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ENID BLYTON
Série Os Cinco – 5
Editorial Notícias
Digitalização e Arranjo
Bernadete Vidal
Agostinho Costa
Editorial Notícias
ENID BLYTON
OS CINCO E O CIRCO
Paginação – cabeçalho
Índice
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Trazia consigo dois cães «terrier». Tim começou a ladrar e a =Zé segurou-
lhe na coleira.
— Não se cheguem muito perto — pediu ela.
— O Tim ainda não sabe quem vocês são.
— Não lhe vamos fazer mal — respondeu o rapaz, e sorriu =outra vez. Tinha
uma cara feia e sardenta e o cabelo todo despenteado. =— Eu não deixarei
os meus cães comerem o vosso Tim.
— Como se eles pudessem! — começou a Zé, cheia de =génio, mas depois riu-
se. Os «terriers» continuavam junto do =rapaz. Ele assobiou e os dois
cãezitos levantaram-se nas patas =traseiras e caminharam assim, com
passinhos muito engraçados.
— São cães amestrados? — perguntou Ana.
— São teus?
— Estes dois são — respondeu o rapaz. — Este =é o Ladra-Ladra e este o
Rosna-Rosna. São meus, desde =cachorrinhos. São espertos que nem alhos.
— Béu, béu!—fez o Tim, parecendo desgostoso por ver =cães a andarem duma
maneira tão estranha. Nunca lhe tinha ocorrido =que um cão pudesse andar
nas patas traseiras.
— Onde vão dar o vosso próximo espectáculo? — =perguntou a Zé, com
vivacidade. — Nós gostávamos de ir =assistir.
— Agora vamos descansar — disse o rapaz — nuns =montes, onde fica um lago
azul. Temos licença para acampar aí com =os nossos animais; é um campo
despovoado e assim não incomodamos =ninguém. É só chegar com os nossos
carros e acampar.
— Parece-me estupendo! — disse David. — Qual é o =teu carro?
— É este aqui, que está a chegar — disse o =rapaz,
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— Rrrrm! — avisou o Tim, com delicadeza. Ele era o =único que naquele
momento podia prestar atenção a qualquer =outra coisa.
— Olá, mãe! — exclamou Júlio. — Chegou =mesmo no momento oportuno, porque
queremos contar-lhe uma ideia que =tivemos.
A mãe sentou-se, sorrindo. — Vocês parecem muito =entusiasmados — disse
ela. — O que se passa?
— Bem, é como diz, mãezinha — respondeu Ana, antes =de qualquer dos
outros. — Nós gostaríamos muito de ir =passear numa «roulotte» por uns
dias, sozinhos. Ó mãezinha, =seria tão divertido!
— Sozinhos? — perguntou a mãe, duvidosa. — =Não sei que responda.
— O Júlio pode tomar conta de nós — acrescentou =Ana.
— E o Tim também — declarou a Zé imediatamente, e o =Tim bateu no chão
com a cauda. Sem dúvida que ele podia tomar =conta deles. Não o tinha
feito durante anos, participando em todas as =suas aventuras? E
continuava a bater com a cauda.
— Eu tenho de falar sobre o caso com o paizinho — disse a =mãe. — Mas não
fiquem desapontados; eu não posso decidir =uma coisa dessas, só por mim,
assim de repente. Pode ser que tudo se =arranje, pois o paizinho tem de
ir ao Norte por uns dias e ele gostaria =que eu o acompanhasse. Assim é
possível que ache o vosso passeio =uma boa ideia. Falarei com ele hoje à
noite.
— Nós podíamos levar o Dobi para puxar a «roulotte», =mãezinha — disse
Ana com os olhos brilhantes. — Não =lhe parece? Ele devia gostar imenso!
Agora tem uma vida tão =aborrecida...
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— O paizinho diz que não vê nenhum motivo para vocês =não irem passear de
«roulotte». Diz que até lhes vai fazer =bem. Mas vocês têm de arranjar
duas «roulottes» em vez de =uma. Não está certo vocês quatro, e ainda o
Tim, viverem só =numa «roulotte».
— Ó mãezinha, o Dobi não pode puxar duas =«roulottes» ao mesmo tempo!—
exclamou Ana.
— Nós podemos pedir emprestado outro cavalo — lembrou =Júlio. —Não
podemos, mãe? Mil obrigados, paizinho, por =nos deixar ir. É muito
simpático da sua parte!
— Simpatiquíssimo! — exclamou David.
— Maravilhoso! —disse a Zé, coçando a cabeça de =Tim, muito entusiasmada.
— Quando poderemos partir? =Amanhã?
— Com certeza que não!—respondeu Júlio. — =Temos de arranjar as
«roulottes», pedir emprestado um cavalo, =fazer as malas e muitas outras
coisas.
— Vocês poderiam ir na próxima semana, quando eu levar a =vossa mãe ao
Norte — disse o pai. — Isso é que nos =convém. Assim daríamos também umas
férias à cozinheira. =Vocês terão de nos mandar um postal todos os dias,
a dizer como =estão e onde estão.
— Sinto-me entusiasmadíssima!—participou a Ana. —= Nem tenho apetite para
comer o pequeno almoço.
— Olha que se é esse o efeito que a ideia das =«roulottes» tem sobre ti,
parece-me que é melhor não ires =— aconselhou a mãe.
Ana apressou-se a comer os seus flocos de aveia e depressa lhe voltou o
=apetite. Era bom de mais para ser verdade ter duas «roulottes» e =dois
cavalos e possivelmente dormir em beliches, e cozinhar as =refeições lá
fora, ao ar livre.
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Não é fantástico como tudo se adapta tão bem dentro das =paredes das
«roulottes»? Há espaço para tudo e no entanto =nem se nota que estão aqui
estes armários.
— Hei-de conservar tudo muito limpo — afirmou a Ana. =— Bem sabe como eu
gosto de brincar às donas-de-casa, não =sabe, mãe? Desta vez será a
valer. Vou ter duas «roulottes» =para limpar, e serei eu sozinha.
— Sozinha? — notou a mãe. — Com certeza que os =rapazes hão-de ajudar-te;
e a Zé também!
— Pfff. Os rapazes! Nem sabem lavar uma chávena como deve ser! =E a Zé
nunca se preocupou com coisas desse género. Se eu não =fizer as camas e
não lavar o chão, ninguém o fará por mim. =Isso sei eu!
— Bem, é uma coisa boa que ao menos um de vocês seja =razoável —
respondeu a mãe. — Mas vais ver que todos =te ajudarão, Ana. Agora vão
buscar as vossas roupas. Para =começar, tragam as gabardinas.
Foi muito divertido levarem as coisas para as «roulottes» e =arrumarem
tudo lá dentro. Havia umas prateleiras onde o Júlio =arrumou os baralhos
de cartas, o loto, um dicionário, o dominó, e =também uns quatro ou cinco
livros para cada um. Juntou ali alguns =mapas do distrito, pois ele
queria planear o caminho a percorrer e =escolher as melhores estradas a
seguir.
O pai deu-lhe um livrinho muito útil onde estavam os nomes dos
=proprietários que davam licença para as «roulottes» ficarem =nos seus
terrenos, durante a noite.
— Quando for possível, devem escolher um campo
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Estou convencida que o Tim deve gostar mais de biscoitos fritos do que
=assim.
— Não gosta, não — respondeu a Zé. — =Podiam fazer-lhe mal.
— Como é que tu sabes? — perguntou a Ana.
— Não podes ter a certeza.
— Eu sei sempre do que o Tim gosta e do que não gosta — =afirmou a Zé. —
E sei que ele não gostaria dos seus =biscoitos fritos. Passa-me as
ameixas, David. Parecem estupendas.
Eles ficaram à volta do lume durante muito tempo, até que Júlio =achou já
serem horas de irem para a cama. Ninguém se importou, =pois todos queriam
experimentar os beliches de aparência tão =confortável.
— Lavo-me no regato, ou na bacia onde lavei os pratos?—=perguntou a Ana.;
—Não sei o que será melhor.
— Há mais água para gastar no regato — disse =Júlio. — Despachem-se,
porque eu quero fechar à chave a =vossa «roulotte», para assim ficarem em
segurança.
— Fechar a porta por fora! —exclamou a Zé, indignada. =—Não vais fazer
isso! Ninguém me vai fechar a mim à =chave! Pode-me apetecer ir dar um
passeio ao luar ou qualquer outra =coisa.
— Pois sim, mas um ladrão ou alguém, pode...
— começou Júlio. A Zé interrompeu-o com ímpeto.
— E o Tim? Sabes perfeitamente que ele nunca deixaria ninguém =aproximar-
se das nossas «roulottes». Não quero ser fechada à =chave, Júlio. Não
posso suportar uma coisa dessas. O Tim é =melhor do que qualquer porta
fechada à chave.
— Também acho que sim — concluiu o Júlio.
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— Está bem Zé, não fiques tão zangada. Passeia ao =luar metade da noite,
se te apetecer, ainda que eu tenha a certeza de =que não vai haver nenhum
luar. Estou cheio de sono!
Subiram para as «roulottes» depois de se terem lavado no regato.
=Despiram-se e meteram-se nos convidativos beliches. Havia para cada um,
=um lençol, um cobertor e uma coberta, mas as pequenas tiraram os
=cobertores e as cobertas e ficaram só com o lençol, naquela noite =tão
quente.
Ao princípio a Ana meteu-se no beliche mais baixo, ficando a Zé no =de
cima, mas o Tim queria subir por ali, tentando chegar à Zé. =Queria
deitar-se aos pés dela, como sempre. A Ana começou a =rabujar. —Zé, é
melhor mudares de lugar comigo. O Tim =está a saltar e a andar por cima
de mim, tentando chegar ao teu =beliche. Assim nunca mais vou adormecer.
A Zé mudou de lugar e depois disso o Tim não fez mais barulho =ficando
satisfeito aos pés do beliche da Zé, sobre o cobertor =enrolado. A Ana
deitou-se no beliche de cima, tentando não adormecer =logo; por ser tão
maravilhoso sentir-se dentro duma «roulotte» =que estava no meio do
campo, junto a um regato.
As corujas gritavam umas para as outras e o Tim rosnava baixinho. A voz
=do regato, alegre e faladora, ouvia-se agora melhor por estar tudo =tão
sossegado. Ana sentiu os olhos a fecharem-se. Que pena, ela tinha =mesmo
que adormecer!
Mas de repente qualquer coisa a acordou em sobressalto e o Tim ladrou
=com tanta força que tanto a Zé como a Ana iam quase caindo dos
=beliches, assustadas. Qualquer coisa batera de encontro à =«roulotte»
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indignada. — Estou apenas a dizer a verdade. Tu, Zé, nem uma =só vez
fizeste a tua cama. Não é que eu me importe de =fazê-la. Eu até adoro ter
duas casas rolantes para cuidar.
— Tu és uma belíssima donazinha-de-casa
— afirmou Júlio.—Nós não poderíamos passar sem =ti.
Ana corou de orgulho. Tirou a panela do lume e distribuiu o conteúdo =por
quatro pratos.
— Vamos! —chamou ela com um tom de voz igual ao da sua =mãe. — Venham
comer enquanto está quente!
— Eu prefiro deixar arrefecer, se não te importas — =disse a Zé. — O
tempo não refrescou, apesar de ser já =noite.
Eles haviam caminhado durante quatro dias até àquele momento e a =Ana
desistira de procurar os tais montes onde eles esperavam encontrar
=acampada a companhia de circo.
De facto ela desejava muito em segredo que não chegassem a =encontrá-los,
pois estava a gostar imenso daquele passeio através =de campos tão belos.
Depois da refeição a Ana e a Zé lavaram a loiça num =regatozinho e o
Júlio desdobrou o seu mapa. Ele e David examinavam-no =com atenção.
— Nós estamos neste ponto — indicou Júlio. — =Parece-me que amanhã
devemos chegar a esses montes ao pé do lago. =Então veremos o circo.
— Óptimo — respondeu David. — Espero que o Dino =lá esteja. Tenho a
certeza que ele vai gostar de nos mostrar tudo. E =também pode ser que
nos indique um bom lugar para acamparmos.
— Esse saberemos nós encontrar — afirmou Júlio,
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— Em mim não baterá ele. — afirmou Júlio. —= Mas teremos de nos conservar
afastados. Concordo que não parece um =sujeito muito agradável. Talvez lá
não esteja.
— Tim, sai de baixo da «roulotte»!—chamou a Zé. =— Aqui onde nós estamos
está sombra e muito fresco. =Anda!
Ele foi, sempre com a língua de fora. O Trot imediatamente se =levantou e
foi ter com o cão. O cavalinho deitou-se ao lado do Tim e =começou a
cheirá-lo. Tim deu-lhe uma lambedela no nariz e depois =afastou-se,
parecendo aborrecido.
— Não acham o Trot tão engraçado? — perguntou a =Ana. — Tim, o que pensas
sobre os animais do circo, gostava tanto =de saber! Eu espero amanhã ver
o circo. Achas que conseguimos chegar =até aos montes, Júlio? Apesar de
que eu não me importava nada =se não chegássemos; é tão bom continuarmos
só nós, =como até agora!
No dia seguinte todos tentavam descobrir os montes, enquanto as
=«roulottes» seguiam vagarosamente através dos campos, puxadas =pelo Trot
e pelo Dobi. E nessa tarde começaram a vê-los à =distância, como a uma
mancha azul.
— Ali estão eles!—exclamou Júlio.—Devem ser =os Montes Merran, e o Lago
Merran deve ficar no sopé. Espero que os =nossos cavalos tenham força
suficiente para subirem um bocado da =encosta. Haverá uma vista sobre o
lago, maravilhosa, se conseguirmos =subir o bastante.
Os montes aproximavam-se cada vez mais. Eram bastante altos e pareciam
=lindos à luz do crepúsculo. Júlio consultou o relógio. . =— Receio que
esta noite não tenhamos tempo para subir
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Viam-se poucas pessoas por ali, naquela tarde tão quente. Mas o Dino =lá
estava, com o chimpanzé, duas mulheres mexiam nas panelas =colocadas
sobre pequenas fogueiras, e parecia ser tudo.
Os cães do circo começaram a ladrar às «rou-lottes» verde =e vermelha
quando estas chegaram próximo. Um ou dois homens =apareceram à entrada
das barracas e olharam para o caminho que se =dirigia ao acampamento.
Começaram a apontar para as «roulottes» =dos pequenos, parecendo
admirados.
Dino, segurando com firmeza a mão do chimpanzé, saiu do =acampamento, com
curiosidade de ver mais de perto aquelas estranhas =casas. Júlio chamou-
o.
— Olá, Dino! Nunca pensaste que nos verias por aqui, pois =não?
Dino ficou encantado por o tratarem pelo seu nome. Ao princípio =não se
lembrava nada dos pequenos. Depois recordou-se.
— Com seiscentos macacos, são aqueles miúdos que eu vi na =estrada! Que
estão vocês a fazer aqui?
O Tim ladrava sem parar e a Zé chamou o Dino. — O cão nunca =viu um
chimpanzé. Achas que se darão bem?
— Não sei — replicou o Dino, com certas dúvidas. =— O velho Pongo dá-se
bem com os cães do circo. Mas de =qualquer maneira não deixe o seu cão
correr para o Pongo, que o =pode comer vivo! Bem sabe como os chimpanzés
são fortes!
— Achas que é possível eu tornar-me amiga do Pongo? —= perguntou a Zé.
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— Têm de ter cuidado, quando o Pongo está próximo =— avisou o Dino. — Ele
adora tirar coisas das algibeiras =das pessoas. E agora reparo, digam-me
cá, são estes os vossos =carros? Não são «piramidais»?
— Foram-nos emprestados — disse David.
— Na verdade foi ao ver o vosso circo passar, com todos os seus =carros,
que nos lembrámos de arranjar uns e vir passear =também.
— E como nos disseste para onde vinham, pensámos em segui-los =até os
encontrar, para tu nos mostrares o acampamento — =explicou Júlio.
— Espero que não te importes.
— Sinto-me orgulhoso — afirmou Dino, ficando muito =vermelho. — Não é
vulgar as pessoas quererem travar =relações com um rapaz do circo, como
eu; refiro-me a gente =educada, da vossa classe. Eu ficarei todo vaidoso
por lhes mostrar tudo =e vocês poderão travar relações com todos os cães
e =cavalos do lugar!
— Oh, muito obrigado! — disseram todos.
— Que simpático da tua parte — afirmou David. — =Meu Deus, olhem para o
chimpanzé, está outra vez a tentar =«cumprimentar» a cauda do Tim. Ele
deve ser muito engraçado =quando trabalha no circo, não é verdade Dino?
—É de rir às gargalhadas! —disse Dino.—Deita a =casa abaixo. Haviam de
vê-lo a representar com o meu tio Dan. =Vocês sabem que ele é o palhaço-
chefe. Pongo é tão bom =palhaço como o meu tio. É de morrer a rir ver os
dois a fazerem de =malucos.
— Gostava de assistir — disse a Ana. — O teu tio =não se importa que nos
mostres os animais e tudo o resto?
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— Bem — pensou Júlio — pode ser o melhor dos =acrobatas do Mundo mas é um
tipo bem antipático. Não há =grande diferença entre ele e o Tigre Dan!
Lou levantou-se, esticando o seu corpo comprido, como um gato. Movia-se
=com facilidade. Dirigiu-se a Dino, ainda com o mesmo ar carrancudo.
— Quem são estes miúdos? — perguntou
— Que estão eles a bisbilhotar aqui?
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— Nós partimos esta manhã, como tencionávamos. Mas se =vocês acham que
devemos ir já, é melhor pensarem bem. Este =terreno é tanto para vocês
acamparem como para nós. Agora =vão-se embora e não nos incomodem outra
vez.
—Vou dar-te uma chicotada, a ti, frango miúdo — gritou =o Lou, e começou
a desapertar o cinto de cabedal.
A Zé deixou de segurar a coleira do Tim. — Vai ter com eles, =Tim — disse
ela. — Mas não os mordas. Prega-lhes só =um susto!
O Tim saltou para o chão, ladrando satisfeito. Correu para os dois
=homens. Sabia bem o que a Zé queria que ele fizesse e embora lhe
=apetecesse agarrar os dois intrusos com os seus dentes aguçados, =não o
fez. Mas fingiu que os ia morder e ladrou tão ferozmente que =eles
ficaram assustados e perplexos.
O Lou queria bater no Tim, ameaçando que o matava. Mas o Tim não =se
ralava com ameaças daquela espécie. Agarrou a calça da perna =direita de
Lou, puxou, e rasgou-a do joelho ao calcanhar.
— Vamos, o cão é doido!—gritou Dan. — =Agarra-nos pela garganta se não
nos vamos embora. Chamem o cão, =miúdos! Nós já nos vamos. Mas não se
esqueçam de sair =daqui logo de manhã. Nós vos pagaremos um dia.
Vendo que os homens se iam realmente embora a Zé assobiou ao =Tim.—Vem
para aqui, Tim! Mas fica de sentinela até que eles =desapareçam. Corre
para eles, se voltarem atrás.
Mas os homens depressa desapareceram; e nada os faria voltar a enfrentar
=Tim, outra vez, naquela noite!
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— Olha que foi uma boa coisa as raparigas terem o Tim com elas, =esta
noite. Aqueles homens queriam mesmo bater-te, Júlio.
— Pois queriam e eu não podia levar a melhor contra eles dois =— disse o
Júlio. — São ambos fortes e pesados.
Na manhã seguinte todos eles acordaram cedo. Ninguém se sentia =disposto
a continuar na cama; estavam ansiosos por se irem embora antes =que
aparecessem novamente o Lou e o Dan.
— Arranjem o pequeno almoço, Ana e Zé, enquanto o David e =eu atrelamos
os cavalos às «roulottes» — disse o =Júlio. — Assim estaremos prontos a
partir logo em seguida ao =pequeno almoço.
Terminado o pequeno almoço, sentaram-se nos bancos da frente das
=«roulottes» e iam partir quando apareceram no caminho o Lou e o =Dan,
dirigindo-se para eles.
— Ora vão-se embora, não é verdade? — disse o =Dan, com um sorriso
antipático. — Muito bem. Gosto de ver =miúdos tão obedientes. Para onde
vão?
— Para os montes — respondeu o Júlio. — Mas =não têm nada com isso.
— Porque não vão à volta do lago em vez de subirem lá =acima? — disse
Lou. — Que ideia tão parva subirem com =as «roulottes» e obrigarem os
cavalos a esforçarem-se todo o =caminho!
Júlio ia responder que não tencionavam ir mesmo até ao cimo do =monte,
mas conteve-se. Achou melhor não dar a conhecer àqueles =sujeitos que a
sua intenção era ficar na encosta; eles podiam ir =aborrecê-los
novamente.
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O Dobi começou a andar. — Nós vamos para onde queremos =— disse Júlio a
Lou num tom conciso. — Saiam do =caminho, por favor.
Como Dobi continuava a andar na direcção dos dois homens, eles =tiveram
de dar um salto para o outro lado e lançaram olhares furiosos =aos quatro
pequenos. Depois ouviram-se os passos de alguém que corria =e apareceu o
Dino, com o Ladra-Ladra e o Rosna-Rosna à volta dele, =como de costume.
— Porque partem tão cedo? —gritou ele.
— Deixem-me ir com vocês, parte do caminho.
— Não quero que vás — disse-lhe o tio, dando ao =rapaz, surpreendido, um
inesperado soco. — Eu disse a estes =miúdos para se porem a andar e eles
aí vão. Não quero =estranhos metediços perto do acampamento. E não
julgues que eles =querem tornar-se teus amigos! Vai treinar esses cães ou
dou-te outro =murro nos ouvidos que ficas a ver as estrelas.
Dino olhou para ele, zangado e com medo.
Conhecia o tio demasiado bem para o contradizer. Voltou-se tristemente e
=foi andando para o acampamento. As «roulottes» ultrapassaram-no =pelo
caminho e Júlio chamara em voz baixa:
— Alegra-te, Dino. Nós ficamos à tua espera lá em cima. =Mas não digas
nada ao Lou ou ao teu tio. Deixa-os julgarem que nós =fomos para mais
longe. Leva o Pongo contigo.
Dino sorriu.-—Que bons são vocês!—disse ele. —= Também posso levar os
cães para os treinar, mas hoje não. Hoje =não me atrevo. E logo que eles
forem passar fora um dia inteiro, eu =trago-os cá abaixo e mostro-lhes o
acampamento. Está bem?
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— Óptimo — disse Júlio afastando-se. Nem o Lou nem o =Dan tinham ouvido
uma palavra e nem mesmo adivinhavam que eles estavam a =conversar, pois o
Dino teve o cuidado de continuar a andar e nem uma =só vez se voltou para
os seus amigos.
A estrada subia pelo monte. Ao princípio não era muito íngreme, =e tinha
muitas curvas torneando a encosta. A meio caminho as =«roulottes»
atravessaram uma ponte de pedra por onde passava um =riacho.
— Esta corrente vai muito depressa!—disse a Zé =observando-a lá em baixo.
— Olhem, é ali que ela começa! =Ali no meio da encosta!
Ela apontava para um lugar um pouco mais alto e realmente parecia que a
=corrente começava ali.
— Mas não pode começar assim de repente — disse =Júlio.—É demasiado
grande e rápida! Vamos ver. Estou com =sede e se há ali água, deve ser
muito fresca e limpa. Própria =para beber. Vamos, vamos ver.
Mas não havia nenhum regato. A corrente não «começava» =ali, mas saía por
uma cavidade, tão grande e rápida como corria =por baixo da ponte de
pedra. Os pequenos inclinaram-se olhando pela =abertura donde saía a
água.
— Vem do interior do monte — notou a Ana surpreendida. =— Que engraçado,
correr lá dentro do monte. Deve ficar =contente por encontrar uma saída!
Não quiseram beber, pois não era a corrente fresca e límpida =que
esperavam encontrar. Mas afastando-se um pouco descobriram uma
=verdadeira nascente,
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que saía duma pedra, fresca e límpida como cristal. Beberam ali e
=chegaram à conclusão que era a melhor bebida que tinham tomado =até
àquele dia. O David seguiu a água da nascente e viu que se =ia juntar ao
riacho.
— Tenho a impressão que vai dar ao lago
— disse ele. — Vamos, Júlio, a ver se encontramos uma =quinta. Ouvi há
bocado um galo a cantar e por isso não devemos =estar muito longe.
Passaram uma curva da estrada e viram a quinta, com uma porção de
=edifícios dispersos, sem simetria. As galinhas corriam dum lado para =o
outro, cacarejando. Os carneiros pastavam na parte superior da quinta =e
as vacas ruminavam nos campos ali perto. Um homem estava a trabalhar,
=não muito longe, e Júlio dirigiu-se a ele.
— Bom-dia! O senhor é o dono?
— Não. O patrão está ali — disse o homem =apontando um celeiro perto da
casa de habitação.
— Tenham cuidado com os cães.
As duas «roulottes» dirigiram-se para o celeiro. O lavrador ouviu
=barulho e foi até à porta com os cães. Quando viu que eram =só crianças
quem guiava as «roulottes» ficou =surpreendido.
Júlio tinha uma maneira delicada de falar,, que todas as pessoas
=crescidas apreciavam. Depressa entabulava uma grande conversa com o
=homem, obtendo os melhores resultados. O quinteiro estava disposto a
=fornecê-los com todos os produtos da quinta que eles precisassem e
=podiam levar a qualquer hora a quantidade de leite que quisessem. E ele
=estava certo de que a sua mulher lhes cozinhava o que pedissem e =também
lhes poderia fazer bolos.
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— E posso combinar com ela quanto devo pagar? — perguntou =Júlio. —Eu
gostava de pagar tudo quanto comprasse.
— Está muito bem, meu filho — concordou o =proprietário. — Paga sempre as
tuas dívidas e nunca =terás aborrecimentos. Vão falar com a minha
velhota. Ela gosta de =crianças e vai recebê-los com satisfação. Onde vão
=acampar?
— Gostávamos de encontrar um sítio com uma bonita vista =sobre o lago —
disse Júlio. — Por enquanto ainda não =sabemos mas pode ser que um pouco
mais adiante encontre o lugar que =pretendo.
— Tem razão. Caminhem mais um quilómetro — =aconselhou o lavrador. — A
estrada vai até lá; quando =chegarem a um maciço de bétulas, verão uma
espécie de cova =mesmo na encosta do monte, com uma vista maravilhosa
sobre o lago. Podem =levar as vossas «roulottes» para ali, meu filho; e
ficarão =abrigados do vento.
— Muitíssimo obrigado — disseram os pequenos, todos em =coro, pensando
que o quinteiro era um homem muito simpático. Que =diferente de Lou e de
Dan, com as suas ameaças e furores!
— Primeiro vamos falar com a sua mulher, senhor — disse o =Júlio. —
Depois, seguiremos até ao lugar que nos indicou. =Espero vê-lo mais
vezes.
Foram falar com a mulher do quinteiro, uma pessoa de idade, gorda e face
=redonda, com uns olhos pequeninos e negros, cheios de bom-humor. Ela
=recebeu-os muito bem, deu-lhes umas arrufadas que estavam a sair do
=forno e disse-lhes para colherem ameixas vermelhas da árvore que =ficava
ao pé da casa.
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Júlio combinou pagar um tanto por cada coisa que comprasse. Os =preços
que a mulher do quinteiro pedia pareciam muito baixos mas ela =não
deixava darem-lhe mais dinheiro pelos produtos.
— Será sempre um prazer ver à minha porta as vossas caritas =alegres —
disse ela. — Isso será parte do que eu lhes =cobro, combinado? Vejo que
são crianças muito bem educadas, pelas =vossas boas maneiras. E sei que
nunca farão aqui na quinta estragos =nem disparates.
Os pequenos partiram carregados de toda a espécie de mantimentos, =desde
ovos e presunto, até «scones» e bolos de gengibre.
A boa senhora meteu uma garrafa de xarope de medronhos na mão da Ana,
=quando a pequenita se despediu. Mas quando o Júlio voltou atrás =para
pagá-la, ela ficou toda zangada.
— Se eu quero dar um presente a alguém, tenho o direito de o =fazer! —
disse ela. — Calem-se com isso de «pagar por =isto, pagar por aquilo».
Cada dia hei-de ter uma coisa extra para =vocês e nem se atrevam a
perguntar quanto é, que eu corro atrás =dos meninos com o meu rolo da
massa tenra!
— Não é simpatiquíssima? — disse a Ana quando se =dirigiram para as
«roulottes». — Até o Tim lhe foi =apertar a mão, sem tu o teres mandado,
Zé. E é difícil ele =fazer isso a qualquer pessoa, não é?
Guardaram as coisas na despensa, voltaram para os assentos da frente,
=fizeram andar o Dobi e o Trot, partindo de novo.
Cerca de um quilómetro de distância encontraram um maciço de =bétulas. —
Devemos encontrar o tal lugar abrigado aqui ao =pé — disse Júlio.
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- Sim, reparem! Ali está ele! Um lugar mesmo agradável. Muito =próprio
para acampar, e olhem que vista magnífica!
Era realmente linda! Podiam ver o lago aos pés do monte, =estendendo-se,
liso e magnífico como um espelho encantado. Do lugar =onde estavam viam a
margem oposta emoldurando aquela grande extensão =de água.
— Não é tão azul? — disse a Ana, encantada.
— Ainda mais azul do que o céu. Não vai ser maravilhoso =vermos o lago
todos os dias que aqui estivermos?
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O Júlio levou as «roulottes» para a cova abrigada. Crescia ali =um tojo
tão fofo como um tapete verde. Campainhas pálidas como o =céu ao
entardecer cresciam aos cachos nas fendas do monte. Era um =lugar
encantador para acampar.
O ouvido apurado da Zé percebeu o som da água a correr e foi =procurá-la.
Pouco depois chamou os outros.
— Sabem uma coisa? Há aqui outra nascente, vinda de dentro do =monte.
Temos água para beber e para lavar. Somos pessoas de =sorte!
— Lá isso somos! — concordou o Júlio. — É =um lugar encantador e aqui
ninguém nos aborrecerá.
Mas ele falava antes de tempo!
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O Tim era um cão tão invulgar, pensava ela, enquanto lhe fazia =festas na
cabeça.
Estava um dia quentíssimo. Demasiado quente para fazer fosse o que
=fosse; até mesmo para ir lá abaixo, tomar banho no lago. Os =pequenos
estavam satisfeitos por já se encontrarem no monte, pois ao =menos corria
uma aragem de vez em quando. Naquele dia já não =esperavam ver o Dino
outra vez, mas calculavam que ele iria lá acima =no dia seguinte. Pelo
menos, quando fossem até ao lago tomar banho, =esperavam encontrá-lo por
lá.
Depressa a laje aqueceu tanto que não podiam estar ali sentados. Os
=pequenos abrigaram-se no maciço de bétulas que dava alguma sombra.
=Levaram livros e o Tim também os acompanhou arquejando como se =tivesse
corrido vários quilómetros. Estava sempre a ir beber =água à nascente. A
Ana encheu uma grande vasilha com água =fresca e colocou-a num sítio
arejado, ali ao pé, com um púcaro. =Tiveram sede durante todo o dia e era
agradável mergulhar o púcaro =na água da nascente e depois beberem.
Naquele dia o lago estava inacreditavelmente azul e a água tão =parada
como um espelho. Já não se via o barco do Dino. Tanto ele =como o Pongo
tinham-se ido embora. Não havia um único movimento em =todo o lago.
— Vamos lá abaixo, logo à tarde, quando estiver mais =fresco, para
tomarmos banho? — perguntou o Júlio à hora do =lanche. — Hoje quase não
fizemos exercício. Fazia-nos bem =caminharmos até ao lago e nadarmos um
pouco. É melhor não =levarmos o Tim, pois pode dar-se o caso de
encontrarmos o Lou ou o Dan. =Agora,
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com certeza que o Tim corre para eles. Devemos estar sempre alerta com
=esses dois, para podermos evitá-los. Mas o Tim atira-se a eles logo =que
os descobrir. Nós podemos estar dentro de água e não =conseguirmos
impedi-lo.
— Em todo o caso fica de guarda às nossas «roulottes» =— disse a Ana. —
Bem, vou lavar no regato estes pratos e =chávenas. Ninguém quer comer
mais nada?
— Está demasiado calor — respondeu David, deitando-se =de costas. —
Gostava de estar ao pé do lago, neste momento; ia =direitinho para dentro
de água.
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— Que homem tão grosseiro e egoísta! Mas tu parece não =lhe ligares muita
importância.
— Claro que não ligo!—respondeu o Dino.
— Ele está no monte, não está? Só tenho de tomar =cuidado para que ele
não me veja com vocês e isso é tudo. =Ninguém do acampamento irá fazer
queixa de mim, pois todos =detestam o Lou e o Tigre Dan.
— Nós vimos-te no barco, com o Pongo — disse o =Júlio, nadando para se
juntar aos outros na conversa. — =Pensámos que sempre que quiseres fazer-
nos sinal, podes sair no teu =barco e acenar-nos com um lenço ou qualquer
outra coisa. Nós temos =um binóculo e facilmente te vemos. Podemos vir cá
abaixo se tu nos =fizeres sinal, pois ficamos a saber que não há perigo.
— Muito bem — disse o Dino. — Vamos fazer uma =corrida. Aposto que chego
à praia antes de vocês.
Não chegou, como é natural, pois não sabia nadar a preceito. =Até a Ana
lhe podia passar à frente. Em breve estavam todos a =secar-se, esfregando
as toalhas com força.
— Tenho uma fome horrível!—disse o Júlio. — =Vem jantar connosco, lá
acima, Dino!
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- Nós voltamos aqui acima esta noite para arranjarmos um lugar para =os
nossos animais. E não queremos que vocês corram nenhum =perigo.
— Não correremos — disse o Júlio, desdenhoso.
— E nestes montes há bastante espaço para os senhores com =os vossos
animais e para nós também. Não pensem assustar-nos =porque não conseguem.
E se precisarmos de ajuda temos o quinteiro e =os seus homens aqui perto,
para não falar no nosso cão.
— Deixaram o cão de guarda? — perguntou o Lou ao ouvir =o Tim ladrar
outra vez. — Devia ser abatido, esse vosso cão; =é um perigo!
— É só perigoso com os marotos e patifes
— disse a Zé, cortando a conversa. — Conservem-se longe =das nossas
«roulottes» quando o Tim estiver de guarda. Ele pode =maltratá-los se se
aproximarem.
O Lou começava a perder a paciência. — Então, vocês =vão-se embora ou
não? — perguntou ele.
— Já lhes dissemos que queremos este terreno aqui. Podem =descer e
acampar ao pé do lago outra vez, se quiserem.
— Sim, podem ir — afirmou o Tigre Dan, com o maior pasmo =dos pequenos. —
Podem ir, estão a ouvir? Podem tomar banho no =lago todos os dias, podem
pedir ao Dino para lhes mostrar o acampamento =e podem tornar-se amigos
de todos os animais, estão a ouvir?
Agora era a vez de Dino ficar admirado.
— Com seiscentos macacos! Então o senhor não me bateu com =toda a força,
por eu andar com estes miúdos? — perguntou =ele.
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— Que jogo é este agora? Nunca tiveram animais aqui no monte, =nunca...
— Cala-te — ordenou o Tigre Dan com uma voz tão =áspera que os pequenos
se assustaram. O Lou fez um sinal ao Dan e =este esforçou-se por parecer
outra vez simpático.
— Nós não queríamos que o Dino travasse relações =com meninos finos como
vocês —começou ele de novo. —=Mas parece que vocês querem acamaradar com
ele e nós então =consentimos. Agora vão acampar ao pé do lago e o Dino
vai =mostrar-lhes o circo. Não podemos fazer mais do que isto.
— Devem ter outras razões para nos fazerem tais propostas =— disse o
Júlio, com desdém. — Sinto muito, mas os =nossos planos estão feitos e
não vou discuti-los com os =senhores.
— Vamos — disse David. — Vamos ao encontro do Tim. =Ele está a ladrar com
toda a força porque nos está a ouvir e =não tardará em aparecer aqui.
Depois será difícil =conservá-lo a distância destes dois sujeitos.
Os quatro pequenos começaram a andar. O Dino olhava receoso para o =tio.
Não sabia se havia de seguir os pequenos ou não. Lou fez novo =sinal a
Dan.
— Se quiseres também podes ir — disse o Tigre Dan =tentando sorrir
amigavelmente para o surpreendido Dino. — =Conserva os teus simpáticos
amigos! Tens muito que aprender com =eles.
O sorriso transformou-se num esgar antipático e Dino escapou-se
=prontamente do alcance das mãos do tio. Estava intrigado e com =vontade
de saber o que se escondia atrás daquela mudança do Tigre =Dan.
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— Não digo que quero pagar-lhe, pois tenho medo do seu rolo da =massa
tenra — disse ele. — Mas muito, muito obrigado.
Ele partiu, muito satisfeito. Pensava no prazer da Ana quando visse os
=cestos. Como ela ia gostar de meter as coisas na despensa, acamar a
=manteiga num prato em cima duma vasilha com água fresca e pôr os =ovos
na prateleira!
Quando ia a chegar, o Júlio chamou-o.
— O Dino está no barco. Anda ver. Está a acenar com =qualquer coisa que
não pode ser um lenço. Naturalmente é o =lençol da cama dele.
— O Dino não dorme com lençóis — disse a Ana. =— Nem sabia o que eram,
quando os viu nos nossos beliches. Talvez =seja uma toalha de mesa.
— De qualquer maneira é uma coisa grande, para nos prevenir =que é muito
boa altura de irmos ao acampamento — disse o =Júlio. — Estão todos
prontos?
— Quase — disse a Ana, tirando os alimentos dos cestos que =David
trouxera. — Tenho de arrumar estas coisas. Vocês querem =que levemos
almoço connosco? Nesse caso vou prepará-lo. Olhem para =estas delícias!
Todos foram ver. — A senhora Mackie é um amor — disse a =Ana. — Palavra
que é tudo estupendo... Olhem para este =presunto apetitoso. Cheira
divinamente!
— Aqui está o presente dela; rebuçados feitos em casa =— disse o David,
tirando-os da algibeira. — Querem um?
Meia hora depois a Ana tinha tudo pronto. Havia decidido levar o =almoço,
para eles e para o Dino.
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O Dino foi buscar o Pongo que estava aos pulos dum lado para o outro,
=dentro duma gaiola, soltando guinchos por julgar que estava a ser
=esquecido. Ficou encantado ao ver outra vez os pequenos e pôs
=imediatamente o braço à volta da cintura da Ana. Depois puxou o =cabelo
à Zé e escondeu a cara atrás das patas, espreitando com =malícia.
— És muito engraçado, Pongo! —disse o Dino. — =Agora ficas quieto, òu
voltas para a tua gaiola, estás a =ouvir?
Foram ver os cães e soltaram-nos todos. Havia muitos «terriers» =e cães
sem raça, todos muito bem tratados, saltando com vivacidade =para o Dino,
fazendo uma grande brincadeira. Era evidente que gostavam =do Dino e
confiavam nele.
— Querem vê-los a jogar o futebol? — perguntou o Dino. =— Ladra-Ladra,
vai buscar a bola. Vai depressa!
O Ladra-Ladra correu para o carro do Dino. A porta estava fechada mas o
=inteligente cãozinho ergueu-se nas patas traseiras e rodou o puxador
=com o nariz. A porta abriu-se e lá entrou o Ladra-Ladra. Saiu =impelindo
a bola com o focinho. Esta rolou pelas escadas e depois pelo =chão. Os
cães saltaram todos sobre ela, com latidos de =entusiasmo.
Passaram a bola uns aos outros, enquanto o Dino mantinha as pernas
=abertas, fazendo a baliza. O Ladra-Ladra e o Rosna-Rosna é que deviam
=marcar os golos, e os outros cães deviam impedi-los. Por isso era um
=jogo divertidíssimo. Uma vez quando o Ladra-Ladra meteu um golo
=passando a bola com toda a força por entre as pernas do Dino,
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O Fúria era um cavalo pequeno e bonito, com os olhos muito vivos que
=indicavam ser pouco domável. Dino correu para ele e montou-o mesmo =sem
selim. O cavalo empinou-se, relichando e tentando atirar com o =pequeno.
Mas o cavalo não levava a melhor. Fizesse o que fizesse o =Dino
continuava montado, firme como uma rocha.
Por fim o Fúria estava cansado e começou a trotar à volta do =campo.
Depois galopou e às tantas parou repentinamente, tentando =fazer o Dino
saltar por cima da sua cabeça.
Mas o rapaz estava à espera desta partida e inclinou-se todo para =trás,
sem perda de tempo.
— Muito bem! — continuava a dizer o Rossy.
— Daqui a pouco dá-te cabo das mãos, Dino. — Dino, =Dino, tu tens um
jeito enorme! —gritava-lhe a Ana. — Quem =me dera saber fazer o que tu
fizeste. Quem me dera!
O Dino escorregou pelo pescoço do Fúria, muito satisfeito. Era =agradável
mostrar as suas habilidades aos seus amigos =«finos».
Depois olhou em redor. — Oiçam lá, onde está o =chimpanzé? Deve estar a
fazer qualquer malandrice. Vamos =procurá-lo.
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— Passam sim, graças a Deus — afirmou o Dino. — =Saíram para um dos seus
misteriosos passeios. Sabem, quando nós =andamos com o circo, de terra em
terra, algumas vezes o meu tio =desaparece durante a noite. Eu acordo e
ele não está no carro.
— Onde irá ele? — perguntou a Zé.
—- Não me atrevo a perguntar — respondeu o Dino. =— De qualquer modo,
hoje tanto ele como o Lou vão deixar-nos =em paz. Não devem chegar antes
de anoitecer.
Almoçaram ao pé do lago, que brilhava calmo e azul, muito =convidativo.
— E se fôssemos tomar banho?—lembrou o David, depois de =todos terem
comido até não poderem mais. O Júlio olhou para o =relógio.
— Não é bom tomar banho depois duma refeição tão =forte — disse ele. — Tu
bem sabes, David. Temos de =esperar.
—Está bem—concordou o David, deitando-se na relva. =— Vou passar pelo
sono ou vamos todos ver os macacos?
Dormitaram um pouco e depois levantaram-se para irem conhecer os
=macacos. Quando chegaram ao acampamento encontraram-no cheio de gente,
=toda muito excitada.
— Que aconteceu? — perguntou o Dino. — Olhem para =aquilo, os macacos
estão todos à solta!
Era verdade. Para qualquer parte que olhassem, os pequenos viam um
=macaquito castanho, no tecto dum carro ou no cimo duma tenda.
Uma mulher muito morena, com os olhos chamejantes, veio ter com o Dino.
=Agarrou-o pelo ombro
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Um por um, os macacos correram para ela, saltando dos tejadilhos dos
=carros, dando pequenos gritos de amizade e boas-vindas. Pulavam para os
=braços e para os ombros da Lucília, agarrando-se a ela como =crianças
pequeninas. Não faltava nem um macaco, todos iam ter com =a Lucília, como
que guiados por um encantamento.
Ela dirigiu-se para as gaiolas, murmurando as suas palavras suaves
=enquanto caminhava. As outras pessoas observavam em silêncio.
— Ela é uma criatura muito estranha — disse ao Dino a =mulher morena. —
Não gosta de ninguém a não ser dos seus =macacos. E ninguém gosta dela,
tirando eles. Tens muita sorte de =não se haver voltado contra o teu
chimpanzé, por ele ter solto os =seus preciosos macacos!
— Eu vou levá-lo ao banho, com o Velhote, apressou-se a =responder o
Dino. — Quando regressarmos, a Lucília já se =terá esquecido.
Foram buscar o Velhote e descobriram onde estava escondido o Pongo, por
=baixo dum carro. Seguiram depressa para o lago, com o Velhote todo
=satisfeito por saber que ia tomar banho.
— Tenho a impressão que estão sempre a acontecer coisas =destas num
acampamento de circo — disse a Ana. —Não se =parece nada com a vida
normal.
— Não se parece? — perguntou o Dino, surpreendido. =— Mas para mim é esta
a vida normal.
No lago estava fresco e todos se divertiram muito a nadar e a mergulhar.
=O Pongo não ia muito longe, mas salpicava quem se aproximasse, com
=gritos animados. Pregou um susto ao Velhote, saltando para cima dele e
=puxando-lhe por uma das suas grandes orelhas.
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— Deve estar zangado — disse o David. — Pobre Tim! =Com certeza pensa que
resolvemos não fazer mais caso dele.
Chegaram às «roulottes» e o Tim correu para a Zé como se =não a visse
havia um ano. Tocava-lhe com as patas e lambia-a, depois =recomeçava a
fazer-lhe festas com as patas.
O Ladra-Ladra e o Rosna-Rosna também estavam satisfeitos por tornar a
=vê-lo e então o Pongo estava encantado. «Cumprimentou» a =cauda do Tim
por várias vezes e ficou desapontado por o Tim não =lhe ligar
importância.
— Atenção. O que está o Ladra-Ladra a morder?— =disse o David de repente.
—Carne crua! Como veio aqui parar? Acham =que o quinteiro tenha aqui
estado e tenha deixado alguma para o Tim? =Então -porque não a comeu o
Tim?
Todos olharam para o Ladra-Ladra que estava a comer um bocado de carne,
=no chão. O Rosna-Rosna também se foi juntar ao outro. Mas nem o =Tim nem
o Pongo se aproximaram. O Tim tinha a cauda caída e o Pongo =escondia a
cara atrás das mãos.
— Que esquisito — disseram os pequenos intrigados com o =estranho
procedimento dos dois animais. Depois, repentinamente, =perceberam, pois
o pobre Ladra-Ladra soltou um uivo terrível tremendo =dos pés à cabeça e
rebolando-se no chão.
— Com seiscentos macacos! Está envenenado!
— gritou o Dino, afastando o Rosna-Rosna do resto da carne. =Agarrou no
Ladra-Ladra e com a maior comoção os pequenos viram que =o Dino estava a
chorar.
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— Vai morrer — disse o rapaz, com uma voz impressionante. =—Pobre Ladra-
Ladra!
O infeliz Dino começou a descer o monte, levando o Ladra-Ladra ao =colo,
seguido pelo Rosna-Rosna e pelo Pongo. Ninguém tinha coragem =para o
acompanhar.
Carne envenenada, que coisa terrível!
AZé estava a tremer. Parecia que as suas pernas não conseguiam =aguentá-
la e ela sentou-se, sem forças, na laje. Pôs os =braços à volta do Tim.
— Ó Tim, aquela carne era para ti! Graças a Deus, graças =a Deus tiveste
esperteza suficiente para não lhe tocares. Ó Tim, =tu podias ter ficado
envenenado!
O Tim lambia a sua dona mansamente. Os outros estavam à volta da =Zé,
aflitos, sem saberem o que pensar. Pobre Ladra-Ladra! Morreria? E =se em
vez dele fosse o Tim? Tinham-no deixado só e podia muito bem =ter comido
a carne e morrido.
— Eu nunca, nunca mais te deixo aqui em cima, sozinho — =disse a Zé.
— Quem pensam vocês que lhe atirou a carne envenenada? —= perguntou a Ana
num tom abafado.
— Quem pensam que foi? — gritou a Zé numa voz dura e =zangada.—O Lou e o
Tigre Dan!
— Eles querem pôr-nos fora daqui, isso está à vista =— disse o Júlio,
intrigado. — Mas porquê?
— Ou querem tirar o Tim do seu caminho — disse o David. =— Mas também
porquê?
— Que poderá haver neste lugar para que os homens queiram =livrar-se de
nós? — perguntava o Júlio. — Eles =são uns autênticos patifes.
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Coitado do Dino. Deve passar uma vida horrível, com eles. E agora
=envenenaram-lhe o cãozito.
Nessa noite ninguém tinha grande apetite. A Ana retirou o pão, a
=manteiga e o frasco da compota. A Zé não conseguiu comer =absolutamente
nada. Que fim horrível para um dia tão bem =passado!
Deitaram-se cedo e ninguém se importou quando o Júlio disse que ia
=fechar à chave as duas «roulottes». — Não é que eu =pense que o Lou e o
Dan voltem aqui durante esta noite — explicou =ele. — Mas nunca se sabe.
Se eles voltaram ou não, os pequenos nunca chegaram a saber, pois =embora
o Tim começasse a ladrar muito alto a meio da noite e =arranhasse com
fúria a porta fechada da «roulotte» da Zé, =quando o Júlio abriu a sua
porta, com a lanterna acesa, não =conseguiu ouvir nem ver nada de
especial.
O Tim calou-se e não voltou a ladrar. Deitou-se muito quieto, =dormindo
com uma orelha arrebitada. O Júlio deitou-se e começou a =pensar.
Provavelmente o Lou e o Dan tinham vindo, pé ante pé, pela =noite escura,
esperando que o Tim tivesse comido a carne e morresse =envenenado. Mas
quando o ouviram ladrar, perceberam que ele estava bem e =então deviam
ter-se retirado. Que pensariam eles fazer a seguir?
— Há qualquer coisa por trás de tudo isto — pensava =e tornava a pensar o
Júlio. — Mas que poderá ser? Porque =quererão eles afastar-nos deste
lugar?
Não fazia a menor ideia. Por fim adormeceu, pensando num vago =plano.
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Na manhã seguinte não fazia tanto calor e o céu estava cheio de =nuvens.
Ninguém se sentia muito animado, pois continuavam a pensar no =Dino e no
pobre Ladra-Ladra. Comeram o pequeno almoço quase em =silêncio e depois a
Ana e a Zé começaram a juntar os pratos, =para os levarem até ao regato e
lavá-los.
— Hoje vou eu à quinta — disse o Júlio.
— Tu sentas-te na laje, com o binóculo, David, para veres se o =Dino sai
no barco e nos faz sinal. Tenho a impressão que hoje ele =não nos vai
querer no acampamento. Se suspeitou que foram o Lou e o =Dan que puseram
o veneno na carne deve ter tido uma séria =discussão com eles.
O Júlio partiu para a quinta, com os dois cestos vazios. A senhora
=Mackie já o esperava e ele comprou uma grande quantidade de comida
=apetitosa. Desta vez, o presente da senhora foi um bolo redondo, acabado
=de fazer.
— A gente do circo vem aqui muitas vezes comprar comida? — =perguntou o
Júlio, enquanto pagava à senhora Mackie.
— Vêm algumas vezes — respondeu ela. — Não me =importo que venham as
mulheres ou as crianças, embora muito sujas e =levando de vez em quando
uma das minhas galinhas; mas os homens é que =eu não suporto. Havia dois,
no ano passado, sempre a andarem aqui =pelo monte e o meu marido teve de
correr com eles. *
O Júlio apurou o ouvido.—Dois homens? Como eram eles?
— Muito feios — contou a senhora Mackie.
— Um deles tinha os dentes mais amarelos que eu tenho visto. =Muito mal-
humorados, tanto um como o outro.
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Passavam por aqui durante a noite e nós tínhamos medo que nos =roubassem
as galinhas. Juraram que não queriam as galinhas, mas que =outra coisa
podiam procurar aqui, durante a noite?
— Não faço ideia — respondeu o Júlio. Ele estava =convencido que os dois
homens eram o Lou e o Tigre Dan. Porque andariam =eles pelos montes,
durante a noite?
Despediu-se e foi-se embora, com os cestos. Quando chegou perto das
=«roulottes» o David chamou-o, muito excitado.
— Júlio! Anda ver pelo binóculo. O Dino está no barco, =com o Pongo, mas
não consigo perceber o que estão a acenar.
O Júlio pegou no binóculo e observou. Lá muito em baixo, na =superfície
do lago, flutuava o barquito do Dino. Ali estava ele e =também o Pongo.
Ambos acenavam com qualquer coisa vermelho-vivo.
— Não consigo perceber com que estão a acenar, mas isso =não interessa —
disse o Júlio. — O que importa é =estarem a acenar com uma coisa vermelha
e não branca. Vermelho quer =dizer perigo. Ele está a avisar-nos.
— É verdade, não pensei nisso. Que estúpido que eu sou! =— disse o David.
— Vermelho quer dizer perigo. Que terá =acontecido?
— Bem, é evidente que hoje não devemos ir ao acampamento =— disse o
Júlio. — E também é evidente que, =qualquer perigo de que se trate, é
muito sério, porque tanto o =Dino como o Pongo estão a acenar com panos
vermelhos; duas vezes =perigo!
— Vermelho quer dizer perigo. Ele está a avisar-nos.
— Ó Júlio, tu és muito perspicaz — disse a Zé, =que estava a seguir a
conversa. — Foste o único de nós =todos que descobriu tudo isso. Perigo a
dobrar. Que poderá ser?
— Talvez queira dizer que há perigo lá em baixo no =acampamento e também
aqui em cima — disse o Júlio, =pensativo. — Espero que o pobre do Dino
esteja bem. O Tigre Dan =é tão bruto com ele! Até aposto que já apanhou
uma ou duas =sovas, desde a noite passada.
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— Vamos todos por caminhos diferentes — disse o Júlio. =— Para cima, para
baixo e para os lados. Eu vou para cima.
Separaram-se, partindo nas várias direcções, a Zé e o Tim =juntos, claro
está! Procuraram possíveis cavernas ou mesmo =qualquer espécie de
esconderijo. O Tim metia a cabeça em cada toca =de coelho que encontrava
e por isso também andava muito ocupado.
Cerca de meia hora depois os outros ouviram o Júlio a chamar. =Correram
até às «roulottes» convencidos que ele descobrira =qualquer coisa
importante.
Mas não descobrira. Apenas estava cansado de procurar e decidira
=desistir. Abanou a cabeça quando os outros correram para ele, =ansiosos
por saberem o que ele havia descoberto.
— Nada — disse ele. — Já estou farto de =procurar. Estou convencido que
não há por aqui nenhuma caverna. E =algum de vocês encontrou alguma
coisa?
— Nada! — disseram em coro, desanimados. — Que =vamos fazer agora?
— Pôr o nosso plano em acção — disse o Júlio =prontamente. — Deixemos os
homens mostrarem-nos o que procuram. =Descemos o monte e gritamos ao Dino
que passamos todo o dia fora. E =depois, tenhamos esperanças que o Lou e
o Dan nos oiçam.
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Houve uma conversa entre-dentes e Júlio não conseguiu apanhar nem =uma
frase. Depois, subitamente, tudo ficou silencioso. Nem uma pancada
=contra a «roulotte». Nada!
Júlio continuava quieto. Podia ser que os homens ainda ali =estivessem.
Ele não ia dar sinal da sua presença. Esteve deitado =durante bastante
tempo, esperando e pensando. Mas não ouviu nada.
Depois viu um passarinho voar para o ramo de uma árvore; bateu as =asas e
começou a procurar migalhas. Era o passarinho que costumava =aparecer
quando os pequenos comiam as suas refeições, mas só se =aproximava depois
de eles se afastarem.
Em seguida foi um coelho que saiu dum buraco e começou a correr por =ali.
— Bem — pensou o Júlio. — É evidente que os =homens não estão agora aqui,
pois de contrário os passaritos e =os coelhos não se aproximavam. Ali
está outro coelho. Aqueles =homens devem ter ido a qualquer parte, sabe
Deus onde. Acho que posso =agora espreitar sem correr nenhum perigo.
Escorregou até à borda e espreitou pela parte de trás da =«roulotte».
Observou o chão. Não havia absolutamente nada =que lhe indicasse o que os
homens tinham estado a fazer, ou para onde =tinham ido! Crescia ali o
tojo, como no resto do terreno. E nada =mostrava o motivo por que os
homens tinham feito barulho.
— Isto é realmente muito esquisito — pensava o =Júlio, já com medo de ter
estado a sonhar. — Os homens =desapareceram, e parece que se evaporaram.
Devo arriscar-me a descer =para ver se descubro alguma coisa?
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Acho que não devo. Os homens podem voltar a todo o momento e é =certo que
ficarão furiosos se me encontrarem aqui; então é que =me atiram com a
«roulotte» pela encosta abaixo! E o declive é =enorme!
Continuou ali deitado, pensando. Começou a sentir muita fome e sede.
=Ainda bem que tivera a prudência de levar comida para o tejadilho. Ao
=menos podia comer qualquer coisa enquanto esperava pelos homens, caso
=eles voltassem.
Começou pelas sanduíches. Estavam muito saborosas. Comeu-as todas =e
continuou com o bolo. Também este estava muito bom. Levara ameixas, =o
que lhe deu grande satisfação, pois estava com sede. Atirou com =os
caroços das ameixas para o chão antes de pensar no que estava a =fazer.
— Que asneira! Porque fiz eu isto? Se os homens reparam neles, =podem
lembrar-se que não estavam lá anteriormente, ainda que a =maior parte Se
tenham metido no tojo.
O sol apareceu por uns instantes e Júlio sentiu-se cheio de calor. =Ele
só desejava que os homens voltassem e descessem o monte. Estava =cansado,
pois havia muito tempo que continuava estendido sobre o telhado =tão
duro. E além disso tinha muito sono. Começou a abrir a boca =em silêncio
e fechou os olhos.
Quanto tempo dormiu, não fazia a menor ideia; acordou de repente
=sentindo a «roulotte» deslocar-se outra vez. Agarrou-se à =chaminé
ouvindo os homens a falar em voz baixa.
Eles estavam a puxar a «roulotte» para o lugar donde a tinham =tirado.
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Seria alguém que espiava o Lou e o Dan? Mas que cara horrível! =Não
parecia humana.
Apareceu uma mão, que coçou a cara e o Júlio viu que era =felpuda. Cheio
de surpresa percebeu a quem pertencia aquela cara; era ao =Pongo, o
chimpanzé! Não admirava que tivesse achado a cara feia e =inumana. Estava
bem para um chimpanzé, até era simpática, mas =não para um homem.
O Pongo olhou para o Júlio, muito sério. E o Júlio fitou-o, com =as
ideias em turbilhão. Que estava o Pongo a fazer ali? Estaria o =Dino com
ele? Se assim fosse, o Dino corria perigo, pois de um momento =para o
outro os homens podiam acordar. Júlio não sabia o que =fazer. Se chamasse
o Dino para o avisar, acordava os homens.
O Pongo estava contente por ver o Júlio e não parecia achar o =tejadilho
duma «roulotte», um lugar estranho para se estar. No fim =de contas ele
também ia muitas vezes para os tejadilhos dos carros do =circo. Pongo
cumprimentou o pequeno e piscou-lhe o olho, e depois =estendeu a cabeça.
Nessa altura apareceu por trás dele a cara do Dino, uma cara com =todos
os sinais de quem esteve a chorar, inchada e com nódoas negras. =Ele viu
o Júlio em cima da «roulotte» e abriu a boca, cheio de =surpresa. Parecia
que ia falar, e o Júlio fez-lhe sinal com a =cabeça, vivamente, para que
se calasse, apontando para baixo, =tentando avisar o Dino que estava ali
alguém.
Mas o Dino não compreendeu. Sorriu e com a maior aflição de =Júlio
começou a subir pela encosta, na direcção da laje! Os =homens estavam a
dormir ali,
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Ele não queria dar-lhes a entender que fora ele quem estivera a =espiar e
também não queria brigar com os homens, pois sabia =perfeitamente que não
levaria a melhor. Mas ninguém podia ficar =indiferente, vendo dois homens
tratarem um rapazinho daquela maneira. =Resolveu saltar do tejadilho
sobre os dois homens e salvar o pobre Dino, =se conseguisse.
Dino soltou um grito angustioso, quando o Lou lhe deu uma vergastada com
=o cinto de couro, mas antes do Júlio saltar para o socorrer, =alguém
interveio! Alguém que mostrando os dentes, dava guinchos =selvagens e
ferozes, alguém que tinha os braços muito mais fortes =do que o Lou ou o
Dan. Alguém que gostava do pobre Dino e não ia =deixar baterem-lhe mais!
Era o Pongo. O chimpanzé observara a cena com os seus olhinhos
=inteligentes. Ainda estivera escondido na árvore pois tinha medo do =Lou
e do Dan. Mas ao ouvir os gritos do Dino, saltou da árvore e =correu para
os homens.
Mordeu com força um braço do Lou. Depois mordeu uma perna do Dan. =Os
homens gritavam alto, ainda mais alto do que o pobre Dino havia =gritado.
O Lou acertou com o cinto de couro num ombro do Pongo. O =chimpanzé deu
um grito e saltou para o Lou, com os braços abertos, =apertando o homem
contra ele, tentando morder-lhe a garganta.
O Tigre Dan fugiu pelo monte abaixo, a toda a velocidade, aterrado com o
=chimpanzé. O Lou gritou ao Dino:
— Chama-o! Ele vai matar-me!
— Pongo!—gritou o Dino. — Pára com isso! Pongo! =Anda cá.
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Não bebi nada, durante todo o dia. Vou tomar uma laranjada.
— Estamos todos com sede. Vou buscar cinco garrafas; não, =seis, pois eu
julgo que o Pongo também vai querer uma.
O Pongo gostava imenso de laranjada. Sentou-se na laje com os pequenos e
=segurou o copo que a Ana lhe ofereceu, tal como uma criança. O Tim
=estava um pouco invejoso, mas como não gostava de laranjada não =podia
fazer companhia.
O Júlio começou a contar aos outros tudo o que lhe acontecera e =como se
escondera no tejadilho da «roulotte». Descreveu como os =homens tinham
chegado e tinham ido para baixo da «roulotte» e =depois a haviam puxado.
Todos ouviram de olhos arregalados. Mas que =história!
Depois o Dino contou a sua parte.
— Eu apareci e ia estragando tudo — disse ele, quando o =Júlio chegou à
altura em que os homens estavam a dormir e a =ressonar. Mas, vocês
compreendem, eu tinha de os prevenir. O Lou e o =Dan juraram que haviam
de envenenar o Tim de qualquer maneira, nem que =para isso fosse preciso
dar-lhe um narcótico, metê-lo num saco e =levá-lo para o acampamento. Ou
então darem-lhe uma pancada na =cabeça.
— Que experimentem! — disse a Zé, fora de si, pondo um =braço à volta do
Tim. O Pongo imediatamente foi também =abraçar o Tim.
— E eles disseram que queriam estragar as vossas =«roulottes», talvez
pegar-lhes fogo — continuou o Dino.
As quatro crianças fitaram o Dino, aterradas. — Mas não =podem fazer uma
coisa dessas!
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A passagem terminava numa pequena gruta que parecia não ter outra =saída.
Não havia ali nada. O Júlio examinou as paredes.
Viu mais saliências de ferro que subiam pela parede e seguiam até =um
buraco no tecto, que devia ter sido aberto, anos antes, pela água
=corrente. — É por ali que nós vamos — disse ele. =— Anda!
— Não me digas que... — principiou a dizer o Júlio, =aflito, sacudindo a
lanterna com força para tornar a luz mais =intensa. Mas a pilha estava
quase gasta e a luz não melhorou. Ao =contrário, tornava-se cada vez mais
ténue até que se reduziu =apenas a um ponto luminoso.
— Vamos, temos que voltar para trás imediatamente — =disse o Júlio
sentindo-se um pouco assustado. — Não quero =andar por aqui às escuras.
Não me diverte nada.
O Dino agarrou a pata cabeluda do Pongo e agarrou-se também à =camisola
do Júlio. Não se queria perder de nenhum deles. A luz da =lanterna
apagou-se por completo. Agora tinham de procurar o caminho de =regresso
na mais completa escuridão.
O Júlio apalpava à sua volta para encontrar o começo da =passagem que ia
dar ao buraco. Encontrou-a e começou a subir, =tacteando os lados. Não
era nada agradável e Júlio dava =graças a Deus, por ele e o Dino terem
caminhado pouco para dentro do =monte. Seria um autêntico pesadelo, se se
tivessem afastado muito e =depois não pudessem ver o caminho da volta.
Uma luz brilhava ao longe e calcularam ser a luz do dia, passando pela
=entrada do buraco.
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O Tim ia correndo à frente, com a cauda a dar a dar. O Pongo subiu =para
o telhado da «roulotte» vermelha, ficando a vê-los. O Dino =e o David
sentaram-se ao sol, sobre a laje,.com as cabeças apoiadas =em tufos de
verdura macia.
—Está-se bem aqui — declarou o Dino. — Muito =melhor do que lá em baixo.
Gostaria de saber o que pensam que =aconteceu a mim e ao Pongo. Aposto
que o senhor Górgio, o dono do =circo, está zangado por o chimpanzé ter
desaparecido. Naturalmente =manda alguém vir buscar-nos cá acima.
O Dino tinha razão. Tinham mandado duas pessoas para os levar: o Lou =e o
Tigre Dan. Estes vinham a subir por entre o tojo e os fetos, sempre
=alerta por causa do Tim e do Pongo.
O chimpanzé pressentiu-os muito antes de eles aparecerem e avisou o
=Dino. Este ficou muito pálido. Tinha um medo terrível dos dois =patifes.
— Vai para dentro duma das «roulottes» — disse o =David em voz baixa. —
Depressa. Eu ocupo-me desses sujeitos, se =acaso forem eles. E se for
necessário, o Pongo há-de =ajudar-me.
O Dino meteu-se dentro da «roulotte» verde e fechou a porta. O =David
ficou sentado onde estava. O Pongo acomodou-se no telhado da =«roulotte»,
observando.
De súbito apareceram o Lou e o Dan. Eles viram o David, mas não =viram o
Pongo. Olharam em volta procurando os outros.
— Que desejam? — perguntou o David.
— O Dino e o Pongo — respondeu o Lou, com mau modo.—=Eles estão aqui?
— Eles vão ficar a viver connosco — declarou o =David.
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e atirou-as com tão boa pontaria que depressa o David começou a =ouvir
gritos de dor.
O Pongo voltou, parecendo muito satisfeito consigo mesmo. Foi até =à
«roulotte» verde, enquanto o David gritava ao Dino:
— Está tudo bem, Dino. Eles foram-se embora. O Pongo e eu =ganhámos a
batalha!
O Dino apareceu. O Pongo abraçou-o e começou a fingir que lhe =falava ao
ouvido. O Dino estava bastante envergonhado.
— Sou muito cobarde, não sou? — disse ele. — =Deixar-te aqui sozinho!
— Diverti-me muito — respondeu o David com =convicção. — E estou certo
que o Pongo também =gostou.
— Tu não sabes como o Lou e o Dan são perigosos — =disse o Dino, olhando
a encosta para se certificar que os homens tinham =realmente fugido. —
São capazes de fazer mal sem motivo. Eles =queriam queimar as vosssas
«roulottes», deitá-las pelo monte =abaixo, envenenar o vosso cão e
fazerem-lhes todo o mal que pudessem. =Tu não os conheces como eu!
— Sabes, nós temos vivido várias aventuras cheias de =emoções, onde
aparecem homens tão maus como o Lou e o Dan =— disse o David. — Nós
acabamos sempre por nos meter no =meio duma ou outra aventura. Nas férias
passadas fomos para um lugar =chamado o Monte dos Contrabandistas e tu
nem calculas as aventuras que =ali tivemos! Nem acreditarias!
— Conta-nos, a mim e ao Pongo! — pediu o Dino, sentando-se =ao lado do
David. — Temos muito tempo até os outros =voltarem.
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Depressa as duas pequenas estavam muito ocupadas a preparar um =magnífico
almoço e todos se sentaram na laje, para o saborear.
— A senhora Mackie deu-nos hoje de presente esta enorme =«tablette» de
chocolate — disse a Ana, mostrando-a ao David =e ao Dino. — Não foi
simpática? Não, Pongo, não é =para ti; come as tuas sanduíches com termos
e não as =esmigalhes.
— Proponho que levemos connosco alguma comida, lá para =baixo—disse o
Júlio.—Pode ser que nos demoremos muito =tempo e não poderemos voltar à
hora do lanche.
— Ui, um piquenique dentro do monte! —exclamou a Ana. =— Vai ser
sensacional. Vou meter alguma comida dentro dum saco. =Não estou para
fazer sanduíches. Levamos um pão inteiro, =manteiga, fiambre e um bolo, e
cortamos o que quisermos. E se =levássemos qualquer coisa para beber?
— Se tivermos sede, podemos esperar até voltarmos — =disse o Júlio.
A Zé e o Dino levantaram a mesa e foram lavar os pratos. A Ana =embrulhou
os alimentos em papel vegetal e arrumou tudo com cuidado =dentro do saco,
para o Júlio levar. Também meteu no saco a =«tablette» de chocolate.
Seria agradável comerem nos momentos =difíceis.
Finalmente estava tudo pronto. O Tim abanava a cauda. Ele sabia que iam
=a qualquer parte.
Todos cinco empurraram a «roulotte» por alguns metros, para a =abertura
ficar à vista. Na noite anterior tinham puxado a =«roulotte» para o lugar
do costume, não fossem o Lou e o Dan =querer entrar pelo buraco. Ninguém
podia lá ir, estando a =«roulotte» por cima.
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Cada pequeno vestira mais uma camisola, por ordem do Júlio, pois ele
=calculava que devia estar frio dentro do monte. Emprestaram ao Dino uma
=camisola velha do David. Logo que começaram a andar pela passagem
=escura, que conduzia à primeira gruta, ficaram satisfeitos por =trazerem
mais abafos, pois o ar era muito frio. Chegaram à pequena =gruta e o
Júlio mostrou-lhes,, à luz da lanterna, onde estavam as =placas de ferro
que subiam pela parede até uma abertura no tecto.
— É extraordinário! — exclamava a Zé, emocionada. =— Eu gosto deste
género de coisas. Onde irá dar aquela =abertura do tecto? Eu vou à
frente.
— Não vais — disse o Júlio, com firmeza. — Eu =vou primeiro. Não sei o
que poderá estar lá em cima!
Começou a subir, segurando a lanterna com a boca, pois precisava das
=duas mãos para trepar. As placas de ferro eram fortes e estavam bem
=cravadas na parede, por isso a subida tornava-se bastante fácil.
Chegou à abertura do tecto e meteu a cabeça por ali. Deu um grito =de
admiração.
— Meu Deus. Há aqui uma gruta ENORME! É maior do que seis =salas de baile
juntas, e as paredes brilham; acho que é =fosforescência.
Entrou pela abertura, ficando no chão da gruta imensa. As paredes
=cintilavam,
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com uma luz especial e o Júlio apagou a lanterna. Via-se bem só =com a
luz fosforescente que havia na gruta.
Chegaram os outros, um por um, ficando todos maravilhados. — É =como a
gruta de Aladino! — disse a Ana. — Não é uma =luz tão esquisita a que vem
das paredes e também do tecto, =Júlio?
O David e a Zé tiveram uma certa dificuldade em levar o Tim para a
=gruta, mas por fim conseguiram. O Tim não gostou da luz que cintilava
=por toda a parte, mas conformou-se, quando a Zé lhe fez festas.
Os cinco pequenos examinaram todos os recantos e fendas da gruta
=cintilante.
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— Mas acho que esta peça deve ser uma preciosidade. Um =coleccionador de
porcelanas daria por isso uma fortuna. Que grandes =patifes são o Lou e o
Dan!
— Olhem para aqui! —exclamou a Zé, tirando várias =caixas de couro para
fora de uma mala.
— São jóias!
Abriu as caixas. Os pequenos ficaram maravilhados. Havia diamantes com
=reflexos chamejantes, rubis luzindo, esmeraldas a brilhar, colares,
=pulseiras, anéis e broches. As mais belas coisas luziam à luz das =cinco
lanternas.
Havia uma caixa com uma tiara que parecia feita só de grandes =diamantes.
Ana tirou-a da caixa, com cuidado, e pô-la na =cabeça.
— Sou uma princesa! Esta é a minha coroa
— disse ela.
— Estás linda! — exclamou o Dino, cheio de =admiração. — Estás tão bonita
como a Delfina, a que =faz habilidades nos cavalos, quando aparece em
cena, montada no seu =cavalo, com jóias a brilhar por toda a parte.
A Ana pôs colares e pulseiras, sentando-se no banco de pedra como uma
=princesinha, resplandecente de jóias magníficas. Depois tirou-as e
=guardou-as com cuidado nas caixinhas forradas de cetim.
— Mas que colheita têm feito aqueles dois malandros! — =disse o Júlio,
tirando algumas pratas doutro saco. — Devem ser =ladrões de primeira
ordem.
— Eu sei como eles trabalham — disse o David.
— O Lou é um óptimo acrobata, não é? Naturalmente =trepa pelas paredes e
pelos telhados e entra pelas janelas.
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O Tigre Dan deve ficar em baixo, à espera, e apanha tudo quanto o =outro
lhe atira.
— Deves ter razão — concordou o Dino, agarrando uma =linda chávena de
prata. — O Lou pode subir a qualquer parte, =pela hera ou pelos canos e
até se ele subisse pela parede nua duma =casa, eu não me admiraria! E
saltar! Consegue saltar como um gato! O =Tigre Dan e ele devem vir
praticando os seus roubos, desde há muito, =creio eu. Agora já percebo
onde ia o Tigre Dan durante a noite, =quando andávamos de terra em terra
e eu acordava e não o via =deitado no carro.
— Tenho a impressão de que guarda os objectos roubados naquele =vagão que
tu nos mostraste
— lembrou o Júlio. — Até nos contaste como ele ficou =zangado contigo,
uma vez que tu ias lá mexer. Naturalmente guardam =tudo ali e cada ano,
ele e o Lou, vêm meter tudo neste esconderijo, =até que a polícia desista
de procurar as coisas roubadas; depois =levam aos poucos o que podem
vender em qualquer parte, sem perigo.
— Uma ideia bem inteligente — disse o David.
— Que boas oportunidades eles têm, andando de lugar para =lugar, ouvindo
falar de pratas ou jóias famosas, escapando-se de =noite, e o Lou a subir
pelas paredes e a entrar nos quartos, como um =gato. Só gostava de saber
como encontraram este sítio, que é o =melhor dos*esconderijos!
— Tens razão. Ninguém deve nem sonhar que ele existe! =— disse a Zé.
— E então nós viemos pôr a nossa «roulotte» mesmo =em cima da entrada,
logo na altura em que eles queriam trazer umas =coisas cá para dentro
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O Júlio não respondeu. Estava furioso consigo, por não ter =previsto que
aquilo podia acontecer. Ainda que tivessem visto o Lou e o =Dan a entrar
para o autocarro, com as malas, podia ser muito bem que =eles não
tencionassem passar a noite fora. As malas podiam conter =coisas para
vender; objectos roubados de qualquer espécie.
— Eles regressaram depressa e subiram ao monte, naturalmente para
=tentarem outra vez levar o Dino e o Pongo — disse o Júlio, =muito
agitado. — Que idiota que eu fui por deixar as coisas =acontecerem desta
maneira. Bem, vamos tentar afastar aquelas tábuas; =com um pouco de
sorte, talvez se consiga.
Fizeram os possíveis e conseguiram afastá-las um bocado. Mas tal =como o
Júlio temia, tinham puxado a «roulotte» para cima do =buraco e, mesmo
afastando algumas tábuas, era impossível =saírem.
— Talvez o Pongo nos possa ajudar — lembrou o Júlio de =repente. Começou
a gritar com força. — Pongo! Pongo! Vem =ajudar-nos!
Ficaram quietos, esperando ouvir o Pongo a guinchar ali perto ou
=arranhando as tábuas pela parte de cima. Mas não havia nenhum =sinal do
Pongo.
Todos chamaram, mas sem resultado. O Pongo não aparecia. Que lhe =teria
acontecido? O pobre Dino estava muito aflito.
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— Gostava de saber o que lhe sucedeu — não parava de =dizer. — Pressinto
que aconteceu qualquer coisa horrível ao =pobre Pongo. Onde poderá estar?
O Pongo não estava muito longe. Estava deitado, com a cabeça a =sangrar.
Completamente inconsciente, não podia ouvir os apelos =insistentes dos
pequenos. Coitado do Pongo!
O que o Júlio temia tinha realmente acontecido. O Lou e o Dan haviam
=subido ao monte, levando dinheiro para resolver o Dino e o Pongo a
=voltarem com eles. Quando chegaram perto das «roulottes», pararam,
=chamando com força:
— Dino! Dino! Viemos fazer as pazes e não para te bater! Temos =dinheiro
para ti. Sê um rapazinho sensato e volta ao acampamento. O =senhor Górgio
anda à tua procura.
Como não ouvissem nenhuma resposta, os homens aproximaram-se. =Então
viram o Pongo e pararam. Mas o chimpanzé não podia =atacá-los porque
estava preso à «roulotte». Ficou ali, =guinchando, zangado.
— Onde teriam ido os miúdos? — perguntou Lou. Nessa =altura viu que a
«roulotte» estava um pouco afastada e =imediatamente adivinhou.
— Encontraram o caminho para o subterrâneo! Repara, afastaram =uma das
«roulottes» de cima do buraco. Que vamos nós fazer =agora?
— Primeiro isto — respondeu o Tigre Dan com uma voz =terrível, apanhando
uma pedra enorme. Atirou-a com toda a força =sobre o pobre Pongo, que
tentou desviar-se; mas a corda não o deixou =e a pedra apanhou-o mesmo em
cheio, na cabeça.
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Era um grupinho muito triste e desanimado o que voltava pelo túnel =até à
gruta.
Lá iam os pequenos, devagar e com custo, pois não era tão =fácil, contra
a corrente. O Júlio tiritava; estava completamente =molhado por ter
tentado nadar.
Chegaram por fim à gruta, onde a água passava suavemente. — =Vamos correr
aqui à volta, para aquecermos — lembrou o =Júlio. — Eu estou gelado;
David, empresta-me uma das tuas =camisolas secas. Tenho que tirar estas
duas, ensopadas.
Os pequenos correram à volta da gruta, organizando corridas, só =para
aquecer. Acabaram por ter calor e sentaram-se num monte de areia,
=arquejantes. Estiveram ali sentados por uns momentos, descansando.
Depois ouviram qualquer coisa. O Tim foi o primeiro a ouvir e começou =a
ladrar.
— Com seiscentos macacos, que se passa com o Tim? — =perguntou o Dino,
assustado. De todos era o Dino quem se assustava com =mais facilidade.
Naturalmente por causa das aflições que passara =naqueles últimos dias.
Todos escutaram, a Zé com a mão agarrada à coleira do Tim. Este
=continuou a ladrar. O barulho que todos ouviam parecia uma =respiração
ofegante, vinda da corrente que chegava até à =gruta!
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A quem ler este papel — Por favor suba ao monte, até ao lugar =onde estão
duas «roulottes». Por baixo da «roulotte» =vermelha, fica a entrada para
uma passagem subterrânea. Nós =estamos aí aprisionados. Por favor salvem-
nos depressa.
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— É possível que o Larry, ou outra pessoa que venha, não =veja as placas
de ferro que sobem pela parede da primeira gruta. Podem =não perceber
onde nós estamos.
Isso parecia muito possível. Seguiram todos pelo túnel que passava =pelo
esconderijo dos ladrões e chegaram à gruta maior. Havia um =canto arenoso
mesmo ao pé da abertura que dava para a gruta pequena e =as crianças
preferiram sentar-se ali do que na primeira passagem ou =na gruta mais
pequena, ambas pouco confortáveis. Chegaram-se todos =uns aos- outros,
para aquecerem. Tinham fome.
A Ana e o Dino estavam cheios de sono. A Zé também quase =adormeceu. Mas
os dois irmãos e o Tim continuavam bem acordados, =conversando em voz
baixa. Pelo menos, o Tim não falava mas abanava a =cauda cada vez que o
Júlio ou o David diziam alguma coisa. Era a sua =maneira de participar na
conversa.
Depois do que lhes pareceu muito tempo, o Tim ladrou e os dois pequenos
=endireitaram-se. Fosse o que fosse que os ouvidos apurados do Tim
=percebessem, o Júlio e o David não conseguiam ouvir nada. Mas o =Tim
continuava a ladrar.
O Júlio despertou os outros. — Julgo que chegou alguém para =nos salvar —
disse ele. — Mas é melhor não irmos =ver, não se dê o caso de serem o Lou
e o Dan. Acordem e =animem-se.
Ficaram todos bem despertos, num momento. Seria o Larry que vinha, por
=ter recebido a mensagem? Ou seriam aqueles homens horríveis, o Tigre
=Dan e o Lou, o acrobata?
Depressa souberam! De repente apareceu uma cabeça na abertura,
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ali perto, e uma luz brilhou sobre eles. O Tim começou a ladrar
=furiosamente e esforçava-se por avançar, mas a Zé segurava-lhe =com
força na coleira, pensando que podia ser o Larry.
Mas não era! Era o Lou, o acrobata, como os pequenos perceberam logo =que
ouviram aquela voz. O Júlio acendeu a lanterna, voltando-a para o
=patife.
— Espero que se tenham divertido — disse a voz áspera =do Lou. — E tu
toma conta do cão, rapaz, ou dou-lhe um tiro. =Estão a ver? Desta vez não
estou para graças com o cão. =Olhem para este revólver!
A Zé viu, horrorizada, que o Lou apontava um revólver para o Tim. =Ela
deu um grito e pôs-se à frente do cão.—Não se =atreva a atirar sobre o
meu cão. Olhe que eu vou, eu vou... eu =vou...
Não conseguia lembrar-se de nada suficientemente mau para fazer a um
=homem que queria matar o Tim e calou-se, sufocada com lágrimas de =raiva
e medo. O Tim, não sabendo o que era um revólver, não =conseguia perceber
por que razão a Zé não o deixava correr =sobre o seu inimigo; estava numa
posição tão boa, com a =cabeça a sair daquele buraco! O Tim achava que
podia =desembaraçar-se daquela cabeça num instante.
— Agora, miúdos, levantem-se e vão para aquele túnel =— ordenou o Lou. —
Vamos! Todos à minha frente e não =se atrevam a parar. Temos que fazer
aqui um trabalho, esta noite, e =não queremos ter mais interferências de
miúdos como vocês. =Compreendem?
Os pequenos compreendiam perfeitamente.
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Ele via o Tigre Dan a trabalhar com rapidez, metendo as coisas no saco,
=levando-as para fora, voltando de novo e carregando mais coisas outra
=vez. O Lou continuava sentado, com a lanterna e o revólver nas =mãos,
divertindo-se com as caras assustadas das raparigas e do Dino. =O Júlio e
o David mostravam um à-vontade que estavam longe de =sentir. O Tigre Dan
afastou-se com outro saco cheio. Mas não tinha =desaparecido havia meio
minuto, quando um grito de dor fez eco =através do túnel.
— Lou! Socorro! Socorro! Estão a atacar-me! Socorro!
O Lou levantou-se e correu pelo túnel.
— É o Pongo! Aposto que é o Pongo! — disse o =Júlio, excitado.
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Deu uma grande corrida sempre junto à parede, para se livrar de todo
=aquele reboliço, e dirigiu-se o mais depressa que podia, às =escuras,
para onde ele julgava estar a abertura que descia até à =primeira
passagem. Tinha de caminhar com cuidado, com medo de cair por =ali.
Finalmente encontrou-a, desceu até à cave e então acendeu =a lanterna,
pois achou que já não havia perigo.
Pouco depois saía pelo buraco e passava a correr pelas =«roulottes». Mas
de repente parou, sobressaltado com um =pensamento. Ele podia ir buscar
ajuda e entretanto os homens fugirem! =Não havia dúvida de que eles se
estavam a preparar para se =escaparem com todos os valores.
E se ele pusesse as tábuas sobre o buraco, puxando-as com toda a =força e
depois colocasse algumas pedras pesadas, por cima? Não =conseguia puxar
as «roulottes» para cima das tábuas, pois era =demasiado peso para as
forças dum rapazito. Mas as pedras talvez =servissem; os homens pensariam
tratar-se da «roulotte».
Numa grande excitação colocou as tábuas no seu lugar. Depois =acendeu a
lanterna, procurando pedras ali à volta. Havia várias. =Não conseguia
levantá-las mas foi-as rolando até às =tábuas. Assim já ninguém poderia
abrir o buraco pelo lado de =dentro.
— Bem sei que fechei os outros com os homens — pensou o =David. — Mas eu
espero que o Júlio encontre um bom =esconderijo, só por algum tempo.
Estou cheio de calor! Agora vou =descer o monte e espero não me perder na
escuridão.
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mas o Pongo não tinha a força habitual por causa do ferimento na =cabeça.
Os homens acabaram por conseguir afastá-lo e ele foi aos =saltos na
direcção do túnel, procurando as crianças.
Certamente o Lou lhe teria dado um tiro se conseguisse encontrar o
=revólver naquela altura. Mas não podia procurá-lo no escuro. =Apanhou a
lanterna e embora estivesse estragada conseguiu acendê-la =depois de a
bater duas ou três vezes contra o chão. Voltou a luz =na direcção do Dan.
— Nós devíamos procurar o chimpanzé quando notámos =que ele tinha fugido
— «rosnou» o Dan.
— Deve ter roído a corda com os dentes. Devíamos ter =pensado que ele
estava perto. Ia-me matando, saltando sobre mim no meio =da escuridão.
Foi uma sorte ter-se agarrado ao saco e não a =mim.
— Vamos buscar o resto das coisas e fugir
— disse o Lou, que ficara bastante abalado. — Depois =voltamos ao túnel,
para assustar os miúdos mais uma vez, damos um =tiro no Pongo, se
conseguirmos, e fugimos. Deitamos umas latas de comida =cá para baixo e
podemos fechar a abertura.
— Não me vou arriscar a encontrar outra vez o chimpanzé =— respondeu o
Dan. — Deixemos ficar o resto das coisas. =Vamo-nos já embora.
O Lou também não tinha grande vontade de voltar a ver o Pongo.
=Conservando a lanterna acesa, com cuidado, e o revólver na outra =mão,
seguiu o Dan para a abertura que dava para a primeira gruta. =Continuaram
pela passagem, ansiosos por chegar lá fora e descer pela =estrada com o
vagão.
Apanharam um grande susto quando viram que o buraco estava fechado! O
=Lou levantou a lanterna e fitou pasmado o lado de dentro das =tábuas.
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O Dan chamou-o. — Devia haver mais uma rapariga, Lou. Acho que o =Dino
disse que eram dois rapazes e duas raparigas. Onde está a outra
=rapariga?
— Foi andando pelo túnel, creio eu — respondeu o Lou, =tentando ver. —
Agora tu, rapaz, vem para aqui.
A Ana começou a chorar.—Não vás, Zé; não vás. =Eles vão magoar-te muito.
Diz-lhe que és uma...
— Cala-te — disse a Zé, vivamente. E acrescentou num =murmúrio: — Se eu
digo que sou uma rapariga percebem que falta =o David e ficam
zangadíssimos. Segura o Tim.
A Ana apertou a coleira do Tim na sua mão, a tremer. A Zé =começou a
andar para a gruta. Mas o Júlio não podia consentir =que batessem na Zé.
Ela gostava de passar por rapaz, mas ele não =ia deixá-la ser tratada
como tal.
O Lou agarrou a Zé logo que ela saiu do túnel e nesse momento o =Júlio
conseguiu com um pontapé fazer cair a lanterna da mão do =Lou; esta voou
até ao tecto da gruta e caiu no chão, apagando-se. =Agora a gruta estava
completamente às escuras.
— Volta para o túnel, Zé, com a Ana — gritou o =Júlio. — Tim, Tim, anda!
Pongo, vem cá!
— Eu não quero que dêem um tiro ao Tim! — gritou a =Zé, aterrorizada,
quando o cão passava por ela, correndo.
Mas no momento em que ela estava a falar ouviu-se um tiro. Era o Lou,
=atirando às cegas para o sítio onde supunha estar o Tim. A Zé =deu um
grito.
— Ó Tim, Tim! Não te feriram, pois não?
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— Está tudo bem, Ana! — disse ele. — A aventura =acabou. Podes rir outra
vez!
A Ana teve um sorriso desmaiado. O Pongo pegou-lhe na mão, =fazendo-lhe
festas que a animaram bastante. A Zé chamou o Tim, com =medo que ele
desse uma última mordedela ao Lou. Este observou-a. =Olhou para o David e
para o Júlio. Depois para a Ana.
— Então havia só uma rapariga! — disse ele. — =Porque resolveste dizer-me
que eram dois rapazes e duas raparigas? =— perguntou ele ao Dino.
— Porque é verdade — respondeu o Dino, apontando para a =Zé. — É uma
rapariga, ainda que pareça um rapaz. E é =tão boa como um rapaz, em tudo.
A Zé sentiu-se orgulhosa. Olhou o Lou com ar de desafio. Ele tinha =sido
agarrado por um polícia forte e o Tigre Dan estava nas mãos =de outros
dois.
— Acho melhor deixarmos este lugar tão lúgubre — =disse o Inspector,
guardando o bloco-notas onde estivera a escrevinhar =à pressa. — Em
frente!
O Júlio abria o caminho, através do túnel. Indicou a prateleira =onde os
homens guardavam as coisas e o Inspector pegou nos poucos =objectos que
ainda ali estavam. Enquanto caminhavam o Tigre Dan ia =praguejando.
— Eles vão para a prisão? — segredou a Ana ao =David.
— Com certeza — disse o David. — Era onde eles =deviam estar há muito
tempo. Os seus roubos têm dado que fazer =à polícia desde há quatro anos!
Saíram do túnel e passaram à gruta das paredes =fosforescentes.
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— Tudo acabou, por fim! — exclamou o Júlio satisfeito. =— Devo dizer que
nos saímos bem. Nem posso explicar-te, David, =como fiquei contente ao
ver-te aparecer com os polícias, tão =depressa. Foi uma grande ideia
teres telefonado da quinta.
O David começou a bocejar. — Deve ser tardíssimo — =disse ele. — Deve
passar da meia-noite. Mas tenho tanta fome que =vou comer qualquer coisa
antes de me deitar no meu beliche.
— Que nos vais dar, Ana? — perguntou o Júlio.
A Ana animou-se logo. — Vou ver — disse ela. — =Qualquer coisa se há-de
arranjar.
Abriu duas latas de sardinhas e fez sanduíches; abriu duas latas de
=pêssegos em conserva, e assim arranjaram uma agradável ceia. =Comeram
sentados no chão da «roulotte» das raparigas. O Pongo =comeu tanto como
os outros e o Tim mordeu uns ossos.
Naquela noite não levaram muito tempo a adormecer. Na verdade, =estavam
todos com tanto sono, quando acabaram de comer, que nem se =despiram!
Foram para os beliches tal como estavam e adormeceram logo. O =Dino ficou
com o Pongo e o Tim foi deitar-se aos pés da Zé. =Reinava a paz nas
«roulottes» e naquela noite ninguém foi =incomodá-los!
Dormiram todos até muito tarde, na manhã seguinte. Acordaram com =uma
pancada na «roulotte» dos rapazes. O Júlio gritou =sobressaltado:
— Quem está aí?
— Somos nós — disse uma voz familiar. O senhor Mackie e =a mulher estavam
a espreitar pela porta entreaberta, parecendo bastante =preocupados.
— Queríamos saber o que aconteceu — disse o quinteiro. =— O menino saiu a
correr quando acabou de telefonar e nunca mais =o vimos.
— Realmente devia ter lá voltado para vos contar — =disse o David,
sentando-se, com o cabelo a cair para a cara; puxou-o =para trás, e
continuou.
— Mas esqueci-me. Os polícias foram aos subterrâneos e =apanharam os dois
homens. São dois ladrões muito conhecidos. A =polícia também levou as
coisas roubadas. Foi uma noite muito =emocionante. Os meus maiores
agradecimentos por terem deixado servir-me =do telefone.
— Não tem nada que agradecer — disse a senhora Mackie. =— Olhem, trouxe-
lhes alguma comida.
Ela segurava dois cestos cheios de coisas apetitosas. O David, ao =vê-
las, sentiu-se cheio de fome.
— Obrigado — disse ele, reconhecido. — Os senhores =são muito boas
pessoas!
O Dino e o Pongo saíram de repente da pilha de cobertores e a senhora
=Mackie deu um grito.
— Que diabo é aquilo? Um macaco?
— Um chimpanzé, minha senhora — disse o Dino com =delicadeza. — Não lhe
fará nenhum mal. Pongo, tira a pata =desse cesto!
O chimpanzé, que estava com esperanças que ninguém o tivesse =notado,
cobriu a cara com as patas cabeludas, olhando por entre os dedos =para a
senhora Mackie.
— Olhem para ele, agora! Parece uma criança mal-educada! =— disse a
senhora Mackie. - Não achas, Ted?
— Lá isso parece — respondeu o quinteiro.
— Que animal mais esquisito.
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por um ano ou dois, até não se falar mais no roubo; depois =mandavam-nas
para amigos deles, na Bélgica e Holanda.
— O Tigre Dan em tempos trabalhou num circo, na Holanda — =lembrou o
Dino. — Contava-me isso muitas vezes. Tinha amigos em =toda a Europa,
tudo gente de circos.
— Por isso era-lhe fácil vender os objectos roubados no =estrangeiro —
disse o Inspector.
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- Ele planeara ir hoje para a Holanda; preparou tudo com o Lou, ou seja
=o Luís Faísca, para lhe dar o seu verdadeiro nome. Iam vender a =maior
parte destas coisas. Vocês conseguiram chegar a tempo!
— Que sorte tivemos! — disse a Zé. — Quase nos =escapavam! Se o David não
tivesse fugido quando o Pongo estava a =atacá-los, a estas horas ainda
nós estávamos presos nos =subterrâneos e o Lou e o Dan já iam a caminho
da Holanda.
— Que belo trabalho vocês fizeram! — disse o Inspector, =felicitando-os.
Depois olhou para o pote de mel. — Este mel é =óptimo, não é? Tenho que
comprar um pouco na senhora =Mackie.
— Coma mais — insistiu a Ana, muito atenciosa. — =Temos ali outro pão.
— Aceito — disse o Inspector pegando noutra fatia e =barrando-a com o mel
amarelinho. Parecia que não ia ficar nenhum para =o Pongo lamber! A Ana
gostava de ver uma pessoa crescida apreciando =pão com mel tanto como as
crianças.
— Sabem, esse Lou fez alguns roubos notáveis — =continuou o Inspector. —
Uma vez atravessou do terceiro andar =duma casa para o terceiro andar
duma outra, através da rua, =ninguém sabe como!
— Isso foi fácil para o Lou — disse o Dino, perdendo de =repente o medo
do Inspector. — Deve ter atirado um cabo de um =lado para o outro da rua;
laçou qualquer coisa com a ponta, talvez a =parte de cima dum cano,
esticou o cabo e passou por ali. Ele é um =formidável equilibrista. Não
há nada que ele não possa fazer =a trabalhar no arame!
— Provavelmente foi o que ele fez — concordou o Inspector. =— Nunca
pensámos nisso.
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Muito obrigado, mas agora já não quero mais mel. O chimpanzé =mata-me se
eu não lhe deixo um bocadinho para ele lamber.
O Pongo levou o frasco, sentou-se por baixo duma das «roulottes» e
=começou a lamber os restos do mel, com uma grande língua rosada.
=Quando o Tim se aproximou para ver o que era aquilo, o Pongo levantou o
=frasco acima da cabeça:
— Iarra-iarra-iarra-iarra! — dizia ele. O Tim, bastante =surpreendido,
voltou para o pé da sua dona. Esta estava a ouvir com =grande interesse o
que o Inspector lhes contava sobre as grutas =subterrâneas.
— São muito antigas — explicou ele. — Havia uma =entrada no sopé do
monte, mas abateu um bocado da encosta e a entrada =ficou tapada. Ninguém
se incomodou a desimpedi-la pois as grutas =não tinham nenhum valor
especial.
— Mas isso têm — afirmou a Ana. — Principalmente =a das paredes
fosforescentes.
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— Calculo que por acaso, um dia, o Lou e o Dan encontraram outra =entrada
— continuou o Inspector. — A entrada que vocês =conhecem. Um buraco que
segue para dentro do monte. Devem ter achado um =esconderijo óptimo para
as coisas roubadas, completamente seguro, =completamente seco e muito
perto do acampamento que todos os anos aqui =têm. Que poderiam encontrar
melhor?
— E eu acho que eles continuariam roubando durante anos e =escondendo
tudo, se não acontecesse nós pormos uma das =«roulottes» mesmo sobre a
entrada do subterrâneo! — =disse o Júlio. — Que pouca sorte eles tiveram!
— E que grande sorte tivemos nós! — respondeu o =Inspector. — Nós
suspeitávamos deles dois, e uma ou duas =vezes inspeccionámos o circo,
tentando encontrar objectos roubados; =mas devem sempre tê-los avisado da
nossa ida e traziam tudo para =aqui, a tempo.
— Esteve lá em baixo no acampamento, senhor? — =perguntou o Dino. <
— Sim, já lá estivemos esta manhã — respondeu o =Inspector. —
Interrogámos todos. Ficaram muito agitados e =confusos.
O Dino entristeceu.
— Que se passa, Dino? — perguntou a Ana, reparando na =expressão do
rapazito.
— Vai ser um sarilho quando eu voltar ao acampamento — =explicou o Dino.
— Vão dizer que foi por minha culpa que os =polícias lá foram. Nós não
gostamos da polícia a meter-se =nas nossas vidas. Se eu voltar, vão cair-
me todos em cima. Eu não =quero voltar!
Ninguém respondeu. Todos começaram a pensar
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o que aconteceria ao pobre Dino, agora que o tio Dan estava preso.
Então a Ana perguntou: — Com quem vais passar a viver no =acampamento,
Dino?
— Alguém tomará conta de mim, para me fazer trabalhar todo =o dia — disse
o Dino. — Não me importava se pudesse =ficar com os cavalos; mas o Rossy
não me vai deixar. Se eu pudesse =ficar com os cavalos, sentia-me feliz.
Eu gosto deles e eles percebem-me =bem.
— Que idade tens tu, Dino? — perguntou o Inspector, =metendo-se na
conversa. — Não devias ir para a escola?
— Nunca lá estive, senhor — disse o Dino.
— Tenho quase catorze anos e acho que já não irei.
Ele riu-se. Não parecia ter catorze anos. Pela estatura parecia ter =uns
onze. Depois ficou outra vez triste.
— Creio que não volto hoje ao acampamento
— disse ele. — Devem estar todos contra mim. E o senhor =Górgio com
certeza está furioso por ter perdido o melhor =palhaço e o melhor
acrobata!
— Podes ficar connosco o tempo que quiseres
— disse o Júlio. — Nós ainda aqui ficaremos por mais =algum tempo.
Mas o Júlio estava enganado. Logo que o Inspector se foi embora,
=apareceu a senhora Mackie, muito apressada, com um pequeno sobrescrito
=cor-de-laranja na mão.
— Esteve na quinta o rapaz dos telegramas
— disse ela. — Andavam à vossa procura. Espero que =não sejam más
notícias.
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teve uma grande conversa com o senhor Mackie; em seguida foi-se embora a
=correr, com boas notícias.
— Dino! —gritou ele quando já estava perto das =«roulottes». — Dino!
Gostavas de ir trabalhar com o senhor =Mackie, ajudando-o a tratar dos
cavalos? Ele diz que se quiseres podes =começar amanhã e viverás na
quinta!
— Com seiscentos macacos! — disse o Dino, admirado e =incrédulo. — Na
quinta? A trabalhar com os cavalos? Eu gostava =muito, mas o senhor
Mackie certamente não me quer.
— Quer, sim. Diz que podes ir à experiência
— afirmou o Júlio. — Nós partimos amanhã e até =lá podes ficar connosco.
Não precisas de voltar para o =acampamento.
— E o Rosna-Rosna? — disse o Dino. — Tem de ficar =comigo. É o meu cão.
Julgo que o Ladra-Ladra deve ter morrido. O =quinteiro não se importa que
eu leve um cão?
— Acho que não — disse o Júlio. — =Naturalmente tens que dar uma saltada
ao acampamento para trazeres as =tuas coisas e o Rosna-Rosna. O melhor é
ires já, Dino, para =passares o resto do dia connosco.
O Dino partiu, radiante. — Nunca pensei!
— dizia ele para consigo.—Nunca pensei! O Lou e o Dan =nunca mais me
podem bater. Eu já não volto a viver no circo e vou =tomar conta dos
cavalos da quinta! Nunca pensei!
Os pequenos disseram adeus ao Pongo, pois ele tinha de voltar com o Dino
=para o acampamento. Pertencia ao senhor Górgio e não era =possível o
Dino ficar com ele. E de qualquer maneira,
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Ao princípio estava um pouco fraco das pernas, mas esta manhã =já estava
completa-mente bem.
Realmente nem parecia que acontecera algum mal ao Ladra-Ladra. Ele e o
=Rosna-Rosna farejavam à volta do Tim, com as caudas a dar a dar. O =Tim
também lhes fez muita festa.
— Tive sorte — disse o Dino. — Só falei com a =Lucília e com o Larry. O
senhor Górgio tinha saído para ir =responder a umas perguntas, na
polícia, assim como alguns dos outros. =Por isso eu só pedi ao Larry para
dizer ao senhor Górgio que me ia =embora, peguei nas minhas coisas e
«raspei-me».
— Agora podemos realmente gozar o nosso último dia! — =disse o Júlio. —
Todos estamos contentes!
É bem certo que se divertiram. Foram tomar banho ao lago. Depois =tiveram
um óptimo lanche, em casa dos Mackies, por especial convite. =Jantaram na
laje, com os três cães a brincar, ali à volta. O =Dino tinha pena de em
breve ter de dizer adeus aos seus amigos =«finos», mas sentia-se
satisfeito e orgulhoso por ter um emprego =na quinta, a tratar dos
cavalos de que ele tanto gostava.
Na manhã seguinte, o Dino, o Ladra-Ladra, o Rosna-Rosna, o senhor =Mackie
e a senhora Mackie, todos ficaram na estrada a dizer adeus aos =pequenos.
— Adeus! — gritava o Dino. — Felicidades! Um dia =hei-de voltar a vê-los!
Adeus, adeus famosos Cinco!... Até à vossa próxima =aventura!
FIM
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