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ELIANA MARQUES ZANATA
ANTONIO FRANCISCO MARQUES
VERA LÚCIA MESSIAS FIALHO CAPELLINI
(organizadores)
2018
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Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho”
Realização
Departamento de Educação
PPG Docência para Educação Básica
Faculdade de Ciências – Unesp – Campus Bauru
Av. Eng. Edmundo Carrijo Coube, 14-01
Bauru – SP - CEP 17.033-360 - Tel. (14) 3103-6081 FAX (14) 3103-6095
Reitor
Sandro Roberto Valentini
Vice- reitor
Sergio Roberto Nobre
Pró-reitor de Planejamento Estratégico e Gestão
Leonardo Theodoro Bull
Pró-Reitora de Extensão Universitária
Cleopatra da Silva Planeta
Pró-Reitora de Graduação
Gladis Massini-Cagliari
Pró-reitor de Pós-graduação
João Lima Sant'Anna Neto
Pró-Reitora de Pesquisa
Carlos Frederico de Oliveira Graeff
Chefe de Gabinete
Carlos Eduardo Vergani
Secretário Geral
Arnaldo Cortina
Chefe da Assessoria de Comunicação e Imprensa
Fábio Mazzitelli de Almeida
Diretor da Faculdade de Ciências de Bauru
Jair Lopes Júnior
Vice-Diretor da Faculdade de Ciências de Bauru
Vera Lucia Messias Fialho Capellini
Chefe do Departamento de Educação
Maria José da Silva Fernandes
Vice-Chefe do Departamento de Educação
Antonio Francisco Marques
Conselho Editorial
Ana Maria Andrade Caldeira (Faculdade de Ciências - UNESP Bauru – São Paulo); Luciana Ponce Bellido Giaraldeli (Universidade Federal de
Goiania – Goiás); Relma Urel Carbone Carneiro (Faculdade de Ciências e Letras - UNESP Araraquara – São Paulo); Maria José da Silva
Fernandes (Faculdade de Ciências - UNESP Bauru – São Paulo)
Autores
Sylvia hHelena Souza da Silva Batista; Ana Maria Lombardi Daibem; Luis Paulo Leopoldo Mercado; Ana Maria Klein; Neiza de Lourdes Frederico
Fumes; Maria Quitéria da Silva; Eliane Cristina Moraes de Lima; Soraya Dayanna Guimarães Santos.
135 p.
Inclui bibliografia
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO 9
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Apresentação
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publicação da pesquisa, enfatiza que nos tempos atuais, a verdade está sendo
relativizada e enfraquecida pelo poder das TDIC, através do uso das redes sociais.
Em se tratando da Educação em Direitos Humanos - EDH, Ana Maria Klein
objetiva em seu capítulo apresentar e discutir as principais orientações relacionadas
à EDH e propor a transversalidade e o trabalho com projetos como estratégia
coerente e viável para o desenvolvimento da EDH nas escolas.
Finalizando esta síntese de estudos apresentados no Congresso Brasileiro
de Educação , não menos instigante, e objeto de discussões, críticas e defesas no
campo educacional, a Base Nacional Comum Curricular - BNCC é abordada por
Vandeí Pinto da Silva com o proposito de promover reflexões na perspectiva do
questionamento sobre uma educação com qualidade social, trazendo um olhar
crítico frente velhos desafios e propondo novas possibilidades.
Com discussões profundas e específicas em sua singularidade todos os
textos contemplaram a temática proposta “Educação e Formação Humana: práxis e
transformação social” com ênfase na Educação Básica. Acreditamos que a leitura
proporcionará aos congressistas um retorno às discussões que foram realizadas no
evento e, àqueles que não tiveram a oportunidade de lá estar conosco, a
possibilidade de se apropriar das ideias debatidas.
Desejamos bons momentos de leitura e reflexão.
Organizadores
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EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO HUMANA: PRÁXIS E
TRANSFORMAÇÃO SOCIAL
Sylvia Helena Souza da Silva Batista
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responsabilidade, pois sou neta de D Consuelo que foi, por anos, única professora
de uma cidade chamada Peixe Boi, interior do Estado do Pará e como somente tinha
a quarta série era até esta série que todos estudavam. Mãe de 21 filhos, tendo
criado 17, ensinou-nos a lutar com alegria, esperança e força. Sou filha do seu filho
mais velho: Francisco que casado com Clarice (uma sergipana que a tudo
abandonou para casar e seguir seu amor), construiu uma família de seis filhos
(Júnior, Consuelo, Mônica, Sylvia, Paulo e Simone) e teve na escola sua grande
âncora: a educação é a nossa herança para vocês, nos prometeram sempre!!! Devo
a Deus a possibilidade da vida! Devo a esta grande familia (em quantidade, mas
principalmente em partilha espiritual e amorosa) muito do que hoje sou como
pessoa. Honra e responsabilidade, pois quando estive pela primeira vez em sala de
aula na condição de aprendiz da docência (no estágio curricular da Licenciatura
Plena em Psicologia, UFPA, 1984), simultaneamente começava atuar na Secretaria
de Estado de Educação em Belém, na Divisão da Educação Pré-Escolar, no
Departamento de Ensino de Primeiro Grau, e fui percebendo que as teias da
educação eram vigorosas, potentes, encantadoras, mas exigiam permanente
cuidado para que pudessem envolver a todos e todas.
Alegria e gratidão, pelo encontro com amigos, pela oportunidade singular de
partilhar este momento com tantos educadores e educadoras, pela chance de poder
mais uma vez, afirmar que nestes itinerários a educação e a formação de
professores foram se desenhando como meus espaços, também, de constituição
como pessoa. Devo à escola pública as lições de cidadania, de luta por direitos, de
encantamento com o ensinar, da alegria de aprender! Alegria e gratidão de
reabastecer as energias e os sonhos por um pais justo, equânime, inclusivo, espaço
e território para experiências formativas que busquem o diálogo com o trabalho e
com as políticas púbicas.
E navegando pelas águas da honra, da responsabilidade, da alegria e
gratidão, empresto as palavras de Érico Verissimo em Solo de Clarineta (1978, p.
44-45):
[...] tem-me animado até hoje a idéia de que o menos que um escritor
pode fazer, numa época de atrocidades e injustiças como a nossa, é
acender a sua lâmpada, trazer luz sobre a realidade de seu mundo,
evitando que sobre ele caia a escuridão, propícia aos ladrões, aos
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assassinos e aos tiranos. Sim, segurar a lâmpada, a despeito da
náusea e do horror. Se não tivermos uma lâmpada elétrica,
acendamos nosso toco de vela ou, em último caso, risquemos
fósforos repetidamente, como um sinal de que não desertamos
nosso posto.
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Como nos dizem Larossa e Kohan (2004):
Assim, aprendi junto com “tanta gente, diferente gente” que se posicionar por
uma educação como prática de liberdade implica reconhecer a que projeto
societário disponho meu estar no mundo: é um permanente indagar-se, como
Clarice Lispector , “ser feliz é para conseguir o quê?” Talvez seja uma fugaz
felicidade clandestina (principalmente em tempos tão nublados), mas que se
manifesta e se refaz na educação, que causa deslocamento, que move mulheres e
homens:
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Portanto, não se trata de algo relativo a apenas uma etapa ou fase
do desenvolvimento humano, mas sim como algo que percorre,
atravessa e constitui a história dos homens como seres sociais,
políticos e culturais” (BATISTA, 2001, p.134)
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parcerias construídas. Compreender a formação como construção de autoria implica
reconhecer o enfoque da autoformação, a partir do qual podemos compreender que
formar e formar-se no encontro, na discussão coletiva, na elaboração própria, na
busca contínua do conhecimento, na experiência de sermos pessoas em interação,
delineiam um modo de apropriar-se da própria história. (PINEAU, 2005)
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E ainda, nos alerta para os riscos das redes serem tomadas como espaços
do homogêneo”, em que a contradição e o debate perdem espaço e sentido. As
redes para serem possibilidades de novas conexões, como nos propõe Mauss,
precisam abandonar a crença da discordância como um mal, reconhecendo na
diferença um eixo estruturante. As redes que operam na incerteza e na esperança
na perspectiva da autonomia, da produção de opções abertas, da Ação política.
(BAUMAN, 2016)
E o interjogo da incerteza e a esperança anuncia um tempo de transição:
Silva (2000, p.181) ao fazer a resenha do livro Educação como Prática de Liberdade,
de Paulo Freire, coloca que perspectiva de Freire
Bauman afirma que o que mantém a vida é a esperança, pois afirma que : “o
mundo dos seres humanos é um reino de possibibilidades-probabilidades, não de
determinações e necessidades”. (p. 61) E como nos ensinou Paulo Freire (1992,
p.9):
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Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é
passível de fazer sentido. Eu não: quero uma verdade inventada.
Meu querer pelas flores nasceu pelas mãos sujas de terra da mãe.
Lembro-me que ela vivia a pelejar flores no nosso quintal quando eu
era pequena, Mas só de vez em quando uma daquelas mudas
vingava. Era quase estéril o nosso chão. Mesmo assim, a mãe não
desistia.
Quando, por um generoso milagre da natureza, uma margarida
pegava, ela se esmerava em protegê-la com todos os cuidados que
era capaz de arquitetar. Regava a planta de amanhã e à tarde, fazia
pequenas cercas de gravetos em torno dela e, às vezes, colocava
casca de ovo ou de batata bem perto da raiz. (PAULINO, 2005, p.53)
REFERÊNCIAS
BAUMAN,Z; MAURO, E. Babel - entre a incerteza e a esperança. 3 ed. São Paulo: Zahar,
2016.
FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
FREIRE, P. Nós podemos reinventar o mundo. (entrevista). Rev. Nova Escola. Novembro
de 1993.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 58 Ed. [1968]. São Paulo: Paz e Terra, 2001.
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LAROSSA e KOHAN. Prefácio. In: RANCIÈRE, J. O mestre ignorante. Cinco lições sobre a
emancipação intelectual. Trad. Lílian do Valle. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. (Série:
Educação. Experiência e sentido).
LISPECTOR, C. A hora da estrela. 23. Ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1995.
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A CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SEUS REFLEXOS NA EDUCAÇÃO E NA
SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA
Introdução
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em qualquer área do conhecimento. A pesquisa tem por objetivo encontrar soluções
para os problemas propostos e basicamente exige a elaboração de um problema,
justificativa de escolha, quadro teórico (conhecimento da temática), descrição de
objetivos a serem alcançados e metodologias aplicadas no desenvolvimento da
pesquisa.
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pesquisadores; social, oferecendo condições de melhoria do bem-estar e qualidade
de vida; educacional, subsidiando a construção do currículo e ferramentas
pedagógicas.
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recursos que facilitam a coleta de dados, o acesso a públicos diversificados e
análise de dados; diminui o tempo de acesso dos participantes aos documentos de
pesquisa; materiais na forma de arquivos ampliada por métodos de armazenamento
e recuperação digital (digitalização).
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clicado pelos usuários, proporcionando acesso apenas as informações que o usuário
quer ver.
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de informações, do aumento exponencial do número de periódicos e de artigos
científicos que são inseridos na literatura.
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científico para ser reconhecido e possa subsidiar outras investigações, necessita
circular.
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seguidas por autores e editores, enfocando a qualidade da produção científica,
visando a correção dos erros da literatura. (PHITAN e OLIVEIRA, 2016)
Documentos nacionais e internacionais regulam a integridade na pesquisas
internacionais trazem posicionamentos de instituições de fomento e sociedades de
pesquisa que propõem ações preventivas e pedagógicas relacionadas à cultura da
integridade na pesquisa. Indicam as condutas inadequadas e traçam diretrizes para
práticas com integridade científica. Preveem o respeito às normas éticas de
publicação científica com o objetivo de evitar fraudes, tais como a falsificação ou
fabricação de dados, a duplicidade na publicação e plágio. (PHITAN e OLIVEIRA,
2016). Segundo La Fare et al (2014, p. 253) “fazem parte, dessas diretrizes, critérios
para a coautoria, citação de referências desnecessárias ao texto (escutam-se boatos
de que algumas revistas privilegiam artigos que tenham citado suas publicações,
como forma de aumentar seu fator de impacto), o cuidado com fontes primárias e
secundárias, publicação redundante e segmentada etc”.
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procedimentos para a admissão e a permanência de periódicos científicos – Educa -
Fundação Carlos Chagas (FCC, 2015); National Scientific Foundation. Semiannual
Report of the Congress (NSF, 1992); Documentation for Non-Medical Research
Ethics Board Researcgers – full board and Delegated Board Review (CANADA
OFFICE OF Research Ethics, 2013); Guidelines for Research Ethics in the Social
Sciences, law and the Humanities (NESH, 2006); Guia de Recomendações de
Políticas Responsáveis da Academia Brasileira de Ciências (ABC, 2013).
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periódico científico exerça seu papel de orientar a comunidade científica sobre boas
práticas editoriais e prevenir más condutas no processo de publicação, tais como
casos de plágio, fraude,, falsificação de dados, duplicidade e segmentação de
resultados, autoria indevida, conflitos de interesses, etc.
O rigor da avaliação dos artigos busca assegurar que os periódicos publiquem
estudos de qualidade, que sejam lidos e usados em outros trabalhos, elevando o
fator de impacto da publicação, o número de citações que os artigos de um periódico
recebe em um determinado período. Editores assumem posição privilegiada no
processo de promoção de práticas adequadas de publicação, evitando a publicação
dos dados que podem, quando plagiados, falsificados ou fabricados, causar sérios
danos à sociedade. (BOSCH et al, 2012).
Alguns mecanismos para manter a integridade da construção coletiva da
Ciência como patrimônio coletivo é a retratação, o cancelamento e a manifestação
de preocupação com artigos científicos, geralmente aplicados pelos editores de
periódicos em situações de condutas inadequadas, como: manipulação de imagens,
não submissão da pesquisa ao Comitê de Ética, Termos de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE) ignorados no estudo, fabricação e falsificação de dados
(manipulação intencional de equipamentos, processos e materiais), utilização dos
mesmos dados para gerar diversos trabalhos, omissão de dados ou resultados “não
interessantes”, plágio de dados, ideias ou textos, atribuição indevida de autoria,
ocultação de conflitos de interesse, publicação do mesmo artigo em periódicos
diferentes.
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A manifestação de preocupação sobre um artigo científico é um recursos que
pode ser utilizado pelo editor para registrar que há dúvidas sobre um artigo
publicado em um periódico, mas ainda não há evidências conclusivas suficientes
para uma retratação ou outra medida a tomar. Deve ser utilizada sempre que há
aspectos em dúvida na conduta ou integridade do trabalho. (LINS, 2014).
O Plágio na Pesquisa
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O plágio se caracteriza com a apropriação ou expropriação de direitos
intelectuais. O termo “plágio” vem do latim pagiarius, um abdutor de plagiare ou seja,
“roubar”. Uma das práticas desonestas ou fraudes na Ciência mais presentes é o
plágio, que é a cópia do trabalho de outra pessoa - violações da propriedade
intelectual de outros cientistas, além do autoplágio, variação do plágio, definido
como a postura que “consiste na apresentação total ou parcial de textos já
publicados pelo mesmo autor, sem as devidas referências aos trabalhos anteriores”
(CNPq, 2011, p. 3).
Segundo Pinto (2000), o plágio é o ato pelo qual um individuo faz crer aos
outros, mesmo que por omissão, que um determinado trabalho intelectual é de sua
autoria, assinando-o com seu nome, sem declarar explicitamente que porção ou
porções são pertencentes a determinado autor, por meio de uma referencia,
quando, na verdade, é copia de algum outro anterior. Para a Fapesp (2011), o plágio
é a utilização de ideias ou formulações verbais, orais ou escritas, de outrem sem
dar-lhe por elas, expressa e claramente, o devido crédito, de modo a gerar
razoavelmente a percepção de que sejam ideias ou formulações de autoria própria.
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Quando um autoplágio é detectado num manuscrito submetido à publicação,
os editores podem solicitar que o autor reescreva trechos repetidos, se a reciclagem
for considerada insignificante ou justificada. Se o reuso for extenso e sugerir que a
contribuição do artigo não é nova, o caminho será a rejeição do manuscrito,
comunicando ao autor as razões da medida. Se o problema for encontrado em
artigos já publicados, os editores devem considerar a possibilidade de publicar uma
correção ou de fazer a retratação do artigo. Quando a cópia for extensa,
comprometer a originalidade do artigo e/ou infringir direitos autorais será necessário
a retratação.
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Uma das soluções encontradas para o combate ao plagio é a utilização das
TDIC através do uso de softwares para detecção de plágio, como Anti-Plagiarism,
AntiPlagiarist – ACNP Software, Aprobo, Canexus, CheckForPlagiarism.net,
Compilatio, CopioNic, Copy Spider, Copycatch, Crosscheck, Déjà Vu, DOC Cop,
Document Source Analysis (DSA), DupliChecker, Ephorus, Essay Have, Etblast,
EVE-2, Farejador de Plágio, Ferret, Glatt Self-Detection Test, Integriguard,
iThenticate, Jplag, MOSS, PaperRater, Plag Tracker, Plag.es, PlagAware, Plagiarism
Advice, Plagiarism Checker, Plagiarism Detect, Plagiarism Detection, Plagiarism
Finder, Plagiarism Software, Plagiarism Stoppers, Plagiarism.org,
Plagiarism.org.plagiarism, Plagiarisma Online, Plagiarism-Detect, Plagiserve.com,
Plagium, Plagius, PlagScan, Quetex.com, Safe Assign, Salid Seo Tools, Search
Engine Reports, SeeSources, Small Seo Tools, TBLAST, Turnitin, Urkund, Viper,
WCopyfind, Wordcheck. Yap.
Considerações Finais
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indivíduos atingindo também os processos e produtos da pesquisa, como a literatura
científica.
REFERENCIAS
33
of alleged scientific misconduct. ÖeAWI, 31 jan. 2006. Disponível em:
http://www.oeawi.at/downloads/Richtlinien_zur_Untersuchung_von_Vorwuerfeb_wiss
enschaftlichen_Fehlverhaltens_e.pdf Acesso em 10 abr 2015.
CASTELLS, M.. A sociedade em rede. 10 ed. São Paulo: Paz e Terra, 2007.
34
COMAS, R.; RAMIRES, S.; GALLARDO, J. M. Programas de detección de plagio
acadêmico: conocimiento y uso por parte del profesorado de eso y consejos para su
utilización. Um estúdio de caso de investigación-acción. Edutec. Revista Electrônica
de Tecnologia Educativa, 49. 2014 Disponível em:
http://edutec.rediris.es/revelec2/revelec49/n49_comas-urbina-gallardo.html. Acesso
em 10 abr 2015.
FANG, F. C.; STEEN, R. G.; CASADEVALL, A. Misconduct accounts for the majority
of retracted scientific publications. PNAS, 109, 42, p. 17.028-33, 2012.
FEIJÓ, A. G.; CRIPPA, A. Integridade na pesquisa com animais. In: PITHAN, Livia
H.; MILTON, L. (orgs). Integridade na pesquisa e propriedade intelectual na
universidade. Porto Alegre: Edipucrs, 2016, p. 39-59.
35
HIGGINS, K.. Por´truth: a guide for the perplexed. Nature, 540, 9, 1 dez. 2016.
Disponível em: http://nature.com/news/post-truth-a-guide-for-the-perplexed-1.21054
Acesso em 10 out 2017.
NATIONAL Commitee for Research Ethics on the Social Sciences and The
Humanities in Norway (NESH). Guidelines for research ethics in the social
sicences, law and the humanities, 2006. Disponível em:
https://graduateschool.nd.edu/assets/21765/guidelinesresearchethicsinthesocialscien
ceslawhumanities.pdf Acesso em 10 set 2017.
ORANSKY, I.; MARCUS, A. Fake news invades science and science journalism as
well as politics. STAT News, 30 Dec. 2016. Disponível em:
https://www.statnews.com/2016/12/30/fake-news-science Acesso em: 10 out 2017.
36
Integridade na pesquisa e propriedade intelectual na universidade. Porto
Alegre: Ediopucrs, 2016, p. 147-164.
THURMAN, N. Making “The Daily Me”: Technology, economics and habit in the
mainstream assimilation of personalized news. Journalism, 12, p. 395-415, 2011.
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A escola para todos e as condições de aprendizagem:
políticas e práticas
Ana Maria Lombardi Daibem
Reflexões iniciais
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Neste VI Congresso Brasileiro de Educação que destaca em seu eixo
temático a “Formação Humana”, peço-lhes licença para deixar registrada a seguinte
reflexão: a opção pela educação não constitui apenas uma escolha de ordem
profissional de preparação para a subsistência no mundo do trabalho, mas consiste
numa opção de vida a serviço de uma causa, ou seja, das razões que dão sentido a
existência. Nessa perspectiva recordamos CAMUS quando vemos “(...) muitas
pessoas morrerem porque julgam que a vida não é digna de ser vivida (...) outras,
paradoxalmente sendo mortas por ideias ou ilusões que lhe dão uma razão para
viver – razões para viver são excelentes razões para morrer. Concluo, portanto que
o sentido da vida é a mais urgente das questões”. ( in ALVES, 1984, p.20)
Segundo Nilson Machado: “Cada projeto de vida tende a caracterizar-se como
a realização de uma vocação, de um apelo, de um chamamento vindo, a um tempo,
de dentro e de fora, representando o mais harmonioso encontro entre as aspirações
individuais e os interesses coletivos.” (2001, p.27)
Articular interesses individuais e interesses coletivos requer muito bom senso
de todos nós, que poderá nos conduzir ao consenso que se constrói a partir dos
dissensos com muito diálogo, fruto da inquietação daqueles que buscam
incansavelmente, a verdade com honestidade e coragem.
Nessas reflexões iniciais lhes trago Juan Carlos Tedesco (2004) que em sua
obra “ O novo pacto educativo” trata da ‘Ausência de sentido” afirmando que a
socialização atual está enfraquecida com a perda de ideais, a ausência de utopia, a
falta de sentido, a perda de finalidades, que faz desaparecer a promessa social ou
política de um futuro melhor. Ficamos reféns de condutas de curto prazo com temas
tais como por exemplo: mercado financeiro... desempenho empresarial...
competitividade...
Nesse contexto nós educadores corremos o risco de atuar sem pontos de
referencia, quando clássicas e indispensáveis perguntas ficam sem respostas tais
como: Por quê? Para quê? Para onde?
Para a educação esse quadro é dramático! Além da ausência de sentido “A
transmissão é considerada conservadora e a transformação destruidora.”
(TEDESCO, 2004, p.43).
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Falta identidade e esta urge ser reconstruída. O imobilismo é fortalecido, a
competitividade é estimulada, ao invés de avançarmos para superar a exclusão com
uma mensagem socializadora na qual cada um encontre seu lugar.
Na opção pela escola pública reside a essência da escola para todos, desde
que trabalhada pelo educador progressista a ela compromissado. Sua atuação deve
“(...) favorecer de modo planejado, racional, a emergência do sentido da vida através
do trabalho material ou não material. O trabalho aliado ao conhecimento e á
solidariedade ainda é a base da boa pedagogia.” (VALE, 2002, p.27)
Segundo Misael Ferreira do Vale, a escola pública: “Combatida por muitos,
criticada por professores, alunos e pais, vilipendiada pelos ‘privatistas’ de plantão
que se aproveitam do descaso generalizado do poder público em relação ao ensino
público, mal administrada por profissionais sem compromisso com a educação
básica e superior, considerada ‘terra de ninguém’, a escola pública, da Educação
Infantil `a Universidade, resiste `as ações de forças poderosas que, articuladas aos
grupos hegemônicos internacionais, querem impor modelos externos `a opção
histórica brasileira de escola mantida pelo poder público Municipal, Estadual e
Federal.” (VALE, 2002, p.21)
Segundo Tedesco:
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completo e não um instrumento para a economia. A aquisição de
conhecimentos e competências deve ser acompanhada da educação
do caráter, da abertura cultural e do despertar da responsabilidade
social. (TEDESCO, 2004, p.51)
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Como trabalhar a Educação e as competências na Escola Pública se
as atuais políticas educacionais e governamentais só enxergam o
espaço escolar como atividade pedagógica? Embora o
desenvolvimento das competências seja aspecto bastante importante
na formação dos educadores, esta visão não pode ser exclusiva. A
escola também é cidadela política. Creio que o nosso maior desafio
atual como educadores seja inverter o foco de atenção do ensino por
competências para centrarmos as luzes sobre a finalidade da vida e
do ser humano no planeta. As competências seriam meios de
realizarmos nosso projeto de cidadania nacional e global. Talvez
assim pudéssemos participar de uma humanidade mais civilizada,
pois, o que nos adiantará a competência em um mundo destruído
pela ambição de poucos? (ROSSI, 2002, p.123).
Talvez já conheçam o que passo a relatar, mas como costuma afirmar nossa
inesquecível companheira de departamento Professora Maria da Glória Minguili, se
não conhecem precisam saber e se já sabem é preciso recordar para não esquecer
jamais. Trata-se de trecho de um discurso proferido por Antônio Carlos Caruso
Ronca em 1997, à época reitor da PUC/SP. Este reproduz mensagem encontrada
após a segunda guerra mundial, num campo de concentração nazista, deixada aos
professores por autor desconhecido: “Prezado Professor: Sou sobrevivente de um
campo de concentração. Meus olhos viram o que nenhum homem deveria ver.
Câmaras de gás construídas por engenheiros formados. Crianças envenenadas por
médicos diplomados. Recém-nascidos mortos por enfermeiras treinadas. Mulheres e
bebês fuzilados e queimados, por graduados de colégios e universidades. Assim,
tenho minhas suspeitas sobre Educação. Meu pedido é: ajudem seus alunos a
tornarem-se mais humanos. Seus esforços nunca deverão produzir monstros
treinados ou psicopatas hábeis. Ler , escrever e saber aritmética só são importantes
se fizerem nossas crianças mais humanas”.
Sobre a questão da humanização CHAVES (In: PINHO, 2008, p.52) assim
conceitua:
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luta democrática por uma sociedade que queremos “(...) economicamente justa,
politicamente democrática, culturalmente plural e socialmente fraterna, condições
básicas para o re-encontro do ser humano com sua humanidade”. (DAIBEM, 1997,
p.14-15)
Políticas e Práticas
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da diversidade de problemas que comprometem o bom desempenho das escolas
públicas.
Dentre os programas de formação contínua de professores da educação
básica cito o denominado PEC – Programa de Educação Continuada que se realizou
em convenio com a Secretaria Estadual de Educação do Estado de São Paulo nos
anos 1996/7 e 8 para professores da educação básica de escolas públicas. Destaco
nesse caso a participação de professores universitários e pós-graduandos das mais
diversas áreas de conhecimento, interagindo com o coletivo das escolas públicas
por meio da metodologia ação-reflexão-ação, vivenciando os cinco passos da
pedagogia histórico crítica. Com plena liberdade optamos por concepção e
metodologia de ensino que entendemos compromissada com a escola pública de
qualidade para todos.
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Construção de 10 polos de educação de jovens e adultos que passaram a
oferecer ambiente apropriado e digno para aqueles cuja educação foi negada na
infância e juventude.
Assessoria especializada para formação contínua em educação especial e
implantação de 27 salas de recurso para atender alunos especiais de todas as
modalidades de ensino; recuperando para atuar na rede pública municipal em torno
de 70 professores concursados em Educação Especial , mantidos pelo poder público
e que a 30 anos atuavam em instituições filantrópicas conveniadas, ou seja, não
prestavam serviços na rede pública.
Implantação de polos de informática em 16 escolas de ensino fundamental,
no Departamento de Educação de Jovens e Adultos, assim como no Napem (Núcleo
de Aperfeiçoamento da Educação Municipal – espaço criado `a época para
concentrar as ações de formação) com formação contínua e monitoria especializada
a serviço dos professores e alunos.
Sofremos muito com a falta de recursos para a educação infantil nos tempos
do FUNDEF, mas quando faltavam 1 ano e oito meses para concluir nossa
administração, passamos a receber o FUNDEB que nos permitiu primeiramente
ampliar o padrão salarial de todos os professores da rede municipal assim como
iniciar um amplo programa de construções e reformas das escolas de educação
infantil.
As ações apresentadas são alguns exemplos de políticas públicas que
visaram a escola de qualidade para todos, com a certeza de que muitas outras
pessoas aqui poderiam vir relatar muito mais.
O importante é deixar dito que é possível fazer acontecer projetos sonhados,
quando temos um coletivo compromissado com finalidades e valores, consciente
das condições existentes e das que precisam ser geradas.
Cabe lembrar segundo Misael Ferreira do Vale que projeto significa “(...)
capacidade humana de não aceitar a realidade como determinada e imutável, em
contrapartida, estabelecer alvos e metas que transformem o contexto numa
realidade mais adequada aos fins e desejos humanos”.(VALE, 1995,p.3)
Considerações Finais
46
Segundo Leonardo Boff:
Imperioso é...
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nosso interior com os desejos, ideais e recursos que nos permitam,
quando chegar o momento propício – o kairós – apresentar
realidades mais humanas, mais justas e fraternas. (BERGOGLIO,
2013, p.147).
Referências
ALVES, R. Conversas com quem gosta de ensinar. São Paulo: Cortez, 1984
(Coleção Polêmicas de nosso tempo).
BOFF, L. O bem comum foi enviado ao limbo. Jornal do Sintaema, ano 27, n.817
(2015) 4.
LUBICH, C. A paz não foi derrotada. Revista Cidade Nova, ano XLVI, n. 7 (2004) 3.
MACHADO, N.J. Educação: projetos e valores. 3.ed. São Paulo: Escrituras Editora,
2001. (Coleção Ensaios Transversais)
48
TEDESCO, J. C. O. Novo Pacto Educativo – educação, competitividade e
cidadania na sociedade moderna. São Paulo: Ática, 2004.
VALE, M.J. Projeto Pedagógico como projeto coletivo. In: CIRCUITO PROGRAD,
3, 1995,São Paulo. Anais... O projeto de seu curso está sendo construído por você?
São Paulo: Pró-Reitoria de Graduação, UNESP,1995.
49
EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS, TRANSVERSALIDADE E PROJETOS
1
Professora do Departamento de Educação da UNESP/São Jose do Rio Preto. Docente do Programa de Pós-
graduação em Ensino e Processos Formativos. Consultora UNESCO em Educação em Direitos Humanos foi
membro da Comissão Relatora que elaborou as Diretrizes Nacionais para EDH.
50
Mas de que tipo de educação falamos? A EDH tal qual proposta pelo PNEDH
e ratificada pelas Diretrizes é um processo multidimensional que visa a formação de
seres humanos críticos, cidadãos conscientes de seu papel, abertos à convivência e
à valorização das diversidades humanas, aptos a enxergarem os direitos humanos
como modo de orientação da vida social e pessoal, comprometidos com o respeito,
com a promoção e com a luta por novos direitos. Trata-se de uma educação
comprometida com a emancipação das pessoas e com a construção de sujeitos de
direitos, portanto, almeja-se uma dimensão transformadora da sociedade, com
cidadãos capazes de enxergar no outro alguém tão humano quanto si próprio.
A formação desejada pressupõe muito mais do que conteúdos específicos, é
necessária a organização das atividades pedagógicas de modo a viabilizar a
reflexão, a possibilidade de escuta de diferentes visões de mundo, o despertar da
empatia pelo outro (com todas as suas diferenças). Neste sentido, há que se buscar
maneiras de organização dos conteúdos e metodologias que favoreçam a
participação ativa e reflexiva dos/das estudantes.
O presente capitulo tem por objetivo apresentar as principais orientações
relacionadas à EDH e propor a transversalidade e o trabalho com projetos como
estratégia coerente e viável para o desenvolvimento da EDH nas escolas.
51
b) afirmação de valores, atitudes e práticas sociais que expressem a
cultura dos direitos humanos em todos os espaços da sociedade;
c) formação de uma consciência cidadã capaz de se fazer presente
em níveis cognitivo, social, ético e político;
d) desenvolvimento de processos metodológicos participativos e de
construção coletiva, utilizando linguagens e materiais didáticos
contextualizados;
e) fortalecimento de práticas individuais e sociais que gerem ações e
instrumentos em favor da promoção, da proteção e da defesa dos
direitos humanos, bem como da reparação das violações (BRASIL,
2006, p. 25).
52
Educação Superior poderá ocorrer das seguintes formas: I - pela
transversalidade, por meio de temas relacionados aos Direitos
Humanos e tratados interdisciplinarmente; II - como um conteúdo
específico de uma das disciplinas já existentes no currículo escolar;
III - de maneira mista, ou seja, combinando transversalidade e
disciplinaridade. (BRASIL, 2012, p.2).
Interdisciplinaridade e transversalidade
53
Os conceitos de disciplinar, pluridisciplinar, transdisciplinar e interdisciplinar
dizem respeito ao conhecimento e a maneira como ele está organizado no currículo.
Não se trata apenas de uma organização de conteúdos, adotar uma ou outra
concepção implica na divisão do tempo escolar, na escolha metodológica, na
organização do espaço da escola e da sala de aula, nas atividades e avaliações que
serão propostas aos estudantes. Adotamos as definições propostas pelas Diretrizes
Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica (BRASIL, 2013, p. 28),
documento segundo o qual a pluridisciplinaridade estuda um objeto específico de
uma disciplina pelo ângulo de várias outras, mas seu foco está na disciplina
específica a qual o objeto se relaciona. A transdisciplinaridade ultrapassa os limites
da disciplina, busca a unidade do conhecimento, a articulação de diferentes
dimensões. A interdisciplinaridade pressupõe a articulação de duas ou mais
disciplinas, esta forma de organização curricular possibilita o trabalho com temas
transversais.
A transversalidade é uma forma de organização do trabalho pedagógico, ou
seja, não tem uma dimensão epistemológica como os conceitos que trazem em sua
nomenclatura o sufixo disciplinar. Por meio da transversalidade os temas são
integrados às disciplinas, perpassando por elas.
Yus (1998) discute a necessidade dos temas transversais nas sociedades
contemporâneas. Segundo o autor muitos destes temas surgiram de preocupações
governamentais que entenderam como uma exigência social que se levasse para a
educação ações destinadas a enfrentar problemas em determinadas áreas como
saúde, meio-ambiente, ética, dentre outras. Tais temas não surgiram
simultaneamente uma vez que se articulam com realidades específicas de uma
época ou de um local. No Brasil, os temas transversais chegam exatamente pelas
mãos do governo que por meio dos Parâmetros Curriculares Nacionais propõe o
trabalho com: pluralidade cultural, ética, meio ambiente, saúde, orientação sexual
(BRASIL, 1997). Estes não são os únicos temas transversais possíveis, estão
contextualizados em necessidades e problemáticas da década em que foram
lançados. Duas décadas depois, novos temas podem e devem ser acrescentados a
esta relação, dentre eles incluem-se os Direitos Humanos.
54
Ainda que os temas possam variar de sociedade para sociedade e que novos
temas passem a ser incorporados ao currículo, há características comuns a todos
eles. Segundo Yus (op. cit, p.39), todos os temas transversais:
55
mundo atual. As novas circunstâncias nos obrigam a criar novos modos de vida e
isso implica autonomia moral e criatividade. A dimensão dos valores relacionados à
EDH pode nos ajudar a aprender a viver de forma dialógica, seguindo, às vezes, um
caminho já posto, e outras, utilizando uma bússola para encontrar o melhor caminho.
São princípios éticos essenciais para guiar as pessoas em contextos novos, em que
ainda não se estabeleceram ou consolidaram regras morais.
Outro desafio refere-se a uma das características centrais da
transversalidade, a relação que se estabelece entre aprender conhecimentos
teoricamente sistematizados (aprender sobre a realidade) e as questões da vida real
(aprender na realidade e da realidade). Não se trata de criarmos novas disciplinas
escolares que se destinam apenas à transmissão de informações sobre determinado
tema, nem mesmo de realizarmos palestras para “esclarecer” a comunidade. Temas
transversais relacionam-se à vida cotidiana da comunidade, à vida das pessoas e
aos seus interesses.
A problematização da realidade é fundamental à EDH, pois os Direitos
Humanos não são abstrações ou apenas um conjunto de normas, eles tratam de
direitos que deveriam fazer parte da vida cotidiana de todos. Assim, olhar para o
mundo com a lente dos direitos humanos possibilita perceber sua violação,
reconhecer iniciativas voltadas à sua promoção e desenvolver ações criativas,
capazes de transformar a realidade.
A transversalidade, ao trazer a realidade como pauta de reflexão e mote para
a aprendizagem, pressupõe a articulação de diferentes conhecimentos. A
complexidade da vida e de suas questões nos impõem a necessidade de lançarmos
mão de diferentes conhecimentos e competências para compreendermos e
analisarmos tais temas. Por isso, os temas transversais devem aproximar a vida das
pessoas do currículo formal da escola, ou seja, eles constituem uma oportunidade
de desenvolvermos conteúdos de diferentes disciplinas a partir da discussão de um
tema relevante socialmente. Daí decorre a sua relação com a interdisciplinaridade.
Direitos Humanos necessitam da interdisciplinaridade para a sua análise,
compreensão e promoção. Assim, ao introduzi-los transversalmente nos currículos
escolares, a discussão sobre os Direitos Humanos nos impõe a necessidade de
lançar mão de diferentes conhecimentos e competências para compreendermos e
56
analisarmos tais temáticas. Conhecimentos relacionados à história, geografia,
sociologia, filosofia, ciências da natureza, artes, matemática, língua materna e outros
são necessários para compreendermos o sentido e a extensão da conquista
histórica dos direitos, para a dimensionarmos a amplitude e a complexidade de
princípios como dignidade, democracia, liberdade, igualdade e solidariedade. Sem a
articulação entre os conhecimentos historicamente construídos pela humanidade, os
Direitos Humanos podem ser reduzidos a uma lista de 30 artigos que integram a
Declaração universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948), destituídos de história,
contexto e significado humano, social e pessoal.
A aprendizagem a partir de temas cotidianos, problematizados sob as lentes
dos Direitos Humanos, é capaz de dotar de sentido aquilo que os estudantes
aprendem. Tais temas nos confrontam com dilemas éticos, uma vez que
problematizam a realidade e possibilitam que, situações de violações de direitos,
talvez invisíveis até então, se tornem visíveis e passíveis de reflexão, discussão,
posicionamento e ação. Torna-se possível problematizar preconceitos,
discriminações, desigualdades, injustiças, enfim formas de desrespeito à dignidade
humana. Com isso, espera-se que os estudantes construam uma visão de mundo
crítica e cidadã e sejam capazes de compreender a realidade e, desejavelmente,
atuar no sentido de transformá-la.
Coloca-se, então, uma questão: como concretizar tais princípios e objetivos
nas salas de aulas?
57
ação projetada. A primeira relaciona-se à antecipação de uma ação, à pretensão de
fazer algo transformador que se concretizará no futuro; a segunda implica na
indeterminação e possibilidades do futuro - se o futuro já está determinado não há
projeto possível, da mesma forma que onde existem apenas dúvidas não há base
para a construção de um projeto – o projetar consiste na fixação de metas que
podem ser atingidas. A terceira característica relaciona-se às ações e ao sujeito
(individual ou coletivo) que as projeta. Não podemos ter projetos pelos outros. Dessa
forma, projetos referem-se a “antecipação de uma ação que busca uma meta em um
futuro não determinado cuja realização depende, efetivamente, de seus agentes”
(MACHADO, op.cit. p.7). Entendemos que, assim concebidos, os projetos emanam
das ações dos próprios sujeitos que se percebem, enquanto seres capazes de dar
forma ou de transformar uma situação.
A definição de Machado transcende a dimensão individual de projetos ao
trazer a possibilidade de sujeitos coletivos atuarem com vistas a metas comuns.
Aproximando essa ideia do universo escolar, talvez possamos tomar os projetos
temáticos, a realização de eventos, os trabalhos em grupo, dentre tantas outras
atividades que envolvem a coletividade, como exemplos de projetos com metas
comuns.
O uso dos projetos como uma metodologia de ensino tem sua origem no
trabalho de William Kilpatrick, seguidor das ideias de Dewey, ele utiliza a expressão
“método de projetos” pela primeira vez em 1919, ao defender a utilização destes
como método didático. Esta proposta constituiu uma nova perspectiva que atribuiu
papel ativo àquele que aprende e ao conhecimento atribuiu-se um caráter
contextualizado na realidade dos estudantes.
Ao utilizarmos projetos como metodologia de ensino há algumas etapas
básicas comuns a maioria dos projetos:
1ª Definição do tema.
2ª Problematização do tema.
3ª Planejamento das ações para responder aos problemas levantados.
4ª Organização e divisão de tarefas para a busca de informações e coleta de
dados nas fontes de pesquisa.
5ª Tratamento e análise dos dados.
58
6ª Elaboração do relatório final.
7ª Socialização do projeto.
8ª Avaliação da aprendizagem pelo professor e pelos estudantes envolvendo
conteúdos factuais, conceituais, procedimentais e atitudinais dos
participantes.
Cada etapa envolve diferentes ações e procedimentos, assim a extensão
temporal de cada uma pode variar entre um dia e semanas.
Uma característica central dos projetos é a participação dos estudantes em
todas as etapas do processo. Desde a escolha da temática do projeto, passando
pela sua problematização e suas fases iniciais necessitam ser estabelecidas e
criadas coletivamente por aqueles que estarão envolvidos em seu desenvolvimento.
Os projetos não podem ser criados/idealizados somente pela equipe de
coordenação, gestão ou mesmo pelos educadores, uma vez que o projeto deve
contemplar a vida, a realidade e os interesses dos/as estudantes. Esse é o motivo
pelo qual não é possível que o projeto seja feito por outros; é necessário que seja
criado de maneira cooperativa e coletiva.
Aproximando esta metodologia dos Direitos Humanos, o passo inicial pode se
dar com a apresentação da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU,
1948) e a discussão dos artigos a partir da realidade dos estudantes. Outras
possibilidades são a discussão de uma noticia, de um filme, de uma letra de música
ou ainda de algum acontecimento do cotidiano escolar que possibilitem a relação
com os DH. Esta discussão inicial deve ser planejada intencionalmente pelo docente
para que se transcenda a dimensão do senso comum e novos conhecimentos façam
parte da problematização. Convém destacar que o desconhecimento do tema
inviabiliza a formulação de questões significativas e complexas, afinal como ter
dúvidas ou questionamentos sobre algo que não se conhece? Assim, informações
adicionais e diferentes pontos de vista sobre o tema devem constituir esta etapa a
fim de que os estudantes consigam formular suas dúvidas e questões a cerca do
tema.
Desde o inicio a interdisciplinaridade está presente no projeto, compete ao
professor selecionar os conteúdos de cada disciplina que podem contribuir para a
problematização e desenvolvimento do projeto. Por exemplo, em relação à primeira
59
etapa, se a opção for iniciar pela apresentação da Declaração Universal dos Direitos
Humanos (ONU, 1948) há possibilidades de trazer conteúdos relacionados à história
e à geografia ao contextualizar este documento no pós-guerra. Além disso, seus
artigos remetem aos princípios da Revolução Francesa (liberdade, igualdade,
solidariedade) e trazem a democracia como sistema imprescindível aos DH. Os
conteúdos de língua portuguesa e matemática são instrumentos para a
compreensão de textos e dados sobre os DH. As artes abordam os DH por meio de
outras linguagens. Enfim, cada professor a partir do conhecimento específico de
suas disciplinas terá condições de estabelecer as conexões entre o tema e os
conteúdos que deve ministrar.
Para que estas conexões sejam estabelecidas é necessário o planejamento
docente integrando as aulas de suas disciplinas ao desenvolvimento do projeto.
Simultaneamente, as tarefas relacionadas à pesquisa devem ser planejadas em
conjunto com os estudantes.
O registro das atividades pode ser realizado individualmente por meio de
portfolios nos quais cada estudante seleciona e registra aquilo que considera mais
significativo para a sua aprendizagem. São instrumentos subjetivos que abrem
possibilidade para cada estudante registrar seu próprio percurso no processo de
aprendizagem, a partir de critérios estabelecidos por eles. Neste sentido são
instrumentos únicos que traduzem a singularidade de cada sujeito.
O produto final, resultado do esforço coletivo do grupo classe e/ou dos
subgrupos e estabelecido no inicio do projeto, pode ser um relatório escrito, um
filme, uma peça de teatro, um painel com fotografias, enfim, há diferentes linguagens
que podem ser utilizadas para a socialização do trabalho realizado. Todas elas
envolvem planejamento, definição de objetivos, divisão de tarefas.
A avaliação não se restringe à aferição dos conteúdos disciplinares
abordados. Trata-se de um processo contínuo que avalia cada ação visando
adequar o projeto aos objetivos estabelecidos tendo como foco a aprendizagem dos
estudantes. A avaliação pode abranger componentes de autoavaliações individuais
e/ou coletivas, análise de desempenho, de resultados e de aprendizado dos
estudantes.
60
No que concerne à dimensão axiológica, os valores estão presentes o tempo
todo no cotidiano escolar, na postura docente, nas relações interpessoais, nas
metodologias escolhidas. Adotar tal metodologia implica na participação ativa dos
estudantes em cada etapa, abrindo caminho para tomarem decisões, expressarem
opiniões e aprenderem a conviver e respeitar opiniões e modos de vida diferentes
dos seus. Desenvolver a capacidade de conviver, respeitar e valorizar as
diversidades é um dos desafios centrais da EDH e seu espaço privilegiado é a
escola, pois é nesta instituição que temos como tarefa central a educação do ser
humano e mais do que isso, é neste ambiente que as diversidades se reúnem. Mas
para que isso aconteça é necessário planejamento e ação docente intencional.
REFERÊNCIAS
61
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Conselho Nacional da
Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica/
Ministério da Educação. Secretária de Educação Básica. Diretoria de Currículos e
Educação Integral. – Brasília: MEC, SEB, DICEI, 2013.
62
63
A DOCÊNCIA E A INCLUSÃO DO ALUNO SURDO NA EDUCAÇÃO
SUPERIOR: POSSIBILIDADES PARA O DESENVOLVIMENTO
PROFISSIONAL2
INTRODUÇÃO
2
Pesquisa financiada pela CAPES.
64
Crê-se ser de caráter essencial o estímulo à reflexão sobre a aceitação da
diversidade inerente à condição humana, por meio da eliminação e
adequação de barreiras, sejam elas arquitetônicas, educacionais e
atitudinais, incluindo socialmente toda a comunidade acadêmica por
intermédio da educação (OLIVARES et al, 2006, p. 42)
3
Acerca da mediação, como uma das categorias da Psicologia Sócio-Histórica (PSH), Aguiar e Ozella
(2013, p. 04) dizem que: “Ao utilizarmos a categoria mediação possibilitamos a utilização, a intervenção de
um elemento/processo em uma relação que antes era vista como direta, permitindo-nos pensar em
objetos/processos ausentes até então”.
65
Este processo constitutivo envolve aspectos intelectuais, emocionais e afetivos, em
que os sentidos vão se formando, ou até mesmo, sendo modificados. “Esse processo é
historicamente mediado por experiências simbólicas e emocionais de atuação do sujeito
em diferentes espaços sociais” (SOARES, 2011, p. 84).
Por sua vez, a prática pedagógica, como uma atividade humana, está carregada de
sentidos e significados, os quais não estão dissociados um do outro. De acordo com
Vigotski (2001), o significado é fixo, imóvel, estável, enquanto que o sentido muda a
palavra facilmente, dependendo do seu contexto. Por isso, neste artigo, partimos do
empírico para as zonas de sentido, verificando o que existe além da fala do docente, o
que está implícito.
Considerando estes fundamentos teóricos, acreditamos ser necessária a
apreensão dos sentidos e significados constituídos pelos professores da Educação
Superior sobre suas práticas pedagógicas quando turmas heterogêneas estão sob sua
responsabilidade, principalmente quando estão envolvidos alunos com deficiência. Deste
modo, essa pesquisa buscou apreender as significações de uma professora universitária
do curso de Educação Física sobre a inclusão de um aluno surdo em sua prática docente,
após a consultoria colaborativa.
METODOLOGIA
Essa pesquisa se alicerça na Psicologia Sócio-Histórica, postulando que o homem
é um sujeito histórico e dialético, constituído nas relações sociais vivenciadas ao longo da
vida.
Participou da pesquisa a professora universitária Lilli4, 43 anos de idade, graduada
em Educação Física e Mestre em Ciências da Saúde. A docente lecionava a disciplina
“Ginástica de Academia”, no 7º período do Curso de Bacharelado em Educação Física, de
uma Instituição de Ensino Superior (IES) privada da cidade de Maceió, atuando na
Educação Superior desde 2006.
Participou como elemento essencial dessa pesquisa o aluno surdo da professora
participante, chamado aqui de Luan, com 28 anos de idade e que cursava o 7º período do
Curso Bacharelado em Educação Física.
4
Todos os nomes apresentados no corpo do texto são fictícios com o propósito de garantir o
anonimato, respeitando os princípios éticos da pesquisa.
66
Outro participante da pesquisa foi Leonardo, Tradutor/Intérprete de Língua
Brasileira de Sinais do Curso de Bacharelado em Educação Física, da referida Instituição
de Ensino Superior privada da cidade de Maceió.
Ainda que as análises dos dados incidiram na professora, também participaram
desta pesquisa dois consultores colaborativos: João e Ana, que contribuíram com
orientações didático-pedagógica à Lilli sobre o ensino e a aprendizagem do aluno surdo
em um contexto inclusivo.
Na produção dos dados utilizamos fragmentos da história de vida da professora,
obtidos por meio de entrevista, por entendermos que as experiências e os fatos ocorridos
com o sujeito são partes dos processos históricos que formaram a sua subjetividade.
Fizemos uso também da observação participante. Deslandes e Gomes explicam-na
como “[...] processo pelo qual um pesquisador se coloca como observador de uma
situação social, com a finalidade de realizar uma investigação científica” (2013, p. 70). Por
meio dessa técnica acompanhamos a prática docente, a qual também foi registrada em
vídeos. Os registros escritos, “notas de campo”, também foram realizados por uma das
pesquisadoras e continham, principalmente, informações dos acontecimentos relevantes
para a pesquisa.
Empregamos ainda a técnica da Autoconfrontação Simples (ACS). De acordo com
Clot (2007 p. 135), “[...] trata-se de uma atividade em si em que o trabalhador descreve
sua situação de trabalho para o pesquisador”. Na ACS, o sujeito e a pesquisadora
assistiram o episódio em análise e, em seguida, o sujeito fez algumas reflexões,
pontuando suas observações em relação ao seu fazer pedagógico. “[...] As verbalizações
servem sem dúvida para trazer à luz as realidades do trabalho” (CLOT, 2007, p. 135).
Consideramos importante esclarecer que os dados aqui analisados integram uma
das pesquisas (SANTOS, 2016) desenvolvida no âmbito do projeto PROCAD “Tecendo
redes de colaboração no ensino e na pesquisa em Educação: um estudo sobre a
dimensão subjetiva da realidade escolar”.
Antes de iniciarmos com a pesquisa, entramos em contato com o coordenador e o
diretor da IES e explicamos os objetivos da pesquisa. A partir deste contato, ficou definido
que a pesquisa seria desenvolvida com uma professora do curso de Bacharelado em
Educação Física, que lecionava para um aluno surdo. A professora foi consultada e, após
67
os esclarecimentos de diferentes aspectos da pesquisa, consentiu livremente em
participar.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Alagoas
(protocolo número 439.400). Conforme as exigências éticas, pedimos que professora
assinasse o Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE) e, por fim, entregamos
uma cópia deste documento para a mesma.
A análise dos dados foi realizada à luz dos núcleos de significação, propostos por
Aguiar e Ozella (2006). Inicialmente, fizemos leituras flutuantes e destacamos as palavras
que se mostraram relevantes na fala do sojeito, sejam por maior frequência, carga
emocional, etc., formando assim, os pré-indicadores. Em seguida, aglutinamos os pré-
indicadores conforme sua similaridade ou contraposição, constituindo-se nos indicadores.
Posteriormente, avançamos para o processo de articulação desses indicadores, formando
os núcleos de significação, que apontaram os pontos fundamentais que trouxeram
implicações para o sujeito, o envolveram emocionalmente e revelaram as suas
determinações constitutivas, os quais foram nomeados tematicamente.
Neste capítulo apresentaremos dois núcleos de significações, construídos a partir
da autoconfrontação simples: “Caminhando para uma prática inclusiva” e “Significações
docente para uma prática inclusiva”.
O processo de produção de dados durou três meses e 16 dias, tendo sido
realizadas várias sessões de ACS a partir de 6 episódios (1, 2, 3, 4, 5 e 6). Neste
capítulo, utilizamos apenas o corpus constituído pelas transcrições das ACS dos
Episódios 3 e 6, os quais são recortes de diferentes aulas diferentes, após o processo da
consultoria colaborativa.
68
Luan entendesse essas explicações, pois o intérprete estava envolvido em outra atividade
e suas estavam mãos ocupadas, impedindo-o de sinalizar para o aluno surdo.
Após dois minutos e 30 segundos do início da aula, o intérprete conseguiu
desenrolar o barbante e a professora demonstrou como usar o barbante com um anel
pendurado na bicicleta para formar um ângulo de 90º e fazer o alinhamento do corpo para
preservar as articulações do joelho e tornozelo. Em seguida, utilizou um álbum seriado
com gravuras e umas figuras de carinhas coladas no quadro para demonstrar o esforço
nos exercícios contínuos de intensidade.
Apesar de o intérprete ter passado quase todo esse episódio sem interpretar a aula
para o aluno surdo, Luan conseguiu acompanhar e participar da aula devido à posição em
que a professora se encontrava, de frente para os alunos e dos recursos pedagógicos
utilizados por ela.
Resultados e Discussões
69
Analisando esse núcleo de significação podemos verificar que a Professora Lilli
começou a esboçar, no episódio, elementos para uma prática pedagógica inclusiva, pois,
ao se ver nas filmagens da ACS, conseguiu perceber pontos positivos e negativos acerca
dos recursos pedagógicos utilizados na aula. Considerou que alguns deles foram
eficientes para tornar acessível a aprendizagem do aluno surdo, enquanto outros não
atingiram seu objetivo.
Como aspectos positivos indicados por Lilli, tivemos:
Com o uso deste recurso (ícones relativos à percepção de esforço), Lilli significou
como ter garantido possibilidades para a aprendizagem de Luan nesse momento da aula,
justamente pelo fato de estes se situarem no âmbito visual.
Ainda analisando os recursos didáticos que usou na aula, a professora reconheceu
que deveria ter adotado outra postura em dado momento da aula e, por isso, considerou-
os como pontos negativos:
[...] eu devia não ter pedido para o intérprete. Eu devia ter pedido
para uma outra pessoa continuar desenrolar [barbante][...].
[...] tinha mais gente que eu poderia ter pedido para deixar as mãos
do intérprete livre.
[...] isso aí é uma das anotações que eu coloquei depois da aula
[pedir para outra pessoa desenrolar o barbante].
70
Nessas reflexões, vemos que os sentidos da professora estão caminhando para
uma perspectiva inclusiva – a mesma já consegue identificar recursos pedagógicos
necessários para inclusão do aluno surdo, como também, a importância da presença do
intérprete durante a aula, bem como o seu papel. Acerca disso, Pinto et al (2015)
explicam:
Foi justamente pelo fato de a professora ter dado outra função ao intérprete que a
comunicação entre ela e Luan foi interrompida, prejudicando a participação do aluno. No
processo de co-análise, Lilli percebeu seu equívoco ao atribuir ao intérprete de Libras a
função de seu auxiliar.
Outra estratégia usada por Lilli e que foi considerada por si como acertada para o
aprendizado de seus alunos foi o trabalho em dupla. Ao ser autoconfrontada com a
filmagem de sua aula, a professora disse: “nessa aula, eu gostei muito, porque na hora
que eu fiz em dupla ele [Luan] interagiu com outro colega. Ele regulou o banco, regulou a
distância, regulou o guidão, [...]”.
Lilli entendeu que a atividade conjunta com um colega facilitou a aprendizagem do
aluno surdo, como também do colega em questão. Face a esta discussão, trazemos as
contribuições de Vigotski (2007) sobre a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), que é
entendida como:
71
conhecimento venha a alcançar. Nesse contexto, as medições que se deram durante a
atividade foram percebidas como elemento essencial para o sucesso da atividade.
Continuando com suas reflexões, a professora Lilli significou sua prática
pedagógica como inclusiva ao interagir com o aluno na aula:
[...] ele pedalou no ritmo correto, tanto na reta, como na subida [...], eu
perguntei se o Luan tinha entendido [a cadência].
Ele me explicou que era 60, 80, 90, 110. reta.
Mesmo tendo motivos para desenvolver uma prática pedagógica inclusiva, Lilli
mostrou-se ainda um pouco confusa acerca de certos aspectos específicos da surdez,
principalmente no que tangia à comunicação com o aluno:
Tem uma coisa que eu preciso melhorar muito: eu sou muito verbal. Eu
preciso ser um pouco mais visual e gestual. Eu preciso treinar isso!
Como a gente está dando aula para um deficiente auditivo [surdo], você
não pode usar muito a voz. Você tem que usar mais o gesto, então a
comunicação tem que ser mais gestual do que verbal.
O fato da docente ter um aluno surdo em sua aula não significa que sua prática
pedagógica deva estar exclusivamente direcionada para atendê-lo. É preciso considerar a
heterogeneidade do seu alunado, de modo a não trazer prejuízo aos demais. Batista e
Nicodem (2016, p. 4) apontam que:
72
se de sinais e caracterizar-se na modalidade gestual-visual, por seu canal
ou meio de comunicação constituir-se de movimentos gestuais e
expressões faciais perceptíveis à visão.
73
No caso em análise, os consultores colaborativos (especialistas em Educação de
Surdos) e a pesquisadora (experiente na inclusão na Educação Superior) propiciaram
mediações fundamentais para despertar a mudança nos sentidos da professora. Atuaram
como interlocutores entre a professora e os desafios da docência, como ainda, auxiliaram
com orientações acerca de recursos pedagógicos para tornar o processo de ensino e
aprendizagem inclusivo, dicas sobre a comunicação com o aluno surdo e a função do
intérprete. Todos estes últimos aspectos foram importantes por não integrarem os
saberes de Lilli.
Ainda na ACS, a professora refletiu sobre sua preocupação naquele momento com
as pessoas com deficiência: “tudo que eu faço agora, eu fico pensando [nas pessoas com
deficiência]. Aí agora eu estou lendo umas coisas [sobre as pessoas com deficiência]”.
Entretanto, sua história de vida mostrava que ela já tinha sido afetada anteriormente por
vivências com pessoas com deficiência em sua família, amigos, colegas de escola e do
trabalho. Vejamos alguns recortes de sua história de vida:
Isto nos leva a considerar que as vivências de Lilli com pessoas com
deficiência tornavam mais urgente o seu desejo de mudar enquanto professora e
desenvolver uma prática pedagógica mais aberta à diversidade.
Ainda na sessão de ACS, Lilli enfatizou que as mudanças em sua prática docente
contribuíam com o aprendizado de todos os alunos, e não apenas o aluno surdo, como
74
mostra o pré-indicador: “todo mundo ganha”. Sobre isso, Caldas et al (2014, p. 02)
afirmam que: “O norte desta proposta [inclusiva] demanda que o ambiente escolar seja
um local único, onde o foco seja a classe como um todo, não reduzindo o processo de
ensino-aprendizagem às diferenças individuais dos alunos”.
Desta forma, tudo aquilo que o docente utilizou enquanto estratégias de
ensino e/ou recursos pedagógicos para garantir o aprendizado do aluno com surdez,
possivelmente, também foi benéfico e proporcionou melhorias na aprendizagem de toda
turma.
Galdino, Costa e Ferreira (2016, p. 04) acreditam que “o uso de diversos materiais
pedagógicos, possibilita ao docente o reconhecimento na potencialidade de seu
educando, e no ensino superior, são amplos os métodos de ensino que possam utilizar na
sala de aula, de forma a promover o processo de aprendizagem do aluno surdo”.
Nessa perspectiva, saber diversificar os recursos pedagógicos que irão despertar a
aprendizagem do estudante surdo, bem como a de seus colegas ouvintes, ampliando as
possibilidades de participação nas atividades propostas é uma tarefa importante do
docente que trabalha na perspectiva inclusiva.
75
Observamos no episódio 6 que a professora continuou com a estratégia de
trabalho em equipe que tinha proposto no episódio 3, que permitia a interação do aluno
surdo com os demais colegas, como ainda poderia fomentar a mediação entre o menos
experiente com mais experiente, como já discutimos anteriormente.
Durante a sessão de ACS, a professora Lilli refletiu sobre a possibilidade de uso de
algumas outras estratégias para garantir a participação e aprendizagem do surdo nas
aulas:
Se tivesse algo mais visual, que pudesse auxiliar seria muito melhor.
[Colocar] Ele [Luan] para fazer o alongamento sozinho, tentar tirar alguma
coisa dele, mas não expondo ele demais.
Eu poderia ter trazido o próprio vídeo com um pedacinho de uma aula, ou
até mesmo eu fazendo o alongamento [...].
76
possam aprender ou diminuir as dificuldades com relação aos demais
colegas (LAGO, 2009, p. 2940).
77
mudança, consequentemente, iria melhorar a interação entre aluno-intérprete-professora,
professora-intérprete e professora-aluno.
Martins e Rausch (2012, p. 252) explicam que “tato pedagógico que abrange a
compreensão do ritmo singular de seus acadêmicos, no que tange às suas dificuldades
referentes ao processo ensino aprendizagem”. Galdino, Costa e Ferreira (2016, p. 03)
acrescentam que “[...] os professores devem conhecer e respeitar as particularidades do
acadêmico surdo, sendo necessário uma adequação nos materiais pedagógicos, bem
como, é preciso conhecer as características de aprendizagem do mesmo”.
78
Com isto, podemos salientar que a prática pedagógica inclusiva requer
conhecimento das formas particulares de aprendizagem do estudante, de como ainda o
docente precisa estar disponível para inovar, construindo meios ou utilizando estratégias
para promover a inclusão do estudante com deficiência na aula. No caso de Lilli, se
mostrou muito favorável para esse processo. Ao analisar a prática da professora,
entende-se que a mudança não é algo imediato. É um processo que vai se constituindo
ao longo das vivências em que os elementos cognitivos e emocionais constituintes do
sujeito são afetados.
E, Lilli prossegue sua análise durante a sessão de ACS: “a gente sempre tem que
pensar em outras formas”, evidenciando que tinha se comprometido com o processo
inclusivo e apontava para a necessidade de buscar continuamente outros meios para
promover a aprendizagem do estudante surdo. Clot (2007, p. 135) considera que “[...] As
verbalizações servem sem dúvida para trazer à luz as realidades do trabalho”.
Durante o percurso enfrentam-se barreiras e situações contraditórias. É nessa
conjuntura que se pauta a Psicologia Sócio-Histórica, em que o sujeito é histórico e
dialético. Soares (2011) esclarece que:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
79
processo de inclusão do aluno surdo em suas aulas, como também, as possibilidades da
pesquisa colaborativa para o desenvolvimento profissional docente.
Ao se contemplar nas filmagens da ACS do Episódio 3, a professora fez reflexões
críticas acerca do seu fazer pedagógico, ora ressaltando pontos positivos, como o fato de
ter feito uso de recursos imagéticos, ora ressaltando pontos negativos, como no momento
em que delegou uma função ao intérprete que não era a dele. Porém, deixou claro que já
conhecia bastante acerca da inclusão do aluno surdo, muito embora ainda precisasse
melhorar.
Na ACS do Episódio 6 constatamos que os conhecimentos específicos na área de
aprendizagem de surdos trazidos pela consultoria colaborativa contribuíram para que a
docente adotasse meios (recursos didáticos e/ou estratégias pedagógicas) para que o
estudante surdo participasse ativamente da aula.
Também verificamos que os múltiplos instrumentos utilizados na pesquisa (a
ACS, a história de vida e a observação participante, associada à consultoria colaborativa),
trouxeram uma riqueza de dados que permitiram apreender as determinações
constitutivas do sujeito, como também, as novas significações que foram constituídas com
as mediações vivenciadas durante o processo de pesquisa e com os elementos
cognitivos e afetivos constituintes do sujeito.
Pudemos ainda constatar que a técnica da autoconfrontação simples permitiu que
a professora refletisse sobre suas ações e, a partir de então, compreendesse seu fazer
docente, agindo para a promoção da inclusão do estudante surdo.
Enfim, o processo de constituição de novas significações do sujeito se fez num
movimento dialético, em que a professora passou por enfrentamentos de novas
metodologias, reconheceu quando falhava e teve avanços na direção da construção de
uma proposta inclusiva.
REFERÊNCIAS
AGUIAR, W. M. J.; OZELLA, S.. Apreensão dos sentidos: aprimorando a proposta dos
núcleos de significação. Revista Brasileira de Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 236, p.
80
299-322, jan./abr. 2013. Disponível em: <
http://www.scielo.br/pdf/rbeped/v94n236/15.pdf> Acesso: 28 jul 2017.
81
PINTO, A. L. S. N. et al. Educação de surdos: novas Formas de ensinar. Cadernos de
Graduação: Ciências Humanas e Sociais, Aracaju, v. 3, n.1, p. 173-184, Out. 2015.
SOUSA, L. F. A.; RODRIGUES, S. S.; SILVA, F. D. S.. O uso de tecnologias por docentes
no ensino aprendizagem de alunos surdos. Congresso de Educação 5ª edição. VI
Seminário de estágio. III Encontro do Pibid. UEG, 1 a 3 dez. 2015. Disponível em
<http://www.anais.ueg.br/index.php/congressoeducacaoipora/article/view/5298/3181>
Acesso em: 21 abr 2017.
82
83
BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR PARA UMA EDUCAÇÃO COM
QUALIDADE SOCIAL? UM OLHAR CRÍTICO FRENTE VELHOS DESAFIOS,
NOVAS POSSIBILIDADES
Vandeí Pinto da Silva5
5
Professor Doutor - Universidade Estadual Paulista, Campus de Marília - Departamento de Didática e
Programa de Pós-Graduação em Educação - vandeips@marilia.unesp.br
84
Considerando-se o contexto brasileiro de precarização dos serviços públicos,
de desqualificação da educação e de crescente privatização, há que se
problematizar, antes de tudo, os reais objetivos de uma BNCC e em quais aspectos
ela avançaria em relação aos Parâmetros Curriculares Nacionais e às Diretrizes
Curriculares Nacionais vigentes.
Em que pese a prerrogativa legal do MEC de fixar uma BNCC, esta devia se
fundamentar exclusivamente na atribuição que lhe cabe de zelar pela boa qualidade
da formação escolar básica nos diferentes sistemas de ensino: federais, estaduais,
municipais e particulares.
A tendência de centralização do currículo presente na BNCC, em vez de
estabelecer parâmetros mínimos de qualidade socialmente referenciada tende a se
converter em estratégia de controle, por meio de avaliações em larga escala, sobre
os diferentes sistemas de ensino, as escolas, professores e estudantes. Tal
mecanismo reforça o papel de tutela do Estado quanto aos fins educacionais, em
prejuízo da autonomia das escolas e liberdade acadêmica dos professores.
Favorece o rentável mercado de apostilas.
Há que se reconhecer que num país em desenvolvimento como o Brasil, a
qualidade de vida da população depende da melhoria da qualidade da educação, o
que pressupõe o aumento do percentual do PIB – Produto Interno Bruto destinado à
Educação, como previsto no Plano Nacional de Educação - PNE, não o seu
congelamento por duas décadas, tal como foi aprovado pela PEC n. 95/2016, em
flagrante descumprimento do PNE.
A organização do presente texto percorrerá os seguintes três momentos
interconectados:
1. Tese: caracterização do modelo de BNCC proposto pelo MEC em sua 3ª
versão: os motivos que dão sustentação ao documento, autorias, instituições
parceiras interessadas em sua elaboração e elementos constitutivos.
2. Antítese: contraposição ao discurso oficial contido na BNCC por meio de
outras concepções de escola, interdisciplinaridade, aprendizagem e
desenvolvimento humano.
3. Síntese: estará na esfera nas intervenções possíveis por parte dos
educadores, afinal, “as circunstâncias fazem os homens tanto quanto os homens
85
fazer as circunstâncias” (MARX E ENGELS, 1989, p. 36) e o educador também
precisa ser educado (SILVA, 2014).
86
pelo qual essa fundação assume os processos necessários à consolidação,
disponibilização, divulgação e discussão da terceira versão da BNCC (conforme
publicação no DOU de 23/3/17: http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/
index.jsp?jornal=3&pagina=23&data=23/03/2017). Registre-se que a Fundação
Vanzolini foi a contratada para a implantação da reforma curricular no estado de São
Paulo denominada de São Paulo Faz Escola. A reforma implantou o sistema
apostilado de ensino atrelado ao currículo paulista.
Com base nesse texto o documento tenta esclarecer que não se trata de um
currículo, mas de apenas bases para a construção curricular: a BNCC faz
proposições e ao currículo compete a sua materialização na realidade dos diferentes
sistemas de ensino. Essa tentativa de esclarecimento se contradiz com o grau de
detalhamento dos conteúdos discriminados na BNCC. No caso do Ensino Médio, é
declarada a pretensão de que 60% da carga horária deverá ser destinada ao Núcleo
Comum e os demais 40% à parte diversificada, a ser estabelecida pelos diferentes
sistemas de ensino. Além do adiamento da BNCC do Ensino Médio, a referida
pretensão se esvazia ante o caráter centralizador da contrarreforma do Ensino
Médio.
No PNE 2014-2024, promulgado pela Lei n. 13.005/2014, há a seguinte
proposição:
87
pedagógicas para a educação básica e a base nacional comum dos
currículos, com direitos e objetivos de aprendizagem e
desenvolvimento dos(as) alunos(as) para cada ano do Ensino
Fundamental e Médio, respeitadas as diversidades regional, estadual
e local. (BRASIL, 2014)
88
documento simultaneamente afirma o papel de complementariedade dessas duas
instâncias:
89
Traços, sons, cores e formas, Oralidade e escrita, Espaços, tempos, quantidades,
relações e transformações. (p. 23)
Exemplos relacionados ao campo de experiência “O eu, o outro e o nós”:
1. Crianças de zero a 1 ano e 6 meses (EI01EO01). Perceber que suas ações
têm efeitos nas outras crianças e nos adultos.
2.Crianças de 1 ano e 7 meses a 3 anos e 11 meses (EI02EO01). Demonstrar
atitudes de cuidado e solidariedade na interação com crianças e adultos.
3. Crianças de 4 anos a 5 anos e 11 meses (EI03EO01). Demonstrar empatia
pelos outros, percebendo que as pessoas têm diferentes sentimentos,
necessidades.
Considerando-se o princípio de que se deve atribuir às diferentes etapas da
Educação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental I, Ensino Fundamental II e
Ensino Médio) significação próprias e reconhecimento de sentido nelas mesmas,
causa estranheza o fato de, já na Educação Infantil, terem sido estabelecidas na
BNCC as “sínteses das aprendizagens esperadas” com vistas à “transição para o
Ensino Fundamental I”, mesmo com a ressalva de se ratar de elementos
“balizadores” e “indicadores” e não de “condição” ou “pré-requisito” (p. 49). Nesse
sentido, apresenta-se demasiadamente sofisticada para uma criança pré-escolar, a
síntese dela esperada no campo de experiência da Oralidade e escrita: “Conhecer
diferentes gêneros e portadores textuais, demonstrando compreensão da função
social da escrita e reconhecendo a leitura como fonte de prazer e informação”. (p.51)
Ademais, a “escrita espontânea” não conflui para tal sofisticação.
No ensino Fundamental I e II tem-se a distribuição detalhada de temas pelas
4 grandes áreas do conhecimento (linguagens, matemática, ciências e ciências
humanas), ano a ano, disciplina por disciplina e tópicos detalhados dos conteúdos.
Exemplo:
1. Unidade temática: Apropriação do sistema alfabético de escrita. Objeto de
conhecimento: conhecimento do alfabeto. Habilidade: (EF02LP31): Recitar o
alfabeto na ordem das letras. (p. 81) Registre-se que este tipo de habilidade é
altamente questionável quanto à sua pertinência no contexto das teorias de
alfabetização que consideram o processo e o sentido da escritura.
90
2. Unidade temática: A noção de espaço público e privado. Objeto de
conhecimento: A cidade e seus espaços: espaços públicos e espaços domésticos.
Habilidades: (EF03HI09) Mapear os espaços públicos no lugar em que vive (ruas,
praças, escolas, hospitais, prédios da Prefeitura e da Câmara de Vereadores etc.) e
identificar suas funções. (EF03HI10) Identificar as diferenças entre os espaços
públicos e o espaço doméstico, compreendendo a importância dessa distinção. (p.
361) Note-se que para Arendt, a tradução moderna de zoon politikon por animal
social, em vez da tradução por animal político, contribui com a indistinção entre
público e privado e reduz o universo da vida activa (Arendt, 2008).
O Ensino Médio não foi incorporado à proposta de BNCC, com prejuízos
evidentes à integração do Ensino Básico como um todo. Postergar a BNCC do
Ensino Médio gera questionamentos sobretudo quanto à suposta urgência da
Medida Provisória (MP) n. 746, do Ensino Médio. Com efeito, a conciliação das
discussões iniciadas nas primeiras versões da BNCC mostrou-se problemática com
a edição da MP do Ensino Médio.
91
interesse é formar trabalhadores adaptados a um sistema produtivo que privilegia o
grande capital e não a superação das desigualdades, a autonomia e realização do
trabalhador.
A tensão permanentemente enfrentada pela escola nos âmbitos da adaptação
e da mudança não devia ser omitida. Note-se que na história da humanidade os
processos educativos sempre buscaram cumprir o objetivo de integrar os indivíduos
entre si e ao contexto social em que estiveram inseridos. Tal como Silva et al (2015)
apontam em Interdisciplinary Formation and Social Integration in Present-Day, uma
inserção social adequada supõe formação para a participação ativa nos processos
de trabalho e de vivência cultural. A gestão democrática da escola e a
interdicisplinaridade são fundamentais ao preparado de um sujeito criticamente
inserido no contexto histórico por ele vivido.
A formação interdisciplinar pode representar um avanço na constituição do
perfil formativo do homem contemporâneo, aqui concebido como o que se desafia a
sintetizar as experiências do passado e os projetos do futuro na configuração do
presente, no qual é chamado a viver, por vezes de forma inatual, profanando
convencionalidades habituais (Agamben, 2010).
Cumpre enfatizar que o conceito de formação interdisciplinar implica a
preservação do disciplinar: inter disciplinar, tal como o próprio termo expressa. A
perspectiva interdisciplinar coloca o disciplinar no conjunto das demais disciplinas e
áreas do conhecimento, numa relação dialogal e integrada que facilita aos indivíduos
uma melhor compreensão de si mesmo, dos outros, da natureza e da sociedade.
Rios (2008), coloca-se o problema da globalização e suas consequências na
fragmentação do conhecimento, sua massificação e homogeneidade. Nesse
contexto, advoga a consideração das diferenças e especificidades dos saberes e
práticas num trabalho interdisciplinar e coletivo. “É necessário, assim, refletir sobre o
sentido da interdisciplinaridade. Não se pode ter interdisciplinaridade se não se tiver,
de início, disciplinaridade, muito especificamente falando”. (RIOS, 2008, p. 58)
Em suma, a perspectiva interdisciplinar se configura antes de tudo no
currículo e na construção do Projeto Político Pedagógico da escola, os quais, por
sua vez, são pautados pela definição do papel social da escola na formação do
indivíduo. Nesse sentido, as seleções dos conteúdos, metodologias e estratégias de
92
ensino deverão guardar relação entre as dimensões disciplinares, interdisciplinares e
transdisciplinares. Tais elementos são desprezados na BNCC, com o agravante de
afrontar autonomia das escolas e dos professores na proposição dos conteúdos, ao
prescrever o rol detalhado dos conteúdos para cada disciplina.
93
Em relação ao último aspecto apontado verifica-se um retorno ao chamado
“método fônico”. A BNCC desconsidera que o processo de alfabetização teve uma
evolução significativa ao longo das últimas três décadas. A ênfase nos métodos e
técnicas foi superada pelos trabalhos de Emília Ferrero e continuadores e teóricos
da Teoria Histórico-Cultural, de matriz Vigotskiana. Tais pesquisas trouxeram uma
importante contribuição ao enfatizar o fato de que as crianças se alfabetizam
pensando e refletindo sobre a escrita, que a língua se constitui em contextos
históricos e sociais próprios e carregados de sentidos e significados.
A partir daí, a questão que se coloca é: qual escrita se deve oferecer as
crianças? Portanto, são questionadas as práticas de professores alfabetizadores
centradas num ensino da língua pautado na relação grafema/fonema. Desde há um
bom tempo, já se deslocou a ênfase das unidades individuais e ditas simples – as
letras – para as mais complexas – sílabas/frases/textos. Desta perspectiva, o
resultado das práticas centradas no fônico e alfabético não têm garantido um
processo de alfabetização adequado, pois o foco fica na extração de sons para ler e
escrever. Apesar de muita coisa ter melhorado ao longo do tempo, ainda é preciso
avançar mais, pois as práticas que circundam a escola ainda priorizam que as
crianças decodifiquem o que leem e codifiquem o que escrevem, o que não condiz
com a formação capacitação de um leitor/escritor proficiente.
Estudos recentes apontam a necessidade de uma prática que considere a
alfabetização como prática discursiva. Desse modo, parte-se do gênero textual para
se ensinar a língua.
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Mészáros, em A educação para além do capital (2005, p. 53), parafraseia
José Martí ao lembrar: “as soluções não podem ser apenas formais, elas precisam
ser essenciais”. (2005, p. 53)
Dessa perspectiva, nada adiantam as ditas propostas de reformas
educacionais se elas vêm justificadas em fatos acidentais e desconsideram, por
exemplo, os vários séculos de história do Brasil sem investimento na educação
básica do povo e o descaso dos estados, munícipios e da federação com as
condições de formação e de trabalho dos professores.
Nesse sentido, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(Pnad) do IBGE são reveladores.
Ensino Fundamental Completo (até 16 anos): em 2004: 58,9%; em 2014: 73,3%.
Ensino Médio Completo (até 19 anos): 2005: 41,4%; 2014: 56,7%.
Ensino superior completo: 2000: 4,4%; 2010: 7,9%.
Os percentuais citados falam por si mesmos. O grave problema da educação
escolar brasileira ainda reside baixa e desqualificada oferta de vagas e a carência de
investimentos, aspectos essenciais e elementares não objetivados pelas
contrarreformas.
Como se pode constatar, o percentual de brasileiros com nível superior
completo passou de 4,4%, em 2000, para 7,9% em 2010. A meta do PNE é que o
percentual de matriculados no ensino superior em 2024 atinja 50% e o percentual de
formados 33%, sendo 40% das novas matrículas no seguimento público (Brasil,
2014, p. 73).
A Medida Provisória n. 746, sob o pretexto de fomentar Escolas de Ensino
Médio em tempo integral, realiza, na verdade profundas mudanças de concepção na
formação do jovem.
A marca tecnocrática da BNCC também se expressa pelos códigos
alfanuméricos, os quais detalham em excesso os conteúdos a serem ministrados,
restringindo o papel do professor e das escolas na formulação de suas propostas
pedagógicas. A intenção da BNCC é facilitar os mecanismos de avaliação, a
elaboração de apostilas e o treinamento de professores em conformidade com a
BNCC. Tal mecanismo negará a prerrogativa do professor de preparar seu material
95
didático, pois impõe a ele um material padronizado, o que destoa dos princípios da
elaboração participativa do PPP e da gestão democrática da escola.
96
Nos processos de formação de professores urge resistir também propiciando
formação qualificada, compreendendo o professor como um intelectual, condição
para sua contribuição na superação das condições de alienação do trabalho.
Precede o enfrentamento de questões centrais aprovadas no Plano Nacional
de Educação atinentes à gestão democrática da escola, à melhoria da formação dos
professores, das suas condições salariais e de trabalho e de melhoria da
infraestrutura das escolas, questões estas negligenciadas pela BNCC. Em contexto
exacerbação das avaliações, cumpre empreender rigorosa avaliação acerca do
flagrante descumprimento do PNE por parte governo brasileiro no contexto das
políticas educacionais.
Em suma, a escola não pode mais se dedicar apenas à preparação para o
trabalho. Os objetivos da escola devem transcender à meta de preparação para o
trabalho, incluindo a formação humana omnilateral, de todos os lados, que inclui
simultaneamente formação intelectual, corporal e tecnológica (Marx e Engels, 2004),
o oposto do contido na Reforma do Ensino Médio, marcadamente disciplinar e
unilateral.
A negação da subjetividade dos estudantes e a redução de sua formação ao
viés da preparação elementar para o trabalho consistirá num equívoco grave para as
atuais e futuras gerações, pois o contexto histórico e social está a reclamar
exatamente o contrário: pessoas críticas, criativas, abertas ao novo e conscientes do
seu papel na construção de uma sociedade justa, igualitária e sustentável.
REFERÊNCIAS
ARENDT, H. A condição humana. Trad. Roberto Raposo. 10. ed. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 2008.
97
BRASIL. BNCC. MEC/SEB. http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_
publicacao.pdf (consulta em julho de 2017)
______. Textos sobre educação e ensino. 4. ed. São Paulo: Centauro, 2004.
MÉSZÁROS, I.. A educação para além do capital. Tradução Isa Tavares. São
Paulo: Boitempo, 2005.
98
99