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Sebenta Teoria Geral do Direito Civil - Regência JAV - TB - 2020/2021 - LBT

SEBENTA TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL


(TRATADO DE DIREITO CIVIL II, MENEZES CORDEIRO)

CAPÍTULO 1: Os Fundamentos da Doutrina do Negócio

1§ COORDENADAS HISTÓRICAS:

Negócio Jurídico: Pressupõe pessoas e vontade de celebrar um determinado


acordo com outrem (ou consigo próprio). Estuda a vontade humano. Cria o Direito

Vontade: Tem de ser livre mas não tem de ser racional

História do Negócio Jurídico e do Contrato:

Romanos: O termo “negócio jurídico” era um termo estranho, não existindo


legislação prevista. “Negotium” era algo relativo à gestão (gerere) ou a contratos
(contrahere) que não fossem contra a lei

II d.C. a Gaio (período clássico): alcançada uma ideia geral de contrato como
“fontes de obrigação”

Período Justinianeu (imperador bizantino, 527 a.C.): desapareceram várias


categorias mais clássicas e o contrato passou a ser uma ideia abstrata e mental

São Tomás: veio apurar a noção de “autonomia da vontade” e reforçar a força da


palavra (como algo vinculativo) – “há mentira se alguém não executa o que
prometeu”

Direito Comum Medieval: “Negotium” referia-se a qualquer processo

Alemanha (raiz germânica): acrescentou novas componentes ao negócio/contrato


associadas à vontade individual das pessoas e à ideia de negócio jurídico como
“transferência de título”

Escolástica Tardia (Grócio, séc. XVI): acrescentou que a validade dos atos e
negócios dependia da possibilidade de responsabilizar os seus autores

Bifurcação Pandectistica (Pandecta como escola alemã que estudava a lei


romana): veio separar contrato de negócio jurídico
contrato: implica consenso entre as partes

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negócio jurídico: atuações lícitas das pessoas que têm como objeto direitos e
obrigações recíprocas que levam à constituição de relações jurídicas

2§ AUTONOMIA, TEORIA DA AÇÃO E SISTEMA:

Autonomia Privada: Espaço de autodeterminação pessoal que abrange aquilo que


as pessoas podem ou não fazer, sem necessidade de fundamentar as opções
escolhidas. Permissão concedida por ordem jurídica para que as pessoas possam
determinar a produção de efeitos jurídicos. Manifesta-se através da possibilidade de
celebração de negócios jurídicos, baseando-se no princípio de liberdade e na ideia
de livre arbítrio.

Ordens de Justificação:
Fundamentos Éticos e Politico-Sociais: mais do que a opção livre do direito
civil, a autonomia privada corresponde às exigências da liberdade geral e
dignidade humana
Fundamentos Económico-Sociais: a História mostra que sob regimes
alargados de autonomia se consegue um máximo de equilíbrio social e de
eficiência económica

Teoria da Ação: Destinada a conhecer e a explicar a essência da ação humana,


sendo impossível de desassociar do negócio e da autonomia privada

Ação Humana: Essência da eficácia jurídica, preenchendo a autonomia privada.


Geralmente, é conforme o Direito, interessando, sobretudo, ao Direito Civil.

Conceção Normativista da Ação: Tendo em conta as necessidades do penalismo,


vê a ação como a afirmação ou negação de valores, associando as ações à ética, à
racionalidade, à emocionalidade e à fé. Afasta-se de ideias naturalistas/casuais
devido à aptidão humana de agir conforme valores, mas levanta a questão do
porquê agir conforme os valores (por se ser humano ou por causa de uma
ordenação natural?)

Teoria da Ação Final ou Finalismo (Hans Wezel e Manuel Gomes da Silva): a


ação humana não pode ser entendida como puramente casual, sendo final uma vez
que o agente define previamente o fim que deseja atingir e seleciona, daí, os meios.
O próprio fim é a causa. Assim, os atos humanos que pareçam idênticos podem ter
conteúdos e efeitos muito diferentes tendo em conta o fim que animam.

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Doutrina de Von Wright: Distingue orientações “casualistas” de “intencionalistas”


por pressupor que não há racionalidade. Renascimento de um finalismo associado à
natureza teleológica das ações.
Orientações Casualistas: A intenção é a causa do comportamento. Davidson
retomou o casualismo, entendendo como fim a causa da conduta
Orientações Intencionalistas: Veem uma relação lógica entre a intenção e a
conduta.
Crítica: Explica apenas a estrutura da ação

Negócio Jurídico: Ocorrência provocada pelo Homem que causa relações jurídicas
– cria--as, extingue-as ou modifica-as. Atuações lícitas de pessoas que que têm
como objeto direitos e obrigações, estando presente na parte geral do Código Civil,
é o passo inicial na realização do Direito, revolvendo em torno da ação humana.
Criação abstrata do jusracionalismo.
Como ato de vontade dirigido a certos efeitos, produzidos porque queridos
(Savigny e Pandecta): os efeitos jurídicos produzidos correspondem ao conteúdo da
vontade das partes, tem de existir uma vontade das partes dirigida à produção de
determinados e precisos efeitos jurídicos – teoria dos efeitos jurídicos
Crítica: O Direito surge do exterior, impondo-se às pessoas, derivando a sua
juridicidade do sistema e não das consciências. É impossível mesmo para o
jurista mais experiente saber todos os efeitos em que uma vontade pode
derivar.

Como ato de vontade tendente a um fim protegido e desenvolvido pelo


ordenamento: a juridificação dos efeitos ocorre em consequência de uma proteção
abstratamente conferida, pelo Direito, ao programa básico do declarante, na medida
em que a vontade humana tal via protegida pelo ordenamento, desencadear-se-iam
os efeitos jurídicos, que seriam, ainda, desenvolvidos pelas regras aplicáveis.
Crítica: Permanece a crítica referida a cima, pois é impossível prever todos o
efeitos jurídicos que podem surgir da vontade em causa

Como um ato de autorregulamentação de interesses (Betti e Dias Marques):


segue uma prespetiva normartivista kelsiana por sugerir uma pirâmide de normas,
cujos níveis se iriam justificando mútua e sucessivamente, surgindo na base o
simples negócio, legitimado por normas superiores e capaz de regular interesses,
como qualquer norma
Críticas: não explica a origem do “poder de regulação”; não prevê, em caso
de ausência de interesse, a possibilidade de haver negócio, apesar de esta existir;
não permite distinguir negócios jurídicos dos atos jurídicos em sentido estrito

Como ato de autonomia privada a que o Direito associa a constituição


modificação e extinção de situações jurídicas: a positividade do negócio jurídico
advém do Direito, que institui, regula e defende a autonomia privada. Os efeitos
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concretamente verificados são, no entanto, os indiciados pelas partes através das


suas declarações. O declarante pretende a verificação de um certo efeito jurídico e
pauta a sua atividade em função desse objetivo, devendo a vontade ser dirigida ao
efeito pretendido, enquanto jurídico. Ao reconhecer a autonomia privada as opções
das pessoas produzem os efeitos por elas pretendidos. Em certos negócios é
necessária a aplicação de normas injutivas que não podem ser afastadas.

Vontade: Está na origem do negócio, sendo o corpo da sua juridicidade e


desenvolvendo uma atividade criadora do Direito. Atribui consistência técnica e
significado ideológico aos negócios, apoiando-os em mais do que o Direito
legislado. (Conceção em linha com o sistema de geral delineado por Savigny)

Crítica: A natureza do negócio deve vir da vontade do Direito e não da vontade


pessoal. (Subscrita por Karlowa, Alois von Brinz, Thon, Lotmar,...)

CAPÍTULO 2: Dogmática Geral do Negócio Jurídico

4§ EFICÁCIA JURÍDICA:

Eficácia Jurídica: Quando algo ocorre no mundo do Direito. Sempre que se


verificam determinadas consequências (juridicamente relevantes quando afetas a
pessoas) nas quais, através de critérios reconhecidos, é possível apontar as
características da juridicidade. Resulta de modelos de decisão, ou seja, dos fatores
que compõem o regime jurídico-positivo aplicável. Ponto de partida para o estudo
dogmático do direito civil.

Situação Jurídica: ato ou efeito de realizar o Direito, solucionando um caso


concreto. Resulta de uma decisão jurídica (decisão humana)

Eficácia Jurídica como dimensão dinâmica das situações jurídicas: um efeito


pode ser simultaneamente constitutivo e modificativo – ex: hipoteca

Eficácia Constitutiva= “Aquisição originária”: constituição de uma situação antes


inexistente na ordem jurídica. (ex: aquisição originária)

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Eficácia Transmissiva=”Aquisição derivada”: uma situação já existente na ordem


jurídica transita da esfera de uma pessoa para a de outra pessoa. (ex: contrato
compra e venda)

Eficácia Modificativa: hipótese de uma situação, centrada numa determinada


pessoa, aí se conservar mas com alterações no seu conteúdo

Eficácia Extintiva: desaparecimento de uma situação da ordem jurídica, antes


existente

Transmissão: Passagem de uma situação jurídica da esfera de uma pessoa para a


de outra. A situação pode sofrer alterações

Situação de Posse: no controlo material de uma coisa corpórea, é transmitido o


que se encontrava na esfera do antecessor, assim, no momento em que aquele que
recebe a posse do transmissor conhecer a má fé deste, passa a estar também em
má fé, até lá, estará de boa fé. (art. 1260/1)

Sucessão: Substituição de uma pessoa por outra mantendo-se estática uma


situação jurídica (não pode sofrer alterações) que, assim, estando inicialmente na
esfera de uma pessoa, surge, depois da troca, na esfera de outra.

Situação de Posse: quando, no controlo material de uma coisa corpórea, o


sucessor recebe exatamente o que se encontrava na esfera do antecessor, assim,
se este estiver de boa fé, ele fica de boa fé, e se estiver de má fé, ele fica de má fé.

Eficácia Jurídica Consoante a Natureza das Situações Jurídicas:

Eficácia Pessoal: não tem natureza patrimonial

Eficácia Obrigacional: reporta a situações obrigacionais

Eficácia Real: ocorre perante situações próprias do Direito das coisas (art. 413)

5§ FACTOS, ATOS E NEGÓCIOS JURÍDICOS:

Facto Jurídico: Evento ao qual o Direito vai associar determinados efeitos,


apresentando-se como a realidade apta, dentro de uma previsão normativa, a
desencadear efeitos jurídicos. Justifica que uma decisão, tomada com base em
modelos que o tenham em conta, seja legítima.

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Factos Jurídicos “Strictu Sensu” (em sentido estrito): eventos naturais,


involuntários, mas juridicamente relevantes. (ex: nascer ou morrer)

Atos Jurídicos: manifestações da vontade humana, pela autonomia privada,


juridicamente relevantes e com um propósito. (distinção abaixo conforme a doutrina de Paulo Cunha)
Atos Jurídicos “Strictu Sensu”: Implicam apenas liberdade de celebração, não
controlando os resultados
Negócio Jurídico: Tem de ser lícito e implica liberdade de celebração e
estipulação.

Ato Lícito Ato Ilícito

Processa-se ao abrigo de uma Comportamento humano desconforme


permissão genérica ou irrelevante para com o Direito por implicar atuações
o Direito, ou seja, algo que não seja proibidas ou resultar no não
proibido direta ou indiretamente. acatamento de atitudes prescritas.
São muitas vezes atos jurídicos pois o Geralmente, resulta num juízo jurídico
Direito ainda lhes associa alguns de censura (culpa)
efeitos. Pode produzir alguns dos efeitos que
era suposto desencadear ou ser
paralisado por sanções.

6§ MODALIDADES DE NEGÓCIOS JURÍDICOS:

Parte: Interessado no negócio. Pode ser composta por mais do que 1 indivíduo.

Negócios Unilaterais: Negócios Multilaterais (ou Contratos):

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Os efeitos não diferenciam as pessoas Produto de 2 ou mais partes.


que nele possam, eventualmente, ter Os efeitos diferenciam duas ou mais
intervido por isso tende a haver uma pessoas que desenvolvem regras
única pessoa, uma única parte, uma próprias que devem ser cumpridas.
única declaração ou um único interesse Envolve uma proposta e uma aceitação
Apresentam uma única parte. – ex: compra e venda
Completam-se com 1 declaração,
dispensando-se a anuência dos outros Contratos Sinalgamáticos e Não
intervenientes. Sinalgamáticos: consoante haja (ou
Têm que estar expressamente não) obrigações recíprocas (algumas
previstos na lei, não podendo ser doutrinas também chamam “bilaterais“ e “unilaterais” mas
MC opõe-se pois todos os contratos são, por natureza,
resultado de autonomia privada – ex: bilaterais – mais que 1 parte)
testamento
Contratos Monovinculantes e
Negócio Plural: implica várias pessoas Bivinculantes: consoante fique uma só
Negócio Conjunto: várias parte vinculada ao contrato ou mais.
pessoas são titulares
de posições jurídicas que só podem
atuar em bloco (ex: arrendatários que
denunciam um senhorio)
Deliberação: várias pessoas
titulares de posições jurídicas
confluentes que podem atuar em
sentidos divergentes agem pela maioria
(ex: em associações ou comissões
especiais)

Tipos de Negócios:

Causais: Abstratos: Presuntivos de


Causa:

Para valerem judicialmente Não exigem fonte ou Não vão exigir fonte
dependem da sua fonte/prova. prova. ou prova porque há
No Direito Civil os negócios uma promessa ou
são, em princípio, sempre reconhecimento da
causais. (se eu comprar uns sapatos dívida.
vou precisar de prova da transação
para exigir uma devolução)

De Disposição: De Administração:

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Põe em causa a própria subsistência da Implica modificações secundárias ou


situação. periféricas no seu conteúdo
Podem apenas ser pelo próprio titular Reporta-se a patrimónios, bens ou a
da esfera jurídica a que compete (a coisas.
menos que haja algo como uma
procuração).
Detêm, em si, alguma gravidade para o
indivíduo.

Típicos: Atípicos Mistos/Coligados

A sua regulação consta na lei e A sua regulação não Apresentam partes


é estudada pelo Direito das consta na lei, sendo típicas e atípicas.
Obrigações. engendrado pelas Vão ser estudados
Se compreenderem elementos partes pelo Direito das
obrigatórios deixam de ter nominados: vão Obrigações.Art 405º
liberdade de estipulação, apresentar referencia São diferentes das
desparecendo a natureza legal, contudo não têm uniões ou das
negocial. tratamento explícito no conexões de
inominados: negócio com código negócios, na qual
regulação supletiva legal mas dois ou mais
que não seja apelidado senão negócios foram
pela doutrina. colocados pelas
nominados (nomen iuris): a lei partes numa
designa-o por um nome situação de
interdependência

Onerosos Gratuitos Mistos

Implica esforços Dá corpo a manifestações de Inclui uma


parte
económicos para ambas solidariedade importantes para a onerosa e
outra
as partes em simultâneo coesão ética e social de gratuita.Exemplo;
e com vantagens qualquer comunidade. Doação onerosa
correlativas Só uma parte tem vantagens (art. 963º)
A intenção do negócio vai ou sacríficos.
revelar a sua onerosidade A vontade livre do sacrificador
determina-se pela intenção
(que revela a gratuitidade do

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negócio) de dar (animus


donandi).

Parciários: De Organização: De Distribuição: Aleatórios:

Implica a Visam montar uma Visam percorrer o Quando, não se


participação dos estrutura que faculte circuito económico conhecem as
celebrantes nos a cooperação na parte que liga a vantagens
resultados. permanente num produção ao patrimoniais
certo quadro de vendedor final. resultantes ao
pessoas (≠ de negócio de momento da sua
consumo: aquisição celebração,
de bens pelo sendo celebrado
consumidor) através das
potenciais.Exemp
lo; Contrato de
seguros

Instrumentais: Preparatórios: Acessórios:

Negócios Principais ou Antecedem outros Só fazem sentido no


Finais que vão definir negócios – ex: contrato contexto em que se
termos para contratos promessa compra e inserem, ligando-se a
semelhantes que se sigam, venda. algo – ex: fiança.
regulando os interesses em
jogo.

Inter Vivos: Mortis causa:

Produz efeitos durante a vida dos Manifesta-se apenas após a morte do


celebrantes. seu autor, assente no valor fundamental
da vontade do sujeito. Implicam regras
de interpretação e de aplicação
específicas(art 237º e 2187º)– ex:
testamento

Formais: Consensuais:

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Para serem concluídos a lei exige um Basta existir consenso entre ambas as
determinado ritual exterior à vontade partes para haver conclusão do
individual dos sujeitos Art. 238º contrato.Art 219º

Reais “Quoad Constitutionem”: Para serem celebrados exigem a tradição


(entrega) de uma coisa de modo a exacerbar a importância do negócio. Sujeitos a
registo constitutivo.

Relativos ao tipo de eficácia (ver p. 5)


Pessoais
Obrigacionais
Reais “Quoad Effectum”

7§ ATOS JURÍDICOS EM SENTIDO ESTRITO:

Atos Jurídicos em Sentido Estrito: Exercício da autonomia privada (sendo a


forma mais baixa desta) que vai estar presente apenas na celebração. Presentes no
início das negociações em deveres pré-contratuais e suscetíveis à aplicação das
regras referentes ao negócio jurídico.

Diferentes de:
Atos Semelhantes a Negócios: Manifestações da vontade a que o Direito
associa determinados efeitos.
Atos Reais: Relacionados com puros comportamentos racionais que
desencadeiam efeitos jurídicos.

Alfred Magik classificou em:


Puras Atuações Exteriores: como a ocupação de uma coisa ou a
perseguição e captura de animais
Atuações que impliquem certas opções interiores: como a escolha de um
domicílio ou de uma sede para pessoa coletiva.
Atuações que traduzem matéria já prefixada: como perfilhar
Comunicações: podem ser de conhecimento ou vontade
Aos ato jurídicos em sentido estrito são aplicadas as competentes adaptações, as
classificações acima efetuadas de n.j. (Art. 295º) Importa apenas considerar
distinções específicas dos atos jurídicos em sentido estrito

A Doutrina Alemã distingue:

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● Atos quase-negociais - equivalentes aos atos jurídicos em sentido estrito, que


se analisam numa pura manifestação de vontade
● Atos materiais - correspondem aos atos jurídicos em sentido estrito, que
resultem de atuações materiais voluntárias

8§ ELEMENTOS E PRESSUPOSTOS NEGOCIAIS:

Doutrina Tradicional por Manuel de Andrade:

Elementos Essenciais (essentialia negotii): Condição necessária para a existência


do negócio jurídico.
Elementos Essenciais Gerais: Devem surgir em todos os negócios. São a
capacidade das partes, a declaração de vontade e o objeto possível
Elementos Essenciais Específicos: variam consoante o tipo de negócio.

Elementos Naturais (naturalia negotii): Efeitos que, por sua natureza, os diversos
negócios produzem, mas que as partes podem, ao abrigo da sua autonomia
privada, afastar. Normas cuja aplicação fica ao critério dos indivíduos.

Elementos Acidentais (acidentalia negotii): Estipulações que não são necessárias


para a consistência do negócio jurídico mas que podem ser aplicadas, ao abrigo da
autonomia privada, podendo provir de figurinos do Direito ou ser originais.

Doutrina de Paulo Cunha:

Elementos Necessários: Exigidos pela lei para a validade do negócio


Elementos Necessários Essenciais: Sem eles não há negócio
Elementos Necessários Habilitantes: Requeridos para a total validade do
negócio.

Elementos Específicos: Requeridos para cada tipo de negócio – ex: preço numa
compra e venda.

Elementos Naturais: Derivam da lei e servem diversos tipos negociais mediante a


sua Natureza

Elementos Acidentais: Introduzidos pela vontade das partes


Típicos: Previstos na Lei.
Variáveis: Derivados da vontade das partes.

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Doutrina de Dias Marques, adaptando um esquema de Betti:

Pressupostos: Elementos extrínsecos perante o próprio negócio, abrangendo


fatores atinentes ao autor, ao objeto ou à posição do autor em relação ao obejto do
negócio

Estrutura: Elemento intrínseco ao ato do negócio. Abrange elementos objetivos


(como a forma e o conteúdo) e subjetivos ( como a vontade, a consciência,...)

Função: Reporta-se à causa, sendo o objetivo socialmente relevante procurado


através do negócio

Solução Preconizada pelo Professor Menezes Cordeiro: Resulta dos fatores


apurados no decurso da evolução doutrinária

Elementos do Negócio Jurídico: Associados a normas e princípios ligados à


temática negocial.
Em Sentido Amplo: os elementos vão traduzir um conjunto de realidades
necessárias para que exista uma outra realidade
Em Sentido Estrito: os elementos exprimem fatores que, num momento
considerado, compõem um quid

Pressupostos: Verificamos assim que os pressupostos do n.j só podem ser


considerados como seus elementos se, destes, se fizer uso em sentido amplo. Mas
isto, leva a uma heterogeneidade menos conveniente.
Implicam regras relativas às pessoas, aos bens ou às relações que entrem
ambos se estabelecem.

CAPÍTULO 3: A Formação do Negócio Jurídico:

9§ A DECLARAÇÃO DE VONTADE:

Declaração de Vontade: Pressuposto dependente de uma opção humana


comunicada para o exterior de modo a ser reconhecida pelos operadores jurídicos e
pelo próprio sistema para criar um negócio jurídico. Surge intimamente associada ao
negócio, pois este é um efeito da declaração.

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A declaração da vontade comporta: a vontade humana e a declaração. Segundo


Sevigny podemos ir mais longe tendo a vontade a declaração e a relação de
concordância que se estabelece entre estas.

Por sua vez, a vontade pode ser decomposta em 3 planos:


Vontade do Comportamento (ou da manifestação): Permite constatar a
presença de uma efetiva atuação humana.
Vontade (ou consciência) da Declaração: Implica a consciência das razões
sociológicas ou normativas. O sujeito age voluntariamente, conhecendo a
dimensão jurídica da atuação
Vontade do Negócio: Desejo de desencadear os efeitos ou o conteúdo do
negócio em causa

Declaração: Ato de Validade. Ao fazê-la o declarante manifesta uma adstrição da


própria vontade

A vontade e a declaração constituem um continuum humano e valorativo que pode


ser cindido apenas para efeitos de análise e que pode ser completada:

● Na interpretação prevalece a doutrina da impressão do destinatário ( art 236º


/ 1)
● A reserva mental, traduzida numa declaração que não corresponda à vontade
real, para enganar o declaratário, é irrelevante.
● A declaração que não equivalha à vontade real só pode ser anulada em
condições apertadas( art 247º )
● A declaração feita em situação de incapacidade acidental só pode ser
anulada em, circunstâncias restritas ( 257 º/ 1)

Nota:Um n.j que se mantenha sem vontade real não é um verdadeiro n.j mas, antes
uma manifestação de confiança tutelada.

10§ TIPOS DE DECLARAÇÃO:

Expressa: Tácita: Concludentes: Silêncio:

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Feita por Deduzida de A doutrina atual Total ausência de


palavras, factos com toda a dá-lhes esta nova comunicação por
escrito ou por probabilidade. designação, para
parte do sujeito
qualquer outro Os evitar confusõesconsiderado.
meio direto de comportamentos com o silêncio Requer que não seja
manifestação devem ser Aplicam-se as
possível ser retirada
da vontade. “positivos”, regras respeitantes nenhuma mensagem
Pode surgir “inequívocos” e às expressas (com do contexto.
tanto de “significantes” as necessáriasO silêncio jurídico é
for-mas (acordão supremo adaptações). um nullum
atípicas como tribunal 5/11/1997). A vontade manifesta- Inexistência de
típicas.Art.217ºDeclaração -se não através de qualquer ação, ou
/1 indireta viável por um ato de
seja, de meios para
vias consagradas comunicação a isso chegar a um fim.
Expressa (típicas). dedicado masComportamento
Objetiva: Atua A possibilidade de mediante umpuramente omissivo
por meios cujo haver declrações comportamento que, ou abstensivo.
sentido tácitas exige ter 2 derivado das
Só tem valor como
declaratório fatores em condições em que declaração negocial
está fixado atenção: ocorre, permite
se a lei, uso ou
pelos usos, lei ● 217º/2 - requer-se
inferir a vontade dosconvenção assim o
ou convenção que a forma efeitos do negócio. preconizar(art 218º).
prescrita tenha
● sido observada
Nota: O destinatário
Expressa quanto aos factos Comportamentos de uma proposta
de que se deduza
Subjetiva: a declaração em
Típicos: contratual cujo o
Resulta de causa reconhecidos como silêncio não valha
● Só é legítimo
uma conduta descobrir
manifestação da como aceitação é
destinada a declarações vontade negocial obrigado a restituir a
negociais, ainda
manifestar que tácitas,
coisa que o
uma vontade. quando haja Condutas proponente lhe tenha
verdadeira
vontade, dirigida
Diversas: permitem enviado, quando ele
aos efeitos e inferir a vontade a for ou mandar
minimamente
exteriorizada,
buscar, e bem assim
ainda que de a conservá-la, só
modo indireto
incorrendo, porém,
.Tácita
em responsabilidade
Objetiva: quando tenha agido
Os meios com dolo.
em jogo só
são
possíveis
de Relevância
Positiva: vale como

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compreend declaração de
er tendo em aceitação
conta o
contexto. Caducidade: não
tem valor negocial,
mas ao expirar é
Tácita Subjetiva: como se o negócio
Deriva de uma tivesse sido negado.
atuação que tinha
outros objetivos
mas que da qual
se pode inferir
uma vontade
negocial.

Presumidas: Fictas

A lei associa a um certo A lei veda o acesso a qualquer


comportamento um determinado refutação que seria possível nas
significado, que, contudo, pode ser declarações. A presunção é inilidível
refutado por provas(350º/2) (350º/2)
Ónus da Prova: Geralmente, quem
pretender uma dada eficácia de provar
os factos de onde ela deriva, todavia,
com o benefício de uma presunção
jurídica, passa a competir à outra parte
dar prova (o ónus da prova é
transferido)

Recipiendas Não
Recipiendas:

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Visam integrar um negócio contratual, tendo um destinatário, Não têm


vendo a sua eficácia afetada pela relação que tenham com o destinatário,
mesmo. Na doutrina atual, a “receção” implica a chegada da sendo afetas a
declaração ao âmbito do poder do destinatário, de modo a que negócios
este a possa conhecer. A declaração deve ser “acolhida” ou unilaterais
“armazenada” para evitar extraviações. (contém uma
Art 224-A declaração recipienda é eficaz: única
vontade).
● Quando chegue ao poder do destinatário ou dele seja conhecida
● Quando seja remetida e só por culpa do destinatário não tenha sido
Art. 224º-Este
oportunamente recebida tipo de
● Em qualquer caso, a declaração é ineficaz quando seja recebida declaração
pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não poder ser
conhecida
segue a teoria
da
Teorias de receção da declaração: exteriorização

Teoria da Teoria da Teoria Teoria do Teoria do


Exteriorização Expedição da Acolhimento Conhecimento
Receção

O negócio só A A A declaração A declaração


fica concluído declaração decla-raç torna-se torna-se eficaz
quando a torna-se ão torna eficaz quando quando chega
vontade tiver eficaz se eficaz chega ao ao
obtido forma de quando é quando poder do conhecimento
se exteriorizar remetida chega destinatário. efetivo do
para o destinatário.
(Savingny) destinatário (Titze)
(Windshield) (Kohler) (Becker)

Subsequentes: Contradeclarações:

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Recaem sobre declarações prévias eventualmente já Declarações


consubstanciadas em negócios jurídicos. subsequentes reportadas
a uma primeira declaração
Típicas: Geralmente, estão na base de atos ou no sentido de a suprimir
negócios unilaterais que visam modificar ou extinguir ou reduzir os efeitos que
a eficácia de declarações anteriores, tendo, por dela resultariam.
regra, uma natureza não negocial em que o Nota: O protesto como
declarante tem margem para optar fazê-la mas não contradeclaração, pode pôr em
crise a confiança que resulte da
para estipular os seus efeitos (estão na lei). Tentam
primeira declaração. Por isso,
proteger a confiança na primeira declaração. não é possível a não ser que a
lei ou o contrato o permitam.
Atípicas: Acordadas pelas partes ou facultadas pela
situação existente. Postulam um novo negócio entre Reserva: Usada para
as partes (também pode ocorrer em negócios aderir a uma posição
unilaterais). comum mas não
totalmente (acontece em
tratados)

Não Negociais: Não comportam a liberdade de estipulação, assim, o declarante é


livre de a fazer mas não de estipular os seus efeitos, que surgem previstos pelo
Direito. Geralmente são subsequentes e unilaterais. ex: ratificação, aprovação,
confirmação, validação, reductio ad equitatem, convalidação de negócios nulos,
perdão, anulação, invocação da nulidade,...

11§ O SURGIMENTO DO NEGÓCIO:

Modelo Básico: Permite fixar regras que são, depois, utilizáveis para compor
modelos mais simples ou mais complexos. A partir deste modelo vai surgir o
negócio jurídico, resultando de uma atividade jurídico-científica.

Processo: Quando diversos atos jurídicos se encadeiam de modo a proporcionar


um objeto final que será sempre o negócio jurídico. As normas jurídicas que nele
intervêm devem ser interpretadas e aplicadas em consonância com o objetivo em
causa. As conclusões possíveis podem depender da verificação dos atos
processuais e estes só têm sentido tendo em conta os resultados que pretendem.
Analisa-se em factos ou atos.
Atos: Podem ser agrupados ou ordenados em fases tendo em conta critérios
funcionalidade. As fases podem ser necessárias ou eventuais consoante da
sua ocorrência dependa, ou não, a concretização do fim para que tendam.

Negócios Sem Processo: Negócios que dispensam de qualquer processo


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Negócios Unilaterais: Ficam completos com a declaração de vontade do seu autor.

Negócios por Minuta: Concluem-se pela adesão ou subscrição de ambas partes a


um documento (a uma minuta que é geralmente preparada por terceiros
especialistas e contém algumas indicações dadas pelas partes).

Negócios comuns: Formam-se entre presentes por simples adesão a fórmulas


apresentadas a todos os interessados. Existe sempre um acordo de facto, fruto de
declarações feitas na base de condutas concludentes de onde induzimos consenso
negocial jurídico que vai antecipar as declarações. A concordância é prova das
declarações.

Técnica de Contratação: A captação do negócio jurídico permite surpreender o


fenómeno da formação negocial atribuindo às partes o papel que lhes compete.

Os contatos (minimamente complexos) requerem:


Obtenção de Informações: envolve a escolha de parceiros e a intenção de
procurar um dado negócio.
Borrão do Projeto do Contrato: aproveita-se modelos criados ou por
especialistas, ou provenientes dos interessados ou dos seus mandatários.
Aplicação Hipotética do Contrato: revela que as partes se dedicam a
exercícios ou a simulações de modo a apreender o funcionamento do futuro
contrato.
Concretização dos Critérios de Decisão: implica uma avaliação do conjunto
de modo a determinar o que irá acontecer.
Escolha das Melhores Opções Técnicas: optar pelo caminho mais seguro,
prático, flexível e menos dispendioso e a celebração dos contratos
preparatórios convenientes.
Superação de Conflitos Objetivos: por envolver várias realidades, um bom
contrato deve solucionar os conflitos.
Negociações Contratuais: é importante verificar se têm presentes alguma
forma restritiva de contratação e maxime perante clausulas contratuais
gerais.
Instrução e Aconselhamento: pode ser jurídico ou técnico.
Elaboração do Documento Contratual: ambas as partes devem dar o seu
acordo e deve ser utilizada terminologia jurídica (por ser mais segura e
precisa) e a língua dos contratantes.

12§ A FORMA DA DECLARAÇÃO:

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Forma da declaração (ou do negócio): Modo utlizado para externalizar a vontade,


desde que seja minimamente solene, ou seja, acompanhada por sinais exteriores
sensíveis pelas partes que presenciem a declaração ou que dela tenham
conhecimento. Pelo BGB: “um negócio a que falte a forma legalmente prescrita é
nulo. A falta de forma prescrita através de negócio tem, na dúvida, como
consequência a nulidade”.

Negócios Formais: Necessitam de uma forma solene

Negócios Consensuais: Produzem efeito por pura manifestação da vontade ou


mero consenso entre as partes, independentemente do modo como surja.

Evolução mais recente:


Tendência constante para diminuir os custos de transação das diversas
operações e lutar contra a burocratização.
Capacidade concreta do sistema para intervir nas áreas formais.
Necessidade de absorver novos esquemas de declaração jurídica, com
relevo nos esquemas eletrónicos e automáticos
Reformalização de certos negócios de modo a facilitar o tráfego jurídico.

Forma ad substantiam e ad probationem:

Forma ad substantiam: Exigida pelo Direito para a sua consubstanciação, quando


em falta, o negócio é nulo.

Forma ad probationem: Requer-se, apenas, para demonstrar a existência do


negócio jurídico, quando em falta, o negócio não pode ser comprovado. O Direito
reconhece dentro destas formalidades aspetos como o reconhecimento presencial
na locação financeira art.364/2 (o direito vigente em Portugal não apresenta casos destes)

Justificação da Forma (os limites): As razões justificativas são decisivas para


interpretar e aplicar as regras sobre a forma.

Tradicionalmente: Existiam 3 razões:


Solenidade: Publicidade de determinadas ações com o ato ou efeito de as
dar a conhecer a público. Certos negócios são apenas plenamente
eficazes quando reconhecidos por todos os elementos da comunidade
jurídica. (domínio dos direitos reais)
Reflexão: Relacionada com a gravidade que certos negócios podem ter para
o os contratantes, não devendo ser feitos de ânimo ligeiro.

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Prova: Liga-se à demonstração da ocorrência dos factos. A natureza formal


de determinados negócios facilita essa demonstração. As dificuldades em
encontrá-la podem pôr em causa o próprio negócio (não só a sua validade).

Atualmente: Visam a reconstrução histórico-cultural que permite, minimamente,


determinar o âmbito da forma legal ou o sentido das declarações de vontade.
Existem 18 limites justificativos:
Prova: A presença de um documento facilita a demonstração da existência
do negócio.
Autenticidade: Forma (mais) solene de fixar, com fidedignidade, o conteúdo
efetivo de um negócio.
Identificação: Em caso de dúvidas sobre quem celebra o contrato.
Comunicação: Contratar é comunicar – torna o contrato mais sólido e efetivo.
Informação Material: A leitura de um documento permite entender melhor o
que se irá realizar.
Indício Material: O objeto do negócio fica demarcado, prevenindo equívocos.
Delimitação e Finalização: Depois de vários esboços do contrato,
determinação de uma forma permite apurar o contrato a que se chegou.
Oficialização e Publicidade: Juridicamente relevantes, surgem de forma
solene.
Sobreaviso e Proteção: Em caso de precipitação, as partes têm tempo de se
aperceberem da dimensão daquilo que assumiram.
Consciencialização: Dizer “sim” é fácil, uma assinatura perante notário força à
reflexão sobre o ato decidido.
Segurança dada pela Intervenção de Especialistas: O envolvimento de um
notário ou advogado vai levar a uma revisão e correção do negócio.
Equilíbrio: O negócio solenemente celebrado no notário remove a
possibilidade de sobreposição de autoridade de uma parte sobre a outra.
Regulação: Perante áreas sujeitas a regulação, permite uma supervisão
eficaz.
Tutela de Terceiros e do Tráfego: Torna-se impossível e importante quando os
negócios passam a ser vistos por outros.
Fiscalização Pública: A sua investigação depende da objetivação dada pela
forma.
Viabilização de alguns Negócios: os que implicam títulos escritos.
Executoriedade: Certas formas dotam as partes de títulos executivos em caso
de incumprimento
Proteção do Consumidor: O Direito do Consumo exige a todos os títulos que
os negócios sejam fechados por escrito.

Documentos: Representam pessoas, coisas ou factos, art.362º. Podem ser


classificados em:

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Função de Suporte: Documentos escritos e (reproduções mecânicas, acho que


nao )e documentos digitais, subdividindo-se estas últimas em fotográficas,
cinematográficas e fonográficas.

Função de Entidade de Origem: Documentos oficiais(notariais, locais, centrais,...)


e particulares, podendo, estes últimos, ser produzidos pelo autor e pelo réu.

Em Função do País de Origem: Documentos nacionais e estrangeiros, podendo


ser diplomáticos, internacionais ou europeus quando produto da diplomacia ou de
organizações internacionais.

Em Função de Critérios Jurídicos: Documentos autênticos, autenticados e


particulares (apresentam uma hierarquia art.364º, podendo, face a prova de
declaração, ser substituídos por confissões):
Documentos Autênticos ou Particulares: são particulares(art.363º) todos os
que não são autênticos(autenticidade art.369º e 370º), requerendo uma
assinatura que só deve ocorrer depois da apresentação do texto de modo a
ser autenticado (ónus da prova).
Havendo ainda documentos originais, cópias, documentos reformados, certidões…

§13 O FUNCIONAMENTO DAS REGRAS FORMAIS E O SISTEMA:

Interpretação e Aplicação das Normas: Coloca 3 problemas fundamentais:

O Direito aplica ao incumprimento da forma legalmente prescrita a sanção máxima


da nulidade (art 220 do CC).

A manutenção, nos atuais quadros civis, da categoria dos negócios formais, pode
ser, por vezes, uma fonte de desconexões e injustiças.

A invocação de nulidades formais, especialmente quando feita por quem as criou,


pode se revelar injusta

Regras Formais: A sua mera existência origina uma fonte de erros e dispêndios
que pode complicar o tráfego privado e a convivência entre as pessoas. São regras
especiais para os negócios, estando sob uma pressão que se reflete na
interpretação e aplicação das regras em causa. Caso seja cumprido livremente um
negócio jurídico sem forma pode haver sanção

Nulidade: Negócio que não aplique as regras da forma, é sempre invocável por
qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal (art. 286).

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Mecanismos de Redução Teleológica: As regras formais e a nulidade visam a


publicidade, reflexão e facilidade de provas. Quando estes valores estão
acautelados as regras em causa perdem a sua razão de ser, deixando de ter
aplicação por redução teleológica.

Excecionais: Implicam a inexistência de lacunas ou demonstram uma inaptidão de


princípio para ultrapassar o seu âmbito de previsão. Não comportam uma redução
teleológica.Aqui enquadram-se as regras relativas à forma

Esquemas para amenizar as injustiças que decorrem:


art. 221/1 e 221/2: Podem surgir válidas cláusulas acessórias que não
assumam a forma legalmente exigida para o negócio.
art. 238/1 e 238/2: É possível retirar de um negócio formal um sentido que
tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento,
ainda que imperfeitamente expresso
art. 293: É possível converter um negócio nulo por falta de forma num outro
formalmente menos rigoroso, desde que verificado pelo circunstancialismo.

Inalegabilidades Formais: Situações em que a nulidade, derivada da


inobservância da forma legal prescrita para o determinado negócio jurídico, não
possa ser alegada sob pena de se verificar um “abuso de direito”, contrário à boa
fé(art 334º), como quando, por exemplo, uma das partes desconhecia o
incumprimento.

Venire Contra Factum Proprium: Aproxima-se da realidade das inalegabilidades


formais. O agente convence a contraparte a concluir um negócio nulo por falta de
forma ou a não cumprir a forma legal prescrita, de modo a, depois de fechar o
negócio, o considerar nulo quando lhe convier – abuso de direito (art. 334)
Posição da pessoa contra quem se faz valer a nulidade:

● A sua relação com o vício formal

Necessidade de boa-fé subjetiva por parte de quem queira fazer valer a


inalegabilidade. A boa-fé subjetiva- comporta deveres de indagação e informação
de intensidade acrescida, dada a rigidez das normas em jogo, e visto o
conhecimento generalizado que existe da necessidade de forma solene, para certos
atos. Existem situações concretas especiais (ex. A violação de um forte dever de
lealdade, a cargo da parte depois interessada em invocar a invalidade formal,
lealdade essa que deveria ter obviado à nulidade

● As consequências para ela emergentes da nulidade

Inalegabilidade surge justificada apenas quando a destruição do negócio tivesse,


para a parte contra a qual é atuada, efeitos “não apenas duros, mas insuportáveis”
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Nenhuma disposição ou princípio legal excluam, em concreto, a inalegabilidade e


que não haja outra solução para o caso.
Contudo, não estão sempre todos presentes, Cannaris afirma que os diversos
critérios se articulam em termos de um sistema móvel.
Doutrina da confiança- “ o doloso provoca, na outra parte, a impressão de que o
negócio é eficaz e assume, assim confiança desta: deve responder, pois, pela
situação de confiança obtida”. A base positiva da confiança está na prescrição geral
da boa-fé- 334ºe também para as obrigações 762º \2

Devido a divergências doutrina\ jurisprudência


A inalegabilidade aproxima-se do venire contra factum proprium, requerendo como
ele

● A situação de confiança
● A justificação para a confiança
● O investimento de confiança
● A imputação de confiança ao responsável que irá, depois, arcar com as
consequências

Proposições Essenciais das Inalegabilidades Formais:


● Devem estar em jogo apenas os interesses das partes envolvidas, nunca
também os de terceiros de boa fé.
● A situação de confiança deve ser censuravelmente imputável à pessoa a
responsabilizar.
● O investimento da confiança apresentar-se-á sensível, sendo dificilmente
assegurado por outra fé.

Extensão da Forma:

Forma Legal: Forma exigida pela lei para determinada declaração negocial, trata,
fundamentalmente, de apurar o âmbito de aplicação das competentes normas. As
regras que prescrevem uma forma legal devem ser interpretadas em termos diretos,
encostados à letra da lei. Opera perante o cerne negocial, as estipulações
acessórias só lhes sujeitam quando a razão determinante da forma lhes seja
aplicável.
Negócios Coligados: Não deve haver acessoriedade (art. 221º/1 e 2),
seguindo cada um a forma legal que lhes compita.
Contratos Mistos: Prevalece a forma mais exigente dos elementos presentes.
Estipulações Acessórias: Quando pertencem ao negócio considerado devem
seguir a forma por ele prescrita. Contudo, quando surgem em separado
podem ser anteriores ou contemporâneas à declaração negocial

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Forma Voluntária: No campo da autonomia privada, quando não é exigida por lei
ou convenção, mas é adotada, livremente, pelo declarante.
Estipulações Acessórias: Têm de observar a forma legal quando tal é exigido,
contudo, quando não existe essa exigência, são válidas independentemente
de serem anteriores, posteriores ou concomitantes, desde que correspondam
à vontade do declarante (art. 221 e 222)

Forma Convencional: Implica um pacto prévio no qual as partes combinam emitir


as suas declarações por um certo modo. Possibilidade lícita e eficaz ao abrigo da
autonomia privada. Se, em comum acordo, as partes escolherem não cumprir o
acordo, este é revogado de outra forma, só se houver suporto escrito é que o
acordo pode ser distratado (anulado), a menos que se trate de circunstâncias
especiais assentes na boa fé. A convenção de forma é constitutiva e não
declarativa.

14§ A CULPA IN CONTRAHENDO

Origem das Regras Pré-Negociais:

Origem Contratual: As partes decidem concluir pactos preparatórios. Envolve


desde contratos-promessa, a cartas de intenção, a outros negócios preliminares.
Estes contratos podem apresentar processos autónomos de formação, devendo ser
interpretados e aplicados dentro da lógica do processo a que pertençam.

Origem Legal Específica: Pode surgir em diferentes campos. A lei sobre cláusulas
contratuais gerais (LCCG) contém preceitos diretamente aplicáveis à formação dos
contratos que caiam sob o seu âmbito. Também as leis da defesa do consumidor
abrangem regras pré-contratuais. A articulação de regras específicas com os
princípios gerais coloca questões complexas a explicar dentro dos institutos a que
elas pertencem.

Origem Legal Genérica: Dever de proceder segundo as regras da boa-fé (art.


227º/1). Norma tradicional de teor indeterminado e que se torna incompreensível se
não seguirmos as suas origens e linhas da sua concretização.

Descoberta de Jhering (1861): Jhering demonstra que, na presença de contratos


nulos por anomalias na sua formação, podem ocorrer danos cujo não ressarcimento
seja injusto. Perante tal situação, o responsável, através de regras gerais sobre
danos e culpa, deveria indemnizar pelo interesse contratual negativo, colocando o
prejudicado na situação em que ele se encontraria se nunca tivesse havido

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negociações contrato nulo. Não se trata de indagar em termos rigorosos o alcance


das fontes, mas antes de apurar as soluções mais adequadas perante a Ciência do
Direito.

15§ O PAPEL DA CULPA IN CONTRAHENDO:

Culpa in Contrahendo (CIC): Antes da formação do contrato, as partes já têm


diversos deveres a respeitar e, designadamente, deveres de proteção, de lealdade e
de informação, tais deveres visam prevenir que, nessa fase pré-contratual, alguma
das partes possa atingir a confiança da outra, provocando-lhe danos

Casos que a CIC vem Contemplar/Necessidades que vem Satisfazer:


Ressarcimento de Danos Causados na Fase Pré-Contratual a Pessoas ou
Bens: Estão em jogo deveres de segurança que as partes devem
providenciar para que, nas negociações, ninguém sofra danos, seja na sua
saúde ou integridade física, seja no seu património. Construção de um dever
à segurança.
Circulação, Entre as Partes, de Todas as Informações Necessárias para a
Contratação: Dever de informação(art.227º) pré-contratual de toda a
informação que possa, até de modo indireto, afetar os contratantes.
Alargamento exponencial da área dos deveres preliminares.
Ligada à Atuação das Partes: Há deveres de lealdade, as partes não podem,
em contrahendo, adotar comportamentos que se desviem da procura, ainda
que eventual, de um contrato, nem assumir atitudes que induzam em erro ou
provoquem danos injustificados. Os deveres de lealdade distinguem-se dos
de informação por entrarem, mais do que numa questão de comunicação,
numa questão de conduta.

Constelações de Casos: Concretizam os deveres de segurança, informação e


lealdade pré-negociais.
Vulnerabilidade Pré-Negocial: Documenta-se nas múltiplas situações em que,
à mercê de contratos pré-negociais, uma das partes fica nas mãos da outra
ou, pelo menos, se coloca numa situação de especial fraqueza, dependendo
de deveres de segurança, informação, ou lealdade, a cargo dessa outra.
Contratação Ineficaz: Quando se origina um contrato nulo ou um contrato
impugnável (anulável), pode originar responsabilidade pré-negocial. A prática
revela situações de dolo na conclusão do contrato, podendo levar à
anulabilidade ou a CIC.

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Interrupção Injustificada de Negociações: Conflito entre a boa fé e a


autonomia privada, podendo levar a CIC, uma vez que o desistente pode,
com a sua conduta, originar, no outro contratante, desconfiança, pois este
tinha certeza na formação do contrato.
Tutela da Parte Fraca: Concretiza-se nas relações com os consumidores e
nas áreas sensíveis de banca e dos seguros através dos deveres de
informação. O desenvolvimento de regras especiais, como cláusulas
contratuais gerais, vem concorrer com a CIC.
Responsabilidade por Atos de Terceiros: Casos em que a CIC abrange
terceiros que possam estar envolvidos na conclusão do contrato. Nessa
situação, o representante responde pela CIC, a título pessoal, na hipótese de
quebra de deveres preliminares que lhe sejam dirigidos. O Direito atual
dispõe de meios para ultrapassar as clássicas separações conceituais entre
esferas de imputação.
Proteção de Contraente Débil: Na negociação preliminar, as partes são
formalmente iguais, com tudo, por motivos económicos, sociais, de apoio jurídico,
..., tende a haver uma das partes em situação de supremacia. Assim, são criados
diversos dispositivos, como deveres de informação na Lei das Cláusulas Contratuais
Gerais, de modo a proteger estes contraentes débeis. Geralmente, esta parte fraca
deve ser vista como o cidadão comum isolado, daí a ligação deste tema aos direitos
dos consumidores. A CIC, apesar de apresentar um papel fundamental na correção
dos contratos injustos através da boa fé, não pode ser levada ao ponto de pôr em
causa a autonomia privada.

Obrigação de Contratar: Situação jurídica pela qual um sujeito (o obrigado) é


forçado à celebração de um contrato, ou seja, à emissão da declaração de vontade
que, em conjunto com a da outra parte, dá azo a um negócio jurídico bilateral. Esta
obrigação surge como um corpo estranho na lógica civil por colocar em causa a
autonomia privada. Exige uma forte situação de confiança, imputável à contraparte,
de que o contrato em jogo iria ser celebrado. O dever de contratar surge:

Por Expressa Injunção Legal: Em caso de monopólios ou serviços vitais

Na Falta de Previsão Legal Através de:


Um prévio acordo nesse sentido com natural relevo para o contrato-promessa
(art. 410)
Uma exigência de boa-fé (art. 227/1)

Boa Fé e os Valores do Sistema: Apesar da autonomia privada, conserva-se uma


preocupação de equilíbrio e de proporcionalidade no exercício dos direitos e das
diversas posições jurídicas, em geral, através da boa fé, obrigando:

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Tutela da Confiança: Na fase de preparação dos contratos, as partes não devem


suscitar situações de confiança que depois venham a frustrar – a violação da
confiança legítima provoca responsabilidade

Primazia da Materialidade Subjacente: A autonomia privada faculta, às partes,


negociar livremente os seus contratos, interrompendo as negociações quando o
entenderem – negociação estranha à autonomia privada é contrária à boa-fé.

16§ A CONSTRUÇÃO DA CULPA IN CONTRAHENDO:

O art.227º/2 remete para a prescrição (art.498º).

- Trata-se de uma previsão de prescrição subjetiva, uma vez que começa a correr não a
partir do momento em que o direito possa ser exercido (art.306º/1), mas apenas quando o
titular dele tenha conhecimento, ainda que ignorando a identidade do responsável ou a
extensão dos danos, sendo prazo de três anos.

Teorias Contratuais: A natureza jurídica da culpa in contrahendo suscitou largas


divergências doutrinárias. De modo a facultar o desenvolvimento da matéria,
surgiram várias doutrinas explicativas que se agrupam em 2 pólos.

Soluções Negociais: Procuram reconduzir a CIC e os deveres que a ela se ligam a


negócios jurídicos.
Visão de Franz Leonhard: Reconduz a CIC ao contrato posteriormente
celebrado. O efetivo cumprimento de um contrato exige o acatamento de
deveres que se desenham antes da sua celebração. Existe uma “pré-eficácia”
– celebrado um negócio, certos deveres teriam efeitos retroativos até ao
início das negociações. Críticas:
Ilógico: Assenta na ideia de pré-eficácia que é contraditória em si
mesma, pois, antes do contrato, não podem dele ser retirados deveres
a observar e depois do contrato já não estamos numa fase
pré-negocial.
Excessiva Restrição: Só contempla a hipótese de haver um contrato
válido, mas que causou danos na sua celebração. Não permite
resolver os problemas que causaram a descoberta de Jhering.
Visão de Henrich Siber: Filia os deveres pré-contratuais na celebração de um
contrato preparatório no início das negociações. Ao aceitar negociar a
eventual procura de um consenso contratual, as partes estariam, desde logo,
a aceitar, pelo menos, algumas regras do jogo. Entre outros aspetos,
assumiram o compromisso de não se prejudicarem mutuamente. Críticas:
Ficciosa: Nas declarações comuns não se descobrem quaisquer
declarações destinadas a originar um consenso que permita retirar
deveres de comportamento minimamente consistentes.

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Soluções Legais: Remetem a base de figura para a lei. As partes devem, desde
logo, observar certos deveres que a lei exija. A remissão da CIC para a lei surge,
assim, bastante clara, pois qualquer construção jurídica deve radicar no Direito
objetivo (lei).
Teoria da Relação Contratual de Facto (Gunther Haupt): As partes
conseguiriam, através de puras condutas materiais, originar situações
semelhantes a contratos, mas sem qualquer declaração a tanto destinado.
Dentro destas situações estariam os negócios preliminares. Aplica-se, por
analogia, o regime dos contratos. Esta doutrina não se limita a CIC.
Teoria dos Deveres Extralegais (Hans Dolle): Aprofundando a ideia das
relações contratuais, apura que, em situações de acrescida proximidade,
surgiria uma especial confiança entre as partes que não poderia ser
desamparada. Impor-se-iam deveres de informação e de comunicação que
poderiam ser apoiados na boa-fé ou numa interpretação alargada da vontade
das partes.
Nota:Há limites para os deveres de informação, art 253º. Há uma distinção
entre dolo bónus e dolo malus.
O dolo bonus, art 253º/2 não haverá dolo que justifique recorrer ao 254º. Por
sua vez, o dolo malus é a violação do dever de informar, elegível no art 277º,
e é anulável segundo o art 254º
Teoria da Confiança (Kurt Ballerstedt): Na presença de negociações
assistir-se-ia à criação de uma situação de confiança e ao aproveitamento da
mesma pela outra parte. Esta orientação sublinha a voluntariedade da
situação de base, a presença de confiança e o apelo ao sistema subjacente.
Teoria da Autovinculação Sem Contrato (Johannes Kongden): Análise
comparatística alargada e de uma ponderação sociológica, apresentando
uma ideia de “autovinculação sem contrato”. Os agentes, através de condutas
comunicativas, criam, uns nos outros, expectativas de condutas futuras.
Conduz a uma ideia de autovinculação devido à vinculabilidade da promessa.
Apoio sociológico e proteção da teoria da confiança.
Teoria dos Deveres Unitários (Claus Wilhem Canaris): Sistematiza
pressupostos da tutela da confiança, aplicados pela nossa jurisprudência que
preconizam a existência de um dever unitário de proteção de base legal e
que, surgindo in contrahendo, se mantém na vigência do negócio e na sua
própria nulidade, sobrevivendo-lhe, ainda, post pactum finitum.

Abordagem pela Responsabilidade: Perante a inobservância das condutas


permitidas pela CIC, é colocada a possibilidade de indemnizar. Na base do êxito
jurisprudencial da CIC esteve a possibilidade de a reconduzir ao instituto da
responsabilidade contratual ou obrigacional. Tipos de Responsabilidade:

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Responsabilidade Contratual ou Obrigacional: Tem em causa um vínculo


obrigacional específico. Corresponde à reação do ordenamento mais forte perante o
incumprimento – uma presunção de culpa (art. 799 CC), ficando imediatamente
computados todos os danos correspondentes aos valores assegurados pelo vínculo.

Responsabilidade Delitual ou Aquiliana: Por se julgar de um dever genérico, é


colocado em causa a liberdade das pessoas, reagindo à ordem de modo cauteloso
– não há presunção de culpa (art. 487/1 CC), e a causalidade tem de ser
estabelecida para se calcular a indemnização.

Estimação do Prejuízo da Parte Lesada em CIC:

Pelo Interesse Negativo: Prevalece a ideia de que as próprias negociações foram


ilícitas, devendo ser riscadas do mapa. O lesado vai receber uma indemnização que
permita colocá-lo na situação em que estaria caso nunca tivessem ocorrido tais
negociações. Serão computadas as despesas havidas, os cultos envolvidos e,
eventualmente, o esforço despendido, interesse da confiança que procura
determinar o quantum do investimento de confiança perdido.

Pelo Interesse Positivo: Ilícita foi a interrupção das negociações ou a incapacidade


de, por elas, se chegar a um contrato válido e eficaz. A indemnização vai procurar
colocar o lesado na situação em que estaria caso o contrato tivesse sido válido e
eficaz. Interesse do cumprimento, visa assegurar o valor futuro perdido por via da
CIC.

Por uma Terceira Via: Surge da preocupação de ordenar a CIC, em conjunto com
outros institutos derivados da boa fé e que poderiam envolver responsabilidade
entre a responsabilidade contratual e a aquiliana. Tornada desnecessária pelo BGB
em 2001.

Frustração das Despesas: Quem, tendo em conta a conclusão de um contrato,


realize despesas que, depois, se venham a revelar inúteis pode ser ressarcido pelos
seus montantes. As despesas desaproveitadas integram o interesse negativo.
Modos de imputar as despesas ao agente:

Presunção da Rendibilidade: Parte do princípio que as despesas efetuadas pelo


lesado iriam frutificar, não sendo inúteis, pelo que a sua frustração poria termo a
esse processo.

Equivalência: O lesado assume, ou iria assumir, encargos entre os quais despesas,


numa lógica de equivalência com a contraprestação. Suprimida esta, cair-se-ia na

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necessidade de reequilibrar a situação, o que implicaria a indemnização das


despesas.

Doutrina da Confiança: Diz-nos que as despesas foram efetuadas na base da


crença legítima que haveria contrato. A CIC quebra essa confiança, justificando a
indemnização.

“Solução” (associada ao BGB): Na presença de um vínculo obrigacional há


deveres de proteção na integridade patrimonial que abrangem as despesas
alegadamente realizadas, em função do contrato ou tendo em vista o que se iria
contratar. Estes deveres de proteção determinam a imputação do dono e delimitam
o seu montante, assentes na boa (art. 227/1 e 762/2)

Obrigação In Contrahendo: Une duas pessoas concretas e assume um conteúdo


moldado pelo caso concreto, mas previsível e cognoscível, assim, a sua violação dá
azo a uma clara responsabilidade obrigacional. O teor desta responsabilidade pode
ser mais ténue quando se trata de contratos pouco mais do que ocasionais mas de
maior intensidade em casos que chegue a obrigação de contratar. Estrutura típica
da obrigação:

Prestações Principais: Traduzem atuações primordialmente atribuídos às partes e


que dão o teor básico de obrigação considera.

Prestações Secundárias: Exprimem outras atuações acordadas pelas partes ou


integrantes do tipo negocial perfilhado e que se destinam a complementar as
prestações principais.

Deveres Acessórios: Correspondem a exigências do sistema jurídico, veiculadas


pela ideia de boa-fé. Asseguram que os objetivos últimos do vínculo obrigacional
complexo são, efetivamente, prosseguidos na sua materialidade. Protegem o
património em as próprias partes, prevenindo danos. Dão corpo às exigências
axiológicas nucleadas da tutela da confiança.

18§ A CONCRETIZAÇÃO DA CULPA IN CONTRAHENDO:


Doutrina discute natureza jurídica desta responsabilidade:

Se é responsabilidade extra obrigacional por não se estar perante um contrato.

● Neste caso, aplicam- se pressupostos da responsabilidade extra obrigacional


constantes do art.483º/1
Se é responsabilidade obrigacional/contratual por já se estar em ambiente
contratual.
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● Neste caso são aplicáveis os pressupostos da responsabilidade civil


contratual constantes do art.798º.
● MC- considera que responsabilidade pela CIC é contratual, porque já se
está num ambiente negocial, a formação do negócio jurídico já cria um
ambiente contratual.
● Regente- concorda, exceto no caso dos deveres de proteção em que não há
relação entre o contrato e o dano e não havendo relação, é responsabilidade
aquiliana. Mas nos outros casos, ou seja, frustração deveres de informação e
de lealdade há responsabilidade contratual, o que permite acionar a
presunção de ilicitude e culpa do art.799º/1.

Análise do art. 227 do CC: Prefigura uma formação de contratos, os seguintes


tratam a conclusão contratual. Aplica-se a negócios e a atos jurídicos (art. 295).

227/1:
“negociar”: A CIC não se manifesta apenas perante negociações, abrangendo
os deveres de segurança pré-negociais que surgem independentemente de
quaisquer negociações, formais ou informais. Basta uma especial
proximidade que tenha a ver com a conclusão de um negócio para que ocorra
a relação pré-negocial complexa.
“tanto nos preliminares como na forma”:
“preliminares”: Pressupõe toda a troca de informações necessárias
para haver um acordo.
“formação”: Exprime a formalização do acordo, designadamente,
quando é requerida alguma atividade de documentação.
“proceder segundo as regras de boa fé”: Faz apelo à “lisura”, “honestidade”,
“práticas corretas”, “lealdade”, “decência” e “ética dos negócios”.
“boa-fé”: É objetiva, equivalendo a uma remissão para os valores
fundamentais do sistema presentes nas situações consideradas. Os
valores em causa são mediados pelos princípios da tutela, da
confiança e da primazia da materialidade subjacente. O seu alcance é
inesgotável, chegando a deveres como o de segurança, informação ou
lealdade (art. 437/1 e 762/2)
“sob pena de responsabilidade pelos danos que culposamente causar à outra
parte”: Não delimita nem exclui quaisquer danos – são todos os
“culposamente causados”.
“culposamente”: Juízo de culpa, ou seja, censura jurídica sobre quem
não obedeça, conscientemente, a uma norma jurídica. Abrange o dolo
e a negligência. Estamos perante uma situação de responsabilidade
obrigacional quando, pelo art. 799/1 do CC, se presuma culpa.
Inobservância das regras da boa fé.
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227/2: Remete, no tocante à prescrição, para o art. 498 do CC. Previsão de


prescrição subjetiva, pois não começa a correr a partir do momento em que o Direito
possa ser exercido (art. 306/1), mas apenas quando o titular dele tenha
conhecimento, ainda que ignorando a identidade do responsável ou a extensão dos
danos.

Não aplicação da Culpa In Contrahendo: Casos em que a parte queixosa ou


violara também a relação pré-contratual ou estava na posse de elementos que lhe
permitam não cair em confiança. E em casos em que se não provem danos, não se
mostre que o interessado desconhecia informação vital ou em que falte causalidade.

Indemnização:

Jhering: Limitou a indemnização ao interesse negativo, ou seja, ao prejuízo que o


indivíduo não teria tido se não tivesse começado as negociações prejudiciais. No
cômputo da indemnização, haveria que somar os valores relativos a despesas e
encargos suportados por via das negociações falhadas. Restringe a indemnização
às despesas falhadas que podem ser muito difíceis de provar.
Interesse Positivo: A parte lesada tinha o direito à conclusão de um contrato
válido, logo os lucros frustrados que teriam sido proporcionados devem ser a base
do cálculo da indemnização.

Cálculo da Indemnização: O agente deve indemnizar o lesado pelos danos


causados nos bens jurídicos protegidos pela obrigação violada, tendo de ser tomada
em atenção a fase negocial de que se trate, o tipo de dever e o bem jurídico
atingido.
Dever de Segurança: Devem ser indemnizados todos os danos pessoais,
patrimoniais e morais que possam, causalmente, ser imputados ao agente.
Está em causa o “interesse de integridade” (que não é positivo nem
negativo).
Dever de Informação: Surgem na fase exploratória e intensificam-se na das
negociações informais formais. Incumbem à parte que esteja na posição de
informar - incide sobre a parte fraca.
Em Casos de Violação: Obriga a questionar “qual a informação
omitida/falsamente transmitida”, “que valores visava o dever de
informar proteger” e “que danos foram causado nesses valores”.
Deveres de Lealdade: Surgem com as negociações informais e agravam-se
nas etapas subsequentes. Quando impliquem quebras no sigilo ou violações
de leal concorrência ficam abrangidos os diversos danos aferidos pelo
interesse negativo.

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Fase dos Deveres Pré-Negociais:

Proximidade Negocial: As partes colocam-se de tal modo que possam ser


atingidas pelas condutas uma da outra – surgem deveres de segurança
elementares.

Contactos Exploratórios: As partes comunicam, visitam instalações ou analisam


mercadorias. Existem deveres de segurança acrescidos e, eventualmente, de
informação – estes dois prolongam-se para as seguintes fases.

Negociações Informais: As partes procuram concluir um negócio, podendo ser


trocadas informações sensíveis, haver despesas preparatórias com a contratação
de terceiros. Procura-se assentar num texto com cedências múltiplas, havendo
expectativas para o futuro. Intensificam-se os deveres de confiança e os de lealdade
crescem no sentido de uma obrigação de prevenir, com a necessária veemência,
não haver contrato, se tal for o caso.

Acordo: As partes assentam em todos os pontos e põem-se de acordo, faltando


apenas a formalização e, eventualmente, a preparação dos documentos para tal
necessários. A lealdade atinge um grau máximo, não devendo haver já nada a
informar.

Execução: Por vezes, após o acordo, mas antes da sua formalização, as partes
podem executar, desde logo, o negócio alcançado

19§ ATOS PREPARATÓRIOS:

Atos Preparatórios: Todos os atos que, inserindo-se, pelo seu objetivo, no


processo de formação de um contrato, não possam reconduzir-se à proposta,
aceitação ou rejeição, relativamente ao contrato definitivamente pretendido. São
materiais ou jurídicos consoante tenham efeitos no mundo material ou jurídico.
Surgem de tal modo incisivos e habituais que suscitam, no plano das realidades
sociais, a possibilidade de aplicação de regras adaptadas.

Atos Preparatórios Materiais: Incluem-se neles, como categoria autonomizável os


contactos preliminares em que as partes se procuram conhecer e indagar a possível
negociação dos seus interesses.

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Atos Preparatórios Jurídicos: Dizem-se “vinculativos” ou “não-vinculativos”


conforme obriguem, ou não, as partes ulteriores.

Atos Típicos: Atos preparatórios tipificados na lei ou na prática social.


Ato Preparatório Socialmente Tipificado:
Minuta/Punctação: Documento no qual as partes vão registando, por
escrito, os diversos pontos a inserir no futuro contrato, à medida que
sejam acordados. Na doutrina tradicional, o contrato é aprovado no
seu todo, logo, os pontos sectoriais acordados, mesmo quando
lançados num papel, não vinculam os contraentes antes da aprovação
global final (princípio da aprovação global final).
Ato Preparatório Legalmente Tipificado: Surgem diversos contratos
instrumentais, ou seja, contratos que não visam regular, de modo direto, o
conteúdo que integrará o convênio definitivo, mas, tão-só, aspetos que, a ele
irão conduzir. Cabe referir:
Convenção das partes sobre a forma do futuro eventual do contrato
(art 223).
Convenção das partes sobre o valor do silêncio (art 218)
Convenção das partes sobre o prazo de subsistência de eventuais
propostas (art. 228/1, al. a) )
Contrato-Promessa ou contrato pelo qual as partes se obrigam a
celebrar o contrato definitivo (art. 410 e seguintes).
Pacto de referência ou contrato pelo qual uma das partes se obriga a,
quando contratar, fazê-lo preferencialmente com a outra, desde que
esta acompanhe a oferta de um terceiro (art. 414 e seguintes).

Concurso para a Celebração de um Contrato: Corresponde a um ou mais atos


jurídicos destinados a promover o aparecimento de uma pluralidade de interessados
na conclusão de um contrato e, depois, a facultar, por escolha, a seleção de um
deles, para a celebração em causa. Todos os envolvidos no processo contratual,
diretamente ou a título de potenciais interessados, acordam, previamente, regras
para encontrar contratantes definitivos, restando, apenas aplicar o regime do
contrato e, tendencialmente, as regras relativas ao contrato promessa.

Elementos Essenciais: Existência de pluralidade de interessados e a escolha.

Razões para o Concurso:


Escolha do Parceiro Mais Idóneo: Dada a complexidade das sociedades
técnicas, a pessoa interessada em contratar não conhece, muitas vezes, os
potenciais parceiros, assim, o concurso vai criar publicidade alargada,
trazendo possíveis contratempos que irão facilitar a escolha.

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Aproveitamento dos Mecanismos de Concorrência: Ao abrir um concurso, o


interessado dirige-se aos eventuais interessados que, para obter o lugar, vão
oferecer melhores condições, procurando ultrapassar-se uns aos outros.
Procura da Melhor Gestão: O dono do curso pode não ter ideias assentes
quanto ao contrato a celebrar, pelo que os interessados a concorrer vão
apresentar propostas globais de onde se irá buscar a melhor proposta de
gestão possível (ex: na recuperação de uma empresa)
Legitimação da Escolha: Para a celebração de um contrato, a legitimidade
material advém da autonomia privada, podendo ir mais longe se ficar na
comunidade jurídica, não só a ideia de que havia o direito de celebrar tal
contrato, como que foi escolhido o melhor contratante.

Tipos de Concurso: Consoante o contrato e pode ser administrativo civil,


comercial, para compra, empreitada, aquisição de móveis ou imóveis ou obtenção
de serviços.

Destinatários: Pessoas que podem participar no concurso. Pode ser a nível


internacional, nacional, europeu, regional, local, ...

Concurso Público: Concurso Limitado:

Podem se apresentar quaisquer Podem se apenas apresentar entidades


parceiros que reúnam as condições especialmente convidadas pelo autor
genericamente referidas nos próprios do concurso.
termos de abertura do concurso.

Concurso Unilateral: Apenas o seu dono procede à abertura e aprovação dos


termos, havendo que interpretar a declaração do interessado para apurar as regras
aplicáveis.

Finalidade:
Indicativa: Fonte de Informações para o autor do concurso.
Vinculativa: Integrar com efetividade num processo tendente à formação de
um contrato.

Abertura: Implica uma série de regras processuais e substantivas


Regras Processuais: Relacionadas com os comportamentos instrumentais a
observar pelos envolvidos na fase preparatória – entrega de propostas e
documentos, prazos, modo de abertura, ...
Regras Substantivas: Ligam-se aos valores a ponderar por via do concurso e
fixam os quadros relativos próprio contrato a celebrar, isto é, o tipo de
contrato de que se trata.

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Regime: Vincula o seu autor e deve seguir 3 princípios:


Princípio do Cumprimento das Vinculações Unilateralmente Assumidas: art.
459 do CC
Princípio da Boa Fé na Vertente de Tutela da Confiança: Não pode uma
pessoa gerar, na comunidade jurídica, a convicção de que, para a celebração
de um contrato será seguida certa metodologia, e depois quebrar essa
confiança.
Tutela da Confiança Pré-Contratual: No limite, quem viole normas que o
próprio tenha adotado para um concurso público incorre na culpa in
contrahendo ou em venire contra factum proprium.

20§ NEGÓCIOS MITIGADOS:

Acordos de Cavalheiros: Convénio que as partes pretendem deixar fora do Direito,


podendo, teoricamente, recair sobre quaisquer assuntos patrimoniais ou pessoais.
Assenta na palavra dada e na honra de quem a dá. Mais vinculativo do que
qualquer vínculo jurídico pois o cavalheiro honrará sempre a sua palavra,
independentemente do preço ou circunstâncias. Não é Direito.

Proteção Jurídica: As obrigações naturais não são viáveis nos casos admitidos por
lei (art. 809)
Num acordo de cavalheiros em que alguém compra um automóvel pagando
ao vencedor o preço que entender justo ou é nulo (art. 280/1) ou encontrará
um preço fixado no art. 883/1.
Num acordo de cavalheiros em que alguém empresta uma quantia a outrem
que pagará quando puder (art. 778)
Num acordo de cavalheiros em que as partes vão celebrar um certo contrato,
ou os requisitos legais exigidos na forma são satisfeitos e o contrato vale
como tal, ou não opera, juridicamente.

Contratação Mitigada: Espaço que fica entre a completa ausência de compromisso


e contrato definitivo. São estabelecidos vínculos lassos, de conteúdo variável e com
uma futura composição de interesses. Decorre da prática de negócios. Exemplos:

Tratativas: Troca de correspondência e abordagem preliminar.

Carta de Intenção: Declaração que consigna uma vontade já sedimentada de


concluir certo contrato. Usada muito no comércio internacional onde, devido à
diversidade linguística se recorre, preliminarmente, a instrumentos mais simples.

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Utilizada para demonstrar uma vontade séria de adquirir, de modo a dar início às
auditorias.

Acordo de Negociação: Ocorre em negociações complexas e consiga uma


vontade comum das partes de executar, desde logo, certos pontos, prosseguindo na
negociação, dentro de determinados parâmetros.

Acordo de Base: Também em negociações complexas, podem as partes, obtido


um acordo em área nuclear, formalizá-lo desde logo, prosseguindo, depois, as
negociações, a nível técnico, para aplainar aspetos secundários.

Acordo-Quadro: Em negociações tendentes a originar múltiplos contratos, as


partes assentam num núcleo comum todos eles.

Protocolo Complementar: Visando um contrato nuclear, as partes concluem um


convénio acessório, tendente a complementá-lo.

21§ O PROCESSO DE FORMAÇÃO DOS CONTRATOS:

Contrato entre Ausentes: As partes não estão, necessariamente, fisicamente


separadas, apenas de verifica que a proposta não é seguida de aceitação
imediatamente. Existe um período que prevê a manutenção de proposta – art. 224,
228 e 235.
Desvios Durante a Formação do Contrato:
Limita-se ao Contrato de Duas Partes (Bilateral): Exclui negócios unilaterais
ou plurilaterais.
Ignora Contratos entre Presentes: Como os negócios do dia-a-dia, em
particular os concluídos por comportamentos concludentes ou por uma
simples aceitação de uma oferta ao público.
Contrato entre presentes: Momentos temporais da proposta e da aceitação
tendem a convergir. É possível ocorrer imediatamente após a proposta, uma
aceitação

Proposta: Declaração feita por uma das partes e que, uma vez aceite pela outra, dá
lugar ao aparecimento de um contrato. No contrato entre ausentes é a primeira
declaração.

Requisitos:
Ser Completa: Deve abranger todos os pontos a integrar num futuro contrato,
incluindo os aspetos necessariamente precisados pelos contratantes (ex:
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identidade das partes, objeto a vender, preço) e os que podem ser supridos
pela lei (normas supletivas que as partes decidem moldar pela sua autonomia
privada).
Revelar um Intenção Inequívoca de Contratos: Não existe proposta quando a
declaração do “proponente” for feita em termos dubitativos ou hipotéticos. A
proposta deve ser firme para poder dar lugar ao contrato.
Revestir a Forma Requerida o Negócio em Jogo,Não significa que num
negócio formal, por ex. uma declaração verbal não tenha valor, esta vale por
exemplo para a interpretação do negócio, mas vale como declaração
intermédia e não como proposta.

Complementações: Aspetos que as partes possam querer adicionar ao contrato.


O contrato pode conter mais aspetos do que a proposta: Adição de normas
supletivas.
O contrato pode ter mais espaços em branco para completar com outras
fontes: Não são competência de normas supletivas (ex: preço quando não é
fixado pelas partes nos termos do art. 883/1).
O proponente pode remeter para o destinatário a faculdade de complementar
a proposta: O proponente fica vinculado.
São possíveis lacunas: Dispõe do esquema do art. 239.
As partes podem concluir um negócio incompleto: Remetem para o futuro a
negociação destinada a complementá-lo.

Aceitação: Critério final para decidir a completude de uma proposta pelo art. 232,
236 e 237.

Eficácia da Proposta Contratual: Consiste, essencialmente, em promover, na


esfera do destinatário, o direito potestativo (dependente da vontade de uma das
partes) de, pela aceitação, fazer nascer o contrato proposto.

Duração da Eficácia da Proposta:


O momento até ao qual o autor da proposta fica vinculado por esta está legislado
nos arts. 224º e 228º
Art. 228/1 do CC:
Se for fixado um prazo para a aceitação pelo proponente ou por
acordo de partes, a proposta mantém-se até ao seu termo (art. 228/1,
al. a)
Se não for fixado um prazo, mas o proponente pedir resposta imediata,
esta ir-se-á conservar até que, em condições normais, ela e a
aceitação cheguem ao seu destino (art. 228/1, al. b)

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Se nada for dito, a proposta subsiste pelo período que, em condições


normais, possibilite que a proposta e a aceitação cheguem aos seus
destinatários, acrescidos 5 dias (art. 228/1, al. c) )
Determinação do Período de “Condições Normais”: Deve ser determinado em
abstrato e tendo em conta o meio utilizado pelo proponente para enviar a sua
declaração.
Tempo Mínimo: É utilizado um meio rápido de comunicação (ex: fax,
e-mail, telegrama)
Tempo Maior: Utilização do correio, podendo depender da distância e
do tipo de correio.
O MC diz que em casos de cartas ou postais conjuga-se o
228º/1 com o254º/2 do CPC Salvo em casos de carta registada
ou de situação certificada, quando o proponente utiliza o correio
e peça resposta imediata, esta tem de chegar nos 6 dias
subsequentes (3 + 3 de envio da carta). O prazo passa a 11 dias
se, ao fim dos 6, não surgir resposta.
Se acabar nem domingo ou feriado, transfere-se para o dia útil
seguinte.

Modos que podem conduzir à extinção da proposta:


Decurso do Prazo: Extingue, por caducidade, a proposta, tendo em
conta o 228/1. Se o proponente declarar que a sua proposta se
manterá indefinidamente, a sua proposta vai expirar ao fim de 20 anos
(art. 309)
Revogação: Ato unilateral praticado pelo proponente que visa a
extinção da proposta emitida. Só é possível enquanto não há contrato
só é possível, pelo art. 230, por 2 vias
Se o proponente se tiver reservado a faculdade de revogar (art.
230/1).
Se a revogação for recebida antes ou ao mesmo tempo que a
proposta.
Aceitação: A proposta desaparece, dando lugar ao contrato.
Rejeição
Outras:
Morte ou incapacidade do proponente – art. 231/1 e 226/1
Morte ou incapacidade do destinatário – art. 231/1
Ilegitimidade superveniente do proponente anterior à receção da
proposta – art. 226/2

Oferta ao Público: Dirigido à generalidade das pessoas, deve reunir os três


requisitos (completa, com a intenção de inequívoca de contratar, na forma legal
prescrita). Forma adequada de proporcionar muitos contratos com esforço e custo

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mínimos, por parte dos celebrantes. Contida indiretamente na lei, segundo o artigo
230/3

Convite a Contratar: Através de vários meios, as entidades interessadas
incitam pessoas indeterminadas a contratar (ex: publicidade)
Proposta feita a uma pessoa desconhecida ou de paradeiro ignorado:
Proposta comum com destinatários específicos, de quem se desconhece a
identidade ou paradeiro. Há quem procede a um anúncio público – art. 225
CC
Cláusulas Contratuais Gerais: Não surgem como proposta, implicando uma
rigidez que não se transforma, necessariamente, na oferta ao público.

Invitatio ad offerendum (convite a contratar): o “proponente” declara-se pronto a


receber propostas que, depois, poderá aceitar. Falta a firmeza, portadora da
vontade de vinculação, própria de verdadeira proposta. Técnica de contratação
típica de seguradoras, fazendo os seus clientes seguir a ideia das suas cláusulas de
contratação gerais. Insere-se numa lógica pré-negocial em que impera o princípio
da “boa fé” - art. 227/1.

Leilão: Técnica de Contratação pela qual o ofertante declara vender ao interessado


que sugerir o melhor preço. Não deve ser considerado como uma sucessão de
contratos por ter uma estrutura jurídica e social unitária. O seu regulamento é
decisivo.
Regras possíveis na disponibilidade do ofertante (clausulas contratuais
gerais):
Indicação de um valor mínimo que, a não ser lançado, bloqueia a
venda
Fixação de lances mínimos durante o leilão
Obrigação de pagar a pronto ou entregar logo parte do preço
Vias de entrega do objeto arrematado
Aceitação de uma Proposta: Declaração recipienda formulada pelo destinatário de
proposta negocial, ou por qualquer interessado em caso de oferta ao público. O seu
conteúdo deve ser de total concordância com o teor da declaração do proponente.
Pode ser expressa ou tácita – art. 217/1.

Características:
Traduzir uma concordância total e inequívoca.
Revestir a forma exigida para o contrato.

Espaços por preencher: O proponente aceita de antemão que sejam completos


pelo destinatário, tornando o conteúdo mais vasto.

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Efeitos: Nos termos do art. 224.


Receção Tardia: A aceitação produz os seus efeitos quando a proposta já não
tem eficácia

Art. 229:
Aceitação expedida fora de tempo: O proponente não tem nada a fazer a não
ser enviar nova proposta, caso continue a querer o negócio.
Aceitação expedida em tempo útil: O proponente deve avisar o aceitante que
não chegou a concluir-se qualquer contrato, sob pena de assumir prejuízos.

Revogação: Deve chegar a declaração revogatória ao poder do proponente, ou ser


por ele conhecida, antes ou em simultâneo com a aceitação.

Rejeição de uma proposta: Ato unilateral recipiendo pelo qual o destinatário


recusa a proposta contratual, renunciando ao direito a que dera lugar. Pode ser
expressa ou tácita. A rejeição pode ser revogada desde que a declaração chegue
ao proponente, ou dele seja conhecida, antes ou ao mesmo tempo da chegada da
rejeição – art 235/1.

Alterações: Qualquer aditamento, modificação ou limitação implica a rejeição da


proposta – art. 233, 1ª parte.

Contraproposta (ou proposta formulada pelo destinatário da primeira proposta):


Proposta contratual com a particularidade de implicar à rejeição de uma primeira
proposta. Deve ser inequívoca na vontade de contratar e assumir a forma requerida
para o contrato – art. 233, 2ª parte.

Dispensa da Declaração de Aceitação: Quando na proposta, a própria natureza


ou circunstância do negócio, ou os usos, tornam dispensável a declaração de
aceitação. Tem-se o contrato por concluído logo que a conduta da outra parte
mostre a intenção de aceitar a proposta – art. 234.

Traduz-se materialmente em:


Atos de Apropriação: Como o uso, a modificação, o consumo ou a disposição
das coisas objeto de oferta (mas não encomendada) – ex: abrir as páginas de
um livro, escrever um nome num livro, por um pão num cesto.
Atos de Cumprimento: Reserva de um hotel, execução de um negócio
Atos Concludentes: habituar tráfegos de massas.

Art. 234:
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Aspetos materiais de declaração sem aceitação:


Proposta: O proponente pode dispensar a declaração de aceitação,
mas não a aceitação em si.
Circunstâncias do Negócio: Abertura a comportamentos concludentes
e atos de apropriação.
Usos: No CC só são referidos quando há remissão legal. Investigação
à luz da tutela do consumidor.
Teorias que explicam os problemas levantados:
Teoria do exercício da vontade/do negócio de pura vontade: O preceito
não visa qualquer manifestação de vontade para concluir o negócio.
Teoria de dispensa de comunicação/do destinatário: Existe sempre
uma declaração de vontade de exteriorizada de alguma forma, mas
sem necessidade de envio ao proponente.

Natureza das Declarações Negociais:

Proposta:
Eficaz: Produz efeitos de Direito, fazendo surgir na esfera jurídica do
destinatário o direito potestativo à aceitação (facto jurídico latu sensu).
Livre: O proponente formula-a ao abrigo da sua autonomia privada existe
liberdade de celebração (ato jurídico latu sensu).
Conteúdo Livre: O proponente pode inserir na proposta as clausulas que
entender, devido à liberdade de celebração e surgindo o negócio jurídico.

22§ CONTRATAÇÃO AUTOMÁTICA E ELETRÓNICA:

Autómatos: Dispositivos automáticos capazes de assegurar, mediante um


pagamento, o fornecimento de determinados bens às pessoas interessadas.
Dispensam a presença atuante de um dos parceiros nos contratos. A declaração
feita pelo autómato pode ser de proposta ou aceitação mediante a vontade dos
programadores.

Teoria da Oferta Automática: A simples presença de um autómato pronto a


funcionar, mediante solicitação feita por um utente deve ser vista como uma oferta
ao público. Acionando o autómato, o utente aceitaria a proposta genérica formulada
pela entidade a quem fosse cometida a programação. O autómato é um simples
prolongamento, bastante explícito, da vontade cabal do proponente (pessoa que o
controla), entregando os bens à contraparte. Há contrato com a simples aceitação –

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qualquer falha subsequente surgirá como violação do contrato perpetrada pela


pessoa que recorreu ao autómato para celebrar o negócio.

Teoria da Aceitação Automática (Medicus): O simples acionar do autómato (por


exemplo ao colocar uma moeda) não provoca, necessariamente, a conclusão de um
contrato, tal só ocorrerá se o autómato não estiver vazio, ou seja, se o bem poder
ser solicitado. O contrato só se conclui através do funcionamento do autómato. A
instalação prévia desta representa, apenas, uma atividade preparatória, municiada
para aceitar, eventualmente, solicitações que lhe sejam dirigidas. Como o autómato
se limita a receber propostas, se não funcionar, não se dá uma violação do contrato,
mas sim uma não aceitação.

Liberdade de Estipulação: As opções competentes foram feitas pelo programador,


só podendo por ele ser alteradas, pelo que o autómato não tem liberdade de
decisão, sendo a última palavra do utente.
Oferta Ilimitada: Se o autómato poder responder a inúmeras solicitações dos
utentes, passa a caber a estes a iniciativa, e aos autómatos a aceitar ou
recusar.

Liberdade de Decisão: As opções foram de feitas pelo programador, só podendo


por ele ser alteradas, pelo que o autómato não tem liberdade de decisão, sendo a
última palavra do utente.

Negócio Celebrado entre Autómatos: Negócio celebrado entre computadores


programados para o efeito.

Contratação por Meios Eletrónicos/Via Internet: Enquadrada com recurso aos


esquemas negociais consagrados, acrescentando-lhe algumas cautelas vantajosas
para as empresas e particulares por tornar acessível bens e serviços numa escala
impensável. Apresenta deveres de informação acrescidos e atribui, ao adquirente,
um direito à resolução do contrato, caso se venha a arrepender da celebração do
contrato – decreto lei 7/2004 de 7 de janeiro.

Tutela do Contraente Aderente: Assente em 3 aspetos:

Direito acrescido à informação

Direito à resolução livre e à restituição do bem ou à desistência do serviço.

Direito a reaver o valor desembolsado


Vendas Automáticas: Vendas Especiais Esporádicas:

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Dispõe de comandos explícitos (art. 21 e Realizadas de forma ocasional, fora


23). dos estabelecimentos próprios.
Devem respeitar as regras gerais de Aplica-se, com adaptações, o regime
indicação de preços, rotulagem, de vendas ao domicílio (art. 24)
embalagem e condições Devem ser previamente comunicadas
higiéno-sanitárias (art. 22/1). às atividades competentes – como a
Utilizar equipamento que permita a ADSE (art 25)
recuperação da importância introduzida Vendas proibidas, depois da revisão
no caso de não fornecimento do bem ou de 2008, podem ser mais vendas
serviço solicitado (art. 22/1) ligadas (art. 30)
O equipamento automático deve exibir
uma série de informações (art. 22/2)
Responsabilidade solidária entre o
proprietário do componente e o dono do
local onde ele esteja colocado (art. 23)
(dentro do decreto-lei 143/2001 de 26 de Abril)
(dentro do decreto-lei 143/2001 de 26 de Abril)

Documentos Eletrónicos: Aqueles cujo suporte não é físico, mas “eletrónico” no


sentido mais amplo de modo a abarcar soluções eletromagnéticas e óticas. O
regime é-lhe aplicável, com modificações – para além do Decreto-Lei 290-D99 de 2
de Agosto.

Assinatura Digital: Esquema que permite a uma entidade dotada de uma “chave”
reconhecer e autenticar uma sequência digital proveniente do autor de uma missiva
eletrónica, de modo a autenticá-la – Decreto-Lei 290-D99 de 2 de Agosto.

CAPÍTULO 4: As Clausulas Contratuais Gerais

23§ O USO DAS CLAUSULAS CONTRATUAIS GERAIS:

Clausulas Contratuais Gerais (CCG): Proposições impessoais e pré-elaboradas


que os contratantes podem afetar para efeitos de conclusão do negócio –
Decreto-Lei 446/85 de 25 de Outubro. Filtram a doutrina do negócio jurídico.
Permitem uma contratação eficaz e de um elevado número de pessoas.


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Proposta: As CCG podem integrar, mas, em si, nada propõem uma vez que
não têm destinatários. Estão simplesmente disponíveis para a conclusão de
contratos.
Aceitação: Em casos como nos seguros, são aceites propostas, feitas pelos
interessados, que subscrevem as CCG.
Invitatio ad Offerendum: Apesar de poderem ser acompanhadas de convites
a ofertas, as CCG não têm, em si, esse papel por falta de destinatário.
Publicidade: No campo da atividade destinada a promover vendas ou a
angariar clientes podem surgir, em caso de êxito, CCG, mas que, no entanto,
não integram essa atividade nem são publicadas para o efeito.
Regulamento da Empresa: Adotado pela entidade empregadora, visa reger a
vida empresarial na margem em que ela dependa do poder de direção
patronal, embora de uma fonte privada, o regulamento é puramente
unilateral.
Usos: Muitas vezes, as CCG vêm codificar os usos, contudo estes não têm,
em si, força vinculativa, mas quando inseridos nas clausulas, ganham
natureza contratual. Mesmo assim, existem muitas CCG que não derivam de
usos.
Negócio de Consumo: As CCG, apesar de muitas vezes utilizados para
concluir negócios com consumidores, nem sempre o são.
Contrato Pré-Formulado: Assenta numa proposta que não admite
negociações e suscita a aplicação de regras semelhantes às das CCG, não
se confundindo com elas, que podem apresentar uma multiplicidade de
aplicações.

Funções das Clausulas Contratuais Gerais:


Rapidez: A negociação de um contrato pode ser algo muito demorado, como
não há limite, depende da (boa) vontade dos intervenientes. Algumas
situações da vida económico-social deveriam ocorrer com celeridade, por sua
vez, as CCG conseguem, através de um acordo explícito ou concludente
tomar a contratação imediata.
Racionalização: Necessidade de confecionar contratos idênticos ou paralelos
pode ser expressões variáveis como exigir os contratos como exigir os
contratos com um formato para o preenchimento (pré)tipificado de conceitos
indeterminados. É vantajosa não só para o utilizador de CCG como também
para o aderente por conseguir, mais facilmente, centrar informação em
aspetos sensíveis e consciencializar-se.
Colmatação de Lacunas: Absolutamente necessária perante os tipos sociais
(contratos conhecidos e construídos pela prática, não dispondo de tratamento
legal específico). O recurso às CCG permite transcender o vazio legal,
suprimindo, com flexibilidade, as lacunas da lei e facilitando adaptações.
Ordenação do Risco: Especialização da normalização. Todos os contratos
assumem riscos, normalmente pequenos, contudo, para quem lide com
grandes números, a multiplicidade de “riscos pequenos” pode ser fatal.
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Assim, é necessária uma ordenação de riscos e negócios de modo a não


inviabilizar o negócio. No topo, surgiram clausulas limitativas da
responsabilidade.
Confiança dos Interessados: Liga-se às regras de igual tratamento e às
necessidades de controlo e supervisão. A presença de companheiros
tranquiliza, numa asserção reforçada pelo igual tratamento que é, a todos,
dispensado. O particular aderente sente-se fortalecido pelos números dos
seus pares. E os Estado pode ter acesso ao figurino geral dos contratos das
áreas que supervisiona. A massificação regulada pode ser uma resposta
adequada ao possível desamparo provocado pelos poderosos.

Desvantagens

● Maior probabilidade de prejudicar parte fraca do negócio e de defender


melhor o autor- normalmente correspondem a um grande desequilíbrio
negocial. Necessário reforçar a tutela da parte fraca nestes contratos através
de um regime especifico.

Clausulas Internacionais: Destinadas a contratos conectados com mais de um


ordenamento, mas que também podem ser utilizadas no plano interno.
Clausulas Simplificadoras: Geralmente, traduzem-se por siglas e visam agilizar
contratos, especialmente no domínio dos transportes e da compra e venda.
Incoterms (international comercial terms): Traduzem cláusulas típicas de
elaboração privadas expressas por siglas de locuções em inglês e cuja
inclusão em contratos de rápida celebração e execução permite fixar regimes
claros e experimentados. Visam contratantes indeterminados e, quando
adorados por uma proposta de uma das partes, uma certa rigidez. Cláusulas
experimentadas e equilibradas sozinhas sem incorrer nas proibições das
LCCG. Devem seguir o indicado pela instituição, sempre sem prejuízo da sua
articulação global.
Grupos (4):
E (de “ex” – partidas): Obrigação mínima para o exportador da
mercadoria a ser entregue no local de produção ou “fábrica”.
F (de “free” – livre): A mercadoria é entregue ao transportador,
não sendo o transporte principal da responsabilidade do
exportador.
C (de “cost”/”carriage” – custo): Custo de transporte principal
assumido pelo exportador, mas não os riscos subsequentes do
embarque.
D (de “delivery” – custo): Obrigação máxima para o exportador
que assume todos os riscos e custos até ao local de entrega.

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“Trade Terms”: Cláusulas utilizadas no comércio internacional e,


particularmente, na compra e venda. Os nossos tribunais já reconhecem:
CAD (“cash against documents”): O comprador só pode receber
mercadoria depois de comprovado o pagamento do preço faturado.
COD (“cash on delivery/collect”): O comprador deve pagar no ato de
entrega da mercadoria – a cláusula não se mostra cumprida da
entrega – a cláusula não se mostra cumprida se o transportador se
limitar a aceitar um (mero) cheque.
FCL (“full container load”): Trata-se do transporte de um contentor
selado, compete ao interessado provar que o desaparecimento de
carga se deu durante o transporte

Cláusulas Reguladoras: Destinadas a cumprir contratos de grande complexidade


para os quais não há leis aplicáveis. Ocorrem no domínio do Direito Financeiro.
Promessas de Recompensa: Uma parte vende à outra parte determinados
valores mobiliários, prometendo recompensá-los, em certas condições.
Equivale a um funcionamento que será devolvido aquando da recompensa,
com o equivalente a juros e custos. Usado para garantir fluxos financeiros
dentro do sistema bancário
Swaps

Perigos do Uso das CCG:

Falha na Concorrência: O recurso às CCG põe em causa a liberdade dos


aderentes, podem optar se contratam, ou não, mas não podem negociar o que
contratam. Em caso de monopólio, a própria liberdade de contratar é comprometida.

Assimetria Informativa: O aderente normal não tem nem tempo, nem


conhecimentos, nem gosto para estudar as CCG a que adere, não lhes conhecendo
o alcance ou os efeitos. Ao passo que o utilizador de clausulas as preparou e
aperfeiçoou devido ao seu trabalho enquanto especialista, não sendo, para o
aderente, transparente a situação.

Direito à Legítima Ignorância: O aderente prefere o risco de soluções


desequilibradas em relação ao espaço que representaria estudar e procurar
alternativas. Direito fundamental de resguardo e de não ser incomodado.

Possível Captura, pelo Utilizador das CCG, de uma Sobrerrenda Imediata ou


Mediata, à Custa dos Aderentes: O negócio final pode implicar mais valias que
provém de burocracias. Aquele que estude a matéria poderá deslocar, a seu favor,
tal dinheiro.

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Esquemas de Publicidade ou Facilidade de Contratação pela Net: O particular,


agora como consumidor, pode ser levado a enganos ou contratações inúteis, sendo
tudo isso agravado por regimes contratuais desfavoráveis, emergentes de uma
adesão não melhor pensada às CCG.

Requisitos das CCG:

Juridicidade (proposições negocialmente significativas): Proposições


linguisticamente significativas por escrito nas quais é possível apontar uma
juridicidade negocial. Estruturas vocabulares capazes de exprimir uma volição
negocial. Uma vez subscritas, as CCG passam a cláusulas negociais, dotadas de
vinculabilidade,

Pré-Formulação: Existem antes da sua eventual inclusão num contrato. A prévia


existência das CCG assegura que elas se mantenham “quae tales”,
independentemente de serem, um dia, incluídas nalgum contrato, o que lhes confere
logo alguma juridicidade.

Multiplicidade: As CCG destinam-se a ser subscritos por proponentes ou


destinatários indeterminados, tendo apetência para dar corpo a diversos negócios
(art. 1/1 da LCCG) em duas possibilidades:
Num número indeterminado de negócios singulares: As CCG dirigem-se a
diversos contratos futuros que potenciam um mesmo negócio (criação de um
modelo contratual).
Num modelo determinado de negócios singulares: As CCG foram
desenhadas para um certo caso, mas veio a ser utilizada por outros. A
doutrina e a jurisprudência alemãs requerem que ela esteja presente em, pelo
menos, três contratos.

Rigidez: Não admissão de uma negociação que possa mudar o seu teor.

Requisitos Frequentes, Apesar de Não Necessários (como os supra são):


Desigualdade entre as partes: O utilizador das CCG goza, em regra, de
marcada superioridade económica e científica em relação ao aderente.
Complexidade: As CCG alargam-se por um grande número de pontos,
cobrindo, com minúcia, todos os aspetos contratuais.
Natureza Formularia: As cláusulas constam, com frequência, de documentos
escritos onde o aderente se limita a especificar escassos elementos de
identificação.

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27§ O REGIME GERAL:

Decreto-Lei 446/85 (LCCG): Aprovou o regime das cláusulas contratuais gerais,


não se limitando a proteger os consumidores, visa todos os utilizadores das CCG,
contudo, dispensa aos consumidores um olhar um olhar especial por prever para
eles uma mais extensa lista de proibições. Relativamente a proibições, articulou
uma cláusula geral assente em múltiplas proibições específicas. Associou uma
nulidade a cláusulas contrárias à lei ao inovar em cada caso um sistema geral de
ações inibitórias.

Opções Prévias:
As CCG careciam, em Portugal, de uma intervenção legislativa cuidada
desde a industrialização que as cláusulas se tinham generalizado, sem ter
havido qualquer regulação pelo legislador em 66’. Não existia um corpo de
decisões capaz de dar resposta.
A intervenção a realizar tinha de assumir base doutrinária.
A intervenção legislativa procuraria concretizar os grandes princípios civis já
existentes, mas que, por validade ou indeterminação, não impulsionavam a
jurisprudência.
A intervenção não seria integrada no CC.
A intervenção legislativa não deveria ter opções doutrinárias e colher os
ensinamentos da experiência, conjugando uma fiscalização singular e
preventiva.

Âmbito:
Da forma da sua comunicação ao público: Tanto se visam os formulários
como, por exemplo, uma tabuleta de aviso ao público.
Da extensão que assumam ou venham a apresentar: Dentro dos contratos a
que se destinam.
Do conteúdo que as enforme: Da matéria que vamos regular.
Elaboração: Proponente, destinatário ou terceiros.

Aplica-se também a cláusulas pré-elaboradas, inseridas em contratos


individualizados, relativamente aos quais a contraparte não tenha liberdade de
estipulação. Não estamos perante CCG, uma vez que não se encontram presentes,
as características da generalidade e da abstração típicas destas cláusulas, mas
existe uma extensão deste regime por estarem presentes a mesma razão de ser.

Regente- Tendo em atenção esta razão de ser do regime, esta norma-art.1º/2-


deve ser interpretada com alguma cautela-só faz sentido a extensão do regime se
de facto o aderente estiver numa posição de inferioridade negocial

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Exclusões:
Razões Formais: Art. 3/1 al. a) e b) da LCCG.
Em função da matéria: Art. 3/1 al. c), d) e e) da LCCG.

Inclusões: As CCG inscrevem-se no negócio jurídico através de mecanismos


negociais típicos, pelo que os negócios originados podem ser valorados, como os
restantes, à luz das regras sobre a perfeição das declarações. Lidando com figuras
como o erro, a falta de consciência da declaração ou a incapacidade acidental. A
inclusão depende de uma série de requisitos:
Art 5º - Efetiva Comunicação:
5/1 – Comunicação na Íntegra: A comunicação deve ser feita a todos
os interessados diretos.
5/2 – Comunicação Adequada e Atempada: De acordo com bitolas a
apreciar segundo as circunstâncias.
5/3 – Ónus da Prova: O utilizador que alegue contratos celebrados na
base de CCG deve provar, para além da adesão em si, o efetivo
cumprimento do encargo de comunicar (consultar art. 342º do CC).
Art. 6º - Efetiva Informação: As cláusulas devem ser, efetivamente,
entendidas. A LCCG prevê um dever de informação, na medida em que o
utilizador das CCG deve conceder a informação necessária ao aderido,
prestando-lhe todos os esclarecimentos (razoáveis) exigidos.
Se, não houver uma informação e uma comunicação efetiva, não ha a obrigação de
indemnizar mas sim a não inclusão prevista no art 8º. Isto só pode levar ao dever de
indemnização, quando se verifiquem os pressuposto do art 227º

Jurisprudência: Tal como a doutrina partiu da condenação de situações em que


não tinham sido comunicadas ao aderente as cláusulas a que este teria de aderir.
Permite esclarecer os artigos 5º e 6º (da LCCG), explicando o funcionamento do
ónus da prova neles previsto:
Quando o ónus é adotado pelo aderente:
Cabe ao particular aderente explicitar de que cláusulas não tomou
conhecimento.
O aderente que se queira prevalecer desses dispositivos deve, desde
logo, invocar e provar que contratou por adesão, o que não sucede se
tiver havido negociações.
Encargo do utilizador de provar que houve comunicação:
O teor da informação não deve passar o exigido pela boa fé.
A comunicação, por parte do utilizador, deve ser integral, de modo
adequado para que se perceba e com bastante antecedência.
A assinatura do aderente a dizer que tomou conhecimento das
cláusulas não é suficiente.

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Cláusulas Prevalentes: As partes que subscrevem cláusulas contratuais gerais


podem, em simultâneo, acordar, lateralmente, noutras cláusulas específicas, pois a
adesão faz-se em global sem tomar muita atenção a cada uma das cláusulas
incluídas no formulário. O art. 7º da LCCG determina uma prevalência das cláusulas
específicas entre as gerais.

Cláusulas Específicas Acordadas: Decorrência das regras gerais sobre o ónus da


prova (art. 342 do CC)

Jurisprudência Relativamente ao Art. 7º:


Negociação prévia impede a adesão às CCG.
As “condições especiais” ficam fora da LCCG.
As cláusulas especificamente recordadas prevalecem sobre as gerais.

Cláusulas Excluídas: Presença num contrato celebrado com recurso a CCG de


dispositivos que não tenham sido devidamente comunicados ou informados, não
correspondendo ao consenso real das partes. O artigo 8º, alíneas a) e b) da LCCG,
soluciona esta situação através da sua exclusão dos contratos singulares atingidos.

"Cláusulas Surpresa”: Penalizadas pelas alíneas c) e d) do art. 8º, sendo aferidas


pela lei portuguesa com base em 3 pilares: o contexto, a epígrafe e a apresentação
gráfica. Abrangem as cláusulas que passam despercebidas aos contratantes
normais.

Cláusulas Inseridas depois da assinatura do aderente: Levantam a suspeita de


não terem sido lidas ou levadas a acordo. Penalizadas pelo art. 8º al. d) da LCCG.

Inserção das Cláusulas Referenciadas no Art. 8º no Contexto Singular: Coloca


em causa o problema da sua subsistência:
Art. 9º da LCCG: Determina que, quando se assista à não inclusão de CCG
nos contratos singulares, estes, em princípio, se mantenham.
Art. 9/2 da LCCG:No caso de as soluções de recurso serem
insuficientes ou conduzirem a resultados contrários à boa fé, a
nulidade é inevitável.

Integração e Interpretação: O art. 10º da LCCG dispõe sobre a interpretação e


integração das CCG, remetendo, implicitamente, para os art. 236 e seguintes. Os
contactos singulares e as próprias cláusulas devem ser interpretados pela LCCG.
Impede as próprias CCG de engendrarem outras regras de interpretação.

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Remete para uma Interpretação que Inclua Apenas o Contrato Singular: Corta a
dúvida bem conhecida da doutrina especializada que se prende com o conforto
entre as tendências generalizadas e individualizadora da justiça:
Tendência Generalizadora: Exige que as CCG sejam interpretadas em si
mesmas, sobretudo quando surgem completas, de modo a obter soluções
idênticas para todos os contratos singulares que se venham a formar com
base neles.
Tendência Individualizadora: Abre portas a uma interpretação singular de
cada contrato em si. As mesmas CCG podem propiciar diferentes contratos.
Art. 10º da LCCG: Leva os utilizadores das CCG a desenvolver ao
pormenor os seus contratos de modo a prevenir “interpretações
indesejadas”. Por haver margens interpretativas, não se pode tirar das
CCG as vantagens generalizadas que acarretam.
Distinção de 3 Situações Dentro das CCG:
Cláusulas de Negócios Correntes e de Execução Instantânea: Interpretação
objetiva, não se aplicando o art. 10º da LCCG.
Cláusulas de Negócios Duradouros: Inseridas em áreas dominadas pela
normalização e onde não é possível restituir a vontade das partes ou os
termos concretos da negociação. Interpretação objetiva sem se aplicar o art.
10º.
Cláusulas de Negócios Duradouros Altamente Personalizados: Interpretação
pouco objetiva, aplica-se o art. 10º da LCCG e o 237 e 239 do CC.

Nas CCG, e em caso de dúvidas, a lei manda escolher o sentido que seja mais
favorável ao aderente, porque esta é a parte fraca.

Art. 11º da LCCG: Precisa a temática das cláusulas ambíguas.

28§ O CONTROLO INTERNO:

Controlo Confiado dos Tribunais no Domínio das CCG: As cláusulas contratuais


gerais surgem da natureza privada, escapando ao controlo público, legal e
constitucional que recai sobre os diplomas do Estado. Nos tribunais é confiado o
controlo da eficácia ou pela LCCG de eficácia, não estando em causa um controlo
de equidade, deontológico (dos bons costumes – art. 280/1), interpretativo, ou
integrativo (art. 237 e 239), ou do exercício (abuso do Direito – art. 334). Perante
CCG o juiz deve abdicar de casuísmos.

Nulidade (sui generis): A LCCG veio proibir determinadas cláusulas

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Pode Ocorrer de Duas Formas:


Derivada da aplicação dos art. 15 a 23: Cláusulas vedadas da LCCG
diretamente ao contrato singular onde o problema surge.
Criada pela prévia proibição judicial: Independentemente de situações
concretas pela ação inibitória do art. 25º. Menos envolvente e cuidadosa, mas
mais rápida.

Art. 286 do CC: Cada um decide se lhe convém invocar determinada invalidade. A
presença das CCG nulas pode ser indiferente para o aderente. Contudo, a
invocação vitoriosa de invalidades obriga a uma recomposição do contrato singular.
As CCG deixam de o ser se o aderente a (re)confirmar, individualizadamente e no
âmbito de uma negociação livremente consentida, mostrando que a teoria clássica
das invalidades carece de adaptações

Art. 12 da LCCG: Deve ser interpretado com algum cuidado. Dispõe que as CCG
proibidas são nulas. Todavia, quando passa de CCG a cláusula contratual comum,
fica na liberdade do aderente impugnar ou não a cláusula já inserta no contrato
singular.
Casos Assaz Raros: O legislador proíbe as CCG, já nulas, nos termos do art.
18 al. a), b), c) e d)

Art. 13 da LCCG:
13/1: Dispõe que o aderente pode manter os contratos singulares quando
dispõe cláusulas nulas,
13/2: Regula o número anterior, mostrando que não é obrigatória a nulidade
ou a conversão do negócio, podendo, por exemplo, optar por substituir as
CCG inválidas. Existem 2 situações possíveis:
Estamos diante de um contrato que integra um tipo legal cujas regras
supletivas viessem ser afastadas pelas CCG: as regras retomam a
aplicação.
O contrato equivale a um mero tipo social reconhecido pela prática,
mas ausente da lei: como faltam leis negociais, torna-se impossível a
integração da lacuna negocial.

Redução: Perante a invalidade da CCG a parte aderente pode optar pela redução,
ou seja, pela vigência do contrato sem as cláusulas viciadas ou pela sua
substituição por regras legais supletivas.

Regime de Redução dos Negócios Jurídicos (previstos no art. 292 do CC): O


utilizador de CCG, confrontado com o art. 14 (LCCG) pode provocar a nulidade total,
demonstrando que o negócio não seria possível sem a parte viciada.
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Art. 14 da LCCG: Visa a complementar o quadro das consequências derivadas da


nulidade das CCG. Prevê:
Que o aderente, invocando a invalidade, opte por não apelar à aplicação de
regras supletivas ou à integração negocial.
Tais soluções provocam um desequilíbrio gravemente contrários à boa-fé

Nulidade: Proveniente do acolhimento de CCG e de não ser, de todo, possível


colmatar a lacuna daí derivada.

Redução Convalidante: O juiz opera como administrador dos interesses do


utilizador da cláusula, o aderente perde a possibilidade de se informar dos seus
direitos e deveres e o utilizador fica libertado do risco de total inviabilidade do
negócio. Opção não viável.

Proibição da Contrariedade à Boa-Fé:

Art. 15: Núcleo da lei das CCG.

Art. 16: Indica vias de concretização.


Alíneas a) e b): Configuram as duas grandes vias de concretização da boa-fé
- tutela da confiança e primazia da materialidade subjacente.

Remissão Para a Boa-Fé: Equivalente a delegar ao juiz o poder de, perante cada
cláusula, concretizar os valores gerais do sistema.

Articulação de Proibições: 4 hipóteses básicas contempladas na lei:

Art. 18: Cláusulas absolutamente proibidas entre empresários e equiparados.

Art 19: Cláusulas relativamente proibidas entre empresários e equiparados.

Art. 21: Cláusulas absolutamente proibidas nas relações com consumidores.

Art. 22: Cláusulas relativamente proibidas nas relações com consumidores.

29§ PROIBIÇÕES ENTRE EMPRESÁRIOS:

Proibições Absolutas: Art. 18 da LCCG

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Alíneas a), b), c) e d): Proíbem cláusulas de exclusão ou limitação da


responsabilidade. O legislador pretendeu deixar, entre os empresários, dominar uma
autonomia privada, mas com a responsabilidade inerente aos danos causados.

Alíneas a) e b): Determinam a nulidade das cláusulas que afastam a


responsabilidade por danos pessoais ou patrimoniais aquilianos.

Alíneas e): Visa evitar que se procure conseguir, por via interpretativa, aquilo que
diretamente às partes não conseguem alcançar. Esta regra tem a ver com a
interpretação de qualquer preceito, venha ou não ele de cláusulas predispostas.

Alíneas f), g), h) e i): Relacionadas com os institutos (garantem ou reforçam o


cumprimento de obrigações) da exceção do não cumprimento do contrato (art. 428
do CC), da resolução por incumprimento (art. 432 do CC), do direito de retenção
(art. 754), das faculdades de compensação (art. 847) e da consignação em depósito
(art. 841)

Alínea j): Visa evitar obrigações perpétuas ou cuja duração ficasse apenas
dependente de quem recorrer às CCG. Pode sustentar-se em termos não absolutos
só viáveis quando a lei o permita ou imponha.

Alíneas l): Previne que, a coberto de esquemas de transmissão do contrato se


venha a limitar, de facto, a responsabilidade. Pois, basta transmitir a propriedade
para uma entidade que não tenha a adequada cobertura patrimonial para, na
prática, esvaziar o conteúdo de qualquer imputação de danos.

Proibições Relativas: Afetas ao art. 19 da LCCG

Alíneas a) e b): Relacionadas com o prazo dos contratos, no decurso do qual uma
das partes fica submetida à vontade da outra.
Alínea c): Proíbe cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir.
Proibição muito aplicada perante contratos locação financeira, cujas condições
gerais incluíam, por vezes, cláusulas penais draconianas.

Alíneas d): Inadmissibilidade de recorrer a factos insuficientes para alicerçar a


autonomia privada.

Alínea e): A garantia das qualidades da coisa cedida ou de serviços prestados


pode ser posta na dependência do recurso a terceiros. Contudo, por vezes, tal
situação só irá equivaler a um meio obliquo de limitar a responsabilidade.

Alínea f): Faculdade de, unilateralmente e sem necessidade de justificação, se por


termo a uma situação duradoura.
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Sebenta Teoria Geral do Direito Civil - Regência JAV - TB - 2020/2021 - LBT

Alínea g): O estabelecimento de um tribunal competente que envolva graves


inconvenientes para uma das partes, deve ser justificado por equivalência a
interesses da outra parte. Quando tal não se sucede, a clausula competente é nula.

Alíneas h) e i): Concessão de poderes executivos e exorbitantes a uma das partes.

30§ PROIBIÇÕES COM CONSUMIDORES:

Proibições Absolutas: Afetas ao art. 21 da LCCG.

Alíneas a), b), c) e d): Asseguram que os bens ou serviços pretendidos pelo
consumidor final são, de facto, os que ele vai alcançar.

Alíneas e), f), g) e h): Pretendem garantir a manutenção eficaz de uma tutela
adequada, prevenindo a possibilidade de recurso a vias obliquas para a defraudar à
lei.
Alínea f): Particularmente visada nas proibições judiciais.

Proibições Relativas: Nas relações com consumidores finais, não se trata apenas
de negar a exclusão da responsabilidade, havendo que, pela positiva, assegurar a
própria obtenção do bem, já que a obtenção de uma indemnização é aqui
problemática. Relativamente ao art. 22/1 da LCCG:

Diversas Alíneas: Especificam pontos nos quais, segundo a experiência, os


consumidores podem ver em perigo a sua função

31§ ISENÇÕES LEGAIS:

Art. 22/1 da LCCG:

Alínea c): Proíbe as cláusulas que atribuam o direito de alterar unilateralmente os


termos do contrato, exceto se existir razão atendível que as partes tenham
convencionado.

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Alínea d): Proíbe estipulações da fixação do preço dos bens na data da entrega,
sem que se dê à contraparte o Direito de resolver o contrato, se o preço final for
excessivamente elevado em relação ao valor subjacente às negociações

Art. 22/2 da LCCG: Ressalva, em derrogação da alínea c):

Direito do fornecedor dos serviços financeiros de alterar a taxa de juro ou o


montante de quaisquer outros encargos aplicáveis, desde que correspondam a
variações do mercado e sejam comunicadas de imediato, por escrito, à contraparte.

A atribuição, a quem as predisponha, do direito de alterar unilateralmente o


conteúdo de um contrato de duração indeterminada, contanto que se preveja o
dever de informar a contraparte com pré-aviso razoável e se lhe dê a faculdade de
resolver o contrato.

Art. 22/3 da LCCG: Ressalva, em derrogação às alíneas c) e d) realidades cujas


flutuações o adquirente pode querer assumir:

As transações referentes a valores mobiliários ou a produtos e serviços cujo preço


dependa da flutuação de taxas formadas no marcado financeiro.

Os contratos de compra e venda de divisas, de cheques de viagem, ou de vales


postais internacionais expressos em divisas.

Art. 22/4 da LCCG: Ressalva cláusulas de indexação quando o seu emprego se


mostre compatível com o tipo contratual onde se encontrem inseridas e o
mecanismo de variação do preço esteja explicitamente descrito.

32§ AÇÃO INIBITÓRIA:

Ação Inibitória: Faculta, quando proceda, a proibição judicial da utilização de


certas clausulas, independentemente da sua inclusão em contratos singulares (art.
25 e seguintes da LCCG).

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Consequências: Depois da proibição, as clausulas atingidas não podem mais ser


incluídas em contratos (art. 32), incorrendo os utilizadores em sanções pecuniárias
compulsórias se não respeitarem a proibição (art. 33).

Importância: A existência e divulgação da LCCG levou grandes empresas a


estudar e rever, cuidadosamente, as clausulas contratuais gerais por elas
praticadas, de modo a expurgar nulidades.

CAPÍTULO 5: Negócios Usurários, Defesa do Consumidor e


Não-Discriminação

35§ DEFESA DO CONSUMIDOR:

Defesa do Consumidor: Determinada no art. 60º da CRP, é um dever dos Estados


Modernos.

Projeções:
É um princípio programático que o legislador deve ter presente nos mais
diversos quadrantes normativos. Relacionado com a concretização do art. 60
da CRP.
É um vetor sistemático que permite agrupar e interpretar em conjunto
múltiplas normas que visam a tutela do consumidor.
Área formalmente delimitada da ordem jurídica que assume a finalidade
expressa da tutela do consumidor.

Lei da Defesa do Consumidor (LDC, Lei 24/96 de 31 de julho): Abrange 25


artigos repartidos por 5 capítulos
Capítulo 1 – Princípios Gerais (art. 1º e 2º)
Art. 1º: Dever de proteção do Estado.
Art. 2/1: Define consumidor – O Professor MC considera a definição
indevidamente estreita.
Art. 2/2: Define o âmbito da proteção e das atuações desenvolvidas
pelo Estado.

Capítulo 2 – Direitos do Consumidor (art. 3º a 15º)


Art. 3º: Enumera os direitos que vão ser desenvolvidos nos artigos
seguintes.

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Art. 4º: Direito à qualidade de bens e serviços.


Art. 5º: Direito à proteção da saúde e da segurança física –
desenvolve-se em dois planos:
incompatibilidade de utilizar o bem
dever da Administração Pública para prevenir danos.
Art. 6º: Direito à formação e à educação – atribui ao Estado deveres
formativos e escolares.
Art. 7º: Direito à informação para o consumo (em geral) – impõe ao
Estado múltiplas sanções no domínio da informação do consumidor.
Art. 8º: Direito à informação para o consumo (em particular) – abrange
um dever de informar mais pormenorizado na fase de negociação ou
conclusão do contrato. A violação deste dever dá azo a um direito de
retração por parte do consumidor e de indemnização.
Art. 9º: Direito à proteção dos interesses económicos, implicando
múltiplas cautelas quanto à celebração de contratos de com
consumidores.
Art. 10º a 13º: Direito à prevenção e à reparação de danos patrimoniais
e não patrimoniais.
Art. 14º: Direito à proteção jurídica e a uma justiça acessível e pronta,
implicando deveres do Estado e diversos privilégios processuais.
Direito de participação por via representativa consiste, nomeadamente,
na audição e consulta prévias das associações de consumidores no
tocante a medidas que afetem os seus direitos.
Capítulo 3 - Carácter Injuntivo dos Direitos dos Consumidores (art. 16):
Qualquer cláusula que exclua ou restrinja os direitos atribuídos pela LDC é
nula.
Capítulo 4 – Instituições de Promoção e Tutela dos Direitos do Consumidor
(art. 17 a 22).
Art. 17: Atribui um estatuto especial às instituições de promoção e
tutela dos direitos do consumidor.
Art. 18: Receção de múltiplos direitos de ordem processual pelas
instituições.
Art. 19: Possibilidade das instituições de negociar com os profissionais
ou organismo que os representem
Art. 20: Prevê uma especial atuação do Ministério Público.
Art. 21: Estabelece Instituto do Consumidor.
Art. 22: Estabelece o Conselho Nacional de Consumo.
Capítulo 5 – Disposições Finais (art. 23 a 25)

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CAPÍTULO 6: O Conteúdo do Negócio Jurídico

37§ QUADROS DA EFICÁCIA NEGOCIAL:

Conteúdo do Negócio: Corresponde à regulação por ele desencadeada. Conjunto


de regras que, por ele ter sido celebrado, têm aplicação num tempo e espaço
delimitado pelas partes. Visa proporcionar uma ponderação global da relação
promovida pelo contrato através de uma base panorâmica do conjunto.

Objeto do Negócio: Aquilo sobre o qual recai a própria relação jurídica – aspeto
fundamental/final.

Elementos do Conteúdo do Negócio:


Elementos Normativos: Regras aplicáveis “ex lege” (a que o Direito associa a
celebração dos negócios, independentemente de uma expressa vontade
negocial nesse sentido).
Injuntivos: Quando não ficam na disponibilidade das partes nem
podem, por isso, ser por elas afastadas.
Supletivos: Quando a sua aplicação se destina a suprir o silêncio ou as
insuficiências do clausulado negocial.
Elementos Voluntários: Regras aprontadas e fixadas pelas partes
Necessárias: Correspondem a fatores que, embora na disponibilidade
das partes tenham, por elas de ser fixadas sob pena de incompletude
do negócio.
Eventuais: Integram elementos que as partes podem assumir no
negócio se assim o entenderem.
Clausulas: Compõe o negócio jurídico
Formais: Proposições afirmadas vocabularmente como autonomia em
regras numeradas pelas próprias partes.
Eventuais: Integram elementos que as partes podem assumir no
negócio se assim entenderem.

Tipo Negocial: Conjunto dos seus elementos valorativos e necessários, exprimindo,


ao mais elevado grau, o equilíbrio que o direito positivo entendeu promover como
mais justo.

No Plano Prático: Recorda que, na generalidade, as partes não se esforçam em


procurar regimes específicos para os seus interesses, limitando-se a eleger um
negócio e a complementar os elementos voluntários necessários. As tarefas de

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determinação das regras aplicáveis podem, assim, limitar-se à identificação do tipo


negocial eleito pelas partes.

No Plano Valorativo: Faculta a confluência das composições de interesses mais


ajustadas no momento histórico considerado. Constitui uma lista valorativa adotada
a, por exemplo, à solução de questões deixadas em aberto pela supressão de CCG.

Clausulas Típicas: Dispositivos que o Direito trata expressamente, ficando à


disposição das partes que queiram remeter. Não formam, porém, um todo corrente,
apresentando-se instrumentos em si desconectados, mas que, em conjunto,
formam um todo – elemento voluntário eventual.

Requisitos do Negócio: Qualidades exigidas para o conteúdo e para o objeto de


qualquer negócio (art. 280º do CC)

Possibilidade

Conformidade com a Lei

Determinabilidade

Conformidade com a Ordem Pública

Conformidade com os Bons Costume

38§ A POSSIBILIDADE:

Possibilidade: Requisito que sofre múltiplos desvios, uma vez que a lei associa à
impossibilidade de certos atos consequências diversas.

Possibilidade Física: Tem o seu objeto na natureza das coisas


Pode ser vedada por falta de substrata (ex: negócio de reparação de uma
casa que ardeu por completo).
Pode perder o conteúdo por supressão do escopo (ex: fornecer o vestido de
noiva depois do seu casamento).

Possibilidade Jurídica: Tem o seu conteúdo no Direito


Absoluta ou Relativa (Objetiva ou Subjetiva):

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Absoluta: Conforme atinja o objeto do negócio sejam quais forem as


pessoas envolvidas. Verdadeira impossibilidade, pois o sujeito é
concretamente proibido de atuar certo negócio, podendo, contudo,
celebrá-lo desde que se faça depois substituir na execução. Explica a
possibilidade de negociar coisas futuras (art. 211 e 401/2 do CC).
Relativa: Opera apenas perante os sujeitos concretamente
considerados.
Possibilidade Temporária ou Definitiva: Em função da sua extensão temporal.
A temporária é previsível que cesse e pode ser viável em negócios de coisas
futuras ao contrária da definitiva.
Impossibilidade Efetiva e Meramente Económica:
Impossibilidade Efetiva: O objeto do negócio é ontologicamente
inviável.
Impossibilidade Económica: O objeto do negócio é pensável, mas
surge economicamente tão justo que se torna injusto ou iníquo.
Impossibilidade Inicial e Superveniente:
Impossibilidade Inicial: Opera logo no momento de celebração,
conduzindo à aplicação do art. 280/1 do CC (nulidade do negócio).
Impossibilidade Superveniente: Manifesta-se mais tarde. Atinge
também os requisitos, sendo a consequência a extinção da obrigação
(em caso de devedor imputável) – art. 790/1, ou a extinção com
aplicação de regras do incumprimento – art. 801/1.
Impossibilidade de Paulo Cunha: Impossibilidade moral com o objeto inviável
por contrariar uma conjunção de normas ou princípios jurídicos.

Delimitação e Negócios Absurdos: Triplo sentido da adstrição à prestação


impossível.
Firmar os deveres acessórios que, em qualquer caso, devem ser
observados.
Sujeitar o devedor às consequências do incumprimento, que são
determináveis em função da ausência de prestação vedada.
Obrigar o devedor a substituir a prestação em jogo, garantido, no fundo, o
interesse do credor.

39§ A DETERMINABILIDADE:

Determinabilidade: Coloca um tema de consciência na conformação da vontade


negocial.

Negócio Indeterminável: Não deriva de uma informação clara quanto ao seu


conteúdo ou quanto ao seu objeto. Pode resultar de uma confusão vocabular

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inultrapassável ou de uma remissão para realidades que, por si, não tenham um
teor percetível. É, de todo, indeterminável.

Negócio Indeterminado: Não permite, de momento, apreender o seu objeto ou


conteúdo. Surge determinável.

Aplicação – Tutela da Parte Fraca: A exigência de determinabilidade de conteúdo


e objeto do negócio é uma exigência material de tutela da parte fraca.

40§ A LICITUDE E A CONFORMIDADE LEGAL:

Licitude e Conformidade Legal:

Licitude: Requisito dos negócios jurídicos que consiste na não ultrapassagem dos
limites injuntivos do ordenamento. Pode ser usada numa aceção ampla ou restrita.
Sentido Amplo: O negócio é lícito quando surge perfeito – integra todos os
requisitos pela lei para a sua plena eficácia. A licitude absorve todos os
demais requisitos (possibilidade, determinabilidade, conformidade com os
bons costumes e a ordem pública). Podem ser chamadas a respeito questões
como a forma ou o processo de formação.
Sentido Estrito: Dele não resultam condutas contrárias a normas jurídicas
imperativas.

Ilicitude Restrita ou “propu sensu”:


Ilicitude da Conduta em Si: O sujeito obriga-se a passar os limites da
velocidade.
Ilicitude do Resultado: O sujeito obriga-se a furtar uma quantia
Ilicitude dos Meios: O sujeito obriga-se a assistir a um desafio desportivo,
sem pagar o bilhete.
Ilicitude da Relação Meios/Resultado ou Meios/Fim: O sujeito obriga-se a, por
meios em si ilícitos, mas para resultados lícitos, criar entre eles uma relação
inaceitável (ex: comprar uma arma ilegalmente para caçar).

Conformidade Legal: Requisito residual destinado a facultar a sistematização de


fatores na doutrina de Paulo Cunha.

42§ BONS COSTUMES:


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Bons Costumes: Traduzem uma referência aprazível sem nada a apresentar, não
tendo nada relacionado com o abuso de direito. São regras de conduta externa. Nas
decisões judiciais seguem três vertentes:

Bons costumes referidos em conjunto com a boa-fé a propósito do abuso de direito


(art. 334 do CC)

Bons costumes como tópico argumentativo destinado a reforçar decisões apoiadas


noutros lugares normativos.

Bons costumes “propriamente ditos” na sua vertente de moral sexual, familiar e das
regras deontológicas aplicáveis, ainda que, por vezes, sem uma referência explícita.

43§ A ORDEM PÚBLICA:

Ordem Pública: Fator sistemático de restrição da autonomia privada. Fatores


importantes apesar de não expressamente legislados, construídos pela ciência
jurídica e muitas vezes aplicados em tribunais.

47§ A CONDIÇÃO: FUNÇÃO, MODALIDADES E AFINS

Condição: Pode ser tomada como uma “clausula” contratual, como o evento por ela
prefigurado ou como a efetiva ocorrência desse evento. É uma clausula contratual
típica que vem subordinar a eficácia de uma declaração de vontade a um evento
futuro e incerto. Vem satisfazer necessidade práticas importantes, surgindo em tipos
negociais complexos tanto de base legal como social. Também pode ser usada
como garantia de obrigações duradoras ou pressuposto num ato jurídico (art. 270 do
CC).

Condição Suspensiva e Resolutiva:


Suspensiva: O negócio só produz efeitos após a sua eventual ocorrência.
Resolutiva: O negócio deixa de produzir efeitos após a eventual verificação
da ocorrência em causa.

Condições Casuais e Condições Potestativas:


Casuais: Conforme o evento incerto de que dependam seja um facto alheio
aos participantes, como um facto natural (ex: chuva), um ato de terceiros (ex:

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concessão de fiança) ou de um ato social ou administrativo (ex: autorização


de contruir)
Potestativos: Conforme o evento incerto de que dependam emerja da
vontade deles. O participante em causa recebe o direito potestativo de deter
ou desencadear a eficácia do negócio. Admite-se quando assente em dados
objetivos, de outra forma corresponde a um puro direito potestativo
reconhecido a uma das partes de desencadear efeitos negociais ou revogar o
negócio.

Condições de Momento Certo e de Momento Incerto:


Momento Certo: Ocorrem numa ocasião prefixada, ainda que incerta (ex:
“quando fizeres 30 anos” – podes não viver até lá)
Momento Incerto: Ocorrem numa ocasião indeterminada (ex: “quando
casares” – não consta uma data ou isso acontecer sequer)

Condições Automáticas e Condições Exercitáveis:


Automáticas: Não necessitam de manifestação de vontade para a sua
execução. São mais comuns.
Exercitáveis: Necessita de manifestação da vontade, podendo ser
aproximada de um misto entre a condição casual e potestativa, pois, para
além do evento, requer uma vontade do agente.

Condições Impróprias: Surgem por faltar algum dos requisitos das verdadeiras
condições como a natureza do futuro evento, a sua incerteza ou a voluntariedade da
própria clausula em si:
Condições Presentes ou Passadas: A eficácia fica dependente de algo que,
existindo já, ou não, aquando da celebração, não deixa margem de
pendência para o negócio, deve, no entanto, considerar-se que há condições
quando as partes se reportem, não ao facto em si, mas ao conhecimento
dele.
Condições Impossíveis: Por razões físicas ou legais nunca poderão ocorrer.
No âmbito legal pode ser impossível por ser algo vexado por lei ou por
princípios gerais ou clausulas indeterminadas (impossibilidade moral).
Condições Necessárias: Razões naturais ou legais que iram de certeza
ocorrer, mesmo que em momento incerto.
Condições Legais: Abrande factos eventuais ou futuros que a própria lei, a
não as partes, subordinam certa eficácia

48§ NATUREZA, CONDICIONALIDADE E INVALIDADES:

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Teoria da Unidade (PPV e Oliveira Geraldes): A invalidade de uma condição


acarreta a invalidade de todo o negócio.

Condicionalidade: A regra geral no art. 405/1 (liberdade contratual) conduz à livre


aponibilidade de condições, quem é livre de estipular também o é de condicionar.

Inexistente em: Atos em sentido estrito (ex: apossamento, ocupação) e em


negócios que o Direito pretenda firmes (ex: casamento, arrendamento)

Invalidade: Sempre que seja aposta uma condição num negócio incondicionável ou
que a condição seja, em si, ilícita ou impossível o negócio é nulo (vitiat et vitiatur),
isto tem exceções em que apenas a condição, em si, é nula (vitiatur sed non vitiat).

Condições que proíbem o negócio:


Condição, em si, contrária à lei (ex: cometer um crime).
Condição que conduza a resultados indesejáveis ou que o Direito queira
livres (ex: desistir do exame, romper o noivado).
Condição que implica um comportamento repudiado pelo Direito (ex: castigar
os filhos).

49§ O REGIME DA CONDIÇÃO:

Regime da Condição: Procura um equilíbrio de modo a que a condição seja


respeitada, mas o comércio jurídico não se paralisa, podendo ser concretizado pela
autonomia privada (a condição deve ser respeitada por ser imposta pelas partes),
pela boa-fé (deve ser acatada pelas partes para não falsear o objetivo e serem
causados danos desnecessários) e pela distribuição dos riscos (as situações
condicionadas são instáveis, o que pode resultar em danos para as partes).

Pendência (art. 272 e 275 do CC): O negócio está presente desde o momento da
sua celebração até ao da verificação da sua condição. Gera uma situação particular
de conflito de direitos, pois aquele que aliene um direito sob condição suspensiva
mantém-se seu titular, mas deixará de o ser com a verificação dela, enquanto que
aquele que adquira um direito sob condição resolutiva passa a ser seu titular, mas
deixará de o ser com a verificação da mesma. Cessa pela verificação, opou não, da
condição (pode se manifestar pela positiva ou negativa).
Boa-Fé: Com uma manifestação objetiva, exprime a necessidade de, em
cada situação jurídica, se observarem os vetores fundamentais da ordem
jurídica, estando em causa deveres de conduta:

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Tutela da Confiança: As partes não podem agir contra a ordem natural


das coisas ou contra as opções contratuais, pois foi provocada uma
crença legítima na outra parte.
Primazia da Materialidade Subjacente: Obriga a que a condição não se
possa transformar num jogo formal de proposições, devendo exprimir,
no seu fundamento, a vontade condicional das partes, ou seja, a sua
subordinação ao facto futuro e incerto que escapa à vontade de
qualquer delas.

Expectativa: Situação aprazível na qual se espera a constituição de um direito, ou


se adere à manutenção de uma decorrência favorável.
Expectativa Jurídica: Posição jurídica tutelada pelo Direito no âmbito do
Direito Subjetivo. Surge como conceito capaz de enquadrar o beneficiário de
uma condição suspensiva enquanto esta não acontecer.

50§ O TERMO:

Termo: Clausula pela qual as partes subordinam a eficácia de um negócio jurídico à


verificação de um facto futuro efetivo que pode ser certo no sentido de se saber de
antemão quando irá ocorrer ou incerto, quando, sendo de ocorrência segura, se
desconheça o seu momento exato. Surge como uma efetiva limitação temporal a um
negócio jurídico por iniciativa das partes.

Termo Suspensivo e Termo Resolutivo:


Termo Suspensivo ou Inicial: Momento a partir do qual o negócio considerado
produz efeitos.
Termo Resolutivo ou Final: Marca o fim da eficácia.

Termo Certo (fixo) ou Incerto (infixo): É certo quando, de antemão, o momento de


verificação do evento seja conhecido e incerto nas restantes hipóteses.

Modo de Expressão do Termo:


Expresso: Resulta da vontade assumida de uma das partes.
Tácito: Derive das circunstâncias, que, com toda a probabilidade revelem a
vontade das partes.

Termo Legal: Impróprio por não derivar da vontade das partes.

Regime: Pode se aplicar, por analogia, o das condições:

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Aposição (aplicação) do Termo quando a Lei o proíbe: Envolve a nulidade de


todo o negócio
Pendência: Desde o momento da estipulação ao da verificação do termo.
Envolve um conflito de direitos entre o atual detentor do Direito e aquele que
o receberá quando ele ocorrer.

51§ OUTRAS CLAUSULAS TÍPICAS:

Modo (ou encargo): Clausula típica que traduz uma obrigação a cargo do
beneficiário. Se a obrigação modal não for cumprida, a doação subjacente não pode
ser resolvida, salvo clausula em contrário.

Distinção de Condição:
Suspensiva: O modo não suspende, mas adstringe – ex: “deixo este terreno
ao Estado, desde que nele seja construído uma escola” é condição se deve
fazer a escola, modo se fica obrigado a contruí-la.
Resolutiva: O destinatário é beneficiado para prosseguir um efeito secundário
(modo), o efeito lateral é pretendido, sendo usado o negócio para lá chegar
(condição)

Sinal: Clausula típica própria de contratos onerosos. Aquando da celebração de um


contrato, uma das partes entrega à outra uma coisa ou quantia. Se houver
incumprimento provocado por quem o recebe, ele deve retribuí-lo em dobro, se for o
contrário, o sinal dá-se por perdido. Previsto no art. 440 e seguintes do CC. Opera
na junção de diferentes figuras.

Dimensão Confirmatória Penal: Dá consistência ao contrato e funciona como


indemnização.

Dimensão Penitencial: Quando funcione como “preço do arrependimento”,


permitindo ao interessado resolver o contrato, mediante pagamento do que resulte
do próprio sinal.

Clausula Penal: Clausula típica bastante frequente em que as partes estipulam,


num momento prévio, as consequências do eventual incumprimento do negócio
jurídico, estando sujeita à forma e a formalidades exigidas pela obrigação principal
(art. 809-812 do CC). Quando as partes a fixam não estão a pensar na hipótese de
a virem sofrer.

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CAPÍTULO 7: A Interpretação do Negócio Jurídico

52§ ASPETOS GERAIS; NATUREZA JURÍDICA:

Interpretação do Negócio: Tarefa científica tendente a determinar o regime


aplicável aos problemas colocados no seu âmbito, havendo múltiplos fatores a ter
em conta. É algo necessário.

Teoria da Vontade (Willenstherorie): A declaração tem o sentido que lhe queira


dar o autor (pode valer tanto a vontade do declarante como a do declaratário).

Teoria da Declaração (Erklarungstherorie): Valida o sentido objetivo da própria


declaração.

55§ HORIZONTE DO DECLARATÁRIO (236º/1, 1ª PARTE):

Horizonte do Declaratário (art 236/1 CC): A jurisprudência apela a uma


“interpretação objetiva ou normativa” que não se apegue somente à literalidade do
texto, mas capaz de ter em conta particularidades concretas. Releva todas as
circunstâncias que acompanham a conclusão do contrato e passam, objetivamente,
a vincular um declaratório hipotético, razoável e cuidadoso na posição de
declaratário real, um determinado sentido para a declaração.

Critérios que Integram o Horizonte do Destinatário: A letra do negócio, os textos


circundantes, os antecedentes e a prática negocial, o contexto em jogo e os
elementos jurídicos extra negociais.

Letra (clausulado): Geralmente, um documento escrito, é o ponto de partida para


qualquer interpretação.
Negócio entre Presentes: Maioria dos negócios que suscitam problemas de
interpretação, pois os negócios vão afeiçoando um texto pela negociação,
acabando por assinar o trabalho a que chegam, sendo as duas partes
“destinatários”.
Risco Linguístico: Geralmente, os contratos são celebrados com recurso ao
idioma comum de ambas partes. Contudo, se as partes tiverem línguas
maternas diferentes, devem, primeiramente, selecionar um idioma, criando-se
um risco para quem não conheça suficientemente o idioma em causa. Se

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nada disserem, prevalece a língua do local de celebração. Em contratos


deslocalizados, a língua internacional é o inglês.
Negócios Orais: A interpretação ocorre de imediato, perante as circunstâncias
do caso.
Clausulado: Onde as partes exprimem, á partida, a sua vontade
normativamente relevante. Tende a prevalecer sobre outros elementos
escritos, compreendidos no próprio texto contratual, estes outros elementos,
como o
preâmbulo, definições, notas explicativas ou exemplificativas e anexos são,
apenas, coadjuvantes.
Clausulado do Negócio Incompreensível ou Contraditório: Ocorre por 2 vias:
Falta de Perícia ou Experiência: Por parte dos redatores do texto,
havendo que procurar esclarecer as dúvidas, recorrendo aos demais
elementos, apenas no limite será declarado como nulo por
indeterminabilidade do seu conteúdo (art. 280/1).
Comportamentos Negociais: As partes pretendem um negócio, mas
não conseguem chegar a acordo sobre algum dos pontos, optando,
então, por inserir, lado a lado, as soluções que ambas pretenderiam
ver consideradas ou por estipular em termos vagos. As partes
remetem para o momento ulterior ao do preenchimento do espaço em
branco.

Declarações “per relationem” de Vontade: Situações nas quais a declaração


remete para um conteúdo ou fontes externas, colocando-se um problema de prova –
o de saber se a vontade foi manifestada e entendida. A “relatio” e o negócio
“nuclear” devem ser interpretas em conjunto.
Negócio “Inter Vivos”:
“Relatio Formal”: O declarante aponta uma fonte externa já
conformada.
“Relatio Material”: O declarante remete para uma ulterior formação da
vontade própria ou de terceiro.

Antecedentes (elemento histórico): Em situações de litígio que envolvam a


interpretação de contratos é de boa prática levar ao decisor os textos que
documentem as negociações preliminares (anúncios, atas de reuniões, pareceres
de peritos, minutas preparatórias, correções) por poderem, eventualmente, revelar
contratos previamente concluídos entre as mesmas partes que possam ter algum
paralelismo para o atual negócio.

Contexto da Prática Negocial:


Contexto das Próprias Clausulas: É decisivo, pois as clausulas operam em
conjunto, como um todo, apenas assim prosseguindo o intento das partes. As
clausulas existem na globalidade do negócio.

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Contexto Horizontal: Relativo a todas as circunstâncias que acompanham a


negociação e a conclusão do negócio e as declarações da vontade. Por
vezes, só elas dão sentido à declaração ou são constitutivas do seu teor
comunicativo global. Inclui a lógica social e económica dos contratos. Palco
interpretativo.
Contexto Vertical: Abrange o modo como o contrato é entendido e aplicado
pelas próprias partes. O que se sucede antes e depois da conclusão do
contrato.

Fim do Negócio: O negócio não surge, em regra, como um fim em si mesmo,


apresentando um papel instrumental. Os fins são típicos quando são consequentes
de um tipo negocial eleito. Para serem relevantes em termos de interpretação têm
de resultar do próprio negócio ou de dados comuns a ambas partes. O negócio que
não tenha satisfeito o fim foi mal interpretado.

Elementos Normativos Extra Negociais: Particularmente valorações gerais do


ordenamento carregadas pela boa-fé. Os declaratários agem conforme as boas
práticas do setor sem necessidade da sua inclusão no contrato. Ponderamos o seu
papel na interpretação negocial, sendo, por isso, de afastar interpretações que
conduzam a invalidades ou que permitam apenas aproveitamentos mínimos do
negócio.

Diligência do Declaratório: Surge o problema de como determinar a bitola da


diligência exigida ao declaratário “normal”. Manuel de Andrade explica que, perante
uma declaração que lhe seja dirigida, “o declaratário deve se interrogar sobre o seu
sentido”, podendo-se guiar por um a interpretação mais direta, quando perante
fórmulas muito claras e evidentes, ou por uma interpretação de “boa-fé”
Diligência não observada: O declaratário fica “aquém” do declaratário normal,
sendo tratado “ex lege” como normal e o negócio irá ser interpretado como se
ele tivesse sido diligente, numa situação desvantajosa ou vantajosa,
consoante os casos. No máximo, a falta de cuidado pode envolver
deslealdade “contra bonam fidem”, aplicando-se a culpa in contrahendo.

56§ A IMPUTABILIDADE AO DECLARANTE (236º/1, 2ª PARTE):

Imputabilidade do Declarante (art. 236/1, 2ª parte, CC):

Fórmula Legal: O declaratório pode, colocado na posição do real declaratário,


deduzir o comportamento do declarante, “salvo se este não poder, razoavelmente,
contar com ele”, retirando do horizonte do declaratário aquilo que não possa,

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razoavelmente, ser imputado ao declarante. Compensa a prevalência da teoria da


declaração face à vontade.

Imputabilidade: O significado da interpretação é, geralmente, imputável a ambas


as partes, não existindo na jurisprudência situações em que o sentido acolhido pelo
declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, colocado na posição
do real declaratário não possa ser imputado, razoavelmente, ao declarante.
Contudo, em casos em que a declaração compreenda erros óbvios ou falta de
consciência não pode ser imputada ao declarante.

57§ A VONTADE REAL (236º/2):

Vontade Real (art. 236/2 do CC):

Princípios Básicos:
Existência de uma Declaração: A vontade real resulta da declaração, mas
não é percetível pelo declaratário normal, sendo-o apenas por aquele que
conheça a intenção efetiva do declarante. Deve ser exteriorizada para ser
conhecida pela outra parte.
Concordância: Ambas as partes devem concordar com o que irá integrar o
futuro negócio.

Fórmulas Tradicionais:
“Falsa Demonstratio Non Nocet” (a designação errada não prejudica):
Quando as partes concordam no objeto, mas usam designações diversas,
como partilham do mesmo engano, estão de acordo com a realidade
subjacente. Funciona desde que a vontade real seja conhecida e concorde,
pois uma pessoa pode conhecer a vontade real de outra e, no entanto, não
pertencer aceitá-la através de declaração formal, podendo abrir portas ao
regime do erro, do dolo ou da CIC.
“Protestatio Facto Contratio Non Valet” (a afirmação contrária ao facto não é
eficaz): Quando alguém assuma uma atitude com significado negocial e
declare, ao mesmo tempo, uma atitude com significado negocial e declare, ao
mesmo tempo uma vontade contrária (ou não coincidente) a esse significado.
MC olha para este termo como uma fórmula sugestiva para recordar
que, na formação do negócio, as atitudes das partes não são sempre
uniformes, pelo que no momento da interpretação há que valorar o
conjunto, pois este vai exprimir a efetiva vontade jurígena do
declarante.

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58§ A RECONDUÇÃO AO SISTEMA:

Casos duvidosos (art. 237 do CC): A interpretação negocial fixa soluções jurídicas
para problemas concretos em termos que possibilitem encontrar nelas uma justeza
constituinte e uma legitimidade controlável. Contudo, por vezes, as regras de
interpretação deixam margem para dúvidas, surgindo os “casos duvidosos” em que
se não aplica o art. 236, mas sim o 237.
Equilíbrio das Prestações: Impõe-se, com regra de bom senso, mas é muito
significativa em termos jurídicos, naquilo deixado em aberto pela margem
interpretativa, deve ser validada a interpretação negocial mais justa, sem infligir
danos despropositados a uma das partes em proveito da outra.
Negócios Onerosos: Fixa o sentido juridicamente relevante.
Negócios Gratuitos: Fixa a solução menos onerosa para o disponente.

Articulação dos Diversos Elementos na Interpretação do Negócio: A doutrina


atual encara a interpretação do negócio jurídico como algo essencialmente objetivo
que recai sobre um comportamento significativo e deve operar de tal modo que,
perante um mesmo negócio, seja possível a vários juristas alcançar idênticas
conclusões interpretativas. Devendo a solução emergir em pontos com os da
consciência da declaração e o regime do erro. Todo o sistema da tutela da confiança
pode ser chamado a contribuir para as soluções interpretativas.

Termos Verticais:
Prática contratual entra as partes.
Negociações (e todos os outros atos nesse âmbito) preliminares.
Teor, circunstâncias e condições da emissão e da receção das declarações
negociais.

Termos Horizontais a ter em conta:


Conjunto no qual a clausula a interpretar se insira.
Tipo contratual em jogo.
Inserção do negócio no todo mais vasto a que possa pertencer.
Execução de contratos similares concluídos entre ambas as partes.

59§ REGRAS ESPECIAIS DE INTERPRETAÇÃO:

Contratos Regulativos: Estabelecem regras de aplicação prolongada, suscetíveis


de transcender o exato momento pontual da execução de um negócio.

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Fontes Privadas: Geralmente, seguem regras próprias da interpretação da Lei.

Contratos aplicáveis a Terceiros: Impossível aplicar os art. 236-239, logo a


interpretação deve seguir cânones objetivos, apreensíveis por quantos entrem em
contacto com a sociedade.

CAPÍTULO 8: A Integração do Negócio

61§ PRESSUPOSTOS, VONTADE HIPOTÉTICA E BOA-FÉ:

Lacuna Negocial: Ponto de partida da integração, tratando-se de um espaço


carecido de regulação privada, mas que, contrariando o plano geral das partes, não
obtenha qualquer resposta, devendo, por isso, ser completado. Por vezes tem de
ser preenchida para permitir a execução global do negócio, por razões de ordem
prática ou de justiça. Surge da interpretação das declarações de vontade. Não
existe um procedimento para a sua deteção. Podem ser supervenientes ou iniciais.

Requisitos:
Representar um ponto que, pela interpretação, devesse ser regulado pelo
contrato.
Inaplicabilidade de regras supletivas existentes ou de a encontrar nos termos
do art. 10º – pode se concretizar em duas hipóteses
Trata-se de uma área a cobrir com elementos voluntários necessários
(não existe na lei)
Das regras negociais já apuradas, resulta a clara intenção de afastar
as regras supletivas ou de estabelecer elementos voluntários
eventuais.
Manutenção da validade do negócio – a invalidade só entra em jogo quando
é impossível realizar a integração

Lacunas Contratuais: Áreas que exijam, pelo concreto subsistema negocial


adotado, uma regulação contratual que, sem pôr em causa a subsistência do
contrato, falte.

Conclusões que podem ser retiradas:

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As partes nada disseram por pretenderem que o ponto omisso ficasse fora de
qualquer regulação jurídica.
As partes deixaram a matéria para as normas supletivas, às quais compete
preencher o ponto.
O negócio foi mal conformado, aplicando-se, no limite, a regra da nulidade
por indeterminabilidade do conteúdo.

Integração da Lacuna Negocial Efetiva: Pauta-se pelo art. 239 do CC. Deve
seguir bitolas objetivas suscetíveis de justificação e de controlo. Deve obedecer à
lógica do contrato lacunoso, procurando suprir os silêncios indevidos das partes e
prolongando as suas declarações até ao destino natural. Interpretação
complementadora.

Art. 239º: Critérios da integração negocial:

Vontade Hipotética das Partes: Vontade que as partes teriam tido se houvessem
previsto o ponto omisso
Vontade Hipotética Objetiva: Efetua-se perante a realidade e os valores em
presença, a reconstrução da vontade justa das partes se, com razoabilidade,
tivessem previsto o ponto o omisso
Vontade Hipotética Individual ou Subjetiva: Procura indagar-se perante os
dados concretos existentes, qual teria sido a vontade das partes se tivessem
previsto o ponto o omisso. Críticas:
Há que ter em conta uma vontade hipotética objetiva que exprima uma
ponderação racional de interesses, numa base puramente objetiva. A
vontade hipotética é, de facto, o produto de uma valoração.

Boa-Fé: Confiança efetiva e legítima que as partes tenham depositado no


funcionamento e na adequação do contrato. A primazia da materialidade subjacente
obriga a atender à lógica imanente do contrato.

CAPÍTULO 9: Vícios da Vontade e da Declaração

62§ QUADRO DOS VÍCIOS:

Quadro dos Vícios: O negócio jurídico vale enquanto manifestação da autonomia


privada, correspondendo a uma determinada vontade, isto é, a uma decisão
assumida na sequência de toda uma ponderação imputável a um sujeito. A decisão

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tem de ser exteriorizada para produzir os seus efeitos. Por estarmos perante obra
humana, surgem vários vícios para interferir no processo e que incidem em 2
planos:

Vícios da Vontade: O processo que leva à tomada de decisão pelo sujeito


autónomo é perturbado, o vício ocorre durante a formação da vontade. Podem se
dividir em:
Ausência da Vontade:
Art. 246º: Coação física.
Art. 246º: Falta de consciência da declaração.
Art. 247º (em parte): Incapacidade Acidental.
Vontade Deficiente:
Art. 251º e 252º (erros vício) e 253º e 254º (dolo): Por falta de
conhecimento.
Art. 257º: Por falta de liberdade e conhecimento (incapacidade
acidental)
Art. 258º (e seguintes): Por falta de liberdade (coação moral).

Vícios na Declaração: Algo interfere durante a exteriorização da vontade, de modo


a que a declaração não corresponda à vontade real do sujeito. Pode ser:
Intencional: Surge porque o declarante assim deseja:
Art. 240º (e seguintes): Simulação.
Art. 244º: Reserva Mental.
Art. 245º: Declarações não sérias.
Não Intencional: Lapsos ou dificuldades ocorridas na exteriorização ou na
comunicação.
Art. 247º: Erro obstáculo.
Art. 249º: Erro de cálculo ou escrita.
Art. 250º: Erro na transmissão.

Soluções Para os Vícios: Norteadas por dois princípios fundamentais:


Autonomia Privada: Exige que a vontade juridicamente relevante corresponda
à vontade real, livre e esclarecida do declarante.
Tutela da Confiança: Requer a proteção da pessoa que tenha dado crédito à
declaração de outrem, mesmo quando esta não reúna todos os requisitos que
um puro esquema de autonomia privada requereria.

63§ A FALTA DE CONSCIÊNCIA DA DECLARAÇÃO:

Ausência de Vontade (art. 246): Instituto experimental contrário ao sistema. A falta


de consciência da declaração é percetível do próprio ambiente onde ela se ponha,

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podendo ser percebida pelo declaratário normal na posição do declaratário real se a


declaração é feita vidando deveres de lealdade ou de informação, ou se se colocar
voluntariamente na situação de o fazer fica obrigado a indemnizar o declaratário.

Colisão com o Art. 236: Na parte em que se refere à falta de consciência da


declaração choca com as regras de interpretação.

Colisão com o Art. 247: A vontade declarada sobrepõe-se à vontade real, mesmo
havendo erro, desde que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a
essencialidade, ficando o declarante vinculado a um negócio que, de todo, não
queria por se não verificarem os pressupostos de impugnabilidade por erro.

64§ INCAPACIDADE ACIDENTAL:

Incapacidade Acidental (art. 257): Difere das incapacidades legais

Art. 257/1: Fixa o requisito do facto ser notório. Alguém que contrate com outrem
que não esteja na posse de todas as suas faculdades de entendimento e livre
decisão sujeita-se, desde logo, à impugnabilidade do negócio. Aquele que se
coloque propositadamente nesta situação pode ser detido ao tentar anular o negócio
por abuso de direito. Condições de incapacidade:
Causas Quaisquer: Factos patológicos extrínsecos – embriaguez ou efeito de
estupefacientes; factos psicológicos intrínsecos – doença súbita dos foros
psicológico e psiquiátrico, como um trauma; e factos não patológicos – sono,
euforia, acesso de ira.
Sentido da Declaração: A causa acidentalmente incapacitante atinge a
capacidade intelectual da pessoa:
Perceção: Incompreensão do Idioma
Raciocínio: Não percebe o que é dito
Comunicação: Fica bloqueado quanto à emissão de uma declaração.

Art. 257/2: Explicita que o facto é notório quando uma pessoa de normal diligência o
poderia ter notado. Introduz uma dimensão valorativa.

65§ AS DECLARAÇÕES NÃO SÉRIAS:

Declarações Não-Sérias (art. 245): Todas as situações nas quais o declarante não
tenha a intenção de emprestar, à declaração feita uma dimensão jurídico-negocial,
esperando que o declaratário disso se aperceba.

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Características:
Declaração linguisticamente capaz de exprimir uma declaração negocial
eficaz
Falta de vontade (e consciência) de lhe dar uma dimensão jurídica.
Termos que, de algum modo, reflitam o seu teor (como as circunstâncias).
Se a falta de seriedade não é desconhecida deve alicerçar-se em algo
substancial (como todos perceberem ou ser histórico).

Quadro de Aplicação:
Declaração patente não séria – Art. 245/1
Declaração patente não séria, mas que, por condicionalismos, enganou o
declaratário – Art. 245/2
Declaração secretamente não séria – aplica-se a reserva mental, sendo o
negócio válido e eficaz
Declaração não-séria feita de modo a que a não seriedade não seja
percetível, induzindo a outra parte em erro – Art- 244/2

66§ A RESERVA MENTAL:

Reserva Mental: Por ser puramente interior, não prejudica a validade (art. 244)

67§ COAÇÃO:

Ausência de Liberdade:

Coação Moral: Emprego da força física ou de quaisquer meios que produzam


danos, ou fortes receios deles relativamente à pessoa, honra ou fazenda do
contraente ou de terceiros.
Características (Manuel de Andrade – Código de Seabra)
Essencialidade: Deverá determinar o núcleo da declaração.
Intenção de Coagir: O declaratário terá de ser vítima de ação humana
de lhe extorquir a declaração pretendida.
Gravidade do Mal: Variável, porém o mal deve ter bastante peso.
Gravidade da Ameaça: Independentemente do seu mal, deve ser
avaliada a sua probabilidade.
Injustiça ou Ilicitude da Cominação: A “ameaça” do exercício de um
direito (ex: “vou a Tribunal) não é coação.

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Principal ou Acessória: Consoante atinja o essencial do negócio ou apenas


os aspetos acessórios.
Dirigida ao Próprio ou a Terceiros: Consoante vise a pessoa, a honra ou os
bens do próprio ou de terceiros.

69§ O ERRO NA DECLARAÇÃO (ERRO-OBSTÁCULO):

Erro na Declaração (Erro Obstáculo): A vontade formou-se corretamente, porém,


durante a sua exteriorização houve uma falha, de tal modo que a declaração não
retrata a vontade do declarante.

Elementos Delimitados pela Lei Sobre os Quais Recai o Erro, Para ser
Relevante:
Elementos Nucleares do Contrato: Objeto, conteúdo do negócio ou outros
aspetos principais.
Elementos Circundantes: Características acessórias do objeto, clausulas
acidentais ou fatores periféricos diversos.
Fatores Relativos às Partes: Identidade, qualidade, função, entre outras...

Essencialidade e o Conhecimento (art. 247):


Essencialidade: Permite excluir o erro indiferente e o erro incidental. É
objetivo.
Erro Indiferente: O declarante teria concluído o negócio tal como
resultou.
Erro Incidental: O declarante teria concluído igualmente o negócio,
ainda que com algumas modificações.
Conhecimento da Essencialidade do Elemento pelo Declaratário: É um dado
subjetivo ou se conhece ou não conhece. Geralmente, deriva de uma
comunicação expressa, contudo, por vezes, pode provir do conjunto, das
circunstâncias que rodeiam o negócio ou da própria natureza deste. O
conhecimento e a sua exigência constituem uma válvula de segurança do
negócio, devendo ser invocado em conjunto com a essencialidade para a
anulação do negócio.
Dever de Conhecer: É objetivo por ter natureza normativa. Não existe
necessidade de indagar sobre as razões que levaram a outra parte a
contratar.

Anulação do Contrato por erro na declaração: Pode provocar dano ao


declaratário. Existe um dever elementar, imposto pela boa-fé e tutela da confiança
de fazer corresponder as declarações de vontade realizadas ao que efetivamente se

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pretenda, podendo o declarante ter de corresponder por culpa in contrahendo caso


isso não aconteça. O direito vigente não exige desculpabilidade do erro.

Dissenso: As partes formulam declarações não coincidentes, convencionadas de


que concluíram um contrato, nesta eventualidade, não existe contrato. A primeira
parte que se aperceba tem o dever de avisar a outra que não foi formulada
nenhuma proposta que obtivesse aceitação. Verificados os requisitos, as propostas
podem ser anuladas, caso para tal exista interesse, de outra forma, permanecem
válidas e eficazes até caducarem, serem rejeitadas ou aceites.

Validação do Negócio (art. 248): A anulabilidade fundada num erro na declaração


não procede se o declarante aceitar o negócio como o declarante queria. Esta
validação pressupõe uma declaração, quando aceite prevalece a vontade real do
declarante. Tem o limite objetivo da necessidade de respeito às regras formais, não
podendo ser validado um negócio que não respeite as regras formais (obedece na
mesma aos art. 238 e 293).

Erro de Cálculo ou de Escrita (art. 249): Têm de ocorrer “erros manifestos” ou


“ostensivos”, não sendo possível, por esta via, complementar puras e simples
omissões ou corrigir peças contratuais. Se o erro não for apanhado imediatamente,
recaímos para o art. 247.

Erro na Transmissão da Declaração (art. 250):


Erro na própria declaração (art. 250/1): Casos em que o intermediário ou
núncio não transmita fielmente a vontade do mandante ou quando o
representante se desvie das informações recebidas. Se o destinatário
conhecer a essencialidade, para o mandante, do elemento deturpado na
transmissão, o negócio é anulável.
Caso particular do dolo do intermédio (art. 250/2): Casos em que se altere a
declaração propositadamente, existindo conflito entre a autonomia privada (a
que a lei vai dar primazia) e a tutela da confiança, sendo a declaração
sempre anulável. O dolo deve ser provado por quem o invoque, contra o seu
autor e verificados os pressupostos legais. Surge um direito à indemnização a
todos os lesados de interesses positivos.
70§ O ERRO DA VONTADE (ERRO-VÍCIO):

Erro Relativo à Pessoa ou ao Objeto (art. 251): No tocante à pessoa ou ao


declaratário, o erro pode reportar-se à sua identidade ou qualidades, só sendo
relevante quando colha um elemento concretamente essencial. Quando o erro é
relativo ao objeto deixa de estar em causa a identidade do objeto, mas as suas
qualidades e valores. Se as qualidades que constam no contrato não se verificam, a
hipótese passa do erro para o incumprimento (art. 913).

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Erro Sobre o Futuro Objeto: art. 252

Erro sobre os Motivos (art 252/1): Provém do erro de facto à cerca da causa
(motivo). O facto de o destinatário conhecer, ou dever conhecer, a essencialidade do
motivo não justifica a supressão do negócio, pois, não se tratando de um elemento
nuclear, ele nada tem com isso.

≠ de Condição Resolutiva: Implica uma vontade condicional – ex: “só te vendo o


vestido se te casares com ele”. A condição resolutiva opera automaticamente
enquanto que a eventual anulabilidade por erro dos motivos tem de ser exercida
potestivamente.

Erro sobre a Base dos Negócio (art. 252/2): A lei manda aplicar o regime da
alteração das circunstâncias. Integram na “base do negócio” os elementos
essenciais para a formação da vontade do declarante e conhecidos pela outra parte.
Se estes elementos não corresponderem à realidade, tornam a exigência do
cumprimento do negócio concluído gravemente contrário aos princípios da boa-fé.
Há que aplicar o regime do comum do erro – a anulabilidade (que tem de ser
confirmada – art. 288)

Erro de Direito em Atos “strictu sensu”: O regime do erro da vontade é aplicável,


com adaptações, a atos não contratuais. O declaratário figurado no art. 247 terá de
ser substituído pela figura do interveniente normal que entre em contacto com a
situação criada e possa ser prejudicado pela sua supressão. O art. 295 deve estar
sempre presente.

Dolo (art. 253): Sugestão ou artifícios usados com o fim de enganar o autor da
declaração, criando aparências ilusórias ou destruindo elementos que pudessem
instruir o enganado. Espécie agravada de erro – erro provocado.

É relevante consoante:
O declarante esteja em erro.
O erro tenha sido causado ou dissimulado pelo declaratário ou por terceiros.
O declaratário ou o terceiro recorreram a algum embuste.

Anulabilidade: Apenas se recair sobre elementos essenciais. É cumulável com


indemnização se dor alegada culpa in contrahendo.

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72§ A SIMULAÇÃO NO CÓDIGO CIVIL:

Requisitos da Simulação (art. 240): Devem ser invocados e provados por quem
pretenda prevalecer-se da simulação ou de aspetos do seu regime.

Acordo entre o declarante e o declaratário: Não basta uma das partes manifestar
uma intenção que não corresponda à sua vontade, exige-se sintonia – de outra
forma existe, antes, reserva mental.

Divergência entre a declaração e a vontade das partes: Elemento mais distintivo


que compreende várias modalidades.

Intuito de enganar terceiros: Alguém alheio ao conluio, mas não,


necessariamente, ao contrato simulado, tem de ser impactado pela aparência
criada, se não houver impacto, o engano é virtual.

Modalidades da Simulação:

Inocente: Fraudulenta:

Visa apenas Cria uma falsa aparência para o exterior.


enganar alguém Tem, como fim imediato, retirar benefícios em prejuízo de
terceiros

Absoluta: Relativa:

As partes não Sob a simulação está escondido o negócio realmente


pretendem pretendido (negócio dissimulado)
cele-brar As partes pretendem uma efetiva alteração do “status” real,
qualquer mas com contornos distintos declarados para o exterior.
negócio, tendo
como fim evitar Subjetiva: Objetiva:
alguma
conse-quência
jurídica
prejudicial.

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Incide sobre A divergência recai sobre o objeto ou


as próprias conteúdo do negócio:
partes. Simulação Relativa Simulação Relativa
Objetiva Total: Objetiva Parcial:

O negócio simulado e Respeita somente


o negócio dissimulado par-te do conteúdo,
pertencem a tipos sem afetar a
distintos. qualificação do contrato
concluído

Simulação Subjetiva: Existe uma interposição fictícia das pessoas – “A” vende a
“B”, mas declaram que foi a “C”
Simulação de valor consubstancial: Simulação imprópria cujo regime aplicável,
de base jurisprudencial, se distingue do regime positivado pelos seus elementos
fácticos e jurídicos daí decorrentes.

Nulidade: Alheia à existência de direitos ou interesses da esfera jurídica do terceiro


enganado.

73§ OS EFEITOS DA SIMULAÇÃO:

Nulidade (240/2): O negócio simulado é nulo, contudo, não pode ser invocado por
qualquer interessado nem ser, oficiosamente, declarada em tribunal, sob pena de se
esvaziar a proteção devida aos terceiros de boa fé. (defendido pelos art. 242 e 243
que “ganham” ao 238).

Legitimidade de Arguirem a Simulação (art. 242/1): os herdeiros legítimos (art.


2157) têm uma legitimidade especial para invocarem vício de simulação sempre que
haja intenção de os prejudicar. Cessa com o falecimento do autor da sucessão.

Exceções de Invocação da nulidade (art. 243/1): A nulidade não pode ser


invocada contra terceiros de boa-fé, nem pode ser invocada pelos autores do
negócio, posteriormente.

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Conflito de Interesses entre Terceiros Interessados na Nulidade/Validade: A


solução deve surgir procurada no seio do próprio regime simulatório

Tradicionalmente Abarca 3 Situações:


Conflito entre credores comuns do simulador alienante e credores comuns do
simulador adquirente.
Conflito entre credores comuns do simulador alienante e subadquirentes do
simulador adquirente e o seu contrário.
Conflito entre credores comuns do simulador alienante e subadquirentes do
simulador adquirente.

Valor do Negócio Simulado: Não é válido, contudo, também não é inválido (art.
247/1):

Teoria da Forma da Declaração: O negócio dissimulado apenas pode ser válido se


as próprias declarações de vontade respeitarem a forma exigida.

Teoria da Forma do Negócio: A validade deve ser declarada sempre que exista
uma identidade entre a forma exigida e a forma empregue pelo negócio dissimulado.

Teoria da “ratio” da forma: A validade do negócio dissimulado está dependente do


preenchimento das razões justificativas subjacentes à exigência de uma forma
especial (defendida por Manual de Andrade e Alarcão)

Prova da Dissimulação (art. 394):

Princípio da Prova Escrita: Quando for impossível obter prova escrita ou em caso
de perda não culposa da mesma, é admissível complementá-la através de
testemunhas.
Crítica do Professor Menezes Leitão: É inadmissível que uma prova
testemunhal possa por em causa a fiabilidade do documento autêntica, pois
esta será de “conteúdo altamente duvidoso”.

CAPÍTULO 10: A Ineficácia do Negócio Jurídico

74§ INEFICÁCIA E INVALIDADE:

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Sebenta Teoria Geral do Direito Civil - Regência JAV - TB - 2020/2021 - LBT

Ineficácia em Sentido Amplo: Ineficácia em Sentido Estrito:

Não-produção normal de efeitos que O negócio, em si, não tem vícios,


opera à mercê da presença de vícios verifica-se, contudo, uma conjunção
ou desconformidades com a ordem com fatores extrínsecos que conduz à
jurídica. referida não-produção.

Invalidades: Não produção cabal de efeitos (Windscheis associa-as às ineficácias


em sentido amplo):

Nulidade: Deriva da falta de elementos essenciais ou de contrariedade à lei


imperativa. Tipo residual da ineficácia, pois, quando perante uma falha negocial a
que a lei não determine saída, a resposta pode ser a nulidade. Atinge o negócio em
si e pode ser invocada a todo o tempo, por qualquer interessado e declarada
oficiosamente pelo tribunal. Opera “ipsu iure” (independentemente de qualquer
vontade a desencadear) – art. 286.

Anulabilidade: Quando os valores relativos a uma determinada pessoa não foram


suficientemente atendidos, aquando da celebração do negócio. Só pode ser
invocada pelas pessoas em cujo interesse a lei estabelece e no prazo de um ano
subsequente à cessação do vício, mediante a confirmação (art. 287 e 288)

Invalidades mistas ou atípicas: Invalidades que não podem ser reconduzidas aos
modelos puros da nulidade ou anulabilidade.

75§ A PRETENSA INEXISTÊNCIA:

Inexistência: Apresenta os mesmos pretensos que a nulidade, mas aplica-se a


casos mais graves. Enquanto que na nulidade ainda podem existir alguns efeitos, na
inexistência fica tudo bloqueado.

Divergências Doutrinárias:
Raul Ventura: Aprova a inexistência.
Manuel de Andrade: Aprova a inexistência apenas no casamento.
Galvão Telles: Vê a nulidade igual à inexistência.

76§ INEFICÁCIA ESTRITA E IRREGULARIDADE:

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Sebenta Teoria Geral do Direito Civil - Regência JAV - TB - 2020/2021 - LBT

Ineficácia Estrita: Situação do negócio jurídico que, não apresentando vícios, não
produz todos os seus efeitos por via de fatores extrínsecos. Só surge em casos
específicos previstos pela Lei.

Irregularidades: Quando, dentro da autonomia privada num negócio, existem


regras para ser aplicadas, mas que não são observadas.

77§ O REGIME DAS INVALIDADES:

Invocação: A lei é omissa quanto ao regime geral da invocação das invalidades, o


que depõe no sentido da desformalização mau grado os preparatórios perante
invalidades que atinjam situações registadas. Por serem atos secundários
subordinados aos principais (negócios jurídicos viciados), é entendido que devem
seguir a forma exigida por essa exigida por esses mesmo negócios.

Quando a declaração de nulidade ou a anulação “formais” não são aceites:


Existe litígio a dirimir em juízo. O tribunal limitar-se-á a apreciar se a invocação da
nulidade ou se a anulação foi devidamente atuada.

Consequências: Envolve a nulidade dos negócios subsequentes:

Atos Nulos: Não produziram efeitos jurídicos

Atos Inválidos: Produziram efeitos jurídicos, mas não são imputáveis à lei.
Art. 289: A declaração de nulidade e a anulação do negócio têm efeito
retroativo (art. 289/1), obrigam à restituição do que tiver sido prestado que
pode ser decretada pelo Tribunal quando ele reconheça oficiosamente a
nulidade.

Se adicionar cabeçalhos (Formatar > Estilos de parágrafo), eles passam a aparecer no


índice.

Tutela de Terceiros:

86
Sebenta Teoria Geral do Direito Civil - Regência JAV - TB - 2020/2021 - LBT

Em caso de bens móveis: O terceiro que tenha adquirido de boa fé tem o Direito à
restituição do preço pago a efetuar pelo beneficiário da restituição (art. 1310)

Em caso de bens imóveis: Não são prejudiciais os direitos de terceiros adquiridos


de boa-fé e a título oneroso e que registem a aquisição antes de inscrita qualquer
ação de nulidade ou de anulação ou qualquer acordo relativo à validade do negócio.
Este regime só opera 3 anos após a conclusão do negócio.

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