Você está na página 1de 3

A Liturgia a serviço da vida

3º Encontro

O “tema e lema” do 13º Intereclesial lembram que a liturgia como “exercício do sacerdócio
de Jesus Cristo e do seu corpo místico, a Igreja, através de sinais sensíveis, para o louvor de Deus e
santificação da humanidade” (SC 7), coroa e comporta um compromisso profético e transformador das
estruturas sociais e com o desenvolvimento e promoção da vida, porque toda a criação está inserida no
desígnio salvador de Deus (Cf. Medellin 9,4). Alguém poderia perguntar: “O que tem a ver LITURGIA com
SERVIÇO ou com JUSTIÇA SOCIAL? E com a realidade do povo”?

A liturgia que agrada a Deus é a vida “em espírito e verdade (Jo 4,23-24)”. Isto é, a vida dos cristãos
que brotou do mistério pascal de Cristo pelo batismo (Cf. Rm 6,4-11), inserida no mundo e promovendo o
direito e a justiça, relações fraternas e reconciliadas. Para são Tiago apóstolo, a fé vai além da liturgia do
templo: “Se alguém pensa que é religioso e não sabe controlar a língua está enganando a si mesmo, e sua
religião não vale nada. Religião pura e sem mancha diante de Deus, nosso Pai, é esta: socorrer os órfãos e as
viúvas em aflição, e manter-se livre da corrupção do mundo” (Tg 1,26-27).

A liturgia é caminho que conduz à vida. Não no sentido de quem sai da Igreja convicto de ter
cumprido uma obrigação religiosa, mas de quem, à luz do mistério celebrado, se sente impulsionado à
missão no cotidiano. A liturgia como “encontro com o Senhor” (DAp 250) atualiza no “hoje” do povo
romeiro, o encontro das pessoas com Jesus de Nazaré , no qual elas foram transformadas e dão início a um
estilo de vida novo e diferente (Cf. Lc 19,1-10; Jo 3,1-7).

A relação entre liturgia e vida é ressaltada pela Constituição da Sagrada Liturgia do Vaticano II: “A
liturgia, por sua vez, impele os fiéis, saciados pelos «mistérios pascais», a viverem «unidos no amor»; pede
«que sejam fiéis na vida a quanto receberam pela fé»; e pela renovação da aliança do Senhor com os
homens na Eucaristia, solicita e aquece os fiéis na caridade urgente de Cristo” (SC 10).

A participação no momento da celebração litúrgica sensibiliza a comunidade e a torna mais atenta


na percepção dos sinais do mistério pascal acontecendo no seu cotidiano, nos fatos de sua vida. Participar
da ação litúrgica significa: viver a vida como uma grande liturgia e viver a liturgia sem se desligar da vida,
mas mergulhando como que em sua fonte, em seu mistério, com o olhar esperançoso voltado para o
horizonte, o futuro, a vinda do Reino, por mais difícil que seja o momento presente (Cf. BUYST, I. Participar
da Liturgia. São Paulo: Ed. Paulinas, 2012. p. 48).

“A liturgia e a vida são realidades indissociáveis. Uma liturgia que não tivesse reflexo na vida tornar-
se-ia vazia e certamente não agradável a Deus” (João Paulo II, Mensagem à Congregação para o culto divino
e a disciplina dos sacramentos, 21.12.2001). É a vida dos cristãos que, depois de terem celebrado os
mistérios da salvação e fortalecidos pela força de Deus, inseridos nas multiformes atividades promotoras do
bem comum, servirá de teste para averiguar se a celebração foi apenas um rito vazio, ou se realmente nutriu
a vida dos seus participantes, tornando-a nova e profética.

A ação litúrgica como ação comunitária e com o rosto do povo, atualizadora da “liturgia de Deus que
tem como ápice o mistério pascal de seu Filho Jesus”, revela e mergulha as pessoas na ternura vigorosa do
Pai, confirma e abre novos horizontes na missão; suscita e alimenta a confiança de que um mundo justo e
fraterno é possível, aquece e ilumina a luta resistente do cotidiano, renova e firma a fé, a esperança e a
perseverança no seguimento de Jesus Cristo.

Um jeito de celebração das CEBs e dos romeiros

Um dos traços característicos das celebrações da CEBs e das próprias romarias, é sua
referência à casa. Homens e mulheres, jovens e crianças saem de suas casas para se reunirem em
comunidade ou partirem em romaria na certeza de serem convocados por Deus. Como para a jovem Maria
(Cf. Lc 1,28s), é a partir da “liturgia da casa” que muitas pessoas se sentem convidadas a tomar parte das
celebrações comunitárias e fortalecidas para tomar o caminho da romaria.

As celebrações das comunidades caracterizam-se pela acolhida fraterna, carinhosa e alegre.


Pessoas na porta da igreja ou capela acolhem os irmãos e irmãs que vão chegando e os saúdam com
simpatia, dando uma atenção especial às crianças, aos idosos e às pessoas portadoras de deficiências. A
acolhida reúne as pessoas no carinho de Deus e cria, na força do Espírito Santo, a assembleia litúrgica.

O momento alto e significativo é sempre a proclamação e a partilha da Palavra de Deus. Ela provoca
a partilha da palavra, remete à vida e às lutas do dia a dia, fortalece o compromisso com o bem e proclama
que a união e a participação de todos, fazendo parte da renovação da aliança com Deus. Para as
comunidades, são momentos indissociáveis a acolhida da Palavra de Deus, a partilha e meditação e a
vivência comunitária. Alimentadas pela Palavra de Deus e pela vivência de comunhão, as CEBs ajudam a
Igreja a estar mais comprometida com a vida e o sofrimento dos pobres, como fez Jesus. Elas manifestam,
claramente, que “o serviço dos pobres é medida privilegiada, embora não exclusiva, do seguimento de
Cristo” (DP 1145) (CNBB. Mensagem ao Povo de Deus sobre as Comunidades Eclesiais de Base. maio 2010).

As preces ou orações da comunidade fundam-se na vida, iluminada e questionada pela Palavra


proclamada e partilhada; além disso, expressam o compromisso da aliança como resposta da comunidade
reunida, firmada na confiança inabalável e no hino de louvor. A preocupação de rezar tendo presente as
necessidades da Igreja Local e suas lideranças, faz das preces expressão de comunhão eclesial. A solicitude
com a realidade eclesial e social faz com as orações não sejam uma simples leitura de um texto alheio à vida.

Nas CEBs as celebrações emergem como momentos fortes e que possibilitam às pessoas beberem da
água pura que jorra da fonte, o mistério pascal de Cristo. Para que das ações litúrgicas jorrem, de fato, rios
de água viva que irrigam nossa vida, elas devem ser bem preparadas por “equipes de liturgia”. O roteiro das
celebrações e a divisão corresponsável dos serviços e ministérios constituem-se criativamente integrando a
ação simbólica, o sentido teológico e litúrgico e o agir na inteireza do ser. Nas comunidades eclesiais a
vivência das ações rituais faz parte da dinâmica da preparação das celebrações. Em geral, o povo aprecia a
sadia criatividade e não se importa com o tempo que a celebração pode durar. Enfim, ela faz parte da
dimensão gratuidade da vida. Os fatos da vida são atualizados à luz da proclamação e da partilha da palavra
de Deus.

Os ministros, a assembleia, o povo reunido para a oração e a escuta da Palavra, têm no coração a
alegria de Deus para acolher a todos, dialogar com as pessoas, dar voz e vez aos irmãos e às irmãs e viver a
experiência de filhos e filhas, amados pelo Pai. A comunhão constitui a realidade fundamental que permeia a
todos e que traduz a presença do Deus-Trindade.

O protagonismo dos leigos e leigas nas CEBs é expressão viva de uma Igreja que se renova animada
pelo Espírito Santo, é também um sinal de que no discipulado estão surgindo novos ministérios e serviços.
Há extrema facilidade das pessoas assumirem ministérios litúrgicos e os exercerem dignamente, com uso
adequado de vestes e posturas dignas e nobres, desta forma ajudam as pessoas entrarem no clima do
mistério celebrado e imprimem um tom de festividade.

É desconhecida a presença dos folhetos litúrgicos ou outros textos, mas além de uma folha ou livro
de cantos, todos voltam-se para a escuta da Palavra proclama, acolhem a reflexão partilhada e voltam seus
olhares para os locais onde se desenvolve a ação litúrgica. Há uma liberdade de movimentos e muita
espontaneidade no modo de participar e rezar com a assembleia.

A escolha dos cantos e hinos, baseados nos textos bíblicos ou litúrgicos, num ritmo mais popular e
de fácil aprendizado, acompanhado por instrumentos musicais próprios da cultura local, expressam a atitude
orante das comunidades eclesiais.

Um cuidado especial na preparação do espaço celebrativo, ornado com elementos da natureza e da


cultura popular, normalmente colorido e alegre. A comunidade é a verdadeira casa de Deus. O espaço da
celebração é o espaço do encontro da comunidade reunida. Ele deve primar pela dignidade e beleza, sinal
da beleza de Deus e servir à finalidade da celebração.

Enfim, nas celebrações das comunidades eclesiais, a vida ressuscita, a nova criação de Deus se
anuncia e o futuro se antecipa como promessa e garantia. Elas se constituem numa antecipação do que Deus
promete para todos. Isto é, são, ao mesmo tempo, sinal e penhor da vida plena de Deus em Cristo e no
Espírito, presente na história do povo. O rio da água viva que brota da comunhão trinitária, banha, sacia a
sede e nos revigora através das celebrações das comunidades eclesiais e do peregrinar do povo romeiro.

“Celebrar é preciso para viver dignamente romarias do Reino no campo e na cidade”!

Texto elaborado em mutirão por: Marcelino Sivinski, Carlos Gustavo Haas,


Alberto Reani. Aureliano Gondin .

Você também pode gostar