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A

"I "
A meu irmão, cujos gostos literários e talento como escritor
me inspiraram a ler e me aventurar a criar narrativas de
literatura fantástica desde muito cedo.
A meus filhos, por fazerem nascer em mim o desejo de
inspirá-los e assim me darem a própria inspiração de escrever.
A minha esposa que, com suas "inspiradoras" críticas,
ajudou a tornar a história melhor e sua leitura mais fluída.
Aos primeiros leitores pelos emocionados e entusiasmados
comentários que me inspiraram a seguir em frente.
E por fim, a todos que contribuíram com ideias, opiniões e
sugestões, me inspirando a aperfeiçoar cada curva no caminho
dessa intensa jornada.
R I
Antes de ser transformado neste cinelivro, o roteiro original de
Dragões da Tempestade, em suas versões na língua inglesa,
conquistou vitórias e finais em mais de trinta competições ao redor do
mundo.
“... um filme de ação e fantasia incrivelmente impressionante
que certamente irá agradar aos fãs de O Senhor dos Anéis e
Game of Thrones” – JB, Fresh Voices Screenplay Competition
“... não é comum eu ser completamente surpreendida pelos
becos sem saída e reviravoltas surpreendentes após ter lido
tantos roteiros, mas este me deixou atordoada ... algumas vezes
eu disse ‘Uau!’ em voz alta enquanto lendo” – Jennifer Barbee,
Emerging Screenwriters
“... Várias grandes surpresas no final... Excelente reviravolta
de ‘valer-o-filme’... Uma história excepcionalmente bem escrita
e empolgante” – Barb Doyon, Extreme Screenwriting
“... uma fantástica e emocionante ação e aventura que
combina lendas, tema e momentos de ação excitantes em uma
história que pode atrair facilmente a grande audiência. A
escrita é muito forte... uma habilidade de escrita natural que
absorve imediatamente o leitor... vívida, descritiva e altamente
visual”. – Page Awards
“... antes de tudo, quero dizer que é bastante impressionante
como você construiu este mundo fantástico e criou todos os
personagens ricamente em camadas dentro dele.... No geral, o
roteiro tem muito a seu favor e tem um ótimo conjunto de
personagens e uma inovadora perspectiva em um nível de
fantasia que jamais vimos antes..”. - Script Pipeline First Look
Project
“... é audacioso e traz algumas reviravoltas surpreendentes e
sombrias... na superfície, faz o mesmo de forma diferente para
ganhar um interesse inicial - no entanto, é sua execução
soberba que faz tão emocionante" – Write Movies
“Game of Thrones, Watership Down e A Trilogia do Anel, todos
entrelaçados em uma excitante trama.” – A Film Writer
P
Justin Sloan
L.S. Reis criou uma rica mitologia em DRAGÕES DA TEMPESTADE, que
certamente o atrairá e fará com que você queira virar a próxima página. Tive o
prazer de assistir a jornada de Leonardo e a evolução dessa história, desde os dias
em que participávamos de concursos de roteiro (e ganhávamos!) e dávamos
sugestões no trabalho um do outro. Esta história tem todo o seu coração e alma
derramados nela, e agora que evoluiu para um estilo "cinelivro", estou confiante de
que os leitores sentirão toda a sua paixão nesta história dramática e poderosa, cheia
de ação.
Você será capaz de ver o filme se desenrolando em sua mente. De grandes
guerreiros submetidos a um treinamento intenso, com suas reviravoltas e surpresas,
e uma emocionante história de fundo por trás, uma nova lenda nasce. Esta é uma
história de batalhas épicas e traições, e que ficará com você por muito tempo
depois da última página. Se você gosta de lendas e grandes personagens como eu,
com certeza se sentirá em casa com a nova aventura épica de fantasia de L.S. Reis
- Justin Sloan, é um bem-sucedido autor americano, com mais de cinquenta livros de ficção
científica e fantasia, como as aclamadas séries Shades of Light, Falls of Redemption e The Hidden
Magic Chronicles e roteirista no jogo Game of Thrones da Telltale.
P
Prepare-se para ler um livro de uma maneira que você nunca viu antes.
Um estilo inédito que mistura o melhor da narrativa literária com a estrutura e
as técnicas de contar histórias que fizeram a indústria do cinema bilionária.
Um formato inovador, envolvente, fácil e rápido de ler, que vai fazer você se
sentir assistindo a um filme com os olhos da sua imaginação.
Pegue a pipoca, escolha o melhor lugar e prepare-se para uma experiência nova
e inesquecível com esse verdadeiro "Cinelivro".
Boa leitura! Ou melhor, bom filme!
INDICE
Prelúdio.E
P A
Capítulo 1, M P
Capítulo 2. C
Capítulo 3. A
Capítulo 4. D
S A
Capítulo 5. V M
Capítulo 6. P C
Capítulo 7. O C F
Capítulo 8. B S
Capítulo 9. T
T A
Capítulo 10. Q ?
Capítulo 11. A
Capítulo 12. D
Capítulo 13. P M
Capítulo 14. I
Epílogo. L
C
Pósludio. T
S A
E
PASSAGEM NORTE DE THALDERAN
(P )
O sol lança seus últimos raios por de trás do imponente
Templo dos Dragões. No topo da colina distante, sua silhueta
recorta o horizonte arroxeado, coberto de nuvens relampejantes.
O vento forte acaricia as plumas de ASA AZUL, um corvo azulado
de cabeça e cauda negras, pousado na ponta da mais alta torre do
templo milenar. Os relâmpagos e trovões se intensificam. Uma
forte tempestade se inicia, deixando cair uma rara chuva
avermelhada, como se, dos céus, o próprio Deus Dragão
derramasse lágrimas de sangue sobre a terra.
Acima do farfalhar da tempestade, ecoa uma voz grave, porém
suave. Triste, mas ao mesmo tempo resoluta. Uma voz que emana
a força de um guerreiro junto à placidez de um sacerdote. A voz
de IRMÃ LOBO.
Irmã Lobo: “Escolhas. Podemos definir o valor
de um homem através delas.”
Asa Azul sacode as penas, levanta vôo. Ele sobrevoa o pátio e
plana sobre os grandes portões maciços encravados na muralha
que envolve o templo colossal. O pássaro mergulha sobre uma
rua de paralelepípedos, cercada por prédios baixos e ruas laterais
estreitas, que se espalham por toda a Thalderan, a Cidade Sagrada
dos Antigos. O corvo atinge uma estrada de terra no meio de uma
extensa floresta. Aproveitando uma corrente de ar, bate
fortemente as asas para se lançar alto no céu turbulento. Asa Azul
se aproxima de uma ampla costa. As asas estendidas do pássaro
refletem um brilho levemente azulado quando o fulgor de um raio
as ilumina. Banhado pela tênue luz do crepúsculo, o chão arenoso
entremeado por áreas gramadas estabelece uma larga faixa entre o
mar agitado de um lado e a esparsa floresta do outro. A voz de
Irmã Lobo ecoa novamente.
Irmã Lobo: “Elas marcam o início de cada
jornada e o quão tempestuoso será o seu
caminho...”
O corvo avista uma gigantesca mancha fervilhante, cobrindo
grande parte da imensidão da areia encharcada. Guerreiros.
Milhares deles! O pássaro mergulha em direção às últimas fileiras
do enorme exército. Por alguns segundos ele sobrevoa as lanças,
machados e escudos dos imponentes soldados de pele alva,
enfileirados na extensa praia.
Poucas dezenas de metros à frente do poderoso exército, Asa
Azul avista o vulto de seu GENERAL. Uma rajada de vento move
sua elegante capa de pele de lobo, revelando as costas largas
protegidas por uma suntuosa armadura de batalha, enquanto ele
desce o ornamentado elmo de prata sobre a cabeça, encobrindo
seu rosto. Diante dele, um soldado lhe faz uma reverência e se
ajoelha sobre uma perna para entregar-lhe um longo e pesado,
mas elegantemente desenhado, machado de guerra.
Irmã Lobo: “Elas irão determinar o poder dos
seus inimigos e desafiá-lo com novas escolhas
antes impensáveis...”
Por um breve instante, a imagem de Asa Azul desliza
suavemente, refletida na superfície brilhante do elmo prateado do
General, enquanto ele plana sobre sua cabeça. O pássaro então
mergulha em direção aos quatro homens que se opõem aos
incontáveis soldados e a seu líder. A chuva fustiga o rosto
transtornado do primeiro deles, ZAIROS. Os pulmões do guerreiro
de trinta anos se expandem e se contraem pesadamente. O som de
sua respiração angustiada se mistura com o ruído incessante da
tempestade. Gotas rubras se chocam contra os olhos fechados na
face consumida por um sofrimento torturante. Elas mesclam-se
com suas lágrimas e escorrem como filetes de sangue pelo rosto
cheio de amargura e dor. As veias saltam pelo torso desnudo e
atlético do guardião à medida que seus poderosos músculos se
retesam e suas mãos apertam cada vez mais o cabo da espada
imponente, assim como a alça do escudo redondo de madeira, de
borda e centro metálicos.
Quando a sombra de Asa Azul desliza por um segundo sobre
seu rosto, Zairos parece despertar de um transe. Seus olhos se
abrem repentinamente. O coração parece explodir em seu peito. A
respiração se acelera em um misto de fúria e inconformidade
enquanto fita o General que o desafia a apenas alguns metros à
sua frente.
Irmã Lobo: “Suas consequências poderão fazer sua
alma queimar em sofrimento, remorso e ódio. Fazê-
lo questionar a tudo e a todos.”
O corvo pousa no cajado do velho Sumo Sacerdote, FEIGON,
postado próximo a Zairos. Sem se incomodar com a forte chuva
avermelhada, o ancião abaixa o capuz de seu manto escuro. Ele
levanta lentamente a cabeça calva, revelando os estreitos olhos
amendoados e a longa barba branca em trança.
Alguns metros atrás, PEQUENO URSO, um guerreiro de
tamanho descomunal, pele negra e expressão infantil, aperta as
mandíbulas com força. Em um movimento involuntário ele
balança a cabeça sem cabelos de um lado para o outro, comprime
a boca, franze a testa. Músculos contraídos, ele ergue o pesado
martelo de guerra e dá um passo a frente. Uma mão firme segura
seu ombro e o interrompe. Por trás do braço musculoso
atravessado por uma longa cicatriz, JYGAR, um guerreiro de
meia idade e aparência poderosa, olha firme para o gigantesco
companheiro, para então sacudir a cabeça em um lento não.
Pequeno Urso bufa contrariado e baixa o rosto, como uma criança
zangada, mas se aquieta imediatamente.
Irmã Lobo: “No entanto, elas também revelarão
a grandeza daqueles que sempre lutarão a seu
lado...”
Zairos mantém os olhos, cada vez mais intensos, fixos no
homem à sua frente, que mantém o rosto conhecido escondido
sob o elmo e a cabeça baixa, sem devolver-lhe o olhar. O enorme
exército, ainda que inquieto, permanece formado às costas de seu
General, que se mantém impassível. O guerreiro desvia o olhar
para Feigon, mas as palavras rituais do Sumo Sacerdote são
abafadas pelo som da tempestade. Quando ele encerra sua última
frase, os olhos do guerreiro se viram para a bela senhora próxima
a seu oponente, LISSA.
Trajando um manto azul claro em suave contraste com o
branco de sua coruja, GLACIA, pousada em seu ombro, a
sacerdotisa segura um longo cajado, finamente esculpido. Em
seus lábios, Zairos lê as palavras cerimoniais finais, que tantas
vezes já escutara: “Que o duelo comece!”.
Como um animal enfurecido se libertando das correntes, ele
parte impetuosamente em direção ao adversário. Enquanto a
chuva vermelha escorre lentamente sobre os músculos de seu
corpo, o vento atinge seus ouvidos como o rugido enfurecido de
um dragão.
Irmã Lobo: “Escolhas... Elas podem escrever
com sangue seu nome nas páginas da História,
sussurrar sua lenda nos Ventos da Eternidade.”
Em frente ao exército imóvel, seu comandante ergue o longo
machado na diagonal, aguardando. No exato momento que Zairos
entra no alcance do golpe, o General inicia o ataque. A pesada
arma descendendo velozmente contra o oponente. Desferindo um
golpe feroz com a beirada do escudo contra a mão do agressor,
Zairos interrompe o movimento. Com o punho da espada, acerta
em cheio sua outra mão, fazendo-lhe largar por completo o
machado. Imediatamente, com um violento chute, empurra o
peito do General, lançando-o fortemente de costas contra o chão.
Zairos salta sobre o adversário caído e, com o joelho, pressiona
seu peito ofegante. Furioso, empurra o metal da borda do escudo
contra a base de seu pescoço, enquanto toca a ponta da espada
afiada em sua garganta, manchando-a com uma gota de sangue.
Ele grita com uma fúria insana, cada vez mais intensa.
Zairos: “Você enlouqueceu? Eu ter perdido tudo
não foi suficiente?”
Através da fresta do elmo, o General o olha de volta, sem
demonstrar medo algum.
Zairos: “Por quê? POR QUÊ?”
General: “Apenas para te dar a chance de
escolher.”
Zairos: “Escolher? Eu não tenho escolha agora, a
não ser matar você!”
General: “Não! Agora você pode fazer a escolha
que devia ter feito há muito tempo. A escolha
certa!”
O rosto de Zairos congela. Ao som dos trovões, ele ergue a
cabeça para o céu tempestuoso, enquanto tenta entender o real
sentido daquelas palavras. A chuva rubra para de cair. Seus olhos
vidrados refletem a luz dos relâmpagos, seguido por nuvens cujos
contornos se deslocam e graciosamente se unem ao sabor do
vento para assumir o formato da cabeça de um dragão.
Delicadamente, um pequeno turbilhão dissipa parte delas, abrindo
uma fenda arredondada em seu meio, revelando a lua cheia por
detrás, como se um olho brilhante se abrisse na face do dragão
desenhado nos céus, apenas para observar Zairos, como se
aguardasse sua decisão.
Irmã Lobo: “Para isso, os deuses colocarão o
destino do mundo em suas mãos e lhe
perguntarão: Qual é a sua escolha?”
Com a lua brilhante refletida em seus olhos vidrados, sob as
luzes de uma rajada de relâmpagos e ao som de seus trovões,
Zairos faz sua escolha.
Capítulo 1

M P
VINTE ANOS ANTES...

PASSAGEM NORTE DE THALDERAN


(D )
A escuridão total vai se transformando em uma borda branca em
torno de um círculo esverdeado quando os olhos de um menino
abrem-se de repente. A luz do sol faz com que a pupila se contraia
rapidamente, aumentando a área verde da íris ao seu redor. O olho
se fecha veloz e depois se abre de novo, só que lentamente
agora. Desta vez, o olho recém-aberto encontra os olhos duros de
TORIUS, um homem de uns trinta anos, curvado sobre ele. O olho
se fecha novamente, com força. Torius mexe a cabeça de um lado
para o outro e um sorriso malicioso surge enquanto ele observa a
criança indefesa, deitada diante dele. Zairos (então com 10 anos)
repousa encolhido em cima de uma pilha de peles sobre uma
pequena carroça estacionada em uma praia. O homem estende suas
mãos fortes em direção à garganta da criança.
Torius: “Você sabe o que eu tenho que fazer,
não sabe? Por favor, me perdoe por isso.”
Os dedos grossos alcançam o pescoço de Zairos e começam a
executar o plano traçado... cócegas! Torius mantém seu grande
sorriso enquanto faz cosquinhas em seu filho. O menino começa a
soltar pequenas gargalhadas, apertando as pálpebras cada vez mais
para mantê-las cerradas.
Torius: “Qual é a sua escolha, filho? Ficar
dormindo ou acordado para curtir este lindo
dia de sol?”
Zairos: “Não, não, papa! Deixe-me
dormir! Por favor, por favor!"
Torius: “Escolha errada!”
Torius intensifica as cócegas enquanto Zairos tenta sem sucesso
bloquear as mãos de seu pai. Seu corpo se contorce e se enrola. Ele
ri cada vez mais alto enquanto seus olhos se esforçam cada vez
mais para não abrirem.
Torius: “Acorde! Vamos nos divertir antes de
pegar a estrada novamente.”
Mais cócegas. Mais risadas. O menino arregala os olhos e agarra
os pulsos do pai.
Zairos: “Você venceu, você venceu! Eu
escolho o dia ensolarado!”
Torius interrompe o “ataque”, seu rosto demonstrando
entusiasmo.
Torius: “Haha. Agora você fez a escolha
certa!”
O garoto salta da carroça e os dois ficam lado a lado para olhar
com calma o oceano não tão calmo à sua frente. Grandes ondas
quebram contra a costa. O menino abaixa os olhos.
Zairos: “Talvez eu tenha sido a escolha
errada.”
O homem alto dá um passo à frente e se vira para o filho,
posicionado entre ele e o mar. Seus olhos úmidos se encontram, e
ele segura carinhosamente os ombros de Zairos.
Torius: “Ei! Nunca diga uma coisa dessas
novamente. Também sinto falta dela e
sempre vou amar sua mãe, mas ela tomou a
única decisão que uma mãe amorosa podia
tomar. Eu fiquei muito confuso na época,
mas todos os dias, toda vez que te olho, sei
que você foi a escolha certa.”
Com um salto, emocionado, Zairos abraça o pai. Ambos choram
enquanto mantém os braços afetados em torno um do outro. Com
uma das bochechas pressionada contra o braço do pai e a outra
servindo de caminho para suas lágrimas, o menino olha para o
oceano. Uma grande onda bate contra um grupo de rochas, fazendo
a água espumante explodir em volta dela.
CLAREIRA DO LUAR
(N )
A lua nova banha em prata a densa floresta que circunda uma
pequena clareira arredondada. Chamas crepitam enquanto assam
um gordo javali sobre uma fogueira alta, dois gravetos bifurcados
grossos sustentando o animal. Ao redor do fogo, na clareira,
quatro caçadores axengardianos comem a caça recém abatida. O
mais feio deles, CICATRIZ, um homem alto e magro, na casa dos
quarenta anos e com quatro de cicatrizes paralelas na diagonal da
bochecha, está conversando com outros três, sentados à sua
frente.
Cicatriz: “… então eu desviei de mais um
golpe. As garras afiadas do monstro
sanguinário chegando cada vez mais e mais
perto.”
KODI e KEDI, dois jovens caçadores gêmeos, prestam atenção a
cada palavra enquanto o terceiro homem sentado, ALBAX - um
albino musculoso de meia-idade - tenta conter o riso. Sem muito
sucesso, ele balança a cabeça negativamente para em seguida
abocanhar um grande pedaço de carne.
Um CARDEAL VERMELHO pousa em um galho baixo, próximo
a uma das árvores altas ao redor da pequena clareira, como se
estivesse se juntando a eles para também ouvir a história.
Cicatriz: “Aí a fera me encurralou na beira
de um penhasco e...”
O caçador albino levanta uma sobrancelha.
Albax: “Encurralado na beira de um
penhasco? Cada vez você se supera mais.”
Cicatriz olha para o amigo, que o fita de volta com um sorriso
irônico e a cabeça ainda balançando negativamente. Os gêmeos
mantêm o olhar sobre o contador de histórias, que arregala os olhos
e inclina seu corpo em direção ao seu público.
Cicatriz: “Com muito sangue frio, eu dei um
passo para trás e fiquei bem na beira do
precipício, encarando os olhos quase
humanos da criatura.”
Cicatriz interrompe por um instante a narração para assoprar um
bafo quente e fedorento no rosto de Kodi e Kedi. Os jovens se
contorcem e contraem os rostos em desgosto.
Kodi: “Pelo Fogo Sagrado dos Antigos
Dragões! Que diabo é isso?"
Cicatriz abre as mãos em um movimento teatral.
Cicatriz: “Sim, rapazes! Quando a besta
abriu suas presas tão perto de mim, eu inalei
o terrível hálito da morte...”
Albax: “Sério isso?”
Desta vez, o narrador ignora seu companheiro sarcástico.
Cicatriz: “... e esperei calmamente enquanto
a furiosa criatura saltava em minha direção,
pronta para arrancar minha cabeça com um
golpe de sua pata... olhei mais uma vez para
o seu pai, ainda inconsciente no chão.”
Cicatriz faz uma pausa dramática. Ansiosos pelo desfecho, os
jovens caçadores olham para ele de forma apreensiva.
Albax: “Pela merda divina dos dragões,
acabe logo com essa baboseira!”
O homem com cicatrizes no rosto se volta raivoso para seu
companheiro resmungão.
Cicatriz: “Seu herege!”
Ele volta a atenção para Kodi e Kedi.
Cicatriz: “Quando suas garras afiadas
arranharam minha bochecha, eu pulei da
frente dela, ágil como um gato
selvagem. Surpreso com o meu movimento
acrobático e inesperado, o monstro foi
incapaz de parar o seu avanço. Com um
sorriso no rosto, eu assisti com o coração
acelerado a criatura cair naquele precipício
profundo, direto para os braços da morte.”
Cicatriz esboça um sorriso orgulhoso enquanto passa os dedos
pelas marcas em seu rosto.
Cicatriz: “E foi assim que ganhei essas
cicatrizes: matando o lendário Bestafera para
salvar a vida do seu pai.”
O albino retruca, com a boca ainda cheia de carne.
Albax: “E ao ouvir essa história disparatada,
foi como eu fiquei branco assim. Branco de
vergonha pelo resto da vida.”
Os gêmeos caem na gargalhada. Cicatriz olha zangado de novo
para Albax, que sorri e grita, cuspindo sem querer o resto da carne
mastigada em sua boca.
Albax: “Pelas presas da Loba Gigante,
Cicatriz! Pelo menos respeite os
mortos. Nosso velho amigo deve tá se
revirando no túmulo agora.”
Cicatriz aponta para as marcas em seu rosto.
Cicatriz: “Você sabe que essas marcas foram
feitas por um animal feroz!”
Albax: "Sim, uma mulher que ficou muito
feroz depois que você fez o que não devia
com esse negocinho miúdo que você tem no
meio das pernas!"
Albax ri mais uma vez e os jovens caçadores se juntam a ele
novamente.
Kodi: “Ahh. Essa é a história que papa nos
contou!”
Cicatriz: “E seu papa lhe contou como ele
ficou com o nariz torto naquela mesma
noite?”
Kedi para de rir e abaixa a cabeça. A risada de seus
companheiros desaparece.
Kedi: “Sim, ele contou. Sinto falta das
histórias dele; sinto falta dele rindo enquanto
contava elas pra gente.”
Kodi: “O quão perto nós estamos?”
Cicatriz se aproxima de Kedi e Kodi. Ele se inclina sobre eles e
coloca as mãos em seus ombros.
Cicatriz: “Aquele desgraçado mexeu com os
caçadores errados. A gente rastreou o
miserável até aqui e vamos pegá-lo muito,
mas muito em breve.”
Albax: “Vocês sabem que seu pai era um
irmão para nós. Encontraremos aquele
maldito assassino e vamos trucidar o
desgraçado. Eu prometo a vocês, garotos.”
De repente, o contador de histórias coloca as mãos na própria
barriga e faz uma careta. Um ruído emerge de seu estômago
seguido por um pequeno estalido vindo da floresta. O Cardeal
Vermelho voa para outra árvore.
Cicatriz: “Eu ouvi alguma coisa. Vou dar
uma olhada”
Ele caminha rapidamente em direção ao ponto do som que veio
da floresta em torno deles e desaparece da visão dos seus
companheiros assim que a adentra um pouco.
Albax: “Sim, você ouviu algo: o chamado da
natureza! Agora você vai espalhar o
verdadeiro cheiro do medo e fazer com que
filho da puta cague nas calças com esse fedor
de merda.”
Os jovens caçadores não se juntam ao albino dessa vez, mas ele
continua rindo. Um grito interrompe sua risada. Outro grito se
segue. Eles os reconhecem: são de Cicatriz.
Kodi pega sua lança do chão. Seu irmão desembainha uma
longa adaga. Machado na mão, Albax dispara em direção ao lugar
onde seu amigo entrou na floresta. Kedi o interrompe.
Kedi: “A Bestafera?”
Albax: "Não, o assassino do seu pai."
As sombras da noite envolvem Albax assim que ele passa pela
primeira linha de árvores que fazem fronteira com a clareira. Os
jovens irmãos vêem quando a figura de um adolescente, com pele
escura e cabelos densos e esbranquiçados, salta em suas costas,
jogando Albax de cara contra o chão. O agressor, OLHO DA
NOITE, atravessa uma das pontas de sua lança de lâminas duplas
na parte traseira da coxa de Albax, que grita de dor. Olho da
Noite sussurra na orelha do albino conforme pressiona o rosto do
caçador contra o solo com uma de suas mãos.
Olho da Noite: “Comecei com você, meu
amigo, mas eu quero que você seja o
último.”
Kodi dispara em direção a Olho da Noite. Kedi o segue. O
primeiro tenta um ataque de perfurante com a lança. Olho da Noite
desvia o golpe, e imediatamente contra-ataca com a lâmina de sua
lança, executando um corte preciso na jugular do adversário. Com
as duas mãos e sem sucesso, o jovem caçador tenta parar o
sangramento. Ele engasga enquanto cai de joelhos e em seguida
desaba no chão.
Kedi: “Nããão!”
Segurando a adaga sobre a cabeça, a ponta mirando em Olho da
Noite, Kedi pula sobre o assassino de seu irmão e de seu pai. Com
um movimento rápido, Olho da Noite atravessa a garganta do
jovem com sua lança. Com uma das mãos, ele empurra a cabeça de
seu oponente morto para trás enquanto puxa sua arma de volta com
a outra.
As nuvens no céu tempestuoso se abrem para permitir que os
raios da lua cheia iluminem as costas escuras de Olho da Noite, o
corpo musculoso parcamente coberto pelas roupas tribais do Povo
da Floresta. O luar também revela a natureza de seus cabelos
brancos, albinos e crespos como os de Albax. Relaxado, o jovem
guerreiro descansa sua lança ensanguentada em seus ombros largos
enquanto segue a trilha avermelhada deixada por sua última presa,
o único sobrevivente. Tomado pelo horror, Albax rasteja para
longe, arrastando sua perna coberta de sangue e imóvel em direção
ao rio que corre veloz logo à frente. Alcançá-lo, apenas alguns
metros adiante, parece ser sua única chance de escapar. Confiante
com a proximidade do rio, o albino rasteja cada vez mais
rápido. De repente, o medo toma sua mente e o faz se virar,
procurando por seu inimigo. Nada! Ele não está mais lá. Albax olha
para frente novamente. Seu rosto se contorce quando o peito do pé
de seu predador atinge seu rosto, fazendo seu corpo girar no
ar. Suas costas se espatifam no chão. Zonzo e assustado, ele fecha
os olhos e respira pesadamente enquanto espera pela morte.
Olho da Noite: “Olhe pra mim!”
O caçador, assustado, aperta os olhos ainda mais. Com uma voz
calma e suave, o assassino de seus amigos fala com ele.
Olho da Noite: “Você não quer saber o
quanto eu pareço contigo?”
Hesitante, Albax abre os olhos e treme ao ver o rosto ameaçador
à sua frente. No jovem e endurecido rosto de Olho da Noite, um
olho cego e esbranquiçado, coberto por veias vermelhas parece
olhar de volta para o homem amedrontado. Seu olho leitoso parece
ainda mais vívido e ameaçador que seu par enegrecido. O caçador
tenta desviar o olhar, mas o cabelo albino de seu algoz chama sua
atenção, o mesmo branco amarelado que o seu. Albax abre um
sorriso nervoso, involuntário. Seu agressor o surpreende com um
largo sorriso de volta.
Olho da Noite: “Você conhece a Antiga
Profecia... pai?”
Albax: “Pai? Pai? Eu sou seu..."
Olho da Noite: “Sim... E eu sou grato ao
maldito Deus Dragão por isso. Graças a você
meu nome é Olho da Noite, foi você que me
fez ser quem eu sou. E agora eu conto
contigo mais uma vez para me ajudar a me
tornar o IMORTAL.”
Albax: “O imortal da profecia, minha própria
carne e sangue!? Claro que você pode contar
comigo, filho!”
Olho da Noite beija com ternura a testa de seu pai. Albax lhe dá
um sorriso envergonhado. Seu filho sorri de volta. O albino sente
seu medo começando a se dissipar enquanto o guerreiro ameaçador
agora o fita com olhos calmos e calorosos. Com algum alívio,
Albax dá uma risada leve. Um segundo depois os dois estão rindo
juntos, como grandes amigos, como pai e filho, muito felizes por
finalmente se encontrarem. O som de felicidade termina
abruptamente em um baque seco. Gotas vermelhas salpicam o
rosto pálido de Albax e sua cabeça rola para o lado, separada de
seu corpo.
Olho da Noite: “Sim, sua própria carne e...
sangue! Nunca duvidei que pudesse contar
com você, pai.”
Olho da Noite levanta a cabeça de seu pai pelo queixo, aperta a
mandíbula morta e a faz distorcer-se, como se estivesse gritando de
horror. Com orgulho, ele começa a declamar a profecia para o rosto
sem vida.
Olho da Noite: “Sob a Lua Ancestral, com o
sangue de sua própria família nas mãos, o
Imortal irá se erguer...”
No galho logo acima deles, com um sacudir de penas, o Cardeal
Vermelho decola e dispara veloz por entre as árvores.

ESTRADA VERMELHA
(D )
O pequeno pássaro voa velozmente pelo interior da floresta.
Os primeiros raios de sol atravessam a folhagem, iluminando as
árvores a sua frente. Batendo rápido as asas, ele dispara em
direção ao céu e emerge em uma estrada de terra avermelhada,
entrecortando a floresta. Do alto, ele avista uma velha carroça
cheia de peles de animais. Torius conduz a carroça ao lado de
Zairos. O menino mantém o cenho franzido enquanto fala.
Zairos: “Ele irá arrastar os Guerreiros do
Dragão pelas portas da morte para trazer a
guerra derradeira, para esmagar o coração do
homem… O fim das Três Nações.”
Torius: “Irmã Lobo não devia ter te contado essa
história. Do que você tem tanto medo?”
Zairos: “Não é uma história. É uma profecia! E eu não
tenho medo.”
Torius: “Não?”
Zairos: “Claro que não tô com medo.”
Torius: “Não? Nem um pouquinho?”
Zairos: “Tá bem. Talvez um pouquinho.”
Torius: “Bem, a profecia não é clara como a água do
Rio de Prata. Ela é mais nebulosa, sabe? Algo como a
neblina da Floresta das Brumas. Talvez ela não seja
assim algo tão ruim, concorda comigo?”
Zairos: “É sobre um assassino que não pode ser morto,
Papa! Um homem que vai mandar os Dragões da
Tempestade para o reino dos mortos e começar uma
guerra que vai destruir os Três Reinos! Como isso pode
não ser muito ruim?”
Torius: “É... eu confesso que pode ser difícil encontrar
esperança nessas palavras que parecem tão
assustadoras, mas pelo menos a próxima Lua Ancestral
vai levar ainda muitos ciclos do sol para aparecer no
céu. Então que tal a gente esquecer isso até lá?”
Zairos: “Esquecer? Se eu fosse um Dragão da
Tempestade eu acabava logo com isso, antes que ELE
virasse o Imortal!”
Torius: “Ele quem?”
Zairos: “Você sabe.”
O pai sorri para o filho, que baixa a cabeça com ar de
preocupação. O cardeal então assobia algumas notas enquanto
passa diante do rosto do menino. Com um sorriso, Zairos
acompanha o passarinho disparar por entre as árvores, voando
baixo por um pequeno caminho lateral, com uma extensa clareira
em seu final. Os olhos alertas de Zairos procuram ansiosamente
por algo na clareira à frente, enquanto Torius guia a carroça pela
estreita trilha.

CLAREIRA DO RIO DAS BRUMAS


( )
Um calmo e largo rio atravessa a verdejante clareira. Feixes
de raios de sol encontram caminhos através da copa das árvores
que a cobrem, produzindo tons de arco-íris ao serem refratados
pelas gotículas da névoa muito suave que envolve o local.
Torius e Zairos contemplam com alegria a beleza quase
mágica da clareira e são imediatamente tomados por uma
sensação de paz e tranquilidade. De repente, o menino avista
algo, arregala os olhos.
Zairos: “Olha, papa! A eremita! A sacerdotisa
guerreira!”
Ao longo da margem do rio, IRMÃ LOBO corre de encontro a
um lobo de verdade. O manto desgastado parece dançar ao vento
enquanto os poderosos músculos aceleram o corpo mulato da
sacerdotisa a uma velocidade impressionante, enquanto a mulher
e a fera disputam para alcançar algo muito pequeno,
avermelhado, que se mexe em um ponto equidistante no chão
entre os dois. Irmã Lobo chega ao alvo um segundo antes do lobo
e se abaixa, protegendo a pequena criatura com o braço, enquanto
encara o animal rosnando a sua frente. O lobo congela e, por
alguns segundos, olha fixamente nos olhos determinados da
eremita. Zairos assiste com assombro quando o rosnado se
transforma em um choramingo e o animal dispara de volta para o
interior da floresta. A eremita pega nas mãos a pequena criatura
rubra diante dela.
O pai estaciona a carroça enquanto o menino olha maravilhado
para a mulher alta de cabelos volumosos dispostos em grossos
cachos desgrenhados. Eles descem ao encontro da eremita. Zairos
corre na frente.
Torius: “Irmã Lobo! Bom te ver de novo.”
A eremita se vira, e com um sorriso, encontra Zairos, agitado e
com olhos curiosos, logo a sua frente e Torius um pouco atrás.
Irmã Lobo: “Olá, Torius, olá, Zairos! Olha como
você está grande. Está quase do tamanho do seu
pai.”
Zairos: “Eu tô sim, hahaha… mas o que vai ser
mesmo grande agora é descobrir o que você tá
segurando aí.”
A velha amiga lhes mostra um filhote de passarinho, um
cardealzinho vermelho com suas primeiras plumas, piando.
Sorridentes, pai e filho abaixam a cabeça para olhar a criaturinha
de perto.
Torius: “Que bonitinho. Pena que seja tão frágil.
Acho que ele não vai conseguir viver sem a mãe
dele.”
Irmã Lobo mexe uma das pernas e esboça uma cara fingida de
dor enquanto ergue os olhos em direção a um ninho em um galho
alto.
Irmã Lobo: “Se pelo menos eu não tivesse
torcido meu joelho…”
Torius pisca para o filho com um sorriso.
Torius: “E eu não fosse tão velho...”
O menino imediatamente retira um lenço do bolso e o usa para
fazer uma pequena trouxa. Ele coloca o filhote dentro dela e corre
carregando com cuidado o embrulho até a árvore. Zairos segura
com firmeza a trouxinha com os dentes. Ele olha para cima e em
um salto ágil se agarra em um galho baixo. Com habilidade ele
escala a árvore com facilidade. Ao chegar ao ninho, a mãe o
sobrevoa ansiosa, enquanto ele coloca carinhosamente o
passarinho de volta ao lar. Rapidamente ele desce pela árvore e
com um sorriso orgulhoso estampado no rosto, caminha até onde
seu pai e a eremita o acompanham com rostos também
orgulhosos.
Zairos: “Ele precisa da mãe… Todo mundo
precisa.”
O sorriso do menino se esvaece. Ele abaixa o rosto enquanto
tristes lembranças invadem sua mente.
Zairos: “Você devia ter escolhido ela…”
Irmã Lobo: “Eu sinto muito, Zairos… eu queria
ter podido salvá-la também, mas seu parto foi
um grande desafio, e entre vocês dois, claro, sua
mãe escolheu você, seu menino especial, o
presente dela para o mundo.”
Zairos ergue os olhos. Torius nota que eles estão úmidos.
Torius: “Falando de pessoas especiais, que tal
aquela história que você prometeu tantas vezes
ao garoto?”
A tristeza começa a abandonar o rosto de Zairos quando Irmã
Lobo concorda com um sorriso e se abaixa para pegar seu cajado
de madeira no chão. Os olhos do menino ganham um brilho de
curiosidade e empolgação enquanto eles caminham para uma área
arenosa. Assim que chegam lá, Irmã Lobo começa a desenhar um
mapa na areia: três grandes cidades, distantes umas das outras.
Irmã Lobo: “Três grandes nações, três grandes
povos!”
A sacerdotisa guerreira desenha obstáculos naturais separando
as três cidades.
Irmã Lobo: “O mar, as montanhas e uma densa
floresta separam as Três Grandes Cidades...
Axengard na Costa de Gelo ao norte, Solfira nas
Montanhas de Ferro do leste...”
A eremita faz uma pausa e olha orgulhosa para o rio próximo a
eles, correndo calmamente em direção ao sul, suas águas cristalinas
desaparecendo dentro da bela e densa selva.
Irmã Lobo: “... e no verdejante sul, Brummata,
lar dos meus ancestrais, lar do Povo da Floresta.”
Logo, seus olhos estão de volta à areia e lá ela delineia pequenas
cidades ao redor das três grandes.
Irmã Lobo: “Estas são as Primeiras Cidades!
Carregando o nome de suas capitais, cada uma
das Três Nações era composta de cidades e vilas
independentes. Cada povo unido pelo ódio
contra as outras cidades e pelo desejo de
conquistar seus inimigos. Mas, em meio a eles,
brilha um raio de luz e esperança.”
Irmã Lobo desenha Thalderan no meio do mapa, como um
eixo central ligando as três nações inimigas.
Irmã Lobo: “Aqui, bem no meio, está Thalderan,
a Cidade dos Antigos, a Cidade Sagrada do Deus
Dragão. Lá, e somente lá, as pessoas dos Três
Povos vivem em paz e harmonia.”
Ela traça uma estrada permeando as montanhas e a vegetação,
começando em cada uma das Primeiras Cidades e chegando à
Thalderan.
Irmã Lobo: “Localizado no meio delas, ela
funciona como um portão central para a entrada
nos Três Reinos. Para chegar às cidades
inimigas, as nações precisam atravessar uma das
três passagens que margeiam Thalderan. Para
fazer isso, eles precisam derrotar um de seus
campeões.”
Zairos: “Mas os únicos guerreiros em Thalderan
são seus poucos campeões. Eles não podem parar
um exército inteiro. Por que as nações
simplesmente não passam por cima deles?”
Irmã Lobo: “O Pacto do Dragão! Um antigo
tratado imposto aos homens pelo Deus da
Tempestade.”
Zairos: “Ahhh, o Deus Dragão... Mas ainda não
entendo. Por que as nações querem guerra? Por
que todo esse ódio? O que começou isso tudo?
A sacerdotisa se abaixa e pega um punhado de areia do chão.
Conforme ela a deixa cair, uma animação, quase mágica, começa
na areia, formando a figura de um enorme lobo dourado com
listras escuras e olhos flamejantes.
Irmã Lobo: “O primeiro grande conflito foi nada
menos do que o assassinato de uma divindade, a
Deusa da Lua do Povo da Floresta. Ou, como
Axengard a chamava, a Loba Demônio."
Mais areia cai e o desenho mostra a loba cercada pelos
cadáveres abatidos de muitos caçadores axengardianos, exceto
um. O homem musculoso atinge o crânio do lobo com um
magnífico machado longo e pesado.
Irmã Lobo: “Sob a lua cheia, o Grande Caçador
de Axengard, gravemente ferido, viu seus
homens morrerem por suas presas e garras.
Tomado por uma fúria incontrolável, ele ergueu
o Machado Celestial, roubado do povo de
Solfira, e matou a fera divina.”
A areia se transforma em uma floresta, com o Grande Caçador
caindo de seu cavalo. Um guerreiro de Brummata salta de uma
árvore, jogando uma lança em seu peito, onde outra já está
cravada. Empoleirados nas árvores ao redor, os outros homens da
floresta fazem o assassino de sua deusa se tornar uma presa
indefesa.
Irmã Lobo: “O Matador de Feras, Axengard
passou a chamá-lo. Ele foi proclamado um herói
na nação do norte, enquanto Brummata ansiava
por vingança. Depois de muitos fracassos, uma
emboscada finalmente transformou o Grande
Caçador na grande presa, com o coração
trespassado pelas lanças dos guerreiros da
floresta.”
No chão surge o desenho de um rei bebendo em uma taça com
um homem de pele escura morto a seus pés, ao lado de uma taça
caída. O rei sorri para a mulher de olhos amendoados que o
abraça, com uma adaga na mão, pronta para apunhalá-lo nas
costas.
Irmã Lobo: “Com a guerra iminente, o
Imperador de Solfira enviou sua embaixatriz a
Axengard sob o pretexto de conseguir paz. Mas
depois de seduzir os líderes inimigos, ela
cumpriu sua verdadeira missão e os assassinou.”
A areia se espalha para formar homens chicoteando escravos,
sob o olhar desesperado de uma velha mulher ajoelhada,
chorando abraçada ao corpo esquelético de seu filho.
Irmã Lobo: “Famintos por poder e vingança, os
governantes escolheram um caminho de
dominação, intolerância e ódio. Logo, vilas e
cidades dos Três Reinos foram devastadas pela
escravidão e pela fome.”
No solo arenoso, uma milícia se forma atacando sem piedade
pessoas que correm apavoradas por uma vila em chamas.
Irmã Lobo: “Ataques de grupos revoltosos
atravessaram as fronteiras aumentando ainda
mais o ódio e a destruição. Então, quando o
desespero explodiu em uma ira incontrolável, ela
veio.”
O terreno muda para mostrar os exércitos dos Três Povos em
uma batalha feroz. Armas se chocam, cadáveres espalhados sob
os pés dos combatentes enquanto novos caem por suas espadas,
lanças e machados.
Irmã Lobo: “Guerra! Por mil anos, as nações
estiveram envoltas em uma carnificina sem fim.”
A areia cai e substitui o desenho dos exércitos por vários
sacerdotes ajoelhados, orando dentro de uma caverna, um
relâmpago iluminando sua entrada.
Irmã Lobo: “Tendo sua fé como sua única arma
contra a guerra, dia e noite os Sacerdotes
Dragões oravam ao poderoso deus. Depois de
incontáveis preces, finalmente eles tiveram uma
resposta dos céus.”
O Deus Dragão surge na areia. Diante dele, os sacerdotes, de
joelhos, abaixam as cabeças baixas em reverência.
Irmã Lobo: “Relâmpago. Trovão. E lá estava ele:
Ghoddrak, O Deus Dragão da Tempestade.”
O dragão abre as asas. A caverna desaparece e os poucos
sacerdotes se transformam em muitos guerreiros, suas figuras
curvadas espalhadas em volta da sagrada criatura.
Irmã Lobo: “Em meio a uma violenta
tempestade, ele desceu em um vórtice de
relâmpagos sobre o campo de batalha dos
homens. Adorado e temido por todos, ele fez
com que as guerras parassem. Porém, a guerra
não podia ser retirada do coração do homem, e
ele sabia que, quando se fosse, os tempos de
guerra voltariam. Então, Ele criou... O Pacto!”
A areia muda para dois guerreiros em combate. Alguns
soldados estão atrás do primeiro, em frente a uma pequena aldeia
axengardiana enquanto incontáveis guerreiros de Brummata
permanecem atrás do outro lutador.
Irmã Lobo: “Se uma cidade ameaçada quisesse a
paz, seu melhor guerreiro poderia defendê-la em
um duelo um a um até a morte. O vencedor
poderia escolher a paz, e enviar de volta o
exército do desafiante por um ciclo do sol, ou
guerra, para sempre abrindo aquele portão para
seus soldados.”
Sem vida, o guerreiro de Brummata jaz sob os pés de seu
oponente. O vencedor permanece com as armas em mãos
enquanto o exército inimigo dispara contra ele e seus
companheiros.
Irmã Lobo: “Mas quando um campeão do norte
escolheu a paz para proteger sua aldeia natal, o
Povo da Floresta atacou mesmo assim,
quebrando o pacto e desafiando o Deus Dragão.”
Um sol eclipsado por uma chuva torrencial toma forma na
areia enquanto o Deus Dragão cospe fogo sobre o enorme
exército.
Irmã Lobo: "Uma grande tempestade começou, e
as chamas de Ghoddrak queimaram os corpos e
almas dos guerreiros de Brummata,
transformando-os em cinzas e fumaça."
O líder derrotado, ainda vivo, implora de joelhos por perdão
diante do Deus da Tempestade ao mesmo tempo em que o
Campeão do Norte se aproxima Dele.
Irmã Lobo: “ ‘O pacto foi honrado e, depois do
que aconteceu aqui, sempre será’, pensou o
campeão da aldeia. Mas o que iria acontecer com
as cidades pacíficas sem um campeão como ele
para protegê-las? Ele indagou ao Deus Dragão.”
Ghoddrak tem a colossal cabeça virada para aquele que, em
sua traição, comandara o Povo da Floresta para a morte, ainda
ajoelhado, ainda suplicando por perdão.
Irmã Lobo: “Olhando para o desespero do
Regente de Brummata, Ele encontrou a resposta.
O regente de joelho se levantaria como Seu
sacerdote, para criar campeões da paz, os
Dragões da Tempestade! Esta nova ordem de
guerreiros sagrados daria às cidades pacíficas de
todas as nações uma chance de escapar dos
horrores da guerra.”
Um martelo de guerra, duas espadas gêmeas e um conjunto
formado por uma espada e um escudo redondo, todos envoltos em
chamas, se desenham na areia.
Irmã Lobo: “Ghoddrak então adentrou uma
caverna próxima e derramou seu fogo azul em
suas paredes. Assim, armas sagradas emergiram
da rocha derretida.”
De cada uma das Três Nações, um sacerdote conduz uma
criança até os portões do templo, onde o Sumo Sacerdote de
Thalderan os espera.
Irmã Lobo: “A casa deles, o Templo do Dragão,
em Thalderan. Seus mestres, os melhores
guerreiros das Três Nações. Seus primeiros
membros, três crianças órfãs, uma de cada
povo”.
Três guerreiros ainda muito jovens treinam no jardim de um
templo com as Armas do Dragão nas mãos.
Irmã Lobo: “Então, cada jovem foi treinado para
ser implacável e feroz como uma violenta
tempestade. Nobre e poderoso como um
verdadeiro dragão.”
No chão o templo se transforma em Thalderan. Diante da
Cidade Antiga, cada um dos três jovens protege cada um dos três
caminhos diferentes, três guerreiros mortos a seus pés, três
exércitos partindo.
Irmã Lobo: “Destinados a lutar contra um
guerreiro de seu próprio povo para não aumentar
o ódio entre os reinos, eles se tornaram os
guardiões invencíveis das únicas passagens que
conectam as três nações inimigas. Assim,
enquanto eles não fossem derrotados, os portões
da guerra permaneceriam fechados.”
Pedras cobrem os exércitos. Dentro de uma caverna, o Deus
Dragão fecha seus olhos.
Irmã Lobo: “Ghoddrak então adentrou a caverna,
até sua parte mais profunda. Com um golpe de
sua cauda, ele fechou a passagem e se isolou do
mundo exterior.”
Zairos: “Hã? Ele ainda está lá? Podemos entrar
na caverna para procurar o Deus Dragão?”
Irmã Lobo: “Ninguém quer incomodar um deus.
Além disso, seu hálito pode ser sentido na
entrada e pode levar um homem a loucura.”
Desapontado, Zairos balança a cabeça lentamente. Em seguida,
levanta os olhos, sua mente levando-o de volta à história.
Zairos: “Mas o que aconteceu aos três jovens?
Eles lutaram? Eles venceram?”
Irmã Lobo: “Claro. Eles foram os primeiros
Dragões da Tempestade e nunca, em tempo
algum, um Dragão da Tempestade foi
derrotado.”
Zairos: “Isso é verdade! E quando vai ser o
próximo duelo?”
O cardeal pousa no ombro de Irmã Lobo e pia no ouvido dela,
como se estivesse lhe contando algo. A eremita levanta os olhos
enquanto escuta atentamente. O passarinho voa. Irmã Lobo fita
firmemente os olhos curiosos do menino.
Irmã Lobo: “Exatamente... agora!”
Sob as sobrancelhas erguidas, os olhos de Zairos se arregalam.
Capítulo 2

A
PASSAGEM NORTE DE THALDERAN
( )
Os olhos amendoados do sacerdote refletem os incontáveis
soldados de Axengard, postados, na imensa praia, em oposição a
Feigon. Do alto do longo cajado do velho e altivo sacerdote, Asa
Azul solta um grasnido. Sob a chuva torrencial, Feigon abaixa o
capuz de seu comprido manto.
Feigon: “Em nome de Ghoddrak, o grande Deus
Dragão, evocamos seu Pacto para defender esta
passagem.”
Feigon aponta com o cajado para o guerreiro a seu lado.
Ajoelhado sobre uma perna, Jygar mantém as mãos sobre a borda
de ferro do escudo redondo de madeira, levemente fincado no
chão. A chuva forte corre pelos seus braços relaxados, musculosos
e, ainda, sem cicatrizes sobre a pele clara.
Feigon: “Thalderan, a Cidade dos Antigos,
escolheu Jygar para proteger seus portões.”
Jygar se levanta. Suavemente ele saca a espada e empunha o
escudo. À frente do exército de Axengard, sua sacerdotisa, Lissa,
vestida em seu manto de azul suave – carrega um cajado na mão e
Glacia, sua coruja branca no ombro. Seus grandes olhos verdes
encontram os de Feigon, com um misto de afeto e
constrangimento.
Lissa: “Que assim seja. Vallur, o mais poderoso
dos guerreiros de Axengard, contra Jygar, Dragão
de Thalderan, Campeão da Cidade Sagrada.”
Próximo a ela, VALLUR – grande, extremamente forte, barba e
longos cabelos desgrenhados – ergue o longo e pesado machado
com ambas as mãos.
Feigon: “Ao vencedor, a escolha: paz ou guerra.”
Lissa: “Então, aos olhos do Deus Dragão, que o
duelo comece.”
Vallur ruge enquanto dispara furiosamente para o ataque. Jygar
salta para o lado, gira o corpo e intercepta sua corrida com uma
rasteira que derruba o oponente de cara no chão. O campeão de
Axengard se levanta e ataca novamente. Jygar se desvia dos
primeiros golpes, porém o ataque seguinte choca-se contra seu
escudo com tanta força que o arremessa pelo ar. Mas ele aterrissa
elegantemente, pronto para continuar o embate.
O exército vibra quando, com um urro, Vallur ergue o machado
sobre a cabeça. Em seguida, abre um pequeno sorriso ao notar
uma pequena fissura no escudo de Jygar.
Em frente ao exército, AVERNATH, um jovem alto e louro, cerra
os punhos nervosamente. Ao seu lado, seu pai, o General Uldresh
sorri confiante.
General Uldresh: “O Machado Celestial! Forjado pelo
fogo dos céus com o ferro que veio das estrelas. Por
cem anos, nenhum homem foi sequer capaz de erguê-
lo, filho, Vallur irá nos dar a guerra que desejamos há
tanto tempo.”
Com um salto ágil, Vallur desfere um forte ataque descendente.
Jygar salta para trás. O machado explode uma grande pedra no
chão. Os guerreiros de Axengard rugem entusiasmados. O Dragão
Axengardiano lança um poderoso golpe horizontal. Jygar abre
velozmente o braço esquerdo com toda força, chocando seu
escudo contra o machado. A lâmina do machado espalha faíscas
contra o centro metálico do escudo. Estilhaços de madeira cruzam
o ar sob o som ressonante de metal contra metal enquanto o
escudo se despedaça. Com a mão livre do escudo, Jygar segura o
cabo do machado e o puxa ao mesmo tempo em que enfia a espada
no abdômen de Vallur.
O machado cai na grama. O exército se cala. Seu General
contorce o rosto em frustração. Mas de repente, Vallur agarra a
guarda da espada, impedindo-a de penetrar mais fundo. Com um
violento soco no queixo, ele o arremessa no ar, derrubando o
campeão de Thalderan.
General Uldresh e seu filho se unem ao exército em vibração.
Vallur recupera seu machado, avança contra Jygar, atordoado
no chão e desfere um golpe para partir sua cabeça. A lâmina atinge
o local onde o pescoço de Jygar estava uma fração de segundo
após ele rolar para o lado. O campeão de Thalderan se ergue com
agilidade e se atira contra a cintura de Vallur e empurra a espada,
terminado de enterrá-la em seu estômago. O guerreiro de
Axengard se ajoelha e cai de bruços no chão, fazendo a espada
atravessar suas costas.
Com cuidado, Jygar vira o corpo do adversário para cima,
revelando seus olhos mortos, ainda abertos. Ele retira a espada do
abdômen de Vallur e a enfia no chão. O guardião de Thalderan se
abaixa. Seus músculos se retesam enquanto ele ergue o machado
para colocá-lo de volta nas mãos de seu dono. Os dedos
ensanguentados de Jygar gentilmente fecham os olhos do guerreiro
morto.
Lissa: “Dragão de Thalderan, qual a sua escolha?
Paz ou guerra?”
Jygar se levanta e olha com determinação para os incontáveis
guerreiros de Axengard.
Jygar: “Paz!”
Então se vira para Lissa e a encara com olhos tristes. Ela lhe
devolve o mesmo olhar.
Jygar: “Ele era um grande guerreiro.”
Lissa ajoelha e reabre os olhos de Vallur.
Lissa: “Por isso devemos deixar seus olhos abertos
e manter sua alma no campo de batalha, para
permitir que Ghoddrak o convoque para lutar de
novo.”
Ela sussurra para Jygar.
Lissa: “Você impediu novamente uma guerra
sangrenta. Gratidão.”
Jygar acena com a cabeça e tenta sorrir enquanto Lissa derrama
um líquido em Vallur e reza em uma língua antiga. Ela insere sua
adaga cerimonial entre a palma dela e a de Vallur, e com o sangue
pinta runas funerais sobre o peito dele.
Em desgosto, General Uldresh se prepara para partir com seu
exército. Seu filho se aproxima e se ajoelha diante dele.
Avernath: “Senhor, meu pai! Nossos homens são
leais e guardarão um segredo de guerra. Só dois
homens estão entre nós e nosso verdadeiro
inimigo. Ninguém irá saber.”
O General esbofeteia violentamente o rosto do filho.
General Uldresh: “Eu saberei! O Deus Dragão
saberá!”
Com um forte empurrão, ele joga Avernath de joelhos.
General Uldresh: “Reze para que Ele o perdoe, lhe
implore para que não destrua nossa família e nosso
povo como castigo por suas palavras profanas.”
O general monta em seu cavalo e parte a galope. Avernath
permanece no chão, humilhado. Feigon e Jygar apertam o
antebraço um do outro em saudação.
Feigon: “Que Ghoddrak o abençoe, Jygar.”
Eles se dirigem até Lissa. Asa Azul decola do ombro de Feigon
rumo aos céus enquanto o exército de Axengard parte em retirada.
Lissa e Feigon acompanham o corpo de Vallur, carregado com
sacrifício por alguns soldados de Axengard, até uma cova rasa
recém-aberta. Vallur parece encarar os homens que lhe cobrem o
corpo de terra enquanto salpicos da mesma caem também sobre
seus olhos abertos.

CLAREIRA DO RIO DAS BRUMAS


( )
O vento sopra a areia e começa a desfazer o desenho de
Ghoddrak, o Deus Dragão, adormecido, refletido nos olhos
impressionados e pensativos de Zairos.
Zairos: “Os Dragões da Tempestade nunca serão
derrotados, serão? Nem o Imortal pode derrotar
eles… Certo?”
Irmã Lobo: “Somente se esse for o desejo do Deus
Dragão...”
Zairos: “Mas ele não vai querer isso, vai?”
Irmã Lobo sorri com olhos tristes. O vento arrasta um galho
seco, com um formato parecido com o de uma espada, contra as
pernas de Zairos, chamando sua atenção. O menino abre um largo
sorriso enquanto pega a espada e a aponta para seu pai.
Zairos: “Eu sou um Dragão da Tempestade! Tema
minha espada, Imortal!”
Olhos escondidos os observam da floresta. Uma sombra se
move. Torius estreita os olhos naquela direção, mas tem a atenção
desviada quando Zairos o acerta com um golpe do galho-espada.
O pai sorri e assume posição de guarda ao pegar outro galho.
Torius: “Vamos ver se você é bom mesmo.”
Torius dá um leve golpe nas pernas de Zairos, derrubando-o
sobre o desenho no chão. O menino cospe um pouco de areia e se
levanta, com o galho em guarda. Irmã Lobo se diverte com a cena.
Zairos: “Um Dragão da Tempestade não pode ser
derrotado!”
Torius: “Sempre há uma primeira vez, meu
amigo.”
Zairos ataca e eles são só sorrisos enquanto brincam.
Irmã Lobo se despede com um aceno. Torius acena de volta.
Zairos aproveita para atingir o pai, que o agarra no colo.
De dentro da floresta, dois olhos – um negro, o outro totalmente
branco – assistem quando Irmã Lobo dá uma risada e então
caminha para as profundezas da floresta.
Torius joga o filho no Rio. TCHIBUM. O menino começa a
afundar, se debatendo.
Zairos: “Socorro, Papa! Me ajuda!"
Torius permanece impassível, olhando para ele com um leve
sorriso no rosto.
Zairos: “Eu não sei nadar! Papa, por favor...”
A criança afunda nas águas calmas do rio. Alguns segundos se
passam enquanto seu pai apenas observa, com um grande sorriso
agora.
Torius: “Eu sei onde eu te joguei, garoto!”
Zairos se levanta rindo envergonhado, com a água cobrindo
apenas seus joelhos. Eles sorriem. Torius agarra as mãos do
menino para ajudá-lo a sair da água.
Torius: “Hora de partirmos, filho. Nós temos de
entregar as peles para o Regente de Brummata.”
Zairos: “Eu não quero voltar lá, o Povo da Floresta
não gosta da gente. Aquele homem disse para não
voltarmos lá, nunca!”
O menino franze a testa, aperta a boca e abaixa a cabeça, para
logo em seguida levantar os olhos temerosos.
Zairos: “Eu acho que ele é o Imortal.”
Torius: “O sobrinho do Regente? Vamos lá! Olho
da Noite não é tão mau assim.”
Zairos baixa a cabeça novamente. Torius se diverte enquanto
joga água no seu rosto. O menino começa a rir com a brincadeira
por um segundo, mas o medo toma conta de seu rosto. O pai se
vira para seguir o olhar do filho. Olho da Noite encara os dois com
sua lança de duas lâminas. Das árvores próximas, cinco guerreiros
do Povo da Floresta – grandes, peles escuras, armas em punho –
saltam para o chão. Torius tenta sorrir.
Torius: “Olho da Noite! Que surpresa! Procurando
por algumas peles?”
Ele se move para frente de Zairos para protegê-lo.
Olho da Noite: “De um maldito caçador de
Axengard como você, sangue é tudo que eu estou
procurando.”
Torius: “Zairos! Pra carroça... AGORA!”
O garoto corre em disparada. Olho da Noite ergue a lança.
Zairos é o alvo.
Torius lança o corpo no ar, na horizontal, ambos os pés em um
forte chute duplo no peito de Olho da Noite. Os dois caem ao solo.
No instante seguinte, os guerreiros alcançam Torius, indefeso no
chão e começam a chutá-lo sem piedade. Ele encolhe o corpo e
cobre a cabeça com as mãos tentando protegê-la.
O menino sobe na carroça e incita o cavalo usando o galho. O
cavalo dispara assustado.
Já de pé, Olho da Noite dá um forte pisão nas costas de Torius.
Gemendo de dor e de bruços no chão, Torius sente o solo vibrar
sob seu rosto. Ele levanta a cabeça para ver a carroça se aproximar
a toda velocidade. Olho da Noite ergue alto o joelho, seu calcanhar
apontado para o pescoço do homem caído aos seus pés, pronto
para quebrá-lo. Ele então percebe o chão tremendo e o som da
carroça em disparada atinge seus ouvidos, fazendo-o interromper o
movimento. Torius rola para o lado ao mesmo tempo em que Olho
da Noite salta para trás, enquanto Zairos guia a carroça e atropela
os guerreiros de Brummata. Com uma girada de sua lança, o
guerreiro de olho esbranquiçado faz um corte profundo no torso do
cavalo. O sangue espirra do ferimento do animal, salpicando de
vermelho seu agressor.
Torius aproveita a chance para se levantar em um sobressalto e
disparar em direção a carroça em movimento. Com um salto ele
senta ao lado de Zairos, toma-lhe as rédeas e faz o cavalo acelerar
ainda mais. O pai divide um olhar confiante com o filho enquanto
escapam. Dois dos guerreiros correm atrás deles, porém logo
desistem. Mas Olho da Noite não. Ele ergue a lança em posição de
disparo, mira por um segundo e a arremessa.
Torius sorri para Zairos, que dá um grito de vitória e ergue seu
galho-espada em celebração. Pai e filho compartilham uma risada
de alívio.
A lança atravessa o ar.
Nos lábios sorridentes de Torius, surge um filete de sangue. Seu
corpo se inclina para frente, a lança de Olho da Noite fincada
profundamente em suas costas.
Zairos – olhos arregalados, rosto em desespero – pega as rédeas
e mantém o cavalo em galope.
Olho da Noite sorri.

ESTRADA PARA THALDERAN


(P )
Os últimos raios de sol banham a carroça estacionada na beira
da estrada deserta. Sangue e suor banham o corpo do cavalo
exausto. Com um último relincho, ele desmorona.
Usando uma pedra grande e achatada, Zairos cava uma
sepultura rasa. O corpo sem vida do pai a seu lado. Ele empunha
seu galho como se fosse uma espada e coloca outro galho na mão
de Torius.
Zairos fita os olhos mortos de seu pai. Em lágrimas, desaba de
joelhos e, soluçando o abraça forte. Uma tempestade desaba, mas
Zairos não se move. Ele permanece abraçado com seu amado pai
por um longo momento enquanto a chuva se intensifica.

MAIS TARDE...
A chuva passou. Torius repousa em uma cova rasa. Com as
mãos feridas e sujas, Zairos joga terra sobre o cadáver. Ele repete
o movimento várias vezes, enquanto as lágrimas desenham
caminhos em suas bochechas empoeiradas. Com as costas das
mãos ele enxuga os olhos mareados. Com sofreguidão, olha pela
última vez o rosto de seu pai.
O menino estende o braço para pegar de volta seu “galho-
espada” cravado no chão e olha para cima. O vento move as
nuvens escuras no céu, desenhando uma forma semelhante a um
rosto, que observa Zairos do alto. Uma face com um sorriso
malicioso e um olho esbranquiçado, provocando-o. O órfão encara
o rosto enevoado por alguns segundos.
Zairos: “Não importa se ele é Imortal, Papa. Não
importa. Eu vou matar ele.”
Ele se levanta, olhando para o desenho mal formado nas
nuvens. Sua mente torna o rosto esboçado de Olho da Noite em
um quase real. Um raio cai, iluminando a face enraivecida do
menino.
Zairos: “Eu juro que eu vou.”

ESTRADA VERMELHA
(M )
Zairos caminha solitário pela Estrada Vermelha. Ele pisa sem se
importar nas muitas poças d'água espalhadas pelo chão. Seus olhos
avermelhados de tanto chorar se destacam no rosto pálido e
apático do menino. Segurando o galho-espada ele segue desolado
para Thalderan, já visível no horizonte. O sol se põe em definitivo.

PERIFERIA DE THALDERAN
(N )
A chuva cai fortemente mais uma vez e castiga o rosto exausto
de Zairos enquanto ele vaga pelas ruas estreitas da periferia de
Thalderan.
Ele encontra abrigo em um beco estreito. O menino senta,
apoiado na parede. O corpo tremendo de frio. Lágrimas correm
pelo seu rosto enquanto ele enverga seu galho-espada tentando
quebrá-lo. Ele falha e, com raiva, arremessa-o contra a parede
oposta.
Capítulo 3

A
PERIFERIA DE THALDERAN
(D )
Iluminados pelos primeiros raios de sol, pés descalços correm
pelo beco estreito. Duas meninas de rua, de mãos dadas, passam
por Zairos, fazendo-o acordar. Assustadas, elas dão uma breve
pausa na esquina e olham para trás.
Os olhos de Zairos congelam ao ver MINARA – mesma idade
que ele, linda, olhos orientais de um azul brilhante, cabelo preto
longo e desarrumado. Ela vira a curva arrastando uma
GAROTINHA, de uns seis anos, com ela.
Dois segundos depois, um menino ligeiramente mais velho,
ORGATH – cabelos ruivos curtos, roupas nobres – corre pelo beco.
Assustado, ele olha algumas vezes para trás e parece estar fugindo
da mesma coisa que as garotas. No instante seguinte ele
desaparece na mesma curva.
Gritos! Zairos pega o galho e se esconde na esquina para
observar. Em uma pequena praça, GORDUCHO, um adolescente
obeso de cabelos louros encaracolados, segura Minara e a
Garotinha pelo cabelo. Outros três adolescentes cercam Orgath.
ROCHA – grande, mulato, sorriso maldoso – examina Orgath.
Rocha: “Parece que a linda garota fez você se
perder.”
Minara geme enquanto Gorducho fecha a mão com mais força,
puxando ainda mais seu cabelo. Orgath, assustado, fita Rocha.
GRANDALHÃO, um rapaz muito alto com o rosto cheio de
espinhas, arranca de Orgath um belo colar e admira surpreso o
pesado medalhão de prata em forma de cabeça de lobo, com olhos
de esmeralda.
Grandalhão: “Ah, o símbolo de nobreza
Axengardiano!”
Rocha: “Olho da Noite vai gostar disso!”
A menção do nome do assassino de seu pai faz Zairos contorcer
a face e sua respiração se acelerar.
Rocha faz um gesto de cortar a garganta do menino. Os
adolescentes concordam com um balanço de cabeça. Gorducho
ainda prende com violência as meninas pelo cabelo.
Gorducho: “E as garotas?”
Rocha: “São todas suas. Sirvam-se.”
Um grasnido interrompe a risadinha maldosa dos adolescentes.
Um corvo sobrevoa a cabeça deles. Gorducho se distrai com o
pássaro. Minara aproveita a situação e lhe morde a mão. Com um
grito de dor ele solta as garotas. Minara cospe fora o sangue da
mão do Gorducho de sua boca e grita para a Garotinha.
Minara: “Foge! Rápido!”
Rocha: “Vou pegar essa garota filha da p--.”
Orgath corre, livrando-se dos outros jovens e salta sobre Rocha,
que o agarra enquanto ainda está no ar e arremessa o garoto contra
o chão.
Gorducho corre atrás da Garotinha, mas Minara pula em suas
costas e agarra seu pescoço. A Garotinha escapa por um beco.
Orgath tenta se levantar. O último adolescente, CHUTADOR, um
jovem de corpo atlético e olhos negros amendoados, chuta seu
rosto. Ele cai de novo. Grandalhão se une ao outro. Eles chutam e
pisam o indefeso Orgath.
Gorducho se joga de costas contra uma parede atrás dele,
fazendo Minara se chocar violentamente contra a superfície dura.
Atordoada, ela desliza até o chão. Da mesma forma que Olho da
Noite intencionava acabar com Torius, ele ergue o pé para esmagar
com um pisão a cabeça da bela menina indefesa. Então, algo salta
sobre ele. Zairos e o jovem corpulento rolam pelo solo
pavimentado em pedra. Assim que se separam, Gorducho tenta se
levantar, mas Zairos chuta sua cara, jogando-o no chão novamente.
Zairos parte imediatam ente para o ataque contra os outros
adolescentes, golpeando com o seu galho o joelho de Grandalhão e
a virilha de Chutador no segundo seguinte. Ele se vira para Rocha,
que lhe acerta um soco cruzado na lateral do rosto. Em um rápido
contra-ataque, Zairos quebra o galho na face de seu agressor e lhe
aplica uma sequência ininterrupta de socos no meio da cara até
que Chutador o faz parar com um chute em cheio na boca do
estômago. Zairos se curva, quase vomita. Rocha aproveita a
chance e derruba-o com uma cotovelada na cabeça, Zairos geme
no chão, sangue escorrendo pelo rosto devido ao impacto contra o
solo.
Rocha pega uma pedra próxima, do tamanho de um pequeno
melão, e a ergue, pronto para esmagar a cabeça de Zairos.
Novo grasnido. O líder dos adolescentes vira-se para o som e
fica paralisado, quando avista uma figura encapuzada com um
corvo sobre o ombro. Feigon, olhos negros encarando-o, murmura
na Língua dos Antigos.
Feigon: “Argazi sanctacto orvant gallius…”
Rocha se contorce apavorado, enquanto um arrepio percorre
sua espinha. Suas mãos tremem e deixam a pedra cair. Ele perde o
equilíbrio, cai sentado no chão.
Chutador: “Maldição! Um Sacerdote do Dragão!”
Grandalhão: “Maldição? Maldição é o que ele tá
jogando na gente!”
Gorducho ajuda Rocha a se levantar. Os quatro jovens fogem
em pânico.
Zairos, arfando, de joelhos, observa os arredores. Ele vê o velho
sacerdote ajudar Minara a ficar de pé e em seguida partir em
auxílio de Orgath ainda inconsciente. Feigon abaixa o capuz e
acena para Zairos com um sorriso.

ENFERMARIA DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(A )
Os raios do sol nascente entram pelas janelas da ampla
enfermaria de mobiliário de madeira, formado por muitos
armários, prateleiras e umas poucas camas. Adormecido em uma
dessas camas, Zairos revira a cabeça de um lado para o outro. Seu
rosto ferido e suado se contorce em angústia. Em uma cama no
lado oposto, Orgath dorme irrequieto também enquanto Feigon
aplica um bálsamo de ervas no rosto do garoto.
Através de janela, Asa Azul entra na sala e aterrissa na
cabeceira da cama de Zairos com um grasnado. Zairos abre os
olhos e senta-se abruptamente, ofegando. Feigon ergue a cabeça,
olha para Zairos e eles trocam um meio-sorriso. Quando Zairos vê
Orgath, seus olhos começam a vasculhar a enfermaria em busca de
outra pessoa. Feigon percebe e sussurra para ele.
Feigon: “Ela está bem… no aposento ao lado.”
O sacerdote pisca para ele. Zairos dá um sorriso embaraçado. O
corvo grasna de novo. Feigon acena com a cabeça para o pássaro.
Ele dispara pela janela diante dos olhos fascinados do menino.

PERIFERIA DE THALDERAN
( )
As sombras das muitas construções de Thalderan começam a
cortar suas ruelas com o nascer do dia. Avernath – barba e cabelos
curtos, capa de pele – caminha agitado por entre elas. Ele adentra
um beco para encontrar um grupo de soldados que se aproxima.
Avernath questiona com rispidez o assustado SOLDADO LÍDER.
Soldado Líder: “Seu filho estava
assistindo à apresentação que ele adora,
capitão. Aquela garota cantando e
dançando. Mas logo depois que ela
terminou, ela viu alguém na multidão e
fugiu. Ele foi atrás dela e nós o perdemos
na multidão. ”

Avernath: “Você perdeu meu filho? Eu vou matar


você. Todos vocês!"
Soldado líder: “Minhas... minhas desculpas,
capitão! Procuramos a noite toda, mas...”
Avernath: “Onde está o meu filho?”
Soldado Líder: “Capitão, procuramos por ele a
noite tod--”
A aproximação de Lissa a cavalo o interrompe. Glacia, pousada
em seu ombro, olha para cima. Descendo repentinamente dos céus,
como se a estivesse esperando, Asa Azul mergulha entre os dois
homens para pousar no braço da sacerdotisa.
Lissa: “Orgath está no Templo dos Dragões.
Ferido, mas se recuperando sob os cuidados do
Sumo Sacerdote de Thalderan.”
Avernath: “Truques com pássaros e habilidades de
cura! Isso faz com que vocês Sacerdotes do
Dragão não sejam totalmente inúteis, Lissa.”
Lissa: “O que pode ser mais inútil que exércitos
que não podem ir à guerra?”
Avernath franze o cenho, aborrecido. A coruja de um branco
glacial e o corvo de asas azuladas alçam vôo em direção ao
Templo em uma colina distante. Ela os acompanha a galope. Um
soldado dá a Avernath um cavalo. Ele monta no animal e a segue.

INTERIOR DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(M T )
O quarto pequeno é tenuamente iluminado pela luz matinal
que atravessa com dificuldade as cortinas de um simplório tecido
marrom. Dentro do aposento repousam uma cômoda e uma cama
de madeira, com uma bela menina de longos cabelos negros
dormindo sobre ela. A seu lado, um cobertor repousa emaranhado
no chão. Pequenas mãos o pegam. Elas o usam para cobrir Minara,
encolhida de frio, adormecida na cama.
Os olhos de Zairos se perdem no lindo rosto de Minara. Ela
mexe a cabeça, geme. Zairos foge imediatamente pela porta do
quarto, rapidamente fechando-a com cuidado.
Sorrateiramente, ele explora os longos e altos corredores do
templo. Ele encontra um umbral ornamentado com dragões
esculpidos. Escondido atrás dele, Zairos olha para o amplo salão
ornamentado. Nele esculturas e pinturas com imagens do Deus
Dragão e da criação do Pacto, parecidas com as figuras que Irmã
Lobo desenhara na areia. Feigon, em pé, ao centro, sorri. Por outra
porta, Avernath entra seguido por Lissa.
Feigon: “Lissa! Que prazer ver você!”
Feigon caminha até Lissa. Eles unem as mãos ternamente.
Lissa: “Que o Deus Dragão lhe abençoe.”
Avernath os observa com impaciência, prestes a interromper a
conversa.
Feigon: “Que o fogo do Grande Ghoddrak mantenha seu caminho
livre de obstác--”
Avernath: “Obrigado por salvar a vida do Orgath, sacerdote.”
Feigon: “Agradeça a Zairos. Aquela criança sem
lar se ergueu como um nobre dragão para proteger
seu filho.”
Ainda escondido, Zairos esboça um sorriso, uma centelha de
orgulho em seus olhos curiosos.
Avernath: “Sem lar? Interessante. A que nação ele
per--”
Feigon: “Ele é um dos seus, se é o que quer saber.”
Avernath: “Ótimo, ele não irá mais viver nas ruas.
Ele viverá sob minha proteção.”
Feigon: “Ele já está sob a proteção deste templo.”
Avernath: “Não, sacerdote. Eu devo a ele a vida do
meu fi--”
Feigon: “Você também a deve a mim. Respeite
minha decisão.”
Avernath: “O garoto tem o direito de decidir,
sacerdote. Vamos ver os meninos.”
Feigon: “Sim, ele tem, mas primeiro deixe-me
devolver isso a você.”
Ele pega o colar de Orgath de uma mesa próxima e o entrega a
Avernath, que o examina enquanto acena com a cabeça. Eles
andam na direção de Zairos, que corre de volta para a enfermaria.
O menino entra na enfermaria, rapidamente se recostando em uma
cama ao fundo enquanto pega uma maçã de uma cômoda próxima.
Ele calmamente a morde quando Feigon e Avernath entram no
aposento.
Avernath se aproxima de Orgath, adormecido em uma cama
próxima à entrada. Preocupado, ele checa o rosto ferido do filho e
acaricia gentilmente seus cabelos.
Avernath: “Orgath? Orgath?”
Orgath abre os olhos sonolentos e sorri para seu pai.
Avernath: “Você está bem?”
Orgath acena que sim com a cabeça.
Avernath: “Você foi um idiota em desaparecer
daquele jeito. Mas discutiremos isso mais tarde.”
Avernath deixa o colar pender de sua mão e acena com a cabeça
na direção de Zairos. Ainda fraco, Orgath se levanta, pega o colar
e caminha lentamente até a cama dele. O menino Axengardiano
estende os braços, oferecendo o colar a Zairos.
Orgath: “Obrigado. Se não fosse você…”
Zairos toma o colar em suas mãos e examina o medalhão em
forma de cabeça de lobo. Os olhos brilhantes de esmeralda na
superfície prateada parecem olhá-lo de volta.
Avernath: “Este é o símbolo da Casa de Guerra de
Axengard, comandada pela minha família por
gerações.”
Orgath: “Coloque-o, por favor.”
Zairos coloca o colar.
Orgath: “Você arriscou sua vida para salvar a
minha. De agora em diante nós somos irmãos.
Irmãos de sangue!”
Avernath desembainha uma pequena adaga e a entrega para
Orgath. Ele a usa para fazer um pequeno corte na mão e então
oferece a adaga para Zairos. Ele aceita e tenta disfarçar a dor
enquanto também corta a própria mão. Os dois unem as mãos,
unindo também seu sangue.
Orgath: “Irmãos de sangue para sempre!”
Zairos: “Irmãos de sangue para sempre!”

JARDINS DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(D )
Uma leve brisa acaricia as folhas das pequenas árvores de
copas aparadas cuidadosamente em diversas formas. Os arbustos e
as muitas e exóticas flores se espalham pelo belíssimo jardim do
templo.
Jygar caminha por ele em direção a Zairos, sentado em um
galho de árvore, a uns 3 metros de altura, olhando pensativo para o
sol poente. O guerreiro salta apoiando um pé na árvore enquanto
abraça o galho na altura do peito. Sem se assustar, Zairos vira o
rosto para o líder dos Dragões da Tempestade que tem um sorriso
no rosto barbudo, mas sem bigode.
Jygar: “Então é aqui que você está, Zairos. Eu sou
Jygar.”
Antes que o menino pudesse responder, o ágil homem agarra
um galho grosso, mais ao alto, e prossegue a escalada.
Jygar: “Venha, rápido. Eu quero te mostrar algo.”
O menino pendura-se no mesmo galho para segui-lo.
Jygar: “Feigon me contou sobre seus pais. Eu sinto
muito. Eu também perdi os meus.”
Eles prosseguem subindo, se agarrando em galhos menores,
Zairos um pouco abaixo de Jygar.
Zairos: “Irmã Lobo me disse que todos os Dragões
da Tempestade vêm das ruas.”
Eles então se sentam sobre os calcanhares em mais um galho
robusto, olhando um para o outro.
Jygar: “Sim, os sacerdotes sempre abrigaram essas
crianças, crianças como nós. Em algumas delas…”
Jygar cutuca com o dedo o peito do menino.
Jygar: “… como você, eles encontram o Fogo do
Dragão, em umas poucas outras a Alma. Os que
têm o Fogo se tornam Dragões da Tempestade, os
que têm a Alma, sacerdotes. É a nossa família.”
Jygar estende sua mão direita e mostra a Zairos uma cruz, feita
de duas cicatrizes curvas.
Jygar: “Os Dragões da Tempestade são irmãos,
não de nascimento, mas pelo pacto de sangue e
pelo Fogo do Dragão. Irmãos até a morte. E além
dela.”
Zairos fita o curativo manchado de sangue em sua mão.
Zairos: “Dessa forma então, Orgath é meu irmão.
E Axengard é inimiga do Povo da Floresta. Se eu
for com ele, ele irá me ajudar.”
Jygar: “Do que você está falando, Zairos?”
Eles continuam a subida. O rosto de Zairos se enfurece.
Zairos: “Um homem de Brummata… O Imortal.”
Jygar: “O Imortal?”
Zairos: “Ele matou meu pai, eu vou matá-lo. Não
importa o quão poderoso ele seja.”
Ainda subindo, Jygar ergue a cabeça para olhar as estrelas que
começam a brilhar no céu.
Jygar: “Nós não sabemos se o Imortal é real, mas
os poderes dos Sacerdotes do Dragão são. Eles
podem ler as estrelas, ver através dos olhos de seus
pássaros, escutar os espíritos em seus sonhos.”
Um grasnido! Zairos olha surpreso para Asa Azul, pousado em
um galho próximo a sua cabeça.
Jygar: “Feigon teve uma visão que suas escolhas,
Zairos, podem mudar o destino do mundo... Tenha
muito cuidado na hora de fazê-las.”
Eles chegam à copa da árvore. Ambos de pé, Jygar coloca ambas
as mãos nos ombros do seu jovem acompanhante.
Jygar: “Um Dragão da Tempestade mata apenas
pela paz. Milhares de vidas dependem de nós. Se
vingança é a sua escolha, vá com Orgath, mas se o
Fogo do Dragão queima de verdade no seu
coração, como eu acredito, junte-se a nós.”
Com um leve sorriso e com uma das mãos ainda sobre o ombro
de Zairos, eles observam a Colina do Dragão cortando o horizonte.
Os olhos de menino se arregalam, espantados. Sobre a elevação,
eles avistam um grande vulto negro e imóvel.
Jygar: “Antes de qualquer decisão, ELE tentará
orientá-lo, ELE sempre estará observando, mas a
escolha será sempre sua.”
Um contorno esmaecido de um dragão de asas abertas, que
rapidamente desaparece nas sombras quando o sol termina de se
por à suas costas.

PORTÕES DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(D )
Diante dos massivos portões abertos das muralhas do templo
Avernath e seus homens aguardam, montados em seus cavalos,
prontos para partir. Próximo a eles, Orgath e Zairos apertam as
mãos, cruzando-as na altura do peito.
Orgath: “Sua vingança deve esperar até que
fiquemos mais velhos. Se torne o melhor. Então,
eu prometo, o exército de Axengard irá marchar ao
seu lado contra Brummata e Olho da Noite. Contra
a Profecia e o Imortal.”
Zairos concorda com a cabeça.
Zairos: “Eu vou esperar. Somos irmãos de
sangue...”
Orgath: “Hoje e sempre!”
Orgath dá um tapinha em seu ombro.
Orgath: “Mas a garota é minha. Fui eu quem viu
ela primeiro!”
Orgath faz uma cara assustada. O corpo e o rosto de Zairos se
contorcem de vergonha quando a voz de uma garota, vindo de trás,
atinge seu ouvido.
Minara: “Do que vocês estão falando?”

CAMPO DE TREINO DO TEMPLO DOS DRAGÕES


( )
O sol se põe, lançando um tom alaranjado sobre a área de prática
e seu solo arenoso, um espaço cercado por grama, bancos e bonecos
de madeira para treinamento.
FALCÃO DA LUA - cerca de 30 anos, negro, atlético, cabelo
raspado para formar um bico de falcão apontando para a testa - gira
seu martelo de guerra em um ataque contra KAIJIN. O longo rabo de
cavalo do guerreiro mais jovem também gira conforme ele se desvia
do golpe de seu companheiro. Seus olhos amendoados solfirianos se
comprimem enquanto o lutador do Povo da Floresta bloqueia o
contra-ataque de suas espadas curtas duplas.
Pequeno Urso, nessa época um menino muito grande para seus
13 anos de idade, com pele escura e cabeça sem nenhum cabelo,
tem a língua do lado de fora da boca em uma infantil careta
engraçada. Ele segura os antebraços de Jygar enquanto luta,
tentando empurrar seu mestre em um exercício de força. Ele
reclama de um jeito que o faz parecer uma criança muito mais nova.
Pequeno Urso: “Droga! Você é mais forte do
que um urso.”
Falcão da Lua sorri para o menino.
Falcão da Lua: “Achei que você tivesse mais
disposição, garoto.”
Kaijin: “Não é uma questão de força, Pequeno
Urso...”
Ainda sorrindo, Falcão da Lua pula e estende o braço para
segurar as costas de Kaijin em um estrangulamento.
Falcão da Lua: “... Mas de surpresa?”
Sorrindo, Jygar vira a cabeça em direção a eles enquanto Kaijin
puxa o pulso de seu companheiro com ambas as mãos e se inclina,
fazendo o corpo de Falcão da Lua girar sobre sua cabeça.
Kaijin: "Isso mesmo! E de evitar o confronto
direto contra alguém maior e mais forte!"
Com um sorriso engraçado, Pequeno Urso tira proveito da
distração de Jygar com a brincadeira de luta de seus companheiros.
Enquanto Falcão da Lua se choca contra o chão, o garoto joga
seu corpo para trás e se ajoelha em uma de suas próprias pernas com
um forte puxão que joga seu mestre no chão.
Pequeno Urso: “Peguei você. Hahahaha.”
Jygar se levanta e apoia as mãos nos ombros do menino,
orgulhoso.
Jygar: “Muito bom! E por falar em maior e
mais forte, acho que amanhã outro menino terá
que se preocupar com isso.”
Pequeno Urso abre um sorriso surpreso com a boca aberta e as
sobrancelhas erguidas.
Pequeno Urso: “Jura? Outro menino? E menor
do que eu?”
Jygar: “Sim. Espero que ele venha.”
Pequeno Urso abre os braços em comemoração olhando para o
céu como se estivesse agradecendo aos deuses.
Pequeno Urso: “Sim, sim, finalmente... Eba!”

FLORESTA DE BRUMMATA – ENTRADA DA


CAVERNA DAS PRESAS DA BESTA
(N )
No meio da mata, a luz da lua cheia alcança a entrada de uma
caverna com formações rochosas lembrando dentes em uma boca
escancarada. Em frente a ela, liderados por Olho da Noite, uma
dúzia de guerreiros de Brummata cerca um grupo de caçadores de
Axengard, quatro homens e uma CAÇADORA RUIVA. Encurralados
pelas lanças e facões dos guerreiros, os caçadores largam suas
armas.
Olho da Noite: “ Peguem a mulher. Vamos dar a ela o
que um homem de Axengard não pode dar.”
Eles urram excitados e agarram a mulher. Ela se debate, grita.
Um dos caçadores pega uma faca do chão e avança em auxílio
dela. Uma lança perfura seu coração. Ele desaba aos pés de Olho
da Noite, quando este retira a lança de seu peito. A mulher chora
conforme os homens a jogam no chão. Um CAÇADOR ASSUSTADO
cai de joelhos.
Caçador Assustado: “Você já pegou a sua presa.
Você tem a mulher. Por que não nos deixa ir?”
Olho da Noite fita uma CRIATURA, se debatendo presa em uma
rede de caça. Em seguida encara o Caçador Assustado.
Olho da Noite: “Covarde! Você me pergunta… por
quê?”
O rosto de Olho da Noite treme de ódio. Seu olho branco
parece voltar a enxergar enquanto velhas histórias invadem sua
mente.
17 ANOS ATRÁS...
FLORESTA NEGRA
(Noite)
Um gigantesco javali dispara assustado através da floresta.
ESTAMPIDO. RUGIDO. Ele cai. Uma lança de lâminas duplas
fincada em seu torso. Uma atraente e jovem mulher, Lótus de
Fogo – pele negra, corpo atlético, cabelos curtos e bastante
avermelhados – remove a lança do corpo do animal.
Um som corta o ar. Uma rede de caça captura Lótus de Fogo.
Caçadores de Axengard. Três deles. Olhares perversos,
sorrisos maldosos. Eles batem nela, uma, duas vezes. De novo e
de novo. Quase desacordada ela vê um caçador albino se
aproximando. Albax, ainda jovem, com uns vinte anos nessa
época, começa a tirar a roupa. Ela desmaia.
MAIS TARDE...
Lótus de Fogo – ferida, o corpo nu – chora, encolhida no
chão.

DE VOLTA AO PRESENTE:
Os pensamentos de Olho da Noite voltam ao momento atual.
Seus lábios contorcidos se transformam em um sorriso irônico.
Olho da Noite: “Por quê? Você me pergunta por
quê?”
Ele fita o caçador por um breve instante, como se esperasse
uma resposta. O homem sacode rápida e nervosamente a cabeça de
um lado para o outro.
Olho da Noite: “Apenas histórias que minha mãe
me contou.”
Olho da Noite gesticula para seus homens e eles assassinam os
caçadores desesperados com golpes precisos de seus facões. A
caçadora grita de terror sob o corpo nu de um dos guerreiros, que a
mantém presa sob ele no chão. Olho da Noite faz um gesto para
que o guerreiro se levante e a traga para ele enquanto ele pega o
machado caído de um caçador do chão.
Com satisfação, o herdeiro de Brummata admira o rosto trêmulo
da Caçadora Ruiva, agora em silêncio, com as mãos segurando suas
roupas rasgadas para cobrir seus seios. Ele oferece o machado para
a bela mulher a sua frente. Relutante, ela aceita.
Olho da Noite: “Agora você tem uma escolha:
lute comigo ou seja minha.”
Ruiva: "Eu... eu não posso lutar com você."
Ela fecha os olhos, aperta os lábios e deixa cair as roupas,
revelando seus seios nus. Ele delicadamente segura a mulher pelo
queixo e acaricia seus cabelos ruivos.
Olho da Noite: “A cor do seu cabelo me
lembra alguém muito especial.”
Ela abre os olhos para olhar para ele, mas Olho da Noite agarra
seu cabelo com brutalidade, sua mão apertando sua mandíbula.
Olho da Noite: “Mas ela nunca desistiria...”
Um breve estalo ecoa, quando ele torce o pescoço da caçadora
em um movimento brusco.
Olho da Noite: “Sem uma boa luta..”
Seus longos cabelos dançam vividamente no ar enquanto ela cai
com o pescoço quebrado, sem vida. Um rugido, quase humano,
atinge os ouvidos dele. O homem com um dos olhos lembrando a
lua cheia vira a cabeça na direção do som e segue em direção à
criatura capturada. Conforme ele se aproxima, ela rosna mais e
mais. Sons estranhos, parte homem, parte fera.
Olho da Noite: "Que tipo de abominação é
você?"

CAMPO DE TREINO DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(D )
Os primeiros raios de sol derramam uma bela cor dourada sobre
chão arenoso repartido pelas longas sombras projetadas pelos
quatro guerreiros treinando nele. Jygar usa sua espada e escudo
para treinar com Kaijin e suas espadas gêmeas em um treinamento
vigoroso. Perto dali, Falcão da Lua está sentado em um escudo, se
divertindo enquanto Pequeno Urso puxa as duas correias presas a
ele em um novo exercício de força, fazendo uma larga trilha no
chão.
Com passos tímidos, Zairos se aproxima do grupo. O mestre
dos Dragões da Tempestade percebe e sem se virar, sorri.
Jygar: “Ei, Pequeno Urso, parece que temos um
novo Dragão para treinar conosco.”
Pequeno Urso se vira para olhar Zairos e ri como uma criança,
a boca aberta, demonstrando sutilmente algum tipo de atraso
mental. Zairos caminha até eles. Pequeno Urso parece um pequeno
gigante à frente dele.
Zairos: “Pequeno Urso?”
O menino de cabeça calva confirma com a cabeça. Zairos
começa a rir.
Pequeno Urso: “Que foi? Animais, árvores, olhos do
céu… é só um nome do Povo da Floresta, vindo da
natureza, por causa de quem eu sou... Certo, Falcão da
Lua?”
Falcão da Lua: “Isso mesmo, meu querido menino
gigante. O que você é, e o que você pode ser! Corpo e
alma.”
Com um sorriso engraçado e orgulhoso, a enorme criança fecha
os punhos enquanto levanta e flexiona os braços para mostrar seus
músculos juvenis, mas já enormes.
Pequeno Urso: “Você não vê que sou tão forte quanto
um urso?”
Zairos: “Hahaha. Vejo sim. Mas fico me perguntando
quem seria o GRANDE Urso.”
Zairos: “Só imaginando quem seria o GRANDE urso.”
O rosto alegre de Pequeno Urso se contorce em tristeza.
Pequeno Urso: “Meu irmão. Ele seria o grande
Urso.”
Zairos fica quieto por alguns instantes. Ele estreita os olhos
enquanto vasculha antigas memórias.
Zairos: “Os irmãos criados pelos ursos! Irmã Lobo
me contou essa história uma v--”
Jygar: “Depois. Nossa amiga eremita tem muitas
histórias.”
Zairos e Pequeno Urso concordam balançando a cabeça com
um sorriso. Pequeno Urso aponta para a dupla que se aproxima:
Feigon e Minara. O sumo sacerdote para com ela a seu lado diante
do grupo, todos agora com a atenção voltada aos recém-chegados.
Feigon: “Eu gostaria de apresentar-lhes Minara,
sua nova irmã.”
Pequeno Urso: “Uma… garota?”
De boca aberta, Zairos levanta as sobrancelhas e arregala os
olhos sorridentes.
Jygar: “Bem-vinda, Minara. Por favor, perdoe a
falta de educação de seus novos irmãos.”
Kaijin: “É um prazer ter uma irmã de Solfira,
minha nação.”
Minara inclina o corpo em reverência.
Falcão da Lua: “Sim, bem-vinda a nossa família!
Mas não pense que você vai amolecer nossos
corações com seus lindos olhos azuis.”
Escondendo o sorriso, Minara franze o rosto e olha para eles
com um olhar desafiador. Jygar acena para que ela se junte a eles.
Jygar: “Venha, brava Minara, não vamos perder
mais tempo com palavras.”
Eles começam a treinar. Minara tenta socar o rosto de Jygar,
mas ele se abaixa, pega as pernas dela e a joga no chão. Ainda
deitada no solo, Minara olha para cima com uma expressão de dor
no rosto. A bela menina então se senta.
Zairos corre até ela, lhe estende a mão. Por um instante, ela
apenas fita seus olhos. A seguir, com um leve sorriso, segura a
mão estendida em ajuda. Zairos devolve o sorriso, mas seu rosto
se contorce em uma careta conforme Minara o derruba. Ela sacode
a areia do corpo e sorri para Zairos com um ar de vitória. O
menino olha para ela, surpreso. Todos os outros caem na
gargalhada, enquanto o sol desaparece por trás das torres do
templo, deixando escapar tênues resquícios de sua aura dourada
sobre o campo de treinamento.

SETE ANOS DE DUELOS E TREINAMENTOS:


Por sete anos os jovens Dragões crescem e convivem em meio
a árduos treinamentos e testemunhando os duelos mortais de seus
irmãos mais velhos contra os campeões das nações inimigas, para
assim manter a paz entre os Três Povos.
ANO 1: CAMPO DE TREINO
Zairos pega Pequeno Urso em um estrangulamento. Ele se
debate, sacudindo Zairos de um lado para o outro, como um boi
chucro tentando se livrar de sua montaria. Minara e Orgath
compartilham um sorriso enquanto assistem.

ANO 2: PASSAGEM NORTE


O Campeão de Axengard cai morto perante a espada de Jygar.
Ao lado, Pequeno Urso, Zairos e Minara dividem um sorriso
contido de alívio e orgulho ao mesmo tempo, enquanto Jygar se
ajoelha e cuidadosamente abre os olhos de seu oponente.

ANO 3: CAMPO DE TREINO


Falcão da Lua e Kaijin treinam contra Zairos e Minara, que se
entreolham afetuosamente enquanto lutam. Pequeno Urso gargalha
enquanto Orgath sussurra alguma piada sobre os dois em seu
ouvido.

ANO 4: PASSAGEM SUL


O Dragão de Brummata voa pelo ar, sem vida, peito esmagado,
conforme Falcão da Lua completa o movimento em arco do seu
martelo de guerra. Comemorando mais uma vitória diante de seus
olhos infantis, Pequeno Urso abraça Zairos e Minara.

ANO 5: CAMPO DE TREINO


Minara ataca Pequeno Urso com suas espadas. Ele bloqueia,
mas ela chuta seu peito, derrubando-o. Com um tapinha embaixo
do queixo, Zairos fecha a boca de Orgath, impressionado com as
habilidades dela e ainda mais com suas belas pernas.

ANO 6: PASSAGEM LESTE


O guerreiro escolhido de Solfira desmorona quando Kaijin
remove as espadas duplas de seu peito. Os olhos de Pequeno Urso
sorriem enquanto Minara segura a mão de Zairos e acena com a
cabeça para ele.

ANO 7: CAMPO DE TREINO


A lua cheia junto à algumas tochas altas fincadas no chão
iluminam a área de treinamento. Sob o olhar de seus
companheiros, Jygar derruba Zairos com um golpe de escudo. O
impacto contra o chão faz o jovem guerreiro fechar os olhos. Ele
lembra-se de seu pai caído, indefeso no chão. Imediatamente a
imagem de Olho da Noite surge em sua mente. Sua face se
contorce. Ele se levanta e ataca Jygar com uma fúria incontrolável,
mas seu mestre o lança ao solo novamente com um chute em seu
peito. Jygar balança a cabeça, contrariado e parte.
Zairos senta-se, abraçando as pernas dobradas em frente ao
corpo enquanto apoia a cabeça nos joelhos. Minara e Pequeno
Urso aproximam-se e sentam abraçados com ele.

Capítulo 4

D
ENTRADA DA CAVERNA DO DRAGÃO
(N )
Cinco cavaleiros galopam sob a luz de um luar encoberto por
nuvens carregadas e escuras em direção à grande caverna
encravada no sopé da Colina do Dragão. Eles desaceleram e param
a poucos metros da entrada escura, onde Falcão da Lua e Kaijin os
aguardam. Os cinco desmontam dos cavalos agitados e os dois se
encarregam de amarrar os animais em uma árvore próxima.
Ao lado de Feigon, Jygar conversa com Zairos, Minara e
Pequeno Urso.
Jygar: “Ao final de seus caminhos vocês
encontrarão suas armas. De maneira alguma, não
importa o que aconteça, vocês podem usá-las no
interior da caverna. Então, sem armas! Estou
sendo claro?”
Zairos e Minara assentem com um aceno de cabeça. Pequeno
Urso apenas olha atentamente para Jygar, mas diante do olhar
severo que seu mentor lhe devolve, ele imediatamente concorda
com repetidos e rápidos movimentos da cabeça calva. Falcão da
Lua entrega uma tocha de chamas azuladas para Pequeno Urso e
segura seus ombros de um jeito firme, mas gentil.
Falcão da Lua: “A chama de nosso deus. Lá
dentro, quando você respirar o Hálito do Dragão,
Ghoddrak irá testar a força da irmandade entre
vocês, e também suas almas, criança. Lembre-se
disto.”
Minara recebe uma tocha semelhante das mãos de Kaijin. Ele
lhe dá um beijo carinhoso na testa.
Kaijin: “Eu quase perdi minha mente lá dentro...”
Ele desvia o olhar, por um segundo, para uma grande cicatriz
no abdômen de Falcão da Lua.
Kaijin: “Falcão da Lua quase perdeu a vida. Tome
cuidado... e cuide deles também.”
Pequeno Urso: “ELE está realmente aí dentro?”
Feigon: “Eu acredito que Ghoddrak nos observa lá
de cima, mas muitos acreditam que sim, que ele
está aí.”
Jygar pega uma tocha de Feigon e a dá para Zairos.
Jygar: “Você não vai enfrentar seus deuses quando
entrar, mas seus demônios. Não acredite no que
você vê, mas sim no que você realmente é.”

DENTRO DA CAVERNA
(SEGUNDOS DEPOIS)
Zairos, Minara e Pequeno Urso adentram a inóspita e escura
caverna. O movimento dos três provoca pequenos redemoinhos no
Hálito do Dragão, a tênue névoa verde que os circunda com um
leve e suave cintilar sob a trepidante luz azulada de suas tochas.
Pequeno Urso tapa o nariz, apertando-o com os dedos enquanto
contorce o rosto em uma careta.
Pequeno Urso: “Que fedor!”
Minara: “Já senti cheiros piores. Nossos narizes
logo vão se acostumar com o Hálito do Dragão.
São nossas mentes que me preocupam.”
Eles caminham em silêncio rumo ao interior da caverna. Em
seu final, a tocha de Zairos revela três túneis, a entrada de cada um
lembrando uma monstruosa e medonha boca escancarada coberta
de compridos dentes de pedra.
Zairos: “Uma para cada um de nós.”
Minara concorda com um aceno de cabeça e avança
determinada em direção a uma das passagens, enquanto Pequeno
Urso vira e contorce o rosto como se tivesse visto algo assustador.
Pequeno Urso: “A boca do túnel arreganhou os
dentes para mim!”
Zairos: “É só o Hálito do Dragão pregando uma
peça em nossos olhos.”
Pequeno Urso olha atentamente à frente, os olhos ainda cheios
de medo. Minara caminha de volta até seu gigantesco amigo de
mente de criança. Ela pega suas mãos enormes e gentilmente o faz
se abaixar. Timidamente ele desvia o olhar enquanto se apoia em
um dos joelhos, deixando o rosto dele e de Minara na mesma
altura.
Minara: “Eu também estou com medo. Mas eu sou
apenas uma menininha frágil e se um guerreiro
com esse tamanho todo como você pensa que nós
não podemos fazer, acho que vou ter de desistir
também.”
O homenzarrão fita os doces, mas firmes, olhos de Minara,
ainda mais azuis diante do fogo azulado das tochas e recupera sua
coragem, sua confiança. Ele não pode decepcioná-la, nem a
Zairos, nem a Jygar, nem aos outros.
Pequeno Urso: “Vamos fazer o que temos de fazer,
menininha frágil!”
Ela lhe dá um beijo carinhoso na bochecha. Ele abre um
sorriso, se levanta e com largos e rápidos passos caminha até a
entrada do túnel a sua frente. Ele se detém por um segundo para
encarar os contornos assustadoramente bizarros que contornam a
entrada. Ele faz uma careta de desdém e entra resoluto pela
passagem.
Minara dá uma piscadela para Zairos e dispara, adentrando
outra passagem logo em seguida. Zairos se prepara para seguir
também sua jornada, quando escuta a bela voz feminina que chega
do interior do túnel, reverberando por toda a caverna.
Minara: “Tome cuidado!”
Zairos: “Você também!”
Zairos então corre determinado para a passagem remanescente.
Com a respiração pesada, Zairos percorre o estreito e sinuoso
túnel. O Hálito do Dragão assume uma densidade mais espessa,
espalhando uma coloração esverdeada no local e atenuando o
brilho da tocha. Conforme ele avança com cautela, a névoa verde
se torna cada vez mais densa.
Alguns passos depois, gotas começam a cair do teto escuro do
túnel, atingindo seus ombros e logo depois sua cabeça. O jovem
guerreiro olha para cima e uma das gotas atinge sua boca. Em um
ato reflexo, ele lambe a gota espalhada em seus lábios. Com uma
expressão de repulsa, ele imediatamente cospe longe o líquido e
limpa a boca com os dedos. Então olha para as pontas dos
mesmos. Eles estão vermelhos, manchados de sangue!
Ele ergue a tocha para iluminar o teto e percebe que ele está
coberto do líquido vermelho e grosso, que goteja lentamente, sem
parar. Ele aproxima a tocha do solo para ver poças de sangue por
todo o chão. Uma lufada de vento quase apaga a tocha, mas ela
recupera sua luminosidade prévia em poucos instantes. Zairos olha
adiante e, vários metros à frente, se depara com uma figura
humana imóvel, em uma parte larga do túnel. Zairos caminha lenta
e cautelosamente em sua direção. Enquanto se aproxima, aos
poucos seus olhos começam a identificar, através da névoa, os
contornos de um homem morto, empalado verticalmente em uma
familiar lança de duas pontas. Uma de suas extremidades ancorada
firmemente no chão ensanguentado, a outra ponta saindo pela base
do crânio inclinado para frente.
Zairos corre na direção dele. Quando atinge o local, um forte
arrepio percorre seu dorso no mesmo momento em que uma forte
e gélida rajada de vento apaga a chama da tocha. A caverna torna-
se ainda mais sombria diante da tênue luminescência enevoada do
Hálito do Dragão. Sua visão vai se acostumando com o escuro,
conforme ele caminha cuidadosamente rumo ao corpo de pé, a sua
frente. Ele franze o cenho em um esforço para distinguir as feições
do homem empalado, ao mesmo tempo encoberto e iluminado pela
fantasmagórica neblina. A cada passo, o rosto fica cada vez mais
visível até que a face fúnebre repentinamente abre os olhos. Ao
mesmo tempo Zairos finalmente o reconhece: seu pai!
Em choque, ele cambaleia para trás enquanto deixa cair a tocha,
já inútil. Sua respiração se acelera ainda mais quando a figura sem
vida de seu pai ergue lentamente o braço, apontando para um túnel
lateral. Os olhos assustados de Zairos se movem para o local
indicado pela mão cadavérica. Envolto nas sombras, na entrada da
passagem lateral, vários metros distante, se esconde outro vulto,
também humano. Em sua face encoberta em trevas, um olho
branco solitário brilha de maneira incomum, como a lua cheia
clareando a noite escura. O vulto se inclina à frente, revelando, sob
a fraca luz da névoa fluorescente, sua identidade. Olho da Noite
gargalha, zombando de Zairos.
O jovem Dragão fecha os punhos, cerra os dentes. A névoa se
move como em um sopro descomunal, atingindo sua nuca. Ele
olha de volta para a figura de seu pai, mas ele não está mais lá. Ele
se vira rapidamente em direção a Olho da Noite, mas seu inimigo
também se foi. Zairos abaixa a cabeça e fecha seus olhos.
Zairos: “Eu vou matar esse desgraçado, Papa... Eu
te prometo que vou.”
Um grito reverbera pelas paredes da caverna. Um grito de
mulher. O grito de Minara!
Zairos corre através da passagem onde seu algoz estava
segundos atrás, emergindo em uma câmara muito maior. Muitos e
muitos metros à diante e alguns metros abaixo, em um nível
inferior da caverna, Olho da Noite ataca Minara com um pesado
martelo de guerra. Ela desvia o corpo e, com um ágil salto, gira no
ar para acertar seu peito com um poderoso chute, que o derruba no
chão. Ela corre em direção a uma parede alta, desenhada com
antigas pinturas de armas. Um conjunto de espada e escudo, um
par de espadas gêmeas curtas e um longo martelo de guerra.
Abaixo de cada imagem se encontram as armas correspondentes,
exceto o martelo.
Zairos encontra um caminho para acessar a parte baixa da
caverna, uma parede íngreme a alguns passos dele. A toda
velocidade, ele inicia a descida para alcançá-los o quanto antes e
poder ajudar Minara.
A bela guerreira alcança as espadas duplas e as segura pelos
cabos. Ela congela o corpo por um segundo, morde os lábios. Olho
da Noite se aproxima pelas suas costas, suas duas mãos erguendo
horizontalmente o longo martelo para esmagar-lhe a lateral da
cabeça. Em um movimento súbito, ela larga as lâminas e rola para
o lado em direção ao escudo. O martelo se choca estrondosamente
contra a parede, fazendo-a vibrar. De joelhos ela arrebata o escudo
e o ergue no tempo exato de bloquear com dificuldade mais um
poderoso golpe.
Minara ataca o joelho do adversário com o escudo. Ele salta
para trás, ela rapidamente se levanta e afasta-se da parede, sendo
perseguida pelo oponente que avança furioso contra ela.
Zairos alcança o chão e dispara em direção a eles, ao mesmo
tempo em que vê os golpes de Olho da Noite se tornarem cada vez
mais violentos e as defesas de Minara começarem a fraquejar.
Enquanto se aproxima do ponto do embate, ele passa próximo à
grande parede e, sem perder a passada, pega do chão a espada
longa em frente a ela.
O martelo gira com velocidade e força surpreendentes. Atinge a
borda do escudo de Minara com tanta violência, que o arranca de
suas mãos. Olho da Noite urra enquanto rapidamente move o
martelo para um ataque mortal contra ela. Zairos está a poucos
passos deles e dá um longo salto. O tempo parece caminhar
lentamente enquanto Zairos, ainda no ar move a espada em
direção ao pescoço de seu odiado inimigo, que se vira para ele.
Minara aproveita essa fração de segundo para pegar o escudo de
volta. A lâmina corta o ar, se aproximando do pescoço de Olho da
Noite. Este apenas fecha os olhos, aguardando sua cabeça ser
cortada fora. Mas algo atinge em cheio o queixo de Zairos,
interrompendo o ataque no último milissegundo.
Um grito ecoa pelo salão.
Minara: “Sem armas!”
Zairos se choca contra o chão, junto com o escudo arremessado
por Minara. Atordoado, com as mãos e joelhos apoiados no chão
ele observa Olho da Noite renovar seus ataques contra sua
companheira. Ela grita algo para seu oponente, mas um zumbido
nos ouvidos de Zairos faz as palavras esmaecidas demais para
serem compreendidas.
Ele sacode a cabeça, aperta os olhos antes de abri-los para
clarear a visão, enquanto luta cambaleante para se levantar.
O zunido começa a ceder lugar à vozes do passado, ressonando
em sua mente.
Zairos Criança: “Então podemos entrar na
caverna para procurar o Deus Dragão?”
Irmã Lobo: “... Seu hálito... pode levar um homem
à loucura.”
Jygar: “Não acredite no que você vê, mas sim no
que você realmente é.”
Zairos fixa os olhos no combate à sua frente. Minara se abaixa
de um golpe circular do martelo que passa a poucos centímetros de
sua cabeça, mas Olho da Noite retorna com um ataque usando o
cabo para atingir seu rosto, derrubando-a. Ele grita para Minara.
Olho da Noite: “Onde está meu irmão?”
Minara, ainda grogue pelo golpe, apenas balança lateralmente a
cabeça em resposta à inusitada pergunta. Ele então ergue o
martelo, pronto para esmagar-lhe o crânio.
Zairos: “NÓS somos os seus irmãos!”
Ele se vira para Zairos. Confusão substitui a fúria no rosto de
Olho da Noite. Ele pisca e seu olho danificado se torna um olho
normal, envolto em lágrimas. Sob o olhar admirado de Zairos,
Olho da Noite se transforma lentamente em Pequeno Urso. O
colossal guerreiro aperta os olhos conforme a imagem da guerreira
de Brummata, com um sorriso manchado de sangue, à sua frente
começa a perder a nitidez. Ele larga o martelo quando o rosto dela
se modifica para um bem familiar. O rosto de Minara.
Chorando, Pequeno Urso cai de joelhos e a abraça. Minara o
abraça de volta e acaricia sua cabeça. Zairos olha para os dois com
orgulho.
Zairos: “Nós conseguimos!”

COLINA DO DEUS DRAGÃO


(M )
A tempestade atinge impiedosamente a Colina do Deus
Dragão. As árvores ao redor balançam com os fortes ventos, o
chão gramado tenta, sem sucesso, absorver a torrencial chuva. A
fúria da tempestade parece prestar um tributo turbulento ao rigor e
às intempéries dos sete anos de treinamento dos jovens guerreiros.
Um dragão – cabeça erguida, asas abertas – espreita, imóvel, no
topo da colina.
Um relâmpago revela que é um dragão esculpido em ferro, no
topo de um altar.
Cuidadosamente postados sobre o altar, repousam um pesado
martelo de guerra, um par de espadas gêmeas, e um conjunto de
escudo e espada.
Agachados sobre um dos joelhos, os três antigos Dragões e os
três jovens fitam Feigon, diante deles.
Feigon: “… um homem irá morrer a cada batalha.”
Minara sussurra para Zairos.
Minara: “Ou mulher.”
Ele sussurra de volta.
Zairos: “Não, não uma mulher. Você nunca irá
morrer porque eu nunca vou permitir.”
Minara sorri.
Pequeno Urso: “Shhh!”
Feigon: “O sacrifício de um grande guerreiro em
prol da liberdade e da vida de inúmeros
inocentes.”
Feigon ajoelha-se diante do altar e derrama um denso líquido
azulado nas armas, enquanto profere palavras ancestrais em prece.
Um raio atinge o altar. Faíscas correm pelos olhos e boca do
dragão de ferro, em um espetáculo ao mesmo tempo belo e
assustador. O óleo começa a queimar, espalhando sobre as armas
uma suave chama azul.
Feigon: “Ghoddrak, o Deus Dragão, abençoou
seus guerreiros novamente!”
Feigon cobre sua adaga cerimonial com o mesmo óleo. O fogo
cor de safira imediatamente envolve sua lâmina. O Sumo
Sacerdote acena para Kaijin se levantar e ir até o altar.
De uma maneira cerimonial, Kaijin pega as espadas gêmeas e
as entrega para Minara. Pequeno Urso aceita o martelo de Falcão
da Lua. Zairos recebe a espada e o escudo de Jygar.
Feigon dá a adaga em chamas para Minara. Ela a usa para
cortar a palma esquerda de Zairos, fazendo uma linha vertical,
levemente curvada. Pequeno Urso pega a adaga flamejante para
completar o símbolo com um corte horizontal, formando uma cruz
curva de sangue na mão do amigo.
Minara e Pequeno Urso recebem também, os mesmos cortes de
seus companheiros, a mesma cruz escarlate desenhada em suas
mãos.
Os três jovens Dragões estendem as palmas ensanguentadas
para Feigon. Ele derrama o líquido azulado nas mãos deles e com
a adaga em chamas, acende o fogo azul em suas palmas. As
chamas mostram um brilho mais intenso sobre as cruzes de
sangue.
Eles esticam as mãos para cima. Elas se tocam, sem ser
afetadas pelas chamas, unindo o sangue dos jovens guerreiros. As
labaredas azuladas envolvem por completo as mãos dos três.
Feigon: “Pelo Sangue e pelo Fogo do Dragão,
vocês são irmãos. Vocês são Dragões da
Tempestade!”
Relâmpagos iluminam o céu, seus trovões ecoam. A forte
chuva fustiga o rosto dos jovens dragões. Eles olham para suas
mãos flamejantes estendidas para os céus. Por trás de algumas
árvores distantes, em um terreno um pouco mais elevado e
montado em seu corcel negro, Olho da Noite os observa com um
misto de raiva e, ao mesmo tempo, desdém. Em um movimento
impulsivo ele se prepara para lançar sua lança. Apesar da distância
ele mira em Zairos, depois em Minara e sorri. Sob a luz do
relâmpago e o som do trovão, Asa Azul passa em um vôo rasante
sobre a cabeça do corcel, assustando-o. O cavalo empina e seu
cavaleiro precisa lutar para não cair. Quando ele se recompõe, nota
que Feigon e os Dragões olham em sua direção. A galope, ele bate
em retirada por entre as árvores.

ESTRADA VERMELHA
Sob a chuva torrencial na noite cada vez mais escura, Olho da
Noite cavalga a toda velocidade na estrada que, cortando a mata,
segue até a cidade de Brummata.

ENTRADA DA CAVERNA NA FLORESTA


O barulho da tempestade se une ao farfalhar das árvores
próximas ao redor da entrada da caverna de dentes de pedra, onde
um lobo furioso grunhe. Dois CAÇADORES de Brummata usam
bastões com um laço em volta do pescoço do lobo para mantê-lo
fora da caverna. Um VELHO GUERREIRO se agacha próximo ao
lobo.
Velho Guerreiro: “Calma, garoto! Só mais um
instante…”
Olho da Noite chega em seu corcel negro. O Velho Guerreiro se
levanta e pega as rédeas do cavalo agitado enquanto Olho da Noite
desmonta.
Velho Guerreiro: “Estávamos apenas lhe esperan-
-”
Olho da Noite: “Agora!”
Os Caçadores afrouxam o laço. O lobo salta pra a caverna.
Olho da Noite olha para a caverna enquanto escuta rugidos
enfurecidos.
Um urro quase humano assusta os Caçadores. Então, um som
de ossos quebrando, seguido por uivos de dor que vão
esmaecendo, até sumirem por completo. O silêncio toma a
caverna.
Com orgulho, Olho da Noite sorri para o Velho Guerreiro.
Olho da Noite: “Parece que os lobos viraram
presas fáceis para a minha aberração. Na próxima,
vamos precisar de algo maior: um urso!”
Os Caçadores concordam, perplexos. De uma algibeira na sela
do cavalo, Olho da Noite pega e encaixa em suas mãos um exótico
par de armas. Seus cabos envolvidos em soqueiras de bronze
guardando os punhos, as lâminas largas posicionadas
perpendicularmente à parte inferior do antebraço, com suas pontas
afiadas se estendendo poucos centímetros a frente do cabo e mais
alguns após o cotovelo, na extremidade oposta.
Portando as armas, ele se dirige para a caverna.
Olho da Noite: “Ei, Bestafera! Você vai precisar
disso para brincar com os ursos. Mas não se
preocupe. Eu vou te ensinar como usar.”

CAMPO DE TREINO DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(M )
A tempestade terminou. Uma grande lua cheia ilumina o campo
de treinamento. Uma fogueira crepita com um javali assando sobre
ela. Os velhos e os jovens Dragões riem em volta dela. Feigon,
capuz baixo, toca uma música alegre em sua flauta. Uma voz
surpreendentemente forte e melódica canta a canção uma antiga
canção barda: a voz de Pequeno Urso! Ele pula sozinho com seu
jeito infantil enquanto canta. Sentado a seus pés, Jygar também
canta, acompanhando seu jovem e gigantesco companheiro. Zairos
dança com Minara. Kaijin então se junta a eles, seguido por Falcão
da Lua. Alegres, eles dão as mãos e dançam em círculos.
Um vulto se aproxima nas sombras. Um galho se parte com um
estampido alto, bastante audível mesmo sob o som da celebração.
Os olhos dos Dragões miram a escuridão. Zairos se move para
frente de Minara e assume uma posição de combate. Irritada com
ele, Minara o empurra e move-se para seu lado. Ela não precisa de
sua proteção! Nas sombras, a figura se move com um objeto em
cada mão. Provavelmente armas. O vulto salta sobre eles.
Segurando o gargalo de duas garrafas de vinho, Orgath sorri.
Aliviado, Zairos o chama com um aceno alegre. Falcão da Lua
e Kaijin caem na gargalhada. Jygar e Feigon sacodem a cabeça
negativamente enquanto seguram a risada. Eles bebem, comem e
conversam. Zairos dança, os braços sobre os ombros de Minara de
um lado e sobre os de Orgath do outro.
Zairos e Minara, exaustos, sentam em um tronco de árvore.
Suas mãos se tocam acidentalmente. Minara segura a mão de
Zairos. Ele olha para ela enquanto aperta delicadamente sua mão
de volta. Orgath percebe, se aproxima deles e estende a mão para
Minara.
Orgath: “Venha, vamos dançar um pouco mais.”
Minara aceita sua mão e se levanta. Zairos baixa os olhos.
Minara: “Foi um grande dia, mas eu preciso
começar a treinar amanhã cedo para o Festival.
Afinal, eu não posso desapontar vocês, meninos.”
Orgath: “Nos desapontar? Nunca! Eu… é… O
povo de Thalderan vai amar ver você… vocês...
novos Dragões mostrando suas habilidades para o
mund--”
Zairos: “Ei! Ainda faltam sete ciclos do sol para o
Festival do Dragão.”
Minara dá a Zairos um olhar doce e caloroso, seguido de uma
piscada. Em seguida, dá as costas para eles e se dirige para os
jardins. Zairos baixa os olhos novamente.
Kaijin, Falcão da Lua e Orgath cercam Zairos.
Kaijin: “Vocês são dragões crescidos agora. O que
você está esperando?”
Zairos: “Eu não sei. Eu tenho medo de --”
Falcão da Lua: “Medo? Um Dragão da
Tempestade não pode ter medo de uma linda
garota.”
Kaijin pega uma flor próxima, uma orquídea selvagem, e a
entrega a Zairos. Falcão da Lua sorri e acena com a cabeça para
Zairos. Ele devolve o sorriso e vai atrás de Minara.
Orgath franze o cenho, e começa a caminhar na direção de
Zairos. Sorridente, Falcão da Lua segue Zairos também, mas
Kaijin puxa Orgath pelo colarinho e Falcão da Lua pela orelha.
Falcão da Lua: “Ai!”
Kaijin: “Agora é com ele, meus românticos
amigos.”
Ele se dirige então para Orgath.
Kaijin: “O jeito que você olha pra ela… agora
tenho certeza de que você não vem aqui só para
visitar Zairos e assistir nosso treinamento,
rapazinho.”
Falcão da Lua: “Hahaha. Com toda essa sua
sabedoria, você só descobriu isso agora, meu
querido irmão?
Orgath grita com Zairos como se estivesse brincando, mas seu
tom revela um misto de raiva e frustração.
Orgath: “A garota é minha! Fui eu quem a viu
primeiro! Lembra?”
Sem resposta. Zairos já se foi. Orgath baixa a cabeça e dá a
Kaijin um sorriso triste quando este pousa a mão em seu ombro.

JARDINS DO TEMPLO DOS DRAGÕES


( )
Minara caminha sob o céu estrelado. Seus cabelos, longos e
negros, brilham banhados pela luz da lua cheia. Ela se detém para
admirar uma rosa. Zairos se aproxima e dá a orquídea para
Minara. Ela sorri, cheira a flor e olha para ele carinhosamente.
Zairos: “Bela, rara e… selvagem! Lembra alguém,
não?”
Minara dá uma risadinha.
Minara: “Eu sempre me lembro do dia em que
você me salvou. Na verdade o dia em que Feigon
nos salvou.”
Minara sorri, zombeteira dessa vez. Zairos, aborrecido, tenta
reclamar, mas ela continua falando.
Minara: “Você acha que é um grande lutador, mas
no meu primeiro dia de treino, eu já derrubei
você.”
Minara salta sobre Zairos e o derruba no chão. Os joelhos
pousam pesadamente sobre os braços abertos de Zairos,
aprisionando-os. Um dos braços dela sob a cabeça dele, o outro
pressionando seu pescoço como em um estrangulamento. Zairos,
imóvel, aprecia o lindo rosto de Minara, o céu estrelado ao fundo.
Ela aproxima seus lábios dos dele. Eles quase se beijam. Minara,
constrangida, salta para o lado e se afasta para apreciar a lua.
Minara: “Viu? Eu poderia ter acabado com você.”
Zairos sacode a cabeça. Eles olham um para o outro em
silêncio. Um grilo chilreia.
Zairos: “Noite passada eu sonhei que tinha um
filho. E eu ensinava a ele não apenas a lutar, mas
pelo que lutar. Do jeito que meu pai me ensinou…
Eu queria ter uma família de novo, sabe?”
Minara: “Mas você já tem uma família. Jygar e
Feigon cuidam de nós como se fôssemos seus
filhos. Sem falar no Falcão da Lua e no Kaijin. E
não se esqueça do Pequeno Urso e de mim. Até
mesmo Orgath. Somos todos irmãos. Sempre
seremos!”
Ele se levanta abruptamente e se afasta. Ela vai atrás dele.
Minara: “Ei, o que houve?”
Zairos: “Eu não quero ser seu irmão!”
Minara: “Que bom. Eu também não quero ser sua
irmãzinha.”
Ela se aproxima e carinhosamente coloca uma das mãos na
cintura de Zairos a outra atrás do pescoço dele, acariciando seu
cabelo. Minara aproxima os lábios novamente. Ele não consegue
se mexer, encantando pelos olhos azuis que o fitam
apaixonadamente. Um segundo antes deles se beijarem, Minara
desvia a cabeça para o lado e sussurra em seu ouvido.
Minara: “Seu filho também poderia aprender a
lutar com a mãe! O que você acha?”
Zairos começa a balbuciar algo, mas seu corpo voa pelo ar,
arremessado por Minara. Quando ele encontra o solo, Minara
ajoelha sobre ele, sentando-se em sua barriga, as mãos
pressionando o peito do jovem guerreiro.
Minara: “Viu? Venci de novo.”
Zairos lhe segura os braços, vira o corpo e a derruba. Ele
imediatamente monta sobre ela, com um sorriso orgulhoso.
Zairos: “Um Dragão da Tempestade não pode ser
vencido!”
Ela reage e torce um de seus braços, deixando o rosto de Zairos,
ligeiramente contorcido pela dor, mais próximo do dela. Minara o
encara com um sorrisinho irônico nos olhos e no canto da boca.
Minara: “Eu também sou Dragão da Tem…”
Zairos: “Você é mais do que isso. Você é uma
princesa… minha princesa!”
Ela congela por um segundo. Ele beija seus lábios e eles rolam
no solo gramado e macio, permitindo que ele mova seu corpo
sobre o dela. Seus beijos demoram e ficam mais quentes. Em
poucos segundos eles removem suas roupas, revelando seus
corpos perfeitos banhados em um brilho prateado. Eles rolam de
novo, o corpo dela sobre o dele agora. Suas silhuetas se tornam
uma só, dançando em um ritmo crescente e perfeito,
acompanhadas pelo canto de seus sussurros gemendo enquanto
fazem amor apaixonado sob a lua cheia.

FLORESTA DE BRUMMATA
(D )
Sob um sol escaldante, um urso enorme desmorona sem vida às
margens de um rio na floresta. Diante dele, BESTAFERA – pele
negra, barba falha, dois metros de músculos e cicatrizes – urra.
Bestafera se apoia nas ensanguentadas soqueiras de bronze de suas
armas de lâminas laterais e caminha de quatro, como um animal,
grilhões de ferro em volta de seus tornozelos, pulsos e pescoço.
Ele ergue o rosto selvagem e os olhos bestiais para encarar Olho
da Noite, que acena com a cabeça e sorri com orgulho.
Olho da Noite: “Próxima lição: caçada humana!”
Capítulo 5

V M
3 MESES DEPOIS...

CAMPO DE TREINO DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(D )
O sol está a pino. A areia batida do chão do campo de
treinamento refletindo as ondas de calor. Zairos, espada e escudo,
enfrenta Minara, espadas gêmeas. Jygar treina com Pequeno Urso
e Kaijin com Falcão da Lua. Minara dispara uma série de golpes
que Zairos defende com esforço. Ela para repentinamente, seu
rosto se contorce. A bela guerreira se agacha e baixa a cabeça.
Zairos: “Ei, o que aconteceu?”
Minara franze a testa.
Minara: “Nada.”
Ela senta no chão, sem ar, a face pálida. Zairos se abaixa ao
lado dela e envolve as mãos de Minara com as suas.
Zairos: “Você tem estado diferente, ultimamente.”
Minara: “Você também.”
Zairos: “Eu tenho assuntos inacabados para--”
Minara: “Você nunca vai esquecer isso? Vingança
é sempre uma escolha tola. Isso não pode ser mais
importante que nós, que todos nós.”
Zairos: “Olho da Noite matou meu pai!”
Minara: “Todos nós somos órfãos. Todos temos
tragédias em nossas vidas.”
Zairos se vira e baixa a cabeça em silêncio.
Minara: “Olha o Pequeno Urso.”
A poucos metros, Pequeno Urso para de lutar e sorri para eles.
Jygar lhe dá um tapa amistoso na orelha e eles continuam o treino.
Minara: “O pobre garoto teve os pais trucidados
por ursos. Ele e o irmão foram criados por esses
mesmos ursos. Ursos!”
Zairos: “Então o irmão e a nova mãe urso foram
mortos por caçadores e Irmã Lobo o encontrou. O
que isso tem a--”
Minara: “Ele está sempre feliz. Sempre agradecido
por ter uma nova família, por ter uma missão
sagrada de--”
Zairos: “Paz? Com ele vivo? Você esquece que ele
é o Imortal?”
Minara: “Não use uma velha profecia para fingir
que sua vingança é uma missão de paz.”
Minara se levanta e vai embora. Zairos observa pensativo.

ESTRADA VERMELHA
(N )
Por entre as árvores, a luz da lua cheia e das estrelas banha
Zairos e Orgath em seus cavalos, à beira da estrada.
Orgath: “Eu vou reunir meus homens e ir com
você.”
Zairos: “Isso quebraria o Pacto.”
Orgath: “Assim vou começar a acreditar que você
tem medo de velhas lendas.”
Zairos: “Ghoddrak nos observa, Orgath.”
Orgath: “E o que vai acontecer? Ele vai descer dos
céus e nos destruir?”
Zairos: “Talvez.”
Orgath: “Bosta de dragão! Você é inteligente
demais para não acreditar nessas histórias de
criança, então eu vou lhe dizer exatamente o que
vai acontecer. Guerra! E o melhor: A guerra que
há tanto esperamos.”
Zairos: “Você não quer Guerra com todas as
cidades de todas as nações unidas contra aquele
que ousou desafiar o Deus Dragão.”
Orgath: “É… Você está certo… mas você pode se
unir a Axengard como seu campeão! Vamos
marchar juntos contra Brummata e Olho da Noite.
Nosso antigo plano!”
Zairos: “Um plano infantil! Quem eu terei de
derrotar para atravessar Thalderan? Pequeno Urso?
Jygar? Minara?”
Constrangido, Orgath baixa a cabeça.
Zairos: “Guerra nunca será uma escolha para mim.
Eu preciso ir sozinho atrás dele, você sabe disso.”
Ele estende a mão esperando receber algo. Orgath lhe dá um
mapa. Zairos o pega e parte, galopando a toda velocidade na
estrada de terra. Atrás de Zairos, a uma grande distância, um
cavalo negro corre pela estrada, seu cavaleiro irreconhecível sob
um manto escuro. O canto de um pássaro rouba a atenção de
Zairos. Ele para e observa o Cardeal Vermelho conforme ele voa a
seu redor e mergulha na trilha para a Clareira do Rio das Brumas.
Zairos o segue.

CLAREIRA DO RIO DAS BRUMAS


( )
A clareira parece resplandecer com a suave luz da noite
estrelada de lua cheia. Irmã Lobo, agachada em frente ao rio,
acaricia dois filhotinhos, um LOBO BRANCO e um LOBO NEGRO.
Zairos desmonta e se aproxima com um sorriso. Irmã Lobo sorri
de volta e se levanta. Os dois se entreolham em silêncio por alguns
instantes.
Zairos: “Sinto saudade de suas histórias.”
Irmã Lobo: “Você só precisa se lembrar de uma
antiga… Traição entre irmãos, homens matando a
própria família, os Dragões da Tempestade caindo
junto com as nações que eles sempre protegeram.”
Zairos: “Eu nunca esqueci a Profecia. É por isso
que eu tenho de detê-lo.”
Irmã Lobo: “Ir atrás de Olho da Noite é suicídio.
Ele é protegido pelos seus asseclas dia e noite.
Esqueça a ideia de que ele é o Imortal. Seja
paciente, aguarde que o destino chame você.”
Zairos: “Meu destino é matar Olho da Noite,
agora!”
Minara: “Ou ser morto por ele?”
Minara, vestida em um manto escuro, desmonta do cavalo
negro e se aproxima.
Zairos: “Você não devia ter vindo, ninguém vai me
impedir, Minara.”
Minara: “Errado! Há uma pessoa que pode impedi-
lo e ela está aqui agora.”
Ela derrama uma lágrima e sorri, apontando para a própria
barriga. Zairos levanta uma sobrancelha.
Zairos: “Você?”
Minara: “Não, seu bobo. Aqui dentro…”
Zairos arregala os olhos e sorri. Ela acena com a cabeça. Ele
acaricia a barriga de sua companheira e a abraça com força.
Minara o empurra suavemente.
Minara: “Se você for atrás dele, a qualquer tempo,
eu vou estar do seu lado, com nosso filho, para
viver ou morrer.”
Ele se ajoelha, beija sua barriga e fita os olhos úmidos de
Minara.
Zairos: “Eu nunca vou deixar você ou nosso filho
morrerem, nunca.”
Irmã Lobo concorda com um sorriso. Zairos se levanta e abraça
Minara novamente. Ela fecha os olhos e repousa a cabeça no peito
dele.
Zairos: “Vamos para casa, mas antes...”
Tocando carinhosamente a barriga de Minara, Zairos se vira
para Irmã Lobo.
Zairos: “Um dragãozinho menino ou menina?”
Irmã Lobo se aproxima e, de olhos fechados, encosta
delicadamente a mão no ventre de Minara por alguns segundos.
Irmã Lobo: “Certamente um dragãozinho macho.”
Eles se entreolham com grandes sorrisos. O feliz casal toma um
pequeno susto e olha para baixo. Os lobinhos lambem suas pernas.
Os dois se agacham para brincar com eles. Minara pisca para Irmã
Lobo.
Minara: “Parece que sua família também
aumentou. Você não é mais um lobo solitário, não
é mesmo?”
Zairos: “É. Parece que a Irmã Lobo é agora uma
mãe lobo.”

CASA DE GUERRA DE AXENGARD


(D )
Cruzados na parede de um salão luxuoso cheio de móveis
finamente acabados, grandes machados de prata, incrustados de
esmeraldas, refletem a luz da lareira. Em torno da grande mesa
oval de tampo de jade ao centro, Orgath discute com Avernath.
Orgath: “Não, pai, Zairos nunca vai se unir a nós.”
Avernath: “Então é hora de encontrar um outro
motivo para suas visitas a Thalderan.”
Orgath: “Zairos salvou minha vida. Somos irmãos
por um pacto de sangue. Não é o suficiente?”
Avernath: “Os Dragões da Tempestade são
inimigos de nossa nação. Eu que te pergunto: “não
é o suficiente?”
Orgath: “Suficiente para quê?”
Avernath: “Para que você cumpra seu dever com
sua nação, com sua família, com seus ancestrais.
Axengard precisa de você.”
Ele dá a Orgath um pequeno frasco com um líquido verde.
Orgath: “O que é isso?”
Avernath: “Uma essência rara, criada do Hálito do
Dragão, coletada da Caverna. Um presente de um
velho inimigo para nos ajudar em um desejo em
comum: “guerra!”
Orgath: “O que você es--”
Avernath: “Uma única gota cria ilusões, confunde
a mente. Enlouquece qualquer homem e o torna
um assassino descontrolado já nos primeiros
segundos. Muitas vezes, após a loucura, os
transforma em escravos leais. O veneno perfeito.”
Orgath: “Você quer que eu os envenene?”
Avernath: “Tire seus amigos dragões do nosso
caminho. Traga para Axengard a guerra gloriosa, a
conquista de Thalderan e o poder que nenhum de
nossos ancestrais foi capaz de conseguir.”
Orgath, furioso, arremessa o frasco no chão. Ele se espatifa aos
pés de Avernath.
Avernath salta sobre Orgath e o segura pelo colarinho
violentamente.
Avernath: “Você sabe o quanto isso é raro? Nossa
glória depend--”
Uma inesperada voz grave corta sua fala.
General Uldresh: “Você nunca vai entender,
Avernath. Não há glória em traição e desonra,
filho.”
Avernath se vira para o General que o fita severamente
enquanto adentra o recinto. Avernath trinca os dentes e volta o
rosto furioso novamente para Orgath, que, irritado, empurra o pai
com força enquanto grita.
Orgath: “Eu nunca vou trair meus amigos!”
Avernath perde o equilíbrio. Quando ele cai, os cacos de vidro,
imersos no veneno verde derramado, cortam sua mão. Ele fita a
mão machucada. A poção verde se mistura com seu sangue. Veias
finas e esverdeadas começam a surgir em seu corpo. Ele move a
cabeça de um lado para o outro enquanto as veias esverdeadas
parecem se mover braço acima até chegarem a suas pálpebras
inferiores e lá permanecerem. Avernath então se vira para seu pai e
seu filho, mas, sob o efeito do veneno feito do Hálito do Dragão, a
realidade em sua mente se modifica e sua vista embaçada vê Jygar
e Zairos no lugar de seus familiares. Seus olhos se arregalam. Ele
urra enquanto desembainha a espada e corre furiosamente contra
eles.
Avernath: “Malditos dragões do inferno, eu vou
matar vocês!”
O General consegue agarrar o pulso de Avernath enquanto
Orgath o empurra contra a parede, gritando por ajuda.
General Uldresh: “Guardas! Lissa! Rápido!”

SEIS MESES DEPOIS...

INTERIOR DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(D )
Jygar caminha apressado por entre os corredores do templo.
Zairos, Orgath e Pequeno Urso o seguem. Ele para diante da
entrada de um quarto e bate gentilmente na porta fechada.
Jygar: “Zairos está aqui.”
Uma voz feminina responde de dentro do quarto.
Velha Senhora: “Fale pra ele esperar!”
Pequeno Urso: “Meu sobrinho está chegando!”
Orgath: “Por que não uma sobrinha?”
Pequeno Urso: “Irmã Lobo previu. Ela nunca se
engana.”
Com um sorriso zombeteiro, Orgath pousa a mão no ombro de
Pequeno Urso.
Orgath: “Mas como assim, seu sobrinho? Zairos não é
seu irmão de verdade.”
Pequeno Urso: “É sim! E Minara é minha irmã. Então eu
vou ser tio duas vezes. Duas vezes.”
Pequeno Urso sorri e mostra, orgulhoso, a cicatriz em sua
palma.
Pequeno Urso: “Tio de sangue!”
Orgath sorri de volta.
Pequeno Urso: “Você é irmão de Zairos, então até você é
meu irmão. Um irmão feio e irritante, mas mesmo assim
meu irmão.”
Orgath olha sorridente para a cicatriz em sua própria mão.
Orgath: “Você está certo, gorducho. Eu sou seu
irmão. Sendo assim, eu também vou ser tio,
certo?”
Pequeno Urso gargalha com seu jeito infantil e abraça Orgath
com muita força. O sorriso deste se desfaz em uma careta
enquanto ele tenta se soltar do abraço.
Orgath: “Você está quebrando minhas costelas! Eu
não sou um urso igual a sua família de verdade.”
Furioso, Pequeno Urso o joga com violência através da sala.
Orgath se choca com força contra a parede.
Pequeno Urso: “Não zombe da minha família!”
Alheia ao incidente, uma Velha Senhora abre a porta e sorri.
Velha Senhora: “Venha! Rápido! O pequeno
dragão já está saindo do ovo.”
Com os olhos assustados, Zairos fita Jygar, que gesticula para
ele entrar enquanto se move para ajudar Orgath. Zairos dispara
para dentro do quarto. Em seu interior, Minara – deitada na cama,
pernas dobradas – geme enquanto seu rosto se contorce.
Zairos pega uma bacia de água quente, enquanto observa, um
pouco assustado, Feigon ajudar Minara no parto.
Feigon: “Não fique aí parado, garoto! Pelo menos
segure a mão dela.”
Zairos segura a mão de Minara. Ela sorri, mas o sorriso se
desfaz em caretas e gemidos: o bebê, NAIRON, nasce.”
O choro de Nairon preenche o quarto. Feigon dá um largo
sorriso e levanta o bebê sobre a cabeça.
Feigon: “Como previsto, um forte e saudável
dragãozinho macho.”
O choro do bebezinho fica mais alto e o velho sacerdote o
coloca nos braços de Minara. Ela aproxima o rosto do dele e
começa a cantar com uma voz doce e suave. O choro de Nairon se
transforma em gemidinhos cada vez baixos e depois em silêncio
enquanto ele ouve a velha canção de ninar:
Minara:
♫ Não tema a fúria da tempestade,
Nem a escuridão que chega ao anoitecer,
Porque estarei ao seu lado, de verdade,
Em cada caminho que você escolher.
Quando a chuva cair, eu serei seu abrigo,
Nas sombras serei a luz do seu luar,
Sim, eu sempre, sempre estarei contigo,
Em todas as batalhas que você quiser lutar.
Mesmo se o vento sussurrar que vou embora,
Ou o destino simplesmente te tirar de mim,
Do seu coração nunca me deixe de fora,
E você estará comigo, mesmo após o fim.
Mesmo depois que o céu, o meu nome chamar,
Você não estará sozinho, em momento algum.
Feche os olhos, e se dessa nossa canção você lembrar,
Estaremos juntos, e de novo então, seremos um. ♪
Feigon coloca Nairon nos braços de Minara. Zairos acaricia
seus cabelos enquanto olha para seu filho. Eles sorriem com olhos
marejados por lágrimas de felicidade.
Minara: “Bem-vindo, Nairon!”

FLORESTA DE BRUMMATA
(N )

CLAREIRA NA ENTRADA DA CAVERNA


Uma grande fogueira ilumina e aquece a noite escura. Os
guerreiros de Olho da Noite mantêm cativos três caçadores de
Axengard. Agachado ao lado de Olho da Noite, Bestafera –
correntes com grilhões em volta de seus pulsos, tornozelos e
pescoço – respira pesadamente. Três caçadores de Brummata
seguram firmemente cada uma das cinco correntes.
Olho da Noite se volta para os caçadores de Axengard.
Olho da Noite: “Agora vocês são as presas!”
Os guerreiros libertam os Caçadores de Axengard. Eles correm
para a floresta. Os caçadores de Brummata afrouxam as correntes,
mas Bestafera não se move. Olho da Noite o encara furiosamente.
Olho da Noite: “Atrás deles!”
Bestafera permanece imóvel. Seus olhos recobram a
humanidade enquanto ele responde com uma voz abafada, gutural.
Bestafera: “Não!”
Olho da Noite lhe dá uma bofetada. Bestafera tenta atacá-lo,
mas os caçadores de Brummata puxam as correntes. Eles se
esforçam para contê-lo, o sangue escorre pelos grilhões.
Olho da Noite: “O povo deles matou a sua família!
Matou a minha! Eu salvei você. Eu sou a única
família que te restou.”
Bestafera olha com ódio para os grilhões ensanguentados em
seus punhos e encara furiosamente Olho da Noite. Este lhe
devolve o olhar com fúria ainda maior.
Olho da Noite: “Sim, sua família pode machucar
você, ferir você! Mas ainda é sua maldita família!”
Eles se entreolham. Bestafera parece enxergar através do olho
esbranquiçado de seu captor enquanto o passado invade a mente
de Olho da Noite.

16 ANOS ATRÁS...

TEMPLO DE BRUMMATA
(D )
Altas paredes feitas de imensos troncos de madeira, torcidos
e entrelaçados, adornadas com coberturas de hera e dragões
entalhados, formam um grande salão, iluminado por diversas
tochas e piras. Nove meses após o ataque de Albax, Lótus de
Fogo, em trabalho de parto. Grávida, ela grita em desespero
quando toca a barriga imensa. Ao lado de duas sacerdotisas, seu
irmão, CARVALHO SAGRADO, o sacerdote regente – negro, 30 anos,
cabelos em tranças – a abraça tentando acalmá-la. Muito agitada
ela balança a cabeça de um lado para o outro, sem parar,
enquanto grita em agonia.
Lótus de Fogo: “Não, não. Por Ghoddrak, não.”
Ela percebe a faca na cintura do irmão, e em impulso ela a
pega e fura sua própria barriga. As mulheres ajudam o Sacerdote
Regente a desarmá-la e depois a contê-la enquanto ele tenta
estancar o sangue com um pano branco.
MAIS TARDE...
Carvalho Sagrado tem um recém-nascido chorando em seus
braços. O olho esquerdo do bebê sangra. Ele limpa o olho ferido
com um pano, então sacode a cabeça conforme olha para a faca,
coberta de sangue no chão. Lótus de Fogo, de joelhos, abraça o
bebê e chora copiosamente. O olho esfaqueado totalmente branco
e cego.

DE VOLTA AO PRESENTE:
A mente de Olho da Noite retorna do passado. Ele segura
gentilmente os braços de Bestafera, que bufa por algumas vezes,
mas em seguida para de se debater.
Olho da Noite: “Na próxima vez eu vou lhe dar
vingança: o jovem líder de Axengard, Orgath!… E
através do sangue dele você vai trazer a Profecia à
vida.”
Olho da Noite abre os grilhões. Bestafera dispara para dentro da
floresta. Dentro dela, uma sombra caça os caçadores. Pouco tempo
depois, rugidos quase humanos, são seguidos de gritos totalmente
humanos de desespero e dor. Olho da Noite balança a cabeça mais
uma vez com satisfação e orgulho.

UM ANO DEPOIS...

JARDINS DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(D )
Os jardins do templo parecem mais floridos do que nunca sob
a luz do sol radiante.
Sorridente, Zairos segura sobre sua cabeça seu filho, Nairon,
com um ano agora. Ele olha amorosamente para seus olhinhos
puxados, brilhantes e azuis como os da mãe, enquanto estes olham
atentamente para Pequeno Urso, brincando de fazer careta para
ele. Zairos joga o filho para o alto e o pega de novo. Nairon dá
uma gargalhada, acompanhada por uma quase idêntica de Pequeno
Urso. A cena se repete.
Pequeno Urso: “Agora sou eu!”
Zairos: “Você é muito pesado, Pequeno Urso, eu não sei
se consigo.”
O homenzarrão franze a testa.
Pequeno Urso: “É minha vez de jogar o Nairon.”
Zairos: “Minara tem medo que você o deixe cair.”
Pequeno Urso: “Eu não vou deixar ele cair!”
Jygar se aproxima e pega Nairon das mãos de Zairos. O menino
sorri para ele.
Jygar: “Eu preciso falar com seu pai, Nairon.
Posso pegá-lo emprestado?”
Jygar lhe beija a testa e o entrega para Pequeno Urso.
Zairos: “Pequeno Urso, não jogue ele. Certo?”
Ele concorda com um aceno. Jygar e Zairos caminham em
direção ao campo. Pequeno Urso levanta o bebê sobre a sua
cabeça e gira com ele em uma dança infantil. Sob o largo sorriso
de Nairon, ele canta sua música favorita.
Pequeno Urso: ♫ Não tema a fúria da tempestade,
nem a escuridão ao anoitecer... ♪
A música é interrompida pelas gargalhadas estrondosas dos
dois a cada uma das muitas vezes que o homem gigante atira seu
amiguinho para o alto.
CAMPO DE TREINO DO TEMPLO DOS DRAGÕES
( )
Jygar e Zairos caminham lado a lado pelo campo. Eles param
para observar Minara. A bela guerreira, arquejando e suando,
dispara rápidos e poderosos golpes no ar com as espadas gêmeas.
Jygar: “Você é como um filho para mim. Eu nunca
tive filhos, você sabe, nem uma esposa. Uma ou
outra garota de vez em quando, mas nada muito
sério.”
Jygar mantém uma expressão preocupada enquanto eles andam.
Jygar: “Todos esses anos, tive medo de que você
fosse atrás de Olho da Noite, em busca de
vingança. Mas agora que você tem Minara e
Nairon…”
Zairos se vira para Minara. Seus olhos brilham ao observá-la.
Habilidosos movimentos de combate em harmonia. Força e leveza.
Uma linda dança. Quase tão linda quanto ela.
Zairos: “Eu ainda preciso matá-lo. Meu pai, a
profecia… mas ela me pediu para esperar, até que
o destino me dê uma chance… Então eu vou
esperar… por enquanto.”
Jygar: “Ela é uma mulher sábia. Sua decisão é o
bastante para mim… por enquanto.”
Jygar saca a espada. Com ambas as mãos, ele a oferece a
Zairos, que, surpreso, a aceita.
Jygar: “Meu velho mestre a deu para mim antes do
meu primeiro duelo, a GARRA DO TROVÃO .Ela o
acompanhou, e então a mim, em inúmeras vitórias.
Agora ela irá acompanhar você.”
Zairos olha para a espada, um olho de dragão esculpido onde o
punho encontra a lamina, uma gema azul no centro do olho. Ele vê
sua face refletida na lâmina polida.
Zairos: “É uma honra. Você é mais de que um
irmão. Desde que eu perdi meu pai…”
Olhos paternais, Jygar põe uma mão sobre o ombro de Zairos.
Jygar: “A honra é minha, filho… Vamos ver a
Garra do Trovão em ação.”
Ele então se vira para Minara.
Jygar: “Minara! Combate! Um contra um.”
Minara, completamente exausta, respira fundo. Em seguida
levanta a cabeça com um sorriso irônico nos olhos para Zairos.
Minara: “Quer que eu deixe você vencer dessa
vez?”
Capítulo 6
P C
TRÊS ANOS DEPOIS...

CLAREIRA DO RIO DAS BRUMAS


(D )
Nuvens cobrem o sol, espalhando sombras sobre a clareira. O
Cardeal Vermelho pousa no ombro de Irmã Lobo. Sentada à
margem do rio, a sacerdotisa guerreira assiste a Nairon tentar
erguer a Garra do Trovão, a espada que Jygar havia presenteado a
seu pai, com toda a força que um menino de quatro anos pode ter.
De repente os filhotes de lobo saltam sobre Nairon, derrubando-
o. Zairos sorri. Ele corre até seu filho e o agarra no colo. Nairon
solta um grito, seguido de uma gargalhada, quando Zairos o joga
nas águas calmas do rio e salta logo atrás dele.
Eles brincam na água. Nairon mergulha para se esconder do
pai. Ele emerge atrás de Zairos com mais uma gargalhada. O
menino mergulha de novo. Muitos segundos se passam e o sorriso
de Zairos se desvanece. Seu filho já está submerso por tempo
demais.
Ele finalmente reaparece, gargalhando de novo, vários metros
distante. Zairos respira aliviado. Mas Nairon não é o único a
emergir. Atrás do menino, Olho da Noite aparece e o pega em um
estrangulamento. Em seguida, encosta a ponta de uma faca em seu
pescoço que começa a sangrar.
Zairos nada em uma tentativa desesperada de alcançá-los. Olho
da Noite ergue a faca e --

QUARTO DE ZAIROS
(N )
Zairos, assustado e suado, levanta o tronco e senta-se na cama.
Minara acorda e acaricia suas costas.
Minara: “Outro pesadelo?”
Ele acena que sim. Minara olha para Nairon dormindo
profundamente, virado para um canto. Ela puxa Zairos para trás,
pelos cabelos, e monta sobre ele.
Minara: “Eu vou te dar ótimos sonhos, então.”
Ela beija Zairos com paixão ardente, enquanto seus corpos se
entrelaçam. Eles fecham os olhos vivendo um sonho efêmero
enquanto seus corpos se movem suavemente como um em uma
cadência hipnótica que acelera lentamente junto com a frequência
das notas sussurrantes que suas bocas cantam.

ESTRADA PARA THALDERAN


(D )
Ao pôr do sol, Orgath, elegantemente vestido, cavalga na
estrada. Quatro GUARDAS DE ELITE de Axengard o seguem.

PORTÕES DO TEMPLO DOS DRAGÕES


( )
Na base da colina do templo, Orgath lê um papiro aberto, seus
homens à sua volta. Ele sorri e fecha o documento. Orgath acelera
o cavalo rumo à passagem íngreme para o templo. Os Guardas de
Elite o acompanham. Ele passa por uma árvore com uma grande e
densa folhagem no início do caminho. Um urro assustador. Os
guardas se voltam imediatamente para a origem do som: a copa da
árvore sobre eles. A enorme criatura salta sobre os homens,
derrubando dois deles. Bestafera cai agachado próximo aos
soldados, que tentam se levantar e empunhar suas armas, mas seu
oponente se move rápido. A ponta de lâmina paralela ao braço de
Bestafera termina em uma ponta afiada e protuberante, e com uma
cotovelada para baixo ele a enfia no coração do primeiro guarda,
ainda tentando se erguer. Com um salto, derruba o segundo
novamente no chão e corta sua garganta com uma das lâminas em
seu antebraço.
Assustado, o cavalo de Orgath empina, o atira no chão e foge a
galope. Os outros dois guardas avançam sobre Bestafera com seus
cavalos. O gigantesco guerreiro rola para o lado e destroça o
joelho do animal mais próximo com um golpe de sua arma. O
cavalo tomba sobre seu cavaleiro, esmagando-o. Bestafera se lança
no ar e desfere um soco poderoso. O metal da arma envolvendo
seu punho contra a mandíbula do outro cavalo, derrubando o
animal e seu cavaleiro. A criatura salta imediatamente sobre o
guarda no chão e esmaga seu crânio com um novo soco.
Orgath corre em direção aos portões do templo, mas Bestafera é
muito veloz em seu encalço. O jovem herdeiro de Axengard se
aproxima dos portões, mas eles estão fechados e seu predador está
prestes a alcançá-lo.
Os portões se abrem. Zairos atravessa-os a toda velocidade. Os
outros Dragões da Tempestade o seguem.
Bestafera salta sobre Orgath, jogando-o no chão. Ele aperta
com força o cabelo avermelhado de Orgath, ergue uma das
lâminas e a desce em um golpe mortal. Zairos salta, rola, cai de
joelhos. Seu escudo bloqueia o ataque no último instante.
Bestafera ataca Zairos antes que ele consiga se levantar. Sua
lâmina corta a perna do jovem Dragão, que imediatamente rola
para trás para escapar do próximo golpe. Minara salta. Um chute
em cheio na cabeça que derruba Bestafera. Ele se ergue furioso.
Pequeno Urso desfere um forte golpe com o martelo. Com
dificuldade, Bestafera bloqueia, lâminas unidas na vertical frente
ao corpo, e lança um olhar enraivecido para seu adversário. Seus
rostos estão próximos e eles se entreolham. A visão da face do
outro paralisa ambos por uns poucos segundos. Os olhos de
Pequeno Urso umedecem. O ódio de Bestafera se torna confusão.
Os outros Dragões da Tempestade se aproximam. Bestafera
ruge, encarando os rostos determinados de seus muitos oponentes
e então foge em disparada. Rapidamente ele chega ao íngreme
aclive, próximo à lateral do templo. Com muita agilidade o escala
e desaparece por sobre o seu topo em poucos segundos. Kaijin
tenta persegui-lo, mas o aclive é muito íngreme e seu avanço é
muito lento. Ele olha para Falcão da Lua que sacode a cabeça
negativamente. Kaijin desiste da perseguição. Ele não vai
conseguir alcançá-lo.
Orgath olha para Zairos e, com uma expressão nervosa, acena
com a cabeça em agradecimento. O herdeiro do Axengard então
pega o papiro de volta do chão. Ainda trêmulo, mas com os olhos
mostrando determinação e profundo respeito, ele oferece a carta a
Jygar.
Orgath: “Eu não vou deixar esse incidente impedir
o que vim fazer.”
Jygar o olha inquisitivamente.
Orgath: “É um convite oficial para minha
cerimônia.”
Jygar toma a carta nas mãos e a lê rapidamente. Em seguida a
devolve.
Jygar: “Me desculpe, mas a nomeação de um
General Axengardiano não é uma cerimônia
própria para um Dragão da Tempestade.”
Orgath: “Pelo menos Zairos poderia ir como meu
amigo... como meu irmão. Minara poderia
acompanhá-lo.”
Jygar: “Perdoe-me, mas nenhum de nós estará lá,
filho.”
Orgath: “Eu fui quase assassinado!”
Jygar: “Por isso considere-se meu convidado
pessoal para o Festival do Dragão. E não se
preocupe, você ainda tem três ciclos do sol para se
recuperar.”
Ele então lhe vira as costas e caminha de volta em direção ao
templo. Com um misto de mágoa e indignação, Orgath amassa a
carta e a joga longe. Um gemido de raiva acompanha o gesto.
Jygar para um instante para observar Zairos – perna ferida –
que manca até Pequeno Urso e toca gentilmente em seu ombro.
Zairos: “O que houve?”
Pequeno Urso olha para baixo por alguns segundos. Lágrimas
escorrem de seus olhos estupefatos. Por fim, ele sorri.
Pequeno Urso: “O grande urso... o meu irmão...
Ele tá vivo!”

SAGUÃO REAL DA CASA DE GUERRA DE


AXENGARD
(D )
Dezenas de militares formam várias colunas humanas no
gigantesco salão. Os nobres de Axengard preenchendo cada lado
do recinto. Sentado ao trono, no topo de uma pequena escadaria,
se encontra o General Uldresh. Seu neto, Orgath, elegantemente
vestido, postado diante dele. Com a base de um longo e adornado
machado de duas lâminas, o General atinge o chão três vezes. O
som ecoa pelo salão.
Orgath se inclina sobre o joelho diante dos pés de Uldresh. Este
se levanta segurando o machado cerimonial como se fosse um
cetro.
General Uldresh: “Nobres e guerreiros de
Axengard! Eu nomeio Orgath, meu neto, General
de Axengard. Quando eu morrer, ele será meu
sucessor como o supremo comandante do império
de Axengard.”
Novamente, por três vezes, General Uldresh bate com o
machado no chão. Orgath estende as mãos e, junto com Uldresh,
segura o machado.
General Uldresh: “Erga-se, Orgath, General de
Axengard!”
Orgath, machado nas mãos, se vira para os convidados. Ele bate
com o machado três vezes no chão. O público lhe devolve três
urros de saudação. Orgath sorri.
Capítulo 7

OC F
TRÊS ANOS DEPOIS...

PRAÇA PRINCIPAL DE THALDERAN


(N )
Um céu estrelado e uma lua brilhante iluminam a noite do
Festival do Dragão. Uma fina garoa cai sobre a multidão de todas
as etnias, fervilhando em volta de uma plataforma suspensa de
madeira. Tochas espalhadas por todos os lados tornam a noite
ainda mais iluminada. Os antigos e os novos Dragões da
Tempestade caminham pelo corredor humano pelo meio da platéia
excitada. O povo de Thalderan ama seus heróis da paz e gritam
saudações para seus campeões enquanto eles se dirigem à
plataforma central.
Sentado alegremente sobre os ombros de Orgath, um menino de
olhinhos puxados, azuis e brilhantes. Nairon, com sete anos agora,
acena para Zairos enquanto ele começa a subir no palco. Zairos lhe
sorri de volta. Mais um sorriso encontra o menino, dessa vez o de
Minara quando ela, logo atrás de Zairos, acena para o filho. Nairon
retribui. O rosto da guerreira permanece sorridente enquanto seus
olhos encontram os de Orgath.
Orgath lhe devolve uma expressão alegre, mas envergonhada,
enquanto contempla, mesmerizado, a beleza de Minara. Suas
pernas fortes como o resto do corpo, em um contraste harmônico
com suas curvas suaves e femininas. O cabelo comprido
adornando suas costas e sob os lindos olhos azuis o sorriso mais
encantador que ele já vira.
No palco, Zairos toca o ombro de Minara. A visão do amigo
quebra o quase transe de Orgath. Seu corpo estremece como se
acordando de um sonho bom. Constrangido, ele morde os próprios
lábios enquanto desvia os olhos.
Orgath recebe uma cutucada na cabeça e olha para o autor em
sua garupa. Nairon aponta efusivamente para um MENINO na
multidão. O garoto tem olhos amendoados e azuis como os de
Nairon e é muito parecido com ele em vários aspectos. O jovem
general olha para Nairon e para o Menino. Ele os olha de novo
comparando seus rostos e fica impressionado. Percebendo a
agitação deles o Menino olha para Nairon e abre a boca, espantado
com a semelhança. Os três riem.
Como se anunciando o espetáculo, um relâmpago e um trovão
fazem os três voltarem a atenção para o palco novamente. Olhos
fitando o céu, armas na mão, os Dragões se dividem em pares:
Zairos e Minara, Jygar e Pequeno Urso, Falcão da Lua e Kaijin. A
multidão silencia. Um ANCIÃO aponta para uma luz brilhante que
se revela por trás das nuvens que a encobriam segundos antes.
Ancião: “Olhem! O Deus Dragão!”
Feigon, os Dragões da Tempestade e o povo se ajoelham,
cabeças baixas em veneração à luz que se intensifica.
Orgath é o único em pé. Ele olha zombeteiro para o cometa e
fala para si mesmo.
Orgath: “Isso não é um deus.”
Feigon toca seu ombro com o cajado. Ele se vira para o
sacerdote.
Feigon: “Não, é apenas um dos seus sinais.”
Eles permanecem de joelhos por alguns minutos, até que a luz
começa a diminuir conforme o cometa se afasta nos céus. No
palco, Jygar se levanta e anuncia com um grande sorriso.
Jygar: “Ghoddrak nos abençoou. Que o duelo
comece!”
Aplausos e urros. O público se levanta em completa excitação.
É uma apresentação de habilidades de combate dos heróis de
Thalderan. Os Dragões da Tempestade começam sua exibição,
cada um lutando com seu par. O povo responde com entusiasmo a
cada um dos golpes desferidos, que se tornam mais velozes e
intensos.
No meio da multidão, uma jovem MULHER MISTERIOSA – bela,
pele escura – cobre os lábios com uma pasta grossa. Em seguida,
ela pega um pequeno frasco e usa um pincel fino para espalhar seu
conteúdo nos lábios: “um líquido verde. Escondido na multidão,
uma figura encapuzada a observa. Sob o capuz um sorriso
maldoso e um assustador olho esbranquiçado.”
Os Dragões demonstram toda sua habilidade guerreira. O povo
vibra em êxtase com a apresentação. Os Dragões trocam sorrisos
enquanto trocam golpes. Diversão para todo mundo.
De repente, a Mulher Misteriosa salta sobre o palco. Ela avança
direto até Zairos. Surpreso ele para de lutar. A bela jovem segura
seus braços. Ele congela por um instante enquanto ela se aproxima
para beijar seus lábios. Eles estão prestes a se tocar quando a
cabeça dela se move abruptamente para trás. Minara continua a
puxá-la pelos cabelos e a arremessa no chão, entre Kaijin e Falcão
da Lua.
Minara: “O que você pensa que está fazendo,
donzela?”
A mulher olha para Minara, assustada. Kaijin pega gentilmente
a jovem caída pelas mãos para ajudá-la a se levantar. Durante o
movimento ela o surpreende com um beijo nos lábios. Ele se
ajoelha conforme seus lábios se pressionam firmemente e a
multidão vibra. Falcão da Lua gargalha, mas Jygar observa com
apreensão.
A Mulher Misteriosa sussurra algo no ouvido de Kaijin.
Quando ela afasta o rosto do dele, estranhas veias verdes emergem
visíveis nas pálpebras inferiores, seus olhos agora tomados por
uma fúria inexplicável. Ele olha para Orgath, no meio da multidão.
Ela se afasta rapidamente, com um Kaijin enraivecido ainda de
joelhos. Jygar dispara e segura o braço da mulher, parando-a. Ela
se vira para ele, com medo, enquanto ele a confronta.
Jygar: “O que você --”
O rosto de Jygar se contorce em dor. Ele segura seu próprio
antebraço, sangrando devido a um corte profundo próximo ao
cotovelo. O sangue escorre na lâmina de seu agressor: “Kaijin!
Gritos de surpresa, confusão e medo chegam sem parar da
multidão. Com um chute em cheio na nuca, Kaijin nocauteia Jygar
e parte para o golpe fatal com a lâmina ensanguentada.”
Falcão da Lua detém Kaijin puxando-o pelos ombros. Ele se
vira no mesmo instante. Sangue escorre da boca de Falcão da Lua,
a espada curta de Kaijin enfiada em sua barriga. Kaijin o empurra
com um chute, ao mesmo tempo em que remove a espada e se vira
para matar Jygar, ainda atordoado no chão.
Zairos escorrega pelo chão molhado para lançar uma das pernas
por detrás da panturrilha e a outra sobre o joelho de Kaijin em um
movimento de tesoura. Com um estalo seco, o joelho se quebra.
Kaijin segura a perna, gritando com a dor intensa, e desaba de
costas. O forte impacto da cabeça contra o chão deixa-o
desacordado.
Minara corre para cuidar de Falcão da Lua. Jygar, já de pé,
segura o braço ensanguentado enquanto caminha até eles. Ela tenta
parar o sangramento de Falcão da Lua com um pano. Jygar se
ajoelha e pega o pano já totalmente vermelho e encharcado das
mãos dela. Ele o torce rapidamente, retirando parte do sangue
incrustado no pano e imediatamente o coloca de volta dobrado
sobre o ferimento, continuando a tentativa de estancar a
hemorragia. Zairos ajuda Feigon a subir no palco. As habilidades
do Sumo Sacerdote são a melhor chance de Falcão da Lua. O
velho homem corre até ele, logo em seguida, Orgath também sobe
e dirige-se até Zairos.
Orgath: “Os olhos dele, como os de meu pai… o
Hálito do Dragão. Aquela mulher envenenou
Kaijin!”
Pequeno Urso aponta para o final da plataforma com um grito
nervoso.
Pequeno Urso: “Eles estão fugindo!”
Kaijin acorda quando a Mulher Misteriosa, a cavalo, o puxa da
plataforma para montar em um segundo cavalo logo abaixo do
palco. Eles começam a galopar. Kaijin espanta a multidão com
suas espadas. Orgath saca sua adaga, corre para a borda e a atira.
Ela roda até entrar diretamente na nuca da Mulher Misteriosa. Ela
cai, o cavalo para. Orgath salta e aterrissa no meio da multidão
assustada. Imediatamente ele corre até a mulher e a examina. Ela
está morta. Ele vê Kaijin galopando distante. Com um salto ele
monta no cavalo da Mulher Misteriosa e dispara em perseguição a
ele.
Na plataforma, o sangue desce do braço ferido de Jygar.
Inquieto e nervoso ele observa Feigon tentar, também sem
sucesso, conter o sangue que continua encharcando o pano que ele
pressiona contra o ferimento do dragão caído. Falcão da Lua
geme, os olhos fechados, sacudindo a cabeça de um lado para o
outro. De repente, ele abre os olhos, procurando por Jygar, que se
ajoelha a seu lado. O guerreiro ferido segura a mão de seu querido
amigo, coberta de sangue, entre as suas.
Falcão da Lua: “O Hálito do Dragão… Não foi
culpa dele… Perdoe Kaijin, diga a ele que... eu o
perdoo também.”
Jygar: “Aguente firme, irmão. Feigon está aqui…”
O sacerdote o examina novamente. Com olhos úmidos, ele
sacode negativamente a cabeça. Falcão da Lua olha para Zairos,
Minara e Pequeno Urso. Ele lhes sorri e então aperta a mão de
Jygar enquanto olha em seus olhos.
Falcão da Lua: “Tome conta de nossos irmãozi--”
As mãos de Falcão da Lua soltam a de Jygar. Os olhos deste se
enchem de lágrimas enquanto a cabeça de seu companheiro tomba
lentamente para o lado, já sem vida. A dolorosa cena reaviva
lembranças na mente de Zairos, palavras proferidas por Irmã
Lobo. Lembranças que o fazem murmurar para si mesmo.
Zairos: “Traição entre irmãos, Dragões da
Tempestade caindo… a profecia!”

PASSAGEM NORTE DE THALDERAN


(D )
A neve cobre de branco o chão arenoso da Passagem Norte.
Falcão da Lua repousa em uma cova rasa. Olhos abertos como
reza a tradição, arma na mão, tatuagens funerais sobre o corpo.
Homens e mulheres do Templo pranteiam a sua volta. Orgath, com
o Esquadrão de Elite de Axengard formado às suas costas,
permanece pensativo próximo a eles. Alguns metros à frente, com
um gesto de mão, Zairos o chama. Ele larga seus homens e
caminha até Zairos.
Zairos: “Conseguiu encontrar Kaijin?”
O general baixa os olhos, acenando negativamente com a
cabeça.
Orgath: “Meus homens procuraram por todos os
lugares possíveis e eu pessoalmente procurei nos
impossíveis.”
Feigon se aproxima da cova, se ajoelha e olha para os céus.
Com uma prece ele inicia a cerimônia. Jygar se ajoelha também e
fecha os olhos, a neve caindo suavemente sobre seu rosto.
Pequeno Urso, sentado sozinho no chão, chora silenciosamente.
Zairos os observa com olhos distantes. Minara pega sua mão.
Nairon pega a outra. Eles se entreolham. Nairon vê um misto de
tristeza e ira no rosto de seu pai. Ainda de joelhos, Jygar inclina o
corpo, aproximando seu rosto do de Falcão da Lua, cujos olhos
abertos parecem lhe olhar de volta.
Jygar: “Falcão de Lua, meu irmão! Eu prometo
que estarei aqui para lutar e beber com você a cada
ciclo do sol. A cada um.”
Capítulo 8

B S
COLINA DO DEUS DRAGÃO
(N )
Em frente à escultura de ferro do Deus Dragão, Jygar se posta
diante de Zairos, Minara e Pequeno Urso, alinhados, lado a lado.
Um vento forte atinge seus rostos.
Jygar olha nos olhos de cada um. Pequeno Urso dá um leve
sorriso, que desvanece diante de expressão severa de seu mestre.
Jygar: “A tensão entre Brummata e Axengard está
aumentando. Olho da Noite incita seu tio,
Carvalho Sagrado, o Sacerdote Regente, à guerra.
Orgath, por mais que tente e seja seu neto, não
consegue atenuar o desejo de guerra do General
Uldresh. O Pacto ainda é, e sempre será, nossa
única garantia de paz.”
Jygar baixa a cabeça por instantes. Uma garoa começa a cair.
Jygar: “Nosso irmão Falcão da Lua está morto,
Kaijin se tornou um renegado, e eu--”
Pequeno Urso: “Você é o grande Jygar! O maior
de todos.”
Jygar olha para seu braço esquerdo ferido, enfaixado e contorce
a boca em frustração. A chuva se intensifica.
Jygar: “Kaijin acabou com a destreza de meu
braço para sempre. Mesmo com a ajuda de Feigon,
eu temo não ser mais capaz de enfrentar um
campeão bem treinado.”
Pequeno Urso: “Não se preocupa com isso!
Ninguém pode vencer Pequeno Urso e seus irmãos
dragões.”
Jygar: “Assim espero. As três nações estão
ansiosas para testar cada um de vocês. Axengard
será a primeira. Amanhã, Zairos, você enfrentará
Sangir, um guerreiro muito experiente que tem
treinado os campeões de Axengard por an--”
Minara: “Um perdedor que treina os perdedores.
Zairos foi treinado pelo melhor de todos.”
Jygar: “Não o subestimem. Suas habilidades são
quase um mito em Axengard. Eles acreditam que
ele se tornará uma lenda viva amanhã.”
Minara: “Uma lenda morta!”
Pequeno Urso solta uma pequena gargalhada. Um relâmpago
ilumina o céu.
Zairos: “Um Dragão da Tempestade nunca foi
derrotado. Não serei o primeiro.”

QUARTO DE MINARA E ZAIROS


( )
Agitada em seu sono Minara balança a cabeça de um lado para o
outro. Com um solavanco, ela abre os olhos e sua mão
imediatamente procura Zairos ao seu lado. Nada. Seus olhos
buscam por ele pelo quarto todo. Nada, mais uma vez. Ela pula da
cama e sai correndo do quarto.

CORREDORES
No final de um longo corredor, as portas abertas de um
dormitório infantil ficam cada vez mais próximas à medida que
Minara corre em sua direção. Lá, ela vê a figura de um homem
musculoso deixando o aposento, que caminha em sua direção.
Zairos: “Nairon não está aqui.”
Ela para, abaixa os olhos por um instante e depois mira Zairos
com olhos sorridentes.
Minara: “Acho que sei onde ele está.”

SALÃO SAGRADO
O grande salão tem suas paredes cobertas com pinturas que
contam a história de como O Pacto foi criado. Ao fundo encontra-se
a entrada de uma pequena gruta. Dentro, tochas de chamas azuladas
banham com luzes bruxuleantes uma belíssima estátua de
Ghoddrak. Aos pés dela, um menino de sete anos ora de joelhos.
Nairon: “Grande guardião dos céus e dos
homens, abriga-nos sob suas asas para
proteger-nos do mal. Que sua chama purifique
e ilumine nossos caminhos. Que suas escamas
sejam nossos escudos, suas garras nossas
espadas. Para aqueles que nos desafiam, apenas
a fúria das tempestades e a ferocidade dos
dragões.”
Na porta do santuário, Zairos observa seu filho, seu braço ao
redor de Minara, sua mão segurando o ombro de sua
companheira. Os olhos dela se umedecem assim como os dele. Ela
sussurra para o marido com uma voz calorosa e emotiva.
Minara: “Ele está pedindo ao Deus Dragão
para te proteger.”
Zairos: “Eu sei”
Ele passa as costas das mãos nas pálpebras para se livrar das
lágrimas prestes a caírem.
Zairos: “Ei, filho! As bênçãos de Ghoddrak e o
cuidado de um filho são sempre bem-vindos,
mas você não tem medo de que eu não esteja
pronto para a batalha, não? Não se esqueça que
meu pai me ensinou uma técnica invencível.”
Nairon: “Isso de novo? Não vai funcionar mais
comigo, papai.”
Zairos corre até Nairon e lhe faz cócegas sem parar, da mesma
forma que seu pai fazia com ele. O menino resiste por uns poucos
segundos, mas em seguida cai na gargalhada.
Minara: “Vamos usar seu próprio veneno
contra ele, filho. Eu vou salvar você!”
Ela salta sobre Zairos, derrubando-o e agarrando seus braços.
Minara: “Agora, Nairon, agora!”
O garoto se junta a sua mãe contra seu pai em uma batalha de
cócegas, os movimentos habilidosos dos dedos ferozes provocando
gargalhadas incontroláveis nos três. O vencedor é imprevisível. A
escultura do Deus Dragão no altar parece sorrir para eles.

PASSAGEM NORTE DE THALDERAN


(D )
A neve cai pesadamente. O mar se choca contra as pedras ao
longe. À frente do exército de Axengard, General Uldresh e
Orgath esperam pela batalha. SANGIR – meia-idade, o corpo
musculoso, barba trançada, longos cabelos – caminha ao lado de
Lissa, carregando um machado e uma espada, pronto para a
batalha. No lado oposto, Feigon para em frente a eles. Zairos,
espada e escudo na mão, a seu lado. Atrás deles, Jygar observa em
silêncio enquanto Feigon e Lissa iniciam a cerimônia.
Feigon: “Thalderan, a Cidade Sagrada, escolheu
Zairos como seu campeão.”
Minara, agachada sobre os calcanhares, segura as mãos do
pequeno Nairon, nervoso e preocupado.
Nairon: “Ele vai vencer, não vai, mamãe?”
Minara: “Olhe toda essa neve. Feigon disse que é
uma benção do Deus Dragão. Os espíritos dos
Dragões da Tempestade do passado estão aqui, em
volta de nós, dando todo seu poder para seu pai.
Claro que ele vai vencer.”
Os olhos de Nairon recuperam o brilho e a confiança.
Nairon: “Claro que sim! Um Dragão da
Tempestade nunca perde.”
O combate está prestes a começar. Mãe e filho voltam a atenção
novamente aos sacerdotes.
Lissa: “Então, aos olhos do Deus Dragão, que o
duelo comece.”
Sangir imediatamente avança e inicia uma rajada de ataques
incessantes contra Zairos, fazendo-o recuar enquanto se esforça
para defender os ataques contínuos. Com um salto o campeão
axengardiano desfere um ataque lateral mirando o pescoço do
oponente. A espada corta o ar sobre o Dragão de Thalderan
enquanto ele se abaixa e ergue o escudo, bloqueando o veloz
ataque de machado que se segue.
Ainda agachado, Zairos defende um novo ataque de espada
com a sua própria e golpeia o queixo de Sangir com o escudo, de
baixo para cima, arrancando-o violentamente do chão. Ele salta
sobre o inimigo ainda no ar. Quando o corpo aterrissa, Zairos finca
a espada no chão, através da garganta de Sangir. Um vermelho
vivo mancha o chão coberto de neve.
Nairon se joga sobre Minara em um abraço forte. Zairos abre os
braços e grita para os céus com todas suas forças.
Zairos: “Paz!”
Zairos e Orgath se entreolham. Zairos monta em seu cavalo e
galopa até seu amigo de tantos e tantos anos.
Zairos: “Por quem você estava torcendo?”
Confuso diante do olhar severo do General Uldresh, Orgath
balança a cabeça levemente. De uma pequena bolsa amarrada a
sua sela, Zairos retira o Colar da Casa de Guerra de Axengard,
aquele que Orgath tinha lhe dado.
Zairos: “É hora de escolher um lado, velho
amigo.”
Zairos joga o colar para Orgath, que o pega. Seus olhos seguem
Zairos enquanto ele dispara de volta para junto de seus amigos.
General Uldresh: “O Dragão de Thalderan está
certo, Orgath. Sua amizade com nossos inimigos é
uma ofensa a mim e ao nosso povo.”
Orgath baixa a cabeça e permanece imóvel, constrangido,
enquanto seu avô lhe vira as costas e caminha em direção a seu
cavalo.

TEMPLO DOS DRAGÕES – SALA DOS SACERDOTES


(D )
Estantes repletas de livros cobrem as paredes de uma sala
ampla. Uma mesa, com algumas cadeiras, encontra-se ao fundo.
Feigon está sentado calmamente à mesa. Com as mãos apoiadas
nela, Zairos o confronta.
Zairos: “Aconteceu rápido demais. Ela ainda não
está pronta. Só dessa vez, eu imploro!”
Feigon: “Sinto muito, Zairos. Se há um Dragão da
Tempestade da mesma etnia do desafiante, será
esse Dragão que irá defender Thalderan. É o pacto.
Você sabe que não pode substituí-la.”
Zairos: “Ela pode morrer!”
Uma familiar voz feminina o surpreende, atingindo-o como um
golpe na nuca.
Minara: “Quem pode morrer?”
Zairos, embaraçado, se vira para Minara, que o olha da porta do
recinto com cara de poucos amigos.
Zairos: “Você! Eu estou só cumprindo minha
promessa. Protegendo você.”
Minara: “Pedindo para lutar em meu lugar? Assim
você realmente aumenta minha confiança às
vésperas do meu primeiro duelo!”
Furiosa, ela se move para as costas de Zairos e pisa em sua
panturrilha, fazendo-o ajoelhar-se. Ela passa o braço em torno do
seu pescoço, em um estrangulamento.
Minara: “Se alguém deveria ter fé em mim,
deveria ser você.”
Minara o empurra e tenta deixar a sala, mas Zairos a agarra
pelo pulso.
Zairos: “Você está certa… Como uma mulher que
me vence assim, tão rápido, poderia ser derrotada
por alguém?”
O rosto zangado de Minara se torna sorridente. Ela acaricia os
cabelos de Zairos e aproxima os lábios dos dele. Um puxão de
cabelo, uma rasteira. Zairos solta um gemido com o impacto de
suas costas se chocando contra o chão.
Minara: “Como você acha que me senti assistindo
ao duelo do homem que amo, e que acaba de ser
vencido tão facilmente?”
Feigon dá uma risadinha. Minara estende a mão para ajudar
Zairos a se levantar. Ele segura sua mão, dá-lhe um puxão
repentino. Ela cai sobre seu corpo. Ele rola para cima dela. Seus
olhares se entrelaçam, eles se beijam apaixonadamente. O sacerdote
finge estar limpando a garganta para lembrá-los que ele está ali.
Absortos em um profundo beijo, eles não ouvem. Ele pigarreia
novamente, mais alto. O casal toma um pequeno susto e, sem-
graça, de afastam um do outro. Minara abaixa a cabeça e olha para o
velho homem com olhos envergonhados. Emraraçado, Zairos faz
uma careta de constrangimento. Feigon ergue os olhos enquanto
balança a cabeça e esconde um sorriso sob a barba trançada.

PASSAGEM LESTE DE THALDERAN


(D )
O sol banha o árido e rochoso campo de batalha. Diante de
um exército disciplinado e bem armado, o vento faz dançar os
longos cabelos de uma linda garota de quinze anos. Com seus
olhos amendoados tão negros quanto seu cabelo, CHUN, a jovem
imperatriz de Solfira olha fixamente para Minara. O vento também
acaricia o manto branco do JOVEM SACERDOTE de Solfira, assim
como as plumas de sua Cacatua Rosa, empoleirada em seu ombro,
enquanto ele termina de proferir as palavras cerimoniais que
precedem o duelo.
O campeão do Solfira, WONGH, enlaça com suavidade seus
longos cabelos em uma espécie de rabo de cavalo no topo da
cabeça. O homem, alto e forte, mantém seu rosto severo
impassível enquanto saca uma espada larga e curva e caminha em
direção a Minara. Ela está de joelhos junto com seu filho, ambos
de olhos fechados e de mãos dadas.
Nairon: “… Para aqueles que nos desafiam, apenas
a fúria das tempestades e a ferocidade dos
dragões.”
Ela beija a testa de Nairon e saca suas espadas duplas enquanto
se move em direção ao oponente. Zairos, mãos sobre os ombros do
filho, a observa com apreensão. O menino levanta a cabeça, olha
para trás e vê o rosto aflito de seu pai. Nairon então sorri para ele.
Nairon: “Mamãe irá vencer. Confia nela.”
Jygar e Feigon sorriem para Nairon. Pequeno Urso dá uma
pequena gargalhada.
Minara e Wongh caminham em círculos, encarando um ao
outro. Faíscas e tinidos! O metal das espadas se choca repetidas
vezes. Ela desvia um ataque descendente diagonal com uma das
espadas e ataca o pescoço com a lâmina da outra. Ele se esquiva
com um rodopio, mas a ponta da espada dela atinge-lhe
suavemente a garganta, derramando algumas gotas de sangue.
Wongh parece nem sentir o golpe e completa o movimento com
um furioso chute giratório no estômago que a derruba. No mesmo
segundo, ele ergue a espada para decapitar Minara, atordoada no
chão, apoiada nas mãos e joelhos.
Jygar segura Zairos, que grita por Minara. Nairon abraça a
cintura do pai, escondendo o rosto em pânico. Minara levanta a
cabeça e sorri para sua família e então para Wongh. Ele permanece
com a espada erguida sobre a cabeça, mas não desfere o golpe
fatal. Sem pressa, ela se levanta. O campeão de Solfira começa a
tremer. A raiva nos olhos dele desaparece conforme o fluxo de
sangue de sua garganta aumenta. Ofegante, o homem cai de
joelhos. Ele larga a espada, sua cabeça se inclina e seu corpo
desaba sem vida.
Entre Jygar e Feigon, Zairos tem Nairon sobre seus ombros,
com os braços erguidos em comemoração. Eles têm a alegria
estampada no rosto. Minara cruza os braços – a ponta das espadas
apontadas para baixo, os punhos tocando os ombros opostos – e
inclina o corpo para a Chun, em reverência.
Minara: “Paz!”
Sem se curvar, a jovem líder dirige-se em direção a guardiã de
Thalderan, o vento fazendo farfalhar o seu sofisticado
vestido. Minara levanta o corpo para olhar diretamente nos olhos
plácidos e ternos da adolescente que se aproxima dela. A guerreira
embainha suas espadas e quando elas estão bem próximas, a
imperatriz menina se curva em reverência. Minara se curva de volta.
Chun: “Paz!”
A imperatriz então levanta a parte superior do corpo e coloca as
pequenas mãos nos ombros da campeã.
Chun: “Você não precisa mais lutar”.
Minara franze a testa em surpresa. Chun olha para o cadáver de
Wongh. O sacerdote de Solfira, curvado sobre ele, desenha as runas
sangrentas em seu corpo, sob a supervisão de Feigon, que tem Asa
Azul em um ombro e a Cacatua Rosa no outro.
Chun: “Ele era um homem bom e nobre e
perdeu a vida por nada... Antes de morrer, meu
pai escolheu Wongh como nosso campeão. Se
ele tivesse vencido, teu filho ficaria sem mãe e
muitas famílias seriam destruídas pela guerra
que viria. Sinto muito por só ter visto isso
agora.”
Uma lágrima escorre por sua bochecha.
Chun: “Em sua sabedoria, Ghoddrak disse que
a guerra não poderia ser tirada do coração do
homem, e ele estava certo. No entanto, você e
eu, não somos homens.”
Ela abaixa os olhos quando a lágrima solitária explode a seus
pés, apenas para encontrar um raro girassol selvagem de centro
azulado, o símbolo de Solfira, crescendo no solo infértil.
Chun: “Eu sou a primeira Imperatriz de Solfira
e você é a primeira mulher campeã do Dragão,
vinda de nossa nação. Nós deveríamos ser
amigas. E amigas não vão para a guerra umas
contra as outras. Ver você com seu filho
finalmente me deu a iluminação e a coragem
para interromper esse desejo decrépito e sem
sentido de guerra... Perdoe-me por isso, meu
pai."
Os olhos úmidos de Chun e Minara se encontram.
Chun: “Então, com uma criança cheia de
nobreza viva em nossos corações, somos as
primeiras a declarar paz... juntas, agora e para
sempre!”
Chun se ajoelha e curva-se, sua testa tocando as mãos no chão. O
enorme exército repete o gesto de sua imperatriz. Minara também se
ajoelha e agarra as mãozinhas dela, fazendo Chun endireitar seu
corpo. Mãos ainda menores se juntam às deles: as de Nairon. Ele dá
o Girassol a Chun. Ela a coloca em seus cabelos negros. Os três
demonstram alegria em seus olhos lacrimejantes.

CAMPO DE TREINO DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(N )
Zairos observa duas silhuetas contra a lua cheia. A grande,
Pequeno Urso, fita o astro iluminado. A segunda, Feigon, coloca a
mão no ombro de Pequeno Urso e se vira para Zairos. Eles andam
para se encontrarem a meio caminho. O velho sacerdote segura o
antebraço do jovem dragão.
Feigon: “Ele precisa de você. Apenas faça o que
precisa ser feito.”
Zairos chega até Pequeno Urso e vê as lágrimas em seu rosto.
Pequeno Urso: “Eu preciso que você me substitua…
para matar… meu irmão.”
Zairos: “Eu soube que Brummata, ou melhor, Olho da
Noite, escolheu Bestafera como seu campeão para o
duelo de amanhã.”
Pequeno Urso: “Não chama ele assim. Ele ainda é o meu
irmão, eu ainda amo ele. Ele não tem culpa. Culpa de
nada.”
Zairos: “Mas há a regra da mesma etnia nos duel--”
Pequeno Urso: “Irmã Lobo deixou nossa ordem e fugiu
para a floresta para não ter de lutar contra a mulher que
ela amava. Você sabe disso, né?”
Zairos: “Sim. E também para depois não ter de olhar,
todos os dias, para o irmão dragão que a matou, o
homem que ela também amava... Mas você não pode nos
deixar.”
Pequeno Urso: “Não vou... se você ajudar a mostrar pra
todo mundo que tô ferido e incapaz de lutar.”
Pequeno Urso repousa a mão sobre uma pedra e aponta com os
olhos para seu martelo de guerra.
Zairos: “Como assim? Ficou maluco? A gente pode só
fingir… não acha?”
Pequeno Urso: “Claro que não, um Dragão da
Tempestade nunca mente! O que Ghoddrak pensaria de
nós?”
Zairos bufa e dá uma sacodida na cabeça.
Zairos: “Você tá certo… só promete que você ainda vai
olhar para mim como seu irmão dragão depois disso.”
Pequeno Urso: “Só não quebra ela, tá?.”
Zairos concorda, ergue o martelo com uma nova bufada. O
martelo desce. Pequeno Urso grita.

PASSAGEM SUL DE THALDERAN


(N )
A estrada pela densa floresta desemboca em uma grande área
descampada. O chão gramado e a folhagem das árvores dançam ao
sabor do vento, enquanto a lua cheia banha a passagem sul com
um brilho perolado. Atrás de Zairos, próximo a Jygar, Pequeno
Urso – mão esquerda muito inchada – observa o corvo de Feigon
sobrevoar Olho da Noite e seu tio, Carvalho Sagrado – o magro
tronco nu pintado, um colar de dentes e um FALCÃO pousado no
braço. Diante do Sumo Sacerdote de Thalderan, ele encerra o
ritual para que a batalha comece.
Bestafera abre os braços e ruge. Ele se inclina e apoia as
soqueiras de bronze no chão para caminhar como um urso. Ele
grunhe enquanto se aproxima lentamente de Zairos. Eles lutam.
Golpes rápidos, muitos são bloqueados, mas outros cortam a carne
de ambos. Parece uma batalha sem fim, na qual o vencedor é
imprevisível. Ambos pausam por alguns segundos, arfando, o
sangue espalhado sobre seus corpos. Bestafera ataca novamente
com a lâmina em um golpe giratório. Zairos se abaixa e, com o
escudo, lhe golpeia as costelas, fazendo-o se curvar, expondo-lhe o
pescoço. O campeão de Thalderan ergue a espada, pronto para
desferir o golpe final.
Pequeno Urso: “Nãooo!”
Por meio segundo, Zairos se vira para Pequeno Urso. O
suficiente para Bestafera se recuperar e atingi-lo com um soco
ascendente. O impacto do metal da soqueira quase lhe quebrando
o queixo, atordoando-o. Agora é a vez do gigantesco guerreiro
preparar o ataque fatal.
Pequeno Urso: “IRMÃO!”
Bestafera congela. Ele se vira para seu irmão mais novo e
parece reconhecê-lo. Então se aproxima de Pequeno Urso para
olhar dentro de seus olhos úmidos e tenta sorrir com o que lhe
resta de sua humanidade.
Pequeno Urso: “O que eles fizeram com você?”
Por um momento, a selvageria deixa o rosto de Bestafera. Ele
acena com a cabeça e dá a Pequeno Urso uma nova tentativa de
sorriso. Um grito o interrompe.
Olho da Noite: “Bestafera!”
A selvageria está de volta aos olhos de Bestafera quando ele se
vira para Olho da Noite, mas agora acompanhada por um ódio
totalmente lúcido. Ele fala com esforço.
Bestafera: “Eu não sou besta-fera! Sou um
homem, você, você é a besta-fera!”
Ele parte furiosamente contra um trêmulo Olho da Noite, que se
esconde atrás de seus homens. Pequeno Urso segue seu irmão, mas
Zairos o intercepta, atirando-se sobre sua cintura. Ambos caem no
chão. De lá, eles assistem Bestafera dilacerar dezenas dos soldados
de Olho da Noite na tentativa de alcançá-lo, mas os guerreiros de
Brummata são muitos e eles começam a atingir o feroz e
implacável guerreiro.
Bestafera resiste com força sobre-humana. Mesmo coberto de
ferimentos ensanguentados e carne exposta por todo o corpo, ele
mata muitos homens antes de, finalmente, cair de quatro, trêmulo,
quase morto. Olho da Noite faz seus homens pararem e se
aproxima do gigante caído. Com ambas as mãos, ergue a lança e a
aponta para as costas de Bestafera. Este vira o rosto para o irmão
e, mesmo sob a dor, consegue lhe dar um sorriso triste, mas
verdadeiro. Contido por Zairos, Pequeno Urso grita, enquanto
Olho da Noite atravessa a lança em seu irmão, pisa em suas costas
e retira a arma do corpo já sem vida, caído de bruços no solo
coberto de sangue. Carvalho Sagrado reúne alguns homens para
cuidar dos feridos.
Olho da Noite monta em seu cavalo negro, pronto para partir.
Sentindo a dor de seus ferimentos, Zairos caminha cambaleante,
mas determinado, na direção de seu antigo inimigo.
Zairos: “Olho da Noite! Você matou meu pai! Você se
lembra disso, desgraçado?”
O herdeiro de Brummata abre um sorriso irônico.
Olho da Noite: “Sim… Uma linda lembrança.”
Zairos: “Então aproveite para terminar o que você
começou naquele dia! Estou exausto, ferido. Meu
duelo com seu campeão não terminou.”
O campeão de Thalderan aponta para Carvalho Sagrado.
Zairos: “Deixe seu tio orgulhoso. Substitua
Bestafera, seja o primeiro a vencer um Dragão da
Tempestade. Mostre a todos nós o poder do
Imortal!”
Com os olhos, Olho da Noite inspeciona Zairos – rosto
cansado, respiração pesada, o corpo curvado, o sangue escorrendo
por toda parte – e ganha confiança. Com a cabeça, o Sacerdote
Regente acena que sim para Olho da Noite.
Olho da Noite: “Você ousa me desafiar, Zairos?”
Zairos concorda com um sorriso, endireita o corpo. Seu rosto
muda de exaustão para uma fúria vívida. Seus músculos saltam
conforme ele aperta o cabo da espada e a empunhadura de seu
escudo.
O olhar desafiador de Olho da Noite muda para medo diante da
postura revigorada do campeão de Thalderan.
Olho da Noite: “Hoje não, Dragão!”
Olho da Noite dispara em retirada com o cavalo.
Carvalho Sagrado sacode negativamente a cabeça, antes de
baixá-la, envergonhado. Zairos grita a plenos pulmões.
Zairos: “Covarde!”
Zairos corre então até Pequeno Urso, que chora sobre o corpo
de Bestafera. Feigon se agacha junto a ele.
Feigon: “Vamos dar a ele o funeral de um
verdadeiro Dragão da Tempestade. Então, um dia,
se o Grande Ghoddrak assim o desejar, você e seu
irmão poderão lutar lado a lado.”
Zairos começa a cavar e Jygar se une a ele. Feigon junta sua
mão com a de Bestafera e faz um corte em ambas, com a adaga
cerimonial. Feigon abre os olhos sem vida de Bestafera e começa a
pintar-lhe o corpo com as runas mortuárias de sangue.

CASA DE GUERRA DE AXENGARD


(N )
Gemidos se ouvem pelos largos corredores do palácio de
amplos e suntuosos aposentos.

Q O
Roupas espalhadas pelo chão. Uma tocha acesa na parede
salpica o quarto com sua parca luz bruxuleante. Orgath tem três
lindas jovens orientais nuas em sua cama. Elas o beijam
calorosamente enquanto ele bebe um gole de vinho direto do
gargalo. Gritos desesperados de Lissa atingem seu ouvido.
Lissa: “Orgath! Rápido!”
Ele larga a garrafa, que se estilhaça no chão enquanto ele se
move velozmente para fora do quarto.

Q A
Orgath entra apressadamente no quarto de seu pai. Ele fica
paralisado ao ver seu avô, General Uldresh morto, banhado em
sangue, no chão. Seu pai deitado, com Lissa agachada próxima a
ele. Ele tem sangue nas mãos e uma ferida aberta no peito. Os
olhos perdidos em delírio.
Avernath: “Filho? É você?”
Lissa se levanta ao ver Orgath. Ela baixa os olhos e sacode a
cabeça. Orgath se ajoelha próximo a seu pai. Avernath aponta para
o corpo sem vida de Uldresh, mas, em sua mente, vê Jygar ao
invés do velho general.
Avernath: “Vê? Eles não são invencíveis. Eu
derrotei o poderoso Jygar.”
Ele segura a mão de Orgath.
Avernath: “Agora vá, chame seu avô e lidere
Axengard para a glória, filho.”
Ele dá ao filho um último sorriso orgulhoso antes de soltar sua
mão. O rosto de Orgath se contorce em sofrimento. Ele o cobre
com as mãos cobertas de sangue.

CEMITÉRIO DE AXENGARD
(D )
As árvores desfolhadas e a grama seca no alto da colina
aumentam a atmosfera desoladora do local onde os Axengardianos
queimam seus mortos. Várias urnas funerais se encontram
espalhadas pelo local, pequenas e grandes, quadradas e
arredondadas, muitas distribuídas pelo chão. Outras, maiores e
mais ornamentadas, sobre plataformas de pedra. Nenhuma com
tampa, as mais recentes ainda cheias das cinzas dos mortos.
Vários militares de Axengard estão alinhados diante de duas
piras funerais, ainda apagadas, onde os corpos de Avernath e
Uldresh repousam. Ao lado de cada pira, uma urna de prata
adornada com esmeraldas e runas entalhadas aguarda sobre uma
plataforma de granito negro a chegada das cinzas de seu general.
Com uma tocha ornamentada, Orgath acende as piras. Ele fita o
fogo com olhos letárgicos. Ao lado de Lissa, Zairos assiste às
chamas consumirem os corpos do pai e do avô de seu amigo.
Orgath se aproxima dele.
Orgath: “Sabe de uma coisa? De certa forma, eles
estão mortos por causa de nossa amizade. É por
isso que sinto o sangue deles nas minhas mãos. A
loucura de meu pai começou quando escolhi ficar
do seu lado ao invés do dele.”
Zairos: “O quê...”
Orgath: “Nada, apenas uma história que eu quero
esquecer.”
Ele observa as chamas consumirem os corpos do pai e do avô.
Orgath: “Você salvou minha vida, Zairos… mas
você também a tirou de mim. Meu pai, meu avô, a
mulher que eu amo… até mesmo a chance de
guerra contra os inimigos de minha nação… você,
logo você, sempre contra mim…”
Zairos: “Está me culpando? Eu sou seu melhor
amigo, seu irmão.”
Orgath: “Sim! Um irmão que nunca está do meu
lado.”
O corpo de Orgath estremece. Ele fecha o punho e dispara um
soco na direção de Zairos, que defende o golpe e derruba Orgath
no chão com um empurrão. Raiva nos olhos, Orgath se levanta,
desembainha sua adaga e a levanta contra Zairos, que apenas o
encara.
Orgath: “Agora você vai me bater diante do meu
povo? O que mais você quer, Zairos? O que
mais?”
Zairos balança a cabeça, respira fundo e solta o ar pesadamente.
Então lhe vira as costas e começa a se afastar. Furioso, Orgath
atira a adaga. Ela gora velozmente em direção àquele que sempre
fora seu melhor amigo e penetra profundamente em sue alvo, uma
árvore, próxima a Zairos. O falcão do Sacerdote Regente, pousado
em seus galhos secos, alça voo, enquanto o Dragão de Thalderan
prossegue sua caminhada sem se abalar. Com seu exército às suas
costas, o rosto de Orgath treme enquanto ele tenta impedir a queda
de uma lágrima.

JARDINS DE SOLFIRA
(C )
Sentado em frente a uma mesa oval no pátio florido, Chun insere
uma caneta de pena, com tinta azul fresca na ponta, em um pequeno
suporte de madeira. Sob os olhos da Cacatua Rosa na beira da mesa,
a imperatriz menina enrola o papel amarelado e o enlaça com uma
minúscula fita azulada. Com as duas mãos, ela entrega a carta ao
Jovem Sacerdote ao seu lado. Ele se curva enquanto a toma em suas
mãos. Ele então levanta o pergaminho sobre a cabeça e assobia. Sua
cacatua voa e agarra a carta em suas garras para voar alto sobre as
paredes que cercam o jardim, banhada pelo sol que se põe atrás da
torre do palácio.
SALÃO DA CASA DE GUERRA DE AXENGARD
( )
A lenha crepita na lareira acesa ao fundo da grande sala. Lissa
observa enquanto Orgath lê uma carta. A Cacatua Rosa empoleirada
no ombro dela parece fazer o mesmo. Ele termina a leitura e olha
para a sacerdotisa.
Orgath: “Condolências e uma proposta de
Solfira.”
Lissa: “Que tipo de proposta? Você irá
aceitar?"
Orgath: “Um casamento… para unir nossas
nações... para sempre!”
Lissa: “Isso é maravilhoso! Ela é inteligente,
gentil e bonita. Você vai aceitar, certo?
Lissa: “De que jeito?”
Orgath: “As condolências, sim. A proposta,
talvez no futuro, mas do meu jeito, da maneira
que Axengard merece.”
Ele ignora a sacerdotisa e joga o pergaminho no fogo. Com olhos
pensativos e um sorriso no canto da boca, o jovem General observa
enquanto o papel se transforma em brasas voando e dançando junto
com as chamas cor de safira e rubi.
Capítulo 9

TORMENTAS
4 ANOS DEPOIS...

CIDADE DE BRUMMATA
(N )
O falcão se aproxima das inúmeras casas harmonicamente
integradas com as copas e galhos das frondosas árvores da floresta
de Brummata. Em seu centro, uma grande clareira, com uma
impressionante construção formada por enormes árvores
entrelaçadas, cercada por gigantescas tochas. A imponente ave
mergulha em direção a uma grande janela circular no alto, em seu
centro, e em poucos segundos adentra a estrutura através dela.

S E
Ele abre as asas enquanto plana sobre um grupo de nativos no
amplo e alto salão. Eles espalham um assustador som de percussão
enquanto tocam os tambores de couro em um ritmo frenético.
Olho da Noite é um dos percursionistas. No cento do aposento,
diante de uma pira acesa, Carvalho Sagrado, olhos fechados,
sacode seu corpo de uma maneira ritmada, como em um transe
conectado à música dos tambores. Seu falcão parece também
entrar em transe e mergulha em direção à pira. Ele emite um som
alto e agudo quando esbarra nela, espalhando a madeira flamejante
dentro dela pelo chão. O ritmo dos tambores se intensifica.
O Sacerdote Regente abre os olhos, ainda em transe. O falcão
pousa em seu braço direito, as garras rasgando sua pele, mas ele se
mantém impassível. Em seguida pega uma das lenhas caídas e
parece não sentir o fogo ainda trepidando na madeira enquanto fita
as chamas com olhos vagos.
Carvalho Sagrado: “O Deus Dragão será desafiado
mais uma vez. O Pacto será quebrado!”
Os tambores param. Olho da Noite sorri.
PASSAGEM NORTE DE THALDERAN
(D )
O sol se esconde por trás das nuvens. O mar distante,
silencioso e calmo, ao fundo. Um grande disco de pedra, com um
falcão entalhado, marca o local onde Falcão da Lua está enterrado.
Sentado próximo a ele, Pequeno Urso bebe e come de maneira
espalhafatosa enquanto Jygar conversa com ele. Zairos e Orgath
seguram uma caneca de vinho enquanto assistem Minara, com um
conjunto de espada e escudo, treinar Nairon. Com espadas gêmeas
nas mãos, ele se move com toda a energia de um forte menino em
todo vigor de seus onze anos. Nairon ataca sua mãe com uma
rápida sequência de golpes habilidosos. Ela sorri orgulhosa
enquanto se defende.
Orgath: “Durante todo esse tempo, por várias
vezes eu pensei no que aconteceu no funeral, sabe?
E eu nunca me desculpei pelo que fiz e te disse
naquele dia.”
Zairos: “Esqueça. Foi um momento muito difícil.
Você é meu irmão, é isso que importa. Estou feliz
que você veio aqui hoje.”
Orgath dá um meio sorriso, constrangido. Nairon executa
alguns ágeis e poderosos movimentos que chamam sua atenção.
Orgath: “Ei, olhe o seu filho. Ele é bom, muito
bom. Se ele continuar assim, ele vai ser melhor do
que você. Muito melhor.”
Zairos: “Ele ainda tem muito que aprender, mas
tenho de admitir que ele aprende rápido.”
Orgath: “Muito rápido. É uma pena que a era dos
Dragões da Tempestade vai ter acabado antes dele
se tornar um de vocês.”
Zairos: “Não é uma pena, meu amigo. Solfira
desistiu dos duelos e você, como líder de
Axengard, jamais enviou um campeão contra mim.
Minha gratidão por isso.”
Orgath pressiona os lábios com um aceno de cabeça. O
campeão de Thalderan segura o general pelos ombros.
Zairos: “Parece que as Três Nações não precisam
mais dos campeões de Thalderan para ter paz entre
eles. Agora, apenas Brummata ainda mantém os
duelos. Mas eu acredito que logo eles entenderão o
quão sem sentido são seus desejos de guer--,"
Orgath: "É exatamente desses desgraçados de
quem estou falando. Brummata está preparando
um grande exército. Há rumores de que eles vão
desrespeitar o Pacto.”
Zairos: “Impossível! “Fora o Olho da Noite, desde
a Antiga Traição eles passaram a ser os que têm
mais fé dentre os Três Povos.”
Orgath: “Eles acham que, através de suas ervas e
preces, podem falar com o Deus Dragão para
encontrar um meio de começar a guerra sem o
duelo, mas também sem ferir o Pacto… E, claro,
temos Profecia... e o Imortal.”
Zairos: “Sim, Olho da Noite. O miserável nunca
vai desistir de encontrar um jeito.”
Orgath se senta por alguns segundos em silêncio. Ele respira
fundo e então fala com determinação.
Orgath: “Una-se a Axengard. Vamos atacar
Brummata! Você derrota os campeões que se
intrometerem em nosso caminho e meu exército
derrota o exército deles, antes que eles fiquem
fortes demais.”
Zairos: “Isso de novo? Por cima do corpo de qual
de meus irmãos atravessaremos Thalderan?”
Orgath: “Me desculpe. É uma ideia estúpida.”
Zairos: “Vamos parar de aborrecer Falcão da Lua
com essa conversa sem sentido.”
Zairos caminha em direção a Nairon e Minara. Ela nota,
sussurra no ouvido de Nairon e gesticula para mostrar-lhe algumas
instruções.
Zairos: “Nairon! Comigo agora! O espírito do
Falcão da Lua está ansioso para ver se você vai
conseguir me vencer dessa vez.”
Minara entrega as armas para Zairos. Pai e filho se encaram.
Nairon dá um leve sorriso. Zairos lhe devolve um muito maior.
Zairos: “Eu conheço esse sorriso. Sua mãe te
ensinou uma daquelas combinações malucas de
golpes! Você acha que vai me vencer com isso?”
Nairon: “Malucas, mas poderosas, papa.”
Repentinamente Nairon dá um passo largo para a direita e salta
alto, com as pernas dobradas e os pés em direção ao escudo
redondo do pai. Zairos sustenta o escudo quando Nairon aterrissa
sobre o mesmo e dispara horizontalmente a espada esquerda
contra seu pescoço. Zairos ergue verticalmente sua espada e apara
o ataque. Nairon empurra o escudo com os pés e salta. Ainda no ar
ele desfere um ataque vertical com a espada. Zairos, erguendo
horizontalmente a sua, bloqueia.
Nairon aterrissa no chão. Zairos nota que o filho está prestes a
atingi-lo na cintura, do lado direito, usando a espada esquerda.
Nairon golpeia, mas durante a execução ele abaixa a espada
direita, liberando a espada de seu pai para o ataque. Imediatamente
Zairos a toca no peito do filho. O menino, rosto frustrado, assume
a derrota e larga as espadas.
Zairos: “Não fique aborrecido. Foi um bom
ataque. Se seus braços fossem maiores, você
poderia ter me acertado também. Mas esse
movimento final abre sua guarda, filho.”
Nairon baixa a cabeça. Zairos dá um soquinho no seu queixo.
Zairos: “Um verdadeiro Dragão nunca desiste!”
Com um gesto de cabeça, Zairos convida o filho para uma nova
tentativa. Nairon lhe devolve um olhar determinado e sorridente.
Nairon: “Nunca!”
Um largo sorriso se abre no rosto de Nairon enquanto ele se
agacha para pegar as espadas. De repente, um grito selvagem de
guerra o assusta e o faz parar. Jygar se vira em direção ao som e
imediatamente vocifera um comando de alerta.
Jygar: “Dragões! Armas em guarda! Agora!”
Eles acompanham o olhar de Jygar e encontram um aclive
próximo, quase do tamanho de uma pequena colina. De trás dela,
dezenas e mais dezenas de guerreiros emergem.
Orgath: “Guerreiros de Brummata!”
Zairos: “Orgath! Os cavalos! Tire Nairon daqui!”
Orgath olha aborrecido. Ele está com o machado na mão,
pronto e ansioso pelo combate.
Jygar: “Temos de nos concentrar na batalha, não
em proteger você e Nairon. Tire ele daqui!”
Ainda hesitante, Orgath permanece olhando para os guerreiros
de Brummata que se aproximam. Minara aperta fortemente o
punho de suas espadas gêmeas e olha para Orgath com firmeza.
Minara: “Vá! Proteja meu filho, eu cubro vocês
dois.”
Orgath acena com a cabeça e então pega Nairon pelo braço,
mas o menino se solta com um puxão forte e repentino.
Nairon: “Eu não preciso de proteção! Eu vou lutar
junto com vocês.”
O rosto de Minara se contorce em desespero, mas Orgath pisca
para ela.
Orgath: “Mas eu preciso de você, Nairon! Eu não
sou um Dragão da Tempestade. Ajude sua mãe a
me fazer conseguir escapar.”
O valoroso menino acena com a cabeça, puxando-o pelo pulso.
Nairon: “Sim, você precisa de mim.”
Com Minara logo atrás, eles disparam rumo aos cavalos,
amarrados a algumas árvores frondosas no lado oposto. Ela
permanece alerta, em guarda, enquanto os outros Dragões
avançam para interceptar as forças inimigas. Há mais de quinze
guerreiros de Brummata para cada Dragão da Tempestade, mas os
primeiros caem, um após o outro, diante dos furiosos Dragões, que
os esmagam, perfuram e despedaçam.
Orgath e Nairon alcançam os cavalos e se preparam para
montar. Vindo da árvore acima deles, um guerreiro aterrissa diante
de Orgath –- Olho da Noite. Ele derruba o menino com um pisão
no peito e ataca o herdeiro do Axengard com sua lança, que usa o
machado para desviar os golpes. O guerreiro de Brummata então
sorri para ele e com um golpe veloz acerta seu rosto com o cabo da
lança, fazendo-o se afastar. O sangue escorre da sobrancelha agora
machucada de Orgath. Ele urra e ergue o machado enquanto corre
em direção ao oponente, mas em um movimento repentino, Olho
da Noite o intercepta, cravando a lança em seu ombro. O
axengardiano tomba e solta o machado quando suas costas batem
no solo. Olho da Noite pega uma clava de guerra das próprias
costas e olha com crueldade para seu rival no chão enquanto este
tenta remover a lança fincada em seu ombro. Orgath consegue se
levantar, mas a clava acerta seu rosto, derrubando-o novamente,
quase inconsciente, absolutamente indefeso à mercê do inimigo.
Então, duas pequenas mãos agarram o machado que Orgath
acabara de perder. Nairon, com o grande machado em suas
mãozinhas, salta diante de Olho da Noite. O vilão dá uma pequena
gargalhada enquanto se aproxima do bravo garoto, que ergue o
machado, pronto para a batalha.
Ainda distante, Minara luta contra os guerreiros de Brummata.
Um inimigo salta sobre ela. Um corte de espada. O guerreiro
aterrissa sem cabeça. Ela se vira, cada uma das espadas duplas
trespassa simultaneamente o coração de outros dois oponentes. As
espadas de Minara golpeiam em todas as direções. A cada
movimento, um guerreiro inimigo cai a seus pés.
O grito de uma criança atinge seus ouvidos. O grito de Nairon!
Ela se vira, seu longo cabelo esvoaçando durante o giro, o som das
batidas de seu coração preenchendo o ar. Seu corpo congela, seus
olhos se arregalam, o pavor estampado em seu rosto. Seus lábios
se movem em um grito desesperado de uma mãe chamando seu
filho. Minara começa a correr em direção à cena apavorante que se
apresenta diante dela. Um guerreiro ferido, caído, estende a mão e
agarra-lhe o tornozelo. Ela cai. O guerreiro salta sobre ela com
uma adaga na mão. Ela se vira, corta a mão do inimigo e perfura
seu pescoço.
Aflita, Minara se levanta e se vira em direção a Nairon. Uma
gota de sangue surge no canto de sua boca. Olho da Noite remove
vagarosamente a lança do ventre de Minara. Ela cai de joelhos e
estende uma das mãos, sem forças, enquanto a outra, sobre a
barriga, tentar conter inutilmente o sangue que se espalha sobre ela
e escorre entre seus dedos.
Minara: “Nairon…”

MAIS TARDE...
O sol começa a se por. No campo de batalha, os Dragões matam
os últimos guerreiros de Brummata. O crepúsculo carmim e o
sangue dos seus inimigos envolvem em vermelho as silhuetas de
Zairos, Jygar e Pequeno Urso. Zairos olha na direção dos cavalos e
vê inúmeros corpos espalhados pelo chão. Em desespero, ele grita
enquanto corre na direção deles.
Zairos: “Minara! Nairon!”
Zairos, ferido e exausto, se dirige à área dos cavalos. Ele
encontra Minara gemendo, mortalmente ferida, deitada em uma
poça de sangue. Ele se ajoelha a seu lado. Com a face coberta de
lágrimas e os olhos avermelhados, ela olha para ele.
Minara: “Nosso filho, nosso filho…”
Minara solta um gemido, o brilho azul de seus olhos parece
esmaecer. Suas pálpebras se fecham lentamente, fazendo as
últimas lágrimas correrem com delicadeza pelo belo rosto agora
pálido e imóvel. Zairos a abraça em desespero, sua face se
contorce em agonia. Com as mãos trêmulas em seu pescoço, ele
repousa delicadamente a cabeça dela no solo gramado. Ele acaricia
seus longos cabelos negros espalhados pela relva, em um gesto de
despedida. Minara está morta. Com as marcas de um choro
incontido manchando seu rosto, ele se levanta cambaleante a
procura de Nairon. Mais à frente ele encontra Orgath, curvado
com o corpo de uma criança nos braços.
Zairos: “Nairon? Nairon?”
Orgath, olhos úmidos, o corpo coberto pelo sangue da
sobrancelha e do ombro, vira a cabeça na direção do amigo,
revelando um hematoma grande e severo no lado do rosto
inchado. Ele balança a cabeça enquanto aperta lábios. Jygar chega
e o segura. Zairos desesperadamente se debate, gritando em
prantos. Pequeno Urso chora. Orgath coloca cuidadosamente o
corpo do menino no chão. De cabeça baixa, ele caminha até
Zairos, respira profundamente e segura seus ombros. Lágrimas
escorrem pelo seu rosto enquanto ele fala.
Orgath: “Todos os seus ossos estão quebrados.
Nairon foi desfigurado por uma clava de guerra,
seu rosto... seu rosto... Você não vai querer vê-lo
nesse estado.”
Pequeno Urso bate com as palmas das mãos na cabeça sem parar.
Pequeno Urso: “Não, não, não. Ele era meu
sobrinho, meu sobrinho, meu sobrinho.”
Zairos – face retorcida pela dor – desaba de joelhos.
Zairos: “Diga-me que não é verdade, que você
se enganou. Eu te imploro.”
Orgath: “Você sabe o quanto eu amava seu
filho, meu irmão. Eu não posso trazê-lo de
volta dos mortos, mas acredite em mim, eu vou
matar aquele desgraçado. Eu juro para você
que eu vou.”
Uma raiva intensa percorre o corpo de Zairos, fazendo seus
músculos se retesarem.
Zairos: “Quem? Quem foi o miserável que fez
isso? Foi ELE, não foi?”
Orgath: “Sim... Olho da Noite!”
O rosto e o corpo de Zairos tremem enquanto ele se levanta.
Orgath: “Nairon o atacou para me salvar. Eu
acertei o miserável nas costas, com sua própria
lança, mas já era tarde demais.”
Jygar: "Esse demônio está morto, então?"
Orgath: “Eu apenas consegui feri-lo. Ele
escapou enquanto eu tentava ajudar Nairon...
me perdoem.”
Orgath: “Como vamos contar a Minara tudo
isso? Como?"
Zairos estremece por completo. Com passos cambaleantes,
começa a andar em direção a Nairon.
Zairos: “Não vamos.”
Pequeno Urso grita, sua voz definhando com medo da resposta.
Pequeno Urso: "Onde tá... ela?"
Zairos chega até o corpo de Nairon. Ele tenta encontrar o rosto
do filho na face desfigurada, coberta de tons escarlate enquanto
com as mãos trêmulas fecha seus doces olhinhos azuis, até então
semi-abertos. As feições de Zairos também se deformam com a
dor insuportável dessa visão. Ele imediatamente cerra os olhos e
aperta o filho nos braços. Em prantos, ele carrega o menino em
direção ao corpo de Minara.
Seus companheiros o seguem com passos tímidos, alguns metros
atrás. Eles param quando Zairos se agacha para aninhar Nairon nos
braços de sua mãe morta. Orgath e Pequeno Urso começaram a
chorar. Soluçando, eles se abraçam. Lágrimas também correm pelo
rosto de Jygar enquanto Zairos se ajoelha para segurar Minara e
Nairon em seu colo. Delicadamente, Orgath afasta Pequeno Urso,
que cai de joelhos. Jygar coloca a cabeça de seu amigo gigantesco
em seu ombro. Em uma mistura de pesar e raiva, o axengardiano se
dirige a Zairos.
Orgath: “Como você, seu filho salvou minha
vida e além disso morreu por mim... Eles
tiraram Minara de nós! Olho da Noite e seu
povo quebraram o Pacto e vão pagar por
isso. Se eles querem guerra, é guerra que eles
vão ter.”
Zairos: “É você que deveria ter morrido por
ele! Você!"
Orgath: “Se eu pudesse escolher, eu morreria
por ele, ou por ela, mil vezes, sem pestanejar,
você sabe disso, Zairos!”
Zairos: “Você está certo. Foi minha culpa. Eu
prometi que nunca iria deixar eles
morrerem. Eu estava aqui e mesmo assim
deixei os dois desprotegidos. ”
Orgath: “Não faça isso com você. Não se
culpe.”
Zairos: “Só vá embora. Eu quero ficar sozinho
com eles.”
Orgath abaixa a cabeça e sai. Zairos acaricia os cabelos de
Minara e Nairon.
Zairos: “Eu preciso muito de vocês. Eu sei que
falhei, que eu não podia deixar isso acontecer,
mas por favor não me deixem. Estou
implorando... Feigon vai trazer vocês de
volta... Não, Ghoddrak vai. ”
Chorando compulsivamente, ele olha para o céu, com os olhos
vermelhos, tomados pelo desespero.
Zairos: “Mostre que você é um verdadeiro
deus. Traga eles de volta!"
Nenhuma resposta dos céus. Um longo silêncio se segue,
interrompido apenas pelos soluços de Pequeno Urso ao
longe. Zairos fecha os olhos e coloca a ponta afiada da espada na
interseção entre a garganta e a base do queixo. Uma gota de sangue
escorre pela lâmina, contornando as mãos ensanguentadas que
seguram com força o gume da espada, até ficar presa ao redor da
gema do olho do dragão, em sua guarda.
Quando a lágrima vermelha é liberada e atinge o solo, o
devastado pai e marido inclina a cabeça para trás, pensando se não é
melhor juntar-se a eles. Então, uma voz chorosa, mas melódica,
atinge seus ouvidos com uma canção familiar.
Pequeno Urso: ♫ Não tema a fúria da
tempestade, nem a escuridão que chega ao
anoitecer, porque estarei ao seu lado, de
verdade, em cada caminho que você escolher...

Na mente de Zairos, a voz de Minara se junta ao seu infante
amigo grandalhão na canção de ninar.
Minara / Pequeno Urso: ♫ Quando a chuva
cair, eu serei seu abrigo, nas sombras serei a
luz do seu luar, sim, eu sempre, sempre estarei
contigo, em todas as batalhas que você quiser
lutar... ♪
Zairos afrouxa as mãos entorno da borda da espada. Ele
finalmente a deixa cair assim que a voz de seu filho substitui à de
Pequeno Urso para se unir à de Minara e assumir por completo o
controle de sua mente junto à imagem dos dois dançando e cantando
com rostos sorridentes.
Minara / Nairon: ♫ Mesmo se o vento
sussurrar que vou embora, ou o destino
simplesmente te tirar de mim, do seu coração
nunca me deixe de fora e você estará comigo,
mesmo após o fim... ♪
Imerso em uma dor insuportável, ele murmura choroso a canção
de ninar enquanto abraça cada vez mais apertado os dois corpos sem
vida e os últimos raios de luz desaparecem, dando vez à escuridão
gelada e interminável daquela noite sem-fim.
Minara / Nairon / Zairos: ♫ Mesmo depois que
o céu, o meu nome chamar, você não estará
sozinho, em momento algum. Feche os olhos, e
se dessa nossa canção você lembrar, estaremos
juntos, e de novo então, seremos um. ♪
Capítulo 10

Q E ?
PASSAGEM NORTE DE THALDERAN
(D )
No horizonte, o sol começa a sumir no mar, agora agitado
pelos ventos fortes que o atravessam, espalhando a areia do chão.
Minara repousa em um esquife sobre uma plataforma de pedra.
Seus olhos azuis abertos parecem ainda vivos, fitando um ponto
distante no céu. Com os braços cruzados e as mãos tocando os
ombros opostos, ela segura as espadas apontadas para baixo. As
costas das mãos revelam tatuagens mortuárias.
Feigon, inclinado sobre o corpo dela, usa o próprio sangue para
terminar a última runa. De um jarro prateado ele derrama
lentamente um óleo transparente sobre ela enquanto ora na Língua
Antiga. Em torno do pequeno caixão, Zairos, Jygar, Pequeno Urso
e Orgath se mantêm agachados sobre um joelho, cabeças baixas
em luto. Feigon gesticula para que eles se levantem, um de cada
vez: Orgath, Pequeno Urso, Jygar, e finalmente Zairos. Este se
aproxima de Minara e curva-se para beija sua testa
demoradamente. Uma lágrima desce pelo seu rosto sobre um dos
olhos de Minara para em seguida escorrer pela sua face, como se
ela chorasse junto com ele.
Com Zairos e Jygar à frente, os Dragões e Orgath carregam o
caixão, dois deles de cada lado. Eles caminham, cabeças curvadas,
exceto por Zairos, que olha para frente, com olhos vazios no rosto
distorcido de dor. Cuidadosamente eles pousam o esquife em uma
cova rasa – pouco mais de um metro. Eles tampam o caixão e
começam a cobri-lo com a terra escavada, amontoada em torno
dele. Zairos ajoelha-se, olhos fechados. Ele crava os dedos no
chão, tentando controlar a agonia de uma dor insuportável. A neve
começa a cair. Ele abre os olhos, buscando por Nairon. Seu filho
repousa coberto com uma manta branca sobre uma pira, pronto
para ser cremado.
Zairos se levanta. Ele caminha a passos trôpegos rumo ao corpo
do filho. Um floco de neve suavemente repousa em seu rosto.
Uma lágrima cai, se junta com o floco de neve e corre face abaixo.
A cada passo, uma lembrança invade sua mente.
LAMPEJOS DE MEMÓRIA
– Seus olhos congelam ao ver Minara pela primeira vez;
– Ela o derruba no primeiro dia de treinamento e sorri;
– Eles fazem amor sob a luz do luar;
– O jovem casal chora de felicidade com o nascimento de
Nairon;
– Nairon abraça Minara depois da primeira vitória de
Zairos;
– Ao lado de Orgath, ele assiste a Nairon e Minara
treinarem pela última vez;
– Ele e Nairon trocam olhares sorridentes enquanto duelam
logo a seguir;
– O rosto frustrado de Nairon se abre em um largo e último
sorriso com seu convite para que ele nunca desista.
Feigon entrega a tocha acesa para Zairos, trazendo sua mente
de volta ao momento presente. Ele a levanta e olha para o fogo
azul. Seus olhos úmidos refletem o brilho da chama.
LAMPEJOS DE MEMÓRIA
– Minara, caída, chama pelo filho deles;
– Orgath com Nairon morto em seus braços;
– Ele abraça os corpos sem vida de Minara e Nairon;
– O rosto de seu filho transformado em uma massa disforme
de carne e sangue.
Zairos desperta das rápidas lembranças novamente. De um
sofrimento absoluto, seu rosto muda para uma raiva descomunal.
Ele acende a pira. As chamas se refletem mais uma vez em seus
olhos. Sem lágrimas dessa vez. Ele larga a tocha, abre os braços e
grita para os céus.

CAMPO DE TREINO DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(MAIS TARDE)
Sob a tênue luz do sol poente, Zairos – pernas dobradas no
chão, olhos vermelhos – olha, com sofrimento, para sua própria
imagem refletida na lâmina da Garra do Trovão em suas mãos. Ele
percebe o reflexo do rosto de Feigon surgir ao lado do seu. O
sacerdote se abaixa e segura seus ombros.
Feigon: “Eu sei que você quer ir atrás de Olho da
Noite, mas…”
Zairos: “Depois do que ele fez, minha vingança
não será mais um ato de guerra… Só um ato de
justiça… Eles estão mortos porque eu esperei
demais.”
Feigon: “Ele terá um exército inteiro como
proteção.”
Zairos: “Então eu vou matar um exército inteiro.”
De repente, Jygar e Pequeno Urso chegam a galope, trazendo
outros dois cavalos com eles.
Jygar: “Orgath e seu exército estão marchando
para a passagem!”
Zairos: “O QUÊ?”
Uma forte tempestade se inicia deixando cair uma rara chuva
vermelha. Feigon estende os braços e captura um pouco da água
rubra nas mãos em concha. Ele olha para a água em suas mãos e
vê o reflexo de seu rosto estupefato.
Feigon: “Lágrimas de sangue do Deus Dragão.”

PASSAGEM NORTE DE THALDERAN


(MAIS TARDE)
Uma poça de chuva avermelhada no chão reflete a figura de
Orgath, armadura de combate, elmo embaixo do braço, olhando
para a poça com um sorriso nervoso. Ao lado de Feigon e um
pouco à frente de Jygar e Pequeno Urso, Zairos mantém a cabeça
baixa. O sumo sacerdote, por um instante, troca um olhar triste
com Lissa, postada diante do exército de Axengard e ao lado de
Orgath.
Orgath: “É apenas a poeira das Montanhas de
Ferro misturada na chuva.”
Feigon: “Você sabe que é um sinal do Poderoso
Ghoddrak para que você não faça isso, Orgath.”
Orgath: “Se seu deus chora, ele chora pelo que vocês não fizeram,
não pelo que finalmente será feito.”
Jygar: “Então, onde está seu campeão, General de Axengard?”
Orgath: “Você está olhando para ele.”
Jygar: “Não me faça acabar com você, garoto.”
Orgath: “Esse assunto não é entre nós dois, velho
dragão.”
Zairos: “Ele não sabe o que está fazendo. Mas se é
isso que ele quer, sou eu que ele tem de enfrentar.”
Orgath: “Estou fazendo o que você precisava ter
feito, Zairos, mas não teve coragem.”
Zairos fecha os olhos, gotas rubras se chocam contra suas
pálpebras na face consumida por um sofrimento torturante. Elas
mesclam-se com suas lágrimas e escorrem como filetes de sangue
rosto abaixo. As veias saltam. Seus músculos se retesam. Orgath
baixa a cabeça. Um soldado se ajoelha a seu lado, braços
estendidos oferecendo-lhe um longo machado de guerra. Orgath
levanta o elmo sobre a cabeça, pronto para colocá-lo.
Asa Azul sobrevoa o general, sua sombra desliza sobre o rosto
de Zairos, que abre os olhos abruptamente. Ele vê Orgath pronto
para enfrentá-lo a sua frente. O coração de Zairos parece explodir
em seu peito. A respiração se acelera em um misto de fúria e
inconformidade. O corvo pousa no cajado de Feigon. O sacerdote
abaixa o capuz e olha firmemente para Orgath.
Orgath: “Feigon! Inicie a cerimônia.”
Feigon: “Você não pode--”
Orgath: “Eu invoco o Pacto. O ritual começa agora
ou meu exército irá avançar.”
Enfurecido, Pequeno Urso ergue o pesado martelo de guerra e
dá um passo à frente, mas a mão firme de Jygar segura seu ombro
e o interrompe.
Feigon: “Então que assim seja!”
Com uma raiva cada vez maior, Zairos encara Orgath, que
desvia o olhar.
Feigon e Lissa murmuram as palavras cerimoniais, suas vozes
pouco audíveis ao fundo.
Lissa: “… que o duelo comece!”
O campeão de Thalderan dispara impetuosamente em direção a
Orgath. Em frente a seu exército imóvel, seu general ergue o longo
machado na diagonal.
O General inicia o ataque. Zairos intercepta o movimento com
um forte golpe de escudo na mão. Com o punho da espada acerta a
outra, fazendo-lhe largar a arma. Imediatamente empurra o peito
do General com um violento chute, derrubando-o. Com um salto,
o Dragão ajoelha-se sobre o peito ofegante do amigo caído.
Furioso, pressiona a borda metálica do escudo contra seu pescoço
e encosta a ponta afiada da espada em sua garganta. Uma gota de
sangue escorre lentamente pela pele de Orgath. A ira em sua voz
soa como o estrondo crescente de um trovão.
Zairos: “Você enlouqueceu? Eu ter perdido tudo
não foi suficiente? Por quê? POR QUÊ?”
Orgath: “Apenas para te dar a chance de escolher.”
Zairos: “Escolher? Eu não tenho escolha agora, a
não ser matar você!”
Orgath: “Não! Agora você pode fazer a escolha
que devia ter feito há muito tempo. A escolha
certa!”
O rosto de Zairos congela. Ao som dos trovões e com a luz dos
relâmpagos refletida em seus olhos arregalados, ele ergue a cabeça
para o céu tempestuoso.
Orgath: “Minara, Nairon, seu pai. Eles têm de ser
vingados! Todos eles!”
Zairos solta Orgath. Os dois se levantam. Pensativo, o Dragão
da Tempestade recua alguns passos.
Orgath: “Brummata usou Olho da Noite para trair
o Pacto… Permita que eu passe com meu exército
e eu prometo que será o fim dele e de seu povo
desgraçado.”
Zairos: “Agora eu entendo. Pela primeira vez, um
Dragão da Tempestade deve falhar em parar
Axengard.”
Zairos joga a espada para Orgath, que a pega.
Zairos: “Vá em frente! Tire minha vida. Seja livre
para ir atrás daquele desgraçado. Minha vingança
será feita pelas suas mãos.”
Orgath aponta a espada para Zairos e se aproxima. Feigon e
Jygar se entreolham apreensivos.
Orgath: “Não desse jeito. O destino está lhe
chamando para fazer o que você devia ter feito há
tanto tempo. Seu deus me escolheu para dar a você
essa chance.”
Orgath remove o colar do pescoço e devolve o antigo presente
para o amigo.
Orgath: “Tome isso de volta.”
Olhos vidrados, Zairos pega o colar com o medalhão do
Símbolo Real de Axengard.
Orgath: “Uma vez você disse que a guerra nunca
seria uma escolha para você. Nunca, é hoje! Faça
sua escolha… irmão!”
As palavras de Orgath transportam Zairos ao passado por um
breve instante.
Lissa, ao final do primeiro duelo de Zairos, faz a pergunta
tradicional: “Dragão de Thalderan, qual a sua escolha? Paz ou
guerra?”
O lampejo de memória se encerra tão rápido como começou.
Zairos estende o braço para o alto, o colar pendendo de sua mão,
enquanto murmura.
Zairos: “Guerra!”
Orgath levanta a Garra do Trovão.
Orgath: “Guerra!”
Zairos grita para todos.
Zairos: “Minha escolha é GUERRA!”
O exército de Axengard fica paralisado por um momento e
então ruge de maneira ensurdecedora.
Feigon: “Ghoddrak abençoe nossas almas.”
Jygar: “Ele não pode fazer isso. Ele está
quebrando o Pacto.”
Feigon: “Você sabe que não. Os dois lados
escolheram guerra. Não há nada que possamos
fazer.”
Jygar franze o cenho. Ele corre até Zairos e grita.
Jygar: “Zairos!”
Zairos lentamente vira a cabeça. Conforme seus olhos
encontram os de Jygar, eles mostram tristeza e insanidade. Jygar
cerra o punho, desfere um soco violento. Zairos cai, sangue em seu
rosto.
Jygar: “Feigon teve uma visão de que você
mudaria nosso mundo, mas desse jeito, Zairos?
Guerra é uma opção que eu nunca te ensinei,
filho.”
Jygar se vira e monta em seu cavalo, pronto para partir.
Jygar: “Pequeno Urso! Você é o único que restou! Tenho
certeza de que não vai me desapontar.”
Pequeno Urso: “Aonde você vai?”
Jygar já está galopando em alta velocidade e não responde.
Feigon: “Ele vai visitar seu antigo mestre.”
Pequeno Urso: “Agora? Por quê?”
Feigon: “Esperança, Pequeno Urso. Esperança por paz.”
Capítulo 11
A
ESTRADA VERMELHA
(D )
Zairos e Orgath cavalgam a frente do poderoso exército de
Axengard. O antigo presente balança novamente no pescoço do
novo campeão do Povo do Norte: o medalhão do lobo prateado
com olhos esmeralda.
Orgath: “O povo da floresta também quer a guerra,
assim não haverá duelo para entrarmos em
Brummata, mas o único caminho até lá é através
de duas cidades pacificadas por Feigon no
passado. Ambas terão um campeão e vão tentar
nos deter através do Pacto.”
Zairos: “Ninguém vai me deter, Orgath.
Ninguém!”

ACAMPAMENTO DE GUERRA DE AXENGARD


(N )
Zairos fita sem expressão a fogueira a sua frente. Orgath traz
duas canecas cheias de vinho, senta-se ao seu lado e lhe dá uma
delas.
Orgath: “Beba! Você vai se sentir melhor.”
Zairos, face e olhos imóveis, aceita mecanicamente a caneca,
mas não bebe.
Orgath: “Madaurea é a última cidade antes de
Brummata. Pequena, com um exército ainda
menor. Seu campeão é um antigo Dragão da
Tempestade, mas está velho e certamente não é
páreo pra você.”
Zairos: “Eu o conheço. Serpente das Sombras. Um
grande guerreiro. Um homem nobre. Ele foi o
mestre de Jygar. O mestre do meu mestre.”
Transtornado, Zairos joga a caneca na fogueira e se retira.
Orgath, preocupado, permanece bebendo em frente à fogueira.

ENTRADA DA CIDADE DE MADAUREA


(D )
O exército de Orgath chega a uma clareira que termina em uma
pequena estrada. O exército de Madaurea postado nela, a cidade de
Madaurea em seu final. Orgath, Lissa e Zairos se dirigem aos seus
respectivos oponentes: o general, a SACERDOTISA DE MADAUREA,
vestindo um manto azul e branco com um faisão dourado em seu
ombro, e o CAMPEÃO DE DE MADAUREA. O último, mais distante,
rezando de joelhos tem o rosto escondido atrás do escudo a sua
frente, no qual suas mãos repousam.
Orgath demonstra surpresa ao avistar a silhueta do escolhido
para lutar contra Zairos. Inquisitivo, ele se volta para a Sacerdotisa
de Madaurea.
Orgath: “Ele não é seu velho Dragão! Onde está
Serpente das Sombras? Está com medo?”
O faisão da sacerdotisa dispara, grasnando enquanto voa sobre
o misterioso campeão atrás do escudo. Então uma voz firme e
poderosa, que Orgath já ouvira tantas vezes, atinge seus ouvidos
com a força de um trovão.
Campeão de Madaurea: “Meu velho mestre me
deu a honra de lutar em seu lugar.”
O guerreiro se levanta e caminha até eles, revelando sua
identidade. O campeão é... Jygar! Paralisados, Zairos e Orgath
olham para o lendário guerreiro, em choque. Em frente ao exército
de Madaurea, SERPENTE DAS SOMBRAS – corpo forte e esguio –
acena a cabeça com orgulho para Jygar, que, também com a
cabeça, cumprimenta-o de volta. Orgath se interpõe em seu
caminho.
Orgath: “O que você pensa q--”
Sem se afetar, sem sequer olhar para o jovem General, Jygar
usa uma das mãos para empurrá-lo para o lado, lançando-o no
chão, enquanto prossegue caminhando resoluto até Zairos.
Jygar: “Sua vingança levará milhares de vidas
nessa guerra, Zairos. Eu não posso permitir.”
Orgath grita para Zairos.
Orgath: “Jygar nos traiu!”
Jygar permanece com a atenção totalmente voltada a seu
aprendiz.
Jygar: “Orgath não quer vingança, apenas poder.”
Orgath: “Traidor! Você se uniu a Brummata e vai
morrer com eles.”
Jygar para diante de Zairos, que retruca raivoso.
Zairos: “Nós temos de vingar Minara e Nairon!”
Jygar: “Eu também os amava, mas isso não os
trará de volta.”
Zairos: “Você não percebe? Olho da Noite vai
liderar seu povo para cumprir a maldita profecia!”
Jygar: “Talvez você esteja certo. Talvez ele seja o
Imortal. Mas não podemos condenar o Povo da
Floresta pelos pecados desse desgraçado.”
Jygar joga seu escudo e sua espada no chão.
Jygar: “Serpente das Sombras foi um grande
mestre e eu vim aqui para dar minha vida por
ele… Se vingança é tudo o que você quer, eu fui o
pior dos mestres que um Dragão da Tempestade
poderia ter.”
Ele se ajoelha, abre os braços, joga o peito para trás e fecha os
olhos.
Jygar: “Eu não vou tentar impedir você, filho.”
Um silêncio duradouro se segue. Orgath olha apreensivamente
para Zairos, que permanece hesitante.
Lissa: “Zairos, não...”
Zairos a ignora e saca sua espada, the Garra do Trovão, a
mesma dada a ele por Jygar, a mesma espada que pertencera a
Serpente das Sombras. Ele olha para a arma por um momento e
avança até Jygar. Com as duas mãos, Zairos ergue a espada sobre a
cabeça. A ponta direcionada para baixo, para o peito de seu velho
mestre. Zairos se atira de joelhos enquanto grita e desfere uma
feroz estocada, descendente e vertical, com a espada. A lâmina faz
um som suave, enquanto desliza perfurando a superfície macia. As
mãos dele tremem enquanto apertam seu cabo com vigor,
nervosamente. Na guarda da arma, o olho esculpido do dragão
brilha, assim como a lâmina levemente manchada com o sangue
seco das batalhas. Ele finalmente larga a espada. Jygar lentamente
abre os olhos, a lâmina firmemente cravada no chão ao seu lado.
Com algum orgulho, ele fita seu aprendiz, que inclina a cabeça em
reverência a ele e levanta-se em seguida. Sem coragem de olhar
nos olhos de seu mentor, ele vira-se, caminha até seu cavalo e se
afasta a galope.
Jygar ergue a cabeça e levanta a voz.
Jygar: “Acabou, Orgath.”
Orgath: “Não, Jygar. Não acabou. A cerimônia
nem começou, muito menos o duelo. O Pacto
determina que eu ainda tenho o direito de escolher
meu campeão.”
Orgath se vira e aponta para ISHTUR, um guerreiro musculoso
no meio dos muitos soldados de Axengard.
Orgath: “Ishtur! Chegou a hora de provar seu
valor!”
Ishtur urra e se aproxima de Jygar, segurando o típico machado
de guerra, longo e pesado. Montado em um garanhão negro, um
guerreiro da floresta, carregando uma lança dupla nas mãos, se
aproxima deles. Olho da Noite desmonta diante de Orgath.
Olho da Noite: “Este homem não pode vencer
Jygar. Eu posso.”
Ishtur, machado erguido, salta sobre Olho da Noite e o ataca
com ímpeto.
Ishtur: “Seu bastardo desgraçado! Volte para seu
povo!”
Olho da Noite se desvia e desfere um golpe cortante na
garganta de Ishtur. Ele cai de joelhos, mãos em torno do próprio
pescoço. O guerreiro tosse, expelindo o sangue através do corte na
garganta. Logo a seguir, sufoca e cai morto.
Olho de Noite: "Viu o que eu disse?"
O exército de Axengard grita com selvageria, em protesto.
Orgath grita para seus homens.
Orgath: “Esperem!”
Eles estão agitados, mas obedecem a seu general. Olho da Noite
se aproxima de Orgath.
Olho da Noite: “Eu apenas quero o que você me
prometeu. Além disso, eu tenho um assunto antigo para
resolver com Jygar.”
Orgath fita Olho da Noite nervosamente.
Lissa: “Do que ele está fala--”
Orgath: “Comece a cerimônia!”
Lissa, olhos arregalados, suspira e olha para o rosto
determinado de Jygar. Ele concorda com a cabeça. A boca de
Lissa se move proclamando as palavras cerimoniais, mas Jygar
apenas escuta a respiração excitada de Olho da Noite, enquanto
arranca a Garra do Trovão, sua velha espada, do solo e pega o
escudo. Olho da Noite lambe o sangue na ponta da lança e sorri.
Antes que a sacerdotisa termine as palavras rituais,o guerreiro
de Brummata ataca, disparando rápidos ataques em lados
alternados contra Jygar, que com dificuldade devido ao braço
aleijado, defende os ataques usando a espada e o escudo. Olho da
Noite se agacha e com um veloz golpe lateral de uma das lâminas
de sua lança faz um corte na canela de Jygar. O experiente Dragão
da Tempestade cai sobre um dos joelhos, a cabeça desprotegida.
Olho da Noite dispara, para baixo, a lâmina oposta contra o
pescoço de Jygar e a crava com violência... em seu escudo de
madeira. Com uma torção do escudo, o experiente Dragão
empurra a lança para o chão. Com um pisão na arma, ele a arranca
das mãos de Olho da Noite. Desarmado, ele salta sobre Jygar, que
o joga longe com uma cotovelada na testa. O velho campeão olha
fixamente seu adversário.
Assustado, Olho da Noite se levanta, corre cambaleando em
fuga e solta um assobio alto. Seu corcel negro dispara para pegá-
lo. Ele salta sobre o cavalo e ruma para um ponto distante da
floresta que os cerca. Em sua rota de fuga, ele se pendura
habilmente na sela e, com destreza, consegue pegar sua lança do
chão.
Jygar corre também, monta em um cavalo e começa a persegui-
lo, mas interrompe a caçada repentinamente. Seus olhos fixos em
um cavaleiro sobre uma pequena colina a média distância.
Lissa: “Por que você parou?”
O cavaleiro persegue Olho da Noite. Este olha para trás e
identifica o guerreiro em seu encalço: Zairos!
Jygar: “O momento da vingança finalmente
chegou. Finalmente Ghoddrak deu a Zairos a
chance que ele tanto queria.”

FLORESTA DE BRUMMATA
(D )
Olho da Noite cavalga através da floresta densa. Zairos galopa
a toda velocidade atrás dele e encurta a distância. Seu inimigo
percebe, olha para trás e bate com os calcanhares na barriga de seu
corcel fazendo-o disparar e voltar a ganhar terreno. Zairos pega
seu escudo e o arremessa. Ele plana enquanto gira rapidamente
pelo ar, até atingir em cheio as costas de seu algoz, derrubando-o
do cavalo em disparada. Olho da Noite cai exatamente no meio da
Clareira do Rio das Brumas, onde seus destinos se cruzaram pela
primeira vez. Olho da Noite, levemente atordoado, se levanta
apoiado em sua lança. Zairos, desarmado, salta do cavalo e se
aproxima dele. Seu antigo inimigo o recebe com um sorriso
perverso.
Olho da Noite: “Parece que você deixou sua
espada com Jygar e jogou seu escudo fora.”
Zairos: “Você matou meu pai exatamente nessa
clareira. Eu não preciso de armas para matar
você.”
Olho da Noite ataca. Golpes rápidos com as lâminas das pontas.
Zairos se esquiva dos primeiros golpes, mas um ataque na
diagonal para baixo quase o acerta na barriga. O golpe seguinte
vem do lado oposto e passa a poucos centímetros do pescoço do
Dragão da Tempestade. O próximo arranha seu peito.
Olho da Noite: “Seu pai, sua mulher e seu filho…
e agora, finalmente você!”
Zairos dispara enfurecido na direção dele. Seu inimigo executa
um ataque circular contra suas pernas. Ele salta sobre a lança e
rola para as costas de Olho da Noite. O herdeiro do Povo da
Floresta se vira e ataca de novo, mas Zairos está próximo e com
um salto o atinge com um chute duplo no peito. O golpe o
arremessa longe, fazendo-o perder a lança e se chocar contra o
solo.
Zairos: “O mesmo ataque que meu pai usou para te
derrubar. Lembra disso, covarde?”
Quando Olho da Noite se levanta, Zairos lhe dá um soco no
estômago, seguido de uma cotovelada no queixo, que o derruba.
Ele tenta se levantar, mas recebe uma joelhada em cheio no rosto.
Zairos monta sobre ele e soca seu rosto sem parar. A cada golpe
furioso, sangue e inchaço deformam o rosto de seu inimigo. Uma
lança atravessa o ar. Ela perfura Zairos na interseção de seu peito
com seu ombro. O impacto o desequilibra, quase o derruba.
Enquanto ele tenta remover a lança do ombro, Olho da Noite
rasteja em direção aos inúmeros guerreiros de Brummata que
emergem da floresta. Próximo a eles, ele se levanta com o sorriso
irônico e perverso de volta a seu rosto.
Olho da Noite: “Como eu disse, pai, mulher, filho
e… você.”
Os incontáveis guerreiros armados, ainda distantes, começam a
cercar Zairos lentamente. Já de pé, ele agora apenas segura a lança
ainda levemente encravada em seu torso enquanto os observa.
Olho da Noite: “Sabe o que é melhor? Você pensa
que eu sou seu grande algoz, mas não sou. E você
vai morrer sem saber quem é o bastardo
desgraçado que fez de sua vida um inferno.”
Um guerreiro avança contra Zairos, que termina de arrancar a
lança do ombro e a arremessa acertando-a em cheio o peito do
inimigo, que cai de costas com um baque surdo no chão. O
Campeão de Thalderan nota um galho no solo, o mesmo formato
do galho-espada com o qual brincara com seu pai no dia em que
ele foi morto, naquele mesmo local, por aquele mesmo homem.
Ele olha para Olho da Noite parado, confiante alguns passos à
frente, pega a espada improvisada e corre. Com um grande salto,
ele puxa o cotovelo para trás e o aponta, como uma flecha certeira.
Ainda no ar ele atinge o alvo, enterrando profundamente a ponta
do galho no que era o olho saudável de Olho da Noite. O sangue
escorre de sua vista, o galho impiedosamente fincado nele. Cego
dos dois olhos agora, gritando, o assassino da família de Zairos
desaba de joelhos. O Dragão da Tempestade segura a cabeça
daquele que, até então, ele acreditava ser o Imortal e a torce.
Imediatamente após o breve e seco som de um pescoço se
partindo, os gritos cessam. O rosto inerte de Olho da noite, coberto
de sangue, seguido pelo lento desmoronar de seu corpo, se choca
contra o chão. Olho da Noite certamente não é imortal, pois está
morto aos pés de Zairos.
Ele finalmente conseguiu sua vingança, mas enquanto os
furiosos guerreiros da floresta se aproximam em velocidade
vertiginosa, as últimas palavras de seu inimigo ressoam na mente
de Zairos – 'seu grande algoz... não sou... morrer sem saber quem
é...'.”
Morrer não é mais uma opção. Ele pega a lança de Olho da
Noite e combate os incontáveis inimigos. Os guerreiros são muitos
e o cercam por completo, mas com movimentos ágeis e precisos
ele corta e perfura vários deles com as lâminas da lança, sem ser
atingido.
Então a lâmina de um machado perfura as costas de Zairos.
Dor. Ele gira e desfere um golpe mortal na cabeça do inimigo. Um
facão faz um corte em seu braço. Gemido. Ele contra-ataca. Letal
mais uma vez. Uma clava de guerra quebra suas costelas. Ele grita
ao mesmo tempo em que mata seu agressor. Uma espada faz um
novo corte, agora no peito de Zairos. Banhado em sangue, seu
colar, o colar que Orgath lhe dera, cai no gramado. Zairos enfia a
lança no coração do inimigo, mas enfraquecido pelos ferimentos,
cai de joelhos. Atrás dele, um guerreiro, de feição feroz, ergue o
facão para partir-lhe a cabeça no meio.
Uma mancha branca corta o ar. Mandíbulas ferozes rasgam a
garganta do guerreiro. O Lobo Branco rosna para os outros
homens. Um dos guerreiros mira a lança contra a fera, mas grita
quando o Lobo Negro o derruba e dilacera seu pescoço. De um
galho grosso de árvore, acima da fera, uma figura salta sobre o
próximo guerreiro e esmaga seu crânio com um golpe de cajado.
Irmã Lobo olha para os rostos aturdidos dos muitos guerreiros
remanescentes. Seus lobos rosnam a seu lado.
Zairos desaba. Irmã Lobo tira seu manto, revelando seu corpo
envelhecido, mas ainda forte e harmoniosamente delineado, para
colocá-lo dobrado sob a cabeça de seu protegido. Os lobos uivam.
Um chamado. Dezenas e dezenas de lobos surgem da floresta. Eles
cercam os guerreiros assustados. Irmã Lobo lidera sua matilha ao
ataque. Nesse momento, ele não é mais uma velha sacerdotisa
eremita, mas um Dragão da Tempestade de novo. Seus inimigos
caem diante dos golpes de seu cajado e das mandíbulas dos lobos,
que atacam furiosamente por todos os lados. O bastão ágil da
antiga guerreira do Dragão gira veloz, preciso, fatal. Costelas,
mandíbulas e crânios são fraturados a cada movimento. O Lobo
Branco e o Lobo Negro lutam a seu lado, mulher e animal
executando movimentos de combate perfeitamente harmônicos em
uma dança mortal.
Os guerreiros que escapam de seus ataques são interceptados
pelas presas poderosas dos outros lobos que saltam sobre eles,
cravando os dentes afiados em seus braços, pernas e pescoços. O
eventual gemido agudo dos lobos abatidos é abafado pelos seus
rosnados e, principalmente, pelos gritos de desespero e dor dos
lacaios de Olho da Noite. Eles não são páreo para a velha loba e
sua matilha.

MAIS TARDE...
A batalha está terminada. Os olhos de Irmã Lobo procuram por
entre homens e lobos mortos. O lobo branco e o negro caminham a
seu lado. Seus olhos se perdem em antigas lembranças quando
avistam o corpo de Olho da Noite.

LAMPEJOS DE MEMÓRIA
- PERIFERIA DE THALDERAN: Duas meninas, Irmã Lobo e
Lótus de Fogo, correm e brincam de pega-pega, enquanto
carregam bonecas de pano como se fossem seus bebês.
- TEMPLO DE BRUMMATA: Com a cabeça no ombro de
uma jovem Irmã Lobo e lágrimas nos olhos, Lótus de Fogo
amamenta seu bebê, que mantém os olhos fechados. Então ele
dá um sorriso de satisfação e abre seus olhos para olhar para
sua mãe: um olho escuro como a noite, o outro branco como
a lua. Lótus de Fogo entrega seu filho para sua amiga e cai
no chão em um choro copioso. Irmã Lobo abraça com ternura
o bebezinho e beija-o na cabeça.
– FLORESTA: Feigon mostra a Irmã Lobo algumas ervas
medicinais. Ela se distrai ao ver Lótus de Fogo, olhos cheios
de dor e ódio, treinando duro às margens do rio. Olho da
Noite, ainda menino, observa a mãe, que lhe devolve o olhar
com amargura. O menino abaixa os olhos.
– CLAREIRA DO RIO DAS BRUMAS: Os bastões de madeira
se chocam em um duelo amigável. Lótus de Fogo sorri para a
jovem Irmã Lobo ao mesmo tempo em que é atingida por um
golpe no ombro. Instantes depois, o menino Olho da Noite
coloca algumas ervas no ombro machucado da mãe, que olha
zangada para ele. Irmã Lobo olha para ela ainda mais
zangada. Lótus de Fogo abraça seu filho, ambos com os olhos
úmidos. Irmã Lobo une-se aos dois.
– PASSAGEM SUL: Duelo de Dragões. Um jovem Jygar
remove a Garra do Trovão de seu oponente morto: “Lótus de
Fogo, a lança de duas lâminas caída a seu lado. Jygar se
afasta com pesar. O garoto Olho da Noite corre de seu
esconderijo para abraçar a mãe morta, seguido pela Jovem
Irmã Lobo. Jygar observa o menino pegar a lança dela e, com
esforço, arremessá-la contra ele. Ele torce o corpo e se desvia
com facilidade. Olho da Noite o encara com ódio nos olhos.
Mesmo seu olho branco parece fitá-lo, por trás das lágrimas.
Irmã Lobo abraça o menino e olha para Jygar. Os outrora
companheiros Dragões compartilham um olhar de profunda
tristeza.
Dispersando suas lembranças, Irmã Lobo abre lentamente os
olhos tristes enquanto sacode a cabeça e continua sua busca pelo
corpo de Zairos. Ela encontra Zairos estrado no chão, em uma
imobilidade mórbida. Olhos fechados, o rosto e o corpo cobertos
por feridas abertas, banhadas de sangue.

MAIS TARDE...
O sol começa a se por. Jygar, a cavalo, adentra a clareira e vê
inúmeros corpos espalhados por todos os lados.
Jygar: “Desgraça!”
Ele desmonta. Abutres bicam os corpos de homens e lobos
enquanto ele caminha entre eles, procurando por Zairos. O velho
campeão se inclina ao encontrar o corpo de Olho da Noite e um
leve sorriso percorre seus lábios, mas desaparece ao ver o escudo
de Zairos preso em algumas rochas no rio. Quando anda em
direção ao escudo, ele pisa em uma poça de sangue. Algo brilha
dentro dela. Ele se abaixa para verificar. É o colar de Zairos. O
guerreiro baixa a cabeça e cerra os olhos lentamente. Seu punho se
fecha com força, apertando o colar. Uma lágrima desce pelo rosto
de Jygar. O Cardeal Vermelho sobrevoa sua cabeça com assobios
de lamento e plana até o escudo manchado de sangue, onde pousa
em silêncio.

SALA DE ARMAS DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(N )
Espadas longas e curtas, escudos e martelos de guerra se
espalham pelas paredes da pequena sala. As grandes mãos
trêmulas de Pequeno Urso deixam cair o escudo de Zairos,
manchado de sangue. Ele abraça Jygar, como uma criança
chorando no ombro de seu pai. Jygar chora com ele. Feigon os
observa com tristes olhos lacrimejantes.

CLAREIRA DIANTE DA CABANA DE IRMÃ LOBO


(N )
Sobre a chaminé da pequena cabana de madeira na floresta, em
frente ao rio, o cardeal vermelho, cabeça inquieta, observa. Sob a
luz da lua nova, Irmã Lobo, torso nu, retira Zairos – inconsciente,
à beira da morte, enrolado em seu manto – de uma jangada no rio.
Ela o deita à sua margem e o desenrola do manto. Banhando um
punhado de ervas no rio, ela cuidadosamente limpa os ferimentos
e o sangue espalhados pelo corpo quase sem vida de seu querido
amigo em coma.
Irmã Lobo: “Você não sabe, mas sua vingança não
está completa, minha criança… seja forte,
sobreviva para cumprir seu destino. Detenha-o, ou
o mal traiçoeiro que ele derramou sobre você se
espalhará para destruir o mundo.”
Ela termina de limpar o corpo de Zairos e pega de um pote
fumegante a seu lado, punhados de ervas, alguns em brasa, e os
esfrega sobre cada ferida do Dragão desacordado. Então endireita
o corpo e aproxima seu rosto do dele.
Irmã Lobo: “Orgath, filho, é seu verdadeiro algoz.
A profecia ainda vive.”
A eremita saca uma faca da cintura e a ergue, repousada em
suas mãos, em direção aos céus, pedindo as bênçãos do Deus
Dragão. Em seguida corta os próprios pulsos e começa a
murmurar cânticos antigos enquanto seu sangue cai sobre os
ferimentos abertos de Zairos.

SEMANAS DEPOIS...

CIDADE DE MADAUREA
(D )
Pessoas mortas caídas pelas empoeiradas e largas ruas da
pequena cidade. Feigon e Carvalho Sagrado cuidam dos doentes.
Homens, mulheres e crianças, com suas peles feridas,
descascando, gemem por todos os cantos. Jygar e Serpente das
Sombras os ajudam.
Jygar: “Quando isso começou?”
Serpente das Sombras: “Dez luas atrás. Logo
depois do seu duelo com Olho da Noite.”
Um ancião se aproxima de Serpente das Sombras.
Ancião: “A culpa é sua! De todos vocês.”
Serpente das Sombras abaixa a cabeça. Jygar olha para ele
inquisitivamente.
Ancião: “Um homem branco como você nos
defendendo? O sobrinho de nosso grande
sacerdote se aliando a Axengard? Ghoddrak
amaldiçoou nosso povo!”
Feigon: “Deite aqui agora, ou vou amaldiçoá-lo
pessoalmente. Você está doente. Deixe-me ajudá-
lo.”
O Ancião resmunga algo incompreensível e se deita enquanto
Feigon lhe dá algumas ervas medicinais para mastigar. O
Sacerdote Regente e Serpente das Sombras se entreolham.
Carvalho Sagrado: “Ele está certo. Nosso deus se
virou contra nós. A praga também chegou até
Brummata e meus guerreiros. E Axengard irá se
aproveitar disso e trazer a guerra contra o nosso
povo doente.”
Jygar: “Eles abriram os portões da guerra em
Thalderan, mas não aqui. Eu vou ficar o tempo que
for necessário e deter Axengard como eu sempre
fiz.”
Serpente das Sombras: “Não, é o meu povo. Eu
sou um homem velho, mas ainda sou um Dragão
da Tempestade. Nenhum campeão de Axengard
passará por mim.”
Capítulo 12

D
SETE ANOS DEPOIS...

ENTRADA DA CIDADE DE MADAUREA


(N )
Na clareira cercada por pequenas fogueiras em frente à
Madaurea, Serpente das Sombras permanece imóvel, seus
antebraços cruzados sobre a cintura enquanto as mãos repousam
com leveza nos cabos de suas espadas embainhadas. O exército de
sua pequena cidade formado às suas costas. À sua frente, o
Sacerdote Regente e Orgath, com o exército de Axengard em sua
retaguarda.
Orgath: “Por séculos desejando a guerra e,
novamente, você clama pelo Pacto para impedi-la?
Sei que seu povo é fraco e repulsivo, mas
covarde?”
Carvalho Sagrado: “Você é o covarde! Espere até
nossos guerreiros serem curados da praga e eu vou
lhe dar uma guerra com a qual você jamais sequer
sonhou!”
Orgath: “Eu quero minha guerra agora.”
Serpente das Sombras: “Eu vou mandar você de
volta, junto com todo seu exército. Pela sétima
vez!”
Orgath: “Lissa! Comece a cerimônia.”
O DRAGÃO DE AXENGARD – adolescente, atlético, trança de
cabelos negros e lisos – aguarda de joelhos o início da batalha.
Sua respiração pesada abafa a voz de Lissa. Seus olhos
orientais se fecham quando ele abaixa a cabeça. Seus pensamentos
o levam até o dia em que Minara e Nairon foram assassinados nos
arredores da tumba de Falcão da Lua.
Imagens confusas e turbulentas povoam sua mente. Nelas, os
Dragões da Tempestade enfrentam, lado a lado, os guerreiros de
Olho da Noite. Nessas irreais memórias fragmentadas, o Dragão
de Axengard vê Zairos e Minara receberem durante a batalha a
ajuda de um guerreiro inesperado: Kaijin!
O jovem guerreiro desperta de volta ao presente, quando
Serpente das Sombras desembainha suas espadas gêmeas. O
Dragão de Axengard se levanta instantaneamente, com um par de
espadas curtas, do mesmo tipo, em guarda. As lâminas duplas se
chocam com as do inimigo em uma tempestade selvagem de sons
metálicos e faíscas. Elas deslizam, conectadas em uma dança
mortal de movimentos habilidosos. Serpente das Sombras recua
surpreso.
Serpente das Sombras: “Suas armas, seu
movimentos. Quem lhe ensinou isso?”
Imóvel, o Dragão de Axengard não responde. Serpente das
Sombras dá um passo à frente. Eles se aproximam da distância
perfeita para o ataque, ambos com suas espadas em paralelo, na
altura da cintura, apontadas para o adversário. O Dragão de
Axengard dispara uma estocada. Serpente das Sombras deflete o
golpe, e contra-ataca com o mesmo movimento. A ponta da espada
de Serpente das Sombras penetra a carne do inimigo, próxima ao
ombro. Uma armadilha! Em um movimento repentino, o Dragão
de Axengard corta o pulso de Serpente das Sombras e enfia a outra
espada direto em seu coração.
Dragão de Axengard: “Guerra!”
O velho mestre de Jygar desaba quando o Dragão de Axengard
remove sua espada. Carvalho Sagrado monta em seu cavalo.
Orgath sorri para ele.
Orgath: “Nos vemos em Brummata, sacerdote.
Aproveite seus últimos dias como regente. Ou
melhor, apenas aproveite seus últimos dias.”
Com ódio nos olhos, o líder do Povo da Floresta cavalga rumo
a Brummata. Orgath sorri e aponta seu machado em direção ao
exército inimigo.
Orgath: “GUERRA!”
O poderoso exército de Axengard, em muito maior número,
urra enquanto avança contra os guerreiros doentes, enfraquecidos,
de Madaurea. Os exércitos batalham, mas nessas condições não é
uma batalha e sim um massacre. Os homens de Orgath destroçam
seus oponentes em uma carnificina cruel.

CABANA DE IRMÃ LOBO


(D )
No pequeno quarto, com apenas uma cama e uma mesinha de
cabeceira, Irmã Lobo apoia a cabeça do homem de rosto coberto
por longos cabelos e barba, deitado em coma. Zairos sorve o
líquido quase involuntariamente e lentamente abre os olhos
trêmulos. A eremita abre um largo sorriso.
Irmã Lobo: “Graças ao sangue de Ghoddrak! Eu
sabia que ele o mandaria de volta. Eu sabia.”

AXENGARD CONQUISTA AS CIDADES DE


BRUMMATA
Impiedoso, mas de um lugar seguro na retaguarda, Orgath
comanda o exército de Axengard através de suas investidas ferozes
contra cada uma das cidades do Povo da Floresta. Ao seu lado, o
Dragão Axengard permanece alerta, trabalhando como sua
invencível guarda pessoal. Liderando os soldados no campo de
batalha diante deles, seu CAPITÃO ENCAPUZADO – corpo e feições
escondidos sob um manto de pele – luta como um exército de um
homem só. Mesmo continuamente mancando, nenhum oponente
parece ter a mínima chance de deter o novo misterioso Capitão de
Axengard.
Liderado por Orgath, o exército de Axengard avança
impiedosamente contra cada uma das cidades do Povo da Floresta.
– Um Campeão do Povo da Floresta desaba de costas no chão –
a lâmina de uma espada fincada em sua testa
– diante dos olhos do jovem Dragão de Axengard.
– O CAPITÃO DE AXENGARD – capa de peles, rosto escondido
sob o capuz – comanda seus soldados para o massacre de um
pequeno exército.
– Civis tentam escapar. Orgath comanda seus homens para
chaciná-los.
– O Dragão de Brummata, com cortes diagonais em sua
garganta, cai de joelhos às costas do Dragão de Axengard.
– Orgath comanda um selvagem incêndio de uma cidade. Uma
mãe e seu bebê choram dentro de uma casa envolta em chamas.
– Dois soldados de Axengard arrancam as roupas de uma
mulher desesperada. Ela grita. O Capitão de Axengard se vira para
detê-los, mas Orgath o puxa de volta.
– Orgath sorri enquanto o Capitão de Axengard e um soldado
mantêm o Sacerdote Regente de joelhos. O colar de dentes de
Carvalho Sagrado cai, salpicado de sangue, quando o machado de
Orgath atravessa-lhe o pescoço. A cabeça do regente segue o colar,
pintando de vermelho as penas verdes de seu cocar enquanto ele
rola no solo manchado de sangue até chegar ao falcão morto.

MUITOS DIAS DEPOIS...

CEMITÉRIO DE AXENGARD
(N )
Orgath tem as mãos apoiadas sobre a plataforma de granito
negro sobre a qual repousam as cinzas de seu pai e de seu avô.
Atrás dele, o Capitão de Axengard sustenta uma tocha acesa,
enquanto seu general dirige sua fala aos mortos.
Orgath: “Brummata é nossa. Nossos piores
inimigos subjugados e sofrendo pelas mãos do
herdeiro de vocês. É uma pena que vocês não
estejam aqui para compartilhar dessa glória
comigo.”
Ele pega um punhado de cinzas em cada urna e as esfrega no
rosto. Uma lágrima desce fazendo um caminho pelas cinzas
espalhadas em sua face enquanto continua falando com Avernath e
o General Uldresh.
Orgath: “Eu sinto o sangue de vocês em minhas
mãos. Por isso eu lhes devo que a glória de
Axengard se torne eterna. Que suas cinzas tragam
seus espíritos comigo para as Montanhas de Ferro
do Leste, para que testemunhem a conquista da
Nação de Solfira. Então a queda de Thalderan. E
finalmente, o cumprimento da profecia.”

CABANA DE IRMÃ LOBO


(D )
Zairos, deitado na cama, tem seu corpo coberto por
sanguessugas. Ele se contorce e senta-se com esforço. Ele arranca
as sanguessugas, gotas de sangue lhe mancham a barba e roupas.
Com um esforço ainda maior, ele se levanta. Lentamente, com
pernas trêmulas, ele começa a andar. Na porta, Irmã Lobo lhe
sorri, orgulhosa.

PASSAGEM LESTE DE THALDERAN


(D )
Com Feigon e Jygar a suas costas, Pequeno Urso aperta o cabo
de seu pesado martelo de guerra. Com Lissa e Orgath atrás dele, o
Dragão de Axengard, sentado sobre os joelhos, diante de Pequeno
Urso, fecha os olhos devagar. Mais uma vez o Dragão de
Axengard vê uma cena confusa em sua mente.
No meio da batalha, Pequeno Urso se vira contra Minara e a
atinge em cheio com o martelo em sua cabeça. Ela cai, sem vida.
Enfurecido, O Dragão de Axengard desperta, abre os olhos e
ergue as espadas duplas em guarda. Pequeno Urso ataca várias
vezes, mas, com esforço, ele se desvia de cada um dos poderosos
golpes. O ataque seguinte de Pequeno Urso quase o atinge, mas
este contra-ataca e fere a mão esquerda do Dragão da Tempestade.
Com a mão direita, o defensor de Thalderan roda o martelo e
atinge o estômago do Dragão de Axengard, fazendo-o curvar-se.
Pequeno Urso ergue o martelo, pronto para lhe esmagar o crânio.
Nesse instante, o campeão de Orgath levanta a cabeça. Seus olhos
azuis assustados fitam Pequeno Urso, que fica paralisado por uma
fração de segundo, como se em transe. O Dragão de Axengard
aproveita a hesitação e corta a perna de Pequeno Urso com uma
espada, fazendo-o abaixar a guarda. Com a outra, então, lhe
perfura o estômago.
Inesperadamente, à beira da morte, Pequeno Urso sorri para o
adversário e o abraça ternamente, enquanto lágrimas descem pelo
seu rosto.
Pequeno Urso: “Eu senti sua falta”
O Dragão de Axengard, aturdido e confuso, permanece imóvel
enquanto o gigantesco adversário de rosto infantil desaba à sua
frente.

EM FRENTE À CABANA DE IRMÃ LOBO


(D )
Ainda debilitado, Zairos segura, como se uma espada fosse, um
pesado galho de árvore, enquanto se defende com esforço de
golpes cuidadosamente desferidos pelo cajado de uma
empalidecida Irmã Lobo. Zairos prepara um ataque quando a
eremita, arfando, estende a mão pedindo-lhe que pare por um
instante. Ele para imediatamente e observa o rosto envelhecido e
cansado de sua salvadora. Zairos sente que durante os anos em que
esteve acamado, Irmã Lobo de alguma forma, transferira parte de
sua saúde, e até mesmo de sua vida, para ele. A velha sacerdotisa
guerreira respira fundo e ataca-o novamente. Em seu rosto sofrido
e doente, um leve sorriso, enquanto o exaustivo treinamento
continua por mais algumas horas a fio, sem novas interrupções.

AXENGARD CONQUISTA AS CIDADES DE SOLFIRA


Orgath comanda seu poderoso exército nos sangrentos ataques
a cada uma das cidades do domínio da nação de Solfira.
– Com um golpe vertical duplo, o Dragão de Axengard corta e
quebra as clavículas do campeão adversário.
– O Capitão Encapuzado, machados nas mãos, mata vários
inimigos enquanto lidera o embate de seus soldados contra as
tropas de Solfira.
Um homem velho segura a mão de sua neta enquanto corre com
ela em desespero. Orgath galopa atrás deles, desce o machado em
um golpe no crânio do velho. A menina chora sobre o corpo sem
vida do avô.
PALÁCIO DE SOLFIRA
(N )
No amplo saguão de paredes marmorizadas, matizadas de safira
e ouro, as pesadas portas tremem sob o impacto das batidas. Os
Guardas Imperiais de Solfira permanecem à frente de sua jovem
imperatriz. Chun permanece calmamente sentada em seu trono
ornamentado com dragões de olhos de safira esculpidos. As
batidas se tornam mais intensas. Os guardas tensos, prontos para a
batalha iminente. Mais uma forte batida e os portões do salão se
abrem. O exército de Axengard invade imediatamente com brados
de guerra. Mesmo em menor número, os Guardas Imperiais
demonstram uma qualidade muito superior de combate e derrotam
os primeiros Axengardianos com alguma facilidade. Sua
imperatriz, com uma espada reta na mão, luta bravamente como
um deles.
O Dragão de Axengard adentra a enorme sala, seguido por
Orgath. Com suas espadas mortais em guarda, o jovem campeão
está pronto para proteger seu general. Ambos observam enquanto
seu Capitão, com o rosto sob as sombras de seu capuz, toma a frente
de seus soldados e, mesmo mancando, mostra uma destreza
inigualável tirando a vida da maioria dos habilidosos adversários,
enquanto os restantes são eliminados por seus homens, agora
encorajados.
Espada em guarda, Chun está cercada pelos guerreiros
Axengardianos. Ameaçando-a com suas armas, eles a mantêm no
centro de um círculo humano. Os soldados abrem espaço para seu
capitão e o homem manco se aproxima dela. Quando ele atinge
seu alcance, ela ataca com golpes precisos e rápidos, mas o capitão
usa seus machados duplos para desarmá-la sem esforço. Ele então
acerta a parte de trás da cabeça de um de seus machados em seu
estômago, fazendo-a cair de quatro. Dois soldados pulam para o
lado dela e agarraram seus braços estendidos, segurando Chun de
joelhos. Orgath então entra na sala e caminha por entre os corpos
espalhados. Com o rosto coberto por uma pintura de guerra feita
com cinzas funerárias, ele dá um largo sorriso e pousa a mão no
ombro do capitão de seu exército.
Orgath: “Muito bem. Mesmo com o joelho
machucado, você ainda é capaz de mostrar o quão
invencível um Dragão da Tempestade pode ser. ”
Chun: “Um Dragão da Tempestade?”
O general tira o capuz de seu capitão. O homem de feições
solfirianas mantém os olhos fechados e a cabeça baixa.
Orgath: "Sim, o campeão fugitivo de Thalderan, o
dragão renegado de Solfira, o assassino de Falcão
da Lua... Kaijin!"
A imperatriz encara o foragido Dragão da Tempestade. Kaijin
lentamente levanta a cabeça e abre os olhos vazios, cobertos por
veias verdes. Ela então se vira com um olhar furioso para Orgath.
Chun: “Ele foi um herói, um campeão da paz. O
que você fez com ele?"
O General de Axengard olha para ela enquanto o passado passa
velozmente por sua mente.
LAMPEJOS DE MEMÓRIA
– QUARTO DE ORGATH: Com um sorriso cruel, Orgath
olha para a bela mulher misteriosa, sentada nua em sua
cama. Com moedas de ouro no colo, ela examina o pequeno
frasco com a poção feita do Hálito do Dragão. A mesma que
enlouquecera seu pai;
– FESTIVAL DO DRAGÃO: Sobre o palco da celebração,
segundos antes do assassinato de Falcão da Lua, a Mulher
Misteriosa, lábios brilhando com o tom esverdeado da
poção, beija Kaijin e sussurra em seu ouvido: “Orgath é seu
mestre agora e para sempre. Mate seus inimigos, os outros
Dragões aqui com você”. Os olhos dele congelam, vidrados
no jovem General de Axengard;
– PEQUENA CABANA NAS MONTANHAS: “Sob o efeito
permanente da droga do Hálito do Dragão, Kaijin, veias
esverdeadas abaixo dos olhos vitrificados, se ajoelha diante
de Orgath.”
O General do Axengard desperta de suas memórias e, com um
sorriso malicioso, se aproxima de Chun. Ele gesticula para seus
homens permitirem que a Imperatriz fique de pé novamente. Eles
ainda estão com os braços dela presos quando seu general alcança a
líder de Solfira. Delicadamente, ele segura seu queixo, olhando para
seus profundos olhos negros enquanto acaricia seus longos cabelos
cor de ônix.
Orgath: “Não se preocupe, não vou fazer com a
adorável Imperatriz de Solfira o mesmo que fiz
com ele. Você me lembra muito a única mulher
que já amei... Eu jamais drogaria uma mulher
como você, Chun.”
Ela suavemente aproxima sua testa da dele. Orgath sorri, mas
logo grita quando recebe uma cabeçada no nariz. O impacto o faz
perder o equilíbrio e cambalear, dando alguns passos para trás.
Orgath: “Agora você me lembra ainda mais a
minha Minara.”
Com as costas da mão, o herdeiro de Axengard limpa o sangue
do nariz que escorria até a boca, e se dirige para ela. Chun retribui
com um sorriso irônico.
Orgath: “Eu conquistei sua bela nação, e agora
mereço sua linda imperatriz como meu
prêmio.”
Chun: “A carta que te enviei… Ofereci a você
a chance de ser meu imperador, mas você
apenas me deixou esperando por uma resposta
que nunca veio. Juntos, poderíamos governar
nossos povos e estender as mãos da paz para
eles e para Brummata.”
Orgath: “Paz? A paz nunca funcionou entre
nossos povos. Sua escolha pela paz deixou
vocês despreparados para esta guerra. Mas
agora você tem minha resposta, afinal.”
Chun: “Quando você parou de enviar seus
campeões para Thalderan, achei que era sua
resposta. Mesmo quando você atacou
Brummata, eu acreditei que era apenas por
causa do que Olho da Noite fez.”
Orgath: “A estratégia é a arma real de um
grande general, não o seu exército, criança. O
Povo da Floresta e o seu precisavam ser
conquistados, ficarem aos pés de
Axengard. Agora vai ser desse jeito. Do meu
jeito. Você não tem escolha, ajoelhe-se diante
de mim... imperatriz!”
Ela concorda com um balanço de cabeça e começa a se ajoelhar,
curvando-se. O general deixa seu sorriso ainda mais escancarado.
Chun: “Nós sempre temos uma escolha.”
Sustentada pelos guardas segurando seus braços, ela lança seus
calcanhares no estômago de Orgath, derrubando-o de joelhos. É a
hora dela sorrir. Chun dá um salto mortal para trás se livrando do
agarre dos soldados. Quando ela pousa, desembainha duas longas
adagas escondidas na parte de trás da fita em volta de sua
cintura. Com um movimento duplo, ela as enfia no peito dos dois
oponentes. Ela remove as lâminas banhadas em sangue dos homens
mortos. Eles desmoronam e ela está pronta para lutar enquanto os
incontáveis guerreiros a encurralam. Orgath se levanta e se dirige a
ela, cercado por alguns soldados.
Orgath: “Às vezes não, Chun.”
Chun: “Sempre, Orgath.”
A jovem imperatriz avança contra o general. Seus homens
tentam impedi-la, mas caem por suas lâminas ágeis e letais que
cortam o ar assim como a carne deles. Chun salta contra Orgath,
adagas cruzadas à sua frente, prontas para descruzarem-se em um
corte duplo na garganta do herdeiro de Axengard. O corpo dele
congela, seu rosto se contorce de medo. Orgath grita. O sangue
respinga quando as lâminas atingem o alvo. Mas não são as
lâminas dela, não é o seu alvo. Ela cai, o preto obsidiano de seus
longos cabelos cobrindo o chão de mármore branco, pintando-o
lentamente em vermelho vivo. O general solta um grunhido de
raiva e frustração enquanto olha para as a lâminas dos machados
de Kaijin presas na nuca de Chun.

PORTÕES DA CIDADE DE SOLFIRA


Nos portões da cidade de Solfira, Orgath ergue seu machado e
grita para seus homens.
Orgath: “Para nossa conquista final! Para
Thalderan!”
O exército inteiro, com exceção de seu campeão e de seu
capitão, vibra e urra entusiasticamente sob o sorriso orgulhoso de
seu general.

CABANA DE IRMÃ LOBO


(D )
Uma luz de final de dia ilumina suavemente o pequeno
quarto. Um homem com cabelos longos cobrindo as costas largas
cheias de cicatrizes ajoelha-se diante de uma cama velha. Na
cabeceira, o Cardeal Vermelho observa a envelhecida mulher
morrendo sobre a cama: Irmã Lobo.
Irmã Lobo: “Não se culpe. Nunca é tarde demais
para redenção. Ghoddrak algumas vezes ergue
paredes de fogo em nosso caminho e, apenas em
seu fim, vamos saber se nossas escolhas foram
boas ou ruins. Onde está o fim? Só Ele sabe.”
Sob o cabelo longo e a barba espessa, o rosto de Zairos
expressa pesar e gratidão ao olhar para a mulher que salvara sua
vida.
Irmã Lobo: “Foram precisos anos para sua total
recuperação, mas agora, no momento em que você
é mais necessário, você está pronto para dar um
destino melhor a todos nós. Que o Espírito do
Dragão guie nossas jornadas.”
Mudada permanentemente por seus ferimentos, a voz de Zairos
soa mais profunda e rouca do que antes enquanto ele lamenta.
Zairos: “Eu queria ter o poder de salvar você.”
Irmã Lobo: “Você tem muito mais, meu menino
especial. Você tem o poder de salvar a todos nós.
Agora, o presente de sua mãe para o mundo é meu
também.”
Zairos: “Eu vou impedir a profecia. Eu não vou
falhar com você, como falhei com eles. Eu não
vou falhar com nenhum de vocês novamente.”
Irmã Lobo: “Você vai fazer o que está destinado a
fazer, eu sei... Gosto da sua nova voz, aliás. Me
lembra a do Jygar. Ahhh, gostaria tanto de dar a
ele um beijo de despedida.”
Zairos: “Você vai sobreviver. E você não vai dar
um adeus a ele, mas sim um beijo de celebração."
Uma lágrima escorre lentamente por seus rostos.
Irmã Lobo: “Eu vou sim. Diga a ele que eu irei lhe
dar um último beijo.”
A eremita fecha os olhos e dá a Zairos seu último sorriso. Ele
beija sua testa e se levanta. Chorando, ele segura suas velhas mãos
e inclina a cabeça, em misto de tristeza e gratidão.

CLAREIRA DO RIO DAS BRUMAS


(MAIS TARDE)
Às margens do rio, os últimos raios de sol encontram espaço
entre a folhagem para iluminar Irmã Lobo uma última vez. Mãos
cruzadas sobre a barriga, ela repousa em uma cama de galhos e
folhas sobre uma jangada de madeira. Zairos, tocha acesa na mão,
empurra a jangada para o rio. Ele arremessa a tocha e o fogo se
espalha sobre os galhos e folhas do túmulo flutuante. O corpo de
Irmã Lobo é rapidamente envolvido pelas chamas.
Ao lado do guerreiro renascido, o Lobo Branco e o Lobo Negro
uivam. Da floresta, muitos lobos choram, unindo-se a eles. Zairos
observa a sepultura flamejante seguir o curso do rio. O cardeal
vermelho plana sobre ela, em um silencioso e sereno gesto de
despedida
Capítulo 13

P M
CAMPO DE TREINO DO TEMPLO DOS DRAGÕES
(N )
Na noite escura, sem estrelas, uma tênue garoa se mistura com
o suor que cobre todo o corpo de Jygar. Ele treina incansavelmente
golpeando um boneco de madeira, raiva transbordando a cada
golpe. Sem ser percebido, Feigon o observa com preocupação.
Jygar ergue o escudo com seu braço deficiente. Sua face se
desfigura em dor. Furioso, ele pendura o escudo no boneco e o
golpeia sem parar até quase destruí-lo por completo e a exaustão
tomar conta de seu braço são.
Feigon desembainha sua adaga cerimonial e a joga para Jygar,
que a pega no ar. O velho guerreiro arremessa a adaga com
adornos de dragão. Ela treme ao penetrar perfeitamente no centro
do que restou do escudo.
Feigon: “Uma arma mais leve pode ser útil.”
Os olhos do Dragão da Tempestade mostram sofrimento
enquanto seus lábios se contorcem em um sorriso forçado e ele se
dirige ao velho sacerdote.
Jygar: “Obrigado, velho amigo. Mas você sabe que
isso não será suficiente.”
Feigon: “Não perca a esperança. Você ainda é um
Dragão--”
Jygar: “--aleijado. Pequeno Urso estava em sua
melhor forma e não deteve o campeão de Orgath.”
Feigon: “Sabe? Ainda me lembro do dia em que
encontrei você nas ruas. O coração e alma dos
dragões juntos em uma nobre criança. Cada noite
por um ciclo da lua inteiro, eu vi, em meus sonhos,
como você e uma criança por vir iriam mudar o
mundo. Você e Zairos.”
Jygar: “Infelizmente estamos mudando um mundo
livre para um mundo de escravos. Zairos deu
início à queda dos Dragões da Tempestade e minha
derrota irá selar o fim do nosso legado… E quanto
a Orgath? Você acredita que ele possa ser o
Imortal?”
Feigon: “Fé, Jygar! Você é o ultimo Dragão da
Tempestade. O Deus Dragão não nos abandonará.
Tenha fé!”

PERIFERIA DE THALDERAN
(D )
Ao norte da cidade sagrada, três velhos homens bêbados, um de
cada etnia, garrafas de vinho na mão, caminham cambaleantes e
trôpegos por uma rua larga e quase deserta. Ainda distante, Zairos
galopa na direção deles. Com vozes embriagadas, eles conversam
sem perceber o cavaleiro que se aproxima velozmente.
Homem de Solfira: “Hoje, Thalderan, a única
cidade onde homens das Três Nações podem beber
juntos, irá cair.”
Homem de Axengard: “E nossas esperanças com
ela. O lendário Jygar, com seu braço aleijado, não
vai conseguir vencer o Dragão de Axengard.”
Homem de Brummata: “Vamos fazer um brinde a
nós, os últimos homens livres, na ultima nação
livre, em sua última noite de liberdade.”
Homem de Solfira: “E a Jygar, nosso último
campeão, o último Dragão da Tempestade. Vamos
orar para ele.”
Os três homens fazem um brinde, mas antes que eles bebam, o
som crescente de cascos se chocando contra o chão de pedra os
interrompe. Assustados, eles se afastam uns dos outros. Zairos
passa pelo meio deles com seu cavalo em disparada.
Zairos: “Ele não é o último de nós. Reze por
mim!"
Espantados com suas palavras, os homens mantêm os olhos nas
costas nuas, do guerreiro coberto de cicatrizes, enquanto ele deixa
a cidade, cavalgando a toda velocidade.

PASSAGEM NORTE DE THALDERAN


(D )
Relâmpagos cruzam os céus. Uma nevasca se inicia. Asa Azul
mergulha em um voo rasante sobre o enorme exército em marcha.
O pássaro passa por três cavaleiros, à frente dos incontáveis
soldados. Em um imponente corcel branco, Orgath lidera o grupo.
Lissa e o Dragão de Axengard seguem logo atrás dele, em seus
cavalos. Eles olham para cima quando Asa Azul sobrevoa suas
cabeças. O corvo pousa no ombro de Feigon. Cajado na mão, ele
acaricia o pescoço de seu pássaro. Jygar, de pé ao seu lado, respira
ofegante em um misto de apreensão e ira. Em sua mão esquerda
ele empunha o escudo de Zairos, o sangue da batalha contra os
homens de Olho da Noite incrustado para sempre nos veios da
madeira.
Orgath, acompanhado por seu campeão e pela sacerdotisa de
Axengard, cavalga em direção ao supremo sacerdote de Thalderan
e ao seu último dragão. Poucos metros antes de alcançá-los, o
general freia seu cavalo e ergue a mão sinalizando para seus
companheiros pararem junto a ele.
Feigon: “O duelo para proteger Thalderan não irá
acontecer em seus portões, mas aqui. Na mesma
passagem onde Jygar impediu Axengard de
avançar por todas as vezes.”
Orgath: “Não seja estúpido, Feigon! Jygar está
velho e aleijado. Rendam-se. Deixe que ele viva.”
Jygar: “Traidor covarde! Nós nunca, nunca vamos
nos render a você.”
Lissa: “Feigon, ele está certo sobre as chances de
Jygar. Por favor, apresente outro campeão ou
desista.”
Feigon: “Lissa, minha adorada, Jygar está ferido,
mas ele é um Dragão da Tempestade, o último
deles. Ele nunca irá desistir. Enquanto o coração
dele bater, ele ainda pode vencer.”
Orgath: “Essa é sua decisão final, Jygar? Eu
detestaria ver um velho amigo como você morto.
De verdade.”
Jygar: “Estou farto de suas mentiras, traidor
desgraçado! Vamos acabar logo com isso.”
Lissa baixa a cabeça. Orgath acena para o Dragão de Axengard
e os três desmontam dos cavalos. O Dragão de Axengard senta-se
na posição de lótus, olhos abertos dessa vez. Olhos cheios de ódio,
amendoados e... AZUIS!
Imagens irreais voltam à mente do Dragão de Axengard
levando-o novamente ao ataque na tumba de Falcão da Lua. Lá,
Zairos corre até o corpo de Minara. Jygar enfia a espada em suas
costas. Zairos cai sobre Minara, ambos sem vida.
Sua mente volta ao presente quando ele vê um objeto se
aproximando, cruzando o ar: a lança de Olho da Noite! Ela
aterrissa, fincada no solo, entre os dois campeões, separados por
uma distância de alguns passos. O grupo olha na direção da qual
ela foi arremessada. O rosto confiante de Orgath empalidece, ainda
incerto diante do que vê. Em uma colina próxima, Zairos, montado
em um fogoso cavalo branco, grita com vigor, orgulho e
determinação.
Zairos: “Eu tive um grande mestre e vim aqui para
dar minha vida por ele! E por tudo em que ele
sempre acreditou.”
Feigon e Lissa se entreolham. Esperança brilhando em seus
rostos, enquanto eles tentam acreditar no que seus olhos começam
a identificar. O cavalo relincha. Jygar olha para o cavaleiro na
colina. Os olhos do velho mestre congelam, sua expressão muda
de surpresa para uma contida alegria quando ele reconhece Zairos
por debaixo da barba, do cabelo longo e das muitas cicatrizes.
Orgath – rosto assustado, boca aberta, respiração ofegante –
olha para Zairos como se estivesse vendo um fantasma. Confuso e
incrédulo, o General de Axengard parece frustrado enquanto
balança a cabeça sem cessar, diante da visão de seu amigo de volta
à vida, descendo a colina a cavalo.
Feigon, olhos umedecidos, sorri para Lissa, lágrimas descendo
do rosto dela. Zairos para com seu cavalo agitado por um instante
e grita para Jygar.
Zairos: “Eu espero que meu velho mestre me dê a
honra de lutar em seu lugar!”
O cavalo empina e ele galopa em direção a seu querido mestre.
Zairos salta do cavalo em frente a ele. Ajoelha-se, abaixando a
cabeça em reverência enquanto fala com a voz firme, mas um
tanto quanto envergonhada.
Zairos: “O fogo do dragão em meu coração
consumiu meu corpo e minha alma. Espero que me
perdoe um dia… Me deixe lutar em seu lugar.
Senão, por favor, me mate agora.”
Jygar olha ferozmente dentro dos olhos de Zairos e
desembainha a espada. Ele levanta a cabeça, fecha os olhos e a
abaixa novamente. O velho guerreiro aperta a lâmina com ambas
as mãos até que elas começam a sangrar. Ele oferece a espada
manchada de sangue a Zairos.
Jygar: “Pegue a espada! A Garra do Trovão
pertence a você! Assim como o sangue dos
dragões.”
Zairos pega a espada pela lâmina e também a aperta. Seu
sangue se mistura com o de Jygar e escorre para o olho de dragão
esculpido na interseção da lâmina com o cabo. Com um leve
sorriso, ele cumprimenta Jygar que lhe devolve seu velho escudo.
Jygar: “General de Axengard! Eis o nosso
Dragão!”
Orgath arrasta as mãos sobre o rosto, enquanto baixa a cabeça e
tenta remover a perplexidade de sua face. O Dragão de Axengard
grita furioso para Jygar.
Dragão de Axengard: “Covarde! Depois de matar
seu substituto, eu vou atrás de você, velho
desgraçado.”
Zairos avança lentamente e se posiciona para o duelo. O
Dragão de Axengard ergue as espadas gêmeas, em guarda. O som
da tempestade abafa as vozes de Feigon e Lissa enquanto eles
procedem com o cerimonial de batalha. A neve cai fortemente
sobre o rosto dos dois campeões. A luta começa.
O jovem campeão ataca ininterruptamente. Zairos não se
intimida e contra-ataca, mas seu oponente se defende com
habilidade. O Dragão de Axengard dispara alguns pesados golpes
contra o campeão de Thalderan, que começa a ficar ofegante. Seu
adversário lança um ataque duplo. As lâminas se aproximam da
cabeça e do joelho de Zairos, uma de cada lado. Em uma fração de
segundo, ele abaixa a espada e levanta o escudo para defender os
golpes simultâneos. O Dragão de Axengard inverte a posição do
ataque de maneira inesperada, surpreendendo Zairos. No ultimo
instante, ele salta e, ainda no ar, bloqueia uma espada com o
escudo enquanto a outra espada passa sob suas pernas. Antes de
aterrissar, Zairos desfere um poderoso chute no peito de seu
inimigo, derrubando-o.
O Dragão de Axengard se levanta em um salto e avança contra
ele, mas Zairos começa a tomar o controle da luta. Ele defende
com facilidade os golpes de lâmina, empurrando para trás o jovem
Dragão. Os dois campeões se afastam, respirando fundo.
O campeão axengardiano dá um sorriso leve, intrigando Zairos.
Repentinamente o Dragão de Axengard dá um passo largo para a
direita e salta sobre o escudo com ambos os pés e as pernas
dobradas. Surpresa no rosto de Zairos. Esse movimento lhe é
familiar. Por uma instante, um breve lampejo de memória lhe
mostra o vulto de uma linda guerreira ensinando a um menino de
onze anos o mesmo movimento.
Aterrissando no escudo, o Dragão de Axengard dispara
horizontalmente a espada esquerda contra o pescoço de Zairos. Ele
ergue verticalmente sua espada e apara o ataque enquanto arregala
os olhos. Quando ele viu esses movimentos antes? Um novo
lampejo e por um segundo ele vê o menino executar exatamente o
mesmo ataque, a guerreira defender e os olhos azuis dela
brilharem.
O jovem guerreiro empurra o escudo com os pés e salta. Ainda
no ar ele desfere um ataque vertical com a espada. Zairos,
erguendo horizontalmente sua espada, bloqueia o golpe. Quando o
Dragão de Axengard aterrissa no chão, Zairos nota que ele está
prestes a atingi-lo na cintura, do lado direito, usando a espada
esquerda. O campeão de Thalderan tem certeza de já ter visto os
mesmos movimentos anos atrás. Mais um lampejo. Costas suadas,
o menino aterrissa no solo. O rosto do garoto, difuso em suas
memórias desfocadas pelo clamor da batalha, sorri para ele. Um
guerreiro sorri de volta para o menino agora: o próprio Zairos.
O Dragão de Axengard golpeia, mas durante a execução ele
abaixa a mão direita, liberando a espada de Zairos para o ataque,
que não perde a chance e a usa velozmente para perfurá-lo. No
mesmo instante em que a lâmina afiada penetra em seu peito, o
Campeão de Axengard finaliza o ataque contra Zairos, cortando-
lhe profundamente a lateral do ventre.
A lâmina afiada penetra profundamente no peito do jovem
Dragão ao mesmo tempo em que ele finaliza seu golpe contra o
rival mais velho. O sangue jorra do ferimento profundo no flanco
de Zairos enquanto a lâmina o corta. Ele ignora a dor de tirar a
espada do peito de seu oponente e assustado, encara seus olhos
azuis. Finalmente, seus lampejos do passado na batalha tornam-se
memórias claras e nítidas.

LEMBRANÇAS – EMBOSCADA DE OLHO DA NOITE


Próximo à tumba de Falcão da Lua, Zairos se vê, logo após a
mesma sequência de movimentos, imediatamente tocando a
espada no peito do menino, no peito de Nairon! Com o rosto
frustrado, o garoto assume a derrota e abaixa as espadas.
Zairos: “Não fique aborrecido. Foi um bom ataque. Se
você fosse maior e mais pesado, poderia ter me
acertado também. Mas esse movimento final abre…”
De volta ao terrível presente, os olhos de Zairos se enchem de
lágrimas enquanto murmura.
Zairos: “… sua guarda… filho.”
Os olhos de Nairon, azuis como os de Minara, fitam os de seu
pai. Zairos vê o rosto de Minara sob o de seu filho, então é a vez
da imagem de Nairon ainda criança ficar no lugar de seu rosto
adolescente por alguns segundos. As mãos ensanguentadas de
Zairos colocam a cabeça de seu filho em seu colo. Ele acaricia
seus cabelos com as mãos trêmulas. O rosto de Zairos se contorce
em um sofrimento insuportável, não pela dor do ferimento
sangrando na sua cintura, mas pelo que acabara de fazer.
Zairos: “Me perdoa, meu filho. Me perdoa.”
Nairon, surpreso e sem acreditar, olha para Zairos. Com
esforço, ele levanta a mão para limpar a neve do rosto de seu pai e
vê, sob a barba, o rosto de um Zairos mais jovem. O rosto de seu
pai. Surpreso, ele sussurra para Zairos.
Nairon: “Pa-papa?”
Zairos acena que sim com a cabeça, enquanto as lágrimas
escorrem pelo seu rosto.
Zairos: “Não morra, por favor, não morra... um...
um verdadeiro Dragão nunca desiste.”
Nairon luta contra a dor e seus olhos se tornam sorridentes e
determinados. Os olhos de uma criança prontos para enfrentar o
desafio do pai.
Nairon: “Nunca!”
O menino agora crescido esquece a dor no peito mais uma vez e
dá a Zairos o mesmo sorriso da última vez em que estiveram
juntos em sua infância.
Nairon: “E mamãe? Ela também está aqui?”
Um sofrimento insuportável desfigura o rosto de Zairos
enquanto ele balança negativamente a cabeça.
Nairon: “Pelo menos eu te encontrei uma última
vez na vida e agora eu vou encontrar ela de novo.”
Nairon solta um gemido enquanto envolve as mãos de seu pai
com as suas. Zairos dá um beijo nelas.
Nairon: “Você se lembra da canção de ninar que
mamãe costumava cantar para mim?”
Zairos: “Sim, filho. Claro que sim”
Nairon: “Então, me deixe vivo em seu coração
como fiz todos esses anos com vocês dois e
estaremos sempre juntos, papa. Sempre."
Nairon mantém um pequeno sorriso e parece olhar para o pai
mesmo quando a vida o abandona, logo depois. Zairos, de joelhos,
abraça seu filho e grita desesperado aos céus.
Zairos: “Nairon! Não, de novo não. Por favor, de
novo não.”
Orgath olha para Zairos com tristeza. Então ele fecha os olhos e
baixa a cabeça.
Orgath: “Você não devia ter voltado.”
Zairos olha de volta para ele, o rosto coberto de sofrimento e
incredulidade. O sangue escorre de sua sobrancelha e encontra
seus olhos úmidos, fazendo-os derramar gotas vermelhas.
Orgath: “Mas somos irmãos, eu não vou deixar
você continuar sofrendo. Eu devo isso a você.”
O General então ordena seus soldados.
Orgath: “Matem ele!”
Zairos tenta se levantar. O sangue escorre sem parar de sua
cintura para as pernas. A dor o joga de volta ao chão. Lissa puxa
Orgath pelos ombros. Ele se vira, furioso, para a sacerdotisa do
Dragão.
Lissa: “Não! Acabou, Orgath! Zairos venceu! No
próximo ciclo do sol...”
Os soldados param.
Orgath: “Eu já esperei demais por causa dessa
tradição sem sentido. Eu não vou recuar.”
Lissa: “O Pacto!”
Orgath: “O Pacto é apenas uma história de
criança!”
Lissa: “Todos os seus ancestrais honraram isso!”
Orgath: “Não, não o meu pai… e ele está morto!
Meu avô está morto! Você sabe por quê? Por causa
dessas tradições inúteis de honra, tão inúteis
quanto você.”
Ele fita os céus com um olhar desafiador.
Orgath: “Eu conquistei todas as nações. Eu não
preciso mais temer que elas se unam com os outros
clãs se eu quebrar o Pacto.”
Lissa: “Pelo fogo de Ghoddrak! Você
enlouqueceu? Você não pode...”
O general dá a ela um sorriso de escárnio.
Orgath: “Nós não precisamos de antigos costumes,
nem de feiticeiras decadentes como você.”
Lissa bate no chão com a base de seu cajado. Glacia solta um
piado e com um bater de asas continuo voa de seu ombro para
longe. O rosto abatido da sacerdotisa se transforma em um de
força e determinação. Ela crava os dedos em seu pescoço e aperta-
lhe a garganta, olhando profundamente dentro dos olhos do
General de Axengard.
Lissa: “Argazi sanctacto orvant gallius…”
Orgath se ajoelha, paralisado, sufocando. Ele tenta sacar sua
adaga, mas não consegue. Seu braço apenas treme. Há vários
metros de distância, Kaijin dispara um machado contra Lissa. A
arma roda velozmente pelo ar até atingir a sacerdotisa no ombro,
fazendo-a largar Orgath. Sem hesitar, o jovem general salta sobre
ela e enfia sua adaga no coração de Lissa. A sacerdotisa desaba
lentamente quando ele puxa a lâmina de volta. Jygar, aturdido,
encara o rosto frio de Kaijin. Feigon corre até Lissa. Ele coloca
uma das mãos cuidadosamente sob sua cabeça e acaricia seu rosto
com a outra, enquanto ela lhe olha afetuosamente e sussurra.
Lissa: “Eu vou estar ao lado de Ghoddrak,
esperando por você. Mas, por favor, não tenha
pressa.”
Zairos a assiste fechar os olhos e Feigon beijar seus lábios
mortos, então a tristeza do Dragão de Thalderan muda para fúria
quando ele se vira para Orgath.
Zairos: “Meu verdadeiro algoz… No túmulo de
Falcão da Lua… Você fez um acordo com Olho da
Noite para matar todos nós!”
Orgath: “Todos, menos Minara. Ela seria minha.
Primeiro como minha campeã, depois como minha
rainha.”
Zairos: “Ela foi assassinada!”
Orgath: “Ela viu Nairon nocauteado, sendo
trocado pelo cadáver de um menino muito
parecido com ele que encontramos no festival…
Ela viu que fui EU quem fez a troca e por mais
que eu lamente, depois dela ter visto isso, Olho da
Noite tomou a decisão certa enquanto ela tentava
entender por que eu estava fazendo aquilo. Eu
sinto muito.”
Fortalecido pelo ódio, espada na mão, o campeão do Dragão se
levanta e caminha lentamente, com passos trôpegos, em direção a
Orgath.
Zairos: “Você sente muito? A mulher que eu
amava morreu por sua causa! E por todos esses
anos você me fez acreditar que meu filho estava
morto. Morto!”
Orgath: “Eu a amava também! E eu cuidei dele.
Kaijin treinou seu filho para honrar a mim e ao
próprio Kaijin, seus supostos salvadores. E claro,
para vingar seus pais, assassinados por Jygar e
Pequeno Urso, como eu fiz Nairon acreditar.
Contei a ele que Falcão da Lua era um traidor
também e que Kaijin não era mais o mesmo por
causa de tudo o que aconteceu. Uma história de
vingança perfeita para uma criança inocente e
solitária.”
Zairos o encara com ódio. O general baixa os olhos.
Orgath: “Ele precisava de uma razão para viver e
para lutar. De inimigos para odiar. E eu dei isso ao
seu garoto.”
O herdeiro de Axengard olha para lugar algum, perdido em
recordações.
LAMPEJOS DE MEMÓRIA
– Diante de uma pequena cabana nas montanhas, Orgath,
ao lado de Kaijin, gesticula enquanto conta sua falsa versão
dos fatos para Nairon, ainda menino.
– Dentro dos lacrimejantes olhos azuis de Nairon, as
palavras de Orgath se tornam lampejos distorcidos de um
pesadelo: “Pequeno Urso mata Minara; Jygar perfura as
costas de Zairos; Orgath corre com Nairon inconsciente nos
braços enquanto Kaijin luta contra Olho da Noite
– Lágrimas descem pelo rosto de Nairon. Orgath o abraça e
sorri.
Seus olhos recuperam o foco no presente diante da
aproximação de Zairos, pernas cada vez mais banhadas de sangue.
A poucos metros de Orgath, o Dragão ferido cambaleia e cai de
joelhos outra vez.
Zairos: “Meu filho! Por duas vezes você me
roubou a vida dele, desgraçado!”
Orgath: “A culpa é sua, você matou seu filho! Se
você não tivesse voltado, ele ainda estaria vivo.”
Zairos: “Maldito seja o dia em que salvei você!”
Orgath: “Foi maldito para mim também! Eu nunca
quis ficar na sua sombra. Eu queria retribuir, mas
você nunca aceitou. Juntos poderíamos ter tudo.”
À beira da morte, Zairos ergue a cabeça.
Zairos: “Nós já tínhamos tudo, Orgath. Tudo.”
Orgath: “Você tinha tudo, eu não! E foram sua
teimosia e seu Pacto maldito que mataram todos
eles! Você poderia ter lutado a meu lado para
acabar com os desgraçados do Povo da Floresta,
mas você sempre se recusou.”
Zairos: “Eu não podia ir contra tudo que eu
acreditava. Você sabia que não.”
Orgath: “Tudo que eu sabia é que meu destino era
dar a Axengard a glória que nenhum de meus
ancestrais conseguiu lhe dar.”
Feigon, de joelhos, pinta runas de sangue sobre o corpo de
Nairon, a seu lado Jygar desembainha a adaga e anda rumo a
Orgath.
Jygar: “Eu vou matar esse miserável agora!”
Feigon estende seu cajado em frente ao peito do velho Dragão,
interrompendo seu avanço. Ele hesita e olha aborrecido para o
sumo sacerdote.
Feigon: “O exército dele matará você muito antes
de você chegar perto dele. Contenha-se!”
Jygar bufa em frustração e embainha a adaga de novo. Orgath
olha pensativamente para a cicatriz em sua palma e dirige-se a
Zairos.
Orgath: “Eu não espero que você me perdoe, mas
espero que você me entenda… irmão.”
Zairos: “Irmão? Irmão? Então conceda a seu irmão
um último desejo.”
Orgath: “O que você quiser.”
O Dragão ferido se esforça para ficar de pé, mas desaba
novamente.
Zairos: “Eu matei meu próprio filho e estou
morrendo. Se eu morrer por causa desse ferimento,
Nairon será meu assassino… Honre nossas mortes.
Prove que você ainda respeita alguma coisa.
Derrote-me! Tire minha vida com o seu machado,
livre meu filho dessa culpa.”
Hesitante, Orgath olha para Zairos – de joelhos, tremendo,
indefeso, o sangue escorrendo pelo corpo – e então para seu
machado. Mas o medo de enfrentar um Dragão da Tempestade,
mesmo um mortalmente ferido, o detém.
Zairos: “Prove para seu exército que você não é
apenas minha sombra.”
Orgath: “Eu não sou sua sombra! Eu sou… o
Imortal!”
Orgath, agora enfurecido, se aproxima com determinação.
Zairos abaixa a cabeça e permanece ajoelhado, imóvel enquanto
Orgath o alcança e ergue seu machado. Orgath golpeia para baixo,
com força e velocidade letais. Com uma fúria assassina em seus
olhos, o Campeão de Thalderan bloqueia com a Garra do Trovão.
Reunindo suas últimas forças ele se levanta e revida. Ferozes
golpes de espada contra um assustado Orgath, que os defende com
extrema dificuldade.
Exausto pelo ferimento, Zairos respira ofegante. Com a mão
livre, ele tenta parar o sangramento. Orgath contra-ataca, tentando
acertar o ferimento de Zairos, que se esforça para protegê-lo. O
General de Axengard recupera a confiança e sorri cruelmente para
ele. Com um grito de guerra, o Dragão ensanguentado dispara
ataques furiosos, frenéticos, incansáveis. Orgath move o machado
em desespero para aparar os golpes da espada, mas logo cai sem
forças, amedrontado e encolhido diante daquele que fora seu
melhor amigo, daquele que ele traíra covardemente.
Zairos larga a espada e salta com o joelho sobre o peito de seu
algoz. Agarrando seu machado, ele pressiona fortemente seu cabo
contra o pescoço do general e começa a estrangulá-lo. O rosto de
Orgath começa a ficar arroxeado, seus movimentos cessam. Um
poderoso chute acerta o rosto de Zairos. Kaijin! Quase
inconsciente, ele cai de costas. Ainda tonto com uma das mãos
segurando o próprio pescoço, Orgath se levanta, pega a espada do
chão e a aponta para o peito de Zairos.
Orgath: “Seu último desejo, irmão!”
Ele atravessa a Garra do Trovão pelo coração de Zairos. Ele
tomba lentamente para o lado. Manchando o chão coberto de neve,
o sangue se espalha por baixo de seu corpo já sem vida. O General
de Axengard levanta as mãos para o céu em celebração.
Orgath: “Eu matei o Dragão da Tempestade! Eu
sou o Imortal!”
A nevasca se torna mais intensa. Ofegante e com olhos
beirando a insanidade, ele encara seus soldados. Aturdidos, os
homens se entreolham assustados. O Dragão de Thalderan foi
assassinado, o Pacto foi quebrado!
Feigon e Jygar chegam até o corpo caído de Zairos. Jygar
furiosamente fita Orgath, que já se encontra a muitos passos de
distância, caminhando para os cavalos próximos. Jygar agarra o
cabo da adaga. Feigon segura seu pulso e sacode a cabeça. Ele
solta o cabo.
Jygar: “O seu sonho profético... É assim que ele
termina?”
Feigon se ajoelha e abre os olhos de Zairos. Ele tem outra
adaga na cintura e a saca para começar o ritual funerário.
Feigon: “Não! É assim que ele começa.”
Orgath observa Zairos, Jygar e Feigon se tornarem quase
invisíveis sob a tempestade. Feigon reza antigos cânticos.
Relâmpagos iluminam o céu. Vento e neve se intensificam,
criando uma violenta nevasca.
Capítulo 14

I
PASSAGEM NORTE DE THALDERAN
( )
A tempestade pune Orgath e Kaijin, enquanto eles se movem
vagarosamente até os cavalos inquietos.
Kaijin: “General, precisamos procurar abrigo.”
Orgath: “Thalderan será nosso abrigo!”
Quando chegam aos cavalos, uma forte rajada de vento atinge
Orgath e seus homens. Eles contorcem o rosto e tentam cobrir seus
narizes.
Orgath: “Que cheiro infernal é esse?”
Um VELHO SOLDADO se aproxima e aponta para a Caverna do
Dragão, alguns metros à frente e precariamente visível sob a
tempestade, de onde a rajada de vento se originou.
Velho Soldado: “É o Hálito do Dragão. Nós quebramos o
Pacto. O Deus Dragão está vindo atrás de nós.”
Orgath enfia sua adaga no pescoço do Velho Soldado.
Gemendo, o homem cai, se debatendo, até que a vida lhe abandona
por completo.
Orgath: “Chega de lendas sem sentido. Alguém
mais?”
Orgath monta no cavalo agitado. Ele sorri ao notar que a
tempestade diminui um pouco e aponta para frente.
Orgath: “Guerreiros! Para Thalderan… agora!”
Sob a ainda intensa nevasca, Orgath, Kaijin e o exército de
Axengard avançam lentamente em direção à Cidade Sagrada. Uma
luz forte surge nos céus, cegando-os. Eles param quando um
cometa, o mesmo do Festival do Dragão, surge entre as nuvens. Os
soldados se agitam. Alguns cobrem o rosto, outros se encolhem,
uns poucos caem de joelhos. Quando as nuvens esmaecem a luz
novamente, as figuras de um sacerdote e de um guerreiro estão
postadas diante do general e de seus homens. Orgath os reconhece
imediatamente.
Orgath: “Feigon! Jygar! O que estão fazendo? Vão
lutar sozinhos contra meu exército?”
Feigon: “Nós não estamos sozinhos.”
Três relâmpagos cortam o céu, seguidos por três trovões quase
simultâneos.
Feigon: “Você profanou esse solo sagrado, Orgath.
Você sabe quantos Dragões guerreiros estão
enterrados sob seus pés?”
Orgath: “Muitos. Pena que seu deus não pode
trazê-los de volta para lutar por você, sacerdote.”
Feigon: “Eles viveram e morreram pelo Pacto.
Você desonrou a todos eles. Você que é digno de
pena, uma vergonha para seus ancestrais.”
Um relâmpago risca o céu, seguido por um trovão retumbante.
A nevasca se liquefaz em uma chuva, forte e intensa. Orgath
engole em seco. Um ligeiro tremor percorre seu corpo. As nuvens,
que cobriam a lua, se dissipam. É lua cheia. Uma grande e
vermelha lua cheia: a Lua Ancestral!
Vindos de diversos pontos, surgem figuras de vários guerreiros
armados. A chuva fustiga os olhos de Orgath, impedindo-o de
identificá-los. A lua vermelha por trás dos guerreiros mostra
apenas suas silhuetas. O exército de Orgath supera em muitas e
muitas vezes a quantidade de adversários. Ao notar isso, o General
de Axengard respira aliviado. Um sorriso irônico se abre em seu
rosto.
Orgath: “Esses são seus reforços, Feigon? Você
quer me deter com um punhado de homens?”
Jygar: “Eles não são homens, Orgath!”
Orgath o olha de maneira inquisitiva.
Jygar: “Eles são dragões!”
Feigon sorri. Orgath tem um calafrio.
Jygar: “Dragões da Tempestade!”
Raios e trovões! O líder axengardiano estremece por completo,
ofegante. Os guerreiros passam por Feigon e avançam em direção
ao exército de Axengard, cabeças baixas para proteger a face da
chuva, a grande lua rubra por trás deles. Orgath tenta identificar os
guerreiros que aceleram rumo a seu exército. O líder do grupo
levanta a cabeça: Zairos!
Acima do estrondo dos trovões, a voz do velho sacerdote ecoa
nítida e clara pelo ar, enquanto Orgath fita Zairos, banhado pelo
brilho avermelhado da lua, o sangue de Nairon, seu filho ainda
manchando suas mãos.
Feigon: “Sob a Lua Ancestral, com o sangue de
sua própria família nas mãos”
Tatuagens mortuárias sobre o corpo de Zairos e de todos os
seus companheiros: Falcão da Lua, Pequeno Urso, Nairon, Minara.
E também sobre os muitos Campeões do Dragão a seu lado:
Sangir, Wongh, Serpente das Sombras… além de vários outros de
gerações passadas.
Feigon: “Com o sangue de sua própria família nas
mãos…”
A voz do Sumo Sacerdote ecoa mais uma vez acima do som da
tempestade enquanto Zairos conduz seu exército de guerreiros
mortos de volta ao mundo dos vivos.
Feigon: “Ele irá arrastar os Guerreiros do Dragão
pelas portas da morte.”
Ofegante, o general observa Zairos e os Dragões renascidos
marcharem contra o exército Axengardiano para iniciar uma
guerra sem precedentes.
Feigon: “O Imortal irá se erguer para trazer a
guerra derradeira.”
Expressões de horror e desespero surgem no rosto de Orgath
enquanto ele olha para Zairos e sussurra para si mesmo.
Orgath: “A Profecia… não… Zairos… Zairos é o
Imortal!”
O medo toma completamente o rosto dele. Desesperado ele
grita para seus homens.
Orgath: “Acabem com eles! Matem todos eles!”
Chuva e vento fustigam o exército de Axengard. Confusos e
hesitantes, eles começam a avançar. Jygar sorri. Sua voz soa como
um trovão.
Jygar: “Eles não podem matá-los, General. Eles já
estão mortos!”
Os Dragões renascidos correm em direção a Orgath e seus
homens. Estes disparam a toda velocidade contra os lendários
campeões. Um guerreiro enorme – coberto de lama, machado na
mão – emerge do chão diante de Orgath. A chuva lava seu corpo e
revela uma pele alva, coberta por pinturas rúnicas, barba e longos
cabelos desgrenhados. Vallur ergue o lendário Machado Celestial
sobre a cabeça. Assustado, o cavalo de Orgath empina e derruba
seu cavaleiro. O general cai de costas no solo encharcado.
Alguns soldados ficam imobilizados pelo medo, ao assistir aos
Dragões da Tempestade correndo de encontro a eles. Outros
largam as armas e fogem em pânico. Um jovem soldado cai de
joelhos e começa a chorar em desespero. Orgath corre para trás de
seus homens e os incita ao ataque, erguendo seu machado em
direção ao inacreditável e terrível inimigo.
Orgath: “Glória para Axengard!”
O exército de Axengard, em número muito maior, avança como
uma nuvem de gafanhotos contra os Dragões. A batalha começa
espalhando uma fúnebre música feita pelo som das armas se
chocando e pelo murmúrio dos homens lutando pelas suas vidas na
noite tempestuosa.
Pequeno Urso luta contra os muitos soldados que o rodeiam.
Repentinamente, Bestafera aterrissa a seu lado e ruge. Os soldados
em seu entorno ficam estarrecidos, paralisados. Os irmãos
compartilham um sorriso enquanto um martelo e um par de
lâminas matam incansavelmente seus adversários. Sob as bênçãos
de Ghoddrak, o pequeno e o grande urso lutam lado a lado.
Um denso círculo de várias camadas de soldados se fecha em
torno de Zairos, Minara e Nairon. Um movimento coordenado das
tropas de elite do inimigo, que ataca brutalmente por todos os
lados, com todas as suas forças. Inabaláveis, os três Dragões giram
e saltam em perfeito entrosamento uns com os outros. Golpes
precisos, em uma dança rápida e harmoniosa, frenética e mortal,
onde os corpos sem vida de seus inimigos voam destroçados, sem
parar, em todas as direções. A família reunida em uma festa
sangrenta.
A lança de Olho da Noite é removida do chão do campo de
batalha. Ela finalmente retorna às mãos de quem a possuía antes
de Olho da Noite, sua mãe! Lótus de Fogo se une aos outros
Dragões. Vingança e justiça em seu olhar enquanto trucida os
soldados de Axengard.
Vários e vários soldados caem pelos golpes mortais da espada
de Jygar. Ele se prepara para atacar outro grupo, quando vê Kaijin,
um par de machados em mãos, encarando-o. O então Capitão de
Orgath ataca implacavelmente. Jygar recua enquanto se esforça
para defender a ofensiva. Jygar contra-ataca com um forte golpe
cruzado que corta um dos machados de Kaijin. Mas, com as costas
do outro machado, o Dragão renegado atinge a mão de Jygar,
fazendo-o largar a espada. Kaijin ataca novamente. Jygar agarra e
torce seu pulso, desarmando-o.
Com uma joelhada seguida de uma cotovelada na cabeça, o
velho Dragão o derruba. Jygar desembainha a adaga cerimonial
que Feigon lhe dera e salta sobre Kaijin, pronto para lhe esfaquear
o coração.
Jygar: “Me desculpe, meu irmão. Eu tenho de
libertar você de sua loucura.”
Kaijin fecha os olhos, pronto para morrer, mas uma forte mão,
de cor escura, agarra o pulso de Jygar. Ele se vira, pronto para
lutar, mas vê que é Falcão da Lua quem segura seu braço. Jygar
balança a cabeça negativamente e puxa o braço, libertando seu
pulso da mão firme de seu antigo companheiro. Ele então se volta
novamente para o oponente, ainda caído no chão, e é surpreendido
pela visão de uma mulher de pele parda, agachada, cabeça baixa,
com as mãos sobre a testa de Kaijin. Ela está orando, em uma
espécie de ritual de cura. A mulher ergue seu rosto e sorri para
Jygar. A imagem dela é de alguma forma translúcida, mas ele
reconhece seu rosto. Jygar nunca esqueceria aquele sorriso, aquele
que ele esperou a vida toda ver de novo, aquele da mulher que ele
sempre amou. Irmã Lobo aproxima o rosto ao de Jygar. Paralisado
de espanto, ele fecha os olhos enquanto ela beija o homem que ela
também sempre amou. O último beijo, sua última promessa antes
de morrer.
Um som de metais se chocando ecoa quando Falcão da Lua
bloqueia um ataque contra sua cabeça, despertando Jygar. Irmã
Lobo não está mais lá. Confuso, ele larga a adaga e recua alguns
passos. Kaijin abre os olhos. Com espanto, ele vê, ao lado de
Jygar, seu querido irmão Dragão que morrera por suas mãos.
Falcão da Lua olha dentro dos olhos daquele que, sob o efeito do
Hálito do Dragão, tirara sua vida. Olhos que parecem acordar de
um longo transe, mas que repentinamente são tomados por uma
raiva intensa. Kaijin pega a adaga do chão e a lança contra Jygar.
A lâmina gira no ar enquanto se aproxima do rosto dele. A adaga
mata seu alvo, um guerreiro de Axengard prestes a acabar com a
vida de Jygar. Surpreso, este acena com a cabeça, agradecendo ao
amigo que ele perdera há tanto tempo. Falcão da Lua abre um
largo sorriso. As veias verdes nas pálpebras de Kaijin desaparecem
através de lágrimas esverdeadas descendo pelo seu rosto. Falcão
da Lua estende a mão, palma para cima, mostrando a cicatriz do
pacto de irmão, que lhe segura a mão e se levanta.
Kaijin: “Eu sinto tanto, tan--”
Falcão da Lua: “Esqueça o passado. Lute ao meu lado
pela última vez, irmão.”
Kaijin: “Sim! Irmãos Dragões em sua última
batalha.”
Ele tira a capa de capitão, pega seu machado e corre ao lado de
Falcão da Lua de encontro ao exército de Axengard. Ele é, de
novo, um Dragão da Tempestade.
Os soldados de Axengard caem um após o outro, pelas mãos de
Zairos, Minara, Nairon e dos outros Dragões. Orgath incita seus
homens, mas eles não conseguem abater sequer um oponente. O
exército de Axengard ataca com tudo que ainda lhes resta, mas não
é suficiente. Orgath vê inúmeros de seus soldados mortos diante
dele. Seu desespero aumenta. No meio da feroz batalha, ele avista
Zairos caminhando vagarosamente em sua direção.
O aterrorizado general olha em volta, em busca de ajuda de
seus guerreiros, mas os que ainda restam estão ocupados, sendo
massacrados.
O homem aterrorizado olha a seu redor. Ele busca ajuda de seus
Guardas de Elite, mas eles não param de tombar sob as lâminas
gêmeas de outro Dragão da Tempestade que se aproxima: Minara!
Atordoado, ele congela. O tempo parece passar lentamente enquanto
o corpo perfeito dela parece dançar, suave e veloz, em uma terrível
pintura feita de sangue e cadáveres caindo. Ela encara Orgath, antes
mesmo de suas espadas tirarem a vida dos dois últimos guerreiros
que tentavam proteger seu General.
Ele se vira para fugir, mas o pé de Nairon explode em sua
cabeça. Tonto, ele cambaleia. Com um chute circular no estômago,
o jovem guerreiro o faz cuspir um pouco de sangue. Orgath cai,
encolhido no chão, contorcendo-se de dor enquanto Nairon começa
a recitar a oração que costumava rezar pelos seus pais quando
criança.
Nairon: “Para aqueles que nos desafiam...”
Orgath se levanta, mãos sobre o estômago dolorido, quando
Minara embainha suas espadas e em seguida esmaga o rosto do
traidor com uma série interminável de golpes com as palmas das
mãos. O general ruivo cambaleia para trás, o sangue cobrindo-lhe
o rosto.
Minara: “Apenas a fúria das tempestades...”
Pequeno Urso agarra-lhe a garganta, levantando-o do chão,
sufocando-o.
Pequeno Urso: “E a ferocidade dos dragões.”
O vultoso guerreiro o arremessa com violência no solo
enlameado. Apoiado nas mãos e nos joelhos, Orgath vê Zairos se
aproximando. O General nota duas espadas caídas próximas a ele,
as pega e levanta com um desesperado grito de guerra. Ele tenta
atacar. O Dragão da Tempestade golpeia seu cotovelo com a borda
metálica do escudo. Sob a força do impacto, com um estalo, a
articulação quebra no mesmo instante. Orgath grita. Uma fratura
exposta.
Zairos: “Descanse em paz, irmão… no inferno!”
Zairos lhe corta a outra mão e pisa no seu joelho. Nova fratura
exposta. Orgath desmorona. Uma dor insuportável desfigura seu
rosto. Ele coloca o punho decepado debaixo da axila, tentando
parar o sangramento. Tremendo em uma poça vermelha cada vez
maior, herdeiro de Axengard jaz. Com a visão turva pela morte
que se aproxima, ele vê o espírito de Lissa. A voz dela atravessa o
ar, retumbando em seus ouvidos de forma assustadora.
Lissa: “Agora você acredita, Orgath?”
O outrora poderoso General de Axengard se encolhe e grita
horrorizado. Uma voz poderosa ecoa dentro de sua cabeça.
Feigon: “… para esmagar o coração do homem…”
Zairos se junta a Jygar para aniquilar os últimos guerreiros de
Axengard.
Feigon: “… o fim das Três Nações.”

MAIS TARDE...
O sol nasce, banhando a multidão dos soldados massacrados de
Axengard, espalhados sem vida no ensanguentado campo de
batalha. O corvo de Feigon se coça, pousado na ponta do cabo de
uma lança cravada no chão. Sob ela, o corpo do único Guerreiro
Dragão entre os mortos. Kaijin descansa em paz nos braços da
morte, olhos abertos como se olhando para o céu, um sorriso suave
nos lábios manchados de sangue.
L
MUITOS ANOS DEPOIS...

JARDINS DO TEMPLO DOS DRAGÕES


(N )
Em uma noite escura, sentadas ao redor de uma fogueira
crepitante, várias crianças escutam atentamente, sem sequer piscar
os olhos, ao homem de idade avançada, sentado junto a elas.
Feigon, já muito velho, conta-lhes historias e lendas sobre a
destruição de Orgath e do poderoso exército de Axengard.
Na primeira delas, os soldados de Axengard lutam entre si,
matando uns aos outros, uma expressão de loucura em seus rostos.
Kaijin repetidamente golpeia Orgath com seus machados,
banhando-os em sangue.
Feigon: “Homens sem fé disseram que o Hálito do
Dragão soprado da caverna tornou os guerreiros de
Axengard insanos, fazendo-os lutar uns contra os
outros. A vida de seu General tomada pelas mãos
de seu Capitão.”
Uma versão perfeita para aqueles que não acreditam em deuses
e poderes sobrenaturais.
Na seguinte, Feigon, braços abertos, se ajoelha diante do corpo
de Lissa. Uma luz azulada emerge dela e dispara para o céu
escuro, atravessando as nuvens. Sob a luz dos relâmpagos riscando
o céu. Ghoddrak mergulha dos céus sobre o exército de Axengard,
esmagando vários soldados na aterrissagem. O Deus Dragão abre
suas enormes mandíbulas, pronto para devorar Orgath, que se
encolhe de medo.
Feigon: “Os mais crédulos acreditaram que eu
invoquei o espírito de Lissa para trazer o Grande
Ghoddrak dos céus. Os dentes, garras e chamas do
Deus Dragão destruindo Orgath e seus homens.”
A versão preferida dos adoradores do Deus Dragão.
Na próxima, vindas de todos os lados, centenas de almas
translúcidas desaparecem ao se chocarem contra o corpo de Jygar.
Quando a última é absorvida por ele, seus olhos brilham com
fulgurantes chamas azuis. Jygar rompe as linhas inimigas,
matando vários soldados de Axengard a cada golpe. Com um
poderoso golpe de espada na cintura de Orgath, ele o corta em dois
pedaços.
Feigon: “Outros juraram que Jygar recebeu as
almas e a força dos campeões mortos e assim
eliminou o terrível opressor e todo seu exército.”
Para os muitos que tinham em Jygar, o último Dragão da
Tempestade, seu grande herói, essa era a versão que eles mais
gostavam.
Na última, lado a lado, os Dragões se afastam dos incontáveis
cadáveres. Feigon pousa a mão no ombro de Jygar enquanto os
observam desaparecer na névoa espessa que os cerca.
Feigon: “Mas os mais sábios deles estavam certos
de outra verdade. O velho sacerdote orou ao Deus
Dragão e Ghoddrak respondeu-lhe abrindo os
Portões da Morte. Zairos então guiou os Dragões
da Tempestade através dele, para de volta ao
mundo dos vivos, juntarem-se a Jygar, na
destruição do Exército de Axengard.”
Esta versão, a preferida do velho sacerdote, tinha um sabor
ainda mais lendário para ele do que as outras.
Sentada ao lado de um MENINO GORDINHO, uma GAROTINHA
SARDENTA, de olhos curiosos, interrompe o velho sábio.
Garotinha Sardenta: “E o que aconteceu depois?”
Suas rugas tornam-se ainda mais pronunciadas quando Feigon
franze a testa e lhes conta sobre a reconstrução das Três Nações.
Em Solfira, pessoas mutiladas, feridas, caminham pelas ruas.
Em Brummata multidões desoladas e casas arruinadas, homens e
mulheres desolados espalhados por toda parte. Em Axengard, uma
mãe acalenta seu filho em prantos. A avó assiste a tudo, também
em lágrimas.
Feigon: “A Profecia predisse o fim das Três
Nações. E pela guerra, a própria guerra foi tirada
do coração do homem. Sem regentes, generais ou
exércitos, os povos das sofridas nações precisavam
de alguém em quem pudessem confiar, alguém a
quem pudessem seguir. Alguém para ajudá-los a
reconstruir suas vidas, para uni-los.”
Em Solfira, Jygar comanda e ajuda um grupo a cuidar das
pessoas feridas e mutiladas. Em Brummata, ele ajuda a reconstruir
casas em uma vila. Em Axengard, ele fala para uma multidão de
pessoas. Elas reagem com grande entusiasmo a seu discurso. Um
menino, segurando as mãos dos pais, sorri. Em Thalderan, do alto
da grande torre do templo, Jygar acena para o povo pertencente
outrora às Três Nações, agora unido, formando apenas um povo,
apenas uma nação. O Reino do Dragão!
Feigon: “Então, a lenda viva, o ultimo Dragão, se
ergueu mais uma vez. O guerreiro da paz tornou-
se o líder. O líder tornou-se o rei. O primeiro rei
de uma nova nação unificada. O Rei Imortal,
assim eles o chamaram.”
Garotinha Sardenta: “Jygar, o Rei... Imortal!?”
Ela sorri, perdida em pensamentos por um segundo. Um
MENININHO de olhos arregalados fica de pé, empolgado,
examinando o sacerdote.
Menininho: “Você é tão... velho! Talvez você seja
o Imortal.”
Feigon ri com as crianças enquanto o Menino Gordinho parece
pensativo.
Feigon: “A vida é feita de decisões. Uma delas é
escolher no que você vai acreditar ou não. Então,
agora é sua hora de fazer a sua escolha.”
Menino Gordinho: “E o que aconteceu com os
Dragões renascidos dos mortos?”
Menininho: “É verdade que Jygar lutou junto com
eles na Grande Guerra das Tormentas?”
Relâmpago! Trovão! Uma chuva torrencial desaba sobre eles de
repente. Feigon sorri. As crianças se encolhem, se abraçam,
tentam se cobrir com algo, mas nenhuma se atreve a ir embora.
Eles sabem que é ao sabor de uma forte tempestade que o velho
sumo sacerdote conta as melhores histórias.
Um Cinelivro de
L.S. REIS

Escrito e Produzido por


L.S. REIS
Revisão de Texto
CÁTIA REIS
Capa
GABRIEL FLAUZINO
Ilustrações adiconais
AVE ESPELITA (1ª ilustração)
SAAD IRFAN (Mapa, Segundo Ato, Epílogo)
FRANK FERNANDES (Logo, Primeiro Ato)
LUCAS PANDOLFELLI (Terceiro Ato)
TRI NGUYEN (Prelúdio)
ALAN MARSON (Poslúdio)
Ilustração “Mensagem do Autor”
AVE ESPELITA (Zairos), GABRIEL FLAUZINO (Minara),
FRANK FERNANDES (Templo), TRI NGUYEN (Fundo)

“CENA PÓS CRÉDITOS”


!
T
PLANÍCIES ALÉM DAS MONTANHAS DE GELO
(PÔR-DO-SOL)
Os últimos raios de sol banham em um tom escarlate as
esbranquiçadas Montanhas de Gelo. As sombras de Asa Azul e de
Glacia pairam sobre milhares de soldados de aparência
assustadora, quase monstruosa enquanto o corvo e a coruja voam
lado a lado sobre o poderoso exército. Vários dos guerreiros
erguem a cabeça, sem preocupação, para olhar para o casal
emplumado cruzando os céus. Diante deles, um pequeno grupo
guarda a frente de uma pequena vila e seus habitantes
aterrorizados. Os olhos de Zairos acompanham com satisfação os
pássaros sobre sua cabeça. A seu lado, Minara, Nairon, Falcão da
Lua, Pequeno Urso e Bestafera caminham com uma expressão
determinada estampada em seus rostos. Outros Dragões renascidos
os seguem.
No alto da mais alta das Montanhas de Gelo, Jygar, ajoelhado
sobre uma perna, mantém os olhos fechados e as mãos sobre a
borda do escudo levemente fincado na neve. Ajoelhado atrás dele,
Feigon ora na Língua Antiga aos céus turbulentos, onde uma
aurora boreal dança em tons de safira. Às costas do último Dragão
e do sacerdote ancião, a imagem de uma bela mulher de pele
escura, em forma etérea, os observa. Um lobo branco com um
manto negro uiva sentado a seus pés.
Pesadas nuvens cobrem o sol e engolfam os campeões do
Dragão em suas sombras. Uma grande tempestade começa a se
formar. O Dragão mantém um sorriso nos olhos enquanto sacam
as armas e caminham de encontro ao descomunal exército, para
uma batalha que, mesmo para eles, parece impossível de ser
vencida.
Jygar abre os olhos. Suas pupilas, no formato de fendas
verticais, envoltas por um brilho avermelhado, como nos olhos de
um dragão. O Senhor do Reino do Dragão se levanta e ergue a
Garra do Trovão, apontando a antiga espada para as nuvens
relampejantes sobre sua cabeça.
Zairos sorri quando, no horizonte distante, relâmpagos parecem
sair da arma de seu antigo mestre em direção aos céus. Um trovão
se mescla ao intenso brado de guerra emitido por Zairos. Seguido
por seus companheiros ele inicia uma disparada impetuosa em
direção ao monstruoso inimigo. O uivo do lobo preto e branco
atinge então e um lobo dourado gigante com listras avermelhadas
e olhos flamejantes emerge com um salto por trás para correr ao
lado de Zairos.
As nuvens escuras entrecortadas pelas descargas elétricas dos
relâmpagos cobrem completamente os céus. Uma forte tempestade
desaba, enquanto o vento parece sussurrar, em seus ouvidos, o
primeiro discurso do Rei Imortal aos povos reunificados.
Jygar: “A grande tempestade acabou. Mas onde
quer que ela recomece, nossos Dragões irão bater
suas asas, afastar suas nuvens...”
Diante do avanço dos Dragões em tão menor número, o LÍDER
INIMIGO, mostra, sob o clarão dos relâmpagos, seus dentes
deformados em um sorriso confiante. Dois sombrios guerreiros
caminham ao seu lado. O primeiro - com os olhos vendados, pele
escura, cabelo albino - move a cabeça para apontar uma das
orelhas para o céu. O outro - cabelos ruivos, pele pálida,
carregando um medalhão prateado de um lobo com olhos
esmeralda – aponta, com uma lâmina de machado, que substitui
sua mão, para algo acima deles. Uma grande sombra escurece seus
rostos, seguida pelo som estrondoso de um enorme par de asas
batendo vigorosamente. O comandante da horda ergue seus
apavorantes olhos cor de âmbar, seu rosto se contorce. Seu
exército fica paralisado sob a sombra da imensa criatura alada que
desliza sobre suas cabeças.
Jygar: “Aos Olhos do Dragão e dos homens,
grandes lendas nunca morrem, mas as maiores
renascem, para se tornarem…”
Um forte estrondo. O chão treme sob os pés dos milhares de
guerreiros amedrontados. A imensa cabeça do Deus Dragão se
ergue. Os olhos inteligentes do Deus Dragão brilham como rubis
incandescentes. Ghoddrak ruge com a força de mil trovões. Suas
mandíbulas se abrem para espalhar um gigantesco turbilhão de
chamas azuis.
Zairos: “… IMORTAIS ”
L.S. reis e seus queridos cães, o “Lobo Negro” e o “Lobo Branco”.

S A
L.S. Reis nasceu no Brasil, em tempos antigos, e vive no Rio de
Janeiro com sua esposa e seu casal de filhos. Além de escritor,
dirige uma empresa de software e é mestre de Kung fu!
Do sucesso de seu mundialmente premiado roteiro de cinema,
Storm Dragons, surge a ideia de um novo estilo literário: o
Cinelivro. Dinâmico e surpreendente, ele coloca o leitor frente a
frente com cada cena da história, em uma imersiva experiência
"cinematográfica", a ser vivenciada com os olhos da imaginação.
Dragões da Tempestade inaugura essa nova forma de escrever
através de uma história também revolucionária, consagrada como
a fantasia épica mais premiada de todos os tempos do mundo dos
roteiros ainda não produzidos, e irá transportá-lo para um mundo
sem igual, onde lenda e realidade se unem em uma trama
surpreendente, transformando sua leitura em uma experiência
única, diferente e inesquecível.
U :
Bem vindo ao final dessa dramática jornada, espero que você tenha vivido
tantas emoções quanto eu senti ao escrever essa saga. E falando em emoções, se
essa leitura tocou seu coração de alguma forma, não deixe de compartilhar com sua
família e amigos o quanto você gostou de caminhar lado a lado com Zairos e os
Dragões da Tempestade. Essa é uma história sobre escolhas e como elas podem
mudar o destino do mundo. Por isso, com uma simples escolha você pode ajudar a
espalhar essa história ainda mais, e fazer com que os ventos da eternidade
continuem soprando sua lenda pelos quatro continentes.
Então, agora é hora de fazer parte dessa história. Ao passar essa última página,
participe avaliando e publicando seus comentários na Amazon, redes sociais e onde
mais você puder.
FAÇA PARTE DESSA LENDA.
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Depois de avaliar conheça também a versão em quadrinhos!

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