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MORTE – Não sabeis vós que sou vossa herdeira, pois hei-de morrer.
e a vossa filha a primeira gerada? Eu creio, Mundo, que o meu Redentor
ADÃO – Ó triste Morte, como és apartada! vive, e no dia mais derradeiro
Como és espantosa, em tanta maneira eu o verei Redentor verdadeiro,
desaventurada! meu Deus, meu Senhor e meu Salvador.
Eu o verei, eu,
Entrando na casa de sua prisão, e achando Abel seu filho, preso naquela infernal não outrem por mim, nem com olho seu,
estância, fizeram todos um pranto, cantando a três vozes; e acabando diz o mas o meu olho, assim como está;
porque minha carne se levantará,
MUNDO – Eis Job vem falando há grande pedaço, e em carne mea verei o Deus meu,
triste com causa de ter grão tristeza. que me salvará.
TEMPO – Oh quantos haveres e quanta riqueza
perdeu aquele homem em tão pouco espaço! SATANÁS – Prosigue tu embora tua mania,
MUNDO – Infinitos gados que Deus bem de chapa te assenta ele a mão:
e muitos haveres lhe tenho já dados derribou-te agora as casas no chão,
e tudo lhe foi através brevemente; e matou-te os filhos morte supitânia.
porque Satanás o achou excelente, JOB – Verdade é isso?
todos seus bens lhe tem assolados, SATANÁS – Assim me veja eu rei do Paraíso.
e Job paciente. JOB – Bento e louvado seja o Deus dos Céus!
SATANÁS – Se o tu renegasses, temer-t'ia Deus,
JOB – Se os bens do mundo nos dá a ventura, e correr-se-ia muito de te fazer isso.
também em ventura está quem os tem. JOB – Lá, lá aos incréus!
O bem que é mudável não pode ser bem,
mas mal, pois é causa de tanta tristura; SATANÁS – Assi! ora espera, farei que renegues,
e se Deus os dá, quero fazer o que Deus me manda.
como eu creio mui bem que será,
e a fortuna tem tanto poder, (Toca Satanás a Job, e fica coberto de lepra)
que os tira logo cada vez que quer,
o segredo disto, oh! quem m'o dirá, JOB – Oh chagado de mi, que esta é outra demanda!
pera o eu saber? Oh Deus meu! e porque me persegues?
Contra mi perfias,
SATANÁS – Falemos um pouco, Job, a de parte sabendo que nada são os meus dias!
sobre esse segredo, verás que te digo. Minha alma s'enoja já de minha vida,
Eu quero-te bem e sou teu amigo, e como a seta é minha partida.
sem usar contigo cautela nem arte. Senhor, meu Senhor! porque te desvias
Tu saberás, de tua guarida?
e não me descubras nem hoje nem crás, Responde-me, quantas maldades te fiz?
Deus é aquele que trata assi; Ou quantas treições obrei contra ti?
quer-te grão mal e diz mal de ti:. Porque assim escondes a face de mi,
não cures dele, e logo tornaras como meu contrário, sendo meu juiz?
a como te vi. Contra a folha prove,
Tu dás com teus males louvores a Deus, que ligeiramente o vento revolve,
e ele pesa-lhe por tu nomeá-lo: mostras as forças que tu tens contigo?
renega, renega de ser seu vassalo, Porque te puseste contrário comigo?
e logo verás tecer outros véus. Que a tua bondade me escusa e absolve
JOB – Se o eu leixar. de ser teu imigo.
qual é o senhor que m'há d'emparar? Senhor, homem de mulher nascido
Qual é o Deus que me pode valer? muito breve tempo vive miserando,
Nos bens desta vida não está o perder, e como flor se vai acabando,
que assi como assi cá hão-de ficar, e como a sombra será consumido.
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