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CENTRO UNIVERSITÁRIO ESTÁCIO DO CEARÁ


CURSO DE DIREITO

Disciplina de TCC em Direito Processual Penal


Aluna: Maria Eduarda Rocha dos Santos

TRIBUNAL DO JÚRI: INFLUÊNCIA MIDIÁTICA NOS CRIMES DE


REPERCUSSÃO NACIONAL

FORTALEZA,
2022.2

MARIA EDUARDA ROCHA DOS SANTOS

TRIBUNAL DO JÚRI: INFLUÊNCIA MIDIÁTICA NOS CRIMES DE


REPERCUSSÃO NACIONAL
1

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


como requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Direito do Centro Universitário
Estácio do Ceará.

Professor Orientador: Cristiane Dupret


Filipe Pessoa

FORTALEZA,
Via Corpus,
2022.2

AGRADECIMENTOS

À Deus, por ter sido minha fortaleza, por me fazer ser forte e corajosa para
percorrer este caminho.
À minha mãe, Luciana, que sempre foi minha maior incentivadora durante esta
trajetória, que desde o início da graduação sonha com este momento. Que cuidou de
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mim desde sempre. Que me ensinou a perseguir os meus sonhos e jamais abaixar a
cabeça diante os percalços que esta vida pode trazer e a superar as inúmeras
dificuldades que surgiram durante este árduo caminho. Que sempre acreditou mais em
mim do que eu mesma. Sem ela, eu nada seria. À ela devo toda a minha vida. Nada será
suficiente para agradecê-la.
À minhas irmãs Vanessa e Vitória, pois esta conquista e os frutos que virão dela
serão sempre dedicadas a elas e para elas.
Ao meu irmão Pedro Henrique, pelas palavras de incentivo e de motivação, bem
como por ter tornado realidade um dos maiores sonhos de minha vida: conhecer meus
avós.
À minha irmã Ana Fabíola, a quem sempre me encorajou e por diversas vezes
me estendeu a mão quando precisei.
À minha irmã Amanda Vitória, que apesar de não conhece-la pessoalmente, sei
que estará sempre ao meu lado quando precisar.
Aos meus avós Luiza e Francisco Delfino (in memoriam), pois estão me
protegendo lá de cima e sei que estariam orgulhosos por esta conquista.
À minha tia Maria Neuma (in memoriam), por ter acreditado em mim até o
último dia de sua vida.
À minha avó Cecília, por me colocar sempre em suas orações.
À minha sobrinha Anaiza Barbalho, pela admiração e carinho que tem por mim.
À minha tia Geruza, por ter cuidado de mim juntamente com minha avó Cecília
e minha mãe, bem como por ter me ajudado de maneira bastante significativa durante a
minha vida.
Às minhas primas Jaqueline e Nágila, pelos momentos de alegria e experiências
compartilhadas.
À amiga e colega de trabalho Dra. Camila Furlan, não só pelas palavras de
motivação e incentivo, mas pelo conhecimento transmitido e por me fazer enxergar o
quão longe sou capaz de ir.
Às minhas amigas Dra. Léa Mont’Alverne e Dra. Marize Girão, por terem
acreditado em mim desde o início e não só por terem acompanhado a minha trajetória
profissional, mas também pelas palavras de apoio e incentivo durante a graduação.
Ao meu amigo e ex-chefe Dr. Miguel Vasconcelos, por todo o conhecimento e
experiências profissionais repassados, por todas as vezes que estendeu a mão e me
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ajudou a seguir em frente. Graças a ele, aprendi lições não só da advocacia, mas sim de
humanidade e companheirismo.
Ao meu amigo Antônio Vieira Cartaxo, pelas palavras de motivação e por todo
conhecimento transmitido.
Às minhas amigas e companheiras de trabalho Maria Gabrielly e Willia Soares
por terem compartilhado comigo tantas experiências e momentos incríveis.
À todos os meus professores, que sempre enxergaram em mim um grande
potencial.

TRIBUNAL DO JÚRI: INFLUÊNCIA MIDIÁTICA NOS CRIMES DE


REPERCUSSÃO NACIONAL

Maria Eduarda Rocha dos Santos1

RESUMO

1Aluna do 9º semestre do curso de direito do Centro Estácio do Ceará. Contato:


eduardarocha598@gmail.com
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O presente trabalho tem como tema “Tribunal do Júri: Influência Midiática nos Crimes
de Repercussão Nacional”. Tem como objetivo investigar como se dá a efetivação da
liberdade de imprensa e a interferência midiática na imparcialidade dos crimes de
repercussão nacional, e, ainda, até que ponto esta interferência pode ter relevância no
julgamento destes crimes que geram repercussão. No decorrer do trabalho, será
demonstrado como se deu a introdução do Tribunal do Júri no Brasil e seu breve
contexto histórico, bem como a estrutura das partes que compõem o corpo do júri e os
jurados, competência do tribunal e outros aspectos das garantias constitucionais
asseguradas e princípios norteadores. Por fim, será analisado os aspectos que envolvem
a influência da mídia na sociedade atual e como ela influencia nas decisões tomadas
durante os julgamentos de crimes dolosos contra a vida, tal como a maneira em que os
fatos veiculados pela mídia de maneira exorbitante e por vezes irresponsável, pode
colocar em jogo o futuro do réu que está diante o plenário de julgamento. Ademais,
foram selecionados três casos concretos de crimes de grande repercussão nacional e o
impacto e relevância que estes crimes trouxeram para os dias atuais.

PALAVRAS-CHAVES: Tribunal do Júri; Influência Midiática; Crimes de


Repercussão Nacional; Garantias fundamentais.

SUMÁRIO
INTRODUÇÃO, 2 BREVE CONTEXTO DO TRIBUNAL DO JÚRI NO
ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO; 2.1 ESTRUTURA DAS PARTES
QUE CONSISTEM O JÚRI E DOS JURADOS; 2.2 COMPETÊNCIA DO
TRIBUNAL; 2.3 ASPECTOS GERAIS DAS GARANTIA FUNDAMENTAIS E OS
PRINCÍPIOS NORTEADORES; 2.3.1 SOBERANIA DOS VEREDITOS; 2.3.2
SIGILO DAS VOTAÇÕES; 3 INFLUÊNCIA DA MÍDIA NA SOCIEDADE
ATUAL; 3.1 INFLUÊNCIA DA MÍDIA NO SISTEMA JURÍDICO PENAL
BRASILEIRO; 4 DOS CASOS MAIS EMBLEMÁTICOS DO TRIBUNAL DO
JÚRI; 4.1 INFLUÊNCIA MIDIÁTICA NO TRIBUNAL DO JÚRI 4.2 DA
INTERFERÊNCIA MIDIÁTICA NA IMPARCIALIDADE; CONCLUSÃO;
REFERÊNCIAS.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho de tema “Tribunal do Júri: A Influência Midiática nos


Crimes de Repercussão Nacional”, tem como base uma análise contextuada sobre a
influência da mídia nos julgamentos de crimes dolosos contra a vida perante a
instituição do Tribunal do Júri.
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A problemática surgiu da seguinte indagação: Quais os limites da liberdade de


impressa na influência dos crimes do tribunal do júri para que não sejam violados os
princípios constitucionais?
O objetivo principal é a análise da influência praticada pelos veículos de
comunicação na divulgação de notícias e detalhes de processos criminais para a
formação da opinião pública dentro destes contextos e o quão relevante se mostra o
modo em que as notícias são transmitidas aos espectadores destes conteúdos em nossa
sociedade.
Os objetivos são elencados da seguinte forma: Discorrer sobre o contexto
histórico do tribunal do júri no ordenamento jurídico brasileiro, citar e analisar a
estrutura das partes que consistem o júri e dos jurados além de apresentar a competência
do tribunal.
A escolha do presente tema deu-se a partir do interesse e indagações pessoais
sobre tal influência nas decisões efetivadas pelo júri popular brasileiro, visto o modo
desenfreado que as notícias sobre crimes tornaram-se tão banais perante a sociedade, de
forma em que a população tenha sua convicção formada a partir dos casos que mais
repercutiram no Brasil e de que modo esta veiculação de detalhes interfere no
julgamento perante ao tribunal do júri, uma vez que os crimes cada vez mais tornam-se
pautas de conversas e discussões no meio de uma sociedade completamente leiga sobre
tais assuntos e crucificando de todas as maneiras possíveis alguém que é acusado – e
não culpado perante à lei, de cometer um crime que pareça ser tão repugnante e cruel
aos olhos da sociedade, bem como que o desejo de justiça e a sensação de impunidade
possa vir à intervir no devido processo legal.
Para o desenvolvimento deste trabalho foi necessária uma análise de extenso
material bibliográfico de autores e juristas renomados, tais como Guilherme de Souza
Nucci, Paulo Rangel, Hermínio Alberto Marques Porto e da criminóloga Ilana Casoy
dentre outros.
Para a melhor compreensão, a estrutura do presente trabalho foi dividida em três
seções: Primeira seção: Contextualização da introdução do tribunal do júri no
ordenamento jurídico, bem como as partes e estruturas que compõem o júri, a
competência para julgar crimes dolosos contra a vida, os aspectos que envolvem
princípios e garantias fundamentais assegurados na Constituição Federal.
Segunda seção: A influência da mídia na sociedade atual e a sua influência no
sistema jurídico penal brasileiro. Terceira seção: Os casos mais emblemáticos do
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tribunal do júri, quais sejam, o Caso Richthofen, Caso Daniella Perez e Caso Isabella
Nardoni, bem como se dá a influência da mídia no tribunal do júri e na imparcialidade
dos jurados.

2 BREVE CONTEXTO DO TRIBUNAL DO JÚRI NO ORDENAMENTO


JURÍDICO BRASILEIRO

Começaremos nossa pesquisa trazendo uma definição de instituto júri, onde será
discorrido que a instituição do júri tem uma longa história. Ademais, será exposto que
existem algumas diferenças ao longo do tempo para decidir questões maiores gravidade
ou repercussões sociais, nesse contexto:
Na Palestina, havia o tribunal dos vintes e três, nas vilas em que a população
fosse superior a 120 famílias. Tais cortes conheciam e julgavam processos
criminais relacionados a crimes puníveis com pena de morte. Os membros
escolhidos dentre padres, levitas e principais chefes de Israel (NUCCI, 2008,
p. 41).

Conforme leciona Silva e Avelar (2022, on-line), há exatos 200 anos, o júri foi
constituído pelo decreto de "Sua Alteza Real" Regente Dom Pedro I. A história do júri
original brasileiro capaz de indiciar novos crimes não pode ser considerada linear.
Apresenta um dilema que reflete a era política e social de cada época. Em homenagem a
este dia, apresentamos a Editora Revista dos Tribunais - Thomson Reuters Brasil
“Estudos em Homenagem aos 200 anos do Brasil”, e tivemos o prazer de compilar
alguns dos mais famosos juristas e pesquisadores.
No Brasil, a priori, o júri foi criado para julgar apenas os crimes de imprensa.
Pinto (2020) relata, ainda, que o único recurso cabível à decisão do conselho seria
destinado à Clemência Real, onde os juízes seriam escolhidos pelo Corregedor e os
Ouvidores do Crime.
Como leciona Pinto (2020), somente a partir da promulgação da Constituição do
Império, em 25 de março de 1824 que as Constituições Federais Brasileiras passaram a
elencar a previsão do Tribunal do Júri, onde seriam destinadas ao julgamento de ações
cíveis e criminais, para garantir uma forma de equilíbrio social pertinentes aos ilícitos
praticados por qualquer pessoa.
2.1 ESTRUTURA DAS PARTES QUE CONSISTEM O JÚRI E DOS JURADOS
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O Tribunal do Júri popular é uma instituição prevista no artigo 5º, inciso


XXXVIII da Constituição Federal do Brasil (1998), que prevê a condenação do crime
de ameaça dolosa à vida, consumado ou tentado. Segundo Nucci (2015), o júri é
composto pelos 25 jurados previamente listados e selecionados, além de juízes
conhecidos como juízes presidentes, dos quais apenas sete compõem a comissão
sentenciadora. Além disso, a acusação e a defesa podem dispensar três jurados sem
apresentar motivos. Portanto, para que o sorteio seja válido, pelo menos quinze dos
vinte e cinco jurados devem estar presentes para iniciar o sorteio dos sete jurados que
compõem a comissão de sentença.
Ressalta-se que anualmente serão alistados vários jurados, cujo número varia de
acordo com o porte da Comarca que fará o julgamento. Estes jurados atuarão em todas
as sessões do Júri do ano em questão, ficando excluídos de um alistamento do ano
seguinte. Nesse contexto, como Nucci leciona (2015), qualquer pessoa idônea, a partir
de 18 anos poderá se alistar para participar do júri popular, sendo dispensados aqueles
que possuírem mais de 70 anos.
Desta forma, em interpretação ao Código de Processo Penal (1941),
compreende-se que havendo convocação, o jurado não poderá se eximir de participar
das reuniões periódicas do tribunal do júri, e sua recusa motivada por questões políticas,
filosóficas ou religiosas poderá ensejar na perda de direitos políticos.
Ademais, o art. 437 do Código de Processo Penal elenca aqueles cidadãos que
estão isentos do serviço do júri:

I- o Presidente da República e os Ministros de Estado; II os Governadores de


Estado e seus Secretários; III - os membros do Congresso Nacional, das
Assembleias Legislativas e Distrital e das Câmaras Municipais; IV - os
Prefeitos Municipais V- os Magistrados e membros do Ministério Público e
da Defensoria Pública; VI - os servidores do Poder Judiciário, do Ministério
Público e da Defensoria Pública; VII as autoridades e servidores da polícia e
da segurança pública; VIII - os militares em serviço ativo; IX - os cidadãos
maiores de 70 anos que requeiram sua dispensa; X - aqueles que o
requererem, demonstrando justo impedimento (art. 437, CPP, 1941).

O Ministério Público se faz representado em plenário pelo Promotor de Justiça


atuante na comarca competente para julgar o feito. Em via de regra, o Parquet é o órgão
titular para propor a ação penal, que será obrigatoriamente pública incondicionada, que
segundo Nucci (2015), o Ministério Público seja o polo ativo da ação, poderá pedir a
absolvição do réu ou a aplicação de redutores de pena, desde que fundamentadas as suas
razões para tal.
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Encerradas as oitivas de testemunhas arroladas pela acusação e defesa, o juiz


presidente iniciará o interrogatório do réu, após lida a denúncia. Segundo Nucci (2015),
o magistrado, por sua vez, indagará ao acusado se este deseja manifestar-se e exercer o
seu direito a autodefesa perante o tribunal ou se irá exercer o direito constitucional de
manter-se em silêncio.
Ademais, caso opte por utilizar do direito ao silêncio, o réu não poderá sofrer
qualquer sanção processual. Havendo desejo de manifestar-se e responder as perguntas
formuladas, o réu será interrogado. No entendimento de Nucci (2015), encerrado o
interrogatório, acusação e defesa iniciarão os debates em plenário e apresentarão suas
teses aos jurados. Ao final, haverá a votação na sala secreta e por fim, a leitura da
sentença, encerrando-se os trabalhos do júri.

2.2 COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL

É cediço que as cláusulas pétreas no ordenamento jurídico brasileiro não podem


ser modificadas pelo Poder Reformador, uma vez que a Constituição Federal (1988),
adota o modelo rígido, podendo tais cláusulas serem modificadas tão somente para sua
ampliação. Por estas razões, não há que se falar em revogação de tal medida para
excluir a instituição do Júri Popular. No entanto, nada impede que a competência venha
a ser ampliada.
Na compreensão de Nucci (2015), a inclusão de crimes dolosos contra a vida foi
instituída para o contexto do Tribunal do Júri não há explicação sistemática. Havia de se
elencar algum delito para dar vazão à esta instituição, garantindo assim a sua existência,
e, dentre tantos outros delitos descritos no ordenamento jurídico, a escolha destes crimes
foi meramente política legislativa.
No contexto histórico, relata Nucci (2015), que se buscou respaldo na
Constituição de 1946, que havia inserido a competência de crimes dolosos contra a vida
para o Tribunal do Júri.
Ademais, Nucci (2015) aduz ainda que, naquela ocasião, prevaleceu a vontade
dos “coronéis do sertão”, mormente que estes, quando ordenavam a execução de seus
inimigos, ansiavam pelo julgamento no tribunal popular visto que, deste modo,
concorriam para a pressão dos jurados para concederem a absolvição dos acusados,
cedendo aos anseios políticos da região. Incluem-se na competência de crimes dolosos
contra a vida homicídio simples (art. 121, caput); privilegiado (art. 121, § 1.º),
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qualificado (art. 121, § 2.º), induzimento, instigação e auxílio ao suicídio (art. 122),
infanticídio (art. 123) e as várias formas de aborto (arts. 124, 125, 126 e 127).

2.3 ASPECTOS GERAIS DAS GARANTIA FUNDAMENTAIS E OS PRINCÍPIOS


NORTEADORES

Inicialmente será abordado sobre os aspectos gerais das garantias e princípios


fundamentais para o cumprimento do devido processo legal. Desta forma se faz
necessário mencionar sobre a plenitude de defesa. A Plenitude de defesa é um princípio
que repousa no art. 5º, parágrafo XVIII, alínea “A”, da Constituição Federal Brasileira
(1988), que assegura a defesa plena e ampla do réu em casos de crimes dolosos contra a
vida. Segundo Nucci (2015, p. 34-35):
para alguns, tais expressões possuem o mesmo significado. Portanto, neste
último prisma, aos acusados em geral garante-se a defesa ampla e aos réus
dos processos em trâmite no Tribunal do Júri, identicamente, garante-se a
defesa ampla, embora, nesse caso, teria optado o legislador pela utilização de
outro termo (plenitude).

A plenitude de defesa é ainda mais abrangente do que a ampla defesa, não só


pelo fato de ser o instituto assegurado ao réu em crimes dolosos contra a vida,
divergindo das demais ações penais, mas por ser algo mais efetivamente pleno. Como
leciona Nucci (2015, p. 35):
amplo é algo vasto, largo, copioso, enquanto pleno equivale a completo,
perfeito, absoluto. Somente por esse lado já se pode visualizar a intencional
diferenciação dos termos. E, ainda que não tenha sido proposital, ao menos
foi providencial.

Conforme Nucci, (2015, p. 36):


os processos criminais onde não são julgados crimes dolosos contra a vida, a
defesa exercida pelo causídico não necessariamente há de ser perfeita,
cabendo – ainda que não seja de acordo, eventuais falhas, visto que não há
necessidade de tentar levar a um jurado leigo a absolver ou condenar o réu,
mas sim a decisão de um juiz togado ao convencimento da pronúncia ou
impronúncia do réu, com fundamentações expressamente técnicas e jurídicas.

Logo, nos processos criminais onde a competência cabe ao Tribunal Popular do


Júri, a defesa exercida deve ser a mais completa e perfeita possível. É cediço que o
corpo de jurados não irá se ater a disposições técnicas, mas há de proferir a sua decisão
baseada em argumentos e teses levantadas pela acusação e defesa, onde quem fizer a
melhor interpretação e explanação dos fatos, sairá vencedor do plenário levando a
absolvição ou condenação do réu. Ademais, nas palavras de Nucci (2015, p. 39): “O
Tribunal Popular possuirá amplas condições de analisar os casos, ouvindo bons
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argumentos de ambas as partes, com particular ênfase para a defesa.” Exercida a defesa
plena, completa e perfeita, caberá ao corpo de jurados decidir pela condenação ou
absolvição do réu.
Desta forma, deve ser ressaltado a importância do sigilo das votações, o qual é
um princípio assegurado no art. XXXVIII, alínea “b”, da Constituição Federal Brasileira
(1988), trata-se de outro instituto do Tribunal do Júri no direito brasileiro. Conforme o
Código de Processo Penal (1941), art. 485:
Não havendo dúvida a ser esclarecida, o juiz presidente, os jurados, o
Ministério Público, o assistente, o querelante, o defensor do acusado, o
escrivão e o oficial de justiça dirigir-se-ão à sala especial a fim de ser
procedida a votação.

Como leciona Porto (2001), os jurados que compõem o conselho de sentença


deverão permanecer incomunicáveis durante toda a sessão de julgamento. Ademais, tal
medida é aplicada para que a opinião de um jurado não venha a intervir na convicção do
outro.
Conforme Rangel (2018), a incomunicabilidade envolve o mérito do julgamento,
para impedir que um jurado possa externar sua convicção e que esta venha a influenciar,
de modo favorável ou não, o entendimento de qualquer outro membro do conselho de
sentença. O sigilo das votações difere da incomunicabilidade de votos. Ele exige tão
somente para que não haja pressão sobre a votação dos jurados, através de perseguições,
ameaças, chantagens ou qualquer outro meio que possa vir a perturbar a livre
manifestação do conselho de sentença.
Para que se possa assegurar o sigilo da votação, faz-se necessário cessar a
contagem de votos quando se chegar no quarto sim ou quarto não, visto que há o risco
de, sendo uma votação unânime, o sigilo ser “quebrado”, pois , conforme leciona Rangel
(2018, p. 88): “não será difícil adivinhar quem condenou (ou absolveu) o réu. Logo, por
terra foi a garantia constitucional do sigilo dos votos.”
O art. 489 do Código de Processo Penal (1941), preceitua que, in verbis: “As
decisões do Tribunal do Júri serão tomadas por maioria de votos.” Outrossim, Para
Rangel (2018, p. 88), o artigo estabelece que:
Para que seja estabelecido o quórum mínimo para votação dos jurados, o que
não significa dizer que em todos os casos o juiz irá recolher os sete votos. A
votação dos jurados poderia ser por unanimidade, mas o legislador preferiu
por maioria de votos, e quando forem votados os incisos referentes a
materialidade, autoria e o jurado absolve o acusado e os demais quesitos de
causa de diminuição de pena e as qualificadoras, bastará os quatro primeiros
votos em um único sentido para cômputo da votação, deixando o juiz de ler
os outros três.
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Apesar de todos as assertivas que garantem o sigilo das votações nos


julgamentos, sabe-se que muitas vezes o corpo de jurados teme por sua vida ao compor
o conselho de sentença. Conforme Cardoso (2013, on-line), em cidades com o número
menor de habitantes, alguns membros sorteados chegam a serem ameaçados pelos réus
que estão em liberdade ou coagidos pela família destes para, em eventual participação
no conselho de sentença, absolverem o acusado. Por fim, ressalta-se que embora a
sociedade muitas vezes clame por justiça, tendem a se esquivar da obrigação ao serem
convocados para o Tribunal.

2.3.1 SOBERANIA DOS VEREDITOS

A soberania dos vereditos trata-se de um princípio constitucional assegurado ao


Tribunal do Júri no art. 5º, inciso XXXVIII, alínea “c”. O dispositivo legal indica que a
decisão proferida pelo conselho de sentença será soberana (CRFB, 1988), ou seja, não
caberá ao juiz togado ou qualquer membro da defesa ou acusação alterar a decisão dos
jurados, seja para condenação ou absolvição do réu.
Conforme Nucci (2015, p 43): “o veredito popular é a última palavra, não
podendo ser contestada, quanto ao mérito, por qualquer Tribunal togado.” Durante a
audiência e o estabelecimento do comitê de sentença, o juiz presidente lê um juramento,
e os jurados prometem ouvir o caso de forma justa e dar um veredicto de acordo com
sua consciência. (BRASIL, CPP, 1941).
O próprio princípio assegurado pela Constituição Federal (1988), é de que a
decisão do conselho de sentença é soberana, e como o próprio nome diz, deve-se manter
a vontade dos jurados, ainda que a decisão que proferirem não pareça correta ou
adequada aquele caso. Nucci (2015, p. 43) leciona que: “jurados decidem de acordo
com a sua consciência e não segundo a lei”. Por esta razão, há quem defenda que o
conselho de sentença não deveria ser formado por pessoas leigas, mas sim, aqueles que
detivessem o devido conhecimento técnico para julgar a causa de forma adequada. O
mérito do veredito não deve ser, sob nenhuma hipótese, alterado pelo juiz togado.
A Ministra do STF Rosa Weber (BRASIL, STF, RHC 113314, 2012) em seu
voto num julgamento Agravo Regimental no Recurso Ordinário em Habeas Corpus,
discorreu que:
Os veredictos do Tribunal do Júri são soberanos e não podem ser revistos,
salvo quando manifestamente contrários à prova dos autos, remontando a
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garantia do art. 5.º, XXXVIII, c, da Constituição Federal ao célebre


Buschel’s Case, de 1670, decidido pelas Cortes Inglesas às provas.

No entanto, a decisão do júri pode ser revertida caso se verifique que a decisão
do júri é totalmente contrária às provas constantes dos autos, ou se houver inovação
probatória, a acusação e a defesa apresentarem novas provas não incluídas no processo.
Nesse contexto, como leciona Pinto (2020, p 38): “Ainda que o Tribunal do Júri seja
considerado a forma mais democrática de julgamento, recebe inúmeras críticas pelo fato
de atribuir a cidadãos comuns e sem conhecimento técnico-legal, a responsabilidade de
atuar como julgadores.”

2.3.2 SIGILO DAS VOTAÇÕES

O sigilo das votações é um dos princípios constitucionais do Tribunal do Júri.


Em tese, o caput do art. 485 do Código de Processo Penal (1941) in verbis: “Não
havendo dúvida a ser esclarecida, o juiz presidente, os jurados, o Ministério Público, o
assistente, o querelante, o defensor do acusado, o escrivão e o oficial de justiça dirigir-
se-ão à sala especial a fim de ser procedida a votação.”
O julgamento pelos jurados que compõem o conselho de sentença se dará em
uma sala secreta, longe das vistas do público. Havendo a falta desta sala, o plenário será
esvaziado para que ocorra a votação. Na concepção de Nucci (2015) aduz que existem
discussões à cerca da constitucionalidade do voto dos jurados em uma sala secreta, pois
este instituto estaria violando o princípio constitucional da publicidade. No entanto,
discorre que no mesmo dispositivo legal, há a limitação da publicidade quando estes
venham à ferir a defesa à intimidade ou interesse público.
Não se fala em sigilo do voto, entendido como a cédula individual colocada
pelo jurado, contendo “sim” ou “não”, dentro da urna, mas em sigilo da
votação, que é o ato de votar. Portanto, busca-se resguardar o momento do
jurado apor o voto na urna – que é votar –, razão pela qual a sala especial é o
lugar ideal para tanto (NUCCI, 2015, p. 42).

É comum as pessoas presentes se manifestarem em meio aos debates, ao menor


sinal de descontentamento de uma tese feita pela defesa ou acusação. E, discorre ainda
que, em havendo interferência destas pessoas durante a votação poderia levar à anulação
do júri, visto que colocaria em risco a imparcialidade dos jurados. Por fim, a Carta
Magna assegura o sigilo das votações. Além disso, Nucci (2015) ressalta que não se fala
em sigilo de voto, mas sim ao sigilo de votar e em razão disto, a sala secreta é o local
ideal para assegurar o sigilo das votações.
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3 INFLUÊNCIA DA MÍDIA NA SOCIEDADE ATUAL

Os meios de comunicação possuem um efeito gigantesco perante a sociedade.


É através dela que o cidadão se mantém atualizado sobre os mais diversos assuntos,
criando e moldando sua convicção pessoal por meio de mensagens e notícias que são
veiculadas diuturnamente pela grande imprensa. Nesse contexto, como leciona Pinto
(2020), a mídia representa o meio de exteriorização de uma mensagem, emitida através
de um emissor e caminha à um receptor, possibilitando que qualquer mensagem chegue
ao seu destino sem ruído.
Através da imprensa, o jornalismo em um primeiro momento se desenvolveu
como sendo uma forma de divulgar ideias. Posteriormente, através do rádio e televisão,
conseguiu-se levar a informação aos quatro cantos do mundo. Segundo Pinto (2020),
reverencia ainda que a audiência é a impulsionadora de vendas de fatos e mentiras, que
são compradas através de seus espectadores, deixando de lado quaisquer valores sociais
e morais, impondo tão somente aquilo que de fato interessa aos veículos de imprensa,
transmitindo aquilo que de fato lhes interessa à sociedade.
Quando as informações são emitidas sem a preocupação do transmissor – bem
como do receptor, a respeito da veracidade, e ainda, numa sociedade que já possui
ideias pré-construídas, ocorre a criação do mecanismo de alienação, de modo que são
facilitadas as manipulações de opiniões. Seguindo este raciocínio, nas palavras de Pinto
(2020, p 61):
no exato momento em que as informações são apenas absorvidas, sem a
preocupação sobre sua veracidade, os mecanismos formadores do
comportamento de alienação intensificam-se, facilitando a manipulação das
ideias.

Para Fabricio Corrêa (2013, online), sempre que há necessidade de um


determinado assunto alcançar o apoio social e havendo ainda o interesse entre a mídia e
seus privilegiados, a sociedade passa a ser diuturnamente alimentada com manchetes,
reportagens e outros meios, sejam escritos ou falados, para que assim, seja moldado e
alcançado o apoio da população sobre aquele assunto de interesse. Aduz ainda que o
modo de se fazer notícia não deve ter por finalidade de formar convencimento, mas de
transmitir uma informação de modo que não levem as pessoas a concordarem com tudo
que lhes foi dito, mas sim de o receptor formar a sua própria convicção sobre
determinado assunto e de gerar impressões próprias sobre um fato.
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Pelas proporções alarmantes da mídia, observa-se que as informações


transmitidas atingem os mais variados grupos sociais, dos mais ricos aos mais pobres,
criando uma espécie de “preconceito unilateral” que por sua vez, vai deixando a
população mais passiva, perdendo cada vez mais a capacidade de questionar ou criticar,
fazendo com que apenas absorvam determinado conteúdo e/ou informação (DA SILVA,
2010). Por fim, salienta-se que a população torna-se cada vez mais refém da mídia, visto
que através destas práticas costumeiras, reconstroem e modelam o pensamento da
sociedade sobre aquilo que lhes interessa.

3.1 INFLUÊNCIA DA MÍDIA NO SISTEMA JURÍDICO PENAL BRASILEIRO

Com o advento da mídia, os delitos passaram a ter grande repercussão na


sociedade. Os crimes dolosos contra a vida detêm de grande atenção por parte da
sociedade. Nesse contexto, segundo Prattes e Tavares (2008), o sensacionalismo da
mídia por vezes impõe a opinião pública em detrimento a livre convicção dos jurados,
passando por cima do juramento consoante no art. 466 do Código de Processo Penal
(1941), onde prometem julgar a causa com sua livre convicção.
Os setores da mídia por vezes divulgam nomes dos envolvidos nos delitos e
classificam-nos como “réus” ou “acusados”, antes mesmo do deslinde processual,
expondo de maneira irresponsável os fatos apurados durante as investigações, moldando
assim a opinião pública. Logo, o acusado, mesmo que protegido constitucionalmente,
visto que “ninguém será considerado culpado antes de sentença criminal condenatória”,
será apedrejado e condenado pela opinião pública devido a exposição irresponsável por
parte da mídia. Nos dizeres de Prattes e Tavares (2008, p. 34):
O cidadão nestas circunstâncias, mesmo que teoricamente acobertado
constitucionalmente pelo princípio da presunção de inocência, se vê em
realidade apontado como “culpado” pelos meios de comunicação de massa,
sofrendo enorme exposição e o encargo de poder enfrentar um Conselho de
Sentença maculado por um “jornalismo investigativo” nem sempre ético e
harmonizado com a realidade dos fatos ditos “apurados”.

Cabe salientar que o direito à liberdade de expressão e liberdade de imprensa


não são absolutos. Como leciona Prattes e Tavares (2008), a sociedade não pode se
isentar de estar à par dos diversos acontecimentos do cotidiano, por mais cruéis que
possam ser, no entanto, os veículos de informação devem ter responsabilidade ao
noticiar matérias que dispõem os delitos, divulgando-os de maneira fiel e comprometida
15

às robustas provas dos autos de uma ação penal, de modo que não venham a interferir
na convicção da opinião pública de maneira errônea aos fatos.
Deve-se haver compromisso, não podendo a grande mídia recortar os fatos e
montá-los de forma sensacionalista apenas para atrair audiência, a fim de evitar pré-
julgamentos e conclusões precipitadas. Nas palavras de Prattes e Tavares (2008, p. 37):
“O papel da mídia não é julgar e sim apresentar os fatos de maneira completa e
verdadeira, sem o objetivo de punir o suspeito, mas sim de transmitir ao público a
realidade dos fatos.”
Por fim, Prattes e Tavares (2008), dispõe que havendo tamanha
desproporcionalidade, os julgamentos feitos pelo tribunal do júri poderão ser imersos à
parcialidade dos jurados, visto que irão entrar em plenário com uma convicção pré-
formulada e não se atentarão aos fatos e provas produzidas dentro dos autos processuais
das ações penais, ainda que haja motivos para absolver o acusado, por estarem com a
ínfima ideia de que aquele réu é culpado, estarão a sentenciar alguém inocente a
cumprir uma pena a qual não lhe é necessária.

4 DOS CASOS MAIS EMBLEMÁTICOS DO TRIBUNAL DO JÚRI

No Brasil, diversos casos concretos levaram ao clamor da sociedade dos quais


abordaremos 3 dos mais emblemáticos para tratar neste tópico.
CASO RICHTHOFEN: Conforme Bottiglieri (2020, on-line), o assassinato do
casal Manfred e Marísia Von Richthofen abalou o país em novembro de 2002, quando a
filha do casal, Suzane Louise Von Richthofen, planejou e executou junto com Cristian e
Daniel Cravinhos, o assassinato dos próprios pais, que foram cruelmente mortos
enquanto dormiam no interior da residência da família.
Conforme Bottiglieri (2020, on-line), cena do crime foi cuidadosamente
planejada para parecer um delito de latrocínio, no entanto, a hipótese logo foi descartada
pela Polícia.
Além de haver objetos específicos fora do lugar, a frieza de Suzane Richthofen
causou espanto a todos, que aparentava dar pouca ou nenhuma importância ao ocorrido.
Conforme Bottiglieri (2020, on-line), A imprensa cobriu todos os passos para a
elucidação do crime, bem como, até os dias atuais, a mídia nacional cobre as
“saidinhas” de Suzane em datas comemorativas como o dia das mães e dia dos pais,
causando total repudia a população.
16

CASO DANIELLA PEREZ: Como leciona Camila Lavaqui (2020, on-line), a


atriz e bailarina Daniella Perez Gazzola, filha da escritora Glória Perez, foi morta no dia
28 de dezembro de 1992 aos 22 anos de idade, pelo também ator Guilherme de Pádua e
sua então esposa, Paula Thomaz.
À época do crime a atriz estava no auge de sua carreira e a telenovela “De Corpo
e Alma” alcançava grandes picos de audiência, sendo uma das mais assistidas do país.
Guilherme contracenava junto com Daniella no folhetim e acreditava que seu papel
estaria sendo reduzido por influência da atriz, que era filha da roteirista da novela. No
entanto, a motivação do crime é desconhecida, tendo em vista que os acusados sempre
mudaram a versão dos fatos (LAVAQUI, 2020, on-line).
Como leciona Camila Lavaqui (2020, on-line), na noite do crime, Daniella foi
seguida por Guilherme e Paula até um posto de gasolina onde teve seu carro “fechado”
pelo algoz e, ao sair de seu veículo, foi nocauteada e levada a um matagal desacordada.
Guilherme e Paula desferiram 18 estocadas na vítima, sendo a maioria dessas em seu
coração e após, abandonaram o cadáver em um matagal, que foi descoberto horas
depois pela Polícia. O assassinato de Daniella Perez causou imensa comoção nacional e
à época, toda e qualquer matéria veiculada ao crime ganhava imensa repercussão nos 4
cantos do país. Ademais, o caso foi um verdadeiro “circo midiático”,
Apesar de toda repercussão, o julgamento só ocorreu cerca de 4 anos depois,
levando a condenação dos réus. Destaca-se que o crime de homicídio qualificado não
era tratado de maneira tão gravosa perante a legislação pois não estava incluso no rol de
Crimes Hediondos que havia sido criado através da Lei nº 8.071/90 e possuía diversos
benefícios para a execução da pena (LAVAQUI, 2020, on-line).
No entanto, conforme Camila Lavaqui (2020, on-line), Glória Perez, que ficou
inconformada e revoltada ao saber que os assassinos de sua filha logo estariam em
liberdade, resolveu fazer uma grande mobilização e conseguiu recolher 1,3 milhões de
assinaturas em um abaixo-assinado que circulou o país para criar uma Lei de Iniciativa
Popular, prevista no art. 14, inciso III da Constituição Federal Brasileira, para incluir o
Homicídio Qualificado no rol dos Crimes Hediondos.
O CASO ISABELLA NARDONI: Um dos vastos exemplos a ser citado à
respeito de como a mídia pode interferir na opinião pública é o caso do assassinato de
Isabella Nardoni, ocorrido em 29 de março 2008. De acordo com Lima e Bertoni
(2022), Isabella Nardoni, de 5 anos, morreu após ser arremessada da janela do sexto
17

andar do Edifício London, aos 29 de março de 2008. Tentou-se prestar socorro a


infante, no entanto, não resistiu aos ferimentos e faleceu a caminho do hospital.
Alexandre Nardoni, pai de Isabella, afirmou à polícia que havia ocorrido um
assalto em seu apartamento e que um dos infratores havia arremessado a menina pela
janela do quarto. Nardoni afirmou ainda que levava a filha que estava dormindo para o
interior do imóvel e, após, desceu para auxiliar a esposa, Anna Carolina Jatobá e seus
outros dois filhos e, neste meio tempo, teria ocorrido o incidente. Segundo Lima e
Bertoni (2022) discorrem ainda que não havia qualquer sinal que evidenciasse o assalto
no apartamento, face à ausência de quaisquer cenários de luta ou arrombamento na porta
do imóvel, e que nenhum objeto havia sido levado pelos supostos assaltantes, bem como
que a tela de proteção do quarto das crianças havia sido cortada. Ademais, havia
manchas de sangue no interior do apartamento.
Contudo, conforme Lima e Bertoni (2022) “os detalhes macabros da cena do
crime indicavam que havia sangue no apartamento e que a vítima poderia ter sido
asfixiada antes de ser jogada pela janela.”
Conforme discorre Moreira dos Santos (2016), o caso foi transformado em
melodrama pela mídia, visto que diariamente os mais diversos veículos de comunicação
noticiavam informações sobre o crime que culminou no indiciamento de Alexandre
Nardoni e Anna Carolina Jatobá.
Sbeghen (2016) discorre que na mesma noite do crime, a polícia descartou a
hipótese de acidente, tendo em vista que a tela de proteção da janela do qual Isabella foi
arremessada estava cortada. Ademais, em 18 de abril de 2008, foram encontrados
vestígios de sangue de Isabella no interior do veículo de Alexandre Nardoni, seu pai, o
que culminou no indiciamento do pai e de Ana Carolina Jatobá, madrasta da infante.
Sberghen (2016) relata ainda que não houve limitação para quem quisesse
conhecer o caso tendo em vista que as informações eram atualizadas quase que
instantaneamente e simultaneamente, bem como que as emissoras de televisão e jornais
dedicavam sua programação para relatarem quaisquer fatos relacionados ao crime.
Oliveira e Santos (2011) lecionam que a morte de Isabella apresentava
características que por si só favoreciam o sensacionalismo, uma vez que os envolvidos
eram todos de uma mesma família e, ainda, por serem de classe média e a vítima ser
uma criança, apesar de que, por dia, duas crianças sejam mortas por seus parentes no
Brasil, estes fatos não são exaustivamente noticiados nos veículos de comunicação.
18

A exposição da mídia e sua influência na opinião pública ficou evidente com o


assassinato de Isabella Nardoni. Nas palavras de Teixeira (2011, p. 15) “antes mesmo da
liberação de qualquer laudo pericial centenas de pessoas cercavam o carro dos acusados
clamando por justiça e taxando-os de assassinos”.
Conforme Teixeira (2011), Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá foram
levados à júri popular em um julgamento que iniciou-se em 22 de março de 2010, tendo
finalizado aos 27 de março do mesmo ano. O conselho de sentença julgou procedente a
decisão de pronúncia e os réus foram condenados, tendo o Juiz Maurício Fossen
aplicado a pena de 31 anos, 1 mês e 10 dias à Alexandre Nardoni. Já Anna Carolina
Jatobá, madrasta de Isabella, foi sentenciada à 26 anos e 8 meses de reclusão.
Milício (2010) em artigo escrito na Revista Consultor Jurídico (Conjur), relata
que a sentença foi lida ao som de rojões, que puderam ser ouvidos dentro do plenário.
Ademais, emissoras de TV transmitiram ao vivo o momento em que a leitura da
sentença era proferida, onde dezenas de pessoas acompanhavam o resultado do lado de
fora do 2º Tribunal do Júri do fórum de Santana, em São Paulo.
Por fim, pode-se observar que a intensa exposição midiática envolto ao Caso
Nardoni, notadamente influenciou no resultado do julgamento, visto o forte clamor
público que esperava ansiosamente a condenação do casal. Pagnan (2020), em sua obra
intitulada “O Pior dos Crimes: O Assassinato de Isabella Nardoni”, revela detalhes
extraídos dos autos processuais em que evidenciam diversos erros e falhas cometidos
durante a investigação, e que, no entanto, não foram levados em consideração pelos
jurados que examinaram a causa. Anna Carolina Jatobá e Alexandre Nardoni foram
considerados culpados mesmo antes de se sentarem no banco dos réus em plenário.

4.1 INFLUÊNCIA MIDIÁTICA NO TRIBUNAL DO JÚRI

A mídia inegavelmente possui forte influência perante a sociedade, sobretudo


na opinião pública. Como leciona Pinto (2020, p. 73-74) discorre que: “para muitos
estudiosos, a mídia representa hoje o quarto-poder constituído estabelecido em conjunto
com o legislativo, executivo e judiciário – com força suficiente para manter-se por
muitos anos.”
A mídia dominante define os assuntos de discussão da sociedade, escolhe
quem deve e quem não deve ser celebridade, forma as opiniões do povo, cria
modas, suscita o consumismo, influencia na decisão de voto e interfere de
forma decisiva no Tribunal do Júri, órgão constitucionalmente investido para
dar igualdade nos julgamentos dos crimes contra a vida (PINTO, 2020, p. 74)
19

A Constituição Federal (1988), em seu artigo 5º, LVII diz que “ninguém será
considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença criminal condenatória”. Para
Prattes e Tavares (2018), apesar de constar no bojo da Constituição Federal, no artigo
acima mencionado, que até o trânsito em julgado da sentença criminal condenatória
ninguém será considerado culpado de um crime, os meios de comunicação praticam o
oposto, visto que em alguns casos, o réu é condenado – perante a sociedade, antes
mesmo de seu julgamento.
A Carta Magna presume a inocência do indivíduo até que se comprove o
inverso, mas não obstante a isto os meios de comunicação, em alguns casos,
condenam o réu antes mesmo de seu julgamento. O suspeito muitas vezes é
julgado pela opinião divulgada pela mídia (PRATTES, TAVARES, 2018, p.
36).

Compreende-se que tanto jurados, como membros da defesa, Ministério


Público e juiz devem ser totalmente imparciais em plenário, porém, este dever é
afastado a medida em que a influência da mídia sobre um determinado caso cresce,
tendo em vista que as notícias sobre a criminalidade possuem forte influência no
Tribunal do Júri. Segundo os ensinamentos de Pinto (2020), destaca-se ainda o forte
sensacionalismo por parte da imprensa que se valem da comoção popular para impor
uma manipulação intensa na sociedade. Tal manipulação faz com que o acusado, muito
embora tenha seu direito constitucional assegurado de não ser considerado culpado
daquele crime que lhe é imputado, seja condenado antes mesmo do julgamento em
plenário.
Ressalta-se que devemos observar que nem sempre a sociedade irá atingir
somente a pessoa do acusado. As vítimas e suas famílias passam a sofrer diuturnamente
com a pressão e perseguição da imprensa que, à todo custo buscam trazer quaisquer
detalhes que sejam pertinentes para o imaginário popular. Segundo observa-se em
matéria publicada pelo Fantástico (2022, on-line), destaca-se o recente caso da atriz
Klara Castanho, a qual foi vítima de um estupro e acabou engravidando. Cabe salientar
que Klara não queria expor o caso, que vinha sendo mantido sob sigilo. No entanto,
sites de fofocas levaram a público toda a história, além de diversas especulações. Após
toda a situação, a atriz se viu obrigada a esclarecer o que de fato havia acontecido,
através de uma carta aberta publicada em um perfil de rede social.
Por fim, Pinto (2020) destaca que a influência da mídia no tribunal do júri traz
sérios riscos ao princípio da neutralidade, que podem ser observados em diversos crimes
que repercutiram na imprensa nacional.
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Nos casos de Francisco Assis Pereira - maníaco do parque -; de Guilherme de


Pádua - assassino da atriz Daniela Perez -; e Elias Maluco - assassino do
jornalista Tim Lopes -, da Suzane Richtofen, do Goleiro Bruno, do Casal
Nardoni, a mídia pesadamente realizou um pré-julgamento, condenando sem
direito á defesa perante a opinião pública, todos estes criminosos (PINTO,
2020, p. 108).

Compreende-se que por mais que tais pessoas tenham cometidos crimes que
causem intenso repúdio na sociedade, todos têm direito a um julgamento justo e à ampla
defesa. No entanto, com a enorme pressão e clamor social, estes criminosos sempre
estarão presentes no imaginário popular, podendo impedir, inclusive, a ressocialização
destes após o cumprimento efetivo da pena que lhes foram impostas.

4.2 DA INTERFERÊNCIA MIDIÁTICA NA IMPARCIALIDADE

Sabe-se que a mídia exerce grande influência sobre a sociedade, como


demonstrado pelos temas anteriores. Esses meios de comunicação podem facilmente
moldar as decisões dos jurados que enfrentam julgamento por pôr em risco a vida
deliberadamente.
Os jurados, por serem pessoas leigas, não tem o devido conhecimento técnico
para julgar com exatidão aquela causa que está em plenário, e porventura, suas decisões
podem ser tomadas pela emoção e comoção que nasce exatamente através da mídia,
levando ao comprometimento de suas decisões. No entanto, ante a ausência de
fundamentação das decisões proferidas por estes, torna-se impossível identificar se de
fato, houve parcialidade nos votos (OLIVEIRA, 2015, on-line). Quando um crime
doloso contra a vida toma grandes proporções e causa grande comoção, ao mesmo
tempo traz a sociedade a sensação de impotência bem como gera um desejo de se fazer
justiça a todo custo.
Todos os assuntos veiculados pela mídia causam grandes comentários ante a
sociedade, visto que atualmente, a maioria da população dispõe de algum meio de
comunicação que noticie estes fatos, podendo fazer com que estas informações
influenciem diretamente na decisão daquele jurado, levando-o a agir com mais emoção
do que com a razão. A respeito do relatado acima, Vieira (2003, p. 246) preceitua que:
[...] o jurado é mais permeável à opinião pública, à comoção, que se criou em
torno do caso em julgamento, do que os juízes togados e, por sentirem- se
pressionados pela campanha criada na imprensa, correm o risco de se
afastarem do dever de imparcialidade e acabam julgando de acordo com o
que foi difundido na mídia.
21

A quantidade exacerbada de informações externas tende a influenciar a decisão


daquele jurado, que inclusive, poderá chegar ao plenário com uma convicção já
formada, na intuição de condenar o réu, embora o que de fato esteja colacionado nos
autos, não seja exatamente aquilo que é veiculado através dos meios de comunicação
(PRATES; TAVARES, 2018). Seguindo esta premissa, o réu estará condenado antes do
início do julgamento, mormente porque os jurados não necessitam fundamentar suas
decisões, valendo-se apenas de utilizar a sua consciência para analisar e julgar o delito
cometido pelo réu.
Neste contexto, segundo Prates & Tavares (2008, p. 38): “dificilmente um
jurado consegue manter-se isento diante da pressão da mídia e do prévio julgamento
‘extrajudicial’ transmitido diariamente para suas casas”.
Dentre os delitos que são de competência do Tribunal do Júri, de longe aqueles
que mais repercutem são os homicídios, fazendo com que a imprensa cubra cada detalhe
daquele fato delituoso, levando a sociedade a tecer pré-julgamentos irreparáveis,
tornando, inclusive, os autores do delito, celebridades e que muito provavelmente
permanecerão no imaginário popular durante muito tempo. Seguindo esta premissa,
Pinto (2020, p. 75), aduz que:
os homicídios são os crimes mais noticiados, o que leva a uma cobertura
excessivamente maior. A exploração do espetáculo por parte da mídia atrai
de forma decisiva uma audiência maciça, fazendo do crime um show e dos
criminosos, celebridades circenses.

Podemos citar como exemplo o caso do assassinato do casal Marísia e Manfred


Von Richthofen, onde a filha do casal não só planejou, mas como auxiliou na
preparação e execução do crime que até hoje, muito embora tenha passado tanto tempo,
permanece cravado na sociedade, passando de geração em geração (LIMA; BARTONI,
2016, on-line). O caso tornou-se emblemático não só pelo fato de ser um crime cruel
contra pai e mãe, que em qualquer parte deste mundo são sagrados, mormente pelo fato
de a filha ter o estereótipo clássico do sonho de toda família.
Seguindo este contexto, nas palavras de Ilana Casoy (2016, p. 18):
O circo da mídia mitificou esses assassinos, muito mais a figura "principal"
da filha que matou os pais. Por que esse crime específico ganhou essa
proporção de divulgação? Não pode ser apenas por se tratar de parricídio/
matricídio, que acontece vez por outra o ano inteiro. A resposta
provavelmente envolve o fato de Suzane ter, aparentemente ao menos, o
perfil clássico da filha que todos gostaríamos de ter.

Por mais que o papel dos comunicadores seja o de levar informações ao seu
espectador, muitos utilizam-se deste artifício para impor suas próprias ideologias,
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pensamentos e ideias particulares em pauta perante a população, formando uma


sociedade cada vez mais apática e incapaz de compreender o que de fato está
colacionado nos autos das ações penais (CASOY, 2016). O fato de estarmos insertos em
uma sociedade violenta, com os mais diversos delitos cruéis sendo cometidos a cada dia
que se passa, deve-se observar com cuidado quando falamos de Justiça.
Os infratores devem ser penalizados de acordo com o que permite a legislação
vigente, devendo a sociedade se preocupar em analisar cada caso com o olhar crítico e
ao mesmo tempo justo, não se deixando levar por meias verdades ou imposições
ideológicas transmitidas pelos veículos de comunicação (NYARI, 2018, on-line). A
instituição do Júri Popular não pode e nem deve ser utilizada como meio de vingança.
Toda e qualquer pessoa que esteja sendo acusada de cometer um crime doloso contra a
vida deve ter seus direitos e garantias constitucionais resguardados. O réu não deve ser
condenado ou absolvido baseando-se na opinião pública ou comoção, caso assim, a
sociedade não estará fazendo justiça, mas sim utilizando-se deste meio para uma espécie
de vingança. E onde existe vingança, não há justiça.

CONCLUSÃO

Destarte, o referido trabalho busca demonstrar o quão poderosa a mídia pode ser
no sistema jurídico brasileiro, o quão forte é o seu poder de manipulação e formação da
opinião pública sob a ótica do direito penal.
É cediço que, muito embora os extensos crimes existentes na capitulação penal
revoltem e causem pavor perante a sociedade, sendo inegável o fato de que
determinados meios de comunicação podem interferir nos desfechos das ações penais
que tramitam sob as mais diversas Varas do Júri existentes no Brasil.
A prática delituosa sempre existiu e infelizmente continuará existindo na
sociedade e alguns delitos poderão ser mais graves e mais repugnantes que outros. No
entanto, não podemos classificar e pré-julgar um réu apenas sob a visão contorcida do
que a mídia nos apresenta, mas sim, com dever e senso de justiça. Os jurados que
compõem o conselho de sentença são em grande maioria leigos e não detém de qualquer
conhecimento jurídico, de modo que toda e qualquer informação exposta de maneira
equivocada e irresponsável poderá interferir no futuro daquele que está sentado no
banco dos réus.
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Portanto, cabe à imprensa o dever de divulgar informações com credibilidade e


da maneira mais imparcial possível, exatamente para resguardar os direitos
constitucionais daquele que está para ser julgado perante o tribunal do povo. Sabe-se
que, apesar de fazerem um juramento perante a um juiz togado, muitas vezes suas
emoções podem influenciar nas suas decisões, fazendo com que ignorem
completamente tudo aquilo que foi carreado e apurado nos autos do processo.
A falta de conhecimento jurídico por parte do conselho de sentença torna
suscetível no que diz respeito a parcialidade dos jurados, uma vez que estes não são
obrigados a justificarem suas decisões, resguardados pelo princípio do sigilo das
votações.
O réu sempre terá direito à uma ampla defesa, a um julgamento transparente e
justo, ao final devendo ser punido dentro dos limites em que a legislação permite. A
sociedade tem em suas mãos o poder de se fazer justiça, desde que ela não seja lastreada
por um sentimento de ódio e vingança. A liberdade de expressão, apesar de ser um
direito constitucional garantido, no entanto, ele não é absoluto. A liberdade de imprensa,
do mesmo modo, apesar de ter regulamentação, não é um direito absoluto.
Por fim, o Tribunal Popular do Júri talvez não seja o modo mais justo e
adequado para julgar especificamente os crimes dolosos contra a vida, uma vez que os
delitos ali elencados são repudiados por grande parte da sociedade.

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