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2001)
HUMBERTO Á
VILA
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M EMORIAIS
CONSULENTE
COSAN S/
A
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS
OBJ
ETO
I
MPOSTO DE RENDA DA PESSOA JURÍ
DICA —IRP J. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQ UIDO —
CSLL .I
LEGALIDADE DA TRIBUTAÇ ÃO DE BENEF Í
CIOS FISCAIS ESTADUAIS. PRECEDENTE ESTABELECIDO
DISTINÇÃO PRETENDIDA. I
NTERFER ÊNCIA DA UNIÃO FEDERAL NA POL Í
TICA FISCAL ADOTADA PELOS
PRINC I
PIO FEDERATIVO. I
NEXIST ÊNCIA DE LUCRO TRIBUT ÁVEL. VIOLAÇÃOÀIGUALDADE.
SUM ÁRIO
1. A CO NSU LTA. 2. OS MEM ORIAI S.2.1 O PRECEDENTE FIXAD O NOS EMBA RGOS DE DIVE RGÊNC IA
EM RECURSO ES PE CIAL No. 1.517.492/PR. 2.2 A AB RANGÊNC IA DO PRE CEDEN TEPA RAOS DEMAI S
BE NEF ÍC I
OS FI SC AI S DE ICMS. 2.3 A PRO IBIÇ ÃO DE TRATAMEN TO DI SCR IMI NATÓRI O. 3.
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1. A CONSULTA
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pela União Federal, dos valores correspondentes abenefício fiscal estadual levaria ao
esvaziamento ou àredução do respectivo incentivo, razão pela qual estaria caracterizada
interferência indevida na competência tributária estadual capaz de violar os princípios
federativo eda segurança jurídica.
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pelo IRPJ epela CSLL, pela União, sobre qualquer tipo de benefício fiscal estadual
implicaria a retirada, por via oblíqua, do estímulo concedido pelo ente estadual à
promoção de objetivos públicos de relevância constitucional. Com isso, atributação
federal representaria interferência indevida no exercício da política fiscal estadual,
comprometendo asua autonomia eresultando em violação aos princípios federativo e
da segurança jurídica. Logo, também nessas outras hipóteses de benefícios fiscais
inexistiria lucro tributável.
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2. O SMEMORIAIS
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atua não apenas dentro de um âmbito de ação permitido por uma legislação que
estabelece apenas uma moldura para ação, mas também dentro de um âmbito de ação
estimulado por uma legislação -e, portanto, pelo Estado, que induz asua ação. 2
1ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade. 4a ed. São Paulo: Malheiros/Jus Podium, 2021, p. 169.
2 ARCOS RAMIREZ. Federico. La seguridad jurídica: una teoria formal, Madrid, Dykinson, 2000, p.
265; STÕTZEL, Martin. Vertrauensschutz und Gesetzesrückwirkung, Frankfurt am Main, Peter Lang,
2002, p. 183.
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2.1.7 Com efeito, oque se extrai do voto da Relatora para oacórdão, Ministra
Regina Helena Costa, éjustamente apretensão de justificar averdade de cada uma das
premissas acima mencionadas a fim de corroborar sua conclusão. Com relação à
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No modelo federativo fiscal, aConstituição dita oque pode cada pessoa política
realizar em matéria tributária, demarcando os respectivos âmbitos de atuação,
no intuito de evitar conflitos entre aUnião, os Estados-membros, o Distrito
Federal eos Municípios.
2.1.8 Com relação àPremissa 2, nos termos do voto da Ministra Regina Helena
Costa, aautonomia decisória para exercício da competência tributária compreende ao
mesmo tempo opoder de tributar eopoder de conceder incentivos fiscais, porque esses
dois poderes são faces da mesma moeda. Édizer, como uma das formas de assegurar a
autonomia constitucionalmente conferida às unidades da federação épor meio da
garantia de que cada uma delas terá sua própria fonte de custeio, disso também decorre
que o poder de renunciar às receitas por meio da concessão de incentivos fiscais
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encontra-se exclusivamente nas mãos do Ente que detém aprópria competência para
tributar. Esse entendimento deflui do seguinte trecho:
Anote-se tratar-se de tributo que, por constituir urna das principais fontes de
receita para custeio do aparato estatal, assegura condições para o exercício
desembaraçado da autonomia constitucionalmente conferida às unidades da
Federação.
2.1.9 Mais ainda: para oTribunal, opoder de renunciar areceitas fiscais por
meio da concessão de benefícios fiscais guarda estrita relação com apromoção de
finalidades extrafiscais, isto é, com o incentivo à adoção de comportamentos pelo
contribuinte que promovam alguma finalidade constitucionalmente relevante. Assim o
trecho pertinente:
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Nesse sentido, se oobjetivo de um Ente édesonerar uma operação qualquer, por meio
da concessão de benefícios fiscais, para alcançar uma finalidade que reputa
constitucionalmente relevante, atentativa de outro Ente de tributar ovalor desonerado
interfere na autonomia decisória precisamente porque compromete afinalidade que o
primeiro pretendeu alcançar. Novamente, esse entendimento éextraído diretamente do
acórdão, na seguinte passagem:
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de cálculo do IRPJ e do CSLL não podem conter elementos estranhos àquilo que
pretendem medir, motivo pelo qual ainclusão do valor correspondente ao crédito
presumido de ICMS na base de cálculo do IRPJ eda CSLL seria contrária àConstituição
eàlei instituidora de cada um desses tributos. Em termos analíticos, essa argumentação
pode ser decomposta do seguinte modo:
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afirmar que as bases de cálculo do IRPJ eda CSLL alcançam apenas os acréscimos de
riqueza que se integram de modo definitivo no patrimônio do contribuinte, já que a
materialidade desses tributos diz respeito à riqueza efetivamente percebida pelo
contribuinte.
(...) Por fim, cumpre registrar, dada a estreita semelhança axiológica com o
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4 PECZENIK, Aleksander. On Law and Reason. Sweden: Springer, 2008, p. 272; SCHAUER, Frederick.
"Precedent". In: Stanford Law Review, Vol. 39, no. 3, Stanford Law Review: February, 1987. p. 571-605
(588).
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essas diferenças são juridicamente relevantes, isto é, se são suficientes para computar os
valores correspondentes ao benefício fiscal de ICMS nas bases de cálculo do IRPJ eda
CSLL sem que haja igual violação aos princípios federativo eda segurança jurídica,
como sucede com a inclusão dos valores atinentes ao benefício fiscal de crédito
presumido de ICMS.
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2.2.8 Logo, muito embora possam ser apontadas diferenças com relação ao
modo corno atuam sobre arelação obrigacional tributária, tanto ocrédito presumido
de ICMS quanto os demais benefícios fiscais desse imposto promovem, independente
da forma como concedidos, o"alívio fiscal" proporcionado pelo Ente estadual para que
o fim almejado seja efetivamente promovido. Isso porque é a redução do custo
tributário relativo ao ICMS de determinada atividade que estimula o contribuinte a
desenvolvê-la; eéaadoção desse comportamento pelo contribuinte que contribui para
apromoção do objetivo constitucionalmente relevante almejado pelo Ente estadual.
Isso quer dizer que, muito embora cada espécie de incentivo ou benefício fiscal atue
sobre arelação obrigacional tributária àsua própria maneira, por representarem todos
elas uma redução, direta ou indireta, do ônus tributário suportado pelo particular e
pretenderem influenciar o seu comportamento, não há nenhuma distinção
juridicamente relevante entre as distintas espécies de benefícios fiscais com relação ao
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5 STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 5.929/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em
14.02.2020, line de 06.03.2020; STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 5.882/SC, Tribunal Pleno, Rel. Min.
Gilmar Mendes, julgado em 16.05.2022, DJe de 02.062022.
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2.2.11 Sobre esse último aspecto, cumpre referir que aLei de Responsabilidade
Fiscal (Lei complementar n° 101/00) estabelece que "a concessão ou ampliação de
incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá
estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em
que deva iniciar sua vigência enos dois seguintes" (art. 14). Ou seja, havendo uma
desoneração tributária que implique em perda de arrecadação, éindispensável que seja
veiculada por meio de lei específica para que seja oportunizada adeliberação legislativa
sobre os seus impactos financeiros eorçamentários. Em face disso, como os benefícios
fiscais enumerados são equivalentes sob aperspectiva da desoneração proporcionada
ao contribuinte eda renúncia fiscal observada pelo Ente federativo concedente, otexto
constitucional buscou atribuir omesmo tratamento normativo para asua concessão.
Daí iniciar odispositivo com apalavra "qualquer".
Art. 155. Compete aos Estados eao Distrito Federal instituir impostos sobre:
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(guerra fiscal), em prejuízo, em última análise, para opróprio federalismo fiscal. 6 Essa
exigência constitucional restou satisfeita pela recepção constitucional da Lei
Complementar n°. 24/75, segundo a qual aconcessão ou arevogação de todos os
incentivos ou benefícios fiscais estaduais, sem qualquer distinção quanto ao modo que
atuam sobre arelação obrigacional tributária, devem ser formalizadas por meio de
convênios celebrados eratificados pelos Estados epelo Distrito Federal:
6 STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 5.467/MA, Tribunal Pleno, Rel. MM. Luiz Fux, julgado em
30.08.2019, DJe de 16.09.2019; STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 4.276/MT, Tribunal Pleno, Rel. Min.
Luiz Fux, julgado em 20.08.2014, DJe de 18.09.2014; STF, Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 2.823/MT,
Tribunal Pleno, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 19.12.2018, DJe de 14.02.2019.
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2.2.16 Em especial, chama aatenção ofato de que aratio decidendi adotada nos
respectivos julgados reconhece aaplicação da norma prevista no artigo 178 do Código
Tributário Nacional para outros benefícios fiscais, que não aisenção, porquanto os seus
destinatários "encontram-se em posição equivalente no que tange ao resultado prático
do alívio fiscal". É dizer, ajurisprudência do Tribunal reconhece que não há qualquer
diferença prática quanto aos efeitos da redução do ônus tributário imposto ao particular
por meio da concessão de benefícios fiscais, quando se pretende estimular aadoção de
certos comportamentos pelo contribuinte que contribuam para apromoção de um
objetivo reputado constitucionalmente como relevante pelo Poder Público.
presumido, seja ele isenção, redução da base de cálculo ou alíquota zero, éirrelevante
no que diz respeito ao estímulo oferecido para a prática de comportamentos
compatíveis com aqueles objetivos desejados pelo Poder Público. O que importa éque
odesenvolvimento da atividade econômica incentivada depende da redução do ônus
tributário proporcionada pela concessão do benefício fiscal estadual.
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ICMS envolveria uma renúncia fiscal por parte do Ente estadual eque, portanto, a
tributação desses valores implicaria aretirada, por via oblíqua, do incentivo fiscal então
outorgado no exercício da competência tributária estadual. O mesmo ocorre
relativamente aos benefícios fiscais concedidos sob outras modalidades, como isenção,
redução da base de cálculo e alíquota zero, dentre outros. Também neles, o Ente
estadual renuncia à receita fiscal com a finalidade de incentivar a adoção de
determinado comportamento pelo contribuinte, motivo pelo qual eventual tributação
desses valores implicaria aretirada, por via oblíqua, do incentivo fiscal então outorgado,
do seguinte modo:
1
IRPJ +CSLL
Li
-x
X —(IRPJ +CSLL)
2.2.20 Em outras palavras: atributação, por meio do IRPJ eda CSLL do valor
correspondente ao benefício fiscal de ICMS concedido pelo Estado, qualquer que seja a
sua modalidade, reduz opróprio valor do benefício fiscal inicialmente conferido pelo
Estado. Embora oEstado tenha pretendido influenciar aadoção de um comportamento
pelo contribuinte oferecendo-lhe um incentivo de X, esse incentivo éreduzido, por via
oblíqua, pela União, de modo que oincentivo se torna X -(IRPJ +CSLL). O problema
desse cenário reside precisamente no fato de que o Estado planejou suas finanças e
organizou suas políticas públicas confiando que estaria transferindo ao contribuinte o
valor de X, enão X -(IRPJ +CSLL), como forma de influenciar oseu comportamento.
2.2.21 Exatamente por isso, oque se verifica, de outro lado, éque atributação
pelo IRPJ epela CSLL sobre benefícios fiscais, qualquer que seja amodalidade sob a
qual tenham sido outorgados, configura uma interferência indevida na política fiscal
adotada pelo Ente estadual. Há aqui violação da autonomia estadual assegurada pelo
princípio federativo para o exercício de sua competência tributária. Conforme
demonstrou a análise do precedente fixado pelo Superior Tribunal de Justiça, a
tributação do crédito presumido de ICMS por IRPJ eCSLL configura invasão, por parte
da União, da esfera de poder do Estado.
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X + (IRPJ +CSLL)
Benefício fiscal conferido Benefício fiscal conferido Benefício fiscal que teria que ser conferido
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pelo Estado pelo Estado caso haja pelo Estado caso (i) desejasse incentivar o
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podendo, dessa forma, integrar sua base de cálculo. Ao conceder um benefício fiscal de
ICMS, seja por meio de crédito presumido, seja por meio de isenção, redução de base
de cálculo e.g., o Estado não aumenta necessariamente o lucro tributável do
contribuinte. Eisso pela singela razão de que obenefício fiscal, justamente em razão do
seu caráter extrafiscal, visa apromover uma finalidade constitucionalmente relevante
por meio da concessão de um estímulo financeiro ao contribuinte para que este não
comprometa asua lucratividade ao aderir ao comportamento incentivado.
2.2.25 O alívio fiscal criado pelo benefício éum verdadeiro estímulo financeiro
para a adoção de um comportamento desejado. Nesse sentido, enquanto estímulo
financeiro, o benefício fiscal pode ser direcionado para pelo menos três situações
distintas:
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2.2.29 A União, por sua vez, sustenta que haveria um duplo lucro do
contribuinte: (i) primeiro, em razão do benefício fiscal conferido pelo Estado; e(ii)
segundo, eem momento posterior, em razão do aumento de vendas que gera efetivo
incremento do seu lucro. O que se nega aqui ésimplesmente aexistência de lucro no
primeiro momento, em razão da mera concessão de um benefício fiscal pelo Estado para
incentivar aadoção de um determinado comportamento pelo contribuinte. O efetivo
lucro, por sua vez, será devidamente tributado pela União.
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condições: (i) competência de um Ente para tributar; e(ii) pretensão de outro Ente de
afastar o exercício da competência tributária do primeiro. Ocorre que, conforme
decidido pelo próprio Superior Tribunal de Justiça, aUnião não tem competência para
tributar os valores que não guardam vínculo de pertinência com amaterialidade do IRPJ
eda CSLL, pois de um resultado líquido decorrente da venda de mercadorias, mas de
uma atuação estatal destinada apromover uma finalidade pública. Se aUnião não tem
competência para exigir IRPJ eCSLL sobre os valores correspondentes abenefícios
fiscais de ICMS, qualquer que seja amodalidade sob aqual foram concedidos, então é
evidente que não há qualquer violação àregra que proíbe aconcessão de isenções
heterônomas. De modo simplificado: adesoneração indevida por um Ente pressupõe a
existência de oneração devida por outro Ente, o que não se vislumbra nas hipóteses
deste caso.
2.2.32 Por fim, também não se alegue que os outros benefícios fiscais diversos do
crédito presumido, como isenção e redução de base de cálculo, promoveriam
diretamente uma redução do ICMS devido e, por conta disso, afinalidade almejada
(reduzir o preço final da mercadoria para o consumidor) seria automaticamente
alcançada enão restaria afetada pela posterior tributação do lucro da empresa pelo IRPJ
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epela CSLL. Para melhor entender por que esse argumento está equivocado, épreciso
decompô-lo analiticamente.
2.2.35 Esse argumento, com adevida vênia, não procede. Enão procede porque
ele parte do pressuposto de que haveria uma diferença substancial entre carga tributária
decorrente de tributo indireto (ICMS), que incide na operação de venda eafeta opreço
da mercadoria vendida como tributo incluído no preço, ecarga tributária decorrente de
tributos diretos (IRPJ e CSLL), que são pagos pela empresa e afetam o preço da
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mercadoria vendida como elemento que compõe oseu custo. Ora, nos dois casos -como
tributo embutido no preço ou como custo (de tributo direto) embutido no preço -, a
carga tributária será suportada pelo consumidor final.
2.2.37 Mas se nos dois casos opreço final do produto será afetado, então ser o
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inclusão afeta apromoção do fim que oEstado quis promover com asua concessão,
então, por igual razão, deve afastar ainclusão dos valores das isenções edas reduções
de base de cálculo na base de cálculo do IRPJ eda CSLL porque sua inclusão também
afeta apromoção do fim que oEstado quis promover com asua concessão.
2.2.40 Sendo tudo isso verdadeiro, não há dúvidas de que apretensão da União
de atribuir tratamento tributário distinto para benefícios fiscais de ICMS simplesmente
em razão da modalidade sob a qual foram concedidos implica ainda tratamento
discriminatório. Éoque se passa ademonstrar.
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2.3.2 Isso significa que aUnião defende que omodo pelo qual aredução do
ônus tributário éregistrada na contabilidade do particular definiria aprópria natureza
jurídica da parcela e, portanto, asua tributação pelo IRPJ epela CSLL: se obenefício
fiscal de ICMS oportunizar a compensação do imposto devido e for registrado
contabilmente como um acréscimo de uma "grandeza positiva" no patrimônio do
contribuinte, então oganho obtido com oincentivo deverá ser excluído na apuração do
lucro tributável do exercício; no entanto, se obenefício fiscal de ICMS importar na
redução do imposto incidente efor registrado contabilmente como uma "grandeza
negativa" no patrimônio do contribuinte, então oganho obtido com oincentivo deverá
ser considerado na apuração do lucro tributável do exercício. Esta diferenciação,
contudo, viola aigualdade.
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2.3.3 A igualdade éum princípio relacional, cuja definição diz respeito àrelação
entre dois ou mais sujeitos, com base em medida ou critério de comparação, aferido por
meio de elemento indicativo, que sirva de instrumento para a realização de uma
determinada finalidade. 7 Para o Direito, portanto, não importa apenas saber se as
pessoas são ou não são iguais (igualdade descritiva) de acordo com um determinado
critério (idade, sexo, data de nascimento ou tipo de atividade, por exemplo), mas sim se
as pessoas devem ou não ser tratadas igualmente (igualdade prescritiva).
7 ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade. 4a ed. São Paulo: Malheiros/Juspodium, 2021, p. 45.
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relevante para determinar otratamento aser conferido acada espécie de benefício fiscal
ésaber se eles proporcionam um alívio fiscal como forma de induzir ocomportamento
do contribuinte em direção auma finalidade extrafiscal constitucionalmente relevante.
O critério, portanto, independe da forma como obenefício fiscal atua sobre arelação
obrigacional tributária (redução do imposto devido ou redução do imposto incidente)
ou ainda do modo pelo qual aredução do ônus tributário éregistrada na contabilidade
do particular (acréscimo de um elemento positivo ou decréscimo de um elemento
negativo), mas sim do seu conteúdo (alívio fiscal proporcionado com opropósito de
atingir um objetivo constitucionalmente relevante).
2.3.7 A interpretação conferida pela União, contudo, faz com que anatureza
jurídica da parcela seja definida pela maneira como oparticular registra asua entrada
em seu patrimônio, se como adição de um elemento novo epositivo ou como subtração
ou redução de um elemento negativo. Isto é, adepender do modo como obenefício
fiscal foi escriturado na contabilidade do contribuinte, então orespectivo valor será
8 Ibidem, p. 44-45.
9 ÁVILA, Humberto. Conceito de Renda ecompensação de prejuízos fiscais. São Paulo: Malheiros, 2011,
p. 23.
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2.3.9 No caso concreto, por força do precedente fixado pelo Superior Tribunal
de Justiça nos Embargos de Divergência no Recurso Especial n°. 1.517.492/PR, há duas
medidas de comparação relevantes para atributação pelo IRPJ epela CSLL. A primeira
consiste na existência de um valor que corresponde auma renúncia fiscal por um Ente
da Federação. A segunda consiste na existência de efetivo acréscimo patrimonial, ou
seja, ingresso de uma riqueza nova no patrimônio do particular que seja indicativa de
capacidade contributiva. Contudo, apesar da decisão definitiva proferida pelo Superior
Tribunal de Justiça, a União sustenta que a medida de comparação a ser adotada
concerne exclusivamente à forma de concessão do benefício fiscal, cujo elemento
indicativo éoseu modo de contabilização: se ingresso de uma "grandeza positiva", então
ausência de lucro tributável; e, se ingresso de uma "grandeza negativa", então existência
de lucro tributável.
°
1 ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade. 4a ed. São Paulo: Malheiros/Juspodium, 2021, p. 50-66.
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2.3.11 De um lado, não há relação fundada porque inexiste suporte empírico que
dê supedâneo ao fato de que omodo como oalívio fiscal proporcionado pelo benefício
éregistrado na contabilidade do particular seria determinante para caracterizá-lo como
renúncia fiscal do Ente estadual ou mesmo lucro tributável do contribuinte. Reitera-se:
referidas parcelas, ainda que registradas como "grandezas negativas", caracterizam um
alívio fiscal proporcionado pelo Ente estadual com o propósito de induzir o
comportamento do contribuinte em direção a uma finalidade extrafiscal
constitucionalmente relevante. De outro lado, não há relação conjugada porque o
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incluído numa classe, mesmo que —eis oponto —ele não seja igual aos demais
com base em outros elementos não considerados relevantes pelo padrão legal."
2.3.14 Desse modo, caso prevalecesse ainterpretação conferida pela União, sua
aplicação necessariamente seria realizada de modo anti-isonômico porque haveria
distinção entre contribuintes que não foram diferenciados nem pela legislação, nem
pelo próprio Superior Tribunal de Justiça. Os contribuintes que recebem crédito
presumido de ICMS eque registram contabilmente oalívio fiscal proporcionado pelo
benefício como uma "grandeza positiva" na sua contabilidade não sofrerão aincidência
tributária do IRPJ eda CSLL sobre essa parcela, enquanto os contribuintes que recebem
outras modalidades de benefício fiscal estadual e registram o mesmo alívio fiscal
proporcionado como uma "grandeza negativa" na sua contabilidade serão tributados.
Viola-se, assim, aum só tempo, alegalidade, pela instituição de critério de tributação
11 ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade. 4a ed. São Paulo: Malheiros/Juspodium, 2021, p. 121-122.
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não previsto em lei eem violação nítida ao precedente fixado pelo Superior Tribunal de
Justiça, eaigualdade, pelo tratamento diferenciado para indivíduos que se encontram
na mesma situação.
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2.3.20 E, em terceiro lugar, as considerações feitas até aqui levam auma outra
violação do ordenamento jurídico conectada àigualdade: aviolação àneutralidade da
tributação. Tributação neutra é aquela que respeita as atividades escolhidas pelos
13 GUASTINI, Riccardo. L'interpretazione dei documenti normativi. Milano: Giuffrè, 2004. p. 164.
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contribuintes, sem atingir elementos que lhe são inerentes esem deixar determinados
grupos em situação desfavorável do ponto de vista tributário.' Ao estabelecer uma
tributação diferente com base somente na forma pela qual são concedidos benefícios
fiscais estaduais eno modo como são escriturados pelo contribuinte (como "grandeza
positiva" ou como "grandeza negativa"), ainterpretação sustentada pela União viola a
neutralidade tributária, pois vincula aocorrência do fato gerador dos tributos federais
controvertidos ao modo pelo qual o alívio fiscal proporcionado por benefícios
equivalentes éregistrado no patrimônio do particular. Noutros termos: haverá oneração
daqueles contribuintes que recebem benefícios fiscais na forma de uma "grandeza
negativa", mas não daqueles contribuintes que os recebem na forma de uma "grandeza
positiva", sem que haja uma razão justificadora para esse tratamento.'
2.3 .21 Mas não apenas isso: ainterpretação sustentada pela União também viola
aneutralidade tributária porque vincula aocorrência do fato gerador dos tributos
federais controvertidos àforma pela qual o Ente estadual exerce asua competência
tributária e, consequentemente, dispõe de sua autonomia. É dizer, haverá oneração
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daqueles benefícios fiscais concedidos na forma de uma "grandeza negativa", mas não
daqueles incentivos concedidos na forma de uma "grandeza positiva", sem que haja
uma razão justificadora para esse tratamento. Em termos práticos, aprevalecer atese da
União, será criado um incentivo para que que os Estados maximizem aeficácia de seus
benefícios fiscais concedendo apenas créditos presumidos de ICMS, em substituição às
outras modalidades de incentivos fiscais, tão somente para escapar do "pedágio
federativo" imposto pelos tributos federais que seriam exigidos nessas situações.
14 ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. 4a ed. São Paulo: Malheiros, 2021, p. 97 ess.
RAUPACH, Arndt. Mindestbesteuerung im Einkommen und Kõrperschaftsteuerrecht. In: Verluste
im nationalen und Internationalen Steuerrecht. LEHNER, Moris (org.). München: Beck, 2004. p. 57.
15 HEINRICH, Johannes. Verluste im Fali der Rechtsnachfolge und des Gesellschafterwechsels. In:
Verluste im Steuerrecht. VON GROLL, Rüdiger (Org.). Kõln: Otto Schmidt, 2005, p. 145.
HACKEMACK, Sebastian. Der Verlustabzug im Umwandlungssteuerrecht. Hamburg: Kovac, 2010, p.
134.
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3. CONCLUS ÕES
3.1 Todo oexposto permite concluir que adecisão proferida nos Embargos
de Divergência no Recurso Especial no. 1.517.492/PR não se limita ao reconhecimento
da ilegalidade da inclusão dos créditos presumidos de ICMS da base de cálculo do IRPJ
eda CSLL, alcançando, do mesmo modo, os demais benefícios fiscais de ICMS, pelas
Petição Eletrônica juntada ao processo em 26/04/2023 ?s 08:46:00 pelo usu?rio: SISTEMA JUSTIÇA - SERVIÇOS AUTOMÁTICOS
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Professor Titular da Universidade de São Paulo
7) de outro lado, epor causa disso, atributação por IRPJ eCSLL sobre tais
benefícios configura uma interferência indevida na política fiscal adotada
pelo Ente estadual; assim, aprevalecer atese da União, atributação federal
da renúncia fiscal implicará acobrança de um "pedágio federativo" (o
Estado até poderá conceder obenefício de X ao contribuinte, desde que a
ele acresça ovalor correspondente ao IRPJ eCSLL);
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VILA
Professor Titular da Universidade de São Paulo
desses tributos, não podendo, dessa forma, integrar sua base de cálculo: o
benefício fiscal, justamente em razão do seu caráter extrafiscal, visa a
promover uma finalidade constitucionalmente relevante por meio da
concessão de um estímulo financeiro ao contribuinte para que este não
comprometa asua lucratividade ao aderir ao comportamento incentivado;
Humberto Ávila
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