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Quando estive em Madrid pela última vez, cerca de uns vinte

anos atrás, não existiam cafeterias nesta cidade, sim, um


desastre mundial com certeza, como consegui sobreviver?
Grande questionamento.
Menos mal que meu vício fora descoberto há três anos atrás,
depois de passar longas horas acordada treinando passarela na
Califórnia. E bem, os meus dias atuais, não começam sem café.
Eu deveria ter escolhido alguma casa em Lavapiés, de fato todas
as melhores cafeterias estão neste bairro, meu sonho de
consumo seria de longe acordar com o cheiro do grão sendo
torrado.
Céus, até fico arrepiada com a hipótese.
Lembro-me vagamente de quando era pequena, de que esta
cidade era mais pequena, agora, você encontra de tudo por
aqui. Inclusive...
Céus, de onde saíram estes espanhóis? Marina irá surtar
quando parar para analisar as beldades que a capital está
exibindo. É por este motivo que eu amo o tempo e a sua
evolução, quando eu saí daqui, era tudo mato, um sujeito mais
medonho que o outro, eu mesma, nossa senhora de Almudena,
eu era o mais sinistro espermatozoide feminino que vagava por
estas terras. Mas, observem agora, a cartada bateu na mesa, o
tempo foi bondoso comigo.
Graças à Cristo, ninguém merece viver no glow down para
sempre.
Graças ao tempo, me tornei modelo há quatro anos atrás,
definitivamente, o melhor destino para mim, conquistei toda a
minha liberdade através das passarelas, apesar de que, hoje em
dia, é meio exaustivo seguir à risca todas as regras que a
passarela te trás. É um verdadeiro saco, às vezes.

“Coma pouco, se não ficará inchada”.


“Beba pouca água, ela lhe deixará com retenção”.
“Não consuma doces, quanto menos glicose, melhor”.
(Discordo terrivelmente desta parte, quem é o anormal que
consegue não consumir?).
“Não beba, em hipótese alguma”.
(Há certos limites que precisam ser respeitados, ou eu estou
errada? Isso já é sacanagem).
É claro que, sendo uma boa filha da minha mãe, eu não sigo
nenhuma delas, mas, o que ninguém sabe, ninguém explana,
fato. Eu jamais deixaria que minha carreira adoecesse meu
corpo, gosto de ser magra, mas na medida em que eu tenha
massa e gordura suficiente para ser saudável. E isso nunca me
diminuiu.
Apesar de que, as demais modelos, as que estão em ascensão,
se comportem feito cabritas no abate umas com as outras, eu
nunca de fato liguei.
Acredito fielmente que esta fase passa.
Todas possuem o seu diferencial e potencial, e bem, o meu são
os quadris.
Genética graciosa.
Claro que, nos dias atuais, eu evito o máximo possível me
popularizar nas passarelas, parecer ser uma jovem medíocre,
como concierge no Palace, faz parte do meu plano de descobrir
o sumiço de Javier, meu misterioso papai, que das duas uma, ou
ele fugiu da paternidade, há uma grande chance ou, sumiu por
boicotagem. E eu nunca estive tão sedenta para saciar essa
dúvida, ninguém merece conviver com uma incerteza como
esta. Foi por isto que retornei à esta cidade. E não voltarei para
a Califórnia até descobrir o que dona Amélia esconde de mim,
se a verdade não sair pela boca dela, eu irei por conta própria
descobrir. Mi madre não é uma pessoa ruim, mas algo nela
mudou quando tivemos que sair da Espanha, me chateia que
ela não seja sincera comigo, mas, com o tempo eu compreendi
que, as pessoas têm os motivos que tem para agirem de tal
maneira.
Mas claro que, eu ainda tento tirar uma casquinha da carranca
toda vez que nos vemos, afinal, quem seria melhor para me
esclarecer a verdade do que minha própria mãe, certo?
Ah qual é! Eu não acredito que eu esteja errada em querer ao
menos saber se meu pai está vivo ou, se nos abandonou porque
quis e não por motivos maiores. Isso não é nenhum luxo.
A menos é claro, que ele não queira saber sobre mim, neste
caso, eu enterrarei o assunto, apesar de todos os esforços para
acha-lo.
Afinal, não podemos sofrer ou correr atrás de alguém pela vida
toda, como se isso fosse nos salvar de algo. Se a outra pessoa
escolheu não ter você na vida dela, é porque seu lugar
certamente não cabe a ela. É menos trabalhoso e mais
conformável aceitar as escolhas das pessoas, do que mudar a
cabeça de alguém sobre algo que já está para ela.
Quem é essa moça linda sentada neste café? Posso me juntar a
você? - Perguntou madre ao passar em meu lado e sentar de
frente para mim em uma mesa para dois.
Amélia Perez é uma quase senhora de 60 anos, ela vive em
Madrid sozinha desde que me formei na faculdade e fui para a
Califórnia
A moça é a cópia em xerox de uma mãe gatíssima, não sei se a
senhora curte coroas à flor da pele, mas posso te apresentar a
ela. - Respondo mamãe, ela enlouquece quando a chamo de
coroa.
Amélia automaticamente pega uma das facas posta à mesa –
sem corte algum, provavelmente não mataria nem um grilo - E
mira em minha direção.
Me chame de senhora de novo e eu te esmigalho aqui hein.

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