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Querida Charlotte,
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Prefácio
Lucas Felix
(autor do livro AS LEMBRAÇAS QUE NÃO
QUERO ESQUECER)
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Contents
Os dois céus
O garoto mudo
Trezentos e sessenta graus
Aprendizado
Sabedoria Animal
Dívida
Lei de Murphy
Mundo Azul
Hallelujah
Pastel
Som Angelical
Nahina
Nunca diga nunca
Inimiga
Joia da Rainha
Último Sorriso
Segredo
Culpados
Corpo Gelado
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Os dois céus
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O garoto mudo
quer?
No dia seguinte, levantei cedinho e corri para
ver se o garoto mudo estava na cachoeira e, para
minha surpresa, ele estava lá sentadinho onde
havíamos nos encontrado.
Quando cheguei, ele se levantou e sorriu.
Parecia estar esperando por mim e,
inesperadamente, meu coração acelerou de alegria.
Comecei a falar igual a uma matraca quebrada. Ele
parecia achar graça. Peguei um canário tão
bonitinho e coloquei nas mãos dele.
— Esse pássaro tem um canto tão bonito —
continuei matracando.
— Pa... passa... pássaro — ele disse.
O meu espanto deve ter ficado nítido porque
ele acabou arregalando os olhos de volta para mim.
Então, ele não era mudo como eu havia pensado.
Ah... algumas coisas começaram a fazer sentido.
Ele é só estrangeiro! Menos mal.
Acabei rindo da minha idiotice por achar
que o garoto era mudo.
Começamos a nos encontrar todos os dias, e
ficávamos juntos desde de manhã até o sol quase se
pôr. A cada dia ele aprendia mais. Até enfim,
alguns dias depois de termos nos conhecido, ele
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— É. Rápido.
Fechei não conseguindo para de rir e de me
mexer, meus sentimentos estavam acelerados como
num turbilhão, fazendo meu corpo todo se agitar.
— Quieta.
— Desculpa.
De repente, senti algo delicado e frio correndo
pelo meu pulso até minhas mãos. Abri os olhos e
ele virou delicadamente o meu braço, mostrando o
presente acomodado nele. Uma pulseira dourada
com várias pedras brilhantes imbricadas.
— É linda! — exclamei.
Ele correu os dedos por meus braços
levemente, fazendo estremecer até minha última
célula.
— Mas eu não tenho nada para lhe dar.
— Não precisa, ficou perfeita no seu braço
branco, delicado e macio. É viciante tocar a sua
pele.
Eu arregalei os olhos e meu coração disparou.
Como ele conseguia dizer coisas tão embaraçosas
de um jeito tão natural, como se tivesse fazendo um
pedido de um hambúrguer “duplo cheddar bacon”
em uma lanchonete de fast food?
— Ah, tenho algo para te dar sim.
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primeiro beijo.
Voltei para casa não sei como e dormi também
sem saber como.
No dia seguinte, fui até o nosso ponto de
encontro, mas Dáian não estava lá. Só havia uma
flor sobre a nossa pedra. A mesma flor nascida ao
pé da cachoeira, a qual ele havia me dado no dia de
nosso primeiro encontro. Esperei o dia todo em vão
e acabei por ficar preocupada porque Dáian nunca
deixava de vir. E nos dias que se seguiram, ele
também não veio, por mais que eu o esperasse.
No último dia de férias, meus pais estavam
arrumando tudo para regressarmos e eu continuava
plantada sobre a nossa pedra, esperando.
Quando percebi que não adiantava mais nutrir
nenhuma esperança de que ele retornaria, fui até a
nossa cerejeira. Haviam caído muitas flores e ela já
estava com um aspecto de árvore seca. Só me
lembro de me abaixar ali e abraçar meus próprios
joelhos. Eu nunca chorei tanto.
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Trezentos e sessenta
graus
do Malandro? Aff...
Talvez a teoria do buraco de minhoca fosse a
menos absurda afinal.
Tá bom. Se eu passei mesmo por uma ponte
dessa e estou em outro planeta, como estou
respirando normalmente? Bebi água e comi da
comida deles?
Eu não queria admitir, mas havia sim uma
explicação científica para isso. Se as condições
para vida são peculiares e o planeta precisar estar
numa zona habitável da galáxia, era lógico que
planetas que abriguem vida sejam semelhantes.
Agradeci por assistir ao Canal H2 tantas vezes na
minha vida.
Após encontrar um motivo, logicamente
explicável, embora mirabolante, só restava decidir
o que faria dali por diante. Com certa vergonha,
confesso que o pensamento de não prolongar meu
sofrimento voltou a assombrar minha mente.
Acredito que seja porque, nesses momentos de
crise extrema, todos os tipos de pensamentos
acabem surgindo. Levantei subitamente da cama e,
dessa vez, a determinação me fez esquecer das
dores que ainda sentia.
Não! Eu nunca fui assim. Eu me recuso a
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Aprendizado
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ancestrais. Entendi.
— Como você se chama? — ela perguntou.
— Meu nome é Everlin. E o seu?
— Joen.
— É um prazer Joen e, a propósito, muito
obrigada por salvar minha vida.
Ela sorriu. Em seguida, notei o rapaz loiro
vindo pela trilha e, em poucos passos, passaria por
nós. Quando Joen o viu se aproximando, derrubou
a cesta de frutas que carregava. Virei o rosto para
ela não perceber a risada que soltei. Depois engoli
o riso e formulei a pergunta da forma mais séria
que consegui:
— E ele como se chama?
— Ah, ele é o Jerrá.
— E quando vai dizer a ele o que sente? —
perguntei, achando-me meio inconveniente por me
envolver numa questão sobre a qual ninguém havia
perguntado minha opinião.
Entretanto, ela havia cuidado de mim todo
esse tempo. E não só dispensado cuidados, mas
também tinha me tratado com carinho, preocupado-
se e me ensinado. Enfim, ela fora muito boa para
mim. Ao ouvir minha pergunta, a face dela ficou
vermelha como um pimentão.
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Sabedoria Animal
agradecia ao H2.
Jerrá era, como eu havia pensado, um homem
rústico, de pouca conversa e cuidava muito bem
dos animais. Embora fizesse o plantio com
dedicação, o clima estava longe de cooperar. O
amor dele por Joen era tão evidente. Só ela não
notava. Às vezes, eu tinha a impressão de que ele
se sentia indigno dela, talvez por viver ali como um
filho adotivo.
As poucas vezes em que avistara o avô de
Joen, minha impressão era que se tratava de um
homem bem rigoroso. Administrava seus bens
pessoalmente, apesar de confiar muita coisa a Jerrá,
pois, muito provavelmente, já o via como neto. Isso
significava que, cedo ou tarde, as coisas se
ajeitariam para a Jo.
O avô dela se chamava Abdala ou Abdali,
alguma coisa assim. Acabei me acostumando a
ajudar Jerrá com os animais, contudo, Joen já não
ficava enciumada. Muito provavelmente, ela
percebera o campo de força anti-homens envolta de
mim. Uma vez ela me perguntou se eu não tinha
medo de ficar solteira, respondi-lhe: nasci solteira,
pior que isso, só casando.
Certa amanhã, fui ao curral dos cavalos e
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Terra.
— Jerrá e eu começaremos a planejar o
casamento — anunciou Jo, com um sorriso
iluminado como o sol, como dez sóis.
— Fico muito feliz, Jo — felicitei com um
sorriso também iluminado, no fim acabei me
deixando contagiar.
— Logo encontraremos um bom homem para
você. Um que lhe mereça.
— Eu dispenso, aliás, quando você encontrar
um homem desses, avise-me para eu correr para o
outro lado.
Ela riu como uma criança, e acabei rindo
também.
— Por que você é tão contra se apaixonar?
— Nada em especial.
Ela fingiu acreditar.
— Você é muito sábia, Lin. E forte. O homem
que ganhou seu coração deve ser extraordinário.
Fiquei sem resposta, afinal, ela só parecia
ingênua. Eu não fazia a menor ideia do paradeiro
de Dáian. Sabia menos ainda para que país ele
havia regressado. Talvez ele ainda ganhasse algum
prêmio Nobel na vida, afinal o destino é cheio de
reviravoltas. Talvez já estivesse casado, e levando
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Dívida
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Lei de Murphy
a voz, espantada.
— Sim — ela reafirmou, arregalando os olhos
— a senhorita é a septingentésima décima segunda.
— Issssooooooooooo! — comemorei, sem
nem pensar.
Ela me olhou como se eu fosse mais louca do
que ela pensava, mas eu nem liguei. Enfim, uma
boa notícia! Era óbvio, com tantas esposas, uma e
outra acabaria passando despercebida, e era aí que
eu iria me encaixar. Resolvi aquietar minha boca e
meus pensamentos. Já havia extravasado mais do
que meu plano original de ser invisível permitia.
Era melhor voltar a não chamar a atenção, pelo
menos não mais que meus olhos puxados já
chamavam.
Passado um tempinho, fui conduzida ao
odioso harém real. E quando entrei, tive uma
grande surpresa. Havia muitas mulheres é claro,
mas, após dar uma boa olhada, muitas delas eram
lindas. Lindas de verdade. E teve um tempo que
achei Angelina Jolie a mulher mais bonita do
mundo. Mesmo eu, que odiava a ideia de um ser do
sexo oposto se aproximar de mim,
inconscientemente reparava na beleza feminina.
Provavelmente por causa desse instinto bobo do
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pestanejar.
Ele voltou-se para mim com um olhar de
curiosidade.
— Não? — inquiriu, como se a minha
negativa fosse a coisa mais estranha ou absurda da
face da Terra deles.
Só faltou me perguntar se eu tinha
enlouquecido.
Parei para pensar alguns instantes em minha
situação, e meu coração disparou. Aquele “não”
provavelmente fora a minha sentença de morte.
Mas... espera um pouco. O que isso
importava? Eu já tinha morrido mesmo.
Virei para ele e soltei.
— Foi isso mesmo que você ouviu. Não!
— E por que não? — ele indagou novamente,
aproximando-se tanto de mim, talvez achando que
a sua estatura imponente ou aqueles peitorais
definidos à mostra pela abertura da camisa
desabotoada fossem me intimidar.
Ainda bem que eu estava de salto, porque só
precisou eu me erguer um pouquinho nas pontas
dos pés para ficar quase cara a cara com ele.
— Porque eu não amo você. Simples assim.
— E por acaso tem alguém que você ame?
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Mundo Azul
Procurando Nemo.
— Eu não virei jantar, uhuulll... ninguém
virou jantar... tá de dietaaaa...
Tá legal, caro leitor, eu via muito filme.
Depois da musiquinha infantil, cai de joelhos
em cima daquele colchão maravilhoso, arqueando
meu corpo para trás, como se estivesse
comemorando por ter acabado de fazer um gol, e de
placa ainda.
Levantei rindo sozinha quando vi o rei parado,
gargalhando na porta, com os braços cruzados,
como se estivesse se deleitando com o espetáculo
gratuito que acabara de assistir. A minha cara,
naquela hora, deve ter ficado vermelha igual a um
tomate, porque senti até minhas orelhas
queimarem. Fiquei de pé meio constrangida e, a
seguir, caminhei até ele com um sorrisinho
totalmente sem graça. Delicadamente o empurrei
para o corredor.
— Parece que preciso de um pouco de tempo
para me organizar — afirmei com um sorriso mais
confiante que consegui. Uma expressão típica de
quem ainda quer transparecer estar “por cima da
carne-seca”, mas acabou de dar a maior bola fora
da história.
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Hallelujah
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de nós.
— Acompanhem a minha esposa até minha
sala de jantar e sirvam-lhe o café da manhã.
— Eu não sou sua esposa — esbravejei.
Os servos me olharam como se me
perguntassem se eu não tinha medo de morrer. O
rei me fitou novamente com aquela expressão que
eu não conseguia interpretar, e isso me deixou com
mais raiva.
— E digam a Ralifax que se ela passar fome
outra vez...
— Sim, meu Senhor — responderam
prontamente os servos, sem deixá-lo terminar a
ameaça.
Todos pareciam ter muito medo dele.
— Não foi culpa dele. Fiz um pedido
complicado que o fizesse me deixar em paz por um
bom tempo — expliquei.
Os servos me olharam ainda mais
assombrados, como se não acreditassem que eu
estivesse defendendo alguém como eles.
O rei abriu um sorriso largo. Era primeira vez
que o via com um sorriso assim. Em seguida, fez
um gesto e os servos me puxaram, indicando-me o
caminho.
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seus afazeres.
Quando finalmente voltei a perambular
sozinha, encontrei o maior tesouro de todos. Uma
biblioteca imensa e aparentemente pouco
frequentada, repleta de livros do chão ao alto teto.
Conhecimento, não diria sem fim, mas muito
extenso. Extenso de verdade. Era simplesmente
perfeito. Tinha acabado de encontrar um quartel
general de operações, com uma vasta fonte de
informação. Não pude deixar de me sentir muito
sortuda.
Em algum lugar daquelas prateleiras, deveria
haver um livro com informações referentes ao
mundo azul, da mesma forma como a tapeçaria na
sala do trono. Precisava apenas de paciência para
pesquisar. Eu tinha tempo, paciência e a força para
perseverar. Então era só questão de dias, meses ou
anos para encontrar a ponte. Não importava quanto
tempo levasse, era algo que eu realizar na vida.
Passei todo dia naquela biblioteca. Embora
tivesse dominado a leitura da linguagem mais
moderna deles, a escrita erudita ainda se mostrava
difícil, e teria de aperfeiçoar minha habilidade. Os
ideogramas antigos eram muito complexos. Percebi
que a simbologia em épocas mais remotas era
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Pastel
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intento.
Quando fosse viajar em busca da porta de
casa, teria de saber me cuidar num mundo hostil. E,
apesar de Lui não ter dito nada, eu estava convicta
de que ele aceitou treinar porque apreciara a minha
coragem. Essa parecia ser a única razão lógica para
o “sim” dele ter sido mais fácil do que previ. Ou
talvez ele tivesse se compadecido de mim, afinal
ele sabia porque eu estava no palácio.
— Outra lição importante. Você não será
capaz de derrotar um homem em uma disputa de
força física.
Às vezes, a sinceridade dele era irritante.
Ninguém o ensinou que não precisa falar tudo
o que pensa?
— Mas isso não significa que você não será
capaz de vencer a luta — advertiu.
Franzi a testa e arqueei uma sobrancelha.
— Você terá de ser mais inteligente, mais
astuta. Terá de transformar sua desvantagem em
oportunidade. E lembre-se, basta um golpe. Um
golpe e acabe com a luta, não espere para dar um
segundo, porque a oportunidade pode não chegar,
entendeu? — admoestou, seriamente, fitando-me.
— Entendi — falei arquejante.
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mesmo ar confiante.
— Que tal fazermos um acordo? Cada vez que
eu derrubar você, ganho um beijo — falou, olhando
diretamente para mim, como se fosse a proposta
mais séria do planeta, como se eu fosse uma rainha
derrotada e estivesse diante de uma proposta de
rendição.
O problema era, pelo que havia visto,
derrubar-me não representaria nenhuma dificuldade
para ele.
Que raiva! Eu vou derrubá-lo, nem que seja a
última coisa que eu faça!
— Que tal você calar a boca — rebati.
Ele sorriu como um garoto, como seu eu
tivesse elogiado em vez de ofender.
O treinamento dele era pior que o de Lui. Ele
era mil vezes mais habilidoso. Quando estávamos
em posição de luta, o olhar dele era implacável, e
tenho certeza de que a mente dele funcionava a
todo vapor, calculando todos os possíveis
movimentos do oponente. Provavelmente venceria
Lui facilmente.
— Força nas pernas, Lin. Mantenha sua base
firme!
— É Everlin — pronunciei entre dentes.
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Som Angelical
tocar.
Golpe baixo!
Expirei o ar bem irritada. Retornei, sentei-me
na banqueta e comecei a mostrar sequência das
notas da mão direita bem devagar. Ele tentava
repetir, mas, pelo jeito, a noite ia ser longa, pois ele
não tinha a menor coordenação motora.
Quando já estava quase dormindo sobre as
teclas ele me liberou, com a condição de que eu
tocasse uma última música. Eu não ia tocar nada
sentimental com ele ali, então a única música que
consegui pensar foi He’s a Pirate, do filme Piratas
do Caribe.
— Você podia ter tocado algo mais romântico,
não acha?
— Sabe que não me deu vontade.
— Eu sou paciente — ele disse, com aquele
sorrisinho que me dava nos nervos.
Voltei ao meu quarto com uma convicção:
“para ter o piano, ia ter de carregar o aluno de
brinde”.
Onde eu vim amarrar o meu burro, meu
Deus?
No dia seguinte, lá estava eu, dormindo sobre
a mesa real em pleno café da manhã, com aquela
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Que droga!
— Lui, me diga uma coisa. Que tipo de pessoa
é o rei?
Ele pareceu não gostar da pergunta.
— Um governante inteligente, preocupado
com o povo, um exímio lutador, um bom diplomata
e excelente em estratégias de guerra.
— Você está me descrevendo uma receita de
bolo ou um homem?
O meu ex-professor acabou soltando uma
risada mais aberta.
— Quero saber como ele é como pessoa —
disse também rindo.
— Ah... eu diria que é uma boa pessoa. Em
pouco tempo, já conseguiu retirar a raça dos
comuns, a população carente do país, da extrema
miséria.
Confesso, essa informação me surpreendeu
um pouco.
— E por que tantas mulheres?
— É um costume do nosso povo, o pai dele
tinha mais de mil.
— Hum...
— Isso a incomoda, senhora? — perguntou,
como se não quisesse muito ouvir a resposta.
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— Não.
Lui sorriu. Era até estranho vê-lo sorrindo.
— Todos os homens do seu reino têm muitas
mulheres?
— A senhora é mesmo de longe, não é?
— Mais do que você imagina — respondi,
meio nostálgica.
— Até o nobre mais rico só consegue
sustentar umas três mulheres. Tantas assim, só o
um rei mesmo.
Até nesse mundo mulher é considerada como
despesa. Algumas coisas não mudam, não importa
onde se esteja.
— E por que mulheres valem dinheiro?
— Mulheres são bastante raras no mundo
como um todo. Algumas nações até invadem outras
em busca de mulheres. Quanto mais raras e
habilidosas, mais valiosas.
— Quer dizer que para ele ter setecentas
esposas, deixou pelo menos uns setecentos rapazes
solteiros por aí?
— Algo em torno disso.
Quem diria que existe um planeta onde há
mais homens que mulheres. Conheço algumas
garotas na Terra que, se soubessem disso, iriam
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Nahina
defendido assim.
— Diga ao rei que agradeço, de verdade —
decidi aceitar a trégua.
Muito embora achasse o rei um conquistador
barato, não podia deixar de admitir que, até aquele
momento, ele tinha sido bom para mim. E eu nem
sabia o porquê. Embora ele achasse divertido me
aporrinhar, estava sendo de grande ajuda. Além
disso, em alguns momentos, até eu precisava
engolir um pouco meu gênio.
Quando Ralifax saiu, perguntei os nomes das
meninas, e elas me olharam como se não
acreditassem que eu desejava sabê-los.
— Senhora, nenhuma das esposas do rei
jamais perguntou quem somos.
— Mas não sou uma esposa do rei, sou? Não...
então, vocês não têm motivo para se preocupar.
Elas sorriram.
— Eu sou Janes — apresentou-se a garota que
cuidou dos meus cabelos no primeiro dia.
— Eu sou Carin.
— E eu sou Delaila.
— É um prazer, meninas — falei sorrindo.
— Não era boato que a senhora é diferente.
Até come com os criados — mencionou Janes,
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quarto hoje.
Maravilha! Hoje não é só meu dia de
descanso, é meu dia de folga dele! Nem acredito!
Pedi para todos se sentarem no chão e
começamos nosso enorme e delicioso piquenique.
Todos os servos com quem falei na cozinha, ou
mesmo ali nos meus aposentos, eram pessoas
extremamente gentis e humildes. Era muito melhor
ficar na companhia deles que naquele harém, onde,
pelo jeito, só haviam moças ricas.
E isso, mesmo que eu não quisesse admitir, eu
também devia ao rei. Odiava pensar nele como o
responsável por minha vida, naquele mundo, ter se
tornado um pouco melhor. Na casa de Joen eu
também havia sido muito bem tratada, mas no
palácio, minhas chances de encontrar meu lar
estavam bem mais próximas, mais palpáveis. E
meu plano maluco que, com toda certeza, ia
culminar na minha morte, seria mesmo factível.
Eu também sabia que, cedo ou tarde, teria de
pensar na fuga. E, provavelmente, teria de deixar
para trás a pulseira de Dáian como garantia que não
importunariam a Joen. Ou talvez conseguisse ser
expulsa por insubordinação, o que seria
infinitamente melhor.
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— Saia!
O rei se levantou e passou a me encarar.
— Everlin...
— Nunca mais repita essa palavra perto mim!
Agora saia! — esbravejei.
Ele caminhou em direção a porta, entretanto,
não parecia irado. A impressão era de carregar
algum pesar. Não sabia ao certo se ele havia
enxergado o trauma por trás da minha fúria ou se só
estava curioso. Antes de sair, ele me olhou mais
uma vez.
— Eu odeio essa maldita palavra — confessei
mais calma, agarrada a minha pulseira e sentindo
meu corpo todo tremer.
Sete ainda permaneceu alguns instantes na
porta do aposento com aquela expressão
enigmática. Sua respiração era pesada e
compassada. Comecei a limpar as lágrimas do meu
rosto, as quais acabaram rolando contra minha
vontade quando foram desacorrentadas pelo meu
nervosismo.
Eu devo ser a criatura mais idiota do cosmos
por deixar que uma simples palavra que começa
com “p” destruir todo o meu chão desse jeito.
No entanto, se tinha uma coisa que eu evitava
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Inimiga
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Bufei.
— Não houve nada, só resolvi redecorar.
Ele cruzou os braços e arqueou uma
sobrancelha, como se me perguntasse se eu o
achava com cara de idiota. Mal sabia ele que eu
realmente achava isso.
— O que está segurando?
Droga, ele achou a minha pista.
Entreguei o pedaço de tecido para ele, que se
enfureceu assim que tocou.
— Só para constar, não tenho nenhuma roupa
como essa aqui.
— Não se preocupe com isso.
— Não estou preocupada. Só peço que não
interfira. Meus inimigos eu derroto sozinha —
admoestei.
Ele sorriu.
— Mas é minha função proteger você — disse
com aquele olhar terno detestável.
— Você podia começar ajudando, então. Que
tal parar de chamar para briga alguém que deu o
azar de ficar fora do ar com a cabeça virada na
minha direção.
— Você é muito devagar. Não percebeu, ele
está apaixonado por você?
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Joia da Rainha
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contra a parede.
— Por que você não me chamou? Eu estava
praticamente ali ao lado — indagou, repreendendo-
me.
— Eu já te disse, meus inimigos eu derroto
sozinha — retruquei, tentando me desvencilhar.
— Você sabia que até o sangue daquilo é
venenoso? — reprovou-me, inspecionando meu
corpo como se quisesse ter certeza de que nenhum
pedacinho daquele bicho asqueroso encostou em
mim.
— Eu estou bem, sério — respondi vencida,
diante da preocupação, que parecia genuína.
Em seguida, Sete me abraçou, e acabei não o
afastando. Apesar de toda força que eu
demonstrava, por dentro eu tremia. E meu corpo
parecia irradiar aquela vibração de pavor, sendo
acalmado pelos braços firmes dele. Àquela altura
eu já devia estar acostumada a sentir medo. Não foi
fácil encarar aqueles planetas no céu.
— Agora preciso mesmo ir, vai ficar bem? —
ele indagou de um jeito tão doce que minhas
palavras rebeldes de costume acabaram por não
serem pronunciadas.
Só fiz um gesto afirmativo, o qual eles
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Último Sorriso
todo vermelho.
Às vezes o raciocínio de uma criança é,
simplesmente, extraordinário.
Sete ficou lá parado sem ter o que dizer.
Derrotado por uma menina, a qual aparentava não
ter mais de cinco anos. Claro, não pude evitar ficar
olhando para a cara de tonto dele com a mão na
boca, na tentativa frustrada de esconder que eu
estava rindo até a alma.
— Quem puxou seus olhos? — a pequeninha
disse olhando para mim.
— Deus, eu acho — respondi sorrindo.
— É bonito — ela elogiou alegre.
— Obrigada.
— Quando meus pais melhorarem, você e meu
irmão vão se casar?
— Yuren! — repreendeu Lui.
— Que tal esquecer um pouco essa história de
casamento — interrompeu o rei.
A pequena Yuren olhou para Sete por alguns
instantes e depois voltou-se para mim.
— Acho que o grandão também quer se casar
com você, mas o meu irmão é mais bonito —
declarou com tanta sinceridade que foi impossível
não ceder ao encanto.
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Segredo
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— Eu sei — interrompeu-me.
Nesse instante, chegou um homem a cavalo no
portão. Lui e eu corremos até ele. Era um do tipo
que eles denominavam de “semelhantes”.
— Meu senhor, eu soube de uma mulher, uma
esposa do rei, curando doentes da praga.
— Praga? — indaguei.
— Sim, minha senhora. Já chamam de “o
terror oculto”. A cidade está tomada disso. Dizem
que outros povoados também.
— A cidade é próxima — informou Lui.
— Eu tenho de ir até lá.
Olhei para a casa de Lui. Se eu discutisse isso
com Sete, eu tinha a mais absoluta certeza que
desta vez ele não iria me deixar ir. Ele tinha visto o
risco que corri para tentar salvar Yuren.
— Sem o rei saber, do contrário... —
acrescentei, fixando-me em Lui.
— Ele não vai deixar você ir — completou o
comandante.
Assenti.
— Eu irei com você — asseverou, resoluto.
— Pode ser perigoso.
— Para todo mundo. Eu vou buscar suas
coisas sem que ninguém perceba. Espere aqui.
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— Não se atreva.
— Por que você é tão contra me ver à
vontade? — provocou, deixando o roupão cair até a
metade do corpo, expondo os peitorais torneados.
— Sete, acho bom você colocar de volta esse
roupão e deitar nessa cama minimamente decente.
Caso contrário, você nunca mais me verá no seu
palácio enfeitado. Eu juro! — retorqui com os
olhos em chamas.
Ele olhou para mim de uma forma séria.
Depois acabou abrindo um sorriso largo e
espontâneo.
— Vencido em meu próprio jogo — ele disse
enfim, com aquele sorrisinho maroto.
Agora era eu quem o olhava vitoriosa.
— Só a parte de cima então — retrucou.
— Cubra-se agora.
Ele se recompôs e se deitou. Comecei a
colocar entre nós todo e qualquer travesseiro que eu
via na frente, formando uma barreira.
— Este é o seu lado da cama e este é o meu.
Boa noite! — despedi-me, virando do lado oposto
ao dele.
Ele virou-se para o meu lado, repousando a
cabeça no braço, cujo cotovelo estava apoiado na
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Culpados
tesouro.
— Minha pulseira. Eu tenho de pegá-la de
volta! — eu repetia inconsolável.
Sete me chacoalhou e me encarou.
— Lin, você está bem e é isso que importa.
— Não! Eu tenho que recuperar minha
pulseira! — retorqui aos berros.
— Não se preocupe, eu lhe darei outras cem
iguais àquela — disse o rei me abraçando
novamente.
— Não! — refutei, afastando seus braços
abruptamente — você não entende, aquela pulseira
é insubstituível. É tudo o que me resta dele —
completei, já soluçando de tanto chorar.
— Por que você não consegue esquecer isso?
Por que você não consegue olhar para mim? Por
que sofrer tanto por algo que alguém te deu há mais
de dez anos e você não o vê desde então? — Sete
esbravejava desesperado em minha direção.
— Não me lembro de ter dito a você que eu
não o via há mais de dez anos — falei, encarando-
o.
O rei recuou alguns passos, parecia que estava
escolhendo bem as palavras porque, pelo jeito, a
confissão a seguir seria, no mínimo, embaraçosa.
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Corpo Gelado
luz, eu diria.
— Posso dormir agora, Lin? — indagou com
uma voz debilitada, quase inaudível.
— Pensei que já estivesse dormindo —
respondi.
— Não, eu queria aproveitar você me tocando
— a voz podia estar falhando, mas o sorriso
travesso estava lá firme e forte.
— Não estava te tocando, só limpando seu
suor — retruquei, um pouco sem jeito.
— Você não me deixa nem sonhar, não é? —
ele rebateu, sorrindo.
Corei.
— Pode dormir, eu deixo — liberei-o, enfim.
Ele ensaiou um sorriso abatido e cerrou os
olhos. Levantei um pouco para buscar mais água e
notei o tempo estava mudando. Nuvens bem
carregadas estavam chegando do Norte e o vento
frio já bagunçava meus cabelos.
Entrei na cabana e comecei a reforçar a
cobertura de algumas janelas, mas não havia
sobrado nenhum material para reforçar a da frente.
Encontrei um pedaço de tecido que ia ter de servir
como cobertor.
Cerca de meia hora depois, a chuva começou e
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fugir.
Nem acredito!
Só não explodi de felicidade por causa da
expressão do seu rosto. Ele não parecia deprimido
até soltar aquele “vou”. Pensei ser indelicado da
minha parte comemorar enquanto ele parecia triste,
por isso, fiquei séria.
— Apenas preciso que vá comigo a um lugar
primeiro, pode ser? — ele disse com o olhar tão
distante, e eu podia jurar que os olhos dele
turvaram um pouco.
Eu devia estar ficando louca. Como um
homem daquele porte ia, de repente, ficar com os
olhos cheios lágrimas. Com certeza, eu estava
vendo coisas.
— Tudo bem — assenti.
— Obrigado — ele disse, mirando-me com
aquele olhar penetrante.
— Eu é que agradeço — falei, desviando o
rosto.
Voltei para o meu quarto pensativa. A reação
de Sete não me deixava ficar completamente feliz e
eu não sabia o porquê. Quando cheguei, Ralifax já
estava esperando por mim.
— E aí, Rali? — cumprimentei ainda meio
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cabisbaixa.
— Minha senhora, acredito que o rei já tenha
lhe dito que vão sair.
— Sim, ele disse que ia me levar a um lugar
antes de me liberar.
— Ele disse que iria libertar a senhora! —
exclamou o servo, completamente surpreso.
— Disse. Por que, Rali? — perguntei com o ar
desconfiado.
— Por nada, minha senhora. Começarei a
preparar vossas coisas imediatamente.
A expressão de surpresa de Ralifax colocou
uma pulga atrás da minha orelha. Será que Sete não
tinha a intenção de me libertar? Pensei por alguns
instantes e resolvi expulsar essa dúvida da minha
mente. Afinal, Sete nunca havia mentido para mim.
Ele cumpriu tudo o que prometera.
— Rali, por que precisa preparar minhas
coisas? Onde Sete vai me levar?
— É uma montanha, não fica muito longe do
palácio. Mas acredito que terão de acampar por
uma noite ou duas.
Bom, não adiantava querer apressar as coisas
àquela altura do campeonato. Eu já havia esperado
por tanto tempo para procurar pela ponte que uns
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A Caverna dos
Morcegos
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O meu MP3.
Meus olhos subiram até o seu rosto, e eu senti
como se uma venda tivesse sido arrancada deles. E,
enfim, pela primeira vez, eu o via de verdade.
Isso podia mesmo acontecer? Na vida real?
Era mesmo possível que ele estivesse bem na minha
frente esse tempo todo e eu não tivesse notado?
Que o caminho de duas pessoas se cruze e se cruze
novamente como numa espiral?
Minha visão, agora aguçada, corria por cada
linha do seu rosto. Por cada traço. Por cada curva.
Por cada cor e cada contraste. Os mesmos cabelos
castanhos chocolate. A mesma pele levemente
bronzeada. Os mesmos olhos castanhos caramelo.
A pele da face continuava lisa, como a superfície
de uma seda fina, e os contornos do rosto tornaram-
se mais másculos, mais firmes, assim como todas
as demais partes de si. Todo seu corpo agora era
forte, imponente, protetor, perfeito. Ele havia se
tornado um homem. Um homem incrível.
— Até que enfim você está mesmo olhando
para mim — falou o rei, abrindo, em seguida, um
sorriso tímido.
— Como isso é possível? — indaguei no meu
idioma e com a voz embargada.
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— asseverou.
Voltei-me na direção dele com um pouco mais
de atenção.
— Senhora, a história que quero lhe contar é a
de um jovem príncipe, cuja mãe morreu ao nascer e
passou a ser criado por um preceptor, porque seu
pai, o rei de um grande país, era atarefado demais
para se ocupar de coisas triviais como a sua
educação.
— Certo dia, durante seus exaustivos
estudos, o jovem príncipe ouviu falar de um mundo
longe daqui. Um mundo coberto por águas. Um
mundo onde o verde se estende até onde os olhos
podem alcançar. Um mundo em que o sol brilha
como ouro e uma única lua solitária resplandece
soberana em meio ao manto escuro da noite
estrelada.
— O jovem príncipe ficou encantado com esse
mundo, e durante anos abriu mão de praticamente
todo o seu tempo livre para aprender sobre ele,
admirando cada linha das poucas figuras que dele
existiam. Este príncipe sabia que em seu próprio
mundo havia uma porta, capaz de levá-lo ao mundo
de seus sonhos. Entretanto, a lei de seu pai proibia
terminantemente qualquer um, com conhecimento a
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O Tesouro de Yonah
só de imaginar.
— Acho melhor você ir logo, antes que eu
comece a pensar — alertei, completamente
nervosa.
Dáian sorriu de um jeito tão doce e alegre que
parecia que o fantasma da tristeza de um minuto
atrás nunca houvesse lhe assombrado. Bem
devagar, ele deu a volta por mim, abaixou-se,
pegou o meu robe e voltou a vesti-lo em mim. Ele
estava tão perto, que eu sentia sua respiração em
meu pescoço enquanto seu perfume inebriante me
envolvia indo até as entranhas de minha carne.
O tecido tocou minha pele de um jeito
totalmente diferente de quando eu mesma me
vestia. Até aquele simples pedaço de pano, quando
conduzido pelas mãos de Dáian, era capaz de me
fazer estremecer em êxtase.
Assim que ele terminou de me cobrir, senti
seus dedos correndo suavemente pela lateral da
minha coxa, subindo pela cintura, passando pelo
contorno de meu seio, depois pela axila, descendo
por toda a extensão do meu braço, chegando,
enfim, à palma de minha mão, até seus dedos se
entrelaçarem nos meus. Eu já tinha esquecido como
suas estranhas carícias conseguiam arrancar, lá das
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confessei acanhada.
Dáian abriu um sorriso lindo e radiante.
Depois disso, veio caminhando tão rapidamente em
minha direção que quando me dei conta, já estava
em seus braços e seus lábios já estavam
completamente encaixados nos meus, numa
perfeita simbiose.
Ele me beijava com tanto desejo, como se
estivesse sedento por isso há milênios. E eu, mais
uma vez, senti aquilo que experimentei há dez
anos. Uma sensação que não consigo descrever. E,
finalmente, entendi porque me tornara renitente
quando o assunto era me apaixonar novamente. Em
algum lugar, recôndito de meu ser, perfeitamente
que nenhum homem no universo podia me dar
aquilo, só ele.
Não consegui controlar mais a necessidade, a
qual eu estava contendo há dez longos anos, e
comecei a beijá-lo vorazmente, como se não
houvesse amanhã. Ficamos ali nos beijando nem
sei por quanto tempo e, somente quando estava no
limite do meu fôlego, desgrudei meus lábios dos
dele. Respirei fundo.
— Até que enfim consegui acalmar minha
sede de dez anos — admiti sem pensar e sem saber
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onde me enfiar.
— Mas eu ainda não — afirmou, passando sua
mão pelos cabelos da minha nuca e os segurando
suave e firmemente.
Ele me beijou outra vez, com o mesmo apetite
ávido e, de minha parte, entreguei-me
completamente. Após algum tempo, começamos a
ficar sem fôlego novamente.
— Você me sufoca assim — repreendi, rindo.
— Me desculpe, perdi o controle de mim.
Olhei para ele e fiquei acariciando seus
cabelos. Dáian me tomou em seus braços, como se
eu fosse leve como um papel e se sentou comigo
aninhada ao seu peito, aos pés daquela árvore
gigante e linda.
Deitei minha cabeça em seu ombro.
— Para você ter ido me ver daquele jeito, no
mínimo Ralifax deve ter lhe contado tudo, não é?
— Contou. Eu sinto muito por seu pai —
expressei, levantando a cabeça.
— Eu não queria que você soubesse. Não
quero que sinta nem sequer uma gota de culpa pelo
que aconteceu — asseverou, mirando-me
fixamente.
Beijei sua bochecha.
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— Até amanhã.
Tão logo Dáian saiu, senti que cheguei até
minha cama flutuando numa nuvem. Nem percebi o
sono chegando.
garganta.
Soltei os bastões.
— Não, minha senhora. Minha vida não vale a
sua.
— Nunca mais diga isso, Rali. O que seria de
nós sem você — sorri, tentando manter o otimismo,
porque o desespero não iria ajudar em nada.
Um soldado me agarrou pelo braço.
— É ela a curandeira que arruinou nossos
planos. A esposa de Sete.
— Vamos levá-la para Éfer.
Aquele soldado nojento amarrou minhas mãos
e foi me puxando até me jogar numa espécie de
gaiola carruagem. Pelos buracos das barras entrevi
Dáian chegando e pondo todos aqueles cretinos no
chão.
— Leve-a antes que Sete a pegue de volta.
Senti aquela estranha carruagem começar a se
movimentar.
Dáian me viu e veio em minha direção tirando
todos do caminho como se não passassem de
míseros insetos. Entretanto, à medida que Dáian
avançava no encalço de meus carcereiros, a
retaguarda ficava desguarnecida, porque ele, de
longe, era o guerreiro mais poderoso.
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Super Abraço,
M. Okuno
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CAPITULO EXTRA
Ouvindo Say Something, Anthem
Lights
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Milagre do Universo
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Pobres moças.
O rei parecia não dar a mínima enquanto suas
esposas demonstravam uma felicidade descomunal
no dia de sua visita, deixando evidente o quanto
aquele era o dia mais importante de suas vidas.
Pensando bem, a vida tem mesmo dessas coisas: a
sorte de um pode ser o azar do outro.
Assim que entrei no harém, o anunciei
rapidamente não dando o menor tempo de ele
mudar de ideia, afinal tudo o que eu podia fazer era
convencê-lo, mas se ele resolvesse não comparecer
mesmo, não havia poder no mundo capaz de
obrigá-lo.
Como sempre, todas aguardavam sua chegada
ansiosamente, mas o mestre sempre bufava e
demorava uns minutos para adentrar como se
tentasse buscar algum tipo de força ou paciência,
ou sei lá.
O rei adentrou no recinto e logo a atmosfera
no lugar se transformou completamente, inundado
pela alegria e euforia das mais de setecentas
esposas, e cada uma ansiava ardentemente que sua
noite com o mestre, enfim, tivesse chegado.
As garotas fitavam-no com tanto desejo, mas o
mestre, por sua vez, mantinha o olhar perdido, sem
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inveja.
— Amor? O que é isso? Se usa para fazer o
que? —disparou, provocando-a.
Pelos Céus!!!! De onde ele tirou isso? Morre
de amores por uma garota, a qual “sabe-se lá” o
que estaria fazendo naquele exato momento.
E a pobre criança à sua frente talvez tenha sido
noiva. Era a única razão plausível para ter chorado
o caminho todo.
Justo por essa ele tinha de se engraçar.
Mas o que realmente importava era que ele,
enfim, parecia feliz e, há muito, eu não o via assim.
Só esse fato já me fazia querer beijar os pés
daquela menina.
Como em um único instante essa garota
conseguiu fasciná-lo dessa forma?
Ele a olhava profundamente com um misto de
alegria, euforia, curiosidade e desejo, que me
deixou todo arrepiado. Se ele a queria tanto, tinha
sorte porque ela estava no lugar certinho. Bem na
palma de sua mão.
Ao que tudo indicava, seria uma noite
agradável para o mestre. E ele não desfrutava de
uma noite dessas há muitos anos. A última vez que
o vi com um brilho como aquele, ele havia acabado
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comportar — exortei.
— Eu não perderei o decoro, prometo. Eu só
quero olhar para ela.
— Não estou bem certo disso, dado o vosso
comportamento no harém hoje. Achei que voaria na
menina ali mesmo.
Ele fez uma careta de quem não conseguia
arranjar um bom argumento. Em seguida, acabou
mirando-me com aquela expressão interesseira,
fazendo aquele gesto de “por favorzinho”, da
mesma foram de quando suplicava para eu encobrir
suas fugas para o mundo azul. Semblante, o qual
ele sabia muito bem que arrancava qualquer coisa
de mim.
— Além disso, as meninas ainda devem estar
perambulando pelo salão.
— Esperamos lá perto então, até dormirem —
argumentou, não escondendo a ansiedade.
— Está bem, mas o senhor vai prometer que
manterá um comportamento digno da realeza.
— Eu prometo — comprometeu-se com
aquele ar de menino levado, fazendo-me perceber
que nas profundezas daquele rei forte ainda vivia
um garoto. O meu garoto.
Fomos, então, até o harém real e o lugar ainda
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aflito.
— Mestre, ela parece ser uma garota
razoavelmente inteligente para saber que esse é um
dos possíveis destinos de alguém que se atreve a
pisar o pé de um rei — expliquei do jeito mais
simples e direto possível, sem evitar a risada
quando terminei.
— Está enganado, Ralifax. Ela deve ter
percebido que não sou esse tipo de rei — expôs,
tentando se tranquilizar.
— É, talvez — concordei, mais para mantê-lo
calmo, porque ele pareceu não ter gostado nadinha
da piada e, se ele saísse de si, achando que a
menina estava sofrendo, entraria naquele harém
sem se importar com mais nada — e posso saber de
onde o senhor tirou aquilo sobre o amor? —
prossegui, mudando logo de assunto.
— Eu só quis provocá-la um pouco, nem sei
por que. Sei lá, ela estava tão... combativa. Acho
que quis apreciar um pouco mais aquela carinha de
brava. Uma expressão que, naquele tempo, ela não
demonstrou para mim — explicou, nostálgico.
Bom, se aquilo foi um embate, definitivamente,
o mestre estava perdido.
Saldo da noite, dez a zero para a moça!
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