, foram gastos recursos imensos que poderiam ter sido usados
para fazer coisas criativas, como pintar quadros, praticar desportos ou escrever sonatas. Leibniz não nos diz em
pormenor qual é o bem maior do qual todo este sofrimento é uma componente fundamental. Claro que podemos
imaginar alguns desses bens: o estoicismo da própria criança, a abnegação dos pais e familiares, o
profissionalismo e empatia profunda de médicos e enfermeiros. Contudo, é pura e simplesmente falso que, do
nosso ponto de vista, estes bens superem o mal daquele sofrimento — basta pensar que nenhum progenitor que
não seja perverso provocaria aquela doença no seu filho só porque daí resultam alguns bens.
Poderíamos ainda questionar: Deus não poderia criar circunstâncias favoráveis que impedissem certas ações
morais e suas nefastas consequências para a humanidade?
Além disso, quando se pensa o mal em termos abstratos e gerais, é fácil discorrer a seu respeito. Mas se
analisarmos no plano da realidade concreta a situação é outra.
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