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Editora C/ Arte (2007-2 a Reimpressão) SUMÁRIO

Editor: Fernando Pedro da Silva

Conselho Editorial: Antonio Eugênio de Salles Coelho


Eliana Regina de Freitas Outra
Lucia Gouvêa Pimentel
Marília Andrés Ribeiro INTRODUÇÃO 11
Marília Navais da Mata Machado
Otávio Soares Oulci
Regina Horta Ouarte ARTE COMO CULTURA E EXPRESSÃO 13
1 - Cultura e ensino da arte 13
Revisao: Maria Lúcia Gonçalves Ribeiro 2 - A arte e a experiência segundo John Dewey 21
3 - Arte-educação pós-colonialista no Brasil: aprendizagem triangular 30
Ficha Catalográfica: Maria Holanda Vaz de Mello
4 - Mário de Andrade e a arte-educação
Projeto Gráfico da Capa: Jorge Padilha (anexos: As escapatórias do amor e Pintura e assunto) 52
5 - Citação de imagens 65
Ilustrações da Capa: "Tríptico" de Ana Amália, 19 97 6 - De Gauguin à América Latina 68

Projeto Gráfico do Miolo: Jefferson A. Vie ira


A ECOLOGIA DA DIVERSIDADE 79
Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, armazenamento 7 - A multiculturalidade de que se precisa no Terceiro Mundo 79
ou transmissão de partes deste livro, através de quaisquer meios, sem 8 - A multiculturalidade e os Parâmetros Curriculares Nacionais de 97/98 89
prévia autorização por escrito.
9 - A multiculturalidade da arte e do museu 98
Direiros exclusivos desta ediçã o: 10 - Educação e meio ambiente , 114
Edit ora C/Arte 11 - Aprendendo a ver - Eileen Adams 126
Av. Guarapari, 464
Cep 31560-300 - Belo Horizonte - MG O VISUAL E O VERBAL 137
PABX: (31) 3491-2001
com. a rte@comartevirtual.com.br 12 - Leitura da imagem no vestibular 137
13 - A imagem verbalizada de Barbara Kruger 140
14 - A palavra imágica 143
Barbosa, Ana Mae, 1936- 15 - Além do visual-verbal. Oswald: um olhar multidisciplinar 147
B238t Tópicos Utópicos/Ana Mae Barbosa.-
Belo Horizonte: C/Arte, 1998.
200p.: 33il. p&b - (Arte & Ensino) ENTREVISTAS SOBRE MULHERES, ARTE E ENSINO 151
ISBN: 978-85-87073-55-6 16 - Tuneu aprendendo com Tarsila 151
1. Arte - Estudo e ensino 2. Arte e educação. "-
17 - Yolanda Mohalyi 166
18 - Seonaid Robertson 169
COO: 707
CDU: 7.071.5
UMA REFLEXÃO SOBRE A ARTE NA UNIVERSIDADE 19 5
Para Claudia Toni e Glaucia Amaral, pelos 15 anos de amizade sem pre fiel
e adequadamente resignificada, à med ida que se transformam nossas vidas.
To Mary! De ] ong and Pat 5tsbr who helped me to understand
thePosfeminis»: of the 90 s.
Para João Alexandre que se to rnou muito mais int eressante
e até mais feminista depois que se apose ntou .
Para minhas / me us amigas/ os que se to rna ram alunas / os de pós-graduação
e para @s alun@s que se to rna ram amig@s, em espe cial Lu cia Pimen te!
que me obrigou a publicar este livro.
APRESENTAÇÃO

o segundo livro da Coleção ARTE & ENSINO - TÓPICOS UTÓ -


PICOS - traz o mais importante nome da arte-educação brasileira da aruali-
dade. ANA MAE BARBOSA dispensa apresentação, pois, além da grande
produção de literatura na área, tem uma atu ação marcante junto aos órgãos
associativos nacionais e internacionais .
E ste volume é uma colet ânea de text os polêmicos publicados em vá-
rias épocas, principalmente quando Ana Mae esteve à frente da Direção do
Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, e que desper-
tam discu ssão e nova s buscas, como é do feitio da Coleção.
São textos esparsos no tempo de escrita, mas que se tornam presentes
no tempo deste livro. Algumas palavras tiveram que ser reco nduzidas ao
tempo passado. Outras já nasceram no presente. Mas todas estarão, certa-
mente, no futuro das conversas entre o s arte -educadores e demais pessoa s
interessadas em percorrer os caminhos do conhecimento e da inovação fun -
damentada.
A va ried ad e dos temas e as linhas de abordagem v is a m se r
incentivadores e facilitadores de reflexões sobre teori a e prática do ensino de
arte. O agrupamento em blocos temáticos apenas formula um roteiro para
leitura, não representando uma seqüência obrigatória.
A Coleção ARTE & ENSINO contribui, com mais esta publicação,
para fom entar os diversos aspectos possíveis para discussão nessa área que,
por ser tão rica e diversificada, necessita conquistar seu espaço de maneira
contínua e cada vez mais competente.
i
Licia GOllvêa Pimentel
Coordenadora da Coleção

9
INTRODU ÇÃO

D ep ois da morte das uto pias esperanç o sas do mode rnismo, out ras
utopias, ago ra qua se em for ma de declaração de princíp ios, se impõem .
As utopias sem esperança de hoje, nesse fim de século, são uma trama
de ideologia e imaginação. .
É destas utopias qu e tratam os tópicos desse livro.
O núcleo central é o respeito à diversidade: diver sidade dos código s
cultu rais; diversidad e biológica, gerando as exp ectativas de equilíbrio ecoló-
gico; diversidade de inter pretações e de leitur as da arte.
Este nucle amento na diversidade nutre-se do interesse pelas manifes-
tações estéticas das mino rias e pela idé ia de arte como uma pr od ução qu e
deve ser estudada tendo- se em vista seu contexto cultura l.
Q uestiona-se o universalismo dos código s hegem ônicos que pr eside
os mu seus e elege- se a pluralidade como prin cípio articulador do conh eci-
me nto.
Respeitand o a pluralidade, experiências artísticas mu ltidisciplin ares são
analisadas e a liberd ade avaliativa na vida cultu ral é defendid a.
Relaçõe s entre o erudito e o popular; a teor ia e a prática; o verbal e o
visual; a e lite e as massas o rganizam o de sejo de mu da nça que transparece
nos textos.
O livro é uma homenagem aos colegas qu e trabalharam comigo no
fins dos anos 80 e inicio do s 90, e que comp artilh aram dos esforços em
direção à am pliação da capac idade de entendimento da arte por todas as
classes soc iais. Circunsc reve r a arte ao g ru po dos pouco s que pod em comprá-
la é a atitude domin ant e e a morte do desejo na arte .
Na trilha das homen agen s, quase ao fim do livro, três entrevistas acer-
ca de mulh eres artistas e/ou professora s comemoram: Tarsila, uma artis ta
que nunca ensinou mas que teve um aluno, um discípu lo direto qu e a enca n-
tou; Yolanda Mohaly, uma artista que explorou com seus alunos os mistério s
da abs tração e Seon aid Robertson, uma inglesa qu e, co nquistando, foi con-
quistad a por suas alunas brasileiras e pela " diferença".

11
Tópi cos Utó PICOS

Pretendemos que os diver sos textos, escrito s em diferentes tempos e ARTE COMO CULTURA E EXPRESSÃO
para diferentes lugares, se organizem de mod o a deixar transparente o dese-
nho do fio que os une.
Agradeço a Luc ia Pimentel que co sturou comigo as relações entre os
textos, a Edwin Parra Rocco qu e pôs à minha disposiçã o Fábio Uliani para
ajudar, às tradutoras dos textos em inglês, a Jorge Padilh a e Sylmara Belotti, a
quem teria escolhido como filho s se m eu s filhos não os tivessem escolhido
para mim. Cultura e ensin o da arte *
Finalmente meu muito o brigada a An a Amá lia, qu e tem toda minha
admiração por enfrentar corajosamente a di fícil pluralidade profissional de E ducação para o de senvolvimento
artista e arte-educadora, e a Frederico, qu e interferiu na escolha do título de diferentes códigos culturais
deste livro. A Educação poderia ser o ma is eficiente cam inh o para estimular a
con sciênc ia cultural do indivíduo, começando pelo reconhecimento e apreci-
Ana Mae Barbosa ação da cultura loc al. Co ntudo, a educação formal no Terceiro M undo oci-
dental foi completamente dominada p elos có digo s culturais euro p eus e, mais
recentemente, pelo código cultural norte-americano.
A cultura indí gena só é tolerada na escola sob a forma de folclo re, de
curiosidad e e de eso terismo ; sempre como um a cultur a de segu nda catego-
ria. E m contrast e, foi a própria E ur opa que, na construç ão do ideal mo der-
nista das artes, chamou a atenção para o alto valor das o utras culturas do
lest e e do oe ste, através da apreciação das gravuras japonesas e das escu lturas
africanas. Desta forma, os art istas m odern os euro p eus fo ram os prim eiro s a
criar uma justificação a favo r do multicultur alism o, ap esar de analisar a cultu-
ra dos outro s sob seus próprios câno nes de valores. Somente no sécul o 20,
o s m ovimentos de descolonização e de liberação criaram a pos sibilidade po-
lítica para que o s povos qu e tinham sido dominados recon hecessem sua pró-
pria cultur a e seus próprios valores.

Leitura cu ltural, identi dad e cultural,


ecologia cultural

A bu sca de identidade cultural passo u a ser um dos o bjetivo s do s


p aíses "recém-independentes", cu ja cultura tinh a sido , at é e n t ão,
institucionalmente definida pelos poderes centrais m etropolita nos e cuja his-

• Texto p roduzido por encomenda do Bureau Internacional de Edu cação da Un esco para emb asar a eis -
cussão do Congresso Internacional de Educa çã o, em Genebra, em 1992, qu e ab ord ou o tema Edu ca·
ção e Cultura.Tradu ção de Renata Santana.

12 13
Tópi cos Utópi cos Arte corno cultura e ex pressão

tó ria foi esc rita p elos coloni zad ores. Porém , a iden tidad e cultural não é um a baixas con tinuam a ser igno radas pelas instituições educacionais, mesmo pelos
forma fixa ou con gelada, mas um p rocesso dinâmico, enri quecido através do qu e estão envo lvidos na educação destas classes. Nós ap rende mos co m Pau-
diálogo e tro cas com o utras cultu ras. N este sentido, a identidade c ultu ral lo Fr eire a rejeitar a seg regação cultural na educação. As décadas de luta para
também é um p roblema para o mundo desenvolvido. Apesar disso, a preo cu- salvar os opr imidos da igno rância so b re eles próp rios nos ensina ram qu e
pação com o estímulo cultural através da educação tem sofrido um a di feren- um a educação libertária terá sucesso só quand o os pa rticipantes no pr ocesso
te abo rdagem nos mundos ind ustrializado s e em vias de de senvolvimen to, edu cacion al fo rem capazes de identificar seu ego cultu ral e se o rgulharem
revelan do diversos significados através de diferenças semân ticas. Enquan to dele . Isto não significa a defesa de gueto s cultur ais, nem de excluir a cultura
no Terceiro Mundo falamos sobre a necessidade de busca pela identidad e erudita das classes baixas. Todas as classes têm o direito de acess o aos códi-
cultural, os países industrializados falam sob re a leitura cultural e ecologia gos da cultura erudita por que esses são os códi gos do minantes - os códigos
cultural. Assim, no mundo industrializado, a qu estão cultural é centrada n o do poder. É necessário con he cê-lo s, ser versad o neles, mas tais có digos con-
fornecim ento d e informações glob ais e supe rficiais so bre diferentes campos tinuarão a ser um co nheciment o exterior a não ser que o in divíduo tenha
de co nheci mento (cultural literacy) e na ate nção equilibrada às diversas cultu- dominad o as referências cultu rais da própria classe social, a po rta de entrada
ras de cada país (eco logia cultural). N o Terceiro Mundo, no entanto, a iden - p ara a assimilação do "outro". A mob ilidade social de pe nde da int er-relação
tidade cultural é o inte resse cen tral e significa necessi dade de ser cap az d e en tre os có digos culturais das diferente s classes sociais.
reconh ecer a si próp rio, ou, finalm ent e, um a necessidad e básica de so b revi-
vê ncia e de co nst rução d e sua própria realidade. Os três termos aos quais Intercult u ralid ad e: a cultu ra
no s referim os acima convergem em um ponto comum: a noç ão de diversida- do colon iz ad o r e do op rim id o
d e cultural. Sem a flexibilidade de enca rar a diversidad e cultural existente em
qualqu er país, não é possível tan to uma ide ntificação cultural como uma lei- A diversidade cultural p resume o reco nh ecim ent o dos diferentes có-
tur a cultu ral global ou , ainda, um a cultu ra eco lógica. digo s, classes, gru pos étnicos , crenças e sexos na nação, assim como o diálo-
go com o s diversos códigos culturais das várias naçõ es ou países , que inclu-
em até me sm o a cultura dos primeiros colonizadores. Os movim entos nacio-
Diversidade cultural: multiculturalismo,
nalistas radicai s, que pretenderam o fortalecimento da identidade cultural de
pluriculturalidade e interculturalidade
um país em isolamento, igno ram o fato de que o seu passado já havia sido
Aqui, pa ra definir a diversidade cultural, nós temos que navegar nova- contaminado pelo contato com outras culturas e sua histór ia inte rpe ne trada
m ente através de u ma complexa red e d e te r mos. Alguns falam so b re pela história dos coloni zadores. Por out ro lado, os colonizadores não podem
mu lticulturalisrno, outros sobre pluric ulturalidade, e temos ainda o termo esq uecer que, histori cam ente, eles fo ram ob rigados a incorporar os co ncei-
mais apropriado - inrerculruralidade. Enq uanto os termos "m ulticultu ral" e tos culturais que o oprimido prod uziu acerca daq ueles qu e os co loniza ram.
" pluricultu ral" sign ificam a co existência e mútu o entendime nto de diferen-
tes culturas na mesm a sociedade, e o termo "in rerculrural" significa a interação
Interculturalid ade e cultura do "ou tro"
ent re as diferentes culturas. Isto deveria ser o ob jetivo da educação int er essa-
da no desenvolviment o cultural. Para alcança r tal objetivo, é n ecessário que a A demand a pa ra identifica ção - "isto é ser para um ou tro " - assegu ra
educação fo rneça um conhecimento so bre a cultu ra loc al, a cultura de vá rios a represen tação do sujeito, di ferenciado do "outro" em "a lteridade" 1. "Iden-
grupos que caracterizam a nação e a cultur a d e ou tras naçõ es. tidade é ser para si mes mo e para o outro; conseqüentem ent e, a iden tidade é
encontrada entre no ssas diferenças." 2 A função das artes na formação da

Interculturalidade: alta e baixa cultura


1 HOMI, R. Bhabha. Remembering fanon: self, psycle and colonial condition. ln: KRUGER, Barbara e
N o que diz respeito à cultura local, pode-se co nstatar que apenas o MARIANI, Phil. (ed.) Remaking hislory. NewYork : Dia Foundation, 1989, p.139.

nível eru dito desta cultura é admitido na esco la. As culturas de classes sociais 2 lbidem.

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Tópicos UtÓPiCOS
Art e como cult ura e e.rp res s ôo

imagem da ide n tidade lhe co nfe re um papel característico dentre os co mple- Arte-educação e a consci ên ci a
xos aspectos da cultura. Id entifi cação é semp re a produção de " uma imagem d e cidadania
de identi da de e tran sfo rm ação do sujeito ao assumir ou rejeitar aquela ima -
gem reconh ecida pelo outro" 3. Contudo, não é só incluindo arte no cur rículo que a mágica d e favore-
cer o crescime nto individual e o compor tamento de cidadão com o constr u-
tor d e sua própria nação acontece. Além de rese r var um lugar para a arte no
o papel da Arte no desenvolvimento
currículo, o que está lon ge de ser realizado pelos E stados-m em bro s da Unesco,
cultural
é tam bém nec essário se preocupar como a arte é concebida e ensinada.
Através das artes tem o s a representação simbólica do s traço s espiritu- E m min ha expe riência, tenho visto as artes visuais sen do ensinadas
ais, materiais, intelectuais e emocionais qu e caracterizam a sociedade ou o p rincipalmente co mo desenho geom étrico, ainda segu in do a tradição
grupo social, seu mo do d e vida , seu siste ma de valores, suas tradiçõ es e cren - positivista , ou a arte nas escolas sendo utilizada na comemoração de festas,
ças. A ar te, co mo uma linguagem presentacional dos sentidos, tra nsmite sig- na produção de p resentes estere otipad os pa ra os dias das mães ou dos pais e,
ni ficad os que não pod em ser transmitidos através de nenhum outro tipo de na melhor da hipót eses, ape nas como livre expressão. A falta de p reparação
linguagem , tais co mo as linguagen s discur siva e científica. de pessoal para ensi nar artes é um problema crucial, levando -nos a confun-
N ão podemo s ente nder a cultura de um país sem co nhecer sua arte. di r im provisação com criativida de. A ane mia teórica domina a arte-educação,
Sem conhece r as artes de uma socie dad e, só pode mo s ter conhecimento que está fracassando na sua missão d e favorecer o con hecimento n as e sobre
par cial de sua cultura. Aq ueles qu e estão engajados na tarefa vital d e funda r a artes visuais, organizado de forma a relacionar p rodução artística com ap re-
iden tificação cultural não po dem alcançar um resultado significativo sem o ciação esté tica e in for ma ção his tóri ca. E sta in tegr ação co r resp o nde à
conhecimento das artes. Através da poesia, dos gestos, da imagem , as ar tes ep istemologia da arte . O conheciment o das ar tes tem lugar n a int erseção:
falam aquilo que a história, a sociologia, a antropologia etc. não po dem dizer expe rime nta ção, d ecodificação e informação. N as artes visuais, estar apto a
porque elas usam outro s tip os de linguagem, a discursiva e a cien tífica, qu e prod uzir um a imagem e ser cap az de ler um a imagem são duas hab ilidades
sozinhas não são capazes d e d ecodifi car nuances culturais. D en tre as artes, a int er-r elacion adas.
art e visual, tendo a imagem co mo matéria-prima, torna po ssível a visua lização
d e quem som os, onde estamos e como sentimo s. A art e na educação como
expressão pessoal e como cultura é um importante instrumento para a iden- L eitura visual
tificação cultural e o desenvolvim ent o. Através das art es é possível de senvol-
Em no ssa vida diária, estam os ro deados po r imagen s impostas pela
ver a percepção e a imaginação, ap reender a realidade do meio ambiente,
m ídia, ven dendo produtos, idéias, co ncei tos, co mportamentos, slogans políti-
de senvolver a capacidade crítica, pe rmitindo analisar a realidad e p erceb ida e
cos etc. Co mo resultado de no ssa incap acidad e de ler essas imagens, nós
de senvolver a criatividade de maneira a mu dar a realidade que foi analisada.
ap ren demos po r meio delas in con scientemen te. A edu cação dever ia p restar
"Relembrando Fan on " , eu diria que a arte cap acita um ho mem ou uma mu-
atenção ao discurso visual. Ensinar a gram ática visual e sua sin taxe através da
lher a não ser um estranho em seu meio ambiente nem est rangeiro no seu
arte e tornar as crianças conscientes da p rodução human a de alta qualid ad e é
próprio país. Ela supera o estado de despersonalização, inserind o o indiví-
um a forma de prepará-las para compreend er e avaliar todo o tipo de ima-
duo no lugar ao qual pert enc e.
gem, con scienti zando-as de que estão apre ndendo com estas imagens.
Um currículo que integre ativid ad es artís ticas, histórias das artes e
análise dos trabalhos artísticos levaria à satisfação das nece ssidades e interes-
ses das crian ças, respeitando ao m esm o tempo os co nceitos da discip lina a
ser aprendida, seus valores, suas estrutu ras e sua específica contribuição à
3 Ibidem. cultura. D essa fo r ma , realizaríamos um equ ilíbrio entre as du as teor ias

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T óp ícos UtÓp iCOS Art e co mo cultu ra e c xpre ss õo

curriculares dominan tes: aquela cen trada na criança e a centrada no conteú- d e lon ge, mais significativa para a crian ça. Mas é import ant e en fatiz ar que o s
do. E ste equilíb rio curricular começou a ser defendido no Reino Unido pel o museu s e centro s cultu rais são uma con tribuição insubstituível pa ra ameni-
Basic Design Mooement dura nte os ano s 50, qu ando H arry Thubro n, V ictor zar a idéia de inacessibilidade do trabalho artís tico e o sentime nto de ign o-
Pasmore, Rich ard H amilton, Richard Smith, Joe Tilson e E duardo Pao lozzi rância do visitant e. Aqu eles qu e não têm educação escolar têm medo de en-
d esenvolveram sua arte de ensin ar a arte . Eles associa ram atividades artísti- trar no museu. E les não se sent em suficientes conhecedor es para penetrar
cas com o ensino dos princípios do desigll e informação científica sob re o ver, nos " templo s da cultura" . É ho ra do s m us eus aba ndon arem seu comporta-
tudo isso com ajuda da tecnologia. Seus alunos estudaram gramática visual , m ento sacralizado e assumirem sua parceria com escolas, p orque soment e as
sua sintaxe e seu voca bulário, dominando elementos formais, tais co mo: ponto, escolas podem dar aos alunos de classe pobre a ocasi~o e au to -segurança
linh a, espaços positivo e negativo, divisão de áreas, cor, p ercep ção e ilusão, para en trar em um museu. Os museus são lugares p ara a educação con creta
sign os e sim ulação, tran sformação e p roj eção nas imagens produzidas pelos sobre a herança cultural que d everia p ertencer a to dos, não soment e a uma
arti stas e também pe los meios d e comunicação e publicidade. E les foram classe econó mic a e social privilegiada. O s museus são luga res ideais para o
acusa dos de racio nalismo, mas hoje, após qu ase 70 anos de arte-e ducação cont ato com padrões de avaliação da arte através da sua h istória, que prepara
exp ressio nista nas escolas do mundo ind ustrializado, chega mos à co nclusão um co nsumidor d e arte crítico não só para a arte de ontem e de ho je, mas
d e que a livre-exp ressão não é uma preparação suficie nte p ara o entendimen- também p ara as manifestaçõ es artísti cas do futuro.
to da arte. O conhe cime n to da relatividade dos padrões da avaliação dos tem p os
to rn a o in divíduo flexível p ara criar padrõ es apro priados p ara o julgam ento
Apreci ação d a Ar t e e des envolvimento daquilo que ele ainda não conhece. Tal educação, cap az de de senvolver a
d a criatividade auto -exp ressão, apreciação, de codificação e avaliação dos trabalhos p roduzi-
dos por outros, assoc iados à contextualização históric a, é n ecessária não só
Apreciar, edu car os sen tido s e avaliar a qu alidade das imagens produ- para o crescimento individu al e enriqueciment o da nação, mas tamb ém é um
zidas p elos artistas é um a ampliação necessária à livre-expressão, de mane ira instru mento p ara a profi ssionalização.
a po ssib ilitar o de senvolvimento con tínuo daqu eles que, de p ois d e deixar a
escola, não se tornarão prod utores de ar te. Através d a apreciação e da
decodificação de trabalhos artísticos, des envolvemos fluência, flexibilidade, Ar te p ara o d ese nvolvim ento p rofiss ional
elaboração e originalidade - os p rocesso s básicos da criatividad e. Além dis-
Um grande .número de trab alhos e pro fissões estão direta ou indire ta-
so, a educação da ap reciação é fund ament al para o desenvolvim ento cultural
ment e relacionados à arte comercial e de propaganda , outdo ors, cinema, vídeo,
de um país. E ste desenvolvimento só acont ece quando uma p ro dução artís-
à publicação de livro s e revistas, à pro dução ele discos, fitas e CDs, a som e
tica de alta qua lidade é associada a um alto grau de entendimento desta pro-
cenários para a televisão, e todos os cam pos do desigl1 para a moda e indústria
du ção p elo público.
têxtil, design grá fico, de co ração etc. Não posso conce ber um bom designer
gráfico que não possua algum as info rmações de história da art e, co m o, p or
Ar te -educação preparan d o o público exempl o, o conh ecime nto sob re a Bauh aus. N ão só designers gráfico s, mas
p ara a Ar te mu itos out ro s profiss io nais similares poderiam ser ma is eficient es se conh e-
cessem , fizessem art e e tivessem dese nvolvido sua capacidade analítica atra-
U ma das funções da arte-educação é fazer a me diação entre a arte e o vés da int erp retação dos trabalho s artísticos em seu contexto histó rico. To -
pú blico. Museus e centros cultur ais deveriam ser os líderes na pr eparação do mei conhecimen to de uma p esquisa que co nstatou que os camera III e11 da tele-
público para o entendim ento do trabalho artístico. E nt retanto, p ou co s mu- visão são mais eficient es qu and o têm algum contato sistemático com apreci-
seu s e centros culturais fazem esforço para facilitar a apreciação da arte . As ação da arte. A interpr etação de ob ras de arte e a in for mação histórica são
visitas guiadas são tão entendiantes, que a viagem de ida e volta aos museus é, inseparáveis; sendo uma a abordagem dia cr ónica h orizontal do objeto e a

18 19
TÓpicos Utópico s
Arte como cult uro e e xp rc ss õo

o ut ra sua projeção sincr óni ca ver tical. A interseção dessas d uas linhas de
investigação pr oduzirá um entendimento crítico de como os conceitos for-
mais, visuais e so ciais aparecem na art e, como eles têm sido percebidos,
red efinidos, red esi gn ados, distorcid o s, descartado s, r eapropriados,
reformulados, justific ado s e criticados em seus processo s constr utivos. E ssa
abo rdag em de ens ino ilumina a pr ática da arte, me smo quando esta pr ática é
m eramente cat árti ca,
A arte e a experiência segun do Joh n D ew ey "
Arte pa ra o desenvol vim ento
emoci onal e afe tivo o conceito de experiência articula tod a a obra filosófic a de Dewey,
um conceito identificado com a existência individual e social.
Aqueles que defe ndem a arte na escola meramente para libertar a
É a qualidad e est ética qu e unific a a exp eriência enquanto reflexão . A
emoçã o devem lembrar que podemos ap render muito pouco sob re no ssas
qu alidade estética de um a experiência de qu alquer natureza é a culminação
emo çõ es se não fo rm os cap aze s de refletir sob re elas. N a ed ucação , o subje-
de um processo.
tivo, a vida interior e a vida emocional devem progredir, m as não ao acaso. Se
O pensamento de J ohn D ewey acerca das relações entre arte e experi-
a arte não é tratada como um conhecimento, mas somente co m o um "grito
ên cia se manifesta ao lo ngo de sua obra, mas torna-se mais co nclusivo nos
da alma", não estam os oferecendo nem educação cognitiva, n em educação
escritos "Individualidad e e experiência de 1900" e "Pensamento e experiên-
emocio nal. Word sworth disse: "A art e tem que v er com emo ção, mas não tão
cia" , em D emocracia e Educação, de 191 6, e .Art nature and exp eriente, de 1925.
profundamente para nos reduzirmos a lágrimas."
Finalmente, a consumação de sua exp eriência reflexiva sob re o assunto eclode
no livro A'1 as experieuce, que se tornou , a partir de sua publicação, em 1933,
um desa fio para os arte -educador es.
Alguns teóri cos como Herbert Read e Benedetto Croce criticaram
est e livr o por excitar o pensamento sem apo ntar, entretanto, as soluções
m etodológicas para o ens ino da ar te. E sta, entretanto, é a funç ão que vem
sen do desempenhada por vário s intérpretes da ob ra de D ewey, através dos
mais de 60 anos que se passaram de sde sua publicação.
É. o conceito de exp eriência conjunta e intercornunicante como forma
de vida q ue define a democracia par a ele, assim como é conceito de experiên-
cia indi vidual qu e defin e a intenção consciente. E xp eriên cia, para D ewey, é a
int eração da criatura viva com as condi çõ es que a rodeiam. Aspectos e ele-
m entos do eu e do mundo qualificam a expe riência com emoções e idéias.
Contudo, a exp eriênci a gráv ida de conhecim ento é exp eriên cia co mpleta.
Uma experiência incompleta nada sign ifica. As experiências incompletas ali-
enam e confundem o univer so de sign ificados vitais do ser humano.
Nos anos 50, os trabalhos de E dwin Z iegfeld e de Belle Boas tenta-
ram decodificar na pr ática os pressupo stos reflexivos de Art as experience. Na

• Art igo publicado no Anuário de Inovações em Comunicações e Artes, 1991 .

20
21
T ó pk o s UtÓpi COS Arte como cultura e e xpre ss óo

década de 60 foi a vez de ]une McFee, de K atherine D ewey e de Irving será a experiência. Impregnada po r musgo, ba rro, outras pedras, capim e
K aufman escreverem sub stanciosos artigos int erpretando as idéias de D ewey, flores do caminho, a culm inâ ncia e qualidade estética da experiência será a
o u estenderem suas idéias em direção à an tropologia. Os anos 70 for am mais integração do que ela trouxe consigo ao lo ngo do processo, co nstituindo-se
pródigos, e, dentre um a alen tada lista de intér pre tes de D ewey para a arte- uma unidade enriquecida em relação à unidade que iniciou a descida.
ed ucação, tivemos Arthur Efland, E llio t E isner, G raeme Chalmers, L arry Dewey lemb ra que "os inimigos do estético não são nem o pr ático
Kanrner, Ralph Smith etc . nem o intelectual, mas a lassidão dos fins indefinidos, a submis são à co nven-
A déc ada de 80 foi buscar em Art as experience o pr incípio reformulador ção no s p rocedim entos práticos e intelectuais".
do ensino da art e dit o pós-moderno, que confere à apreciação ênfase equili- Toda experiência é uma experiência estética se a experiência só cessa quan-
b rada com o fazer. Br oudy foi o artífice deste novo entendimento da o bra de do cada momento foi explorado. O encerramento do circuito de energia é o
John D ewey, popularizad o e excessivamen te sistem atizado nos E stados Uni- oposto da suspensão, da stasis, é po rtanto a culmin ância da ação. E sta culminâ n-
dos p elo projeto da Getty Foundation. cia, a sensação de completação, deflagra a energia apreciativa e a emoção.
Conhecer signific a ter um a experiência e não apenas ter exp eriência. A qualidade estética é p ervasiva, e, embor a atinja seu ponto máximo
Uma experiência compl eta é tão íntegra que sua con clusão é uma consuma- no está gio da completação da exp eriência, ela permeia todo o pr oce sso con-
ção e não uma cessação. Consumação é a conclusão significativa impregnada tínuo de pro dução e percepção qu e regula a experiência . Co nh ecim ent o e
pela apreciação pe rvasiva que penetra o to do da experiência. reconhecimento; con strução e reconstr ução ; produção e p ercepção da pro-
A experiência, seja qu al for o seu material (ciência, arte, filosofi a e du ção corporific am a experiência que tem a qualidade estética como elem en-
matemá tica), para ser uma exp eriência, pre cisa ter qualid ade estética. É a to unificador.
quali dade estética que unifica a experi ência enquanto refle xão e emoção. A qualidade estética é a ap reciação consum ató ria difusa que pe netra
Qualidade estética resu lta da consu mação apreciada e difere da quali - toda a experiência, to rn ando-a significativa para () indivíduo. " O esté tico não
dade artística , que é específica, de mat eriais específicos, enquanto a qualidade pode se r separado de mo do taxativo da experiência int elec tu al, já que esta
est ética é conatu ral a todos os materiais que cercam os ritm os constantes da deverá ap resent ar cunho estético a fim de ser comp leta" (Dewey) e ser co m-
vida. Q ualidade estética não é ap enas o reconhecimento de scolo rido e frio pleta para ser significativa.
daquilo qu e foi feito, mas uma condição receptiva interna, que é a válvula O <'l ue difere a expe riência est ética da art e da experiência esté tica de
propulsora de futuras experiências. A qualidade estética de um a experiência outra natu reza é o material. O ma terial das artes consiste em "q ualidades"; o
de qualquer natureza é a culminação de um processo. da expe riência intelectual não' possui qualidade própria int rínseca, mas são
A exp eriência pode ser da nosa para o mu ndo e sua culminância inde- signos e símbolos que subs tituem o utras coisas que podem em outra experi-
sejável, mas pode possuir uma qualidade estética. Por exemplo, um médico ência ser exp erim entados qualitativamente.
operando um paciente de um caso inédito e complicado, p ondo para funcio- 1\ expe riência artística, o fazer artístico, o trabalho com materiais da
nar todo o seu conhecimento acumulado, organizando-o em funç ão da situ- Art e, é fundamental, segundo D ewey, para desenvolver as capacidades de
ação nova, p ode che gar à conclusão de uma expericncia com qu alidade e st é- pr odução - apreciação q ue constitui a experiência signific ativa em qu alque r
rica, embora o p aciente morra. áre a. Segundo Dewey, " A arte une mais que expe riência s de outr a natureza.
Tod a ativid ade prática adquirirá qualidade estética sem pr e que seja As relações de fazer e padecer, e a energia de ida e vind a que faz com que
int eg rada e se mova por seus p róp rios ditames em direç ão à culmin ância. uma experiência seja uma experiênc ia".
D ewey usa em A rt as experieuce a idéia da experiência de uma pedra que A experiência ar tística é mais ins tan taneamente unificável do ponto
rola de cim a de um a montan ha. O objerivo da pedra é chegar embaixo. A de vista intelectual em oci o nal e prático. Uma destas propriedades poderá vir
pedra teria uma experiência - resultado da cu lmin ância de um movimento a ser mais dominante que a o utra de modo a caracteri zar a experiência como
contínuo. Quanto mais a pedra revelar do seu cam inho , mais sign ificativa um tod o, m as suas inter- re laçôes são facilmente verificáveis e apreciáveis.

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T ópi cos Utópi cos Arte com o cultura e expressóo

Na experiência do pensamento, só quando extr aímos um a solução é N esta tese, o autor defend e as idéias de arte como pensamento visual
que as premissas surgem. Portanto é a soluç ão que torna manife stas as pre- reflexivo, reveland o g rande influ ência do capítulo "Pensamento e experiên-
missas . A conclusão não é alvo separado e independente, mas a consumação cia" do livro Educarão esociedade. (1898). Fundamentado em citações de Dewey,
de um movimento tanto nas artes como no pensamento. Entretanto, dada Sampaio defende a idéia de ap reciação e gozo estético da natureza como
sua materialidade, o processo é mais facilmente verific ável nas artes. base para o desenvolvimento da capacidade de desenhar.
Numa obra de arte', diferentes aros, episódi os, aco nte cimentos se m es- Na realidade, D ewey pro p õe não só em Educação e sociedade, ma s tam -
clam materialmente e fundem-se numa unidade, em bor a as part es não desa-
sobre a função
bém em M eu credo pedagógico, a expe riência com o mundo fenomênico p ara
pareçam nem percam seu caráter próprio quando isto sucede. É no campo da arte na
excitar a con sciência acerca da repr esent ação imagética. Chega mesmo a de s-
das artes que o processo da experiência signific at iva se torna mais evident e educação crever uma aula e reproduzir desenh o s de crianças realizados pelo método
para o ser cognoscente. Nas artes, se revela pela obs ervação, pe rce pção e dada a de obs ervação no livro EduCClrão e sociedade. É bem explicito, mo str and o dese-
verificação direta quando a experiência po ssui um a unid ade. A existência importância da nh os considerado s espo ntâ neos de um a árvo re feitos por um a crian ça. Criti-
desta un idade está constituída por um a qu alidade única (qualida de estéti ca) estética na ca-os do ponto de vista da impropriedade da relação com o objeto e mo str a
que pene tra roda a experiência, ape sar da diferença de suas parte s con stitutivas. desenhos da mesm a criança depois qu e foi levada a comparar seu desenho
experiência
O artista incorpora a si próprio a atitude daquilo que percebe enqu anto espontâ neo com um a árvore no parque.
intelectual
trabalha. O fazer é artístico quando o resultado percebido é de tal natureza que
~ "'..: '
suas qualidades, enquanto percebidas , controlam a produção. O processo de
arte na produção está organicamente ligado com a estética da apreciação.
E sta o rganicidade é o ideal perseguid o nas outras áreas de conh eci-
mento e pen samento. A a rt e na educação é, portanto, essenci al p ar a
potenciali zar a operacionalida de da experiênci a significativa em outras áreas.
Por Outro lado, nas artes, o fazer chega ao fim qu and o o res ultad o é
co nsiderado bom e a este julgament o se ch ega não por juízo int electual.
E mb ora a percepção direta não seja preponderant e na exp eriência de p en sa-
Desenho considerado
mento, é-lhe con atural, porque a qualidade est ética de qu alqu er experiência pobre
(in clusive a de p ensamento) de qualquer natureza depende mais da p ercep-
ção direta que do juízo intelectual, uma vez que se revela por aquela sens ação
de completação de que se explorou ao máximo todas as possibilidades , como
no caso do m édico que fez uma belíssima operação embo ra o doente tenh a
morrido.
N o Brasil, as idéias de John Dewey sobre arte e exp eriênci a for am
pacientes de diferentes tratamentos epistemológicos.
A idéia de integração da experiência se inter-relacion ou com a idéia de
desenvolvimento da individualidade, através da inte gração orgânica com o
meio am biente , no caso da primeira tese defendida no Brasil sobre John
D ewey. Tr ata-se da tese de N ereo Sampaio (1929) 1.
Desenho da mesma crianç a
dep ois de obse rva r as
árv ores
, Anísio Teixeira defendeu tese sobre Dewey, mas não no Brasil, e sim no Teachers Colleg e, da Columbia
University (USA).

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T60 1( OS Ut óp icos
Arte come cultura e ex pra ss õo

A tese de N creo Sampaio dem o nstra uma pesquisa feita co m crianças tra balho. Considero, contudo, que em bo ra citasse pouco J ohn Dewey, dele
de 6 a 10 anos qu e, levadas a obs ervar o corpo humano, passando a m ão no assimilou muitos co nceito s, inclu sive o de qu alidade esté tica como aprecia-
contorno da figura uns dos outro s, são capazes de artic ular melhor a repre- ção da experiência que ser viu de base pa ra seu primei ro livro so bre o ensino
sen tação da figura human a. do desenho.
N ereo Samp aio se baseou em trabalhos de D ewey nos qu ais o co ncei-
Nunca con segui localizar a primeira edição des te livro, embo ra tenha,
to de apreciação e de co n suma ção da experiência ainda não estava muito
em 1975, pe squ isado nos arquivos do antigo Instituto Je an Ja cques Rousseau
bem exp licitado. O D ewey de Nereo Sampaio é aind a naturalista e ro m ân ti-
e em sua bibli ot eca. Localizei familia res da au tora (em Gen eb ra e no Brasil),
co. D uas outrasexperiências, as da Es cola N ova - Refo rma Carn eiro Leão,
m as nu nca m e foi possível determ inar a data da prim eira edi ção de seu livro.
em Pernambuco, e a de Ar tus Perrelet, em Minas G erais - o pe racionalizavam
A segu nda edição, de 1922, foi intensamente divulgada no s jornais euro peus.
m ais dir etamente estes co nceitos de ap reciação e de consuma ção.'
V árias resenhas e artigos fo ram pro duzi dos sobre a autora e suas idéias .
A experiência de Pernambuco (feita por pro fesso res paulistas) int er-
pr etou o conceito de qualidade est ética e consum ação da experi ên cia através Perrelet p retendia ensin ar arte através da ap reciação do m eio ambien-
da prática da Art e co m o expressão de aula. Nã o foi nada origina l esta te sem deixar de sistematizar o alfabe to da fo rm a, linha, cor, vo lum e, p ers-
misinterpretation de John Dewey. As progressives scbools, nos E stad o s Unidos , já pectiva etc. Sua idéia cent ral era a apreciação da experiência. Co m o D ewey,
haviam ado tado anos antes esta int erpretaçã o. recome ndav a qu e a esco la não po deria pretend er estar segu ra de qu e a crian -
ça tivesse tido esta o u aquela expe riência. Para sistematizar o conhecim ento
Co m o John D ewey fala da qualidade estética co m o consum ação da
era necessário, como num labo rató rio, provocar a exp eriência n a sala de aula,
exp eriência, os educadores interpretam literalmente o co nceito, exigindo qu e
explo rá-la e sistem atizá-la.
cada aula terminasse com um desenho, ou dramatização, ou pin tu ra ou cerâ-
m ica, etc. Co nsuma ção fo i entendida co mo rerrn inalidade. Para Per relet, o de senho era a gra fia do movi me nto - um a co ncep ção
H á um livr o, Escola N ova em Pernambuco (de J. Scaramelli), que traz um ce rta m e nte assim ilad a d as van gu a rd as a rtís ticas d a ép oca, de sde o
verd adeiro relató rio das muitas aulas "Dewianas" nas quais se ensi na so bre a Impre ssionismo até o Futurismo. E ntretanto, não poderia o professo r supo r
vida dos peixes: se dissecam os peixes e por fim se desenham os p eixes. Ou, a exp eriência de movimento assimilada por seu aluno, teria (]ue p ro vocá-la.
ent ão, colhem-se folhas, aprend em-s e suas pa rt es e funçõ es e, p o r último, Assim , pa ra ela, era muito imp o rtante aprender a grafar individualm ente o
desenham-se as folhas. É uma verdadeira int oxicação temá tica que se preten - m ovimento so m ent e depois de perceb ê-lo e ap reciá-lo, sendo o professor
test emunha des ta percepção e ap reciação. O livro de Perr elet é o prim eiro
dia pro voc ar no aluno. Arte era ape nas o ponto final da intoxicação.
livro d e ensino do de senho através da exp ressão co rp o ral de que se tem
J á Ar tus Perrelet, em Minas Gerais, talvez tenha sido, das manifesta- notícia.
ções "dewianas" , no Brasil, a m ais fiel às idéias do mes tre. Pe rrel et veio ao
Brasil, em 1927, com o g rupo de europ eus qu e, a co nvite do gover no, pre- Perr elet p unha seus aluno s a ap reciarem m ovimentos p rovocados por
tendi a estab elecer a reforma educacional do Es tado de Minas Gerais. E sta ela. Por exemplo, queria que os alunos ap rend essem a expressão da curva em
educado ra trabalh ava na época no In stituto Je an Ja cq ues Rou sseau, um a ins- diverso s contextos: primeiro um jogo de se cu mp rim entare m un s aos o u-
tituição de van gu arda educacio nal naque le tempo. tro s, enquant o parte do g rupo ob ser vava qu e expressão tin ha o co rpo curva-
do no ato de cumprimentar. Um aluno aguava uma planta en quant o os ou-
Colega dos m ais important es educado res, co mo Claparede, Piaget e
tros observavam co mo seu corpo se curvava para atingir o ob jetivo e qual a
Bovet, Perr elet era, co m o todo O Instituto, co nsiderada discretam ente influ-
expressão e a qualidade da linha de seu corpo. Mandava o bse rvar os ninhos
enciada por Dewey, em artigo s de jornais e de revistas escritos so b re seu
dos pássaros, uma vas ilha redond a, os chorões, até retir ar dos alunos o con-
ceito de curva co mo flexibilidade e co nt inent e que sup o rta um conteúdo.
2 Uma análise mais completa da influência de John Dewey no Brasil poderá ser encontrada no livro de
Para isto fazia as crianças exp erim entarem beber águ a na s m ãos para obser-
BARBOSA, Ana Mae. Recorte e colagem . São Paulo: Cortez, 1989. varem como as encurvamos em forma de co ncha para conter água.

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T ópicos Utópicos Arte (a mo culturo e erpre ssóo

Só dep ois da apreciação do corpo em curvatu ra, dos objeto s que con- em seu último livro sob re n B.A.E. (D isciplin e Based Art E d ucatio n) o se-
tinham curvas, d e entender a ex p ressão da curva, é que passava ao desenho, gui nte texto de D ew ey:
pe din do qu e d esenh assem algo q ue contivesse curva . O desenho qu e pedia
já não era ma is um de senho realista, ist o é, cópia da realida de, por ém algo "O arti sta seleciono u, simpli ficou, clarificou, abr eviou,
conde nso u seu desejo. O espectador tem de percorrer tais
evo ca tivo do o bjeto, valo riza ndo m ais a expressão da forma traçad a do que
operações de acordo com seu ponto de vista próprio e seu
sua correspondên cia com a realida de.
pr óprio in teresse. Em ambos os casos tem lug ar um ato de
Como Perrelet passou apenas dois anos no Brasil, deix and o seu livro comp reensã o, de abstração, de cxtração do que é signific ativo.
sendo traduzid o em Minas G erais' , o que ficou de seu método tão ligado à Para pe rcebe r, o esp ectador pr ecisa criar sua própria exp eriên-
ap reciação for am ap enas os de senho s q ue seus alunos ap rese ntavam como cia. Sem o ato de recriação um obj eto não será pe rcebido como
resultad o de um longo trabalho ex plo ra tó rio. O trab alho expl o ratóri o foi ob ra de arte."
totalm ente esqueci do pel o s ed ucadores que a seguiram , os quais se p reo cu-
N ovamente, D ewey está sendo tomado, em plen o século XX, muito
param apenas em fazer seu s alunos desenharem sim plificada me nte. Com o
literalmente. Ralph Sm ith, com estas citaçõ es de D ew ey, pretende defender o
tempo isto ge ro u o terrível desenho pedagógico que nas décadas de 40 e 50
ensino da Arte atrav és da re+ leitu ra de ob ras d e A rte, esquecendo -se d e q ue
d ominou os cursos normais do país. Pior: er a a p ro fessora qu e fazia o dese-
D ewey afirmou que o re + co nhecim ent o ap enas é c ómodo demais para u m a
n ho sim pli ficado d e uma casa, de uma árvo re, e os alu no s tin ham que copiar
co nsc iência v ívida.
a sim plificação.
Su a ob ra está aí para ser posta em prát ica pelo s arte-educadores de
E n fim , operou -se a deturpa ção da sofisticação teórica de P err elet.
u m a maneira integral e não ap enas pa ra ser re talh ada em pedaço s, e cada
E nquanto os alunos de Perrelet p roduziam d esenhos simplificado s, mas com
p ed aço em cada m omento histórico justificar esta ou aquela metodologia do
exp ressão p esso al, as escolas brasileiras assassin aram seu m étod o, levando
ensino da arte.
os alunos a rep ro du zirem massific adas sim plificações form ais. O movim en-
N o Brasil, d ep oi s de haver influenciad o profunda me n te o Movim en-
to como faror de integração o rgânica da experiênci a em Dewey e em Perrelet
to d a E scola N ova na década d e 30, D cwey caiu no os tracismo, ou pior,
era a pe dra fundam ental, e a apreciação pervasiva co n tro lava a co nsu ma ção
p assou a ser cr iticado acerba damen te. O s po ucos au to res brasileiro s (uns 3
d a experiência. M e» credo pedagógico também fo i credo para Perrelet ,
o u 4) que escreveram so b re ele nas d écadas de 80 e 90 foram até discr im ina-
Hoj e, J ohn Dewey vem sendo constantemente revisitad o e revisado. do s pelos grupo s hegemónicos encas telados na Fa culda de de Educação da
O capítulo H aving an e>.cperience de A rl as exp eriente tem sido o m ais citado nos USP, da Unicam p e da PU C-Sr. Como dizia D ewey, o mundo qu e experi-
últimos livro s d e an e-ed uc ação escrito s por p ro fessores ingleses e norte- m entam o s é real m as nem sem p re in telectualmente coere nte e seguro."
am ericanos qu e d efendem o fazer artístico aliado à co m p reensão es té tica.
N o s Es tados U nid o s, o Centro de E stu do s D ew iano s n a Un iversid a-
To d a uma nova pe dagogia da arte p rescr eve a aten ção para a arte na d e de Southern Illinois em Carbondale continuou as pesquisas sobre sua
escola em d ois sentido s: o sen tido cultural, isto é, arte como cultu ra, levan- o b ra sem muita visibilidade durante os anos 80. A década de 90 ass iste a
do-se os alunos a apreciar, co n he cer e an alisar a herança ar tística que o s revitalização da in fluê ncia de Jonh D ewey, qu e ve m sen do ap ontad o co m o
pre ced e; e o sentido exp ressivo, isto é, arte como expressão realiza da no s pion eiro da Ped agogia Cultural (jun to com Paulo Freire), da Ped ag ogia Críti-
ateliês expl orando o fazer indi vidu al. ca, d o C on strutiv ism o, d o Multicultural ism o . Sua o b ra ve m se n do
Esta nova pedagogia se reclama herdeira d e John D ewey e, entre as recontex tualizada por femi nistas, ed ucado res e po líticos , Entre 96 e 97 fo-
muitas cit ações do autor que comprovam es ta descendência, as mais fre - ram publicado s o ito livros sobre Jo hn Dewey nos E stados Unido s.
qüentes são ex traídas de H aving an experience. Por exem plo, Ralph Smith cit a

• Paráfrase de citação de Jonh Dewey em CAMPBEL. James. Und erstanding Dewey. Chicago: Open Court
3 Há uma tradução, provavelmente não revisada pela autora, datada de 1930. Company, 1995, p.75.

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Tóp ico s UtÓp ICOS Arte co mo cultura e exp re ssã o

o ensino da arte em Po rtugal era muito deficiente e o que o reinado


de D. João VI no Brasil proveu, muito mais avançado. Pelo meno s desde c!ue
o Brasil fora tom ado por Po rtugal, os pinto res e arquitetos portugu eses vi-
nh am reclamand o do de scaso so frido pelas artes visuais em seu país. Por
exemplo, Francisco de H olanda, em seu livro Da Ciêllcia do Desenho, publica-
do em 1571, procurou dem onstrar a O. Jo ão III como as art es eram pouc o
p restigiadas em Portugal e tentou co nvencer o Rei de que o en tend ime nto da
Arte -educação pós-colo nialista no Brasil: pintura e do desenho eram essenciais para eficaz elabo ração de estra tégias de
aprendizagem triangular guerr a. E muito s ou tros peroraram pela melho ria do ensino das artes em
Po rtugal nos séculos que se seguiram.
Qu and o D. João VI apa rtou no Brasil, para daí governar Po rtugal,
A consc iência de ser colonizado dos brasileiros é titubeante, confusa e
criou as primeiras esco las de educação sup erio r: Faculd ade de Medicina, para
mal-explicitada. Precisaríamos de um decodificador cultural como Frantz Fanon
pr eparar médico s para cuidar da saúd e da Corte; Faculdad es de Direito, para
para nos analisar, pois só alguém com o ele, psicananalista, ant ropólogo e
pr eparar a elite política local; E scola Militar pa ra defe nder o país de invasor es
anticolonialista, daria conta de nossa contu rbada personalidade colonizada.
e um a Academia de Belas-Artes, Portant o, o ensino das H umanidades come-
Diferentemente dos o utros países da América do Sul e da maioria do s çou no Brasil pela arte.
países colonizados do mund o, depois de três séculos de dom inação po rtu-
Para criar a Academia Im perial de Belas-Artes, D. João VI, através do
guesa, de repente no s vimos com o cap ital do Reino Po rtuguês.
Marquês de Marialva, que se achava na Eu ropa , e do naturalista Alexandre
O s anos an teriores de do minação tinham sido muito degradador es, vo n H umboldt, que estivera no Brasil, co ntratou artistas que ensinavam no
com o, em ge ral, o foi a coloni zação euro péia. P roibidos de termos imp rensa, Instituto de França e eram a vanguarda da épo ca. O s artistas deste Ins tituto,
escol as sup erior es e mesmo um ensino prim ário e secundário o rganizados, criado e desenvolvido por N apoleão Bo napar te, de po is de sua queda, passa -
fomos domados pelos jesuítas e mes mo eles terminaram po r ser expulso s do ram a sofrer perseguições. Algun s deles, d entre vários co nvites recebido s
Brasil pelo poder centra l, con figurado pelo Marquês de Pomb al. A té aí a par a trabalhar cm país estrang eiro, inclusive de Catarina da Rússia, aceitaram
história é a me sma de qualquer país descoberto pelos euro peus. E stávamos vir para o Brasil. O ex-dir etor da Seção el e Relas-Artes do Ministério do
condenados à igno rância e a receber com o habitan tes os prisio neiro s e os Int erior de Na poleão, J oachim Leb reton, o rganizo u o grup o. E ram todos
indesej áveis do país que no s do minava . Entretant o, em 1808, com receio da neo clássic o s co nvictos e interferiram o stensivam ent e na m ud anç a d e
invasão por tropas de N apoleão Bonaparte, o Rei de Portugal transferiu o paradigma esté tico no Brasil. Quando chegaram , enco ntraram um bar roc o
governo, a Corte, para o Brasil. Um país qu e vivia à margem se torna centro, flo rescen te. Impo rtado de Portugal, o barroco havia sido mod ificado pela
o poder central e a colônia fundir am -se e con fundiram- se. As decisõe s pas- força criado ra do s artistas e artífices br asileiros, c pod em o s dizer que já exis-
saram a ser geradas na colô nia que se mascarou de império, embora os int e- tia um ba rroco br asileiro bem difer ent e do po rtu guês, do espanhol e do
resses a defender fo ssem ainda os dos colonizador es. italiano, mui to mais sensual, sedutor e até mais kitscb) se quiser mos usar um a
A cumplicidade entre co lonizados e colonizador es levou à indepen- designação atu al,
dência do Brasil, doada por o rdem de Portugal, graças à insistência da Pr in- Ao chega rem , o s artistas franc eses instituíram um a E sco la neoclássica
cesa Leopoldina, qu e qu eria garantir algum pod er para seus filhos , de linh as retas e puras, contrastando com a abundância de movim entos do
Para confirmar a cumplicidade coloni zador es-colonizados, lembro que nosso barroc o: instalou-se um prec once ito de classe baseado na catego rização
as revisões pós-coloni alistas têm sido mais rigoro samente condenatórias das estética. Barroco era coisa para o povo; as elites aliaram -se ao neoclássico,
invasões culturais franc esa e inglesa, po uco se criticand o os portugueses e, que passou a ser símbo lo de distinção social. Esse pr econ ceito co nt ra o Bar-
no caso do ensino da arte, ainda menos. roco continua no Brasil como vimos através da recepção da crítica micliática

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T ópi cos UtÓpICOS Arte como cultura e expre ss õo

institu ída à exp osição organizada por E manuel Ar aújo no Ce ntro Cultural Q uem de glu te quem?
Fiesp (São Paulo, jun ho-agosto, 98). Um crítico de g rande pr estígio, escre -
vendo acerca da exp osição, classificou o barroc o brasileiro de tosco e imitativo, Com o diz H om i Bhabha, nossa existênc ia hoje é m arc ada pela ten e-
marcad o pela m ediocr idade e inabilidade do artesanato popular, uma esp écie bro sa sensação d e sobrevivênci a, vivendo um presente que não tem nome
de esqu em a d e artesanato em gra nde escala da igreja católica. N ão li o artigo próp rio, mas é de signado por um prefixo acrescent ado ao pa ssado. Trata-se
porque est ava for a do Brasil, mas, qua ndo voltei, essas "verdades" atribuídas do prefixo "pós" do pós-modern ism o, do pó s-colo nialism o, do p ós-fem i-
ao crítico da Revista Bravo estavam sendo rep etidas pelos estudan tes de art e e nism o etc. Q uerem os explicitamente ultrapassar o passado sem deixá-lo de
aplaudidas animad am ente p elos minimalistas. lado. A teo ria do reco nhecimento que susten ta as pe rsistentes pós-u to pias
pó s-colonialistas de no sso tem po se co n figu ram no Terceiro Espaço de H orn i
Atitudes semelhant es no século passado impediram qu e, entre o bar- Bhabha, no co mbate à estereo tipia cultu ral de Edward Said, na alteridade
roco e o neoclássico no Brasil, hou vesse ricas negociações estilísticas, como secun dária de Sanford B udick, na s políticas de reconhec imento das m in oria s
aconteceu, por exemplo, em Pr aga. Curiosam ent e, hoje, os reconstruc ioni stas, sugeridas po r Charles Taylo r e Susan \\'olf, na defesa do sincreti sm o visual
estu dan do este episó dio, invest em co ntra a Fran ça como invasora cul tural e empreendida po r Mosh c Barasch, nas lib er tárias ab or dagen s da cultu ra co m o
n ão contra Po rtug al, que encomen dou a interv en ção em nossa cultur a. Este um qllill b em desenhado de Luc y Lippard, e em muitas o ut ras elocubrações
é um dos inúmero s exemplos em nossa histó ria do ensino da arte qu e po de- de teó rico s da cultura engajados nos movimentos pós-colonialistas, princi-
mos chamar de perturb ação da consciênci a colonizad a, deri vada da confusão palme nte na Aust rália e na Ín dia .
de papéis: coloniza do versus colon izado r.

Nem m esmo o m od ernismo no Brasil ajudo u na deci fração do enig -


C orreçõ es à Prop o s ta Triang ular
ma, por incl uir em sua configur ação a me sma problem ática e falsa identifica-
ção colonizado versus colon izador. Is so porque o pr ojeto do m odernism o f oi no es forço dialogal entre o discurso pó s-moderno global e o pro-
europeu foi inten sam ente b aseado nas culturas colonizadas ou pr imitivas. cesso consciente de diferenciação cultur al também pó s-m oderno que , no
Por sua vez, essas cultu ras, para se renovarem, socorreram-se do m od ernis- ens ino da arte, surg iu a abordagem que ficou co nhecida no Brasil co m o
mo europeu, dos valores ren ovados das metrópoles que incluí am int erpreta- Merodologia T riangu lar, um a designação infe liz, mas um a ação reconstrutor a.
ções feitas pelos colonizado res acerca dele s, os colonizados, o o utro da his - Sistem atizada no Mu seu d e Arte Co n temp orân ea da USP (87 / 93), a
tória. Na verdade, im po rta mos nossos próprios valores disto rcidos pel o co- Triangulação Pó s-Colo nialista do E nsino da Arte no Brasil foi ap elidada de
lonizador. Entretant o, no Brasil, a voz precursora de O swald de Andrad e "meto do logia" pelos pro fesso res. Culpo -me por ter aceitado o apelido e usa-
conclamava pela atitude, defe nd ida dep ois pelos pós- coloni alistas como Albert do a expressão Metodologia T riangular em m eu livro A ;lI/clgellJ no E nsino da
Memmi e Paulo Freire, de lutar po r um lugar na hist óri a, embora se tratasse 'l rle. Hoje , depois de anos de expe rime nt ação, esto u co nven cida de qu e
de um a históri a esc rita pela Eu rop a e de um lugar design ado, norninado pel o m eto dologia é co nstrução de cada p ro fessor em sua sala de aula e gostaria de
pr óprio coloniza do r. ver a expressão P ropos ta Triangular sub stitu ir a pre po te nte de signação
O cub ano Roberto Retam ar, na década de 70, atualizou o co nceito de Metodologia Triangular. E m arte e em ed ucação, problemas semân ticos nunca
antropofagia de O swald de And rade, canibalizando-o, to rna ndo-o p ós-colo- são ap enas semâ nticos, m as envolvem con ceirua ção.
nial na teo ria e co n tra discursivo na prática. Deglute, desconst rói e reo rgani- A Pro posta Tr iangular deriva de uma d up la triangulação. A primeira é
za as influências da Europ a e dos Estados Unidos. Nem mais a dep endência de natureza epis tem ológica, ao de sign ar os co mponentes do en sino / apren-
cultural, nem m ais a bu sca inalcançável da originalidade moderni sta, mas dizagem po r três açõ es mentalmente e sen so rialment e bá sicas, quais sejam :
adequação e elabor ação em diálogo crítico com os países centrais. O contra criação (fazer ar tístico) , leitura da obra de arte e co nt extualização. A segunda
ataque ao ne ocoloni alism o sug ere, no limiar do sécul o XXl , ope rações mais triangulação está na gênese da própria sistematização, originada em um a tríplice
complexas do que a sedu to ra idéia modernista do cani balism o / an tro po fagia. influênc ia, na deglutição de três outras abor dagens epistem ológicas: as Escudas

32 33
T ópico s Utó p ico s
Arre ( orno cultura e c xpre ss óo

aiA ire Libre mexicanas, o Critica]S/lIdies inglês e o Movimento de Ap reciação o movimento Reader Response não de spreza os eleme n to s formais, ma s
E stética aliado ao D BAE (DisCipline BasedArt E dttcation) ame ricano. não os pr ioriza como os estruturalistas o fizeram ; valo riza o objeto, mas não
N o início de uma pesquisa aind a não-concluída sobre a Históri a do o cultua, como os deconstrutivistas; exalta a cognição, ma s n a mesma medi-
E nsino da Ar te em três países lat ino -am ericanos (Argentina, Urugu ai e Mé - da considera a imp o rtância do emocion al na co mp reensão da ob ra de arte. O
xico), m e entusiasmei com as E smelas ai A ire Libre do México, incentivada s leito r e o objeto constroe m a resposta à ob ra numa piagetiana int erp retação
por José Vasconcelos e, principalmente, com a idéia de inter-relacionar arte do ato cognitivo e, mais aind a, vigo tscjuiana in terp ret ação de com p reensão
como exp ressão e como cultu ra na op eração en sino-aprendizagem , como o do mu ndo. Assimilação e acomod ação na relação leitor-objeto (reader - response)
fez Best Maugard, o autor do s livro s didáticos das E scnelas ai Aire Libre. são os processo s fund amentais que se im põem . A o pção p elo fundamental
Surgidas depois da Revolução Mexicana de 1910, estas escol as se cons tituí- se justifica, no caso de meu país, po is fun dam entais são no ssas necessidades
ram num fru tífero mo vimento educacion al, cuja idéia era a recuperação dos ed ucacionais. Tr ata-se de um país com alta percent agem de crianças fora da
padrõ es de arte e artesa nia mexicana, a con stitui ção de um a gra mática visual escola, muitas das quais vivem na ru a, sendo de st ru ídas por aqueles qu e as
mexicana, o ap rimor ame n to da pro dução artística do p aís, o estímulo à ap re- deviam proteger e de professores sem for mação específica porque a socieda-
ciação da arte local e o incentivo à expressão indi vidual. I Pode-se me smo de pouco valo riza a educ ação.
dizer que as E scue/as ai A ire Libre foram a sem ente do mo vimento mu ralista D aí a ênfase na leitura: leitura de palavras, ges tos, açõe s, imagens, ne-
mexican o. cessid ad es, desejos, expectativas, en fim , leitura de nós me sm o s e do mundo
Na mesma épo ca em que des cob ri as E smelas ai A ire Libre, fui aluna, em que vivemos. N um país on d e os politico s ganham eleições através da
no Rio de Jan eiro, de um cur so de Tom H udson, o inventivo professor do televisão, a alfab etização para a leitu ra é fundamental, e a leitu ra da imagem
País de G aies. To mei contato, en tão, com o utra linha de ensino integr ador a artística, humanizadora. E m art e-educação, a Proposta T riangular, que até
da idéia de arte como expressão e como cultu ra, especialme nt e at ravés do pod e ser considerada elem entar se comparada com o s parâm etros edu cacio-
trabalho de Victor Pasmare e Richard H amilton na Universidade de Newcastle, nais e estéticos so fisticados das nações cent rais, tem correspondido à reali-
Posterio rment e, os texto s de D avid Thistlewo od e as con ver sas com ele so- dade do professor que tem o s e à necessidade de instrumentalizar o aluno
bre o moviment o d e Cntical Studies, na Ingla terra, muito ecoa ram na minha para o momento em que vivemos, respon dendo ao valo r fun damental a ser
opção epistemológica. Além disso, as leitur as sob re o movimento de ap reci- buscado em no ssa educação: a leitur a, a alfabetização.
ação estét ica surgido no s E stados Unido s em meado s do s anos 60, sob a E ste princípio de leitura como interpretação cultur al, com muita in-
in fluência de Manuel Bar kan e do qu al o Co ng resso da Penn Sta te, em 65, fluência de Paulo Fr eire, foi inicialmente experime nt ado na organ ização, cur-
tornou se algo semelhante a um manifesto, refo rçaram m uitos po ntoS teór i- sos e o ficinas do Festival ele Invern o de Cam pos de Jordão em 1983, que
cos. Posteriormente, o cantata com os construtores do Disciplined Based Art podemos considerar a primeira experiência pó s-m oderna de ensino da arte
E dtlcatiofl (O BAE) americano, co mo Elliot Ei sner, Ralph Smith e Brent Wil- no Brasil.
son, muito estimul aram me u posicion amento cultu ralista em relação às poli-
Contudo, a Proposta Triangul ar, como sistema epistemológico, só foi
ticas artísticas.
sistematizada e amplament e testada ent re os anos de 1987 e 1993, no Museu
Foi, entretant o, o movimento de crítica literária e ensino da literatura de Arte Con tempo rân ea da USP, tend o como meio a leitu ra d e ob ras o rigi-
ame ricana Reader Response qu e, em diálogo co m no ssa especificidade ter ceiro- nais. De 1989 a 1992 foi exp erimentada nas esco las da rede municipal de
mundista, inspi rou a design ação de " leitu ra de obra de Ar te" para um do s ensino de São Paulo, tend o co mo meio reproduções de obras de arte e visitas
comp onentes da triangulação ensino-aprendizagem. aos originais do museu. E ste projeto foi iniciad o no p eríodo em que Paulo
Freire foi Secretário de Educação do Municípi o de São Paulo e foi conduzi-
do inicial~ente po r mim, depois por Regina Machado e por fim e por mai s
, Acabo de termin ar uma pesquisa mais apro fundada sobre as Escuelas ai Aire Libre. O texto interpretativo
tempo por Chri stin a Rizzi . Sua avaliação positiva após qu atro anos foi extre-
será publi cado em Revista da Universidade Fed eral do Rio Grand e do Sul. mam ente recompensadora.

34 35
Tópi co s U t6 p l(OS Art e como cultu ro e expr e ssOo

Ainda em 1989, iniciou-se a experim en tação da Propo sta T riangu- feroz contra as no vas abordagens culruralisras e/ou pós -modern as do ensi-
lar usa nd o-se o víd eo p ara a leit ur a da ob ra d e arte. A pesquisa financia- no da art e, talvez po rque concent ravam -se naquele E stado o s modelos mais
da p ela Fundação IOC H PE, coo rdenada por A nalicc Pillar e D cn yse pu ros e eficazes de ensino modern ista da art e.
Vieira, usando a P ro po sta Tr iangular e o víd eo para leitura da o b ra d e Co mo não p odiam ir con tra a Fu ndação 10 CH P E po rque de p en-
arte, fo i feita co m quin tas sé ries das escolas particulares e p úb licas d o diam de seus p at ro cín ios para o rganização de even to s e exp o siçõ es, in-
mu nicípio de Porto Aleg re, co m classes-con tro le em ambo s o s sis temas, ves tiram co n tra a Pr oposta T riangular, d isto rcendo -a m alicio sam ente,
p úb lico e privad o. N est as classes-contro le usam o s apenas o faze r ar tísti- calculand o err ada m ente que am eaçariam o pod er qu e sup un ha m q ue eu
co com boa ori entação m o dern ista e/ ou exp ressio nis ta, sem co nt ato co m tive sse na F undação. Fo i u m erro de cálculo, po is n unc a tive po de r cm
leitur as de o bras de arte e sem q ue ho uvesse qu alq uer con teúdo h is tó ri- nen h um n ível d e dec isão d o P ro jeto A rt e na Es co la da F u nd ação
co, enfi m , sem apreciação nem discu ssão so bre ob ras de art e. T ivem o s, IOC HPE, nem na Rede Ar te na E sco la que pos terio rm ent e se co nsti-
d uran te a pe sq uisa , ass ess o rias rápid as, m as m uito eficaz es, de Brc n t tuiu. D ep ois de te r orga nizado teo ricament e o pro jeto, d e ter o rientado a
\Vilson, E lliot Eis ne r, H elo ísa Fe rraz e Mariaz in ha F usari, e ouvimos pri mei ra pes quisa co m muito entusiasm o e d e te r sugerido e facilitad o a
co m ent ário s d e Ralph Sm ith e E ilecn Adams. O resultad o foi q ue as ida do s professo res estr ang eiro s co nvidados pa ra os p roj et e s d o MAC /
crianças que tiveram um ensino b asead o na P ropos ta T riangular (com USP para pales tras c co nsulto rias em Porto Alegre, m inha atividad e se
uso do vídeo), ao fim do semes t re, haviam se d esenvolvido ma is, tanto lim ito u a co nsul tarias que semp re co nduzi com absoluta int eg ridad e.
na criação ar tística quanto na capacid ade de fala r sobre arte. Mesm o estas, a part ir de 95, se reduziram d rasticam ente.
D epois veio a fase de produção de material escrito para orientar, sug e- Os de trarorcs da mudança provocada pela Propo sta T ria ngular,
rir ativid ades, info rmar historicamente e estim ular o s professores no uso de em pr ime iro lug ar, afirma ram qu e se tratava de ada p tação ou có pi a d o
cada vídeo da vide otcca de mais o u menos 250 exemplares, organizada pela D BAE am erica no . O ra, como participante da socied ad e p ó s-m od ern a,
Fundação 10CHPE. Operando u ma matrize ira a laser que foi doada à Uni- não so u contra a cópia, de sd e que ins crita no tem po e na locação ad e-
versidade Federal do Rio G rande do Sul, pre tendia-se for mar 25 outras quad os e fr ut o d e reconstr u ção . O mito da originalidad e é modernis ta, o
videotecas para distribuir o material pelo Brasil, a instituiç ões educaciona is pó s-m o d ern ismo va loriza mais imensamente a elabo ração dentre o s pro-
e/ou museus capazes de conservá -las. Estas deveriam manter serviço per- cesso s m ent ais envolv ido s na criatividade. Con tudo, d iria que a P ropos-
manente de empr éstimo do s vídeos a professores e or ien tar cursos, prepa- ta Triangular se op õe ao DB1\E porque este disci plinariza o s co mp onen-
rando p ro fessores par a, através da Pro posta Triangular e do vídeo, explorar tes da aprendizagem da art e, se parando -os em fazer ar tístico, crí tica d e
as po tencialidacles do ver. arte, estét ica e his tória da arte, rev ela ndo inclu sive u m viés modernista
f oi prod uzido um vídeo com as impr essõ es das criança s sob re as ex- na de fesa implícita d e um currícu lo d esenh ado p or dis ciplinas. É a con-
periências du rante a fase de pesq uisa. O que mais me imp ressiono u foi o tradi ção in trínseca do DBAE, um siste ma pa ra o ensino da arre d e idéias
curto e incisivo depoiment o de uma criança de 12 anos; po bre, muito pob re, pó s-m o dern as, m as de co nstr ução m odern ista. Enq uant o isto, a Pr o -
pobreza detectável visualmente, não só através da roupa, mas do gesto e do po sta Triangu lar designa açõ es co mo componentes curriculares: o fazer,
olhar, gue disse: " por gue nunca ninguém me falou sobre arte abstrata? G os- a leitu ra e a co n textualização. N a época do M useu d e Arte Co ntem po râ-
tei muito de entender isso". So negação de informação das elites para as clas- nea, est a co ntex tua lização era pr io ritariam ente histó rica, dad a a natureza
ses populares é uma constant e no Brasil, on de a maioria do s po dero sos, e até da ins tituição mus eu. Mas co m o pass ar do tempo no s torn am os mais
alguns educadores, acham que esta histór ia d e criatividade é para crian ça rica. rad icais em rel ação à de sd iscip linarização e, em vez de design ar co mo
Segundo eles, os pobres p recisam so men te ap render a ler, escrever e co nta r. his tó ria da art e um do s co mpo nentes da ap rendizagem da art e, amplia -
O que eles não dizem, mas nós sabemos, é que, assim, este s pob res serão mo s o espectro da ex periê ncia no meando -a contextualiz ação, a qual po de
mais facilment e manip ulados. ser histó rica , social, p sico lógica, ant ropo lóg ica, geog ráfica, ecológica, bi-
A reação de grupos de arte-educado res d o Rio G rande do Sul foi ológ ica et c., ass oc iand o- se o p ensam ento nã o ap en as a uma dis ciplin a,

o fazer, a leitura, a contextualização


36 37
Tóp IC OS Utó p IC OS
n rte como <ultura e e xore s soo

mas a um vasto conjunto de sa b er es disc iplinares o u não."


(os, Combogós, LAtaJ e Sucatas e l.LIbirú;to da Moda. A escolha do co nt eúd o com
Contextualizar é estabelecer relaçõe s. N este sentido, a contextuali zação a qual tr abalh ar depende da ideologia do professor e do s códigos de valo r da
no proc esso ensino-aprendizagem é a porta aberta pa ra a int erdisciplinarid ade . cultura do s aluno s. Respo nde, portanto, a o utra pergunt a: "o que en sinar?"
A redução da contextualização à história é um viés modernista . É atr avés da
Q uan do se afirma que a Vide o rcca da Rede Ar te na E sco la é p rinci -
conte xtuali za çã o qu e se p o d e praticar um a educaç ão em dire ção à
p alm ent e de vídeos de art e eru dita, eu conco rdo. N ão festejei so me nt e a
multiculturalidade e à ecol ogia, valores curriculares qu e definem a p edagogia
chegada ao acervo do vídeo da exposição que teve lugar no C ent ro Pompidou
p ós-m oderna ac ertadamente defen dido s pel os Parâm etros Cur riculare s N a-
em Paris, Os M ágicos da Terra, cur ada por Hubert M ar tin, que abriu os olh os e
cion ais (PC N) .
as instituições europé ias pa ra a diversidade cultural sem ant epor barreiras de
Nos dois últimos anos, várias teses so b re arte-educação ap ontaram raça, classe, gênero e naci onalidade. Além disso tam bém recomendei a co m -
par a a importância da contextualização do ensino , dos co nceitos, das im a- p ra d o vídeo Vida de Santeiro, d e Ione Coel ho , b em como have r mai s
gens pa ra um a educação comprom etid a com o so cial. Quero destacar a de pluralidade cultural e depuração crítica nos vídeos existe ntes, alguns não m uito
M aria Luiza Sen e, intitulada A rteJ Vi.ruaiJ, M eio A mbiente e E ducare/o E scolar bons. M as, como já disse, o papel do consultor é recomendar c não decidi r .
(1998)3 que diz, na página 91: Q uem de cide é a direto ria .
"A transformação ambiental voltada à melhoria de qua- N a séria e mu ito boa diss ertação de mestrado de Ro seane Martins
lidade de vida para todos os habitantes das cidades e dos paí- Co elho, defendida na Universidade Federal de Santa Cata rina em 96", acerc a
ses é uma das ações contextualizadoras das atividades ar tísti- da Difusão do ProietoA rte na E scola da Fundação IO CH PE na s esco las pú blicas
cas a serem desenvolvidas na escola." de Flo rianô po lis, outro s equívo cos so bre a Proposta T riangu lar entre o s pro-
A contextu alização é em si m esm a forma de conhecimento relativizada . fesso res for am detecta dos. N este caso não se trata de má in tenção, mas de
Pesqui sas so bre a co gniç ão situada mostram que o conhecimento e o enten- int erpretação er rônea do s pr óprios p rofessores o u de qu em os preparou.
dim en to são m ais facilm ente efeti vad os se emoldurado s pelo sujeito. É esta O err o mais g rave é o de restringir o fazer art ístico, parte inte grante da
m oldura que design am os contextu alização, a qu al pode ser sub jetivam ente tri angulação, à releitura de o bras. O utro é pen sar qu e há um a hierar quia de
el ou social mente construída. at ividades, isto é, p rimeiro a leitura da ob ra de art e, depois a contextualização
O utro equívoco mal-int enc ionado é dizer qu e a P roposta Triangular e finalm ent e o fazer, a cr iação. E sta não é urna in ter p retação co rreta.J á teste-
se de stina ao trabalho com o códi go hegem ônico europeu e norte-am eric an o munh ei ou li relatos de trabalhos realizados nas mai s diferentes regiõe s d o
erudito de art e. A Proposta Tri angul ar é siste m a cu ja proposição dep ende da Brasil, como Ro ndo n ópolis, Vitó ria; Recife, Caruar u e Palm eira dos Índios,
resposta qu e damos à pe rgunta: " co mo se dá o conhecim ent o em arte?" q ue co m eçavam com o fazer e só en tão , a partir da seme lha nç a formal ou
Portant o, qu alquer conteúd o, d e qualquer natureza visual e esté tica, o n teud ística com a o bra da criança , o professor esco lhia a obra do i da art is-
p ode se r explo rado, interpretado e op erac ionalizad o atr avé s da Prop osta ta a ser ana lisada ou apreciada , co mo dizem os Parâm etro s Curriculare s N a-
Tri angular. cio nais (PC N). E m ou tros casos , como vi em Feira de Santana, Blu m ena u e
J acare í, os professores podem começa r analisando um context o social e his -
Muitas foram as exp eriências com Propo sta Tri angul ar em exp osiçõ es
tó rico para depo is escolh er as o bras e objetos a serem dec odificad os a parti r
de código p opular e de estétic a do cotidian o, co mo na exp osiç ão Carnauales-
das pi stas dadas pel o contexto. E nem sempre, felizm ente, um professor
inventivo usa a mesma seqüência dos co m po nentes em diferentes aulas, co m
2 Por favor, não confundam com a herói ca luta por um lugar para a arte como disciplina num currículo já o me smo g rupo de alunos. Segundo Roseane Martins Coelho, com qu em
disciplinarizado, qu e só valoriza o conhecimento disciplinar. Esta luta é necessária no momento e con - tive a op o rtunidade de co nversar demo rad amente depois de ler sua tese, os
texto cultural em que vivemos, mas se o currículo abolir as discip linas ela cessará de ter sentido, assim
como já não tem sentid o rotular o conhecimento que se quer construir em arte s através das disciplina s
que compõem o sistema das artes.

3 Or ientad ora: Preta . Ora. Maria Filismina Fusari.


, Orientadora: Preta. Ora. Mari a Luiza Belloni.

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TÕpl COS U t6pi ( OS Arce co rn o cul t uro e ex p re ss óo

pro fesso res che gam a designar os co m po nent es da Proposta Tria ngular de 1\ Prop osta Trian gular é co n str u tivista, inrer acio nista, d ialogal,
'fasei. N ão se tratam de fases da aprendizagem , mas de pr ocessos mentais rnulticulruralista e é pós-modern a por tudo isto e por articular ar te como
que se interligam pa ra operar a rede co gnitiva da aprendizage m. exp ressão e como cultura na sala de aula, sen do esta articulação o denomina-
Este err o é de somenos importância comparado com o engano de dor comum de todas as propostas pós-modernas do ensino da art e qu e cir-
restr ingir o faze r artístico à releitu ra. A releitu ra é um a atividade possível e culam internacionalme nt e na co nte mporaneida de .
qu ant o m ais problematizadora mais criad o ra. A m elhor explicitacão sobre O g rande gu arda-chu va dewiano, a articulação entre a ed ucação artís-
releitura qu e co nh eço no Brasil é a d e A nalice Piliar, em um pequeno te xto tica (criação) e a ed ucação estética (apr eciação), define o pós-modern ism o
publicado no boletim e/ou ap res entado em reu nião da Red e Arte na E sco la. em arte-educação, ou a co ntemporan eidade, se alguém , po r horror à palavr a
Mas o perigo da reprodução improdutiva ro nda as releituras. Ando tão alar- p ó s-m o dern ism o, preferir.
m ad a com a péssima qualidade de pe nsa me nto visua l resultant e de releituras, É preciso , en tretanto, ficar claro que educação estética não é ens inar
que me peguei outro dia de sreco m endand o completam ente a releitu ra em es tética no sent ido de for mu lação sistemática de cla ssificações e de teo rias
um a pa lestra. Um a releitura divergente elou subjetivada amplia o universo ,]ue produzem definições de arte e análises acerca da beleza e da natureza.
da alte ridade visual e exercita o p ro cesso de ediç ão de ima gens com o qu al Es te não é o pr incipal p ro pósito da educação est ética. O q ue chamam os de
no ssa cognição visu al naturalm en te trab alha. Mas releitu ra como procedi- ed ucação estética de crian ças, ad o lescent es e ad ulto s é principalmente a fo r-
me nto co nstante transforma o fazer art ístico em me ro exercício esco lar. Ar - mação do apr eciado r de art e usando a ter m inologia e o sentid o co ns um ató rio
tistas se ut ilizam d e p ro ced ime ntos mui to variados em suas pe squisas visu- q ue D ewey dava à experiência ap reciativa.
ais. A me sma d iversidade de estímulos se deve ex igir do pro fesso r de art e.
Com o professo res, tem os q ue p ro curar co nhece r estética para estar-
Para falar a verdade, a insis tência na releitura me provo ca o m ed o da cópia
mo s pre parados para os questio nam entos estéticos que nec essariamente sur-
pel a có pia. gem no processo de no ssos alunos entenderem e co nhece rem ar te, qu er seja
Qu ase da mesma maneira, m e assusta a idéia do pr o fesso r que , a pre- fazendo arte o u interpretando o b ras de arte. N este senti do, a est ética tem um
texto de trabalhar co m a leitura da o bra de arte e co m a co ntextualização, dê eno r m e po tencial esclareced or e estim ulador do questio nam ento reflexivo,
lon gas p rele çôes discursivas, isto é, histo ricize acerca de um art ista ou leia ma tér ia-p rima da filos ofia da q ual a es té tica é lima subd ivisão ou filial.
u m a ob ra para alunos red uzidos à p assividade. Aind a não vi isto aco nt ecer, Crawfo rd (1991) conside ra a estética uma disciplina de segunda orde m: seu
mas lemb ro -m e que, em um a reu nião da Rede Arte na Es co la da Fun dação trab alho co meça quando as outra s d isciplinas comp letam sua tare fa. D iz ele:
IOCHPE em Curitiba, ho rrorizei- m e com um a pro fesso ra de Sant a Catarina,
qu e justificou "trabalhar som ente o fazer artístico co m as crianças pe q uenas "Não m ais limitada à tarefa de análise da beleza, no s tem-
p o rq ue elas não têm paciên cia de ficar sentad inhas ou vindo a p ro fess o ra p o s co n temporâ n eo s, a E s té tic a am plia s eu ca mp o d e
falar da vida do ar tista" . Tra balhar só o fazer artístico co m o alun o está b em, questionamento acerca da naturez a do ob jeto da arte e do car á-
é uma opção legítim a de um pro fessor modernista qu e pode ser muito com- ter de sua criação, apreciação, interpretação, avaliação, assim como
p eten te concentrando -se ap enas no desen volvim ento de um dos asp ec to s da acerca das relaçõe s da arte co m a sociedade, tud o isto podendo
ap rendizagem da ar te. O que está terrivelm ent e equivocado são os conceitos ser examinado em diferentes níveis de complexidade. "
de leitur a da obra de arte e o de co nt extualização. E m educação, a tar efa da estética integrada na leitu ra da obra o u do
Leitu ra da obra de art e é questio nam ento, é busca , é descobe rta, é o camp o de sen tido da arte é ajudar a clarificar p ro blem as, a entender no ssa
despertar da cap acid ade crítica , nun ca a redução do s alunos a receptáculos exp eriência da art e, a disc riminar entre opções, a tomar decisões, a em itir
das infor m ações do professor, por m ais in teligentes que elas se jam . A edu ca- juízos d e valor .
ção cultu ral que se pretende com a Proposta Triangular é um a ed ucação
crític a d o conhecimento construído p elo pr óprio aluno, co m a m ediação do
5 CRAWFORD. Donald."T he questions of aesthetics". ln: SMITH. Ralph and SIMPSON, Alan . Aesthetics
professor, ace rca do mundo visual e " ão uma " ed ucação banc ária" . and arts education. Urbana ano Chicago: University of Illinois Press, 1991, p.15.

40 41
r óplcc s U~ 6 p l ( 0 5
Art e co rno cultu ra e e xpr e sv ôo

Tradicionalmente a qu estão mais importante a ser re sp ondida pel a Uma das int erpretaçõ es p ráticas m ais ade quadas da Pro po sta T rian -
esté tica er a: o qu e é art e? H oje a qu est ão que pr evalece é aquela sublinhada gu lar foi realizad a por Ant onio Bian cho Filh o, na co nstrução d e um aplicativo
p or Marcel Duch amp e K ant: qu and o alg o, um o bjeto, uma id éia ou um a m ultimídia pa ra o ens ino da g eo me tria através da arte". Aliás, esp ecialistas
atitu de é arte? têm me cham ado a aten ção para a adequação da Proposta Triangular às n e-
O de sloc amen to do foc o da qu estão so b re " o qu e é arte?" para a cessidad es de reinv en ção do siste m a de com unicaçõ es em relação ao m eca-
qu estão "quando é arte)" foi ratificado pel as teo rias culruralistas, ou melho r, nism o da conscientização so cial. L eitura e contextualiza ção podem ser os
mul ticulruralist as, d a art e. O co n tex to é co m po nente definidor da experiên- m eio s de trazer o d rama das ideologias para a logística9 da per cep ção da reali-
cia artística e da exp eriência es té tica. Além disto, os problem as da perc epção dad e virtua l. "E nvelopadas nas exigências de p rodução e consum o imediat o,
se am pliara m co ns ideravelmen te na er a 'p ós-Duchamp', te ndo em vista a as tecnologias se tornaram convin cen tes pri n cipa lm en te p o rq ue p ar ecem
complexidad e d as realidades virtu ais. O seeing in e o seeing as d efini dos por funcio nar invisivelm en te.? "
\X'o JJh eim 6 e \X'ittgen stein , re spe ctivam en te, se combi na m em múltiplo s A con textua lização pod e ser a mediação en tre per cep ção, histó ria,
qu estionam ento s. E star visua lmente consciente das superfícies e disc ern ir o política, identidade, experiên cia e tecnologia , que trans fo rmará a tecnologia
qu e ne la se dest aca (seeing in) clam a na Arte Contem po rânea por seeing it as. d e mero prin cípio o perativo em um m odo d e participa ção, tornand o visíveis
N ão se trata ape nas de uma percepção do que está lá nem tão pouco d e uma os mundo s p ar ticipatórios do consum o imediato.
ilusão, mas im aginação contextu alizada ou cognição nos m old es d o s siste-
A lém disto, é ó bvia a comp ro vação d e que a co n textualiza ção é
m as saving as, desenhados p ara facilitar multiplicid ade nas m em órias d o s com-
operacionalm ente co natu ral à lingu agem hiper tex tual.
p utado res .
A resp osta es tética, através de o perações sens or iais e físicas, é cognitiva.
T t ata-se de cognição qu e não se centra apenas em ar te fatos , mas in clui um a Plurali dade de leituras
rede de en ergia que liga o arti sta à audiência, e am bos, arti sta e audiência, ao
Sebastião Pedrosa, professo r da U niversidad e Federal d e Pernam b uco,
contexto e a toda a cul tu ra h erdada laten te o u ativa. Com o diz Peter Ab bs,
para sua tese d e d ou to rad o na Unioersiiy 0/ Cei/Irai E ngland, sobre a in fluência
"A rte requer pa ra seu ent endimen to uma linguagem din âmic a de partículas e
br itânica n o ens ino d a arte no Brasil, entrev istou no iníc io dos anos 90 tr ês
ve rb os, n ão d e inertes su bs ta n tivos " ." Co mo no est ud o d as p artículas
ge raçõ es de arte-ed ucad or es e qu ase todo s, co m ap enas uma exc eção, nome-
s ubatô m icas, também no cam po d a arte no sso s termos deveriam ser aque les
aram a E CA e o M useu d e Arte Co ntem po rân ea (Ml\C) da Univer sid ad e d e
ligado s a m ov imento, inrera ção, transformação. D a mesm a m aneira qu e a
São Paulo com o as instituiçõ es mais influ entes na arr e-educação em nosso
natureza da m atéria nã o po de ser separada de sua ativida de, tam b ém a obra
país. Realm ente, de 1989 a 1993, o Ml\C foi um laboratório d e exp erim enta-
d e arte não deveria ser co nceitua lm en te separada do complexo campo n o
ção de en sin o- ap rendi zage m em art e com proj eta s educacionalmente ousa-
qu al ela ope ra.
d o s, algun s em par ceri a co m o utras instituições. M uitas idéias po stas em
Faland o-se em arte n a educação, o utras variáve is se m obilizam tor -
p rática no lvIAC vinham se de senvolvendo na E scola de Com uni cações e
nando-se a próp ria exp eriên cia estética do profes so r, elem ento definitivo da
Artes (ECA) d esde os ano s 80, nos program as d e pós-graduação e especiali-
exp eriên cia es té tica do alun o. A. exp osição do adolescente e da crian ça à arte
zação que aq uela escola m antém .
n a escola depende da escolha d o profe ssor. A exp eriência es tética pode se r
ma is ou m en o s significante e valiosa em fun ção de sta escolha. O p rofessor
d e arte precisa co n hecer esté tica para , pel o m en o s, sabe r o que escolh er.
• Dissertaçã o de mest rado defendida no programa de Arte e Tecnologia da Imagem, linha de Pesquisa
Multi midia, Hiper texto e RealidadeVi rtual, do Instituto de Artes da Universidad e de Brasilia. Orientadora:
Suzete Venturelli.
6 WOLLHE IM, Richard . Painting as an ett. Prince ton. New Jersey: Princ eton University Pre ss, 1987, p.4 5.
9 Expressã o usada por Paul Virilio.
7 ABBS, Peter. Delin ing the aesthetic field. ln: SMITH , Ralph and SIMP SON , Alan. Aestti etics and art
educalion. Urban a and Chicago: University 01Illinois Press, 1991, p. 248 . 10 DRUCKRE Y. Timothy. Cu/ture on lhe brink: ideologies of tectmolcç y. Seattle: Bay Press, 1994, p.2.

42 43
Tóp .co s UtÓP f<OS Arte cerne cult ura e ar p re vsóo

E ntretan to, a falta de um laborató rio de art e p ara cria nças, adolescen - d e a rte p rep ara para ver reflexivamente im agens de outra categoria, como as
tes e adultos iniciantes nas artes retardou m uitas exp eriências acerca da com- ima gens d a T V.
p reensão da obra de arte, feitas dep ois n o lVli\C, on d e contávam o s co m um
gr up o de 12 educad ores, alguns com D o uto rad o e Me strado, e a com p etente O livro .Aprendeudo a t'O; pu blicad o p ela Co leção Ro bert o Marinho,
rela ta diver sas experiên cias com d iferentes leituras d as o b ras exp ostas n o
coordenação d e Vera N ovis, que tão b em so ub e tran sferir seus sólido s co -
Museu de Arte de São Paulo (MA SP) em m arço e abril d e 94. Trata-se d e
nh ecim ento s de teo ria literária p ara op erar co m a ob ra de arte visual. Aliás, a
lições qu e dem onstram a inventividadc das professo ras envolvidas no proje-
crí tica d e art e n o s últ im o s anos vem se apropriando do s co nstr uto s teórico s
to e a flexibilida de da leitura d a obra de arre na Proposta Triangular. Algu -
da literatura e tr aduz indo -o s pa ra as artes v isuais, sendo casos m ais re cent es
mas, como Mariangela Ser ri Francoio, através d e jog os, buscaram d esenvol-
o da estética da recep ção, o da teoria ReaderResponse e o do desconstruci o nismo,
ve r a percepção para a representação e a fle xibilidade para a criação de signi -
Vera N ovis, do m inando a an álise literária e v isual, e C hr istin a Rizzi p ela sua
ficados. Outras, co m o EHy Fer rar i, levaram o s visitantes a investig arem as
exp e riê ncia anterior com a contextu alização de o b jeto s do co tidian o (no
d ife renças entre a representação visual da naturez a e a sua representação
M useu da Casa Brasileira) de ram sol.id ez à leitu ra da o b ra, co mpon ente cen-
o rgân ica. Temos ainda leitu ras es tru tu rais da co m p o sição da obra e leituras
tral da Propos ta T rian gular de ensi no da arte, sis tem atizad a, testad a, rc tcstad a
e d ifu ndida pel o lVlt\C nos anos em qu e a ação daq uela instituição in flu en - o rientadas no sentido da reco ns tr ução da narrativa.
ciou a a rt e-educação n o Brasil. In flu ên cia est a cujo eco se fez sen tir ain d a em Essas arte-educadoras não es tavam apenas fazendo o s g rupo s de visi -
94, p o r oc asião cio trab alho de arte-educação realiz ado no âmb ito da exp o si- tan tes verem a Cole ção Ro b er to Marinho; elas estavam proporcionando uma
ção A ,teM odema Brasileira- Uma 5 elt;ção da Coleção RobertoMnrinbo, ap resenta- alfab etização visual básica, tr ansferível para a leitu ra d e outras imagens, não
da no (.,1ASP. Pro p o sta Tr ian gular é u m facilitad or ent re a obra e o p úb lico . só aplicável às imagens art ísticas. O que há em comum na s experiências que
N es ta a borda ge m , a im agem é co n sid erad a campo de sen tido e o que co ns ti- desc revem é o fato de que , usando a P roposta Triangular, cada uma a seu
tui a ap rendizage m é a co n st ru ção de sign ificado s p elo observado r. modo p otencializou a leitura v isual dos observadores, levando-o s a fazere m
A ima ge m, quer seja ela figur ativa o u abstrata, é um âmbito de realida- suas próprias leituras, e nen huma caiu na tentação narcisista de explicar as
de , nã o ap en as um o b jeto. I m erso s num h umani sm o b asea do na do m inação o b ras pa ra audiência s enfastiadas. Ai está a diferença entre um m ero profes-
de o b jetos, tem sid o difícil p ara o s ed uca d ore s entende rem a im portância da sor e um educador: en c]uanto um seg ue modelos, o outro submete o m od elo
imagem , da reflexão sob re ela, da pe rce pção d e seu senti do, da sua pro dução à sua linguag em pessoal.
estética através da arte e d a sua sed ução atrav és cios me io s d e com un icação . Q ua ndo essas educadoras p ro curaram co ntextualizar historicam ente
Refl exão so bre a im agem é algo que tem lug ar em mu ito pou cas es colas e Di Cavalcan ti, Pancetti e K.rajcberg, elas estavam alfabetizando cultu ralmen-
isso resulta cm co n seq üências nefastas n ão só para a co m p ree nsão da obra te. O Brasil é um dos países da Am érica Latina m ais ign o ran te de sua p rópria
d e art e, m as também p ara uma ap reciação crítica da televisão. A ~'lTV divul- c ultu ra c os ed ucado res co meça m a se p reo cup ar co m isto. É um ab sur do
go u um a pe sq uisa d em onstrand o que seu públ.ico não d iscrim ina o que v ê: u m adolescente deixar a 8' série sem sab er so m ar fraçõ es, m as é tam b ém um
ab surdo não saber quc m fo i Porrinari e nu nca ter visto p elo menos re produ-
"Dos 36 '~'~ de paulistanos que vêem a MTV, q uando
p ergunramos acer ca de seu p rog ram a preferido na grade da
çõ es d e o br as de T arsila do Am aral e de Anita Malfa tri.
emisso ra, 14'i'o não 'so uberam precisar qual e 11 % resp onde- Q ue utilidade tem isto ? Voc ês p od em p erguntar. Acesso ao có digo
ram ge nericam ent e, clipe o u programas de clipe." !' er udito, q ue é o có dig o d o p od er, é essen cial p ara a ascen são d e classe. É tão
Inúmeras p esq uisas feitas no exterio r já d em o nstraram q ue o de sen- im p o rt ant e q uan to a valo rização da cultu ra da classe em (]ue se vive o é p ara
volv im en to d a capacidade de anali sar e au feri r significados a imagens de obras o reforço do ego . Po r outro lad o, a consciência de cidad ani a d ificilm ente se
aguç a se não co n h ecem o s a p rodução do p aís do qual so mos cid adã o s. 1\ 5
comunidades hu m anas são o rg an izadas com base em esp eci ficas info rma-
11 TV Folha, P.4. domingo, 5/2/1995. çõ es co m p artil hadas p or todos.

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Tó picos Ut Óp i COS Rrl e co mo cult uro e e.xpre ss õc

E. D. Hirsch 12 define cuiturai literacy, isto é, alfabe tização cultural, co mo o obj ero da int erp retação é a o bra, não o artista, p o rranto um a int er-
" co nhe cim ento bás ico nec essário pa ra uma alfabe tização fun cional e uma pretação não pr ecisa incluir a int ençã o d o artista, mas não ne cessariam ente
efetiva comunicação nac ional "!' , Ser culturalmente alfabetizado é " possuir se deve excluir dado s cap tados for a da o bra através da biog ra fia, da vida do
as infor mações básicas ne cessárias para pro sperar, florescer, ser bem-suc edi- artista, o qu e era abominado pelos formalistas.
do no mundo moderno" !" e vale para todas as classes so ciais, acrescen ta Mé todos de int erp retação não têm interesse em si m esm os, mas in te-
H irsch. ressam ape nas po rqu e reflete m teori as qu e buscam esclare cer co mo a inter-
N a definição d os co nteú dos da alfabe tizaç ão cultural do s am ericanos , pretação é construída. Alguns m érod o s dão maior impo rt ân cia ao papel do
Hirsch inclui ar te abs tra ta, exp re ssioni smo abs trato , Acro polis, \V'o o dy Allen , ob servado r, co ncebend o-o co m o criad o r de realidade s; o ut ros, co nsideran-
Paul Cé zanne) expressionismo, imp ressioni sm o, cub ism o, Leonardo da Vinci, do a impos sibilidade do significado literal, orienta m em direção à análise das
Michelangelo, Pablo Picasso, J ack son Po llo ck, pré-rafaelitas e mu itos outros relaçõ es de dep endência em função do co ntexto. E há ainda os qu e favo re-
artistas, mo nu m ent o s e con ceito s ligado s às art es visuais. O erro de H irsch cem o resp eito à obje tivida de do obs ervável.
foi pensar qu e um "dicionário de cultura" , o qual veio a produzir de pois de
As teo rias da inte rpretação e seu s métodos os cilam en tr e maior ou
sua pe squisa, iria resolver o probl ema da alfab etização cultural. P rovavel-
me no r responsabilid ade da em oç ão, ou da razão, e evidência na definição do
me n te nunca leu Paulo Freire, po is não sabe qu e a cult ur a de defini ções é
Lampo de sentido, e maior o u menor im portância d e uma das três pe rso na-
m era educação bancária, simples ar m azen am ento de informação passivo.
gen s prin cipais do ato interpretativo: int érprete, obra e contexto.
Cultu ra não se injeta, se pratica.
A Proposta Triangular foi solução segu ida em comu m p elas educado- Se fizermo s um inv ent ário das diferentes questões ligada s à leitu ra da
ob ra de arte, verem os q ue as variáveis acim a nomeadas estão semp re presen-
ras que orientaram a apreciação das ob ras na exposição da Coleção Ro berto
tes e lutand o p o r prep ond erância. São inúmeras as classificações das aborda-
Ma rinho em São Paulo, mas cad a um a construiu seu mé todo, agiu e elaboro u
gens in te rp ret a tivas. Para o modern ism o, as mais impo rtantes fo ram o
propos tas individuais centrad as em sua s pr eo cup ações teóri cas específicas e,
form alismo e a iconografia. Am bas priorizavam a obra e não o leitor ou o
pr inc ipalmen te, levaram os visitante s a co mpre ender faz end o, co ns truindo
suas im agen s através do fazer artístico. Usaram cami nhos diferentes para co n texto ma s divergiam quanto à prio rização da forma ou do co nteúdo na
realizar o ide al de G eor ge E . H ein, de qu e to das as ativida des desenhadas leitur a da ob ra.
para a audiê n cia de mu seu s enga jem a mente e as mãos. E sta experiênc ia Para Ro ger Fr y, um dos p rim eiro s formalistas mod ern o s vin culado s
co mprova primeiramente que leitura é interp retação, e dep o is qu e as inter- às art es visua is, a análise de uma o bra deve p rio rizar os elem ento s do desigll:
pr etaçõe s de um a o br a podem ser tão diferentes, tantos qua nto fo rem os linha, for ma, co r, espaço, luz, bem co mo as categorias do desigl1: equilíbrio,
inte rp reta ntes. o rdem , ritm o, pad rão, co m posição. J á a iconografia de Panofsky co nsidera
Po r ou tro lad o, as interpret açõe s não estão sujeitas ao julgamento de cm prim eiro lugar o assun to, dep ois a co nvenção qu e pr ecede o tema, e por
cert o e errado, mas podem ser julgadas p or ou tros critérios, como o s de último dad os culturais que defin em o tem a: o artista, o tempo.
serem m ais ou m en o s con vin cent es, o u co ere n tes o u ra zoáv eis , ou T entando uma apro ximação m aio r ao co n texto cultural, tem os um a
iluminadora s, ou abrangen tes, o u inclusivas etc. Interpretaçõ es são qualificáveis varian te do formalism o, a teori a da G estalt de Arnheim que, estudando os
e portanto algumas interpr etações pod em ser me lhores que outras. Interpre- elem ento s do design, associa co nceito s de int erpr etação por aproximação co m
tações implicam visão do mundo, lo go, p odem haver interp retaçõ es contra- fo rm as e significados anterio r m ente co nh ecidos. O conhecimento ante rio r é
ditórias e competitivas de um m esm o tr ab alho. o con texto.
Também m ais co ntexrualizado ra é a iconologia, que inser e a ob ra em
12 HIRSCH. E.D. Culturalliteracy. N.Y.: Vint age Books, 1988 p. XV. um program a de co mp reensão mais amplo, mais intertextual qu e a ico nografia,
13 Idem p.XI. da ndo m ais relevância ao s dad os culturais (Gombrich) e à ideol ogia (Mit ch ell) ,
interpretações são qualificáveis. Con tu do, algu mas veze s na prática é difícil distinguir entre as du as, como no
"Idem p. XIII.
não certas ou erradas.
46 47
TÓp l<OS Ut6 r.lIcos
Art0 co rno <ulturo e e xpre ss õo

caso da análi se feita pel a N a tional G allery d e Londres da s ob ras d o seu ace r- relação dial ética entre prod ução e cons umo que ilum ina o entendimento do
vo di fundida p ela lingu agem midi ática,
pap el da ar te na sociedad e e relativiza o autoritarismo in terp retativo resul-
A análise ep iste m o lógica pro cu ra conhecer pro cesso e co nteúdo in ter- tan te das teo rias qu e p ro clamam a autonom ia d a obra de arte. Filiad a à E st é-
relacio nadam en te, e a an álise tele ológica busca res ponder questões acerca da rica da Recep ção, a teoria Reader Respome se refere a uma leitura críti ca mais
funç ão e p ro pó sito da arte . O citacism o na p ó s-m od ernidade ressuscitou a in fluenciada pela su bjetividade do leito r, po rém co m atenção espe cial ao con-
abordagem arqueológica, levan do a inq uirir acerca das fontes o u origem d a tex to. N em a au to nom ia da o b ra, nem a auto no mia do leito r. Am bos são
o bra ou d a im agem , se est á ins erida na tradição, se é resposta ind ivid ual o u da med iatizad os pelas cir cunstâncias do co nt ex to. O con texto co nt orna o pro -
so ciedade etc. cesso d e significação e deter m ina valor; po r isso não há significad o estável
A s int erp retações p sico lóg icas e psicoan alíticas direc ionam as g ues- nem valo r uni versal.
rôes p ara as relações da obra co m a m ente (sent im ento s, ide ação , ob sess õ es, A s teorias da interp retação mais co ntemporâneas, co m o a sem io logia,
rep ressõ es, eg o, id , estado s de consciênc ia etc.) e da rep resentação d a psi que a sem ió tica ,0 d eco nstrucio nism o !" e o femin ism o, têm cm co m um a ên fase
na ob ra etc . O s a sp e cto s m ais im p o r ta n te s de s tas qu es tõe s sã o o s no co n texto cultur al. AlhlUns a té as de sign am co mo ab o rdagens cu ltura listas
p reco nstr utivo s ou g ené tico s, qu e b uscam acla rar co m o a me nte do au to r da leitura da o bra de arte e, espe cialm ente, o de co nstr uc io nism o e o fem inis-
opera na criação e na fo rmalização d o tr ab alh o, Me no s interesse têm des per- mo são id enti ficados co m o sistem as d e interpretação p ó s-m o de rn o s.
tad o o s aspectos afetivo s, mas há relevan tes int erpretaçõe s guc inves tigam O sem iólog o N o r rn an Bryso n, em suas in terp retaçõ es, asso cia o car á-
como a m en te do leito r o u ap reciado r respo nd e ao trabalho e co ntrib ui para ler so cial da imag em à sua realidade como signo. E le ch am a a at enção para a
sua co mp letação. na tu reza d inâmica d a leitura da art e e d o s siste mas de sign o s gue orienta m a
circulação do vedo r e da cultu ra pela imagem . E ntretan to, a mai s conrunden-
U ma m udança m ais radical do fo co de atenção centrad o no p ro d utor
te abordagem contempo rânea à leitura da ob ra de art e é o c1econ strucio nismo.
e no o b je to pa ra centrá -l o n o c o ns u m o fo i o p e r ad a p ela s te o r ias
Trata-se de ve r q ualqu er ob ra com o se se tratasse d e um d up lo statement: um
feno m en o lógicas, cu jo eixo prepo nd erante d e análise é a na tureza d a ex peri-
ex plícito e out ro esco ndido, q ue só poderá ser en tend ido no contexto da
ência estética do o bser vad or. Para Me rleau-Ponry, um fenomeno logista m e-
dife rença, da oposiç ão e d o d esloc am ent o daquilo que é m anifestamen te
no s id ealis ta c m eta físico qu e seus m estres Husserl e Heidegger, interpretar é
cent ral para as margens, para a p eriferia e vice-versa, Obviame nte, é de D errida ,
percebe r. D an do pri mazia à exp eriênc ia p er ceptiva, co nsiderava a pe rcepção
() for m ulad or do d eco ns truci o nism o, o m elh o r exemp lo de uma leitu ra
co m o co nh ecim en to situad o, corporificado, reje itando o tratam en to do cor-
clcsco nstrucion ista da im agem, ao ana lisar Os Sapatos de Vincent van G ogh
po co mo me ro m ecanism o de realização da m en te e a idéia d e re flexão co mo
(1886, M useu Van Gogh, Amsterdam). D errida põ e em o po sição a inrerpre-
superes tr u tura da con sciên cia. O pro cess o d e p ercepção foi co n sid erado um
raç ão d esse qua dro co m o au to biog rafia, feita por Me yer Schapiro e a d e
fi m em si m esm o d o ponto de vista d a int erp retação .
Mar tin H eidegger, q ue o interpreta co m o o statement ac erca do m u nd o de
J á a Penomenologia de G asron Bach elard , mais recepti va à im agina- uma m ulher camponesa.
ção, ab riu espaço para a reverb eração po ética. j\ Fenom enologia H erm en êutica D eco nstruindo a p rópria polaridade q ue o o rienta, D err id a pergun ta:
(G adam er e Rico eur), negando que a es trutura possa so zin ha ex plicar as " co m o Heidegge r e Schapiro sabem qu e o s sapa to s fo rmam u m par? O ()ue
ino vações d a lingu ag em , explo ra os co nflitos de interp retações, po rqu e d ife- é um par? O qu e é um par de sap ato s? D e luvas? De pés ?" etc. O que
renç a e op osição de entendim ento são conaru rais à nossa exp eriência como Derrida qu estio na é a idéia de par co mo estru tura.
seres interpretantes. O pap el dos costum es, das co n venções e das pressupo-
Esta sua leitura é uma m etá fo ra d e sua atirud e crítica caracterizada
siçõ es no entendimen to da obra fo i especialmente destacado p o r G adam er e
pela d eco nstru ção das di ferenças e opo siçõ es en tre p ares d e signi ficad o s
pe los teóricos da recepção Gauss, Iser) .
Na T eoria da Recepção, um a in terp re tação centrada no produto r el
ou na obra p ouco revela acerca da estética comunicativ a. É a interp re tação da " Há autores que preferem a grafia "desc onstrucionismo" . Como amba s são permitidas. fico com
"deconstrucionisrno", que é minha preferida,

48 49
r ópico s Utó p icos Arte co mo cultura e e rore ssõ o

consagrados pe lo pe nsamento ocidental. Sua abordagem analítica, bus cando caso do quadro Portrait oj Mlle. Charlotte dll Vai d'Ognes (c1800). E ssa ob ra
várias unidad es possíveis, se dá por m eio da foc alização em pontos nos qu ais estava no Metropolitan Museurn of Art de New York, co m o um tr ab alho de
uma oposição bin ária tal co mo signi ficante-signi ficado, liter al-figural, pr e- jacques-Louis David e considerad a de extrao rdinári a q ualida de , um a da s mais
sença-ausên cia, natureza-cultura, dentro-fora, o rde m- de so rde m , m asculino- impo rt antes do famoso neoclássico fran cês. D esco briu-se , post erior m ente,
fem inino etc ., man ejad a cirurgicam ente e reco sturad a por uma linha de argu- te r sido pintada p or Constance Marie Cha rpe n tier (1767-1849) . I m ediata-
m ent o, revela incongru ênci as no discurso e rompe a veladura colocada sobre m ente dep ois passou a ser des co n siderada p elos crític os, q ue viam nela atri-
múltiplos sentidos. bu tos fem inin os semp re negativos. Chega ram a dizer: "é poesia, não artes
Além da análise de Os Sapatos de Van G ogh ap resentada em T he T rutb pl ásticas," " é literá ria em ve z de obra plástica", " tem um char me mui to evi-
in Pail1til1g, livro publicado em franc ês em 1978 e em inglês em 1987, dois de n te" , " inteligent em ent e esconde sua fraqu eza" , "é uma mistu ra de atitudes
o utro s estudo s de D errida ampliam as im plicaçõ es dec on strucionistas nas su tis qu e não co nvence, só serve para revelar o espírito feminino" ."
artes esp aciais. Trata-se de um ensaio sobre os dese nhos de A nronin Ar taud, D eve-se a críticas e historiad oras como Abigail Solomon- G o deau, Mary
produzidos qu ando int ern ado em asilo como louco e de um texto pa ra um Ga rrard, Linda N ochlin, G iselda Po lloc k e Lucy Lippard, e a artistas como
catálogo do Lo uvr e so bre ceguei ra e auto-retrato. Am bo s demonstr am o [udy Chicago e Ana Mendieta, estudos e ob ras que ques tionaram o código
deslo cam ent o do int eresse pelo có digo hegemóni co para a produ ção p erifé- heg emó nico masculino.
rica das minorias." E ste é um assunto ao q ual vo ltarei em m eu próxim o livro. Ago ra, ao
Fin alm ente, tam bém a co laboração de D err ida co m Peter E isem ma nn men cionar o feminismo, quis apenas abrir o lequ e int erpretativo para incluir,
é exp licitadora da natureza do deconstrucioni sm o nas artes espaciais. Pode- en tre as mui tas abo rdagen s de leitura da obra de arte, um a que eleve ter esp e-
mos dizer que Ei semmann , que provo ca a instabilid ade geom étrica na arqui- cial significação p ara a educação porqu e a educação é exercida principalm en -
tetura, enco ntro u na atitu de filo sófic a de sequilibr ante de Derrida o seu du - te po r mulh eres que necessitam de instrumental teó rico qu e reforce seus
plo. T rata-se em am bos do m esm o mo vimento constante de b usca em dire - cgo s culturais, tão desq ualificados pela so cied ad e das arte s dominada pelo s
ção a pontos d e reequilibração qu e p or sua vez dão origem a no vas ho m ens.
desequilibrações.
O d eco ns truc ionismo não é um m étod o qu e se ap lica à dec odificação
de um texto o u imagem , é um a atitu de crític a não-hierarquiz ad a. D e um a
man eira geral, a pós-m od ernidad e lib ert o u os m étodos, transformando-o s
em atitudes, propostas elou abordage ns.
Po r último, quero me referir ao feminismo , que também é mu ito mais
uma atitude de p en sam ent o críti co, co ntex tualizado r e de smi stificad o r da
hegem onia e do pode r, do que me ra ferram enta de codific ad or a .
O femini sm o foi de início reinvindicat ório, denunciando a an ulação
da mulh er pe lo pod er dos homen s qu e faziam a his tória, como é o caso de
Gombrich , qu e não m en cion a nenhuma mulher em sua Story oj Art. Outras
denún cias escand alo sas con ven ceram acerca da característic a patri arcal do s
cânones do minant es na art e o cidental. Um dos exemplos mais gri tantes foi o

te Derrida tem outros estudos ace rca de artes plásticas, como os sobre Valeria Adam i e Gerard Tilu s- " Informações encontradas em ADAMS, Laurie Schneider. Ttie metnoaotoçieeotart. NewYork: Icon Editions,
Carmel e o sob re Marie-Françoise Plissart. 1996.

50 51
lo orcos U tÓpICO';
A ecologia do diver sidade

ficou claro qu e os problemas de multi culturalidade circun davam os estud os


de vários int electuais dos E stad os Unid os e Europa. Basta dizer qu e ent re
meus companh eiro s de residência, qu atro estavam escrev end o livro s so bre o
assunto. Entret ant o, o preconceito de classe não era assunto pertin ent e ao
conceito de mul ticulturalidade de nenhum deles. N ão podemos reclam ar po r
uma multiculturalidade da multicultu ralidade ou meta m ulticulturalidade.Isso
ainda não existe. Por isso tem os, no Terceiro Mundo, qu e produzir no ssas
próprias pesq uisas, nossas próp rias análises e no ssas p róprias açõ es para A Multiculturalidade e os Parâmetros
supe rar os preconceitos de classe existentes em nossos países, a resp eito dos Curriculares N acio nais de 97/98
có digos culturais co n figu ráveis.
Sab emo s que há no Br asil preco n ceito co ntra a p ró pria idéia de
Preanuncia-se a possibilidade de que os problemas de diversidade cul-
multiculturalism o. Para uns é coisa de feminista hist érica ou de 'crioulo' como
tural comecem a ser tratados nas Esc olas do Brasil, pois, sob a design ação de
tenho ouvido desrespeitosament e ser dito. Para Outros é invenção de am eri-
" plu ralidad e cultural" ) se tornaram tem as tra nsversais no s Parâm etro s
cano que não tem nada que ver conosco porque, dizem, vivemos nu m a de-
Curriculares N acionais (PCN) editados pelo MEC em 97/ 98.
mocrac ia racial e as m ulh eres aqui têm aces so ao poder e os negros não são
discriminados. E nt retanto, mais que mero tema de estudos de todas as disciplinas, as
q uest ões de multi cultur alidade só serão resolvidas pela flexibilização de ati-
O crítico de cinem a n o rte- ame rican o Ro bert Starn, em entrevista
tudes e valor es. Por outro lado, não se trata de problema transversal, mas
à Folha de S . Paulo (4/7/ 95), lem br a que o multi cultur alismo tem tu do a
b ásico para um a edu cação que se con figure como democrática.
ver com o Brasil. O modernismo de M ário de Andrad e, a antropo fagia
de Oswald d e Andrade e a tro pic ália de Caetano e G il são exemplo s d e A parte geral dos PCN que trata dos temas trans versais, esp ecialmen-
um conceit o de mu lt iculturalidade ma is amplo do que os que o s ameri - te aquela de dicada à pluralidade, é he rmé tica, com uma lingu agem baseada
canos es tão ma ne jan do. cm terminologia pedagógica livresc a que será pouco op eracionalizável.
Aliás, não sei por qu e os PCN ado taram a exp ressão " pluralidad e" em
vez da de sign ação "multiculruralidade", pela qual o p ro blema da diversidade
é conhecido, debatido e avaliado, já há mu itos ano s, tanto pela edu cação
co mo pela arte. Talvez tenha sido m ais um a manifestação d o esp írito
colonialista de Cesar Coll, o espanhol qu e projetou os parâme tro s cur riculares
para todo o nosso pa ís. Talvez quisesse escamotear a origem de sua s idéias e
se mos trar original esco nd endo a sua fonte de inspiração no Cur rículo N acio-
nal Ingl ês, qu e ado ra os tem as tr an sversais, n om eand o u m d eles d e
"rn ulticulruralidade" .
Sabemos que a ordem de Cesar Coll aos brasileiros era para não citar
ninguém nos parâm etros, mas me par ece que ele foi mais am bicioso, chegando
até mes mo a tornar as idéias dos outros irreconh ecíveis para parecerem novas.
Co m isto desterrirorializou, desistoricizou e despolitizou os PCN. N o ta-
se que as elaboradoras dos PCN de arte fizeram muita for ça para recup erar
algu ma histór ia sem infri ngir as regras estab elecidas por Cesar CoU. Mas sem
no m eação a história se transforma em mera moldura despolitizada.

88
89
TÓpicOS Ur óprcos
A ecolog ia da d rver s.c c d e

A p ermi ssividade citacista pós-mod erna não é escamoteador a em re- .issunto, a suas palestras inspiradoras e, principalment e, quando trab alhamos
lação à origem das idéias ou imag ens apropriadas. Pelo contrário, insiste na juntos na lnternationaiSoaety of Education tbroligh Art, à sua atitude em de fesa
tran sparên cia das açõe s apropriativas. O desprezo pelas aspa s, que vêm sen - de diversidade de normas politicas da instituição para atend er às difere nças
do substituídas pela int erpretação dos tex tos e idéias dos qu e pen saram antes socioecon ômicas do Terc eiro Mu ndo. É bom lembrar qu e encont ram os nos
de nó s, clam a por nomeação clara e au to ria ex plícita. Trata-se d e um presidentes Marie Franç oise Chava nne e E Ilio t Eisner tod o apoio e empe-
antiacademicismo resp eito so co m as idéias dos ou tros. A era do co m pu tado r nho em prol do entendimento das diferent es condiçõe s e int eresses do mun-
ins taurou até uma nova categoria de au tor : aquel e que estab elece ligaçõ es do "s ubdesenvolvido" .
entre textos e entre idéias, e já vemos registr ado, principalmente em estudos
O idea l mesmo será com eçar indagando: por que o pr ofessor de arte
qualit ativos, p or exemplo, que este ou aquele link foi antes estab elecido p or
pre cisa trazer para sua sala de aula a pr eoc upação com as diferenç as cultu-
fulan o ou cicrano na Internet ou em aulas.
rais? A resposta, embora pareça óbvia, foi até agora pouco consid erada pe los
A mo rte do autor é argumento ficcion al de Foucault ou fant asm a utó- educado res: em uma sala de aula, espe cialme nt e na escola pública, se int er-
pico. Ironicam ente, a morte da utop ia tam bém já foi anunciada. N o exce len- relacio nam ind ivíduos de dif erent es grupos culturais que terão sempre que
te livro Ensaio sobre o textopoético em contexto digita~ Antonio Riserio diz: lidar com ou tros indivíduos tamb ém de diferen tes culturas e subculturas.
" Con fesso qu e, observa ndo o mundo que m e é dado Os grupos culturais que se imbricam podem ser iden tificados pela
obs erva r, socie dade s e culturas co n tem porâneas, não co nsigo raça, gê nero, opção sexual, idade, loca ção geográfica, rend a, idade, classe so-
encontrar quaisquer indícios ob jetivos qu e apontem, com se- cial, ocupação, educação, religião etc.
gu rança, para o desapare cimento da figur a do aut o r. Penso As pr incipais que stões que norteiam a atitude mu lticultu ralista no en-
mesmo que seria necessária uma gigantesca e p rofun da revo- sino da arte são:
lução cultural para ab olir o autor da humanidade. Ma s uma
1. Como diferentes grupos culturais podem encontrar um lugar pa ra a
revolução completam ent e diferente dessa que estamos viven-
arte em suas vidas?
do agora. P ois, até o n d e p o sso ver, a cultura rnidi ática-
informática não mos tra nenhuma inclinação espec ial pa ra ab rir 2. E ntender que grupos culturais diferentes têm tamb ém necessidade
m ão da assinatura . E se não há p ressão n esse sentido , como el a arte, mas que o próprio con ceito de arte po de diferir de um grupo cultural
antecipar o u dar de barato o sumiço do auto r?" ! para o utro.
A co nsciência de que estas qu estões são básicas, em bo ra pa reçam sim-
Quais as más intençõe s de Cesa r CoIl assassinando nossos auto res, os
ples, ajudar ia a:
autores de além-mar que já deglutimos e co m eles no ssa história?
1. Compreender que a arte pode conferir identidade às pessoas a rrn-
N este livro que voc ê está lendo p rocuro um caminho p ara a minha
"és de sím bo los. Um exemplo: a Arte Haida, a Arte Cont emp orânea no C::1-
libertação acadê mica: evito notas de pé de página, cito autores no texto e não
nadá e a Arte Marajoara no Brasil. Por qu e a Art e Ivlarajoara p erdeu sua fo r ça
cito O livro na bibliografia porque alguns textos são antigos e não os tenho
para conferir identidade e a Ar te H aida, também indígena da mes ma Améri-
na ínte gra. Mas prefiro "errar" dizen do de quem são as idéias sem pr ecisar o
ca, to rn ou-se dignificadora pa ra os seus descendentes e resp eitada pe los in-
livro de onde vieram a me ap ropr iar das idéias dos outros sem info rma r ao
divíduos de outras culturas, in clusive domi nant es? Atitudes pós-co lon ialistas
leitor que estou me apropriand o de alguém .
podem ser alimentadas p ela atitude pluralista em relação à cultu ra.
Por isso quero deixar claro q ue devo muitas das " minhas" idéias sob re
Um a criança negra qu e visite um mu seu que exiba arte ou 'artefa to'
multi culturalidade a Graham Ch almers, a suas inúmeras publicaçõe s sobre o
africano pod erá de lá sair com seu ego cultural refor çado pelo conh ecim en-
to, apr eciação e iden tificação com os valores vivenciais e estéticos da Arte
Africana, ou completamente despossuído culturalmente e desidenti ficado com
, RISERI O, Antonio. Ensaio sobre o text o poético em contexto digital. Salvador: Fund ação Casa de Jorge
Amad o, 1998, p. 147. a gên ese de sua cultura, dep end endo da orientação que o p ro fissio nal do

90 91
A e co lo q lo do d l vtH S l d o (h~
Tóp ico s Ut ópicos

mu seu qu e o receb a der à sua visita. Já vi orientadores de mu seu, ao falarem a uma possível aproximação banal ou ep itelial com a obra. Um certo me do
de Arte Africana, se referirem ap enas à escravidão e aos fazeres manu ais do s da asso ciação do termo "leitu ra" com a decodi ficação semió tica parece ter
escravos pa ra co ntex tualizar os objetos e, em nenhum momento, se referi- in fluenciado na sua rejeição. mudança
rem às suas qu alidades estéticas. E nt retanto, qu and o se con frontavam co m a N os PCN de Arte de 5' a 8' séries, elabo rados po ster iorme nte , as
arte de có digo europeu e norte americano- branco, a co ntex tualização era elaborad oras o ptaram por um a ab ordagem mais co loquial e mais inquirido-
instituci onal e a apreciação tran scend ent al, apeland o para a sensibilida de es- ra. N eles fo i feita a substituição do termo "reflexão" pelo termo "co nt extu-
tética, a valoração eco nó mica e a ide nti ficação com stattts social. alização" . É claro q ue trata-se de mud ança de conceito c não ap enas de te r
2. Sen sibilizar pa ra p roblem as de deficiên cia física e diferença de ra- mo. 1\ ên fase na contextualização é essencial em todas as vertentes da ed uca-
ças, nacion alidade, naturalidade, classe soc ial, religião. ção contemporân ea, que r seja ela baseada em Paulo Freire , Vygotski, App lc,
3. Libertar-se de atitudes discrim inatóri as em relação a pessoas de o ri- o u ge neri came nt e cons tr utivista, para parecer origi nal co mo (luis para 11( ') S
gem étnica e/ou cultural diferen te. Ccsar Coll. Sem o exercício da contextualização co rrem o s o risco de qu e, do
po nto de vista da ar te, a pluralidade cultural se limite a uma abordagem me-
4. Ser capaz de responder à diversidade racial, cultura l e de gênero de
ram ente aditiva.
maneir a positiva e socia lmente respon sável.
A rnulticulruralidad c aditiva vem sendo veemente criticada por soció -
É através da co ntextualização de produ tos e valores es téticos qu e a
logos, ant ro pólogos, educadores e ar te-ed ucadores. Por abordagem aditiva
atitude multi culruralista é desenvolvida. D aí minha oposição à triangulação
ent endemos a atitud e de apenas ad icionar à cultura do minante alguns tóp i-
explicitada pelos PCN , I' a 4' séries, qu al seja ação, apreciação e reflexão.
cos relativo s a ou tras cultu ras. 1Iulticulmr alidade não é apenas fazer cocar no
Considero que reflexão é ope ração envo lvida tan to na ação co mo na apre ci-
ação. In sistir em destacá-la seria subs creve r a estética escolástica, qu e despr e-
dia dos Índios, nem tão pouco fazer ovos de Páscoa ucranianos, ou do br ad uras • \ ,
japonesas, ou qualque r ou tra atividadc clic h é de outra cultura. O (jue precisa-
zava a arte "i n teressada" no socia l e temi a o ape lo aos sentidos, isto é, à
mo s é manter um a atmos fera inve stigado ra, na sala de aula, ace rca das cultu- \
sensorialidacle e à sensualidade co natural à arte, co mo Plat ão já antes o de-
ras comp artilhadas pelo s alunos, ten do em vista que cada um de nós pa rrici {
monstrara. E xarcebava a int electu alização da arte co mo correção aos seus
pa no exercício da vida cotidiana de mais de um grupo cultural,
aspectos sensoriais con side rado s enga nado res da mente.
A estética esco lástica não dá co n ta da arte co ntem porânea da qu al Por exem plo: eu me defino ao mesmo temp o como mulher do ponto
devem os tam bém e principalmente tratar. Para um a triangulação cognoscen te, de vist a de gênero, no rdestina do po ntO de vista da locação cultu ral, arte-
que im pulsione a percepção da cultura do ou tro e relativize as normas e educadora do ponto de vista da ocupação, bran ca do ponto de vista da etnia,
valores da cultura de cada um , teríam os qu e con siderar o fazer (ação), a leitu- heterossexual do pont o de vista da opção sexual, classe méd ia do pont o de
ra das obras de arte (apreciação) e a co ntextualização, qu er seja histó rica, vista da renda. Po rtanto, p ert enço a alguns grupos de cu ltu ra dominant e,
cultural, socia l, eco lógica etc. mas tam bém pertenço a g rup os cultu rais discriminados, com o o de rnulhc-
rcs e de nord estino s em São Paulo. Além disso, como arte-educado ra, so u
As elabo rado ras do s PCN preferiram design ar a deco dificação da obra
discriminad a po r artistas, historiadores e críticos, os grupos dominant es na
de arte como "a preciação". Costumo usar a exp ressão " leitu ra da obra de
área de arte.
arte " em lugar de "apreciação" por tem er que o termo ap reciação seja inter-
pretado como um mero deslum br amen to que vai do arre pio ao sus piro ro- D iria qu e para ter mo s uma ed ucação mulriculruralista crítica em arte é
mântico. A palavra "leitu ra" suge re um a int erpretação pa ra a qu al co laboram necessário:
um a gramá tica, um a sin taxe, um campo d e sen tido d ecodific ável e a poética 1. Promover o entendim ento de cruzamentos culturais, através da iden-
pessoal do decod ificador. tificação de similaridades, pa rticularm ente nos papé is e funções da arte, den-
Continuo prefe rindo a substituição do termo ap reciação por ou tro tro e en tre gr up os cultu rais.
qualquer, mais próx imo ao esforço intel ectu al decodificador e menos sujeito 2. Reco nhecer e celebrar diversidade racial e cultural em arte em no ssa

92 93
rÓ p lCO S Utópicos R ecologia do diver sidade

soci edad e, enqua nto tamb ém se potenci aliza o o rgulho pela heranç a cultu ral Estas discu ssõ es co nt ribu iriam para:
em cad a indivíduo.
1. o respeito às diferenças;
3. Incluir em todos os aspe cto s do ensino da arte (produ ção, aprecia- 2. o reconh ecimento d e m anifestações cultu rais qu e nã o se en caixam
ção e co nt extualização) problem atizações acerca de etno centrism o, est ereó- no sistem a de valores qu e subscrevem os;
tipos culturais, preconceitos, discriminação e racismo.
3. a relativização d e valor es em relação ao tempo.
4. E n fatizar o estudo de g ru pos particulares e/ou minoritários do
Atividad es como ident ificar as formas de arte que importam em uma
ponto de vista do poder como mulheres, índios e negros.
variedade de culturas e subculturas seria uma estra tégia que p od eria levar a
5. Possibilitar a co n fro ntação d e problemas, tais como racism o, sexis- um a atitud e multicultu ralista. Educação multiculturalista p erm ite ao aluno
mo, excepc iona lidade física ou m ental, particip ação democrática, pa ridade lidar com a diferença d e m odo positivo na arte e n a vida .
d e poder.
N ão adian ta nada fugir do uso de p alavras co m o b ranco, n egro, raça
6. E xaminar a dinâmica de diferentes culturas. etc. A ch am ada lingu agem politicamente correta, como diz Gloria Steinern",
7. Desenvolver a consciênci a acerca dos m ecanismos de manutenç ão foi criad a pelas femini stas para ironizar o compo rtamento masculino, que
da cultura dentro de grupos so ciais. busc ava escam o tear a discriminação. O engr açado é que todos levaram a
8. Incluir o estud o acerc a da transmi ssão de valores. sério. En tretanto a lu ta ant idiscrim ina tória consist e em falar a verda de aber-
tam en te, dar o verdadeiro nome que design a o pr econceito, e não adap tar-se
9. Questionar a cultura dominante, laten te ou m anifesta, e todo tipo
de opressão. aos novos temp os multi culturalistas atr avés de de sign ações científicas ou
sup ostam en te respeito sas como etnia em vez de raça, afro brasileiro em vez
10. Destacar a relevância da informação para a flexibilização do gosto de n eg ro.
e do juízo acerca de outras culturas.
Ao substituirmos raça por etnicidade, um princípio de or ganização
E mbo ra isto esteja com cara de 10 mandamentos da multiculturalidad e so cioecon ômico e de coesão, inadvertidamente negamos a história do racis-
em arte, arriscaria dizer que não são um regulam ento n em religião, m as lem - m o. I sto signi fica qu e a respon sabilidade dos brancos pe la explor ação e opres-
bretes pós-cr íticos que , se postos em pr ática, de sm entiri am muitos do s pre- são dos negros e índios é suavizada pela de missão da história. Continuare-
co nce itos culturais, como, por exem plo, a idéia de qu e a melhor arte é a m o s a mostrar a nosso s alunos o lH ollll/JIeJJt o às Bandeiras de Brech eret como
p rod uzid a p elos europ eus e a de que pintura a óleo e a escultura em m ármo- uma magnífica obra d e arte , sem analisar o fato de que ela com emora um
re são as m ais importantes formas de arte. Estas idéias só reforçam o có digo episó dio colonialist a de noss a história, no qual a m atança e a escravizaçã o
hegem ônico. Outra idéia preconceituosa de qu e a m elhor arte tem sido pro- dos nativos, dos índi os, atingiram proporções dizimadoras.
duzid a por hom en s, também seria desmentida se a con textualizássemos em O politicamente co rreto é um clichê. O que acontece, em geral, é que
relação ao papel secund ário que as so ciedad es têm determinado para as mu - mudou a linguagem m as o preconceito permanece, agora disfarçado. Militân cia
lheres. A diferença hierárquic a entre artesa na to e arte, que é tamb ém multi culturalista é compromisso com a de smontag em de preconc eitos e não
pre conceituosa, seria contestada se analisássem os o valor dos sa be res dos com lingua gem atenuante.
po br es e dos ricos auferido pe la cultura do minante.
O que se está ob servando em todo o m undo é que a m od a globalizado ra
Para chegarmos à desmistificação de muito s pr econceitos, é nec essá- de estabelecer currículos n acionais ou outros eufemismos, como standards
rio discutir: nacionais e até parâmetros nacionais, resulta n o desenvolvimento do p oder
1. a função da arte em diferentes culturas; de controle do gov ern o sobre a educação, m as não numa melhoria de quali-
2. o papel do art ista em diferentes culturas; dade das escolas e do ensino.
3. o papel de quem decid e o que é art e e o qu e é arte de boa qu alidade
em diferentes culturas. , STEINEM , Gloria . A feminista tranqü ila. Entrevista ao Jornal do Brasil. Caderno Mulh er. p. 1,1 3/9/1997.

94 95
A e cologia da orver srcode
1,'lp I((, ·. llttl IJIlO '.

Na Inglaterra, h á qui nze anos , h avia maior atenção à educação multi- B i bliografi a
cu ltural d o que agora, depo is del a h aver se tornado o b rigató ria como tema
13ANK S,Jam es e BAN KS , Ch erry M cgee. "'lu/tim/tura/ education. Boston: Allyn
trans versal através do Cu rrículo N acional. Segund o os críticos de ed uca ção
and Baco n (1997) .
ingle ses, a hipótese d e que a tra nsversalidade tem ática seja tão ameaçad ora
BE RG E R, Manfred . Educação e depêudenaa. Rio G rand e do Sul: D ifel, 1976.
pa ta os p ro fessores qu anto o é a in ter disciplinaridade po de exp licar a ap atia
n o qu e se refere a temas cross cun iC1l//IIIJ na Inglater ra. CHAL1\1E.RS, G raerne. Celebratil1gp/1/m/ism. Lo s An gel es:T h e Gerty E ducation
Se lá, ond e já h á uma tr ad ição d e luta p or in terd iscip lin a rid adc In stirute for th e A r ts, 1996 .
(Sum merhill foi um exem p lo) es tá aco nt ecen d o isto, imagine no B rasil, o nd e I'REIRE , Paul o. A educação como prática de liberdade. Rio de Jan eiro: Paz e Te r-
a d escon fiança int erd isciplinar e a falta d e d isp osição para navegar por ma is ra,1968.
d e um a dis cipl ina levo u a l\N PPAV - Asso cia ção Nacio nal d e Pesqu isa e G LA Z E R, N a th an . We are a//llm/tim /tura/ists IJOW. Cam b rid ge: H arvard
P ó s-gr ad uação em Artes Visuais (nã o é a ANPAP) a aprovar a exclusão da Universiry, 199 7, p.ll .
arre-ed uca ção da área de artes do CNPq e d a CAPES. E ssa ass o ciação tem o I'vl cLA RE,N , Peter. i'vlu/tim/tura/ismo critico. São Paulo : In stituto Paulo Freire -
aval destas du as enti da d es que d everiam estar lutand o p ela mel horia d a ed u-
C o rtez , 1997.
°
cação, pois são g overnam entais e g overn o tod o o dia en tra em no ssa casa
lv[ARC U S, G eo rg e E. e MYERS, Fred R. Tb e traJlic iII culture. Berkele y:
at ravés d e jo rn ais e televisões para afi rm ar a prio rida de d e su as açõ es em
relação à ed uca ção . E nq uanto isso, em um a reunião (9 de outu b ro d e 199 7) Univcrsity o f Califor nia, 1995.
de ap enas 12 pesso as', sem nenhu m ar te-edu cad or pr esente, a ANPPAV vo tou i\l E M1\ U , Albert. Tbe colonieer and tbe c%llized. Bo sto n: Bcaco n P ress, 1970.
a elimi na ção d a arte-educação p elo fato de ser difícil decidir q ua ndo um pro- RETAMAR, Ro b ert o E Caliba n . M assachusetts Review.Wi nter/ Spring, 197 0.
jeto apresentad o é de arte ou d e educação. Trata-se de mera int ole rância St\ID, E dward . OrientalismoNew Yo rk: Pan th eon Bo oks, 1978 .
interdisciplin ar e desrespei to pel a ep istem ologia d a arre.
SH O TTE R, J ohn. Culatra!po/itics of el'el) day /ife. To ron to: U n iversity o f To-
N ão se sab e ainda a de cisão d a CAPES e d o CN Pq, p ois nun ca re s- ro nt o, 1993.
p o nde ram às cart as e ab aixo -assina dos d os art e-ed ucadores p ro testando con-
SH UST E RM A N , Rich ard . PragllJatist aesthetics: /ú'iJ1g beauty, retbineing art.
tra a d iscriminação d a q ual fora m vít im as.
O xfo rd: Blackw ell, 1992 .
Coisas com o esta nos faze m tem e r p elo desenvolvimento das aventu -
TAY LO R, Charles. iV1l1/tim/tura/ism: exallJifliflg tbepo/itics of recogJ1itiofl. J ersey:
ras co gnitivas q ue ultrap assem fr on teiras discipl inares e/ o u cu ltu rais.
P rin ceto n Univer siry, 1994 .
'rRE N D, D av id . Cu/tllra/ pedagogy: art/ ed1/cation/po/itics. N ew Yo rk: Bergin &
G arvey, 1992.
3 Os professores presentes nesta reunião e que aprovaram por unanimidade a exclusão de arte-e duca-
ção da área de artes do CNPq e da CAPES eram no momento coo rdenadores dos programas de pós -
graduação em ar tes visuais de várias universidades brasileiras: Ora Glacy Antunes de Oliveira (UFG);
Dr. Heitor Capuz zo Filho( UFMG) ; Dr. João Evange lista Silvei ra (ECAlU SP); Ora Maria Amélia Bulh ões
(UFRGS) ; Ora Mar ia Ce leste de Almeida Wanner (UFBA.); Dra Piedade Carval ho (UFF); Dr Rogério
Medeiros (UFRJ) e os represen tante s das artes no CNPq . Ora. lcl éa Catani e CA PES, Ora. Sonia Go -
mes Pereira.

Sinto ter de dizer que estes professores nunca dera m atenção e muito men os resposta aos apelos
poste riores dos arte-educado res expressos em cartas e abaixo-assinados aprovados por assembléia no
Cong resso Nacional da Fede ração Nacional de Arte-Educadores do Brasil (Dez. 97, Macapá) e da As-
sociaç ão de Arte-Educadores do Distrito Federal (Brasilia, Nov 97). Três out ros professo res que também
condenaram ii exclusão a area de a rte-educação naquele fatídi co ) Encontro da ANPPAV procurara m se
desculpar e acredito serão corajosos o suficien te para reverem suas posições no futuro . São eles: Dr.
.João Jurandir Spinelli (Unesp); Dr. Elyeser Sztrum (UNB); Dra.Helena Ja nk (Unica mp).

97
96
Tópicos UtÓp ICOS
A e colc qro do drver s roc oc

E sta área relacio na conc eitos artístico s, d e design e conceitos ambie ntais
e, como tal, nem semp re encont ra espaço específico no currículo escolar.
E nt retanto, no que diz respeito ao currículo oficial, pode ser incorporada
com o parte da disciplina de arte e design, design e tecnologia, além de educação
am bien tal. I sto diz respeito ao currículo "form al" - o qu e os p ro fesso res
pr eten dem ensinar. G ostaria de incluir tamb ém consideraçõ es sobre o currí-
culo " in fo rmal" - o que os estud an tes aprendem ent re eles, e o currículo
Aprendendo a ver " oculto" - o que eles ap ren dem pelo sim ples fato d e p articip ar em do am bi-
ente escolar.
Eilecn Adams A imp ortância dessa s áreas am pliou-se através do meu envolvim ento
com ou tro p rojeto de pesquisa, Aprendendo através de Paisagens, on de apro fundei
Minha primeira exp eriênci a co m meio ambiente foi como professor a as oportunidades edu cacion ais para melho rar a qualidade ambienta l em área s
de arte na Púd ico School, d e 1974 a 1976, trabalhando no Front Door Projea escolares.
(projeto Porta da Frente) 1 e, d epois, como dire to ra do Pro jeto de Desenvol-
vim en to Curricular Ar! and lhe Buil! E nuironment (Arte e o Ambiente D urant e os último s quin ze anos, meu trabalho es teve ligad o à filoso -
Con struído)", Além disso, lecionei no cur so superior de en sino do design no fia e prática de uma área do currículo de arte e design que se encontra no meio
Rqyal CollegeasAr!, em Lond res, e em vá rios cursos na E scola Politécníca de ambiente e que procur a desenvolver diferentes m aneiras de ver - através dos
Birmingh arrr' . Passei a dedi car-me na pesquisa em tempo integral a p artir de olhos do artista, do crítico e do designer, E sse trab alho começou como urn a
1985. ren tativa d e explicar a aruaç ão do s professores d e arte e atravessou diversas
fases, atrav és d a experim ent ação, crítica e aper feiço amento, atingindo ago ra
N este ensa io pretendo relacionar asp ect os da estética e do design com
o estágio adequ ado para inte grar o currículo esco lar.
a questão do m eio am biente . Que ro explic ar o rece nte de senvolvimento des-
se aspecto do ensino de ar te e do design, bem como considerar as p ossibilida- N o início dos ano s 70, havia um interesse crescente nos assuntos
des futuras. N o momento, essa é a minh a principal pre ocup ação. Atualm ente amb ienta is, particularmente o m eio am biente urbano , o qu e motivou algu-
trab alho como pesquisadora no pro jeto Aprendendo a Ver. O enfoqu e d a pes - mas iniciativas o ficiais como o Relatório Skeffington, em 19694• N o enta nto,
quisa é o trabalh o em escol as bas eado na experiência ambi ental e através dele o meio ambiente "natural" era mais enfatizado como fonte de estímulo s ou
são desenvolvidos: referência p ara trabalhos de observação. N as esco las primárias eram emol-
• o conhecim ento estético e de design; durados croquis que servi am como ilustr ação pa ra trabalhos de designo N as
• um a resposta sensível ao lugar; esco las secundárias, cro quis e foto gra fias eram colocados em po rtifólios como
ma terial de referênc ia, destin ados ao trabalho em diferentes tipos de media. O
• as habilidades críticas e discriminató rias (desenvolvimento da capacida-
de de julgamento); meio ambiente era usado como fonte de estímulos, com o modelo , como
"p ista" para idéias, tendo seu enfoque principal n a natureza. Os professores
• as habilidades de design (dar forma ao ambiente e lidar com mudanças).
de arte supun ham que o "e stud o ambient al" era responsabilid ad e da discipli-
n a de geog ra fia - e se fosse criado um espaço dirigido espe cificamente p ara
1 Projet o Port a da Frente; Boletim de Educação Ambiental, n. 96, Abril de 1976. estudos am bientais, seria ocupado por um biólogo.
2 Ver (1) ADAMS , E. & WARD, C. Arte e construção ambiental. Londres: Longm an (1982) ; (2) ADAMS , E. & Durante a déc ada de 70, o estud o da arqu itetu ra foi ministrado em
BAYNES, K. Arte e a construção ambi ental: atividade s de estudo. Londres: Longm an Resources Unit
(1982); (3) ADAMS , E. Arte e cons trução ambiental. Equip es de trabalho. Londr es: Longman Resour ces poucas escolas, abordando princip alm ente história e o desenvolvimento de
Uni! (1982 ).

, Escola Politécnica da Cidad e de Birmingham. Arte e construção ambiental. Artig o resultant e do trabalh o
de alunos do DPSE e PGCE (1983).
4 Relatóri o Skeffington, Pessoas e lugare s. Londr es: HMSO (1969).

126
127
A ec ologia do d iver sida de
TÓpicOS Utópicos

estilo s de arqui tetu ra. A his tó ria da art e parecia m ais r elacionad a com a histó- Foi m uito difícil para os professo res ad o tarem a titud es di fer entes sem
ria de pintura. Nem todos os professores de arte tinham conh ecimento de estímulo ou a poio de fora d e sua classe. A fim de providenciar um ca talisado r
que sua orientação se des tin ava ao ens ino da arte e da arquitetura. A crítica par a tal mudan ça, muitos arqui teto s e p ro jetistas am bientais foram encoraja-
como estud o ainda n ão é p opular hoje. O s p rofessores en car avam a críti ca d o s a trab alh ar ao lad o de p ro fessores p ara d esenvolver asp ec tos críticos e de
com sent ido ne gativo. Ficavam indeciso s so bre co mo lid ar co m estu dos d e ap ro fu n da me n to d o es tudo a m biental. Seu próprio trab alh o reivindica dis-
crítica em relação ao ambiente e achavam difícil relacio nar esse as p ecto com criminação e julgamento em relação a ass un to s ambi entais e eles es tão in te-
seus conteúdos d e en sino. D a mesm a forma, o estudo do desigll era cada vez ressados em lidar com mudanças. O ap oio quanto à importância da arte e do
mais v isto co m o território do p rofessor de artesan ato ou tecnol ogia, e o design em educação e para o envolvim ento de arquitetos e p roj etis tas foi dado
estudo ambien tal de sempenhava ap enas um p eq uen o p apel em seu trab alh o, a partir d o relat óri o E mironmenta]educationin urban areas (Educação ambien tal
embora o c ur rículo do curso de design incluísse um subs tancial componente em áreas u rb an as)".
am bien tal.
"A educação ambiental urban a deve ajudar as pessoas
~í,t.l )\
Tudo isso foi co nfir m ad o n as conclusões qu e fizeram p arte de um a se conscientizar, compreender, analisar e, final m c.ite, aper-
relatório d e 1973 , en tirulado Design iII General E ducation (Design n a ed ucaç ão \ \\\\Vi.
DO feiçoar as edificações. Sua preocupação principal deve ser aju-
geral)S, do Roya! College of A rf. O relatório revelou que o estud o de arte e dar as pessoas a participar mais efetivament e na for mação de ~\j- , \
<;.E de sign nas escolas estava lim itado a pro jete s g ráficos e d e p ro duto s, com seu meio am biente local. Isto não é um problema único em
ên fase n a criação d e o b jeto s. Havia p o uca evidência de estudos críticos e sua es sê nc ia, d eve nd o reportar- se também a as p ecto s
nenhuma evidência de p rojetas ambientais. ambien tais de problemas tradicionais, variando desd e as ciên-
"l O p ro jeto Front Door (porta da Frente) veio resp on der diretamente a es- cias naturais, através da geografia c história da arte, arqui tctura
e planejamento. D evo incluir compone ntes visuais c de clesign
sas conclusõ es. N aquela época, dois esp ecialistas em estudos de arte fo ram par-
e deve envolver tanto a experiência direta com o o resultado
ticula rm ente influentes para a promoção do trabalho am biental nas escolas: D an
- \~IlS Shanno n , o rientando assunt os de arqu itetura e planejamento; e R alp h Jeffrey, acadêmico." (Conclu são 2)
um do s criadores do p ro jeto "A Arte e a Construção Ambiental para E sco las" . ''As respostas estéticas for maram uma das áreas mais
D an Shanno n promoveu o cantata entre professo res, arquitetos e projetistas; impor tant es e mais negligenciadas. Nossa to tal falta de arcn
NON ção para a ed uca ção visual, para ensinar as pessoas a enxerga
Ralph Jeffrey tinha um interesse particular na crític a como um estu do.
, ':'1.:
c-l <'-C 1
'
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rem, foi sempre reiterada pelos ent revistados; eles con sidera-
Vário s docum entos curriculares e p ro g ra m as d e avali ação elaborados
ram este ponto um a das características mais p reocupantes ,k
apoiavam essa área de estudo, encoraj ando o pe n sam ento crítico e a ha bilida-
nosso sistema educacional, o que acarre tou as co n seq üêr« 1.1' .
de de pl an ejamento, emb ora ainda ho uves se re sist ênc ia entre os p ro fessores
mais desastrosas. A preservação de um sentido de lugar c "
em lida r com uma áre a na qual eles sen tiam que h avia falta de co m p etê ncia
conhecimento de suas raízes foram aborda do s como aspc' I I J'
pe sso al e profissional. A ên fase do ensino de arte co n tinuava o rientada para parti cularmente vitais, quando tant os tiveram experiêncr.i II,
o trabalh o de expressão e o mod elo do artista co ntinuav a send o a grande segund a mão. Praz er, curiosidade e um sentiment o de elll . 11'
influência so b re o qu e foi e como foi en sin ado com relação ao tr abalho tamen to, quand o apropriados, devem ser ativamente cn r II .' I

am b ien tal. Par a muitos professores de arte, a experiência de seu próprio trei -
jados." (Conclusão 12)
n amento - p ar a muito s d eles como pintores - teve um profundo efeito em
sua atuação como p rofessores e desafio s de am pliar sua aru a ção para um Algum as entidad es tiv eram influência na cri aç ão do inte rc âu ii"
território p o uco famili ar am eaçava a id entidade d e seu desempenho. inr erprofissional na educação : E uropean Arcbitectural H eritage Year (A I1' I , I"

S Colégio Real de Artes. Design na educação geral. Unidade Educacional de Projetos (1979). 6 HALL , Peter. Educaçã o ambie ntal em áreas urbanas . Londres, DoE (1979).

I ' '' '


128
Tópico s Utópicos A eco lo g ia do dive rsi(!çi l l"
outras referências variadas
Pat rim ónio Ar q uite t ônico E uropeu), o School Council (Co ns elho de E scolas), sen so de julgam ento co ns trutivo. T anto faz se responder m os, por exemp lo,
e o Royal Institute of BritisbArchitects (Ins tituto Real Britânico de Ar quite tos) , a novos produtos de co nsumo, a recentes manifestações artís ticas ou a alte -
e as associações regio nais de arte . Escritó rios de arquitetura e cen tros de rações do meio am biente com interesse , au to con fiança e bom julgame nto,
estudos ur ban os ajuda ram a facilitar essa ques tão . ou, ao co nt rário, co m uma vu lnerável falta de co n hec imento. Isto vai depen-
H avia tamb ém o p erigo de que a cre scente p opul aridade do apren di- der em parte da qualidade do processo educacional.i."
zado, baseado em unida des, te nderia a enfatizar a realida de soc iopolitica , à O p ropósito a long o prazo d o P r o jeto de Art e e C o n str uç ão
custa dos interesses estéticos e de design, e fosse negligenc iada a im portância A m biental era de capacita r as pessoas a to mare m um a posição m ais cri-
da percep ção ind ividual, a ética su bjetiva e sua respo sta corresp ondente: ativa e participativa na form ação de se u meio am biente no futu ro . Is to
II'
re-em er giu agora co m o um a preo cupação em in iciativas, tais com o o
E stetas .Actions Programme (programa d e A tivida des Patrim oniais) e os pro - Ck.\ -\
"A cidade, como a conhecemos, a suave cidade da ilu-
são, mit o e pe sadelo é tão real, talvez mais real, do qu e a dura
gram as de cOJlllJJunity refurbisbment (recu p eração co m unitá ria), o nde os \J{\ I?\ I'
cidade que po dem os localizar nos mapas, n as estatísticas, em
m o rad o re s são en corajados a assum ir um co ntrole m aio r na fo r m ação e
artigo s espe cializado s sobre sociologia e arquitetu ra urbana.':"
admi n is tração d e seus ar redores. I sto r e -em erg iu , n a co nsci ê nc ia
A ênfase d ada - an álise quantitativa - fez com que ficas se muito difícil am b iental, co mo um a qu estão p ara a co n serv ação, re ab ilit açã o, re n ova-
in tro du zir estu dos qualitativos, en fatizand o a avaliação e a fo rm ação de jul- ção e heranç a. R e-emergiu em es fo rços re n ovados p o r pa rte d e in stitu i-
gamento. E nq uanto a qualid ade ambienta l e o impacto am biental to rnaram- çõ es e g rupos de p ressão para aumen tar os níveis d e inter esse, co m p re-
se ago ra assun tos de natureza própr ia. O in teresse at ual nesses assun to s em en são e preocupação ta n to d o p ú blico pro fissio nal co m o leigo. Re-cm cr-
círc ulos nobres, na rn ídia, na sociedade, no governo e em filas de ô nibus, giu n a retó rica go vern am en tal co m o a necessi d ade de m aio r r esp o n sa b i-
tud o apo nta para o novo despertar de int eresse nessa área - o m eio ambiente lid ad e pessoal pe lo meio am bie nte e engajamento de cidada nia . Re- crncr-
o nde vivemos, trabalhamos e nos divertimos, com o qu e ele se pa rece, co m o giu co m o um co nce ito de m ídi a em inco ntáveis pro gramas d e televisão
ele é sen tido, com o somos por ele afera dos e co m nós o afetamos. sobre a r e cu p eraç ão d as cid ades, arqu itetu ra m o d er n a e projeto s
E sp ecialistas têm dito nos últimos anos: ambien tais. Aparece aind a em tantas o u tras co mpe tições e programas ele
...a essência da co ntribuição que a art e nos dá aqui se situ a no julga- prêm io s - a BBC tem It 's My Ciry (Es ta co n cIama p ara uma "I nghrcrra
me nto e dec isão... m el h o r" ).
...a co nstituição e info rmação des ses julgamentos pela ex periência e Sim, mas o que tem tud o isso a ver co m arte e desigll no co nt exto da
enr iquecimen to é a principa l finalidade da arte na escola... educação am biental? Tem tudo a ver, sobretu do se tivermos uma ampla vi
são de nossa tarefa e a relacio narmos com qu estões de educação em gn;\1.
...espe ra-s e que os alunos ten ham um co n hec ime nto crí tico de seu
Tem tu do a ver com o desenvolvime nto do co n heci m en to, da comprCl'lls:l()
me io ambiente, sua qualidad e e seu estilo (o u a falta deste) no proj eto de sua
e da p reocupação co m a qu alidade estética e do designo Se co mpararmos ( l
casa, ves tim enta e ador no, e de como as co isas podem ser melho radas ...
ressu rgim en to do int eresse o ficial e d o público em assun tos am bientais, co m
...as principais habilidad es desenvo lvidas pela prática da arte são: a a atenção sem precedentes que arualme n te está send o dispensada à educa-
habilidad e de comunicar-se visualme nt e e o poder de discriminação - o reco- ção, aqu eles env olvidos com a educação de ar te e design precisam estar a par
n hec im ento de que, con for me o Relatóri o N ewsom, "os alun os são p essoas da importância de seu cam po deatu ação em áreas que estão atu alm ente scn -
que têm a capac ida de de for ma r um julgamen to correto"... do examinadas bem mais detida me nte: estética, que envolve expe riênc ia scn-
...tradição e antecedentes são menos úteis ago ra como guia s n um a so rial, considerações quanto à for ma e à aparência; crítica, qu e envolve a
situa ção de muda nças aceleradas, e por isso há uma maior nec essid ad e de um

7 RABAN , Jonathan . Cidade suav e. , Departamento de Educa ção e Ciência : Papéis de comentários: Curriculo 5-16 .

130 131
Tóp IC OS Utó p IC OS A eco lo gi a da d lver s.dode

formação de julga m en tos sobre qualid ade; e projetes, qu e envolve a forma - sido u sad a como um m eio de intensificar ex p eriê ncias, concen t ra r a aten -
ção e co ntrole do m eio am biente. Todas elas lida m co m os relacionamento s ção, como um meio de percepção, d e a nálise, de re flex ão sob re estas
entre pessoas e lugares, o que envo lve significado emocio na l, significa do sim - experi ências, com o um meio d e reproce ssa r es ta experi ênci a a fim d e
b ólico e compreensão cultu ral. To das elas são b astant e ad equadas ao territó- en t en d ê-Ia. E la fo i u sad a não apenas p ar a re sp onder o que ali h avia, mas
rio do pro fess or de artes e design o u do profes sor de ensi n o funda m ental p ara consid erar o qu e p oderia h aver, pa ra ex p lo rar o sign ificad o e va lor e
preocupad o co m o ensino d e artes. p ar a envo lv er os es tuda ntes na criação do sig n ificad o atrav és d a avalia-
O trabalho nas esco las ab rang e um am plo raio d e in teresse. I sso in clui ção das a tiv id ad es. A escol a p ro p riamente di ta ag e como um p od ero so
tu do aq uilo que desenvolva um m aior g rau de conh ecimento am biental; aquilo ed uc ad or atrav és d a lin gu ag em vis ual, esp eci al e simbólica, que ela em-
q ue cons trói u m vo cab ulário relacion ad o co m experiênc ia estética e d e desig11; prega e propo rcio na co m o u m a fonte sign ifica tiva para ed ucação arn bi -
aquilo que encoraja um a resp o sta am p la para promover um se nti do de lugar. cs- tJJ W) \:
e ntal, ar te s e desig11. Po deríamos p ergu nta r a t é que p onto o am b ie n teoutras
A arte aqui é impo rtan te no de senvo lvim en to do sentido de p o sse e identida- co lar, ta n to em ter mo s fí sicos como sociais, d est ró i as idéias, atitu dquestões
es c .
de em relação ao meio am bient e. E la é usada co m o um m eio de intensificar va lo res qu e pro curam o s p ro m over n a au la de a rtes ? Com o am p liare mos ~,~\ I
exp eriências, in fluen ciar a p ercep ção, p er m itin do ao s estudan tes qu e refli - o in tere sse por val o res es té tico s e quali dad e de projeto introdu zin d o -o I\"'-' \\ ;~' \
tam sob re a exp eriên cia adq uirida e p o ssa rep ro cessá-Ia para que faça sen ti- n o n osso ambi ente d o di a-a -d ia e nas ati vidade s com ele r elac io n ad as) -::1\ 1\II I'
do. E la tam b ém en co rajo u um a abo rdag em que enfatiza a c rítica, co m o um As idéias em sua ess ência são to das muito boas, m as é claro que ter ão
es tu do atr avés do q ual o s estu da ntes têm sido ajudados a form ar julgamen - vida cur ta , a não ser q ue sejam fei tas tentati vas p ara ins titucio nali zá-las. Isto
tos d e ava liação sobre q ualid ade e a tentar explicá-los o u justificá-los. Este está acon tecen do de diver sas man eiras: através do tr einam ento d e p ro fesso -
tip o de trab alho envo lveu assim tan to o us o de uma linguagem visu al como res, ta nto n o seu treinam ent o inicial qu anto p o sterio r; atr avé s de inici at ivas
o uso d e palavras. El a m o stro u co m o em alguns casos isto condu z à ativida- d e dese n v o lv iment o de c u r rí c ul os , t ai s como equip e s de tr a b a lh o
de de desig11, o n de o s estudantes es tavam engajado s em co nc eitu alizar p ossi- int erp ro fissio nais; atr av és de programas de ava liação. E stes p ro g ram as pr cci- 11 t ' ,,
b ilid ad es de mud an ça, utiliz ando im ag ina ção e fan tasia p ara criar uma n ova sam de um reforço ad icional atrav és d e uma exp o sição mais ampla em apr e ,, ' I
realidade. sen taço- es, p u bli caço- es, co b ertu ra p or te Ievisao
. - e cori t:rere. n cias.
, A'
cim a (I c 1.1Il I" , (U \\ \' ) \ 1
~r') '\ v
E s tas ár ea s de es tu d o en contraram eco em exem p los d e trab alho s ele s precisa m se r explicitamente en quadrad o s no currículo ofic ial. E s rlldo s l-O t\~ I-.
l~ realiz ado s no exter io r, é sig nifica tivo q ue n o s caso s em que h o u ve um d e co n str ução am bilentaI po deri enam se r m . eIUIíd os em p e Io m en o s trc. s :'I IT :I S: )\'fI \I )I l.
co nraro d e trabalho com coleg as d e o u t ro s p aíses tan to as id éias p ara não ap enas em ge ografia, ma s em ar te e design e design e tecn ologia. Pod('III" ~ ~I' N
.: . , estud o como o s m é to d o s de est u d o s de se n vol v id o s n esse país p u d eram de um a forma útil ado rar o con ceito do prati can te, on d e, a tra vés ele n:l'I" :;:1I1 I \'f \ c ( I
~O\fL se r tr ans fe rido s p ara o u tro s am b ien tes e d iver sas in stit uiçõ es c ult u rais. so bre nossa atuação e da sua avaliação, p o ssamos revisar, definir c rl't1 l'!i lli I l II' !\l'l\
l'A - E ntreta n t o, n u m e stud o q u e re alize i p a ra a U ne sco ,? em n o m e da So cie- n o sso tr abalho, dep ois inves tin do esta compreensão em futu ro s e01p n,(,ll' II ~ l' '' .\
d ad e Inte rn ac ional p ara E d u cação a t rav és d a A rte, e m 1983, fico u cl a ro men tos . De fo rma igu almen te freqü ente, o de senvolvimento de currícu lo. \ U ,If\
q u e co leg as no camp o do ensin o d a a r te em outro s países europe us de- requer no vo s relacionamen to s de trab alho, p eríodo de exp eriências, assl1111i I
. ram u m a ên fase mui to maio r à id entidad e cu ltural do q u e n ó s d am o s em risco s, qu estionam ento e reavaliação, e implica estar preparando p:lr:1 I r. il ':1
• ~ I estud o s qu e lig am a arte ao m eio ambiente . lhar em favo r d e e aceita r um in evi tável g rau de mudan ça.
O s mét o d o s d e estudo procu ra ram re sp o nde r a duas p ergun tas: Na maioria das vezes, os relacio nam ent o s e p ráticas dentro d:l:: ( ',( ( I

,co m o p o d emos ampliar a experiê n cia ambi ental d o s es tu d an t es? E co m o las tendem a enco rajar a co n solidação e tr abalh o na direção co n trá ria. Pr' ,
po demo s apro fu n da r su a compreen são d o m eio am b ien t e? A a rte t em fessores criativo s sempre se envolvem em experiên cias e in o va ç ões. 1::111 V:II
U)I~ '
questões p erman ecer em nível de aru açã o individual, a não se r qu e sua c xpc ric n ci.r ·;t j:1
tornad a acessível e di sse minada mais ampl amente. A questão ag or;) é 1(li 11:11
.. ADAMS, E., BERG, E. & MASO N, R. (Mai o de 1984) Edu cação artística e educação ambíent aJ. (Revisa -
do. ADAMS , Out.l 1984, 1996). UNESCO - Sociedade Intern acional para Educação através da Art e. no sso trab alh o conhecido e no ssa voz o uvida.

132 133
r óp ico s Ut Óp iCOS
A eco loq io da diversida de

Programa de cinco itens para arte e design 4. Treinamento de professores


em relaç ão ao estudo ambiental Es tão ocorrendo mu itas mudanças nas condições de treinament o do
pr ofessor de arte e designoTorna-se ne cessário colo car as questões ambientais
1. Atitude
de acordo com as várias exigências de professores e alunos. Torn a-se nec es-
Aqueles que estão envolvidos com ensino da arte e do design já viram que sário gerar e d esenvolver expe riências ade quadas , cursos e matérias que aju-
não faz sentido ficar escondendo-se sob a falsa segurança do estúdio de arte e dem os professores a lida r co m esta complexa e desafiado ra área d e estudos
deixar que qualquer um interfira na política escolar. As escolas são ago ra arenas qu e inte r-relaciona qu estõ es d e arte, design e edu cação am biental.
políticas, nas quais você, que qu er tomar uma posição positiva, briga por seu
espaço, justifica sua existência em condições que sejam aceitas e compreendidas 5. Col abo ração interprofissional na educação
por outras pessoas a fim de desempenh ar seu papel profissional. É preciso que D evemos esta r preparados para pedir ajuda e apoio para enri quecer e
os professores d e arte desenvolvam um autoconceito positivo. Professores en- am pliar o que os professor es podem realmente proporc ion ar, pa ra utilizar os
volvidos com esse ensino precisam reconhecer seu papel no contexto da educa- recurs os que uma variedade de entidades da comunidade o fere ce. O utro s
ção em geral. Es pecialmente com relação ao currículo oficial, nós temos que profi ssionais e entidades que não pertencem a escolas estão em mu itos caso s
aceitar nossas respo nsabilidade relativamente a "todos" os aluno s e reco nhece r a capaci tados e querend o dar assistê ncia, mas a iniciativa tem que pa rtir das
necessidade de cursos de artes e projetos que atenda m às necessidades de uma escolas, de form a que o trabal ho cooperativo seja dirigido para finalidades
diversidade de alunos. Os professores de arte e design precisam exemplificar o educativas.
modelo do bom aluno, ser curioso, querer aprender, saber com o aprender, valo- (Novembro de 1988)
rizar novas experiê ncias e idéias, desenvolver conceitos, ser capaz de pensar e de
agir. Isto é particularmente imp ortante com relação ao meio ambiente, onde a
única certeza que temos é a de mud ança.

2. Debate
Professor es de arte e design pr ecisam engajar-se no deba te sob re as-
suntos de estética, projeto e meio ambiente . Freqüentemente ou tras vozes
são ouvid as, e representa m difer entes co nju ntos de valo res qu e pode m
distorcer as men sagen s que as pessoas precisam ouvir. Falamo s levian a e
facilmente so b re exp ressão e comunicação. Pr ecisam os demon strar no ssa
proficiência nestes campos. Precisam os influ en ciar o pensam ento so bre o
currículo oficial. Pod em os fazê-lo co mo indivíduos, como m embro s de as-
sociações pro fissionais ou grupo s de int eresse especial.

3. Documentação e divulgação
Já é ba stante di fícil fazer o trabalho nas escolas sem ter ainda que
escrever so b re ele depois. Entretanto, se nós não documentarmo s no sso
trabalho de alguma forma e divulgarm o s os resultado s, ninguém ficará sa-
bend o o que estamos fazendo. O ato de reportar ao nosso trabalh o, d e analisá-
lo enc oraja um a tomada de posição crítica. Somo s capaz es de refletir so bre
nossa experiê ncia, de aprend er a partir dela e de co mpartilhá- la com ou tros,
d e forma qu e venham a apre nde r também .

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