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PESQUISA EM DEBATE
REVISTA ELETRÔNICA DO PROGRAMA INTERDISCIPLINAR EM EDUCAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO E COMUNICAÇÃO
ISSN 1808-978X
2005
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PESQUISAEMDEBATE
Revista eletrônica do Programa Interdisciplinar em Educação, Administração e Comunicação
Diretora da Revista: Prof.ª Dr.ª Anna Barros
Comissão editorial:
Carlos Felipe Moisés, Luiz Paulo Rouanet, Reynaldo Damazio, Rosemari Fagá Viegas
Conselho consultivo:
Alzira Lobo de Arruda Campos, Ana Mae Barbosa (USP), Carlos Elias Kater, Cidmar Theodoro
Pais (USP), Cléa Lebjman, Dilma de Melo e Silva (USP), Eduardo de Camargo Oliva, Fernando
Cilento Fittipaldi (SMA – Instituto Geológico), Gilbertto Prado (USP), Gilda Figueiredo Portugal
Gouvêa (Unicamp- Fecap), Hélio de Souza Santos, João Alexandre Barbosa (USP), João
Batista Brito (UFPB), Joaquim Antônio Severino (FEA – USP), José Americo Martelli Tristão,
Laima Mesgravis, Leda Tenório da Motta (PUC-SP), Leonel Mazzali, Liana Maria Sabino
Trindade, Lincoln Etchebèré Junior, Lúcia Santaella (PUC-SP), Luiz Fernando Santoro, Marcos
Antonio Lorieri (PUC- SP), Maria Esther Maciel (UFMG), Marília Gomes Ghizzi Godoy, Milton
Sogabe (Unesp), Paulo Sérgio Marchelli, Regina Silveira (USP), Sandra Farto Truffem, Saulo
César da Silva (Centro Universitário Álvares Penteado), Senira Annie Ferraz Fernandes
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Sumário
APRESENTAÇÃO • 5
ARTIGOS
Educação pelo diálogo, contribuições de Jürgen Habermas e Paulo Freire
Luiz Paulo Rouanet / Miriam de Cássia Valerio • 7
Public Choice
Joviniano José Rezende de Oliveira • 81
RESENHAS
MARINI, Marcos V. P. M. Administração Pública e Livre
Resenhistas: Rosimeri Ferraz Sabino / Floriano Barboza Silva • 113
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Apresentação
Este número, além dos habituais artigos e resenhas, traz um conte rendu de uma
experiência comunitária entre alunos e habitantes da aldeia indígena de Krucutu, dirigida
pela Profª. Dr.ª Marília Godoy, prêmio Unisol/Banco Real.
Apesar de Philadelpho Menezes ter se destacado tanto na área acadêmica quanto na produção de eventos
culturais-artísticos é importante lembrar que acima de tudo ele era poeta. Em 1980, com 20 anos de idade,
edita em produção independente seu primeiro livro de poemas “Quatro Achados Construídos”. Esta publicação
continha 4 poemas visuais impressos. “Máquina” é um deles. Anos depois, em 1998, adapta para uma
versão interativa do mesmo poema para CD-Rom : “Interpoesia”. Philadelpho ficou mais conhecido por sua
produção poética em mídias digitais e também como introdutor da chamada “Poesia Sonora” no Brasil,
através da sua pesquisa na Europa em 1990. Porém em sua trajetória, a Poesia Visual deu início ao percurso
de suas publicações nunca deixando de estar presente durante toda a criação de sua obra. “Máquina” já
apontava para o caminha que Philadelpho traçava em ultrapassar o espaço material do livro. “Intersígnos”,
projeto de curadoria realizado em 2 edições (Centro Cultural São Paulo e Paço das Artes) é o melhor exemplo
para se conhecer suas idéias no qual visualidade, sonoridade e poesia se mesclam formal e conceitualmente.
Resumo
Este texto elabora uma relação entre as idéias de Paulo Freire e Jürgen Habermas no que
se refere à importância do diálogo na prática educativa, em especial, na relação professor-
aluno. Procura, também, destacar a ação emancipadora da educação na visão desses
pensadores.
Palavras-chave: educação, diálogo, emancipação.
Abstract
We have elaborated a relation between Paulo Freire and J. Habermas’ ideas about the importance
of the dialogue in the educative praxis, specially, in the relationship teacher-student. We also
emphasized the educacion as emancipation from the points of view of tese thinkers.
Key-words: Education, Dialogue, Emancipation.
*
Mestre e Doutor em Filosofia pela USP. Leciona atualmente na Universidade São Marcos e na
PUC-Campinas.
**
Graduada em Ciências Sociais e aluna do Programa de Pós-Graduação em Educação,
Administração e Comunicação da Universidade São Marcos. Leciona na Rede Pública do
Município de São Paulo.
Aqui, o foco é a escola. É oportuno discutir como o espaço escolar e seus atores podem
participar da sociedade como agentes dinamizadores de novas relações entre os homens.
No entanto, uma rápida reflexão sobre a escola permite-nos situá-la como produto
das relações humanas e como tal seu entendimento só é possível a partir da compreensão
do contexto histórico social, econômico e político da sociedade em que ela está inserida.
O reconhecimento deste fato é necessário para compreendermos a dinâmica das relações
que ocorrem no interior da escola, uma vez que a forte racionalização da sociedade
capitalista encontra-se também no ambiente escolar.
Pretendemos elaborar essa discussão a partir das idéias de Jürgen Habermas e Paulo
Freire, uma vez que esses pensadores contribuem, guardadas as diferenças, para a análise
e crítica da escola como instituição e de forma mais ampla para o questionamento do
projeto de educação gestado no interior da sociedade capitalista.
Habermas defende que a sociedade é que deve criar suas próprias regras por meio
de um discurso não autoritário, através do qual os próprios cidadãos entram em acordo
sobre o que é ou não permitido.
1
BRONNER, Stephen Eric. Da Teoria Crítica e seus teóricos. Trad. de Tomás R. Bruno e Cristina
Maneguelo. Campinas, SP: Papirus, 1997, p. 349.
2
FREITAG, Bárbara. A questão da moralidade: da razão prática de Kant à ética discursiva de
Habermas. Tempo Social; Revista de Sociologia da USP. São Paulo: EDUSP, vol. 1, 2, p. 7-44,
2. sem. 1989.
Paulo Freire, segundo o professor Antonio Cândido, foi “um pensador atuante, que
fez da educação um instrumento humanizante de cunho ao mesmo tempo prático e
utópico”, pois via “na educação um conjunto de forças cujo alvo é a liberdade individual
e a transformação social”.3
Foi, então, um educador com uma prática crítica e fundamentada em ações éticas.
3
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
4
Cf. FREIRE. Op.cit., p. 77.
Em seus textos, Paulo Freire faz uso da dialética para criticar a alienação política,
social e econômica, avaliando suas conseqüências sociais, políticas e pedagógicas nas
diversas formas de relações entre os seres humanos.
O “método” tem como princípio partir da realidade do educando através de sua própria
fala e no diálogo reflexivo com outros sujeitos e a realidade que os cerca construir uma nova
realidade social. Desde o início de seus escritos Paulo Freire defende que o educando é sujeito
e não objeto de educação, portanto, capaz de refletir e responder aos desafios do mundo.
Paulo Freire fundamenta, assim, uma nova concepção de relação pedagógica que
não é apenas transmissão de conteúdos, é antes o estabelecimento do diálogo, é um
5
GADOTTI, Moacir. Paulo Freire:uma biobibliografia. São Paulo: Cortez, IPF; Brasília: UNESCO,
1996, p.70
6
Cf. FREIRE. Op.cit., p.77
Considerações Finais
Diante do exposto, é possível notar que Habermas e Freire podem nortear, através
da dialogicidade, uma proposta pedagógica que responda às necessidades da sociedade
contemporânea.
Para Paulo Freire é com a pedagogia dialógica que se supera a dominação e se instaura
a consciência crítica que fundamenta uma sociedade democrática e ética.
Habermas, por sua vez, vê a escola como uma instância social em que confluem a
racionalidade instrumental e a racionalidade comunicativa. Sua preocupação pedagógica,
então, consiste na possibilidade da conexão entre ambas a partir da ação dialógica entre
os sujeitos na construção de um entendimento capaz de normatizar os processos da vida
social de forma livre, emancipadora e ética.
7
Ibidem, p.68.
Nota: os autores agradecem a colaboração da Prof.a Maria Teresa Baiochi Romano na elaboração
do abstract.
Referências Bibliográficas
BRONNER, Stephen Eric. Da teoria crítica e seus teóricos. Trad. De Tomás R. Bruno e
Cristina Maneguelo. Campinas, São Paulo: Papirus, 1997.
FREITAG, Bárbara e ROUANET, Sérgio P. Habermas. Col. Grandes Cientistas Sociais. São
Paulo: Ática, 1993.
GADOTTI, Moacir. (org). Paulo Freire: uma biobibliografia. São Paulo: Cortez, IPF Brasília:
UNESCO, 1996.
Resumo
O presente artigo aponta e discute de forma crítica alguns aspectos relevantes que dizem
respeito à gestão de políticas públicas no Brasil, sinalizando pistas para um modelo adequado
às nossas especificidades históricas, sociais e culturais. Foram desenvolvidos três núcleos
basilares: o político-econômico, o conceito de desenvolvimento inclusivo e os modelos
gerencias. Os debates ideológicos vinculados à democracia liberal e ao socialismo estatal
foram insuficientes, na prática, para evitar os problemas sociais que entravam o
desenvolvimento do país. As políticas públicas de cunho universalista têm engendrado um
sofisma que não rompe com a histórica assimetria social brasileira. Por outro lado, o focalismo
não constitui um antídoto eficaz para o veneno da exclusão social no Brasil. O presente
artigo sugere uma estratégia menos óbvia para o desenvolvimento inclusivo: universalização
com foco, processo que resulta na Tecnologia da Inclusão (T. In.). Esta construção se revela
adequada para enfrentar as especificidades identificadas no estudo. Trata-se de um modelo
inovador que decifra a cultura de exclusão desenvolvida no país.
Palavras-chave: Políticas de inclusão, desenvolvimento socioeconômico, tecnologia da
inclusão, administração de políticas públicas.
Abstract
This work studies the management of inclusion public politics in Brazil, signaling an adequate
model to our historical, social and cultural aspects. Three fundamental nuclei had been
developed: the politician-economic, the concept of inclusive development and the public politics
manage models. In Brazil, the ideological debates tied with the liberal democracy and the
state socialism had been insufficient to prevent the social problems that entered the development
*
Professor do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Educação, Comunicação e
Administração da Universidade São Marcos.
**
Professor do Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Educação, Comunicação e
Administração da Universidade São Marcos.
of the country. The public politics of universal type have produced a sophism that does not
breach with the historical Brazilian social asymmetry. The present article suggests a less
common strategy for the inclusive development: universality with focus, process that results
in the Technology of the Inclusion (T. In.). This construction discloses adequate to face the
specific aspects identified in the study. The work shows that the technology of the inclusion is
an innovative model that deciphers the culture of exclusion developed in the country.
Keywords: Politics of inclusion, social and economic development, technology of the inclusion,
public politics administration.
Introdução
1
CASTOR, Belmiro V. J. Fundamentos para um novo modelo do setor público no Brasil. In:
Revista de Administração Pública. Rio de Janeiro, 1994, p. 155-61.
FELIX, Luiz A. Instrumentos inovadores em gestão pública: um estudo exploratório. Tese de
Doutorado. Universidade de São Paulo, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade.
São Paulo, 1999.
BEZERRA FILHO, João E. Modelo conceitual de decisão e apuração de resultados: uma
contribuição para a avaliação da eficiência e eficácia na gestão dos recursos públicos.
Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo, Faculdade de Economia, Administração
e Contabilidade. São Paulo, 2002.
2
PNAD. Pesquisa nacional por amostra de domicílios, 1999.
3
SANTOS, Helio. A busca de um caminho para o Brasil: a trilha do círculo vicioso. São Paulo:
SENAC, 2001.
4
HENRIQUES, Ricardo. Desigualdade racial no Brasil: evolução das condições de vida na década
de 90. In: Ipea: Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada. Rio de Janeiro: IPEA, 2001
(Texto para discussão, 807).
5
SANTOS, Helio, op. cit.
Esta primeira seção tem como objetivo discutir o conceito de tecnologia no âmbito da
economia política e apresentar as principais formulações que circunscrevem o domínio
das políticas públicas como fator de mudança social. Os debates puramente ideológicos
que caracterizaram o pensamento político brasileiro ao longo do século XX, baseados nas
fórmulas econômicas abstratas das vertentes da democracia liberal e do socialismo estatal,
não puderam evitar, na prática, os problemas sociais que são considerados hoje o principal
entrave para o desenvolvimento do país. Trata-se da profunda cisão entre os mais ricos
e pobres presente na nossa estrutura social e econômica, conformada historicamente
pela falta quase absoluta de mecanismos que contemplem, independentemente da posição
ideológica das lideranças políticas, o fenômeno organizacional da sociedade em termos
do desenvolvimento de processos de gestão pública metodologicamente organizados. Os
problemas gerados pela insipiente interpretação do nosso processo de evolução histórica
e econômica, bem como as práticas políticas apresentadas, do ponto de vista da gestão
pública, pela nossa tênue conjuntura organizacional, produziram, no Brasil contemporâneo,
o que pode ser entendido como a dialética da exclusão.
6
FELIX, Luiz A, op. cit., p. 132.
SANTOS, Helio. Teoria do círculo vicioso. In: São Paulo em perspectiva. São Paulo: Fundação
Seade, 1994.
Conforme explica Furtado 7, mesmo nas ciências sociais, que em seu esforço de
elaboração teórica nos últimos decênios construiu “[...] modelos capazes de proporcionar
uma percepção totalizante dos processos históricos [...]”, produziu-se nada mais do que
apenas “[...] um amplo reencontro com os elementos básicos do pensamento dialético, na
forma como este foi desenvolvido por Marx”. A falência econômica dos regimes totalitários
que implantaram o socialismo de Estado, fechando-se para o capitalismo baseado na livre
concorrência, mostra como a prática política com base no marxismo foi nada mais do que
uma ficção histórica. Por outro lado, os governos de direita do mundo todo, que nunca
estiveram tão fortes como hoje, depois da queda do socialismo, começaram a praticar
como princípio básico da doutrina capitalista neoliberal uma férrea disciplina orçamentária,
que incidiu sobre os gastos com o bem-estar social, reduzindo-os sistematicamente, bem
como uma política econômica de desemprego visando à quebra dos sindicatos dos
assalariados por meio da ampliação do exército de reserva dos trabalhadores:
[...] reformas fiscais eram imprescindíveis, para incentivar os agentes econômicos. Em outras
palavras, isso significava reduções de impostos sobre os rendimentos mais altos e sobre as
rendas. Desta forma, uma nova e saudável desigualdade iria voltar a dinamizar as economias
avançadas, então às voltas com uma estagflação, resultado direto dos legados combinados de
Keynes e de Beveridge, ou seja, a intervenção anticíclica e a redistribuição social, as quais
haviam tão desastrosamente deformado o curso normal da acumulação e do livre mercado. 8
Iniciamos, dessa forma, com uma reflexão sobre a teoria do desenvolvimento social
do ponto de vista das metodologias sistêmicas de cunho tecnológico, que estão
reformulando as bases da economia política contemporânea e com a conceituação das
políticas públicas enquanto instrumentos presentes na práxis do planejamento econômico.
7
FURTADO, Celso. Dialética do desenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1964. p. 17.
8
ANDERSON, Perry. Balanço do neoliberalismo. In: SADER, Emir; GENTILI, Pablo (orgs.). Pós-
neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. 5.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
2000, p. 9-23.
da economia política de base antropológica fez com que aparecesse um interesse crescente
pela cultura que, transmitida ao longo do processo histórico, determinou a distinção e a
interdependência entre os elementos materiais e não-materiais socialmente integrados
no desenvolvimento econômico. Dessa forma, a antropologia e a sociologia passaram a
fazer parte da teoria econômica, de modo a explicar como o funcionamento dinâmico da
história é pautado pelas formas culturais que podem acelerar ou retardar o progresso
implícito nas transformações sociais. A percepção da dependência recíproca entre história,
economia e cultura levou à compreensão de como os sistemas de equilíbrio que atuam
na determinação dos comportamentos inibem os conflitos sociais. Além disso, as inovações
culturais não produzem necessariamente, no conjunto, resultados que caminham no
sentido da geração do progresso econômico. Ao se traduzirem em aumento na oferta de
bens e serviços à disposição da coletividade, as transformações determinam a liberação
de mão-de-obra de uns setores e sua absorção em outros, esperando-se repercussões
singulares não previsíveis. Pode ocorrer, porém, que as inovações introduzidas não
provoquem modificações definitivas no equilíbrio social, sendo portanto absorvidas.
Com efeito, cabe definir o desenvolvimento econômico como um processo de mudança social pelo
qual um número crescente de necessidades humanas – preexistentes ou criadas pela própria
mudança – são satisfeitas através de uma diferenciação no sistema produtivo decorrente da
introdução de inovações tecnológicas. O avanço da ciência desempenha papel estratégico nesse
processo, pois dele emanam as inovações tecnológicas. Mas, como o avanço da ciência está
inter-relacionado com o desenvolvimento econômico, isto é, com a maior abundância de bens e
serviços, é perfeitamente concebível que, em determinadas circunstâncias históricas – como
ocorre no presente – se criem condições para o avanço progressivo da ciência, com perspectivas
sempre renovadas para o desenvolvimento econômico de uma determinada sociedade.9
9
FURTADO, Celso, op. cit., p. 27, grifos do autor.
Enquanto que para a dialética o conceito de tecnologia não pode ser captado porque
não está presente no todo de um fenômeno, pertencendo às suas partes constituintes,
que não podem ser concebidas de imediato, para a visão da ciência é no todo, que vem
depois da análise das partes, onde a tecnologia se situa, funcionando como a síntese
sistêmica do processo de conhecimento. Dessa forma, a interpretação do lugar da
tecnologia na economia se constitui como um problema que resulta da antinomia teórica
entre o método dialético e o da ciência convencional. Isso fez com que a política econômica
clássica falhasse na tentativa de formular um conceito de tecnologia baseado em princípios
universais de conhecimento, como ela apregoa que devem ser suas regras.
[...] as inovações tecnológicas põem em marcha uma série de reações que passam a
reproduzir-se ad infinitum: causam um aumento na produtividade média do sistema, que
por sua vez causa maior disponibilidade de bens e serviços, que por sua vez causa maior
impulso ao desenvolvimento científico, que por sua vez causa novos avanços tecnológicos.
Desta forma, por mais que tenhamos avançado na construção de modelos, cabe reconhecer
que sempre partimos para sua construção de algumas hipóteses intuitivas sobre o
comportamento do processo histórico como um todo. [...] Uma hipótese simplificadora como
a que formulou Marx, grupando os elementos que compõem a estrutura social em infra-
estruturais (relacionados com o processo produtivo) e superestruturais (valores ideológicos)
teve extraordinária importância como ponto de partida para o estudo da dinâmica social. Até
o momento presente essa hipótese não foi substituída por outra de maior eficácia explicativa,
ao nível de generalidade a que foi formulada. Contudo, é necessário reconhecer que a esse
nível de generalidade quase nenhum valor apresenta um modelo analítico como instrumento
de orientação prática. E o objetivo da ciência é produzir guias para a ação prática.10
São três os níveis de investigação abordados pela ciência política clássica: em primeiro
lugar tem-se o conhecimento sistêmico que se destina a responder perguntas sobre
como um governo pode propiciar a felicidade dos cidadãos; em segundo lugar surge um
nível de análise funcional, quando se questionam sobre os mecanismos institucionais de
poder, as leis, as forças políticas que os processos decisórios engendram etc; e, por
10
Ibidem, p. 21-2.
último, vem a avaliação dos resultados que determinado programa político produz. As
investigações se dão mediante a hipótese de que na política há leis e princípios de
regulação, de forma que o resultado dos conteúdos dos programas sistêmicos dos
governos, os processos funcionais das instituições e os resultados dos projetos políticos
podem ser previstos a partir de estruturações logicamente imaginadas pelo investigador.
No Brasil, estudos sobre políticas públicas foram realizados só recentemente. Nesses estudos,
ainda esporádicos, deu-se ênfase ou à análise das estruturas e instituições ou à caracterização
dos processos de negociação das políticas setoriais específicas. Deve-se atentar para o fato
de que programas ou políticas setoriais foram examinados com respeito a seus efeitos e que
esses estudos foram antes de mais nada de natureza descritiva com graus de complexidade
analítica e metodológica bastante distintos. Predominam “microabordagens” contextualizadas,
porém dissociadas dos macroprocessos ou ainda restritas a um único “approach” e limitadas
no tempo. Normalmente, tais estudos carecem de um embasamento teórico que deve ser
considerado um pressuposto para que se possa chegar a um maior grau de generalização
dos resultados adquiridos. 11
11
FREY, Klaus. Políticas públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à prática da
análise de políticas públicas no Brasil. In: Planejamento e políticas públicas. nº 21, jun.
2000, p. 211-59. p. 214-5.
A policy arena e a policy cicle são categorias de análise criadas no âmbito do esforço
destinado à superação das dificuldades teóricas do enfoque sobre o objeto político. No
entanto, as quatro formas de política definida pela primeira e as três fases do ciclo
12
Ibidem, p. 220-1.
13
Ibidem, p. 223-4.
14
Ibidem, p. 227-8, grifos do autor.
político da outra, constituem, na verdade, um conjunto de objetos que pela sua estrutura
lógica devem ser considerados em duas classes muito mais simples e completamente
diferentes, ou seja: (1) quanto à sua função dentro do espaço social as políticas públicas
podem ser distributivas ou redistributivas; e, (2) quanto à sua temporalidade implícita
as políticas públicas apresentam uma fase constitutiva (elaboração e regulamentação) e
uma fase de implementação (implementação propriamente dita e avaliação).
O principal problema das forças organizadas fora da esfera institucional é que elas
pouca ou quase nenhuma pressão exercem sobre os componentes sistêmicos e funcionais
da organização política, possuindo essencialmente poderes consultivos e, em alguns casos,
administrativos. Mas é assim que se constituem as novas tecnologias políticas, ou seja,
para os mecanismos neo-institucionais ganharem força dentro da esfera sistêmica e
funcional do aparelho do Estado, elas têm necessidade de agregar valores estratégicos
concretizados por ações de grande exatidão metodológica, substancialmente reguladas
pelas tecnologias de base que alicerçam a cultura material da sociedade.
15
Ibidem, p. 232.
atores políticos singulares como essenciais para compreender melhor o processo político,
que, por sua vez – eis um pressuposto central dessa abordagem –, repercute na qualidade
dos programas e projetos elaborados e implementados”. Essa análise enfoca, por exemplo,
a influência de comportamentos do tipo clientelista, paternalista ou corrupto na geração
de tensões responsáveis por rupturas e mudanças do processo político. Trata-se do enfoque
sobre os valores, idéias, sentimentos, orientações e atitudes predominantes na sociedade
que definem a “cultura política”. Os tipos de cultura política existente caracterizam as
diferentes fases de modernização e de desenvolvimento das sociedades: “na cultura
‘paroquial’ não existe ainda uma visão política sistêmica; na ‘cultura de súditos’, a
população desempenha um papel passivo e se mostra apenas interessada nos resultados
da política; enquanto que na ‘cultura de participação’ ela interfere de forma ativa nos
acontecimentos políticos”16.
2. Desenvolvimento Inclusivo
É fundamental para o propósito desse trabalho conceituar o que vem a ser inclusão;
o que significa essa idéia-possiblidade no Brasil. O conceito trabalha com o pressuposto
de que há excluídos. Assim, preliminarmente, há que focalizar a exclusão e suas
conseqüências. “A exclusão não é uma gradação da iniqüidade, mas trata-se de um
mecanismo que retira as pessoas do eixo social central”.17 Assim, podemos entender a
exclusão como sendo a ausência dos componentes essenciais à cidadania, em que se
16
Ibidem, p. 235-7.
17
FELIX, Luiz A., op. cit., p. 60.
18
UNICEF. Relatório de 1999 do Fundo das Nações Unidas para a Infância.
19
SANTOS, Helio. A busca de um caminho para o Brasil: a trilha do círculo vicioso. op. cit.,
p. 394.
20
FELIX, Luiz A., op. cit., p. 61.
21
EASTERLY, The Elusive Quest for Growth-Economist’s Adventures and Misadventures in the
Tropics. In GASPARI, Elio. 50 anos de fracassos das ekipekonômicas. Folha de São Paulo,
14.10.2001.
22
GIDDENS, Anthony. The third way: the renewal of science democracy. In: Polity Press. U.K.,
1998. Extrato publicado no The Observer, ed. 13/set/1998. Disponível em: <http://
www.iww.ca/news/iwwnews00329.html>. Acesso em: 28/abr/2003.
23
REDDIN, Willian J. O que é eficácia gerencial. São Paulo: Atlas, 1977.
As políticas universalistas no Brasil vêm tendo sua eficácia e efetividade cada vez
mais contestadas. Santos 24 , todavia, sugere entremear a utilização dos modelos
universalista e focalista no sentido de se obter maior eficácia das políticas sociais. Fala-
se ainda na inversão de posições, em que o cidadão-cliente, que paga pelos serviços
públicos, além de mal atendido, acaba obtendo-os como se fosse merecedor de um favor.25
A parcela da população que se utiliza dos serviços universalizados – sobretudo os referentes
à escola fundamental, serviços de saúde e previdência social – é a mais pobre. Mesmo a
classe média baixa vem se utilizando da escola fundamental particular bem como dos
planos privados de saúde. Por razões históricas e culturais, crê-se que os subcidadãos do
Brasil não desenvolvido e pobre são maltratáveis; daí aquele cacoete inversivo. As classes
médias e ricas não se utilizam há muito tempo daqueles serviços; classificados de forma
categórica como sucateados e insuficientes. O afastamento das classes abastadas, que
dispõem de maior força de pressão, dos serviços públicos fundamentais, fez com que
estes se deteriorassem mais ainda – agora com menos chances de cura.
Por outro lado, segundo Dowbor 26, no Brasil cerca de 25% do PIB são despendidos
com a área social. Apesar desse montante ser superior ao de outros países em
desenvolvimento, os principais indicadores sociais – mortalidade infantil, qualidade do
ensino fundamental, condições habitacionais – são renitentemente baixos. Esse panorama
das políticas públicas no Brasil se enquadra no que Dowbor denominou “[...] cultura
administrativa herdada pela nação”27. Trata-se de um poderoso ingrediente da nossa
cultura de desenvolvimento a qual se especializou em excluir com zelo ibérico.
24
SANTOS, Helio. A busca de um caminho para o Brasil: a trilha do círculo vicioso. op. cit., p. 315.
25
BASTO Luiz E. et al. Organizações públicas brasileiras: a busca da eficiência, da eficácia ou da
efetividade? In: Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, out./dez. 1993, p.142-6.
26
DOWBOR, Ladislau. Governabilidade e descentralização. In: Revista do Serviço Público. Brasilia,
jan./jul. 1994, p. 95-117.
27
Ibidem, p. 95.
Halpern 28, ao debater a terceira via, adverte que ao propiciar maior inclusão social
poderiam advir impasses de natureza política. Isso se daria em função de uma
redistribuição da riqueza além dos limites aceitos pela sociedade. Essa advertência pode
fazer sentido na rica Europa unificada, onde os espaços estão demarcados. Todavia, no
Brasil, a exuberante capacidade ociosa existente – tanto de recursos materiais, quanto
humanos – não induz a esse entendimento. Não se trata, portanto, de uma equação de
soma zero, na qual os ganhos de alguns implicam nas perdas de outros. Se está diante
da reconhecida dificuldade nacional em promover políticas que incluem; que alberguem
setores da população historicamente fora da cidadania plena. Aqui, não é uma inferência
ideológica supor que tais políticas não surtem êxito por motivos de natureza
comportamental da sociedade. Há – sim – tecnalidades avulsas a serem consideradas.
Todavia, diversos estudos identificam óbices na cultura brasileira de desenvolvimento
para potencializar determinados setores da população.29
28
HALPERN, David. The third way: Summary of NEXUS on-line discussion, Cambridge University,
1998. Disponível em: <http://www.netnexus.org/library/papers/3way.html>. Acesso em:
28/abr/2003.
29
FERNANDES, Florestan; BASTIDE, Roger. Negros e brancos em São Paulo. São Paulo:
Nacional, 1959.
SANTOS, Helio. A busca de um caminho para o Brasil: a trilha do círculo vicioso. op. cit.
HENRIQUES, Ricardo, op. cit.
30
BIRDSALL, Nancy. Apud RICUPERO, Rubens. Folha de São Paulo, 24. out.1998.
31
SANTOS, Helio. A busca de um caminho para o Brasil: a trilha do círculo vicioso. op. cit.,
p. 398.
32
FURTADO, Celso, op.cit.
vivida até aqui pelo país. Para a montagem desse modelo, além do Estado, dois setores
têm papel crucial: a academia e o mundo empresarial. O primeiro, pesquisando e
apresentando construtos adequados nas diversas áreas fundamentais para a cidadania:
economia, educação, trabalho, saúde – notadamente no campo da medicina preventiva –
, engenharia civil e sanitária, arquitetura, psicologia social e cultura. Quanto ao mundo
artístico-cultural, requer-se uma consistente invasão cultural à periferia, onde há que se
focalizar nas crianças e sobretudo na adolescência de risco. No campo do trabalho, onde
a escassez de oportunidades não se resolve apenas com a capacitação, o associativismo
e o cooperativismo emergem como parte importante da solução do desemprego estrutural
que assola o grupo mais pobre da população. Ao setor empresarial cabe efetivar
materialmente as idéias desenvolvidas pelos cientistas. A gerência profissional do plano
que viabiliza a cidadania integral não pode se submeter aos governos – partidários e
partidarizados – que dão plantões de 4 ou 8 anos. A logística do país, que agrega mais de
5000 municípios distribuídos numa extensão continental, é bem conhecida pelas forças
armadas – instituição que vem sendo reiteradamente convocada a cumprir o papel que
caberia às polícias, dado o descalabro urbano abastecido por uma violência endêmica e
incontrolável pelos governos estaduais. O desenvolvimento de uma logística que refine
melhor o quadro geográfico-social deve ser elaborado pela Fundação IBGE em parceria
com as forças armadas. Em consonância com o foco desse artigo, o secretário-executivo
do Ministério da Ciência e Tecnologia informa que naquele órgão acaba de ser criada uma
Secretaria de Inclusão Social 33, providência reclamada por Santos34. Dado o caráter
estratégico que tem o projeto de inclusão sinalizado nesse artigo, requer-se para o mesmo
uma gestão profissional que transcenda aos interesses provisórios de curto prazo. As
políticas de saúde e o ensino fundamental, universalizados pela Constituição, não só
devem ser mantidos como melhorados. A qualidade de ambos deve ser um dos focos
mais centrais da T. In. O ensino universitário público e gratuito deve abranger
preferencialmente alunos vindos da rede pública de ensino a qual deve ser restaurada
face ao abandono a que foi relegada nas últimas décadas. Universalizar com foco é
buscar a excelência dos serviços públicos já ofertados à população excluída. É cumprir o
caminho inverso do que vem sendo feito desde tempos imemoriais. Para tanto, Santos
propõe as Políticas Públicas de Inclusão (PMIs) que:
33
SOUZA, Wanderley. Ciência e tecnologia para todos. Folha de São Paulo. São Paulo, 22 abr.
2003. Caderno A, p.3.
34
SANTOS, Helio. A busca de um caminho para o Brasil: a trilha do círculo vicioso. op. cit., p. 398.
[...] são ações do setor público articuladas no sentido de promover grupos e populações
inteiras para a cidadania plena. Seja pela capacitação e pelo trabalho, seja pela recuperação
de áreas degradadas. Tudo com muito esmero. 35
A T. In. não deve ser inovadora e modernizadora apenas em seus aspetos operacionais.
O modelo requer inflexão semelhante no que diz respeito à democratização das decisões:
sob gestão profissional do Governo Federal e com a ajuda da academia e do setor
empresarial, as ações desenvolvidas devem ter na sociedade civil o termômetro que
afere o rigor do cumprimento das metas.
35
Ibidem, p. 400.
36
BRASIL. Lei Federal n.º 4.320, de 17 de março de 1964. Estatui normas gerais de direito
financeiro para elaboração dos orçamentos e balanço da União, dos estados, dos municípios
e do distrito federal.
ele anexadas sob a forma de patrimônio público. Nem sequer há controle de ativos fixos
no modelo contábil da União, pois este conceito não se aplica às instituições
governamentais que não podem ter “fins lucrativos”.
37
BEZERRA FILHO, João E. Modelo conceitual de decisão e apuração de resultados: uma
contribuição para a avaliação da eficiência e eficácia na gestão dos recursos públicos.
Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo, Faculdade de Economia, Administração
e Contabilidade. São Paulo, 2002. p. 42.
38
MENDES, Eugênio V. O sistema único de saúde: um processo social em construção. Disponível
em: <http://www.opas.org.br/rh/publicacoes/textos_apoio/pub04U1T1.pdf>. Acesso:
28.abr.2002.
[...] o subsistema físico pode ser caracterizado como o hardware da entidade, composto de
todos os elementos concretos e palpáveis, com exceção das pessoas. [...] No ambiente
interno, o subsistema físico-operacional formata as atividades fins e de apoio, por meio da
estrutura funcional, e, no ambiente externo, delineia as relações com os entes próximos. É
no subsistema operacional que são processadas as transações, os eventos, as atividades e
os programas, [...] produzindo impacto predefinido na estrutura patrimonial da entidade e
principalmente em benefícios diretos ou indiretos à sociedade, tendo, assim, sempre uma
formatação contábil. 39
O hardware e o software não podem ser pensados separadamente dentro das novas
concepções sistêmicas, mesmo que se trate puramente de operações contábeis. Quando
se torna necessário interpor à análise elementos relacionais do ambiente institucional
externo, como o caso das entidades políticas representadas no contexto neo-institucional
do sistema, a necessidade de uma tecnologia política ampla se torna ainda mais premente.
Dessa forma, os modelos gerenciais das políticas públicas no Brasil ainda se encontram
em sua fase inicial de elaboração.
Considerações finais
Por outro lado, não resiste mais o anacrônico argumento segundo o qual as mudanças
sociais mais impactantes na sociedade brasileira – aquelas que propiciam maior inclusão
– dependem apenas de vontade política com o subsequente recurso financeiro. Sem
dúvida, para que a inclusão se efetive há que se ter foco no grupo subcidadão; o que
significa uma vontade política bem definida. Há que se ter ainda vínculo orçamentário e
dinheiro. Todavia, vez por outra, essas duas variáveis têm estado juntas sem que algo
luminoso e transformador consiga romper a persistente e dramática assimetria social do
país. Nossas especificidades, que tornam mais complexas as dificuldades – como aquelas
de fundamento histórico enfrentadas pela população negro-descendente e indígena -,
bem como o tamanho do fosso social que aparta da cidadania plena significativa parcela
da população, e, considerando ainda a violência das cidades, alimentadas por uma
39
BEZERRA FILHO, João, op. cit. p. 49.
Santos40 desenvolve a Teoria do Círculo Vicioso para estudar a saga dos 45% de
pretos e pardos constatados no Brasil pelo Censo de 2000. Observa naquele estudo que
as dificuldades enfrentadas pelos negro-descendentes retroalimentam os preconconceitos
engendrados pela sociedade contra o grupo. Castor41, fazendo outro tipo de estudo, ao
analisar as dificuldades da administração pública brasileira, observa de maneira semelhante
a Santos, a existência de “[...] um efeito circular em que causa e a conseqüência se
confundem”. Ambos , ao estudarem coisas diferentes, mas que se assemelham, flagram
problemas que prejudicam – quando não impedem – a cidadania. É nesse quadro de
ambigüidades que se impõe a utilização de um modelo mais articulado e inovador, capaz
de decifrar as especificidades da cultura de exclusão desenvolvida no país. Esta cultura
simula com extrema eficácia um efeito particularmente perverso: os próprios excluídos
são responsabilizados pela sua subcidadania, quando em realidade são vítimas de uma
incúria político-administrativa secular.
40
SANTOS, Helio. A busca de um caminho para o Brasil: a trilha do círculo vicioso. op. cit., p. 176.
41
CASTOR, Belmiro V. J. op. cit., p. 156.
Referências bibliográficas
ANDERSON, Perry. Balanço do neoliberalismo. In: SADER, Emir; GENTILI, Pablo (orgs.).
Pós-neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. 5. ed. Rio de Janeiro:
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BRASIL. Lei Federal n.º 4.320, de 17 de março de 1964. Estatui normas gerais de direito
financeiro para elaboração dos orçamentos e balanço da União, dos estados, dos municípios
e do distrito federal.
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Revista de Administração Pública. Rio de Janeiro, 1994, p.155-61.
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Nacional, 1959.
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University, 1998. Disponível em: <http://www.netnexus.org/library/papers/3way.html>.
Acesso em: 28.abr.2003.
SANTOS Helio. Teoria do círculo vicioso. In: São Paulo em perspectiva. São Paulo: Fundação
Seade, 1994.
SANTOS, Helio. A busca de um caminho para o Brasil: a trilha do círculo vicioso. São
Paulo: SENAC, 2001.
SOUZA, Wanderley. Ciência e tecnologia para todos. Folha de São Paulo. São Paulo,
22.abr.2003, Caderno A, p.3.
Cleide Bernardes
Resumo
Neste trabalho, nos ateremos à concepção de universalidade adotada por Singer para a
elaboração de uma ética utilitarista consequencialista. Teremos como referencial teórico as
obras de Peter Singer, principalmente Ética Prática (2002) e Libertação Animal (2004). A
obra Ética Prática apresenta a proposta de Singer para se pensar as questões éticas levantadas
e a solução possível indicada pelo autor por meio do estabelecimento do princípio de igual
consideração de interesses. A obra Libertação Animal, publicada pela primeira vez em 1975,
trata dos direitos dos animais sob a perspectiva singeriana. Singer, embora não adote o
princípio kantiano do imperativo categórico tido como referência de uma moral deontológica,
também apresenta uma visão universal de ética, própria da tradição filosófica.
Palavras-chave: ética, universalidade, interesses, filosofia.
Abstract
This work aims to consider the conception of universality built by Singer for the elaboration
of an utilitarian and consequential ethic. We have as a theoretical reference the Peter Singer’s
work, mainly The Practical Ethics (2002) and The Animal Liberation (2004). The Pratical
Ethics presents the Singer’s proposal to the ethic questions and the possible solution indicated
by the author who settle the principle of equal consideration of interests. The Animal Liberation,
published for the first time at 1975, speaks of the animal rights in a Singer’s perspective.
The author doesn’t agree with the Kent’s principle of the imperative and categoric that is a
strong reference of a deontological moral, however, Singer also presents an universal view
of ethic, proper of the philosophic tradition.
Key-words: ethics, universality, interests, philosophy.
o gênero humano está sob o domínio de dois senhores soberanos: a dor e o prazer, e somente
a eles compete apontar o que devemos fazer e determinar o que faremos. A esses dois
senhores, está vinculada por uma parte, a norma que distingue o que é reto do que é errado,
e por outra, a cadeia das causas e dos efeitos.3
Bentham, considerou adequado mudar o termo utilidade para felicidade, por achar
que este estava mais próximo da idéia de prazer e dor, sendo o termo utilidade pouco
aceito na época. 4 Com o princípio de utilidade, pretende estabelecer a norma do certo e
do errado através do número de interesses afetados, norma esta que regulamentará as
ações na medida em que estas tendem a aumentar ou diminuir a felicidade da pessoa
cujo interesse está em jogo.
1
BENTHAM, J. Uma introdução aos princípios da moral e da legislação.São Paulo: Abril,
1974, p. 8.
2
Esta renomeação ocorre em uma nota de 1822, onde Bentham escreve: “o princípio que
estabelece a maior felicidade daqueles cujo interesse está em seu jogo, como sendo a justa
e adequada finalidade da ação humana, e até a única finalidade justa, adequada e
universalmente desejável em qualquer situação ou estado de vida.” (Bentham 1974, p 9.)
3
Idem.
4
A palavra utilidade não ressalta as idéias de prazer e dor com tanta clareza quanto o termo
felicidade (happiness, felicity); tampouco o termo nos leva a considerar o número dos interesses
afetados; número este que constitui a circunstância que contribui na maior proporção para
formar a norma em questão – a norma do reto e do errado, a única que pode capacitar-nos
a julgar da retidão da conduta humana, em qualquer situação que seja. (Bentham, Uma
introdução aos princípios da moral e da legislação. São Paulo: Abril, 1974, p. 9).
O termo utilidade significa aqui uma propriedade em virtude da qual um objeto tende
a proporcionar beneficio, vantagem, prazer, bem ou felicidade de uma pessoa ou de um
grupo específico ou impedir que aconteça o dano, a dor, o mal ou a infelicidade das partes
interessadas. Para isto, deve-se considerar o interesse de cada um separadamente, pois,
para Bentham, o conceito de comunidade é fictício, já que esta é composta de indivíduos.
Da exposição acima, temos que o princípio de utilidade é mais verbal do que real, o
que indica a necessidade de se examinar as ações humanas e fazer uma análise da sua
utilidade e dos seus efeitos para o indivíduo em si e para a comunidade. Para contestá-
lo será necessário recorrer ao próprio princípio, como nesta objeção: “o princípio da
utilidade é um princípio perigoso; em certas ocasiões é perigoso consultá-lo. Isto equivale
a dizer que não é condizente à utilidade consultar a utilidade.”5
Bentham justifica seu princípio de utilidade como um instrumento que irá regulamentar
as ações humanas através da razão e da lei, buscando a satisfação dos interesses de todos
os envolvidos de forma justa, em qualquer situação ou estado de vida. O único fundamento
válido da ação humana é, em última análise, a consideração da utilidade. Se esta for
comprovada e aprovada em um determinado caso, sê-lo-á em todos os outros casos
semelhantes. Esta arte de dirigir as próprias ações levando em consideração o interesse de
outros, refere-se não apenas a outros seres humanos, mas a outros agentes que estão sob
a influência do mando humano e são também suscetíveis ao prazer e a dor: os animais.
5
No original: “That is not consonant to utility, to consult utility: in short, that it is not consulting
it, to consult it.” (Idem).
Isto indica que, embora exista uma espécie de consenso acerca desta igualdade, sua
fundamentação ética não parece clara. Todavia, as diferenças entre os seres humanos
remetem a uma grande variedade de características que devem ser consideradas ao se
estabelecer o princípio de igualdade.
Para Singer, existe uma abordagem sempre válida da ética que praticamente não é
afetada pelas complexidades que tornam as normas simples em difíceis de serem
aplicadas: a concepção consequencialista. Os seus adeptos não partem de regras morais,
mas de objetivos. Avaliam a qualidade das ações mediante uma verificação do quanto
elas favorecem suas metas. Na perspectiva consequencialista, a partir da avaliação das
alternativas possíveis deve-se escolher o curso da ação que terá as melhores conseqüências
para todos os envolvidos.
6
SINGER, P. 2000, p. 30.
Considera que estas ações quando aplicadas de forma adequada, devem estar em
harmonia com a igualdade de interesses. Ainda que isto não ocorra em todas as situações,
deve se aplicar pelo menos aos interesses primordiais defendidos por Singer em sua
Ética Prática. Diante das inúmeras diferenças, o princípio de igual consideração de
interesses deve funcionar como uma balança atuando de maneira imparcial, levando em
conta os interesses que são comuns a todos, como por exemplo o interesse pela
sobrevivência e a indesejabilidade da dor.7
A questão não pode ser resumida em termos econômicos, em uma disputa entre
ricos e pobres. Singer argumenta que será necessário buscar uma justificativa ética e
não econômica para a solução destes problemas. O autor considera arbitrário defender o
7
SINGER, P. Ética prática. 3ª ed, São Paulo: Martins Fontes: 2002, p. 31.
8
SINGER, P. Ética prática. 3ª ed, São Paulo: Martins Fontes: 2002, p. 22.
ponto de vista de que somente os interesses da espécie humana devem ser levados em
conta ao se fazer uma abordagem séria dos valores ambientais. Torna-se necessária a
formulação de uma ética ecológica,9 que trate da relação da espécie humana com a
terra, os animais e as plantas que nela vivem.
Singer estabelece quatro princípios para uma nova ética ambiental que levará em
conta os interesses de todos os afetados pelas ações humanas. Primeiro: cada ação
prejudicial ao meio ambiente será considerada eticamente duvidosa, e francamente errada
cada ação que seja desnecessariamente prejudicial; segundo: será considerado virtuoso
o aproveitamento e a reciclagem de recursos e perversos o consumo e a extravagância
desnecessários; terceiro: serão considerados os interesses de todas as criaturas
sencientes, inclusive das gerações que habitarão o planeta num futuro remoto; quarto:
serão rejeitados os ideais de uma sociedade materialista na qual o sucesso é medido
pelo número de bens de consumo que alguém é capaz de acumular.10
9
Para uma maior compreensão da proposta ética de Singer no que se refere às relações do
homem com o meio ambiente, consideramos conveniente esclarecer o significado da palavra
ecologia. Palavra de origem grega, que significa casa ou meio ambiente próximo. Entretanto,
o zoologista alemão Ernest Haeckel deu a esta palavra um sentido mais abrangente, passando
a significar o estudo do meio ambiente natural e das relações dos organismos entre si e com
os seus arredores.(cf. Ricklefs, 1973: p.2).
10
SINGER, P. Ética prática. 3ª ed, São Paulo: Martins Fontes: 2002, p. 301.
As missões evangélicas
em comunidades indígenas1
1
Trabalho apresentado ao professor Dr. Lincoln Etchebéhère Júnior na disciplina Religião e
Educação no Brasil (1889-1988) do Curso de Mestrado Interdisciplinar Educação, Administração
e Comunicação da Universidade São Marcos/SP
2
Mestranda no Programa de Mestrado da Universidade São Marcos – São Paulo.
Conta-se que, certo dia, um senhor andava pelas montanhas da Guatemala distribuindo
folhetinhos. Ele era americano, mas sabia que a língua nacional da Guatemala era espanhol
sendo assim, carregava também folhetinhos em espanhol. O que ele desconhecia era
que aquele povo das montanhas falava uma outra língua bem diferente do inglês e do
espanhol, apesar de estarem no mesmo país. Nesse dia um índio da montanha perguntou
ao entregador de folhetinhos: “Ei, seu moço...se este seu Deus aí é tão bom, e me ama
tanto, porque é que ele nem ao menos fala a minha língua?”3
Depois dessa experiência, o Sr. William Cameron Towsend fundou a associação Wcfliffe
de Tradudores da Bíblia, e a Sociedade Internacional de Lingüística (SIL). Os discípulos
dessa associação eram enviados aos povos tribais de todo o mundo para aprender a
língua, reduzi-la na forma escrita e traduzir a Bíblia. Com esse intuito, eles logo se
tornaram os maiores especialistas do mundo em tradução de línguas indígenas.
3
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As igrejas evangélicas brasileiras naquele tempo não davam muito apoio às missões,
pois a maioria dos templos eram pequenos, espalhados pelos interiores do país. Com o
objetivo de evangelizar os povos do mundo, porque Jesus estava voltando, as missões
estrangeiras espalharam-se por todo o nosso território. Até a década de 70 não havia nenhuma
oposição dos Governantes quanto à atuação de missionários estrangeiros no Brasil.
O órgão responsável pela proteção aos índios (SPI) foi criado em 1910 e extinto em
1967, com a criação da FUNAI. Essa mudança trouxe modificações nas diretrizes para
educação escolar dos índios. A FUNAI elegeu, enquanto proposta educativa, o ensino
bilíngüe como forma de respeito às diversidades tribais. Em 1973, O Estatuto do Índio
propunha obrigatoriamente o ensino de línguas nativas nas escolas indígenas. Sendo
assim, a FUNAI resolveu investir em professores e membros das comunidades indígenas
para que assumissem as funções educativas em suas nações. Mas os educadores indígenas
não conseguiram com sucesso a alfabetização de seus irmãos, por desconhecerem
metodologias que contemplassem o estudo do bilingüismo e a estrutura da língua nacional.
4
IPN e A causa indígena. Boletim Dominical. Evangelização e pesquisa. www. Ipn.org.br//
fipnindio.2000.
5
Esses programas foram criados no período pós-guerras pelos paises capitalistas desenvolvidos,
a fim de criar melhores condições de vida no Terceiro Mundo e deter o avanço do socialismo.
6
FERREIRA, M. K. L. A educação escolar indígena: um diagnóstico crítico da situação no Brasil,
Antropologia, História e Educação. São Paulo: Global, 2001, p.76.
trabalho desenvolvido pelo SIL nas aldeias vinha ao encontro com os projetos políticos
da Funai, que desejava instituir uma política indigenista aceita internacionalmente7.
Até a década de 70, o Estado por meio de sucessivos convênios firmados com o SIL,
repassou a ação governamental brasileira para essa instituição norte-americana, cujo
maior objetivo de suas ações era a convenção de povos indígenas ao protestantismo, por
meio da leitura de textos bíblicos traduzidos em língua indígena. Devido à polêmica em
torno da presença do SIl no Brasil e da denúncia de antropólogos quanto às ações dos
missionários em aldeias indígenas, alegando que esses estariam “interessados em nossas
pedras preciosas, em nossos conhecimentos, e tudo que é nosso...”9 o convênio foi rompido
em 1977, mas em 1983 o SIL conseguiu reativar a parceria com a Funai, com o objetivo
de manter atividades assistenciais de lingüística, educação, saúde e desenvolvimento
comunitário junto a aproximadamente 53 povos indígenas.10
O material educativo produzido pelo SIL é utilizado até os dias atuais, principalmente
nas escolas da Funai, mesmo em comunidades em que não houve atuação de missionários
do SIL. Segundo Ferreira11, “O SIL elaborou estudos lingüísticos e pedagógicos para os
povos Xavantes, Kayabi, Bakairi, Assurini, Karajá, Guajajara, Guarani, Kayapó, Nambiquara,
7
Atender à Convenção de Genebra, de 1957, que dispunha sobre a proteção e a integração
das populações indígenas e de outras populações tribais e semitribais de países independentes.
8
O artigo 49 do Estatuto do Índio estabelece: “A alfabetização dos índios far-se-á na língua do
grupo a que pertençam, e em português, salvaguardando o uso da primeira”.
9
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10
Op. cit. FERREIRA, M. K. L. A educação escolar indígena: um diagnóstico crítico da situação
no Brasil, Antropologia, História e Educação. São Paulo: Global, 2001, p.83.
11
Ibidem, p.83.
Munduruku, Parintintin, Saruí, Terena, Ribaktsa, Canela, Pareci, Bororo, Waurá, Urubu,
Arara e Waiãpi.”
Devido às críticas dirigidas à política de ensino da Funai junto ao SIL, hoje a Funai
desvinculou o discurso sobre educação indígena da atuação do SIL. Mas o que percebemos
é que os sucessivos convênios entre a Funai e as missões, permitindo que essas atuassem
nos campos educacionais, eximiu o Estado de investir na educação indígena, repassando
a ação governamental brasileira para a instituição norte-americana – SIL.
12
GOMES, N. S. A Sil e os estudos das línguas indígenas brasileiras. Anais do Congresso Nacional
de Lingüística e Filologia, CIFEFIL/UERJ, 1998.
• Início de cursos específicos para campo indígena oferecido por New Tribes (1956)
e SIL (1959, com dados oficiais a partir de 1973);
13
Ibidem
(2) Será que não temos o direito de receber o evangelho na nossa própria cultura?
Somos tão diferentes assim? Será que não nascemos, vivemos e morremos
também? Do ponto de vista de Deus, somos todos iguais, merecedores da mesma
forma da sua graça. Conhecer Jesus não é somente privilégio do homem branco:
é do índio também. Mais de 50% das tribos nunca ouviram falar de Jesus Cristo.
Há lágrimas nos meus olhos e dor no meu coração em saber que muitos parentes
meus estão morrendo sem nunca ouvir de Jesus, aquele que dá valor à vida16.
(3) ... é fazer a gente esquecer o que a gente tem. Querem que a gente viva como
eles, como os brancos vivem...Porque os missionários destruíram a cultura dos
Kayabi que vivem no rio dos Peixes. Lá os índios só vivem atrás da comida do
14
AZEVEDO. A.C.W.C. Você sabe o que é o COMPLEI, IPN e A causa indígena. Boletim Dominical,
1.10.2000 www. Ipn.org.br//fipnindio.2000.
15
Op. cit. GOMES, N. S. A Sil e os estudos das línguas indígenas brasileiras. Anais do Congresso
Nacional de Lingüística e Filologia, CIFEFIL/UERJ, 1998.
16
Carta do pastor indígena Henrique Dias Terena, publicado no Boletim Dominical de 27.08.2000.
IPN e a causa indígena. www.ipn.org.br.
branco. Lá eles não cantam mais a festa da gente. Hoje a gente não quer que
esses missionários venham aqui. 17
(4) A escola dos missionários do MNTB (Missão Novas Tribos do Brasil), um dos
mecanismos usados para legitimar sua presença nas áreas, conquistando a confiança
dos grupos, dominando-lhes a língua e devolvendo-lhes escrita, com o objetivo de
‘salvar-lhes as almas’. A língua do grupo escrita é , pois, oferecida em escambo aos
próprios falantes, como símbolo do poder/saber dos missionários que, em troca,
pedem-lhes o abandono de suas crenças e a adoção da religião evangélica.18
Referências bibliográficas
AZEVEDO. A.C.W.C. Você sabe o que é o COMPLEI, IPN e A causa indígena. Boletim
Dominical., 1.10.2000. Disponível em <http:// www. Ipn.org.br/ fipnindio.2000>. Acesso
em 10 out. 2004.
17
Avaliação do líder de uma aldeia Kayabi, em 1990, ao trabalho de missionários, apud FERREIRA,
M. K. L. A educação escolar indígena: um diagnóstico crítico da situação no Brasil, Antropologia,
História e Educação. São Paulo: Global, 2001, p.83.
18
Avaliação de Monte, apud, FERREIRA, M. K. L. A educação escolar indígena: um diagnóstico
crítico da situação no Brasil, Antropologia, História e Educação. São Paulo: Global, 2001, p.85.
19
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Resumo
Esse trabalho estuda o contexto sociológico e político da reforma na educação brasileira
ocorrida na década de 1930. Naquela época, organizou-se no Brasil um movimento de
intelectuais denominado Escola Nova, que colocou as teorias de Jean Piaget e de John Dewey
no centro das novas idéias educacionais. A Reforma Francisco Campos procurou reorganizar
o ensino médio brasileiro segundo as novas idéias. O trabalho analisa principalmente as
mudanças na educação matemática ocasionadas pelo uso do método heurístico e das técnicas
de resolução de problemas. Discute-se como a divisão tradicional do currículo em aritmética,
álgebra e geometria foi questionada para dar lugar às idéias oriundas da lógica e da análise.
Conclui-se que as mudanças implementadas naquela época constituíram-se nos fundamentos
da educação matemática até os dias de hoje.
Palavras-chave: políticas educacionais no Brasil, história da educação matemática, métodos
de ensino, Jean Piaget, John Dewey.
Abstract
This work studies the sociological and political context of the reform in the Brazilian education
occurred in the decade of 1930. At that time, a movement of intellectuals called Escola Nova
was organized in Brazil, placing the theories of Jean Piaget and John Dewey in the center of
the new educational ideas. The Reformation Francisco Campos looked for to reorganize
Brazilian average education in accordance with the new ideas. The paper analyzes the changes
in the mathematical education caused by the use of the heuristical method and the techniques
of resolution of problems. It is argued that the traditional division of the curriculum in
arithmetic, algebra and geometry was questioned to give place to the ideas deriving of the
logic and the analysis. The conclusion is that the changes then implemented have been
making the beddings of the mathematical education.
Keywords: educational politics in Brazil, history of the mathematical education, educational
methods, Jean Piaget, John Dewey.
Talvez não haja área em que a dependência científica e cultural brasileira tenha sido
tão forte quanto na educação matemática. Os brasileiros nem podem, nesse domínio, ser
criticados por copiar o que acontece lá fora, mesmo que a dependência viole, de alguma
forma, os seus sentimentos de autonomia. É claro que nenhum país pode viver fechado
dentro de si mesmo no campo científico, mas em vez de incorporar aspectos de outras
culturas à nossa, o que fazemos geralmente é submeter nossa cultura às outras. Servir
aos interesses dos outros sem atender aos interesses próprios é uma questão
extremamente delicada, pois não há dúvida que mesmo em se tratando de conhecimento
abstrato e simbólico, a matemática comporta no que tange ao seu ensino pressupostos
que implicam concepções que são, em última hipótese, sociológicas e políticas.
1
GARCIA, Walter E. Inovação educacional no Brasil: problemas e perspectivas. São Paulo:
Cortez/Autores Associados, 1980, p. 195.
Como avanço político, em 1932 surge o voto feminino e, no campo da cultura, é realizado
no Rio de Janeiro o primeiro concurso de escolas de samba. A fundação da Universidade de
São Paulo dá-se em 1934, marcando a inserção do Brasil no âmbito das tendências
internacionais do ensino superior pela adoção do modelo europeu. A produção intelectual
e artística nesse período forneceu as obras que definiram a identidade do povo brasileiro,
como a Evolução política do Brasil, livro de Caio Prado Júnior, Casa grande e senzala, livro
de Gilberto Freyre, As Pastorinhas, marcha carnavalesca de Noel Rosa, O que é que a
baiana tem?, samba de Dorival Caymmi e Limite, filme de Mário Peixoto. Carmem Miranda
foi produzida pela grande indústria cultural cinematográfica norte-americana como uma
representação caricata de nossa cultura. No cenário internacional, os anos 1930 assistiram
à ascensão dos nazistas e fascistas ao poder respectivamente na Alemanha e na Itália, ao
regime do General Franco na Espanha e de Salazar em Portugal, mostrando como os
regimes ditatoriais estavam em evolução no velho mundo.
Desde a década dos anos 1920, várias reformas do ensino primário vinham sendo
produzidas pelos Estados brasileiros, decorrentes da adequação da educação aos
clamores de uma sociedade em pleno devir urbano-industrial. Após a Primeira Guerra,
com a industrialização, os estratos sociais pequenos burgueses emergentes passaram
a exigir o acesso à educação. No entanto, tomando emprestados os valores
da oligarquia, os novos segmentos da elite social visavam a uma educação
preponderantemente acadêmica, desprezando a formação técnica, considerada inferior.
Mas o operariado em formação, reconhecendo a importância da escolarização, começou
a exercer pressão para a expansão da oferta de ensino. Interessada em formar mão-
de-obra para tocar a indústria nascente, as elites forneceram aos segmentos populares
uma educação voltada para a prática, dentro da qual os ecos produzidos pelos países
já industrializados surtiram grande efeito, fornecendo os fundamentos conceituais
para o Movimento da Escola Nova.
Em 1924, foi fundada a Associação Brasileira de Educação (ABE), que realizou diversas
conferências nacionais, abrindo um espaço dentro do qual eram debatidas políticas para
que mudanças significativas pudessem surgir e melhorar a sociedade brasileira. Os
educadores reunidos na ABE apregoaram a necessidade de articulação de uma política
nacional de educação, saindo em busca de modelos já experimentados e que deram
certo em outros países. Dessa forma é que o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova
surgiu em 1932 conclamando a elaboração de um amplo programa político destinado a
reorganizar a educação brasileira.
De 1931 até 1937, foram intensos os debates em que os defensores das novas idéias
se confrontavam com os tradicionalistas católicos. As Constituições de 34 e 37 refletem
a influência destas duas tendências, mas é indiscutível o atendimento de muitas das
reivindicações dos educadores imbuídos das concepções inovadoras. Com a instalação
do Estado Novo em 1937, o debate foi interrompido e seus interlocutores calaram-se
para dar lugar à “neutralidade pedagógica” subsidiada tecnicamente pelo regime ditatorial
de Getúlio Vargas.
2
Ibid., p. 196.
3
GILBERT, Roger. As idéias atuais em pedagogia. São Paulo: Martins Fontes, 1976, p. 12.
4
HARPER, Babette et alli. Cuidado escola! 24 ed. São Paulo: Brasiliense, 1987, p. 23.
5
GILBERT, op. cit., p. 14.
6
ARROYO, F. História geral da pedagogia. Tradução de Luiz Aparecido Caruso. São Paulo:
Mestre Jou, 1974, p. 35.
As crianças não são adultos em miniatura e têm seus próprios caminhos, de forma que
o desenvolvimento mental infantil progride através de estágios definidos numa seqüência
fixa. “Embora os estágios do desenvolvimento mental ocorram numa ordem fixa, crianças
diferentes passam de um estágio para outro em idades diferentes”.8 O desenvolvimento
mental é influenciado por quatro fatores inter-relacionados: maturação física, principalmente
do sistema nervoso central; manipulação de objetos concretos com os respectivos processos
de pensamento envolvidos; interação social por meio do jogo, conversa e trabalho com
outras pessoas, especialmente outras crianças; equilibração das estruturas cognitivas.
7
REVISTA NOVA ESCOLA. São Paulo: Abril, ano VII, no 61, abril de 1993, p. 8.
8
CHARLES, C. M. Piaget ao alcance dos professores. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico e Científico,
1975, p. 1.
O problema deve sempre ser colocado a partir de uma necessidade real, situação
nova ou dúvida encontrada pelos próprios alunos, assegurando com isso a motivação
para a aprendizagem. Um aspecto pedagógico importante dos métodos implicados pela
estratégia de resolução de problemas é o respeito e o estímulo à liberdade e à capacidade
9
COUSINET, R. A educação nova. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1959, p. 96.
10
THORNDIKE, E. L. Elementary principles of education. Nova York: The Macmillian Co.,
1929, p. 167.
11
FREEMAN, G. E. Modern elementary school pratice. Nova York: The Macmillian Co., 1926, p. 126.
12
Ibid., p. 157.
criadora. O professor não procura fazer o que os alunos podem fazer por si mesmos, mas
exerce uma atividade de cooperação em suas tarefas, dando-lhes por meio de instruções
e aconselhamentos ampla liberdade de expressão. Muitos chegam a considerar a resolução
de problemas como a principal razão para se ensinar matemática, porque é através dela
que a criança se inicia no modo de pensar e nas aplicações dessa disciplina.
Uma didática adequada aplicada a esses conteúdos levaria a criança a aprender por
si mesma, cabendo ao professor estimular, dirigir e, quando necessário, auxiliar os alunos.
13
DEWEY, John. Los fines, las materias y los métodos de la educación. vol. IV. Madri: D. Appleton
& Co., 1927, p. 17.
14
ROMANELLI, Otaíza de O. História da educação no Brasil – 1930/1973. Petrópolis: Vozes,
1990, p. 135.
Além disso, para atender ao interesse imediato da sua utilidade e ao valor educativo dos
seus métodos, [o ensino da matemática] procurará, não só despertar no aluno a capacidade
de resolver e agir, com presteza e atenção, como ainda favorecer-lhe o desenvolvimento da
faculdade de compreensão e das relações quantitativas e espaciais, necessárias às aplicações
nos diversos domínios da vida prática e à interpretação exata e profunda do mundo objetivo. 17
15
ROCHA, J. L. A matemática do curso secundário na Reforma Francisco Campos. 2001,
Dissertação de Mestrado em Matemática. Departamento de Matemática. Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro, p. 28.
16
BICUDO, J. C. O ensino secundário no Brasil e sua atual legislação (de 1931 a 1941 inclusive).
São Paulo, 1942, p. 139.
17
Ibid., p. 156.
18
Ibid., p. 157.
Dessa forma, o método heurístico não está apoiado nas deduções que têm como ponto
de partida os axiomas e as demonstrações de teoremas, mas sim na intuição do aluno, que
privilegia o ponto de vista psicológico. Ao trabalhar com a intuição, lida-se com a matemática
como ciência viva; o mesmo não acontecendo com o método dedutivo, que ao abordar os
teoremas e axiomas como ponto de partida, está-se afirmando, mesmo que subliminarmente,
que a matemática é uma ciência pronta. Segundo Roxo deve-se deixar que o aluno tente, a
seu modo, resolver os problemas que lhe são propostos, para depois moldar seu pensamento
de maneira que ele se torne mais formal. Não é a apresentação brusca do pensamento
lógico-formal que educa a inteligência, mas sim o desenvolvimento progressivo da sua
capacidade de abstrair e fazer deduções de forma natural.
Considerações finais
19
ROXO, E. A matemática na educação secundária. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1937, p. 70.
Referências bibliográficas
BICUDO, J. C. O ensino secundário no Brasil e sua atual legislação (de 1931 a 1941,
inclusive). São Paulo, 1942.
DEWEY, John. Los fines, las materias y los métodos de la educación. vol. IV. Madri:
Madri: D. Appleton & Co., 1927.
FREEMAN, G. E. Modern elementary school pratice. The Macmilan Co.: Nova York, 1926.
GILBERT, Roger. As idéias atuais em pedagogia. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1976.
HARPER, Babette et alli. Cuidado escola! Apresentado por Paulo Freire. São Paulo:
Brasiliense, 1987.
REVISTA NOVA ESCOLA. São Paulo: Abril, ano VII, no 61, abril de 1993.
ROXO, E. A matemática na educação secundária. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1937.
THORNDIKE, E. L. Elementary principles of education. Nova York: The Macmillian Co., 1929.
Resumo
A FUNÇÃO ARTÍSTICO-SOCIAL EDUCACIONAL DO PARQUE DO IBIRAPUERA é o resultado de
uma pesquisa inédita sobre o conjunto cultural do Parque do Ibirapuera: Bienal, Oca, MAM e
Jardim das Esculturas, em função de seu papel sócio-cultural e histórico, sob o ponto de
vista do cidadão e de sua educação em arte. O espaço estudado, pelos eventos que aí se
desenrolam, tem uma função interdisciplinar, sendo o lugar ideal para o redimensionamento
do indivíduo, auxiliado pela arte. Considera o papel que a visita monitorada a essas exposições
tem exercido sobre a formação de conhecimento e de sensibilidade perceptiva nos seus
visitantes, principalmente criando novas oportunidades para pessoas de nível social menos
favorecido, gerando, assim, cidadãos mais responsáveis. Para tanto, o papel de monitores
treinados têm facilitado a comunicação entre obra e público.
Abstract
THE ARTISTIC-SOCIAL EDUCATIONAL FUNCTION OF THE IBIRAPUERA PARK is the result of
an unprecedent research on the cultural ensemble in the Ibirapuera Park (São Paulo, Brazil):
the Bienal, the OCA, the MAM (Museum of Modern Art) and its Sculpture Garden, considering
its social, cultural and historical role from the viewpoint of the citizens and their education in
art. Those spaces, dedicated for cultural events hold an interdisciplinary purpose and are
the ideal place for the reassessment of the human dimension through art.
A história do Parque do Ibirapuera iniciou-se muito antes dele ter sido dado como
presente ao povo de São Paulo, por ocasião do IV Centenário da cidade, em 1954.
A região do Ibirapuera era uma aldeia indígena que deu origem ao nome (YBI-CA-OUÊRA)
– significando em Tupi “pau podre”, “árvore velha extinta” – e sofreu uma variação ortográfica,
até chegar ao nome atual.
O local abrangia uma vasta área de terras que iam além do bairro de Santo Amaro.
A área, em 1906, foi transferida para o Município de São Paulo, depois de longa disputa
judicial, que durou decênios.
No ano de 1951, criou-se uma comissão, presidida pelo Sr. Francisco Matarazzo
Sobrinho, com a finalidade de dar existência a um parque nessa região, tendo sido o
projeto urbanístico elaborado por um grupo de arquitetos: Oscar Niemeyer, Zenon Lotufo,
Eduardo Kneese de Mello e Helio Uchoa.
No Palácio das Indústrias, a indústria paulista mostrou o que tinha de mais moderno
em tecnologia na época, em: tecelagem, vidraria, alimentação, química e farmácia,
aparelhos cirúrgicos, aparelhos eletrônicos e outros, numa autêntica confirmação de ser
São Paulo o maior parque industrial da América Latina.
1
ALMEIDA, Fernando. O Franciscano Ciccilo. São Paulo: Livraria Pioneira Editora, 1976, p. 142.
O ano em que São Paulo comemorou seus 400 anos foi marcante para o povo
paulistano, dentro de um programa cultural muito bem elaborado pela comissão do IV
Centenário, “São Paulo tornou-se um dos centros de atenção e interesse dos homens de
pensamento de todos os continentes, muitos dos quais, e em elevado número, afluíram
à capital, o que deu lugar a uma profícua troca de conhecimento e experiência”3.
A par de seu alto padrão científico, possuía cunho eminentemente didático, colocando os
visitantes em contato direto com preciosos documentos e oferecendo, uma idéia geral do
desenvolvimento histórico do Estado e do país 4.
O Concurso Carlos Gomes para Peça Sinfônica alvoroçou o meio musicista nacional e
internacional (ao todo 62 músicos do mundo todo se inscreveram), estimulando a criação
de novas obras musicais. Villa Lobos apresentou Sume Pater Patrium (uma sinfonia ameríndia
com cocos); Camargo Guarnieri apresentou a Sinfonia nº 3 São Paulo, que foi a vitoriosa
do concurso. A Orquestra Sinfônica Municipal apresentou-se em vários concertos.
2
ALMEIDA. Opus cit. p. 141.
3
ALMEIDA. Opus cit. p. 142.
4
ALMEIDA. Opus cit. p. 146.
mundo na época: Aurélio Milos. Ao maestro italiano Nino Stinco coube reger a Orquestra
Sinfônica Municipal, que acompanhava o balé. O repertório, constituído de 16 balés,
estava distribuído em 4 programas com 58 figurantes, com obras de compositores
internacionais especialmente adaptadas por Milos para o evento, num absoluto ineditismo5.
Entretanto, decorridos dois anos, a imagem do parque era bem outra: seus prédios,
que haviam sido projetados com a finalidade de incentivar a cultura, a ciência e a arte,
eram agora um melancólico conjunto de repartições municipais.
5
ALMEIDA. Opus cit. p. 145.
6
ALMEIDA. Opus cit. p. 145.
7
ALMEIDA. Opus cit. p. 145.
Em 1970, o parque foi cercado e algumas das construções mais deterioradas, como
o Pavilhão da Feira Internacional, o Pavilhão Verde e o Café Concerto, foram demolidas.
O Ibirapuera começava a ressurgir. Aos poucos as repartições públicas foram sendo
removidas, mas a Prefeitura de São Paulo só se transferiu do Palácio das Nações – hoje
Pavilhão Manoel da Nóbrega – para o Palácio das Indústrias, no centro da cidade, em
1992, na gestão da então Prefeita Luiza Erundina.
Das instituições, que desde o início determinaram o espaço cultural dentro do parque,
ainda estavam presentes a Bienal, o Planetário, o Museu de Arte Moderna e o Pavilhão
Japonês. As demais buscaram outros locais: o Museu do Presépio (1970) hoje encontra-
se no Museu de Arte Sacra; o Museu da Aeronáutica (1959) está localizado no Campo
de Marte; o Museu de Arte Contemporânea (1963) na Universidade de São Paulo e o
Museu do Folclore no Butantã. A permanência de alguns locais culturais contribuíram
para que a finalidade inicial do Parque, de ser pólo irradiador de cultura, ciência e arte,
não se perdesse.
Hoje uma das exigências fundamentais da educação é possibilitar, aos vários grupos
que compõem a sociedade, um maior acesso ao conhecimento interdisciplinar, em
substituição às informações estanques que têm constado das várias disciplinas. Dentro
deste prisma, os espaços culturais do Parque do Ibirapuera oferecem essa oportunidade,
por meio do ingresso gratuito.
Obras de diferentes épocas são apresentadas nesse complexo. Por serem diferentes
em sua própria formação, constituem um desafio para a emoção e para a inteligência
neste conjunto formado pelo sentir, o pensar e o contextualizar, na relação entre a obra
de arte e o apreciador.
Esses espaços culturais, ao mesmo tempo que são diferentes entre si, têm em comum
a proposta de priorizar a leitura dos objetos culturais. O fazer e o estudo da história da
arte muitas vezes não são possíveis, por não haver espaço necessário e nem tempo hábil
para sua apreciação, o que seria o mais adequado à educação escolar. Esses espaços
procuram proporcionar a educação e a democratização do acesso aos bens culturais tão
discutidos na atualidade, cumprindo assim a função social de se incluírem como agentes
educativos, desenvolvendo suas atividades como complementadores do ensino formal,
em união com a escola.
O museu precisa se dedicar principalmente ao público jovem para que haja uma
efetiva democratização artístico-cultural, não só na visitação, mas também na crítica e
no fazer. A necessidade cultural é produto da educação e da vivência; é uma lenta
conquista, que vai se realizando num processo contínuo, com igualdade de oportunidades
– fator fundamental – criando reais condições de apropriação da arte como um dos
principais conteúdos ampliadores do universo cultural de um povo. Não basta abrir as
portas gratuitamente à população. Será preciso abrir ao povo as portas da apropriação
da obra de arte, para um saber assimilado, digerido, fruído, que o torne capaz de
reconhecer os bens artísticos armazenados e expostos nesses espaços, como patrimônio
cultural. A propósito escreve Franz:
O educando necessita para sua formação de uma relação contínua e constante, como
observa Porcher:
8
FRANZ, Terezinha Sueli. Educação para uma compreensão critica da Arte. Florianópolis: Letras
Contemporâneas, 2003, p. 253.
A escola e os espaços culturais devem trabalhar em conjunto para que ocorra uma
democratização cultural e artística. De que adianta um museu ou uma exposição de arte
elaborar programas de alto nível e competência didática dirigidos aos educandos, se a
escola não levar seus alunos para esses espaços, não os preparando para o desenvolvimento
das habilidades necessárias à compreensão dos objetos artísticos ali expostos?
Um primeiro passo seria permitir que os educandos falassem livremente sobre a obra
em análise, dando-lhes a oportunidade de expressar suas concepções iniciais sobre ela.
Foi colocada toda uma gama de conhecimentos informais, ingênuos, fragmentados, sobre
a obra que foram incentivados a refletir.
Neste estágio não somente dominamos os aspectos inerentes às obras, mas também nos
colocamos a partir do nosso próprio ponto de vista pessoal, ou seja, distanciamo-nos do
objeto artístico para emitir apreciações próprias e o fazemos de modo crítico e avaliativo
como o fazem os especialistas10.
Assim, é possível chegar ao estágio acima referido por meio desse acompanhamento
atento do iniciante.
9
POCHER, Luis. Educação Artística luxo ou necessidade? São Paulo: Summer, 1982, p. 46.
10
FRANZ. 2003, Opus cit. p. 185.
A importância dos serviços educativos em espaços dedicados à Arte faz-se notar pela
transformação que a visitação que proporciona uma significativa experiência de fruição
aproxima e estabelece relações significativas entre sujeito-obra. Tais ações auxiliam a
mudança de conceito da ida a uma exposição, que deixa de ser enfadonha, intelectualizada,
antiga, para se tornar algo agradável, fazendo com que os sujeitos possam ser estimulados
a vivenciar e a conhecer arte.
É preciso lembrar a atuação de Ana Mae Barbosa, quando diretora do MAC, que
possibilitou visitas ao museu de grande número de escolas periféricas e pobres; em
convênio com a Prefeitura oferecia ônibus para o transporte das crianças, foi a semente
iniciadora de todos os projetos futuros que aconteceram e estão acontecendo no Brasil.
Pelos projetos educativos nestes espaços, os visitantes exercitam muito mais suas
capacidades intelectuais e sensíveis – justamente porque a mediação educativa consegue
construir uma ponte entre o visitante e a obra, transformando os museus e as exposições
de arte em espaços democráticos aos quais grande parte da população tem acesso – e
não se sentem mais fora deles, mas sim integrados.
Nas exposições propiciadas por esse espaço cultural, não há fatores impeditivos à
visita, em virtude das ofertas da gratuidade presentes, em dias da semana, ou em períodos
especiais, onde permanecem por dias seguidos. Exclui-se dessa forma a imagem de que
o acesso às obras culturais seja privilégio de uma classe social elitizada; o fato é que,
apesar da oferta dada, entre os menos privilegiados esta prática aparece em menor
escala. As visitas às exposições são resultado ou produto do acesso à educação. Essas
desigualdades na utilização e no usufruir desses espaços culturais refletem as
desigualdades presentes no acesso à educação.
Vale ressaltar que uma grande maioria desse público comparece às exposições por
ser um local de lazer, mas também para poder apreciar, ao mesmo tempo, as novidades
que lhes são apresentadas. Aprendem essas novas experiências culturais que lhes são
oferecidas, de maneira agradável.
Referências bibliográficas
ALMEIDA, Fernando Azevedo de. O Franciscano Ciccilo. São Paulo: Livraria Pioneira
Editora, 1976.
FRANZ, Terezinha Sueli. Educação para uma compreensão crítica da arte. Florianópolis:
Letras Contemporâneas, 2003.
POCHER, Luis. Educação Artística: luxo ou necessidade? São Paulo: Summer, 1982.
Camila Valiengo*
Resumo
O presente artigo resume algumas propostas músico pedagógicas que surgiram a partir do
século XX. São citados, rapidamente, pontos relevantes de seis métodos ativos da primeira
metade do século em questão e de quatro propostas da segunda metade, traçando um
panorama do que vem influenciando a educação musical brasileira.
Palavras-chave: Educação musical, métodos ativos.
Abstract
This article is a summary about some musical pedagogical. Witch appeared on the twentieth
century. In this article are written six actives methods from the first half of the century in
question and four of the second part, making a “panel” of what is a influence in the Brazilian
musical education.
*
É aluna do Mestrado Interdisciplinar em Educação, Administração e comunicação da
Universidade São Marcos. Tem como tema de sua pesquisa a Educação Musical em duas
instituições da cidade de São Paulo, sob orientação do prof. Dr. Carlos Kater. É pedagoga e
educadora musical, atuando em Projetos Sociais, escolas particulares do sistema regular de
ensino e programas governamentais na cidade de Mogi das Cruzes e Região.
1
BEYER, Ester. A educação musical sob a perspectiva de uma construção teórica: uma análise
histórica, Fundamentos da Educação Musical, ABEM, 1993
A partir daí são muitas variações das formas de educação musical, e sua importância
para os povos, tendo objetivos éticos, religiosos, políticos, artísticos ou científicos. Essas
características vão de acordo com o contexto de cada povo e época, vislumbrando
diferenças quanto à importância da música na formação humana, os tipos de composições
e interpretações.
Os responsáveis pela Educação Musical e o público alvo dessa educação também vão
sendo alterados ao longo do tempo. Houve épocas em que a Educação Musical esteve
restrita aos religiosos e às pessoas que pagassem por ela. Outros momentos o gênero foi
determinante para ser educado musicalmente, assim como a classe social, e também
houve períodos em que se buscou a democratização da educação musical com diversos
propósitos, sendo praticada associada à educação formal e em escolas específicas de
Educação Musical, que passaram a surgir somente a partir do século XIX.
Com a criação do primeiro Tratado de Educação feito por Comenius (1592 – 1670), a
educação de forma geral passou por grandes transformações e como conseqüência a
Educação Musical mudou seu enfoque, incentivando as sensações e ações. Alguns
pensadores de outras áreas colaboraram muito oferecendo novas visões sobre o
desenvolvimento humano, através de estudos filosóficos e educacionais. A partir do século
XVIII apareceram as primeiras sistematizações em Educação Musical antecipando os
“métodos ativos” surgidos no século XX.
O grande objetivo de Dalcroze era a educação das massas, e o meio que apontava
para isso era inserir a educação musical nas escolas de ensino regular. Ainda hoje existe
em Genebra o Instituto Jacques Dalcroze, fundado por ele mesmo, que se mantém vivo
através de reflexões sobre a aplicação do método na atualidade. Essa proposta influenciou
muitos educadores não só na área musical, mas também na dança e teatro.
Muito inspirado por Dalcroze, o belga Edgar Willems, que foi seu aluno, propôs um
método baseado nos aspectos da fisiologia do ouvido humano e apontava para a importância
do preparo auditivo antes do ensino instrumental. Utilizava jogos, sons de diferentes
naturezas e teclados especiais. Foi muito envolvido com os pensamentos do século anterior
ao seu, mesmo sendo em áreas como física, educação, filosofia e biologia e também se
baseou em pensadores contemporâneos à sua época, como Jean Piaget e Claparéde. Visava
o ensino coletivo e o ideal de que a música pudesse ser feita por todos, independentemente
de talentos. Buscava sempre encontrar relações entre o ser humano e a música.
Carl Orff, outro compositor e educador alemão (1895-1982), não nos deixou um
método sistematizado com textos sobre sua abordagem, porém deixou cinco volumes de
peças escritas para serem interpretadas por seus alunos. Criou um instrumental específico
composto por instrumentos de percussão como metalofones e xilofones, tambores, pratos,
além de flautas doces, viola da gamba entre outros. Sua proposta é relevante por ter
tido grande aceitação na Europa e América. Orff tinha como intenção possibilitar uma
vivência musical e não a formação de músicos profissionais. Para isso utilizava repetições
(eco) e estímulos (pergunta / resposta), resultando em improvisos, além de jogos e uma
música de base que envolvesse fala, dança e movimento, partindo do ritmo, o que chamou
de “música elemental”. Carl Orff, como outros pedagogos, baseou-se na origem única da
palavra e da música, assim como na integração das artes.
Outro método importante dessa época foi o criado por Zoltán Kodaly (1882-1967),
compositor húngaro que através de intenso trabalho de sistematização da cultura musical
popular de seu país, acrescida de implantação de programas de educação musical na rede
de ensino, pesquisas e composições revitalizou as origens daquele povo. Kodály não criou
uma nova metodologia, ele adaptou sistemas de ensino de outros países, como o Manosolfa
(conjunto de sinais que auxiliam o desenvolvimento de relações tonais) e Tonic Solfa (sistema
de alturas relativas conhecido como dó móvel). Sua importância está nos resultados obtidos
pela proposta do canto coletivo e alfabetização musical que atingiu 100% da população.
Shinichi Suzuki foi outro educador musical relevante, que embora fosse japonês criou
uma proposta nos moldes europeus, inclusive utilizando o repertório clássico europeu. Ele
mostrou que crianças bem jovens podem tocar obras complexas. Pensou sua proposta para o
ensino de violino, hoje adaptada para outros instrumentos. A base do método está em aprender
música da mesma maneira como se aprende a língua materna. Sendo assim, o apoio dos pais
dos alunos é de fundamental importância para criar um ambiente, como sugeria Suzuki, em
que a audição seja intensamente estimulada. A repetição constante é outro ponto evidente de
sua proposta, assim como a prática em grupo, sendo um estímulo positivo para o aluno.
Integração das X X
linguagens artísticas
Exclusividade musical X X X X
Habilidade instrumental X X
Habilidade vocal X X X X
Repertório folclórico X X
Repertório clássico europeu X X X X
Repetição X
Improvisação X
Democratização da música X X X X X
Acredita na origem única
da palavra e da música X X
Palavra-chave Rítmica Afetividade Improvisação Canto Instrumento Canto
coletivo coletivo Orfeônico
2
PENNA, Mura. A dupla dimensão da política educacional e a música na escola: I – Analisando
a legislação e termos normativos, Revista ABEM, Porto Alegre: ABEM, nº10, p. 19 – 27, 2004
Outra proposta que ilustra essa fase é a de John Paynter, também inglês, com
princípios bastante parecidos com os de George Self no que diz respeito à condição da
educação e fazer musical, muito calcados no passado. Também apóia sua proposta na
música de vanguarda e na escuta ativa e experimental.
Para esse educador no ensino da música não pode existir método, pois acredita que
os métodos são a “antítese da mente criativa”. Por isso não cria um método e sim propõe
uma rede de relações construída a partir de estudos diversificados que geram novos
estudos, resultando na experiência da pessoa.
Murray Schafer, canadense nascido em 1933, não nos apresenta uma metodologia,
mas uma proposta de despertar o ouvir consciente através de exercícios simples,
melhorando conseqüentemente a condição sonora das sociedades. Tendo algumas de
suas publicações traduzidas para o português e participando de eventos no Brasil tem
difundido mais sua proposta não só no Brasil como na América Latina como um todo. A
grande contribuição de Schafer está em suas discussões e no cuidado intenso com o
ambiente sonoro, apresentando alternativas positivas, isto é, o que fazermos para melhorar
essa condição ecológica em que nos encontramos, diferente das “proibições” ou do que
não fazer vindos da área médica ou física.
E parte daí sua proposta pedagógica, de “ensinar aquilo que o aluno quer saber, e
jamais o que ele pode encontrar em livros”, cujas chaves são os “por quês?”, as dúvidas.
Sua “idéia é de educar pela e para a transformação”.
Referências bibliográficas
BEYER, Ester. “A educação musical sob a perspectiva de uma construção teórica: uma
análise histórica”. In: Fundamentos da Educação Musical Porto Alegre: Associação de
Educação Musical, maio de 1993, p.5-25.
_______. De tramas e fios: um ensaio sobre a música e educação. São Paulo: Universidade
Estadual Paulista, Instituto de Artes, tese (livre docência), 2001.
_______. “A educação musical no Brasil”. In: Anais do II encontro da ABEM, Porto Alegre:
Associação de Educação Musical, 1993
GAINZA, Violeta Hemsy. “A improvisação musical como técnica pedagógica”. In: Cadernos
de Estudo: Educação Musical, nº 1 (Org. Carlos Kater). São Paulo: Atravez, 1990, p.22-30.
HENTSCHKE, Liane. “Relações da prática com a teoria na educação musical”. In: Anais do
II encontro da ABEM. Porto Alegre: Associação de Educação Musical, 1993.
Public Choice
Resumo
Plublic Choice, ou teoria da escolha pública, é um programa de investigação que utiliza os
métodos e pressupostos da microeconomia neoclássica na análise dos processos de decisão
política. O objetivo de nosso trabalho é expor de maneira os pressupostos deste programa
de investigação e suas implicações no contexto sócio-econômico.
Palavras Chave: Arrow, Mueller, escolha pública.
Abstract
Public Choice is a investigation’s program that make use of the neoclassic microeconomy’s
presupposed in political decision’s analysis. This work to present the presupposed of the
investigation’s program and his results in the social and economic context.
Key-words: Arrow, Mueller, public choice.
Introdução:
Ao tentar remontar às origens da Public Choice, Pereira evidencia que outros cientistas
políticos ao abordarem este programa de investigação reportam sua origem a Condorcet e a
sua “descoberta” do paradoxo do voto. Todavia foi na contemporaneidade que a escolha
pública se constituiu como uma teoria política. Pereira cita seis dos principais autores que
formam esta escola: “Duncan Black (1958), James Buchanan e Gordon Tullok (1962), Mancur
Olson (1965), Kenneth Arrow (1951), Anthony Downs (1957) e William Riker (1962)” (Pereira,
1997, p. 420)1. No presente trabalho utilizaremos como referência de nossa discussão apenas
1
Pereira destaca que a distinção entre public choice e social choice ocorreu principalmente
após a publicação das obras de Arrow e Sen. Contudo, não iremos diferenciar uma da outra
neste trabalho, porque ambas se mantêm em estreita relação. Cf. PEREIRA, P. T. “A teoria da
escolha públic (public choice): uma abordagem neoliberal?”. Análise Social. Vol XXII (141),
1997 (2º), 419 – 442. p. 420.
as obras Social Choice and Individual Values de Kenneth Arrow, Peças e engrenagens das
Ciências Sociais de Jon Elster e Elección Publica de Dennis Mueller.
Desde sua origem, a Public Choice se vinculou ao debate político como uma abordagem
neoliberal, por ter se constituído como uma crítica e alternativa as teorias econômicas do
bem-estar social que defendiam um Estado com poder de intervir nas decisões econômicas.
Este posicionamento da welfare econonomic se baseava na crítica dos “fracassos do
mercado”, para justificar a intervenção do Estado. A Public Choice, em contrapartida,
criticava a posição adotada pelo welfare economic, e por isso a teoria da escolha pública
deu maior ênfase aos “fracassos do governo” e suas políticas intervencionistas a fim de
elucidar os limites de intervenção do Estado2 . Isto explica o fato da Public Choice ter
sido uma das principais escolas de pensamento a fundamentar a ideologia neoliberal.
Para Dennis Mueller, “La ellección pública pued definirse como el estúdio econômico
del processo de adopción de decisiones en un contexto ajeno al mercado, o, simplesmente,
como la aplicación de la teoria económica a la ciencia política. El objecto de estudio de la
elección pública es el mesmo que el da ciencia política: la teoria del Estado, las reglas de
votación, la conducta del votante, la política de partidos, la burocracia, etc.”.
1 – Individualismo metodológico:
2
PEREIRA, P. T. “A teoria da escolha públic (public choice): uma abordagem neoliberal?”.
Análise Social. Vol XXII (141), 1997 (2º), p. 420.
3
Buchanan um dos teóricos capitaneadores da Public Choice define individualismo metodológico
como “uma tentativa de reduzir todos as questões de organização política ao confronto do
indivíduo com alternativas e sua escolha entre elas. Esta “lógica da escolha” tornar-se a
parte central da análise, e não é preciso tomar qualquer posição quanto aos fins últimos ou
critérios que dirigiriam sua escolha” (Buchanan, 1962, 1962, p. VII, apud: MORAES, R. C. C.
“As incomparáveis virtudes do mercado: políticas sociais e padrões de atuação do Estado nos
marcos do neoliberalismo”. In: KRAWCEYK, N. CAMPOS, M.M. HADDAD, S. O Cenário Latino
Americano no Limear do século XXI. Reformas em debate. Campinas: Editora Autores
Associados, 2000, p. 20.
4
ELSTER, J. Peças e engrenagens das Ciências Sociais. São Paulo: Relume-Dumara, 1994, p. 7.
5
Idem.
6
Todavia em suas últimas obras Elster tem esclarecido que embora um dos principais
mecanismos para explicar as decisões individuais seja a escolha racional, “o individualismo
metodológico não implica a escolha racional (ele é compatível com qualquer conjunto específico
de motivação); nem o caráter inato ou “dado” dos desejos (ele é consistente com a visão de
que desejos são moldados pelas sociedades, isto é, por outros indivíduos); finalmente, não
implica também o individualismo político (sendo uma doutrina metodológica compatível com
qualquer orientação política ou normativa) (Idem, p. p. 9-10).
7
Ibidem, p. 10
os eventos. Para tanto, é preciso explicitar os mecanismos que nos fornecem o “porque”
e o “como” inerentes às ações individuais no interior das instituições e mudanças sociais.
Para Elster, uma ação pode ser explicada como resultado final de duas operações
filtradoras sucessivas. Começamos com um grande conjunto de todas as ações
abstratamente possíveis que um indivíduo poderia empreender. O primeiro filtro é constituído
por todas as coerções físicas, econômicas, legais e psicológicas com que o indivíduo se
depara. As ações consistentes com essas coerções formam seu conjunto de oportunidades.
O segundo filtro é um mecanismo que determina qual ação do conjunto de oportunidades
será de fato executada. Nesta exposição os principais mecanismos a serem considerados
são a escolha racional (capítulo III) e as normas sociais (capítulo XII) 8.
Elster sintetiza a teoria da escolha racional com a assertiva: “quando defrontadas com
vários cursos da ação, as pessoas fazem o que acreditam que levará ao melhor resultado
global” 11
. A situação de escolha se caracteriza pela presença de um indivíduo (agente
representativo) que possível ou necessariamente deve escolher uma opção em um conjunto
de oportunidades. A noção de racionalidade adotada na escolha racional é consequencialista
“a escolha racional é instrumental: é guiada pelo resultado da ação” (Idem, p. 38). O
agente racional é aquele que busca encontrar os melhores meios para seus fins, todavia,
a racionalidade nesta perspectiva pode falhar, pois o agente escolhe aquilo que “crê” ser
o melhor. O problema que surge neste momento é saber qual é a premissa em que se
baseia a crença do agente, e até que ponto a escolha realizada pode ser onerosa para
ele. Todavia não discutiremos aqui os limites da racionalidade, o que nos interessa de
8
Ibidem, p. 29
9
Ibidem, p. 30
10
Ibidem, p. 37
11
Idem, p. 38
fato é elucidar como se aplica a teoria da escolha racional às decisões coletivas tendo
em vista que esta teoria é definida em termos individuais. A passagem entre individual
e coletivo pode ser entendida quando pensamos em termos de teoria dos jogos, pois
esta nos fornece uma conquista prática para análise das ações individuais por ser um
aparato lógico que quando acrescido de princípios de comportamento pode ser submetido
a testes empíricos 12 .
Um dos principais pressupostos da teoria dos jogos é que quando dois ou mais
indivíduos interagem eles podem fazer muito pior por si mesmo do que quando agem
isoladamente 13, isto é, num contexto de ação coletiva devido a interdependência das
decisões devemos sempre tentar antecipar a decisão dos outros para que a ação em
conjunto não seja oneroso ao indivíduo. O mais conhecido de todos os jogos é o “dilema
do prisioneiro”. Para enunciarmos um exemplo elucidativo do “dilema do prisioneiro”
recorreremos a nota 40 do capítulo 8 da obra Poliarquia de Robert Dahl:
“Trata-se de um jogo para duas pessoas com quatro resultados possíveis: (1) a melhor
alternativa de A, que é a pior para B. (2) A melhor alternativa de B, que é a pior para A
(3) A pior altenativa para ambos. (4) Uma altenativa satisfatória, melhor do que o pior
para cada um deles, mas um pouco menos satisfatória para cada um do que seu melhor.
Um exemplo seria:
B escolhe alternativa
___________________________________
x y
(4) (1)
p A ganha U$ 9 A perde U$ 10
q perde U $ 10 A perde U $ 9
B ganha U $ 10 B perde U $9
12
Idem, p. 45
13
Ibidem.
Como já mencionamos uma das principais obras que influenciou a escola da Public
Choice foi o livro Social Choice an Individual Values. Nesta obra, Arrow indicou a
inconsistência lógica das escolhas coletivas e sugeriu a construção de modelos teóricos
que sejam capazes de explicar a lógica da ação social de maneira coerente de maneira
que as preferências individuais não sejam solapadas.
Para Arrow, “In a capitalist democracy there are essentialy two method by which
social choices can be made: voting, typically used to make political decisions, and the
market mechanism, typically used to make economic decisions”15. Estes procedimentos
de fato são as duas principais maneiras de se tomar decisões sociais nas democracias
contemporâneas. O voto é utilizado nas decisões políticas enquanto os mecanismos de
mercado se aplicam às decisões econômicas. Mesmo em países de economia mista o
14
DAHL, R. Poliarquia: participação e oposição. São Paulo: Edusp, 1997, p.69.
15
ARROW, K. J. Social Choice and Individual Values. New York, Wiley, 1963, p. 1.
peso maior é dado ao voto. Em unidades sociais menores as decisões são tomadas por
um indivíduo ou pelo código sagrado (costumes – tradições). No tocante a escolha social,
Arrow indica que a ditadura ideal (autoridade exercida por um indivíduo que sozinho tem
o poder de realizar as escolhas sociais) e a convenção (onde existe uma vontade comum
ou vontade geral) são métodos mais eficazes do que o voto e os mecanismos de mercado
para a consideração dos valores individuais. Neste contexto se insere a principal questão
do texto de Arrow: “ we ask if it is for possible to contruct a procedure for passing from
a set of known individual tastes to a pattern of social decision – making, the procedure in
question being required to satisfy certain natural conditions” 16 . O autor critica o
procedimento do voto e do mercado por amalgamar as preferências individuais. Uma
sociedade bem integrada é obtida através de decisões sociais consistentes embora envolva
preferências conflitantes. Como então é possível lançar mão de um método formal de
agregação de escolhas individuais? Em outras palavras, é possível uma vontade geral
(comum) capaz de ordenar os conflitos sociais sem amalgamar as preferências individuais?
1, 2, 3 – indivíduos
A, B, C – alternativas
1 prefere A a B a C = A a C.
2 prefere B a C a A = B a C.
3 prefere C a A a B = C a B.
16
ARROW, K. J. Social Choice and Individual Values. New York, Wiley, 1963, p. 2.
17
Idem.
18
MORAES, R. C. C. “As incomparáveis virtudes do mercado: políticas sociais e padrões de
atuação do Estado nos marcos do neoliberalismo”. In: KRAWCEYK, N. CAMPOS, M.M. HADDAD,
S. O Cenário Latino Americano no Limear do século XXI. Reformas em debate. Campinas:
Editora Autores Associados, 2000, p. 19.
Ao tratar das razões da escolha coletiva, Mueller traça uma espécie de elogio à mão
invisível: “el logro más importante de la teoria enconómico es la demonstración de que
los indivíduos, dotados de motivos estrictamente egoístas, pueden resultar mutuamente
beneficiados mediante el intercambio”19. A mão invisível tem na economia de mercado
livre a regra para a escolha coletiva. Todavia, para que a relação de troca não seja
onerosa para nenhum das partes, os indivíduos que escolhem comprar ou vender devem
estabelecer um contrato constitucional que fundamentaria as trocas voluntárias. Uma
dos principais cláusulas deste contrato é que o ato de roubar não é permitido, isto garantirá
que a troca será vantajosa. Em termos institucionais o contrato constitucional “estabelece
os direitos de propriedade e as restrições de conduta para cada indivíduo” (Mueller, p.
24). Para Samuelson, “um sistema de derechos de propriedade y de mecanismos para
seu cumprimento, constitue um bem público (...) o consumo de um indivíduo não diminui
o consumo de outro indivíduo do bem em questão”20.
19
MUELLER, D. Elección Pública. Madrid: Alianza Editorial, 1979, p. 23.
20
Samuelson, 1954, apud: Muelle Elección Pública. Madrid: Alianza Editorial, 1979, p. 25.
3 – Considerações finais:
21
MUELLER, D. Elección Pública. Madrid: Alianza Editorial, 1979, p. 27.
22
MUELLER, D. Elección Pública. Madrid: Alianza Editorial, 1979, p. 30.
Referências Bibliográficas:
ARROW, K. J. Social Choice and Individual Values. New York: Wiley, 1963.
GuilhermeCoutinho
Guilherme CoutinhoD’Onofrio
D’Onofre*
Resumo
O presente texto aborda as condições históricas e sociais do trabalho realizado pelo Recanto
Vida Nova, na Paróquia São José do Ipiranga, localizada no bairro do Ipiranga. O objetivo é
identificar e descrever os diferentes aspectos socioculturais que dão suporte à implantação
e ao desenvolvimento das atividades do Recanto Vida Nova, que contribui para a recuperação
de moradores de rua da região.
Palavras Chaves: Recanto Vida Nova, Paróquia São José; Moradores de Rua; Bairro do Ipiranga
Abstract
The present paper approaches historical and social conditions of the work done by the
Institution Recanto Vida Nova, São José do Ipiranga Parish, located at Ipiranga neighborhood.
The aim of the paper is to identify and to describe the various socio-cultural aspects that
support and set up the development of the activities of Recanto Vila Nova, which contributes
to the recovering of homelesses that inhabit the region.
Key-words: Recanto Vida Nova, São José Parish; homeless; Ipiranga neighborhood
de milhões de pessoas que vivem nas periferias das cidades. É importante destacar que
grande parte da população favelada deixou terras de sua propriedade ou locais onde
plantavam para exercer funções mal remuneradas nos centros urbanos.
Organizado pela Paróquia São José, o Recanto Vida Nova tem capacidade para abrigar
20 internos, sendo mantido com dízimos dos fiéis, doações e auxílio de empresas tais
como: a Intermédia Sistema de Saúde, a Dissei Engenharia e Construções Ltda e a Edições
Loyola (desligada do projeto, nesse semestre). O fim da exclusão social, no bairro do
Ipiranga, é uma das prioridades da entidade, que desenvolve diversos projetos para a
readaptação do ser humano ao convívio da denominada “sociedade”. O trabalho social da
Paróquia São José é muito diversificado e intenso, envolvendo projetos em plena execução
Padre Antônio de Lima Brito é o pároco da Igreja São José do Ipiranga e também um
líder na execução dessas atividades. Desenvolve diversas ações na região, entre elas:
inúmeras pastorais dinamizadas (catequeses em crescentes níveis, atendendo às
diferentes faixas etárias, chegando à formação de agentes): orientação de noivos e
encontros de casais; criação do Centro de Pastoral; gerenciamento da Pastoral da Saúde;
desenvolvimento de quatro projetos educativos com formação de coral, banda e aulas de
computação, expressão corporal e violão (além da catequese, esses projetos já
conseguiram tirar mais de 190 crianças das ruas, dando condições melhores de vida);
formação da Farmácia Paroquial, centro médico e odontológico; execução do projeto
Casa Êxodo e da Comunidade São Judas Tadeu que atendem dependentes químicos; e o
Recanto Vida Nova, especializado em dar abrigo aos moradores de rua.
1
Depoimento de Ilário Augusto Mazzarolo, padre superior geral da Congregação dos Religiosos
de Nossa Senhora de Sion, Jornal O Carpinteiro. Julho/Agosto 2002, p. 6.
Sacomã 13 ———- 13
DISTRITOS LOGRADOURO
Rua Cisplatina
Rua Lino Coutinho
Rua Bom Pastor
Praça da Independência
Rua Pouso Alegre
Rua Lino Coutinho
2
Fonte: Censos de Moradores de Rua da Cidade de São Paulo 2000
– Secretaria Municipal de Assistência Social SAS/CGPC \
– Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas – FIPE
Cursino Santa Cruz Ocupado por uma família que comercializa plantas
Referências Bibliográficas
ALMEIDA, José Luís Vieira. Tá na rua: representações de prática dos educadores de rua.
São Paulo: Xamã, 2001.
NASSER, Ana Cristina Arantes. A vida dos homens da noite na cidade grande. Travessia
do Migrante. São Paulo, nº 29, Setembro/Dezembro de 1997, p. 5-11.
Resumo
Este trabalho trata da importância da informação para o investimento no agronegócio para o
Brasil, e principalmente para o Estado de São Paulo. A partir das análises das ações do
governo paulista, observou-se que existe uma grande preocupação no que diz respeito às
políticas públicas de geração e transferência de conhecimento técnico e científico para a
população que depende dos setores agrícola e agroindustrial. O enfoque principal dessa
pesquisa foi avaliar em que medida a comunicação científica e tecnológica, por meio da
informação, pode contribuir para o desenvolvimento do agronegócio. Como objeto de estudo
para esta pesquisa, foi escolhida uma instituição que trabalha com a informação, e para isto
utiliza a internet e se destaca na área de desenvolvimento de pesquisas e difusão tecnológica
para o agronegócio paulista, o Instituto de Tecnologia de Alimentos (ITAL).
Palavras-chaves: Informação, Comunicação, Conhecimento, Setores agrícola e agroindustrial.
Abstract
This study aims at the importance of information for the investment in agribusiness within
Brazil, and mainly to the State of São Paulo. Based on the analysis of actions carried out by
the Paulista Govemment, it was clearly noticed that there is a great concern by virtue of the
public policies in terms of creation and transfer of technical and scientific knowledge to the
population who relies on the agricultural and agro-industrial sectors. The main focus of this
research was on the extension that technical and scientific communication – through
information – can contribute to the development of agribusiness. For this study has been
chosen to focus on, the Instituto de Tecnologia de Alimentos – ITAL:(Institute of Food
Technology) was chosen. This institute deals with information making use of the Internet to
do so, apart from standing to the Paulista agribusiness sector.
Keywords: Information, Communication, Knowledge, Agricultural and agro-industrial sectors.
A busca por informação tem sido uma demanda crescente entre os agricultores.
Entre os veículos de comunicação, a Internet e o rádio apresentam-se, para o agricultor,
como importantes instrumentos para a aquisição de conhecimento. O rádio é utilizado há
muito tempo, mostrando-se adequado às necessidades do homem do campo, em especial,
pelo imediatismo da informação e pelo relacionamento íntimo que consegue estabelecer
com a comunidade1. Quanto à Internet – mesmo com o acesso ainda limitado em grande
parte da área rural – apresenta-se como um canal de alta relevância, pois pode realizar
a mediação necessária entre fonte e destinatário2.
1
RABAÇAL, Myriam da Costa Hoss. Rádio: 80 anos no ar. Revista Álvares Penteado. São Paulo,
v. 4, n. 10, p. 81, dez. 2002.
2
POLISTCHUCK, Llana & TRINTA, Aluízio R. Teoria da comunicação: o pensamento e a prática
da comunicação social. Rio de Janeiro: Campus, 2003, p. 161.
ao produtor rural e pequeno empresário familiar. Nesse sentido, deve se destacar que a
informação dirigida aos setores agropecuário e agroindustrial somente repercute quando
a linguagem empregada pelos meios de difusão recebe um tratamento adequado ao
repertório do receptor, nesta análise: o produtor rural.
As pesquisas realizadas pelo ITAL apontam a Internet como canal pelo qual o fluxo
de informação encontra o seu mais preciso e rápido meio para chegar até o destinatário.
Qualificada como “meio de difusão coletiva”, a Internet tornou-se para o ITAL um
importante veículo de ação simultânea e cooperação na troca, difusão e obtenção de
informações e conhecimentos para o agronegócio paulista. A emergência de veículos
especializados, o fortalecimento de periódicos focados prioritariamente em economia/
negócio e, sobretudo, a multiplicidade de web sites que contemplam as atividades agrárias
são ações que aumentaram significativamente o espaço de divulgação do agronegócio.4
3
D’AZEVEDO, M. C. Teoria da informação. Fundamentos biológicos, físicos e matemáticos.
Relações com a Cultura de Massas. Petrópolis: Vozes, 1871, p. 89.
4
BUENO, Wilson da Costa. A Internet na Agricultura. Jornal O Estado de S. Paulo. São Paulo,
Suplemento Agrícola, Jan. 2004, p. 12.
As políticas públicas adotadas pelo Estado dão prioridade à criação de unidades como
os institutos especializados em alta tecnologia e transmissão de informações para o
agronegócio. Com a intervenção estatal, o pequeno produtor rural pode ter acesso à
Internet de uma maneira coletiva, em bairros rurais, unidades de cooperativas, associações
5
SANTORO, Luiz Fernando. Mídia comunitária, Internet, imprensa e televisão: o que muda no
processo de formação da opinião pública no Brasil. Apostila para o curso de Mestrado em
Educação, Administração e Comunicação da Universidade São Marcos. Julho 2002, p. 10.
Referências Bibliográficas
RABAÇAL, Myriam da Costa Hoss. Rádio: 80 anos no ar. Revista Álvares Penteado. São
Paulo, v. 4, n. 10, 2002.
SANTORO, Luiz Fernando. Mídia comunitária, Internet, imprensa e televisão: o que muda
no processo de formação da opinião pública no Brasil. Apostila para o curso de Mestrado
em Educação, Administração e Comunicação da Universidade São Marcos. Julho 2002.
Resumo
O artigo reproduz os conteúdos do projeto “Krucutu: resgate da sabedoria do palmito na
Mata Atlântica”, o prêmio da Unisol/Banco Real e relata experiências entre os universitários e
os indígenas guarani mbya da aldeia Krucutu (SP).
Palavras-Chave: projeto de reflorestamento, índios mbya, experiência universitária.
Abstract
The article reproduces the contents of the project “Krucutu: rescue of the wisdom of the
palmito in Mata Atlântica”, the prize of the Unisol/Banco Real and tells to experiences between
the colleges student and the aboriginals guarani mbya of the aldeia Krucutu (SP).
Keywords: project of reforestation, indians mbya, university experience.
Um olhar sobre a aldeia Indígena Krucutu ressalta o núcleo Guarani Mbya situado na
região de Parelheiros, a beira da Represa Billings. Entre as vinte e nove aldeias guarani
do Estado de São Paulo, a aldeia Krucutu e sua vizinha aldeia Morro da Saudade (também
chamada Tenonde Porã) compreendem núcleos inseridos na metrópole paulista.
*
Professora de antropologia e membro do Núcleo de Programas e Projetos Sociais da
Universidade São Marcos.
**
Assistente de Projetos do Núcleo de Programas e Projetos Sociais da Universidade São Marcos.
Nos últimos dez anos os índios guarani vêm se tornando alvo de atenção dos civilizados
em decorrência de iniciativas e projetos que foram aplicados em suas aldeias no Estado
de São Paulo. Os campos de atuação relacionados a saúde, educação, habitação são os
mais destacados dessa influência. Nas aldeias da cidade de São Paulo a criação de escolas
estaduais de 1º grau e do Centro Educacional de Cultura Indígena – CECI – de iniciativa
municipal (para atendimento de crianças de 1 a 6 anos), nos últimos 3-4 anos, representam
a presença de valores desenvolvidos conforme definição atual da educação indígena e o
seu sentido emancipador de interculturalidade.
1
Considerou-se o termo jejy, em língua nativa, para o projeto. Esse termo é a designação
para o palmito juçara.
2
A organização desse projeto e sua inserção no referido concurso da FGV (Gestão e Cidadania)
foi realizada pela Profª Drª Marília G. Ghizzi Godoy nos anos 96-98 e 2002 quando recebeu
o prêmio.
Com o prêmio, o Projeto Jejy ganhou vulto e desde então vem se tornando um meio
de sustentabilidade e também de reforço das tradições culturais indígenas na Mata
Atlântica, no ambiente comunitário.
À medida que a palmeira passou a fazer parte do meio nativo, os plantios tornaram-
se recursos integrantes do cotidiano e universo cultural dos habitantes. Viver ao lado
desse reflorestamento passou a ser intrínseco à vida nativa.
Diante dessa iniciativa, outras aldeias inseridas em áreas devastadas da Mata Atlântica
apresentam motivações no sentido de implantar o reflorestamento do palmito juçara.
2. Descrição do Projeto
É preciso constar que para introduzir o projeto na dinâmica concursiva foi preciso
preencher os incisos do modelo de projeto, conforme edital da entidade proponente (Unisol).
Tem ele por objetivo promover a reprodução do “Projeto Jejy” a partir da aldeia do
Ribeirão Silveira que deu origem a viveiros de mudas de palmito e formação de palmiteiros
naquela região. Pelo projeto desenvolveram-se meios de subsistência aos índios guaranis
Da ampla bibliografia que trata desse povo foram destacadas as obras de Egon
Schaden, M. Inês Ladeira, Marília G.G. Godoy, Bartomeu Melià.
Uma reflexão e discussão sobre esses autores seguiu como prioritário a identidade
da cultura em termos de sua concepção mitológica, messiânica com um dom religioso
próprio que preenche todas as esferas do convívio nativo, principalmente um passado
expressivo com uma tradição “caçador-coletor” indica a rotina desse povo ao se dedicarem
a “morar no meio da mata”. De forma estratégica o sedentarismo e o desempenho agrícola
que se desenvolveram entre eles projeta-se como representação histórica da comunidade
e subsistência. As bases da organização social encaminhada pela chefia e parentelas
decifram os agrupamentos patrilocais da aldeia em discussão.
Como em outras aldeias mbya o xamanismo toma vulto pela atuação dos grandes
xamãs, designados Xeramoi, termo que quer dizer “meu avô”. Os rituais religiosos ocorrem
3
Descrição e narrativa do projeto em questão.
Essa viagem contou com o apoio da escola municipal que favoreceu a estadia e
ordenação das reuniões. Criou-se um espaço educativo onde a comunidade e os líderes
do plantio do palmito puderam expor idéias e apresentarem posições sobre a cultura,
ligados ao replantio de árvores nativas e a questão de sustentabilidade.
Ficou marcante o que representa o palmito para os guarani. Trata-se de uma árvore
nativa presente no interior das matas e cujo caule comestível era obtido como parte dos
4
O termo jurua é usado em todas as aldeias Mbya para expressar o branco, representante do
estilo de vida civilizado. Esta designação deriva do termo juru que indica boca e ‘a (cabelo):
significa a figura do homem branco marcada pelo bigode.
5
A seleção desses alunos foi resultante de um edital de convocação que foi colocado em cada
sala de aula. Considerou-se como critério que os universitários deveriam cursar no mínimo o
3º semestre dos cursos.
Os dois guarani, Valdelino Gonçalves, Noelio Vitorino Karai Tataendy que foram os
indígenas mais atuantes no projeto puderam sentir de perto o convívio com os
universitários. O entendimento do plantio foi sendo construído por meio de uma troca de
conhecimentos. Foi destacável a capacitação desenvolvida pela influência de Vando e do
Projeto Jejy. Para eles a experiência enfatizou um meio próprio de comparação e afirmação
dos saberes tradicionais e a leitura técnica dos universitários jurua.
Após a recepção do grupo, foi realizada uma reunião na associação local para
apresentação da proposta de trabalho para esse dia: fazer o reconhecimento das trilhas da
aldeia utilizando um GPS (Sistema Global de Posicionamento) e coletar amostras do solo
da aldeia para análise, visitar e conhecer os agrupamentos familiares. Retornamos às 17
horas após uma visita na Casa de Rezas.”
A equipe dos alunos saiu da Universidade às 8 horas, chegou 9h30 no local e deu
início aos trabalhos, após breve encontro com a equipe indígena que vem nos
acompanhando e, assim, foram verificados o crescimento dos palmitos, já plantados.
Estamos sempre rodeados pelas crianças as quais para nós tornaram-se integrantes
da experiência. Percebemos o quanto elas compartilham da experiência. Estão sempre
alegres e demonstraram muito interesse por tudo que nos diz respeito. Nós conversamos
muito e na hora da refeição é uma confraternização entre todos.
Mas o jejy não é apenas bonito saboroso. Ele é também um dos guardiões da mata.
Com a sua volta, voltarão os bichos da mata, virão outras plantas que resgatam a saúde
dos solos e cicatrizam as feridas da mata.
Para que a gente não precise cortar o palmito juçara que é também parte do paisagismo,
plantamos o Pupunha, ele também é muito saboroso. Esta palmeira demora apenas três
anos para crescer, dá muito palmito e quanto mais a gente corta, mais palmito vão
surgindo. As coisas saborosas da Natureza são para serem apreciadas.
Sem a planta não há bicho, sem bicho não há planta, sem planta não há solo, sem
solo não há alimento, sem alimento não há gente e sem gente não há sentido.
A palmeira continua no topo da mata, mas seus irmãos se foram quase todos. Restaram
poucos para contar sobre os segredos da sua espécie, poucos para nos contar sobre A
Sabedoria do Palmito Juçara.
A professora Marília Godoy faz de tudo para a gente aprender a cultura guarani. Entendemos
como as famílias vivem. Pudemos conviver nos pátios das moradias e saber um pouco desse
modo de vida que tínhamos lido nos livros. Compartilhando de um mundo natural e com respeito
pela vida tradicional esses guarani são como filósofos que se negam a seguir os brancos. O modo
de ser deles chamado nhangareko é uma expressão da sua filosofia voltada para a natureza. Nas
atividades diárias observamos como a cultura cria valores que têm uma expressão de definir o
dia-a-dia da comunidade e da sobrevivência. A presença de escolas, da televisão em algumas
moradias parecem representar verdadeiros testes para o futuro desses indígenas.6
Bibliografia
GODOY, Marília G. Ghizzi – Nande Reko Arandu – Música e Tradição Cultural – Arte e Ciência
– Descoberta/Descobrimentos. São Paulo, ECA-USP. Ano 2 nº 2. Pp. 276-289. s/d.
6
Texto do diário de campo do aluno Felippe Augusto Tribuzzi (curso de Pedagogia).
GODOY, Marília G. Ghizzi – “Teko Axy – o misticismo Guarani Mbya na era do sofrimento
e da imperfeição” Tese de doutoramento. PUC, São Paulo, 1995 (datilografada).
LADEIRA, Maria Inês – “O caminhar sob a luz”- O território Mbya à beira do oceano
– Dissertação de mestrado. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica, março de 1992
(datilografada).
MELIÀ, Bartomeu – A experiência religiosa guarani IN: MELIA, Bartomeu et alli – O rosto
índio de Deus – Coleção Ecologia e Libertação. Rio de Janeiro, vozes, 1989, Pp. 293-357.
Imagens
a relevância de se trabalhar com programas de código aberto, onde todos podem colaborar
para a construção de melhores resultados.
O livro aborda o Projeto GNU, sistema operacional livre, que se complementa com
um dos maiores e mais populares programas livres: o Linux, o qual foi utilizado na
experiência de Marini na gestão de tecnologia da informação na Prefeitura de Rio das
Ostras (RJ). Ao final dessa seção o livro traz textos complementares à leitura, como a
“Definição de Software Livre da Free Software Foundation”, instituição criada por
Stallman, cuja filosofia rompe as amarras dos programas sob propriedade, defendendo
a liberdade dos usuários. Independente de ser programador ou usuário eventual, o
indivíduo deve ter a liberdade de executar, copiar, distribuir, estudar, modificar ou
aperfeiçoar os seus softwares. Manter um programa sob propriedade é, conforme a
Free Software Foundation, um exercício do poder. E é nessa filosofia que o movimento
do software livre se constitui parceiro do desenvolvimento do conhecimento e da
cidadania. O conhecimento deve ser para todos.
Mas é na seção “Resumo dos trabalhos”, ao final da primeira parte, que o leitor
visualiza a considerável redução de custos que representa o uso do free software. O
autor sugere diversos programas livres que podem substituir os programas proprietários,
salientando a relação custo x benefício implicada na troca. É importante que a população
conheça os valores cobrados pelos fabricantes de softwares e possa optar por uma
tecnologia similar que não ofereça custos.
A demanda por soluções tecnológicas cresce a cada dia, inclusive no setor público que
deve buscar propostas para atender as necessidades da população. Aliada ao pionerismo
do e-book de Marini, foi publicada pelo Governo Federal, em junho, a Cartilha Amarela. O
material esclarece, de forma resumida, os cidadãos sobre os benefícios do uso dos programas
livres. Esse manual eletrônico, publicado no site www.softwareLivre.org.br, faz parte das
ações do Instituto Nacional de Tecnologia de Informação, responsável pelas práticas de
Governo Eletrônico no Brasil.
O livro “Administração Pública e Livre, que vai ao encontro das iniciativas governamentais
brasileiras, contribui com os leitores, individualmente, na medida em que esclarece o
indivíduo sobre a realidade dos monópolios na área tecnológica, e coletivamente quando
expõe o software livre como estratégia de governança pública para administrar recursos
de forma a contemplar mais projetos que beneficiem a população.
Além desses motivos que fazem a leitura da obra uma tarefa indispensável a qualquer
administrador, quer seja da iniciativa pública ou privada, o livro conta com uma abordagem
simplificada, permeada de imagens que ilustram o assunto de forma didática.
Normas editoriais
3- Só serão aceitas resenhas de livros publicados no Brasil nos últimos três anos e, no
exterior, nos cinco últimos anos.
7- As imagens, quando houver, devem ser remetidas com os artigos para serem
escaneadas pela produção da revista ou estarem em tif com 150 dpis.
12- Caso o artigo seja resultante de uma pesquisa contemplada com auxílio financeiro, a
instituição responsável pelo auxílio deve ser mencionada.
13. Os trabalhos devem ser apresentados em disquete e em duas vias impressas, das
quais uma não exibirá dados de identificação do autor. O programa utilizado deve ser
compatível com o Word for Windows.
- SOBRENOME, Nome. Título do capítulo ou parte do livro. In: Titulo do livro itálico.
Tradução, edição, Cidade: Editora, ano, p. x-y.
18. As notas explicativas devem ser reduzidas ao mínimo e remetidas ao rodapé por
números, situados na entrelinha superior.
20. As imagens e suas legendas devem ser claramente legíveis após sua redução no
texto impresso de 10 x 17 cm. Devem-se indicar, a lápis, no verso, autor, título
abreviado e sentido da figura. As legendas das ilustrações nos locais em que aparecerão
as imagens devem ser numeradas consecutivamente, em algarisos arábicos, e iniciadas
pelo termo “Imagem”.
21. Os dados e conceitos emitidos nos trabalhos são de inteira responsabilidade dos
autores.
22. Os trabalhos que não se enquadrarem nas normas da revista serão devolvidos aos
autores, ou serão solicitadas adaptações, indicadas em carta pessoal.