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SÍNTESE TEMÁTICA

I – O QUE É A FILOSOFIA?
A FILOSOFIA COMO ATIVIDADE CONCEPTUAL E CRÍTICA

A filosofia começa por recolocar muitas das questões que fizemos em criança e examina as crenças que formamos
sobre a realidade que nos rodeia. Assim, uma primeira resposta à pergunta “O que é filosofia?” poderia ser a decisão
de não aceitar como óbvias e evidentes as coisas, as ideias, os conceitos, os factos ou as situações da nossa existência
quotidiana sem antes os ter investigado e compreendido. Por ser uma disciplina que examina as crenças essenciais
sobre a realidade e os conceitos em que elas se baseiam, a filosofia é uma atividade conceptual crítica. Essa atividade
não se traduz necessariamente na rejeição das nossas crenças, mas sim na sua avaliação, de modo a perceber se
existem boas razões para continuar com elas. Dessa forma, as nossas crenças básicas sobre a realidade e a vida tornam-
se verdadeiramente nossas: aceitamo-las porque as pensamos por conta própria e não porque os nossos pais, amigos
ou sociedade nos condicionaram a aceitá-las. Assim, ganha-se autonomia, um tipo de independência e liberdade de
poder decidir por si mesmo aquilo em que se acredita, pelo recurso às suas próprias capacidades racionais. O
objetivo da filosofia é fazer com que respondamos a essas perguntas por nós mesmos. A palavra filosofia resulta da
junção das palavras gregas philos, que significa “amor”, e sophia, que significa “sabedoria”. A filosofia é, na aceção
etimológica, o amor à sabedoria, que nasce da relação que mantemos com o mundo e com os outros e se desenvolve
a partir da problematização e do questionamento das crenças que formamos sobre os mesmos.

Na origem da filosofia podem encontrar-se diferentes situações e motivações:


▪ O ESPANTO OU A ADMIRAÇÃO PERANTE O MUNDO QUE NOS RODEIA;
▪ A DÚVIDA FACE ÀQUILO QUE TOMAMOS COMO CERTO E GARANTIDO;
▪ A CONSCIÊNCIA DA NOSSA FRAGILIDADE E DO SOFRIMENTO;
▪ A VONTADE DE ESTABELECER UMA COMUNICAÇÃO AUTÊNTICA COM OS OUTROS.
Apesar desta variedade de situações e motivações, o amor pela sabedoria é uma característica comum a todos os
filósofos, que os leva a refletir criticamente e a desenvolver respostas para os problemas que colocam.

AS QUESTÕES DA FILOSOFIA

Os problemas filosóficos são, geralmente, enunciados na forma de questões filosóficas. Estas exigem um certo
distanciamento da vida quotidiana e de si mesmo, indagando o que são as crenças e os sentimentos que alimentam a
nossa existência. Elas implicam o desejo de conhecer as razões por que acreditamos no que acreditamos.
Assim:
▪ em vez de levantar a questão de saber “que horas são” ou “que dia é hoje”, o filósofo levanta a questão de
saber “o que é o tempo”;
▪ em vez de levantar a questão de saber se alguém está a sonhar ou se endoideceu, questiona sobre o que é o
sonho, o que é a loucura ou o que é a razão;
▪ em vez de perguntar se alguém está a mentir, questiona sobre o que é a verdade, o que é erro, o que é a
mentira.

Por conseguinte, as questões da filosofia têm algumas características que as distinguem das demais:
✓ são relativas às nossas crenças fundamentais;
✓ geram controvérsia e discussão crítica de ideias;
✓ levam a um avanço na compreensão e aprofundamento do tema;
✓ dizem respeito e interessam, em princípio, a toda a Humanidade; não são resolvidas matemática nem
experimentalmente.

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Alguns exemplos de questões não-filosóficas, filosóficas e respetivas disciplinas filosóficas são apresentados no quadro
que se segue:

DISTINÇÃO ENTRE FILOSOFIA E AS CIÊNCIAS

A filosofia distingue-se das ciências empíricas pelo objeto a que se dedicam, pelos problemas que colocam e pelo
método que utilizam. Ao passo que a filosofia se dedica a estudar a realidade como um todo, as ciências empíricas
dedicam-se ao estudo detalhado de parcelas dessa realidade. Por outro lado, enquanto que os problemas da filosofia
são problemas conceptuais, analisados a partir do método reflexivo/crítico e argumentativo, os das ciências
empíricas são problemas empíricos, investigados pelo uso do método experimental.
Contudo, ambas – filosofia e ciências empíricas – procuram atingir o mesmo objetivo, a saber: encontrar a verdade.

II – LÓGICA

A reflexão crítica e a racionalidade argumentativa encontram-se na base da dimensão discursiva do trabalho


filosófico. A resposta a questões e problemas filosóficos implica algumas atividades fundamentais, como: a análise de
conceitos; a formulação e avaliação de teses e teorias; a formulação e avaliação de argumentos. Para assegurar a
qualidade das suas análises, formulações e avaliações, os filósofos recorrem à lógica.

A IMPORTÂNCIA DA LÓGICA PARA A FILOSOFIA


A lógica é indispensável para o exercício da atividade filosófica pelas seguintes razões:
✓ Permite-nos distinguir argumentos de não argumentos.
✓ Permite-nos clarificar os argumentos.
✓ Ensina-nos a avaliar criticamente argumentos, ou seja, a verificar se são bons.
✓ Ensina-nos a pensar de forma consequente.
✓ Como a atividade filosófica, consiste essencialmente na discussão de ideias; mediante a lógica tornamo-nos
mais capazes de apresentar argumentos a favor de uma ideia, ou de contra-argumentar.

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CONCEITO, TERMO, TESE, PROPOSIÇÃO, ARGUMENTO

O conceito constitui o elemento básico do pensamento. Trata-se da representação intelectual de determinada


realidade.
O conteúdo dessa representação (as propriedades ou características) pode dizer respeito a uma classe de objetos –
por exemplo, "flor", "caderno", "guerra" – ou a uma realidade singular – por exemplo, "Joana", "Ponte D. Luís", "Lua".
O termo é geralmente entendido como a expressão verbal do conceito.
O mesmo conceito pode ser expresso por termos diferentes sob o ponto de vista linguístico – "domicílio" e
"residência", por exemplo – e o mesmo vocábulo pode exprimir diferentes conceitos – "nota" enquanto apontamento
e "nota" enquanto dinheiro, por exemplo.
De um ponto de vista lógico, teremos, neste último caso, de falar em termos distintos. Convém ainda sublinhar que
um termo pode ser constituído por mais do que uma palavra, exprimindo um único conceito: por exemplo, "livros de
poesia".

Uma tese é uma ideia que se quer defender a propósito de um dado problema.
No âmbito da filosofia, uma tese constitui uma resposta a um problema em aberto, estando, por conseguinte, sujeita
a discussão.
As teses ou teorias são expressas em frases.
Todavia, aquilo que efetivamente interessa aos filósofos discutir não são as frases a partir das quais as teses são
formuladas, mas sim as ideias que lhes subjazem. Tais ideias são as proposições.

Uma proposição é o pensamento ou conteúdo, verdadeiro ou falso (ou seja, possui valor de verdade), expresso por
uma frase declarativa.

Chama-se, por vezes, juízo à operação mental que permite estabelecer uma relação entre conceitos e que está
subjacente à formação de proposições. Iremos usar os termos juízo e proposição como sinónimos.
Exemplo de uma proposição: “O gelo é a água em estado sólido”.

Apenas as frases declarativas expressam proposições, dado que somente estas expressam um determinado
conteúdo que pode ser classificado em verdadeiro ou falso.

As frases nas quais se interroga, ordena, pede, aconselha, chama, deseja ou promete não expressam proposições,
já que nelas nada se afirma ou nega que seja suscetível de ser considerado verdadeiro ou falso.
A mesma proposição pode ser expressa por diferentes frases declarativas.
Por exemplo, a frase “Kant é o autor da Crítica da Razão Pura” expressa a mesma proposição que a frase “O autor da
Crítica da Razão Pura é Kant”.
Além disso, há frases que, sendo ambíguas, exprimem mais do que uma proposição. Por exemplo, a frase “Maria
encontrou o dono do terreno com o seu primo” tanto exprime a ideia de que “Maria encontrou o seu primo com o dono
do terreno”, como a ideia de que “Maria encontrou o dono do terreno com o primo dele”.
Frases declarativas absurdas, como “O quadrado circular acordou com sardas”, também não expressam proposições,
já que não expressam qualquer pensamento suscetível de ser classificado em verdadeiro ou falso. Para o estudo da
lógica, importa distinguir vários tipos de proposições: as categóricas, as condicionais, as bicondicionais, as disjuntivas,
etc. Por agora, vamos referir-nos apenas às proposições categóricas. Mais adiante, estudaremos outros tipos de
proposições.

As proposições categóricas são aquelas em que, de forma explícita ou implícita, de modo absoluto e sem fixar
condições ou considerar alternativas, se estabelece uma relação de afirmação ou de negação entre termos, podendo
tal relação ser considerada verdadeira ou falsa.
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A fórmula clássica que representa esta relação é "S é P" ou "S não é P". Isto significa que, quando formamos uma
proposição categórica, afirmamos ou negamos alguma característica – o termo predicado (P) – de alguma coisa – o
termo sujeito (S).
A defesa de uma tese ou teoria implica a construção de bons argumentos.

Um argumento é um conjunto de proposições devidamente articuladas – a conclusão e a(s) premissa(s) –, no qual


a(s) premissa(s) tenta(m) defender, sustentar, apoiar ou justificar a conclusão. À conclusão também se chama tese,
dado que ela traduz a ideia que se quer defender.

Exemplo de um argumento:
As bebidas alcoólicas são proibidas a menores.
A cerveja é uma bebida alcoólica.
Logo, a cerveja é proibida a menores.

O que caracteriza o argumento é o nexo lógico que se verifica entre as premissas e a conclusão.
A inferência ou raciocínio é o que está na base do argumento, ou seja, é a operação mental em que se efetua a
transição lógica entre proposições, extraindo-se uma conclusão a partir de razões ou premissas.
Neste sentido, argumento, inferência, raciocínio, justificação são conceitos muito próximos e, de algum modo,
sinónimos.

A avaliação de um argumento e da inferência que lhe está subjacente implica um passo fundamental: identificar qual
das proposições do argumento é a conclusão e qual(ais) é(são) a(s) premissa(s).
Apesar de, no nosso discurso do dia a dia, não formarmos, em geral, argumentos que obedeçam a uma estrutura
canónica, há algumas expressões que indicam a presença de premissas e outras que indicam a presença de conclusões.
Indicadores de premissas – alguns exemplos: pois, dado que, visto que, já que, porque, entre outros.
Indicadores de conclusão – alguns exemplos: logo, assim, deste modo, portanto, consequentemente, por
conseguinte, por isso, entre outros.

VALIDADE - VERDADE
Um argumento não deixa de ser válido por ter premissas falsas nem tem a sua validade garantida por ter premissas
verdadeiras.
A validade de um argumento dedutivo depende unicamente da forma lógica do argumento, ou seja, da relação
correta que se dá entre as premissas e a conclusão (sejam estas de facto verdadeiras ou não).
A validade e a invalidade são qualidades próprias dos argumentos dedutivos, resultantes do facto de as premissas
apoiarem de modo decisivo (garantirem) ou não a conclusão. Vejamos então qual é a diferença entre argumentos
válidos e inválidos.

Um argumento só é válido quando as suas premissas oferecem uma garantia completa à conclusão, sendo
logicamente impossível que as premissas sejam verdadeiras e, simultaneamente, a conclusão falsa.

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Uma vez que a validade ou invalidade dos argumentos depende essencialmente da sua forma lógica, se
substituirmos os termos das proposições por letras (F em vez de «baleias», G em vez de «mamíferos» e H em vez de
«cachalotes»), obteremos a seguinte forma lógica:

Todos os F são G.
Todos os H são F.
Logo, todos os H são G.

Trata-se de uma forma válida. Qualquer argumento que tenha esta forma será válido.

Além disso, um argumento também pode ser válido mesmo que as suas premissas sejam falsas.
Exemplo:
Todas as formigas são aves.
As girafas são formigas.
Logo, as girafas são aves.

Neste exemplo, apesar de as proposições serem falsas, a estrutura do argumento mantém-se, ou seja, continua a
ser um argumento válido.
Assim, o facto de um argumento ser válido não pode, por si só, garantir-nos que qualquer uma das suas proposições
seja verdadeira; esse facto apenas nos diz que a conclusão deve ser verdadeira se as premissas forem verdadeiras.

Bom estudo!

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