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MEDITAÇÃO
Facilitação: José G. Benetti M.
sob orientação do Lama Padma Samten
“A busca da estabilidade na natureza básica da mente é o caminho direto da meditação,
aquele no qual se busca praticar a mente liberta, a condição de libertação”.
Contexto budista
Iremos abordar a meditação no contexto budista dentro da prática do CEBB. Mesmo no
budismo existem inúmeras formas de meditação, com objetivos e técnicas diferentes. No caso
do budismo praticado no CEBB, a meditação é muito mais do que um método de
transformações mentais, emocionais e físicas. De acordo com o que o próprio Buda Sakyamuni
realizou em vida e, especialmente, de acordo com a ação de Guru Rinpoche, considerado por
muitos como um “segundo Buda”, e também como o mestre que deu origem ao budismo
tibetano, a ação iluminada é o ponto culminante. Ou seja, vamos praticar não para
permanecermos meditando, presos à própria meditação. Vamos meditar para agir. E agir de
forma iluminada.
no nível do corpo: ações como matar, roubar e gerar sofrimento através do sexo;
no nível da fala: ações como mentir, falar agressivamente, falar inutilmente e difamar outras
pessoas;
e no nível da mente: a avareza, a má vontade e as visões errôneas.
Tais recomendações do Buda não partem de uma moralidade dogmática, mas sim do
puro bom senso que surge da análise dos efeitos das ações, que podem ser constatados
através da experiência direta. Estas etapas pertencem ao Nobre Caminho de Oito Passos
descrito pelo Buda, sendo que a meditação silenciosa é ensinada no sexto passo.
É claro que não precisamos levar à perfeição cada uma destas etapas anteriores para
iniciarmos a meditação. O método é circular. Avançaremos em todas as etapas ao mesmo
tempo.
Outras compreensões preliminares que potencializam a prática da meditação são:
Posição de corpo
Para que o corpo fique bem na posição de meditação é sempre muito benéfico trabalhar o
alongamento da musculatura envolvida e soltar as diversas articulações: tornozelos, joelhos,
coxo-femural (que liga cada coxa ao tronco), coluna vertebral, pescoço, ombros, cotovelos,
pulsos, dedos. O alongamento será conquistado lentamente, não deve ser forçado. Técnicas
como yoga, pilates, etc, podem oferecer grande auxílio, mas a persistência e a regularidade na
prática é que trarão a pacificação do corpo.
Como sentar
Existem várias opções de acordo com as possibilidades de cada um.
É vista como a postura ideal para longos períodos de meditação, desde que seja
facilmente realizada. Ou seja, é preciso desenvolver o alongamento e a familiarização
necessários ao longo do tempo. Não deve ser forçada, pois é muito fácil se lesionar.
3) Pernas cruzadas:
Uma perna diante da outra, tocando o chão igualmente.
4) Outras posturas:
a) ajoelhada sobre uma pilha de almofadas, alta o suficiente para que os ísquios (ossos dos
glúteos) não toquem os calcanhares;
b) ajoelhada na mesma postura, mas sobre um banco de meditação;
c) sentada numa cadeira, com uma almofada para erguer a coluna;
d) em pé;
e) deitada: posição mais difícil do que parece, pois impossibilita pequenas alterações de
postura no meio da prática, caso haja dor por pressão, além de induzir com frequência ao sono,
mas também muito benéfica para propiciar um maior relaxamento, relaxando músculos e
liberando o corpo no solo;
f) caminhando: conhecida como kinhin na prática Zen, essa meditação exige explicações mais
detalhadas, porém pode-se dizer apenas que o importante é manter o olhar à frente
repousado, do modo como foi trabalhado durante o curso e como é explicado adiante, os
passos devem ser mais lentos do que o nosso usual e deve-se manter o mesmo ritmo do início
ao fim da sessão.
1) Coluna: ereta, mas sem excesso de tensão. Podemos encontrar a melhor posição
balançando o corpo para frente e para trás, para a direita e para a esquerda.
2) Braços: ao lado do corpo, com os cotovelos levemente afastados
3) Queixo: ‘encaixado’ (levemente recolhido).
4) Rosto: relaxado, especialmente ao redor dos olhos.
5) Olhos: iremos meditar com os olhos abertos, direcionando a visão num ângulo de 45º em
relação ao chão, ou olhando diretamente à frente. Quando há um repouso natural, a
necessidade de piscar os olhos diminui. Ou seja, não vamos forçar para que isso aconteça. Se
surgir a necessidade de piscar, pisque. Como estamos buscando estabilidade para agirmos
melhor em meio ao mundo, e como no mundo estamos a maior parte do tempo com os olhos
abertos, é recomendável treinar diante dos próprios objetos.
6) Boca: fechada ou levemente entreaberta, com a língua tocando o céu da boca, o que diminui
um pouco a salivação. Do mesmo modo que com o piscar, se vir a salivação em excesso,
engula.
7) Mãos: há várias possibilidades para a posição das mãos. Na prática do CEBB, usamos duas:
ou sobre os joelhos, simplesmente repousadas; ou no mudra (gesto) da equanimidade: mão
direita sobre a mão esquerda aberta, com os polegares muito próximos, mas sem se tocar,
repousando diante da região do umbigo, mas mantendo a postura, ou seja, sem “despencar”
sobre os calcanhares.
8) Pernas: as pernas ficam inteiramente no chão. A almofada serve apenas para erguer os
ísquios. Ou seja, sentamos no chão mesmo (na almofada retangular maior, chamada zabuton,
por exemplo) e usamos a almofada ou o zafu para erguer a coluna. Caso o alongamento não
permita que as pernas estejam inteiras no chão, usamos almofadas para apoiá-las, distribuindo
o peso do corpo inteiramente sobre elas.
9) O mais importante: é a postura de mente. Os detalhes descritos aqui podem estar sendo
perfeitamente cumpridos e, justo por isso, a mente estar completamente tensa. Esse não é o
ponto. A posição deve ser sustentada, mas não deve gerar muita tensão. É preciso buscar um
repouso, que não é o relaxamento usual, como simplesmente se deitar no sofá, mas também
não é o oposto, a tensão excessiva.
O ambiente deve ser agradável e permitir o isolamento. Se houver muitas fontes de distração
por perto, ou se não nos sentirmos bem naquele local será difícil praticar no início. Podemos
arrumar o local com objetos que nos inspirem, imagens, flores, queimar incenso, etc. Tudo isso
pode ser testado por cada um. Os retiros procuram facilitar o isolamento. Com o tempo
sentiremos vontade de aplicar mais tempo para aprofundar as práticas. Mais adiante seremos
capazes de manter a concentração mesmo em lugares agitados, ou que sejam perturbadores,
como praças, ônibus, cemitérios, praias, etc.
O equilíbrio deste elemento pode vir a equilibrar todos os outros. Corpo e mente podem
entrar em sintonia e harmonia, diminuindo nossa responsividade, se simplesmente
equilibrarmos a energia (fala). A palavra tibetana para energia é lung. O Anexo V desta apostila
faz um aprofundamento neste ponto do lung, buscando iluminá-lo a partir de cinco aspectos,
ou os cinco elementos (éter, ar, fogo, água e terra).
Posição de mente
A mente deve seguir as instruções da prática específica que estiver sendo realizada. Por
exemplo, se é uma prática de concentração unifocada, procuraremos manter nossa atenção
100% no objeto de meditação, sem dar sequência aos pensamentos. O movimento dos
pensamentos não deve ser visto como um inimigo. Lutar contra a própria mente não gera
resultados. A mente deve estar concentrada, mas relaxada. Pensamentos sobre o passado ou o
futuro, aceitação ou rejeição, passam pela mente como nuvens no céu. Não os reprimimos,
mas também não os seguimos.
Em geral, o que chamamos de “pensamentos” são os impulsos cármicos que nos
mantêm sempre em atividade mental. Se ficarmos dominados por esses impulsos, a mente
estará sempre ocupada e teremos a sensação de sermos a todo momento arrastados por
nossos pensamentos. Estando a mente sobrecarregada e constantemente ocupada, temos a
sensação de não conseguirmos centrá-la em alguma outra coisa mais elevada, como o
caminho espiritual.
Logo, por meio da meditação, estamos gerando um processo pelo qual vamos poder
focar a mente em uma só coisa por vez, ou em várias delas em sequência, mas sempre por
escolha, por liberdade e não por impulso cármico. Por isso, tranquilizamos o corpo, a fala
(energia) e a mente.
Vemos os pensamentos surgirem e serem substituídos por outros, sucessivamente.
Inicialmente apenas observamos esse ir e vir. Pode ser que precisemos retornar diversas vezes
dentro de uma mesma sessão ao foco que elegemos, por exemplo, a respiração, ou a energia
(lung). Vamos fazendo isso de forma gentil e paciente, sem brigar com a mente e também sem
aceitar os conteúdos que surgem. Ao poucos, esse processo vai possibilitar que reconheçamos
os pensamentos que brotam como sendo bolhas de um vasto espaço de liberdade. Eles surgem
dali e ali mesmo se dissolvem. Essas bolhas podem nos oferecer enredos e histórias, ora
sedutoras ora repulsivas ora sem qualquer conteúdo efetivamente importante, mas na medida
em que reconhecemos que são apenas bolhas, elas estouram, voltam a pertencer ao lugar de
onde vieram, esse espaço de liberdade natural.
Procuramos não seguir as bolhas de pensamentos que surgem, simplesmente as
observamos sem rejeição e sem apego, nos mantemos presentes, atentos ao ciclo de
inspiração e exalação atual.
Mandala
A cada ciclo de inspiração e exalação ampliamos mais e mais este ambiente interno de
serenidade, até repousarmos no espaço natural e incessante de serenidade, que é expressão
da Natureza Primordial. Assim, repousamos na “Mandala Natural de Serenidade de todos os
Budas.”
Céu
A natureza livre da nossa mente é a Natureza Primordial, o Espaço Básico, o aspecto do
Céu. Por meio da meditação, aos poucos, vamos reconhecendo que, em verdade, quando
geramos uma paisagem de serenidade estamos acessando um espaço natural e incessante de
serenidade, paz e liberdade, que nunca se distanciou de nós, reconheçamos isso ou não. A
cada inspiração e expiração aumentamos o brilho nos olhos e ampliamos a serenidade e a
estabilidade, nutrimos e curamos o nosso corpo.
Ao repousarmos no espaço básico, do qual tudo surge e ao qual tudo retorna,
reconhecemos que os fenômenos são totalmente puros, não há nenhum problema com eles em
si mesmos. O problema é quenos agarramos a eles, por apego ou aversão, é passamos a vê-los
de modo “contaminado”.
A partir do espaço básico também acessamos as Intenções Iluminadas – a energia que
nos anima, nos sustenta, dá brilho, força, magnetismo, lucidez, destemor, clareza e propósito
de vida. Ao localizarmos as Intenções Iluminadas e nos dedicarmos a nos mover a partir delas,
tomamos refúgio em algo que não é fugidio, entramos numa Terra Pura, operamos a partir de
uma Mandala. Mas isso ocorre quando tornamos prioridade a nossa transformação interna;
senão, seguiremos dependentes das condições externas.
O reconhecimento das Intenções Iluminadas como expressões de lucidez, onde a
energia natural e não condicionada – não por controle – nos move em meio ao mundo, gera a
inseparatividade entre a prática formal e a prática no quotidiano. Este é o despertar da
compaixão – a aspiração de manifestarmos as Sabedorias Búdicas como modo de
beneficiarmos amorosamente os seres em todas as direções.
Temos liberdade de trocar de paisagens. O Céu é o que nos permite saltarmos de uma
paisagem para outra, o Céu é essa liberdade incessantemente presente antes, durante e
depois de cada resposta que damos.
Por meio da meditação, estamos exercitando esta experiência de Céu, o repousar no
Espaço Básico, e somos capazes de, no silêncio, experimentarmos uma vivacidade, o brilho nos
olhos, e redirecionarmos nossa vida a partir deste brilho.
Então buscamos estabilidade de corpo, energia, mente, paisagem, mandala e céu, e
vamos nos dedicar a avançar nos níveis da Visão, da Meditação e da Ação.
Principais obstáculos
Existem muitos obstáculos que surgem durante as práticas meditativas, mas no início
eles estão divididos principalmente em dois grupos: a excitação ou agitação mental e o torpor
ou sonolência. A mente deve possuir uma qualidade de vivacidade durante a meditação, mas
sem agitação. No nível do corpo, a posição do olhar ajuda a lidar com estes dois fatores:
quando estivermos mais agitados, podemos olhar para baixo. Quando estivermos com sono
podemos olhar para cima. Inspirar e segurar o ar por alguns instantes também irá ajudar a
diminuir o sono. Um modo que se mostra bastante eficiente também é o repouso vivo sobre o
lung dos elementos (Anexo V). Por exemplo, repousar sobre o lung do éter nos desperta,
repousar sobre o lung da água nos flexibiliza, repousar sobre o lung da terra nos estabiliza, etc.
Outro obstáculo pode ser a noção de que estamos “piorando” quando começamos a
meditar. Parece que nossa mente fica ainda mais agitada. O que ocorre é que tomamos ainda
mais consciência de nossas mentes. Nossa mente pode ser comparada a um copo com água e
terra revoltas. Ao começarmos a praticar, tomamos consciência inicialmente desse copo e,
gradativamente, vemos a terra se assentar. Quando não praticávamos, a água e a terra eram
uma coisa só. Agora, elas começam a se separar e tomamos uma consciência maior da terra
que se assentou.
Quanto à dor física, tende a diminuir com o tempo de prática, mas é necessário que
combinemos as sessões formais, sempre alternando as posturas conforme descrito acima, com
alongamentos e práticas como ioga, pilates, etc. Ao mesmo tempo, a própria frequência tende
a acostumar o corpo e torná-lo mais dócil e flexível.
Podemos ter diversas “experiências” durante a meditação: ver luzes coloridas, imagens
que se movem na parede, fortes sensações de calor ou frio, histórias que surgem na mente,
seres estranhos próximos a nós, etc. Todos estes efeitos não devem ser reprimidos, mas
também não devemos lhes dar grande importância, pois eles nada mais são do que
manifestações da própria mente. Seguimos em frente focando a técnica que estivermos
praticando.
Paciência e perseverança são duas qualidades essenciais para sustentar a prática. Sem
elas, logo que os obstáculos surgirem poderemos pensar que não levamos jeito para a coisa,
que é muito difícil, que os resultados vão demorar muito, que nesta vida não dará mais tempo,
etc.
ITEM 3 - Impermanência
A impermanência significa que aquilo que hoje está presente e é favorável pode desaparecer.
Vamos supor; os ensinamentos do Buda; no Brasil, eles são recentes. No final da década de 80
nós tivemos os primeiros movimentos aqui no Rio de Janeiro, então isso ainda é muito recente,
e do mesmo modo que os ensinamentos surgem, os ensinamentos podem cessar. É natural que
isso possa acontecer. Do mesmo modo, nossa saúde, nossa condição de aproveitar os
ensinamentos também é algo transitório, é triste pensarmos nisso, mas naturalmente essa é a
realidade. Nós precisaríamos entender que a impermanência pode se exercer sobre esses
fatores , hoje positivos, e que deveríamos usá-los do melhor modo. Eu tenho acompanhado
diferentes praticantes que já entraram em processo de morte... e morreram. Nessa hora,
quando a doença surge e se instala, sempre há essa perspectiva: “eu deveria ter praticado
mais, eu deveria ter aproveitado melhor o meu tempo”. E é evidente que essas circunstâncias
vão acontecer com cada um de nós, porque naturalmente nós temos o único pré-requisito
essencial para morrer, que é estar vivo, não falta mais nada, não precisamos de mais nada.
Então, nós naturalmente vamos passar por isso. Quando formos entrar nessa rota de forma
mais clara vamos ter a sensação de que deveríamos ter praticado mais. A impermanência
aquece as nossas costas, estamos andando e sentimos alguma coisa por trás, sentimos que
deveríamos andar mais rápido. É muito importante que entendamos isso. Deveríamos
aproveitar os ensinamentos que recebemos e transformá-los em realidade.
ITEM 4 - Carma
A melhor explicação para essa questão do carma, acredito, é a que fala do carma primário e
as condições secundárias. Por exemplo: “eu tenho um carma de brabeza?” Eu? não... como?”;
“nós somos pacíficos”. “Eu teria assim... carma para o reino dos infernos? Não... nem para o
reino dos seres famintos, nem para o reino dos animais etc”... a gente olha e parece que está
limpo, porém, quando as condições secundárias surgem... então aquilo pode aparecer. É
importante entender as condições secundárias, pois elas revelam as nossas fragilidades,
revelam nossas conexões com os seis reinos, revelam as ações não virtuosas. Por exemplo, nós
jamais mataríamos, exceto... percebemos que não faríamos nenhuma dessas dez ações não
virtuosas aqui nessa sala, por exemplo. Mas saímos daqui, saímos da meditação, vamos para
um outro lugar e ai surgem as condições secundarias que podem propiciar o impulso para as
ações não virtuosas, como se fosse uma grande inteligência. É assim mesmo que funciona,
essas são as condições secundárias. Precisaríamos entender que nós temos essa fragilidade.
Isso nos ajuda a compreender a importância de usar os ensinamentos o quanto antes.
ITEM 5 - O sofrimento
Depois, se entendemos que as ações não virtuosas, junto com o carma, propiciam sofrimento
para nós, então sabemos que se nós estamos bem agora, pode ser que daqui a pouco não
estejamos mais; pode ser que estejamos imersos em sofrimentos devido às nossas próprias
ações, devido às nossas próprias estruturas cármicas que constroem essas conexões. Nós
estamos bem, porém, o recado é esse: aproveitem essa condição imediatamente!
Nós tomamos o Buda como nosso referencial, nós tomamos os ensinamentos do Buda e dos
mestres das linhagens, os ensinamentos mais elevados, o Darma, e tomamos a energia do
nosso encontro, a energia da sanga como a própria essência daquilo. Gostaria de comentar
brevemente, apesar de nosso tema não ser os Três Refúgios. Tomamos o refúgio no Buda como
a própria imagem do Buda, como o Buda histórico, mas também podemos tomar refúgio no
Buda como a natureza ilimitada, como o Buda Primordial, por exemplo. Nós também podemos
tomar refúgio na natureza de Buda como aquilo que nos anima, como a natureza primordial
inseparável de nós. Nós tomamos refúgio no Darma como os ensinamentos do Buda, mas nós
também podemos tomar refúgio no Darma como os ensinamentos dos mestres todos, e o
refúgio no Darma como a compreensão que brota internamente da própria natureza ilimitada
que é inseparável de nós. Nós tomamos refúgios na sanga como o grupo de praticantes
ordenados, e também podemos tomar o refúgio no grupo de seres que nos ajuda e sustenta
nossa prática e nos apóia dentro disso; podemos tomar refúgio na sanga como esse conjunto
tão amplo junto com a própria natureza, junto com a própria biosfera que sustenta nossa vida e
sustenta a vida de todos. Mas, especialmente, gostaria que vocês avaliassem a sanga como a
energia que nos une, que nos faz sorrir e nos leva a praticar e aprofundar na nossa prática.
Vocês podem olhar a sanga não composta propriamente de pessoas, mas na seguinte
perspectiva: a sanga como essa energia que nos anima quando nós nos juntamos. Eu tenho
uma imagem que gosto muito: pegamos muito galhos secos e tortos; para fazermos um fogo
nós juntamos esses galhos, e a chama cresce. Essa chama é o próprio Buda, essa chama é a
própria sanga, essa chama é o próprio Darma. No entanto, os galhos são cada um de nós. Torto
ou reto, mais lustroso, mais jovenzinho ou mais velho, aquilo essencialmente é um galho que
tem sua própria perspectiva. Ainda que não haja um galho igual ao outro, pelo o que eu vejo,
todos terminam queimados nas suas diferenças. Então, essa chama termina por remover as
nossas particularidades cármicas e nós vamos na verdade nos transformando nessa chama,
nessa energia. Por outro lado, se nós afastarmos esses galhos, a chama cessa. Pegamos as
brasas, botamos todos juntos de novo, aqueles galhos com brasa um pouco fraca, e aparece a
chama de novo. Então, na sanga nós nos juntamos com os nossos galhos tortos, mais bonitos
ou mais feios, vamos nos juntando(na verdade, todos bonitos né?). e aí surge a chama. Quando
a chama surge, todos nos aquecemos, aquilo que é cármico em nós vai se reduzindo a cinzas e
aquilo que é limitado em nós vai se transformando nessa chama, a energia surge e tudo anda.
Então a sanga é a expressão do próprio Buda. Quando nós entramos numa sala há essa
energia, essa energia é o Buda, vivo! Nós tomamos refúgio nisso: no Buda, no Darma e na
sanga. Tomamos refúgio também no lama. Mas aqui é muito importante vocês observarem que
o refúgio no lama deveria passar por um controle de qualidade que lembra uma observação do
próprio Buda: aquele que me olhar no fenômeno da minha aparência física e fizer prostrações
como diante de um Buda, esse é um herege, porque o Buda não pode ser reconhecido no
fenômeno de sua aparência física. Esse é um ponto de grande importância. Ele nos permite
entender por exemplo a noção de Tatagata. O Buda ele é o Tatagata, ele é um bodisatva de
nono nível, ele já é o Buda: o Tatagata. Mas o Tatagata, na perspectiva dos dez níveis de
bodisatva, ele é o nono, não o décimo. O Tatagata está em algum lugar físico; quando ele está
aqui ele não está em outro; está naquele lugar. Então ele vem àquele lugar e vai. O Tatagata é
aquele que vem e vai, ele se manifesta localmente. O Buda morreu, deixou de se manifestar,
esse é o Tatagata. Daí o Buda diz: aquele que me vê, aquele que vê o meu corpo, não vê o
verdadeiro Buda, o verdadeiro Buda é o Darmamega, o décimo estágio. Ele se manifesta
através das qualidades que não são temporais, nem espaciais. Hoje, por exemplo, podemos
acessar diretamente as qualidades do Buda (darmamega do mesmo modo que o Buda
Tatagata, o Buda Sakyamuni acessava essas qualidades. A função dos lamas é semelhante. Os
lamas se manifestam em corpo físico, todos mais parecidos ou mais diferentes uns dos outros;
eles vão manifestar essa natureza ilimitada, essa é a função deles. Nós tomamos refúgio nessa
natureza ilimitada através dos lamas e não na figura deles.
ITENS 7 a 13:
Paisagem - Prece de Sete Linhas - usamos a imagem de Guru Rinpoche sentado no lótus, no
Lago Danakosha de Ordjen. Lembramos do surgimento extraordinário de Guru Rinpoche e
pedimos as bênçãos de também nascer sobre o lótus, é a culminância da motivação.
Contemplar em energia, e não apenas no aspecto mental.
ITEM 7 - O Lodo
Reconhecemos as emoções perturbadoras, as ações não virtuosas, as condições não
auspiciosas presentes na situação? Vemos o lodo? Fazemos contato, de algum modo aquilo
parece que gruda mesmo em nosso pé!
ITEM 8 - A Água
Reconhecemos o sofrimento na forma de tristeza, desânimo, violência, revolta, etc? As
lágrimas estão presentes? Vemos a água?
ITEM 11 - O Nascimento
A etapa seguinte seria o nosso nascimento sobre o Lótus. Existe essa visão de mundo que nos
permite intervir positivamente? Nós nos vemos surgindo no lótus, com recursos para ação
positiva? Há essa segurança, essa possibilidade de uma inserção no mundo? Assumimos que
vamos viver a partir da flor, dos meios hábeis ou retornamos para os 6 reinos? Se nos damos o
nascimento na flor, a motivação está completa.
ITEM 12 - Radiância
Energia auto-surgida; com essa motivação, vamos praticar, vamos sustentar esse nascimento
na flor de lótus e gerar benefícios. Surge uma alegria, uma energia que nem sabemos de onde
brota. Nos 6 reinos tb surgem energias que parecem dar sentido à vida, propósitos, etc. Mas
essas energias, não importa a força que tenham, são frágeis, cíclicas e oscilam. Quando os
mestres estão sustentados por essa radiância, sentem a inseparatividade dos Budas.
ITEM 13 - O Céu
Ainda que tudo seja extraordinário, tudo está dentro do espaço básico. Os Budas e Bodistavas
não têm realidade em si. Eles surgem, são manifestações mágicas, livres, lúcidas, dentro das
bolhas.
ANEXO II
Dentro do caminho, onde estamos agora, vamos aos poucos abandonando o aspecto
cognitivo e as identidades correspondentes, e a noção de espaço e tempo passa e não ter mais
tanta importância; não porque estamos nos opondo a algo, mas porque aos poucos estes
referenciais vão se evaporando e perdendo o sentido. Na verdade nem percebemos que
estamos abandonando algo, simplesmente começamos a fazer algo novo.
A observação do mundo circundante a partir dos lungs já é uma operação impessoal e
atemporal, está para além de vida e morte, transita pelos seis bardos e seis reinos sem
nenhuma preocupação.
O lung não diz respeito à observação de objetos, é um movimento de energia.
O lung não comporta divisão, a segmentação que fazemos é meramente didática, para
que possamos olhar com mais detalhes. É como se olhássemos para um diamante e
focássemos cada uma de suas faces para poder olhar com mais detalhe.
O lung é algo que não deveríamos dividi-lo em cinco partes – os cinco elementos. Nós
fazemos esta divisão para poder “olhá-lo” durante a prática. É como se tivéssemos um
diamante e olhássemos para um lado dele e localizássemos o lado do elemento éter, depois
olhássemos para o outro lado e localizássemos o lado do elemento ar, depois o elemento fogo,
o elemento água e o elemento terra. Mas nós não temos nenhuma dúvida de que se trata de
uma única pedra.
Assim, na nossa prática é muito importante nós não criarmos a ideia de que há esta
divisão e pensarmos que isolamos o elemento éter, ar, fogo, água e terra. Esses são aspectos
do lung que nós olhamos para conseguir “ver” com mais detalhe o foco da nossa prática.
Ao adentrarmos no aspecto dos lungs devemos primeiramente nos lembrar dos mestres
do passado, nos lembrarmos da linhagem.
Assim, lembramos do aspecto milagroso onde, através de um longo tempo, de geração
a geração, os mestres encontram um jeito de manter estes ensinamentos vivos.
ÉTER: Sentamos e mantemos a luminosidade do olhar. Quando cansamos, o brilho no olho
enfraquece. A mente possui a capacidade de fazer surgir o brilho no olho por si só, sem a
necessidade de algo externo. Começamos pelo reconhecimento do elemento éter: o brilho nos
olhos, a clareza da mente, um brilho que se funde com a espacialidade da mente. Na visão da
Mandala Primordial, o elemento éter corresponde à vastidão da mente, à experiência de
espacialidade.
No samsara, nos engajamos nos pensamentos e nas bolhas de realidade a partir do
elemento éter. Surge um pensamento e, sutilmente, dizemos “oh!” e entramos na corrente de
pensamentos. Os pensamentos produzem um brilho de um certo tipo em nós, e assim
entramos na cadeia de pensamentos discursivos. É através do brilho do elemento éter que
nascemos com um corpo sutil de uma identidade dentro de uma bolha particular. Se
estivermos com excesso de elemento éter, podemos ficar demasiadamente agitados e
empolgados. Na sua falta, nos tornamos apáticos e sem vida.
AR: Esse brilho da mente produz o elemento ar e nós respiramos. O elemento ar traz
movimento, uma fluidez que surge por dentro do brilho da mente. Na experiência da Mandala
Primordial, o elemento ar corresponde à expansão infinita do espaço básico, como respirar ao
contemplar a amplidão da realidade do alto de uma montanha.
Podemos também levar o elemento ar, através da respiração, para cada parte do nosso
corpo. Se estivermos com excesso de elemento ar, somos simplesmente arrastados de um lado
para o outro, literalmente ao sabor dos ventos cármicos. Na sua falta, nos tornamos fechados e
monótonos.
FOGO: Da união desse brilho sutil do elemento éter com a respiração, o movimento do
elemento ar, surge um calor interno e o nosso corpo se aquece: é o elemento fogo. O fogo
produz uma sensação de vida, nos permite ver as coisas, criar, dar significados, dar cor às
experiências. Sentimos um calor sutil preenchendo nosso corpo.
Podemos levar calor e aquecer cada parte do nosso corpo, sentindo o elemento fogo o
preenchendo. Quando nos engajamos nos pensamentos e nas bolhas que surgem na mente,
perdemos a estabilidade destes elementos e, consequentemente, a capacidade de 25plica25ce-
los. Se estivermos com excesso de elemento fogo, nos tornamos impulsivos, impacientes e
irritados. Na sua falta, nos tornamos apáticos e sem energia e criatividade.
ÁGUA: Do elemento fogo vem a fluidez do elemento água, uma ausência de rigidez. Sentimos
nosso corpo leve, fluido, sem tensão, pronto para agir. A natureza primordial é fluida, não-
obstruída. Podemos visualizar todo nosso corpo sendo inundado pela flexibilidade do elemento
água. Se estivermos com excesso de elemento água, afundamos nas emoções e pensamentos,
nos tornamos excessivamente emotivos. Na sua falta, nos tornamos insensíveis e secos, sem a
capacidade de flexibilizar.
TERRA: Na sequência surge a estabilidade do elemento terra, uma serenidade, uma confiança
e não oscilação do nosso movimento. Se estivermos com excesso de elemento terra, nos
tornamos rígidos, tensos. Na sua falta, oscilamos junto com as experiências, sem estabilidade
nenhuma. No samsara, todos nós aspiramos estabilizar tudo, ter experiências sólidas como
uma casa, um carro, um relacionamento, um emprego. Mas tudo se mostra impermanente. Mas
enquanto não reconhecermos a estabilidade da Natureza Primordial, não vamos conseguir
estabilizar nada. A Natureza Primordial é a estabilidade que podemos obter. É na verdade, a
única estabilidade possível.
Quanto tempo leva para chegar-se à pura quiescência? Este tipo de experiência vem como
resultado de um tremendo esforço na prática. Não é um resultado que venha facilmente ou
rapidamente.
Outros benefícios desta realização incluem relaxamento físico e mental; e, uma vez que
não há distração, a prática pode ser sustentada indefinidamente. Agora, quando você pratica,
tanto o corpo como a mente se cansam; e, à medida que você fica desconfortável, você liga
algo mais para mudar a experiência de desconforto. Ao chegar ao nível de pura quiescência, o
corpo e a mente estão sempre em estado de conforto. Entretanto, se a mente se apega à
experiência de sentir bem estar físico e mental, então, tal mente de apego começará a
produzir as causas de renascimento no reino do desejo, trazendo-o de volta novamente à
existência cíclica. É necessário que nunca haja apego à qualquer experiência.
Os oito estados cognitivos são: as consciências associadas aos olhos, ouvidos, nariz, língua, corpo, mente,
consciência aflita e consciência básica ou mente básica de tudo.
2
[ingl. ”awareness”]
Geralmente você deveria manter na mente que, quando sua prática de meditação começar
a aprofundar-se, há três experiências que ocorrerão. A primeira é bem estar 3, a segunda é
clareza, e a terceira é a experiência de ausência de pensamentos. Quando tiver estas
experiências, se você ligar-se a elas pensando que, de algum modo atingiu o resultado
derradeiro, então estará novamente produzindo causas para renascimento em samsara. Não
confunda estas experiências com o resultado final de iluminação. Se apegar-se ao bem estar,
estará estabelecendo as causas para o renascimento no reino do desejo. Se apegar-se à
luminosidade ou claridade, isto estabelece as causas para o renascimento no reino da forma.
Apego à ausência de pensamentos estabelece as causas para o renascimento no reino dos
deuses sem forma. Estes são os três reinos (desejo, forma e não-forma) da existência cíclica
dentro do qual as seis classes de seres se debatem. Através da meditação você pode de fato
produzir as causas para o renascimento nestes três âmbitos de existência caso não seja
cuidadoso.
Esta é uma explicação concisa de como praticar para atingir a quiescência que inclui
instruções sobre o que evitar enquanto praticando. Se for capaz de praticar com sucesso, irá
atingir a quiescência por períodos prolongados de tempo e meditar com claridade, preparando-
se então para a segunda fase, a prática principal de cultivar a sabedoria primordial da intuição.
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[ingl. “bliss”]
ANEXO IV
Trazemos à mente uma pessoa próxima ou não, com a qual a relação seja boa ou não, que
esteja em dificuldades ou não. Montamos nossa “lista” de pessoas e então visualizamos, uma a
uma, e seguimos as oito recomendações abaixo:
Foque uma pessoa (...), que pode ser você mesmo, então repita (mentalmente ou verbalmente,
conforme as circunstâncias do entorno e sua disposição):
Meditar nestas oito frases tem o poder de reconstruir as relações, pelo simples fato de que as
coisas não são tão sólidas quanto parecem, e muito menos as relações. Podemos começar
conosco mesmos, depois com as pessoas mais fáceis, depois as mais difíceis.
DESPEDIDA
Boa prática!
Que muitos possam ser beneficiados!!
REFERÊNCIAS / LEITURAS SUGERIDAS