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FACULDADE SENAC GOIÁS

ANNA LUIZA PEREIRA DE OLIVEIRA


MARCO ANTÔNIO HORÁCIO JUNIOR

DESIGN DE SUPERFÍCIE COMO FERRAMENTA


DE VALORIZAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO TERRITORIAL A PARTIR DAS
VISUALIDADES URBANAS DE GOIÂNA

GOIÂNIA
2020
ANNA LUIZA PEREIRA DE OLIVEIRA
MARCO ANTÔNIO HORÁCIO JUNIOR

DESIGN DE SUPERFÍCIE COMO FERRAMENTA


DE VALORIZAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO TERRITORIAL A PARTIR DAS
VISUALIDADES URBANAS DE GOIÂNA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à


Faculdade SENAC Goiás, como parte dos
requisitos necessários para obtenção do título
de tecnólogo no curso de Design Gráfico.

Orientador: Professor Aurisberg Leite Matutino

GOIÂNIA
2020
ANNA LUIZA PEREIRA DE OLIVEIRA
MARCO ANTÔNIO HORÁCIO JUNIOR

DESIGN DE SUPERFÍCIE COMO FERRAMENTA


DE VALORIZAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO TERRITORIAL A PARTIR DAS
VISUALIDADES URBANAS DE GOIÂNA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


à Faculdade SENAC Goiás, como parte dos
requisitos necessários para obtenção do título
de tecnólogo no curso de Design Gráfico.

Aprovados em ___ de __________________ de _________

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________
Aurisberg Leite Matutino Professor Orientador

___________________________________________________
Flávio De Lima Ferreira Professor Avaliador

___________________________________________________
Priscila Monique Teixeira Rodrigues Professora Avaliadora
RESUMO

Este projeto apresenta o design de superfície como ferramenta projetual de


valorização e identificação territorial. Propõe-se uma discussão entre relação da
sociedade que transita pela cidade de Goiânia e as visualidades urbanas presentes
em seu espaço urbano, sobretudo a arte urbana na arquitetura Art Déco. O objetivo
geral se destina à criação de estampas que construam e valorizem a identidade do
território, tomando como base os elementos visuais característicos da Art Déco e
dos artistas urbanos locais Kboco e Selon, sujeitos relevantes para o estudo de
caso. O trabalho ainda relata o processo de criação das estampas, passando pelas
etapas de pesquisas bibliográficas, análise de similares, desenvolvimento,
experimentação e aplicação em diversas superfícies que atribuam valor cultural
para o produto, desde materiais gráficos impressos e digitais até superfícies têxteis
e produtos regionais.

Palavra-chave: Visualidades urbanas. Art Déco. Arte urbana. Design de superfície.


ABSTRACT

This project presents surface design as a design tool for territorial valorization and
identification. A discussion is proposed between the relationship of society that
transits the object of study in question to the city, and the urban visualities presented
in space, specifically urban art in art deco architecture. We have as a general
objective the creation of prints that build and enhance the identity of the territory,
based on the visual elements characteristic of the graffiti and muralism of the artists
Kboco and Selon, who were relevant participants for the case study carried out
during the research and Art Déco in architectural surroundings observed in Goiania.
In addition, the project has the following specific objectives: to study the definition of
surface design; understand and explain elements and techniques used in the
creation of prints; develop compositions based on urban visual elements
characteristic of Goiania; design patterns with the elements created; and, apply the
standards. The work also discusses the way that territorial design can be used as a
tool for valuing a region and how to recognize the identity of a territory as a
methodological procedure and reports the process of creating the prints, going
through the stages of development, experimentation and application.

Keywords: Urban visuals. Art Déco. Urban art. Surface design.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Mural de Wes Gama.............................................................................14


Figura 2 – Lambes na Avenida Tocantins..............................................................15
Figura 3 – Protesto anônimo..................................................................................16
Figura 4 – Irmãos Staden.......................................................................................17
Figura 5 – Grafites de Decy e Wes Gama.............................................................18
Figura 6 – A dança no Moulin Rouge (1889-90), Toulouse-Lautrec......................20
Figura 7 – Tumba do rei Tut...................................................................................23
Figura 8 – Portas ornamentadas em Art Déco e Art Nouveau...............................23
Figura 9 – Portas ornamentadas em Art Déco e Art Nouveau...............................24
Figura 10 - Théâtre des Champs-Élysées.............................................................25
Figura 11 – Elevador Lacerda................................................................................26
Figura 12 – Attilio Corrêa Lima, 1942....................................................................27
Figura 13 – Museu Zoroastro Artiaga....................................................................28
Figura 14 – Estação Ferroviária.............................................................................28
Figura 15 – Praça Cívica, 1930..............................................................................29
Figura 16 – Vitral do Palácio das Esmeraldas.......................................................29
Figura 17 – Projeto original proposto por Attilio Corrêa Lima................................30
Figura 18 – Ornamento Art Déco em ferro fundido................................................31
Figura 19 – Ornamento em concreto armado........................................................31
Figura 20 – Casa Rosa, Projeto Pigmentos...........................................................32
Figura 21 – Teatro Goiânia, Projeto Pigmentos.....................................................32
Figura 22 – Casa Rosa, Projeto Base Central.......................................................38
Figura 23 – Gráfico de faixa etária.........................................................................42
Figura 24 – Gráfico de identificação sexual...........................................................43
Figura 25 – Gráfico de identificação de cor/etnia...................................................43
Figura 26 – Gráfico de identificação com a Art Déco.............................................44
Figura 27 – Gráfico de motivação para ir ao Centro..............................................44
Figura 28 – Gráfico de deslocamento ao Centro...................................................45
Figura 29 – Gráfico de meio de transporte utilizado..............................................45
Figura 30 – Gráfico de segurança..........................................................................46
Figura 31 – Gráfico de percepção visual...............................................................46
Figura 32 – Gráfico de impacto da arquitetura Art Déco e da arte urbana............47
Figura 33 – Gráfico de alternativas de entretenimento.........................................47
Figura 34 – Gráfico de relação entre segurança e frequência de visita................48
Figura 35 – Gráfico de identificação com grafite e Art Déco.................................48
Figura 36 – Arquitetura Art Déco em Goiânia........................................................50
Figura 37 – Registros fotográficos de trabalho de campo.....................................51
Figura 38 – Painel semântico de Selon.................................................................52
Figura 39 – Painel semântico de Kboco................................................................53
Figura 40 – Painel semântico do Projeto Base Central.........................................54
Figura 41 – Pesquisa de elementos visuais...........................................................55
Figura 42 - Estampas Sol, Dunas e Forte dos Reis do Magos..............................56
Figura 43 - Linhas Pôr do Sol, Metrópoles e Verde...............................................56
Figura 44 - Figuras rupestres, módulos, ladrilhos hidráulicos................................57
Figura 45 - Linhas Modernista, Colonial e Tribal...................................................57
Figura 46 – Formas de aplicação de um módulo...................................................59
Figura 47 – Unidade compositiva...........................................................................59
Figura 48 – Multimódulo.........................................................................................60
Figura 49 – Estudo de elementos do relógio Déco................................................61
Figura 50 – Construção do módulo digital.............................................................62
Figura 51 – Módulo digitalizado.............................................................................62
Figura 52 – Estudo de processo de desenvolvimento...........................................63
Figura 53 – Malha construtiva digitalizada.............................................................63
Figura 54 – Módulo digitalizado.............................................................................64
Figura 55 – Exercício com padrão, módulo e encaixe em área de continuidade..65
Figura 56 – Teste de encaixe.................................................................................65
Figura 57 – Teste de encaixe.................................................................................66
Figura 58 – Sistemas alinhados e não alinhados dos módulos.............................67
Figura 59 – Sistema alinhado e sistema não alinhado..........................................67
Figura 60 – Malha de formada deslocada em colunas..........................................68
Figura 61 – Malha quadrada..................................................................................69
Figura 62 – Translação e Reflexão.......................................................................70
Figura 63 – Rotação e Inversão............................................................................70
Figura 64 – Dilatação.............................................................................................70
Figura 65 – Mapa mental.......................................................................................72
Figura 66 – Palavras-chave do mapa mental........................................................72
Figura 67 – Goiânia Palace Hotel, tipografia.........................................................73
Figura 68 – Teatro Goiânia, tipografia...................................................................74
Figura 69 – Fachada Grande Hotel, tipografia.......................................................74
Figura 70 – Tipografia aplicada ao naming teste...................................................75
Figura 71 – Fonte Mouse Deco..............................................................................75
Figura 72 – Paleta cromática.................................................................................76
Figura 73 – Estudo Avenida Marginal Botafogo.....................................................77
Figura 74 – Paleta cromática.................................................................................77
Figura 75 – Estudo Casa Rosa..............................................................................78
Figura 76 – Resultados e estudos.........................................................................78
Figura 77 – Mockup 1............................................................................................79
Figura 78 – Mockup 2............................................................................................79
Figura 79 – Mockup 3............................................................................................80
Figura 80 – Mockup 4............................................................................................80
Figura 81 – Mockup 5............................................................................................81
Figura 82 – Mockup 6............................................................................................81
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 9
2 REFERENCIAL TEÓRICO 11
2.1 VISUALIDADES URBANAS 11
2.1.1 Cidades globalizadas 11
2.1.2 O espaço urbano e a produção de imagens 12
2.1.3 Identidade territorial 12
2.2 ARTE URBANA 13
2.2.1 A arte-manifesto das ruas 13
2.2.2 Goiânia e a arte urbana 13
2.2.3 O eixo Centro-Setor Sul 18
2.2.4 Intervenção e manifesto a partir do sujeito 19
2.3 MOVIMENTO ART DÉCO NO MUNDO 20
2.3.1 Belle Époque 20
2.3.2 Belle Époque no Brasil: ecos de Paris 21
2.3.3 A Belle Époque e suas dicotomias 21
2.3.4 Art Déco no mundo 22
2.3.5 Art Déco no Brasil 25
2.3.6 Art Déco em Goiânia 26
2.3.7 O projeto 30
2.4 DESIGN DE SUPERFÍCIE 33
2.4.1 Princípios do design de superfície 33
2.4.2 O design gráfico no design de superfície 33
2.4.3 Design de superfície como ferramenta projetual 33
2.4.4 Valorização territorial por meio do design 34
3 ESCOLHAS METODOLÓGICAS 35
3.1 METODOLOGIA CIENTÍFICA 35
3.2 METODOLOGIA PROJETUAL 37
4 TRABALHO DE CAMPO 38
4.1 ESTUDO DE CASO: A CASA ROSA 38
4.2 ENTREVISTA 39
4.2.1 Análise da entrevista 39
4.3 QUESTIONÁRIO 41
4.3.1 Análise do questionário 48
5 PROCESSO DE CRIAÇÃO 49
5.1 PESQUISA VISUAL DE BASE 49
5.1.1 Elementos visuais urbanos através da fotografia 49
5.1.2 Painéis semânticos 52
5.1.3 Análise de similares 55
5.1.4 Módulos 58
5.1.5 Encaixes 64
5.1.6 Sistemas de repetição 66
5.1.7 Malhas 68
5.1.8 Simetria 69
5.2 PRODUTO 71
5.2.1 Público-alvo 71
5.2.2 Naming 71
5.2.3 Cores 75
5.2.4 Coleção de padronagens 77
5.3 APLICAÇÕES E RESULTADOS 79
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 81
REFERÊNCIAS 83
APÊNDICE A - ENTREVISTAS 87
9

1 INTRODUÇÃO

O tema deste trabalho aborda as visualidades urbanas da cidade de Goiânia


como campo de pesquisa, pela qual a arte urbana e a Art Déco são identificadas
como parte da identidade regional da cidade, destacando-se como formas de
expressão cultural local. Assim, torna-se válido perguntar como seria possível
valorizar a construção visual, tanto do ponto de vista artístico quanto arquitetônico,
da cidade, tornando-a uma marca territorial? Uma possibilidade seria a busca por
compreender de que forma a arte urbana e a Art Déco são visualizadas pelas
pessoas que transitam pela cidade e convivem com seu cotidiano; observando o
cenário urbano; entendendo o grafite como um tipo de informação relevante social
e politicamente; e, não menos importante, compreendendo a Art Déco como um
patrimônio cultural que deve ser valorizado e ressaltado como parte da identidade
local de Goiânia.
Nesse mesmo cenário também encontramos o sujeito que pratica a arte
urbana e que colabora com essas visualidades culturais da cidade: os grafiteiros e
os muralistas, que interrompem um discurso urbano ao gerar informações que
chegam à sociedade, que por sua vez vive e convive no mesmo espaço geográfico.
A partir da união das artes urbana e Déco e com estudos específicos de dois artistas
que colaborativamente trabalharam na revitalização do eixo Centro-Setor Sul da
cidade, em nosso objeto de pesquisa demos inicio à produção de sobreposições de
formas e cores regionais que caracterizam a Art Déco na arte urbana de suas obras.
Esses artistas nos permitiram o entendimento de seus processos criativos, como,
por exemplo, a de que maneira utilizam a cidade e como expressam seus elementos
referenciais para obter novos padrões e aplicações que resultaram em nosso
produto final.
Na mesma medida, pretendemos, mais especificamente, pesquisar e definir
o que é design de superfície; estudar e explorar técnicas de criação de estampas;
elaborar composições visuais baseadas em elementos urbanos característicos de
Goiânia, de modo que, por meio dessas composições, sejam estabelecidos
padrões, e que esses padrões possam, enfim, ser aplicados.
A relevância do tema consiste em trazer benefícios no sentido de valorização
cultural e estratégia local num contexto social e político da cidade. Desse modo,
acredita-se ser possível afetar a sociedade e o seu comportamento em relação às
10

tradições e memórias conterrâneas de sua cultura, contribuindo assim para a


discussão sobre como o design pode influenciar na reconstrução de uma identidade
visual e resgatar os grafismos da Art Déco de Goiânia. Não menos importante, este
tema também lança luz para a arte urbana, o urbanismo, assim como para o
comportamento do cidadão que habita a cidade, buscando entender o que ele
consome e absorve das informações geradas pelo espaço urbano.
Com esse tema pretendemos abordar questões socioculturais dentro do
contexto regional no qual o design atua. Nossa intenção, com isso, é obter
resultados de valorização histórica no que diz respeito ao espaço urbano e à cidade,
assim como sua influência social no consumo local. Além disso, visamos atender
às necessidades de preservação das memórias cultural e visual, que por sua vez
constroem um sistema não-próprio ao passo que representam e identificam a cidade
e as pessoas que a habitam. Como instrumento de identificação própria foi utilizado
o design de superfície, que busca expressar através de padronagens, cores e
formas da cidade local, usando a fotografia como pesquisa visual e explorando a
variedade de aplicações em uma superfície têxtil, mobiliária e diversos materiais.
No primeiro capítulo contextualizamos os assuntos que estão inseridos no
tema de pesquisa. A partir de referências bibliográficas, abordamos diretamente a
reflexão sobre a temática aplicada no projeto, reforçando como a visualidade urbana
goiana pode se relacionar com a ferramenta projetual determinada, isto é, o design
de superfície. Por meio de dissertações sobre a sociologia urbana, o design
territorial, a arquitetura patrimonial histórica e a arte urbana local, especificamente
o grafite e o muralismo, entendemos melhor as relações existentes entre os
elementos gráficos urbanos de Goiânia tanto como expressão visual quanto como
cocriação do espaço urbano.
No segundo capítulo explicamos sobre as metodologias da pesquisa no
âmbito cientifico e projetual e por que esses métodos contribuem para a realização
do projeto.
No terceiro capítulo inserimos o trabalho de campo realizado no setor central.
Para esta fase foram utilizados questionários para o público-alvo do projeto, ou seja,
pessoas não familiarizadas com Art Déco e tampouco com arte urbana como
identificação territorial; além dos referidos questionários, também foram realizadas
entrevistas com os artistas urbanos locais do Projeto Base Central, o que resultou
na revitalização de uma edificação Art Déco no local do trabalho de campo.
11

No quarto capítulo dissertamos sobre os processos criativos e metodológicos


que resultaram no produto de design final: a coleção de padronagens aplicada em
diversas superfícies, atribuindo valores culturais a produtos locais, demonstrando,
assim como o design de superfície pode ser versátil e aplicável a vários formatos e
técnicas.

2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 VISUALIDADES URBANAS

Uma grande discussão social vem sendo levantada com o estabelecimento


do avanço tecnológico, de modo que cada vez mais a imagem visual desempenha
não somente o papel de ornamentar, mas também o de criticar e nos orientar pelo
momento atual. Assim, essas atuais funções da imagem acabam por criar um local
singular, fruto da sociedade que por ali passa ou vive (BRIGHENTI; CAMPOS;
SPINELLI, 2011). Desse modo, cada cidadão tem o poder de, no seu dia a dia,
criar maneiras de interagir com o seu entorno e de compreendê-lo (KULAK;
OLIVEIRA, 2014).

2.1.1 Cidades globalizadas

Segundo Rem Koolhaas (1995), a constante globalização torna as cidades


mais parecidas umas com as outras a cada dia que passa. Empresas e marcas
multinacionais padronizam o espaço com prédios e edifícios genericamente
estruturados, levando as cidades a perderem o que as tornam singulares. A partir
dessa afirmação, buscamos refletir sobre os impactos causados nos centros
históricos e na vida dos cidadãos urbanos.
Consideremos “urbanização” como um termo utilizado a fim de expressar os
impactos causados pela globalização. O processo de urbanização acaba por apagar
a memória local, memória esta que torna a cidade única, em vista de uma estética
globalizada e homogênea.
Para Koolhaas (1995), o centro deveria ser um lugar para guardar a história
e as dicotomias da cidade, fazendo com que sua identidade se tornasse um fator
de atração. Para Aleixo (2005), as cidades globalizadas dispõem de elementos que,
a partir do design urbano, eliminam setores populares para dar espaço a um
12

conjunto de locais, tais como: museus, centros culturais e universidades, num


processo que acaba por mascarar a verdadeira face do centro urbano ao invés de
enaltecer a essência estética presente.

2.1.2 O espaço urbano e a produção de imagens

A visibilidade da cidade nos remete a questões de regulamentos políticos. A


atuação dos intervencionistas na cidade resulta em uma composição da paisagem
urbanística, propondo uma autonomia da construção e da transmissão de imagens.
Ao proporem paisagens, os produtores dessas imagens estabelecem uma estrutura
visual geográfica que, embora seja normalizada, é frequentemente instigada por um
grupo de intermediários diversos. A cidade também é cenário de deslocamentos
interruptivos e, muitas vezes, inseguros e ilegítimos, classificados diretamente por
ordens de poder dominante. Atualmente há pesquisas de várias áreas de estudo
que analisam a produção de imagens recorrentes da prática e vivência urbana,
atentando-se ao modo como absorvemos as informações carregadas nessas
imagens reproduzidas e propondo uma discussão do espaço público urbano como
um local para exercer atividades de cunho sociopolítico (BARBOSA; CAMPOS;
ECKERT, 2018).
Os artistas modificam a cidade por meio da arte urbana. Embora seus
trabalhos cumpram um papel de denúncia e ornamento, muitas vezes passam
despercebidos pela sociedade. Por meio de uma concepção histórica, sociopolítica
e cultural, esta pesquisa aponta não só como a arte urbana goiana intercede no
espaço urbano, como também fornece cultura e promove a composição do sistema
social. Mettrau, Vasques-Menezes e Rink (2018) concluem que ainda que
permaneça uma interlocução principal entre os espaços urbanos, a performance dos
artistas que interferem nesses locais apresenta diversos discursos sociais que
retratam linguagens artísticas contemporâneas e novas ações no ambiente público.

2.1.3 Identidade territorial

De acordo com Josiane Tochetto (2016), o termo “identidade territorial” é


utilizado para designar um apanhado de peculiaridades de um determinado local.
13

Além de facilitar o reconhecimento do local, essas peculiaridades funcionam como


símbolos, que, por sua vez, constroem uma identidade perene, durando por muitos
anos e influenciando o modo de vida de sua população. Para entender o valor
transmitido pelas paredes e superfícies de um determinado local temos que nos
colocar como habitantes e desenvolver uma conexão entre os contextos social e
político de seu tempo.

2.2 ARTE URBANA


2.2.1 A arte-manifesto das ruas

Tomamos por arte contemporânea toda arte que, ocupando espaços como
muros e placas, quebra as barreiras entre o público e o privado com o intuito de
manifestar algo (TOCHETTO, 2016). Essa forma de expressão data desde a
antiguidade, quando se utilizava dos muros da cidade como meio de manifesto,
abrangendo desde declarações de amor a protestos políticos. Durante os anos
1960, a arte urbana teve um papel importante para a sociedade, que protestava
contra autoridades políticas e sistemas econômicos. Cartazes, panfletos e grafites
eram distribuídos por toda cidade, trazendo críticas e poemas que buscavam
retratar a sociedade e seus costumes. Desde então os muros se tornaram um meio
recorrente de fixar manifestos nos grandes centros urbanos. Ferreira (2012) ainda
afirma que no Brasil, durante a ditadura, a frase “Abaixo a ditadura” era grafitada
em muros e espaços vazios, dando voz à juventude que fazia ligação entre a arte e
a política, ou seja, construindo uma nova linguagem, a linguagem das ruas.

2.2.2 Goiânia e a arte urbana

O cenário artístico e cultural de Goiânia possui uma movimentação expoente


tanto no que diz respeito aos artistas quanto para quem trabalha na área ou admira
a cena, a qual ainda é muito restrita para outros públicos, que não possuem contato
diário com esses estímulos visuais criativos. A arte urbana, contudo, se relaciona
diretamente com outros métodos artísticos e com a sociedade, por estar presente
principalmente em grandes centros e por fazer parte da paisagem urbana, gerando
cada vez mais reflexões e diálogos diretos e indiretos com os cidadãos que
efemeramente transitam entre um bairro e outro.
14

Figura 1 - Mural de Wes Gama

Fonte: O Popular.

Em A revolução urbana, Henri Lefebvre (2008) entende o acesso à cidade


como um precursor da produção de imagens, sons, relações e interferências no
espaço urbano, reproduzindo, assim, uma apropriação do espaço público, agindo
coletivamente no meio social e propondo uma extensão do tecido urbano que inclui
a sociedade e suas relações com o contexto urbanístico. O que a arte urbana goiana
propõe aos seus cidadãos é, portanto, muito importante: olhar para os cantos
despercebidos, se desenvolvendo como uma arte que não apenas enfeita e colore
paredes acinzentadas, mas que impressiona, instiga e atrai todos os tipos de
olhares, dos mais conservadores aos mais liberais. Há aqueles que se sentem
agredidos e há aqueles que admiram, mas, de todo modo, há algo que a arte urbana
indiscutivelmente promove: a liberdade de se expressar visualmente em um espaço
público, a própria cidade.
Figura 2 - Lambes na Avenida Tocantins
15

Fonte: Conta de Instagram, Aproveite a cidade.

Por ser uma capital ainda em evolução, Goiânia conta com artistas jovens e
ativos por todos os cantos da cidade. A forma como técnicas e estímulos são
compartilhados para promover a arte urbana acaba se distinguindo justamente por
conter poucas pessoas interessadas em permitirem-se usufruir dos espaços da
cidade, entendendo que ainda é muito burocrático o modo como funciona o
processo de se expor “clandestinamente” como artista de rua. Apesar de certas
restrições impostas pelo conservadorismo, exigindo-lhe cautela para que não
corram o risco de serem vistos como marginais e vândalos por suas intervenções
numa cidade ainda pequena, são muitos os artistas que buscam o reconhecimento
e garantem sua liberdade de continuar realizando seus grafites, lambe-lambes,
murais, stêncils, etc.
Há os que produzem na rua por uma questão de provocação, com o principal
intuito de intrigar por meio de suas performances anônimas. É o caso de artistas
que consideram suas obras como uma arte muito mais política e construtiva do que
ornamental e decorativa.

Figura 3 - Protesto anônimo


16

Fonte: Capa do jornal O Popular, set. 2001, acervo do artista.

Um exemplo é Oscar Fortunato, o artista contemporâneo conterrâneo cujas


intervenções se fazem presentes nas ruas de Goiânia desde a década de 1990.
Fortunato reconhece sua linguagem visual como transgressora e progressiva,
herança de sua educação musical punk. O artista realiza diversos trabalhos que
exploram os aspectos sociais e políticos do goiano, promovendo mais amor pela
cidade de onde viemos, honrando nossas raízes e costumes culturais, além de
questionar sobre casos que geram uma insatisfação social coletiva, concretizando
uma arte manifesto.
Irmãos Staden, por exemplo, é uma obra de Fortunato que consiste em uma
sequência de cartazes em formato lambe-lambe realizada de 2004 a 2011, nos
quais são anunciadas carnes exóticas de diversos animais do açougue dos Irmãos
Staden. Essa arte-manifesto, que aconteceu inicialmente no anonimato, teve o
intuito de, por meio de cartazes publicitários que divulgava a venda de carnes
incomuns ao paladar dos locais, explorar a reação provocativa dos cidadãos
transeuntes.

Figura 4 - Irmãos Staden


17

Fonte: Acervo do artista.

O grafite goiano conta com vários artistas cujos trabalhos dialogam com
diferentes assuntos e recortes temáticos, sempre explorando técnicas e ocasiões.
Como registra Nathália de Freitas (2014), a prática do grafite tem início em Goiânia
logo após o acidente radioativo com o Césio-137, em 1987. Foi com o intuito de
melhorar a autoestima da cidade surgiram grupos de grafiteiros como o Pincel
Atômico, que procurava trabalhar com o bom-humor como forma de expor e lidar a
delicada situação da cidade naquele momento. Além dos grupos que surgiram
espontaneamente, o governo da época, por meio de sua Secretaria de Cultura,
colocou em prática o projeto Galeria Aberta, uma ação de grafite dedicada a
convidar artistas locais para revitalizar o Setor Central, de modo que enriquecessem
a visualidade urbana da cidade ao passo que, como observa Salvio Farias (2005),
apostavam numa temática regional, evidenciando as cores, a fauna e a flora de
Goiás.
Por sua vez, em artistas como Decy e Wes Gama podemos reconhecer tanto
a proposta de uma discussão social quanto de um imaginário racial. Suas obras são
marcadas por grafites de grande escala representando figuras humanas negras,
18

caipiras e indígenas, inspiradas em grande parte por pessoas reais da cidade, de


modo que passam a estimular uma relação de identificação pessoal por parte de
muitas pessoas que se encontram no mesmo contexto racial.

Figura 5 - Grafites de Decy e Wes Gama

Fonte: Acervo dos artistas.

2.2.3 O eixo Centro-Setor Sul

Com suas artes cheias de linguagens e estilos confluentes com a arquitetura


da cidade, os artistas locais Kboco e Santhiago Selon revitalizaram o eixo Centro-
Setor Sul de Goiânia, evidenciando as visualidades urbanas e também investindo
numa perspectiva artística (LOPES, 2014) Produzidos em pontos movimentados da
cidade e combinando pintura e técnica da lata de tinta spray, cinco murais
constituem o Projeto Base Central, que intervém artisticamente no espaço público
da capital. O objetivo do projeto é a renovação e valorização do centro histórico,
oferecendo uma congregação entre as histórias, memórias, gerações e diferentes
formatos de arte, arquitetura, grafite e muralismo. Ao se completarem, essas
diversas formas de expressão criam uma identidade visual para o centro urbano de
Goiânia.
O projeto aconteceu com o intuito de dissociar as artes de seu ciclo privado
e, consequentemente, limitador, ampliando assim a disposição dos manifestos
artísticos pelo país. Outro propósito é o de promover a aproximação entre a cidade
e seus habitantes, intervindo estética e politicamente no lugar comum do espaço
público. Além disso, munido de novas imagens simbólicas territoriais, o projeto visa
enfatizar Goiânia como um bem cultural ao mesmo temo que intensifica o valor do
19

patrimônio histórico brasileiro e, em paralelo, contribui para reconhecer a arte como


poderosa uma ferramenta de transformação social (ibidem).
Kboco nasceu na cidade de Goiânia. Nesse contexto, ainda adolescente,
começou a busca pelo desenvolvimento de sua linguagem artística. Esse processo
teve início nas ruas, com o grafite. Desde o princípio seu trabalho plástico destacou-
se dos demais, inclusive da tradicional arte de rua de Nova Iorque. Com o tempo,
os murais externos ganharam novas dimensões e Kboco levou sua pintura para
outros suportes, como a tela. Kboco tem uma relação íntima com a arquitetura.
Atualmente o artista possui ume estúdio em São Paulo, onde reside. Dedicando-se
ao desenvolvimento de telas e instalações, hoje trabalha com as galerias Choque
Cultural, Marilia Razuk e SIM Galeria (ibidem) Ao apresentar uma exposição de
pinturas contemporâneas na SIM, o curador Felipe Scovino observa que a obra de
Kboco

possui uma ambiguidade perspicaz, porque ao mesmo tempo em que


constrói a cartografia de um mundo imaginário por meio de uma série de
junções de fragmentos, papéis e colagens, esse mapa (que também pode
ser confundido com fachadas ou plantas baixas, deixando clara o diálogo
com a arquitetura) possui referências que se cruzam: desde arabescos a
uma linguagem que possui fortes vínculos com o grafite. 1

Kboco vem atuando por todo o Brasil, onde cria um diálogo entre sua arte e
a arquitetura local. No exterior, o artista possui obras no Chile, criadas durante o
período de dois meses que morou no país, e também exposições que passaram
pela Europa e por outras cidades da América (LOPES, 2014).

2.2.4 Intervenção e manifesto a partir do sujeito

O ser humano é um ser social, sujeito a divergências e mudanças constantes.


Por ser um local de grande influência e destinado a todos, a rua consegue conectar
diferentes ideias, assim como tantas lutas sociais de uma época ou de um indivíduo
qualquer (PROSSER, 2006). Para além de somente um local de transição que nos
permite ir de um ponto a outro, a cidade também pode ser encarada como uma
galeria em processo de ininterrupta metamorfose.

1 Disponível em: <http://simarte.com.br/pt BR/Exposicoes/Exposicao?exposicaoId=29>.


Acesso em: 18 fev. 2020.
20

Enquanto Bauman (2000, p. 21) conclui que “a desintegração social é tanto


uma condição quanto um resultado da nova técnica do poder, que tem como
ferramentas principais o desengajamento e a arte da fuga”, Prosser (2006) comenta
que uma cidade é um local público, porém, devido ao seu valor econômico, pode
segregar. Por outro lado, a arte que a caracteriza pode vir a ressignificar esses
valores.

2.3 MOVIMENTO ART DÉCO NO MUNDO


2.3.1 Belle Époque

Figura 6 – A dança no Moulin Rouge (1889-90), Toulouse-Lautrec

Fonte: site Arte e Artistas.

A Art Déco tem origem em Paris, mais especificamente a partir da chamada


Belle Époque, que durou de 1871 até o começo da Primeira Guerra Mundial, em
1914. A Belle Époque foi permeada por diversos estilos, desde o neobizantino, com
seus mosaicos de vidro, cúpulas opulentes e arte sacra, passando pela Art
Nouveau, até chegar, enfim, à Art Déco, quando passa a adotar o aço inoxidável e
o ferro, além de elementos como grandes espelhos e cores distintas, ou seja, todo
um conjunto de materiais que na época eram tidos como exóticos e traziam o ar de
uma nova era e uma nova visão de mundo (HOBSBAWN, 2012)
21

Durante esse período, tanto a arquitetura quanto a sociedade sofriam


drásticas mudanças no modo de viver nas grandes metrópoles e,
consequentemente, de interagir com a cidade.

2.3.2 Belle Époque no Brasil: ecos de Paris

De acordo com Débora Motta (2019), a França era a representação de um


ideal de modernidade para todo o mundo. No Brasil, a Belle Époque teve início em
1889 com a Proclamação da República, durando até o começo do Modernismo de
1922; teve como ponte Eça de Queiroz, diplomata português que morou na França
e que por meio de seus textos ficcionais e jornalísticos, publicados em revistas e
jornais como o Gazeta de notícias e a Revista moderna, trazia o ar da Cidade Luz
para a nova república brasileira.
Com o início da ascensão das massas e a grande influência europeia,
começou a surgir uma dicotomia entre a cidade velha do Rio de Janeiro, com suas
ruas tortas e estreitas, e o aparecimento de grandes hotéis, teatros cafés, casarões
e largas avenidas da cidade nova.

2.3.3 A Belle Époque e suas dicotomias

Eloísa Pereira Barroso (2012) comenta que esse novo repertório visual
impactou Walter Benjamin, outro importante influenciador de sua época, que adotou
novas formas de percepção estética na modernidade e que tecia crônicas sobre a
arte de perambular com inteligência por ruas e cruzar multidões em busca de uma
nova essência advinda do progresso; esse ritual foi chamado de flâneur. Já pelas
ruas da maior cidade do Brasil à época, João do Rio, um legítimo flâneur, publicou
crônicas e livros, como A alma encantadora das ruas, no qual destacava, logo na
abertura do primeiro parágrafo, o desejo de provocar e de fazer refletir sobre a vida
urbana:

Eu amo a rua. Tudo se transforma, tudo varia o amor, o ódio, o egoísmo.


Hoje é mais amargo o riso, mais dolorosa a ironia. Os séculos passam,
deslizam, levando as coisas fúteis e os acontecimentos notáveis. Só
persiste e fica, legado das gerações cada vez maior, o amor da rua. a rua
é um fator da vida das cidades, a rua tem alma! (1908, p. 1).
22

A Belle Époque brasileira, livro organizado por Luís da Cunha Pinheiro e


Maria Manuel Marques Rodrigues (2012), demonstra que é a partir desse olhar que
João do Rio identifica o brilho e a sombra da modernidade nas cidades durante a
Belle Époque brasileira. Por meio de sua literatura, o escritor dizia, em Psicologia
urbana: “Estamos na era da exasperante ilusão, do artificialismo, do papel pintado,
das casas pintadas, das almas pintadas.”.

2.3.4 Art Déco no mundo

De acordo com Simone Koff Barbosa (2005), o estilo Art Déco surge com o
intuito de evocar modernidade por meio de linhas suaves, dispostas de maneira a
dar foco e ênfase às curvas e suas funções. O estilo adotava a beleza das formas
geométricas limpas e claras, proporções exatas, ritmo, harmonia, cores vibrantes e
o uso de metais e pedras. Em seus grafismos, os principais motivos eram o
feminino, os raios de sol, folhagens, animais, de modo que todos esses elementos
eram dispostos repetidamente, formando um padrão visual.
Essas características são reforçadas pelo professor Khaled M. Dewidar
(2018, p. 08) ao lembrar que “o estilo foi parcialmente inspirado por artefatos
descobertos em 1922 na tumba do rei Tut, e muitos edifícios Art Déco incluem
desenhos repetitivos e cores vivas comuns nas obras de arte egípcias”. Com isso,
percebemos o quanto a herança histórica do estilo Art Déco não se restringe apenas
a uma noção de modernidade europeia, também se revelando devoto a culturas que
à primeira vista poderiam parecer inconciliáveis, como a egípcia.

Figura 7 – Tumba do rei Tut


23

Fonte: site Greenlane.

Figura 8 – Portas ornamentadas em Art Déco e Art Nouveau

Fonte: site Greenlane.

Figura 9 – portas ornamentadas em Art Déco e Nouveau


24

Fonte: site Greenlane.

As formas geométricas aerodinâmicas e a distinta coloração fizeram desse


movimento o mais famoso e influente dos anos 1920 aos anos 1940. A Art Déco
abraçou essas características e inspirou toda uma geração de artistas e,
naturalmente, diversos tipos de artes, desde pequenas joias e artefatos gráficos até
arranha-céus de Nova Iorque. Nesse sentido, Chwast e Heller (1988, p. 160) dizem
que:

A aerodinâmica foi mais do que um estilo americano Moderno, foi a


metáfora de uma nova época. O casamento entre arte, indústria e ciência
estava sendo praticado passionalmente por uma nova legião de designers
gráficos, que utilizaram as noções de movimento e aerodinâmica através
do re-desenho de diversos tipos de máquinas, que apareciam nos
cartazes. Sua relação com o Art Déco estabelecia uma conexão entre o
próprio estilo e a era da velocidade, que neste sentido, proclamava a ideia
de otimismo.

Diferente da Art Nouveau, que possuía formas orgânicas e tinha a natureza


como inspiração, a Art Déco abrangeu artes visuais, arquitetura e design, tendo
início em 1925, na França, na Exposição Internacional de Artes Decorativas e
Industriais. Assim como o movimento anterior, a filosofia base era puramente
decorativa e teve alta adesão por parte de arquitetos e designers do mundo todo
(BARBOSA, 2005).
25

Figura 10 - Théâtre des Champs-Élysées

Fonte: ArchDaily

Entre as grandes estruturas construídas pelo mundo naquela época estão a


Torre Eiffel, que, em ferro forjado e aço, foi a maior delas até o ano de 1930, e o
Théâtre des Champs-Élysées, tido como revolucionário para seu tempo devido ao
seu formato retangular, linhas limpas e formas geométricas distintas do movimento
artístico anterior (ibidem).

2.3.5 Art Déco no Brasil

O Brasil possui algumas cidades influenciadas pela Art Déco, como Cipó -
BA, Iraí – RS, Rio de Janeiro - RJ e, claro, Goiânia – GO, concebida tendo o estilo
como sua principal vertente construtiva. Nasr Fayad Chaul (2009) comenta que,
com o fim da República Velha nos anos 1930, Pedro Ludovico Teixeira deu início
ao plano de mudar a capital do estado de Goiás, plano este que já era esperado por
muitos anos, criando, assim, a marcha para o oeste.
26

Figura 11 – Elevador Lacerda

Fonte: Bahia Turismo.

Segundo o autor, o principal objetivo era o de consolidar populações no


centro do Brasil, seguindo o movimento da marcha para o oeste de Getúlio Vargas.
Para isso, foi preciso uma série de mudanças, desde estradas até a construção de
novas e convidativas cidades.

2.3.6 Art Déco em Goiânia

A década de 1930 foi marcada por renovações culturais e uma série de


mudanças. Getúlio Vargas via como necessidade e estratégia a implementação de
uma nova capital no Centro-Oeste brasileiro. Afinal, ainda por ser explorada, essa
fronteira demonstrava grande potencial econômico para um estado que se
encontrava estagnado e isolado, situação agravada pela crise financeira que a
quebra da bolsa de Nova Iorque havia instaurado no mundo em 1929 (VIEIRA,
2011).
Em 1932, por convite do próprio governador do estado, foi escolhido o
arquiteto da capital: Attilio Corrêa Lima, graduado na França e recém-chegado
27

Europa aceitou o desafio de incorporar os anseios da elite urbana goianiense, que


visava a expansão do mercado, e conectar o estado aos eixos do capital. Attilio
formula o projeto e ajusta ao seu ponto de vista, não surpreendentemente carregado
de influência da Art Déco. Assim, por meio do projeto de uma nova capital, se
buscava organizar e promover um novo desenvolvimento social (ibidem).

Figura 12 - Attilio Corrêa Lima, 1942

Fonte: Biblioteca IBGE.

Mesmo em seu declínio como estilo em Paris, a Art Déco seguia regras de
design que eram firmadas com a finalidade de manter uma unidade e criar uma
nova face para a cidade. Com isso em mente, Attilio Corrêa adaptou seu projeto
para o centro brasileiro, desenvolvendo zonas distintas de moradia, lazer e comércio
buscando, assim, proteger e delegar áreas independentes para melhorar a
qualidade de vida das pessoas e dar-lhes um sentimento de pertencimento. Em
Goiânia, as principais características da Art Déco se concentraram nas cores em
tons pastéis, nas linhas distintas e suntuosas, nos jardins com palmeiras e
gramados, e em grandes vãos apoiados por pilares circulares (ibidem).
Figura 13 – Museu Zoroastro Artiaga
28

Fonte: Viaje na Viagem.

Ainda de acordo com a pesquisa de Patrick Vieira, Attilio Corrêa “considerava


que uma capital necessitava da imponência monumental e, para tanto, lançou mão,
na nova cidade, do expediente formal do patê d’oie nascendo em frente ao palácio
do governo estadual” (ibidem, p. 57-58). Foi movido por essa perspectiva ambiciosa
que o urbanista desenvolveu, além de edificações, o eixo que conectava a Praça
Cívica à estação de ferro, ligada por uma avenida que dispunha de fontes, bancos
e um jardim central, uma grande referência francesa oriunda da Belle Époque e da
experiência flâneur.

Figura 14 – Estação Ferroviária

Fonte: Viaje na Viagem.


Figura 15 – Praça Cívica, 1930
29

Fonte: MIS – Goiás.

Figura 16 – Vitral do Palácio das Esmeraldas

Fonte: site do Governo do Estado de Goiás.

Os famosos elementos que caracterizam a Art Déco pelo mundo foram


também adaptados aos seus respectivos locais. Isso ocorreu tanto pela dificuldade
de adaptação por parte dos construtores, que viam com certo ceticismo os novos
materiais (como o tijolo de vidro), como também para se adequar ao meio em que
estavam sendo implementados, como é o caso dos vitrais do Palácio do Governo,
que contém ornamentos como figuras de índios e bandeirantes (UNES, 2010).
30

2.3.7 O projeto

O projeto consistia em um plano piloto que garantiria o crescimento uniforme


e controlado de novas construções. De acordo com Patrick Vieira (2011), essas
construções asseguravam uma unidade ao projeto, firmando a Art Déco como o
estilo vigente da nova capital.

Figura 17 – Projeto original proposto por Attilio Corrêa Lima

Fonte: Manso, 2001.

No entanto, dividido entre seu trabalho no Rio de Janeiro e a construção da


nova capital, Attilio Corrêa se via cada vez mais distante do projeto e com
dificuldades para manter o cronograma do contrato. Até que, enfim, a prestação de
serviços ao estado viria a ser suspensa, fazendo com que o engenheiro Armando
de Godoy se tornasse o técnico de construção dos irmãos Coimbra Bueno (VIEIRA,
2011).
Com essa mudança, algumas das decisões de Attilio Corrêa foram deixadas
de lado. Se, com o propósito de evitar o crescimento desgovernado, parte do projeto
original do urbanista italiano visava a garantia tanto da integridade estrutural como
também das características Art Déco da capital, seus planos deram lugar aos
31

interesses capitalistas dos irmãos Coimbra Bueno e suas propagandas de


loteamentos por todo o país, o que resultou justamente num crescimento
desenfreado e sem regras (ibidem).

Figura 18 – Ornamento Art Déco em ferro fundido

Fonte: Mais Goiás.

Figura 19 - Ornamento em concreto armado

Fonte: Viaje na Viagem, 2012.


32

Figura 20 – Casa Rosa, Projeto Pigmentos

Fonte: Dia Online.

Figura 21 – Teatro Goiânia, Projeto Pigmentos

Fonte: Dia Online.

Patrick Vieira (ibidem) afirma que essa falta de cuidado acabou com a
diferenciação arquitetônica entre os edifícios institucionais e privados, o que
culminou em um contraste. O autor ainda comenta que se por um lado se via maior
riqueza de ornamentos e composições, por outro, percebia-se apenas uma ou outra
característica Art Déco, com pequenas mudanças para camuflar os telhados
coloniais, deixando a cidade, embora recentemente construída, infelizmente
33

descaracterizada e com poucas obras representantes do estilo artístico. Foi a partir


desse momento que teve início um processo de falta de identidade própria e, em
decorrência disso, uma carência por valorização que permeia até os dias de hoje.

2.4 DESIGN DE SUPERFÍCIE


2.4.1 Princípios do design de superfície

No Brasil, o design de superfície não é muito conhecido. A designer Renata


Rubim ajudou a disseminar o termo pelo meio acadêmico brasileiro. Para designers
gráficos, o termo tem muita relevância, pois sempre estamos evocando essa
vertente, seja em ilustrações, peças gráficas ou desenvolvimento de websites.
Segundo Rubim (2005, p.35), “o design de superfície pode ser representado pelas
mais diversas formas, desde que aceitemos que qualquer superfície pode receber
um projeto”. Sendo assim, precisamos enfatizar a importância de se projetar uma
ilustração ou uma padronagem, que existem para além de formas, linhas e cores
(ibidem).

2.4.2 O design gráfico no design de superfície

Ainda de acordo Rubim (ibidem), e colocando de maneira sucinta, o design


gráfico parte do pressuposto de que organiza informações a fim de criar uma
conexão com quem lida com esses dados. O design de superfície pode ser
entendido como uma técnica que exige prática e disciplina, de modo que o resultado
venha a ser singular e criativo. A prática de aplicar padrões estéticos em uma
determinada superfície possui o intuito de valorizar, passar uma mensagem ou de
ornamentar, sempre com algum embasamento prévio.

2.4.3 Design de superfície como ferramenta projetual

Notamos que o design de superfície possui grande potencial como meio de


atuação na valorização de um determinado local. Por meio de grafismos e
padronagens, previamente embasados no design, conseguimos ressignificar e
enfatizar esse local, buscando, em consequência, maneiras de popularizá-lo. Como
ferramenta de projeto, o design de superfície ajuda a complementar ou até mesmo
34

a substituir a comunicação verbal; afinal, se bem produzido, é capaz de passar


informações imageticamente (ROSA, 2017).
Por sua vez, o módulo é uma unidade projetada para ser combinada ou
ajustada com outras unidades. Assim, os modelos de repetição a partir de um
módulo de determinada natureza simétrica geram variadas posições visuais.
Segundo Rosa (ibidem), um valor é inevitavelmente agregado ao produto que
apresenta uma representação gráfica, atraindo o consumidor e despertando
esteticamente uma carga afetiva de acordo com as cores, formas e material definido
no processo final do projeto da elaboração de uma determinada superfície.

2.4.4 Valorização territorial por meio do design

A valorização territorial busca contribuir com a comunidade, tendo como


objetivo retomar a memória de um lugar ou de um produto. Procura resgatar suas
origens e demonstrar o que as diferencia dos demais locais, fazendo uma conexão
direta com quem consome a informação. Em meio à globalização, é imprescindível
o uso de estratégias que entendam o modo de vida e o contexto nos quais o sujeito
esta inserido. Em Design e território, Lia Krucken diz:

Ao adquirir produtos de forma consciente, o consumidor desempenha


papel fundamental na valorização e na preservação dessas dimensões de
qualidade. O produto deve ser visto, portanto, como uma construção
coletiva ao longo da produção e distribuição, conectando produtores e
consumidores. (2009, p. 30).

Com base nessa conclusão, pode-se dizer, portanto, que o valor agregado
ao produto, quando desenvolvido no seu contexto social, ganha importância entre
a população do local, uma vez que passa a criar uma conexão entre o objeto
produzido, o contexto e o sujeito.
35

3 ESCOLHAS METODOLÓGICAS
3.1 METODOLOGIA CIENTÍFICA

Por ter como resultado a execução de um projeto, este trabalho, segundo as


nomenclaturas de Lakatos e Marconi (2003), pode ser classificado como uma
pesquisa projetual, de modo que, ao utilizar os conhecimentos de forma prática,
também se enquadra como uma pesquisa aplicada.
A fundamentação foi constituída a partir de uma pesquisa teórica. De base
descritiva, este trabalho também se dedicou a descrever as etapas de produção tal
qual o seu desenvolvimento. Com relação ao método de abordagem, foi utilizado o
método dedutivo, de modo que a pesquisa se estrutura a partir de um contexto geral
(dos conhecimentos da área de estudo), para então aplicar esses conhecimentos a
um projeto específico e, por fim, obter uma conclusão particular. Já como método
de procedimento, foi utilizado o método estruturalista, buscando gerar, a partir das
informações e dados obtidos durante todo o processo da pesquisa, a estruturação
de um modelo ou protótipo.
Na fase de documentação, a coleta de dados envolveu pesquisa bibliográfica
com acesso a livros, teses, dissertações, artigos, matérias jornalísticas, websites,
entre outros. Também foram realizadas visitas ao centro de Goiânia, isto é, pesquisa
de campo, local, com o objetivo de adquirir informações por meio de observações e
fotografias. Foi elaborado, ainda, um questionário para averiguar e mensurar os
hábitos e as opiniões de parte da população-alvo. Por fim, para conceituar o
trabalho, utilizamos recursos metodológicos do projeto de design de superfície.
As abordagens metodológicas clássicas se adaptam cada vez mais à
necessidade de inclusão social nos processos dos projetos de design e com isso,
passam a abordar novos métodos. Para Bonsiepe (2012), ao encarar o design como
uma atividade artística, é importante olhar para as metodologias alternativas, pois
projeto é diferente de ciência – portanto, quando nos limitamos apenas a
metodologias clássicas, chegamos a uma formalidade científica que não condiz com
a produção do design, justamente por não ser uma atividade científica. Ao propor
uma melhor experiência do usuário por meio de novas formas de se fazer design,
resgatando identidades locais e observações de suas próprias vivências cotidianas,
chegamos a um ponto que indica o usuário como coautor desse processo, ou seja,
para conseguir atender os caminhos desse processo é necessário ouvir, interpretar,
36

ver, observar, descobrir, aproximar, estar junto e apreciar, conseguindo, deste


modo, acesso a experiências que a sociedade vive. Só então poderemos
compreender mensagens não verbalizadas, como olhares e as interações com as
edificações em Art Déco e suas artes urbanas que constituem a cidade de Goiânia.
Portanto, como uma pesquisa exploratória, pode ser classificada com base na sua
natureza e no caráter de seus obejtivos, pois busca proporcionar maior relação com
o objeto de estudo, tornando-o mais explicíto (GIL, 1996).
Com esse tema, pretende-se abordar questões socioculturais no contexto
regional no qual o design atua, visando obter resultados de valorização histórica do
espaço urbano, da cidade de Goiânia. Também será estudada a influência do
consumo na sociedade considerando sua inserção num contexto local específico,
atendendo assim as necessidades de preservação das memórias culturais e visuais
que representam a cidade e as pessoas que a constituem como um sistema em si.
Na busca por expressar por meio de padronagens, cores e formas urbanas locais,
e lançando mão da fotografia como pesquisa visual, o design de superfície foi usado
como um instrumento de identificação própria que seja capaz de explorar a
variedade de aplicações em uma superfície têxtil, mobiliária e de diversos materiais.
Temos como objetivo valorizar a cultura local e reconectar a população com
a cidade na qual vivem, buscando, para isso, as características de consumo na
sociedade e expressar, por meio do design de superfície, as formas e cores dos
lugares que hoje passam despercebidos. Desse modo, pretendemos fomentar a
cultura goiana e experimentar padronagens na arte urbana e na Art Déco,
estimulando o olhar da sociedade para que esta possa enaltecer e valorizar a
arquitetura e a cultura de rua em Goiânia.
Por abordar um objeto específico e fazer uma observação significativa a
respeito do campo social ao qual esse objeto pertence, a presente pesquisa também
pode ser classificada como um estudo de caso. Como ferramentas para a aplicação
do método de pesquisa, optamos pela realização de questionários, que por sua vez
fornecerão dados empíricos. Por meio desse levantamento inicial será possível
analisar a realidade atual do local e interpretá-la para a realização de entrevistas
semiestruturadas. Não menos importante, as fotografias cumprirão o papel de
registro dos espaços urbanos, mais especificamente aqueles voltados para o
exercício do olhar artístico de edificações Art Déco, além de murais e grafites, que
37

serão transmitidos como ideias gráficas e desenhos referentes ao projeto em


desenvolvimento.

3.2 METODOLOGIA PROJETUAL

Compreender a função da metodologia de design é fundamental para a


escolha de ferramentas e técnicas que cooperem com o processo criativo
necessário para chegar a resultados seguros e que atendam aos objetivos do
projeto.
Segundo Pazmino (2013), a metodologia do design funciona como uma
ciência que explora os métodos, podendo ser estes aplicados ao desenvolvimento
de produtos ou serviços. Por meio do conhecimento dos métodos, que se adaptam
à natureza do projeto, é preciso definir qual método atende às particularidades da
pesquisa.
As metodologias do design abordam questões que se adaptam a realidades
sociais atuais. Isso é feito, vale observar, sem se distanciar dos estudos clássicos,
que inclusive flexibilizam os métodos baseados em teórica empírica, possibilitando
o desenvolvimento de produtos e serviços que atendem às necessidades da
sociedade de acordo com sua localidade, que por sua vez indica o cenário cultural
e social no qual os indivíduos estão inseridos. Victor e Sylvia Margolin (2004)
discutem como o modelo de design é voltado para o mercado e em como há uma
necessidade de pensar o design por uma perspectiva social. Para isso, seria preciso
dialogar com diferentes áreas de conhecimento que possam auxiliar os projetos de
design nesse sentido, tornando-os mais inclusivos. Algumas dessas áreas são a
sociologia e a história, que complementam esta pesquisa tanto em parte do
referencial teórico, nos fazendo entender como Goiânia se tornou referência na
arquitetura Art Déco, quanto no sentido mais prático, pelo qual chegamos às
relações e interações sociopolíticas entre os cidadãos e o cenário gráfico urbano,
com suas particularidades artísticas e visuais.
Os trabalhos dos artistas mencionados nos inspiraram a utilizar técnicas do
design de superfície a fim de buscar a valorização da Art Déco e da cultura urbana
presente no centro da cidade. Estudos de Neves, Rüthschilling e Schwartz (2008)
foram utilizados como base para nosso processo de desenvolvimento metodológico
projetual, no qual técnicas de criação de padronagens se mostraram úteis para
38

desenvolvermos módulos que surgiram a partir de estudos de caso e processos


manuais.

4 TRABALHO DE CAMPO
4.1 ESTUDO DE CASO: A CASA ROSA

Figura 22 – Casa Rosa, Projeto Base Central

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Com o objetivo de responder às questões referentes à presença do grafite e


do muralismo na arte urbana goiana e também da arquitetura Art Déco encontrada
na cidade de Goiânia. Foi analisado um local de estudo que abrange ambos os
temas apresentados na pesquisa, reforçando, assim, como a arte urbana pode
revitalizar a Art Déco, cada dia mais degradada.
Buscamos entender como o fenômeno de ocupação dos espaços estudados
ocorreu por meio das intervenções artísticas. Para isso, além de escrever sobre o
Projeto Base Central que resultou na revitalização da casa rosa localizada na Rua
10 do Setor Central, procuramos compreender a relação entre esse fenômeno e o
objeto do estudo de caso. Ao dispor da coleta de dados a partir das entrevistas
39

realizadas com os artistas urbanos, foi possível analisar as possíveis razões que
levaram os sujeitos a intervirem nesse local patrimonial. Levantamos quatro
hipóteses para explicar a ocorrência desses fenômenos:
a) No sentido da teoria de produção do espaço de Henri Lefebvre (2009), os
responsáveis pelo início da ocupação do local buscavam modificá-lo e renová-lo por
meio da instauração de intervenções artísticas no espaço urbano, na tentativa de
se aproximarem do território do qual são nativos, já foram residentes e no qual
desenvolveram sua linguagem artística visual;
b) Os interventores realizaram processos de formas, escalas e cores
atribuídas ao método de visualização e observação arquitetônica, resultando em
uma harmonia do mural pintado e grafitado com o estilo Art Déco da edificação do
local;
c) Os artistas buscavam um processo próximo à institucionalização de um
espaço de instauração de obras de grafite e arte urbana, na expectativa de atingir
uma quantidade maior de pessoas e um público transeunte que permeia
cotidianamente a cidade em questão;
d) Com financiamento do Fundo de Arte e Cultura local e com a pretensão
de se tornar um fenômeno anual, os artistas visavam expandir seus projetos visuais
sem se preocupar com a maneira como estes seriam recebidos pela população
(FERREIRA, 2019).

4.2 ENTREVISTA

A partir do estudo de caso realizado para integrar nossa pesquisa a um


fenômeno real e particular da de Goiânia, percebemos a necessidade de elaborar
uma entrevista em nosso trabalho de campo de forma que esclarecesse como os
artistas Selon e Kboco percebem o papel de seus trabalhos na revitalização da casa
rosa.Estruturada em oito questões subjetivas, a entrevista explora desde a intenção
dos artistas até o modo como enxergam a relação da sociedade com suas criações
e com a arte urbana em geral.

4.2.1 Análise da entrevista


40

Com as informações adquiridas pela entrevista com os referidos artistas,


percebemos que existe um paradigma ainda muito estipulado entre o sujeito
intervencionista e o sujeito observador dentro do espaço urbano. Uma das questões
abordadas durante o contato dos artistas com o organismo urbano foi a distinção
entre as classes sociais. Por estar exposto na rua durante os processos de grafitar
e pintar um muro, os artistas identificam um distanciamento de determinadas
classes sociais e uma aproximação de outras. É como se as classes média e alta
não vissem a atuação do artista urbano como um método de exploração e cocriação
que atribuísse valores culturais ao espaço urbano e, em vez disso, passassem a
interpretar esse ato como uma marginalização, a ponto de conceitualmente
aproximar os artistas a criminosos que estariam subutilizando os murais grafitados
como uma forma de agredir o espaço público.
Por sua vez, para as classes baixas a realização de murais e grafites estão
mais próximas de suas realidades, até porque muitos trabalhos de arte urbana se
manifestam pela representação de figuras humanas negras inspiradas nos próprios
cidadãos, como é o caso do grafiteiro Decy, em Goiânia. Para essa classe social, a
utilização do espaço urbano para aplicações artísticas se torna um fenômeno
correspondente a um adornamento e encantamento da cidade. Segundo o
entrevistado, seu contato com cidadãos que também utilizam a rua como local de
trabalho sempre rendeu elogios e agradecimentos por alegrar com cores e formas
o dia a dia dessas pessoas, um cotidiano difícil e que muitas vezes pode limitar a
observação de uma obra artística e o tempo necessário para se refletir sobre elas.
Automóveis e transeuntes também foram significativos para entender como o artista
posiciona sua arte no espaço público e no espaço privado. Afinal, há muitas pessoas
que não tem contato com galerias de arte e que entendem a cidade como uma
grande exposição aberta, de modo que parte daí a necessidade de realizar cada
vez mais a arte urbana.
No decorrer de suas trajetórias profissionais, é comum que muitos artistas
urbanos transitem entre o espaço público e o espaço privado. É o caso dos artistas
entrevistados, que, após um tempo ampliando suas linguagens visuais nas ruas,
passaram a incluir suas obras em galerias de arte e em projetos de design de
interiores, participando assim de uma forma muito distante do espaço urbano. Ao
discorrer sobre isso, entendemos a posição da arte urbana tanto dentro quanto fora
de seu contexto, ou seja, ao grafitar e pintar um muro em um casa com projeto
41

arquitetônico que inclua um mural de gosto influenciado pelo cliente final, gera-se
uma reflexão muito apropriada quando a arte urbana não está inserida na cidade,
na rua, para que os transeuntes observem e apreciem. O espaço privado limita e
monetiza os processos do grafite e do muralismo, mas a partir do momento que se
diferencia o público do privado, compreendendo e assumindo que seus respectivos
trabalhos artísticos foram desenvolvidos ocorreu nas ruas, essa relação entre os
dois espaços distintos torna-se menos distante e passa a complementar a intenção
do artista de levar sua arte para diversos âmbitos, reconhecendo, assim, várias
formas de ampliar e comunicar seus trabalhos.
Com o Projeto Base Central, os artistas entrevistados intervêm no eixo
Centro-Setor Sul de Goiânia de forma que dialogam com a arquitetura da cidade,
com os elementos Art Déco de maneira alguma passando despercebidos. Desse
modo, a influência de uma linguagem tridimensional conceitua o trabalho de Selon,
cuja arte representa bidimensionalmente essa linguagem visual arquitetônica, e
também amplifica as dimensões do trabalho de Kboco, que, por sua vez,
desconstrói as formas da visualidade urbana que harmonizam com elementos
ocasionais da cidade. Uma vez esclarecido o processo criativo de desconstrução
das formas e da resolução de padrões visuais de acordo com os elementos visuais
encontrados na cidade, consideramos, para nosso produto final, a utilização desses
métodos construtivos e artísticos, atribuindo, por fim, valores locais e visuais.

4.3 QUESTIONÁRIO

Nossa enquete foi motivada pelo fato de que precisamos voltar o olhar para
o centro. Com isso em mente, desenvolvemos perguntas a fim de compreender
algumas das principais características que resultam na evasão de uma parcela da
sociedade do centro de Goiânia.
Nos dias atuais, as metrópoles brasileiras já não são (se é que já foram)
capazes de esconder o que têm de desigualdade e segregação, oriundas de muitos
anos de descasos e atritos entre classes, que, como consequência, veem definhar
as características que as tornam singulares e distintas umas das outras.
Decadências assim não acontecem repentinamente, são frutos de muitos anos de
descaso político e social (VIEIRA, 2012).
42

Uma metrópole é singular devido às particularidades de seu centro. pois é o


que nos dá sentido de pertencimento e é o que permeia o imaginário coletivo.
Entretanto, ao ceder à criminalidade e à ausência de motivos sólidos, faz com que
uma parcela da sociedade não desfrute de um caminhar por suas ruas e avenidas,
trocando o centro por idas a shoppings centers carentes de personalidade e que
acabam por descaracterizar ainda mais uma cidade. De acordo com Wolney Unes
(2010, p.33), “os shopping centers, tão iguais entre si, oferecem as mesmas lojas,
as mesmas marcas, que dentro de qualquer deles poderia ocorrer o extremo de não
sabermos se estamos em Hong Kong, Amsterdã ou no Rio”.
Se por um lado notamos que o centro já é assiduamente frequentado por
uma parcela da sociedade, vaie, em contrapartida, raramente visitado por outra
parte da população, criando, assim, alienação e dicotomia social, isto é, um
distanciamento capaz de gerar vários contrastes sociais e diversos outros
problemas, como a falta de empatia para com o outro e seu entorno.
Foi realizada uma pesquisa com pessoas de classe média economicamente
ativas, de diferentes cores e sexos, a fim de coletar informações sobre suas
percepções e anseios. Nesse recorte, 78% foram representados por jovens de 21 a
35 anos e que estão ativos social e economicamente.

Figura 23 - Gráfico de faixa etária

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

58,3% são do sexo feminino e 41,7%, do sexo masculino.

Figura 24 – Gráfico de identificação sexual


43

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

50% se consideram brancos, 36% se consideram pardos, 8% se consideram


amarelas, e 6% se consideram negros. Não houve indígenas identificados pela
pesquisa.

Figura 25 – Gráfico de identificação de cor/etnia

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Quando questionados se identificavam os monumentos Art Déco, 87,5%


disseram que sim, enquanto 12,5% disseram que não. Os resultados dessa amostra
nos levam a concluir que a Art Déco é reconhecida e apreciada por quem visita o
Setor Central de Goiânia.
44

Figura 26 – Gráfico de identificação com a Art Déco

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Quando questionados sobre os motivos para ir ao centro, 74% responderam


ser por alguma necessidade pessoal, enquanto 26% disseram ser por demanda de
trabalho. A partir desses dados, entendemos que se tivessem mais motivos, a
maioria iria por vontade própria.

Figura 27 – Gráfico de motivação para ir ao Centro

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Quando questionados sobre a frequência com que se deslocam ao centro,


70% disseram ir raramente ao centro, 20% responderam ir ao centro uma vez por
semana, 8% disseram ir pelo menos três por semana , e 2% disseram ir duas vezes
por semana. Os dados demonstram que a maior parte das pessoas não possuem
tantos motivos para frequentá-lo.
45

Figura 28 – Gráfico de deslocamento ao Centro

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Quando questionados sobre o meio de transporte utilizado, 62% disseram


utilizar carro próprio, 16% disseram se locomover por meio de aplicativos de
transporte, 14% disseram ir de ônibus, 6% disseram ir a pé, e 2% disseram ir de
bicicleta. Ou seja, considerando nosso argumento de que os carros contribuem para
o distanciamento entre as classes sociais e a consequência mudança de
perspectiva em relação ao ambiente, a maior parte das pessoas que frequentam o
Setor Central de Goiânia, de acordo com a amostragem, estão mais sujeitos a uma
alienação na sua relação com o local e também com as pessoas que o habitam.

Figura 29 – Gráfico de meio de transporte utilizado

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.


46

Quando questionados sobre se sentirem seguros ao caminhar pelo centro,


87,8% disseram não se sentir seguros, enquanto 12,2% responderam que se
sentem seguros. Concluímos que a falta de segurança é um fator relevante para
que as pessoas deixem de apreciar a cidade a pé, colaborando para que prefiram
se deslocar por meio de veículos, o que, reforçado pelos dados da questão anterior,
colabora para uma crescente alienação social e espacial.

Figura 30 – Gráfico de segurança

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Quando questionados se costumam reparar na paisagem em seu entorno,


84% responderam que sim, enquanto 16% disseram que não. Concluímos, com
isso, que a maior parte da população repara na paisagem que a cerca, mas, por
falta de segurança e motivação, não é incentivada a apreciá-la tanto quanto poderia.

Figura 31 – Gráfico de percepção visual

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

96% responderam que se sentem impactados por obras arquitetônicas ou de


arte urbana, 4% disseram que não se sentem impactados por nenhuma obra. A
47

grande diferença de porcentagem explicita o quão importante é a necessidade de


voltar a dar atenção ao centro e a seus grafismos.

Figura 32 – Gráfico de impacto da arquitetura Art Déco e da arte urbana

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Questionados se gostariam de ter mais alternativas de entretenimento no


centro, 98% responderam que sim, enquanto 2% disseram que não, o que
demonstra o anseio por novos motivos para frequentar a região central de Goiânia.

Figura 33 – Gráfico de alternativas de entretenimento

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Questionados se visitariam o centro mais frequentemente caso se sentissem


mais seguros na região, 100% dos entrevistados responderam que sim. Havendo
mais motivos para frequentar o centro e com a garantia de sensação de segurança,
todos responderam que não teriam problemas em ir ao centro, o que demonstra um
importante fator a ser resolvido por parte das políticas públicas. Desse modo, a
presença de pessoas mal intencionadas seria reduzida e uma das consequências
seria a abertura de mais oportunidades para que a arte urbana se manifestasse.
48

Figura 34 – Gráfico de frequência de visita e segurança

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Quando questionados se identificavam a presença do grafite no centro da


cidade, 94% responderam que sim, enquanto 6% responderam que não. A
amostragem demonstra que o grafite é um evidente meio de comunicação e
ornamentação para aqueles que passam pelo centro.

Figura 35 – Gráfico de identificação com grafite e Art Déco

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

4.3.1 Análise do questionário

Concluímos que o recorte populacional estudado anseia por novas opções


de lazer e também por segurança pública na região central da cidade. A partir
49

dessas informações, ainda inferimos que um projeto que vise dar chamar atenção
para o centro seria algo capaz de melhorar a visibilidade dessa área tão importante
para a cultura e vida em sociedade.

5 PROCESSO DE CRIAÇÃO
5.1 PESQUISA VISUAL DE BASE

A pesquisa visual a partir de fotografias e imagens encontradas em meios


digitais realizada pelos autores lhe permitiu ocupar o espaço urbano tanto quanto
seus observadores. Portanto, a visita ao local de trabalho de campo foi essencial
para que esses registros definissem, a partir do ponto de vista dos autores, como
se comportam as visualidades urbanas por meio de imagens construídas e
percebidas no próprio local.
Os painéis semânticos também foram de grande apoio para concretizar uma
relação entre as produções artísticas, os artistas urbanos entrevistados e a
arquitetura goiana - sobretudo as construções adeptas do estilo Art Déco, uma
arquitetura que, apesar de não constituir intencionalmente a linguagem visual dos
artistas, os próprios admitem que a formação de suas linguagens urbanas é indireta
e inevitavelmente influenciada pela realidade local na qual se formaram como
artistas e interventores na paisagem de Goiânia. Isso expressa ainda mais a
influência das visualidades urbanas territoriais como precursora de histórias e
informações na educação visual de seus cidadãos.

5.1.1 Elementos visuais urbanos através da fotografia

As fotografias da arquitetura e dos elementos inseridos na paisagem urbana


carregam riqueza nos detalhes e exploram as edificações de diversos ângulos,
possibilitando que o observador perceba, por meio de vários pontos de vista –
superiores inferiores laterais –, a amplitude de detalhes que contidos no estilo Art
Déco, assim como quantas formas geométricas são transformadas por meio da
tridimensionalidade da arquitetura.

Figura 36 - Arquitetura Art Déco em Goiânia


50

Montagem: Autores.

A partir do trabalho de campo, foi realizado um estudo fotográfico por meio


do qual foram retratadas as visualidades urbanas que atravessam o estilo Art Déco
da cidade, assim como a arte urbana e o mobiliário urbano em seus mais
significativos detalhes e amplitudes. Ao visitar o local, também percebemos como
são observados esses fenômenos da cidade, esse conjunto de elementos a partir
dos cidadãos que se movem pelas ruas, seja de carro, bicicleta, transporte público
ou caminhando, mas, de todo modo, participando do cenário público urbano.

Figura 37 - Registros fotográficos de trabalho de campo


51

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Junior.


52

5.1.2 Painéis semânticos

Figura 38 - Painel semântico de Selon

Fonte: Acervo do artista.

Visualidades tridimensionais de formas arquitetônicas estão presentes na


arte geométrica e moderna de Selon, representadas, em algumas obras, por cores
identificadas na Art Déco. A partir do ponto de vista do observador de edificações
de grande escala, o artista busca a perspectiva dos ângulos inferiores, pela qual
propõe um crescimento da forma. As cores fogem do padrão da paleta Art Déco,
como é o caso da cor rosa.
53

Figura 39 - Painel semântico de Kboco

Fonte: Acervo do artista.

A arte ornamental, geométrica, é constituída por uma confluência de linhas e


formas circulares de diferentes tamanhos, que se tornam, repetitivamente, uma
espécie de padronagem, refletida e aplicada a partir de técnicas do grafite e do
muralismo e misturando os efeitos da lata spray com o pincel e a tinta. Nas obras
de Kboco, as cores vão desde tons pastéis, do lilás e do azul, a cores mais terrosas,
sóbrias e até mesmo acinzentadas.
54

Figura 40 - Painel semântico do Projeto Base Central

Fonte: Iago Mati.

Durante o Projeto Base Central foi documentado pelo fotógrafo e diretor de


cinema Iago Mati a produção dos sete murais produzidos pelos artistas participantes
do projeto. O material foi exposto em conteúdos digitais que exploram desde as
ferramentas e os sketches realizados no momento da intervenção artística, até a
relação do público observador com os murais grafitados e pintados.
Além das fotografias, Mati produziu um documentário em curta-metragem
que chegou a ser exibido em Los Angeles durante o Hollywood Brazilian Film
Festival. O filme registra os processos criativos dos artistas e suas relações afetivas
e conterrâneas com a região central da cidade a partir de suas visões arquitetônicas.
O documentário de Mati foi de grande auxílio para melhor compreender como esses
artistas entendem a cidade e suas visualidades urbanas, e de que maneira
imprimem os elementos visuais apresentados nessas visualidades, proporcionando
um diálogo com o cenário urbano por meio de murais de grande escala.

Figura 41 - Pesquisa de elementos visuais


55

Fonte: Pinterest.

A partir desses elementos visuais urbanos chegamos à concepção visual de


formas contínuas, destacadas no design de superfície, e como esses elementos,
em sua composição visual, podem gerar, em conjunto ou isoladamente, uma
padronagem. A pesquisa visual de referências que delimitam uma relação entre o
modernismo e a arte de Selon e Kboco resultou num painel em que são percebidos
vários estilos e técnicas de composição de formas, seja em um desenho
bidimensional ou em suas repetições de módulos.

5.1.3 Análise de similares

Durante o projeto, foi realizada a pesquisa de trabalhos de design de


superfície, em que foram desenvolvidos padronagens e uma coleção desses
elementos visuais. Percebemos como similares projetos que visam transformar em
um design de superfície os elementos iconográficos e simbólicos que transmitam a
estética de um espaço urbano. Foram filtrados quatro projetos que auxiliaram no
entendimento da importância do trabalho final.
56

a) Estampas potiguares.

Figura 42 - Estampas Sol, Dunas e Forte dos Reis do Magos

Fonte: Beatriz Lima da Cruz.

O projeto de Beatriz Lima da Cruz apresenta o design de superfície aplicado


ao design territorial, propondo uma relação entre a criação de estampas e a
identidade do território, inspirando-se nos elementos visuais característicos da
cidade de Natal - RN. Ao entender os elementos e técnicas utilizados na criação de
estampas, desenvolvem-se composições de padrões com os elementos criados e,
consequentemente, aplicações dessas padronagens. O trabalho disserta sobre de
que maneira o design territorial pode ser utilizado como ferramenta de valorização
de uma região e como se reconhece a identidade de um território, além de relatar o
processo de criação das estampas, passando pelas etapas de desenvolvimento,
experimentação e aplicação técnicas de serigrafia e estêncil, e, por fim,
apresentando os resultados de suas aplicações na reprodução de padrões
contínuos. As aplicações foram feitas desde o papel até o tecido.

b) Criação de linha de estampas.

Figura 43 - Linha Pôr do Sol, Linha Metrópoles e Linha Verde

Fonte: Nathalia Gil Testa.

Nathalia Gil Testa se baseou no design de superfície para seu projeto de


criação de uma identidade visual para Porto Alegre. Valorizando os elementos da
cidade, criou estampas a partir do estudo da região., Testa desenvolveu três linhas
de estampas, que foram posteriormente aplicadas em canecas e capas de cadernos
com o intuito de valorizar os pontos de relevância de sua cidade.
57

c) ladrilho hidráulico: a valorização do território através do design de


superfície.

Figura 44 - Figuras rupestres, módulos, ladrilhos hidráulicos

Fonte: Medeiros, A.T. 2015.

Arthur Thiago Medeiros e Alícia Afonso Grace Sampaio desenvolveram um


trabalho pelo qual criaram ladrilhos hidráulicos a partir de símbolos rupestres a fim
de resgatar, valorizar e proteger a história do local arqueológico. Os designers
vetorizaram as formas e, em seguida as padronizaram, o que resultou em uma
coleção única e com um bom método de pesquisa.

d) Coleção Brasiliana.

Figura 45 - Linha Modernista, Colonial e Tribal

Fonte: Renata Rubim.

Em 2015, a designer Renata Rubim lançou uma coleção de revestimentos


tridimensionais inspirada na história do Brasil, na qual foram desenvolvidas três
linhas: Tribal, Colonial e Modernista. A coleção retrata as formas mais imponentes
de suas referências conceituais visuais, como os azulejos portugueses na linha
58

colonial, os grafismos indígenas na linha tribal e o concretismo e construtivismo de


Athos Bulcão, em módulos que expressam desenhos tridimensionais em
revestimentos, formando um design de superfície com uma padronagem contínua
por meio de sistemas alinhados e não alinhados que proporcionam, ao consumidor
final, diversas paginações em um espaço arquitetônico. Além de ser um produto de
design especifico para uso arquitetônico, a designer propõe, a partir de espaços
atemporais, uma linhagem histórica de uma visão contemporânea.

5.1.4 Módulos

A construção do módulo e a constante prática de se fazer testes são


primordiais para o desenvolvimento de padronagens, uma vez que possibilitam a
diversidade de resultados mais personalizados. Para a definição do módulo, faz-se
necessário a estruturação do projeto do design de superfície por meio de pesquisas
que vão desde referências visuais até seu formato geométrico bidimensional ou
tridimensional (SCHWARTZ, 2008).
Ao analisar os dados coletados, identificamos alguns pontos de inspiração
entre estes dois tipos de movimentos tão opostos, a arquitetura e o grafite. A
arquitetura Art Déco é ornamental e constituída por formas geométricas
tridimensionais, como linhas e curvas opulentes (BARBOSA, 2005). Por sua vez, o
grafite que adotamos como objeto de estudo é constituído por diversos elementos
também geométricos, de formas bidimensionais, porém muito mais acessível
(LOPES, 2014). Sendo assim, começamos a idealizar como seria a aplicação do
módulo, seja parcial ou total, local ou global, com ou sem repetições, e prevendo os
encaixes. Como lembra Schwartz (2008, p. 56),

Preocupar-se com os sistemas de repetição e tais encaixes pode parecer


à primeira vista limitantes à criação. No entanto, se eles forem previstos
desde o início do processo que define o Módulo a ser utilizado, podem
possibilitar soluções plásticas mais interessantes.

Sendo assim, ao utilizar o sistema de repetições dos módulos, quando há


intervalos regulares por fim resultam em um padrão (ibidem).

Figura 46 - Formas de aplicação de um módulo


59

Adaptação autoral a partir de Schwartz, 2008.

Figura 47 - Unidade compositiva

Adaptação autoral a partir de Schwartz, 2008.

Ao analisarmos um módulo quadrado, para compor seu conjunto minímo são


necessários quatro módulos para elaborar uma unidade compositiva.
Consideramos ainda que existem distintas formas de encaixe e de simetria para a
criação de padrões, que são justamente comportados por diversos módulos.
Denominamos essa composição com uma repetição modular de multimódulos, que
consiste em um sistema agrupado de sistemas menores (ibidem).

Figura 48 – Multimódulo
60

Adaptação autoral a partir de Schwartz, 2008.

Quanto mais próximo das bordas laterais do modulo, maior é a relação que
se forma entre eles, fazendo com que os módulos se conectem e formem padrões
visuais geométricos e que nos passe a impressão de continuidade (ibidem).
Comunicar, por meio de um módulo, formas encontradas nas visualidades urbanas,
como os módulos geométricos de artistas locais ou de grades de edificações e
mobiliário no estilo arquitetônico Art Déco, foi essencial para a criação de
padronagens que visam difundir a arte de rua e chamar a atenção aos pequenos
detalhes encontrados nas visualidades urbanas; O módulo, um elemento estrutural
em forma de unidade, compõe uma criação de padrão contínuo e marcante
(RÜTHSCHILLING, 2002).
O módulo foi projetado a partir de uma pesquisa sobre as formas e
ornamentos da Art Déco e dos padrões visuais dos artistas locais, de modo que
possamos difundir e enaltecer a arte inspirada pelas ruas e seus pequenos detalhes,
que fazem toda diferença. Ao caminhar pelas ruas do centro da cidade identificamos
formas ornamentais e, a partir de um estudo com fotos, encontramos um detalhe
que passa despercebido e que possui uma beleza única na sua forma. A seguir,
demonstramos o processo percorrido para alcançar um de nossos módulos:

Figura 49 - Estudo de elementos do relógio Déco


61

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

O relógio possui um ornamento em ferro fundido, muito peculiar, e que, em


meio ao caos da cidade, quase não é notado. A partir de desenhos e estudos,
identificamos um padrão vertical com formas circulares e que representa, de
maneira simplificada, a Art Déco. Já a partir da malha milimetrada, dividimos em um
modulo que possui 4/6 na sua proporção. A malha nos auxiliou no momento de
construir o módulo no computador, uma vez que apenas seguimos as proporções
exatas do papel milimetrado.

Figura 50 - Construção do modulo digital


62

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Figura 51 - Módulo digitalizado

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

O resultado foi um modulo que possui uma forma bem ornamentada e que
nos remete ao estilo Art Déco, podendo ter ou não ter encaixe.
63

Por sua vez, com o Projeto Base Central, a Casa Rosa foi a nossa maior
fonte de pesquisa, pois une a Art Déco e o grafite de maneira harmônica e orgânica,
de forma que uma complementa a outra. O grafite, no caso, foi nossa maior fonte
de inspiração.

Figura 52 - Estudo de processo de desenvolvimento

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Figura 53 - Malha construtiva digitalizada

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.


64

Figura 54 - Módulo base digitalizado

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

A partir dessas formas e dos testes iniciais, seguimos com o processo de


criação, pois assim atingiríamos harmonia, chamando a atenção de quem passa por
elas (SCHWARTZ, 2008).

5.1.5 Encaixes

Utilizando como base os estudos de Ada Schwartz (2008), procuramos atingir


uma padronagem harmônica e que fosse agradável, atraente, que possuísse fluidez
e que marcasse de alguma forma quem passasse por elas. Essa sincronia só seria
alcançada a partir de testes e de uma análise detalhada dos encaixes entre
módulos.
Abaixo, podemos ver algumas imagens e composições visuais. Os módulos
quadriculares exemplificam o processo de testes e de composição de encaixes,
assim como a disposição dos elementos, de forma bem definida e estudada, cria
um padrão visual harmônico (RÜTHSCHILLING, 2002).
65

Figura 55 - Exercício que permite um padrão com o módulo


em seu encaixe nas aréas de continuidade

Fonte: adaptação autoral a partir de Schwartz, 2008.

Figura 56 - Teste de encaixe

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.


66

Figura 57 - Teste de encaixe

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Quanto mais próximo das bordas laterais do módulo, maior a relação


estabelecida entre eles, fazendo com que os módulos se conectem e formem
padrões visuais geométricos que nos passem impressão de continuidade
(SCHWARTZ, 2008).

5.1.6 Sistemas de repetição

Rüthschilling (2002) identifica como Rapport o sistema de repetição dos


módulos apresentando duas formas: o sistema alinhado e o não alinhado. As
repetições no estilo Art Déco aparecem, em sua grande maioria, com sistemas
alinhados e verticalizados, o que propõe uma grade com linhas, permitindo, assim,
o posicionamento lado a lado dos “módulos”. No sistema não alinhado ocorre uma
alteração entre os módulos em seus ângulos ou espaçamento (RÜTHSCHILLING,
2002), que pode funcionar de forma vertical ou horizontal.
67

Figura 58 - Sistemas alinhados e não alinhados dos módulos

Fonte: Adaptação autoral a partir de Rüthschilling.

De acordo com Rubin (2005), começamos a desenvolver o nosso projeto de


repetição – ou rapport, termo francês frequentemente usado para descrever
modulação e repetição – e nos vimos livres para pensar em superfícies e fazer isso
de forma marcante.
Como cita a autora:

Por isso uma das coisas mais importantes na área é aprender como criar
e projetar um desenho, pois uma imagem relativamente simples pode se
tornar uma composição interessante e cativante, em virtude de ter sido
habilmente uma padronagem cujo desenho básico está em repetição.
(ibidem, p. 36).

Ainda com base na autora Schwartz (2008), que nos auxiliou no


entendimento da repetição dos módulos de forma, começamos a fazer testes de
deslocamentos.

Figura 59 - Sistema alinhado e sistema não alinhado

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.


68

Com o objetivo de obter fluidez e simetria, para o padrão 1 optamos por


utilizar o sistema não alinhado com deslocamento de meio módulo na vertical,
enquanto para o padrão 2, para a Casa Rosa, optamos por utilizar o sistema
alinhado.

5.1.7 Malhas

Ao termos uma malha como base para o projeto, ela acaba por auxiliar de
modo que possa dar mais volume ou rigidez. A partir do modelo de quadro com
tipos de malhas de Barison (2008 apud SCHWARTZ, 2008), definimos que:

Figura 60 - Malha de formada deslocada em colunas

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

No padrão relógio Déco, utilizamos uma malha deformada a fim de equivaler


à área do padrão escolhido, além de deslocar as colunas pela metade do todo. Essa
malha foi de grande auxílio, pois com ela conseguimos obter um padrão mais
orgânico e coeso.
69

Figura 61 - Malha quadrada

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Já no padrão Casa Rosa foi utilizada a malha quadrada, uma das mais
populares devido a sua regularidade, a qual nos forneceu a estabilidade que
procurávamos.

5.1.8 Simetria

A partir de uma unidade compositiva e multimódulo, e quando aplicado à


simetria, o sistema estrutural de uma padronagem constitui diversas formas de
padrões (SCHWARTZ, 2008); Portanto, com a metodologia de Schwartz, o
exercício de simetria submetido aos módulos desenvolvidos durante o projeto
propõe várias formas de comportar o módulo, de modo que se obtenha um design
de superfície. Translação, Reflexão, Rotação, Inversão e Dilatação são formas de
compor a repetição de padronagens.
70

Figura 62 - Translação e Reflexão

Fonte: adaptação autoral a partir de Schwartz, 2008.

Figura 63 - Rotação e Inversão

Fonte: adaptação autoral a partir de Schwartz, 2008.

Figura 64 - Dilatação

Fonte: adaptação autoral a partir de Schwartz, 2008.

As simetrias simples, quando combinadas, propõem criações complexas de


padrões que são resultados de técnicas que exploram a disposição dos módulos.
71

5.2 PRODUTO
5.2.1 Público-alvo

A partir dos formulários de pesquisa, encontramos nosso público-alvo: jovens


na faixa de 18 a 35 anos, classe média, que não moram no centro e tampouco o
visitam com frequência, apenas em momentos de necessidade. Esse público anseia
por novas alternativas de locais de encontros e de socialização, porém não se
sentem seguros; por todos esses motivos, o se torna um local de passagem para
essa parcela da população. Com isso em mente, desenvolvemos o projeto com o
intuito de valorizar os detalhes da arte urbana presente em nossa cidade, por meio
de produtos como canecas, papéis de parede e pôsteres, de modo que a população
possa levar um pouco da cultura de rua para dentro casa. Trazendo esse olhar para
o espaço doméstico, esperamos que a cultura de frequentar o centro de Goiânia
seja resgatada.

5.2.2 Naming

A partir de estudos e pesquisas no trabalho de campo, percebemos a


necessidade de expressar visualidades urbanas que carregassem história, cultura
e arte contemporânea, fazendo um contraplano entre a arquitetura patrimonial Art
Déco e a arte urbana goiana. Desse modo, a criação de um naming para a coleção
torna-se essencial para formalizar o projeto e definir, por meio do nome da coleção,
do que se trata o seu conceito – afinal, o naming identifica, valoriza e formaliza uma
ideia, uma marca. Nesse caso, a escolha de um naming carrega uma mensagem
visual característica do seu conceito até mesmo em sua tipografia, que contém
traços Art Déco a fim de estimular a ideia do estilo e referir-se diretamente ao tema
ao tema da coleção.
Uma das principais ferramentas intelectuais do Design Thinking, o mapa
mental revela-se muito útil para definir um naming não só para uma marca, como
também para a criação de nomes de diversos projetos, apresentando uma grande
coerência com a funcionalidade da ramificação de palavras, frases ou imagens
(LUPTON, 2012).
72

Figura 65 - Mapa mental

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Figura 66 – Palavras-chave do mapa mental

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.


73

Nesse caso, o mapa mental foi um exercício que funcionou para estimular a
ramificação dos termos que identificam as palavras-chave temáticas, que, quando
em conjunto, se tornaram o conceito do design de superfície. Ao final do processo
do mapa mental exploramos combinações de duas palavras, buscando assim
entender qual seria a melhor forma de expressar o intuito da coleção e seu diálogo
com o público. Além do naming, a escolha de uma tipografia que traduza e expresse
visual e legivelmente a estética da coleção de padronagens é essencial para que o
público perceba, já no primeiro contato, qual é a ideia central do projeto, tornando
possível harmonizar a comunicação verbal com a comunicação não-verbal, com
suas próprias formas e cores preponderantes do produto final.
A partir do mapa mental definimos o nome Elemento Rua, pois identifica as
nossas inspirações principais, que foram os elementos visuais urbanos das ruas do
centro de Goiânia.
Figura 67 - Goiânia Palace Hotel, tipografia

Fonte: Embaixada da França no Brasil.


74

Figura 68 - Teatro Goiânia, tipografia

Fonte: Conad.

Figura 69 - Fachada Grande Hotel, tipografia

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.


75

Figura 70 - Tipografia aplicada ao naming

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Figura 71 - Fonte Mouse Deco

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

A fonte Mouse Deco possui uma forma geométrica e elegante,


transpassando uma estética característica dos anos 1920 com uma expressão
vintage, remetendo, assim, ao histórico europeu da década. Apesar da estética
francesa, esse estilo tipográfico é muito visualizado nas edificações comercias e
artísticas de Goiânia, como, por exemplo, o Teatro Goiânia, o Grande Hotel e o
Hotel Palace.

5.2.3 Cores

Foram consideradas, a partir do painel semântico e dos estudos fotográficos,


as cores predominantes e mais destacadas das obras dos artistas entrevistados
76

durante a pesquisa e também das obras Art Déco locais. Nas edificações, é possível
notar uma maior recorrência dos tons de rosa de alto valor tonal, seguidos por uma
paleta de tons pastéis que passam pelo verde, amarelo e azul, colorações que, por
sua vez, se destacam ainda mais na ambiência sóbria e acinzentada da cidade. Em
combinação com o preto, o dourado e o bronze são as principais cores do estilo Art
Déco global, e, não surpreendentemente, também são encontradas nas edificações
Goiânia. Em seus trabalhos, os artistas também utilizam cores em tons pastéis e
tons amarelados próximos ao dourado, que dialogam com a arquitetura patrimonial
histórica da cidade. Mesmo em trabalhos que não são em superfícies de Art Déco,
os artistas representam essas cores em seus diversos murais e grafites.

Figura 72 - Paleta cromática

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.


77

5.2.4 Coleção de padronagens

Figura 73 – Estudo Avenida Marginal Botafogo

Fonte Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Figura 74 - Paleta cromática

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.


78

Figura 75 - Estudo Casa Rosa

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Figura 76 - Resultados e estudos

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.


79

5.3 APLICAÇÕES E RESULTADOS

Figura 77 – Mockup 1

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Figura 78 - Mockup 2

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Figura 79 - Mockup 3
80

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Figura 80 - Mockup 4

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Figura 81 - Mockup 5
81

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

Figura 82 - Mockup 6

Fonte: Anna Luiza Pereira de Oliveira e Marco Antônio Horácio Júnior.

A partir dessa pequena amostra de possíveis aplicações, pretendemos


produzir e comercializar os produtos online a fim de disseminar e valorizar a nossa
cultura local, para que as pessoas possam levar para dentro de casa um pouco da
cultura urbana de rua.
82

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho procurou contextualizar a maneira como o centro de Goiânia


se desenvolveu desde sua concepção até os dias atuais, destacando o contraste
entre dois estilos de artísticos considerados opostos, a Art Déco e a arte urbana, e
buscando um modo de conectá-los. O objetivo foi encontrar vias que permitam que
uma forma de arte valorize a outra, de modo que alcance todos os públicos
possíveis e ajude a tornar o grafite mais que uma forma de expressão, uma maneira
de valorizar os locais onde são inseridos em Goiânia, principalmente na região
central. Para tanto, nos inspiramos na arte de dois importantes artistas da nossa
cidade, tornando-os objetos de estudo, com o intuito de desenvolver nossa própria
linguagem.
Em parceria com o IPHAN, pretendemos dar continuidade a este estudo num
projeto futuro: a aplicação de lambe-lambes pelo centro, sobretudo em alguns dos
mais de 22 patrimônios históricos da cidade. Para além das exposições visuais em
si, visamos, a médio e longo prazo, enaltecer a cultura de rua, valorizar nossa
história e cultivar o antigo costume de caminhar pelo centro, enxergando a cidade
com outro olhar. Assim, acreditamos ser possível conectar as diferentes classes
sociais, da mesma forma que demonstramos ser possível a aproximação entre a Art
Déco e a arte urbana.
Devido às atuais medidas de distanciamento social, tomadas em razão da
pandemia da Covid-19, tivemos alguns desafios no percurso da pesquisa, mas que
não nos impediram de alcançar nossos objetivos. Como alternativa, realizamos
pesquisas online com o objetivo de compreender o porquê de a cidade estar
dividida; entrevistamos os artistas via chamadas de vídeo, ao passo que, para o
desenvolvimento do projeto, as orientações e comunicações diárias foram
realizadas por meio de redes sociais. Por fim, acreditamos ter conseguido
desenvolver um produto final com potencial para ser aplicado em diversos meios e
colocado em prática não apenas como uma padronagem, mas também uma arte
como uma forma de manifesto. Apresentaremos online um manual com as
padronagens para o teste de funcionalidade com a Professora formada em artes
cênicas (UFG) Any Ferreira, a Arquiteta e fotografa Marina Borges (PUC, mestrado
UNB) e a Produtora Luana Leonis, e apresentaremos em Tópicos no dia da
apresentação.
83

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87

APÊNDICE A - ENTREVISTAS

1) Como a arte urbana local é vista e percebida pelo público goiano e


até onde vocês acham que a arte urbana pode fazer com que o cidadão
entenda esta arte como parte de seu espaço territorial?

KBOCO: A arte urbana e a arte em geral ajudam muito a sociedade a se


conhecer. Existe um poder subutilizado de quem se apropria de um grafite, de um
mural, para canalizar isso como sua identidade regional. É simples e complexo ao
mesmo tempo. Pintar e grafitar em um muro da cidade se torna um processo mais
vivo por ter pessoas participando involuntariamente do seu processo. Há quem
passe na rua e aprecie seu ato de decorar, intervir na cidade, e há quem ainda não
vê como algo que seja de relevância para a sociedade, ainda marginalizam todo
esse processo de se expor na rua “rabiscando” um muro, não veem como um
trabalho, mas como uma provocação. São casos isolados, que abrangem todo tipo
de gente, com suas opiniões e visões muito distantes umas das outras, mas que se
aproximam de alguma forma, por serem afetados visualmente pelas artes nos
muros que aparecem em seus trajetos do cotidiano.

SELON: Eu acho que a arte urbana, hoje, ela já e vista com bons olhos, tanto
por quem aprecia, como também por um público mais consumidor em diversos
níveis, desde colecionadores até empresas, que querem relacionar o seu nome ou
produto a alguma atividade artística. Já essa influência da arte com o cidadão, do
entendimento do espaço, eu acho que é um pouco amplo. Mas existe uma
identificação, desde a pessoa que mora no bairro que tem um grafite ou uma pintura
na rua, até quem já conhece o artista de uma maneira mais próxima, que sabe que
tem uma pessoa ali que produz um trabalho específico, e que é um produto que é
uma arte criada na cidade de Goiânia, na cidade que a pessoa habita, sabe que é
um artista local. Então eu acho que isso traz uma noção de pertencimento, de grupo.
E eu acho que quando você tem um trabalho de arte num espaço público, você vai
criando ponto de referência.

2) O que pretendem comunicar com o trabalho de vocês? É possível


perceber, visualmente, que há uma forte relação entre o contexto urbano e Art
88

Déco da cidade. A partir disso, como vocês enxergam as visualidades


urbanas? Como essas visualidades interferem e influenciam no processo
criativo de vocês?

KBOCO: Na rua existe a arquitetura, e o grafite usa a cidade como suporte.


Eu analiso tudo em volta. Acredito que acontece um diálogo entre o artista e a
cidade porque você está intervindo em um espaço que não é só seu, é
completamente participativo. Muitas vezes é o lugar na cidade que me chama, nem
sempre sou eu que escolho conscientemente o espaço que vou intervir. E pra nós,
artistas urbanos, a arquitetura é vista como uma superfície. Quando estamos
abertos para os processos de acordo com o contexto visual e conceitual da cidade,
acontecem coincidências dessa atmosfera. Em meu trabalho, por exemplo, existe
uma relação com a fiação das ruas; os postes, que é algo no meu processo que
acontece intuitivamente, muitas vezes não penso exatamente em me inspirar
nesses elementos urbanos, mas de alguma forma meu trabalho dialoga com a
cidade, com elementos visuais que muita gente nem repara e talvez a minha arte
propõe enxergá-los.

SELON: Eu tento falar sobre o nosso convívio urbano, e muito da minha


experiência pessoal, que pode criar identificação em outras pessoas, como uma
experiência coletiva de vida na cidade, sobre uma dinâmica, sobre a relação com a
arquitetura, a relação com os espaços urbanos, como a cidade, quanto à industria.
Eu particularmente, apesar de ter ouvido muito isso, que o meu trabalho tem uma
relação com a Art Déco, eu não cultivo essa afinidade de maneira efetiva, eu não
tenho essa vontade direta de ter uma relação com a Art Déco. Mas eu acredito que
pode ser uma relação subjetiva da minha própria experiência, principalmente com
os monumentos de Goiânia, com os pontos de referência, tipo a Praça do
Trabalhador, e o relógio da Goiás. Com o meu trabalho, eu aceito essa influência
da cidade, no que eu sinto, no que eu vivo, e eu tento expressar o meu entendimento
do que é uma parte dessa experiência urbana, dessa experiência da cidade no meu
trabalho, a cidade em si, não só a Art Déco, o espaço onde eu habito, tanto a
arquitetura, como os objetos industrializados, no sentido amplo, máquinas, um
banco, um caixa eletrônico, um caminhão, tudo isso nos afeta através da visão e
89

através de outros estímulos sensoriais. Então a minha expressão, ela vai sair como
um resultado dessa afetação.

3) Goiânia é uma cidade que lida com a arte urbana de forma que ela
faça parte da identidade territorial contemporaneamente?

KBOCO: Pinto há muito tempo, quando ainda não existiam muitas pessoas
se mobilizando em Goiânia nesse segmento, desde a época que a linguagem do
grafite era embrião dentro do hip hop, pintando temas do hip-hop. O grafite ainda
não era visto e definido como arte porque não tinha linguagens próprias, traços
desenvolvidos e estudados pelos artistas, só existiam referências no hip hop. Por
conta disso, parei de grafitar por um tempo, até buscar e entender o meu estilo.
Depois disso voltei pras ruas, explorando mais o meu universo, definindo o que eu
faço nos muros como arte depois de entender que, na verdade, tudo é arte. E o
mais interessante disso é a diversidade, o processo de se descobrir, e a vivência da
rua potencializa isso: dividir um muro e entender que a arte urbana é coletiva tanto
pra quem intervém, quanto pra quem é atingido visualmente e esteticamente por
ela.

SELON: Eu acredito que Goiânia tem, sim, uma aceitação da arte urbana
como parte da identidade do território contemporâneo, tanto por parte de agentes
do meio da arte, de curadores, produtores, até da parte pública, prefeitos que
enxergam que aquilo existe e afeta as pessoas, e também abraçam isso como parte
da identidade. Eu percebo a inclusão da arte urbana dentro do contexto da cidade
tanto pela parte governamental, quanto por instituições de arte, e também pelas
pessoas que se interessam.

4) As galerias de arte e projetos de design de interiores se tornaram uma


alternativa para a divulgação e a ampliação do trabalho de vocês. Mas, ainda
por ser uma realidade muito distante das ruas e da arte urbana, como
entendem a necessidade desse intercâmbio entre o espaço social, público, e
o espaço privado das galerias de arte e dos interiores? Como enxergam essa
aceitação da arte urbana em Goiânia? E o estímulo e incentivo para que sejam
realizados mais murais e grafites?
90

KBOCO: Como disse, a rua é um suporte para ampliar a minha arte. A partir
do momento que se diferencia e entende o lugar que está ocupando no espaço
público e no espaço privado, consigo separar esses dois momentos e considerar o
que agrega e o que não agrega no meu trabalho. Atualmente vejo muitos casos de
artistas que começam a experimentar o spray em uma tela, o que interfere no
processo do grafite de fazer parte da rua e estar em contato direto com a cidade se
manifestando. A partir do momento que me expresso nas galerias com minhas
técnicas de grafite em telas, depois de ter uma bagagem cultural urbana, vejo que
estou aproximando meu trabalho de outro público, de outro contexto mais privado
mesmo, mas que ainda me entendem como um artista que veio da rua e só buscou
outra forma de expor o meu trabalho, expandindo a minha liguagem. Mas há quem
ainda acha estrelismo e desconsidera artistas que vieram das vivências da cidade
e que hoje atuam em galerias de arte e em projetos de interiores, entendendo como
uma forma de comercializar e formatar a nossa arte, se inserindo no mercado e
priorizando o espaço privado, como se as intervenções nas ruas fossem só uma
fase, e não é exatamente isso. Estender a minha arte pra galerias é uma forma de
também chamar a atenção pra quem ainda interfere na cidade sem uma intenção
comercial, de receber em dinheiro por aquela arte no muro. Tudo depende da
intenção e existe espaço para todo mundo na rua. Agora, no mercado de arte acaba
sendo mais restrito, o que gera essa distância dos muros e das telas. Não acho que
existe um estímulo liberal em buscar conhecimento em arte, não só urbana, mas na
arte e na cultura geral em Goiânia. É um lugar ainda muito limitado, que
desconsidera muito a nossa área de criatividade. Sinto falta do investimento
financeiro e principalmente de atenção e apreciação. O Projeto Base Central
mesmo: era para acontecer anualmente, fomentando a arte urbana e valorizando
artistas que se identificam com a linguagem visual da cidade, mas não houve
capital, nem atenção do governo pro projeto, e são eles que muitas vezes
conseguem influenciar a arte urbana, por terem esse poder de manipular os
conteúdos que entram e saem da cidade e valorizá-los. Ou seja, muitas pessoas só
vão enxergar a arte urbana e aceitar ela se houver uma permissão dos “superiores”
para intervir organizadamente e dentro da lei, com um tipo de processo burocrático
pra intervir naquele espaço. Fora disso, os artistas acabam sendo visto por muitos
como um marginal, pintando ou grafitando em um muro que não cabe a ele
91

manipular. Infelizmente, o estímulo muitas vezes acaba tendo que vir desses meios
governamentais, pra só assim expandir a visão da sociedade goiana, pra entender
que arte urbana contribui e retribui de forma cultural pra cidade, e não de forma
marginal.

SELON: Eu acho que são dois contextos diferentes, que em alguns


momentos se cruzam, mais as galerias e o design de interiores. Acho que são dois
momentos, como eu falei, e em alguns momentos eles se relacionam. Eu acho que
Goiânia é uma cidade muito carente de galerias, de pessoas que queiram trabalhar
com arte, que saibam trabalhar fazendo uma intermediação do artista com o público;
eu acho que Goiânia é muito carente disso. Por outro lado, às vezes quem faz o
papel de levar o artista a se aproximar do público, e a arquitetura ou o design de
interiores tem uma aceitação, tem um interesse dos arquitetos e designers de
interiores pela a arte urbana. Mas isso varia muito do trabalho de cada artista. É
difícil falar todos os artistas que se enquadram no segmento. Alguns artistas que
conseguem trabalhar mais com empresas, com algum segmento da economia,
outros trabalham mais com o design de interiores mesmo, fazendo pintura interna
num quarto ou escritório. Na verdade, tem muito essa diferenciação, tem muitos
artistas que trabalham com fachada, e outros que trabalham mais na área interna,
depende muito do estilo do artista. E como eu falei, a aceitação da arte urbana eu
acredito que é positiva, tem uma aceitação boa na questão de produção de mais
murais; a maioria dos murais são produzidos pelos próprios artistas, com iniciativas
próprias, os artistas pintam o mural onde eles querem, pintam o que eles querem,
a maioria dos murais são assim, não sei se isso e só em Goiânia, acho que é no
mundo todo, isso é meio que a essência da arte urbana, o artista vai pintar na rua
independente de qualquer pessoa, instituição ou empresa. O estímulo privado,
governamental ou patrocínio mensal, ele consegue ter uma relação da arte de rua
como seu trabalho financeiro, que realmente lhe dê um retorno capital.

5) O mural, realizado em colaboração dos dois artistas em uma


edificação reconhecida como patrimônio histórico cultural de Goiânia, faz
parte do nosso estudo de caso. De que forma a arte urbana pode valorizar e
revitalizar a arquitetura Art Déco dessas edificações no centro urbano?
92

KBOCO: Lembro que um tempo atrás a casa do lado da Casa Rosa, que eu
e o artista Selon intervimos no Projeto Base Central, também tinha características
Art Déco. Mas acabou sendo depredada. Essa casa foi o último muro que pintamos
no projeto, e o que acho mais interessante é justamente o poder que a linguagem
tem. Ao estipular formas, traços e cores que harmonizam com o estilo Art Déco
existente na arquitetura da casa, nós conseguimos propor uma ampliação do estilo
e destacar ainda mais o Art Déco dessa edificação. Mas, como disse anteriormente,
muitas vezes não é tão intencional a forma como eu trabalho a minha arte de acordo
com a arquitetura; muitas vezes acaba sendo coincidências, por eu estar
completamente aberto ao contexto urbano e minhas referências consistirem em ter
uma harmonização direta e espontânea com as superfícies da cidade. Revitalizar
acaba sendo uma forma de propor o novo sem ter que interromper a linguagem que
já existia naquele espaço, moldando e encaixando o melhor jeito de intervir sem
precisar reconstruir. Muito pelo contrário: é mais um processo de desconstrução
daquelas formas arquitetônicas para manipulá-las em um formato bidimensional,
que caiba no contexto daquela edificação sem fugir da memória afetiva e da
importância e contribuição que aquela casa tem. Ou seja, a arte urbana impõe uma
atenção visual ainda maior pra esse patrimônio histórico.

SELON: No Projeto Base Central o idealizador foi o Kboco, que possui uma
aproximação com a Art Déco, com o setor central, a localidade em si. Eu trabalhei
mais com questões de efetivação do projeto, mais burocráticas, de organização e
produção. Num segundo momento, realizamos o trabalho artístico em parceria, de
atividade mútua. A realização desse trabalho aconteceu quando as edificações
escolhidas estavam bem cuidadas, restauradas e conservadas, e os trabalhos de
arte urbana não são feitos para ficar na parede pra sempre. A relação da arte urbana
com esses prédios não seria nem tanto de valorizar, mas de gerar diálogos com a
arquitetura, a arte contemporânea com a Art Déco, pela execução do mural do
grafite ressaltar a pintura. Portanto acredito que seja mais uma troca entre o suporte
(as edificações), o artista e a sua arte.
93

6) Como vocês percebem que a sociedade interage e reconhece esses


murais e edificações como elementos políticos e visuais que identificam uma
identidade territorial para a capital?

KBOCO: A sensibilidade da sociedade é muito relativa. E existem públicos


muito distantes dentro desse sistema. Há quem aprecia e se coincide com a minha
arte, há quem ignora, irrelevando o meu processo.

SELON: Existe mais de um lado, mais de um público que eu percebo que


existe. Desde a pessoa que observa o mural e percebe como ele está valorizando
a edificação, à pessoa que relaciona esse diálogo da arte urbana com a arquitetura,
onde aconteça um marco como ponto referencial da cidade. E até pessoas que não
percebem essas pinturas, ou que observam, mas não são diretamente afetadas em
sua territorialidade.

7) Criar padronagens, um design de superfície a partir da arte urbana


goiana, evidenciando formas e cores dos trabalhos de vocês e da Art Déco
explorada na cidade, seria uma forma de aproximar o grafite da Art Déco e
produzir imagens a partir de possíveis aproximações entre essas duas
linguagens urbanas?

KBOCO: O Art Déco é algo que acaba se destacando por ser um único
diferencial da cidade e fica muito em cima só desse estilo. Muitas pessoas não
sabem muito bem o que vem a ser esse estilo arquitetônico. A integração da arte
urbana e da arquitetura faz parte da humanidade desde tempos antigos, mas eu
prefiro fazer perguntas do que dar respostas sobre isso. Teria um arquiteto que se
interessaria em projetar um elemento na cidade já pensando na necessidade da
superfície do seu projeto para a arte urbana? Qualquer arquitetura que possibilite
uma interação eu acho interessante. Sou suspeito para falar dessa junção e acho
que é disso que o mundo precisa.

SELON: Acredito que criar padronagens a partir de referências de imagens


arquitetônicas e artísticas urbanas é produzir novas imagens, assim como nós,
artistas urbanos, fazemos ao produzir visualmente na cidade. Assim vocês
94

valorizam os artistas que participaram do Projeto Base Central como


intervencionistas em seu próprio espaço territorial, e valorizam também o histórico
do Art Déco e o que ele atribui até hoje no contexto cultural da cidade.

8) Ao entender que o trabalho de arte urbana de vocês também gera um


design de superfície nos muros da cidade, o que acham do nosso projeto de
produzir uma coleção de padronagens, uma estamparia com o intuito de
valorizar e identificar o território goiano?

KBOCO: Já criei padronagens e acho muito interessante essa possibilidade


de produzir em cima do que já foi criado, expandindo formas de aplicar referências
arquitetônicas e artísticas em espaços e produtos diversos. Disseminar um projeto
que releve outro projeto me faz perceber que, quando criamos algo, não temos
muito mais controle do que aquilo vai interferir no processo ou no trabalho de
alguém. Penso que se até hoje meu trabalho gera reflexões, imagina se fossem
feitos mais murais e mais grafites, quantas reflexões a mais isso ia gerar. A falta de
investimento temporal e financeiro impossibilita a cena de arte urbana goiana de
crescer e interferir mais ainda na identidade territorial da sociedade local.

SELON: Chega um momento em que a arte urbana e o design se separam.


As pinturas foram realizadas naqueles locais específicos, sem projeto prévio, sem
uma demonstração final do produto que iríamos ter. O processo aconteceu todo
momentâneo, mas o design pode ser uma ferramenta para manipular uma imagem
e aplicar projetualmente o design de superfície, experimentando várias formas e
caminhos que poderiam acontecer se o Projeto Base Central tivesse sido aplicado
a partir de uma manipulação de uma fotografia do local a ser pintado previamente.
E, pra mim, o trabalho de arte urbana se aproxima em termos de manipulação do
espaço de diversas formas como seu produto final. Mas não consigo ver
diretamente o meu trabalho de muralismo como um design de superfície. Criando
um projeto de estamparia baseado na arquitetura Art Déco e nos trabalhos de arte
urbana, você vai ressaltar a existência dessas situações para as pessoas que
estarão consumindo o seu produto, criando um público que irá consumir esse
produto, que são as pessoas que se identificam com a arquitetura e a arte urbana
da cidade, e o nosso projeto faz parte desse processo de tornar nosso trabalho uma
95

ampliação do nosso produto que é a nossa arte. Consequentemente, você pode


gerar essa identificação nas pessoas com o território, e até delas, de perceber e
estimular o consumo de produtos e produções locais através da afinidade com a
arquitetura e a arte urbana expressivas da cidade. É importante entender que a
arquitetura, o design e a arte urbana se amplificam quando estão em conjunto,
gerando esses diálogos visuais, mas que existe um limite na temporalidade e na
manipulação do design e da arte urbana nessa arquitetura que foi construída há
muitos anos. O design e a nossa arte geram uma linguagem contemporânea nessa
construção. Portanto, criar essas padronagens seria uma manipulação das formas
da Art Déco e da nossa arte urbana de forma atemporal, ao entender que em uma
edificação construída há anos foi realizada uma pintura específica, pensada para
aquele local, sem um planejamento prévio, e que vai ser produzido um design de
superfície que consegue manipular essas formas, possibilitando diversas maneiras
de serem apresentadas visualmente.

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