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"I "
A meu irmão, cujos gostos literários e talento como escritor
me inspiraram a ler e me aventurar a criar narrativas de
literatura fantástica desde muito cedo.
A meus filhos, por fazerem nascer em mim o desejo de
inspirá-los e assim me darem a própria inspiração de escrever.
A minha esposa que, com suas "inspiradoras" críticas,
ajudou a tornar a história melhor e sua leitura mais fluída.
Aos primeiros leitores pelos emocionados e entusiasmados
comentários que me inspiraram a seguir em frente.
E por fim, a todos que contribuíram com ideias, opiniões e
sugestões, me inspirando a aperfeiçoar cada curva no caminho
dessa intensa jornada.
R I
Antes de ser transformado neste cinelivro, o roteiro original de
Dragões da Tempestade, em suas versões na língua inglesa,
conquistou vitórias e finais em mais de trinta competições ao redor do
mundo.
“... um filme de ação e fantasia incrivelmente impressionante
que certamente irá agradar aos fãs de O Senhor dos Anéis e
Game of Thrones” – JB, Fresh Voices Screenplay Competition
“... não é comum eu ser completamente surpreendida pelos
becos sem saída e reviravoltas surpreendentes após ter lido
tantos roteiros, mas este me deixou atordoada ... algumas vezes
eu disse ‘Uau!’ em voz alta enquanto lendo” – Jennifer Barbee,
Emerging Screenwriters
“... Várias grandes surpresas no final... Excelente reviravolta
de ‘valer-o-filme’... Uma história excepcionalmente bem escrita
e empolgante” – Barb Doyon, Extreme Screenwriting
“... uma fantástica e emocionante ação e aventura que
combina lendas, tema e momentos de ação excitantes em uma
história que pode atrair facilmente a grande audiência. A
escrita é muito forte... uma habilidade de escrita natural que
absorve imediatamente o leitor... vívida, descritiva e altamente
visual”. – Page Awards
“... antes de tudo, quero dizer que é bastante impressionante
como você construiu este mundo fantástico e criou todos os
personagens ricamente em camadas dentro dele.... No geral, o
roteiro tem muito a seu favor e tem um ótimo conjunto de
personagens e uma inovadora perspectiva em um nível de
fantasia que jamais vimos antes..”. - Script Pipeline First Look
Project
“... é audacioso e traz algumas reviravoltas surpreendentes e
sombrias... na superfície, faz o mesmo de forma diferente para
ganhar um interesse inicial - no entanto, é sua execução
soberba que faz tão emocionante" – Write Movies
“Game of Thrones, Watership Down e A Trilogia do Anel, todos
entrelaçados em uma excitante trama.” – A Film Writer
P
Justin Sloan
L.S. Reis criou uma rica mitologia em DRAGÕES DA TEMPESTADE, que
certamente o atrairá e fará com que você queira virar a próxima página. Tive o
prazer de assistir a jornada de Leonardo e a evolução dessa história, desde os dias
em que participávamos de concursos de roteiro (e ganhávamos!) e dávamos
sugestões no trabalho um do outro. Esta história tem todo o seu coração e alma
derramados nela, e agora que evoluiu para um estilo "cinelivro", estou confiante de
que os leitores sentirão toda a sua paixão nesta história dramática e poderosa, cheia
de ação.
Você será capaz de ver o filme se desenrolando em sua mente. De grandes
guerreiros submetidos a um treinamento intenso, com suas reviravoltas e surpresas,
e uma emocionante história de fundo por trás, uma nova lenda nasce. Esta é uma
história de batalhas épicas e traições, e que ficará com você por muito tempo
depois da última página. Se você gosta de lendas e grandes personagens como eu,
com certeza se sentirá em casa com a nova aventura épica de fantasia de L.S. Reis
- Justin Sloan, é um bem-sucedido autor americano, com mais de cinquenta livros de ficção
científica e fantasia, como as aclamadas séries Shades of Light, Falls of Redemption e The Hidden
Magic Chronicles e roteirista no jogo Game of Thrones da Telltale.
P
Prepare-se para ler um livro de uma maneira que você nunca viu antes.
Um estilo inédito que mistura o melhor da narrativa literária com a estrutura e
as técnicas de contar histórias que fizeram a indústria do cinema bilionária.
Um formato inovador, envolvente, fácil e rápido de ler, que vai fazer você se
sentir assistindo a um filme com os olhos da sua imaginação.
Pegue a pipoca, escolha o melhor lugar e prepare-se para uma experiência nova
e inesquecível com esse verdadeiro "Cinelivro".
Boa leitura! Ou melhor, bom filme!
INDICE
Prelúdio.E
P A
Capítulo 1, M P
Capítulo 2. C
Capítulo 3. A
Capítulo 4. D
S A
Capítulo 5. V M
Capítulo 6. P C
Capítulo 7. O C F
Capítulo 8. B S
Capítulo 9. T
T A
Capítulo 10. Q ?
Capítulo 11. A
Capítulo 12. D
Capítulo 13. P M
Capítulo 14. I
Epílogo. L
C
Pósludio. T
S A
E
PASSAGEM NORTE DE THALDERAN
(P )
O sol lança seus últimos raios por de trás do imponente
Templo dos Dragões. No topo da colina distante, sua silhueta
recorta o horizonte arroxeado, coberto de nuvens relampejantes.
O vento forte acaricia as plumas de ASA AZUL, um corvo azulado
de cabeça e cauda negras, pousado na ponta da mais alta torre do
templo milenar. Os relâmpagos e trovões se intensificam. Uma
forte tempestade se inicia, deixando cair uma rara chuva
avermelhada, como se, dos céus, o próprio Deus Dragão
derramasse lágrimas de sangue sobre a terra.
Acima do farfalhar da tempestade, ecoa uma voz grave, porém
suave. Triste, mas ao mesmo tempo resoluta. Uma voz que emana
a força de um guerreiro junto à placidez de um sacerdote. A voz
de IRMÃ LOBO.
Irmã Lobo: “Escolhas. Podemos definir o valor
de um homem através delas.”
Asa Azul sacode as penas, levanta vôo. Ele sobrevoa o pátio e
plana sobre os grandes portões maciços encravados na muralha
que envolve o templo colossal. O pássaro mergulha sobre uma
rua de paralelepípedos, cercada por prédios baixos e ruas laterais
estreitas, que se espalham por toda a Thalderan, a Cidade Sagrada
dos Antigos. O corvo atinge uma estrada de terra no meio de uma
extensa floresta. Aproveitando uma corrente de ar, bate
fortemente as asas para se lançar alto no céu turbulento. Asa Azul
se aproxima de uma ampla costa. As asas estendidas do pássaro
refletem um brilho levemente azulado quando o fulgor de um raio
as ilumina. Banhado pela tênue luz do crepúsculo, o chão arenoso
entremeado por áreas gramadas estabelece uma larga faixa entre o
mar agitado de um lado e a esparsa floresta do outro. A voz de
Irmã Lobo ecoa novamente.
Irmã Lobo: “Elas marcam o início de cada
jornada e o quão tempestuoso será o seu
caminho...”
O corvo avista uma gigantesca mancha fervilhante, cobrindo
grande parte da imensidão da areia encharcada. Guerreiros.
Milhares deles! O pássaro mergulha em direção às últimas fileiras
do enorme exército. Por alguns segundos ele sobrevoa as lanças,
machados e escudos dos imponentes soldados de pele alva,
enfileirados na extensa praia.
Poucas dezenas de metros à frente do poderoso exército, Asa
Azul avista o vulto de seu GENERAL. Uma rajada de vento move
sua elegante capa de pele de lobo, revelando as costas largas
protegidas por uma suntuosa armadura de batalha, enquanto ele
desce o ornamentado elmo de prata sobre a cabeça, encobrindo
seu rosto. Diante dele, um soldado lhe faz uma reverência e se
ajoelha sobre uma perna para entregar-lhe um longo e pesado,
mas elegantemente desenhado, machado de guerra.
Irmã Lobo: “Elas irão determinar o poder dos
seus inimigos e desafiá-lo com novas escolhas
antes impensáveis...”
Por um breve instante, a imagem de Asa Azul desliza
suavemente, refletida na superfície brilhante do elmo prateado do
General, enquanto ele plana sobre sua cabeça. O pássaro então
mergulha em direção aos quatro homens que se opõem aos
incontáveis soldados e a seu líder. A chuva fustiga o rosto
transtornado do primeiro deles, ZAIROS. Os pulmões do guerreiro
de trinta anos se expandem e se contraem pesadamente. O som de
sua respiração angustiada se mistura com o ruído incessante da
tempestade. Gotas rubras se chocam contra os olhos fechados na
face consumida por um sofrimento torturante. Elas mesclam-se
com suas lágrimas e escorrem como filetes de sangue pelo rosto
cheio de amargura e dor. As veias saltam pelo torso desnudo e
atlético do guardião à medida que seus poderosos músculos se
retesam e suas mãos apertam cada vez mais o cabo da espada
imponente, assim como a alça do escudo redondo de madeira, de
borda e centro metálicos.
Quando a sombra de Asa Azul desliza por um segundo sobre
seu rosto, Zairos parece despertar de um transe. Seus olhos se
abrem repentinamente. O coração parece explodir em seu peito. A
respiração se acelera em um misto de fúria e inconformidade
enquanto fita o General que o desafia a apenas alguns metros à
sua frente.
Irmã Lobo: “Suas consequências poderão fazer sua
alma queimar em sofrimento, remorso e ódio. Fazê-
lo questionar a tudo e a todos.”
O corvo pousa no cajado do velho Sumo Sacerdote, FEIGON,
postado próximo a Zairos. Sem se incomodar com a forte chuva
avermelhada, o ancião abaixa o capuz de seu manto escuro. Ele
levanta lentamente a cabeça calva, revelando os estreitos olhos
amendoados e a longa barba branca em trança.
Alguns metros atrás, PEQUENO URSO, um guerreiro de
tamanho descomunal, pele negra e expressão infantil, aperta as
mandíbulas com força. Em um movimento involuntário ele
balança a cabeça sem cabelos de um lado para o outro, comprime
a boca, franze a testa. Músculos contraídos, ele ergue o pesado
martelo de guerra e dá um passo a frente. Uma mão firme segura
seu ombro e o interrompe. Por trás do braço musculoso
atravessado por uma longa cicatriz, JYGAR, um guerreiro de
meia idade e aparência poderosa, olha firme para o gigantesco
companheiro, para então sacudir a cabeça em um lento não.
Pequeno Urso bufa contrariado e baixa o rosto, como uma criança
zangada, mas se aquieta imediatamente.
Irmã Lobo: “No entanto, elas também revelarão
a grandeza daqueles que sempre lutarão a seu
lado...”
Zairos mantém os olhos, cada vez mais intensos, fixos no
homem à sua frente, que mantém o rosto conhecido escondido
sob o elmo e a cabeça baixa, sem devolver-lhe o olhar. O enorme
exército, ainda que inquieto, permanece formado às costas de seu
General, que se mantém impassível. O guerreiro desvia o olhar
para Feigon, mas as palavras rituais do Sumo Sacerdote são
abafadas pelo som da tempestade. Quando ele encerra sua última
frase, os olhos do guerreiro se viram para a bela senhora próxima
a seu oponente, LISSA.
Trajando um manto azul claro em suave contraste com o
branco de sua coruja, GLACIA, pousada em seu ombro, a
sacerdotisa segura um longo cajado, finamente esculpido. Em
seus lábios, Zairos lê as palavras cerimoniais finais, que tantas
vezes já escutara: “Que o duelo comece!”.
Como um animal enfurecido se libertando das correntes, ele
parte impetuosamente em direção ao adversário. Enquanto a
chuva vermelha escorre lentamente sobre os músculos de seu
corpo, o vento atinge seus ouvidos como o rugido enfurecido de
um dragão.
Irmã Lobo: “Escolhas... Elas podem escrever
com sangue seu nome nas páginas da História,
sussurrar sua lenda nos Ventos da Eternidade.”
Em frente ao exército imóvel, seu comandante ergue o longo
machado na diagonal, aguardando. No exato momento que Zairos
entra no alcance do golpe, o General inicia o ataque. A pesada
arma descendendo velozmente contra o oponente. Desferindo um
golpe feroz com a beirada do escudo contra a mão do agressor,
Zairos interrompe o movimento. Com o punho da espada, acerta
em cheio sua outra mão, fazendo-lhe largar por completo o
machado. Imediatamente, com um violento chute, empurra o
peito do General, lançando-o fortemente de costas contra o chão.
Zairos salta sobre o adversário caído e, com o joelho, pressiona
seu peito ofegante. Furioso, empurra o metal da borda do escudo
contra a base de seu pescoço, enquanto toca a ponta da espada
afiada em sua garganta, manchando-a com uma gota de sangue.
Ele grita com uma fúria insana, cada vez mais intensa.
Zairos: “Você enlouqueceu? Eu ter perdido tudo
não foi suficiente?”
Através da fresta do elmo, o General o olha de volta, sem
demonstrar medo algum.
Zairos: “Por quê? POR QUÊ?”
General: “Apenas para te dar a chance de
escolher.”
Zairos: “Escolher? Eu não tenho escolha agora, a
não ser matar você!”
General: “Não! Agora você pode fazer a escolha
que devia ter feito há muito tempo. A escolha
certa!”
O rosto de Zairos congela. Ao som dos trovões, ele ergue a
cabeça para o céu tempestuoso, enquanto tenta entender o real
sentido daquelas palavras. A chuva rubra para de cair. Seus olhos
vidrados refletem a luz dos relâmpagos, seguido por nuvens cujos
contornos se deslocam e graciosamente se unem ao sabor do
vento para assumir o formato da cabeça de um dragão.
Delicadamente, um pequeno turbilhão dissipa parte delas, abrindo
uma fenda arredondada em seu meio, revelando a lua cheia por
detrás, como se um olho brilhante se abrisse na face do dragão
desenhado nos céus, apenas para observar Zairos, como se
aguardasse sua decisão.
Irmã Lobo: “Para isso, os deuses colocarão o
destino do mundo em suas mãos e lhe
perguntarão: Qual é a sua escolha?”
Com a lua brilhante refletida em seus olhos vidrados, sob as
luzes de uma rajada de relâmpagos e ao som de seus trovões,
Zairos faz sua escolha.
Capítulo 1
M P
VINTE ANOS ANTES...
ESTRADA VERMELHA
(D )
O pequeno pássaro voa velozmente pelo interior da floresta.
Os primeiros raios de sol atravessam a folhagem, iluminando as
árvores a sua frente. Batendo rápido as asas, ele dispara em
direção ao céu e emerge em uma estrada de terra avermelhada,
entrecortando a floresta. Do alto, ele avista uma velha carroça
cheia de peles de animais. Torius conduz a carroça ao lado de
Zairos. O menino mantém o cenho franzido enquanto fala.
Zairos: “Ele irá arrastar os Guerreiros do
Dragão pelas portas da morte para trazer a
guerra derradeira, para esmagar o coração do
homem… O fim das Três Nações.”
Torius: “Irmã Lobo não devia ter te contado essa
história. Do que você tem tanto medo?”
Zairos: “Não é uma história. É uma profecia! E eu não
tenho medo.”
Torius: “Não?”
Zairos: “Claro que não tô com medo.”
Torius: “Não? Nem um pouquinho?”
Zairos: “Tá bem. Talvez um pouquinho.”
Torius: “Bem, a profecia não é clara como a água do
Rio de Prata. Ela é mais nebulosa, sabe? Algo como a
neblina da Floresta das Brumas. Talvez ela não seja
assim algo tão ruim, concorda comigo?”
Zairos: “É sobre um assassino que não pode ser morto,
Papa! Um homem que vai mandar os Dragões da
Tempestade para o reino dos mortos e começar uma
guerra que vai destruir os Três Reinos! Como isso pode
não ser muito ruim?”
Torius: “É... eu confesso que pode ser difícil encontrar
esperança nessas palavras que parecem tão
assustadoras, mas pelo menos a próxima Lua Ancestral
vai levar ainda muitos ciclos do sol para aparecer no
céu. Então que tal a gente esquecer isso até lá?”
Zairos: “Esquecer? Se eu fosse um Dragão da
Tempestade eu acabava logo com isso, antes que ELE
virasse o Imortal!”
Torius: “Ele quem?”
Zairos: “Você sabe.”
O pai sorri para o filho, que baixa a cabeça com ar de
preocupação. O cardeal então assobia algumas notas enquanto
passa diante do rosto do menino. Com um sorriso, Zairos
acompanha o passarinho disparar por entre as árvores, voando
baixo por um pequeno caminho lateral, com uma extensa clareira
em seu final. Os olhos alertas de Zairos procuram ansiosamente
por algo na clareira à frente, enquanto Torius guia a carroça pela
estreita trilha.
A
PASSAGEM NORTE DE THALDERAN
( )
Os olhos amendoados do sacerdote refletem os incontáveis
soldados de Axengard, postados, na imensa praia, em oposição a
Feigon. Do alto do longo cajado do velho e altivo sacerdote, Asa
Azul solta um grasnido. Sob a chuva torrencial, Feigon abaixa o
capuz de seu comprido manto.
Feigon: “Em nome de Ghoddrak, o grande Deus
Dragão, evocamos seu Pacto para defender esta
passagem.”
Feigon aponta com o cajado para o guerreiro a seu lado.
Ajoelhado sobre uma perna, Jygar mantém as mãos sobre a borda
de ferro do escudo redondo de madeira, levemente fincado no
chão. A chuva forte corre pelos seus braços relaxados, musculosos
e, ainda, sem cicatrizes sobre a pele clara.
Feigon: “Thalderan, a Cidade dos Antigos,
escolheu Jygar para proteger seus portões.”
Jygar se levanta. Suavemente ele saca a espada e empunha o
escudo. À frente do exército de Axengard, sua sacerdotisa, Lissa,
vestida em seu manto de azul suave – carrega um cajado na mão e
Glacia, sua coruja branca no ombro. Seus grandes olhos verdes
encontram os de Feigon, com um misto de afeto e
constrangimento.
Lissa: “Que assim seja. Vallur, o mais poderoso
dos guerreiros de Axengard, contra Jygar, Dragão
de Thalderan, Campeão da Cidade Sagrada.”
Próximo a ela, VALLUR – grande, extremamente forte, barba e
longos cabelos desgrenhados – ergue o longo e pesado machado
com ambas as mãos.
Feigon: “Ao vencedor, a escolha: paz ou guerra.”
Lissa: “Então, aos olhos do Deus Dragão, que o
duelo comece.”
Vallur ruge enquanto dispara furiosamente para o ataque. Jygar
salta para o lado, gira o corpo e intercepta sua corrida com uma
rasteira que derruba o oponente de cara no chão. O campeão de
Axengard se levanta e ataca novamente. Jygar se desvia dos
primeiros golpes, porém o ataque seguinte choca-se contra seu
escudo com tanta força que o arremessa pelo ar. Mas ele aterrissa
elegantemente, pronto para continuar o embate.
O exército vibra quando, com um urro, Vallur ergue o machado
sobre a cabeça. Em seguida, abre um pequeno sorriso ao notar
uma pequena fissura no escudo de Jygar.
Em frente ao exército, AVERNATH, um jovem alto e louro, cerra
os punhos nervosamente. Ao seu lado, seu pai, o General Uldresh
sorri confiante.
General Uldresh: “O Machado Celestial! Forjado pelo
fogo dos céus com o ferro que veio das estrelas. Por
cem anos, nenhum homem foi sequer capaz de erguê-
lo, filho, Vallur irá nos dar a guerra que desejamos há
tanto tempo.”
Com um salto ágil, Vallur desfere um forte ataque descendente.
Jygar salta para trás. O machado explode uma grande pedra no
chão. Os guerreiros de Axengard rugem entusiasmados. O Dragão
Axengardiano lança um poderoso golpe horizontal. Jygar abre
velozmente o braço esquerdo com toda força, chocando seu
escudo contra o machado. A lâmina do machado espalha faíscas
contra o centro metálico do escudo. Estilhaços de madeira cruzam
o ar sob o som ressonante de metal contra metal enquanto o
escudo se despedaça. Com a mão livre do escudo, Jygar segura o
cabo do machado e o puxa ao mesmo tempo em que enfia a espada
no abdômen de Vallur.
O machado cai na grama. O exército se cala. Seu General
contorce o rosto em frustração. Mas de repente, Vallur agarra a
guarda da espada, impedindo-a de penetrar mais fundo. Com um
violento soco no queixo, ele o arremessa no ar, derrubando o
campeão de Thalderan.
General Uldresh e seu filho se unem ao exército em vibração.
Vallur recupera seu machado, avança contra Jygar, atordoado
no chão e desfere um golpe para partir sua cabeça. A lâmina atinge
o local onde o pescoço de Jygar estava uma fração de segundo
após ele rolar para o lado. O campeão de Thalderan se ergue com
agilidade e se atira contra a cintura de Vallur e empurra a espada,
terminado de enterrá-la em seu estômago. O guerreiro de
Axengard se ajoelha e cai de bruços no chão, fazendo a espada
atravessar suas costas.
Com cuidado, Jygar vira o corpo do adversário para cima,
revelando seus olhos mortos, ainda abertos. Ele retira a espada do
abdômen de Vallur e a enfia no chão. O guardião de Thalderan se
abaixa. Seus músculos se retesam enquanto ele ergue o machado
para colocá-lo de volta nas mãos de seu dono. Os dedos
ensanguentados de Jygar gentilmente fecham os olhos do guerreiro
morto.
Lissa: “Dragão de Thalderan, qual a sua escolha?
Paz ou guerra?”
Jygar se levanta e olha com determinação para os incontáveis
guerreiros de Axengard.
Jygar: “Paz!”
Então se vira para Lissa e a encara com olhos tristes. Ela lhe
devolve o mesmo olhar.
Jygar: “Ele era um grande guerreiro.”
Lissa ajoelha e reabre os olhos de Vallur.
Lissa: “Por isso devemos deixar seus olhos abertos
e manter sua alma no campo de batalha, para
permitir que Ghoddrak o convoque para lutar de
novo.”
Ela sussurra para Jygar.
Lissa: “Você impediu novamente uma guerra
sangrenta. Gratidão.”
Jygar acena com a cabeça e tenta sorrir enquanto Lissa derrama
um líquido em Vallur e reza em uma língua antiga. Ela insere sua
adaga cerimonial entre a palma dela e a de Vallur, e com o sangue
pinta runas funerais sobre o peito dele.
Em desgosto, General Uldresh se prepara para partir com seu
exército. Seu filho se aproxima e se ajoelha diante dele.
Avernath: “Senhor, meu pai! Nossos homens são
leais e guardarão um segredo de guerra. Só dois
homens estão entre nós e nosso verdadeiro
inimigo. Ninguém irá saber.”
O General esbofeteia violentamente o rosto do filho.
General Uldresh: “Eu saberei! O Deus Dragão
saberá!”
Com um forte empurrão, ele joga Avernath de joelhos.
General Uldresh: “Reze para que Ele o perdoe, lhe
implore para que não destrua nossa família e nosso
povo como castigo por suas palavras profanas.”
O general monta em seu cavalo e parte a galope. Avernath
permanece no chão, humilhado. Feigon e Jygar apertam o
antebraço um do outro em saudação.
Feigon: “Que Ghoddrak o abençoe, Jygar.”
Eles se dirigem até Lissa. Asa Azul decola do ombro de Feigon
rumo aos céus enquanto o exército de Axengard parte em retirada.
Lissa e Feigon acompanham o corpo de Vallur, carregado com
sacrifício por alguns soldados de Axengard, até uma cova rasa
recém-aberta. Vallur parece encarar os homens que lhe cobrem o
corpo de terra enquanto salpicos da mesma caem também sobre
seus olhos abertos.
MAIS TARDE...
A chuva passou. Torius repousa em uma cova rasa. Com as
mãos feridas e sujas, Zairos joga terra sobre o cadáver. Ele repete
o movimento várias vezes, enquanto as lágrimas desenham
caminhos em suas bochechas empoeiradas. Com as costas das
mãos ele enxuga os olhos mareados. Com sofreguidão, olha pela
última vez o rosto de seu pai.
O menino estende o braço para pegar de volta seu “galho-
espada” cravado no chão e olha para cima. O vento move as
nuvens escuras no céu, desenhando uma forma semelhante a um
rosto, que observa Zairos do alto. Uma face com um sorriso
malicioso e um olho esbranquiçado, provocando-o. O órfão encara
o rosto enevoado por alguns segundos.
Zairos: “Não importa se ele é Imortal, Papa. Não
importa. Eu vou matar ele.”
Ele se levanta, olhando para o desenho mal formado nas
nuvens. Sua mente torna o rosto esboçado de Olho da Noite em
um quase real. Um raio cai, iluminando a face enraivecida do
menino.
Zairos: “Eu juro que eu vou.”
ESTRADA VERMELHA
(M )
Zairos caminha solitário pela Estrada Vermelha. Ele pisa sem se
importar nas muitas poças d'água espalhadas pelo chão. Seus olhos
avermelhados de tanto chorar se destacam no rosto pálido e
apático do menino. Segurando o galho-espada ele segue desolado
para Thalderan, já visível no horizonte. O sol se põe em definitivo.
PERIFERIA DE THALDERAN
(N )
A chuva cai fortemente mais uma vez e castiga o rosto exausto
de Zairos enquanto ele vaga pelas ruas estreitas da periferia de
Thalderan.
Ele encontra abrigo em um beco estreito. O menino senta,
apoiado na parede. O corpo tremendo de frio. Lágrimas correm
pelo seu rosto enquanto ele enverga seu galho-espada tentando
quebrá-lo. Ele falha e, com raiva, arremessa-o contra a parede
oposta.
Capítulo 3
A
PERIFERIA DE THALDERAN
(D )
Iluminados pelos primeiros raios de sol, pés descalços correm
pelo beco estreito. Duas meninas de rua, de mãos dadas, passam
por Zairos, fazendo-o acordar. Assustadas, elas dão uma breve
pausa na esquina e olham para trás.
Os olhos de Zairos congelam ao ver MINARA – mesma idade
que ele, linda, olhos orientais de um azul brilhante, cabelo preto
longo e desarrumado. Ela vira a curva arrastando uma
GAROTINHA, de uns seis anos, com ela.
Dois segundos depois, um menino ligeiramente mais velho,
ORGATH – cabelos ruivos curtos, roupas nobres – corre pelo beco.
Assustado, ele olha algumas vezes para trás e parece estar fugindo
da mesma coisa que as garotas. No instante seguinte ele
desaparece na mesma curva.
Gritos! Zairos pega o galho e se esconde na esquina para
observar. Em uma pequena praça, GORDUCHO, um adolescente
obeso de cabelos louros encaracolados, segura Minara e a
Garotinha pelo cabelo. Outros três adolescentes cercam Orgath.
ROCHA – grande, mulato, sorriso maldoso – examina Orgath.
Rocha: “Parece que a linda garota fez você se
perder.”
Minara geme enquanto Gorducho fecha a mão com mais força,
puxando ainda mais seu cabelo. Orgath, assustado, fita Rocha.
GRANDALHÃO, um rapaz muito alto com o rosto cheio de
espinhas, arranca de Orgath um belo colar e admira surpreso o
pesado medalhão de prata em forma de cabeça de lobo, com olhos
de esmeralda.
Grandalhão: “Ah, o símbolo de nobreza
Axengardiano!”
Rocha: “Olho da Noite vai gostar disso!”
A menção do nome do assassino de seu pai faz Zairos contorcer
a face e sua respiração se acelerar.
Rocha faz um gesto de cortar a garganta do menino. Os
adolescentes concordam com um balanço de cabeça. Gorducho
ainda prende com violência as meninas pelo cabelo.
Gorducho: “E as garotas?”
Rocha: “São todas suas. Sirvam-se.”
Um grasnido interrompe a risadinha maldosa dos adolescentes.
Um corvo sobrevoa a cabeça deles. Gorducho se distrai com o
pássaro. Minara aproveita a situação e lhe morde a mão. Com um
grito de dor ele solta as garotas. Minara cospe fora o sangue da
mão do Gorducho de sua boca e grita para a Garotinha.
Minara: “Foge! Rápido!”
Rocha: “Vou pegar essa garota filha da p--.”
Orgath corre, livrando-se dos outros jovens e salta sobre Rocha,
que o agarra enquanto ainda está no ar e arremessa o garoto contra
o chão.
Gorducho corre atrás da Garotinha, mas Minara pula em suas
costas e agarra seu pescoço. A Garotinha escapa por um beco.
Orgath tenta se levantar. O último adolescente, CHUTADOR, um
jovem de corpo atlético e olhos negros amendoados, chuta seu
rosto. Ele cai de novo. Grandalhão se une ao outro. Eles chutam e
pisam o indefeso Orgath.
Gorducho se joga de costas contra uma parede atrás dele,
fazendo Minara se chocar violentamente contra a superfície dura.
Atordoada, ela desliza até o chão. Da mesma forma que Olho da
Noite intencionava acabar com Torius, ele ergue o pé para esmagar
com um pisão a cabeça da bela menina indefesa. Então, algo salta
sobre ele. Zairos e o jovem corpulento rolam pelo solo
pavimentado em pedra. Assim que se separam, Gorducho tenta se
levantar, mas Zairos chuta sua cara, jogando-o no chão novamente.
Zairos parte imediatam ente para o ataque contra os outros
adolescentes, golpeando com o seu galho o joelho de Grandalhão e
a virilha de Chutador no segundo seguinte. Ele se vira para Rocha,
que lhe acerta um soco cruzado na lateral do rosto. Em um rápido
contra-ataque, Zairos quebra o galho na face de seu agressor e lhe
aplica uma sequência ininterrupta de socos no meio da cara até
que Chutador o faz parar com um chute em cheio na boca do
estômago. Zairos se curva, quase vomita. Rocha aproveita a
chance e derruba-o com uma cotovelada na cabeça, Zairos geme
no chão, sangue escorrendo pelo rosto devido ao impacto contra o
solo.
Rocha pega uma pedra próxima, do tamanho de um pequeno
melão, e a ergue, pronto para esmagar a cabeça de Zairos.
Novo grasnido. O líder dos adolescentes vira-se para o som e
fica paralisado, quando avista uma figura encapuzada com um
corvo sobre o ombro. Feigon, olhos negros encarando-o, murmura
na Língua dos Antigos.
Feigon: “Argazi sanctacto orvant gallius…”
Rocha se contorce apavorado, enquanto um arrepio percorre
sua espinha. Suas mãos tremem e deixam a pedra cair. Ele perde o
equilíbrio, cai sentado no chão.
Chutador: “Maldição! Um Sacerdote do Dragão!”
Grandalhão: “Maldição? Maldição é o que ele tá
jogando na gente!”
Gorducho ajuda Rocha a se levantar. Os quatro jovens fogem
em pânico.
Zairos, arfando, de joelhos, observa os arredores. Ele vê o velho
sacerdote ajudar Minara a ficar de pé e em seguida partir em
auxílio de Orgath ainda inconsciente. Feigon abaixa o capuz e
acena para Zairos com um sorriso.
PERIFERIA DE THALDERAN
( )
As sombras das muitas construções de Thalderan começam a
cortar suas ruelas com o nascer do dia. Avernath – barba e cabelos
curtos, capa de pele – caminha agitado por entre elas. Ele adentra
um beco para encontrar um grupo de soldados que se aproxima.
Avernath questiona com rispidez o assustado SOLDADO LÍDER.
Soldado Líder: “Seu filho estava
assistindo à apresentação que ele adora,
capitão. Aquela garota cantando e
dançando. Mas logo depois que ela
terminou, ela viu alguém na multidão e
fugiu. Ele foi atrás dela e nós o perdemos
na multidão. ”
DE VOLTA AO PRESENTE:
Os pensamentos de Olho da Noite voltam ao momento atual.
Seus lábios contorcidos se transformam em um sorriso irônico.
Olho da Noite: “Por quê? Você me pergunta por
quê?”
Ele fita o caçador por um breve instante, como se esperasse
uma resposta. O homem sacode rápida e nervosamente a cabeça de
um lado para o outro.
Olho da Noite: “Apenas histórias que minha mãe
me contou.”
Olho da Noite gesticula para seus homens e eles assassinam os
caçadores desesperados com golpes precisos de seus facões. A
caçadora grita de terror sob o corpo nu de um dos guerreiros, que a
mantém presa sob ele no chão. Olho da Noite faz um gesto para
que o guerreiro se levante e a traga para ele enquanto ele pega o
machado caído de um caçador do chão.
Com satisfação, o herdeiro de Brummata admira o rosto trêmulo
da Caçadora Ruiva, agora em silêncio, com as mãos segurando suas
roupas rasgadas para cobrir seus seios. Ele oferece o machado para
a bela mulher a sua frente. Relutante, ela aceita.
Olho da Noite: “Agora você tem uma escolha:
lute comigo ou seja minha.”
Ruiva: "Eu... eu não posso lutar com você."
Ela fecha os olhos, aperta os lábios e deixa cair as roupas,
revelando seus seios nus. Ele delicadamente segura a mulher pelo
queixo e acaricia seus cabelos ruivos.
Olho da Noite: “A cor do seu cabelo me
lembra alguém muito especial.”
Ela abre os olhos para olhar para ele, mas Olho da Noite agarra
seu cabelo com brutalidade, sua mão apertando sua mandíbula.
Olho da Noite: “Mas ela nunca desistiria...”
Um breve estalo ecoa, quando ele torce o pescoço da caçadora
em um movimento brusco.
Olho da Noite: “Sem uma boa luta..”
Seus longos cabelos dançam vividamente no ar enquanto ela cai
com o pescoço quebrado, sem vida. Um rugido, quase humano,
atinge os ouvidos dele. O homem com um dos olhos lembrando a
lua cheia vira a cabeça na direção do som e segue em direção à
criatura capturada. Conforme ele se aproxima, ela rosna mais e
mais. Sons estranhos, parte homem, parte fera.
Olho da Noite: "Que tipo de abominação é
você?"
Capítulo 4
D
ENTRADA DA CAVERNA DO DRAGÃO
(N )
Cinco cavaleiros galopam sob a luz de um luar encoberto por
nuvens carregadas e escuras em direção à grande caverna
encravada no sopé da Colina do Dragão. Eles desaceleram e param
a poucos metros da entrada escura, onde Falcão da Lua e Kaijin os
aguardam. Os cinco desmontam dos cavalos agitados e os dois se
encarregam de amarrar os animais em uma árvore próxima.
Ao lado de Feigon, Jygar conversa com Zairos, Minara e
Pequeno Urso.
Jygar: “Ao final de seus caminhos vocês
encontrarão suas armas. De maneira alguma, não
importa o que aconteça, vocês podem usá-las no
interior da caverna. Então, sem armas! Estou
sendo claro?”
Zairos e Minara assentem com um aceno de cabeça. Pequeno
Urso apenas olha atentamente para Jygar, mas diante do olhar
severo que seu mentor lhe devolve, ele imediatamente concorda
com repetidos e rápidos movimentos da cabeça calva. Falcão da
Lua entrega uma tocha de chamas azuladas para Pequeno Urso e
segura seus ombros de um jeito firme, mas gentil.
Falcão da Lua: “A chama de nosso deus. Lá
dentro, quando você respirar o Hálito do Dragão,
Ghoddrak irá testar a força da irmandade entre
vocês, e também suas almas, criança. Lembre-se
disto.”
Minara recebe uma tocha semelhante das mãos de Kaijin. Ele
lhe dá um beijo carinhoso na testa.
Kaijin: “Eu quase perdi minha mente lá dentro...”
Ele desvia o olhar, por um segundo, para uma grande cicatriz
no abdômen de Falcão da Lua.
Kaijin: “Falcão da Lua quase perdeu a vida. Tome
cuidado... e cuide deles também.”
Pequeno Urso: “ELE está realmente aí dentro?”
Feigon: “Eu acredito que Ghoddrak nos observa lá
de cima, mas muitos acreditam que sim, que ele
está aí.”
Jygar pega uma tocha de Feigon e a dá para Zairos.
Jygar: “Você não vai enfrentar seus deuses quando
entrar, mas seus demônios. Não acredite no que
você vê, mas sim no que você realmente é.”
DENTRO DA CAVERNA
(SEGUNDOS DEPOIS)
Zairos, Minara e Pequeno Urso adentram a inóspita e escura
caverna. O movimento dos três provoca pequenos redemoinhos no
Hálito do Dragão, a tênue névoa verde que os circunda com um
leve e suave cintilar sob a trepidante luz azulada de suas tochas.
Pequeno Urso tapa o nariz, apertando-o com os dedos enquanto
contorce o rosto em uma careta.
Pequeno Urso: “Que fedor!”
Minara: “Já senti cheiros piores. Nossos narizes
logo vão se acostumar com o Hálito do Dragão.
São nossas mentes que me preocupam.”
Eles caminham em silêncio rumo ao interior da caverna. Em
seu final, a tocha de Zairos revela três túneis, a entrada de cada um
lembrando uma monstruosa e medonha boca escancarada coberta
de compridos dentes de pedra.
Zairos: “Uma para cada um de nós.”
Minara concorda com um aceno de cabeça e avança
determinada em direção a uma das passagens, enquanto Pequeno
Urso vira e contorce o rosto como se tivesse visto algo assustador.
Pequeno Urso: “A boca do túnel arreganhou os
dentes para mim!”
Zairos: “É só o Hálito do Dragão pregando uma
peça em nossos olhos.”
Pequeno Urso olha atentamente à frente, os olhos ainda cheios
de medo. Minara caminha de volta até seu gigantesco amigo de
mente de criança. Ela pega suas mãos enormes e gentilmente o faz
se abaixar. Timidamente ele desvia o olhar enquanto se apoia em
um dos joelhos, deixando o rosto dele e de Minara na mesma
altura.
Minara: “Eu também estou com medo. Mas eu sou
apenas uma menininha frágil e se um guerreiro
com esse tamanho todo como você pensa que nós
não podemos fazer, acho que vou ter de desistir
também.”
O homenzarrão fita os doces, mas firmes, olhos de Minara,
ainda mais azuis diante do fogo azulado das tochas e recupera sua
coragem, sua confiança. Ele não pode decepcioná-la, nem a
Zairos, nem a Jygar, nem aos outros.
Pequeno Urso: “Vamos fazer o que temos de fazer,
menininha frágil!”
Ela lhe dá um beijo carinhoso na bochecha. Ele abre um
sorriso, se levanta e com largos e rápidos passos caminha até a
entrada do túnel a sua frente. Ele se detém por um segundo para
encarar os contornos assustadoramente bizarros que contornam a
entrada. Ele faz uma careta de desdém e entra resoluto pela
passagem.
Minara dá uma piscadela para Zairos e dispara, adentrando
outra passagem logo em seguida. Zairos se prepara para seguir
também sua jornada, quando escuta a bela voz feminina que chega
do interior do túnel, reverberando por toda a caverna.
Minara: “Tome cuidado!”
Zairos: “Você também!”
Zairos então corre determinado para a passagem remanescente.
Com a respiração pesada, Zairos percorre o estreito e sinuoso
túnel. O Hálito do Dragão assume uma densidade mais espessa,
espalhando uma coloração esverdeada no local e atenuando o
brilho da tocha. Conforme ele avança com cautela, a névoa verde
se torna cada vez mais densa.
Alguns passos depois, gotas começam a cair do teto escuro do
túnel, atingindo seus ombros e logo depois sua cabeça. O jovem
guerreiro olha para cima e uma das gotas atinge sua boca. Em um
ato reflexo, ele lambe a gota espalhada em seus lábios. Com uma
expressão de repulsa, ele imediatamente cospe longe o líquido e
limpa a boca com os dedos. Então olha para as pontas dos
mesmos. Eles estão vermelhos, manchados de sangue!
Ele ergue a tocha para iluminar o teto e percebe que ele está
coberto do líquido vermelho e grosso, que goteja lentamente, sem
parar. Ele aproxima a tocha do solo para ver poças de sangue por
todo o chão. Uma lufada de vento quase apaga a tocha, mas ela
recupera sua luminosidade prévia em poucos instantes. Zairos olha
adiante e, vários metros à frente, se depara com uma figura
humana imóvel, em uma parte larga do túnel. Zairos caminha lenta
e cautelosamente em sua direção. Enquanto se aproxima, aos
poucos seus olhos começam a identificar, através da névoa, os
contornos de um homem morto, empalado verticalmente em uma
familiar lança de duas pontas. Uma de suas extremidades ancorada
firmemente no chão ensanguentado, a outra ponta saindo pela base
do crânio inclinado para frente.
Zairos corre na direção dele. Quando atinge o local, um forte
arrepio percorre seu dorso no mesmo momento em que uma forte
e gélida rajada de vento apaga a chama da tocha. A caverna torna-
se ainda mais sombria diante da tênue luminescência enevoada do
Hálito do Dragão. Sua visão vai se acostumando com o escuro,
conforme ele caminha cuidadosamente rumo ao corpo de pé, a sua
frente. Ele franze o cenho em um esforço para distinguir as feições
do homem empalado, ao mesmo tempo encoberto e iluminado pela
fantasmagórica neblina. A cada passo, o rosto fica cada vez mais
visível até que a face fúnebre repentinamente abre os olhos. Ao
mesmo tempo Zairos finalmente o reconhece: seu pai!
Em choque, ele cambaleia para trás enquanto deixa cair a tocha,
já inútil. Sua respiração se acelera ainda mais quando a figura sem
vida de seu pai ergue lentamente o braço, apontando para um túnel
lateral. Os olhos assustados de Zairos se movem para o local
indicado pela mão cadavérica. Envolto nas sombras, na entrada da
passagem lateral, vários metros distante, se esconde outro vulto,
também humano. Em sua face encoberta em trevas, um olho
branco solitário brilha de maneira incomum, como a lua cheia
clareando a noite escura. O vulto se inclina à frente, revelando, sob
a fraca luz da névoa fluorescente, sua identidade. Olho da Noite
gargalha, zombando de Zairos.
O jovem Dragão fecha os punhos, cerra os dentes. A névoa se
move como em um sopro descomunal, atingindo sua nuca. Ele
olha de volta para a figura de seu pai, mas ele não está mais lá. Ele
se vira rapidamente em direção a Olho da Noite, mas seu inimigo
também se foi. Zairos abaixa a cabeça e fecha seus olhos.
Zairos: “Eu vou matar esse desgraçado, Papa... Eu
te prometo que vou.”
Um grito reverbera pelas paredes da caverna. Um grito de
mulher. O grito de Minara!
Zairos corre através da passagem onde seu algoz estava
segundos atrás, emergindo em uma câmara muito maior. Muitos e
muitos metros à diante e alguns metros abaixo, em um nível
inferior da caverna, Olho da Noite ataca Minara com um pesado
martelo de guerra. Ela desvia o corpo e, com um ágil salto, gira no
ar para acertar seu peito com um poderoso chute, que o derruba no
chão. Ela corre em direção a uma parede alta, desenhada com
antigas pinturas de armas. Um conjunto de espada e escudo, um
par de espadas gêmeas curtas e um longo martelo de guerra.
Abaixo de cada imagem se encontram as armas correspondentes,
exceto o martelo.
Zairos encontra um caminho para acessar a parte baixa da
caverna, uma parede íngreme a alguns passos dele. A toda
velocidade, ele inicia a descida para alcançá-los o quanto antes e
poder ajudar Minara.
A bela guerreira alcança as espadas duplas e as segura pelos
cabos. Ela congela o corpo por um segundo, morde os lábios. Olho
da Noite se aproxima pelas suas costas, suas duas mãos erguendo
horizontalmente o longo martelo para esmagar-lhe a lateral da
cabeça. Em um movimento súbito, ela larga as lâminas e rola para
o lado em direção ao escudo. O martelo se choca estrondosamente
contra a parede, fazendo-a vibrar. De joelhos ela arrebata o escudo
e o ergue no tempo exato de bloquear com dificuldade mais um
poderoso golpe.
Minara ataca o joelho do adversário com o escudo. Ele salta
para trás, ela rapidamente se levanta e afasta-se da parede, sendo
perseguida pelo oponente que avança furioso contra ela.
Zairos alcança o chão e dispara em direção a eles, ao mesmo
tempo em que vê os golpes de Olho da Noite se tornarem cada vez
mais violentos e as defesas de Minara começarem a fraquejar.
Enquanto se aproxima do ponto do embate, ele passa próximo à
grande parede e, sem perder a passada, pega do chão a espada
longa em frente a ela.
O martelo gira com velocidade e força surpreendentes. Atinge a
borda do escudo de Minara com tanta violência, que o arranca de
suas mãos. Olho da Noite urra enquanto rapidamente move o
martelo para um ataque mortal contra ela. Zairos está a poucos
passos deles e dá um longo salto. O tempo parece caminhar
lentamente enquanto Zairos, ainda no ar move a espada em
direção ao pescoço de seu odiado inimigo, que se vira para ele.
Minara aproveita essa fração de segundo para pegar o escudo de
volta. A lâmina corta o ar, se aproximando do pescoço de Olho da
Noite. Este apenas fecha os olhos, aguardando sua cabeça ser
cortada fora. Mas algo atinge em cheio o queixo de Zairos,
interrompendo o ataque no último milissegundo.
Um grito ecoa pelo salão.
Minara: “Sem armas!”
Zairos se choca contra o chão, junto com o escudo arremessado
por Minara. Atordoado, com as mãos e joelhos apoiados no chão
ele observa Olho da Noite renovar seus ataques contra sua
companheira. Ela grita algo para seu oponente, mas um zumbido
nos ouvidos de Zairos faz as palavras esmaecidas demais para
serem compreendidas.
Ele sacode a cabeça, aperta os olhos antes de abri-los para
clarear a visão, enquanto luta cambaleante para se levantar.
O zunido começa a ceder lugar à vozes do passado, ressonando
em sua mente.
Zairos Criança: “Então podemos entrar na
caverna para procurar o Deus Dragão?”
Irmã Lobo: “... Seu hálito... pode levar um homem
à loucura.”
Jygar: “Não acredite no que você vê, mas sim no
que você realmente é.”
Zairos fixa os olhos no combate à sua frente. Minara se abaixa
de um golpe circular do martelo que passa a poucos centímetros de
sua cabeça, mas Olho da Noite retorna com um ataque usando o
cabo para atingir seu rosto, derrubando-a. Ele grita para Minara.
Olho da Noite: “Onde está meu irmão?”
Minara, ainda grogue pelo golpe, apenas balança lateralmente a
cabeça em resposta à inusitada pergunta. Ele então ergue o
martelo, pronto para esmagar-lhe o crânio.
Zairos: “NÓS somos os seus irmãos!”
Ele se vira para Zairos. Confusão substitui a fúria no rosto de
Olho da Noite. Ele pisca e seu olho danificado se torna um olho
normal, envolto em lágrimas. Sob o olhar admirado de Zairos,
Olho da Noite se transforma lentamente em Pequeno Urso. O
colossal guerreiro aperta os olhos conforme a imagem da guerreira
de Brummata, com um sorriso manchado de sangue, à sua frente
começa a perder a nitidez. Ele larga o martelo quando o rosto dela
se modifica para um bem familiar. O rosto de Minara.
Chorando, Pequeno Urso cai de joelhos e a abraça. Minara o
abraça de volta e acaricia sua cabeça. Zairos olha para os dois com
orgulho.
Zairos: “Nós conseguimos!”
ESTRADA VERMELHA
Sob a chuva torrencial na noite cada vez mais escura, Olho da
Noite cavalga a toda velocidade na estrada que, cortando a mata,
segue até a cidade de Brummata.
FLORESTA DE BRUMMATA
(D )
Sob um sol escaldante, um urso enorme desmorona sem vida às
margens de um rio na floresta. Diante dele, BESTAFERA – pele
negra, barba falha, dois metros de músculos e cicatrizes – urra.
Bestafera se apoia nas ensanguentadas soqueiras de bronze de suas
armas de lâminas laterais e caminha de quatro, como um animal,
grilhões de ferro em volta de seus tornozelos, pulsos e pescoço.
Ele ergue o rosto selvagem e os olhos bestiais para encarar Olho
da Noite, que acena com a cabeça e sorri com orgulho.
Olho da Noite: “Próxima lição: caçada humana!”
Capítulo 5
V M
3 MESES DEPOIS...
ESTRADA VERMELHA
(N )
Por entre as árvores, a luz da lua cheia e das estrelas banha
Zairos e Orgath em seus cavalos, à beira da estrada.
Orgath: “Eu vou reunir meus homens e ir com
você.”
Zairos: “Isso quebraria o Pacto.”
Orgath: “Assim vou começar a acreditar que você
tem medo de velhas lendas.”
Zairos: “Ghoddrak nos observa, Orgath.”
Orgath: “E o que vai acontecer? Ele vai descer dos
céus e nos destruir?”
Zairos: “Talvez.”
Orgath: “Bosta de dragão! Você é inteligente
demais para não acreditar nessas histórias de
criança, então eu vou lhe dizer exatamente o que
vai acontecer. Guerra! E o melhor: A guerra que
há tanto esperamos.”
Zairos: “Você não quer Guerra com todas as
cidades de todas as nações unidas contra aquele
que ousou desafiar o Deus Dragão.”
Orgath: “É… Você está certo… mas você pode se
unir a Axengard como seu campeão! Vamos
marchar juntos contra Brummata e Olho da Noite.
Nosso antigo plano!”
Zairos: “Um plano infantil! Quem eu terei de
derrotar para atravessar Thalderan? Pequeno Urso?
Jygar? Minara?”
Constrangido, Orgath baixa a cabeça.
Zairos: “Guerra nunca será uma escolha para mim.
Eu preciso ir sozinho atrás dele, você sabe disso.”
Ele estende a mão esperando receber algo. Orgath lhe dá um
mapa. Zairos o pega e parte, galopando a toda velocidade na
estrada de terra. Atrás de Zairos, a uma grande distância, um
cavalo negro corre pela estrada, seu cavaleiro irreconhecível sob
um manto escuro. O canto de um pássaro rouba a atenção de
Zairos. Ele para e observa o Cardeal Vermelho conforme ele voa a
seu redor e mergulha na trilha para a Clareira do Rio das Brumas.
Zairos o segue.
FLORESTA DE BRUMMATA
(N )
16 ANOS ATRÁS...
TEMPLO DE BRUMMATA
(D )
Altas paredes feitas de imensos troncos de madeira, torcidos
e entrelaçados, adornadas com coberturas de hera e dragões
entalhados, formam um grande salão, iluminado por diversas
tochas e piras. Nove meses após o ataque de Albax, Lótus de
Fogo, em trabalho de parto. Grávida, ela grita em desespero
quando toca a barriga imensa. Ao lado de duas sacerdotisas, seu
irmão, CARVALHO SAGRADO, o sacerdote regente – negro, 30 anos,
cabelos em tranças – a abraça tentando acalmá-la. Muito agitada
ela balança a cabeça de um lado para o outro, sem parar,
enquanto grita em agonia.
Lótus de Fogo: “Não, não. Por Ghoddrak, não.”
Ela percebe a faca na cintura do irmão, e em impulso ela a
pega e fura sua própria barriga. As mulheres ajudam o Sacerdote
Regente a desarmá-la e depois a contê-la enquanto ele tenta
estancar o sangue com um pano branco.
MAIS TARDE...
Carvalho Sagrado tem um recém-nascido chorando em seus
braços. O olho esquerdo do bebê sangra. Ele limpa o olho ferido
com um pano, então sacode a cabeça conforme olha para a faca,
coberta de sangue no chão. Lótus de Fogo, de joelhos, abraça o
bebê e chora copiosamente. O olho esfaqueado totalmente branco
e cego.
DE VOLTA AO PRESENTE:
A mente de Olho da Noite retorna do passado. Ele segura
gentilmente os braços de Bestafera, que bufa por algumas vezes,
mas em seguida para de se debater.
Olho da Noite: “Na próxima vez eu vou lhe dar
vingança: o jovem líder de Axengard, Orgath!… E
através do sangue dele você vai trazer a Profecia à
vida.”
Olho da Noite abre os grilhões. Bestafera dispara para dentro da
floresta. Dentro dela, uma sombra caça os caçadores. Pouco tempo
depois, rugidos quase humanos, são seguidos de gritos totalmente
humanos de desespero e dor. Olho da Noite balança a cabeça mais
uma vez com satisfação e orgulho.
UM ANO DEPOIS...
QUARTO DE ZAIROS
(N )
Zairos, assustado e suado, levanta o tronco e senta-se na cama.
Minara acorda e acaricia suas costas.
Minara: “Outro pesadelo?”
Ele acena que sim. Minara olha para Nairon dormindo
profundamente, virado para um canto. Ela puxa Zairos para trás,
pelos cabelos, e monta sobre ele.
Minara: “Eu vou te dar ótimos sonhos, então.”
Ela beija Zairos com paixão ardente, enquanto seus corpos se
entrelaçam. Eles fecham os olhos vivendo um sonho efêmero
enquanto seus corpos se movem suavemente como um em uma
cadência hipnótica que acelera lentamente junto com a frequência
das notas sussurrantes que suas bocas cantam.
OC F
TRÊS ANOS DEPOIS...
B S
COLINA DO DEUS DRAGÃO
(N )
Em frente à escultura de ferro do Deus Dragão, Jygar se posta
diante de Zairos, Minara e Pequeno Urso, alinhados, lado a lado.
Um vento forte atinge seus rostos.
Jygar olha nos olhos de cada um. Pequeno Urso dá um leve
sorriso, que desvanece diante de expressão severa de seu mestre.
Jygar: “A tensão entre Brummata e Axengard está
aumentando. Olho da Noite incita seu tio,
Carvalho Sagrado, o Sacerdote Regente, à guerra.
Orgath, por mais que tente e seja seu neto, não
consegue atenuar o desejo de guerra do General
Uldresh. O Pacto ainda é, e sempre será, nossa
única garantia de paz.”
Jygar baixa a cabeça por instantes. Uma garoa começa a cair.
Jygar: “Nosso irmão Falcão da Lua está morto,
Kaijin se tornou um renegado, e eu--”
Pequeno Urso: “Você é o grande Jygar! O maior
de todos.”
Jygar olha para seu braço esquerdo ferido, enfaixado e contorce
a boca em frustração. A chuva se intensifica.
Jygar: “Kaijin acabou com a destreza de meu
braço para sempre. Mesmo com a ajuda de Feigon,
eu temo não ser mais capaz de enfrentar um
campeão bem treinado.”
Pequeno Urso: “Não se preocupa com isso!
Ninguém pode vencer Pequeno Urso e seus irmãos
dragões.”
Jygar: “Assim espero. As três nações estão
ansiosas para testar cada um de vocês. Axengard
será a primeira. Amanhã, Zairos, você enfrentará
Sangir, um guerreiro muito experiente que tem
treinado os campeões de Axengard por an--”
Minara: “Um perdedor que treina os perdedores.
Zairos foi treinado pelo melhor de todos.”
Jygar: “Não o subestimem. Suas habilidades são
quase um mito em Axengard. Eles acreditam que
ele se tornará uma lenda viva amanhã.”
Minara: “Uma lenda morta!”
Pequeno Urso solta uma pequena gargalhada. Um relâmpago
ilumina o céu.
Zairos: “Um Dragão da Tempestade nunca foi
derrotado. Não serei o primeiro.”
CORREDORES
No final de um longo corredor, as portas abertas de um
dormitório infantil ficam cada vez mais próximas à medida que
Minara corre em sua direção. Lá, ela vê a figura de um homem
musculoso deixando o aposento, que caminha em sua direção.
Zairos: “Nairon não está aqui.”
Ela para, abaixa os olhos por um instante e depois mira Zairos
com olhos sorridentes.
Minara: “Acho que sei onde ele está.”
SALÃO SAGRADO
O grande salão tem suas paredes cobertas com pinturas que
contam a história de como O Pacto foi criado. Ao fundo encontra-se
a entrada de uma pequena gruta. Dentro, tochas de chamas azuladas
banham com luzes bruxuleantes uma belíssima estátua de
Ghoddrak. Aos pés dela, um menino de sete anos ora de joelhos.
Nairon: “Grande guardião dos céus e dos
homens, abriga-nos sob suas asas para
proteger-nos do mal. Que sua chama purifique
e ilumine nossos caminhos. Que suas escamas
sejam nossos escudos, suas garras nossas
espadas. Para aqueles que nos desafiam, apenas
a fúria das tempestades e a ferocidade dos
dragões.”
Na porta do santuário, Zairos observa seu filho, seu braço ao
redor de Minara, sua mão segurando o ombro de sua
companheira. Os olhos dela se umedecem assim como os dele. Ela
sussurra para o marido com uma voz calorosa e emotiva.
Minara: “Ele está pedindo ao Deus Dragão
para te proteger.”
Zairos: “Eu sei”
Ele passa as costas das mãos nas pálpebras para se livrar das
lágrimas prestes a caírem.
Zairos: “Ei, filho! As bênçãos de Ghoddrak e o
cuidado de um filho são sempre bem-vindos,
mas você não tem medo de que eu não esteja
pronto para a batalha, não? Não se esqueça que
meu pai me ensinou uma técnica invencível.”
Nairon: “Isso de novo? Não vai funcionar mais
comigo, papai.”
Zairos corre até Nairon e lhe faz cócegas sem parar, da mesma
forma que seu pai fazia com ele. O menino resiste por uns poucos
segundos, mas em seguida cai na gargalhada.
Minara: “Vamos usar seu próprio veneno
contra ele, filho. Eu vou salvar você!”
Ela salta sobre Zairos, derrubando-o e agarrando seus braços.
Minara: “Agora, Nairon, agora!”
O garoto se junta a sua mãe contra seu pai em uma batalha de
cócegas, os movimentos habilidosos dos dedos ferozes provocando
gargalhadas incontroláveis nos três. O vencedor é imprevisível. A
escultura do Deus Dragão no altar parece sorrir para eles.
Q O
Roupas espalhadas pelo chão. Uma tocha acesa na parede
salpica o quarto com sua parca luz bruxuleante. Orgath tem três
lindas jovens orientais nuas em sua cama. Elas o beijam
calorosamente enquanto ele bebe um gole de vinho direto do
gargalo. Gritos desesperados de Lissa atingem seu ouvido.
Lissa: “Orgath! Rápido!”
Ele larga a garrafa, que se estilhaça no chão enquanto ele se
move velozmente para fora do quarto.
Q A
Orgath entra apressadamente no quarto de seu pai. Ele fica
paralisado ao ver seu avô, General Uldresh morto, banhado em
sangue, no chão. Seu pai deitado, com Lissa agachada próxima a
ele. Ele tem sangue nas mãos e uma ferida aberta no peito. Os
olhos perdidos em delírio.
Avernath: “Filho? É você?”
Lissa se levanta ao ver Orgath. Ela baixa os olhos e sacode a
cabeça. Orgath se ajoelha próximo a seu pai. Avernath aponta para
o corpo sem vida de Uldresh, mas, em sua mente, vê Jygar ao
invés do velho general.
Avernath: “Vê? Eles não são invencíveis. Eu
derrotei o poderoso Jygar.”
Ele segura a mão de Orgath.
Avernath: “Agora vá, chame seu avô e lidere
Axengard para a glória, filho.”
Ele dá ao filho um último sorriso orgulhoso antes de soltar sua
mão. O rosto de Orgath se contorce em sofrimento. Ele o cobre
com as mãos cobertas de sangue.
CEMITÉRIO DE AXENGARD
(D )
As árvores desfolhadas e a grama seca no alto da colina
aumentam a atmosfera desoladora do local onde os Axengardianos
queimam seus mortos. Várias urnas funerais se encontram
espalhadas pelo local, pequenas e grandes, quadradas e
arredondadas, muitas distribuídas pelo chão. Outras, maiores e
mais ornamentadas, sobre plataformas de pedra. Nenhuma com
tampa, as mais recentes ainda cheias das cinzas dos mortos.
Vários militares de Axengard estão alinhados diante de duas
piras funerais, ainda apagadas, onde os corpos de Avernath e
Uldresh repousam. Ao lado de cada pira, uma urna de prata
adornada com esmeraldas e runas entalhadas aguarda sobre uma
plataforma de granito negro a chegada das cinzas de seu general.
Com uma tocha ornamentada, Orgath acende as piras. Ele fita o
fogo com olhos letárgicos. Ao lado de Lissa, Zairos assiste às
chamas consumirem os corpos do pai e do avô de seu amigo.
Orgath se aproxima dele.
Orgath: “Sabe de uma coisa? De certa forma, eles
estão mortos por causa de nossa amizade. É por
isso que sinto o sangue deles nas minhas mãos. A
loucura de meu pai começou quando escolhi ficar
do seu lado ao invés do dele.”
Zairos: “O quê...”
Orgath: “Nada, apenas uma história que eu quero
esquecer.”
Ele observa as chamas consumirem os corpos do pai e do avô.
Orgath: “Você salvou minha vida, Zairos… mas
você também a tirou de mim. Meu pai, meu avô, a
mulher que eu amo… até mesmo a chance de
guerra contra os inimigos de minha nação… você,
logo você, sempre contra mim…”
Zairos: “Está me culpando? Eu sou seu melhor
amigo, seu irmão.”
Orgath: “Sim! Um irmão que nunca está do meu
lado.”
O corpo de Orgath estremece. Ele fecha o punho e dispara um
soco na direção de Zairos, que defende o golpe e derruba Orgath
no chão com um empurrão. Raiva nos olhos, Orgath se levanta,
desembainha sua adaga e a levanta contra Zairos, que apenas o
encara.
Orgath: “Agora você vai me bater diante do meu
povo? O que mais você quer, Zairos? O que
mais?”
Zairos balança a cabeça, respira fundo e solta o ar pesadamente.
Então lhe vira as costas e começa a se afastar. Furioso, Orgath
atira a adaga. Ela gora velozmente em direção àquele que sempre
fora seu melhor amigo e penetra profundamente em sue alvo, uma
árvore, próxima a Zairos. O falcão do Sacerdote Regente, pousado
em seus galhos secos, alça voo, enquanto o Dragão de Thalderan
prossegue sua caminhada sem se abalar. Com seu exército às suas
costas, o rosto de Orgath treme enquanto ele tenta impedir a queda
de uma lágrima.
JARDINS DE SOLFIRA
(C )
Sentado em frente a uma mesa oval no pátio florido, Chun insere
uma caneta de pena, com tinta azul fresca na ponta, em um pequeno
suporte de madeira. Sob os olhos da Cacatua Rosa na beira da mesa,
a imperatriz menina enrola o papel amarelado e o enlaça com uma
minúscula fita azulada. Com as duas mãos, ela entrega a carta ao
Jovem Sacerdote ao seu lado. Ele se curva enquanto a toma em suas
mãos. Ele então levanta o pergaminho sobre a cabeça e assobia. Sua
cacatua voa e agarra a carta em suas garras para voar alto sobre as
paredes que cercam o jardim, banhada pelo sol que se põe atrás da
torre do palácio.
SALÃO DA CASA DE GUERRA DE AXENGARD
( )
A lenha crepita na lareira acesa ao fundo da grande sala. Lissa
observa enquanto Orgath lê uma carta. A Cacatua Rosa empoleirada
no ombro dela parece fazer o mesmo. Ele termina a leitura e olha
para a sacerdotisa.
Orgath: “Condolências e uma proposta de
Solfira.”
Lissa: “Que tipo de proposta? Você irá
aceitar?"
Orgath: “Um casamento… para unir nossas
nações... para sempre!”
Lissa: “Isso é maravilhoso! Ela é inteligente,
gentil e bonita. Você vai aceitar, certo?
Lissa: “De que jeito?”
Orgath: “As condolências, sim. A proposta,
talvez no futuro, mas do meu jeito, da maneira
que Axengard merece.”
Ele ignora a sacerdotisa e joga o pergaminho no fogo. Com olhos
pensativos e um sorriso no canto da boca, o jovem General observa
enquanto o papel se transforma em brasas voando e dançando junto
com as chamas cor de safira e rubi.
Capítulo 9
TORMENTAS
4 ANOS DEPOIS...
CIDADE DE BRUMMATA
(N )
O falcão se aproxima das inúmeras casas harmonicamente
integradas com as copas e galhos das frondosas árvores da floresta
de Brummata. Em seu centro, uma grande clareira, com uma
impressionante construção formada por enormes árvores
entrelaçadas, cercada por gigantescas tochas. A imponente ave
mergulha em direção a uma grande janela circular no alto, em seu
centro, e em poucos segundos adentra a estrutura através dela.
S E
Ele abre as asas enquanto plana sobre um grupo de nativos no
amplo e alto salão. Eles espalham um assustador som de percussão
enquanto tocam os tambores de couro em um ritmo frenético.
Olho da Noite é um dos percursionistas. No cento do aposento,
diante de uma pira acesa, Carvalho Sagrado, olhos fechados,
sacode seu corpo de uma maneira ritmada, como em um transe
conectado à música dos tambores. Seu falcão parece também
entrar em transe e mergulha em direção à pira. Ele emite um som
alto e agudo quando esbarra nela, espalhando a madeira flamejante
dentro dela pelo chão. O ritmo dos tambores se intensifica.
O Sacerdote Regente abre os olhos, ainda em transe. O falcão
pousa em seu braço direito, as garras rasgando sua pele, mas ele se
mantém impassível. Em seguida pega uma das lenhas caídas e
parece não sentir o fogo ainda trepidando na madeira enquanto fita
as chamas com olhos vagos.
Carvalho Sagrado: “O Deus Dragão será desafiado
mais uma vez. O Pacto será quebrado!”
Os tambores param. Olho da Noite sorri.
PASSAGEM NORTE DE THALDERAN
(D )
O sol se esconde por trás das nuvens. O mar distante,
silencioso e calmo, ao fundo. Um grande disco de pedra, com um
falcão entalhado, marca o local onde Falcão da Lua está enterrado.
Sentado próximo a ele, Pequeno Urso bebe e come de maneira
espalhafatosa enquanto Jygar conversa com ele. Zairos e Orgath
seguram uma caneca de vinho enquanto assistem Minara, com um
conjunto de espada e escudo, treinar Nairon. Com espadas gêmeas
nas mãos, ele se move com toda a energia de um forte menino em
todo vigor de seus onze anos. Nairon ataca sua mãe com uma
rápida sequência de golpes habilidosos. Ela sorri orgulhosa
enquanto se defende.
Orgath: “Durante todo esse tempo, por várias
vezes eu pensei no que aconteceu no funeral, sabe?
E eu nunca me desculpei pelo que fiz e te disse
naquele dia.”
Zairos: “Esqueça. Foi um momento muito difícil.
Você é meu irmão, é isso que importa. Estou feliz
que você veio aqui hoje.”
Orgath dá um meio sorriso, constrangido. Nairon executa
alguns ágeis e poderosos movimentos que chamam sua atenção.
Orgath: “Ei, olhe o seu filho. Ele é bom, muito
bom. Se ele continuar assim, ele vai ser melhor do
que você. Muito melhor.”
Zairos: “Ele ainda tem muito que aprender, mas
tenho de admitir que ele aprende rápido.”
Orgath: “Muito rápido. É uma pena que a era dos
Dragões da Tempestade vai ter acabado antes dele
se tornar um de vocês.”
Zairos: “Não é uma pena, meu amigo. Solfira
desistiu dos duelos e você, como líder de
Axengard, jamais enviou um campeão contra mim.
Minha gratidão por isso.”
Orgath pressiona os lábios com um aceno de cabeça. O
campeão de Thalderan segura o general pelos ombros.
Zairos: “Parece que as Três Nações não precisam
mais dos campeões de Thalderan para ter paz entre
eles. Agora, apenas Brummata ainda mantém os
duelos. Mas eu acredito que logo eles entenderão o
quão sem sentido são seus desejos de guer--,"
Orgath: "É exatamente desses desgraçados de
quem estou falando. Brummata está preparando
um grande exército. Há rumores de que eles vão
desrespeitar o Pacto.”
Zairos: “Impossível! “Fora o Olho da Noite, desde
a Antiga Traição eles passaram a ser os que têm
mais fé dentre os Três Povos.”
Orgath: “Eles acham que, através de suas ervas e
preces, podem falar com o Deus Dragão para
encontrar um meio de começar a guerra sem o
duelo, mas também sem ferir o Pacto… E, claro,
temos Profecia... e o Imortal.”
Zairos: “Sim, Olho da Noite. O miserável nunca
vai desistir de encontrar um jeito.”
Orgath se senta por alguns segundos em silêncio. Ele respira
fundo e então fala com determinação.
Orgath: “Una-se a Axengard. Vamos atacar
Brummata! Você derrota os campeões que se
intrometerem em nosso caminho e meu exército
derrota o exército deles, antes que eles fiquem
fortes demais.”
Zairos: “Isso de novo? Por cima do corpo de qual
de meus irmãos atravessaremos Thalderan?”
Orgath: “Me desculpe. É uma ideia estúpida.”
Zairos: “Vamos parar de aborrecer Falcão da Lua
com essa conversa sem sentido.”
Zairos caminha em direção a Nairon e Minara. Ela nota,
sussurra no ouvido de Nairon e gesticula para mostrar-lhe algumas
instruções.
Zairos: “Nairon! Comigo agora! O espírito do
Falcão da Lua está ansioso para ver se você vai
conseguir me vencer dessa vez.”
Minara entrega as armas para Zairos. Pai e filho se encaram.
Nairon dá um leve sorriso. Zairos lhe devolve um muito maior.
Zairos: “Eu conheço esse sorriso. Sua mãe te
ensinou uma daquelas combinações malucas de
golpes! Você acha que vai me vencer com isso?”
Nairon: “Malucas, mas poderosas, papa.”
Repentinamente Nairon dá um passo largo para a direita e salta
alto, com as pernas dobradas e os pés em direção ao escudo
redondo do pai. Zairos sustenta o escudo quando Nairon aterrissa
sobre o mesmo e dispara horizontalmente a espada esquerda
contra seu pescoço. Zairos ergue verticalmente sua espada e apara
o ataque. Nairon empurra o escudo com os pés e salta. Ainda no ar
ele desfere um ataque vertical com a espada. Zairos, erguendo
horizontalmente a sua, bloqueia.
Nairon aterrissa no chão. Zairos nota que o filho está prestes a
atingi-lo na cintura, do lado direito, usando a espada esquerda.
Nairon golpeia, mas durante a execução ele abaixa a espada
direita, liberando a espada de seu pai para o ataque. Imediatamente
Zairos a toca no peito do filho. O menino, rosto frustrado, assume
a derrota e larga as espadas.
Zairos: “Não fique aborrecido. Foi um bom
ataque. Se seus braços fossem maiores, você
poderia ter me acertado também. Mas esse
movimento final abre sua guarda, filho.”
Nairon baixa a cabeça. Zairos dá um soquinho no seu queixo.
Zairos: “Um verdadeiro Dragão nunca desiste!”
Com um gesto de cabeça, Zairos convida o filho para uma nova
tentativa. Nairon lhe devolve um olhar determinado e sorridente.
Nairon: “Nunca!”
Um largo sorriso se abre no rosto de Nairon enquanto ele se
agacha para pegar as espadas. De repente, um grito selvagem de
guerra o assusta e o faz parar. Jygar se vira em direção ao som e
imediatamente vocifera um comando de alerta.
Jygar: “Dragões! Armas em guarda! Agora!”
Eles acompanham o olhar de Jygar e encontram um aclive
próximo, quase do tamanho de uma pequena colina. De trás dela,
dezenas e mais dezenas de guerreiros emergem.
Orgath: “Guerreiros de Brummata!”
Zairos: “Orgath! Os cavalos! Tire Nairon daqui!”
Orgath olha aborrecido. Ele está com o machado na mão,
pronto e ansioso pelo combate.
Jygar: “Temos de nos concentrar na batalha, não
em proteger você e Nairon. Tire ele daqui!”
Ainda hesitante, Orgath permanece olhando para os guerreiros
de Brummata que se aproximam. Minara aperta fortemente o
punho de suas espadas gêmeas e olha para Orgath com firmeza.
Minara: “Vá! Proteja meu filho, eu cubro vocês
dois.”
Orgath acena com a cabeça e então pega Nairon pelo braço,
mas o menino se solta com um puxão forte e repentino.
Nairon: “Eu não preciso de proteção! Eu vou lutar
junto com vocês.”
O rosto de Minara se contorce em desespero, mas Orgath pisca
para ela.
Orgath: “Mas eu preciso de você, Nairon! Eu não
sou um Dragão da Tempestade. Ajude sua mãe a
me fazer conseguir escapar.”
O valoroso menino acena com a cabeça, puxando-o pelo pulso.
Nairon: “Sim, você precisa de mim.”
Com Minara logo atrás, eles disparam rumo aos cavalos,
amarrados a algumas árvores frondosas no lado oposto. Ela
permanece alerta, em guarda, enquanto os outros Dragões
avançam para interceptar as forças inimigas. Há mais de quinze
guerreiros de Brummata para cada Dragão da Tempestade, mas os
primeiros caem, um após o outro, diante dos furiosos Dragões, que
os esmagam, perfuram e despedaçam.
Orgath e Nairon alcançam os cavalos e se preparam para
montar. Vindo da árvore acima deles, um guerreiro aterrissa diante
de Orgath –- Olho da Noite. Ele derruba o menino com um pisão
no peito e ataca o herdeiro do Axengard com sua lança, que usa o
machado para desviar os golpes. O guerreiro de Brummata então
sorri para ele e com um golpe veloz acerta seu rosto com o cabo da
lança, fazendo-o se afastar. O sangue escorre da sobrancelha agora
machucada de Orgath. Ele urra e ergue o machado enquanto corre
em direção ao oponente, mas em um movimento repentino, Olho
da Noite o intercepta, cravando a lança em seu ombro. O
axengardiano tomba e solta o machado quando suas costas batem
no solo. Olho da Noite pega uma clava de guerra das próprias
costas e olha com crueldade para seu rival no chão enquanto este
tenta remover a lança fincada em seu ombro. Orgath consegue se
levantar, mas a clava acerta seu rosto, derrubando-o novamente,
quase inconsciente, absolutamente indefeso à mercê do inimigo.
Então, duas pequenas mãos agarram o machado que Orgath
acabara de perder. Nairon, com o grande machado em suas
mãozinhas, salta diante de Olho da Noite. O vilão dá uma pequena
gargalhada enquanto se aproxima do bravo garoto, que ergue o
machado, pronto para a batalha.
Ainda distante, Minara luta contra os guerreiros de Brummata.
Um inimigo salta sobre ela. Um corte de espada. O guerreiro
aterrissa sem cabeça. Ela se vira, cada uma das espadas duplas
trespassa simultaneamente o coração de outros dois oponentes. As
espadas de Minara golpeiam em todas as direções. A cada
movimento, um guerreiro inimigo cai a seus pés.
O grito de uma criança atinge seus ouvidos. O grito de Nairon!
Ela se vira, seu longo cabelo esvoaçando durante o giro, o som das
batidas de seu coração preenchendo o ar. Seu corpo congela, seus
olhos se arregalam, o pavor estampado em seu rosto. Seus lábios
se movem em um grito desesperado de uma mãe chamando seu
filho. Minara começa a correr em direção à cena apavorante que se
apresenta diante dela. Um guerreiro ferido, caído, estende a mão e
agarra-lhe o tornozelo. Ela cai. O guerreiro salta sobre ela com
uma adaga na mão. Ela se vira, corta a mão do inimigo e perfura
seu pescoço.
Aflita, Minara se levanta e se vira em direção a Nairon. Uma
gota de sangue surge no canto de sua boca. Olho da Noite remove
vagarosamente a lança do ventre de Minara. Ela cai de joelhos e
estende uma das mãos, sem forças, enquanto a outra, sobre a
barriga, tentar conter inutilmente o sangue que se espalha sobre ela
e escorre entre seus dedos.
Minara: “Nairon…”
MAIS TARDE...
O sol começa a se por. No campo de batalha, os Dragões matam
os últimos guerreiros de Brummata. O crepúsculo carmim e o
sangue dos seus inimigos envolvem em vermelho as silhuetas de
Zairos, Jygar e Pequeno Urso. Zairos olha na direção dos cavalos e
vê inúmeros corpos espalhados pelo chão. Em desespero, ele grita
enquanto corre na direção deles.
Zairos: “Minara! Nairon!”
Zairos, ferido e exausto, se dirige à área dos cavalos. Ele
encontra Minara gemendo, mortalmente ferida, deitada em uma
poça de sangue. Ele se ajoelha a seu lado. Com a face coberta de
lágrimas e os olhos avermelhados, ela olha para ele.
Minara: “Nosso filho, nosso filho…”
Minara solta um gemido, o brilho azul de seus olhos parece
esmaecer. Suas pálpebras se fecham lentamente, fazendo as
últimas lágrimas correrem com delicadeza pelo belo rosto agora
pálido e imóvel. Zairos a abraça em desespero, sua face se
contorce em agonia. Com as mãos trêmulas em seu pescoço, ele
repousa delicadamente a cabeça dela no solo gramado. Ele acaricia
seus longos cabelos negros espalhados pela relva, em um gesto de
despedida. Minara está morta. Com as marcas de um choro
incontido manchando seu rosto, ele se levanta cambaleante a
procura de Nairon. Mais à frente ele encontra Orgath, curvado
com o corpo de uma criança nos braços.
Zairos: “Nairon? Nairon?”
Orgath, olhos úmidos, o corpo coberto pelo sangue da
sobrancelha e do ombro, vira a cabeça na direção do amigo,
revelando um hematoma grande e severo no lado do rosto
inchado. Ele balança a cabeça enquanto aperta lábios. Jygar chega
e o segura. Zairos desesperadamente se debate, gritando em
prantos. Pequeno Urso chora. Orgath coloca cuidadosamente o
corpo do menino no chão. De cabeça baixa, ele caminha até
Zairos, respira profundamente e segura seus ombros. Lágrimas
escorrem pelo seu rosto enquanto ele fala.
Orgath: “Todos os seus ossos estão quebrados.
Nairon foi desfigurado por uma clava de guerra,
seu rosto... seu rosto... Você não vai querer vê-lo
nesse estado.”
Pequeno Urso bate com as palmas das mãos na cabeça sem parar.
Pequeno Urso: “Não, não, não. Ele era meu
sobrinho, meu sobrinho, meu sobrinho.”
Zairos – face retorcida pela dor – desaba de joelhos.
Zairos: “Diga-me que não é verdade, que você
se enganou. Eu te imploro.”
Orgath: “Você sabe o quanto eu amava seu
filho, meu irmão. Eu não posso trazê-lo de
volta dos mortos, mas acredite em mim, eu vou
matar aquele desgraçado. Eu juro para você
que eu vou.”
Uma raiva intensa percorre o corpo de Zairos, fazendo seus
músculos se retesarem.
Zairos: “Quem? Quem foi o miserável que fez
isso? Foi ELE, não foi?”
Orgath: “Sim... Olho da Noite!”
O rosto e o corpo de Zairos tremem enquanto ele se levanta.
Orgath: “Nairon o atacou para me salvar. Eu
acertei o miserável nas costas, com sua própria
lança, mas já era tarde demais.”
Jygar: "Esse demônio está morto, então?"
Orgath: “Eu apenas consegui feri-lo. Ele
escapou enquanto eu tentava ajudar Nairon...
me perdoem.”
Orgath: “Como vamos contar a Minara tudo
isso? Como?"
Zairos estremece por completo. Com passos cambaleantes,
começa a andar em direção a Nairon.
Zairos: “Não vamos.”
Pequeno Urso grita, sua voz definhando com medo da resposta.
Pequeno Urso: "Onde tá... ela?"
Zairos chega até o corpo de Nairon. Ele tenta encontrar o rosto
do filho na face desfigurada, coberta de tons escarlate enquanto
com as mãos trêmulas fecha seus doces olhinhos azuis, até então
semi-abertos. As feições de Zairos também se deformam com a
dor insuportável dessa visão. Ele imediatamente cerra os olhos e
aperta o filho nos braços. Em prantos, ele carrega o menino em
direção ao corpo de Minara.
Seus companheiros o seguem com passos tímidos, alguns metros
atrás. Eles param quando Zairos se agacha para aninhar Nairon nos
braços de sua mãe morta. Orgath e Pequeno Urso começaram a
chorar. Soluçando, eles se abraçam. Lágrimas também correm pelo
rosto de Jygar enquanto Zairos se ajoelha para segurar Minara e
Nairon em seu colo. Delicadamente, Orgath afasta Pequeno Urso,
que cai de joelhos. Jygar coloca a cabeça de seu amigo gigantesco
em seu ombro. Em uma mistura de pesar e raiva, o axengardiano se
dirige a Zairos.
Orgath: “Como você, seu filho salvou minha
vida e além disso morreu por mim... Eles
tiraram Minara de nós! Olho da Noite e seu
povo quebraram o Pacto e vão pagar por
isso. Se eles querem guerra, é guerra que eles
vão ter.”
Zairos: “É você que deveria ter morrido por
ele! Você!"
Orgath: “Se eu pudesse escolher, eu morreria
por ele, ou por ela, mil vezes, sem pestanejar,
você sabe disso, Zairos!”
Zairos: “Você está certo. Foi minha culpa. Eu
prometi que nunca iria deixar eles
morrerem. Eu estava aqui e mesmo assim
deixei os dois desprotegidos. ”
Orgath: “Não faça isso com você. Não se
culpe.”
Zairos: “Só vá embora. Eu quero ficar sozinho
com eles.”
Orgath abaixa a cabeça e sai. Zairos acaricia os cabelos de
Minara e Nairon.
Zairos: “Eu preciso muito de vocês. Eu sei que
falhei, que eu não podia deixar isso acontecer,
mas por favor não me deixem. Estou
implorando... Feigon vai trazer vocês de
volta... Não, Ghoddrak vai. ”
Chorando compulsivamente, ele olha para o céu, com os olhos
vermelhos, tomados pelo desespero.
Zairos: “Mostre que você é um verdadeiro
deus. Traga eles de volta!"
Nenhuma resposta dos céus. Um longo silêncio se segue,
interrompido apenas pelos soluços de Pequeno Urso ao
longe. Zairos fecha os olhos e coloca a ponta afiada da espada na
interseção entre a garganta e a base do queixo. Uma gota de sangue
escorre pela lâmina, contornando as mãos ensanguentadas que
seguram com força o gume da espada, até ficar presa ao redor da
gema do olho do dragão, em sua guarda.
Quando a lágrima vermelha é liberada e atinge o solo, o
devastado pai e marido inclina a cabeça para trás, pensando se não é
melhor juntar-se a eles. Então, uma voz chorosa, mas melódica,
atinge seus ouvidos com uma canção familiar.
Pequeno Urso: ♫ Não tema a fúria da
tempestade, nem a escuridão que chega ao
anoitecer, porque estarei ao seu lado, de
verdade, em cada caminho que você escolher...
♪
Na mente de Zairos, a voz de Minara se junta ao seu infante
amigo grandalhão na canção de ninar.
Minara / Pequeno Urso: ♫ Quando a chuva
cair, eu serei seu abrigo, nas sombras serei a
luz do seu luar, sim, eu sempre, sempre estarei
contigo, em todas as batalhas que você quiser
lutar... ♪
Zairos afrouxa as mãos entorno da borda da espada. Ele
finalmente a deixa cair assim que a voz de seu filho substitui à de
Pequeno Urso para se unir à de Minara e assumir por completo o
controle de sua mente junto à imagem dos dois dançando e cantando
com rostos sorridentes.
Minara / Nairon: ♫ Mesmo se o vento
sussurrar que vou embora, ou o destino
simplesmente te tirar de mim, do seu coração
nunca me deixe de fora e você estará comigo,
mesmo após o fim... ♪
Imerso em uma dor insuportável, ele murmura choroso a canção
de ninar enquanto abraça cada vez mais apertado os dois corpos sem
vida e os últimos raios de luz desaparecem, dando vez à escuridão
gelada e interminável daquela noite sem-fim.
Minara / Nairon / Zairos: ♫ Mesmo depois que
o céu, o meu nome chamar, você não estará
sozinho, em momento algum. Feche os olhos, e
se dessa nossa canção você lembrar, estaremos
juntos, e de novo então, seremos um. ♪
Capítulo 10
Q E ?
PASSAGEM NORTE DE THALDERAN
(D )
No horizonte, o sol começa a sumir no mar, agora agitado
pelos ventos fortes que o atravessam, espalhando a areia do chão.
Minara repousa em um esquife sobre uma plataforma de pedra.
Seus olhos azuis abertos parecem ainda vivos, fitando um ponto
distante no céu. Com os braços cruzados e as mãos tocando os
ombros opostos, ela segura as espadas apontadas para baixo. As
costas das mãos revelam tatuagens mortuárias.
Feigon, inclinado sobre o corpo dela, usa o próprio sangue para
terminar a última runa. De um jarro prateado ele derrama
lentamente um óleo transparente sobre ela enquanto ora na Língua
Antiga. Em torno do pequeno caixão, Zairos, Jygar, Pequeno Urso
e Orgath se mantêm agachados sobre um joelho, cabeças baixas
em luto. Feigon gesticula para que eles se levantem, um de cada
vez: Orgath, Pequeno Urso, Jygar, e finalmente Zairos. Este se
aproxima de Minara e curva-se para beija sua testa
demoradamente. Uma lágrima desce pelo seu rosto sobre um dos
olhos de Minara para em seguida escorrer pela sua face, como se
ela chorasse junto com ele.
Com Zairos e Jygar à frente, os Dragões e Orgath carregam o
caixão, dois deles de cada lado. Eles caminham, cabeças curvadas,
exceto por Zairos, que olha para frente, com olhos vazios no rosto
distorcido de dor. Cuidadosamente eles pousam o esquife em uma
cova rasa – pouco mais de um metro. Eles tampam o caixão e
começam a cobri-lo com a terra escavada, amontoada em torno
dele. Zairos ajoelha-se, olhos fechados. Ele crava os dedos no
chão, tentando controlar a agonia de uma dor insuportável. A neve
começa a cair. Ele abre os olhos, buscando por Nairon. Seu filho
repousa coberto com uma manta branca sobre uma pira, pronto
para ser cremado.
Zairos se levanta. Ele caminha a passos trôpegos rumo ao corpo
do filho. Um floco de neve suavemente repousa em seu rosto.
Uma lágrima cai, se junta com o floco de neve e corre face abaixo.
A cada passo, uma lembrança invade sua mente.
LAMPEJOS DE MEMÓRIA
– Seus olhos congelam ao ver Minara pela primeira vez;
– Ela o derruba no primeiro dia de treinamento e sorri;
– Eles fazem amor sob a luz do luar;
– O jovem casal chora de felicidade com o nascimento de
Nairon;
– Nairon abraça Minara depois da primeira vitória de
Zairos;
– Ao lado de Orgath, ele assiste a Nairon e Minara
treinarem pela última vez;
– Ele e Nairon trocam olhares sorridentes enquanto duelam
logo a seguir;
– O rosto frustrado de Nairon se abre em um largo e último
sorriso com seu convite para que ele nunca desista.
Feigon entrega a tocha acesa para Zairos, trazendo sua mente
de volta ao momento presente. Ele a levanta e olha para o fogo
azul. Seus olhos úmidos refletem o brilho da chama.
LAMPEJOS DE MEMÓRIA
– Minara, caída, chama pelo filho deles;
– Orgath com Nairon morto em seus braços;
– Ele abraça os corpos sem vida de Minara e Nairon;
– O rosto de seu filho transformado em uma massa disforme
de carne e sangue.
Zairos desperta das rápidas lembranças novamente. De um
sofrimento absoluto, seu rosto muda para uma raiva descomunal.
Ele acende a pira. As chamas se refletem mais uma vez em seus
olhos. Sem lágrimas dessa vez. Ele larga a tocha, abre os braços e
grita para os céus.
FLORESTA DE BRUMMATA
(D )
Olho da Noite cavalga através da floresta densa. Zairos galopa
a toda velocidade atrás dele e encurta a distância. Seu inimigo
percebe, olha para trás e bate com os calcanhares na barriga de seu
corcel fazendo-o disparar e voltar a ganhar terreno. Zairos pega
seu escudo e o arremessa. Ele plana enquanto gira rapidamente
pelo ar, até atingir em cheio as costas de seu algoz, derrubando-o
do cavalo em disparada. Olho da Noite cai exatamente no meio da
Clareira do Rio das Brumas, onde seus destinos se cruzaram pela
primeira vez. Olho da Noite, levemente atordoado, se levanta
apoiado em sua lança. Zairos, desarmado, salta do cavalo e se
aproxima dele. Seu antigo inimigo o recebe com um sorriso
perverso.
Olho da Noite: “Parece que você deixou sua
espada com Jygar e jogou seu escudo fora.”
Zairos: “Você matou meu pai exatamente nessa
clareira. Eu não preciso de armas para matar
você.”
Olho da Noite ataca. Golpes rápidos com as lâminas das pontas.
Zairos se esquiva dos primeiros golpes, mas um ataque na
diagonal para baixo quase o acerta na barriga. O golpe seguinte
vem do lado oposto e passa a poucos centímetros do pescoço do
Dragão da Tempestade. O próximo arranha seu peito.
Olho da Noite: “Seu pai, sua mulher e seu filho…
e agora, finalmente você!”
Zairos dispara enfurecido na direção dele. Seu inimigo executa
um ataque circular contra suas pernas. Ele salta sobre a lança e
rola para as costas de Olho da Noite. O herdeiro do Povo da
Floresta se vira e ataca de novo, mas Zairos está próximo e com
um salto o atinge com um chute duplo no peito. O golpe o
arremessa longe, fazendo-o perder a lança e se chocar contra o
solo.
Zairos: “O mesmo ataque que meu pai usou para te
derrubar. Lembra disso, covarde?”
Quando Olho da Noite se levanta, Zairos lhe dá um soco no
estômago, seguido de uma cotovelada no queixo, que o derruba.
Ele tenta se levantar, mas recebe uma joelhada em cheio no rosto.
Zairos monta sobre ele e soca seu rosto sem parar. A cada golpe
furioso, sangue e inchaço deformam o rosto de seu inimigo. Uma
lança atravessa o ar. Ela perfura Zairos na interseção de seu peito
com seu ombro. O impacto o desequilibra, quase o derruba.
Enquanto ele tenta remover a lança do ombro, Olho da Noite
rasteja em direção aos inúmeros guerreiros de Brummata que
emergem da floresta. Próximo a eles, ele se levanta com o sorriso
irônico e perverso de volta a seu rosto.
Olho da Noite: “Como eu disse, pai, mulher, filho
e… você.”
Os incontáveis guerreiros armados, ainda distantes, começam a
cercar Zairos lentamente. Já de pé, ele agora apenas segura a lança
ainda levemente encravada em seu torso enquanto os observa.
Olho da Noite: “Sabe o que é melhor? Você pensa
que eu sou seu grande algoz, mas não sou. E você
vai morrer sem saber quem é o bastardo
desgraçado que fez de sua vida um inferno.”
Um guerreiro avança contra Zairos, que termina de arrancar a
lança do ombro e a arremessa acertando-a em cheio o peito do
inimigo, que cai de costas com um baque surdo no chão. O
Campeão de Thalderan nota um galho no solo, o mesmo formato
do galho-espada com o qual brincara com seu pai no dia em que
ele foi morto, naquele mesmo local, por aquele mesmo homem.
Ele olha para Olho da Noite parado, confiante alguns passos à
frente, pega a espada improvisada e corre. Com um grande salto,
ele puxa o cotovelo para trás e o aponta, como uma flecha certeira.
Ainda no ar ele atinge o alvo, enterrando profundamente a ponta
do galho no que era o olho saudável de Olho da Noite. O sangue
escorre de sua vista, o galho impiedosamente fincado nele. Cego
dos dois olhos agora, gritando, o assassino da família de Zairos
desaba de joelhos. O Dragão da Tempestade segura a cabeça
daquele que, até então, ele acreditava ser o Imortal e a torce.
Imediatamente após o breve e seco som de um pescoço se
partindo, os gritos cessam. O rosto inerte de Olho da noite, coberto
de sangue, seguido pelo lento desmoronar de seu corpo, se choca
contra o chão. Olho da Noite certamente não é imortal, pois está
morto aos pés de Zairos.
Ele finalmente conseguiu sua vingança, mas enquanto os
furiosos guerreiros da floresta se aproximam em velocidade
vertiginosa, as últimas palavras de seu inimigo ressoam na mente
de Zairos – 'seu grande algoz... não sou... morrer sem saber quem
é...'.”
Morrer não é mais uma opção. Ele pega a lança de Olho da
Noite e combate os incontáveis inimigos. Os guerreiros são muitos
e o cercam por completo, mas com movimentos ágeis e precisos
ele corta e perfura vários deles com as lâminas da lança, sem ser
atingido.
Então a lâmina de um machado perfura as costas de Zairos.
Dor. Ele gira e desfere um golpe mortal na cabeça do inimigo. Um
facão faz um corte em seu braço. Gemido. Ele contra-ataca. Letal
mais uma vez. Uma clava de guerra quebra suas costelas. Ele grita
ao mesmo tempo em que mata seu agressor. Uma espada faz um
novo corte, agora no peito de Zairos. Banhado em sangue, seu
colar, o colar que Orgath lhe dera, cai no gramado. Zairos enfia a
lança no coração do inimigo, mas enfraquecido pelos ferimentos,
cai de joelhos. Atrás dele, um guerreiro, de feição feroz, ergue o
facão para partir-lhe a cabeça no meio.
Uma mancha branca corta o ar. Mandíbulas ferozes rasgam a
garganta do guerreiro. O Lobo Branco rosna para os outros
homens. Um dos guerreiros mira a lança contra a fera, mas grita
quando o Lobo Negro o derruba e dilacera seu pescoço. De um
galho grosso de árvore, acima da fera, uma figura salta sobre o
próximo guerreiro e esmaga seu crânio com um golpe de cajado.
Irmã Lobo olha para os rostos aturdidos dos muitos guerreiros
remanescentes. Seus lobos rosnam a seu lado.
Zairos desaba. Irmã Lobo tira seu manto, revelando seu corpo
envelhecido, mas ainda forte e harmoniosamente delineado, para
colocá-lo dobrado sob a cabeça de seu protegido. Os lobos uivam.
Um chamado. Dezenas e dezenas de lobos surgem da floresta. Eles
cercam os guerreiros assustados. Irmã Lobo lidera sua matilha ao
ataque. Nesse momento, ele não é mais uma velha sacerdotisa
eremita, mas um Dragão da Tempestade de novo. Seus inimigos
caem diante dos golpes de seu cajado e das mandíbulas dos lobos,
que atacam furiosamente por todos os lados. O bastão ágil da
antiga guerreira do Dragão gira veloz, preciso, fatal. Costelas,
mandíbulas e crânios são fraturados a cada movimento. O Lobo
Branco e o Lobo Negro lutam a seu lado, mulher e animal
executando movimentos de combate perfeitamente harmônicos em
uma dança mortal.
Os guerreiros que escapam de seus ataques são interceptados
pelas presas poderosas dos outros lobos que saltam sobre eles,
cravando os dentes afiados em seus braços, pernas e pescoços. O
eventual gemido agudo dos lobos abatidos é abafado pelos seus
rosnados e, principalmente, pelos gritos de desespero e dor dos
lacaios de Olho da Noite. Eles não são páreo para a velha loba e
sua matilha.
MAIS TARDE...
A batalha está terminada. Os olhos de Irmã Lobo procuram por
entre homens e lobos mortos. O lobo branco e o negro caminham a
seu lado. Seus olhos se perdem em antigas lembranças quando
avistam o corpo de Olho da Noite.
LAMPEJOS DE MEMÓRIA
- PERIFERIA DE THALDERAN: Duas meninas, Irmã Lobo e
Lótus de Fogo, correm e brincam de pega-pega, enquanto
carregam bonecas de pano como se fossem seus bebês.
- TEMPLO DE BRUMMATA: Com a cabeça no ombro de
uma jovem Irmã Lobo e lágrimas nos olhos, Lótus de Fogo
amamenta seu bebê, que mantém os olhos fechados. Então ele
dá um sorriso de satisfação e abre seus olhos para olhar para
sua mãe: um olho escuro como a noite, o outro branco como
a lua. Lótus de Fogo entrega seu filho para sua amiga e cai
no chão em um choro copioso. Irmã Lobo abraça com ternura
o bebezinho e beija-o na cabeça.
– FLORESTA: Feigon mostra a Irmã Lobo algumas ervas
medicinais. Ela se distrai ao ver Lótus de Fogo, olhos cheios
de dor e ódio, treinando duro às margens do rio. Olho da
Noite, ainda menino, observa a mãe, que lhe devolve o olhar
com amargura. O menino abaixa os olhos.
– CLAREIRA DO RIO DAS BRUMAS: Os bastões de madeira
se chocam em um duelo amigável. Lótus de Fogo sorri para a
jovem Irmã Lobo ao mesmo tempo em que é atingida por um
golpe no ombro. Instantes depois, o menino Olho da Noite
coloca algumas ervas no ombro machucado da mãe, que olha
zangada para ele. Irmã Lobo olha para ela ainda mais
zangada. Lótus de Fogo abraça seu filho, ambos com os olhos
úmidos. Irmã Lobo une-se aos dois.
– PASSAGEM SUL: Duelo de Dragões. Um jovem Jygar
remove a Garra do Trovão de seu oponente morto: “Lótus de
Fogo, a lança de duas lâminas caída a seu lado. Jygar se
afasta com pesar. O garoto Olho da Noite corre de seu
esconderijo para abraçar a mãe morta, seguido pela Jovem
Irmã Lobo. Jygar observa o menino pegar a lança dela e, com
esforço, arremessá-la contra ele. Ele torce o corpo e se desvia
com facilidade. Olho da Noite o encara com ódio nos olhos.
Mesmo seu olho branco parece fitá-lo, por trás das lágrimas.
Irmã Lobo abraça o menino e olha para Jygar. Os outrora
companheiros Dragões compartilham um olhar de profunda
tristeza.
Dispersando suas lembranças, Irmã Lobo abre lentamente os
olhos tristes enquanto sacode a cabeça e continua sua busca pelo
corpo de Zairos. Ela encontra Zairos estrado no chão, em uma
imobilidade mórbida. Olhos fechados, o rosto e o corpo cobertos
por feridas abertas, banhadas de sangue.
MAIS TARDE...
O sol começa a se por. Jygar, a cavalo, adentra a clareira e vê
inúmeros corpos espalhados por todos os lados.
Jygar: “Desgraça!”
Ele desmonta. Abutres bicam os corpos de homens e lobos
enquanto ele caminha entre eles, procurando por Zairos. O velho
campeão se inclina ao encontrar o corpo de Olho da Noite e um
leve sorriso percorre seus lábios, mas desaparece ao ver o escudo
de Zairos preso em algumas rochas no rio. Quando anda em
direção ao escudo, ele pisa em uma poça de sangue. Algo brilha
dentro dela. Ele se abaixa para verificar. É o colar de Zairos. O
guerreiro baixa a cabeça e cerra os olhos lentamente. Seu punho se
fecha com força, apertando o colar. Uma lágrima desce pelo rosto
de Jygar. O Cardeal Vermelho sobrevoa sua cabeça com assobios
de lamento e plana até o escudo manchado de sangue, onde pousa
em silêncio.
SEMANAS DEPOIS...
CIDADE DE MADAUREA
(D )
Pessoas mortas caídas pelas empoeiradas e largas ruas da
pequena cidade. Feigon e Carvalho Sagrado cuidam dos doentes.
Homens, mulheres e crianças, com suas peles feridas,
descascando, gemem por todos os cantos. Jygar e Serpente das
Sombras os ajudam.
Jygar: “Quando isso começou?”
Serpente das Sombras: “Dez luas atrás. Logo
depois do seu duelo com Olho da Noite.”
Um ancião se aproxima de Serpente das Sombras.
Ancião: “A culpa é sua! De todos vocês.”
Serpente das Sombras abaixa a cabeça. Jygar olha para ele
inquisitivamente.
Ancião: “Um homem branco como você nos
defendendo? O sobrinho de nosso grande
sacerdote se aliando a Axengard? Ghoddrak
amaldiçoou nosso povo!”
Feigon: “Deite aqui agora, ou vou amaldiçoá-lo
pessoalmente. Você está doente. Deixe-me ajudá-
lo.”
O Ancião resmunga algo incompreensível e se deita enquanto
Feigon lhe dá algumas ervas medicinais para mastigar. O
Sacerdote Regente e Serpente das Sombras se entreolham.
Carvalho Sagrado: “Ele está certo. Nosso deus se
virou contra nós. A praga também chegou até
Brummata e meus guerreiros. E Axengard irá se
aproveitar disso e trazer a guerra contra o nosso
povo doente.”
Jygar: “Eles abriram os portões da guerra em
Thalderan, mas não aqui. Eu vou ficar o tempo que
for necessário e deter Axengard como eu sempre
fiz.”
Serpente das Sombras: “Não, é o meu povo. Eu
sou um homem velho, mas ainda sou um Dragão
da Tempestade. Nenhum campeão de Axengard
passará por mim.”
Capítulo 12
D
SETE ANOS DEPOIS...
CEMITÉRIO DE AXENGARD
(N )
Orgath tem as mãos apoiadas sobre a plataforma de granito
negro sobre a qual repousam as cinzas de seu pai e de seu avô.
Atrás dele, o Capitão de Axengard sustenta uma tocha acesa,
enquanto seu general dirige sua fala aos mortos.
Orgath: “Brummata é nossa. Nossos piores
inimigos subjugados e sofrendo pelas mãos do
herdeiro de vocês. É uma pena que vocês não
estejam aqui para compartilhar dessa glória
comigo.”
Ele pega um punhado de cinzas em cada urna e as esfrega no
rosto. Uma lágrima desce fazendo um caminho pelas cinzas
espalhadas em sua face enquanto continua falando com Avernath e
o General Uldresh.
Orgath: “Eu sinto o sangue de vocês em minhas
mãos. Por isso eu lhes devo que a glória de
Axengard se torne eterna. Que suas cinzas tragam
seus espíritos comigo para as Montanhas de Ferro
do Leste, para que testemunhem a conquista da
Nação de Solfira. Então a queda de Thalderan. E
finalmente, o cumprimento da profecia.”
P M
CAMPO DE TREINO DO TEMPLO DOS DRAGÕES
(N )
Na noite escura, sem estrelas, uma tênue garoa se mistura com
o suor que cobre todo o corpo de Jygar. Ele treina incansavelmente
golpeando um boneco de madeira, raiva transbordando a cada
golpe. Sem ser percebido, Feigon o observa com preocupação.
Jygar ergue o escudo com seu braço deficiente. Sua face se
desfigura em dor. Furioso, ele pendura o escudo no boneco e o
golpeia sem parar até quase destruí-lo por completo e a exaustão
tomar conta de seu braço são.
Feigon desembainha sua adaga cerimonial e a joga para Jygar,
que a pega no ar. O velho guerreiro arremessa a adaga com
adornos de dragão. Ela treme ao penetrar perfeitamente no centro
do que restou do escudo.
Feigon: “Uma arma mais leve pode ser útil.”
Os olhos do Dragão da Tempestade mostram sofrimento
enquanto seus lábios se contorcem em um sorriso forçado e ele se
dirige ao velho sacerdote.
Jygar: “Obrigado, velho amigo. Mas você sabe que
isso não será suficiente.”
Feigon: “Não perca a esperança. Você ainda é um
Dragão--”
Jygar: “--aleijado. Pequeno Urso estava em sua
melhor forma e não deteve o campeão de Orgath.”
Feigon: “Sabe? Ainda me lembro do dia em que
encontrei você nas ruas. O coração e alma dos
dragões juntos em uma nobre criança. Cada noite
por um ciclo da lua inteiro, eu vi, em meus sonhos,
como você e uma criança por vir iriam mudar o
mundo. Você e Zairos.”
Jygar: “Infelizmente estamos mudando um mundo
livre para um mundo de escravos. Zairos deu
início à queda dos Dragões da Tempestade e minha
derrota irá selar o fim do nosso legado… E quanto
a Orgath? Você acredita que ele possa ser o
Imortal?”
Feigon: “Fé, Jygar! Você é o ultimo Dragão da
Tempestade. O Deus Dragão não nos abandonará.
Tenha fé!”
PERIFERIA DE THALDERAN
(D )
Ao norte da cidade sagrada, três velhos homens bêbados, um de
cada etnia, garrafas de vinho na mão, caminham cambaleantes e
trôpegos por uma rua larga e quase deserta. Ainda distante, Zairos
galopa na direção deles. Com vozes embriagadas, eles conversam
sem perceber o cavaleiro que se aproxima velozmente.
Homem de Solfira: “Hoje, Thalderan, a única
cidade onde homens das Três Nações podem beber
juntos, irá cair.”
Homem de Axengard: “E nossas esperanças com
ela. O lendário Jygar, com seu braço aleijado, não
vai conseguir vencer o Dragão de Axengard.”
Homem de Brummata: “Vamos fazer um brinde a
nós, os últimos homens livres, na ultima nação
livre, em sua última noite de liberdade.”
Homem de Solfira: “E a Jygar, nosso último
campeão, o último Dragão da Tempestade. Vamos
orar para ele.”
Os três homens fazem um brinde, mas antes que eles bebam, o
som crescente de cascos se chocando contra o chão de pedra os
interrompe. Assustados, eles se afastam uns dos outros. Zairos
passa pelo meio deles com seu cavalo em disparada.
Zairos: “Ele não é o último de nós. Reze por
mim!"
Espantados com suas palavras, os homens mantêm os olhos nas
costas nuas, do guerreiro coberto de cicatrizes, enquanto ele deixa
a cidade, cavalgando a toda velocidade.
I
PASSAGEM NORTE DE THALDERAN
( )
A tempestade pune Orgath e Kaijin, enquanto eles se movem
vagarosamente até os cavalos inquietos.
Kaijin: “General, precisamos procurar abrigo.”
Orgath: “Thalderan será nosso abrigo!”
Quando chegam aos cavalos, uma forte rajada de vento atinge
Orgath e seus homens. Eles contorcem o rosto e tentam cobrir seus
narizes.
Orgath: “Que cheiro infernal é esse?”
Um VELHO SOLDADO se aproxima e aponta para a Caverna do
Dragão, alguns metros à frente e precariamente visível sob a
tempestade, de onde a rajada de vento se originou.
Velho Soldado: “É o Hálito do Dragão. Nós quebramos o
Pacto. O Deus Dragão está vindo atrás de nós.”
Orgath enfia sua adaga no pescoço do Velho Soldado.
Gemendo, o homem cai, se debatendo, até que a vida lhe abandona
por completo.
Orgath: “Chega de lendas sem sentido. Alguém
mais?”
Orgath monta no cavalo agitado. Ele sorri ao notar que a
tempestade diminui um pouco e aponta para frente.
Orgath: “Guerreiros! Para Thalderan… agora!”
Sob a ainda intensa nevasca, Orgath, Kaijin e o exército de
Axengard avançam lentamente em direção à Cidade Sagrada. Uma
luz forte surge nos céus, cegando-os. Eles param quando um
cometa, o mesmo do Festival do Dragão, surge entre as nuvens. Os
soldados se agitam. Alguns cobrem o rosto, outros se encolhem,
uns poucos caem de joelhos. Quando as nuvens esmaecem a luz
novamente, as figuras de um sacerdote e de um guerreiro estão
postadas diante do general e de seus homens. Orgath os reconhece
imediatamente.
Orgath: “Feigon! Jygar! O que estão fazendo? Vão
lutar sozinhos contra meu exército?”
Feigon: “Nós não estamos sozinhos.”
Três relâmpagos cortam o céu, seguidos por três trovões quase
simultâneos.
Feigon: “Você profanou esse solo sagrado, Orgath.
Você sabe quantos Dragões guerreiros estão
enterrados sob seus pés?”
Orgath: “Muitos. Pena que seu deus não pode
trazê-los de volta para lutar por você, sacerdote.”
Feigon: “Eles viveram e morreram pelo Pacto.
Você desonrou a todos eles. Você que é digno de
pena, uma vergonha para seus ancestrais.”
Um relâmpago risca o céu, seguido por um trovão retumbante.
A nevasca se liquefaz em uma chuva, forte e intensa. Orgath
engole em seco. Um ligeiro tremor percorre seu corpo. As nuvens,
que cobriam a lua, se dissipam. É lua cheia. Uma grande e
vermelha lua cheia: a Lua Ancestral!
Vindos de diversos pontos, surgem figuras de vários guerreiros
armados. A chuva fustiga os olhos de Orgath, impedindo-o de
identificá-los. A lua vermelha por trás dos guerreiros mostra
apenas suas silhuetas. O exército de Orgath supera em muitas e
muitas vezes a quantidade de adversários. Ao notar isso, o General
de Axengard respira aliviado. Um sorriso irônico se abre em seu
rosto.
Orgath: “Esses são seus reforços, Feigon? Você
quer me deter com um punhado de homens?”
Jygar: “Eles não são homens, Orgath!”
Orgath o olha de maneira inquisitiva.
Jygar: “Eles são dragões!”
Feigon sorri. Orgath tem um calafrio.
Jygar: “Dragões da Tempestade!”
Raios e trovões! O líder axengardiano estremece por completo,
ofegante. Os guerreiros passam por Feigon e avançam em direção
ao exército de Axengard, cabeças baixas para proteger a face da
chuva, a grande lua rubra por trás deles. Orgath tenta identificar os
guerreiros que aceleram rumo a seu exército. O líder do grupo
levanta a cabeça: Zairos!
Acima do estrondo dos trovões, a voz do velho sacerdote ecoa
nítida e clara pelo ar, enquanto Orgath fita Zairos, banhado pelo
brilho avermelhado da lua, o sangue de Nairon, seu filho ainda
manchando suas mãos.
Feigon: “Sob a Lua Ancestral, com o sangue de
sua própria família nas mãos”
Tatuagens mortuárias sobre o corpo de Zairos e de todos os
seus companheiros: Falcão da Lua, Pequeno Urso, Nairon, Minara.
E também sobre os muitos Campeões do Dragão a seu lado:
Sangir, Wongh, Serpente das Sombras… além de vários outros de
gerações passadas.
Feigon: “Com o sangue de sua própria família nas
mãos…”
A voz do Sumo Sacerdote ecoa mais uma vez acima do som da
tempestade enquanto Zairos conduz seu exército de guerreiros
mortos de volta ao mundo dos vivos.
Feigon: “Ele irá arrastar os Guerreiros do Dragão
pelas portas da morte.”
Ofegante, o general observa Zairos e os Dragões renascidos
marcharem contra o exército Axengardiano para iniciar uma
guerra sem precedentes.
Feigon: “O Imortal irá se erguer para trazer a
guerra derradeira.”
Expressões de horror e desespero surgem no rosto de Orgath
enquanto ele olha para Zairos e sussurra para si mesmo.
Orgath: “A Profecia… não… Zairos… Zairos é o
Imortal!”
O medo toma completamente o rosto dele. Desesperado ele
grita para seus homens.
Orgath: “Acabem com eles! Matem todos eles!”
Chuva e vento fustigam o exército de Axengard. Confusos e
hesitantes, eles começam a avançar. Jygar sorri. Sua voz soa como
um trovão.
Jygar: “Eles não podem matá-los, General. Eles já
estão mortos!”
Os Dragões renascidos correm em direção a Orgath e seus
homens. Estes disparam a toda velocidade contra os lendários
campeões. Um guerreiro enorme – coberto de lama, machado na
mão – emerge do chão diante de Orgath. A chuva lava seu corpo e
revela uma pele alva, coberta por pinturas rúnicas, barba e longos
cabelos desgrenhados. Vallur ergue o lendário Machado Celestial
sobre a cabeça. Assustado, o cavalo de Orgath empina e derruba
seu cavaleiro. O general cai de costas no solo encharcado.
Alguns soldados ficam imobilizados pelo medo, ao assistir aos
Dragões da Tempestade correndo de encontro a eles. Outros
largam as armas e fogem em pânico. Um jovem soldado cai de
joelhos e começa a chorar em desespero. Orgath corre para trás de
seus homens e os incita ao ataque, erguendo seu machado em
direção ao inacreditável e terrível inimigo.
Orgath: “Glória para Axengard!”
O exército de Axengard, em número muito maior, avança como
uma nuvem de gafanhotos contra os Dragões. A batalha começa
espalhando uma fúnebre música feita pelo som das armas se
chocando e pelo murmúrio dos homens lutando pelas suas vidas na
noite tempestuosa.
Pequeno Urso luta contra os muitos soldados que o rodeiam.
Repentinamente, Bestafera aterrissa a seu lado e ruge. Os soldados
em seu entorno ficam estarrecidos, paralisados. Os irmãos
compartilham um sorriso enquanto um martelo e um par de
lâminas matam incansavelmente seus adversários. Sob as bênçãos
de Ghoddrak, o pequeno e o grande urso lutam lado a lado.
Um denso círculo de várias camadas de soldados se fecha em
torno de Zairos, Minara e Nairon. Um movimento coordenado das
tropas de elite do inimigo, que ataca brutalmente por todos os
lados, com todas as suas forças. Inabaláveis, os três Dragões giram
e saltam em perfeito entrosamento uns com os outros. Golpes
precisos, em uma dança rápida e harmoniosa, frenética e mortal,
onde os corpos sem vida de seus inimigos voam destroçados, sem
parar, em todas as direções. A família reunida em uma festa
sangrenta.
A lança de Olho da Noite é removida do chão do campo de
batalha. Ela finalmente retorna às mãos de quem a possuía antes
de Olho da Noite, sua mãe! Lótus de Fogo se une aos outros
Dragões. Vingança e justiça em seu olhar enquanto trucida os
soldados de Axengard.
Vários e vários soldados caem pelos golpes mortais da espada
de Jygar. Ele se prepara para atacar outro grupo, quando vê Kaijin,
um par de machados em mãos, encarando-o. O então Capitão de
Orgath ataca implacavelmente. Jygar recua enquanto se esforça
para defender a ofensiva. Jygar contra-ataca com um forte golpe
cruzado que corta um dos machados de Kaijin. Mas, com as costas
do outro machado, o Dragão renegado atinge a mão de Jygar,
fazendo-o largar a espada. Kaijin ataca novamente. Jygar agarra e
torce seu pulso, desarmando-o.
Com uma joelhada seguida de uma cotovelada na cabeça, o
velho Dragão o derruba. Jygar desembainha a adaga cerimonial
que Feigon lhe dera e salta sobre Kaijin, pronto para lhe esfaquear
o coração.
Jygar: “Me desculpe, meu irmão. Eu tenho de
libertar você de sua loucura.”
Kaijin fecha os olhos, pronto para morrer, mas uma forte mão,
de cor escura, agarra o pulso de Jygar. Ele se vira, pronto para
lutar, mas vê que é Falcão da Lua quem segura seu braço. Jygar
balança a cabeça negativamente e puxa o braço, libertando seu
pulso da mão firme de seu antigo companheiro. Ele então se volta
novamente para o oponente, ainda caído no chão, e é surpreendido
pela visão de uma mulher de pele parda, agachada, cabeça baixa,
com as mãos sobre a testa de Kaijin. Ela está orando, em uma
espécie de ritual de cura. A mulher ergue seu rosto e sorri para
Jygar. A imagem dela é de alguma forma translúcida, mas ele
reconhece seu rosto. Jygar nunca esqueceria aquele sorriso, aquele
que ele esperou a vida toda ver de novo, aquele da mulher que ele
sempre amou. Irmã Lobo aproxima o rosto ao de Jygar. Paralisado
de espanto, ele fecha os olhos enquanto ela beija o homem que ela
também sempre amou. O último beijo, sua última promessa antes
de morrer.
Um som de metais se chocando ecoa quando Falcão da Lua
bloqueia um ataque contra sua cabeça, despertando Jygar. Irmã
Lobo não está mais lá. Confuso, ele larga a adaga e recua alguns
passos. Kaijin abre os olhos. Com espanto, ele vê, ao lado de
Jygar, seu querido irmão Dragão que morrera por suas mãos.
Falcão da Lua olha dentro dos olhos daquele que, sob o efeito do
Hálito do Dragão, tirara sua vida. Olhos que parecem acordar de
um longo transe, mas que repentinamente são tomados por uma
raiva intensa. Kaijin pega a adaga do chão e a lança contra Jygar.
A lâmina gira no ar enquanto se aproxima do rosto dele. A adaga
mata seu alvo, um guerreiro de Axengard prestes a acabar com a
vida de Jygar. Surpreso, este acena com a cabeça, agradecendo ao
amigo que ele perdera há tanto tempo. Falcão da Lua abre um
largo sorriso. As veias verdes nas pálpebras de Kaijin desaparecem
através de lágrimas esverdeadas descendo pelo seu rosto. Falcão
da Lua estende a mão, palma para cima, mostrando a cicatriz do
pacto de irmão, que lhe segura a mão e se levanta.
Kaijin: “Eu sinto tanto, tan--”
Falcão da Lua: “Esqueça o passado. Lute ao meu lado
pela última vez, irmão.”
Kaijin: “Sim! Irmãos Dragões em sua última
batalha.”
Ele tira a capa de capitão, pega seu machado e corre ao lado de
Falcão da Lua de encontro ao exército de Axengard. Ele é, de
novo, um Dragão da Tempestade.
Os soldados de Axengard caem um após o outro, pelas mãos de
Zairos, Minara, Nairon e dos outros Dragões. Orgath incita seus
homens, mas eles não conseguem abater sequer um oponente. O
exército de Axengard ataca com tudo que ainda lhes resta, mas não
é suficiente. Orgath vê inúmeros de seus soldados mortos diante
dele. Seu desespero aumenta. No meio da feroz batalha, ele avista
Zairos caminhando vagarosamente em sua direção.
O aterrorizado general olha em volta, em busca de ajuda de
seus guerreiros, mas os que ainda restam estão ocupados, sendo
massacrados.
O homem aterrorizado olha a seu redor. Ele busca ajuda de seus
Guardas de Elite, mas eles não param de tombar sob as lâminas
gêmeas de outro Dragão da Tempestade que se aproxima: Minara!
Atordoado, ele congela. O tempo parece passar lentamente enquanto
o corpo perfeito dela parece dançar, suave e veloz, em uma terrível
pintura feita de sangue e cadáveres caindo. Ela encara Orgath, antes
mesmo de suas espadas tirarem a vida dos dois últimos guerreiros
que tentavam proteger seu General.
Ele se vira para fugir, mas o pé de Nairon explode em sua
cabeça. Tonto, ele cambaleia. Com um chute circular no estômago,
o jovem guerreiro o faz cuspir um pouco de sangue. Orgath cai,
encolhido no chão, contorcendo-se de dor enquanto Nairon começa
a recitar a oração que costumava rezar pelos seus pais quando
criança.
Nairon: “Para aqueles que nos desafiam...”
Orgath se levanta, mãos sobre o estômago dolorido, quando
Minara embainha suas espadas e em seguida esmaga o rosto do
traidor com uma série interminável de golpes com as palmas das
mãos. O general ruivo cambaleia para trás, o sangue cobrindo-lhe
o rosto.
Minara: “Apenas a fúria das tempestades...”
Pequeno Urso agarra-lhe a garganta, levantando-o do chão,
sufocando-o.
Pequeno Urso: “E a ferocidade dos dragões.”
O vultoso guerreiro o arremessa com violência no solo
enlameado. Apoiado nas mãos e nos joelhos, Orgath vê Zairos se
aproximando. O General nota duas espadas caídas próximas a ele,
as pega e levanta com um desesperado grito de guerra. Ele tenta
atacar. O Dragão da Tempestade golpeia seu cotovelo com a borda
metálica do escudo. Sob a força do impacto, com um estalo, a
articulação quebra no mesmo instante. Orgath grita. Uma fratura
exposta.
Zairos: “Descanse em paz, irmão… no inferno!”
Zairos lhe corta a outra mão e pisa no seu joelho. Nova fratura
exposta. Orgath desmorona. Uma dor insuportável desfigura seu
rosto. Ele coloca o punho decepado debaixo da axila, tentando
parar o sangramento. Tremendo em uma poça vermelha cada vez
maior, herdeiro de Axengard jaz. Com a visão turva pela morte
que se aproxima, ele vê o espírito de Lissa. A voz dela atravessa o
ar, retumbando em seus ouvidos de forma assustadora.
Lissa: “Agora você acredita, Orgath?”
O outrora poderoso General de Axengard se encolhe e grita
horrorizado. Uma voz poderosa ecoa dentro de sua cabeça.
Feigon: “… para esmagar o coração do homem…”
Zairos se junta a Jygar para aniquilar os últimos guerreiros de
Axengard.
Feigon: “… o fim das Três Nações.”
MAIS TARDE...
O sol nasce, banhando a multidão dos soldados massacrados de
Axengard, espalhados sem vida no ensanguentado campo de
batalha. O corvo de Feigon se coça, pousado na ponta do cabo de
uma lança cravada no chão. Sob ela, o corpo do único Guerreiro
Dragão entre os mortos. Kaijin descansa em paz nos braços da
morte, olhos abertos como se olhando para o céu, um sorriso suave
nos lábios manchados de sangue.
L
MUITOS ANOS DEPOIS...
S A
L.S. Reis nasceu no Brasil, em tempos antigos, e vive no Rio de
Janeiro com sua esposa e seu casal de filhos. Além de escritor,
dirige uma empresa de software e é mestre de Kung fu!
Do sucesso de seu mundialmente premiado roteiro de cinema,
Storm Dragons, surge a ideia de um novo estilo literário: o
Cinelivro. Dinâmico e surpreendente, ele coloca o leitor frente a
frente com cada cena da história, em uma imersiva experiência
"cinematográfica", a ser vivenciada com os olhos da imaginação.
Dragões da Tempestade inaugura essa nova forma de escrever
através de uma história também revolucionária, consagrada como
a fantasia épica mais premiada de todos os tempos do mundo dos
roteiros ainda não produzidos, e irá transportá-lo para um mundo
sem igual, onde lenda e realidade se unem em uma trama
surpreendente, transformando sua leitura em uma experiência
única, diferente e inesquecível.
U :
Bem vindo ao final dessa dramática jornada, espero que você tenha vivido
tantas emoções quanto eu senti ao escrever essa saga. E falando em emoções, se
essa leitura tocou seu coração de alguma forma, não deixe de compartilhar com sua
família e amigos o quanto você gostou de caminhar lado a lado com Zairos e os
Dragões da Tempestade. Essa é uma história sobre escolhas e como elas podem
mudar o destino do mundo. Por isso, com uma simples escolha você pode ajudar a
espalhar essa história ainda mais, e fazer com que os ventos da eternidade
continuem soprando sua lenda pelos quatro continentes.
Então, agora é hora de fazer parte dessa história. Ao passar essa última página,
participe avaliando e publicando seus comentários na Amazon, redes sociais e onde
mais você puder.
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