Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE DIREITO
GRADUAÇÃO EM DIREITO
ESCRIVÃO FILHO, Antônio Sérgio, SOUSA JUNIOR, José Geraldo de. Para um Debate
Teórico-Conceitual e Político sobre os Direitos Humanos. Belo Horizonte: Editora D`Plácido,
2016.
Esta resenha aborda o Cap VII do livro acima, sob o título “Reforma do Ensino
Jurídico e Direitos Humanos”. Neste capítulo, os autores relatam que durante a década de
1990 o ensino jurídico começou a ser amplamente questionado no que se refere ao seu
distanciamento da realidade social no contexto nacional, tornando juristas e profissionais do
direito, indivíduos com suas visões limitadas ao conhecimento positivista e abstrato do direito
tradicional então vigente no meio acadêmico.
Essa nova perspectiva vem ao encontro dos ideais preconizados pelo Direito Achado
na Rua, por Roberto Lyra Filho, no sentido de que o direito ensinado nos meios acadêmicos é
errado, pois sem a articulação do conhecimento teórico com as condições sociais fáticas,
coloca-se o direito num campo isolado no mundo das ciências, sem poder projetá-lo no
mundo real e sem uma razão de ser.
Ao mesmo tempo em que essas diretrizes também se aproximam aos agentes públicos
legislativos, em pesquisas, seminários e debates promovidos pelo Ministério da Justiça e com
a contribuição das assessorias jurídicas de movimentos sociais no sentido de elaborar políticas
públicas voltadas para a valorização dos direitos humanos e em consonância com a realidade
social das comunidades.
Neste viés, o autor cita e analisa vários autores como Anatole France, Victor Hugo,
João Mangabeira e Gerivaldo Neiva para embasar a tese de que é preciso estender a função
social na aplicação da jurisdição por parte dos juízes, com sensibilidade e reconhecimento à
realidade social e à necessidade de atendimento aos direitos humanos, como no exemplo do
Projeto Justiça Comunitária, inicialmente itinerante, que instituiu no Tribunal de Justiça do
DF uma proposta de justiça emancipatória, sendo reconhecido e premiado pela suas ações de
democratização do acesso à justiça por meio da iniciativa da conciliação como forma de
resolver grande parte dos litígios.
Por fim, o autor finaliza o texto analisa em breves dizeres sobre o projeto do Direito
Achado na Rua, que dentro tem por objetivo aproximar a construção do conhecimento
jurídico e sua aplicação aos movimentos sociais emergentes, no entendimento que o direito
deve ser modelo de libertação de minorias e oprimidos, tornando-o mais democrático e social.
3
Nessa proposta, Roberto Lyra Filho pressupõe que não basta o pesquisador utilizar-se
dos conceitos e das hipóteses de trabalho apenas para justificar ou substituir uma visão
predefinida do fenômeno pesquisado, e sim que deve haver uma colaboração da sociologia e
da filosofia nos estudos da todo e da parte que o compõe, numa dialética constante a fim de
“encontrar a essência deste na própria cadeia das transformações, no próprio vir-a-ser
jurídico, expresso em fenômenos e dentro do mundo histórico e social” (p.07).
Nesse mesmo diapasão, a Nova Escola Jurídica Brasileira, designada por Lyra Filho
de NAIR, constitui-se de um grupo de produtores intelectuais independentes das amarras de
ideologias, ou dogmas aprisionadores e preconceituosos, no qual utiliza-se da abordagem
filosófica, sociológica e jurídica para a pesquisa em Direito em constante evolução, portanto,
nunca se finaliza o debate, mantendo a dialética epistemiológica e ontológica das questões.
Logicamente a NAIR assimila influências libertadoras e revolucionárias, apresentadas nos
4
pensamentos de Engels, Marx e Rosa de Luxemburgo, sem vestir as vestes de suas correntes
doutrinárias.
A NAIR nega a forma com se realiza o Direito Positivista atual e preconizado ainda no
ensino jurídico tradicional, que apresenta inversões, contradições, autoritarismo e
coercitividade ainda preconizado nas Faculdades. O normativismo estatal é autoritário a partir
do momento que não houve uma revolução que o investiu de poder normatizador e
sancionador. Também é contraditório no momento em que algumas normas compões o
Direito afirmando que a norma estatal não é o Direito verdadeiro, como no exemplo, citado
pelo conferencista, do Estatuto da OAB que fundamenta o direito de advogar no
reconhecimento da “injustiça da lei” (p.13).
A NAIR não é apenas crítica, ela também é propositiva e renovadora, onde não apenas
se enquadra no positivismo e nem no jusnaturalismo, por meio de cinco proposições: a de que
o Direito é libertador, pois dá livre condição de desenvolvimento do conjunto; que essa
liberdade consciente reflete a dialética dos grupos antagônicos e produz a verdadeira Justiça;
que a legitimidade das normas estão amparados no vetor histórico das sociedades realmente
livres, isso se chama direitos humanos; que o processo de liberdade não pode ser totalmente
controlado por um calhamaço de normas aprisionadoras e limitadoras do Direito e nem pode
estar sob a égide de tutores que determinam e delimitam essa liberdade dentro de uma área
que lhes interessam; e que a positivação oriunda da dialética jurídica proposta não ficará
trancada numa ordem social e seu direito positivo.
O Direito real e concreto é aquele advindo dos anseios de um povo que o substancia
em norma, e não o contrário, fazendo com o Estado seja influenciado pela liberdade
conscientizada daquele povo. Este Direito é libertador e tem pluralidade jurídica.
5
De tal sorte, o progresso nunca pode ser efetuado dentro da ordem instituída,
mas segundo o processo que a condena à perecebilidade social, tanto quanto
o processo da vida humana também nos condena à perecibilidade biológica –
e até com a mesma ressalva à Lavoisier, de que nada se perde, nem se cria,
senão que tudo se transforma. (p. 26).
O Estado não pode ser o único dono do Direito, afinal a busca da felicidade pessoal
não depende dele, por isso as concepções socialistas de pensadores como Marx e Engels,
podem recuperar a dignidade do Direito e da política.