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Evinis Talon

Investigação criminal defensiva

2020
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ICCS – International
Center for Criminal Studies
Gramado/RS
www.iccs.com.br
EVINIS TALON
Professor de cursos de pós-graduação em Direito Penal e
Processual Penal
Mestre em Direito pela UNISC/RS
Especialista em Processo Penal pela Universidade de
Coimbra (Portugal).
Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela
UGF/RJ
Especialista em Direito Constitucional pela UGF/RJ
Especialista em Filosofia pela UGF/RJ
Especialista em Sociologia pela UGF/RJ
Ex-Defensor Público do Estado do Rio Grande do Sul.
Advogado, consultor jurídico e parecerista.
Presidente do International Center for Criminal Studies
(ICCS)
Fundador do www.cursopenal.com.br
Palestrante
Autor de vários livros
www.evinistalon.com
Instagram: @evinistalon
Para minha querida esposa Jaiane e meus
filhos caninos Piu e Apolo, porque
estiveram do meu lado enquanto eu
escrevia cada letra deste livro. São,
praticamente, coautora e cãoautores.

Aos meus pais Denize e José Inacio, por tudo


que sempre fizeram por mim e que eu
jamais conseguiria descrever com
meras palavras.

Aos meus irmãos José Edinis (in memoriam), por ter


me dado o meu primeiro livro, e Eusiane, pelas
inúmeras horas que estudou comigo na infância.

Aos melhores sobrinhos


que um tio pode ter:
Luana, José Victor,
Lucas, Ketleyn e Dinis.

A todos que me ajudaram nas pesquisas


e revisões deste livro, especialmente
Bianca, Giovanna e Régis.

A você, que acompanha o meu trabalho


e me honra com a sua confiança.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AgRg - Agravo regimental


Art. - Artigo
CF - Constituição Federal
CNJ - Conselho Nacional de Justiça
CNMP - Conselho Nacional do Ministério Público
CP - Código Penal
CPC - Código de Processo Civil
CPP - Código de Processo Penal
HC - Habeas corpus
LEP - Lei de Execução Penal
Min. - Ministro
MP - Ministério Público
OAB - Ordem dos Advogados do Brasil
PIC - Procedimento investigatório criminal
RE - Recurso extraordinário
RESP - Recurso especial
Rel. - Relator
RHC - Recurso em habeas corpus
STF - Supremo Tribunal Federal
STJ - Superior Tribunal de Justiça
TJ - Tribunal de Justiça
Sumário

Parte I - Teoria geral da investigação criminal


defensiva
1. Noções gerais
2. Os problemas do inquérito policial
3. Os problemas da questão probatória
3.1. A busca da “verdade real”
3.2. O "peso" da prova testemunhal e a distribuição
do ônus da prova
3.3. Processar para absolver
4. Os problemas da (falta de) participação da defesa
na persecução penal
5. Em busca da paridade de armas
6. Um novo nicho na Advocacia?
7. Os fundamentos da atuação defensiva e
investigativa
7. 1. Fundamentos constitucionais da investigação
criminal defensiva
7.2. O Código de Processo Penal
7.2.1. O art. 156 do CPP: quem deve provar?
7.3. A investigação direta pelo Ministério Público
7.4. A Lei do Detetive Particular
7.5. O Estatuto da OAB
7.6. O Provimento n. 188/2018 do Conselho Federal
da OAB
7.7. O projeto do Novo Código de Processo Penal
8. O conceito de investigação criminal defensiva
9. Comparando com o inquérito policial
10. Quais atividades podem ser objeto de investigação
criminal defensiva?
11. A investigação para subsidiar queixa-crime
12. A investigação é privativa da Advocacia
13. Quem participa da investigação criminal
defensiva?
14. Momentos da investigação criminal defensiva
14.1. A investigação defensiva durante a
investigação oficial
14.2. A investigação durante a instrução processual
14.3. A investigação na fase recursal
14.4. A investigação defensiva na execução penal
14.5. A investigação defensiva para a revisão
criminal
15. Finalidades da investigação
15.1. Pedido de instauração de inquérito policial
15.2. Pedido de trancamento de inquérito
15.3. Rejeição ou recebimento de denúncia ou
queixa
15.4. Resposta à acusação
15.5. Pedido de medidas cautelares
15.6. Defesa em ação penal pública ou privada
15.7. Razões de recurso
15.8. Revisão criminal
15.9. Habeas corpus
15.10. Proposta de acordo de colaboração
premiada
15.11. Proposta de acordo de leniência
15.12. Outras medidas destinadas a assegurar os
direitos individuais em procedimentos de natureza
criminal
16. Diligências possíveis
16.1. Depoimentos
16.2. Pesquisa e obtenção de dados e informações
16.3. Laudos e exames periciais
16.4. Reconstituições
17. Uma investigação imparcial para fins parciais
18. Sigilo das informações
19. É dever do Advogado levar os fatos investigados à
autoridade?
20. Comunicação e publicidade do resultado da
investigação
Parte II - Questões práticas
21. Limites da investigação defensiva
21.1. Falta de coerção e de fé pública
21.2. A ausência de poder de requisição
21.3. Superando algumas dificuldades
22. Os autos da investigação criminal defensiva
23. Termo de instauração
24. Capa
25. Comunicação à OAB
26. Rit(m)o e andamento
27. A divisão da diligência em partes
28. Ordem de serviço
29. Auto de descrição de local
30. Termo de declarações
31. Auto de reconhecimento de pessoa
32. Auto de reconhecimento de objeto
33. Auto de avaliação de coisa
34. Relatórios
35. Termo de enumeração de pessoas
36. Termo de enumeração de crimes
37. Relatório de conclusão
38. A utilização parcial dos resultados da investigação:
cuidados
39. Quando juntar aos autos oficiais?
40. O que fazer se os resultados da investigação
criminal defensiva não forem aceitos?
41. Continuar a investigação durante todo o processo?
Considerações finais

Referências
Parte I
Teoria geral da investigação criminal
defensiva
1. Noções gerais

O Advogado Criminalista pode fazer uma


investigação paralela e alheia ao inquérito policial? Além
de requerimentos na investigação criminal oficial – quase
sempre indeferidos –, o Advogado poderá instaurar e
conduzir sua própria investigação?
Trata-se de um tema atual, de importância prática e
intimamente ligado à Advocacia Criminal artesanal,
especializada e detalhista.
Atualmente, não se admite mais uma defesa técnica
padronizada e passiva, que apenas rebata os fatos e as
provas que surgem na persecução penal por meio da
atividade policial, da atuação da acusação e do criticável
protagonismo de alguns Juízes na gestão probatória.
É imperativo que os Advogados Criminalistas e
Defensores Públicos ataquem, e não apenas defendam.
Devem produzir provas, não se limitando a contrariar as
provas produzidas pela acusação. Exige-se iniciativa,
superando a lógica da mera resposta.
O Advogado tem o dever de tomar todas as
medidas possíveis/cabíveis em favor do investigado/réu.
Essas medidas não podem ser limitadas a reações aos
atos da acusação e às decisões dos Juízes, porque devem
abranger também iniciativas da defesa técnica, como a
investigação criminal defensiva.
A utilização efetiva da investigação defensiva pode
decidir se um inocente será condenado ou absolvido, se
será ou não aplicada uma qualificadora, privilegiadora,
agravante, atenuante, causa de aumento ou de
diminuição de pena. Pode, ainda, seguir linhas de
investigação descartadas pela autoridade policial ou pelo
Ministério Público, encontrando elementos que
permaneceriam desconhecidos.
A investigação criminal defensiva amplia o cenário
de atuação da defesa técnica, que não mais deve
permanecer inerte ou apenas rebater o que a outra parte
apresenta nos autos. Exige-se uma postura ativa,
inovadora e produtora de elementos, quiçá preventiva,
dependendo do caso.
Contudo, a abordagem doutrinária dessa forma de
atuação pela defesa técnica ainda é acanhada, não
recebendo a atenção que o tema merece.
Enquanto a investigação direta pelo Ministério
Público recebeu enorme atenção doutrinária,
jurisprudencial e midiática, o mesmo não ocorreu, até o
momento, em relação à investigação direta pela defesa.
Apesar dos inúmeros livros e artigos defendendo o poder
de investigação do órgão acusador, ainda é tímida essa
iniciativa no âmbito da Advocacia e da Defensoria
Pública, mesmo após a publicação do Provimento n.
188/2018 do Conselho Federal da OAB. Aliás, é possível
supor que muitos Advogados desconheçam a
possibilidade de instauração de uma investigação
defensiva paralela ao inquérito ou processo.
Já se observou há muito tempo que a acusação
prepondera no processo penal brasileiro, o que decorre
de inúmeros fatores:
excesso de livros de Direito Penal e Direito
Processual Penal escritos por Promotores de
Justiça, Procuradores da República ou
Magistrados com um perfil mais punitivista;
escassez de livros escritos por Advogados.
Ademais, não é raro que os Advogados autores
de livros sejam membros aposentados do
Ministério Público;
foco midiático na acusação em detrimento da
defesa;
confusão popular entre os crimes praticados
pelo investigado ou réu e o Advogado ou
Defensor Público que realiza a defesa, muitas
vezes atacado com a frase “quem defende
bandido também é bandido”;
a “busca da verdade real”, que incentiva o
protagonismo dos Juízes;
o crescimento da onda punitivista.
Deve-se inserir na pauta da defesa a busca da
redução da desigualdade entre os poderes das partes,
inclusive na fase pré-processual. Como objetivo onírico
ou utópico – que sempre deve ser buscado –, deveríamos
tentar igualar tais poderes.
O Advogado jamais poderá ficar satisfeito com a
mera formalidade da sua admissão em um processo,
como se fosse um desimportante adorno da sala de
audiências.
A defesa não garante resultados, mas deve buscá-
los com todos os meios legalmente permitidos. Nas
belíssimas palavras de Silva (1991, p. 21), “a defesa é
um meio e persegue um fim. Não é preciso defender
‘bonito’, é preciso defender ‘útil’.”
Deve-se ter responsabilidade como Advogado ou
Defensor Público de alguém. Como diz Oliveira (2008, p.
17):
Qualquer relação de aconselhamento jurídico ou
de patrocínio forense importa, para o respectivo
advogado, uma irrenunciável responsabilidade
cívica ética e profissional, mormente pelas
consequências mediatas que possam vir a
produzir-se na esfera jurídica do aconselhado ou
representado, na sequência do desempenho
daquele.

A relevância do papel defensivo somente é sentida


se, em cada agir, tivermos ciência das consequências
possíveis: pena privativa de liberdade, estigma de
condenado, ofensas a direitos (incluindo a vida) no
cárcere etc. Como disse o conselheiro Acácio, no O primo
Basílio, de Eça de Queirós, as consequências vêm sempre
depois.
É missão vital do Advogado refletir sobre as dores
que o investigado/réu sofre e imaginar o sofrimento
inimaginável de quem deposita as últimas esperanças
nos seus serviços.
Carnelutti (2009, p. 34-35) descreve com exatidão o
papel do Advogado:
A essência, a dificuldade, a nobreza da
advocacia é esta: situar-se no último degrau da
escada, junto ao imputado. As pessoas não
compreendem aquilo que, por outro lado, sequer
os juristas compreendem; e riem, e
ridicularizam, e escarnecem.

Por todos esses motivos, devemos considerar e


incentivar a utilização da investigação criminal defensiva
como instrumento de efetivação da ampla defesa.

2. Os problemas do inquérito policial

A fase da investigação preliminar tem um impacto


considerável no futuro processo penal, haja vista que
seus resultados serão utilizados como fundamentos do
arquivamento do inquérito ou para o oferecimento e o
recebimento da peça acusatória. Não raramente, durante
a investigação, também são aplicadas medidas
cautelares pessoais (inclusive a pior delas: a prisão
preventiva) e reais, bem como produzidas provas
irrepetíveis.
Conquanto seja dispensável (arts. 12, 27, 39, §5º e
46, §1º, todos do CPP), o inquérito policial, via de regra,
acompanha a denúncia ou queixa, sendo decisivo para
que o julgador receba ou rejeite a exordial acusatória,
mormente para a análise da justa causa.
Dessa forma, devemos entender o papel da defesa
durante o inquérito e as desvantagens que temos em
comparação com quem, futuramente, fará a imputação
de uma infração penal contra o investigado.
A primeira observação recai sobre o fato de que o
Ministério Público exerce o controle externo da atividade
policial (art. 129, VII, da Constituição Federal). Ainda que
o Delegado tenha boa-fé na condução do inquérito, é
evidente que essa atribuição do Ministério Público pode
influenciar a forma de investigar, adotando linhas que
favoreçam os interesses do Parquet.
Além disso, nos concursos públicos para o cargo de
Delegado, é comum que os candidatos precisem adotar
livros de viés punitivista ou, no mínimo, que repitam
mantras como “não existe contraditório no inquérito
policial”.[1] Esse tipo de estudo poderá ter influência no
exercício das atribuições, inclusive quando for decidir
sobre o pedido de alguma diligência formulado pelo
investigado (art. 14 do CPP).
Sem a investigação criminal defensiva, o Advogado
dependeria sempre da concordância da autoridade
policial para realizar as diligências no inquérito policial, o
que, conforme a parte final do art. 14 do CPP (“será
realizada, ou não, a juízo da autoridade”), não seria tão
fácil. Aliás, na prática, é comum o indeferimento desses
requerimentos. Cita-se, por exemplo, a seguinte decisão:
(...)
V. A autoridade policial possui discricionariedade
na condução do inquérito, dentro dos limites da
lei. As diligências citadas pela defesa, não
realizadas na fase extrajudicial pelo delegado,
não demonstram parcialidade ou irregularidade.
Decorrem da linha de investigação adotada.
Preliminares rejeitadas.
(...)
(TJ-DF - RSE: 20141010053739, Relatora:
SANDRA DE SANTIS, Data de Julgamento:
17/09/2015, 1ª Turma Criminal, Data de
Publicação: Publicado no DJE: 21/09/2015. Pág.:
168)
A defesa é afastada da fase preliminar.
Normalmente, seus pedidos são indeferidos e sua
presença é indesejada ou apenas tolerada, mas
raramente oportunizada/invocada.
Nesse viés, “temos uma política estatal de
desconsideração das hipóteses defensivas, sendo tais
proposições vistas com maus olhos, e taxadas quase
sempre de irrelevantes, impertinentes e/ou protelatórias”
(BULHÕES, 2019, p. 59).
Por outro lado, o membro do Ministério Público pode
simplesmente requisitar o cumprimento de alguma
diligência ou até instaurar uma investigação direta,
procedimento já autorizado pelo Supremo Tribunal
Federal (RE 593.727). Trata-se de uma nítida falta de
paridade de armas, como veremos adiante.
Uma sugestão muito interessante apresentada por
Silva (2019, p. 87) é a seguinte:
(...) quando a defesa encontrasse obstáculo à
realização de diligência requerida no corpo do
inquérito policial, com base no permissivo
constante do art. 14 do CPP, demonstrando a
sua pertinência para a apuração do fato, poderia
o defensor propor ao Ministério Público a prática
de ato cooperativo para a tomada de
depoimento em conjunto, realizando-se uma
oitiva de testemunha no gabinete do Ministério
Público com a participação da defesa técnica,
sempre que negada a oitiva pelo Delegado de
Polícia.

Essa sugestão dependeria de uma cooperação do


Ministério Público, que, muitas vezes, não se mostra
disposto a buscar qualquer coisa que não seja uma
confirmação da versão acusatória.
Não apenas é difícil ter êxito nos requerimentos
defensivos, mas também, em alguns casos, o acesso aos
autos do inquérito policial é, por si só, hercúleo, apesar
da súmula vinculante n. 14 do STF, que afirma ser direito
do defensor, no interesse do representado, ter acesso
amplo aos elementos de prova que, já documentados em
procedimento investigatório realizado por órgão com
competência de polícia judiciária, digam respeito ao
exercício do direito de defesa. Da mesma forma, o art.
7º, XIV, do Estatuto da OAB, prevê como direito do
Advogado examinar, em qualquer instituição responsável
por conduzir investigação, mesmo sem procuração, autos
de flagrante e de investigações de qualquer natureza,
findos ou em andamento. Inclusive, a diuturna violação
desse direito ensejou a tipificação da negativa de acesso
aos autos como crime de abuso de autoridade.[2]
No mesmo sentido, também é constantemente
violado o direito previsto no art. 7º, XXI, do Estatuto da
OAB, que consiste em assistir aos clientes investigados
durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade
absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento,
podendo apresentar razões e quesitos.
Muitos desses problemas decorrem da equivocada
ideia de que há uma rivalidade entre a autoridade policial
e o Advogado Criminalista ou que este estaria em busca
da impunidade. Desconsidera-se, infelizmente, o fato de
que o Advogado é indispensável à administração da
justiça (art. 133 da Constituição Federal).
Por derradeiro, como em qualquer outra carreira –
pública ou privada –, há policiais que desonram as
instituições em que trabalham, cometendo ilegalidades
absurdas. Basta pesquisar a expressão “kit flagrante”
para encontrar notícias assustadoras. Felizmente, é uma
minoria. Infelizmente, basta que um policial aja assim
para destruir a vida de alguém.
Muitas ilegalidades policiais permanecem
desconhecidas e invisíveis, dificultando o controle judicial
e ministerial, ao contrário dos abusos praticados por
Magistrados, normalmente gravados e consignados. Por
esse motivo, Lyra (2009, p. 20) afirma que é preferível “a
‘elaboração’ judicial, que comporta defesa e recurso, às
violências e fraudes policiais, aos expedientes de
supostos técnicos arvorados em guias forenses.”
Por todos esses motivos, o inquérito policial não é
um cenário adequado para a defesa exercer plenamente
sua atividade. Queremos com isso sustentar que, como
forma de superar os problemas do inquérito policial – já
enraizados na prática forense e de difícil superação –,
deve-se admitir a investigação criminal defensiva.
Conforme Oliveira (2008, p. 19), “o defensor não
deve confiar o destino do arguido ‘à sorte’ das
investigações oficiosas e, antes pelo contrário, deverá
nas mesmas procurar intervir”. Em suma, desconsiderar
a importância do inquérito policial, deixando as
investigações nas mãos da autoridade policial, é um
grande equívoco estratégico para a defesa.
Se, tentando intervir no inquérito policial, o
Advogado não obtiver êxito, além das medidas de praxe
(habeas corpus, mandado de segurança, reclamação
constitucional etc.), a investigação criminal defensiva
poderá ser uma saída.

3. Os problemas da questão probatória

De acordo com Gomes Filho (2005, p. 307-308),


uma das interpretações da palavra prova é no sentido de
que ela serve para indicar:
(...) cada um dos dados objetivos que confirmam
ou negam uma asserção a respeito de um fato
que interessa à decisão da causa. É o que se
denomina elemento de prova (evidence, em
inglês). Constituem elementos de prova, por
exemplo, a declaração de uma testemunha
sobre determinado fato, a opinião de um perito
sobre a matéria de sua especialidade, o
conteúdo de um documento etc.
(...)
Sob outro aspecto, a palavra prova pode
significar a própria conclusão que se extrai dos
diversos elementos de prova existentes, a
propósito de um determinado fato: é o resultado
da prova (proof, em inglês), que é obtido não
apenas pela soma daqueles elementos, mas
sobretudo por meio de um procedimento
intelectual feito pelo juiz, que permite
estabelecer se a afirmação ou negação do fato é
verdadeira ou não.

Infelizmente, ainda prepondera na prática uma


atividade defensiva de mera contestação da versão
apresentada na exordial (denúncia ou queixa) e das
provas produzidas pela acusação. Aqueles que se
destacam no exercício de uma Advocacia efetivamente
artesanal e com a pretensão de efetividade são os que
apresentam versões diferentes daquelas da acusação e
atuam proativamente na busca/produção de provas que
confirmem a narrativa.
É crucial entender as “regras do jogo” definidas pela
jurisprudência quanto à questão probatória, como:
a supervalorização das palavras dos policiais;
a supervalorização das palavras da vítima nos
crimes sexuais ou praticados no contexto da
violência doméstica e familiar contra a mulher;
o “ônus da prova” atribuído ao réu por alguns
julgadores, sobretudo no caso das excludentes
de ilicitude.
Há inúmeros problemas na questão probatória. A
utilização da investigação criminal defensiva não
resolverá todos eles, mas será um meio a mais para a
defesa combatê-los.

3.1. A busca da “verdade real”


O primeiro e mais conhecido problema em relação
às provas diz respeito à busca da verdade real, como se
fosse possível atingir ou reproduzir a realidade dos fatos.
A busca da verdade real é utilizada como
fundamento para que Juízes defiram requerimentos do
Ministério Público – ainda que ilegais ou intempestivos –
e quando, violando o sistema constitucional acusatório,
produzem prova de ofício.
Não sabemos se é por ingenuidade, compadrio com
o Ministério Público ou desconhecimento quanto à
compreensão dos fatos – a hermenêutica filosófica
ajudaria neste caso –, mas a verdade real continua
aparecendo em inúmeras decisões, inclusive dos
Tribunais Superiores.
Supõe-se, equivocadamente, que o Juiz deve buscar
a verdade real e que é possível alcançar a realidade dos
fatos, reproduzindo o que aconteceu.
No que concerne ao desejo insaciável de perseguir
a verdade real, os Juízes deveriam entender que são
pautados pela imparcialidade. Presumindo-se a inocência
dos réus, qualquer conduta ativa dos Magistrados seria
uma tentativa de afastar essa presunção, o que significa,
em outras palavras, uma busca de razões para condenar.
Ora, essa postura é evidentemente incompatível com o
sistema acusatório. Se quiser acusar e produzir provas,
que faça concurso para o Ministério Público e abandone a
Magistratura.
Quanto à possibilidade de alcançar a realidade dos
fatos, falta-lhes um pouco de clareza sobre a função que
desempenham diariamente.
O Juiz nunca interpretará diretamente os fatos.
Aliás, ainda que presenciasse alguma conduta criminosa
na sua frente, permaneceria na compreensão dos fatos
por meio da tradição em que está inserido. Ou voltamos
para a proposta de interpretação sujeito-objeto?
No processo penal – como em qualquer outro –, há
uma metainterpretação dos fatos. Isso significa que o Juiz
não interpreta os fatos diretamente, mas apenas
interpreta a interpretação exteriorizada pelas
testemunhas ou pelos peritos.
Quando uma testemunha relata algo ao Juiz durante
o seu depoimento, já está interpretando tudo que
viu/ouviu ou acredita ter visto/ouvido. Nesse ponto,
também surge o risco das falsas memórias.
Em um processo por furto, por exemplo, a
testemunha interpreta e narra ao Juiz se viu o réu
próximo ao local do fato (e também está interpretando o
conceito de proximidade espacial), se o acusado parecia
suspeito, como agiu, se houve escalada etc.
Por sua vez, em um processo por corrupção ativa,
quando o funcionário público, em seu testemunho, narra
que o réu lhe ofereceu uma vantagem indevida, uma
equivocada interpretação dos fatos na hipótese, por
exemplo, de um suposto oferecimento implícito, poderia
comprometer a interpretação a ser realizada pelo Juiz.
Em suma, o Juiz interpreta o conjunto de
interpretações feitas pelas testemunhas. As provas não
são o fato em si, mas sim interpretações sobre ele.
Noutros termos, primeiramente, a testemunha presencia
algo (talvez uma parte da conduta criminosa); em
seguida, relata ao Juiz durante a audiência, podendo
cometer equívocos (falsas memórias); por fim, o Juiz
interpreta a interpretação das testemunhas. Portanto, um
equívoco na observação do fato ou no seu relato ao Juiz
pode contaminar a sua interpretação.
Ademais, com audiências realizadas a cada 10 ou
15 minutos, seria pretensioso imaginar a possibilidade de
interpretar adequadamente os fatos. Voltando ao caso do
furto, por exemplo, é comum perceber que, quando uma
testemunha diz que o autor do fato “deve ter escalado”
para subtrair a coisa alheia móvel, é raro que algum
membro do Ministério Público ou Magistrado pergunte
qual era a altura da parede supostamente escalada, se
seria necessário algum esforço significativo (daí a
qualificadora da escalada) etc. Normalmente, após a fala
da testemunha, já estaria configurada a qualificadora
para muitos Magistrados, que acreditam cegamente na
interpretação explanada em audiência. A busca da
verdade real, além de impossível, é casuística,
agraciando apenas a acusação.
Sem uma atuação defensiva satisfatória – nos autos
oficiais ou por meio da investigação criminal defensiva –,
pode ser reproduzida uma interpretação equivocada
sobre os fatos, apresentando lacunas, contradições ou
“achismos”.
Preocupar-se apenas com o convencimento do Juiz
(nas alegações finais, por exemplo) é desconsiderar que
a interpretação judicial é feita com base nas várias
interpretações feitas anteriormente (depoimentos,
perícias etc.) e que os Juízes assumem – indevidamente –
um protagonismo na produção de provas invocando que
estão em busca da “verdade real”.[3]
A atuação da defesa deve ter impacto na produção
da prova, não sendo reservada somente para a valoração
feita pelo Juiz.

3.2. O "peso" da prova testemunhal e a


distribuição do ônus da prova
Ainda que não exista, no processo penal brasileiro,
uma prova que dispense a valoração de todas as outras,
é inegável que se utiliza excessivamente a prova
testemunhal, a qual, em razão das falsas memórias, das
influências indevidas e da forma de inquirir, pode ser
facilmente manipulada.
A indevida distribuição do ônus da prova – em
alguns casos atribuído diretamente à defesa – também é
um problema que precisa ser superado doutrinária e
jurisprudencialmente ou, no mínimo, precisa de
contornos que facilitem o cumprimento dessa
incumbência, como a possibilidade de realizar a
investigação criminal defensiva.
Em relação aos crimes patrimoniais, por exemplo, é
frequente o entendimento jurisprudencial de que, sendo
o agente encontrado na posse do objeto, cabe a ele
provar sua inocência. Noutros termos, inverte-se o ônus
da prova em prejuízo do réu.
APELAÇÃO-CRIME. ROUBO SIMPLES. TENTATIVA.
1. ÉDITO CONDENATÓRIO. MANUTENÇÃO. (…)
Apreensão da “res furtivae” em poder do
agente, logo após a prática subtrativa, é
situação que faz gerar presunção de autoria,
com a inversão do “onus probandi”, cumprindo
ao flagrado o encargo de comprovar a licitude
da posse (art. 156 do CPP), ônus do qual não se
desincumbiu a contento. (…) APELO IMPROVIDO.
DE OFÍCIO, CORRIGIDO ERRO MATERIAL HAVIDO
NO DISPOSITIVO DA SENTENÇA PARA CONSTAR
QUE O ACUSADO RESTOU CONDENADO NOS
LINDES DO ART. 157, CAPUT, C/C ART. 14, II,
AMBOS DO CP. (Apelação Crime Nº
70070553458, Oitava Câmara Criminal, Tribunal
de Justiça do RS, Relatora: Fabianne Breton
Baisch, Julgado em 14/12/2016)

Em determinados casos, como crimes sexuais e


aqueles relativos à violência doméstica e familiar contra
a mulher (Lei n. 11.340/2006 - Lei Maria da Penha),
consolidou-se o entendimento de que a palavra da vítima
tem especial valor, caso não existam elementos que
demonstrem, por exemplo, o interesse em prejudicar o
réu. Não se trata de uma inversão no ônus da prova, mas
consiste em uma facilidade para a acusação.
(...)
IV - Em crimes cometidos na clandestinidade,
sem a presença de qualquer testemunha, a
palavra da vítima assume especial relevância
como meio de prova, nos termos do
entendimento desta eg. Corte.
(...)
(RHC 119.097/MG, Rel. Ministro LEOPOLDO DE
ARRUDA RAPOSO (DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TJ/PE), QUINTA TURMA, julgado
em 11/02/2020, DJe 19/02/2020)

Também devemos considerar que, em muitos casos,


as palavras dos policiais (inclusive aqueles que
efetuaram a prisão em flagrante) adquire grande
relevância na formação da convicção do julgador.
Inúmeros fatores contribuem para isso, como o fato de
serem servidores públicos, a autoridade transmitida
pelos uniformes, a experiência como testemunhas e, não
raramente, a vontade do julgador de não se indispor em
relação a eles.
(...) IV - O depoimento dos policiais prestado em
Juízo constitui meio de prova idôneo a resultar
na condenação do réu, notadamente quando
ausente qualquer dúvida sobre a imparcialidade
dos agentes, cabendo à defesa o ônus de
demonstrar a imprestabilidade da prova, o que
não ocorreu no presente caso. Precedentes.
(...)
(HC 471.082/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER,
QUINTA TURMA, julgado em 23/10/2018, DJe
30/10/2018)

Para arrematar, a prova testemunhal, se


confrontada com o interrogatório do réu, tem um peso
maior na prática. Assim, se a vítima ou uma testemunha
afirmar que o réu praticou o crime, mas este negar em
seu interrogatório, é provável que seja prolatada uma
sentença condenatória, caso não existam outras provas
que confirmem a narrativa defensiva.
A supervalorização da prova testemunhal pode ser
fruto da ainda tímida e precária utilização de provas
periciais. Apenas recentemente foi intensificada a
preocupação quanto às provas técnicas/periciais,
notadamente por meio da Lei n. 13.964/2019 (Lei
Anticrime), que instituiu:
a regulamentação da cadeia de custódia (arts.
158-A, 158-B, 158-C, 158-D, 158-E e 158-F do
CPP);
uma disciplina maior dos bancos de perfis
genéticos (art. 9º-A da LEP);
a regulamentação da captação ambiental de
sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos
(art. 8º-A da Lei n. 9.296/96);
a criação do Banco Nacional de Perfis Balísticos
(art. 34-A do Estatuto do Desarmamento);
a autorização da criação, no Ministério da
Justiça e Segurança Pública, do Banco Nacional
Multibiométrico e de Impressões Digitais (art.
7º-C da Lei n. 12.037/2009).
A utilização da investigação criminal defensiva pode
servir como instrumento de combate às afirmações das
testemunhas e, ao mesmo tempo, como cenário de
obtenção de elementos técnicos/periciais que
fundamentem a versão defensiva.

3.3. Processar para absolver


O processo, onde as provas são produzidas e
valoradas, causa sofrimento até para os inocentes.
Segundo Carnelutti (2009, p. 66):
Infelizmente, a justiça humana está feita de tal
maneira que não somente se faz sofrer os
homens porque são culpados, senão também
para saber se são culpados ou inocentes. Esta é,
infelizmente, uma necessidade, à qual o
processo não pode se subtrair, nem sequer se
seu mecanismo fosse humanamente perfeito.
Santo Agostinho escreveu a este respeito uma
de suas páginas imortais; a tortura, nas formas
mais cruéis, foi abolida, ao menos no papel; mas
o próprio processo é uma tortura.

O Advogado não pode desconsiderar o sofrimento


causado pela tramitação de um processo. Se for cabível,
a persecução penal deverá ser encerrada o mais cedo
possível, preferencialmente por meio do trancamento ou
arquivamento do inquérito policial, bem como pela
rejeição da denúncia ou queixa.
O recebimento de uma denúncia perceptivelmente
sem justa causa para avaliar, durante o processo, se
existem provas suficientes para a condenação constitui
uma gravíssima atrocidade.
Ademais, utilizando as lições de Carnelutti (2009, p.
94), ressaltamos que “todas as sentenças de absolvição,
excluída a absolvição por insuficiência de provas,
implicam a existência de um erro judicial”. No processo
penal brasileiro, podemos considerar que houve um erro
do Ministério Público ao oferecer a denúncia e do
Magistrado ao recebê-la quando se trata de fato atípico,
abrangido por uma excludente de ilicitude ou sem provas
de autoria ou materialidade.
Reiteramos: se possível, a defesa deverá abreviar a
persecução penal, não admitindo que alguém seja
processado para, ao final, ser absolvido. O processo, por
si só, também causa sofrimento, ainda que não resulte
em uma pena.
A dificuldade consiste em evitar esse sofrimento
quando se sabe que o inquérito policial tem vários
problemas – especialmente o afastamento da defesa e a
escolha de linhas de investigação acusatórias –, o que
também ocorre no processo, que é repleto de falhas na
questão probatória.
Por esses motivos, o uso da investigação criminal
defensiva deve ser uma opção real para conduzir a fase
inquisitorial a outras linhas diversas das habitualmente
adotadas. Na fase processual, a investigação defensiva
deve ter o desiderato de obter o máximo de elementos
com maior brevidade, buscando, se possível, o
trancamento do processo.
Conclui-se que a investigação defensiva não será
suficiente para superar todas as mazelas da persecução
penal, especialmente porque os vícios continuarão sendo
reproduzidos. A mudança consiste na possibilidade de
questionamento ou superação parcial desses vícios por
meio de elementos produzidos unilateralmente pela
defesa.

4. Os problemas da (falta de)


participação da defesa na persecução
penal

Durante a persecução penal – nas fases policial e


judicial –, há um afastamento da defesa técnica, que é
tratada como mera formalidade.
Isso acontece, por exemplo, quando são chamados
os Advogados apenas para a assinatura do auto de
prisão em flagrante, sem qualquer orientação do cliente
quanto ao seu interrogatório.
Ainda na fase policial, o Advogado raramente é
chamado para participar da inquirição de testemunhas,
mesmo que tenha procuração nos autos. Às vezes, por
ter contato com as pessoas envolvidas, o investigado
(cliente) surpreende/constrange o Advogado
perguntando sobre o depoimento marcado para ouvir
alguém.
Na fase judicial, constata-se um confronto desigual,
com amplo favorecimento da acusação, muitas vezes
com o fomento de Magistrados que desconhecem a
importância da imparcialidade e, não raramente, aplicam
seus próprios “Códigos”. Nas exatas palavras de Rosa
(2017, p. 35-36):
(...) encontraremos juízes que se declararam
imperadores de suas unidades jurisdicionais, nas
quais o Direito se confunde com suas
preferências pessoais, como se pudessem eles,
democraticamente, criar seu autodireito, sem
referenciais externos e normativos. O império do
‘eu penso assim’ e ‘se não gostou, recorra’.

No que tange às medidas cautelares, há uma


previsão legal – recentemente melhorada pela Lei
Anticrime – no art. 282, §3º, do CPP, que é pouco
conhecida e diuturnamente desrespeitada/manipulada.
Trata-se da previsão de que, como regra, existe
contraditório prévio em relação à decretação de medidas
cautelares:
Art. 282, § 3º, do CPP: Ressalvados os casos de
urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o
juiz, ao receber o pedido de medida cautelar,
determinará a intimação da parte contrária,
para se manifestar no prazo de 5 (cinco) dias,
acompanhada de cópia do requerimento e das
peças necessárias, permanecendo os autos em
juízo, e os casos de urgência ou de perigo
deverão ser justificados e fundamentados em
decisão que contenha elementos do caso
concreto que justifiquem essa medida
excepcional.

Ora, não é raro que, na prática, os Juízes


desconsiderem totalmente a regra e utilizem diretamente
a exceção (decretação da medida sem contraditório),
afirmando que se trata de caso urgente ou de perigo de
ineficácia da medida. A exigência de fundamentação com
elementos do caso concreto, apesar de ser um limite, é
facilmente manipulável.
Na instrução processual, especificamente nas
audiências, os Magistrados utilizam a parte final do caput
do art. 212 do CPP (“não admitindo o juiz aquelas que
puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a
causa ou importarem na repetição de outra já
respondida”) quase que exclusivamente contra a defesa.
Dificilmente indeferem uma pergunta feita pelo
Ministério Público.
Em relação às diligências, enquanto o Ministério
Público pode simplesmente requisitar informações ou
documentos, a defesa não tem o mesmo poder,
precisando “solicitá-los” ao possuidor e, em caso de
negativa, deverá requerer ao Magistrado, que não
raramente também indeferirá o pedido, afirmando que se
trata de medida protelatória ou impertinente. Às vezes, a
defesa é intimada para informar o que pretende provar
com tal diligência, algo teratológico que produz a
necessidade de antecipar nos autos a estratégia
defensiva.
Para piorar o cenário, é comum observar, nas
decisões de correição parcial ou habeas corpus que
tenham como objetivo o pedido de reconhecimento do
cerceamento de defesa, afirmações de que o fato não
gera prejuízo. Essa negativa de prejuízo acontece,
inclusive, em casos de condenação do réu.
Em suma, pode-se afirmar que, no sistema penal, a
atuação da defesa no processo penal não é desejada,
mas apenas tolerada (ainda assim, nem sempre).

5. Em busca da paridade de armas

No processo penal, por vários fundamentos


constitucionais, exige-se a paridade de armas entre as
partes, que tem sua importância reconhecida pelo STF:
(...) 1. A isonomia é um elemento ínsito ao
princípio constitucional do contraditório (art. 5º,
LV, da CRFB), do qual se extrai a necessidade de
assegurar que as partes gozem das mesmas
oportunidades e faculdades processuais,
atuando sempre com paridade de armas, a fim
de garantir que o resultado final jurisdicional
espelhe a justiça do processo em que prolatado.
(STF - ARE: 648629 RJ, Relator: Min. LUIZ FUX,
Data de Julgamento: 24/04/2013, Tribunal Pleno,
Data de Publicação: REPERCUSSÃO GERAL -
MÉRITO)

A paridade de armas exige a possibilidade de


atuação ampla da defesa, com todos os meios possíveis,
e não apenas uma participação passiva, vazia e
meramente formal. Nas precisas palavras de Silva (2019,
p. 79), “não basta apenas o ‘convite para a festa
processual’. A defesa deve ser capaz de ‘se vestir e
chegar nessa festa’ para gozar de tudo que lhe seja
proporcionado durante o evento processual”.
Contudo, atualmente, é impossível afirmar que
existe paridade de armas na persecução penal.
De certa forma, todos estão contra o acu(s)ado:
Polícia Militar, Polícia Civil, Ministério Público, assistente
da acusação e, não raramente, um Juiz que tem perfil
acusador. Do outro lado, apenas o investigado/réu e seu
Advogado ou Defensor Público.
Na fase preliminar, admite-se a investigação da
Polícia (controlada externamente pelo MP) e do Ministério
Público (futura parte do processo), não havendo previsão
legal ou posicionamento jurisprudencial consolidado
quanto à investigação feita pelos outros participantes da
investigação, quais sejam, o investigado/indiciado e seu
Advogado. Trata-se de uma indevida tentativa de
exclusão da defesa, dando-lhe um papel meramente
protocolar e tratando o investigado como objeto da
investigação, com poucos resquícios do seu tratamento
como sujeito de direitos, quase sempre violados (vide
tópico anterior).
Ora, uma vez que se admita a investigação feita
pela Polícia e pelo Ministério Público, que é uma parte no
processo, deve-se admitir que seja feita paralelamente
uma investigação pelo Advogado, que defende os
interesses da outra parte.
A igualdade de oportunidades entre as partes tem
amparo jurisprudencial, conforme se observa:
(...) O princípio da paridade de armas encontra
plena incidência no processo penal, em prestígio
aos direitos fundamentais da igualdade e do
devido processo legal, que têm sede
constitucional. A igualdade não pode ser apenas
formal, devendo ter aplicação efetiva, ou seja,
no curso do processo penal, guardadas
particularidades próprias da acusação e da
defesa, bem como do juízo, impende que às
partes sejam outorgadas as mesmas
oportunidades de falar, de contraditar, de
reperguntar, de sustentar, de requerer e de
intervir nas provas, com a adequada simetria.
(...) (TJ-DF 07162593320188070000 DF
0716259-33.2018.8.07.0000, Relator: MARIO
MACHADO, Data de Julgamento: 11/10/2018, 1ª
Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado
no DJE: 18/10/2018. Pág.: Sem Página
Cadastrada.)

Não há paridade de armas quando uma parte tem


mais poderes que a outra. Inexiste paridade de armas se
a acusação tiver mais informações que a defesa,
sobretudo se puder utilizá-las.
Sobre esse tema, uma interessante decisão do
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul analisou a
impossibilidade de utilização de informações extraídas do
Sistema de Consultas Integradas, cujo acesso é
disponibilizado a membros do Ministério Público, mas não
à defesa:
(...) Nessa conjuntura, informações sobre a vida
pregressa do acusado constituem argumento de
autoridade, segundo interpretação
hermenêutica do artigo 478 do Código de
Processo Penal. Há diferença entre a juntada de
Antecedentes Criminais e Informações extraídas
do Sistema de Consultas Integradas. O primeiro,
qualquer parte pode ter acesso, acusação ou
defesa. Logo, tratam-se de documentos de
acesso público. O segundo, é de uso exclusivo
somente a magistrados e ao órgão ministerial,
não a defesa, seja Defensoria Pública ou defesa
constituída. Portanto, tratam-se de documentos
de acesso restrito. Daí por que não há paridade
de armas em permitir a juntada de documentos
Informações do Sistema de Consultas Integradas
que somente uma das partes tem acesso e a
outra não, mas há paridade quando a juntada se
trata de documentos cujo acesso é comum e...
possível a ambas as partes Certidão de
Antecedentes Criminais. Destarte, evidencia-se
o prejuízo à defesa. CORREIÇÃO
IMPROCEDENTE. (TJ-RS - COR: 70081292039 RS,
Relator: Sérgio Miguel Achutti Blattes, Data de
Julgamento: 23/05/2019, Terceira Câmara
Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça
do dia 28/05/2019)

Da mesma forma que não se pode admitir que o


Ministério Público utilize um documento de acesso
exclusivo a ele, também deveríamos, por coerência,
entender que o Advogado pode conduzir e utilizar a
investigação criminal defensiva, equiparando sua
atuação à investigação direta realizada pelo MP.
A defesa técnica não pode existir apenas para
cumprir a formalidade legal. Exige-se uma defesa efetiva.
Enquanto permanecer a desigualdade de poderes, a
defesa, por mais esforçada que seja, sempre estará em
desvantagem.
A investigação defensiva não deve ser considerada
a solução para todos os problemas da violação à
paridade de armas, mas um passo importante em
direção a isso.
Nery Junior (2010, p. 252) demonstra, com
exatidão, o problema da defesa meramente protocolar:
A defesa feita de forma burocrática, apenas para
atender formalmente à garantia da ampla
defesa, não impede a caracterização da violação
dessa garantia constitucional. É necessário que
se dê à parte o direito efetivo de ampla defesa.

Exercer a defesa não pode ser apenas uma atuação


de rebater e contrariar a versão da poderosa acusação.
Deve-se também disponibilizar um conjunto de
instrumentos, medidas e direitos para que a defesa
consiga provar suas alegações, como a investigação
defensiva.
Por derradeiro, é curioso que, quanto aos meios
utilizados pelas autoridades públicas (Polícia, Ministério
Público e Juiz), normalmente, defenda-se a busca da
“verdade real”, um conceito filosoficamente perigoso.
Entretanto, quando se trata da atividade investigativa da
defesa, esse escopo não recebe os mesmos incentivos.
Veja-se, por exemplo, a utilização do “princípio da
busca da verdade real” em favor da acusação:
(...)
5. A jurisprudência desta Corte Superior de
Justiça possui o entendimento consolidado de
que não configura nulidade a ouvida de
testemunha indicada extemporaneamente pela
acusação, como testemunha do Juízo, conforme
estabelece o art. 209 do Código de Processo
Penal, em observância ao princípio da busca da
verdade real.
(...)
(HC 503.241/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS,
QUINTA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe
23/08/2019)

Ora, ouvir como testemunha do Juízo uma pessoa


indicada pela acusação – fora do prazo para arrolar
testemunhas –, ainda que com fundamento no art. 209
do CPP, é uma violação à paridade de armas,
especialmente se considerarmos que, quando a defesa
requer a oitiva de uma testemunha após o prazo da
resposta à acusação, normalmente o pedido é indeferido,
em que pese fundamentado na ampla defesa.
Infelizmente, a busca da verdade real quase sempre é
invocada apenas em prol da acusação.
É necessário se insurgir contra esse tratamento
desigual e propor que o direito de provar seja visto como
um direito subjetivo das partes. Aliás, seria um dever da
defesa técnica, porque sua inércia, quando há
possibilidade de atuação, constitui uma deficiência
defensiva passível de nulidade. O Advogado deve lutar,
pois, como já dizia Carnelutti (2009, p. 19), “enquanto o
juiz está ali para impor a paz, o Ministério Público e os
advogados estão para fazer a guerra. Precisamente, no
processo, é necessário fazer a guerra para garantir a
paz”.

6. Um novo nicho na Advocacia?

Para a Advocacia, a investigação criminal defensiva


é de extrema importância, haja vista que se trata de uma
nova forma de atuação, inclusive sendo possível
imaginar um novo nicho no mercado jurídico.
Afinal, da mesma forma que surgiu uma onda de
Advogados especialistas em delação premiada
(“delacionistas”), também seria possível imaginar um
nicho especializado em investigação defensiva,
especialmente em um formato de consultoria voltada
para a investigação, com um Advogado trabalhando para
outro Advogado. Aliás, poderia ser um nicho interessante
para ex-Delegados e ex-policiais, que possuem
experiência em investigação e, em regra, têm mais
habilidade/facilidade para a condução desse tipo de
procedimento.
O nicho da investigação criminal defensiva exigiria
uma postura diferente dos Advogados, que normalmente
rebatem fatos apresentados pela acusação ou produzem
provas em juízo. A nova forma de atuação teria como
ponto nevrálgico a produção de elementos sem a
habitual dependência dos órgãos oficiais.
Destarte, é recomendável que o Advogado tenha
um perfil investigativo, com a habilidade de perseguir
rastros, encontrar vestígios, analisar documentos e
inquirir adequadamente.
Ademais, como lembra Bulhões (2019, p. 96):
Conhecimentos os mais diversos acerca de
tecnologias, arquivologia, cadeia de custódia,
ciências periciais, entre muitos outros temas
serão exigidos. E não há como pré-determinar
em absoluto quais serão os conhecimentos
necessários à realização desta ou daquela
investigação defensiva. Isto vai depender do
contexto concreto posto em discussão.

Evidencia-se, assim, que o Advogado atuante na


investigação criminal defensiva não deve limitar-se a
teses jurídicas, mas também dedicar sua atenção ao
estudo amplo e profundo dos fatos.
Para atuar efetivamente na investigação criminal
defensiva, deve-se ter apreço pelo trabalho de campo,
exercido no ambiente externo (fora do escritório), com a
realização ou fiscalização de diligências. Por mais que o
Advogado conduza a investigação com auxiliares, seria
difícil imaginar uma atuação plena por meio de uma
“Advocacia de gabinete”.
O Advogado que decidir atuar nesse nicho também
precisará de uma rede de profissionais de confiança que
sejam especialistas em determinadas áreas, facilitando a
rápida contratação para determinadas diligências.
Dependendo do caso, a demora para encontrar um
especialista pode ser prejudicial ao andamento da
investigação.
Será necessária uma aproximação do cliente que
extrapole a mera leitura fria de documentos juntados aos
autos do inquérito ou processo. Deve-se conversar sobre
o fato, as possibilidades, os caminhos, as pessoas
envolvidas e os elementos que ainda não são de
conhecimento das autoridades.
Nesse esteio, o Advogado que desenvolver uma
investigação defensiva será um confidente, devendo ser
discreto e cauteloso, respeitando, ainda, o necessário
sigilo profissional. Ainda que essa postura também seja
exigida da Advocacia em geral, o profissional que atua
nesse nicho, em muitos casos, precisará ser estratégico e
controlar as informações que poderão ser públicas e
aquelas que deverão permanecer em sigilo para a
proteção da intimidade, ou aguardar o melhor momento
para levá-las aos autos.
Para ter uma visão panorâmica de todas as
possibilidades defensivas e as linhas de investigação
disponíveis, o Advogado precisará ter a confiança do
cliente, algo muitas vezes ignorado. Lembrando as
precisas lições de Carnelutti (2009, p. 32), “as pessoas
não sabem, e nem sequer o sabem os juristas, que o que
se pede ao advogado é a esmola da amizade, antes de
qualquer outra coisa.”
Na mesma esteira, Oliveira (2008, p. 17) afirma que
há a necessidade de uma “sólida relação de confiança
com o constituinte que proporcione ter em conta todas
as características e condicionantes do caso concreto –
potenciada, aliás, pelo sigilo profissional a que o
advogado está adstrito”.
Talvez o Advogado que atue nesse nicho deva ter
uma pitada de insatisfação quanto aos rumos atuais da
persecução penal. Precisa entender que o uso da
investigação criminal defensiva é uma tentativa de
superação dos problemas no inquérito policial, na
questão probatória e no tratamento da defesa no
processo penal, não utilizando esse instrumento como
mera formalidade.
Deverá, inclusive, sentir o peso da tarefa que
assume. Conduzir a investigação defensiva pode
significar riscos, principalmente em razão de algumas
autoridades da persecução penal que criminalizam a
Advocacia. A realização do seu trabalho enfrentará
empecilhos e, não raramente, intimidações. Inclusive, o
profissional poderá ser visto com desconfiança pela
polícia ou pelo Ministério Público.
Para termos ciência da grandeza e dos desafios da
investigação defensiva, ressaltamos as palavras de
Oliveira (2008, p. 18):
Quando assume a Defesa Criminal de um
determinado arguido, o advogado assume
também o encargo de proteger os seus
interesses num processo extremamente severo,
em termos psicológicos e não só, no qual o seu
representado poderá sentir-se como <<David
contra Golias>>, encarando toda a máquina
judicial e os órgãos de polícia criminal como
inimigos que têm de ser enfrentados.

Por todo o exposto, acreditamos que a investigação


criminal defensiva é um novo nicho de atuação, que
pode desenvolver-se dentro de outros nichos da
Advocacia Criminal ou como nicho único de um
profissional.

7. Os fundamentos da atuação
defensiva e investigativa

Ainda que, até o momento, o Brasil não tenha um


fundamento – constitucional ou infraconstitucional – que
mencione especificamente a investigação criminal
defensiva, há vários motivos para considerarmos a
possibilidade dessa forma de atuação.
Deve-se considerar, inicialmente, a ausência de
qualquer proibição ao intento do Advogado de investigar
paralelamente às investigações oficiais (inquérito policial,
sindicância, comissão parlamentar de inquérito etc.).
Admitindo-se a investigação feita pela acusação,
também deve ser admitida a perquirição dirigida pela
defesa, sob pena de inquestionável violação à paridade
de armas. Aliás, o Ministério Público tem poder de
requisição e exerce o controle externo da atividade
policial, somando vantagens estratégicas em relação à
defesa.
Por derradeiro, há inúmeros fundamentos que, em
que pese não mencionem a investigação criminal
defensiva, justificam o exercício do direito de defesa da
forma mais completa possível, como passaremos a
analisar.

7. 1. Fundamentos constitucionais da
investigação criminal defensiva
O art. 5º, LV, da Constituição Federal, prevê que
“aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e
aos acusados em geral são assegurados o contraditório e
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Ainda que não mencione expressamente, trata-se de um
importante fundamento da investigação criminal
defensiva.
O exercício da defesa técnica não pode ser limitado
à concordância do Delegado de Polícia quanto ao
deferimento de diligências postuladas pelo Advogado no
inquérito policial.
Com precisão, Nery Junior (2010, p. 249) afirma:
Feitas as alegações, os titulares da garantia da
ampla defesa têm o direito à prova dessas
mesmas alegações. De nada adiantaria garantir-
se a eles com uma mão o direito de alegar e
subtrair-lhes, com a outra, o direito de fazer
prova das alegações. O direito à prova, pois,
está imbricado com a ampla defesa e dela é
indissociável.

O art. 5º, LIV, da Constituição Federal, traz um dos


trechos mais importantes para o processo penal:
“ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem
o devido processo legal”.
A melhor forma de consolidar o devido processo
legal e evitar que alguém seja privado da liberdade de
forma ilegal é permitir que o maior interessado – o réu –
tenha meios de contribuir ativamente para o processo e
para a futura decisão.
Ainda no art. 5º da Constituição Federal, o inciso
LXXV destaca que “o Estado indenizará o condenado por
erro judiciário, assim como o que ficar preso além do
tempo fixado na sentença”. Evitar o erro judiciário é uma
das grandes motivações do Advogado que instaura e
conduz uma investigação criminal defensiva, buscando
provas e contrariando as autoridades policiais,
ministeriais e judiciais.
Aliás, ninguém tem mais interesse em evitar o erro
judiciário do que o investigado/réu e seu Advogado. Se
for prolatada uma condenação que desconsidere provas
que poderiam ter sido produzidas pela defesa, quem
sofrerá as consequências de uma pena privativa de
liberdade será o condenado. Por outro lado, o acusador e
o julgador dificilmente serão punidos e nunca pedirão
desculpas àquele que sofreu o erro. É a liberdade do
acusado que permanece em jogo diante da possibilidade
de erro judiciário.
A presunção de inocência (art. 5º, LVII, da
Constituição Federal) também é um fundamento da
atuação defensiva. Ora, existindo a presunção de
inocência, deve-se permitir ao titular desse direito a
possibilidade de participar ativamente para que a
presunção seja mantida.
Ademais, a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III,
da Constituição Federal), tão invocada genericamente
para solucionar todos os problemas, deveria ser
observada no processo penal.
No exercício da ampla defesa, não se pode limitar
as manifestações do Advogado às questões jurídicas.
Deve-se humanizar o processo, demonstrando que o
investigado ou réu é uma pessoa concreta. Não se pode
admitir o tratamento do acusado como um objeto em
que são despejados todos os medos e desejos de
vingança da sociedade por meio da força do Estado.
Conforme Carnelutti (2009. p. 9-10):
Considerar o homem como uma coisa: pode
haver uma fórmula mais expressiva de
incivilidade? No entanto, é o que ocorre,
infelizmente, em nove de cada dez vezes no
processo penal. Na melhor das hipóteses, os que
se vão ver trancados numa cela como animais
no jardim zoológico parecem homens fictícios ao
invés de homens de verdade. E se alguém se dá
conta de que são homens de verdade, parece a
si que se tratam de homens de outra raça ou,
poderíamos dizer, de outro mundo. Este que
pensa dessa maneira não lembra, quando assim
sente, a parábola do publicano e do fariseu, e
não suspeita que sua mentalidade é
propriamente a do fariseu: eu não sou como
este.

O exercício da ampla defesa é um lembrete ao Juiz:


o réu também é um ser humano, tanto quanto ele, com a
diferença de que se encontra submetido a um processo
criminal e com possibilidade concreta de sofrer uma
pena.
Também amparada no direito de defesa, a súmula
vinculante n. 14 do Supremo Tribunal Federal ressalta o
papel da defesa técnica, mormente na investigação
policial, ao afirmar que é direito do defensor, no interesse
do representado, ter acesso amplo aos elementos de
prova que, já documentados em procedimento
investigatório realizado por órgão com competência de
polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito
de defesa.
Ora, nada mais óbvio que possibilitar que o
Advogado conheça os elementos contra o seu
constituinte. Para defender adequadamente, é
necessário conhecer o que existe contra quem é
defendido.
Como visto, há inúmeros fundamentos
constitucionais que amparam o direito de defesa e,
portanto, a utilização da investigação criminal defensiva:
contraditório e a ampla defesa, principalmente
por meio de uma defesa efetiva, e não
meramente formal;
o devido processo legal;
permitir que o maior interessado no caso
contribua para evitar o erro judiciário;
a dignidade da pessoa humana, para que, de
fato, o acusado seja visto como um ser humano
real, de carne e osso, cuja vida está em
julgamento;
a súmula vinculante n. 14 do STF, que reitera o
direito de ter ciência do teor da investigação, o
que, em última análise, destina-se a possibilitar
uma reação adequada.[4]
Se conduzida corretamente, a investigação criminal
defensiva ampliará a compreensão que se tem sobre os
direitos mencionados, poderá evitar o tratamento
objetificado do réu e reduzirá as chances de erros
judiciários.

7.2. O Código de Processo Penal


O Código de Processo Penal contém vários
dispositivos importantes para a atuação da defesa
técnica no que concerne à produção de provas,
fundamentando, direta ou indiretamente, uma atuação
defensiva mais ampla.
Para o exercício da ampla defesa e, especialmente,
para a juntada dos resultados da investigação criminal
defensiva, o art. 231 do CPP tem grande relevância ao
dispor: “Salvo os casos expressos em lei, as partes
poderão apresentar documentos em qualquer fase do
processo.”
Essa previsão legal de que as partes juntem
documentos em qualquer fase do processo é de suma
importância para definir a grande variedade de opções
quanto ao momento de juntada dos resultados da
investigação criminal defensiva. Aliás, o texto legal vai
ao encontro do Provimento n. 188/2018 do Conselho
Federal da OAB, que prevê a utilização da investigação
criminal defensiva inclusive na fase recursal.
Também devemos considerar que o art. 396-A do
CPP prevê que, na resposta à acusação, podem ser
oferecidos documentos. Nada impede que a defesa,
nessa fase, junte os resultados da investigação criminal
defensiva.
Destaca-se, ainda, a regulamentação legal da
cadeia de custódia, por meio da Lei n. 13.964/2019 (Lei
Anticrime), que incluiu no CPP, entre outros, os arts. 158-
A, 158-B, 158-C, 158-D, 158-E e 158-F.
O conceito de cadeia de custódia está previsto no
art. 158-A do CPP:
Art. 158-A. Considera-se cadeia de custódia o
conjunto de todos os procedimentos utilizados
para manter e documentar a história cronológica
do vestígio coletado em locais ou em vítimas de
crimes, para rastrear sua posse e manuseio a
partir de seu reconhecimento até o descarte.

Esse conceito legal, anteriormente de origem


apenas doutrinária, demonstra a preocupação atual de
incentivar as provas técnicas e questionar o
rastreamento dos vestígios nas etapas da cadeia de
custódia, algo importantíssimo para a defesa.
Segundo Prado (2014, p. 80), a cadeia de custódia
representa justamente o importante “dispositivo que
pretende assegurar a integridade dos elementos
probatórios”.
Por sua vez, Bernacchi e Rodrigues (2018, p. 23)
analisam:
A cadeia de custódia tem o seu início na
preservação do ambiente do crime, passando
pela coleta das evidências e percorrendo as
demais fases, desde o momento do
acontecimento do fato que deixou vestígios até
a apresentação em juízo das provas produzidas
com base nesses vestígios. A principal função da
cadeia de custódia é garantir a integridade da
prova material, seja para preservação das suas
características e a sua rastreabilidade, além da
garantia de que os objetos apreendidos e
examinados pela perícia sejam exatamente os
materiais coletados no local do crime, e que o
manuseio tenha sido realizado pelos
profissionais habilitados.

A cadeia de custódia adquire especial relevância


para a defesa, sobretudo na investigação criminal
defensiva, por se tratar de um caminho para impugnação
dos elementos obtidos na investigação oficial.
Em outros trechos do Código de Processo Penal,
observamos que há várias referências ao direito de
defesa, seja pela defesa técnica, seja como autodefesa.
No art. 187, §2º, VIII, do CPP, por exemplo, há
previsão de que, ao final do interrogatório, o acusado
seja indagado se tem algo mais a alegar em sua defesa.
Logo, poderá acrescentar informações que não foram
objeto de perguntas anteriores.
Por sua vez, o art. 240, §1º, “e”, in fine, do CPP,
prevê a possibilidade de busca domiciliar, quando
fundadas razões a autorizarem, para descobrir objetos
necessários à defesa do réu.
Aliás, como regra, a defesa deve ser ouvida antes
da decretação de uma medida cautelar, como a prisão
preventiva. Nos termos do art. 282, §3º, do CPP, salvo
nos casos de urgência ou de perigo de ineficácia da
medida, o Juiz, ao receber o pedido de medida cautelar,
determinará a intimação da parte contrária, para se
manifestar no prazo de 5 dias. Para afirmar que se trata
de caso urgente ou que tenha perigo de ineficácia – que
dispensa a intimação da defesa –, o Magistrado deverá
fundamentar com base em elementos do caso concreto.
Os dispositivos anteriormente citados são apenas
alguns exemplos da necessidade de respeitar o direito de
defesa, por meio da autodefesa ou da defesa técnica.
Justifica-se, assim, uma atuação ampla e intensa da
defesa técnica, inclusive por meio de um instrumento
próprio – que não dependa da vontade das autoridades –
de produção de elementos que fundamentem suas
manifestações, teses e versões: a investigação criminal
defensiva.

7.2.1. O art. 156 do CPP: quem deve provar?

Um dos pontos nevrálgicos da investigação


defensiva consiste em estabelecer o que deve ser
provado pela defesa. Para tanto, exige-se indagar quem
deve provar, isto é, a quem incumbe o ônus da prova, de
acordo com uma análise constitucional do art. 156 do
CPP.
Na prática forense, observamos, por exemplo,
muitas sentenças condenatórias fundamentadas no fato
de que o réu não se desincumbiu do seu ônus de provar
a excludente de ilicitude alegada. Normalmente, essas
decisões deixam em segundo plano o ponto relevante
para a condenação: a presença dos elementos do crime,
quais sejam, fato típico, ilicitude e culpabilidade.
Noutros termos, os julgadores desconsideram a
necessidade de avaliar a presença da ilicitude, ônus da
acusação, optando por atribuir um onírico e equivocado
ônus à defesa, consistente na necessidade de provar a
excludente de ilicitude alegada.
Entrementes, no Brasil, vigora o princípio da
presunção de inocência (art. 5º, LVII, da Constituição
Federal), razão pela qual essa pretensão de distribuir o
ônus probatório entre as partes deve ser analisada de
acordo com esse relevante princípio constitucional.
A Constituição Federal não possui previsão
específica relacionada ao ônus probatório, limitando-se a
prever o devido processo legal (art. 5º, LIV), o direito ao
contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LV) e a
inadmissibilidade de provas ilícitas (art. 5º, LVI). O Código
de Processo Penal, por outro lado, prevê, na parte inicial
do art. 156, que a prova da alegação incumbirá a quem a
fizer. Dessa forma, surgem algumas indagações no que
concerne à compreensão do ônus da prova,
especialmente quando se aborda a previsão do Código
de Processo Penal sem antes observar o que dispõe a
Constituição Federal.
Apontando esse equívoco da preponderância do
Código de Processo Penal em detrimento da Constituição
Federal, Rangel (2011, p. 498) destaca:
A doutrina, em maioria, ao estudar a divisão do
ônus probatório, sustenta que a divisão do ônus
é baseada no interesse da própria afirmação, ou
seja, o ônus compete a quem alega o fato. Trata-
se de uma visão exclusiva e isolada do art. 156
do CPP, com redação da Lei 11.690/08, em
desconformidade com a Carta Política do País,
pois há que se fazer, hodiernamente, uma
interpretação conforme a Constituição.

Em outras palavras, é imprescindível que se


observe a norma processual (art. 156 do CPP) tendo
como parâmetro a Constituição Federal em sua
integralidade – e não o contrário –, haja vista a evidente
posição de supremacia do texto constitucional em
relação ao ordenamento jurídico infraconstitucional.
Destarte, entende-se que o princípio da presunção
de inocência produz impacto diretamente no ônus
probatório, e não o contrário. Não deve ser o princípio
constitucional afetado por uma previsão
infraconstitucional de distribuição do ônus, mas sim esta
deve ser relida de acordo com aquele princípio
constitucional.
Contudo, há uma tentativa de inserir no processo
penal a lógica probatória do Processo Civil (art. 373 do
CPC), o que decorre da habitual adoção de uma teoria
geral do processo. Nesse caso, a cada polo da relação
processual caberia o ônus de demonstrar suas alegações,
esquecendo-se de que, no Processo Penal, as partes não
são totalmente iguais, porquanto a liberdade de uma
(acusado) está em evidência, enquanto a outra parte
(acusação) não terá nenhuma consequência negativa
caso não confirme suas alegações, nem mesmo um
prejuízo de ordem financeira, como normalmente ocorre
no Processo Civil.
Como exemplo da incorreta distribuição do ônus
probatório, cita-se a seguinte decisão do Superior
Tribunal de Justiça (STJ), que atribui à defesa o ônus de
provar a tese de excludente de ilicitude:
(...)
3. De igual modo, cabe à defesa a provar sua
tese de excludente de ilicitude e/ou de
culpabilidade. Precedentes.
4. Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 871.739/PE, Rel. Ministro Arnaldo
Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em
18/11/2008, DJe 09/12/2008)

Como se observa na decisão do STJ – e em muitas


outras pelo Brasil –, os Juízes e Tribunais normalmente
consideram que as excludentes de ilicitude devem ser
provadas pela defesa. Em outras palavras, não seria
incumbência do Ministério Público provar que o acusado
não agiu amparado por uma excludente de ilicitude, mas
sim da defesa provar que, no caso concreto, estava
presente uma excludente e, por consequência, não se
concretizou a presença de todos os elementos da
infração penal.
Esse entendimento merece inúmeras críticas. Não é
possível, a partir do princípio da presunção de inocência,
distribuir o ônus probatório, como se a acusação tivesse
a incumbência de provar a ilicitude e à defesa coubesse
provar a excludente. Mais perigoso ainda seria inverter o
ônus, desconsiderando que o MP precisa provar a
ilicitude e pressupondo apenas que a defesa deve provar
a excludente, como na sobredita decisão.
No âmbito do processo penal não cabe ao réu a
prova de sua inocência, mas sim ao Ministério Público
provar a acusação, em todos os seus termos, já que é o
titular da ação penal pública e possui esta
prerrogativa/atribuição. Nesse prisma, a defesa tem a
possibilidade ou faculdade de se manifestar como forma
de fortalecer a presunção já existente em favor do
acusado, mas nunca terá o ônus ou o dever processual
de fazê-lo, ainda que sua alegação diga respeito a
eventual excludente.
Nesse ponto, tem razão Guarnieri (1952, p. 305) ao
afirmar que “incumbe a la acusación la prueba positiva,
no sólo de los hechos que constituyan el delito, sino
también de la inexistencia de los que le excluyan.”
A questão é muito simples: não é possível que o
Ministério Público prove a ilicitude sem demonstrar,
simultaneamente, que não se aplica ao caso nenhuma
das excludentes de ilicitude. Caso não prove isto, não
estará provado aquilo. Algo não pode ser (ilicitude) se
algo o impede de ser (excludente).
Trata-se de uma questão não apenas jurídica, mas
também lógica, considerando que, para que a acusação
prove que o fato é típico, ilícito e culpável, deve
demonstrar que não há uma excludente que afaste
algum dos elementos da infração penal.
Há um equívoco ao se afirmar que a acusação não
tem a atribuição de provar a inocorrência da excludente
de ilicitude. Ora, sendo ônus da acusação provar que
estão presentes todos os elementos da infração penal,
deve provar também que não há nada que desconstitua
o crime, como uma excludente de ilicitude.
A única consequência da inércia da defesa é a perda
de uma circunstância favorável, qual seja, o
fortalecimento da alegação de uma excludente de
ilicitude e uma maior possibilidade de absolvição. Em
sentido idêntico, Aroca (1997, p. 153) entende que “el
acusado no necesita probar nada, siendo toda la prueba
de cuenta de los acusadores, de modo que si falta la
misma ha de dictarse sentencia absolutoria.”
Aliás, nem mesmo o caráter indiciário da ilicitude é
suficiente para atribuir ao acusado o ônus de provar sua
inocência. Se a acusação consegue provar que o fato é
típico e, portanto, indiciário de ilicitude, ao réu continua
atribuída uma presunção de inocência, que não é
desfeita apenas por indícios de que a conduta também é
ilícita. Com efeito, indícios de ilicitude não afastam a
presunção de inocência, tampouco são sinônimo de
prova da ilicitude em sua integralidade (positiva e
negativamente), ou seja, presença de ilicitude e ausência
de excludentes.
Em suma, cabe exclusivamente à acusação provar
que o fato é típico, ilícito e culpável, bem como a
ausência de excludentes de ilicitude.
Atribuindo o ônus da prova exclusivamente à
acusação, deve-se concluir que a defesa pode
permanecer inerte e deixar de produzir provas? Não! O
debate sobre o ônus da prova não pode legitimar uma
defesa fraca e desinteressada.
Conforme ressalta Oliveira (2008, p. 20-21):
(...) será à Defesa Criminal que incumbe a tarefa
de promover o descondicionamento do processo
penal, logo nas suas fases preliminares.
Porquanto, interessa à Defesa que as entidades
judiciárias se debrucem – investigando e
analisando – sobre os factos e as circunstâncias
que mais favorecem o ponto de vista do arguido.

Ainda que se entenda, como propomos aqui, que o


ônus da prova é exclusivo da acusação, o Advogado ou
Defensor Público deverá atuar como se precisasse provar
a inocência, buscando provas que justifiquem suas
alegações e contrariem a versão acusatória. Afinal, é
provável que o Juiz ou Tribunal adote o entendimento de
que a prova da acusação incumbe a quem a fizer (art.
156 do CPP).

7.3. A investigação direta pelo Ministério


Público
Admitir que a parte acusadora (Ministério Público)
investigue os fatos é um fator determinante para, da
mesma forma, aceitar que a defesa realize a sua própria
investigação. Noutros termos, com a aceitação da
investigação direta pelo Ministério Público, deve-se
aceitar também a investigação instaurada e conduzida
pela defesa.
Sobre o Ministério Público, o STF, no RE 593.727,
decidiu o seguinte:
(...)
4. Questão constitucional com repercussão
geral. Poderes de investigação do Ministério
Público. Os artigos 5º, incisos LIV e LV, 129,
incisos III e VIII, e 144, inciso IV, § 4º, da
Constituição Federal, não tornam a investigação
criminal exclusividade da polícia, nem afastam
os poderes de investigação do Ministério
Público. Fixada, em repercussão geral, tese
assim sumulada: “O Ministério Público dispõe de
competência para promover, por autoridade
própria, e por prazo razoável, investigações de
natureza penal, desde que respeitados os
direitos e garantias que assistem a qualquer
indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação
do Estado, observadas, sempre, por seus
agentes, as hipóteses de reserva constitucional
de jurisdição e, também, as prerrogativas
profissionais de que se acham investidos, em
nosso País, os Advogados (Lei 8.906/94, artigo
7º, notadamente os incisos I, II, III, XI, XIII, XIV e
XIX), sem prejuízo da possibilidade – sempre
presente no Estado democrático de Direito – do
permanente controle jurisdicional dos atos,
necessariamente documentados (Súmula
Vinculante 14), praticados pelos membros dessa
instituição”. Maioria. (...)
(RE 593727, Relator: CEZAR PELUSO, Relator p/
Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno,
julgado em 14/05/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO
REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-175 DIVULG
04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015)

Na tese fixada, observamos que:


o Ministério Público pode promover, por
autoridade própria, investigações de natureza
penal;
a investigação deve ter duração razoável;
exige-se o respeito aos direitos e garantias que
assistem a qualquer indiciado ou a qualquer
pessoa sob investigação do Estado;
devem ser observadas as hipóteses de reserva
constitucional de jurisdição;
exige-se o respeito às prerrogativas
profissionais dos Advogados;
é possível o permanente controle jurisdicional
dos atos.
Entendemos pertinente a utilização dessas
características e limitações da investigação direta pelo
MP como parâmetro para a investigação criminal
defensiva, ainda que com algumas adequações.
Da mesma forma que o MP pode promover as
investigações, o Advogado e o Defensor Público também
devem ter o poder de instaurar e conduzir uma
investigação em favor do constituinte ou assistido.
No que concerne ao prazo, por não se tratar de
instrumento para submissão de alguém a um processo
criminal – mas sim para sua defesa –, devemos entender
que a investigação defensiva não deve ter um prazo fixo,
podendo durar enquanto permanecer a sua
utilidade/necessidade.
Sobre o respeito aos direitos e garantias, trata-se de
uma exigência imposta a todo e qualquer procedimento.
Deve-se ter cuidado, especialmente, quanto à
privacidade, ao patrimônio e ao direito ao silêncio,
sobretudo, neste caso, quando se trata de testemunha
que tem o risco de se autoincriminar.
A reserva constitucional de jurisdição, exigência de
ordem judicial para determinadas medidas, é um limite
imposto também ao Advogado, que não poderá praticar
atos que a Constituição determina que dependem de
prévia decisão judicial. Excepcionalmente, caso exista o
consentimento do titular do direito, será possível a
prática do ato (ex.: ingresso em residência).
Em relação ao respeito às prerrogativas da
Advocacia, deve-se destacar que a investigação criminal
defensiva se trata de um procedimento instaurado e
conduzido por um Advogado, isto é, pelo titular de tais
prerrogativas. Ademais, há uma relação entre o cliente e
o Advogado, exigindo-se o sigilo deste, que somente
dará publicidade aos resultados da investigação quando
for expressamente autorizado por aquele.
Por fim, a inafastabilidade da jurisdição também é
aplicável aos atos da investigação criminal defensiva. O
art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, prevê que “a lei
não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça a direito”. Se, na condução da investigação, o
Advogado praticar algum ato ilícito, a pessoa prejudicada
poderá provocar o Judiciário na seara cível ou criminal
(ação penal privada) ou comunicar o fato à autoridade
policial ou ao Ministério Público para que, se for o caso,
seja oferecida denúncia relativa a eventual crime
(ameaça, por exemplo).
A Resolução n. 181, de 7 de agosto de 2017, do
Conselho Nacional do Ministério Público, trata das regras
da investigação direta, que é instrumentalizada no
procedimento investigatório criminal (PIC). Trata-se de
mais um parâmetro para a investigação criminal
defensiva.
Por meio do amparo jurisprudencial e no CNMP, a
investigação direta pelo Ministério Público se
desenvolveu rapidamente. Conforme Bulhões (2019, p.
78-79):
Proliferaram-se os chamados Procedimentos (ou
‘peças’) Internas de Investigação Criminal
(PIIC’s), bem como se treinou e qualificou o
quadro de membros e servidores com o uso de
técnicas especiais e tecnologias avançadas,
notadamente por meio do incremento dos
GAECO’s e CAOP’s, e da utilização de agentes e
recursos de outras forças de segurança pública.

Ao longo deste livro, traremos, sempre que


necessário, o tratamento dispensado ao PIC e como
podemos adequá-lo à investigação conduzida pelo
Advogado.
Evidentemente, a atuação do Ministério Público na
condução de uma investigação exige – ou deveria exigir –
a observância de rigores ainda maiores que a
investigação conduzida por um Advogado. Afinal, como
explica Lyra (2009, p. 13) ao abordar a atuação dos
Juízes, a “responsabilidade de quem responsabiliza seus
semelhantes deve ser a mais rigorosa, a mais efetiva, a
mais constante.”

7.4. A Lei do Detetive Particular


A Lei n. 13.432, de 11 de abril de 2017, trata do
exercício da profissão de detetive particular, dispondo
sobre limites, proibições, deveres, direitos e outros
pontos.
Uma análise aprofundada dessa Lei fugiria dos
objetivos da presente obra, que tem como tema a
investigação criminal defensiva. Destarte, analisaremos
apenas alguns pontos que podem contribuir para a
compreensão acerca da investigação realizada pela
defesa.
O art. 2º da referida Lei afirma que:
Art. 2º Para os fins desta Lei, considera-se
detetive particular o profissional que,
habitualmente, por conta própria ou na forma de
sociedade civil ou empresarial, planeje e
execute coleta de dados e informações de
natureza não criminal, com conhecimento
técnico e utilizando recursos e meios
tecnológicos permitidos, visando ao
esclarecimento de assuntos de interesse privado
do contratante.

No que tange à seara criminal, o art. 5º disciplina o


seguinte:
Art. 5º O detetive particular pode colaborar com
investigação policial em curso, desde que
expressamente autorizado pelo contratante.
Parágrafo único. O aceite da colaboração ficará
a critério do delegado de polícia, que poderá
admiti-la ou rejeitá-la a qualquer tempo.

De início, observa-se que o detetive particular


precisa de expressa autorização do contratante para
colaborar com a investigação policial. A Lei não aborda a
questão sobre a investigação criminal defensiva, mas
podemos pressupor que seria admissível a sua
colaboração, especialmente porque o contratante
provavelmente utilizará os serviços do Advogado –
presidente da investigação defensiva – e do detetive.
Da mesma forma que o art. 14 do CPP concede
discricionariedade ao Delegado para realizar ou não as
diligências requeridas, a colaboração do detetive
particular também ficará a critério da referida autoridade
policial.
Por sua vez, o art. 7º afirma que o detetive
particular é obrigado a registrar em instrumento escrito a
prestação de seus serviços. Sugerimos que a mesma
providência seja tomada pelos Advogados, por meio de
contrato de prestação de serviços advocatícios que
tenha, na cláusula do objeto, a menção à investigação
criminal defensiva.
É sabido que a atividade do detetive particular não
será sempre segura. Por esse motivo, o art. 8º, parágrafo
único, prevê que é facultada às partes a estipulação de
seguro de vida em favor do detetive particular, que
indicará os beneficiários, quando a atividade envolver
risco de morte.
O art. 9º afirma que, ao final do prazo para a
execução dos serviços profissionais, o detetive particular
entregará ao contratante ou a seu representante legal,
mediante recibo, relatório circunstanciado sobre os fatos
e informações coletados. O relatório deverá conter os
procedimentos técnicos adotados, a conclusão em face
do resultado dos trabalhos executados e, se for o caso, a
indicação das providências legais a adotar, assim como a
data, identificação completa do detetive particular e sua
assinatura.
Apesar da ausência de previsão legal sobre a
elaboração de relatório em que o Advogado detalha sua
atuação para o cliente, é possível aderir a essa prática na
investigação defensiva, entregando ao constituinte o
relatório de conclusão da investigação ou um relatório
específico que tenha o objetivo único de detalhar, em
linguagem simples – porque destinada ao cliente –, os
atos praticados no procedimento.
No art. 10, a Lei prevê algumas vedações ao
detetive particular, como, por exemplo, a proibição de
aceitar ou captar serviço que configure ou contribua para
a prática de infração penal ou tenha caráter
discriminatório. Também é vedado, entre outras coisas,
participar diretamente de diligências policiais e de
divulgar os meios e os resultados de coleta de dados e
informações a que tiver acesso no exercício da profissão,
salvo em defesa própria. Como veremos, a investigação
defensiva também tem algumas limitações, incluindo o
sigilo.
Os deveres do detetive particular estão previstos no
art. 11 da referida Lei, chamando a atenção a
preservação do sigilo das fontes de informação, o
respeito aos direitos das pessoas (intimidade,
privacidade, honra e imagem), a necessidade de prestar
contas ao cliente e a restituição ao contratante, findo o
contrato ou a pedido, de documento ou objeto que lhe
tenha sido confiado.
No que concerne aos direitos do detetive particular,
o art. 12 aborda, entre outros, a possibilidade de recusar
serviço que considere imoral, discriminatório ou ilícito e
renunciar ao serviço contratado, caso gere risco à sua
integridade física ou moral.
Como veremos adiante, inúmeras questões da
regulamentação da atividade do detetive particular são
semelhantes à regulamentação presente no Provimento
n. 188/2018 do Conselho Federal da OAB, especialmente
quanto aos deveres.
Na condução da investigação criminal defensiva, o
Advogado também deverá estar atento, da mesma forma
que o detetive particular, para não praticar condutas que
configurem ou contribuam para a prática de infrações
penais.
Sobre a participação direta em diligências policiais,
antes de se debater a (im)possibilidade, urge ressaltar
uma provável indisposição da autoridade policial para
aceitá-la. Na prática, as chances de aceitação da
participação do Advogado em diligências policiais são
mínimas. Em algumas diligências, como a lavratura de
prisão em flagrante, a presença do Advogado será crucial
para a legalidade do ato. Em outras situações, como
busca e apreensão na residência do investigado, o
Advogado será, no máximo, tolerado.
De qualquer sorte, a participação do Advogado nas
diligências policiais consiste em uma aferição da sua
legalidade, podendo requerer diligências e questionar
atos, inclusive judicialmente.
Observa-se, por fim, que a atuação do detetive
particular não reflete a totalidade das possibilidades de
uma investigação defensiva. Com razão, Bulhões (2019,
p. 55) alerta que “a investigação defensiva deve ser
sempre parte de uma estratégia maior de defesa, não se
confundindo com a atividade desempenhada nos termos
da Lei Federal n.º 13.432/2017.”
Destarte, a contratação de um detetive particular
pode ser relevante para determinada diligência, mas a
investigação defensiva abrange muitas outras
possibilidades, como a oitiva de testemunhas e a
realização de perícias.
Moraes e Pimentel Júnior (2018, p. 231) trazem uma
importante observação sobre a participação de detetives,
especificamente sobre o custo:
De fato, em que pese haver uma impressão
inicial de que a contratação de um detetive
privado estará restrita àquelas pessoas físicas
ou jurídicas que possam arcar com tais serviços,
ao menos em um plano teórico, instituições
incumbidas da tutela jurídica a necessitados
como a Defensoria Pública poderão, por
intermédio de seus servidores de apoio como
oficiais e agentes de Defensoria, desempenhar
atividades similares às de detetive quando
necessário nos casos concretos em que o órgão
estiver funcionando.

Ainda que não se trate exatamente do exercício


pleno da atividade de detetive particular, é
inquestionável que alguns atos podem ser praticados por
servidores da Defensoria Pública ou, quanto à defesa
privada, pelo próprio Advogado ou seus colaboradores.
A pesquisa de informações e documentos, inclusive
em sites ou repartições públicas, não exige habilitação
especial. Limitar a prática desses atos a detetives
particulares constituiria violação à isonomia e a ampla
defesa, porque possibilitaria a instrução/fundamentação
das alegações apenas para quem tivesse disponibilidade
financeira para contratar os referidos profissionais.

7.5. O Estatuto da OAB


O Estatuto da OAB e da Advocacia (Lei n. 8.906, de
4 de julho de 1994) dispõe sobre inúmeras prerrogativas
do Advogado que fundamentam uma atuação artesanal e
efetiva na área criminal.
O art. 7º, XIII, dispõe que é direito do Advogado
examinar, em qualquer órgão dos Poderes Judiciário e
Legislativo, ou da Administração Pública em geral, autos
de processos findos ou em andamento, mesmo sem
procuração, quando não estiverem sujeitos a sigilo ou
segredo de justiça, assegurada a obtenção de cópias,
com possibilidade de tomar apontamentos. Na mesma
linha, o inciso XIV prevê como direito examinar, em
qualquer instituição responsável por conduzir
investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante
e de investigações de qualquer natureza, findos ou em
andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo
copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou
digital.
O inciso XIV do art. 7º deve ser complementado
pelos §§ 11 e 12 do mesmo dispositivo legal:
§ 11. No caso previsto no inciso XIV, a
autoridade competente poderá delimitar o
acesso do advogado aos elementos de prova
relacionados a diligências em andamento e
ainda não documentados nos autos, quando
houver risco de comprometimento da eficiência,
da eficácia ou da finalidade das diligências.
§ 12. A inobservância aos direitos estabelecidos
no inciso XIV, o fornecimento incompleto de
autos ou o fornecimento de autos em que houve
a retirada de peças já incluídas no caderno
investigativo implicará responsabilização
criminal e funcional por abuso de autoridade do
responsável que impedir o acesso do advogado
com o intuito de prejudicar o exercício da
defesa, sem prejuízo do direito subjetivo do
advogado de requerer acesso aos autos ao juiz
competente.

Observa-se, portanto, uma possibilidade de


delimitação do acesso em caso de diligências em
andamento, havendo, no parágrafo seguinte, uma
repressão ao fornecimento incompleto de autos e ao
fornecimento de autos em que houve a retirada de peças
já incluídas no caderno investigativo.
Para exercer efetivamente o direito de defesa, o
Advogado deverá ter conhecimento das imputações, dos
elementos informativos e das provas que integram os
autos oficiais. É impossível se defender do que é
desconhecido. Por isso, a regra é a possibilidade de
amplo acesso aos autos, com a excepcionalíssima
hipótese de restrição em caso de diligências em
andamento e ainda não documentadas.
Pelo mesmo motivo, também é prevista a
prerrogativa de ter vista dos processos e retirá-los do
cartório ou da repartição, conforme os incisos XV ("ter
vista dos processos judiciais ou administrativos de
qualquer natureza, em cartório ou na repartição
competente, ou retirá-los pelos prazos legais") e XVI
(“retirar autos de processos findos, mesmo sem
procuração, pelo prazo de dez dias”).
O art. 7º, XIX, do Estatuto da OAB, prevê o direito
de o Advogado recusar-se a depor como testemunha em
processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre
fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi
Advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo
constituinte, bem como sobre fato que constitua sigilo
profissional.
Conforme analisaremos, o sigilo é inerente à
investigação criminal defensiva, que exige várias
cautelas para a condução dos trabalhos, a obtenção de
resultados e a publicidade do seu teor.
As supracitadas prerrogativas da Advocacia,
conquanto não fundamentem direta e especificamente a
investigação criminal defensiva, instituem meios para o
seu desenvolvimento efetivo, mormente quanto ao
acesso aos autos oficiais (inquérito e processo) e à
possibilidade de o Advogado se recusar a depor como
testemunha.

7.6. O Provimento n. 188/2018 do


Conselho Federal da OAB
O Provimento n. 188/2018 da OAB foi aprovado pelo
Conselho Federal em 11/12/2018 e publicado no Diário
Eletrônico da OAB no dia 31/12/2018. Ele regulamenta a
investigação realizada por Advogados.
Atualmente, a única regulamentação sobre a
investigação criminal defensiva no Brasil é o Provimento
n. 188/2018 da OAB. No entanto, por não se tratar de
legislação, não vinculará Juízes, Delegados e membros do
Ministério Público, mas apenas os Advogados.
Explico: o Provimento é um ato da OAB, não tendo
sido editado por um Poder da República. Não tem,
portanto, a força normativa da Constituição (ou de suas
emendas), das leis (complementares ou ordinárias), das
medidas provisórias ou de qualquer outro ato que integre
o processo legislativo (art. 59 da Constituição Federal).
Portanto, o Provimento vincula somente os
Advogados, abordando, basicamente, a relação destes
com os clientes em caso de investigação criminal
defensiva e como o profissional poderá conduzir o
procedimento. Noutros termos, concede um poder – que
poderia ser presumido a partir do princípio da ampla
defesa – e disciplina os aspectos jurídicos e éticos, mas
não impõe a sua observância às autoridades públicas.
Por mais elogiável que seja a aprovação do
Provimento, há o risco de que, fora da Advocacia, não se
respeite o poder de investigar atribuído aos Advogados,
fazendo com que a regulamentação seja mais utilizada
no aspecto disciplinar pela OAB (para punir o Advogado
que a descumprir) do que como constrangimento das
autoridades que atuam na persecução penal. Cita-se, por
exemplo, eventual reclamação formulada pelo cliente à
OAB, argumentando que o seu Advogado juntou aos
autos de um processo documentos de que não tinha
conhecimento e que são relativos à questões íntimas ou
privadas.
Por esses motivos, é fundamental que a
regulamentação seja feita não apenas por normas
internas da OAB, mas, principalmente, por alterações
legislativas que devem ser observadas e respeitadas
pelas autoridades.
Esse também é o entendimento de Bulhões (2019,
p. 73), que afirma que “precisa ser promulgado um
marco legal, que traga segurança jurídica definitiva, bem
como possa cogitar do alargamento das prerrogativas da
advocacia, no sentido melhor exercer a sua função
investigativa.”
De qualquer forma, o Provimento é um importante
parâmetro para a atuação do Advogado, devendo ser
utilizado como base da sua atuação na investigação
criminal defensiva. Afinal, esse poder decorreria
diretamente da Constituição, mormente dos princípios do
contraditório e da ampla defesa, assim como do Código
de Processo Penal, sobretudo da permissão para juntar
documentos nos autos, considerando que os resultados
da investigação (depoimentos, perícias, imagens etc.)
constituirão documentos que, se obtidos por meios
lícitos, podem e devem ser admitidos no processo penal.

7.7. O projeto do Novo Código de


Processo Penal
Atualmente, tramitam no Congresso Nacional
projetos de lei que instituem e disciplinam – ainda que
resumidamente – a investigação criminal defensiva.
No dia 22 de abril de 2009, o Senador José Sarney
(PMDB/AP) apresentou o Projeto de Lei do Senado n.
156/2009, que dispõe sobre a reforma do Código de
Processo Penal. A sua aprovação em Plenário ocorreu em
dezembro de 2010, sendo posteriormente remetido à
Câmara dos Deputados, tornando-se o PL n. 8.045/2010.
O texto original do PLS n. 156/2009 abordava a
investigação criminal defensiva no art. 14, facultando ao
investigado, por meio de seu Advogado ou de outros
mandatários com poderes expressos, tomar a iniciativa
de identificar fontes de prova em favor de sua defesa,
podendo inclusive entrevistar pessoas. Também
disciplinava que as entrevistas deveriam ser precedidas
de esclarecimento sobre seus objetivos e do
consentimento das pessoas ouvidas.
No dia 7 de dezembro de 2010, o Deputado Federal
Miro Teixeira, do PDT/RJ, apresentou à Câmara dos
Deputados o Projeto de Lei que “Institui o Código de
Processo Penal”, o qual recebeu a numeração 7987/2010.
Esse projeto foi apensado ao PL n. 8045/2010, da mesma
forma que mais de 300 outros projetos.
No PL n. 8045/2010, a regulamentação da
investigação criminal defensiva é feita nos seguintes
termos:
Art. 13. É facultado ao investigado, por meio de
seu advogado, de defensor público ou de outros
mandatários com poderes expressos, tomar a
iniciativa de identificar fontes de prova em favor
de sua defesa, podendo inclusive entrevistar
pessoas.
§ 1º As entrevistas realizadas na forma do caput
deste artigo deverão ser precedidas de
esclarecimentos sobre seus objetivos e do
consentimento formal das pessoas ouvidas.
§ 2º A vítima não poderá ser interpelada para os
fins de investigação defensiva, salvo se houver
autorização do juiz das garantias, sempre
resguardado o seu consentimento.
§ 3º Na hipótese do § 2º deste artigo, o juiz das
garantias poderá, se for o caso, fixar condições
para a realização da entrevista.
§ 4º Os pedidos de entrevista deverão ser feitos
com discrição e reserva necessárias, em dias
úteis e com observância do horário comercial.
§ 5º O material produzido poderá ser juntado
aos autos do inquérito, a critério da autoridade
policial.
§ 6º As pessoas mencionadas no caput deste
artigo responderão civil, criminal e
disciplinarmente pelos excessos cometidos.

De início, observa-se que foi adicionado o Defensor


Público ao lado do Advogado e de outros mandatários
com poderes expressos. Concordamos com essa
alteração, haja vista que deve ser plenamente admitida –
e até incentivada – a instauração e condução de uma
investigação defensiva por membro da Defensoria
Pública.
A utilização do referido procedimento pela
Defensoria Pública é crucial para consolidar a ampla
defesa, porquanto se trata de instituição essencial à
função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a
orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a
defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos
direitos individuais e coletivos, de forma integral e
gratuita, aos necessitados (art. 134 da Constituição
Federal). Se não fosse possível que a Defensoria
investigasse em favor dos seus assistidos, haveria
desigualdade entre os poderes das defesas realizadas
por Advogado e Defensor Público, prejudicando, portanto,
os investigados e réus. Por esse motivo, defendemos não
apenas a permissão, mas também o incentivo a essa
forma de atuação.
O §2º apresenta uma limitação, que consiste na
impossibilidade de interpelar a vítima na investigação
criminal defensiva, salvo se tiver autorização judicial e o
seu consentimento. Na autorização, o Juiz poderá fixar
condições para a entrevista (§3º).
De fato, a inserção da vítima na investigação
criminal defensiva gera muitos receios e necessita de
alguns cuidados que reduzam os riscos de que o convite
para a sua oitiva pareça ser uma tentativa de
intimidação. Acreditamos, contudo, que é uma limitação
que prejudica o principal objetivo da investigação
defensiva: a efetivação da ampla defesa.
Para não prejudicar a defesa, é imperativo que o
Advogado participe do depoimento da vítima no inquérito
policial, com possibilidade de formular as perguntas que
entender pertinentes.
O §4º apresenta algumas condições para o pedido
de entrevista, quais sejam, discrição, reserva e apenas
em dias úteis, com observância do horário comercial.
Consideramos que esse parágrafo, apesar de integrar um
projeto de lei, deve ser considerado como parâmetro de
atuação para os Advogados desde já. Evidentemente, por
não se tratar de legislação em vigor, trata-se, ainda, de
mera recomendação, servindo como um possível
parâmetro que pode evitar riscos desnecessários.
O §5º representa um retrocesso, por considerar que
o material produzido poderá ser juntado, a critério da
autoridade. Mantém-se, portanto, a discricionariedade
que já existe quanto aos requerimentos de diligências
(art. 14 do CPP), o que em nada contribui para a
efetivação da ampla defesa.
Entendemos que seria muito importante a previsão
da discricionariedade do Advogado quanto a juntar ou
não o material produzido. Afinal, por respeito ao direito
de não se autoincriminar, não existe o dever de juntar
provas contrárias ao investigado ou réu. Infelizmente, o
projeto trata da (perigosa) discricionariedade da
autoridade policial, mas desconsidera a
discricionariedade da defesa técnica.
Por fim, o §6º prevê a responsabilização civil,
criminal e disciplinar pelos excessos cometidos na
condução da investigação defensiva.
Ainda que o projeto seja tímido e não contemple
toda a complexidade inerente à investigação criminal
defensiva, deve-se reconhecer que sua aprovação seria
um avanço para o exercício da ampla defesa, em que
pese a previsão da discricionariedade da autoridade
policial – o que permite ocultar do inquérito policial
elementos favoráveis à defesa – e a falta de
regulamentação dos outros meios que podem ser
empregados na investigação.

8. O conceito de investigação criminal


defensiva

O art. 1º do Provimento n. 188/2018 do Conselho


Federal da OAB prevê o conceito de investigação criminal
defensiva:
Art. 1° Compreende-se por investigação
defensiva o complexo de atividades de natureza
investigatória desenvolvido pelo advogado, com
ou sem assistência de consultor técnico ou
outros profissionais legalmente habilitados, em
qualquer fase da persecução penal,
procedimento ou grau de jurisdição, visando à
obtenção de elementos de prova destinados à
constituição de acervo probatório lícito, para a
tutela de direitos de seu constituinte.

Conforme se observa, a investigação criminal


defensiva é composta de várias atividades, de modo
similar ao inquérito policial e à investigação direta
realizada pelo Ministério Público.
Trata-se de uma atividade desenvolvida pelo
Advogado, com ou sem a participação de terceiros
(funcionários, peritos, contadores etc.). Apesar de ser
possível conduzir a investigação sozinho, há casos em
que a participação de especialistas de outras áreas é
essencial, como nas situações em que são necessários
conhecimentos técnicos sobre medicina, engenharia,
balística e outros temas.
Quando o Advogado instaurar uma investigação
criminal defensiva referente a um crime ambiental, por
exemplo, é recomendável contratar um profissional que,
tendo o conhecimento especializado, ofereça serviços
técnicos e oriente sobre a realização da perícia nos autos
oficiais, informando quais quesitos devem ser formulados
e, após sua realização, demonstrando as críticas aos
métodos e referências.
O conceito previsto no Provimento também
demonstra a ampla possibilidade de utilização da
investigação criminal defensiva (“em qualquer fase da
persecução penal, procedimento ou grau de jurisdição”).
Deve-se admitir sua utilização em todos os momentos,
incluindo a fase inquisitorial, a instrução processual e a
fase recursal. Ademais, também será possível conduzir a
investigação defensiva antes mesmo de qualquer
investigação oficial ou após o trânsito em julgado, para
fundamentar a revisão criminal ou qualquer pedido ou
defesa no âmbito do processo de execução criminal.
Observa-se, assim, que a investigação defensiva
não permanece “presa” a determinada fase da
persecução penal, estando, na verdade, desvinculada do
inquérito ou processo criminal.
O conceito previsto no Provimento também é claro
quanto à finalidade da investigação criminal defensiva:
“visando à obtenção de elementos de prova destinados à
constituição de acervo probatório lícito, para a tutela de
direitos de seu constituinte”.
A investigação defensiva tem o propósito de
efetivar a ampla defesa, sendo um procedimento que o
Advogado ou Defensor Público poderá utilizar para obter
elementos que favoreçam o investigado, réu ou apenado,
devendo atuar de acordo com os limites éticos e legais.
Também poderá ser utilizado em favor da vítima, com o
objetivo de subsidiar a atuação como assistente da
acusação ou querelante.

9. Comparando com o inquérito policial

O estudo da investigação criminal defensiva deve


partir de investigações preliminares já existentes e
consolidadas, como o inquérito policial e a investigação
direta pelo Ministério Público. Assim, algumas
comparações são inevitáveis.
As investigações preliminares exigem um ato formal
de instauração (portaria), com a delimitação do objeto
(fatos apurados) e dos possíveis suspeitos. No mesmo
ato, normalmente se define a sequência das primeiras
diligências.
Os atos não são praticados apenas pela autoridade
que preside a investigação (Delegado, Promotor de
Justiça ou Procurador da República, conforme seja
inquérito policial ou investigação direta pelo MP Estadual
ou Federal, respectivamente). Muitas diligências são
delegadas a servidores da mesma instituição ou a
especialistas de outras instituições (peritos, por
exemplo). As delegações normalmente são feitas por
meio de ordens de serviço ou ofícios.
Após algumas diligências, é elaborado um relatório
descrevendo pormenorizadamente o método empregado,
as condições/circunstâncias e os resultados obtidos.
O desenvolvimento da investigação deve respeitar
os direitos e as garantias fundamentais constantes da
Constituição Federal e da legislação infraconstitucional.
Exige-se a observância, por exemplo, da reserva de
jurisdição, do direito ao silêncio, da preservação da
intimidade e de outros direitos igualmente relevantes.
No final, é elaborado um relatório de conclusão,
com uma breve explanação sobre as diligências
realizadas na investigação e a interpretação dos fatos
apurados. Fala-se que a finalidade do inquérito policial é
subsidiar a interpretação feita pelo acusador, que pode
ser no sentido de arquivamento, denúncia ou realização
de novas diligências.
No caso da investigação criminal defensiva, os
parâmetros são muito parecidos com o inquérito policial,
com algumas exceções.
Salienta-se, inicialmente, que o Advogado atuará
por meio de procuração, após a contratação feita pelo
cliente, que normalmente é investigado em um inquérito
ou réu em um processo criminal, mas também pode
tratar-se de vítima, caso tenha o objetivo de subsidiar o
oferecimento de uma queixa-crime ou a atuação como
assistente da acusação. Por outro lado, o inquérito
policial terá início mediante provocação ou de ofício, não
tendo o desiderato de tutelar a situação individual da
vítima ou do autor do fato.
O início da investigação defensiva também
dependerá de um ato formal, qual seja, o termo de
instauração. Esse ato será semelhante a uma portaria de
instauração de inquérito policial, devendo individualizar
os fatos apurados e as pessoas envolvidas, bem como, se
for o caso, definir as diligências iniciais.
Da mesma forma que uma investigação oficial não é
conduzida apenas pela autoridade que a instaurou
(Delegado, Promotor de Justiça ou Procurador da
República), também é possível que o Advogado, após a
instauração da investigação defensiva, conte com os
serviços de outros profissionais, especialmente quando
forem necessários conhecimentos específicos.
Sugere-se que, após as diligências da investigação
defensiva, sejam feitos relatórios descrevendo o que foi
feito, os métodos empregados e quais foram os
resultados, nos mesmos moldes das investigações
policiais mais complexas.
O Advogado deverá observar os limites
constitucionais, legais e éticos, não podendo, por
exemplo, tomar medidas que exijam decisão judicial
(reserva de jurisdição) ou violar direitos de outras
pessoas. Por ser uma atividade ainda pouco difundida e
relativa a alguém que ocupa o papel de investigado/réu,
o cuidado deve ser maior para evitar riscos indesejados,
principalmente eventual responsabilização por prática de
crimes (coação no curso do processo, ameaça, invasão
de domicílio etc.).
Da mesma forma que nas investigações policiais, o
Advogado poderá elaborar um relatório de conclusão, o
qual não necessariamente será levado ao conhecimento
de terceiros. Em alguns casos, quando o relatório tiver o
escopo de apresentar reflexões sobre as teses e
estratégias defensivas, é aconselhável que não seja
juntado aos autos oficiais.
No que concerne à finalidade, pode-se fazer um
paralelo entre a utilização do inquérito policial para
subsidiar uma denúncia ou queixa-crime e a condução de
uma investigação defensiva para fundamentar uma
queixa-crime ou a atuação como assistente da acusação.
Entretanto, a investigação defensiva tem muitas outras
finalidades, como a defesa em um processo criminal e a
sua utilização para subsidiar habeas corpus, revisão
criminal, manifestações (pedidos ou defesas) na
execução penal e muito mais.
Dependendo da finalidade, a investigação defensiva
precisará ser mais contundente do que normalmente o é
um inquérito policial. Explico: normalmente, argumenta-
se que o inquérito precisa apenas ser suficiente para o
oferecimento e recebimento da inicial acusatória. Por
outro lado, uma investigação defensiva que tenha o
objetivo de subsidiar uma revisão criminal precisará ser
extremamente contundente para contribuir para a
desconstituição da coisa julgada, quando, segundo a
jurisprudência, não se fala mais em presunção de
inocência, por já existir sentença condenatória transitada
em julgado.
Sobre a linha investigativa, entende-se que o
inquérito policial deveria adotar todos os caminhos
possíveis para a formação da opinio delicti, seja para o
arquivamento, seja para o oferecimento da denúncia. Na
prática, o inquérito policial normalmente segue uma linha
mais acusatória, principalmente por proporcionar poucas
chances de participação da defesa.
A investigação defensiva, por sua vez, tem uma
finalidade parcial, qual seja, favorecer o cliente
(investigado ou réu) e fundamentar teses e estratégias
defensivas. No caso de investigação desenvolvida em
favor da vítima (assistente da acusação ou querelante),
busca-se a construção ou o fortalecimento da versão
acusatória.
Por derradeiro, o inquérito policial e a investigação
criminal defensiva não são obrigatórios para um processo
penal, em que pese o primeiro quase sempre acompanhe
as exordiais acusatórias. A investigação feita pela defesa
não apenas é uma faculdade, como também ainda é
pouco utilizada.
Apesar de ser dispensável, o inquérito policial deve
ser instaurado – inclusive de ofício (art. 5º, I, do CPP) –
quando a autoridade policial tiver conhecimento de
algum fato criminoso, devendo realizar as diligências
necessárias, sob pena de responsabilização
administrativa e criminal (prevaricação, por exemplo). A
investigação defensiva, como referido, é dispensável e
sua instauração é facultativa.
O inquérito policial tem prazo para ser encerrado
(art. 10 do CPP), o que não ocorre em relação à
investigação criminal defensiva, que poderá ter a
duração definida pelo Advogado que a instaurou, de
acordo com a necessidade de obtenção de elementos e
os momentos adequados para levar os resultados aos
autos oficiais. Defendemos, ainda, que a investigação
defensiva pode continuar durante todo o processo, não
havendo a obrigatoriedade de que, em algum momento,
seja encerrada, salvo quando não mais for necessária.
A organização dos autos da investigação criminal
defensiva pode ser similar aos autos de um inquérito
policial ou de um processo, contendo folhas numeradas e
uma sequência cronológica de documentos. Os autos
terão uma capa e, no seu interior, o ato de instauração,
termos de depoimentos, relatórios, imagens,
documentos, perícias e, por fim, relatório de conclusão.
No caso do inquérito policial, tudo deverá ser levado aos
autos oficiais. A investigação defensiva, por outro lado,
pressupõe uma avaliação do que pode ser aproveitado e
daquilo que, por irrelevância ou risco de prejudicar o
cliente, deve ser descartado.
Portanto, a condução e a organização da
investigação criminal defensiva seguem a mesma lógica
dos inquéritos policiais, termos circunstanciados,
inquéritos civis públicos, investigações diretas pelo
Ministério Público etc. A diferença mais evidente consiste
no fato de que quem preside a investigação defensiva
não é uma autoridade pública – tendo algumas limitações
na sua atuação – e, normalmente, sofre o estigma na
persecução penal, como se estivesse buscando a
impunidade, e não exercendo o direito de defesa.
Por essa razão, a investigação defensiva deve ser
preparada de modo a evitar retaliações das autoridades,
isto é, precisa ser formalizada e ter a instauração
devidamente comunicada à OAB, conduzindo-a com o
respeito aos direitos de terceiros e aos limites do
exercício de uma atividade que não tem poder de
coerção. Recomenda-se, ainda, que, sempre que
possível, os atos sejam gravados, evitando futuras
alegações de excessos, intimidações, ameaças ou
coações exercidas pelo Advogado.

10. Quais atividades podem ser objeto


de investigação criminal defensiva?

Da mesma forma que o inquérito policial e outras


investigações preliminares, há possibilidade de
desenvolver muitas atividades na investigação criminal
defensiva, como:
juntada de documentos;
tomada de depoimentos;
acareações;
perícias;
obtenção de fotografias ou gravações;
análise de locais ou coisas para descrição;
reconhecimentos de pessoas;
reconhecimentos de coisas;
reconstituição de crime ou reprodução
simulada dos fatos;
auto de avaliação de coisa.

O Advogado definirá as atividades que devem ser


desenvolvidas de acordo com o caso concreto,
analisando os elementos que integram os autos oficiais e
perquirindo como afastar a versão acusatória e
fundamentar a linha defensiva.
Há crimes, como os patrimoniais, que poderão
demandar a elaboração de um auto de avaliação da
coisa subtraída. Outros, como os crimes de trânsito e de
homicídio, poderão exigir perícias complexas no local, no
veículo, na arma utilizada ou em uma pessoa.
Se houver questionamento sobre a autoria, o
reconhecimento de pessoa poderá ser útil. Noutro
sentido, em crimes que envolvam contratos ou imóveis, a
obtenção e a juntada de documentos é uma medida
possível.
Tomar depoimentos pode ser útil em praticamente
todos e quaisquer tipos de crimes, podendo surgir, a
partir dos depoimentos, a necessidade de fazer
acareações entre testemunhas, vítima e testemunha,
testemunha e investigado ou vítima e investigado.
Há crimes que, pelo local em que supostamente
foram praticados (estabelecimento comercial,
estacionamento ou condomínio, por exemplo), podem ser
provados ou rechaçados por meio de gravações de
câmeras de segurança. Se for o caso, o Advogado poderá
diligenciar nesse sentido.
Durante o trâmite da investigação criminal
defensiva, normalmente surge a necessidade de realizar
diligências que, no início, não foram consideradas. O
andamento das investigações pode justificar um novo
olhar sobre o que se pretende produzir e quais resultados
são necessários.

11. A investigação para subsidiar


queixa-crime

O art. 3º, parágrafo único, do Provimento n.


188/2018 do Conselho Federal da OAB dispõe:
Parágrafo único. A atividade de investigação
defensiva do advogado inclui a realização de
diligências investigatórias visando à obtenção
de elementos destinados à produção de prova
para o oferecimento de queixa, principal ou
subsidiária.

Trata-se de uma previsão objetivando a realização


de uma investigação, conduzida por um Advogado, com
o desiderato de subsidiar o oferecimento de uma queixa-
crime, principal ou subsidiária.
Antes de abordarmos as diligências possíveis nesses
casos, devemos discorrer sobre questões práticas e
elucidar os aspectos classificatórios, principalmente
sobre a nomenclatura “investigação defensiva” para se
referir às diligências em favor das vítimas de crimes.
Bulhões (2019, p. 104) utiliza a seguinte
classificação:
Para fins didáticos, portanto, propõe-se a
seguinte taxonomia, sendo encarada a
investigação defensiva (lato senso) como um
gênero, do qual fazem parte quatro espécies: i)
investigação defensiva stricto senso; ii)
investigação defensiva dos interesses das
vítimas; iii) investigação defensiva corporativa;
e, ainda, iv) investigação defensiva
colaboracional.

Dessa forma, o autor chama de investigação


defensiva dos interesses das vítimas o procedimento que
tem o desiderato de subsidiar uma queixa-crime ou
qualquer outro ato em favor de quem teria sofrido a
prática de uma infração penal.
Adotando outra classificação, Silva (2019, p. 461)
afirma:
A investigação criminal defensiva, ou também,
para a defesa de interesses pode ocorrer por
meio de um inquérito defensivo, instrumento
destinado à coleta de informações em favor de
suspeitos, indiciados, acusados e condenados ou
por meio de um inquérito auxiliar, quando
realizado pelo querelante, vítima ou assistente
de acusação.

As duas classificações possuem bons fundamentos,


mas, no presente livro, utilizaremos a expressão
investigação criminal defensiva como gênero,
explicitando, sempre que necessário, que se trata de
procedimento em favor de um investigado/réu ou de uma
vítima.
Na prática, observamos que, quando se trata de
investigação de um crime sujeito à ação penal pública
(homicídio, roubo, furto, estupro, lavagem, tráfico de
drogas etc.), ainda que condicionada à representação
(perigo de contágio venéreo, ameaça, furto de coisa
comum, estelionato etc.), são realizadas muitas
diligências, definidas de ofício pela autoridade policial ou
requisitadas pelo Ministério Público. Nesses casos, a
investigação – inquérito policial ou termo circunstanciado
– será analisada pelo membro do Ministério Público, que
avaliará se é caso de arquivamento, oferecimento da
denúncia ou realização de novas diligências.
Por outro lado, tratando-se de crime de ação penal
privada (calúnia, difamação, injúria, esbulho possessório,
fraude à execução etc.), a investigação normalmente não
é muito aprofundada, limitando-se à oitiva da vítima e,
se possível, do autor do fato. Em regra, o Advogado que
atua em favor da vítima não postula diligências – às
vezes, a vítima não é informada sobre a necessidade de
constituir um Advogado ou procurar a Defensoria Pública
– ou, quando requer uma diligência, seu requerimento é
indeferido. Em seguida, aguarda-se o oferecimento da
queixa-crime com pouquíssimos elementos – o que pode
gerar a rejeição da inicial acusatória – ou o termo
circunstanciado é enviado ao Juizado Especial Criminal
para a realização de audiência preliminar.
Para evitar que a queixa-crime seja instruída apenas
com o boletim de ocorrência e com o objetivo de diminuir
o risco de rejeição da exordial acusatória, a investigação
criminal defensiva pode ser um excelente expediente.
Destarte, a investigação conduzida por um
Advogado teria o desiderato de subsidiar a acusação
instrumentalizada por uma queixa-crime, que pode ser
principal ou subsidiária. A classificação doutrinária da
ação penal explica adequadamente a diferença entre as
duas espécies e como a segunda tem um empecilho
sobre o qual devemos refletir.
É cediço que, como regra, a ação penal é pública,
salvo quando a lei expressamente a declara privativa do
ofendido (art. 100 do CP).
No que concerne à queixa-crime principal, trata-se
da ação penal de iniciativa privada, ou seja, aquela que é
promovida mediante queixa do ofendido ou de quem
tenha qualidade para representá-lo (art. 100, §2º, do CP).
O cabimento da queixa-crime como exordial acusatória
depende da mera análise da legislação, que contém, no
dispositivo que trata da conduta criminosa ou em outro
(normalmente no mesmo capítulo), expressões como
“somente se procede mediante queixa”, “depende de
queixa” ou outra similar (arts. 145, 161, §3º, 167, 179,
186, I, 236, parágrafo único, e 345, parágrafo único,
todos do CP).
Por sua vez, a queixa subsidiária diz respeito à
permissão de que seja oferecida ação privada nos crimes
de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal.
Significa, basicamente, o cabimento de uma queixa em
uma situação que originariamente dependeria de uma
denúncia oferecida pelo Ministério Público. Trata-se de
uma hipótese prevista no art. 5º, LIX, da Constituição
Federal, inserida no título que trata dos direitos e das
garantias fundamentais. No mesmo sentido, o art. 100,
§3º, do CP, anuncia que a ação de iniciativa privada pode
intentar-se nos crimes de ação pública, se o Ministério
Público não oferece denúncia no prazo legal.
A jurisprudência definiu o entendimento de que não
é cabível a ação penal privada subsidiária da pública em
caso de arquivamento do inquérito policial, conforme o
STJ:
(...) 1. A ação penal privada subsidiária da
pública somente é cabível nos casos em que
ficar caracterizada a inércia do Ministério
Público, por não oferecer denúncia no prazo
legal, não sendo cabível nas hipóteses de
arquivamento de inquérito policial formulado por
esse órgão e acolhido pelo juiz (...) (AgRg no
REsp 1477394/DF, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS
JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 04/02/2016,
DJe 23/02/2016)

(...) o pedido de arquivamento do inquérito não


caracteriza inércia do Parquet, razão pela qual
não abre a possibilidade de eventual
oferecimento de ação penal privada subsidiária
da pública. Precedentes.
3. Agravo regimental improvido.
(AgRg no RMS 27.518/SP, Rel. Ministro MARCO
AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em
20/02/2014, DJe 27/02/2014)
Deve-se observar esse entendimento
jurisprudencial para evitar a rejeição da queixa-crime
referente a uma ação penal privada subsidiária da
pública, evitando, além disso, que se instaure uma
desnecessária investigação criminal defensiva.
Finalmente, constata-se que a investigação
realizada por um Advogado pode ser utilizada para
subsidiar o oferecimento de uma queixa-crime, seja no
caso de ação penal privada, seja na hipótese em que o
Parquet não oferece a denúncia no prazo legal.
Da mesma forma que o inquérito policial é
dispensável para o oferecimento da denúncia, também
não é obrigatória a instauração de uma investigação
defensiva para o oferecimento da queixa-crime. Havendo
elementos suficientes no inquérito policial ou no termo
circunstanciado, não haverá necessidade de que o
Advogado instaure a investigação. Ademais, se já tiver os
elementos à disposição (documentos, por exemplo),
independentemente de uma investigação defensiva,
poderá anexá-los à queixa-crime.
A investigação defensiva será recomendável,
portanto, nos casos em que:
inexistam elementos suficientes no inquérito
policial ou no termo circunstanciado e a
autoridade policial não defere os
requerimentos de diligências formulados pelo
ofendido;
o ofendido não tenha os elementos à
disposição, necessitando, assim, de um
procedimento para produzir e documentar tudo
que tenha o condão de subsidiar a queixa-
crime.
12. A investigação é privativa da
Advocacia

O art. 7º do Provimento n. 188/2018 do Conselho


Federal da OAB traz a previsão de que as atividades são
privativas da Advocacia:
Art. 7º As atividades descritas neste Provimento
são privativas da advocacia, compreendendo-se
como ato legítimo de exercício profissional, não
podendo receber qualquer tipo de censura ou
impedimento pelas autoridades.

A instauração e a condução de uma investigação


criminal defensiva são atos privativos da Advocacia.
Contudo, além da possibilidade de contar com
profissionais externos (especialistas de outras áreas),
também se admite que qualquer pessoa – especialmente
o próprio investigado ou réu – pratique alguns atos que
também se inserem na investigação defensiva.
Nesse sentido, Oliveira (2008, p. 31):
Aliás, não existem no nosso ordenamento
jurídico quaisquer limitações à actividade de
‘investigar por conta própria’ ou por intermédio
de terceiros, pelo que podemos partir da
afirmação de um princípio geral da livre
investigação dos factos, coincidente com alguns
dos direitos, liberdades e garantias
constitucionalmente consagrados, tais como o
direito à liberdade individual, o direito de se
informar e de ser informado livremente e sem
impedimentos, o direito à livre circulação, entre
outros.
E tal investigação por conta própria sucede com
frequência nos casos em que alguém pretende
descobrir o paradeiro de determinada pessoa,
obter informações sobre bens dos seus
devedores, inteirar-se do comportamento do seu
cônjuge, etc.
Imaginemos, por exemplo, um investigado por
crime ambiental que, por conta própria,
independentemente de qualquer orientação de um
Advogado ou Defensor Público, contrate um profissional
para fazer uma perícia e formular um laudo sobre
destruição ou dano a uma floresta considerada de
preservação permanente. Ora, além de não haver
impedimento para essa iniciativa, também não há
qualquer prejuízo quanto à validade e à veracidade do
laudo. Apenas seria exigível o filtro da defesa técnica –
Advogado ou Defensor Público – quanto às
(des)vantagens da juntada aos autos oficiais.
No que concerne à impossibilidade de receber
qualquer tipo de censura ou impedimento pelas
autoridades, duas observações devem ser feitas.
A um, é inegável que, como ato relativo ao exercício
da Advocacia, as prerrogativas previstas no Estatuto da
OAB são totalmente aplicáveis.
A dois, por se tratar de um Provimento aprovado
pelo Conselho Federal da OAB e sendo desprovido de
caráter legislativo, sua observância não pode ser exigida
das autoridades, o que pode gerar, infelizmente, a recusa
quanto ao recebimento dos resultados da investigação
defensiva. Evidentemente, entendemos que a
possibilidade de investigar e produzir elementos que
corroborem a versão do investigado/réu emana da
Constituição Federal, especificamente da ampla defesa,
mas não podemos desconsiderar a chance de rejeição
desse argumento por parte das autoridades que atuam
na persecução penal.

13. Quem participa da investigação


criminal defensiva?
O primeiro e mais fundamental participante da
investigação criminal defensiva é o Advogado ou
Defensor Público que a instaura e conduz os trabalhos.
Aliás, é nesse sentido que o art. 7º do Provimento n.
188/2018 do Conselho Federal da OAB define tais atos
como privativos da Advocacia.
Sobre outros profissionais que podem atuar na
investigação defensiva, o parágrafo único do art. 4º do
referido Provimento afirma que “na realização da
investigação defensiva, o advogado poderá valer-se de
colaboradores, como detetives particulares, peritos,
técnicos e auxiliares de trabalhos de campo.”
Inicialmente, deve-se observar que os profissionais
mencionados (detetives particulares, peritos, técnicos e
auxiliares de trabalhos de campo) fazem parte de um rol
meramente exemplificativo dos colaboradores que
podem prestar serviços na investigação defensiva.
Também é importante destacar que a participação
de colaboradores é uma faculdade do Advogado, ainda
que, em alguns casos, seja extremamente recomendável
para a obtenção de resultados satisfatórios.
Em um inquérito ou processo que tenha como
objeto um crime de homicídio, o Advogado poderá
contratar um especialista em balística, acidentes de
trânsito, toxicologia, traumatologia ou asfixiologia,
dependendo da forma de execução do crime.
Em caso de crime contra a ordem tributária ou
qualquer outro que envolva tributos, poderá valer-se dos
serviços de um contador.
Da mesma forma, caso seja necessário avaliar a
escrita (assinatura, letras de uma declaração etc.) de
alguém, poderá contratar um profissional que tenha
experiência em perícia grafotécnica. Inclusive, seria a
oportunidade de definir se é uma boa estratégia a
juntada de determinado documento aos autos oficiais
(inquérito ou processo), nos quais poderá ser realizada a
perícia determinada pelo Delegado ou Juiz.
Por meio de profissionais especializados, também
será possível questionar a materialidade do tráfico de
drogas, especialmente em relação à natureza, à forma de
apreensão, à cadeia de custódia e suas várias etapas
(art. 158-B do CPP).
Tratando-se de uma imputação de crime ambiental,
pode-se contratar um perito ambiental,
preferencialmente com graduação em engenharia
ambiental.
Em todos esses casos, o Advogado contratará os
especialistas para que realizem perícias e elaborem
laudos contendo a análise técnica e verdadeira sobre
determinados pontos. Por óbvio, não se deve contratar
um profissional para que ele “encontre um jeito” – ainda
que por afirmações falsas – de dizer algo favorável ao
investigado/réu, mas sim para que, com autonomia, ele
avalie o objeto da perícia. Se o resultado da perícia for
desfavorável às alegações defensivas, poderá ser
desconsiderado, deixando de juntá-lo nos autos oficiais.
Também é possível a contratação de um detetive
particular, expediente já utilizado em processos de
Direito de Família, mormente quando se trata de pedido
de guarda e/ou alimentos. Nesses casos, utiliza-se o
serviço de um detetive particular para demonstrar que a
outra parte não tem condições (emocionais, sociais etc.)
de ficar com a criança, no caso da guarda, ou que
ostenta boas condições financeiras (gastos excessivos,
veículos caros etc.) para a fixação dos alimentos.
No bojo de uma investigação criminal defensiva,
nada impede a utilização de um detetive particular para
realizar trabalhos de campo, como o acompanhamento
de testemunhas que estão se encontrando com a vítima
ou seu Advogado e recebendo orientações e/ou dinheiro
para que deponham contra o réu.
Em determinadas situações, a atividade do detetive
poderá desenvolver-se poucos minutos antes da
audiência, monitorando as testemunhas policiais no
fórum e demonstrando que os servidores do cartório lhes
forneceram cópias dos depoimentos prestados no
inquérito policial. Essa estratégia poderá contribuir para
a diminuição da credibilidade do depoimento ou como
fator que afete a estabilidade da testemunha que tenha
tendência de favorecer à acusação.
Imaginemos que uma testemunha tenha sido
gravada conversando com o Advogado da vítima antes
da audiência. O detetive entregou a cópia da gravação
ao Advogado do réu, que o contratara. Na audiência, o
Advogado pergunta para a testemunha se ela recebeu
orientações sobre o que deveria falar em seu
depoimento. A testemunha nega que tenha recebido
orientações do Advogado da vítima e, em seguida, é
surpreendida pelo Advogado do réu, que entrega ao Juiz
a cópia da gravação, requerendo que seja juntada aos
autos. Possivelmente, o Juiz advertirá a testemunha
sobre o compromisso de dizer a verdade, a possibilidade
de responder por crime de falso testemunho e a chance
de se retratar.
Concluímos que, conforme as peculiaridades do
caso concreto e as estratégias defensivas adotadas, o
Advogado poderá avaliar a contratação de inúmeros
profissionais que tenham conhecimentos especializados
e dominem os métodos necessários para a obtenção dos
resultados pretendidos.

14. Momentos da investigação criminal


defensiva

De acordo com o art. 1º do Provimento, a


investigação defensiva pode ser realizada “em qualquer
fase da persecução penal, procedimento ou grau de
jurisdição”. Portanto, a investigação defensiva poderia
ser utilizada durante o inquérito policial ou outra
investigação conduzida por alguma autoridade pública,
depois do oferecimento da denúncia, durante a
instrução, antes ou depois da audiência e em qualquer
outro momento.
Insta salientar que o art. 231 do CPP permite a
juntada de documentos em qualquer fase do processo.
Portanto, é possível inclusive a juntada de elementos
obtidos na investigação defensiva no momento de
apresentar os memoriais, hipótese em que,
normalmente, para garantir o contrário, o Juiz
determinará a intimação do Ministério Público ou
querelante para ter ciência dos documentos juntados
pela defesa.
O art. 1º do Provimento também menciona que é
cabível a investigação defensiva em qualquer
procedimento, o que significa que é possível utilizá-la no
procedimento comum ordinário, no sumário, no rito dos
crimes dolosos contra a vida, no Juizado Especial Criminal
(Lei n. 9.099/95), no procedimento da Lei de Drogas (Lei
n. 11.343/2006), nos procedimentos relativos à
competência originária dos Tribunais e em qualquer outro
procedimento. Afinal, a ampla defesa, com todos os seus
meios e recursos, não tem limitações quanto ao
procedimento.
No que concerne à possibilidade de realizar a
investigação defensiva em qualquer grau de jurisdição,
devemos ter uma interpretação ampla, no sentido de que
não se trata apenas de sua utilização durante a fase
recursal no Tribunal de Justiça, Tribunal Regional Federal,
Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal,
mas também nos casos de competência originária desses
Tribunais.
Evidentemente, o fato de ser uma autorização
criada por um Provimento da OAB tem como
consequência a possibilidade de que esses Tribunais, na
competência originária ou recursal, não aceitem os
elementos informativos produzidos pelo Advogado na
investigação direta.
Ademais, sobre a competência recursal dos
Tribunais Superiores, também é importante considerar
que há entendimento jurisprudencial pacífico de que
esses Tribunais não analisam questões fático-probatórias.
Portanto, especificamente na fase recursal dos
Tribunais Superiores, podemos imaginar duas limitações:
possibilidade de que não aceitem os elementos
produzidos direta e isoladamente por um
Advogado, considerando que o Provimento da
OAB não tem caráter de lei;
entendimento jurisprudencial contra a análise
de fatos e provas nos recursos que tramitam
nos Tribunais Superiores.
Com essas limitações, seria recomendável realizar a
investigação defensiva o mais cedo possível, ainda
durante a tramitação do inquérito policial ou durante a
instrução do processo no primeiro grau.
Ainda quanto aos momentos da investigação
defensiva, de forma específica, o art. 2º do Provimento
afirma:
Art. 2º A investigação defensiva pode ser
desenvolvida na etapa da investigação
preliminar, no decorrer da instrução processual
em juízo, na fase recursal em qualquer grau,
durante a execução penal e, ainda, como
medida preparatória para a propositura da
revisão criminal ou em seu decorrer.

Trata-se de uma enumeração de várias


possibilidades de desenvolvimento da investigação
defensiva, quais sejam:
na etapa da investigação preliminar (durante o
inquérito policial ou a investigação direta pelo
Ministério Público, por exemplo);
no decorrer da instrução processual em juízo;
na fase recursal em qualquer grau;
durante a execução penal;
como medida preparatória para a propositura
da revisão criminal;
no decorrer da revisão criminal.

Apesar de não ter sido mencionada no Provimento,


podemos considerar também a possibilidade de
realização de uma investigação defensiva antes de
qualquer procedimento extrajudicial ou judicial, isto é,
antes mesmo de ser instaurado um inquérito policial ou
outra investigação preliminar. Cita-se, por exemplo, a
investigação para colher elementos de prova antes de
registrar um boletim de ocorrência.
14.1. A investigação defensiva durante
a investigação oficial
Como é sabido, o inquérito policial é dispensável
(arts. 12, 27, 39, §5º e 46, §1º, todos do CPP), mas, em
regra, é amplamente utilizado como procedimento para
investigar e subsidiar a exordial acusatória.
Ademais, prepondera o entendimento de que
eventuais vícios ocorridos no inquérito policial não
contaminam o processo, além de ser considerado um
procedimento pré-processual que não tem contraditório
ou, no mínimo, terá um contraditório diferido ou
postergado. Nesse sentido, o STJ:
(...)
I - É cediço que o inquérito policial é peça
meramente informativa, de modo que o
exercício do contraditório e da ampla defesa,
garantias que tornam devido o processo legal,
não subsistem no âmbito do procedimento
administrativo inquisitorial. Precedentes.
(...)
(RHC 57.812/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER,
QUINTA TURMA, julgado em 15/10/2015, DJe
22/10/2015)

Outrossim, também é relevante asseverar que o


Ministério Público exerce o controle externo da atividade
policial (art. 129, VII, da Constituição Federal) e, como
titular da ação penal pública, tem grande ingerência na
investigação, inclusive com constantes manifestações
sobre diligências.
Ainda, a participação de Advogados no inquérito
policial é mínima, muitas vezes sem qualquer
comunicação para que participem da oitiva de
testemunhas. O acesso aos autos do inquérito policial,
uma das questões mais básicas, encontra obstáculos na
prática, como a absurda exigência de procuração, quiçá
uma petição requerendo o acesso. Em alguns lugares,
chega-se a um absurdo ainda maior: aguardar a
deliberação do Delegado de Polícia sobre deferir ou não o
acesso do Advogado aos autos do inquérito.
Conquanto exista previsão de requerer diligências
no inquérito policial (art. 14 do CPP), é comum que se
defenda a discricionariedade do Delegado para deferir ou
não as medidas requeridas. Como regra, as chances de
deferimento dos pedidos de diligências formulados pelo
Advogado do investigado são mínimas.
Por esses motivos, o inquérito policial virou um
instrumento de busca incessante da autoria e da
materialidade, muitas vezes sem a consideração de
outras linhas de investigação que poderiam favorecer o
investigado e justificar, v. g., o arquivamento do
inquérito.
Assim, a investigação defensiva pode funcionar
como um instrumento para efetivar a paridade de armas
na persecução penal, propiciando-a na fase de
investigação, mas posteriormente repercutindo na fase
processual.
Nesse sentido, Oliveira (2008, p. 21) demonstra que
a atuação defensiva no inquérito repercutirá durante
toda a persecução penal:
Impulsionar o conhecimento da argumentação
contrária aos pontos de vista da Defesa, logo no
momento da Acusação, se este vier a ter lugar.
Pela intervenção da Defesa nas investigações
criminais e pela exploração das suas teses
iniciais por parte das autoridades judiciárias, o
defensor obterá ainda um precioso contributo
para a reavaliação da direcção da Defesa, em
toda a sua actuação subsequente. Isto, porque
os resultados das diligências de investigação
requeridas passarão a constar do Inquérito e,
certamente, sobre tais resultados as entidades
judiciárias terão de pronunciar-se.
Também é importante observar que aquilo que
interessa ao investigado não necessariamente estará
alinhado ao que as autoridades pretendem obter nas
investigações oficiais, motivo pelo qual pode ser difícil
contribuir para o inquérito policial se a contribuição não
for bem-vinda. Logo, não se deve apenas tentar
participar ativamente da investigação oficial, mas
também instaurar e presidir a própria investigação, qual
seja, a investigação criminal defensiva.
Além do inquérito policial, também seria admissível
realizar a investigação defensiva durante outras
investigações oficiais, como o inquérito policial militar, as
comissões parlamentares de inquérito e as investigações
relativas a autoridades com foro por prerrogativa de
função.
Em tese, nada impediria a realização da
investigação defensiva durante o termo circunstanciado.
Entrementes, a forma como é lavrado, muitas vezes
sendo concluído no mesmo dia do fato, poderia ser um
empecilho ao desenvolvimento da investigação
defensiva.
Da mesma forma, caso exista um procedimento que
apure fatos em outras áreas, mas que tenha o condão de
repercutir na seara criminal, como o inquérito civil
público e o procedimento administrativo disciplinar
contra servidor público, a investigação criminal defensiva
poderá ser um instrumento preparatório e uma
estratégia de antecipação contra eventual persecução
penal.
Por derradeiro, as investigações oficiais podem ser
utilizadas como parâmetro de avaliação do que ainda
precisa ser produzido pela defesa, isto é, o Advogado ou
Defensor Público poderá, ao examinar os autos da
investigação oficial, traçar a estratégia da investigação
defensiva quanto às diligências que ainda precisam ser
desenvolvidas. Nas palavras de Oliveira (2008, p. 25),
“pode o arguido partir da avaliação que fez das
investigações judiciárias para a investigação de factos e
recolha de meios de prova, por sua conta, em sentidos
que se lhe mostrem convenientes”.

14.2. A investigação durante a instrução


processual
A investigação realizada pela defesa também pode
ser utilizada no decorrer da instrução processual em
juízo, do momento do oferecimento da denúncia até o
momento imediatamente anterior à prolação da
sentença.
O cenário ideal seria encerrar a investigação
defensiva até o momento da citação, apresentando seus
resultados anexos à resposta à acusação, considerando
que é possível oferecer documentos nessa peça, com
fulcro no art. 396-A do CPP.
Contudo, nada impede que a defesa junte os
documentos posteriormente, antes ou depois da
audiência. Também poderia cogitar a apresentação dos
documentos relativos à investigação defensiva na peça
de memoriais, o que provavelmente faria o Magistrado
determinar a intimação do Ministério Público, quando não
indeferisse a juntada.
Juntar os resultados da investigação defensiva no
momento da audiência terá como vantagem estratégica
para a defesa a surpresa do Ministério Público, que não
terá conhecimento prévio de todo o contexto probatório.
Se o Juiz negar a juntada, será cabível habeas
corpus ou correição parcial, com fundamento no
cerceamento da defesa e no prejuízo causado ao réu,
que consiste na impossibilidade de apresentar
documentos que fundamentem sua versão.

14.3. A investigação na fase recursal


A investigação defensiva também pode ocorrer
durante a fase recursal, nos Tribunais de segundo grau
ou nos Tribunais Superiores.
Consideramos ter mais utilidade a investigação
defensiva realizada antes da fase recursal (no inquérito
policial ou durante a instrução) ou, no máximo, para
instruir eventual recurso. A investigação defensiva
realizada durante a fase recursal, que não admite
produção de provas, pode ser inócua.
De qualquer forma, poderíamos imaginar a
realização da investigação defensiva para instruir recurso
em sentido estrito (contra a decisão de pronúncia, por
exemplo), apelação, embargos infringentes e de
nulidade, correição parcial, recurso extraordinário,
recurso especial ou qualquer outro recurso.
Destaca-se, contudo, que a juntada de documentos
na fase recursal nem sempre é aceita pelos
Desembargadores e Ministros, mormente nos casos em
que se pretenda uma inovação fático-probatória. O art.
231 do CPP (“Salvo os casos expressos em lei, as partes
poderão apresentar documentos em qualquer fase do
processo”), em muitos casos, é ignorado ou superado
com base no argumento de que se trata de prova
protelatória ou irrelevante.
Há, contudo, jurisprudência no sentido de que é
possível a juntada de documentos na fase recursal,
desde que seja oportunizado o contraditório.
Em determinado caso apreciado pelo Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul, a defesa juntou
documentos nas razões recursais, oportunidade em que
o Ministério Público requereu – sem sucesso – o
desentranhamento:
(...) Nos termos da lei processual penal, salvo
nos casos expressos em lei, as partes, em
qualquer fase do processo, poderão juntar
documentos (art. 231 do CPP). Defesa que, com
as razões recursais, juntou documentos que
apenas retratam situação exposta pela ré L.C.N.
no interrogatório. Documentação à que teve
acesso o Ministério Público, não havendo falar
em prejuízo. Desentranhamento indeferido.
Preliminar desacolhida. (...) (Apelação Criminal,
Nº 70080810625, Oitava Câmara Criminal,
Tribunal de Justiça do RS, Relatora: Fabianne
Breton Baisch, Julgado em: 24-06-2020)

O Superior Tribunal de Justiça também admite a


juntada de documentos em qualquer fase, nos termos do
art. 231 do CPP, desde que seja oportunizado o
contraditório:
(...)
2. De acordo com a jurisprudência deste
Superior Tribunal de Justiça, salvo nos casos
expressos em lei, no processo penal admite-se a
juntada de documentos posteriormente à
instrução processual, em atenção ao que
estabelece o artigo 231 do Código de Processo
Penal, desde que assegurado o devido
contraditório.
(...)
(AgRg no REsp 1543200/RS, Rel. Ministra MARIA
THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA,
julgado em 27/10/2015, DJe 13/11/2015)

Entretanto, há entendimento no sentido que a regra


prevista no art. 231 do CPP não é absoluta. Cita-se, por
exemplo, o seguinte julgado:
(...)
3. A regra insculpida no art. 231 do CPP, no qual
se estabelece que as partes poderão apresentar
documentos em qualquer fase do processo não
é absoluta, sendo que nas hipóteses em que
forem manifestamente protelatórias ou
tumultuárias podem ser indeferidas pelo
magistrado.
(...)
(HC 250.202/SP, Rel. Ministra MARILZA
MAYNARD (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO
TJ/SE), Rel. p/ Acórdão Ministra LAURITA VAZ,
QUINTA TURMA, julgado em 10/09/2013, DJe
28/11/2013)

O supracitado entendimento já foi reiterado em


casos mais recentes, como no AgRg no HC 504589/MG,
julgado pela Sexta Turma do STJ em 2019.
Isso significa uma ampla e subjetiva possibilidade
de que o julgador, entendendo que se trata de prova
“protelatória ou tumultuária”, indefira a juntada do
documento.
Diante dos entendimentos jurisprudenciais
supracitados, entendemos que, apesar da possibilidade
de juntada dos resultados da investigação criminal
defensiva na fase recursal, trata-se de uma estratégia
arriscada, sobretudo se houver chance de que o julgador
interprete o documento como prova protelatória. Tendo a
possibilidade de juntar os resultados da investigação
durante o inquérito policial ou a instrução criminal, é
preferível que assim seja feito, reduzindo os riscos de
indeferimento da juntada.

14.4. A investigação defensiva na


execução penal
O Provimento da OAB menciona a possibilidade de
investigação defensiva durante a execução penal, fase
em que muitos imaginam, de forma equivocada, inexistir
produção probatória.
A primeira hipótese de realização da investigação
defensiva na execução penal seria em caso de apuração
de falta grave praticada durante o cumprimento da pena,
como a fuga ou o porte de aparelho telefônico (art. 50 da
LEP).
Na prática, a passividade defensiva é amplamente
adotada no procedimento administrativo disciplinar (PAD)
que tramita no estabelecimento prisional e na audiência
de justificação perante o Juiz da Execução Penal.
Imagina-se que essas etapas são constituídas apenas
pelo interrogatório do apenado e pelas manifestações
jurídicas (Ministério Público e Advogado ou Defensor
Público), o que não é verdade.
Em ambas as fases (administrativa e judicial), a
defesa poderá produzir provas, juntar documentos,
postular diligências e requerer a oitiva de testemunhas,
ainda que, na prática, poucos tenham essa postura.
Dessa forma, se é possível produzir provas “dentro
do sistema” (no PAD ou na fase judicial), também é
possível produzir um acervo probatório por meio de uma
investigação defensiva conduzida pelo Advogado.
A investigação defensiva seria útil, v. g., para tentar
justificar a fuga do apenado, comprovando que ele sofreu
graves ameaças no interior do cárcere e que sua vida
estava em risco.
Uma dificuldade para a realização da investigação
defensiva seria o fato de que, como regra, eventuais
testemunhas que poderiam depor sobre o fato que
ensejou a apuração da falta grave seriam policiais penais
(agentes penitenciários) ou outros presos, o que,
especialmente quanto ao segundo grupo, tornaria
inviável a tomada de depoimentos no escritório do
Advogado. Ainda que se pretenda inquirir os outros
presos no estabelecimento prisional, outros obstáculos
poderiam surgir, como a discordância dos agentes de
segurança e a irritação dos Advogados que representam
esses presos.
Se a oitiva de testemunhas se tornar inviável na
investigação criminal defensiva, será possível requerer a
oitiva no procedimento administrativo disciplinar ou na
fase judicial. De qualquer forma, existiriam outras
opções, como a juntada de documentos, mídias etc.
A investigação defensiva também seria cabível para
realizar diligências prévias ao pedido de detração penal,
sobretudo na identificação do tempo de prisão cautelar.
Em alguns casos, essa informação é facilmente
encontrada por meio de pesquisa nos autos ou na
movimentação processual. Em outros, o Advogado
precisará perscrutar e diligenciar para obter a
informação.
Além disso, em caso de divergência na declaração
dos dias trabalhados para fins de remição, a investigação
defensiva poderá ser útil para comprovar que o apenado
cumpriu determinada carga horária trabalhando em
determinados dias da semana no interior do
estabelecimento prisional ou no trabalho externo.
Dependendo da simplicidade probatória, não será
necessário instaurar uma investigação defensiva, mas
apenas realizar uma diligência isolada.
Por fim, após a chamada Lei Anticrime (Lei n.
13.964/2019), foi incluído o §9º do art. 2º da Lei n.
12.850/2013, que diz:
§9º O condenado expressamente em sentença
por integrar organização criminosa ou por crime
praticado por meio de organização criminosa
não poderá progredir de regime de cumprimento
de pena ou obter livramento condicional ou
outros benefícios prisionais se houver elementos
probatórios que indiquem a manutenção do
vínculo associativo.

Sem entrar no mérito sobre a


(in)constitucionalidade do referido dispositivo, deve-se
notar que a investigação criminal defensiva poderá ser
útil para demonstrar que não se mantém o vínculo
associativo. Também será cabível sua utilização para
contrariar os elementos probatórios que integram o
processo de execução criminal.
Esses são apenas alguns exemplos de utilização da
investigação criminal defensiva, não excluindo outras
possibilidades que, diante de um caso concreto, podem
justificar o uso do referido procedimento.

14.5. A investigação defensiva para a


revisão criminal
Conforme Lopes Jr. (2020, p. 1178), a revisão
criminal é:
(...) um meio extraordinário de impugnação, não
submetida a prazos, que se destina a rescindir
uma sentença transitada em julgado, exercendo
por vezes papel similar ao de uma ação de
anulação, ou constitutiva negativa no léxico
ponteano, sem se ver obstacularizada pela coisa
julgada.

Para o ajuizamento da revisão criminal,


especialmente quando há necessidade de produção de
prova testemunhal, entende-se que há necessidade de
justificação criminal, que consiste em um procedimento
no juízo de primeiro grau para realizar a inquirição da
testemunha. Em seguida, os autos da justificação seriam
anexados à petição de ajuizamento da revisão criminal.
Esse entendimento decorre do fato de que a revisão
criminal, que tramita no Tribunal, não tem uma fase de
produção de provas. Logo, eventuais provas deverão ser
constituídas no juízo de primeiro grau.
Nesse diapasão, poder-se-ia cogitar a investigação
defensiva como um substituto da justificação criminal,
utilizando-a para produzir os elementos que serão
anexados à petição de ajuizamento da revisão criminal.
Seria uma forma de evitar a dependência da pauta do
Juiz de primeiro grau e qualquer filtro arbitrário pelo
Magistrado, que, para omitir erros próprios ou de seus
colegas, poderia conduzir a justificação com certa
indisposição.
Ocorre que a utilização da investigação defensiva
para instruir a revisão criminal – sem a realização da
justificação – dependeria da aceitação, pelos Tribunais,
das provas produzidas pelos Advogados.
Portanto, em busca de resultados, a recomendação
seria instaurar a investigação defensiva e, em seguida,
com a sua conclusão, utilizar seus resultados para
instruir a justificação, inclusive para a repetição de
depoimentos já colhidos no procedimento conduzido pelo
Advogado. Em seguida, utilizaria os resultados da
justificação para instruir a revisão criminal.
Nessa sequência, em primeiro lugar, utilizaria a
investigação defensiva para instruir a justificação.
Posteriormente, utilizaria a justificação para instruir a
revisão criminal.
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal, por
exemplo, entendeu que seria incabível a justificação
criminal, porque a defesa a utilizou como se fosse uma
investigação criminal defensiva:
(...)
No caso, a Defesa técnica do Paciente busca, em
verdade, se valer do Poder Judiciário para
inaugurar verdadeira investigação criminal
defensiva, com o intuito de contraditar a linha
investigativa encampada pela autoridade
policial no inquérito policial que lastreou a
denúncia oferecida contra o Paciente e demais
corréus, não sendo essa a função da Justificação
Criminal. 5. Ordem denegada.
(TJ-DF 07084202020198070000 DF 0708420-
20.2019.8.07.0000, Relator: WALDIR LEÔNCIO
LOPES JÚNIOR, Data de Julgamento: 06/06/2019,
3ª Turma Criminal, Data de Publicação:
Publicado no PJe: 10/06/2019. Pág.: Sem Página
Cadastrada.)
Para instruir a justificação e/ou a revisão criminal, a
investigação defensiva pode ter inúmeros atos, como:
inquirição de testemunhas que pretendem
alterar seus depoimentos ou que não foram
ouvidas no processo;
obtenção de ata notarial para certificar
determinados fatos;
diligências para obtenção de documentos ou
mídias.
Considerando que a revisão criminal tem o
desiderato de desconstituir uma decisão com trânsito em
julgado e que suas hipóteses de cabimento estão
previstas taxativamente no art. 621 do CPP, deve-se
conduzir a investigação criminal defensiva de modo a
subsidiar o fundamento selecionado. Ademais, é
necessário ter ciência de que a prova – quando exigida –
precisará ter força suficiente para superar a coisa
julgada, haja vista que na revisão criminal, conforme a
jurisprudência, não mais vigora a presunção de
inocência.
Nas hipóteses do inciso I do art. 621 do CPP
(“quando a sentença condenatória for contrária ao texto
expresso da lei penal ou à evidência dos autos”), não se
fala em avaliação de provas novas. Aliás, a hipótese
prevista no final do inciso (“contrária à evidência dos
autos”) demanda uma observação do conjunto
probatório originário (aquele que integra os autos da
decisão condenatória), e não a produção ou avaliação de
novas provas, razão pela qual a investigação defensiva
não teria muita relevância/utilidade.
Diferentemente, para a hipótese prevista no inciso II
do art. 621 do CPP (“quando a sentença condenatória se
fundar em depoimentos, exames ou documentos
comprovadamente falsos”), é justificável e útil a
instauração e condução de uma investigação criminal
defensiva. Afinal, não é possível provar a falsidade da
prova apenas no bojo da revisão criminal. Exige-se que
tal demonstração ocorra previamente, tendo como base,
por exemplo, uma condenação por falso testemunho ou
falsa perícia. Também seria possível, por exemplo, por
meio da confissão de uma testemunha no sentido de que
mentiu no processo originário, com a devida
apresentação de provas da versão verdadeira.
O Advogado ou Defensor Público poderia utilizar a
investigação defensiva para subsidiar – como assistente
da acusação – a versão de que a testemunha cometeu o
crime de falso testemunho. Da mesma forma, poderia
ouvir a testemunha do processo originário no bojo da
investigação criminal defensiva, obtendo uma base
suficiente para a justificação criminal e, posteriormente,
para a revisão criminal. Mais do que apenas obter uma
retratação da testemunha, o ideal seria obter outras
provas que demonstrem a falsidade do depoimento
anterior e a veracidade do depoimento atual (ex.:
documentos que contrariem a versão falsa e provem a
nova versão, comprovantes de pagamento de vantagem
indevida para mentir no depoimento anterior, vídeos,
imagens etc.).
Por fim, a hipótese prevista no inciso III do art. 621
do CPP (“quando, após a sentença, se descobrirem novas
provas de inocência do condenado ou de circunstância
que determine ou autorize diminuição especial da pena”)
é, por excelência, uma situação clara de utilização da
investigação criminal defensiva, utilizando este
procedimento como meio de obtenção das provas de
inocência ou de circunstância que diminua a pena.

15. Finalidades da investigação


Em relação ao objetivo da investigação defensiva, o
art. 1º do Provimento afirma que o procedimento se
destina à “obtenção de elementos de prova destinados à
constituição de acervo probatório lícito, para a tutela de
direitos de seu constituinte”.
De modo geral, a finalidade da investigação
defensiva é produzir elementos que poderão ser
utilizados em inquéritos ou processos, buscando
favorecer o cliente.
O acervo probatório construído por meio da
investigação defensiva poderá ter várias finalidades
específicas, como:
absolvição (negativa de autoria, inexistência de
materialidade etc.);
nulidade (demonstração de alguma situação
que gere uma ilegalidade, por exemplo);
extinção da punibilidade (demonstrar
especificamente qual foi a data do fato ou do
conhecimento da autoria do fato, para alegar,
respectivamente, prescrição ou decadência);
provar fatos que afastem qualificadoras,
agravantes ou causas de aumento;
provar fatos que possibilitem o acolhimento de
privilegiadoras, atenuantes ou causas de
aumento de pena;
provar fatos que beneficiem o réu quanto à
análise das circunstâncias judiciais do art. 59
do Código Penal (ex.: conduta social).

Quanto à expressão “acervo probatório lícito”,


destaca-se que a investigação defensiva deve respeitar
as restrições constitucionais e legais.
Destarte, não se trata de um procedimento que
permite toda e qualquer ilegalidade em busca de provas.
Deve-se trabalhar dentro da legalidade, respeitando, por
exemplo, a inviolabilidade de domicílio e de
comunicações, assim como a proibição à tortura. Em
outras palavras, a finalidade é conseguir elementos
probatórios, mas sem a prática de crimes ou outras
ilegalidades.
Quanto à destinação específica do acervo
probatório produzido por meio da investigação defensiva,
o art. 3º do Provimento prevê:
Art. 3° A investigação defensiva, sem prejuízo
de outras finalidades, orienta-se, especialmente,
para a produção de prova para emprego em:
I – pedido de instauração ou trancamento de
inquérito;
II – rejeição ou recebimento de denúncia ou
queixa;
III – resposta a acusação;
IV – pedido de medidas cautelares;
V – defesa em ação penal pública ou privada;
VI – razões de recurso;
VII – revisão criminal;
VIII – habeas corpus;
IX – proposta de acordo de colaboração
premiada;
X – proposta de acordo de leniência;
XI – outras medidas destinadas a assegurar os
direitos individuais em procedimentos de
natureza criminal.
Parágrafo único. A atividade de investigação
defensiva do advogado inclui a realização de
diligências investigatórias visando à obtenção
de elementos destinados à produção de prova
para o oferecimento de queixa, principal ou
subsidiária.

Não se trata de um rol taxativo, razão pela qual


deve ser admitida a investigação defensiva em outras
hipóteses não previstas no texto acima, especialmente
em virtude da abertura proporcionada pelo inciso XI.
Utilizando o supracitado rol como parâmetro,
analisaremos as principais finalidades específicas da
investigação defensiva.
15.1. Pedido de instauração de inquérito
policial
Representando o interesse da vítima de uma
infração penal, o Advogado poderá conduzir uma
investigação defensiva que tenha o escopo de subsidiar o
pedido de instauração de um inquérito policial.
Trata-se, portanto, de um caso de investigação
“defensiva” (seria uma defesa de direitos da vítima, mas
não para uma defesa no sentido processual, de ampla
defesa de um acusado) voltada para a acusação,
possivelmente com o objetivo de, futuramente, no
processo, atuar como assistente da acusação ou, se for
crime de ação penal privada, promover a queixa-crime
como querelante.
Com base em elementos produzidos pelo Advogado
na investigação defensiva e juntados ao pedido de
instauração do inquérito policial dirigido ao Delegado de
Polícia, este poderá instaurar a investigação tendo, “ab
initio”, uma linha de raciocínio já estabelecida.
Para a vítima, a realização da investigação
defensiva com o escopo de instruir o pedido de
instauração de inquérito policial poderá reduzir
significativamente os riscos de eventual
responsabilização criminal por denunciação caluniosa
(art. 339 do CP). Ao oferecer elementos razoáveis e
verdadeiros, pautados, v. g., por depoimentos de
testemunhas e documentos públicos, poder-se-ia supor
que o pedido de instauração do inquérito foi feito de boa-
fé, acreditando que o fato realmente ocorreu.
De qualquer forma, sempre é recomendável que o
Advogado anexe ao pedido de instauração de inquérito
policial uma declaração assinada pela vítima contendo a
narrativa sobre o fato. O mesmo cuidado também é
válido para instruir a queixa-crime.
Salienta-se que, a princípio, a instauração de um
inquérito policial não exige um conjunto probatório
robusto, o qual somente é exigido para eventual
condenação e, em menor intensidade, para o
recebimento da denúncia ou queixa. Na prática, apenas a
palavra da vítima ou de uma testemunha seria suficiente
para a instauração do inquérito.
Portanto, deve-se ter cautela, haja vista que a
antecipação desnecessária de elementos que
fundamentam a acusação significaria conceder mais
tempo para que a parte contrária (in casu, o autor do
fato) prepare a reação.
Urge destacar que o requerimento de instauração
de inquérito policial formulado por ofendido tem como
fundamento o art. 5º, II, in fine, do CPP. No §1º do art. 5º
do CPP, observamos o que o requerimento deverá conter
(se possível): a narração do fato, com todas as
circunstâncias; a individualização do indiciado ou seus
sinais característicos e as razões de convicção ou de
presunção de ser ele o autor da infração, ou os motivos
de impossibilidade de o fazer; a nomeação das
testemunhas, com indicação de sua profissão e
residência.
Assim, para subsidiar o pedido de instauração de
inquérito policial, a investigação criminal defensiva
poderá ter como objetivo, entre outras coisas:
a compreensão do fato que deverá ser narrado;
provar a narrativa fática, isto é, a materialidade
do fato narrado no pedido de instauração de
inquérito;
descobrir quem é o autor do fato;
provar a autoria do fato;
obter testemunhas e a respectiva qualificação.

Nada impede que a investigação criminal defensiva


utilizada para subsidiar a instauração de um inquérito
policial continue tramitando durante toda a persecução
penal (inquérito e instrução processual). Caso se
pretenda atuar como assistente da acusação ou
querelante, seria recomendável esse prolongamento da
investigação defensiva.

15.2. Pedido de trancamento de


inquérito
De acordo com Lopes Jr. (2020, p. 138), a
investigação preliminar “serve como filtro processual
para evitar acusações infundadas, seja porque despidas
de lastro probatório suficiente, seja porque a conduta não
é aparentemente criminosa”. Nesse diapasão, o
Advogado deve ressaltar esse filtro, buscando, quando
cabível, o trancamento do inquérito policial, evitando que
tenha início um processo penal teratológico.
Assim, é possível instaurar e conduzir uma
investigação defensiva em prol de um
investigado/indiciado, com o objetivo de evitar a
tramitação de um inquérito policial ilegal, sem justa
causa ou que tenha como objeto um fato que não é
crime, seja qual for o fundamento (atipicidade ou
excludentes de ilicitude e culpabilidade, por exemplo), ou
que não seja punível (prescrição, por exemplo).
Vale lembrar que, na prática, os requerimentos do
investigado feitos ao Delegado de Polícia, no bojo de um
inquérito policial, são diuturnamente indeferidos.
Prepondera a lógica de que se deve investigar a autoria e
a materialidade, praticamente inadmitindo qualquer linha
de investigação que possa desconstruir eventual versão
acusatória. Em outras palavras, na prática, há casos em
que o inquérito policial é feito para formar a versão
acusatória, somente encontrando elementos que
justifiquem o arquivamento por acaso ou “sorte/azar”.
Há casos de trancamento de inquérito policial que
não dependem de elementos informativos, como a
atipicidade formal e a prescrição. Por outro lado, há
hipóteses de trancamento de inquérito que precisam da
demonstração fática de determinada situação.
Para essa finalidade, a investigação defensiva
poderá ter como foco a produção de provas de que, por
exemplo, a conduta do investigado foi praticada em
legítima defesa. Também poderá ser utilizada para
consolidar a falta de justa causa ou a negativa de
autoria. Além disso, poderá ser útil em caso de alegação
do princípio da insignificância, para provar o valor do
objeto subtraído, quando o auto de avaliação produzido
no inquérito policial for incorreto.
Em todos esses casos, a investigação poderá ser
utilizada, parcial ou totalmente, para instruir o habeas
corpus que tenha como objetivo o trancamento do
inquérito policial.
Salienta-se que também é cabível o arquivamento
do termo circunstanciado e, por conseguinte, o seu
trancamento.
Deve-se, sempre que possível, evitar o
prolongamento do sofrimento do investigado/réu na
persecução penal, o que pode demorar muitos anos de
incontáveis reflexões sobre a possibilidade de ser
condenado – e qual será a pena – ou absolvido. Assim, o
trancamento do inquérito policial é uma redução desse
sofrimento.
Entretanto, às vezes, a tentativa de trancamento
não redunda em êxito, frustrando as expectativas do
Advogado momentaneamente. Se isso acontecer, não se
deve descartar a tese imediatamente, mas sim
reconsiderar sua utilização e, se for o caso, buscar novas
provas que reforcem a alegação.
15.3. Rejeição ou recebimento de
denúncia ou queixa
Essa hipótese prevê duas situações distintas quanto
aos interessados na condução da investigação defensiva:
rejeição da denúncia ou queixa: consiste em
objetivo do denunciado ou querelado, isto é, o
suposto autor ou partícipe da infração penal;
recebimento da denúncia ou queixa: trata-se
de objetivo da vítima, que poderá contribuir,
preferencialmente durante o inquérito, para
que a denúncia seja oferecida pelo Ministério
Público e recebida pelo Juiz, da mesma forma
que poderá utilizar a investigação defensiva
para subsidiar a queixa que pretende oferecer,
nos crimes de ação penal de iniciativa privada
ou quando cabível a ação penal privada
subsidiária da pública.
Insta recordar que o art. 395 do Código de Processo
Penal prevê as hipóteses de rejeição da denúncia ou
queixa:
Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada
quando:
I - for manifestamente inepta;
II - faltar pressuposto processual ou condição
para o exercício da ação penal; ou
III - faltar justa causa para o exercício da ação
penal.
Assim, para a rejeição da exordial acusatória, a
investigação defensiva pode ter a finalidade de
apresentar questionamentos (contradições, omissões
etc.) sobre os elementos informativos produzidos no
inquérito, tentando evidenciar a falta de justa causa.
Noutra senda, a investigação defensiva dificilmente
será utilizada para os incisos I e II do art. 395 do CPP,
haja vista que são matérias que prescindem de
aprofundamento fático. A inépcia da denúncia, por
exemplo, pode ser percebida com a mera leitura da peça
acusatória, constatando que o Parquet não narrou os
fatos corretamente ou deixou de individualizar as
condutas, em caso de pluralidade de denunciados.
A contrario sensu, a denúncia ou queixa será
recebida quando não incidir em alguma das hipóteses do
art. 395 do CPP. Nesse caso, o Advogado da vítima
poderá conduzir uma investigação criminal defensiva
para oferecer elementos à autoridade policial ou ao
Ministério Público, objetivando o oferecimento e o
recebimento da exordial acusatória.
Quanto ao recebimento da queixa, o Advogado da
vítima – in casu, querelante – atua amparado também
pelo art. 3º, parágrafo único, do Provimento n. 188/2018
do Conselho Federal da OAB, que prevê que a
investigação defensiva conduzida pelo Advogado
abrange a realização de diligências investigatórias com o
objetivo de obter elementos destinados à produção de
prova para o oferecimento de queixa, principal ou
subsidiária. Ora, uma consequência normal do
oferecimento da queixa é a pretensão de que ela seja
recebida.

15.4. Resposta à acusação


A resposta à acusação pode ter várias finalidades,
como o reconhecimento de uma preliminar (v. g., a
inépcia da denúncia), a declaração da extinção da
punibilidade (por exemplo, a decadência ou a
prescrição), a absolvição sumária (art. 397 do CPP) ou os
pedidos de produção de provas durante a instrução,
incluindo a apresentação do rol de testemunhas.
Especificamente quanto ao pedido de absolvição
sumária, que dependeria, em muitos casos, da análise
fático-probatória, a investigação defensiva pode ter
enorme utilidade, especialmente quando o inquérito
policial tiver seguido apenas a linha investigativa da
acusação.
Para tanto, deve-se observar o art. 397 do CPP:
Art. 397. Após o cumprimento do disposto no
art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz
deverá absolver sumariamente o acusado
quando verificar:
I - a existência manifesta de causa excludente
da ilicitude do fato;
II - a existência manifesta de causa excludente
da culpabilidade do agente, salvo
inimputabilidade;
III - que o fato narrado evidentemente não
constitui crime; ou
IV - extinta a punibilidade do agente.

Logo, uma investigação defensiva destinada a


instruir a resposta à acusação e o respectivo pedido de
absolvição sumária deveria ter como desiderato a
demonstração fática de alguma das hipóteses do art. 397
do CPP.
Quanto às excludentes de ilicitude, o art. 23 do
Código Penal prevê a legítima defesa, o estado de
necessidade, o estrito cumprimento de um dever legal e
o exercício regular de um direito. Também existem outras
excludentes específicas de determinados crimes, na
Parte Especial do Código Penal ou na legislação penal
especial.
Se o objetivo for reconhecer a legítima defesa, por
exemplo, a investigação defensiva poderá ser útil para
provar um ou mais elementos do art. 25 do Código Penal,
como o uso moderado dos meios necessários ou a prévia
agressão injusta da pretensa vítima.
No inciso II do art. 397 do CPP, a absolvição sumária
decorrente de excludente de culpabilidade (salvo
inimputabilidade) pode abranger o erro de proibição ou a
inexigibilidade de conduta diversa, sobretudo em caso de
fato cometido sob coação irresistível ou em estrita
obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de
superior hierárquico (art. 22 do CP).
Nesse prisma, poder-se-ia utilizar a investigação
defensiva para demonstrar que não havia a potencial
consciência da ilicitude do fato. Ademais, também seria
cabível a investigação defensiva para provar a existência
de uma coação moral que era insuperável (irresistível),
assim como o fato de ter agido seguindo estritamente a
ordem (provada, v. g., por documentos ou depoimentos)
de um superior hierárquico (provando por meio de
documentos funcionais/oficiais), quando tal ordem não
era manifestamente ilegal.
O inciso III do art. 397 do CPP consiste na absolvição
sumária proveniente do reconhecimento de que o fato é
atípico. Qual fato? Aquele narrado na denúncia ou
queixa. A princípio, essa hipótese prescinde de análise
fático-probatória, porquanto bastaria fazer um cotejo
entre a narrativa exposta na exordial acusatória e os
tipos penais previstos na legislação (principalmente
aquele descrito na peça da acusação), caso se trate de
atipicidade formal. No caso de pedido de aplicação do
princípio da insignificância (atipicidade material), é
cabível a produção de elementos que demonstrem o
ínfimo valor da coisa, por meio, por exemplo, de
orçamentos e autos de avaliação.
Sobre o inciso IV do art. 397 do CPP, temos uma
hipótese que causa divergência, porque seria um caso
em que a extinção da punibilidade produziria uma
absolvição, algo não previsto no art. 386 do CPP, que
trata dos casos de absolvição após a instrução
processual (na sentença).
Sem entrar no exame acerca de eventual falta de
técnica do legislador ao prever a extinção da punibilidade
como hipótese de absolvição sumária nessa etapa do
processo, devemos lembrar que as principais causas de
extinção da punibilidade estão no art. 107 do CP,
destacando-se, nesse momento, a prescrição e a
decadência.
Poder-se-ia cogitar a utilização da investigação
defensiva para esclarecer o marco inicial da decadência,
considerando que o art. 103 do CP prevê que a
decadência do direito de queixa ou de representação
ocorre se o direito não for exercido “dentro do prazo de 6
(seis) meses, contado do dia em que veio a saber quem é
o autor do crime”. Portanto, a investigação defensiva
poderia ter a finalidade de provar que a suposta vítima
tinha ciência de quem é o autor do crime desde
determinada data (anterior àquela que consta na
investigação oficial), tendo sido superado o prazo
decadencial.
Em qualquer caso, ainda que não se obtenha êxito
imediatamente após a resposta à acusação – quando o
Juiz salienta que não é caso de absolvição sumária e
designa a data da audiência de instrução –, será possível
utilizar os resultados da investigação defensiva também
para a instrução do habeas corpus direcionado ao
respectivo Tribunal, objetivando o trancamento do
processo pelo mesmo fundamento que poderia ter sido
acolhido para a absolvição sumária.

15.5. Pedido de medidas cautelares


A investigação defensiva para instruir pedido de
medidas cautelares se destina preponderantemente à
atuação da vítima, mormente como querelante ou
assistente da acusação.
Nessa hipótese, a vítima poderá, v. g., requerer o
sequestro de bens do investigado/réu, considerando que
o art. 127 do CPP prevê que o Juiz, de ofício, a
requerimento do Ministério Público ou do ofendido, ou
mediante representação da autoridade policial, poderá
determinar o sequestro, medida cabível em qualquer
fase do processo, bem como antes de oferecida a
denúncia ou queixa.
A investigação defensiva poderá ter o propósito de
demonstrar que os bens imóveis foram adquiridos com
os proventos da infração (art. 125 do CPP), apresentando
“indícios veementes da proveniência ilícita dos bens”
(art. 126 do CPP).
Também é importante destacar os arts. 134 e 135,
§1º, ambos do CPP:
Art. 134. A hipoteca legal sobre os imóveis do
indiciado poderá ser requerida pelo ofendido em
qualquer fase do processo, desde que haja
certeza da infração e indícios suficientes da
autoria.
Art. 135. Pedida a especialização mediante
requerimento, em que a parte estimará o valor
da responsabilidade civil, e designará e estimará
o imóvel ou imóveis que terão de ficar
especialmente hipotecados, o juiz mandará logo
proceder ao arbitramento do valor da
responsabilidade e à avaliação do imóvel ou
imóveis.
§ 1o A petição será instruída com as provas ou
indicação das provas em que se fundar a
estimação da responsabilidade, com a relação
dos imóveis que o responsável possuir, se outros
tiver, além dos indicados no requerimento, e
com os documentos comprobatórios do domínio.

Nesse sentido, a investigação defensiva poderá ter


como finalidade a demonstração do prejuízo para a
vítima – e o respectivo valor – ou a existência de bens do
investigado/réu, de acordo com o art. 135, §1º, do CPP.
Para especificar o valor do prejuízo, o Advogado
pode valer-se de perícias e testemunhas, não
desconsiderando que o arbitramento do valor da
responsabilidade e a avaliação dos imóveis designados
serão feitos por perito nomeado pelo Juiz, onde não
houver avaliador judicial, sendo-lhe facultada a consulta
dos autos do processo respectivo (art. 135, §2º, do CPP).
Destarte, o resultado da investigação defensiva poderá
ser utilizado como parâmetro para o arbitramento do
valor da responsabilidade e a avaliação dos imóveis,
servindo como um instrumento que tem o objetivo de
influenciar o perito e o Juiz.
Quanto à existência de bens do acusado, a
realização de diligências para obter prova documental
seria de enorme importância, sobretudo realizando
pesquisas nos Cartórios de Registros de Imóveis.
Além das medidas cautelares reais, a investigação
defensiva também poderá subsidiar as medidas de
natureza pessoal (prisão cautelar e medidas cautelares
diversas da prisão).
O art. 282, §2º, do CPP, afirma que as medidas
cautelares serão decretadas pelo Juiz a requerimento das
partes ou, quando no curso da investigação criminal, por
representação da autoridade policial ou mediante
requerimento do Ministério Público. Em seguida, no §4º
do mesmo dispositivo legal, prevê que, em caso de
descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o
Juiz, mediante requerimento do Ministério Público, de seu
assistente ou do querelante, poderá substituir a medida,
impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar
a prisão preventiva. Observa-se, assim, a legitimidade do
querelante ou assistente para requerer a aplicação de
medidas cautelares, inclusive a substituição das medidas
aplicadas.
No art. 311 do CPP, há previsão de que, em
qualquer fase da investigação policial ou do processo
penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo Juiz, a
requerimento do Ministério Público, do querelante ou do
assistente, ou por representação da autoridade policial.
Logo, a vítima, como querelante ou assistente da
acusação, também pode requerer a decretação da prisão
preventiva, a mais gravosa medida cautelar pessoal.
Em relação ao requerimento de decretação da
prisão preventiva, a investigação criminal defensiva
poderá ter como finalidade a demonstração do periculum
libertatis e do fumus commissi delicti.
É recomendável seguir o disposto no art. 312 do
CPP na condução da investigação defensiva que tenha
esse desiderato, sobretudo quanto à necessidade de que
a prisão seja decretada para a garantia da ordem
pública, da ordem econômica, por conveniência da
instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei
penal. Também deve ter como escopo a obtenção de
prova da existência do crime e indício suficiente de
autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do
imputado.
Se o fundamento da prisão preventiva for o
descumprimento das obrigações impostas por meio das
outras medidas cautelares (art. 312, §1º, do CPP), pode-
se utilizar a investigação defensiva para convencer o
Magistrado quanto ao referido descumprimento, como o
fato de o investigado ou réu ter frequentado um lugar
proibido, mantido contato com determinada pessoa ou
violado o recolhimento domiciliar no período noturno,
medidas previstas no art. 319 do CPP.
Conclui-se que a investigação defensiva pode ser
utilizada para o querelante ou assistente da acusação
demonstrar faticamente o preenchimento dos requisitos
ou fundamentos das medidas cautelares reais e pessoais,
incluindo a prisão preventiva. Em sentido oposto,
também será possível a utilização da investigação
defensiva pelo investigado ou réu, com o desiderato de
provar a ausência de fundamento para a aplicação das
medidas cautelares reais e pessoais.

15.6. Defesa em ação penal pública ou


privada
Essa hipótese de utilização da investigação
defensiva é a mais comum e pode produzir resultados
significativos, como a absolvição ou a desclassificação
para uma infração penal menos grave.
Basicamente, a investigação defensiva significaria
uma instrução paralela àquela do processo, que tem a
participação do Ministério Público, querelante ou,
eventualmente, do assistente da acusação, com o filtro
do Juiz para deferir ou não os requerimentos defensivos.
Conduzindo a investigação defensiva, o Advogado
terá a possibilidade de excluir a ingerência da parte
acusadora, ao mesmo tempo em que deixa de depender
do deferimento do Juiz, que nem sempre respeitará a
ampla defesa. Afinal, não são raros os casos de
cerceamento de defesa por indeferimento de perguntas
ou pedidos de diligências.
Enquanto as testemunhas são ouvidas na instrução
processual, com a inquirição feita também pela parte
contrária e pelo Juiz, a investigação defensiva será
realizada de forma unilateral, com a discricionariedade
do Advogado para adotar as melhores linhas de
investigação e utilizar ou não os resultados do
procedimento.
Evidentemente, a condução da investigação
defensiva pelo Advogado não excluirá a realização da
instrução processual, que é sempre necessária,
tampouco afastará a exigência de que a defesa técnica
participe do processo. Noutros termos, a investigação
defensiva não substitui a instrução processual, mas sim
funciona como um complemento que, se utilizado
corretamente, terá o condão de favorecer o réu.
Os resultados pretendidos com a investigação
defensiva podem ser vários, citando, entre os principais:
absolvição (art. 386 do CPP);
desclassificação para infração penal menos
grave que aquela imputada na denúncia ou
queixa;
afastamento de qualificadora, agravante ou
causa de aumento de pena;
reconhecimento de privilegiadora, atenuante
ou causa de diminuição de pena;
afastamento do dever de indenizar,
demonstrando que não há prejuízo para a
vítima.

Ademais, a finalidade da investigação pode ser


sustentar a versão já apresentada nos autos oficiais ou
buscar uma nova versão, ainda não alegada, mas que
seja mais plausível.

15.7. Razões de recurso


Essa finalidade da investigação defensiva é
consideravelmente ampla e, ao mesmo tempo, enfrenta
dificuldades para sua implementação.
Há inúmeros recursos que podem ser interpostos
pela defesa, como apelação, recurso em sentido estrito,
correição parcial, recursos extraordinário e especial,
agravo regimental etc.
Ocorre que, na prática, a juntada de documentos na
fase recursal enfrenta grande resistência dos
Desembargadores e Ministros. Outrossim, os Tribunais
Superiores consolidaram a tese de que não se admite
reexame fático e probatório nos recursos extraordinário e
especial.
A princípio, poderia ser utilizada a investigação
defensiva para provar um fato ou um fundamento já
alegado. Se pretendesse sustentar um fato novo em grau
recursal, haveria o risco de o Tribunal entender que se
trata de supressão de instância.
De qualquer forma, tratando-se de um caso
excepcionalmente instigante e que envolva algum
equívoco absurdo, é possível que o Tribunal ao menos
considere os documentos juntados.

15.8. Revisão criminal


Nas palavras de Badaró (2020, p. 509):
No processo penal, uma condenação errônea
que tenha transitado em julgado significa a
perpetuação de uma gravíssima injustiça, que
indevidamente priva o indivíduo de um de seus
direitos mais relevantes: a liberdade. É
necessário, portanto, que, mesmo após o
trânsito em julgado, haja algum mecanismo
para fazer aflorar a justiça, corrigindo erros cuja
perpetuação seria inaceitável.

O mecanismo para evitar a perpetuação da injustiça


ou do erro nesses casos é a revisão criminal, que tem
natureza de ação autônoma de impugnação, servindo
para atacar decisões judiciais transitadas em julgado.
Nos termos do art. 621 do CPP, a revisão será
admitida:
quando a sentença condenatória for contrária
ao texto expresso da lei penal ou à evidência
dos autos;
quando a sentença condenatória se fundar em
depoimentos, exames ou documentos
comprovadamente falsos;
quando, após a sentença, se descobrirem
novas provas de inocência do condenado ou de
circunstância que determine ou autorize
diminuição especial da pena.
Ademais, a revisão é cabível a qualquer tempo,
inclusive após a extinção da pena (art. 622 do CPP).
Em um plano ideal, a investigação defensiva
poderia subsidiar diretamente o ajuizamento da revisão
criminal, evitando a necessidade de justificação criminal
no primeiro grau e, consequentemente, o prolongamento
de um erro judiciário. Contudo, precisamos entender os
limites jurisprudenciais.
O STJ já decidiu o seguinte sobre a exigência de
justificação criminal antes da revisão:
(...) 1. De acordo com a jurisprudência há muito
consolidada deste Superior Tribunal de Justiça, o
pedido de revisão criminal, calcado na
existência de prova oral nova, pressupõe a
necessidade de sujeição dos novéis elementos
probatórios ao eficiente e democrático filtro do
contraditório. 2. Referido entendimento foi
mantido não obstante a supressão, pelo Novo
Código de Processo Civil, do procedimento
cautelar de justificação, sendo necessária a
produção antecipada de provas (arts. 381 e 382
do referido Estatuto Processual) para
ajuizamento de ação revisional fundada na
existência de novas provas decorrentes de fonte
pessoal. 3. Recurso especial provido. (STJ - REsp:
1720683 MS 2018/0019317-4, Relator: Ministra
MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de
Julgamento: 02/08/2018, T6 - SEXTA TURMA,
Data de Publicação: DJe 13/08/2018)

Por outro lado, sobre a desnecessidade da


justificação, já decidiu:
(...) 3. A exigência de justificação judicial diz
respeito tão-somente à prova oral, não sendo
necessária quando se cuida de prova pericial,
cuja realização foi determinada durante o
inquérito, mas que veio a ser juntada aos autos
da ação penal apenas quando já proferida a
condenação. (...) (STJ - AREsp: 1026149 SP
2016/0321845-1, Relator: Ministro ROGERIO
SCHIETTI CRUZ, Data de Publicação: DJ
26/10/2017)

Em suma, havendo necessidade de produção de


prova oral, ela deverá ser feita em uma justificação
criminal. A contrario sensu, outras provas de natureza
não oral poderão ser levadas diretamente à revisão
criminal.
O primeiro ponto consiste em entender que, pela
jurisprudência do STJ, a produção de uma prova oral não
poder ser feita isoladamente pela defesa, tampouco
produzida na revisão criminal, que exige prova pré-
constituída e não admite dilação probatória. É necessário
que a prova oral seja produzida na justificação criminal.
A principal prova oral é a testemunhal, disciplinada
entre os arts. 202 e 225 do CPP. Assim, caso a revisão
criminal seja fundamentada em uma prova testemunhal,
exige-se a justificação criminal. No mesmo sentido, a
oitiva do ofendido (art. 201 do CPP), que também é uma
prova de natureza oral.
Da mesma forma, mas com uma utilização muito
menor, podemos imaginar os esclarecimentos de peritos
e as acareações (art. 400 do CPP). Na prática, não se
observa a utilização dessas provas como fundamento
para uma revisão criminal.
Nesses casos, é recomendável utilizar a
investigação criminal defensiva como forma de
antecipação do depoimento para avaliar se seu resultado
é suficiente como fundamento de uma futura revisão
criminal.
Defendemos a posição de que, como regra, os
resultados da investigação criminal devem ser aceitos
para o ajuizamento da revisão criminal,
independentemente de justificação no primeiro grau.
Somente não poderão ser considerados quando houver
fundada suspeita de erros, falsidades ou quaisquer
outros vícios que comprometam a veracidade do seu
conteúdo.
De qualquer forma, sabe-se que, na prática, nosso
entendimento dificilmente será aceito pelos Tribunais de
forma pacífica, sobretudo em razão da crescente
desconfiança em relação à Advocacia.
Assim, como dica prática, sugerimos que os
resultados da investigação criminal sejam utilizados
como fundamento da justificação criminal, sendo esta,
em seguida, utilizada como fundamento da revisão
criminal. Esse seria o caminho menos arriscado, ainda
que mais demorado.
Considerando os entendimentos do STJ
anteriormente citados, pode-se adotar como estratégia a
utilização da investigação criminal defensiva para obter
os documentos ou realizar as perícias e, em seguida,
ajuizar a revisão criminal, pulando a etapa da
justificação.
Por outro lado, caso o fundamento da revisão
criminal seja uma prova oral, recomenda-se conduzir
uma investigação criminal defensiva para ouvir a
testemunha ou vítima, utilizando uma estratégia de
antecipação do depoimento – ouvi-la antes de levá-la às
autoridades – para que, em seguida, o Advogado avalie
se é plausível ouvir a testemunha novamente em uma
justificação criminal ou se o seu depoimento não é bom o
suficiente, devendo ser descartado.
Explico: no caso de necessidade de produção de
prova oral, a investigação criminal defensiva serviria
como um filtro. Faz-se a inquirição da testemunha nos
autos da investigação para saber qual é o conteúdo do
seu depoimento atualmente. Se for desfavorável à
defesa, desconsidera-se o depoimento, não levando os
resultados da investigação à justificação ou à revisão
criminal, tampouco requerendo a oitiva da testemunha
na justificação. Por outro lado, se o depoimento tomado
na investigação defensiva for favorável, deve-se utilizar a
justificação criminal para que ele seja novamente
produzido, desta feita perante o Juízo, com o exercício do
contraditório pelo Ministério Público. Em seguida,
repetindo o êxito do depoimento, pode-se ajuizar a
revisão criminal.

15.9. Habeas corpus


A importância do habeas corpus é inquestionável
em um sistema punitivo como o brasileiro, que produz
muitas ilegalidades e, normalmente, deixa-se levar pelo
clamor público e por ondas punitivistas.
No art. 5º, LXVIII, da Constituição Federal, consta
que “conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém
sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou
coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade
ou abuso de poder”.
Por sua vez, o art. 647 do CPP afirma: “Dar-se-á
habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na
iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua
liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição
disciplinar”. Em seguida, o art. 648, também do CPP,
apresenta um rol de hipóteses de coações ilegais,
destacando-se, por exemplo, a ausência de justa causa, o
processo manifestamente nulo e o cessamento do motivo
que autorizou a coação.
Nos últimos anos, o habeas corpus foi fundamental
para combater ilegalidades que se tornaram cotidianas,
como muito bem destaca Toron (2020, p. 29):
(...) foi por meio do habeas corpus que se
conseguiu quebrar a espinha dorsal de uma
maneira policialesca de se investigar: prender e
não permitir que os advogados tivessem acesso
aos autos; prender temporariamente como
forma de facilitar a obtenção de confissões e a
generalização de escutas, muitas vezes
abusivas.

Reconhecida a importância do referido remédio


constitucional, deve-se destacar que a investigação
criminal defensiva também pode ser utilizada para
conseguir elementos que fundamentem o habeas corpus.
Como é sabido, o habeas corpus depende de prova
pré-constituída, sob pena de que o remédio
constitucional não seja conhecido. Assim, a investigação
criminal defensiva poderá ser utilizada especificamente
para reunir as provas que serão utilizadas na instrução
do habeas corpus.
Em alguns casos, por exemplo, o habeas corpus
terá o desiderato de trancar o processo por legítima
defesa (excludente de ilicitude) ou inexistência de provas
de autoria e/ou materialidade (falta de justa causa).
Nessas situações, a investigação terá utilidade para
instruir adequadamente o remédio constitucional,
tentando provar a reação a uma agressão injusta (e os
outros requisitos da legítima defesa) ou para desconstruir
os elementos presentes nos autos oficiais.
Caso o habeas corpus seja utilizado contra uma
prisão cautelar, a investigação defensiva poder ter o
escopo de reunir elementos que afastem os fundamentos
da segregação, demonstrando, por exemplo:
a inexistência de algum fundamento previsto
no art. 312 do CPP, isto é, garantia da ordem
pública, da ordem econômica, conveniência da
instrução criminal ou necessidade de assegurar
a aplicação da lei penal;
também com base no art. 312 do CPP, a
inexistência de prova da materialidade ou de
indício suficiente de autoria, bem como a
ausência de perigo gerado pelo estado de
liberdade do imputado;
que não foi descumprida a medida cautelar
anteriormente aplicada (art. 312, §1º, do CPP);
que não são verdadeiros os fatos novos ou
contemporâneos utilizados na decisão para
justificar a aplicação da prisão preventiva (art
312, §2º, do CPP).

15.10. Proposta de acordo de


colaboração premiada
A investigação criminal defensiva pode ser utilizada
para subsidiar a proposta de acordo de colaboração
premiada.
Salienta-se que o art. 3º-C, §4º, da Lei n.
12.850/2013 (Lei das Organizações Criminosas), dispõe
que incumbe à defesa instruir a proposta de colaboração
e os anexos com os fatos adequadamente descritos, com
todas as suas circunstâncias, indicando as provas e os
elementos de corroboração.
Logo, não basta apresentar uma proposta de acordo
de colaboração premiada sem qualquer descrição dos
fatos ou desprovida da indicação de provas e elementos
de corroboração. Exige-se uma justa causa inicial para
que a proposta não seja sumariamente indeferida (art.
3º-B, §1º, da Lei das Organizações Criminosas).
Ainda que exista a possibilidade de que o acordo de
colaboração premiada seja precedido de instrução,
quando houver necessidade de identificação ou
complementação de seu objeto, dos fatos narrados, sua
definição jurídica, relevância, utilidade e interesse
público (art. 3º-B, §2º, da Lei das Organizações
Criminosas), deve-se oferecer, com a proposta, uma base
suficiente para que o celebrante confie no potencial
colaborador e inicie as tratativas.
Urge destacar que a antecipação desses elementos
na proposta de acordo não pode, em tese, causar
prejuízo ao potencial colaborador, considerando que o
recebimento da proposta para formação de acordo de
colaboração constitui marco de confidencialidade,
configurando violação de sigilo e quebra da confiança e
da boa-fé a divulgação de tais tratativas iniciais ou de
documento que as formalize, até o levantamento de
sigilo por decisão judicial (art. 3º-B, caput, da Lei das
Organizações Criminosas).
Ademais, na hipótese de não ser celebrado o acordo
por iniciativa do celebrante, este não poderá se valer de
nenhuma das informações ou provas apresentadas pelo
colaborador, de boa-fé, para qualquer outra finalidade
(art. 3º-B, §6º, da Lei das Organizações Criminosas).
Dessa forma, há uma garantia para evitar que o
potencial colaborador apresente todas as informações e
indique as provas, com posterior negativa do acordo pelo
celebrante, valendo-se este de tudo que foi objeto da
proposta.
Assim, ciente da necessidade de subsidiar a
proposta e tendo a garantia de que esses elementos não
serão utilizados se o acordo não for celebrado por
iniciativa do celebrante, deve-se ter uma postura ativa
para a formação do que será objeto da proposta de
colaboração premiada.
Em alguns casos, o potencial colaborador terá a
narrativa completa à disposição, bastando consultar
algumas anotações. Entretanto, na maioria dos casos,
será necessário realizar um conjunto de diligências para
obter endereços, registros, dados etc. Além disso,
também precisará documentar todos os elementos,
relacionando cada parte da narrativa com aquilo que
prova o respectivo fato. Para isso, a investigação criminal
defensiva terá enorme utilidade.

15.11. Proposta de acordo de leniência


De modo similar à proposta de acordo de
colaboração premiada, a tentativa de formalização de um
acordo de leniência também pode ter como fase
preparatória a investigação criminal defensiva.
A Lei n. 12.846/2013 trata da responsabilização
administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de
atos contra a administração pública nacional ou
estrangeira. Nos arts. 16 e 17, prevê a possibilidade de
celebrar acordo de leniência com as pessoas jurídicas
responsáveis pela prática dos atos previstos na sobredita
lei que colaborarem efetivamente com as investigações.
Conforme Antonik (2016, p. 53):
Leniência é a característica daquilo que é
marcado pela suavidade. É uma qualidade do
que é agradável, suave ou doce, ou no sentido
de mansidão ou lenidade. Também pode ser
traduzido como excessiva tolerância. Já o Acordo
de Leniência é um tipo de ajuste que possibilita
ao infrator fazer parte da investigação, com o
intuito de prevenir ou restaurar um dano por ele
cometido, e, por fazer isso, receberá
determinados benefícios.

De acordo com Meira e Valim (2019):


Os acordos de leniência são ferramentas
fundamentais de enfrentamento da corrupção
que promovem, a um só tempo, a ampliação das
investigações, a implantação e monitoramento
do controle interno das empresas e a
preservação da atividade econômica.
Observa-se que o acordo de leniência gera, a
princípio, vantagens para todos que dele participam,
especialmente para a pessoa jurídica, que, conforme o
art. 16, §2º, da Lei n. 12.846/2013, ficará isenta das
sanções previstas no inciso II do art. 6º e no inciso IV do
art. 19 e reduzirá em até 2/3 (dois terços) o valor da
multa aplicável. Contudo, o acordo não afastará a
obrigação de reparar integralmente o dano causado (art.
16, §3º).
Como proteção, o art. 16, §7º, da Lei n.
12.846/2013, institui que não importará em
reconhecimento da prática do ato ilícito investigado a
proposta de acordo de leniência rejeitada.
Os requisitos do acordo de leniência estão previstos
no art. 16, §1º, da Lei n. 12.846/2013, quais sejam:
a pessoa jurídica seja a primeira a se
manifestar sobre seu interesse em cooperar
para a apuração do ato ilícito;
a pessoa jurídica cesse completamente seu
envolvimento na infração investigada a partir
da data de propositura do acordo;
a pessoa jurídica admita sua participação no
ilícito e coopere plena e permanentemente
com as investigações e o processo
administrativo, comparecendo, sob suas
expensas, sempre que solicitada, a todos os
atos processuais, até seu encerramento.
O acordo de leniência também deverá gerar os
resultados mencionados no art. 16, incisos I e II, que são:
a identificação dos demais envolvidos na
infração, quando couber;
a obtenção célere de informações e
documentos que comprovem o ilícito sob
apuração.
Quanto aos dois resultados exigidos e ao requisito
da cooperação plena e permanente com as investigações
e o processo administrativo, a investigação criminal
defensiva pode ter utilidade para consolidar a justa causa
que possibilite a celebração do acordo.
Por meio da investigação criminal defensiva, será
possível cooperar com as investigações oficiais,
justificando a formalização do acordo de leniência.
Busca-se, assim, um conjunto mínimo de elementos que
seja suficiente para demonstrar o potencial de gerar os
resultados previstos na Lei n. 12.846/2013.

15.12. Outras medidas destinadas a


assegurar os direitos individuais em
procedimentos de natureza criminal
Trata-se de hipótese consideravelmente ampla e
subsidiária em relação às possibilidades anteriores.
A investigação criminal defensiva pode ser utilizada
para obter elementos que serão utilizados em qualquer
procedimento de natureza criminal, abrangendo todas as
fases (inquérito policial, instrução, recursos ou execução
penal, assim como a revisão criminal).
Destarte, não há limitação sobre a destinação
específica da investigação criminal defensiva, que
poderá ter qualquer uma das finalidades previstas no rol
não taxativo do Provimento n. 188/2018 do Conselho
Federal da OAB.
Aqui, estaria abrangida, por exemplo, a investigação
criminal defensiva que tenha a finalidade de surtir efeito
na execução penal, em caso de fundamentação do
pedido de algum direito (indulto, detração, prisão
domiciliar etc.) ou para realizar a defesa em
procedimento de apuração de falta grave.
Limitar a investigação defensiva seria reduzir suas
possibilidades, o que significa, basicamente, limitar a
ampla defesa, impondo uma impossibilidade de produzir
provas que influenciem o julgador.

16. Diligências possíveis

O art. 4º do Provimento n. 188/2018 do Conselho


Federal da OAB dispõe:
Art. 4º Poderá o advogado, na condução da
investigação defensiva, promover diretamente
todas as diligências investigatórias necessárias
ao esclarecimento do fato, em especial a
colheita de depoimentos, pesquisa e obtenção
de dados e informações disponíveis em órgãos
públicos ou privados, determinar a elaboração
de laudos e exames periciais, e realizar
reconstituições, ressalvadas as hipóteses de
reserva de jurisdição.

O sobredito artigo apresenta um rol exemplificativo


de possíveis diligências, admitindo que o Advogado
pratique todas as diligências investigatórias necessárias
ao esclarecimento do fato, listando, em seguida, alguns
atos específicos:
colheita de depoimentos;
pesquisa e obtenção de dados e informações
disponíveis em órgãos públicos ou privados;
determinar a elaboração de laudos e exames
periciais;
realizar reconstituições.
Além desses atos, também devem ser admitidos
quaisquer outros que não estejam sujeitos à reserva de
jurisdição, como:
obtenção de documentos;
realização de acareações;
realização de reconhecimento de pessoa;
realização de reconhecimento de coisa;
avaliação de objeto.
A seguir, analisaremos as principais diligências e
como elas podem ser conduzidas pelo Advogado ou
Defensor Público.

16.1. Depoimentos
A colheita de depoimentos é uma das principais
possibilidades na investigação criminal defensiva, porque
permite a antecipação de um testemunho que, se
favorável, poderá ser levado aos autos oficiais, por
declaração escrita ou audiovisual, bem como repetida,
arrolando a testemunha para que seja ouvida no
processo.
De certa forma, o Ministério Público já faz isso na
investigação direta (PIC) ao ouvir testemunhas sem a
presença do Advogado do réu, tendo, ainda, a liberdade
para inquirir sem o controle realizado pelo Magistrado,
que poderia indeferir, por exemplo, perguntas que
induzam a resposta (art. 212 do CPP).
Para a defesa, a vantagem de tomar depoimentos
consiste em obter declarações de testemunhas sem a
participação da outra parte (Ministério Público ou
querelante), que poderia, por suas perguntas, gerar
contradições ou enfraquecer a versão apresentada.
Inquirindo a testemunha na investigação criminal
defensiva, o Advogado terá a vantagem estratégica de
que a inquirição não tenha perguntas do Delegado,
Ministério Público, querelante, assistente da acusação ou
Juiz. Seriam formuladas apenas as perguntas escolhidas
previamente pelo Advogado, que teria o domínio da
situação.
Outra vantagem seria a discricionariedade de juntar
ou não aos autos oficiais o termo de declaração ou sua
respectiva gravação audiovisual. Sendo desfavorável ao
investigado/réu e considerando que não se pode exigir a
autoincriminação, o depoimento poderia permanecer
apenas nos autos da investigação defensiva, não sendo
juntado aos autos oficiais. Por outro lado, quando uma
testemunha é arrolada e inquirida em um inquérito ou
processo, suas palavras não podem ser extraídas dos
autos se forem desfavoráveis à parte que a arrolou.
Feitas as considerações sobre as vantagens da
oitiva de uma testemunha na investigação defensiva,
questionamos: como isso deve ser feito na prática?
O primeiro passo consiste em perguntar ao cliente
se há pessoas que saibam sobre o fato e que podem
colaborar para o fortalecimento da sua versão.
Identificando as testemunhas e sabendo o que, em tese,
elas podem declarar, deve-se pesquisar o respectivo
endereço. Em alguns casos, o cliente saberá o endereço.
Em outros, o Advogado precisará diligenciar em busca
dessa informação.
Em seguida, deve-se elaborar um convite à
testemunha para que compareça ao escritório com a
finalidade de prestar declarações sobre o fato. Nada
impede que o convite seja feito por telefone, e-mail ou
aplicativo de mensagens, mas, para garantir a
formalidade do ato, recomenda-se que seja por escrito,
com aviso de recebimento.
Nessa linha, Bulhões (2019, p. 120) afirma:
Nessa toada, é possível que o advogado chame,
formalmente, testemunhas, sejam elas
amigáveis, neutras ou hostis. As ‘amigáveis’
poderão facilmente comparecer
espontaneamente, enquanto talvez as ‘neutras’
reajam positivamente a uma notificação
extrajudicial privada, e às ‘hostis’ muito
provavelmente reste a alternativa da notificação
cartorária (pública). Todas deverão ser
igualmente documentadas.

Se a testemunha não comparecer, não há


consequências. Não será possível sua condução
coercitiva ou a aplicação de multa, tampouco a
responsabilização por crime de desobediência (hipótese
prevista em algumas intimações judiciais). A única
possibilidade será entrar em contato novamente,
questionando se há alguma dúvida sobre o ato ou se
prefere agendar para uma nova data. Obviamente,
também restará a alternativa de ouvi-la diretamente nos
autos oficiais (inquérito ou processo).
Comparecendo a testemunha, recomenda-se que
tudo seja gravado por meio audiovisual, incluindo a
qualificação. Não será tomado o compromisso de dizer a
verdade, considerando que não há crime de falso
testemunho se a mentira ou omissão ocorrer em um
depoimento na investigação defensiva. Por outro lado,
recomenda-se que se pergunte à testemunha se ela está
comparecendo voluntariamente, a fim de que sua
resposta fique gravada na mídia.
Inicialmente, deve-se fazer a qualificação da
testemunha. Recomenda-se a utilização do art. 203 do
CPP como parâmetro, com exceção da parte inicial, que
trata do compromisso de dizer a verdade:
Art. 203. A testemunha fará, sob palavra de
honra, a promessa de dizer a verdade do que
souber e Ihe for perguntado, devendo declarar
seu nome, sua idade, seu estado e sua
residência, sua profissão, lugar onde exerce sua
atividade, se é parente, e em que grau, de
alguma das partes, ou quais suas relações com
qualquer delas, e relatar o que souber,
explicando sempre as razões de sua ciência ou
as circunstâncias pelas quais possa avaliar-se de
sua credibilidade.
Assim, as perguntas sobre a qualificação podem
dizer respeito aos seguintes dados:
nome;
idade;
residência;
profissão;
lugar onde exerce sua atividade;
se é parente, e em que grau, de alguma das
partes, ou quais suas relações com qualquer
uma delas.
Em seguida, na parte específica sobre o fato, o
Advogado deve explicar rapidamente do que se trata o
procedimento e qual é o fato investigado, perguntando,
logo depois, sobre o que a testemunha sabe.
Após o relato inicial da testemunha, o Advogado
deve fazer as perguntas pertinentes, indagando, quando
for o caso, como a testemunha tem ciência das
informações prestadas, com base em quais elementos
ela faz tais afirmações e de que forma pode ser
confirmada sua credibilidade. Não se pode desconsiderar
essa parte, haja vista que os motivos da ciência da
testemunha podem justificar novas diligências na
investigação defensiva. Cita-se, v. g., o caso em que uma
testemunha diz que soube de determinadas informações
por meio de outra pessoa, hipótese em que o Advogado
poderá convidar esse terceiro para prestar declarações.
Por fim, como encerramento, deve perguntar à
testemunha se há algo mais que ela queira falar ou que
considere relevante sobre o fato.
Após o encerramento da gravação, o Advogado
deverá pedir à testemunha que assine um termo de
declarações que contenha as informações sobre o
depoimento, especificamente que, no dia e horário
mencionados, a testemunha compareceu
voluntariamente para declarar o que consta na mídia.
Vejamos um exemplo:
FULANO, (nacionalidade), (estado civil),
(profissão), RG n. ____, CPF n. ____, residente e
domiciliado ____, declara que compareceu na
data de hoje ao escritório ____, com sede na rua
____, VOLUNTARIAMENTE, para prestar
informações relacionadas ao processo ____, nos
autos da investigação criminal defensiva n. ____.

Futuramente, no momento oportuno, o Advogado


precisará avaliar se as declarações são favoráveis ao
cliente, hipótese em que poderá juntar uma cópia aos
autos oficiais (inquérito ou processo). Sendo
desfavoráveis as palavras da testemunha, poderá deixar
o depoimento apenas na investigação defensiva, não o
levando para o inquérito ou processo.
Para atribuir mais valor ao depoimento, o Advogado
poderá, além de juntar a cópia nos autos oficiais, arrolar
a testemunha para que seja inquirida na audiência de
instrução, perante o Juiz, submetendo-a ao contraditório,
porque também será perguntada pela outra parte.
Vale lembrar que, na prática, muitos Advogados e
Defensores Públicos já utilizam declarações de
testemunhas abonatórias, obtidas unilateralmente. Com
a utilização do sobredito procedimento, as declarações
deixariam de se limitar a aspectos sobre a conduta social
e a personalidade (circunstâncias judiciais do art. 59 do
CP, presentes na primeira fase da dosimetria da pena)
para abranger também questões sobre o fato, como
autoria, materialidade e excludentes de ilicitude.

16.2. Pesquisa e obtenção de dados e


informações
A pesquisa e obtenção de dados e informações
disponíveis em órgãos públicos ou privados é uma
atividade corriqueira, já utilizada por muitos Advogados,
independentemente de investigação defensiva. Aliás,
para obter alguns dados, nem mesmo é necessário ser
Advogado, porque bastaria uma pesquisa rápida em
alguns sites.
Se pretende encontrar informações sobre alguém
que integra algum conselho de classe, pode-se pesquisar
no respectivo site. Como exemplo, para encontrar
algumas informações sobre Advogados, é recomendável
utilizar o site https://cna.oab.org.br/.
A pesquisa no Google também encontra
informações importantes, principalmente os links das
redes sociais, do currículo Lattes e de outros sites que
agregam informações, como o Escavador. Para ser
frutífera, a pesquisa deve ser feita com o uso correto das
aspas e, quando necessário, algum tipo de identificação
quanto à profissão e/ou ao local. Ex.: médico “Fulano de
Tal” Goiânia.
Nas redes sociais, recomenda-se que a pesquisa
não se limite ao nome completo da pessoa. Quando nada
for encontrado, é recomendável pesquisar apenas o
sobrenome, sobretudo se for incomum.
Se o objetivo for obter meios para entrar em
contato com alguém, alguns sites podem fornecer o
número de telefone, como https://www.telelistas.net/ e
http://www.brasilpaginasamarelas.com.br/busca/.
Para obter informações sobre uma pessoa jurídica,
recomenda-se a página
https://servicos.receita.fazenda.gov.br/Servicos/cnpjreva/
Cnpjreva_Solicitacao.asp, que, para ser utilizada,
necessita da inserção do CNPJ. Por outro lado, se o
objetivo for pesquisar uma pessoa física, o link a ser
utilizado é o
https://servicos.receita.fazenda.gov.br/Servicos/CPF/Cons
ultaSituacao/ConsultaPublica.asp, que exige a inserção
da data de nascimento.
Se o objetivo for encontrar informações sobre um
funcionário público, pode-se consultar no Portal da
Transparência do respectivo Órgão/Poder.
Pesquisando o nome da pessoa física ou jurídica no
Jusbrasil (https://www.jusbrasil.com.br), é possível
encontrar processos dos quais ela seja parte. Em
seguida, pode-se consultar o número do processo no site
do respectivo Tribunal e verificar a parte de mandados de
intimação, com o fim de saber se aquela pessoa foi
encontrada nos outros processos e em qual endereço.
Também devemos considerar a possibilidade de
diligenciar em órgãos públicos, cartórios e tabelionatos
em busca de informações e, se for o caso, certidões.
Deve-se destacar que o art. 5º, XXXIV, “b”, da
Constituição Federal, prevê a obtenção de certidões em
repartições públicas, para defesa de direitos e
esclarecimento de situações de interesse pessoal.
Por fim, há empresas que realizam essas pesquisas
mediante o pagamento de um valor, normalmente
definido de acordo com a complexidade da pesquisa e a
quantidade de pessoas, coisas ou informações que serão
pesquisadas.
A obtenção de imagens, especialmente aquelas
gravadas por câmeras de vigilância, também é uma
opção. Contudo, o Advogado não poderá requisitá-las ou
“determinar” sua entrega, mas apenas solicitar ao
proprietário.
Conforme Bulhões (2019, p. 125):
Nesse ponto, contudo, é importante lembrar que
a atividade advocatícia não detém poder de
polícia e nem cogência, sendo qualquer
colaboração obtida mediante voluntariedade da
pessoa física ou jurídica solicitada.

Enfim, há uma variedade de fontes de informações


e bancos de dados, devendo o Advogado escolher quais
são adequadas ao caso concreto.
16.3. Laudos e exames periciais
A produção de laudos e exames periciais é uma
prática já aceita e utilizada, especialmente em alguns
casos de homicídio, independentemente de investigação
criminal defensiva.
A atuação defensiva por meio da produção ou do
questionamento de provas periciais não é uma novidade.
Afinal, há alguns dispositivos legais que permitem essa
atuação.
Conforme Bulhões (2019, p. 127):
Vislumbrando uma classificação para a atuação
do perito dentro da investigação defensiva,
pode-se dividi-la em: (i) atuação enquanto
assistente técnico após a conclusão das perícias
oficiais (artigo 159, §3º, CPP); (ii) atuação em
contra-perícia, para realização de uma perícia
em paralelo à perícia oficial; (iii) atuação em
uma perícia autônoma, totalmente
independente até mesmo da existência de
qualquer perícia oficial.

Observa-se que a atuação defensiva em relação à


perícia é muito ampla. Não se deve admitir que a prova
pericial seja produzida sem a participação da defesa.
Ademais, quando produzida, ainda se deve tentar
questioná-la. Por fim, também deve ser considerada a
produção de uma perícia fora dos autos oficiais, de modo
independente.
Cita-se, de início, o art. 159 do CPP, que disciplina a
atuação do assistente técnico em vários pontos:
Art. 159 (...)
§ 3o Serão facultadas ao Ministério Público, ao
assistente de acusação, ao ofendido, ao
querelante e ao acusado a formulação de
quesitos e indicação de assistente técnico.
§ 4o O assistente técnico atuará a partir de
sua admissão pelo juiz e após a conclusão
dos exames e elaboração do laudo pelos
peritos oficiais, sendo as partes intimadas
desta decisão.
§ 5o Durante o curso do processo judicial, é
permitido às partes, quanto à perícia:
I – requerer a oitiva dos peritos para
esclarecerem a prova ou para responderem
a quesitos, desde que o mandado de intimação
e os quesitos ou questões a serem esclarecidas
sejam encaminhados com antecedência mínima
de 10 (dez) dias, podendo apresentar as
respostas em laudo complementar;
II – indicar assistentes técnicos que
poderão apresentar pareceres em prazo a
ser fixado pelo juiz ou ser inquiridos em
audiência.
§ 6o Havendo requerimento das partes, o
material probatório que serviu de base à perícia
será disponibilizado no ambiente do órgão
oficial, que manterá sempre sua guarda, e na
presença de perito oficial, para exame pelos
assistentes, salvo se for impossível a sua
conservação.
§ 7o Tratando-se de perícia complexa que
abranja mais de uma área de conhecimento
especializado, poder-se-á designar a atuação de
mais de um perito oficial, e a parte indicar
mais de um assistente técnico. (grifo nosso)

A atuação de um perito particular, contratado pelo


investigado ou réu, pode ser relevante para apresentar
conclusões diversas daquelas dos peritos oficiais ou não
oficiais (duas pessoas idôneas que prestaram o
compromisso), isto é, aqueles que atuam na persecução
penal.
Também poderá apresentar pareceres
demonstrando os equívocos das perícias que estiverem
nos autos oficiais.
Por fim, o perito particular poderá questionar a
cadeia de custódia (art. 158-A do CPP), apresentando
erros no rastreamento ou manuseio dos vestígios em
alguma de suas etapas (art. 158-B do CPP).
Também é possível produzir uma perícia no bojo da
investigação criminal defensiva para que, se o resultado
for favorável, ela seja juntada aos autos oficiais. A
vantagem dessa estratégia consiste no conhecimento do
resultado da perícia antes que ela integre os autos do
inquérito ou processo.

16.4. Reconstituições
No bojo da investigação criminal defensiva, poderá
ser necessário realizar a reconstituição dos fatos. Trata-
se de medida permitida pelo art. 4º do Provimento n.
188/2018 do Conselho Federal da OAB.
O art. 7º do CPP afirma que “para verificar a
possibilidade de haver a infração sido praticada de
determinado modo, a autoridade policial poderá proceder
à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não
contrarie a moralidade ou a ordem pública.”
Por mais que se esforce nos detalhes e pormenores,
a reprodução jamais será como o fato original. Os
sentimentos, as emoções, a velocidade dos fatos e até a
implantação de falsas memórias podem alterar
significativamente o resultado.
De qualquer forma, recomenda-se que o Advogado
documente tudo que for possível, inclusive as condições
e circunstâncias da reconstituição.
É sabido que a reconstituição não será possível em
alguns casos, ainda que seja requerida nos autos oficiais.
Cita-se um caso em que o STJ entendeu como correto o
indeferimento da reconstituição de um crime sexual:
(...)
Na hipótese, a reconstituição do crime,
conforme pleiteado pela defesa, não se revela
possível, por se tratar de crime sexual, a
denotar que seu deferimento, por certo, poderia
contrariar a moralidade e a ordem pública,
conforme dispõe o art. 7º do Código de Processo
Penal.
(...)
(AgRg nos EDcl no HC 463.089/PR, Rel. Ministro
REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA
TURMA, julgado em 23/10/2018, DJe
31/10/2018)

Na mesma linha, há de se ter cautela quanto à


realização da reconstituição na investigação criminal
defensiva. Ainda que ela seja feita apenas com o
investigado/réu, sem a participação de terceiros (vítima e
testemunhas), deve-se ter cuidado quanto ao lugar,
evitando que pareça haver algum objetivo de destruição
de vestígios.

17. Uma investigação imparcial para fins


parciais

A investigação criminal defensiva, apesar de ser


instaurada e conduzida pelo Advogado, pode/deve ter
um caráter imparcial, objetivando uma finalidade parcial.
Explico: diferentemente do inquérito policial, que
normalmente investiga de acordo com os interesses da
acusação, a investigação defensiva deve abranger todos
os caminhos possíveis, ainda que aparentemente sejam
prejudiciais ao cliente.
Parece contraditório, mas a postura de investigar
todas as versões possíveis pode evitar surpresas no
inquérito policial ou no processo penal.
Alguns clientes, por vergonha, medo ou qualquer
outro motivo, omitem ou alteram informações de seus
Advogados. Além da vergonha por eventual fato
constrangedor, o medo de que o Advogado vaze a
informação também contribui para essas
omissões/alterações fáticas, de forma deliberada ou não.
Nesse diapasão, não é raro que o Advogado,
seguindo a versão apresentada pelo cliente, seja
surpreendido com algum depoimento ou documento que
prove exatamente o contrário. Eventual sentimento de
traição e quebra de confiança é irrelevante se
comparado com o prejuízo que isso poderá gerar para o
investigado/réu.
Portanto, embasar uma estratégia/tese apenas na
versão apresentada pelo cliente é um risco que não
devemos correr. Deve-se perguntar a ele, por exemplo:
o que pode surgir na investigação?
alguém viu ou sabe o que aconteceu?
existe alguma prova que tem o condão de
desconstituir a versão defensiva apresentada?
Ademais, não se deve confiar totalmente nas
respostas do cliente. Após a instauração da investigação
defensiva, não se pode desconsiderar a existência de
elementos que prejudiquem a versão do réu e
eventualmente possam ser juntados ao processo pela
parte contrária, ainda que a defesa não tenha o dever de
levar tais elementos aos autos oficiais (não é exigida a
autoincriminação).
Destarte, a investigação defensiva deve ser
imparcial para seguir todas as linhas possíveis e
considerar tudo que poderá ser objeto de investigação ou
instrução pela autoridade policial ou pela acusação.
Por outro lado, a imparcialidade é limitada à
investigação. Após a obtenção dos elementos possíveis,
o Advogado deverá retornar ao seu papel de procurador
do réu e avaliar qual é a melhor estratégia possível,
considerando o arcabouço probatório de que tem
conhecimento e que integra a investigação oficial e a
presidida pela defesa.
Carnelutti (2009, p. 54) pontua que:
(...) o defensor não é um raciocinador imparcial.
E é isto o que escandaliza a gente. Apesar do
escândalo, o defensor não é imparcial porque
não deve sê-lo. E porque não é imparcial o
defensor, tampouco pode ser nem deve ser
imparcial seu adversário. A parcialidade deles é
o preço que se deve pagar para obter a
imparcialidade do juiz, que é, pois, o milagre do
homem, uma vez que, conseguindo não ser
parte, supera-se a si mesmo. O defensor e o
acusador devem buscar as premissas para
chegar a uma conclusão forçada.

Logo, conclui-se que a investigação defensiva deve


ser conduzida de forma imparcial, considerando tudo que
eventualmente poderá ser encontrado pela polícia ou
pela acusação, mas sem perder de vista a finalidade
parcial, que é levar aos autos oficiais apenas o que
beneficie o acusado e montar argumentos que
eventualmente consigam rebater aquilo que o
prejudique.

18. Sigilo das informações

O art. 5º do Provimento n. 188/2018 assevera:


Art. 5º Durante a realização da investigação, o
advogado deve preservar o sigilo das
informações colhidas, a dignidade, privacidade,
intimidade e demais direitos e garantias
individuais das pessoas envolvidas.

Trata-se de uma proteção do cliente e um limite da


atuação do Advogado. Diferentemente do inquérito
policial, que, como regra, é público, a investigação
defensiva é um procedimento particular decorrente da
contratação de um Advogado por um investigado/réu ou
ofendido (querelante ou assistente da acusação). A
divulgação precipitada de informações poderia, inclusive,
inviabilizar a continuidade da investigação defensiva.
Aliás, o sigilo da relação entre Advogado e
constituinte também encontra respaldo no art. 7º, XIX,
do Estatuto da OAB, que concede o direito ao Advogado
de se recusar a depor como testemunha em processo no
qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato
relacionado com pessoa de quem seja ou foi Advogado,
mesmo quando autorizado ou solicitado pelo
constituinte, bem como sobre fato que constitua sigilo
profissional. O Estatuto da OAB também prevê como
infração disciplinar a violação, sem justa causa, de sigilo
profissional (art. 34, VII).
O sigilo inerente à investigação defensiva abrange
também a possibilidade de não informar às autoridades
os resultados do procedimento, conforme o art. 6º do
Provimento n. 188/2018:
Art. 6º O advogado e outros profissionais que
prestarem assistência na investigação não têm o
dever de informar à autoridade competente os
fatos investigados.

Insta observar que o Advogado não tem função de


garantidor, tampouco precisa contribuir para as
investigações oficiais em prejuízo do cliente. É, portanto,
uma condição diferente daquela do funcionário público,
que pode ser responsabilizado criminalmente por sua
omissão, por meio de figuras típicas como a prevaricação
(art. 319 do CP) e a condescendência criminosa (art. 320
do CP), além da responsabilização administrativa.
O Advogado não tem o dever de levar os fatos às
autoridades, mas, evidentemente, não significa que não
poderá ser responsabilizado em caso de coautoria ou
participação em algum crime, como favorecimento
pessoal, favorecimento real, lavagem de capitais ou
organização criminosa. Entretanto, nunca – jamais
mesmo! – poderemos admitir a criminalização do
exercício regular da Advocacia ou do recebimento de
honorários.
Portanto, a ausência do dever de informar às
autoridades e a prerrogativa do exercício da Advocacia
evitam a responsabilização criminal e disciplinar do
Advogado que atue nos limites legais e éticos. Se, por
ação ou omissão, incidir em algum tipo penal,
extrapolando os limites do exercício da Advocacia,
poderá ser responsabilizado.
Nesse diapasão, devemos lembrar que a
inviolabilidade do escritório também tem limites,
conforme o art. 7º, II, §§6º e 7º, do Estatuto da OAB:
Art. 7º: São direitos do advogado:
(...)
II – a inviolabilidade de seu escritório ou local de
trabalho, bem como de seus instrumentos de
trabalho, de sua correspondência escrita,
eletrônica, telefônica e telemática, desde que
relativas ao exercício da advocacia;
(...)
§ 6o Presentes indícios de autoria e
materialidade da prática de crime por parte de
advogado, a autoridade judiciária competente
poderá decretar a quebra da inviolabilidade de
que trata o inciso II do caput deste artigo, em
decisão motivada, expedindo mandado de busca
e apreensão, específico e pormenorizado, a ser
cumprido na presença de representante da OAB,
sendo, em qualquer hipótese, vedada a
utilização dos documentos, das mídias e dos
objetos pertencentes a clientes do advogado
averiguado, bem como dos demais instrumentos
de trabalho que contenham informações sobre
clientes.
§ 7o A ressalva constante do § 6o deste artigo
não se estende a clientes do advogado
averiguado que estejam sendo formalmente
investigados como seus partícipes ou co-autores
pela prática do mesmo crime que deu causa à
quebra da inviolabilidade.
Assim, o Advogado deve manter uma conduta lícita
e ética, pois, como bem destaca Branco (1989, p. 3),
“quando um advogado, mal avisado, comete uma
infração ao seu dever ético, não somente prejudica o seu
próprio nome, como também a todos os seus colegas”.

19. É dever do Advogado levar os fatos


investigados à autoridade?

Na condução de uma investigação criminal


defensiva, não há garantia de que todos os elementos
obtidos serão favoráveis ao cliente. Realizando inúmeras
diligências, é possível que algumas sejam contrárias à
versão defensiva e fortaleçam a narrativa acusatória.
Nessa situação, tem relevância o debate sobre (não)
ser um dever do Advogado levar ao processo todos os
fatos de que tiver conhecimento sobre o caso, ainda que
contrários ao interesse do cliente.
Em que pese possa surgir alguma fundamentação
de caráter ético, entendemos que não há suporte jurídico
para impor ao Advogado o dever de prejudicar o cliente,
levando aos autos oficiais todos os resultados obtidos na
investigação criminal defensiva. Essa também foi a linha
seguida pelo art. 6º do Provimento n. 188/2018 do
Conselho Federal da OAB, que diz: “O advogado e outros
profissionais que prestarem assistência na investigação
não têm o dever de informar à autoridade competente os
fatos investigados”.
Na doutrina, esse também é o entendimento de
Oliveira (2008, p. 65), ao afirmar que “não podemos
perder de vista que o arguido não está obrigado a
oferecer às autoridades judiciárias quaisquer meios de
prova que tenha obtido”.
Por meio da procuração, o Advogado assume o
compromisso de não prejudicar o cliente e fazer tudo que
for legalmente permitido para melhorar sua situação em
um processo. Violaria a confiança inerente à relação
entre Advogado e cliente exigir daquele uma postura de
"fiscal" dos fatos de que tiver conhecimento.
É papel do Advogado orientar o investigado/réu e
atuar de modo a evitar a autoincriminação, salvo nos
casos em que o cliente quiser adotar uma postura que
pressuponha a confissão, que poderá viabilizar um
acordo de não persecução penal, a formalização de uma
colaboração premiada ou a aplicação da atenuante da
confissão espontânea.
Seria uma deficiência defensiva – quiçá uma falta
de defesa – a conduta do causídico que, querendo
colaborar com as autoridades, levasse aos autos, sem o
consentimento do cliente, declarações que obteve
durante a tramitação da investigação criminal defensiva.
Ademais, não sendo possível exigir do investigado
ou réu a autoincriminação, também não seria cabível
impor ao seu Advogado que apresente às autoridades os
elementos prejudiciais ao seu cliente.
Nesse diapasão, o Advogado deverá fazer um filtro
de tudo que integra a investigação defensiva antes de
requerer a juntada aos autos oficiais, utilizando apenas
os elementos que tenham reais vantagens para o cliente
e que não o prejudiquem, ainda que indiretamente.
Considerando que é possível que o Advogado
descarte integralmente os resultados da investigação
defensiva, não os utilizando nos autos oficiais, também é
possível que utilize apenas uma parte da investigação
particular. Assim, em uma investigação criminal
defensiva com perícias, vários depoimentos, fotografias e
documentos, pode-se utilizar apenas um depoimento,
desconsiderando todo o resto.
Destarte, de acordo com a aferição da possibilidade
de contribuir para a estratégia defensiva adotada, o
Advogado poderá levar para os autos oficiais um, alguns
ou todos os elementos obtidos na investigação criminal
defensiva.
Observa-se que a vantagem estratégica da
instauração e condução de uma investigação defensiva é
a possibilidade de antecipar os resultados que somente
seriam produzidos diretamente na persecução penal,
quando o desentranhamento não seria mais possível.
Produzindo os elementos na investigação defensiva, será
possível deliberar sobre levar aos autos oficiais os
resultados favoráveis e descartar os desfavoráveis.

20. Comunicação e publicidade do


resultado da investigação

Uma vez definidos os resultados que são favoráveis


ao cliente, o próximo passo será comunicá-los às
autoridades (Delegado, Promotor/Procurador e Juiz),
requerendo a juntada aos autos oficiais. É o momento em
que os resultados saem da esfera privada de um
procedimento particular e passam a compor um inquérito
policial ou processo penal, que, como regra, será público.
Sobre esse tema, o parágrafo único do art. 6º do
Provimento n. 188/2018 do Conselho Federal da OAB
institui:
Parágrafo único. Eventual comunicação e
publicidade do resultado da investigação
exigirão expressa autorização do constituinte.

Portanto, o Advogado não poderá utilizar os


resultados da investigação defensiva sem autorização do
cliente, que, como é sabido, é a pessoa mais interessada
no caso, por ter contra si uma investigação criminal ou
um processo, com o risco real de sofrer a aplicação de
uma pena.
Ademais, em determinados casos, a investigação
defensiva encontrará informações que abordam a
intimidade do cliente ou de pessoas próximas a ele.
Nessas hipóteses, com mais razão, será imprescindível a
autorização expressa do constituinte antes de utilizar e
dar publicidade aos resultados da investigação.
Parte II
Questões práticas
21. Limites da investigação defensiva

De início, observamos um limite à realização da


investigação criminal defensiva: a reserva de jurisdição.
Segundo Rangel (1997, p. 27):
(...) com o estabelecimento de uma reserva
pretende justamente garantir-se que o órgão
político-constitucionalmente pensado para se
desimcumbir de uma certa função, o faça
efectivamente (e sem interferência de outro
órgão). Trata-se, pois, de uma técnica normativa
destinada a revigorar a idéia de separação dos
poderes e onde, melhor do que em quaisquer
outras, se verifica o fenômeno da contaminação
material das normas organizatórias, por isso que
se liga incidivelmente o domínio de uma matéria
determinada à estruturação de um certo órgão.

No processo penal, a reserva de jurisdição


normalmente funciona como um limite à atuação da
autoridade policial e do Ministério Público, por meio da
exigência de autorização judicial para determinados atos.
Há inúmeras hipóteses que necessitam de decisão
judicial no Código de Processo Penal:
art. 13-B. Se necessário à prevenção e à
repressão dos crimes relacionados ao tráfico de
pessoas, o membro do Ministério Público ou o
delegado de polícia poderão requisitar,
mediante autorização judicial, às empresas
prestadoras de serviço de telecomunicações
e/ou telemática que disponibilizem
imediatamente os meios técnicos adequados –
como sinais, informações e outros – que
permitam a localização da vítima ou dos
suspeitos do delito em curso;
art. 13-B, § 2 o Na hipótese de que trata o
caput, o sinal: I - não permitirá acesso ao
conteúdo da comunicação de qualquer
natureza, que dependerá de autorização
judicial, conforme disposto em lei; (...) III - para
períodos superiores àquele de que trata o
inciso II, será necessária a apresentação de
ordem judicial;
a homologação de acordo de não persecução
penal (art. 28-A, §6º, do CPP);
o descarte de vestígios relacionados à cadeia
de custódia (art. 158-B, X, do CPP);
a restituição de coisas apreendidas, quando
duvidoso o direito (art. 120, §1º, do CPP). Não
existindo dúvida quanto ao direito do
reclamante, a restituição poderá ser ordenada
pela autoridade policial ou Juiz (art. 120 do
CPP);
a inutilização de uma prova declarada
inadmissível (art. 157, §3º, do CPP);
a incomunicabilidade do indiciado, que não
excederá de três dias (art. 21, parágrafo único,
do CPP);
a declaração da extinção da punibilidade (art.
61 do CPP);
a decisão sobre a suspeição de membro do
Ministério Público (art. 104 do CPP);
a decisão sobre a suspeição de peritos,
intérpretes, serventuários ou funcionários da
justiça (art. 105 do CPP);
o sequestro de bens (art. 127 do CPP);
a determinação de avaliação e venda dos bens
em leilão público cujo perdimento tenha sido
decretado (art. 133 do CPP);
a utilização do bem sequestrado, apreendido
ou sujeito a qualquer medida assecuratória
para interesse público (art. 133-A do CPP);
a determinação da alienação antecipada de
bens (art. 144-A do CPP);
a decisão sobre a falsidade de um documento
(arts. 145 e 147 do CPP);
a condução de testemunha que, regularmente
intimada, deixou de comparecer sem motivo
justificado (art. 218 do CPP);
a decretação de medidas cautelares, a
requerimento das partes ou, quando no curso
da investigação criminal, por representação da
autoridade policial ou mediante requerimento
do Ministério Público (art. 282, §2º, do CPP);
decretar a prisão preventiva, a requerimento
do Ministério Público, do querelante ou do
assistente, ou por representação da autoridade
policial (art. 311 do CPP), bem como revogá-la
(art. 316 do CPP).

Em outras leis, também constatamos atos que


dependem de autorização judicial:
a liberação do acesso ao banco de dados de
identificação de perfil genético, em caso de
requerimento de autoridade policial, federal ou
estadual (art. 9º-A, §2º, da LEP);
a infiltração por agentes de polícia (art. 53, I,
da Lei de Drogas, e art. 10 da Lei de
Organizações Criminosas);
determinar a apreensão e outras medidas
assecuratórias nos casos em que haja suspeita
de que os bens, direitos ou valores sejam
produto do crime ou constituam proveito dos
crimes previstos na Lei de Drogas (art. 60);
a interceptação de comunicações telefônicas
(art. 1º da Lei de Interceptações);
a captação ambiental de sinais
eletromagnéticos, ópticos ou acústicos (art. 8º-
A da Lei de Interceptações);
a decretação da prisão temporária (art. 2º da
Lei n. 7.960/89).

Por fim, a Constituição Federal, no art. 5º, apresenta


três hipóteses de reserva de jurisdição:
XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo,
ninguém nela podendo penetrar sem
consentimento do morador, salvo em caso de
flagrante delito ou desastre, ou para prestar
socorro, ou, durante o dia, por determinação
judicial;
XII - é inviolável o sigilo da correspondência e
das comunicações telegráficas, de dados e das
comunicações telefônicas, salvo, no último caso,
por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que
a lei estabelecer para fins de investigação
criminal ou instrução processual penal;
LXI - ninguém será preso senão em flagrante
delito ou por ordem escrita e fundamentada de
autoridade judiciária competente, salvo nos
casos de transgressão militar ou crime
propriamente militar, definidos em lei;

Tratando-se de ato abrangido pela reserva de


jurisdição, o Advogado poderá requerer ao Juiz nos autos
oficiais (inquérito policial ou processo). Poderia, por
exemplo, requerer ao Juiz a busca e apreensão domiciliar,
nos termos do art. 242 do CPP.
Ademais, também existem limitações de ordem
material ou financeira. Como muito bem destaca Bulhões
(2019, p. 97):
Não há como olvidar, nessa ótica, o custo
econômico inerente às medidas e às diligências
necessárias a uma investigação defensiva,
sendo certo que existem várias ferramentas de
baixo custo, enquanto que outras são
extremamente custosas (por exemplo a
contratação dos serviços de detetives
particulares e a consulta a determinados bancos
de informações).

Recomenda-se que o contrato de prestação de


serviços advocatícios tenha cláusula expressa sobre
quem é o responsável (cliente ou Advogado) pelas
despesas inerentes à condução da investigação criminal
defensiva, que podem abranger, por exemplo:
contratação de terceiros, como detetives
particulares e fotógrafos;
contratação de empresas especializadas em
pesquisas;
perícias e exames médicos;
atas notariais;
deslocamentos a outras cidades;
obtenção de documentos.
Ainda que a investigação criminal defensiva tenha
muitas limitações constitucionais/legais e materiais, há
uma enorme margem de atuação por meio de atos
permitidos ou não proibidos e que geram custos ínfimos
ou inexistentes.

21.1. Falta de coerção e de fé pública


Por ser um procedimento particular, a investigação
criminal defensiva não contempla algumas
características das investigações oficiais, conduzidas por
Delegados de Polícia ou membros do Ministério Público.
Como é sabido, a prática de atos pelo Estado tem
um regime jurídico diverso dos atos particulares, a saber:
os atos administrativos possuem alguns
atributos, como a presunção de legitimidade, a
imperatividade, a exigibilidade e a
autoexecutoriedade;
a legislação prevê poder de requisição para
várias autoridades;
normalmente, há previsão de sanções para o
descumprimento de determinadas medidas,
como a aplicação de multa e a condução
coercitiva de testemunhas faltantes;
o crime de desobediência tem como objeto
apenas a ordem legal de funcionário público
(art. 330 do CP);
os agentes públicos têm poderes, mas também
precisam evitar o seu abuso, que, em alguns
casos, pode constituir crime de abuso de
autoridade (Lei n. 13.869/2019).
Nas investigações oficiais, é muito comum observar
certidões feitas pelos servidores públicos que gozam de
fé pública no exercício da função. Portanto, é mais fácil
demonstrar fatos, inclusive corriqueiros, com expressões
como “certifico que, em contato telefônico com fulano
nesta data, ele me relatou que ____”.
Por outro lado, considerando que os atos do
Advogado não gozam de fé pública, o idêntico “certifico
que (...)” não teria a mesma presunção de legitimidade.
Sobre a ausência de coerção, urge salientar que o
Advogado não tem o uso legitimado da violência, que é
possível apenas ao Estado, em situações como a
condução coercitiva de testemunhas e a prisão
preventiva. Há atos que somente podem ser praticados
pela Polícia, em alguns casos com a necessidade de
prévia decisão judicial.
Ao convidar uma testemunha para prestar
depoimento, o Advogado não poderá, por exemplo,
empregar trechos que apresentem consequências que
somente se aplicam na persecução penal, como “sob
pena de condução coercitiva” ou “sob pena de multa”.
Também não poderá utilizar a expressão “sob pena de
responsabilização por crime de desobediência”, haja
vista que esse crime não abrange a “ordem” de
particular, mas apenas a de funcionário público.
Compilando esses problemas, Oliveira (2008, p. 56-
57):
(...) o principal obstáculo com que poderá
deparar-se o arguido nas suas próprias
investigações será o da escassez de meios de
averiguação e obtenção de prova que envolvam
terceiras pessoas ou poderes de autoridade.
Porquanto, nem todos os terceiros estarão
dispostos a colaborar com o arguido, nem este
pode alcançar todos os meios de prova que
consiga identificar como úteis ou necessários à
sua Defesa.
A defesa deve ter ciência de todas essas limitações
e buscar alternativas (lícitas, evidentemente) para
superar as dificuldades.

21.2. A ausência de poder de requisição


Uma das principais diferenças entre a condução de
uma investigação por Delegado ou membro do Ministério
Público e aquela presidida por um Advogado diz respeito
ao poder de requisição das referidas autoridades
públicas, o que facilita consideravelmente a obtenção de
documentos, informações e outros elementos.
No art. 129, VI, da Constituição Federal, existe a
previsão, como função institucional do Ministério Público,
da possibilidade de expedir notificações nos
procedimentos administrativos de sua competência,
requisitando informações e documentos para instruí-los,
na forma da lei complementar respectiva.
Por sua vez, a LC n. 75/93 apresenta várias
hipóteses de poder de requisição. O art. 7º, II e III, prevê
que incumbe ao Ministério Público da União, sempre que
necessário ao exercício de suas funções institucionais,
requisitar diligências investigatórias e a instauração de
inquérito policial e de inquérito policial militar, podendo
acompanhá-los e apresentar provas, assim como
requisitar à autoridade competente a instauração de
procedimentos administrativos, ressalvados os de
natureza disciplinar, podendo acompanhá-los e produzir
provas.
Em seguida, no art. 8º, II, III e IV, da referida Lei
Complementar, observa-se que o Ministério Público da
União poderá, nos procedimentos de sua competência:
requisitar informações, exames, perícias e
documentos de autoridades da Administração
Pública direta ou indireta;
requisitar da Administração Pública serviços
temporários de seus servidores e meios
materiais necessários para a realização de
atividades específicas;
requisitar informações e documentos a
entidades privadas.

O art. 26, I, “b”, e II, da Lei n. 8.625/93 (Lei


Orgânica Nacional do Ministério Público), apresenta
poderes semelhantes, como a possibilidade de instaurar
inquéritos civis e outras medidas e procedimentos
administrativos pertinentes e, para instruí-los, requisitar
informações, exames periciais e documentos de
autoridades federais, estaduais e municipais, bem como
dos órgãos e entidades da administração direta, indireta
ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, assim como
requisitar informações e documentos a entidades
privadas, para instruir procedimentos ou processo em
que oficie.
Fora da legislação institucional do Ministério Público,
o poder requisitório também está presente.
No Código de Processo Penal, o art. 47 prevê que,
se o Ministério Público julgar necessários maiores
esclarecimentos e documentos complementares ou
novos elementos de convicção, deverá requisitá-los,
diretamente, de quaisquer autoridades ou funcionários
que devam ou possam fornecê-los.
Ainda no Código de Processo Penal, o art. 13-A
prevê que, nos crimes previstos nos arts. 148, 149 e 149-
A, no § 3º do art. 158 e no art. 159 do Código Penal, e no
art. 239 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o
membro do Ministério Público ou o Delegado de Polícia
poderá requisitar, de quaisquer órgãos do poder público
ou de empresas da iniciativa privada, dados e
informações cadastrais da vítima ou de suspeitos.
Em linha semelhante, o art. 13-B do CPP prevê,
quanto aos crimes relacionados ao tráfico de pessoas,
que o membro do Ministério Público ou o Delegado de
Polícia poderão requisitar, mediante autorização, às
empresas prestadoras de serviço de telecomunicações
e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os
meios técnicos adequados – como sinais, informações e
outros – que permitam a localização da vítima ou dos
suspeitos do delito em curso. Em seguida, no §4º, prevê
que, não havendo manifestação judicial no prazo de 12
horas, a autoridade competente requisitará às empresas
que disponibilizem imediatamente os meios técnicos
adequados, com imediata comunicação ao Juiz. Noutros
termos, há previsão da necessidade de decisão judicial
para a requisição prevista nesse dispositivo, mas, não
havendo decisão no prazo de 12 horas, será possível a
requisição diretamente.
Como se o poder de requisição não fosse suficiente,
também há previsão de acesso a determinados dados,
especialmente na Lei n. 12.850/2013 (Lei das
Organizações Criminosas), que prevê, no art. 15, que o
Delegado de Polícia e o Ministério Público terão acesso,
independentemente de autorização judicial, apenas aos
dados cadastrais que informem exclusivamente a
qualificação pessoal, a filiação e o endereço mantidos
pela Justiça Eleitoral, empresas telefônicas, instituições
financeiras, provedores de internet e administradoras de
cartão de crédito. Há previsão idêntica no art. 17-B da Lei
n. 9.613/98.
Em seguida, no art. 16, prevê que as empresas de
transporte possibilitarão, pelo prazo de 5 anos, acesso
direto e permanente do juiz, do Ministério Público ou do
Delegado de Polícia aos bancos de dados de reservas e
registro de viagens.
Por fim, o art. 17 determina que as concessionárias
de telefonia fixa ou móvel mantenham, pelo prazo de 5
anos, à disposição das autoridades mencionadas no art.
15 (Delegado de Polícia e Ministério Público), registros de
identificação dos números dos terminais de origem e de
destino das ligações telefônicas internacionais,
interurbanas e locais.
O poder de requisição também se encontra previsto
no art. 80 do Código de Processo Penal Militar, no sentido
de que, sempre que, no curso do processo, o Ministério
Público necessitar de maiores esclarecimentos, de
documentos complementares ou de novos elementos de
convicção, poderá requisitá-los, diretamente, de qualquer
autoridade militar ou civil, em condições de os fornecer,
ou requerer ao Juiz que os requisite.
No processo penal militar, o Superior Tribunal Militar
já decidiu:
(...) O MPM dispõe de poder legal para, em
qualquer fase da ação penal, requisitar
informações diretamente às autoridades civis ou
militares, independente de crivo judicial (art. 80
do CPPM). (...) (STM - Cparcfo: 1972 PE
2007.01.001972-6, Relator: MARIA ELIZABETH
GUIMARÃES TEIXEIRA ROCHA, Data de
Julgamento: 09/04/2008, Data de Publicação:
30/04/2008 Vol: Veículo:)
Em relação à autoridade policial, há previsão
específica no art. 2º, §2º, da Lei n. 12.830/2013, o qual
prevê que, durante a investigação criminal, cabe ao
Delegado de Polícia a requisição de perícia, informações,
documentos e dados que interessem à apuração dos
fatos.
Nessa linha, o enunciado n. 14 do II Encontro
Nacional de Delegados de Polícia sobre Aperfeiçoamento
da Democracia e Direitos Humanos afirma o seguinte:
O poder requisitório do delegado de polícia, que
abrange informações, documentos e dados que
interessem à investigação policial, não esbarra
em cláusula de reserva de jurisdição, sendo
dever do destinatário atender à ordem no prazo
fixado, sob pena de responsabilização criminal.

Por fim, apenas a título de complementação, o art.


218 do CPP prevê que o Juiz poderá requisitar à
autoridade policial ou determinar que seja conduzida por
oficial de justiça a testemunha que, regularmente
intimada, deixar de comparecer sem motivo justificado.
Observa-se que o Delegado de Polícia e o Ministério
Público possuem um amplo e significativo poder de
requisição, o qual fortalece e facilita suas investigações.
A extrema facilidade para obter informações,
documentos, gravações e perícias constitui enorme
vantagem na condução de uma investigação criminal.
Não raramente, para garantir o cumprimento da
requisição, as autoridades inserem a informação de que
o seu descumprimento constitui crime de desobediência
(art. 330 do CP), na tentativa de provocar sentimento de
desespero no destinatário, ocasionando pressão
psicológica.
Aliás, já foi decidido pelo STJ que o poder de
requisição do Promotor de Justiça pode ser exercido em
relação a Delegado de Polícia, que, se não cumprir,
poderá ser responsabilizado por crime de desobediência:
PROCESSUAL PENAL. DELEGADO DE POLÍCIA.
DESCUMPRIMENTO DE REQUISIÇÃO DE
PROMOTOR DE JUSTIÇA. SONEGAÇÃO DE
DOCUMENTOS E DESOBEDIÊNCIA. AÇÃO PENAL.
FALTA DE JUSTA CAUSA. AUSÊNCIA DE DOLO.
TRANCAMENTO. REVOLVIMENTO FÁTICO.
IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA. (...) 2. Segundo
doutrina de escol, o funcionário público pode ser
sujeito ativo do crime de desobediência, desde
que, como na espécie, não seja
hierarquicamente subordinado ao emitente da
ordem legal e tenha atribuições para cumpri-la.
3. O fato de o delito de desobediência estar
inserido no capítulo dos ilícitos penais
praticados por particular contra a administração
pública não impede a sua consumação,
porquanto haverá, em tal caso, violação ao
princípio da autoridade que é objeto da tutela
jurídica. (...) (STJ - RHC: 85031 DF
2017/0126784-4, Relator: Ministra MARIA
THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de Julgamento:
19/10/2017, T6 - SEXTA TURMA, Data de
Publicação: DJe 27/10/2017)

Na comparação com a investigação criminal


defensiva conduzida por Advogado, as investigações
presididas por Delegados ou membros do Ministério
Público têm uma força coercitiva muito maior, mormente
pelo poder de requisição e pela ideia de que o seu
descumprimento configura o crime de desobediência.
Para equilibrar o jogo e produzir uma investigação
frutífera, o Advogado precisará superar as dificuldades
inerentes ao desenvolvimento de uma atividade privada
desprovida de poder de requisição, fé pública e coerção,
com o adicional de que a Advocacia é diuturnamente
criminalizada por algumas autoridades.

21.3. Superando algumas dificuldades


Conforme analisado, os atos da investigação
criminal defensiva não possuem fé pública, não tendo,
por conseguinte, presunção de veracidade. Ademais, o
Advogado também tem como limites a reserva de
jurisdição e a ausência de coerção e de poder de
requisição.
No inquérito policial, os atos dos policiais têm fé
pública e, na prática, seus depoimentos possuem um
peso maior na instrução processual, ainda que,
frequentemente, sejam interessados no êxito da
acusação, o que ocorre, v. g., quando efetuaram a prisão
em flagrante e há questionamentos defensivos sobre a
ilegalidade do ato e eventual abuso de autoridade.
Observa-se, assim, uma contradição: os atos do
Advogado não possuem fé pública, mas os dos policiais,
mesmo quando interessados em determinada versão
acusatória para que não sofram responsabilização
criminal por alguma ilegalidade, possuem fé pública e
seus depoimentos adquirem especial relevância para os
Juízes. Essa contradição somente é superada pelo fato de
que o Advogado é um particular, ao passo que os
policiais são agentes públicos.
Em alguns casos, para tentar superar esse prejuízo
na investigação defensiva, é recomendável utilizar a ata
notarial, que, como é sabido, tem um custo elevado. Essa
prática já é utilizada para atribuir a presunção de
veracidade a conversas em aplicativos e postagens em
redes sociais.
Nas lições de Bulhões (2019, p. 116):
Uma hipótese muito útil é a ata notarial de
verificação de fatos em diligência, quando se
poderá registrar situações as mais diversas. Um
exemplo pode ser a escuta de uma ligação
telefônica feita em “modo viva-voz”, onde o teor
do diálogo será registrado, além dos números
telefônicos da chamada discada e recebida, a
hora e o dia de realização do telefonema, etc.
Ademais, Bulhões (2019, p. 116) também fala sobre
transformar em ata notarial a declaração feita por uma
pessoa na presença do tabelião, o que poderia atribuir
credibilidade aos atos praticados no contexto da
investigação criminal defensiva.
Urge destacar que o art. 384, parágrafo único, do
Código de Processo Civil, disciplina a utilização e o objeto
da ata notarial:
Art. 384. A existência e o modo de existir de
algum fato podem ser atestados ou
documentados, a requerimento do interessado,
mediante ata lavrada por tabelião.
Parágrafo único. Dados representados por
imagem ou som gravados em arquivos
eletrônicos poderão constar da ata notarial.
No caso específico de prints, a utilização de uma ata
notarial pode ser complementada pela realização de uma
perícia que tenha o escopo de afirmar que a conversa ou
postagem não foi adulterada.
Insta destacar, ainda, o teor do art. 425, IV e VI, do
Código de Processo Civil:
Art. 425. Fazem a mesma prova que os originais:
(...)
IV - as cópias reprográficas de peças do próprio
processo judicial declaradas autênticas pelo
advogado, sob sua responsabilidade pessoal, se
não lhes for impugnada a autenticidade;
(...)
VI - as reproduções digitalizadas de qualquer
documento público ou particular, quando
juntadas aos autos pelos órgãos da justiça e
seus auxiliares, pelo Ministério Público e seus
auxiliares, pela Defensoria Pública e seus
auxiliares, pelas procuradorias, pelas repartições
públicas em geral e por advogados, ressalvada a
alegação motivada e fundamentada de
adulteração.

A validade das sobreditas cópias e reproduções


digitalizadas como provas originais, quando declaradas
ou juntadas por Advogado, constitui uma facilidade para
a utilização dos resultados das investigações criminais
defensivas.
Outra solução para as dificuldades inerentes à
investigação criminal defensiva consiste em requerer ao
Juiz, nos autos oficiais, que expeça ofícios, no exercício
do poder de requisição, para obter documentos ou
informações.
Ressalta-se que há decisões reconhecendo essa
possibilidade, inclusive com expressa menção de que se
trata de medida que tem o desiderato de garantir a
paridade de armas, haja vista que o réu e seu Advogado
não possuem os mesmos poderes de requisição do
Parquet. Nesse sentido:
(...) A expedição de ofícios às repartições
públicas, como a Receita Federal e o Detran, e
também às empresas privadas, a exemplo das
companhias telefônicas, pelo Poder Judiciário,
com o intuito de obter informações acerca do
endereço de testemunha arrolada pelo réu no
processo penal, é medida imprescindível que
consagra os mais nobres princípios processuais
penais, como o da ampla defesa, do
contraditório e da busca da verdade real, além
de garantir a simétrica paridade de armas com o
órgão acusador, pois o acusado não possui os
mesmos poderes requisitórios do Ministério
Público (...) (TJ-MG - COR: 10000180963357000
MG, Relator: Otávio Portes, Data de Julgamento:
04/11/2019, Data de Publicação: 08/11/2019)

(...) 2 A despeito disso, uma vez instaurada a


ação penal, o juiz continua sendo o responsável
pela direção dos trabalhos, competindo-lhe,
dentre outras atribuições, a de requisitar
documentos a partir do requerimento das
partes. Trata-se de uma consequência do
princípio da paridade de armas, considerando
que o réu, por seu defensor, não dispõe do
mesmo poder de requisição. (...) (TJ-PA - MS:
201330146453 PA, Relator: PAULO GOMES
JUSSARA JUNIOR - JUIZ CONVOCADO, Data de
Julgamento: 08/11/2014, CÂMARAS CRIMINAIS
REUNIDAS, Data de Publicação: 11/11/2014)

Também nos autos oficiais, é possível utilizar o art.


242 do CPP, que prevê: “a busca poderá ser determinada
de ofício ou a requerimento de qualquer das partes.”
Havendo necessidade de realizar uma busca
domiciliar e eventual apreensão, o Advogado poderá
requerer ao Juiz, utilizando como fundamento específico
o art. 240, §1º, “e”, in fine, do CPP. Noutras palavras, será
cabível a busca domiciliar quando fundadas razões a
autorizarem, para descobrir objetos necessários à prova
de infração ou à defesa do réu.
No requerimento, o Advogado deverá utilizar como
parâmetro para detalhamento e fundamentação o art.
243 do CPP, mormente quanto à indicação, da forma
mais precisa possível, da casa em que será realizada a
diligência e o nome do respectivo proprietário ou
morador, mencionando, ainda, o motivo e os fins da
diligência.

22. Os autos da investigação criminal


defensiva

A formação dos autos da investigação defensiva


deve ser feita de modo semelhante à formalização do
inquérito policial e do processo, por meio da reunião e
organização de folhas e mídias nos autos, seguindo uma
ordem cronológica.
Recomenda-se que nada seja deixado de fora dos
autos. Todos os documentos, favoráveis ou não, devem
integrá-los, evitando a descentralização das informações
e o risco de que elementos importantes sejam perdidos
ou permaneçam desorganizados.
O objetivo da formação dos autos da investigação
defensiva é reunir, em apenas um lugar, tudo que o
Advogado encontrar ou produzir sobre o fato objeto da
apuração.
Uma observação importante consiste no fato de que
não há documentação obrigatória na investigação
defensiva. Diante da inexistência de previsão legal e da
falta de exigência específica no Provimento n. 188/2018
do Conselho Federal da OAB, os documentos são
facultativos, razão pela qual todas as indicações a seguir
serão recomendações.
Contudo, o Advogado não deve desconsiderar que
há uma necessidade de observância máxima da
formalização dos atos para:
evitar ou reduzir riscos, como eventual
interpretação de que, por exemplo, o contato
com as testemunhas constitui uma forma de
intimidação (ameaça, coação no curso do
processo etc.);
garantir a produção efetiva de elementos, com
todos os cuidados e seguindo as diretrizes
recomendadas;
facilitar a organização dos autos e,
principalmente, a futura utilização dos
resultados da investigação defensiva.
Nada impede que o Advogado forme os autos da
investigação criminal defensiva em meio eletrônico,
digitalizando os documentos e armazenando os arquivos.
Também é possível formar os autos físicos e, como
cópia de segurança, armazenar os documentos
digitalizados.
A utilização dos autos físicos ou eletrônicos para a
documentação da investigação criminal defensiva
também pode considerar qual é o formato dos autos
oficiais e de que maneira, do ponto de vista operacional,
será melhor o armazenamento para futura juntada dos
resultados.

23. Termo de instauração

O início da investigação criminal defensiva ocorre


com sua instauração, mediante termo. Trata-se de um
documento inicial importante, porquanto qualquer
procedimento – público ou particular – não poderá
começar diretamente por relatórios, juntadas de
documentos ou diligências. Deve-se ter um ato formal de
instauração, com a delimitação do objeto e dos sujeitos
envolvidos.
Para uma melhor compreensão, recomenda-se
utilizar como base o art. 4º da Resolução n. 181, de 7 de
agosto de 2017, do Conselho Nacional do Ministério
Público (CNMP), que aborda a forma de instauração do
procedimento investigatório criminal (PIC):
Art. 4º O procedimento investigatório criminal
será instaurado por portaria fundamentada,
devidamente registrada e autuada, com a
indicação dos fatos a serem investigados e
deverá conter, sempre que possível, o nome e a
qualificação do autor da representação e a
determinação das diligências iniciais.

Por esse dispositivo, a portaria deve ser:


fundamentada;
registrada;
autuada.
Também precisa indicar os fatos a serem
investigados. Se possível, deve conter o nome e a
qualificação do autor da representação e a determinação
das diligências iniciais.
Trazendo esses critérios para a Advocacia,
recomenda-se que o documento de instauração da
investigação defensiva seja fundamentado,
especialmente no princípio da ampla defesa. Após a
instauração, deve ser autuado, inserindo-o na pasta que
servirá de capa. Para formalizar o procedimento, também
é recomendável comunicar a instauração da investigação
à Ordem dos Advogados do Brasil, minorando os riscos
de que os atos do Advogado pareçam uma tentativa de
interferir ilicitamente na investigação oficial.
De modo geral, o documento de instauração
mencionará os fatos investigados (aqueles apurados no
inquérito policial ou no processo), contendo também os
dados do cliente e de outras pessoas envolvidas (outros
suspeitos, investigados ou réus). No ato da instauração,
também é recomendável inserir os próximos passos, isto
é, as diligências que serão realizadas inicialmente.
Quanto a quem deve elaborar/assinar o termo de
instauração, é inegável que, como a investigação
criminal defensiva é ato privativo da Advocacia, deve ser
o Advogado que preside e conduz o procedimento.
Também é aconselhável que seja juntada, com o
termo de instauração, a procuração assinada pelo cliente
(investigado ou réu), demonstrando que não se trata de
investigação defensiva instaurada “de ofício”, mas sim
no exercício da atividade advocatícia, após a devida
concessão de poderes.
Em que pese não exista, até o momento, consenso
sobre qual deve ser o conteúdo da procuração ao
Advogado que instaurará a investigação, entendemos
que não há necessidade de poderes especiais (ao
contrário da procuração para oferecer queixa-crime), por
se tratar de atividade inerente à defesa. Contudo, para
evitar inconvenientes, recomenda-se a previsão da
atribuição do poder de instaurar investigação criminal
defensiva. Portanto, não seria obrigatório, mas apenas
recomendável.
Dessa forma, na procuração, recomenda-se o
acréscimo de um trecho com os seguintes termos:
O cliente outorga poderes, inclusive, para a
instauração e condução de uma investigação
criminal defensiva, conforme autorizado pelo
Provimento n. 188/2018 do Conselho Federal da
OAB e, com essa finalidade, tomar depoimento
de testemunhas, produzir perícias e realizar
outras diligências necessárias.

Quanto ao termo de instauração, sugere-se a


seguinte estrutura:
uma numeração única e renovada anualmente;
os fundamentos (“considerando que…”);
a qualificação do cliente e, se possível, a da
vítima, que pode ser encontrada nos autos da
investigação oficial;
as informações relativas ao crime
investigado/imputado, como a tipificação legal,
a data, o horário e o local de sua suposta
prática;
as informações relativas à instauração da
investigação defensiva, como a data, o horário
e o local do seu início;
as diligências iniciais.

Uma observação pertinente quanto à


fundamentação do ato de instauração é feita por Bulhões
(2019, p. 134-135):
Quanto à Portaria ou Termo de Instauração, há
como estruturar o documento em vários
‘CONSIDERANDOS’, narrando os fundamentos
que legitimam a atuação do profissional e ainda
as circunstâncias que ensejaram a investigação
defensiva, seguido da justificativa pela qual se
‘RESOLVE’ instaurar o Autos de Investigação
Defensiva (AID).

A inserção da fundamentação inicial com inúmeros


“considerando que…” é muito frequente na instauração
dos inquéritos civis públicos e dos procedimentos
investigatórios criminais.
Vejamos um exemplo desse trecho inicial do termo
de instauração de uma investigação criminal defensiva:
Considerando que a Constituição Federal
garante a ampla defesa, com os meios e
recursos a ela inerentes (art. 5º, LV, da
Constituição Federal);
Considerando que o Provimento n. 188/2018 do
Conselho Federal da OAB autoriza e
regulamenta a investigação criminal defensiva;
Considerando que a autoridade policial trata
como discricionariedade os requerimentos da
defesa (art. 14 do CPP);
Considerando que o Ministério Público, parte
interessada em promover a denúncia, exerce o
controle externo da autoridade policial (art. 129,
VII, da Constituição Federal), o que viola a
paridade de armas;
Considerando que está em andamento o
inquérito policial número ____, em ____, tendo o
constituinte como investigado;
Considerando que, conforme o sobredito
inquérito policial, há uma produção de
elementos informativos unicamente em favor da
versão acusatória, desconsiderando a linha
defensiva;
Considerando que é função do Advogado tutelar
os direitos e interesses de seu cliente;
Considerando a necessidade de desconstituir a
narrativa acusatória.

Salienta-se, por oportuno, que esses fundamentos


podem ser utilizados, com as devidas adequações, na
petição de juntada dos resultados da investigação
defensiva aos autos oficiais (inquérito policial ou
processo penal).
Após os “considerandos”, adiciona-se o trecho
relativo ao ato de instauração da investigação defensiva,
com algumas informações importantes, além do trecho
“resolve instaurar a presente investigação criminal
defensiva”.
Como exemplo do trecho completo, temos o
seguinte:
No dia ____, às ____ horas, na cidade de ____, o
Advogado ____, regularmente inscrito na
OAB/____ sob o n. ____, (qualificação do
Advogado), resolve instaurar a presente
investigação criminal defensiva em favor de
____, (qualificação do cliente), em razão da
tramitação do inquérito policial n. ____, em
andamento na cidade de ____, por suposta
prática do crime de ____ (art. ____ do Código
Penal), no dia ____, às ____ horas, em ____,
contra ____, (qualificação da vítima).

Também deve inserir no termo de instauração da


investigação defensiva as diligências ou medidas iniciais.
Normalmente, instaura-se o procedimento tendo um
panorama das primeiras atividades que serão
desenvolvidas (oitivas, perícias, atividades de campo
etc.). Instaurar uma investigação sem saber quais serão
os primeiros atos pode demonstrar que o Advogado está
perdido quanto às estratégias ou que deu início à
investigação apenas como forma de transmitir a
aparência de uma atuação artesanal.
Sugere-se a inserção de um trecho nos seguintes
moldes:
“De início, devem ser tomadas as seguintes
providências”;
“De início, resolve apurar os seguintes fatos”;
“De início, resolve diligenciar no seguinte
sentido”.
É imperativo perceber que esse primeiro momento
tem relevância para reunir o máximo possível de
elementos que contribuam para a definição da estratégia
e dos próximos passos. Conforme Oliveira (2008, p. 60),
deve-se adquirir e reunir as informações que ainda
estejam dispersas.
Em seguida, deve-se apresentar um rol das
diligências, como:
a) fazer contato telefônico com ____, a fim de
obter informações sobre ____;
b) diligenciar na busca por gravações
audiovisuais no local do fato;
c) obter o endereço da testemunha ____ para,
em seguida, tomar o seu depoimento;
d) entrar em contato com as pessoas que
moram no quarteirão do local em que teria
acontecido o crime.

A escolha das diligências iniciais dependerá do


crime investigado, do panorama apresentado até o
momento da instauração e das informações obtidas por
meio da análise dos autos oficiais e do atendimento ao
cliente.
Após a elaboração do termo de instauração, o
Advogado deverá inseri-lo nos autos, comunicar à OAB e
ter como foco a realização das diligências já definidas e a
avaliação sobre o cabimento de novas diligências.

24. Capa

A capa é a primeira parte visível dos autos da


investigação criminal defensiva. Por mais que ela pareça
desnecessária, observa-se grande relevância para a
organização da atuação do Advogado.
Quando começa a conduzir investigações
defensivas, o Advogado deve pensar a longo prazo,
organizando os autos de modo semelhante ao cartório de
uma vara judicial.
Depois de alguns anos, talvez o Advogado tenha
dezenas de autos de investigações criminais defensivas.
Com a organização correta, será possível revisar e
revisitar os autos de uma investigação já encerrada há
alguns meses ou anos. Para tanto, as informações da
capa terão muita importância.
A capa deve ser elaborada após a instauração da
investigação defensiva, no momento de fazer a
autuação. Deverá conter as informações necessárias,
evitando omissões e, principalmente, excesso de
informações. Afinal, a capa deve ser didática e facilitar a
organização.
O melhor parâmetro para a capa dos autos de uma
investigação criminal defensiva é a capa de um processo
judicial físico, que apresenta informações simples e
objetivas sobre a natureza da ação, o crime, a
competência, os nomes das partes e uma numeração
identificadora.
Sugere-se, inicialmente, a aquisição de capas
padronizadas ou personalizadas, inclusive com o logotipo
do escritório. Urge destacar que a capa não será levada
aos autos oficiais, mas apenas algumas partes do
conteúdo dos autos. Por esse motivo, a “formalidade” da
capa deve considerar apenas a didática das informações,
evitando pontos burocráticos irrelevantes.
As informações que a capa pode conter não são
impositivas. Apenas é recomendável que apresente
determinadas informações, como:
área de atuação referente à investigação. Aqui,
estamos abordando a área criminal, mas não
podemos desconsiderar que é possível
conduzir investigações em outras searas, como
muitos Advogados fazem no Direito de Família.
No Poder Judiciário, observamos que, quanto
aos autos físicos, as cores das capas são
diferentes (rosa ou azul, por exemplo)
dependendo da área, havendo, ainda, uma
etiqueta que diz “Criminal”, “Cível” ou outra
área;
a cidade que sedia o escritório condutor da
investigação criminal defensiva. Como regra, a
investigação tramitará em um escritório que
fica localizado na mesma cidade em que o fato
é investigado em um inquérito policial ou
processo penal. Entretanto, há casos em que o
escritório é contratado para atuar em um
inquérito ou processo de outra cidade. Nessa
situação, sugere-se a inclusão de um trecho
como “investigação defensiva instaurada na
cidade de Porto Alegre, sobre inquérito que
tramita na cidade de Canoas” ou “investigação
defensiva instaurada na cidade de Porto Alegre,
sobre fato ocorrido na cidade de Canoas”.
Assim, havendo algo a ser feito na cidade do
fato (uma audiência em outro processo, por
exemplo), o Advogado poderá olhar as capas
das investigações defensivas e conferir se há
alguma diligência a ser feita naquele local
(tomar o depoimento de uma testemunha,
pesquisar um endereço etc.), aproveitando a
viagem para levar tudo que for necessário
(gravador, câmera, pen drive, documentos
etc.);
a numeração da investigação defensiva. Da
mesma forma que inquéritos policiais e
processos são individualizados por uma
numeração única, também se deve identificar a
investigação criminal defensiva. Sugere-se, por
exemplo, a utilização das expressões AID
(autos de investigação defensiva) ou ICD
(investigação criminal defensiva) e a inclusão
do número e do ano de instauração, de modo
que, a cada ano, o número recomece a
contagem a partir de 1. Ex.: AID n. 1/2019, AID
n. 2/2019 e ICD n. 1/2020;
a identificação do Advogado que instaurou a
investigação defensiva. Nos processos
criminais, observamos nas capas a informação
“1ª Vara Criminal da Comarca de ____”. Não há
referência ao nome do Juiz, que pode mudar
por vários fatores (férias, licença, remoção e
promoção). Por outro lado, na investigação
criminal defensiva, sugere-se a inserção do
nome do Advogado, do seu número de
inscrição na OAB, do nome do escritório e o
número da inscrição da sociedade de
Advogados na OAB. Ex.: Advogado, OAB/RS n.
____, atuante no escritório ____, OAB/RS n. ____;
a data da instauração da investigação
defensiva. Essa informação poderia ser
considerada desnecessária, haja vista que a
identificação dos autos (AID) já menciona o ano
de instauração. Entrementes, em casos
considerados urgentes, é importante saber, por
uma mera análise na capa, qual foi o dia exato
da instauração da investigação. Por isso,
poderia inserir, por exemplo, “data da
instauração: 5 de julho de 2020”;
a infração penal imputada. Essa informação
aparece nas capas de inquéritos e processos,
fazendo com que, por mais curta que seja,
transmita um conjunto de conceitos prévios
sobre o fato (complexidade, principais teses
etc.) e a forma de condução (diligências mais
utilizadas, forma de provar as alegações, linhas
investigativas etc.). Na capa da investigação
criminal defensiva, pode-se adicionar apenas o
tipo penal e, entre parênteses, o nomen juris.
Ex.: art. 157 do CP (roubo);
a identificação de que se trata de investigado
ou réu preso cautelarmente (prisão temporária
ou preventiva). Essa informação, também
utilizada nos autos físicos de processos
criminais, tem o escopo de chamar a atenção
quanto à celeridade do feito e da constante
necessidade de reavaliar a manutenção da
prisão cautelar.

Esses seriam os principais dados da capa. Havendo


alguma peculiaridade do caso concreto, pode-se inserir
outra informação, desde que não se desconsidere que o
objetivo da capa é organizar os dados principais e ser
didática para facilitar uma rápida compreensão sobre a
investigação.

25. Comunicação à OAB

Em razão da falta de regulamentação legislativa e


considerando a insuficiência do Provimento n. 188/2018
do Conselho Federal da OAB – que apenas autoriza a
investigação e regulamenta a responsabilidade do
Advogado –, precisamos ter cuidado na condução da
investigação criminal defensiva, sobretudo porque, como
sabemos, a Advocacia Criminal é diariamente
criminalizada.
Nos noticiários, já observamos casos em que
Advogados foram presos por instruírem o cliente a não
fechar a colaboração premiada. Há casos em que o
Advogado, mesmo exercendo a função dentro dos limites
legais, foi investigado por supostamente integrar
organização criminosa. Portanto, exige-se uma atuação
cuidadosa.
No âmbito da investigação criminal defensiva, o
Advogado exerce uma postura ativa, pouco usual, na
busca de provas que favoreçam o seu cliente. Como
ainda não é uma prática muito comum, devemos estar
preparados para eventuais represálias pelas autoridades
que atuam na persecução penal.
Alguns atos da investigação defensiva, como a
inquirição de uma testemunha, podem ser vistos como
uma forma de ameaçar/coagir as pessoas envolvidas ou
criar obstáculos para a investigação oficial. Se esses atos
forem desenvolvidos de modo informal, sem meios de
comprovar que se trata de um procedimento que poderá
ser levado para os autos oficiais, o Advogado correrá
graves riscos.
Para evitar/reduzir os riscos, não basta criar uma
pasta no escritório, com capa e autuação. Deve-se
demonstrar, por meios formais, que houve a instauração
da investigação defensiva e que todas as diligências
realizadas no seu bojo têm o escopo de subsidiar o
inquérito policial ou processo.
Para tanto, após definir qual será o foco da
investigação defensiva, recomenda-se a comunicação de
sua instauração à OAB, inclusive juntando cópia do
protocolo e de eventual resposta da instituição nos autos
da investigação.
Nesse caso, o Advogado terá a possibilidade de,
após ser intimado por alguma autoridade, apresentar as
cópias dos documentos que comprovam a comunicação à
OAB sobre a instauração da investigação defensiva.
É possível que, após o Advogado convidar
determinada pessoa para prestar um depoimento, ela
procure a Polícia ou o Ministério Público, acreditando que
se trata de uma tentativa de intimidação.
Caso o Advogado precise se manifestar para a OAB,
o Ministério Público ou a Polícia, poderá informar que o
convite à testemunha teve a finalidade de tomar seu
depoimento, conforme permite o Provimento n. 188/2018
do Conselho Federal da OAB, nos autos da investigação
defensiva n. ____, do ano ____, que teve a instauração
devidamente comunicada à OAB.
Em que pese não exista previsão da obrigatoriedade
de comunicação à OAB, esse ato poderá gerar mais
segurança para o Advogado, que conduzirá um
procedimento formal.
Não há previsão sobre qual deve ser o
endereçamento, ou seja, se seria para a Subseção ou a
Seccional da OAB, tampouco se deveria ser encaminhada
ao presidente ou a outro membro da diretoria.
Acreditamos que, salvo disposição em sentido
contrário, a comunicação deve ser feita à Seccional da
OAB, que é quem se manifesta sobre aspectos
burocráticos (constituição de sociedades, alterações
contratuais etc.) e onde está inserido o Tribunal de Ética
e Disciplina (TED), que avaliará eventuais excessos ou
infrações disciplinares.
De qualquer forma, para evitar erros, recomenda-se
o contato prévio com a OAB, indagando para quem
encaminhar a referida comunicação, que, como é sabido,
não demandará atos posteriores da instituição, mas
apenas a confirmação da cientificação do seu teor.
Esperamos que, futuramente, com a adesão da
investigação defensiva na prática forense, seja feita uma
regulamentação nacional específica sobre a
comunicação.
Como já referido, após a comunicação, guarde a
cópia com o protocolo, bem como eventual despacho do
responsável da OAB dando ciência sobre a instauração.
Se preferir, junte aos autos da investigação defensiva.
Trata-se de uma garantia contra eventuais alegações –
principalmente pelas autoridades – de que o Advogado
entrou em contato com as testemunhas de forma
indevida e/ou criminosa.
Sobre o teor da comunicação à OAB, vejamos um
exemplo:
Ilustríssimo senhor Presidente da Seccional da
OAB do Estado do ____
NOME, Advogado inscrito na OAB sob o n. ____,
com endereço profissional na Rua ____, na
cidade de ____, vem, à presença de Vossa
Senhoria, comunicar que instaurou investigação
criminal defensiva sob o n. ____/____, para
fundamentar sua atuação em prol de NOME, no
processo n. ____, que tramita na ____ª Vara
Criminal da Comarca de ____.
Assim, comunica à OAB para a devida
formalização da tramitação da investigação
defensiva, conforme permite o Provimento n.
188/2018 do Conselho Federal da OAB, que
regulamenta essa forma de atuação, valendo o
presente como garantia de que, de fato, tramita
um procedimento instaurado por este Advogado,
com o desiderato de realizar todas as diligências
necessárias ao exercício da ampla defesa,
dentro dos limites éticos e legais, incluindo a
tomada de declarações de testemunhas e a
realização de perícias.

Trata-se de um exemplo simples, sem


fundamentação exaustiva, considerando que inexiste
regulamentação sobre a forma e o teor dessa
comunicação. Se preferir, o Advogado poderá
acrescentar outras informações que entender
importantes e anexar a cópia da procuração assinada
pelo seu cliente.
Conquanto a comunicação não seja obrigatória – por
falta de previsão –, a medida é recomendável para
formalizar a investigação, atribuir um caráter de
seriedade e resguardar o Advogado durante sua atuação.
Preencher determinadas formalidades pode ser crucial
para evitar preocupações desnecessárias.
Sempre que possível, converse com outros
membros da OAB que já tenham instaurado/conduzido
investigação criminal defensiva ou que participem de
grupos de debates sobre o tema para que você conheça
as formalidades que estão cumprindo. Da mesma forma
que os inquéritos policiais são conduzidos de formas
distintas em locais diferentes, é possível que, por falta de
uma regulamentação exaustiva, cada Estado tenha
certas peculiaridades quanto à investigação criminal
defensiva. Pode ser, por exemplo, que se adote como
prática a comunicação à OAB sobre a conclusão da
referida investigação.

26. Rit(m)o e andamento

Para que a investigação criminal defensiva seja


produtiva, é crucial definir adequadamente o seu ritmo.
Deve-se adotar um ritmo semelhante ao proposto
pela duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, da
Constituição Federal), ou seja:
não pode ter um ritmo lento que atrase a
utilização dos seus resultados nos autos
oficiais;
não pode ter um ritmo afobado que atrapalhe
as diligências.
Logo, o ritmo deve ser aquele que produza os
resultados necessários no momento adequado.
Se a condução da investigação criminal defensiva
for muito lenta, o Advogado perderá a oportunidade de
juntar os seus resultados ao inquérito policial, quando
seria possível tentar o arquivamento ou o trancamento
do procedimento inquisitorial. Se descuidar, o prazo da
resposta à acusação – um dos momentos para a juntada
dos resultados da investigação defensiva – será
ultrapassado.
Nos processos de réus presos, a celeridade imposta
pelas autoridades pode fazer com que o Advogado
precise acelerar o ritmo da investigação defensiva para
aproveitar seus resultados antes do fim da instrução. O
mesmo acontece nos inquéritos policiais com
investigados presos, quando, para evitar o excesso de
prazo e o consequente relaxamento da prisão preventiva,
normalmente o prazo legal para a conclusão é
observado.
A defesa também deverá ser célere na investigação
defensiva caso o objetivo seja fundamentar a
manifestação contra uma prisão cautelar (relaxamento,
revogação ou substituição por medida cautelar diversa
da prisão). Combater uma prisão ilegal, absurda ou
desnecessária é a prioridade defensiva. Afinal, o
sofrimento no cárcere é terrificante. Em sábias palavras,
Carnelutti (2009, p. 24) explicou que “há os que
concebem o pobre com a figura do faminto, outros com a
do vagabundo, outros com a do enfermo; para mim, o
mais pobre de todos os pobres é o preso, o encarcerado.”
Entendemos que o mais importante, dependendo da
necessidade de rapidez, é que a investigação defensiva
seja feita, ainda que não perfeita. Preferimos que os
resultados da investigação sejam utilizados nos
momentos adequados – ainda que sem a pretensão de
perfeição – a aguardar que ela seja perfeita, mas nunca
utilizada.
Vale o mesmo raciocínio de Carnelutti (2009, p. 97)
quanto ao fim do processo:
Entretanto, ao chegar a um certo ponto, é
necessário terminar. O processo não pode durar
eternamente. É um final por esgotamento, não
por obtenção do objeto. Um final que se
assemelha mais à morte que ao cumprimento. É
necessário contentar-se. É necessário resignar-
se.

Para atribuir a celeridade necessária – a duração


razoável da investigação criminal defensiva –, alguns
pequenos atos podem contribuir, ainda que como fatores
de autoconstrangimento. Cita-se, por exemplo, a
inserção da data de instauração na capa da investigação
e a definição, no termo de instauração, de diligências
que devem ser realizadas logo no início.
Também pode funcionar como fator de
impulsionamento da investigação defensiva a inserção
de informações sobre a movimentação do inquérito
policial ou do processo penal. Se a denúncia tiver sido
oferecida recentemente, é provável que o Juiz a receba e
determine a citação em pouco tempo, abrindo o prazo
para a resposta à acusação, momento em que é possível
– e talvez recomendável – juntar os resultados da
investigação. Se a última movimentação do processo
tiver sido a designação da audiência de instrução e
julgamento para a próxima semana (algo frequente em
caso de réu preso), há muitas chances de que a instrução
termine rapidamente, de modo que seria encerrada a
oportunidade de juntar os resultados da investigação
defensiva com o desiderato de influenciar a sentença.
Portanto, deve-se conciliar o momento da persecução
penal e o ritmo da investigação defensiva. Para sempre
se lembrar disso, recomenda-se a inserção da última
movimentação processual nos autos da investigação
defensiva.
Com base em Bulhões (2019, p. 76):
Portanto, a investigação defensiva pode ser
realizada a qualquer tempo, desde que
solicitada pelo constituinte ou seja uma
sugestão do advogado acatada pelo cliente. Por
essa lógica, pode-se falar ainda que não há
duração máxima fixada para a investigação
defensiva, devendo ela perdurar enquanto
houver necessidade de resguardo dos interesses
processuais e/ou legais para o qual foi o
advogado contratado.

É sabido que o Advogado não precisa concluir a


investigação defensiva no mesmo momento da
conclusão do inquérito policial, mas sim no momento
definido como estratégico para a juntada dos resultados
nos autos oficiais. Também poderá, como falaremos
adiante, utilizar os resultados da investigação
parcialmente, conforme eles sejam obtidos,
independentemente da conclusão do procedimento
instaurado pelo Advogado.
A fim de evitar o indeferimento da juntada dos
resultados da investigação, é aconselhável adotar como
estratégia a juntada durante o inquérito ou a instrução,
evitando que se entre na divergência sobre ser ou não
possível a juntada em grau recursal.
Por derradeiro, devemos conciliar a duração
razoável da investigação defensiva com a ideia de que
esse procedimento não deve ser estanque e estagnado
após a utilização dos resultados. É possível – e até
recomendável – que a investigação seja contínua,
permanecendo à disposição do Advogado enquanto for
necessária. Noutros termos, a utilização de alguns
resultados da investigação defensiva não a encerra,
porque é plenamente possível que se prolonge durante
todo o processo judicial, inclusive se estendendo à
execução da pena ou ao ajuizamento da revisão criminal.

27. A divisão da diligência em partes

Havendo a chance de utilização parcial dos autos da


investigação defensiva, com a desconsideração de
alguns/muitos trechos e páginas, deve-se ter enorme
cuidado na condução da investigação e na produção dos
documentos que serão juntados.
Imaginemos a seguinte situação: para provar
determinado fato, o Advogado contrata um especialista
em determinada área, que terá a função de realizar uma
perícia. Em termos práticos, o Advogado apresentará os
quesitos que deverão ser respondidos pelo perito ou que
serão utilizados como parâmetro para que o profissional
dirija o seu trabalho e forneça conclusões acerca do fato.
A perícia constituirá um único documento, com
numeração de cada página e, normalmente, com uma
sequência de quesitos e conclusões. Ao contratar a
perícia, o Advogado não terá a garantia de que as
conclusões serão integralmente favoráveis à defesa. É
possível que a resposta a algum quesito prejudique a
versão defensiva.
Nesse diapasão, é cediço que o Advogado não
poderá juntar aos autos oficiais apenas uma parte da
perícia. Também não poderá juntar trechos, selecionar
folhas (apenas as folhas 1 a 4 e 7 a 9 do laudo pericial,
por exemplo) ou rasurar o laudo para omitir as partes
que prejudiquem a defesa.
Ademais, também é evidente que o Advogado, na
condução de uma investigação defensiva, deverá ter
ciência do direito que o investigado/réu tem de não se
autoincriminar, o que deve ser observado pela defesa
técnica quanto à juntada de documentos e
manifestações.
Assim, surge um problema: se um documento – v.
g., o laudo pericial – tiver partes favoráveis e contrárias
aos objetivos da defesa, o que o Advogado deve fazer?
Juntar o laudo em sua integralidade, prejudicando o
acusado? Deixar de juntar o documento, abrindo mão
das partes favoráveis?
Entendemos que a solução deve ser buscada antes
da realização da perícia ou de qualquer outra diligência.
A recomendação é realizar a cisão das diligências desde
o início, dividindo-as em várias partes.
Desse modo, caso o Advogado preveja a
possibilidade de uma parte das diligências ser prejudicial
ao cliente, deve-se realizar uma cisão em vários atos. Se
uma perícia puder gerar respostas prejudiciais à defesa,
é recomendável solicitar mais de um laudo pericial.
Dependendo do caso, seria possível solicitar que cada
laudo abordasse poucos quesitos ou pontos,
possibilitando que a defesa utilize apenas aqueles que
lhe forem favoráveis, deixando de juntar aos autos
oficiais os outros laudos.
Se possível, o ideal seria debater com o perito
contratado sobre as várias questões que serão
abordadas na perícia, inclusive mencionando o objetivo
de juntar aos autos apenas pontos favoráveis. Dessa
forma, o perito poderá sugerir a inclusão ou o descarte
de quesitos.
Evidentemente, o Advogado jamais deverá solicitar
ou determinar que o perito apresente informações
inverídicas no seu laudo, tampouco que forneça
conclusões com as quais não concorde. Trata-se apenas
de realizar uma cisão da perícia em quantos laudos
forem necessários e, se for o caso, incluir ou excluir
quesitos e matérias que serão objeto da perícia.
A cisão das diligências também pode ser útil quanto
à tomada de depoimentos de testemunhas. Existindo a
possibilidade de que uma testemunha fale alguns pontos
favoráveis e outros desfavoráveis à defesa, o ideal seria
fazer mais de uma inquirição.
Dessa forma, em um primeiro depoimento, o
Advogado realizaria a inquirição com perguntas que, de
acordo com a previsão do Advogado, produzirão
respostas favoráveis, como aquelas sobre conduta social
do cliente, como se fosse apenas uma testemunha
abonatória.
Havendo a possibilidade de que essa testemunha
fale sobre autoria ou materialidade, mas havendo o risco
de obter respostas desfavoráveis, o Advogado poderia
ouvi-la em outra oportunidade, com outro registro em
meio audiovisual ou por termo.
Assim, se o segundo depoimento for contrário aos
interesses do cliente, o Advogado poderá utilizar apenas
o primeiro depoimento, como se a testemunha fosse
apenas abonatória.
Portanto, para evitar a juntada aos autos oficiais de
documentos que sejam desfavoráveis ao cliente e para
não descartar documentos que tenham partes
favoráveis, sugere-se a realização das diligências em
várias partes.
Por outro lado, teria pouca credibilidade a juntada
de apenas algumas folhas de algum documento (apenas
duas ou três folhas de um laudo que tem oito páginas,
por exemplo). Logo, recomenda-se a cisão no momento
de realização das diligências, e não quando os
documentos forem juntados.
Não precisaria ser dito, mas, apenas para reforçar,
salientamos que seria antiética e, dependendo do caso,
criminosa a conduta consistente em rasurar ou falsificar
documentos, assim como a inserção de informações que
não reflitam a realidade (v. g., inserir palavras que não
foram ditas pela testemunha).

28. Ordem de serviço

As ordens de serviço são muito comuns em


investigações policiais. Frequentemente, na portaria de
instauração do inquérito, os Delegados inserem
diligências a serem realizadas pelos policiais. Também é
frequente a determinação de ordens de serviço em fases
mais avançadas da investigação, a partir de alguma
necessidade que tenha surgido, como, por exemplo, para
subsidiar uma representação que tenha como objetivo
uma busca e apreensão.
Em alguns casos, antes de representar ao Juiz pela
busca e apreensão, o Delegado de Polícia, por uma
ordem de serviço, determina que os agentes policiais se
desloquem até o local e monitorem se o investigado
utiliza o imóvel, quanto tempo normalmente fica lá e
outras informações que facilitem a futura busca. A partir
de uma diligência mais simples, fundamenta-se o pedido
de uma diligência mais complexa.
Assim, o cumprimento de uma diligência pode:
por si só, trazer informações;
auxiliar na decisão sobre quais devem ser as
próximas diligências;
fundamentar o pedido de alguma diligência no
inquérito ou no processo.
No desenvolvimento da investigação criminal
defensiva, o Advogado poderá atuar pessoalmente ou
por meio de colaboradores, como outros Advogados,
peritos, contadores, estagiários, funcionários
administrativos do escritório ou qualquer outra pessoa
que execute as tarefas relacionadas à investigação.
Considerando que a investigação defensiva poderá
demandar uma delegação de tarefas aos colaboradores,
a ordem de serviço terá a finalidade de organizar essa
distribuição.
Na ordem de serviço, o Advogado que instaura e
preside a investigação criminal defensiva formaliza e
define as diligências que devem ser realizadas,
especificando quem cumprirá a ordem e qual será o
prazo para essa finalidade.
Conforme sugere a nomenclatura, a ordem de
serviço é uma determinação para que alguém faça algo.
Deve-se ter coerência para que, havendo necessidade, a
ordem seja dada a quem tenha o conhecimento ou as
habilidades para o serviço delegado. Caso não exija
conhecimentos específicos (tirar fotografias de um local,
sem finalidade pericial), a delegação pode ser feita a
qualquer pessoa, como outro Advogado do escritório, um
estagiário, um fotógrafo ou um prestador de serviço
externo.
Aliás, caso precise encontrar o profissional com o
conhecimento especializado para determinada diligência,
pode-se formalizar uma ordem de serviço direcionada a
alguém do escritório para que pesquise profissionais que
tenham a habilidade exigida. Teria, por exemplo, um
trecho afirmando: “determino a realização de perícia
contábil para analisar se houve supressão de tributos e,
para tanto, determino ao Advogado X que pesquise
contadores com experiência em ____”.
Nessa situação, será necessário pesquisar
profissionais na área exigida, fazer orçamentos e decidir
quem será o profissional contratado.
No exemplo acima, havendo necessidade de revisar
determinados registros contábeis, deve-se delimitar o
período, quais são os tributos (de acordo com a
persecução penal) e o que se pretende provar por meio
dessa diligência. Essa delimitação do objeto é importante
para procurar o profissional adequado ao serviço e para
obter um orçamento, assim como para a própria revisão
dos registros. Aliás, para demonstrar a seriedade da
diligência, recomenda-se informar ao profissional
contratado que aquilo que será elaborado por ele poderá
ser juntado em um processo criminal e que, havendo
necessidade, ele será arrolado como testemunha.
Em que pese a ordem de serviço não seja uma
imposição ou um documento imprescindível, recomenda-
se a sua utilização.
Por mais que pareça dispensável – e talvez tolo –
inserir na investigação defensiva uma ordem de serviço
para que um funcionário do escritório obtenha
orçamentos e contrate um profissional externo ou para
que o estagiário pesquise determinadas certidões na
internet, trata-se de uma formalidade que pode ser
relevante para a delegação das atividades. Portanto, não
se trata de mera burocracia despropositada e irrefletida.
A documentação das delegações de atos por meio
da ordem de serviço faz com que a atividade seja levada
a sério, atribuindo um caráter de importância. Uma
ordem oral, de modo informal, parece ter pouca
urgência, especialmente em um escritório com uma
grande estrutura e inúmeras demandas. Todavia, a
mesma ordem, entregue por escrito, com a assinatura de
quem delegou o ato e a confirmação – também por
assinatura – de quem a recebeu, contendo um prazo para
seu cumprimento, tem maior respeitabilidade e até
sisudez.
Outrossim, a documentação por escrito, com a
assinatura de quem recebeu a delegação, de modo símil
a uma intimação, passa a ter o atributo da exigibilidade.
Com o devido reconhecimento da importância e das
vantagens da ordem de serviço, o próximo passo é
entender sua estrutura, isto é, quais informações devem
compor esse documento.
A primeira informação consiste na individualização
do ato, por meio de uma numeração única (OS n. 1/2020,
por exemplo), assim como a numeração dos autos da
investigação criminal defensiva (AID n. 2/2020, por
exemplo). Se for o caso, a numeração da ordem de
serviço pode conter a numeração da investigação
defensiva, ficando, por exemplo, assim: OS n. 1/2/2020.
Nesse caso, seria a ordem de serviço 1 da investigação
defensiva 2 do ano de 2020.
Em seguida, deve-se inserir a descrição da
diligência a ser realizada. Por razões óbvias, essa é a
parte mais importante, exigindo detalhamento sobre o
que deve ser feito, como e com qual finalidade.
As finalidades podem ser procurar o endereço de
alguém, tirar fotos de um local, vigiar a movimentação
de uma pessoa, analisar documentos etc.
Na ordem de serviço, também deve constar o nome
do profissional que deverá cumprir a tarefa, assim como
a sua qualificação e, se for o caso, o endereço
profissional, além do número de registro no órgão de
classe competente. Tratando-se de um funcionário do
escritório, a qualificação poderá ser resumida, como
“será cumprida por Fulano, estagiário deste escritório”.
Quando a tarefa incumbir a um profissional
especializado, a qualificação poderá mencionar títulos
acadêmicos e cursos frequentados.
Outro ponto de enorme importância – sobretudo
prática – é a previsão de um prazo para a conclusão da
diligência e, se for o caso, a apresentação de relatório
pormenorizado dos meios utilizados e resultados obtidos.
A definição de prazos evita o acúmulo de diligências
pendentes e demonstra a formalidade do ato. O prazo
pode variar de 24 horas (tarefas simples) a algumas
semanas (elaboração de laudos, pesquisas complexas
etc.).
Na estrutura da ordem de serviço, Bulhões (2019, p.
140) também sugere “as recomendações expressas no
sentido de assegurar a legalidade e constitucionalidade
da diligência, em especial nos direitos e garantias de
terceiros”.
Sugere-se, portanto, a especificação de algumas
proibições, principalmente aquelas que podem
caracterizar crimes, o que pode ser fundamental quando
a diligência for praticada por alguém sem conhecimento
jurídico.
Após o cumprimento da ordem de serviço e a
juntada da diligência realizada nos autos da investigação
criminal defensiva, recomenda-se a elaboração de um
relatório que aborde a utilidade dos respectivos
resultados.

29. Auto de descrição de local

Em algumas situações, a descrição de um local


pode ser muito relevante para a construção de uma tese
defensiva ou, no mínimo, para contextualizar o fato.
Nas lições de Oliveira (2008, p. 76-77):
Sem embargo, para uma completa averiguação
circunstancial do crime, sobretudo naqueles
onde a actuação humana não se resuma a
meios documentais, a observação e o
conhecimento das características dos locais
onde aquela actuação se desenrolou é
fundamental quer à compreensão do que se terá
passado quer à solução do crime.

Há casos em que a descrição do local será parte


integrante da perícia e do respectivo laudo. Em outros, a
descrição terá utilidade por si só, servindo, por exemplo,
como parâmetro para a análise das teses, da forma de
execução do crime, da autoria e de outros aspectos.
A realização de um auto de descrição de local pode
ter como ponto inicial a sua determinação por meio de
uma ordem de serviço, que deverá apontar a pessoa
responsável pela diligência, o local (indicando endereço,
pontos de referência e outras informações relevantes) e
a finalidade da descrição.
O responsável pela descrição deverá dirigir-se ao
local com os instrumentos e dispositivos necessários
(notebook, celular, câmera etc.) e, após uma observação
inicial, proceder à descrição do local. Caso a descrição
tenha o objetivo de instruir ou compor uma perícia, a
diligência deverá ser feita pelo perito, que é quem tem o
conhecimento especializado acerca dos pontos
relevantes.
Pode-se utilizar como parâmetro o art. 158-B, III, do
Código de Processo Penal, que trata da fixação, uma das
etapas do rastreamento de vestígios na cadeia de
custódia. O referido dispositivo legal informa que a
fixação é a descrição detalhada do vestígio conforme se
encontra no local de crime ou no corpo de delito, e a sua
posição na área de exames, podendo ser ilustrada por
fotografias, filmagens ou croqui, sendo indispensável a
sua descrição no laudo pericial produzido pelo perito
responsável pelo atendimento.
A descrição do local deve ter o máximo de
detalhamento, inclusive anexando imagens do local.
Além de mencionar as informações nitidamente
relevantes para o caso, também deve incluir aquelas
que, no momento, não pareçam importantes.
Também é recomendável detalhar as condições –
especialmente climáticas – do dia da realização da
diligência, o que permitirá uma comparação com o dia do
suposto fato criminoso. Exemplificando, se o fato
referente ao crime de trânsito imputado ao réu tiver
ocorrido em um dia de chuva, recomenda-se que a
descrição seja feita em iguais condições climáticas ou, se
não for possível, que conste no auto de descrição do
local quais eram as condições no dia da diligência.

30. Termo de declarações

Uma das possibilidades na condução de uma


investigação criminal defensiva é tomar declarações de
pessoas, de modo semelhante à produção de uma prova
testemunhal em um processo judicial.
Para entendermos os limites legais e as
formalidades recomendadas, nossa análise deve partir
das regras previstas para a inquirição de testemunhas
por um Juiz.
Sabe-se, por exemplo, que a testemunha fará, sob
palavra de honra, a promessa de dizer a verdade do que
souber e lhe for perguntado (art. 203 do CPP). Ademais, o
Juiz deve advertir as testemunhas das penas cominadas
ao falso testemunho (art. 210 do CPP).
Há previsão de crime de falso testemunho (art. 342
do CP) para a testemunha que fizer afirmação falsa,
negar ou calar a verdade em processo judicial ou
administrativo, inquérito policial ou em juízo arbitral.
Esse crime tem pena de reclusão, de 2 a 4 anos, e multa,
com aumento de um sexto a um terço, se o crime for
praticado mediante suborno ou se cometido com o fim de
obter prova destinada a produzir efeito em processo
penal, ou em processo civil em que seja parte entidade
da administração pública ou indireta.
Contudo, em relação à investigação criminal
defensiva, não há possibilidade de que, em caso de
omissão ou declarações inverídicas, a testemunha seja
responsabilizada criminalmente por falso testemunho.
Observando o art. 342 do CP, nota-se que é
elementar do tipo penal que a declaração seja feita em
processo judicial ou administrativo, inquérito policial ou
em juízo arbitral, o que não abrange a investigação
criminal defensiva, que permanece fora desses
conceitos.
Assim, por inexistir crime de falso testemunho no
que tange às declarações feitas em uma investigação
defensiva, seria incorreto e atécnico exigir o
compromisso da testemunha ou adverti-la sobre o
“dever” de falar a verdade, que, como dito, não existe na
investigação conduzida por Advogado.
Quanto à testemunha de um processo judicial,
também existe previsão legal de que, sendo
regularmente intimada e deixando de comparecer sem
motivo justificado, o Juiz poderá requisitar à autoridade
policial a sua apresentação ou determinar que seja
conduzida por oficial de justiça, que poderá solicitar o
auxílio da força pública (art. 218 do CPP). Na mesma
linha, o art. 219 do CPP afirma que o Juiz poderá aplicar à
testemunha faltosa uma multa, sem prejuízo do processo
penal por crime de desobediência, e condená-la ao
pagamento das custas da diligência.
No âmbito da investigação criminal defensiva, caso
a testemunha, após o convite, não compareça para ser
ouvida, não será cabível a sua condução ou qualquer
outra coerção/sanção. A saída possível seria arrolar essa
pessoa como testemunha no processo criminal, para que
sejam aplicadas as consequências previstas nos arts. 218
e 219 do CPP, se, após ser regularmente intimada, ela
deixar de comparecer sem motivo justificado.
Se quiser, a testemunha poderá ser acompanhada
de um Advogado, especialmente se houver chance de
autoincriminação. Neste caso, o correto é informá-la
sobre o direito de permanecer em silêncio quanto a
eventuais condutas criminosas.
Também é importante formalizar todos os atos e
evitar que pareça ser uma coação no curso do processo
(art. 344 do CP). Para tanto, deve-se ter cuidado em
tudo, do convite até o final do depoimento.
O primeiro passo é convidar a potencial testemunha
para, querendo, comparecer em determinado lugar –
preferencialmente no escritório do Advogado – para
prestar depoimento. A utilização de termos como
“convite” tem a finalidade de evitar que pareça uma
tentativa de intimidação.
Comparecendo a testemunha, deve-se gravar o que
for possível, inclusive o momento imediatamente anterior
ao depoimento, isto é, a explicação sobre o que será feito
no ato.
O depoimento começará com a qualificação,
passando, em seguida, para a cientificação do direito de
ficar em silêncio em relação a eventuais condutas
criminosas que a testemunha tenha praticado.
A inquirição propriamente dita tem início com a
primeira pergunta sobre o fato, normalmente mais
genérica (“o que o senhor sabe sobre tal coisa?”), que
servirá de base para as perguntas seguintes, de acordo
com as respostas obtidas. Ao final, pode-se encerrar o
ato com uma pergunta aberta que oportunize à
testemunha falar sobre pontos ainda não perguntados
(“tem algo mais a falar sobre o caso?”).
Por fim, assina-se um termo de declaração que
tenha algumas informações resumidas, como o fato de
que a testemunha foi convidada e compareceu
voluntariamente, além da possibilidade de que o seu
depoimento seja utilizado em um inquérito ou processo,
bem como a informação de que suas declarações
constam na mídia anexa (normalmente, um DVD).

31. Auto de reconhecimento de pessoa

O art. 6º, VI, do CPP, prevê que, logo que tiver


conhecimento da prática da infração penal, a autoridade
policial deverá proceder a reconhecimento de pessoas.
Por sua vez, o art. 226 do CPP apresenta a
sequências de atos inerentes ao reconhecimento de
pessoa:
Art. 226. Quando houver necessidade de fazer-
se o reconhecimento de pessoa, proceder-se-á
pela seguinte forma:
I - a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento
será convidada a descrever a pessoa que deva
ser reconhecida;
Il - a pessoa, cujo reconhecimento se pretender,
será colocada, se possível, ao lado de outras
que com ela tiverem qualquer semelhança,
convidando-se quem tiver de fazer o
reconhecimento a apontá-la;
III - se houver razão para recear que a pessoa
chamada para o reconhecimento, por efeito de
intimidação ou outra influência, não diga a
verdade em face da pessoa que deve ser
reconhecida, a autoridade providenciará para
que esta não veja aquela;
IV - do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto
pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela
pessoa chamada para proceder ao
reconhecimento e por duas testemunhas
presenciais.

O dispositivo legal supra pode ser utilizado como


parâmetro para o reconhecimento de pessoa na
investigação criminal defensiva, mas devemos observar
que há algumas limitações e dificuldades.
Inicialmente, uma dificuldade facilmente perceptível
consiste na colocação da pessoa a ser reconhecida ao
lado de outras pessoas. Quanto ao réu (contratante do
Advogado que conduz a investigação), não há
dificuldade, mas, em relação aos outros (quem fará o
reconhecimento, especialmente se for a vítima ou
alguma testemunha que tenha relação com ela, bem
como as pessoas que ficarão ao lado do réu), a medida
pode ser tão difícil quanto a obtenção de suas
declarações.
Assim, a etapa que está no inciso II do art. 226 do
CPP será realizada somente se for possível, conforme o
próprio texto legal.
Sugere-se a observância das etapas previstas no
dispositivo processual, começando sempre com a
descrição, passando em seguida para o apontamento da
pessoa reconhecida, que preferencialmente estará ao
lado de outras pessoas semelhantes. A providência
prevista no inciso III dificilmente será necessária, haja
vista que, diferentemente da persecução penal, o
comparecimento para o reconhecimento na investigação
defensiva será facultativo, com base em prévio convite, e
não intimação com possibilidade de condução coercitiva.
Em último caso, não sendo possível fazer o
reconhecimento pessoal ou havendo temor da vítima ou
testemunha quanto à presença do réu, pode-se fazer o
reconhecimento por fotografia, hipótese já aceita pela
jurisprudência em inúmeras oportunidades contra o réu.
Ora, se a jurisprudência aceita a indevida violação da
forma legal para validar o reconhecimento contra o réu,
com mais razão, por uma questão de proporcionalidade,
deve aceitar o reconhecimento por fotografia em favor
do acusado. Nessa hipótese, a fotografia utilizada para o
reconhecimento deve permanecer anexa ao respectivo
auto.
Por derradeiro, o reconhecimento deve ser
formalizado por meio de auto que mencione a sequência
de atos, a pessoa chamada a fazer o reconhecimento, a
descrição feita, as pessoas que ficaram à disposição para
o reconhecimento, quem foi apontado (reconhecido) e,
por fim, as assinaturas de todos os envolvidos e das
testemunhas.
Para evitar influências indevidas, o art. 228 do CPP
assevera que, se várias forem as pessoas chamadas a
efetuar o reconhecimento, cada uma fará a prova em
separado, evitando-se qualquer comunicação entre elas.
Esse cuidado deve ser observado também na
investigação criminal defensiva. Aliás, recomenda-se
que, havendo necessidade de que mais de uma pessoa
faça o reconhecimento, cada ato seja feito em um turno
do dia, mencionando no auto o respectivo horário. Essa
informação demonstrará que houve respeito ao art. 228
do CPP, porquanto as pessoas chamadas para o
reconhecimento não o fizeram no mesmo horário.

32. Auto de reconhecimento de objeto

Na prática forense, o reconhecimento de objeto é


muito mais incomum que o de pessoa. Contudo, não
pode ser ignorado.
Da mesma forma que o reconhecimento de pessoas,
o de objetos também está previsto no art. 6º, VI, do CPP,
como atribuição da autoridade policial, devendo ser feito
logo que tiver conhecimento da prática da infração
penal.
O art. 227 do CPP afirma que, no reconhecimento de
objeto, proceder-se-á com as cautelas estabelecidas no
art. 226, no que for aplicável. Portanto, segue-se o
procedimento previsto para o reconhecimento de
pessoas.
Trazer esse procedimento para a investigação
criminal defensiva pode ter alguns obstáculos. O
principal deles: o Advogado terá à disposição o objeto
que será reconhecido? Evidentemente, sem o objeto,
sofre-se um enorme prejuízo no reconhecimento, que
ainda pode ser feito por meio de fotografia, mas sem a
mesma credibilidade. Desde já, salienta-se que a regra
deve ser o reconhecimento perante o objeto, apenas
admitindo o ato por fotografia como última opção,
hipótese em que será recomendável a juntada da
fotografia nos autos da investigação, anexo ao termo de
reconhecimento.
De início, a pessoa que fará o reconhecimento
deverá descrever detalhadamente o objeto,
mencionando, se for o caso, marca, modelo, cor,
tamanho, peso, formato etc.
Em seguida, se possível, o objeto será colocado ao
lado de outros objetos semelhantes para que a pessoa
aponte o reconhecido.
Por fim, será elaborado o auto de reconhecimento
de objeto, com todas as informações necessárias, isto é,
a sequência de atos, quem fez o reconhecimento, a
descrição do objeto e se houve ou não o reconhecimento.

33. Auto de avaliação de coisa

Em muitos casos, especialmente nos referentes a


crimes patrimoniais, pode ser necessário investigar o
valor do objeto subtraído ou do prejuízo/dano. Para essa
finalidade, o auto de avaliação é o documento adequado.
No inquérito policial, o auto de avaliação é
elaborado, via de regra, sem muito aprofundamento,
baseando-se no senso comum ou, no máximo, em uma
ligação para algum comércio ou uma rápida pesquisa na
internet.
Desconsidera-se, por exemplo, que o valor em
determinados sites é muito inferior ao preço cobrado por
lojas presenciais no local em que ocorreu o crime.
Também é desconsiderado o fato de que,
dependendo do caso, o objeto a ser avaliado (por ter sido
subtraído, por exemplo) não era novo, mas sim usado,
razão pela qual deveria ser considerada a desvalorização
decorrente do desgaste natural ou de danos existentes
na coisa (arranhões, partes quebradas etc.). Caso se
considere o valor da coisa em uma loja, possivelmente
será utilizado o preço da coisa nova.
A situação se agrava quando sabemos que, na
prática, o auto de avaliação raramente é desconsiderado
pelos Juízes. Caso especifique um valor ínfimo e estando
preenchidos os outros requisitos, os Juízes aplicam o
princípio da insignificância, não exigindo outras provas
acerca do valor da coisa. Por outro lado, se mencionar
um valor alto, fora do patamar normalmente considerado
para se entender como crime de bagatela, também não
há questionamentos.
Ademais, o auto de avaliação também pode ser
utilizado para avaliar as consequências do crime,
circunstância judicial prevista no art. 59 do Código Penal
e que incide na primeira fase da dosimetria da pena.
Sobre esse aspecto, cita-se, por exemplo, um julgado do
STJ referente ao crime de furto:
(...)
2. O desvalor das consequências do delito
decorreram da análise do auto de avaliação que
indicou prejuízo patrimonial de R$154.000,00. A
revisão desse ponto esbarra no óbice trazido
pelo enunciado 7 da Súmula desta Corte.
(...)
(AgRg no REsp 1803273/SP, Rel. Ministro
ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA,
julgado em 25/06/2019, DJe 02/08/2019)

O STJ também já consignou que o questionamento


sobre o método de avaliação de uma coisa deveria ter
sido submetido ao Tribunal a quo. Sem esse
questionamento e inexistindo elementos que justifiquem
a contestação ao auto de avaliação, seria incabível a
análise pelo Tribunal Superior, pois consistiria em
supressão de instância:
(...)
3. A insurgência da defesa quanto ao método de
avaliação do botijão de gás não foi submetida ou
analisada pelo Tribunal a quo, não havendo
elementos para contestar o valor mencionado,
sob pena de se incidir em indevida supressão de
instância. Ademais, o relatório do acórdão
impugnado faz menção ao auto de avaliação
que instruiu a inicial acusatória.
(...)
(HC 361.019/SC, Rel. Ministro JOEL ILAN
PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em
27/09/2016, DJe 10/10/2016)

Por esses motivos, a defesa técnica precisará refletir


se é caso de elaboração de um auto de avaliação –
isoladamente ou no bojo de uma investigação criminal
defensiva –, inclusive para questionar o documento
oficial e apresentar ao julgador fundamentos idôneos
para desconsiderar o valor atribuído.
Na produção de um auto de avaliação, o primeiro
ponto será a descrição detalhada do objeto a ser
avaliado, mencionando, pormenorizadamente, a marca, o
modelo, suas características, estado (novo ou usado) e
outras informações que individualizem o objeto. O
Advogado deverá lembrar-se de que a avaliação não é
referente a todo e qualquer objeto semelhante, mas sim
àquele que supostamente sofreu a ação criminosa.
Noutros termos, o objetivo não é dizer que “uma panela
normalmente custa ___”, mas sim que “a panela
supostamente subtraída, que é usada, da marca ____ e
tem o tamanho ____, custa, com tais características, o
valor ____”.
Recomenda-se a instrução do auto de avaliação da
coisa com declarações do valor, orçamentos ou imagens
da internet, preferencialmente três, para atribuir um
valor médio. Se a coisa for usada, é recomendável obter
os orçamentos ou as declarações em lojas de coisas
usadas, tentando fazer com que o parâmetro utilizado
seja o mais próximo possível da coisa avaliada.
Se, na elaboração do auto de avaliação, apenas
forem encontrados valores de objetos novos, deve-se
mencionar qual seria a depreciação decorrente do
desgaste, utilizando como parâmetros a experiência
comum e comparações entre produtos novos e usados
similares.

34. Relatórios
Antes de refletirmos sobre a utilização e a
importância dos relatórios na investigação criminal
defensiva, devemos ter uma visão panorâmica do
processo penal brasileiro e de como os relatórios são
utilizados no inquérito, nos exames periciais, no júri, nas
diligências e em muitos meios de prova.
Sobre o inquérito policial, o art. 10, § 1o, do CPP, diz
que “a autoridade fará minucioso relatório do que tiver
sido apurado e enviará autos ao juiz competente”. Trata-
se do relatório final ou de conclusão, que não é o único
relatório possível no inquérito policial.
No art. 169, parágrafo único, do CPP, consta que,
em relação ao exame do local onde houver sido
praticada a infração, os peritos registrarão, no laudo, as
alterações do estado das coisas e discutirão, no relatório,
as consequências dessas alterações na dinâmica dos
fatos.
Ao preparar o processo para ser levado ao plenário
do júri, o Juiz presidente fará “relatório sucinto do
processo, determinando sua inclusão em pauta da
reunião do Tribunal do Júri” (art. 423, II, do CPP). Aliás, na
sessão do júri, o jurado receberá a cópia do referido
relatório (art. 472, parágrafo único, do CPP).
Na Lei de Organizações Criminosas (Lei n.
12.850/2013), há previsão de que, findo o prazo da
infiltração de agentes, será apresentado um relatório
circunstanciado ao Juiz competente, que imediatamente
cientificará o Ministério Público (art. 10, §4º), Além disso,
no curso do inquérito policial, o Delegado de Polícia
poderá determinar aos seus agentes, e o Ministério
Público poderá requisitar, a qualquer tempo, relatório da
atividade de infiltração (art. 10, §5º).
A Lei de Organizações Criminosas também prevê,
em relação à figura dos agentes de polícia infiltrados
virtuais, que, após o prazo, o relatório circunstanciado,
juntamente com todos os atos eletrônicos praticados
durante a operação, deverão ser registrados, gravados,
armazenados e apresentados ao Juiz competente, que
imediatamente cientificará o Ministério Público (art. 10-A,
§5º). Igualmente, prevê que, no curso do inquérito
policial, o Delegado de Polícia poderá determinar aos
seus agentes, e o Ministério Público e o Juiz competente
poderão requisitar, a qualquer tempo, relatório da
atividade de infiltração (art. 10-A, §6º).
Em sentido semelhante, a Lei de Interceptações
Telefônicas (Lei n. 9.296/96), no seu art. 6º, §2º, prevê
que, cumpridas as diligências, a autoridade policial
encaminhará o resultado da interceptação ao Juiz,
acompanhado de auto circunstanciado, que deverá
conter o resumo das operações realizadas.
Nos inquéritos policiais mais simples, como aqueles
que apuram furtos ou outros crimes sem complexidade,
observamos depoimentos, documentos, perícias (às
vezes) e, ao final, o relatório de conclusão elaborado pelo
Delegado de Polícia, que contém um resumo de todas as
diligências e sua opinião jurídica sobre ser caso de
arquivamento ou de imputação de alguma infração
penal. Normalmente, quando o caso não é complexo, o
único relatório é o final.
Por outro lado, nos inquéritos que investigam crimes
mais complexos, especialmente aqueles conduzidos pela
Polícia Federal ou que abordem crimes relativos ao
Direito Penal Econômico, é comum encontrarmos mais
relatórios, como aqueles mencionados anteriormente
(agentes infiltrados, interceptações telefônicas etc.) ou
que se refiram a alguma diligência, mencionando
informações sobre o local, as pessoas com quem os
agentes tiveram contato, o que observaram e outros
dados relevantes. Trata-se, portanto, de uma explicação
das diligências realizadas.
Assim, de modo geral, um relatório deve:
detalhar o que foi feito;
possibilitar uma visão geral;
analisar os atos, fatos, circunstâncias, locais e
pessoas;
apresentar conclusões.
Nesse esteio, a documentação dos resultados da
investigação defensiva por meio de relatórios é de
extrema importância. Pode ser produtivo elaborar
relatórios referentes a cada diligência, não se limitando
ao relatório final.
Após o cumprimento de uma ordem de serviço, por
exemplo, pode-se elaborar um relatório narrando os
detalhes da diligência. Caso o Advogado ou algum de
seus auxiliares diligencie para obter documentos, tirar
fotos ou entrar em contato com pessoas envolvidas, será
útil documentar, por meio de um relatório, as
circunstâncias da diligência, as informações recebidas e
quaisquer outras questões relevantes.
Em uma persecução penal que apure um crime de
trânsito, por exemplo, o Advogado poderá instaurar a
investigação criminal defensiva e, como diligência,
deslocar-se até o local do acidente para tirar fotos,
solicitar filmagens, anotar características importantes do
local (buracos, curvas, condições do asfalto etc.) e, ao
final, elaborar um relatório com tudo que foi realizado
durante a diligência, bem como suas conclusões ao
interpretar as informações obtidas.
Destaca-se, por oportuno, que o Advogado não
precisará juntar aos autos do inquérito policial ou do
processo todas as peças da investigação defensiva, razão
pela qual o relatório não necessariamente será juntado
aos autos oficiais. Em alguns casos, é recomendável que
esse documento não seja juntado, sobretudo para
permitir ao Advogado utilizar o relatório como local para
realizar algumas reflexões/conclusões que poderiam
prejudicar o cliente. Nessa linha, utilizaria o relatório para
fazer reflexões imparciais e comparar a versão
apresentada pelo cliente (investigado ou réu) com os
elementos obtidos na investigação defensiva.
Aqui, precisamos explicar o sentido de fazer essas
reflexões imparciais nos relatórios. Não se trata de uma
conduta que tenha o condão de prejudicar o cliente, mas,
pelo contrário, de evitar uma participação despreparada
no processo, sem o conhecimento do máximo possível de
informações. Deve-se tentar descobrir tudo que poderá
ser utilizado pela acusação nos autos oficiais, evitando
que a versão do investigado ou réu seja superada, de
forma surpreendente, por informações obtidas por
peritos ou declaradas por testemunhas.
Voltando ao exemplo do crime de trânsito, após a
diligência realizada no bojo da investigação criminal
defensiva, pode ser necessário inserir no relatório, por
exemplo, que o réu havia informado que o local era uma
reta e que era permitida a ultrapassagem, mas foi
constatado que se tratava de uma curva com sinalização
proibindo a ultrapassagem. Essa comparação entre a
versão do cliente e a realidade constatada na diligência
evitará uma surpresa desagradável durante a instrução
processual.
Percebe-se que, na investigação defensiva, não se
pode seguir irrefletidamente a versão do réu,
investigando apenas o que lhe é favorável e distorcendo
a realidade observada durante as diligências. A
investigação precisa ser fiel às apurações, o que equivale
a dizer que precisa ser, de certa forma, imparcial. Apenas
depois, ao selecionar o que será levado aos autos
oficiais, é que se exige uma atuação parcial (em favor do
cliente).
Por esse motivo, o relatório deve ser um resumo das
diligências realizadas, com as interpretações,
apreciações e conclusões do Advogado, ainda que essa
deliberação seja inicialmente contra a narrativa do
investigado. O relatório é um “debate em forma de
monólogo”, apreciando as informações e comparando
dados e fatos.
Sugere-se, preferencialmente, a elaboração de um
relatório ao final de cada diligência realizada na
investigação defensiva, seguindo o mesmo parâmetro já
mencionado acerca das perícias e dos meios de obtenção
de provas.
Nesse esteio, Bulhões (2019, p. 136-137):
Se possível, cada diligência, seja de mão própria
ou por terceiros profissionais, deve gerar um
relatório acerca do método empregado, as
condições de tempo, lugar e outras informações
que possam ser pertinentes e relevantes ao
contexto de determinação, desenvolvimento e
apresentação das provas obtidas/produzidas em
cada atividade investigativa.

No que concerne ao método empregado, essa


informação tem especial relevância quando se trata de
diligência que envolva algum conhecimento
especializado, como uma perícia.
Ainda que não se fale em método propriamente
dito, é fundamental narrar as circunstâncias da
diligência, como o deslocamento até determinado lugar,
a comunicação a algum órgão público, o protocolo de
uma petição, um requerimento formulado, as condições
de transporte de algum objeto ou qualquer outro dado
sobre a origem ou a forma de obtenção de uma
informação.
Também é recomendável inserir no relatório
informações sobre o tempo, lugar e outras condições
relevantes, possibilitando uma revisão sobre o objeto da
diligência, bem como uma reflexão sobre circunstâncias
não pensadas durante o ato.
Imaginemos, por exemplo, uma investigação
criminal defensiva sobre um crime de trânsito que
causou uma morte, havendo dúvidas sobre o crime ter
ocorrido de forma culposa ou dolosa. Durante a
investigação, o Advogado se desloca até o local do
acidente com o perito, tira fotos, documenta e faz
anotações sobre o local.
Nesse caso, se o acidente/crime tiver ocorrido em
um dia muito movimentado e com chuva, mas a
diligência tiver sido feita em um dia/horário ensolarado e
pouco movimentado (talvez em um feriado), há
condições distintas que podem atrapalhar as conclusões
do Advogado.
Tendo a anotação dessas condições no relatório, o
Advogado poderá perceber a necessidade de ir ao local
novamente em outro dia da semana ou horário para
observar as circunstâncias e condições semelhantes
àquelas do dia do fato, o que permitirá uma comparação
entre o que investigou e o que consta no inquérito ou
processo.
Ademais, é relevante inserir no relatório qualquer
outra informação que possa ajudar na elucidação do fato,
na contextualização e na formação da tese defensiva:
nomes de pessoas com quem teve contato,
estabelecimentos comerciais no local, endereços,
fotografias, mapas e até desenhos. Na diligência,
recomenda-se que o Advogado (a)note como é a rua,
quais são as características da calçada, o que existe do
lado do local (uma casa, um terreno baldio…) e outras
informações relevantes.
Conclui-se, portanto, que o relatório não deve
apresentar apenas o método empregado na pesquisa e
na diligência, mas também as condições de tempo e
lugar, fotos, mapas, desenhos, características,
adjacências e tudo mais que se entenda necessário,
acrescentando, ainda, as conclusões do profissional que
cumpriu a diligência.
35. Termo de enumeração de pessoas

O termo de enumeração de pessoas não é um


documento obrigatório, apesar de ter grande utilidade
para a organização da investigação criminal defensiva.
Trata-se de um documento que individualizará e
qualificará as pessoas envolvidas, mormente os
investigados, indiciados, réus ou meros suspeitos (que
não sejam formalmente investigados ou réus). Também
será útil inserir, em tópico separado desse termo, os
nomes e as qualificações de outras pessoas, como
possíveis testemunhas.
Como bem descreve Bulhões (2019, p. 138):
(...) a partir da instauração é importante que
exista uma delimitação subjetiva acerca do
objeto da investigação defensiva, isto é, sobre
quais pessoas, físicas e/ou jurídicas, recaem as
suspeitas acerca do fato delituoso em testilha.

Essa delimitação formalizada no termo de


enumeração de pessoas servirá para facilitar a busca da
qualificação (nome completo, profissão, endereço etc.)
das pessoas que tenham relação com a investigação e
que, por conseguinte, poderão ser ouvidas nos autos
oficiais.
Com o termo de enumeração de pessoas, será
possível, por exemplo:
encontrar o endereço das testemunhas que
serão arroladas;
verificar as profissões das pessoas que serão
ouvidas (testemunhas e corréus), decidindo, a
partir disso, quais perguntas serão formuladas
(ex.: perguntas específicas para médicos ou
policiais);
analisar se o endereço da pessoa pode ter
relevância para o debate sobre o fato
investigado (ex.: a testemunha é vizinha da
vítima).

O termo de enumeração de pessoas também facilita


o atendimento do cliente realizado pelo Advogado. É
comum que, em algum momento, o cliente pergunte ao
Advogado sobre o depoimento de alguma testemunha ou
quem seria tal pessoa. Com o referido termo, a busca da
resposta será muito mais rápida e evitará a aparência de
desconhecimento em relação ao caso.
Inclusive, recomenda-se a leitura atenta do termo
de enumeração de pessoas antes de realizar o
atendimento do cliente, guardando, principalmente, os
nomes e as profissões dos envolvidos. Para o cliente, o
inquérito ou processo é o caso de sua vida. Ele tem
conhecimento de praticamente todos os nomes
envolvidos e provavelmente reflete diariamente sobre o
fato investigado. Por outro lado, o Advogado tem muitos
outros processos, com dezenas, centenas ou milhares de
nomes envolvidos, o que pode fazer com que se esqueça
de informações cruciais durante o atendimento. Assim, a
leitura do sobredito termo possibilitará uma revisão
rápida do caso.
Não há uma regra sobre quais informações devem
integrar o termo de enumeração de pessoas, mas é
recomendável que adicione o máximo possível de dados,
como:
nome completo;
estado civil;
data de nascimento ou idade aproximada;
profissão;
RG ou CPF (se possível);
endereço residencial;
endereço profissional;
telefone e e-mail.
Tratando-se de pessoa jurídica, recomenda-se a
inserção dos seguintes dados:
razão social e nome fantasia;
data de abertura;
ramo de atuação;
CNPJ;
quadro societário;
situação cadastral;
endereço;
telefone e e-mail;
nome do administrador e/ou do contato na
empresa.
Muitas dessas informações sobre as pessoas físicas
ou jurídicas podem ser obtidas pela internet, inclusive
nas redes sociais.
Dependendo do momento de elaboração do termo
de enumeração de pessoas, o Advogado poderá
consultar os atos do inquérito policial (boletim de
ocorrência, termo de declarações ou indiciamento) e do
processo (denúncia ou queixa-crime, mandado de
intimação ou qualificação no depoimento ou
interrogatório) para ter conhecimento dos dados
necessários.
Ao analisar o inquérito, reflita sobre todos os nomes
que foram mencionados no auto de prisão em flagrante,
no boletim de ocorrência, na portaria de instauração, nos
relatórios, nas ordens de serviço e em quaisquer outros
atos. Como se percebe, a elaboração do termo de
enumeração de pessoas já é, de certa forma, um exame
detalhado dos autos oficiais.
Insistimos, mais uma vez, na necessidade de não se
fazer apenas um termo de enumeração de pessoas
suspeitas, investigadas ou denunciadas, mas sim algo
mais amplo, indicando todos os envolvidos, o que pode
incluir até mesmo as autoridades da persecução penal,
com informações sobre serem titulares ou substitutos,
tempo de carreira, perfil (punitivista ou garantista) etc.
Essas informações servirão para entender quem são os
jogadores e quais estratégias podem funcionar.
Para subsidiar o referido termo, recomenda-se que,
em qualquer contato com outras pessoas durante as
diligências, solicite-se algum meio de contato e sempre
pergunte sobre o endereço atualizado.
Em termos práticos, podemos imaginar uma
situação em que uma testemunha arrolada pela
acusação não tenha sido encontrada, ocorrendo a
desistência pelo Ministério Público. O Juiz determina a
intimação da defesa para que, tendo interesse na oitiva
da testemunha, informe o endereço. Normalmente, o
prazo concedido pelo Juiz é curto (em regra, 5 dias).
Nessa situação, observando o termo de enumeração
de pessoas, o Advogado poderá consultar o endereço da
testemunha ou, caso não o tenha, talvez consiga com
alguma das pessoas listadas (outras testemunhas,
pessoas com quem teve contato nas diligências etc.),
utilizando os meios de contato disponíveis no termo.

36. Termo de enumeração de crimes

O termo de enumeração de crimes consiste em uma


lista ou um rol de infrações penais (crimes e
contravenções) que serão apuradas por meio das
diligências e dos atos da investigação criminal defensiva.
A formulação desse termo deve considerar as
informações presentes na portaria de instauração do
inquérito policial, o indiciamento, eventual auto de prisão
em flagrante, o relatório de conclusão do inquérito e a
denúncia, conforme esses documentos sejam
apresentados e de acordo com a fase da persecução
penal.
Além de considerar as informações oficiais, também
devem constar no termo de enumeração de crimes
eventuais condutas típicas que poderão ser objeto da
persecução penal ou da investigação criminal defensiva,
segundo as informações repassadas ao Advogado pelo
investigado/réu ou que se tornem conhecidas a partir das
diligências realizadas (tomada de depoimentos, análise
de documentos etc.).
Portanto, o termo de enumeração de crimes deve
incluir todas as infrações penais que estiverem sendo
apuradas no inquérito policial ou no processo criminal,
além de eventuais condutas que, conquanto não
constem na persecução penal, sejam de conhecimento
do Advogado que conduz a investigação defensiva e,
dependendo do caso, devam ser objeto de diligências.
A amplitude da investigação defensiva é uma
medida de garantia contra eventuais surpresas.
Explico: tendo conhecimento de outras infrações
penais que não integrem a persecução penal,
recomenda-se a realização de diligências no âmbito da
investigação defensiva, considerando a possibilidade de
que, futuramente, o Ministério Público faça o aditamento
da denúncia ou ofereça uma nova denúncia para iniciar
outro processo. Se isso acontecer, o Advogado já estará
preparado com os elementos de provas obtidos por meio
da investigação defensiva durante o período em que tais
infrações ainda não integravam a persecução penal.
Adotando uma linha de acordo com o exercício da
defesa, o ideal seria utilizar uma nomenclatura diferente
de "termo de enumeração de crimes", que,
aparentemente, pode refletir o sentido de que as
condutas criminosas realmente foram praticadas.
Assim, algumas possibilidades são:
termo de enumeração de supostas condutas
criminosas;
termo de enumeração de imputações;
termo de enumeração de condutas
investigadas.
Como se trata de ato que não objetiva provar fatos,
mas sim organizar as condutas apuradas na investigação
criminal defensiva, recomenda-se que o referido termo
não seja juntado aos autos oficiais. Servirá, portanto,
apenas para que a defesa se organize e tenha uma visão
panorâmica do que deve investigar.
Uma dúvida que pode surgir é se teria algo de
errado na conduta do Advogado que, descobrindo crimes
ainda não investigados nos autos oficiais, não os levasse
às autoridades. Noutros termos, o Advogado deve
comunicar às autoridades os crimes que foram
praticados por seu cliente ou por terceiros?
Em relação ao cliente, há uma proteção pelo sigilo,
inclusive como decorrência da relação de confiança
estabelecida com o Advogado (arts. 5º e 6º do
Provimento n. 188/2018 do Conselho Federal da OAB).
Quanto aos crimes praticados por terceiros, nada
impede que o Advogado, com a concordância do cliente,
comunique às autoridades. Aliás, essa conduta pode
constituir uma estratégia defensiva para proteger o
cliente, ganhar a confiança das autoridades que atuam
na persecução penal e, se for o caso, demonstrar
eventual interesse dos outros investigados ou réus em
prejudicar o seu cliente. Também é uma conduta que
pode fundamentar uma proposta de acordo de
colaboração premiada.
Entrementes, o Advogado não tem o dever jurídico
de evitar crimes praticados por terceiros ou comunicá-los
às autoridades, considerando que não ocupa o papel de
garantidor e sua omissão não é, em tese, penalmente
relevante (art. 13, §2º, do Código Penal).
Somente não se admite que, durante ou após a
investigação defensiva, o Advogado pratique crimes ao
lado do réu ou para protegê-lo (intimidação de
testemunhas, falsificação de documentos, alteração de
lugar etc.). Essa é a linha que jamais deve ser
atravessada. Por outro lado, não existe dever jurídico de
que o Advogado comunique às autoridades eventuais
crimes que venha a descobrir na investigação.
O termo de enumeração de crimes não é imutável.
Poderá ser alterado futuramente, caso se perceba que
novas condutas criminosas devem ser adicionadas ou
alguma já mencionada nele deve ser removida, como em
casos de percepção da atipicidade da conduta.
Após o título do documento (termo de enumeração
de crimes ou outra expressão, conforme análise
anterior), recomenda-se inserir um parágrafo com um
desses inícios:
“Supostamente, há elementos de que foram
praticados os seguintes crimes (...)”;
“Há análise relativa a eventual prática dos
seguintes crimes (...)”;
“De acordo com a denúncia, fulano teria
praticado os crimes de (...)”;
“Os autos oficiais apresentam as seguintes
imputações de crimes (...)”.
Também é possível fazer uma análise conjunta entre
o termo de enumeração de crimes e o termo de
enumeração de pessoas investigadas/suspeitas, de modo
semelhante às denúncias elaboradas pelo Ministério
Público em casos de pluralidade de denunciados e
crimes.
Nesse caso, o termo teria os nomes e as
qualificações do cliente e de todos os investigados ou
suspeitos. Em seguida, um trecho especificando que “A,
B e C teriam praticado o crime de (...)”. Inclusive, poderia
mencionar as provas que sustentam ou afastam essa
afirmação.
Com a utilização correta desses termos, o Advogado
terá uma visão geral das pessoas envolvidas e das
possíveis imputações de infrações penais. Em casos
complexos, com vários investigados/réus e muitos
crimes, essa organização tem enorme importância para
que seja mantida a clareza da investigação.

37. Relatório de conclusão

Da mesma forma que o Delegado de Polícia elabora


um relatório final ou de conclusão no encerramento do
inquérito policial (art. 10, §1º, do CPP), também é
recomendável que o Advogado o faça no término da
investigação criminal defensiva.
O objetivo do relatório de conclusão é possibilitar
uma visão geral dos atos desenvolvidos na investigação
defensiva, permitindo, inclusive, reflexões sobre os
elementos obtidos, os resultados e, se for o caso, a
especificação do que deverá ser levado aos autos
oficiais.
Deve-se começar o relatório com uma descrição dos
atos mais importantes, da instauração até o ato
imediatamente anterior ao relatório, seguindo,
basicamente, a ordem cronológica da autuação.
Na descrição dos atos, recomenda-se uma
especificação quanto aos depoimentos, às perícias e às
diligências realizadas, mencionando o número da página
e, se quiser, a data da realização do ato.
Após o relato da sequência de atos da investigação,
pode-se abrir um espaço para reflexões sobre o fato e os
resultados obtidos, por meio de conclusões sobre o
arcabouço probatório reunido, inclusive comparando
elementos, confrontando declarações e interpretando
documentos que constam nos autos.
O relatório pode ser utilizado como um espaço para
que o Advogado desenvolva o raciocínio sobre os fatos
investigados e defina os próximos passos, sobretudo
quais páginas da investigação defensiva serão juntadas
aos autos oficiais.
Por esse motivo, não é recomendável juntar o
relatório final da investigação defensiva aos autos
oficiais. Afinal, isso poderia significar a explanação
aberta sobre as estratégias defensivas, o que não é
aconselhável.
Verdadeiramente, deve-se tratar o relatório de
conclusão como um documento íntimo da defesa, que
não deve se tornar público, mormente para que as
conclusões não sejam de conhecimento da autoridade
policial, do membro do Ministério Público e do Juiz.

38. A utilização parcial dos resultados


da investigação: cuidados

Conforme já referido, a preparação dos autos da


investigação criminal defensiva é similar à organização
de um inquérito policial, isto é, consiste em reunir as
folhas em uma pasta, com a numeração das páginas em
sequência única, passando pela peça de instauração e
pelas diligências (depoimentos, perícias etc.), chegando
ao relatório final ou de conclusão.
Como regra, enquanto a investigação criminal
defensiva é conduzida, não se tem conhecimento de
quais partes serão posteriormente juntadas ao inquérito
policial ou processo penal, tampouco se serão juntados
os documentos originais ou cópias. Não é sabido, por
exemplo, se serão juntados todos os depoimentos ou
apenas alguns deles (os favoráveis). Aliás, há
documentos ou diligências que serão apenas
parcialmente favoráveis.
Portanto, em algum momento, enquanto tramita a
investigação criminal defensiva ou após o seu
encerramento, o Advogado precisará refletir sobre quais
documentos, perícias e depoimentos serão juntados aos
autos oficiais, bem como se, em relação a cada
documento, a juntada será total ou apenas parcial.
Nesse ponto, combinando a dica referente à
numeração das folhas dos autos da investigação e a
possibilidade de juntada parcial dos resultados, surge um
problema: caso o Advogado decida juntar somente uma
parte dos autos da investigação e estando as folhas
devidamente numeradas, poderá gerar dúvidas nas
autoridades (Delegado, Membro do Ministério Público e
Juiz) sobre o que foi deixado de fora pela defesa. Em
outras palavras, como as autoridades tratarão a omissão
de algumas folhas dos autos da investigação defensiva?
Para exemplificar, imaginemos os autos de uma
investigação defensiva que tenha 100 folhas
devidamente numeradas. Refletindo sobre a melhor
estratégia defensiva e descartando os elementos
desfavoráveis, o Advogado junta aos autos oficiais
apenas 20 folhas.
Após a juntada, o Delegado ou o membro do
Ministério Público percebe que as folhas estão
numeradas, apresentando sequências como: folhas 9 a
15, 43 a 47, 61 a 64 e 92 a 95. Assim, surge a indagação:
o que a defesa deixou de juntar? Seriam elementos
desfavoráveis? Como seria possível descobrir quais são
esses elementos? Quem prestou um depoimento
desfavorável nos autos da investigação defensiva?
Esses questionamentos também podem surgir na
sessão do tribunal do júri, tentando convencer os jurados
de que a numeração das folhas demonstra que a defesa
não levou ao processo todas as informações que
investigou e descobriu.
Portanto, a juntada parcial de folhas numeradas
pode ocasionar uma preocupação da autoridade policial
ou do membro do Ministério Público e acender um alerta
quanto a possíveis linhas investigativas que ainda não
foram exploradas nos autos oficiais.
O risco de gerar essa consequência e a
possibilidade de que o Juiz leve em consideração a
omissão de algumas folhas dos autos da investigação
defensiva não podem levar o Advogado a juntar tudo que
se encontra na sua investigação, incluindo eventuais
provas desfavoráveis ao investigado/réu. Afinal, se levar
aos autos oficiais os elementos desfavoráveis, o prejuízo
será garantido. Por outro lado, se deixar de juntá-los,
existe apenas um potencial de que isso seja considerado
pela acusação na definição de sua estratégia ou pelo Juiz
no momento de decidir. Dessa forma, não se deve trocar
uma possibilidade de prejuízo por um prejuízo garantido.
Ademais, é evidente que o Advogado deverá
respeitar o direito do seu cliente de não se
autoincriminar (nemo tenetur se detegere), não podendo
juntar provas que o prejudiquem.
Por outro lado, como reduzir ou exterminar o risco
de que a omissão de algumas folhas dos autos da
investigação defensiva conduza a acusação a buscar
novas provas?
Uma opção válida seria deixar de numerar as folhas
dos autos da investigação defensiva, evitando que, ao
fazer a juntada parcial nos autos oficiais, sejam
constatadas sequências na numeração que demonstrem
uma omissão de algumas ou várias folhas.
Além disso, mesmo que não se faça a numeração
nos autos da investigação defensiva, permanece o risco
de que, por exemplo, um relatório, uma notificação ou
uma ordem de serviço mencione o nome de duas
testemunhas, quando, na verdade, foi juntado apenas
um depoimento aos autos oficiais. Se isso ocorrer,
qualquer Delegado ou membro do Ministério Público
minimamente atento tentará descobrir quem é aquela
testemunha que, a princípio, foi chamada para depor,
mas teve seu depoimento descartado pela defesa. O que
ela disse?
Essa “lacuna” no conjunto probatório produzido pela
defesa pode ser descoberta de várias formas, como pela
análise dos números das páginas (e a percepção de que
algumas páginas da investigação defensiva não foram
juntadas) ou por meio de documentos juntados pela
defesa, especialmente notificações e relatórios que
mencionem a testemunha cujo depoimento não foi
juntado aos autos oficiais.
Se, por exemplo, o relatório final da investigação
defensiva menciona que foram ouvidas 8 testemunhas,
mas, nos autos oficiais, a defesa anexa apenas os
depoimentos de 5 testemunhas, surgirá uma indagação
quanto ao que foi omitido. Nessa situação, o ideal seria
não juntar aos autos oficiais o relatório final da
investigação criminal defensiva.
Uma dica prática para evitar esse erro na estratégia
defensiva seria elaborar um relatório para cada
depoimento. Nesse relatório, o Advogado abordaria como
o respectivo depoimento poderia ser interpretado,
destacando os pontos mais relevantes para a defesa.
Por fim, é possível que o leitor imagine que bastaria
à defesa juntar os depoimentos selecionados no
momento da apresentação da resposta à acusação, de
modo que, mesmo que o acusador perceba que alguns
depoimentos não foram juntados, não seria mais cabível
a ele a indicação de novas testemunhas, porquanto o
último momento para isso seria o oferecimento da
denúncia. Em que pese o raciocínio esteja correto, há
alguns fatores que nos levam a discordar dessa
estratégia.
A questão é simples: o Ministério Público poderia
descobrir as testemunhas que foram ouvidas na
investigação defensiva e levá-las ao processo penal por
outros meios.
Em um caso de crime doloso contra a vida, por
exemplo, essas testemunhas poderiam ser arroladas
para inquirição na sessão do tribunal do júri.
Também não é raro que o Ministério Público ouça
testemunhas na sua sede, registre tudo por escrito ou
por gravação audiovisual e leve os registros aos autos
como documento. Ainda que discordemos dessa prática –
que impede a participação da defesa e do Juiz –, observa-
se esse comportamento em alguns casos, inclusive para
o plenário do júri, quando o acusador toma conhecimento
de alguma testemunha após o prazo para arrolá-la.
Destarte, é imprescindível que a defesa tenha
cuidado na juntada parcial dos resultados da
investigação defensiva, evitando que o Delegado, o
Ministério Público, o querelante e até mesmo o Juiz
percebam que a defesa não juntou tudo que produziu.
Ainda que seja legalmente possível deixar de juntar
provas desfavoráveis, essa conduta, caso conhecida pelo
julgador, poderá gerar uma indisposição no momento de
julgar. Quanto à acusação, poderá buscar essas provas
desfavoráveis e juntá-las aos autos.

39. Quando juntar aos autos oficiais?

Ao iniciar uma investigação defensiva, devemos


pensar no momento decisivo: quando juntar os
resultados da investigação aos autos oficiais?
A investigação defensiva, como regra, não tem
relevância de forma isolada. Sua relevância consiste em
preparar os elementos que serão futuramente levados ao
inquérito policial ou ao processo penal. Noutros termos, a
investigação defensiva será conduzida para municiar a
versão defensiva nos autos oficiais.
Portanto, é imperativo refletir, de modo estratégico,
sobre o momento de juntada aos autos oficiais e quais
são as consequências dessa juntada em cada fase da
persecução penal.
Qual será o comportamento dos outros jogadores
diante da juntada dos resultados da investigação
defensiva? Quem são esses jogadores?
Basicamente, devemos imaginar a reação de três
jogadores: Delegado, acusador (membro do Ministério
Público ou querelante) e Juiz.
No inquérito policial, a preocupação deve ser com a
reação do Delegado, principalmente quanto a eventual
indeferimento da juntada dos resultados da investigação
defensiva.
Há Delegados que tratam o inquérito policial como
procedimento voltado exclusivamente para moldar a
versão acusatória, desconsiderando a relevância de
outras linhas de investigação favoráveis ao investigado.
Muitos foram condicionados pelos estudos para
concursos que pregam, na linha do entendimento
jurisprudencial preponderante, que não existe
contraditório no inquérito policial ou, se existe, ele seria
diferido ou postergado, devendo acontecer apenas no
processo.
Assim, caso o Advogado tente juntar os resultados
da investigação defensiva ao inquérito, poderá encontrar
resistência por parte da autoridade policial, da mesma
forma (ou até mais) que encontra dificuldades para
acessar o inquérito ou requerer diligências, que são
diuturnamente indeferidas.
Se for indeferido o pedido de juntada dos resultados
da investigação defensiva ao inquérito policial, o
Advogado precisará judicializar a questão, impetrando
habeas corpus ou mandado de segurança, conforme o
entendimento a ser adotado. Enquanto isso, a autoridade
policial terá ciência dos documentos que não foram
juntados e poderá seguir outras linhas de investigação
que “contestem” tudo que o Advogado conseguiu em sua
investigação.
Portanto, apesar de ter força para convencer o
Ministério Público a não oferecer a denúncia ou o Juiz a
rejeitá-la, a juntada dos resultados da investigação
defensiva durante o inquérito policial pode ser uma
estratégia ruim.
Para compreender o processo penal de forma
estratégica, precisamos de um afastamento que nos dê
uma visão panorâmica, abrangendo o início do inquérito
policial até o momento do trânsito em julgado. Com esse
afastamento, podemos compreender as vantagens e
desvantagens da juntada em cada fase.
Nesse prisma, a juntada da investigação defensiva
durante a fase policial teria a vantagem de contribuir
para eventual arquivamento do inquérito, mas teria a
grande desvantagem de possivelmente ser indeferida e
possibilitar que a autoridade policial e o Ministério
Público compreendam a tese defensiva.
Na fase judicial, seria possível juntar os resultados
da investigação defensiva com a resposta à acusação. Há
possibilidade de que o Juiz considere prova “ilícita”
(produzida sem o contraditório) e determine o
desentranhamento, mas, além de ser uma possibilidade
remota, poderia ser facilmente combatida por meio de
habeas corpus ou correição parcial, destacando que se
trata de cerceamento de defesa e que o Código de
Processo Penal permite a juntada de documentos.
Ademais, o contraditório seria feito pela acusação
em relação ao que foi juntado, não havendo necessidade
de que ele exista na produção dos elementos na
investigação defensiva, isto é, a acusação não precisaria
participar da coleta de depoimentos ou de qualquer outra
diligência empreendida pela defesa.
Por outro lado, um ponto negativo da juntada dos
resultados da investigação defensiva na fase judicial
consiste na possível manifestação contrária do Ministério
Público.
No inquérito, o Ministério Público está distante,
manifestando-se apenas sobre dilação de prazo e
realização de diligências (prisão preventiva, busca e
apreensão etc.), avaliando, ao final, se é caso de
arquivamento do inquérito ou oferecimento da denúncia.
Se a defesa tiver êxito na juntada da investigação
defensiva, a tendência é que o Delegado não comunique
ao Ministério Público, ao contrário do que ocorre no
processo penal.
Em sentido diferente, se o Advogado optar por
juntar a investigação defensiva apenas durante a
instrução processual, há uma chance enorme de que o
Juiz determine a intimação do Ministério Público acerca
dos documentos juntados. Não seria absurdo imaginar
que a acusação discordaria da juntada da investigação
defensiva, argumentando, possivelmente, que se trata
de prova inadmissível.
Há mais um fator para considerarmos sobre o
momento de juntada: tratando-se de inquérito policial
com investigado que se encontra preso cautelarmente, o
procedimento tramitará rapidamente, provavelmente
dentro do prazo legal. Assim, caso se pretenda realizar
uma investigação defensiva para juntar em um inquérito
policial que tenha investigado preso cautelarmente, o
Advogado precisará empregar um ritmo acelerado de
realização das diligências.
Além disso, se o Advogado deixar para juntar a
investigação defensiva, total ou parcialmente, durante o
processo penal, terá a vantagem de surpreender o
Ministério Público, que elaborará a denúncia
considerando apenas aquilo que estava no inquérito
oficial e com total ignorância dos elementos obtidos pela
defesa.
Contudo, juntar os resultados da investigação
defensiva durante o processo também significa perder a
chance de utilizá-los para tentar o arquivamento do
inquérito policial, algo que evitaria todos os transtornos
de um processo contra o réu.
A consideração sobre o perfil dos
jogadores/julgadores também é de enorme importância
para a escolha do momento de juntada da investigação
defensiva.
Se o membro do Ministério Público tiver um perfil
menos combativo (mais inerte), tolerando passivamente
a atuação proativa da defesa, o Advogado poderá
considerar esse fator para optar pela juntada da
investigação durante o processo. Nesse caso, a chance
de impugnação pelo acusador seria menor, de modo que
o êxito defensivo dependeria do perfil do julgador
(garantista ou punitivista).
Em suma, a definição do melhor momento para
juntar os resultados da investigação defensiva não pode
ser feita abstratamente, sem considerar as
peculiaridades do caso concreto e os jogadores
envolvidos. A escolha do momento adequado dependerá
de uma avaliação profunda das vantagens e
desvantagens, assim como do perfil das autoridades
envolvidas (Delegado, membro do Ministério Público e
Juiz) e da chance de impugnação ou indeferimento da
juntada.

40. O que fazer se os resultados da


investigação criminal defensiva não
forem aceitos?
Considerando que ainda inexiste previsão legal
sobre a investigação defensiva e que não será raro que
as autoridades desconsiderem o Provimento n. 188/2018
do Conselho Federal da OAB, é imperativo avaliar quais
devem ser as medidas adotadas em caso de recusa do
Delegado ou do Juiz quanto ao pedido de juntada dos
resultados da investigação conduzida pela defesa.
Primeiramente, insta recordar que os resultados da
investigação defensiva são levados ao inquérito policial
ou processo como documentos. As perícias, declarações
(escritas ou gravadas) e outras provas constituirão prova
documental, o que não impede que, nos autos oficiais,
seja novamente produzida a prova em outro formato.
Imaginemos, por exemplo, um caso em que uma pessoa
é ouvida em uma investigação criminal defensiva e,
posteriormente, seu depoimento (escrito ou gravado) é
juntado ao inquérito policial. Nada impede que depois, no
início do processo, ela seja arrolada como testemunha
pelo Ministério Público (na denúncia), pelo réu que
contratou o Advogado que a ouviu na investigação
defensiva ou por algum corréu (na resposta à acusação).
Nesse caso, o depoimento levado por escrito ou gravado
será repetido em audiência, oralmente, com a
participação de todos os atores (Juiz, Promotor,
Advogados dos corréus e assistente da acusação), que
poderão formular perguntas.
A interpretação sobre os momentos da juntada de
documentos e a admissibilidade de uma prova gera
várias controvérsias, não raramente tendo resquícios de
casuísmo. No HC 265.329/RJ, por exemplo, o STJ aceitou
que o Ministério Público, no momento das alegações
finais, juntasse mídia contendo depoimento de
testemunha, inclusive com a reabertura da instrução
para ouvi-la:
(...)
1. É legal a juntada de nova prova aos autos
mesmo após o término da instrução criminal,
quando o Ministério Público, no momento da
intimação para o oferecimento de alegações
finais, requer juntada de mídia com depoimento
de testemunha, bem como a oitiva desta, tendo
sido aberta a oportunidade para defesa
manifestar-se a respeito, uma vez que o Juiz
entendeu ser necessária a realização da
diligência para formação do seu livre
convencimento, dependente, como atividade
ínsita ao processo penal, do encontro da
verdade por meio da reconstrução histórica dos
fatos, observados os princípios da busca da
verdade, da ampla defesa, do contraditório e do
devido processo legal.
(...)
(HC 265.329/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI
CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 13/08/2019,
DJe 27/08/2019)

Contudo, quando se trata da defesa, dificilmente


existe a mesma tolerância. Não será raro se a juntada
dos resultados da investigação defensiva for indeferida e,
após levar a matéria ao Tribunal, for prolatada decisão
afirmando que não há cerceamento de defesa e que seria
hipótese de nulidade relativa, exigindo prejuízo, o que
não se constata no caso concreto. De qualquer forma,
incumbe ao Advogado insistir para que seja respeitado o
direito de defesa.
Caso o indeferimento da juntada dos resultados da
investigação defensiva ocorra no inquérito policial, será
cabível a judicialização da questão por de meio mandado
de segurança – enfrentando o debate sobre a existência
de direito líquido e certo de participação efetiva da
defesa no inquérito policial – ou habeas corpus.
Se o indeferimento ocorrer na instrução processual,
será cabível a correição parcial ou a impetração de
habeas corpus ou mandado de segurança,
fundamentando a medida no cerceamento de defesa.
Deve-se sempre demonstrar o prejuízo causado pelo
indeferimento da juntada dos resultados da investigação
criminal defensiva, haja vista que a jurisprudência, a
cada dia, amplia essa exigência.

41. Continuar a investigação durante


todo o processo?

Ao contrário do inquérito policial, que cessa a


realização de diligências após o membro do Ministério
Público avaliar se é caso de oferecer a denúncia ou
promover o arquivamento, a investigação defensiva
poderá continuar tramitando sem um termo final, mesmo
que algumas partes já tenham sido extraídas e juntadas
ao inquérito ou ao processo.
Dessa forma, o Advogado poderá continuar a
investigação defensiva durante todo o processo, inclusive
durante a fase recursal ou após o trânsito em julgado,
sobretudo para a utilização dos seus resultados em
eventual revisão criminal ou na execução penal.
Urge destacar que a investigação defensiva terá o
ritmo definido pelo Advogado que a preside/conduz,
inclusive com a possibilidade de flexibilizar etapas e
prolongar ou renovar diligências. Também será possível,
de acordo com a necessidade, instaurar uma nova
investigação defensiva, caso se entenda que o objeto da
investigação atual é significativamente diferente do
objeto da investigação que deve ser iniciada.
Logo, nada impede a prorrogação da investigação
defensiva após a juntada de uma parte dos seus
resultados nos autos oficiais ou, se assim preferir, a
instauração de uma nova investigação defensiva para
tratar do mesmo fato e cliente.
Caso a investigação defensiva tenha esse caráter
contínuo, recomenda-se um controle, nos autos da
investigação, das páginas que já foram juntadas aos
autos oficiais (inquérito policial ou processo penal),
evitando a juntada de documentos repetidos. Uma breve
certidão que informe que “foram remetidos aos autos do
processo n. ____ os documentos das fls. ____” seria
suficiente.
Para facilitar a compreensão, vamos exemplificar:
Imaginemos um caso em que o Advogado foi
procurado pela família de alguém que fora preso em
flagrante. Nesse momento, a maior urgência defensiva é
buscar fundamentos para o relaxamento ou a revogação
da prisão, dependendo do caso.
O Advogado pode instaurar uma investigação
defensiva com o objetivo de conseguir subsídios para
que o seu cliente seja solto. Para tanto, avalia se há uma
hipótese de álibi ou de afastamento da situação de
flagrante. Também busca elementos que coloquem em
dúvida o periculum libertatis e/ou o fumus commissi
delicti. Trata-se de uma questão urgente, razão pela qual
a investigação defensiva precisará desenvolver-se em
poucos dias para que seus resultados sejam utilizados na
audiência de custódia, em uma petição ao Juiz ou em um
habeas corpus.
Na investigação defensiva, serão delegadas as
tarefas para outros Advogados ou profissionais que
auxiliem o escritório, como a coleta de declarações, a
realização de diligências para conseguir documentos que
comprovem residência fixa e trabalho, a busca de
comprovantes que indiquem que o cliente estava em
outro lugar no momento do crime etc. Também serão
realizadas diligências que abordem a ausência de risco
de fuga (v. g., a falta de condições financeiras) e a
necessidade de afastamento de possíveis fundamentos
para a decretação ou a manutenção da prisão cautelar.
Ainda poderia diligenciar para conseguir
informações sobre a alteração da cadeia de custódia
quanto aos vestígios ou outras formas de atacar a
materialidade da infração penal, de acordo com as
etapas do rastreamento do vestígio (art. 158-B do Código
de Processo Penal), quais sejam, reconhecimento,
isolamento, fixação, coleta, acondicionamento,
transporte, recebimento, processamento,
armazenamento e, por fim, descarte.
Em determinado momento, após a reunião de
elementos suficientes, o Advogado levaria os resultados
da investigação defensiva ao Judiciário (audiência de
custódia, petição ou habeas corpus, por exemplo), ainda
que não realize o encerramento do procedimento. Nos
autos da investigação defensiva, certificaria a extração
de cópias, para juntada aos autos oficiais, das folhas X a
Y.
Em seguida, a investigação defensiva poderia
continuar com o mesmo objetivo (obtenção da liberdade)
ou com finalidades diversas, como a produção de
elementos que contribuam para o arquivamento ou
trancamento do inquérito policial ou para outro resultado
favorável no processo (absolvição, desclassificação,
aspectos sobre a pena etc.).
Observa-se, assim, a flexibilidade da investigação
defensiva.
A um, é possível extrair partes da investigação
defensiva e juntá-las ao inquérito ou processo, ainda que
a investigação não tenha sido concluída.
A dois, a extração de parte da investigação
defensiva não impede que ela continue com o mesmo
foco ou com novos objetivos. O Advogado que preside a
investigação poderá elaborar um relatório informando os
principais atos realizados até aquele momento e, em
seguida, concluir que tal investigação passará a ter outra
finalidade, como a obtenção de documentos que
instruirão a resposta à acusação. Seria, basicamente, a
instauração de uma nova investigação dentro dos autos
da investigação anterior ou o aditamento do termo de
instauração.
Com habitual lucidez, Oliveira (2008, p. 26)
apresenta a vantagem estratégica de uma atuação
defensiva ao longo de todas as fases da persecução
penal:
Além disso, na verdade, o defensor pode manter
a sua intervenção ao longo de todo o processo –
desde as suas fases preliminares até ao
Julgamento – ao passo que as autoridades
judiciárias mudam ao longo daquele e o próprio
Tribunal de Julgamento terá forçosamente de ser
constituído por magistrados que ainda não
tenham intervindo no processo, só podendo
ainda levar em conta a prova produzida ou
sujeita a análise na Audiência, por força do
princípio da imediação da prova – o que pode
traduzir-se em mais uma inestimável vantagem
da Defesa Criminal.

Destarte, é possível e recomendável continuar a


investigação defensiva enquanto ela tiver utilidade,
inclusive em razão da possibilidade de juntar
documentos a qualquer momento, em qualquer fase do
processo, conforme dispõe o art. 231 do CPP (“Salvo os
casos expressos em lei, as partes poderão apresentar
documentos em qualquer fase do processo”).
Considerações finais

A investigação criminal defensiva é um importante


instrumento de concretização da ampla defesa e de
busca da implementação real da paridade de armas
entre as partes do processo penal.
Ainda que sua regulamentação específica esteja
apenas no Provimento n. 188/2018 do Conselho Federal
da OAB, sua utilização é inerente a diversos direitos e
princípios constitucionais, como o devido processo legal,
o contraditório, a ampla defesa, a presunção de
inocência e a previsão de indenização por erro judiciário.
Também encontra amparo na legislação
infraconstitucional, mormente na permissão de juntada
de documentos em qualquer fase do processo (art. 231
do CPP).
Com a investigação criminal defensiva, pretende-se
superar ou mitigar vários problemas que, infelizmente,
integram a prática forense, sobretudo na fase
inquisitorial e na produção de provas. Aliás, tais
problemas são incentivados por uma jurisprudência que
nega a participação ativa da defesa no inquérito policial
e, ao mesmo tempo, fomenta a “busca da verdade real”
por Magistrados que deveriam ser imparciais.
A utilização da investigação criminal defensiva tem
especial relevância nos casos em que a investigação
oficial é falha, segue apenas linhas favoráveis à acusação
ou nega a participação da defesa (indeferimento de
pedido de diligências, por exemplo).
Aliás, como destacada França (2015, p. 105), sendo
possível a ação penal privada subsidiária da pública no
caso de inércia do Ministério Público, também teria
sentido admitir a investigação criminal defensiva quando
a investigação oficial fosse falha ou omissa. Em uma
hipótese, observa-se a pretensão acusatória, permitindo
que o particular ofereça queixa-crime quando o Parquet
não agir tempestivamente; na outra, respeita-se a
pretensão defensiva de ser ouvida durante toda a
persecução penal, inclusive na fase inquisitorial.
Evidentemente, a investigação criminal defensiva
não seria cabível somente em caráter subsidiário –
quando a investigação oficial não fosse realizada ou
tivesse falhas –, mas sim complementar. Não se tem o
escopo de substituir a investigação oficial, haja vista que
o interesse defensivo é parcial (a favor do investigado),
razão pela qual inexiste dever de colaborar ou
compartilhar informações com as autoridades.
Como vantagem estratégica, a investigação criminal
defensiva proporciona a obtenção de informações e a
possibilidade de prévia avaliação dos resultados antes
que eles integrem os autos oficiais.
No seu bojo, a defesa poderá tomar depoimentos,
realizar perícias, fazer reconhecimentos, pesquisar dados
e informações, utilizar os serviços de terceiros (inclusive
detetives), elaborar relatórios e muito mais. As
diligências somente são limitadas pela legalidade, pela
ética e pelos custos de realização, devendo ser
respeitada, ainda, a cláusula de reserva de jurisdição. Em
relação a esta, a defesa poderá provocar o Judiciário para
que seja deferida a realização da diligência, como no
caso de busca e apreensão (arts. 240, §1º, “e”, e 242,
ambos do CPP).
Dessa forma, esperamos ter demonstrado, no
presente livro, a fundamentação, a possibilidade, os
momentos, as finalidades, as vantagens estratégicas, os
atos, as diligências e a formalização da investigação
criminal defensiva, bem como sua utilização nos autos
oficiais e os meios de superar as dificuldades e a
ausência de poderes – como o de requisição – disponíveis
apenas para as autoridades públicas.
Referências

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responsabilidade social e empresarial: uma visão prática.
Rio de Janeiro, RJ: Alta Books, 2016

AROCA, Juan Montero. Principios del proceso penal.


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BADARÓ, Gustavo Henrique. Manual dos recursos penais.


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BERNACCHI, Paulo Eduardo Elias; RODRIGUES, Anderson


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BRANCO, Vitorino Prata Castelo. Como se faz uma defesa


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BULHÕES, Gabriel. Manual prático de investigação


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CARNELUTTI, Francesco. As misérias do processo penal.


Trad. Carlos Eduardo Trevelin Millan. São Paulo: Editora
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[1] Como justificativa para a inexistência de contraditório e ampla defesa no

inquérito policial, há quem sustente que o respeito a esses direitos poderia


atrasar o inquérito ou prejudicar a eficácia das investigações.
[2] O art. 32 da Lei n. 13.869/2019 dispõe: Art. 32. Negar ao interessado,

seu defensor ou advogado acesso aos autos de investigação preliminar, ao


termo circunstanciado, ao inquérito ou a qualquer outro procedimento
investigatório de infração penal, civil ou administrativa, assim como impedir
a obtenção de cópias, ressalvado o acesso a peças relativas a diligências em
curso, ou que indiquem a realização de diligências futuras, cujo sigilo seja
imprescindível:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
[3] Insta salientar que a Lei n. 13.964/2019 adicionou ao Código de Processo

Penal o art. 3º-A, que diz: “O processo penal terá estrutura acusatória,
vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da
atuação probatória do órgão de acusação”. Entretanto, em decisão cautelar
proferida nas ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) 6.298, 6.299,
6.300 e 6.305, o Min. Fux suspendeu a eficácia, por tempo indeterminado,
do referido dispositivo legal, assim como de outros artigos que foram
incluídos no CPP pela Lei Anticrime.
[4] Apesar de não ser um fundamento constitucional, a súmula vinculante é

editada em virtude de autorização constitucional (art. 103-A da Constituição


Federal) pelo guardião da Constituição (art. 102 da CF), qual seja, o
Supremo Tribunal Federal.

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