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Belém: música e identidade na cidade plural.

Henry Burnett
Henry Martin Burnett Junior nasceu na
cidade de Belém do Pará no ano de
1971, viveu na capital paraense até aos 27
anos. Morou em Campinas, Rio de
Janeiro, São Paulo e atualmente reside
em São José dos Campos/SP, onde é
professor livre-docente em Filosofia da
Universidade de São Paulo, UNIFESP. Em
Belém é professor convidado da Universidade
Federal do Pará onde também contribui
no programa PPGFIL. Atua com pesquisa e
desenvolvimento, Departamento de Filosofia,
músico e compositor há 20 anos, É o autor da
obra “meio-dia”, um relato biográfico,
romance de auto ficção, crônica de uma
história musical? Publicado no ano de 2021.
Como pesquisador é autor das obras
“Cinco prefácios para cinco livros
escritos: uma autobiografia filosófica de
Nietzsche” (2008), “Nietzsche, Adorno e
um pouquinho de Brasil” (2011) e “Para
ler o nascimento da Tragédia de
Nietzsche” (2012). Como músico, possui
4 CDs gravados sendo eles, “Linha
urbana” (1996); “Não Para Magoar”
(2006); “Interior”, em parceria com
Florencia Bernales (2007) e o livro/CD
Retruque/Retoque (2010), em parceria
com o poeta Paulo Vieira. Para os críticos
é considerado um compositor e escritor
com amplo domínio musical e filosófico.
"Quando se está imerso na
própria identidade
normalmente não sabemos
do que somos feitos."
Quem sois índio-mulato?

Foram décadas de silêncio midiático

30 anos
Quem sois índio-mulato?

• Foram décadas de uma auto-sustentação cultural, principalmente no


interior, já que a capital se comunicava com as ondas musicais de massa
de modo completo, bastando para isso relembrar o nome de dois eventos
que aconteceram durante muitos anos em Belém.

• Movimento de autoafirmação cultural pelo viés do combate.

• O grupo Arraial do Pavulagem foi o resultado da mudança.


O mercado de música local reagiu, mas não tinha a extensão pop
das aparelhagens de onde nasceu o Tecnobrega, permanecendo até
hoje como um entrave na cena local.

• A diferença entre os estilos musicais que marcaram a música popular em Belém


são distintos e causa estranheza para quem for compará-las.
Tamba-tajá (Waldemar Henrique) Beba doida (Gaby Amarantos)

"Tamba-tajá me faz feliz Tamba-tajá me faz feliz Ela tá beba, doida E vai pra cima da mesa.
Que meu amor me queira Que meu amor me Ela tá beba, doida Começa na cerveja
bem queira bem Ela tá beba, doida Bebe, à noite inteira
Que seu amor seja só meu Que seu amor seja só Tá beba, tá doida. Mistura tudo
de mais ninguém, meu de mais ninguém, Ela chegou E vai pra cima da mesa.
Que seja meu, todinho meu, Que seja meu, todinho Ela é um perigo Ela tá beba, doida
de mais ninguém meu, de mais Só sai da mesa Ela tá beba, doida
Tamba-tajá me faz feliz... ninguém... 30 anos Quando ela seca o litro. Ela tá beba, doida
Assim o índio carregou sua Tamba-tajá me faz Começa na cerveja, Tá beba, tá doida.
macuxy feliz... Bebe a noite inteira (Ela só sai carregada,
Para o roçado, para a guerra, Que mais ninguém Mistura tudo querida)
para a morte, possa beijar o que
Assim carregue o nosso beijei,
amor a boa sorte... Que mais ninguém
Tamba-tajá escute aquilo que
Tamba-tajá-a escutei,
Nem possa olhar dentro
dos olhos que olhei.
Tamba-tajá
Tamba-tajá-a
Sobre a questão da identidade

Esse tema nunca esteve presente Artistas e compositores como :


no horizonte dos belenenses: Nilson Chaves, Vital Lima, Walter
Freitas, Ronaldo Silva, Mestre
Ninguém nunca perguntou se Verequete, Mestre Vieira, Pinduca,
Pinduca, o “Rei do Carimbó”, era mais entre dezenas de outros, são
paraense que Walter Bandeira, que artistas centrais para o
foi o grande intérprete da cidade, entendimento da história da
embora fossem em alguma música popular do Pará.
medida opostos quanto ao recorte
estético e quanto à escolha do
repertório.
O livro: A música e os músicos do Pará,
de Vicente Salles,
Belém, Secult/Seduc/Amu, 2a ed., 2007.
Sobre a questão da identidade

O misto de orgulho e vergonha

Quando Gaby Amarantos aparece em cadeia nacional há quem se orgulhe e há


quem se envergonhe da representatividade. É uma opinião bastante complexa.

Em 1938 Mário de Andrade organizada a Missão de Pesquisas Folclóricas. A tarefa


era capturar em gravações, fotos e filmes as manifestações populares que todos
julgavam ameaçadas pela penetração das novas tecnologias e pelos processos iniciais de
veiculação comercial da música;
O registro de carimbó foi feito em São Luiz do Maranhão e o registro de boi-bumbá foi
gravado em Belém.
Não se sabe de nenhum cantador de carimbó maranhense que tenha levado adiante
aquele passado ligado ao estilo registrado pela equipe da Missão.
O que é ser
paraense dentro dessa
ausência de identificação
entre público e arte Que Belém é essa que
pública? gerou a impetuosa
A música representa, desde sempre, Gaby Amarantos?
a sociedade onde ela se produz.

A crença em uma homogeneidade


cultural, será que desapareceu ao longo
do tempo?

Como essa perda de autoidentificação


pode ter acontecido em tão poucos
anos?
• Quando se está imerso na própria identidade, ou
no que pensamos ser essa
delimitação, normalmente não sabemos do que
somos formados. A identidade não chega a ser
umaquestão quando não precisamos saber do
que somos feitos ou quando essa interrogação é vã
porque nada acrescenta ao que pensamos à vida
comum. Só quando a dinâmica cultural se impõe é
que nossa “marca” precisa ser impressa e às vezes
até mesmo defendida, porque já não basta
pertencer a este ou aquele lugar, mas
fundamentalmente mostrar do que
somos constituídos “de verdade”.
Coda
• O Tecnobrega prescindiu – sua origem e até onde se pode ver – dos
esquemas arranjados de divulgação.
• Essa defesa do conteúdo ideológico é na verdade um argumento falho,
porque o que está em pano de fundo é a defesa não do suposto conteúdo
revolucionário, mas dos aspectos culturais da cena musical.
• Henry Burnett diz ser necessários critérios alheios à audição e apreciação
musical para dar conta de sua dinâmica atual, ou mais, de que é
dispensável discorrer sobre questões de ordem qualitativa, a essa altura,
julga ele, inúteis.
• Tudo isso que movimenta o debate recente carece de algo essencial, e que
está para além do plano estético: tentar pensar a cidade que gerou essa
música sôfrega que tanto se difere daquele ambiente perdido do qual
muitos lamentam o fim. Essa mudança muitas vezes não é percebida por
quem vive nela.
• O Tecnobrega prescindiu – sua origem e até onde se pode ver – dos
esquemas arranjados de divulgação.
• Essa defesa do conteúdo ideológico é na verdade um argumento
falho, porque o que está em pano de fundo é a defesa não do suposto
conteúdo revolucionário, mas dos aspectos culturais da cena musical.
• Henry Burnett diz serem necessários critérios alheios à audição e
apreciação musical para dar conta de sua dinâmica atual, ou mais, de
que é dispensável discorrer sobre questões de ordem qualitativa, a
essa altura, julga ele, inúteis.
• Tudo isso que movimenta o debate recente carece de algo essencial,
e que está para além do plano estético: tentar pensar a cidade que
gerou essa música sôfrega que tanto se difere daquele ambiente
perdido do qual muitos lamentam o fim. Essa mudança muitas vezes
não é percebida por quem vive nela.

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