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Investigacao Criminal Defensiva - Evinis Talon
Investigacao Criminal Defensiva - Evinis Talon
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Evinis Talon
2020
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ICCS – International
Center for Criminal Studies
Gramado/RS
www.iccs.com.br
EVINIS TALON
Professor de cursos de pós-graduação em Direito Penal e
Processual Penal
Mestre em Direito pela UNISC/RS
Especialista em Processo Penal pela Universidade de
Coimbra (Portugal).
Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela
UGF/RJ
Especialista em Direito Constitucional pela UGF/RJ
Especialista em Filosofia pela UGF/RJ
Especialista em Sociologia pela UGF/RJ
Ex-Defensor Público do Estado do Rio Grande do Sul.
Advogado, consultor jurídico e parecerista.
Presidente do International Center for Criminal Studies
(ICCS)
Fundador do www.cursopenal.com.br
Palestrante
Autor de vários livros
www.evinistalon.com
Instagram: @evinistalon
Para minha querida esposa Jaiane e meus
filhos caninos Piu e Apolo, porque
estiveram do meu lado enquanto eu
escrevia cada letra deste livro. São,
praticamente, coautora e cãoautores.
Referências
Parte I
Teoria geral da investigação criminal
defensiva
1. Noções gerais
7. Os fundamentos da atuação
defensiva e investigativa
7. 1. Fundamentos constitucionais da
investigação criminal defensiva
O art. 5º, LV, da Constituição Federal, prevê que
“aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e
aos acusados em geral são assegurados o contraditório e
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Ainda que não mencione expressamente, trata-se de um
importante fundamento da investigação criminal
defensiva.
O exercício da defesa técnica não pode ser limitado
à concordância do Delegado de Polícia quanto ao
deferimento de diligências postuladas pelo Advogado no
inquérito policial.
Com precisão, Nery Junior (2010, p. 249) afirma:
Feitas as alegações, os titulares da garantia da
ampla defesa têm o direito à prova dessas
mesmas alegações. De nada adiantaria garantir-
se a eles com uma mão o direito de alegar e
subtrair-lhes, com a outra, o direito de fazer
prova das alegações. O direito à prova, pois,
está imbricado com a ampla defesa e dela é
indissociável.
16.1. Depoimentos
A colheita de depoimentos é uma das principais
possibilidades na investigação criminal defensiva, porque
permite a antecipação de um testemunho que, se
favorável, poderá ser levado aos autos oficiais, por
declaração escrita ou audiovisual, bem como repetida,
arrolando a testemunha para que seja ouvida no
processo.
De certa forma, o Ministério Público já faz isso na
investigação direta (PIC) ao ouvir testemunhas sem a
presença do Advogado do réu, tendo, ainda, a liberdade
para inquirir sem o controle realizado pelo Magistrado,
que poderia indeferir, por exemplo, perguntas que
induzam a resposta (art. 212 do CPP).
Para a defesa, a vantagem de tomar depoimentos
consiste em obter declarações de testemunhas sem a
participação da outra parte (Ministério Público ou
querelante), que poderia, por suas perguntas, gerar
contradições ou enfraquecer a versão apresentada.
Inquirindo a testemunha na investigação criminal
defensiva, o Advogado terá a vantagem estratégica de
que a inquirição não tenha perguntas do Delegado,
Ministério Público, querelante, assistente da acusação ou
Juiz. Seriam formuladas apenas as perguntas escolhidas
previamente pelo Advogado, que teria o domínio da
situação.
Outra vantagem seria a discricionariedade de juntar
ou não aos autos oficiais o termo de declaração ou sua
respectiva gravação audiovisual. Sendo desfavorável ao
investigado/réu e considerando que não se pode exigir a
autoincriminação, o depoimento poderia permanecer
apenas nos autos da investigação defensiva, não sendo
juntado aos autos oficiais. Por outro lado, quando uma
testemunha é arrolada e inquirida em um inquérito ou
processo, suas palavras não podem ser extraídas dos
autos se forem desfavoráveis à parte que a arrolou.
Feitas as considerações sobre as vantagens da
oitiva de uma testemunha na investigação defensiva,
questionamos: como isso deve ser feito na prática?
O primeiro passo consiste em perguntar ao cliente
se há pessoas que saibam sobre o fato e que podem
colaborar para o fortalecimento da sua versão.
Identificando as testemunhas e sabendo o que, em tese,
elas podem declarar, deve-se pesquisar o respectivo
endereço. Em alguns casos, o cliente saberá o endereço.
Em outros, o Advogado precisará diligenciar em busca
dessa informação.
Em seguida, deve-se elaborar um convite à
testemunha para que compareça ao escritório com a
finalidade de prestar declarações sobre o fato. Nada
impede que o convite seja feito por telefone, e-mail ou
aplicativo de mensagens, mas, para garantir a
formalidade do ato, recomenda-se que seja por escrito,
com aviso de recebimento.
Nessa linha, Bulhões (2019, p. 120) afirma:
Nessa toada, é possível que o advogado chame,
formalmente, testemunhas, sejam elas
amigáveis, neutras ou hostis. As ‘amigáveis’
poderão facilmente comparecer
espontaneamente, enquanto talvez as ‘neutras’
reajam positivamente a uma notificação
extrajudicial privada, e às ‘hostis’ muito
provavelmente reste a alternativa da notificação
cartorária (pública). Todas deverão ser
igualmente documentadas.
16.4. Reconstituições
No bojo da investigação criminal defensiva, poderá
ser necessário realizar a reconstituição dos fatos. Trata-
se de medida permitida pelo art. 4º do Provimento n.
188/2018 do Conselho Federal da OAB.
O art. 7º do CPP afirma que “para verificar a
possibilidade de haver a infração sido praticada de
determinado modo, a autoridade policial poderá proceder
à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não
contrarie a moralidade ou a ordem pública.”
Por mais que se esforce nos detalhes e pormenores,
a reprodução jamais será como o fato original. Os
sentimentos, as emoções, a velocidade dos fatos e até a
implantação de falsas memórias podem alterar
significativamente o resultado.
De qualquer forma, recomenda-se que o Advogado
documente tudo que for possível, inclusive as condições
e circunstâncias da reconstituição.
É sabido que a reconstituição não será possível em
alguns casos, ainda que seja requerida nos autos oficiais.
Cita-se um caso em que o STJ entendeu como correto o
indeferimento da reconstituição de um crime sexual:
(...)
Na hipótese, a reconstituição do crime,
conforme pleiteado pela defesa, não se revela
possível, por se tratar de crime sexual, a
denotar que seu deferimento, por certo, poderia
contrariar a moralidade e a ordem pública,
conforme dispõe o art. 7º do Código de Processo
Penal.
(...)
(AgRg nos EDcl no HC 463.089/PR, Rel. Ministro
REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA
TURMA, julgado em 23/10/2018, DJe
31/10/2018)
24. Capa
34. Relatórios
Antes de refletirmos sobre a utilização e a
importância dos relatórios na investigação criminal
defensiva, devemos ter uma visão panorâmica do
processo penal brasileiro e de como os relatórios são
utilizados no inquérito, nos exames periciais, no júri, nas
diligências e em muitos meios de prova.
Sobre o inquérito policial, o art. 10, § 1o, do CPP, diz
que “a autoridade fará minucioso relatório do que tiver
sido apurado e enviará autos ao juiz competente”. Trata-
se do relatório final ou de conclusão, que não é o único
relatório possível no inquérito policial.
No art. 169, parágrafo único, do CPP, consta que,
em relação ao exame do local onde houver sido
praticada a infração, os peritos registrarão, no laudo, as
alterações do estado das coisas e discutirão, no relatório,
as consequências dessas alterações na dinâmica dos
fatos.
Ao preparar o processo para ser levado ao plenário
do júri, o Juiz presidente fará “relatório sucinto do
processo, determinando sua inclusão em pauta da
reunião do Tribunal do Júri” (art. 423, II, do CPP). Aliás, na
sessão do júri, o jurado receberá a cópia do referido
relatório (art. 472, parágrafo único, do CPP).
Na Lei de Organizações Criminosas (Lei n.
12.850/2013), há previsão de que, findo o prazo da
infiltração de agentes, será apresentado um relatório
circunstanciado ao Juiz competente, que imediatamente
cientificará o Ministério Público (art. 10, §4º), Além disso,
no curso do inquérito policial, o Delegado de Polícia
poderá determinar aos seus agentes, e o Ministério
Público poderá requisitar, a qualquer tempo, relatório da
atividade de infiltração (art. 10, §5º).
A Lei de Organizações Criminosas também prevê,
em relação à figura dos agentes de polícia infiltrados
virtuais, que, após o prazo, o relatório circunstanciado,
juntamente com todos os atos eletrônicos praticados
durante a operação, deverão ser registrados, gravados,
armazenados e apresentados ao Juiz competente, que
imediatamente cientificará o Ministério Público (art. 10-A,
§5º). Igualmente, prevê que, no curso do inquérito
policial, o Delegado de Polícia poderá determinar aos
seus agentes, e o Ministério Público e o Juiz competente
poderão requisitar, a qualquer tempo, relatório da
atividade de infiltração (art. 10-A, §6º).
Em sentido semelhante, a Lei de Interceptações
Telefônicas (Lei n. 9.296/96), no seu art. 6º, §2º, prevê
que, cumpridas as diligências, a autoridade policial
encaminhará o resultado da interceptação ao Juiz,
acompanhado de auto circunstanciado, que deverá
conter o resumo das operações realizadas.
Nos inquéritos policiais mais simples, como aqueles
que apuram furtos ou outros crimes sem complexidade,
observamos depoimentos, documentos, perícias (às
vezes) e, ao final, o relatório de conclusão elaborado pelo
Delegado de Polícia, que contém um resumo de todas as
diligências e sua opinião jurídica sobre ser caso de
arquivamento ou de imputação de alguma infração
penal. Normalmente, quando o caso não é complexo, o
único relatório é o final.
Por outro lado, nos inquéritos que investigam crimes
mais complexos, especialmente aqueles conduzidos pela
Polícia Federal ou que abordem crimes relativos ao
Direito Penal Econômico, é comum encontrarmos mais
relatórios, como aqueles mencionados anteriormente
(agentes infiltrados, interceptações telefônicas etc.) ou
que se refiram a alguma diligência, mencionando
informações sobre o local, as pessoas com quem os
agentes tiveram contato, o que observaram e outros
dados relevantes. Trata-se, portanto, de uma explicação
das diligências realizadas.
Assim, de modo geral, um relatório deve:
detalhar o que foi feito;
possibilitar uma visão geral;
analisar os atos, fatos, circunstâncias, locais e
pessoas;
apresentar conclusões.
Nesse esteio, a documentação dos resultados da
investigação defensiva por meio de relatórios é de
extrema importância. Pode ser produtivo elaborar
relatórios referentes a cada diligência, não se limitando
ao relatório final.
Após o cumprimento de uma ordem de serviço, por
exemplo, pode-se elaborar um relatório narrando os
detalhes da diligência. Caso o Advogado ou algum de
seus auxiliares diligencie para obter documentos, tirar
fotos ou entrar em contato com pessoas envolvidas, será
útil documentar, por meio de um relatório, as
circunstâncias da diligência, as informações recebidas e
quaisquer outras questões relevantes.
Em uma persecução penal que apure um crime de
trânsito, por exemplo, o Advogado poderá instaurar a
investigação criminal defensiva e, como diligência,
deslocar-se até o local do acidente para tirar fotos,
solicitar filmagens, anotar características importantes do
local (buracos, curvas, condições do asfalto etc.) e, ao
final, elaborar um relatório com tudo que foi realizado
durante a diligência, bem como suas conclusões ao
interpretar as informações obtidas.
Destaca-se, por oportuno, que o Advogado não
precisará juntar aos autos do inquérito policial ou do
processo todas as peças da investigação defensiva, razão
pela qual o relatório não necessariamente será juntado
aos autos oficiais. Em alguns casos, é recomendável que
esse documento não seja juntado, sobretudo para
permitir ao Advogado utilizar o relatório como local para
realizar algumas reflexões/conclusões que poderiam
prejudicar o cliente. Nessa linha, utilizaria o relatório para
fazer reflexões imparciais e comparar a versão
apresentada pelo cliente (investigado ou réu) com os
elementos obtidos na investigação defensiva.
Aqui, precisamos explicar o sentido de fazer essas
reflexões imparciais nos relatórios. Não se trata de uma
conduta que tenha o condão de prejudicar o cliente, mas,
pelo contrário, de evitar uma participação despreparada
no processo, sem o conhecimento do máximo possível de
informações. Deve-se tentar descobrir tudo que poderá
ser utilizado pela acusação nos autos oficiais, evitando
que a versão do investigado ou réu seja superada, de
forma surpreendente, por informações obtidas por
peritos ou declaradas por testemunhas.
Voltando ao exemplo do crime de trânsito, após a
diligência realizada no bojo da investigação criminal
defensiva, pode ser necessário inserir no relatório, por
exemplo, que o réu havia informado que o local era uma
reta e que era permitida a ultrapassagem, mas foi
constatado que se tratava de uma curva com sinalização
proibindo a ultrapassagem. Essa comparação entre a
versão do cliente e a realidade constatada na diligência
evitará uma surpresa desagradável durante a instrução
processual.
Percebe-se que, na investigação defensiva, não se
pode seguir irrefletidamente a versão do réu,
investigando apenas o que lhe é favorável e distorcendo
a realidade observada durante as diligências. A
investigação precisa ser fiel às apurações, o que equivale
a dizer que precisa ser, de certa forma, imparcial. Apenas
depois, ao selecionar o que será levado aos autos
oficiais, é que se exige uma atuação parcial (em favor do
cliente).
Por esse motivo, o relatório deve ser um resumo das
diligências realizadas, com as interpretações,
apreciações e conclusões do Advogado, ainda que essa
deliberação seja inicialmente contra a narrativa do
investigado. O relatório é um “debate em forma de
monólogo”, apreciando as informações e comparando
dados e fatos.
Sugere-se, preferencialmente, a elaboração de um
relatório ao final de cada diligência realizada na
investigação defensiva, seguindo o mesmo parâmetro já
mencionado acerca das perícias e dos meios de obtenção
de provas.
Nesse esteio, Bulhões (2019, p. 136-137):
Se possível, cada diligência, seja de mão própria
ou por terceiros profissionais, deve gerar um
relatório acerca do método empregado, as
condições de tempo, lugar e outras informações
que possam ser pertinentes e relevantes ao
contexto de determinação, desenvolvimento e
apresentação das provas obtidas/produzidas em
cada atividade investigativa.
Penal o art. 3º-A, que diz: “O processo penal terá estrutura acusatória,
vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da
atuação probatória do órgão de acusação”. Entretanto, em decisão cautelar
proferida nas ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) 6.298, 6.299,
6.300 e 6.305, o Min. Fux suspendeu a eficácia, por tempo indeterminado,
do referido dispositivo legal, assim como de outros artigos que foram
incluídos no CPP pela Lei Anticrime.
[4] Apesar de não ser um fundamento constitucional, a súmula vinculante é