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AGRADECIMENTOS
O desenvolvimento deste trabalho contou com a ajuda de diversas pessoas, dentre as quais
agradecemos:
Às nossas mães, as fortes mulheres e donas de casa que inúmeras vezes colocaram os
nossos sonhos em primeiro lugar. Às nossas primeiras educadoras, que proporcionaram de
forma tão dedicada o nosso primeiro contato com as letras. Aos colegas do curso de Letras do
Instituto Federal Fluminense campus Centro, em especial ao querido amigo Maycon Dias
Prado, por ter segurado nossa mão quando pensamos em desistir, e às nossas inspiradoras
amigas Cessiani Monteiro, por ter nos cedido espaço seguro e apoio em sua casa quando
precisamos nos reunir na pandemia; Maria Isadora Caldas, por ter nos auxiliado a estruturar
inicialmente nossas ideias no papel; e a Ulli Marques, pela escuta e pelas preciosas e certeiras
dicas.
A todos os professores e professoras do curso, que compartilharam os conhecimentos que
nos trouxeram até aqui. Dentre eles, agradecemos especialmente a Eduarda Araújo da Silva
Martins, que foi nossa orientadora na primeira etapa da pesquisa até a defesa para a pré-banca,
e a Sarita Erthal, que foi nossa mentora no período entre orientadoras. Sem a dedicação, o
carinho e o norte inicial de vocês, não teríamos conseguido manter o trabalho em andamento
durante esse tempo tão difícil que foi a pandemia.
Por último, mas fundamental: queremos agradecer à nossa sábia orientadora Érica
Luciana de Souza Silva, a admirável mulher e profissional que abraçou e desenvolveu junto
conosco esta pesquisa, sempre apontando os melhores caminhos e nos ensinando a superar os
percalços.
6
Conceição Evaristo
7
RESUMO
ABSTRACT
This study intends to investigate and analyze the process of erasure of 19th century female
writers from the literary canon, ascertaining through the historical development of our
contemporary society, from the Portuguese colonization until the current century, the social
structures that sustain the continuous upkeep of these erasure, given the fact that even after the
implementation, through the last couple decades, of rescue projects from many of these female
writers and the recovering of part of brazilian literary history, mainly because of researcher
Zahidé Lupinacci Muzart and her collaborators’ arduous work, still hasn’t been offered to these
writers the proper recognition space from the literary critics. The main goal is to raise a
discussion about the importance and need of providing a platform to these women, as a way to
fight against sexism, that for centuries has affected women profoundly, hampering the proper
exercise of the right to integrity, value and recognition equivalence for their contributions, in
addition to proposing a Literature class that addresses the literary production of an author
referring to the period of Romanticism, to bring these reflections closer to everyday school life.
Keywords: Brazilian Literature. 19th Century. Literary canon. Feminism. Zahidé Muzart.
9
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 10
2 A MULHER NAS LETRAS ............................................................................................... 12
2.1 A mulher personagem......................................................................................................... 17
2.1.1 A mulher virtuosa ............................................................................................................ 21
2.1.2 A mulher imoral .............................................................................................................. 23
2.2 O gênero do cânone ............................................................................................................ 26
3 ZAHIDÉ: A PESQUISA SOBRE UMA PESQUISADORA ........................................... 29
3.1 Editora e editora ................................................................................................................. 32
3.2 As oitocentistas nas escolas ................................................................................................ 36
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 40
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 43
ANEXOS ................................................................................................................................. 47
Anexo I - O plano de aula......................................................................................................... 47
Anexo II – Poemas para a aula ................................................................................................. 50
10
1 INTRODUÇÃO
Desde que os corpos desnudos dos índios e das índias tupi escandalizaram os
exploradores recém-chegados das terras além-mar, a então Ilha de Vera Cruz passou a servir
como um dos grandes palcos da dominação europeia sobre os povos das Américas e, com esse
novo modelo cultural, vieram os ideais da Igreja Católica que, além de ser a instituição religiosa
que mais propaga o patriarcalismo, ainda exercia, na época, um poder governante quase tão
soberano quanto o do Estado em grande parte do continente Europeu até fins do século XVIII.
A opressão, a imposição cultural e a escravização de índios e índias e de africanos e africanas
alicerçaram o processo de colonização; e, no caso particular das mulheres, houve ainda um lado
da subjugação que seus conterrâneos não conheceram: a de seus próprios corpos.
Violentamente, Portugal crava sua bandeira, deixando bem claro que o indivíduo dominante é
o homem branco e católico. Isso, no entanto, não era novidade para as senhoras e senhoritas
europeias. Na obra A história das mulheres no Brasil (2018), organizada por Mary Del Priore,
o escritor e historiador Emanuel Araújo, sobre a realidade das mulheres no Brasil colônia,
afirma:
primeira seção haverá, ainda, uma subdivisão em 2.1.1, A mulher ‘virtuosa’ e 2.1.2, A mulher
‘imoral’, isto é, os dois estereótipos atribuídos às personagens femininas na literatura de autoria
masculina. Enquanto isso, na segunda seção será apresentada a discussão acerca do apagamento
das mulheres como produtoras de bens simbólicos nos registros canônicos da Literatura
Brasileira e como essa exclusão foi realizada com base nos papéis de gênero que inferiorizam
a mulher através dos séculos.
Nossa escolha por estudar sobre Zahidé Lupinacci Muzart, e não sobre uma autora
oitocentista em específico, se deu por compreendermos a grande importância desta
pesquisadora para a Academia e para o meio editorial como uma estudiosa das mulheres de
antes, mas também como escritora que passa por silenciamento, desta vez no século XXI. No
Capítulo 3, intitulado Zahidé: a pesquisa sobre uma pesquisadora, serão concentradas as
reflexões acerca do impacto de seu trabalho e seus esforços. Este Capítulo será dividido em
duas seções: em 3.1, o foco será a Editora Mulheres e Zahidé enquanto editora; já em 3.2, será
apresentada uma proposta de plano de aula, que é a nossa contribuição para o combate ao
silenciamento das autoras oitocentistas, luta que pode servir como incentivo, ainda, a jovens
que pensam em tornar-se escritoras.
1
A presente pesquisa trata de um grupo específico de mulheres, no caso meninas, majoritariamente brancas e
pertencentes às classes mais elevadas da sociedade da época, fato decorrente da escravização, que impossibilitou
o acesso da maior parte das meninas negras ao ensino formal.
13
da Independência, havia as chamadas escolas de primeiras letras, que eram divididas por
gênero. A educação oferecida por essas escolas era a mesma para meninos e meninas apenas
nos primeiros anos, quando todos deveriam aprender a ler, a escrever e a realizar as quatro
operações. As doutrinas cristãs também faziam parte deste currículo. Finalizado este ciclo
básico e comum a todos, os percursos educacionais se tornavam distintos e a cada grupo cabia
uma orientação específica: aos meninos eram oferecidos conhecimentos escolares,
especialmente nas áreas de geometria e ciências, e às meninas cabia a formação para a vida
doméstica, com aulas de bordado, costura, culinária, entre outras habilidades voltadas para a
vida familiar. Isto é, o percurso científico e artístico era praticamente impossibilitado às
meninas, enquanto que, para os meninos, a produção técnico-científica-intelectual era destino
certo. De acordo com tal perspectiva, as instituições de ensino superior, o mercado de trabalho
e a atuação política eram campos sociais, exclusivamente, deles. Como resultado dessa
imposição de papéis ainda na juventude, Norma Telles descreve:
Além disso, segundo Maria Amélia Teles (1999, p. 28), o número de escolas para
meninos era muito maior do que para meninas: no Rio de Janeiro, nessa primeira metade do
século, foram registradas 17 escolas primárias para eles e apenas 9 para elas. O registro do
primeiro ingresso de uma mulher no ensino superior brasileiro data de 1881, já quase na virada
do século. Logo, quando se fala em relação de mulheres e letras no país oitocentista, fala-se
também da trajetória percorrida por elas rumo à emancipação, à conquista de direitos e espaços
para além do doméstico, especialmente no que diz respeito à participação ativa nos âmbitos
sociopolíticos e culturais das comunidades em que viviam; e essa trajetória não ocorreu sem
obstáculos. No período referido, a elite brasileira se encontrava no processo de formação de
uma identidade nacional e tomava para si o modelo europeizado de civilização, marcadamente
branco, católico e masculino 3. Rita Terezinha Schmidt, sobre isso, afirma:
2
O texto citado foi publicado em 1997, sendo assim o "século passado" ao qual se refere é o século XIX.
3
Este assunto será abordado na próxima seção.
14
Pensar em uma mulher ocupando um cargo público, por exemplo, seria transgredir essa
matriz ideológica, sendo considerado, portanto, um cenário socialmente inaceitável. Júlia Lopes
de Almeida, escritora de grande destaque e sucesso editorial do final do século XIX, foi a
primeira a alcançar amplo reconhecimento público e autonomia financeira pela venda de seus
livros, que abrangem diversos gêneros literários, entre contos, crônicas, poesias, ensaios,
romances e peças teatrais. Participou ativamente do cenário artístico e literário carioca, junto
com seu marido, o também escritor Filinto de Almeida, sendo considerada “a ‘primeira dama’
da Belle Époque brasileira” (SHARPE, 2004, p. 188). Michelle Asmar Fanini (2009) relata que
ela se dividia num “equilíbrio tenso” entre os papéis de esposa, mãe e escritora, e que foi peça
fundamental na criação da Academia Brasileira de Letras (ABL), em 1897. Também chegou a
receber indicação a uma Cadeira, porém não recebeu apoio suficiente da maior parte dos
“homens de letras”:
Impedida por causa de seu sexo, a escritora perde a Cadeira para o marido. Júlia Lopes
de Almeida foi um dos grandes nomes da Literatura Brasileira dos séculos XIX e XX e, no
entanto, os principais manuais e compêndios de história da literatura nacional sequer
registraram seu nome em notas de rodapé. Desta maneira, o silenciamento da autoria feminina
na literatura do passado é uma forma de manutenção da dominância masculina nesse espaço e
também do pensamento de que o único campo de atuação válido para a mulher é o da
administração do lar, do casamento e da prole. Em suma: falar de mulher nas letras é também
falar de feminismo.
Entre meados do século XVIII e a segunda metade do século XIX, nos Estados Unidos
e na Europa, mais especificamente França e Inglaterra, as mulheres começaram a se levantar
contra as condições de opressão impostas por seus respectivos governos, e esse movimento
ecoou nas mulheres latinas. De acordo com Maria Amélia Teles (1999, p. 36), elas começaram
a se organizar em clubes para discutir questões sociopolíticas e direitos das mulheres, fundaram
15
revistas e jornais (como os famosos franceses A Opinião das Mulheres e Tribuna das Mulheres)
para o público feminino onde escreviam e publicavam suas ideias. Elas exigiam igualdade
política e civil entre os sexos, o que incluía maior acesso à educação formal, direitos sindicais,
direito ao divórcio e ao voto. Este período correspondeu ao que ficou conhecido como a
primeira onda do feminismo no mundo. Nomes como o da britânica Mary Wollstonecraft, que
publicou um dos primeiros tratados feministas, intitulado Vindications of the Rights of Woman 4
(1792), e o da francesa Olympe de Gouges, com os famosos artigos da Declaração dos Direitos
da Mulher e da Cidadã (1791), foram considerados precursores do movimento na Europa.
No Brasil, as pouquíssimas pessoas que tinham contato com educação estrangeira na
primeira metade do século XIX, que eram os filhos da “elite” burguesa, foram as responsáveis
por trazer os ideais vigentes nos países do hemisfério norte a seus conterrâneos. Ainda sobre
este cenário, Constância Lima Duarte (2000, p. 177) destaca como grande precursora do
feminismo a professora e escritora Nísia Floresta. Depois de muitas viagens por terras
estrangeiras, como França e Itália, em 1832, Floresta publica em Recife seu primeiro livro,
intitulado Direitos das mulheres e injustiça dos homens (1832), um apanhado de ideias
traduzidas de autoras feministas europeias, como as duas citadas no parágrafo anterior,
absorvidas e aplicadas à situação das mulheres de seu país. Nele, ela defende a necessidade de
conceder às mulheres pleno direito à instrução e ao trabalho, afirmando que depende disto o
progresso da sociedade, e critica o interesse dos homens em mantê-las em situação de exclusão,
dependência e submissão.
Além disso, foi uma das primeiras mulheres a ter nome ativo na grande imprensa e, em
1838, ela fundou, no Rio de Janeiro, um colégio para meninas com um currículo inovador para
sua época, como o ensino de línguas estrangeiras em detrimento do de habilidades manuais
voltados para o ambiente doméstico. Foi muito elogiada pelos cariocas pela qualidade do ensino
oferecido a essas meninas, porém, também duramente criticada pela “audácia” de romper com
os padrões vigentes (DUARTE, 2000, p. 175), caindo posteriormente no esquecimento da
história do Brasil. Nísia Floresta vem sendo, há apenas poucas décadas, trazida a público, com
suas obras sendo resgatadas, reeditadas e republicadas, e recebendo o reconhecimento da
Academia pelos seus feitos pelas mulheres brasileiras.
Apenas a partir do fim da década de 60, com a chamada segunda onda do movimento
feminista, é que foi fortemente trazida à consciência a importância do olhar atento das mais
diversas áreas de estudo à questão da condição feminina, não mais apenas como uma minoria,
4
Tradução livre: Reivindicação dos Direitos da Mulher.
16
desviante da regra que é a masculina. Os estudos sobre mulher aqui considerados são
concordantes com os critérios escolhidos por Albertina de Oliveira Costa, Carmen Barroso e
Cynthia Sarti no artigo Pesquisa sobre mulher no Brasil: do limbo ao gueto? (2019), que são
os que carregam uma intenção crítica em relação à (pouca) produção que ocorria anteriormente:
Desta forma, durante a segunda onda, especialmente ao longo da década de 70, em que
as mulheres invadem as universidades e inserem temas no campo de pesquisa que falam de si,
de suas próprias histórias e das de suas antepassadas, permitindo a investigação e compreensão
da origem de suas crenças e valores e o reconhecimento de práticas sociais opressivas a elas
(RAGO, 2019, p. 382), houve uma forte emergência na historiografia brasileira de novos temas
e objetos de estudo que reconheciam, finalmente, as mulheres como agentes históricos.
Como consequência, no Brasil, a empreitada de dar voz àquelas que foram colocadas à
margem da história da Literatura, interferindo na estrutura há muito engessada do cânone, ganha
força com o trabalho de pesquisadores e pesquisadoras que atuam como verdadeiras
arqueólogas, resgatando nomes e obras que não receberam o devido valor da crítica de sua
época. Dentre alguns nomes, um de grande destaque – e impulsionador deste trabalho – é o da
professora, editora e crítica feminista Zahidé Lupinacci Muzart 5, que desde 1991 até o ano de
sua morte, 2015, atuou como bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) em seu projeto de resgate de escritoras brasileiras do século XIX, ligado
à Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Muzart trabalhou como professora nas áreas de Literatura Brasileira e Teoria Literária
na UFSC entre os anos de 1976 e 1993, quando se aposentou. Apesar disso, ela mesma conta,
levou o projeto a frente por mais de uma década e, dele, nasce a ideia de se criar uma editora.
Fundada em 1995, juntamente com outra grande pesquisadora na área de Literatura,
Feminismo e Estudos de gênero, Susana Funck, e com a professora Elvira Sponholz 6, a Editora
Mulheres estreia com a edição e republicação da obra “Mulheres illustres do Brazil” (1899), de
5
Conforme descrito na Introdução, as reflexões acerca da autora e de seu legado serão desdobradas no capítulo
III.
6
Susana Funck e Elvira Sponholz são duas professoras aposentadas pela Universidade Federal de Santa Catarina.
Ambas atuaram ativamente como pesquisadoras em Literaturas e Estudos de gênero na mesma universidade; ao
que se sabe, Funck atuou até o ano de 2014.
17
Ignez Sabino, que reúne diversas escritoras de sua época com fotos e biografias. Zahidé conta
ainda que a inspiração para o propósito desta editora veio principalmente da primeira editora
feminista francesa, a Des Femmes, criada em 1973 por Antoinette Fouque, cinco anos após a
fundação do Mouvement de Libération des Femmes (MLF), que foi um dos maiores marcos do
movimento feminista na Europa.
Além de republicar obras de autoras do passado e difundir pesquisas na área de estudos
de gênero, a Editora Mulheres também assina outro grande fruto de todo esse projeto de resgate
de Zahidé: a importantíssima antologia, composta por três volumes, Escritoras brasileiras do
século XIX (1999), que é o somatório do trabalho integrado por diversas pesquisadoras lideradas
por Muzart e que trouxe de volta a público mais de cem escritoras oitocentistas, suas vidas e
obras. Nomes como Júlia Lopes de Almeida e Maria Firmina dos Reis 7, que, graças a esses
esforços, estão aos poucos sendo reinseridos na historiografia, vêm para recontar o século do
Romantismo brasileiro.
Após todo esse tempo, há ainda muitos esforços para revisitar esse passado literário
que fora contado apenas pela classe dominante essencialmente masculina e questionar a forma
como ele vem sendo ensinado nas salas de aula – tanto do ensino básico quanto do ensino
superior, especialmente nas licenciaturas. Há redescobertas de narrativas, fatos, nomes; novas
histórias, reinterpretações, republicações de obras que estavam há muito perdidas. Tirar as
mulheres do lugar de sombra que lhes foi por tanto tempo imposto e lhes dar o lugar de destaque
na historiografia literária que lhes é devido é essencial e extremamente enriquecedor para a
memória cultural da nação. Nas palavras da própria Zahidé (1995): “A mulher, no século XIX,
só entrou para a História da Literatura como objeto. É importante, para reverter o cânone
literário, mostrar o que aconteceu quando o objeto começou a falar”.
7
Maria Firmina dos Reis é hoje considerada por muitos estudiosos a primeira romancista brasileira. Sendo uma
das escritoras mais importantes do século XIX, ela quebrou os paradigmas de sua época, sendo uma mulher negra
numa sociedade escravocrata que escreveu e, em 1859, publicou o romance “Úrsula”.
18
outros à sua imagem e semelhança, dobrados ao seu ideal civilizatório que consideravam ser
superior.
Considerando isto, ao investigar o contexto histórico em que as brasileiras viviam dois
séculos atrás e os fatores que levaram ao processo de apagamento das que ousaram produzir
literatura neste período, depara-se com uma sociedade que, mesmo após proclamar sua
independência em 1822 e se tornar uma nação “livre”, ainda era profundamente afetada pelas
designações culturais da metrópole – afinal, o poder ainda estava nas mãos da Família Real,
que residia em terras nacionais desde 1808 e comandou o Brasil império durante boa parte do
século XIX. Além disso, atrás dela, de seus empregos e de suas famílias, ainda desembarcaram
outros milhares de portugueses (ALENCASTRO, 1997, p. 12).
Sendo assim, quando o Brasil pós-colonial começa a dar os primeiros passos no
processo de modernização de sua sociedade e na busca por uma identidade própria, ainda se
seguia os modelos e os ideais europeus, importados e aplicados pela elite letrada, funcionários
da corte e da Igreja. Segundo Norma Telles, era uma influência que acontecia da maior para a
menor escala: “das grandes teorias científicas ou filosóficas ao modo de se portar em
determinado ambiente, como cuidar do corpo ou se dirigir ao outro” (TELLES, 2018, p. 401).
O rosto que se queria dar à sociedade brasileira diante do mundo era antes o do colonizador e,
depois, o do “colono europeizado, herdeiro dos seus valores e candidato à sua posição de
domínio” (CANDIDO, 1989, p. 164), mantendo, portanto, os aspectos que caracterizam o
sujeito dominante na hierarquia social 8: gênero masculino, raça caucasiana e de religião
católica.
O objetivo deste trabalho é focar na hierarquização do gênero masculino em detrimento
do feminino na produção da historiografia literária do país, mas é imprescindível destacar que,
no Brasil, outro elemento trazido da cultura europeia e que se tornou a base da economia
brasileira foi o regime escravista, que perdurou do século XVI até o fim do XIX. Insere-se,
portanto, nessa hierarquia, os grupos étnicos dominados e escravizados pelo homem branco, o
qual acreditava ser superior a todos os demais: primeiramente, os indígenas nativos. Depois,
perante o visível fracasso de dominação dos povos autóctones brasileiros, a sociedade colonial
brasileira lança-se à escravização de homens e mulheres africanas. Logo, a mulher branca
8
O conceito aqui utilizado segue a linha de pensamento do sociólogo Max Weber, observado pelo professor e
doutor em sociologia contemporâneo Márcio Mucedula Aguiar, em comparação com o conceito apresentado por
Karl Marx: “Observamos que para Marx, a classe era um conceito objetivo decorrente da esfera produtiva. Max
Weber amplia o debate, na medida em que separa na sua teoria as dimensões econômicas, políticas e sociais da
distribuição do poder na sociedade” (AGUIAR, 2007, p. 84).
19
9
É necessário frisar que o privilégio referido diz respeito ao falso poder que estas mulheres burguesas, as sinhás,
possuíam, que era limitado ao ambiente familiar. A estas mulheres era permitida a dominação das mulheres
escravizadas e somente enquanto fosse do interesse dos homens, que poderiam revogar tal poder quando bem
entendessem.
10
A concepção de modernidade é tomada como novos e refinados hábitos adotados pela aristocracia europeia e
que chegavam em terras brasileiras com economia essencialmente agrária. Sendo assim, tudo isso se apresentava
por aqui como avanços modernos advindos do Velho Mundo.
11
É importante destacar, ainda, que o posicionamento da Inglaterra contra o sistema de escravização se dá por
motivos meramente econômicos. Inglaterra era um grande produtor industrial, especialmente de tecidos. Pessoas
escravizadas produzem, mas não possuem renda. Sendo assim, é um mercado em potencial, mas totalmente
desprovido de recursos para adquirirem os produtos ingleses. Para resolver tal impasse, a Inglaterra se posicionou
contra a escravidão, proibindo e dificultando o tráfego negreiro. A questão posta é que tal posicionamento não é
fruto de consciência crítica ou social, mas adequação de um determinado contexto aos interesses econômicos
ingleses.
20
burguês, deveria ser “civilizado”, como nos padrões europeus e, principalmente, franceses.
Faziam parte desse grupo os capitalistas: banqueiros, comerciantes, proprietários de indústria,
grandes latifundiários, entre outros. Eram os que detinham os bens de produção e os bens de
capital.
Com esta nova configuração social, surge também um novo ideal de mulher esposa e
mãe burguesa – não apenas avaliado entre as famílias, como ocorria anteriormente quando a
mulher ocupava apenas o lugar doméstico, mas agora também pela sociedade nos ambientes
nos quais passam a conviver os conterrâneos: saraus, bailes, teatros, cafés e outros eventos
sociais; tendo de aprender regras sobre como se comportar em público e de maneira educada
(D’INCAO, 2018, p. 228). Ela devia ser recatada, mas ter alguns dotes que a enfeitassem
socialmente, como saber tocar piano, falar francês e ler romances.
Na obra O primo Basílio (1878), de Eça de Queirós, publicada originalmente em 1878,
o autor faz uma crítica ao ideal burguês de sua época e à ideia de “refinamento” que as mulheres
deveriam ter. Logo nas primeiras páginas do romance, ele faz uma descrição da personagem
Luísa como a mulher ideal do período do Romantismo e, ainda que em forma de crítica, o trecho
torna possível ao leitor a noção dessa “mulher enfeite de sala” moldada como exemplo para as
concepções burguesas.
Mas Luísa, a Luisinha, saiu muito boa dona de casa; tinha cuidados muito
simpáticos nos seus arranjos; era asseada, alegre como um passarinho, como
uma passarinha amiga do ninho e das carícias do macho; e aquele serzinho
louro e meigo veio dar à sua casa um encanto sério. — É um anjinho cheio
de dignidade! — dizia então Sebastião... (QUEIRÓS, 2002, p. 5-6)
Além disso, passa a ser considerada de total responsabilidade desta mulher a criação
dos filhos, que antes eram cuidados pelas “amas”, juntamente com a responsabilidade pelo
prestígio social de toda a família. Sobre isto, Maria Ângela D’Incao ainda afirma que, embora
21
a autoridade ainda estivesse nas mãos do homem, ele estava sempre rodeado de mulheres (mães,
esposas, tias) que cuidavam de sua imagem pública.
Sendo assim, agora era esperado por toda a sociedade um certo tipo de comportamento
e comprometimento da mulher burguesa para com seu papel de mulher educada, boa esposa e
mãe. A Literatura, neste cenário de muita valorização das artes, vem como uma potente
ferramenta de cristalização desse novo ideal. Isso porque, assim como ela funciona como uma
expressão da “alma” de sua época, servindo inclusive como um registro histórico para a
posteridade, ela também pode ser utilizada como uma forma de reforçar costumes dessa época
ao influenciar o imaginário de quem a consome. No Brasil, ela teve grande atuação no processo
de imposição de padrões culturais (CANDIDO, 1989, p. 171) bem como de expressão da cultura
dominante. Nesse sentido, a Literatura tanto representa quanto reforça o ideal da figura mulher
burguesa oitocentista e a desumanização da figura da mulher negra escravizada, sendo ambas,
em diferentes níveis, sistematicamente silenciadas pelos valores discriminatórios de sua época.
Nas subseções, abordaremos essas duas realidades femininas na ficção literária.
Em meados do século XIX, durante a segunda fase do Romantismo, ocorre uma forte
expressão de sentimentalismo, de exaltação ao amor romântico e ao objeto desse amor, a
mulher, nas obras literárias. Esta última era descrita muitas vezes “de uma forma idealizada,
pura e angelical, segundo a concepção platônica da mera contemplação, distante do contato
corporal – um ser diáfano, imaginário e imaterial” (OLIVA, 2017, p. 97) 12. Essa idealização,
carregada de uma religiosidade lusófona, demonstra o arquétipo da mulher que é digna do amor
na concepção do homem escritor oitocentista. Neste período, a Província do Rio de Janeiro
torna-se o centro cultural do Brasil graças à presença da corte europeia e “seu protocolo, os seus
concertos e festas, o exemplo de maneiras refinadas dado pela nobreza, diplomatas, altos
funcionários” (CANDIDO, 2002, p. 11), e era principalmente lá que os escritores absorviam
essa cultura e passaram a imprimi-la em suas obras. Além disso, havia os que possuíam poder
aquisitivo (os filhos da elite) para estudar no exterior, geralmente em países como Portugal,
França e Inglaterra, e também importavam para a literatura brasileira os costumes-modelo
europeus.
12
A existência de um certo nível de erotismo faz parte também das características dos textos literários produzidos
durante o Romantismo brasileiro. Vale destacar, entretanto, que era apenas uma ideia, ou seja, este erotismo nunca
se concretiza, porque a mulher era idealizada e vista como pura e intocável.
22
Na praia deserta que a lua branqueia, /Que mimo! que rosa! que filha de Deus!
/Tão pálida... ao vê-la meu ser devaneia, /Sufoco nos lábios os hálitos meus!
/Não corras na areia, /Não corras assim! /Donzela, onde vais? /Tem pena de
mim! (AZEVEDO, 1996, p. 3);
Por que, pálida inocência, /Os olhos teus em dormência /A medo lanças em
mim? / [...] Quem te amasse! e um momento /Respirando o teu alento
/Recendesse os lábios seus! /Quem lera, divina e bela, /Teu romance de
donzela /Cheio de amor e de Deus! (AZEVEDO, 1996, p. 24);
Na prosa, além da exaltação dessa mulher pálida e virginal, havia também os “alertas”
para as que fugissem do ideal cristão e patriarcalmente controlável. Em Lucíola (1862), de José
de Alencar, a protagonista Lúcia é uma prostituta que se apaixona por Paulo, um rapaz do
interior que recém chegara à capital a fim de conhecer a Corte. No romance, há uma dualidade
simbólica cristã entre o bem e o mal: a Lúcia prostituta está para Lúcifer, o anjo caído, e a Maria
da Glória, seu verdadeiro nome – o qual volta ao usar quando é tomada por esposa por Paulo,
está para Virgem Maria, mãe de Jesus (OSTERNE, 2004, p. 83), a mais sagrada e virtuosa
figura de mulher para a religião católica. Sobre a mensagem passada na obra aos leitores,
principalmente às leitoras, Higor Cavalcante e Valdeci Batista de Melo Oliveira afirmam:
normalizada na época. Era comum também o destrato, e até violência física, por parte da
senhora burguesa, por “ciúmes” de seu marido. A mulher negra como personagem na Literatura
era comumente retratada como esse animal sensual, mais atraente que a mulher branca,
irresistível e que seduzia os homens. Dessa forma, há uma inversão de papéis e o homem é
posto no lugar de objeto da sedução (GIACOMINI, 1988, p.66), responsabilizando a mulher
negra pela prática do estupro. Aos olhos da sociedade burguesa, ela era impura, imoral,
portanto, desprezível.
Na ficção oitocentista, a narrativa “Lucinda, a mucama”, presente na obra As vítimas
algozes (1869) 13, de Joaquim Manuel de Macedo, é um excelente exemplo desse tipo de
representação estereotipada da mulher negra. Na obra, a moça burguesa, Cândida, recebe de
presente pelo seu décimo primeiro aniversário a jovem escrava Lucinda, depois da perda de sua
antiga ama cuidadora Joana, que se casara. O narrador, ao apresentar a personagem Lucinda, já
a compara de forma pejorativa com Joana, que era descrita como “a companhia inapreciável”,
de “serviço dedicado de uma boa senhora, mulher pobre, mas livre e de sãos costumes”,
“agradável” e “sempre fora honesta”, era também “segunda mãe”, “criada amiga” e “nobre”
(MACEDO, 2010, p. 144). Em seguida, descreve Lucinda:
Lucinda era aos doze anos de idade uma crioula quase mulher, tendo tomado
as formas que se modificam ao chegar à puberdade: um pouco magra, de
estatura regular, ligeira de movimentos, [...] (MACEDO, 2010, p. 150);
13
As citações elencadas neste trabalho foram retiradas da edição de 2010.
25
Além disso, Maria Firmina dos Reis dedica todo este capítulo à narrativa da personagem
Susana, que conta sua trajetória de sofrimento por ter sido arrancada de sua terra natal, obrigada
a abandonar sua família e sofrido os horrores no navio negreiro. A autora confere-lhe uma
identidade cultural de forma extremamente sensível:
14
As citações elencadas neste trabalho foram retiradas da edição de 2021.
26
— Sim, para que estas lágrimas?... Dizes bem! Elas são inúteis, meu Deus;
mas é um tributo de saudade, que não posso deixar de render a tudo quanto
me foi caro! Liberdade! Liberdade... Ali eu a gozei na minha mocidade! —
continuou Susana com amargura. [...] Mais tarde deram-me em matrimônio a
um homem, que amei como a luz dos meus olhos, e como penhor dessa união
veio uma filha querida, em quem me revia, em quem tinha depositado todo o
amor da minha alma. Uma filha que era minha vida, [...] Tudo me obrigaram
os bárbaros a deixar! Oh, tudo, tudo até a própria liberdade! — Estava
extenuada de aflição, a dor era-lhe viva, e assoberbava-lhe o coração. (REIS,
2021, p. 135)
A história do mundo vem sendo contada pelo ponto de vista masculino desde o início
dos registros ocidentais, o que a tornou parcial e fez com que as mulheres fossem relegadas ao
lugar de espectadoras da história e dos feitos dos homens. Segundo a escritora e filósofa Simone
de Beauvoir, “a representação do mundo, como o próprio mundo, é operação dos homens; eles
o descrevem do ponto de vista que lhes é peculiar e que confundem com a verdade absoluta.”
(BEAUVOIR, 2009, p. 183). Dessa forma, o que se conhece como verdade sobre a história do
mundo é a verdade singular dos homens pertencentes a uma determinada elite social registrada
formalmente, como uma documentação das culturas, constituindo o que se conhece hoje como
historiografia.
Na historiografia literária, o cânone é a assinatura que valida concretamente essa
verdade para a posteridade. Ele é a lista oficial das obras clássicas, “valiosas”, “universais”,
27
[...] a aceitação se deu durante muito tempo apenas no campo dos homens, ser
escritor era uma profissão masculina, as mulheres que se arriscaram por tal
terreno ficaram em grande medida, negligenciadas. Suas obras, na maioria das
vezes, vinham assinaladas sob pseudônimos, muitas vezes até mesmo
masculinos. Tal prática se dava como uma forma de aceitação e legitimação
para os seus escritos, [...]. (RIBEIRO, 2018, p.32)
Sobre isso, a pesquisadora Anna Faedrich, que é doutora em Teoria Literária (PUCRS)
e coordenadora de um Grupo de Trabalho (FAPERJ) com foco em repertórios de exclusão de
Literatura Brasileira de autoria feminina na Belle Époque, publicou, também em 2018, um
artigo argumentando que essa recepção crítica discriminatória foi outro fator que contribuiu
para o gradual apagamento das mulheres oitocentistas da memória literária brasileira. De acordo
com ela, as reações de escritores homens prestigiados da época, como Olavo Bilac e Lima
Barreto, “revelam os jogos de poder e as implicações políticas com possível desdobramento
sobre a fortuna das carreiras de mulheres no mundo das letras” (FAEDRICH, 2018, p. 164) pois
eles “desestimularam uma série de escritoras com comentários que diminuíam sua capacidade
intelectual e o valor literário de suas obras” (FAEDRICH, 2018, p. 168), muitas vezes
utilizando-se de tom supostamente elogioso.
Para citar alguns exemplos, com destaque para os trechos grifados: no trecho do prefácio
de Horto (1900), de Auta de Souza, escrito por Olavo Bilac, ele diz que: “Não há nas estrofes
do Horto o labor pertinaz de um artista, transformando as suas ideias, as suas torturas, as suas
esperanças, os seus desenganos em pequeninas joias" (2009, p. 29 apud FAEDRICH, 2018,
p.168 grifo nosso); em outro trecho, ele ainda afirma que: “Aqui a alma vibra em liberdade,
sem a preocupação dos enfeites da Forma, livre da complicada teia de artifício” (2009, p. 29
apud FAEDRICH, 2018, p.168 grifo nosso). Torna-se evidente que o poeta parnasiano julga a
escritora como incapaz de uma produção literária complexa e que, por isso, ele não a considera
uma verdadeira artista.
Outra mulher que sofreu com o descrédito de seus contemporâneos foi Albertina Bertha,
29
uma importante voz na literatura do início do século XX. Faedrich a considera como “voz
dissonante” e “corrompedora” do conservadorismo de sua época por:
Seu primeiro romance, Exaltação, foi publicado em 1916 e teve sucesso de vendas,
tendo sido reeditado seis vezes em vida. Ainda assim, Lima Barreto, em correspondência no
mesmo ano com a escritora, julga sua obra como:
Para tratar da história das mulheres como parte integrante da história geral, é preciso
que ela seja percebida com a sua devida representatividade, não apenas como um estudo menor
ou à parte do todo. Para tanto, torna-se necessário reavaliar a forma como toda a história
30
brasileira vem sendo registrada, e pesquisas como esta são uma forma de dar mais força a esse
debate, para que assim ele avance.
O resgate da literatura escrita por mulheres é uma tentativa de dar a visibilidade que
lhes fora negada em sua época, pois, ainda que tivessem uma boa recepção por parte do público,
essas escritoras foram desprezadas pela crítica e, consequentemente, excluídas dos registros
formais que são os responsáveis pela propagação da Literatura através dos tempos. É necessário
questionar, também, a estrutura acadêmica responsável por formar profissionais da área de
Letras, já que é por meio do ensino de Literatura nos cursos de graduação que os futuros
docentes terão acesso formal a esta literatura e, consequentemente, poderão levá-la para as salas
de aula da Educação Básica.
Sem o pioneirismo de Zahidé Lupinacci Muzart, é provável que esse quadro de
apagamento/esquecimento fosse ainda mais profundo do que é atualmente, pois a reunião feita
por ela e suas colaboradoras é o que existe de mais completo sobre o assunto até o presente
momento e que serve de base para pesquisas espalhadas por todo o país. Também é importante
destacar que esse tipo de trabalho tem cunho social e político, pois falar sobre o apagamento
das mulheres como produtoras de bens simbólicos 15 evidencia a invisibilização delas como
sujeitos na sociedade oitocentista. Afinal, esse é um “trabalho árduo e extenso do feminismo
histórico, um movimento que tem ressonância política” (MUZART, 2011 p. 17).
Zahidé Muzart, além de professora, editora e crítica feminista, também foi bolsista do
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) no início da década
de 1990, com seu projeto de resgate das escritoras brasileiras oitocentistas. Suas pesquisas
contaram com uma predominância de abordagens voltadas à articulação entre o texto literário
e seu contexto de produção, demonstrando a preocupação com o papel político da pesquisa e
sua possibilidade de afetar a sociedade. Segundo Muzart, elas estão inseridas
15
Segundo Pierre Bourdieu (2007), ‘bem simbólico’ define-se como objeto artístico ou cultural ao qual foi
atribuído um valor de mercado e transformado em mercadoria. Nesse sistema, vão existir grupos de produtores e
grupos de consumidores de bens simbólicos.
31
Em mais de uma década dedicando-se a um grande projeto de resgate, que contou com
a colaboração de outros grandes nomes da área, como Constância Lima Duarte 16, Rita
Terezinha Schmidt 17 e Eliane Vasconcellos 18, Zahidé Lupinacci Muzart trouxe 160 nomes de
escritoras que produziram literatura no século XIX, reunindo-os na antologia composta por três
volumes Escritoras brasileiras do século XIX (1999). Nos livros, ela e suas colaboradoras
discorrem sobre a vida dessas mulheres e mostram vários excertos de suas obras. Dentre essas
escritoras, alguns nomes que se destacam e ganharam a atenção da Academia, principalmente
após o projeto, foram os de Júlia Lopes de Almeida, Maria Firmina dos Reis (já mencionadas
neste trabalho) e Narcisa Amália, poetisa fluminense, nascida em São João da Barra (RJ),
cidade vizinha de Campos dos Goytacazes. Sobre ela, Sylvia Paixão, no primeiro volume da
obra organizada por Muzart, escreve:
Sylvia Paixão ainda menciona dois trabalhos anteriores que tratam da vida e obra da
escritora oitocentista, difundindo ainda mais informações sobre essa tão importante mulher que
por pouco não fora esquecida da história. Desta forma, em aproximadamente três mil páginas,
Muzart alcança o objetivo de jogar o holofote dos estudos acadêmicos para as mulheres que,
assim como Narcisa Amália, ficaram à margem da narrativa histórica hegemônica da Literatura
Brasileira.
Além disso, Muzart, sendo pioneira nos estudos sobre Literatura e Mulher no Brasil,
contribuiu forte e incansavelmente para a “definição do status da crítica literária enquanto uma
disciplina de caráter científico, assim como para a consolidação de uma crítica literária
feminista” (HELLMANN, 2017, p. 3), desde meados de 1980 até os últimos dias de sua vida.
Ela veio a falecer em 2015, tendo enviado seu último projeto como bolsista da CNPq três meses
antes. O legado que ela deixa é importantíssimo para a historiografia literária brasileira e é o
16
Constância Lima Duarte é doutora em Literatura Brasileira pela Universidade de São Paulo (1991), com vasta
experiência em pesquisa sobre os temas literatura de autoria feminina e crítica literária feminista;
17
Rita Terezinha Schmidt é doutora em Literatura pela Universidade de Pittsburgh (1983) e atua na área de
Literatura Comparada com foco na literatura de autoria de mulheres a partir de aportes de teorias feministas e pós-
coloniais;
18
Eliane Vasconcellos é doutora em Literatura Brasileira pela Universidade do Rio de Janeiro (1990), é museóloga
e especialista em acervos literários e também se dedica aos estudos que tratam da relação mulher-literatura.
32
objeto central de estudo deste trabalho. Neste capítulo será abordado o que Zahidé Muzart
revelou e quais foram os ecos de seu legado no campo acadêmico e editorial do Brasil.
Muzart deixa claro nas primeiras páginas do primeiro volume de sua antologia que a
obra não é a primeira sobre mulheres escritoras a ser publicada no Brasil. Inês Sabino, em 1899,
publica o importante livro Mulheres ilustres do Brasil; Henriqueta Galeno, em 1971, organiza
e publica a coleção de quatro volumes Mulheres do Brasil. Existem ainda algumas antologias
sobre o tema, como a de Cândida Brito de 1929, intitulada Antologia feminina, e a de Alzira
Tacques, Perfis de musas, poetas e prosadoras brasileiras (1956), entre outras. Contudo, como
aponta a autora, são ainda muito poucas as obras que, de fato, reproduzem os textos dessas
escritoras do passado (MUZART, 2000, p.17).
Sendo assim, Muzart é considerada atualmente a pioneira no que diz respeito ao resgate
desses textos que tanto têm a dizer sobre uma época em que a mulher tinha que transgredir para
produzir literatura. Sua antologia traz vários excertos de cada escritora citada, além de sua
biografia e contexto histórico-social arrumados de forma cronológica, o que permite ao leitor e
a outros pesquisadores acesso a um material riquíssimo da geração oitocentista.
Advindo do Grupo de Trabalho (GT) “A Mulher na Literatura”, da Associação Nacional
de Pós-Graduação e Pesquisa em Letras e Linguística (ANPOLL), que se calca nos chamados
Estudos da Mulher e no feminismo, o trabalho integrante que resultou nesta antologia revela
ainda algumas análises sobre os fatores que levaram a não-canonização dessas escritoras,
considerando que algumas delas tiveram espaço para publicar e algum apoio da crítica da época.
De acordo com Muzart, para além da questão de gênero feminino e todos os aparatos sociais
limitantes concernentes a esta “condição” (tratados no Capítulo anterior deste trabalho), existia
também a questão do gênero literário: as poetisas eram as mais aceitas e, em certo ponto, até
respeitadas do que as que escreviam em outros formatos, isto porque esses textos se mantinham
numa “temática nobre” e “dentro do âmbito dos sentimentos familiares” (MUZART, 2000, p.
26). Eram as poetisas, portanto, mais aceitas, pois ainda estavam dentro do código de
moralidade da burguesia; as dramaturgas e as narradoras, em contrapartida, eram as mais
ignoradas.
A escritora Maria Benedita Câmara Bormann (1853-1895), de pseudônimo Délia, é
mais um grande exemplo citado por Muzart de narradora omitida, por esses motivos, da
historiografia literária brasileira. Natural de Porto Alegre, Maria Benedita foi uma cronista,
33
contista e romancista que viveu no Rio de Janeiro desde os dez anos de idade e passou boa parte
de sua carreira literária publicando nos principais jornais cariocas, como Gazeta da Tarde, O
País e A Notícia. Além disso, publicou ainda diversos livros, entre eles: Aurélia (1883); Uma
vítima, Duas Irmãs e Magdalena (1884); Lésbia (1890) e Celeste (1893). A seção presente no
primeiro volume de Escritoras Brasileiras do Século XIX (2 ed., 2000) que aborda vida e obra
de Délia fica a cargo de Norma Telles, que conta:
Desta forma, a autora enfatiza que só há libertação para as mulheres por meio
principalmente da instrução. Nesse sentido, Zahidé se junta a ela e às tantas outras escritoras
34
resgatadas por sua iniciativa, como Nísia Floresta, em um lugar de luta pelo direito das mulheres
ao pleno acesso ao conhecimento, à instrução, e pelo mesmo espaço de produção e
reconhecimento que é, até hoje, muito mais conferido aos homens. O movimento de resgatar
essas escritoras é uma forma de mostrar que sempre houve a mesma capacidade de produção
que eles, só não havia equidade de atribuição de valor às obras:
No início de minha pesquisa, era voz corrente que aquelas mulheres do século
XIX nada tinham escrito, e, por conseguinte, menos ainda publicado enquanto
viveram. No entanto, logo ficou claro que, na verdade, não só escreveram e
publicaram uma grande quantidade de textos, mas, bem mais que isso, que
esses textos constituíam um legado de boa qualidade literária e de valor
histórico inquestionável. Tudo ficou ainda mais evidente quando descobrimos
que de nada adiantaria apenas revelar os nomes dessas escritoras, os
pormenores de suas vidas, relacionar o que escreveram. Era fundamental
republicá-las hoje. (MUZART, 2014, p. 431)
Como já dito no capítulo 2 deste trabalho, a partir dos anos 70 acontece a inserção de
mulheres nas universidades brasileiras e, com isso, surgem muitas pesquisas que legitimam a
mulher como objeto de estudo e a reconhecem como agente histórico. Dessa década para frente,
como contam Costa, Barroso e Sarti (2019), há uma fase muito importante de “consolidação e
expansão em que a legitimidade dessa área de estudo não está mais por comprovar, e as
exigências são de outra ordem, maior rigor científico e elaboração teórica mais sólida” (p. 112).
É nessa perspectiva que é criada por Zahidé Muzart, Susana Funck e Elvira Sponholz, em 1991,
a Editora Mulheres. O papel que ela desempenhou foi importantíssimo para a Literatura
Brasileira e para o campo editorial no país, porque foi criada com o intuito de republicar não
apenas os textos literários das escritoras oitocentistas, como também investir na publicação e
tradução de ensaios sobre estudos de gênero e feminismo de outras pesquisadoras, trilhando a
linha da crítica feminista e contribuindo ricamente para essa consolidação e expansão citada
por Costa, Barroso e Sarti.
De acordo ainda com Ana Elisa Ribeiro e Sérgio Karam (2020), muitas das obras
publicadas pela Editora se tornaram, posteriormente, “referência na formação de outras
gerações de pesquisadoras/es e mesmo de escritoras brasileiras” (RIBEIRO e KARAM, 2020,
p. 5), mas não sem obstáculos: além das dificuldades financeiras, se colocando, Zahidé, como
uma editora mais preocupada com consciência política e cultural do que com lucros comerciais,
a Editora ainda sofria com o descrédito e preconceito do mercado por ser de pequeno porte,
com o título “Mulheres” e por ser dirigida por mulheres mais velhas e aposentadas (MUZART,
2004, p. 104). Resiliente, a mulher editora não deixou que esses obstáculos impedissem a
Editora Mulheres de funcionar: supervisionava diretamente todo o processo editorial das obras
35
Foi nessa linha de inclusão e confronto de alicerces que a Editora funcionou entre os
anos de 1991 e 2015. Seu catálogo pode ser acessado pelo link: Catálogo novembro 2015
(nonada.com.br). A título de legado, escritoras de importante relevância, como Júlia Lopes de
Almeida, tiveram suas obras trazidas, novamente ou de forma inédita, a conhecimento e acesso
público, como já foi mencionado anteriormente neste trabalho.
Assim como as oitocentistas, a própria Muzart vem experimentando apagamentos.
Primeiro, a Editora Mulheres foi vendida por seus herdeiros após a morte de sua principal
idealizadora em 2015, e deixou de cumprir o objetivo para o qual foi criada. Sobre isso, Ana
Elisa Ribeiro e Sérgio Karam (2020) contam que visitaram o site em 2019 e o que encontraram
foi uma Editora Mulheres que presta outro tipo de serviço: “Pesquisadoras do GT Mulher na
Literatura mantiveram certo ritmo de publicações, empregando a marca da editora, no entanto
a perda de força do selo é sensível” (2020, p. 4). Contudo, neste ano de 2022, não se encontra
nenhuma página na web da empresa e nem informação mais recente sobre a que fim levou,
deixando a ideia que a Editora possivelmente não existe mais.
Além disso, nós mesmas tivemos muita dificuldade em adquirir a antologia completa
Escritoras Brasileiras do Século XIX para a realização deste trabalho – isso sem contar que
nunca tínhamos ouvido falar do nome Zahidé Muzart nem das escritoras aqui citadas, exceto
uma menção ou outra a Júlia Lopes, durante todo o curso de formação. Havia pouquíssimos ou
nenhum exemplar da antologia em livrarias e sebos (físicos e virtuais) e, quando
encontrávamos, era apenas um dos três volumes. Foi preciso entrar em contato com a
Universidade de Santa Catarina – momento no qual também nos deparamos com outro
empecilho, pois cada site da internet informava um número de telefone diferente e, quando
conseguimos algum existente e a ligação completava, transferiam-nos de setor em setor até
36
chegarmos finalmente ao responsável pelo material produzido pela antiga Editora. Por fim,
conseguimos os três volumes.
A pergunta “Onde está Zahidé?” foi feita a Ribeiro e Karam no IX Colóquio de
Mulheres em Letras da UFMG em 2017, quando apresentaram uma pesquisa sobre mulheres
editoras no Brasil sem o nome de Zahidé Lupinacci Muzart em sua lista, o que levou parte da
plateia a confrontar os pesquisadores sobre esta ausência. Em resposta, eles produziram o artigo
“Editora Mulheres, Zahidé Muzart e um caso relevante de edição de livros no Brasil” (2020),
que foi utilizado neste trabalho. Como eles, alguns poucos nomes também produzem pesquisas
na tentativa de manter vivo o nome e a importante contribuição desta mulher para o Brasil. A
este propósito, humildemente, este trabalho também se junta.
não abordam explicitamente os assuntos “gênero” e “orientação sexual”, deixando que fique a
cargo da opinião pessoal do professor a decisão de abordá-los ou não com os alunos.
A exclusão do primeiro tema afeta diretamente a discussão acerca do papel da mulher
na sociedade e da busca pela emancipação, fazendo com que reflexões como a tratada neste
trabalho sejam vistas como irrelevantes, acarretando no retrocesso que foi tão combatido por
Zahidé e tantas outras profissionais da educação. Tal retrocesso evidencia que a luta travada
por Muzart e suas contemporâneas está longe do fim, mas não deve ser abandonada.
Com resultado de muita reflexão, a proposta de aula 19 apresentada aqui traz a poeta
gaúcha Rita Barém de Melo (1840-1868) para o centro da discussão sobre o Romantismo
brasileiro, devido a sua grande contribuição no que diz respeito a uma compreensão mais ampla
do período literário em questão, como afirma Rita Terezinha Schmidt:
Mesmo com pouco acesso à educação formal, quando ela ainda tinha 15 anos, fez sua
estreia publicando no periódico O Guaíba, semanário famoso no sul do país. Além disso, esteve
envolvida com o cenário jornalístico da época também por meio de contribuições feitas ao
jornal O Artista, de Rio Grande (RS). Segundo Schmidt (2004), sua obra teve grande influência
à época, apesar de não estar presente nos registros por mais de um século devido ao
posicionamento excludente da crítica literária em relação às produções de autoria feminina.
Marcada por sua sensibilidade aguçada e emoções fortes, embora tratadas com
serenidade, a poesia de Barém de Melo em certo ponto se assemelha com a estética e a temática
das obras de Casimiro de Abreu, sendo um bom paralelo para trabalhar em sala de aula. Desse
modo, o plano de aula em questão traz como proposta a leitura e análise dos poemas 20 “A... Eu
não posso te amar” e “O canto da índia”, ambos da autora Rita Barém de Melo, e a possível
relação estética e temática com seus contemporâneos “Amor e medo”, de Casimiro de Abreu,
e “Leito de Folhas Verdes”, de Gonçalves Dias.
A escolha desta autora e destes poemas se deu pela preocupação em selecionar textos
que fossem facilmente identificados pelos alunos como pertencentes ao período literário em
questão. Rita Barém de Melo foi uma das autoras oitocentistas que teve melhor aceitação da
19
A proposta de aula elaborada encontra-se no Anexo I deste trabalho.
20
Assim como a proposta de aula, os poemas citados encontram-se no Anexo II deste trabalho.
39
crítica de sua época por ter produzido nos moldes esperados, possibilitando a elaboração de
uma proposta de aula na qual o foco seja o estudo das características típicas do Romantismo,
por meio de textos de autoria feminina e masculina e da comparação entre eles. Além disso, o
uso do gênero poema torna mais viável para a/o profissional docente trabalhá-lo em dois tempos
(50 minutos cada) de aula, por serem mais curtos do que as narrativas em prosa.
Sendo assim, o professor deverá iniciar a aula com provocações que façam os alunos
pensarem sobre os comportamentos de homens e mulheres diante de possíveis flertes amorosos,
com indagações como: “Você é cortejada/o por uma pessoa que lhe demonstra amor, mas você
não se sente atraída/o. Neste caso, o que você faria ou diria a essa pessoa? Mulheres e homens
agem da mesma forma quando é preciso recusar alguém? Socialmente, homens e mulheres que
recusam possíveis parceiros são avaliados da mesma forma?”.
A partir das respostas, pressupõe-se que os alunos compreendam que os
comportamentos de homens e mulheres deveriam ser muito diferentes nos séculos passados,
sendo os homens os detentores do poder de aceite ou recusa em potenciais relacionamentos e,
para as mulheres, somente existia a possibilidade de esperar passivamente que algum homem a
cortejasse ou que algum parente, também do sexo masculino, arranjasse um pretendente
aceitável, o que retirava a autonomia e o protagonismo das mãos das mulheres, como já foi
citado ao longo do trabalho.
Com esta introdução ao assunto, os alunos poderão refletir acerca da socialização de
gênero imposta às mulheres e as implicações disso na vida pessoal e profissional das escritoras
da época, preparando-os para adentrar na discussão sobre a vida e obra da autora principal a ser
estudada, Rita Barém de Melo, bem como uma rápida contextualização histórica. Para dar
sequência à proposta de aula, seria realizada, também, a leitura e análise dos poemas citados.
Esta tarefa pode ser realizada oralmente, dividindo a turma em grupos, assim o professor pode
se colocar como um mediador do debate, que deve ser primeiramente focado nas percepções
dos alunos, sem tanto rigor acadêmico.
Em um momento posterior a este debate, após o reconhecimento dos textos, com o
auxílio do material didático oferecido pela unidade escolar e as anotações que o professor
trouxer a respeito do Romantismo, poderá ser realizada uma análise mais criteriosa dos poemas
de Rita Barém de Melo, Casimiro de Abreu e Gonçalves Dias, que já servirá como uma forma
de avaliação, por ser um meio de identificar como vem se dando o aprendizado destes alunos
sobre o assunto, pois pressupõe-se que esta aula não seja o primeiro contato dos alunos com a
escola literária abordada. A forma como o professor decidirá conduzir a aula influenciará
diretamente nas impressões dos alunos sobre o tema, por isso é importante que seja trabalhada
40
a qualidade estética dos poemas de Barém de Melo de maneira equivalente ao tratamento dado
às obras de autoria masculina, e que esta crítica ao cânone seja parte integrante da aula, para
que os alunos não reproduzam o menosprezo que era direcionado aos poemas das autoras
oitocentistas.
Sugere-se que, para finalizar a aula, o professor incentive a turma a realizar pesquisas
sobre a literatura de autoria feminina do século XIX e oriente que, para dar continuidade aos
estudos sobre o Romantismo eles levem, na próxima aula, breves apresentações sobre outras
escritoras e trechos de poemas, para que apresentem aos colegas em um seminário rápido, pois
este tipo de atividade promove a autonomia no processo de ensino-aprendizagem.
Com este breve plano de execução de aula espera-se que haja uma aproximação entre
as produções das escritoras oitocentistas e os jovens que estão inseridos no ambiente escolar da
Educação Básica, visando difundir o conhecimento sobre a existência dessas escritoras, suas
vivências e obras, como citado anteriormente. Além disso, a proposta visa promover o
pensamento crítico destes estudantes, a fim de evitar que esse histórico de exclusão das
mulheres na Literatura não se perpetue, e fornecer incentivo para que novas vozes femininas
ganhem fôlego.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa foi iniciada com base nos conhecimentos que adquirimos ao longo
da graduação e um sentimento de inconformidade, de certa maneira, um lamento por não termos
acessado esta discussão quando estudamos sobre a Literatura Brasileira do século XIX. Nos
últimos anos, entretanto, nos surpreendemos de forma positiva ao saber que as escritoras
oitocentistas vêm sendo inseridas no currículo do curso, sendo assunto, também, de pesquisas
de outras colegas de graduação.
Não podemos considerar que nossas reflexões aqui apresentadas encerram o assunto e
solucionam a problemática do silenciamento enfrentado pelas mulheres oitocentistas, mas
finalizamos esta análise, por ora, com a certeza de que mais um pequeno passo foi dado e que
nossa contribuição também faz parte do legado de Zahidé Lupinacci Muzart.
43
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XIX: antologia, vol. I. 1 ed. Florianópolis: Editora Mulheres; Santa Cruz do Sul: EDUNISC,
2004. p. 359-373.
SHARPE, Peggy. Júlia Lopes de Almeida. In: MUZART, Zahide (org.). Escritoras Brasileiras
do Século XIX: antologia, vol. II. 1 ed. Florianópolis: Editora Mulheres; Santa Cruz do Sul:
EDUNISC, 2004. p. 188-238.
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TELES, Maria Amélia. Breve história do feminismo no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1999.
TELLES, Norma. Escritoras, escritas, escrituras. In: DEL PRIORE, Mary (org.); PINSKY,
Carla Bessanezi (coord. de textos). História das mulheres no Brasil. 10. ed. São Paulo:
Contexto, 2018. p. 401-441.
______. Maria Benedita Câmara Bormann (Délia). In: MUZART, Zahidé Lupinacci. (Org.).
Escritoras brasileiras do século XIX: antologia, vol. I. 2 Ed. Florianópolis: Editora Mulheres;
Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2000. p. 567-590.
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ANEXOS
V. Conteúdo e desenvolvimento:
● Breve reflexão em grupo sobre os papéis de gênero na sociedade oitocentista;
● Rápida contextualização histórica sobre o século XIX, retomando pontos chave
sobre o Romantismo;
● Leitura e análise dos poemas: I - “A… Eu não posso te amar”, II - “O canto da
índia”, III - “Amor e medo” e IV - “Leito de Folhas Verdes”;
● Vida e obra da autora Rita Barém de Melo;
● Avaliação oral sobre o aprendizado dos alunos sobre Romantismo e a autoria
feminina no século XIX;
● Proposta de atividade de pesquisa sobre outras autoras da época a fim de realizar
um seminário na aula seguinte e dar continuidade aos estudos sobre o assunto.
VI. Bibliografia
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SCHMIDT, Rita Terezinha. Rita Barém de Melo. In: MUZART, Zahidé (org.). Escritoras
Brasileiras do Século XIX: antologia, vol. I. 1 ed. Florianópolis: Editora Mulheres; Santa Cruz
do Sul: EDUNISC, 2004. p. 359-373.
A) Unidades temáticas:
B) Campos
Campo artístico-literário
C) Competências
2- Compreender os processos identitários, conflitos e relações de poder que permeiam as práticas sociais de linguagem,
respeitando as diversidades e a pluralidade de ideias e posições, e atuar socialmente com base em princípios e valores assentados
na democracia, na igualdade e nos Direitos Humanos, exercitando o autoconhecimento, a empatia, o diálogo, a resolução de
conflitos e a cooperação, e combatendo preconceitos de qualquer natureza.
3- Utilizar diferentes linguagens (artísticas, corporais e verbais) para exercer, com autonomia e colaboração, protagonismo e
autoria na vida pessoal e coletiva, de forma crítica, criativa, ética e solidária, defendendo pontos de vista que respeitem o outro
e promovam os Direitos Humanos, a consciência socioambiental e o consumo responsável, em âmbito local, regional e global.
6- Apreciar esteticamente as mais diversas produções artísticas e culturais, considerando suas características locais, regionais e
globais, e mobilizar seus conhecimentos sobre as linguagens artísticas para dar significado e (re)construir produções autorais
individuais e coletivas, exercendo protagonismo de maneira crítica e criativa, com respeito à diversidade de saberes, identidades
e culturas.
D) Habilidades
(EM13LGG302) Posicionar-se criticamente diante de diversas visões de mundo presentes nos discursos em diferentes
linguagens, levando em conta seus contextos de produção e de circulação.
(EM13LGG303) Debater questões polêmicas de relevância social, analisando diferentes argumentos e opiniões, para formular,
negociar e sustentar posições, frente à análise de perspectivas distintas.
(EM13LGG604) Relacionar as práticas artísticas às diferentes dimensões da vida social, cultural, política e econômica e
identificar o processo de construção histórica dessas práticas.
Texto I
A… Eu não posso te amar
(Rita Barém de Melo)
Se te amara,
Confessara
Meu amor;
Nem te amo,
Nem m’inflamo
Nesse ardor.
(J. Aboim)
Texto II
O canto da índia
(Rita Barém de Melo)
Texto III
Amor e Medo
(Casimiro de Abreu)
Texto IV
Leito de folhas verdes
(Gonçalves Dias)