Você está na página 1de 124

Relatividade e Cosmologia

Nelson J. Nunes
Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa,
Departamento de Fı́sica,
Instituto de Astrofı́sica e Ciências do Espaço
Contents

1 Introdução 2

2 O que é a Relatividade Geral? 3

3 Os princı́pios da Relatividade Geral 4

4 Princı́pio da equivalência 6

5 A luz sente a gravidade 9

6 Desvio para o vermelho gravitacional 10

7 A equação da geodésica 12

8 O limite Newtoniano ou limite do campo fraco 16

9 O desvio para o vermelho gravitacional revisitado 18

10 Vectores e tensores 19
10.1 Vector contravariante 19
10.2 Vector covariante 20
10.3 Tensores 20

11 Derivada covariante 22

12 Derivada total e o transporte paralelo 24

13 Curvatura 26

14 As identidades de Bianchi contraı́das 29

15 O tensor energia-momento 30

16 As equações de Einstein 31

17 As soluções esfericamente simétricas 34

18 A solução de Schwarzschild 35

19 A equação de Binet na mecânica Newtoniana 36

20 A equação de Binet na Relatividade Geral 37

21 Precessão do periélio de Mercúrio 38

–i–
22 Deflexão dos raios luminosos 40

23 Atraso gravitacional de Shapiro 42

24 Singularidades da métrica de Schwarzschild 44

25 Partı́culas em queda livre radial 45

26 Fotões em queda livre radial 47

27 Coordenadas de Kruskal-Szekeres 49

28 Ponte de Einstein-Rosen ou buraco de verme 52

29 Diagrama de Penrose para Kruskal 54

30 A equação de desvio geodésico Newtoniano 56

31 A equação de desvio geodésico na Relatividade Geral 57

32 Ondas gravitacionais 59

33 Graus de liberdade das perturbações gravitacionais 62

34 Polarização das perturbações gravitacionais 64

35 Emissão de ondas gravitacionais 66

36 O princı́pio cosmológico 69

37 A métrica de Friedmann-Lemaı̈tre-Robertson-Walker (FLRW) 70

38 A equação de Friedmann 72

39 A equação da continuidade 73

40 A lei de Hubble-Lemaı̈tre 75

41 Formas de matéria 76

42 Desvio para o vermelho cosmológico 78

43 Os parâmetros cosmológicos 79

44 Universo dominado por matéria 80


44.1 Universo sem constante cosmológica 80
44.2 Universo com constante cosmológica negativa 82
44.3 Universo com constante cosmológica positiva 83

– ii –
45 A idade do Universo 86

46 Distâncias em cosmologia 88

47 Distância luminosa e magnitude aparente 90

48 Horizontes em cosmologia 92

49 Densidades tensoriais 94

50 O determinante da métrica 95

51 Coordenadas geodésicas 97

52 O princı́pio variacional para a Relatividade Geral 98

53 O Lagrangiano de matéria 100

54 Tensor energia-momento do electromagnetismo 101

55 Tensor energia-momento para um campo escalar 102

56 O método de Palatini 104

57 Teorias f (R) 106

58 Teorias de f (R) no formalismo de Palatini 108

59 Teorias escalares-tensoriais 111

60 O Lagrangiano de Horndeski 112

61 Derivada de Lie 113

62 Vectores de Killing 116

63 Soluções de Bianchi I no vazio 119

–1–
1 Introdução
“Eu nunca ensino nada aos meus alunos, eu só facilito as condições para
que eles consigam aprender.”
A. Einstein

Estas notas resultam da compilação dos meus apontamentos para o curso de Relatividade
e Cosmologia dado na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Curiosamente,
o primeiro ano em que dei esta disciplina, 2015, celebrava-se o centenário do nascimento
da teoria da Relatividade Geral. No ano seguinte celebrava-se o centenário da descoberta
teórica das ondas gravitacionais, o mesmo ano em que foi anunciada a detecção da primeira
onda gravitacional. Em 2017 celebrava-se o centenário da aplicação da relatividade geral
à Cosmologia. Em 2018 vimos a primeira colisão de estrelas de neutrões e em 2019 a
primeira imagem da sombra de um buraco negro. Em 2020 foi reconhecido o trabalho de
Roger Penrose no tema das singularidades dos buracos negros ao receber o Prémio Nobel
da Fı́sica nesse ano. Torna-se evidente assim que a Relatividade Geral continua uma área
muito activa com aplicações no quotidiano e noutra áreas da Fı́sica e previsões ainda por
confirmar.
A compilação destas notas foram-me um pouco forçadas, e deveram-se à pandemia da
Covid-19 que obrigaram qualquer docente a reinventar os métodos de estudo habituais. O
resultado foi uma reflexão maior sobre os meus apontamentos, melhorando-os, e permitindo
que eu pudesse entender um pouco melhor o ”reino das ideias” geniais e elegantes da
relatividade geral.
O objectivo é dar uma visão geral da Relatividade Geral com aplicações à cosmologia e
também com o intuito de preparação para a disciplina de Universo Primitivo e Cosmologia
Fı́sica. Tenta ser uma abordagem muito simples evitando quanto possı́vel a introdução de
nova matemática coisa que só é feita quando são necessárias novas ferramentas para que se
possa progredir. E claro, não dispensa a leitura da biografia recomendada e na qual estas
notas beberam muito [1–5].
Devo ainda agradecer as contribuições dos alunos Ana Ribeiro (cap. 58), Pedro Ruivo
(caps. 61, 62), e Rafael Pastor e Beatriz Reis (cap. 63), para alguns dos capı́tulos da sebenta
como resultado das suas respectivas apresentações sobre um tópico à escolha.

–2–
2 O que é a Relatividade Geral?
“Quando estás a cortejar uma bela jovem, uma hora parece um segundo.
Quando te sentas numas brasas quentes e vermelhas, um segundo parece
uma hora. Isso é a relatividade.”
A. Einstein

A Relatividade Geral é uma extensão das leis de Newton e da relatividade restrita na


medida em que procura escrever as equações de forma que estas sejam independentes entre
referenciais inérciais mas também entre referenciais acelerados.
Nesta procura, encontra-se uma teoria goemétrica da gravitação que reinterpreta a
gravidade como uma manifestação da curvatura do espaço tempo. Esta relaciona-se com
a energia e o momento da matéria presente. A quatificação desta ligação está especificada
num conjunto de equações diferenciais chamadas, as equações de Einstein.
A relatividade tem feito um número de previsões impressionante

1. Dilatação gravitacional do tempo (o tempo passa mais depressa perto de uma fonte
gravitacional)

2. Lentes gravitacionais (curvatura da luz perto de uma fonte gravitacional)

3. Desvio para o vermelho gravitacional (a redução da frequência da luz ao abandonar


um campo gravitacional)

4. Atraso do tempo gravitacional (efeito de a luz levar mais tempo a chegar quando a
trajectória passa junto a um objecto massivo)

5. Ondas gravitacionais (a propagação das perturbações gravitacionais)

6. Buracos negros (objectos astrofı́sicos extramamente densos)

7. Cosmologia (a dinâmica e fases de evolução do Universo)

–3–
3 Os princı́pios da Relatividade Geral

[D’Inverno cap. 9]
“E foi quando me ocorreu a ideia mais feliz da minha vida na seguinte
forma. O campo gravitacional só tem uma existência relativa... Porque
para um observador em queda livre do telhado de uma casa não existe
(pelo menos na sua vizinhança) campo gravitacional. De facto, se o ob-
servador deixar cair alguns corpos estes manter-se-ão relativamente a
ele num estado estacionário ou em movimento uniforme, independente-
mente da sua natureza quı́mica ou fı́sica.”
A. Einstein

Quando Einstein se preparava para uma revisão da sua teoria da relatividade restrita
pensou no facto que uma pessoa que salta do telhado de um prédio não sente o seu peso.
Este pensamento que mais tarde descreveu como “A ideia mais feliz da minha vida”, foi
a semente de onde nasceu a teoria da relatividade geral na qual podemos identificar os
seguintes princı́pios:

1. Princı́pio da equivalência
O movimento de uma partı́cula teste num campo gravitacional não depende da sua
massa ou composição.
Daqui saem duas consequências.

(a) Não há experiências locais que possam distinguir uma queda livre sem rotação
num campo gravitacional de um movimento uniforme no espaço na ausência de
campo gravitacional.

–4–
(b) Um referencial acelerado relativamente a um referencial inercial em relatividade
restrita, é idêntico a um referencial em repouso num campo gravitacional.

2. Princı́pio da covariância geral


Todos os observadores são equivalentes. Ou por outras palavras, as leis da fı́sica
devem ter todas a mesma forma em todos os referências. Eisntein acreditava que
todos os observadores, inérciais ou não, devem ser capazes de descobrir as leis da
fı́sica.

3. Princı́pio da correspondência
A relatividade geral deve concordar com a relatividade restrita na ausência de gravitação
e com a gravitação Newtoniana no limite do campo fraco e pequenas velocidades.

4. Princı́pio do acoplamento mı́nimo


A fazer a transição da mecânica ou da relatividade restrita para a relatividade geral,
as derivadas parcias tornam-se derivadas covariantes e nunca são adicionados termos
que empreguem explicitamente o tensor de curvatura. Este explicaremos melhor mais
tarde quando for necessário empregá-lo.

–5–
4 Princı́pio da equivalência

[D’Inverno cap. 9.3; Ferreira cap. 3; Hartle cap. 6.1]


“Não é que eu seja muito esperto, o que acontece é que eu permaneço
com os problemas durante mais tempo.”
A. Einstein

O princı́pio da equivalência assenta na identificação da massa inercial com a massa


gravitacional. Recordando a segunda lei de Newton e a lei da atracção universal de Newton,
temos para a massa inercial

F~ = mI ~a

e para a massa gravitacional

F~ = −mG ∇φ = mG~g

onde φ é o campo gravitacional. Vamos assumir duas partı́culas de massas inerciais mI1 e
mI2 e massas gravitacionais mG G
1 e m2 , que são deixadas cair da mesma altura num campo
gravitacional φ. Então temos

F~1 = mI1~a1 = mG
1~g
F~2 = mI2~a2 = mG
2~g

Se ~a1 = ~a2 , então tiramos que

mI1 mI2
=
mG
1 mG
2

e por uma escolha adequada de unidades, podemos dizer que mI = mG , ou seja, as massas
inercial e gravitacional são idênticas. Alternativamente, se ~a1 6= ~a2 , então a quantidade

a1 − a2 mG /mI − mG I
2 /m2
η=2 = 2 1G 1I
a1 + a2 m1 /m1 + mG I
2 /m2

não se nula. É precisamente este parâmetro que é medido (ou constrangido) pela ex-
periência de Eotvös. Usando berı́lio e titânio para cada uma das massa no campo gravita-
cional da Terra, temos

η = (0.3 ± 1.8) × 10−13

Usando o sistema Terra-Lua, no campo gravitacional do Sol, ficamos com

η = (−1.0 ± 1.4) × 10−13

A formulação moderna do princı́pio da equivalência tem três versões.

–6–
Figure 1. Idealização da experiência de Eötvos. Emprestado de C. Will, “Was Einstein right?”

Figure 2. Vista de perfil do aparato mostrando as forças que actuam em cada uma das massas.
Para que não haja torção, as componentes da força gravitacional e da força centrı́fuga no plano
de torção têm de se anular. Isto só pode acontecer se mG /mI for igual para as duas massas. As
componentes verticais são canceladas pela tensão no fio que liga à barra.

1. Princı́pio da equivalência fraco


Uma vez definidas a posição e velocidades iniciais, todas as partı́culas teste sem carga
em queda livre, seguem as mesmas trajectórias.

2. Princı́pio da equivalência de Einstein


Extende o princı́pio de equivalência fraco a todos os referenciais em queda livre onde
se deve recuperar as leis da relatividade restrita independentemente da posição e ve-
locidades iniciais (localmente e sem contar com forças de maré).

–7–
Este princı́pio é testado por variações de parâmetros adimensionais (como a factor
giromagnético do protão, a constante de estrutura fina) e razões entre massas (como
a razão entre a massa do protão e do electrão).

3. Princı́pio da equivalência forte


O princı́pio de equivalência de Einstein é válido não só para partı́culas teste mas
também para massas gravitacionais para qualquer referencial em queda livre (local-
mente e sem contar com forças de maré).
Este princı́pio é testado pela variação da constante gravitacional, ou de forma equiv-
alente, na variação da massa das partı́culas.

–8–
5 A luz sente a gravidade

[Hartle cap. 6.2]


O poder do princı́pio da equivalência deve-se à sua afirmação que é válido para todas
as leis da fı́sica. Por exemplo, temos de aceitar que também a luz cai num potencial
gravitacional com a mesma aceleração com que cai um corpo material. Para compreender
isto vamos imaginar que temos um fogetão no espaço longe de um campo gravitacional.
Vamos admitir que um raio de luz entra no fogetão com uma velocidade perpendicular à
velocidade do foguetão. Se o foguetão estiver parado, a luz entra por uma parede e sai na
parede adjacente num local à mesma altura da entrada. Contudo, se o foguetão estiver em
movimento uniforme, um observador no referencial do foguetão verá a luz descrever uma
trajectória que ainda é uma recta mas o raio abandonará o foguetão num ponto mais baixo
do que quando entrou. Se o foguetão tiver um movimento acelerado, a trajectória já será
curva e o ponto de saı́da ficará muito mais abaixo do ponto de entrada. Do princı́pio de
equivalência aprendemos que um referencial acelerado é equivalente a um referencial num
campo gravitacional. Ou seja, quando o foguetão está em repouso num campo gravitacional
uniforme, um observador no referencial do foguetão de facto vê a luz acelerar para baixo.
Então a luz curva num campo gravitacional? Sim, ou melhor a luz anda em linha
recta, o espaço é que é curvo devido à presença de matéria. É a partir desta ideia que
vamos construir a teoria da Relatividade Geral. Mas antes disso, vamos ver mais uma
consequência do princı́pio da equivalência.

–9–
6 Desvio para o vermelho gravitacional

[Hartle cap. 6.3]


“O cientista não é aquele que oferece as melhores respostas, mas aquele
que faz as perguntas certas.”
Claude Levi-Strauss

Já vimos que se as massas inérciais e gravitacional são iguais, qualquer partı́cula num
campo gravitacional, sofre uma aceleração ~g . Pelo princı́pio de equivalência, isto é equiva-
lente a termos as partı́culas fora do campo gravitacional mas num referencial acelerado de
~g . Vamos explorar esta identidade.
Consideremos dois observadores, A e B. O observador A está a uma altura h da su-
perfı́cie da Terra e B está à superfı́cie. A emite um sinal em t = tA = 0 e em ∆tA que é
recebido em B em tB e tB +∆tB . Isto tem de ser assim mesmo com ∆tB < ∆tA porque pelo
princı́pio da equivalência esta situação é equivalente a ser realizada longe de um campo
gravitacional mas num referêncial acelerado. Nesse caso, o segundo sinal chega a B mais
rápido do que o primeiro sinal chegou uma vez que o fotão tem uma distância mais curta
a percorrer.

t=0 t = tB t = ∆tA t = tB + ∆tB

– 10 –
O sistema pode então ser descrito num meio sem gravidade mas a deslocar-se para
cima com aceleração ~g . Temos que nas posições A e B,
1 1
yA (t) = gt2 + h , yB (t) = gt2
2 2
Temos então, para o primeiro sinal,
1
yA (0) − yB (tB ) = h − gt2B = ctB
2
e para o segundo, desprezando termos em (gh/c2 )2 ,
1 1
yA (∆tA ) − yB (tB + ∆tB ) = h + g∆t2A − g(tB + ∆tB )2
2 2
1 2
= h − g(tB + 2tB ∆tB ) + O(∆t2 )
2
1 2
= h − gtB − gtB ∆tB
2
= ctB − gtB ∆tB

Mas esta quantidade também tem de ser a distância percorrida pelo fotão entre os instantes
∆tA e tB + ∆tB ou seja,

ctB − gtB ∆tB = c(tB + ∆tB − ∆tA )


 g 
∆tA = ∆tB 1 + tB
c
e com tB ≈ h/c, (desprezando termos (gh/c2 )2 ),
 g 
∆tA = ∆tB 1 + 2 h
c

que como se esperava é ∆tA > ∆tB . Podemos ainda escrever gh em termos da diferença
de potencial em A e B, tal que gh = ΦA − ΦB e então
 
ΦA − ΦB
∆tA = ∆tB 1 +
c2

ou em termos da frequência
 
ΦA − ΦB
νA = νB 1−
c2

Ou seja, νA < νB , a frequência é menor acima da superfı́cie do que é à superfı́cie. Um


observador em B vê o tempo a passar mais depressa em A. Se fizermos as contas ao
contrário, um observador em A, vê o tempo a passar mais lentamente em B.

– 11 –
7 A equação da geodésica

[Gibbons cap. 5; D’Inverno cap. 7.6; Ferreira cap. 4]


Pelo princı́pio da equivalência, a queda de dois corpos não depende da massa. Na
relatividade geral, associamos a trajectória das partı́culas e corpos à curvatura do espaço
tempo.
Vamos admitir que o elemento de linha é dado pela métrica gab tal que

ds2 = gab (x)dxa dxb

Vamos também definir o tempo próprio, τ , de um relógio que se desloca ao longo de


uma curva como
Z p
cτ = dλ −gab ẋa ẋb

onde λ é um chamado parâmetro afim que nos diz a posição na trajectória da partı́cula e
ẋa = dxa /dλ. E para uma partı́cula com massa define-se a acção

S = −mc2 τ

Vamos tomar a métrica Minkowski como exemplo, temos então, gab = ηab , x0 = ct,
xi = (x, y, z) e x0 = λ = ct e ficamos com
s
Z r
1 dx 2 v2
Z  
2 2
S = −mc τ = −mc cdt 1 − 2 = −mc dt 1 − 2
c dt c

que é a acção na relatividade restrita como esperarı́amos. Identifica-se então o Lagrangiano,


L, com a expressão
q
L = −gab (x)ẋa ẋb

e usamos as equações de Euler-Lagrange para obter as equações do movimento, tal que,


 
d ∂L ∂L
c
− c =0
dλ ∂ ẋ ∂x
 
d 1 1 ∂gab a b
− gab (ẋb δca + ẋa δcb ) + ẋ ẋ = 0
dλ 2L 2L ∂xc
 
d 1 b 1 ∂gab a b
− 2gcb ẋ + ẋ ẋ = 0
dλ 2L 2L ∂xc

Agora note-se que se λ = τ então da definição de τ e de L, temos que L = c, e conse-


quentemente temos
d   1 ∂gab a b
gcb ẋb − ẋ ẋ = 0
dτ 2 ∂xc
∂gcb d b 1 ∂gab a b
gcb ẍb + ẋ ẋ − ẋ ẋ = 0
∂xd 2 ∂xc

– 12 –
Mas o segundo termo pode ser dividido em dois permutando b ↔ d porque são ambos
ı́ndices mudos, e no último termo fazemos a → d,
1 ∂gcb d b 1 ∂gcd b d 1 ∂gdb d b
gcb ẍb + ẋ ẋ + ẋ ẋ − ẋ ẋ = 0
2 ∂xd 2 ∂xb 2 ∂xc

Usando a definição de métrica inversa g ab = (gab )−1 = g ba , temos, g ca gcb = δba , e multipli-
cando a equação por g ca temos
 
1 ∂gcb ∂gcd ∂gdb
ẍa + g ca + − ẋb ẋd = 0
2 ∂xd ∂xb ∂xc

Esta é equação da geodésica que também se escreve como


 
a a
ẍ + ẋb ẋc = 0
bc

onde
   
a 1 ∂gdb ∂gdc ∂gbc
= g ad + −
bc 2 ∂xc ∂xb ∂xd

são os chamados sı́mbolos de Christoffel e que também se podem escrever como


 
a 1
= g ad (gdb,c + gdc,b − gbc,d )
bc 2

Este exercı́cio pode ser reproduzido se tivéssemos trabalhado com L2 = gab ẋa ẋb em
vez de L e usando S = dλ L2 , o que torna o cálculo um pouco mais fácil porque se evita
R

a raı́z quadrada e a divisão por L. Note-se também que fizémos este exercı́cio assumindo
uma partı́cula massiva, L = c. Para fotões, ds2 = 0 e consequentemente L = 0. Aqui as
coisas mudam um pouco mas ainda assim é possı́vel mostrar que a equação da geodésica
se escreve da mesma maneira para os fotões.
Para geodésicas temporais, espaciais e nulas usamos respectivamente, os parâmetros
afim λ = τ , λ = s e λ = σ tal que,

ds2 dxa dxb


c2 dτ 2 = −gab dxa dxb = −ds2 ⇒ L2 = − = −g ab = c2
dτ 2 dτ dτ
ds2 dxa dxb
ds2 = gab dxa dxb ⇒ L2 = 2 = gab =1
ds ds ds
dxa dxb
ds2 = 0 ⇒ L2 = gab =0
dσ dσ
para cada um dos casos, onde τ é tempo próprio e σ é um parâmetro afim que deixa a
equação da geodésica como nós a derivámos. [Para saber mais, ver o D’Inverno pag. 100].
Ou seja, para partı́culas normais temos L2 = c2 e para os fotões temos L2 = 0.

– 13 –
Uma consequência do que vimos acima é que o produto interno das velocidades são
respectivamente

ua ua = −c2 ,
ua ua = 1 ,
ua ua = 0 ,

para partı́culas mais lentas que a luz, partı́culas mais rápidas do que a luz e para os fotões.

Exemplo
Vamos calcular os sı́mbolos de Christoffel para a métrica da superfı́cie de uma esfera
de raio 1,

ds2 = dθ2 + sin2 θdφ2

de forma que
! !
1 0 1 0
(gab ) = , (g ab ) = 1
0 sin2 θ 0 sin2 θ

Seja x1 = θ e x2 = φ. Isto permite escrevermos com a = 1,


 
1 1
= g 1d (gdb,c + gdc,b − gbc,d )
bc 2
Como a métrica é diagonal, temos que na soma que envolve g 1d , só a contribuição g 11 não
é nula, e ficamos com
 
1 1
= g 11 (g1b,c + g1c,b − gbc,1 )
bc 2
Como a única derivada da métrica que não se anula é

gφφ,θ = g22,1 = 2 sin θ cos θ

temos que as componentes não nulas são para b = c = 2, e então


 
1 1 1
= g 11 (−gbc,1 ) = (1) (−2 sin θ cos θ) = − sin θ cos θ
22 2 2
Da mesma forma, agora temos para a = 2,
 
2 1
= g 2d (gdb,c + gdc,b − gbc,d )
bc 2
1
= g 22 (g2b,c + g2c,b − gbc,2 )
2
Agora as única possibilidade para o primeiro termo não se anular é que b = 2 e c = 1. A
única possibilidade para o segundo termo não se anular é que b = 1 e c = 2. E finalmente,
o terceiro termo anula-se sempre. Daqui resulta que
   
2 2 1 1
= = (2 sin θ cos θ) = cot θ
12 21 2 sin2 θ

– 14 –
Importa agora verificar estas relações a partir do princı́pio variacional. Neste caso, como o
elemento de linha é do género espaço, temos

ds2
L2 = = θ̇2 + sin2 θφ̇2
dλ2
Da equação de Euler-Lagrage para θ, temos

d ∂L2 ∂L2
− =0
dλ ∂ θ̇ ∂θ
d
(2θ̇) − 2 sin θ cos θφ̇2 = 0

θ̈ − sin θ cos θφ̇2 = 0

Comparando com a equação da geodésica, tiramos que


 
1
= − sin θ cos θ
22

E agora considerando a equção de Euler-Lagrange para φ temos

d ∂L2 ∂L2
− =0
dλ ∂ φ̇ ∂φ
d
(sin2 θφ̇) − 0 = 0

φ̈ + 2 cot θ θ̇φ̇ = 0

Note-se que no último termo estão duas contribuições contabilizadas. A θ̇φ̇ e φ̇θ̇, o que
significa que
   
2 2
= cot θ , = cot θ
12 21

que são as expressões que obtivémos aplicando directamente a definição dos sı́mbolos de
Christoffel.

– 15 –
8 O limite Newtoniano ou limite do campo fraco

[Ferreira cap. 6]
A partir de agora vamos fazer c = 1 que só voltará a aparecer de forma artificial quando
for preciso usar unidades naturais.
Vimos já que segundo o princı́pio da correspondência, a relatividade geral deve concor-
dar com a relatividade restrita na ausência de gravitação e com a gravitação Newtoniana
no limite do campo fraco e pequenas velocidades. Vamos então considerar um campo grav-
itacional fraco e estacionário e partı́culas não relativistas, portanto com velocidades v  1.
O último requerimento sugere que

dxi dt
 ≈1
dτ dτ
Então a equação da geodésica

d2 xa dxb dxc
 
a
+ =0
dτ 2 bc dτ dτ

fica simplificada para


2
d2 xa dx0
 
a
+ =0
dτ 2 00 dτ

Se o campo gravitacional é estacionário, então, ∂gab /∂t = 0, e os sı́mbolos de Christoffel


são
 
a 1 1
= g ad (g0d,0 + gd0,0 − g00,d ) = − g ad g00,d
00 2 2

Vamos agora considerar o campo fraco, ou seja, uma perturbação à métrica de Minkowsi
tal que

gab = ηab + hab

onde ηab = diag(−1, 1, 1, 1) e assumimos |hab |  1. Podemos expandir os sı́mbolos de


Christoffel em primeira ordem e obtemos
 
a 1 1
= − η ad h00,d = − h00,a
00 2 2

Substituindo na equação da geodésica,


2
d2 xa 1 ,a dx0

− h00 =0
dτ 2 2 dτ

E como x0 = t e dt/dτ ≈ 1, temos

d2 xa 1
= h00,a
dt2 2

– 16 –
que em notação vectorial se escreve como

d2~r 1
2
= ∇h00
dt 2
Se nos lembrarmos que da equação da aceleração de Newton, que a força é o gradiente de
uma potencial

d2~r
F~ = 2 = −∇Φ
dt
podemos indentificar

h00 = −2Φ

E então, g00 = η00 + h00 , fica

g00 = −(1 + 2Φ)

Ou seja, na mecânica Newtoniana, na presençaa de um campo estacionário, podemos es-


crever o elemento de linha como

ds2 = −(1 + Φ)dt2 + dxi dxi

– 17 –
9 O desvio para o vermelho gravitacional revisitado

[Ferreira cap. 6]
Consideremos o tempo próprio de uma partı́cula τ tal que,

ds2 = −dτ 2 = g00 dt2 + gij dxi dxj

e vamos escolher um sistema estacionário tal que dxi = 0, então temos usando o resultado
do capı́tulo anterior
√ √
dτ = −g00 dt = 1 + 2Φ dt ≈ (1 + Φ)dt

Comparemos agora os tempos em dois pontos distintos A e B, em que B está na


superfı́cie da Terra e A está acima da superı́cie,

s
dτA A
g00 1 + ΦA
= B
= ≈ (1 + ΦA )(1 − ΦB ) ≈ 1 + ΦA − ΦB
dτB g00 1 + ΦB

Ou em termos de frequências,

νA = νB (1 − (ΦA − ΦB ))

que ó mesmo resultado que obtivémos no capı́tulo 6 com c = 1. Como Φ = −GM/r, temos
ΦA − ΦB > 0 e resulta que νA < νB .
Esta diferença entre as frequeências em A e em B, foi testada pela primeira vez na
famosa experiência de Pound e Rebka em Harvard, com núcleos de 57 Fe.

– 18 –
10 Vectores e tensores

[Gibbons cap. 8; D’Inverno cap. 5]


Recordar que do princı́pio da covariância, devemos ser capazes de escrever as equações
da fı́sica de forma a que são válidas para cada sistema de coordenadas. Dado um sistema de
coordenadas xa , podemos sempre passar para um novo sistema de coordenadas x̃a = x̃a (xa )
e calcular a matriz Jacobiana
∂ x̃a
Jba =
∂xb
Dado um novo sistema de coordenadas x̄ = x̄a (x̃b ) temos
a

∂ x̄a ∂ x̄a ∂ x̃c


=
∂xb ∂ x̃c ∂xb
a a
e se a tansformação x → x̃ é invertı́vel,
 a
∂ x̃
det 6= 0
∂xb
e temos
∂xa ∂ x̃c
= δba
∂ x̃c ∂xb
10.1 Vector contravariante
Consideremos uma curva num espaço-tempo parametrizada por λ, tal que xa = xa (λ). O
vector tangente a esta curva é
dxa
Ta =

Nas coordendas x̃a temos

dx̃a
T̃ a =

Usando a regra da cadeia
dx̃a ∂ x̃a dxb
T̃ a ==
dλ ∂xb dλ
ou seja, o vector tangente transforma-se como
∂ x̃a b
T̃ a = T
∂xb

– 19 –
10.2 Vector covariante
Vamos agora ver os vectores que se transformam de forma oposta. Por exemplo, o gradiente
de uma função f , é desta forma

∂f
Fa = = ∂a f
∂xa

Agora usando a regra da cadeia temos

∂f ∂xb ∂f
F̃a = =
∂ x̃a ∂ x̃a ∂xb
e então o vector covariante transforma-se como

∂xb
F̃a = Fb
∂ x̃a

A contracção de um vector contravariante com um vector covariante

∂xb ∂ x̃a
F̃a T̃ a = Fb T c = δcb Fb T c = Fb T b
∂ x̃a ∂xc
vemos que é um invariante, ou seja, é um escalar, não há ı́ndices livres.

10.3 Tensores
Podemos agora generalizar para um objecto com um número arbitrário de ı́ndices em cima
e em baixo. Por exemplo, o tensor da métrica é um tensor de segunda ordem, com dois
ı́ndices covariantes.

ds2 = gab dxa dxb = g̃cd dx̃c dx̃d

mas como
∂xa c
dxa = dx̃
∂ x̃c
temos
∂xa ∂xb
g̃cd = gab
∂ x̃c ∂ x̃d
Em geral temos que um tensor Qab...
cd... se tranforma

∂ x̃a ∂ x̃b ∂xγ ∂xδ αβ...


Q̃ab...
cd... = ... Q
∂xα ∂xβ ∂ x̃c ∂ x̃d γδ...
Podemos ainda decompor um tensor numa parte simétrica e numa parte antisimétrica
tal que

Qab = Q(ab) + Q[ab]

– 20 –
onde Q(ab) é a parte simétrica

1
Q(ab) = (Qab + Qba ) = Q(ba)
2
e Q[ab] é a parte antisimétrica

1
Q[ab] = (Qab − Qba ) = −Q[ba]
2
Também se pode definir o traço de um tensor como a contração dos seus ı́ndices e mostra-se
facilmente que é um invariante.

∂ x̃a ∂xd c
Q̃aa = Q = δcd Qcd = Qcc
∂xc ∂ x̃a d

– 21 –
11 Derivada covariante

[Gibbons cap. 9]
Vimos que Fa = ∂a f se transforma como um vector covariante. Mas a sua derivada já
não se transforma como um vector covariante. Vejamos,
 c 
∂ F̃a ∂ ∂x ∂xc ∂xd ∂Fc ∂ 2 xc
= Fc = + Fc
∂ x̃b ∂ x̃b ∂ x̃a ∂ x̃a ∂ x̃b ∂xd ∂ x̃b ∂ x̃a

O primeiro termo é do género que nós estarı́amos à espera, mas a presença do segundo
termo impede que a deriva da seja um vector covariante. Portanto, a segunda derivada de
um escalar, ou Hessiana, não é um tensor covariante.
Vamos então introduzir a definição de derivada covariante, ∇a , tal que:

1. A derivada covariante de um escalar é igual à derivada parcial,

∇a f = ∂a f

2. Obedece à regra de Leibnitz, ou seja, para os tensores genéricos M e N ,

∇a (M N ) = (∇a M )N + M (∇a N )

onde se omitiram os ı́ndices.

3. Comuta com contracções entre ı́ndices,

∇a ∇a = ∇a ∇a

4. Aplicada a um vector contravariante temos

∇a V b = ∂a V b + Γbac V c

5. Aplicada a um vector covariante fica

∇a Ub = ∂a Ub − Γcab Uc

Estas quantidades Γabc são chamadas de conexões afim. Estas não são tensores. Na verdade,
debaixo de uma transformação de coordenadas, impondo que a derivada covariante se
transforma como um tensor,
c d
˜ a Ṽb = ∂x ∂x ∇c Vd

∂ x̃a ∂ x̃b
então as conexões afim transforma-se na forma
∂ x̃a ∂xg ∂xd e ∂ x̃a ∂ 2 xe
Γ̃abc = Γ +
∂xe ∂ x̃b ∂ x̃c gd ∂xe ∂ x̃b ∂ x̃c
que fica como exercı́cio mostrar.

– 22 –
Para tensores mais gerais temos

∇a Mbc = ∂a Mbc − Γdab Mdc − Γdac Mbd


∇a N bc = ∂a N bc + Γbad N dc + Γcad N bd
∇a Ocb = ∂a Ocb + Γbad Ocd − Γdac Odb

Define-se ainda o tensor de torção como


b
Tac = Γbac − Γbca

b = −T b = 2Γb . Podemos deduzir, a partir


que é portanto, um tensor antisimétrico, Tac ca [ac]
da transformação de Γbac , que

∂ x̃b ∂xg ∂xd e ∂ x̃b ∂x[g ∂xd] e ∂ x̃b ∂xg ∂xd e


Γ̃b[ac] = Γ = Γ = Γ
∂xe ∂ x̃[a ∂ x̃c] gd ∂xe ∂ x̃a ∂ x̃c gd ∂xe ∂ x̃a ∂ x̃c [gd]
o que mostra que mostra que de facto se transforma como um tensor.

– 23 –
12 Derivada total e o transporte paralelo

[Gibbons cap. 10]


Num espaço plano, o transporte paralelo de um vector não depende do caminho. Num
espaço curvo, um vector transportado paralelamente já depende do caminho.

a
Se T a = dx c
dλ é o vector tangente a uma curva x (λ), definimos a derivada absoluta de
um vector por

DV a
= T b ∇b V a (12.1)

ou seja,

DV a   dV a dxb c
= T b ∂b V a + Γabd V d = + Γabc V .
Dλ dλ dλ
Dizemos que um vector é transportado paralelamente ao longo de uma curva se

DV a
=0 (12.2)

ou seja,

dV a dxb c
+ Γabc V = 0. (12.3)
dλ dλ
Quando a equação de transporte paralelo é aplicada ao vector tangente T a , temos
DT a
=0

 a
d dx dxb dxc
+ Γabc =0
dλ dλ dλ dλ

– 24 –
d2 xa dxb dxc
2
+ Γabc =0 (12.4)
dλ dλ dλ
 
a
Esta é a equação da geodésica que já tı́nhamos visto com Γabc = . Quando não existe
bc
torção as conexões afim são simétricas Γabc = Γacb , e escrevem-se

1
Γabc = g ad (gbd,c + gcd,b − gbc,d ) (12.5)
2

e passamos a chamar-lhes conexões da métrica. Esta definição leva à igualdade que fica
para exercı́cio

∇c gab = 0 (12.6)

chamada de metricidade.

– 25 –
13 Curvatura

[Ferreira cap. 10, D’Inverno cap. 6.7]


Já vimos que um vector tranportado paralelamente tem componentes diferentes de-
pendendo do caminho. Para quantizar isto vendo a mudança de um vector V0a ao longo de
dois caminhos diferentes num paralelograma. O primeiro caminho assinalado com etapas
1 e 2 e, o outro caminho com etapas 3 e 4 na figura. O desvio em cada caso é ua ou v a .

Da definição de transporte paralelo temos que da Eq.(12.3)

dV a dxb c
= −Γabc V ⇒ δV a = −Γabc V a δxc
dλ dλ
Então, a mudança no vector ao seguir um dos caminhos é dada por
a
V12 = V0a − Γabc (x)V b (x) uc − Γabc (x + u)V b (x + u) v c
a
V34 = V0a − Γabc (x)V b (x) v c − Γabc (x + v)V b (x + v) uc

Podemos expandir em série de Taylor os termos Γ(x + u)V , tal que

∂(Γabc V a ) d c
Γabc (x + u)V b (x + u)v c ≈ Γabc V b v c + u v
∂xd
∂(Γabc V b ) c d
Γabc (x + v)V b (x + v)uc ≈ Γabc V b uc + uv
∂xd
Temos então que a diferença entre os caminhos é

δV a = V12
a a
− V34 = −Γabc V b uc − Γabc V b v c − ∂d (Γabc V b )ud v c
+Γa V b v c + Γabc V b uc + ∂d (Γabc V b )uc v d
h bc i
= −∂c (Γabd V b ) + ∂d (Γabc V b ) uc v d
h i
= ∂d Γabc V b + Γabc ∂d V b − ∂c Γabd V b − Γabd ∂c V b uc v d

– 26 –
Mas também já sabemos da equação de transporte paralelo que
dV b
= −Γbde V e
dxd
E então, a mudança do vector fica
h i
δV a = ∂d Γabc V b − Γabc Γbde V e − ∂c Γabd V b + Γabd Γbce V e uc v d

Vamos fazer uma última mudança de ı́ndices e ↔ b no segundo e no quarto termo, para
ficarmos com

δV a = [∂d Γabc − Γaec Γedb − ∂c Γabd + Γaed Γecb ] V b δac δbd


a
= −Rbcd V b uc v d

onde se definiu
a
Rbcd = ∂c Γabd − ∂d Γabc + Γaec Γedb − Γaed Γecb

como o tensor de curvatura de Riemann. Este quantifica a curvatura do espaço tempo. Se


não houvesse curvatura, δV a = 0. O tensor de Riemann é um tensor de grau 4 e depende
de segundas derivadas da métrica gab . Também podemos definir o tensor de Riemann em
termos da derivada covariante tal que,

(∇b ∇c − ∇c ∇b ) V a = Rdbc
a
Vd

Fica para exercı́cio mostrar isto.


O tensor de Riemann satisfaz as seguintes propriedades:
a a
Rbcd = −Rbdc (13.1)
Rabcd = −Rbacd (13.2)
Rabcd = Rcdab (13.3)
a a a
Rbcd + Rcdb + Rdbc =0 (13.4)
e . Também temos a identidade de Bianchi
onde Rabcd = gae Rbcd
a a a
∇e Rbcd + ∇d Rbec + ∇c Rbde = 0. (13.5)

Define-se ainda o tensor de Ricci


c
Rab ≡ Racb . (13.6)

e o escalar de Ricci

R = g ab Rab . (13.7)

Exemplo
Para uma métrica
!
1 0
(gab ) =
0 sin2 θ

– 27 –
Calculámos Γ122 = − sin θ cos θ, Γ212 = Γ221 = cot θ. E agora calculamos o tensor de Riemann,
c
Rdab = ∂a Γcbd − ∂b Γcad + Γcae Γebd − Γcbe Γead

c
Relembrar que Rdab c
= −Rdba e Rcdab = Rabcd . Então podemos começar pela coordenada
1, e fazemos c = 1 e temos,
1
Rdab = ∂a Γ1bd − ∂b Γ1ad + Γ1ae Γebd − Γ1be Γead

Do lado direito, as componetes não nulas no primeiro termo são para b = d = 2, no


segundo termo para a = d = 2. Para o terceiro termo consideremos primeiro Γ1ae . Tira-
se que a = e = 2. O que significa que de Γebd as possibilidades são, b = 1, d = 2, ou
alternativamente b = 2, d = 1. Para o quarto termo o raciocı́nio é semelhante. De Γ1be
tira-se que b = e = 2, e consequentemente de Γead só podemos ter como não nulas as
componentes com a = 1, d = 2, ou alternativamente a = 2, d = 1. Escolhamos então a
primeira possibilidade, b = d = 2, e portanto, a = 1, o que dá
1
R212 = ∂1 Γ122 − 0 + 0 − Γ122 Γ212
= ∂θ (− sin θ cos θ) − (− sin θ cos θ) cot θ
= − cos2 θ + sin2 θ + cos2 θ = sin2 θ.

Podemos agora proceder de igual forma para calcular Rdab2 . Alternativamente, podemos

usar as simetrias do tensor de Riemann para obter as restantes componentes. Comecemos


2 ,
por exemplo por R121
2
R121 = g 2a Ra121 = g 22 R2121 = g 22 R1212
1
= g 22 g1a R212
a
= g 22 g11 R212
1
= . 1 . sin2 θ = 1
sin2 θ
E então temos ainda para o tensor de Ricci,
c
Rab = Racb
c 1 2
R11 = R1c1 = R111+ R121 =1
c 1 2
R12 = R1c2 = R112 + R122 =0
c 1 2
R22 = R2c2 = R212 + R222 = sin2 θ

e para o escalar de Ricci,


1
R = g ab Rab = g 11 R11 + g 22 R22 + 0 = 1 + sin2 θ = 2.
sin2 θ

– 28 –
14 As identidades de Bianchi contraı́das

[Gibbons cap. 11.4]


Já vimos as identidades de Bianchi na Eq. (13.5) que reescrevemos aqui
d d d
∇e Rcab + ∇b Rcea + ∇a Rcbe =0 (14.1)

trocando os ı́ndices e e a no segundo termo e depois contraı́ndo os ı́ndices d e a temos


d
∇e Rcb − ∇b Rce + ∇d Rcbe =0

Vamos agora contrair com o tensor inverso da métrica g ce (que é uma maneira elegante de
dizer que vamos multiplicar por g ce ), e não esquecer que ∇a g bc = 0 (metricidade). Então
temos

∇e (g ce Rcb ) − ∇b (g ce Rce ) + ∇d (g ce Rcbe


d
)=0
∇e Rbe − ∇b R + ∇d (g ce Rcbe
d
)=0

Agora note-se que

g ce Rcbe
d
= g ce g df Rf cbe = g ce g df Rcf eb = g df Rfe eb = g df Rf b = Rbd ,

o que nos permite escrever as identidades de Bianchi como

∇e Rbe − ∇b R + ∇d Rbd = 0
2∇e Rbe − ∇b R = 0

e multiplicando por g ab , ficamos com


1
∇e Rea − g ab ∇b R = 0
2
e ainda
 
ab 1 ab
∇b R − g R = 0 (14.2)
2

Também se define o tensor de Einstein como


1
Gab = Rab − g ab R com ∇b Gab = 0 (14.3)
2
Exemplo
Voltamos à nossa métrica preferida, gab = diag(1, sin2 θ), e temos
1 1
G11 = R11 − g11 R = 1 − · 1 · 2 = 0
2 2
1 1
G12 = R12 − g12 R = 0 − · 0 · 2 = 0
2 2
1 1
G21 = R21 − g21 R = 0 − · 0 · 2 = 0
2 2
1 1
G22 = R22 − g22 R = sin θ − · sin2 θ · 2 = 0
2
2 2

– 29 –
15 O tensor energia-momento

[Ferreira cap. 12]


Procuramos agora compreender como é que as formas de energia/massa actuam como
fontes de campo gravitacional. Na gravitação de Newton temos a equação de Poisson
∇2 φ = 4πGρ e sabemos que temos de recuperar isto mesmo em Relatividade Geral. Vamos
utilizar o tensor energia-momento como termo de fonte na equação de campo. Por exemplo,
para ui  c = 1 e para poeira, temos que

T ab = ρua ub (15.1)

e temos ua = (1, ~u).


Vamos mostrar que

∂a T ab = 0

corresponde a duas leis de conservação conhecidas. Vamos olhar primeiro para as compo-
nente b = 0.

∂0 T 00 + ∂i T i0 = 0
∂ρ
+ ∇ · (ρ~u) = 0
∂t

A que chamamos equação da continuidade. Agora consideremos as componentes com b = i,

∂0 T 0i + ∂j T ji = 0
∂(ρui )
+ ∂j (ρui uj ) = 0
  ∂t
 i 
i ∂ρ j ∂u j i
u + ∂j (ρu ) + ρ + u ∂j u = 0
∂t ∂t

Mas pela equação da continuidade, o primeiro termo anula-se e ficamos com

∂~u
+ (~u · ∇)~u = 0
∂t

e a esta chamamos equação de Navier-Stokes. E temos, pelo Princı́pio do Acoplamento Mı́nimo


que mencionámos no Cap. 3 que diz que em Relatividade Geral, as derivadas parciais são
substituı́das por derivadas covariantes [D’Inverno cap. 9.6]. Então em Relatividade Geral
as equações da conservação generalizam-se para

∇b T ab = 0 (15.2)

– 30 –
16 As equações de Einstein

[Ferreira cap. 13]


“O espaço-tempo diz à matéria como se mover e a matéria diz ao espaço-
tempo como curvar.”
John Wheeler

Já vimos que o tensor da métrica, o tensor de Einstein e o tensor energia-momento


são três quantidades que se conservam, tal que, ∇b g ab = ∇b Gab = ∇b T ab = 0. É então
concebı́vel que estas três quantidades sejam proporcionais entre si. Em particular, vamos
procurar uma solução tal que
1
Gab = Rab − gab R = ATab (16.1)
2
e vamos olhar para o limite do campo fraco para determinar o valor de A. Nesse limite, já
vimos, perturbamos o tensor da métrica

gab = ηab + hab

onde |hab |  1. Vamos considerar poeira, com ui  1, u0 = 1, portanto, T 00 = ρ e T ij ≈ 0.


Em primeira ordem em hab , temos que as conexões da métrica ficam,
1
Γabc ≈ η ab (hdc,b + hdb,c − hbc,d )
2
O tensor de Riemann escreve-se em primeira ordem como
c
Rdab = ∂a Γcbd − ∂b Γcad + O(h2 ).
   
1 ce 1 ce
= ∂a η (heb,d + hed,b − hbd,e ) − ∂b η (hea,d + hed,a − had,e
2 2
1 ce
= η [heb,ad + hed,ab − hbd,ae − hea,bd − hed,ba + had,be ]
2
1
= η ce [heb,ad − hbd,ae − hea,bd + had,be ]
2
e o tensor de Ricci fica
c 1
Rdb = Rdcb = η ce [heb,cd − hbd,ce − hec,bd + hcd,be ] .
2
Vamos primeiro calcular a componente R00 .
1
R00 = η ce [he0,c0 − h00,ce − hec,00 + hc0,0e ] .
2
Tı́nhamos visto que no limite de campo fraco também considerávamos um campo estático,
ou seja, ∂gab /∂t = 0, e portanto, hab,0 = 0, o que nos simplifica o tensor de Ricci para

1 1
R00 = − η ce h00,ce = − ∇2 h00 .
2 2

– 31 –
E como também já aprendemos que h00 = −2Φ,
R00 = ∇2 Φ .
Para calcular o escalar de Ricci fazemos
R = g db Rdb ≈ η db Rdb = −R00 + η ij Rij
E agora temos de calcular estes Rij . Para continuar o cálculo há agora três métodos que
passamos a analisar.
1. Método ”às três pancadas”
Voltamos à expressão do tensor de Ricci e tomamos
1 ce
Rij = η [hei,cj − hij,ce − hec,ij + hcj,ie ]
2
1 1
= η 00 [h0i,0j − hij,00 − h00,ij + h0j,i0 ] + η kl [hki,lj − hij,kl − hkl,ij + hlj,ik ]
2 2
Então temos
1 1
η ij Rij = − η ij η 00 h00,ij + η ij η kl [hki,lj − hij,kl − hkl,ij + hlj,ik ]
2 2
1 2 1h j k i
= ∇ h00 + hk, j − hjj, kk − hkk, jj + hkj, jk
2 2
1 2  
= ∇ h00 + hjk, kj − hjj, kk
2
Para já vamos tomar hji = 0 para i 6= j e hji = −2Ψ para i = j. Isto não é evidente
e só se torna um pouco mais claro quando estudarmos buracos negros. Neste caso a
igualdade pode ser simplificada para
η ij Rij = −∇2 Φ + h11, 11 + h22, 22 + h33, 33 − ∇2 (h11 + h22 + h33 )


= −∇2 Φ + (−2∇2 Ψ + 6∇2 Ψ)


= −∇2 Φ + 4∇2 Ψ
Então o escalar de Ricci escreve-se como
R = −R00 + η ij Rij = −∇2 Φ − ∇2 Φ + 4∇2 Ψ = −2∇2 Φ + 4∇2 Ψ
Nos casos em que temos um sistema isotrópico, Ψ = Φ, e nesse caso
R = 2∇2 Φ
Lembrando agora que T00 = g0a g0b T ab = g00 g00 T 00 = ρ, então para a primeira
componente nas equações de Einstein fica
1
R00 − g00 R = AT00
2
1
∇ Φ − g00 2∇2 Φ = Aρ
2
2
1
∇2 Φ = Aρ
2
E como pela equação de Poisson, ∇2 Φ = 4πGρ , temos que A = 8πG.

– 32 –
2. Método ”Chico esperto”
Como T ij ≈ 0 temos que Gij ≈ 0 e então,
1
Rij − gij R ≈ 0
2
1
Rij ≈ ηij R
2
Que uma vez substituido na expressão para R temos
3
R = −R00 + η ij Rij = −R00 + R ⇒ R = 2R00 = 2∇2 Φ
2
E depois o resto segue como no método anterior.

3. Método ”cabecinha pensadora”


Outra forma é ainda é usar a contracção da equação de Einstein com g ab , ficando
1
g ab Rab − g ab gab R = Ag ab Tab
2
1
R− ·4·R = T
2
−R = AT

Substituindo agora na equação de Einstein


1
Rab − gab (−AT ) = ATab
2  
1
Rab = A Tab − gab T
2
Como T ab = ρua ub então T = ρua ua = −ρ. Voltando à equação de Einstein com
componentes 00,
 
1
R00 = A T00 − η00 (−ρ)
2
 
2 1 1
∇ Φ = A ρ − ρ = Aρ ⇒ A = 8πG
2 2
como tı́nhamos encontrado antes.
As equações de Einstein escrevem-se então como
1
Rab − gab R = 8πGTab
2
Mais tarde o Einstein acabou por adicionar o termo que envolve o tensor da métrica com
um termo multiplicativo que se passou a chamar de constante cosmológica Λ,
1
Rab − gab R + Λgab = 8πGTab (16.2)
2
Este termo foi invocado para permitir que o Universo fosse estático. Esta equação junta-
mente com a equação da geodésica são o ponto de partida para a famosa frase de John
Wheeler.

– 33 –
17 As soluções esfericamente simétricas

[Barbosa Henriques cap 5.1]


Vamos considerar soluções esfericamente simétricas e estáticas tal que o elemento de
linha ds2 deva ser construı́do a partir dos elementos invariantes rotacionais, dt2 , dr2 , r2 dr2 ,
dtdr, dΩ, onde dΩ = dθ2 + sin2 θdφ2 , de forma que temos
ds2 = −F (r)dt2 + 2rE(r)dtdr + r2 D(r)dr2 + C(r)(dr2 + r2 dΩ)
Primeiro que tudo vamos mostrar que é possı́vel eliminar o termo dtdr. Seja uma nova
variável tempo t̃ = t + h(r), onde h(r) é arbitrária e pode ser
dh E
= −r
dr F
então
dt̃ = dt + dh
dt̃2 = dt2 + dh2 + 2dtdh
 2
2 2 2 E 2 E
dt = dt̃ − dh − 2dtdh = dt̃ − r dr2 + 2r dtdr
F F
e substituindo no element de linha
E2 2
ds2 = −F dt̃2 + r2 dr + r2 Ddr2 + C(dr2 + r2 dΩ)
F
= −F dt̃2 + Gdr2 + C(dr2 + r2 dΩ)
com
E2
 
2
G=r D+
F
Vamos agora livrar-nos daquele C a multiplicar o ângulo sólido. Para isso redefinimos r de

tal forma que r̃ = Cr. Então,
r C0 √
 
dr̃ = √ + C dr
2 C
r C0 2 2
 
2
dr̃ = C 1 + dr
2C
onde C 0 = dC/dr, e substituindo no elemento de linha
G 1 1
ds2 = −F dt̃2 + 2 dr̃2 + 2 2
 dr̃ + r̃ dΩ
C 1+ rC 0 r C0 2

2 C 1+ 2 C
e agora definindo,
r C 0 −2
  
G
f (r̃) = F (r), g(r̃) = 1+ 1+ ,
C 2C
r̃ → r , t̃ → t
Temos a versão simplificada

ds2 = −f (r)dt2 + g(r)dr2 + r2 (dθ2 + sin θ2 dφ2 ) (17.1)

– 34 –
18 A solução de Schwarzschild

[Ferreira cap. 14]


“Como vê, a guerra tem sido simpática para mim permitindo-me, ape-
sar do som das armas a curta distância, caminhar nessa sua terra de
ideias.” K. Schwarzchild

Vamos agora resolver a equação de Einstein no vazio onde Tab = 0. Da solução es-
fericamente simétrica temos que gtt = −f (r), grr = g(r), gθθ = r2 , gφφ = r2 sin2 θ. As
componentes do tensor de Ricci não nulas ficam então
1 f 00 1 f 0 f 0 g 0 1 f0
 
Rtt = − + +
2 g 4g f g r g
00 0
 0 0 1 g0

1f 1f f g
Rrr = − + + +
2 f 4f f g rg
 0 0

1 r1 f g
Rθθ = 1 − − −
g 2g f g
Rφφ = sin2 θRθθ
Aplicando agora as equações de Einstein, que já vimos podem ser escritas como
 
1
Rab = 8πG Tab − gab T
2
E consequentemente, no vazio, ficamos com Rtt = Rrr = Rθθ = 0. O que quer dizer que
das duas primeiras expressões temos
f f 0 g0
 
gRtt + f Rrr = + =0
r f g
Ou seja,
f0 g0
=− ⇒ f g = α = constante
f g
Na solução de Minskowski, f → 1, g → 1, então faz sentido estabelecer α = 1. Usando
agora a expressão para Rθθ com g = 1/f , temos
f + rf 0 = 1 ⇒ (rf )0 = 1
que depois de integrada dá
B
f =1+
r
No caso particular do limite do campo fraco vimos que
GM
f = −gtt = 1 + 2Φ = 1 − 2
r
O que nos diz que a solução de esfericamente simétrica e estática no vácuo ou solução de Schwarzschild

2GM −1 2
   
2 2GM 2
ds = − 1 − dt + 1 − dr + r2 (dθ2 + sin2 θdφ2 ) (18.1)
r r

– 35 –
19 A equação de Binet na mecânica Newtoniana

[Ferreira cap. 2]
Consideremos o sistema a dois corpos tais como o Sol (com massa mA ) e um planeta
(com massa mB ). O Lagrangiano é

1 µM
L = µṙ2 + G
2 r
onde r = |~r| = |~rA − ~rB |, M = mA + mB e µ = mA mB /M . Escrevendo o Lagrangiano em
coordenadas esféricas temos
1 µM
L = µ(ṙ2 + r2 θ̇2 + r2 sin2 θφ̇2 ) + G .
2 r
Vamos assumir que o θ = π/2. Então as equações de Euler-Lagrange ficam

M
r̈ − rφ̇2 = −G
r2
d 2
(r φ̇) = 0
dt

daqui tiramos que r2 φ̇ = h = constante, que nós interpretamos como a conservação do


momento ângular.
Façamos agora uma transformação de coordenadas tal que u = 1/r. Então
 
d 1 1 du 1 du du
ṙ = = − 2 φ̇ = − 2 hu2 = −h
dt u u dφ u dφ dφ
2 2
 
d du d u d u
r̈ = − h = −h 2 φ̇ = −h2 u2 2
dt dφ dφ dφ

Então a equação do movimento para r pode ser escrita como

d2 u GM
2
+u= 2
dφ h

Esta é a chamada equação de Binet e é a equação de um oscilador harmónico simples com


uma fonte constante. A solução é dada por

GM
u= [1 + e cos(φ − φ0 )] (19.1)
h2

onde e é a elipticidade. Corresponde a órbitas fechadas na forma de elipses.

– 36 –
20 A equação de Binet na Relatividade Geral

[Gibbons cap. 16.1; D’Inverno cap. 15.3, Ferreira cap. 7]


Agora para a Relatividade Geral, já vimos que podemos construir o Lagrangiano a
partir da métrica de Schwarzschild

ds2 2GM −1 2
   
2 2GM 2
L =− 2 = 1− ṫ − 1 − ṙ − r2 (θ̇2 + sin2 θφ̇2 )
dλ r r

Novamente, fazemos θ = π/2, e temos

2GM −1 2
   
2 2GM 2
L = 1− ṫ − 1 − ṙ − r2 φ̇2
r r

Das equações de Euler-Lagrange temos


    
d 2GM 2GM
1− ṫ = 0 ⇒ 1− ṫ = E
dλ r r
d 2
(r φ̇) = 0 ⇒ r2 φ̇ = h

Da primeira relação temos a conservação da energia e da segunda a conservação do momento
ângular. Vamos agora substituir ṫ no Lagrangiano e temos

h2
  
2 2 2GM 2
ṙ = E − 1 − L + 2 (20.1)
r r

Usando agora ṙ = (dr/dφ) φ̇ e substituindo φ̇ = h/r2 ,


2
h2 h2
   
dr 2 2GM 2
=E − 1− L + 2
r4 dφ r r

e como r = 1/u,

dr 1 du
=− 2
dφ u dφ
ficamos com
2
E2 L2

1 du 1
+ u2 = 2 − (1 − 2GM u) 2 + GM u3 .
2 dφ 2 2h 2h

Fazendo mais uma derivada em ordem a φ temos a equação do movimento

d2 u GM
2
+ u = 2 L2 + 3GM u2 (20.2)
dφ h

Esta é a equação de Binet da Relatividade Geral que se reduz à da mecânica Newtoniana


com L2 = 1 e o termo em u2 é a correcção da Relatividade Geral.

– 37 –
21 Precessão do periélio de Mercúrio

[Ferreira cap.7]
“Durante alguns dias estive fora de mim com uma feliz excitação.”
A. Einstein

Vamos agora usar a equação de Binet da Relatividade Geral e ainda a pensar na órbita
de um planeta em torno do Sol, fazemos L2 = 1. Procuramos, uma solução perturbativa
tal que

u = u0 + u1 ,

com u0 dado pela solução (19.1), u0 = (GM/h2 )(1 + e cos φ). Substituindo esta solução
teste na equação de Binet, temos para u1 ,
3GM 2
u001 + u1 = u0

e por análise dimensional 3GM/ ∼ 1/u0 , e consequentemente define-se
3G2 M 2
= .
h2
Para o planeta Mercúrio,  ≈ 10−7 . E agora tentamos encontrar a solução de u1 .
GM
u001 + u1 = (1 + e cos φ)2
h2
GM
= 2 (1 + 2e cos φ + e2 cos2 φ)
h 
e2 e2

GM
= 2 1+ + 2e cos φ + cos 2φ
h 2 2
onde no último passo se usou a identidade cos2 φ = (1 + cos 2φ)/2. Podemos tentar uma
solução da forma

u1 = A + Bφ sin φ + C cos 2φ

e vamos à procura dos coeficientes A, B , C. Como

u01 = B sin φ + Bφ cos φ − 2C sin 2φ


u001 = 2B cos φ − Bφ sin φ − 4C cos 2φ

Substituindo na equação do movimento temos

2B cos φ − Bφ sin φ − 4C cos 2φ + A + Bφ sin φ + C cos 2φ =


e2
 
GM 2GM GM 2
2
1+ + 2
e cos φ + e cos 2φ
h 2 h 2h2
tira-se que
e2 GM e2
 
GM GM e
A= 2 1+ , B= , C=−
h 2 h2 6h2

– 38 –
Ficando a solução como

e2 e2
 
GM
u = u0 +  2 1 + + eφ sin φ − cos 2φ .
h 2 6

Após algumas revoluções, o termo φ sin φ torna-se o mais importante, então, substituindo
u0
GM
u= (1 + e cos φ + eφ sin φ)
h2
Mas note-se que da identidade cos(φ − φ) = cos φ cos(φ) + sin φ sin(φ) ≈ cos φ + φ sin φ,
o que significa que a solução aproximada é

GM
u= [1 + e cos((1 − )φ)] (21.1)
h2

Ou seja, ao contrário do que acontece na solução da mecânica Newtoniana, em que o


perı́odo é 2π, agora a solução volta ao mesmo ponto quando φ = 2π/(1 − ). Ou seja, a
órbita não se fecha sobre si mesma.

Para o sistema Sol-Mercúrio, temos M = 2 × 1030 Kg, T = 88 dias, r = 5.8 × 1010 m.


Portanto o efeito da precessão do periélio de Mercúrio é de

∆φ = 2π = 42.9800 /sec .

Esse efeito da precessão foi detectado por Verrier no século XIX. A precessão dos equinócios
contribui com 502500 /séc. Os outros planetas com 53100 /séc. O Sol tem um quadrupolo que
contribui com 0.02500 /séc. Tirando todos estes efeitos, ainda resta uma precessão intrı́nseca
de

∆φ = 42.96900 ± 0.005200 /sec .

– 39 –
22 Deflexão dos raios luminosos

[Gibbons cap. 16.1.2; Ferreira cap. 8]


“Estrelas não estão onde deviam estar, mas ninguém precisa de se pre-
ocupar.” New York Times, 6 Novembro 1919

Vamos agora procurar uma solução da equação de Binet da Relatividade Geral mas
para a luz, ou seja, quando L2 = 0, e vamos aplicá-la a defexão dos raios de luz quando estes
passam junto a uma campo gravitacional. Por outras palavras, vamos calcular o desvio na
trajectória da luz emitida por uma estrela quando passa rasante ao Sol. A equação fica
simplesmente

d2 u
+ u = 3GM u2 .
dφ2
Vamos procurar uma solução u = u0 + u1 onde u0 é a solução da equação homogénea, ou
seja

d2 u0
+ u0 = 0 ,
dφ2
e cujo resultado é
sin φ d
u0 = , r=
d sin φ

e que descreve uma linha recta, de tal forma que quando φ → 0, r → ∞ e quando φ → π/2,
r → d e quando φ → π, r → ∞, novamente. É portanto, uma recta com parâmetro de
impacto r = d, a distância mais curta ao ponto de referência.

Agora substituimos u0 na equação de Binet e procuramos a solução de u1

u001 + u1 = 3GM u20


sin2 φ 3GM
= 3GM 2 = (1 − cos 2φ)
d 2d2
que tem solução (sem demonstração)
 
sin φ 3GM 1
u= + 1 + cos 2φ
d 2d2 3

– 40 –
que é a perturbação a uma recta. As constantes de integração foram escolhidas de forma
que haja uma simetria em torno de φ = π/2. Queremos agora saber para que valores de
φ temos as trajectória a ir para infinito, r → ∞ ou u → 0. Com cos 2φ ≈ 1, esses serão
então,
2GM
sin φ = −
d
ou seja, quando
2GM 2GM
φ− = − , φ+ = π +
d d
e então o desvio total é ∆φGR = |φ− | + |φ+ − π|

4GM
∆φGR =
d

Para raios de luz rasantes ao Sol, d = 6.96340 × 108 m, esta deflexão é de ∆φ ≈ 1.7500 .
Isto foi medido pela primeira vez por Eddington por ocasião do eclipse do Sol de 1919.
Hoje o limite observacional é

∆φ = (0.99992 ± 0.00023) × 1.7500

Importa aqui verificar como isto se compara com a previsão da mecânica de Newton.
Vamos admitir que podı́amos escrever o momento angular por unidade de massa do fotão
como, h = L/m = mdv/m = d, porque v = c = 1. Então da equação de Binet da mecânica
Newtoniana, terı́amos
GM
u00 + u =
d2
cuja solução é
sin φ GM
u= + 2
d d
e então o desvio seria apenas
2GM
∆φN =
d
ou seja, apenas metade daquilo que é previsto pela Relatividade Geral.

– 41 –
23 Atraso gravitacional de Shapiro

[Ferreira cap. 8]
Quando um sinal de radar passa rasante a um objecto massivo, leva mais tempo
a chegar ao alvo do que o tempo que levaria caso o objecto massivo não estivesse na
trajectória. Por exemplo, o intervalo de tempo entre a emissão de um sinal de radar que
passa junto ao sol e o sinal recebido depois que é reflectido na superfı́cie de um planeta
tem um atraso que se deve à curvatura do espaço-tempo.

Primeiro que tudo temos de calcular o tempo que a luz percorre na viagem entre a Terra
e o planeta, ∆t. E depois comparar com o tempo que decorreu na Terra, ∆τ . Vamos cal-
cular primeiro ∆t e partimos da métrica de Shwarzschild para uma onda electromagnética,
i.e., com ds2 = 0.

2GM −1 2
   
2GM 2
1− dt − 1 − dr − r2 dφ2 = 0
r r

Na verdade é possı́vel simplificar escrevendo dφ como função de dr. Para isso, vamos
tomar a solução em primeira ordem para a equação de Binet relativista aplicada aos raios
luminosos, ou seja, a equação da recta
d
r=
sin φ
que nos dá diferenciando
cos φ 1
dr = −d dφ = − r2 cos φ dφ
sin2 φ d
e consequentemente
2
d2

2 2 d dr
r dφ = = tan2 φ dr2 = dr2
cos φ r r 2 − d2

Substituindo na métrica temos


" −2  −1 #
2GM 2GM d2
dt2 = 1− + 1− dr2
r r r2 − d2

– 42 –
Expandindo em primeira ordem em GM/r,
d2
   
2 4GM 2GM
dt ≈ 1 + + 1+ dr2
r r r 2 − d2
    
1 4GM 2 2 2GM
= 2 1+ (r − d ) + 1 + d2 dr2
r − d2 r r
r2
 
4GM 2GM 2
= 2 1+ − d dr2
r − d2 r r3
ou seja,
 
r 2GM GM 2
dt ≈ ± √ 1+ − 3 d dr
r2 − d2 r r
Integrando entre os pontos A e B temos
" r !#B
2
 
p 2GM r r
∆t = ± r2 − d2 1 − + 2GM ln −1+ (23.1)
r d2 d
A

Vamos agora calcular o tempo, ∆τ que passou na Terra, onde τ é o tempo próprio
assumindo uma órbita circular de modo que dr = dθ = 0 mas dφ 6= 0. Podemos relacionar
o tempo t com τ usando o elemento de linha percorrido pela Terra
 
2 2 2GM
ds = −dτ = 1 − dt2 − rT2 dφ2
rT
onde rT é o raio da órbita da Terra. Simplificando ficamos com
 1/2  
2GM 2 2 GM 1 2 2
dτ = 1 − − rT φ̇ dt ≈ 1 − − rT φ̇ dt
rT rT 2
Podemos fazer esta aproximação para um campo gravitacional fraco e para uma momento
ângular pequeno. Como para uma órbita circular com φ̇ = constante temos a compensação
entre a força centrı́fuga e a força gravitacional tal que mrφ̇2 = GmM/r2 então,
 
GM 1 GM
dτ = 1 − − dt
rT 2 rT
e integrando
 
3 GM
∆τ = 1 − ∆t (23.2)
2 rT
Então concluı́mos que ∆τ < ∆t. Também devemos notar que tomando r  d, quando d é
muito pequeno, o termo logaritmico em (23.1) diverge, ou seja, quando o raio passa muito
próximo da fonte do campo gravitacional, o atraso torna-se extremamente grande. Este
efeito pode de facto ser testado ao seguir o pulso de um sinal electromagnético à medida
que passa por detrás de um corpo massivo e verifica-se um pico durante o trânsito. Foi isto
que foi proposto por Shapiro em 1960. A experiência consistia em enviar sinais de radar
regulares para Vénus e esperar pelo eco na Terra. Quando a Terra e Vénus estão alinhados
com o Sol, confirma-se um efeito de milisegundos. Este efeito também se observou com
as sondas Mariner 6 e 7 em Marte e Landers 1 e 2. Também se verifica com binários de
estrelas.

– 43 –
24 Singularidades da métrica de Schwarzschild

[D’Inverno cap. 16.2; Barbosa Henriques cap. 8.1]


Só para ficar bem assente, estamos a falar desta métrica

2GM −1 2
   
2GM
ds2 = − 1 − dt2 + 1 − dr + r2 (dθ2 + sin2 θ dφ2 )
r r

que tem três singularidades que passamos a enumerar

θ = 0, π: O elemento de linha passa a ser degenerado, ou seja, o valor de φ pode ser


qualquer. É uma singularidade removı́vel porque podemos eliminá-la introduzindo
coordenadas cartesianas.

r = rS = 2GM : Este é o raio de Schwarzschild. Esta singularidade também pode


ser removida. Note-se que quando r → rS temos g00 → 0 e grr → ∞, todavia,
Rabcd Rabcd = 48(GM )2 /rS6 que é finito. Ou seja, não há nenhuma singularidade na
curvatura a acontecer.

r = 0: Esta singularidade de facto não pode ser removida. É uma singularidade fı́sica.

– 44 –
25 Partı́culas em queda livre radial

[D’Inverno cap. 16.5; Ferreira cap. 14]


Consideremos o caso de uma partı́cula com massa (L2 = 1) em queda radial (dθ =
dφ = 0) na métrica de Schwarzschild

2GM −1 2
   
2 2GM 2
L = 1− ṫ − 1 − ṙ = 1
r r

E da equação do movimento para t temos


 
2GM
1− ṫ = E (25.1)
r

Vamos escolher E = 1, de maneira a que a partı́cula no infinito (r → ∞ ) tem velocidade


nula (ṙ → 0). Substituindo então em L2 ,
−1
2GM −1 2
  
2GM
1− − 1− ṙ = 1
r r
2GM
1 − ṙ2 = 1 −
r
2 2GM
ṙ =
rr
2GM
ṙ = ±
r
Como estamos em queda (e não a subir) escolhemos a raı́z negativa, e temos
r
r
dτ = − dr
2GM
e integrando
2 1 
3/2

τ − τ0 = √ r0 − r3/2
3 2GM

e com rS = 2GM , reescrevemos na forma


" 3/2  3/2 #
2 r0 r
τ − τ0 = rS −
3 rS rS

Isto significa que a partı́cula pode passar pela singularidade r = 2GM continuamente
até r = 0 num tempo próprio finito. Nada de especial acontece em r = 2GM . Vamos
agora ver o que acontece do ponto de vista do observador no infinito, ou seja num espaço
Euclidiano. Partimos da Eq. (25.1) e comparemos com a equação para ṙ,

dt ṫ 1 1
= =− 2GM
q
dr ṙ 1− r 2GM
r

– 45 –
e ou seja

r3/2
Z
1
t − t0 = − √ dr
2GM r − 2GM

que tem solução


" √ !#r
2 1   r1/2 + 2GM
t − t0 = − √ r3/2 + 6GM r1/2 + 2GM ln √
3 2GM r1/2 − 2GM r 0

com rS = 2GM , reescrevemos como


" r  1/2
!#r
r1/2 + rS

r 2 r
t − t0 = rS − 2+ + ln 1/2
rS 3 rS r1/2 − rS r0

Quando r  rS , a solução é simplesmente


"   3/2 #
2 r0 3/2 r
t − t0 ≈ rS −
3 rS rS

que é a solução que tı́nhamos antes para τ . Ou seja, t e τ decorrem de forma semelhante.
Mas quando r → rS , o termo no logaritmo predomina e temos
 1/2 !
r
t − t0 ≈ −rS ln −1
rS

ou seja, t → ∞. A partı́cula leva um tempo infinito a atingir a superfı́cie com r =


rS , embora leve um tempo finito quando este é medido por um relógio no referêncial da
partı́cula em queda.

– 46 –
26 Fotões em queda livre radial

[D’Inverno cap 16.3-16.4]


Agora olhamos para o caso de um raio de luz em queda livre radial (L2 = 0). Direc-
tamente do Lagrangiano temos a equação para o tempo

2GM −1 2
   
2 2GM 2
L = 1− ṫ − 1 − ṙ = 0
r r
e consequentemente,

2GM −1
 
r
dt = ± 1 − dr = ± dr
r r − rS

que tem solução


 r
r
t − t0 = ± r + rS ln − 1
rS r0

Quando r  rS a solução para t é simplesmente


dt
t ≈ ±r ou = ±1
dr
Por outro lado, quando r ≈ rS , t → ∞. E quando r  rS ,

r2 dt r
t≈∓ ou =∓
2rS dr rS
Uma partı́cula na região r > rS seria vista a levar um tempo infinito a chegar a r = rS .
Para r < rS os cones de luz dobram porque as coordenadas tempo e espaço trocam de papel.
Uma partı́cula nesta região não pode estar em repouso mas é forçada a mover-se para r = 0.
Causalmente, não é possı́vel sair de dentro do raio de Schwarzschild que funciona como um
horizonte a partir do qual não podemos ver nada. É um horizonte de acontecimentos.
Qualquer raio de luz emitido de r . rS sofre um desvio para o vermelho para o infinito
p
porque g00 → 0 (lembrar que ν1 /ν2 = g00 (r2 )/g00 (r1 )), o que significa que deixamos de
ver a superfı́cie da fonte de luz. Um objecto que tem um horizonte de acontecimentos
chama-se um buraco negro. Desenhamos então o diagrama de espaço tempo em coorde-
nadas de Scwarzschild.

– 47 –
– 48 –
27 Coordenadas de Kruskal-Szekeres

[Barbosa Henriques cap. 8.2]


Já vimos que as coordenadas de Schwarzschild apresentam inconvenientes devido à
presença de vários tipos de singularidades. Também a coordenada t afasta-se da coordenada
τ quando uma partı́cula se aproxima do horizonte. Existem várias alternativas estudadas
ao longo dos anos: coordenadas Eddington-Finkelstein; coordenadas Eddington-Finkelstein
avançadas; coordenadas Eddington-Finkelstein retardadas; coordenadas Kruskal-Szekeres
que vamos passar a estudar. Estas são definidas pelas expressões

r/2rS √ r/2rS √
   
t t
V =e r − rS sinh , U =e r − rS cosh
2rS 2rS
para r > rS , e

r/2rS √ r/2rS √
   
t t
V =e rS − r cosh , U =e rS − r sinh
2rS 2rS
para r < rS . Existe ainda a solução de substituir V → −V e U → −U , nos dois casos.
Pode-se verificar que o elemento de linha fica então

rS2 −r/rS
ds2 = 4 dV 2 − dU 2 + r2 dΩ

e
r
Mais uma vez, verifica-se que nada de especial acontece em r = rS mas que persiste a
singularidade em r = 0. Das definições temos que

V 2 − U 2 = −er/rS (r − rS )

e para r = 0, fica

V 2 − U 2 = rS

que define duas hipérbolas.

Agora em r = rS , temos V 2 = U 2 , ou seja, V = ±U , e esta superfı́cie é então


representada por duas rectas

– 49 –
Para r > rS , as respectivas curvas são hipérboloides assimptóticas às rectas V = ±U .
Curvas que correspondem a valores de t constantes são representadas por linhas rectas
tais que
 
V t
= tanh = constante
U 2rS

Em particular, t = 0 corresponde à linha V = 0. E para t → ± ∞, correspendem as rectas


V = ±U , ou seja, as mesmas curvas em que r = rS .
Uma geodésica radial nula (ds2 = 0, dθ = dφ = 0), é definida por dV 2 = dU 2 , ou seja,
dV = ±dU , e os cones de luz são sempre limitados por curvas de 45º com os eixos das
coordenadas (U, V ) como são em Minkowski. Identificamos assim as quatro regiões: I -
solução de Schwarzscild com r > rS ; II - buraco negro; III - outra solução de Schwarzschild
com r > rS ; IV - buraco branco. Geodésicas que saem de r < rS para r > rS . Não são
conhecidos objectos astrofı́sicos deste género.

– 50 –
– 51 –
28 Ponte de Einstein-Rosen ou buraco de verme

[D’Inverno cap. 17.3]


Também conhecido por wormhole pelos anglo-saxónicos, ou buraco de minhoca pelos
brasileiros. Já vimos que podemos escrever a relação entre as coordenadas de Kruskal-
Szekeres

U 2 = V 2 + (r − rS )er/rS (28.1)

Em particular, se V = 0, temos que r nunca pode ser menor que rS e temos na verdade
duas soluções

U = ± r − rS er/2rS

Daqui podemos calcular dU e verifica-se que fica

1 r/rS r2
dU 2 = e dr2
4rS2 r − rS

que uma vez colocado na métrica com θ = π/2, ficamos com


r
ds2 = dr2 + r2 dφ2
r − rS
Isto é equivalente a uma métrica de uma figura de revolução descrita por uma curva z(r)
rodada em torno do eixo do z onde r é a coordenada radial no plano x − y (ver folha de
problemas), em que o elemento de linha é

ds2 = (1 + z 02 )dr2 + r2 dφ2

Neste caso, calcula-se que


r
1 + z 02 =
r − rS
02 rS
z =
r − rS

0 rS
z = ±√
r − rS
e integrando
√ √
z = ±2 rS r − rS

Então temos uma superfı́cie bidimensional com este elemento de linha embebido num espaço
plano 3-dimensional.
Agora pensemos no caso em que V > 0. A figura é semelhante mas a garganta é mais
estreita. Na verdade podemos procurar o valor de r para um dado U e V resolvendo em r
a equação (28.1), e a resposta é
 2
U −V2

r = rS + rS W0
rS e

– 52 –
onde W0 é a função de LambertW. Se quisermos saber para que valor de r é que U 2 se
anula, então temos a figura

Ou seja, quando V = rS , a garganta é tão estreita que se anula em r = 0. Quando

V > rS , não há solução para r, o que significa que acabamos por ter duas superfı́cies
disjuntas e perdemos o buraco de verme por completo.

√ √
V =0 V = rS V > rS

– 53 –
29 Diagrama de Penrose para Kruskal

[D’Inverno cap. 17.5]


O diagrama de espaço tempo que vimos para as coordenadas de Kruskal-Szekeres
estende-se até ao infinito o que o torna pouco atraente. Seria melhor termos uma versão
onde pudéssemos trazer pontos no infinito para valores finitos. Podemos de facto proceder
a uma compactificação conforme da solução de Kruskal definindo as variáveis
1 1
V = (v + u) , U = (v − u)
2 2
para ficarmos com o elemento de linha
rS2 −r/rS
ds2 = −4 e dudv + r2 dΩ .
r
E agora definindo
   
v u
ṽ = arctan √ , ũ = arctan √
rS rS
temos os limites
π π π π
− < ṽ < , − < ũ < , −π < ṽ + ũ < π
2 2 2 2
Então desenhamos o diagrama de Penrose

Considere-se qualquer ponto com r > rS , uma geodésica nula radial que se dirige para
fora termina algures na linha a Nordeste, que é o infinito, mas uma geodésica dirigida para
dentro acaba na singularidade futura, a linha ondulada a Norte. Para qualquer ponto com
r < rS , quer uma geodésica dirigida para dentro ou para fora, termina na singularidade
futura.

– 54 –
– 55 –
30 A equação de desvio geodésico Newtoniano

Considere-se uma partı́cula em P num campo gravitacional com uma trajectória xa1 = xa1 (t),
e uma outra partı́cula vizinha em Q com trajectória xa2 = xa1 (t) + ξ a (t).

Então tiramos que a equação do movimento para a partı́cula 1 é

ẍa1 = −(∂ a φ)P

e para a partı́cula 2 é

ẍa2 = ẍa1 + ξ¨a = −(∂ a φ)Q


= −(∂ a φ)P − (∂b ∂ a φ)P ξ b + ...

Ou seja,

ξ¨a = −(∂b ∂ a φ)P ξ b

Que também se escreve como

ξ¨a + Kba ξ b = 0

onde Kba = ∂b ∂ a φ, é chamado o tensor de maré.

– 56 –
31 A equação de desvio geodésico na Relatividade Geral

[Barbosa Henriques cap. 3.8]


Lembremo-nos da experiência com as maçãs dentro do elevador em queda livre num
campo gravitacional. Uma forma de percebermos que o elevador está em queda livre é
notar que as maçãs acabam por se aproximar uma da outra. Agora partimos da equação
da geodésica

ẍa + Γabc ẋb ẋc = 0

onde agora a derivada é em relação ao parâmetro afim λ e a trajectória de duas partı́culas


são respectivamente xa (λ) e xa (λ) + ξ a (λ). Primeiro que tudo expandimos as conexões

Γabc |x+ξ = Γabc |x + ∂d Γabc |x ξ d

Substituindo na equação da geodésica

ẍa + ξ¨a + (Γabc + ∂d Γabc ξ d )(ẋb + ξ˙b )(ẋc + ξ˙c ) = 0

e desprezando termos O(ξ 2 ), temos

ξ¨a + ∂d Γabc ξ d ẋb ẋc + 2Γabc ẋb ξ˙c = 0

Sejamos francos, esta equação não é muito bonita. Gostarı́amos de a escrever como a
equação do desvio geodésico Newtoniano. Para esse efeito vamos usar a derivada absoluta
que definimos anteriormente no capı́tulo do transporte paralelo.
Dξ a
= ξ˙a + Γabc ẋb ξ c

e vamos aplicar D/Dλ outra vez a esta equação

D Dξ a d  ˙a   
= ξ + Γabc ẋb ξ c + Γade ẋd ξ˙e + Γebc ẋb ξ c
Dλ Dλ dλ
= ξ a + ∂d Γabc ẋd ẋb ξ c + Γabc ẍb ξ c + Γabc ẋb ξ˙c + Γade ẋd ξ˙e + Γade Γebc ẋd ẋb ξ c
¨

Agora podemos substituir ξ¨a pela equação do desvio geodésico e ẍb pela equação da
geodésica e temos

D2 ξ a
= −∂d Γabc ξ d ẋb ẋc − 2Γabc ẋb ξ˙c
Dλ2
+∂d Γabc ẋd ẋb ξ c
 
−Γabc Γbde ẋd ẋe ξ c
+Γabc ẋb ξ˙c + Γade ẋd ξ˙e + Γade Γebc ẋd ẋb ξ c
= [∂c Γabd − ∂d Γabc + Γace Γebd − Γaed Γecb ] ẋb ẋc ξ d

– 57 –
ou seja, temos a equação do desvio geodésico dada por

D2 ξ a a
= Rbcd ẋb ẋc ξ d (31.1)
Dλ2

que é da forma

D2 ξ a
= Kda ξ d
Dλ2
onde o tensor de maré é Kda = Rbcd
a ẋb ẋc .

Próximo de um buraco negro, temos nas várias componentes

D2 ξ r rS D2 ξ θ 1 rS D2 ξ φ 1 rS
2
= 3 ξr , 2
= − 3 ξθ , 2
= − 3 ξφ
Dλ r Dλ 2r Dλ 2r
o que quer dizer que na direcção radial duas partı́culas tendem a afastar-se, e nas duas di-
recções angulares, duas partı́culas tendem a aproximar-se. O efeito é mais dominate quanto
mais próximo o observador estiver do buraco negro. A este efeito chama-se esparguetificação.

– 58 –
32 Ondas gravitacionais

[D’Inverno cap. 20.1; Barbosa Henriques cap. 9.1]


Vamos agora expandir as equações de Einstein começando por assumir que a métrica
se afasta ligeiramente da métrica de Minkowski,

gab = ηab + hab

onde |hab |  1 e ηab = diag(−1, 1, 1, 1). De gac g cb = δab , resulta que o inverso da métrica
se expande com

g ab = η ab − hab + O(h2 )

onde

hab ≡ η ac η bd hcd

e vamos admitir que no infinito, o espaço é assimptoticamente plano, i.e.,

lim hab = 0 .
r→∞

Como ηab não tem componentes que dependem das coordenadas, temos
1 ad
Γabc = g (gdc,b + gdb,c − gbc,d )
2
1
= η ad (hdc,b + hdb,c − hbc,d )
2
1 a
= (hc,b + hab,c − hbc, a )
2
O tensor de Riemann fica então
1
Rabcd = (had,bc + hbc,ad − hac,bd − hbd,ac )
2
O tensor de Ricci resulta
1
Rab = η cd Rcadb = (hca,bc + hcb,ac − hab − h,ab )
2
onde definimos o traço de hab e o d’Alambertiano respectivamente

∂2
h ≡ η ab hab = hcc ,  ≡ η ab ∂a ∂b = ∂ a ∂a = − + ∇2
∂t2
O escalar de Ricci fica agora

R = hab
,ab − h

Finalmente, para o tensor de Einstein


1 c 
Gab = ha,bc + hcb,ac − hab − h,ab − ηab (hcd
,cd − h)
2

– 59 –
Estas expressões podem ser simplificadas se introduzirmos uma nova variável

1
h̄ab ≡ hab − ηab h
2

e de forma equivalente
1
h̄ab ≡ hab − η ab h
2
O tensor de Einstein escreve-se agora na forma
1 c 
Gab = h̄a,bc + h̄cb,ac − h̄ab − ηab h̄cd
,cd
2
Pronto, está bem, parece que não adiantou muito. Mas se podermos impor a igualdade

h̄ab
,a = 0

então temos imediatamente que

1
Gab = − h̄ab
2

o que já é mais animador. Aquela igualdade é conhecida como condição ou norma de Einstein.
Também é conhecida como condição de Donder, de Hilbert ou de Fock. Vamos mostrar
agora que é sempre possı́vel impor esta condição.
Consideremos uma transformação de coordenadas dada por

xa → x̃a = xa + ξ a

onde ξ a é uma perturbação. Já vimos que a métrica se transforma com a relação

∂xa ∂xb
g̃cd = gab
∂ x̃c ∂ x̃d
mas como
∂ x̃a
= δba + ξ,b
a
∂xb
temos ao substituir na métrica

ηcd + h̃cd = (ηab + hab )(δca − ξ,c


a
)(δdb − ξ,d
b
)
= ηcd − ξd,c − ξc,d + hcd
h̃cd = hcd − ξd,c − ξc,d

ou trocando de indices

h̃ab = hab − ξa,b − ξb,a (32.1)

– 60 –
E agora como se transforma o h̄ab ? Da expressão anterior deduzimos que debaixo de uma
transformação de coordenadas temos

˜ = h̃ − 1 η h̃
h̄ab → h̄ ab ab ab
2
1 c
= hab − ξa,b − ξb,a − ηab (h − 2ξ,c )
2
c
= h̄ab − ξa,b − ξb,a + ηab ξ,c

E subindo um indice
˜ a = h̄a − ξ a − ξ a + δ a ξ c
h̄b b ,b b, b ,c

E se agora fizermos a derivada em relação a xa ,


˜ a = h̄a − ξ a − ξ a + ξ c
h̄b,a b,a ,ba b, a ,cb

ou seja,
˜ a = h̄a − ξ
h̄b,a b,a b

Portanto se impusermos uma transformação de coordenadas especı́fico (diz-se transformação


de ”gauge” no inglês ou de ”calibre” no português) tal que ξ a satisfaz a condição

ξb = h̄ab,a

˜ a = 0 como querı́amos e a Eq. (32.1) aplica-se. No vazio, T = 0, temos


então temos de h̄b,a ab
então que

h̄ab = 0 (32.2)

Mas podemos ir mais longe. Se fizermos o traço desta equação temos


 
1
 hab − ηab h = 0
2
 
1
 h − 4h = 0.
2
h = 0

Substituindo este resultado de volta em (32.2), temos

hab = 0 (32.3)

desde que h̄ab,a = 0, ou seja, na gauge de Einstein, que é como quem diz

1
hab,a − h,b = 0 (32.4)
2

Note-se que (32.3) é a equação de onda de uma perturbação no espaço-tempo de Minkowski


que se propaga à velocidade da luz. É portanto, uma onda gravitacional.

– 61 –
33 Graus de liberdade das perturbações gravitacionais

[D’Inverno cap. 20.3 (embora em espaço real)]


Já vimos que a equação de onda para as ondas gravitacionais é dada por (32.3),

hab = 0

que tem solução


c
hab = ab eikc x

onde ab são as amplitudes das várias compenentes e k c é o 4-vector número de onda com
k 2 = kc k c = 0 porque é um vector nulo. Resulta então de (32.3) que

k 2 ab = 0

Substituindo a solução na condição de Einstein (32.4)


1
hab,a − h,b = 0
2
a 1 a
ika b − ia kb = 0
2
1
ka ab = aa kb
2
a 1 a
k ab = a kb
2
Há aqui quatro condições. Vamos agora admitir que a propagação da perturbação se
faz na direcção z e definimos o número de onda k a = (1, 0, 0, 1), e consequentemente,
ka = ηab k b = (−1, 0, 0, 1). Substituindo b = 0, 1, 2, 3 temos as condições escritas como
1
00 + 30 = − aa (33.1)
2
01 + 31 = 0 (33.2)
02 + 32 = 0 (33.3)
1
03 + 33 = aa (33.4)
2
onde aa = η ab ab = −00 + 11 + 22 + 33 . Somando as equações (33.1) e (33.4) temos
1
00 + 203 + 33 = 0 , ⇒ 03 = − (00 + 33 )
2
Subtraindo essas mesmas equações temos

00 + 30 − 03 − 33 = −aa


= 00 − 11 − 22 − 33 ⇒ 11 = −22

Das equações (33.3) e (33.4) temos respectivamente

01 = −31
02 = −32

– 62 –
Então para já temos
 
00 01 02 − 12 (00 + 33 )
 01 11 12 −01 
(ab ) = 
 
−11 −02

 02 12 
1
− 2 (00 + 33 ) −01 −02 33

Vamos ainda mostrar que é possı́vel usar a liberdade de gauge para impor 00 = 01 =
02 = 33 = 0.
Vimos que debaixo de uma transformação de coordenadas, hab se transforma como
(32.1)

h̃ab = hab − ξa,b − ξb,a

Se admitirmos que ξa tem soluções


c
ξa = va eikc x

então, as amplitudes ab transforma-se com

˜ab = ab − iva kb − ivb ka

Vamos usar esta propriedade para reduzir ainda mais os graus de liberdade e impor ˜00 =
˜01 = ˜02 = ˜33 = 0 à custa de fixar as amplitudes va . Temos então o sistema de equações

˜00 = 00 − 2iv0 k0 = 00 + 2iv0 = 0


˜01 = 01 − iv0 k1 − iv1 k0 = 01 + iv1 = 0
˜02 = 02 − iv0 k2 − iv2 k0 = 02 + iv2 = 0
˜33 = 33 − 2iv3 k3 = 33 − 2iv3 = 0

Então com as identidades


i i
v0 = 00 , v1 = i01 , v2 = i02 , v3 = − 33
2 2
podemos de facto anular mais quatro componentes e chegamos ao número de graus de
liberdade total de apenas 2, e temos
 
0 0 0 0
0 h
11 h12 0
(hab ) = 
 
 0 h12 −h11

0
0 0 0 0

Poderı́amos ter feito, claro, outras escolhas. Resumindo, a métrica tem 16 entradas mas
como é simétrica, ficamos com 10 graus de liberdade. Aplicando a gauge de Einstein,
subtraı́mos mais 4 graus de liberdade, e pela lei de transformação das perturbações da
métrica, tiramos outros 4 graus de liberdade, restando apenas 2.
Note-se que o traço de hab se anula, haa = 0, e que as direcções de oscilação são ortogonais
à direcção de propagação . Chama-se a esta gauge, transversa e sem traço.

– 63 –
34 Polarização das perturbações gravitacionais
[Barbosa Henriques cap. 9.3]
Já vimos que uma onda gravitacional pode ser descrita pelas duas componentes h11 e
h12 na gauge transversa e sem traço. Agora vamos ver qual é o efeito da passagem de uma
onda gravitacional sobre duas partı́culas próximas uma da outra. Seja ξ a o vector que liga
as geodésicas de duas partı́culas. Sabemos da equação do desvio geodésico (31.1) que
D2 ξ a a
= Rbcd ẋb ẋc ξ d
Dτ 2
Se as partı́culas estão inicialmente em repouso temos, ẋa = (1, 0, 0, 0). Qualquer per-
turbação em ẋa será pequena e vamos ignorá-la. As componentes do tensor de Riemann
que não se anulam são
1 1 1 1 1
R010 = − ḧ11 , 2
R020 = ḧ11 , 2
R010 = − ḧ21 , 1
R020 = − ḧ12 .
2 2 2 2
Suponhamos primeiro que as partı́culas estão no eixo dos x, separadas de
ξ a (τ = 0) = (0, δ, 0, 0)
A equação do desvio geodésico dá-nos
1
ξ¨1 ≈ R001
1
ẋ0 ẋ0 ξ 1 = −R010
1
δ = ḧ11 δ (34.1)
2
1
ξ¨2 ≈ R001
2
ẋ0 ẋ0 ξ 1 = −R010
2
δ = ḧ21 δ (34.2)
2
Agora vamos assumir que as partı́culas estão no eixo dos y separadas de δ tal que,
ξ a (τ = 0) = (0, 0, δ, 0)
Da equação do desvio geodésico temos agora,
1
ξ¨1 ≈ R002
1
ẋ0 ẋ0 ξ 2 = −R020
1
δ = ḧ12 δ (34.3)
2
1
ξ¨2 ≈ R002
2
ẋ0 ẋ0 ξ 2 = −R020
2
δ = − ḧ11 δ (34.4)
2
Estamos agora em condições de vermos o efeito das duas polarizações em separado num
circulo de partı́culas de raio δ.
(a) Polarização (+): h11 = −h22 6= 0 e h12 = 0.
O movimento das partı́culas alinhadas no eixo dos x é descrito pela Eq. (34.1), ξ¨1 =
ḧ11 δ/2, enquanto que o movimento das partı́culas alinhadas no eixo dos y é descrito
pela Eq. (34.4), ξ¨2 = −ḧ11 δ/2, ou seja, as oscilações das duas direcções estão em
oposição de fase.

(b) Polarização (×): h11 = −h22 = 0 e h12 6= 0.


Neste caso, as partı́culas no eixo dos x são descritas pela Eq. (34.2), ξ¨2 = ḧ21 δ/2,
enquanto que o movimento das partı́culas alinhadas no eixo dos y é descrito pela
Eq. (34.3), ξ¨1 = ḧ12 δ/2, e assim, as oscilações das duas direcções estão em fase.
Estes dois casos diferem por uma rotação dos eixos de 45º. No caso geral, existe um
sobreposição dos dois tipos de polarização (+) e (×).

– 64 –
Figure 3. Polarização (+).

Figure 4. Polarização (×).

– 65 –
35 Emissão de ondas gravitacionais

[Barbosa Henriques, cap. 9.4]


Já vimos que no vácuo a equação do movimento das ondas gravitacionais, na gauge de
Einstein, é hab = 0, mas na presença de matéria temos
1
Gab = − h̄ab = 8πGTab
2
e portanto,

h̄ab = −16πGTab

Vamos agora, primeiro que tudo, considerar este Tab como a fonte das ondas gravita-
cionais e admitir que a fonte está a oscilar com uma frequência ω constante. Isto é valido
porque podemos sempre fazer uma decomposição de Fourier nos vários modos de um sinal
mais complexo.
Vamos também supor que a região do espaço onde Tab 6= 0, é pequena em comparação
com λ = 2π/ω. Isto significa ainda que as velocidades tı́picas da fonte são não-relativistas
(se ω → ∞ ⇒ λ → 0, e seria mais difı́cil satisfazer aquela condição).
Vamos então representar a fonte por uma distribuição de massa diferente de zero no
interior de uma esfera de raio R  λ = 2π/ω. Ou seja, Rω  2π.
Vamos separar o tensor energia-momento na sua parte temporar e na parte espacial
tal que,

Tab = Cab (xk )eiωt

onde xk = (r, θ, φ), e dadas as equações de Einstein, procuramos uma solução genérica
interior do tipo,

h̄int k iωt
ab = Bab (x )e

Fora da fonte procuramos uma solução que decaia com a distância tal como acontece com
o dipolo oscilante no electromagnetismo, então façamos,

eiω(t−r)
h̄ext k
ab = Aab (x )
r
tal que a onda se expande a partir da fonte.
Substituindo h̄int
ab na equação de Einstein, temos

(ω 2 + ∇2 )Bab (xk ) = −16πGCab (xk )

Mas como no primeiro termo

(4π)3
Z

d3 x ω 2 Bab (xk ) ≤ ω 2 |Bab |max R3  R|Bab |max
3 3
onde no último passo usámos que ωR  2π. E como faremos R → 0, desprezamos este
termo.

– 66 –
Agora o segundo termo, usando o teorema de Gauss, resulta,

eiωt
Z Z  
3
d x ∇ · ∇Bab = dS ~n · ∇ Aab
S r
eiωt
Z  
2 d
= dθdφ sin θ r Aab
S dr r
 
iωR−iωRAab eiωR
= 4π −Aab e
≈ −4πAab

onde se usou eiωR ≈ 1. Então temos


Z
k
Aab (x ) = 4G d3 x Cab (xk )

e substituindo na solução exterior ficamos com


Z  iω(t−r)
ext 3 k e
h̄ab = 4G d x Cab (x )
r

O problema é que nós não sabemos Tkl , e quanto muito sabemos T00 . Usamos agora
um truque para escrever esta relação em termos de T00 usando a conservação do tensor
energia-momento, que para o efeito podemos aplicar só derivadas parciais, ∂b T ab = 0, tal
que

∂0 T a0 = −∂k T ak

e integrando sobre o volume que tem a fonte no seu interior


Z Z Z Z
3 a0 d
d x ∂0 T = d x T = − d x ∂k T = − dS T ak = 0
3 a0 3 ak
dt S

onde nos últimos passos se usou o teorema de Gauss e o facto de na superfı́cie exterior à
fonte, T ab = 0. Ou seja, temos
Z
d
d3 x T a0 = 0
dt
que implica que

∂0 T a0 = iωC a0 eiωt = 0

e portanto C a0 = 0, e consequentemente h̄a0 = 0.


Agora olhemos em particular para a componente a = 0. Temos a condição

∂0 T 00 = −∂k T 0k

Façamos novamente uma derivada em ordem ao tempo

∂02 T 00 = −∂0 ∂k T 0k

– 67 –
Vamos agora multiplicar por xl xm e integrar em volume que contenha a fonte no interior,
Z Z
d x ∂0 T x x = − d3 x ∂0 ∂k T 0k xl xm
3 2 00 l m

Z
= − d3 x ∂k ∂0 T 0k xl xm
Z
= + d3 x ∂k ∂n T nk xl xm
Z
= d3 x T nk ∂k ∂n (xl xm ) + termos de superficie
Z
= 2 d3 x T lm
Z  Z 
2 iωt 3 00 l m 3 lm
−ω e d xC x x =2 d xC eiωt

Ou seja,

ω2
Z Z
3 lm
d xC =− d3 x C 00 xl xm
2
e depois de substituirmos na solução exterior temos

eiω(t−r)
h̄lm 2
ext = −2ω GI
lm
r

onde
Z
lm
I = d3 x C 00 xl xm

representa o momento quadripolar da distribuição de massa da fonte.

– 68 –
36 O princı́pio cosmológico

[Ferreira cap. 15]


Dadas as observações independentes do Universo em grande escala, afirma-se o princı́pio
cosmológico que diz que “Para escalas suficientemente grandes, o Universo é homogéneo e
isotrópico”. Importa então diferenciar estas duas propriedades.

Isotropia: Não há direcção preferencial no Universo. O Universo aparenta o mesmo


independentemente da direcção de observação;

Homogeneidade: O Universo aparenta exactamente o mesmo em qualquer ponto do


espaço.

Homogéneo, não isotrópico Isotrópico, não homegéneo

Se o Universo é isotrópico em todos os pontos do espaço, então é homogéneo.

– 69 –
37 A métrica de Friedmann-Lemaı̈tre-Robertson-Walker (FLRW)

[Ferreira cap. 18]


Como o Universo é homogéneo, a métrica tem de ser democrática nas direcções espa-
ciais, e portanto só pode depender do tempo

ds2 = −dt2 + a(t)2 dl2

onde a(t) é o factor de escala do Universo. Para uma geometria plana, o elemento de linha
espacial escrito em coordenadas cartesianas e em coordenadas esféricas é simplesmente,

dl2 = dx2 + dy 2 + dz 2
= dr2 + r2 (dθ2 + sin2 θdφ2 ) .

Vamos agora pensar num Universo de curvatura positiva. Para perceber melhor, de-
screvemos a superfı́cie 3-dimensional de uma hiperesfera embebida num espaço fictı́cio de
4 dimensões descrito por coordenadas X, Y , Z, W , pela equação

X 2 + Y 2 + Z 2 + W 2 = R2 .

Podemos agora usar as coordenadas hiperesféricas

X = R sin χ sin θ cos φ , Y = R sin χ sin θ sin φ , Z = R sin χ cos θ , W = R cos χ

para escrever o elemento de linha na superfı́cie desta hiperesfera,

dl2 = dX 2 + dY 2 + dZ 2 + dW 2
= R2 dχ2 + sin2 χ dθ2 + sin2 θdφ2
 

Para compararmos com a métrica da geometria plana fazemos r = R sin χ e temos dr =


R cos χdχ, e

dr2 dr2 dr2


dχ2 = = =
R2 cos2 χ R2 (1 − sin2 χ) R2 − r 2

que uma vez substituı́do no elemento de linha fica

dr2
dl2 = + r2 (dθ2 + sin2 θdφ2 )
1 − r2 /R2
Podemos agora voltar a fazer este exercı́cio mas para um Universo de curvatura negativa.
Agora consideremos uma superfı́cie 3-dimensional de uma hiper-hipérbola que é descrita
por

X 2 + Y 2 + Z 2 − W 2 = −R2

Usemos agora as coordenadas

X = R sinh χ sin θ cos φ , Y = R sinh χ sin θ sin φ , Z = R sinh χ cos θ , W = R cosh χ

– 70 –
Temos então o elemento de linha

dl2 = dX 2 + dY 2 + dZ 2 + dW 2
= R2 dχ2 + sinh2 χ dθ2 + sin2 θdφ2
 

Fazendo agora r = R sinh χ, temos dr = R cosh χdχ, e consequentemente

dr2 dr2 dr2


dχ2 = = =
R2 cosh2 χ R2 (1 + sinh2 χ) R2 + r 2

que uma vez substituı́do no elemento de linha fica

dr2
dl2 = + r2 (dθ2 + sin2 θdφ2 )
1 + r2 /R2

Em geral podemos descrever as métricas homogéneas e isotrópicas como

dr2
 
2 2 2 2 2 2 2
ds = −dt + a(t) + r (dθ + sin θdφ ) (37.1)
1 − kr2

onde

2
 1/R ,
 geometria de curvatura positiva
k= 0, geometria plana
 −1/R2 ,

geometria de curvatura negativa

Esta é a chamada métrica de Friedmann-Lemaı̈tre-Robertson-Walker. Esta métrica


preserva isotropia, g0i = 0 e a = a(t).

– 71 –
38 A equação de Friedmann

[Ferreira cap. 15]


Consideremos um universo permeado por um fluido perfeito

Tab = (ρ + p)ua ub + pgab

temos

T00 = ρ , Tij = a2 p δij

ou em forma matricial
 
−ρ 0 0 0
 0 p 0 0
(Tba ) = 
 

 0 0 p 0
0 0 0 p

Temos ainda que


ȧ i
Γij0 = Γi0j = δ , Γ0ij = aȧ δij
a j
 ·  2
ä ȧ ȧ k
R00 = −3 , R = −6 − 12 −6 2
a a a a
 2  2 !
ȧ k ä ȧ k
G00 = −3 −3 2 , Gij = − 2 + + 2 δij , G0i = 0
a a a a a

Usando agora as equações de Einstein Gab = 8πG Tba , temos a chamada equação de Friedmann

 2
ȧ 8πG k
= ρ− 2 (38.1)
a 3 a

e a equação de Raychaudhuri

ä 4πG
=− (ρ + 3p) (38.2)
a 3

Note-se que a primeira equação depende da curvatura do universo, enquanto a segunda é


independente da curvatura.

– 72 –
39 A equação da continuidade

[Barbosa Henriques, cap. 7.1.1]


Da conservação do tensor energia-momento para um fluido perfeito com quadrivector
ua

T ab = (ρ + p)ua ub + pg ab

temos

∇a T ab = 0
∇a ρ ua ub + ∇a p ua ub + (ρ + p)∇a (ua ub ) + g ab ∇a p = 0

multiplicando por ub e lembrando que ub ub = −1, ficamos com

ub ∇a T ab = 0
−∇a ρ ua − ∇a p ua + (ρ + p)ub ∇a (ua ub ) + ua ∇a p = 0
−ua ∇a ρ − (ρ + p)∇a ua + (ρ + p)ub ua ∇a ub = 0

Mas nós já sabemos que o quadrivector velocidade se transporta paralelamente, i.e.
Dua
= ua ∇a ub = 0

Foi daqui afinal, que nós obtivémos a equação da geodésica. Segue a equação da con-
tinuidade

ua ∇a ρ + (ρ + p)∇a ua = 0

ou ainda com ua = (1, 0, 0, 0), ou seja, no referência do fluido,

ρ̇ + (ρ + p)Γaab = 0

Para a métrica FLRW temos então


ρ̇ + 3 (ρ + p) = 0
a

É curioso que esta equação se pode obter facilmente da primeira lei da Termodinâmica

dU + pdV = T dS

Num universo homogéneo todas as quantidades fı́sicas são independentes da posição espa-
cial, ou seja, não há derivadas espaciais, em particular, não há gradientes de temperatura.
Isto significa que não há transporte de calor e a energia total deve manter-se constante.
Escrito de forma matemática,

dU = −pdV ⇒ dS = 0 ,

– 73 –
ou seja, a evolução do universo é um processo adiabático. Se dividirmos tudo por dt e com
V ∼ a3 e consequentemente U ∼ ρa3 , temos
dU dV
+p =0
dt dt
d(ρa3 ) d a3
+p =0
dt dt

ρ̇ + 3 (ρ + p) = 0
a
como tı́nhamos pela conservação do tensor energia-momento.

– 74 –
40 A lei de Hubble-Lemaı̈tre

[Ferreira cap. 16]


Sejam duas partı́culas (ou mesmo galáxias que para os cosmólogos dá no mesmo)
separadas de

d(t) = a(t)x(t)

onde x(t) é uma coordenada e a(t) nos dá a distância fı́sica entre as partı́culas, d(t). As
velocidade relativa entre elas é
d(ax) ȧ ȧ
v = d˙ = = a x + aẋ = d + aẋ
dt a a
Se desprezármos as chamadas velocidades peculiares ẋ, temos

v = Hd

com H = ȧ/a. Esta equação aplicada ao presente com H(a = a0 ) = H0 , fica

v = H0 d (40.1)

onde H0 é a constante de Hubble

H = 100hKm s−1 Mpc−1

e h ∼ 0.7 segundo as observações actuais.

– 75 –
41 Formas de matéria

[Ferreira cap. 17]


Existem vários tipos de matéria no nosso Universo que se comportam de formas diver-
sas e por isso afectam a evolução do Universo de forma diferente.

• Radiação
À medida que o universo se expande o comprimento de onda de um fotão sofre
desvio para o vermelho porque ν ∝ a−1 (ver capı́tulo seguinte). A energia de um
fotão é E = hν ∝ a−1 e a densidade de energia será ρ ∝ E/V ∼ a−4 . Também
podemos chegar a esta conclusão usando a equação da continuidade. Já vimos dos
exercı́cios que para o electromagnetismo T = −ρ + 3p = 0, ou seja, a pressão e a
densidade de energia relacionam-se com p = ρ/3. Colocando esta relação na equação
da continuidade ficamos com

ρ̇r + 4 ρr = 0,
a
que se integra para dar
 a 4
0
ρr = ρr0 .
a
Substituindo na equação de Friedmann,
 2
ȧ 1
∝ 4,
a a

o que dá a dependência do factor de escala com o tempo, a ∝ t1/2 .


Note-se que a densidade de energia de um corpo negro é dada pela lei de Stefan-
Boltzmann

ρ = 4σT 4
4 /15c2 h3 = 5.7×10−8 W m−2 K−4 é a constante de Stefan-Boltzmann.
onde σ = 2π 5 kB
Isto quer dizer que o factor de escala e a temperatura dos fotões se relaciona com
a0
T = T0
a

• Poeira
Para a poeira já vimos que, p = 0, e então substituindo na equação da continuidade
agora temos,

ρ̇m + 3 ρm = 0,
a
que se integra para dar
 a 3
0
ρm = ρm0 .
a

– 76 –
Substituindo na equação de Friedmann,
 2
ȧ 1
∝ 3,
a a

que neste caso indica, a ∝ t2/3 .

• Constante cosmológica
Obsevações de supernovas distantes, as chamadas SnIa, indicam que o Universo está
hoje numa fase de expansão acelerada. Para o Universo acelerar temos de ter ä > 0
o que implica, da equação de Raychaudhuri que p < −ρ/3. O exemplo de um género
de matéria assim é a energia de vácuo ou de uma constante cosmológica (dependendo
de que lado da equação de Einstein é colocada essa contribuição ),

Gab + Λgab = 8πGTab , constante cosmológica


 
Λ
Gab = 8πG Tab − gab , energia de vácuo
8πG
Λ ≡ −g Λ/8πG. Consequentemente, ρ = T
onde se define Tab ab Λ 00 = Λ/8πG,

e p =
−2
a T11 = −ρΛ . Substiuindo na equação de Friedmann, resulta que a ∝ e Λt .

– 77 –
42 Desvio para o vermelho cosmológico

Superfı́cies espaciais podem-se expandir ou contrair controladas pelo factor de escala a(t).
Isto leva ao desvio para o vermelho (redshift) ou para o azul (blueshift) dos fotões que se
propagam pelo espaço-tempo.
Considere-se um sinal de luz emitida em re no instante te e outro emitido no instante
te + dte e recebidos em r0 = 0 respectivamente nos instantes t0 e t0 + dt0 . Para os fotões,
ds2 = 0, então, da métrica de FLRW (37.1) com dθ = dφ = 0 temos

dt dr
=√
a 1 − kr2
A distância comóvel entre a fonte e o observador (voltaremos a esta definição mais tarde)
é Z 0 Z t0 Z t0 +dt0
dr dt dt
χ= √ = = = constante .
re 1 − kr 2
te a te +dte a

Vamos agora dividir as várias partes dos integrais


Z te +dte Z t0 Z t0 Z t0 +dt0
dt dt dt dt
+ = +
te a te +dte a te +dte a t0 a

mas como o segundo integral do lado esquerdo cancela com o primeiro integral do lado
direito da equação ficamos com
Z te +dte Z t0 +dt0
dt dt
=
te a t0 a

Podemos admitir que entre te e te + dte , o factor de escala se manteve constante em a = ae


e o mesmo em entre t0 e t0 + dt0 em a = a0 de tal forma que podemos escrever
Z te +dte Z t0 +dt0
1 1
dt = dt
ae te a0 t0

que se reduz a
dte dt0 dt0 a0
= ⇒ =
ae a0 dte ae
Como dt = 1/ν é o periodo de uma onda de luz de frequência ν define-se então o desvio para o vermelho
como a razão entre a frequência emitida e a observada e relaciona-se na proporção inversa
como o factor de escala.
νe a0
1+z ≡ =
ν0 ae

– 78 –
43 Os parâmetros cosmológicos

[Ferreira cap. 18]


Voltando à equação de Friedmann (38.1) com a definição H = ȧ/a,

8πG k
H2 = ρ− 2
3 a
e dividindo tudo por H 2 , também se pode escrever

1 = Σi Ωi + Ωk

onde se definiram as abundâncias


8πG k
Ωi = ρi , Ωk = − .
3H 2 H 2 a2
Para um Universo composto de radiação, matéria sem pressão e uma constante cos-
mológica, a equação de Friedmann escreve-se da seguinte forma
 
2 8πG  a 3
0
 a 4
0 k
H = ρm0 + ρr0 + ρΛ0 − 2 .
3 a a a

Dividindo ambos os termos por H02 e usando a relação entre redshift e o factor de escala,
bem como as definições para as abundâncias, temos

H 2 = H02 Ωm0 (1 + z)3 + Ωr0 (1 + z)4 + ΩΛ0 + Ωk0 (1 + z)2 ,


 

onde Ωk0 ≡ −k/a20 H02 . A partir de agora vamos definir as abundâncias no presente como
Ωm , Ωr , ΩΛ e Ωk e quando nos queremos referir a estas quantidades no passado a um tempo
t ou redshift z, usaremos Ωm (z), Ωr (z), ΩΛ (z) e Ωk (z).
A constante de Hubble, já vimos escreve-se como

H0 = 100 h km s−1 Mpc−1 , (43.1)

e os melhores constrangimentos actuais indicam que a matéria se desdobra em bariões


e matéria escura e que, pelo menos durante parte da história do Universo, a radiação
se desdobra em fotões e neutrinos. Estes parâmetros têm aproximadamente os seguintes
valores segundo o Planck e Oscilações Acústicas Bariónicas:

h = 0.677 ± 0.004,
Ωγ h2 = 2.47 × 10−5 ,
Ωb h2 = 0.0242 ± 0.00014,
Ωdm h2 = 0.1193 ± 0.0009,
ΩΛ = 0.689 ± 0.006,

onde “b” significa bariões e “dm” representa matéria escura (dark matter) e γ representa
fotões.

– 79 –
44 Universo dominado por matéria

[D’Inverno cap. 23.1–23.3]


O universo de Einstein é um universo com matéria mas sem movimento.
O universo de de Sitter, é um universo sem matéria mas com movi-
mento.

Vamos agora estudar a evolução do universo para casos particulares de uma forma
qualitativa. Para esse usamos um conjunto de regras que nos auxiliam na construção de
diagramas de densidades e assim avaliar em que situações é possı́vel ter um universo viável

(i) Os diagramas têm eixos ln ρ vs ln a;

(ii) Componentes com ρ > 0 são desenhadas com linhas a cheio, e componentes com
ρ < 0, são desenhadas a tracejado;

(iii) Como, H 2 > 0, só intervalos do factor de escala em que as componentes positivas são
dominates, correspondem a uma cosmologia consistente.

(iv) No ponto onde uma linha que corresponde a uma componente dominate positiva
intersecta uma linha de uma componente dominante negativa, ȧ ≈ 0 e o universo tem
um ”bounce” (ou um ”boing”) se ä > 0 ou um ”turn around” (também conhecido
como ”toing”) se ä < 0.

44.1 Universo sem constante cosmológica


A equação de Friedmann é simplesmente
 2
ȧ C k
= 3− 2
a a a

(a) Espaço Euclideano (k = 0)

C
ȧ2 = ⇒ a ∝ t2/3
a

Este é chamado o universo de Einstein-de Sitter.

– 80 –
(b) Modelo elı́ptico (k = +1)
A equação de Friedmann fica
 2
ȧ C 1 C
= 3− 2 ⇒ ȧ2 = −1
a a a a

Neste caso há um valor máximo para o factor de escala, amax = C, onde ȧ = 0. O
universo muda de um comportamento de expansão para contracção. O universo tem
um ”toing”. Resolvemos a equação fazendo

a = C sin2 θ , ⇒ ȧ = 2C sin θ cos θθ̇

e substituindo na equação de Friedmann temos


C
θ̇2 4C 2 sin2 θ cos2 θ = −1
C sin2 θ
θ̇2C sin2 θ = 1
dt = 2CZsin2 θdθ
t = C (1 − cos 2θ)dθ
 
1
t = C θ − sin 2θ
2

que é equivalente a escrever

t = C(θ − cos θ sin θ)

O Big-Crunch é atingido quando θ = π em t = πC. Note-se que para θ  1, ou seja,


para factores de escala pequenos, temos

θ2 θ3
  
t ≈ Cθ 1 − 1 − =C ⇒ a ∝ t2/3 ,
2 2

como esperarı́amos.

(c) Modelo hiperbólico (k = −1)

– 81 –
Agora temos
 2
ȧ C 1 C
= 3+ 2 ⇒ ȧ2 = +1
a a a a

O factor de escala cresce sempre. Também podemos escrever a solução

a = sinh2 χ

t = C(cosh χ sinh χ − χ)

e podemos verificar que quando o factor de escala é pequeno, χ  1, recuperamos


a ∝ t2/3 mais uma vez.

44.2 Universo com constante cosmológica negativa


Agora temos uma equação de Friedmann
 2
ȧ C |Λ| k
= 3− − 2
a a 3 a

e temos as seguintes situações

(a) Espaço Euclideano (k = 0)


O universo tem um toing e acaba num Big-Crunch.

(b) Espaço elı́ptico (k = +1)


O universo tem um toing e acaba num Big-Crunch.

(c) Espaço hiperbólico (k = −1)


O universo tem um toing e acaba num Big-Crunch.

– 82 –
Figure 5. Diagramas ln ρ vs ln a para um universo com costante cosmológica negativa com k =
0, 1, −1, respectivamente.

Figure 6. Modelo com constante cosmológica positiva e curvatura nula.

44.3 Universo com constante cosmológica positiva


A equação de Friedmann escreve-se agora como
 2
ȧ C Λ k
= 3+ − 2
a a 3 a
e temos as seguintes situações

(a) Espaço Euclideano (k = 0)


O universo expande-se para sempre.

(b) Espaço elı́ptico (k = +1)


Existe um valor crı́tico Λc = 4/9C 2 e um ponto crı́tico ac = 3C/2 tal que para estes
valores ȧc = 0. Temos então três situações possı́veis

(i) Λ > Λc
Modelo de Lemaı̈tre. O Universo expande-se para sempre.
(ii) Λ = Λc
Aqui temos várias possibilidades:
- Modelo estático de Einstein.
- Modelo em que o universo começa com a < ac , se expande e se aproxima
de Einstein estático assimptoticamente.

– 83 –
- Modelo em que o universo começa com a > ac , se expande e torna-se de
Sitter, Eddington-Lemaı̈tre.
E claro que também podemos considerar os casos em que o universo contrai
num Big-Crunch e em que o universo contrai e se aproxima de Einstein estático
assimptoticamente. Mas estes casos são semelhantes aos anteriores revertendo
a seta do tempo.
(iii) 0 < Λ < Λc
- O universo tem um toing e termina num Big-Crunch
- O universo contrai, tem um boing, e expande-se para sempre.

Figure 7. Diagrama ln ρ vs ln a para um universo com constante cosmológica positiva com Λ > Λc ,
Λ = Λc , e Λ < Λc , respectivamente.

(c) Espaço hiperbólico (k = −1)

Figure 8. Modelo com constante cosmológicas positiva e curvatura negativa.

O universo expande-se para sempre.

Resumindo, temos a seguinte tabela com a classificação dos modelos de Friedmann


com todas as situações possı́veis (para um universo com poeira apenas).

– 84 –
k=0 k=1 k = −1

Λ=0

Λ<0

Λ > Λc

Λ>0 Λ = Λc

Λ < Λc

– 85 –
45 A idade do Universo
Uma constante cosmológica entra num bar. O empregado grita ”Con-
stantes cosmológicas não são permitidas neste bar”. A constante cos-
mológica responde tristemente ”É sempre a mesma coisa em todo o
lado!”

A idade do Universo pode ser calculada a partir da equação de Friedmann. Temos


Z t Z a Z a Z a
dt a da 1 da
t= dt = da = =
0 0 da 0 ȧ a 0 H a

Mas como
a 1 da dz
= ⇒ =−
a0 1+z a 1+z
e então ficamos com
Z z Z ∞
1 dz 1 dz
t=− =
∞ H 1+z H0 z (1 + z)E(z)

onde se usou a definição

H2
E(z)2 ≡ = Ωm (1 + z)3 + Ωr (1 + z)4 + ΩΛ + Ωk (1 + z)2
H02

Vamos considerar três possibilidades. Se admitirmos que o Universo é dominado por


radiação até à altura em que acontece a equivalência entre a radiação e a matéria em
zeq ≈ 3400 (exercı́cio), então
p
E(z) = Ωr (1 + z)2

e a idade do Universo calcula-se como


Z ∞  zeq
1 dz 1 1 1 1 1 1
teq ≈ √ 3
= √ 2
= √
H0 Ωr zeq (1 + z) H0 Ωr 2 (1 + z) ∞ 2 H0 Ωr (1 + zeq )2

escrevendo a taxa de expansão de Hubble em anos e calculando Ωr que deve incluir tanto
os fotões como os neutrinos,
1
≈ 10 × 109 h−1 anos ,
H0
 4/3 !
7 4
Ωr = Ωγ + Ων = Ωγ 1+3× × = 4.07 × 10−5 h−2
8 11

temos
1 1 1
teq ≈ 10 × 109 h−1 anos −5 −2 1/2 2
≈ 6.8 × 104 anos .
(4.07 × 10 h ) 2 3400

– 86 –
A partir dessa época o Universo é dominado por matéria. Se admitirmos por agora
que a matéria é tudo o que temos num universo plano, Ωm = 1, então, E(z) = (1 + z)3/2 e
ficamos com
Z zeq  0
1 dz 1 2 1 2 1
t0 = 5/2
= 3/2
= ≈ 9 × 109 anos .
H0 0 (1 + z) H0 3 (1 + z) zeq 3 H0

Vemos então que a idade do Universo é essencialmente dada pelo perı́odo em que a
matéria é dominante. Mas também sabemos que deve existir algo como uma constante
cosmológica que acelera o Universo e que deve ter começado a dominar a evolução muito
tarde. Desprezando a contribuição da radiação temos então
Z ∞
1 dz
t0 =
H0 0 (1 + z)(Ωm (1 + z)3 + ΩΛ )1/2
"  #
2 1 1 1 − Ωm 1/2
= √ arcsinh .
3 H0 1 − Ωm Ωm

Para Ωm ≈ 0.3 e h ≈ 0.7 resulta que

t0 ≈ 13.8 × 109 anos .

Isto quer dizer que a constante cosmológica faz o Universo um pouco mais velho do que se
só considerássemos matéria.

Figure 9. A evolução das várias densidades de energia do Universo.

– 87 –
46 Distâncias em cosmologia

[Ferreira cap. 19]


Já vimos que podemos escrever a métrica de FLRW como

dr2
 
2 2 2 2
ds = −dt + a(t) + r dΩ
1 − kr2

ou de forma equivalente como

ds2 = −dt2 + a(t)2 dχ2 + r2 dΩ


 

onde temos

 R sin χ ,
 curvatura positiva
r= χ, geometria plana

 R sinh χ , curvatura negativa

1. Distância comóvel
Define a distância no espaço das coordenadas χ que um fotão viaja entre um objecto
distante e nós.
Z t0
dt
χ=
t a

2. Distância própria
Define a distância percorrida, rp , no espaço das coordenadas r.
Z 0 Z rp
dr dr
χ=− √ = √
1 − kr 2 1 − kr2
r 0
 p p 

 √1 arcsin |k| rp , curvatura positiva
 |k|

= rp , p  geometria plana

1
 √ arcsinh |k| rp , curvatura negativa


|k|

Invertendo esta expressão e notando que


k
Ωk = − ⇒ |k| = |Ωk |H02
a0 H02

onde se fez a0 = 1, ficamos com a relação entre χ e rp ,


  p 
√ 1

 sin H 0 |Ω k | χ , curvatura positiva
 H0 |Ωk |

rp = χ,  p  geometria plana

 √ 1
sinh H0 |Ωk | χ , curvatura negativa


H0 |Ωk |

– 88 –
3. Distância ângular
É a distância subentendida pela razão entre o tamanho l de um objecto que é transver-
sal à nossa linha de observação e a abertura ângular desse objecto.
l
dA =
θ

Da métrica de FLRW sabemos que a distância própria correspondente ao ângulo θ é


dl2 = a2 r2 dθ2 , ou seja, l = arp θ, o que significa que escrevemos a distância ângular
como
arp θ
dA = = arp
θ
ou melhor ainda
rp
dA =
1+z

4. Distância luminosa
Podemos também definir uma distância associada à luminosidade absoluta, L, de um
objecto. O fluxo da luz de um objecto a essa distância é
L
F =
4πd2L
onde dL é a distância luminosa. A luminosidade absoluta escreve-se como
(fotoes emitidos) × (energia dos fotoes) Nγ Ee
L= =
intervalo de tempo dte
Para o observador que está a uma distância própria rp da fonte, os fotões difundem-se
numa área A = 4πa20 rp2 = 4πrp2 . O fluxo observado num intervalo dt0 é então

Nγ E0
F =
dt0 A
O número de fotões é conservado mas a sua energia é menor devido ao desvio para o
vermelho cosmológico E0 = Ee /(1 + z). Por outro lado, o intervalo de tempo também
sofre uma dilatação porque já vimos que dt0 = dte (1 + z). Colocando tudo junto na
expressão para o fluxo medido temos
Nγ Ee L
F = 2 2
=
dte (1 + z) 4πrp 4π(1 + z)2 rp2

e daı́ tiramos que a distância luminosa é

dL = (1 + z)rp

e que se relaciona com a distância ângular com

dL = (1 + z)2 dA .

– 89 –
47 Distância luminosa e magnitude aparente

Vimos no capı́tulo anterior a definição de distância comóvel, χ. Esta pode ser escrita na
forma
Z t0 Z a0 Z a0 Z a0 Z 0
dt dt da 1 da 1 da 1
χ= = = = 2
=− dz
t a a da a a ȧ a a H a z H

E finalmente usando a definição de E(z) = H/H0 , temos


Z z
1 dz
χ=
H0 0 E(z)

E ficamos então com a expressão para a distância luminosa


 p R z dz 
√c
 (1 + z) sin |Ω k | 0 E(z) , curvatura positiva
H0 |Ωk |



z dz
(1 + z) Hc0 0 E(z)
R
dL = , geometria plana
 p R z dz 
 (1 + z) √c |Ω |

 sinh k 0 E(z) , curvatura negativa
H0 |Ωk |

onde se colocou a velocidade da luz no vácuo, c, explicitamente.


O astrónomo grego Hiparco inventou uma escala de magnitudes que descrevia o brilho
de cada estrela no céu. Às estrelas mais brilhantes atribuiu-lhes um valor de m = 1 e às
mais fracas o valor de m = 6. A estas corresponde um brilho aparente que é 100 vezes mais
fraco que o das estrelas do primeiro grupo. Podemos estender esta relação para magnitudes
fora deste intervalo e convencionou-se comparar com o brilho aparente de um objecto a
10 parsec a que corresponde uma magnitude bolométrica M . Como o fluxo, que mede o
brilho aparente, depende da distância luminosa com d−2 L , temos

dL 2
 
F (d = 10pc) m−M
= = 100 5
F (dL ) 10pc
Mas em cosmologia a unidade de distância mais comum é o Mega parsec, fazendo o logar-
itmo, podemos escrever esta relação como
 
dL
m = M + 5 log10 + 25
Mpc

Para as supernovas do tipo Ia, a magnitude bolométrica é aproximadamente M = −19.5.


Hoje fazemos o diagrama de Hubble usando magnitudes versus o desvio para o vermelho.
De certa forma, estamos a colocar as distâncias no eixo dos y e as velocidades no eixo dos
x. Na figura podemos ver o diagrama de Hubble como determinado por supernovas de
baixo redshift mais 42 supernovas de alto redshift em 1998.
Hoje temos análises que incluem muito mais supernovas e a precisão é portanto muito
maior. Podemos inclusivé considerar que a aceleração do Universo é causada por uma
componente geral, energia escura, com parâmetro de equação de estado w. Acontece que
os dados actuais sugerem que w = −1, ou seja, a energia escura é mesmo uma constante
cosmológica ou algo muito próximo de o ser.

– 90 –
Figure 10. O diagrama de Hubble a partir de 42 supernovas a redshift elevado. Figura de
Perlmutter et al. ApJ, 1999.

Figure 11. O diagrama de Hubble a partir da compilação Pantheon e limites ao parâmetro da


equação de estado w. Figuras de Jones et al. ApJ, 2018, Scolnic et al. ApJ 2018.

– 91 –
48 Horizontes em cosmologia

[Barbosa Henriques cap. 7.3]


Já vimos que da métrica de Friedmann para um fotão (ds2 = 0) com dθ = dφ = 0,
emitido em r1 no instante t1 é recebido pelo observador em r0 = 0 no instante genérico t2 ,
percorreu
Z r1 Z t2
dr dt
χ= √ =
t1 a
1 − kr 2
0

Para uma evolução do factor de escala a = (t/t0 )n , com n < 1, temos


"   1−n #
t0 t2 1−n t1 n 1 h (1−n)/n (1−n)/n
i
χ= − = a2 − a1 ,
1−n t0 t0 1 − n H0

e no caso de uma constante cosmológica, a evolução do factor de escala satisfaz a = eH(t−t0 ) ,


e temos
 
1  −H(t1 −t0 ) −H(t2 −t0 )
 1 1 1
χ= e −e = −
H H a1 a2

1. Horizonte de partı́culas
Se à medida que t1 → 0, e t2 → t0 , ou seja, o fotão foi emitido no passado longı́nquo e
recebido hoje, o integral diverge, significa que o observador pode receber informação
de qualquer ponto do passado, desde que essa informação tenha sido emitida sufi-
cientemente cedo.
Por outro lado, se o integral é finito, significa que o observador só pode receber
informação de partı́culas em posições r < r1 = rH (t), o chamado, horizonte de
partı́culas.
Para radiação e poeira (com n = 1/2 ou n = 2/3, respectivamente) temos
t0 n 1
χ= =
1−n 1 − n H0
o que significa que há um horizonte, mas que ele aumenta à medida que t0 cresce.
Para um universo com uma constante cosmológica, temos,
 
1 a1
χ= 1−
Ha1 a0

Aqui também há um horizonte, e mesmo que esperemos muito tempo, há eventos no
passado que nunca vemos.

2. Horizonte de acontecimentos
Da mesma forma agora podemos averiguar se há acontecimentos de que nunca nos
poderemos aperceber no futuro. No caso em que t2 → ∞, e o integral diverge,
significa que no futuro poderemos ter conhecimento de qualquer acontecimento desde

– 92 –
que esperemos tempo suficiente. Por outro lado, se o integral é finito, significa que
há acontecimentos que nunca veremos. Existe um horizonte de acontecimentos. No
caso em que há um Big-Crunch, devemos considerar antes t2 → tmax < ∞.
Voltemos ao nosso exemplo de um universo com radiação ou poeira. O integral fica

χ→∞

o que significa que podemos tomar conhecimento de qualquer acontecimento desde


que esperemos o tempo suficiente. E para uma constante cosmológica,
1
χ→
Ha1
e temos um claro horizonte de acontecimentos.

Como a velocidade da luz marca uma região onde se pode trocar informação, estes
horizontes são interpretados como regiões causais no universo.

– 93 –
49 Densidades tensoriais

[D’Inverno cap.7]
De seguida vamos utilizar um método mais robusto de determinar as equações de
Einstein que consiste na abordagem pelo princı́pio variacional. Ou seja, vamos construir
uma acção cujas equações do movimento são as equações de Einstein. Esta ferramenta é
muito poderosa na procura de extensões à Relatividade Geral e por isso muito popular.
Para prosseguirmos teremos de nos apetrechar com algumas ferramentas matemáticas como
o conceito de densidade tensorial. Esta é uma grandeza que se transforma de maneira
semelhante a um tensor mas com um factor adicional de J w , onde w é o peso da densidade
tensorial e J a matriz Jacobiana
a
∂x
J = b .
∂ x̃

Temos então de uma forma geral,

a... ∂ x̃a ∂xν


T̃b... = Jw ... ...Tνµ .
∂xµ ∂ x̃b
O produto de duas densidades tensoriais de pesos w1 e w2 é uma densidade tensorial de
peso w1 + w2 . Para a derivada covariante podemos adoptar
a... a...
∇c Tb... = ∂c Tb... d...
+ Γadc Tb... a...
+ ... − Γdbc Td... a...
− ... − wΓdcd Tb... .

Por exemplo, para um vector,

∇c T a = ∂c T a + Γabc T b − wΓbba T a

Se w = 1 e c = a, então

∇a T a = ∂a T a + Γaba T b − Γbba T a = ∂a T a (49.1)

e a derivada covariante é igual à derivada parcial.

– 94 –
50 O determinante da métrica

[D’Inverno cap. 7]
Já vimos que a métrica gab (x), se tranforma como

∂xc ∂xd
g̃ab (x̃) = gcd (x)
∂ x̃a ∂ x̃b
porque é um tensor covariante de segunda ordem. O determinante, g = det(gab ) transforma-
se como:

g̃ = J 2 g

ou seja, o determinante é uma densidade tensorial de peso w = 2.


Para métricas de assinatura negativa escrevemos antes:
p √
(−g̃) = J 2 (−g) , ⇒ −g̃ = J −g

onde agora −g é uma densidade tensorial de peso w = 1.
Vamos agora calcular a derivada covariante do tensor da métrica. Primeiro tomemos
uma matriz genérica (aij ), cujo determinante a = det(aij ), é

a = Σnj=1 aij Aij

onde Aij é a matriz dos cofactores transposta. Diferenciado em relação a aij resulta

∂a
= Aij
∂aij

Como a = a(aij (x)) = a(x), podemos fazer

∂a ∂a ∂aij ∂aij
c
= c
= Aij c
∂x ∂aij ∂x ∂x

Mas a matriz transposta relaciona-se com a inversa de aij , a matriz aji como

Aij = a(aji )

então
∂a ∂aij
c
= a(aji ) c
∂x ∂x
Vamos agora aplicar isto à nossa métrica e seu determinante, e atendendo que g ba = g ab

∂c g = gg ab ∂c gab (50.1)

mas atenção que porque gab g ac = δbc , temos que

∂d (gab g ac ) = 0 , ⇒ g ac ∂d gab = −gab ∂d g ac

– 95 –
e então

∂c g = −ggab ∂c g ab (50.2)

Por outro lado, como a derivada covariante do tensor da métrica se anula, temos

∇c gab = 0 ⇒ ∂c gab = Γdac gdb + Γdbc gad (50.3)

e usando esta relação em (50.1) temos


 
∂c g = gg ab Γdac gdb + Γdbc gad = gΓaac + gΓbbc

ou seja,

∂c g = 2gΓaac

Mas como g é uma densidade escalar de peso w = 2, também sabemos que

∇c g = ∂c g − 2Γaac g

que usando o resultado anterior significa que

∇c g = 0

O mesmo acontece com −g. Temos das equações (50.1) e (50.2), respectivamente,

√ 1√ 1√
∂c −g = −g g ab ∂c gab = − −g gab ∂c g ab
2 2

Usando a condição de metricidade (50.3) na primeira igualdade, temos


√ √
∂c −g = −g Γaac

Mas como −g é densidade escalar de peso w = 1,
√ √ √
∇c −g = ∂c −g − Γaac −g

então temos de ter



∇c −g = 0

Dado um tensor T a , então ( −gT a ) é uma densidade tensorial de peso w = 1. Então
da identidade (49.1) podemos dizer imediatamente que
√ √
∇a ( −gT a ) = ∂a ( −gT a )

o que pode ser facilmente verificado a partir das relações acima.

– 96 –
51 Coordenadas geodésicas

[D’Inverno cap 6.6; Gibbons cap 11.1]


Por vezes é útil definir um sistema de coordenadas na vizinhança de um ponto P tal
que nesse pontos as componentes das conexões da métrica se anulam

(Γabc )P = 0

Vamos mostrar que é possı́vel fazer uma transformação de coordenadas de maneira a que
isto possa ser feito. Vamos tomar, sem perda se generalidade, o ponto P como a origem
das coordenadas, xaP = 0. Consideremos agora a transformação de coordenadas

1
xa → x̃a = xa + Qabc xb xc
2

e determinemos os coefficientes Qabc de forma a que (Γ̃abc )P = 0. Vamos assumir que


Qabc = Qacb . Já vimos a lei de transformação das conexões da métrica

∂ x̃a ∂xe ∂xf d ∂xd ∂xe ∂ 2 x̃a


   
(Γ̃abc )P = Γ −
∂xd ∂ x̃b ∂ x̃c ef P ∂ x̃b ∂ x̃c ∂xd ∂xe P

Calculando as derivadas que entram na transformação usando xaP = 0,

∂ x̃a
 a
a a b ∂ x̃
= δ d + Qbd x , ⇒ = δda
∂xd ∂xd P
∂ 2 x̃a
 2 a 
a ∂ x̃
d e
= Qde , ⇒ = Qade
∂x ∂x ∂xd ∂xe P

temos que

(Γ̃abc )P = (Γabc )P − Qabc .

Ou seja, se escolhermos os coefficientes Qabc = (Γabc )P , então (Γ̃abc )P = 0, neste sistema de


coordenadas. Note-se que as derivadas de Γ̃abc podem não se anular, todavia. Este resultado
pode facilitar muitas vezes os cálculos porque as derivadas covariantes passam a ser iguais
às derivadas parciais. Para além disso, mostra que numa vizinhança suficientemente pe-
quena podemos admitir a geometria como plana. Lembrar o princı́pio de equivalência, na
relatividade geral e a ideia de que um observador em queda livre anula a força da gravidade
na sua vizinhança, mas só na vizinhança imediata.

– 97 –
52 O princı́pio variacional para a Relatividade Geral

[D’Inverno cap. 11.5]


Vamos considerar a acção para o campo gravitacional escrita como


Z
S= d4 x −gR

onde R = g ab Rab é o tensor de Ricci. Queremos mostrar que as equações de campo são as
equações de Einstein. Vamos fazer a variação da acção para escrever
Z h √  √ i
δS = d4 x δ −gg ab Rab + −gg ab δRab = 0 .

Olhemos primeiro para o segundo termo. Se trabalharmos em coordenadas geodésicas


(Γabc )P = 0, e variarmos o tensor de Ricci temos

δRab = ∂c δΓcab − ∂b δΓcac

uma vez que termos do género ΓδΓ são nulos nestas coordenadas. Para além disso, nestas
coordenadas, as derivadas covariantes são iguais às derivadas parciais, e podemos escrever
∂c = ∇c , e resulta a chamada identidade de Palatini

δRab = ∇c (δΓcab ) − ∇b (δΓdad )

Usando esta identidade resulta


 
g ab δRab = g ab ∇c (δΓcab ) − ∇b (δΓdad )

e como ∇c g ab = 0,
 
g ab δRab = ∇c g ab δΓcab − δbc g ab δΓdad

e também ∇c −g = 0,
√ ab
h√ 
ab
i
−gg δRab = ∇c −g g − δΓcab δbc g ab δΓdad
h√  i
= ∂c −g g ab δΓcab − δbc g ab δΓdad

onde no último passo se usou o facto de a quantidade dentro do parêntesis recto ser uma
densidade tensorial de peso w = 1. Esta quantidade é uma derivada total de maneira que
pelo teorema de Gauss
Z Z
dV ∂c X = dS X
V ∂V

e como fazemos em mecânica clássica que nas fronteiras δΓ = 0, este termo, portanto,
anula-se.

– 98 –
Voltamos agora ao primeiro termo
√  √ √
δ −gg ab Rab = −gδg ab Rab + δ −gR
√ √
mas já vimos antes que δ −g = − 21 −ggab δg ab , podemos escrever

4 √
Z  
1
δS = d x −g Rab − gab R δg ab = 0
2

o que significa que para perturbações não nulas temos de ter

1
Rab − gab R = 0
2

que de facto é a parte puramente geométrica das equações de Einstein.

– 99 –
53 O Lagrangiano de matéria

[D’Inverno cap. 11.8]


Vamos agora ver como o Lagrangiano gravitacional encaixa com o Lagrangiano para
os campos de matéria. Escreve-se tipicamente
√ √
Z Z
1
S= d4 x −gR + d4 x −gLm
16πG
Variando a acção temos
√ √
4 δ( −gR) 4 δ( −gLm )
Z Z
1 ab
δS = d x δg + d x δg ab
16πG δg ab δg ab

1 √
   
δ( −gLm )
Z
1
= d4 x −g Rab − gab R + δg ab = 0
16πG 2 δg ab

Daqui tiramos que



1 1 δ( −gLm )
Rab − gab R = −16πG √
2 −g δg ab
= 8πGTab

E então relacionamos o tensor energia-momento com a derivada funcional do Lagrangiano


como

2 δ( −gLm )
Tab = − √
−g δg ab

e pode-se mostrar que também se pode escrever



2 δ( −gLm )
T ab = √
−g δgab

– 100 –
54 Tensor energia-momento do electromagnetismo

[D’Inverno cap.12.6]
A acção para o campo electromagnético escreve-se como


Z
1
Sem =− d4 x −gFab F ab
4

onde o tensor F ab se relaciona com os campos eléctrico e magnético em coordenadas carte-


sianas segundo a matriz
 
0 Ex Ey Ez
 −E 0 Bz −By 
x
F ab = 
 
 −Ey −Bz 0

Bx 
−Ez By −Bx 0

E também pode ser escrito em termos de um potencial vector Aa tal que Fab = ∇a Ab −
∇b Aa . Usando este resultado e as simetrias do tensor de Riemann, mostra-se que

∇c Fab + ∇a Fbc + ∇b Fca = 0 (54.1)

Notemos que neste caso temos para a densidade Lagrangiana


√ 1√ 1√
−gLem = − −gFab F ab = − −gg ac g bd Fab Fcd
4 4
√ √
usando δ −g = − 12 −ggab δg ab , temos a derivada

1√
 
δ( −gLem ) 1 ab bd
=− −g − gef Fab F + 2g Feb Ff d
δg ef 4 2
1√
 
1 ab d
=− −g − gef Fab F + 2Fe Ff d
4 2

e então o tensor energia-momento que se relaciona com a densidade Lagrangiana



2 δ( −gLm )
Tab = − √
−g δg ab

escreve-se simplesmente como

1
Tab = Fa d Fbd − gab Fcd F cd
4

Usando a conservação do tensor energia-momento temos que

∇b F ab = 0 . (54.2)

As equações (54.1) e (54.2) são a versão covariante das equações de Maxwell.

– 101 –
55 Tensor energia-momento para um campo escalar

[Amendola cap. 7.1]


Z  
4 1 a
Sφ = − d x −g ∂ φ∂a φ + V (φ)
2

onde temos portanto,


√ √
 
1 ab
−gLφ = − −g g ∂a φ∂b φ + V (φ)
2

e ficamos com a derivada funcional



1√ √ 1
 
δ( −gLφ ) 1 c
ab
= −ggab ∂ φ∂c φ + V (φ) − −g ∂a φ∂b φ
δg 2 2 2

de onde resulta o tensor energia-momento


 
1 c
Tab = ∂a φ∂b φ − gab ∂ φ∂c φ + V (φ)
2

Comparando com o tensor energia-momento para um fluido perfeito

Tab = (ρ + p)ua ub + gab p

retiramos imediatamente que a pressão para um campo escalar se escreve como


1
p = − ∂ c φ∂c φ − V (φ)
2
Para identificar a densidade de energia vamos lembrar que para um fluido perfeito Taa =
−ρ + 3p. Temos da definição
 
a a a 1 c
Tb = ∂ φ∂b φ − gb ∂ φ∂c φ + V (φ)
2
e consequentemente

T = Taa = −ρ + 3p = −∂ a φ∂a φ − 4V (φ)

e que susbtituindo p e resolvendo para ρ obtemos


1
ρ = − ∂ c φ∂c φ + V (φ)
2
Ou seja, comparando os tensores energia-momento do fluido perfeito e do campo escalar,
temos a igualdade

(ρ + p)ua ub = ∂a φ∂b φ
−∂ c φ∂c φ ua ub = ∂a φ∂b φ

– 102 –
e então podemos identificar o 4-vector velocidade como
∂a φ
ua = − √
−∂ c φ∂c φ
e note-se que de facto se mantém ua ua = −1 como vimos antes.
Agora que temos o tensor energia momento e definimos pressão e densidade de energia,
podemos usar a equação da continuidade derivada para FLRW para obter a equação do
movimento para o campo

ȧ ∂V
φ̈ + 3 φ̇ + =0 (55.1)
a ∂φ

Também podemos obter este resultado a partir das equações de Euler-Lagrange agora
que temos o Lagrangiano. Tomamos então
√ √
∂( −gL) ∂( −gL)
∂a − =0
∂(∂a φ) ∂φ

onde

∂( −gL) √
= − −g∂ a φ
∂(∂a φ)
e consequentemente

∂( −gL) √ √ √
∂a = −∂a ( −g∂ a φ) = − −g∂a ∂ a φ − ∂a −g∂ a φ
∂(∂a φ)
√ √
= − −g∂a ∂ a φ − −gΓcca ∂ a φ
√ √
onde se usou ∂a −g = −g Γcca , e para o outro termo

∂( −gL) √ ∂V
= − −g
∂φ ∂φ
e a equação do movimento fica

∂V
−∂a ∂ a φ − Γcca ∂ a φ + =0
∂φ

que para um espaço de FLRW, ∂0 φ = φ̇, ∂ 0 = −φ̇, Γii0 = 3ȧ/a resulta a equação do
movimento (55.1).

– 103 –
56 O método de Palatini

[D’Inverno cap. 11.7]


O método de Palatini prende-se na ideia de tratar a métrica e as conexões de forma
separada como variáveis dinâmicas. Partimos da acção

4 √ √
Z Z
S = d x −gLG + d4 x −gLm

onde o Lagrangiano da gravidade é


√ √ 
−gLG = LG −gg ab , Γabc , Γabc,d
1 √
= −gg ab Rab
16πG

O cálculo variacional do Lagrangiano resulta


√ 1 √ √ 1 √
δ( −gL) = Rab δ( −gg ab ) + δ( −gLm ) + −gg ab δRab = 0
16πG 16πG
ou seja,
1 √ √ 1 √
 
ab 1 cd
−g Rab δg − R gcd δg + δ( −gLm ) + −gg ab δRab = 0
16πG 2 16πG
e usando a definição do tensor energia momento

2 δ( −gLm )
Tab = − √
−g δg ab
temos que
√ √
 
1
−g Rab − gab R − 8πGTab δg ab + −gg ab δRab = 0
2
Como não sabemos se Rab é simétrico ou não porque as conexões não estão definidas,
podemos escrever Rab com uma parte simétrica e outra anti-simétrica tal que

Rab = R(ab) + R[ab]

e como g ab é simétrico, então R[ab] δg ab = 0, e o cálculo variacional em relação á metrica


g ab resulta
1
R(ab) − gab R = 8πGTab
2
Ainda não acabou. Agora precisamos de aplicar o método variacional em relação a
Γabc . Temos, usando a identidade de Palatini,
√ √
−gg ab δRab = −gg ab [∇c δΓcab − ∇b δΓcac ]
√ √
= ∇b ( −gg ab )δΓcac − ∇c ( −gg ab )δΓcab +
h√ i h√ i
∇c −gg ab δΓcab − ∇b −gg ab δΓcac

– 104 –
Os dois últimos termos são derivadas totais, portanto, darão contribuições nulas na acção
e (fazendo b → d) )ficamos com
√ h √ √ i
−gg ab δRab = δcb ∇d ( −gg ad ) − ∇c ( −gg ab ) δΓcab

Agora lembre-se que quando temos tensores tais que (tensor anti-simétrico) × (tensor
simétrico) = 0. Como as perturbações das conexões da métrica são simétricas, a parte
anti-simétrica do termo entre parêntesis rectos vezes aquela anula-se imediatamente. Então
só temos de impôr que a parte simétrica em a − b da quantidade entre parêntesis se tem
de anular. Ou seja
1 b √ 1 √ √
δc ∇d ( −gg ad ) + δca ∇d ( −gg bd ) − ∇c ( −gg ab ) = 0 (56.1)
2 2
Fazendo c = b, temos
1 b √ 1 √ √
δb ∇d ( −gg ad ) + δba ∇d ( −gg bd ) − ∇b ( −gg ab ) = 0
2 2
1 √ √
(4 + 1)∇d ( −gg ad ) − ∇b ( −gg ab ) = 0
2

ou seja, ∇d ( −gg ad ) = 0, que substituindo na equação (56.1) implica

∇c ( −gg ab ) = 0

Deste resultado podemos ainda mostrar (também é um bom exercı́cio) que ∇c −g = 0,
que ∇c g ab = 0, e consequentemente
1
Γabc = g ad (gbd,c + gcd,b − gbc,d )
2
e de facto obtemos exactamente as mesmas equações de campo e as mesmas relações entre
a métrica e as conexões pelo método de Palatini. Isso já não é verdade nas teorias de f (R).

– 105 –
57 Teorias f (R)

As teorias f (R) são uma extensão da teoria da relatividade geral onde se considera uma
função geral do escalar de Ricci na acção

Z
1
S= d4 x −gf (R)
16πG
Pelo princı́pio variacional
 √  √
Z
d4 x δ −g f (R) + −g δf (R)

16πG δS =
1√ √
Z   
4 ab ab
= d x − −gf (R)gab δg + −gδf g Rab
2
4 √
Z   
0 1 ab 0 ab
= d x −g f (R)Rab − gab f (R) δg + f (R)g δRab = 0
2
Já vimos que
√ h√  i
−gg ab δRab = = ∂c −g g ab δΓcab − δbc g ab δΓdad

No nosso caso temos


√ h√  i
−gf 0 (R)g ab δRab = = f 0 (R)∂c −g g ab δΓcab − δbc g ab δΓdad

Quando f (R) = R, temos uma derivada total e portanto este termo não aparece nas
equações de campo. Aqui já não é o caso e precisamos de calculá-lo com cuidado. Temos
então que
√ h √  i
−gf 0 (R)g ab δRab = ∂c f 0 (R) −g g ab δΓcab − δbc g ab δΓdad −
√  
∂c f 0 (R) −g g ab δΓcab − δbc g ab δΓdad

O primeiro termo é uma derivada total e não irá contribuir para as equações de campo.
Vamos então calcular o termo que sobra. Como
1
Γcad = g ce (gae,d + gde,a − gad,e )
2
a sua variação fica
1 1
δΓcad = δg ce (gae,d + gde,a − gad,e ) + g ce (∂d δgae + ∂a δgde − ∂e δgad )
2 2
Em coordenadas geodésicas ∂c g ab = ∇c g ab = 0, e então, só o segundo termo realmente
conta, e ficamos com
1
δΓcad = g ce (∂d δgae + ∂a δgde − ∂e δgad )
2
Calculemos o primeiro termo (em que d = b), temos
1
g ab δΓcab = g ab g ce (∂b δgae + ∂a δgbe − ∂e δgab )
2

– 106 –
Como em coordenadas geodésicas ∂c g ab = 0, podemos incluir os tensores da métrica dentro
das derivadas e ficamos então com
1  
g ab δΓcab = ∂ a (g ce δgae ) − ∂ c g ab δgab
2
Para calcular o segundo termo contraı́mos os ı́ndices d e c,
1
δΓdad = g de (∂d δgae + ∂a δgde − ∂e δgad )
2
Mais uma vez, como as derivadas parciais da métrica são nulas em coordenadas geodésicas,
podemos levantar o ı́ndice d no primeiro termo e o ı́ndice e no terceiro e vemos que eles se
anulam, resultando,
1  
δΓdad = ∂a g de δgde
2
e ainda
1  
δbc g ab δΓdad = ∂ c g de δgde
2
Colocando tudo junto, temos,
√ √
 
0 ab 0 a ce 1 c  ab  1 
c de
−gf (R)g δRab = ∂c f (R) −g ∂ (g δgae ) − ∂ g δgab − ∂ g δgde
2 2
√ h  i
= ∂c f 0 (R) −g ∂ a (g ce δgae ) − ∂ c g ab δgab
√ h    i
= ∂c f 0 (R) −g ∂ a g cb δgab − ∂ c g ab δgab
que a menos de derivadas totais fica
√ √ √
−gf 0 (R)g ab δRab = −g cb δgab ∂ a −g∂c f 0 (R) + g ab δgab ∂ c −g∂c f 0 (R)
 

como g ab δgbc = −gbc δg ab ,


√ √ √
−gf 0 (R)g ab δRab = gcb ∂a ∂ c −gf 0 (R) − gab ∂ c ∂c −gf 0 (R) δg ab
  

Então na acção total temos a equação de Einstein modificada


√ √ √
 
1
−g f (R)Rab − gab f (R) − gcb ∂a ∂ c −gf 0 (R) + gab ∂ c ∂c −gf 0 (R) = 0
0
 
2
√ √
Como para coordenadas geodésicas ∂a −g = ∇a −g = 0,
1
f 0 (R)Rab − gab f (R) + (gab  − ∇a ∇b ) f 0 (R) = 0
2
Podemos facilmente incluir o tensor energia-momento para a matéria
1
f 0 (R)Rab − gab f (R) + (gab  − ∇a ∇b ) f 0 (R) = 8πGTab materia
2
ou então escrever em termos de um tensor energia-momento efectivo para a curvatura
 
1 curvatura 1 materia
Rab − gab R = 8πG Tab + 0 T
2 f (R) ab
onde
 
curvatura 1 0 1 0

Tab ≡ (∇a ∇b − gab ) f (R) + gab f (R) − f (R)R
8πGf 0 (r) 2

– 107 –
58 Teorias de f (R) no formalismo de Palatini

[T. Sotiriou cap. 3.4]


As teorias f (R) são uma extensão da teoria da relatividade geral onde se considera
uma função do escalar de Ricci na acccão. No formalismo de Palatini, trata-se a métrica
e as conexões de forma separada como variáveis dinâmicas independentes. Partimos da
acccão
√ √
Z Z
1
S= d4 x −gf (R̃) + d4 x −gLm
16πG

com um Lagrangiano gravitacional dependente de f (R̃), em que R̃ = g ab R̃ab e R̃ab é o tensor


de Ricci construd́o para uma conexão independente, e uma acção na matéria independente
da conexão. Pelo princı́pio variacional
√ 1 √ √  √
δ( −gL) = −gδf (R̃) + δ −gf (R̃) + δ( −gLm ) = 0
16πG
ou seja
√ √ 1√ √
 
1 0 ab 0 ab ab
−gf (R̃)R̃ab δg + −gf (R̃)g δ R̃ab − −gf (R̃)gab δg + δ( −gLm ) = 0
16πG 2
e usando a definição de tensor energia-momento temos

2 δ( −gLm )
Tab = − √
−g δg ab
ficamos com
√ √
 
1
−g f (R̃)R̃ab − f (R̃)gab − 8πGTab δg ab + −gf 0 (R̃)g ab δ R̃ab = 0
0
(58.1)
2

Como as conexões não são definidas no formalismo de Palatini, não se sabe se R̃ab é
simétrico. No entanto, pode ser escrito com uma parte simétrica e outra anti-simétrica,
R̃ab = R̃(ab) + R̃[ab] . Assim, para o primeiro termo da última equação escrevemos
√ √  
−gf 0 (R̃)R̃ab δg ab = −gf 0 (R̃) R̃(ab) + R̃[ab] δg ab

Como g ab é simétrico, R̃[ab] δg ab = 0, e então


√ √
−gf 0 (R̃)R̃ab δg ab = −gf 0 (R̃)R̃(ab) δg ab

Substituindo esta relação na anterior, do cálculo variacional em relação à métrica g ab ,


obtemos a equação
1
f 0 (R̃)R̃(ab) − f (R̃)gab = 8πGTab (58.2)
2
que permite generalizar as equações de campo de Einstein-Hilbert. Fazendo ainda o traço
desta equação, vem

f 0 (R̃)R̃ − 2f (R̃) = 8πGT (58.3)

– 108 –
Agora vamos aplicar o método variacional em relação a Γabc , correspondente ao último
termo da equação de campo (58.1). Primeiro, usando a identidade de Palatini,

¯ c (δΓc ) − ∇
δ R̃ab = ∇ ¯ b (δΓcac )
ab

¯ c corresponde à derivada covariante definida com a conexão independente. Temos


em que ∇
√ √
−gf 0 (R̃)g ab δ R̃ab = −gf 0 (R̃)g ab ∇¯ c (δΓc ) − ∇
¯ b (δΓc )
 
ab ac

Usando a definição de derivada covariante do produto, temos que


√ ¯ c √−gf 0 (R̃)g ab δΓc − ∇
h i
¯ c √−gf 0 (R̃)g ab δΓc
 
−gf 0 (R̃)g ab ∇
¯ c (δΓc ) = ∇
ab ab ab

Fazendo o mesmo para o segundo termo temos


√ ¯ c √−gf 0 (R̃)g ab δΓc − ∇
h i
¯ b √−gf 0 (R̃)g ab δΓc
h i
−gf 0 (R̃)g ab δ R̃ab = ∇ ab ac
√  √ 
−∇¯c −gf 0 (R̃)g ab δΓcab + ∇¯b −gf 0 (R̃)g ab δΓcac

Os dois primeiros termos são derivadas totais e por isso a sua contribuição na acçõ é nula,
pelo que resulta
√  
¯ b √−gf 0 (R̃)g ab δΓcac
¯ c √−gf 0 (R̃)g ab δΓc + ∇
 
−gf 0 (R̃)g ab δ R̃ab = −∇ ab

Fazendo, no segundo termo, o ı́ndice mudo b → d e δΓcac = δcb δΓcab


√ ¯ c √−gf 0 (R̃)g ab δΓc + ∇
 
¯ d √−gf 0 (R̃)g ad δ b δΓc
 
−gf 0 (R̃)g ab δ R̃ab = −∇ ab c ab
h √  √  i
= −∇ ¯c −gf 0 (R̃)g ab + ∇
¯d −gf 0 (R̃)g ad δcb δΓcab

Assim, o cálculo variacional em relação às conexões dá

¯ c √−gf 0 (R̃)g ab + ∇ ¯ d √−gf 0 (R̃)g d(a δ b) = 0


   
−∇ c (58.4)

onde se usou que a parte anti-simétrica do segundo termo, multiplicada por δΓcab , que é
simétrico porque não estamos a considerar torção, se anula, i.e.,

¯ d √−gf 0 (R̃)g d[a δ b] δΓc = 0


 
∇ c ab

Contraindo b = c em (58.4) obtém-se que

¯ d √−gf 0 (R̃)g da = 0
 

e consequentemente

¯ c √−gf 0 (R̃)g ab = 0
 
∇ (58.5)

Definindo uma métrica g̃ab conforme a gab tal que

g̃ab = f 0 (R̃)gab

– 109 –
e a sua inversa g̃ ab tal que
1
g̃ ab = g ab
f 0 (R̃)

e sendo g̃ = det(g̃ab ) e g = det(gab ), então g̃ = g(f 0 (R̃))4 . Substituindo na equação (58.5),


obtém-se:
√  √ 
¯ 0 ab

¯ −g̃ 0 0 ab ¯c
p 
∇c −gf (R̃)g = ∇c f (R̃) f (R̃)g̃ =∇ −g̃g̃ ab = 0
(f 0 (R̃))2
O que significa que as conexões Γcab são as conexões de Levi-Civita para a métrica g̃ab , ou
seja,

Γcab = g̃ cd (∂a g̃bd + ∂b g̃ad − ∂d g̃ab )


1 h      i
= g cd ∂a f 0 (R̃)gbd + ∂b f 0 (R̃)gad − ∂d f 0 (R̃)gab
f 0 (R̃)

Dado que a equação (58.3) pode ser resolvida para escrevermos R̃ em termos de T . Isto
quer dizer que os termos f 0 (R̃) na equação da conexão podem ser expressos como derivadas
de T e podemos escrever as equações de campo em termos da métrica gab e dos campos
de matéria sem precisarmos das conexões. Usando as relações para as transformações
conformes, podemos escrever o tensor de Ricci como
 
3 1 
0

0
 1 1
R̃ab = Rab + ∇a f (R̃) ∇b f (R̃) − ∇a ∇b − gab  f 0 (R̃)
2 (f 0 (R̃))2 0
f (R̃) 2

Calculando o traço de R̃ab ,


3 1    3
R̃ = R + ∇a f 0 (R̃) ∇a f 0 (R̃) +  f 0 (R̃)
2 (f 0 (R̃))2 f 0 (R̃)
Substituindo estas expressões nas equações de campo (58.2) e usando a definição de tensor
de Einstein, Gab = Rab − gab R/2, temos
!
8πG 1 f (R̃) 1
Gab = Tab − gab R̃ − + (∇a ∇b − gab  ) f 0 (R̃)
0
f (R̃) 2 0
f (R̃) 0
f (R̃)
 
3 0

0
 1
0 2
− ∇a f (R̃) ∇b f (R̃) − gab (∇f (R̃))
2(f 0 (R̃))2 2

Se f (R̃) = R̃, a teoria reduz-se à Relatividade Geral. Por outro lado, para campos de
matéria em que T = 0, no vácuo, e assumindo que R̃ = R̃(T ), então R̃ e, consequentemente,
f (R̃) e f 0 (R̃) são constantes e a teoria reduz-se à Relatividade Geral com uma constante
cosmológica
!
1 f (R̃0 ) R̃0
Λ= R̃0 − =
2 f 0 (R̃0 ) 4

onde se usou (58.3), e uma constante de acoplamento modificada, Geff = G/f 0 (R̃0 ).

– 110 –
59 Teorias escalares-tensoriais

A acção destas teorias é dada por

4 √
Z  
1 1 a
S = d x −g f (ϕ, R) − ζ(ϕ)∂ ϕ∂a ϕ + Sm (gab , Ψm )
2 2

onde f (R) corresponde à escolha f (ϕ, R) = f (R) e ζ(ϕ) = 0. Aqui, Ψm são campos de
matéria.
Se reescrevermos esta teoria com as definições φ = φ(ϕ), tal que,

f (ϕ, R) = F (φ)R − 2U (φ)


F (φ) = e−2Qφ
 2
2 dφ
ζ(φ) = (1 − 6Q )F

temos a acção

4 √
Z  
1 1 2 a
S = d x −g F (φ)R − (1 − 6Q )F (φ)∂ φ∂a φ − U (φ) + Sm (gab , Ψm )
2 2

Podemos ainda tomar a definição ψ = F (φ) = e−2Qφ , ou φ = − ln ψ/2Q e ficamos com

4 √
Z  
1 ωBD a
S = d x −g ψR − ∂ ψ∂a ψ − U (ψ) + Sm (gab , Ψm )
2 2ψ

que é a chamada teoria de Brans-Dicke, com parâmetro ωBD definido por


1
3 + 2ωBD =
2Q2

Na relatividade geral, Q = 0, e ωBD = ∞. Em teorias f (R), Q2 = 1/6, e então, ωBD = 0.


Acontece que os constrangimentos dos testes do sistema solar impõem ωBD > 40000, o que
põe as teorias em aparente dificuldade. Existe todavia um mecanismo chamado, camaleão,
que esconde os efeitos da teoria para objectos de grande densidade contornando assim os
constrangimentos do sistema solar.

– 111 –
60 O Lagrangiano de Horndeski

Esta é uma generalização das teorias escalares-tensoriais. É a teoria mais geral com um
campo escalar, φ, que em quatro dimensões leva a equações do movimento de segunda
ordem. Ou seja, que evita instabilidades nas equações . Foi encontrado por Horndeski em
1975, e redescoberto por Deffayet et al. em 2011. Inclui os modelos que já encontrámos, e
ainda outros como k-essence e Galileon. O Lagrangiano escreve-se como
1 X
L= R+ Li + Lm
16πG
i

onde os termos individuasi são

L2 = K(φ, X)
L3 = −G3 (φ, X)φ
L4 = G4 (φ, X)R + G4,X (φ)2 − (∇µ ∇ν φ)(∇µ ∇ν φ)
 

L5 = G5 (φ, X)Gµν (∇µ ∇ν φ) −


1
G5,X (φ)3 − 3(φ)(∇µ ∇ν φ)(∇µ ∇ν φ)+

6 i
2(∇µ ∇α φ)(∇α ∇β φ)(∇β ∇µ φ)

As funções K(φ, X), G3 (φ, X), G4 (φ, X) e G5 (φ, X) são à partida arbitrárias. Mas o
evento de fusão de estrelas de neutrões que envolveu uma contrapartida no óptico coloca
a velocidade dos fotões e a velocidade das ondas gravitacionais essencialmente idêntica, ou
seja, a velocidade da luz, e consequentemente as funções são tais que G5 = 0, G4,X = 0, o
que limita severamente este Lagrangiano.

– 112 –
61 Derivada de Lie

[D’Inverno, cap. 6.2]


Vamos considerar um conjunto de curvas de forma que apenas uma curva passa por
cada um dos pontos do espaço-tempo onde residem. Podemos considerar um vector X a (x)
tangente a cada ponto tal que
dxa
X a (x(λ)) =

Reciprocamente, podemos considerar que no espaço-tempo está definido o campo vectorial
X a e com ele contruı́mos, usando a equação diferencial acima para construir um conjunto
de curvas.

Vamos agora definir uma derivada de um vector V b usando o campo vectorial X a .


Vamos definir uma derivada direccional ou derivada de Lie que corresponde à mudança
de V b vista por um observador que vai de P com coordenada xa para Q com coordenada
x̃a = xa + X a dλ. A isto chama-se ”arrastar” o vector V b .

V b (x) Ṽ b (x̃)

V b (x̃)
X a (x)

X a (x̃)

P
Q

Então temos que


∂ x̃a
= δba + ∂b X a dλ
∂xb

– 113 –
Temos da lei de transformação de um vector contravariante que
∂ x̃c b
Ṽ a (x̃) = V (x)
∂xb
= (δba + ∂b X a dλ)V b (x)
= V a (x) + ∂b X a V b dλ

E usando a série de Taylor temos ainda que


∂V a
V a (x̃) = V a (x) + dλ
∂λ
= V a (x) + ∂b V a X b dλ

ou seja,

V a (x) = V a (x̃) − ∂b V a X b dλ

e então substituindo em Ṽ a (x̃), temos

Ṽ a (x̃) = V a (x̃) − ∂b V a X b dλ + ∂b X a V b dλ

Definindo a derivada de Lie de V a em relação a X b como

V a (x̃) − Ṽ a (x̃)
LX V a ≡ lim
dλ→0 dλ
resulta

LX V a = X b ∂b V a − V b ∂b X a

que não é uma expressão covariante, mas mostra-se facilmente que é equivalente a

L X V a = X b ∇b V a − V b ∇b X a

e na verdade, isto aplica-se sempre na derivada de Lie: as derivadas parciais podem ser
substituı́das por derivadas covariantes.
A derivada de Lie tem as seguintes propriedades:

1. A derivada de Lie de um tensor ainda é um tensor do mesmo tipo;

2. É linear, ou seja,

LX (λY a + µZ a ) = λLX Y a + µLX Z a

3. Satisfaz a regra de Leibniz

LX (Y a Z b ) = Z b LX Y a + Y a LX Z b

4. Comuta com a contração de tensores, i.e.,

LX (Y a Za ) = Za LX Y a + Y a LX Za

– 114 –
5. Para uma função escalar
df
LX f = = X a ∂a f

6. Para um vector covariante temos

LX Ya = X b ∇b Ya + Yb ∇a X b

7. E então podemos generalizar para um tensor arbitrário


a...
LX Tb... = X c ∇c Tb...
a... c...
− Tb... ∇c X a − ... + Tc...
a...
∇b X c + ...

– 115 –
62 Vectores de Killing
a... é transportado de Lie ao longo do vector tangente X a à curva
Diz-se que um tensor Tb...
a...
γ se LX Tb... = 0. Suponhamos que se escolhem coordenadas tal que

X a = (0, ..., 1, ..., 0) = δia

tal que ∂b X a = 0. E ficamos com


a...
LX Tb... = X c ∂c Tb...
a...
= δic ∂c Tb...
a... a...
= ∂i Tb... =0

O que significa que nestas coordenadas o tensor Tb...a... é constante ao ser arrastado ao

longo da curva γ. Vemos assim que a derivada de Lie nos dá uma forma covariante (i.e.,
independente das coordenadas) de descrever simetrias de um tensor.
Admitamos agora que esse tensor é a própria métrica gab , e que há um vector ξ a tal
que,

Lξ gab = 0

Então da definição de derivada de Lie temos

ξ a ∇c gab + gcb ∇a ξ c + gac ∇b ξ c = 0

e usando metricidade, resulta que

∇a ξb + ∇b ξa = 0

Esta é a chamada equação de Killing e o vector ξ a é o vector de Killing e descreve uma


simetria do espaço-tempo. Podemos obter uma descrição de todas as simetrias de uma
métrica encontrando os seus vectores de Killing independentes e explorando as propriedades
desses vectores.
Exemplo
Considere-se a métrica de Minkowski, ηab = diag(−1, 1, 1, 1) para a qual as conexões
de mt́rica se anulam, Γabc = 0, a derivada covariante será então apenas a derivada parcial e
a equação de Killing é dada por

∂ b ξa + ∂ a ξb = 0

e se voltarmos a derivar, ficamos com

∂ c ∂ b ξa + ∂ c ∂ a ξb = 0

Comutando os ı́ndices a → c, c → b, b → a temos a equação equivalente

∂b ∂a ξc + ∂b ∂c ξa = 0

e com c → b, b → a, a → c, temos alternativamente

∂a ∂c ξb + ∂a ∂b ξc = 0

– 116 –
Somando as duas primeiras equações e subtraindo a última temos

∂c ∂b ξa + ∂c ∂a ξb + ∂b ∂a ξc + ∂b ∂c ξa − ∂a ∂c ξb − ∂a ∂b ξc = 0
∂c ∂b ξa = 0

Obtém-se então que ξa ĺinear e podemos esccrever

ξa = ca + ab xb

onde ca e ab são constantes de integração. Substituindo nas equações de Killing temos que
ab = −ba , ou que ab é anti-simétrico. Em forma matricial,
 
0 01 02 03
 −
 01 0 12 13 
(ab ) = 

 −02 −12 0 23 

−03 −13 −23 0

ou seja, tem 6 componentes independentes, ou 6 graus de liberdade. E para ca temos quatro


possibilidades diferentes. Temos portanto um conjunto de 10 vectores independentes ξa .
Para obter todos os vectores de Killing, consideremos cada uma destas constantes ca e ab a
que atribuı́mos o valor de 1 uma a uma e 0 às restantes componentes. Primeiro escolhemos
ab = 0 e ca = 1, tal que temos ξa = ca , o que leva às seguintes possibilidades.

Ta = (1, 0, 0, 0)
Xa = (0, 1, 0, 0)
Ya = (0, 0, 1, 0)
Za = (0, 0, 0, 1)

Escreve-se X = Xa ∂a onde {∂a }, são a base de um espaço vectorial. Então reconhecemos


os vectores geradores das translações
∂ ∂ ∂ ∂
T = , X= , Y = , Z= ,
∂t ∂x ∂y ∂z

Façamos agora ij = 1 = −ji e todos os outros iguais a zero. Temos então ξi = ij xj .
Com 12 = −1, temos

(Jz )a = (0, −y, x, 0)

com 13 = 1 temos

(Jy )a = (0, z, 0, −x)

e com 23 = −1, resulta

(Jx )a = (0, 0, −z, y)

– 117 –
que então levam aos geradores das rotações respectivamente
∂ ∂
Jz = x −y
∂y ∂x
∂ ∂
Jy = z −x
∂x ∂z
∂ ∂
Jx = y −z
∂z ∂y
E para finalizar temos ainda os casos 0i = −1 = i0 , e ficamos com

(Bx )a = (−x, t, 0, 0)
(By )a = (−y, 0, t, 0)
(Bz )a = (−z, 0, 0, t)

ou seja, os geradores dos boosts segundo cada um dos eixos espaciais são
∂ ∂
Bx = −x +t
∂t ∂x
∂ ∂
By = −y + t
∂t ∂y
∂ ∂
Bx = −z + t
∂t ∂z
Note-se que

[Jx , Jy ] = (y∂z − z∂y )(z∂x − x∂z ) − (z∂x − x∂z )(y∂z − z∂y )


= y∂x − x∂y = −Jz

De igual forma se mostra que

[Jx , Jz ] = Jy , [Jy , Jz ] = −Jx

De uma forma geral, quando um espaço-tempo tem três vectores de Killing J1 , J2 , J3 , que
satisfazem a relação

[Ji , Jj ] = −kij Jk

diz-se que o espaço-tempo tem simetria esférica. Para Minkowski temos ainda que

[Jx , Y ] = −Z , [Jy , Z] = −X , [Jz , X] = Y

De igual forma, dizemos que um espaço-tempo com três rotações J1 , J2 , J3 e três translações
π1 , π2 , π3 , que satisfazem a relação

[Ji , πj ] = −kij πk

diz-se que é homogéneo e isotrópico.

– 118 –
63 Soluções de Bianchi I no vazio

[Al-Haysah, Hasmani, International Journal of Computer Applications (0975 - 8887) Vol-


ume 177 - No.45, March 2020]
Vamos agora estudar uma classe de soluções espacialmente homogéneas e anisotrópicas,
sendo usadas para descrever hiper-superfı́cies de curvatura plana, isto é, com k = 0. As
soluções de Kasner são um caso particular das soluções de Bianchi I, uma vez que consid-
eramos soluções no vácuo, isto é, com tensor energia-momento, Tab = 0. As soluções de
Bianchi I no vácuo têm a seguinte métrica a elas associada
3
X
2 2
ds = −dt + ai (t)2 dx2i
i=1

onde ai (t) com i = 1, 2, 3, são fatores de escala correspondentes a cada direção espacial.
Note-se que, se a1 = a2 = a3 = a, esta métrica transforma-se na métrica de FLRW com
k = 0. Sejam Hi = ȧi /ai e θ = H1 + H2 + H3 , com Hi as taxas de Hubble nas três direções
espaciais. As componentes do tensor de Ricci que não se anulam são

R00 = −θ̇ − H12 + H22 + H32




R11 = a21 (Ḣ1 + θH1 )


R22 = a22 (Ḣ2 + θH2 )
R33 = a23 (Ḣ3 + θH3 )

O escalar de Ricci fica portanto,

R = g ab Rab = θ̇ + H12 + H22 + H32 + Ḣ1 + Ḣ2 + Ḣ3 + (H1 + H2 + H3 )θ


= 2θ̇ + 2(H12 + H22 + H32 ) + 2(H1 H2 + H1 H3 + H2 H3 )

Usando a componente (00) das equações de Einstein, obtemos que


1
R00 − g00 R = 0
2
H1 H2 + H2 H3 + H1 H3 = 0

Como consequência, da definição de θ obtemos que

θ2 = (H1 + H2 + H3 )2 = H12 + H22 + H32

Assim, substituı́ndo em R00 , obtém-se

R00 = −θ̇ − θ2

Se θ = 0, significa que H1 = H2 = H3 = 0, ou seja, a1 , a2 , a3 são constantes. Daqui obtemos


o espaço-tempo de Minkowski. Se por outro lado θ 6= 0, da relação R00 = 0, dá-nos que
1
θ=
t

– 119 –
Onde se fez uma escolha conveniente da origem t0 = 0. Assim, de R11 = 0, obtemos
p1
H1 =
t
sendo p1 uma constante. Do mesmo modo para R22 = 0 e R33 = 0, obtemos, respetiva-
mente,
p2 p3
H2 = , H3 =
t t
Das expressões para θ e θ2 implica que
1 p1 p2 p3
θ= = H1 + H2 + H3 = + +
t t t t
1 p 2 p 2 p2
θ2 = 2 = H12 + H22 + H32 = 21 + 22 + 23
t t t t
e resulta que
3
X 3
X
pi = p2i = 1
i=1 i=1

Estas são as chamadas relações de Kasner. De H1 = ȧ1 /a1 , vem que a1 ∝ tp1 e o mesmo
acontece para a2 e a3 . Podemos escrever a métrica de Kasner como
3
X
ds2 = dt2 − t2pi dx2i
i=1

A métrica de Kasner é uma solução para as equações de Einstein no vácuo, pelo que os
tensores de Ricci e o escalar de Ricci anulam-se para qualquer escolha de expoente pi ,
desde que satisfaçam as condições de Kasner (hiper-superfı́cie plana no vazio, homogénea e
anisotrópica). O tensor de Riemann anula-se se e só um dos pi = 1, com i = 1, 2, 3 e todos
os outros se anulam, e neste caso o espaço é plano.

– 120 –
References

[1] R. A. D’Inverno, Introducing Einstein’s relativity. 1992.


[2] J. B. Hartle, Gravity : an introduction to Einstein’s general relativity. 2003.
[3] A. Barbosa Henriques, Uma Introdução à Relatividade Geral. 2009.
[4] P. Ferreira,
Lectures on General Relativity and Cosmology, http://www-astro.physics.ox.ac.uk/ pgf/B3..pdf.
2006.
[5] G. Gibbons,
Part II General relativity, http://www.damtp.cam.ac.uk/research/gr/members/gibbons/partiipublic-2006.pdf.
2006.

– 121 –

Você também pode gostar