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Índice

Introdução ......................................................................................................................... 4

1. Objectivos.................................................................................................................. 5

1.1. Objectivos gerais ................................................................................................... 5

1.2. Objectivos específicos ........................................................................................... 5

2. ELEMENTOS ESSÊNCIAS do NEGÓCIO JURÍDICO.......................................... 5

2.1. Conceito do negócio jurídico................................................................................. 5

3. Elementos do negócio jurídico .................................................................................. 7

3.1. Elemento essencial ................................................................................................ 7

3.2. Forma ad solenitatem ............................................................................................ 9

3.3. Forma ad probationem tantum ............................................................................... 9

3.4. Sujeito .................................................................................................................. 10

3.5. Objecto ................................................................................................................ 11

3.6. Objecto materialmente existente (vontade e, para alguns, idoneidade do objecto)


11

4. Classificação do negócio jurídico ........................................................................... 12

5. Interpretação do negócio jurídico ............................................................................ 14

6. A forma dos negócios jurídicos: declaração e comportamento............................... 15

Conclusão ....................................................................................................................... 20

Referencias Bibliográficas .............................................................................................. 21

Legislação ....................................................................................................................... 21

Manuais .......................................................................................................................... 21
4

Introdução

O estudo do negócio jurídico é um dos pontos notório do Direito Civil, já que


consubstancia a essência da relação entre indivíduos em um sistema jurídico. Mas, antes
de estudá-lo especificamente, é preciso contextualizá-lo no mundo dos factos.

De todos os acontecimentos da vida social, há os fatos jurídicos lato sensu e os fatos


não jurídicos. Aqueles geram potencialmente efeitos jurídicos, criando, extinguindo ou
modificando direitos, ao passo que estes são indiferentes ao mundo jurídico. Assim, a
ocorrência de uma chuva é, em tese, um fato não jurídico. Mas, se uma determinada
chuva causar inundações e destruição de propriedades, ela torna-se relevante aos olhos
do Direito e, portanto, um fato jurídico lato sensu.

Assim, o conceito de fato jurídico lato sensu é o acontecimento, natural ou humano, que
é apto a adquirir, resguardar, modificar ou extinguir relações jurídicas. Este é o conceito
tradicionalista. A doutrina mais moderna, entretanto, percebe que há fatos que são
relevantes ao ordenamento jurídico, mas que podem jamais produzir quaisquer efeitos.
É o caso de um testamento: havendo revogação ou falecimento do beneficiário antes do
doador, ele pode jamais produzir efeitos. Por isso, a doutrina moderna entende que a
produção de efeitos não é o aspecto mais importante ao conceito, mas sim a
potencialidade de produção de efeitos. Por isso, para esta corrente, fato jurídico em
sentido amplo é aquele acontecimento capaz de adquirir, modificar, resguardar ou
extinguir situações jurídicas concretas, tendo potencialidade de produzir tais efeitos.

O fato jurídico lato sensu pode derivar de um acontecimento natural (fato natural) ou da
vontade humana (fato voluntário ou ato jurídico lato sensu).

Os fatos voluntários, por sua vez, podem ser lícitos ou ilícitos. Os actos ilícitos
constituem o principal campo de estudo da Responsabilidade Civil.

Finalmente, os atos lícitos podem constituir-se ato jurídico stricto sensu ou negócio
jurídico.

No presente estudo, trataremos do negócio jurídico, apontando as suas principais


diferenças em relação ao ato jurídico.
5

1. Objectivos

1.1. Objectivos gerais

O presente trabalho discorre sobre os aspectos gerais dos negócios jurídicos, abordando
seus elementos, algumas de suas principais classificações e as teorias a respeito da
interpretação dos negócios jurídicos.

1.2. Objectivos específicos

 Negócio jurídico;
 Elementos do negócio jurídico;
 Interpretação do negócio jurídico.

2. ELEMENTOS ESSÊNCIAS do NEGÓCIO JURÍDICO

2.1. Conceito do negócio jurídico

De acordo com Santoro Passarelli, (pág. 272) explica que “O negócio jurídico é um acto
de uma vontade autorizada pelo ordenamento jurídico para perseguir um fim próprio.
Mais especificamente o negócio jurídico é um ato de autonomia privada, encaminhada a
um fim que o da declaração conduz à solução diversa no trato dos problemas dos vícios
do consentimento e determina orientação diferente na interpretação dos negócios
jurídicos.

Continua Santo Passarelli, A teoria da vontade centra-se na autonomia da vontade como


elemento fundamental para definição de validade de determinado negócio jurídico. Isso
significa que a validade dos negócios depende de requisitos formais e de uma
manifestação de vontade em consonância com as representações mentais do agente.

Essa teoria estabelece que a manifestação da vontade é um fenómeno individual, ligada


que está a uma vontade psicológica, e não a uma manifestação social objectiva.

A teoria da declaração como um entendimento da noção do negócio jurídico, é mais


próxima de uma ideologia intervencionista, calcada em valores de ordem ético-social
como a confiança, a solidariedade e a cooperação1.

1
Teoria que, em nossa visão, prevalece na actual codificação. Razão por que Miguel Reale explica que
um dos princípios ordenadores da actual codificação é a socialidade, a qual deve ser compreendida como
6

Neste caso, a teoria da declaração, partindo do referencial de que os negócios jurídicos


não encontram sua validade e eficácia apenas na vontade individual2, princípios como o
da boa-fé objectiva, da vedação à onerosidade excessiva e à lesão, e da função social
dos contractos, ganha contornos mais efectivos de aplicação.

Ainda realça (Miguel Realle), A teoria da declaração, por sua vez, transpassa os
aspectos da subjectividade relativos à vontade individual, pois entende que o negócio é
acto comunicativo e social resultante de uma vontade declarada, logo, é uma estrutura
normativa objectivamente colocada; uma declaração preceptiva que ganha relevância
jurídica.

Após as análises dada acima preferimos alocar as seguintes noções do negócio jurídico.

Após as divergências o grupo preferiu destacar a seguinte noção, negócio jurídico e todo
facto jurídico que consiste em uma declaração de vontade a qual o ordenamento jurídico
atribuirá os efeitos designados como desejados, desde que sejam respeitados os
pressupostos da existência, os requisitos de validade e os factores de eficácia (impostos
pelas normas jurídica).

Como alude Orlando Gomes, “é através dos negócios jurídicos que os particulares auto-
regulam seus interesses, estatuindo as regras a que voluntariamente quiseram subordinar
o próprio comportamento”3.

Ainda continua Gomes, o negócio jurídico representa o poder atribuído à vontade de


constituir, modificar ou extinguir uma situação jurídica. Os negócios jurídicos são,
portanto, uma expressão da autonomia privada voltada para fins socialmente úteis e
juridicamente regulados e protegidos pela ordem jurídica.

uma forma de tentar “superar o manifesto carácter individualista”. Novo código civil brasileiro: estudo
comparativo com o código de 1916. São Paulo: revista dos Tribunais, (2002, pág. 13).
2
Artigo 217.º do código civil
Declaração expressa e declaração tácita
1. A declaração negocial pode ser expressa ou tácita: é expressa, quando feita por palavras, escrito ou
qualquer outro meio directo de manifestação da vontade, e tácita, quando se deduz de factos que, com
toda a probabilidade, a revelam.
2. O carácter formal da declaração não impede que ela seja emitida tacitamente, desde que a forma tenha
sido observada quanto aos factos de que a declaração se deduz.
3
Gomes, Orlando. (2001). Introdução ao direito civil. (18a. Ed.) Rio de Janeiro: Forense, pág. 264.
7

3. Elementos do negócio jurídico

A semelhança entre ato jurídico stricto sensu e negócio jurídico é que ambos resultam
da vontade humana. A principal diferença entre os institutos está nos efeitos: os efeitos
do ato jurídico stricto sensu são ex lege (resultam da lei), ao passo que os efeitos do
negócio jurídico são ex voluntate (resultam da vontade). Pode-se também afirmar que,
no ato jurídico stricto sensu, há liberdade de iniciativa, enquanto no negócio jurídico há
liberdade de iniciativa e de regulamentação. Como exemplos de ato jurídico stricto
sensu, temos a fixação do domicílio voluntário, o reconhecimento voluntário de
paternidade e a aceitação e renúncia à herança. Por outro lado, os contractos (mesmo os
típicos), o testamento e a promessa de recompensa são exemplos de negócio jurídico.

Os elementos dos negócios jurídicos podem ser essenciais:

 Essenciais;
 Naturais ou acidentais.

3.1. Elemento essencial

Os elementos essenciais dividem-se em elementos de existência e elementos de


validade.

Os elementos de existência do negócio jurídico são: sujeito, objecto materialmente


existente, vontade e, para alguns, idoneidade do objecto.

Os elementos essenciais gerais de validade são: agente capaz; objecto lícito, possível,
determinado ou determinável; forma prescrita ou não defesa em lei (artigo 104 do
Código Civil); ausência de defeitos do negócio jurídico (erro, dolo, coacção, estado de
perigo, lesão e fraude contra credores); ausência dos casos de nulidade do negócio
(artigos 166 e 167 do Código Civil) e legitimação.

Para Gomes, o objecto lícito, possível e determinado ou determinável, como elemento


essencial de validade (artigo 104, II, do Código Civil), é o objecto material (a coisa).
Seriam exemplos os entorpecentes e as armas proibidas. No entanto, a doutrina
majoritária entende que esse dispositivo se refere ao objecto jurídico (conteúdo
resultante da vontade). A simples análise do objecto material é insuficiente para
constatar a validade do negócio jurídico. Assim é que, confrontados os exemplos dados,
é possível afirmar que o Poder Público pode realizar contrato de transporte de
8

substância entorpecente; as Forças Armadas podem firmar contrato de aquisição de


armas.

Pereira acredita que não há diferença entre o objecto ilícito e o objecto juridicamente
impossível, já que as expressões são sinónimas. Porém, a doutrina majoritária enxerga
diferenças entre os termos, com fundamento na redacção do art. 883 do Código Civil.
Além disso, o legislador distingue a condição juridicamente impossível (art. 123, I, do
Código Civil) da condição ilícita (art. 123, II, do Código Civil).

A consequência prática dessa distinção é que o negócio celebrado com objecto ilícito
gera efeitos jurídicos vinculados à ilicitude. Por exemplo: se um sujeito contrata outrem
para prática de homicídio, o contrato celebrado gerará efeitos jurídicos, tais como a
responsabilidade penal. Mas, o negócio celebrado com objecto juridicamente impossível
não gera consequências jurídicas em decorrência de vedação legal. Por exemplo: o
contrato envolvendo herança de pessoa viva (art. 426 do Código Civil). Dessa forma,
pode-se afirmar que o objecto ilícito é uma ofensa mais grave ao ordenamento do que o
objecto juridicamente impossível. Na ilicitude, há consequências jurídicas indesejáveis.
Na impossibilidade jurídica, o ordenamento ignora o negócio.

Para que um negócio seja válido, deve-se ainda observar a forma prescrita ou não defesa
em lei. A forma do negócio é meio pelo qual se exterioriza a vontade. Em Moçambique,
ela é presumidamente livre (artigos 219.º, a 223, do Código Civil)4.

Artigo 238.º Negócios formais, 1. Nos negócios formais não pode a declaração valer
com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo
documento, ainda que imperfeitamente expresso. 2. Esse sentido pode, todavia, valer, se
corresponder à vontade real das partes e as razões determinantes da forma do negócio se
não opuserem a essa validade.

Para que um negócio seja válido, deve-se ainda observar a forma prescrita ou não defesa
em lei. A forma do negócio é meio pelo qual se exterioriza a vontade. No Brasil, ela é
presumidamente livre (artigos 104, III, e 107, do Código Civil).

4
Artigo 219.º
Liberdade de forma
A validade da declaração negocial não depende da observância de forma especial, salvo quando a lei a
exigir.
9

A forma pode ser ad solenitatem – forma é solenidade essencial à prática do ato, como
no caso do art. 108 do Código Civil – ou ad probationem tantum – forma é exigida
apenas como instrumento probatório, como no exemplo do art. 227 do Código Civil.

É possível apresentar as principais diferenças entre as formas ad solenitatem e ad

probationem tantum da seguinte forma:

3.2. Forma ad solenitatem

Não é passível de suprimento;

Sua inobservância gera nulidade absoluta. Não é cabível a convalidação do ato;

É um requisito essencial de validade.

3.3. Forma ad probationem tantum

Pode ser suprida por confissão, revelia ou ausência de impugnação;

O escrito posterior produz efeitos ex tunc, convalidando o acto desde a origem;

É mero mecanismo de instrumento probatório.

Normalmente, a forma ad solenitatem é criada por disposição legal, mas o princípio da


autonomia privada também pode criar forma ad solenitatem (art. 109 do Código Civil).

Há, por fim, a legitimação, que não se confunde com impedimento, pois a legitimação é
episódica, pontual, casuística.
Os elementos essenciais específicos de validade são aqueles elementos que se impõem
para determinado negócio jurídico, mas não são exigidos genericamente. Exemplo
clássico da doutrina: a compra e venda têm como elementos essenciais específicos de
validade a coisa, o preço e o consenso (art. 482 do Código Civil).

Os elementos naturais resultam espontaneamente da celebração do negócio,


independentemente de previsão contratual, como os vícios redibitórios e a evicção.

No silêncio do contrato, os elementos naturais aplicam-se aos negócios jurídicos, mas as


partes podem afastar sua incidência. São exemplos nessa manifestação de vontade o art.
448 do Código Civil (evicção) e a cláusula “no estado em que se encontra” no caso dos
vícios redibitórios. No entanto, nos contratos consumistas e nos contratos de adesão (art.
10

424 do Código Civil), há uma mitigação dessa liberdade das partes para afastamento
dos elementos naturais.

Por fim, os elementos acidentais são a condição, o termo e o encargo, que serão objecto
de análise aprofundada em outra oportunidade.

Há uma controvérsia antiga, envolvendo casualistas e não casualistas, que consiste em


determinar se a causa seria elemento essencial do negócio jurídico. O Código Civil de
2002 não contemplou a causa como elemento essencial do negócio jurídico, mas ela tem
um papel determinante: ela é usada para tipificar o contrato.

Isso porque a causa representa os efeitos mínimos e indispensáveis à caracterização de


determinado tipo negocial. Assim é que a gratuidade é causa do comodato (se num
contrato intitulado de comodato, houver cláusulas com menção a pagamento, não há
comodato), o dever de guarda é causa do contrato de depósito (a jurisprudência costuma
rejeitar cláusulas de isenção de responsabilidade por objectos deixados no interior dos
veículos em estacionamentos).

Em regra, as partes podem modular os efeitos dos contratos, com base no princípio da
autonomia privada. Mas há limites para essa liberdade de modulação, já que uma vez
alterada a sua causa, a própria tipificação da espécie contratual fica comprometida.

Por fim, é mister que se diferencie motivo de causa. O motivo são as razões subjectivas
que levam alguém a praticar determinado negócio. Assim, se alguém vende um carro
para comprar um imóvel, o motivo do contrato de compra e venda do carro é a compra
de um imóvel. Em regra, o motivo não tem relevância jurídica, há algumas excepções
legais (artigos 137, 140 e 166, III, do Código Civil).

3.4. Sujeito

Em primeiro lugar, deve haver um sujeito. A ausência de sujeito torna o negócio


jurídico inexistente. Assim, uma conta-corrente fantasma é um negócio inexistente por
ausência de sujeito.

Para melhor entendimento o grupo preferiu salientar acerca dos sujeitos com o artigo
66.o e o artigo 67.o, ambos do código civil5.

5
Artigo 66.º
Começo da personalidade
11

3.5. Objecto

Não querendo abster-se do código civil, o grupo aludiu as noções previstas no código
civil, no seu artigo 202.º.6

3.6. Objecto materialmente existente (vontade e, para alguns, idoneidade do


objecto)

Além disso, o objecto deve ser materialmente existente. O próprio ordenamento jurídico
apresenta algumas excepções: artigo 212.o (contracto aleatório) e artigo 211.o (compra e
venda de coisa futura) do Código Civil7.
Por fim, não se exige que a vontade seja livre, mas apenas que haja vontade. Na coacção
moral, há anulabilidade, porque há manifestação de vontade, apesar de viciada. Já na
coacção física, não há manifestação de vontade, acarretando a inexistência do negócio.

Gonçalves & Amaral defendem, (2010, 2003) ainda, a existência da idoneidade do


objecto como um elemento essencial de existência. Este seria o caso da hipoteca de bem
móvel, ressalvadas as excepções legais (navios, aeronaves), que é um negócio jurídico
inexistente, já que bem móvel não é bem idóneo para a hipoteca.

1. A personalidade adquire-se no momento do nascimento completo e com vida.


2. Os direitos que a lei reconhece aos nascituros dependem do seu nascimento.
Artigo 67.º
Capacidade jurídica
As pessoas podem ser sujeitos de quaisquer relações jurídicas, salvo disposição legal em contrário: nisto
consiste a sua capacidade jurídica.
6
Artigo 202.º Noção
1. Diz-se coisa tudo aquilo que pode ser objecto de relações jurídicas.
2. Consideram-se, porém, fora do comércio todas as coisas que não podem ser objecto de direitos
privados, tais como as que se encontram no domínio público e as que são, por sua natureza, insusceptíveis
de apropriação individual.
7
Artigo 211.º
Coisas futuras
São coisas futuras as que não estão em poder do disponente, ou a que este não tem direito, ao tempo da
declaração negocial.
Artigo 212.º
Frutos
1. Diz-se fruto de uma coisa tudo oque ela produz periodicamente, sem prejuízo da sua substância.
2. Os frutos são naturais ou civis; dizem-se naturais os que provêm directamente da coisa, e civis as
rendas ou interesses que a coisa
produz em consequência de uma relação jurídica.
3. Consideram-se frutos das universalidades de animais as crias não destinadas à substituição das cabeças
que por qualquer causa
vierem a faltar, os despojos, e todos os proventos auferidos, ainda que a título eventual.
12

É preciso, no entanto, observar que a idoneidade do objecto pode ser enquadrada no


plano de validade do negócio jurídico (objecto juridicamente possível), e não no plano
de existência. O objecto existe materialmente, mas não juridicamente.

4. Classificação do negócio jurídico

Há inúmeras formas de classificar o negócio jurídico. No entanto, em razão do objectivo


deste trabalho e da maneira abundante com que já foram tratadas pela doutrina, as
classificações clássicas (inter vivos x mortis causa, unilateral x bilateral) não serão
analisadas no presente trabalho, mas apenas algumas das classificações mais
contemporâneas.

Em primeiro lugar, o negócio pode ser fiduciário ou indirecto. No negócio fiduciário, as


partes se utilizam de um tipo contratual de efeitos mais amplos do que o tipo
usualmente adoptado para o atingimento de determinado fim. O exemplo típico é a
alienação fiduciária em garantia (a propriedade é transferida com escopo de mera
garantia). A cessão fiduciária de crédito, prevista no art. 66-B da Lei nº 4.728/65,
também é um exemplo (a cessão de crédito tem escopo de garantia).

Tepedino, apresenta o seguinte exemplo: se um empresário necessita de alguém para


exercer a administração de sua empresa enquanto está ausente, mas possui empregados
muito resistentes à autoridade de um mandatário, pode haver a celebração de uma
compra e venda resolúvel da sociedade que tem por escopo a mera transferência dos
poderes de administração (ao invés de celebração de contrato de mandato).

Rizzardo ressalta que, no negócio fiduciário, o meio excede o fim.

No negócio indirecto, ocorre o contrário: as partes se utilizam de um tipo negocial de


efeitos mais restritos do que o tipo usualmente adoptado para o atingimento de
determinado fim. O exemplo típico é o mandato em causa própria (art. 685 do Código
Civil). A sua causa é a transferência de propriedade, e não a transferência dos poderes
de administração. Logo, não se lhe aplica as características típicas do mandato: o
mandatário é dispensado de prestar contas e o mandato em causa própria é justo título,
possibilitando a usucapião ordinária.

Essas duas espécies de contrato são diferentes do contrato simulado. Na simulação,


aquilo que as partes declaram não corresponde à realidade. Há uma divergência
intencional entre o que se pretende e o que se declara. No negócio fiduciário e no
13

negócio indirecto, aquilo que se declara corresponde à realidade. O princípio da


autonomia privada modula os efeitos típicos do negócio jurídico.

O negócio pode ser também gratuito ou oneroso. A doutrina, de forma predominante,


entendia que a doação com encargo era negócio gratuito, porque o negócio só é oneroso
se houver contraprestações recíprocas. O encargo não tem natureza jurídica de
contraprestação, mas sim de elemento acidental do negócio jurídico. Apesar de esse
entendimento ainda ser predominante na doutrina, o Código Civil do 2002 prevê a
figura da doação onerosa (artigos 441, parágrafo único, e 562), o que é objecto de crítica
por parte da doutrina.

Os negócios jurídicos que podem ser tanto gratuitos como onerosos são chamados de
negócios bifrontes. Exemplos: mandato, depósito e mútuo.
Gonçalves entende que existe uma quarta espécie de negócio, além de gratuito, oneroso
e bifronte: os negócios neutros, que são aqueles desprovidos de atribuição patrimonial,
nos quais se estabelece a destinação de bens. Os exemplos seriam as cláusulas de
inalienabilidade, de impenhorabilidade e de incomunicabilidade, e a instituição do bem
da família voluntário. Esse entendimento é criticável porque esses exemplos não
configuram negócio jurídico, mas sim ato jurídico stricto sensu, já que os seus efeitos
decorrem da lei.

Há, ainda, os negócios conexos (ou coligados). Neles, há um nexo económico unitário
entre dois ou mais negócios jurídicos, ou seja, há uma relação de interdependência entre
negócios jurídicos. O exemplo mais usual na prática é aquele do sujeito que celebra um
contrato de mútuo com instituição financeira vinculada à concessionária de veículos e
um contrato de compra e venda do carro com a própria concessionária. Nesse caso, o
vício no contrato de compra e venda pode contaminar o contrato de mútuo (que em tese
não possui vício), de forma a possibilitar ao consumidor a realização do seu direito de
exigir a resolução do contrato, após o período de 30 dias previsto no Código de Defesa
do Consumidor.

Assim, nessas hipóteses, é possível a superação do princípio da relatividade: o


inadimplemento contratual por um dos integrantes do grupo contratual tem o condão de
atingir os demais.
14

5. Interpretação do negócio jurídico

A interpretação dos negócios jurídicos é usada nos casos em que há divergência entre a
vontade declarada e a vontade interna.

A primeira teoria a respeito da interpretação dos negócios jurídicos foi a teoria da


vontade, idealizada por (Friedrich Carl Von Savigny), segundo a qual prevalece a
vontade interna. Esta teoria prevalecia na época em que a autonomia privada era um
valor absoluto, razão pela qual o ordenamento jurídico devia proteger a vontade do
sujeito.

Contudo, essa teoria trazia uma grande insegurança jurídica. Então, como contrapartida,
surgiu a teoria da declaração, segundo a qual prevalece a vontade declarada.

O art. 112 do Código Civil aparentemente adoptou a teoria da vontade, mas uma análise
mais atenta mostra que a intenção do declarante deve ser analisada com base nas
declarações (“nelas consubstanciada”). Assim, a tendência da doutrina é preconizar que
o dispositivo segue a teoria da declaração.

No meio-termo, surgiu a teoria da responsabilidade, segundo a qual prevalece a vontade


interna, salvo se o declarante é o responsável (culpado) pela divergência. Essa teoria se
manifestava no instituto do erro no Código Civil de 1916, pois o erro tinha que ser
escusável.

Modernamente, adopta-se uma quarta teoria, que se refere ao princípio da confiança,


segundo o qual prevalece a vontade declarada, desde que ela venha a conduzir outrem a
uma legítima expectativa (Enunciado nº 363 do Conselho da Justiça Federal – CJF).

Essa teoria é uma decorrência da função interpretativa do princípio da boa-fé objectiva


(art. 113 do Código Civil).

A diferença entre as duas últimas teorias consiste no fato de que na teoria da


responsabilidade, o enfoque está centrado na figura do declarante: verifica-se se há
culpa do declarante.

Ao contrário, no princípio da confiança, o enfoque se desloca para o declaratório:


verifica-se se há uma legítima expectativa por parte do declaratório.
15

6. A forma dos negócios jurídicos: declaração e comportamento

A forma, segundo Betti (pág. 247), é o meio pelo qual o negócio jurídico se torna
reconhecível aos outros, por intermédio de uma declaração verbal ou por um
comportamento

Ainda para Betti, (pág. 248) a declaração é a exteriorização do “pensamento do íntimo


de cada um, para se tornar expressão objectiva, dotada de vida própria, perceptível e
apreciável no mundo social”. A declaração, na esteira do autor, é, em sua natureza, um
acto consciente destinado No entanto, o conhecimento da declaração pelo destinatário
não pode faltar, sob pena de perder sua relevância social, como uma voz clamada no
deserto. Não havendo destinatário, a declaração não terá relevância social, não formará
um negócio.
a ser conhecido por outros a partir de um determinado conteúdo. Consiste, portanto,
num ato que se dirige, necessariamente, aos outros.

A consequência dessa afirmação é que toda declaração visa um destinatário, que em


algum momento – mais cedo ou mais tarde – a conhecerá.

Não é um requisito para o negócio que o destinatário seja imediatamente determinado.


Exemplo desse fato é quando o agente que lança uma garrafa ao mar, uma declaração de
vontade nela contida não produz efeito algum até que encontre um destinatário, (Betti,
pág. 249).

Por outrora, diferindo da declaração, o comportamento puro e simples não pode contar
com a colaboração psíquica alheia, representando uma exigência a satisfazer numa
relação com os demais; não apela para a consciência ou para a vontade das pessoas em
cuja esfera deverão desenvolver-se os efeitos do negócio, (Betti, pág. 250).

O comportamento caracteriza-se pelo fato de esgotar o seu resultado numa modificação


objectiva, socialmente reconhecível e relevante, da situação de fato preexistente. Este
efectua e realiza uma regulamentação de interesses privados, porém, não pretende torna-
la conhecida aos outros, apesar de, por se configurar numa modificação no mundo
exterior, ser reconhecível no ambiente social.

O comportamento exige uma interpretação distinta da declaração: enquanto a declaração


vincula o autor, segundo seu significado objectivo, criando uma responsabilidade por
16

sua decorrência, o comportamento não vincula o agente por um significado social


objectivo, pois este depende da verificação de uma intenção efectiva na sua realização8.

Seja como declaração, seja como comportamento, por forma do negócio deve se
entender um meio que o torne socialmente reconhecível, e, a forma do acto obriga, em
regra, o agente, segundo o seu significado social objectivo.

Se o negócio se estruturar por meio de uma declaração de vontade, requer um


destinatário (embora não seja condição para sua realização, ainda que indefinido). Por
ser declaração, gerará no seu destinatário uma expectativa normativa em torno de um
laço de confiança. No entanto, sendo um comportamento, o ato não é dirigido a alguém
(não há destinatários), não produz nos outros uma expectativa de comportamento, mas,
segundo Betti, apenas justifica ilações, inferência ou deduções.

Nos negócios declarativos, a parte é livre, até certo ponto, quanto à escolha das
palavras, e, por isso, tem o ónus de se expressar adequadamente, pois deve suportar o
risco de uma expressão inadequada, obscura ou ambígua. Em outras palavras, a intenção
de regular certos interesses só tem eficácia na medida em que as palavras empregadas
resultem no conteúdo essencial do negócio jurídico.

A declaração é o resultado da manifestação volitiva, ao ganhar o mundo exterior, e,


desde que seja emitida com intencionalidade, passa a ter uma existência independente
de seu autor.

O momento da separação pode ocorrer de forma mediata ou imediata, nesse caso se


alcançar o destinatário no momento de sua emissão ou no primeiro se chegar até por um
meio interposto.

Tratando-se de declaração imediata, feita directamente ao destinatário, presente ou em


comunicação verbal transmitida imediatamente, o ato da separação se confunde com o
acto da expressão.

Emissão e expressão passam a ser uma só coisa e, uma vez acessadas pelo destinatário,
têm carácter irrevogável.

8
Mais uma vez Betti critica o dogma da vontade: “Seria, porém, um erro explicar essa diferença,
recorrendo à ideia de que nos negócios que consistam num simples comportamento, a <<vontade>> se
encontra no estado puro, sem necessidade de uma forma”. Idem. p. 251.
17

9
Por outro lado, tratando-se de declaração mediata, feita por meio escrito ou por outro
meio similar de comunicação (não-imediata), a expressão precede e adquire existência
com a formação da escrita e a emissão consiste no processo de dar ciência ao
destinatário do conteúdo da declaração, como ocorre com a postagem de uma carta
numa agência dos correios.

A declaração de vontade em certos negócios precisa ser feita por meio de um


documento para que produza efeitos jurídicos. O documento assume, em relação à
declaração documentada, uma função de garantir ou de preservar a declaração já
formada.

No primeiro caso, possui uma função constitutiva, quer como instrumento de


comunicação entre ausentes, quer como requisito necessário ao negócio, tendo,
portanto, função essencial. Em contrapartida, no segundo caso, atribui-se ao documento
uma função meramente representativa ou probatória, sendo, portanto, facultativo.

Já o comportamento distingue-se da declaração na estruturação dos negócios jurídicos,


porque embora não se destine a comunicar certo conteúdo preceptivo, pode, entretanto,
adquirir no ambiente social um significado e valor de declaração, na medida em que
tornar reconhecível, de acordo com as experiências comuns, uma posição a respeito de
algum interesse que afecta a esfera jurídica alheia.

Enquanto as declarações de vontade são meios directos de estruturação do negócio, o


comportamento é um meio indirecto. Isso porque a declaração de vontade produz a
recognoscibilidade necessária não só por intermédio da palavra escrita e oral, mas
também por gestos e sinais.

O comportamento, por sua vez, é sempre uma manifestação tácita e indirecta, mas, por
ele, socialmente se torna reconhecível a vontade do agente, assumindo a mesma função
de uma declaração direita.

Trata-se de uma declaração concludente, como afirma Betti (pág. 269):

9
Aqui é preciso considerar que hoje os aplicativos de mensagens pela internet propiciam uma
comunicação em tempo real, de tal modo que a comunicação feita de forma intencional, vincula o agente
na medida em que chega ao seu destinatário.
18

O comportamento qualifica-se como concludente, quando impõe uma conclusão, uma


ilação lógica, que não se fundamenta na consciência do agente (que até poderia nem dar
conta da confluência da sua conduta), mas sobre o espírito de coerência que, segundo os
pontos de vista comuns, deve informar qualquer comportamento entre membros da
sociedade, e sobre a auto-responsabilidade que se liga, por uma exigência social, ao
ónus de conhecimento.

Dentro da perspectiva objectiva do negócio, o comportamento do agente é causa do


negócio, porque é possível inferir a declaração de vontade em face do conjunto de
circunstâncias.

Não é a vontade interna que se deduz do comportamento e que torna possível estruturar
o negócio, mas o conjunto fático-circunstancial presente no comportamento que
estrutura o negócio jurídico de forma implícita e indirecta.

Quanto ao silêncio, Betti investiga em sua obra até que ponto a inércia consciente, na
presença de certas circunstâncias e situações por parte de quem tenha a concreta
possibilidade de agir, é suficiente para dar formação a um ato de autonomia privada e
revestir o significado de negócio jurídico10.

O autor enfatiza que não se pode considerar a existência de um negócio sem algum tipo
de manifestação.

No entanto, a inércia consciente, ainda assim, pode tornar reconhecível a exteriorização


da vontade formando um negócio, sobretudo em razão de costumes ou de circunstâncias
em torno dos quais o negócio se estrutura:

Se ao comportamento andam ligados efeitos jurídicos, em consideração da sua


conformidade com a intenção normal que o determina, deverá reconhecer-se-lhe o valor
de negócio, quer ele configure uma verdadeira declaração, ainda que silenciosa, ou se
concretize numa conduta concludente. Aliás, para que o silêncio adquira significado de
negócio, é suficiente uma apreciação, que é contingente e variável, conforme o
ambiente histórico, os usos e a consciência social, bem como segundo a qualidade das
pessoas (por ex. comerciantes acostumados com aquele género de contratações) e
conforme as circunstâncias em que elas actuam, no caminho da objectivação, segundo

10
Artigo 218.º do Código Civil
O silêncio como meio declarativo
O silêncio vale como declaração negocial, quando esse valor lhe seja atribuído por lei, uso ou convenção.
19

as concepções do comércio. O silêncio pode ser tornado significativo, objectivamente,


por um costume prevalente num determinado sector social, ou então, subjectivamente,
por uma prática introduzida (é o caso dos chamados usos interpretativos), ou por um
acordo estabelecido entre os interessados. Costumes, práticas e acordos desse género,
têm, sobretudo, razão de ser em matéria contratual, na qual a conduta do destinatário de
uma proposta, que se abstenha de responder a ela negativamente, é por vezes,
interpretável como uma aceitação.
20

Conclusão

Conforme demonstrado ao longo deste trabalho, o estudo do negócio jurídico é


fundamental para a exacta compreensão do direito privado.

Em primeiro lugar, dominar os elementos do negócio jurídico permite ao operador do


direito diferenciar os casos de inexistência, nulidade ou ineficácia do ato. Além disso,
conhecer as diversas classificações dos negócios jurídicos, antes de uma actividade
meramente académica, é fundamental para que se extraiam as devidas consequências do
ato praticado. Por fim, saber interpretar adequadamente os negócios jurídicos é
importante para resolver os casos de divergência entre a vontade declarada e a vontade
interna.
21

Referencias Bibliográficas

Legislação

Código Civil – Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de Novembro de 1966

Manuais

Amaral, Francisco. (2003). Direito civil, Introdução. (5. Ed.). Rio de Janeiro: Renovar.

Betti, Emílio. (1969). Teoria geral do negócio jurídico. Tomo I. Coimbra: Coimbra
Editora.
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Revista de Direito Civil, ISSN 2596-2337, v. 1, n. 2, jul./dez. 2019

Santoro, Passarelli Francesco. (1964). Doctrinas generales del derecho civil. Tradução
para o espanhol por A. Luna Serrano. Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado,
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Tepedino, Gustavo. (2008). Comentários ao novo Código Civil. In: Teixeira, Sálvio de
Figueiredo. São Paulo: Forense, volume X.

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