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UFPB - Universidade Federal da Paraíba

Centro de Ciências Jurídicas - DCJ - Santa Rita


Introdução ao Direito I - Profª Ana Lia Almeida
Discentes: Thiago Carvalho de Lima; João Pedro Miguel
de Oliveira; William Paulino Andrade Soares Maia; Vitor Lucas
Jucá Cruz.

Relato de Experiência Jurídica em Consonância com o Texto “O Papel das


Ideologias na Formação do Campo Jurídico”

João Pessoa, 2024


O presente trabalho propõe-se a ser um relato de um grupo de estudantes à
uma audiência presenciada no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) da Paraíba em
João Pessoa, no dia 5 de fevereiro de 2024. Seu foco constituiu-se majoritariamente
na análise de infrações e/ou irregularidades em processos de campanha eleitoral
em 2020 e 2022, tal como sua subsequente punição ou absolvição. Há de se
destacar, por exemplo, o caso do candidato a Deputado Estadual Wellington Silva e
seu inconsistente uso de fundos eleitorais, oferecendo salários variáveis entre 1300
- 5000 reais para funcionários que exerciam a exata mesma função (coordenador de
campanha). Após a análise dos profissionais, foi ordenado o recolhimento de 14900
reais ao candidato.
O objetivo deste trabalho, no entanto, não limita-se apenas à apresentação
expositiva do conteúdo da audiência, mas sim à uma análise da experiência em
conexão com o texto “O Papel das Ideologias na Formação do Campo Jurídico”,
escrito pela professora Ana Lia Almeida. A docente trabalha em sua dissertação a
tese de que o meio jurídico, tal qual o direito em si, é elitizado e dispõe da ideologia
para a manutenção de seu status, seus privilégios. É de suma importância destacar
que a palavra “ideologia” corriqueiramente tem um sentido pejorativo em seu uso
popular, dando a ideia de uma análise imprecisa e enviesada da realidade. Esse
pensamento não leva em consideração que nenhum indivíduo ou grupo é imparcial,
livre de ideologia e isso não necessariamente constitui um problema; Afinal, uma
análise que se propõe a ser totalmente “livre de viés”, via de regra, está fadada a
permanecer no limiar da mediocridade.
A elitização do campo jurídico citada no texto é de fácil percepção ao entrar
em um ambiente como o que foi visitado. Todos os integrantes do grupo, apesar de
uma falta de familiaridade com tais ambientes jurídicos que dispõem de exacerbada
formalidade, tinham plena consciência do tipo de roupa a ser usada, da linguagem,
da postura, etc. Isso advém da adequação normativa do espaço visitado, comum a
todos dentro do meio, o que acaba por gerar uma dicotomia: todos podem estar
naquele ambiente e presenciar a audiência, porém uma minoria do povo se sentiria
pertencente àquilo. É impossível não notar a tamanha discrepância de abordagem
da corte em momentos distintos; No intervalo as conversas eram tão informais como
as de qualquer cidadão: futebol, assuntos cotidianos e até palavras de baixo calão
eram proferidas, já quando se dá o prosseguimento da audiência, a formalidade
predomina e os termos do campo jurídico tem seu livre passe para circular.
Isso caracteriza-se como uma evocação do “homo juridicus” (homem jurídico
no latim), um ser possuído de um formalismo exacerbado que, sob influência do
juspositivismo (pensamento dominante no campo jurídico brasileiro) atualmente, só
se preocupa com a letra da lei, na tentativa de ser o mais “imparcial” possível. Tal
descrição vai de encontro com a abordagem do texto analisado, no qual a
professora afirma que o direito ocidental moderno, com base nos interesses
burgueses dos séculos XVIII e XIX, possui como uma de suas características a
busca pela impessoalidade como tentativa de neutralizar os juízos de valor.
Contudo, o revés desse pensamento está no próprio conteúdo, tendo em
vista que a “imparcialidade” do campo jurídico científico também é construída com
ideologia, pois o método não afasta a ciência da ideologia, apenas a formaliza,
tendo em vista que, como citado no texto analisado, os processos de consciência se
relacionam dialeticamente com uma base material.
Outro fator importante na caracterização do Direito como uma área elitizada e
conservadora é a falta de diversidade. Tomando por exemplo a audiência abordada
neste trabalho, a corte constituída por diferentes profissionais era formada quase
que em totalidade por pessoas brancas, sendo dos 10 profissionais presentes, 7
homens e apenas 3 mulheres.
Segundo um dos filósofos mencionados no texto, István Mészáros (filósofo
marxista húngaro), é possível identificar 3 posições ideológicas fundamentais para
compreender a realidade social: a primeira visa a manutenção da ordem,
apoiando-a incondicionalmente de forma acrítica, a segunda entende os problemas
sociais e critica o “status quo”, porém apenas visa sua reforma pois, nas palavras do
próprio Mészáros “sua crítica é viciada pelas contradições de sua própria posição
social – igualmente determinada pela classe, ainda que seja historicamente mais
evoluída”, a terceira visa um rompimento revolucionário, propondo a superação da
ordem. Pelo exposto, é possível identificar que o Direito encontra-se
majoritariamente alinhado com a primeira posição, fazendo uso da ideologia para
manter seu status atual e seus privilégios, corroborando para um ambiente elitizado
e com pouca diversidade.
As outras duas posições fazem-se presentes em uma escala mínima no
Direito pelo seu caráter transformador, sendo também ideológicas, pois a ideologia
encontra-se presente independentemente do posicionamento. As ideologias
colaboram, por exemplo, para a construção de uma análise mais crítica da
sociedade na aplicação da lei. A professora Ana Lia aponta justamente essa
abordagem no seu texto ao evidenciar que as ideologias não podem ser enxergadas
apenas como algo que está limitado ao campo cognitivo da razão humana, mas
essa atividade reflexiva é oriunda de fatos, problemas sociais complexos existentes
que corroboram para o desenvolvimento de ideias que procuram entender as raízes
do problema e a suas possíveis soluções.
Em suma, essa experiência mostrou-se muito importante para nós discentes.
Fomos capazes de entender e nos habituar mais ao meio que estudamos, nos fez
observar seus padrões, convenções, contradições, falhas, injustiças e
principalmente, nos fez ter uma análise crítica dele para que não nos tornemos
pessoas e profissionais acomodados, satisfeitos com a situação vigente.

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