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STJ-Petição Eletrônica (PET) 00374221/2023 recebida em 26/04/2023 08:34:10 (e-STJ Fl.

2001)

HUMBERTO Á
VILA
Professor Titular da Universidade de São Paulo

M EMORIAIS

CONSULENTE

COSAN S/
A
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

OBJ
ETO

I
MPOSTO DE RENDA DA PESSOA JURÍ
DICA —IRP J. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQ UIDO —

CSLL .I
LEGALIDADE DA TRIBUTAÇ ÃO DE BENEF Í
CIOS FISCAIS ESTADUAIS. PRECEDENTE ESTABELECIDO

PELA PRIMEIRA SEÇÃO DO E.SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO J


ULGAMENTO DOS EMBARGOS DE

DIVERG ÊNCIA N.. 1.517.492/ PR .I


NEXIST ÊNCIA DE DIFERENÇAS RELEVANTES QUE J
USTIFI QUEM A

DISTINÇÃO PRETENDIDA. I
NTERFER ÊNCIA DA UNIÃO FEDERAL NA POL Í
TICA FISCAL ADOTADA PELOS

ESTADOS. OBST ÁCULOS À PROMOÇÃO DOS OB J


ETIVOS FUNDAMENTAIS DA REP ÚBLICA. VIOLAÇ ÃO AO

PRINC I
PIO FEDERATIVO. I
NEXIST ÊNCIA DE LUCRO TRIBUT ÁVEL. VIOLAÇÃOÀIGUALDADE.

SUM ÁRIO

1. A CO NSU LTA. 2. OS MEM ORIAI S.2.1 O PRECEDENTE FIXAD O NOS EMBA RGOS DE DIVE RGÊNC IA

EM RECURSO ES PE CIAL No. 1.517.492/PR. 2.2 A AB RANGÊNC IA DO PRE CEDEN TEPA RAOS DEMAI S

BE NEF ÍC I
OS FI SC AI S DE ICMS. 2.3 A PRO IBIÇ ÃO DE TRATAMEN TO DI SCR IMI NATÓRI O. 3.

CONC LUSÕ ES.

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VILA
Professor Titular da Universidade de São Paulo

1. A CONSULTA

1.1 Em 08.11.2017, aPrimeira Seção do Superior Tribunal de Justiça apreciou


os Embargos de Divergência no Recurso Especial n° 1.517.492/PR, de relatoria do
Ministro Og Fernandes, no qual se discutia a legalidade da inclusão dos valores
correspondentes abenefícios fiscais estaduais de crédito presumido de ICMS nas bases
de cálculo do IRPJ eda CSLL.

1.2 A controvérsia instaurada naquela ocasião dizia especificamente respeito


àdivergência verificada entre acórdãos proferidos no âmbito da Primeira Seção. De um
lado, oacórdão paradigma, da Segunda Turma, segundo oqual ocrédito presumido de
ICMS, por implicar redução da carga tributária, acarretaria, indiretamente, oaumento
do lucro do contribuinte e, portanto, deveria ser submetido àtributação pelo IRPJ epela
CSLL. De outro, oacórdão embargado, da Primeira Turma, de acordo com oqual o
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estímulo oferecido por meio do crédito presumido de ICMS caracterizaria um benefício


fiscal, cujos valores auferidos não poderiam ser submetidos àtributação pelo IRPJ epela
CSLL em face da vedação constitucional imposta aos entes federados de que instituam
impostos sobre patrimônio, renda ou serviços uns dos outros (art. 150, IV, a, CF/88).

1.3 Ao apreciar a questão, o Ministro Relator Og Fernandes adotou o


entendimento manifestado no acórdão paradigma no sentido de que, ao configurar
diminuição de custos tributários do contribuinte, o crédito presumido de ICMS
aumentaria indiretamente o lucro tributável e, portanto, deveria compor abase de
cálculo do IRPJ eda CSLL. Entretanto, após pedido de vista, aMinistra Regina Helena
Costa apresentou voto divergente que acabaria orientando atese vencedora naquela
oportunidade.

1.4 No seu entendimento, aconcessão de benefícios fiscais estaduais seria


medida indutora de desenvolvimento econômico em nível regional, adotada para a
promoção de objetivos de envergadura constitucional, de modo que caracterizaria um
instrumento legítimo de política fiscal necessário à materialização da autonomia
assegurada aos entes federados pelo princípio federativo. Em face disso, atributação,

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pela União Federal, dos valores correspondentes abenefício fiscal estadual levaria ao
esvaziamento ou àredução do respectivo incentivo, razão pela qual estaria caracterizada
interferência indevida na competência tributária estadual capaz de violar os princípios
federativo eda segurança jurídica.

1.5 Com essa decisão, o Tribunal firmou verdadeiro precedente quanto à


ilegalidade da inclusão de benefícios fiscais de ICMS nas bases de cálculo do IRPJ eda
CSLL. Porém, considerando que acontrovérsia submetida àapreciação nos Embargos
de Divergência no Recurso Especial n° 1.517.492/PR envolvia adiscussão arespeito da
legalidade da inclusão de benefícios fiscais estaduais concedidos na forma de crédito
presumido de ICMS nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, inaugurou-se nova
controvérsia no âmbito do Tribunal, dessa vez com relação àextensão do entendimento
firmado no aludido precedente. A divergência diz respeito asaber se adecisão firmada
restringir-se-ia aos benefícios fiscais concedidos sob aforma de créditos presumidos de
ICMS pelos Estados ou se, ao contrário, referido precedente alcançaria outros benefícios
fiscais estaduais, tais como isenções ereduções de base de cálculo.
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1.6 Nesse cenário, de um lado, aFazenda Nacional defende que o aludido


precedente seria inaplicável para afastar atributação federal sobre os demais benefícios
fiscais estaduais. Segundo seu entendimento, diferentemente do crédito presumido de
ICMS, oganho obtido com esses outros benefícios fiscais jamais teria sido contabilizado
como receita do contribuinte. Ou seja, enquanto os créditos presumidos de ICMS
representariam oingresso de uma "grandeza positiva" no patrimônio do contribuinte
que não poderia ser qualificado como receita ou lucro tributável, os demais benefícios
fiscais de ICMS, a exemplo das isenções e reduções de base de cálculo, seriam
"grandezas negativas", que apenas reduziriam o custo do tributo estadual suportado
pelo contribuinte eque não poderiam ser convertidos automaticamente em deduções
na apuração das bases de cálculo do IRPJ eda CSLL, sob pena de caracterizarem
"isenções heterônomas".

1.7 De outro lado, os contribuintes defendem que a decisão firmada nos


Embargos de Divergência no Recurso Especial n° 1.517.492/PR, considerando as razões
prevalentes naquela ocasião, abrangeria todos os benefícios fiscais de ICMS concedidos
pelos Estados, independentemente da forma como concedidos. Isso porque atributação

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pelo IRPJ epela CSLL, pela União, sobre qualquer tipo de benefício fiscal estadual
implicaria a retirada, por via oblíqua, do estímulo concedido pelo ente estadual à
promoção de objetivos públicos de relevância constitucional. Com isso, atributação
federal representaria interferência indevida no exercício da política fiscal estadual,
comprometendo asua autonomia eresultando em violação aos princípios federativo e
da segurança jurídica. Logo, também nessas outras hipóteses de benefícios fiscais
inexistiria lucro tributável.

1.8 Dada arelevância da controvérsia eamultiplicidade de recursos especiais


com fundamento em idêntica questão de direito no âmbito do Tribunal, aquestão foi
submetida àsistemática de recursos repetitivos, nos termos do artigo 1.036, caput e§
1°, do Código de Processo Civil. A formalização do Tema Repetitivo n° 1.182 destaca
que anova decisão versará exatamente sobre aextensão do entendimento firmado no
julgamento anterior, afim de lhe atribuir asua correta interpretação:

Tema Repetitivo n°. 1.182


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Definir se épossível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS, -tais


corno redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade,
diferimento, entre outros -da base de cálculo do IRPJ eda CSLL (extensão do
entendimento firmado no ERESP 1.517.492/PR que excluiu o crédito
presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ eda CSLL). (Grifos meus)

1.9 Diante desse contexto, énecessário esclarecer, primeiro, os fundamentos


decisórios adotados pelo precedente fixado nos Embargos de Divergência em Recurso
Especial n°. 1.517.492/PR; segundo, se as razões de decidir desse precedente abrangem
oafastamento da tributação pelo IRPJ epela CSLL sobre os valores correspondentes aos
demais benefícios fiscais de ICMS concedidos pelo Ente estadual; e, terceiro, se o
afastamento da aplicação do precedente com base na diferenciação proposta pela União
écompatível com oprincípio da igualdade tributária. É oque se passa aresponder da
forma mais objetiva possível.

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2. O SMEMORIAIS

2.1 O PRECEDENTE FIXADO NOS EMBARGOS DE D IVERG ÊNCIA


EM RECURSO ESPECIAL No. 1.517.492/ PR

2.1.1. Em 08.11.2017, aPrimeira Seção do Superior Tribunal de Justiça julgou


os Embargos de Divergência no Recurso Especial n°. 1.517.492/PR. O caso analisado
referia-se àpossibilidade de inclusão do valor correspondente ao crédito presumido de
ICMS nas bases de cálculo do IRPJ eda CSLL. Por maioria, vencidos oMinistro Relator
Og Fernandes ea Ministra Assusete Magalhães, enos termos do voto da Ministra
Regina Helena Costa, a Primeira Seção desproveu os Embargos de Divergência,
reconhecendo, assim, ailegalidade da inclusão do valor relativo ao crédito presumido
de ICMS nas bases de cálculo do IRPJ eda CSLL. A ementa do julgado foi redigida do
seguinte modo:

TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL.


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CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. ICMS.


CRÉDITOS PRESUMIDOS CONCEDIDOS A TÍTULO DE INCENTIVO
FISCAL. INCLUSÃO NAS BASES DE CÁLCULO DO IMPOSTO SOBRE A
RENDA DA PESSOA JURÍDICA -IRPJ E DA CONTRIBUIÇÃO SOCIAL
SOBRE O LUCRO LÍQUIDO - CSLL. INVIABILIDADE. PRETENSÃO
FUNDADA EM ATOS INFRALEGAIS. INTERFERÊNCIA DA UNIÃO NA
POLÍTICA FISCAL ADOTADA POR ESTADO-MEMBRO. OFENSA AO
PRINCÍPIO FEDERATIVO E À SEGURANÇA JURÍDICA. BASE DE
CÁLCULO. OBSERVÂNCIA DOS ELEMENTOS QUE LHES SÃO
PRÓPRIOS. RELEVÂNCIA DE ESTIMULO FISCAL OUTORGADO POR
ENTE DA FEDERAÇÃO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO FEDERATIVO.
ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS.
INCONSTITUCIONALIDADE ASSENTADA EM REPERCUSSÃO GERAL
PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (RE N. 574.706/PR). AXIOLOGIA
DA RATIO DECIDENDI APLICÁVEL À ESPÉCIE. CRÉDITOS
PRESUMIDOS. PRETENSÃO DE CARACTERIZAÇÃO COMO RENDA OU
LUCRO. IMPOSSIBILIDADE. (...) Ao considerar tal crédito como lucro, o
entendimento manifestado pelo acórdão paradigma, da 2a Turma, sufraga, em
última análise, apossibilidade de aUnião retirar, por via oblíqua, o incentivo
fiscal que o Estado-membro, no exercício de sua competência tributária,
outorgou. IV -Tal entendimento leva ao esvaziamento ou redução do incentivo
fiscal legitimamente outorgado pelo ente federativo, em especial porque

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fundamentado exclusivamente em atos infralegais, consoante declinado pela


própria autoridade coatora nas informações prestadas. (...) IX -A tributação
pela União de valores correspondentes aincentivo fiscal estimula competição
indireta com o Estado-membro, em desapreço à cooperação e à igualdade,
pedras de toque da Federação. (...) XII -O abalo na credibilidade ena crença no
programa estatal proposto pelo Estado-membro acarreta desdobramentos
deletérios no campo da segurança jurídica, os quais não podem ser desprezados,
porquanto, se opropósito da norma consiste em descomprimir um segmento
empresarial de determinada imposição fiscal, éinegável que oressurgimento do
encargo, ainda que sob outro figurino, resultará no repasse dos custos adicionais
às mercadorias, tornando inócua, ou quase, afinalidade colimada pelos preceito
legais, aumentando o preço final dos produtos que especifica, integrantes da
cesta básica nacional. XIII -A base de cálculo do tributo haverá sempre de
guardar pertinência com aquilo que pretende medir, não podendo conter
aspectos estranhos, é dizer, absolutamente impertinentes à própria
materialidade contida na hipótese de incidência. XIV -Nos termos do art. 4° da
Lei n. 11.945/09, aprópria União reconheceu aimportância da concessão de
incentivo fiscal pelos Estados-membros e Municípios, prestigiando essa
iniciativa precisamente com a isenção do IRPJ e da CSLL sobre as receitas
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decorrentes de valores em espécie pagos ou creditados por esses entes atítulo de


ICMS eISSQN, no âmbito de programas de outorga de crédito voltados ao
estímulo à solicitação de documento fiscal na aquisição de mercadorias e
serviços. (...) (STJ, Embargos de Divergência no Recurso Especial n°.
1.517.492/PR, Relator Ministro Og Fernandes, Relatora para Acórdão Ministra
Regina Helena Costa, Primeira Seção, julgado em 8/11/2017).

2.1.2 Para o objeto destes memoriais, é de suma relevância determinar o


conteúdo eoalcance dessa decisão, afim de averiguar se suas razões de decidir também
servem de justificação para anão inclusão de outros benefícios fiscais de ICMS, diversos
de crédito presumido, nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL. Para tanto, deve-se
examinar, primeiro, os fatos relevantes do caso e, segundo, aratio decidendi adotada no
acórdão.

2.1.3 Em primeiro lugar, os fatos relevantes do acórdão demonstram que a


Primeira Seção do Tribunal examinou alegalidade da inclusão, nas bases de cálculo do
IRPJ eda CSLL, dos valores atinentes ao crédito presumido de ICMS conferido pelo

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Estado do Paraná aos estabelecimentos fabricantes de farinha de trigo. A controvérsia


foi assim delimitada pela Relatora para oacórdão, Ministra Regina Helena Costa:

"No mérito, controverte-se acerca da possibilidade de inclusão de crédito


presumido do Imposto sobre Operações de Circulação de Mercadorias e
Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de
Comunicação —ICMS nas bases de cálculo do Imposto sobre aRenda de Pessoa
Jurídica —IRPJ eda Contribuição Social sobre oLucro Líquido —CSLL." (p. 13
do acórdão)

2.1.4 O crédito presumido de ICMS é uma espécie de benefício fiscal. Os


benefícios fiscais caracterizam-se por afetarem negativamente a carga tributária,
reduzindo-a ou mesmo eliminando-a. As normas que criam benefícios fiscais, entre as
quais se encontram aquelas que concedem crédito presumido de ICMS, destinam-se a
atingir uma finalidade extrafiscal, sendo instituídas com oobjetivo prevalente de atingir
fins econômicos ou sociais.' Essas normas dirigem-se à própria indução do
comportamento do contribuinte. Isso significa dizer que oparticular, nessas situações,
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atua não apenas dentro de um âmbito de ação permitido por uma legislação que
estabelece apenas uma moldura para ação, mas também dentro de um âmbito de ação
estimulado por uma legislação -e, portanto, pelo Estado, que induz asua ação. 2

2.1.5 Em segundo lugar, aratio decidendi do acórdão revela as razões tidas


como suficientes pela Primeira Seção para afastar ainclusão do crédito presumido de
ICMS nas bases de cálculo de IRPJ eda CSLL, no sentido de que, estando elas presentes,
aconclusão adotada pelo Tribunal se confirma.' Assim, dois foram os fundamentos
adotados pela Primeira Seção para justificar anão inclusão dos valores correspondentes
ao crédito presumido de ICMS nas bases de cálculo de IRPJ eda CSLL.

1ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade. 4a ed. São Paulo: Malheiros/Jus Podium, 2021, p. 169.

2 ARCOS RAMIREZ. Federico. La seguridad jurídica: una teoria formal, Madrid, Dykinson, 2000, p.
265; STÕTZEL, Martin. Vertrauensschutz und Gesetzesrückwirkung, Frankfurt am Main, Peter Lang,
2002, p. 183.

3ÁVILA, Humberto. Competências tributárias. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 11.

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2.1.6 O primeiro fundamento reside na aplicação do princípio federativo ao


caso. Conforme reconhecido no acórdão, "a outorga de crédito presumido de ICMS
insere-se em contexto de envergadura constitucional" (p. 16 do acórdão), pois configura
uma forma de, por meio do "alívio fiscal, induzir o desenvolvimento econômico
regional", "reduzir desigualdades regionais e alavancar o desenvolvimento social e
econômico do país" (p. 15 do acórdão). Nesse cenário, ao pretender incluir o valor
corresponde ao crédito presumido de ICMS nas bases de cálculo do IRPJ eda CSLL, a
União afronta oprincípio federativo porque viola aautonomia do Estado, invadindo
seu poder decisório para desonerar operações ese beneficiando da receita objeto de
renúncia pelo Estado para de promover uma finalidade constitucionalmente relevante.
Em termos analíticos, essa argumentação pautada no princípio federativo pode ser
assim decomposta:

Premissa 1: O princípio federativo garante a cada Ente da Federação


autonomia decisória para exercer sua competência tributária.

Premissa 2: A autonomia decisória para exercer acompetência tributária


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compreende tanto o poder de tributar quanto o poder de conceder


incentivos fiscais.

Premissa 3: Toda interferência de um Ente da Federação sobre opoder de


outro Ente da Federação de conceder incentivos fiscais viola aautonomia
decisória para exercer competência tributária.

Premissa 4: Toda interferência na autonomia decisória para exercer


competência tributária de um Ente da Federação por outro Ente da
Federação viola oprincípio federativo.

Conclusão: Toda interferência de um Ente da Federação sobre opoder de


outro Ente da Federação de conceder incentivos fiscais viola oprincípio
federativo.

2.1.7 Com efeito, oque se extrai do voto da Relatora para oacórdão, Ministra
Regina Helena Costa, éjustamente apretensão de justificar averdade de cada uma das
premissas acima mencionadas a fim de corroborar sua conclusão. Com relação à

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Premissa 1, ovoto da Ministra éclaro quanto às peculiaridades do sistema tributário


nacional, que repartiu competências tributárias entre três ordens jurídicas distintas
(federal, estadual/distrital emunicipal), de modo apreservar aautonomia decisória de
cada Ente. Esse modelo federativo fixado pela Constituição, além de constituir cláusula
pétrea (art. 60, §4°, I, CF/88), condiciona aorganização do Estado eopróprio exercício
da competência tributária dos Entes da Federação. É o que demonstra a seguinte
passagem do acórdão:

"Outrossim, remarque-se que acompetência tributária consiste na aptidão para


instituir tributos, descrevendo, por meio de lei, as suas hipóteses de incidência.
No Brasil, oveículo de atribuição de competências, inclusive tributárias, éa
Constituição da República. Tal sistemática torna-se especialmente relevante
em um Estado constituído sob aforma federativa, com apeculiaridade do
convívio de três ordens jurídicas distintas: afederal, aestadual/distrital ea
municipal.

Não por outra razão, cuidou o legislador constituinte originário de alçar a


Federação à categoria de cláusula pétrea, tornando-a intangível pelo Poder
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Constituinte Derivado, conforme odisposto no art. 60, §4°, I. (...)

No modelo federativo fiscal, aConstituição dita oque pode cada pessoa política
realizar em matéria tributária, demarcando os respectivos âmbitos de atuação,
no intuito de evitar conflitos entre aUnião, os Estados-membros, o Distrito
Federal eos Municípios.

O modelo federativo por nós adotado abraça aconcepção segundo aqual a


distribuição das competências tributárias decorre dessa forma de
organização estatal epor ela écondicionada." (p. 16-17 do acórdão) (Grifos
meus)

2.1.8 Com relação àPremissa 2, nos termos do voto da Ministra Regina Helena
Costa, aautonomia decisória para exercício da competência tributária compreende ao
mesmo tempo opoder de tributar eopoder de conceder incentivos fiscais, porque esses
dois poderes são faces da mesma moeda. Édizer, como uma das formas de assegurar a
autonomia constitucionalmente conferida às unidades da federação épor meio da
garantia de que cada uma delas terá sua própria fonte de custeio, disso também decorre
que o poder de renunciar às receitas por meio da concessão de incentivos fiscais

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encontra-se exclusivamente nas mãos do Ente que detém aprópria competência para
tributar. Esse entendimento deflui do seguinte trecho:

"Como corolário desse fracionamento de competências, oart. 155, XII, g, da


Constituição da República, atribuiu aos Estados-membros e ao Distrito
Federal acompetência para instituir oICMS -e, por consequência, outorgar
isenções, benefícios e incentivos fiscais, atendidos os pressupostos de lei
complementar.

Anote-se tratar-se de tributo que, por constituir urna das principais fontes de
receita para custeio do aparato estatal, assegura condições para o exercício
desembaraçado da autonomia constitucionalmente conferida às unidades da
Federação.

A concessão de incentivo por Estado-membro, observados os requisitos


legais, configura, portanto, instrumento legítimo de política fiscal para
materialização dessa autonomia consagrada pelo modelo federativo. Embora
represente renúncia aparcela da arrecadação, pretende-se, dessa forma, facilitar
oatendimento aum plexo de interesses estratégicos para aunidade federativa,
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associados às prioridades e às necessidades locais coletivas." (p. 17-18 do


acórdão) (Grifos meus)

2.1.9 Mais ainda: para oTribunal, opoder de renunciar areceitas fiscais por
meio da concessão de benefícios fiscais guarda estrita relação com apromoção de
finalidades extrafiscais, isto é, com o incentivo à adoção de comportamentos pelo
contribuinte que promovam alguma finalidade constitucionalmente relevante. Assim o
trecho pertinente:

"É induvidoso, ademais, o caráter extrafiscal conferido pelo legislador


estadual à desoneração, consistindo a medida em instrumento tributário
para oatingimento de finalidade não arrecadatória, mas, sim, incentivadora
de comportamento, com vista àrealização de valores constitucionalmente
contemplados, conforme apontado." (p. 20 do acórdão) (Grifos meus)

2.1.10 Com relação àPremissa 3, oacórdão esclarece que toda interferência de


um Ente da Federação sobre opoder de outro Ente da Federação de conceder incentivos
fiscais viola aautonomia decisória porque interfere diretamente na sua política fiscal.

10

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HUMBERTO Á
VILA
Professor Titular da Universidade de São Paulo

Nesse sentido, se oobjetivo de um Ente édesonerar uma operação qualquer, por meio
da concessão de benefícios fiscais, para alcançar uma finalidade que reputa
constitucionalmente relevante, atentativa de outro Ente de tributar ovalor desonerado
interfere na autonomia decisória precisamente porque compromete afinalidade que o
primeiro pretendeu alcançar. Novamente, esse entendimento éextraído diretamente do
acórdão, na seguinte passagem:

"No caso concreto, verifica-se, de fato, interferência na política fiscal adotada


pelo Estado-membro mediante oexercício de competência federal.

Examinada a questão sob valores ético -


constitucionais da Federação,
limitadores do próprio exercício dessa competência, como também pelo
princípio da subsidiariedade, fator de salvaguarda da autonomia dos entes
federados perante aatividade tributante federal, constata-se que aconcorrência
desses elementos, adiante sopesados, écapaz de inibir apretensão de incidência
tributária defendida pela União." (p. 18 do acórdão) (Grifos meus)
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

2.1.11 E, finalmente, com relação àPremissa 4, o acórdão esclarece que toda


interferência de um Ente da Federação na autonomia decisória de outro viola o
princípio federativo porque estimula a competição indireta entre eles, frustrando,
assim, sua cooperação. É dizer, se um Ente concede um benefício fiscal, mas outro
tributa ovalor aele correspondente, então o que se tem éum Ente se beneficiando
daquilo aque ooutro renunciou, em nítida afronta àautonomia decisória de cada um
deles. Assim apassagem relevante do acórdão:

"(...) Desse modo, a tributação pela União de valores correspondentes a


incentivo fiscal estimula competição indireta com o Estado-membro, em
desapreço àcooperação eàigualdade, pedras de toque da Federação.

Naturalmente, não está em xeque acompetência da União para tributar arenda


ou olucro, mas, sim, airradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre
a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa, em
desarmonia com valores éticos-constitucionais inerentes àorganicidade do
princípio federativo, eem atrito com asubsidiariedade, "um princípio de bom
senso", no dizer do professor André Franco Montoro (Federalismo e o
fortalecimento do Poder Local no Brasil ena Alemanha. Coleção Debates da
Fundação Konrad Adenauer: Rio de Janeiro, 2002. p. 59), que reveste eprotege
aautonomia dos Estados-membros." (p. 18-19 do acórdão) (Grifos meus)

11

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HUMBERTO Á
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2.1.12 Foram essas quatro premissas combinadas que permitiram ao Tribunal


concluir que toda interferência de um Ente da Federação sobre opoder de outro Ente
da Federação de conceder incentivos fiscais viola oprincípio federativo. Justamente
porque compete ao Ente que tem opoder de onerar também opoder de desonerar, a
tentativa de outro Ente de tributar o valor correspondente ao benefício concedido
frustra por completo aautonomia do primeiro com relação aos efeitos que pretende
produzir ao conceder um benefício fiscal. Essa conclusão, aplicada ao caso concreto
relativo àinclusão dos valores correspondentes ao crédito presumido na base de cálculo
do IRPJ eda CSLL, demonstra que aUnião não pode exercer sua competência tributária
sobre uma receita que foi objeto de renúncia fiscal por um Estado da Federação, sem
que isso implique violar oprincípio federativo.

2.1.13 O segundo fundamento utilizado pelo Tribunal para considerar que os


valores correspondentes ao crédito presumido de ICMS não devem ser incluídos nas
bases de cálculo de IRPJ eda CSLL reside na proibição de extensão da regra que confere
competência àUnião para tributar olucro de pessoas jurídicas. Para oTribunal, as bases
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

de cálculo do IRPJ e do CSLL não podem conter elementos estranhos àquilo que
pretendem medir, motivo pelo qual ainclusão do valor correspondente ao crédito
presumido de ICMS na base de cálculo do IRPJ eda CSLL seria contrária àConstituição
eàlei instituidora de cada um desses tributos. Em termos analíticos, essa argumentação
pode ser decomposta do seguinte modo:

Premissa I: As bases de cálculo do IRPJ eda CSLL não podem conter


elementos estranhos àsua materialidade.

Premissa 2: Os valores correspondentes ao crédito presumido de ICMS


são elementos estranhos àmaterialidade do IRPJ eda CSLL.

Conclusão: As bases de cálculo do IRPJ eda CSLL não podem conter os


valores correspondentes ao crédito presumido de ICMS.

2.1.14 Novamente, ovoto da Relatora para oacórdão, Ministra Regina Helena


Costa, explicita a pretensão do Tribunal de justificar a verdade de cada uma das
premissas acima mencionadas. Com relação àPremissa I, oTribunal foi enfático ao

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afirmar que as bases de cálculo do IRPJ eda CSLL alcançam apenas os acréscimos de
riqueza que se integram de modo definitivo no patrimônio do contribuinte, já que a
materialidade desses tributos diz respeito à riqueza efetivamente percebida pelo
contribuinte.

2.1.15 Com relação à Premissa 2, o Tribunal entendeu que os valores


correspondentes ao crédito presumido de ICMS não configurariam riqueza nova e
definitiva do contribuinte porque não se integrariam de modo definitivo no seu
patrimônio. Assim otrecho relevante do acórdão, que justifica aadoção dessas duas
premissas:

"A base de cálculo, inquestionavelmente, haverá sempre de guardar


pertinência com aquilo que pretende medir, não podendo conter aspectos
estranhos, é dizer, absolutamente impertinentes à própria materialidade
contida na hipótese de incidência.

(...) Por fim, cumpre registrar, dada a estreita semelhança axiológica com o
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

presente caso, que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em regime de


repercussão geral, o RE n. 574.706/PR, assentou a inconstitucionalidade da
inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS eda COFINS. Entendeu oPlenário
da Corte, por maioria, que ovalor de ICMS não se incorpora ao patrimônio do
contribuinte, constituindo mero ingresso de caixa, cujo destino final são os
cofres públicos, conforme acórdão assim ementado:

(...) Note-se que, na linha de raciocínio esposada pelo Supremo Tribunal


Federal, os créditos presumidos de ICMS, concedidos no contexto de
incentivo fiscal, não teriam, com ainda mais razão, ocondão de integrar as
bases de cálculo de outros tributos, como quer aora Embargante, em relação
ao IRPJ e à CSLL, quer porque não representam lucro, quer porque tal
exigência tem fundamento em meras normas infralegais, quer ainda, àvista de
fundamento não menos importante, por malferir oprincípio federativo." (p. 21-
24 do acórdão) (Grifos meus)

2.1.16 Aqui, deve-se inclusive apontar que oTribunal rechaçou oentendimento


adotado pelo Ministro Og Fernandes, vencido no julgamento, de acordo com oqual "o
crédito presumido do ICMS, ao configurar diminuição de custos edespesas, aumenta
indiretamente olucro tributável e, portanto, deve compor abase de cálculo do IRPJ e

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da CSLL" (p. 6 do acórdão). Prevaleceu exatamente apremissa contrária: o crédito


presumido de ICMS não aumenta necessariamente olucro tributável, motivo pelo qual
éelemento estranho às bases de cálculo do IRPJ eda CSLL.

2.1.17 As considerações precedentes revelam que cada um dos fundamentos


adotados pelo Tribunal ésuficiente, por si só, para sustentar aconclusão de que os
valores correspondentes ao crédito presumido de ICMS não se incluem nas bases de
cálculo do IRPJ e da CSLL. Isso quer dizer que basta haver violação ao princípio
federativo para que ovalor que se pretenda tributar não possa ser incluído nas bases de
cálculo do IRPJ eda CSLL; ou, alternativamente, basta haver elemento incompatível
com amaterialidade desses tributos, para que ele não possa ser incluído nas respectivas
bases de cálculo. Esses fundamentos, portanto, oferecem cadeias independentes de
justificação para afastar ainclusão dos valores correspondentes ao crédito presumido
de ICMS nas bases de cálculo do IRPJ eda CSLL.
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

2.1.18 Estabelecidas essas premissas relativamente ao conteúdo da decisão


tomada, resta nítida aconclusão de que as razões de decidir do caso terminaram por
fixar um precedente sobre a ilegalidade da inclusão de benefícios fiscais de ICMS,
independentemente da forma como concedidos, na base de cálculo do IRPJ eda CSLL.
Um precedente éuma decisão que se torna um padrão aser observado em casos futuros
semelhantes. 4 Ele se caracteriza exatamente por constituir um conjunto de razões
necessárias esuficientes para solucionar um caso. A identificação de um precedente
pressupõe uma análise fático-jurídica, cujas razões, abstraídas euniversalizadas, sirvam
de parâmetro para julgar futuros casos idênticos ou análogos naquilo que for essencial
para a justificativa adotada. Como será demonstrado a seguir, tendo em vista as
semelhanças fáticas ejurídicas entre aexclusão de créditos presumidos de ICMS das
bases de cálculo do IRPJ eda CSLL eaexclusão de outros benefícios fiscais de ICMS das
bases de cálculo dos mesmos tributos, não há dúvidas de que as razões de decidir
aplicáveis aos primeiros abrangem os segundos. Éoque se passa ademonstrar.

4 PECZENIK, Aleksander. On Law and Reason. Sweden: Springer, 2008, p. 272; SCHAUER, Frederick.
"Precedent". In: Stanford Law Review, Vol. 39, no. 3, Stanford Law Review: February, 1987. p. 571-605
(588).

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2.2 A ABRANGÊNCIA DO PRECEDENTE PARA OS


DEMAIS BENEFÍCIOS FISCAIS DE ICMS

2.2.1 Examinados os fundamentos adotados como razões de decidir no


julgamento dos Embargos de Divergência no Recurso Especial n°. 1.517.492/PR, deve-
se analisar agora se há diferenças juridicamente relevantes entre os benefícios fiscais de
ICMS concedidos sob aforma de crédito presumido eaqueles concedidos sob outras
formas para justificar atentativa de diferenciação entre referidas situações. Tal análise
permitirá responder à principal questão que deve ser respondida por meio deste
arrozoado, qual seja, se as razões de decidir adotadas pelo Superior Tribunal de Justiça
para determinar aexclusão dos valores correspondentes ao benefício fiscal de crédito
presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ eda CSLL também servem para
justificar aexclusão dos demais benefícios fiscais referentes aesse imposto.

2.2.2 Não há dúvidas de que inexistem diferenças juridicamente relevantes


Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

entre os benefícios fiscais de ICMS concedidos sob aforma de crédito presumido e


aqueles concedidos sob outras modalidades, motivo pelo qual aeles deve ser concedido
o mesmo tratamento. Essa conclusão encontra suporte em três razões distintas:
primeiro, não há diferença juridicamente relevante na qualificação instrumental dos
diferentes benefícios fiscais para fins tributários; segundo, o próprio ordenamento
jurídico brasileiro assegura tratamento isonômico atodas as modalidades de benefícios
fiscais; e, terceiro, o Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência consolidada no
sentido de reconhecer que as distintas modalidades de benefícios fiscais devem receber
omesmo tratamento jurídico. Passa-se aexaminar cada uma dessas razões.

2.2.3 Em primeiro lugar, não há diferença juridicamente relevante na


qualificação instrumental dos diferentes benefícios fiscais para fins tributários. A União
alega que aforma contábil de escrituração do benefício fiscal seria elemento indicativo
das diferenças existentes entre as distintas modalidades de benefício fiscal. Para essa
visão, enquanto ocrédito presumido de ICMS envolveria uma "grandeza positiva" que
se incorporaria no patrimônio do contribuinte, as demais espécies de benefícios fiscais
configurariam uma "grandeza negativa" que diminuiria o imposto devido em cada
operação. A questão, contudo, não diz respeito asaber se há diferença entre as distintas
formas de benefícios fiscais das quais se pode valer olegislador estadual, mas sim se

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essas diferenças são juridicamente relevantes, isto é, se são suficientes para computar os
valores correspondentes ao benefício fiscal de ICMS nas bases de cálculo do IRPJ eda
CSLL sem que haja igual violação aos princípios federativo eda segurança jurídica,
como sucede com a inclusão dos valores atinentes ao benefício fiscal de crédito
presumido de ICMS.

2.2.4 Nesse sentido, não se questiona aqui aexistência de espécies distintas de


benefícios fiscais de ICMS. A título meramente exemplificativo, um benefício fiscal de
ICMS pode ser concedido sob aforma de (i) crédito presumido, hipótese na qual o
contribuinte ou responsável terá direito aaproveitar crédito de ICMS em valor superior
àquele incidente nas operações anteriores; (ii) isenção, hipótese na qual haverá anão
incidência do imposto legalmente prevista; (iii) redução da base de cálculo ou da
alíquota, hipóteses nas quais haverá aredução de um dos elementos que influenciam
diretamente no valor do imposto aser pago; dentre outras. Éevidente que todas essas
espécies de benefícios fiscais de ICMS diferem entre si, apresentando traços distintivos
quanto à sua operacionalização e implementação. O ponto ora controvertido,
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entretanto, diz respeito a saber se essas diferenças operacionais são juridicamente


relevantes para fins tributários, levando-se em consideração os fundamentos decisórios
adotados no julgamento dos Embargos de Divergência no Recurso Especial n°.
1.517.492/PR. A resposta, àtoda evidência, énegativa.

2.2.5 Da perspectiva jurídico-tributária, orelevante para determinar anatureza


das normas que conferem benefícios fiscais não éaforma como o contribuinte os
registrou na sua contabilidade, mas sim afinalidade visada pela criação da própria
norma. Nesse sentido, as normas que conferem benefícios fiscais afetam negativamente
ovalor do crédito tributário, reduzindo ou mesmo eliminando acarga fiscal com o
objetivo prevalente de alcançar uma finalidade extrafiscal reputada
constitucionalmente relevante pelo Ente estadual concedente. Assim, seja por meio de
um crédito presumido, seja por meio de uma isenção ou redução da base de cálculo, por
exemplo, aconcessão de um benefício fiscal destina-se aincentivar aadoção de um
comportamento pelo contribuinte. Logo, orelevante para determinar otratamento a
ser conferido acada espécie de benefício fiscal ésaber se ele se destina aatingir uma
finalidade extrafiscal constitucionalmente relevante por meio da indução do
comportamento do contribuinte, enão aforma como será contabilizado.

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2.2.6 Tanto é assim que questões atinentes à forma de contabilização do


benefício fiscal não foram sequer examinadas pela Primeira Seção do Superior Tribunal
de Justiça no julgamento dos Embargos de Divergência no Recurso Especial n°.
1.517.492/PR. Ora, fosse a forma de contabilização um elemento relevante para
determinar otratamento jurídico aser conferido aum benefício fiscal de ICMS, então
ocaso ora referido não poderia ter sido decidido sem que esse ponto fosse examinado.
Justamente porque aforma adotada pelo contribuinte para registrar um benefício fiscal
éirrelevante para fins tributários, oSuperior Tribunal de Justiça proferiu adecisão sem
examinar ou, no mínimo, mencionar acontabilidade do contribuinte.

2.2.7 De igual modo, no julgamento do aludido precedente, o Superior


Tribunal de Justiça também esclareceu que os elementos relevantes para exame do
benefício fiscal são, de um lado, aredução do encargo tributário e, de outro, asua
utilização como estímulo ao comportamento. Nesse sentido, oTribunal caracterizou o
crédito presumido de ICMS como um instrumento disponível aos Estados para
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viabilizar o exercício de determinada política fiscal. Em trecho relevante, aMinistra


Regina Helena Costa afirmou se tratar de "alívio fiscal, indutor do desenvolvimento
econômico regional" que tinha o escopo de desonerar atividades econômicas
desenvolvidas pelo contribuinte consideradas relevantes pelo Poder Público (naquele
caso, aprodução de alimentos básicos que devem ser acessíveis atoda apopulação).

2.2.8 Logo, muito embora possam ser apontadas diferenças com relação ao
modo corno atuam sobre arelação obrigacional tributária, tanto ocrédito presumido
de ICMS quanto os demais benefícios fiscais desse imposto promovem, independente
da forma como concedidos, o"alívio fiscal" proporcionado pelo Ente estadual para que
o fim almejado seja efetivamente promovido. Isso porque é a redução do custo
tributário relativo ao ICMS de determinada atividade que estimula o contribuinte a
desenvolvê-la; eéaadoção desse comportamento pelo contribuinte que contribui para
apromoção do objetivo constitucionalmente relevante almejado pelo Ente estadual.
Isso quer dizer que, muito embora cada espécie de incentivo ou benefício fiscal atue
sobre arelação obrigacional tributária àsua própria maneira, por representarem todos
elas uma redução, direta ou indireta, do ônus tributário suportado pelo particular e
pretenderem influenciar o seu comportamento, não há nenhuma distinção
juridicamente relevante entre as distintas espécies de benefícios fiscais com relação ao

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que juridicamente importa: constituir meio para promover finalidades cuja


configuração cabe ao Ente federado no exercício da sua autonomia federativa.

2.2.9 Em segundo lugar, aconclusão de que inexistem diferenças juridicamente


relevantes entre as distintas espécies de benefícios fiscais de ICMS éconfirmada pelo
próprio ordenamento jurídico brasileiro, examinado na sua integralidade. De um lado,
aequivalência prática do alívio fiscal, direto ou indireto, proporcionado por todas as
demais modalidades de benefícios fiscais ora examinados éreconhecida pelo próprio
texto constitucional, ao condicionar indistintamente asua concessão ou revogação à
edição de lei específica, nos seguintes termos:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, évedado


àUnião, aos Estados, ao Distrito Federal eaos Municípios: (...)

§6° Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de


crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou
contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal,
estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

enumeradas ou ocorrespondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do


disposto no art. 155, §2.°, XII, g. (Redação dada pela Emenda Constitucional
n° 3, de 1993) (Grifos meus)

2.2.10 Tal exigência possui três propósito fundamentais, amplamente


reconhecidos na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. O primeiro, assegurar a
observância da legalidade tributária (art. 150, I) egarantir que o Poder Executivo não
usurpe acompetência do Poder Legislativo para fixar os requisitos para afruição da
respectiva desoneração tributária. O segundo, evitar que aconcessão de benefício fiscal
passe despercebida durante a apreciação dos órgãos legislativos. E, o terceiro,
especialmente relevante para asituação ora examinada, assegurar ocontrole do impacto
orçamentário do respectivo benefício fiscal em razão da desoneração econsequente
perda de arrecadação ocasionada pela sua concessão.'

5 STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 5.929/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em
14.02.2020, line de 06.03.2020; STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 5.882/SC, Tribunal Pleno, Rel. Min.
Gilmar Mendes, julgado em 16.05.2022, DJe de 02.062022.

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2.2.11 Sobre esse último aspecto, cumpre referir que aLei de Responsabilidade
Fiscal (Lei complementar n° 101/00) estabelece que "a concessão ou ampliação de
incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá
estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em
que deva iniciar sua vigência enos dois seguintes" (art. 14). Ou seja, havendo uma
desoneração tributária que implique em perda de arrecadação, éindispensável que seja
veiculada por meio de lei específica para que seja oportunizada adeliberação legislativa
sobre os seus impactos financeiros eorçamentários. Em face disso, como os benefícios
fiscais enumerados são equivalentes sob aperspectiva da desoneração proporcionada
ao contribuinte eda renúncia fiscal observada pelo Ente federativo concedente, otexto
constitucional buscou atribuir omesmo tratamento normativo para asua concessão.
Daí iniciar odispositivo com apalavra "qualquer".

2.2.12 De outro lado, aequivalência prática do alívio fiscal proporcionado pelas


demais modalidades espécies de benefícios fiscais ora examinados também é
reconhecida pelo próprio texto constitucional, ao condicionar indistintamente asua
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

concessão ou revogação àobservância dos limites estabelecidos por lei complementar,


nos seguintes termos:

Art. 155. Compete aos Estados eao Distrito Federal instituir impostos sobre:

§2° O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (...)

XII -cabe àlei complementar: (...)

g) regular aforma como, mediante deliberação dos Estados edo Distrito


Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e
revogados. (Grifos meus)

2.2.13 Tal exigência justifica-se pela preservação do princípio federativo em face


da competição indireta que poderia surgir entre os Entes estaduais se lhes fosse possível
conceder livremente benefícios fiscais de ICMS para atrair investimentos ou subsidiar
determinadas atividades econômicas em seu território em detrimento dos demais

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(guerra fiscal), em prejuízo, em última análise, para opróprio federalismo fiscal. 6 Essa
exigência constitucional restou satisfeita pela recepção constitucional da Lei
Complementar n°. 24/75, segundo a qual aconcessão ou arevogação de todos os
incentivos ou benefícios fiscais estaduais, sem qualquer distinção quanto ao modo que
atuam sobre arelação obrigacional tributária, devem ser formalizadas por meio de
convênios celebrados eratificados pelos Estados epelo Distrito Federal:

Art. 1° -As isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de


mercadorias serão concedidas ou revogadas nos termos de convênios celebrados
eratificados pelos Estados epelo Distrito Federal, segundo esta Lei.

Parágrafo único -O disposto neste artigo também se aplica:

I-àredução da base de cálculo;


II -àdevolução total ou parcial, direta ou indireta, condicionada ou não, do
tributo, ao contribuinte, aresponsável ou aterceiros;
III -àconcessão de créditos presumidos;
IV -àquaisquer outros incentivos ou favores fiscais ou financeiro-fiscais,
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concedidos com base no Imposto de Circulação de Mercadorias, dos quais


resulte redução ou eliminação, direta ou indireta, do respectivo ônus;
V -às prorrogações eàs extensões das isenções vigentes nesta data. (Grifos
meus)

2.2.14 Precisamente porque a concessão de benefícios fiscais de ICMS


proporciona aredução do imposto devido pelo particular no exercício de determinada
atividade econômica, independentemente do modo como atuam sobre a relação
obrigacional tributária, éque são estabelecidos parâmetros comuns para que asua
concessão não venha às custas dos valores ético-constitucionais inerentes ao
federalismo de cooperação incorporado pela Constituição. Como não há qualquer
diferença no que diz respeito ao alívio fiscal oferecido por meio da concessão de créditos
presumidos de ICMS e dos demais benefícios fiscais estaduais, o constituinte e o
legislador complementar asseguram o mesmo tratamento normativo para a sua
concessão ou asua revogação.

6 STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 5.467/MA, Tribunal Pleno, Rel. MM. Luiz Fux, julgado em
30.08.2019, DJe de 16.09.2019; STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 4.276/MT, Tribunal Pleno, Rel. Min.
Luiz Fux, julgado em 20.08.2014, DJe de 18.09.2014; STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 2.823/MT,
Tribunal Pleno, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 19.12.2018, DJe de 14.02.2019.

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2.2.15 E, em terceiro lugar, o próprio Superior Tribunal de Justiça tem


jurisprudência consolidada no sentido de reconhecer que as distintas modalidades de
benefícios fiscais são semelhantes para fins jurídico-tributários. Nesse sentido, o
Tribunal já se pronunciou sobre airrelevância da distinção quanto àforma em que se
opera aredução do ônus tributário suportado pelo particular, relativamente àrevogação
de benefícios fiscais onerosos ou condicionados -seja isenção, alíquota zero ou redução
da base de cálculo -, conforme evidenciam os seguintes julgados:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE


PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. DISCIPLINA DO ART. 178
DO CTN À HIPÓTESE DE ALÍQUOTA ZERO. POSSIBILIDADE. NÃO
SUJEIÇÃO DOS VAREJISTAS AOS EFEITOS DO ART. 9° DA MP N. 690/2015
(CONVERTIDA NA LEI N. 13.241/2015). PRESENÇA DE ONEROSIDADE
(CONTRAPARTIDA) NO CONTEXTO DO INCENTIVO FISCAL DA LEI N.
11.196/2005 ("LEI DO BEM"). PREMATURA CESSAÇÃO DA INCIDÊNCIA
DE ALIQUOTA ZERO. VULNERAÇÃO DA NORMA QUE DÁ
CONCRETUDE AO PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA (PROTEÇÃO
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

DA CONFIANÇA) NO ÂMBITO DAS ISENÇÕES CONDICIONADAS EPOR


PRAZO CERTO. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA N. 544/STF. PRECEDENTES
DESTA TURMA. (...) II -Adequada a aplicação do art. 178 do Código
Tributário Nacional àhipótese de fixação, por prazo certo eem função de
determinadas condições, de alíquota zero da Contribuição ao PIS e da
Cofins, porquanto os contribuintes, tanto no caso de isenção, quanto no de
alíquota zero, encontram-se em posição equivalente no que tange ao
resultado prático do alívio fiscal. (...) VII -Recurso Especial provido, nos
termos expostos. (REsp n. 1.941.121/PE, relatora Ministra Regina Helena Costa,
Primeira Turma, julgado em 3/8/2021, DJe de 9/8/2021.) (Grifos meus)

TRIBUTÁRIO. PIS E CONFINS. ALÍQUOTA ZERO. PROGRAMA DE


INCLUSÃO DIGITAL. LEI 11.196/2005. "LEI DO BEM". INSTITUIÇÃO DA
ALIQUOTA ZERO POR PRAZO CERTO E SOB CONDIÇÕES ONEROSAS.
REVOGAÇÃO ANTES DO PRAZO FINAL. IMPOSSIBILIDADE.
VIOLAÇÃO AO ART. 178 DO CTN. HISTÓRICO DA DEMANDA (...) 4. A
exigência de que aempresa deva se submeter a um processo específico de
produção caracteriza aonerosidade para usufruir da redução da alíquota zero.
Houve, assim, quebra da previsibilidade econfiança, oque ocasiona violação à
segurança jurídica em relação aos contribuintes que tiveram que se adequar às
normas do Programa de Inclusão Digital. Portanto, ficou violado oart. 178 do
Código Tributário Nacional, ainda que, na matéria em questão, trate-se de

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revogação de aliquota zero. (...) 7. Recurso Especial conhecido para dar-lhe


provimento. (REsp n. 1.987.675/SP, relator Ministro Herman Benjamin,
Segunda Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 27/6/2022.) (Grifos meus)

2.2.16 Em especial, chama aatenção ofato de que aratio decidendi adotada nos
respectivos julgados reconhece aaplicação da norma prevista no artigo 178 do Código
Tributário Nacional para outros benefícios fiscais, que não aisenção, porquanto os seus
destinatários "encontram-se em posição equivalente no que tange ao resultado prático
do alívio fiscal". É dizer, ajurisprudência do Tribunal reconhece que não há qualquer
diferença prática quanto aos efeitos da redução do ônus tributário imposto ao particular
por meio da concessão de benefícios fiscais, quando se pretende estimular aadoção de
certos comportamentos pelo contribuinte que contribuam para apromoção de um
objetivo reputado constitucionalmente como relevante pelo Poder Público.

2.2.17 Tudo isso reforça o entendimento de que o modo pelo qual é


proporcionado o alívio fiscal objeto dos benefícios ora examinados, seja ele crédito
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

presumido, seja ele isenção, redução da base de cálculo ou alíquota zero, éirrelevante
no que diz respeito ao estímulo oferecido para a prática de comportamentos
compatíveis com aqueles objetivos desejados pelo Poder Público. O que importa éque
odesenvolvimento da atividade econômica incentivada depende da redução do ônus
tributário proporcionada pela concessão do benefício fiscal estadual.

2.2.18 Em razão da inexistência de diferença juridicamente relevante entre os


benefícios de ICMS concedidos sob aforma de crédito presumido esob outras formas
(e.g., isenções ereduções de base de cálculo), também não há diferenças com relação à
aplicação do princípio federativo eda regra que delimita abase de cálculo do IRPJ eda
CSLL às distintas modalidades de benefícios fiscais de ICMS. Por isso, os fundamentos
utilizados pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Embargos de
Divergência no Recurso Especial n°. 1.517.492/PR abrangem plenamente às demais
espécies de benefícios fiscais de ICMS.

2.2.19 No que tange ao princípio federativo, de um lado, oprecedente analisado


pela Primeira Seção do Tribunal enfatizou que aconcessão do crédito presumido de

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ICMS envolveria uma renúncia fiscal por parte do Ente estadual eque, portanto, a
tributação desses valores implicaria aretirada, por via oblíqua, do incentivo fiscal então
outorgado no exercício da competência tributária estadual. O mesmo ocorre
relativamente aos benefícios fiscais concedidos sob outras modalidades, como isenção,
redução da base de cálculo e alíquota zero, dentre outros. Também neles, o Ente
estadual renuncia à receita fiscal com a finalidade de incentivar a adoção de
determinado comportamento pelo contribuinte, motivo pelo qual eventual tributação
desses valores implicaria aretirada, por via oblíqua, do incentivo fiscal então outorgado,
do seguinte modo:

1
IRPJ +CSLL

Li
-x
X —(IRPJ +CSLL)

Benefício fiscal conferido Beneficio fiscal conferido


pelo Estado pelo Estado caso haja
tributação por IREI eCSLL
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

2.2.20 Em outras palavras: atributação, por meio do IRPJ eda CSLL do valor
correspondente ao benefício fiscal de ICMS concedido pelo Estado, qualquer que seja a
sua modalidade, reduz opróprio valor do benefício fiscal inicialmente conferido pelo
Estado. Embora oEstado tenha pretendido influenciar aadoção de um comportamento
pelo contribuinte oferecendo-lhe um incentivo de X, esse incentivo éreduzido, por via
oblíqua, pela União, de modo que oincentivo se torna X -(IRPJ +CSLL). O problema
desse cenário reside precisamente no fato de que o Estado planejou suas finanças e
organizou suas políticas públicas confiando que estaria transferindo ao contribuinte o
valor de X, enão X -(IRPJ +CSLL), como forma de influenciar oseu comportamento.

2.2.21 Exatamente por isso, oque se verifica, de outro lado, éque atributação
pelo IRPJ epela CSLL sobre benefícios fiscais, qualquer que seja amodalidade sob a
qual tenham sido outorgados, configura uma interferência indevida na política fiscal
adotada pelo Ente estadual. Há aqui violação da autonomia estadual assegurada pelo
princípio federativo para o exercício de sua competência tributária. Conforme
demonstrou a análise do precedente fixado pelo Superior Tribunal de Justiça, a
tributação do crédito presumido de ICMS por IRPJ eCSLL configura invasão, por parte
da União, da esfera de poder do Estado.

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2.2.22 O Estado, ao renunciar àreceita fiscal de ICMS, não ofaz em benefício da


União, mas sim em benefício do contribuinte, buscando estimular o seu
comportamento. Isso significa que, aprevalecer o entendimento da União, o que se
criaria seria uma exigência de que oEstado renunciasse auma parcela ainda maior da
sua receita caso efetivamente buscasse incentivar aadoção de um comportamento pelo
contribuinte oferecendo-lhe um benefício fiscal de X. E isso pela singela razão de que
parte do benefício fiscal outorgado seria tributado pela União por meio de IRPJ eCSLL.
Éoque revela aseguinte imagem:

X + (IRPJ +CSLL)

Benefício fiscal conferido Benefício fiscal conferido Benefício fiscal que teria que ser conferido
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pelo Estado pelo Estado caso haja pelo Estado caso (i) desejasse incentivar o

tributação por IRPJ eCSLL comportamento do contribuinte com X e(ii)


houvesse tributação por IRPJ eCSLL

2.2.23 O que se percebe, dessa forma, éque aprevalecer atese da União, no


sentido de que adecisão firmada não abrangeria outros tipos de benefícios fiscais, a
tributação federal da renúncia fiscal oferecida anível estadual implicará na cobrança de
um "pedágio federativo": oEstado até poderá conceder obenefício de X ao contribuinte,
desde que a ele acresça o valor correspondente ao IRPJ e CSLL que deverão ser
necessariamente repassados à União. Dito de outro modo: para transferir X ao
contribuinte, oEstado terá que renunciar auma receita equivalente aX +(IRPJ +CSLL).
A afronta àautonomia do Ente estadual não poderia ser mais clara, na medida em que
esse jamais será livre para conceder um benefício fiscal ao contribuinte sem que àUnião
também seja transferida uma parcela da receita sobre aqual renunciou.

2.2.24 No que tange ao dever de congruência entre abase de cálculo do IRPJ e


da CSLL esuas respectivas materialidades, também nos casos de benefícios fiscais de
ICMS concedidos sob forma diversa do crédito presumido, o valor a eles
correspondentes representa elemento estranho àmaterialidade desses tributos, não

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podendo, dessa forma, integrar sua base de cálculo. Ao conceder um benefício fiscal de
ICMS, seja por meio de crédito presumido, seja por meio de isenção, redução de base
de cálculo e.g., o Estado não aumenta necessariamente o lucro tributável do
contribuinte. Eisso pela singela razão de que obenefício fiscal, justamente em razão do
seu caráter extrafiscal, visa apromover uma finalidade constitucionalmente relevante
por meio da concessão de um estímulo financeiro ao contribuinte para que este não
comprometa asua lucratividade ao aderir ao comportamento incentivado.

2.2.25 O alívio fiscal criado pelo benefício éum verdadeiro estímulo financeiro
para a adoção de um comportamento desejado. Nesse sentido, enquanto estímulo
financeiro, o benefício fiscal pode ser direcionado para pelo menos três situações
distintas:

(i) ampliação de investimentos: nessas situações, obenefício fiscal destina-


se aestimular aimplantação ou expansão da atividade econômica dos
contribuintes (que não seria realizado sem oincentivo);
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(ii) ressarcimento de custos correntes ou operacionais de uma dada


operação: destina-se aauxiliar financeiramente o contribuinte com os
custos edespesas necessários àoperação emanutenção da sua atividade
econômica (que não seria mantida sem oincentivo);

(iii) redução do preço da mercadoria para oconsumidor final: destina-se a


viabilizar acompra da mercadoria pelo consumidor final, garantindo que
opreço final do produto será reduzido ou, ainda, mantido nos casos em
que economicamente ele deveria ser aumentado (que não seria reduzido
sem oincentivo).

2.2.26 Em todas essas situações, o benefício fiscal não aumenta o lucro do


contribuinte, mas apenas preserva o lucro já existente antes da adoção do
comportamento estimulado pelo Poder Público. Não fosse o estímulo financeiro
concedido pelo Estado, o contribuinte não teria incentivos para expandir seus
investimentos, continuar uma operação economicamente desafiadora ou ainda reduzir
opreço da mercadoria para o consumidor final. E tudo isso porque aexpansão de
investimentos, a manutenção de uma operação com altos custos correntes ou

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operacionais earedução do preço da mercadoria para oconsumidor final importariam


na redução do lucro do contribuinte se não fosse oferecido esse estímulo financeiro.
Sem estímulos, essas atividades simplesmente não seriam realizadas. O benefício fiscal,
portanto, apenas preserva alucratividade da operação que restaria comprometida na
sua ausência.

2.2.27 Insista-se nesse ponto: não há necessariamente aumento do lucro do


contribuinte. O que há, isto sim, éuma redução do custo tributário do próprio ICMS
com vistas afacilitar amanutenção das atividades do contribuinte ou ainda reduzir a
dimensão do tributo transferido ao consumidor final, de modo atornar as mercadorias
mais acessíveis (a exemplo de medicamentos eitens da cesta básica). O objetivo do
benefício fiscal estadual épreservar aviabilidade da atividade para que ocontribuinte
adote ocomportamento almejado pelo Poder Público. Épor essa razão que oingresso
financeiro proporcionado pelo benefício fiscal estadual não se amolda àmaterialidade
do IRPJ eda CSLL, nem revela capacidade econômica do contribuinte.
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2.2.28 Não se deve confundir atributação do valor correspondente ao benefício


fiscal de ICMS, qualquer que seja asua modalidade, com atributação do resultado
decorrente desse benefício. Imagine-se que um Estado confira um benefício fiscal de
redução de base de cálculo avendedores de sabonetes visando areduzir opreço dessa
mercadoria para o consumidor final. Em decorrência disso, mais sabonetes são
vendidos pela empresa X e, consequentemente, essa empresa pode vir ater um lucro
maior àquele existente anteriormente, oqual deverá ser submetido àtributação do IRPJ
eda CSLL. Não se discute neste momento essa tributação. O ponto aqui controvertido
diz respeito àtributação do valor correspondente ao próprio benefício fiscal de ICMS
inicialmente conferido ao contribuinte.

2.2.29 A União, por sua vez, sustenta que haveria um duplo lucro do
contribuinte: (i) primeiro, em razão do benefício fiscal conferido pelo Estado; e(ii)
segundo, eem momento posterior, em razão do aumento de vendas que gera efetivo
incremento do seu lucro. O que se nega aqui ésimplesmente aexistência de lucro no
primeiro momento, em razão da mera concessão de um benefício fiscal pelo Estado para
incentivar aadoção de um determinado comportamento pelo contribuinte. O efetivo
lucro, por sua vez, será devidamente tributado pela União.

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2.2.30 Destaque-se que, como já apontado, aconclusão de que poderia haver a


tributação nesse primeiro momento foi rechaçada pela Primeira Seção do Superior
Tribunal de Justiça, que, ao examinar os Embargos de Divergência no Recurso Especial
n°. 1.517.492/PR, afastou oentendimento do Ministro Og Fernandes, de acordo com a
qual "o crédito presumido de ICMS, ao configurar diminuição de custos edespesas,
aumenta indiretamente olucro tributável" (p. 6do acórdão). Como referido, prevaleceu
exatamente a premissa contrária: o crédito presumido de ICMS não aumenta
necessariamente olucro tributável, motivo pelo qual éelemento estranho às bases de
cálculo do IRPJ eda CSLL. Tal entendimento, portanto, abrange os benefícios fiscais de
ICMS de modo geral, em razão da inexistência de diferenças relevantes entre eles.

2.2.31 Essas considerações revelam ainda atotal improcedência da alegação da


União de acordo com aqual anão inclusão dos valores correspondentes abenefícios
fiscais de ICMS nas bases de cálculo do IRPJ eda CSLL representaria uma "isenção
heterônoma". Somente se pode falar em isenção heterônoma se satisfeitas as seguintes
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condições: (i) competência de um Ente para tributar; e(ii) pretensão de outro Ente de
afastar o exercício da competência tributária do primeiro. Ocorre que, conforme
decidido pelo próprio Superior Tribunal de Justiça, aUnião não tem competência para
tributar os valores que não guardam vínculo de pertinência com amaterialidade do IRPJ
eda CSLL, pois de um resultado líquido decorrente da venda de mercadorias, mas de
uma atuação estatal destinada apromover uma finalidade pública. Se aUnião não tem
competência para exigir IRPJ eCSLL sobre os valores correspondentes abenefícios
fiscais de ICMS, qualquer que seja amodalidade sob aqual foram concedidos, então é
evidente que não há qualquer violação àregra que proíbe aconcessão de isenções
heterônomas. De modo simplificado: adesoneração indevida por um Ente pressupõe a
existência de oneração devida por outro Ente, o que não se vislumbra nas hipóteses
deste caso.

2.2.32 Por fim, também não se alegue que os outros benefícios fiscais diversos do
crédito presumido, como isenção e redução de base de cálculo, promoveriam
diretamente uma redução do ICMS devido e, por conta disso, afinalidade almejada
(reduzir o preço final da mercadoria para o consumidor) seria automaticamente
alcançada enão restaria afetada pela posterior tributação do lucro da empresa pelo IRPJ

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epela CSLL. Para melhor entender por que esse argumento está equivocado, épreciso
decompô-lo analiticamente.

2.2.33 De acordo com ele, obenefício do crédito presumido não bloquearia a


própria incidência do ICMS na operação de venda, mas apenas diminuiria valor do
imposto aser pago pela empresa no final do período de apuração. Édizer, oconsumidor
da mercadoria não suportaria um ônus econômico menor ao comprá-la, pois opreço
não teria sido diminuído em virtude de oICMS ter incidido normalmente. Sob essa
perspectiva, obenefício do crédito presumido não operaria direta enecessariamente
uma redução do preço final do produto vendido ao consumidor e, por conta disso, a
finalidade que justificou asua concessão não seria automaticamente promovida. Assim,
se os valores de crédito presumido de ICMS compusessem abase de cálculo do IRPJ e
CSLL aserem pagos pela empresa, a eficácia do benefício fiscal seria prejudicada,
caracterizando uma interferência indevida na autonomia federativa do respectivo Ente
estadual concedente.
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2.2.34 Já com os outros benefícios fiscais, como reduções de base de cálculo e


isenções, seria diferente. Eassim seria porque esses sim bloqueariam ou diminuiriam a
própria incidência do ICMS na operação, fazendo com que o consumidor da
mercadoria suportasse um ônus econômico menor, via embutimento de um valor
menor de ICMS no preço. Sob essa ótica, os benefícios fiscais de redução de base de
cálculo eisenção promoveriam direta enecessariamente aredução do preço final do
produto vendido ao consumidor e, por conta disso, afinalidade que justificou asua
concessão seria automaticamente alcançada. Assim, se os valores de isenção eredução
de base de cálculo de ICMS compusessem abase de cálculo do IRPJ eCSLL aserem
pagos pela empresa, aeficácia do benefício fiscal não seria prejudicada, deixando, assim,
de caracterizar qualquer interferência indevida na autonomia federativa do respectivo
Ente estadual concedente.

2.2.35 Esse argumento, com adevida vênia, não procede. Enão procede porque
ele parte do pressuposto de que haveria uma diferença substancial entre carga tributária
decorrente de tributo indireto (ICMS), que incide na operação de venda eafeta opreço
da mercadoria vendida como tributo incluído no preço, ecarga tributária decorrente de
tributos diretos (IRPJ e CSLL), que são pagos pela empresa e afetam o preço da

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mercadoria vendida como elemento que compõe oseu custo. Ora, nos dois casos -como
tributo embutido no preço ou como custo (de tributo direto) embutido no preço -, a
carga tributária será suportada pelo consumidor final.

2.2.36 Sendo assim, porém, se o preço da mercadoria é afetado tanto pela


tributação indireta (via ICMS, que compõe opreço) quanto pela tributação direta (via
IRPJ eCSLL, na forma de custo, que também afeta opreço), não faz diferença alguma
se obenefício fiscal atuará na própria incidência do ICMS (via isenção ou redução de
base de cálculo) ou apenas no pagamento do ICMS no final do período de apuração (via
crédito presumido). Nos dois casos, atributação federal acarretará omesmo aumento
no preço final da mercadoria e a mesma restrição do alcance do benefício fiscal
concedido pelo Ente estadual como forma de incentivar a sua produção e a sua
comercialização.

2.2.37 Mas se nos dois casos opreço final do produto será afetado, então ser o
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benefício fiscal um crédito presumido ou uma isenção ou redução de base de cálculo é


indiferente com relação àformação do preço da mercadoria cuja produção econsumo
se quer incentivar por meio do benefício fiscal. Como tributo embutido no preço ou
como custo embutido no preço, pouco importa, opreço será afetado pela concessão do
respectivo benefício fiscal. Sendo assim, porém, não se afigura correto afirmar, de um
lado, que aeficácia do benefício fiscal seria automática nos casos de isenção eredução
de base de cálculo, de modo que afinalidade do benefício fiscal não restaria afetada pela
tributação do lucro da empresa, e, de outro lado, que essa mesma eficácia não seria
automática no caso de crédito presumido, de maneira que afinalidade do benefício
fiscal restaria afetada pela tributação do lucro da empresa. Nos dois casos ainclusão do
benefício fiscal na base de cálculo dos tributos federais pagos pela empresa termina por
afetar opreço da mercadoria vendida ao consumidor -como tributo incluído no preço
ou como custo incluído no preço, pouco importa. Mas se assim é, então ainclusão tanto
dos valores dos créditos presumidos quanto dos valores das isenções edas reduções de
base de cálculo na base de cálculo do IRPJ eda CSLL afetam aeficácia eafinalidade do
benefício fiscal.

2.2.38 Ora bem, se oprecedente em discussão entendeu por afastar ainclusão


dos valores dos créditos presumidos da base de cálculo do IRPJ eda CSLL porque sua

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inclusão afeta apromoção do fim que oEstado quis promover com asua concessão,
então, por igual razão, deve afastar ainclusão dos valores das isenções edas reduções
de base de cálculo na base de cálculo do IRPJ eda CSLL porque sua inclusão também
afeta apromoção do fim que oEstado quis promover com asua concessão.

2.2.39 Todo o exposto conduz àconclusão de que, em face da inexistência de


diferenças juridicamente relevantes entre o benefício fiscal de crédito presumido de
ICMS eos demais benefícios fiscais estaduais, deve ser reconhecida aabrangência da
tese fixada nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n°. 1.517.492/PR para os
benefícios fiscais de ICMS, independentemente da forma como concedidos. A ratio
decidendi fixada, no sentido de que apretensão fazendária de tributar arenúncia fiscal
estadual viola, aum só tempo, oprincípio federativo eodever de congruência entre a
base de cálculo do IRPJ eda CSLL esuas respectivas materialidades, aplica-se atodos
os benefícios fiscais de ICMS.
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2.2.40 Sendo tudo isso verdadeiro, não há dúvidas de que apretensão da União
de atribuir tratamento tributário distinto para benefícios fiscais de ICMS simplesmente
em razão da modalidade sob a qual foram concedidos implica ainda tratamento
discriminatório. Éoque se passa ademonstrar.

2.3 A PROIBIÇÃO DE TRATAMENTO DISCRIMINATÓRIO

2.3.1 A interpretação no sentido de que outras modalidades de benefícios fiscais


estaduais, que não o crédito presumido de ICMS, deveriam ser incluídas na base de
cálculo do IRPJ eda CSLL viola oprincípio da igualdade por estabelecer tratamento
discriminatório fundado em critério inválido de diferenciação entre particulares.
Conforme mencionado, de acordo com a União, o crédito presumido de ICMS
envolveria uma "grandeza positiva" que se incorporaria no patrimônio do contribuinte,
enquanto outras modalidades de benefícios fiscais corresponderiam apenas à uma
„grandeza negativa" que diminuiria oimposto devido pelo particular. Em razão disso,
enquanto o crédito presumido de ICMS não deveria ser considerado renda, por não
consubstanciar verdadeiro acréscimo patrimonial, os demais benefícios fiscais

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examinados seriam meras reduções de custo, incapazes de descaracterizar oalívio fiscal


gerado no patrimônio do particular como lucro tributável.

2.3.2 Isso significa que aUnião defende que omodo pelo qual aredução do
ônus tributário éregistrada na contabilidade do particular definiria aprópria natureza
jurídica da parcela e, portanto, asua tributação pelo IRPJ epela CSLL: se obenefício
fiscal de ICMS oportunizar a compensação do imposto devido e for registrado
contabilmente como um acréscimo de uma "grandeza positiva" no patrimônio do
contribuinte, então oganho obtido com oincentivo deverá ser excluído na apuração do
lucro tributável do exercício; no entanto, se obenefício fiscal de ICMS importar na
redução do imposto incidente efor registrado contabilmente como uma "grandeza
negativa" no patrimônio do contribuinte, então oganho obtido com oincentivo deverá
ser considerado na apuração do lucro tributável do exercício. Esta diferenciação,
contudo, viola aigualdade.
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2.3.3 A igualdade éum princípio relacional, cuja definição diz respeito àrelação
entre dois ou mais sujeitos, com base em medida ou critério de comparação, aferido por
meio de elemento indicativo, que sirva de instrumento para a realização de uma
determinada finalidade. 7 Para o Direito, portanto, não importa apenas saber se as
pessoas são ou não são iguais (igualdade descritiva) de acordo com um determinado
critério (idade, sexo, data de nascimento ou tipo de atividade, por exemplo), mas sim se
as pessoas devem ou não ser tratadas igualmente (igualdade prescritiva).

2.3.4 Esses juízos comparativos estão evidentemente relacionados: para saber


se as pessoas devem ser tratadas igualmente épreciso verificar, no plano dos fatos, se
elas têm as propriedades selecionadas como relevantes pela norma; as vezes, uma razão
para tratar as pessoas igualmente éo próprio fato de elas serem iguais, quando se
pretende mantê-las iguais; outras vezes, uma razão para tratá-las igualmente éofato de
elas serem diferentes, caso se queira aproximá-las; e, outras vezes, ainda, uma razão para
tratá-las diferentemente éo fato de elas serem iguais, caso se queira separá-las. A
igualdade, enquanto dever de tratamento igualitário, só surge quando, para alcançar
determinada finalidade que deve ser buscada, os sujeitos são comparados por critérios

7 ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade. 4a ed. São Paulo: Malheiros/Juspodium, 2021, p. 45.

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que, além de serem permitidos, são relevantes e congruentes relativamente àquela


finalidade.' Dessa constatação surge uma conclusão tão importante quanto
menosprezada: fins diversos levam àutilização de critérios distintos, pela singela razão
de que alguns critérios são adequados àrealização de determinados fins; outros, não.'

2.3.5 Do ponto de vista do Direito Tributário, aigualdade foi expressamente


prevista como uma das Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Com efeito, o
artigo 150, inciso II, da Constituição, veda tanto o tratamento desigual entre
contribuintes que se encontrem em situação equivalente quanto o tratamento igual
entre contribuintes que não se encontrem em situação equivalente. Em outras palavras,
os contribuintes que se encontrem em situação equivalente devem ser tratados
igualmente; e, acontrario sensu, aqueles que estiverem em situação distinta devem ser
tratados de forma diversa.

2.3.6 Essas considerações são fundamentais para o caso aqui analisado. O


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relevante para determinar otratamento aser conferido acada espécie de benefício fiscal
ésaber se eles proporcionam um alívio fiscal como forma de induzir ocomportamento
do contribuinte em direção auma finalidade extrafiscal constitucionalmente relevante.
O critério, portanto, independe da forma como obenefício fiscal atua sobre arelação
obrigacional tributária (redução do imposto devido ou redução do imposto incidente)
ou ainda do modo pelo qual aredução do ônus tributário éregistrada na contabilidade
do particular (acréscimo de um elemento positivo ou decréscimo de um elemento
negativo), mas sim do seu conteúdo (alívio fiscal proporcionado com opropósito de
atingir um objetivo constitucionalmente relevante).

2.3.7 A interpretação conferida pela União, contudo, faz com que anatureza
jurídica da parcela seja definida pela maneira como oparticular registra asua entrada
em seu patrimônio, se como adição de um elemento novo epositivo ou como subtração
ou redução de um elemento negativo. Isto é, adepender do modo como obenefício
fiscal foi escriturado na contabilidade do contribuinte, então orespectivo valor será

8 Ibidem, p. 44-45.

9 ÁVILA, Humberto. Conceito de Renda ecompensação de prejuízos fiscais. São Paulo: Malheiros, 2011,
p. 23.

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considerado lucro tributável, concluindo-se, assim, pela incidência da tributação. Essa


interpretação, porém, viola aigualdade sob três perspectivas distintas: na interpretação,
na aplicação isonômica ena neutralidade da lei.

2.3.8 Em primeiro lugar, viola aigualdade do ponto de vista da interpretação


da lei porque sustenta norma que estabelece elemento indicativo inválido da medida de
comparação. Conforme explicado, aigualdade éuma norma relacional porque exige a
comparação entre dois ou mais indivíduos que são diferenciados com fundamento em
uma finalidade constitucionalmente válida, por meio de uma medida que, por sua vez,
éaferida por um elemento indicativo. O relevante para ocaso éessa segunda relação,
qual seja, ovínculo entre amedida de comparação eoelemento indicativo, que devem
ser fundados econjugados entre si. Referida relação éconsiderada, de um lado, fundada
quando houver aexistência de um vínculo estatisticamente verificável entre amedida e
o elemento indicativo eleito por meio de suporte empírico considerável. E, de outro
lado, arelação éconsiderada conjugada quando oelemento indicativo escolhido pelo
legislador exteriorizar em maior medida, considerados outros elementos também
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possíveis, apropriedade conotada pela medida de comparação.'

2.3.9 No caso concreto, por força do precedente fixado pelo Superior Tribunal
de Justiça nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n°. 1.517.492/PR, há duas
medidas de comparação relevantes para atributação pelo IRPJ epela CSLL. A primeira
consiste na existência de um valor que corresponde auma renúncia fiscal por um Ente
da Federação. A segunda consiste na existência de efetivo acréscimo patrimonial, ou
seja, ingresso de uma riqueza nova no patrimônio do particular que seja indicativa de
capacidade contributiva. Contudo, apesar da decisão definitiva proferida pelo Superior
Tribunal de Justiça, a União sustenta que a medida de comparação a ser adotada
concerne exclusivamente à forma de concessão do benefício fiscal, cujo elemento
indicativo éoseu modo de contabilização: se ingresso de uma "grandeza positiva", então
ausência de lucro tributável; e, se ingresso de uma "grandeza negativa", então existência
de lucro tributável.

°
1 ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade. 4a ed. São Paulo: Malheiros/Juspodium, 2021, p. 50-66.

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2.3.10 O problema é que esse elemento indicativo (forma de escrituração


contábil) não possui uma relação fundada econjugada com as medidas de comparação
eleitas pelo próprio Superior Tribunal de Justiça. Com efeito, aforma como oalívio
fiscal proporcionado pelo benefício éregistrada na contabilidade do contribuinte é
indiferente para verificação das medidas de comparação (tanto aexistência de um valor
correspondente auma renúncia fiscal por um Ente da Federação como aexistência de
acréscimo patrimonial).

2.3.11 De um lado, não há relação fundada porque inexiste suporte empírico que
dê supedâneo ao fato de que omodo como oalívio fiscal proporcionado pelo benefício
éregistrado na contabilidade do particular seria determinante para caracterizá-lo como
renúncia fiscal do Ente estadual ou mesmo lucro tributável do contribuinte. Reitera-se:
referidas parcelas, ainda que registradas como "grandezas negativas", caracterizam um
alívio fiscal proporcionado pelo Ente estadual com o propósito de induzir o
comportamento do contribuinte em direção a uma finalidade extrafiscal
constitucionalmente relevante. De outro lado, não há relação conjugada porque o
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elemento indicativo "modo de escrituração contábil do alívio fiscal proporcionado pelo


benefício fiscal" não exterioriza em maior medida as propriedades conotadas pelas
medidas de comparação "existência de renúncia fiscal pelo Ente da Federação" e
"existência de acréscimo patrimonial", considerados outros elementos possíveis.
Novamente, pelo contrário, este elemento étotalmente impertinente para verificação
das medidas de comparação adotadas como significativas pelo precedente.

2.3.12 Em segundo lugar, oentendimento fazendário viola aigualdade no plano


na aplicação da lei, pois visa àsua aplicação de maneira anti-isonômica. Nesse ponto, a
igualdade possui conexão com alegalidade, uma vez que alei, por ser geral eabstrata,
acaba por desconsiderar particularidades individuais em favor de uma classe de
contribuintes. Conforme me manifestei anteriormente, as leis estabelecem padrões de
tratamento aos particulares:

"As leis como que 'enquadram' os contribuintes em classes: a classe dos


contribuintes que auferem rendimentos até determinado limite; aclasse dos
contribuintes que gastam com saúde, e, assim, sucessivamente. Nessas situações,
o contribuinte não está sendo individualmente considerado; ele está sendo

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incluído numa classe, mesmo que —eis oponto —ele não seja igual aos demais
com base em outros elementos não considerados relevantes pelo padrão legal."

2.3.13 O legislador, ao editar alei, ao mesmo tempo em que elege o critério


relevante para enquadramento dos contribuintes em uma determinada classe para que
aeles seja dispensado um tratamento específico, afasta todos os demais critérios para
este mesmo fim, com vistas, entre outras coisas, à redução de complexidade e à
facilitação da compreensão da lei» No caso concreto, alegislação eainterpretação
conferida aela pelo Superior Tribunal de Justiça estabeleceram que orelevante para
inclusão de um indivíduo na classe de contribuinte desses tributos seria anão violação
ao princípio federativo eaapuração de lucro tributável, assim entendido oacréscimo
patrimonial líquido e disponível. A contrario sensu a legislação e a interpretação
conferida aela pelo Superior Tribunal de Justiça determinaram que qualquer outro
valor, independentemente da forma como realizada asua escrituração contábil, seria
irrelevante para enquadramento de um indivíduo na classe de contribuinte desses
tributos federais. Em outras palavras, ao reputar que todo ovalor correspondente auma
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renúncia fiscal de um Ente da Federação eque não corresponda aefetivo acréscimo


patrimonial não se amolda àmaterialidade do IRPJ eda CSLL, oTribunal afastou a
consideração de qualquer outro critério que porventura poderia ser tido como relevante
para determinar oenquadramento dos sujeitos como contribuintes desses tributos.

2.3.14 Desse modo, caso prevalecesse ainterpretação conferida pela União, sua
aplicação necessariamente seria realizada de modo anti-isonômico porque haveria
distinção entre contribuintes que não foram diferenciados nem pela legislação, nem
pelo próprio Superior Tribunal de Justiça. Os contribuintes que recebem crédito
presumido de ICMS eque registram contabilmente oalívio fiscal proporcionado pelo
benefício como uma "grandeza positiva" na sua contabilidade não sofrerão aincidência
tributária do IRPJ eda CSLL sobre essa parcela, enquanto os contribuintes que recebem
outras modalidades de benefício fiscal estadual e registram o mesmo alívio fiscal
proporcionado como uma "grandeza negativa" na sua contabilidade serão tributados.
Viola-se, assim, aum só tempo, alegalidade, pela instituição de critério de tributação

11 ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade. 4a ed. São Paulo: Malheiros/Juspodium, 2021, p. 121-122.

12 GRIBNAU, J. L. M. "Equality, Consistency and Impartiality in Tax Legislation". In GRIBNAU, Hans


(Org.). Legal protection against discriminatory tax legislation. Hague: Kluwer, 2003, p. 25-26.

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não previsto em lei eem violação nítida ao precedente fixado pelo Superior Tribunal de
Justiça, eaigualdade, pelo tratamento diferenciado para indivíduos que se encontram
na mesma situação.

2.3.15 Insista-se neste ponto: ao apreciar os Embargos de Divergência no


Recurso Especial n° 1.517.492/PR, este Tribunal afastou atributação federal sobre o
crédito presumido de ICMS com base em dois fundamentos independentes. O primeiro
fundamento reside na aplicação do princípio federativo ao caso, porque aconcessão do
benefício foi realizada no exercício da competência tributária estadual eem observância
aum objetivo de envergadura constitucional, importando em renúncia fiscal estadual
direcionada à indução do desenvolvimento econômico regional. O segundo
fundamento utilizado pelo Tribunal reside na proibição de extensão da regra que
confere competência àUnião para tributar olucro de pessoas jurídicas. Para oTribunal,
aapuração do lucro tributável não poderia levar em consideração elementos estranhos
àquilo que pretendem medir, motivo pelo qual ainclusão do valor correspondente ao
crédito presumido de ICMS na base de cálculo do IRPJ eda CSLL seria indevida.
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2.3.16 O Tribunal, portanto, considerou irrelevante aforma como adesoneração


proporcionada pelo incentivo teria sido registrada na contabilidade do contribuinte,
rechaçando expressamente o entendimento de que o crédito presumido de ICMS
acarretaria um aumento indireto no lucro do contribuinte. Desse modo, verifica-se que,
embora oprecedente firmado por este Superior Tribunal de Justiça tenha reconhecido
que o alívio fiscal proporcionado por benefício fiscal estadual não caracteriza lucro
tributável esua tributação viola diretamente oprincípio federativo, aUnião realiza urna
interpretação restritiva do precedente, introduzindo um novo critério jurídico para,
mediante oemprego da técnica da dissociação, afastar aconclusão tornada de modo
definitivo por este Tribunal.

2.3.17 A dissociação caracteriza-se como uma técnica interpretativa que consiste


em atribuir a termos ou expressões um significado menos extenso do que aquele
legalmente previsto, de modo aexcluir do campo de aplicação normativa casos que
estariam abrangidos, sob aalegação de que olegislador teria feito (ou querido fazer)

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essa distinção se tivesse tomado em consideração os casos excluídos. 13 O intérprete, ao


examinar ofato hipotético "F", diferencia duas subclasses de fatos "Fl" e"F2" com base
na tese de que legislador não teria querido se referir atodos os fatos "F", mas apenas
àqueles incluídos na subclasse "F 1". Daí se dizer que o emprego da técnica da
dissociação resulta em uma interpretação restritiva da disposição normativa eenvolve
autilização da finalidade objetiva da lei ou da vontade presumida do legislador.

2.3.18 É precisamente essa atécnica interpretativa utilizada pela União. Com


efeito, ao examinar ahipótese "F" ("redução do ICMS devido em razão da concessão de
benefício fiscal estadual"), aUnião diferencia asubclasse de fatos "F 1" ("redução do
ICMS devido em razão da concessão de benefício fiscal estadual registrado
contabilmente como uma 'grandeza positiva') da subclasse de fatos "F2" ("redução do
ICMS devido em razão da concessão de benefício fiscal estadual registrado
contabilmente como uma 'grandeza negativa') na suposição de que afinalidade legal
não abrangeria todos os fatos "F" ("redução do ICMS devido em razão da concessão de
benefício fiscal estadual"), mas apenas aqueles incluídos na subclasse "Fl" ("redução do
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ICMS devido em razão da concessão de benefício fiscal estadual registrado


contabilmente como uma 'grandeza positiva").

2.3.19 Ao assim proceder, aUnião viola tanto aigualdade quanto o caráter


vinculante do precedente examinado, por inserir na hipótese legal uma condição nela
não prevista, alterando-a. Onde está prescrita a "não-tributação do alívio fiscal
proporcionado por benefício fiscal estadual", aUnião lê "não-tributação do alívio fiscal
proporcionado por benefício fiscal estadual registrado contabilmente como uma
'grandeza positiva', sem qualquer justificativa normativa para tanto. Logo, a
interpretação conferida pela União termina por aplicar de modo anti-isonômico o
precedente fixado pelo próprio Superior Tribunal de Justiça. Ao fazê-lo, também acaba
por violar alegalidade, pela inserção de critério jurídico sem fundamento normativo.

2.3.20 E, em terceiro lugar, as considerações feitas até aqui levam auma outra
violação do ordenamento jurídico conectada àigualdade: aviolação àneutralidade da
tributação. Tributação neutra é aquela que respeita as atividades escolhidas pelos

13 GUASTINI, Riccardo. L'interpretazione dei documenti normativi. Milano: Giuffrè, 2004. p. 164.

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contribuintes, sem atingir elementos que lhe são inerentes esem deixar determinados
grupos em situação desfavorável do ponto de vista tributário.' Ao estabelecer uma
tributação diferente com base somente na forma pela qual são concedidos benefícios
fiscais estaduais eno modo como são escriturados pelo contribuinte (como "grandeza
positiva" ou como "grandeza negativa"), ainterpretação sustentada pela União viola a
neutralidade tributária, pois vincula aocorrência do fato gerador dos tributos federais
controvertidos ao modo pelo qual o alívio fiscal proporcionado por benefícios
equivalentes éregistrado no patrimônio do particular. Noutros termos: haverá oneração
daqueles contribuintes que recebem benefícios fiscais na forma de uma "grandeza
negativa", mas não daqueles contribuintes que os recebem na forma de uma "grandeza
positiva", sem que haja uma razão justificadora para esse tratamento.'

2.3 .21 Mas não apenas isso: ainterpretação sustentada pela União também viola
aneutralidade tributária porque vincula aocorrência do fato gerador dos tributos
federais controvertidos àforma pela qual o Ente estadual exerce asua competência
tributária e, consequentemente, dispõe de sua autonomia. É dizer, haverá oneração
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daqueles benefícios fiscais concedidos na forma de uma "grandeza negativa", mas não
daqueles incentivos concedidos na forma de uma "grandeza positiva", sem que haja
uma razão justificadora para esse tratamento. Em termos práticos, aprevalecer atese da
União, será criado um incentivo para que que os Estados maximizem aeficácia de seus
benefícios fiscais concedendo apenas créditos presumidos de ICMS, em substituição às
outras modalidades de incentivos fiscais, tão somente para escapar do "pedágio
federativo" imposto pelos tributos federais que seriam exigidos nessas situações.

2.3.22 Diante do exposto, tem-se que atributação de diferentes modalidades de


benefícios fiscais de ICMS viola aigualdade sob três perspectivas: primeiro, no plano da
interpretação, porque reconstrói norma que estabelece elemento indicativo inválido
para verificação da medida de comparação, isto é, o modo como alívio fiscal

14 ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. 4a ed. São Paulo: Malheiros, 2021, p. 97 ess.
RAUPACH, Arndt. Mindestbesteuerung im Einkommen und Kõrperschaftsteuerrecht. In: Verluste
im nationalen und Internationalen Steuerrecht. LEHNER, Moris (org.). München: Beck, 2004. p. 57.

15 HEINRICH, Johannes. Verluste im Fali der Rechtsnachfolge und des Gesellschafterwechsels. In:
Verluste im Steuerrecht. VON GROLL, Rüdiger (Org.). Kõln: Otto Schmidt, 2005, p. 145.
HACKEMACK, Sebastian. Der Verlustabzug im Umwandlungssteuerrecht. Hamburg: Kovac, 2010, p.
134.

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proporcionado pelo incentivo éimpertinente para identificar violação ao princípio


federativo ou àapuração de lucro tributável; segundo, no plano da aplicação, pois
emprega norma que gera efeitos anti-isonômicos, ao determinar, sem base normativa,
a aplicação da tributação de forma diferente a depender do modo pelo qual esses
benefícios são escriturados na contabilidade do particular; eterceiro, por desrespeitar a
neutralidade tributária, pois onera uma determinada classe de contribuintes com base
em elemento eminentemente particular, sem que haja razão justificadora para esse
tratamento.

3. CONCLUS ÕES

3.1 Todo oexposto permite concluir que adecisão proferida nos Embargos
de Divergência no Recurso Especial no. 1.517.492/PR não se limita ao reconhecimento
da ilegalidade da inclusão dos créditos presumidos de ICMS da base de cálculo do IRPJ
eda CSLL, alcançando, do mesmo modo, os demais benefícios fiscais de ICMS, pelas
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seguintes razões aqui sumarizadas:

1) examinados os fundamentos fáticos ejurídicos adotados como razão de


decidir no aludido precedente, verifica-se que inexistem diferenças
juridicamente relevantes entre os benefícios fiscais de ICMS concedidos
sob a forma de crédito presumido e aqueles concedidos sob outras
modalidades que justifiquem adiferenciação proposta pela União;

2) em primeiro lugar, porque da perspectiva jurídico-tributária, o


relevante para determinar anatureza das normas que conferem benefícios
fiscais éafinalidade visada pela criação da própria norma, de modo que
todas as normas que conferem benefícios fiscais, independentemente da
sua modalidade, afetam negativamente o valor do crédito tributário,
reduzindo ou mesmo eliminando acarga fiscal com oobjetivo prevalente
de alcançar uma finalidade extrafiscal reputada constitucionalmente
relevante pelo Ente estadual concedente;

3) em segundo lugar, porque opróprio ordenamento jurídico brasileiro


confirma a inexistência de diferenças relevantes, seja porque a
Constituição Federal estabeleceu aequivalência prática do alívio fiscal

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proporcionado por todas as demais espécies de benefícios fiscais ao


condicionar indistintamente asua concessão ou revogação àedição de lei
específica eàobservância dos limites estabelecidos por lei complementar,
seja porque a legislação complementar fixou que a concessão ou a
revogação de todos os benefícios fiscais estaduais devem ser formalizadas
por meio de convênios celebrados e ratificados pelos Estados e pelo
Distrito Federal, sem traçar distinção quanto ao modo que cada benefício
atua sobre arelação obrigacional tributária;

4) e, em terceiro lugar, porque opróprio Superior Tribunal de Justiça tem


jurisprudência consolidada reconhecendo que as distintas modalidades de
benefícios fiscais são semelhantes para fins jurídico-tributários;

5) em razão da inexistência de diferenças juridicamente relevantes entre os


benefícios de ICMS concedidos sob aforma de crédito presumido esob
outras formas (e.g., isenção, reduções de base de cálculo), também não há
diferenças com relação àaplicação do princípio federativo eda regra que
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

delimita abase de cálculo do IRPJ eda CSLL às distintas modalidades de


benefícios fiscais de ICMS;

6) no que tange ao princípio federativo, oque se verifica éque, de um lado,


em todos os benefícios fiscais, oEnte estadual renuncia àreceita fiscal com
afinalidade de incentivar aadoção de determinado comportamento pelo
contribuinte, motivo pelo qual eventual tributação desses valores implica
aretirada, por via oblíqua, do incentivo fiscal então outorgado;

7) de outro lado, epor causa disso, atributação por IRPJ eCSLL sobre tais
benefícios configura uma interferência indevida na política fiscal adotada
pelo Ente estadual; assim, aprevalecer atese da União, atributação federal
da renúncia fiscal implicará acobrança de um "pedágio federativo" (o
Estado até poderá conceder obenefício de X ao contribuinte, desde que a
ele acresça ovalor correspondente ao IRPJ eCSLL);

8) oque tange ao dever de congruência entre abase de cálculo do IRPJ e


da CSLL esuas respectivas materialidades, também nos casos de benefícios
fiscais de ICMS concedidos sob forma diversa do crédito presumido o
valor aeles correspondentes representa elemento estranho àmaterialidade

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STJ-Petição Eletrônica (PET) 00374221/2023 recebida em 26/04/2023 08:34:10 (e-STJ Fl.2041)

HUMBERTO Á
VILA
Professor Titular da Universidade de São Paulo

desses tributos, não podendo, dessa forma, integrar sua base de cálculo: o
benefício fiscal, justamente em razão do seu caráter extrafiscal, visa a
promover uma finalidade constitucionalmente relevante por meio da
concessão de um estímulo financeiro ao contribuinte para que este não
comprometa asua lucratividade ao aderir ao comportamento incentivado;

9) essas considerações demonstram ainda que ainterpretação restritiva


que aUnião pretende conferir ao precedente do Superior Tribunal de
Justiça viola aigualdade sob três perspectivas distintas: (i) primeiro, sob o
ponto de vista da interpretação da lei, porque sustenta norma que
estabelece elemento indicativo inválido da medida de comparação; (ii)
segundo, sob oponto de vista da aplicação da lei, porque visa àaplicação
da lei edo próprio precedente de maneira anti-isonômica; e(iii) terceiro,
sob oponto de vista da neutralidade da tributação, porque cria incentivo
para que que os Estados maximizem aeficácia de seus benefícios fiscais
concedendo apenas crédito presumido de ICMS, em substituição às outras
modalidades de incentivos fiscais, tão somente para escapar do "pedágio
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS

federativo" imposto pelos tributos federais que seriam exigidos nessas


situações.

10) todo oexposto revela aimprocedência da argumentação da União e,


consequentemente, o dever de observância ao precedente fixado nos
Embargos de Divergência no Recurso Especial n°. 1.517.492/PR para
reconhecer ailegalidade da inclusão dos valores relativos àrenúncia fiscal
estadual da base de cálculo do IRPJ eda CSLL.

São Paulo, 18 de abril de 2023.

Humberto Ávila

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