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V I S ÃO G E R A L DO C O N T E ÚD O
Impermanência e Morte
Os Cinco Agregados
Samsara e Nirvana
Impermanência e Morte
Paráfrase do "Conselho de um
Homem Velho e Experiente"
Geshe Ngawang Dhargyey
A isto, o velho responde: "Se dizes que ajo, ando, falo e me movimento de
uma maneira diferente, não te sintas voando pelo céu. Põe os pés no chão
como eu e escuta as minhas palavras."
[Alguns jovens sentem que a velhice é apenas para os idosos e que nunca
lhes chegará. São muito arrogantes e não têm paciência para se
envolverem com os velhos.]
O velho continua: "Há uns anos atrás eu era muito mais forte, mais bonito
e mais vigoroso do que tu. Não nasci como sou agora.
[A maior parte dos idosos falam deste modo. O presente nunca é tão bom
como outrora.]
[Uma vez, na região onde vivi, havia um jovem que levava uma vida
luxuosa, abandonando-se continuamente aos prazeres. A pouco e pouco
tornou-se velho, seu corpo encurvou e seu provento diminuiu. Ele disse
aos seus amigos: "Nunca pensei que a velhice chegasse tão de repente"]
"Quando ficamos muito velhos, não gostamos de nós quando nos vemos
ao espelho. Nessa altura os nossos corpos e mentes tornam-se fracos. Os
nossos corpos começam a degenerar, da cabeça aos dedos dos pés. As
nossas cabeças ficam curvadas, como se estivessem sempre recebendo
uma iniciação do vaso."
"Os meus cabelos brancos, sem nenhum preto que lhes reste, não são
sinal de purificação. São a seta da geada da boca do Senhor da Morte que
aterrou na minha cabeça. As rugas da minha testa não são os vincos de
um bebê gorducho bebendo o leite de sua mãe. É a contagem dos anos
que já vivi pelos mensageiros do Senhor da Morte. Quando entorto os
olhos, não é que o fumo esteja nos meus olhos. É um sinal de impotência à
degeneração dos meus poderes sensoriais. Quando tento fazer um grande
esforço para ouvir pondo a mão na minha orelha, não é que esteja
fazendo uma comunicação secreta. É um sinal de degeneração da minha
audição."
"Quando me é difícil respirar e fico sem fôlego, não é que esteja curando
alguém soprando um mantra. É sinal da fraqueza e da exaustão das
energias do meu corpo. Quando faço muito pouco e tenho poucas
atividades, não é que esteja controlando intencionalmente as minhas
atividades. É devido às limitações do que um velho pode fazer. Quando
sou muito esquecido, não é que julgue os outros com menor importância
nem que os olhe com superioridade. É sinal da degeneração da
consciência da minha memória."
"Ó jovem, não gozes nem zombes de mim. O que eu agora experiencio não
é meu exclusivo. Todos experienciam isto. Espera para ver; em três anos,
chegarão os primeiros mensageiros da velhice. Não acreditarás no que
digo nem gostarás de o ouvir, mas aprenderás da experiência. Nesta
época das cinco degenerações, serás afortunado se chegares à minha
idade. Mesmo que vivas durante tanto tempo quanto eu, não serás capaz
de falar tanto quanto eu".
"Porém, eu não me sinto assim. Não estou certo de ter feito algo de
construtivo. Tenho medo da morte e estou grato por cada dia que posso
permanecer vivo. O meu grande desejo é o de continuar vivo todos os
dias."
O jovem muda de ideias e diz: "Ó velho, tudo o que dizes é verdade. O que
os outros me disseram sobre o sofrimento da velhice está de acordo com
o que vejo em ti. A demonstração da velhice que me fizeste foi muito útil à
minha mente. Estou espantado com o sofrimento da velhice. ."
“Uma longa vida não pode ser comprada com dinheiro nem obtida
através do conforto físico. Se tiveres confiança espiritual e souberes o que
queres da vida, então quanto fisicamente mais velho ficares, mais
felicidade e juventude mental terás. Se gozares muito conforto físico mas
tiveres levado uma vida vazia, então quanto mais velho ficares mais
infeliz te tornarás. Terás de viajar como turista para distraires a tua
mente da preocupação com a morte. Por outro lado, mesmo se tiveres
apenas um pouco de confiança espiritual, quanto mais perto estiveres da
morte, mais te sentirás como um filho que regressa feliz a casa. Não
sentirás aversão à morte, mas olharás em frente para as contínuas vidas
de felicidade."
[Uma vez, um grande mestre espiritual disse: "Como tenho confiança total
nos meus nascimentos futuros, não tenho preocupações nenhumas. A
morte pode vir a qualquer altura; será bem-vinda.”]
O jovem diz: "Tudo o que dizes é verdade e muito útil. Mas durante os
próximos anos não posso fazer essas coisas. Tenho outros trabalhos a
fazer. Tenho uma grande propriedade, tenho bens e assim por diante.
Tenho muitos negócios a fazer e preciso de cuidar da minha propriedade.
Daqui a alguns anos encontro-me outra vez contigo, e então farei as
práticas."
O velho fica muito infeliz e diz: "Tudo o que me acabas de dizer não
passam de palavras vazias e sem sentido. Tive o mesmo desejo de fazer
algo de significativo para depois de alguns anos, mas nunca fiz nada e
agora estou velho. Eu sei como é ilusório o que dizes. As coisas a fazer
daqui a alguns anos nunca acabarão. Irás adiá-las para sempre. As coisas
a fazer daqui a alguns anos são como a barba de um velho; se a fizer hoje,
mais crescerá amanhã. Depois de adiares até amanhã e depois, depressa
verás que a tua vida acabou. Este adiamento da prática do Dharma tem
enganado a todos. Não tenho confiança nenhuma de que um dia irás
praticar o Dharma. Por isso, falarmos é um total desperdício. Regressa à
tua casa, faz o que quiseres e deixa-me dizer uns manis (mantras)."
O velho ri: "Fazes-me essas perguntas, por isso acho que devo responder
o quanto tempo demora a realizar qualquer coisa. Em direção ao sul vive
o Senhor da Morte, que não se importa nada se acabaste ou não o teu
trabalho. Ele faz o que quer. Se puderes ter relações amigáveis com ele e
obter a sua permissão para realizares algo na vida, então podes relaxar.
Caso contrário, nunca o poderás fazer. As pessoas morrem a meio de uma
xícara de chá, enquanto a comida está na mesa, ao passearem, antes de
conseguirem acabar de fumar um cigarro."
"Isso acontece a todos, até aos grandes mestres. Muitos dos seus
ensinamentos estão incompletos porque morreram antes de os acabarem
de escrever. Por isso, quando o Senhor da Morte vier, não poderás dizer:
'Eu tenho uma grande propriedade e muito trabalho por fazer'. Não te
poderás gabar de nada; terás de deixar tudo. A este respeito somos
completamente impotentes. Não podemos determinar a duração da nossa
vida. Portanto, se puderes fazer qualquer coisa, começa a praticar agora.
Isso será significativo; senão, as tuas propriedades, em si, não têm
sentido. Mas hoje há poucas pessoas falando verdade sobre o que é útil. O
que ainda é mais raro é alguém que escute os conselhos sinceros."
O velho concorda e aceita. Diz ele: "Eu não sei muito, mas experienciei
bastante. Com isso posso ensinar-te. A coisa mais difícil é começar e
estabelecermo-nos no Dharma. Começar a praticar depois de velho é mais
difícil. Por isso, é importante começarmos com uma idade jovem."
“No Dharma não há regras rígidas. Por isso tenta não teres demasiados
pensamentos nem uma mente errática. Começa agora e mantém o teu
interesse no Dharma. Não mudes de ideias a cada momento. A partir
deste momento, dedica a tua vida – o teu corpo, palavra e mente – à
prática do Dharma."
[Atisha deu ênfase a esta questão. Contava com frequência que tinha uma
igual dedicação e devoção a todos os seus 155 gurus.]
O velho diz: "Eu ouvi estes ensinamentos dos meus mentores espirituais e
eles também são baseados na minha própria experiência. Que isto possa
beneficiar os ilimitados seres sencientes na obtenção da sua felicidade."
1. visões
2. sons
3. odores
4. sabores
5. sensações físicas.
1. consciência do olho
2. consciência do ouvido
3. consciência do nariz
4. consciência da língua
5. consciência do corpo
6. consciência mental.
Milarepa tinha uma irmã que insistia que ele encontrasse uma esposa e
tivesse casa e filhos, mas ao invés disso Milarepa deixou sua casa e
encontrou seu professor, Marpa. Quando sua irmã descobriu que Marpa
era casado e tinha casa e família, ela voltou a insistir com Milarepa.
“Por que você não faz como o seu professor?” ela perguntou.
“Quando um jovem e uma jovem se conhecem, eles são tão belos que
parecem deuses um para o outro e têm um desejo insaciável de olhar um
para o rosto do outro. Mas, quando eles já se conhecem há um tempo,
começam a olhar feio um para o outro. Em breve, se um disser duas
palavras, o outro dirá três. Logo eles começam a brigar. Se um toca o
cabelo do outro, o outro agarra o seu pescoço. Então um ameaça bater no
outro com uma vara e o outro pega uma colher de madeira para bater de
volta.
“Algum tempo depois, eu dei uma iniciação para a qual Rechungpa veio.
Eu mostrei um cordão de turquesas e disse, “se você quiser receber a
iniciação, terá que me dar isso”, sabendo muito bem que Rechungpa já
tinha dado sua turquesa! Como vocês veem, casais brigam. Quando
envelhecem e perdem os dentes, eles se parecem com bois e vacas.
Eventualmente se parecem com demônios e fantasmas! Por isso, não,
obrigado, eu não aceitarei sua oferta de me adotar.”
O homem persistiu, insistindo que ele tinha que ter um filho para cuidar
dele e de sua esposa, para lhes dar segurança. “Se você for nosso filho, nós
arranjaremos um casamento e você poderá ter filhos que cuidarão de
você.” Mas Milarepa recusou.
“É tão bom ter filhos. Quando você tem filhos, no começo eles são tão
belos – como os filhos dos deuses! E eles trazem tanta felicidade! Mas aos
poucos, quando crescem, eles exigem tudo de você. Agem como se
tivessem lhe emprestado dinheiro, constantemente importunando e
lembrando-o de pagá-los. Um dia os filhos trarão estranhos para casa,
amigos e namoradas para que os pais alimentem. Então eles tomam conta
da casa e aos poucos expulsam os pais de sua própria casa.
“Se você lhes perguntar algo amavelmente, eles gritam com você. Eles o
menosprezam quando você está velho e ficam com vergonha de você –
mesmo de sua própria mãe. Portanto, eles ficam totalmente diferentes do
que eram – doces principezinhos. Nunca te dão paz de espírito, nunca
retribuem sua bondade. Sempre farão o oposto do que você quer que
façam – cabelo bagunçado, roupas estranhas, sapatos esquisitos.”
“Se um filho dá tanto trabalho assim, nós preferimos uma filha”, sugeriu a
esposa sem querer desistir.
“Eles são iguais! Quando você os conhece, são todos sorrisos, tão
agradáveis, fazem você se sentir tão feliz. Então começam a contar
histórias e novidades, te convidam para ir aqui e ali e você nunca tem um
momento para si mesmo. Então você tem que voltar para casa para visitar
todos os parentes deles – eles contam todas as novidades e você nunca
tem paz. Depois disso, vocês trocam presentes e comida, preparam
refeições um para os outros. Logo começam a competir entre si. Cada um
precisa saber o que o outro está fazendo, eles ficam com ciúmes e as
rivalidades aparecem.
Os Quatro Maras
O Mara da Morte
A morte, logicamente, é o que mais interfere em nossa prática espiritual.
Não há como ter certeza de que nossa próxima vida será uma vida
humana preciosa, com todas as folgas e oportunidades que nos permitem
praticar sem obstáculos. Mesmo que tenhamos tal renascimento,
precisamos começar novamente o caminho espiritual como criança. Além
disso, a morte é um evento incontrolavelmente recorrente ao final de
cada vida.
Yama oculto ou secreto - são as três mentes conceituais mais sutis que
criam as aparências de uma existência verdadeira: limiar (nyer-thob,
quase-atingimento, aparência preta), difusão (mched, aumento,
aparência vermelha), e aparecimento (snang, aparência, aparência
branca). Cada renascimento começa com essas três mentes conceituais
sutis criando aparências que parecem existir verdadeiramente. Tendo
por base a falta de consciência, acreditamos que essas aparências
correspondem à realidade, e assim nos agarramos à existência
verdadeira e temos todas as emoções e atitudes perturbadoras que
derivam da falta de consciência e do agarramento.
Elogio ou crítica
Boas notícias ou más notícias — inclusive ter ou não ter notícias das
pessoas que amamos; ou ouvir sons agradáveis ou desagradáveis
Seguir com nossa prática do dharma sem nos importar com o que os
outros pensam à nosso respeito
Manter sempre nossos compromissos e a consciência profunda
Seguir continuamente com nossa prática sem nos deixar levar por
preocupações inúteis.
Consciência Primária
A escola Chittamatra adiciona mais dois tipos de consciência primária, o que faz de
sua lista um entrelaçamento de oito consciências primárias (rnam-shes tshogs-
brgyad):
Alayavijnana é uma consciência individual, não é universal, e está por trás de todos
os momentos de cognição. Ela tem ciência dos mesmos objetos que aparecem para
as demais consciências, mas é uma cognição que não define o que aparece (snang-
la ma-nges-pa, cognição desatenta) e não percebe com clareza seus objetos. Ela
carrega os legados kármicos e as impressões mentais de memórias, ambos
abstrações não estáticas imputadas no alayavijnana. A continuidade de uma
alayavijnana individual cessa quando se atinge a iluminação.
Assim como a consciência primária, os fatores mentais também são meras formas
de estarmos cientes de algo. Eles tem consciência de seus objetos de uma forma
especial, mas sem inserção (sgro-‘dogs, adicionando algo que não está lá) ou
repúdio (skur-‘debs, negando algo que está lá). Alguns executam funções que
ajudam a consciência primária a tomar cognitivamente (‘dzin-pa) seu objeto.
Outros adicionam um sabor emocional à tomada do objeto.
Consciência Principal
Por exemplo, o sistema Teravada apresentado em Um Texto Que Tudo Inclui dos
Pontos de Tópicos de Conhecimento (Pali: Abhidhammattha-sangaha) de Anuruddha
especifica cinquenta e dois fatores mentais. O tratado padrão do Bon sobre esse
tópico, encontrado no texto Núcleo Mais Profundo de Tópicos de
Conhecimento (mDzod-phug) de Shenrab Miwo (gShen-rab mi-bo), desenterrado
como um texto-tesouro (gter-ma, terma) por Shenchen Luga (gShen-chen Klu-dga’),
lista cinquenta e um fatores.
Asanga listou:
Essas listas de fatores mentais não são completas e definitivas. Existem muitos
outros fatores além dos cinquenta e um. Muitas das boas qualidades (yon-tan)
cultivadas no caminho budista não estão listadas separadamente – por exemplo,
generosidade (sbyin-pa), disciplina ética (tshul-khrims), paciência (bzod-pa), amor
(byams-pa) e compaixão (snying-rje). De acordo com a apresentação Gelug, os cinco
tipos de consciência profunda (ye-shes) – do espelho, equalizadora,
individualizadora, realizadora e esfera da realidade (Skt. dharmadhatu) – também
são fatores mentais. As várias listas são compostas apenas de determinadas
categorias significativas de fatores mentais.
Os Cinco Fatores Mentais Que Estão Sempre em Funcionamento
Por exemplo, com a cognição visual não conceitual, conseguimos distinguir formas
coloridas no campo sensorial visual como sendo uma forma amarela, por exemplo.
Segundo a tradição Gelug, a cognição visual também nos permite distinguir objetos
comuns, como uma colher. Nesses casos, a distinção não atribui o
nome amarelo ou colher, nem mesmo sabe que a cor é amarela ou que o objeto é
uma colher, apenas distingue o objeto como um item convencional. Assim, até um
recém-nascido consegue distinguir luz de escuridão e calor de frio. Isso é
conhecido como a distinção que toma a particularidade característica de um item
(don-la mtshan-mar ‘dzin-pa’i ‘du-shes).
Assim, ao atribuir um nome a seu objeto, como “amarelo” ou “colher”, esse fator
mental distingue essa categoria de tudo o que não é essa categoria; a categoria
“amarelo” não é a categoria “preto”, por exemplo, e a categoria “colher” não é a
categoria “garfo”. Isso é conhecido como a distinção que toma a particularidade
característica que diz respeito a uma convenção (tha-snyad-la mtshan-mar ‘dzin-
pa’i ‘du-shes). A cognição não conceitual não faz esse tipo de distinção.
(3) Um impulso (sems-pa) faz com que a atividade mental olhe para um objeto ou
vá em sua direção. Em geral, ele move o continuum mental para tomar
cognitivamente um objeto. Um continuum mental é uma sequência eterna e
individual de momentos de atividade mental.
(5) Prestar atenção ou trazer à mente (yid-la byed-pa) engaja (‘jug-pa) a atividade
mental com o objeto. O engajamento cognitivo pode ser simplesmente prestar uma
certa atenção ao objeto, desde muito pouca atenção a muita atenção. Pode ser
também focar no objeto de uma certa forma. Por exemplo, a atenção pode focar o
objeto de forma minuciosa, de forma a retomá-lo, de forma ininterrupta, ou mesmo
sem esforço.
Na verdade, não experimentamos um objeto a não ser que sintamos algum sentimento
do espectro que vai de feliz, passando por neutro, a infeliz
Não tomamos algo no campo sensorial como um objeto de cognição a menos que
consigamos distinguir alguma particularidade nele.
Nós sequer olhamos ou nos direcionamos a um objeto de cognição a não ser que
tenhamos um impulso para tal.
Não temos nenhuma base para sentir alguma coisa em relação ao objeto a menos que
tenhamos consciência dele através do contato, para que possamos distinguir se é
agradável, desagradável ou neutro.
Não nos engajamos verdadeiramente com o objeto específico a menos que prestemos
algum nível de atenção a ele, mesmo que seja extremamente baixo.
Vasubandhu definiu esses cinco fatores de forma genérica e afirmou que também
acompanham todos os momentos de cognição. Já Asanga os chamou de fatores
mentais determinantes e os definiu de forma mais específica. Para Asanga, eles
acompanham apenas as cognições construtivas que apreendem (rtogs-pa,
entender) seus objetos e, portanto, são subcategorias do que Vasubandhu definiu.
Eles permitem que a atividade mental determine (nges-pa) seu objeto, ou seja, que
o identifique com certeza.
(1) Intenção Positiva (‘dun-pa) não é a mera motivação para tomar qualquer objeto,
alcançar qualquer objetivo ou para fazer algo com o objeto ou o objetivo, uma vez
que o tenhamos tomado ou alcançado. É a vontade de ter o objeto construtivo
desejado, de fazer algo com ele, ou de atingir o objetivo construtivo desejado. A
intenção pode ser o desejo de encontrar um objeto construtivo previamente
conhecido, de não se separar dele ou um forte interesse (don-gnyer) em um objeto
construtivo que pode ser obtido no futuro. A intenção positiva leva à uma alegre
perseverança (brtson-grus) para conseguir o objeto ou atingir o objetivo desejado.
(2) Uma Convicção firme (mos-pa) foca em um fato que tenhamos validamente
identificado como sendo isso e não aquilo. Sua função é fazer com que nossa crença
na veracidade de um fato seja tão forte que outros argumentos e opiniões não
possam nos dissuadir. Para Vasubandhu, esse fator mental significa consideração.
Ele simplesmente considera que o objeto tem uma certa quantidade de boas
qualidades — no espectro que vai de nenhuma boa qualidade à todas as boas
qualidades — e essa percepção pode estar correta ou distorcida.
(3) Presença mental que se recorda (dran-pa) não é simplesmente manter o foco em
um objeto reconhecido. Aqui, ela evita que a atividade mental esqueça ou perca o
objeto construtivo com o qual está familiarizada. Possui três características:
O objeto deve ser algo construtivo com o qual estejamos familiarizados (‘dris-pa)
O aspecto (rnam-pa) deve ser que foca nesse objeto e não o esquece ou perde
A função deve ser prevenir a mente de vagar.
Assim, a presença mental é equivalente a uma “cola mental” (‘dzin-cha) que segura
o objeto em foco e não o larga. Sua força está no espectro que vai de fraca a forte.
Além disso, é necessário que se tome o objeto com consciência mental. Isto porque
o rotulamento mental é uma função restrita à cognição conceitual, que é
exclusivamente mental. Fixação é a permanência da mente em um objeto e pode
variar em força, desde fraca até forte. Serve como base para a consciência
discriminativa.
(3) Cuidado com o reflexo de nossas ações nos outros (khrel-yod) - é o sentido de
evitarmos comportamentos negativos por nos importarmos com o reflexo de
nossas ações naqueles que estão conectados a nós. Estes podem ser nossa família,
professores, grupo social, grupo étnico, ordem religiosa ou conterrâneos. Para
Vasubandhu, esse fator mental significa ter escrúpulos, e é evitar sermos
descaradamente negativos. Este, juntamente com o fator mental anterior,
acompanha todos os estados mentais construtivos.
A coragem que funciona como uma armadura (go-cha’i brtson-‘grus) para suportar
dificuldades. Vem de nos lembrarmos da alegria com a qual iniciamos nossa
empreitada.
(2) A raiva (khong-khro) mira em outro ser limitado, em nosso próprio sofrimento,
nas situações de sofrimento que surgem de um dos dois ou simplesmente em
situações de sofrimento. A raiva é impaciente (mi-bzod-pa) e deseja se livrar do
sofrimento, danificando (gnod-sems), machucando ou combatendo (kun-nas mnar-
sems). Tem como base considerarmos um objeto repulsivo por sua própria
natureza e funciona de forma a nos trazer sofrimento. Hostilidade (zhe-sdang) é
uma categoria da raiva e é direcionada principalmente, mas não exclusivamente, a
seres sencientes. Assim como acontece com o desejo, apesar da raiva poder
ocorrer na cognição mental e sensorial, ela se baseia em uma inserção conceitual
anterior. A inserção exagera ou adicional qualidades negativas ao objeto. Assim, a
inserção conceitual presta atenção ao objeto de forma discordante — por exemplo,
considerando incorretamente algo que não é responsável como sendo responsável.
(3) Arrogância (nga-rgyal, orgulho) é uma mente inflada (khengs-pa) com base em
uma visão equivocada em relação a um entrelaçamento transitório (‘jig-lta).
Conforme explicado abaixo, essa visão equivocada foca em algum aspecto ou um
entrelaçamento de aspectos do nossos cinco agregados e o identifica como um “eu”
monolítico e inalterável, separado dos agregados e senhor deles. Dentre as várias
formas e níveis de visão equivocada em relação a um entrelaçamento transitório, a
arrogância está baseada especificamente no surgimento automático de um
agarramento a um “eu” (ngar-‘dzin lhan-skyes). Funciona de forma que não
apreciamos os outros ou respeitamos suas boas qualidade (mi-gus-pa) e faz com
que não aprendamos coisas. Existem sete tipos de arrogância:
Arrogância (nga-rgyal) - é uma mente inflada que acha que eu sou melhor do que
alguém inferior a mim em certas qualidades.
Arrogância exagerada (lhag-pa’i nga-rgyal) -é um mente inflada que acha que eu sou
melhor que alguém igual a mim em certas qualidades.
Arrogância ultrajante (nga-rgyal-las-kyang nga-rgyal) - é uma mente inflada que acha
que eu sou melhor do que alguém superior a mim em determinadas qualidades.
Arrogância egoísta (nga’o snyam-pa’i nga-rgyal) - é uma mente inflada que pensa “eu”
ao focar em seus agregados perpetuadores do samsara (nyer-len-gyi phung-po).
Arrogância falsa ou antecipatória (mngon-par nga-rgyal) - é uma mente inflada que
acha que eu tenho alguma qualidade que na verdade não tenho ou ainda não tenho.
Arrogância modesta (cung-zad snyam-pa’i nga-rgyal) é uma mente inflada que acha que
sou apenas um pouquinho inferior a alguém que é extremamente superior a mim em
determinadas qualidades, e que sou superior a quase todo mundo.
Arrogância distorcida (log-pa’i nga-rgyal) é uma mente inflada que acha que um
aspecto perverso que adquiri (khol-sar shor-ba) é uma boa qualidade— como, por
exemplo, ser um bom caçador.
Vasubandhu mencionou que os textos budistas listam nove tipos de arrogância,
que podem ser resumidas em três das categorias acima — arrogância, arrogância
exagerada e arrogância modesta. Os nove tipos de arrogância são uma mente
inflada que acha que:
(5) Dúvida aflitiva (the-tshoms, dúvida) é ter duas opiniões sobre o que é verdade,
ou seja, é a indecisão entre aceitar e rejeitar aquilo que é verdade. O que é verdade
refere-se a fatos como as quatro nobres verdades e causas e efeitos
comportamentais. E ainda, a indecisão pode pender para o lado da verdade, para o
lado do que é falso ou estar igualmente dividida entre os dois lados. A dúvida
aflitiva funciona como base para não nos engajarmos no que é construtivo.
(6) Visões equivocadas (ing. deluded awareness) olham para o objeto de uma certa
maneira. Buscam nele e considerm-no algo a que se aferrar (yul-‘tshol-ba), sem
antes examinar, analisar ou investigar. Em outras palavras, é uma mera atitude em
relação aos objetos. Só ocorre em cognições conceituais e é acompanhada de
inserção ou repúdio. Entretanto, como fator mental elas por si só não inserem ou
repudiam nada.
Existem cinco visões equivocadas. Asanga explicou que cada uma é uma
consciência discriminativa (shes-rab nyon-mongs-can) equivocada e perturbadora.
Entretanto, não são subcategorias da consciência discriminativa que é um fator
mental determinante. Isto porque não preenchem o critério de Asanga para essa
consciência determinante, que é compreender corretamente seu objeto.
Além disso, Asanga explicou que cada uma das cinco visões equivocadas implica
em:
Tolerância com a visão equivocada, uma vez que consegue discriminar que ela traz
sofrimento.
Considerá-la inteligente.
(2) Uma visão extrema (mthar-‘dzin-par lta-ba, mthar-lta) considera nossos cinco
agregados perpetuadores do samsara de forma eternalista (rtag-pa) ou niilista
(‘chad-pa). Em sua Grande Apresentação dos Estágios do CaminhoGradual (Lam-rim
chen-mo), Tsongkhapa explicou que uma visão extrema é uma consciência
discriminativa equivocada e perturbadora que foca no “eu” convencional que a
atitude perturbadora anterior identificou com um entrelaçamento transitório. Ela
considera que o “eu” convencional tem uma identidade permanentemente ou que
não tem continuidade em vidas futuras. De acordo com Vasubandhu, uma visão
extrema enxerga os agregados produtores do samsara como durando eternamente
ou se extinguindo com a morte, sem continuidade em vidas futuras.
(3) Considerar uma visão equivocada como suprema (lta-ba mchog-tu ‘dzin-pa, uma
visão de falsa supremacia) considera suprema uma de nossas visões equivocadas e
os agregados através dos quais ela é produzida. Tsongkhapa especificou que a
visão que essa consciência discriminativa equivocada e perturbadora considera
pode ser nossa visão equivocada de um entrelaçamento transitório, nossa visão
extrema ou nossa visão distorcida. Segundo Vasubandhu, essa atitude
perturbadora pode considerar os agregados perpetuadores do samsara, que são a
base para as três visões equivocadas, com a atenção discordante de que são
totalmente limpos por natureza ou a fonte de felicidade verdadeira.
(4) Uma visão que toma uma moral ou conduta equivocada como suprema (tshul-
khrims-dang brtul-zhugs mchog-tu ‘dzin-pa) considera como pura, liberada e
definitivamente liberada alguma moral ou conduta equivocada, e também os
agregados perpetuadores do samsara que geram essa moral e conduta. Essa visão
equivocada vem de termos uma visão equivocada de um entrelaçamento
transitório, uma visão extrema ou uma visão distorcida. Ela considera a moral ou
conduta equivocada como o caminho que nos purifica (‘dag-pa) de forças kármicas
negativas (sdig-pa, potenciais negativos), nos libera (grol-ba) das emoções
perturbadoras e nos tira definitivamente (nges-par ‘byin-pa) do samsara (ciclo
incontrolável de renascimentos). Também considera os agregados produtores do
samsara, quando disciplinados por tais visões e condutas como tendo sido
purificados, liberados, e definitivamente liberados.
(5) Uma visão distorcida (log-lta, visão falsa) considera uma verdadeira causa, um
verdadeiro efeito, um verdadeiro funcionamento ou um fenômeno existente, como
não sendo verdadeiros ou existentes. Assim, é acompanhado de repúdio, por
exemplo, ao fato dos comportamentos construtivos e destrutivos serem as
verdadeiras causas da experiência de felicidade ou infelicidade. O repúdio pode ser
ao fato da felicidade e infelicidade serem o resultado do amadurecimento de forças
kármicas positivas e negativas. Pode ser também ao fato de que vidas passadas e
futuras realmente funcionam; ou ao fato de que podemos atingir a liberação e a
iluminação. Segundo Tsongkhapa e a escola Gelug-Prasangika, uma visão
distorcida pode também considerar uma causa, efeito ou funcionamento falso ou
um fenômeno não existente como verdadeiro e existente. Assim, também pode vir
acompanhada de um inserção, por exemplo, de que a matéria primal ou o deus
hindu Ishvara é a causa ou o criador dos seres limitados.
(1) Ódio (khro-ba) faz parte da hostilidade, e é a intenção veemente de causar mal.
(5) Inveja (phrag-dog) faz parte da hostilidade e é uma emoção perturbadora que
nos torna incapaz de suportar as boas qualidades e boa sorte alheias, devido a um
apego excessivo ao nosso próprio ganho e ao respeito que recebemos. Além disso,
a inveja deseja possuir as qualidades ou boa sorte dos outros e frequentemente
deseja que os outros não as possuam.
(10) Crueldade (rnam-par ‘tshe-ba) faz parte da hostilidade e possui três formas:
(12) Não importar-se com o resultado de nossas ações sobre os outros (khrel-med) é
parte de qualquer das emoções venenosas. É a ausência de qualquer disposição em
evitarmos comportamentos destrutivos por nos importarmos com o reflexo de
nossas ações nos outros. Esses “outros” podem ser nossa família, professores,
grupo social, grupo étnico, ordem religiosa ou nossos conterrâneos. Para
Vasubandhu, esse fator mental quer dizer não ter escrúpulos, e é não evitar ser
descaradamente negativo. Este, e também o fator mental anterior, acompanham
todos os estados mentais destrutivos.
(14) Distração mental (rgod-pa) é parte do desejo. É o fator mental que faz com
que nossa atenção fuja do objeto e lembre-se ou pense em algo atraente que já
experimentamos. Assim, faz com que percamos a paz mental.
(16) Preguiça (le-lo), faz parte da ingenuidade. Com a preguiça a mente não busca e
nem se engaja em coisas construtivas, porque se agarra ao prazer de dormir,
deitar, relaxar e assim por diante. Existem três tipos:
(18) Esquecimento (brjed-nges). Tem como base a lembrança de algo que nos
desperta uma emoção ou atitude perturbadora. O esquecimento é perder nosso
objeto de foco de forma que a mente vagueie em direção ao objeto perturbador. O
esquecimento serve como base para a distração mental (rnam-par g.yeng-ba).
Asanga listou quatro tipos de fatores mentais que que têm um status ético mutável.
Eles podem ser construtivos, destrutivos ou não especificados, dependendo do
status ético da cognição com a qual compartilham as cinco particularidades
concomitantes.
(1) Sono (gnyid) é parte da ingenuidade. O sono é um retirar-se da cognição
sensorial, caracterizada por uma sensação física de peso, fraqueza, cansaço e
escuridão mental. Nos faz deixar nossas atividades.
Budas e Arhats
Outra grande diferença, no que diz respeito aos budas, é que a escola
Mahayana é a única a afirmar a existência dos três corpos de um buda —
nirmanakaya, sambhogakaya e dharmakaya. O Hinayana não os
reconhece. Portanto, o conceito de buda é significativamente diferente
entre o Hinayana e o Mahayana.
Bodhisattvas
O Mahayana afirma que surgirão mil budas nesse “eon afortunado” e que
eles fundarão religiões universais, e também afirma que já existiram e
ainda existirão muitos outros budas em outras eras. O Mahayana também
afirma que todos podemos nos tornar budas, porque todos temos os
fatores da natureza búdica, que possibilitam isso. O Hinayana não fala
sobre a natureza búdica; entretanto a escola Theravada menciona
centenas de budas do passado. Um dos sutras Theravada lista 27 nomes.
E todos foram bodhisattvas antes de tornarem-se budas. O Theravada
também afirma que haverão inúmeros budas no futuro, incluindo
Maitreya, o próximo, e que qualquer um pode tornar-se um buda se
praticar as dez atitudes de vasto alcance.
Generosidade
Autodisciplina ética
Paciência
Perseverança
Estabilidade mental (concentração)
Consciência discriminativa (sabedoria)
Meios hábeis
Preces de aspiração
Força
Consciência profunda.
Renúncia
Sinceridade
Determinação
Amor
Equanimidade.
As Duas Verdades
Introdução
A meditação sobre essas quatro atitudes inclui gerar cada estado mental,
um de cada vez, primeiro dirigido-o a si mesmo, e depois à mãe, ao pai, à
família, aos estranhos, inimigos, aos compatriotas, e assim por diante, até
que o sentimento alcance todos os seres limitados. Depois de fazer esta
sequência com a primeira atitude incomensurável, geramos a próxima, e
a estendemos aos outros da mesma forma. As atitudes são:
A Tradição Mahayana
Antes de fazer essa afirmação, no primeiro desses dois textos, Atisha cita
uma longa passagem de O Sutra Ensinado pelo Arya Akshayamati, que
contém a citação mencionada acima. Assim sendo, poderíamos supor que
Atisha concorda com a ordem das quatro atitudes incomensuráveis
encontrada neste sutra, que começa com amor. No entanto, muitos dos
textos tibetanos que seguem sua orientação a respeito da sequência das
meditações mudam a ordem e colocam a equanimidade em primeiro
lugar.
Após a meditação nas formas com alvo e sem alvo das quatro atitudes
incomensuráveis, utilizando-se a sequência que começa com a
equanimidade, Longchenpa descreve mais meditações, mas agora
começando pelo amor. Estas meditações, que utilizam a ordem
tradicional das quatro atitudes, ajudam na diminuição do apego que pode
surgir ao alvo da meditação.
Patrul explica:
Ao definir a grande alegria como sendo o estado mental que se alegra com
a felicidade alheia, o Bon concorda com o Theravada, com o Nichiren e
com Patrul, mestre da tradição Nyingma. Apesar de muitas tradições e
textos tibetanos incluírem menções às causas da felicidade no amor
incomensurável e às causas do sofrimento na compaixão incomensurável,
o Bon parece ser o único a mencionar as causas da felicidade na alegria
incomensurável.
Variações Gelug
As várias práticas da tradição Gelug para nos efetivarmos como uma
figura búdica expõem uma grande diversidade de variações na
formulação das quatro atitudes incomensuráveis.
Kalachakra
Em Uma Sadhana Extensa da Mandala do Corpo, Fala e Mente de
Kalachakra (bCom-ldan-'das dpal dus-kyi 'khor-lo'i sku-gsung-thugs yongs-
su rdzogs-pa'i dkyil-'khor-gyi sgrub-thabs mkhas-sgrub zhal-lung) do
Sétimo Dalai Lama, repetida em Um Guru-Yoga Kalachakra Juntamente
com uma Prática de Seis Sessões (Thun-drug-dang ‘brel-ba’i dus-‘khor bla-
ma’i rnal-’byor dpag-bsam yongs-’du’i snye-ma) de Sua Santidade o
Décimo Quarto Dalai Lama, colocada em verso por Ling Rinpoche (Yongs-
’dzin Gling Rinpoche Thub-bstan lung-rtogs rnam-rgyal ‘phrin-las):
Nesse texto, Asanga afirma que existem três tipos de equanimidade: uma
variável subjacente ('du-byed, Skt. samskara) incluída no agregado de
outras variáveis subjacentes, um sentimento (tshor-ba, Skt. vedana) e
uma atitude incomensurável. A função mencionada acima é a da
equanimidade como variável subjacente, não da equanimidade
incomensurável. Como variável subjacente, a equanimidade é definida
por Asanga como um estado mental apropriado, que espontaneamente
realiza seu propósito sem se deixar influenciar por agitação ou torpor.
Vajrabhairava e Hayagriva
Outra variação na formulação ocorre em:
Akshobhya
Em Uma Sadhana de Vajra Akshobhya (bCom-ldan-'das rdo-rje mi-'khrugs-
pa'i sgrub-dkyil yongs-su rdzogs-pa'i cho-ga mngon-par dga'-ba'i sgo-
'byed), também do Quarto Panchen Lama,
Conclusão
A partir desta pesquisa, fica claro que existe uma grande variedade de
entendimentos, definições e práticas das quatro atitudes
incomensuráveis. Essa diversidade indica o amplo escopo da prática e, se
ao invés de vermos as diferentes tradições como contraditórias
tomarmos consciência da grande variedade de formas, enriqueceremos
nossa prática.
Sejam felizes
Sejam fisicamente felizes
Tenham a felicidade de um ser limitado (um ser que ainda não é um
buda)
Nunca se afastem a felicidade de um ser limitado
Tenham a felicidade de um arya
Tenham a felicidade temporária de um dos estados melhores de
renascimento e a felicidade definitiva da iluminação
Tenha qualquer dessas felicidades e as causas dessas felicidades
Tradição Monástica
Além do mais, ambos os lados concordam que, após análise, nada pode
ser encontrado existindo independentemente, por si só, estabelecendo
sua existência por si só, embora causa e efeito ainda funcionem. Os
Gelugpas explicam que as aparências da existência verdadeiramente
estabelecida são como uma ilusão, ou seja, não correspondem a nada real:
enquanto as outras três tradições enfatizam que a existência
verdadeiramente estabelecida é de fato uma ilusão.
Teoria da Percepção
Gelugpas afirmam que mesmo de forma não conceitual, nós não vemos
somente um momento de formas coloridas, mas a cada momento também
vemos objetos convencionais, como maçãs, que podem ser reconhecidos
através de vários sentidos e que perduram no tempo. A relação entre
pensamento conceitual e objetos convencionais não é que objetos só
possam ser reconhecidos conceitualmente, ou que eles sejam apenas a
criação do pensamento conceitual. Mas que só podemos explicar sua
existência em termos de rótulos mentais do pensamento conceitual,
conforme explicado acima. Portanto, ambos os lados concordam que
entender o papel do pensamento conceitual no nosso caminho para
reconhecer o mundo é essencial para sobrepujar e eliminar para sempre
nossa confusão e ignorância sobre a realidade – a causa mais profunda de
todo nosso sofrimento.
Conclusão
Introdução
Esta noite pediram-me para falar sobre a tradição Bon e a sua relação
com o budismo. Quando Sua Santidade o Dalai Lama fala das tradições
tibetanas, refere-se frequentemente às cinco tradições do Tibete:
Nyingma, Kagyu, Sakya, Gelug e Bon. Do ponto de vista de Sua Santidade,
Bon tem um lugar igual com as quatro linhagens do budismo tibetano.
Sua Santidade é muito aberto. Não todos concordam com essa posição.
Houve, e ainda há, várias ideias muito estranhas sobre Bon entre
professores budistas. Do ponto de vista da psicologia ocidental, quando as
pessoas estão tentando com muito esforco enfatizar coisas positivas das
suas personalidades antes que terem realmente resolvido coisas a um
nível profundo, então o lado-sombra é projetado em um inimigo. "Nós
somos os Bonpos, seguindo um trajeto puro e correto e eles são o diabo".
Infelizmente, os Bonpos têm sido os objetos tradicionais desta projeção
na história tibetana. Olharemos para as razões históricas para isto. Isto
precisa mesmo de ser compreendido dentro do contexto da história
política tibetana.
De acordo com a própria tradição Bon, foi fundada por Shenrab Miwo,
que viveu há trinta mil anos. Isso colocá-lo-ia algures na Idade da Pedra.
Eu não acho que isto significa que ele era um homem das cavernas. Uma
maneira comum de demonstrar grande respeito a uma linhagem é dizer
que ela é antiga. Em qualquer caso, as datas reais da sua vida não são
possíveis de provar. Shenrab Miwo viveu em Omolungring. A descrição
deste lugar parece ser uma mistura das ideias sobre Shambhala, Monte
Meru, e Monte Kailash. É a descrição de uma terra espiritual ideal. Diz-se
estar dentro de uma área maior chamada Tazig. A palavra "Tazig" pode
ser encontrada tanto no persa como no árabe para se referir à Persia ou à
Arábia. Em outros contextos, refere-se a uma tribo nomádica. Na tradição
Bon, Tazig é descrita como sendo a oeste do reino de Zhang-zhung, que
era no Tibete Ocidental.
Isto sugere que o Bon veio da Ásia Central, e provavelmente de uma área
cultural iraniana. É possível que Shenrab Miwo tenha vivido numa cultura
iraniana antiga e tenha depois ido para Zhang-zhung. Algumas versões
dizem que ele veio entre os séculos XI e VII a.C. Isso também foi há muito
tempo atras e, uma vez mais, não há maneira de provar uma posição ou
outra. O que é claro é que na altura da fundação da Dinastia Yarlung no
Tibete Central (127 a.C.) já havia algo como uma tradição nativa. Nós nem
sequer sabemos o que era chamada nessa altura.
A Conexão Iraniana
O budismo foi da India para o Afeganistão muito cedo. De fato, diz-se que
dois dos discípulos do próprio Buda vieram do Afeganistão e que levaram
o budismo para lá. Nos séculos I e II a.C., vemos que o budismo foi para o
próprio Irã e até mesmo à Ásia Central. O budismo estava lá. Se Bon diz
que ideias que parecem ser muito semelhantes ao que o Buda ensinou
vieram de uma área persa para dentro do Tibete Ocidental durante um
período muito antes de terem vindo diretamente da India, é muito
possível que tenham vindo de uma mistura de budismo e ideias culturais
iranianas locais que estavam presentes nessa área. A área que parece ser
a mais lógica fonte das ideias budistas iranianas é Khotan.
Khotan
Podemos ver que a apresentação do Bon é muito plausível. Pode bem ser
que veio de Khotan. Deste ponto de vista, poderíamos dizer que o
budismo chegou ao Tibete de duas direções: de Khotan ou das culturas
iranianas para o Tibete Ocidental e depois, mais tarde, da India. No
primeiro caso, poderia ter vindo na forma do antigo Bon. É bastante
possível que o budismo, e em especial o dzogchen, tenha vindo de ambos
os lados e que cada lado tenha emprestado do outro. Isso está
provavelmente mais perto da verdade.
O que é muito único ao antigo Bon é uma ênfase na vida após a morte,
especialmente no estado intermediário. Quando os reis morriam, íam
para uma vida após a morte. Porque precisavam de coisas para a sua
viagem, havia sacrifício de animais, e possivelmente até sacrifícios
humanos, embora isso seja discutível. Certamente, enterravam retratos,
alimentos e todas as coisas que uma pessoa necessitaria na sua viagem
após a morte.
Dentro da corte imperial havia uma fação pró-China, uma fação pró-India
e uma fação nativa xenófoba ultra-conservadora. O pai do imperador Tri
Songdetsen tinha casado uma rainha chinesa que tinha muita influência e
consequentemente o pai tinha sido pró-Chinês em muitos assuntos
políticos. A fação conservadora tinha assassinado o pai. Eu penso que esta
é uma das razões por que os chineses perderam o debate. Não havia
maneira de conseguirem ganhar um debate. Os chineses não tinham a
tradição do debate e foram postos contra o melhor debatente da India.
Não tinham uma língua em comum, por isso em que língua debateram?
Tudo estava sendo traduzido. Obviamente, foi uma estratégia política
para se livrarem da fação chinesa. Por causa dos chineses, o pai do
imperador tinha sido morto. Agora, além disso, o rei também se queria
livrar da fação anti-estrangeiros. A fação indiana era a menor ameaça ao
poder político do imperador. Assim, a fação política conservadora foi
enviada para o exílio. Esses eram os Bonpos.
O espírito vital de alguém podia ser roubado por espíritos nocivos. Todas
as tradições budistas tibetanas têm pujas para enganchar de volta um
espírito vital que tinha sido roubado por espíritos nocivos. Envolvem um
resgate: aqui está uma torma, dá-me de volta o meu espírito vital. Como é
que sabemos que o nosso espírito vital foi roubado? De um ponto de vista
ocidental, podemos chamá-lo um esgotamento nervoso ou estresse pós-
traumático, onde não podemos lidar com a vida. Alguém cujo espírito
vital foi roubado é incapaz de organizar a sua vida. Este espírito vital
governa a nossa vida como o Khan domina o país. A palavra tibetana para
espírito vital, "la", é usada na palavra lama. Um lama é alguém que tem
realmente um espírito vital. “La” é usado também em alguns contextos
para traduzir a “bodhichitta branca”, por isso é uma força ou essência
material muito forte dentro do corpo.
A ideia das bandeiras de orações também vêm do Bon. Elas vem com as
cores dos cinco elementos e são penduradas para harmonizar os
elementos externos para que as coisas estejam equilibradas para que
possamos fazer o trabalho interno. Muitas bandeiras de orações têm a
imagem do cavalo de vento (lungta, rlung-rta), que está associado com o
cavalo da fortuna. A China foi o primeiro país a desenvolver um sistema
de correio, em que os carteiros andavam de cavalo. Havia certos lugares
onde paravam e mudavam de cavalos. Esses cavalos dos correios eram os
cavalos do vento. As palavras chinesas são as mesmas. A ideia é que a boa
fortuna virá num cavalo como o carteiro traz bens, cartas, dinheiro, etc. É
muito tibetano/chinês.
Certos aspectos da cura Bon vieram para o budismo, tal como borrifar
água consagrada com uma pena. Em todos os rituais de iniciação budistas,
encontramos uma pena de pavão num vaso. O queimar das folhas e ramos
da árvore de junípero, chamada sang em tibetano, é feito nos topos das
montanhas para saudar alguém que está vindo. Fazem-no ao longo do
lado da estrada quando Sua Santidade regressa a Dharamsala. É
associado com o fazer-se oferendas aos espíritos locais.
Buda ensinou muitíssimo sobre muitos tópicos. Onde quer que o budismo
esteve na Ásia, as pessoas salientaram os elementos que íam ao encontro
da sua cultura. No budismo indiano existe uma menção de terras puras
porém não foi enfatizada. (Por outro lado,) os chineses, que tinham a
ideia taoista de irem para a terra ocidental dos imortais, puseram uma
enorme ênfase nas terras puras e expandiram-na muitíssimo. Assim,
temos o budismo da terra pura. É uma das escolas budistas chinesas mais
significativas. Do mesmo modo, dentro do budismo indiano, nós
encontramos a discussão dos protetores, dos vários espíritos, do
oferecimento de pujas, e assim por diante, mas os tibetanos expandiram
muitíssimo estes elementos porque se encontravam na sua cultura.
Conclusão
Eu penso que é muito importante ter-se muito respeito pela tradição Bon.
Há muitas coisas que podem ser identificadas como Bon ou como cultura
tibetana que não são completamente em comum com o budismo tibetano.
Há vários elementos nos ensinamentos budistas que também são
encontrados no Bon. O debate sobre quem copiou o que de quem não é
útil. O budismo e o Bon tiveram contato um com o outro e não há razão
porque não se influenciariam um ao outro.
Tantra: Teoria
Tantra: Avançado
Dzogchen: Avançado
Tantra: Teoria
As Principais Características do
Tantra
Dr. Alexander Berzin
O Significado de Tantra
As Classes do Tantra
Preliminares
Preliminares Partilhadas
As práticas preliminares partilhadas em comum com a prática sutra do
bodhisattva incluem a obtenção dos quatro pensamentos que
encaminham a mente para o Dharma (blo-ldog rnam-bzhi). Elas são a
apreciação:
Todas as classes de tantra exigem uma base estável nas outras práticas
sutra do bodhisattva. O tantra, na verdade, é um método para combinar e
praticar simultaneamente todas elas. As práticas do sutra incluem:
Preliminares Não-Partilhadas
Para purificar forças negativas internas (sdig-pa, sânsc. papa, potenciais
negativos) e acumular forças positivas (bsod-
nams, sânsc. punya, potencialidades positivas, méritos), a prática do
tantra também exige pelo menos um certo número de preliminares
especiais que não são compartilhadas com a prática sutra. Na maior parte
das vezes, elas incluem cem mil repetições de:
Empoderamento
A visualização de nós próprios como figuras búdicas exige primeiro que
se receba um empoderamento. Um empoderamento permite-nos ter
sucesso na nossa prática:
Permissão Subsequente
Depois de recebermos o empoderamento para uma determinada figura
búdica, podemos também receber uma permissão subsequente para a
figura:
Recolha de Mantras
Depois de recebermos um empoderamento para uma figura búdica
específica, também podemos receber uma recolha de mantras para essa
figura, quer tenhamos recebido a sua permissão subsequente ou não.
Para uma cerimônia de recolha de mantras, as vogais e consoantes (a-li
ka-li) do alfabeto sânscrito são escritas com pó coloridos na superfície de
um espelho metálico, geralmente com cada letra num quadrado separado
numa grade. Durante o ritual, o mestre tântrico lê, uma a uma, a
localização, na grade, da consoante e vogal para cada sílaba do mantra
principal da figura – por exemplo, as coordenadas vertical e horizontal do
quadrado que a contem. Depois de cada sílaba, um assistente tira algum
pó colorido do espelho e usa-o para escrever a sílaba na superfície de
outro espelho metálico. Através do ritual, obtemos firme convicção na
exactidão dos mantras.
Votos
A Rapidez do Tantra
O período de três anos e três fases da lua não deve ser tomado muito
literalmente nem usado como publicidade falsa ou propaganda de
marketing para seduzir pessoas para a prática de anuttarayoga. Ele
deriva da apresentação Kalachakra da contagem de um tipo especial de
respirações de vento-energia sutis (rlung, Sânsc.prana) durante uma vida
de cem anos e simplesmente representa um tempo muito curto. Por
razões propícias, os retiros de grande aproximação decorrem por essa
duração, tal como os retiros de formação básica em tantra de
anuttarayoga nas tradições não-Gelug.
A Prática de Visualização no Tantra
Dr. Alexander Berzin
Como Visualizar
Muitas pessoas dizem, “Bom, eu não consigo visualizar. Então como posso
utilizar esses métodos?” Na realidade, se investigarmos por um minuto,
perceberemos que todos temos poderes imaginativos. Por exemplo, tente
se lembrar como sua mãe ou seu melhor amigo, não importa qual, se
parece. Por favor, faça isso por um momento. Todos somos capazes de
lembrar como nossos entes mais queridos se parecem. Portanto, somos
capazes de visualizar.
Lembro-me que certa vez estava na Índia com uma amiga que realmente
tinha problemas em visualizar. Estávamos em uma longa viagem de
ônibus, juntos em um dia muito quente, e ela sofria com calor e sede.
Então comecei a, de certo modo, torturá-la dizendo, “Nossa, não seria
ótimo se tivéssemos nove laranjas geladas? Imagina como seria
refrescante o sabor. E o cheiro?” E de repente ela descobriu que
conseguia visualizar e imaginar muito bem uma laranja. Portanto, todos
somos capazes; é apenas uma questão de treinamento.
Outra utilização da imaginação no sutra é quando imaginamos um Buda
na nossa frente como objeto de concentração para ganharmos
concentração perfeita. O caminho sutra é dividido em Hinayana e
Mahayana, o “modesto veículo da mente” e o “vasto veículo da mente”.
Nas escolas Hinayana, a maneira usual de desenvolver concentração é
focar na respiração, o que utiliza a consciência sensorial. Focamos na
sensação física do ar entrando e saindo do nariz. O Mahayana, entretanto,
mostra que precisamos considerar o propósito para o qual estamos
usando a concentração. Usamos a concentração para sermos capazes de
focar concentradamente na realidade e permanecermos focados em
sentimentos de amor e compaixão. Portanto, o que queremos ser capazes
de fazer é concentrar com nossa consciência mental e não com a
consciência sensorial. Assim, no Mahayana, o método preferido para
desenvolver concentração é num Buda imaginário.
Mas não estamos apenas imaginando uma maçã na nossa frente, estamos
imaginando um Buda. Isso é muito significativo, porque no budismo,
como você sabe, temos a tendência de fazer muitas coisas ao mesmo
tempo. Focando no Buda para ganharmos concentração também focamos
nas qualidades do Buda. Isso nos ajuda a manter nossa concentração
perfeita nessas qualidades. Além do mais, ao nos concentrarmos no Buda,
nossa concentração é acompanhada de uma forte tomada de refúgio. Em
outras palavras, “Essa é a direção segura que quero tomar na minha vida”.
Podemos acompanhar nossa concentração com um intuito de
desenvolver bodhichitta também, em outras palavras, “Quero me tornar
um Buda, como essa figura que estou imaginando, para beneficiar a
todos.” Se conseguirmos desenvolver concentração perfeita na figura do
Buda, tendo em mente as qualidades do Buda, e quisermos seguir a
direção segura que o Buda indica e nos tornarmos um Buda para ajudar a
todos – se isso é o pacote em que estamos nos concentrando – então trará
muito mais benefícios do que simplesmente nos concentrarmos nas
sensações do ar entrando e saindo do nariz. Esse é um método vasto. Por
isso é chamado “Mahayana”, um veículo vasto de treinamento por
técnicas vastas.
“Clareza” e “Orgulho”
Para visualizarmos uma figura búdica, é claro que precisamos saber que
aspecto ela tem. Mas nos visualizarmos em um formato especial não é tão
difícil como poderíamos pensar. Por exemplo, tente sentir sua cabeça.
Primeiro, vamos tentar imaginar algo no topo de nossas cabeças. A
maneira de fazer isso é colocando a mão em cima da cabeça. Você
consegue sentir sua mão em cima da sua cabeça? Agora tire a mão.
Continua sentindo o topo da sua cabeça? É assim que se imagina algo
sobre a cabeça. Foque ali. Tudo o que precisa é sentir alguma coisa ali.
Não precisa estar em foco para fazer a meditação. Realmente não é tão
difícil.
Agora, para se imaginar como uma figura, tente estar consciente de sua
cabeça e também de seus braços e pernas e de seu corpo todo. Consegue
estar consciente de todo seu corpo? É assim que você imagina que é uma
figura búdica. Podemos não ser capazes de ver nosso rosto, podemos não
ser capazes de visualizá-lo, mas você consegue sentir que tem olhos, nariz
e uma boca? Portanto, é assim que os visualiza, que os imagina.
Mesmo quando essas figuras tenham muitos braços, também não é tão
difícil. Vamos tentar Chenrezig com quatro braços. Ponha suas mãos na
sua frente. Consegue sentir? Agora ponha suas mãos para os lados. Agora
imagine uma foto com dupla exposição. Ponha suas mãos no colo. Pode
sentir esses quatro braços? Não é tão difícil. É assim que trabalhamos
com nossa imaginação com essas figuras.
Para que tudo isso seja muito mais significativo, é crucial gerarmos todos
esses sentimentos, imagens e assim por diante, dentro do contexto de
nossa compreensão da vacuidade.
É preciso que dissipemos todas as fantasias loucas que temos sobre nós
mesmos, como as de que somos monstros. Isso se aplica especialmente no
tantra, onde trabalhamos com nossa autoimagem, que é com o que
estamos lidando quando nos imaginamos como uma figura búdica.
Contemplamos como nossa autoimagem usual é insana, sem nenhuma
referência. Compreendemos, “Não sou um monstro, porque monstros não
existem”. E então recitamos em uma prática tântrica de visualização
(a sadhana), “Na vacuidade eu surjo assim e assim.”
Isso não é autoengano porque sabemos que não chegamos lá, ainda não
somos um Buda. Mas também não é uma loucura ou distorção, porque
temos o potencial para chegarmos lá. Claro, podemos argumentar que
também temos o potencial para renascer como um cachorro. Mas não é a
mesma coisa, uma vez que não há nenhum benefício em nos imaginarmos
como cachorro. Mas há sim um grande benefício em imaginarmos que
temos compaixão e sabedoria perfeitas. Imaginar e praticar agora como
se tivéssemos sabedoria perfeita e assim por diante nos ajuda a
desenvolver mais rapidamente essas qualidades.
Nossa mente pode fazer com que essa mistura dos dois níveis quânticos
apareça com tendo aparência concreta ou não concreta. O problema,
entretanto, é que nossas mentes automaticamente farão com que essa
nossa aparência com uma figura búdica, baseada na natureza búdica,
surja como uma identidade concreta. E então podemos achar que temos
essa identidade concreta tipo, “Oba! Eu tenho clareza mental” “Oba! Eu
tenho sabedoria. Eu sou Manjushri”. Não tem que ser emotivo assim, pode
ser bem sutil, mas ainda há esse sentimento de solidez. Quando estamos
fazendo isso, esquecemos de todos os nossos outros aspectos, e então
pensamos que isso é “a minha identidade monolítica concreta”.
Entretanto, sabemos que ainda não chegamos lá.
Além disso, focando numa figura búdica durante a meditação, que pode
ser nós mesmos como uma figura búdica, faz com que seja muito mais
fácil desenvolvermos uma concentração absorta perfeita do que focando
em nosso corpo grosseiro. Essa é outra vantagem. A razão para isso é que
nosso corpo grosseiro está em constante mudança. A posição do nosso
corpo está sempre sofrendo uma leve mudança, mesmo quando estamos
sentados em meditação. E também tem dias em que nos sentimos bem e
outros nos quais não nos sentimos tão bem, e assim por diante. Sentimos
várias dores, sem falar nas coceiras. Devido a essas constantes mudanças,
não temos um objeto consistentemente estável para desenvolvermos
concentração absorta. Por outro lado, se nos concentrarmos nessa figura
búdica que imaginamos, ela nunca muda. Podemos sempre voltar para a
mesma visualização. Aquilo que imaginamos permanece sempre o
mesmo, portanto é muito mais fácil desenvolvermos uma concentração
estável focando nela.
O que estamos fazendo quando nos identificamos com uma figura búdica?
Estamos nos rotulando, nos denominando figuras búdicas baseados na
nossa natureza búdica. Ainda assim não conseguimos achar a figura
búdica e não conseguimos achar um Buda concreto dentro de nós.
Compreendemos, entretanto, que rotularmo-nos como figuras búdicas é
válido. Estamos nos rotulando como figuras búdicas, o segundo nível
quântico, tomando como base nossa natureza búdica. Mas não
conseguimos achar essa figura búdica, e não conseguimos localizar com
precisão esse segundo nível quântico de sermos uma figura búdica, mas
ainda assim compreendemos que esse é um rótulo válido. Assumimos
esse nível quântico de figura búdica porque temos os fatores da natureza
búdica que nos permitirão alcançar esse nível. Portanto, existimos como
figura búdica meramente na medida em que podemos nos rotular de
maneira válida como tal. Não há nada concreto ou que consigamos achar
em nosso interior que nos torne uma figura búdica.
Podemos entender isso de uma maneira muito mais fácil nos imaginando
como figuras búdicas, porque é obvio que não podemos encontrar nada
dentro de nós que nos faça uma figura búdica, nem mesmo uma figura
búdica que possa ser encontrada. Podemos estabelecer que existimos
como uma figura búdica meramente porque podemos validamente nos
imaginar assim e validamente nos referimos a nós próprios dessa forma e
validamente sentirmos que somos assim, com base nos fatores de nossa
natureza búdica. Na mera dependência desse fato – é isso que queremos
dizer com a expressão “originação dependente” – podemos dizer que
existimos como uma figura búdica, apesar de não haver nada dentro de
nós, concreto e encontrável, que nos faça assim.
Resumo
Perguntas
Seguindo o seu último raciocínio, devemos concluir que a natureza
búdica em si também é vazia?
Sim, tudo é vazio de modos impossíveis de existência. O que quer que seja
que exista efetivamente, ou seja, o que quer que seja validamente
cognoscível, não possui nada internamente que estabeleça sua existência.
Algo que seja encontrável dentro de um objeto é uma maneira impossível
de estabelecer que o objeto existe, porque não existe nada encontrável
dentro de alguma coisa. O que a vacuidade nega é a maneira impossível
de existência, pela qual haveria algo dentro, concreto e encontrável, que
por si só estabelecesse sua existência e consequentemente desse uma
identidade concreta, permanente, que nunca foi e nunca fosse afetada por
nada. Portanto, a única coisa que podemos dizer, se tivermos que dizer
algo sobre o que estabelece a existência das coisas, é somente rótulo
mental.
Isso não significa que o rótulo mental os cria, uma vez que podemos
rotular mentalmente alguém como um monstro, mas isso não faz da
pessoa um monstro. O que estabelece a existência de alguma coisa é que
ela é meramente o objeto de referência de nomes e conceitos, validado
por uma cognição valida do objeto ao qual nos referimos. Esse fato diz
respeito a tudo, inclusive à natureza búdica, iluminação, Budas e até a
vacuidade em si. Obviamente, temos que pensar profundamente sobre
isso para entendermos e compreendermos que é verdade.
Portanto, existimos como essa pessoa que somos porque as pessoas nos
concebem, pensam sobre nós, nos rotulam e nos chamam pelo nosso
nome; e é um rótulo correto. E é só isso! Nada mais é necessário para
estabelecer nossa existência. É o que queremos dizer com “apenas rótulo
mental”. O budismo tem toda uma argumentação bastante complicada
sobre como saber que um rótulo ou um nome está correto. Mas de novo,
só porque eu chamo aquela almofada de cachorro não faz dela um
cachorro. Mas formas válidas de saber é outro tópico muito grande nos
estudos budistas e não podemos entrar nisso hoje.
Bem, temos que ser um pouco cuidadosos aqui. Primeiro, todas essas
figuras búdicas também eram alheias à cultura tibetana, ainda assim os
tibetanos conseguiram, com o tempo, sentir-se confortáveis com elas. Ser
de uma cultura diferente não é uma barreira inerente. Segundo, essas
figuras não devem ser consideradas só pela aparência. Elas são usadas em
um método muito sofisticado. Todos os braços, rostos e assim por diante
representam muitos níveis diferentes de significado e carregam um
profundo simbolismo. Eles representam, por exemplo, diversas
realizações diferentes que estamos tentando ter simultaneamente em
nossas mentes. Tentar ter 24 insights simultâneos em nossa mente é
muito difícil se fizermos isso de maneira abstrata, não só
conceitualmente, mas também não conceitualmente. Estamos falando de
amor, paciência, compreensão e assim por diante. Mas se representarmos
esses 24 insights ou qualidades de maneira gráfica como 24 braços,é
muito mais fácil imaginarmos tudo isso ao mesmo tempo. Assim sendo, a
visualização dessas figuras com vários braços e varias faces é um
dispositivo para nos ajudar a manter todas as coisas que elas
representam simultaneamente em nossas mentes.
Portanto, temos que ser muito cuidadosos para não jogarmos fora um dos
principais propósitos dessas figuras, que é ter todos esses braços, pernas
e faces. Entretanto, quando a iconografia dessas figuras foi de um país
para o outro – da Índia não só para o Tibete, mas também para a China e
Japão – as características faciais, por exemplo, mudaram de indianas para
chinesas. Algumas roupas também mudaram. A mudança mais dramática
foi que Avalokiteshvara mudou de sexo e se tornou uma mulher na China.
Ele era um homem na Índia e no Tibete. Portanto, existem algumas coisas
que podem ser adaptadas em um nível superficial, mas temos que ser
muito cuidadosos. Fazer qualquer adaptação cultural, como meus
professores sempre disseram, requer um conhecimento muito completo
tanto da cultura original quanto da cultura para a qual estamos indo e,
logicamente, um conhecimento completo do budismo. Isso requer um
conhecimento muito vasto; não só profundo, como vasto.
Entendo que existem duas maneiras de se dissolver uma
visualização, e quero saber se isso é correto. Uma é, por exemplo,
quando visualizamos Vajrasattva no topo de nossa cabeça, no fim da
nossa prática ele se dissipa e se dissolve em luz e vai para o nosso
coração, certo? Esse é um tipo de dissolução. A outra é como com o
campo de mérito, onde uma figura se dissolve na outra. Isso está
correto?
Dedicação
Vamos então dissolver nossa sessão com uma dedicação – que é outra
maneira de dissolvermos uma aparência. Pensamos que qualquer
entendimento, insight ou força positiva que possamos ter ganhado nesta
noite cresça cada vez mais. Particularmente, o que discutimos nesta noite
não foi fácil; é bastante sofisticado. Portanto esperamos que nosso
entendimento torne-se cada vez mais profundo à medida que ouvimos as
gravações ou lemos as transcrições e tentamos compreender cada vez
mais, se estivermos interessados em fazer isso. Que possamos obter cada
vez mais benefícios a partir da integração desses ensinamentos na nossa
prática e na nossa personalidade, para que eles possam nos ajudar a
superar dificuldades e realizar mais e mais nosso potencial de ajudar da
melhor maneira a todos. E que tentemos juntar todos os pedaços do
quebra cabeça do Dharma, para que compreendamos mais e mais, e
possamos obter mais e mais benefícios dos ensinamentos e práticas.
Corpo Ilusório
O Corpo Onírico
O que é conhecido como corpo sutil (lus phra-mo) não é um corpo que
pode deixar a nossa forma física grosseira. Em vez disso, é o sistema de
energia sutil dentro dos nossos corpos grosseiros. É a rede dos canais
invisíveis de energia (rtsa, sânsc . nadi), dos nós de energia (rtsa-
`khor, sânsc. chakra), das gotas de energia criativa (thig-le, sânsc . bindu)
neles situadas, e dos ventos de energia (rlung, sânsc. prana) que correm
através deles. Partes deste sistema estão envolvidas no funcionamento
normal da percepção dos sentidos. Com absorta concentração e
treinamento avançado de yoga, é possível fazermos um uso especial deste
sistema para obtermos poderes extra-físicos e extra-sensoriais, tais como
telepatia e clarividência. No entanto, há também muitas doenças que
resultam de distúrbios e desequilíbrios dos ventos de energia. Tais
desordens podem produzir alucinações e percepções anormais, tal como
a sensação de se estar fora do próprio corpo.
Possessão
É também possível que o nosso corpo ou mente seja possuído por um ser
do reino dos espíritos. Isto pode ocorrer por razões benéficas, como no
caso dos oráculos em transe, ou por razões nocivas, como com um
encosto (espíritos famintos). Na literatura budista também há referências
de seres que morreram e renasceram como espíritos ou criaturas do
inferno e que, nestes estados, comunicaram com os seus anteriores
familiares e amigos. Isto é baseado em fortes conexões kármicas, como é
o reconhecimento, por exemplo, de um asno como a reencarnação do seu
falecido tio.
Pode acontecer que espíritos ou forças nocivas estejam fazendo com que
a pessoa tenha percepções alteradas ou perca o controlo da sua
consciência. Esta é também uma situação perigosa e deve ser cuidada por
um lama, por um médico [medicina tibetana] ou por um oráculo que seja
perito nos rituais de exorcismo. Se a sensação extracorpórea for uma
alucinação causada por uma droga, esta também não deve ser engajada.
Podem ocorrer efeitos a longo prazo causados por uma exposição
prolongada à distorção da consciência.
Conclusão
Yoga Tantra
Anuttarayoga Tantra
Fazer oferendas
Manter nossos votos.
5. As cinco práticas para estreitarmos nosso vínculo com a consciência
da esfera da realidade (sabedoria de dharmata) (Akshobia):
Amitaba
A História do Dzogchen
Dr. Alexander Berzin
Introdução
Bon, de acordo com a sua própria descrição, foi fundado por Shenrab
Miwo (gShen-rab mi-bo), em Tazig (sTag-gzig), uma área de cultura
iraniana na Ásia central, e foi levado no século XI a.C. para Zhang-zhung
(Tibete Ocidental). Não há nenhuma forma disto ser validado
cientificamente. O Buda viveu no século VI a.C., na India.
A análise histórica e política revela que o motivo para o exílio teve como
base a suspeita de que a conservadora e xenófoba facção política de
Zhang-zhung poderia assassinar o imperador por ele ser pró-indiano, tal
como tinham feito a seu pai. Apesar disso, o estado manteve os rituais
funerários e os sacrifícios Bon. Daí, é razoável concluir que se tratava de
uma perseguição à facção política de Zhang-zhung, e não uma
perseguição à religião Bon.
Por este motivo, vários eruditos ocidentais afirmam que neste período o
termoBonpo (seguidores do Bon) tinha principalmente uma conotação
política em vez de religiosa. Era usado para a facção política de Zhang-
zhung da corte e para os seus seguidores, em vez de ter sido usado para
os líderes espirituais que executavam os ritos religiosos de Zhang-zhung
na corte, e para os seus seguidores.
A Perseguição ao Budismo
O Bon também se reavivou nesta altura, mas agora os seus conteúdos são
muito budistas. Os textos Bon foram sistematizados em 1017 – na maior
parte textos não-dzogchen, nas categorias principais da literatura budista.
Mais tarde no século XI, textos Nyingma e mais textos dzogchen Bon
foram encontrados, frequentemente pela mesma pessoa.
Dado que tanto Nyingma como Bon asseveram ser a origem de dzogchen
e que a outra [tradição] copiou-o dele, há três possibilidades:
.
V I S ÃO G E R A L DO C O N T E ÚD O
Votos
Preliminares
Práticas Tântricas
Votos
Introdução
(1) práticas individuais para cada uma das Três Jóias (so-so'i bslab-bya)
(6) Adotar os padrões éticos que o Buda estabeleceu. Esta ética é baseada
no claro discernimento entre o que é útil e o que é prejudicial a uma
direção segura na vida, e não na obediência a um grupo de leis ordenadas
divinamente. Assim, seguir a ética budista significa nos refrearmos de
certos modos de conduta porque são destrutivos e dificultam as nossas
capacidades de beneficiar a nós ou aos outros, e abraçarmos outros
modos de conduta porque são construtivos e nos ajudam a crescer.
(7) Tentar ser benevolente e compassivo para com os outros tanto quanto
possível. Mesmo se os nossos objetivos espirituais forem apenas os de
obter a liberação dos nossos problemas pessoais, isto nunca [deve ser] à
custa dos outros.
Finalmente, para manter a nossa ligação com a Tripla Jóia, (8) fazer
oferendas especiais de fruta, flores e assim por diante, nos dias santos
budistas, tais como o aniversário da iluminação de Buda. Observar
feriados religiosos com rituais tradicionais ajuda-nos a sentir que
fazemos parte de uma comunidade maior.
As três ações a adotar como sinal de respeito são: honrar (4) todas as
estátuas, pinturas e representações artísticas de Budas; (5) todos os
livros, especialmente os relacionados com o Dharma; e (6) todas as
pessoas com votos monásticos budistas, e até os seus mantos.
Tradicionalmente, os sinais de desrespeito são: pisar tais objetos; sentar
ou estar de pé em cima deles; e colocá-los diretamente no assoalho ou no
chão sem colocar pelo menos um pedaço de pano embaixo deles. Embora
estes objetos não sejam as verdadeiras fontes de direção segura, eles
representam os seres iluminados, as suas realizações supremas e os
praticantes altamente realizados e avançados nesse objetivo, e nos
ajudam a permanecer conscientes deles.
(2) Oferecer diariamente à Tripla Jóia, com gratidão pela sua bondade e
apoio espiritual, a primeira porção das nossas bebidas e refeições
quentes. Geralmente isto é feito por imaginação, embora possamos
também colocar uma pequena porção da nossa primeira bebida quente
do dia perante uma estátua ou pintura de Buda. Mais tarde, imaginamos
que os Budas nos devolvam a oferta, para nós próprios a apreciarmos e a
bebermos. Seria altamente desrespeitoso deitar as nossas oferendas para
a latrina ou derramá-las no lavatório.
(5) Seja o que for que aconteça, confiar na nossa direção segura. Em
épocas de crise, a direção segura é o melhor refúgio porque lida com a
adversidade procurando eliminar a sua causa. Os amigos podem nos dar
simpatia mas, a menos que sejam seres iluminados, deixam-nos
inevitavelmente desapontados. Têm os seus próprios problemas e são
limitados naquilo que podem fazer. Porém, trabalhar constantemente
para a superação das falhas e dificuldades de uma maneira séria e
realista, nunca falha na hora da nossa necessidade.
Isto conduz ao compromisso final; (6) nunca abandonar esta direção na
vida, seja o que for que aconteça.
1. aspirativa (smon-sems),
2. engajada ('jug-sems).
Contexto
Esta queda refere-se especificamente a fazer algo que cause dano a um,
dois ou três monges ou monjas budistas, não obstante o seu status moral
ou nível de estudo ou prática. Tais ações são motivadas pela inimizade ou
malevolência, e incluem bater ou insultá-los, confiscar seus bens, ou
expulsá-los dos seus mosteiros. No entanto, expulsar os monásticos não é
uma queda, caso eles tiverem quebrado um dos seus quatro votos
principais, que sao: não matar, especialmente outro ser humano; não
roubar, particularmente algo pertencendo à comunidade monástica; não
mentir, especificamente sobre realizações espirituais; e manter o celibato
total.
A sexta queda- raiz é rejeitar os textos dos veículos dos shravakas ou dos
pratyekabuddhas como sendo as palavras autênticas do Buda. Aqui,
aceitamos que são, mas estamos negando a eficácia de seus ensinamentos
e afirmando que é impossível livrarmo-nos das emoções e atitudes
perturbadoras por intermédio das suas instruções, por exemplo, as
do vipassana (meditação da introvisão).
Mantendo os Votos
(1) Não considerar a ação negativa como sendo prejudicial, ver apenas
vantagens e cometer a ação sem nenhum arrependimento.
Enfraquecendo os Votos
Um nível ainda mais fraco de manter essa forma nas nossas vidas começa
quando não reconhecemos que haja algo de errado em recusar emprestar
o livro. Esse é o nível menor de corrupção média (zag-pa 'bring).
Acrescentando um ou dois dos outros fatores que amarram,
enfraquecemos essa forma ainda mais, com corrupção média principal e
corrupção principal (zag-pa chen-po) respectivamente. Quando todos os
quatro fatores que amarram estão presentes, cometemos uma queda- raiz
e perdemos completamente nossos votos de bodhisattva. Estamos agora
inteiramente sob o controle do apego e da avareza, o que significa que já
não estamos engajados na sua superação ou na realização dos nossos
potenciais de modo a podermos beneficiar os outros. Ao abandonarmos o
estágio engajado da bodhichitta, perdemos nossos votos de bodhisattva
que estruturam esse nível.
Observações Conclusivas
Introdução
1. generosidade
2. autodisciplina ética
3. paciência
4. perseverança
5. estabilidade mental (concentração)
6. consciência discriminativa (sabedoria).
(9) Não corrigir aqueles que atuam sob o poder das emoções e atitudes
perturbadoras
(2) Não nos livrarmos dos obstáculos que impedem a estabilidade mental
(3) Exercer esforço no estudo de textos não budistas quando isso não dever
ser feito
De acordo com os comentários, os textos não budistas referem-se a obras
sobre lógica e gramática. Podemos sem dúvida incluir aqui também livros
para aprender línguas estrangeiras ou qualquer tópico do curriculum
educacional moderno, tal como a matemática, a ciência, a psicologia ou a
filosofia. A falha aqui estaria em colocar todos os nossos esforços no
estudo destes assuntos e negligenciar nossos estudos e práticas do
Mahayana, de modo que eventualmente acabamos por esquecer-nos de
tudo sobre eles. Se, porém, formos extremamente inteligentes, capazes de
aprender coisas rapidamente, tivermos uma compreensão sadia e estável
dos ensinamentos do Mahayana com base na lógica e no raciocínio, e
formos capazes de reter esses ensinamentos nas nossas memórias por
muito tempo, não haverá falha em estudar textos não budistas se também
mantivermos, a cada dia, os nossos estudos e prática do Mahayana.
A sexta queda raiz é afirmar que os textos Mahayana não são as palavras
de Buda. Aqui, aceitamos que em geral eles são autênticos, mas criticamos
certos aspectos , especificamente os textos sobre as ações
inacreditavelmente extensas dos bodhisattvas e os ensinamentos
inconcebivelmente profundos sobre a vacuidade. Os primeiros incluem
relatos de Budas multiplicando-se em formas incontáveis, ajudando
simultaneamente inúmeros seres em uma miríade de mundos, enquanto
que os últimos incluem coleções de versos breves e concisos, e
extremamente difíceis de compreender. Degeneramos a nossa
consciência discernente ao repudiá-los em qualquer uma destas quatro
maneiras, pensando: que (a) o seu conteúdo é inferior – o que dizem é
absolutamente absurdo, (b) a sua forma de expressão é inferior – estão
mal escritos e não fazem sentido, (c) o seu autor é inferior – não são as
palavras de um Buda iluminado, ou que (d) o seu uso é inferior – não são
de benefício a ninguém. Discernindo falsamente deste modo, com a mente
fechada e impetuosa, danificamos a nossa capacidade de discernir as
coisas de maneira correta.
Também por causa das mesmas razões. Sete tipos de pessoas afligidas
por dificuldades requerem cuidado especial: (a) os cegos, (b) os surdos,
(c) os amputados e aleijados, (d) viajantes cansados, (e) aqueles sofrendo
de alguns dos cinco obstáculos que impedem a estabilidade mental, (f)
aqueles com inimizades e fortes preconceitos, e (g) aqueles que caíram de
suas posições de algum status elevado.
(4) Não tentar ensinar os que atuam de modo irresponsavel de acordo com
o seus caráteres
Não querer retribuir aos outros a ajuda que eles nos deram, ou não nos
lembrarmos de retribuir ou nem sequer pensarmos nisso. Não haverá
falha, porém, se ao tentarmos fazê-lo. por ejemplo, ao estarem
consertando os seus carros, nos faltar o conhecimento e a habilidade, ou
se estivermos demasiado fracos. Além disso, se aqueles que nos ajudaram
não desejam nada de retorno, não os forçaremos a aceitar a nossa oferta
de ajuda.
Desde que o que os outros querem que façamos ou o que eles gostem não
seja prejudicial a ninguém, é uma falha não concordar. Todos nós fazemos
as coisas de modos diferentes e temos gostos individuais. Esta falha
ocorre se não honrarmos isto, por causa da malevolência, preguiça ou
indiferença, ou se discutimos sobre coisas triviais como onde comer, ou
se somos insensitivos às suas preferências e causamos o seu desconforto
ou ressentimento ao escolher a comida.
Sumário
Os irmãos e as irmãs vajra são aqueles que têm votos tântricos e que
receberam um empoderamento em qualquer sistema de figura búdica de
qualquer classe de tantra do mesmo mestre tântrico. Os empoderamentos
não precisam ter sido recebidos ao mesmo tempo, nemprecisam ser do
mesmo sistema ou classe de tantra. Esta queda ocorre quando, sabendo
muito bem que certas pessoas são nossos irmãos ou irmãs vajra, nós os
importunamos ou abusamos verbal e diretamente sobre falhas, defeitos,
fracassos, erros, transgressões e assim por diante que eles podem ou não
possuir ou ter cometido, e eles compreendem o que dizemos. A motivação
tem de ser uma de hostilidade, raiva, ou o ódio. Indicar as fraquezas de
tais pessoas de uma maneira amável, com o desejo de as ajudar a superá-
las, não é uma falha.
Tal como com a nona queda-raiz tântrica, o vazio pode ser compreendido
de acordo com o sistema Chittamatra ou o sistema Madhyamaka. Quando
obtemos um entendimento (de uma destas visões) , é uma queda-raiz
deixar passar mais do que um dia e noite sem meditar nela. O costume
normal é meditar sobre o vazio pelo menos três vezes durante o curso de
cada dia e três vezes cada noite. Precisamos continuar essa prática até
nos termos livrado de todos os obstáculos que impedem a onisciência
(shes-sgrib) – ponto esse em que permanecemos diretamente cientes do
vazio o tempo todo. Se pusermos um limite pensando que já meditamos
suficientemente no vazio antes de alcançar este objetivo, poderemos
nunca vir a alcançá-lo.
(13) Não confiar corretamente nas substâncias que nos ligam intimamente
à prática tântrica (dam-rdzas)
Concentração na Respiração
Oferendas
Regozijo
Pedir Ensinamentos
Assim, nós estamos prontos para o sexto ramo, que é suplicar aos
professores que não morram. Nós pensamos, por favor nunca deixem de
ensinar; continuem para sempre! Nós não estamos suplicando dessa
maneira por causa do apego aos nossos professores. Mas, sim, estamos
reafirmando que somos sérios e sinceros em nossa prática. “Eu quero
seguir por completo até a iluminação, para ser capaz de ajudar todos.
Assim, não morra! Eu preciso de aprender”. Nós também nos dirigimos
aos ensinamentos em si; continuem a nos ensinar – Shantideva e seu
texto. Nos ensinem mais e mais. Deixem-nos obter cada vez mais
compreensão, e ter cada vez mais progresso com esse material. Nunca
párem até alcançarmos a iluminação; até que todos atinjam a iluminação.
Dedicação
O sétimo e último ramo é a dedicação. Nós pensamos que, o que quer que
aprendamos, o que quer que entendamos, isso possa agir como uma
causa para alcançarmos a iluminação e, assim, sermos capazes de
beneficiar os outros o mais possível. Possa nossa compreensão se
aprofundar mais e mais. Possa ela se entranhar e causar uma grande
impressão em nós, de maneira que gradativamente sejamos capazes de
aplicá-la ao longo do caminho para a iluminação. Especificamente,
possamos ser capazes de aplicar na nossa vida diária aquilo que
aprendemos, para que comece a fazer diferença na maneira como lidamos
com os outros, para que a pouco e pouco lhes possamos levar mais
alegria.
(7) Pela força positiva acumulada por tudo o que fiz dessa
maneira, que todos os sofrimentos
de todos os seres limitados possam desaparecer.
Com este receptivo estado mental que gerámos, estamos quase prontos
para começar as nossas aulas ou sessões de meditação. No entanto, é útil
primeiramente tomar a decisão consciente de ouvir, estudar ou meditar
com concentração. Nós decidimos que no caso da nossa atenção vaguear,
iremos trazê-la de volta, e caso comecemos a ficar sonolentos, iremos nos
alertar. Quando tomamos estas decisões conscientemente, temos uma
melhor chance de concentração.
Introdução
Sofrimentos Verdadeiros
Sofrimentos verdadeiros referem-se à nossa experiência dos resultados
do amadurecimento do karma. Esses resultados podem ser sentimentos
maculados de felicidade, sentimentos de infelicidade ou fatores agregados
maculados da experiência (phung-po, Skt. skandha). Em geral, “maculado”
(zag-bcas, contaminado) refere-se a algo que vem da falta de consciência
(ma-rig-pa, Skt. avidya; ignorância) da realidade, ou seja, não saber como
os fenômenos existem ou ter uma compreensão equivocada sobre como
eles existem.
Causas Verdadeiras
As verdadeiras causas desses três tipos de sofrimento são o karma e as
aflições mentias (nyon-mongs, Skt. klesha; emoções e atitudes
perturbadoras). “Aflições mentais” são fatores mentais que, quando
acompanham um momento de nossa experiência, nos fazem perder a paz
mental e o autocontrole. Além de motivarem ações kármicas, também
servem como condição para o amadurecimento das repercussões
kármicas dessas ações. Porém, em última análise, tanto o karma quanto
as aflições mentais derivam da falta de consciência sobre a natureza da
realidade ou, mais especificamente, do apego à existência inerente (bden-
‘dzin).
Um anseio (sred-pa)
Uma aflição obtentora (len-pa)
Um desejo kármico por mais uma existência
Resumindo:
Verdadeiro Cessar
O verdadeiro cessar do sofrimento só pode acontecer se houver um
verdadeiro cessar de suas causas. Assim, um verdadeiro cessar refere-se
à ausência absoluta de karma e de aflições mentais, e também daquilo que
deles amadurece: a experiência de sofrimento verdadeiro dos
sentimentos e agregados maculados. “Ausência absoluta” significa cessar
de forma a nunca mais surgir.
O Processo de Purificação
Primeiro livramos (spang-ba) nosso contínuo mental da rede de forças e
tendências kármicas. Esse termo, spang-ba, aqui traduzido como “livrar”
— normalmente traduzido como “abandonar” — significa purificar nosso
contínuo mental de alguns fenômenos maculados, de forma que eles
cessem verdadeiramente. Nos livramos de nossa rede de forças kármicas,
tanto positivas como negativas, e de todas as nossas tendências kármicas
quando atingimos o estado de arhat, ou seja, quando atingimos a
liberação.
O Nível Pré-Tantra
Apesar da meditação no mantra de Vajrasattva ser uma prática tântrica, a
maioria das pessoas começa a fazê-la antes de se engajar no tantra. Essa
prática inicial estaria no estágio em que treinam apenas no nível sutra do
Mahayana. Esse nível tem três estágios, de acordo com os níveis graduais
de motivação e metas apresentados nos ensinamentos dos caminhos
mentais do lam-rim: inicial, intermediário e avançado. Apesar de apenas o
nível avançado do lam-rim estar no nível de motivação estritamente
Mahayana, os níveis iniciais e intermediários precisam entrar como
degraus no caminho para o desenvolvimento da motivação avançada. E
ainda, todos os três níveis de motivação do lam-rim desenvolvidos no
contexto da prática sutra Mahayana precisam ser praticados como
degraus para a prática do tantra.
Neste nível, trabalhamos para nos purificar dos efeitos dos seguintes
karmas negativos:
Ter cometido cada uma das dez ações destrutivas (dez não virtudes)
Ter transgredido e, portanto, enfraquecido nossa direção segura
(refúgio) em cada uma das Três Joias Preciosas
Ter nos comportado de forma inapropriada com cada um de nossos
mentores espirituais e assim enfraquecido nosso vínculo de
proximidade (dam-tshig, Skt. samaya) com eles.
Ter transgredido ou enfraquecido cada um de nossos votos de
pratimoksha para liberação individual, cada um de nossos votos de
bodhisattva e cada uma das dezoito práticas de compromisso e vinte e
dois pontos de treinamento para limpar nossas atitudes (lojong;
treinamento de atitude; treinamento da mente).
O arrependimento sincero
A decisão firme de tentar não repetir a ação
A reafirmação de nossa base, ou seja, nossa direção segura e ideal de
bodhichitta
A aplicação de ações construtivas contrárias, tais como a meditação e
visualização de Vajrasattva.
Esse apego à existência inerente está por trás da aflição mental da culpa.
Visualização de Vajrasattva
De acordo com o contexto em que estivermos praticando, visualizamos a
forma correspondente de Vajrasattva sentado no topo de nossa cabeça. Se
tivermos dificuldade de visualizar em detalhes, podemos visualizar
apenas uma bola de luz branca. O aspecto de manter o orgulho da deidade
— neste caso, o sentimento de um Vajrasattva realmente sentado em
nossa cabeça — é mais importante do que o aspecto de nitidez da figura
em nossa imaginação. Um método para aprendermos a visualizar algo no
topo da cabeça é pôr a mão na cabeça e depois tirar. Ainda podemos
sentir o ponto em na cabeça onde nossa mão estava e ainda sentimos
como se algo estivesse lá.
Faça com que eu seja estável — através de minha eliminação das redes
de forças kármicas e tendências kármicas negativas do contínuo
mental.
Faça com que eu seja feliz — através da minha eliminação das redes de
todas as forças kármicas e todas as tendências kármicas negativas do
contínuo mental, para que eu atinja a liberação, com sua felicidade
imaculada.
Faça com que eu esteja protegido — de forma que minha mente nunca
se afaste da consciência bem-aventurada de clara luz da vacuidade.
SARVA = tudo; SIDDHIM = realização; ME = eu; PRAYACCHA = conceder.
Variações do Mantra
O mantra acima é a forma genérica do mantra de cem sílabas e aparece na
maior parte das práticas de kriya, charya e yoga tantra, bem como nas
práticas de Guhyasamaja, Mahachakra Vajrapani e Kalachakra do
anuttarayoga tantra. No entanto, existem diversas variações do mantra de
cem sílabas. Alguns mantras, por exemplo, terminam em AH HUM PHAT,
ou AH HUM, ou simplesmente AH, mas não faz diferença qual você usa.
Visualizações da Purificação
Vários textos e professores apresentam diferentes conjuntos de
visualizações para fazermos junto com a meditação no mantra de
Vajrasattva. Vamos detalhar um desses conjuntos de múltiplos passos.
Purificação Derradeira
A purificação derradeira é equivalente a um verdadeiro cessar, ou seja, à
remoção total das repercussões kármicas de nosso contínuo mental.
Conseguimos esse verdadeiro cessar através da repetida cognição não
conceitual da vacuidade junto com o ideal de bodhichitta — em outras
palavras, com a consciência discriminativa de amplo alcance da
vacuidade (perfeição da sabedoria), prajnaparamita. Tal cognição é o
derradeiro mantra de Vajrasattva. Conforme está escrito no Sutra do
Coração, “a consciência discriminativa de amplo alcance (perfeição da
sabedoria) é o (grandioso) mantra protetor mental, o mantra protetor
mental do grande conhecimento, o mantra protetor mental insuperável, o
mantra protetor mental igual ao inigualável, o mantra protetor mental
que subjuga todo sofrimento”
O Budismo na Índia
O Budismo no Tibete
O Budismo na Ásia Central
O Budismo no Sudoeste da Ásia
Diálogo Interreligioso
Budismo e Islã
Budismo e Islã: Avançado
Astrologia Tibetana
Medicina Tibetana
Shambhala
O Budismo nos Tempos Modernos
Transmissão do Budismo no Ocidente
O Budismo na Índia
A Sociedade e o Pensamento
Indianos antes e durante a Ēpoca do
Buda
Dr. Alexander Berzin
Harappa-Mohenjadaro
Os Vedas
O ato ritual de fazer oferendas era venerado ainda mais do que os próprios deuses
e, por conseguinte, os sacerdotes brâmanes desempenhavam um papel essencial
na sociedade. Ou seja, a sociedade acreditava que o seu bem-estar derivava não
tanto do favor dos deuses mas, pelo contrário, da correta execução pelos brâmanes
das oferendas rituais. Consequentemente, o hinduismo antigo é referido
geralmente como “bramanismo”. Além disso, a sociedade via o ritual das oferendas
como uma dívida aos deuses. Essa crença fez surgir o conceito bramânico dos atos
positivos como sendo o desempenho do nosso dever.
Os Upanishads
O Império Paurava começou a declinar no século VIII a.C., depois de uma enorme
inundação ter forçado a mudança da sua capital. Lentamente, o império dividiu-se
em numerosos pequenos estados. Alguns eram reinos; outros eram repúblicas.
Estas grandes mudanças na sociedade indiana marcaram o começo de um período
de especulação filosófica e religiosa.
A parte final dos Brahmanas eram os Upanishads, um corpo de literatura que
desenvolveu mais completamente a base filosófica para o bramanismo. Escrito no
decurso de várias centenas de anos, começando por volta do final do século VII a.C.,
doze dos Upanishads são anteriores ao Buda. Embora cada um dos doze
apresentasse ensinamentos ligeiramente diferentes, eles partilhavam contido
muitos temas gerais.
A Escola Ajivaka, fundada por Gosala, era determinista e, assim, rejeitava o processo
causal do carma. Afirmavam que os elementos constituintes do universo – terra, água,
fogo, vento, felicidade, infelicidade, e almas viventes (sânsc: jiva) – são mónadas ou
átomos indivisíveis não-criados que não interagem uns com os outros. Como tudo é
predeterminado, embora ações ocorram através dos átomos destes constituintes; não
obstante, nem as próprias ações nem os átomos causam realmente o acontecimento de
algo. As almas vivas atravessam um número enorme de renascimentos e, depois de
terem experienciado todas as vidas possíveis, entram automaticamente num estado de
paz e ficam assim livres do renascimento. Como consequência, a liberação não depende
do que alguém realmente faz.
A Escola Lokayata ou Charvaka, ensinada por Ajita, também rejeitava o carma. Não só
isso, rejeitava também o renascimento e qualquer coisa como uma alma viva. Advogava
o hedonismo, ensinando que todas as ações devem ser espontâneas e deviam vir da
nossa própria natureza (sânsc:svabhava) – ou seja, devem ser naturais. O objetivo da
vida era experienciar tanto prazer sensual quanto possível. Esta escola rejeitava todas
as formas de lógica e de raciocínio como modos válidos de se conhecer algo.
A Escola Jainista ou Nirgrantha, fundada por Mahavira, afastou-se da Escola de
Lokayata como uma forte reação contra ela. Por isso, asseverava a existência de almas
vivas experienciando renascimentos através da força do carma. O jainismo, existente
ainda hoje como um dos principais sistemas religiosos indianos, ensina um
comportamento ético extremamente estrito e, de fato, um ascetismo extremo como
meio de atingir a liberação.
A Escola Ajnana Agnóstica, liderada por Sanjayin, afirmava que era impossível obter
um conhecimento conclusivo sobre algo mediante especulações filosóficas ou debates
baseados na lógica. Advogava a vida em comunidades celibatárias que colocavam a sua
ênfase apenas na amizade.
O budismo desenvolveu-se como uma escola shramana que aceitava o renascimento
sob a força do carma, enquanto que rejeitava a existência do tipo de alma que as outras
escolas propunham. Além disso, o Buda aceitava, como parte do caminho para a
liberação, o uso da lógica e do raciocínio, assim como também o do comportamento
ético, mas não ao nível do ascetismo dos jainistas. E assim, o budismo evitou os
extremos das quatro escolas shramana precedentes.
Buda e os Eventos Políticos de Seu
Tempo
Dr. Alexander Berzin
Mas o rei sentiu a necessidade de uma terceira esposa, para lhe dar um
filho homem. E casou-se com Vasabha, a filha de Mahanama (rDo-rje-ma,
sânsc. Vajri), primo do Buda, que tornou-se governador de Sakiya após a
morte do pai do Buda. Mahanama era irmão de Ananda e Anuruddha,
discípulos próximos do Buda. Apesar de Mahanama ter apresentado
Vasabha como uma mulher nobre, na realidade ela era sua filha ilegítima
com uma escrava. Apesar de Vasabha ter dado um filho ao rei Pasenadi,
Vidadabha, sua posição como herdeiro do trono de Kosala era precária,
por conta da fraude em relação à linhagem sanguínea de sua mãe. Essa
fraude também colocou o Buda em uma posição difícil por ser parente de
Vasabha.
Quando o Buda tinha setenta e dois anos, seu primeiro patrono, o rei
Bimbisara de Magadha, foi forçado a abdicar do trono em favor do filho,
Ajatasattu (Ma-skyes dgra, sânsc. Ajatashatru). Ajatasattu prendeu o pai e
o deixou morrer de fome. A viúva de Bimbisara, Devi, irmã do rei
Pasenadi, morreu de desgosto. Como vingança pela morte da irmã,
Pasenadi declarou guerra a seu sobrinho Ajatasattu para tentar reaver os
vilarejos em torno de Varanasi, ao norte do Ganges, com os quais ele
havia presenteado Bimbisara, como parte do dote de Devi. A guerra foi
inconclusiva, e, para assegurar a paz, Pasenadi foi forçado a casar sua
filha Vajiri com Ajatasattu.
Cerca de um ano mais tarde, o Buda viajou novamente para sua terra
natal, Sakiya. Durante a visita do rei Pasenadi ao Buda, para prestar-lhe
os seus respeitos, o General Karayana armou um golpe e colocou o
príncipe Vidadabha no trono de Kosala. Pasenadi, o rei deposto, não tinha
para onde ir, fugiu para Magadha buscando a proteção de seu sobrinho e
genro, o rei Ajatasattu em Rajagaha. Entretanto, Pasenadi foi impedido de
entrar na cidade e foi encontrado morto no dia seguinte.
Enquanto isso, o novo rei de Kosala, Vidadabha, declarou guerra contra
Sakiya, como vingança pela fraude de seu avô Mahanama em relação a
sua linhagem sanguínea. Mahanama, você deve lembrar, era primo do
Buda e governador de Sakiya. Apesar do Buda ter tentado, por três vezes,
convencer o rei a não atacar, ele não teve sucesso. As forças de Kosala
foram ordenadas a matar todos os habitantes de Kapilavatthu, capital de
Sakiya. Sem conseguir evitar o massacre, o Buda fugiu para Rajagaha em
Magadha, buscando a proteção do rei Ajatasattu, a mesma proteção que
Pasendi não conseguiu fornecer.
Vassakara, o primeiro ministro do rei Ajatasattu, foi visitar o Buda. Ele lhe
contou sobre os planos de Ajatasattu em expandir o reino, e sua intenção
de invadir a República Vajji em breve. Apesar do Buda avisar que não
conseguiriam vencer a República Vajji pela força, que eles sempre
tentariam manter sua forma de governo, ele não conseguiu impedir a
guerra, da mesma forma que não conseguiu impedir a invasão de Kosala
pelos Sakiyas. O Buda ainda sofreu outra perda nessa época, Sariputta e
Moggallana morreram. O velho Sariputta morreu de uma doença e
Moggallana foi espancado até a morte por bandidos enquanto fazia um
retiro solitário.
Durante o curso das chuvas de monção, o Buda, já com oitenta anos, ficou
gravemente doente e estava à beira da morte. Ananda pediu que desse
uma última recomendação aos monges. O Buda disse que já os havia
ensinado tudo o que sabia e que, no futuro, os ensinamentos seriam seu
principal refúgio e direcionamento. Para se libertarem do sofrimento,
deveriam incorporar os ensinamento, e não depender de um líder ou
comunidade para salvá-los. E então o Buda anunciou que morreria em
breve.
Com seus primos discípulos, Ananda e Anuruddha, o Buda foi mais uma
vez atrás das chuvas. À caminho de Sakiya, eles pararam em Pava, uma
das duas principais cidades de Malla. Lá, um ferreiro chamado Chunda
(Tsu-nda, sânsc. Cunda) serviu porco envenenado ao grupo. Suspeitando
de alguma coisa, o Buda disse a seus primos que não comessem porco,
mas ele, por sua vez, comeu e pediu que enterrassem o que havia
sobrado. Malla era a terra natal do General Karayana, que liderou os
massacres em Sakiya, e é possível que o veneno tivesse como alvo
Ananda, que era famoso por ter memorizado todos os ensinamentos do
Buda. Se Ananda morresse, os ensinamentos e a comunidade do Buda não
resistiriam.
Introdução
Buda Shakyamuni
O príncipe Sidarta, que se tornou no Buda Shakyamuni, viveu de 566 a 486 a.C. na
parte central do norte da India. Após ter alcançado a iluminação com a idade de
trinta e cinco anos, vagueou como mendicante, ensinando aos outros. Uma
comunidade de buscadores espirituais celibatários depressa se reuniu em seu
redor acompanhando-o enquanto ele viajava. Por fim, quando surgiu a
necessidade, Buda estabeleceu regras de disciplina monástica para esta
comunidade. Os “monges” reuniam-se quatro vezes por mês para recitar essas
regras e purificar todas as infrações que pudessem ter ocorrido.
Cerca de vinte anos depois da sua iluminação, Buda iniciou o costume dos monges
permanecerem no mesmo local, todos os anos, durante a estação das chuvas, para
um retiro de três meses. A construção de mosteiros budistas desenvolveu-se a
partir deste costume. Poucos anos antes de falecer, Buda introduziu também uma
tradição de monjas.
Ananda (Kun-dga'-bo) recitou os sutras (mdo) – os discursos acerca dos vários temas
da prática.
Upali (Nye-bar ‘khor) recitou o vinaya – as regras de disciplina monástica.
Mahakashyapa (‘Od-bsrung chen-po) recitou o abhidharma (chos mngon-pa), acerca dos
tópicos especiais de conhecimento.
Estas três divisões dos ensinamentos de Buda formaram As Três Coleções tipo-
Cestos (sDe-snod gsum, sânsc. Tripitaka, Três Cestos).
De acordo com outros relatos, a verdadeira divisão aconteceu mais tarde, em 349
a.C. O ponto de disputa não era sobre questões de disciplina monástica, mas antes
sobre visões filosóficas. A divergência foi sobre a questão dos arhats – seres
liberados – serem ou não limitados.
Pondo de lado a data em que ocorreu o concílio, a sua principal tarefa era analisar
os ensinamentos de Buda e refutar o que os ortodoxos anciãos Theravada
consideravam como visões incorretas. Moggaliputta Tissa, o monge-líder do
concílio, compilou estas refutações analíticas em Motivos de
Controvérsia (pali: Kathavatthu), que se tornou o quinto dos sete textos do Cesto do
Abhidhamma Theravada.
Outras tradições Hinayana não relatam este concílio do mesmo modo que
Theravada. Em qualquer caso, um dos principais pontos filosóficos sobre o qual a
separação ocorreu era a existência de fenómenos passados, presentes e futuros.
Sarvastivada afirmava que tudo existe – as coisas que já não estão acontecendo, as
coisas que estão acontecendo atualmente e as coisas que ainda não aconteceram. Isto
porque são eternos os átomos de que as coisas são feitas; apenas mudam as formas que
eles tomam. Assim, as formas que tomam os átomos podem se transformar de coisas
que ainda não estão acontecendo em coisas que estão acontecendo agora e, depois, em
coisas que já não estão acontecendo. Mas os átomos que constituem cada uma destas
coisas são os mesmos eternos átomos .
A Escola Theravada conduziu o seu quarto concílio em 29 a.C., no Sri Lanka, sob o
patrocínio do rei Vattagamani. Face aos vários grupos que se tinham afastado da
Theravada devido a diferenças de interpretação das palavras de Buda,
Maharakkhita e quinhentos anciãos da Theravada reuniram-se para recitar e
escrever as palavras de Buda a fim de preservar a sua autenticidade. Esta foi a
primeira vez que os ensinamentos de Buda passaram a escrito e, neste caso, foram
transcritos na língua Pali. Esta versão das Três Coleções tipo-Cestos, Tipitaka, é
geralmente conhecida como o Cânone Pali. As outras escolas Hinayana, entretanto,
continuaram a transmitir os ensinamentos oralmente.
O mais famoso dos regentes de Kushan foi o rei Kanishka que, de acordo com
algumas fontes, governou de 78 a 102 d.C. e, segundo outras, de 127 a 147 d.C. Em
qualquer caso, a Escola Sarvastivada conduziu o seu quarto concílio durante o seu
reinado, na sua cidade-capital de Purushapura (atual Peshawar) ou em Srinagar,
Caxemira. O concílio rejeitou o abhidharma Sautrantika e sistematizou o seu
próprio abhidharma em O Grande Comentário (sânsc. Mahavibhasha). O concílio
também supervisionou a tradução de prakrit para sânscrito da versão Sarvastivada
das Três Coleções tipo-Cestos, e a escrita destes textos em sânscrito.
O Surgimento do Mahayana
Os sutras Mahayana apareceram pela primeira vez entre o século I a.C. e o século
IV d.C., em Andhra, no sul da India Oriental, área em que Mahasanghika estava
florescendo. Segundo as tradicionais narrativas budistas, estes sutras tinham sido
ensinados por Buda, mas tinham sido transmitidos oralmente e mais em privado
do que as obras Hinayana tinham sido. Alguns até tinham sido protegidos em
reinos não-humanos.
A Escola Madhyamaka, vinda de Nagarjuna, que viveu em Andhra entre 150 e 250 d.C.,
explica os Sutras Prajnaparamita. De acordo com narrativas tradicionais, Nagarjuna
recuperou estes sutras do fundo do mar, onde os nagas os tinham protegido desde a
altura em que Buda os tinha ensinado no Pico dos Abutres (Bya-rgod phung-pa’i ri,
sânsc. Grdhrakuta), perto de Rajagrha, no centro do norte da India. “Nagas” são seres
meio-humanos meio-serpentes que vivem debaixo da terra e debaixo de corpos de
água.
A Escola Chittamatra baseou-se no Sutra da Descida a Lanka (Lan-kar gshegs-pa’i mdo,
sânsc. Lankavatara Sutra). Embora este sutra tivesse primeiro aparecido em Andhra, os
ensinamentos Chittamatra foram desenvolvidos ainda mais por Asanga, que viveu
durante a primeira metade do século IV d.C., em Gandhara, no atual Paquistão Central.
Asanga recebeu estes ensinamentos através de uma visão do Buda Maitreya.
O tantra também emergiu entre os séculos III e VI d.C., com o primeiro aparecendo
uma vez mais em Andhra, no sul da India. Este foi o Tantra Guhyasamaja (dPal
gSang-ba ‘dus-pa’i rgyud). Nagarjuna escreveu vários comentários. De acordo com
a tradição budista, os tantras também tinham sido transmitidos oralmente desde a
época em que Buda os ensinou, mas de um modo ainda mais privado do que
tinham sido os ensinamentos dos sutras do Mahayana.
Songtsen-gampo
Essa região era fortemente budista e tinha sido influenciada principalmente pela
cultura iraniana. Seu idioma estava relacionado com idiomas iranianos que tinham
grande influência no Tibete, mas isso não é muito enfatizado nas histórias escritas.
Por exemplo, o alfabeto tibetano na verdade deriva da escrita Khotan, que por sua
vez já era uma adaptação do alfabeto sânscrito. Acontece que os professores
khotaneses que Thonmi Sambhota iria encontrar estavam na Caxemira, e era
necessário cruzar a Caxemira para chegar a Khotan. Por este motivo é dito
frequentemente que a grafia tibetana vem da Caxemira, mas após análise histórica
detalhada, vemos que não é o caso. Além disso, o sistema de tradução para o
tibetano foi fortemente influenciado pelo estilo khotanês de separar sílabas e dar
significado a sílabas individuais.
Mais tarde, o contato com a China e Khotan aumentou, e depois com a Índia. A
princesa de Zhang-zhung trouxe muitos rituais Bon para o estado, embora fossem
muito diferentes daquilo que chamamos de Bon hoje.
Aproximadamente 140 anos depois, em meados do século VIII DC, o Imperador Tri
Songdetsen focou na expansão do império e entrou em guerras com a China e
vários reinos turcos. De acordo com uma profecia, ele convidou o grande abade de
Nalanda, Shantarakshita para vir da Índia e ensinar no Tibete.
Naquele tempo, havia muitas facções políticas dentro do governo, umas das quais
era conservadora e contra estrangeiros e que nada gostou do fato de o Imperador
convidar Shantarakshita. Infelizmente, a chegada de Shantarakshita coincidiu com
uma pequena epidemia de catapora e ele acabou levando a culpa e servindo de
bode expiatório, sendo expulso do Tibete.
Antes disso, existiam templos, mas não monastérios que orientassem os monges
ordenados. Guru Rinpoche não achou as pessoas muito receptivas ou maduras
para ensinamentos mais avançados, e por isso enterrou textos sobre o dzogchen, a
classe mais elevada de ensinamentos do tantra de sua tradição, dentro dos muros e
pilares de Samye e em outros diversos locais no Tibete e Butão. A tradição
Nyingma vem dele.
Em meados do século IX, Tri Ralpachen decretou que sete lares deveriam ficar
responsáveis por apoiar cada monge. Objetivamente podemos dizer que ele era um
fanático religioso. Ao invés de impostos irem para o governo, todo o dinheiro era
destinado ao apoio de monges e monastérios. Isso devastou economicamente o
país e o governo. Ele também indicou ministros monges e os monastérios
ganharam mais e mais poder.
Kadam e Gelug
Por isso, houve uma profunda análise das traduções tibetanas de alguns textos
indianos mais complicados. Ao contrário de outros muitos autores que o
precederam, Tsongkhapa simplesmente não pulou partes obscuras. Estas
passagens complicadas eram aquelas que ele prazerosamente tentava entender e
explicar. Assim, chegou a uma interpretação radicalmente diferente de quase tudo.
De fato, Tsongkhapa era um grande revolucionário. Entre os seus vários discípulos
está o monge que posteriormente seria conhecido como o Primeiro Dalai Lama. O
título lhe foi dado postumamente, na época do Terceiro Dalai Lama. “Dalai” é um
nome mongol que significa “oceano”.
Houve uma terrível guerra civil por aproximadamente 150 anos até que os
mongóis chegaram e terminaram com ela. Naquela época, os mongóis
transformaram o V Dalai Lama no líder político e espiritual do Tibete e seu
professor passou a ser conhecido como o IV Panchen Lama. Em 2011, o XIV Dalai
Lama acabou com a tradição de os Dalai Lamas terem qualquer posição política.
Sakya
Kagyu
Nyingma
Muitos textos foram descobertos e era bastante confuso entender como eles
estavam conectados. Eles foram padronizados e esclarecidos no século XIII pelo
grande mestre Nyingma, Longchenpa, que é o verdadeiro pai da tradição Nyingma
que encontramos hoje. Há uma divisão entre a linhagem do tesouro norte e a
linhagem do tesouro sul. A tradição Nyingma é mais fragmentada que outras e não
conforma um estilo particular.
O Movimento Rima
Conclusão
Geografia
O Período Kushan
O rei mais famoso de Kushan foi Kanishka (governou 78 – 102 d.C.), cuja
capital ocidental era em Kapisha. Ele apoiava a Escola Sarvastivada
Hinayana. A sua subdivisão Vaibhashika era especialmente proeminente
no Tocaristão. Ghoshaka, o monge tocariano, foi um dos compiladores dos
comentários Vaibhashika sobre oabhidharma (tópicos especiais de
conhecimento), aceites durante o Quarto Conselho Budista, conduzido
por Kanishka. Quando, após o Conselho, Ghoshaka regressou a Tocaristão,
fundou a Escola Vaibhashika Ocidental (Balhika). Nava Vihara, o mosteiro
principal em Balkh, rapidamente se tornou o centro de estudos
superiores budistas para toda a Ásia Central, comparável ao Mosteiro
Nalanda na India Setentrional Central. Enfatizava principalmente o
estudo do abhidharma Vaibhashika e apenas admitia monges que já
tivessem composto textos sobre o tema. Visto que abrigava uma relíquia
do dente do Buda, era também um dos principais centros de peregrinação
ao longo da Rota da Seda, da China à India.
Os Turcos Ocidentais
A Aliança Tibetana
Após ter derrotado o seu irmão, al-Ma'mun declarou essa jihad. Em 815,
derrotou o regente Turki Shahi, conhecido como o Xá de Kabul, e forçou-
lhe a converter-se ao islamismo. O que mais ofendia os credos
muçulmanos era a idolatria. Os cultos árabes pagãos que precederam
Maomé adoravam ídolos e mantinham as suas estátuas em Meca, na
sagrada Kaaba. Ao estabelecer o islamismo, o profeta destruiu-os todos.
Consequentemente, como símbolo de submissão, o al-Ma'mun fez o Xá
enviar para Meca uma estátua de ouro do Buda. Indubitavelmente com
finalidades de propaganda a fim de assegurar a sua legitimidade, al-
Ma'mun manteve a estátua em exposição pública no Kaaba, durante dois
anos, com o anúncio de que Alá tinha convertido o rei do Tibete ao
islamismo. Os árabes estavam a confundir o rei do Tibete com o seu
vassalo, o Xá Turki de Kabul. Em 817, os abássidas derreteram a estátua
do Buda para fazerem moedas de ouro.
Após o seu sucesso contra os Turki Shahis, os abássidas atacaram a região
de Gilgit, controlada pelos tibetanos, no atual Paquistão Setentrional, e
em pouco tempo também a anexaram. Enviaram de volta para Bagdá um
comandante tibetano capturado e humilhado.
O Período Mongol
Os Turki Shahis
Os Uigures
Os uigures, por sua vez, passaram sua forma de budismo como também
seu alfabeto e suas habilidades administrativas aos mongóis no início do
século 13 no tempo de Gengis Khan. No final do século 13, os uigures
mudaram o estilo de sua prática e adotaram a forma tibetana de budismo
como fizeram seus aliados mongóis. Os uigures traduziram um vasto
número de textos budistas para a língua turca a partir do sânscrito,
sogdiano, tochariano, chinês e tibetano, e foram tradutores pioneiros das
escrituras budistas para mongol. Seu estilo de traduzir, mantendo muitos
termos técnicos do sânscrito, foi adotado pelos mongóis. O budismo
continuou entre os uigures até aproximadamente o século 17.
Tuva
No ano de 671 D.C., o peregrino chinês Yijing (I-Tsing) partiu do porto de Cantão
em um navio persa, para visitar a Índia e estudar budismo. A lembrança de
Xuanzang (Hsüan-Tsang), o famoso monge e tradutor, que havia morrido alguns
anos antes, lhe deu a coragem para empreender essa perigosa viagem. Mas, ao
contrário de seu compatriota, Yijing não viajou pela famosa Rota da Seda. A
demanda pela seda chinesa estava diminuindo, já que Bizâncio havia desenvolvido
uma bem-sucedida sericultura desde o ano 551. Além disso, a Rota da Seda havia
se tornado cada vez mais perigosa: desde o início do século VII, campanhas
militares árabes bloquearam a passagem terrestre pela Pérsia. O comércio entre a
China e Sind (atualmente uma província do Paquistão) foi interrompido devido às
intermináveis guerras na Ásia Central entre a dinastia árabe Umayyad, a Dinastia
Tang chinesa, os tibetanos e os turcos orientais. Mercadorias e peregrinos chineses
tinham que viajar pelo mar através do Estreito de Malaca, já uma das mais
importantes rotas do comércio internacional.
Yijing se tornaria o primeiro cronista dessa nova rota marítima, que também seria
uma rota do budismo. Em seu relato de viagem, traduzido para o inglês em 1896
por Junjiro Takakusu, e entitulado “Um relato da religião budista praticada na
Índia e no arquipélago Malaio, 671-695 D.C.” Yijing conta que, após vinte dias no
mar, parou em uma cidade fortificada desconhecida, localizada em uma ilha
chamada “Fo-Che”:
Após nove anos em Nalanda, cidade que abrigava a maior universidade monástica
budista mahayana da época, no atual estado de Bihar na Índia, Yijing voltou duas
vezes para esse misterioso reino na ilha de Fo-Che, que ele também chamava “San-
fo-ts'i” ou “Mo-lo-yeu.” Yijing escreveu:
Isso indica que disciplinas como lógica, gramática e filologia, medicina, artes, assim
como metafísica e filosofia eram ensinadas em Fo-Che. De acordo com os relatos, lá
ele copiou centenas de manuscritos sânscritos antes de voltar para a China em 694.
Onde se localizava esse misterioso reino de Fo-Che? O enigma permaneceu sem
resposta por mais de doze séculos. Em 1918, o epigrafista francês George Coedès
finalmente identificou Fo-Che ou San-fo-ts’i como o reino de Srivijaya com capital
em Palimbão, Sumatra. Nos anos 1980, escavações arqueológicas confirmaram que
o porto fluvial de Palimbão era de fato a capital política e militar desse poderoso
reino do Estreito de Malaca, no encontro do comércio marítimo entre China, Índia
e o Oriente Médio. Apesar da descoberta de uma gigantesca estátua do Buda em
um monte de Palimbão, não havia qualquer evidência definitiva do grande centro
de estudos budistas que Yijing comparou com Nalanda.
Três séculos e meio mais tarde, outro relato de viagem apóia o de Yijing: Um Relato
Sobre o Encontro Com o Mestre Serlingpa Chokyi Dakpa, escrito em tibetano, em
primeira pessoa, por Atisha, um importante mestre budista indiano. Atisha nasceu
no Reino de Zahor (atualmente próximo de Daca, Bangladesh) em 980, filho do rei
Kalyana, e foi chamado de príncipe Chandragarbha. Em sua adolescência, Atisha
deixou seu reino e viajou por florestas e montanhas buscando a sabedoria de
mestres que viviam na natureza ou nas universidades monásticas de Nalanda e
Odantapuri. Aos 29 anos, foi ordenado monge budista e recebeu o nome
Dipamkara Jnana, “Aquele Cuja Consciência Profunda Serve como Lâmpada.”
O Canto 132 da biografia tibetana de Atisha (rNam-thar rgyas-pa, escrita por volta
de 1355) diz:
Com 125 alunos e um grupo de comerciantes que buscava ouro, Atisha partiu. Seu
relato diz:
Homenagem a Maitreya e Avalokiteshvara! Eu, bhikshu (monge)
Dipamkarashrijana, viajei de navio por treze meses e fui onde o Lama
Serlingpa estava. Após cinco meses, o Filho do Deus Indra enviou
grandes tempestades para me impedir de continuar minha missão de
Bodhicitta. Ele também apareceu na forma de um makara gigante para
me deter, e enviou relâmpagos. Naquele momento, eu fiz uma
meditação intensiva em Amor e Compaixão. Como resultado, a
tempestade se acalmou e seis enormes relâmpagos foram vistos presos
no céu sem poder cair. Entretanto, o makara conseguiu nos interromper.
No mesmo momento um vento violento fez nosso navio se tornar
instável como bandeiras ao vento: tremendo, agitando, vindo à tona e
afundando. Os quatro mastros nos quatro cantos foram abaixados e as
quatro grandes pedras foram lançadas para ancorar o navio. Mas a
atmosfera se tornou ainda mais assustadora. Terríveis sons retumbaram
das quatro direções seguidos de relâmpagos...
Atualmente, a foz do rio Batanghari, Muara Sabak, é apenas um cais. O mar fica
distante, pelo menos duas horas de barco, mas a terra acaba onde o rio se divide
em dois braços. Os dois braços cercam uma ilha que fica em frente ao Estreito de
Malaca, guardando a entrada do rio. Essa ilha fluvial faz parte de um parque
nacional com muitos crocodilos e mangues. Exatamente como na descrição de
Atisha.
Várias descrições no relato de sua viagem sugerem que foi em Muara Jambi que
Atisha encontrou Serlingpa e estudou com seu querido mestre, tais como o grande
número de monges que viviam lá e a excelência dos textos budistas que eram
ensinados:
Então eu (Atisha) vi de longe os bhikshus vindo em procissão seguindo
seu mestre. Eles estavam bem vestidos com os três mantos. Cada um
levava um recipiente com água e um bastão. Eram quinhentos e trinta e
cinco e tinham a aparência compassiva dos arhats. O mestre estava
acompanhado por sessenta e dois sramaneras. Ao todo havia
quinhentos e setenta e dois monges. Assim que vi isso, senti como se
estivesse vendo o Buddha rodeado por arhats. Que cena agradável! ...
Então fomos para a residência do Lama, o Palácio do Guarda-sol
Prateado, e nos sentamos... Após nos instalarmos, o Lama começou os
ensinamentos do “Abhisamayalamkara” em cinco sessões, para me
apresentar as características da “originação dependente”. Hospedado no
Palácio do Guarda-sol Prateado, continuei minhas práticas de escuta,
concentração e meditação. O Lama Serlingpa me guiou durante esse
processo de prática.
Não se sabe o motivo pelo qual Muara Jambi caiu em esquecimento após o século
XIII. Alguns especialistas mencionam o ataque do reino hindu dos Cholas, do sul da
Índia, que queria controlar o lucrativo e estratégico Estreito de Malaca. Mas esse
ataque, que teria acabado com o poder de Srivijaya, aconteceu em 1025, e uma das
estátuas mais bonitas descobertas em Muara Jambi é uma Prajnaparamita datada
do século XIII ou XIV. Outros especialistas sugerem que o reino Mo-lo-yeu,
mencionado por Yijing e localizado onde Muara Jambi está, era um feudo, um
concorrente ou uma “matriz” dos Cholas e portanto foi poupado do ataque e
floresceu após a queda de Srivijaya. Diferente dos grande monastérios indianos de
Bihar, que foram transformados em ruínas por ataques turcos e afegãos, Sumatra e
todo o arquipélago indonésio não passou por invasões muçulmanas. O saque de
Muara Jambi, se é que aconteceu, não pode ser atribuído ao Islã, a religião
dominante na região atualmente.
Na mesma área de Muara Jambi há uma vila em que todos os habitantes são
muçulmanos. Suas casas são feitas de madeira e construídas sobre palafitas, ao
longo do rio Batanghari. Seus pomares com cacau e durio se prolongam até as
ruínas do templo. Muitos jovens da região trabalham ocasionalmente nas
escavações, sob supervisão dos arqueólogos. Eles conseguem identificar cada
pedra, cada monte de terra vermelha, cada árvore da floresta onde seus pais têm
pequenas cabanas que usam para vigiar a queda dos durios durante a noite. Eles
conseguem identificar diversas espécies de árvores do subcontinente indiano que
não crescem em nenhum outro lugar de Sumatra, exceto nas florestas de Muara
Jambi. Por exemplo, a árvore de kapung ou kembang parang (tib. metog
dzambaka), que possui, dentro de sua casca, pétalas brancas semelhantes a
películas, que são usadas na Índia e no Tibete como oferendas de flores em
iniciações tântricas.
Outra categoria inclui talvez a antiga sociedade egípcia. Não sei muito
sobre ela. A civilização egípcia recua a seis ou sete mil anos atrás e tinha
fé. Quando estive numa das universidades do Cairo, expressei o interesse
de que, se tivesse mais tempo, gostaria de lá estudar e aprender mais
sobre esta antiga civilização egípcia, mas infelizmente não tive tempo. De
qualquer modo, outra categoria de religião inclui as civilizações do Vale
do Indo, na India, e a civilização chinesa. Estas tinham religiões com uma
ideologia mais sofisticada. Talvez fosse mais sofisticada na civilização do
Vale do Indo do que noutras. Na India, há três ou quatro mil anos, já havia
uma fé com uma certa filosofia. Assim, outra categoria de religião é a fé
com determinados conceitos filosóficos.
Depois, de onde vem a alma? Ela tem um princípio ou não? Não ter um
princípio é difícil de aceitar, por isso tem que haver um princípio, como
há o princípio deste corpo. E assim Deus cria a alma. E quanto ao fim,
entramos na presença de Deus ou eventualmente nos absorvemos dentro
de Deus. As religiões do Médio Oriente – antigo judaismo, cristianismo, e
talvez a egípcia – acreditam na vida após a morte. Mas, para os judeus,
cristãos e muçulmanos, a verdade última é Deus, o Criador. Essa é a fonte
de tudo. Esse Deus deve ter poder ilimitado, e compaixão e sabedoria
ilimitadas. Todas as religiões afirmam a compaixão infinita, como Alá. E
Deus, a verdade última, está para além da nossa experiência. Isto é a
religião teísta.
Dentro das religiões não-teístas, diz o budismo que tudo vem das suas
próprias causas e condições e, por causa disso, uma das naturezas
próprias da causa e efeito é a mudança. As coisas nunca estão paradas.
Por isso, como a base para o self ou "eu" é o corpo e a mente, que
obviamente estão sempre mudando, e como o "eu" depende deles, o "eu"
tem que ser da mesma natureza. Não pode ser imutável e permanente. Se
a base muda, o que é designado nela também tem que estar sujeito à
mudança. Por conseguinte, não há nenhuma alma permanente e imutável
– " anatma", sem-self. Este é o conceito unicamente budista – tudo é
interdependente e relacionado. Assim, dentro das três religiões não-
teístas, embora as outras duas aceitem a causalidade, afirmam contudo
um self permanente e imutável.
Buda não ensinou tudo isto devido à sua própria confusão. Nem os
ensinou para deliberadamente causar mais confusão aos discípulos. Por
que ensinou deste modo? Buda respeitava as diferenças entre os
indivíduos e ensinou tudo isto para lhes ajudar. Viu que tudo isto era
necessário.
Há três mil anos talvez houvesse de dez a cem milhões de pessoas. Agora
há mais de seis bilhões. Entre todas estas pessoas há certamente
temperamentos diversos. Nós podemos ver isto até entre filhos dos
mesmos pais. Até ao nível dos gêmeos, as suas mentes e emoções são
diferentes. Por conseguinte, entre a humanidade há temperamentos
diferentes, estilos de vida diferentes e maneiras diferentes de pensar.
Estas diferenças também são condicionadas pelo ambiente, geografia e
clima. Por exemplo, a Arábia é quente e seca. A India tem as chuvas da
monção, por isso é diferente e as pessoas dali têm um estilo de vida
diferente. Talvez em épocas primitivas as pessoas fossem mais
semelhantes em toda a parte. Mas agora, por causa destas diferenças, é
importante termos abordagens diferentes. Mas na verdade, as diferenças
de filosofias e conceitos não são importantes. O mais importante é a meta,
o objetivo de todas elas e esse é o mesmo: sermos pessoas gentis e
compassivas na nossa abordagem para com os outros.
Para algumas pessoas, então, o conceito de um Deus criador é muito útil.
Perguntei uma vez a um velho monge cristão por que razão o cristianismo
não acredita em vidas passadas. Disse ele: "porque esta própria vida é
criada por Deus". Pensar deste modo dá-nos um sentimento de
intimidade com Deus. Este corpo vem do útero da nossa mãe e por isso
temos um sentimento de ternura e conforto com a nossa mãe. Assim, dá-
se o mesmo com Deus. Nós vimos de Deus e isso dá-nos um sentido de
proximidade com Deus. Quanto mais próximos nos sentirmos, mais forte
será a intenção de seguir o conselho de Deus, que é o amor e a compaixão.
A abordagem teísta é portanto muito poderosa e muito mais útil para
muitas pessoas do que uma abordagem não-teísta.
Observações Introdutórias
O Que É o “Eu”?
O Budismo é a única religião que diz não haver um “eu” independente dos
agregados de corpo e mente. Em geral, o budismo fala em termos de
impermanência, sofrimento, vazio e ausência de “eu”. Essas são [em
parte] as quatro características do dharma, ou os quatro pontos
necessários para rotularmos uma visão como baseada nos discursos
iluminados do Buda, ao invés de como uma visão não-budista. [Vazio e
ausência de um “eu” — ou seja, a ausência de um “eu” impossível — é a
terceira das quatro características.] As quatro características são: os
fenômenos condicionados [passíveis de serem afetados] são
impermanentes [não-estáticos], os fenômenos maculados são sofrimento
ou implicam em sofrimento, todos os fenômenos são vazios [e não
possuem uma alma ou um “eu” impossível] e nirvana é paz [a pacificação
do sofrimento]
Portanto, no que diz respeito à origem do “eu”, temos uma visão teísta e
uma não-teísta e aqui a posição não-teísta é a dos jainistas, budistas e de
parte dos samkyas. Do ponto de vista deles, não existe começo: só existe a
lei da causalidade.
No que diz respeito à sua origem, uma vez que o “eu” só pode existir e ser
compreendido com relação aos, ou na dependência dos, agregados, a
questão sobre o início do “eu” nos leva à questão sobre o início do
continuum dos agregados. Quanto à isso, de maneira geral, todos temos
um corpo e uma mente. Considerando-se que a base para o rotulamento
do “eu” é principalmente o continuum de atividade mental [individual] e
consciência, a questão é: “Existe um começo para o continuum de
atividade mental [individual]?
Conclusão
Mas quais são as fontes de problemas e infelicidade? Há muitas. Nós vivemos num
tempo em que há problemas econômicos, problemas relacionados a vários tipos de
conflitos ao redor do mundo. E estamos todos ligados, então o que acontece numa
parte do mundo afeta todos. Não é mais possível viver de forma isolada.
Então quando olhamos para várias crenças religiosas é muito importante que as
diferenças entre elas não contribuam para criar ainda mais problemas. E a
pergunta então é: como podemos evitar disputas, conflitos e mal-entendidos que
podem surgir por causa de diferentes crenças? Não é suficiente dizer, “todas as
religiões são iguais. Todas as crenças, também as não-religiosas, são iguais. Todos
nós acreditamos em tentar fazer desse mundo um lugar melhor”. Isso não é
suficiente. Mesmo que talvez seja verdade que compartilhamos o mesmo valor,
desejo e objetivo, ainda assim há diferenças e não é justo dizer que não há
diferenças entre as diversas religiões.
Mas o que causa desarmonia é muitas vezes baseado na nossa ignorância sobre as
crenças um dos outros. Isso é agravado com frequência pela nossa falta de
conhecimento profundo sobre a nossa própria tradição. Então ao invés de se
basear em conhecimento e compreensão, nossas atitudes em relação às nossas
origens e às origens dos outros podem facilmente se transformar no que é
chamado de “mentalidade de time de futebol”. Essa mentalidade significa que “esse
é o meu time de futebol, ele é o melhor e nós temos que ganhar. Nós temos que
competir e derrotar todos os outros times de futebol.” Essa é a crença de que a
minha creligião é a melhor simplesmente porque é a minha e a da minha família.
Uma vez perguntaram para Sua Santidade o Dalai Lama, “qual é a melhor religião?”
e ele respondeu, “a melhor religião é aquela que ajuda você a se tornar uma pessoa
mais bondosa.” Por isso para cada pessoa uma religião ou a outra será mais útil
para torná-la uma pessoa mais bondosa. Eu acho que essa é uma forma muito útil
de lidar com diversidade religiosa. Nós precisamos reconhecer que cada religião
tenta ajudar os seus seguidores a se tornarem melhores pessoas, pessoas mais
bondosas. Para reconhecer isso, precisamos ter conhecimento. Precisamos
aprender sobre a nossa própria religião e as dos outros. Isso pode ser feito de
forma científica por meio da educação, sem tentar converter ninguém e sem
qualquer tipo de julgamento, apenas conhecimento geral. Isso é muito útil e
importante.
Assim, eu viajei para lugares como Egito e Jordânia, Turquia etc. e conheci
professores e líderes teológicos do Islã. Eu recebi um grande elogio do reitor da
Universidade Teológica do Cairo, a Universiade Al-Azhar. Ele disse que eu era um
verdadeiro guerreiro da verdade, o verdadeiro significado de mujahedin. Eu estava
tentando mostrar a verdade do que realmente aconteceu. Eu percebi que não só os
professores e líderes religiosos que eu conheci, mas também os estudantes,
estavam muito interessados. Trezentos alunos vieram para uma palestra opcional
que eu dei na Universidade do Cairo sobre budismo.
Uma vez, Sua Santidade o Dalai Lama me pediu para fazer uma coisa. De vez em
quando ele me dava o que eu chamava de missão impossível. Ele disse, “eu quero
que você encontre e traga para mim um líder negro africano sufista muçulmano.”
Como responder a um pedido como esse a não ser “muito obrigado”? Sua
Santidade tem uma habilidade incrível de saber as conexões kármicas que as
pessoas têm e sempre que ele me pediu para fazer essas tarefas aparentemente
impossíveis, foi extremamente fácil realizá-las – tudo simplesmente dá certo.
Pouco tempo depois, eu viajei para a Europa – eu costumava dar muitas palestras
ao redor do mundo – e conheci um alemão com quem comecei a conversar. Ele era
diplomata na África e então eu contei para ele o pedido do Dalai Lama e ele disse,
“Um grande amigo meu por coincidência é o líder religioso sufi de Guiné.” Guiné é
na África Ocidental e eu me esqueci de dizer que Sua Santidade também pediu que
o líder fosse da África Ocidental. Esse líder estava na Europa e estava indo para a
Índia para alguns tratamentos médicos ayurvédicos. Por coincidência ele ia estar
em Délhi exatamente quando eu voltaria para lá e por coincidência ele tinha alguns
dias livres antes de ir embora da Índia e estava muito disposto a se encontrar
comigo e que eu o acompanhasse a Dharamsala para conhecer o Dalai Lama. Assim
não foi necessário nenhum esforço para organizar isso.
Então eu conheci esse líder sufi. Ele tinha uma aparência imponente. Era grande
como um chefe tribal africano e extremamente digno. Nós fomos para Dharamsala
e eu o acompanhei em seu encontro com o Dalai Lama. Ele estava vestido com uma
dessas túnicas brancas muito elegantes. O encontro deles foi tão emocionante e
caloroso, como dois velhos amigos que se encontram, que o líder sufi chegou até a
chorar. O Dalai Lama se levantou e foi para a outra sala – fora da sala onde ele
recebe visitantes – e trouxe um lenço pessoalmente para que o líder sufi enxugasse
suas lágrimas, algo que eu nunca tinha visto ele fazer antes. Ele sempre tinha um
assistente para trazer coisas para ele ao invés de ir buscar ele mesmo. Os dois
tiveram uma calorosa discussão sobre a base para a compaixão no budismo e no
sufismo. Depois disso, por muitos anos eles tiveram outros encontros.
Assim, o próprio Dalai Lama tem muito interesse nesse diálogo, não só com os
muçulmanos, mas com líderes de outras religiões ao redor do mundo. Ele me
incentivou a traduzir muitas partes do meu site para línguas islâmicas para
disponibilizar ao mundo islâmico o conhecimento sobre budismo, sobre o Tibete,
sobre seus escritos e discursos sobre harmonia religiosa e ética secular. Outra
missão impossível. Mas surpreendentemente nós já conseguimos traduzir grandes
partes do site para o árabe e urdu. Urdu é a língua do Paquistão e dos muçulmanos
do norte da Índia. Recentemente, novamente sem ir atrás disso e sem procurar por
eles, uma equipe que está interessada em traduzir nosso site para o indonésio
apareceu. A Indonésia tem a maior população muçulmana do mundo.
A primeira coisa que me veio à memória foi que em certas religiões pede-se aos
adeptos para rezar em certos momentos do dia – como entre os muçulmanos, cinco
vezes ao dia. Assim, se você estiver supervisionando uma construção na qual
alguns dos trabalhadores são muçulmanos ou se você estiver construindo um
prédio público, uma escola, por exemplo, na qual haverá alunos ou professores
muçulmanos, pode ser útil criar uma atmosfera harmoniosa com a construção de
uma sala para orações, se for permitido que aqueles que querem rezar durante o
dia possam seguir suas crenças e costumes. Semelhantemente, se há costumes de
outras religiões que podem ser levados em consideração na construção de um
prédio, isso é muito positivo. Em outras palavras, leve em consideração as
características marcantes de uma crença para fazer as pessoas se sentirem bem-
vindas e confortáveis.
Eu acho muito importante permitir que as pessoas sejam leais às suas tradições se
isso não causar grandes problemas à sociedade. Qual é o problema se você usa um
turbante e não corta seu cabelo se está numa escola ou no exército? Há algum
problema? Na verdade, não. Você ainda pode fazer seu trabalho muito bem. Qual o
problema se, como budista, você faz uma oração e uma oferenda antes de comer?
Qual é o problema? Se você usa um véu que cobre seu rosto completamente – isso
pode ser um problema para dirigir, por exemplo, porque sua visão é limitada.
Então você poderia dizer, “Você não pode usar um véu cobrindo o rosto inteiro se
estiver dirigindo.” Mas em outras situações, qual é o problema? Ou se você é uma
mulher, qual é o problema em insistir em ser tratada por médicas e enfermeiras
em um hospital? Há muitas mulheres, mesmo sem religião, que também
prefeririam isso.
Em resumo, como o Dalai Lama sempre diz, é muito bom que existam tantas
religiões diferentes no mundo e não só religiões, mas crenças seculares também.
Porque, como no exemplo da comida, se houvesse só um tipo de comida para todo
mundo, isso seria muito chato e não serviria para todos. É o mesmo para crenças: o
que funciona para uma pessoa pode não servir para outra. Há muitas crenças que
podem nos ajudar a ser pessoas mais bondosas, mais atenciosas, mais amorosas,
que podem nos ensinar métodos para viver em harmonia com os outros. E como
Sua Santidade diz, a melhor religião é aquela que funciona para você e te ajuda a
ser uma pessoa mais bondosa. Ou seja: “só porque eu gosto de sorvete de
chocolate, não significa que você tem que gostar de sorvete de chocolate também.”
Combinando o Yoga com a Prática
Budista
Yury Milyutin
A prática diária de asanas treina a disciplina e faz com que seja mais
fácil começarmos uma prática regular de meditação
Nosso corpo fica mais forte e flexível, o que faz com que seja mais
fácil meditarmos sentados. Na prática de shamatha, cujo objetivo é um
estado mental tranquilo e estável, a postura é muito importante e a
prática de asanas nos ajuda a mantê-la.
Se conseguirmos permanecer concentrados durante a prática de
asanas, estaremos desenvolvendo a introspecção, assim como
acontece com a prática de pranayama, que é focada na respiração.
Shavasana, a postura do cadáver, nos ensina a relaxar - o que é uma
habilidade crucial para quem quer desenvolver shamatha.
Que nossa visão distorcida da realidade faz com que surjam kleshas —
emoções destrutivas como raiva, apego e arrogância.
Que o caminho para acabarmos com a visão distorcida é através
de prajna — a compreensão do que é a realidade.
Que para conseguirmos firmar essa compreensão em nossa mente
precisamos de samadhi — concentração.
Que para alcançarmos o samadhi precisamos antes seguir uma
disciplina ética. No yoga isso é chama de yama (ética universal)
e niyama (ética pessoal), enquanto no budismo é
chamado shila (autodisciplina ética)
Que treinando a mente dessa maneira, atingimos moksha — liberação
do karma e do renascimento.
Introdução
O que importa é que nós somos seres humanos iguais. Como eu sempre
menciono: somos mental, emocional e fisicamente iguais. Especialmente
quando dou palestras, sempre olho para todos vocês, meus
companheiros, seres humanos, sem fazer diferenças. Se eu insistisse,
dizendo: “eu sou budista”, “eu sou tibetano”, ou talvez “eu sou o Dalai
Lama”, ou algum tipo de pessoa especial, isto não faria sentido. Esta
forma de pensar cria uma espécie de barreira. É claro que há algumas
diferenças, como a cor ou a forma do nariz. Mas em um nível mais
profundo, somos emocionalmente iguais e compartilhamos um potencial
igual para ter emoções construtivas e destrutivas. Mentalmente,
intelectualmente, todos têm o mesmo potencial. Então, é melhor que
falemos como seres humanos.
O que é felicidade?
Eu tenho que mencionar que estou muito feliz e é uma grande honra dar a
Palestra pela Paz em homenagem a Anwar Sadat. Como presidente, ele
realmente fez passos decisivos e corajosos para criar paz nesta parte do
mundo, e eu era um admirador dele à distância. Hoje, eu encontrei a viúva
dele e eu fiquei tão feliz, foi uma honra tão grande, que eu lhe expressei a
minha admiração por seu falecido marido. Se ele tivesse mantido a
suspeita ou o ódio dentro dele, teria sido muito difícil ter tal coragem.
Uma forma de pensar mais vasta e mais holística que visa interesses a
longo prazo – quando você respeita, fala, aperta a mão de seu inimigo e
olha para as diferenças e semelhanças entre vocês – isso é o que há de
melhor.
Todos querem paz e ninguém quer problemas nem violência, que sempre
criam sofrimento. O pior aspecto da violência é que ela é sempre
imprevisível. Uma vez que ela foi cometida, mesmo se havia uma boa
motivação ou um bom objetivo em mente, o fato de que o método usado
foi violento trará consequências inesperadas. Isso sempre acontece.
Assim sendo, eu sinto que é uma grande honra falar no nome dele, e eu
gostaria de agradecer à universidade e as pessoas responsáveis pelo
evento que me deram esta oportunidade.
Na antiga tradição hindu, por pelo menos três mil anos houve uma
filosofia sem o conceito de um criador. O janaísmo e o budismo seguem
isto. E nessas tradições sem conceito de um criador, há diferenças no que
diz respeito à existência de uma alma ou um “eu” independente
permanente, ou a não existência de tal entidade permanente e
independente.
Então, por que será que há filosofias tão diferentes? Há tantas disposições
mentais diferentes entre as pessoas. Para algumas delas, a tradições
religiosas teístas são mais efetivas. É como com diferentes remédios: eles
podem ter diferentes ingredientes, mas todos eles têm o objetivo de curar
doenças. Há diferentes doenças que vêm de diferentes idades e condições
físicas; assim sendo, precisamos de uma variedade de diferentes
remédios. Da mesma forma, os remédios para a paz mental também
precisam de variedade. Assim, todas as maiores tradições religiosas têm o
mesmo potencial e o mesmo objetivo. Por isso, elas são muito relevantes
para todos nós, sete bilhões de seres humanos.
Como a Índia é uma nação de múltiplas fés, não se pode dizer que uma
religião é mais elevada que as outras. Em um nível global, o secularismo é
o único caminho que é aceito universalmente. Portanto, estamos agora
tentando criar um currículo que se adapte ao campo educacional secular.
Estamos trabalhando nisso e talvez daqui a um ano o trabalho esteja
pronto. Mas precisamos de mais estudos com cientistas, filósofos,
educadores e assim por diante, o que já estamos fazendo na Índia.
Uma vez que tivermos completado o currículo, talvez lugares como esta
universidade possam implementar um programa experimental. Uma
escola pode oferecer um programa e observar os resultados após alguns
anos. Se houver resultados positivos aparentes, podemos finalizar o
currículo e expandi-lo para dez escolas, cem escolas, e depois chegar ao
nível estatal. Depois do estado, como mais discussões sérias, talvez isso
possa chegar ao nível federal, e então ao nível das Nações Unidas, até que
o mundo inteiro seja encorajado a incluir algum tipo de educação de ética
moral não baseada na educação, mas no secularismo.
Penso que há mais que quinze mil irmãos e irmãs aqui, e se vocês não
sentirem que é necessário olhar seriamente para essas questões, não há
problema. Mas se vocês tiverem algum interesse e quiserem se envolver
mais, então, pensem mais sobre seus próprios valores internos.
Pratiquem-nos primeiro em um nível de conhecimento, de ter uma
simples atenção em relação a esses valores. Depois, busquem
familiarizar-se com esses valores, então, eles se tornarão algo que está
vivo dentro de vocês. Depois, implementem os valores e eles se tornarão
parte de seus cotidianos, e vocês receberão reais benefícios. Portanto,
pensem mais! Obrigado!
Budismo e Islã
Hamid Abdul Qadir, erudito dos meados do século XX, no seu Buda, O
Grande: Sua Vida e Filosofia (Árabe: Budha al-Akbar Hayatoh wa
Falsaftoh), postula que o Profeta Dhu'l-Kifl, significando "o de Kifl",
mencionado duas vezes no Quran (Al-Anbiya 85 eSad 48) como tolerante
e bondoso, se refere a Buda Shakyamuni. Embora a maioria dos eruditos
identifiquem Dhu'l-Kifl como o Profeta Ezekiel, Qadir explica que "Kifl" é
a forma arabizada de Kapila, diminutivo de Kapilavastu. Ele propõe
também que a menção alcorânica da figueira (At-Tin 1-5) se refere
também a Buda, visto que alcançou a iluminação debaixo de uma. Alguns
eruditos aceitam esta teoria e, como suporte a esta posição, salientam que
al-Biruni, o historiador muçulmano persa do século XI da India, se referiu
a Buda como um Profeta. Outros ignoram esta última peça de prova e
explicam que al-Biruni estava apenas querendo dizer que as pessoas na
India consideravam Buda como um profeta.
Vazio e Interdependência
Então, os pontos principais dos ensinamentos de Buda são a visão da
realidade, isto é, da interconectividade de tudo e de todos e
consequentemente o cultivo do amor e compaixão iguais para com todos
os seres. O princípio supremo que une tudo é conhecido como o "vazio",
que está para além de todos os nomes e conceitos. O vazio refere-se ao
fato de que nada existe de um modo impossível ou fantasiado, como
verdadeiramente independente de todas as outras coisas, pois que todos
os seres e coisas surgem interdependentes uns dos outros. Como todos os
seres vivos e o ambiente são interdependentes, devemos ter amor,
interesse e compaixão por todos os outros e ter a responsabilidade de
ajudar ativamente. Para permanecer focalizado nestes dois aspectos,
vazio e compaixão, conhecidos como sabedoria e método, precisamos de
uma concentração perfeita e de uma firme base em auto-disciplina ética.
Buda ensinou muitas técnicas para o treinamento de todas estas áreas.
Ética e Karma
Em especial, Buda enfatizou a conduta de uma vida ética com uma estrita
moral. Disse que tentássemos ajudar os outros e, se isso não fosse
possível, pelo menos que não lhes fizéssemos mal. Explicitou a base da
ética de acordo com os princípios científicos do karma, ou causa e efeito
comportamentais. "Karma" não significa destino, mas se refere aos
impulsos que motivam e acompanham as nossas ações físicas, verbais e
mentais. Os impulsos de agir positiva ou negativamente surgem devido ao
condicionamento que vem de trás e levam-nos a situações nas quais
iremos experienciar um certo nível de felicidade ou de sofrimento. Estas
situações ocorrerão nesta vida ou em vidas futuras.
Renascimento
Tal como em outras religiões indianas, o budismo afirma o renascimento
ou reencarnação. O continuum mental de um indivíduo, com seus
instintos, talentos e assim por diante, vem de vidas passadas e continua
em vidas futuras. Dependendo das nossas ações e das tendências por elas
acumuladas, um indivíduo pode renascer num céu ou num inferno, ou
como um animal, um ser humano, ou qualquer um de uma variedade de
fantasmas ou espíritos. Todos os seres experienciam o renascimento
incontrolável devido à força das suas atitudes perturbadoras, tais como o
apego, a raiva e a ingenuidade, e aos impulsos kármicos, por elas
despoletados, de agir compulsivamente. Se seguirmos os impulsos
negativos que surgem na nossa mente devido a hábitos comportamentais
passados, e se agirmos destrutivamente, experienciaremos sofrimento e
infelicidade como resultado. Se, por outro lado, praticarmos ações
construtivas, experienciaremos felicidade. Assim, a felicidade ou
infelicidade de cada um de nós não é uma recompensa ou uma punição,
mas são criadas pelas nossas anteriores ações de acordo com as leis de
causa e efeito comportamentais.
Tradição Monástica
O budismo tem uma tradição monástica e uma tradição leiga. Há monges
e monjas que mantêm centenas de votos, incluindo o celibato total.
Raspam as suas cabeças, vestem mantos especiais e vivem em
comunidades monásticas. Devotam as suas vidas ao estudo, meditação,
oração e a cerimónias para o benefício da comunidade leiga. As pessoas
leigas, por sua vez, suportam os monásticos oferecendo comida
diretamente aos mosteiros ou aos monges que vão coletar esmolas às
suas casas todas as manhãs .
Igualdade
Embora, na época de Buda, a sociedade indiana, hindu, estivesse
organizada em termos de castas, com alguns grupos de baixo estatuto
sendo até considerados intocáveis, Buda declarou que eram todos iguais
na sua comunidade monástica. Assim, Buda aboliu as diferenças de castas
para os que deixaram a sociedade para viverem em mosteiros e
conventos a fim de devotarem as suas vidas à prática espiritual. A
hierarquia nas instituições monásticas era baseada no respeito por
aqueles que tinham sido ordenados e mantido os votos há mais tempo.
Um jovem ordenado antes de alguém mais velho ficaria sentado à sua
frente nas assembleias de oração, e a comida e o chá ser-lhe-ia servido
primeiro. De acordo com o costume asiático, quando homens e mulheres
se reuniam em assembleias religiosas, sentavam-se separados, com os
homens à frente.
As Guerras Santas no Budismo e no
Islã
Dr. Alexander Berzin
De acordo com a tradição, em 880 a.C., em Andhra, no sul da India, Buda ensinou
o Tantra de Kalachakra a Suchandra, o visitante Rei de Shambhala e ao seu séquito.
O Rei Suchandra levou os ensinamentos para o seu reino nórdico, onde
floresceram a partir dessa altura. Shambhala é um reino humano e não uma pura
terra budista, onde todas as circunstâncias são conducentes à prática de
Kalachakra. Embora uma posição real na terra a possa representar, Sua Santidade
o XIV Dalai Lama explica que Shambhala existe simplesmente como um reino
espiritual. Apesar da literatura tradicional descrever a viagem física até lá, a única
forma no entanto de a alcançar é pela prática intensa da meditação de Kalachakra.
Em 176 a.C., sete gerações de reis após Suchandra, o Rei Manjushri Yashas reuniu
os líderes religiosos de Shambhala, especificamente os sábios brâmanes, a fim de
fazer uma profecia e de lhes prevenir: daqui a oitocentos anos, em 624 d.C., uma
religião não índica surgirá em Meca. Devido a uma falta de unidade entre os povos
dos brâmanes e à negligência do correto seguimento dos preceitos das suas
escrituras védicas, muitos irão aceitar essa religião, no futuro distante, quando os
seus líderes ameaçarem uma invasão. Para evitar esse perigo, Manjushri Yashas
uniu o povo de Shambhala em uma única “casta-vajra” conferindo-lhe o
empoderamento de Kalachakra. Pelo seu ato, o rei tornou-se o Primeiro Kalki – o
Primeiro Possessor da Casta. Ele compôs então O Tantra de Kalachakra Abreviado,
que é a versão presentemente existente do Tantra de Kalachakra.
Os Invasores Não-Índicos
Como a fundação do islamismo data de 622 d.C., dois anos antes da data predita em
Kalachakra, a maioria dos eruditos identifica a religião não-índica com essa fé. As
descrições dessa religião em outras partes dos textos de Kalachakra, como o abate
de gado ao recitar o nome do seu deus, a circuncisão, mulheres veladas e preces
[feitas com a orientação do crente] em direção à sua terra santa, cinco vezes por
dia, reforçam a sua conclusão.
Aqui, o termo sânscrito para não-índico é mleccha (Tib. lalo), significando alguém
que fala numa língua não-sânscrita incompreensível. Tanto os hindus como os
budistas aplicaram esse termo a todos os estrangeiros que invadiram o norte da
India, começando com os macedónios e os gregos na época de Alexandre, o Grande.
O outro termo sânscrito principal usado é tayi, que deriva do termo persa para os
árabes, usado, por exemplo, em referência aos árabes que invadiram o Irã em
meados do século VII d.C..
Maomé viveu entre 570 e 632 d.C. na Arábia. Bagdá, contudo, foi construída somente
em 762 d.C. como a capital do Califado Abássida árabe (750 – 1258 d.C.).
Mani foi um persa do século III que fundou uma religião eclética, maniqueísmo, que tal
como o zoroastrismo, a religião iraniana mais antiga, enfatizava uma batalha entre as
forças do bem e do mal. Dentro do islã, Mani teria sido aceite talvez como um profeta –
embora não seja claro que ele o tivesse alguma vez sido – somente pela herética seita
islâmica maniqueísta, que se encontrava entre alguns oficiais no início da corte
Abássida em Bagdá. Os califas abássidas perseguiram severamente os seus seguidores.
Eruditos budistas do atual Afeganistão e do subcontinente indiano trabalharam em
Bagdá durante a última parte do século VIII d.C., traduzindo textos sânscritos para o
árabe.
Mahdi será um futuro soberano (iman), descendente de Maomé, que irá conduzir os
fiéis a Jerusalem, restaurar a lei e a ordem alcorânica e unir os seguidores do islamismo
num único estado político antes do apocalípse do fim do mundo. Ele é o equivalente
islâmico de um messías. O conceito de Mahdi tornou-se proeminente somente durante
o período inicial Abássida, com três reivindicadores ao título: um califa, um rival em
Meca e um mártir, em cujo nome foi conduzida uma rebelião anti-Abássida. Contudo, o
conceito de Mahdi como um messias não apareceu até ao final do século IX d.C..
A lista dos profetas dos xiítas ismaelitas é a mesma que se encontra em Kalachakra,
apenas menos Mani. Os ismaelitas são a única seita islâmica que considera Mahdi como
um profeta.
A seita xiíta ismaelita era a seita oficial do islamismo seguido em Multan (atualmente
Sindh setentrional, no Paquistão), durante a segunda metade do século X. Multan era
um aliado do Império Fatímida Ismaelita centrado no Egito e que desafiava os
abássidas na supremacia do mundo islâmico.
Desta evidência, podemos postular que a descrição Kalachakra dos invasores não-
índicos foi baseada nos ismaelitas de Multan nos finais do século X d.C., misturada
com alguns aspectos dos muçulmanos maniqueítas dos finais do século VIII. Os
compiladores desta descrição teriam sido muito provavelmente mestres budistas
vivendo sob o regime Shahi hindu, no Afeganistão Oriental e Oddiyana (Swat
Valley, no atual noroeste do Paquistão). Os mosteiros budistas na região de Cabul,
do Afeganistão, tal como Subahar, tinham padrões arquiteturais semelhantes
àqueles da mandala de Kalachakra. Oddiyana foi uma das regiões principais em
que o tantra budista se desenvolveu. Além disso, Oddiyana tinha contato próximo
com Cachemira, onde floresceu o tantra budista e hindu Shaivite. Uma importante
rota de peregrinação budista ligava os dois. Assim, devemos examinar as relações
budisto-muçulmanas no Afeganistão Oriental, Oddiyana, e Cachemira, durante o
período Abássida, para compreendermos o contexto dos seus ensinamentos na
história e guerras santas.
Apesar das negações textuais da chamada para uma efetiva guerra santa, a
implicação aqui que o islã é uma religião cruel, caracterizada pelo ódio, pela
malícia e pelo comportamento destrutivo, pode facilmente ser usada como
evidência para suportar que o budismo é anti-muçulmano. Embora alguns budistas
do passado possam de fato ter tido este preconceito e alguns budistas de hoje
possam, do mesmo modo, manter perspectivas sectárias, podemos extrair uma
conclusão diferente se também refletirmos num dos métodos didáticos do
budismo Mahayana.
Os shahis turcomanos dominaram a região até 870 d.C., perdendo o domínio dela
apenas entre 815 e 819. Durante esses quatro anos, o califa abássida al-Ma'mun
invadiu Cabul e forçou o shah regente a submeter-se a ele e a aceitar o islamismo.
Para manifestar a sua submissão, o shah de Cabul deu ao califa, como oferta, uma
estátua de ouro do Buda, do mosteiro de Subahar. Como um sinal do triunfo do
islão, o califa al-Ma'mun enviou para Meca a enorme estátua, com o seu trono de
prata e coroa engastada de jóias, expondo-a no Kaaba durante dois anos. Ao fazê-
lo, o califa estava demonstrando a sua autoridade para governar todo o mundo
islâmico, após ter vencido o seu irmão numa guerra civil. Contudo, ele não forçou
os budistas de Cabul a converterem-se, nem destruiu os mosteiros. Ele nem sequer
destruiu, como ídolo [que era], a estátua do Buda que o shah de Cabul lhe tinha
oferecido, mas em vez disso enviou-a para Meca como fruto do saque. Após a
retirada do exército abássida para lutar contra movimentos pró-autonomia
noutras partes do seu império, os mosteiros budistas rapidamente se recuperaram.
O período seguinte, em que a região de Cabul ficou sob o regime islâmico, foi
também curto, entre 870 e 879 d.C.. Foi conquistada pelos regentes safárides, de
um estado militar autônomo, recordados pela sua crueldade e destruição de
culturas locais. Os conquistadores enviaram ao califa abássida muitos “ídolos”
budistas como troféus de guerra. Quando os shahis hindus, sucessores dos shahis
turcomanos, retomaram a região, o budismo e os mosteiros recuperaram uma vez
mais o seu anterior esplendor.
Depois desta vitória em Multan, e motivado indubitavelmente pela avidez por mais
território e riqueza, Mahmud impeliu a sua invasão mais para o oriente.
Conquistou o atual Punjab indiano, conhecido naquela época como “Deli”. No
entanto, quando as tropas ghaznávidas empurraram para o norte, de Deli para as
montanhas de Caxemira, perseguindo o remanescente dos shahis hindus, em 1015
ou em 1021, dependendo das fontes que usamos, foram derrotadas supostamente
pelo uso de mantras. Este foi o primeiro ataque em Caxemira tentado por um
exército muçulmano. A descrição Kalachakra das futuras invasões e derrotas das
forças não-índicas em Deli é muito provavelmente, então, uma mescla da ameaça
multanesa aos abássidas e ghaznávidas e da ameaça de Ghaznavid a Caxemira.
Assim, a profecia prediz que as forças destrutivas hostís à prática espiritual – e não
especificamente um exército muçulmano – irão atacar no futuro, e uma “guerra
santa” externa contra elas será necessária. A mensagem implícita é que, se os
métodos pacíficos falharem e tivermos de combater numa guerra santa, a batalha
deve basear-se sempre nos princípios budistas de compaixão e do profundo
apercebimento da realidade. Isto é verdadeiro apesar de que na prática é
extremamente difícil seguir-se esta recomendação treinando-se soldados que não
são bodhisattvas. Contudo, se a guerra for motivada pelos princípios não-índicos
do ódio, da malícia, do ressentimento e do preconceito, as gerações futuras não
verão nenhuma diferença entre as atitudes dos seus antepassados e as das forças
não-índicas. Por conseguinte, adotarão facilmente atitudes não-índicas.
A palavra árabe jihad significa uma luta na qual precisamos tolerar sofrimentos e
dificuldades, tais como a fome e a sede durante o Ramadã, o mês santo do jejum.
Aqueles que se engajam nesta luta são mujahedin. Faz-nos lembrar os
ensinamentos budistas aos bodhisattvas, sobre a paciência, para tolerarem as
dificuldades que surgem durante o caminho à iluminação.
1. Uma jihad militar é uma campanha defensiva contra agressores que tentam prejudicar
o islão. Não é um ataque ofensivo para converter outros pela força ao islão.
2. Uma jihad por recursos envolve o apoio financeiro e material aos pobres e aos que
precisam de ajuda.
3. Uma jihad pelo trabalho é o sustento honesto a nós próprios e à nossa família.
4. Uma jihad pelo estudo é a obtenção do conhecimento.
5. Uma jihad contra nós próprios é a batalha interna para superar os desejos e os
pensamentos contrários aos ensinamentos muçulmanos.
Conclusão
O mesmo pode ser dito sobre os ensinamentos budistas e islâmicos a respeito das
guerras santas. Ambas as religiões assistiram a abusos das suas chamadas para
uma batalha externa, quando forças destrutivas ameaçavam a prática religiosa.
Sem negar nem insistir nesses abusos, podemos obter inspiração focalizando nos
benefícios do empreendimento de uma guerra santa interna em qualquer dos
credos.
O Dalai Lama em Diálogo com
Estudiosos Sufis
O 14º Dalai Lama
Dra. Elahé Omidyar Mir Djalali: Obrigado, diretora Thornton Dill. Suas
palavras são tão desconcertantes que não tenho palavras para responder.
Sua Santidade, reitor Wallace Loh e distinto público, em nome do
Instituto de Patrimônio Cultural Roshan com sua missão “Esclarecimento
por meio da educação”, nos sentimos felizes e privilegiados de poder
contribuir para esse grande evento, “Um encontro de dois oceanos:
diálogo sobre sufismo e budismo”.
Ele diz: “Que a separação despedace o meu coração para que eu coloque a
dor da saudade em palavras, porque quem quer que se encontre longe de
seu lar, de sua origem, certamente buscaria o reencontro com os seus.”
Para os sufis, o motor dessa busca, essa busca pela origem, é o amor. “A
força, o fogo que dá calor à minha voz”, Rumi diz, “é o amor.” E o amor
para os sufis não é um conceito teórico. Sim, eles falam bastante sobre ele
em teoria, mas é a experiência que importa. Eles acreditam que nós temos
que nos permitir experimentar o amor. O conceito de experimentar é
muito importante e é só então que reconhecemos as qualidades
transformativas do amor, por isso Rumi diz que “o amor se mostra na
forma como o coração chora”, portanto ele se mostra ao invés de se
descrever ou de que nós o descrevamos. Esse anseio dá ao buscador a
força para ir em frente e no entanto o anseio em si não pode ser explicado
ou descrito, porque não tem forma.
Rumi diz, “eu falei muito para descrever e desmistificar o amor, mas
quando eu o encontrei, percebi que tinha feito um mal trabalho, porque
ele não pode ser descrito, mas quando experimentado o amor deixará sua
marca em seu coração”. Por isso a tarefa da poesia e música sufi é dar
uma mostra dessa não-forma ou dessa beleza sem forma para aquele que
busca.
Como vínculo altruísta que liga todos os seres, o sufi vive em meio à vida
social. Não há fuga da sociedade em direção à natureza, nem
recolhimento em comunidades enclausuradas. Mesmo que períodos de
isolamento sejam necessários para que o sufi refine o coração espiritual,
ele ou ela raramente abandona a vida social por completo. Esse
compromisso com a sociedade e com a vida comunitária é a marca do
sufismo. Esse é o motivo pelo qual os sufis se organizam em comunidades
ao redor de mestres sufis renomados, mas se recusam a se separar da
sociedade como grupos distintos. Eles vivem como pessoas comuns
dentro de comunidades maiores, urbanas ou rurais. Suas associações
frequentemente se tornam centros comunitários que prestam vários
tipos de serviços à sociedade em geral ao seu redor em forma de comida,
abrigo, assistência espiritual e material, orientação religiosa, terapia,
socialização, educação e entretenimento verdadeiramente instrutivo.
Essa inserção dos sufis na sociedade, esse instinto comunitário, essa face
socialmente engajada marca a conclusão do caminho sufi. O sufi
conquistou e domou o eu inferior mesquinho, o substituiu por uma
individualidade espiritual e superior e utilizou a fonte de amor e
compaixão que nasce da pessoa espiritual para servir todos os seres com
altruísmo.
Essa visita parece ter uma ênfase maior em sabedoria. Havia um líder de
um pequeno grupo em Ítaca, uma pessoa maravilhosa que acreditava que
todas as diferentes tradições, especialmente as diferentes tradições
indianas, eram iguais. Ele achava que todas as partes importantes eram
iguais e com essa crença ele tentava deixar claro a igualdade de todas
essas filosofias, mas ele me disse que achava muito difícil fazer isso. Já
que nós éramos bons amigos, uma vez quando ele reclamou da
dificuldade de reconciliar todas as diferenças e contradições entre as
diferentes filosofias, eu disse para ele que o que ele estava fazendo era
provavelmente um trabalho extra e desnecessário.
Claro que com canto e música todas as tradições têm uma prática em
comum. Nós sabemos por experiência própria que embora as palavras
possam ser iguais ou semelhantes, a forma como as dizemos ou tocamos a
música pode ter diferentes efeitos naqueles que escutam. Essa é outra
similaridade, mas às vezes as pessoas ficam apegadas demais aos
instrumentos e à música e se esquecem do significado verdadeiro. Muitos
monastérios tibetanos adoram rituais, porque eles são uma oportunidade
para usar os instrumentos, mas eles nunca dão atenção suficiente aos
estudos. Nesses casos, é como um mestre tibetano disse uma vez, que “as
pessoas se agarram aos galhos e se esquecem de cuidar das raízes”.
Sua Santidade o Dalai Lama: Então até o número é semelhante. Para ser
sincero, embora os textos falem de 84.000 formas de sofrimento, quando
se chega aos pormenores as apresentações são muito mais gerais com
classificações de 21.000 que pertencem a essa categoria e 21.000 que
pertences àquela [risos].
Dra. Fatemeh Keshavarz: Sua Santidade, você cita poesia e textos curtos
em seus livros. Eu me pergunto se vocês usam poesia para inspiração e
meditação, isso é parte da sua tradição?
Carl Ernst: Eu devo adicionar que há uma tradição entre alguns sufis que
estudaram yoga e perceberam que a repetição de alguns mantras em
sânscrito é muito similar aos nomes árabes do zikr e assim a recitação
dessas sílabas, que de alguma forma nos conecta com o ser interior, abre
novos níveis de percepção.
Dra. Elahé Omidyar Mir Djalali: Sua Santidade, é meu dever agora
encerrar esse encontro. Eles estão me dizendo que está na hora, embora
ainda estejamos sedentos por ouvir mais sobre esse estudo comparativo,
mas nós não queremos cansá-lo. Já que você fez uma longa viagem da
Índia por dezesseis horas, nós não queremos cansá-lo mais e é hora de
encerrar esse evento, se você me permite.
Dra. Elahé Omidyar Mir Djalali: Sua Santidade, eles fazem isso em
particular, eles não abrem para o público pelos mesmos motivos que você
mencionou, que há tantos níveis de entendimento e interpretação do que
é dito que, devido ao medo de ser mal entendido pela maioria, esses
praticantes sérios permanecem em silêncio e só trocam reflexões e ideias
entre si. Rumi e Shams Tabrizi são bons exemplos juntamente com
muitos outros, muitos verdadeiros praticantes não abrem para o público.
Eles dão ensinamentos ao público usando uma linguagem contraditória,
da mesma forma que você mencionou que alguns ensinamentos do Buda
são contraditórios. Os mestres sufis fazem a mesma coisa porque eles
dizem que em um grande público cada um entenderá o que pode, o que
quer e/ou o que conseguem escutar do ensinamento. Então, para evitar
confusão sobre conceitos complexos e difíceis de entender, eles só
conversam entre si... porque chegaram a um ponto em que menos mal-
entendidos podem acontecer.
Sua Santidade o Dalai Lama: Mesmo assim, não é necessário que seja
em público, mas apenas uma seleção de dez ou vinte praticantes que
possam trocar suas experiências profundas e verdadeiras. Seria
imensamente proveitoso para entendermos o valor de diferentes
tradições, o que é muito importante. Agora é o momento em que
precisamos fazer um esforço para promover a harmonia religiosa a fim de
criarmos uma harmonia autêntica. Nós precisamos fazer todo esforço
para desenvolvermos respeito mútuo e compreensão, não vindos de
palavras acadêmicas ou belas apresentações, mas de experiências
espirituais verdadeiras.
Dra. Elahé Omidyar Mir Djalali: O evento de hoje foi histórico, tomara
que seja o primeiro de muitos sob a orientação de Sua Santidade. Com a
esperança de que esse seja apenas o início de um diálogo sincero entre
todas as religiões, nós agradecemos à Sua Santidade por sua honrosa
participação e à Universidade de Maryland e a todos os participantes. Eu
também gostaria de agradecer ao público por estar aqui para se
beneficiar da orientação de Sua Santidade e desfrutar dessa troca
profunda.
O Povo Uigur
O Povo Hui
Migração Hui
O povo hui ocidental tem se mudado não apenas para o Tibete, mas
também em todas as partes de Gansu e Xinjiang como pioneiros da
colonização chinesa. Eles abrem restaurantes e lojas por todas as
estradas, e assim que há um pequeno número deles em qualquer
localidade, eles constroem uma mesquita – geralmente como um local
para encontros sociais e para manter a sua comunidade unida, e não tanto
por zelo religioso. Não apenas os tibetanos, mas também o povo uigur
ressente a imigração hui. Embora o exército chinês han e a sua burocracia
tenham se mudado primeiro, os comerciantes e homens de negócios han,
sem o espírito pioneiro do povo hui, apenas seguiram os passos destes.
Em 1841, o exército Dogra de Caxemira invadiu o Tibete. Após sua derrota, muitos
soldados muçulmanos de Caxemira e de Ladakh que haviam sido aprisionados
decidiram ali ficar. Alguns dos prisioneiros hindús do exército Dogra também
decidiram ficar no Tibete e adotar o islamismo. Eles introduziram o cultivo de
maçãs e damascos no país.
Embora os hui sejam uma das minorias nacionais da China, eles não constituem um
grupo etnicamente homogêneo. São de origem árabe, persa, mongol e da Ásia
Central, e chegaram à China em várias ondas migratórias. A primeira delegação
árabe islâmica chegou, em 651 dC, à China da Dinastia Tang dezanove anos depois
da morte do profeta Maomé, e um ano após a conquista da Pérsia pelos árabes. A
partir desse momento, comerciantes principalmente árabes, como também um
número menor de persas, se estabeleceram ao longo da costa sudeste da China. Em
758, o imperador chinês Tang pediu ao califa abássida de Bagdá que lhe enviasse
um exército de 20.000 soldados para o ajudar a pôr fim à rebelião An Lushan.
Depois disso, os soldados árabes e persas permaneceram na China, fixando-se nas
áreas noroestes de Gansu e Ningxia. Além disso, em 801, os tibetanos reuniram 20
mil mercenários árabes e sogdianos para os ajudarem na guerra contra o reino
Nanzhao, em Yunnan, no sudoeste da China. Embora os tibetanos tenham sofrido
uma derrota, os soldados muçulmanos permaneceram na região. Em 1070 e 1080,
a pedido do imperador chinês Song, do norte, outros 15 mil soldados árabes foram
estabelecer uma zona defensiva no nordeste da China, entre o seu reduzido reino e
o Império de Khitan em expansão.
No entanto, a maior parte dos hui descende dos dois a três milhões de muçulmanos
da Ásia Central que o governante mongol Kubilai (Kublai) Khan levou para a China,
na década de 1270, como reserva militar. Eles ajudaram-no a conquistar o sul da
China em 1279, e em paz se fixaram por toda a China como comerciantes,
trabalhadores agrícolas e artesãos.
Ananda, um dos netos de Kubilai Khan, foi criado por pais adotivos muçulmanos
persas. Em 1285, ele se tornou o Príncipe de Anxi, uma região que abrangia o
conquistado reino Tangut em Gansu, Ningxia e Sichuan. Os tanguts seguiam uma
forma misturada de budismo tibetano e chinês. Juntamente com seu primo Ghazan
Khan, do Ilkhanato, na Pérsia, o Príncipe Ananda converteu-se ao islamismo em
1295. Por conseguinte, o forte exército mongol em Anxi de 150.000 homens e a
maioria dos tanguts também adotaram a fé islâmica. Assim, no final da dinastia
Yuan mongol, em 1368, os hui eram a maior minoria da China.
Como reação à protecção Ming aos hui, a dinastia seguinte que governou a China, a
dinastia Qing manchu (1644 – 1912), começou a perseguir os muçulmanos da
China. Essa perseguição também se estendeu aos muçulmanos uigures, no
Turquistão Oriental. Entre 1648 e 1878, mais de doze milhões de muçulmanos hui
e uigures foram mortos em dez revoltas fracassadas contra a opressão Qing.
Porém, os tibetanos, que também foram perseguidos pelas forças chinesas han e
manchu [da dinastia] Qing, mantiveram boas relações com os hui. O V Dalai Lama,
por exemplo, visitou em 1652 líderes islâmicos hui, em Yinchuan, capital da atual
Ningxia, quando ía a caminho do Tribunal Imperial Manchu, em Pequim, onde
debateram questões filosóficas e religiosas.
No final do século XIX, houve duas vagas migratórias de hui para o Turquistão
Ocidental sob o domínio russo. O primeiro grupo de Gansu e Shanxi chegou em
1878, depois de uma revolta fracassada contra o governo Manchu. A segunda vaga
migratória partiu em 1881 do vale do rio Ili, no extremo oeste do Turquistão
Oriental. Os russos haviam ocupado a região em 1871, mas depois do seu retorno
para a China com o Tratado de São Petersburgo, em 1881, foi dada à população
local a possibilidade de escolha da nacionalidade russa ou chinesa. Estas duas
vagas migratórias hui fixaram-se principalmente no vale do rio Chu, no
Quirguistão, próximo de Bishkek, chamando-se a si próprios de Dungans.
Os Hui Ocidentais e Orientais
Introdução e História
Antes de mais devo mencionar que não sou um médico, assim por favour não me
façam perguntas sobre as vossas várias doenças. Eu estudei um pouco sobre a
medicina tibetana e há anos que tomo medicina tibetana, por isso só posso explicar
algo sobre a teoria.
A medicina tibetana tem uma longa história. Havia uma tradição nativa de
medicina no Tibete. Com a formação do Império Tibetano no século VII da era
moderna, os imperadores convidaram doutores da India e da China, assim como
tambem das áreas persas e romanas da Ásia Central. Mais tarde, lá para o fim do
século VIII, convidaram mais doutores destas regiões. Também naquela época, os
ensinamentos do Buda sobre medicina foram trazidos da India ao Tibete. Isto
coincidiu com a chegada de Padmasambhava e dos ensinamentos Nyingma.
Naquela altura, havia um grande debate sobre que tipo de budismo e que tipo de
medicina seria adotado no Tibete. Os sistemas budistas indianos venceram em
ambas as contagens por razões sobre as quais não vamos falar aqui. Havia naquele
tempo um grande médico tibetano que combinou aspectos da medicina chinesa e
grega, que tinham estado presentes na Ásia Central, nos ensinamentos budistas
indianos básicos sobre medicina. Assim como muitos textos budistas foram
escondidos naquela época devido a dificuldades, também foram escondidos estes
textos médicos. Foram redescobertos no século XII e então foram ligeiramente
revisados e modernizados. É desta revisão que deriva o atual sistema médico
tibetano.
Classificações de doenças
A segunda classe é das doenças que surgem de outras circunstâncias. Isto inclui os
desequilíbrios no corpo que surgem devido a várias circunstâncias: o ambiente,
poluição, germes e várias outras circunstâncias. São o tipo usual de doenças e,
assim, este é o foco principal da medicina tibetana. Um exemplo seria a asma que
surge mais tarde na vida devido a viver-se numa cidade poluida e a experienciar-se
muito stress.
Vento diz respeito principalmente ao vento no corpo. Há ventos que lidam com a
parte superior do corpo: a energia que entra e sai da parte superior do corpo tal
como quando engolimos, falamos e assim por diante. E ventos que lidam com a
parte de baixo do corpo: a energia que entra e sai da parte de baixo do corpo, tal
como reter ou libertar as fezes, a menstruação e o orgasmo. Um aspecto da energia
lida com a circulação do corpo e a pressão arterial. Também temos energia física
relacionada ao movimento e vários tipos de energia associados com o coração.
Bílis lida com certos aspectos da digestão, como a bílis do fígado. Lida com os
aspectos diferentes da pigmentação, como quando ficamos queimados pelo sol,
com a hemoglobina, as células de sangue vermelhas, e com coisas relacionadas aos
olhos.
As doenças são vistas como desequilíbrios destes três humores, que poderia
significar que um deles é demasiado forte ou que um deles é demasiado fraco.
Podem haver disturbios simples e podem haver disturbios de vários sistemas
simultaneamente. A medicina tibetana é um sistema holístico, tratando o corpo
inteiro, visto que todos os sistemas do corpo estão inter-relacionados.
Em geral, as doenças podiam ser causadas pela dieta: comer alimentos que
discordam conosco ou demasiado gordurosos. Podem surgir devido a problemas
com o nosso comportamento, como sair quando está frio sem roupa suficiente.
Sentarmo-nos lá fora no chão frio ou numa rocha molhada fria é causa certa para
problemas de rins. As doenças podem ser causadas por pequenos organismos,
bactérias ou micróbios. Aqui, é semelhante ao que a medicina ocidental diz. No
entanto, o que a medicina tibetana diz além disto é que podemos examinar as
causas das doenças a um nível mais profundo. Penso que provavelmente a maneira
mais interessante e mais útil de analisar a medicina tibetana em termos do nosso
modo de pensar é a idéia de que a causa subjacente básica do desequilíbrio físico é
o desequilíbrio emocional e mental.
Embora não seja totalmente correto, também podemos aplicar isto em relação a
outras doenças. Frequentemente com o cancer, descobrimos que as pessoas têm
atitudes muito auto-destrutivas. Depois da minha tia ter morrido, o meu tio ficou
sem vontade nenhuma de continuar a viver. Seu estilo de vida começou a tornar-se
auto-destrutivo e muito depressa desenvolveu cancer em que o corpo se auto-
destruiu. Morreu dentro de um ano. Podemos pensar que o estado de mente está
refletido na auto-destruição do cancer. Isto obviamente não é verdade com cada
caso de cancer mas dá-nos algo interessante para pensar.
Com a SIDA, o corpo não tem nenhuma capacidade de lutar contra as coisas.
Algumas pessoas com SIDA não tinham capacidade de lutar contra o vício às
drogas ou ao sexo promíscuo. Tal como não conseguem se controlar com os seus
desejos, o corpo não consegue se defender. Este é o aspecto da medicina tibetana
que eu acho mais estimulante – além do uso prático da medicina.
Tratamento
Dieta
Se tivermos um disturbio do vento, entao certos alimentos serão muito
prejudiciais. Por exemplo a cafeína, como no café, agrava os disturbios do vento.
Estamos muito nervosos e nossa pressão arterial é alta. Lentilhas, como feijões,
produzem vento – a flatulência é uma indicação disto. Para disturbios da bílis, ovos
e alimentos gordurosos ou fritos são muito ruins. Para disturbios da fleuma,
evitamos produtos lácteos e arroz, visto que produzem muito muco. Também
podemos ver isto no ocidente. Outros tipos de alimento podem ser muito úteis
para estes disturbios. Por exemplo, beber água quente é muito bom para a fleuma
porque elimina os mucos.
Modificação do Comportamento
No que diz respeito à modificação do comportamento, se tivermos um disturbio do
vento é importante mantermo-nos quentinhos e estar com amigos afetuosos. O riso
é ótimo para disturbios do vento. Se estivermos muito perturbados e nervosos, o
riso libera-o. Olhar para fora para uma vista de longa distância é muito útil. E
podemos evitar coisas como estarmos à frente de um ventilador ou na rua num
vento forte. Frequentemente as pessoas descobrem que máquinas muito
barulhentas, como máquinas elétricas de cortar a grama ou condicionadores de ar,
as farão ainda mais nervosas. Para disturbios da bílis, é muito útil mantermo-nos
frios/frescos e fora do sol. Para a fleuma, exercício e mantermo-nos quentinhos são
muito bons. Isso porá mais flexibilidade nas articulações e ajudará com a
eliminação dos mucos.
Medicinas
Tomar remédios é o tratamento principal na medicina tibetana. A medicina é feita
principalmente de ervas. Inclui também várias substâncias minerais etc. Cada
medicina pode ter cinquenta ou mais ingredientes misturados. Geralmente são
misturados e pulverizados em forma de pílula. Estas pílulas devem ser mastigadas
e tomadas com água quente. Se não as mastigarmos e apenas as engolirmos,
provavelmente apenas atravessarão por nós sem se dissolverem. São muito duras.
Os tibetanos têm dentes muito fortes. Se as acharmos difíceis de mastigar,
podemos sempre envolvê-las em algo como um lenço e esmagá-las com um
martelo.
Uma das grandes vantagens da medicina tibetana é que em quase todos os casos –
embora hajam exceções – não existem efeitos secundários. No entanto, é um pouco
como a medicina homeopática, não no sentido de ser micro-doses mas no sentido
que a medicina vai primeiro agregar a doença junto de modo que fique
concentrada. Depois destrui-la-á. Por causa disto, em muitos casos, embora não
sempre, a doença torna-se um pouco pior no início. Isso é simplesmente um sinal
que o remédio está extraindo a doença para poder livrar-se dela. Temos de ter
paciência e atravessar o estágio inicial.
Massagem e Acupuntura
Na medicina tibetana, não se dá muita ênfase à massagem. Existe algum tipo de
aplicação de óleos medicinais para determinadas doenças, mas é aplicado sem se
fazer um tipo manipulativo de massage. A medicina tibetana não manipula a aura,
como no sistema japonês de Reiki. Há uma forma de acupuntura, que é diferente da
acupuntura chinesa. Os pontos são diferentes e as descrições dos canais em que as
energias se movem através do corpo são diferentes. Os tipos de agulhas usadas
também são diferentes. Os tibetanos usam agulhas de várias substâncias. A agulha
de ouro é uma das mais comuns. É posta na parte macia do topo da cabeça para
estimular os vários nervos. Isto é usado para coisas como a epilepsia.
Queimar
Moxa é a aplicação de calor ou de queimaduras em partes diferentes do corpo.
Estas são feitas nos mesmos pontos nos quais se faria a acupuntura. Em lugares
frios de alta altitude moxa é mais eficaz; em lugares mais quentes de baixa altitude
as agulhas são mais eficazes nos mesmos pontos. Porém, para doenças específicas,
a moxabustão é recomendada.
Tive outra doença. Às vezes quando se anda muito nas montanhas, para cima e
para baixo, um tendão começa a friccionar contra o osso no joelho. É muito
doloroso. Fui a um doutor ocidental que disse, “Use uma bandagem elástica sempre
que você andar”. Muito obrigado. Tentei acupuncture chinesa e não ajudou nada.
Finalmente, regressei à India e fui ao meu doutor tibetano. Fêz uma queimadura
diretamente no joelho e noutro lugar na parte superior da perna e fiquei
completamente curado. Assim, pela minha experiência pessoal, acho a moxa
queimar um tipo de tratamento muito eficaz.
Um tipo mais forçoso de queimadura é feito com uma vara de ferro ou de prata
feita vermelha-quente nos carvões. Eu vi este método usado para problemas com a
coluna onde há algo de errado com um disco ou a coluna está fora de alinhamento.
Queimam-se em pontos específicos ao lado da coluna e isso causa um choque tão
incrível ao corpo que o corpo automaticamente se corrige a si próprio. Mais uma
vez, parece muito medieval, mas resulta.
Treino
Astrologia
Cirurgia
A medicina tibetana nas épocas antigas tinha uma forma de cirurgia. Temos
gravuras nos textos de instrumentos cirúrgicos. Mas uma vez um médico executou
uma cirurgia no coração de uma rainha sem sucesso. Depois disso, as operações e a
cirurgia foram proibidas. A medicina tibetana pode tratar muitas coisas com ervas
que no oeste requereriam uma operação, como a apendicite. Se tivermos um
acidente de carro a medicina tibetana pode ajudar a ajustar os ossos, há medicina
muito boa para choque e para acelerar o processo curativo, mas se precisarmos
realmente de qualquer tipo de operação é melhor irmos a médicos ocidentais.
O fato é que não devemos colocar todas as nossas esperanças apenas num sistema
médico. Vários sistemas médicos à volta do mundo são úteis para tipos de coisas
específicos. Há determinadas coisas que a medicina tibetana nunca conseguiu
tratar, como a varíola ou a tuberculose. Mas tem curas excelentes para outras
coisas que nós não temos tratamentos no oeste, como a artrite e a hepatite.
Determinados – não todos – tipos de cancer respondem muito bem à medicina
tibetana. Mesmo se não curar o cancer, pode fazer reduzir a dor e melhorar a
qualidade da vida de uma pessoa que está para morrer.
Adaptações Modernas
Não devemos esperar milagres ao tomar medicina tibetana. Também temos que
levar o karma em consideração. Podemos ter duas pessoas exatamente com a
mesma doença tomando a mesma medicina e dará resultado com uma mas não
com a outra. Há muitos fatores envolvidos. Um é a ligação kármica, vinda de vidas
passadas, com um tipo específico de tratamento médico e um médico específico. Se
não tivermos acumulado as forças kármicas para sermos curados de uma doença,
não importa que tipo de medicina ou que tipo de médico temos, nada nos irá
ajudar. Temos de ser realísticos quando abordamos qualquer sistema médico,
incluindo o tibetano. Também precisamos tentar ter uma atitude positiva, visto
que isso afeta certamente o sistema imunitário. Mas não devemos esperar milagres
e depois levar o médico ao tribunal se a medicina não trabalhar como queriamos.
Shambhala
Introdução
Teosofia
Não está claro até que ponto Blavatsky realmente estudou os textos de
Kalachakra diretamente. O primeiro material ocidental sobre o tópico foi
um artigo de 1833 entitulado “Note on the Origins of the Kalachakra and
Adi-Buddha Systems” [Observações sobre as Origens dos Sistemas de
Kalachakra e de Adi-Buddha] pelo pioneiro erudito húngaro Alexander
Csomo de Körös (Körösi Csoma Sandor). De Körös compilou o primeiro
dicionário e gramática tibetana numa língua ocidental, o inglês, em
1834.O Tibetan-Russian Dictionary and Grammar [Dicionário e Gramática
Tibetano-Russa], de Jakov Schmidt depressa seguiu em 1839. A maioria
do conhecimento de Blavatsky sobre o Kalachakra, contudo, veio do
capítulo intitulado “The Kalachakra System” [O Sistema de Kalachakra]
em Buddhism in Tibet [Budismo no Tibete] (1863), por Emil Schlagintweit,
como evidenciado pelo empréstimo de muitas passagens desse livro nas
suas obras. Seguindo o seu princípio de tradução, no entanto, ela rendeu
Shambhala em termos de conceitos semelhantes ao hinduísmo e
ocultismo.
Noutro lugar, ela escreveu que quando Lemúria se afundou, parte do seu
povo sobreviveu em Atlântida, enquanto que parte dos seus eleitos
migrou para a ilha sagrada de “Shamballah” no deserto de Gobi. No
entanto, nem a literatura de Kalachakra nem The Vishnu Purana,
mencionam Atlântida, Lemúria, Maitreya ou Sosiosh. Contudo, a
associação de Shambhala com eles continuou entre os seguidores de
Blavatsky.
Ossendowski e Agharti
Saint-Yves d' Alveidre pode ter, de fato, retirado vários elementos da sua
história da discussão de Kalachakra sobre Shambhala. O número 1800
aparece repetidamente como um motivo na literatura de Kalachakra e os
textos clássicos relatam que os líderes de Shambhala possuíam o
conhecimento para construir armas para derrotar as forças do invasor.
Não obstante, o autor francês claramente escreveu um trabalho de ficção.
Assim, a principal associação que Roerich fez com Shambhala era como
um lugar de paz. Em Shambhala: In Search of a New Era [Shambhala: Em
Busca de Uma Nova Era] (1930), Roerich descreveu Shambhala como uma
cidade sagrada a norte da Índia. O seu regente revela os ensinamentos do
Buda Maitreya para a paz universal. Cada tradição descreve Shambhala
de acordo com a sua própria compreensão e, assim, a lenda do Santo Gral,
por exemplo, é uma versão da estória de Shambhala. Constantino o
Grande, o Chinggis Khan (Genghis Khan) [Gêngis Khan], e Prester John
encontram-se entre aqueles que receberam mensagens dos ensinamentos
do “Misterioso Local Espiritual e Irmandade no coração da Ásia”.
Jocelyn Godwin, em Arktos, The Polar Myth in Science, Symbolism and Nazi
Survival [Arktos, o Mito Polar na Ciência, no Simbolismo e na Sobrevivência
Nazista] (1993), identificou o poder de Agni com vril. Vril é o poder
psicocinético protegido pelos habitantes de Thule, que os nazistas
tentaram obter para ajudar a fortalecer a sua super-raça ariana. Roerich,
contudo, nunca fez esta associação.
Com Dorjiev, Shambhala foi associada com a Rússia e mais tarde também
com o comunismo, enquanto que com Ossendowski, Agharti foi associada
com as forças anti-semíticas e anticomunistas do Barão alemão von
Ungern-Sternberg. Desde a Revolução Comunista bavariana de 1918, a
Sociedade de Thule e o Hitler eram fervorosamente anticomunistas.
Antes disto, ambos já eram antisemíticos. Assim, em seus olhos,
Shambhala era uma força escura e negativa que suportava a “ciência
Judaica-Marxista-Liberal” totalmente materialística. Com esta forte
atitude anticomunista, Hitler assinou o Pacto Anti-Commintern com o
Japão em Novembro de 1936, em que ambos os países declararam a sua
hostilidade mútua em relação à propagação internacional do comunismo.
Ambos concordaram que não iriam assinar quaisquer tratados políticos
com a União Soviética. Não obstante, para evitar uma guerra européia em
duas frontes, Hitler assinou o Pacto Nazi-Soviético com Stalin em Agosto
de 1939. Contudo, ele quebrou este pacto em Junho de 1941, quando as
forças nazistas invadiram a União Soviética.
A Conexão Calmuque
Com base nas expedições nazistas à Antártica Nazi e nos relatos acima, o
ocultista alemão Ernst Zündel escreveu vários livros na década de 1970,
incluindo UFO’s: Nazi Secret Weapons? [OVNIs: Armas Secretas Nazistas?],
afirmando que os nazistas mantinham uma base secreta numa área de
lagos de água morna que haviam encontrado na Antártica. Lá, eles teriam
escondido a sua arma secreta, OVNIs. Zündel é também conhecido como o
proponente mais ardoroso sobre a teoria de que o holocausto na
realidade nunca teria acontecido.
Introdução
O segundo ingrediente era a ideia de uma terra oca. No fim do século XVII,
o astrónomo britânico Sir Edmund Halley sugeriu pela primeira vez que a
terra era oca, consistindo em quatro esferas concêntricas. A teoria da
terra oca excitou as imaginações de muitas pessoas, especialmente com a
publicação, em 1864, da Viagem ao Centro da Terra do novelista francês
Júlio Verne.
A Suástica
Nos finais do século XIX, Guido von List adotou a suástica como emblema
para o movimento Neo-Pagão da Alemanha. No entanto, os alemães não
usaram a palavra sânscrita suástica, mas em vez disso chamaram-na
“Hakenkreutz”, significando “cruz enganchada”. Derrotaria e substituiria
a cruz, assim como o neo-paganismo derrotaria e substituiria o
cristianismo.
O Ahnenerbe
Em Fest der weissen Schleier: Eine Forscherfahrt durch Tibet nach Lhasa,
der heiligen Stadt des Gottkönigtums (Festival dos Cachecóis Brancos de
Gaze: Uma Expedição de Investigaçãoatravés do Tibete a Lhasa, a Cidade
Santa da Terro do Rei-Deus)(1950), Ernst Schäfer descreveu as suas
experiências sobre a expedição. Durante as festividades, relatou ele, o
Oráculo de Nechung avisou que, embora os alemães tivessem trazido
presentes e palavras doces, o Tibete deveria ter cuidado: o líder da
Alemanha é como um dragão. Tsarong, o anterior líder pró-japonês das
forças armadas tibetanas, tentou suavizar a predição. Disse que o Regente
tinha ouvido muito mais do Oráculo, mas que ele próprio não estava
autorizado a divulgar os detalhes. O Regente reza diariamente para que
não haja guerra entre os ingleses e os alemães, dado que isto também
viria a ter consequências terríveis para o Tibete. Ambos os países devem
compreender que todas as boas pessoas devem rezar o mesmo. Durante o
resto da sua estada em Lhasa, Schäfer reuniu-se frequentemente com o
Regente e teve com ele um bom relacionamento.
Budismo e Ciência
Dr. Alexander Berzin
O budismo não requer isso. Podemos ver isso na definição budista de "o
que existe". O que existe é definido como "aquilo que pode ser
conhecido". Se não puder ser conhecido então não existe; por exemplo,
chifres de coelho, cabelos de tartaruga ou lábios de galinha. Podemos
imaginar lábios humanos numa galinha; podemos imaginar um desenho
de lábios numa galinha; mas nunca poderemos ver lábios de galinha
numa galinha porque tal coisa não existe. Não existe porque não pode ser
conhecida.
Isto implica que tudo o que existe pode ser conhecido. É possível, para as
nossas mentes – nomeadamente, a nossa atividade mental da consciência
de fenômenos -, tudo abranger. Há passagens nas escrituras que dizem
que o absoluto está para além da mente e para além das palavras. Em
primeiro lugar, não gosto de traduzir o termo como "absoluto", pois tem a
conotação de que está para além de nós, como se fosse algo que estivesse
lá em cima no céu. Em vez disso, prefiro traduzí-lo como "o fato mais
profundo sobre as coisas". O fato mais profundo sobre as coisas existe.
Está para além da mente e para além de conceitos e palavras no sentido
em que está para além da nossa maneira usual de perceber as coisas. A
linguagem e a ideia implicam que as coisas existam nas categorias de
preto e branco. Boa pessoa, má pessoa, idiota, gênio – a implicação de
usar linguagem é que as coisas realmente existem nestas categorias bem
definidas, independentes: "Esta pessoa é um idiota. Não consegue fazer
nada corretamente". "Esta é uma grande pessoa". Perceber a realidade é
ver que as coisas não existem nestas maneiras fantasiadas e impossíveis,
nas categorias de preto e branco. As coisas são mais abertas e dinâmicas.
Lá por alguém não ser capaz de fazer algo agora, isso não significa que
seja exclusivamente um idiota. A pessoa pode ser muitas outras coisas –
um amigo, um pai, e assim por diante.
Assim, quando dizemos que o fato mais profundo sobre as coisas é que
elas existem de uma maneira que está para além da mente e para além
das palavras, estamos referindo ao fato de que as coisas não existem nas
formas em que os conceitos e a linguagem implicam que elas existam. As
nossas mentes são capazes de abranger isso.
Não é que as nossas mentes não consigam abranger certas coisas e por
isso devemos dar um salto de fé para acreditar nelas. O budismo nunca
exige que tenhamos fé cega. Pelo contrário, Buda disse: "não acredite no
que eu digo apenas devido ao respeito por mim, mas teste-o você mesmo,
como comprando ouro". Isto é verdade a todos os níveis.
Parece haver pelo menos duas razões principais para o número crescente
de organizações de Dharma. A primeira está relacionada com a pressão
que os professores tibetanos têm no angariamento de dinheiro para a
reconstrução dos seus mosteiros e para a alimentação dos seus monges. A
outra razão é o mal-entendido sobre a devoção ao guru pelos estudantes
ocidentais. Pensam que devem considerar o seu professor literalmente
como um Buda e, assim, quando o seu professor morre, acham que devem
procurar o seu tulku, mesmo se o professor for apenas um Geshe. Se não o
fizerem, pensam que isso significa que não acreditaram que seu professor
era na verdade um Buda. Tendo um tulku novo, sentem então que devem
continuar a organização de Dharma do tulku anterior, por forma a que o
novo tulku a conduza um dia.