Você está na página 1de 12

Vxx (x) – Abr.

20xx
pp. xx - xx

EXPLORANDO A UTILIZAÇÃO DIDÁTICA DA HISTÓRIA E DA FILOSOFIA DA CIÊNCIA NO


ENSINO DE CIÊNCIAS: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA DOS ENPEC’S DE 2019, 2017 E 2015.

Exploring the didactic use of History and Philosophy of Science in Science Education: a literature
review of ENPEC 2019, 2017 and 2015.

Resumo

Apresentamos uma revisão bibliográfica sobre a utilização didática da História e Filosofia da Ciência
(HFC). Tomando como fonte de dados os Anais do Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em
Ciências (ENPEC) de 2015, 2017 e 2019, identificamos 13 trabalhos ligados à temática. Seguindo
pressupostos da análise de conteúdo (AC), proposta por Moraes (1999), buscamos categorizar: os
níveis de ensino a que se dirigiam as propostas; os temas e áreas do conhecimento abordadas; as
justificativas apresentadas pelos autores para a utilização didática da HFC e as metodologias
utilizadas. Os resultados revelam que a utilização da HFC no ensino de Ciências se baseia,
principalmente, na possibilidade de discutir aspectos relacionados à Natureza da Ciência (NdC),
estimulando assim o pensamento crítico e uma contextualização da ciência com os aspectos
extracientíficos envolvidos.

Palavras-Chave: História e Filosofia da Ciência; Ensino de Ciências; Utilização Didática; Revisão bibliográfica

Abstract (Bold, Arial 10 pt.)

We present a bibliographic review on the didactic use of History and Philosophy of Science (HPS).
Taking the Proceedings of the National Meeting of Research in Science Education (ENPEC) from 2015,
2017, and 2019 as data sources, we identified 13 works related to the theme. Following the
assumptions of content analysis (CA), proposed by Moraes (1999), we sought to categorize: the
educational levels targeted by the proposals; the themes and knowledge areas addressed; the
justifications presented by the authors for the didactic use of HPS, and the methodologies employed.
The results reveal that the use of HPS in science education is primarily based on the opportunity to
discuss aspects related to the Nature of Science (NOS), thus stimulating critical thinking and
contextualizing science with the non-scientific aspects involved.

Keywords: History and Philosophy of Science; Science Education; Didactic Use; Literature Review.
Investigações em Ensino de Ciências – Vxx (x), pp. xx-xx, 20xx

INTRODUÇÃO

Muitos autores advogam pelos benefícios de uma aproximação entre a HFC e o Ensino de Ciências
desde a educação básica. (Matthews, 1995; Peduzzi, 2001; Guerra, Freitas & Braga, 2004; Martins, 2007;
Forato, Pietrocola & Martins, 2011). Um dos seus principais objetivos é evitar a disseminação de
interpretações distorcidas que erroneamente retratam a ciência com um empreendimento neutro, totalmente
objetivo e construído exclusivamente por mentes geniais isoladas (Vidal & Porto, 2008; Martins & Brito, 2006;
Allchin, 2004; Gil-Perez et al., 2001).

Ao introduzir a HFC no ensino, os estudantes são encorajados a explorar aspectos relacionados à


complexa Natureza da Ciência (NdC), entendendo que ela é uma empreitada humana, sujeita a influências
culturais, sociais e históricas (Allchin, 2017; Moura & Silva, 2014). Ao destacar a importância da
contextualização histórica e cultural, a HFC busca mostrar como os paradigmas científicos evoluem ao longo
do tempo, sendo moldados por debates, controvérsias e revisões constantes. Isso permite que os estudantes
compreendam que a ciência é um processo dinâmico, sujeito a revisões e aprimoramentos contínuos
(Longino, 2019).

Além disso, a HFC também aborda a questão da objetividade científica, enfatizando que a ciência
não está isenta de influências subjetivas. A percepção de que os cientistas são seres totalmente objetivos e
imparciais é “posta em xeque” pela HFC, que destaca a presença de valores, interesses e pressupostos nas
práticas científicas. Essa abordagem permite uma compreensão mais crítica da ciência, contribuindo para
uma formação mais reflexiva dos estudantes, capacitando-os a desenvolver uma postura mais ativa em
relação aos impactos da ciência na sociedade (Moura & Silva, 2014).

Embora haja uma ampla gama de estudos que defendem os benefícios da História e Filosofia da
Ciência na educação básica e na formação de professores (Matthews, 1995; Peduzzi, 2001), ainda são
escassos os trabalhos que propõem sua implementação em sala de aula. A complexidade do desafio de
aplicar atividades em sala de aula é ressaltada por Forato, Pietrocola e Martins (2011), que apontam diversos
obstáculos enfrentados pelos professores de ciências ao tentarem incorporar a HFC no ensino.

Um dos principais desafios mencionados é a seleção criteriosa dos assuntos a serem abordados,
diante da vasta extensão da História e Filosofia da Ciência. Ainda segundo os autores, a alocação adequada
do tempo para aplicação das atividades é um fator crucial, já que os docentes precisam equilibrar o tempo
dedicado à HFC com os demais conteúdos do currículo científico.

A falta de formação específica dos docentes, a dificuldade de adaptar materiais históricos para a sala
de aula em forma de narrativas envolventes, o fomento de questões relativistas e a determinação do nível de
aprofundamento que será dado à atividade, buscando uma integração coerente entre a história e os aspectos
conceituais do ensino de ciências também são outras dificuldades apontadas pelos autores.

Com base nisso, o objetivo dessa pesquisa é realizar uma revisão bibliográfica dos trabalhos
apresentados nos ENPEC de 2019, 2017 e 2015, com foco nas estratégias de utilização da HFC em sala de
aula. O intuito é identificar as principais abordagens e metodologias utilizadas na integração da HFC ao
ensino, além de investigar o nível de ensino para o qual as propostas destinadas e as áreas específicas do
conhecimento em que são aplicadas.

Nessa revisão, buscamos ideias sobre como a HFC pode ser efetivamente incorporada ao contexto
educacional, oferecendo diretrizes práticas para os docentes interessados em explorar essa abordagem,
contribuindo assim para uma formação mais ampla dos estudantes (Brasil, 2018). Além disso, pretendemos
identificar lacunas nesta prática, sugerindo temas e enfoques para futuras pesquisas que possam contribuir
para a utilização didática da HFC.

2
Investigações em Ensino de Ciências – Vxx (x), pp. xx-xx, 20xx

METODOLOGIA

Para alcançar os objetivos deste trabalho, realizamos um levantamento nas publicações, voltadas à
área de História e Filosofia da Ciência (HFC), das edições de 2015, 2017 e 2019 do Encontro Nacional de
Pesquisa em Ensino de Ciências. A busca foi conduzida diretamente no site da Associação Brasileira de
Pesquisa em Educação em Ciências (ABRAPEC), que abriga uma coleção de registros de trabalhos
apresentados no ENPEC.

Nossa estratégia de busca envolveu a aplicação de critérios de inclusão bem definidos. Inicialmente,
focamos nos trabalhos em seções específicas do congresso dedicadas à área de HFC, o que nos permitiu
direcionar a atenção para as publicações mais alinhadas ao nosso tema de interesse.

Após acessar a seção de interesse em cada uma das três edições do ENPEC, procedemos a uma
análise cuidadosa dos títulos e resumos dos trabalhos, com ênfase na identificação de indícios de utilização
didática da HFC. Para isso, adotamos um segundo critério de inclusão, buscando por expressões ou palavras-
chave que indicassem a aplicação didática desses conceitos. Alguns exemplos dessas expressões foram:
“sequência didática”, “abordagem histórico-filosófica”, “abordagem didática”, “proposta prática”, “atividade
pedagógica”, “estudo de caso”, “unidade de ensino”, “proposta histórica”, “atividade investigativa”,
“abordagem didática” e “proposta para abordar com os alunos”.

As publicações que atenderam aos critérios de inclusão foram selecionadas para uma leitura
aprofundada e análise detalhada. A leitura integral dos artigos permitiu uma compreensão mais ampla das
abordagens utilizadas e dos resultados obtidos na aplicação da HFC em sala de aula. Durante essa etapa,
identificamos exemplos concretos de práticas educacionais que incorporaram a HFC, bem como suas
contribuições para o ensino de ciências.

RESULTADOS

O Quadro 1 apresenta um levantamento geral dos trabalhos da área de interesse, comparando-os ao


total de trabalhos publicados nos Anais do ENPEC.

Quadro 1 – Comparativo entre o total de trabalhos e os da área de HFC.

Trabalhos em HFC Total de trabalhos

2019 39 1035

2017 53 1343

2015 62 1116

Total 154 3494

Para efeito de comparação com outras temáticas abordadas no congresso, analisamos também a
quantidade de trabalhos publicadas em outras três áreas: “Alfabetização científica e tecnológica, abordagens
CTS/CTSA”, “Ensino e aprendizagem de conceitos e processos científicos” e “Processos, recursos e materiais
educativos”. Os resultados, com a quantidade de trabalhos em cada uma das áreas é apresentado no Gráfico
1.

3
Investigações em Ensino de Ciências – Vxx (x), pp. xx-xx, 20xx

Comparativo entre diferentes áreas


7%
14%

5%
8%
66%

Alfabetização científica e tecnológica, abordagens CTS/CTSA


Ensino e aprendizagem de conceitos e processos científicos
História, Filosofia e Sociologia da Ciência
Processos, recursos e materiais educativos
Outras áreas

Gráfico 1 – Comparativo entre diferentes áreas.

A análise dos trabalhos seguiu o referencial de Moraes (1999), que apresenta a análise de conteúdo
como “uma metodologia de pesquisa usada para descrever e interpretar o conteúdo de toda classe de
documentos e textos” (Moraes, 1999, p. 2). Moraes defende a ideia de que os objetivos de pesquisas que
utilizam a AC, têm sido definidos em seis categorias, considerando aspectos intrínsecos do contexto e da
matéria-prima. Esta classificação parte de seis questões, definidas originalmente por Laswell: 1) Quem fala
(locutor)? 2) Para dizer o quê (finalidade)? 3) A quem (público-alvo)? 4) De que modo (como a mensagem é
passada)? 5) Com que finalidade (objetivo)? 6) Com que resultados (efeito)? (parênteses nossos).

Considerando os objetivos desta pesquisa de fazer uma revisão bibliográfica sobre a aplicação da
HFC em sala de aula, elaboramos algumas questões como norteadoras da nossa pesquisa. O Quadro 2 traz
as questões, o momento de sua definição e suas relações com as questões definidas por Laswell.

Quadro 2 – Questões norteadoras da pesquisa.

Questões Relação com Laswell

1 Qual(is) a(s) justificativa(s) para aplicação da proposta? Finalidade

2 Em qual nível de Ensino a proposta foi aplicada? Público-alvo


Para qual área do conhecimento a proposta foi Público-alvo
3
desenvolvida?
Qual(is) é(são) a(s) temática(s) utilizada(s) nas De que modo
4
propostas?
5 Qual(is) a(s) metodologia(s) utilizada(s) nas propostas? De que modo

Em nossa análise de conteúdo, consideramos as cinco etapas propostas por Moraes (1999):

a) Preparação das informações: definição do corpus de análise de acordo com os objetivos desta
pesquisa, triando os anais do ENPEC.
b) Unitarização ou transformação do conteúdo em unidades: localização das respostas para as
perguntas propostas na pesquisa.
c) Categorização ou classificação das unidades em categorias: etapa de agrupamento dos
trabalhos analisados, por pontos de semelhança. Nesta etapa, algumas categorias foram
definidas a priori, e outras a partir das leituras dos trabalhos.
d) Descrição: etapa de apresentação dos resultados, compilando tabelas e quadros, com base nas
categorias definidas anteriormente.
e) Interpretação: segundo o próprio autor, esta etapa consiste na busca por “(...) atingir uma
compreensão mais aprofundada das mensagens, através de inferências e interpretação"
(MORAES, 1999, p. 9).

4
Investigações em Ensino de Ciências – Vxx (x), pp. xx-xx, 20xx

Preparação das informações


Dos 154 trabalhos publicados na área de HFC, seguindo os critérios de inclusão mencionados,
apenas 13 foram selecionados para compor o corpus de análise desta pesquisa, o que corresponde a
aproximadamente 8,5 % dos trabalhos da área de interesse. Pensando de uma forma ainda mais ampla, no
evento como um todo, este resultado corresponde a apenas 0,4% do total de trabalhos apresentados nas
edições do congresso. Estes resultados estão de acordo com o argumento apresentado por Forato, Pietrocola
& Martins, em estudo realizado em 2011, de que ainda são poucos os trabalhos que apresentam propostas
práticas de utilização didática da HFC.

Os títulos dos trabalhos, assim como o nome dos autores e o ano de publicação são apresentados
no Quadro 3.

Quadro 3 – Corpus de análise da pesquisa.

Título Autores Código


Laís Jubini Callegario;
(Des)construindo a história da ciência através
2019 Débora Schmitt Kavalek; T1
de imagens.
Gesiane Cabral de Freitas
História e Filosofia da Ciência na Formação
Maria Fernanda Bianco Gução;
2019 Inicial: discussão sobre o conceito de T2
Marcelo Carbone Carneiro
movimento.
A História da Ciência numa abordagem
Erick Elisson Hosana Ribeiro;
regional e suas contribuições para o ensino
2017 Alícia Thayna da Silva Alves; T3
de Física: O episódio de Júlio César Ribeiro
Hellen Tamyres Souza Cruz
(1843 – 1887) e a Dirigibilidade Aérea.
A Natureza da Ciência na escola por meio de Luiz Henrique Martins Arthury;
2017 T4
um material didático sobre a Gravitação. Eduardo Adolfo Terrazan.
A qualidade dos argumentos dos alunos em
uma Sequência Didática que usa a História Josebel Maia dos Santos;
2017 T5
da Ciência e a argumentação no ensino de Elder Sales Teixeira.
Física.
As narrativas presentes na História da
2017 Ciência: os limites entre o lúdico e o real no Rafaella Martins da Silva T6
Ensino de Física.
Anita Gabriella Ferreira Norato;
Arieli Tristão Rézio; Gisely
Sinalizando possibilidades no ensino de da Silva Santos; Iara Lúcia
2017 Genética: Avaliação de uma proposta prática B. Fernandes Vieira; Simone T7
utilizando a abordagem histórica. Sendin M. Guimarães; Andréa
Inês Goldschmidt.

Utilização da História da Ciência no ensino Monique Aline R. dos Santos;


2017 visando o aprendizado de Natureza da Rosária Justi. T8
Ciência.
Análise de aspectos da Natureza da Ciência
(NdC) e motivacionais em estudantes do Luciana Valéria Nogueira;
2015 Ensino Médio mediada por sequência Kelma Cristina de Freitas T9
didática centrada na replicação de
experimentos históricos darwinianos.
Nirly Araujo dos Reis; Carlos
Buscando discutir História da Ciência por
2015 meio de atividades investigativas no âmbito Bruno Alves de Oliveira; T10
Erivanildo Lopes da Silva
da formação inicial de professores.
Tauan Garcia Gomes; Thaís
Construindo uma abordagem histórica da
2015 Cyrino de Mello Forato T11
radioatividade.
Carlos Ap. da Silva Junior;
Inserção da História da Biologia na Educação Letícia Vieira Basílio; Bruno
2015 Básica: produção e análise de sequências Mangili de P. Rodrigues T12
didáticas.
Thaís Gimenez da S. Augusto

5
Investigações em Ensino de Ciências – Vxx (x), pp. xx-xx, 20xx

Máquinas térmicas no cinema: uma proposta Julliana Bomfim; José


2015 para abordar a HFC e a NdC no ensino Claudio Reis T13
básico.

Unitarização
Esta etapa da AC, segundo Moraes (1999), tem como finalidade a fragmentação do material,
possibilitando uma análise de aspectos significativos aos objetivos estabelecidos por essa pesquisa. Neste
trabalho, as unidades serão frases utilizadas pelos autores, que respondam as perguntas propostas.

A fim de facilitar a identificação das respostas para as questões norteadoras desta pesquisa,
utilizamos uma estratégia que consistiu em grifar com diferentes cores as respostas para as diferentes
perguntas elaboradas. O Quadro 4 apresenta essa codificação criada.

Quadro 4 – Codificação para identificação das respostas.

Questões Cor utilizada

1 Qual(is) a(s) justificativa(s) para aplicação da proposta? Rosa

2 Em qual nível de Ensino a proposta foi aplicada? Verde


Para qual área do conhecimento a proposta foi Amarelo
3
desenvolvida?
Qual(is) é(são) a(s) temática(s) utilizada(s) nas Azul
4
propostas?
5 Qual(is) a(s) metodologia(s) utilizada(s) nas propostas? Laranja

Como um exemplo da unitarização desenvolvida, apresentamos, no Quadro 5, as respostas


encontradas no T1.

Quadro 5 – Codificação para identificação das respostas.

Questões Respostas
“Com o objetivo de ressignificar
as concepções sobre a natureza
1 Qual(is) a(s) justificativa(s) para aplicação da proposta? da ciência dos alunos e
incorporar visões consideradas
mais adequadas (...)” (p. 2).
“O público-alvo foi alunos
2 Em qual nível de Ensino a proposta foi aplicada? cursando a 3ª série do ensino
médio” (p. 3).
“(...) a inserção da sequência
Para qual área do conhecimento a proposta foi
3 didática ocorreu na disciplina de
desenvolvida?
Química (...)” (p.3).
“(...) fórmula estrutural do
benzeno, a partir do sonho de
Kekulé (...)” (p. 3). “Uma
Qual(is) é(são) a(s) temática(s) utilizada(s) nas delas é a Teoria da Gravitação
4
propostas? Universal de Newton” (p. 3).
“A terceira relacionava-se ao
Princípio de Arquimedes (...)” (p.
3).
“Inicialmente cada grupo
recebeu uma imagem para que
eles discutissem e
5 Qual(is) a(s) metodologia(s) utilizada(s) nas propostas? apresentassem por escrito as
considerações(...). Após essa
etapa, cada grupo recebeu um
texto (...)” (p. 4).

6
Investigações em Ensino de Ciências – Vxx (x), pp. xx-xx, 20xx

Categorização, descrição e intepretação


Seguindo nosso referencial de AC, e etapa de categorização, segundo o próprio autor, consiste em
“(...) agrupar dados considerando a parte comum existente entre eles” (Moraes, 1999, p. 6). Para fins de
organização do trabalho e maior fluidez, faremos as três últimas etapas em um mesmo subtópico.

No Quadro 6, apresentamos as categorias propostas para agrupar as justificativas utilizadas pelos


autores para aplicação da proposta didática utilizando a HFC. Estas categorias foram definidas a posteriori,
a partir de leitura integral do corpus de análise.

Quadro 6 – Justificativas para aplicação das propostas.

Categorias Ocorrências Trabalhos


1 Exploração de relações CTS 1 T2

2 Melhoria das habilidades de argumentação 1 T5

3 Auxílio na compreensão de um conceito científico 5 T3, T5, T6, T11, T13

Discussão de aspectos relacionados à NdC 10 T1, T2, T4, T7, T8, T9, T10,
4 T11, T12, T13

Sobre as justificativas dos autores para aplicação de propostas didáticas que utilizem a HFC, 10
trabalhos (77%) utilizaram o argumento da possibilidade de discutir aspectos relacionados à Natureza da
Ciência com os estudantes, indo esta justificativa de acordo com as ideias defendidas por Allchin (2017) e
Moura e Silva (2014), de que a ciência é uma construção humana, que muitas vezes busca atender interesses
específicos, sendo influenciada diretamente pelo contexto social, cultural e histórico.

Ainda chama a atenção que 5 trabalhos (39%) utilizaram a HFC como ferramenta de auxílio na
compreensão de um conteúdo científico específico. Esta utilização da HFC está de acordo com o defendido
por Matthews (1994), que advoga a favor desta utilização para atrair e motivar os estudantes, humanizando
o conteúdo e favorecendo a compreensão de um conceito científico.

O Quadro 7, abaixo, resume os resultados relacionados ao nível de Ensino no qual as propostas


foram aplicadas. Para esta pergunta, as categorias definidas, todas a priori, foram: Educação Infantil, Ensino
Fundamental, Ensino Médio, Ensino Superior (Formação de Professores).

Quadro 7 – Níveis de Ensino de aplicação das propostas.

Categorias Ocorrências Trabalhos


1 Educação Infantil 0 ----

Ensino 0 ----
2 Fundamental

Ensino Médio 9 T1, T3, T4, T7, T8, T9, T11, T12,
3 T13.

4 Ensino Superior 4 T2, T5, T6, T10.

Os resultados obtidos nesta análise encontram-se em convergência com a importância que alguns
autores conferem a utilização da HFC desde o Ensino Médio, e de uma forma ainda mais aprofundada no
Ensino Superior, contribuindo para a formação de docentes críticos e reflexivos (Moura & Silva, 2014; Martins,
2007; Peduzzi, 2001).

O Quadro 8, apresenta, de forma resumida, os resultados relacionados às áreas do conhecimento


nas quais as propostas foram aplicadas. Diferentemente das categorias da análise anterior, para esta
pergunta as categorias foram criadas, todas, a posteriori, e são: Biologia, Física, Química e Pedagogia.

7
Investigações em Ensino de Ciências – Vxx (x), pp. xx-xx, 20xx

Quadro 8 – Áreas do conhecimento de aplicação das propostas.

Categorias Ocorrências Trabalhos


1 Biologia 3 T7, T9, T12

2 Física 6 T2, T3, T4, T5, T11, T13

3 Química 3 T1, T8, T10

4 Pedagogia 1 T6

Os resultados desta análise mostram que dos 13 trabalhos, 3 (23%) são relacionados à área de
Biologia, 6 (46%) à área de Física, 3 (23%) à Química, e 1 (8%) à Pedagogia. Os dados obtidos, onde 92%
são propostas aplicadas em áreas relacionadas à Ciências da Natureza e suas Tecnologias, estão de acordo
com diversos autores que defendem o uso da HFC no ensino de ciências, dentre os quais podemos Forato,
Pietrocola e Martins (2011). Segundo os autores:

“[...] Preparar o estudante para lidar com as constantes inovações das ciências e
tecnologias, além de entender a articulação entre os conteúdos científicos e seus
usos sociais, significa promover o desenvolvimento de competências, visando
contribuir para o complexo processo de ensino e aprendizagem” (Forato; Pietrocola
& Martins, p. 28-29).

O Quadro 9 traz uma visão geral sobre a forma como estas propostas foram aplicadas em sala de
aula, ou seja, qual metodologia foi aplicada para inserção da HFC no processo de ensino. Assim como as
categorias relacionadas aos níveis de ensino de aplicação das propostas, todas as categorias referentes à
metodologia de aplicação da proposta também foram criadas a posteriori. Vale ressaltar que assim como nas
justificativas, alguns trabalhos utilizaram mais de um tipo de metodologia, aparecendo assim em mais de uma
categoria.

Quadro 9 – Metodologias utilizadas na aplicação das propostas.

Categorias Ocorrências Trabalhos

1 Uso de imagens 1 T1

2 Fontes primárias 1 T2

Narrativas históricas (textos não originais) 7 T1, T4, T5, T6, T8, T11,
3 T12

4 Documentário / Filme 2 T3, T13

5 Atividade experimental 3 T3, T9, T10

6 Linha do tempo 1 T7

Os resultados desta análise estão em diálogo direto com autores que defendem a utilização da HFC
em perspectiva historiográfica atual, a partir da utilização de episódios históricos cuidadosamente
reconstruídos (Martins, 2001, 2006; Porto, 2010). Além disso, a maioria das propostas, 8 dos 13 trabalhos
analisados (62%) utilizam narrativas históricas como sua metodologia, superando uma das dificuldades
apontadas por Forato e colaboradores (2011) e Höttecke e Silva (2011) que é dificuldade em adaptar uma
linguagem de forma que seja atrativa aos estudantes, o que se torna possível com narrativas bem elaboradas.

Outro ponto que vale ressaltar é que a segunda metodologia mais utilizada foram as atividades
experimentais. Diversos autores que realizam pesquisas relacionadas ao Ensino de Ciências defendem a
utilização de práticas experimentais como uma ferramenta valiosa nesse processo, dentre os quais podemos
citar: Giordan (1999), Oliveira (2010) e Machado (2004). Segundo este último, a construção do conhecimento

8
Investigações em Ensino de Ciências – Vxx (x), pp. xx-xx, 20xx

químico depende da inter-relação entre as abordagens fenomenológica, teórica e representacional, que é


favorecida pela utilização de atividade experimentais.

Nossa última análise de resultados é apresentada no Quadro 10, que mostras as categorias criadas
em relação às temáticas abordadas nas propostas. Como, para sua criação, a leitura das pesquisas era
necessária, essa foi outra categorização realizada a posteriori. Vale destacar, mais uma vez, que algumas
propostas abordaram mais de uma temática, o que justifica a ocorrência do mesmo trabalho em diferentes
categorias.

Quadro 10 – Temáticas abordadas nas propostas.

Categorias Ocorrências Trabalhos


1 Gravitação Universal 4 T1, T4, T5, T6

2 Princípio do Empuxo 2 T1, T6

3 Natureza elétrica da matéria 2 T6, T10

4 Sistemas cosmológicos 1 T2

5 Dirigibilidade aérea 1 T3

6 Queda Livre 1 T6

7 Fórmula estrutural do benzeno 1 T1

8 História da Genética 1 T7

9 Fabricação de pão no Egito Antigo 1 T8

10 Teoria da Evolução 1 T9

11 Dissociação eletrolítica 1 T10

12 Equação geral dos gases 1 T10

13 Teoria do Flogístico 1 T10

14 Radioatividade 1 T11

15 Conceito de vida 1 T12

16 Termodinâmica 1 T13

Dentre as temáticas abordadas nos trabalhos em análise, 4 (31%) utilizaram a Gravitação Universal
como único ou um de seus temas base. Esta escolha é justificada já que Newton é apresentado por diversos
autores como um personagem importante no desenvolvimento da ciência (Silva & Moura, 2008; Teixeira,
Peduzzi & Freire Jr, 2010). Esta importância faz com que muitas fontes de consulta sobre ele estejam
disponíveis, ajudando a superar uma das barreiras para aplicação da HFC em sala de aula que é a falta de
materiais de qualidade (Forato, Pietrocola & Martins, 2011; Höttecke & Silva, 2011).

9
Investigações em Ensino de Ciências – Vxx (x), pp. xx-xx, 20xx

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa teve como objetivo apresentar algumas características da pesquisa em História e
Filosofia da Ciência (HFC), focando sua aplicação prática em salada de aula, a partir de levantamento de
trabalhos apresentados nas edições de 2015, 2017 e 2019 do ENPEC.

Constatou-se como um resultado significativo que a principal finalidade que os autores encontraram
para aplicar a HFC didaticamente foi a exploração de aspectos relacionados à Natureza da Ciência, sendo
as propostas direcionadas, em sua maioria, para o Ensino Médio, visando a formação de estudantes mais
críticos, que sejam capazes de atuar na sociedade (Moura & Silva, 2014).

A HFC tem-se mostrado como muito benéfica, principalmente ao promover o pensamento crítico nos
estudantes, que devem analisar além do conceito científico trabalhado, os aspectos históricos, sociais e
culturais presentes no fazer ciência (Allchin, 2017; Moura & Silva, 2014). Suas estratégias de aplicação são
as mais variadas como: narrativas históricas, análise de experimentos clássicos e leituras de textos científicos
relevantes, como podemos ver nas metodologias aplicadas.

Mesmo com tais benefícios, sua aplicação em sala não é um processo simples, já que alguns desafios
práticos como falta de material didático, a adequação do tempo e a falta de formação adequada para os
docentes, devem surgir nesta tentativa de aplicação didática da HFC (Forato, Pietrocola & Martins, 2011;
Höttecke & Silva, 2011).

Para superar estes obstáculos uma estratégia seria a colaboração entre pesquisadores de ciências,
propondo aplicações práticas da HFC em sala de aula, já que, apesar de todas as dificuldades apresentadas,
sua inclusão no ensino de ciências pode contribuir para o desenvolvimento de uma visão mais ampla e
contextualizada da ciência, assim como a promoção de uma cidadania mais crítica e reflexiva.

10
Investigações em Ensino de Ciências – Vxx (x), pp. xx-xx, 20xx

REFERÊNCIAS

Allchin, D. (2004). Pseudohistory and pseudoscience. Science & Education, 13, 179-195.

_______. (2017). Historical inquiry cases for nature of Science learning. Cadernos de História da
Ciência, 13(2), 101-116.

Brasil. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular (2018). Brasília.

de Mello Forato, T. C., Pietrocola, M., & Martins, R. A. (2011). Historiografia e natureza da ciência na sala
de aula. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, 28(1), 27-59.

de Oliveira, J. R. S. (2010). A perspectiva sócio-histórica de Vygotsky e suas relações com a prática da


experimentação no ensino de Química. Alexandria: Revista de Educação em Ciência e Tecnologia, 3(3),
25-45

Gil Pérez, D., Fernández Montoro, I., Carrascosa Alís, J., Cachapuz, A., & Praia, J. (2001). Para uma
imagem não deformada do trabalho científico. Ciência & Educação, 7(02), 125-153.

Giordan, M. (1999). O papel da experimentação no ensino de ciências. Química nova na escola, 10(10), 43-
49.

Höttecke, D., & Silva, C. C. (2011). Why implementing history and philosophy in school science education is
a challenge: An analysis of obstacles. Science & Education, 20, 293-316.

Machado, A. (2004). Aula de Química: discurso e conhecimento. 3ª. Ijuí. Editora da Unijuí.

Martins, A. F. P. (2007). História e filosofia da ciência no ensino: há muitas pedras nesse


caminho... Caderno Brasileiro de Ensino de Física, 24(1), 112-131.

Martins, R. D. A. (2001). Como não escrever sobre história da física–um manifesto historiográfico. Revista
Brasileira de Ensino de Física, 23(1), 113-129.

Martins, L. A., & BRITO, A. A. (2006). História da ciência e o ensino da genética e evolução no nível médio:
um estudo de caso. Estudos de história e filosofia das ciências: subsídios para a aplicação no ensino.
São Paulo: Livraria da Física, 246-280.

Matthews, M. S. (1994). History, philosophy, and science teaching: A useful alliance.

Matthews, M. S. (1995). História, filosofia e ensino de ciências: a tendência atual de


reaproximação. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, 12(3), 164-214.

Moraes, A. G., Reis, J. C., & Braga, M. A. B. (2004). Uma abordagem histórico-filosófica para o
eletromagnetismo no ensino médio. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, 21(2), 224-248.

Moraes, R. (1999). Análise de conteúdo. Revista Educação, Porto Alegre, 22(37), 7-32.

Moura, B. A., & Silva, C. C. (2014). Abordagem multicontextual da história da ciência: uma proposta para o
ensino de conteúdos históricos na formação de professores. Revista Brasileira de História da
Ciência, 7(2), 336-348.

Peduzzi, L. O. (2001). Sobre a utilização didática da História da Ciência. Ensino de Física: conteúdo,
metodologia e epistemologia numa concepção integradora. Florianópolis: Editora da UFSC, 37.

Porto, P. A. (2010). História e Filosofia da Ciência no Ensino de Química: em busca dos objetivos
educacionais da atualidade. Ensino de química em foco, 159-180

Silva, C. C. (2006). Estudos de história e filosofia das ciências: subsídios para a aplicação no Ensino.
Editora Livraria da Física.

11
Investigações em Ensino de Ciências – Vxx (x), pp. xx-xx, 20xx

Silva, C. C., & Moura, B. A. (2008). A natureza da ciência por meio do estudo de episódios históricos: o caso
da popularização da óptica newtoniana. Revista Brasileira de Ensino de Física, 30, 1602-1.

Teixeira, E. S., de Quadro Peduzzi, L. O., & Junior, O. F. (2010). Os caminhos de Newton para a gravitação
universal: uma revisão do debate historiográfico entre Cohen e Westfall. Caderno Brasileiro de Ensino de
Física, 27(2), 215-254.

Vidal, P. H. O., & Porto, P. A. (2012). A história da ciência nos livros didáticos de química do PNLEM
2007. Ciência & Educação (Bauru), 18, 291-308.

12

Você também pode gostar