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REVELIA E A APLICAÇÃO DE SEUS EFEITOS À PESSOAS

HIPOSSUFICIENTES
Aluna: Luísa Gabriel Vilar
Universidade Católica de Pernambuco
Orientador: Mateus Pereira

Este presente resumo busca estudar o conceito de Revelia por um todo,

avaliando a sua definição no Código de Processo Civil brasileiro, estabelecendo

como os seus efeitos afetam pessoas hipossuficientes.

Em um Procedimento Judicial, existem várias ações que podem ser tomadas,

tanto pelo autor, quanto pelo réu. Quando se fala sobre atitudes do demandado,

pode-se identificar como uma das mais prejudiciais para tal, a Revelia.

De causas a efeitos, a revelia ou contumácia, como interpretam alguns

doutrinadores, está prevista no Art. 344 do Código de Processo Civil, e consiste

quando o réu não responde à citação, não comparecendo ao processo. Tendo em

vista o sistema processual brasileiro, mesmo que o demandado não compareça à

audiência de conciliação designada pelo juiz, abre-se prazo para apresentação de

contestação. Caso ele, mesmo sendo devidamente citado e intimado, não

apresentar defesa dentro do prazo estipulado no ordenamento, ele é considerado

como revel.

A revelia, assim como a exceção e reconvenção, é um dos comportamentos

possíveis a ser tomado pelo réu em um processo. Seus efeitos consistem na

presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor, desnecessidade de

intimação posterior do réu revel, e julgamento antecipado por mérito, além do réu,

perder o direito de se manifestar no processo e juntar provas ou arrolar

testemunhas. Mesmo que possa ser presumida a veracidade da demanda alegada,

não significa que tal consequência será tida como fato, pois o Art.345 do Novo

Código de Processo Civil prevê algumas exceções para tal, lê-se:


“Art. 345. A revelia não produz o efeito

mencionado no art. 344 se:

I - havendo pluralidade de réus, algum deles

contestar a ação;

II - o litígio versar sobre direitos indisponíveis;

III - a petição inicial não estiver acompanhada de

instrumento que a lei considere indispensável à prova do

ato; ”

IV - as alegações de fato formuladas pelo autor

forem inverossímeis ou estiverem em contradição com

prova constante dos autos.

Entretanto, levando em consideração o cenário atual brasileiro, surge um

questionamento: Como se dá a aplicação desses efeitos às pessoas que não detém

recursos adequados para comparecer em juízo ou realizar defesa?

No Brasil, um país de grande desigualdade, enxerga-se o réu revel com maus

olhos, tanto pelo juízo, quanto pela própria sociedade, deixando se ser um ausente

e virando um delinquente.

É fato que a revelia ocorre normalmente a pessoas com recursos escassos,

ou com baixo nível de instrução. Perceba, é essencial levar em consideração os

fatores que levam o réu a se tornar revel. Seja pelo fato da incapacidade de

deslocamento, devido à grandes distâncias, a má informação acerca dos

procedimentos jurídicos ou até a dificuldade de conseguir um advogado.

Analisando uma situação corriqueira, uma senhora de idade avançada recebe

uma intimação para comparecer em audiência de conciliação, relativa a processo de

divórcio litigioso. Ao ler tal documento entregue pelo oficial de justiça, não sabe ao
certo do que se trata, visto que está em uma linguagem rebuscada e utiliza de

termos jurídicos. Pelo fato de nunca ter recebido algo do tipo, e já estar separada de

fato do ex companheiro há mais de 30 (trinta) anos, não comparece à audiência por

não saber da importância do processo, e não apresenta contestação por não

conhecer dos efeitos da revelia.

O ponto é, na inicial apresentada pelo autor contra a senhora, pede que

sejam pagos o percentual de 15% (quinze por cento) do valor da causa, relativos

aos honorários advocatícios. Tais consequências recaem sobre a senhora, que é

hipossuficiente e não possui condições de arcar com os custos.

Segundo o doutrinador, Prof. Luís Antônio de Andrade, lê-se:

“É notório, com efeito, que a omissão de

defender-se, num país como o nosso, nem sempre faz

presumir que o réu disponha de argumentos para

impugnar o pedido do autor. A omissão, muitas vezes,

resulta de outras causas, como a má compreensão do

que significa ser citado para um processo, a dificuldade

de obter advogado, por falta de meios ou

impossibilidade de percorrer distâncias longas, etc.

Tanto assim é que na maior parte dos casos a revelia

ocorre com pessoas de recursos escassos ou de baixo

nível de instrução” e afirma que não é suficiente

permitir-se ao revel ingressar no processo a qualquer

momento, pois, o que lhe adiantará essa “atividade

probatória, se de antemão estiver determinado que o juiz

tem de reputar verdadeiros os fatos afirmados pelo

autor?”.

Apesar do Estado dispor da Defensoria Pública para auxiliar aqueles que não

detém condições financeiras de arcar com advogados particulares, o acesso à

justiça continua negligenciado. Mesmo âmbito teórico sendo bastante utópico e


aparentar solucionar tal problema de maneira mais simples e rápida, a demanda por

assistência judiciária é exorbitante, criando uma defasagem no atendimento.

Não cabe a esse resumo analisar os problemas referentes à Defensoria

Pública, sendo internos ou por culpa do Estado, mas sim como a alta demanda

afeta o atendimento daqueles que buscam por representação processual, a fim de

evitar a revelia.

Ou seja, acaba que ajuda ofertada na elaboração de contestação, não serve

para solucionar de fato a necessidade do assistido, devido à indisponibilidade de

horários vagos, impossibilitando que o réu acesse com maior rapidez os serviços da

Defensoria.

Por essas e outras razões, vem o doutrinador Calmon de Passos:

“O Brasil é um continente, segundo velho, mas

expressivo, lugar-comum. Possui Estados

dolorosamente pobres e atrasados, onde analfabetos e

marginalizados vivem em lugares precariamente

servidos de meios de comunicação e nos quais muitas

vezes nem chegou a ser visto um profissional de direito.

Lugares aonde as partes, sem que isso constitua

raridade, nem mesmo sabem o real significado de uma

citação e, recebendo-a das mãos do oficial (quando as

recebem), procuram na cidade o coronel ou o compadre

letrado, para que as oriente a respeito. E tanto o oficial

quanto o citado viajam léguas ‘na alpercata’, que ainda é

meio de comunicação do mundo esquecido deste Brasil

que não ‘cheira’ ao mar, nem ao café, nem ao petróleo.

E todos são brasileiros, apesar de tudo. E porque o são,

aliando a essa qualificação cívica a qualificação de

seres humanos, esses Josés de Coisa Nenhuma

deveriam ser considerados como um dado relevante na

solução de problemas dessa ordem. Os cultos, os


bem-providos, ou bem nascidos e os bem-situados

financeira e geograficamente, esses dificilmente são

revéis. Mas os outros, os que se situam fora da cerca,

ou dentro do cercado, esses dificilmente não são revéis

de fato ou de direito. E eles foram esquecidos”

Em suma, o réu revel não necessariamente aquele que “ignora” o processo,

ou não se preocupa com o andamento do mesmo. É necessário avaliar inúmeros

aspectos que levam o demandado a não comparecer em juízo, seja por questões de

mobilidade, financeiras ou puro desconhecimento do assunto.

Existem diversos aspectos que vão além do mero estudo da revelia, como a

baixa escolaridade ou evasão escolar, que impede a população de conhecer ou

estudar o mínimo de seus direitos, até a própria previsão legal que não expressa de

maneira clara as outras possíveis maneiras de se pronunciar no processo.

Por isso a aplicação de seus efeitos deve ir além da mera previsão legal, que

é restrita, e não abrange situações em que pessoas hipossuficientes são levadas

em consideração.

Referências Bibliográficas

SANTOS, Marcel Mascarenhas dos. A Revelia no Processo Civil e a Questão


Social: ao revel pobre deve ser aplicado o efeito da revelia? 2006, 25 fls
Disponível em: <http://www.direito ufba.net/artigos/artigo 023.doc>. Acesso em:
15/11/2023.

JÚNIOR, José Wilson Sales. O Instituto da Revelia. 2003, 45 fls Disponível em:
<https://www.mpce.mp.br/wp-content/uploads/ESMP/monografias/proc.civil/o.institut
o.da.revelia[2003].pdf>. Acesso em: 15/11/2023.

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