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PCNS E A TRANSPOSIÇÃO DOS GÊNEROS TEXTUAIS PARA A

SALA DE AULA1

Érica Araújo
Jeronilda Sanches
Larissa Carvalho2

O enfoque temático do presente artigo é circundado por questões concernentes aos


PCNs (doravante Parâmetros Curriculares Nacionais) de 3º e 4º ciclos do Ensino Fundamental
- Língua Portuguesa e a Transposição dos Gêneros discursivos para a prática de leitura e
escrita em sala de aula. A prioridade desse trabalho é promover uma reflexão acerca da
disseminação do ensino dos Gêneros do discurso na esfera pública e privada de ensino. Para
assegurar esse objetivo, julgamos necessário demonstrar a distância entre Teoria x Prática no
ensino de Língua Portuguesa via Gêneros discursivos. Alicerçado aos Parâmetros
Curriculares Nacionais e às teorias propostas por Bakhtin (2000 e 2003), Rojo (2000) e
Marcuschi (2005) que prezam pela adoção do referido conteúdo no âmbito educacional, esse
artigo pretende se constituir como instrumento de reflexão, reavaliação e renovação das
práticas educativas comumente propostas pelos profissionais de educação da área de Língua
Portuguesa.

Palavras chave: Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa, Transposição


didática, Gêneros do discurso, Renovação metodológica.

INTRODUÇÃO

O interesse pela produção desse artigo surgiu a partir das leituras realizadas sobre o
mecanismo das aulas de Língua Portuguesa, no que se refere à disseminação do ensino dos
Gêneros discursivos ou textuais. Nesse contexto, percebemos que o conteúdo mencionado,
quando ,de fato, era introduzido aos discentes, por vezes se constituía de erros. Isso nos faz
pensar que o educador não possuía entendimento adequado do tema para transpô-lo e, por
alguma razão teve de ministrar aulas a esse respeito.

1
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à coordenação do Curso de Letras com Habilitação em Língua
Inglesa e Respectivas Literaturas das Faculdades Jorge Amado, do semestre de 2008.1, sob a Orientação do Prof.
Ms. Ismahelson Luiz Andrade.
2
Graduandas do Curso de Letras com Habilitação em Língua Inglesa e Respectivas Literaturas das Faculdades
Jorge Amado.
2
Nesse sentido, a inevitável conclusão se revela diante de nós, futuros profissionais da
área de Língua Portuguesa: o atual cenário educacional brasileiro encontra-se “carente” de
mudanças metodológicas e de profissionais habilitados para a promoção do conhecimento. Ao
fazer referência a palavra “carente”, queremos assinalar a necessidade de promover uma
renovação da práxis educativa, que culmine num aprendizado efetivo e também, em uma
formação (docente e discente) satisfatória.
No âmbito da renovação da prática educativa os professores, protagonistas da
educação, contam com um grande aliado, no que diz respeito à natureza social e educacional
do processo de ensino/aprendizagem, os PCNs, que procuram oferecer importantes subsídios
para a implantação de uma reforma na educação brasileira.
Apontado pelos próprios PCNs como um dos conteúdos para transposição didática, o
tema “Os gêneros textuais como objeto de ensino”, será de agora em diante, o centro das
discussões desse artigo. Em sintonia com um estudo aturado de diferentes materiais, que
trazem como tema principal os Parâmetros e a sua transposição para sala de aula, iremos
realizar uma análise dos componentes social, histórico e cognitivo dos gêneros textuais, bem
como sua inserção institucional, e maneiras de transpô-los para sala de aula, a partir de
soluções oferecidas pelos parâmetros e autores, como Bakhtin (2000 e 2003) Marcuschi
(2005) e Roxane Rojo (2000).
Apresentaremos a abordagem textual realizada preferencialmente pelos professores
de LP (doravante Língua Portuguesa) e, em seguida apresentaremos a abordagem dos gêneros
textuais como objeto de ensino/aprendizagem preconizada por Bakhtin e outros autores. Todo
esse processo tem a finalidade, não só de contrastar as duas formas de ensino do texto, mas
também, favorecer o ensino dessa última.
Finalmente será feita uma contraposição entre teoria e prática, mostrando a distância
existente entre elas, com o propósito de ressaltar a importância de promover uma formação
inicial e continuada dos educadores, para que esses possam transmitir o conteúdo aqui
abordado, de maneira inequívoca.

SOBRE OS PCNs

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), aprovados no governo do ex-


presidente Fernando Henrique Cardoso, no ano de 1998 foram elaborados com o objetivo de
solucionar a problemática educacional brasileira. Segundo Rojo (2000, p. 27):

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A elaboração e a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais,
para o Ensino Fundamental representam em minha opinião, um avanço
considerável nas políticas educacionais brasileiras, em geral e, em
particular, no que se refere aos PCNs de Língua Portuguesa, nas políticas
lingüísticas contra o iletrismo e em favor da cidadania crítica.

Os PCNs se constituem como diretrizes que norteiam os currículos e seus conteúdos


estão pautados numa prática educativa que assegura a construção da cidadania. Eles apontam
para a necessidade de uma reforma em todos os níveis educacionais, uma vez que as
metodologias e critérios de ensino se encontram defasados. Por isso, se faz necessária uma
reflexão sobre as necessidades e as dificuldades enfrentadas pelos professores de Língua
Portuguesa, ao tentar aplicar os PCNs às práticas de sala de aula.
No que se refere à área de conhecimento Língua Portuguesa, os PCNs assinalam
como responsabilidade do docente, a combinação de textos orais e escritos, como forma de
desenvolver as habilidades comunicativas dos discentes. Nesse sentido, o educador tenderá a
ampliar o repertório lingüístico, ao passo que contribui para o desenvolvimento da capacidade
discursiva dos educandos, formando assim, pessoas mais atuantes e conscientes do papel que
representam na sociedade.
Dentro desse contexto se insere a concepção enunciativa/discursiva da linguagem
considerada pelos PCNs como objeto de ensino de Língua Portuguesa, tanto na perspectiva
oral quanto na escrita, sobre a qual abordaremos a diante.

A PROPOSTA DAS ESCOLAS (PRODUÇÃO E LEITURA DE TEXTO)

O mecanismo das aulas de Língua Portuguesa, no que concerne ao trabalho com


textos escritos e orais, está arraigado a um ensino eminentemente tradicional, sem a devida
reflexão sobre a língua como prática social. Quando direcionamos o título “tradicional” ao
ensino, não o fazemos com a conotação de qualidade “ruim” ou “antepassada”, porém
consideramos que o ensino tradicional pode denominar-se ruim, se não ajustado às
necessidades de aprendizagem dos discentes, à realidade e ao contexto social, histórico e
cultural em que eles estão inseridos.
A abordagem da tipologia textual, baseada em aspectos meramente classificatórios
tem sido disseminada predominantemente pelos professores de LP. Em função disso, os
elementos da enunciação (locutor/interlocutor, tema discutido, lugar social, visão ideológica,
momento histórico, a intenção, a finalidade, dentre outros.) não conseguem ser capturados, a

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partir dessa abordagem textual. Segundo Peixoto (2000, p.152) “A maioria dessas tipologias
está calcada em critérios estruturais/formais (narração, descrição, dissertação, etc.) ou
funcionais (textos informativos, textos literários, textos apelativos)”.
Marcuschi (apud Dionízio 2005, p.23) concebe a noção tipológica do texto como
sendo: “(...) seqüências lingüísticas ou seqüências de enunciados no interior dos gêneros e não
são textos empíricos”. Ainda segundo Marcuschi, os tipos textuais possuem classificações
finitas: “(...) sua nomeação abrange um conjunto limitado de categorias teóricas determinadas
por aspectos lexicais, sintáticos, relações lógicas, tempo verbal.”
A partir do ensino tipológico, o educando fica restrito à classificação categórica do
texto, e quando tenta produzir um texto baseado numa dada tipologia, se atrapalha
freqüentemente com outra, ou seja, decoram as características, por exemplo, de um texto
dissertativo, contudo não conseguem produzí-lo ou identificá-lo em outra ocasião.
Um fato importante de ser relatado é que, o texto dissertativo, por vezes, é
apresentado aos alunos somente no último ano do Ensino Médio. Os professores partem do
pressuposto que ensinando a dissertação, estarão contribuindo para um bom desempenho dos
alunos na produção da redação requerida pelo vestibular. Fato que efetivamente não ocorre.
Resultados de pesquisas identificam e comprovam as dificuldades apresentadas pelos
estudantes na construção e produção de texto, apesar dos esforços prestimosos dos professores
ao tentar ensinar, apenas e tão somente, a tipologia do texto.
Freqüentemente, as questões propostas nos livros didáticos ou elaboradas pelos
próprios educadores, no que se refere à identificação de um tipo textual são realizadas sem
nenhuma preocupação em estimular o aluno a refletir sobre a língua. O educador apresenta
um texto e pede para identificar as características que comprovam o seu pertencimento a uma
dada tipologia, ou até mesmo solicita a produção de um tipo de texto. Ora, que reflexão o
educando poderá obter de uma questão como esta? Fatalmente, o aluno concluirá o Ensino
Médio sem conseguir produzir, tampouco compreender um texto. Com essa afirmação não
desejamos responsabilizar integralmente o professor pelo desempenho insuficiente dos
estudantes, em relação às peculiaridades da Língua Portuguesa, até porque este profissional da
educação está submetido, as falhas do sistema educacional, ou seja, convivem com salários
extremamente baixos, sobretudo desmotivantes, carga horária exaustiva e, pior uma inércia
dos órgãos educacionais para solucionar as mazelas da educação.
Um fator decisivo que favorece o desempenho lingüístico/discursivo dos discentes
que poderia, ou melhor, deveria ser adotado como subsídio na assimilação do conteúdo, é
agregar às aulas, a leitura e produção de diversos gêneros textuais. Tendo em vista que o

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exercício contínuo da leitura é um método eficaz para dominar a Língua Portuguesa, no
sentido de comunicação e expressão que inclui ler, escrever, ouvir e falar, o desinteresse pela
leitura incidirá, indubitavelmente, numa má articulação das idéias tanto nas construções
escritas e quanto nas faladas.
As atividades de classificação e produção textual recomendados pelos profissionais
de Língua Portuguesa de instituições públicas e privadas não requerem dos alunos nenhum
esforço na obtenção das respostas e, também e nenhuma reflexão sobre os aspectos inerentes
ao texto no momento da produção que incluem a linguagem, objetivo, função social dentre
outras, ou seja, falham no que se refere à explicitação do conteúdo pautada num ensino
contextualizado
O educador, de uma maneira geral e, em especial o de Língua Portuguesa
desempenha o papel de mobilizar diversos recursos no sentido de despertar no aluno um
gradativo desejo de ler, o que pode ser feito de diversas formas, dentro e fora da sala de aula.
O professor deve reservar um espaço na suas aulas para promover a leitura, dando
oportunidade aos alunos compreenderem o universo do texto, a fim de que eles possam, a
partir disso, ter uma noção de como redigir um texto de forma coerente, concisa, adequando a
linguagem a cada contexto dentre outros aspetos imanentes à natureza textual. Ressaltamos,
porém, que esse processo não ocorre de maneira tão regular, haja vista que os professores nem
sempre se encontram em situações favoráveis para propiciar ao aluno, aulas dinâmicas com
incentivo à leitura e apresentação de diversos gêneros textuais.
Nesse ínterim, acreditando que a metodologia empregada pelo professor, deixa claro
que tipo de sujeito (autônomo ou passivo) ele quer formar, a linguagem escrita e oral não
pode ser considerada mera forma dos indivíduos se expressarem, ela é acima de tudo, um rico
instrumento para indivíduo inserir-se no mundo. Seguindo uma modalidade inovadora de
ensino de texto, docente tende a despertar no aluno o senso crítico, formando assim, seres
pensantes, capazes de interagir, tecer comentários, concordar, criticar, opinar, enfim o
discente pode torna-se ser um sujeito mais participativo, conseqüentemente menos ouvinte,
não apenas no âmbito escolar, mas, sobretudo, no âmbito social.

OS GÊNEROS DISCURSIVOS

Os gêneros textuais se desenvolveram a partir da concepção contextualizada e


funcional do texto cunhada pela Lingüística Textual. Nesse sentido, o texto foi compreendido

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como sendo organizações sociais e históricas oriundas das diversas esferas da atividade
humana.
De acordo com Marcuschi (apud DIONÍSIO et al, 2005, p.20), um pequeno conjunto
de gêneros foi desenvolvido pelos povos cuja cultura era especialmente oral. A partir da
invenção da escrita alfabética, aproximadamente no século VII a. c , os gêneros foram se
multiplicando, surgindo os gêneros referentes à escrita. Atualmente presenciamos uma
efervescência dos gêneros escritos e orais. O avanço tecnológico e as novas invenções da
comunicação a exemplo do telefone, rádio, TV e, em especial, o computador (internet),
propiciaram o surgimento de novos gêneros.
A noção de gênero é emergente no contexto escolar e acadêmico, em função disso, o
ensino desse conteúdo tem sido pouco efetivado pelos educadores de Língua Portuguesa, o
que certamente dificulta a sua transposição para o ambiente de sala de aula.
No entanto, antes de relatar o entendimento sobre gêneros textuais, julgamos
necessário lembrar que gêneros são todos os tipos de texto, sejam eles literários ou não.
Alguns considerados como modalidades discursivas, em vista das suas funções sociais e de
sua estrutura (narrativas, dissertativas, argumentativas, procedimentais e exortativas) e outros
como gêneros textuais (anúncios, convites, atas, avisos, bulas, cartas, comédias, contos de
fadas, convênios, crônicas, ementas, ensaios, entrevistas, reportagem, artigo de opinião,
decretos, discursos políticos, histórias, letras de música, leis, notícia, entre outros.). Essas
modalidades têm muito em comum o fato de todas relatarem acontecimentos atuais e de
interesse público, ou seja, cada modalidade possui uma função específica destinada para um
público específico.
O ensino de Língua Portuguesa via gêneros textuais, além de permitir desenvolver um
exercício mais pleno da cidadania, norteia também os aspectos envolvidos em atividades de
leitura e produção de texto, orientando os alunos na percepção de parâmetros mais claros para
compreender e produzir textos.
O educador pode e deve explorar os gêneros de forma progressiva, de acordo com as
possibilidades e necessidades de aprendizagem dos alunos. Como bem enfatizam os PCNs, os
conteúdos de LP devem seguir esse critério. Ao contrário do que se possa imaginar, não há
um momento exato para introduzir os gêneros do discurso. O que nós esperamos é que, a
partir de um exercício de sondagem, o professor possa redefinir técnicas metodológicas que
permitam o aluno se apropriar do conhecimento de maneira adequada.
Como forma de ratificar as contribuições que os gêneros trazem, tomemos por base o
ensino do gênero carta. Quando o professor solicita aos alunos a produção de uma carta

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destinada a um amigo, supondo que ele, previamente, já havia introduzido diversos de
gêneros e discutido suas características, finalidade etc, o aluno, cônscio da natureza do
referido conteúdo, saberá, portanto, o interlocutor a quem irá direcionar o objetivo da
produção e a linguagem que utilizará na elaboração dessa carta. Os elementos supracitados
são parâmetros que possibilitam ao aluno um melhor entendimento no quesito linguagem em
uso, ele compreenderá que a linguagem é maleável, adequada ao tipo de ouvinte, ao contexto
social em que ele está inserido, enfim, entenderá que o texto exerce, principalmente, uma
função social.
O debate, gênero inerente à oralidade pode, por exemplo, ser contemplado nas séries
do Ensino Fundamental e Médio, desde que o educador possua o domínio sobre o conteúdo. A
transposição desse gênero pode ocorrer de diversas maneiras, a exemplo dos debates sobre
temáticas de filmes, acontecimentos históricos, fato ocorrido na sociedade, ficando a critério
do professor a opção ajustada ao grau de letramento dos estudantes. Em uma atividade como
essa, é possível trazer implicações históricas, sociais e culturais. O aluno, diferentemente de
uma atividade de denominação de texto, tenderá a refletir, argumentar, defender seu
posicionamento ideológico, atuando de forma crítica sobre a temática socializada em sala de
aula.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa, embasados na concepção
enunciativa proposta por Bakhtin, mostram que o trabalho com diferentes gêneros textuais de
forma contextualizada desenvolve a competência comunicativa fundamental para a construção
significativa para a formação do indivíduo. Os PCNs selecionam os gêneros de acordo com a
sua circulação social são eles: gêneros literários, de divulgação científica, publicitários,
concebidos como gêneros em que se verifica uma utilização mais freqüente, no que concerne
à na leitura e produção de texto.
Marcuschi (apud DIONÍZIO 2005, p.23), utiliza a noção Gênero textual para se referir
aos textos materializados que encontramos no cotidiano cujas características são sócio-
comunicativas definidas pelos conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição. “(...)
sua nomeação abrange um conjunto aberto e praticamente ilimitado de designações concretas
determinadas pelo canal, estilo, conteúdo, composição e função”. Marcuschi parte do
pressuposto que é impossível haver comunicação sem o intermédio dos gêneros, assim como
é impossível haver comunicação verbal a não ser por algum texto. Essa idéia, também
preconizada por outros autores permite conceber a língua como atividade social, histórica e
cognitiva, ou seja, a língua é tratada em seus aspectos discursivos e enunciativos e não por
seus aspectos estruturais.

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Dolz e Schneuwly (apud ROJO 2000), pesquisadores da Universidade de Genebra
propuseram “agrupamentos dos gêneros” com a finalidade de classificá-los e facilitar sua
inserção escolar. Os cinco agrupamentos sugeridos são: Gêneros da ordem do narrar (Ex:
contos de fadas, fábulas, lendas, romance policial etc.); Gêneros da ordem do relatar (Ex:
diários, autobiografias, relatos históricos, reportagens, notícias), Gêneros da ordem do
argumentar (Ex: resenhas - críticas, textos de opinião, carta de leitor, ensaio etc.), Gêneros da
ordem do expor (Ex: seminário, verbete de enciclopédias, texto explicativo etc.) e Gêneros da
ordem de descrever ações (Ex: receitas, bulas, instrução de montagens, estatutos regras de
jogos etc.).
Segundo Peixoto, esses agrupamentos não se caracterizam como única possibilidade
de ensino/aprendizagem, mas possuem a vantagem de tematizar o contexto social e histórico.
A importância da classificação dos gêneros se destaca por permitir uma progressão curricular,
ou seja, o educador tende a oportunizar os alunos a (re) conhecerem as variedades dos gêneros
discursivos desde as seres iniciais.
De acordo com Bakhtin (apud ROJO 2000, p. 152), os gêneros do discurso permitem
capturar aspectos de ordem social e histórica, e ainda permitem considerar a situação de
produção de um determinado discurso.

(...) cristalização de formas de dizer sócio- historicamente


constituídas, como objeto de ensino, pelo fato de esse conceito incluir
aspectos da ordem da enunciação e do discurso, pode contemplar de
maneira mais satisfatória, o complexo processo de compreensão e
produção de texto.

Isso não requer dizer que os gêneros não apresentem uma forma definida, até porque,
em algumas situações, a forma irá defini-lo, porém, em outras situações eles serão definidos
por sua função. É possível, por exemplo, encontrar o gênero artigo de opinião no formato de
um poema. Esse processo, segundo Úrsula Fix (apud DIONÍZIO 2005, p. 31) denomina-se
“intertextualidade inter-gêneros“ quando há uma hibridização dos gêneros em que um gênero
textual assume a função do outro. Em situações como essas, sabendo da dinamicidade dos
gêneros, não haverá dificuldades interpretativas, pois a verificação do predomínio da função
do gênero é o fator que evidência a sua denominação O educador habilitado, certamente não
encontrará dificuldades para apresentar a definição do gênero para os educandos. Por outro
lado, o educador que mal conhece o universo que compões os gêneros textuais, decidirá por
não apresentar essa estrutura, ou o fará de forma errônea.

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De acordo com Bakhtin (2005, p.262) a indefinição terminológica dos gêneros advém
do fato da heterogenia funcional que eles apresentam, portanto não há um único plano para o
seu estudo.

A riqueza e a diversidade dos gêneros do discurso são infinitas por


que são inesgotáveis as possibilidades da multiforme atividade
humana e por que em cada campo dessa atividade é integral o
repertório de gêneros do discurso, que cresce e se diferencia à medida
que se desenvolve e se complexifica um determinado campo.

São várias as tentativas de conceituar os gêneros, não há uma possibilidade mais


provável que outra. Acreditamos, porém, que algo é correto afirmar sobre os gêneros: eles
não seguem um rigor quanto à sua forma lingüística ou estrutural, pelo fato de se
apresentarem como instrumento de uso dinâmico e moldável da criação humana.
Marcuschi (apud Dionízio 20005 p.30) ratifica a afirmação supracitada: “Os gêneros
não são entidades naturais como as borboletas, as pedras, rios e as estrelas, mas são artefatos
naturais construídos historicamente pelo ser humano”.
As discussões aqui comentadas se destacam por fomentar reflexões sobre as práticas
metodológicas, construindo assim, alternativas para uma abordagem textual que favoreça o
aprendizado dos discentes, no sentido de contribuir para um melhor desempenho lingüístico
nas produções escritas e orais.

TEORIA VERSUS PRÁTICA (OS DESAFIOS DA TRANSPOSIÇÃO)

A abordagem dos gêneros textuais ou discursivos na unidade escolar se apresenta


como uma proposta inovadora de ensino-aprendizagem, uma vez que não capturam apenas, os
aspectos estruturais do texto, mas também sócio-históricos e culturais. Peixoto (Apud Rojo
2000, p.158) contrapõe a tipologia textual e os gêneros textuais, preferindo a segunda
modalidade de ensino “... o trabalho com diferentes gêneros do discurso, em contraposição a
um trabalho baseado em diferentes tipos de texto, definidos apenas por sua estrutura e função
é mais satisfatório, tendo em vista o desenvolvimento das capacidades discursivas”. Nesse
sentido, os gêneros do discurso possibilitam um melhor tratamento da linguagem oral e do
processo de compreensão e produção de texto.
Todavia, a adoção dos gêneros discursivos como conteúdo, pode se revelar como um
dos grandes desafios para a transposição dos PCNs. Segundo Roxane (2000), alguns desafios

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circundam a adoção dos gêneros textuais: o primeiro e o mais importante desafio é a formação
inicial e contínua dos professores, que inclua revisões curriculares dos Cursos de Letras e das
disciplinas Prática de ensino e projetos que favoreçam aos atuais professores de LP (doravante
Língua Portuguesa).
O professor é o alicerce da educação, portanto ele deve, dentre um conjunto de
indicações para o exercício da docência, possuir um nível de instrução e apropriação do
conhecimento adequado, e, sobretudo estar disposto a revisar, ou até mesmo modificar sua
metodologia de ensino, sempre que os educandos apresentarem um grau de compreensão do
conteúdo insatisfatório, ou até mesmo quando reconhecer que o conteúdo ensinado não
atingiu a finalidade proposta, do contrário, não faria sentido, a freqüência do discente à
escola. A propósito, o que aprenderia? Ou melhor, aprenderia de maneira correta um dado
conteúdo? Questionamentos como esses deveriam promover uma reflexão dos órgãos
educacionais, professores e das próprias escolas, no momento em que mencionarem em seus
discursos, a tão almejada qualidade na educação.
Antunes, em entrevista ao Jornal Extra Classe (Ano 9; nº 79 . Março 2004.), vem
reafirmar o que foi dito acima quando diz: “(...) a informação rapidamente se banaliza (...) é
essencial levar o aluno a transformá-la em conhecimento e em sabedoria.”
Jacqueline Peixoto (apud ROJO 2000) enfatiza a necessidade da formação do
professor no processo educacional, trazendo uma contradição dos próprios PCNs no material
do MEC Parâmetros em ação, no que diz respeito à abordagem dos gêneros discursivos. Os
Parâmetros em ação pretendiam realizar um estudo sobre os gêneros do discurso, porém, o
que ocorreu foi um destaque excessivo aos aspectos inerentes a estrutura externa do texto. A
partir desse exemplo fatídico de assimilação incorreta do conteúdo, é possível perceber a
distância entre teoria x prática, ou seja, o professor pode até apresentar interesse no assunto, e
de certa forma, apresentar o conhecimento na área, porém não consegue transpor de maneira
satisfatória e inequívoca.
De acordo com Iram Ferreira (2007, p.60): “o professor que se compromete com o
ensino da língua sob a teoria do gênero assume um ideal de texto como ação social, mas isso
não garante que ele saiba transmitir para seu aluno, de modo claro, o que significa gênero
textual.”
A preferência dos professores na abordagem da tipologia textual é outro desafio da
transposição didática. Ora, o tempo de circulação da tipologia textual é maior no âmbito
educacional, portanto, os professores discriminam o ensino dos gêneros textuais, por estarem

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habituados ao sistema tradicional de ensino e aprendizado do texto e, também por não
dominarem integralmente a modalidade dos gêneros.
A superação dos desafios mencionados acima depende, sem dúvida, da reforma nas
políticas educativas, e a implantação de outras que favoreçam aos atuais e aos futuros
professores, no que se refere à habilitação para o exercício da docência. Como bem enfatiza
Celso Antunes (nº79 2004): “(...) vive-se em um país que não reconhece a grandeza do seu
papel e a essencialidade de sua ação na construção de um amanhã.”
Os aspectos aqui mencionados serviram para destacar o papel relevante dos
Parâmetros Curriculares Nacionais, como balizador das propostas pedagógicas e alicerce para
os docentes, no que ser refere ao desenvolvimento das competências lingüísticas, políticas e
sociais dos discentes. Portanto, todo educador, comprometido efetivamente com a educação,
deve agregar, às suas aulas, esse documento de valor inestimável para a educação.
Nesse contexto, vale ressaltar a prioridade de uma formação intensiva e continuada, na
qual os educadores possam se atualizar em relação às novas formas de ensino-aprendizagem,
a exemplo da adoção dos gêneros textuais abordadas nesse artigo. Como observa Jaqueline
Peixoto (apud Rojo, 2000, p.174)

A maioria dos professores de Língua Portuguesa existentes na rede


pública são ainda bastante distantes do professor pressuposto pelos
PCNs. Por essa razão, projetos de formação se fazem necessários.
Sem isso, corremos o risco de ver algo que, sem dúvida nenhuma,
representou um avanço em termos de políticas educacionais públicas
em nosso país se transformar em uma mera carta de intenções.

Essa sincronia entre os princípios supracitados garante o sucesso dos PCNs e da


Educação Nacional. De outra forma, os PCNS, segundo Jaqueline, poderão se transformar em
uma mera carta de intenções.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observamos que os estados e municípios oferecem material básico para a reflexão


crítica sobre os processos de ensino-aprendizagem, contudo não investem na qualificação dos
profissionais de ensino, o que acaba aumentando as dificuldades no momento de transpor os
parâmetros, e outros documentos, com mesma finalidade, para o contexto escolar.
A falta de preparo e de qualificação dos profissionais de ensino é agravante,
sobretudo, no ensino de Língua Portuguesa, área que necessita de atenção urgente, tanto do

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ponto de vista da pesquisa quanto do ponto de vista da prática em sala de aula. A
problemática gerada no ponto de vista da pesquisa situa-se no âmbito da revisão dos
currículos para orientar o trabalho dos profissionais de educação. E o da práxis educativa está
voltada para dissolução de problemas referentes ao uso da linguagem tanto no contexto
escolar quanto fora dele.
Através dos estudos realizados, percebemos que todas as proposições, apresentadas
pelos PCNs, fornecem os subsídios teóricos realmente úteis para a inserção dos gêneros
textuais e a ruptura com as práticas inadequadas e ineficientes no ensino de Língua
Portuguesa. Entretanto, há uma grande distância entre o que está sendo propostos nesses
documentos e o que efetivamente acontece na prática escolar.
Para que essas práticas sejam realmente efetivas, são necessárias várias mudanças,
essencialmente, na escola e no corpo docente. A escola atual tem que ser capaz de elaborar
seu próprio projeto pedagógico, levando em conta as dificuldades dos seus educandos,
contemplando as diversidades existentes, mas sem deixar de cumprir a base curricular
comum. E ao professor caberá (re)pensar sobre o seu papel na reforma escolar, procurando
assegurar a realização do currículo em sala de aula, deixando de ser mero executor de velhos
padrões e programas impostos.
Em virtude dos argumentos defendidos nesse artigo, acreditamos ser possível incitar
uma análise reflexiva sobre a disseminação de ensino de texto atual, proporcionada pelos
profissionais de Língua Portuguesa, no sentido de contribuir para o aprimoramento da
metodologia de ensino. Essa possibilidade se concretiza afinal, por termos como referência
Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa que prezam por uma educação
responsável, sobretudo voltada para a construção da cidadania dos educandos e também o
suporte dos autores, que apresentaram soluções aceitáveis para a compreensão acerca dos
gêneros textuais, tornando, desse modo, o ensino/aprendizado muito mais prazeroso e
eficiente.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. In: –––. Estética da criação verbal, [trad.
francês: Maria Ermantina Galvão; revisão: Marina Appenzeller]. 3ª ed. São Paulo: Martins
Fontes , 2003, pp. 262 a 287

ROJO, Roxane (org.). A Prática de linguagem em sala de aula: praticando PCNs. 1. ed.:
Mercado de Letras, 2000, pp 27 a 182.

ANTUNES, Celso. Jornal Extra Classe. (Março 2004) Ano 9 nº79.

MELO Iran Ferreira. Regeneração. Discutindo Língua Portuguesa. Ano2, nº8, pp. 60-63,
2007.

MARCUSHI, L. A. “Gêneros textuais: definição e funcionalidade” In DIONÍSIO, Ângela


Paiva. et al (orgs). Gêneros textuais e ensino. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005 pp.19 a 36,

PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS: terceiro e quarto ciclos do ensino


fundamental: língua portuguesa / Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília: MEC/SEF,
1998.

PCNs: introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Secretaria de Educação


Fundamental, Brasília, MEC/SEF, 1997.

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