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APRESENTAÇÃO

Esta seleção de textos se refere a uma sociedade de contrastes, transcultural, consumista, mixada pelo gairaigo, mas que ainda consegue preservar suas
insígnias tradicionais, os mons e kamons. Esta sociedade capaz de equalizar a convivência do antigo com o moderno, com a cultura de massa, com os
excessos, as saturações, os colecionismos, ou os problemas de confinamento é também capaz de preencher o olhar do turista com as imagens das pomposas
gueixas que passeiam nas ruas lado a lado com a rebeldia e a graciosidade das meninas gyarus (girls). O Japão é uma vitrine para o mundo e aqui se pode
devorar de tudo! Este livro parte dessa discussão, percebida pelos olhos de pesquisadores de fora do Japão.

Para iniciar, a pesquisa de Roberta Akemi Yamada sobre “Gairaigo”, o chamado empréstimo linguístico, procura discutir a formação de inúmeras palavras
japonesas, de origem estrangeira, que tem influenciado a língua falada atualmente. Além deste aspecto, a pesquisadora preocupa-se também com a
demonstração pelo viés fonológico e morfossintático da língua japonesa.

A pesquisa de Eduardo Ávila trata das insígnias familiares japonesas, denominadas Kamon, pensadas como código visual de reconhecimento dos grupos
sociais e sua organização categórica em manifestações hierárquicas e outras variações. Eduardo descreve ainda, como os padrões visuais foram se
solidificando ao longo dos tempos e percorrendo outros suportes até a sua ressignificação.

A ideia de trazer o corpo para discussão é a proposta do pesquisador Marcel Sousa, organizado em três partes, a saber: como um breve mapeamento histórico
contextual; como algumas características do pensamento oriental e suas representações; como desdobramentos sobre a corporalidade oriental, destacando a
importância do treinamento, das relações espaço-temporais e das experiências práticas.

Em relação às práticas corporais, a pesquisadora Lariani Djunko traz uma abordagem do Aikido, como arte que recebeu influência dos aspectos culturais e
comportamentais da sociedade japonesa, refletindo sobre como os ‘artifícios’ nos treinamentos afetam os atletas, questionando as estratégias educacionais
utilizadas para a viabilização do treino, apreendendo a relação: disciplina e conduta.

A hipótese levantada pelo professor Ismar Lima aponta o Japão como uma nação transcultural, constituída de “enclaves etnoculturais e estrangeiros” e em
flagrante transição e transformação, incorporando aspectos culturais e sociais de outros povos. O professor Ismar procura discutir questões atadas ao
transculturalismo nipônico, à aculturação e à japonicidade, levantando questionamentos sobre o rompimento com o paradigma da sociedade homogênea.

E finalmente, minha pesquisa sobre o universo otaku e hikikomori procura nova luz nos paradoxos de um país atravessado pela tecnologia comunicacional, mas
que ao mesmo tempo, abriga uma gama de prisioneiros da (in) comunicação. Os hikikomoris se isentam dos contatos físicos durante longos anos, ou décadas,
permanecendo trancafiados em seus quartos, vivendo e respirando tecnologia através dos seus computadores. Atualmente, o tema começa a despertar
interesse e discussão no mundo.
Sobre o Centro de Pesquisas em Cultura Japonesa de Goiás

Esta publicação recebeu o convite inicial por intermédio da Editora CRV, de Curitiba, em agosto de 2011 e mobilizou os pesquisadores interessados em
colaborar com este labor coletivo. Justamente nesse período, fui agraciada com a bolsa de pós-doutorado, concedida pela FAPESP. O apoio da FAPESP me
permitiu viajar para o Japão, documentando boa parte da pesquisa, além de possibilitar a aquisição de materiais para dar continuidade às pesquisas no Brasil.
Chegar até aqui não teria sido possível sem o incentivo de inúmeras pessoas e instituições, entre elas, a Associação Nipo Brasileira de Goiás, representadas
pelo presidente Carlos Suguri e demais diretores, Jadir Matsuy, Junichiro Sado, Mário Kuwae, Akira Sado, Octavio Saito, Edgar Yabumoto, Reinaldo Garibaldi e
outros, que não mediram esforços para nos apoiar nesta publicação; e também a Profa. Dra. Christine Greiner e o jornalista Prof. Dr. Marco Souza, do Centro de
Estudos Orientais da PUC-SP, parceiros do CPCJ-GO.

O interesse inicial pela formação de um centro de pesquisas (situado em uma associação nipo-brasileira) surgiu após o lançamento do livro “Meia volta ao
mundo, imigração japonesa em Goiás” que tive a honra de coordenar e que foi publicado pela ANBG em 2008, ano do centenário da imigração japonesa no
Brasil. O livro recebeu apoio financeiro da Secretaria Municipal da Cultura de Goiânia, e de lá pra cá tem atraído inúmeros interessados nos estudos japoneses.
Este centro de pesquisa é pioneiro no Estado de Goiás, no que diz respeito ao acolhimento dos estudos interdisciplinares, com foco na cultura japonesa.

Após esta etapa, alguns pesquisadores passaram a participar de eventos acadêmicos submetendo seus artigos em encontros científicos voltados à temática
japonesa. O primeiro deles foi o XX ENPULLCJ1 e VII CIEJB “Para além do Japão: Brasil, Canadá e França” realizados na Casa da Cultura Japonesa e
organizado pelo Centro de Estudos Japoneses da FFLCH-USP, da Universidade de São Paulo. Em 2010, alguns pesquisadores participaram novamente deste
encontro, desta vez na Universidade de Brasília, DF. Desde sua fundação, inúmeras atividades marcaram a trajetória do CPCJ-GO, dentre elas: a participação
na XIV e XV Mostra da Cultura Japonesa Bunka-sai respectivamente em 2009 e 2010; no Projeto Imaginário Coletivo, 80 anos da imigração japonesa em
Nerópolis, realizado em parceria com a Prefeitura e a Câmara Municipal de Nerópolis e a ANBG - Associação Nipo Brasileira de Goiás; elaboração do website
www.cpcjgo.org e 12 palestras e encontros mobilizando os próprios pesquisadores. Participamos também no Projeto Dança em Territórios, em parceria com a
Companhia Flutuante de São Paulo e a Escola de Música e Artes Cênicas da UFG (em abril/maio de 2010), sendo este, contemplado com o apoio financeiro da
FUNARTE.

Os desafios ainda estão longe de serem vencidos, entretanto, poder contar com a credibilidade de parceiros como a Associação Nipo Brasileira de Goiás; a
Associação Brasiliense de Ex-Bolsistas Brasil/Japão (ABRAEX) representada pelo Presidente Ogib Teixeira Filho e pela Vice-Presidente Marta Yada; o Núcleo
de Educação a Distância da Faculdade de Artes Visuais da UFG (EAD-FAV) pelo apoio da Profa. Dra. Lêda Guimarães e da Profa. Noeli Batista; e o Centro de
Estudos Orientais (CEO-PUC-SP), tem nos motivado a dar prosseguimento nesta jornada. Nossos sinceros agradecimentos a todos!

Profa. Dra. Cecilia Noriko Ito Saito

Tokyo, 20 de março de 2012.

NOTA PRELIMINAR

Para a transcrição de palavras da língua japonesa utiliza-se o método de rômaji Hepburn*, de transliteração de sons do idioma japonês em caracteres latinos.
Esse método é adotado oficialmente em países de língua inglesa e no Japão. De tal modo, os termos escritos em rômaji (letras latinas/romanas) serão grafados
em itálico. É importante ressaltar que os nomes próprios de origem japonesa, serão escritos como no Japão: sobrenomes seguidos de nomes; e os topônimos
serão grafados também ao modo Hepburn: Tôkyô (em vez de Tóquio ou Tokyo) Kyôto (em vez de Quioto ou Kyoto), Ôsaka (em vez de Osaca ou Osaka).

OTAKU E HIKIKOMORI – DESDOBRAMENTOS DA CULTURA POP DO JAPÃO

Cecilia Noriko Ito Saito

Introdução

Esta pesquisa procura trazer os temas “otaku” e “hikikomori” para discussão, analisando seus processos de significação e suas relações com as novas
tecnologias comunicacionais. Conhecido como um dos países a abrigar o maior número de devoradores de jogos e de tecnologia digital do mundo, o Japão é o
responsável pela nomeação ao otaku e hikikomori. Mas, o que é otaku? E hikikomori? De um modo geral, os otakus são pessoas particularmente ávidas por
colecionar objetos de anime e mangá, apaixonadas por games de toda natureza e experts em algum assunto relacionado à cultura pop do Japão. Os otakus são
facilmente vistos em Akihabara, o bairro tecnológico do Japão, e são conhecidos pelas peculiaridades físicas e na vestimenta. Embora existam as similaridades,
o hikikomori pode ser pensado como um subgrupo otaku. São indivíduos que apresentam comportamentos radicais, vivendo em confinamento em seus lares
durante anos ou décadas, sendo sustentados pelos seus familiares. Muitas vezes, o hikikomori é associado aos portadores de um tipo de distúrbio social.

Ainda pouco debatido no Brasil, mas movimentando inúmeras discussões na Europa, Estados Unidos e outros países, o universo otaku e hikikomori conquista
visibilidade mundial atrelado à cultura pop japonesa e à contaminação dos animes e mangás na era globalizada. Adentrar o âmago deste universo significa
tatear as inúmeras ramificações e complexidades inerentes ao objeto de pesquisa. Algumas similaridades podem ser percebidas, a exemplo da solidão das
mães japonesas e do manifesto das garotas “gyarus” que desfilam pelas ruas de Tôkyô. Andar pelos arredores de Shibuya, Harajuku e Shinjuku fará muita
diferença para quem nunca viu a imagem destas garotas. É impossível ao olhar estrangeiro ignorar o embate visual através do estranhamento.

Por outro lado, o crescente desenvolvimento das redes sociais na Internet, repletas de depoimentos, imagens, vídeos e uma gama variada de informações,
possibilitam proximidade com os elementos de outra cultura. Pensando nesta perspectiva, visitar o Japão tornou-se também imprescindível para a observação
do fenômeno. Assim, estando em Tôkyô, pude descobrir alguns trabalhos muito interessantes de apoio aos hikikomoris.

Dentre as inúmeras inquietações sobre o tema, uma delas sempre se repete: até que ponto a ramificação destas questões ultrapassam as fronteiras do Japão?
Embora ciente de que lidamos com deslocamentos, vale lembrar Peter Burke2 e sua proposta de um continuum cultural que possibilita abertura para novos
caminhos investigativos. A base bibliográfica para as análises advém dos fundamentos dos estudiosos do Japão3 e de outros países do ocidente4 contando
também com a abordagem da Teoria Corpomídia5, que juntos, fornecerão referenciais para as investigações das novas formas de comunicação no Japão
contemporâneo.
Este texto é um recorte do projeto de Pós-Doutoramento, vinculado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, supervisionado pela Profa. Dra. Christine Greiner (coordenadora do Centro de Estudos Orientais da PUC-SP) e conta com
o auxílio financeiro da FAPESP6.

O universo Otaku e Hikikomori

O otaku é fruto da cultura pop japonesa e da primeira geração multimídia que cresceu em um período de forte prosperidade econômica do Japão. Para Azuma
Hiroki7 (2001) estudioso da cultura otaku, a origem do fenômeno se deu por volta da década de 1960, porém, há uma classificação em etapas que aconteceram
gradativamente; a segunda etapa ocorreu com os indivíduos nascidos na década de 1970; e a terceira com aqueles nascidos na década de 1980. Embora
Azuma aponte a década de 1960 como a de origem da cultura otaku, sua consagração no Japão ocorreu por volta da década de 1980, como resultado da
relação tecnologia/consumo e da sedução pelas novas referências visuais destacadas pelas imagens de mangá8 e animê9.

O termo otaku (■■) possui duplo significado, podendo indicar habitação ou moradia, ou um tratamento impessoal de distanciamento quando se dirige a alguém
sem aprofundar uma relação. A palavra é antiga no vocabulário japonês, mas conquistou o sentido atual ao ser mencionada por Nakamori Akio (em 1983), para
nomear o grupo em um artigo escrito para a revista Buricco. Em 1989, o termo conquista visibilidade (embora de forma negativa), atrelado ao assassinato de
quatro meninas por um rapaz10, reconhecido como sendo um típico otaku. O episódio não conseguiu destruir a identidade do grupo que permanece como um
fenômeno até a atualidade.

O jornalista francês Étienne Barral, radicado no Japão, investigou o fenômeno apontando instigantes questões sobre o assunto em seu livro Otaku - os filhos do
virtual (2000). Esta publicação tornou-se referência para aqueles que desejam conhecer parte das complexidades que envolvem o tema. Barral afirma que o
otaku não pode ser dissociado do sistema educativo japonês, sendo vítima da concepção para a grande massa. Embora não se pretenda reduzir o fenômeno a
dualidades (vítima/agressor) ou negativismos, muitas vezes o otaku torna-se prisioneiro de discriminação (ijime)11 e violência, que podem culminar até mesmo
em suicídio (motivados pelas constantes agressões e humilhações sofridas nas escolas). A incidência de indivíduos que se retiram dos ambientes sociais para
viverem isolados em seus lares atinge significativa porção nas fatias da estatística japonesa. Muitos casos de reclusão são camuflados pelos próprios familiares,
motivados pelo sentimento de vergonha e desconforto causado perante a sociedade.

No Japão, o condicionamento a regras de memorização tem início na fase pré-escolar acompanhando o estudante por todo o seu percurso histórico. As críticas
ao sistema acirram-se com casos de suicídio entre adolescentes e até entre crianças japonesas, sobretudo nos primeiros anos da década de 9012. As pressões
educacionais, somadas à sensação de fracasso àqueles que não conseguem a adaptação ao sistema são alguns dos motivos para a busca de um alívio a tais
pressões. A educação obrigatória perdura por nove anos, dos quais, seis deles estão voltados à escola primária e três ao ginasial. O ingresso ao ensino médio é
o momento da avaliação de desempenho e os melhores classificados seguirão para as grandes e renomadas universidades: Tóquio, Waseda e Keio, por
exemplo. Mesmo entre os professores privilegia-se a atenção aos resultados dos exames ao invés do desenvolvimento pedagógico.

A pesquisadora Mary Brinton, da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, acompanhou durante vários anos o sistema educacional japonês e constatou
graves problemas motivados pela crise financeira do século XXI. Os protagonistas estudados por Brinton foram os jovens da classe não elitizada japonesa.
Brinton descreve o surgimento de novos termos que não existiam antes do ano 2000, como os NEET (Not Employment Education Training, jovens que não
trabalham e não estudam), os wakingu pua (em inglês, os working poor), os hikikomoris (pessoas reclusas em seus lares) e kakusa shakai (sociedade desigual),
tornaram-se bastante citados no discurso da mídia japonesa. Essa geração acabou ficando perdida na transição econômica do Japão. Não são mais estudantes,
mas também não se encaixam nas afiliações tradicionais, de segurança no emprego ou no casamento.

Atualmente, a etimologia da palavra otaku se desdobra para o termo hikikomori característica dos indivíduos que optam pelo autoenclausuramento. Carregando
em seus corpos o estigma dos excessos da sociedade moderna japonesa, tornam-se referência para a juventude mundial 13. O hikikomori pode permanecer
trancafiado em seu lar durante meses, anos, décadas, recusando-se a manter contato com pessoas que não compartilhem do mesmo ramo ou grau de
conhecimento específico14.

Quando Étienne Barral (2000) estudou o comportamento otaku, ainda não havia menção ao termo hikikomori, citado pela primeira vez pelo psicólogo japonês
Saito Tamaki, mas que, atualmente, tornou-se objeto de interesse dos pesquisadores de várias nacionalidades. Muitas similaridades podem ser detectadas entre
os indivíduos otakus e hikikomoris nas várias partes do mundo, como por exemplo, o fanatismo por coleções ou mesmo o gosto pela Internet, porém os otakus
não se isolam fisicamente, possuem uma vida de atividades sociais e muitos se tornam bem sucedidos em suas carreiras. Os casos de isolamento radical estão
sendo considerados problemas de saúde pública15 no Japão onde milhares de jovens se encontram em situação semelhante.

O suporte aos hikikomoris e suas famílias

Existem ainda associações não governamentais que prestam auxílio aos pais e familiares dos hikikomoris. Segundo reportagem da Revista Veja16, em 2005, o
publicitário Masayuki Okumura afirma que, após sofrer as violências de seu filho (hikikomori), decide expulsá-lo de casa e, por não encontrar apoio em órgãos
governamentais, anos depois, funda a Associação de Pais Vítimas de Hikikomori. Esta associação conta com cerca de dez mil pessoas inscritas em todo o
Japão. Há também a organização não governamental New Start, localizada em Chiba, que inovou suas ações com as “irmãs de aluguel”, cuja tarefa consiste em
visitar os hikikomoris procurando oferecer apoio e integrá-los novamente à sociedade.

A professora Kitazawa Kumi, uma das responsáveis pela New Start, me recebeu durante o mês de março de 2012 para a realização de entrevistas e
investigações que serão anexados ao projeto final. Os dados coletados serão publicados após a realização do seminário, previsto para junho deste mesmo ano.
Visitei também a instituição do governo japonês Seishin Hoken Fukushi Center na cidade de Nagano sendo recebida pelo senhor e senhora Takeuchi.

O caso de Kazutaka Tashiro, um ex-hikikomori, particularmente chama a atenção17. Em período de extrema crise, Kazutaka relata que estava prestes a
cometer suicídio, mas após ser salvo pela atuação da New Start, considera-se recuperado e atualmente trabalha como funcionário da instituição. O caso é
considerado vitorioso, pois somente cerca de 30% são solucionados de forma satisfatória. Ainda nessa mesma matéria, o jornalista japonês Yutaka Shiokura,
autor de um livro sobre os hikikomoris sintetiza a situação: “O Japão não tem espaço para as diferenças, é como um trem de um único vagão. Quem não
consegue embarcar nele fica na plataforma para o resto da vida”. O que Shiokura enfatiza é a questão da homogeneização, pela qual a cultura japonesa é
bastante conhecida. Desde a mais tenra idade a criança é submetida às lições de nivelamento, pois, aprende tanto no convívio familiar quanto na escola que,
para o “prego que se destaca” existe sempre a “martelada” como metáfora.
O filósofo Zygmunt Bauman (2008) explica que, para se viver em sociedade é necessário haver compartilhamento, aceitação e respeito para com aquilo que é
compartilhado, pois “viver em sociedade” é a única receita para vivermos felizes (se não felizes para sempre)18. Levando em consideração esta pontuação, a
pergunta que insiste em não calar é: o que acontece com o indivíduo que não consegue embarcar no trem de um único vagão? Estaria fadado a permanecer
infeliz na estação? Aqui, um dos pontos em que o trabalho das associações de apoio e amparo aos hikikomoris representa papel fundamental tem sido no
sentido de demonstrar às pessoas, que ainda existe outro trem a chegar e que sempre haverá um novo embarque e será possível até mesmo escolher o vagão
em que se deseja entrar.

Os Fundamentos da Teoria Corpomídia

Uma das bases teóricas desta pesquisa toma por referência a investigação “Corpomídia”, que vem sendo desenvolvida no Programa de Estudos
Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica, da PUC-SP, pelas professoras Christine Greiner e Helena Katz ao longo da última década. Tal investigação
pesquisa fundamentos teóricos que relacionam os estudos da Teoria da Comunicação19 e das Ciências Cognitivas20, pensando o corpo não como um veículo
de transmissão e sim como mídia de si mesmo.

A teoria Corpomídia21 pesquisa o “estado do corpo ser”, e surge pela hipótese de que tudo o que é vivo existe como resultado sempre parcial de uma condição
coevolutiva; e apoia-se em outros entendimentos do binômio dentro/fora, que modificam a própria noção de fronteira. Ao observar um corpo, visualiza-se um
“estado” e não um corpo que possui um modelo pré-estabelecido. No processo em que a informação adentra o corpo, tudo se reorganiza novamente. Nessa
perspectiva, todo corpo é um estado de “coisas” que dele fazem parte. No momento em que ocorre alguma modificação, ocorre também um inteiro rearranjo. A
proposta é olhar para o corpo como um “estado processual” que está em constante mudança.

O corpo não é pensado como um instrumento de alguém ou de um sujeito que o habita. Para o pesquisador que o analisará, a tarefa será observá-lo pelo viés
da sua singularidade. Nesse contexto, mesmo estando o corpo em um grupo ou vivendo uma experiência comum com outros indivíduos, há sempre um traço
singular que depende fundamentalmente do ambiente, em correlação. O corpo assim se constitui devido ao ambiente em que esteve (e que estará), mas não é
construído pelo ambiente, isso se deve ao fluxo de informações que o atravessa, em dupla direção, o tempo todo.

Vale aqui um adendo acerca do desenvolvimento infantil estabelecido em um ambiente educacional democrático22, que pauta-se pela construção processual do
aprendizado e pela mobilidade construtiva do conhecimento. Tal mobilidade refere-se a um processo sempre em andamento e inacabado, como parte
importante da constituição dos signos que possibilita um olhar múltiplo e “indisciplinar”. No processo de auto-organização, as soluções para os diferentes tipos
de problemas acontecem pelo enfrentamento, quando a criança exercita a atividade exploratória. Essa atividade exploratória é pautada pela mobilidade e
modifica-se continuamente clamando pelos instrumentais processuais. O termo “indisciplinar” aqui citado, leva em conta a visão de Muniz Sodré23 no que diz
respeito ao percurso cognitivo transdisciplinar, em um campo de relações hipertextuais, permeado pela interface com a virtualidade.

O sujeito de identidade fixa e estável no mundo é destituído de sua consistência histórica, que garantia a gestão da objetividade social e vinha induzindo a
objetividade científica buscada pelas disciplinas teóricas24. Com a quebra da identidade fixa e estável do sujeito evidenciam-se as fragilidades no
relacionamento humano, estudadas pelo filósofo Zygmunt Bauman (2004), para quem os habitantes do líquido mundo moderno em vez de falar em “relações” ou
“relacionamento”, cada vez mais passam a falar em conexões, “conectar-se” ou “estar conectado”. Em vez de parceiros, fala-se em “redes”, que serve tanto para
conectar como desconectar, ou seja, são as “relações virtuais” que parecem feitas sob medida para o líquido cenário da vida moderna25. Os relacionamentos
talvez sejam os representantes mais comuns da ambivalência estudada por Bauman, pois tanto podem portar-se como sonhos, mas também como pesadelos.
As pessoas esperam obter as satisfações nas relações, justamente porque estas, não têm sido verdadeiramente satisfatórias.

O sociólogo Antony Giddens (2004) pesquisador das interconexões entre as sociedades mundiais, do desaparecimento do sistema social tradicional e das
mudanças ocorridas pela “globalização” afirma que cada vez mais se convive com a interdependência entre indivíduos, grupos e nações. É a interação entre a
extraordinária inovação tecnológica e o alcance mundial promovido por um capitalismo global que dá à mudança de hoje sua compleição específica. Agora ela
tem uma rapidez, uma inevitabilidade e uma força que nunca teve26 e conforme aponta Castells (2010), com o desenvolvimento da Web 2.0 e Web 3.0 e outros
dispositivos que auxiliam no crescimento dos espaços sociais, graças ao aumento da capacidade da banda larga, os softwares de código aberto e a melhoria da
interface gráfica houve uma intensificação no ritmo de formação de um sistema comunicacional digital multimodal e multicanal que integra todas as formas de
mídia27. Bauman (2004) complementa dizendo que movimentar-se tornou uma necessidade nos dias atuais e o que antes parecia somente uma aventura
tornou-se tarefa cansativa, pois a incerteza e a confusão supostamente escorraçadas pela velocidade não estão apartadas. A facilidade do desengajamento e
do rompimento (a qualquer hora) não reduzem os riscos, apenas os distribuem de modo diferente, junto com as ansiedades que provocam28.

Essa contextualização importa no sentido da relação corpo/ambiente e sua abordagem pela proposta da teoria Corpomídia. Não se pode apartar o corpo das
mudanças ocorridas na contemporaneidade, cenário em que o objeto de pesquisa se insere, pois o corpo é um conjunto de ajeitamentos que desloca o
ambiente para onde for, em corresponsabilidade.

Replicação da situação otaku/hikikomori em outros universos

Adentrando o mar revolto dos rigorosos padrões comportamentais da cultura japonesa, seria possível pensar uma replicação29otaku/hikikomori criando raízes
em outros universos, a exemplo da solidão das mães japonesas, ou, pelo embate visual das estudantes kogyaru30 e ganguro gyaru31?

Em relação às mães japonesas, a pesquisadora Ueno Chizuko32 renomada professora de Sociologia na Universidade de Tôkyô, em um artigo intitulado
Collapse of “Japanese Mothers” argumenta que a maternidade não é natureza e nem cultura, mas um construto histórico. Ela sustenta esta afirmação
analisando a representação de “mãe” na moderna literatura japonesa. A professora Ueno Chizuko tem lutado contra as discriminações sofridas pelas mulheres
no Japão. Apesar de ser uma das intelectuais mais respeitadas pela sua formação, não deixou de sentir na pele as injustiças ao longo de sua carreira
profissional33. Seu interesse em estudar a condição feminina japonesa deu-se em parte pela própria convivência familiar. Após presenciar os maus tratos de
seu pai para com sua mãe e a aparente infelicidade das mulheres japonesas, tornou-se feminista e optou por não se casar e nem ter filhos. Estudou e trabalhou
nos Estados Unidos como professora da Universidade de Columbia em Nova York, em 1996.

Para Ueno Chizuko (2005) ninguém nasce uma mãe, ou mesmo nasce para ser uma mãe, é um papel que é apreendido e então internalizado no processo de
socialização de gênero. Nem toda mulher dá a luz, então as mulheres não têm destino natural absoluto para tornarem-se mães. Mesmo os detalhes do papel de
mãe permanecem indeterminados, porque a experiência do papel de mãe varia ao longo do tempo e do espaço e também pela individualidade das mulheres. O
conceito de mãe vem de um período em que a ideologia cultural tenta mascarar reprimindo a origem histórica. Os estudos históricos de gênero e sexualidade
têm desafiado aquilo que parece fundamentado pela realidade biológica, mostrando que o contexto histórico aponta para constantes mudanças que diferem de
acordo com a classe, o grupo étnico, e a região. Os estudiosos das mulheres têm desafiado a noção universal de maternidade definida como autossacrifício e
dedicação.

A historiadora social francesa Elizabeth Badinter34 em seu estudo sobre o laço íntimo entre mãe e bebê, afirma que este laço foi estabelecido somente depois
da formação da família centrada na criança. A historiografia medieval aponta uma relativa indiferença das mães para com suas crianças. As mães raramente
amamentavam seus bebês e até as confiavam para os pais em vilas rurais. Nessa época, a taxa de mortalidade era alta por conta da subnutrição e da pobreza e
os pais não se preocupavam tanto com seus bebês. O último declínio na mortalidade infantil foi também causado pelo aumento dos cuidados das mães para
com seus filhos. A amamentação que já foi trabalho para as babás e mulheres pobres e tornou-se uma norma para a mulher moderna.

A construção da maternidade foi fortalecida no período Meiji como parte de um processo de modernização. A historiadora Koyama Shizuko, demonstrou que o
conceito de “mães que educam” não existia antes desse tempo. Sua cuidadosa investigação nos textos confucianos do período Tokugawa mostrou que os
autores não consideram a educação como uma obrigação materna. O papel das mulheres estava restrito à mera provisão biológica da vida, pois se presumia
que elas eram “estúpidas” demais para transmitir algo mais abstrato para a sua prole35. Koyama descobriu que a ideologia confuciana foi modificada durante a
época da modernização e a defesa na educação para as mulheres ocorreu devido à interferência dos nacionalistas reacionários, ou seja, por pressões políticas.

Ainda segundo a pesquisadora Ueno (2005), a natureza se destrói no processo de industrialização, e como resultado, as mulheres têm a origem de sua
“maternidade” como um prêmio de participação na sociedade moderna. A “natureza” das mulheres não pode ser uma área sacrossanta no meio desta
desintegração, apesar das fantasias dos homens autocentrados em preservar tal proteção a si próprios. As mulheres não são vítimas passivas da ilusão
artificial, mas ativas cúmplices que trabalham com os homens para promover os processos históricos. A única maneira das mulheres sobreviverem na sociedade
industrializada seria aceitar seu status de cidadã de segunda classe ou, internalizar a misogenia visualizando por uma perspectiva masculina. Porém, existe o
paradoxo, as mulheres que fazem sucesso nessa internalização são definidas como “neuróticas”, porque falham em aceitar sua feminilidade. No artigo da
pesquisadora, alguns exemplos relatam a infelicidade da mãe japonesa e o não desejo de semelhança de seu filho com o fracassado pai. Quando a vida da
mulher está nas mãos do marido, torna-se difícil estar satisfeita com ele em termos de emoção, afeição, status, riqueza e mesmo personalidade36.

Em 1985 foi aprovada a Lei de Oportunidades Iguais no Emprego para beneficiar a mão de obra feminina japonesa, o que facilitou a entrada de mulheres nas
linhas de produção das fábricas ou em outras áreas marcadamente de atuação masculina, porém em relação às posições de comando, as mulheres ainda
continuam sendo pouco reconhecidas.

A Organização das Nações Unidas por meio de sua agência Organização Mundial do Trabalho tem monitorado as condições da mão de obra feminina no Japão
e afirma que, por volta de 2005, as mulheres ocupavam apenas 10,1% dos cargos gerenciais nas companhias e no governo japonês, enquanto que os Estados
Unidos detinham 42,5%. A barreira instaurada para dificultar a permanência da mulher nos trabalhos corporativos, além das discriminações, tem a ver também
com as longas jornadas, geralmente de 15 horas seguidas ou até mais37. A situação de grande parte das mulheres e mães japonesas que não se enquadram
nas estatísticas laborais poderia ser enquadrada no contexto estudado por Ueno Chizuko, guardadas as devidas proporções, representadas pela “solidão” e
clausura em seus lares, ante a falta de perspectiva e dependência, que podem ser associadas a um confinamento hikikomori.

As meninas Gyaru, Kogyaru, Ganguro gyaru, Yamanba e Bihaku

Não apenas os termos otaku ou hikikomori podem causar estranhamento para quem percorre os mistérios destes domínios, como também quando o assunto diz
respeito às garotas “gyarus” japonesas, mais exatamente do termo “girl” em inglês. Ainda há muito a ser pesquisado, mas o trabalho de Sharon Kinsella38 e
Margrit Brehn39, estudiosas da cultura pop do Japão, poderia auxiliar na complementação de inúmeras inquietações.

Em termos de um recorte contextual podemos dizer que, a partir da década de 60, com a popularização da televisão, os lares do mundo puderam entrar em
contato com os animes das grandes produtoras japonesas que exportavam seus produtos, considerados diversão de baixo custo. Com isso, a estética dos olhos
grandes ou dos cabelos espetados acabou tornando-se familiar40 e sinônimo da estética japonesa. Porém, entre os próprios japoneses se acreditava que as
manifestações da cultura pop não passariam de modismos, pairando certo teor preconceituoso. No caso das animações, a internacionalização possibilitou a
propagação dos “aspectos de valores e referências culturais exclusivamente japoneses, assim como o cinema americano serviu de difusor dos valores, do estilo
de vida e da estética americanos41”.

A década de 1980 foi um período bastante movimentado e de inúmeras transformações culturais no Japão. A moda japonesa tornou-se conhecida
internacionalmente, não apenas pelos seus costureiros e designers, como também pela dinamicidade da moda de rua em Tôkyô. O fotógrafo japonês Shoichi
Aoki (2003), instigado pelo momento, registrou parte do modo como inúmeras pessoas que circulavam por esse trajeto ditavam suas preferências através das
vestimentas. Aoki publicou um ensaio fotográfico denominado “Fruits”, que possibilitou a divulgação do que vinha acontecendo nas ruas de Harajuku. As
grandes livrarias de todo o mundo, inclusive as do Brasil passaram a oferecer a sua obra. Nesse ensaio, o fotógrafo retrata a moda de rua e as modificações que
vinham acontecendo no comportamento dos adolescentes japoneses.

A moda de rua tem sido considerada um movimento revolucionário no Japão, e em seu estágio inicial as tendências mudavam a cada três ou quatro meses, pois
havia um número menor de líderes que desenvolviam estilos próprios e atraíam seguidores que começavam a copiá-los. Isto favoreceu a criação de novos e
extravagantes estilos que acabaram por desenvolver várias tendências. A visualidade daqueles corpos, na pequena rua de Tôkyô, passou a chamar a atenção
do mundo. O que estaria acontecendo no Japão?

Por outro lado, abrindo aqui um parênteses, a pesquisadora Margrit Brehm42 em seus estudos sobre a cultura pop japonesa comenta que, atualmente, as fontes
de experiências visuais de mundo são: a televisão e o computador e o novo desenvolvimento figurativo surge do mundo mídia: o mangá e o animê. O cotidiano
tornou-se código que expressa uma condição social e uma orientação visual. Brehm acompanha o trabalho de alguns artistas japoneses contemporâneos,
pertencentes a uma geração cuja infância e adolescência foram marcadas pelo consumismo e pela influência da mídia. Esses artistas pertencem ao mundo
chamado J-Pop ou New-Pop, um exemplo do fenômeno midiático, cujo foco é inventar novas imagens que tenham função de “imagem-mídia”, ou seja,
transformam a estética do cotidiano em arte.

O J-Pop ou New Pop é um movimento de arte que se desenvolveu no Japão, por volta dos anos 90. A tese defendida por Brehm (2002) é aquela que debate
como a cena da arte contemporânea no Japão é inevitável e pressupõe que o J-Pop inicia uma decisiva reorientação não somente na arte japonesa, mas
também em sua recepção no Ocidente. O trivial é adaptado e modificado gerando novas imagens que estão contemporaneamente em sua artificialidade. A
provocação das obras e o comentário social que projetam, discutem suas referências à sociedade. Os artistas Takashi Murakami e Yoshitomo Nara podem ser
vistos como seus representantes mais populares. Filhos do milagre econômico, nascidos entre 1959 até por volta de 1965, formularam suas críticas ao sistema
e uma irônica referência à discrepância entre a cultura oficial e a real influência da cultura pop.

O artista Takashi Murakami considerava a si próprio um otaku, e por conhecer bem o seu mundo, suas obras propositadamente criticam o estilo de vida otaku, a
subcultura, o consumismo e o fetichismo sexual, considerados estereótipos do Japão contemporâneo. Murakami estudou nihonga como estratégia artística para
criar sua obra prima Superflat, inserindo uma teoria que lembra as ligações entre arte e sociedade; o passado e o presente. Influenciado pelas figuras do mangá
de sua própria infância, suas obras “Mr. DOB”, “Flowers” e “Kaikai” e “Kiki” desenvolvem um idioma pictórico próprio, cujas dimensões estão constantemente
aumentando. São figuras achatadas e lisas, que lixadas, adquirem um aspecto de perfeição industrial.

O artista Yoshitomo Nara, reflete sobre as questões poeticamente subjetivas acerca de seu estado pessoal ou de sua condição social. As figuras de Nara são
pintadas, desenhadas ou esculpidas em fiberglass e suas representações de crianças e cachorros despertam emoções pela esperteza, embora camuflando as
frequentes agressividades43. Os artistas reconhecem a necessidade de se criar uma arte subversiva, cuja linguagem popular de uma cultura diária como
televisão, cinema, música, publicidade, e depois o computador, expressem a própria experiência de vida. O J-Pop é um exemplo de fenômeno midiático, cujo
foco é inventar novas imagens que tenham a função de “imagem mídia”.

Em se tratando de visibilidade social, também podemos encontrar traços de similaridade entre o que estamos aqui discutindo e os cyberpunks. A pesquisadora
Adriana Amaral44 em seu artigo Visões perigosas: para uma genealogia do cyberpunk cita Sterling (1990) e seu estudo sobre a inter-relação entre os
aficionados por tecnologia, o underground Pop e o fenômeno cyberpunk no Japão. “Em Tóquio eles tratam o cyberpunk como cultura pop em vez de um
fenômeno de gênero45”. A autora complementa reforçando que as imagens de mangás e animes que usam a temática cyberpunk46 são muito difundidas no
Japão e até Neuromancer47 ganhou sua versão em forma de história em quadrinhos. O cyberpunk é visto como uma espécie de hibridização pelo uso da
tecnologia através das subculturas e podem ser vistos nas ruas de Tôkyô, como por exemplo, o estilo gothic lolita, considerado influência japonesa, surgido a
partir das garotas que se vestem de forma infantil, inspiradas em mangá ou animê e adoradas pelos otakus e hikikomoris.

Em 1993, a revista Wired48 trouxe uma matéria sobre a cultura Otaku. Era o primeiro sintoma do que vinha acontecendo no Japão, marcado pelas animações:
Evangelion, Dragon Ball, Sailor Moon, Akira, entre outros. O fenômeno modificou até mesmo o comportamento das meninas japonesas. Sempre reunidas em
bandos pelas ruas, passaram a inventar diferentes grupos como: Kogyaru, baseado no fetichismo das escolares sedutoras que dialogam com as Lolicon mangá
(quadrinhos para o público masculino que cultiva o complexo de Lolita); Ganguro (■■), palavra cujo sentido é “extremamente escuro ou fortemente bronzeado”
e Yamanba (■■) deriva da palavra yama-uba, em homenagem à história de uma bruxa das montanhas.

Dentre as características das garotas Ganguro Gyaru e Yamanba, podemos citar: o uso de tintura com cores fortes nos cabelos, como o louro, o laranja, o cinza
e o branco; muita loção bronzeadora, pó/gel brilhante no rosto; a sobreposição de camadas de sombra branca nos olhos; delineador líquido de cor preta;
espessos cílios postiços; lente de contato; adesivos colados ao rosto; batom branco ou rosa claro; unhas glamurosas; flores falsas de hibisco nos cabelos; vinil e
plástico como tecidos; minissaias; botas plataforma muito altas; destacando sempre a atenção pelo uso de cores bem vivas. A grande proposta por trás dessa
expressividade é a busca de um visual que funcione como o negativo de si mesmas. Essas gyarus são exemplos de “imagem-mídia” do Japão contemporâneo a
desfilar pelos arredores da estação Shibuya, em Tôkyô. Existe certa rivalidade entre as gyarus de Harajuku e as de Shibuya, atualmente, as meninas “bonecas”
são mais facilmente localizadas em Harajuku e as demais nos arredores de Shibuya.

Percorrer os depaatos (departamentos comerciais) em Shibuya se torna uma viagem fascinante, principalmente quando se estuda este universo. Há um apelo
visual intenso e que movimenta muitos milhões de ienes, voltados para o público jovem japonês. Ao caminhar pelas ruas facilmente podemos localizar os
diferentes tipos de gyarus em suas performances diárias.

Por volta de 2004, surgem também as “Bihaku” (■■), que pode ser traduzido como “beleza branca”, o oposto da Ganguro. Essas garotas de pele extremamente
branca, desejam restaurar a brancura da pele de porcelana das gueixas, desfilando, desta vez, com suas peles extremamente clareadas49. Os riscos à saúde a
partir dos exageros, em paralelo, seguem as questões que envolvem o mercado dos produtos. O comércio passa a investir tanto em cosméticos como também
em medicamentos cuja finalidade é proporcionar a brancura da pele e o controle da produção de melanina no corpo. Como explicar os tipos de ações, visíveis
no corpo, mas que possibilitam uma variedade de interpretação? Além disso, vale lembrar que, algum tempo depois, as Yamanba foram ressignificadas e
passaram a se chamar Manba50 (por volta de 2008), não ostentando mais os adesivos colados no rosto.

A pesquisadora Sharon Kinsella (2002) verifica a necessidade da leitura desse fenômeno, que conquistou visibilidade inicial por volta do ano 2000. No fundo,
são jovens garotas que desejam ter seu espaço respeitado, não são apenas as meninas engraçadinhas exibicionistas que estão por trás do movimento. Suas
ações manifestam o desejo profundo de transformação na sociedade japonesa. Em busca de liberdade, individualidade e autoexpressividade, essas garotas
exercem um papel crítico interessante protestando contra as discriminações e constrangimentos sofridos pela sociedade tradicional. Apesar das mudanças que
vêm ocorrendo no Japão, ainda se percebe a discriminação contra a mulher. Como pano de fundo, a manifestação destas gyarus não se dá em atos
desprovidos de sentido, são posturas críticas assumidas contra os rígidos regulamentos escolares do Japão. Análogo ao comportamento otaku/hikikomori, essas
gyarus carregam a tecnologia em seus corpos como imagem-mídia, promovendo a visibilidade social por trás de suas performances.

Mangá e anime: “NHK ni Y■koso!” e “Sayonara Zetsubo-sensei”

Quando falamos em anime e mangá, logo somos remetidos ao Japão. Trabalhando temáticas variadas, as produtoras têm investido muito neste tipo de
empreendimento, conquistando razoável público no mundo. Sobre o tema otaku e hikikomori foram lançados inúmeros animes emangás, mas um dos mais
conhecidos é “NHK ni Y■koso!” ou “Bem-vindo à NHK!” baseado inicialmente no mangá de Oiwa Kenji e desenvolvido por Takimoto Tatsuhiko. O enredo faz
referências à famosa emissora de televisão NHK (Nippon H■s■ Ky■kai), como a instituição que planeja uma conspiração para criar a associação de hikikomoris
utilizando a mesma sigla “NHK”, chamado de Nippon Hikikomori Ky■kai. A história foi uma adaptação do mangá para o anime e retrata a vida de um hikikomori
de 21 anos, Sato Tatsuhiro, que abandona a Universidade Heisei Bunka e é sustentado pelos pais (que não sabem que o filho se tornou um deles). Tatsuhiro
Sato conhece a jovem Nakahara Misaki com quem estabelece um acordo. A jovem diz trabalhar como voluntária em um projeto que auxilia os hikikomoris e
convence-o a assinar um termo de compromisso para que ele não falte às reuniões de aconselhamentos, pois caso contrário, haveria uma alta multa a ser paga
em dinheiro.

Outro personagem que movimenta o anime é o vizinho de Sato, um típico otaku chamado Yamazaki Kaoru. Depois de muito se irritar com a constante
sonoridade vinda do apartamento de Yamazaki, o hikikomori Sato resolve ir tirar satisfação com o mesmo, quando descobre que ambos tinham sido colegas na
época de colégio. Assim, Yamazaki convence Sato a trabalharem em parceria. Sato ajuda Yamazaki na criação do enredo de um ero-game (jogos eróticos)
tornando-se um lolicon. O anime consegue expressar de forma engraçada e angustiante os problemas de alguém que fica muito tempo em isolamento. Além dos
aparentes distúrbios mentais e da irritabilidade constante, em alguns momentos temos a sensação de que o protagonista se tornou um usuário de drogas, mas
isso não fica claro no transcorrer do anime.

As outras personagens são: a veterana Kashiwa Hitomi e a colega de Sato, Kobayashi Megumi. Kashiwa Hitomi, apesar de estar empregada como funcionária
pública, sente-se infeliz e atormentada por uma conspiração. Foi ela quem convenceu Sato a acreditar na ideia de que existe uma conspiração acontecendo, e
da qual Sato deve ficar atento. Já a colega Kobayashi Megumi sofre com a perda do pai e precisa lutar para sustentar seu irmão, que se tornou um hikikomori.

O anime “NHK ni Youkoso!” é classificado como light novel51 que teve início em 2002 com a capa desenhada por Abe Yoshitoshi; e a segunda edição foi
publicada em 2005. Os efeitos gráficos do anime são muito bem elaborados e prendem a atenção do espectador pela ambiguidade das cenas, no início é um
tanto difícil para o público leigo entender do que se trata. A série apresenta 24 episódios (com cerca de 30 minutos de duração cada) e foi exibida de julho até
dezembro de 2006.

Dentre os mangás que retratam o assunto em questão, Sayonara Zetsubou-Sensei (traduzido como “Adeus professor desespero52”) é um dos mais
interessantes. Foi criado por Kumeta Koji, e é uma comédia protagonizada por um professor com instinto suicida (Nozomu Itoshiki), que ironiza a sociedade e a
mídia japonesa. Em uma das tentativas de suicídio, o professor é salvo por uma garota bastante otimista, mas esquizofrênica, Fuura Kafuka (nome em alusão a
Franz Kafka). No início do período letivo, eles descobrem que Nozomu Itoshiki será o professor de Fuura Kafuka. No momento da apresentação, percebem que
o ideograma japonês escrito na horizontal e juntando-os, transforma o significado do nome do professor de Nozomu Itoshiki (■■ ■) para Zetsubou (■■), cujo
significado é “desespero”. Uma das personagens, a garotinha Komori Kiri (trocadilho da palavra hikikomori) é uma típica hikikomori que está sempre escondida,
saindo de seu quarto somente pela atuação do professor e de Fuura Kafuka. Em 2005, o mangá tornou-se uma série pela Weekly Shonen Magazine e foi
publicado pela Kodansha, sendo mais tarde adaptado para um seriado de anime contendo 12 capítulos.

O anime NHK ni Youkoso e o mangá Sayonara Zetsubou Sensei são apenas exemplos encontrados dentre os milhares de trabalhos desenvolvidos na área. Em
maio de 2009, Paul Gravett53, diretor da Comica (London’s International Comics Festival) proferiu uma palestra na Royal Academy of Arts de Londres intitulada:
“Mangaísmo, o novo Japonismo?”. Gravett (2009) lembra que o mangá tem se alastrado internacionalmente, e seus motivos, técnicas, teorias, em muitos casos
traduzem as raízes das gravuras do passado e afetam o novo movimento gráfico worldwide reavaliando o mangá no próprio Japão. Conforme se leva em conta
a onda internacional de aclamação e imitação do mangá fora do Japão, poderíamos refletir acerca da sugestão de Paul Gravett quando classifica o novo
fenômeno como “Mangaísmo”. A importância do mangá tem sido destacada no Japão, a exemplo da inauguração do primeiro Museu do Mangá em Kyôto, em
2006, e ainda em 2007, quando foi criado o International Manga Award para reconhecer os criadores não japoneses54. Tôkyô é uma cidade que destaca o
mangá em todas as formas de mídias, é impossível não perceber sua forte influência na cultura contemporânea japonesa.

Considerações Finais

É inegável que a linguagem do anime e do mangá transformou a visualidade do Japão contemporâneo. Novos desdobramentos podem ser percebidos a partir
da replicação da cultura pop japonesa, a exemplo dos trabalhos de Takashi Murakami e Yoshitomo Nara, representantes das artes plásticas neste contexto. Em
paralelo, a expansão das novas tecnologias comunicacionais ressignificou a indústria cultural japonesa fortalecendo a cultura pop e a estética do cotidiano,
contaminando assim, não apenas a moda de rua e as garotas gyarus como também os colecionismos dos otakus, ou a sedução pelos jogos on-line dos
hikikomoris. A cultura pop estabelece uma rede gigante de alastramentos e conexões invadindo praticamente todas as áreas, inflando também o consumismo
em todo o Japão.

A utilização das redes sociais e o turbilhão de interações tem sido o elo relacional desta geração em transição, imersa nas telas dos celulares e em seus
computadores móveis. A grande maioria dos otakus e hikikomoris encontra na tecnologia digital a válvula de escape para sua vida, de colecionismos ou de
isolamento. De um modo geral, os jovens das grandes cidades japonesas estão utilizando cada vez mais seus celulares em trens, metrôs, ônibus, andando nas
ruas ou nas calçadas. Percorri por vários dias a linha JR Yamanote 1 e 2 e pude perceber a dimensão da importância dos celulares para grande parte dos
usuários. Percorri também a linha de metrô Ginza Line, Oedo Line, Tôkyô Line, Yurikamome Line, e essa impressão permaneceu comigo. As telas estão em
todas as partes, transformando as pessoas em elementos holográficos (que cantam e fazem shows) ou mergulhando as garotas em mundos de fantasias, ao
transformarem os espaços públicos em particulares, maquiando e se olhando o tempo nos seus pequenos espelhos, nos versos dos celulares, dentro dos trens
em movimento.

Os hikikomoris apresentam níveis de isolamento, segundo afirma a professora Kitazawa da New Start, alguns não encontram lugar em um ambiente saturado de
regras e opressões e por razões diversas acabam se isolando radicalmente, não sendo vistos nem mesmo pelos seus próprios familiares, mas existem aqueles
que se deslocam na calada da noite para comprar os suprimentos numa konbine55, não trocando qualquer palavra com outras pessoas. Estando em Tôkyô é
até possível entender o que sente um hikikomori, não apenas no que diz respeito às facilidades de sobrevivência (com as máquinas de bebidas e comidas
espalhadas por toda a cidade e as konbines com uma variedade enorme de produtos etc.), como por outro lado, a aparente indiferença das pessoas umas com
as outras parece forçar a quem não encontra o acolhimento num olhar, num carinho ou numa manifestação de qualquer tipo de afetividade, a pressão para uma
imersão nas telas de celulares ou dos computadores móveis.

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Sayonara Zetsubou Sensei: http://pt.wikipedia.org/wiki/Sayonara,_Zetsubou_sensei - acessado em 20/02/2012.

1 XX Encontro Nacional de Professores Universitários de Língua, Literatura e Cultura Japonesa e VII Congresso Internacional de Estudos Japoneses no Brasil.

2 BURKE,2003:14

3 SAITO, 1998; KUDO, 2001; ITO, 2003.

4 BARRAL, 2000; KINSELLA, 1995; KERR, 2001; BRINTON, 2011.

5 KATZ, 2004; GREINER, 2005.

6 O projeto “O universo Otaku e Hikikomori: novas formas de comunicação no Japão contemporâneo” conta com o apoio financeiro da FAPESP, contemplado
com a Bolsa no País/Regular/Pós-Doutorado e está vinculado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP.

7 Para Azuma Hiroki (2001), a cultura otaku espelha as transformações da sociedade japonesa do pós-guerra, o que motivou o consumo, sacrificando a busca
por um maior significado na vida, comparado à gratificação instantânea e quase animalesca.

8 História em quadrinhos; palavra surgida pela junção do ideograma “man” (humor) e “gá” (desenho).

9 Animação (forma contraída da palavra animation em inglês).

10 Tsutomu Miyazaki, um otaku de 27 anos.

11 Termo comum no Japão para designar as provocações e maus tratos que ocorrem nas escolas.

12 SINGER,1997:62.

13 BARRAL, 2000; BREHM, 2002.

14 SATO, 2007:21.

15 Para o psicólogo Saito Tamaki, grande parte da população adolescente masculina estaria vivendo em situação de total reclusão, porém, devido ao
comportamento isolacionista e a camuflagem existente nos nichos familiares, o número oficial de hikikomoris não pode ser medido com exatidão.

16 Revista Veja, Editora Abril, ed.2034. 14/11/2007. Ano 40, no. 45. P.131-134.

17 Revista Veja, Editora Abril, ed.2034. 14/11/2007. Ano 40, no. 45. P.131-134.
18 BAUMAN, Zygmunt. A sociedade individualizada: vidas contadas e histórias vividas; traduzido por José Gradel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2008.
p.8

19 SODRÉ 2002; Hauser 1997; Martin-Barbero 2003.

20 Damásio 1999 e outros.

21 KATZ, 2004

22 Tema da minha tese de Doutorado: Ação e Percepção nos processos comunicacionais do corpo em formação, defendida em 2007 pelo Programa de Estudos
Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP e publicada pela Editora Hedra de São Paulo, em 2010.

23 SODRÉ, 2006:235.

24 Op.cit.

25 BAUMAN, 2004:12

26 GIDDENS & HUTTON, 2004:7.

27 CASTELLS, 2010: XII

28 BAUMAN,2004:13

29 GREINER, 2008

30 Grupo de meninas cuja característica é reforçada pela representação de sedução das colegiais japonesas.

31 Grupo de meninas estudantes que descolorem os cabelos, fazem uso de bronzeamento artificial, pintam ao redor dos olhos de branco e “propõem um visual
que é o negativo de si mesmas” (GREINER, 2008:149).

32 UENO, Chizuko, 2005:247

33 Entrevista ao The Japan Times on-line: http://www.japantimes.co.jp/text/fl20060305x1.html entrevistada por Eric Prideaux, em 05 de Março de 2006.

34 Apud. UENO, 2005.

35 A discriminação contra as mulheres vem de longa data, basta lembrar que a criação de um alfabeto simplificado (hiragana), uma das formas de escrita
japonesa ocorreu em função das mulheres que eram consideradas inaptas intelectualmente para o aprendizado dos ideogramas, tidos como muito complexos.

36 Ueno, Shizuko, 2005:249.

37 Reportagem: Tradição é obstáculo para carreira das trabalhadoras japonesas. Martin Fackler, em Tokyo - The New York Times - 07/08/2007 ( traduzido por
UOL Notícias).

38 Sharon Kinsella é professora de cultura visual japonesa na University of Manchester.

39 Editora do livro The Japanese Experience Inevitable, In the Floating World: Slash with a Knife, 1999.

40 SATO, Cristiane: www.culturajaponesa.com.br

41 Op.cit.

42 BREHM, Margrit, 2002:08

43 BREHM, 2002:12

44 Revista E-Compós: http://www.compos.com.br/e-compos

45 STERLING,1990, Apud: AMARAL, Adriana. 2006.

46 Como Ghost in the Shell 1 e 2, Geno Cyber, Cyberweapon, Cyber City Oedo, Akira, Aeon Flux, Robotech, Tetsuo e outros

47 Livro de William Gibson, considerado o romance que deu origem ao gênero cyberpunk.

48 Revista Wired é uma revista mensal publicada nos Estados Unidos, trabalhando temas ligados à tecnologia e sua influencia à sociedade, cultura, economia e
política.

49 Nicole Mowbray (04/04/2004) “Japanese girls choose whiter shade of pale | World news | The Observer”. London: The Guardian.
http://www.guardian.co.uk/world/2004/apr/04/japan.nicolemowbray.

50 Existem algumas diferenças entre Yamanbas e Manba. As Yamanba fazem uso da maquiagem branca apenas acima dos olhos e as Manbas maquiam
abaixo dos olhos.
51 Light Novel são romances elaborados em estilo manga-anime, direcionados para o público jovem. No início as publicações podem ocorrer em formato de
folhetim para depois seguir para os jornais, revistas, livros e, atualmente estão na Internet e até mesmo nos celulares.

52 Ver em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Sayonara,_Zetsubou_sensei - acessado em 20/02/2012.

53 http://www.paulgravett.com/index.php/articles/article/manga_at_the_royal_academy/.

54 SAITO, 2009:221 - Anais do XX Encontro Nacional de Professores Universitários de Língua, Literatura e Cultura Japonesa e VII Congresso Internacional de
Estudos Japoneses no Brasil – Para além do Japão: Brasil, Canadá e França.

55 Konbine são as lojas de conveniência, facilmente encontradas em toda a parte das grandes cidades japonesas.

56 Entende-se que os Estudos Culturais se configuram enquanto um campo onde há a ocorrência de intersecção de diversas disciplinas para a realização de
estudos sobre determinados aspectos culturais da sociedade contemporânea. Para compreender tal campo, ver Escoteguy (2012).

57 As sociedades modernas ocidentais (especialmente na fase de consolidação do capitalismo liberal), regida pela razão instrumental, caminharam para um
processo de crescente racionalização de suas ações e de suas estruturas social, política e econômica conforme Weber (2002a; 2002b; 2004). Apesar de a
modernidade, especialmente no século XIX, ser conhecida como um período de desencantamento do mundo que distanciava o sujeito do sagrado, isto não
significou a eliminação da religião. Ao contrário, a religião se fortalece enquanto via de salvação, mas perde a centralidade na vida social. Para ver sobre o
desenvolvimento do conceito de desencantamento do mundo na teoria weberiana, ver Pierucci (2003). Sobre a influência da religião no mundo moderno e nas
concepções sobre o corpo, ver Corbin (2009).

58 “O conceito de natureza, ou physis, era compreendido pelos antigos gregos, especialmente na formulação aristotélica, como aquilo que tem o princípio de
movimento em si mesmo, um principio imanente e que atua para um fim (telos), que não é outro senão a própria natureza” (SILVA, 2005, p. 28).

59 Os estudos anatômicos se basearam na experimentação com o corpo morto, tendo como principal método a dissecação. Kuriyama considera que este
método não foi o interesse principal dos médicos chineses, o que levaria a seu baixo grau de desenvolvimento.

60 No caso, a meditação assumia a principal forma. Em algumas escolas como a S■t■, a principal via era a chamada meditação sentada (zazen). Por esta
postura, a pessoa acaba por encarar a sua própria natureza de Buda e entrar no domínio da liberdade (YUSA, 2002).

61 HOLLIS, 2001, p. 225.

62 No presente artigo, respeitei o uso já convencionado do artigo definido masculino para termos de origem japonesa, a saber, “o mangá”, “o animê”, “o kimono”,
“o biombo”. Além disso, o termo kamon, quando precedido do artigo “o”, corresponde ao sentido de “emblema familiar”.

63 Outros termos que se referem à essas insígnias são: mondokoro ■■ (“insígnia do lugar”), monshô ■■ (“composição em formato de insígnia”) ou
simplesmente mon ■ (“emblema”; “insígnia”). Monshô também é utilizado como termo correspondente para “brasão de armas” em japonês, porém geralmente
está relacionado à simbologia de corporações, governos e outras entidades coletivas.

64 Em alguns casos, optarei pela livre-tradução para privilegiar o sentido dos títulos atribuídos às insígnias (kamon) e aos padrões visuais (mon’yô). Contudo,
essas traduções receberão notas de rodapé com informações complementares.

65 Ave da subfamília das Charadriidae.

66 As glicínias chinesas (wisteria sinensis), também conhecidas como “lilases”, pertencem ao gênero wisteria, e é uma planta trepadeira com flores em tons lilás
e azul, com formato de cachos pendentes.

67 Unpan ■■ (“chapa em formato de nuvem”), também conhecida como chôban ■■ (“chapa para bater”) ou shôban ■■ (“chapa de ressoar”), é uma espécie de
chapa circular de metal, suspensa verticalmente, utilizada como gongo em templos zen budistas para anunciar quem acabara de chegar.

68 Sen, moeda que corresponde a um centésimo de iene. Esse formato de moeda começou a ser cunhado no Período Edo, com um padrão em forma de ondas
(seigaiha) em seu reverso.

69 Yamauchi-ke ■■■ (“a família Yamauchi”), que líderava o clã Tosa, possuía grande prestígio na região de Shikoku, onde Iwasaki Yatarô havia nascido.

70 LARAIA, 2002, pp. 59-60.

71 Fictive kinship é um termo usado por antropólogos e etnógrafos para distinguir as formas de parentesco que não se baseiam em laços consanguíneos ou
conjugais.

72 FRUTIGER, 1999. p. 288.

73 WICHMANN, 1981, p. 294.

74 HOUAISS, 2009, p. 2102

75 Op. cit. p. 1323

76 In O FLORESCER das cores: a arte do Período Edo. Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2008. p. 19

77 Padrões de tecelagem utilizados por membros da nobreza, desde o período Heian (794–1185), compostos, predominantemente, de motivos repetidos e
geométricos.
78 Método de tingimento utilizado, originalmente, na pintura e nas artes decorativas para dar a sensação de tridimensionalidade ao objeto. O resultado da
composição são faixas contendo padrões de cores vibrantes.

79 In: A Dictionary of Japanese art terms. [s.l]: Tôkyô Bijutsu, 1990.

80 No Japão, as famílias são constituídas pelo Ie ■ (“casa”; “clã”). Esses clãs são grupos que envolvem não apenas os membros vivos, mas também os
ancestrais e, igualmente, os descendentes que ainda não nasceram. Ie foi o termo utilizado pela legislação japonesa para a constituição das unidades familiares
até o final da Segunda Guerra Mundial.

81 FRUTIGER, 1999, p. 209

82 Tipo de sobretudo que se veste sobre outras peças de quimono.

83 NOMA, 1983, p. 167

84 GOMBRICH, 1995, pp. 99-111

85 PANOFSKY, 1991, pp. 52-58

86 Op. cit. p.136

87 Algumas das fontes pesquisadas registram também a grafia hinagata-bon ■■■■■ ou apenas hinagata ■■ (“modelo em miniatura”).

88 Veste de mangas curtas, confeccionada de seda, com cortes planos e longos, formando uma superfície totalmente plana, principalmente, na região das
costas. Kosode compreende o espaço ideal para a representação dos mais variados padrões. É considerado o precursor do quimono moderno. In O
FLORESCER das cores: a arte do Período Edo. Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2008. p. 21

89 “Foldout 1: Kimono Design Books” In NOMA, 1983.

90 É indicado no livro Kosode to Nô-ishô ■■■■■■ (“kosode e vestuário de nô”), de Noma Seiroku ■■■■ (1902–1966), cujo título em inglês é Japanese
costume and textile arts ■ incluso na bibliografia. Dentre as instituições pesquisadas até então, três possuem exemplares de Ehon Asakayama: o Museu
Britânico, o Spencer Museum of Art, da Universidade de Kansas e o Museu de Belas Artes de Boston.

91 Outra tradução para o termo é “forma de boneca”, pois indicavam as bonecas feitas de papel que serviam de modelo para difundir os projetos de kosode.

92 LAPLANTINE; TRINDADE, 2003, p. 21

93 BALANDIER, 1999.

94 SOUZA, 2008, p. 5

95 Op. cit. p. 8

96 Os empréstimos antigos do Mandarim não são considerados empréstimo, mas os recentes como R■men (sopa de talharim chinês) o são, e também é
utilizada a escrita específica do empréstimo.

97 Carta de Cosme de Torres, um padre jesuíta português, para seus superiores em Roma, relatando sobre o país ainda agora descoberto, o Japão. Os
portugueses chegaram ao Japão por volta de 1543 e foram os primeiros povos europeus a conhecer os japoneses.

98 Aqui trata-se da concepção de Língua/Fala (Langue/Parole) de Ferdinand de Saussure.

99 O Japonês hoje é falado por mais de 126.5 milhões de pessoas no Japão. As principais áreas onde é falado fora do Japão, seguindo os períodos anteriores
da diáspora do japonês, são a costa oeste da América do Norte, do Havaí e da América do Sul. Apesar de muitas pessoas descendentes de japoneses morarem
nessas áreas não falam mais sua língua de herança.

100 O Altaico é um grupo genético proposto que inclui minimamente o Turco, o Tungusico e as famílias mongólicas, talvez também o Coreano e o Japonês. (...)
Os outros dois potenciais membros da família altaica são o Coreano e o Japonês. Coreano (SOHN 1999) é uma língua única. O Japonês (SHIBATANI 1990) é
estritamente falando uma pequena família, incluindo não apenas o Japonês, mas também as Línguas Ry■ky■, que não são mutuamente inteligíveis com o
Japonês ou entre elas; a família é às vezes chamada Japonês – Ry■ky■.

101 Esta tabela tem como base o “Esquema de sons” do Livro Nihongo Hatsuon (), p. 5.

102 O traço em cima da vogal A indica o alongamento da vogal. Quando escrito no Kana Hiragana a vogal é escrita duas vezes, exceção feita à vogal O, que,
quando dobrada, recebe a vogal U. No Kana Katakana o alongamento é indicado por um “travessão” após a vogal que tem que ser dobrada.

103 O Japonês é uma língua de final verbal. A ordem de palavras na sentença é relativamente livre, desde que as sentenças terminam com o verbo principal.

104 Kuno (1978) nomeia as “Partículas de Caso” como “Postpositional Particles” (Partículas Posposicionais).

105 Classificados assim no ensino de Língua Japonesa para estrangeiros, quando estudada no Japão não há esta divisão.

106 Estes 3 (três) verbos estão na forma de dicionário (Jisho kei ).

107 As nomenclaturas Forma Polida e Forma Comum são traduções literais das nomenclaturas japonesas Teineikei e Futs■kei, respectivamente.
108 O verbo benky■ shinakereba narimasen não tem esta separação no momento da escrita e da fala. Aqui está separado para um melhor entendimento do
leitor.

109 Dos mais de 3000 Kanji que um japonês adulto pode empregar em sua vida diária, 1945 são de estudo obrigatórios ao longo do sistema educativo. Esta
lista é conhecida como Kanji de uso comum (■■■■■ J■y■ Kanji). A esta lista soma-se outra, que compreende os Kanji que podem ser utilizados para nomes e
sobrenomes (■■■■■ Jinmeiyou Kanji). Existem ainda Kanji que não pertencendo à lista oficial, são menos usados na vida diária.

110 Os exemplos desta tabela apresentam somente uma leitura do Kanji. Vale lembrar que a maioria dos exemplos tem mais de uma leitura além das aqui
citadas.

111 A transliteração do japonês em alfabeto latino ado(p)tada por Hepburn (1815 - 1911). (Definição retirada de Coelho & Hida (1999), o Dicionário Universal
Japonês – Português).

112 A Língua Shanenawa é uma Língua Indígena, falada por cerca de 400 pessoas em três aldeias na região da Amazônia.

113 A Língua Katukina é uma língua falada no Estado do Acre por mais ou menos 300 pessoas.

114 Sempre que citar sílaba, vogal ou letra, também estarei me referindo como som. Na minha concepção de kana, a sílaba, vogal ou letra corresponde sempre
a um som.

115 A epêntese é a adição de uma vogal ou consoante. No caso da Língua Japonesa, nos empréstimos, acrescenta-se uma vogal epentética após uma
consoante para adaptar a palavra ao padrão silábico da Língua Japonesa, que é CV.

116 A vogal dobrada ocorre somente na escrita, porque no momento da pronúncia o som é longo e não dobrado, ou seja, não se pronunciam duas vogais e sim
uma vogal longa.

117 Na Língua Japonesa diferencia-se o arroz cozido (Gohan ■■■) do arroz cru (Kome ■■).

118 Luta que possui um ringue circular, onde dois lutadores se enfrentam com o objetivo de derrubar ou empurar o adversário para fora do ringue. Esporte
tradicional no Japão ele ainda conserva rituais xintoístas.

119 Arte Suave, Ju-Justu é conhecido como Jiu-Jitsu, nesta arte não se utiliza armas, portanto, dizemos que é uma arte de mãos livres ou sem armas (DUNK,
2009)

120 Literalmente ,“Técnica da espada” utilizada pela classe dos samurais.

121 Escola de esgrima frequentada por Ueshiba.

122 Aikikai Foundation, também conhecido como Hombu Dojo.

123 Sede mundial do Aikido, localizada em Tóquio, ela coordena as regras do estilo, além de monitorar as sedes espalhadas pelo mundo.

124 Há um Guia do Iniciante disponibilizado pela União Sul-Americana de Aikido – Shihan Kawai. Academia Central (SP). Disponível em
<http://www.aikidokawai.com.br/pt/guia-do-iniciante.html> Acesso em: 9 fev. 2012.

125 Samurai que se tornou monge e teve suas memórias registradas por um discípulo em 1716, compilação que ganhou o nome de Hagakure e hoje é
considerado o primeiro relato do bushidô (conduta ética dos samurais).

126 Esgrima japonesa, descendendo do kenjutsu. Teve sua sistematização após a Segunda Guerra Mundial, tornando-se parte do currículo escolar japonês.
(LOURENÇÃO, 2009)

127 Tiro com arco e flecha, literalmente “O caminho do arco”.

REFLEXÕES SOBRE A CONTEMPORANEIDADE CULTURAL DO JAPÃO E SEU LEGADO HISTÓRICO: CLUSTERS


ETNOCULTURAIS, ACULTURAÇÃO E JAPONICIDADE

Prefácio

O objetivo deste capítulo é discutir a contemporaneidade cultural do Japão como legado histórico; uma sociedade milenar que, apesar de manter diversas
particularidades e unicidades sociais, culturais, e organizacionais, bem como tradições, filosofias, e princípios de orientação coletiva por gerações, revela-se não
estanque. O Japão não ficou livre de um processo de aculturação que pode ser classificado como ‘tênue’ (latente) ou ‘forte’ (explícito) dependendo de seu
momento histórico. O tema é provocativo e tem o propósito de instigar a continuação desse debate nos meios acadêmicos, centros de pesquisa e nos fóruns
especializados sobre sociedade e cultura japonesa. O capítulo apenas introduz de forma geral aspectos, circunstâncias e contextos históricos, culturais, sociais,
societários e identitários que podem vir a ser parte de uma abordagem mais abrangente sobre o Japão, o que é chamado nesta obra de ‘japonicidade’. A
definição de ‘japonicidade’ ainda está em construção, e é uma missão complexa que demanda contribuições dos vários pesquisadores e estudiosos da área no
Brasil e no exterior. A definição e o desenvolvimento do conceito ‘japonicidade’ são tarefas desafiadoras uma vez que não se pode usar de um determinismo
simplista na explicação de uma sociedade milenar, peculiar e culturalmente rica como a japonesa. Japonicidade diz respeito a todos os fatos, eventos, produção
intelectual, nuanças sociais e experiências vividas por uma nação, e inclui a existência de um consciente coletivo que engloba valores, crenças, identidade, os
elementos autóctones, regras e normas sociais, códigos implícitos e explícitos de conduta, as narrativas e as construções discursivas de um povo, sua literatura,
os aspectos linguísticos (DONAHUE, 2002), o papel da imprensa e mídia na formação da opinião pública, os arranjos organizacionais, as instituições, o nível
tecnológico, os festivais, a cultura, os costumes, o ethos, nacionalismo, e as orientações e decisões nas relações exteriores. No entanto, a discussão sobre
‘japonicidade’ não ficaria completa se não fossem rompidos paradigmas enraizados em axiomas que podem interferir na descrição mais fidedigna de uma
realidade nipônica. Os pressupostos para o debate são de que o Japão não é uma nação monocultural, homogênea em bloco, monolítica, mas sim
‘transcultural’, constituída também de ‘enclaves etnoculturais e estrangeiros’ (WEINER, 1997), e em flagrante transição e transformação incorporando aspectos
culturais e sociais de outros povos. A fim de sistematizar a análise, o autor busca subsídios, evidências e intersecções factuais usando como método de coleta
de dados o estabelecimento de vínculos entre a realidade contemporânea do Japão e sua história milenar, e divide o capítulo em três seções principais: i) o
legado histórico das ofensivas bélico-militar ultramar do Japão; ii) as diásporas japonesas; iii) os nichos etnoculturais e estrangeiros no Japão, com ênfase para
os nikkeis brasileiros residentes no Japão e com status de dekasseguis. O termo ‘nikkei’ refere-se aos descendentes dos japoneses que fizeram parte da
diáspora do século XX. São três momentos da história do Japão que se revelam intrinsecamente interligados, pois as pretensões bélicas japonesas tiveram
participação direta e indireta nas diásporas, com inúmeras famílias deixando o arquipélago buscando melhorias financeiras e de vida, e algumas famílias se
exilaram também fugindo das expiações e incertezas causadas pelas guerras. Por outro lado, foram justamente as ações ultramar do Japão e as diásporas
nipônicas que propiciaram também o surgimento de clusters etnoculturais e estrangeiros em seu solo. A palavra ‘clusters’ é usada aqui no sentido de
‘agrupamento’, ‘aglomeração’, ‘nicho’. Foram justamente as alternâncias de emigração e imigração, combinadas com a expansão mercantilista japonesa que
contribuíram para o que se pode afirmar, mas com certa cautela, de uma aculturação nipônica. Evidências dessa aculturação são buscados na releitura do
contexto do Japão imperialista e mercantilista. Em termos de marco temporal, o Japão é situado em dois principais momentos históricos: antes e depois de
1945. O ano de 1945 é citado como um marco divisor entre um Japão beligerante e um Japão tecnológico; um ano em que ocorreram também mudanças
profundas na sociedade japonesa, tanto em termos de autopercepção global, com uma nova orientação e ordem nipônica frente aos desafios do pós-guerra.
Talvez o fato mais notório desse “turning-point” histórico, ou seja, a virada de rumo da história japonesa, tenha sido o lançamento das bombas atômicas em
Nagasaki e Hiroshima. Ao olharmos o desenrolar da história do Japão, há, em relação ao ano de 1945, a observância patente de uma dicotomia na forma em
que os japoneses, mais especificamente seus líderes e dirigentes, conduziram o futuro do país com políticas públicas que contrastaram com as visões de
domínio pelos meios bélicos e conquistas territoriais de outrora. O Japão pós-Segunda Guerra Mundial teve como recursos fundamentais para sua reconstrução
a capacidade interna de produzir, inovar e competir. Uma combinação de força física, excepcionalidade intelectual, e cooperação internacional. Assim, o domínio
pós-1945 não foi o beligerante, mas o domínio tecnológico e das parcerias. Um processo que foi apoiado de forma orquestrada e disciplinada por toda a nação.
Um exemplo inegável de superação e reconstrução nacional. Esses fatos mostram a importância de expressões como ‘gambare’, e ‘ganbatte’ (ambos do verbo
‘gambaru’, ou seja, ‘esforçar-se’, dar o seu melhor em termos de empenho etc). A compreensão da contemporaneidade da sociedade e cultura japonesa
demanda uma investigação holística que vai além dos aspectos mais visíveis em termos antropológicos, sociológicos, geográficos e territoriais do Japão.
Metodologicamente, o autor busca sustentar seus argumentos e pontos-de-vista com a revisão da literatura pertinente, em particular com base naquelas obras
publicadas no idioma inglês, pois essas somam um maior número de abordagens no tema. A vivência do autor no Japão por quatro anos para estudos do idioma
japonês e para a realização de pós-graduação na região de Niigata-ken e Nagoya-shi como bolsista do Ministério da Educação, Ciência e Cultura do Japão,
Monbukagakusho, contribuiu para fortalecer e respaldar as interpretações, análises e pontos de vista aqui expostos.

Introdução

Este capítulo busca questionar e, também, corroborar conclusões publicadas por autores de referência na literatura que abordam os temas sobre ‘sociedade’ e
‘cultura’ japonesa, bem como reunir evidências que possam validar o argumento de que o Japão tem sido ao mesmo tempo agente e objeto de uma aculturação
ao longo de sua história, denotando algo que poderia ser chamado de ‘simbiose cultural multiétnica’ – uma troca cultural entre os povos e nações com os quais
historicamente manteve contato - o que nos leva a uma reflexão sobre quais são os aspectos que podem fazer parte de uma ‘japonicidade’; um termo usado em
referência ao conjunto de elementos que contribuem para caracterizar uma cultura, um povo, uma nação, e uma sociedade, e diz respeito a um consciente
coletivo; uma palavra que tem o seu correspondente em inglês ‘Japaneseness’, e que na língua japonesa se aproxima do termo ‘nihonjiron’ (■■■■), que, de
modo literal, refere-se às discussões e teorias sobre os japoneses.

Na literatura, o termo ‘nihonjiron’ faz conotações com ‘nacionalismo cultural’, e, portanto, de insinuações etnocêntricas. Para Donahue (2002), ‘japonicidade’ leva
a uma reflexão sobre o que significa ser ‘japonês’. Befu (2001) explica que ‘nihonjiron’ usualmente faz alusão às características estereotipadas dos japoneses e
de sua cultura, mas em sua obra ele faz um levantamento mais ostensivo sobre a literatura ‘nihonjiron’, abrangendo desde a ecologia, comuidade rural e língua,
a fim de demonstrar o papel que o ‘nihonjiron’ exerce na formação da identidade japonesa e nas orientações públicas, funcionando como uma “religião civil”;
uma autoidentidade nipônica que se alterna entre positiva e negativa desde a Era Meiji (BEFU, 2001).

Mas o conceito de ‘japonicidade’ não se limita ao ‘nihonjiron’; ‘japonicidade’ inclui elementos do ‘nihonjiron’, mas como apresentado na seção anterior também
implica as abordagens de outras teorias sobre o Japão, entre elas o ‘nihonshakairon’ (■■■■■), as teorias sobre a sociedade japonesa, e o ‘nihonbunkaron’
(■■■■■), as teorias sobre a cultura nipônica. Apesar disso, são termos que se referem a elementos tangíveis e intangíveis próprios de um país ou de uma
sociedade específica, e isso inclui incorporações, convergências e intersecções étnicas e, ou, culturais, além de outros fatores sociais, societários e de
identidade como legado histórico comum de um povo.

Assim, o texto busca discutir o ‘transculturalismo’ e a ‘aculturação’ em relação ao Japão, buscando-se argumentos e uma análise crítica isenta – sem as
influências de um nacionalismo cultural - de que tais processos podem vir a fazer parte de uma ‘japonicidade’, rompendo-se com o paradigma de que o Japão é
incontestavelmente uma sociedade homogênea, cultural e socialmente. O texto é, de certo modo, provocativo, pois incita a um debate mais profundo e eclético
entre os pesquisadores e estudiosos da área acerca da sociedade japonesa, para que introspectivamente se possa melhor compreender sua
contemporaneidade. Para Weiner (1997), observa-se que ao se falar sobre ‘japonicidade’, as minorias existentes no arquipélago japonês acabam excluídas.

A aculturação é intrinsecamente parte do processo de endoculturação em que uma sociedade incorpora novos valores, significados, ideologias, processos,
técnicas e tecnologias, visões de mundo, e comportamentos, influenciados por fatores endógenos e exógenos diversos nas relações e interações entre os
indivíduos daquela mesma sociedade e, ou, entre os indivíduos autóctones com aqueles de atributos sociais e culturais não autóctones. A ‘aculturação’ é
definida na Enciclopédia Britânica, como ‘o processo de mudança dos artefatos, costumes, e crenças como resultado do contato entre duas ou mais culturas’.

Já a ‘endoculturação’, ou ‘enculturação’, pode ser compreendida como a socialização normativa dentro de uma cultura em que as gerações de indivíduos, de
qualquer cultura, passam entre si (ROMERO et. al, 2000); é um processo de socialização em que há transferência de competências comportamentais, valores,
de língua ou de certas expressões linguísticas, habilidades, e de identidade cultural (KNIGHT et. al., 1993). Desta forma, a ‘etnocultura’ é intrinsecamente o
resultado de uma endoculturação em que há um processo permanente de transmissão de conhecimento, saberes, sentimentos de pertencimento, de
manutenção de estilos de vida e de aprendizado dentro da mesma cultura de uma coletividade (Ver Fig. 1).

Fig. 1 - Endoculturação, Aculturação e Socialização Normativa


Yoshino (1992) mantém uma posição conservadora acerca do Japão situando-o como ‘culturalmente distinto’ em uma linha histórica em função do identitário
coletivo. Para Yoshino, o Japão é possuidor de um ‘nacionalismo cultural’. Essa abordagem centra-se na análise do ‘nacionalismo cultural’ e da ‘identidade
nacional’ como legado cultural da sociedade japonesa contemporânea, e, talvez, conote uma visão etnocêntrica nacional sobre aquela sociedade. O
‘nacionalismo cultural’ é entendido como todos os aspectos que venham a regenerar a comunidade nacional pela criação, preservação e fortalecimento da
identidade cultural de um povo em termos de ‘sentimento’, e não está relacionado a movimentos nacionalistas (YOSHINO, 1992).

Um indivíduo ‘nacionalista cultural’ considera seu país o produto de uma história única e com atributos peculiares, e coloca em destaque a comunidade cultural
como a essência de uma nação e busca assegurar direitos de cidadania a seus membros. Yoshino (1992) explica que normalmente há dois grupos que
favorecem o surgimento de um nacionalismo cultural: os intelectuais, considerados as ‘elites do pensamento’, que formulam ideais da identidade cultural da
nação, e a chamada ‘intelligentsia’, ou grupos sociais de elevada formação educacional, que contribuem para uma representatividade cultural societária
refletindo, portanto, uma posição social, econômica e política desses grupos.

Em sua análise, Yoshino (1992) discute sociologicamente as várias obras produzidas por uma ‘elite intelectual’ que relatam as ‘unicidades’ da cultura japonesa;
o ‘nihonjinron’ (■■■■) literalmente significa ‘discussões acerca das coisas únicas relativas ao Japão’, o que podemos também considerar um dos estudos
acerca das ‘japonicidades’ daquela nação, tema abordado mais frequentemente nas décadas de 1970 e 1980. Na literatura, o nihonjinron é analisado como
sendo inerentemente parte de um ‘nacionalismo cultural’, e tal abordagem é feita a partir de materiais ilustrativos de ocorrências cotidianas, produções ou
citações folclóricas, diários de viagem, notícias contemporâneas, e episódios registrados em diversas obras sobre o tema, entre elas: Delmer Brown, 1955,
‘Nacionalismo no Japão: Uma Introdução à Análise Histórica’ que discute o ‘etnicismo nipônico’ no período entre o século VII e o fim da década de 1940, o
pós-guerra. Outras obras existentes são o ‘Pensamento e Comportamento na Política Japonesa Moderna, de Maruyama Masao, 1963; e a ‘Direita no Japão: Um
Estudo de Pós-Guerra, de Ivan Morris, 1960.

Talvez um dos aspectos mais visíveis dessa aculturação recente do Japão possa estar no modo cada vez mais ocidentalizado dos nihonjins, dos japoneses, por
influência dos Estados Unidos, pois se observa naquele país uma flagrante americanização do estilo de vida, dos gostos, das escolhas, do vestuário, da música,
do corte de cabelo, inclusive com a incorporação do inglês katakanizado, ou mesmo romanizado, como recurso linguístico indispensável nas rotinas dos
japoneses, e muitos fazem questão de ter um sotaque americano na pronúncia do inglês. Tal fato é observado nas interlocuções triviais do dia a dia, na mídia,
nos esportes e na educação, fazendo com que o inglês se torne uma das principais fontes para o ‘gairaigo’ (■■■), um termo que se refere a palavras tomadas
emprestadas de outro idioma e que são escritas em katakana. Nesse aspecto, o inglês povoa todo o vocabulário, excedendo-se no esporte. O tema ‘gairaigo’ é
abordado com excelência e originalidade neste livro no capítulo escrito pela autora Akemi Yamada.

O katakana é um dos recursos da escrita japonesa e é usado na transliteração de nomes de origem estrangeira, inclusive nomes das pessoas, e também usado
para representar onomatopeias. Com esse recurso linguístico, cujos símbolos são bem mais simplificados do que o kanji e o hiragana, as palavras não nipônicas
se destacam em um texto podendo imediatamente ser identificadas no conjunto de frases. Aliás, o katakana simbolicamente representa essa preocupação dos
japoneses em distinguir o que seja próprio deles e o que “vem de fora”.

Na interpretação do autor, o uso de uma forma escrita diferenciada para registrar palavras ‘estrangeiras’ ou ‘não tradicionais’ no vocabulário da língua japonesa
já evidencia per se a materialidade de uma aculturação. A china, por exemplo, também tem uma escrita constituída por ideogramas e esses são usados se
modificações ou simplificações para se referirem às palavras de origem estrangeira. Mas o povo japonês demonstra grande interesse em conhecer a cultura dos
demais povos e países independente da posição geográfica, e esse interesse acaba por ter um significado e peso no estilo de vida nipônico. Some-se a isso
também o fato de que o japonês – principalmente os jovens – tem buscado viver no exterior a fim de obter experiências culturais e, ou, como parte de formação
educacional, o que acaba por ter influência em sua cultura quando na volta desses indivíduos ao arquipélago.

O autor destaca a partir de sua vivência no Japão que a aculturação não é um processo livre de conflitos e contradições, pois mesmo aqueles que aderem e
praticam um ‘americanismo’, ou ‘ocidentalismo’, o fazem contrariando regras sociais e padrões profundamente enraizados na sociedade japonesa, e não estão
livres de críticas e de pagar um preço social alto por buscarem ser diferentes. Para alguns jovens universitários que buscam um estilo diferenciado de viver e
vestir, a “rebeldia” tem um limite e prazo para que eles não fiquem socialmente e profissionalmente excluídos. Por exemplo, usam roupas multicoloridas, e, às
vezes, bizarras; os cabelos espetados muitas vezes com cores fortes, alaranjado, vermelho, roxo, etc., no entanto, fazem isso no primeiro e segundo ano da
Universidade, e nos últimos anos restantes voltam a ser os ‘japoneses de contorno mais conservador’, vestindo seus ternos preto ou azul escuro, e, assim,
voltam também a se comportarem de acordo com as regras socialmente aceitas, e são poucos os que realmente incorporam ou adotam o estilo rebelde ou de
contraste como algo permanente.
Mesmo as gangues de motociclistas juvenis japonesas, conhecidas como ‘bosozoku’, parecem não se equivaler às gangues de motociclistas de outros países
em termos de violência, infrações, delinquência, e vandalismo, principalmente em relação às gangues dos Estados Unidos. Em Nagoya, algumas dessas
gangues são seguidas de perto em todo seu trajeto durante a madrugada por um carro característico, de vidros escuros, supostamente pertencentes à polícia ou
à investigadores; os motociclistas são fotografados, filmados, e se limitam a acelerar suas motos fazendo muito barulho, e, talvez a infração mais grave que
cometem é andar na pista oposta, dirigindo em zigue-zague, ou o desrespeito ao sinal de pare ou ao semáforo vermelho. São gangues de rebeldia relativamente
“disciplinada”, ou seja, não são infratores deliberados, e sim delinquentes que sabem até onde podem ir com a quebra das ‘regras sociais’ e das ‘leis’, de modo a
evitar uma criminalização de seus atos, uma corte judicial, ou, evitar, o que se pode chamar de ‘suicídio social’ ficando excluídos naquela sociedade.

Mas para se compreender o Japão em sua totalidade social e cultural, o autor faz uma releitura crítica daquela sociedade situando-a em dois macros momentos
históricos antagônicos em sua formação e existência. Levando-se em conta os ímpetos e planos daquele país de se tornar líder global, existem, portanto, dois
contextos históricos do Japão tendo como marco divisor o ano de 1945: o antes e o depois da Segunda Guerra Mundial (Fig. 2). Antes de 1945, o Japão buscou
se tornar líder mundial principalmente pelo domínio bélico e pelas conquistas territoriais. Nessa fase, predominou-se uma maior imposição da cultura nipônica
em razão dos objetivos de domínio do “outro”, do território ultramar. As razões históricas da beligerância japonesa são detalhadas nas seções seguintes deste
capítulo.

Após 1945, o Japão abandona completamente suas pretensões e ambições beligerantes, e a partir daí passa a ganhar o respeito e simpatia mundial pelos
avanços e contribuições tecnológicas. Nessa fase, pode-se afirmar que a cultura nipônica não é mais imposta, mas cultivada e aceita globalmente sendo
considerada ‘peculiar’, ‘rica’, ‘exótica’ e ‘fascinante’. Concernentes a isso, duas coisas podem ser ditas: o Japão não se fez “império” (líder) pela guerra, mas pela
paz; e apesar de uma forte orientação nacionalista e uma acentuada percepção identitária coletiva, o autor defende que a progênie e a cultura nipônicas não
ficaram incólumes às influências de outros povos com os quais teve contato e interações.

Fig. 2 - Antagonismos Históricos do Japão: 1945, Marco Divisor

Conquista bélico-militar Conquista científico-tecnológica


Devolução de territórios e restituição de soberanias. Compensações são feitas
Conquista territorial: invasão e apropriação às nações invadidas. Predominam-se a cooperação, os tratados, e acordos
bilaterais e multilaterais. O Japão torna-se nação amiga e parceira mundial.
Domínio físico Domínio imaterial (intelectual-tecnológico)
Um ‘nacionalismo endógeno’ voltado para a reconstrução da nação no
Excessivo nacionalismo: orgulho nipônico
pós-guerra
Cultura e gastronomia japonesa se popularizam pelo mundo, aceitas e
Imposição cultural e linguística reconhecidas mundialmente como peculiares, ricas, exóticas e fascinantes.
Cresce o interesse pelo idioma japonês.
Japão torna-se potência mundial fazendo parte do G-7, as oito nações mais
Intenções imperiais em nível global
poderosas.
Sociedade hierarquizada, mas com uma estratificação em transformação.
Reformas institucionais são feitas. As organizações corporativas, os Keiretsu, a
Sociedade altamente hierarquizada e estratificada
meritocracia e a senioridade passam por mudanças e reestruturação, ganhando
características mais ocidentalizadas.
Flexibilização quanto à entrada e permanência de estrangeiros. O Japão
permite a entrada das primeiras levas de imigrantes trabalhadores, iniciando-se
Restrições extremas à entrada e permanência de estrangeiros, exceto pelo
a ‘diáspora do retorno’ dos Nikkeis. O turismo se intensifica tornando-se o
comércio exterior.
Japão um expressivo mercado emissor (o japonês viaja o mundo) e receptor
(destino mundial).

Autor: Ismar Lima, 2012.

Outro aspecto a ser analisado são as relações e inter-relações culturais do Japão com as demais minorias étnicas (nichos étnicos) em seu próprio arquipélago,
pois naquele país predomina uma estrutura social altamente estratificada, hierarquizada (WEINER, 1997), e uma indústria de cultura corporativa agressiva. Sob
as égides desse sistema, os verbos ‘mudar’, ‘incorporar’, ‘aceitar’ e ‘flexibilizar’ (talvez seja mais correto falar em ‘humanizar’) parecem ser ainda uma barreira a
ser rompida entre os representantes e grupos mais conservadores, principalmente os corporativos, e, também, por uma parcela da população. Nesse sentido,
uma visão crítica sobre os ‘grupos específicos nipônicos’ e as ‘comunidades estrangeiras’ (nichos estrangeiros) existentes no Japão, bem como sobre as
investidas históricas japonesas no exterior faz-se necessária para a compreensão sociológica e cultural do tema, não se refutando – no entanto – a existência de
um marcante ‘nacionalismo cultural nipônico’ (YOSHINO, 1992).

Há, portanto, neste debate indagações acerca das asserções na literatura sobre a ‘homogeneidade cultural’ e a ‘homogeneidade étnica’ do Japão e sobre o
contexto dos nichos étnicos e estrangeiros minoritários no território japonês. Pode-se afirmar que o Japão é um país de cultura e sociedade monolítica? São a
monocultura e a monoetnia elementos inquestionáveis de uma ‘japonicidade’? Quais são as verdades e quais são as afirmações falaciosas sem respaldo
acadêmico-científico acerca da intangibilidade do Japão? É possível validar a tese de um Japão transcultural e multiétnico?

Para sustentar seus argumentos, o autor faz uma revisão da literatura e do timeline do Japão, bem como uma releitura dos nichos étnicos e culturais existentes
no arquipélago japonês, em especial dos nikkeis brasileiros, dos nipo-brasileiros, e das investidas japonesa ultramar. O termo ‘nikkei’ é usado para designar os
descendentes filhos dos japoneses da diáspora do século XX, também chamados de issei, nissei, sansei, yonsei etc. dependendo de qual geração pertencem,
por exemplo, se são da primeira geração, são chamados ‘isseis’, da segunda geração, ‘nisseis’. Além disso, o autor se respalda em sua própria vivência no
Japão, país em que morou por quatro anos entre 2000 e 2004 para fazer estudos do idioma japonês na Universidade de Niigata, mestrado em Relações
Internacionais, na Universidade Internacional do Japão (IUJ), e uma especialização focada em ‘Assistência Oficial para o Desenvolvimento (ODA) do Japão e
Projetos Ambientais em Países Subdesenvolvidos’, na Faculdade de Desenvolvimento Internacional (GSID), pertencente à Universidade de Nagoya.

Nessa última cidade, o autor pôde conviver mais proximamente da realidade dos dekasseguis brasileiros naquele país, legitimando suas asserções e ponto de
vista, sempre se apoiando na ‘participação observante’ como método investigativo. Além disso, o autor possui em sua família primos nikkeis, e desse convívio
passou desde criança a ter certo contato e primeiras experiências do legado nipônico no Brasil. Some-se a isso a participação do autor como Vice-Presidente do
Centro de Pesquisa da Cultura Japonesa em Goiás, CPCJ-GO, um Centro de investigação em que os debates temáticos sobre o Japão têm contribuído com o
subsídio intelectual necessário para o amadurecimento acadêmico e individual.

Assim, ao mencionar a ‘realidade contemporânea’ do Japão, o autor deixa latente que a realidade atual é o resultado de um acúmulo de experiências e vivências
culturais, históricas, sociais, tecnológicas e econômicas do povo nipônico como nação milenar, e a ‘modernização’ confunde-se com o processo de aculturação e
ocidentalização, tendo como ponto de partida histórico mais aparente, a abertura dos portos japoneses (BEFU, 2008) durante o Período Edo (■■■■) (tendo sua
sede em Yedo, atualmente Tóquio), também chamado de Período Tokugawa (■■■■).

Mas o movimento de abertura do Japão para a civilização ocidental foi ostensivamente defendida por Yukichi Fukuzawa (1835-1901); em 1869, ele liderou uma
ampla campanha para a ocidentalização nipônica. Isso tudo coincidiu com o início da Restauração Meiji ou Era Meiji (■■■■), 1868-1912, marcando
sobremaneira um período em que o Japão presenciava um dinamismo pujante no progresso das ciências e no aprendizado científico, com um fluxo intenso de
ideias e cultura vindas do Ocidente. Para se ter uma ideia dos planos de Fukuzawa, em 1869, a Escola Confúcio de Edo torna-se uma universidade no estilo
ocidental, atualmente a Universidade de Tóquio.

A Era Meiji é também chamada de Restauração, pois foi durante os 45 anos de governo que o Japão rompeu com sua estrutura feudal, havendo uma
intervenção do Estado na economia, e foram criadas formas centralizadas de administração pública, bem como favoreceu-se a modernização do modo de
produção do arquipélago com a adoção de tecnologias ocidentais, ocorrendo a ‘revolução industrial japonesa’ e, consequentemente, sua entrada no sistema
capitalista. Outra mudança (restauração) fundamental para a modernização do Japão foi a reforma agrária, acabando-se com os privilégios de senhores feudais,
com reformas também na legislação rural com a criação de impostos territoriais. Além disso, durante o Período Meiji, foi criado o parlamento, promulgada a
primeira constituição, e foram criadas várias universidades, seguindo-se o modelo de instituições ocidentais; além de se criar uma malha ferroviária no
arquipélago, uma infraestrutura de transporte essencial para o seu desenvolvimento capitalista.

No entanto, os 45 anos de reformas e restaurações com a entrada e participação ocidental causaram grande impacto no país, e o Japão parecia que iria, em
curto tempo, se ocidentalizar com o estilo de vida sendo alterado se comparado com o estilo dos tempos do regime dosshogunate, período Edo; uma transição
marcada por rotinas estressantes de uma economia que estreava no capitalismo (CULLEN, 2003); esses fatos levaram a população a questionar as mudanças
guiadas pela industrialização, causando na época momentos de violência, desentendimentos e confusão, alarmada pelo ritmo dramático da modernização (ou
ocidentalização); assim, iniciou-se um sentimento em certos grupos sobre a importância de se preservar a cultura tradicional do Japão.

No final do século XIX havia uma equalização entre ‘modernização’ e ‘ocidentalização’ (seiyoka), uma correspondia à outra na percepção da sociedade
japonesa, em que o ‘Ocidente’ era visto como uma região de certa superioridade em relação às demais áreas do planeta (CULLEN, 2003). Quando o Japão teve
de admitir a presença estrangeira, o país escolheu criar instituições de governo no estilo ocidental, incluindo o Sistema de Justiça. Essas asserções são
polêmicas no debate acadêmico, e, portanto, passíveis de ‘inquiries’ (questionamentos) nas ciências sociais, humanas e políticas.

Até antes das revoltas por causa do processo de ‘ocidentalização’ de certos aspectos sociais, culturais e institucionais nipônicos, o sistema imperial tinha sido
menos restritivo permitindo o “utilitarismo” de Fukuzawa Yukichi, com uma evidente ‘ocidentalização da língua e da moda’, além de mudanças no estilo ocidental
em outras áreas, incluindo os debates acerca dos méritos e ganhos da democracia e o socialismo, mas por volta de 1935 tais manifestações não mais aceitas
devido à posição ideológica imperial (CULLEN, 2003).

No período antecedente à Segunda Guerra Mundial, a comunidade internacional tinha a concepção de que o Japão matinha um poder em virtude da Ásia, ou
seja, limitava-se àquele continente, e, ao se fazer ‘imperial’ na Ásia, equiparava-se - em termos de importância global - aos países ocidentais que eram o ‘poder
dominante’; por isso, havia uma preocupação do Japão de se fortalecer na região para garantir sua supremacia e domínios territórios (as áreas originais e as
terras conquistadas), fazendo-se uma vanguarda vis-à-vis as ações ou pretensões colonialistas do ocidente na Ásia, ou seja, vindo a praticar formas de
deterrence visando a desencorajar quaisquer pretensões militares de outras nações na região de domínio nipônico.

Foram esses dilemas da abertura do Japão a partir da Restauração Meiji (1868), sua ‘modernização’, e a necessidade de afirmar seu ‘poder’ na Ásia frente ao
avanço do sistema colonialista ocidental, que levou o Japão a um conflito bélico com os Estados Unidos em 1941, o histórico ataque a Pearl Harbor.

Cullen (2003) explica que ações beligerantes “aos de fora”, os estrangeiros, se justificavam, pois o Japão teve em determinados momentos de sua história, por
exemplo, em 1630, restringir, limitar ou proibir (sakoku) a presença de certas nacionalidades (ou povos) em seu território pelo temor de se ver invadido e, ou,
largamente ocidentalizado. Considere-se que no início do século XVII havia uma escalada pela conquista de territórios ultramar, e os portugueses, holandeses,
ingleses e espanhóis, há séculos, possuíam um histórico de guerras entre si; portanto, nada mais realístico por parte do Japão do que salvaguardar seu
território, e, também, a sua cultura, e – nesse sentido - expedientes restritivos foram criados. Por exemplo, o termo ‘sakoku’ (■■) refere-se a uma estratégia
nipônica nas relações internacionais do Período Tokugawa em que nenhum indivíduo estrangeiro, ou suas embarcações, poderia entrar ou sair do arquipélago
japonês.

O Legado Histórico das Ofensivas Militares Ultramar do Japão

Lie (2001), em sua revisão da literatura identificou vários autores que veemente sustentam a visão de um Japão monoétnico, o que se contrapõem ao ponto de
vista aqui levantado acerca de uma heterogeneidade nipônica; assim ao se defender a tese de um ‘Japão multiétnico’, isso representaria per se um oximoro;
ideias antagônicas em sentido, mas reunidas em uma única frase dando um significado específico a um determinado evento; ‘na interpretação de alguns
estudiosos, a multietnia nipônica pode corresponder a um ‘oximoro’, pois a palavra ‘Japão’ pode levar, muitas vezes, a uma percepção geral de cultura singular,
imperativa, dominante, e única, portanto, ‘monoétnico’.

Essa visão monoétnica sobre o Japão é defendida por Edwin Reischauer, estudioso da sociedade japonesa, que explica aquele país como “o conjunto de
pessoas mais sistematicamente unificado e mais culturalmente homogêneo do mundo”. Reischauer reforça essa visão ao mencionar que “os japoneses se
sentem orgulhosos sobre a ‘pureza’ do sangue deles” (1988, p.33; p.396, apud LIE, 2001, p. 18). Em seu livro, Japan Today, Buckley (1990) afirma que
“nenhuma outra sociedade industrial se aproxima do Japão em termos de homogeneidade racial” (p.82); o mesmo ponto de vista é compartilhado por Kumagai
(1996) que advoga que o Japão “é a nação mais homogênea, racialmente e etnicamente, do que praticamente qualquer outra nação moderna” (p.9).

Com uma visão e interpretação sociológica contrastante à crença comum, Willis e Murphy-Shigematsu (2008) defendem a tese de que o Japão é uma sociedade
multicultural, em franca oposição ao pensamento de um Japão homogêneo étnico e racialmente, o que necessariamente não contradiz a posição de um
nacionalismo cultural de Yoshino, uma vez que o nacionalismo é um desejo coletivo, uma vontade geral, que não necessariamente traduz a realidade. Willis e
Murphy-Shigematsu (2008) refutam as construções sociais de um Japão monoétnico, confirmando as análises e interpretações de outros autores pioneiros no
tema, entre eles: Waga Wagatsuma Hiroshi, Changsoo Lee, Richard Mitchell, William Wetherall, George DeVos, Mikiso Hane, Roger Goodman, Tanaka Hiroshi,
Ross Mouer, Yoshio Sugimoto (p.17). Todos eles sustentam que existe um contexto da realidade japonesa em termos de composição étnica diferente daquela
ecoada correntemente na literatura de um Japão de pureza racial; segundo esses autores, existem “ilusões” de uma homogeneidade nipônica; aliás, uma
imagem estereotipada (e talvez equivocada historicamente) de um Japão monolítico.

No entanto, é inegável que o Japão possui suas características próprias, únicas, ímpares, peculiares, e endêmicas, social e culturalmente falando; uma
sociedade com seus estereótipos formados por grupos de indivíduos com suas idiossincrasias; uma sociedade pujante, disciplinada, consumista, e com códigos
sociais que se entrelaçam com as rotinas do trabalho; um povo de orientação coletiva em contraposição ao individual, fato que os contrasta vis-à-vis as
sociedades ocidentais predominantemente individualizadas em que as conquistas, méritos e fracassos tendem a ser realizações ou eventos de abrangência
restritiva, pertencentes a uma pessoa ou a um grupo. Esses elementos simbolicamente representam as ‘unicidades nipônicas’ que fazem parte dos traços e
legados materiais e imateriais daquela sociedade, mas nada que sustente a visão de uma cultura ilhada, intacta às mudanças. Existem, logicamente, culturas
que são mais resistentes às influências externas, mantendo traços, rituais, dogmas, crenças e comportamentos geração após geração permitindo apenas
alterações sutis, como ocorre com alguns grupos indígenas, nesse caso por seu isolamento em áreas remotas. Essas considerações são imprescindíveis no
momento de se explicar o termo ‘japonicidade’ devido a sua complexidade.

O Japão tem-se mostrado um país em transformação ao longo dos séculos, em particular, concernentes a dois momentos históricos, após 1868 com a
Restauração Meiji, e após a Segunda Guerra Mundial, 1945; isso em termos de sociedade bem como no aspecto arquitetônico e nas investidas tecnológicas,
mas ainda se sustenta o argumento, ou “mito”, de que o Japão possui uma sociedade homogênea e uniforme (WEINER, 1997) que não permite uma significativa
permeabilidade cultural, mantendo-se relativamente ‘isolado’ em relação às influências externas, portanto, monocultural.

Matsumoto (2002) também valida a asserção de que o Japão é um país culturalmente e socialmente em transformação, pois a cultura contemporânea revela-se
consideravelmente diferente de uma cultura prévia de um Japão, comumente e estereotipadamente estabelecida como “unicultural”, cuja essência tem sido a
dignidade, aristocracia, educação e polidez (como regra social), honra, orgulho, e perseverança, algo cultivado por gerações, mas que parece estar sendo
paulatinamente sobreposto por outros valores e códigos morais, especialmente por causa da juventude japonesa, que optar por atitudes, crenças e
comportamentos contrastantes rompendo com os códigos morais da vivência rotineira e do convívio social que resistiram no país por gerações (p. 1-5).

Uma resistência da estrutura social apontada nos trabalhos de Chie Nakane, um dos escritores de maior influência recente; no livro ‘Sociedade Japonesa’
(1970), ele repercute a percepção de uma cultura homogênea. Uma das unicidades (ou estereótipo) mais comuns entre japoneses e não japoneses é de que a
dimensão cultural e social do Japão assenta-se no fato “de sua organização ser de orientação ‘coletiva’ e não ‘individualista’”, tal como ocorre nas relações
societárias de outras sociedades no mundo (MATSUMOTO, 2002, p. 37). Apesar de ter suas ‘unicidades’, um olhar mais atento poderá revelar que um Japão
culturalmente uniforme não representa em plenitude sua realidade contemporânea, e nos questionários respondidos por estudantes universitários japoneses,
70,8% deles se consideravam ‘individualistas’ e apenas 29,2% se achavam de orientação ‘coletiva’, já o mesmo questionário aplicado aos adultos revela outra
percepção; 67,9% dos adultos japoneses se acham com ações, pensamentos e atitudes coletivistas, e 32.1 se achavam individualistas.

Com base em seus levantamentos, Matsumoto (2002) elenca sete novos estereótipos que representariam uma contraposição às concepções clássicas acerca
da cultura japonesa, o que ele chama de o ‘Novo Japão’, título de sua obra. Os setes estereótipos são: i) o coletivismo japonês; ii) conceitos próprios do ‘eu’
japonês ; iii) consciência interpessoal japonesa; iv) a emoção japonesa; v) o “salaryman” japonês; vi) o emprego vitalício japonês; e vii) e o casamento japonês.
Esses estereótipos são feitos com base no estilo de vida de orientação coletiva, atitude pessoal em relação ao grupo, percepção societária, as interrelações,
profissão e trabalho versus meritocracia e senioridade, a o casamento e vida familiar.

Esses estereótipos podem ser reflexos de uma aculturação ou aquisição de novos valores e códigos sociais (morais) na história do Japão, havendo
possivelmente um processo de incorporação de aspectos da cultura do outro, incluindo a aceitação de costumes e gastronomia – por exemplo, o tempura,
empanado japonês, tem origem portuguesa -, bem como elementos e recursos linguísticos, primeiro da China com a adoção da língua escrita com o uso de
centenas de kanjis, os ideogramas, por volta de 500 D.C.; e, também de Portugal e da Coreia, e, mais recentemente, dos Estados Unidos, mas os ‘empréstimos’
não se limitam a esses países. Por exemplo, uma das palavras mais populares no Japão, o ‘arubaito’ (■■■■■), cuja tradução é ‘trabalho de meio período’ ou
‘trabalho ocasional’, vem do alemão ‘arbeiten’, mas os exemplos linguísticos importados são vários.

Antes de considerarmos plenamente as afirmações dos autores supracitadas, uma revisão das investidas do Japão no exterior se faz necessária, pois foram
(são) as experiências desse país, no exterior tanto para a beligerância quanto para o comércio exterior, os principais meios para inter-relações e contatos que
favoreceram influências culturais recíprocas. A beligerância nipônica se resume aos projetos de Imperialismo do Japão com as invasões e conquistas territoriais
na Ásia e no Pacífico (BEFU, 2008), bem como as atividades corporativas e operações militares pacíficas mais recentes no exterior.

De acordo com Willis e Murphy-Shigematsu (2008), atualmente há registros de comunidades japonesas com mais de 5.000 pessoas em Seoul, Hong Kong,
Cingapura, Bangcoc, Honolulu, Los Angeles, São Francisco, Chicago, Nova Iorque, Paris e Londres, onde a língua japonesa é o meio de comunicação
predominante, havendo, inclusive, escolas especiais para a educação dos filhos desses desterrados corporativos temporários. Isso mostra que o Japão não está
confinado ao arquipélago situado no leste asiático (WILLIS e MURPHY-SHIGEMATSU, 2008a). Existe, portanto, uma reterritorialização do Japão para além de
suas ilhas (BEFU, 2008). Nos séculos passados, isso ocorreu de duas formas: primeiro, com as conquistas territoriais beligerantes pela Ásia; posteriormente,
com a diáspora japonesa pelo mundo, em particular, para o Brasil e Peru. Todos esses fatos são elementos indissociáveis na elaboração do conceito
‘japonicidade’ visando a explicar a cultura e a sociedade nipônicas no espaço e no tempo como um povo de características próprias, mas suscetíveis
historicamente a ser objeto e sujeito de uma aculturação.

No Período Edo (■■■■), também chamado de Período Tokugawa (■■■■), predominou-se o governo dos Xoguns, entre 1603 e 1867; foi um regime que
oscilou entre aberturas do Japão para o comércio, o mercantilismo, bem como ficou marcado no século XVII pelas restrições de acesso de estrangeiros em suas
ilhas, mas foi um período de irrefutável influência ocidental, em particular, dos portugueses, holandeses, e, mais tardiamente, dos Estados Unidos.

Matsumoto (2002) comenta que na literatura o Japão das décadas anteriores à Restauração Meiji, antes de 1862, é citado como uma sociedade que ficou
basicamente fechada ao resto do mundo pelos Shoguns, e os “niponologistas” (estudiosos do Japão) têm caracterizado ou estereotipado tradicionalmente a
sociedade japonesa como centrada em uns poucos valores, traços de personalidade e virtudes morais (p.3). Contudo, Lie (2001) não compartilha dessa posição,
e afirma que o Japão nunca ficou integralmente fechado aos povos estrangeiros, nem fechado às suas ideias e mercadorias, por cerca de 200 anos, a partir de
1641 no Período Tokugawa, como historicamente alardeado; o que de fato aconteceu é que o estado Tokugawa monopolizou o comércio exterior, mas esse
monopólio não proibiu ideias estrangeiras, nem mesmo as ‘ocidentais’, de entrarem em suas ilhas (TSURUTA, 1992; JANSEN, 1992, p.2), por exemplo, mais de
200 livros estrangeiros foram traduzidos na época (ARANO, 1994, p. 228-229), e a passagem do Japão feudal-medieval para um Japão moderno foi marcada
pela existência de grupos etnicamente diversos. Na Era Meiji, ocorreu a colonização de Hokkaido e de Okinawa, e a expansão imperialista possibilitou a entrada
de muitos coreanos e chineses no Japão quando este invadiu e tomou controle da Manchuria e da Península Coreana (BEFU, 2008), aliás, a migração coreana
totalizava em 1945, mais de 2.300.000 pessoas (LIE, 2001, p.24) (ver Tab. 1.0).

Na segunda fase da Era Meiji, por volta do final do século XIX, o país começou a se estabelecer como poder imperial na Ásia invadindo também Taiwan,
Sakhalin, e a Micronésia (Befu 2008). Nesse mesmo período, os projetos de globalização do Japão moderno ganharam força, e com eles – paradoxalmente – a
possível ocorrência de uma aculturação tênue em meio à imposição de um nacionalismo cultural (YOSHINO, 1992). De acordo com Lie (2001), o ‘Japão
moderno’ vai do período após a Restauração Meiji, 1868, inclui o pós-Segunda Guerra Mundial, 1945, chamado de Sengo, e encerra-se com a morte do
Imperador Hirohito (Showa) em 1989.

Diferentemente de Lie, o autor acredita que o Japão possa ser classificado em quatro períodos históricos distintos considerando-se seus mais de dois mil anos
de existência. Esses quatro períodos seriam: o Japão ancestral; o Japão feudal-Medieval da Dinastia Tokugawa; o Japão Imperial Moderno da Era Meiji; e o
Japão Tecnológico Contemporâneo (Ver Fig. 2.0 e Fig. 3.0). Esses períodos históricos se situam dentro dois macros momentos históricos do Japão, como
anteriormente ilustrados: i) o ‘Domínio Bélico-Militar (tempos de beligerância; guerras, disputas), entre +2000 A.C. e 1945, e ii) o ‘Domínio Tecnológico’ (tempos
de paz), de 1945 até os dias atuais. O domínio tecnológico é, igualmente, marcado pela liderança econômica do Japão.

Em 1603, Tokugawa Ieyasu recebeu o título de Shogun pelo Imperador, e a população foi dividida em cinco classes hereditárias decrescente, levando-se em
conta a ordem de importância. O rígido status hierárquico proibia a mobilidade e o casamento entre castas diferentes (MINEGISHI, 1989). Assim, as cinco
classes foram chamadas de Shi-nõ-kõ-shõ: os Senhores; os Samurais; os agricultores, os artesãos, e os mercantes (LIE, 2001, p.28) dando início a uma
dinastia feudal-medieval que durou 265 anos.

Em 1868, o Imperador Meiji anuncia o retorno do poder imperial e declara-se um governante divino; a divindade imperial é negada em 1945 pelo Imperador
Hirohito após a derrota do Japão na Segunda Guerra mundial. Apesar de a Restauração Meiji introduzir a igualdade entre os cidadãos, no Japão do pré-guerra,
claramente pode ser notada uma elite formada por: família imperial (kõzoku); os nobres (kazoku), e os ex-samurais (shizoku), e os cidadãos comuns (heimin),
bem como os Burakumins como subclasse social (shin heimin) (LEBRA, 1993, p. 57-60).

O ano de 1945 é considerado pelo autor como um ‘marco divisor’, em que a história do Japão pode ser dividida em dois grandes momentos; ou seja, a
existência de um Japão marcado pela instabilidade por causa de suas pretensões imperialistas com conquistas bélicas territoriais (o Japão antes de 1945), e a
existência de um Japão líder mundial da tecnologia de ponta, inovador, pacífico, fomentador de cooperação e assistência internacional, e parceiro global nas
mais diversas áreas das Ciências e da Tecnologia, tornando-se dessa forma um país cujas credenciais das últimas décadas denotam seu sucesso. Existe,
portanto, um Japão dicotomizado historicamente pelo ano de 1945; dois momentos distintos de uma mesma sociedade (Ver Fig. 3.0).

Contudo, na literatura os períodos históricos do Japão são ordenados cronologicamente tendo como base os Imperadores de cada época, ficando assim
divididos: i) Período Histórico Precursor/Ancestral: Asuka/Nara, de 550 A.C. a 794 D.C.; ii) Período Heian, de 794 a 1185; iii) Era Medieval constituída de dois
períodos: Período Kamakura, de 1185 a 1333, e o Período Moromachi, de 1333 a 1568; iv) Primeira fase da Era Moderna também constituída de dois períodos:
Período Momyama, de 1568 a 1600 e o Período Edo (Tokugawa), de 1600 a 1868; e v) Segunda fase da Era Moderna: a Restauração Meiji, de 1868 a 1912; vi)
Contemporaneidade: 1912 até os dias atuais.

Fig. 3 – Japão e suas Quatro Dimensões Históricas:

Ancestral, Feudal, Imperial e Contemporâneo Tecnológico.

Tomando-se como base a linha de tempo da Fig. 3.0, o autor se propõe a sublinhar os eventos em que o Japão possui maior interatividade com povos de outras
culturas dentro e fora de seu arquipélago. Cronologicamente são dispostos os momentos em que essa interação ou contato para fins mercantilistas ou em razão
de ocupações de territórios podem ter sido propensos a uma possível aculturação ativa ou passiva do Japão. São também mencionados os momentos de
isolamento o que representam as vanguardas ou resistências com a finalidade de defesa do território e da cultura. Insulamento como estratégia.
Encontram-se na Tab.1.0 os períodos históricos e os respectivos fatos de maior expressão para os objetivos desta investigação que é mostrar a influência
estrangeira na cultura e sociedade japonesa. Na década de 1920, o ultranacionalismo japonês leva o país a intensificar suas conquistas territoriais e guerras
com o discurso da necessidade de se preservar os valores japoneses tradicionais, rejeitando a influência ocidental.

Tabela 1 - Japão Ancestral, Feudal, Imperial e Contemporâneo (-2000 A.C.- Atual): Possíveis Ocorrências de Aculturação e Insulamento (Reafirmação
Nacionalista e Cultural)

Eventos e Ocorrências no Arquipélago que


Investidas e Ofensivas Bélico-Militar Japonesa no Isolamento, Insulamento e Restrições
Intensificaram o contato e interação com outros
Estrangeiro, e as Diásporas (Possível Aculturação (Fortalecimento/ Reafirmação Cultural e, ou,
povos, tais como: religião, comércio etc. (Possível
Ativa-Passiva) Nacionalista)
Aculturação)
- 500 D.C. – O Japão adota o alfabeto chinês.

- 538 D.C. – O Reino da Coreia despacha uma


delegação para apresentar o Budismo ao Imperador,
e o ocorre uma introdução dessa religião no Japão.
- 838 D.C. – O Imperador proíbe o contato com a
China.
- Em 1274 – Kublai Khan e os Mongóis tentam
invadir o território japonês mas são expulsos pelos
‘kamikazes’. Obs: Em 1050, surge uma nova classe
militar: os Samurais.
- Em 1614, Ieyasu bane o Cristianismo do Japão.
- Em 1549, o missionário jesuíta português, Saint
Francis Xavier chega ao Japão. Os portugueses - Em 1633, o Shogun Iemitsu proíbe as viagens para
intensificam o mercantilismo com o Japão, o exterior e a leitura de livros estrangeiros, e em
tornando-se o único país europeu a realizar grandes 1638 ele proíbe a construção de navios.
negociações bem sucedidas.
- Em 1641, Iemitsu faz com o Japão rompa os
- Em 1591, os Jesuítas produzem os primeiros vínculos com todos os povos estrangeiros, e bane os
impressos de imprensa no Japão. estrangeiros do arquipélago, exceto Chineses e
Holandeses que permaneceram nas
Costas de Nagasaki. Houve um insulamento que
dura cerca de 200 anos.
- Em 1854, Os japoneses assinam acordos
comerciais, o ‘Tratado de Kanagawa’, reabrindo dois
de seus portos para os Estados Unidos após dois
séculos de restrições. Obs.: Em 1864, forças
britânicas, francesas, holandesas e americanas
bombardeiam Choshu, reabrindo mais portos - Em 1869, o governo inicia a colonização de
japoneses aos estrangeiros. Hokkaido.

- Em 1869, Yukichi Fukuzawa lança um movimento - Em 1895 – Os japoneses conquistam Taiwan.


de ‘ocidentalização’ no Japão, nesse mesmo ano a
Escola Confúcio de Edo torna-se uma universidade
no estilo ocidental, atualmente a Universidade de
Tóquio.

- Em 1873 – O Japão concede liberdade religiosa.


- Em 1904, o Japão entra em guerra com a Rússia, e
sai vitorioso em 1905. Em 1910 – O Japão anexa a
Coreia como território depois de três de guerra, e é
considerado um dos países mais poderosos do
mundo. Entre 1914 – 1918, Primeira Guerra Mundial:
O Japão declara guerra à Alemanha.

- A diáspora japonesa para o Brasil ocorre


principalmente entre 1907 e 1955.
- Na década de 1920, o Japão acirra sua postura
ultranacionalista com mais conquistas territoriais e
guerras para preservar os valores e tradições do
país contra a influência ocidental.
- Em 1931 – O Japão conquista a Manchúria.

- Em 1937, o Japão entra em guerra com a China e


ocupa Xangai, Pequim, e Nanquim, com registros de
atrocidades nesta última cidade.
- Em 1947, o Japão aprova uma nova constituição e
- Em 1940 – O Japão entra na Segunda Guerra
implanta o sistema parlamentarista, ficando todos os
Mundial e ocupa a região nordeste da Indochina
adultos elegíveis a votar. Nesse mesmo ano, o
Francesa (*Obs: em 7 de dezembro de 1941, o
Japão renúncia a qualquer atividade bélica e
Japão bombardeia Pearl Harbor, no Havaí (Cullen,
promete não manter qualquer tipo de força aérea,
2003), e nos dias 6 e 9 de agosto de 1945 os E.U.A
marítima e terrestre para fins bélicos.
lançam duas bombas atômicas sobre Hiroshima e
- Entre 1945 e 1952, os Estados Unidos ocupam Nagasaki), ocorrendo em seguida a rendição
várias ilhas do Japão para incondicional

uso militar; o país é ainda obrigado a reestruturar


suas instituições de acordo com os modelos do Japão, ano em que Imperador Hirohito nega seu
ocidentais. Em 1952 o Japão ganha sua status de divindade.
independência.
- Em 1956, o Japão torna-se membro das Nações
- Em 1945, a migração coreana no Japão totalizava Unidas.
2.300.000 pessoas.
- Na década de 1980 inicia-se o movimento
imigratório de trabalhadores Nikkeis para o Japão,
entre eles os Dekasseguis brasileiros (a diáspora do
retorno).
- Na década de 1990, o número de brasileiros no
Japão chega a 300.000 pessoas, a maioria de
descendentes de japoneses dekasseguis.
- Em 2004, Japão juntamente com o Brasil,
- Em 2004, pela primeira vez após a Segunda
Alemanha, e Índia lançam candidatura para uma
Guerra Mundial o Japão envia tropas (pacificadoras)
cadeira permanente no Conselho de Segurança da
para uma zona de guerra, o Iraque.
ONU.
- A crise econômica do Japão e sua recessão
iniciadas nos anos 90 acirram-se nos anos seguintes
fazendo com que muitos dekasseguis desistam de
continuar no Japão, optando pelo retorno definitivo
ao Brasil (a “diáspora da desilusão Nikkei”).

Autor: Ismar Lima, 2012, com base em várias fontes literárias.

A Diáspora Japonesa

Adachi (2006a) relata em sua obra que a formação da identidade dos descendentes dos japoneses no Brasil foi aquela da passagem de um contexto de
“migrantes agrários” para um contexto de “trabalhadores urbanos de colarinho branco”, portanto, as gerações subsequentes conquistaram e usufruíram de
situação muito mais privilegiada do que os seus antecessores, e, no Brasil, os descendentes de japoneses são comumente estereotipados como um grupo
étnico de identidade marcante, competentes profissional e academicamente, e de nível intelectual acima da média.

Mas a história da diáspora japonesa para o Brasil tem dois elementos fundamentais no final do século XIX que favoreceram a sua ocorrência: primeiro, o Japão
enfrentava uma grave crise econômica; segundo, a abolição da escravatura em 1888 dava um novo contorno social e laboral ao Brasil, e a necessidade de mão
de obra nas lavouras demandava um contingente imigratório (ADACHI, 2006a; LONE, 2001). Primeiro vieram para o Brasil os alemães, em 1824. Em 1894, o
deputado japonês Tadashi Nemoto veio ao Brasil, e viu no país uma possibilidade imigratória para o Japão, recomendando-a; no ano seguinte, em 1895, Brasil e
Japão assinam o Tratado de Amizade, Comércio e Navegação, e, com esse Tratado, iniciou-se uma campanha para incentivar os japoneses a imigrarem.

A região de São Paulo com seus cafezais precisava desse contingente para manter o ritmo de produção e os lucros; assim, o governo de São Paulo deu apoio
direto à vinda dos japoneses. Em 1907, a Companhia Imperial de Imigração, gerenciada por Ryu Mizuno, assina o acordo para o envio de 3.000 imigrantes em
três anos. Com o apoio de um grupo de intérpretes, o navio Kasato Maru atraca em São Paulo, em 1908, com 781 japoneses a bordo, 165 famílias, e esse ano
marca o início da imigração japonesa para o Brasil (SUDA e SOUSA, 2006, p.1). Os japoneses são enviados para a Casa da Imigração, e dias depois divididos
em seis grupos e enviados para a cafeicultura, mas no ano seguinte, em 1909, apenas 191 continuaram nos postos de trabalho.

Apesar desse resultado insatisfatório, em 1910, chega o segundo navio com mais imigrantes japoneses, e vindos em maior número, passam a formar núcleos
agrícolas próprios, expandindo-se a fronteira agrícola. Em 1926, em Cotia, é fundada a primeira Cooperativa Agrícola para o escoamento de batatas evitando-se
a ação de atravessadores. No interior do estado, começam a surgir as primeiras associações culturais japonesas. Lone (2001) fez um estudo sobre a
comunidade japonesa no Brasil entre 1908 e 1940, e relata a saga dos nipônicos em solo tropical, a luta, os sonhos, as conquistas, as incertezas, as saudades
da terra natal, o choque cultural e os sofrimentos, em uma narrativa metafórica que situa os japoneses no Brasil entre o dilema de pertencerem à terra dos
Samurais mas residindo na terra do Carnaval.

Segundo Adachi (2001), em termos de assentamento, os japoneses imigrantes no Brasil podem ser classificados em três grandes comunidades iniciais. O
primeiro grupo foi denominado ‘Vizinhança Japonesa’, pois após finalizar o período de contrato deles nos cafezais, individualmente alugaram ou adquiriram
campos para cultivos próprios próximos de outras áreas também pertencentes ou administradas por japoneses. Uma dessas comunidades foi a ‘Vizinhança
Minasu Sankaku’, formada a partir de 1916 com a ida de famílias japonesas para os municípios de Conquista, Igarapava, e Uberaba, somando 400 pessoas por
volta de 1919.

Um fato interessante relatado por Handa (1970) é de que as famílias de Minasu Sankaku optaram por arrendamentos de terras ou serem parceiros nos cultivos
das fazendas locais em vez de adquirir terras, pois se o fizessem seria uma demonstração pública de que o Brasil não era mais apenas um ‘lugar de trabalho’,
mas o novo lar (p. 214-224), e essa situação iria de encontro aos ideais de voltar para o Japão bem financeiramente; além disso, por cultivarem ‘arroz’ na região,
isso fazia com que eles ficassem ainda mais saudosos da terra natal, uma vez que o ‘arroz’ representa o símbolo existencial da cultura japonesa
(OHNUKI-TIERNEY, 1993; ADACHI 2001; 126). Para essa comunidade, o Brasil era visto como um lugar emprestado e temporário para eles. Essa comunidade
teve dificuldades em aceitar e lidar com a derrota japonesa na Segunda Guerra Mundial, pois a derrota conotava que o Japão não estava lá mais pronto para
esperá-los tal como eles o tinham deixado.

O segundo tipo de comunidade foi chamada de ‘Distrito de Líderes’; imigrantes japoneses que por possuírem afinidades ideológicas ou filosóficas, decidiram se
agrupar em novas localidades para começar uma nova vida. Uma dessas comunidades foi a de Hirano formada inicialmente em 1915 às margens do Rio
Dourados, na vila de Cafelândia, cerca de 370 km de São Paulo. Mas por causa de uma epidemia de malária com a morte de vários membros da comunidade,
em 1919, as famílias japonesas resolveram se afastar das margens do rio, indo rumo ao interior, e ali fundaram um novo assentamento, chamando-o de Hirano
Shokumin-Chi, o nome Comunidade Hirano, foi em homenagem ao líder que os comandou rumo às novas terras, e que também pereceu vítima da malária.

A Comunidade Hirano sempre manteve relativamente mais isolada, e os residentes nipônicos conseguiram manter uma dualidade identitária forte, com a
presença de tradições, cultura, ideologia, religião, e costumes do Japão e do Brasil, em um sincretismo beneficial. No entanto, a organização de uma
congregação budista, em 1930, e a construção de um templo, em 1934, em solo brasileiro, algo que era proibido pelo governo japonês, pois o mesmo obedecia
as cláusulas e orientações dos tratados de imigração entre os dois países, fez com o governo brasileiro se empenhasse na conversão daquela comunidade ao
catolicismo a fim de se evitar preconceitos e hostilidades contra eles por parte da população.

Já o terceiro tipo de comunidade foi a dos ‘Distritos Patrocinados’, que eram assentamentos construídos ou estabelecidos pelas agências governamentais
japonesas ou agências semiprivadas no Brasil (ADACHI 2001, p. 124).

Por volta de 1941, com o início da Segunda Guerra Mundial, as relações entre Brasil e Japão ficaram estremecidas fazendo com que a imigração fosse
interrompida, mas naquele ano já se encontravam residindo no país cerca de 180.000 japoneses (LONE 2001, p.71). Por causa da guerra, os japoneses
passaram a ser ‘vigiados’ e ‘cerceados’; e algumas das medidas tomadas pelo governo brasileiro incluíam: o fechamento das escolas especiais para os
japoneses; a proibição do uso do idioma japonês e das transmissões radiofônicas do Japão; além disso, os japoneses eram detidos sob suspeita de espionagem
ou conspiração. Essas foram talvez as ações mais opressoras contra a comunidade japonesa no Brasil, mas não por discriminação, e, sim, por razões militares
durante a guerra. Os generais da ativa temiam que surgissem núcleos de guerrilha japonesa no Brasil, pois entre os imigrantes havia grupos fundamentalistas e
ultranacionalistas dispostos a defender o Japão fora do arquipélago, um desses grupos radicais monitorado pelo governo brasileiro foi o Shindo Renmei.

A partir da década de 1945 pode-se falar de uma comunidade japonesa consolidada e o fim da guerra e a derrota do Japão fazem com que a vida dos
imigrantes volte à sua normalidade, livres do cerceamento e das incertezas do período de guerra, tanto é que em 1946 é lançado o primeiro jornal em língua
japonesa, o São Paulo Shimbun, e em 1947 Yukishigue Tamura se elege vereador de São Paulo, e a estreia dele na política serve de exemplo, abrindo espaço
para que os demais imigrantes japoneses e suas gerações almejem outros espaços profissionais, políticos e sociais, e os jovens nikkeis deixam a agricultura
para se dedicar aos estudos e ao comércio nos centros urbanos. Nas décadas seguintes, os nikkeis ocupam várias vagas nos cursos superiores em
Universidades de prestígio no país, e essa mudança de perfil dos descendentes de japoneses imigrantes levou Adachi a escrever, em 2001, o texto,
‘Construindo a identidade Nipo-Brasileira: de migrantes agrários a trabalhadores urbanos de colarinho branco’.

Em 1952, Brasil e Japão assinam o Tratado de Paz, e em 1955 chega ao país uma nova leva de imigrantes trazidos pela Cooperativa de Cotia, mas para
trabalharem nas fazendas administradas pelos próprios japoneses, e a comunidade nipo-brasileira se fortalece culturalmente, com ações e movimentos que não
deixam a cultura brasileira se sobrepor totalmente à japonesa, havendo a manutenção de uma ‘identidade nikkei’. É importante ressaltar que aqui se fala de
identidade ‘nikkei’ em vez de uma identidade ‘nipônica’! Na cidade de São Paulo, tem-se a continuidade das atividades culturais iniciadas no interior anterior à
Segunda Guerra, e são criados clubes urbanos para danças, futebol de salão e tênis de mesa; em 1960, é inaugurado em Arujá o Nippon Country Club. Nessa
época com o estabelecimento dos japoneses, o Brasil já era aceito como ‘casa definitiva’ e não mais um ‘local temporário de trabalho’, pois os imigrantes já
passavam por um processo de incorporação da cultura e estilo de vida brasileiro, principalmente por causa de seus filhos, netos, bisnetos; ou seja, os nisseis e
sanseis, yonseis, e gosseis. Pode-se falar de uma identidade mista nipo-brasileira, ou ‘identidade nikkei’ em razão do processo de aculturação ocorrido ao longo
das décadas desde a chegada do navio Nasato Maru aos portos brasileiros.

Com o ‘milagre econômico brasileiro’ na década de 1970 e o ‘crescimento industrial do Japão’, surge um grande interesse de investimentos japoneses no Brasil
em mega projetos, entre eles no setor da energia, mineração, e agricultura; para Valente (1978), a emigração japonesa para o Brasil continuou até os anos 70
(p. 22). Nesse contexto, os nisseis (o termo refere-se à segunda geração de descendentes japoneses) ganham um novo papel cultural nas mediações entre os
‘japoneses’ e ‘brasileiros’. Em 2004, o primeiro-ministro daquele período, Junichiro Koizumi realizou sua primeira vista ao Brasil e no município de Guatapará,
considerado o nascedouro da imigração japonesa, emocionou-se ao falar dos conterrâneos que deixaram o arquipélago rumo à América do Sul, Brasil e Peru.

Atualmente mais de um milhão e meio de descendentes de japoneses vivem no Brasil, e formam a maior congregação de japoneses vivendo fora do Japão. E é
um pequeno percentual desse contingente nikkei que acabou por se tornar a mão-de-obra mais adequada, na visão do governo japonês, a assumir postos de
trabalho nas indústrias do Japão. O movimento emigratório nikkei é relatado nas seções seguintes deste capítulo como parte da análise dos nichos
etnoculturais.

Mas a diáspora japonesa não se limitou ao Brasil e Peru; conforme Lie (2001), a diáspora se estendeu pela Ásia e América do Norte, com um total de 1.400.000
japoneses vivendo no exterior por volta de 1940 (TANAKA, 1991, p. 193); nos anos 90s mais de 200.000 estavam residindo nos Estados Unidos, além de existir
mais de 700.000 nipo-americanos naquele país (TANAKA, 1991, p. 185-186), e, não se pode deixar de mencionar que os japoneses dos negócios, os turistas
japoneses e imigrantes japoneses estão por toda parte (Lie, 2001). Mas White (1988), alerta que apesar de o sucesso corporativo do Japão levar milhões de
japoneses a viver no exterior, a volta às rotinas ao arquipélago torna-se extremamente difícil para os filhos deles nascidos alhures; é uma reintegração – muitas
vezes - marcada pelos desafios de uma adaptação traumática, penosa, com conflitos identidários, linguísticos, e de aceitação pelo grupo social a qual venham a
pertencer.

Os Nichos Etnoculturais e Estrangeiros no Japão

Outro assunto a ser abordado neste capítulo é a existência de ‘clusters étnicos e culturais’ no Japão; o termo ‘cluster’ é, neste caso específico, usado para se
referir a ‘grupos humanos específicos’ existentes em território japonês, entre eles os grupos de imigrantes e grupos particulares nipônicos como os Ainus, de
Hokkaido. Os ‘clusters’ formados por grupos imigrantes, as chamadas de ‘comunidades gaijins’, ou ‘enclaves’ ou ‘guetos’ de estrangeiros, entre eles os Filipinos
e os Dekasseguis, descendentes de japoneses – majoritariamente nikkeis brasileiros e peruanos. Alguns autores defendem que existem seis principais grupos
minoritários no Japão contemporâneo, sendo eles: os Ainus, os Burakumins, os Chineses, os Coreanos, os Nikkeijins, e os Okinawans (WEINER, 1997; HUI,
2008; SAMUEL, 2008; UEUNTEN, 2008; WILLIS E MURPHY-SHIGEMATSU, 2008b).

Os Ainus (■■■) representam uma minoria étnica indígena que habita a parte norte do Japão, a ilha de Hokkaido, e as Ilhas Sacalina e Curilas, e que resistiram
por séculos à colonização japonesa entre os anos de 1400 e 1789 (WEINER, 1997), e ao perderem a batalha Kunasiri-menasi, esse grupo de cultura específica
foram dominados e explorados, adotando nomes japoneses até 1868, quando se iniciou a Restauração Meiji (SJOBERG 2008). Durante décadas, os Ainus
sofreram uma pressão para sufocar sua cultura e tradições, ficando essas subordinadas à cultura japonesa, e com a intensificação da ocupação de Hokkaido, os
Ainus passaram a se sentir mais ostilizados, enfrentando discriminações diversas por causa de sua origem, levando inclusive, famílias a esconderem a origem
de seus filhos e netos, poupando-os de preconceitos (SJOBERG 2008; WEINER, 1997).

Os Burakumins (■■■) são outro grupo minoritário em território japonês que também sofreu (e sofre) com discriminação por causa de suas origens por terem
sido considerados uma ‘casta’ inferior na hierarquia social estratificada do Japão feudal e medieval dos Tokugawas, pois ocupavam postos de trabalho rotulados
como ‘impuros’, entre eles os de açougueiro, coveiro, coletor de lixo, e de executor de criminosos (SAMUEL, 2008). O preconceito tem sua origem na ideologia e
filosofia Xintoísta acerca da pureza do indivíduo que poderia perde-la ao realizar funções ‘sujas’ (WEINER, 1997), no entanto, vale ressaltar que alguns dos
artistas, atores e escritores de expressão no Japão foram ou são de origem ‘burakumin’ (SAMUEL, 2008).

O tema ‘Burakumin’ é ainda um tema tabu e evitado ser discutido nas rodas entre amigos. Evita-se falar sobre eles, e o autor – quando residia no Japão –
chegou a questionar sobre os Burakumins com alguns colegas japoneses de Nagoya, alguns universitários, e todos diziam desconhecer detalhes sobre essa
minoria da população “japonesa”, sua história de flagelo e discriminação no Japão, e não prolongavam o assunto. Outra minoria que deve ser mencionada como
‘nicho etnocultural’ no Japão são os Okinawanos que historicamente se fizeram uma nação separada até 1879, tanto que sua cultura e língua são distintas da
dos japoneses de Honshu e das outras ilhas (WEINER, 1997; UEUNTEN 2008).

Além das minorias etnoculturais específicas que já habitavam o arquipélago Japonês (Hokkaido e Okinawa), o legado demográfico, cultural e histórico das
minorias estrangeiras da Ásia que migraram para o Japão também devem ser debatidas e contextualizadas em termos de ‘aculturação’ e ‘japonicidade’. As
correntes imigratórias de Chineses, Taiwaneses, e Coreanos para as quatro principais ilhas japonesas, Honshu, Shikoku, Kyushu, e Hokkaido, tiveram como
causa direta a expansão imperialista do Japão na Ásia antes da Segunda Guerra Mundial.

De acordo com Befu (2008), no contexto do pré-guerra esses grupos de território invadido situaram-se em um interstício social sendo ‘japoneses legalmente’,
mas não ‘japoneses etnicamente’, uma situação que se perpetuou no pós-guerra e segue até os dias de hoje (FOREWORD, p.22). No Japão, ‘japonês’
legalmente falando refere-se somente às pessoas que sejam cidadãs do Japão por possuírem a nacionalidade japonesa, um status civil que não tem nada a ver
com raça geográfica ou política, ou com etnia de qualquer espécie (WETHERALL, 2008, p. 266). Além desses, ainda existem os islâmicos que vão a trabalho ou
a estudos para o Japão, e mesmo não sendo eles em quantidade tão expressiva como os nikkeis, formam um agrupamento, nicho cultural e – em muitos casos
– também religioso (AKIKO, 2008; GOODMAN, 2008). Já os americanos formam um nicho bem representativo no Japão, e estão ali por razões diversas, por
exemplo, professores da língua inglesa, homens de negócios, e os quase 50.000 militares americanos presentes em solo japonês, a maioria concentrada em
Okinawa; mas desde de abril 2012, os Estados Unidos e o Japão fecharam um acordo para a retirada gradativa desses americanos de bases militares
localizadas no arquipélago.

A Tabela 2.0 mostra o número de estrangeiros no Japão no ano de 2006 bem como o respectivo percentual de representatividade de cada grupo naquele país
conforme o Ministério da Justiça do Japão. No entanto, o Ministério ainda não divulgou os números recentes desta presença estrangeira em seu território,
também não são apresentados os detalhes sobre as demais nacionalidades que fazem parte dos 14,8% de estrangeiros, entre eles, certamente, estão os
grupos de Bangladesh, Paquistão, Vietnã, e Rússia. Naquele ano, os brasileiros representavam 15,0% dos estrangeiros, e os peruanos representavam apenas
1/5 do número de brasileiros; uma comunidade bem mais reduzida; e as Filipinas também figuram como grupo representativo, ficando em quarto lugar com um
contingente bem acima em relação aos americanos.

Os coreanos e chineses juntos representaram mais de 50% do total, sendo maioria absoluta, ficando os coreanos em primeiro em número (Tab. 2.0). Ryang e
Lie (2008) relatam os desafios, contradições e aspectos comuns sobre a experiência da diáspora coreana, e incluem em suas pesquisas as questões de
cidadania e pertencimento, além de abordarem aspectos políticos e pessoais desse grupo migrante. Já Hui (2008) aborda a situação atual dos Chineses no
Japão, mais especificamente o contexto vivido por esse grupo na região de Chinatown em Kobe. Os Chineses ali despontam como um grupo que deixa de fazer
parte de um gueto étnico para ter uma representatividade e visibilidade em virtude dos restaurantes, sendo chamado de República Gourmet Chinesa de Kobe;
mas mesmo assim é um nicho que experimenta várias ambiguidades étnicas no arquipélago japonês (HUI, 2008).

Para Lie (2001), centenas de milhares de trabalhadores entraram no Japão, legal e ilegalmente, vindos da América Latina, do Sul e Sudeste Asiático e do
Oriente Médio, contribuindo para fomentando um enriquecimento etnocultural dentro do Japão em virtude de suas culturas, valores e costumes próprios. Alguns
desses grupos acabaram por se especializar em determinadas tarefas ou funções no Japão, ficando – de certa forma – estereotipados por isso. Por exemplo, os
nikkeis Latinos conhecidos por trabalharem principalmente na indústria automobilísticas, mas não sendo exclusivos dessas; os islâmicos de Bangladesh foram
para o Japão para trabalhar na construção civil; os filipinos, em particular filipinas, têm atuado como ajudantes de enfermeiras cuidando de pessoas idosas
preenchendo a falta de uma mão-de-obra escassa em um Japão que tem uma grande parcela da população em idade senil; e as mulheres tailandesas foram
trazidas para o Japão para trabalharem na indústria do entretenimento e do sexo, como salienta Befu (2008) existem diversidades de situações envolvendo os
indivíduos de uma mesma nacionalidade no Japão, não havendo margem para uma estereotipação, sem espaço para formação de “patterns” sociais e étnicos.

portanto, uma filipina pode se casar com um japonês, ter uma cidadania japonesa, e ser uma dona-de-casa em tempo integral com crianças na escola,
enquanto que outra filipna pode ser pega em situação irregular, ilegal no país, com visto expirado, e atuando no círculo de prostituição controlado por
gangues japonesas (tradução própria) (BEFU, 2008, p. 24).

Logicamente que tais estereótipos generalizados geram um problema de percepções equivocadas em relação a determinadas nacionalidades e povos, pois nem
todas as filipinas cuidam de idosos, nem todas as tailandesas estão na indústria do sexo, nem todos os brasileiros nikkeis são dekasseguis com funções 3ks,
kitanai, kiken, e kitsui (sujo, perigoso e duro) (OCADA, 2000). Em meio a esse contingente estereotipado, há estudantes de graduação e pós-graduação,
turistas, pessoas de negócios, empresários, e estrangeiros que se casaram com japoneses e vivem no arquipélago. Seria um grave erro e um despropósito criar
estereótipos rotulando povos e indivíduos!

Tabela 2 – Estrangeiros no Japão por Nacionalidade em 2006


Nacionalidade Ano 2006 Percentual Representativo
Coreia 598.219 28,7 %
China 560.741 26,9 %
Nacionalidade Ano 2006 Percentual Representativo
Brasil 312.929 15,0 %
Filipinas 193.488 9,3 %
Peru 58.721 2,8 %
Estados Unidos 51.321 2,5 %
Outras Nacionalidades 309.450 14,8 %
TOTAL 2.084.919 100 %

Fonte: Ministério da Justiça do Japão, no website: www.moj.go.jp

Mas Lie (2001) relata que os trabalhadores estrangeiros constituem um potencial de ameaça à sociedade japonesa por causa da “racialização” e ‘visibilidade
social’ em um país considerado por alguns como homogeneamente étnico. Para Lie (2001), o termo ‘racialização’ é o processo pelo qual um grupo acaba sendo
estereotipado por seu aspecto físico ou diferença cultural (p.18-20), ocorrendo um determinismo pelas características que não representa o todo de um grupo
específico, ou seja, a partir de um etnocentrismo, o outro que é não pertence ao grupo de origem, autóctone, é identificado por suas características mais
marcantes, e rotulado como tal por suas diferenças; rotulações que podem ter conotações xenofóbicas.

Lie (2001) ressalta que na década 80, a mídia de massa japonesa passou a usar o termo ‘japanyukisan’ para designar os novos trabalhadores migrantes; um
termo de conotações preconceitos se analisar sua etimologia, pois deriva da palavra ‘karayukisan’ usada em referência às prostitutas japonesas no exterior no
final do século XIX (SUZUKI, 1993, p. 224-236); portanto, o termo ‘japanyukisan’ pode implicitamente significar ‘mulheres trabalhadoras sexuais’. Até 1988, a
maior parte dos deportados do Japão, algo como 80% - 90% deles, eram mulheres que trabalhavam anfitriãs de bares e prostitutas, entre elas filipinas,
tailandesas etc. (HINAGO 1986, p. 143-144, apud in LIE, 2001, p.20). A palavra ‘gaijin’ também é considerada por muitos como um termo carregado de
implícitos xenofóbicos, uma forma de ‘racialização’, pois faz uma distinção entre os que pertencem à sociedade japonesa e os que a ela não pertencem, levando
a possíveis conotações de exclusão, tais como ‘intruso’; ‘gaijin’ é a forma reduzida de ‘gaikokujin’ que literalmente significa o ‘sujeito que é (vem) de fora’, o
forasteiro, o estranho, uma ádvena.

Transculturalismo no Japão: A diáspora do retorno: os Nikkeis se fazem nichos Dekasseguis no Japão

Com as demandas por mão-de-obra nas indústrias japonesas a partir dos anos 80 durante a “bolha econômica”, e assim iniciou-se o movimento ‘dekassegui’,
que tem sua escrita aportuguesada ‘decasségui’, também chamado na literatura de a ‘diáspora do retorno’. É importante salientar que essa ‘diáspora do retorno’
(TSUDA, 2003) não foi um retorno de grupos rurais de nikkeis brasileiros famintos e miseráveis, mas de descendentes de japoneses em sua maioria
razoavelmente estabelecidos em áreas urbanas do Brasil, e que buscavam dar um salto na qualidade de vida, fugindo da insustentável crise econômica do
Brasil da década de 1980 e 1990 (ROTH, 2002; TSUDA, 2003); uma crise econômica sem precedentes, com uma dívida externa “impagável”, hiperinflação,
recessão, especulações de toda sorte, descontrole econômico e financeiro, resultando em achatamento salarial, queda no poder de compra, e falências
individuais e corporativas; lucravam no país aqueles que possuíam um capital excedente para especular em artifícios financeiros em que dinheiro vira ‘muito
dinheiro’ em curto prazo; uma crise que marcou a agitada transição de uma ditadura militar de 21 anos para um regime de governo civil eleito por voto, portanto,
mais democrático.

A onda emigratória trabalhadora ‘nikkei’ se intensificou com as sucessivas crises econômicas brasileiras, resultado dos fracassos acumulados de planos
econômicos como o Plano Cruzado I, II, Plano Bresser, Plano Verão etc. Nessa conjuntura prevaleciam a hiperinflação, o achatamento salarial, e a queda de
poder de compra Esses fatores que contribuíram na década de 80 para que os nikkeis deixassem o país. ‘Crise econômica’ foi o elemento comum presente nas
duas diásporas, tanto na diáspora dos antepassados do Japão para o Brasil, quanto na diáspora nikkei para o Japão. Ambos foram chamados de dekasseguis,
pois deixaram sua terra de origem para irem trabalhar, daí a origem do nome dekassegui (■■■), que é formado por duas palavras, ‘deru’ (sair) e ‘kasato’ (para
trabalhar) (ROTH 2002; TSUDA, 2003; OCADA, 2000). Os dekasseguis, em sua maioria, acabaram indo trabalhar em fábricas no Japão assumindo postos de
trabalho conhecidos como ‘3ks’ nas fábricas (OCADA, 2000); postos que eram desprezados ou desdenhados pela força produtiva juvenil japonesa, fazendo dos
nipo-brasileiros imigrantes a comunidade minoritária mais recente do arquipélago (TSUDA, 2003).

Na década de 1990, os dekasseguis chegaram a representar um número significativo, e segundo o último levantamento do governo japonês, em 2006, os
brasileiros (nikkei e não nikkei) totalizavam 312.929 pessoas, representando 15% do total de estrangeiros presentes naquele país. As aglomerações de
dekasseguis concentram-se em certas cidades japonesas tais como as da província de Aichi-ken: Toyohashi, Toyota, Komaki, Nishio, Chiry■; de Gifu-ken: Kani,
■gaki, Minokamo; de Gunma-ken: ■ta, Oizumi e Isezaki; de Mie-ken: Suzuka, Yokkaichi, Tsu, Iga, Kameyama; de Nagano-ken: Iida e Ueda; de Shiga-ken:
Nagahama, Konan, K■ka; de Shizuoka-ken: Hamamatsu, Iwata, Kakegawa, Kikugawa, Fukuroi, Fuji e Kosai, além de Tokyo, sendo que a maior concentração
de brasileiros dekasseguis encontra-se em Hamamatsu, com cerca de 20 mil pessoas. Com essas aglomerações, vieram os choques culturais, as crises de
identidade, e os problemas sociais com famílias fragmentadas ou desfeitas, filhos sem frequentar a escola ou com problemas na adaptação à escola japonesa
por causa de discriminação e barreiras do idioma. Há ainda registros de delitos e crimes atribuídos a nikkeis brasileiros e peruanos, fatos esses que são
relatados em reportagens na mídia local e também nos jornais direcionados aos nikkeis, entre eles o Jornal NippoBrasil, e Jornal International Press e o IPCTV
do grupo IPC Digital, entre outros.

Existem dekasseguis que vivem há mais de 20 anos em solo japonês, com filhos nascidos ali, já estabelecidos, enraizados, e com uma identidade mista, talvez
seja mais apropriado dizer ‘híbrida’, digamos, uma identidade nipo-brasileira. Tsuda (2003) afirma que os descendentes japoneses, os dekasseguis, nasceram
no Brasil, portanto, são culturalmente brasileiros, e reforça que os nipo-brasileiros residentes no Japão, por serem objeto de marginalização socioeconômica no
arquipélago, acabam tendo fortalecidos seus sentimentos nacionalistas como brasileiros, tornando-se uma comunidade migrante transnacional bem integrada. A
quase totalidade dos ‘dekasseguis’ permanece destituída da nacionalidade japonesa, ficando no Japão em situação incerta e temporária, ou seja, estrangeiros,
mas em situação legal por meio de concessões de autorizações para continuar no país (ROTH, 2002), o que leva a todos à maratona dos vistos, suas
renovações e registros nas prefeituras onde residem, entre outras formalidades e burocracias por não serem ‘residentes permanentes’ ou ‘cidadãos’. No entanto,
desde de 2001 o governo japonês tem concedido ‘vistos permanentes’ a certos grupos estrangeiros, os Dekasseguis inclusive, outorgando a eles um status de
imigrantes. Mas no caso da situação dos dekasseguis, uma reflexão mais ontológica - e de contexto histórico - se faz necessária, pois os japoneses que um dia
deixaram o país em busca de uma perspectiva de vida melhor têm seus filhos, netos e bisnetos não acolhidos como japoneses.

Em virtude de entraves nacionalistas e institucionais, o Japão adota um sistema misto de ‘jus sanguinis’ (direito à cidadania adquirida por causa dos laços
sanguíneos e pela ancestralidade genética) e o ‘jus solis’ (direito à cidadania em função do lugar de nascimento) para reconhecer um indivíduo como sendo ou
não um cidadão japonês. Pelo sistema ‘jus sanguinis’, os dekasseguis deveriam ter a cidadania japonesa e ter os mesmos direitos de um japonês nascido em
solo nipônico, tal como acontece com os descendentes de italianos imigrantes que nasceram e cresceram no Brasil, e estão, portanto, elegíveis a se
candidatarem à cidadania italiana. A saga e a odisseia japonesa pelo mundo são relatadas em seus pormenores na obra editada por Nabuko Adachi, intitulada
‘Japanese Diasporas: Unsung Pasts, Conflicting Presents, and Uncertain Futures’ (‘Diásporas Japonesas: Passados não Contados, Atualidades Conflitantes e
Futuros Incertos’), obra ainda não traduzida para o português.

Assim, há duas perguntas inquietantes a se fazer sobre esse tipo de situação: primeiro, tomando-se como base as leis vigentes e as barreiras do governo
japonês em relação à permanência dos dekasseguis no Japão, não tendo um status definitivo, não sendo cidadãos por direito, então, são os seus antecessores
(ancestrais) que imigraram para o Brasil no século XX considerados desertores, párias nacionais? Segundo, afinal são os dekasseguis japoneses étnicos ou
não? Se houver um consenso de que são eticamente japoneses, então por que não podem ser considerados cidadãos japoneses com os mesmos direitos e
deveres daqueles que nasceram e cresceram naquele país?

Talvez uma posição mais flexível do governo do Japão e daquela sociedade em relação aos dekasseguis poderia por fim a um dilema de identidade, de
reconhecimento e de aceitação que os perturba há décadas, pois o reencontro com as raízes e com a cultura original tem sido repleto de desapontamentos,
frustrações e injustiças, tal como registrado por Angelo Akimitsu Ishi, no texto ‘Between privilege and prejudice: Japanese-Brazilian Migrants in “the land of yen
and the ancestors” (‘Entre privilégios e preconceitos: os migrantes brasileiro-japoneses na Terra do Ien e de seus ancestrais’, tradução própria’) que é capítulo
do livro ‘Transcultural Japan: At the Borderlands of Race, Gender, and Identity’. No caso dos dekaseguis nem se poderia dizer que a sociedade japonesa e o
governo têm sido etnocêntricos, nacionalistas, pois esse grupo nikkei - na compreensão do autor - não se distingue biologicamente e, culturalmente, os nikkeis -
por serem descendentes - mantiveram vários dos aspectos culturais nipônicos, ou no mínimo eles têm um conhecimento ou vivência mais significativa sobre a
cultura dos japoneses do arquipélago se comparados a outros grupos estrangeiros ou étnicos.

O autor com base em suas observações e experiências pessoais e nos contatos com os nipo-brasileiros em Aichi-ken, Nagoya-shi, principalmente na região do
Consulado do Brasil, onde funciona o supermercado brasileiro, The Amigos, afirma que os dekasseguis são na verdade a evidência mais palpável de uma
cultura nipônica forte, pois mesmo longe do Japão por décadas foram capazes de manter vários aspectos daquela cultura e do idioma, mostrando-se uma
vanguarda cultural ultramar. Nesse caso, houve certamente um processo de aculturação dos ancestrais japoneses e de seus descendentes, mas de modo que
vários traços da cultura nipônica resistiram a uma provável sobreposição da cultura brasileira, ocorrendo um fenômeno espetacular de duas culturas, digamos,
justapostas, e que com o tempo tiveram algum nível de imbricação, sem que uma cultura anulasse a outra completamente. Logicamente que há ‘nikkeis’ que
conhecem muito pouco da história, cultura, sociedade e da língua japonesa. Por exemplo, o autor não é descendente de japonês, mas tem na família um caso
de casamento inter-racial, e desse relacionamento vieram dois primos nikkeis, e apesar de terem traços nipônicos, não possuem domínio da língua japonesa,
nunca estiveram no Japão, e o referencial identitário deles é notadamente brasileiro. Nesse caso particular, o autor tem muito mais bagagem cultural e
linguística japonesa do que os próprios primos nikkeis.

No entanto, em termos de formação de identidade, os nikkeis que vão para o Japão sofrem com a dualidade paradoxal de serem chamados e percebidos como
‘japoneses’ no Brasil, mas quando chegam em terras japonesas, não são aceitos prontamente como parte daquela cultura e sociedade, fazendo surgir nos
nikkeis um sentimento nacionalista excessivo (TSUDA, 2003), com a valorização dos elementos simbólicos da cultura brasileira incluindo a música, dança,
esporte, gastronomia, (o samba, o carnaval, feijoada, o futebol) que antes, para muitos dos nikkeis, tais elementos não tinham tanta representatividade ou
importância. Isso foi observado pelo autor durante sua estada na região de Aichi-ken, em Nagoya, especialmente nos contatos e interações dialógicas com os
nikkeis no supermercado The Amigos. Reafirmar a cultura brasileiro em território japonês parece ser uma forma instintiva de dar uma resposta à não aceitação,
ou rejeição, de uma sociedade cujos antepassados faziam parte. Algo semelhante pode-se afirmar dos dekasseguis peruanos, que juntos formam o grupo nikkei
latino. De acordo com os estudos etnográficos de Tsuda (2003), esse nacionalismo dos migrantes nipo-brasileiros em solo japonês acaba criando um invólucro,
uma vanguarda, uma resistência às pressões culturais japonesas.

Ao permitir a entrada de 300.000 dekasseguis no Arquipélago, o Japão favoreceu de certa forma uma retorno de descendentes nipônicos às suas origens
(TSUDA, 2003), mas por ser um grupo humano especial, de cultura mista e, ou, com similaridade dos traços físicos em relação aos nativos, esse grupo tem
buscado um espaço, uma presença, e feito a seu modo uma adaptação cultural e de sobrevivência ao passo que incorpora elementos culturais perdidos no
passado distante, impõe também a flexibilidade e aspectos da cultura brasileira, fato que – muitas vezes – gera conflitos devido ao choque cultural nesse
processo simbiótico de existir e viver dos dekasseguis no Japão.

O que muitos estudiosos não percebem é que existe já faz algum tempo uma ocorrência única, extraordinária, da aculturação dos grupos nikkeis e, de certo
modo, dos japoneses como sociedade receptora desses grupos; essa aculturação tende a ser na verdade um resgate linguístico-cultural. Há, portanto, uma
necessidade urgente de mudança de postura e de percepção do governo e da sociedade japonesa de modo que passem a considerar os dekasseguis como um
grupo muito especial com o status de cidadão japonês, nihonjins, ao invés de percebê-los apenas como uma mão de obra importada e conveniente para o
trabalho pesado e exaustivo nas indústrias em épocas de prosperidade e demandas econômicas (TSUDA, 2003). Outro fato a ser investigado é se há ou não
bairrismos nos redutos nikkeis como forma de se afirmarem culturalmente no Japão. Igualmente importante seria o levantamento sobre movimentos ou ações
etnoculturais das comunidades estrangeiras não nikkeis.

Negar aos dekasseguis certos direitos seria incorrer no despropósito de negar um período da história de luta e de crises do Japão; um país pequeno, mas
reconhecidamente de grandes feitos. Uma sociedade marcada pela determinação, organização e disciplina. Um país que acumula acertos e erros em sua
trajetória histórica como sociedade, mas que busca no contexto do pós-guerra a convivência pacífica em que as intervenções beligerantes foram substituídas
por outras formas de conquistas: a tecnologia, o fortalecimento econômico, a busca pela qualidade e excelência em suas produções, as tradições, a
gastronomia, a cultura, a polidez nas inter-relações, e a hospitalidade. Os dekasseguis são o exemplo histórico mais notório e remanescente dessa saga de
afirmação e de conquista do Japão.

Os descendentes de japoneses no Brasil somam mais de um milhão de pessoas, e o Bairro da Liberdade, em São Paulo, torna-se o reduto cultural mais
expressivo deles no Brasil, além de outros ‘enclaves’ espalhados pelo território nacional. Em Goiás, os festivais japoneses no Clube Kaikan atraem centenas de
descendentes e não descendentes que buscam uma experiência cultural, linguística, artística, e gastronômica nipônica mais genuínas. O Bon-Odori e o
Bunkasai são inquestionavelmente eventos consolidados no Estado. O Centro de Pesquisa da Cultura Japonesa em Goiás, CPCJ-GO, juntamente com a Escola
Modelo de Japonês, ambos localizados no Kaikan, têm tido um papel crucial na revivência, resgate e manutenção da cultura e língua japonesa.

O grande desafio para os dois governos, do Brasil e do Japão, tem sido resolver a situação incerta de famílias que em solo japonês se estabeleceram, ficaram
raízes com filhos que nem falam o português fluentemente ou se identificam mais como sendo japoneses do que brasileiros, mas não tem a cidadania nipônica.
Aquele país é ainda algo “emprestado” a eles mesmo após 22 anos da chegada ao arquipélago. Mas a comunidade dekassegui presencia uma redução
significativa em número de indivíduos devido às crises econômicas e recessões no Japão nas duas últimas décadas, e agravadas com as crises nos Estados
Unidos e na Europa, e, também, pela melhoria da situação econômica do Brasil, o que serviu de atrativo para que muitos desistissem de continuar uma vida
incerta no Arquipélago Asiático, fazendo o retorno definitivo ao país tupiniquim.

Considerações Finais

O tema proposto neste capítulo faz uma releitura crítica das várias abordagens históricas, culturais e sociais e pode mostrar caminhos para a elaboração do
conceito de ‘japonicidade’; uma missão nada fácil, mas certamente gratificante e de notável contribuição para a literatura. È um debate que ultrapassa as
dicotomias das discussões disciplinares isoladas, envolve os ‘nipologistas’, mas também requer uma investida interdisciplinar, multidisciplinar, transdisciplinar,
para uma compreensão holística da sociedade contemporânea japonesa; uma compreensão que não pode alijar os grupos minoritários presentes no
arquipélago japonês.

Dessa forma, uma resposta precisa, de base mais empírica, poderia ser dada face às indagações feitas no início do capítulo, mas que foram consistentemente
analisadas e, em alguns trechos e com base na literatura pertinente, de várias formas, foram respondidas. As perguntas foram: Pode-se afirmar que o Japão é
um país de cultura e sociedade monolítica? São a monocultura e a monoetnia elementos inquestionáveis de uma ‘japonicidade’? Quais são as verdades e quais
são as afirmações falaciosas sem respaldo acadêmico-científico acerca da intangibilidade do Japão? É possível validar a tese de um Japão transcultural e
multiétnico?

Tendo vista a complexidade desse debate, o autor optou por orientar a discussão, bem como apontar a literatura, abordagens, conceitos e teorias existentes que
podem contribuir para a profundidade do tema. Mas sem se mostrar neutro, o autor advoga que o Japão é um mosaico de experiências históricas, culturais,
linguísticas e culturais, experimentando avanços e retrocessos em sua ocidentalização; no entanto, sempre houve movimentos de resistência de caráter
endógeno que lutaram pela prevalência e manutenção da essência da sociedade japonesa, e as evidências dessa resistência pode ser observada em todo o
arquipélago, na gastronomia, na arquitetura, no vestuário, no idioma e nos recursos linguísticos, nas formas de organização, nas crenças e nos valores, e, na
postura – obviamente – nacionalista. Aliás, essa talvez seja o elemento mais contraditório daquela sociedade, pois ao mesmo tempo em que unge, almeja e
valoriza aquilo que seja estrangeiro, incluindo as pessoas, em atitude inversa, acaba por repudiar aquilo que seja de fora, e se inicia um processo de
sobrevalorização das coisas autóctones e nativas.

Para Lie (2001), a “inevitável dialética da internacionalização e heterogeneidade étnica tem sido repetidamente negada” (p.25), e toda tentativa de
‘internacionalizar o Japão’ parte da prerrogativa que aquela nação tenha ficado fechada ao mundo, negligenciando-se com uma realidade multiétnica do
passado e do presente do país (YAMAWAKI, 1994), e a cada convocatória para uma nova internacionalização (ampliação da abertura do país aos “de fora”) tem
sido motivo de alvoroço no Japão, pois prevalece a noção de riscos para uma homogeneidade étnica japonesa em flagrante rejeição a um passado multiétnico
(LIE, 2001), e a problemática de novas levas de trabalhadores estrangeiros no país, uma segunda abertura do Japão, leva a um fortalecimento da crença de um
Japão monoétnico na sociedade contemporânea, ofuscando-se a existência das minorias étnicas e o legado colonial (LIE, 2001).

Uma das contribuições originais desse capítulo é a análise do legado histórico do Japão para o próprio Japão, e a saga das diásporas japonesas, e os
desdobramentos históricos do exílio voluntário nipônico, e isso inclui as contribuições e o legado deixado pelos japoneses que no passado, corajosamente,
deixaram sua terra natal rumo a terras distantes, desconhecidas, em um período de crise, de guerras, de incertezas. Com a mesma visão crítica, o autor retoma
as discussões sobre a situação dos dekasseguis brasileiros no Japão, e ressalta os problemas identitários, de socialização, e de crises desse grupo. Outras
minorias como a dos chineses, coreanos, bem como a dos inus e dos burakumins, bem como os aspectos transculturais não são esquecidas nesse debate.

O autor defende que a elaboração do conceito de ‘japonicidade’ e a análise sobre uma ‘aculturação nipônica’ não podem ser fruto de um determinismo
acadêmico simplista. Japonicidade diz respeito a todos os fatos, eventos, produção intelectual, nuanças sociais e experiências vividas por uma nação, e inclui a
existência de um ‘consciente coletivo’ que engloba valores, crenças, identidade, os elementos autóctones, regras e normas sociais, códigos implícitos e
explícitos de conduta, as narrativas e as construções discursivas de um povo, sua literatura, os recursos linguísticos, o papel da imprensa e mídia na formação
da opinião pública, os arranjos organizacionais, as instituições, o nível tecnológico, os festivais, a cultura, os costumes, o ethos, nacionalismo, e as orientações e
decisões nas relações exteriores. No entanto, a discussão sobre ‘japonicidade’ não ficaria completa se não fossem rompidos paradigmas enraizados em
axiomas que podem interferir na descrição mais fidedigna de uma realidade nipônica.

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1 XX Encontro Nacional de Professores Universitários de Língua, Literatura e Cultura Japonesa e VII Congresso Internacional de Estudos Japoneses no Brasil.

2 BURKE,2003:14

3 SAITO, 1998; KUDO, 2001; ITO, 2003.

4 BARRAL, 2000; KINSELLA, 1995; KERR, 2001; BRINTON, 2011.

5 KATZ, 2004; GREINER, 2005.

6 O projeto “O universo Otaku e Hikikomori: novas formas de comunicação no Japão contemporâneo” conta com o apoio financeiro da FAPESP, contemplado
com a Bolsa no País/Regular/Pós-Doutorado e está vinculado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP.

7 Para Azuma Hiroki (2001), a cultura otaku espelha as transformações da sociedade japonesa do pós-guerra, o que motivou o consumo, sacrificando a busca
por um maior significado na vida, comparado à gratificação instantânea e quase animalesca.

8 História em quadrinhos; palavra surgida pela junção do ideograma “man” (humor) e “gá” (desenho).

9 Animação (forma contraída da palavra animation em inglês).

10 Tsutomu Miyazaki, um otaku de 27 anos.

11 Termo comum no Japão para designar as provocações e maus tratos que ocorrem nas escolas.

12 SINGER,1997:62.

13 BARRAL, 2000; BREHM, 2002.

14 SATO, 2007:21.

15 Para o psicólogo Saito Tamaki, grande parte da população adolescente masculina estaria vivendo em situação de total reclusão, porém, devido ao
comportamento isolacionista e a camuflagem existente nos nichos familiares, o número oficial de hikikomoris não pode ser medido com exatidão.
16 Revista Veja, Editora Abril, ed.2034. 14/11/2007. Ano 40, no. 45. P.131-134.

17 Revista Veja, Editora Abril, ed.2034. 14/11/2007. Ano 40, no. 45. P.131-134.

18 BAUMAN, Zygmunt. A sociedade individualizada: vidas contadas e histórias vividas; traduzido por José Gradel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2008.
p.8

19 SODRÉ 2002; Hauser 1997; Martin-Barbero 2003.

20 Damásio 1999 e outros.

21 KATZ, 2004

22 Tema da minha tese de Doutorado: Ação e Percepção nos processos comunicacionais do corpo em formação, defendida em 2007 pelo Programa de Estudos
Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP e publicada pela Editora Hedra de São Paulo, em 2010.

23 SODRÉ, 2006:235.

24 Op.cit.

25 BAUMAN, 2004:12

26 GIDDENS & HUTTON, 2004:7.

27 CASTELLS, 2010: XII

28 BAUMAN,2004:13

29 GREINER, 2008

30 Grupo de meninas cuja característica é reforçada pela representação de sedução das colegiais japonesas.

31 Grupo de meninas estudantes que descolorem os cabelos, fazem uso de bronzeamento artificial, pintam ao redor dos olhos de branco e “propõem um visual
que é o negativo de si mesmas” (GREINER, 2008:149).

32 UENO, Chizuko, 2005:247

33 Entrevista ao The Japan Times on-line: http://www.japantimes.co.jp/text/fl20060305x1.html entrevistada por Eric Prideaux, em 05 de Março de 2006.

34 Apud. UENO, 2005.

35 A discriminação contra as mulheres vem de longa data, basta lembrar que a criação de um alfabeto simplificado (hiragana), uma das formas de escrita
japonesa ocorreu em função das mulheres que eram consideradas inaptas intelectualmente para o aprendizado dos ideogramas, tidos como muito complexos.

36 Ueno, Shizuko, 2005:249.

37 Reportagem: Tradição é obstáculo para carreira das trabalhadoras japonesas. Martin Fackler, em Tokyo - The New York Times - 07/08/2007 ( traduzido por
UOL Notícias).

38 Sharon Kinsella é professora de cultura visual japonesa na University of Manchester.

39 Editora do livro The Japanese Experience Inevitable, In the Floating World: Slash with a Knife, 1999.

40 SATO, Cristiane: www.culturajaponesa.com.br

41 Op.cit.

42 BREHM, Margrit, 2002:08

43 BREHM, 2002:12

44 Revista E-Compós: http://www.compos.com.br/e-compos

45 STERLING,1990, Apud: AMARAL, Adriana. 2006.

46 Como Ghost in the Shell 1 e 2, Geno Cyber, Cyberweapon, Cyber City Oedo, Akira, Aeon Flux, Robotech, Tetsuo e outros

47 Livro de William Gibson, considerado o romance que deu origem ao gênero cyberpunk.

48 Revista Wired é uma revista mensal publicada nos Estados Unidos, trabalhando temas ligados à tecnologia e sua influencia à sociedade, cultura, economia e
política.

49 Nicole Mowbray (04/04/2004) “Japanese girls choose whiter shade of pale | World news | The Observer”. London: The Guardian.
http://www.guardian.co.uk/world/2004/apr/04/japan.nicolemowbray.
50 Existem algumas diferenças entre Yamanbas e Manba. As Yamanba fazem uso da maquiagem branca apenas acima dos olhos e as Manbas maquiam
abaixo dos olhos.

51 Light Novel são romances elaborados em estilo manga-anime, direcionados para o público jovem. No início as publicações podem ocorrer em formato de
folhetim para depois seguir para os jornais, revistas, livros e, atualmente estão na Internet e até mesmo nos celulares.

52 Ver em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Sayonara,_Zetsubou_sensei - acessado em 20/02/2012.

53 http://www.paulgravett.com/index.php/articles/article/manga_at_the_royal_academy/.

54 SAITO, 2009:221 - Anais do XX Encontro Nacional de Professores Universitários de Língua, Literatura e Cultura Japonesa e VII Congresso Internacional de
Estudos Japoneses no Brasil – Para além do Japão: Brasil, Canadá e França.

55 Konbine são as lojas de conveniência, facilmente encontradas em toda a parte das grandes cidades japonesas.

56 Entende-se que os Estudos Culturais se configuram enquanto um campo onde há a ocorrência de intersecção de diversas disciplinas para a realização de
estudos sobre determinados aspectos culturais da sociedade contemporânea. Para compreender tal campo, ver Escoteguy (2012).

57 As sociedades modernas ocidentais (especialmente na fase de consolidação do capitalismo liberal), regida pela razão instrumental, caminharam para um
processo de crescente racionalização de suas ações e de suas estruturas social, política e econômica conforme Weber (2002a; 2002b; 2004). Apesar de a
modernidade, especialmente no século XIX, ser conhecida como um período de desencantamento do mundo que distanciava o sujeito do sagrado, isto não
significou a eliminação da religião. Ao contrário, a religião se fortalece enquanto via de salvação, mas perde a centralidade na vida social. Para ver sobre o
desenvolvimento do conceito de desencantamento do mundo na teoria weberiana, ver Pierucci (2003). Sobre a influência da religião no mundo moderno e nas
concepções sobre o corpo, ver Corbin (2009).

58 “O conceito de natureza, ou physis, era compreendido pelos antigos gregos, especialmente na formulação aristotélica, como aquilo que tem o princípio de
movimento em si mesmo, um principio imanente e que atua para um fim (telos), que não é outro senão a própria natureza” (SILVA, 2005, p. 28).

59 Os estudos anatômicos se basearam na experimentação com o corpo morto, tendo como principal método a dissecação. Kuriyama considera que este
método não foi o interesse principal dos médicos chineses, o que levaria a seu baixo grau de desenvolvimento.

60 No caso, a meditação assumia a principal forma. Em algumas escolas como a S■t■, a principal via era a chamada meditação sentada (zazen). Por esta
postura, a pessoa acaba por encarar a sua própria natureza de Buda e entrar no domínio da liberdade (YUSA, 2002).

61 HOLLIS, 2001, p. 225.

62 No presente artigo, respeitei o uso já convencionado do artigo definido masculino para termos de origem japonesa, a saber, “o mangá”, “o animê”, “o kimono”,
“o biombo”. Além disso, o termo kamon, quando precedido do artigo “o”, corresponde ao sentido de “emblema familiar”.

63 Outros termos que se referem à essas insígnias são: mondokoro ■■ (“insígnia do lugar”), monshô ■■ (“composição em formato de insígnia”) ou
simplesmente mon ■ (“emblema”; “insígnia”). Monshô também é utilizado como termo correspondente para “brasão de armas” em japonês, porém geralmente
está relacionado à simbologia de corporações, governos e outras entidades coletivas.

64 Em alguns casos, optarei pela livre-tradução para privilegiar o sentido dos títulos atribuídos às insígnias (kamon) e aos padrões visuais (mon’yô). Contudo,
essas traduções receberão notas de rodapé com informações complementares.

65 Ave da subfamília das Charadriidae.

66 As glicínias chinesas (wisteria sinensis), também conhecidas como “lilases”, pertencem ao gênero wisteria, e é uma planta trepadeira com flores em tons lilás
e azul, com formato de cachos pendentes.

67 Unpan ■■ (“chapa em formato de nuvem”), também conhecida como chôban ■■ (“chapa para bater”) ou shôban ■■ (“chapa de ressoar”), é uma espécie de
chapa circular de metal, suspensa verticalmente, utilizada como gongo em templos zen budistas para anunciar quem acabara de chegar.

68 Sen, moeda que corresponde a um centésimo de iene. Esse formato de moeda começou a ser cunhado no Período Edo, com um padrão em forma de ondas
(seigaiha) em seu reverso.

69 Yamauchi-ke ■■■ (“a família Yamauchi”), que líderava o clã Tosa, possuía grande prestígio na região de Shikoku, onde Iwasaki Yatarô havia nascido.

70 LARAIA, 2002, pp. 59-60.

71 Fictive kinship é um termo usado por antropólogos e etnógrafos para distinguir as formas de parentesco que não se baseiam em laços consanguíneos ou
conjugais.

72 FRUTIGER, 1999. p. 288.

73 WICHMANN, 1981, p. 294.

74 HOUAISS, 2009, p. 2102

75 Op. cit. p. 1323

76 In O FLORESCER das cores: a arte do Período Edo. Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2008. p. 19
77 Padrões de tecelagem utilizados por membros da nobreza, desde o período Heian (794–1185), compostos, predominantemente, de motivos repetidos e
geométricos.

78 Método de tingimento utilizado, originalmente, na pintura e nas artes decorativas para dar a sensação de tridimensionalidade ao objeto. O resultado da
composição são faixas contendo padrões de cores vibrantes.

79 In: A Dictionary of Japanese art terms. [s.l]: Tôkyô Bijutsu, 1990.

80 No Japão, as famílias são constituídas pelo Ie ■ (“casa”; “clã”). Esses clãs são grupos que envolvem não apenas os membros vivos, mas também os
ancestrais e, igualmente, os descendentes que ainda não nasceram. Ie foi o termo utilizado pela legislação japonesa para a constituição das unidades familiares
até o final da Segunda Guerra Mundial.

81 FRUTIGER, 1999, p. 209

82 Tipo de sobretudo que se veste sobre outras peças de quimono.

83 NOMA, 1983, p. 167

84 GOMBRICH, 1995, pp. 99-111

85 PANOFSKY, 1991, pp. 52-58

86 Op. cit. p.136

87 Algumas das fontes pesquisadas registram também a grafia hinagata-bon ■■■■■ ou apenas hinagata ■■ (“modelo em miniatura”).

88 Veste de mangas curtas, confeccionada de seda, com cortes planos e longos, formando uma superfície totalmente plana, principalmente, na região das
costas. Kosode compreende o espaço ideal para a representação dos mais variados padrões. É considerado o precursor do quimono moderno. In O
FLORESCER das cores: a arte do Período Edo. Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2008. p. 21

89 “Foldout 1: Kimono Design Books” In NOMA, 1983.

90 É indicado no livro Kosode to Nô-ishô ■■■■■■ (“kosode e vestuário de nô”), de Noma Seiroku ■■■■ (1902–1966), cujo título em inglês é Japanese
costume and textile arts ■ incluso na bibliografia. Dentre as instituições pesquisadas até então, três possuem exemplares de Ehon Asakayama: o Museu
Britânico, o Spencer Museum of Art, da Universidade de Kansas e o Museu de Belas Artes de Boston.

91 Outra tradução para o termo é “forma de boneca”, pois indicavam as bonecas feitas de papel que serviam de modelo para difundir os projetos de kosode.

92 LAPLANTINE; TRINDADE, 2003, p. 21

93 BALANDIER, 1999.

94 SOUZA, 2008, p. 5

95 Op. cit. p. 8

96 Os empréstimos antigos do Mandarim não são considerados empréstimo, mas os recentes como R■men (sopa de talharim chinês) o são, e também é
utilizada a escrita específica do empréstimo.

97 Carta de Cosme de Torres, um padre jesuíta português, para seus superiores em Roma, relatando sobre o país ainda agora descoberto, o Japão. Os
portugueses chegaram ao Japão por volta de 1543 e foram os primeiros povos europeus a conhecer os japoneses.

98 Aqui trata-se da concepção de Língua/Fala (Langue/Parole) de Ferdinand de Saussure.

99 O Japonês hoje é falado por mais de 126.5 milhões de pessoas no Japão. As principais áreas onde é falado fora do Japão, seguindo os períodos anteriores
da diáspora do japonês, são a costa oeste da América do Norte, do Havaí e da América do Sul. Apesar de muitas pessoas descendentes de japoneses morarem
nessas áreas não falam mais sua língua de herança.

100 O Altaico é um grupo genético proposto que inclui minimamente o Turco, o Tungusico e as famílias mongólicas, talvez também o Coreano e o Japonês. (...)
Os outros dois potenciais membros da família altaica são o Coreano e o Japonês. Coreano (SOHN 1999) é uma língua única. O Japonês (SHIBATANI 1990) é
estritamente falando uma pequena família, incluindo não apenas o Japonês, mas também as Línguas Ry■ky■, que não são mutuamente inteligíveis com o
Japonês ou entre elas; a família é às vezes chamada Japonês – Ry■ky■.

101 Esta tabela tem como base o “Esquema de sons” do Livro Nihongo Hatsuon (), p. 5.

102 O traço em cima da vogal A indica o alongamento da vogal. Quando escrito no Kana Hiragana a vogal é escrita duas vezes, exceção feita à vogal O, que,
quando dobrada, recebe a vogal U. No Kana Katakana o alongamento é indicado por um “travessão” após a vogal que tem que ser dobrada.

103 O Japonês é uma língua de final verbal. A ordem de palavras na sentença é relativamente livre, desde que as sentenças terminam com o verbo principal.

104 Kuno (1978) nomeia as “Partículas de Caso” como “Postpositional Particles” (Partículas Posposicionais).

105 Classificados assim no ensino de Língua Japonesa para estrangeiros, quando estudada no Japão não há esta divisão.
106 Estes 3 (três) verbos estão na forma de dicionário (Jisho kei ).

107 As nomenclaturas Forma Polida e Forma Comum são traduções literais das nomenclaturas japonesas Teineikei e Futs■kei, respectivamente.

108 O verbo benky■ shinakereba narimasen não tem esta separação no momento da escrita e da fala. Aqui está separado para um melhor entendimento do
leitor.

109 Dos mais de 3000 Kanji que um japonês adulto pode empregar em sua vida diária, 1945 são de estudo obrigatórios ao longo do sistema educativo. Esta
lista é conhecida como Kanji de uso comum (■■■■■ J■y■ Kanji). A esta lista soma-se outra, que compreende os Kanji que podem ser utilizados para nomes e
sobrenomes (■■■■■ Jinmeiyou Kanji). Existem ainda Kanji que não pertencendo à lista oficial, são menos usados na vida diária.

110 Os exemplos desta tabela apresentam somente uma leitura do Kanji. Vale lembrar que a maioria dos exemplos tem mais de uma leitura além das aqui
citadas.

111 A transliteração do japonês em alfabeto latino ado(p)tada por Hepburn (1815 - 1911). (Definição retirada de Coelho & Hida (1999), o Dicionário Universal
Japonês – Português).

112 A Língua Shanenawa é uma Língua Indígena, falada por cerca de 400 pessoas em três aldeias na região da Amazônia.

113 A Língua Katukina é uma língua falada no Estado do Acre por mais ou menos 300 pessoas.

114 Sempre que citar sílaba, vogal ou letra, também estarei me referindo como som. Na minha concepção de kana, a sílaba, vogal ou letra corresponde sempre
a um som.

115 A epêntese é a adição de uma vogal ou consoante. No caso da Língua Japonesa, nos empréstimos, acrescenta-se uma vogal epentética após uma
consoante para adaptar a palavra ao padrão silábico da Língua Japonesa, que é CV.

116 A vogal dobrada ocorre somente na escrita, porque no momento da pronúncia o som é longo e não dobrado, ou seja, não se pronunciam duas vogais e sim
uma vogal longa.

117 Na Língua Japonesa diferencia-se o arroz cozido (Gohan ■■■) do arroz cru (Kome ■■).

118 Luta que possui um ringue circular, onde dois lutadores se enfrentam com o objetivo de derrubar ou empurar o adversário para fora do ringue. Esporte
tradicional no Japão ele ainda conserva rituais xintoístas.

119 Arte Suave, Ju-Justu é conhecido como Jiu-Jitsu, nesta arte não se utiliza armas, portanto, dizemos que é uma arte de mãos livres ou sem armas (DUNK,
2009)

120 Literalmente ,“Técnica da espada” utilizada pela classe dos samurais.

121 Escola de esgrima frequentada por Ueshiba.

122 Aikikai Foundation, também conhecido como Hombu Dojo.

123 Sede mundial do Aikido, localizada em Tóquio, ela coordena as regras do estilo, além de monitorar as sedes espalhadas pelo mundo.

124 Há um Guia do Iniciante disponibilizado pela União Sul-Americana de Aikido – Shihan Kawai. Academia Central (SP). Disponível em
<http://www.aikidokawai.com.br/pt/guia-do-iniciante.html> Acesso em: 9 fev. 2012.

125 Samurai que se tornou monge e teve suas memórias registradas por um discípulo em 1716, compilação que ganhou o nome de Hagakure e hoje é
considerado o primeiro relato do bushidô (conduta ética dos samurais).

126 Esgrima japonesa, descendendo do kenjutsu. Teve sua sistematização após a Segunda Guerra Mundial, tornando-se parte do currículo escolar japonês.
(LOURENÇÃO, 2009)

127 Tiro com arco e flecha, literalmente “O caminho do arco”.

REFLEXÕES DE PASSAGEM SOBRE A CORPORALIDADE NO MUNDO ORIENTAL

Marcel Farias de Sousa

Introdução: Notas sobre o interesse pelo corpo

Há muitas histórias e interesses pelo corpo. Moldado pelo contexto social e cultural em que o sujeito (ator, para David Le Breton) se insere, o corpo é o vetor
semântico pelo qual a evidência da relação com o mundo é construída: desde simples percepções obtidas a técnicas corporais elaboradas ou exercícios físicos,
o sujeito/corpo se encontra imerso num conjunto de relações materiais e simbólicas com a sociedade, com os outros sujeitos, com a natureza. Na relação com o
meio, com a natureza, o corpo responde com uma infinidade de atitudes ou movimentos, ou mesmo é um veículo de expressão das emoções ou de reflexões.
Le Breton (2010) também considera acertadamente que do corpo nasce e se propaga as significações que fundamentam a existência individual e coletiva, ou
seja, se torna o eixo da relação com o mundo, com o lugar e com o tempo nos quais a existência, o próprio Ser, toma forma através da fisionomia singular que
os sujeitos adquirem.

Diante a esta complexa “figuração” do corpo, no campo acadêmico, as ciências humanas têm trazido análise sobre diferentes enfoques e perspectivas, que
ultrapassam os limites das concepções “materialistas” e biologicistas, conforme expõe Sant’anna (2007). Áreas como as ciências sociais (sociologia,
antropologia), as artes, a história, a comunicação, têm estudado as práticas e as representações corporais de civilizações do passado e culturas do presente.
Parte disto é motivada pelo reconhecimento da relação entre o corpo, sujeito e a sociedade, o que leva ao surgimento do interesse de algumas disciplinas
acadêmicas a analisar estas conexões. Como aponta Albuquerque (2001), no século XIX, os estudos eram voltados para a saúde e a relação entre pobreza e
doença sendo direcionados para a análise da saúde física e mental no âmbito do processo de industrialização e urbanização ocorridas na modernidade. No
entanto, isto não tornou o corpo um objeto de estudo consagrado semelhante a outros temas como a religião e o conhecimento (ALBUQUERQUE, 2001). De
certa forma, este movimento representa a ambiguidade presente no interesse pelo corpo.

Mas é a partir da década de 50 e 60, momento este que na história se teve um grande desenvolvimento de técnicas (especialmente estabelecidas na medicina
estética e na indústria cosmetológica) que procuravam responder ao sonho humano de inventar um corpo triunfante sobre a sua própria natureza, que os
estudos realizados sobre os significados de corpo encontram um amplo e inexplorado (até então) terreno de pesquisa ao contemplar a amplitude desse mercado
e ao indagar como os grupos sociais consomem e também concebem as propostas para produzir uma aparência rejuvenescida e bela (SANT’ANNA, 2007).
Aliado a este aspecto, encontra-se também a dimensão das mudanças sociais e culturais, na qual o sujeito se encontrava inserido e se tornava passível de
influência em seu corpo. Como aponta Le Breton (2010), ao final dos anos de 1960, estabeleceu-se uma crise de legitimidade das modalidades físicas da
relação do homem com os outros e com o mundo a partir do feminismo, da revolução sexual, da expressão corporal, da body art, da consolidação do esporte
(que levou ao surgimento de construções teóricas críticas), da individualização, entre outros fatores.

Junto a este crescimento no interesse sobre o corpo e na ampliação da pesquisa, o estudo etnológico e antropológico suscitou a necessidade de se também
buscar a compreensão do corpo em outros sistemas socioculturais. Recentemente, os chamados estudos culturais56 procuram construir abordagens
metodológicas pluralistas levando em consideração, as representações e construção imaginária sobre o corpo oriundo de outros grupos sociais.

É claro, vale ressaltar que este processo passa por diversas fases anteriores à consolidação dos estudos culturais enquanto área acadêmica interdisciplinar. No
caso dos países e cultura do oriente (em especial, o Japão), há uma evocação da noção de “Outro”, diferente do “Nós” ocidental (ORTIZ, 2000). Com isso se
cria um tipo de discurso que legitima esta noção de diferença, na qual se convencionou chamar de “orientalismo”. Said (2007) aponta que o orientalismo é um
tipo de discurso de poder, que procura legitimar a dicotomia superioridade/inferioridade nos processos comparativos entre sociedades diferentes. E isto tanto se
dá nas relações socioculturais como também se encontrava engendrada nas produções acadêmicas.

Ante a diversidade de teorias e leituras, torna-se importante concentrar esforços na compreensão histórica sobre este interesse e nas teorias que se
desenvolveram. Neste breve texto, procuramos: 1) inicialmente perceber a dimensão histórica do trato ao corpo no desenvolvimento da civilização ocidental
procurando elencar os principais pontos de viragens; 2) em seguida, procurou-se discutir algumas características do pensamento oriental sobre a corporalidade,
centrando-se especialmente nas representações estabelecidas no Japão e na China e; 3) Desdobramentos de pesquisas sobre a corporalidade oriental.

Breves notas sobre o corpo na história

Num momento anterior da história humana, o corpo reconhecido na (da) natureza, via neste meio uma referência essencial tanto para o conhecimento quanto
para o próprio cuidado (SANT’ANNA, 2006). Era na natureza primária primordial que se buscava a cura para doenças, o alimento adequado e a construção de
representações de diversos elementos da vida social que traziam significados e sentidos para a própria existência humana (como o conhecimento religioso,
gnóstico). Conforme ainda nos aponta Sant’anna (2006),

[...] a medicina se misturava à astrologia enquanto a saúde dependia de vários fatores externos, incluindo as características das estações do ano e as variações
do clima. O controle do corpo exigia muito mais esforço em mantê-lo harmoniosamente relacionado com o meio ambiente e o cosmo do que a sua liberação em
relação às forças naturais (SANT’ANNA, 2006, p. 06).

A medicina hipocrática tinha esta característica: considerava o corpo humano como um microcosmo inserido num cosmo maior. Desta forma, Hipócrates via que
era a própria natureza que condicionava a saúde humana:

[...] é a natureza que cura as doenças. Ela encontra por ela mesma as vias convenientes sem ter necessidade de ser dirigida por nossa inteligência. É ela que
nos ensina a abrir e a fechar os olhos, a mover a língua e outras coisas parecidas, sem ajuda de um mestre (SANT’ANNA, 2006, p. 06).

Neste modelo, temos o princípio da separação entre a medicina e a magia: para Hipócrates, a relação do corpo com o mundo não era explicada através de
crenças ou divagações metafísicas, sobrenaturais. No entanto, isto não impediu que das escolas médicas surgidas na antiga Grécia, viessem médicos
sacerdotes. A associação da medicina e magia, da terapia e religião, do domínio do corpo e do espaço cósmico, era legitimada a partir de práticas de curas para
o corpo que estes sacerdotes buscavam na relação que “possuiam” com o sagrado.

A espiritualidade e religiosidade são elementos importantes que também determinam ou influenciam na construção de um ideário de corporalidade. Durante o
período medieval europeu, conforme Gélis (2010), a influência religiosa (catolicismo) gerou dois tipos de ideias sobre o corpo. Apesar de o Cristianismo ser
anterior, somente a partir do Concílio de Trento (1545) que o “cristocentrismo” se acentuou quando colocaram Cristo no centro da pastoral da salvação. O corpo
é elevado a uma alta dignidade a partir da glorificação, da devoção e fé ao corpo de Cristo: “O corpo de Cristo está no centro da mensagem cristã, e o
cristianismo é a única religião na qual Deus se inscreveu na história tomando forma humana: a religião do Deus encarnado” (GÉLIS, 2010, p. 23). Desta forma,
Deus assume uma forma corpórea que o identifica com a humanidade. A imagem do Sudário tornou-se a resposta para a indagação sobre quem seria Cristo e
qual forma ele possuiria (além de também servir como um documento identificador e legitimador da presença divina na Terra e da consolidação desta nova
religião). Um corpo santificado, que sofreu todo o tipo de flagelo, que sentiu dor, mas que conseguiu transcender a Carne.

O cristianismo, segundo Sennett (2003) conferiu a dor do corpo um novo valor espiritual. O mesmo flagelo e suplício enfrentando por Deus encarnado tornou-se
uma espécie de exemplo e uma via para se alcançar a salvação. No mundo pagão, segundo este autor, o sofrimento físico quase não era encarado enquanto
uma circunstância humana. A segunda imagem do corpo se associa com esta noção do sofrimento como via de redenção já que o ser humano, desde a queda
de Adão e Eva, tornou-se pecador. O corpo tornou-se um vetor que poderia desvirtuar a alma, que é por ele que se “[...] corre o risco de perder-se” (GÉLIS,
2010, p. 20). Desta forma, temos uma ambígua relação com o corpo no cristianismo: há um duplo movimento de enobrecimento e de menosprezo do corpo.
Aqueles que queriam seguir o exemplo de Cristo, o corpo se tornou o maior obstáculo: a tortura ao corpo e o castigo são necessários. Se o sujeito hesita, não
merecia nenhum respeito. Era uma forma de disciplinar, a partir das mais dolorosas formas de ações e flagelos ou até mesmo através da privação alimentar.
Conforme Sennett (2003) expõe, os estudos sobre o corpo humano realizados por William Harvey e publicados em sua principal obra Motus Cordis (1628),
inaugura uma distinta e inovadora compreensão. Sua descoberta era bastante “simples”: percebeu-se que o coração bombeava o sangue pelas artérias
espalhadas pelo corpo e recebia das veias para novo bombeamento (SENNETT, 2003). Seu estudo e descoberta sobre a respiração, circulação sanguínea e
função do coração trouxe profundas influências no desenvolvimento crescente da medicina, das políticas da saúde pública e urbanização das cidades. Além de
influenciar nas ideias de economistas como Adam Smith e do matemático filósofo René Descartes.

Na obra de René Descartes se construiu a ideia do corpo como uma máquina, do corpo encarado em sua materialidade, o que, segundo Silva (2006), se
encontra engendrado na criação de uma série de posições dualistas e dicotômicas (corpo/alma, essência/materialidade, corpo/mente, entre outros). Este
processo também trouxe um maior aprofundamento sobre a própria representação do sujeito: tem-se um processo de “desnaturalização” do sujeito e seu corpo,
de enxergá-lo como algo distinto da natureza tendo-se assim, uma tentativa de afastamento desta. Um interessante elemento ilustrativo deste processo é
apresentado no estudo de Williams (1989) sobre as transformações das relações entre campo e cidade na Inglaterra durante o processo de transformações
ocorrido entre os séculos XVI e XIX e que influenciaram a literatura inglesa. O processo de modernização e transformação ocorrida neste período gerou
profundas modificações nas relações sociais entre proprietários, arrendatários e trabalhadores rurais. A própria relação com a natureza, com a terra encarada
enquanto uma propriedade que outrora no período medieval era considerada uma herança e que gerava uma determinada renda, por exemplo, passou a ser
vista como oportunidade de investimento que traria um lucro maior (WILLIANS, 1989).

As transformações ocorridas na modernidade trazem um conjunto de ressignificações que atingem todas as estruturas da sociedade mundial, inclusive as
instâncias ligadas à formação do aspecto cognitivo e motor dos sujeitos. Se no plano social temos um intenso processo de racionalização57, também se tem
uma preocupação com o comportamento do sujeito na sociedade. O sujeito, seu corpo, também se torna alvo desta racionalidade: na Europa isto veio em forma
de uma sistematização do movimento humano através dos métodos ginásticos ou esportivos no século XIX, tendo como principal concepção o atendimento dos
“novos códigos de civilidade” (SOARES, 1998, p. 17). Conforme Holt e Vigarello (2009), entre os anos de 1810 e 1820 foi inventado este trabalho físico (a
ginástica) que mensura os atos e as próprias ações são resultados de cálculos e racionalizações do movimento humano. O programa ginástico comportava
diversos conteúdos, mas que procurava enfatizar a noção de controle, precisão, eficácia através de movimentos corporais precisos que confirmam descobertas
de um espaço corporal atravessados por lógicas mecânicas e de “[...] atos musculares totalmente pensados segundo seu efeito localizado [...]” (HOLT;
VIGARELLO, 2009, p. 414).

A ginástica europeia desenvolvera a partir dos estudos anátomo-fisiológicos, um conjunto de técnicas para corresponder e atender a estes objetivos
“declarados”. A ginástica europeia vinha “recheada” por um conjunto de técnicas e de um respectivo discurso aparente em torno da melhoria na qualidade de
vida do indivíduo (saúde) ou de uma formação de um padrão estético. É claro, por trás das mudanças não apenas estéticas, há a afirmação de que o novo
método serve “como forma específica de treinamento do corpo e da vontade deste homem novo que se desejou criar ao longo de todo o século XIX” (SOARES,
1998, p. 29) e que levavam as mães a desejar o “conserto” do corpo (que já aparecia, de certa forma, moldado pelo espartilho) de suas filhas, conforme o novo
padrão estético, mas também no comportamento moral deste indivíduo. O idealizador do método francês de ginástica, Francisco Amoros, imaginava que seu
novo conjunto de técnicas se inseriria “no conjunto das normas de conduta moral e de pedagogias que se elaboram para formar ou reformar o corpo, regulando
corretamente suas manifestações e educando a vontade” (SOARES, 1998, p. 37). Esta conceituação, aliada ao crescente domínio do pensamento econômico
nas sociedades ocidentais, faz com que o objetivo dos exercícios físicos para este novo homem o torne forte, ágil, empreendedor, para assim ter a sua força
apropriada para o mundo do trabalho. A força física se tornava mercadoria e a sociedade necessitava aprimorar seu sujeito para estarem aptos para o mercado,
para o exército (de onde sai todo um discurso disciplinar), para o crescimento de uma nação com indivíduos fortes e saudáveis. Como ainda se vê no trabalho
de Elias e Dunning (1992), o processo da racionalização que caracteriza a modernidade e sua ação na corporalidade embasa as modificações nas atividades
corporais a partir da necessidade de imposição de padrões nestas práticas, mas que corresponderia a múltiplos objetivos, entre os quais se destacam a
formação da conduta e comportamento de sujeitos aptos para uma vida social e para o trabalho (o que, no âmbito do processo civilizador significa reprimir
instintos básicos do sujeito e de seu corpo). Aliados a esta nova prática, vê se surgir na Europa um movimento de ressignificação de algumas atividades
corporais tradicionais: pode-se afirmar que o esporte é um fenômeno recente, surgido a partir da ruptura e transformação das diversas manifestações corporais
clássicas do início do século XVIII (SOUSA, 2010). O esporte moderno, conforme Elias e Dunning (1992) e Bracht (1997), resultou de um processo de
modificação dos elementos da cultura corporal de movimento das classes populares e também da nobreza inglesa, como os jogos populares e danças. O
processo de industrialização e urbanização levou a novos padrões e novas condições de vida, com as quais aqueles jogos e práticas não eram mais
compatíveis.

Vemos que, para fortalecer este discurso, um dos mecanismos complementares à ginástica foi à implantação de uma medicina social. Foucault analisa,
inclusive, que não houve uma privatização da medicina entre os séculos XVIII e XIX: na verdade ela foi coletivizada para tratar do corpo, enquanto força de
trabalho. Para este autor, aliás:

o controle da sociedade sobre os indivíduos não se opera simplesmente pela consciência ou pela ideologia, mas começa no corpo, com o corpo. Foi no corpo,
no somático, no corporal que antes de tudo, investiu a sociedade capitalista (FOUCAULT, 2001, p. 80).

O papel da medicina social atuava nos processos de urbanização das cidades dentro de uma lógica higienista e de controle (disciplina) sobre o corpo “força de
trabalho”. A medicina social, por intermédio das instituições públicas, dentre outros mediadores, lançam mão de inúmeras propagandas e campanhas que
buscam controlar o avanço das doenças do mundo moderno e urbano. Entre essas campanhas, presenciamos vários incentivos à prática da atividade física nas
ruas, nos parques, em academias, em casa e no trabalho. Atreladas a essas campanhas estão as de controle de tabagismo e da obesidade (estas sendo
grandes preocupações no mundo contemporâneo).

Segundo Silva (1999), a partir de estudos sobre autores que discutem a função da medicina social, a atividade do médico tornou-se fundamental nesse processo
de subjetivação que ocorre na modernidade, com um incentivo especial à identificação do indivíduo com sua dimensão corporal. Ela cita o exemplo da história
do banho como uma ilustração do processo civilizador de higienização (sendo que a medicina e seu profissional assumem uma grande importância) do corpo e
consequente separação deste da natureza (SILVA, 1999).

Nesse momento do imaginário social, ainda está presente uma interação com o todo, o corpo não é visto como uma entidade em separado da natureza e por
isso os temores do “mal” que se encontra difuso no ambiente tornam-se motivos de grande preocupação e paranoia. Com o surgimento da peste bubônica, os
banhos públicos e privados desaparecem totalmente nos séculos XVI e XVII por incentivo dos médicos, até que os banhos nas casas se instalam de forma lenta
entre as classes superiores durante o século XVIII.
É nesse momento, como continua a explicar Silva (1999), que os médicos e higienistas exprimem seu receio acerca dos banhos de mar. O discurso desta ordem
profissional produziu e codificou práticas que visavam à correção dos males da civilização urbana: “[...] a palavra de ordem é fortificar, a preocupação essencial
é repor a energia” (SILVA, 1999, p. 14). Com o respaldo científico, a saúde impera sobre o prazer e os banhos serão prescritos e seguidos de acordo com as
ordens médicas. Desta forma, o banho frio oferecido enquanto uma recomendação médica fundamenta-se numa transformação social e traz uma nova
expectativa sobre o corpo: “[...] crenças numa força autônoma, inventada por uma burguesia confiante em suas próprias energias físicas, confiante, sobretudo
em vigores totalmente independentes das filiações e laços sanguíneos” (VIGARELLO apud SILVA, 1999, p. 14). O corpo que perde sua vinculação com a alma é
agora considerado pela sua dinamicidade proveniente da força mecânica atribuída ao próprio corpo.

A própria imagem corporal forjada torna-se coerente com a profunda transformação social que se operava: o individualismo, como expressão ideológica do
capitalismo industrial. As relações entre os sujeitos desta sociedade são afetadas. Será levada para o primeiro plano a importância do “eu”, com toda a sua
moralidade própria e distinta em cada ser. Haverá uma dicotomização (ou um desequilíbrio na balança, como aponta Elias) na relação “nós-eu”, sendo que
“nós”, não significa uma totalidade, uma soma dos vários “eus”. Significaria o conjunto de relações entre os “eus” numa estrutura complexa que reúne e liga as
inúmeras unidades desiguais nos valores éticos e morais (ELIAS, 1994).

Outro aspecto do discurso sobre o corpo que Silva (1999) traz em seu estudo é que, fundamentado numa perspectiva hierárquica e numa visão conservadora de
mundo, tal discurso reforçará a dicotomia sexual presente e o domínio que lhe corresponde. Estes acontecimentos têm relação com o desenvolvimento de novas
tecnologias para o corpo, aspecto este ligado ao fortalecimento ou enrijecimento que se tornaram elementos requisitados naquele período.

As diferenças de gênero, conforme Silva (1999), são observadas também na forma de perceber a nudez. O código estrito do pudor que surge deixa pressentir a
intensidade da sensação, penosa ou agradável, como expõe Corbin (apud SILVA, 1999). Para compreender este aspecto, a autora propõe pensar (baseada na
obra de Alain Corbin) a intensa carga erótica dos tornozelos e da cabeleira femininos no século anterior.

O simples contato dos pés descalços com a areia da praia representa uma solicitação sensual, um substitutivo não muito consciente da masturbação. [...] Para
as mulheres burguesas, condenadas ao lar, mais que para as aristocratas habituadas à vida mundana, a prescrição médica possibilita uma liberdade
inesperada, reserva de insólitos prazeres (CORBIN apud SILVA, 1999, p. 14-5).

Esses sentimentos que se tornaram predominantes na classe burguesa não são os mesmos entre as classes populares em seu ato de banho, pois havia a
mistura dos sexos e de forma consentida. Esta forma posteriormente é modificada: há a subjugação do modelo popular frente ao modelo burguês com o auxílio
imposto das autoridades. A uniformização do banho de mar obedece a três imperativos importantes: o moral, o terapêutico e a dinamicidade a partir da
acentuação das normas de pudor que acompanham o processo civilizador (SILVA, 1999).

Um implemento ao processo de subjetivação, de individuação já iniciado, será dado com a atenção à sexualidade. Anteriormente discutida de forma aberta e no
século XVIII, terá seu foco de atenção alterado no século seguinte, com ênfase nas discussões sobre as desordens, as anomalias e os desvios, que refletem o
recato vitoriano. A importância que é atribuída ao sexo, ou melhor, ao controle da sexualidade é compreendida melhor por Foucault (2001), que argumenta que
o sexo se transforma, a partir do século XVIII, numa peça fundamental, pois se encontra na articulação entre as disciplinas individuais do corpo e as regulações
da população. A sexualidade se constituiu na chave para garantir a vigilância sobre os indivíduos e o controle sobre o corpo social. O corpo passa a ser
enfocado pelas tecnologias individualizantes do poder, por uma anatomia política que atua sobre os indivíduos, tornando-os centrados em seus corpos, com
base nas preocupações terapêuticas e morais que vão sendo internalizadas.

Perspectivas do corpo na modernidade

A pesquisa teórica tem apresentado grandes distinções no que diz respeito ao entendimento e à descrição do corpo, conforme expõe Greiner (2005). Isto
começa pela própria reflexão em torno da palavra substantiva: corpo vem do latim corpus e corporis e segundo Dagognet (apud GREINER, 2005), corpus
sempre designou o corpo morto, isto é, colocava o cadáver em oposição à alma ou anima. Acrescenta-se e precede-se a este termo, o estudo sobre os
vocabulários de origens gregas, como physis, soma e demas. Silva (2006) nos mostra que a própria concepção de corpo encontra sua viragem ainda na
antiguidade clássica greco-romana. O termo physis é a raiz da expressão “físico”, expressão esta que é utilizada como sinônimo de corpo (em referência à
dimensão biológica do ser humano). No entanto, a expressão era utilizada na antiguidade clássica como referência a natureza58, a essência do ser humano e
na vinculação desta com a representação “integrativa” do próprio cosmo. A physis se contrapõe ao conceito de techné, entendendo esta expressão como
representação de tudo que é criado pelo ser humano a partir de sua capacidade racional.

Na própria cultura helenística, o termo sofreu uma inversão que se perduraria e ganharia maior importância na modernidade. A partir da perspectiva materialista
(negação do espiritual, do imaterial) encontrada na obra de Epicuro e entre os filósofos estoicistas, pregou-se a exclusividade da existência dos corpos; a physis
é percebida em sua dimensão material, corpórea. Este conceito, especialmente na Modernidade, se populariza através de práticas sociais que se difundem sob
as denominações como educação física ou atividade física (SILVA, 2006). Estas práticas não assumiram a expressão correspondente a corpo, soma. Contudo,
conforme alerta Greiner (2005), esta palavra era usada apenas para nomear o corpo morto, enquanto demas era usada para o corpo vivo. Segundo esta autora,
é daí que parece nascer a divisão que gerou a separação entre o material e o mental, entre o corpo morto e corpo vivo.

Os estudos sobre o corpo, especialmente a partir do surgimento dos estudos culturais, ganharam outras dimensões ao perceber que para além dos estudos
desenvolvidos nas ciências sociais e humanas, na psicologia e na filosofia, o cruzamento interdisciplinar e de estudos de outros sistemas socioculturais
poderiam trazer novos ganhos teóricos e perceptivos, consequentemente. Em outros sistemas socioculturais percebe-se que as distinções promovidas no
pensamento greco-romano não se encontravam; aliás, o que se encontravam eram significados “integrativos”. Ainda conforme Greiner (2005), no antigo
dicionário indo-iraniano, krp é uma raiz que indica forma. Em outros contextos, como no Japão, as palavras correspondentes ao vocábulo corpo também
apresentam interessantes sentidos.

Para a análise da corporalidade japonesa, buscamos pesquisas de autores japoneses, como Kuriyama (1999) que fez um estudo comparativo entre as
concepções do corpo na China e no Ocidente. A diferença fundamental que este autor constata é que a noção de corpo na China nunca foi um substantivo, “[...]
um corpo com nome” (GREINER, 2005, p. 22) e aparece descrita de uma forma mais próxima a “qualidades de existência” encontradas e caracterizadas em
descrições de posturas, de atitudes, de gestos, como por exemplo: corpo sentado, corpo em pé, corpo andando, corpo risonho, corpo que chora, corpo doente e
assim por diante (GREINER, 2005; KURIYAMA, 1999). Em suma: “O corpo, nestes estudos, já era entendido a partir dos seus diferentes estados, sendo sempre
ativo e nunca considerado como um instrumento ou objeto” (GREINER, 2005, p. 22).
As descrições encontradas em seu livro já geram uma surpreendente revelação: a anatomia chinesa se desenvolvera de forma distinta da anatomia ocidental
(percebemos que a diagramação sobre o corpo na visão europeia busca ênfase na constituição muscular – influência do método hipocrático desenvolvido na
Grécia – enquanto na visão chinesa este aspecto não se encontra presente, sobressaltando a noção dos pontos energéticos para a aplicação do método
acupunturista), onde o corpo era entendido numa abordagem “holística” (LOCK, 1980), já que esta concepção não se encontra separada dos valores e da
filosofia espiritual: princípios como o Yin/Yang tornam-se central na medicina oriental. A ideia de equilíbrio da natureza humana e não havendo inclusive a
dicotomização do sujeito desta, influenciaram a busca da compreensão sobre a anatomia do corpo humano. No livro de Kuriyama (1999), vemos que as
divergências entre as duas formas de conhecimento sobre o corpo, não eram aspectos meramente intelectuais ou conceituais, mas se relacionavam aos modos
orientais e ocidentais de conhecer o corpo e a si mesmo. O interesse pelo músculo na sociedade ocidental, por exemplo, pode estar associado à ideia de
potência, autonomia e individualidade, aspectos tão caros à sociedade europeia. Na China e na Ásia de uma forma geral, o sujeito é considerado dentro de uma
abordagem integrativa em que o indivíduo é uma espécie de microcosmo, ou como simplifica Lock (1980), o sujeito é parte da natureza, do universo e por isso
está sob o jugo de suas forças. Desta forma, métodos como a acupuntura, desenvolvem a noção de saúde e doença a partir desta perspectiva sobre o corpo
(KURIYAMA, 1999).

A “musculosidade/muscularidade” (KURIYAMA, 1999) é um elemento que também se ressalta no campo das representações artísticas, dimensão esta em que o
autor debruçou seus estudos comparativos para averiguar a “ausência” desta estrutura corporal na arte oriental chinesa. Para a arte ocidental desenvolvida nos
séculos XVI a XVIII, um iniciante nas artes plásticas não teria um “olhar” ainda apropriado sobre o corpo, pois não enxergaria o músculo num corpo nu. Desta
forma, o artista deveria estudar anatomia59, “[...] para que possa descobrir o paradeiro (lugar) dos músculos e ossos” (JOMBERT apud KURIYAMA, 1999, p.
112).

No trabalho de Yuasa (1987), o autor aponta que a separação do corpo e da mente na filosofia cartesiana os tornou instâncias opostas. Esta separação, na
história das ideias, desenvolveu dois tipos de sistemas de pensamento (idealismo e materialismo). Em vez de continuar nesta forma, Yuasa compreendeu esta
relação não em seu nexo dualista, mas entendeu o corpo e mente em sua harmonia. A concepção de corpo no Japão e na China decorre do entendimento de
que a relação corpo-mente muda pelo treinamento do corpo, que se processa pela disciplina (shugîyo) e a formação (keiko) propriamente dita (GREINER, 2008,
p. 22; YUASA, 1987, p. 37). Yuasa buscou em figuras históricas japonesas, especificamente nos relatos de monges budistas que descreviam o seu despertar
(satori), o exemplo sobre o processo de mudança da relação corpo-mente pelo treinamento60: o fundador da Escola Rinzai de Zen Budismo, Eisai (1141-1215),
o fundador da escola S■t■ do Zen Budismo, D■gen (1200-1253) e My■e (1173-1232), um famoso monge no período Kamakura.

É apenas depois de adotar esse ponto de partida experiencial que se pode perguntar qual é a relação entre corpo e mente. Ou seja, o debate sempre parte de
uma aliança entre teoria e prática. Yuasa chama a atenção para a obra de Tetsurô Watsuji (1889-1960), esclarecendo que para investigar a ideia de “ser
humano” precisamos, antes de qualquer coisa, prestar atenção no “entre” (aidagara; betweenness) no qual as pessoas se localizam. Como encontramos a
definição no livro de Yuasa, este “entre” são os vários relacionamentos da nossa vida (ou vida-mundo, conforme sugere o texto, que nos traz uma aproximação
com a concepção de mundo vivido presente na fenomenologia) e é justamente esta rede de relações que parece prover a humanidade com significados sociais.
Em Yuasa (1987) vemos que o sujeito nunca está separado do ambiente onde vive e dificilmente seria compreendido sem uma atenção especial às relações
que aí se estabelecem, nas inter-relações.

Conforme comenta Greiner (2005) e Yuasa (1987), estudiosos de Watsuji têm observado que a sua “filosofia da pessoa” capturou bem os padrões
característicos de comportamento e pensamento japonês, no sentido de chamar a atenção para esta dependência (amae). A própria palavra pessoa, em
japonês, ningen ■■ é composta por dois caracteres, o primeiro significa pessoa (■) ou homem e o segundo é espaço (■) ou entre. Este “entre” significa no
sentido físico, uma distância espacial separando uma coisa em relação à outra (YUASA, 1987, p. 40). Existir no espaço é o significado primário da existência
humana e o “entre” seria a extensão de um espaço subjetivo corporificado. Não aparece, portanto, uma dualidade entre natureza e cultura para o entendimento
deste espaço: mente-corpo-ambiente existiriam como uma unidade inseparável. O “entre” é uma mediação.

Segundo Yuasa (1987, p. 40), a partir da obra de Watsuji Tetsuro, a concepção de corpo no mundo ocidental – dentro do modelo hipocrático e posteriormente
no modelo cartesiano – o encara como objeto. O corpo aparece meramente como parte das experiências espaciais humanas.

Em outras palavras, sobre este ponto de vista, o modo de ser do corpo é equivalente ao de um objeto físico que ocupa espaço. Para o sujeito consciente, além
disso, o espaço aparece como a experiência espacial de uma perspectiva auto-observável (YUASA, 1987, p. 40). Esta operação do ser consciente que identifica
a si próprio como algo externo à natureza difere radicalmente da concepção integrativa existente na filosofia oriental. Para Watsuji Tetsuro, que é citado por
Yuasa (1987, p. 46), a própria separação corpo e mente existente no pensamento ocidental não condiz com a experiência do mundo oriental. E isto gera o
entendimento das possibilidades de identificação do corpo-sujeito nos seus espaços de inter-relações, o chamado betweenness. A espacialidade torna-se até
mais importante que o próprio sujeito, o próprio corpo ou pessoa-mundo (YUASA, 1987), pois é visto o reconhecimento deste como um ocupante de um lugar
(basho) de onde nos interconectamos com os significados da vida no mundo.

Considerações finais: estudos da corporalidade japonesa e suas possíveis aplicações

Os estudos da corporalidade, conforme as hipóteses levantadas por Kuriyama em seus estudos comparativos entre o corpo na China e no Ocidente sugerem a
análise dos diferentes estados corporais, “sempre ativos e nunca considerado como instrumento ou objeto” (GREINER, 2005, p. 22). Discutir a corporalidade
significa adentrar o universo dos diferentes estados do corpo vivo e em ação no mundo (op.cit).

Nesse contexto, as pontuações do filósofo Yasuo Yuasa reforçam que o treinamento corporal muda a relação corpo-mente, processado pela cultura e pela
formação. Essa relação implica a experiência das práticas corporais com o ambiente em que o sujeito está integrado, atento ao “entre” (aidagara) reforçado
pelas relações interpessoais, como uma rede de significados sociais, conforme a visão de Watsuji Tetsuro, ou seja, a importância do espaço e do ambiente
como complemento das práticas corporais. Conforme observa Greiner (2005), o fluxo de informações entre o interior e o exterior não são aspectos opostos,
designam ao mesmo tempo a vivência, o contexto ou lugar e os mecanismos cognitivos.

Estas dimensões se encontram manifestas em práticas corporais como as lutas/artes marciais japonesas que devem justamente ser abordadas como práticas
estruturadas em determinadas figurações sócio-históricas, que carregam elementos e significados próprios que, de certa forma, também estrutura as ações dos
sujeitos envolvidos. No caso das lutas japonesas, a própria distinção ocorrida endogenamente a partir de mudança de bujutsu para bud■ e na modernidade
japonesa algumas manifestações se esportivizarem, torna-se um rico elemento para análise. As manifestações de lutas japonesas possuem características
ímpares por serem sistemas que procuram através do treinamento (keiko) transcender as limitações presentes no corpo. Ou mesmo tornarem-se caminhos para
respeitar os deuses ou as manifestações sagradas da natureza, como o é proposto no bud■ de Morihei Ueshiba, sensei e criador do aikid■ (SOUSA, 2010):
Através do Michi (Caminho), nós devemos conhecer a sinceridade; através do Michi, nós exibimos Makoto (sinceridade), e desse Makoto devemos criar uma
imagem e forma. Então, é dessa forma que nós exibimos o espírito e o treinamos. Assim, nós fazemos da criação de sinceridade, o propósito do nosso treino do
Budô (via, caminho marcial). Isso é o que nós estamos tentando alcançar. Nós observamos que a santidade na Natureza, de todos os fenômenos genuínos e
todas as coisas no Céu e na Terra é esclarecida sobre eles. Então, por meio do Michi, nós conhecemos Makoto e criamos formas assim, fazendo com que o Rei
(espírito) vire realidade (UESHIBA apud SOUSA, 2010, p. 190).

O estudo sobre a corporalidade nas práticas marciais possui diversos e riquíssimos elementos. Tem-se como exemplo a própria gestualidade ocorrida no doj■,
no espaço de treino: a conduta do praticante pelo bud■ também perpassa por um controle rígido de suas ações corporais e atitudes. A etiqueta, um elemento
que possui o caráter de manutenção das características culturais do Japão, proporciona também a segurança de seus praticantes.

A transmigração (ou mesmo desterritorialização) das práticas de lutas japonesas também se torna um importante ponto para reflexão e desenvolvimento de
investigações sobre a corporalidade japonesa, as relações estabelecidas com o mundo e suas ressignificações. A apropriação destas manifestações ocorreu a
partir de “traduções” que, na incerteza de compreensão dos elementos presentes nas práticas, eram adaptadas à luz do conhecimento ocidental: a própria
corporalidade, os conhecimentos sobre o corpo construído nos países orientais foram adotados parcialmente, suprimidos ou substituídos por entendimento
plausíveis para a cultura dos países localizados nesta “metade do mundo”. Ou seja, a decodificação das lutas, de forma semelhante a outras manifestações
culturais como a literatura, também ocorreu pela leitura “orientalista” estabelecida.

Também se pode perceber estes elementos nas danças e teatros japoneses, possuidora de um distinto senso estético e valorativo, como encontramos no N■ e
no Kabuki. E também são manifestações que sofrem influência da situação sociocultural vivida, como é o caso do But■. Pode-se dizer que esta dança é um
manifesto vivo do turbulento período pós-guerra em que o Japão (provavelmente o país que mais sofreu com os “monstros” tecnológicos criados neste período)
questionava a sua própria identidade e valores. Autores-dançarinos-coreógrafos como Tatsumi Hijikata e Kazuo Ohno procuravam através de seu but■, realizar
profundas experiências na qual o próprio corpo já se encontrava imerso sócio-historicamente: experiências da infância, do corpo doente, do corpo deficiente, da
sexualidade, da morte. Experiências estas desenvolvidas para obter então, através de sua dança, uma recriação do corpo, um corpo aberto para o exterior
(UNO, 2007).

Assim, para possíveis aplicações que envolvem os preceitos dos estudos da corporalidade japonesa seria necessário atentar para as questões que levam em
conta os estados corporais ativos, o treinamento, o ambiente e a integração nas relações interpessoais.

REFERÊNCIAS

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YUASA, Y. The body, toward an eastern mind-body theory. Tradução para a língua inglesa Nagatomo Shigenori e Thomas Kasulis, New York: State University
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KAMON:

INSÍGNIAS FAMILIARES JAPONESAS COMO INTERFACE SOCIOCULTURAL

Eduardo Araújo de Ávila

Atualmente, os estudos em design gráfico japonês, sobretudo no âmbito da identidade visual, refletem o paradigma provocado pela diversificação do mundo
globalizado e pela massificação das práticas comerciais, advindas da informatização e da absorção de características ocidentais.

A partir desse panorama, as instituições japonesas vêm buscando novas formas de se destacar no mercado internacional. Para alcançarem tal destacamento,
essas instituições recorrem a elementos ocidentais, como o uso do alfabeto latino em suas marcas. Por outro lado, existem aquelas que, quando são fundadas
por membros da mesma família, tomam como símbolo visual o emblema identificador de seu clã. Diante isso, como destaca o designer gráfico Richard Hollis61,
o design japonês tirou proveito das imagens criadas e manipuladas em computador e explorou incansavelmente a tradicional simplicidade dos kamon62.

As insígnias japonesas nomeadas por kamon63 ■■ (“emblema familiar”; “insígnia da família”)64 têm ilustrado, durante vários séculos, feitos de grande valor
dignos de honra, como também tradições populares, relações supersticiosas ou auspiciosas. Essas insígnias constituíam, e ainda constituem, uma espécie de
código visual de reconhecimento de importantes grupos sociais e familiares, formados por guerreiros (samurai), artesãos, comerciantes, administradores de
templos ou santuários. As insígnias de características búdicas (por vezes metafóricas), geralmente são ilustradas pelo círculo, que indica, grosso modo, a
concepção budista do “vazio”. Nos manuais, dicionários e sites de coleções especializadas, os kamon são organizados em sete categorias ou temas: plantas
(representações de flores e folhas de espécies de plantas nativas); animais (sobretudo, coelhos, cavalos, pássaros, animais marinhos, animais mitológicos como
o dragão e a fênix, e insetos como borboletas e formigas); pequenos utensílios (leques, receptáculos, artigos domésticos); corpos da natureza (círculos
representando corpos celestes como estrelas, o sol ou a lua, ondas do mar, bancos de areia, nuvens, neblina); e símbolos gráficos (ideogramas combinados
com outros elementos); composições geométricas (principalmente com círculos, losangos e hexágonos); elementos arquitetônicos (eremitérios. poços, cercas,
colunas, arcos, portais torii).

Exemplos de kamon:

1. chidori mon ■■■ (“insígnia da tarambola-dourada”)65

2. usagi mon ■■ (“insígnia do coelho”)


3. nobori bara fuji mon ■■■■■■ (“insígnia das rosas de glicínia chinesa em ascensão”)66

4. sasa rindô mon ■■■■ (“insígnia de folha de bambu e genciana azul”)

5. takara musubi mon ■■■■ (“insígnia do nó da fortuna”)

6. unpan mon ■■■ (“insígnia do gongo em formato de nuvem”)67

7. tachibana mon ■■ (“insígnia de tangerina”)

8. matoni atari ya mon ■■■■■■ (“insígnia da flecha e o alvo”)

9. uranami sen mon ■■■■ (“insígnia da moeda com padrão de ondas”)68

10. boke mon ■■■ (“insígnia do marmelo japonês”)

Inicialmente, os kamon pertenciam somente às famílias aristocráticas, porém adotados gradualmente por indivíduos comuns. As categorias de kamon, de acordo
com sua procedência, são expressas da seguinte maneira:

1. seimon ■■ (“insígnia principal”), representa a insígnia que foi adquirida pelo chefe da linhagem principal da família. Também nomeado como omotemon ■■
(“insígnia frontal”) ■ que se refere à fachada da porta de entrada da casa ■, ou jômon ■■ (“insígnia determinante”);

2. fukumon ■■ (“insígnia secundária”), representa uma subcategoria da insígnia principal e é usada por membros das linhagens subsequentes. Também
nomeado como kaemon ■■(“insígnia substituta”);

3. fukeimon ■■■ (“insígnia de origem paterna”), expressa a insígnia que foi herdada pelo pai e repassada para os filhos e filhas;

4. bokeimon ■■■ (“insígnia de origem materna”), representa a insígnia que foi herdada pela mãe e transmitida tanto para suas filhas quanto para seus filhos.
Esta categoria pode ser adotada como insígnia principal;

5. shimon ■■ (“insígnia pessoal”), representa a insígnia que foi escolhida livremente por um dos membros da família para seu uso particular.

O kamon usado exclusivamente pelas mulheres da família é nomeado como onnamon ■■(“insígnia para mulheres”; “insígnia feminina”). Nesse caso, as
mulheres não nascidas na família usam o onnamon da casa de sua mãe. Contudo, se a casa possui vários emblemas, o único a ser considerado oficial é o
seimon e os outros são usados de maneira informal.

É importante ressaltar que há o risco de traduzir-se o kamon como equivalente japonês para brasão de armas. Enquanto produção técnica, o termo “brasão de
armas” pertence especificamente à terminologia da heráldica europeia. O brasão na Europa é definido pela descrição de seus adornos ■ tais como os tipos de
escudos, suportes, figuras, cores ■, os quais são determinados por uma linguagem própria: a linguagem heráldica. Dessa maneira, o termo não corresponde
como tradução direta para o termo kamon, pois este não segue leis de elaboração heráldica. Isto é, no Japão, a produção dos kamon é determinada por um ou
mais elementos visuais que nomeiam a insígnia, e não por regras formais ou orientações rigidamente padronizadas. O kamon é, portanto, uma figura simbólica,
um emblema, uma insígnia.

Embora a heráldica europeia seja pouco difundida no Japão, atualmente, a estrutura do brasão de armas é adotada por corporações de influência ocidental,
como os clubes esportivos japoneses, para compor seus emblemas distintivos. No entanto, muitos desses símbolos são compreendidos como falsos brasões, já
que, apesar de utilizarem a formatação dos brasões europeus, não obedecem às regras da heráldica.

No que tange à regulação de uso dos kamon, considerava-se impróprio usar um kamon que fosse sabido pertencer de alguma outra pessoa. Também era
ofensivo usar um kamon que pertencesse a alguém de um nível social elevado. Quando um kamon tornava-se visualmente conflituoso com outro, o indivíduo
cuja hierarquia fosse inferior era induzido a modificar seu kamon para evitar ofender seus superiores. No Japão, os kamon pertencentes aos clãs dominantes
são protegidos legalmente de uso desautorizado, tais como maru ni mitsu-ba aoi mon (“insígnia das três folhas de malva em círculo”) dos Tokugawa ■■■,
geralmente representada na cor verde, ou kôshitsu no kikka mon ■■■■■■(“insígnia do crisântemo imperial”), também reconhecida por jû-roku hachi-jû-hyô kiku
■■■■■■(“crisântemo em formato duplo de dezesseis pétalas”).

insígnia da família Tokugawa

insígnia imperial do crisântemo

Nota-se também que o tema central (plantas, animais, corpos da natureza), assim como as figuras, que nomeiam os kamon, contém infindáveis variações.
Insígnias como a da malva, dos Tokugawa, e a insígnia do crisântemo possuem versões que são combinadas com figuras como o círculo e o losango, e que
podem ser compostas também com outros elementos figurativos. Algumas delas tomam a forma de outro elemento, pertencente a outro tema, tornando-se um
kamon que passa a pertencer a dois temas distintos. Como exemplo, as insígnias de plantas nativas do Japão que tomam a forma de uma borboleta ou as
insígnias de aves que são representadas em formato circular.
Variações da insígnia da malva:

1. maru ni in mittsu aoi mon ■■■■■■■ (“insígnia do negativo de três brotos de malva em círculo”)

2. muttsu aoi-sha mon ■■■■■ (“insígnia da malva de seis raios”)

3. ki-chô mon ■■■ (“insígnia da malva-borboleta”)

4. wari tsuru aoi-hishi mon ■■■■■■ (“insígnia do losango de malva-videira espelhada”)

5. kawari futatsu zuru aoi no maru mon ■■■■■■■■■■ (“insígnia circular da malva-videira com dois brotos alternados”)

6. kawari fu-sen aoi mon ■■■■■■■ (“insígnia da malva de linhas flutuantes e alternadas”)

Tanto o brasão de armas europeu quanto o kamon representam, em sentido restrito, o conjunto de uma família e, em sentido amplo, uma corporação, um
território, uma nação. Entre cidadãos iletrados da sociedade japonesa, esses emblemas serviram como símbolos úteis para o reconhecimento de grupos ou
instituições. Os kamon foram adaptados por várias organizações, tais como guildas de comerciantes e de artesãos, templos e santuários, grupos dos teatros
tradicionais nô e kabuki e, em casos excepcionais, por grupos criminosos.

Nesse sistema simbólico japonês, no qual o kamon se insere, há outra categoria de insígnia: o yagô■■ (“nome do comércio”). Também conhecidos como iena
■■ (“nome da casa”) ou kadona ■■(“nome da fachada”), esses emblemas, ainda mais simples graficamente que os kamon, são atribuídos aos artesãos do
período Muromachi (1333–1568). Inicialmente, foram criados para serem utilizados como insígnias de identificação de residências e pequenas lojas. Sua
consagração aconteceu no período Edo (1603–1868), tornando-se uma espécie de “marca registrada” dessa época. Os yagô são utilizados até hoje em muitas
situações. Por exemplo, para o comércio, indústria, nomes pessoais, nomes de família, lugares históricos, nomes de cidade etc.

Embora não se saiba com precisão sua origem, os yagô já eram citados em crônicas do Período Muromachi, e desempenhavam por vezes a função de distinguir
linhagens com status mais elevados, nas cidades e nas vilas onde muitas pessoas possuíam o mesmo sobrenome.

Além dos ideogramas que compunham o sobrenome, havia a possibilidade de identificação de um determinado membro da família através do emblema. O yagô
representava desde a residência matriz até as linhagens mais recentes de uma família. Em alguns casos, o yagô permanecia como símbolo identificador da
casa e, em casos remotos, quando a casa mudava de proprietários o símbolo era adotado pelos novos habitantes. Nessas situações, o símbolo passava,
portanto a representar outro nome de família.

Durante o período Edo as insígnias tornaram-se habituais para famílias que atuavam no kabuki. O renomado ator de kabuki, shodai Ichikawa Danjûrô
■■■■■■■ (1660–1704), por exemplo, era conhecido como Naritaya ■ assim como seus sucessores ■, que era o nome atribuído ao yagô de seu clã.

Emblema Naritaya, ou Mitsu irekomasu, utilizado pela família de atores kabuki Ichikawa.

Artistas, escritores e poetas no Japão, como em outras partes do mundo, muitas vezes, assumem um hitsumei ■■ (“nome de pena”) ou pseudônimo. Estes, por
sua vez, são derivados dos nomes de seus mentores, mestres. Frequentemente, esses nomes artísticos são chamados em japonês kagô ■■ ou simplesmente
gô ■.

O yagô, assim como o kamon, ainda funciona como logotipo para instituições comerciais japonesas. Um exemplo de uso recente é o logotipo do conglomerado
de empresas japonês Mitsubishi, que começou como uma empresa de navegação marítima.

Os navios de guerra de Tosa-han ■■■ (“o clã Tosa”) tinham sido usados no final do século XIX, na Guerra Sino-Japonesa contra a Coreia, e o nome Mitsubishi
foi dado a um dos navios de guerra da frota. A marca foi então desenhada como três losangos justapostos. A marca é a combinação de dois kamon: mitsu-baku
mon ou mitsu-gashiwa mon ■■■■ (“insígnia das três folhas de carvalho”), do clã Tosa69, combinada à san-gai bishi mon ■■■■ (“insígnia dos três losangos
sobrepostos”), de Iwasaki-ke ■■■ (“a família Iwasaki”). Logo, Iwasaki Yatarô ■■■■■ (1835–1885), um dos fundadores da companhia, determinou que a
“marca dos três diamantes” representasse a organização Mitsubishi.

Da esquerda para a direita: mitsu-gashiwa mon; san-gai bishi mon; insígnia utilizada pela empresa, no século XIX; marca atual.
Ainda convém lembrar que, mesmo com o desenvolvimento de novas tecnologias e metodologias no campo da Comunicação Visual, esses emblemas
continuam sendo utilizados como marcas. Isso se deve ao fato de que, visualmente, tanto os kamon quanto os yagô possuem a mesma capacidade de síntese e
clareza na informação visual dos logotipos projetados atualmente.

Por extensão, essas insígnias tornaram-se, ao longo dos séculos, interlocutores entre dois sistemas complementares: o cultural e o social. Desse modo, com a
apropriação de um termo da informática, no âmbito da comunicação, é possível estabelecer uma compreensão do kamon como uma espécie de dispositivo,
interface, graças ao qual se efetuam as trocas simbólicas entre esses dois sistemas.

A cultura, neste caso, é o sistema adaptativo, dependente da sociedade, da história e do local onde se está inserido. Assim como a memória e a identidade, a
cultura depende do outro e do lugar para se construir e se consolidar, não deixando, porém, de se adaptar às mudanças. Laraira esclarece, “culturas são
sistemas (de padrões de comportamento socialmente transmitidos) que servem para adaptar as comunidades humanas aos seus embasamentos biológicos”70.

No entanto, para compreender as atribuições culturais feitas às essas insígnias, é necessário antes compreender o outro dispositivo desta interface: a
sociedade, especialmente a dinâmica das relações familiares e comerciais no Japão. Alguns kamon foram criados a partir das relações entre a linhagem
principal de uma família e as novas gerações. Essas relações familiares são conhecidas como honke ■■ (“família matriz”) e bunke ■■ (“família sucursal”).

Honke-Bunke é uma expressão utilizada para descrever o relacionamento entre membros da família principal (honke) e agregados familiares mais próximos
(bunke) em famílias extensas. Esta expressão é também usada para descrever determinados relacionamentos de “parentesco arranjado” na sociedade
japonesa. É algo bem próximo do conceito inglês dos fictive kinships71 (“parentescos fictícios”).

As associações comerciais de honke-bunke são também citadas na literatura japonesa como dôzoku-kaisha ■■■■ (“empresa familiar”), ou seja, um grupo
corporativo familiar composto por parentes que geralmente residem numa mesma cidade. Um grupo tipicamente dôzoku era criado por meio de relações
comerciais entre filhos do sexo masculino, de modo que pudesse parecer ser um grupo patrilinear. Em suma, conceito honke-bunke é um dos paradigmas da
sociedade japonesa, sendo considerado também em relacionamentos entre companhias e suas subsidiárias.

Padrões visuais do sistema mon

As tradicionais estética e cultura do Japão expressam-se no conceito de beleza, baseado na pureza e no equilíbrio essencial. A comunhão espiritual, quase
meditativa, dos japoneses com a natureza influenciou profundamente, da concepção arquitetônica às vestimentas72. Nesse sentido, na iconografia que compõe
a indumentária tradicional é possível extrair ricos exemplos que revelam, de acordo com Wichmann, “uma antecipação de um instante intangível, e uma espécie
de tensão entre as sensações terrenas e o significado espiritual”73.

Por cerca de doze séculos, os kamon foram amplamente empregados como símbolos de distinção nas batalhas, aplicados em bandeiras, carruagens, selas de
montaria e equipamentos de luta: elmos, armaduras, espadas etc. No campo de batalha, esses emblemas serviram como padrões do exército, mesmo que esse
uso não fosse universal e os padrões excepcionalmente projetados do exército fossem apenas tão comuns quanto os padrões básicos. Todavia, o sistema mon
foi difundido como padrão visual aplicado às vestimentas e aos artigos de uso pessoal, tais como carteiras, joias, pentes de cabelo, além dos chôdo ■■
(“utensílios cotidianos”): artigos de laca e porcelana, que geralmente faziam parte do enxoval de noivas de famílias abastadas.

Os padrões tradicionais (dentô mon’yô ■■■■) assinalam o imaginário e a capacidade de síntese dos artistas japoneses, e estabelecem conexões com outros
sistemas sígnicos, como a moda, por exemplo, transformando e gerando novas mensagens e significações. Etimologicamente, defini-se “padrão” ■ de acordo
com a acepção do latim medieval patronus ■, como o exemplar; o original, propenso à imitação; o arquétipo, que deve ser copiado. Enquanto elemento
decorativo, o termo assemelha-se ao sentido de “patrão” — patrono, o modelo a ser imitado —, e converte-se para “modelo ou desenho em tecido ou noutro
material.”74

No contexto das artes têxteis, “motivo” é o ornato que estabelece o padrão decorativo. No motivo, concentra-se a ideia principal, o tema da obra visual75. O
termo “motivo” é usualmente associado à “padrão”, contudo, ambos possuem ambiguidades e polissemias. O mesmo acontece com as palavras inglesas pattern
e motif. Na língua japonesa, o termo que designa tais acepções elimina possíveis jogos polissêmicos. Contudo, mon’yô ■■ (“padrão”; “motivo”; “estilo de
decoração”) é associado à dois outros termos de igual ou semelhante pronúncia: mon’yô ■■ (“estilo de insígnia”) e moyô ■■(“estilo de imitação”).

Moyô ■■ refere-se ao padrão que “segue a estrutura de repetição de um mesmo motivo”76. Frequentemente, moyô é associado ao termo mon’yô com a mesma
acepção, porém moyô é o padrão “imitado”, ou seja, repetido de forma contínua, enquanto mon’yô traduz-se como padrão individual e espargido
assimetricamente, criando composições extensas sob uma determinada superfície. Mon’yô ■■ é mais amplamente aplicável, abrangendo desde
yûsoku-mon’yô77 ■■■■ (“padrão da aristocracia”) ao ungen-zaishiki78 ■■■■ (“tingimento matizado”). Os mon’yô ■■ variam de acordo com o período e a
região e desempenham um papel importante no auxílio de pesquisas sobre obras de arte japonesas79. Não obstante, mon’yô ■■ representa o padrão figurativo
das insígnias de família do Japão, que servira para identificar membros da mesma casa80. Embora homônimo, é grafado com o ideograma ■ (mon), cuja
significação exclusiva, define-se por “insígnia” ou “adorno emblemático”. Esse padrão constitui-se uma das espécies de mon’yô.

Os padrões visuais, que descrevem os kamon e seus esquemas gráficos, têm sido reproduzidos na indumentária, na decoração de interiores e nos objetos de
arte japoneses, desde o período Heian (794–1185). Contudo, o recorte temporal para tal investigação privilegiou o período Edo, visto que esses padrões foram
confeccionados, especialmente, nesse período, e quando aplicados aos quimonos e outros objetos — por meio de técnicas como, o bordado, o tingimento —,
criaram esquemas visuais, comuns ao imaginário japonês de Edo, os quais são reproduzidos até hoje.

A respeito dos motivos que compunham os padrões de insígnias, é importante ressaltar a necessidade da investigação sobre os kamon, em vista da grande
quantidade de aplicações desse tipo de padrão na indumentária japonesa. O processo de estilização das insígnias, mesmo quando delineava padrões abstratos
■ comumente encontrados no vestuário dos teatros kabuki e nô ■, ainda indicava essencialmente à representação da realidade ■ algo perfeitamente possível
para essas insígnias que possuem tantos significados, e que ainda são utilizadas em diversas situações. Os padrões abstratos de natureza figurativa podem ser
observados nos motivos que seguem um fluxo contínuo de repetição como, yama-gata ■■ (“formato de montanha”); seigaiha ■■■ (“ondas do mar azul”),
formado por semicírculos justapostos; matsukawa-bishi ■■■ (“losango de casca de pinheiro”); kagome ■■(“trama de fibra de bambu”), constituída por linhas
horizontais e diagonais; kanoko ■■■ (“mancha de veado”), que consiste em imitar-se a pele do veado, por meio de tingimento, amarando-se o tecido em
pequenas áreas; e kikkô ■■ (“carapaça de tartaruga”), disposta por hexágonos de linhas finas e espessas.
Da esquerda para a direita: yama-gata, seigaiha, matsukawa-bishi, kagome, kanoko, kikkô.

As insígnias, assim como os padrões decorativos, são formadas, em sua maioria, por desenhos de objetos, plantas e animais, e algumas são ajustadas para
que possam compor um círculo. Por exemplo, as insígnias denominadas ichô eda maru ■■■■ (“galho de ginkgo circular”), ine no maru ■■■(“círculo dos ramos
de trigo”) e ebi no maru ■■■ (“círculo do camarão”), consistem em arranjos, organizados e voltados em direção a um ponto central. Outros exemplos
importantes desse grupo são as insígnias maihôô ■■■ (“fênix que baila”) e tsuru no maru ■■■ (“círculo do grou japonês”). Segundo Andrian Frutiger81, as
imponentes imagens das aves com as asas arqueadas integram-se totalmente no formato de círculo, e as tornam sinais que adquirem uma expressão
sobrenatural.

Da esquerda para a direita: as insígnias ichô eda maru, ine no maru, ebi no maru, maihôô e tsuru no maru.

Os padrões circulares em questão foram bordados em cetim de seda, com a finalidade de servir como peça de figurino kitsuke82 ■■, utilizada em várias cenas
do teatro nô. Os padrões de insígnias circulares estão relacionados aos chirashi mon’yô ■■■■■ (“padrões espalhados”), que foram amplamente utilizados
como padrão de vestuário feminino no início do período Edo. Os chirashi mon’yô formam outra categoria importante de decoração têxtil. Embora os modelos
desse tipo sejam diferentes dos moyô, os chirashi mon’yô podem ser descritos como resultantes de um processo de ampliação de parte de um padrão repetido.
Os “padrões espalhados” foram reproduzidos extensamente no período Edo, mas já eram conhecidos nos períodos Nara (710–794) e Heian (794–1185), assim
como no Ocidente antigo.

Os padrões tradicionais do Japão configuram-se como “esquemas visuais” e, quando analisados a partir do conceito de schemata, proposto por Ernst Gombrich,
formam um extenso sistema de códigos visuais que guardam, em si, o potencial de significação da imagem. Esses esquemas revelam a visão aproximada
daquilo que se quer representar, como flores, árvores, aves, insetos, crustáceos, peixes e paisagens. Decorrentes disso, infindáveis são as combinações e as
sobreposições de figuras que compõem a miríade de padrões tradicionais no Japão.

A característica mais tipicamente japonesa de padrões figurativos é a representação da paisagem natural. Essa característica estava relacionada com a
produção pictórica, e indicava quão estreitamente os japoneses identificavam-se com a natureza. Padrões figurativos são caracterizados por terem mais
liberdade de composição do que os abstratos. Em geral, os padrões abstratos dão a impressão seriedade e solenidade à indumentária, adequados para o
figurino de nô, enquanto os padrões figurativos indicam mais delicadeza e elegância ■ tema ideal para as vestimentas femininas. Segundo Noma83, “os motivos
naturais não eram utilizados de forma indiscriminada. A preferência era dada aos que possuíam associações poéticas, em virtude de terem sido tratados na
poesia e na música ■ um exemplo do poder da tradição”.

Para Gombrich84, não há “percepção neutra”, isenta de categorias iniciais. A cada nova categorização de imagem conduz a esquemas preexistentes. Esses
esquemas compõem a schemata. Dessa maneira, sem algum esquema inicial ou ponto de partida, nunca poderíamos classificar nossas percepções.

Nessa perspectiva, Erwin Panofsky85 indica que o significado intrínseco ou conteúdo releva os modos de proceder primordiais de uma determinada nação, de
um período, classe social, filosofia. Esses princípios se manifestam, por meio dos “métodos de composição” ou da “significação iconográfica”. Com efeito, os
métodos iconográfico e iconológico, determinados por Panofsky, serão utilizados para o processo de descrição e classificação, bem como para a análise das
imagens, símbolos, alegorias e demais especificidades que compõem os motivos e os padrões tradicionais. Os elementos descritos no decorrer da pesquisa
serão arranjados de modo a facilitar a interpretação tanto das partes quanto do todo. Por conseguinte, o ato interpretativo e a análise do significado iconográfico
dos padrões tradicionais japoneses são relevantes para se compreender o cotidiano do período Edo.

O vestuário de palco do teatro kabuki é caracterizado pela opulência dos bordados, dos tecidos e por utilizarem-se técnicas de representação de padrões
tridimensionais e de grandes dimensões. Na composição cromática das vestimentas, adotavam-se sempre cores vívidas e brilhantes, para destacar os
movimentos do ator no momento da atuação86. Na tradição teatral de nô, o vestuário se reporta às técnicas e desenhos, utilizados na criação dos padrões, e ao
refinamento dos têxteis. Esse refinamento determina o caráter de yûgen ■■ (“charme sutil”), conceito estético influenciado pelos preceitos zen, que mescla o
sentimento de beleza sutil e enigmática aos pesares contidos nos infortúnios humanos.

Como referencial imagético e textual dos dentô mon’yô, é importante ressaltar os “livros de modelos de quimono” (hiinagata-bon ■■■■■■). Os hiinagata-bon87
consistiam em livros de moda ilustrados com modelos de kosode88 ■■ (“mangas pequenas”). Eram utilizados como mostruário para encomendar-se as
vestimentas, e apresentavam informações sobre tecidos, amostras de cores e padrões. As primeiras coleções de hiinagata-bon foram publicadas no período
Momoyama (1568–1603), em decorrência do aumento na demanda de roupas luxuosas. Os comerciantes de tecido compunham cada edição com coleções de
seus mais recentes modelos de kosode, e os clientes apresentavam as suas escolhas a partir desses modelos. No período Edo, esses livros indicavam o
julgamento e a percepção do que as pessoas apreciavam ao imaginar os acréscimos das vestes em seus guarda-roupas89. Várias coleções de institutos
japoneses de moda e de vestuário revelam exemplos de kosode, cujas aplicações dos padrões (geométricos, abstratos, pictóricos, figurativos e auspiciosos)
foram representadas inicialmente nos hiinagata-bon.

As publicações foram interrompidas no final do período Edo. Um dos mais antigos já encontrados, o Shinsen On-hinagata ■■■■■ (“Nova Coleção de Distintos
Modelos”), foi publicado em meados da década de 1660. Os hiinagata-bon foram produzidos por profissionais que atuavam com tecelagem e tingimento, como
Miyazaki Yûzen ■■■■ (?–1758) e Hishikawa Morofusa ■■■■ (ca.1685–1703), que também trabalhou na produção de ukiyo-e.

Os livros eram, predominantemente, impressões monocrômicas em preto, mas alguns receberiam retoques coloridos aplicados manualmente. Embora a maioria
dos hiinagata-bon apresentasse apenas representações de modelos de vestes, outros ilustravam mulheres trajando alguns dos modelos.

Nesse sentido, Ehon Asakayama90 ■■■■■ (“Livro-pintura do Monte Asaka”), de 1739, é um exemplo importante desse gênero de hiinagata91. Publicado por
Kikuya Kihê ■■■■■ de Kyôto, o livro foi produzido por Nishikawa Sukenobu ■■■■ (1671–1751), cuja trajetória artística foi marcada pela versatilidade dos
projetos com os quais se envolvera, como livros shunga, livros de moda, guias de viagem, além de centenas de livros-pintura.

De forma gradual, os padrões ilustrados nos livros hiinagata tornaram-se refinados e determinaram o senso estético japonês nos séculos XVII e XVIII. Essa
progressão reflete como a moda esteve em constante mudança no período Edo.

O kamon e a comunidade nipo-brasileira

Levando-se em conta o que foi mencionado, logo, podemos observar que a comunicação visual praticada no Japão, se apropria de elementos do imaginário do
arquipélago, inclusive por meio dos kamon, para representação gráfica de suas instituições. Os kamon, assim como outros símbolos, caracterizam-se pelo
ecletismo semântico que, de acordo com Laplantine e Trindade, aliam o caráter individualista e sentimental de indivíduos com a mesma formação cultural sobre
uma mesma figura sintética. Laplantine e Trindade ainda ressaltam que

o simbólico se faz presente em toda a vida social, na situação familiar, econômica, religiosa, política etc. Embora não esgotem todas as experiências sociais,
pois em muitos casos essas são regidas por signos, os símbolos mobilizam de maneira afetiva as ações humanas e legitimam essas ações.92

Nesse contexto, instituições nipo-brasileiras possuem certo padrão de comportamento e costumes de seus membros, que se baseiam em características
predominantemente japonesas. Embora não seja bem delimitado, esse padrão está relacionado aos valores culturais, filosóficos e sociais, e aos níveis de
interação da instituição com o ambiente externo, ou seja, o público não descendente.

Várias das instituições no Brasil relacionadas ao Japão estabelecem uma fusão de interesses sociais, culturais e econômicos entre os dois países. Essas
instituições podem até exercer seu trabalho no mercado brasileiro, mas o produto final precisa ser caracteristicamente japonês.

Desse modo, a modernidade, ou a pós-modernidade, debatida por Balandier93, leva os sujeitos a uma necessidade de se reconfigurarem, porém não consegue
afastar esses sujeitos de sua necessidade intrínseca de identidade, de contato com o tradicional. Nesse sentido, elementos intangíveis, como é o caso dos
kamon, também são importantes para a compreensão de determinado sistema cultural em determinada época, pois são elementos impregnados de sentido, que
representam uma vida, um sentimento, um tempo passado.

De acordo com esse pensamento, a influência da cultura japonesa na comunidade nipo-brasileira, faz do kamon um elemento de manifestação de suas
características ancestrais. Ao longo da história do Japão, os kamon foram assimilados como artefatos de ostentação e poder, contudo, neste novo contexto, as
insígnias tornam-se objetos comunicacionais de uso comum, capazes de representar a assinatura institucional da empresa ou estabelecimento, além de receber
outras formas de aplicação, mais simples e menos requintadas como outrora. Por isso, algumas instituições de famílias de ascendência japonesa no Estado de
São Paulo, assim como em outros Estados, num ato de ressignificação, se apropriam dos kamon para a sua representação cultural. Várias dessas associações
comerciais são encontradas no Bairro da Liberdade, na Cidade de São Paulo. Nessa região, podem ser vistas aplicações de kamon nas fachadas das lojas de
produtos e souvenirs japoneses, pequenos hotéis e restaurantes, como também nos portões de um templo budista, nos arredores da principal via do Bairro, a
Avenida Galvão Bueno.
Exemplos de kamon encontrados no Bairro da Liberdade:

1. maru ni ara eda-tsuki migiyori sankai matsu mon ■■■■■■■■■■■■■ (“insígnia de três andares de galhos brutos de pinheiro inclinados à direita e em
círculo”)

2. kai ume mon ■■■■ (“insígnia da fragrância de flor de ameixa”)

3. maru ni boke mon ■■■■■ (“insígnia do marmelo japonês em círculo”)

4. maru ni yottsu me bishi mon ■■■■■■■ (“insígnia dos quatro losangos em círculo”)

5. shichi-go kiri mon ■■■■ (“insígnia da paulonia cinco-sete”)

6. itsutsu yoko sasa rindô mon ■■■■■■■ (“insígnia das cinco hastes de folha de bambu e genciana azul”)

Marco Souza comenta que “[...] no processo de urbanização-metropolitização da cidade de São Paulo, toda a formação histórica, social e cultural do espaço do
Bairro Oriental é resultado de uma série de circunstâncias e de modificações”94. Os aspectos econômicos e culturais do Bairro revelam os pormenores da
população de imigrantes japoneses que dele se apropriou, tornando-o um espaço integrante na cidade de São Paulo, organizado por um determinado grupo de
indivíduos que compartilham, costumes, histórias e visualidades em comum. Compreender o Bairro Oriental paulistano é estabelecer conveniente diferença
entre os “signos-vestígios” deixados pelos “habitantes-usuários” do Bairro que criaram um vínculo com o processo de imigração por meio dos costumes diários,
da linguagem, da forma de comercialização, marcadas por ações em torno dos seus significados e por formas de apropriação95.

Ao fazer uma análise dos usos desses símbolos pela sociedade nipo-brasileira, buscam-se, nesse contexto, registros de aplicações das insígnias e de seu
processo histórico, vindas do Japão ao Brasil. Embora esses registros ainda sejam principiantes em nosso país, foi possível colher, até o momento, indicações
de que os kamon são objetos carregados de sentido, que representam o cotidiano, o sentimento de pertencimento desses indivíduos, conferindo-os
singularidade. De fato, os imigrantes japoneses e seus descendentes, compartilham conosco, esse processo de projeções sobre sua memória familiar, e nos
permitem compreender como a tradição se incumbiu de perpetuar os valores e as características ancestrais para as atuais gerações.

Exemplos de kamon encontrados no Brasil:


1. umebachi mon ■■■ (“insígnia da coroa de flor de ameixa”)

2. myôga mon ■■■ (“insígnia do gengibre japonês”)

3. chigai hishi mon ■■■ (“insígnia dos losangos entrelaçados”)

4. maru uni chigai taka-wa mon ■■■■■■ (“insígnia das asas de falcão invertidas em círculo”)

5. hidari mittsu domoe mon ■■■■■ (“insígnia das três grandes vírgulas em sentido horário”)

REFERÊNCIAS

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1 XX Encontro Nacional de Professores Universitários de Língua, Literatura e Cultura Japonesa e VII Congresso Internacional de Estudos Japoneses no Brasil.

2 BURKE,2003:14

3 SAITO, 1998; KUDO, 2001; ITO, 2003.

4 BARRAL, 2000; KINSELLA, 1995; KERR, 2001; BRINTON, 2011.

5 KATZ, 2004; GREINER, 2005.

6 O projeto “O universo Otaku e Hikikomori: novas formas de comunicação no Japão contemporâneo” conta com o apoio financeiro da FAPESP, contemplado
com a Bolsa no País/Regular/Pós-Doutorado e está vinculado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP.

7 Para Azuma Hiroki (2001), a cultura otaku espelha as transformações da sociedade japonesa do pós-guerra, o que motivou o consumo, sacrificando a busca
por um maior significado na vida, comparado à gratificação instantânea e quase animalesca.

8 História em quadrinhos; palavra surgida pela junção do ideograma “man” (humor) e “gá” (desenho).

9 Animação (forma contraída da palavra animation em inglês).

10 Tsutomu Miyazaki, um otaku de 27 anos.


11 Termo comum no Japão para designar as provocações e maus tratos que ocorrem nas escolas.

12 SINGER,1997:62.

13 BARRAL, 2000; BREHM, 2002.

14 SATO, 2007:21.

15 Para o psicólogo Saito Tamaki, grande parte da população adolescente masculina estaria vivendo em situação de total reclusão, porém, devido ao
comportamento isolacionista e a camuflagem existente nos nichos familiares, o número oficial de hikikomoris não pode ser medido com exatidão.

16 Revista Veja, Editora Abril, ed.2034. 14/11/2007. Ano 40, no. 45. P.131-134.

17 Revista Veja, Editora Abril, ed.2034. 14/11/2007. Ano 40, no. 45. P.131-134.

18 BAUMAN, Zygmunt. A sociedade individualizada: vidas contadas e histórias vividas; traduzido por José Gradel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2008.
p.8

19 SODRÉ 2002; Hauser 1997; Martin-Barbero 2003.

20 Damásio 1999 e outros.

21 KATZ, 2004

22 Tema da minha tese de Doutorado: Ação e Percepção nos processos comunicacionais do corpo em formação, defendida em 2007 pelo Programa de Estudos
Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP e publicada pela Editora Hedra de São Paulo, em 2010.

23 SODRÉ, 2006:235.

24 Op.cit.

25 BAUMAN, 2004:12

26 GIDDENS & HUTTON, 2004:7.

27 CASTELLS, 2010: XII

28 BAUMAN,2004:13

29 GREINER, 2008

30 Grupo de meninas cuja característica é reforçada pela representação de sedução das colegiais japonesas.

31 Grupo de meninas estudantes que descolorem os cabelos, fazem uso de bronzeamento artificial, pintam ao redor dos olhos de branco e “propõem um visual
que é o negativo de si mesmas” (GREINER, 2008:149).

32 UENO, Chizuko, 2005:247

33 Entrevista ao The Japan Times on-line: http://www.japantimes.co.jp/text/fl20060305x1.html entrevistada por Eric Prideaux, em 05 de Março de 2006.

34 Apud. UENO, 2005.

35 A discriminação contra as mulheres vem de longa data, basta lembrar que a criação de um alfabeto simplificado (hiragana), uma das formas de escrita
japonesa ocorreu em função das mulheres que eram consideradas inaptas intelectualmente para o aprendizado dos ideogramas, tidos como muito complexos.

36 Ueno, Shizuko, 2005:249.

37 Reportagem: Tradição é obstáculo para carreira das trabalhadoras japonesas. Martin Fackler, em Tokyo - The New York Times - 07/08/2007 ( traduzido por
UOL Notícias).

38 Sharon Kinsella é professora de cultura visual japonesa na University of Manchester.

39 Editora do livro The Japanese Experience Inevitable, In the Floating World: Slash with a Knife, 1999.

40 SATO, Cristiane: www.culturajaponesa.com.br

41 Op.cit.

42 BREHM, Margrit, 2002:08

43 BREHM, 2002:12

44 Revista E-Compós: http://www.compos.com.br/e-compos


45 STERLING,1990, Apud: AMARAL, Adriana. 2006.

46 Como Ghost in the Shell 1 e 2, Geno Cyber, Cyberweapon, Cyber City Oedo, Akira, Aeon Flux, Robotech, Tetsuo e outros

47 Livro de William Gibson, considerado o romance que deu origem ao gênero cyberpunk.

48 Revista Wired é uma revista mensal publicada nos Estados Unidos, trabalhando temas ligados à tecnologia e sua influencia à sociedade, cultura, economia e
política.

49 Nicole Mowbray (04/04/2004) “Japanese girls choose whiter shade of pale | World news | The Observer”. London: The Guardian.
http://www.guardian.co.uk/world/2004/apr/04/japan.nicolemowbray.

50 Existem algumas diferenças entre Yamanbas e Manba. As Yamanba fazem uso da maquiagem branca apenas acima dos olhos e as Manbas maquiam
abaixo dos olhos.

51 Light Novel são romances elaborados em estilo manga-anime, direcionados para o público jovem. No início as publicações podem ocorrer em formato de
folhetim para depois seguir para os jornais, revistas, livros e, atualmente estão na Internet e até mesmo nos celulares.

52 Ver em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Sayonara,_Zetsubou_sensei - acessado em 20/02/2012.

53 http://www.paulgravett.com/index.php/articles/article/manga_at_the_royal_academy/.

54 SAITO, 2009:221 - Anais do XX Encontro Nacional de Professores Universitários de Língua, Literatura e Cultura Japonesa e VII Congresso Internacional de
Estudos Japoneses no Brasil – Para além do Japão: Brasil, Canadá e França.

55 Konbine são as lojas de conveniência, facilmente encontradas em toda a parte das grandes cidades japonesas.

56 Entende-se que os Estudos Culturais se configuram enquanto um campo onde há a ocorrência de intersecção de diversas disciplinas para a realização de
estudos sobre determinados aspectos culturais da sociedade contemporânea. Para compreender tal campo, ver Escoteguy (2012).

57 As sociedades modernas ocidentais (especialmente na fase de consolidação do capitalismo liberal), regida pela razão instrumental, caminharam para um
processo de crescente racionalização de suas ações e de suas estruturas social, política e econômica conforme Weber (2002a; 2002b; 2004). Apesar de a
modernidade, especialmente no século XIX, ser conhecida como um período de desencantamento do mundo que distanciava o sujeito do sagrado, isto não
significou a eliminação da religião. Ao contrário, a religião se fortalece enquanto via de salvação, mas perde a centralidade na vida social. Para ver sobre o
desenvolvimento do conceito de desencantamento do mundo na teoria weberiana, ver Pierucci (2003). Sobre a influência da religião no mundo moderno e nas
concepções sobre o corpo, ver Corbin (2009).

58 “O conceito de natureza, ou physis, era compreendido pelos antigos gregos, especialmente na formulação aristotélica, como aquilo que tem o princípio de
movimento em si mesmo, um principio imanente e que atua para um fim (telos), que não é outro senão a própria natureza” (SILVA, 2005, p. 28).

59 Os estudos anatômicos se basearam na experimentação com o corpo morto, tendo como principal método a dissecação. Kuriyama considera que este
método não foi o interesse principal dos médicos chineses, o que levaria a seu baixo grau de desenvolvimento.

60 No caso, a meditação assumia a principal forma. Em algumas escolas como a S■t■, a principal via era a chamada meditação sentada (zazen). Por esta
postura, a pessoa acaba por encarar a sua própria natureza de Buda e entrar no domínio da liberdade (YUSA, 2002).

61 HOLLIS, 2001, p. 225.

62 No presente artigo, respeitei o uso já convencionado do artigo definido masculino para termos de origem japonesa, a saber, “o mangá”, “o animê”, “o kimono”,
“o biombo”. Além disso, o termo kamon, quando precedido do artigo “o”, corresponde ao sentido de “emblema familiar”.

63 Outros termos que se referem à essas insígnias são: mondokoro ■■ (“insígnia do lugar”), monshô ■■ (“composição em formato de insígnia”) ou
simplesmente mon ■ (“emblema”; “insígnia”). Monshô também é utilizado como termo correspondente para “brasão de armas” em japonês, porém geralmente
está relacionado à simbologia de corporações, governos e outras entidades coletivas.

64 Em alguns casos, optarei pela livre-tradução para privilegiar o sentido dos títulos atribuídos às insígnias (kamon) e aos padrões visuais (mon’yô). Contudo,
essas traduções receberão notas de rodapé com informações complementares.

65 Ave da subfamília das Charadriidae.

66 As glicínias chinesas (wisteria sinensis), também conhecidas como “lilases”, pertencem ao gênero wisteria, e é uma planta trepadeira com flores em tons lilás
e azul, com formato de cachos pendentes.

67 Unpan ■■ (“chapa em formato de nuvem”), também conhecida como chôban ■■ (“chapa para bater”) ou shôban ■■ (“chapa de ressoar”), é uma espécie de
chapa circular de metal, suspensa verticalmente, utilizada como gongo em templos zen budistas para anunciar quem acabara de chegar.

68 Sen, moeda que corresponde a um centésimo de iene. Esse formato de moeda começou a ser cunhado no Período Edo, com um padrão em forma de ondas
(seigaiha) em seu reverso.

69 Yamauchi-ke ■■■ (“a família Yamauchi”), que líderava o clã Tosa, possuía grande prestígio na região de Shikoku, onde Iwasaki Yatarô havia nascido.

70 LARAIA, 2002, pp. 59-60.


71 Fictive kinship é um termo usado por antropólogos e etnógrafos para distinguir as formas de parentesco que não se baseiam em laços consanguíneos ou
conjugais.

72 FRUTIGER, 1999. p. 288.

73 WICHMANN, 1981, p. 294.

74 HOUAISS, 2009, p. 2102

75 Op. cit. p. 1323

76 In O FLORESCER das cores: a arte do Período Edo. Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2008. p. 19

77 Padrões de tecelagem utilizados por membros da nobreza, desde o período Heian (794–1185), compostos, predominantemente, de motivos repetidos e
geométricos.

78 Método de tingimento utilizado, originalmente, na pintura e nas artes decorativas para dar a sensação de tridimensionalidade ao objeto. O resultado da
composição são faixas contendo padrões de cores vibrantes.

79 In: A Dictionary of Japanese art terms. [s.l]: Tôkyô Bijutsu, 1990.

80 No Japão, as famílias são constituídas pelo Ie ■ (“casa”; “clã”). Esses clãs são grupos que envolvem não apenas os membros vivos, mas também os
ancestrais e, igualmente, os descendentes que ainda não nasceram. Ie foi o termo utilizado pela legislação japonesa para a constituição das unidades familiares
até o final da Segunda Guerra Mundial.

81 FRUTIGER, 1999, p. 209

82 Tipo de sobretudo que se veste sobre outras peças de quimono.

83 NOMA, 1983, p. 167

84 GOMBRICH, 1995, pp. 99-111

85 PANOFSKY, 1991, pp. 52-58

86 Op. cit. p.136

87 Algumas das fontes pesquisadas registram também a grafia hinagata-bon ■■■■■ ou apenas hinagata ■■ (“modelo em miniatura”).

88 Veste de mangas curtas, confeccionada de seda, com cortes planos e longos, formando uma superfície totalmente plana, principalmente, na região das
costas. Kosode compreende o espaço ideal para a representação dos mais variados padrões. É considerado o precursor do quimono moderno. In O
FLORESCER das cores: a arte do Período Edo. Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2008. p. 21

89 “Foldout 1: Kimono Design Books” In NOMA, 1983.

90 É indicado no livro Kosode to Nô-ishô ■■■■■■ (“kosode e vestuário de nô”), de Noma Seiroku ■■■■ (1902–1966), cujo título em inglês é Japanese
costume and textile arts ■ incluso na bibliografia. Dentre as instituições pesquisadas até então, três possuem exemplares de Ehon Asakayama: o Museu
Britânico, o Spencer Museum of Art, da Universidade de Kansas e o Museu de Belas Artes de Boston.

91 Outra tradução para o termo é “forma de boneca”, pois indicavam as bonecas feitas de papel que serviam de modelo para difundir os projetos de kosode.

92 LAPLANTINE; TRINDADE, 2003, p. 21

93 BALANDIER, 1999.

94 SOUZA, 2008, p. 5

95 Op. cit. p. 8

96 Os empréstimos antigos do Mandarim não são considerados empréstimo, mas os recentes como R■men (sopa de talharim chinês) o são, e também é
utilizada a escrita específica do empréstimo.

97 Carta de Cosme de Torres, um padre jesuíta português, para seus superiores em Roma, relatando sobre o país ainda agora descoberto, o Japão. Os
portugueses chegaram ao Japão por volta de 1543 e foram os primeiros povos europeus a conhecer os japoneses.

98 Aqui trata-se da concepção de Língua/Fala (Langue/Parole) de Ferdinand de Saussure.

99 O Japonês hoje é falado por mais de 126.5 milhões de pessoas no Japão. As principais áreas onde é falado fora do Japão, seguindo os períodos anteriores
da diáspora do japonês, são a costa oeste da América do Norte, do Havaí e da América do Sul. Apesar de muitas pessoas descendentes de japoneses morarem
nessas áreas não falam mais sua língua de herança.

100 O Altaico é um grupo genético proposto que inclui minimamente o Turco, o Tungusico e as famílias mongólicas, talvez também o Coreano e o Japonês. (...)
Os outros dois potenciais membros da família altaica são o Coreano e o Japonês. Coreano (SOHN 1999) é uma língua única. O Japonês (SHIBATANI 1990) é
estritamente falando uma pequena família, incluindo não apenas o Japonês, mas também as Línguas Ry■ky■, que não são mutuamente inteligíveis com o
Japonês ou entre elas; a família é às vezes chamada Japonês – Ry■ky■.

101 Esta tabela tem como base o “Esquema de sons” do Livro Nihongo Hatsuon (), p. 5.

102 O traço em cima da vogal A indica o alongamento da vogal. Quando escrito no Kana Hiragana a vogal é escrita duas vezes, exceção feita à vogal O, que,
quando dobrada, recebe a vogal U. No Kana Katakana o alongamento é indicado por um “travessão” após a vogal que tem que ser dobrada.

103 O Japonês é uma língua de final verbal. A ordem de palavras na sentença é relativamente livre, desde que as sentenças terminam com o verbo principal.

104 Kuno (1978) nomeia as “Partículas de Caso” como “Postpositional Particles” (Partículas Posposicionais).

105 Classificados assim no ensino de Língua Japonesa para estrangeiros, quando estudada no Japão não há esta divisão.

106 Estes 3 (três) verbos estão na forma de dicionário (Jisho kei ).

107 As nomenclaturas Forma Polida e Forma Comum são traduções literais das nomenclaturas japonesas Teineikei e Futs■kei, respectivamente.

108 O verbo benky■ shinakereba narimasen não tem esta separação no momento da escrita e da fala. Aqui está separado para um melhor entendimento do
leitor.

109 Dos mais de 3000 Kanji que um japonês adulto pode empregar em sua vida diária, 1945 são de estudo obrigatórios ao longo do sistema educativo. Esta
lista é conhecida como Kanji de uso comum (■■■■■ J■y■ Kanji). A esta lista soma-se outra, que compreende os Kanji que podem ser utilizados para nomes e
sobrenomes (■■■■■ Jinmeiyou Kanji). Existem ainda Kanji que não pertencendo à lista oficial, são menos usados na vida diária.

110 Os exemplos desta tabela apresentam somente uma leitura do Kanji. Vale lembrar que a maioria dos exemplos tem mais de uma leitura além das aqui
citadas.

111 A transliteração do japonês em alfabeto latino ado(p)tada por Hepburn (1815 - 1911). (Definição retirada de Coelho & Hida (1999), o Dicionário Universal
Japonês – Português).

112 A Língua Shanenawa é uma Língua Indígena, falada por cerca de 400 pessoas em três aldeias na região da Amazônia.

113 A Língua Katukina é uma língua falada no Estado do Acre por mais ou menos 300 pessoas.

114 Sempre que citar sílaba, vogal ou letra, também estarei me referindo como som. Na minha concepção de kana, a sílaba, vogal ou letra corresponde sempre
a um som.

115 A epêntese é a adição de uma vogal ou consoante. No caso da Língua Japonesa, nos empréstimos, acrescenta-se uma vogal epentética após uma
consoante para adaptar a palavra ao padrão silábico da Língua Japonesa, que é CV.

116 A vogal dobrada ocorre somente na escrita, porque no momento da pronúncia o som é longo e não dobrado, ou seja, não se pronunciam duas vogais e sim
uma vogal longa.

117 Na Língua Japonesa diferencia-se o arroz cozido (Gohan ■■■) do arroz cru (Kome ■■).

118 Luta que possui um ringue circular, onde dois lutadores se enfrentam com o objetivo de derrubar ou empurar o adversário para fora do ringue. Esporte
tradicional no Japão ele ainda conserva rituais xintoístas.

119 Arte Suave, Ju-Justu é conhecido como Jiu-Jitsu, nesta arte não se utiliza armas, portanto, dizemos que é uma arte de mãos livres ou sem armas (DUNK,
2009)

120 Literalmente ,“Técnica da espada” utilizada pela classe dos samurais.

121 Escola de esgrima frequentada por Ueshiba.

122 Aikikai Foundation, também conhecido como Hombu Dojo.

123 Sede mundial do Aikido, localizada em Tóquio, ela coordena as regras do estilo, além de monitorar as sedes espalhadas pelo mundo.

124 Há um Guia do Iniciante disponibilizado pela União Sul-Americana de Aikido – Shihan Kawai. Academia Central (SP). Disponível em
<http://www.aikidokawai.com.br/pt/guia-do-iniciante.html> Acesso em: 9 fev. 2012.

125 Samurai que se tornou monge e teve suas memórias registradas por um discípulo em 1716, compilação que ganhou o nome de Hagakure e hoje é
considerado o primeiro relato do bushidô (conduta ética dos samurais).

126 Esgrima japonesa, descendendo do kenjutsu. Teve sua sistematização após a Segunda Guerra Mundial, tornando-se parte do currículo escolar japonês.
(LOURENÇÃO, 2009)

127 Tiro com arco e flecha, literalmente “O caminho do arco”.

GAIRAIGO

■■■
Roberta Akemi Yamada

Arakida Moritake (1473–1549)

Tobi ume ya

Karogaroshiku mo

Kami no Haru

Voa o papel
Junto às flores de ameixeira

Primavera dos deuses.

Ao vislumbrar uma ameixeira no santuário de Ise ( ), Moritake (■■■■), ele mesmo sacerdote xintoísta, teria se lembrado da curiosa lenda da Tobi Ume
(■■■■) “Ameixeira Voadora”. Sugawara no Michizane (■■■■■■■■■) (845–903), intelectual e político, foi desterrado por causa de falsas acusações. Havia,
no jardim de sua casa, uma ameixeira que ele muito amava e à qual dedicou um poema de despedida: “Ao soprar o vento leste,/ Exalem seu perfume,/ Oh,
flores da ameixeira!/ Mesmo longe de seu mestre,/ Não se esqueçam da primavera.” Diz a lenda que a ameixeira voou de Ky■to (■■■■) até Dazaifu (
), atual Fukuoka ( ) para reencontrar seu dono. No Haiku (■■■) de Moritake, a expressão Kami no Haru ( ) “primavera
dos deuses” denota o início da estação em um santuário xintoísta. Também há o recurso ao trocadilho, no qual a palavra Kami ( ) pode ser lida como

“Deus” ( ) ou “Papel” ( ). Assim, a imagem da ameixeira que voa conduz à ideia da leveza (Karogaroshiku ( ) das folhas de papel (Kami

) que o vento traz junto com as flores, ou à leveza da própria primavera que chega ao santuário por obra dos deuses. O Haiku sustenta-se por este
trocadilho, servindo como um modelo das técnicas da época.

Introdução

O Gairaigo é o empréstimo linguístico, ou seja, são palavras que compõem a Língua Japonesa, mas que possuem origem estrangeira, sem ligação com o

Mandarim96 (Língua Chinesa Ch■gokugo - a língua do país de dentro, literalmente). Os ideogramas da palavra Gairaigo já expressam o seu

significado: Gairaigo ( )= = Gai/Soto = Fora + = raí/kuru = Vir + = Go = Palavra, ou seja, palavra que vem de fora. Trata-se de um conjunto
de palavras emprestadas ou substituídas de outros idiomas e que tem grande influência na Língua Japonesa falada hoje. Os empréstimos linguísticos existem
em todas as línguas do mundo, porque, quando há o contato cultural e o contato entre falantes, há também o contato linguístico, com isso as línguas vão
emprestando, tomando emprestado, e todos temos um pouco das línguas dos “outros”. Aqui no Brasil, grande parte de nossas palavras é de outra origem. Com
a Língua Japonesa não é diferente. Os empréstimos são muitos e de diversas línguas. Este trabalho irá se preocupar somente com este modo de adquirir o
léxico, não tendo por objetivo tratar os chamados neologismos (cf. CARVALHO, 1989).

O que me despertou a atenção para este tema foram os trabalhos que realizei sobre a Língua Japonesa em meu Curso de Letras na UFG e a grande
quantidade de palavras de origem estrangeira encontradas nos materiais didáticos, sempre comentados pelos aprendizes, que ficam surpresos com a mudança
sonora que as palavras sofrem ao serem adaptadas à Língua Japonesa. O Gairaigo também tem uma particularidade muito interessante, que até hoje só
encontrei na Língua Japonesa, que é a escrita diferenciada, ou seja, na Língua Japonesa há um silabário praticamente exclusivo para escrever estes
empréstimos. Para a identificação dos dados para este estudo, utilizei o Vocabulário e Palavras e Informações de Referência, dos livros Minna no Nihongo I e II,
estes livros foram elaborados no Japão para o ensino de Língua Japonesa voltada aos estrangeiros. Cada livro é composto de 25 lições.

O trabalho não tem como objetivo abordar somente os empréstimos linguísticos da Língua Japonesa. Tenho o objetivo não só de mostrar como é ou o que é o
Gairaigo, mas também mostrar alguns aspectos fonológicos e morfossintáticos da Língua Japonesa para que todos possam entender oGairaigo e a Língua
Japonesa. Espero que ao final deste trabalho haja um interesse maior na descoberta desta língua tão intrigante, e tão distante da Língua Portuguesa, mas tão
fascinante aos meus olhos exatamente por este motivo.

O trabalho foi dividido em 3 momentos, além da Introdução, das Considerações Finais e da Bibliografia. No primeiro capítulo apresento informações sobre o
Japão e a Língua Japonesa, tentando de uma maneira rápida explicar aspectos da geografia e da Língua Japonesa para que, mesmo sem nenhum
conhecimento mais aprofundado, o leitor possa compreender um pouco a Língua Japonesa, especialmente o Gairaigo.

Tenho também como objetivo apontar algumas diferenças entre as Línguas Portuguesa e Japonesa, não sendo minha intenção julgá-las nem compará-las.
Somente apresento essas diferenças porque a Língua Portuguesa é a “Nossa Língua” e com isso há uma compreensão melhor da Língua Japonesa. Tanto a
Língua Japonesa como a Língua Portuguesa tem sua própria lógica interna, sua forma de se estruturar, e não posso julgá-las nem compará-las, porque toda
língua no mundo, apesar das semelhanças e famílias em comum, são sempre Únicas, por isto injulgáveis e incomparáveis. Não me atentei a todos os aspectos
da Língua Japonesa, por não ser o meu objetivo aqui fazer uma descrição total da língua.
No segundo capítulo apresento uma revisão bibliográfica sobre o empréstimo, expondo um pouco das teorias de aquisição do empréstimo, com base em
diversos autores que pesquisam empréstimos em diferentes línguas.

O terceiro capítulo detém-se exclusivamente no Gairaigo, inicialmente relatando os principais momentos de introdução do Gairaigo na Língua Japonesa. Após
esse relato, explico como os empréstimos são adaptados à Língua Japonesa, baseando-me na classificação de Schane (1975) e Istre (1983). Em um terceiro
momento falo dos tipos de empréstimo da Língua Japonesa, com base em Grosjean (1982) e Romaine (1995) (apud BORGES, 1998). E ao final discuto os
empréstimos necessários e desnecessários, fundamentando-me em Haugen (apud BORGES, 1998).

A Língua Japonesa é uma língua que me encanta em todas as suas particularidades, desde a língua às características culturais. Meu estudo não é algo
somente acadêmico, mas um estudo da minha própria etnicidade, ou seja, uma forma de conhecer mais sobre a língua e a cultura dos meus ancestrais.

O Japão e a Língua Japonesa

Neste capítulo farei considerações acerca do Japão, relatando um pouco de seu povo, com a intenção de colaborar para um melhor entendimento da Língua
Japonesa, porque o estudo de uma língua está intimamente ligado ao estudo de sua cultura, ao lugar de onde ela veio, e à sua história. Farei considerações
especiais sobre a Língua Japonesa, por este ser o aspecto de maior relevância para a compreensão deste trabalho.

O Japão

São discretos quanto se pode cuidar: governãose pela razão tanto ou mais que os espanhóis. São curiosos de saber mais que quantas gentes eu tenho
conhecido... Em todo o descoberto não há homens da sua maneira: tem mui linda conversação que parece que todos elles se criaram em paços de grande
senhores. Os comprimentos que têm hus com os outros he impossível poderse descrever... Se ouvera de escrever todas as boas partes que ha nelles, antes
faltaria tinta e papel que a matéria97. (COSME DE TORRES, apud BOSSONG, 2003, p.214, 215).

Como já explicitei acima, a Língua Japonesa está diretamente ligada à cultura de seu povo e à sua história, como ocorre com todas as outras línguas do mundo.
Falar de língua é falar de modo de vida, costumes, geografia, história, ou seja, falar de língua vai muito além da Langue98, do sistema. Como afirma Mello
(1999, p. 23):

Uma língua não é apenas um sistema de sons, um conjunto de unidades significativas dispostas em uma cadeia morfossintática. É muito mais do que um
instrumento de comunicação. Uma língua é um comportamento social e como tal está intrinsecamente ligada à vida, à cultura e à história de um povo. São os
falares, os modos de ser, os valores, as crenças que fazem com que os povos sejam diferentes ou semelhantes, porém singulares. Não há sequer dois grupos
sociais idênticos em todos os seus aspectos, inclusive o linguístico.

O Japão é um arquipélago que os japoneses denominam Nihon ou Nippon ( ). Seus ideogramas representam respectivamente Sol e Origem, por isso a
denominação Terra do Sol Nascente. Localizado ao extremo da Ásia, com uma área de 377.815 Km², que é 23 vezes menor que o Brasil, corresponde a um
território menor que o Estado do Mato Grosso do Sul. No Japão a população contabiliza mais de 120.000.000,00 (120 milhões) de pessoas. O arquipélago
japonês é formado por 4 (quatro) ilhas principais que correspondem a 97% de todo o território japonês, e outras 3.400 menores. Por isso o litoral é bastante
extenso, propiciando a pesca e o alto consumo de peixes e frutos de mar pela população japonesa. Como afirma Sakurai (2007, p. 26):

Os japoneses tiram vantagem do litoral inteiramente recortado em que vivem. A pesca é abundante, principalmente no mar do Japão. Por séculos, os japoneses
extraem do mar a base para a sua alimentação. A dieta japonesa inclui invariavelmente algum produto marinho em cada refeição desde o café-da-manhã, seja
peixe, algum fruto do mar ou os mais variados tipos de alga, ou todos ao mesmo tempo.

O povo japonês se denomina Nihonjin ( ), que significa ‘pessoa do Japão’. O Japão causa sempre certo mistério e muitas vezes criam-se paradigmas
sobre eles (Nihon e Nihonjin) que às vezes não são verdadeiros. Como explicou Sakurai (2007), cria-se um Japão Pop ao redor do verdadeiro Japão que existe.
Hoje não sabemos muito sobre a verdadeira realidade do Japão. Não digo que tudo que se sabe não é verdadeiro, mas há muitos mitos, como afirma Sakurai
(2007, p. 353): “Na verdade é um ‘Oriente tipo exportação’, um Japão que se assemelha muito ao do tempo das gueixas dos filmes de Hollywood (...). É um
Japão superficial. Mais imaginado e fantasiado que captado em sua complexidade”.

O Japão modernizou-se, transformou-se e ao mesmo tempo manteve um pouco do antigo e do tradicional em sua vida. Já se tornou um cliclê dizer que o Japão
é um misto de antigo e moderno, mas é o que pode se dizer do Japão hoje. Neste ambiente antigo e moderno surge o Gairaigo para traduzir o moderno e o
novo, mas nunca deixando de lado o velho, a cultura milenar. Talvez a cultura tão antiga e forte possa ser a explicação dos japoneses utilizarem uma escrita
diferente para a grafia de suas palavras estrangeiras, mas sobre isto falarei mais à frente, no tópico 1.3.

A Língua Japonesa

A Língua Japonesa tem duas denominações: Nihongo (Língua do Japão), quando estudada como língua estrangeira, e Kokugo (Língua Pátria),
quando estudada como língua materna. O número de falantes da Língua Japonesa no Japão é de aproximadamente 126,5 milhões de pessoas. Há falantes
também em colônias japonesas fora do Japão, como no Havaí e nas Américas. Como afirma Gottlieb (2005, p.6):

Japanese today is spoken by most of the 126.5 million people in Japan. The main areas where it is spoken outside Japan, following earlier periods of limited
Japanese diaspora, are the west coast of North America, Hawaii and South America, although many people of Japanese descent living in those areas no longer
speak their heritage language.99

A Língua Japonesa é uma das línguas mais faladas no mundo pelo número de falantes, e uma das línguas estrangeiras mais estudadas no mundo (FUJISAWA,
1992). O início deste interesse para o estudo dessa língua deu-se em meados dos anos 80, no período do Boom da economia japonesa, como afirma Gottlieb
(2005). Os estudantes optavam pela Língua Japonesa visando trabalhar no Japão ou para ter negócios com esta nova super potência.

Em relação à classificação linguística, há várias definições. Fujisawa (1992, p. 556) afirma que a Língua Japonesa tem uma família separada de todas as outras
famílias linguísticas.
A origem da língua japonesa é até hoje desconhecida. Sabe-se que apresenta traços de parentesco com a língua coreana, mas sem constituir com esta uma
única família. Assim ela forma, com o ry■ky■ (língua nativa da atual província de Okinawa), uma família denominada “japonesa’’, independente das
ramificações das árvores genealógicas de línguas naturais.

Já para Aronoff & Miller (2002) a Língua Japonesa é classificada como língua altaica, como demonstram em seu livro (2002, p.23):

Altaic is a proposed genetic grouping that would include minimally the Turkic, Tungusic, and Mongolic families, perhaps also Korean and Japanese. (...) The other
two potential members of the Altaic family are Korean and Japanese. Korean (Sohn 1999) is a single language. Japanese (Shibatani 1990) is strictly speaking a
small family, including not only Japanese but also the Ryukyuan languages, which are not mutually intelligible with Japanese or with each other; the family is
sometimes called Japanese-Ryukyuan.100

Na família altaica incluem – se mais ou menos 60 línguas, não sendo uma família totalmente homogênea por não haver muitas características que as agrupam.
Algumas das características comuns às línguas altaicas são a ausência de gênero, rotacismo (pouca diferenciação entre “L” [l] e “R” [4]) e morfologia
aglutinante. Essas características estão presentes na Língua Japonesa.

Aspectos Fonológicos e Morfossintáticos da Língua Japonesa

Os sons da Língua Japonesa assemelham-se com alguns da Língua Portuguesa, mas há uma quantidade maior de sons nesta última. Na Língua Japonesa há
sons que não existem na Língua Portuguesa, como é o caso dos contoides [ts], [N], [dz], [F], [ ], [ j], e do vocoide [M]. Outra diferença em relação aos
vocóides é que na Língua Japonesa não há vogais nasais correspondentes às orais como há na Língua Portuguesa.

Abaixo mostrarei a tabela101 com os sons da Língua.

[a] vogal baixa central não arredondada


[i] vogal alta anterior não arredondada
Vogais [M] vogal alta posterior não arredondada
[e] vogal média fechada anterior não arredondada
[o] vogal média fechada posterior arredondada
Sons Oclusivos [p], [t], [k], [b], [d], [g]
Sons Fricativos [s], [■], [ç], [h], [F], [z], [■]
Sons Africados [ts], [t■], [dz], [d■]
Consoantes
Sons Nasais [m], [■], [n], [■], [■]
Sons Vibrantes [ ]
“Glides” Semivogais [j], [w]

Na Língua Japonesa há vogais longas (Ch■on ), que devem ser bem observadas, porque muitas vezes o alongamento da vogal pode mudar muito o
significado das palavras, por exemplo:

1. Ob■san102 ■■■■■ (avó) e Obasan ■■■■ (tia)

2. K■k■ ■■■■ (escola colegial) e Koko ■■ (aqui)

Há também a oclusão chamada de Sokuon , uma pequena pausa após a pronúncia da última sílaba. Ela é representada pelo Kana Tsu (■/■), escrito em
tamanho menor, como em Zashi ■■■ (revista) e Petto ■■■ (animal de estimação).

A estrutura da Língua é silábica, formada por sílabas V (vogal), CV (consoante + vogal) e CSvV (consoante + semivogal + vogal), como mostram Fromkin &
Rodman (1993, p. 163):

O japonês é a única das línguas principais a usar um sistema silábico. Todas as palavras da Língua Japonesa podem ser fonologicamente representadas por
cerca de 100 sílabas diferentes, pertencendo a maior parte delas ao tipo consoante-vogal (CV). Para escrever essas sílabas os japoneses têm dois silabários,
cada um com cerca de 45 “letras de sílaba” e vários diacríticos(...)

Na classificação morfológica a Língua Japonesa é considerada aglutinante (sintética), ou seja, é uma língua em que os vocábulos compõem-se tipicamente em
uma sequência de morfes, cada qual representando um morfema. Como afirma Aikhenvald (2007, p. 5), uma língua sintética é aquela “em que uma palavra é
formada por vários morfemas e há muitos morfemas presos”. Exemplos de línguas aglutinantes são o Japonês, o Turco, o Húngaro e o Russo.

O padrão sintático é Sujeito – Objeto – Verbo, ou seja um padrão SOV, enquanto na Língua Portuguesa o padrão é Sujeito – Verbo – Objeto (SVO). Como
afirma Fujisawa (1992, p. 559):

“Verbo principal, sempre no final da oração.” – Esta é a regra máxima da sintaxe da Língua Japonesa. Ao dizermos verbo principal, na verdade fazemos
referência ao núcleo do predicado da oração principal, que, em japonês, pode ser tanto um verbo, como um auxiliar ou um adjetivo (...)

Kuno (1978, p.57) explica que “Japanese is a verb-final language. Word order in the sentence is relatively free, as long as the sentence ends with a main verb
(…)”103

Por exemplo:

3. Watashi wa b■ru wo nomimasu. ( ■■■■■ ■■■■)

Watashi (■) = Eu (Sujeito)

Wa (■) = Partícula de sujeito


B■ru(■■■) = Cerveja (Objeto)

Wo (■) = Partícula de objeto

Nomimasu (■■■■) = Bebo (Verbo beber)

Língua Portuguesa = Eu bebo cerveja. (SVO)

Língua Japonesa = Eu cerveja bebo. (SOV)

As classes de palavras são divididas por Fujisawa (1992) como:

• Partículas (Joshi )

• Partículas de Caso (Kaku Joshi ■■ )104

• Partículas Finalizadoras de Oração (Sh■ Joshi ■■■ )

• Partículas Adverbializantes (Fuku Joshi ■■ )

• Partículas Conjuntivas (Setsuzoku Joshi ■■■■ )

• Substantivos (Meishi )

• Verbos (D■shi )

• Verbos Auxiliares (Jo D■shi )

• Adjetivos (Keiy■shi )

• Verbos – Adjetivos (Keiy■ – D■shi )


• Pronomes Pessoais (Jin – Daimeishi ■■■■■■■)
• Demonstrativos (Shijishi ■■■)

• Numerais (S■shi )

• Unidades de contagem ou Classificadores numéricos (Jo – S■shi ■■ )

• Advérbios (Fukushi )

• Onomatopeias (Gion – Go e Gitai – Go )

• Conjunções (Setsuzokushi )

O uso de partículas é comum. As partículas servem para indicar a relação entre as palavras na frase e, como se pode observar acima, elas são classificadas de
acordo com a função que exercem. A língua não possui artigos, nem flexão de gênero (masculino e feminino), nem tampouco flexão de número (singular e
plural). Portanto, os substantivos da Língua Japonesa não são flexionados nem em gênero nem em número.

Os verbos são divididos e 3 grupos (verbos do 1º, 2º e 3º grupos)105, sendo conjugados da mesma forma no plural e no singular, e flexionados nas formas
passado e não passado, ou seja, para descrever uma ação futura ou presente, usa-se a mesma flexão verbal, distinguindo somente, quando necessário, por
palavras que darão a noção do tempo, como: hoje, amanhã, dia, mês etc. Tanto no passado como no presente/futuro os verbos são flexionados afirmativa e
negativamente, ou seja, teremos duas formas diferentes para descrever os verbos nos dois tempos.

Seguem exemplos dos verbos Asobu ■ (brincar), Miru ■ (ver) e Suru ■■106 (fazer), respectivamente verbos do 1º, 2º e 3º grupos. Os exemplos serão
dados a partir da forma masu ■■, por esta ser a forma polida do verbo na Língua Japonesa. A língua tem também vários níveis de tratamento, que também
implicam a mudança não somente do verbo, mas na maioria das classes de palavras.107

Presente/
Passado Passado Presente/Futuro Presente/Futuro Passado Passado
Presente/ Futuro Futuro
Afirmativo Afirmativo Afirmativo Negativo Negativo Negativo Negativo
Polido105 Afirmativo
Polido Comum Polido Comum Polido Comum
Comum
Asobimashi Asobima Asobima
Asobimasu Asobu Asonda Asobanaka
Asobanai (não
ta sen sendeshita
brinco)
(brinco) (brinco) (brinquei) tta (não brinquei)
(brinquei) (não brinco) (não brinquei)
Mimasu Miru Mimashita Mita Mimasen Minai Mimasendeshi
Minakatta (não vi)
(vejo) (vejo) (vi) (vi) (não vejo) (não vejo) ta (não vi)
Shimasen
Shimasu Suru Shimashita Shita Shimasen Shinai Shinakatta
deshita
(faço) (faço) (fiz) (fiz) (não faço) (não faço) (não fiz)
(não fiz)
Porém, não devemos pensar que a flexão dos verbos na Língua Japonesa seja simples. Apesar de serem conjugados apenas no passado e no presente/futuro,

existem diversas formas do verbo, como as formas Te kei (■ ) = forma te, Nai kei (■■ ) = forma nai, Kan■ kei ( ) = forma kan■ kei( ),

Ta kei (■ ) = forma ta. Estas formas ainda são combinadas com outras para indicar as várias intenções do falante.

Por exemplo:

4. Watashi wa ky■ benky■ shinakereba108 narimasen. ( ■ ■■■■■■■■■■■)

Eu tenho que estudar hoje.

Watashi = eu (sujeito)

Wa = (partícula de sujeito)

Ky■ = hoje (Advérbio de tempo)

Benky■ = estudo (verbo)

Shinakereba narimasen = (parte final do verbo, que indica uma obrigação da pessoa que está falando)

Além da flexão dos verbos em negativo e afirmativo existe uma diferença entre a Forma Comum (Futs■kei ) e a Forma Polida (Teineikei■■■■ ),
como já mostrado acima. Essas duas formas são usadas distintamente conforme a ocasião, abrangendo toda a língua, não somente os verbos. De uma maneira

muito diferente de outras línguas, a Língua Japonesa tem um sistema gramatical e léxico de exprimir diferentes graus de cortesia, chamado de Keigo
(expressões de respeito). Pode-se dizer que existem basicamente três níveis de polidez (DOI, 1991), embora seja impossível teorizá-los, já que a delimitação
dos níveis de cortesia é difícil por causa da interdependência entre cada um dos níveis. Classificado por Doi (1991) como: Sonkeigo ( )
expressões de respeito; Kenj■go (■■■■■■) expressões de modéstia; e Teineigo ( ) expressões de polidez.

Além das expressões de respeito, existe a diferença entre a fala feminina e a masculina. Por exemplo:

5. Watashi ( ) – Significa Eu = seu uso pode ser tanto para homens como para mulheres.

Boku ( ) – Significa Eu = seu uso é restrito para os homens.

Watakushi ( ) – Significa Eu = pode ser usado por homens e mulheres, é uma forma muito polida.

Ore (■■) – Significa Eu = usado somente pelos homens e com conotação bem grosseira.

Observando o tipo de linguagem usada, podemos saber o sexo dos participantes da conversa, sua faixa etária, o status social e o grau de intimidade existente
entre eles.

Os adjetivos, diferentemente do que ocorre na Língua Portuguesa, são flexionados como os verbos, ou seja, em Presente/Futuro, Passado, formas afirmativa e

negativa. Os adjetivos são divididos em adjetivo “i” e adjetivo “na”, respectivamente, “i Keiy■shi ■ ” e “na Keiy■shi ■ ”, cada um flexionado
de maneira distinta. Também há diferença na flexão dos adjetivos Polido e Comum, como pode ser visto na página seguinte:

Adjetivo “i”

Oish■ = Gostoso, saboroso

Presente/
Passado Passado Presente/Futuro Presente/Futuro Passado Passado
Futuro
Presente/ Futuro
Afirmativo Afirmativo Negativo Negativo Negativo Negativo
Afirmativo Polido Afirmativo
Polido Comum Polido Comum Polido Comum
Comum
Oishiku Oishiku Oishikuna katta
Oish■ desu Oish■ Oishikatta desu Oishikatta Oishikunaka tta
desu
nai desu nai
Não é/Não está Não é/Não está Não era/Não estava Não era/Não estava
É/Está gostoso É/Está gostoso Era/Estava gostoso Era/Estava gostoso
gostoso gostoso gostoso gostoso

Adjetivo “na”

Shinsetsu ■ = Gentil, atencioso


Presente/
Passado Passado Presente/Futuro Presente/Futuro Passado Passado
Futuro
Presente/ Futuro
Afirmativo Afirmativo Negativo Negativo Negativo Negativo
Afirmativo Polido
Afirmativo
Polido Comum Polido Comum Polido Comum
Comum
Shinsetsu ja Shinsetsu ja Shinsetsu ja
Shinsetsu desu Shinsetsuda Shinsetsu ja nai Shinsetsu deshita Shinsetsu datta
arimasen arimasen deshita nakatta
Não é/Não está Não é/Não está Não era/Não estava Não era/Não estava
É/Está gentil É/Está gentil Era/Estava gentil Era/Estava gentil
gentil gentil gentil gentil

Uma classe de palavras que existe na Língua Japonesa, mas não existe na Língua Portuguesa são asUnidades de contagem ou Classificadores numéricos (Jo -
S■shi). Os classificadores númericos consistem em afixos que se juntam para categorizar nomes no contexto da quantificação. Na Língua Japonesa o
classificador é número + sufixo, para indicar que há 3 pessoas, por exemplo, San Nin , San (Três) + Nin (sufixo de pessoa). De acordo com Cândido
(2003), os classificadores numéricos são escolhidos normalmente por critérios semânticos, como pela forma (longo, plano, arredondado), pelo tamanho (grande,
pequeno, médio) entre outros critérios. Alguns classificadores da Língua Japonesa são exemplificados a seguir:

6. Yon hon = Yon (quatro) + Hon (sufixo para objetos finos e alongados) = cinco lápis, canetas

7. Ni hiki = Ni (dois) + Hiri (sufixo para animais pequenos, peixes e insetos) = dois cachorros, gatos

8. Go hai = Go (cinco) + Hai (sufixo para xícaras e copos de bebida) = cinco xícaras, copos

9. Ichi ban = Ichi (um) + Ban (sufixo para ordem) = primeiro

10. Nana sai = Nana (sete) + (sufixo para idade de alguém) = sete anos

A Escrita da Língua Japonesa

A Língua Japonesa possui 3 tipos de escrita: o Kanji, o Hiragana e o Katakana. Iniciarei falando do Kanji porque dele derivam os silabários Hiragana e Katakana.

1.3.1 O Kanji

O Kanji ( ) é o ideograma (“ideia desenhada” ou “ideia escrita”), ou seja, é provido de um significado, sendo de origem chinesa. Biderman (2001) afirma
que o ideograma está ligado ao plano do conteúdo e não ao plano da expressão, ou seja, o ideograma é o significado e não o significante, na concepção de
significado e significante de Saussure (2002). Acredita-se que o Kanji exista na China desde 1.300 anos antes de Cristo, mas sua forma atual data do ano 400
depois de Cristo. O Kanji foi emprestado ao Japão através dos coreanos entre os séculos 4º e 6º do Período Kofun (Sakurai 2007). Antes disso o Japão era um
país ágrafo. O nome Kanji quer dizer escrita de Kan. Kan era uma região da China de onde veio o Kanji. Antigamente a China era dividida em 3 regiões (Shin,
Kan e Min) e o Kanji veio da região de Kan, por isso o nome Kanji.

Na China há por volta de 50.000 Kanji, sendo 5.000 utilizados regularmente. Cada Kanji tem uma única leitura. Já no Japão são por volta de 5.000. Pelo grande

e variado número de Kanji, o ministério da educação japonês definiu, em outubro de 1981, o J■y■ Kanji ( ), uma lista de 1.945 Kanjioficiais,
distribuídos por ordem de traços, de 1 até 23. Esta lista permite a leitura de 99% dos textos escritos em Kanji. Como afirma Deblas (2003), na introdução do seu
dicionário de Kanji:

De los más de 3.000 kanji que un japonés adulto puede manejar en su vida diaria, 1.945 son de estudio obligatorio a lo largo del sistema educativo. Esta lista se
conoce como “Kanji de uso común” (■■■■j■y■ kanji). A esta lista se suma otra que recoge los kanji que se pueden utilizar para nombres y apellidos (■■■■■
jinmeiyou kanji). Existen además kanji que, no perteneciendo a la lista oficial, se utilizan a menudo en la vida diaria. 109

Diferentemente da China, no Japão um único Kanji pode ter mais de uma leitura, ou seja, um mesmo ideograma pode ter dois sons diferentes e vários
significados diferentes, como no Kanji ■■■, que tanto pode significar kane (■■), que é dinheiro, como Kin (■■), que significa ouro. As duas leituras são

denominadas Kun yomi ( ■), leitura japonesa, e On yomi ( ■), leitura chinesa. NoKanji ■■■, Kane seria Kun yomi e Kin, On yomi. Não

necessariamente o Kanji tem duas leituras e significados diferentes. Às vezes o Kanji tem somente o On yomi, como é o caso do Kanji ■ ■, que tem
somente o som de [t■a], que significa chá. O nome leitura chinesa é somente uma denominação, porque na China e no Japão o Kanji normalmente tem o
mesmo conceito, mas o som e a entonação são completamente diferentes nas duas línguas.

Como afirma Keiko Fujisawa, no apêndice do dicionário de Hinata (1992, p.556): “A crença, muito popular entre os estrangeiros, de que a Língua Japonesa
apresenta semelhanças com a Língua Chinesa é errônea, pois dela foi-lhe apenas emprestada a sua milenar escrita e parte dos vocábulos”.

Sakurai (2007, p. 261) afirma que:

À primeira vista, a sua forma escrita, composta basicamente de ideogramas, parece ser a mesma da chinesa. No entanto, o Japonês não é igual ao Chinês nem
na leitura, nem no som das palavras ou na entonação das frases. Apenas os conceitos dos ideogramas japoneses são semelhantes aos dos chineses. Toda a
estrutura da escrita japonesa teve inspiração na China, mas foi moldada por modificações significativas conforme se desenvolveu no Japão. Assim, a menos que
um tenha estudado a língua do outro, um chinês não entende o que o japonês fala, e vice-versa.

A seguir alguns Kanji:110


■■ ■■ ■■■
■ = Hana = Flor ■ = Mon = Portão ■ = Hikari = Luz
■■■ ■■ ■
■ = Kokoro = Coração ■ = Mimi = Orelha ■ = Ki = Árvore
■■ ■ ■■
■ = Ai = Amor ■ ■ = Kiku = Ouvir ■ = Mori = Floresta

Vale lembrar que o Kanji exprime uma ideia, um conceito, sendo possível então uma classificação por radicais (Bushu ■■■), ou seja, para compreender melhor
um Kanji, é necessário um bom conhecimento dos radicais (pelo menos os básicos), porque é nestes radicais que obtemos semelhanças e diferenças entre um
Kanji e outro e a lógica de sua junções e formações, conseguindo talvez abstrair um pouco do pensamento dos chineses no momento da criação e modificação
dos ideogramas. Por exemplo, observe o Kanji de árvore e de floresta. O Kanji de árvore é considerado um radical denominado Kihen (■■■), ou seja, tudo que
for relacionado a árvore ou a madeira terá este radical. É o caso do Kanji de bosque, que podemos ver claramente acima que seriam muitas árvores, por
issofloresta.

A classificação é muitas vezes complexa porque existem muitos radicais e, além disso, os radicais não ocupam a mesma posição no Kanji, ou seja, o radical
pode vir ao lado como no radical Hen (■■), que também subdivide – se em outras classificações de acordo o que se pretende escrever. Os radicais podem vir
do lado direito, esquerdo, em cima, em baixo, ao redor e todos estes também têm suas subclassificações.

O Hiragana

O Hiragana (■■■■) é denominado Kana, que representa o som, mas não tem significado como o Kanji, ou seja, ele é a tradução fonética do Kanji, sendo a
primeira escrita aprendida pelas crianças. OHiragana surgiu através da escrita cursiva do Kanji criado pelas mulheres, por não terem uma educação formal para
escrever e aprender o Kanji como os homens. Hoje é usado por ambos os sexos. Como afirma Sakurai (2007, p. 262):

Originalmente, os alfabetos estavam voltados para as mulheres, que, sem muito acesso aos estudos, podiam escrever de forma mais simples imitando os sons
das palavras com letras que reproduzem sons simples ou sílabas. Já os homens, com maior educação formal, escreviam em ideogramas (ou em Katakana para
as palavras de origem estrangeira). Hoje todos podem usar tudo.

O Hiragana, além de ser usado para escrever palavras de origem japonesa, tem a função de auxiliar na leitura do Kanji. Tendo esta função, é chamado
Furigana, e também serve para escrever a parte final do Kanji (conjugação de verbo, adjetivo etc...). Com essa função, é chamado Okurigana. Por exemplo:

11. ■■■ = Furigana

Ir (Verbo) ■■■ = Okurigana

12. ■■ = Furigana

Redondo (Adjetivo) = Okurigana

O Hiragana possui 46 sílabas estruturais, chamadas pelos japoneses de Seion ■ ■■ (Kanas não modificados) e mais 58 complementares, chamados de
Dakuon ■■■■ e Y■ On ■■■■ (Sons sonorizados e sons palatalizados respectivamente, ou seja, Kanas modificados).

O Katakana

O Katakana (■■■■) é um Kana como o Hiragana, ou seja, representa som, mas não tem significado. O Katakana surgiu através da abreviatura de alguns Kanji,
inicialmente era utilizado por monges budistas para auxiliar na leitura dos textos em Kanji. Hoje é utilizado por todos para escrita de palavras de origem
estrangeira, onomatopeias, nome de animais e às vezes para criar destaque em algumas palavras japonesas. Como no Hiragana, há 46 sílabas estruturais e 58
complementares.

O R■maji

Durante muitos anos de relações com países de alfabeto românico, os japoneses interpolaram a fonética japonesa com a escrita românica, e este “fenômeno

linguístico” é denominado R■maji (■■■ ). Mas o R■maji é utilizado somente em placas publicitárias, placas de sinalização destinadas aos estrangeiros, não
sendo utilizado no cotidiano. Essa escrita romanizada tem como base a fonética da Língua Inglesa, o “Sistema Hepburn”, chamado pelos japoneses de sistema

Hebon-shiki-r■maji111 (■■■ ■■■ ). Vale lembrar que o R■maji não é classificado pelos japoneses como um quarto tipo diferente de escrita.

Para finalizar sobre a escrita japonesa, mostrarei abaixo como exemplo a palavra Estrela escrita emkanji, hiragana, katakana e R■maji:

1. Kanji – ■

2. Hiragana – ■■

3. Katakana – ■■

4. R■maji – Hoshi

O Léxico e o Empréstimo Linguístico

Este capítulo corresponde à fundamentação teórica do presente estudo. Abordarei o que é léxico e como este se amplia. Enfatizarei o empréstimo linguístico, as
diversas teorias que o abordam e alguns trabalhos a ele destinados, por ser este o tema deste trabalho.

O Léxico e sua Amplitude


O léxico, que vem da palavra grega lexicon, é um conjunto de palavras de qualquer língua do mundo que consta nos dicionários. O léxico de uma língua é
considerado a menos sistemática das estruturas, ao contrário dos sistemas gramaticais, que são grupos fechados e de pouca mobilidade. Pode-se fazer uma
oposição e uma relação entre léxico e gramática, sendo o léxico formado por unidades significativas e a gramática por regras combinatórias.

Para Carvalho (1989, p. 22): “O léxico de uma língua é como uma galáxia, vive em expansão permanente por incorporar as experiências pessoais e sociais da
comunidade que a fala”.

Por ser considerada uma estrutura com mais “liberdade”, o léxico dá possibilidade de entrada a novos itens para seu sistema. Esta entrada de novos itens é
denominada ampliação lexical.

A ampliação lexical se dá de duas maneiras, classificadas por Carvalho como dois processos, que são:

1. O processo de criação dentro da própria língua, representado pelos neologismos e;

2. O processo de adoção e adaptação de um termo de língua estrangeira, representado pelos empréstimos.

Meu foco será abordar o segundo processo, ou seja, os empréstimos linguísticos. Segundo Carvalho (1989, p. 24),

A ampliação do léxico, pelo empréstimo, é o resultado não propriamente de uma inovação, mas de uma adoção que é a adequação da língua como saber
linguístico à sua própria superação e tem como determinante fins culturais, estéticos e culturais.

O Empréstimo Linguístico

O empréstimo linguístico, como já foi falado, é o empréstimo ou adoção de vocábulos de outras línguas. Para Borges (1998, p. 137):

Empréstimo é um termo técnico usado para descrever aquilo que era anteriormente denominado ‘mistura de línguas’, expressão rejeitada por vários estudiosos,
dentre os quais Haugen (apud McMahon.), que entende que a introdução de elementos de uma língua em outra indica uma alteração na língua que os recebeu,
e não uma mistura de ambas. Para ele, o empréstimo deve ser compreendido como uma tentativa de reprodução em uma língua dos modelos previamente
encontrados em outra. (MCMAHON, 1994).

Ajayil (2002) define o empréstimo como Borges, ou seja, afirma que não há uma mistura de línguas, mas sim a adoção de palavras que sofrem alguma
transformação na língua receptora. Esta transformação é afirmada por Steinberg (2003, p. 20):

Tomada de outras línguas com as quais a sociedade entrou em contato, os empréstimos muitas vezes sofrem alterações fonológicas e grafológicas. Adaptando
a pronúncia dos fonemas que são estranhos ao idioma, a grafia sofre alteração.

As definições sobre o empréstimo linguístico são várias, defendidas por um número variado de linguistas, em todo o mundo, que pesquisam tanto Línguas de
“prestígio” ou “dominantes”, como a Língua Inglesa, quanto as chamadas ‘Línguas Étnicas’ (OLIVEIRA, 2007), como é o caso das Línguas Indígenas e Línguas
Africanas. Para Ribeiro & Cândido (2004/2005. p. 51), que pesquisam os empréstimos da Língua Portuguesa na Língua Shanenawa112:

(...) dá-se o nome de ’empréstimo’ a uma palavra ou expressão cedida por uma língua (doadora) a outra (receptora). Ao processo de aquisição dessa palavra ou
expressão ou, ainda, a qualquer outro tipo de incorporação de aspectos linguísticos (fonológico, gramatical, semântico, entre outros), por parte da língua
receptora, convencionou-se chamar ■empréstimo linguístico’.

O termo ‘adoção’ também é utilizado por Steinberg (2003), que diz que a palavra ‘empréstimo’ é um termo inadequado, porque empréstimo pressupõe algo que
tomamos emprestado e depois devolvemos, fato que não ocorre com as palavras “emprestadas”. Quando começamos a utilizar uma palavra estrangeira na
nossa língua, nós não a devolvemos depois de algum tempo. Podemos até não utilizá-la, mas ela continuará pertencendo à nossa língua, ou seja, nós a
adotamos, muitas vezes nos esquecendo que foi uma palavra vinda de fora.

O empréstimo linguístico é então um conjunto de palavras adotadas de outras línguas que normalmente sofrem alterações fonológicas, grafológicas ou até
mesmo morfológicas para fazerem parte de uma nova língua, nesse caso a Língua Japonesa. O empréstimo ocorre em todas as línguas do mundo em que há
contato com outros povos, só que há línguas que tem uma facilidade maior de adquirir os empréstimos do que outras.

Na Língua Japonesa a incorporação de empréstimos já faz parte da vida de muitos japoneses, principalmente dos mais jovens. Mas esta fácil incorporação está
intimamente ligada ao processo de globalização e da constante caminhada dos japoneses em busca da modernidade.

Na China há uma resistência maior ao empréstimo. Por isso, criam-se constantemente novas palavras para palavras estrangeiras combinadas com o Kanji
apropriado, como no caso da palavra computador, que é o Kanji de eletrônico mais o Kanji de cérebro.

Na língua Katukina113 é como no Mandarim (Língua Chinesa): há uma resistência maior em adquirir os empréstimos, como afirma Aguiar (1995, p. 82):

Uma característica interessante do Katukina é que essa língua não admite que se incluam no seu léxico palavras de uma outra língua sem antes fazê-las passar
por um processo rigoroso de adaptação, tornando-as quase irreconhecíveis por falantes nativos da língua originária do empréstimo, já que essa palavra, através
de uma espécie de filtro fonológico, passa a ser muito semelhante aos demais itens lexicais do Katukina.

Esta característica de torná-las quase irreconhecíveis por falantes nativos da língua originária do empréstimo é também observada na Língua Japonesa. Mesmo
com facilidade em receber os empréstimos a palavra sempre sofre uma adaptação para ser pronunciada à moda nipônica.

Processos de Aquisição do Empréstimo

Ribeiro & Cândido (2004/2005. p.54) indicam três fatores responsáveis pela aquisição do empréstimo. São eles:
• Empréstimo por necessidade – quando algum objeto ou conceito é introduzido em determinada cultura, havendo necessidade da introdução de um novo
termo lexical para designá-lo;
• Empréstimo por prestígio – quando palavras ou expressões estrangeiras por algum motivo foram apreciadas pela cultura receptora;
• Empréstimo por depreciação, ou seja:

Embora de forma mais rara, pode ocorrer o contrário do empréstimo de prestígio. Tem – se então, a depreciação que caracteriza o fato de falantes tomarem por
empréstimo uma palavra “alienígena” com significação não pejorativa da língua doadora e importá – la para seu idioma com sentido claramente depreciativo.

O Gairaigo

Neste capítulo falarei sobre o Gairaigo, foco principal deste trabalho. Relatarei um pouco sobre a história do Japão para um melhor entendimento da introdução
do Gairaigo na cultura japonesa.

Os Processos de Introdução do Gairaigo

O Gairaigo não é um fenômeno moderno. Seu início é bem antigo. A introdução de palavras estrangeiras na Língua Japonesa começou com palavras de origem
coreana e chinesa. Com um contato entre os portugueses por volta de 1543 vieram as palavras de origem portuguesa. Os portugueses, por serem os primeiros
ocidentais a conhecer o povo japonês, foram os que apresentaram o Japão para o resto da Europa e do mundo. Após sua chegada outros povos foram ao
arquipélago, como os holandeses, ingleses, franceses, alemães e vários outros. Estes outros estrangeiros trouxeram cigarro, vinho, armas de fogo e também
novas palavras, não somente as relacionadas a essas novidades, como também palavras típicas de suas nacionalidades.

Em 1637 o Japão fechou-se para o mundo. Ninguém mais saía ou entrava do arquipélago, como mostra Sakurai (2007, p.124):

Em 1633, os navios japoneses foram proibidos de ir à Europa, três anos depois, de sair das águas territoriais. A partir de 1637, nenhum japonês podia mais
tentar deixar o país sob pena de morte. Os que estavam fora não puderam voltar. (...) Enfim, o Japão isolou-se comercial e culturalmente do mundo exterior e
passou a se desenvolver internamente sem o peso da influência ocidental.

Somente 3 séculos mais tarde com a pressão do mundo todo para a abertura dos portos, o Japão saiu de seu isolamento. Este período, que se iniciou em 1868,
foi chamado restauração Meiji (■■■), e foi um momento de grande transformação para o Japão e para o seu povo. Como afirma Sakurai (2007, p.132):

O ano de 1868 é importantíssimo para os japoneses, pois marca o início de um intenso processo de mudanças que influencia toda a história posterior do Japão.
A restauração Meiji introduz o país em uma nova realidade, dessa vez planetária.

Nestes 3 séculos fechado, o Japão viveu como um grande feudo, e, com a Restauração Meiji, tudo mudou. Não havia mais senhores feudais e agora todos

deviam possuir um sobrenome, porque na época somente um grande senhor de terras ou um samurai ( ) tinha direito de possuir um sobrenome. Foi um
período decisivo para a liberação do contato com o estrangeiro e a assimilação de suas palavras. Neste período também os japoneses voltaram a incorporar
novas palavras estrangeiras no seu vocabulário.

Com o término da Segunda Guerra Mundial, após a rendição do Japão depois das terríveis bombas de Hiroshima e Nagasaki, a incorporação de palavras
estrangeiras foi cada vez mais forte e frequente, devido à grande presença americana no pós-guerra. Como mostra Sakurai (2007, p.268): “Com o término da
Segunda Guerra Mundial, o Japão se volta cada vez mais para o exterior e, nesse movimento, a tendência é de incorporar palavras e expressões estrangeiras
usando o katakana”. Hoje, estão em todo Japão, inclusive substituindo palavras japonesas, como arroz cozido, que era gohan, e hoje muitos chamam de raisu,
proveniente da palavra rice, arroz da Língua Inglesa.

Sakurai (2007, p. 262) afirma que:

A incorporação de elementos estrangeiros na Língua Japonesa não se restringe ao período posterior ao fim da Segunda Guerra Mundial. No passado, palavras
estrangeiras constantemente enriqueceram a língua, a começar por vocábulos originalmente chineses ou coreanos.

A Adaptação do Gairaigo à Língua Japonesa

As palavras estrangeiras (Gairaigo) não podem ser transpostas exatamente da sua língua para a Língua Japonesa, devido à diferença ou à ausência de alguns
sons. Por isso existem regras a serem seguidas em relação ao som e à grafia das palavras estrangeiras, regras estas que permitem a niponização das palavras,
ou seja, elas sofrem mudanças para se adaptarem à fonética japonesa e posteriormente são grafadas em Kana. No caso do Gairaigo são grafadas em
Katakana. As adaptações sempre ocorrem nas línguas, como afirma Steinberg (2003, p.13, 31):

A cunhagem de termos novos se dá em obediência aos padrões de estrutura da língua. Os empréstimos de outras línguas sofrem adaptações, que podem ser
substituições de fonemas, alterações ortográficas, desvios etimológicos, retenção de significados antigos ou alteração de significados... (...) Os empréstimos não
se eternizam na língua. Alguns, depois de um tempo, simplesmente deixam de ser usados. A parte interessante nesse tipo de neologismo é a do processo
linguístico pelo qual passa para se incorporar ao léxico. O primeiro deles é o de adaptação fonológica, isto é, a substituição de fonemas estranhos ao idioma por
outros a ele pertencentes e que se assemelham aos do empréstimo.

Uma das primeiras questões a serem pensadas no momento da adaptação para a Língua Japonesa é que a estrutura da língua é silábica, como já foi abordado
em (1.2). Sendo este o padrão silábico, normalmente para escrever as palavras estrangeiras temos que acrescentar vogais suplementares ou em alguns
momentos até fazermos a supressão de sílabas. Cada Kana corresponde a uma sílaba, um som. A junção de um Kana (Sílaba/Som)114 a outro forma outro
Kana diferente, mas com a grafia do segundo em tamanho menor e com uma aglutinação do som. Neste caso seria o padrão CSvV, como em Kya (■■), Nya
(■■), Myo (■■), Cha (■■), e todos que têm a grafia do segundo Kana menor.

Bossong (2003, p. 225) afirma:


O Japonês só tem sílabas abertas ou sílabas que terminam em nasal ou na primeira parte de uma consoante longa. (...). Por isso os grupos consonânticos que
fecham as sílabas têm de ser reduzidos através de vogais epentéticas. 115 Porque a articulação da vogal [M] é muito reduzida no Japonês actual, quase não
sendo audível, é frequentemente utilizada como vogal epentética, excepto depois de [t], onde é obrigatório o uso de [o] para este efeito.

O ensurdecimento das vogais é visto como algo recente, porque nos empréstimos da Língua Portuguesa que existem há mais de 400 anos pode ser observado
que não há o ensurdecimento das vogais. Mas as palavras de origem portuguesa na sua maioria foram substituídas por palavras da Língua Inglesa. Estima-se
que há cerca de 300 empréstimos da Língua Portuguesa, que hoje têm somente valor histórico, por serem na sua maioria de cunho religioso, como deusu ■■■
(Deus), kurusu ■■■ (Cruz) e muitas outras, sendo utilizados atualmente somente 30 desses empréstimos (BOSSONG, 2003).

Mesmo sendo poucos os empréstimos da Língua Portuguesa, eles têm grande peso na Língua Japonesa falada hoje. Este peso se dá pelo tempo de existência
do empréstimo, ou seja, por serem dos mais antigos, eles estão muito integrados à Língua Japonesa. Exemplo disto é o Gairaigo tabako (■■■), que quer dizer
‘cigarro’, e é sempre grafado em Hiragana, que é uma escrita exclusiva para palavras japonesas e sino-japonesas (provenientes do Mandarim).

Na Língua Japonesa as palavras emprestadas (Gairaigo) seguem a pronúncia da língua doadora. Por exemplo, em size ‘tamanho’, da Língua Inglesa, que se
torna saizu (■■■), é acrescida a vogal A no momento da escrita japonesa, para que na hora da pronúncia o som fique mais próximo ao da língua doadora. Na
palavra pão, empréstimo da Língua Portuguesa, no momento da adaptação, leva-se em conta o som da Língua doadora. Em vez de ser pão é na verdade pan
(■■).

Descreverei a seguir os fenômenos de adaptação das palavras estrangeiras à Língua Japonesa verificados em meus dados. O referencial teórico provém de
Schane (1975) e Istre (1983).

Acréscimo

Este tipo de adaptação consiste no acréscimo de uma vogal suplementar para que palavras estrangeiras que terminam em consoante possam ficar com o
padrão silábico da Língua Japonesa, ou seja, para se tornarem V, CV ou CSvV. Como na palavra bus ‘ônibus’, do Inglês, que se torna basu (■■), ou seja, para
a palavra se tornar niponizada há o acréscimo da vogal posterior alta oral não arredondada [M] após a consoante fricativa alveolar surda [s]. O acréscimo da
vogal U [M] é o mais comum, pois este é ensurdecido na Língua Japonesa, ou seja, a vogal quase não pode ser ouvida. Mas em casos de palavras terminadas
em [t] e [d], oclusivas alveolares, é acrescida a vogal posterior média fechada oral arredondada O [o], como em tost, do Inglês (torrada), que se torna t■suto
(■■■■), test (teste) = tesuto (■■■) e slide, que se torna suraido (■■■■).

Nas demais consoantes acrescentamos a vogal U [M], como em pink (cor de rosa), empréstimo da Língua Inglesa, que nipônico torna-se pinku (■■■). No
Francês soupe (sopa) há empréstimo através do Inglês, em soup. Por isto na Língua Japonesa ela se tornou s■pu (■■■), por ter sido emprestado do Inglês
diretamente e não do Francês.

Supressão

Em alguns casos há a supressão de uma parte da palavra na hora da fala, e muitas vezes na hora da escrita informal também. Por exemplo, a palavra terebijon
(■■■■■■) é uma adaptação fonológica da palavra television (televisão) da Língua Inglesa, mas, no dia a dia, os japoneses dizem somente terebi (■■■). Como
em kar■ raisu (■■■■■■), do Inglês curry rice (caril e arroz), que normalmente se diz somente kar■ (■■■). A supressão de palavras ocorre também em
n■tobukku ■■■■■■, de notebook (Caderno) da Língua Inglesa, onde se diz apenas n■to.

O mesmo ocorre com konbiniensusutoa (■■■■■■■■■■), de convenience store (Latim/Inglês), que significa loja de conveniência, e se diz somente konbini
(■■■■). Há supressão também nas palavras mirim■toru (■■■■■■), de milímetro (Português), e birudingu (■■■■■■), de building (edifício, prédio) da Língua
Inglesa, que ficam respectivamente miri (■■) e biru (■■). Em w■dopurosess■ (■■■■■■), de word processor (processador de texto), que vem do Latim, mas
os japoneses a adotaram a partir do Inglês. Há uma redução maior da palavra, e, em vez da palavra ficar w■dopuro, ela fica w■puro (■■■■).

Modificação

As adaptações fonológicas que ocorrem em relação à niponização das palavras não são somente no padrão silábico da Língua Japonesa. Nesta língua não
existem as consoantes fricativas labiodentais [f] e [v]. Digo não existiam porque hoje, com o aumento e a modernização dos empréstimos, houve a necessidade
de serem utilizados novos sons e novos Kana para representarem as palavras estrangeiras. Em palavras mais antigas, em que não se utilizavam estes novos
sons, se substituía a fricativa labiodental [v] pela oclusiva bilabial [b]. Por exemplo, veludo, da Língua Portuguesa, que para a fonética japonesa é bir■do
(■■■■), e bideo (■■■), de video (Latim/Inglês).

A consoante lateral dental sonora [l] é substituída por falantes não nativos por [4], consoante vibrante simples alveolar sonora, mas este som na realidade é um
som entre esses dois sons, que é representado por [ ], que é uma consoante vibrante alveopalatal sonora. Por uma maior semelhança com o som [4], as
palavras estrangeiras com [l] são pronunciadas como [4], por exemplo, lobby, da Língua Inglesa, é adaptada para a Língua Japonesa como rob■ (■■■), e
launch (Língua Inglesa), que se torna ranchi (■■■).

Em palavras terminadas em [de] e [te], substitui-se a vogal [e], anterior média fechada oral não arredondada, pela vogal [o], posterior média fechada oral
arredondada. Na palavra tomate, que é de origem portuguesa, quando adaptada se torna tomato (■■■). O mesmo ocorre quando as demais consoantes vêm
ao final acompanhadas de um E [e] ensurdecido, como em grape (uva), que se tornagur■pu (■■■■), e knife (faca), que se torna naifu (■■■).

Alongamento

No momento em que palavras como meeting (reunião) e spoon (colher), da Língua Inglesa, são transformadas em “palavras japonesas” e escritas em alfabeto
românico (Rom■ji), as vogais dobradas116 recebem um traço em cima da letra a ser alongada, como acontece na escrita do Latim, que indica assim as vogais
breves e longas. Quando escritas em Kana recebem um “travessão” após a letra que deve ser alongada. Nesses casos as palavras ficam respectivamente
m■tingu (■■■■■■) e sup■n (■■■■). Em outros casos com vogais dobradas, como pool (piscina), da Língua Inglesa, ocorre o mesmo uso do “travessão”,
fazendo com que a palavra torne-se p■ru (■■■).
Em palavras com ar, er, ir, or, ur, também há o alongamento, como em report (relatório), computer (computador), telephone card (cartão telefônico), da Língua
Inglesa. Quando niponizadas tornam-se respectivamente rep■to (■■■■), konpy■t■ (■■■■■■■) e terehonk■do (■■■■■■■).

Os tipos de Empréstimos da Língua Japonesa

A classificação dos tipos de empréstimo será com base em Grosjean (1982) e Romaine (1995) (apud BORGES, 1998).

Adaptações Fonológicas e Morfológicas (Loanwords)

Este tipo de empréstimo consiste na adaptação fonológica e morfológica das palavras emprestadas, ou seja, as palavras sofrem adaptações fonéticas e
morfológicas pela língua importadora, de acordo com seus padrões fonéticos e morfológicos. Como ocorre com gás, que foi um empréstimo Holandês. Quando
adaptada para a Língua Japonesa, tornou-se gasu (■■). Nesta palavra ocorreu uma adaptação fonológica e morfológica da palavra gás. Como na Língua
Japonesa as sílabas são sempre V, CV e CSvV, na palavra gasu foi adicionada a vogal U [M] para ela se tornar tipicamente japonesa, com o padrão CVCV.
Algumas destas adaptações:

13. Pet (animal de estimação) g Petto (■■■) – Acréscimo da vogal O [o] no final da palavra;

14. Print (cópia) g Purinto (■■■■) - Acréscimo da vogal O [o] no final da palavra;

15. Tabaco (cigarro) g Tabako (■■■) – Adaptação para a escrita romanizada japonesa (Hebonshiki);

16. Radio (Rádio) g Rajio (■■■) – Adaptação para a escrita romanizada japonesa (Hebonshiki);

17. Rock (Rock) g Rokku (■■■) - Acréscimo da vogal U [M] no final da palavra;

18. Suit (Terno) g S■tsu (■■■) - Acréscimo da vogal U [M] no final da palavra;

19. Card (Cartão) g K■do (■■■) - Acréscimo da vogal O [o] no final da palavra.

Empréstimos Parciais (Loanblends)

Os Loanblends consistem em empréstimos em que uma parte da palavra é emprestada e a outra pertence à língua de origem, por exemplo, takush■ noriba

■■■■ ■ (embarque de táxi), em que a primeira palavra takush■ (■■■■) é de origem francesa, e significa táxi, mas emprestada através do inglês, e a

segunda palavra noriba ( ■ ) é de origem japonesa, e quer dizer embarque. O mesmo ocorre com ebi furai ■■■■■ (camarão frito), ebi (■■) de origem
japonesa, que significa camarão, e furai (■■■), de origem Latina, mas emprestada através do Inglês, que significa frito. Em keshigomu (borracha) (■■■■),
keshi ■■ é do verbo japonês kesu (apagar), e gomu, do holandês gom (borracha). Nos verbos k■p■shimasu ■■■■■■■ (copiar), memoshimasu ■■■■■
(anotar) e kyanserushimasu ■■■■■■■■ (cancelar), as palavras k■pi (■■■), memo (■■) e kyanseru (■■■■■) são empréstimos da Língua Inglesa, que
significam respectivamente cópia, nota e cancelamento. O final suru (■■) é o verbo fazer da Língua Japonesa.

Empréstimos Semânticos (Loanshifts)

O empréstimo Semântico é o que chamamos de empréstimo de significado. Estes empréstimos em sua maioria foram adquiridos durante a Segunda Guerra
Mundial. Neste período, o Japão vivia um momento de nacionalismo forte e intenso e por isso as palavras emprestadas dos inimigos americanos não eram bem
vindas. Foi um momento de total aversão aos empréstimos, ou seja, a tudo que era de fora e uma supervalorização do que era tipicamente japonês. Como
explica Sakurai (2007, p.186, 187):

A tensão de 1941 ocorreu no momento de ápice do nacionalismo belicoso japonês que, desde as duas décadas anteriores, ganhava espaço na sociedade
japonesa. (...) Os japoneses de então se acreditavam “iluminados”, ou seja, moral e racialmente superiores aos demais povos. (...) Toda onda de ocidentalização
verificada no país a partir de 1968 foi sendo substituída pela supervalorização do que se entendia como genuinamente japonês. O “espírito samurai” foi revivido
de forma contundente como exemplo de comportamento a ser seguido por todos os japoneses: lealdade, obediência às normas e à hierarquia, orgulho da pátria.

Os empréstimos normalmente fonológicos e morfológicos vindos da Língua Inglesa foram substituídos por empréstimos semânticos (empréstimos de
significado). Naquele momento se tomava emprestado somente o significado. A palavra era formada com os ideogramas que descreviam a ação ou a coisa. Por

exemplo, voleibol não era mais bar■boru ■■■■■■, do Inglês volleyball, e sim haikyu ( ). Os ideogramas representam respectivamente expulsar e bola,

que seria expulsar a bola. O mesmo ocorre com chikatetsu ( ), que significa metrô, e é a junção do ideograma de terra (■) mais os ideogramas de
embaixo (■) e ferro ou aço (■), ou seja, ferro embaixo da terra, mas a palavra metrô nunca teve um empréstimo por adaptação fonológica como a palavra

voleibol. A palavra b■ru (■■■) foi substituida nesta época por ky■ ( ) ou tama ( ). Com basukettob■ru ■■■■■■■■ (Inglês) ocorre o mesmo, torna-se

r■ky■ ( ), que é cesto ( ) e bola ( ).

Os empréstimos semânticos são muitas vezes difíceis de serem identificados, porque sua grafia é feita normalmente em Kanji. Muitas palavras tipicamente
japonesas também fazem este tipo de analogia com os ideogramas. Por isso é difícil identificar se os japoneses adquiriram aquela significação de um outro
povo, ou se foram eles mesmos que criaram tal analogia.

Empréstimos Duplos

O empréstimo duplo consiste em um empréstimo em que há uma fonte antecessora à língua doadora (STEINBERG, 2003). Por exemplo, a palavra basu
(ônibus) vem do inglês bus, mas a palavra bus já é um empréstimo do Latim omnibus (para todos). Dansu ■■■ (Dança) é um empréstimo da Língua Inglesa,
mas a palavra é originalmente Francesa, proveniente de danse. Em alguns casos as palavras continuam com a mesma escrita da língua originária, como é o
caso da palavra piano, uma palavra Italiana (piano) que foi adotada pelo Inglês, que também continua sendo piano, e depois adotada pela Língua Japonesa,
continuando piano (■■■).

Abaixo mais alguns exemplos de empréstimos duplos:

20. Bazaar (Persa) g Bazar (Português) g Baz■ ■■■ (Japonês) = Bazar;

21. Singulus (Latim) g Single (Inglês) g Shinguru ■■■■ (Japonês) = Quarto de solteiro;

22. Thema (Grego) g Thema (Alemão) g T■ma ■■■ (Japonês) = Tema;

23. Hospitale (Latim) g Francês (Hôtel) g Hotel (Inglês) g Hoteru ■■■ (Japonês) = Hotel;

24. Chocolatl (Asteca) g Chocolate (Inglês) g Chokor■to ■■■■■■ (Japonês) = Chocolate;

25. Hamburg (Alemão) g Hamburger (Inglês) g Hanb■g■ ■■■■■■ (Japonês) = Hambúrguer;

26. Masjid (Árabe) g Mosque (Inglês) g Mosuku ■■■ (Japonês) = Mesquita.

Os Empréstimos Necessários e Desnecessários

Na Língua Japonesa não há somente as palavras emprestadas que entram na língua para dar nome a objetos e conceitos que antes não existiam na língua. Há
também as substituições que Haugen (apud BORGES, 1998) define como ‘empréstimos desnecessários’, ou seja, são palavras para as quais há
correspondentes na língua receptora (Língua Japonesa), mas que são substituídos por outras palavras da língua doadora.

Como afirma Haugen (apud BORGES, 1998. p.138), há empréstimos necessários e desnecessários.

Os primeiros preenchem lacunas lexicais em uma dada língua, enquanto outros são essencialmente gratuitos, ou seja, a língua que incorpora o empréstimo
possui um item lexical equivalente que poderia ser empregado. Esses últimos são condenados por puristas que acreditam ser essa uma estratégia discursiva
indicadora da preguiça, estando em vigor, portanto, a lei do menor esforço.

Na Língua Japonesa também ocorre este tipo de empréstimo nomeado por Haugen de “essencialmente gratuitos”. Sakurai (2007, p. 262) cita este tipo de
substituição na Língua Japonesa:

O mais impressionante foi a substituição da palavra gohan (que quer dizer “arroz cozido”) pela palavra raisu (de rice, que é arroz em inglês) no uso cotidiano.
Essa substituição desagradou os mais conservadores pelo lugar de destaque que o arroz tem na cultura japonesa, tanto que os japoneses têm palavras
diferentes para se referir ao arroz cru e ao cozido. Assim como ocorreu com gohan, centenas de outras palavras do japonês falado antigamente estão sendo
substituídas por outras baseadas em vocábulos estrangeiros.

Mas na Língua Japonesa há substituições que não são propriamente desnecessárias, porque há palavras que existem na língua, mas são usadas para objetos
tipicamente da cultura japonesa. Por exemplo, há a palavra ‘porta’ na Língua Japonesa, que é to (■), mas esta palavra refere-se às típicas portas japonesas de
correr, enquanto que a palavra doa (■■), de origem inglesa, é proveniente de door e também significa porta, mas refere-se às portas ocidentais.

O mesmo ocorre com ranchi (■■■), emprestado da Língua Inglesa, que quer dizer almoço comercial (almoço em restaurante, refeitório da empresa etc...),
enquanto Hirugohan ( ■■■) significa almoço em casa. A palavra sh■to ■■■■, do Inglês (curto), só é usada quando se refere ao comprimento do corte de
cabelo. Para indicar curto nas demais palavras da Língua Japonesa usam-se o adjetivo Mijikai (■■■■). Com a palavra leite não é o mesmo caso das palavras
acima, porque Gy■ny■ (■■■■■■) e Miruku (■■■) parecem representar exatamente a mesma coisa. O mesmo ocorre com todas as palavras que estão na
lista abaixo.

Palavra Japonesa Palavra Substituída Significado em Português Língua Fonte Escrita na Língua Fonte
■■■■■■
Miruku (■■■) Leite Inglês Milk
Gy■ny■ ( ■ ■ )
Latim
■■■
Masut■do (■■■■■) Mostarda Mustard
Karashi (■■) Inglês
■■■
Toire[tto] (■■■[■■]) Banheiro Francês Toalete
Otearai (■■■■)
■■■■■
Pinpon (■■■■) Tênis de Mesa Inglês Ping - Pong
Takky■ ( ■ ■ )
Palavra Japonesa Palavra Substituída Significado em Português Língua Fonte Escrita na Língua Fonte
Árabe
■■
Kyand■ (■■■■■) Bala Francês Candy
Ame ( ■ )
Inglês
■■■■■■
Gaido (■■■) Guia (Turístico) Inglês Guide
Annaisho ( ■ ■ ■ )
Francês Grappe
■■■
Gur■pu (■■■■) Uva
Bud■ ( ■■ ) Inglês Grape
N■to[bukku]
■■■■■
Caderno Inglês Notebook
Ch■men ( ■ ■ ) (■■■■■■■■)
Latim Coquina
■■■■■
Kichin (■■■) Cozinha
Daidokoro ( ■ ■ ) Inglês Kitchen
Latim Plata
■■
Shirub■ (■■■■) Prata
Gin ( ■ ) Inglês Silver
Grego
Oruza
■■■
Raisu (■■■) Arroz Cozido115 Francês
Gohan ( ■■ ) Rice
Inglês
Sutorober■
■■■
Morango Inglês Strawberry
Ichigo ( ■ ) (■■■■■■)
■■■
Baggu (■■■) Bolsa, Pasta, Mala Inglês Bag
Kaban ( ■ )
■■■
M■tengu (■■■■■■) Reunião Inglês Meeting
Kaigi ( ■■ )
Meikuappu
■■■■
Maquiagem Inglês Make-up
Kesh■ ( ■■ ) (■■■■■■)
Latim Auru
■■
G■rudo (■■■■) Ouro
Kin ( ■ ) Inglês Gold
Grego Sukkhos
■■■■
Sokkusu (■■■■) Meia
Kutsushita ( ■ ■ ) Inglês Socks
■■■■
Pinku (■■■) Cor de rosa Inglês Pink
Momo iro ( ■ ■ )

Z■tsu (■■■) Terno Inglês Suit


Sebiro ( ■■■ )

117

Palavra Japonesa Palavra Substituída Significado em Português Língua Fonte Escrita na Língua Fonte
Bronzo Italiano
■■■■
Buronzu (■■■■) Bronze Francês Bronze
Seid■ ( ■ ■ )
Bronze Inglês
Grego
■■■■
Foto (■■■) Fotografia Photograph
Shashin ( ■ ■ ) Inglês
Latim
■■■
Risaikuru (■■■■■) Lixo Reciclável Recycle
( ■■ ■■)
Inglês
Latim Testum
■■■
Tesuto (■■■) Teste, Exame
Shiken ( ■■ ) Inglês Test
Latim Frons
■■■■
Furonto (■■■■) Recepção
Uketsuke (■ ■) Inglês Front
■■■■■■
Zukku (■■■) Tênis Holandês Doek
Und■gutsu (■ ■ ■)

Apesar de existirem muitos empréstimos desnecessários (substituições), existem também empréstimos que à primeira vista parecem desnecessários, mas, após
um estudo mais aprofundado do uso da palavra, podemos perceber que ela tem momentos específicos de serem usados, como é o caso de doa (■■), ranchi
(■■■) e sh■to (■■■■), descritos acima.

Observando a tabela das substituições podemos perceber que somente uma das substituições é do Holandês. Todas as outras são do Inglês. Os empréstimos
da Língua Inglesa são a maioria na Língua Japonesa, de acordo com os dados identificados nos livros Minna no Nihongo I e II. Foram levantadas 435 palavras e
somente em 378 pude encontrar a Língua Fonte, sendo distribuídas e apresentadas por ordem decrescente na tabela abaixo.

Língua Fonte Número de Palavras Identificadas


Inglês 285
Português 27
Francês 25
Holandês 13
Alemão 11
Língua Fonte Número de Palavras Identificadas
Italiano 7
Grego 3
Espanhol 2
Mandarim 2
Checo 1
Latim 1
Russo 1

Considerações finais

Se nomeasse esta parte como ‘Conclusão’, estaria afirmando que este trabalho já obteve o seu fim. Mas, como meu objetivo não é encerrar este trabalho por
aqui, resolvi nomeá-lo de ‘Considerações Finais’, porque a meu ver este trabalho não se encerra. Aqui são as primeiras reflexões em relação ao empréstimo na
Língua Japonesa, porque seria muita pretensão de minha parte achar que poderia concluir um assunto tão rico e complexo com somente 2 anos de pesquisa.

O Gairaigo hoje é algo muito forte na sociedade japonesa, e está na vida de milhares de japoneses. Neste tempo de pesquisa pude perceber que a maioria das
palavras japonesas possui substituições da Língua Inglesa, e muitas destas substituições julgo como desnecessárias. Por que substituir uma palavra existente
na sua língua por uma palavra estrangeira? Com os “empréstimos desnecessários” a língua pode ir morrendo e a cultura também e, se perdendo a cultura, se
perde a ideologia, e consequentemente toda lógica de um povo. Como afirma Pimentel da Silva (2001, p.126):

(...) a língua de uma sociedade, ao entrar na outra, leva consigo a concepção de mundo do povo que a fala. Isso, numa relação assimétrica, gera conflitos e
quebra os elos que ligam os gêneros dos discursos de uma sociedade, pois a palavra estrangeira, segundo Bakhtin/Volochinov (1929), transporta consigo forças
e estruturas sociais de um outro mundo e de uma outra verdade.

A incorporação do Gairaigo à Língua Japonesa é um fenômeno que já está na vida de milhares de japoneses. O processo de empréstimo faz parte do
desenvolvimento da língua e também da cultura. Conforme Mattoso Câmara Júnior (1973 apud BORGES 1998. p.137), “o empréstimo é o principal mecanismo
responsável pela renovação lexical. (...)”. Não há línguas dominantes que emprestam itens lexicais sem tomar alguns emprestados de outras. Afirmado também
por Pimentel da Silva (2008):

(...) as línguas mudam, transformam-se, surgem novas palavras, novos enunciados, outros desaparecem. Tudo isso faz parte da vida de uma língua, que
acompanha as mudanças da sociedade que a fala. Ou seja, em qualquer língua, palavras nascem, morrem, mudam de sentido, reúnem-se e separam-se em
locuções, são substituídas, cortadas, ampliadas, ressurgidas e renovadas.

Portanto, o efeito do empréstimo, variará de língua para língua. Em línguas minorizadas, como as línguas indígenas brasileiras, poderá haver o desaparecimento
destas. Em línguas majoritárias, como a Língua Portuguesa e a Língua Japonesa, os efeitos são outros, podendo haver um enriquecimento da língua, ou seja, o
surgimento de um novo conceito ou mesmo uma substituição por uma palavra da língua estrangeira, como comumente está ocorrendo com a Língua Japonesa
e com a Língua Portuguesa. Tanto na Língua Japonesa como na Língua Portuguesa ocorre uma “invasão” de palavras inglesas. Na Língua Japonesa a grande
maioria dos empréstimos é de origem inglesa.

Os jovens já se acostumaram com o Gairaigo e colaboram para cada dia ele se manter e se renovar na Língua Japonesa, mas os idosos ainda encontram
dificuldade neste “novo dialeto”. O Governo Japonês preocupa-se com os idosos e faz questão de informar a população sobre o funcionamento do Gairaigo,
oferecendo linhas telefônicas para esclarecer dúvidas sobre o Gairaigo e até mesmo divulgando painéis com o Gairaigo explicado em Kanji.

O Gairaigo não pode ser visto como um “vilão” que está “comendo” a Língua Japonesa, mas uma consequência da transformação do povo japonês, devido ao
seu desenvolvimento, economia e também uma maneira de acompanhar e integrar a globalização. O ponto principal é que, se continuar havendo muitos
“empréstimos desnecessários”, a Língua Japonesa pode se tornar uma outra língua para alguns, e talvez se abra um imenso abismo entre a linguagem dos
jovens e dos anciãos.

Com este trabalho, cujo assunto não irei esgotar aqui, pretendo fornecer reflexões de como ocorre o empréstimo na Língua Japonesa. Espero que tais reflexões
sejam úteis para os professores de Língua Japonesa, contribuindo para o ensino do Gairaigo e também para uma reflexão sobre o “porquê” dos empréstimos. É,
portanto, um estudo introdutório que abre caminhos para uma reflexão muito mais aprofundada do Gairaigo, como um estudo comparativo entre o Gairaigo de
hoje e o da época da imigração.

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1 XX Encontro Nacional de Professores Universitários de Língua, Literatura e Cultura Japonesa e VII Congresso Internacional de Estudos Japoneses no Brasil.

2 BURKE,2003:14

3 SAITO, 1998; KUDO, 2001; ITO, 2003.

4 BARRAL, 2000; KINSELLA, 1995; KERR, 2001; BRINTON, 2011.

5 KATZ, 2004; GREINER, 2005.

6 O projeto “O universo Otaku e Hikikomori: novas formas de comunicação no Japão contemporâneo” conta com o apoio financeiro da FAPESP, contemplado
com a Bolsa no País/Regular/Pós-Doutorado e está vinculado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP.
7 Para Azuma Hiroki (2001), a cultura otaku espelha as transformações da sociedade japonesa do pós-guerra, o que motivou o consumo, sacrificando a busca
por um maior significado na vida, comparado à gratificação instantânea e quase animalesca.

8 História em quadrinhos; palavra surgida pela junção do ideograma “man” (humor) e “gá” (desenho).

9 Animação (forma contraída da palavra animation em inglês).

10 Tsutomu Miyazaki, um otaku de 27 anos.

11 Termo comum no Japão para designar as provocações e maus tratos que ocorrem nas escolas.

12 SINGER,1997:62.

13 BARRAL, 2000; BREHM, 2002.

14 SATO, 2007:21.

15 Para o psicólogo Saito Tamaki, grande parte da população adolescente masculina estaria vivendo em situação de total reclusão, porém, devido ao
comportamento isolacionista e a camuflagem existente nos nichos familiares, o número oficial de hikikomoris não pode ser medido com exatidão.

16 Revista Veja, Editora Abril, ed.2034. 14/11/2007. Ano 40, no. 45. P.131-134.

17 Revista Veja, Editora Abril, ed.2034. 14/11/2007. Ano 40, no. 45. P.131-134.

18 BAUMAN, Zygmunt. A sociedade individualizada: vidas contadas e histórias vividas; traduzido por José Gradel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2008.
p.8

19 SODRÉ 2002; Hauser 1997; Martin-Barbero 2003.

20 Damásio 1999 e outros.

21 KATZ, 2004

22 Tema da minha tese de Doutorado: Ação e Percepção nos processos comunicacionais do corpo em formação, defendida em 2007 pelo Programa de Estudos
Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP e publicada pela Editora Hedra de São Paulo, em 2010.

23 SODRÉ, 2006:235.

24 Op.cit.

25 BAUMAN, 2004:12

26 GIDDENS & HUTTON, 2004:7.

27 CASTELLS, 2010: XII

28 BAUMAN,2004:13

29 GREINER, 2008

30 Grupo de meninas cuja característica é reforçada pela representação de sedução das colegiais japonesas.

31 Grupo de meninas estudantes que descolorem os cabelos, fazem uso de bronzeamento artificial, pintam ao redor dos olhos de branco e “propõem um visual
que é o negativo de si mesmas” (GREINER, 2008:149).

32 UENO, Chizuko, 2005:247

33 Entrevista ao The Japan Times on-line: http://www.japantimes.co.jp/text/fl20060305x1.html entrevistada por Eric Prideaux, em 05 de Março de 2006.

34 Apud. UENO, 2005.

35 A discriminação contra as mulheres vem de longa data, basta lembrar que a criação de um alfabeto simplificado (hiragana), uma das formas de escrita
japonesa ocorreu em função das mulheres que eram consideradas inaptas intelectualmente para o aprendizado dos ideogramas, tidos como muito complexos.

36 Ueno, Shizuko, 2005:249.

37 Reportagem: Tradição é obstáculo para carreira das trabalhadoras japonesas. Martin Fackler, em Tokyo - The New York Times - 07/08/2007 ( traduzido por
UOL Notícias).

38 Sharon Kinsella é professora de cultura visual japonesa na University of Manchester.

39 Editora do livro The Japanese Experience Inevitable, In the Floating World: Slash with a Knife, 1999.

40 SATO, Cristiane: www.culturajaponesa.com.br


41 Op.cit.

42 BREHM, Margrit, 2002:08

43 BREHM, 2002:12

44 Revista E-Compós: http://www.compos.com.br/e-compos

45 STERLING,1990, Apud: AMARAL, Adriana. 2006.

46 Como Ghost in the Shell 1 e 2, Geno Cyber, Cyberweapon, Cyber City Oedo, Akira, Aeon Flux, Robotech, Tetsuo e outros

47 Livro de William Gibson, considerado o romance que deu origem ao gênero cyberpunk.

48 Revista Wired é uma revista mensal publicada nos Estados Unidos, trabalhando temas ligados à tecnologia e sua influencia à sociedade, cultura, economia e
política.

49 Nicole Mowbray (04/04/2004) “Japanese girls choose whiter shade of pale | World news | The Observer”. London: The Guardian.
http://www.guardian.co.uk/world/2004/apr/04/japan.nicolemowbray.

50 Existem algumas diferenças entre Yamanbas e Manba. As Yamanba fazem uso da maquiagem branca apenas acima dos olhos e as Manbas maquiam
abaixo dos olhos.

51 Light Novel são romances elaborados em estilo manga-anime, direcionados para o público jovem. No início as publicações podem ocorrer em formato de
folhetim para depois seguir para os jornais, revistas, livros e, atualmente estão na Internet e até mesmo nos celulares.

52 Ver em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Sayonara,_Zetsubou_sensei - acessado em 20/02/2012.

53 http://www.paulgravett.com/index.php/articles/article/manga_at_the_royal_academy/.

54 SAITO, 2009:221 - Anais do XX Encontro Nacional de Professores Universitários de Língua, Literatura e Cultura Japonesa e VII Congresso Internacional de
Estudos Japoneses no Brasil – Para além do Japão: Brasil, Canadá e França.

55 Konbine são as lojas de conveniência, facilmente encontradas em toda a parte das grandes cidades japonesas.

56 Entende-se que os Estudos Culturais se configuram enquanto um campo onde há a ocorrência de intersecção de diversas disciplinas para a realização de
estudos sobre determinados aspectos culturais da sociedade contemporânea. Para compreender tal campo, ver Escoteguy (2012).

57 As sociedades modernas ocidentais (especialmente na fase de consolidação do capitalismo liberal), regida pela razão instrumental, caminharam para um
processo de crescente racionalização de suas ações e de suas estruturas social, política e econômica conforme Weber (2002a; 2002b; 2004). Apesar de a
modernidade, especialmente no século XIX, ser conhecida como um período de desencantamento do mundo que distanciava o sujeito do sagrado, isto não
significou a eliminação da religião. Ao contrário, a religião se fortalece enquanto via de salvação, mas perde a centralidade na vida social. Para ver sobre o
desenvolvimento do conceito de desencantamento do mundo na teoria weberiana, ver Pierucci (2003). Sobre a influência da religião no mundo moderno e nas
concepções sobre o corpo, ver Corbin (2009).

58 “O conceito de natureza, ou physis, era compreendido pelos antigos gregos, especialmente na formulação aristotélica, como aquilo que tem o princípio de
movimento em si mesmo, um principio imanente e que atua para um fim (telos), que não é outro senão a própria natureza” (SILVA, 2005, p. 28).

59 Os estudos anatômicos se basearam na experimentação com o corpo morto, tendo como principal método a dissecação. Kuriyama considera que este
método não foi o interesse principal dos médicos chineses, o que levaria a seu baixo grau de desenvolvimento.

60 No caso, a meditação assumia a principal forma. Em algumas escolas como a S■t■, a principal via era a chamada meditação sentada (zazen). Por esta
postura, a pessoa acaba por encarar a sua própria natureza de Buda e entrar no domínio da liberdade (YUSA, 2002).

61 HOLLIS, 2001, p. 225.

62 No presente artigo, respeitei o uso já convencionado do artigo definido masculino para termos de origem japonesa, a saber, “o mangá”, “o animê”, “o kimono”,
“o biombo”. Além disso, o termo kamon, quando precedido do artigo “o”, corresponde ao sentido de “emblema familiar”.

63 Outros termos que se referem à essas insígnias são: mondokoro ■■ (“insígnia do lugar”), monshô ■■ (“composição em formato de insígnia”) ou
simplesmente mon ■ (“emblema”; “insígnia”). Monshô também é utilizado como termo correspondente para “brasão de armas” em japonês, porém geralmente
está relacionado à simbologia de corporações, governos e outras entidades coletivas.

64 Em alguns casos, optarei pela livre-tradução para privilegiar o sentido dos títulos atribuídos às insígnias (kamon) e aos padrões visuais (mon’yô). Contudo,
essas traduções receberão notas de rodapé com informações complementares.

65 Ave da subfamília das Charadriidae.

66 As glicínias chinesas (wisteria sinensis), também conhecidas como “lilases”, pertencem ao gênero wisteria, e é uma planta trepadeira com flores em tons lilás
e azul, com formato de cachos pendentes.

67 Unpan ■■ (“chapa em formato de nuvem”), também conhecida como chôban ■■ (“chapa para bater”) ou shôban ■■ (“chapa de ressoar”), é uma espécie de
chapa circular de metal, suspensa verticalmente, utilizada como gongo em templos zen budistas para anunciar quem acabara de chegar.
68 Sen, moeda que corresponde a um centésimo de iene. Esse formato de moeda começou a ser cunhado no Período Edo, com um padrão em forma de ondas
(seigaiha) em seu reverso.

69 Yamauchi-ke ■■■ (“a família Yamauchi”), que líderava o clã Tosa, possuía grande prestígio na região de Shikoku, onde Iwasaki Yatarô havia nascido.

70 LARAIA, 2002, pp. 59-60.

71 Fictive kinship é um termo usado por antropólogos e etnógrafos para distinguir as formas de parentesco que não se baseiam em laços consanguíneos ou
conjugais.

72 FRUTIGER, 1999. p. 288.

73 WICHMANN, 1981, p. 294.

74 HOUAISS, 2009, p. 2102

75 Op. cit. p. 1323

76 In O FLORESCER das cores: a arte do Período Edo. Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2008. p. 19

77 Padrões de tecelagem utilizados por membros da nobreza, desde o período Heian (794–1185), compostos, predominantemente, de motivos repetidos e
geométricos.

78 Método de tingimento utilizado, originalmente, na pintura e nas artes decorativas para dar a sensação de tridimensionalidade ao objeto. O resultado da
composição são faixas contendo padrões de cores vibrantes.

79 In: A Dictionary of Japanese art terms. [s.l]: Tôkyô Bijutsu, 1990.

80 No Japão, as famílias são constituídas pelo Ie ■ (“casa”; “clã”). Esses clãs são grupos que envolvem não apenas os membros vivos, mas também os
ancestrais e, igualmente, os descendentes que ainda não nasceram. Ie foi o termo utilizado pela legislação japonesa para a constituição das unidades familiares
até o final da Segunda Guerra Mundial.

81 FRUTIGER, 1999, p. 209

82 Tipo de sobretudo que se veste sobre outras peças de quimono.

83 NOMA, 1983, p. 167

84 GOMBRICH, 1995, pp. 99-111

85 PANOFSKY, 1991, pp. 52-58

86 Op. cit. p.136

87 Algumas das fontes pesquisadas registram também a grafia hinagata-bon ■■■■■ ou apenas hinagata ■■ (“modelo em miniatura”).

88 Veste de mangas curtas, confeccionada de seda, com cortes planos e longos, formando uma superfície totalmente plana, principalmente, na região das
costas. Kosode compreende o espaço ideal para a representação dos mais variados padrões. É considerado o precursor do quimono moderno. In O
FLORESCER das cores: a arte do Período Edo. Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2008. p. 21

89 “Foldout 1: Kimono Design Books” In NOMA, 1983.

90 É indicado no livro Kosode to Nô-ishô ■■■■■■ (“kosode e vestuário de nô”), de Noma Seiroku ■■■■ (1902–1966), cujo título em inglês é Japanese
costume and textile arts ■ incluso na bibliografia. Dentre as instituições pesquisadas até então, três possuem exemplares de Ehon Asakayama: o Museu
Britânico, o Spencer Museum of Art, da Universidade de Kansas e o Museu de Belas Artes de Boston.

91 Outra tradução para o termo é “forma de boneca”, pois indicavam as bonecas feitas de papel que serviam de modelo para difundir os projetos de kosode.

92 LAPLANTINE; TRINDADE, 2003, p. 21

93 BALANDIER, 1999.

94 SOUZA, 2008, p. 5

95 Op. cit. p. 8

96 Os empréstimos antigos do Mandarim não são considerados empréstimo, mas os recentes como R■men (sopa de talharim chinês) o são, e também é
utilizada a escrita específica do empréstimo.

97 Carta de Cosme de Torres, um padre jesuíta português, para seus superiores em Roma, relatando sobre o país ainda agora descoberto, o Japão. Os
portugueses chegaram ao Japão por volta de 1543 e foram os primeiros povos europeus a conhecer os japoneses.

98 Aqui trata-se da concepção de Língua/Fala (Langue/Parole) de Ferdinand de Saussure.


99 O Japonês hoje é falado por mais de 126.5 milhões de pessoas no Japão. As principais áreas onde é falado fora do Japão, seguindo os períodos anteriores
da diáspora do japonês, são a costa oeste da América do Norte, do Havaí e da América do Sul. Apesar de muitas pessoas descendentes de japoneses morarem
nessas áreas não falam mais sua língua de herança.

100 O Altaico é um grupo genético proposto que inclui minimamente o Turco, o Tungusico e as famílias mongólicas, talvez também o Coreano e o Japonês. (...)
Os outros dois potenciais membros da família altaica são o Coreano e o Japonês. Coreano (SOHN 1999) é uma língua única. O Japonês (SHIBATANI 1990) é
estritamente falando uma pequena família, incluindo não apenas o Japonês, mas também as Línguas Ry■ky■, que não são mutuamente inteligíveis com o
Japonês ou entre elas; a família é às vezes chamada Japonês – Ry■ky■.

101 Esta tabela tem como base o “Esquema de sons” do Livro Nihongo Hatsuon (), p. 5.

102 O traço em cima da vogal A indica o alongamento da vogal. Quando escrito no Kana Hiragana a vogal é escrita duas vezes, exceção feita à vogal O, que,
quando dobrada, recebe a vogal U. No Kana Katakana o alongamento é indicado por um “travessão” após a vogal que tem que ser dobrada.

103 O Japonês é uma língua de final verbal. A ordem de palavras na sentença é relativamente livre, desde que as sentenças terminam com o verbo principal.

104 Kuno (1978) nomeia as “Partículas de Caso” como “Postpositional Particles” (Partículas Posposicionais).

105 Classificados assim no ensino de Língua Japonesa para estrangeiros, quando estudada no Japão não há esta divisão.

106 Estes 3 (três) verbos estão na forma de dicionário (Jisho kei ).

107 As nomenclaturas Forma Polida e Forma Comum são traduções literais das nomenclaturas japonesas Teineikei e Futs■kei, respectivamente.

108 O verbo benky■ shinakereba narimasen não tem esta separação no momento da escrita e da fala. Aqui está separado para um melhor entendimento do
leitor.

109 Dos mais de 3000 Kanji que um japonês adulto pode empregar em sua vida diária, 1945 são de estudo obrigatórios ao longo do sistema educativo. Esta
lista é conhecida como Kanji de uso comum (■■■■■ J■y■ Kanji). A esta lista soma-se outra, que compreende os Kanji que podem ser utilizados para nomes e
sobrenomes (■■■■■ Jinmeiyou Kanji). Existem ainda Kanji que não pertencendo à lista oficial, são menos usados na vida diária.

110 Os exemplos desta tabela apresentam somente uma leitura do Kanji. Vale lembrar que a maioria dos exemplos tem mais de uma leitura além das aqui
citadas.

111 A transliteração do japonês em alfabeto latino ado(p)tada por Hepburn (1815 - 1911). (Definição retirada de Coelho & Hida (1999), o Dicionário Universal
Japonês – Português).

112 A Língua Shanenawa é uma Língua Indígena, falada por cerca de 400 pessoas em três aldeias na região da Amazônia.

113 A Língua Katukina é uma língua falada no Estado do Acre por mais ou menos 300 pessoas.

114 Sempre que citar sílaba, vogal ou letra, também estarei me referindo como som. Na minha concepção de kana, a sílaba, vogal ou letra corresponde sempre
a um som.

115 A epêntese é a adição de uma vogal ou consoante. No caso da Língua Japonesa, nos empréstimos, acrescenta-se uma vogal epentética após uma
consoante para adaptar a palavra ao padrão silábico da Língua Japonesa, que é CV.

116 A vogal dobrada ocorre somente na escrita, porque no momento da pronúncia o som é longo e não dobrado, ou seja, não se pronunciam duas vogais e sim
uma vogal longa.

117 Na Língua Japonesa diferencia-se o arroz cozido (Gohan ■■■) do arroz cru (Kome ■■).

118 Luta que possui um ringue circular, onde dois lutadores se enfrentam com o objetivo de derrubar ou empurar o adversário para fora do ringue. Esporte
tradicional no Japão ele ainda conserva rituais xintoístas.

119 Arte Suave, Ju-Justu é conhecido como Jiu-Jitsu, nesta arte não se utiliza armas, portanto, dizemos que é uma arte de mãos livres ou sem armas (DUNK,
2009)

120 Literalmente ,“Técnica da espada” utilizada pela classe dos samurais.

121 Escola de esgrima frequentada por Ueshiba.

122 Aikikai Foundation, também conhecido como Hombu Dojo.

123 Sede mundial do Aikido, localizada em Tóquio, ela coordena as regras do estilo, além de monitorar as sedes espalhadas pelo mundo.

124 Há um Guia do Iniciante disponibilizado pela União Sul-Americana de Aikido – Shihan Kawai. Academia Central (SP). Disponível em
<http://www.aikidokawai.com.br/pt/guia-do-iniciante.html> Acesso em: 9 fev. 2012.

125 Samurai que se tornou monge e teve suas memórias registradas por um discípulo em 1716, compilação que ganhou o nome de Hagakure e hoje é
considerado o primeiro relato do bushidô (conduta ética dos samurais).
126 Esgrima japonesa, descendendo do kenjutsu. Teve sua sistematização após a Segunda Guerra Mundial, tornando-se parte do currículo escolar japonês.
(LOURENÇÃO, 2009)

127 Tiro com arco e flecha, literalmente “O caminho do arco”.

ASPECTOS CULTURAIS E TRADICIONAIS NO TATAME: A ETIQUETA NO DOJ■ APLICADA AO AIKIDO

Lariani Djunko de Lima

Introdução

O doj■ (■■) se designa como o local de treinos das artes marciais, em um sentido mais restrito, ele representa a casa de seus praticantes, onde se mantém a
memória dos antepassados e a transmissão da arte e seus valores.

A etiqueta no doj■ é uma prática cultural que está enraizada em várias artes marciais, principalmente japonesas, ela permite a manutenção dos valores sociais
e filosóficos que permeiam a prática de artes marciais tradicionais. Com a disseminação dessas artes para outros países, vieram com elas a etiqueta e regras de
conduta que se deve ter dentro do doj■.

Neste artigo, abordarei sua importância no Aikido, como essa arte recebeu influência dos aspectos culturais e comportamentais da sociedade japonesa e como
seus ‘artifícios’ nos treinos afetam os aikidocas, quais as abordagens educacionais são usadas para que se viabilize o treino e que o praticante possa apreender
em relação à disciplina e conduta.

Morihei Ueshiba

Fundador do Aikido, Morihei Ueshiba nasceu na cidade de Tanabe, província de Wakayama no ano de 1883, sua saúde era frágil durante os primeiros anos.
Seu pai, preocupado com a situação, ingressou o filho em práticas esportivas como a natação e o sum■ (■■)118 durante a juventude. Durante uma viagem a
Tóquio, Ueshiba treinou artes tradicionais do jujutsu119 e kenjutsu120. (DUNK, 2009) além de outra artes marciais tradicionais estudadas por Morihei Ueshiba
como deixou claro: “Já estudei muitos tipo de artes marciais – Yagyu Ryu, Shinyu Ryu, Kito Ryu, Daito Ryu, Shinkage Ryu e outras mais.” (UESHIBA, K. [1977]
2006).

Pouco depois ele se alistou no exército e participou da guerra Russo-Japonesa (1904-1905) sendo enviado para a Manchúria, durante esse período continuou
seus estudos sobre as marcialidades e após seu regresso ao Japão entrou para a escola Gotô se formando em Yagyu-ryu ju-jutsu121 com o mestre Masakatsu
Nakai (idem). Enquanto trabalhava nas terras da família em Tanabe, procurou estudar j■d■ (■■), com Kiyoichi Takagi. Com um grupo de pessoas lideradas por
Ueshiba, em 1910 eles partem para Hokkaido para se estabelecerem no local, neste mesmo período que o Fundador conhece Sokaku Takeda do estilo Daito
Ryu. Uma grande influência para os estudos e composição das técnicas do bud■ criado posteriormente por Morihei, assim como as orientações do reverendo
Onisaburo Deguchi, da seita xintoísta Omoto Ryu, que após a morte de seu pai, Yoroku Ueshiba, muda-se para Ayabe em busca de desenvolvimento espiritual
e das práticas marciais. A popularidade fez com que Ueshiba passasse a ensinar a arte marcial nas bases navais. Como destacou Dunk sobre a divulgação da
arte marcial antes desta ser intitulada Aikido em 1942:

O aiki-budô passou a ter maior divulgação em meio a figuras ilustres do alto comando militar e até mesmo do Imperador Hiroito no pós-guerra. Assim,
entre 1930 e o pós-guerra, Ueshiba era continuamente convidado a ensinar na corte para militares e mesmo para governantes. Durante o período de
pós-guerra e a ocupação estadunidense no Japão, algumas artes marciais não obtiveram espaço para se desenvolverem, porém o Aikidô teve abertura
para a retomada das atividades em Tóquio, posteriormente para outras províncias e futuramente para outros países. (DUNK, 2009 p.11 -12)

Morihei Ueshiba faleceu em 26 de abril de 1969, tendo ensinado e praticado não apenas no Japão, mas em vários lugares do mundo. (UNIÃO, 2009)

O Conceito do Bud■

O Aikido, considerado um bud■ (classificação das artes marciais tradicionais, criada durante o Período Edo) consiste no aprimoramento das técnicas marciais
tradicionais, combinada com uma sublime filosofia do espírito (UESHIBA, 2002), baseado em movimentos circulares, o desenvolvimento e domínio do ki e a
ausência de força física, transformando a força de ataque do oponente e utilizando contra ele mesmo. Os treinos não possuem caráter competitivo, eles se
baseiam na repetição de técnicas onde o único oponente a ser derrotado é a si próprio. O bud■ não se limita a técnicas de defesa pessoal, ou a uma atividade
física: os praticantes de Aikido buscam através dessa arte, unificar corpo e mente em harmonia com o todo.

Como definiu Kisshomaru Ueshiba sobre as técnicas do Aikido:

(...) as técnicas do Aikido nascem da harmonização entre o corpo humano e a energia universal (ki) do céu e da terra. Em poucas palavras, todas as
técnicas de Aikido derivam do princípio do movimento natural. Como cada técnica de Aikido tem sua característica especial, aberta à interpretação
pessoal, o número de técnicas de Aikido é ilimitado. Por conseguinte, o Aikido não pode ser ensinado por meio de padrões predefinidos nem pode ser
rigidamente sistematizado. (UESHIBA,K. [1999] 2002, p.9)

Conceito que se aplica à maioria das artes marciais, a interpretação pessoal de cada praticante ajuda a moldar e compreender o Caminho do Aikido. De início, o
uso de um sistema de repetição de técnicas proporciona o condicionamento do corpo, ao longo do tempo e por meio da experiência eles se tornam princípio do
dia a dia, os métodos aplicados para o ensino e a filosofia da arte marcial.

No Aikido, assim como em algumas artes marciais, há também o treinamento com armas, como a bokken (espada de madeira), j■ (bastão de madeira) e tantto
(faca). O comportamento polido nesse contexto é utilizado como para que o doj■ seja um ambiente agradável sendo muito importante que seja seguido. Aos
iniciantes é comum estranhar o uso do reishiki, tendo em vista que sua mente está focada no preparo físico e não espiritual, no primeiro momento. Assimilar
condicionamento físico e bem-estar da mente é um dos princípios para quem pratica.

Aikido no Brasil

O Aikido no Brasil se inicia em 1960 com a vinda de Reishin Kawai, que era popular entre os imigrantes japoneses por seus conhecimentos em acupuntura e
shiatsu, desenvolvendo seu trabalho entre as comunidades japonesas que visitou no Brasil e principalmente em São Paulo. Com o prolongamento de sua
estadia no país, Kawai sensei acaba ministrando treinos de Aikido em São Paulo e tornando-se representante – geral da Fundação Aikikai122 do Japão no
Brasil, em setembro de 1975. Kawai sensei era faixa preta 8°dan e tinha o título de shihan (algo como instrutor-modelo) concedido por O-Sensei (Grande
Mestre) Morihei Ueshiba, em 1963. Fundador da Federação Paulista de Aikido, e da União Sul-Americana de Aikido, durante o decorrer dos anos, Kawai sensei
viajou a vários lugares do país, divulgando e ensinando a arte marcial. Faleceu em 26 de janeiro de 2010.

Atualmente quem administra e promove a divulgação do Aikido no mundo é o d■shu (■■), que significa literalmente, “senhor do Caminho”) em Aikido Moriteru
Ueshiba, o neto do fundador.

Apesar de não haver regras escritas sobre a conduta no doj■, que tenham sido elaboradas pelos Hombu Dojo123 muitos dos que praticam Aikido veem a
necessidade de explicar atos decorrentes da prática da arte marcial fora do Japão. Isso se deve a falta de costume com tais ritos e reverências que são feitos
com frequência na maioria das artes marciais. E isso pode ser interpretado por um leigo como adoração à algum tipo de religião ou subserviência. O que é
natural aos japoneses, pode ser estranho para os estrangeiros desacostumados com tais regras de etiqueta.

Ao longo da pesquisa, me deparei com vários manuais brasileiros de etiqueta japonesa elaborados pelos doj■ e disponíveis nos respectivos sites destes, é uma
forma interessante e dinâmica encontrada para guiar os iniciantes no Aikido124. Como é possível observar, o nível de educação e integração cultural abrangido
pelas artes marciais modernas é muito além de uma atividade física que reunem pessoas por um fator comum (como a arte marcial aqui tratada, o Aikido), a
difusão da etiqueta japonesa através do Bud■ não se limita ao lugar e as relações sociais entre os aikidocas, a maioria das vezes essa etiqueta e costumes
transpõe essa área e adentram no cotidiano dessas pessoas, levando em consideração que elas não possuam qualquer interação com costumes japoneses
além da arte marcial que pratica.

O Bushid■

Os samurais surgiram da necessidade de treinar homens, lavradores em potencial para se tornar guerreiros e proteger as terras de invasões, um exército
particular de homens exímios na arte da espada, arco e cavalaria, para os clãs de famílias influentes na Era Heian (794 –1192). E por sete séculos, entre 1192 a
1868, eles foram considerados a elite militar do país. Nas palavras relatadas por Yamamoto Tsunetomo125:

Se tivéssemos que dizer em poucas palavras o que é ser um samurai, a base de tudo seria a devoção total do corpo e da alma ao nosso mestre. E se nos
perguntassem o que fazer além disso, a resposta seria nos prepararmos internamente com inteligência, humanidade e coragem. (...) (YAMAMOTO, 1716,
p.88)

Comprometidos com seus senhores, os samurais seguiam uma rígida conduta que lhes permitiam viver com honra e dignidade e sempre preparados para a
morte, seja ela em batalha ou em defesa da honra e de seu senhor, o Bushid■ (■■■) era responsável pelo comportamento e hábitos do guerreiro, um código
de leis que identificava a classe dos samurais. Hierarquia, conduta social, princípios militares, lealdade ao senhor e questões sobre a morte.

Sobre esse conceito, Inazo Nitobe disserta sobre o termo bushid■ em seu livro Bushid■ – alma de samurai:

(…) Essa classe foi naturalmente recrutada, num longo período de guerra constante, entre os mais másculos e mais intrépidos, e durante todo o processo
em que durava a eliminação, os tímidos e frágeis eram descartados e apenas “uma raça rude, todos másculos, com força brutal,” para emprestar a frase
de Emerson, sobreviveu para formar famílias e fileiras dos samurais. Aparecendo para professar grandes honras e privilégios, e correpondentemente
grandes responsabilidades, logo sentiram a necessidade de um padrão comum de comportamento, especialmente por estarem sempre em pé de guerra e
pertencerem a diferentes clãs. Da mesma forma que os médicos limitam a competição entre si por cortesia profissional, do mesmo modo que os
advogados vão aos tribunais de honra em casos de etiqueta violada; assim os guerreiros devem também possuir algum lugar para um julgamento final de
suas contravenções. (NITOBE, 2005, p.12-13)

Baseado em vertentes da filosofia oriental como o confucionismo, xintoísmo e no budismo, este último é apresentado um exemplo característico da classe dos
samurais:

O budismo emprestou ao bushido um sentido de tranquila confiança na sorte, uma submissão pacífica ao inevitável, uma atitude estoica diante do perigo
e da calamidade, o desdém pela vida e a familiaridade com a morte. (YAMAMOTO, Y.)

“Assim como a flor de cerejeira é a flor por excelência, da mesma forma entre os homens o samurai é o homem por excelência.” autor desconhecido.

A mesma perfeição que os samurais procuravam encontrar em tudo que faziam, é a mesma que um praticante de aikido busca encontrar nas técnicas que
pratica. A consciência dos movimentos no tatame e o aprimoramento na relação corpo-mente é a prática do bud■.

Uma das peças usada na vestimenta de um samurai e que representa a preservação das tradições nas artes marciais é o hakama, uma espécie de calças
usadas pelos samurais como proteção para as pernas ao andar a cavalo e para escondê-las durante um combate em terra, ocultando os movimentos. O
hakama possui sete pregas e cada uma delas simboliza uma das qualidades que os samurais deveriam ter: coragem, perseverança, liberdade, lealdade,
sinceridade, compaixão e benevolência. No aikido, aos homens é permitido o uso do hakama a partir da faixa preta (1° dan), as mulheres a partir da faixa roxa
(4° kyu), o motivo estaria na preservação do pudor feminino. Considerando que o dogi (quimono) seja uma roupa de baixo. Há outras formas adotadas por
algumas escolas, como o uso do hakama desde o início, ou em que a mulheres o usam apenas depois da faixa preta, assim como os homens. Isso varia
conforme o estilo de cada uma dessas escolas.

O hakama ainda pode ser encontrado em outras artes marciais tradicionais, como o kenjutsu, kend■126, e kyud■127. Essa preservação dos costumes dos
samurais nas artes marciais, retrata o símbolo que os guerreiros representam no Japão e que se acentuou com o papel que eles tiveram durante o Xogunato
Tokugawa.

O xogunato, termo derivado de xogum, ou chefe militar, era uma nomeação concedida pelo imperador e que possuia caráter hereditário. Ao xogum, cabia
exercer plenos poderes administrativos do país. Durante séculos, o imperador exercia no arquipélago um papel meramente cerimonial (CEPALUNI, 2008).

O sistema era semelhante ao feudal, empregado na Europa da Idade Média. O poder político era dividido entre os daimiôs, nobres que governavam em
territórios designados pelo imperador. O período mais conhecido talvez seja a Era Tokugawa, ou Edo (1603 – 1868), onde os samurais se consolidaram como a
classe social mais poderosa da época. Seus serviços militares aos daimiôs eram pagos com uma cota anual de arroz.

Com esse “assalariamento”, o xogum separou os samurais da terra privando-os das bases de seu poder independente. Assim, eliminou pela raiz uma das
fontes de instabilidade política e suprimiu a função específica dos samurais na sociedade japonesa. (COGGIOLA, 2008, p.34)

Nesse período, os portos são fechados e o cristianismo proibido. O desenvolvimento da manufatura nacional e consequentemente o crescimento da economia
criaram as bases para a industrialização na Era Meiji. O prestígio aos samurais se deve ao sistema de vassalagem imposto pelo xogum e o uso de espadas
permitido apenas aos samurais, assim como as artes marciais passaram a ganhar respeito. Houve o surgimento de vários dojos nessa época, o reishiki se
tornou refinado, o neoconfucionismo contribuía para que isso acontecesse. A ideia de que toda autoridade vem de cima e que todas as pessoas têm seu lugar
na ordem das coisas era reafirmada pelo grau de reverência entre as pessoas. (TAYLOR, 1991). O bushid■ transformou a etiqueta a tornando distinta da
etiqueta usada pelo povo, transformou em algo mais do que reconhecer as autoridades e a hieraquia, ela permitiu que os samurais daquela época vivessem em
alerta, mas sem ter que considerar atos como ofensivos. Nenhuma atitude poderia ser considerada sem intenção.

Esse período de relativa paz serviu para que os guerreiros se aprofundassem em outras artes além das técnicas de guerra. Se instruíam em artes e literatura,
alguns passaram a ser burocratas ou ronin (■■), samurais sem um senhor, andarilhos.

Com o fim do Xogunato, a reestruturação do país e extinção de feudos, a organização de prefeituras e a volta do poder administrativo ao Imperador, a classe
dos samurais foi dispensada de seus serviços por dois motivos principais: seus valores e conhecimentos em batalha, tanto em armas quanto as estratégias,
foram consideradas ultrapassadas. E dessa forma, remunerá-los e mantê-los se tornou um desperdício ao governo que visava usar o dinheiro em prol do
desenvolvimento. Através de decretos, muitos samurais residentes no interior se sentiram traídos pelos que assumiram cargos de confiança no governo.
Proibidos também de portar espadas, esse direito passou a ser exclusivo de policiais e militares. Rebeliões organizadas pelos samurais eram facilmente
sufocadas pelo exército imperial.

Mais do que lutar pela classe social que se extinguia, os samurais lutavam contra a modernização do país e em defesa das tradições (como no caso das
gueixas, consideradas ultrapassadas, mas detentoras de um passado glorioso do Japão.)

A transformação sofrida na Restauração Meiji, com o avanço tecnológico e a introdução de aspectos culturais ocidentais em um país que fechara
completamente seus portos para qualquer negociação e intervenção estrangeira por mais de 250 anos, com sua abertura durante esse período, resultou em
uma drástica mudança comportamental da sociedade e seus princípios, confrontando diretamente com antigos valores e que se preservaram através de
adaptações ao meio, caso este das artes marciais. Durante o período Tokugawa, as tradições da classe militar, como continuação da cultura antiga,
condicionaram profundamente o caráter nacional. (RATTI, 1973) o domínio da classe militar deixaram para a sociedade nipônica comportamentos e
pensamentos que mantém seus resquícios até os dias atuais.

Contudo, as dificuldades não fizeram com que Jigoro Kano desistisse do objetivo de preservar os elementos das artes marciais tradicionais quando criou o Jud■
(literalmente “Caminho Suave”):

As artes marciais tradicionais do Japão podem ser consideradas importantes tesouros culturais e históricos, mas, depois da Restauração Meiji, em 1868,
e da falência da antiga ordem dos samurais, a rápida e indiscrimianda ocidentalização do país produziu um efeito devastador sobre todas as artes
marciais. Jigoro Kano (1860 - 1938) achava que os melhores elementos das artes marciais japonesas deverriam ser preservadas, mas para ele foi muito
difícil encontrar mestres exímios e aprender com eles – a maioria dos artistas marciais antigos havia desaparecido.

Somente com perseverança e esforços diligentes ele conseguiu fundar o Kodokan Judo, para preservar o melhor das artes marciais tradicionais
japonesas num contexto moderno. (UESHIBA, M. 2002, p.10)

Morihei Ueshiba acreditava na preservação do ‘espírito japonês’ no Aikido e o uso da arte marcial para a correta solução dos problemas estratégicos (RAITTI,
1973) talvez não na competição esportiva como forma de divulgação ao Ocidente, como acabou acontecendo ao Jud■ de Jigoro Kano como apontado por
Ueshiba M. (2002), a não competividade é uma das características que distingue o Aikido de outras artes, Há presença de técnicas de imobilização, as quais
não são entendidas enquanto movimento pelo movimento, mas espiritualmente contextualizadas. (DUNK, 2009) e a desvinculação de elementos culturais
japoneses, no caso etiqueta e espiritualidade dos ritos, tornam a prático do Aikido apenas a junção de técnicas sem propósitos maiores do que a atividade física,
contudo sem os benefícios à mente ou a manutenção de valores e aspectos tradicionais incutidos no doj■.

Etiqueta no tatame

É comum associar os asiáticos com a forma de cumprimento usado por eles, o exemplo está na reverência, gesto que equivale ao aperto de mão dos países
ocidentais e que por vezes é satirizado na forma estereotipada do japonês. O modo de se curvar o corpo diante de outra pessoa (ojigi) representa um gesto de
respeito. Pode significar desde um cumprimento, um pedido de desculpas ou até mesmo súplica. Toda essa formalidade baseia-se na tradição chinesa que
influenciou fortemente o Japão através de Confúcio (551 a.C. - 479 a.C.) e transformou-se em aspecto cultural com o tempo: essa etiqueta é utilizada em todos
os lugares e denominada tatemae. Atualmente o cumprimento ocidental de se dar as mãos está se tornando aceitável entre os japoneses, entretanto o beijo
ainda enfrenta resistência devido seu forte apelo sexual, até mesmo entre os jovens.

O reishiki, longe de ser um ato de submissão no tatame, se resume a etiqueta entre os praticantes durante sua permanência no doj■. Comportamento que os
instrutores a maioria das vezes esperam serem desenvolvidos naturalmente, quando isso não acontece é feito uso de manuais, conversas sobre como se portar
nos treinos e sobre a importância dessa conduta. No Japão esse comportamento é esperado e exigido pela sociedade e pelo ambiente apenas variando seu
grau de acordo com a posição e a circunstância em que a pessoa se encontra (como o tatemae citado no início).

“O Bud■ começa e termina com Reishiki.” Isso não quer dizer que balançamos a cabeça no início e no fim das aulas, isso significa que o Bud■ é Reishiki. As
boas maneiras não são “adicionadas”, elas fazem parte da arte. (TAYLOR, 1991). As regras de etiqueta que há no doj■ são as formas de respeito e humildade
que devem ser mostrados ao budô e ao seu fundador. É a corrente subjacente de etiqueta e comportamentos sociais que nos permite praticar em segurança,
disciplinar e redirecionar as reações agressivas e desenvolvendo os sentimentos de compaixão e respeito. (ABA, 2005.) Algumas das medidas do reishiki que
são importantes no doj■:

• Ao entrar e sair do tatame, deve-se fazer uma reverência, ou Shomen Ni Rei (saudação) em direção a foto do fundador Morihei Ueshiba ou como em alguns
dojos, fazer uma reverência ao kamizama (altar shintoísta). Em seiza (sentado sobre os calcanhares), fazer novamente reverência ao fundador e ao sensei.
• Ao início e término da prática da técnica, fazer reverência ao parceiro dizendo onegai shimasu (por favor) antes de começar e domo arigatou gozaimashita
(muito obrigado) ao final da prática.
• Quando o sensei estiver demonstrando uma técnica ou orientando, permanecer em seiza e ao final agradecer com uma reverência – essa atitude denota
respeito e que está concentrado para aprender.
• Manter o doj■ sempre limpo, essa responsabilidade se estendendo para o gi (quimono) e a faixa – são sinais de higiene e disciplina.

Considerada um bud■ moderno, o Aikido busca com a rígida etiqueta valorizar a conduta que os samurais seguiam. Um discípulo deve sempre servir seu
mestre, respeitá-lo e considerar o que pratica um caminho.

O comportamento adquirido no doj■, precede da ética seguida pelos samurais, o bushid■, que hoje é preservado pelas artes marciais modernas. O Aikido tem
como função a preservação dessa etiqueta, desenvolvido na Era Tokugawa (ou Edo), conforme Kisshomaru Ueshiba descreve:

As antigas artes de combate constituem um legado histórico e cultural, tendo se originado no campo de batalha em períodos de conturbações sociais e
posteriormente formalizadas como Bud■, o Caminho das artes marciais, no período Tokugawa (1603-1868). Precisam ser avaliadas e apreciadas
devidamente. Em sua forma original, não são aceitas pelas pessoas de hoje e estão fora de lugar no mundo moderno que, especificamente para o Japão,
teve início com a Restauração Meiji (1868). (UESHIBA, 1984. P.21).

A contribuição da etiqueta social e a decorrente troca de informações que existem entre sociedade e artes marciais, visa a a evolução e formação do homem
íntegro (YAMAMOTO Y.) aumentando seu senso de responsabilidade e dever para com o coletivo. A exigência de treinar com sinceridade, tentando aplicar cada
golpe de forma perfeita, assim como de melhorar o comportamento no doj■ e no meio social, induz o kenshi a analisar constantemente se sua atitude está certa,
se se comportamento está correto e útil para a coletividade.(idem, p.25). Assim como o definido por Yamamoto Y., a hierarquia e a resistência aos conflitos
gerados pela convivência, podem ser evitados por uma mente alerta e pacífica, o espírito de combatividade é contido e moldado no decorrer dos treinos. Com
relação aos treinos no Brasil, a identidade nipônica é exteriorizada entre os praticantes brasileiros, com o tempo os hábitos usados no doj■ se projetam em
diferentes situações sociais fora do local de treino. A influência da cultura nipônica aplicada ao Aikido, denotam que são ´dispositivos’ para que sejam ativados,
se passa a ter contato com os discursos sobre a disposição japonesa e esse ´modo´ internaliza-se e se atualiza. (LOURENÇÃO, 2010) Essa valorização da
moralidade, ética, e prática de mente e corpo do bud■ são temas que permeiam a ideia do ‘ser/estar japonês’ dos praticantes de Aikido.

Conclusão

Com o fim da Era Tokugawa, a extinção da classe dos samurais e a proibição do porte de espadas por estes, os doj■s que sobreviveram a essa época se
tornaram a resistência ao fim do sistema feudal e a restituição dos poderes ao Imperador. O nacionalismo, o orgulho japonês e sua honra, definem o que as
artes marciais não deveriam perder naquele momento. Os doj■s deixam de criar guerreiros para tornar a prática das artes marciais em um caminho de
autoconhecimento e vida. Entretanto, continuam a praticar suas cerimônias, conduta e hierarquia, para que não se perdessem seus valores culturais e aspectos
que poderiam ser esquecidos com a parcial ocidentalização. A Restauração Meiji, ao abolir as antigas estruturas feudais sem, todavia, alterar profundamente as
bases da sociedade japonesa, permitiu aos privilegiados da antiga ordem reciclar-se em homens de negócios, mantendo a crença social nas fortes tradições
ancestrais (COGGIOLA, 2008)

Morihei Ueshiba vive nesse contexto de “reformulação” das artes marciais, por isso sente a necessidade de conservar a essência dos valores do bushid■ e do
que a sociedade japonesa foi durante muitos anos e ainda continua sendo: tratar com respeito e cordialidade as pessoas, evitando conflitos desnecessários. A
preservação da conduta samurai na prática do aikido se difunde pelos países que adotaram o bud■, como no Brasil. Todavia, há adaptações ao método de
ensino, na forma de diálogos durante os treinos, explicações sobre a conduta no doj■ e uso de manuais virtuais que são distribuídos através dos sites que
divulgam os locais de treino. A tentativa de simplificar uma cultura tão diferente da brasileira, cria elementos eficazes e de fácil concepção, gerando uma
‘identidade’ dentro do tatame, baseado nas experiências, discussões e aconselhamento dos veteranos. O praticante de Aikido inclui em seu cotidiano o que
aprende no doj■.

Pois, como o dito anteriormente, a separação de ‘técnica’ e ‘cultura’ apenas tornaria o Aikido em um conjunto de movimentos feitos aleatoriamente. Por isso,
esses valores que são passados no tatame funcionam como manutenção de um ambiente de disciplina e respeito mútuo, tornando-o agradável e carregando
consigo o real significado do reishiki, a paz do ambiente e consequentemente a paz de espírito.

REFERÊNCIAS

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CREMONA, Paulo Sérgio, Guia prático de defesa pessoal: Aikido. São Paulo: Ed. Escala.
COGGIOLA, Osvaldo, Uma via original para a modernidade. História viva: Japão: 500 anos de história: 100 anos de imigração, Duetto Editorial, São Paulo,
2008.

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DUNK, Marcos D. O.2009: Aikidô e Dialogicidade: um possível caminho de sabedoria. Monografia de conclusão do curso de Pedagogia da Universidade Federal
de São Carlos (UFSCar).

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LOURENÇÃO, Gil Vicente, 2010: Identidades, práticas e moralidades transnacionais: etnografia da esgrima japonesa no Brasil. Dissertação de mestrado
apresentado no Programa de pós-graduação de Antropologia Social da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
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UNIÃO SUL – AMERICANA DE AIKIDO KAWI SHIHAN. Disponível em <http://www.aikidokawai.com.br/> Acesso em 9 fev. 2012.

SHUGYAOKAN SHORIN RYU DOJO: What is Reishiki? Disponível em:


<http://alljapankarate.com/index.php?option=com_content&task=blogcategory&id=45&Itemid=55>. Acesso em: 02 fev. 2012.

1 XX Encontro Nacional de Professores Universitários de Língua, Literatura e Cultura Japonesa e VII Congresso Internacional de Estudos Japoneses no Brasil.

2 BURKE,2003:14

3 SAITO, 1998; KUDO, 2001; ITO, 2003.

4 BARRAL, 2000; KINSELLA, 1995; KERR, 2001; BRINTON, 2011.

5 KATZ, 2004; GREINER, 2005.

6 O projeto “O universo Otaku e Hikikomori: novas formas de comunicação no Japão contemporâneo” conta com o apoio financeiro da FAPESP, contemplado
com a Bolsa no País/Regular/Pós-Doutorado e está vinculado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP.

7 Para Azuma Hiroki (2001), a cultura otaku espelha as transformações da sociedade japonesa do pós-guerra, o que motivou o consumo, sacrificando a busca
por um maior significado na vida, comparado à gratificação instantânea e quase animalesca.

8 História em quadrinhos; palavra surgida pela junção do ideograma “man” (humor) e “gá” (desenho).

9 Animação (forma contraída da palavra animation em inglês).

10 Tsutomu Miyazaki, um otaku de 27 anos.

11 Termo comum no Japão para designar as provocações e maus tratos que ocorrem nas escolas.

12 SINGER,1997:62.

13 BARRAL, 2000; BREHM, 2002.

14 SATO, 2007:21.
15 Para o psicólogo Saito Tamaki, grande parte da população adolescente masculina estaria vivendo em situação de total reclusão, porém, devido ao
comportamento isolacionista e a camuflagem existente nos nichos familiares, o número oficial de hikikomoris não pode ser medido com exatidão.

16 Revista Veja, Editora Abril, ed.2034. 14/11/2007. Ano 40, no. 45. P.131-134.

17 Revista Veja, Editora Abril, ed.2034. 14/11/2007. Ano 40, no. 45. P.131-134.

18 BAUMAN, Zygmunt. A sociedade individualizada: vidas contadas e histórias vividas; traduzido por José Gradel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2008.
p.8

19 SODRÉ 2002; Hauser 1997; Martin-Barbero 2003.

20 Damásio 1999 e outros.

21 KATZ, 2004

22 Tema da minha tese de Doutorado: Ação e Percepção nos processos comunicacionais do corpo em formação, defendida em 2007 pelo Programa de Estudos
Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP e publicada pela Editora Hedra de São Paulo, em 2010.

23 SODRÉ, 2006:235.

24 Op.cit.

25 BAUMAN, 2004:12

26 GIDDENS & HUTTON, 2004:7.

27 CASTELLS, 2010: XII

28 BAUMAN,2004:13

29 GREINER, 2008

30 Grupo de meninas cuja característica é reforçada pela representação de sedução das colegiais japonesas.

31 Grupo de meninas estudantes que descolorem os cabelos, fazem uso de bronzeamento artificial, pintam ao redor dos olhos de branco e “propõem um visual
que é o negativo de si mesmas” (GREINER, 2008:149).

32 UENO, Chizuko, 2005:247

33 Entrevista ao The Japan Times on-line: http://www.japantimes.co.jp/text/fl20060305x1.html entrevistada por Eric Prideaux, em 05 de Março de 2006.

34 Apud. UENO, 2005.

35 A discriminação contra as mulheres vem de longa data, basta lembrar que a criação de um alfabeto simplificado (hiragana), uma das formas de escrita
japonesa ocorreu em função das mulheres que eram consideradas inaptas intelectualmente para o aprendizado dos ideogramas, tidos como muito complexos.

36 Ueno, Shizuko, 2005:249.

37 Reportagem: Tradição é obstáculo para carreira das trabalhadoras japonesas. Martin Fackler, em Tokyo - The New York Times - 07/08/2007 ( traduzido por
UOL Notícias).

38 Sharon Kinsella é professora de cultura visual japonesa na University of Manchester.

39 Editora do livro The Japanese Experience Inevitable, In the Floating World: Slash with a Knife, 1999.

40 SATO, Cristiane: www.culturajaponesa.com.br

41 Op.cit.

42 BREHM, Margrit, 2002:08

43 BREHM, 2002:12

44 Revista E-Compós: http://www.compos.com.br/e-compos

45 STERLING,1990, Apud: AMARAL, Adriana. 2006.

46 Como Ghost in the Shell 1 e 2, Geno Cyber, Cyberweapon, Cyber City Oedo, Akira, Aeon Flux, Robotech, Tetsuo e outros

47 Livro de William Gibson, considerado o romance que deu origem ao gênero cyberpunk.

48 Revista Wired é uma revista mensal publicada nos Estados Unidos, trabalhando temas ligados à tecnologia e sua influencia à sociedade, cultura, economia e
política.
49 Nicole Mowbray (04/04/2004) “Japanese girls choose whiter shade of pale | World news | The Observer”. London: The Guardian.
http://www.guardian.co.uk/world/2004/apr/04/japan.nicolemowbray.

50 Existem algumas diferenças entre Yamanbas e Manba. As Yamanba fazem uso da maquiagem branca apenas acima dos olhos e as Manbas maquiam
abaixo dos olhos.

51 Light Novel são romances elaborados em estilo manga-anime, direcionados para o público jovem. No início as publicações podem ocorrer em formato de
folhetim para depois seguir para os jornais, revistas, livros e, atualmente estão na Internet e até mesmo nos celulares.

52 Ver em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Sayonara,_Zetsubou_sensei - acessado em 20/02/2012.

53 http://www.paulgravett.com/index.php/articles/article/manga_at_the_royal_academy/.

54 SAITO, 2009:221 - Anais do XX Encontro Nacional de Professores Universitários de Língua, Literatura e Cultura Japonesa e VII Congresso Internacional de
Estudos Japoneses no Brasil – Para além do Japão: Brasil, Canadá e França.

55 Konbine são as lojas de conveniência, facilmente encontradas em toda a parte das grandes cidades japonesas.

56 Entende-se que os Estudos Culturais se configuram enquanto um campo onde há a ocorrência de intersecção de diversas disciplinas para a realização de
estudos sobre determinados aspectos culturais da sociedade contemporânea. Para compreender tal campo, ver Escoteguy (2012).

57 As sociedades modernas ocidentais (especialmente na fase de consolidação do capitalismo liberal), regida pela razão instrumental, caminharam para um
processo de crescente racionalização de suas ações e de suas estruturas social, política e econômica conforme Weber (2002a; 2002b; 2004). Apesar de a
modernidade, especialmente no século XIX, ser conhecida como um período de desencantamento do mundo que distanciava o sujeito do sagrado, isto não
significou a eliminação da religião. Ao contrário, a religião se fortalece enquanto via de salvação, mas perde a centralidade na vida social. Para ver sobre o
desenvolvimento do conceito de desencantamento do mundo na teoria weberiana, ver Pierucci (2003). Sobre a influência da religião no mundo moderno e nas
concepções sobre o corpo, ver Corbin (2009).

58 “O conceito de natureza, ou physis, era compreendido pelos antigos gregos, especialmente na formulação aristotélica, como aquilo que tem o princípio de
movimento em si mesmo, um principio imanente e que atua para um fim (telos), que não é outro senão a própria natureza” (SILVA, 2005, p. 28).

59 Os estudos anatômicos se basearam na experimentação com o corpo morto, tendo como principal método a dissecação. Kuriyama considera que este
método não foi o interesse principal dos médicos chineses, o que levaria a seu baixo grau de desenvolvimento.

60 No caso, a meditação assumia a principal forma. Em algumas escolas como a S■t■, a principal via era a chamada meditação sentada (zazen). Por esta
postura, a pessoa acaba por encarar a sua própria natureza de Buda e entrar no domínio da liberdade (YUSA, 2002).

61 HOLLIS, 2001, p. 225.

62 No presente artigo, respeitei o uso já convencionado do artigo definido masculino para termos de origem japonesa, a saber, “o mangá”, “o animê”, “o kimono”,
“o biombo”. Além disso, o termo kamon, quando precedido do artigo “o”, corresponde ao sentido de “emblema familiar”.

63 Outros termos que se referem à essas insígnias são: mondokoro ■■ (“insígnia do lugar”), monshô ■■ (“composição em formato de insígnia”) ou
simplesmente mon ■ (“emblema”; “insígnia”). Monshô também é utilizado como termo correspondente para “brasão de armas” em japonês, porém geralmente
está relacionado à simbologia de corporações, governos e outras entidades coletivas.

64 Em alguns casos, optarei pela livre-tradução para privilegiar o sentido dos títulos atribuídos às insígnias (kamon) e aos padrões visuais (mon’yô). Contudo,
essas traduções receberão notas de rodapé com informações complementares.

65 Ave da subfamília das Charadriidae.

66 As glicínias chinesas (wisteria sinensis), também conhecidas como “lilases”, pertencem ao gênero wisteria, e é uma planta trepadeira com flores em tons lilás
e azul, com formato de cachos pendentes.

67 Unpan ■■ (“chapa em formato de nuvem”), também conhecida como chôban ■■ (“chapa para bater”) ou shôban ■■ (“chapa de ressoar”), é uma espécie de
chapa circular de metal, suspensa verticalmente, utilizada como gongo em templos zen budistas para anunciar quem acabara de chegar.

68 Sen, moeda que corresponde a um centésimo de iene. Esse formato de moeda começou a ser cunhado no Período Edo, com um padrão em forma de ondas
(seigaiha) em seu reverso.

69 Yamauchi-ke ■■■ (“a família Yamauchi”), que líderava o clã Tosa, possuía grande prestígio na região de Shikoku, onde Iwasaki Yatarô havia nascido.

70 LARAIA, 2002, pp. 59-60.

71 Fictive kinship é um termo usado por antropólogos e etnógrafos para distinguir as formas de parentesco que não se baseiam em laços consanguíneos ou
conjugais.

72 FRUTIGER, 1999. p. 288.

73 WICHMANN, 1981, p. 294.

74 HOUAISS, 2009, p. 2102


75 Op. cit. p. 1323

76 In O FLORESCER das cores: a arte do Período Edo. Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2008. p. 19

77 Padrões de tecelagem utilizados por membros da nobreza, desde o período Heian (794–1185), compostos, predominantemente, de motivos repetidos e
geométricos.

78 Método de tingimento utilizado, originalmente, na pintura e nas artes decorativas para dar a sensação de tridimensionalidade ao objeto. O resultado da
composição são faixas contendo padrões de cores vibrantes.

79 In: A Dictionary of Japanese art terms. [s.l]: Tôkyô Bijutsu, 1990.

80 No Japão, as famílias são constituídas pelo Ie ■ (“casa”; “clã”). Esses clãs são grupos que envolvem não apenas os membros vivos, mas também os
ancestrais e, igualmente, os descendentes que ainda não nasceram. Ie foi o termo utilizado pela legislação japonesa para a constituição das unidades familiares
até o final da Segunda Guerra Mundial.

81 FRUTIGER, 1999, p. 209

82 Tipo de sobretudo que se veste sobre outras peças de quimono.

83 NOMA, 1983, p. 167

84 GOMBRICH, 1995, pp. 99-111

85 PANOFSKY, 1991, pp. 52-58

86 Op. cit. p.136

87 Algumas das fontes pesquisadas registram também a grafia hinagata-bon ■■■■■ ou apenas hinagata ■■ (“modelo em miniatura”).

88 Veste de mangas curtas, confeccionada de seda, com cortes planos e longos, formando uma superfície totalmente plana, principalmente, na região das
costas. Kosode compreende o espaço ideal para a representação dos mais variados padrões. É considerado o precursor do quimono moderno. In O
FLORESCER das cores: a arte do Período Edo. Pinacoteca do Estado de São Paulo, 2008. p. 21

89 “Foldout 1: Kimono Design Books” In NOMA, 1983.

90 É indicado no livro Kosode to Nô-ishô ■■■■■■ (“kosode e vestuário de nô”), de Noma Seiroku ■■■■ (1902–1966), cujo título em inglês é Japanese
costume and textile arts ■ incluso na bibliografia. Dentre as instituições pesquisadas até então, três possuem exemplares de Ehon Asakayama: o Museu
Britânico, o Spencer Museum of Art, da Universidade de Kansas e o Museu de Belas Artes de Boston.

91 Outra tradução para o termo é “forma de boneca”, pois indicavam as bonecas feitas de papel que serviam de modelo para difundir os projetos de kosode.

92 LAPLANTINE; TRINDADE, 2003, p. 21

93 BALANDIER, 1999.

94 SOUZA, 2008, p. 5

95 Op. cit. p. 8

96 Os empréstimos antigos do Mandarim não são considerados empréstimo, mas os recentes como R■men (sopa de talharim chinês) o são, e também é
utilizada a escrita específica do empréstimo.

97 Carta de Cosme de Torres, um padre jesuíta português, para seus superiores em Roma, relatando sobre o país ainda agora descoberto, o Japão. Os
portugueses chegaram ao Japão por volta de 1543 e foram os primeiros povos europeus a conhecer os japoneses.

98 Aqui trata-se da concepção de Língua/Fala (Langue/Parole) de Ferdinand de Saussure.

99 O Japonês hoje é falado por mais de 126.5 milhões de pessoas no Japão. As principais áreas onde é falado fora do Japão, seguindo os períodos anteriores
da diáspora do japonês, são a costa oeste da América do Norte, do Havaí e da América do Sul. Apesar de muitas pessoas descendentes de japoneses morarem
nessas áreas não falam mais sua língua de herança.

100 O Altaico é um grupo genético proposto que inclui minimamente o Turco, o Tungusico e as famílias mongólicas, talvez também o Coreano e o Japonês. (...)
Os outros dois potenciais membros da família altaica são o Coreano e o Japonês. Coreano (SOHN 1999) é uma língua única. O Japonês (SHIBATANI 1990) é
estritamente falando uma pequena família, incluindo não apenas o Japonês, mas também as Línguas Ry■ky■, que não são mutuamente inteligíveis com o
Japonês ou entre elas; a família é às vezes chamada Japonês – Ry■ky■.

101 Esta tabela tem como base o “Esquema de sons” do Livro Nihongo Hatsuon (), p. 5.

102 O traço em cima da vogal A indica o alongamento da vogal. Quando escrito no Kana Hiragana a vogal é escrita duas vezes, exceção feita à vogal O, que,
quando dobrada, recebe a vogal U. No Kana Katakana o alongamento é indicado por um “travessão” após a vogal que tem que ser dobrada.

103 O Japonês é uma língua de final verbal. A ordem de palavras na sentença é relativamente livre, desde que as sentenças terminam com o verbo principal.
104 Kuno (1978) nomeia as “Partículas de Caso” como “Postpositional Particles” (Partículas Posposicionais).

105 Classificados assim no ensino de Língua Japonesa para estrangeiros, quando estudada no Japão não há esta divisão.

106 Estes 3 (três) verbos estão na forma de dicionário (Jisho kei ).

107 As nomenclaturas Forma Polida e Forma Comum são traduções literais das nomenclaturas japonesas Teineikei e Futs■kei, respectivamente.

108 O verbo benky■ shinakereba narimasen não tem esta separação no momento da escrita e da fala. Aqui está separado para um melhor entendimento do
leitor.

109 Dos mais de 3000 Kanji que um japonês adulto pode empregar em sua vida diária, 1945 são de estudo obrigatórios ao longo do sistema educativo. Esta
lista é conhecida como Kanji de uso comum (■■■■■ J■y■ Kanji). A esta lista soma-se outra, que compreende os Kanji que podem ser utilizados para nomes e
sobrenomes (■■■■■ Jinmeiyou Kanji). Existem ainda Kanji que não pertencendo à lista oficial, são menos usados na vida diária.

110 Os exemplos desta tabela apresentam somente uma leitura do Kanji. Vale lembrar que a maioria dos exemplos tem mais de uma leitura além das aqui
citadas.

111 A transliteração do japonês em alfabeto latino ado(p)tada por Hepburn (1815 - 1911). (Definição retirada de Coelho & Hida (1999), o Dicionário Universal
Japonês – Português).

112 A Língua Shanenawa é uma Língua Indígena, falada por cerca de 400 pessoas em três aldeias na região da Amazônia.

113 A Língua Katukina é uma língua falada no Estado do Acre por mais ou menos 300 pessoas.

114 Sempre que citar sílaba, vogal ou letra, também estarei me referindo como som. Na minha concepção de kana, a sílaba, vogal ou letra corresponde sempre
a um som.

115 A epêntese é a adição de uma vogal ou consoante. No caso da Língua Japonesa, nos empréstimos, acrescenta-se uma vogal epentética após uma
consoante para adaptar a palavra ao padrão silábico da Língua Japonesa, que é CV.

116 A vogal dobrada ocorre somente na escrita, porque no momento da pronúncia o som é longo e não dobrado, ou seja, não se pronunciam duas vogais e sim
uma vogal longa.

117 Na Língua Japonesa diferencia-se o arroz cozido (Gohan ■■■) do arroz cru (Kome ■■).

118 Luta que possui um ringue circular, onde dois lutadores se enfrentam com o objetivo de derrubar ou empurar o adversário para fora do ringue. Esporte
tradicional no Japão ele ainda conserva rituais xintoístas.

119 Arte Suave, Ju-Justu é conhecido como Jiu-Jitsu, nesta arte não se utiliza armas, portanto, dizemos que é uma arte de mãos livres ou sem armas (DUNK,
2009)

120 Literalmente ,“Técnica da espada” utilizada pela classe dos samurais.

121 Escola de esgrima frequentada por Ueshiba.

122 Aikikai Foundation, também conhecido como Hombu Dojo.

123 Sede mundial do Aikido, localizada em Tóquio, ela coordena as regras do estilo, além de monitorar as sedes espalhadas pelo mundo.

124 Há um Guia do Iniciante disponibilizado pela União Sul-Americana de Aikido – Shihan Kawai. Academia Central (SP). Disponível em
<http://www.aikidokawai.com.br/pt/guia-do-iniciante.html> Acesso em: 9 fev. 2012.

125 Samurai que se tornou monge e teve suas memórias registradas por um discípulo em 1716, compilação que ganhou o nome de Hagakure e hoje é
considerado o primeiro relato do bushidô (conduta ética dos samurais).

126 Esgrima japonesa, descendendo do kenjutsu. Teve sua sistematização após a Segunda Guerra Mundial, tornando-se parte do currículo escolar japonês.
(LOURENÇÃO, 2009)

127 Tiro com arco e flecha, literalmente “O caminho do arco”.

SOBRE OS AUTORES

Cecilia Noriko Ito Saito

Pós-doutorado PUC-SP/FAPESP (em andamento), Doutorado (CNPq) e mestrado pelo Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica, da
PUC-SP. Especialização em Arte e Tecnologia. Autora dos livros: Ação e Percepção, Editora Hedra, São Paulo (2010); O shodô, o corpo e os novos processos
de significação, Editora Annablume, São Paulo (2004). Organizadora do livro Meia volta ao mundo, editado pela ANBG, patrocinado pela Secult, de Goiânia
(2008). Fundadora do CPCJ-GO.

E-mail: ceciliasaito@uol.com.br

Ismar Borges de Lima


Professor efetivo da Universidade Estadual de Roraima, UERR, coordenador do Curso de Turismo e Coordenador-geral do Laboratório Multidisciplinar em
Planejamento Regional, Dinâmicas Territoriais e Desenvolvimento Sustentável na Amazônia Setentrional, MULTIAMAZON, da Universidade Estadual de
Roraima. Mestre em Relações Internacionais pela International University of Japan (IUJ). Doutor em Geografia Humana e Turismo pela Universidade de Waikato
(Nova Zelândia). Membro do Centro de Pesquisas em Cultura Japonesa de Goiás.

E-mails: ismarlima@yahoo.com.br / ismargo2000@hotmail.com

Marcel Farias de Sousa

Professor assistente na Faculdade de Educação Física da Universidade Federal de Goiás. Formação em Licenciatura em Educação Física pela Escola Superior
de Educação Física e Fisioterapia de Goiás, unidade da Universidade Estadual de Goiás (UEG) e Mestre em Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em
Sociologia da UFG. Membro do Centro de Pesquisa em Cultura Japonesa de Goiás.

E-mail: nichscene@yahoo.com

Eduardo Araújo de Ávila

Mestrando em Arte e Cultura Visual e Graduado em Artes Visuais, ambos pela Universidade Federal de Goiás – UFG. Membro do Centro de Pesquisas em
Cultura Japonesa de Goiás. Atua principalmente nas áreas de Artes Visuais e Estudos Orientais. Possui experiências em design instrucional, design editorial,
identidade visual, gravura, práticas e processos artísticos.

E-mail: eduavil@gmail.com

Roberta Akemi Yamada

Graduada pela Universidade Federal de Goiás, em Letras, Bacharelado em Estudos Linguísticos e Licenciatura em Língua Portuguesa. Atua na área de
Linguística, com foco na Língua Japonesa. Pesquisadora do Centro de Pesquisas em Cultura Japonesa de Goiás (CPCJ-GO) desde sua fundação em 2009.

E-mail: yamadakemi@gmail.com

Lariani Djunko de Lima

Graduada em História pela Universidade Paranaense – UNIPAR, com especialização em História Social pela Universidade do Norte do Paraná – UNOPAR.
Membro do Centro de Pesquisas em Cultura Japonesa de Goiás. Atua principalmente em estudos sobre a imigração japonesa no Brasil e cultura japonesa.

E-mail: djunko.ldl@gmail.com

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