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C APA POR : M ARCOS A LEXANDRE A LVARENGA

T EXTO E O BRA : A LBERTO W ANDSON L OIOLA


DO N ASCIMENTO

D EDICADO A J OSEFA O LIVEIRA L OIOLA N ETA ,


A BASE DE TODA MINHA HISTÓRIA E
CARÁTER.
PREFÁCIO

Alberto Wandson Loiola do Nascimento, nome de doutor, como os


mais velhos de minha terrinha, lá no Trici diziam neto do Seu Calô e
Dona Mariquinha.

Sobrinho afilhado de Seu Lisboa, neto de finado Lucaro e Dona Emília.

Mais conhecido como Vandin, filho de Zefinha, aquela que trabalhava


no posto telefônico das Flores.

Sim! Ela mesma, a que não negava ajuda a ninguém, que era amável
com todos e que se foi tão jovem, deixando o menino menor no
mundo.

Criado sob o estresse traumático de ser órfã cresceu no bom grado de


familiares e se estabeleceu com o passar do tempo, como leitor
assíduo, após aprender a magia maravilhosa da leitura.

Bendita sabedoria concedida, tão boa essa que salvou sua vida,
mesmo nos currais ou no meio da mata caatinga, ele lia e colocava a
mente a prova para sua imaginação afiar-se e torna-se distinta.

Clamava por fadas, silfos e ninfas, naquelas solitárias pradarias, com


mente de menino, que mesmo pequeno, tinha o maior ideal do mundo.

Queria ele compartilhar a magia, o saber e a alegria, a plenitude de lê


e se transportar para outros mundos através de palavras reproduzidas
na mente.

Tão contente ficou quando compôs as páginas a seguir, que cada


palavra coloque em seu coração um pouco do sentimento que sentiu
ele em sua infância, ao encontrar na literatura um abrigo protetor da
solidão.

Boa Leitura!

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PRIMEIRA PARTE

PEQUENAS CRÔNICAS
DE OUTRORA
Olá? Há tempos sussurros vindos de todas as partes me
pedem que eu saia do relento e volte a escrever.

São anos afastados das páginas e da escrita casual... Era


a paz que rondava que assegurava isso.

A mente sempre foi uma extrema bagunça, desde os


tempos que me lembro de brincando solitário naquele
casarão, enquanto uma manada de moleques brincava na
terra de pés descalços a beira da barragem da vila de
flores.

Acabo de me arrepiar de tanta falta.

Engraçado que outrora eu sempre me vi enrascado e


cabisbaixo, mas sem perder da mente a imaginação e o
instinto de grandiosidade.

Melhor época, onde os deuses sempre foram tão


próximos.

Mãe me pedia cuidado e cuidado tinha até quando pôde.

Anos e anos se passaram e vai e vem e vem e vai sem


parar.

Pessoas? Conheço aos milhares!

Incrivelmente desenvolvi a capacidade de reconhecer


auras e sua dignidade. Atraí-me sempre por seres que
impunham seu lugar na Terra e sob os olhos das
Divindades era bem visto ou ao menos respeitado, era
como se na cabeça ouvisse um “Esse é dos Meus”.

Sem dúvida pude viver maravilhas até o então momento.

Confesso não mais ter a mesma cabeça, não sei a quem


culpar.

Sou orgulhoso demais pra culpar a mim mesmo, apesar


de não ser um leão, mas sim um velho lobo do deserto
solitário, que prefere assobiar cânticos a estar em uma
roda entrosada de amigos das mais diversas raças.

Amo apreciar a convivência humana, mas não me


associo a nenhuma camada, por mais que às vezes tente.

Quem sabe no fim da Jornada.

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O propósito disso por fim é praticar.

São perturbações tremendas em minha mente que vão da


mais simples goteira, até o mais terrível dos poréns
terrenos que é o débito financeiro.

Comentei recente porventura com alguém por quem


tenho amor que esses médicos da mente humana, mal
sabem eles que são pagos pra um estudo infeliz.

Um ponto a me referir importante e que sempre me


parece intrigante: Cada um que me manda procurar um
desses profissionais, poucos dias depois some de minha
vida.

Gaitadas? Damos.

Deus seja louvado, mas pra valer em polvorosa


aclamação, mas sem versículos... Apenas danças e
rituais pagãos.

Bendita seja a vida desgraçada que me tenta e me


empodrece a cada dia.

Saudações á aquela criança maldita órfã que um dia


sonhou em escrever uma vida.

Saudades de mim.
Foi essa semana, olha só, me senti tenaz e vil ao mesmo tempo.

Tão singela e bruta é a vida.

Lembrei-me das brincadeiras de outrora nos “munturos” lá de casa.

Por quantas vezes imaginava mundos sem fim ridicularmente


complicados, mas que de maneira clara na minha cabeça jamais
existiriam.

Ao menos assim pensava.

Havia dinâmicos heróis de guerra que sempre burlavam as leis da tirania,


seja sobrevoando as metrópoles com suas monumentais naves, que
sempre eram gigantescos galhos de árvores de “mameleiro”,mas que na
minha vista eram naves descomunais em tecnologia.

Findava as brincadeiras na hora de ir pra aula, tinha que pegar o “pau de


arara” lá no meio da vila.

Não tirava da cabeça a continuação da peripécia.

Depois de incontáveis destruições no meio da mata e baixas pro lado do


“Exército Pedregulho”, os “Madeiras” retomavam suas terras, detinham a
tirania e viviam em paz por pelo menos mais cem anos.

Cem anos não durava um dia.

Na manhã seguinte uma nova era surgia e um conto novo começara.

Mas isso tudo somente depois dos afazeres de casa, levar as vacas pra
roça e pôr todas as ovelhas no roçado.

Plenitude.

Deus ofertou-me uma paz lindamente bem vivida.

O mundo é bem mais simples na mente de um matuto apaixonado pela


natureza.

A destruição e tristeza eram facilmente desfeitas com apenas um


vislumbre do céu e de paisagens verdes que se perdiam de vista.

Saudações às ninfas e fadas que sempre nesses momentos cantarolavam


no meu ouvido o lindo som de uma ventania.

Bendita seja a terra mágica.

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Recordo-me uma vez de um garoto olhando as estrelas e imaginando o
mundo e o quão grande ele seria.

Estava ele totalmente espesso.

O mais longe que fora não dava pra se medir na vista e não era por causa
dos montes.

O garoto sentou no terreiro de sua casa, encontrava aconchego em seu


assunto com as estrelas que de lá de cima tudo viam e se pudessem falar,
lhe dariam notícias das pessoas que amava.

Eram lindas noites de silêncio e algazarra na cabeça.

Quão propensos a bolar planos futuros ele era?

Nem me pergunte.

Tinha a vida projetada e quando qualquer dos planos se esvaía como


fracasso, ele não desistia.

Muitas vezes se pusera a chorar em seu íntimo.

Mas nunca deixou que o mundo visse tal.

Era ele um exímio escalador.

Mas somente aos fins de tarde pra ver o pôr do Sol.

Bendita seja a Mãe que lhe concedera tão bendita Plenitude e ao mesmo
tempo temperamento pra tanto.

Ainda bem que as estrelas só ouviam e cochichavam entre elas...


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Fogo

Ar ameno

Parece engraçado o incêndio tracejando um desenho no interior de mim

Caos em vitro

Badalo esquisito

Temeis a manhã?

Não tema, a tarde vem em seguida e segue a vida num caos em vitro.

Não se esquece de abastecer

A manhã já vem
Tomei meu café hoje sem prosa

Segunda incendiada

Queria praia

Vi um mártir

Enchi a xícara

Reguei-me de força

Sem atrito

Apenas “Splash!”

Queria amar o mar e ser bem vindo ao amor que outrora senti lá

Porque tão longe de mim, Iracema.

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Se o Todo é mente e o Universo é Mental

Então se entende que o que havia na cabeça dele era nada mais, nada
menos que um mundo todo em modo experimental.

Tamanha era a imaginação, projetava na natureza sua companhia.

Fadas, silfos e ondinas.

Gnomos, anões e sereias do rio.

Quão mágico há de ser o mundo além vista?

Suponhamos que você seja um leitor de sua própria fantasia, ficaria


maravilhado?

Menino, o que é isso? Falando de novo sozinho?

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Era dia de chuva

Ele já sabia o que esperar

Pés descalços, calça suja.

12 quilômetros pra enfrentar

Um cipó a mão como se fosse uma espada

Armado até os dentes com patuá a tiracolo e uma baladeira carregada

Temperamental e rígido

Cuidadoso, mas pouco habilidoso.

Talvez fosse reconhecido por sua astúcia ao invés de sua força

Olha ele, o tamanho disso.

Não dar nem pra saída

Não se passou um mês olha só

É um incrível batalhador

A dificuldade lhe imposta foi o pavio aceso pra sua vitória

Não cesse se do chão não sair, se torne o maior dentre eles...

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Foi ontem que vi um pé de seriguela carregado, minha nossa!

Aquela árvore que pode chegar a oito metros, com troncos retorcidos e
folhas brancas...

Escalar aquilo era como buscar o fruto do sucesso, quão escorregadio e


perigoso.

Mas pra quem se aventurava saltando cercas que nem ele era moleza

Menino! Deixe de teima que tu cai!

Gritou Dona Zefinha

Que menino mais teimoso, metido a ser cabrito.

A mãe lhe resguardava, não era hora de se pôr a prova.

Poxa mãe, o garoto só queria calar a boca de quem lhe duvidou.

O menino é pequeno, mas a coragem era nítida e aquela teima até hoje
reverberou.

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Naquele fim de tarde ele se propôs a ler,

Estava crédulo que a história lhe tiraria dali...

Do chão, do vulgo comum.

Ele queria estar onde quisesse estar

Por ventura nada o lhe bastava se não fosse aquela


colina de casa, que dava pro horizonte sem fim.

Calce as botas menino!

Tá em tempo de chuva

Cheio de cobra no caminho

O tio lhe orientou a ir a lagoa dar água às ovelhas, era


perto, mas os minutos eram suficientes pra que ele se se
projeta em um navio.

E um mundo onde talvez a solidão não o atingisse

Será que foi muito longe?

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O sol já saía e o chocalho ecoava

Os gritos longínquos tangiam o gado

Viu que era dia de sol forte, mas muito vento.

Quão agradável era seguir montado a cavalo com a brisa no


rosto

Na volta pra casa, depois de deixado o gado no cercado,


transformava o pangaré num Pégaso alado.

Às vezes sorria, seguia.

Ele viu que tinha tempo e foi até a lagoa

Lagoa seca, como era chamada.

Desmontando do Pégaso, se pôs a assobiar.

Cantarolava cânticos de mamãe

Olhava o céu pintado de azul apaziguador

Bendita plenitude, mas nem de longe a paz que buscava.

Montara de novo no Cavalo Alado

Continuava sua busca

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O Céu de Lá

Eu deitei na terra como de costume

Vi o céu estrelado e sorri

Tempos bons de outrora

Sinto falta de casa, do céu de lá.

Saía à noite com olhos de coruja

Jamais tropecei, cresci sob as estrelas.

Sempre tão nítido no céu

Quando sumiam, sinal de chuva vindo.

Tão rara era a sensação

Aos primeiros pingos na cara eu corria

Resguardava-me debaixo do alpendre

Se estivesse na mata, sem diferença.

Qualquer algaroba servia

Saudades do céu de lá

Estrelado ou chovendo

Eu sorria, vivia.

Quantos dias faz?


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Estaria eu no chão de casa

Catando feijão

Enchendo a carroça

Atando os nós de outrora

Por percalços passados perdi

Mas me achei

E que beleza, debaixo do alpendre.

Lendo um livro

Roupa amarrotada

Mas em paz, no chão de casa.

Sol quente e o cavalo sem sela

Tangendo os bodes

Escrevi sobre o mormaço

Sobre assobio que dei quando veio o vento.

No chão de casa

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SEGUNDA PARTE

POEMAS AMOROSOS E
DEVANEIOS EM MELANCOLIA
E PROSA
Mentes perdidas, sem um pingo de rumo ficam assim,
misturando seus momentos de paz com seus momentos
de caos.

As mãos tremem e o mundo vira de pernas para o ar


como um se uma tempestade passasse destruindo tudo e
deixando somente a bagunça, a ruína...

Mas calma lá, é só na cabeça dele.

Uma simples ideia muda tudo não é?

Mas saiba que tem algo de muito real em tudo isso.

O pedido de socorro em meio a tanta balbucia.

Quanto choro contigo.

Não se vê o fim.

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Venha pequeno, atravesse o rio.

Que rio frio.

Detesto o frio.

Não sei nadar.

Quem sabe se eu mergulhar possa ver além do fundo escuro o


outro lado do mundo.

Amo a profundeza, assim como amo o céu.

Ambos mortais pra mim.


São raras às vezes em que alguns de nós conseguimos se
encontrar consigo mesmo e se maravilhar com seu próprio
vislumbre.

É culpa do amor que temos por outros.

A decepção nos agride de uma forma tão rude não é


mesmo?

É difícil explicar, ela vai e volta e às vezes faz parecer como


se você não tivesse existido antes dela...

Você até consegue ouvi uma música, ler algo que goste
trabalhar.

Às vezes nada.

E quando acho que estou andando num fio que liga as


estrelas, na verdade estou andando em corda bamba.

Tenho dores em lugares em que o sol nunca há de tocar.

Eu posso perdoar pelas vezes em que em crise não me


abstive de palavras e tentei por vezes arrancar a liberdade e
me sobressair como um benfeitor, mesmo que por vezes
indigno.

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Eu já estive mais transtornado

Hoje já mais apaziguado posso dizer,

A sombra daquela arvore virou lembrança, um


contentamento, mas queria tanto que fosse presente.

Que fosse mais que uma lembrança feliz.

Estou por um triz;

Bem pouco falta até eu me render,

Jurei não mais explodir por dores como essa que não
partiram de mim, mas que eu permiti por falta de
autocuidado.

Tão bela era a vida outrora, pelo menos penso assim...


Talvez só estivesse entorpecido pelo orvalho das manhãs
dali

Agora no cerrado não sinto mais aquele cheiro, é diferente,


convidativo... Mas não é o mesmo.

Sabe o que é pior? É que por mais que retraia, o cheiro


insiste e me deixa numa gangorra.

Vou despencar do barco, mas não serei comido pelos


tubarões.

Eu nado.

Nadarei...
Esperei por ti ontem,

Assim como todo dia faço.

Tu só me vens nos sonhos e quando vens não se demoras

Que bem me faria não acordar...

Você cintila a pele, respinga em mim teu vibrar.

Não sei como me portar.

É grandioso demais o sentido

Meu afinco, minha flor.

Não vai não, fica aí.

Não me faça suplicar.

Escrevi-te tantas cartas, tantas dela nem sequer leu.

Em cada uma foi um pedacinho meu

Espero tanto rever teu olhar.

Melhor vai ser se me olhar de volta e me chamar pra te amar.

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Até onde tu pensa que vai artista?

Vibre e fascine-se

Pode chorar que eu deixo

Mas na proporção certa pra não se descabelar, ora, pois.

Chegou à vez de se soltar

Vai durar até amanhã?

Tem que dar

Vejamos, até onde pensa que vai artista, é um devaneio?

Eu não sei, mas não vou parar.

Vou me amar se quiser vir junto, aí é que tá, tanto faz pra mim.

Mas se vier, melhor ainda.


Eu escreveria sobre agora, mas agora é indescritível.

Foi como superar qualquer lacuna

Gerei desconforto e apaziguei, fiz meu trabalho.

Não conseguirei de novo

É como ficar por horas mergulhadas

Respiração cessou talvez

Mas por acaso me mantive vivo

Foi calor, um tremendo alvoroço.

Indescritível

Escrevi e você nem leu

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Só hoje, tomei com mais pressa o café.

Só hoje não me lembrei de olhar o céu

Só hoje me apressei no pedalo até aqui

Só hoje furei o sinal, por resolver intervir.

Fiz da minha vida hoje o que bem quis!

Errado será não estou?

Foi só hoje.

Por hoje chega, não quero mais.

Mas amanhã quero de novo

Mas, sem pressa, talvez na segunda.

Outra xícara, um novo assunto

Não se prenda

Não se arrependa

Vai viver o hoje


Clima

Aclimatar-se do bem de quem tem amor

Fervor

Não sou bicho de julgamento

Sou sentimento

Sou fogo

Queimou-se?

Não sofro, mergulho.

Não ceda ao entulho

Bagulho

Veja a Flor

Desabrochou

Que clima.

Bendito Sol que me amou.

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Não se aperreia por nada não.
Uma hora dar certo!

Não cesse.

Alberto Wandson Loiola

Quem disse que um vaqueiro de cabrito não


pode também ser um escritor distinto?

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