É preciso, primeiramente, considerar que, por meio da literatura, é possível conhecer
inúmeros materiais humanos e sociais com um valor documental inestimável, tanto no campo da história quanto no campo da sociologia. Nesse sentido, a literatura marginal é de grande valor, haja vista, que ela se diferencia das outras literaturas que costumam circular com maior frequência, porque ela apresenta na ficção, uma realidade bem pouco abordada nas grandes obras nacionais: ela nos mostra a verdadeira vida de quem (sobre)vive à margem da sociedade. A literatura marginal, é aquela criada por autores que vivem ou viveram em locais desassistidos pelas políticas, geralmente, regiões periféricas em que imperam a fome, a violência e a miséria. E dessas graves situações, surgem materiais para uma escrita por vezes dura e triste, mas extremamente necessária para que não esqueçamos que nossos semelhantes, são tratados diferentes pelas políticas sociais - logo ali - naquele lado, em que se nascemos privilegiados, somos ensinados, desde cedo, a nunca olhar ao cruzarmos. Ao lermos a obra Quarto de despejo - Diário de uma favelada, de Carolina Maria de Jesus, temos um panorama de que a insegurança alimentar, termo que se popularizou devido à pandemia do coronavírus, é algo que perdurou ao longo dessas décadas que se passaram desde a publicação da obra. Nesse sentido, também é possível perceber a literatura marginal como uma literatura de denúncia: denúncia da desigualdade social, denúncia da má distribuição de dinheiro público, denúncia da falta de humanidade e muitas outras denúncias das carência e das inseguranças daqueles que são largados à sorte num "quarto de despejo." É indiscutível que a literatura marginal, infelizmente, ainda ocupa um lugar menor em detrimento às outras obras. No entanto, ela não é menor em sentido de qualidade literária, sua circulação é que ainda ocupa menor tempo e espaço social, e isso se dá, porque além de muito se vender literatura estrangeira, ainda impera a venda de literatura escrita por homens brancos, e que ocupam um lugar privilegiado na sociedade, como bem pontuou a professora e pesquisadora Regina Dalcastagnè. Desse modo, claro está, que as editoras ainda estão tímidas na publicação de obras de autores marginais. Entretanto, nota-se, que mesmo a passos lentos, há uma movimentação por parte de autores e artistas, para que essa literatura tão importante, e de muita qualidade, tenha o merecido reconhecimento e uma publicação global. Em síntese, faz pouco tempo em que consumo essa literatura com certa regularidade, e quando penso no que me motiva e qual a razão desse meu interesse por temas muitas vezes desoladores, só consigo ponderar que assim, pratico um pouco a minha humanidade e uso lentes das quais não me pertencem para ver aquilo que durante muito tempo, me foi camuflado. A literatura marginal é resistência, consumir essa literatura, além de dar reconhecimento aos autores, é resistir com eles.