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Jaqueline Antonello
São Paulo State University
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All content following this page was uploaded by Jaqueline Antonello on 20 February 2021.
Jaqueline Antonello 1
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo discutir sobre disgrafia e o trabalho docente com metodologias
inclusivas para o ensino de Língua Portuguesa nos anos finais do Ensino Fundamental. Com o
intuito de demonstrar possibilidades metodológicas para o trabalho dos professores de Língua
Portuguesa com alunos disgráficos, este trabalho aborda pressupostos teóricos relacionados aos
distúrbios de aprendizagem e aos princípios da Educação Inclusiva. Trata-se de uma pesquisa
qualitativa, marcada por revisão bibliográfica e por investigação caracterizada como estado do
conhecimento, com base nas teses e dissertações disponíveis na plataforma virtual da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), no período de 2009 a
2019, a respeito da temática da disgrafia na educação escolar. Os resultados da pesquisa
demonstram que poucas investigações têm sido realizadas, no nível de pós-graduação stricto
sensu, sobre o tema das metodologias de ensino de Língua Portuguesa para alunos disgráficos.
INTRODUÇÃO
1
Mestranda em Educação da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, campus Francisco
Beltrão. Licenciada em Letras. Licenciada em Pedagogia. Especialista em Docência e Gestão do Ensino
Superior. E-mail: jaqueline_antonello@hotmail.com.
Por considerar tais aspectos, torna-se importante esclarecer que o homem é um
sujeito que se humaniza por meio do trabalho e das relações que estabelece com outros
homens e com a natureza. Por meio destas relações, o ser humano se apropria da
cultura, modifica a natureza e modifica também a si próprio. Nesse processo de
humanização, a linguagem se apresenta como essencial, pois, a partir dela a
comunicação se efetiva e os sujeitos sociais podem transmitir valores, hábitos, costumes
e conhecimentos para cada nova geração (BAKHTIN; VOLOCHINOV, 1981).
No que se refere à importância da linguagem, seja ela verbal ou não verbal, é
necessário enfatizar que esta atua diretamente no desenvolvimento do ser humano e é
primordial na sociedade letrada na qual o homem é partícipe desde a sua mais tenra
idade. Considerando estes aspectos, é possível afirmar que boa parte do processo de
aquisição e aprimoramento da linguagem ocorre no ambiente escolar, isto é, numa das
principais instituições sociais responsáveis pela educação formal dos indivíduos.
Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei n°
9.394/1996, na educação básica, objetiva-se o desenvolvimento das potencialidades dos
alunos e a aquisição dos conhecimentos historicamente elaborados pelo ser humano.
Um destes conhecimentos é o conhecimento da língua, no caso do Brasil, da Língua
Portuguesa. Isto significa que a escola trabalha com a língua padrão e ensina aos alunos
as práticas sociais da leitura e da escrita ao sistematizar os saberes e conhecimentos
específicos da língua.
Ao levar em conta a relevância da linguagem para o ser humano e atentar
especificamente à linguagem verbal, percebe-se a necessidade de maior compreensão
sobre os distúrbios que podem vir a ocorrer nesse processo. Desta forma, o que moveu
esta pesquisa foi a necessidade de investigar diferentes metodologias de ensino para
professores de Língua Portuguesa dos anos finais do Ensino Fundamental que tenham
alunos com um distúrbio de aprendizagem específico: a disgrafia.
Tal desejo de obter respostas metodológicas conduz à reflexão sobre a própria
função do professor em sala de aula ao trabalhar com um aluno disgráfico. Neste caso,
se estabelece a seguinte questão problematizadora: qual é o papel do professor de
Língua Portuguesa na formação do aluno com disgrafia nos anos finais do Ensino
Fundamental?
Este trabalho foi produzido por meio de pesquisa bibliográfica e de pesquisa de
estado do conhecimento a partir da análise dos títulos e dos resumos de teses e
dissertações disponíveis no catálogo de teses e dissertações da plataforma eletrônica da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e tem como
tema a atuação do professor de Língua Portuguesa no processo de ensino e
aprendizagem de alunos com disgrafia nos anos finais do Ensino Fundamental.
A pesquisa foi pautada nos seguintes objetivos específicos: explicar brevemente
o que são distúrbios de aprendizagem, em especial a disgrafia; investigar metodologias
de ensino de Língua Portuguesa para professores que têm alunos com disgrafia nos anos
finais do Ensino Fundamental; e, finalmente, verificar os limites e as possibilidades para
a utilização destas alternativas pedagógicas no contexto da escola pública.
Para cumprir com os objetivos propostos, este trabalho foi organizado de modo a
explicitar a metodologia e, em seguida, abordar os resultados e discussões por meio de
dois tópicos. O primeiro tópico tratou da linguagem de maneira geral e de um distúrbio
de aprendizagem específico da linguagem verbal: a disgrafia.
O segundo tópico, por sua vez, trouxe reflexões sobre o papel do professor com
alunos disgráficos e expôs os resultados da pesquisa de aproximação à temática, que
buscou metodologias de ensino de Língua Portuguesa para professores de alunos com
disgrafia nos anos finais do Ensino Fundamental.
De maneira geral, os resultados demonstraram que poucas investigações têm
sido realizadas, no nível de pós-graduação stricto sensu, sobre o tema das metodologias
de ensino de Língua Portuguesa para alunos disgráficos. Mas, apesar disso, algumas
possibilidades metodológicas de trabalho docente, apresentadas no decorrer deste
trabalho, apresentaram-se como indicativos potenciais para a prática de ensino.
METODOLOGIA
Este trabalho de pesquisa teve como objetivo explicitar uma discussão sobre
disgrafia e o trabalho docente com metodologias inclusivas para o ensino de Língua
Portuguesa nos anos finais do Ensino. Para atingir tal objetivo foi necessário estabelecer
um percurso metodológico que respaldasse uma pesquisa sobre o assunto. Sendo assim,
baseando-se no método de abordagem dedutivo, método este “que antecede a
experiência, e não exige confirmação experimental, mas somente coerência lógica"
(RUIZ, 1979, p. 110), optou-se por realizar pesquisa bibliográfica e pesquisa de estado
do conhecimento, com base em dados da CAPES.
Marconi e Lakatos (2003, p. 158), afirmam que para a “obtenção de dados
podem ser utilizados três procedimentos: pesquisa documental, pesquisa bibliográfica e
contatos diretos”. Ao tratar especificamente da pesquisa bibliográfica, os autores
explicam como esta pode auxiliar no delineamento do trabalho:
Essa aquisição não acontece de maneira tão fácil na palavra lida e escrita porque
a aprendizagem desses dois processos é muito complexa e envolve várias habilidades.
Entre estas habilidades vale ressaltar a integração harmônica entre os três sistemas
verbais que, apesar de se desenvolverem em momentos diferentes, são manifestações de
um mesmo sistema: o sistema da linguagem.
Ao tratar especialmente do sistema verbal escrito, Raupp (2008, p. 34) afirma
que “a escrita é uma atividade motora fina, altamente complexa e diferenciada, que é
desenvolvida com muita dedicação e destreza”. Goldfeld (2003) demonstra a
complexidade desta aquisição ao apontar que o desenvolvimento do grafismo tem três
etapas: fase pré-caligráfica, fase caligráfica e fase pós-caligráfica.
Na primeira fase, o sujeito apresenta muita dificuldade motora, na segunda fase,
o equilíbrio gráfico é afetado pela dificuldade motora e prevalece o domínio do gesto e
na terceira fase, o equilíbrio gráfico que já havia começado a melhorar volta a vacilar.
Por ser um processo complexo, o sistema verbal escrito é construído pelo indivíduo
durante toda a sua vida. Tal consideração sobre o desenvolvimento do grafismo, isto é,
da aquisição da linguagem verbal escrita, leva ao entendimento de que esta aquisição
não é padronizada a todos os indivíduos, o que faz com que dificuldades neste processo
sejam muito comuns.
Nessa direção é possível falar sobre distúrbios de aprendizagem, pois, conforme
define o Comitê Nacional de Dificuldade de Aprendizagem, este “é um termo genérico
que se refere a um grupo heterogêneo de desordens manifestadas por dificuldades na
aquisição e no uso da audição, fala, leitura, escrita, raciocínio ou habilidades
matemáticas” (COLLARES; MOYSÉS, 1992, p. 32). Quanto ao item que se refere às
dificuldades de aquisição na escrita, pode-se afirmar que diz respeito a duas
dificuldades de aprendizagem específicas: a disgrafia e a disortografia.
A definição destes dois distúrbios está na própria etimologia da palavra. A
disgrafia é um distúrbio de aprendizagem relacionado com a caligrafia, ou seja, com o
traçado das letras. A disortografia, por sua vez, é um distúrbio na ortografia, “é uma
dificuldade de escrever sem erros, ou seja, é um conjunto de erros na escrita que afetam
a palavra, mas não o seu traçado ou grafia” (CURITIBA, 2013, p. 47).
Analisando estes dois distúrbios de aprendizagem da escrita, é necessário
apontar que “muitos fatores interdependentes – biológicos, sociais, linguísticos e
cognitivos – afetam o desenvolvimento” (GODOY; DIAS, 2014, p. 61) da linguagem e
modificam a forma como ela é adquirida. Assim, não é possível identificar uma única
causa para o desenvolvimento dos distúrbios,
Ainda que não exista uma única causa para o desenvolvimento dos distúrbios de
aprendizagem, uma vez que “podem ser atribuídas as mais variadas causas, dentre elas:
orgânicas, psicológicas, pedagógicas, socioculturais” (SILVA, 2006, p. 75), é consenso
entre os estudiosos do assunto que “estas desordens são intrínsecas ao sujeito”
(COLLARES; MOYSÉS, 1992, p. 32) e que, além disso, podem se manifestar em
qualquer momento da vida do indivíduo.
Nessa lógica, Zorzi (2004), ao apontar a possível causa orgânica da disgrafia,
afirma que esta pode ser provocada devido a alterações na região posterior do
hemisfério cerebral direito, que desempenha função cognitiva espacial e pode levar à
síndrome de disfunção hemisférica direita. Descrita por Fonseca (2007) como uma lesão
cerebral mínima, a disgrafia pode implicar não em incapacidades, mas em dificuldades
de aprendizagem, especificamente em dificuldades na escrita, isto é, na grafia das
palavras.
Retomando o desenvolvimento do grafismo pelos indivíduos e as três fases pelas
quais este desenvolvimento passa (pré-caligráfica, caligráfica e pós-caligráfica), pode-se
dizer que “quando uma destas etapas não consegue ser bem superada, pode haver [...]
alteração gráfica” (RAUPP, 2008, p. 34), neste caso, o que pode ocorrer é a disgrafia.
Mesmo que a disgrafia possa ser identificada a qualquer momento da vida das
pessoas, tal identificação comumente ocorre no ambiente escolar. O Curso de Avaliação
Psicoeducacional no Contexto Escolar, realizado no estado do Paraná no ano de 2013 é
um documento que oferece subsídios e orientações pedagógicas sob o enfoque de
identificação de alunos com dificuldades de aprendizagem. Este documento apresenta
algumas características mais frequentes da disgrafia e, entre elas, é possível mencionar:
De maneira geral, “a disgrafia não consiste somente em uma letra feia, mas sim
em uma letra difícil de ser compreendida, às vezes, até pela própria pessoa que
escreveu” (RAUPP, 2008, p. 34). Também é relevante explicitar que este distúrbio de
aprendizagem pode ser classificado de duas formas: como disgrafia motora, que
consiste em dificuldades na coordenação motora fina no momento em que se realizam
movimentos necessários à escrita ou como disgrafia perceptiva, quando o sujeito não
relaciona “o sistema simbólico e as grafias que representam os sons” (RAUPP, 2008, p.
34).
Após a identificação precoce da disgrafia no ambiente escolar, é necessária uma
avaliação mais sofisticada para que a existência do distúrbio de aprendizagem do
estudante seja devidamente confirmada. A partir do resultado dessa avaliação, algumas
coisas devem mudar na escola, tais como: a organização do espaço e do tempo em sala
de aula e o trabalho do professor regente da turma em que o aluno disgráfico estuda.
Por considerar que cada aluno precisa ser respeitado e ensinado conforme suas
especificidades e por compreender a relevância do trabalho do professor neste processo,
o próximo tópico procura se apresentar como norteador de um trabalho voltado à
melhoria da qualidade de aprendizagem do aluno disgráfico nas aulas de Língua
Portuguesa.
2
Esta etapa da educação básica foi selecionada para a realização desta pesquisa porque, de acordo com
Fonseca (1995, p. 98), “sabe-se hoje que os problemas da DA tendem a reduzir a sua importância a partir
dos 14”.
aprendizagem e a dificuldade permanecer, daí a necessidade de encaminhamento à
profissional específico.
Efetivar um processo de trabalho inclusivo em sala de aula para alunos com
distúrbios de aprendizagem, especificamente com disgrafia, não é tarefa fácil. O
professor precisa compreender que os “pequenos problemas de recepção, elaboração e
expressão de informação [escrita] podem influenciar no desempenho escolar”
(FONSECA, 1995, p. 74) caso a aprendizagem não seja mediatizada por experiências
adequadas as possiblidades do aluno. A partir disso, o professor pode perceber que:
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A partir deste momento, cada menção à datilografia deve ser compreendida nesta perspectiva. O
objetivo não é defender a volta do uso da máquina de escrever, mas explicitar a importância de
ferramentas que sigam princípios de digitação, nos casos em que os alunos não progridam na escrita
cursiva.
trabalho com o aluno disgráfico em sala de aula. Ao analisar a profissão docente, é fácil
se deparar com uma realidade complexa, comumente percebida nas escolas públicas:
“professores descontentes com seus salários, com suas instituições de ensino, com seus
alunos, com os governantes e com as políticas voltadas para a educação” (RAUPP,
2008, p. 47).
A maneira como os professores se sentem sobre sua própria profissão pode
afetar profundamente as práticas de ensino em sala de aula e isso muitas vezes conduz
ao descaso frente aos distúrbios de aprendizagem. Muitos professores “têm tanto
trabalho que muitas vezes apenas leem e leem, mas não se dão o tempo necessário para
refletir sobre a sua ação docente e sobre um ensino de mais qualidade” (RAUPP, 2008,
p. 48). Ressalva-se que não se trata de um exercício de culpabilização, mas de um
indicativo preocupante relacionado com a intensificação e a precarização do trabalho
docente.
Mesmo que muitos professores se empenhem em atitudes individualizadas que
reverberem na resolução de problemas e dificuldades cotidianas do ambiente escolar,
tem-se claro que o trabalho docente qualificado, em especial relativo à Educação
Inclusiva, demanda não apenas ações individuais e focalizadas, mas o apoio do Estado
via políticas públicas que garantam a efetividade dos direitos sociais, particularmente,
do direito à educação.
Contudo, ainda que a realidade laboral no âmbito da educação pública seja
complexa e desafiadora e que o professor não seja o único responsável pela
aprendizagem do estudante com disgrafia, não se pode negar a importância de sua
prática pedagógica e de seu papel de sensibilidade e criticidade no processo de ensino e
aprendizagem.
Nesse sentido, destaca-se que não basta a inclusão física do aluno com disgrafia
no ambiente da sala de aula. Para além disso, torna-se necessário fornecer meios para
que o aluno efetivamente aprenda e cabe ao professor, em parceria com a instituição
escolar e com a família, procurar meios para que o aluno disgráfico aprenda
efetivamente os conteúdos referentes às disciplinas escolares, especialmente os
conteúdos de Língua Portuguesa, foco de análise deste trabalho.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
BRASIL. Lei nº 11.274, de 6 de fevereiro de 2006. Altera a redação dos arts. 29, 30, 32
e 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996 e dispõe sobre a duração de 9 (nove)
anos para o ensino fundamental. Diário Oficial da União: Brasília, 2006.
RUIZ, João Álvaro. Metodologia científica: guia para eficiência nos estudos. São
Paulo: Atlas, 1979.