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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO – UFRJ

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS – IFCS


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA COMPARADA – PPGHC
Linha de Pesquisa: História Comparada das Formas Narrativas
Profa. Dra. Cláudia Andréa Prata Ferreira

PPGHC / IFCS / UFRJ


História Comparada

Material de Estudo
Coletânea de textos do PPGHC e outros

Profa Dra Cláudia Andréa Prata Ferreira.


Faculdade de Letras da UFRJ.
PPGHC/IFCS/UFRJ.
2º sem./2008.

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ÍNDICE

1 - PPGHC – Normas Técnicas/SIBI/UFRJ______________________________________3


2 - Material Complementar (Textos)____________________________________________3
2.1 - História Comparada (PPGHC) - Histórico________________________________________3
2.2 - História Comparada (PPGHC) - Objetivo________________________________________4
2.3 - História Comparada (PPGHC) – Perspectiva_____________________________________5
2.4 - História Comparada (PPGHC) – Proposta________________________________________7
2.5 - História Comparada (PPGHC)__________________________________________________10
2.6 - História Comparada (Neyde Theml)____________________________________________11
2.7 – História e Comparação (M. Aymard)___________________________________________13
2.8 – Simples Reflexões sobre a História Comparada (Jean-Marie Hannick)__________21
2.9 – O Debate sobre a Comparação e a Transferência: e agora? (H. Kaelble)________49
2.10 – Apontamentos sobre Kocka__________________________________________________56
3 – Textos Avulsos____________________________________________________________58
3.1 - Interdisciplinar, Transdisciplinar, Multidisciplinar______________________________58
3.2-Da Disciplina à Transdisciplinaridade____________________________________________60
4 – Histórica Comparada (Indicação de textos em ordem cronológica de publi-
cação original)________________________________________________________________66
5 – Bibliografia Básica Sugerida: Seleção de Mestrado PPGHC 2009____________________67

2
Cultura não é saber tudo sobre um pequeno ponto. Tampouco é
saber pequenos pontos sobre tudo, como geralmente é o caso
das pessoas que se dizem cultas. A cultura é uma argamassa,
um cimento que permite construir sentido integrando
conhecimentos.1

1 - PPGHC – NORMAS TÉCNICAS/SIBI/UFRJ

link: http://www.sibi.ufrj.br/publicacoes_sibi.html
ou
link: http://www.sibi.ufrj.br/manual_teses.doc

2 - MATERIAL COMPLEMENTAR (TEXTOS)

2.1 - História Comparada (PPGHC) - Histórico 2

Há alguns anos, as atividades de pesquisa, ensino e extensão no Departamento de História


(UFRJ) são desenvolvidas por grupos de especialistas organizados em Laboratórios e Programas.
Criou-se assim um locus para a formação de equipes de pesquisa propiciando uma abordagem
comparativa. Três destes Laboratórios - o Programa de Estudos Medievais (PEM), criado em 1991,
o Laboratório de História Antiga (LHIA), criado em 1993 e o Laboratório de Estudos do Tempo
Presente (TEMPO), criado em 1995 - procuraram estimular a criação de equipes cuja proposta de
trabalho coletivo investisse na redefinição dos modos de fazer a História, no trabalho com os
diferentes cortes transversais espaço-temporais, na ampliação do conceito e do uso das fontes e no
diálogo com as outras Ciências Humanas. As vias desenvolvidas foram o enfoque comparativo
entre as sub-áreas tradicionais da História e uma perspectiva plural, envolvendo os diferentes
objetos, problemas, conceitos e métodos das Ciências Humanas.
Foi a partir desses núcleos que os professores começaram a debater e delinear os princípios
de uma experiência da pesquisa comparada em História, envolvendo profissionais de diversas
especialidades na abertura de campos de exercício de experimentação. Este processo consolidou o
1
ROSNAY, Joel de. Conceitos e operadores transversais. IN: MORIN, Edgar. A religação dos saberes: os desafios do
século XXI. Trad. E notas Flávia Nascimento. 3.ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. p.499.
2
Disponível em: <http://www.hcomparada.ifcs.ufrj.br/apresentacao/index-historico.php>.
Acesso em 22/12/2006.

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grupo que construiu a presente proposta. O PPGHC reproduz e amplia todas as estratégias que
orientaram as diretrizes dos Laboratórios e Programas, vide item 4 - Objetivos.
A participação nas diversas atividades do PEM, LHIA e TEMPO foi consolidando a equipe
do PPGHC, que resultou em experiências, tais como os cursos de extensão História e Trabalho
(1999), O Campesinato na História (2000) e Violência na História (2001) e as publicações coletivas
História & Imagem (1998) e O campesinato na História (2002).
Nestas ocasiões, o convívio e a construção de um conjunto de problemas a partir das
pesquisas dos professores foram cruciais para perceber a confluência de interesses e a viabilidade de
aprofundar um projeto coletivo de maior amplitude, fundamentado numa abordagem comparativa
da História.
No ano de 2000, quinze professores do Departamento de História do IFCS/ UFRJ iniciaram
um processo de implementação do Programa de Pós-Graduação em História Comparada (PPGHC) a
partir de uma profunda análise dos seus projetos de pesquisa, muitos dos quais já possuíam um
enfoque comparativista.
O PPGHC tem como objetivo construir um locus de ensino, pesquisa e extensão para
desenvolver de maneira muito mais acentuada e sistemática as abordagens comparativas da
História, já parcialmente vislumbrada nas referidas práticas do PEM, LHIA e TEMPO.

2.2 - História Comparada (PPGHC) - Objetivo 3

a) Formar profissionais capazes de: construir problemas, formular hipóteses e empregar


conceitos teóricos de pesquisa em História; articular, de forma orgânica, as dimensões teórica,
metodológica e empírica na pesquisa em História Comparada; incorporar, às suas reflexões
históricas, as contribuições de diferentes áreas do conhecimento sobre o seu objeto de pesquisa;
valorizar o trabalho acadêmico desenvolvido em equipe; conhecer as diferentes modalidades de
História Comparada; redigir um texto acadêmico de história; estar apto a exercer a docência em
nível de graduação e/ou atender a uma demanda diversificada do mercado de trabalho, para atuar
em institutos culturais e de pesquisa, em meios de comunicação de massa (imprensa, televisão etc.)
e em assessorias culturais e políticas.
b) Organização de grupos de pesquisa como campos de exercício de experimentação
comparada, promovendo o aporte de olhares plurais sobre conjuntos de problemas definidos pelas
Linhas de Pesquisa de História Comparada das Diferenças Sociais, das Formas Narrativas e das
Instituições e Formas Políticas;
3
Disponível em: <http://www.hcomparada.ifcs.ufrj.br/apresentacao/index-objetivo.php>.
Acesso em: 22/12/2006.

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c) Promoção periódica de atividades em que pesquisadores discutiram os projetos e
trocaram informações, propondo novos caminhos à pesquisa e estabelecendo o interesse da equipe
e de profissionais convidados em manter as atividades conjuntas de pesquisa;
d) Promoção de cursos de extensão, simpósios, ciclos de debates, oficinas e
conferências, nos quais especialistas brasileiros e estrangeiros das diversas áreas das Ciências
Sociais, possam praticar o método comparativo, a partir dos temas selecionadas em cada evento,
criando-se assim um fórum para o debate;
e) Integrar as atividades do PPGHC com os Cursos de Graduação do IFCS através das
atuações de ensino, pesquisa e extensão do seu corpo docente permanente, as quais se
fundamenta na existência dos Laboratórios; da realização de atividades de extensão abertas à
participação dos alunos de Graduação e através da participação dos mestrandos nas disciplinas dos
Cursos de Graduação, ministrados pelos seus orientadores;
f) Estimular a publicação das conclusões das pesquisas individuais e coletivas em
revistas indexadas e em obras de caráter coletivo.

2.3 - História Comparada (PPGHC) – Perspectiva 4

O Programa de Pós-Graduação em História Comparada funciona no IFCS da UFRJ, desde


2002, com o apoio da Pró-Reitoria de Ensino para Graduados e Pesquisa da UFRJ. Foi credenciado
pela Capes em 21 de maio de 2004 e devidamente reconhecido pelo MEC em 10 de novembro de
2004.
Nas primeiras décadas do séc. XX, Davillé [1] e Febvre [2] apresentaram a possibilidade de
usar o método comparativo na História, superando a concepção tradicional baseada na singularidade
do fato político. Inserido neste contexto, Bloch [3] definia que a comparação explicaria as
semelhanças e diferenças entre duas séries de natureza análoga, mas de meios sociais distintos.
Como objeto de aplicação deste método, elegeu sociedades que eram vizinhas e contemporâneas,
sofriam "influência uma da outra" e remontavam parcialmente a uma "origem comum" [4]. A
proposta de Bloch, próxima do comparativismo de Durkheim, trazia uma perspectiva histórica mais
ampla, extrapolando os estudos locais, característicos da tradição historiográfica francesa. Este
método comparativo tinha o mérito de afastar o estudioso de seu próprio ponto de observação e
permitir a passagem da descrição à explicação de processos históricos, sistematizando
conhecimentos. Entretanto, a História Comparada de Bloch atinha-se às fronteiras políticas e a uma
mesma temporalidade. A maioria dos estudos históricos comparativos ainda segue neste sentido,

4
Disponível em: <http://www.hcomparada.ifcs.ufrj.br/apresentacao/index-perspectiva.php>.
Acesso em: 22/12/2006.

5
"comparando-se o comparável", ou seja, privilegiando sociedades vizinhas de mesma natureza e
coetâneas.
O comparativismo de Bloch se distinguia daquele de Weber para as Ciências Sociais, que
cotejava traços de um período com os de outros, objetivando ver o que não estava lá, a ausência
específica. Comparava aspectos parciais e selecionados dos processos em confronto, mesmo que
distantes temporalmente, a partir de probabilidades típicas de acontecer (e eventualmente da
formulação de tipos ideais). Esta abordagem envolvia, portanto, sociedades francamente
heterogêneas e/ou muito afastadas temporalmente, procurando o peculiar e não o comum a várias
ou a todas as configurações históricas.
Havia o receio de que a História Comparada resultasse numa abstração excessiva, caso
tornasse tudo passível de confrontação independentemente de tempo/espaço, negando justamente o
que é caro aos historiadores: privilegiar a singularidade e a temporalidade dos fenômenos sociais. O
uso inadequado da comparação levaria a anacronismos quando confundisse analogias superficiais
com similitudes profundas e desconsiderasse as especificidades das sociedades, como foi criticado
por Febvre [5] nas obras de Spengler e Toynbee.
Corria-se ainda o risco de etnocentrismo pois, muitas vezes, considerava-se o Ocidente
como norma da qual divergiriam as outras culturas. Daí, a cautela em relação ao comparativismo
em História.
Entretanto, aspectos favoráveis foram levantados. Cardoso e Pérez Brignoli [6] afirmam que
o impulso da História Comparada deveu-se principalmente ao estabelecimento de um contato mais
aprofundado com as Ciências Sociais, para as quais a construção do objeto implicava em
comparação; ao desenvolvimento da História em diversos países no pós-Segunda Guerra,
ampliando as possibilidades de verificação de hipóteses; e ao sucesso alcançado por estudos
comparativos, sensíveis às especificidades dos elementos analisados e com maior rigor teórico-
metodológico. Estes historiadores destacam ainda outros pontos positivos deste tipo de abordagem
como, por exemplo, o rompimento com um dos legados da historiografia do séc. XIX - a concepção
das fronteiras políticas nacionais como unidades naturais de estudo - e concomitantemente a
disponibilização de ferramentas para a distinção das singularidades de um objeto situado numa
tipologia, destacando-se quer os traços comuns quer os traços incidentais no conjunto dos objetos
comparados.
Assim, a partir de meados do séc. XX, com a fragmentação do mundo contemporâneo e a
crítica à concepção evolucionista / progressista da História, abriram-se novos caminhos ao método
comparativo. O desenvolvimento da Arqueologia, Antropologia e Semiótica, dentre outros,
propiciou uma visão distinta das sociedades a partir de problematizações comuns, encontrando-se

6
respostas diferentes. Isto foi possível no contexto da crítica aos paradigmas iluministas, com a
desconstrução de hierarquias culturais e visões etnocêntricas, viabilizando epistemologicamente
"comparar o incomparável". Tal é a proposta de História Comparada apresentada por Vernant e
Detienne e adotada pelo PPGHC.

2.4 - História Comparada (PPGHC) – Proposta 5

Nos anos de 1960, Vernant, Detienne e outros pesquisadores criaram o Centre de


Recherches Comparées sur les Sociétés Anciennes (CRCSA), cujas análises comparativas
contribuíram para o estudo das sociedades em geral. Pelo reconhecimento do mérito deste trabalho,
o CRCSA foi convidado a participar da EHESS.
Detienne, em obra publicada em 2000, [7] apresenta os pressupostos do trabalho deste
grupo: considerar que uma sociedade é formada por uma complexidade infinita de elementos,
própria da dinâmica das relações e práticas pelas quais os homens se articulam, produzindo
múltiplas combinações e ações sociais; reconhecer que há diversas redes de imbricações, não
necessariamente lineares, causais e evolutivas, que têm mais condições de serem percebidas ao se
tornarem objeto de comparação pela construção de conjuntos de problemas comuns às pesquisas da
equipe; abordar os diferenciais espaço-temporais, além das várias modalidades de observação e
análise dos fenômenos, incentivando que as questões sejam discutidas sob diversos ângulos pela
equipe, rejeitando princípios de univocidade, advindos de autoridade pessoal, modelos,
enquadramentos e linearidade do objeto/sujeito de conhecimento; preocupar-se em descobrir formas
múltiplas através da construção de conjuntos comparáveis, compreendendo assim diversas culturas
e como elas se auto-representam; trabalhar coletivamente, pois a pesquisa de cada um se completa
com as demais.
A partir destes pressupostos, a abordagem comparativa no Modelo Vernant-Detienne é
operacionalizada em 3 etapas complementares:
a) Construção de objetos de pesquisa pelos projetos individuais da equipe. No PPGHC,
esta etapa se concretiza na diversidade das pesquisas realizadas por seus membros, docentes e
discentes, abrangendo distintas temporalidades e espacialidades, fenômenos e fontes;
b) Construção de conjuntos de problemas. O conjunto de problemas é um conceito
metodológico que constitui um primeiro horizonte de aproximação das questões que perpassam os
projetos individuais da equipe, estabelecendo as linhas mestras da comparação em um horizonte
fenomenológico e conceitual aberto, transversal aos cortes espaço-temporais tradicionais. O
5
Disponível em: <http://www.hcomparada.ifcs.ufrj.br/apresentacao/index-proposta.php>.
Acesso em 22/12/2006.

7
conjunto de problemas possibilita o compartilhamento e a circulação das idéias, formas de
abordagem, hipóteses e encaminhamentos teórico-metodológicos que incidem sobre os objetos de
pesquisa. No PPGHC, as Linhas de Pesquisa definem-se como conjuntos de problemas, oferecendo
linguagens comuns às questões debatidas em cada projeto e viabilizando em seu âmbito um lugar
próprio ao enfoque comparativo;
c) Criação dos campos de exercício de experimentação comparada. Também se trata de
um conceito metodológico, baseado na comparação construtiva, que se inicia com a elaboração de
conjuntos de problemas e se concretiza nos debates entre os membros da equipe. Este campo é
efetivado em atividades acadêmicas regulares, em que os pesquisadores apresentam o
desenvolvimento de seus temas, individual (projetos de pesquisa) e coletivamente (conjuntos de
problemas). No PPGHC, isto ocorre nas disciplinas, atividades de extensão, Simpósios anuais de
História Comparada e intercâmbios acadêmicos / institucionais, resultando em publicações
científicas de obras coletivas e artigos.

A investigação comparativa é um desafio epistemológico, acadêmico e político para a


História. As iniciativas nesta área não são homogêneas, mas, apesar disso, o que as une é a atitude
enfaticamente crítica do comparativismo face aos paradigmas tradicionais do saber histórico e o
estabelecimento do diálogo entre várias disciplinas. Neste sentido, sem descartar o comparativismo
de Weber ou Bloch, a proposta do PPGHC segue um outro caminho.

A opção do PPGHC pelo comparativismo do Modelo Vernant-Detienne está relacionada,


sobretudo, às características mais incisivas da História na Modernidade, tal como a fragmentação
dos sujeitos, a multiplicação dos campos do saber e a busca por perspectivas plurais, sem, contudo,
abrir mão do diálogo e da síntese. Neste sentido, se, por um lado, recusa-se uma visão única das
sociedades, uma só teoria ou método no fazer História, por outro lado procura-se articular o singular
ao coletivo, o macro ao micro, fundamentando a produção do conhecimento histórico na construção
coletiva de conjuntos de problemas e campos de experimentação, que pressupõem o cultivo à
diversidade, o estímulo à criatividade e ao diálogo. Assim, o que se analisa não é apenas aquilo que
pode ser comparado em sua singularidade fechada, fundamentado na semelhança taxonômica.
Deve-se considerar que os fenômenos cotejados, relativos a gênero, raça, dominação, conflito,
resistência e outros, não significam a mesma coisa para todas as sociedades. O método comparativo
permite estabelecer o estranhamento, a diversificação e a singularidade do que parecia
empiricamente diferente ou semelhante, posto pelo habitus e reproduzido pelo senso comum.
Portanto, o fundamental do método comparativo adotado pelo PPGHC, e que define o seu perfil e a

8
sua capacidade de inovação, é o trabalho coletivo, aberto à pluralidade de opções em relação ao
recorte do objeto, tempo, espaço, métodos e conceitos. Consideramos que a História hoje não pode
prescindir das contribuições de outras áreas do conhecimento, embora o trabalho multifocal não
implique necessariamente em um produto final interdisciplinar; produz-se História, mas, sendo
comparada, esse saber histórico se identifica na incorporação de outras perspectivas advindas de
diversas disciplinas das Ciências Humanas. Ou seja, a História Comparada no Modelo Vernant-
Detienne exige que a disciplina se refaça no diálogo, na consolidação de grupos de pesquisa, no
aporte de olhares plurais sobre conjuntos de problemas tornados convergentes pela síntese
comparativa e não pela sua "semelhança" originária.
Há poucos centros formais de estudos históricos comparativos no Brasil, embora haja
pesquisas individuais seguindo diversas linhas da abordagem comparada. Estes trabalhos são
agrupados por seus objetos: caso se compare práticas políticas, por exemplo, situa-se
tradicionalmente em linhas de pesquisa ou áreas de concentração de História Política. A
implantação do PPGHC visa conferir uma identidade a essas e outras pesquisas comparadas, quer
sigam modelos estabelecidos do comparativismo de Bloch ou Weber, quer procurem inserção em
campos de exercício de experimentação formados na linha Detienne-Vernant. O Programa procura
manter-se em processo contínuo de aperfeiçoamento, afim de permitir a cada vez maior integração -
sem fechamento - da estrutura curricular com as linhas de pesquisa e os trabalhos da equipe,
consolidando a proposta de uma concentração em História Comparada.
Assim, no que tange à UFRJ, a criação de um novo programa gera um significativo
potencial de crescimento do Departamento de História em nível de pós-graduação; a existência de
dois programas (PPGHC e PPGHIS) é positiva, pois reflete a capacitação, a qualificação e as
diferentes inserções historiográficas do seu corpo de docentes pesquisadores. O PPGHC configura-
se hoje como um novo e diferente campo acadêmico já institucionalizado, capaz de contribuir para
o desenvolvimento e a importância da pesquisa histórica no país.

Notas:

[1] DAVILLÉ, L. La comparaison et la méthode comparative, en particulier dans les études


historiques. Revue de synthèse historique XXVII (79-80): 4-33, 1913; XXVII (81): 217-257, 1913;
e XXVIII (83-84): 201-229, 1904.

[2] FEBVRE, L. Une esquisse d'histoire comparée. Revue de synthèse historique XXXVII: 151-
152, 1924.

[3] BLOCH, M. Comparaison. Revue de synthèse historique LXIX (boletim anexo): 31-39, 1930.

[4] BLOCH, M. A sociedade feudal. Lisboa: Edições 70, 1979; BLOCH, M. Os reis taumaturgos.
São Paulo: Cia. das Letras, 1993.

9
[5] FEBVRE, L. Duas filosofias oportunistas da História. De Spengler a Toynbee. In: Combates
pela História. 3. ed. Lisboa: Presença, 1989.

[6] CARDOSO, C. F. S., PÉREZ BRIGNOLI, H. O método comparativo na História. In: Os


métodos da História; uma introdução aos problemas, métodos e técnicas da história demográfica,
econômica e social. 3. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1983.

[7] DETIENNE, M. Comparer l'incomparable. Paris: Seuil, 2000.- Viabilizar a prática da História
Comparada como campo de investigação histórica que se constrói pelo diálogo contínuo com outras
disciplinas e distintas temporalidades/espacialidades, criando as condições para o desenvolvimento
de projetos integrados;

2.5 - História Comparada (PPGHC) 6

O Programa de Pós-Graduação em História Comparada (PPGHC) 7 objetiva construir um


espaço de produção de conhecimento referente aos fenômenos sociais em seus diversos
ângulos de abordagens através da construção de um campo de exercício de experimentação
comparada.
O campo de experimentação comparada está fundamentado em torno do diálogo (seja em
termos multidisciplinar, interdisciplinar ou transdisciplinar) entre os membros da equipe. É
um conceito metodológico, elaborado por Detienne, 8 que se inicia com a construção de
conjuntos de problemas em comum e se efetua no decorrer dos debates entre os pesquisadores.
Expressa uma atividade acadêmica regular de debates entre os pesquisadores, docentes e discentes,
na qual se apresentam os resultados das pesquisas individuais e verificam-se as diferenças sociais e
históricas diante dos conjuntos de problemas, que todos se propuseram a observar durante as suas
pesquisas. No PPGHC, elegeram-se, como campo de experimentação comparada, os seguintes loci:
o elenco de disciplinas do programa, em que se discutem as Linhas de Pesquisa e as pesquisas
realizadas no PPGHC; as atividades de extensão (simpósios, grupos de estudos, conferências, ciclos
de debates, oficinas...), que materializam a reflexão da pesquisa pós-graduada em História
Comparada; as publicações objetivando difundir e compartilhar os resultados das pesquisas do
PPGHC; e os convênios que viabilizam o intercâmbio científico interinstitucional. (o grifo em
negrito é nosso)
6
Adaptado de material informativo elaborado pelo PPGHC (ano 2006).
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ / Instituto de Filosofia e Ciências sociais – IFCS / Pós-Graduação em
História Comparada - PPGHC
Endereço: Largo de São Francisco de Paula n 1o., sala 311 – Centro – Rio de Janeiro, RJ - BRASIL – CEP 20051-
070 - Tel.: (0XX21) 2221-4049 - Tel e Fax: (0XX21) 22214049 - Fax: (0XX21) 2221-1470
E-mail: hcomparada@ifcs.ufrj.br - Site: http://www.hcomparada.ifcs.ufrj.br
7
O PPGHC foi aprovado pelo Parecer CNE/CES 314/2004.
8
DETIENNE, M. Comparer l’incomparable. Paris: Seuil, 2000. Versão brasileira: DETIENNE, M. Comparar o
incomparável. Aparecida / SP: Idéias & Letras, 2004.

10
O mundo atual não nos permite mais nos fechar em nossas pesquisas. Um saber sólido se
constrói com o intercâmbio e a reflexão conjunta. Dialogar, discutir, criticar, divulgar são práticas
de pesquisa que promovem a eficácia da pesquisa e estimulam a formação de equipes, primordiais
para o saber histórico. A participação em eventos acadêmicos aprofunda o campo de exercício de
experimentação em História Comparada. (o grifo em negrito é nosso)

2.6 - História Comparada (Neyde Theml) 9

Profa.Dra. Neyde Theml. Exposição sobre a proposta de


história comparada abordada por DETIENNE, M. Comparar o
incomparável. Aparecida/SP: Idéias & Letras, 2004.

HISTÓRIA COMPARADA

o A História Comparada pretende produzir conhecimento, referente aos fenômenos sociais,


em diversos ângulos de abordagens.

o A primeira etapa chamamos de experimentação. Ela se apresenta empiricamente na forma


de - campo de exercício de experimentação comparada, ou campo de exercício
experimental.

o A experimentação está no justo momento da reunião dos pesquisadores das diversas áreas
conhecimento. Não importa o conhecimento que cada um traga .....mas daquele produzido
em conjunto ou em equipe.

o Juntos, nesta reunião, no campo do exercício de experimentação comparada, irão sugerir


conjuntos de problemas ou de conceitos, ou de categorias que serão pesquisados a partir
daquele momento.

o Após estabelecido o objeto de pesquisa, os pesquisadores reunidos irão estabelecer um


projeto, no qual estará bem marcado as etapas do trabalho de cada um da equipe.

No projeto deve ficar claro para os pesquisadores que:

o a comparação é singular e plural;

o percorrer tanto as sociedades antigas quanto as atuais, as simples e as complexas;

o colocar em perspectiva as singularidades, as repetições, o tempo e o espaço.

o comparar pressupõe a existência de diferenças (de tempo, de espaço e de escolhas sociais);


não teria sentido comparar conjuntos sociais iguais, tendo-se em conta que os fenômenos
sociais apresentam variáveis infinitas
9
Material apresentado pela Profa.Dra. Neyde Theml no Fórum de Estudos de História Comparada do PPGHC, em 31 de
maio de 2006.

11
o comparar, também, pressupõe uma equipe multidisciplinar (historiadores, antropólogos,
sociólogos, filóso, lingüistas e outros) para que o objeto em pesquisa possa ter a leitura
comparada dos diversos campos das Ciências Humanas.

o A História Comparada é ao mesmo tempo experimental e construtiva.

o Construtiva no sentido de construção do conhecimento.

o A equipe deve se reunir frequentemente para discutir e debater o andamento do


projeto em equipe, ou seja, juntos.

o A cada reunião se re-estabelece o campo de exercício experimental.

o O resultado da pesquisa deve se apresentar na forma de publicação em conjunto, em


grupo, em equipe...

o Sugestões para pesquisa comparada


o A: Conceitos de trabalho, de império, de justiça ...
o B: Sistemas culturais, sistema de valores; sistemas políticos; sistemas simbólicos........

DETIENNE, M. Comparar o incomparável. Aparecida / SP: Idéias & Letras, 2004.


Link 1
Disponível em: <http://www.ideiaseletras.com.br/LvCompararoIncomparavel.htm>.
Acesso em 28/05/2006.
Responde a um desafio importante, imposto pelo processo da globalização: a necessidade de abrir
espaço para o diálogo entre as diferentes culturas. Um diálogo que nos deve levar não apenas às
questões de caráter antropológico e cultural, mas também ao passado, à maneira de ler a história,
comumente construída em torno de visões nacionalistas, onde o "incomensurável e o
incomparável", tornam-se perigos mortais. Partindo do pressuposto que os historiadores são avessos
ao uso da comparação, Detienne demonstra o quanto esse método, comum na área da
antropologia, possa ser fecundo na construção da ciência histórica, para que esta possa fugir do
fechamento perigoso das leituras "nacionais".

Link 2
Disponível em:
<http://www.itf.org.br/index.php?pg=conteudo&revistaid=6&fasciculoid=134&sumarioid=1941>.
Acesso em 28/05/2006.
Comparar o incomparável, por Marcel Detienne (Trad.Ivo Storniolo). Aparecida. 2004. 149 p. –
Partes da obra: Prefácio. I. Se por acaso um antropólogo encontrar um historiador. II. Construir
comparáveis. III. Colocar em perspectiva os regimes de historicidade. IV. Experimentar no campo
dos politeísmos. V. Das práticas de assembléia às formas do político. – A obra interessará de modo
particular aos sociólogos, historiadores e antropólogos.

12
2.7 – História e Comparação (M. Aymard)

História e Comparação

AYMARD, M. Histoire et comparaison. In: ATSMA, H., BURGIÈRE, A.


(ed.). Marc Bloch aujourd’hui; Histoire comparée & Sciences So-
ciales. Paris: Éditions de l’École des Hautes Études en Sciences So-
ciales (EHESS), 1990. p. 271-278. [tradução de Regina Maria da
Cunha Bustamante] – Observação : a numeração das notas segue
o sistema original.

M.Aymard

[p. 271] Desde o início do século, a História se acha confrontada com a necessidade de
comparar. Ela não chegou aqui por si própria, e muitos historiadores continuam a reafirmar o
caráter irredutível, rebelde a toda generalização, a toda sistematização, a toda modelização do que é
o mais difícil de compreender, mas que justifica sozinho, aos seus olhos, a disciplina: o vivido
humano, concreto, dos indivíduos. Mas, ela não teve escolha. Teve que considerar o desafio que lhe
lançou a Sociologia – na França, sob a direção de Émile Durkheim – na competição que esta coloca
então em cena para se atribuir e se fazer reconhecer como um verdadeiro primado entre as Ciências
do Homem: “A História pode ser somente uma ciência na medida em que explica, e somente pode-
se explicar comparando”. Uma afirmação da qual os historiadores que a retomam, hoje como
ontem, por sua conta, esquecem em geral, ou preferem passar em silêncio, a conseqüência, lapidar,
formulada no rastro: “Desde que compara, a História torna-se indistinta da Sociologia”. Este
imperialismo de uma Sociologia então nascente pode hoje nos fazer sorrir. Mas, nos lembra, mais
profundamente, a natureza verdadeira dos embates. Coloca de fato a comparação no coração, às
vezes, por um lado, da ambição unificadora das Ciências Sociais tomadas em seu conjunto, e por
outro lado, do projeto teórico próprio a cada Ciência Social considerada separadamente: sua
pretensão de compreender a totalidade do social, e de lhe propor um sistema de explicação que alie
a exaustividade à coerência.
Este desafio marcou tanto Lucien Febvre como Marc Bloch, mas se as referências a
Durkheim são nitidamente mais freqüentes no segundo que no primeiro, este, que reprovou em
Durkheim seu dogmatismo e um determinismo simplificador, exprimiu, aliás, suas reticências em
relação a um certo “sociologismo” que ele percebia na Sociedade Feudal. Um e outro, muito cedo,
tinham escolhido seu campo, que já era aquele de Paul Lacombe (Da história considerada como
ciência, Paris, 1894) ou de Henri Berr contra Charles Seignobos. Mas, quando, entre as duas
guerras, eles decidem aceitar o desafio, a Sociologia, desde a morte de Durkheim (1917), colocou

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mais em surdina este imperialismo inicial e um modus vivendi voltou pouco a pouco ao cenário,
deixando o campo livre à História, para retomar o empreendimento por sua conta, mas com
infinitamente mais flexibilidade e cuidados: longe de impor seus métodos, o historiador estaria
principalmente atento ao empréstimo dos métodos dos outros, como se não tivesse nada, ou melhor,
pouco a dar, e tudo a tomar e a aprender. Marc Bloch pode assim, no prefácio de Caracteres
Originais, registrar o reconhecimento, por Durkheim, da importância da História para o sociólogo
(“Para conhecer o presente, deve-se inicialmente se desviar dele”), mas para reivindicar
imediatamente como uma necessidade, logo também como um direito, a passagem para as terras do
sociólogo: “Nestas situações também, para interpretar o passado, é para o presente, ou ao menos
para um passado muito vizinho ao presente, que inicialmente o olhar se assenta” (p. X). O método
[p. 272] regressivo aqui se acha justificado, até no seu empirismo prudente. Ele protege do risco
que consiste, por um raciocínio circular, em deduzir a continuação dos acontecimentos a partir de
uma origem reconstituída, precisamente, sobre a base destes. Mais profundamente, ele dá ao
historiador um domínio mais eficaz do tempo, que somente ele é capaz de remontar.
Este domínio do tempo, o historiador o combina, para Marc Bloch, com o domínio,
emprestado do geógrafo, do espaço: o estudo dos campos abertos e alongados toma somente seu
sentido caso englobe, na mesma visão, para além das fronteiras e sem buscar fazer disto o
monopólio de um país (como Meitzen) ou uma realidade estrangeira (como Fustel de Coulanges,
que não viu traço disto na França), a totalidade de sua área de extensão (p. XI). Da mesma forma,
“os desenvolvimentos próprios às diversas regiões” francesas não podem ser percebidos, “na sua
singularidade” própria, “sem uma olhadela sobre o conjunto da França”, e “o movimento francês
toma somente seu verdadeiro sentido uma vez examinado sobre o plano europeu” (p. VIII). O
historiador se acha assim chamado a atuar, tanto no espaço como no tempo, no jogo permanente da
comparação, para melhor “distinguir” ao invés de “assimilar e confundir”. A mesma chave – o
tempo – permite ocupar-se das continuidades e a das rupturas, assim como a mesma chave – o
espaço – permite ocupar-se dos caracteres comuns e a das originalidades: nos dois casos, cada um
dos termos toma somente seu sentido em relação ao outro. Longe de se excluir, o idêntico e o
diferente, o individual e o coletivo, o excepcional e o regular se encontram estreitamente
associados. Não ao “fato”, não ao “acontecimento”, não à “realidade” histórica, que não chamam,
pois, a uma dupla leitura. Isto François Simiand, em seu artigo, que é referência, escrito em 1903
(Método histórico e ciência social. Estudo crítico segundo as obras recentes de Lacombe e
Seignobos. REVUE DE SYNTHÉSE HISTORIQUE, p. 1-22, 129-157), já formulara, de acordo
com Paul Lacombe: “Não é fato que se possa distinguir uma parte do individual e uma parte do

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social, uma parte do contingente e uma parte da regularidade” (p. 18). Mas pode-se comparar,
precisamente, sem sacrificar uma destas dimensões à outra?
No seu esforço para responder esta questão central, os historiadores hesitaram durante muito
tempo, e continuam ainda, para muitos deles, a hesitar entre duas posições extremas. A primeira é
quase tão antiga quanto à própria História, tal como ela se define no século XIX como disciplina
com pretensão científica. Ela repousa sobre uma visão unificadora, seja linear, seja, ao contrário,
dialética, de uma História medida por etapas, às vezes, necessárias e sucessivas do desenvolvimento
das sociedades. Um certo marxismo a dividiu com a mais pura tradição liberal: comparar modos de
produção ou regimes políticos supõe que se distingam as unidades de fundo de suas modalidades de
fato, ou, se preferir, o essencial do acessório. Isto permite recusar todo alcance geral, logo toda
significação, ao que aparece como tão afastado em relação ao modelo ou à norma, quando não,
como escórias da História. Estes descartes, menores e voluntariamente minorados, encontram, pelo
contrário, sua importância caso se possa imputar-lhe o fracasso final, quer dizer, seja a ruptura da
progressão linear, seja o bloqueio da operação dialética. Os problemas são assim resolvidos antes
mesmo de serem colocados, e, no final, sem ter necessidade de sê-lo.
[p. 273] A segunda resposta, pelo contrário, marcou a grande mutação da pesquisa histórica
no curso dos últimos quarenta ou cinqüenta anos. No essencial, ela se identificou com a invenção e
a promoção do serial, isto é, com o isolamento desta “parte do social” e, mais ainda, desta “parte da
regularidade”, da qual falava François Simiand, para construir artefatos, cuja definição e
formalização rendem precisamente comparações no limite de critérios próprios que são, eles
mesmos, normalmente, emprestados de outras disciplinas constituídas ou autônomas (Economia,
Demografia, Antropologia, etc.), e submetidos às próprias regras da elaboração estatística. Este foi
o caso, inicialmente, para os preços, que os historiadores responderam ao chamado lançado desde o
fim dos anos 20 pelos economistas. Este foi o caso para as taxas de fecundidade, de natalidade, de
casamentos, de mortalidade cujo cálculo sistemático orienta, ao mesmo tempo, a partir dos anos 50,
demógrafos e historiadores – associados e concorrentes – para a exploração dos registros
paroquiais. Este é o caso, desde quinze ou vinte anos, para as estruturas familiares e os sistemas de
parentesco e de aliança, para os quais os historiadores se deram conta das interrogações, conceitos,
vocabulário e métodos de classificação dos antropólogos. Inicialmente, reservado aos fatos
econômicos e demográficos, os mais fáceis de quantificar, os mais susceptíveis também de um
tratamento estatístico de mesma natureza do que aquele que são objeto atual, o serial paralelamente
conseguiu, desde meados dos anos 60, esta “inserção no qualitativo”, do qual Pierre Chaunu
destacava, na época, o caráter revolucionário: as atitudes diante da morte com o exame dos
testamentos, as práticas e as mutações culturais com as pesquisas sobre alfabetização, a educação, a

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circulação do livro, as crenças e práticas religiosas, com o tratamento das visitas pastorais foram
assim o objeto de pesquisas sistemáticas, implicando cada vez mais em exames massivos,
justificados por um cuidado da “pesagem global” e de uma precaução estatística, a lei dos grandes
números sendo chamada para compensar os erros de fontes imperfeitas. Grades de leituras cada vez
mais sofisticadas permitem confiar dados muito fragmentados e incompletos à intervenção
tranqüilizante do computador que se encarregará, entre outras coisas, de testar todas as correlações
possíveis entre as múltiplas variáveis. Há uma única e verdadeiramente importante diferença com a
Economia e Demografia: as curvas e os mapas assim obtidos são, na melhor das hipóteses, somente
aproximações em relação a uma realidade, que não se deixa jamais encerrar em cifras e que
constitui, pois, sempre além, um limite jamais verdadeiramente alcançado. Bom símbolo da própria
História, definida, por sua busca mais que por seus resultados, e que deve, sem cessar, ser reescrita.
Na prática cotidiana de sua profissão, o privilégio concedido ao serial orientou o historiador
em uma dupla direção. A primeira o conduziu a compreender grandes espaços em seus contrastes –
diferença dos níveis e das curvas de preço, das pirâmides das faixas etárias, das estruturas sociais e
familiares, das regras de transmissão do patrimônio, etc. – mas também nas suas solidariedades, seu
“movimento de conjunto, seu destino coletivo”. A França do Antigo Regime elaborada por Ernest
Labrousse, o Mediterrâneo de Fernand Braudel, o Atlântico de Pierre Chaunu ilustram, cada um a
sua maneira, as ambições e [p. 274] os sucessos de uma diligência que visava ultrapassar sem
sacrificá-la à fragmentação da realidade vivida para reintegrá-la em uma coerência cujos próprios
atores – os homens – não tinham consciência, ou somente uma consciência imperfeita, cuja chave
detinha a História. Mas uma tal diligência era somente possível se, na base, esta diversidade e esta
complexidade do real fossem, por sua vez, tomadas, em troca, na sua totalidade: donde a escolha,
complementar do precedente, da monografia. Algumas vilas e, no limite, uma única vila, uma
cidade, uma micro-região serviam nesta perspectiva de quadro a uma análise em forma de
inventário, que constrói as séries, cifra após cifra, verificando nela minuciosamente a
representatividade e a validade, as reposições no seu contexto concreto e em demonstração das
ligações com tudo o que, por natureza ou por insuficiência de fontes, escapa à colocação em série.
A monografia pôde assim ultrapassar os seus limites geográficos evidentes para se impor como via
de acesso quase privilegiada a uma “História Total”.
Os próprios limites a estas diligências não tardaram, entretanto, a aparecer, e, sem dúvida,
teriam ganho ao serem explicitados desde o início. Toda comparação entre séries reconstruídas para
regiões e épocas diferentes implica, de fato, em certa identidade, ou, ao menos, uma
homogeneidade dos contextos. Que importam séries de salários, escrevia basicamente, desde 1960,
Pierre Vilar, se não há assalariado, isto é, o mercado de trabalho regido pela oferta e pela demanda,

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mesmo mediatizadas pelas intervenções institucionais, freqüentado por atores livres em suas
decisões e sobre os quais a própria estrutura das remunerações, em dinheiro ou in natura, seria, às
vezes, coerente e estável? Ou, para ficar apenas na França, pode-se verdadeiramente comparar sem
precaução nem reserva, no século XVII ou no XVIII, uma curva de preços de trigo de uma região
parisiense especializada desde longa data, com sua rede de grandes fazendas, no aprovisionamento
da capital, e uma outra concernente a uma região de pequenas e médias explorações familiares,
vivendo nos limites da auto-suficiência, vendendo pouco e procurando comprar menos ainda? É
significativo que o historiador, confrontado com esta dificuldade, tenha inicialmente procurado a
resposta na busca de uma maior “pureza” de sua observação, a fim de satisfazer as exigências
daqueles, economistas e demógrafos principalmente, dos quais tomara emprestados os métodos e
buscava o seu assentimento. Fundou então seus cálculos sobre famílias completas sozinhas, como
se elas fossem representativas do conjunto e não constituíssem, pelo contrário, uma “aristocracia”
camponesa privilegiada pela continuidade e estabilidade de sua história. Mesmo pesquisando os
“verdadeiros preços de mercado” e enfadando-se com as taxações impostas pelas autoridades, como
se estas fossem falsas aparências jogadas sobre um “mercado negro” majoritário e que não
regulamentavam a maioria das trocas tanto na cidade como no campo, somente os mais ricos e os
mais poderosos podiam, de fato, escapar disto. Em um segundo tempo, por sorte, o contexto
retomou seus direitos sobre esta vontade de abstração: não à série, cujo sentido não mudava no
tempo e que podia ser automaticamente comparada uma a outra, reconstruída para um outro lugar,
sem verificação prévia.
A monografia percorreu, de certa forma, o mesmo caminho. Sua ambição de História Total
chocou-se, indubitavelmente, com as insuficiências da documentação, mais ainda, com a
dificuldade de passar da [p. 275] descrição para o estabelecimento de coerências cujo local não
constituía o nível exclusivo de definição e de compreensão. Na maior parte, senão na totalidade dos
casos, a descrição serviu para fundar tipologias, isto é, classificações mais ou menos empíricas de
semelhanças e diferenças, mas sem jamais poder pretender a exaustividade da observação. Tudo
então se passou como se a monografia, tão sedutora para o historiador, pela possibilidade que
oferece de reconciliar em uma mesma análise o individual e o geral, o excepcional e o regular, tão
próxima também do trabalho concreto de construção e elaboração pacientes de uma documentação,
em que a pesquisa oral permite preencher os silêncios das fontes de arquivos, tão aberta também às
práticas das disciplinas vizinhas como a Antropologia e a Sociologia, tendia a fechar o historiador
em uma dupla armadilha. A armadilha da repetição e a da banalização de descobertas que deixam
de sê-las – levando então a uma diminuição crescente da produtividade do trabalho científico. A
armadilha de uma retomada ao infindo da descrição, a busca de uma exaustividade que acaba por

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apagar toda distinção entre o que já tem um sentido – porque já conhecido, indicado, interpretável
segundo categorias conhecidas – e o que não tem (ainda) sentido, mas cuja novidade pode permitir
elaborar novas categorias de classificações e de interpretação. Donde, sem dúvida, um certo
sentimento de fracasso que pôde justificar, para alguns, a renúncia ao princípio mesmo da
comparação, e a reafirmação do caráter decididamente irredutível do individual e, de fato, do
singular.
Mas, este fracasso relativo – ou este sentimento de um fracasso – deve ser recolocado em
seu contexto, que produz as duas perspectivas que nós acabamos de analisar aqui. A História tem,
com efeito, seguido, no decurso do último meio século, vias bem diferentes daquelas que Marc
Bloch fixara. Seu objetivo em Caracteres Originais e Sociedade Feudal foi, de fato, identificar as
especificidades e as diferenças, e, por isto, encontrar as coerências de funcionamento e as lógicas de
reprodução ou de evolução de um certo número de estruturas. A História Serial, pelo contrário,
atuou, cada vez mais, no jogo da conjuntura. Para além do tempo curto da crise e dos retornos
regulares do ciclo, ela lhe exigiu o duplo segredo de uma transformação quantitativa e de uma
ruptura qualitativa. De um lado, o crescimento (ou decréscimo) da população, da produção, das
trocas, logo a medida de um certo número de estoque, supostamente comparável no tempo: para os
primeiros, os dízimos, os rendimentos, mas também os batismos, os casamentos, as sepulturas, ou
enfim as firmas; para os segundos, os cadastros, os recenseamentos, os inventários. Mas, este
crescimento, que originou o nosso mundo, toma, por outro lado, seu sentido somente ao descobrir
as rupturas, identificáveis com tanto cuidado – correspondente a mudanças de equilíbrio em uma
dada sociedade, assim como o dos 50% alfabetizados na população masculina – ou marcadas pela
passagem de um sistema ao outro, funcionando segundo regras diferentes: o que conduz então a
opor – assim como na Economia ou na Demografia – um “antigo regime” a um “novo” e a colocar
em evidência, para tentar datar e explicar, as “revoluções” correspondentes. Conhecem-se as
transformações da “revolução agrícola” [p. 276] justamente contestada por Michel Morineau para a
França no século XVIII, e, mais recentemente, para a Inglaterra. A revolução demográfica não teve,
a sua maneira, melhor quinhão: a aparição, reputada precoce na França, de práticas de limitação
voluntária de nascimentos inspirara, há mais de trinta e cinco anos, as primeiras pesquisas de
demografia histórica: o fenômeno é hoje melhor datado e as etapas de seu surgimento, depois de sua
difusão, são melhores identificadas. Mas, não se encontrou para tanto a explicação. Ou pior ainda,
perdeu-se aquela explicação que, durante muito tempo, se propusera, e que imputava a
responsabilidade disto à Revolução Francesa e à transformação em um sentido igualitário das regras
de transmissão de bens. Em contrapartida, ganhou dimensões novas: a de indício de uma mutação
mais profunda das atitudes diante da vida e da morte, também a de uma revolução cultural,

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testemunha indireta, mas tanto mais significativa, de uma liberação em relação aos ensinamentos da
Igreja. Colocam-se ainda novas questões, sugerem-se novas respostas. Mas, permanece mais que
nunca isolado e, no limite, na medida mesmo em que nos afasta da Demografia ao invés de nos
aproximar dela, inimitável. Pois se pode reproduzir – e se é, de fato, por conseguinte, reproduzido,
talvez o termo correto seria “produzido” – alhures e mais tarde, com as mesmas conseqüências em
certos casos, mas em outros contextos, que sugerem que suas causas foram então diferentes.
Sem dúvida, a situação hoje mudou: a história do crescimento perdeu sua fascinação e se
reencontrou a Antropologia, que ressaltou o interesse pelas estruturas e, de maneira geral, por todas
as formas e as modalidades da reprodução social. Família, parentesco, aliança, regra de troca de
mulheres e de transmissão de bens se prestam melhor, aparentemente, à comparação na medida em
que suas variações locais não se inscrevem em uma tipologia aberta e susceptível de se alargar ao
infinito, mas em uma série de soluções (para cada uma) e de combinações (entre elas), cujos termos
tenham atualmente e já sido inventariados. Tudo se passa, no limite, como se cada caso ou figura
susceptível de ser identificada no passado, como no presente, já tivesse seu lugar em uma
classificação preestabelecida, que permitiria também, ao menos algumas vezes, prever suas
evoluções possíveis. Mas, o perigo de um determinismo, fundado em uma leitura, por vezes,
esquemática e parcial da realidade, não é basicamente diferente daquele que escondiam as séries
econômicas e demográficas. A classificação das estruturas familiares, propostas, há vinte anos, por
Peter Laslett, é um bom exemplo disto: útil em um primeiro momento para mostrar a predominância
estatística precoce, na Europa do fim da Idade Média, da família nuclear sobre todas as formas de
família extensiva, foi, rapidamente, vítima de sua simplicidade e de sua comodidade de utilização,
que pareciam autorizar a comparação rápida de situações distintas no tempo e no espaço. Reduzida
à posição de tipologia estática, ela contribuiu para congelar uma leitura que devia esclarecer.
Recolocada na dinâmica do ciclo familiar, ganhou logo uma significação nova: a mesma família
pode passar ilesa, no curso de sua história, de uma forma a uma outra, para aparecer alternadamente
múltipla, alargada e nuclear, e o ideal social – como a família-tronco nos Pirineus do século XIX
segundo a demonstração recente de Antoinette Fauve-Chamoux – pode muito bem ser somente
alcançado por uma [p. 277] minoria estatística bem reduzida. Mesmo assim reabilitada, entretanto,
ela não esgota a leitura de uma sociedade, pois as mesmas formas podem recobrir realidades, aliás,
muito diferentes. E, pode-se dizer isto tanto para as regras de aliança como para as de sucessão: elas
revelam, nas sociedades complexas da Europa medieval e moderna, como bem o demonstrou as
análises de Georges Augustins, Alain Collomp e Pierra Lamaison para as sociedades “em casas” [à
maisons???] na metade sul da França, ou aquelas de Gerard Delile para a prática aristocrática e
camponesa de aliança na Itália meridional, de uma notável plasticidade, que sugere que elas são

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tanto determinadas como determinantes. O que põe em novos termos o problema da legitimidade da
comparação: estaria condenada a permanecer formal ou parcial?
Melhor seria então hoje nos distanciar da fórmula excessivamente brilhante e simples de
Durkheim. Pois, se a História deve sempre demonstrar um status científico, que jamais o foi
adquirido de uma vez por todas, não é, e em todo caso não unicamente, pelo valor das explicações,
que saberá dar, que conseguirá isto, mas, muito mais, pela retomada permanente das explicações
que ela terá precedentemente avanços. E a comparação não constituirá apenas uma parte, seja
positiva, seja negativa, destas explicações: não ao fato isolado, não à realidade singular cuja
comparação com outros fatos, outras realidades, possa satisfazer para dar conta; contudo, não mais
explicação que valha para este único fato, para esta única realidade. O historiador se achará então
condenado a se encontrar entre os dois extremos de uma irracionalidade e de uma racionalidade do
real igualmente absolutas, um tipo de caminho do meio, para o qual o ensinamento de Marc Bloch
guarda, até hoje, todo o seu valor. Três regras surgem para alcançar isto.
A primeira será dar à monografia, além de uma descrição que se persegue por si própria ao
infinito, sua dimensão estrutural: é em seu nível que deve, inicialmente, descobrir e reatar os fios,
restabelecer e construir as ligações complexas entre as diferentes séries ou níveis da realidade
estudada. Sua função é menos de verificar as concordâncias ou relações de exclusões já
identificadas alhures do que sugerir novas pistas e retomar a pesquisa.
A segunda será renunciar contrariamente ao cessar de querer, a todo preço, achar coerências
de conjunto em nível superior, como se certas tendências de fundo deviam, a todo custo, colocar
uma ordem unânime ou linear na diversidade do real. O primeiro ganho da crise dos anos 70 fora
recolocar o espaço em igualdade com o tempo, e de lhe dar um valor de variável à parte inteira que
a História tendia, freqüentemente, a lhe recusar, ou ao menos, minorar.
A terceira será, uma vez tendo feito o inventário sistemático das semelhanças e diferenças,
não se contentar apenas com uma tipologia que se limitaria a classificá-las, mas pesquisar as
relações de complementaridade ou de exclusão que as explicam e estruturam este espaço
aparentemente heterogêneo: pois elas sozinhas permitem alcançar um outro nível de coerência, que
integra a complexidade e as contradições do real ao invés de esvaziá-las ou colocá-las entre
parênteses como tantos acidentes, de importância, no fundo [p. 278], menor, e que os recoloca,
ainda lá, em uma duração que não cessa de modificar o seu sentido.
Ninguém necessita para uma tal prática comparativista, empírica e, no fundo, “agnóstica”,
de pôr invariáveis como termos estáveis de referência: simples articulações maleáveis e cambiantes
com o tempo, relações um pouco constantes entre um número não infindo, mas sempre preciso de
variáveis cobrindo um espaço suficientemente extenso ou uma duração suficientemente longa,

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aparecem ao historiador como instrumentos suficientes. Sem dúvida, deve se satisfazer somente
com isto. Mas, é verdade que sua tarefa é, no leque das Ciências do Homem, algo particular. Pois se
sabe que as mesmas causas não produzem, em toda parte e em todo tempo, os mesmos efeitos, e
que os mesmos efeitos podem, por sua vez, reenviar a causas diferentes: a sua explicação cessa aqui
de perder e a comparação ganha aqui.

2.8 – Simples Reflexões sobre a História Comparada


(Jean-Marie Hannick)

Simples Reflexões sobre a História Comparada

HANNICK, J.-M. Simples réflexions sur l´Histoire Comparée. In:


http:bcs.fltr.ucl.ac.be/FE/02. Acesso em 05/01/2005. [tradução de Regina
Maria da Cunha Bustamante] FEC 2 (2001) - Folia Electronica Classica
(Louvain-la-Neuve) – Número 2 – julho-dezembro de 2001
<folia_electronica@fltr.ucl.ac.be>

Jean-Marie HANNICK (hannick@anti.ucl.ac.be)*


Professor na Universidade de Louvain
Colégio Erasmo - B 1347 Louvain-la-Neuve

Publicado sob o título Breve história da História Comparada. In: JUC-


QUOIS, G; VILLE, Chr. (eds.). O comparatismo nas Ciências do Ho-
mem. Abordagens pluridisciplinares. Bruxelas, 2000, p. 301-327.

Plano
Introdução
1. O que é a História Comparada?
2. O comparatismo na historiografia ocidental
2.1. Antigüidade e Idade Média
2.2. Os tempos modernos
2.3. O século XIX
3. O comparatismo na historiografia contemporânea
4. Conclusão
Bibliografia

Introdução
Muito se falou de “História Comparada” no início do século XX. O tema estava em voga, ao
menos nos círculos universitários franceses. ”A História”, declarara Durkheim [1], “podia ser
somente ciência na medida em que explica, e somente podia explicar comparando”. Os
historiadores estavam convencidos por este apótema da Sociologia, ou melhor, o que era mais
provável, impressionados pelos resultados engendrados então pelo comparatismo nas Ciências

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Humanas vizinhas da sua? As reflexões sobre as virtudes da História Comparada se multiplicaram
nos anos seguintes. Limitemo-nos a alguns exemplos. Em 1907, G. Glotz consagrou sua lição de
abertura na cadeira de História Grega na Universidade de Paris a Reflexões sobre o objetivo e o
método da História. Ele aqui elogiou os méritos do método, embora convidando seus ouvintes à
prudência: ”O método comparativo permitiu em todos os tipos de ciências realizar em menos de um
século progressos miraculosos, por que não procurar os mesmos benefícios para a História?
Somente se o aplicar com cuidado. Este instrumento tão possante é de um manejo delicado e
perigoso... A maior circunspeção é então necessária a quem quer se servir dele” [2]. Um pouco mais
tarde, é L. Daville (1913-1914) que publicou na Revista de Síntese Histórica de H. Berr em longos
artigos intitulados A comparação e o método comparativo em particular nos estudos históricos,
artigos com forte conotação epistemológica e que quase não dizem, em definitivo, o que este autor
esperava, para a História, do recurso ao comparatismo [3].
No pós 1a. Guerra Mundial, no V Congresso Internacional das Ciências Históricas, o
próprio H. Pirenne (1923) se engaja no debate: seu discurso de abertura é uma vigorosa defesa em
favor do método comparativo, nós voltaremos a isto. No congresso seguinte, reunido em Oslo, M.
Bloch toma o bastão. Lamentando que a maior parte dos historiadores não esteja convencida dos
méritos do método comparativo, ele afirma que este ”pode, deve penetrar as pesquisas de casos. Seu
futuro, ‘acrescenta ele,’ o futuro talvez de nossa ciência seja a este preço.” [4].
Este obstáculo para a História Comparada parece estar, atualmente, um pouco arrefecido. O
assunto suscita em todo caso menos debates e estes parecem mais confidenciais [5]. O método,
considerado quase como salvador, teria decaído? Interessaria apenas a alguns teóricos? Este é o
problema sobre o qual estas páginas gostariam de tentar responder, mas que não se abordará de
pronto. Para aqui ver claramente, importa, me parece, tentar inicialmente ver o mais exatamente
possível o que é a história comparada [6], estudar em seguida a gênese deste método. Poder-se-á
então avaliar de maneira mais precisa o papel que tem atualmente o comparatismo na pesquisa
histórica.
Acrescentemos imediatamente que as páginas que se seguem não se pretendem nem tão
exaustivas, nem definitivas. O assunto, vasto e difícil, teria exigido pesquisas mais demoradas que
as que pude fazer. Achar-se-á então aqui um esboço, uma síntese provisória, correta em suas linhas
gerais, eu o espero, mas certamente susceptível de ser enriquecida e aprofundada.

1. O que é a História Comparada?


“É muito útil se colocar questões, mas muito perigoso respondê-las.” [7]. A despeito do
risco corrido, deve-se entretanto tentar definir a História Comparada. Se não se sabe do que se fala,

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como não naufragar na confusão? Ora, de um lado ao outro, as idéias sobre o assunto flutuam, eu
dou imediatamente dois exemplos disto. Em um livro, aliás notável, consagrado a O método
histórico de Políbio (Paris, 1964), P. Pédech dedica um capítulo ao método comparativo aplicado
pelo historiador grego. “As comparações as mais numerosas pertencem ao domínio militar”, nota
ele na p. 420, e Pédech nos mostra que no seu relato da batalha de Drepano, por exemplo, – quando
da 1a. Guerra Púnica –, Políbio “constrói um quadro comparativo dos elementos que eram
favoráveis aos cartagineses, e desfavoráveis aos romanos” (p. 421). Políbio procede evidentemente
da mesma maneira em seus outros relatos de batalhas, navais ou terrestres. Mas pode-se falar aqui
do método comparativo? Seguramente que não. Contar uma batalha implica que se descrevem as
forças presentes, que se analisam os trunfos de uns e de outros para explicar o sucesso deste ou
daquele campo. Caso se siga Pédech, todos os relatos de combates implicariam História
Comparada! Outro exemplo, que eu hesito em dar, pois eu me choco aqui com um “texto
fundador”; eu o faço somente com prudência e, como dizia E. Pasquier, “sob a correção e censura
dos mais sábios”. Trata-se do famoso discurso de H. Pirenne (1923) sobre O método comparativo
na História. Lendo bem estas linhas, percebe-se que se trata inicialmente de um requisitório contra
a História Nacional, que se colocou, às vezes, a serviço dos beligerantes durante a 1 a. Guerra
Mundial, contra a teoria das raças que dava “uma base científica aos exageros do nacionalismo”,
contra o etnocentrismo que é “o que existe de mais oposto à ciência”. O método comparativo é
apresentado como o remédio a todos estes males, mas parece se confundir com uma pesquisa que,
simplesmente, ignora as fronteiras de Estado [8]. O historiador seria compartista sob a condição de
adotar um ponto de vista universal e é, aliás, assim, nota Pirenne, que se concebe a História desde a
Antigüidade até o século XVIII. A ruptura ocorreria somente no século seguinte, com o romantismo
e o nacionalismo que “orientaram os historiadores ao estudo dos caracteres particulares que
diferenciavam os povos”. Este discurso, então, sugere um tipo de identidade entre História
Comparada e História supra-nacional, o que não é evidentemente satisfatório. Convém dizer que o
Ensaio de uma História Comparada dos povos da Europa de Charles Seignobos (Paris, 1933)
merece verdadeiramente seu título? Sim, segundo o critério de H. Pirenne. Fala-se de alemães,
franceses, ingleses, italianos... Não é então uma História Nacional e as comparações aqui são muito
numerosas, mas puramente descritivas [9]. Tomemos, por exemplo, o que nos diz no capítulo X das
Formas diferentes de governos no fim da Idade Média. Séculos XI e XV: “A autoridade do rei tinha
sido transformada em sentidos opostos nas diferentes países. O rei da Inglaterra continuava a
exercer a autoridade mais centralizada... O rei da França não era obedecido em todo o reino. As
províncias possuídas por um príncipe ficavam governadas como um Estado independente... Os dois
métodos foram aplicados pelos outros reis e pelos príncipes e pelas cidades, mas o regime francês

23
foi muito mais empregado que o regime inglês” (p. 161-162). O autor faz somente colocar em
paralelo o que poderia nos ensinar uma História da França, da Inglaterra, da Alemanha... Uma
verdadeira História Comparada deveria ter, parece, outras ambições. Nós voltamos ao ponto de
partida, o problema da definição.
Inútil procurar isto nos grandes tratados de método histórico. Estas obras, relativamente
antigas [10], se não ignoram a questão, a tratam de maneira sumária, e com muitas reservas.
Bernheim consagra algumas dezenas de linhas ao método comparativo (p. 606-607) que se justifica,
aos seus olhos, pela identidade geral da natureza humana e dos fatores que tratam sobre ela, de
maneira que os processos de desenvolvimento podem se apresentar de forma semelhante nas
diversas épocas e em povos diferentes. Mas, se o autor admite que a comparação pode dar
resultados que não se obteria pelo estudo de casos particulares, é para colocar imediatamente em
guarda contra os perigos inerentes ao método, exemplos o apóiam (p. 609-613). O comparatismo
não é tratado melhor na Introdução aos métodos históricos de Langlois-Seignobos: não existe nada
a tirar, me parece, do pouco que os autores dizem sobre isto (p. 252 et ss.)
O historiador que mais se interessou pelo método comparativo, que o praticou com mais
sucesso e se expressou sobre o assunto com a maior clareza é provavelmente M. Bloch [11]. Titular
da cadeira de História Medieval na Universidade de Strasbourg desde 1927, Bloch era já desde
alguns anos um adepto declarado do comparatismo. Em 1924, apareceu seu livro Reis taumaturgos.
Ensaio sobre o caráter sobrenatural atribuído ao poder real particularmente na França e na
Inglaterra [12]. No mesmo ano, em uma carta a H. Berr [13], aparecia esta frase, muito nítida:
“você sabe, eu penso, que todas minhas tendências de espírito vão precisamente em direção à
História Comparada”. Vêm em seguida dois textos nos quais o autor expõe sua concepção desta
forma de História que adotou. Eu já fiz alusão anteriormente à comunicação de Bloch no Congresso
de Oslo [14].Voltando a este assunto em 1930, redige para o Vocabulário histórico colocado em
andamento por H. Berr no Centro Internacional de Síntese no artigo “Comparação” [15]. Tentemos
resgatar as linhas essenciais destas duas exposições, evidentemente muito semelhantes. Bloch
(1930, p. 34) definiu assim o método comparativo: a prática é “pesquisar, a fim de explicá-las, as
semelhanças e dessemelhanças que oferecem séries de natureza análoga, emprestadas de meios
sociais diferentes”. Deve-se então, para que se possa falar de História Comparada, que duas
condições sejam cumpridas, “uma certa similitude entre os fatos observados – esta vai por si – e
uma certa dessemelhança entre os meios em que eles são produzidos” (Bloch, 1936, p. 17). O
método, precisa ele, pode se aplicar de duas maneiras muito diferentes. Comparar sociedades
distantes tanto no espaço quanto no tempo que eventuais analogias não possam se explicar nem por
influências mútuas, nem por uma comunidade de origem, é uma primeira maneira de proceder, e o

24
autor invoca aqui o exemplo de Ramo de ouro de J. Frazer; outra técnica, “estudar paralelamente
sociedades às vezes vizinhas e contemporâneas, continuamente influenciadas umas pelas outras,
submetidas em seu desenvolvimento... à ação das mesmas grandes causas, e remontando,
parcialmente ao menos, a uma origem comum”, e Bloch (1928, p. 18-19) conclui: “parece evidente
que, dos dois tipos de método comparativo, o mais limitado em seu horizonte seja também
cientificamente o mais rico”.
Segundo nosso autor [16], os resultados que se pode esperar deste método não são poucos.
Ele, inicialmente, tem uma função heurística, permitindo descobrir fenômenos que não se
perceberiam em tal lugar caso não se tivesse em mente realidades de mesmo gênero, mais visíveis
em outros meios (Bloch, 1928, p. 20-23). Mas, ele é igualmente susceptível de ajudar a
interpretação de fatos históricos. Como explicar – exemplo dado por Bloch (1928, p. 24-26) – o
fenômeno monárquico carolíngeo, tão diferente do sistema anterior, o dos merovíngeos? A
comparação com o Reino Visigótico autoriza ao menos a hipótese de uma influência das
instituições existentes na Espanha sobre aquelas do Império de Carlos Magno. Uma perspectiva
comparatista terá ainda por efeito desviar o historiador de falsas explicações. Ela lhe evitará,
particularmente, de buscar justificar fenômenos gerais por causas puramente locais (Bloch, 1928, p.
27-30). Ela o colocará ao abrigo, enfim, de falsas analogias, pois se a comparação deve notar as
semelhanças, ela deve também e principalmente revelar as diferenças: melhor que um outro, o
historiador comparatista ainda resgatará a originalidade das diferentes sociedades.
O terreno foi suficientemente desobstruído, me parece, para passar à etapa seguinte de nosso
estudo. Tratar-se-á agora de ver como este tipo de curiosidade para o que pode se passar “além”,
este interesse pela comparação, foi introduzido na mentalidade dos historiadores. Sabe-se que as
idéias de M. Bloch, expostas brevemente acima, devem muito aos trabalhos de Lingüística
Comparada de A. Meillet [17]. Mas, ele não teve que esperar o século XX para que se manifestasse,
na historiografia, um certo “estado de espírito” comparatista. É o que as páginas seguintes
gostariam de mostrar.

2. O comparatismo na historiografia ocidental

2.1. Antigüidade e Idade Média


Uma certa forma de comparatismo é tão antiga quanto a História e eu seria mesmo tentado a
dizer – segundo muitos outros autores [18] – que esta deve seu nascimento, em grande parte ao
menos – à comparação. O exemplo de Hecateu de Mileto, se bem que sua obra foi conservada
apenas em estado fragmentário, é muito revelador deste aspecto. Heródoto (II, 143) conta que

25
Hecateu acreditava ter um deus por 16o. ancestral e, tendo chegado a Tebas no Egito, ele tinha feito
parte aos sacerdotes de Zeus desta lisonjeira origem. Estes teriam replicado lhe mostrando as
estátuas de seus grandes-sacerdotes erigidas no templo, grandes-sacerdotes que se sucederam de pai
para filho; o santuário continha não menos que 345 estátuas e a 1 a. da série não era nem um deus
nem um herói: “Eles não admitiram o que ele dizia, que um homem fosse nascido de um deus”, nota
Heródoto, que não nos informa infelizmente a reação do milesiano. Pode-se entretanto pensar que
este contato com as tradições egípcias não tinha relação com a famosa declaração de Hecateu: “Eu
escreverei o que me parece ser a verdade. As narrativas dos gregos, de fato, são, ao meu ver,
excessivamente diversas e pouco sérias” [19]. A busca da verdade talvez fosse estimulada, no
logógrafo jônio, por sua viagem ao Egito e suas outras peregrinações.
Outro grande viajante, Heródoto é também muito sensível às semelhanças, às diferenças
entre os homens, seus costumes, seus comportamentos [20]; suas Histórias formigam de
comparações e se deverá então limitar-se a alguns exemplos. A abertura de espírito do “Pai da
História” (Cícero) se manifesta desde as primeiras linhas da obra; “Heródoto de Túrioi expõe aqui
suas pesquisas, para impedir que o que os homens fazem, com o tempo, não se apague da memória
e que grandes e maravilhosos feitos, realizados tanto por bárbaros como pelos gregos, não cessem
de ser renomados; particularmente, o que foi causa para que gregos e bárbaros entrassem em guerra
uns contra os outros” [21]. Duas passagens deste prólogo merecem ser sublinhadas: 1) Heródoto
quer consignar por escrito as ações dos homens, e principalmente, seus feitos, mas estes são
realizados tanto por bárbaros como por gregos; 2) as Histórias são consagradas às Guerras Médicas
(mesmo se a curiosidade de Heródoto a ameniza ao falar de uma massa de outras coisas), mas
aquelas não são apresentadas como uma invasão estrangeira (“gregos e bárbaros entraram em
guerra uns contra os outros”) [22]. Por tudo isto, nós estamos nos antípodas de uma atitude
etnocêntrica!
Existem, na obra de Heródoto, comparações que não vão além de simples constatação. Os
espartanos organizam os funerais de seus reis tal qual fazem os persas (VI, 58-59); existem três
profissões hereditárias em Esparta – as de arauto, de flautista e de cozinheiro –, um fenômeno
idêntico se constata no Egito: “eis como as coisas se passam”, nota secamente o historiador (VI,
60). Algumas comparações o levam, entretanto, mais longe. Eu sei, diz ele, que os persas não
consagram aos seus deuses nem templos, nem estátuas, nem altares, e conclui: “a razão disto, na
minha opinião, é que eles jamais pensaram como os gregos, que os deuses sejam da mesma natureza
que os homens” (I, 131). Alhures é um problema de lingüística que chama a atenção de nosso autor.
Os caúnios, vizinhos dos cários (nós estamos no sudoeste da Ásia Menor), falam uma mesma língua
ainda que os primeiros sejam autóctones, enquanto que os cários sejam originários das ilhas do Mar

26
Egeu. Os caúnios sofreram influência da língua dos cários ou o inverso? Se o historiador se
confessa incapaz de responder, ele tem ao menos o mérito de colocar a questão (I, 171-172). Último
exemplo, eu o repito, dentre tantos outros. Ele concerne aos costumes humanos. Cada um, pensa
Heródoto, crê que os seus são os mais belos. Como prova, esta anedota em que se vê Dario
interrogar os gregos e os indianos sobre a maneira de tratar seus mortos: os gregos os incineram, o
que ojeriza os indianos, que os comem, o que escandaliza os gregos (III, 38). Píndaro disse a
verdade, conclui Heródoto, “o costume é o rei do mundo” [23].
Ao lado destas comparações, que poderiam ser chamadas de etnográficas, aparecem
comparações “políticas”. Como os homens devem se governar? A diversidade dos regimes que a
Grécia conheceu no decorrer dos séculos (monarquia, oligarquia, tirania...) e a coexistência, no
mesmo momento, de sistemas políticos radicalmente diferentes – com estes dois pólos, Atenas e
Esparta – eram um convite à comparação. Em Heródoto (III, 80-82), já, se encontra uma longa
passagem em que três persas discutem os méritos respectivos da democracia, da oligarquia e da
monarquia [24]. O tema volta em Eurípides (Suplicantes, vv. 399-462), Isócrates (Para Nicoclés,
[seção] 14-26), Platão (República VIII, 544c et sv.), Aristóteles (Política 1279a et sv.; Ética a
Nicômaco VIII, 1160b), Políbio. Neste último, a comparação dos regimes políticos existentes,
acrescentando-se, bem compreendido, ao que o autor retirou de seus predecessores, terminou no
enunciado de uma verdadeira lei da evolução dos Estados, a anakuklosis [25]. Os regimes
políticos, pretende Políbio, se desenvolvem naturalmente segundo um ciclo comportando sete fases.
Na origem, os homens vivem como os animais e, como estes, se submetem à autoridade do mais
forte (monarquia). Depois, com o desenvolvimento da sociabilidade, o aparecimento das noções de
“bem”, de “justiça”, a monarquia se transforma em realeza, que degenera necessariamente em
tirania. Esta, derrubada, é substituída pela aristocracia que, por sua vez, se degrada em oligarquia. O
povo então se revolta, toma o poder (democracia), mas seus excessos (oclacracia) levam a cidade à
desordem inicial – e o ciclo recomeçará. Que exista, neste esquema, qualquer coisa de um pouco
artificial pouca importa, o que se deve notar, é a ambição de Políbio de ir além do caso particular,
de analisar várias constituições e de resgatar os traços comuns de sua evolução. Sem negligenciar,
aliás, as diferenças. Esparta e Roma não se integram na anakuklosis, dotadas que são de uma
constituição mista, em que se misturam elementos monárquicos, aristocráticos e democráticos,
garantia de estabilidade [26].
A conquista da Grécia pelos romanos, processo que começa na época de Políbio, e a
transformação da região em simples província do Império deviam dar matéria a novas comparações.
Os vencidos se resignam a sua sorte, mas permanecem fiéis ao seu passado: em relação a Roma,
eles não têm porque se envergonhar de seus grandes homens, nem de suas instituições.

27
Na época de Augusto, Dionísio de Halicarnasso compôs as Antiguidades Romanas, uma
história que se estendia das origens a 264 a.C. (início da 1 a. Guerra Púnica) [27]. A obra abunda em
comparações entre Grécia e Roma, da qual Dionísio de Halicarnasso é, contudo, um orgulhoso
admirador: eis alguns exemplos disto, retirados do livro II. Estudando as instituições assentadas por
Rômulo, Dionísio revela que um bom número delas são um decalque dos modelos gregos, assim o
fenômeno da clientela, que tem o seu equivalentes nos tessálios e atenienses (II, 9, 2). O Senado é
uma imitação do Conselho dos gregos (II, 12, 4); a repartição de poderes entre o rei, o Senado e o
povo é um empréstimo da constituição de Esparta (II, 14, 2). Mais ainda (II, 16-17), Dionísio
compara a política de conquista dos romanos e dos gregos. Os primeiros se mostraram mais sábios,
e mais eficazes. De preferência a massacrar os inimigos e reduzir a população civil à escravidão,
eles transformaram as cidades conquistadas em colônias, lhes concedendo ainda algumas vezes a
cidadania romana. “Quando eu comparo com isto”, prossegue Dionísio, “os hábitos dos gregos, eu
não sei a razão de felicitar os lacedemônios, os tebanos e os atenienses”. Seu orgulho, sua
parcimônia na concessão da cidadania os conduziram ao desastre [28]. Além disso (II, 18-22), é a
religião romana que é comparada a dos gregos. Rômulo pegou emprestado muito destes últimos
(templo, altares, estátuas, sacerdotes...), mas rejeitou todos os mitos blasfematórios para os deuses.
E se poderia alongar sem fim esta lista de comparações: refeições comuns e sissitiai (II, 23), rapto
das sabinas e práticas matrimoniais espartanas (II, 30)... Em Dionísio, elas são sistemáticas [29].
Outro representante deste comparatismo “patriótico”, Plutarco [30]. Nas suas Vidas
Paralelas, este quer mostrar que para cada romano ilustre pode se apresentar um grego que seja do
mesmo nível. Desfilando assim duplas de grandes homens, Teseu – Rômulo, Demóstenes – Cícero,
Agesílaos – Pompeu... Ao todo, vinte e dois pares de biografias que terminam ordinariamente com
uma synkrisis em que coloca em relevo e confronta as qualidades e os defeitos das duas
personalidades das quais acaba de falar. Neste paralelismo, sente-se um pouco, é verdade, o
exercício de escola e acontece que algumas aproximações estabelecidas por Plutarco são
francamente artificiais – não existe grande coisa em comum, por exemplo, entre Péricles e Fábio
Máximo –, mas deve-se lhe tirar rigor por isto? Não é mais a ocasião de se interrogar sobre a
aplicação do método comparativo na biografia? Não é certo que este gênero literário seja um
terreno ideal para uma tal abordagem.
Encontra-se enfim nas Obras Morais de Plutarco um curioso tratado – apócrifo – conhecido
sob o título de “Paralelos Menores”. Trata-se de uma antologia de histórias extraordinárias
provenientes dos tempos antigos, confrontadas a outras, todas também fantásticas, datando de
épocas mais recentes. As velhas narrativas são credíveis? Por que não? Observa o autor em sua
breve introdução: “As histórias antigas passam geralmente, por causa da singularidade das

28
aventuras, por serem apenas um composto de ficções e de fábulas. Mas como eu acho, mesmo nos
nossos dias, semelhantes fatos vindos dos romanos, eu fiz uma coleta deles; e em seguida a cada
acontecimento antigo, eu juntei a narração de um outro muito semelhante vindo dos tempos
modernos. Eu nomeio, além disso, os historiadores que os contaram” [31]. A comparação serve aqui
para autenticar fatos que, tomados isoladamente, teriam sido rejeitados porque inverossímeis [32].
Nota-se que chegado a Plutarco, quer dizer ao século II, eu ainda não citei um historiador
romano. É que eu não encontro entre estes esta via de espírito comparatista tão visível nos gregos
[33]. Diferença de mentalidade que talvez seja explicável. A historiografia romana aparece de fato
tardiamente, na época da 2a. Guerra Púnica, ou seja, no momento em que Roma domina já quase a
totalidade da Itália e da Sicília, a qual se acrescentam a Córsega e a Sardenha. As conquistas
continuam e, muito normalmente, os historiadores romanos vão adotar o ponto de vista do
vencedor. O prefácio de Tito Lívio é eloqüente neste aspecto: “Eu serei feliz”, proclama ele
orgulhosamente, “de ter contribuído com meu melhor para lembrar os altos feitos do primeiro povo
do mundo” [34]. E o de Floro veio do mesmo filão: “O povo romano realizou tantas ações em
setecentos anos, do rei Rômulo a César Augusto, seja em tempo de paz, seja em tempo de guerra,
que, caso se compare a grandeza do Império com o número de seus anos, acreditar-se-ia mais
antigo. Trouxe tão longe seus exércitos sobre a terra que ao ler suas proezas, aprende-se a história
não de um único povo, mas do gênero humano. Obtiveram-se presas com tantas penas e perigos
que, para constituir seu Império, Coragem e Fortuna pareciam ter rivalizados” [35]. Toda a
historiografia romana, certamente, não foi animada por um patriotismo tão exacerbado, mas o que
E. Cizek chama de “romanocentrismo” está aqui bem presente [36]. A exceção mais notável, pelo
que conheço, é representada por Cornélio Nepos, cuja obra é infelizmente conservada de maneira
muito fragmentária. Sua Vida de Homens Ilustres opunha sistematicamente as grandes figuras da
Roma Antiga (reis, generais, mas também oradores, poetas, filósofos...) aos equivalentes
estrangeiros, principalmente gregos. Somente subsistem a compilação consagrada aos generais
estrangeiros, entre os quais figura Aníbal, e as vidas de Catão e de Ático. É então difícil de ver
como Nepos praticava a comparação, mas um Prefácio joga alguma luz sobre sua abertura de
espírito [37]. Leitores, diz ele fundamentalmente, ficarão talvez escandalizados com certos
costumes gregos. Deve-se aprender disto “que os povos não julgam todos com as mesmas
conveniências e indecência e que a regra nestes assuntos é o uso estabelecido”. Inversamente,
muitos dos costumes romanos pareceriam inaceitáveis aos estrangeiros. Nisto, volta-se, em suma,
para a fórmula de Píndaro retomada por Heródoto: “o costume é o rei do mundo”.
Eu me empenho somente agora com muita hesitação no mundo da historiografia medieval: o
domínio é tão vasto que mesmo especialistas os mais cuidadosos confessam dominá-lo

29
imperfeitamente [38]; o simples “estudioso da Antigüidade”, que eu sou, deve então se fixar em
objetivos muito modestos. De fato, eu me limitarei em apresentar alguns textos em que aparece uma
ou outra comparação, simples exemplos respingados aqui e acolá, em direção dos meus leitores.
Não é evidentemente nos anais ou nas crônicas que se pode esperar achar os traços do
comparatismo [39]. Os fatos considerados como importantes e que são de natureza muito diferente
(epidemia, coroamento de um rei, morte de um bispo ou de um abade, inundação, alto feito de
armas, milagres...) são simplesmente notados, ano a ano. São as obras pertencentes ao gênero
histórico que convêm explorar. Eu percorri um certo número delas, para uma messe ainda medíocre.
Cuidadosos sem dúvida de fazer expor seus conhecimentos clássicos, alguns autores
comparam de bom grado as proezas de seu herói às dos grandes capitães da Antigüidade. Guilherme
de Poitiers, na sua História de Guilherme o Conquistador [40], usa abundantemente deste
procedimento. Em 1054, a Normandia estava ameaçada por uma coalizão agrupando o rei de
França, da Bretanha, da Borgonha, do Averno e da Gascônia: “Júlio César... teria sem dúvida
fugido diante deste exército aterrorizante” (I, 30). Guilherme permanece impávido e sai vitorioso do
conflito (I, 31). A travessia da Mancha que vai levar à conquista da Inglaterra? Uma proeza do
duque da Normandia superior a de Agamêmnon na rota para Tróia e a de Xerxes que, quando da 2 a.
Guerra Médica, fez uma ponte de barcos sobre o Helesponto (II, 7). Ou ainda. Na véspera da
batalha de Hastings, Guilherme, com uma escolta de vinte e cinco cavaleiros, vai ele próprio
explorar os lugares: Mário e Pompeu não se arriscaram tanto, eles enviaram batedores (II, 9).
Guilherme de Poitiers exalta tanto os feitos do Conquistador que pretende que a Inglaterra tenha
sido submetida em um único dia (uno die ab hora tertia in vesperum) enquanto Agamêmnon
levou dez anos para se apoderar de Tróia e Roma, anos “para vencer uma a uma algumas cidades”
(II, 26).
Guibert de Nogent conhecia também seus clássicos. A 1 a. Cruzada, da qual, deve-se
ressaltar, ele não participou, lhe pareceu uma proeza superior às guerras de Xerxes, de Felipe da
Macedônia e de Alexandre. “De fato, se nós contrabalançarmos cuidadosamente as guerras dos
gentios e os reinos que eles invadiram ao preço de um grande esforço militar, nós concluiremos que
seu poderio e suas empresas guerreiras não estão absolutamente no mesmo pé do que, pela graça de
Deus, nós próprios obtivemos” [41]. Bem no fim de sua obra, Guibert se compara inicialmente a
César e Hírcio Pansa; ele admite que sua narração da Guerra das Gálias e da Guerra Civil é talvez
melhor informada que sua história da cruzada: César e Hírcio são mais precisos, mais detalhistas
porque eles foram testemunhas dos acontecimentos. Vem então uma comparação entre a arte militar
dos romanos e a dos cruzados. Neste aspecto, a superioridade dos primeiros é evidente, de onde esta
conclusão: se os cruzados conquistaram os infiéis, é “pela vivacidade de sua fé e sua energia” [42].

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Mas, o domínio militar não é o único que se presta a comparações. Guilherme de Poitiers
consagra todo um capítulo às relações muito estreitas que uniam o duque da Normandia à Lanfranc
du Bec, relações que lhe lembravam as do imperador Teodósio com o monge João [43]. Aliás,
evocando os conselheiros de Guilherme, ele nota que sua sabedoria valia bem mais que a dos
senadores romanos (II, 1). Guibert de Nogent vai mais longe no uso da comparação. Ele reconhecia
ter enormes dificuldades com a antroponímia e a toponímia orientais porque as denominações
recentes estão, às vezes, superposicionadas às antigas: o Cáucaso, por exemplo, tornou-se o
Khorazan. Mas a Nêustria, repara ele, tornou-se a Normandia; a Austrásia, a Lorraine! E o autor
comenta: “Eu chamo a atenção sobre isto: mesmo se é certo que, nas nossas regiões, territórios
foram designados por numerosos nomes, da mesma maneira, não há dúvidas disto, terras
estrangeiras mudaram de denominação” [44]. Depois da toponímia, eis a teologia comparada. Como
explicar, se pergunta Guibert, que todas as heresias, ou quase, tenham nascido no Oriente? O
Ocidente, pelo seu conhecimento, engendrou apenas Pelágio. A teoria dos climas lhe dá a resposta:
“Os próprios homens desta região, por causa da pureza do ar e do céu sob o qual nasceram, são às
vezes mais leves de corpo e mais alertas de espírito, e inclinados a abusar da iluminação de sua
inteligência para se entregar a numerosas e inúteis divagações” [45].
Textos deste gênero são, entretanto, muito excepcionais. De uma maneira geral – mas eu
devo repetir que minha pesquisa não foi sistemática –, a comparação me parece pouco presente na
historiografia medieval. Isto se deveria à pobreza das informações das quais dispunham os autores?
[46] O motivo pode ser invocado em certos casos. Orderic Vital, por exemplo, um contemporâneo
de Guibert, deve de se limitar, em sua História Eclesiástica, aos acontecimentos recentes ou
geograficamente próximos. “Eu não posso pesquisar”, diz ele, “sobre o que se passou em
Alexandria, Grécia ou Roma, nem sobre outras coisas dignas de memória porque, monge
enclausurado por meus próprios votos, eu estou absolutamente preso a respeitar a regra monástica”
[47]. Supõe-se perceber como um desejo do autor em não ter podido viajar para enriquecer seus
conhecimentos [48]. Filipe de Commynes, por sua vez, não podia invocar uma tal desculpa. Não se
vangloriava, ao contrário, de seus contactos com todos os grandes personagens, “tanto... espirituais
quanto temporais” de França, mas também de Flandres, da Alemanha, da Inglaterra, da Espanha, de
Portugal e da Itália? [49]. Entretanto, Commynes quase não foi tentado pela comparação [50]. Não
é então o volume de informações recolhidas que é a única causa. Talvez deva-se procurar na idéia
que o historiador, na Idade Média, faz de sua profissão [51].
No início do século VIII, Beda, o Venerável definiu a “verdadeira lei da História”: “nós nos
esforçamos simplesmente em colocar por escrito, para a edificação da posterioridade, o que se
informa habitualmente” [52]. O historiador relata então acontecimentos, as datas, mas não se sente

31
quase ocupado – ou capaz – de explicá-los. “A vontade divina pela qual tudo ocorre, eu não posso
esclarecê-la, eu sou incapaz de desvelar as causas ocultas dos acontecimentos. A pedido de meus
confrades, eu escrevo simplesmente uma história, ano a ano. Quem pode sondar o insondável? Eu
me contento a observar o curso das coisas como eu as vi ou como as aprendi de meus predecessores
e glorifico o Senhor todo-poderoso em todas suas obras que são verdadeiramente justas”. Assim se
expressa Orderic Vital [53]. Muito mais tarde, um eclesiástico mais culto, antigo professor da
Universidade de Caen, antigo bispo de Lisieux, Tomás Basin, é também tão modesto. Qual é a
causa da terrível derrota francesa em Azincourt? Alguns acreditaram que era uma punição divina; o
próprio Basin não se pronuncia. “Cada um é livre de pensar sobre isto o que quiser; para nós, nos
contentamos de contar de forma verídica os fatos, nós deixamos aos mais audaciosos a tarefa de
penetrar nas obras impenetráveis da divindade” [54]. Concebe-se que impregnados de tais idéias, os
historiadores da Idade Média não teriam quase sido levados à comparação.

2.2. Os tempos modernos


No século XVI, o comparatismo retoma vigor. As grandes descobertas alargaram os
horizontes [55]; o retorno à Antigüidade restabelece a honra, entre outras, das Histórias de
Heródoto e de Políbio [56]. A historiografia, em parte ao menos, muda de tom.
Em 1566, Jean Bodin publica um curioso livro tendo por título Methodus ad Facilem
Historiarum Cognitionem [57]. Título enganoso. Nesta obra, quase não há questão de
metodologia histórica no sentido habitual do termo. Trata-se antes de uma vasta reflexão sobre a
História Universal, muito desviante em certos aspectos [58], mas certas partes são verdadeiramente
fundadas sobre o comparatismo [59]. Não se insistirá sobre o capítulo IV, em que Bodin apresenta
as obras de um bom número de seus predecessores – gregos, latinos, autores judeus e cristãos,
modernos como Guichardin ou Bembo – e confronta seus méritos. A conclusão é muito pobre: “É
necessário agora que, diante de um tão grande número de historiadores de todo tipo, cada um
escolha de acordo com sua vontade, se não quiser ser oprimido sob uma bela massa de escritores”
(p. 66). No capítulo VI, em compensação, capítulo consagrado a Constituição das Repúblicas, a
análise tem mais consistência: pareceu-me útil, declara o autor, “comparar os impérios dos antigos
com os nossos, a fim de que esta síntese geral permita melhor compreender a História Universal dos
Estados” (p. 139). Está longe, desta vez, das elucubrações do autor sobre os astros ou os números, e
mesmo de suas comparações entre, por exemplo, Políbio e P. Jove (p. 45-47). São agora as
constituições de Atenas, Esparta, Roma, Veneza, Florença, Império Germânico, Suíça... que são
dissecadas, confrontadas. Bodin estuda as revoluções nestes países e volta sobre aquelas que são
produzidas nos impérios caldeu, assírio, persa, parto, árabe e turco (p. 253-256). A Polônia, a

32
Dinamarca, a Suécia, a Inglaterra, a Espanha chamam também a sua atenção. A questão essencial
que resulta desta vasta pesquisa é aquela que filósofos já se colocavam: qual é a melhor forma de
governo? A monarquia, responde Bodin (p. 261-274), mas não é tanto a resposta que importa, é o
método que conduziu a isto, a História Comparada – evidentemente tributária dos conhecimentos
que se podia ter na época – dos povos da Antigüidade e dos tempos modernos.
Uma dezena de anos mais tarde (1575), Loys Le Roy faz aparecer uma obra tratando Da
vicissitude ou variedade das coisas do universo [60]. Este erudito infeliz e empobrecido que, após
estadias em Turim e Londres, termina sua carreira como professor de grego em Paris, se interessa
por tudo e compara constantemente. O sumário do livro VII, por exemplo, apresenta-se assim:
“Comparação dos romanos com os egípcios, assírios, persas, gregos, partos: em poderio, milícia,
saber, linguagem, eloqüência, poesia e obras de outras artes. Do Império Romano com o Assírio,
Persa, Macedônio, Parto...” (p. 11). Resumindo seu livro XI, o autor escreve: “Este século [o XVI] é
comparado aos precedentes mais ilustres em feitos de armas, condutas de Estado, excelência das
letras, perfeição de obras, novidade de invenções, navegações jamais tentadas anteriormente, e
descobertas de terras novas desconhecidas na Antigüidade: para saber em que somos inferiores ou
iguais aos antigos, e em que devemos ser preferidos” (p. 14). Esta última frase mostra que, se a
comparação é onipresente na obra de Le Roy, seu objetivo não é de aperfeiçoar o conhecimento que
se possa ter do passado. O autor tem outras preocupações. Sua conclusão, diz ele, mostrará “como é
recear o que está por vir em virtude de tão grande excelência de poder, sapiência, disciplinas, livros,
indústria, obras, conhecimento do mundo, não decaindo outrora [uma outra vez, no futuro] como o
passado tem feito” (p. 14-15). Daí seu discurso final “admoestando os doutos em tentarem pelas
próprias invenções acrescentar o que falta às disciplinas, fazendo para a posteridade o que a
Antigüidade fez por nós: a fim de que o saber não se perca, assim se alcança diariamente
crescimento” (p. 15).
Em La Popelinière [61], em compensação, o método comparativo parece fazer parte
integrante do trabalho do historiador. Não é evidentemente conveniente aqui analisar em detalhe o
pensamento de nosso autor [62]. Observemos apenas que ele estudou a obra de seus predecessores,
achou-a insuficiente e propôs uma diligência em que o comparatismo tivesse um lugar essencial. Se
todos, “seja por preguiça, seja por avareza ou por outra paixão, têm muito levianamente escrito suas
Histórias”, alguns “não marcaram suas Histórias por nenhum conhecimento de coisas estrangeiras.
As quais pela conjunção, afinidade e vizinhança dos franceses, poderiam esclarecer suas matérias
principais” [63]. La Popelinière volta sobre esta idéia um pouco mais tarde (p. 277): “Mas a maior
falta, que eles fizeram na escolha destas matérias, é que para os próprios domésticos, aos quais se
prenderam: não tiveram o cuidado e o julgamento de tomar os que fossem os mais belos e

33
necessários ao saber...”. Vem então uma lista de questões “belas e necessárias ao saber”: “Quais são
as diferenças entre os povos gauleses, romanos e germanos na própria Gália? Qual é a diferença
entre franceses e germanos?... O que é ser da nobreza, sua autoridade, poder, exercício, dever, e
funções, em todas estas nações?... Se vós não estiverdes bem esclarecidos, e corretamente
resolvidos em tudo isto, qual conhecimento vós poríeis dizer ter do Estado dos franceses?” (p. 278).
Ignorância das coisas “estrangeiras” que poderiam esclarecer a história da França, as diferenças
entre gauleses, romanos e germanos, dito de outra forma, a ausência de comparatismo,– mesmo se a
palavra não existisse na época –, é uma das censuras que La Popelinière dirige aos seus
predecessores. Ele próprio pratica a comparação que lhe serve principalmente para refutar a lenda
das origens troianas da monarquia francesa. Como, pergunta-se ele, um pequeno grupo de fugitivos
teria podido conquistar terras no estrangeiro enquanto que os europeus tiveram tanta dificuldade em
se implantar em suas colônias? “Se então os espanhóis, portugueses, franceses, ingleses e outros
que desembarcaram em diversos países estrangeiros com propósito deliberado: advertidos dos
incômodos que poderiam sofrer: e porque chegaram com todo o necessário: mal avançaram em suas
descobertas nestes países em que mesmo tendo seu braço de entrada, se sua vida fosse tão graciosa
quanto sua palavra. Como se pode fantasiar, que poucos exilados, destroçados de força e coragem,
desprovidos de tudo o que é requisitado ao seu desembarque, tenham podido ganhar dos originários
deste Mar-Maior: e conquistar o país que circunvizinha o Palus Meotides?” (p. 338). Aliás, que
Enéias e seus companheiros tenham podido abandonar uma cidade tomada pelo inimigo é coisa
impossível: “Para ainda melhor mostrar que os forjadores desta opinião comum não a podem ajudar
com exemplos. Deve-se fazer ver que desde o tempo destes troianos, uma única cidade não foi
forçada em todo Universo, da qual tropa de homens tenha podido sair para conquistar e povoar um
outro país” (p. 342). Mas, La Popelinière estava disposto a fazer do comparatismo, livresco.
Curioso de etnografia, tendo algumas idéias sobre os povos primitivos, e principalmente sobre sua
maneira de registrar os fatos históricos [64], nosso autor teria querido embarcar com os holandeses.
Em 1604, escreve neste sentido a Scaglier [65]. “Eu tenho considerado”, diz ele, “que, para ter o
julgamento a mais nobre e necessária parte do homem, nada pode tanto consolidá-lo que a viagem e
cuidadosa observação do país estrangeiro, a fim de que nos aproximemos da perfeição da História”.
O humanista lembra então que “os mais renomados dos gregos, Sólon, Demócrito, Empédocles...
quase não deram ouvidos à Babilônia, ao Eufrates nem ao Egito” e conclui: “É porque, zangado que
ninguém de nosso tempo não empreendesse tão alto empreendimento, eu vos comunico meu desejo
de ir para efetuá-lo, se e como achareis melhor. Eu entendo, se existe meio de se acomodar com
vossos holandeses, que se diga de ir anualmente e próximo deste tempo”. A viagem em questão não

34
ocorreu. La Popelinière morreu em 1608, “de uma doença assaz ordinária aos homens de letras e
virtuosos como ele era, a saber, da miséria e da necessidade” (P. de l’Estoile).
Seria tedioso passar em revista todos os autores que, a partir da época em que nós chegamos,
praticaram pouco a pouco o comparatismo. São cada vez mais numerosos, contudo, à bem da
verdade, bom número destas obras se situa um pouco à margem do gênero histórico propriamente
dito. O Padre Lafitau, por exemplo, publica, em 1724, seus Costumes dos selvagens americanos
[66]. Este missionário jesuíta passou vários anos na América do Norte, observou os costumes dos
índios e tenta mostrar, convencido da unidade da espécie humana, que seus comportamentos são
menos estranhos do que parece, que os povos da Antigüidade pagã viveram antigamente da mesma
maneira: mas, o desenvolvimento era mais rápido no Mundo Antigo, daí a distância que separa
agora os europeus dos iroqueses ou dos hunos [67]. Quase na mesma época, aparece em Nápoles a
Ciência Nova de Vico, em que a comparação tem um papel importante pois, como o título o indica,
esta “ciência nova” é relativa “à natureza comum das nações” [68]. As comparações abundam
igualmente em historiadores do direito e das instituições como o abade Dubos [69], Montesquieu
[70] e, é claro, no Ensaio sobre os costumes de Voltaire [71].

2.3. O século XIX


É no século XIX, me parece, que o comparatismo começa a produzir resultados verdadeira-
mente significativos. No estudo das sociedades antigas, a comparação com a Índia permite a B. G.
Niebhur, depois a H. S. Maine, destrinchar certos problemas delicados que aqui coloca a proprie-
dade fundiária. Problemas que não serão expostos aqui, não mais que a validade das respostas apor-
tadas por estes dois sábios. O que nos interessa, é seu método e, neste aspecto, Niebhur é muito
claro. Na sua História Romana (primeira edição, 1811-1812) [72], tratando de questões agrárias e
principalmente da noção de ager publicus a propósito do qual autores antigos (Apiano, Plutarco)
estão em desacordo, Niebhur indica a origem da solução na qual chegou: “Talvez jamais tivesse
sucesso aqui, se o estado da possessão e da contribuição fundiária na Índia não me fornecesse uma
imagem viva da possessão, do vectigal romano e de sua adjudicação. Na Índia, o soberano é o único
proprietário do solo...” [73]. Meio século mais tarde. H. S. Maine volta a estes problemas de
propriedade fundiária, e a muitos outros aliás, nas sociedade antigas [74]. É de novo a comparação
com a Índia que lhe permite fundamentar sua teoria de uma propriedade originalmente coletiva que
foi substituída gradualmente pela apropriação privada da terra [75]. Maine permanecerá em seguida
vários anos neste país (1862-1869), experiência direta que tira proveito para Comunidades aldeãs
no Leste e Oeste (1871) [76], depois se volta para o antigo direito irlandês e publica suas Leituras
na História Inicial das Instituições (1874), em que se encontra esta passagem muito reveladora

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[77]: “Tem freqüentemente ocorrido para mim que funcionários indianos, em suas controvérsias
veementes sobre os direitos respectivos de várias classes que compõe uma comunidade aldeã, estão
inconscientemente se esforçando para ajustar através de uma arbitragem benéfica as queixas e
contra-queixas entre eupátridas e os demos, do Populus e da Plebs”.
Voltemos agora para a França. Em 1831, J. Michelet faz aparecer o que ele próprio chamará
de uma obra de juventude, uma História Romana que vai das origens à batalha do Ácio. A obra, um
pouco esmagada pela História da França e pela História da Revolução, não é quase lida
atualmente. É, entretanto, plena de interesse e, para o assunto que nos ocupa, contém uma passagem
que merece de ser citada, mesmo se um pouco longa. Michelet viu bem, de fato, que a espinhosa
questão das origens de Roma não pode ser resolvida isoladamente, que deve passar pela
comparação: “A história de Roma diz respeito a toda história do mundo. É necessário o
conhecimento da segunda para julgar a primeira. Jamais se saberá como o texto primitivo da
história romana pôde ser modificado, falsificado, se não se observou em outras literaturas exemplos
de transformações análogas; se, por exemplo, não se acompanharam as tradições orientais e
medievais, as metamorfoses bizarras que sofreu Alexandre pelos gregos; se não se estuda os
Nibelungos em suas mudanças diversas, desde o momento em que o poema começa a despontar nas
trevas simbólicas do Edda, até o momento em que retorna sob a forma eficaz do Niflungasaga na
sua pátria primitiva. É por uma crítica deste tipo que se deveria começar uma verdadeira história
das origens de Roma; seria necessário, para discutir com autoridade as tradições alteradas e
incompletas, para ter o direito de retificá-las ou completá-las, procurar nas literaturas, cujos
monumentos foram melhor conservados pelo tempo, como um pensamento primeiro pode ser
desfigurado, seja por elaboração necessária que sofreu através das idades, seja pelas falsificações
furtivas e mais ou menos acidentais que aqui introduzem as pretensões de nações e de famílias”
[78]. Singular clarividência em um autor que tem apenas trinta e três anos, mas que espera “que um
mais hábil empreenda esta grande obra”.
Uma trintena de anos mais tarde (1864), Fustel de Coulanges publica sua Cidade Antiga:
estudo sobre o culto, o direito, as instituições da Grécia e de Roma [79]. “Ninguém tinha ainda
feito um tal estudo comparado e sistemático das instituições dos dois grandes povos clássicos”,
observa seu discípulo C. Jullian [80]. Mas, Glotz acha o comparatismo de Fustel “tímido” e M. I.
Finley aqui vê “em uma grande medida uma ilusão” [81]; o próprio François Hartog fala “de um
comparatismo todo azimute, mais preocupado com a coleção do que com a interpretação” [82]! Nós
não tentaremos resolver em algumas linhas uma questão que mereceria um estudo aprofundado.
Vários textos de Fustel mostram em todo caso que se ele não era hostil ao método comparativo [83],
ele desejava vê-lo manuseado com circunspeção. Em 1887, ele repreende G. Monod a propósito da

36
interpretação de uma passagem de Gregório de Tours: “Eu espero que não se engane sobre meu
pensamento. Não é a aproximação em si que combato. Os melhores eruditos fizeram aproximações
e continuarão a fazê-las com grande proveito para a verdade. Existem aproximações justas.
Reconhecem-se nelas duas condições, uma, em que os dois textos ou os dois fatos, que se
relacionam, foram inicialmente analisados isoladamente e bem estudados cada um em si, e a outra,
em que se possa mostrar entre os dois uma relação certa, um elo visível, um ponto de junção. O que
combato, é a aproximação que dispensa a análise, é a aproximação sem relação constatada, é a
aproximação arbitrária e que existe somente no espírito daquele que a faz” [84]. Mas eis uma
passagem mais explícita ainda, extraída da introdução das Pesquisas sobre o direito de propriedade
nos gregos [85]: “Eu não constato que o método comparativo não seja muito útil à História; ele
pode se tornar uma fonte fecunda de descobertas, e eu não sou daqueles que recusam se servir dele;
mas, o seu abuso é perigoso. Vós observareis certas comunidade de aldeias na Índia; vós
encontrareis alguma coisa análoga no mir russo e nas pequenas aldeias da Croácia; parece-vos, à
primeira vista, que os allmeden da Suíça e da Bélgica apresentam os mesmos traços característicos;
vós relacionai tudo disto por duas linhas de César sobre os antigos germanos, uma frase de Diodoro
sobre um pequeno povoado das ilhas Lipari e algumas fantasias de poetas latinos sobre a Idade de
Ouro. Vós assim acumulastes um número suficiente de indícios, mas coletados precocemente,
imperfeitamente estudados, tomados aqui e acolá, misturando épocas e confundindo povos. Isto é
suficiente para deduzir uma lei geral da humanidade? Um tal método falta-lhe rigor. A comparação
entre os povos deveria vir somente após um estudo escrupuloso e completo de cada povo. Em
História como em toda ciência, a análise deve preceder a síntese. Eu gostaria que a história do mir
russo, a da aldeia hindu ou javanesa, a da comunidade agrícola da Croácia e mesmo a da Mark
germânica fossem mais nitidamente conhecidas do que elas são, antes que se tirasse uma conclusão
geral da aproximação destes conhecimentos. Eu desejaria que uma primeira geração de
trabalhadores se aplicasse separadamente a cada um destes objetos e se deixasse para a geração
seguinte o cuidado de procurar a lei universal que adviesse talvez destes estudos particulares”. Em
suma, Fustel estima que a comparação, que pode se “uma fonte fecunda de descobertas”, é
prematura, que os trabalhos de análise não foram ainda desenvolvidos suficientemente longe:
caberá à geração seguinte fazer as aproximações que chegarão “talvez” a descobrir leis universais.
Esta atração pela comparação – foi mitigada no caso de Fustel de Coulanges – não é o
monopólio dos especialistas em sociedades antigas. Sob formas diferentes, sem dúvida, daquelas
que nos encontramos em um Niebuhr ou um S. Maine, historiadores dos tempos modernos praticam
também a aproximação, a confrontação, alargando o quadro de suas pesquisas. Tomemos, por
exemplo, um escritor tão “clássico” quanto Guizot. Nos anos 1820-1822, ele consagra seu curso de

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História Moderna em Sorbonne às Origens do governo representativo, – na Europa, precisa o título
[86]. É verdade que o autor muda logo de opinião: “seguir na Europa inteira a marcha das
instituições políticas... seria uma tentativa excessivamente vasta e longa... A Inglaterra, a França e a
Espanha fornecerão ao nosso empreendimento uma matéria bem suficiente” (v. I, p. 28-29). Mas,
mesmo reduzindo a estes três países, a diligência permanece notável: depois de tudo, Guizot teria
podido se contentar em analisar o sistema francês! Esta abertura de espírito se encontra em outras
obras. Guizot estuda a Revolução Inglesa? Ele sublinha imediatamente o que a aproxima e o que a
diferencia da Revolução Francesa [87]. A História da civilização na Europa [88] se presta ainda
melhor, é claro, à comparação. Abordando o movimento comunal, Guizot segue seu
desenvolvimento na Itália, na Espanha, na Inglaterra e na França (p. 174 et sv.); a análise do
fenômeno monárquico o leva ainda mais longe, para América, África e até China (p. 205 et sv.); a
organização da Itália Medieval lhe lembra a da Grécia Antiga (p. 231). Esta História da civilização
na Europa não é uma simples justaposição de dados relativos aos diversos países do velho
continente: trata-se verdadeiramente de História Comparada,– mesmo se o título não o diz.
O título dado por Tocqueville para a obra que consagrou à Revolução de 1789 não anuncia a
perspectiva comparatista. E, entretanto, O Antigo Regime e a Revolução regurgita de comparações
[89]. Eu me limito a uma única passagem, particularmente esclarecedora em que mostra a função
heurística e hermenêutica – para empregar palavras sábias – do comparatismo: “Eu tive a ocasião de
estudar as instituições políticas da Idade Média na França, na Inglaterra e na Alemanha, e, na
medida em que avançava neste trabalho, eu estava tomado de espanto vendo a prodigiosa similitude
que se encontra entre todas estas leis, e eu admirava como povos tão diferentes e tão pouco
misturados entre si tinham podido dar-se de tão semelhantes. Não é que elas não variassem sem
cessar e quase ao infinito nos detalhes, segundo os locais; mas seu fundo é o mesmo para todos.
Quando eu descobria na velha legislação germânica uma instituição política, uma regra, um poder,
eu sabia de antemão que, procurando isto bem, eu encontraria alguma coisa de todo semelhante,
quanto à substância, na França e na Inglaterra, e, de fato, eu aí encontrava. Cada um destes três
povos me ajudava a compreender melhor os dois outros” (p. 74). O Antigo Regime apareceu
somente em 1856, três anos antes da morte do autor, mas este vira desde muito tempo a fraqueza de
uma pesquisa histórica limitada a um quadro nacional: “Eu sempre me espantei”, diz ele em uma
carta de 1828 ao seu amigo G. de Beaumont, “vendo tantas pessoas de espírito e mérito atribuir a
existência do regime feudal na França aos problemas da segunda raça [os carolíngeos] e à fraqueza
da terceira [os capetíngeos]. Parece-me ver um médico que atribuísse uma febre da qual se cura ou
se morre ao fim de três meses às fatigas de uma caçada. Uma reflexão basta para destruir, na minha
opinião, o sistema do qual falo. Se a feudalismo é um acidente na França, por qual bizarrice da

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fortuna este acidente se renovou entre os alemães, entre os poloneses, onde o feudalismo existe
ainda, entre os godos da Espanha e até na Itália, extremidade meridional da Europa?” Para o autor,
o feudalismo não é um acidente e se deve pesquisar os “princípios primitivos do sistema”: “Eu
digo”, prossegue ele, “que esta pesquisa somente pode ser feita com mais proveito e frutos nos
tempos que precedem a conquista dos normandos, porque, como eu já disse anteriormente, nenhum
povo de nosso conhecimento não está mais perto do estado primitivo dos povos do Norte que os
saxões e daneses. Nenhum povo expõe isto mais fielmente nas instituições e eu estou persuadido
que um estudo aprofundado destes tempos explicaria bem as coisas inexplicáveis na história dos
outros povos, entre outras, algumas máximas do direito público, tornadas leis em toda Europa e das
quais não se pôde encontrar a fonte...” [90].
Niebhur, Maine, Guizot, Tocqueville – poder-se-ia acrescentar K. Lamprecht [91], e sem
dúvida muitos outros ainda – a lista dos historiadores que, sem reivindicar explicitamente o método
comparativo, o praticaram em graus diversos não pára de brilhar. Compreende desde o início deste
século, como se viu no início desta exposição, o dito método comparativo tenha sido objeto de
tantos debates. Tem-se em mãos, parece, um meio de descobrir fatos novos e melhor explicar a
realidade histórica. Resta-nos ver – e isto não será mais fácil – como se apresenta hoje a História
Comparada.

3. O comparatismo na historiografia contemporânea


A situação atual do comparatismo histórico me parece bastante paradoxal. O método é
praticado e abundantemente. Por outro lado, existe a sensação de que ele não conquistou sua carta
de nobreza: reticências subsistem, quando não é uma franca oposição. Existe nisto um fenômeno
que merece atenção por alguns instantes e que demanda, se possível, ser explicado.
Não é questão, evidentemente, de aqui se fazer um inventário sistemático das obras ou artigos
recentes dependentes da História Comparada, nem mesmo de tentar estabelecer uma bibliografia seletiva
sobre o assunto. Contentar-se-á em assinalar alguns títulos destinados a mostrar a vitalidade deste tipo de
pesquisa na historiografia dos últimos decênios, começando por uma obra que, desde sua publicação – e
de sua tradução para o francês –, provocou um alvoroço: K. A. Wittgogel, Despotismo Oriental: um
Estudo Comparativo do Poder Totalitário, New Haven, 1957. O autor, um sinólogo, aqui estuda a
emergência do Estado despótico no Egito Antigo, na Mesopotâmia, na Índia, na China e associa esta
forma de organização política às necessidades da irrigação: estar-se-ia na presença das civilizações
“hidráulicas” [92].
Procuram-se exemplos na história da Antigüidade Greco-romana? Encontra-se uma grande
quantidade. Faz uma trintena de anos que P. A. Brunt se entregou a uma comparação entre os

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imperialismos romano e britânico [93]. Em todo um outro registro, sublinharam-se as semelhanças
entre o menadismo dionisíaco e as práticas convulsionárias de algumas das populações africanas
[94]. O fenômeno da escravidão, naturalmente, não escapou de uma análise comparativa [95]. E, em
um estudo muito recente consagrado às feiras e aos mercados no Império Romano, vê-se o autor
invocar situações paralelas no México e na Polônia da época moderna [96].
As instituições da Idade Média tiveram também lugar em muitos dos estudos comparativos.
Sem voltar às publicações de M. Bloch, que foi questão anteriormente, poder-se-ia mencionar, por
exemplo, as de H. Mitteis [97], de R. Coulborn [98], de R. W. Kaeuper [99].
O colonialismo era igualmente um assunto tentador [100]. Foi o tema, há pouco, de um
pequeno livro de R. Syme [101], e, atualmente, de um livro extenso de M. Ferro [102]. E as
revoluções, é claro, não escaparam ao olhar dos comparatistas: é uma longa lista de títulos que se
poderia mencionar aqui, em que se encontrariam, por exemplo, os trabalhos de C, Brinton [103], R.
R. Palmer [104], J. Godechot [105], G. Gusdorf [106], Theda Skocpol [107]. O método
comparativo se aplicou também aos fascismos, às guerras de camponeses do século XX [108], –
que eu saiba ainda. Enfim, a produção neste domínio e, como se vê, considerável.
E, entretanto, o comparatismo não parece verdadeiramente ter adquirido o direito de
cidadania no mundo dos historiadores. Não existem muitas revistas que tenham adotado esta
perspectiva [109]; vêem-se poucas reuniões científicas consagradas a este tipo de pesquisas [110]; a
rubrica “História Comparada” quase não aparece nas bibliografias [111].
É que alguns historiadores têm manifestadamente pouco gosto por este gênero de pesquisa
[112], reação que se compreende, ao menos em parte, quando se vêem os erros em que se
escorregavam por vezes as obras com perspectivas excessivamente vastas para que o autor pudesse
verificar todas suas assertivas [113]. Mas este desinteresse relativo pelo comparatismo, ver a
rejeição do método, tem, me parece, uma outra causa, mais profunda. Não é somente porque
existisse fonte possível de mal-entendidos – quem não os comete? –, o mais grave é a
transformação da própria natureza das maneiras de trabalhar. Em sua defesa de 1928, M. Bloch
sublinhava que os resultados os mais interessantes do comparatismo podiam ser esperados do
estudo de “sociedade às vezes vizinhas e contemporâneas” [114]. E o historiador se prepara para
este gênero de pesquisas: “Ele aprendeu línguas, o máximo de línguas que pôde delas em cima do
alemão e do inglês. Línguas modernas, línguas antigas igualmente, um pouco de russo, de
flamengo, de escandinavo, suficiente do velho alemão para poder se entranhar, sem perder pé, em
uma literatura de excepcional interesse, suficiente do velho saxão para não ficar fechado à
inteligência das sociedades nórdicas do além-Mancha. Ao mesmo tempo, ele se iniciava nas
realidades da vida agrícola. Na rotação das culturas. Nas técnicas de arroteamento, da lavra, da

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messe. E descobria este imenso domínio do cadastro, e das plantas de parcelas, das quais ia se
tornar, na França, o explorador” [115]. Lancemos olhar à declaração de um sociólogo convidado
para um colóquio tratando das Visões sobre o desenvolvimento dos Estados europeus: “Como um
sociólogo geral convidado a contribuir para fazer uma conferência para historiadores, eu estou...
receoso de proferir observações sobre as origens do Estado moderno na Europa que são baseadas
em pouco ou nenhum conhecimento de primeira mão das fontes documentais” [116]. O contraste é
flagrante. O historiador, mesmo conquistado pelo comparatismo, quer permanecer em contacto com
as próprias fontes; o sociólogo admite que trabalha de segunda mão – e ainda se trata aqui de um
estudo somente de Estados europeus. Outras pesquisas comparativas se fixam horizontes mais
largos. Nas Guerras camponesas do século XX de E. Wolf [117], por exemplo, o território varrido
vai do México e de Cuba à China, passando pela Argélia, a Rússia e o Vietnam!
4. Conclusão
Por mais imperfeitas que sejam, as páginas precedentes terão mostrado, eu espero, que,
desde as origens, alguns historiadores foram atraídos pela comparação, – por razões que, aliás, eram
freqüentemente muito distantes de uma verdadeira curiosidade científica: tratava-se de pronunciar
julgamentos de valor. Péricles ultrapassou Fábio Máximo? A democracia era um regime preferível à
monarquia? As Cruzadas são mais importantes que as Guerras Médicas?
Mas, desde o início também, o comparatismo produziu conclusões mais substanciais.
Analisando as práticas religiosas dos persas e dos gregos, Heródoto deduziu que a concepção do
divino de uns e de outros era diferente: os deuses persas ao contrário dos gregos, não são
antropomórficos. Políbio, que estudou longamente a evolução dos regimes políticos no mundo
greco-romano, chegou a formular a “lei” de anakuklosis. Muito mais tarde, sonhando com uma
“história acompanhada”, La Popolinière sublinha a importância que existe em não se fechar no
assunto: é necessário procurar conhecer as “coisas estrangeiras”, susceptíveis de esclarecer a
matéria principal que se quer tratar.
Mas, se existe uma tão longa convivência entre a História e o comparatismo, como explicar
o incômodo atual, este tipo de desconfiança em relação ao método tão promissor aos olhos de
Pirenne, de Bloch e de muitos outros sem dúvida? Eu me pergunto se o comparatismo não é, em
realidade, vítima de seu sucesso. Realizado sobre uma larga escala pelos práticos das Ciências
Sociais, mas de uma outra maneira – com trabalho de segunda mão –, parece ter se tornado suspeito
a um certo número de historiadores de observância restrita. Haveria, pelo lado histórico, segundo a
fórmula célebre “se feita com textos” – entendemos fontes primárias, documentos originais –, e de
outro, a Sociologia, a Antropologia em que se pode permitir explorar simplesmente os trabalhos de
outrem. Mas, se a História supõe a utilização direta das fontes, todo comparatismo um pouco largo

41
está evidentemente condenado e mesmo, no limite, toda comparação. Pois uma outra idéia conheceu
um certo sucesso: a História se ocuparia de fatos singulares. Que interesse haveria, nestas
condições, em estudar o sistema feudal na França e na Inglaterra, em confrontar a Revolução de
1789 com a de 1917? Falta-nos ainda hoje, me parece, uma verdadeira metodologia da História
Comparada que fixasse seus objetivos e condições de validade. Seria necessário, em suma, retomar
e desenvolver de maneira sistemática as reflexões às quais se entregava M. Bloch nos anos de
1920/30. Trata-se, é verdade, de uma tarefa tremenda e se pode perguntar quem a coragem de se
atrelar a ela.

Bibliografia

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DAVILLÉ, Louis. La comparaison et la méthode comparative en particulier dans les études histo-
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VEYNE, Paul. Comment on écrit l'histoire. Essai d'épistémologie. Paris, 1971. p. 152-157 [L'his-
toire comparée - C'est une heuristique].

Notas do artigo de J. M. Hannick, Simples reflexões sobre a História Comparada

[1] L'ANNÉE SOCIOLOGIQUE, I, 1896-1897, p. II.

42
[2] O texto desta lição foi publicado na REVUE INTERNATIONALE DE L'ENSEIGNEMENT 85: 481-
495, 1907. A citação foi tirada da p. 490.
[3] Davillé anunciou uma continuação de seu artigo de 1914. Eu folheei em vão os fascículos posteriores da
REVUE DE SYNTHÈSE HISTORIQUE: a continuação prometida não foi jamais publicada.
[4] BLOCH (1928, p. 15-16). Nas Mélanges historiques, a citação aparece nas páginas 16-17.
[5] Eu penso, por exemplo, no livro de SCHIEDER (1965). É uma longa questão de História Comparada,
mas notar-se-á que a exposição sobre o assunto (Möglichkeiten und Grenzen vergleichender Methoden in der
Geschichtswissenschaft) foi rejeitada no apêndice, nos Untersuchungen, que constituem a segunda parte da
obra (p. 187-211). Merecem também ser assinalados os estudos reunidos sob o título Comparative History in
Theory and Practice. AMERICAN HISTORICAL REVIEW 85: 763-857 e 1055-1166, 1980.
[6] “O difícil é dizer onde cessa a História, onde começa a História Comparada” (VEYNE, 1971, p. 152).
[7] A palavra de Charles Seignobos foi narrada por BLOCH, M. Apologie pour l'histoire ou métier
d'historien, 3. ed., Paris, 1959, p. XVI.
[8] SCHIEDER (1965, p. 187) observa que, ainda hoje, o interesse pelo método comparativo não é sem
relação com a política. Citando uma passagem do Editorial de S. L. Thrupp no primeiro volume dos
COMPARATIVE STUDIES IN SOCIETY AND HISTORY, ela faz este comentário: “O redirecionamento
para pesquisas comparativas é ainda um sintoma da vontade de superar fronteiras nacionais também na
História, que estão sempre próximas de sofrerem em seu mundo de conhecimento científico uma forte
influência política – anteriormente em cada distinta tradição científica nacional, hoje cada vez mais
universalmente”.
[9] L. Fébvre fez uma avaliação muito severa desta obra nos ANNALES D'HISTOIRE SOCIALE 11: 293-
295, 1939, sem atacar, entretanto, esta pretensão do autor de fazer História Comparada.
[10] O Lehrbuch der historischen Methode und der Gechichtsphilosophie de É. Bernheim data de 1889 (5.
ed., Leipzig, 1908). Em francês, o manual clássico foi durante muito tempo o de LANGLOIS, Ch.-V;
SEIGNOBOS, Ch. Introduction aux études historiques, Paris, 1898.
[11] Para uma rápida apresentação da vida e da obra do historiador, ver a notícia que lhe consagrou
BURGUIÉRE, A. Dictionnaire des sciences historiques, Paris, 1986, p. 88-91. O colóquio consagrado a M.
Bloch, que ocorreu em Paris em 1986, contém uma série de comunicações reunidas sob o título “A
comparação em História” (ATSMA-BURGUIÈRE, 1990, p. 253-334).
[12] Reedição Paris, 1983 (Bibliothèque des Histoires), com um importante prefácio de J. Le Goff (p. I-
XXXVIII).
[13] BLOCH, M. Écrire “La société féodale”. Lettres à Henri Berr 1924-1943, PLUET-DESPATIN, J.
(ed.), Paris, 1992, p. 29.
[14] Bloch dedicava uma grande importância a este texto. Em uma carta a H. Berr (cf. BLOCH, M. Écrire
“La société féodale”, p. 54-55), ele solicita as 150 notas de seu artigo, “cifra exorbitante” que o autor
justifica dizendo que elas deveriam lhe servir na exposição para a candidatura a uma cadeira de História
Comparada das Sociedades Européias a ser criada no Colégio de França. Sabe-se que esta tentativa fracassou
e que uma segunda (1935) também não foi bem sucedida.
[15] Este texto foi publicado no BULLETIN DU CENTRE INTERNATIONAL DE SYNTHÈSE 9: 31-39,
1930, anexado à REVUE DE SYNTHÈSE HISTORIQUE 49, 1930. Foi objeto de uma interessante
discussão, na qual se encontrará um balanço no próprio BULLETIN, p. 15-19. Ver também BLOCH, M.
Écrire “La société féodale”, p. 52-53.
[16] Para uma apresentação mais recente, mas não substancialmente diferente, dos benefícios a descontar do
método comparativo, ver GREW, 1990, p. 328-331.
[17] Cf. MASTROGREGORI, M. Il genio dello storico. Gli scritti teorici di Marc Bloch a Strasburgo.
RIVISTA STORICA ITALIANA 99: 66, 1987.
[18] P. ex., ROUSSEL, D. Les historiens grecs, Paris, 1973, Coll. SUP, p. 16: “A descoberta do outro, o
exotismo, se bem que não saiba qual consciência nacional, são a origem das primeiras reflexões históricas”.
J. B. Bury expressava já esta idéia nas conferências feitas em Harvard em 1908: “Uma conseqüência natural
[da conquista da Jônia pelos persas no século V a.C.] foi o estímulo do interesse e da curiosidade entre estes
gregos sobre as outras terras do grande reino, as quais eles estavam agora ligados; e sua nova posição
proporcionou facilidades para satisfazer esta curiosidade. A Geografia e a História orientais apresentaram
para os gregos um novo campo de estudo, e este exerceu... uma importante influência no nascimento da
História” (The Ancient Greek Historians. reimpr. New York, 1958, p. 11).
[19] VAN EFFENTERRE, H. L'histoire en Grèce. Paris, 1967, Coll. U2, p. 89. Cf. MOMIGLIANO, A. Les
fondations du savoir historique. Paris, 1992, p. 36-37.

43
[20] “Heródoto é o historiador da diferença. Ele ama fazer ver o que separa comunidades humanas de outras
comunidades humanas... Este interesse pelos outros, os não-gregos, tão desprezados alhures, é talvez seu
legado mais precioso” (LÉVÊQUE, P. in BRIANT, P; LÉVÊQUE, P. (dir.). Le monde grec aux temps
classiques, I. Le Ve siècle. Paris, 1995, Nouvelle Clio, p. 416-417).
[21] HERÓDITO. Histórias I, 1, trad. Ph.-E. Legrand, Paris, 1956 (Coll. des Universités de France).
[22] Comparar-se-á a apresentação de Heródoto com a de Tucídides (A Guerra do Peloponeso I, 18, 1-2):
“Após o fim da tirania na Grécia, então, poucos anos se passaram até a batalha de Maratona, que opunha os
medos aos atenienses. E dez anos depois, o bárbaro voltou com sua grande expedição contra a Grécia, que
queria submeter” (trad. J. de Romily, 2. ed., Paris, 1958, Coll. des Universités de France).
[23] Sobre este tema, ver, entre outros, GIGANT, M. NOMOS BASILEUS, Nápoles, 1956.
[24] Heródoto (III, 80) pretende que estes discursos ocorreram realmente entre os persas Otanes, Megábizos
e Dario. Os comendadores modernos vêem mais neste capítulo o reflexo do pensamento dos sofistas e,
talvez, mais precisamente, de Protágoras: cf. LASSÈRE, F. Hérodote et Protagoras: Le débat sur les
constitutions. MUSEUM HELVETICUM 33: 65-84, 1976.
[25] POLÍBIO. Histórias VI, 4-9. Para uma análise detalhada desta passagem, ver WALBANK, F. W. A
Historical Commentary on Polybius, I. Commentary on Books I-VI. Oxford, 1970, p. 643-648.
[26] POLÍBIO. Histórias VI, 10 (Esparta); 11-17 (Roma).
[27] Para os textos citados anteriormente, cf. trad. V. Fromentin e J. Schnabelle, Les antiquités romaines.
Livres I et II (Les origines de Rome). Paris, 1990 (La roue à livres).
[28] Cf. GAUTHIER, Ph. “Générosité” romaine et “avarice” grecque: sur l'octroi du droit de cité, in Mé-
langes W. Seston. Paris, 1974, p. 207-215.
[29] BODIN, L. La méthode de l'histoire (cf. abaixo n. 57), p. 47-49, sublinhava já esta particularidade nas
Antigüidades de Dionísio.
[30] BOULOGNE, J. Plutarque. Un aristocrate grec sous l'occupation romaine. Lille, 1994 consagra toda a
segunda parte (p. 55-71) ao método comparativo nas Vidas Paralelas.
[31] PLUTARCO. Obras morais e obras diversas. trad. V. Betolaud, t. II, Paris, 1870, p. 114.
[32] Encontra-se em Paulo Diacre (História dos lombardos, I, 15), o raciocínio inverso: “Uma puta aleita,
por esta época, sete bebês de uma vez... se alguns julgam a situação impossível, que eles releiam a História
Antiga e acharão que não amamentavam apenas sete crianças de uma vez, mas nove, principalmente entre os
egípcios”. (trad. Fr. Bougard, Turnhout, 1994).
[33] “Entretanto, o espírito da História romana difere sensivelmente daquele da História grega... o historiador
grego está voltado para o presente e o universal, o historiador romano, para o passado e apenas para Roma.
Para um Trogo-Pompeu que coloca Políbio com uma visão mundial de História, quantos historiadores
romanos – e todos os maiores – que vêem apenas na sua obra a ocasião de ilustrar o ‘momento romano da
História Universal’” (ANDRÉ, J.-M.; HUS, A. L'histoire à Rome. Paris, 1974, Coll. SUP, p. 5-6).
[34] TITO LÍVIO. História Romana, Prefácio [[seção]] 3, trad. J. Bayet e G. Baillet, 6. ed., Paris, 1958
(Coll. des Universités de France).
[35] FLORO. Obras, t. I, Quadro da História do Povo Romano; Prefácio 1-2, trad. P. Jal, Paris, 1967 (Coll.
des Universités de France).
[36] Histoire et historiens à Rome dans l'antiquité. Lyon, 1995. Eu cito algumas linhas da Introdução (p. 10):
“Além disso, o que contava era o que os romanos concluíam. Ou melhor, o que, em outros povos, podia
servir como exemplo para os romanos. Daí, como já foi assinalado anteriormente, o uso que fazia a
historiografia romana das anedotas e dos comentários, dos retratos e dos discursos. Logo, a historiografia
romana era ‘romanocentrista’”.
[37] CORNÉLIO NEPO. Obras, Prefácio, trad. A.-M. Guillemin, Paris 1923 (Coll. des Universités de
France).
[38] Cf. GUENÉE, B. Histoire et culture historique dans l'Occident médiéval. Paris, 1980, p. 7.
[39] Sobre as diferenças, excessivamente fluidas, entre “anais”, “crônicas” e “história”, ver a obra citada
anteriormente de Guenée, p. 203-207 e do mesmo autor Histoire et chronique. Nouvelles réflexions sur les
genres historiques au moyen age, in POIRION, D. (ed.), La chronique et l'histoire au moyen âge, Colloque
des 24 et 25 mai 1982. Paris, 1986, p. 3-12.
[40] Trad. R. Foreville, Paris, 1952 (Les Classiques de l'histoire de France au Moyen Age).
[41] Gesta Dei per Francos, I, 1 (Recueil des historiens des Croisades. Historiens occidentaux, t. IV, Paris,
1879, p. 123).
[42] Gesta Dei per Francos, VII, 50 (Recueil des historiens des Croisades, t. IV, p. 260).
[43] História de Guilherme o Conquistador I, 52.

44
[44] Gesta Dei per Francos, Prefácio (Recueil des historiens des Croisades, t. IV, p. 121).
[45] Gesta Dei per Francos, I, 2 (Recueil des historiens des Croisades, t. IV, p. 125).
[46] O 24°. Congresso da Sociedade dos Historiadores Medievalistas do Ensino Superior Público
(S.H.M.E.S.), que ocorreu em Avignon em junho de 1993, era consagrado à Circulação das notícias na
Idade Média. As atas apareceram sob este título em 1994 (Collection de l'École Française de Rome, 190).
Infelizmente, não há questão para os historiadores deste volume: tratam-se aqui essencialmente das
informações circulando no mundo dos diplomatas e dos mercadores.
[47] ORDERIC VITAL. História Eclesiástica, Prólogo, I, 3, ed. M. Chibnall, Oxford, 1980 (Oxford Me-
dieval Texts).
[48] Em realidade, as informações que Orderic pôde recolher, sempre permanecendo em seu claustro, não
são negligenciáveis: cf. MUSSET, L. L'horizon géographique, moral et intellectuel d'Ordéric Vital, historien
anglo-normand, in POIRION, D. (ed.). La chronique et l'histoire au moyen âge, p. 101-122.
[49] ] Mémoires, Prologue à M. l'Archevesque de Vienne, in PAUPHILET, A.; POGNON, E. Historiens et
chroniqueurs du Moyen âge. Paris, 1952, p. 949 (Bibliothèque de la Pléiade).
[50] Cf. BASTIN, J. Les Mémoires de Philippe de Commynes. Bruxelles, 1944, p.17.
[51] Cf. GUENÉE, B. Histoire et culture historique dans l'Occident médiéval, p. 18-25.
[52] História eclesiástica do povo inglês, Prefácio, eds. B. Colgrave e R. A. B. Mynors, Oxford, 1969
(Oxford Medieval Texts), p. 6: “[nos] qui, quod vera lex historiae est, simpliciter ea quae fama vulgante
collegimus ad instructionem posteritatis litteris mandare studuimus”.
[53] História eclesiástica XIII, 16, ed. M. Chibnall, Oxford, 1978 (Oxford Medieval Texts).
[54] História de Carlos VII, I, 9, trad. Ch. Samaran, Paris, 1933 (Les Classiques de l'histoire de France au
Moyen Age).
[55] Cf. ATKINSON, G. Les nouveaux horizons de la Renaissance française. Paris, 1935.
[56] A primeira edição de Apologia pro Herodoto de H. Estienne data de 1566. A propósito de Políbio, ver
MOMIGLIANO, A. La redécouverte de Polybe en Europe occidentale, in Problèmes d'historiographie
ancienne et moderne. Paris, 1983, p. 186-209 (Bibliothèque des histoires).
[57] Consultar-se-á esta obra na tradução de MESNARD, P. La méthode de l'histoire. Paris, 1941
(Publications de la Faculté des Lettres d'Alger, IIe. sér., t. XIV).
[58] No capítulo V, por exemplo, Bodin discute longamente a influência do clima e dos astros na História
Humana. Mais tarde (p. 216 et sv.), encontram-se bizarras reflexões sobre a virtude dos números. A morte
dos homens, por exemplo, ocorre freqüentemente nos anos múltiplos de 7 e 9, principalmente aos 63 anos: é
a idade atingida por Aristóteles, Boccaccio, São Bernardo, Erasmo, Lutero... (p. 217). Para as mudanças nos
Estados, deve-se tomar estes números ao quadrado ou ao cubo: assim, da fundação de Roma à tomada de
poder por Augusto, se passaram 729 anos, ou seja, o cubo de 9 (p. 219). E assim segue...
[59] Cf. SÉE, H. La philosophie de l'histoire de Jean Bodin. REVUE HISTORIQUE 175: 497-505, 1935: “O
que interessa para nós”, observa o autor do artigo, “é também o método do qual se faz o iniciador. Ele quer
chegar a compreender a História Universal dos Estados e se dá conta que, para isto, somente o método
comparativo será eficaz” (p.503).
[60] A obra foi reeditada por Ph. DESAN in Corpus des œuvres de philosophie en langue française. Paris,
1988. Encontrar-se-á um bom comentário em HUPPERT, G. L'idée de l'histoire parfaite. Paris, 1973
(Nouvelle bibliothèque scientifique): o capítulo VI (p. 110-123) – Uma História Comparativa das
civilizações – lhe foi inteiramente consagrado.
[61] Uma palavra de apresentação se impôs a propósito deste autor do qual não se encontra menção no
manual de FUETER, E. Geschichte der neueren Historiographie. 3. ed., Munich-Berlin, 1936. Henri
Lancelot de Voisin, senhor de La Popelinière, nasceu em 1541. Após seus estudos, participa nas Guerras de
Religião ao lado dos huguenotes, depois se dedicou à História, inicialmente, à História Contemporânea: A
verdadeira e inteira história destas últimas discórdias (1571), obra que será reeditada sob o título de
História da França. Muito mais tarde (1599), La Popelinière publica o tratado aqui discutido, A história das
histórias (reed. Ph. DESAN, 2 vol., Paris, 1989, Corpus des œuvres de philosophie en langue française). A
obra comporta três partes: 1) A história das histórias: vasto catálogo de todos os historiadores antigos e
modernos conhecidos pelo autor; 2) A idéia da história acompanhada: exposição teórica sobre a concepção
ideal que La Popelinière faz da História; 3) Projeto da história nova dos franceses: aplicação das idéias
expressas na segunda parte à história da França. Na reedição de 1989, A história das histórias propriamente
dita constitui o volume I, A idéia de história acompanhada e o Projeto da história nova dos franceses, o
volume II.

45
[62] Ver, sobre este assunto, YARDENI, M. La conception de l'histoire dans l'œuvre de La Popelinière.
REVUE D'HISTOIRE MODERNE ET CONTEMPORAINE 11: 109-126, 1964; HUPPERT, G. L'idée de
l'histoire parfaite, p.141-156 (capítulo VIII: La Popelinière: “A representação do todo”); DUBOIS, Cl.-G.
La conception de l'histoire en France au XVIe siècle (1560-1610). Paris, 1977, p. 124-153.
[63] A história das histórias, v. II, p. 276.
[64] No seu ensaio historiográfico (A história das histórias, v. I, p. 31 et sv.), La Popelinière distingue quatro
tipos de histórias. A primeira “pode se chamar natural e grosseira: porque ela eclodiu de um movimento
natural dos primeiros homens, quase rurais e não civilizados, a respeito de suas notícias: por mais artifícios
que eles pudessem aqui trazer, construíram várias marcas, signos e diversos cantos através dos quais
representavam as mais notáveis coisas das quais queriam guardar na memória”.
[65] A carta em questão está reproduzida em HUPPERT, G. L'idée de l'histoire parfaite, Apêndice II, p. 201-
203. Ela já tinha sido reeditada, com um abundante comentário, por VIVANTI, C. Alle origini dell'idea di
civiltà. Le scoperte geografiche e gli scritti di Henri De La Popelinière. RIVISTA STORICA ITALIANA
74: 225-249, 1962.
[66] LAFITAU, Joseph-François. Mœurs des sauvages américains comparées aux mœurs des premiers
temps, Introdução, escolha dos textos e notas por E. H. Lemay, 2 v., Paris, 1983 (FM/La Découverte).
[67] Para uma análise menos sumária do pensamento de nosso missionário etnólogo, ver MERCIER, R. La
méthode comparative en histoire: le Père Lafitau, in L'histoire au dix-huitième siècle. Colloque d'Aix-en-
Provence 1er., 2 et 3 mai 1975, Aix-en-Provence, 1980, p. 55-78 e DUCHET, M. Le partage des savoirs.
Discours historique et discours ethnologique. Paris, 1985, p. 30-52 (Capítulo I Da história moral à
descrição dos costumes: Lafitau).
[68] VICO, Giambattista. Principes d'une science nouvelle relative à la nature commune des nations. trad.
A. Doubine, Paris, 1953. De Michelet a Momigliano, não faltam admiradores de Vico. Admitir-se-á,
entretanto, que suas comparações são, por vezes, muito audaciosas e de um interesse discutível, assim na p.
15, o legislador ateniense Drácon (cerca de 630 a.C.) foi assimilado à serpente da Górgona e comparado ao
dragão dos chineses.
[69] História crítica do estabelecimento da monarquia francesa na Gália, nova edição, 4 v, Paris, 1742. Ver,
por exemplo, a comparação entre os campos dos hunos e dos poloneses feito de um círculo de carroças (v. II,
p.132).
[70] “A faculdade principal da alma é comparar” (Essai sur les causes qui peuvent affecter les esprits et les
caractères, citado por STAROBINSKI, J. Montesquieu. Paris, 1989, p. 115).
[71] Essai sur les mœurs et l'esprit des nations et sur les principaux faits de l'histoire depuis Charlemagne
jusqu'à Louis XIII, ed. R. Pomeau, 2 v., Paris, 1963 (Classiques Garnier). Ver, por exemplo, v. I, p. 264:
“Aos amadores da Antigüidade, aqueles que gostam de comparar os gênios das nações, verão com prazer o
quanto os costumes, os usos do tempo de Maomé, de Abu Bakr, de Omar se pareciam aos costumes antigos
dos quais Homero foi um pintor fiel. Vêem-se chefes desafiar para um combate singular os chefes inimigos,
os vêem avançar fora das fileiras e combater sob a vista dos dois exércitos, espectadores imóveis... É
evidente que os combates das amazonas, dos quais Homero e Heródoto falam, não estão fundamentados
sobre fábulas. As mulheres da tribo de Imiar, da Arábia Feliz, eram guerreiras e combatiam nos exércitos de
Abu Bakr e de Omar. Não se deve acreditar que jamais existira um reino das amazonas... mas nos tempos e
nas regiões, onde se levava uma vida agreste e pastoral, não é surpreendente que mulheres, tão duramente
educadas quanto os homens, tenham algumas vezes combatido como eles”.
[72] É necessário lembrar que, nesta mesma época (1816), F. Bopp publica seu tratado Über das
Conjugationssystem der Sanskritsprache in Vergleichung mit jenem der griechischen, lateinischen,
persischen und germanischen Sprache?
[73] Histoire romaine, trad. P. A. de Golbéry, v. II, Bruxelles, 1836, p. 166. Cf. MOMIGLIANO, A. Niebuhr
and the Agrarian Problems of Rome. HISTORY AND THEORY 21: 3-15, 1982.
[74] Ancient Law: Its Connection with the Early History of Society, and its Relation to Modern Ideas. Lon-
dres, 1861.
[75] Cf. MOMIGLIANO, A. From Mommsen to Max Weber. HISTORY AND THEORY 21: 17-18, 1982.
[76] A 3a. edição desta obra (1876) comporta um acréscimo interessante: Os efeitos da observação da Índia
no pensamento europeu moderno.
[77] A expressão é de Momigliano, de quem peguei emprestado esta citação (From Mommsen to Max
Weber, p.18). Sobre H. S. Maine, ver também BOCK, K. E. Comparison of Histories: The Contribution of
Henry Maine. COMPARATIVE STUDIES IN SOCIETY AND HISTORY 16: 232-262, 1974.

46
[78] Eu cito o texto de acordo com o volume que tenho em mãos: Histoire romaine. République, v. I, 3. ed.,
Paris, 1843, p. 378. As obras completas de Michelet estão atualmente em curso de reedição sob os cuidados
de P. Viallaneix (Paris, 1971- ); para a passagem em questão, ver v. II, p. 641.
[79] A obra foi reeditada em várias ocasiões. Pode-se lê-la agora na Coleção Champs-Flammarion (Paris,
1984), com um importante prefácio de Fr. Hartog.
[80] Extraits des historiens français du XIXe siècle. Paris, 1896, p. CV. Julgamento confirmado por A.
Momogliano: “Na França, é Fustel que, primeiro, aplica o método comparativo ao estudo do direito antigo”
(Problèmes d'historiographie ancienne et moderne, p. 404).
[81]GLOTZ, G. La cité grecque. Paris, 1953, p. 5; o autor nuança imediatamente sua proposta acrescentando
que “ninguém, desde Montesquieu, tinha manejado este método com tal maestria”. FINLEY, M. I. Mythe,
mémoire, histoire. Les usages du passé. Paris, 1981, p. 99.
[82] Prefácio citado acima (n. 79), p. XIV. Estas apreciações divergentes sobre a obra de Fustel dão uma
certa importância à observação desabusada de P. Veyne, citada anteriormente (n. 6): onde cessa a História?
Onde começa a História Comparada?
[83] Não se pode negar, aliás, que a Cidade Antiga seja fundamentalmente comparatista, mas de maneira
unilateral: o autor quer ver somente as semelhanças entre a Grécia e Roma.
[84] Este texto apareceu na REVUE DES QUESTIONS HISTORIQUES de 1887. Encontrar-se-á o texto
mais comodamente em HARTOG, Fr. Le XIXe siècle et l'histoire. Le cas Fustel de Coulanges. Paris, 1988,
p.353.
[85] Uma parte desta longa memória foi publicada por Fustel em 1880. A totalidade foi editada apenas dois
anos após a morte do autor, graças aos cuidados de JULLIAN, C. Nouvelles recherches sur quelques
problèmes d'histoire. Paris, 1891 (reimpr., Bruxelles, 1964). A passagem citada se encontra nas p. 4-5 deste
volume.
[86] Histoire des origines du gouvernement représentatif en Europe. 2 v., Bruxelles, 1851.
[87] Histoire de la Révolution d'Angleterre, Prefácio. Para uma edição recente deste texto, ver GAUCHET,
M. Philosophie des sciences historiques. Lille, 1988, p. 123-129. Este prefácio é, infelizmente,
excessivamente longo para ser citado in extenso e se presta mal a um recorte em trechos escolhidos: eu
posso então somente encaminhar o leitor assegurando-o que ele não será desiludido por esta lição de
comparatismo, quaisquer que sejam as opiniões de Guizot sobre as duas revoluções.
[88] Histoire de la civilisation en Europe depuis la chute de l'Empire romain jusqu'à la Révolution française,
ed. P. Rosanvallon, Paris, 1985 (Coll. Pluriel).
[89] Eu cito este livro na edição de J.-P. MAYER, Paris, 1967 (Idées-Gallimard).
[90] Œuvres complètes, v. VIII, 1, Correspondance d'Alexis de Tocqueville et de Gustave de Beaumont, ed.
A. Jardin, Paris, 1967, p. 51-52.
[91] Ver, por exemplo, seu artigo sobre La méthode historique en Allemagne. REVUE DE SYNTHÈSE
HISTORIQUE I: 21-27, 1900. Lamprecht distingue, no método histórico, um método superior e um inferior,
o primeiro implicando o comparatismo: “Nós vemos aparecer o método histórico superior lá onde se trata de
dominar os fatos e suas relações, e de abarcar com o olhar um horizonte mais vasto. Isto, naturalmente,
somente é possível caso se recorra à comparação. É necessário que os fatos sejam relacionados uns aos
outros, que sejam comparados uns com os outros, e é assim que se descobrirá seu sentido profundo, sua
estreita relação” (p.21-22).
[92] A tradução francesa deste livro foi publicada em Paris em 1964 com um prefácio importante e sem
complacência de P. VIDAL-NAQUET, que reproduziu este texto em La démocratie grecque vue d'ailleurs.
Essais d'historiographie ancienne et moderne. Paris, 1990, p. 277-317. Ver também LÉVÊQUE, P. (dir.).
Les premières civilisations. I. Des despotismes orientaux à la cité grecque. Paris, 1987, Peuples et Civilisa-
tions, p. 17-32.
[93] Reflections on British and Roman Imperialism. COMPARATIVE STUDIES IN SOCIETY AND
HISTORY 7: 267-288, 1965.
[94] JEANMAIRE, M. Dionysos. Histoire du culte de Bacchus. Paris, 1951 (reimpr., 1978). Ver também
DODDS, E. R. Les Grecs et l'irrationnel. Paris, 1977, Champs-Flammarion, p. 265-274.
[95] Ver, por exemplo, FINLEY, M. I. Esclavage antique et idéologie moderne. Paris, 1981 (Coll. “Le sens
commun”) Ou, mais recentemente, ROSIVACH, J. V. Agricultural Slavery in the Northern Colonies and in
Classical Athens: Some Comparisons. COMPARATIVE STUDIES IN SOCIETY AND HISTORY 35: 551-
567, 1993.

47
[96] LIGT, L. de. Fairs and Markets in the Roman Empire. Economic and Social Aspects of Periodic Trade
in a Pre-Industrial Society, Amsterdam, 1993 (Dutch Monographs on Ancient History and Archæology, n.
11). Ver, principalmente, p. 180-185.
[97] Der Staat des hohen Mittelalters. Grundlinien einer vergleichenden Verfassungsgeschichte des Lehn-
szeitalters, 8. ed., Weimar, 1968.
[98] COULBORN, R. (ed.). Feudalism in History, Princeton, 1956. Esta obra, que reúne as contribuições de
uma dezena de autores, cobre um terreno imenso, da Europa Ocidental ao Japão, com desvios pelas
civilizações do Egito Antigo, da Mesopotâmia e de Bizâncio. O. Lattimore fez disto uma análise detalhada
em PAST AND PRESENT 12: 47-57, 1957.
[99] Guerre, justice et ordre public. La France et l'Angleterre à la fin du Moyen Age. Paris, 1994 (Collection
historique).
[100] Cf. JENSEN, M.; REYNOLDS, R. L. European Colonial Experience. A Plea for Comparative Studies,
in Studi in onore di G. Luzzatto. v. IV, Milan, 1950, p. 75-90.
[101] Colonial Elites. Rome, Spain and the Americas. Oxford, 1958.
[102] Histoire des colonisations. Des conquêtes aux indépendances. XIIIe - XXe siècle. Paris, 1994.
[103] The Anatomy of Revolution. New York, 1938.
[104] 1789. Les révolutions de la liberté et de l'égalité. Paris, 1968 (Les grandes vagues révolutionnaires).
[105] Les révolutions (1770-1799). 4. ed., Paris, 1986 (Nouvelle Clio).
[106] Les révolutions de France et d'Amérique. La violence et la sagesse. Paris, 1988 (Passé simple).
Observemos que Gusdorf sublinha mais as diferenças entres estas duas revoluções tão próximas no tempo;
ver principalmente o capítulo II: “1787-1789: uma falsa simetria”.
[107] States and Social Revolutions. A Comparative Analysis of France, Russia, and China. Cambridge,
1979.
[108] A propósito do fascismo, ver as referências fornecidas por BARRACLOUGH, G. Tendances actuelles
de l'histoire. Paris, 1980, p. 276, n. 122, as quais se pode acrescentar MILZA. P. Les fascismes. Paris, 1985.
Sobre as guerras de camponeses, ver WOLF, E. Les guerres paysannes du vingtième siècle. Paris, 1974
(Bibliothèque d'anthropologie).
[109] Exceção notável, COMPARATIVE STUDIES IN SOCIETY AND HISTORY, cujo primeiro volume
apareceu em 1958/1959. Observar-se-á, entretanto, que se os artigos publicados aqui tocam todas as regiões
do mundo, os estudos propriamente comparativos não são muitos.
[110] Merecem tanto mais ser assinalados neste contexto as reuniões da “Sociedade Jean Bodin para a
História Comparativa das instituições”, que ocorrem regularmente desde 1935. A 23 a. sessão, consagrada à
Pena, se passou em Barcelona; as atas, em 4 volumes, foram publicadas em Bruxelas em 1989-1991.
[111] A INTERNATIONAL BIBLIOGRAPHY OF HISTORICAL SCIENCES, por exemplo, parece ignorar
o comparatismo. No v. 56, 1987, p. 188-189, encontram-se títulos como CORNI, G. La politica agraria del
fascismo: un confronto fra Italia e Germania (n. 3282) ou MILLER, J. Bourbon and Stuart: the Kings and
Kingship in France and England in the 17th Century (n. 3312) sob o título: “Époque moderne. Ouvrages
généraux”.
[112] Ver, por exemplo, MILLAR, F. The Emperor in the Roman World (31 BC-AD 337). Londres, 1977, p.
XII: “Preparando o trabalho, eu tenho rigidamente evitado ler trabalhos sociológicos sobre monarquias ou
tópicos correlatos, ou estudos de instituições monárquicas em sociedade outras que as de Grécia e Roma. Eu
estou perfeitamente ciente que isto envolverá consideráveis perdas na compreensão, e ignorância de
dimensões inteiras de questões que eu pudesse ter perguntado. No entanto, estou confiante que a perda no
caso oposto teria sido muito maior”.
[113] Sobressalta-se quando se lê, escrito por L. MUMFORD (La cité à travers l'histoire. Paris, 1964), que a
introdução do alfabeto na Grécia esteia situado cerca de 650 a.C. (p. 163): o fenômeno é anterior
aproximadamente dois séculos (cf. GUARDUCCI, M. L'epigrafia greca dalle origini al tardo Impero.
Rome, 1987, p. 19-20) – mas, é verdade que alguns especialistas são partidários de uma data mais baixa. Em
compensação, nenhuma desculpa pode ser achada para a descrição totalmente errônea das consultas a Delfos
(p. 179). Os peregrinos não estavam “adormecidos pelos cuidados da sacerdotisa”, nem eram “visitados pelo
deus” e curados durante o sono. Vinha-se a Delfos, como cada um sabia, para consultar o oráculo de Apolo,
e não para se fazer tratar.
[114] Cf. nota acima.
[115] FEBVRE, L. Combats pour l'histoire. Paris, 1953, p. 395.

48
[116] RUNCIMAN, W. G. The Origins of the Modern State in Europe and as a Topic in the Theory of Social
Selection, in Visions sur le développement des États européens. Théories et historiographies de l'État
moderne. Rome, 1993, p. 45 (Collection de l'École Française de Rome, 171).
[117] Ver acima, n.108. Eu chamo atenção sobre o fim do prefácio desta obra: “Os estudos de caso
apresentados aqui foram embasados em materiais de segunda mão. Os acontecimentos, observados por um
pesquisador tendo uma ótica antropológica e se interessando por questões levantadas aqui, são exceção. Isto
significa que o antropólogo é necessariamente dependente por natureza de materiais de pesquisa para os
quais nada contribuiu. Os fatos que são pertinentes para ele devem ser extraídos de obras escritas para um
outro público, em outro projeto” (p. 12).

49
2.9 – O Debate sobre a Comparação e a Transferência: e
agora? (H. Kaelble)

O Debate sobre a Comparação e a Transferência10:


e agora?11

Hartmut Kaelble
Tradução:
Álvaro Alfredo Bragança Júnior
(UFRJ/FL/PPGHC)

Nos anos passados inflamou-se um caloroso e instrutivo debate sobre a comparação histórica.
Ponto de partida deste debate foi a comparação histórica clássica. Ela era com muita freqüência praticada
na Europa e nos EUA desde os anos 70, porém sempre e somente por uma escassa minoria de
historiadores. Aquela recebera muito impulso por parte dos sociólogos históricos americanos, dentre
estes, exilados da Europa, [e]12 obteve um importante estímulo através de um ensaio dos anos 20 de Marc
Bloch, mais uma vez trazido à luz13. Desde os anos 90 compara-se inclusive mais na Europa do que nos
EUA, na Alemanha especialmente em Berlim e Bielefeld, mas também em outros lugares. A comparação
histórica foi uma entrada em uma orientação mais fortemente transnacional da história européia. Várias
vezes ela foi pesada.14 No sentido clássico entende-se sob comparação histórica a procura sistemática por
diferenças e semelhanças, por divergências e convergências entre vários casos de comparação. À
comparação pertencem a explicação ou o desenvolvimento de tipologias de tais diferenças e
semelhanças, [e],15 com isto, sua contextualização.
Após um quarto de século de comparação histórica 16, no qual surgiram centenas de trabalhos
comparativos, começou na metade dos anos 90 um debate, no qual, em primeiro lugar, foi
desenvolvido o conceito de “transferência”, depois o conceito de „entangled history“, depois o
conceito de „histoire croisée“ e além disso o conceito de combinação de história da comparação e
história das relações. Primeiramente descreverei o desenvolvimento destes conceitos [e] após isso
chegarei aos desafios na situação atual.
O conceito de “transferência” foi em especial bem e eficientemente formulado e criticado
por Michel Espagne em um artigo de 1994 na revista Genèses. Ele requer que se dê mais espaço aos
10
Transfer, no original, entendido como “transferência”.
11
Disponível em <http://geschichte-transnational.clio--online.net/forum/id=574&type=artikel>.
Acesso em: 05/01/2005. Texto original de 21/12/2004.
12
Inserção do tradutor.
13
Literalmente, “desenterrado”.
14
Literalmente, “colocado em balança, analisada em uma balança”.
15
Idem à nota 1 (nota 10).
16
Comparação, aqui, também pode ser entendido como “comparativismo”.

50
exames de transferências nas ciências humanas. Sob transferência, Michel Espagne entende as
transformações que ocorrem no momento da transmissão de conceitos, normas, imagens e
representações de uma cultura para outra. Tais transmissões podem surgir através da migração,
como também através de encontros e de leituras de um texto oriundo de uma outra cultura. Michel
Espagne argumenta, que cada nação se constitui não apenas a partir de suas próprias tradições, mas
também, numa parte substancial, através de tais transferências, a partir de outras nações. Não se
entende a história de uma nação, se esta fosse escrita, limitando-a somente à história nacional.
Michel Espagne critica veementemente a comparação clássica, pois esta, ao seu ver, possui diversas
fraquezas, que o exame das transferências não tem. A comparação clássica é obrigada a construir,
em primeiro lugar, as unidades comparativas, para que possa simplesmente comparar. Com isso, ela
precisa distanciar-se da realidade um bom pedaço e freqüentemente deixa de levar em consideração
as transferências provenientes de outras nações ou civilizações. O exame das transferências, ao
contrário, não é obrigado a fazer tais construções, pois ele permanece muito mais próximo da
realidade, quando segue de perto a mudança no momento da transmissão de uma cultura para outra.
Além disso, a comparação clássica concentra-se continuamente em estruturas e instituições e exclui
continuamente as experiências na história. As experiências, ao contrário, situam-se no centro do
exame das transferências. A comparação clássica trata muito pouco do objeto central do historiador,
o tempo. Regra geral, ela compara as sociedades em um mesmo momento. Para o exame das
transferências, por outro lado, o tempo é essencial, já que aquela sempre examina as mudanças.
Um segundo conceito vai mais além em uma direção semelhante a de Osterhammel,
conceito esse que é caracterizado como “entangled history” ou “shared history” e que foi
desenvolvido pela cientista social Shalini Randeria e pelo historiador e especialista sobre o Japão
Sebastian Conrad. Este conceito apresenta uma crítica semelhante à de Michel Espagne no que
tange à comparação clássica, porém vai mais além em dois aspectos, de forma bastante semelhante
à de Jürgen Osterhammel. Neste conceito, as transferências unem e entrelaçam não somente países
como França e Alemanha, vizinhos ou que pertencem à mesma civilização, mas também nações
muito distantes uma da outra, como Japão e Alemanha. Transferências diretas ou indiretas
encontram-se em toda a parte e unem todas as sociedades do mundo. Contudo, mais importante
ainda é um segundo passo. O conceito de “entangled history” poderia em especial salientar de
forma enfática, que as sociedades colonizadoras e colonizadas também são unidas intensivamente
uma com a outra através das transferências, e, em verdade, não apenas através das transferências da
mãe-pátria para as colônias, freqüentemente investigadas, mas também de forma inversa através das
transferências raramente seguidas a partir das colônias para a mãe-pátria. O conceito de “entangled
history” exige, portanto, uma mudança de perspectiva fora da Europa.

51
Uma reação a este debate é o conceito de “histoire croisée”, exposto pelo germanista e
historiador francês Michael Werner e pela cientista política francesa Bénédicte Zimmermann. Três
elementos deste conceito levaram, ao meu ver, este debate mais além. Este conceito baseia-se, mais
ou menos de forma explícita, em um ceticismo face à independência de ambientes, movimentos,
línguas, valores ou instituições transnacionais. Considera-se a nação, por este conceito, mais como
uma unidade de orientação central. Como conseqüência disto exige-se decisivamente deste
conceito, que as pesquisas transnacionais de qualquer espécie se confrontem de forma intensiva
com as perspectivas, freqüente e fundamentalmente diferentes, em outras sociedades comparadas e,
neste sentido, aquelas sempre modificarão as perspectivas e através disso tornar-se-ão mais
reflexivas. Com isso, este conceito insiste em ir além dos conceitos de transmissões de comparações
e exames de transferências e se referir a princípios e investigações plurilaterais. Finalmente, neste
conceito novamente argumenta-se e retoma-se um pouco a aguda oposição entre, por um lado, a
prejudicial e clássica comparação e, por outro lado, o vantajoso exame das transferências, de forma
que as fraquezas e pontos-fortes entre comparação e transferência são repartidos de forma muito
mais simétrica.
Com isso, a “histoire croisée” situa-se próxima de um quinto conceito: a combinação entre
comparação e exame das transferências. A favor deste conceito são apresentados três argumentos.
Em primeiro lugar, argumenta-se mais uma vez, que a comparação clássica da mesma forma que o
exame das transferências possui suas fraquezas e pontos-fortes. Os exames das transferências
também precisam construir suas unidades, pois, caso contrário, não podem determinar em que
consiste a mudança quando da transmissão de uma cultura para a outra. Também as comparações,
não apenas os exames das transferências, trabalham na dimensão temporal, pois elas investigam não
só semelhanças e diferenças, mas também divergências e convergências. Também as comparações,
não somente os exames das transferências, podem examinar experiências. Além disso, os exames
das transferências e as comparações necessitam-se reciprocamente e completam-se. As
comparações precisam dos exames das transferências, porque as transferências, na maioria das
vezes, são um fator importante para aproximações ou também para divergências. Sem os exames
das transferências deixa-se de ver, conseqüentemente, uma explicação importante para as
divergências ou convergências. Inversamente, os exames das transferências precisam da
comparação, porque somente através da comparação pode se constatar em que a cultura de partida e
a cultura de chegada de uma transferência se diferenciam e em que efetivamente consiste, por
conseguinte, a mudança, ou seja, o cerne da transferência. Quando se argumenta que a nação alemã
se constitui, de maneira considerável, a partir de transferências francesas, então precisa-se apurar
através da comparação, o que é alemão e o que é francês. Por fim, necessita-se paralelamente aos

52
exames das transferências continuar com a comparação, pois comparar pertence tanto mais ao
pensar do cotidiano quanto mais estreitas duas sociedades se entrelaçam e quanto mais encontros
ocorrem entre duas sociedades. Ocupar-se de tais juízos do cotidiano e de preconceitos sobre o
mesmo, explicá-los, examiná-los, neles influir, estas são uma tarefa essencial dos cientistas sociais e
historiadores justamente em um mundo fortemente entrelaçado.
Neste debate, três pontos são dignos de observação e de crítica:
1. Ele não é um debate metodológico puro, mas sim parte de uma reorientação transnacional
da historiografia. Esta reorientação ocorreu em um determinado contexto histórico-temporal da
Europa, possuindo poucas chances em épocas anteriores: seguramente foi fomentada pelos
massivos medos da globalização em tempos de crescente desemprego e queda da economia
européia diante do Japão e do Sudeste Asiático, como também diante dos EUA; pela descoberta da
União Européia desde os anos de 1980 através dos intelectuais europeus como um importante
centro de poder transnacional europeu; mais além, pelo processo de individualização, no qual se
afrouxou em muitos países europeus as fortes lealdades face ao estado nacional, também para os
historiadores, e no qual, freqüentemente ao mesmo tempo, os valores transnacionais de um
entendimento e compreensão internacionais foram revalorizados; finalmente do mesmo modo pelas
novas maneiras de guerras transnacionais desde os anos de 1990, nas quais os atores principais não
eram mais somente os estados e nas quais a Europa também foi envolvida. Sem esse contexto
histórico-temporal ficaria incompreensível a nova orientação transnacional dos historiadores. O
debate, aqui resumidamente descrito, discutiu diferentes opções de uma orientação transnacional da
História Social e da História da Cultura. A comparação era uma opção diferente do exame das
transferências e das relações. Por causa disso e simultaneamente, a combinação de ambos os aportes
foi possível, porque ambas as opções, ao fim, tratavam do mesmo objetivo, de uma mais forte
transnacionalização da historiografia. Certamente, elas não foram, para não se deixar mal-
entendidos, as únicas opções. A história cultural e a história ampliada histórico-economicamente
das relações internacionais, que do mesmo modo se desenvolveu nos anos de 1990, foi uma terceira
e importante opção, nem sempre separada daquelas com nitidez.
2. O debate descrito decorreu em um círculo relativamente estreito e tornou-se relativamente
pouco conhecido para além deste estreito círculo. Ele foi limitado aos especialistas dos últimos dois
séculos e meio e por razões evidentes não foi entendido 17 nem pelos historiadores dos primeiros
séculos da Idade Moderna nem pelos historiadores da Idade Média. De mais a mais, foi um debate
entre historiadores sociais e germanistas, em si, um incomum par de disciplinas, que já a um bom
tempo não travavam um estreito diálogo. Ela mal encontrou eco nas costumeiras parceiras da

17
Rezipieren, no original, “perceber, tomar conhecimento e processar intelectualmente”.

53
ciência histórica, na Politologia, na Sociologia, na Etnologia, na Filosofia e na Jurisprudência.
Nestas disciplinas, seguramente foram discutidos algumas vezes problemas similares, mais ou
menos sob o tema do problema de Galtung 18, segundo o qual não se pode comparar unidades, se
estas estão em estreita relação uma com a outra. Contudo, este debate sobre o problema de Galtung
foi completamente separado daquele aqui descrito.
3. Até agora neste debate ninguém ainda tentou pormenorizadamente escrever a história da
ciência da comparação histórica e da história das transferências e da história das relações.
Seguramente, ela não se instituiu somente nos anos de 1970, como normalmente se considera na
Europa. Em premissas extremamente interessantes, a história da comparação geral das ciências
sociais e culturais foi remontada às suas origens no Iluminismo ou até mesmo nas civilizações grega
e romana, em época bem recente por Peter Brockmeier, Lorraine Daston, Chris Lorenz, Lars
Mjøset, Jürgen Schriewer. Isto ainda falta para a comparação histórica e para o exame das
transferências históricas.
Quais são os desafios mais importantes no atual estágio do debate? Como a
comparação histórica e a história das relações históricas podem continuar a se desenvolver?
A primeira e mais importante exigência tem a ver com o fato de que este debate
metodológico antecede a prática da pesquisa histórica. Enquanto os trabalhos metodológicos
sobre a comparação histórica clássica surgiram no fim de uma longa prática de comparação dos
historiadores, a discussão sobre os outros conceitos desenvolveu-se de maneira antes inversa. Nem
para a “entangled history”, nem para a “histoire croisée”, nem para a combinação da comparação
histórica e da história das relações históricas há uma grande quantidade de investigações empíricas
ou mesmo estudos de modelos internacionalmente conhecidos, muito citados e traduzidos, com os
quais futuras investigações poderão se confrontar metodologicamente. Também no que concerne ao
exame das transferências não se nada em um mar de pesquisas. Por isso, precisamos de um tempo
de prática da pesquisa empírica. Caso contrário, o debate corre o perigo de tornar-se vácuo.
Investigações de modelos, em especial, necessitam com freqüência de muitos anos.
Uma segunda exigência: os graus de conceituação do outro lado da comparação
histórica são muito pouco conciliados, um em relação ao outro. Muito pouco ainda se refletiu
sobre como a “história das transferências”, a “história das interdependências”, a “história das
relações” e a transnacionalidade estão uma para a outra, mesmo quando há propostas. A linguagem
científica ainda está muito pouco estruturada. Dever-se-ia antes abolir “história das transferências”
e utilizar o conceito mais amplo de “interdependência”, pois o conceito de transferência é muito

18
Johan Galtung, nascido em 1930, na Noruega, recebeu o Prêmio Nobel Alternativo da Paz, Professor de Estudos da
Paz em muitas universidades (Universidade do Hawaii, Universidade de Witten/Herdecke, European Peace University,
etc.) é diretor do TRANSCEND, Instituto para os Estudos da Paz e organizador dos "Critical Peace Studies.”

54
limitado e sempre significa apenas modificações de concepções, experiências, significações na
passagem de uma cultura para a outra, enquanto interdependências são muito mais includentes? Ou
“transferência” é antes um conceito mais amplo do que “interdependência”, porque as
transferências podem ocorrer também entre países que não possuem uma estreita relação de
dependência um com o outro e pouco tem diretamente a ver um com o outro? Ou tanto a “história
das transferências” quanto a “história das interdependências” são conceitos muito limitados e dever-
se-ia melhor usar a expressão neutra “história das relações”, a qual nem se reduz às modificações
nas transmissões transnacionais nem pressupõe que todas as sociedades do mundo sejam
interdependentes e que as relações exteriores para cada sociedade sejam essenciais? Ou o conceito
de “história das relações” também é muito limitado para a história transnacional especialmente do
século XX, porque ele não pode abranger importantes evoluções transnacionais como as instituições
internacionais, Banco Mundial, a ONU, a União Européia, a Igreja Católica ou ambientes sociais
transnacionais, movimentos sociais transnacionais, valores, linguagens e discursos transnacionais,
já que não se pode dissolvê-las nas relações entre países e sociedades isoladas, mas elas possuem
sua própria lógica interna comum? Pois seria realmente possível e sensato diluir as decisões da
Comissão Européia em contribuições e relações francesas, britânicas, alemãs e espanholas ou
explicar as decisões da Igreja Católica a partir das relações das igrejas-filhas nacionais? Por causa
disso, o conceito de história das relações também não possui aqui claras limitações? Seria melhor se
decidir por uma espécie de hierarquia entre transnacionalidade, história das relações, história das
interdependências ou transferências?
A terceira exigência: esse debate deveria sair de sua exclusividade. Ele deveria ser
transmitido mais fortemente às disciplinas vizinhas e no diálogo, aquele também se transformará
com elas. Em especial, o debate deveria sair da exclusividade franco-alemã e abrir-se mais
fortemente também para o espaço anglo-saxão, de língua espanhola, do sudeste asiático. Para tanto,
seriam necessárias traduções dos textos-chave em inglês, espanhol, chinês ou japonês. O debate,
que até agora estava intimamente unido ao contexto europeu, também receberá novos impulsos
através do diálogo com esses historiadores de fora da Europa.

Referências Bibliográficas:

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Mélanges historiques. vol. 1. Paris, 1983.

CONRAD, Sebastian; SHALINI, Randeria (Org.). Jenseits des Eurozentrismus. Postkolonioale Per-
spektiven in den Geschichts und Kulturwissenschaften. Frankfurt, 2002.

55
ESPAGNE, Michel. Au delà du comparatisme. In: _______. Les transferts culturels francoalle-
mands. Paris, 1999, S. 3549.

HAUPT, HeinzGerhard. Comparative history. In: INTERNATIONAL ENCYCLOPEDIA OF THE


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HAUPT, HeinzGerhard; KOCKA, Jürgen (Org.). Geschichte im Vergleich. Ansätze und Ergebnisse
international vergleichender Geschichtsschreibung. Frankfurt, 1996.

KAELBLE, Hartmut. Der historische Vergleich. Eine Einführung zum 19. und 20. Jahrhundert.
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WERNER, Michael; ZIMMERMANN, Bénédicte. Penser l’histoire croisée: entre empirie et


réflexivité. Annales 58: 736, 2003.

WERNER, Michael; ZIMMERMANN, Bénédicte. Vergleich, Transfer, Verflechtung. Der Ansatz


der histoire croisée und die Herausforderung des Transnationalen. Geschichte und Gesellschaft
28: 607636, 2002.

56
2.10 – Apontamentos sobre Kock a

As considerações de Jürgen Kocka sobre a História Comparada.


As comparações assimétricas: a história das transferências e a história
Cruzada.

KOCKA, J. Comparison and beyond. History and Theory, n. 42, pp. 39-44, feb. 2003.

Pontos a serem observados em Kocka:


O autor define a comparação de uma forma bastante simples, mas que dá amplas
possibilidades ao campo de escolhas do pesquisador. Para ele, a comparação em História é a
discussão sistematizada de dois ou mais fenômenos históricos acerca de suas similaridades e
diferenças de modo a se alcançar determinados objetivos intelectuais. Segundo Kocka, o método
comparativo reúne quatro propósitos metodológicos: heurísticos, descritivos, analíticos e
paradigmáticos (p.39). Cabe ressaltar aqui que Kocka não apresenta um método específico para a
comparação e nem demonstra preferência por nenhuma metodologia já utilizada para fomentar a
mesma.
Para nós, a principal contribuição de Kocka é apresentar uma série de precauções básicas
quando da opção pelo estudo comparado, das quais consideramos relevantes para o
desenvolvimento de nossa pesquisa: 1) Em primeiro lugar, ele aconselha que se faça o menor
número de comparações possível, pois quanto mais casos um estudo comparativo incluir, mais
dependente ele se tornará de literatura secundária, o que dificultará a aproximação dos documentos
e a sua leitura na língua original; Contudo, o autor considera que o controle dos idiomas não deve
ser tomado como desculpa para a sobre-especialização profissional e, tampouco, se tornar
empecilho à adoção de perspectivas abertas e à formulação de interpretações compreensivas; 2) A
segunda precaução é a cerca do perigo de, através da comparação, se perder a continuidade
narrativa e, conseqüentemente o contexto, indispensável ao trabalho do historiador; Em
contrapartida, Kocka afirma que a continuidade é apenas um princípio guia, entre outros, da
reconstrução histórica e que invariavelmente as operações realizadas por um historiador ao
considerar um contexto são sempre optativas, seletivas, diretamente relacionadas a um ponto de
vista, e, neste sentido, as abordagens analíticas nunca reconstroem abordagens na sua totalidade;
para o autor, as abordagens comparativas apenas destacam e fazem se tornar claro aquilo está
implícito em todo tipo de trabalho histórico: o componente seletivo e construtivo (p.41-3).
O autor levanta ainda a questão de saber se abordagens transnacionais (História Cruzada)
estão além ou aquém da comparação. Segundo ele, diante da história cruzada, a comparação

57
aparenta ser mecânica demais, analítica demais ao separar a realidade em diferentes pedaços, para
utilizá-los como unidades de comparação, enquanto seria necessário vê-los como um todo, como
uma teia de entrelaçamentos e relações (p.43).
Os historiadores podem e devem incorporar elementos da abordagem das “Histórias
Cruzadas” nos esquemas comparativos de suas pesquisas. O ato de comparação pressupõe a
separação analítica dos casos a serem comparados, o que não significa ignorar ou negligenciar as
inter-relações entre esses casos (contanto que existam). Tais relações devem se tornar parte do
esquema comparativo através de sua análise como fatores que levaram a similaridades ou
diferenças, convergência ou divergência entre os casos que se compara. Não é necessário escolher
entre História Comparada e História Cruzada. O objetivo é combiná-las (p.44).

Assimetrical Historical Comparison: The Case of the German Sonderweg


Jürgen Kocka
Freqüentemente, comparações históricas são assimétricas no sentido em que investigam um
caso cuidadosamente enquanto se limitam a fazer um mero esboço de outro(s) caso(s) que serve(m)
como ponto(s) de referência comparativa. O debate do German Sonderweg (caminho especial) e a
rica literatura histórica originada deste debate podem servir como exemplos (p.40).
Desde a década de 1940 uma variante crítica da tese do sonderwg emergiu. Esta versão teve
famosos ancestrais como Friederich Engels e Max Weber [...] Em essência, a versão crítica da tese
do sonderweg tentou responder uma questão fundamental, isto é: na crise geral do período entre
guerras, por que a Alemanha – diferente de países comparáveis no Ocidente e no Norte – se voltou
para uma perversão fascista e/ou totalitarista? Eles interpretaram o maior desenvolvimento da
história alemã, pelo menos desde o século XIX, à luz desta questão (p.41).
De fato, o termo foi mais usado pelos seus críticos do que pelos seus defensores (p.43).
Alguns autores argumentaram que a idéia de um sonderweg assume a existência de um
“caminho normal” do qual o desenvolvimento alemão se desviou [...] Se normal significa mediano
ou mais freqüente, é difícil demonstrar que os desenvolvimentos inglês, francês, ou americano
representaram “normalidade”, devido às grandes diferenças, o que tornaria problemático classificá-
los como grupo ocidental. Entender “normal” como “norma” implica um alto valor subjetivo de
julgamento, além do que, o perigo de idealizar o Ocidente (p.43-4).
[...] a gradual europeização dos temas, definições e interpretações mais além relativisa o
ponto de vista do sonderweg (p.45).

58
Aplicado a maioria dos tópicos o conceito de German Sonderweg tem pouco ou nenhum
poder explicativo, dado que, em relação à maioria das temáticas, todos os países e todas as regiões
têm seu próprio sonderweg (p.48).
Comparações assimétricas como o sonderweg são freqüentemente arriscadas, pois ao
abordarem unidades comparativas através de um esboço tornam-se seletivas, superficiais,
estilizadas e idealizadas, levando a resultados distorcidos. Há de se criticar também o estudo
instrumentalizado da unidade, em que é examinada apenas para entender melhor uma outra (p.49).
De outra forma, podemos dizer que, mesmo de forma assimétrica, a comparação lança
questionamentos que de outra forma não poderiam aparecer [...] a perspectiva comparativa amplia
os horizontes da pesquisa, mesmo quando não aplicada de maneira equilibrada [...] e mesmo que a
comparação assimétrica possa levar a resultados problemáticos e distorções, estes podem ser
corrigidos através de pesquisa empírica no objetivo de descortinar conclusões que privilegiaram
apenas um lado e resultados parciais (p.49).

3 – TEXTOS AVULSOS

3.1 - Interdisciplinar, Transdisciplinar, Multidisciplinar

Texto abordado: CARDOSO, Ciro Flamarion. “História das Religiões”. IN: ---. Um historiador
fala de teoria e metodologia. Ensaios. Ensaios. Bauru, SP: EDUSC, 2005. p.209-230.

Resenha elaborada por:


André Barroso. Mestrando em História Comparada (PPGHC/IFCS/UFRJ), em 31/10/2006.
Disciplina: Tópico de Pesquisa “História Comparada das Formas Narrativas”.
Tema: Estudos Bíblicos e Judaísmo: Religião, História e Literatura. Período: 2006 / 2.

O capitulo 10 desta obra versa sobre a História das Religiões, onde a linha de argumentação
delineia o questionamento acerca da possibilidade ou não de se fazer história das religiões sem,
contudo se tornar um mero legitimador ou repetidor das verdades da teologia. Tarefa esta já
adiantada pelo autor ser senão impossível é, por demais, difícil. Para tanto o autor cita alguns casos
de especialistas de renome que se deixaram ou não conseguiram escapar das teias da tradição
religiosa quando tratavam de experimentos científicos que nada tinham a ver com o campo da
teologia.
Numa primeira reflexão sobre o assunto, estou convencido de que a metodologia comparada
e, dentro desta a transdisciplinaridade se mostra hoje como a melhor e mais eficaz metodologia para

59
a construção do conhecimento no campo da História, que é a área na qual atuo, e ouso arriscar que
também se aplica as outras áreas do saber humano.
Antes de formular as bases da teoria de aplicação do método comparativo, tendo como eixo
a transdisciplinaridade na educação básica, é importante fazermos algumas distinções para daí
resultar da definição plausível e aplicável à realidade escolar na qual atuamos. Deste momento não
trabalharei com o conceito de comparação, entenda o leitor este estar implícito quando o texto falar
em transdisciplinaridade.
Costumamos falar de interdisciplinaridade, multidisciplinaradade e transdisciplinaridade
como sendo a mesma coisa, embora os prefixos inter, multi e trans queiram dizer coisas, contudo
não opostas, pelo menos distintas são suas definições. De acordo com as gramáticas, e para tanto,
verifiquei vários dicionários, assim, a definição a qual me aproprio aqui é a do Diccionário de la
lengua española, a) “inter” quer dizer aquilo que esta entre, no meio, entre vários (ALONSO.
2000.P.650); o que nos leva a inferir que interdisciplinaridade é um elo que se coloca entre as
disciplinas, estas, porém se mantém intactas em seus programas, conteúdo e havendo desta feita
uma coordenação responsável por pensar o conteúdo que seria possível trabalhar em comum, os
temas transversais, por exemplo. Na perspectiva interdisciplinar os feudos são mantidos, como se
ninguém tivesse a capacidade de emitir opinião sobre o conteúdo alheio, neste caso torna-se um ato
esporádico e facultativo que conta mais com a boa vontade de alguns poucos professores de
disciplinas afins, do que uma metodologia de trabalho. b) Já o prefixo “mult” expressa a idéia
multiplicidade (ALONSO. 2000. P.650), sem, contudo estabelecer nenhum elo necessário entre os
termos enumerados ou relacionados, no caso da educação as disciplinas envolvidas no processo
educativo. Desta forma, a relação é ainda pior que a interdisciplinaridade já que a
multidisciplinaradade não prevê nenhum trabalho em comum, é importante nota que também não o
proíbe. c) Enfim, partiremos para definição que salta aos olhos quando efetuamos a distinção. O
prefixo “trans”. Segundo o vocabulário Técnico e crítico da Filosofia, o prefixo trans e muito usado
pelos filósofos contemporâneos para citar termos novos opondo uma noção àquela que ela
ultrapassa (LALANDE. 1996. P. 1149). Neste sentido, subentende algo que perpassa de um lado
para o outro, através de, sendo o próprio objeto sujeito e objeto da ação. Como um trançar de fios
que vai dando o tom do tecido.
Assim, penso que podemos definir o trabalho transdisciplinar como aquele trabalho onde as
disciplinas passam umas através das outras emitindo opiniões, acrescentando saberes e olhares
plurais (THELM e BUSTAMANTE. 2004. P 10: 9-30), tirando o professor da posição de dono do
seu saber, para que este seja mais um pesquisador junto com os alunos neste grande laboratório
educacional que deve se transformar a escola. O trabalho transdisciplinar subverte a ordem de

60
tempo e espaço da escola burguesa conteudista, e leva a sério as palavras de Paulo Freyre que
pensava a educação como uma relação de saberes com a finalidade de ser instrumento de libertação
do ser humano e transformação social.
Assim, concordo com Ciro quando ela afirma que a transdisciplinaridade é a solução
metodológica para os estudos da religião.
3.2-Da Disciplina à Transdisciplinaridade

Maria Luisa da Silva19


Professora de Lingüística no Curso de Letras - UEMG/INESP
Mestranda em Educação

Resumo
O presente artigo aborda algumas questões envolvidas no debate sobre a transdisciplinaridade como
paradigma da educação na pós-modernidade. O artigo aponta para a possibilidade de se adotarem
práticas educacionais transdisciplinares, a partir de uma mudança epistemológica e da superação de
entraves decorrentes da tradição disciplinar da ciência moderna que fragmentou o conhecimento e
seu ensino.
Palavras-chave: Disciplina, Transdisciplinaridade, Paradigma da educação, Mudança
epistemológica.

Introdução
Vivemos uma época de desestabilização do conhecimento fragmentado em disciplinas, cujo
grau de especialização chegou a tal ponto que engendrou a necessidade de sua superação.
A fragmentação do saber científico reflete-se no ensino compartimentado dos saberes
compondo o que chamamos de estrutura disciplinar, em que se distingue não só a divisão rígida
entre as disciplinas, como a hierarquia entre elas. E, embora desestabilizada, questionada e
combatida, é esta ainda a estrutura mais freqüente nos sistemas e instituições de ensino. Dessa
forma, o debate sobre inter ou transdisciplinaridade tem sido feito sob o domínio da disciplina,
considerada aqui tanto como estrutura de produção e transmissão do conhecimento, quanto como
uma estrutura de percepção da realidade.
O objetivo deste artigo é abordar as definições de disciplina, multidisciplinaridade,
pluridisciplinaridade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade e considerar algumas questões
que envolvem o debate sobre a transdisciplinaridade como paradigma da educação na pós-
modernidade.
Desenvolvimento

Disponível em: <http://www.divinopolis.uemg.br/revista/revista-eletronica2/artigo7-7.htm>.


19

Acesso em 17/11/2006.

61
Entende-se por disciplina diferentes domínios de conhecimento, na medida em que são
sistematizados de acordo com critérios específicos que determinam rigidamente os limites entre os
campos do saber. A origem das disciplinas remonta ao século XVII, com o método de Descartes.
Uma especialização crescente levou a uma separação característica do que podemos chamar de
modernidade e que só fez concretizar a separação sujeito-objeto que se encontra na origem da
ciência moderna. Numa estrutura disciplinar não há a integração de conteúdos ou objetivos e o
conhecimento é fragmentado. Nas palavras de Japiassu (1992): “Chegamos ao ponto em que o
especialista se reduz àquele que, à custa de saber cada mais sobre cada vez menos, termina por
saber tudo sobre o nada. Torna-se uma ilha de saber, cercada por um oceano de ignorâncias.”
A multidisciplinaridade propõe uma estrutura em que a solução de um problema utiliza
informações de duas ou mais especialidades sem que as disciplinas levadas a contribuir para aquelas
que a utilizam sejam modificadas ou enriquecidas. Estuda-se um objeto de estudo sob vários
ângulos mas sem que tenha havido antes um acordo prévio sobre os métodos a seguir e os
conceitos a serem utilizados. Suas primeiras manifestações surgem no final do século XVII. Em
um sistema multidisciplinar, uma gama de disciplinas é proposta simultaneamente para estudar um
objeto sem que apareçam, explicitamente, as relações entre elas.
A pluridisciplinaridade é uma estrutura na qual o agrupamento das disciplinas se faz
entre aquelas que possuem algumas relações entre si, visando-se à construção de um sistema de um
só nível e com objetivos distintos, embora excluindo toda coordenação. No sistema pluridisciplinar
justapõem-se disciplinas situadas no mesmo nível hierárquico de modo a que se estabeleçam as
relações entre elas. De acordo com Guattari (1992): “Freqüentemente, no entanto, o encontro das
disciplinas não basta para que sejam eliminadas as fronteiras entre as problemáticas e modos de
expressão presentes. São enviados sinais de uma área à outra, sem que uma comunicação mais
profunda aconteça.”
As estruturas multi e pluridisciplinares pressupõem uma atitude de justaposição de
conteúdos de disciplinas heterogêneas ou a integração de conteúdos numa mesma disciplina,
atingindo-se quando muito o nível de integração de métodos, teorias e conhecimentos.
No final do século XIX, o avanço da ciência permitiu uma visão mais profunda do universo
e de sua complexidade, originando novos enfoques que lançam mão de métodos próprios de
diversas disciplinas e levam à interdisciplinaridade. Nesse sistema tem-se uma relação de
reciprocidade, de mutualidade, em regime de co-propriedade que possibilita um diálogo mais
fecundo entre os vários campos do saber, que leva a uma modificação e enriquecimento das
disciplinas envolvidas, na medida em que cada uma se conscientiza dos seus limites e acolhe as
contribuições de outras disciplinas.

62
A interdisciplinaridade provoca trocas generalizadas de informações e de críticas, amplia a
formação geral e questiona a acomodação dos pressupostos implícitos em cada área, fortalecendo o
trabalho de equipe e buscando superar a fragmentação do conhecimento própria da estrutura
disciplinar.
No entanto, segundo D’Ambrósio, citado por Assmann (1998), “a realidade cósmica, a
natureza da matéria, o fenômeno da vida e os mistérios da mente e, sobretudo, as inter-relações
entre tudo isso resistem ao tratamento disciplinar, mesmo que se adote a multidisciplinaridade ou a
interdisciplinaridade. É absolutamente fundamental que se tenha uma visão global. A totalidade está
sempre presente, não só nas manifestações identificáveis de cada aspecto, mas também nas
interações não perceptíveis. O passo fundamental da mecânica quântica, revelando o
comportamento interativo das partículas, é reconhecido como a essência do universo. A única
possibilidade de conhecer a totalidade – se isso é possível – é adotar um enfoque holístico, indo
mais além das disciplinas, transcendendo objetos e métodos disciplinares. Isto é a
transdisciplinaridade.”
Nesta etapa superior, a transdisciplinaridade, termo cunhado por Piaget, eliminaria as
fronteiras rígidas entre as disciplinas. Isso não significa eliminar as disciplinas, mas abrir-se para
aquilo que vai através e além delas, possibilitando uma nova visão da realidade. Numa estrutura
transdisciplinar não há o domínio de uma disciplina sobre as outras, mas uma abertura para o
diálogo, não só das disciplinas entre si, como entre as áreas da ciência e, mais ainda, da ciência com
outros campos como a arte, a literatura, a religião. Uma atitude transdisciplinar também deverá
considerar as várias formas de apreensão e transmissão do conhecimento, valorizando os aspectos
intelectuais bem como o papel da intuição, da imaginação, da sensibilidade no processo de ensino-
aprendizagem. Não há especialistas transdisciplinares, mas profissionais movidos por uma atitude
transdisciplinar que se apóiam nas diversas atividades da arte, da poesia, da filosofia, do
pensamento simbólico, da ciência e da tradição com toda sua riqueza e diversidade.
O movimento pós-moderno propõe o paradigma transdisciplinar e o especialista já não pode
mais se encastelar na sua disciplina e fechar-se ao novo que se impõe. Os próprios avanços da
ciência contribuíram para derrubar conceitos clássicos do positivismo e levaram a uma nova lógica
na percepção da realidade na qual não se pode mais pensá-la como um único plano regido por uma
única lógica, explicável por uma ciência única e onipotente. Uma visão transdisciplinar possibilita a
aceitação de diferentes níveis de realidade, regidos por lógicas diferentes. Segundo Portella (1992),
“O movimento do conhecimento implica, permanentemente, um deslocamento de fronteiras, ou
antes, a criação de um território trans-fronteiras.”

63
Morin, citado por Assmann (1998), destaca dois elementos básicos do conceito de
transdisciplinaridade: “primeiro, trata-se de algo mais que a mera intensificação do necessário
diálogo entre as distintas áreas e disciplinas científicas, porque a questão que precisa ser explicitada
é a da mudança de paradigma epistemológico; segundo, o diálogo entre as ciências será mais
profundo se houver uma transmigração de conceitos fundantes através das diversas disciplinas.”
A busca de uma postura transdisciplinar pode ser percebida em vários setores da sociedade.
O mercado de trabalho exige cada vez mais um profissional polivalente, que domine diferentes
códigos e transite por diversos campos de conhecimento; a inteligência artificial (IA) se constitui
como campo transversal de disciplinas técnicas e humanas; da saúde à educação, as estruturas
disciplinares parecem não mais responder às demandas da atualidade. A ecologia evoluiu da
simples consideração do equilíbrio dos recursos naturais a um sentido mais amplo que engloba o ser
humano nos seus aspectos biológicos, psíquicos e sociais em inter-relações consigo mesmo, com o
outro e com o planeta, culminando no que Guattari chama de ecosofia. Segundo Guattari (1992), “A
ecologia científica aplicada ao meio ambiente permanecerá impotente, se não acarretar novos
comportamentos sociais e políticos e estes, por sua vez, vegetarão no imobilismo e no
conservadorismo, sem uma profunda transformação das realidades./.../ A interdisciplinaridade, que
prefiro chamar de transdisciplinaridade, passa, portanto, acredito, pela reinvenção permanente da
democracia, nos diversos estágios do campo social.”
Parece não haver dúvidas de que o excesso de especialização levou à necessidade de sua
superação e de que o próprio avanço do conhecimento gerou novas formas de estruturação que, sem
eliminar a disciplina propriamente, buscam superar as fronteiras dos campos de saber. Estruturas
multi, pluri, inter e transdisciplinares foram concebidas como alternativas à especialização
excessiva e conseqüente fragmentação do conhecimento científico e de seu ensino.
No entanto, a concepção, o debate e a implementação dessas alternativas se dão sob o
domínio inquestionável da estrutura disciplinar. Será possível, assim, o salto para a
transdisciplinaridade?
De acordo com Guattari (1992), “A transdisciplinaridade, como movimento interno de
transformação das ciências, aberta para o social, o estético e o ético, não nascerá espontaneamente.
A vida científica internacional fica, freqüentemente, presa a rituais formais, numa
interdisciplinaridade de fachada. Seu aprofundamento implica numa permanente ‘pesquisa sobre a
pesquisa, uma experimentação de novas vias de constituição de agrupamentos coletivos de
enunciação. Não apenas equipes pluridisciplinares devem funcionar, se necessário por períodos às
vezes longos, ou de acordo com ritmos temporais apropriados, como a questão de sua implantação,

64
de seus campos de investigação, da integração de sua atividade com o meio ambiente humano será
freqüentemente discutida.”
No âmbito da educação, temos assistido a experiências que comprovam que não existe ainda
uma prática generalizada, coletiva e institucional de atividades inter ou transdisciplinares e sim
práticas individuais ou de pequenos grupos. Antes de tudo, o que as sustenta é uma atitude
transdisciplinar dos profissionais envolvidos nos projetos. Nessa atitude inclui-se o reconhecimento
do valor da especialização e da importância da contribuição de cada uma das disciplinas, sem
qualquer hierarquia entre elas. Por outro lado, também se reconhece que o conhecimento de cada
disciplina é limitado e que uma compreensão mais ampla de qualquer objeto de estudo só se dá pelo
compartilhamento de informações, o que possibilita a recomposição da unidade do conhecimento.
Nenhuma disciplina ou professor pode se intitular ‘dono da verdade’ e deles se exige uma atitude de
‘humildade intelectual’. Segundo Japiassu (1992), “O desenvolvimento da especialização divide ao
infinito o território do saber, para que cada cientista ocupe, como proprietário exclusivo e privado,
seu minifúndio de saber, ao qual se apega com tremenda vaidade. Ora, à cegueira do especialista, o
homem inteligente opõe a compreensão de situações complexas. E, ao destruir a cegueira do
especialista, o conhecimento interdisciplinar vai recusar o caráter territorial do poder pelo saber, ou
melhor, do mini-poder pelo mini-saber.”
Embora não tenhamos o objetivo de discutir todos os entraves à implantação da
transdisciplinaridade, vale a pena destacar os fatores apontados em Japiassu (1992) como
obstáculos à interdisciplinaridade, que, conseqüentemente, podemos estender à
transdisciplinaridade: “o peso da rotina, a rigidez das estruturas mentais; a inevitável inveja dos
conformismos e conservadorismos em relação às idéias novas e às inovações que seduzem (ódio
fraterno); o positivismo anacrônico que, preso a um ensino dogmático (o que não é histórico é
dogmático), encontra-se à míngua de fundamentos teóricos; a mentalidade esclerosada de um
ensinamento apenas por entesouramento; o enfeudamento das instituições; o carreirismo buscado
sem competência; a ausência de crítica dos saberes fragmentados...”
Para superar esses obstáculos, é preciso correr riscos, quebrar estruturas tradicionais,
abandonar a segurança do conhecido e enfrentar os desafios do novo. Isso, em geral, produz
insegurança entre os professores e torna-se uma dificuldade na implantação dos projetos. Mas,
abrindo-se a um diálogo baseado no respeito às diferenças, é possível ultrapassar as barreiras das
disciplinas e instituir a transdisciplinaridade.
Segundo Japiassu (1992), dentro desse novo paradigma, “o papel do educador não será mais
o de um transmissor de conhecimentos já feitos, mas o de alguém que seja capaz de manter desperto
no educando o princípio da cultura continuada, que jamais poderá ser confinada ao tempo

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escolar./.../ Porque ele é um agente provocador e desequilibrador de estruturas mentais rígidas. /.../
Ensinar a aprender, a se construir ou a se reconstruir : eis o papel do educador. Todo progresso na
educação está na construção do espírito e não em sua domesticação.”
Conclusão
Reconhecendo o valor da especialização, a transdisciplinaridade procura ultrapassá-la
recompondo a unidade do conhecimento e encontrando o sentido inerente à vida. O conhecimento
compartilhado poderá levar a uma compreensão compartilhada baseada no respeito absoluto das
diferenças entre os seres e entre as concepções.
De acordo com Japiassu (1992), são condições para a ocorrência do transdisciplinar: “a) que
o homem inteligente oponha à cegueira do especialista a compreensão de situações complexas; b)
que recuse todo o caráter territorial do poder pelo saber; c) que abandone a concepção de uma
verdade que seria assimilada à busca causal da coisa.”
Em suma, a questão é de uma mudança de paradigma epistemológico. E essa mudança
exigiria uma nova forma de racionalidade, chamada razão transversal, que se caracteriza por um
modo de pensar e agir segundo uma racionalidade em trânsito, instrumento apto a permitir a
compreensão da complexidade do mundo atual. Dessa forma, a transdisciplinaridade se tornaria o
paradigma educacional da pós-modernidade.

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