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SALMOS E SAPIENCIAIS

CURSOS DE GRADUAÇÃO – EAD


Salmos e Sapienciais – Prof.ª Ms. Rita de Cácia Ló e Prof. Dr. Cássio Murilo Dias da Silva.

Meu nome é Rita de Cácia Ló. Sou bacharel em Teologia e


mestre em Ciências da Religião, na área de Literatura e Religião
no Mundo Bíblico – UMESP. Atualmente, colaboro na formação
de leigos nas dioceses de Campinas e Bragança Paulista.
Publiquei vários artigos na área de exegese e teologia bíblica.
E-mail: cacialo@yahoo.com.br

Meu nome é Cássio Murilo Dias da Silva. Tenho mestrado e


doutorado em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico
de Roma. Faço parte do corpo de tradutores e revisores da
Bíblia da CNBB e colaboro com as Edições Loyola como tradutor
e assessor. Tenho livros e artigos publicados sobre exegese e
teologia bíblica. Dedico minha vida ao estudo e ao ensino da
Bíblia. Encorajo todos a buscarem conhecer sempre mais a
Palavra de Deus.
E-mail: kassiomu@yahoo.com.br
Prof. Dr. Cássio Murilo Dias da Silva
Prof.ª Ms. Rita de Cácia Ló

SALMOS E SAPIENCIAIS

Caderno de Referência de Conteúdo


© Ação Educacional Claretiana, 2010 – Batatais (SP)
Trabalho realizado pelo Centro Universitário Claretiano de Batatais (SP)

Cursos: Graduação
Disciplina: Salmos e Sapienciais
Versão: jul./2013

Reitor: Prof. Dr. Pe. Sérgio Ibanor Piva


Vice-Reitor: Prof. Ms. Pe. José Paulo Gatti
Pró-Reitor Administrativo: Pe. Luiz Claudemir Botteon
Pró-Reitor de Extensão e Ação Comunitária: Prof. Ms. Pe. José Paulo Gatti
Pró-Reitor Acadêmico: Prof. Ms. Luís Cláudio de Almeida

Coordenador Geral de EAD: Prof. Ms. Artieres Estevão Romeiro


Coordenador de Material Didático Mediacional: J. Alves

Corpo Técnico Editorial do Material Didático Mediacional


Preparação Revisão
Aline de Fátima Guedes Felipe Aleixo
Camila Maria Nardi Matos Rodrigo Ferreira Daverni
Carolina de Andrade Baviera
Talita Cristina Bartolomeu
Cátia Aparecida Ribeiro
Vanessa Vergani Machado
Dandara Louise Vieira Matavelli
Elaine Aparecida de Lima Moraes
Josiane Marchiori Martins Projeto gráfico, diagramação e capa
Lidiane Maria Magalini Eduardo de Oliveira Azevedo
Luciana A. Mani Adami Joice Cristina Micai
Luciana dos Santos Sançana de Melo
Lúcia Maria de Sousa Ferrão
Luis Henrique de Souza
Patrícia Alves Veronez Montera Luis Antônio Guimarães Toloi
Rita Cristina Bartolomeu Raphael Fantacini de Oliveira
Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli Tamires Botta Murakami de Souza
Simone Rodrigues de Oliveira Wagner Segato dos Santos

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SUMÁRIO

CADERNO DE REFERÊNCIA DE CONTEÚDO


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................... 9
2 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA DISCIPLINA............................................. 11

Unidade 1 – INTRODUÇÃO À LITERATURA SAPIENCIAL BÍBLICA


1 OBJETIVOS......................................................................................................... 27
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 27
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 27
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE ............................................................................... 28
5 O QUE É LITERATURA SAPIENCIAL?................................................................. 28
6 LINGUAGEM DA SABEDORIA............................................................................ 31
7 SABEDORIA NO ANTIGO ORIENTE PRÓXIMO ................................................ 31
8 SABEDORIA NOS TEXTOS BÍBLICOS................................................................. 37
9 TEOLOGIA DA RETRIBUIÇÃO............................................................................ 39
10 Q UESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 41
11 CONSIDERAÇÕES............................................................................................... 41
12 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 42

Unidade 2 – ESTUDO DOS LIVROS DE PROVÉRBIOS E SIRÁCIDA


1 OBJETIVOS......................................................................................................... 43
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 43
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 43
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE ............................................................................... 44
5 PROVÉRBIOS...................................................................................................... 44
6 GÊNEROS LITERÁRIOS ...................................................................................... 48
7 CONTEÚDO TEOLÓGICO .................................................................................. 53
8 SIRÁCIDA (ECLESIÁSTICO)................................................................................. 59
9 ORIGINAL EM HEBRAICO.................................................................................. 60
10 C ANONICIDADE................................................................................................. 61
11 B EN SIRA NETO E A TRADUÇÃO PARA O GREGO............................................ 64
12 G ÊNEROS LITERÁRIOS ...................................................................................... 66
13 CONTEÚDO TEOLÓGICO................................................................................... 69
14 M ENSAGENS DOS ACRÉSCIMOS...................................................................... 74
15 Q UESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 75
16 CONSIDERAÇÕES............................................................................................... 75
17 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA......................................................................... 76
Unidade 3 – ESTUDO DOS LIVROS DE JÓ E QOHÉLET
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 79
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 79
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 79
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE ............................................................................... 80
5 O LIVRO DE JÓ................................................................................................... 80
6 QUEM É JÓ?....................................................................................................... 83
7 ESTRUTURA........................................................................................................ 84
8 GÊNERO LITERÁRIO DO LIVRO ........................................................................ 84
9 CONTEÚDO TEOLÓGICO .................................................................................. 85
10 C ONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE JÓ................................................................. 91
11 O LIVRO DE QOHÉLET (ECLESIASTES).............................................................. 92
12 ESTRUTURA ....................................................................................................... 96
13 C ONTEÚDO TEOLÓGICO................................................................................... 97
14 Q UESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 103
15 C ONSIDERAÇÕES............................................................................................... 104
16 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 105

Unidade 4 – ESTUDO DO LIVRO DA SABEDORIA


1 OBJETIVOS......................................................................................................... 107
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 107
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 107
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE ............................................................................... 108
5 SABEDORIA........................................................................................................ 108
6 CONTEÚDO TEOLÓGICO .................................................................................. 113
7 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 117
8 CONSIDERAÇÕES............................................................................................... 117
9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 118

Unidade 5 – ESTUDO DO LIVRO DOS SALMOS


1 OBJETIVOS......................................................................................................... 119
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 119
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 119
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE ............................................................................... 121
5 RESUMO DA HISTÓRIA DA INTERPRETAÇÃO DOS SALMOS........................... 121
6 SALMOS ............................................................................................................. 123
7 GÊNEROS LITERÁRIOS....................................................................................... 133
8 VEJAMOS, COM MAIORES DETALHES, CADA UMA DESSAS FAMÍLIAS......... 136
9 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 148
10 CONSIDERAÇÕES............................................................................................... 148
11 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 149

Unidade 6 – ESTUDO DO LIVRO DE CÂNTICO DOS CÂNTICOS


1 OBJETIVOS......................................................................................................... 151
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 151
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 151
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 152
5 TÍTULO ............................................................................................................... 153
6 CANONICIDADE................................................................................................. 153
7 DATA .................................................................................................................. 154
8 AUTOR................................................................................................................ 154
9 GRANDES CORRENTES DE INTERPRETAÇÃO DO CÂNTICO ........................... 155
10 ESTRUTURA ....................................................................................................... 157
11 G ÊNEROS LITEÁRIOS ........................................................................................ 158
12 CONTEÚDO TEOLÓGICO................................................................................... 159
13 Q UESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 160
14 CONSIDERAÇÕES............................................................................................... 161
15 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 162

Unidade 7 – CRÍTICA SOCIAL


1 OBJETIVOS......................................................................................................... 163
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 163
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 163
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 164
5 A LITERATURA SAPIENCIAL BÍBLICA COMO FRUTO DAS CLASSES
DOMINANTES.................................................................................................... 165
6 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 175
7 CONSIDERAÇÕES............................................................................................... 178
8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 178

Unidade 8 – CRIAÇÃO, LIBERTAÇÃO E RETRIBUIÇÃO NA LITERATURA


SAPIENCIAL
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 179
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 179
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 180
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 180
5 MUNDO, COSMOS: QUE É ISSO?...................................................................... 181
6 CRIAÇÃO............................................................................................................. 182
7 SABEDORIA CRIADORA..................................................................................... 185
8 CRIAÇÃO E HISTÓRIA DA SALVAÇÃO................................................................ 185
9 LIBERTAÇÃO HISTÓRICA E MESSIÂNICA.......................................................... 186
10 L IBERTAÇÃO SOCIAL.......................................................................................... 186
11 L IBERTAÇÃO FILOSÓFICO-TEOLÓGICA (OU RETRIBUIÇÃO)........................... 187
12 C ONCLUSÃO: LITERATURA SAPIENCIAL E NOVO TESTAMENTO.................... 190
13 Q UESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 197
14 C ONSIDERAÇÕES............................................................................................... 197
15 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 198
EAD
Caderno de
Referência de
Conteúdo

CRC

Ementa––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Salmos e Sapienciais como resposta ao Deus da Aliança diante das diferentes
situações individuais e coletivas. Conceito de sabedoria. História (pós-exílio, for-
mação do judaísmo) e teologia dos livros sapienciais e poéticos do Antigo Testa-
mento, bem como o gênero literário e as linhas de interpretação, visando formar
fundamentos para aprofundamento e atualização teológico-pastoral.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

1. INTRODUÇÃO
Nossa disciplina está dividido em três partes bem delimitadas.
Na primeira, estudamos a Literatura Sapiencial Bíblica propriamente
dita: Provérbios, Jó, Qohélet (Eclesiastes), Sirácida (Eclesiástico), Sa-
bedoria. Na segunda parte, toma lugar a Literatura Lírica: Cântico dos
Cânticos e Salmos. A terceira e última parte oferecerá algumas sínte-
ses teológicas por meio de temas que atravessam todos esses livros.
10 © Salmos e Sapienciais

Literatura Sapiencial propriamente dita


Que é Literatura Sapiencial? Começamos distinguindo a Lite-
ratura Sapiencial dos demais corpos literários da Sagrada Escritura,
bem como discutindo a finalidade da tarefa sapiencial. Veremos
que a sabedoria é uma "oferta de sensatez": oferta, porque deixa
o discípulo na liberdade de rejeitá-la; sensatez, porque oferece cri-
térios para percepção e juízo da realidade. Além disso, trata-se de
uma sabedoria artesã, um conhecimento prático para solucionar
os problemas da vida quotidiana. Sábio, portanto, não é o inte-
lectual, mas o homem que sabe aproveitar-se das experiências,
próprias e alheias, para discernir o caminho a tomar.

Sabedoria no Antigo Oriente Próximo


Num segundo momento, estudaremos como a preocupação
sapiencial não foi um fenômeno particular de Israel, mas algo co-
mum a todos os povos do Antigo Oriente Próximo (AOP). Meso-
potâmia, Egito e Ugarit: os vizinhos de Israel tinham seus próprios
caminhos. O povo de Deus foi mais passivo que ativo nesse proces-
so, importando e assimilando muito do patrimônio internacional.
Somente quando fica superado o confronto Javismo versus Sabe-
doria do AOP, Israel começará a ser mais original.

Gêneros literários sapienciais


Embora não se limitem à Literatura Sapiencial, conhecere-
mos alguns deles nesta disciplina. Nossos antepassados sábios
tinham uma maneira própria de organizar o conhecimento e de
formular o raciocínio. Queremos oferecer, pois, algumas ferramen-
tas para ler e compreender melhor esses textos. Sabendo como os
sábios articulavam suas ideias e as defendiam, torna-se mais fácil
para nós captar o alcance e as consequências de suas posições.

Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO


© Caderno de Referência de Conteúdo 11

Introdução especial a cada livro


Em nossa disciplina, a chave de leitura para a Literatura Sa-
piencial é a chamada Teologia da Retribuição. Essa teologia pode
ser assim esquematizada:
• Fidelidade = bênção = justo = sábio.
• Infidelidade = castigo = ímpio = estulto.
Os cinco livros sapienciais, no entanto, não são unânimes
quanto à eficácia dessa teologia. Afinal de contas, a Teologia da
Retribuição funciona ou não?
• Pr e Sir: sim!
• Jó e Qo: não!
• Sb: sim, mas só na outra vida!
É sob essa perspectiva que tais livros serão estudados.

Literatura Lírica
Na segunda parte do estudo, veremos dois livros no quais se
manifesta o fenômeno do lirismo, comum a todo o Antigo Oriente
Próximo. Ganharão destaque dois tipos de cantos: os cantos de
amor (presentes abundantemente no Cântico dos Cânticos) e os
cantos ligados à vida religiosa, no livro dos Salmos.

Sínteses teológicas
Por fim, elaboraremos uma visão panorâmica, por meio de
temas globalizantes: crítica social; criação, salvação e retribuição;
a literatura sapiencial e o Novo Testamento.

2. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA DISCIPLINA

Abordagem Geral da Disciplina


Neste tópico, apresentamos uma visão geral do que será
estudado nesta disciplina. Aqui, você entrará em contato com
12 © Salmos e Sapienciais

os assuntos principais deste conteúdo de forma breve e geral e


terá a oportunidade de aprofundar essas questões no estudo de
cada unidade. No entanto, essa Abordagem Geral visa fornecer-
lhe o conhecimento básico necessário a partir do qual você po-
derá construir um referencial teórico com base sólida – científica
e cultural – para que, no futuro exercício de sua profissão, você a
exerça com competência cognitiva, ética e responsabilidade social.
Vamos começar nossa aventura pela apresentação das ideias e dos
princípios básicos que fundamentam esta disciplina.
As introduções são temáticas e históricas. Não são exausti-
vas, pois o interesse é levar você a pesquisar o texto da disciplina
e, de modo especial, estimular a leitura do texto da disciplina na
Educação a Distância e o texto dos livros bíblicos em questão, bem
como a consulta de alguma obra indicada nas bibliografias.
Apresentaremos, nesta Abordagem Geral, uma introdução
do que é Literatura Sapiencial. Vamos lá?!
Trata-se de uma coleção de livros que contém: conselhos,
reflexões e exemplos destinados a oferecer a sensatez e o bom
senso. Devemos ter bem claro que a sabedoria é uma oferta de
sensatez. É uma oferta, porque deixa o discípulo livre para rejeitá-
la. E é uma oferta de sensatez, porque apresenta critérios para
perceber e julgar a realidade.
Além disso, é uma sabedoria artesã, um conhecimento prá-
tico para solucionar os problemas da vida quotidiana.
O sábio, portanto, não é o intelectual, mas o homem que
sabe aproveitar-se das experiências, próprias e alheias, para dis-
cernir o caminho a tomar.
Agora, veremos uma introdução especial para cada livro.
A disciplina de Salmos e Sapienciais estudará sete livros. Cin-
co são os livros propriamente sapienciais: Provérbios, Jó, Eclesias-
tes (ou Qohélet), Eclesiástico (ou Sirácida) e Sabedoria. Dois são de
poesia lírica: Salmos e Cântico dos Cânticos.

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© Caderno de Referência de Conteúdo 13

A chave de leitura para os livros sapienciais propriamente


ditos é a chamada Teologia da Retribuição, que é uma doutrina
longamente amadurecida e vivida ainda hoje, que tem o seguin-
te princípio: "tudo o que a gente faz aqui, aqui mesmo a gente
paga".
Essa Teologia pode ser assim esquematizada:
Fidelidade ↔ Bênção Justo ↔ Sábio
Infidelidade ↔ Castigo Ímpio ↔ Insensato
Os cinco livros sapienciais, no entanto, não são unânimes
quanto à eficácia dessa teologia. Para a pergunta "A Teologia da
Retribuição funciona ou não?", eles respondem da seguinte ma-
neira:
• Pv e Sir: Sim!
• Jô e Qo: Não!
• Sb: Sim, mas não agora. Só depois, na outra vida.
É nessa perspectiva que tais livros serão estudados.
Com relação à doutrina dos provérbios, veremos as seguintes
linhas:
1) A Sabedoria: é a mediadora entre o fiel e Deus; portanto,
deve ser amada e buscada.
2) A vida pessoal de cada homem deve ser pautada pela
busca das atitudes louváveis (prudência no falar, ser jus-
to, saber ser rico) e pela fuga das censuráveis (preguiça,
embriaguez, tagarelice, injustiça).
3) A vida em família: a autoridade paterna é forte, a educa-
ção dos filhos é rígida, o adultério é condenado.
4) A vida em sociedade: tudo gira ao redor da Teologia da
Retribuição: sensato = justo = rico; insensato = ímpio =
pobre. Sem o instrumental da Sociologia ou do materia-
lismo dialético, os sábios cujos ensinamentos encontra-
mos no livro de Provérbios tinham uma visão que hoje
poderíamos chamar de ingênua. No entanto, devemos
notar que sua análise era religiosa, e não sociológica.
14 © Salmos e Sapienciais

5) O âmbito religioso: não se questiona a existência de


Deus. Ele é Criador, Senhor, Juiz e, acima de tudo, o Re-
tribuidor, isto é, Ele é quem fundou e garante a Teologia
da Retribuição. Por isso, é necessário temer a Deus.
O Eclesiástico, por sua vez, foi escrito entre 190 a 180 a.C. O
ponto focal do livro de Jesus Ben Sira é o seguinte:
• a tradição de Israel não perde nada para a filosofia grega;
• a história de Israel é uma história de heróis igual (pra não dizer
melhor) à mitologia grega. Ou seja, não há nada que invejar.
Jesus Ben Sira é um "conservador progressista": apoia-se nas
tradições dos antigos para responder às questões do seu tempo. A
Teologia da Retribuição, nesse sentido, deve servir de base e enco-
rajamento para não se deixar enganar pelos atrativos do helenis-
mo e da nova mentalidade social que ele impõe. Boa mesmo é a
tradição sapiencial de Israel.
O tema central do livro é a Sabedoria:
• Ela tem uma origem divina, é uma criatura de Deus e ele
a dá como dom a seus amigos; mas isso somente depois
de prová-los.
• Ela está intimamente ligada à Torah; é a shekinah, a pró-
pria revelação e presença de Deus a Israel. A Torah é a
melhor expressão da Sabedoria. Em outras palavras, a
prática da Lei é a manifestação concreta da Sabedoria e
do temor do Senhor.
Baseado nisso, Jesus Ben Sira passa a descrever a vida em
família, os servos, as profissões, os amigos, a injustiça social, as
expectativas futuras.
Na contramão da Teologia da Retribuição, um teólogo-poeta per-
gunta: como fica o sofrimento do justo? E quem é Deus nisso tudo?
Essas perguntas não foram formuladas somente pelo autor
do livro de Jó. Outros sábios de outros povos também o fizeram.
Nosso autor, portanto, vive num tempo de crise da Teologia da
Retribuição.

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© Caderno de Referência de Conteúdo 15

Começaremos com uma panorâmica do livro:


O prólogo: honradez desinteressada (1-2,13).
O diálogo com os 3 amigos, sobre a Teologia da Retribuição: o desti-
no do malvado e a justiça de Deus; Jó desafia a Deus (3-31).
A Teofania: Deus responde no meio da tempestade: o mistério de
Deus a vera religião (38-42,6).
A verdadeira sabedoria (28).
O epílogo: a liberdade de Deus (42,7-17).

Jó não é o autor, mas o personagem principal. Outro aspecto


interessante do livro é que são dois "Jós":
• O primeiro está no prólogo (1,1-2,13) e no epílogo (42,7-17);
esses dois blocos formam uma história completa: é o mito
primitivo de Jó, um homem saudável e rico que perde tudo
e fica muito doente. A causa dessa desgraça é uma aposta
entre Deus e um de seus conselheiros, Satã, que exerce a
função de acusador. Mesmo sem saber o porquê, Jó perde
tudo, mas não se rebela. Antes, torna-se o modelo de pieda-
de, paciência e perseverança. Por isso, Deus restitui-lhe tudo
em dobro. Essa era e é a história mais conhecida de Jó.
• O segundo apresenta um Jó rebelde (4-27), que recebe a
visita dos três amigos (Elifaz, Bildad, Sofar), os quais são
representantes da Teologia da Retribuição. Cada um ex-
põe seu ponto de vista por meio de longos discursos e Jó
responde a cada um deles com outro discurso criticando
a Teologia da Retribuição: ele quer discutir com o próprio
Deus. Enquanto Deus não lhe responder, Jó considera seu
sofrimento injusto: Jó tem certeza de sua inocência (21,4;
23,2). Por isso, o pano de fundo e o escopo de todo o livro
é "ver Deus" (42,5), mas não o Deus da Teologia da Re-
tribuição pregado pelos amigos, mas o verdadeiro Deus,
experimentado pessoalmente.
Apesar de seu esforço para negar a Teologia da Retribuição,
o livro termina de forma um tanto quanto paradoxal: por sua justi-
16 © Salmos e Sapienciais

ça, Jó foi reabilitado e recebeu em troca muito mais que antes. Ou


seja, Deus deu-lhe a retribuição.
Outro livro que questiona a Teologia da Retribuição é Qohé-
let (Eclesiastes). Já de cara, o autor expõe sua tese fundamental:
"vaidade das vaidades tudo é vaidade". Com essas palavras, Qohé-
let questiona as equiparações em que sempre acreditou:
• Fidelidade = bênção – justo = sábio.
• Infidelidade = castigo – ímpio = insensato.
O método de conhecimento de Qohélet é o empírico: ele
aplica na prática, em todos os âmbitos da vivência humana, os es-
quemas da Teologia da Retribuição e avalia os resultados sob o cri-
vo de sua experiência pessoal. Sua conclusão é que nada acontece
como se esperaria: o sentido da realidade permanece oculto.
Não há retribuição nesta vida, e muito menos na outra (por-
que a outra também não existe): o destino é o mesmo para os jus-
tos e injustos, para sábios e insensatos. As únicas coisas que valem
a pena nesta vida, as "vantagens para o homem", são:
• ver o bom resultado de sua própria obra;
• o gozo que deriva de tudo que dá prazer;
• as coisas belas da criação e a alegria de estar vivo.
Mas não devemos nos empolgar muito com elas e achar que
nos acontecem porque Deus está nos retribuindo por alguma boa
ação, pois são consequências infalíveis de nossos esforços. Na ver-
dade, esse jeito de pensar é hébel, vaidade.
Com relação ao livro da Sabedoria, este foi escrito entre os
anos 30 a. C. e 14 d. C. em grego.
Foi escrito em Alexandria, no Egito, isto é, em ambiente gre-
go. Seu autor é um judeu que escreve para judeus e para pagãos.
Por isso, ele usa não só a tradição de Israel, mas também os con-
ceitos fornecidos pela própria filosofia grega.

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© Caderno de Referência de Conteúdo 17

O livro, portanto, tem uma dupla finalidade:


• sustentar na fé o judeu piedoso;
• fazer os pagãos reconhecerem quem é o verdadeiro
Deus.
É mais ou menos o mesmo projeto de Jesus Ben Sira, mas
num outro ambiente, com novas categorias.
Podemos dividir esse livro em três partes:
• Parte 1 (1-5[6,21]) – a esperança do justo é cheia de imor-
talidade.
• Parte 2 (6[,22]-9) – a Sabedoria como irradiação da luz de
Deus.
• Parte 3 (10-19) – o grande Midrash sobre o Êxodo.
As duas primeiras partes são mais filosóficas; a terceira é
uma releitura teológico-moral da libertação do Egito.
Após esta apresentação dos livros sapienciais propriamente
ditos, podemos passar para os livros de poéticos: Salmos e Cântico
dos Cânticos.
O livro dos Salmos é uma coleção de orações do povo de
Deus. Neles, Israel expressou sua fé e seus sentimentos ao longo
de sua história: as alegrias, as dores, as revoltas, as conquistas, a
esperança de um governo melhor etc.
Os salmos são canções de um povo que crê. Deve-se, no en-
tanto, notar que nem todos os salmos da Bíblia estão no livro dos
Salmos: há vários espalhados aqui e acolá. E, ainda assim, o livro
dos Salmos é o maior da Bíblia. Ainda hoje, os salmos ajudam-nos
a rezar e a cantar a presença carinhosa de Deus. De fato, eles não
falam "de" Deus, mas "a" Deus. Ou seja, eles colocam palavras em
nossas bocas e ensinam-nos a louvar a Deus como convém.
Os salmos são divididos em sete famílias, algumas delas com
subdivisões:
18 © Salmos e Sapienciais

6) Família hínica:
a) hinos a Deus Salvador;
b) hinos a Deus Criador;
c) hinos a Deus Rei;
d) hinos a Sião;
7) Família dos salmos de súplica:
a) súplicas individuais;
b) súplicas coletivas.
8) Família dos salmos de confiança e de ação de graça:
a) confiança individual;
b) confiança coletiva;
c) ação de graças individual;
d) ação de graças coletiva.
9) Família litúrgica:
a) salmos de ingresso;
b) salmos proféticos;
c) salmos de peregrinação.
10) Família sapiencial:
a) salmos sapienciais;
a) salmos alfabéticos.
11) Família histórica
12) Família dos salmos régios:
a) salmos de maldição e vindita.
O Cântico dos Cânticos contém poemas de vários gêneros
literários, tais como cântico de descrição, cântico de admiração e
cântico de desejo.
São várias as correntes de interpretação:
1) Interpretação literal (ou naturalista): o Cântico é ex-
pressão do amor humano, um livro erótico (não porno-
gráfico). O amor do homem e da mulher é mistério do
amor criador de Deus.
2) Interpretação alegórica (ou típica): o noivo é Javé, ou
Jesus Cristo; a noiva é Israel, ou a Igreja.

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© Caderno de Referência de Conteúdo 19

3) Interpretação antológica: o Cântico é uma releitura das


várias fases da história da salvação e das manifestações
do amor de Deus para com Israel.
4) Interpretação mítico-cultual: o Cântico é a versão israe-
lita do matrimônio sagrado dos deuses da fertilidade.
5) Interpretação política (histórico-popular): o Cântico é
um texto cifrado e tem por objetivo incentivar a união
dos vários grupos do período pós-exílico.
6) Interpretação feminista: o Cântico faz uma reviravolta
no preconceito patriarcal sobre a mulher.
Quanto à Teologia, o Cântico dos Cânticos envereda pela po-
lissemia: o mesmo texto pode ter uma pluralidade de significados,
ou seja, amor humano e amor divino.
Na Literatura Sapiencial o acento maior recai sobre o signi-
ficado da vida e da existência humana, interligando os discursos
sobre Deus, o homem e sua atividade.

Glossário de Conceitos
Este glossário permite a você uma consulta rápida e preci-
sa das definições conceituais, possibilitando-lhe um bom domínio
dos termos técnico-científicos utilizados na área de conhecimento
dos temas tratados na disciplina Salmos e Sapienciais. Veja, a se-
guir, a definição dos principais conceitos desta disciplina:
1) Exegese e teologia bíblica: estudo da Bíblia de modo
científico, com o objetivo de fazer uma reflexão siste-
mática, abrangente e crítica sobre os conteúdos da dou-
trina e dos dogmas. Cada autor bíblico tem sua própria
teologia, que pode ser estudada por meio de um estudo
exegético de sua obra.
2) Gêneros literários: esquema relativamente fixo e co-
mum presente em vários textos formalmente semelhan-
tes (ainda que o conteúdo seja diferente). Cada um dos
livros estudados nesta disciplina usa e abusa de vários
gêneros literários.
20 © Salmos e Sapienciais

3) Retribuição: teologia ou doutrina segundo a qual "aqui


se faz, aqui se paga": Deus recompensa (retribui) a cada
um conforme suas obras. Essa doutrina está presente
em vários livros bíblicos, em maior ou menor intensida-
de. No caso da literatura sapiencial propriamente dita, é
o fio condutor que perpassa cada livro, que pode aceitá-
-la ou criticá-la. Em outras palavras, o dogma da retribui-
ção oferece o conceito fundamental para uma síntese da
teologia dos livros sapienciais bíblicos.
4) Sabedoria: não deve ser confundida com inteligência nem
com conhecimento enciclopédico do universo. É o conheci-
mento prático e artesanal, que dá ao homem discernimento
e sensatez para resolver os problemas práticos do cotidiano,
bem como a orientação fundamental para toda a sua vida.

Esquema dos Conceitos-chave


Para que você tenha uma visão geral dos conceitos mais impor-
tantes deste estudo, apresentamos, a seguir (Figura 1), um Esquema
dos Conceitos-chave da disciplina. O mais aconselhável é que você
mesmo faça o seu esquema ou, até mesmo, seu mapa mental. Esse
exercício é uma forma construir seu conhecimento, ressignificando
as informações com base em suas próprias percepções.
É importante ressaltar que o propósito desse Esquema dos
Conceitos-chave é representar, de maneira gráfica, as relações entre
os conceitos por meio de palavras-chave, partindo dos mais comple-
xos para os mais simples. Esse recurso pode auxiliar você na ordena-
ção e na sequenciação hierarquizada dos conteúdos de ensino.
Com base na teoria de aprendizagem significativa, entende-se
que, por meio da organização das ideias e dos princípios em esque-
mas e mapas mentais, o indivíduo pode construir seu conhecimento
de maneira mais produtiva e, assim, obter ganhos pedagógicos sig-
nificativos em seu processo de ensino e aprendizagem.
Aplicado a diversas áreas do ensino e da aprendizagem esco-
lar, tais como planejamentos de currículo, sistemas e pesquisas em
Educação, o Esquema dos Conceitos-chave baseia-se, ainda, na ideia

Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO


© Caderno de Referência de Conteúdo 21

fundamental da Psicologia Cognitiva de Ausubel, que estabelece que


a aprendizagem ocorre pela assimilação de novos conceitos e de pro-
posições na estrutura cognitiva do aluno. Assim, novas ideias e infor-
mações são aprendidas, uma vez que existem pontos de ancoragem.
Tem-se de destacar que "aprendizagem" não significa, ape-
nas, realizar acréscimos na estrutura cognitiva do aluno; é preci-
so, sobretudo, estabelecer modificações para que ela se configure
como uma aprendizagem significativa. Para tanto, é importante
considerar as entradas de conhecimento e organizar bem os mate-
riais de aprendizagem. Além disso, as novas ideias e os novos con-
ceitos devem ser potencialmente significativos para o aluno, uma
vez que, ao fixar esses conceitos em suas já existentes estruturas
cognitivas, outros serão também relembrados.
Nessa perspectiva, partindo-se do pressuposto de que é
você o principal agente da construção do próprio conhecimento,
por meio de sua predisposição afetiva e de suas motivações in-
ternas e externas, o Esquema dos Conceitos-chave tem por ob-
jetivo tornar significativa a sua aprendizagem, transformando o
seu conhecimento sistematizado em conteúdo curricular, ou seja,
estabelecendo uma relação entre aquilo que você acabou de co-
nhecer com o que já fazia parte do seu conhecimento de mundo
(adaptado do site disponível em: <http://penta2.ufrgs.br/eduto-
ols/mapasconceituais/utilizamapasconceituais.html>. Acesso em:
11 mar. 2010).
22 © Salmos e Sapienciais

Figura 1 Esquema dos Conceitos-chave da disciplina Salmos e Sapienciais.

Como você pode observar, esse Esquema dá a você, como


dissemos anteriormente, uma visão geral dos conceitos mais im-
portantes desse estudo. Ao segui-lo, você poderá transitar entre
um e outro conceito desta disciplina e descobrir o caminho para
construir o seu processo de ensino-aprendizagem.
O Antigo Testamento, ao qual pertencem os livros da Literatura
Sapiencial, Salmos e Cântico dos Cânticos, deve ser inicialmente com-
preendido por si mesmo, e não em função da releitura cristã. Inde-
pendentemente de Jesus Cristo, o Antigo Testamento vale por si mes-
mo e é assim que será estudado nesta disciplina: com as ferramentas
oferecidas pela exegese e pela teologia bíblica. Para os livros sapien-
ciais propriamente ditos, da exegese utilizaremos principalmente os
gêneros literários, e da teologia bíblica vamos nos servir da reflexão
sapiencial acerca da Sabedoria como o caminho para encontrar o sen-

Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO


© Caderno de Referência de Conteúdo 23

tido da vida, e a temática da retribuição (um dogma que, para alguns


sábios, é infalível, enquanto, para outros, é um devaneio). Para os li-
vros poéticos, isto é, Salmos e Cântico dos Cânticos, a exegese e a te-
ologia bíblica vão nos ajudar a compreender a mensagem de fé, bem
como o modo em que os autores expressaram tal conteúdo.
O Esquema dos Conceitos-chave é mais um dos recursos de
aprendizagem que vem se somar àqueles disponíveis no ambiente
virtual, por meio de suas ferramentas interativas, bem como àqueles
relacionados às atividades didático-pedagógicas realizadas presen-
cialmente no polo. Lembre-se de que você, aluno EAD, deve valer-se
da sua autonomia na construção de seu próprio conhecimento.

Questões Autoavaliativas
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados, as quais podem
ser de múltipla escolha ou abertas com respostas objetivas ou dis-
sertativas. Vale ressaltar que se entendem as respostas objetivas
como as que se referem aos conteúdos matemáticos ou àqueles
que exigem uma resposta determinada, inalterada.
Responder, discutir e comentar essas questões, bem como
relacioná-la pode ser uma forma de você avaliar o seu conheci-
mento. Assim, mediante a resolução de questões pertinentes ao
assunto tratado, você estará se preparando para a avaliação final,
que será dissertativa. Além disso, essa é uma maneira privilegiada
de você testar seus conhecimentos e adquirir uma formação sólida
para a sua prática profissional.
Você encontrará, ainda, no final de cada unidade, um gabari-
to, que lhe permitirá conferir as suas respostas sobre as questões
autoavaliativas (as de múltipla escolha e as abertas objetivas).

As questões dissertativas obtêm por resposta uma interpretação


pessoal sobre o tema tratado. Por isso, não há nada relacionado a
elas no item Gabarito. Você pode comentar suas respostas com o
seu tutor ou com seus colegas de turma.
24 © Salmos e Sapienciais

Bibliografia Básica
É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus
estudos, mas não se prenda só a ela. Consulte, também, as biblio-
grafias complementares.

Figuras (ilustrações, quadros...)


Neste material instrucional, as ilustrações fazem parte inte-
grante dos conteúdos, ou seja, elas não são meramente ilustrativas,
pois esquematizam e resumem conteúdos explicitados no texto.
Não deixe de observar a relação dessas figuras com os conteúdos
da disciplina, pois relacionar aquilo que está no campo visual com
o conceitual faz parte de uma boa formação intelectual.

Dicas (motivacionais)
O estudo desta disciplina convida você a olhar, de forma
mais apurada, a Educação como processo de emancipação do ser
humano. É importante que você se atente às explicações teóricas,
práticas e científicas que estão presentes nos meios de comunica-
ção, bem como partilhe suas descobertas com seus colegas, pois,
ao compartilhar com outras pessoas aquilo que você observa, per-
mite-se descobrir algo que ainda não se conhece, aprendendo a
ver e a notar o que não havia sido percebido antes. Observar é,
portanto, uma capacidade que nos impele à maturidade.
Você, como aluno do curso de Graduação na modalidade
EAD e futuro profissional da educação, necessita de uma forma-
ção conceitual sólida e consistente. Para isso, você contará com
a ajuda do tutor a distância, do tutor presencial e, sobretudo, da
interação com seus colegas. Sugerimos, pois, que organize bem o
seu tempo e realize as atividades nas datas estipuladas.
É importante, ainda, que você anote as suas reflexões em seu ca-
derno ou no Bloco de Anotações, pois, no futuro, elas poderão ser utili-
zadas na elaboração de sua monografia ou de produções científicas.

Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO


© Caderno de Referência de Conteúdo 25

Leia os livros da bibliografia indicada, para que você amplie


seus horizontes teóricos. Coteje-os com o material didático, discuta
a unidade com seus colegas e com o tutor e assista às videoaulas.
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas, que são importantes para a sua análise sobre os
conteúdos desenvolvidos e para saber se estes foram significativos
para sua formação. Indague, reflita, conteste e construa resenhas,
pois esses procedimentos serão importantes para o seu amadure-
cimento intelectual.
Lembre-se de que o segredo do sucesso em um curso na
modalidade a distância é participar, ou seja, interagir, procurando
sempre cooperar e colaborar com seus colegas e tutores.
Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a
esta disciplina, entre em contato com seu tutor. Ele estará pronto
para ajudar você.
Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO
EAD
Introdução à Literatura
Sapiencial Bíblica

1
1. OBJETIVOS
• Comparar a sabedoria bíblica com a sabedoria da Meso-
potâmia e do Egito.
• Compreender a importância da Teologia da Retribuição.

2. CONTEÚDOS
• A linguagem da sabedoria.
• Sabedoria no Antigo Oriente Próximo.
• Sabedoria no Antigo Testamento.
• Teologia da Retribuição.

3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE


Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que
você leia as orientações a seguir:
28 © Salmos e Sapienciais

1) Leia os livros da bibliografia indicada para que você am-


plie e aprofunde seus horizontes teóricos. Esteja sempre
com o material didático em mãos e discuta a unidade
com seus colegas e com o tutor.
2) Tenha sempre à mão o significado dos conceitos explici-
tados no Glossário e suas ligações pelo Esquema de Con-
ceitos-chave para o estudo de todas as unidades deste
Caderno de Referência de Conteúdo. Isso poderá facilitar
sua aprendizagem e seu desempenho.
3) Para maior compreensão do assunto que será discuti-
do nesta unidade, sugerimos outras narrações egípcias,
como: As instruções de Duauf-Jeti; As instruções de Ani e
As instruções de Ank-sesonqy. Sugerimos, também, que
você leia: VÍLCHEZ LÍNDEZ, José. Sabedoria e Sábios em
Israel. São Paulo: Loyola, 1999.
4) São vários os exemplos de ditos no Antigo Oriente Próxi-
mo que poderíamos citar aqui. Eles podem ser encontra-
dos em: VÍLCHEZ LÍNDEZ, J. Sabedoria e Sábios em Israel.
São Paulo: Loyola, 1999.

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Estamos iniciando nossos estudos da disciplina Salmos e
Sapienciais. Nesta primeira unidade, será abordado o conteúdo
referente à sabedoria e à sua linguagem, sua história no Antigo
Oriente, Antigo Egito, Mesopotâmia e Ugarit. Além disso, iremos
estudá-la nos textos bíblicos e, para terminarmos nossa introdu-
ção à literatura sapiencial bíblica, conheceremos a Teologia da Re-
tribuição.
Vamos lá?!

5. O QUE É LITERATURA SAPIENCIAL?


Para responder à pergunta que compõe o título deste tópico
("O que é literatura sapiencial?"), seguiremos as considerações de

Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO


© Introdução à Literatura Sapiencial Bíblica 29

Alonso Shökel (1978), no capítulo inicial de seu comentário ao livro


de Provérbios (p. 17-29).
A expressão "literatura sapiencial" designa um tipo específi-
co de livros, bem diferente dos demais escritos da Bíblia:
1) é diferente de Pentateuco, Samuel e Reis, porque não
são narrativos;
2) é diferente dos corpos legais (Ex, Lv, Dt), porque não
apresentam leis obrigatórias;
3) é diferente dos profetas, porque não faz denúncias nem
anúncios;
4) é diferente das novelas (Tb, Est, Jt), porque não são rela-
tos nem ficções;
5) é diferente dos Salmos, porque não são orações.
Que é então a literatura sapiencial?
Para responder a tal pergunta, é necessário antes responder
a outra: que é sabedoria e qual a sua tarefa?
A tarefa sapiencial não pode ser confundida com outras:
• Sabedoria e conhecimento: "sábio" não equivale a "filó-
sofo", pois a busca do conhecimento e de soluções de
enigmas não esgota a tarefa dos sábios, nem é o enfoque
específico da sabedoria.
• Sabedoria e ética: os sábios não buscam unicamente a or-
dem moral; antes, interessam-se por um conteúdo mais
abrangente, uma vez que aconselhar não é estabelecer
um código moral.
• Sabedoria e ordem cósmica: os sábios não buscam desco-
brir uma ordem no cosmo ao qual o homem deve adaptar-
se (algo semelhante à Ma'at dos egípcios): também nesse
caso, o ensinamento sapiencial é bem mais abrangente.
A melhor definição de sabedoria talvez seja "uma oferta de sen-
satez": é "oferta", porque não é uma lei; é de "sensatez", porque impli-
ca percepção, discernimento e juízo. Por isso, "sabedoria" (em hebraico,
30 © Salmos e Sapienciais

hokhmah; em grego, téchnê; e, em latim, ars) é um "saber fazer" (em


tempos modernos, algo semelhante ao famoso know how ou savoir
faire). Não é, portanto, equivalente à inteligência e ao intelecto. Antes,
é uma sabedoria artesã, isto é, habilidade no comércio, na política, na
indústria, na construção, na agricultura etc. Em outras palavras, um co-
nhecimento prático para solucionar problemas do dia a dia.
Essa definição de sabedoria leva inevitavelmente a pergun-
tar: como adquirir a sabedoria? Quais as fontes da sabedoria?
Quais os passos para atingi-la?
Tudo parte das experiências concretas (pessoais ou de ou-
tros) que são somadas, amadurecidas, catalisadas, verbalizadas.
Assim, a aquisição da sabedoria é algo contínuo e interminável,
uma vez que novas situações na vida (mesmo na velhice) implicam
fazer novas experiências e refletir sobre elas. Além disso, é um fato
social: não se restringe a uma única pessoa, mas é um processo
coletivo, que cresce e se desenvolve com a própria humanidade.
Tal processo pode ser assim esquematizado:
1) experiência: diante de determinada situação em uma reali-
dade complexa, a busca de uma solução até encontrá-la;
2) reflexão e formulação: avaliação daquela experiência ini-
cial (o que foi positivo e o que foi negativo) e tradução em
palavras do que se aprendeu de modo a consolidar um
conhecimento que pode ter valor para conduta (não só
para o saber), e que deve ser confirmado pelo sucesso;
3) transmissão e adaptação: difusão, de geração em geração,
de povo para povo, daquela verdade prática e comprovada,
e adequando-a ao momento, à cultura e a novas situações;
4) aceitação: recepção não obrigatória daquele ensinamento,
porque é percebido como algo que tem valor e autoridade.
O sucesso de um ensinamento muitas vezes depende de
como ele é formulado. Por isso, é necessário que a formulação
seja concisa e fácil de memorizar. Por exemplo: "casa de ferreiro,
espeto de pau", "água mole em pedra dura, tanto bate até que
fura", "vingança é um prato que se come frio".

Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO


© Introdução à Literatura Sapiencial Bíblica 31

Ser sábio, portanto, não é ter uma profissão ou um diploma,


mas é ter uma experiência (ou muitas); é ter um comportamento,
um caráter.
O sábio não impõe nem obriga; ao contrário, ele constata,
avalia, aconselha, ensina. E cada conselho tem uma autoridade
própria que transcende quem formula, quem transmite e quem
acolhe tal ensinamento.
E, finalmente, podemos responder à pergunta: que é litera-
tura sapiencial?
É um conjunto de livros que reúne ensinamentos resultantes
daquele processo descrito anteriormente (experiência – reflexão e
formulação – transmissão e adaptação – aceitação), ensinamentos
conservados e difundidos (oralmente e por escrito) pelos sábios
e que, no caso da literatura sapiencial bíblica, são considerados
também eles "palavra de Deus".

6. LINGUAGEM DA SABEDORIA
Para uma maior compreensão da literatura sapiencial, é ne-
cessário um estudo das raízes da sabedoria, bem como sua lingua-
gem e sua origem no Antigo Oriente Próximo.
Em hebraico, a palavra "sabedoria" vem da raiz hkm, que
significa "ser sábio, ser hábil". O termo aparece na maioria das lín-
guas semitas, principalmente no ugarítico, embora também apa-
reça no fenício e no egípcio. No hebraico, encontramos os termos:
hakhamim ("sábios") ou hakham ("sábio"). Deles deriva os termos
hokhmah e hokhmot, ambos traduzidos por "sabedoria".

7. SABEDORIA NO ANTIGO ORIENTE PRÓXIMO


Como vimos anteriormente, o conceito de "sabedoria" não
é bem delimitado e preciso. Vários tipos de pessoas recebem, no
32 © Salmos e Sapienciais

Antigo Oriente Próximo, o título de sábios: escribas, conselheiros


políticos e administrativos, magos, feiticeiros, astrólogos etc. Algu-
mas culturas não tinham um termo correspondente ao hebraico
hokhmah - "sabedoria", mas o conceito sim.
A sabedoria bíblica tem suas raízes nas civilizações vizinhas
da Mesopotâmia e do Egito, que, desde muitos séculos, têm sido
consideradas como os principais berços das culturas. Em algumas
pesquisas realizadas no Egito, arqueólogos encontraram documen-
tos escritos que datam do terceiro milênio antes de Cristo. Funda-
mentado nesse raciocínio, conclui-se que Israel não inventou a lite-
ratura sapiencial; ao contrário, ela é mais antiga que Israel (ALONSO
SCHÖKEL, 1978).
O Antigo Oriente Próximo teve seu centro de cultura nas
cortes de seus reis e nos seus grandes santuários. Nessa época, a
sabedoria era transmitida por meio da instituição de ensino, que
podia ser o palácio onde o rei transmitia o ensinamento para o
príncipe, e os nobres, para os seus filhos; a aldeia, onde o escri-
ba ensinava o conhecimento ao seu discípulo; ou, mesmo, a casa,
onde o pai transmitia a sabedoria dos seus antepassados ao seu
filho. Nos textos sapienciais, o aluno ou discípulo é chamado indis-
criminadamente de "filho"; por esse motivo, nem sempre é fácil
saber de quem se trata.
Praticamente em toda a cultura do Antigo Oriente Próximo,
instruções ou ensinamentos eram dados por meio de frases ou de
pequenos poemas, cuja finalidade era a educação. Podemos dizer
que era um tipo de testamento ou frase de sabedoria que os mais
velhos endereçavam aos jovens. Vejamos, nos tópicos a seguir, al-
guns exemplos desses escritos anteriores à Bíblia.

Antigo Egito
No Antigo Egito, vigorava a noção de ma'at. Trata-se de um
termo que designa tanto o conceito de "ordem cósmica e social"
(equilíbrio, ritmo da natureza, bem, justiça, direito), como a deu-

Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO


© Introdução à Literatura Sapiencial Bíblica 33

sa que personifica essa ordem. A deusa Ma'at é representada por


uma jovem com uma pluma na cabeça, para simbolizar a leveza e
a fragilidade da ordem cósmica.
A finalidade da sabedoria é criar condições para a ma'at: em
cada nova situação, é necessário atualizá-la. A ma'at é algo imutá-
vel universalmente válido; ao homem cabe adaptar-se, integrar-se
e submeter-se a ela. O ideal para o homem é ser silencioso e justo,
pois a cada ação corresponde um resultado preciso: recompensa
ou castigo. Todo homem, ao morrer, era julgado pela deusa Ma'at:
em prato da balança, a pluma de sua cabeça; no outro, o coração
do falecido. Caso o coração fosse mais pesado que a pluma, ele era
entregue a Ammut (a deusa do Inferno) para ser devorado.
Quanto ao que chamaríamos de "literatura sapiencial", o
Egito é o país que mais nos oferece material escrito. Da grande
quantidade desse material, podemos destacar alguns por sua im-
portância no estudo aqui proposto.
Os ditos de Ptah-hotep podem ser considerados como as ins-
truções mais antigas (2.450 a.C.). Neles, podemos notar que uma
pessoa da nobreza instrui seu filho; as sentenças são muito seme-
lhantes às que se encontram no livro dos Provérbios. Vejamos al-
guns ditos de Ptah-hotep:
Ninguém nasce sábio.
A injustiça jamais conduziu sua empresa a um bom porto.
A palavra é mais difícil que qualquer outro trabalho; confere auto-
ridade apenas a quem a domina completamente.
Não responda em estado de agitação.
Conhece-se o sábio pelo que ele sabe, e o nobre por suas boas
ações (VÍLCHEZ LÍNDEZ, 1999, p. 19).

Convém citar, também, as instruções dirigidas a Meri-ka-re


(2.100 a.C). São nobres conselhos que um pai dirige ao próprio filho:
Sê hábil nas palavras, para poder convencer; pois a língua é a força
do homem.
Só se converte em mestre aquele que deseja se instruir.
34 © Salmos e Sapienciais

Acalme o que chora, não oprimas a viúva, não expulses um homem


da terra de seus pais.
Não faças diferença entre o filho de um nobre e um homem co-
mum (VÍLCHEZ LÍNDEZ, 1999, p. 20).

Todavia, não podemos deixar de citar os ensinamentos de


Amen-em-opet (de 1.000 a 600 a.C). Descobertos em 1923, torna-
ram-se os ensinamentos mais estudados, graças à sua relação com
o livro dos Provérbios (cf. 22,17-24,11). Particularmente interes-
sante é Pr 22,20: "Escrevi para ti trinta máximas de experiência";
tal frase só pode ser explicada à luz das instruções Amen-em-opet
27,7-8: "Considera estes trinta capítulos que instruem e educam".
Seguindo esse raciocínio, veja outras instruções de Amen-
em-opet com estreitos paralelos em Provérbios:
Guarda-te de roubar de um infeliz e de atormentar quem está de-
bilitado. Não levantes tuas mãos para afastar um ancião nem inter-
rompas a palavra a um velho (4,4-7).
Outra coisa boa segundo o coração de Deus: fazer uma pausa antes
de falar (5,7-8).
Não sejas avarento e encontrarás abundância... Não ambiciones um
palmo de terra, nem ultrapasses a divisa de uma viúva (7,14-15).
Mais vale o pão com alegria do coração que riquezas com tormen-
tos (9,7-8 e 16,13-14).
Que tua língua não revele mais que o bem, e que o mal fique oculto
diante de ti (11,10-11).
Não te rias de um cego, não zombes de um anão, não faças mais
pesada a provação de um coxo (24,8-10).
Deus gosta mais de quem honra o pobre do que de quem adula o
rico (26,13-14) (VÍLCHEZ LÍNDEZ, 1999, p. 21-22).

Graças à grande semelhança entre os ensinamentos de


Amen-em-opet e Pr 22,17-23,14, H. Gunkel, em 1906, fez esta ob-
servação:
Os escritos sapienciais do Antigo Testamento não dependem nem
dos profetas, nem dos escritos da Lei, mas formam um corpo à par-
te; e quiçá tenhamos de buscar no Egito a origem da poesia pro-
verbial, que também existiu na Babilônia (apud ALONSO SCHÖKEL,
1978, p. 42).

Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO


© Introdução à Literatura Sapiencial Bíblica 35

Mesopotâmia
Na Mesopotâmia, não se encontra um termo equivalente ao
hakham hebraico.
Os textos sumérios e assírio-babilônicos não são tão nume-
rosos como os egípcios, porém formam um corpo respeitável, uma
vasta literatura sapiencial contendo uma grande coleção de pro-
vérbios (textos escolares) e de questões referentes à vida prática
(ética e ordem moral). Incluem, também, fábulas, disputas, listas
enciclopédicas (coleção de termos para sistematizar o mundo ob-
jetivo e empírico), bem como mitos e poesias que falam da criação
e da restauração da ordem cósmica.
Veja alguns exemplos de ditos populares, conselhos e pro-
vérbios da região da Mesopotâmia:
"Fiz caminhar meu irmão; meu irmão caminha como eu."
"Fiz caminhar minha irmã; minha irmã caminha como eu."
"A arte de escrever é a mãe dos oradores, pai dos doutos."
"Faz a vontade do presente, calunia o ausente."
"Fruto da primavera, fruto da aflição."
"A vida de ontem é a vida de qualquer dia."
"A amizade dura uma vida, a escravidão é perpétua."
"Um cidadão vulgar em outra cidade vira chefe."
"Em boca fechada não entra mosquito" (VÍLCHEZ LÍNDEZ, 1999, p.
26-27).

Eis alguns provérbios sumérios:


"Para o pobre, mais vale estar morto do que vivo. Se ele tem pão,
não tem sal; se tem sal, não tem pão."
"Quem nunca sustentou mulher ou filho jamais teve argila no nariz."
"A bilha, no deserto, é a vida do homem, a esposa é o futuro do
homem, o filho é o refúgio do homem. Mas a nora é o inferno do
homem."
36 © Salmos e Sapienciais

"Aquele que tem muito dinheiro pode ser feliz; aquele que possui
muita cevada pode ser feliz. Mas aquele que não tem nada pode
dormir" (VÍLCHEZ LÍNDEZ, 1999, p. 27).

Ugarit
Na região de Ugarit, foram encontrados vários escritos, den-
tre os quais devemos destacar o texto acerca da "origem da sabe-
doria". Segundo ele, a sabedoria tem sua origem no deus El, o pai
dos deuses. El é sábio porque tem muitos anos de experiência, o
que lhe dá autoridade para presidir o destino do mundo, da hu-
manidade e dos outros deuses do panteão ugarítico. Por isso, os
outros deuses, quando se aproximam de El, saúdam-no como o
deus da sabedoria:
A tua palavra, ó El, é sábia,
A tua sabedoria é para sempre,
A vida é o resultado da tua palavra.

Como veremos mais adiante, essa atribuição da origem da


sabedoria ao deus El encontrará um paralelo na literatura sapien-
cial bíblica, que atribui a origem da sabedoria a Javé, o Deus de
Israel.

Israel
Visto que a sabedoria era um fenômeno cultural de todo o
Antigo Oriente Próximo, Israel foi mais passivo que ativo e sofreu
grande influência dos povos vizinhos. Em contrapartida, a fé de
Israel em um único deus nacional, Javé, levou os sábios a desmito-
logizar e purificar a experiência e os ensinamentos sapienciais dos
povos vizinhos, adaptando-os à sua própria fé. Dependência, sim,
mas com desenvolvimentos e originalidade.
Um exemplo dessa originalidade é encontrado na diferencia-
ção entre a ma'at dos egípcios e a hokhmah dos israelitas. Esque-
maticamente:

Claretiano - REDE DE EDUCAÇÃO


© Introdução à Literatura Sapiencial Bíblica 37

ma'at hokhmah
• Grande, permanente, imutável desde • Sabedoria artesã, que se adapta à
sempre e para sempre. realidade e a cada nova situação.
• Uma deusa, filha de uma divindade, • Não é uma divindade, nem a
personificação da justiça, do direito, da personificação de uma qualidade de Deus,
ordem cósmica e social. mas uma realidade criada por Deus para
uma função precisa.

8. SABEDORIA NOS TEXTOS BÍBLICOS


Segundo Alonso Schökel (1978), a melhor definição para a
sabedoria nos textos bíblicos é uma "oferta de sensatez": oferta,
porque deixa ao indivíduo a liberdade de aceitá-la ou não; sen-
satez, porque proporciona critérios para a percepção e o juízo da
realidade. Além disso, trata-se de uma sabedoria artesã, ou seja,
um conhecimento prático para solucionar os problemas da vida
cotidiana. Portanto, ser sábio não é ser intelectual, e, sim, saber
aproveitar das experiências próprias e alheias para discernir qual
caminho seguir.
Acima de tudo, a Bíblia mostra que toda sabedoria é dom de
Deus:
O Senhor falou a Moisés: Eis que chamei pelo nome a Beseleel, fi-
lho de Uri, filho de Hur, da tribo de Judá. Eu o enchi com espírito de
Deus em sabedoria, entendimento e conhecimento para toda es-
pécie de trabalho, para elaborar desenhos, para trabalhar em ouro,
prata e bronze, para lapidação de pedras de engaste, para entalho
de madeira, e para realizar toda espécie de trabalhos (Ex 31,1-5).

É Deus quem concede o "espírito de sabedoria": "Dirás a to-


das as pessoas hábeis, a quem enchi do espírito de sabedoria [...]"
(Ex 28,3). Ele é o grande artesão, criador e sábio por excelência:
Ele fez a terra por sua potência, por sua sabedoria estabeleceu o
mundo e por sua inteligência estendeu os céus. Quando ele faz
ressoar o trovão, há um bramido de águas no céu; ele faz subir as
nuvens do extremo da terra, produz os raios para a chuva e faz sair
o vento de seus depósitos. [...] A Porção de Jacó não é como eles,
porque ele é o que formou o universo, e Israel é a tribo da sua he-
rança. Senhor dos Exércitos é o seu nome (Jr 10,12-16. Cf. também
Jr 51,15; Sl 104,24; Pr 3,19).
38 © Salmos e Sapienciais

Deus é a fonte da sabedoria, assim diz o Sirácida (Eclesiás-


tico): "Toda sabedoria vem do Senhor, ela está junto dele desde
sempre." (Eclo 1,1; cf. Br 3,12; Eclo 11,15; Pr 2,6). Logo, a sabedo-
ria é um atributo essencialmente divino (Sb 9,1-4) e Deus a conce-
de a quem quiser (Eclo 1,26; Sb 9,6; 1Rs 3,12). O verbo "hakham"
– "ser sábio" – pode também ser traduzido por "ser inteligente, ser
especialista" e, normalmente, refere-se a alguém que entende e
domina algum assunto. Ou seja, é aplicado ao cotidiano das pesso-
as e tem o sentido de executar com excelência o próprio serviço.
Veja, a seguir, alguns exemplos de hakham com o sentido de
habilidade e destreza nas artes e nos ofícios:
1) Pessoas dotadas de habilidades manuais e que o texto
bíblico chama de sábias:
a) As mulheres habilidosas: Ex 35, 25-26.
b) Vários tipos de artesãos: Jr 10,9; Is 3,3.
c) Marinheiros peritos nos seus ofícios: Ez 27,8-9
Sb14,1-2.
d) Escultores: Is 40,20.
e) Escribas: Eclo 38,24.
f) Construtores do templo de Jerusalém: Ex 31,6-7;
35,10; 36,1-2.8; 1Cr 22,15; 2Cr 2,6.12.
g) Carpideiras: Jr 9,16.
Essa concepção de sabedoria também se aplica às atividades
intelectuais: o saber acumulado, a ciência e a doutrina.
2) Personagens famosos são igualmente considerados sá-
bios:
a) Davi, no relato da mulher de Técua (2Sm 14): a sa-
bedoria do rei é considerada sobrenatural, de um
"anjo de Deus" (cf. 2Sm 14,20).
b) Salomão, segundo a tradição bíblica, é o rei sábio
por excelência: 1Rs 5,9-14. 10,1-13; 2Cr 9,22-28; Ecl
1,16-18; 2,9.

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© Introdução à Literatura Sapiencial Bíblica 39

c) Quando se trata de governar, vários reis são consi-


derados sábios: o da Assíria (Is 10,13), o da Babilônia
(Is 47,10) e o de Tiro (Ez 28,17).
d) Há, também, um mau uso da sabedoria em Is 29,14
e Jó 12,2. Aconselhar e planejar seriam funções da
classe dos dirigentes, sacerdotal ou conselheiros po-
líticos; quando isso não acontece, a sabedoria divina
fará falhar a sabedoria deles. O mesmo acontece em
Jr 8,8-9; 9,22; 49,7.
3) A sabedoria é prudência política:
a) A sabedoria é a arte de governar bem: Is 11,2; Dt
34,9; 2Cr 1,11; 1Rs 3,28.
b) O sábio é o governante ideal: Dt 1,13; 1Rs 5,21.
4) A sabedoria como prudência e sensatez, ou seja, o ho-
mem moralmente responsável:
a) A sabedoria é a virtude pela qual o homem orien-
ta sua vida ordenadamente e segundo a vontade de
Deus. Mas o homem não está só, pois Deus o ajuda
a conseguir a sensatez: Dt 4,6; Sl 90,12.
b) Sensatez e prudência são adquiridas com o passar
dos anos (Jó 12,12), mas a juventude e a prudência
não são incompatíveis (veja a história de José, em
Gn 37-50).
c) A sede da sabedoria está no coração (Sl 90,12; Pr
2,10; 14,33). A sabedoria é própria do homem justo
e piedoso (Pr 10,31; 11,2).

9. TEOLOGIA DA RETRIBUIÇÃO
Além das considerações sobre a sabedoria no Antigo Oriente
Próximo, para o nosso estudo sobre a literatura sapiencial bíblica,
é necessário compreender a Teologia da Retribuição.
Correntes teológicas nasceram e desapareceram ao longo da
história humana; porém, a Teologia da Retribuição está presente
claramente nos tempos da Bíblia e nos nossos dias.
40 © Salmos e Sapienciais

Em palavras mais simples, a Teologia (ou Doutrina) da Re-


tribuição defende que o justo e o injusto colherão o resultado de
suas ações ainda neste mundo. A retribuição é temporal, isto é,
antes da morte. É o velho e conhecido ditado: "tudo o que a gente
faz, aqui mesmo a gente paga". Portanto, felicidade, saúde e rique-
za são bênçãos de Deus para o justo; desgraça, doença e pobreza
são castigos para o injusto.
Assim, os textos em que aparece a personificação da sabe-
doria, principalmente quando ela nos convida a aceitar seus ensi-
namentos, têm um cunho moral: ou o homem aceita-a e tem uma
vida em abundância, ou ele rejeita-a e encontra a desgraça. É a an-
títese "vida versus morte" (cf. Pr 8,1-11.32-36; 9,1-6). Dessa forma,
a sabedoria deixa de ser conhecimento adquirido pela experiência
e passa ser resultado, um processo de educação moral.
A sabedoria com que Deus criou o mundo se entrega aos
homens, mora no meio deles e tem um nome: Torah (Lei). Nesse
sentido, a ordem cósmica e social está submissa a um paradigma
moral que se encarrega do resultado. A submissão à Torah garante
um resultado positivo, isto é, saúde, riqueza etc.; em contraparti-
da, a desobediência à Torah provoca um resultado negativo e de-
sastroso: doença, pobreza etc.
Mas os livros sapienciais bíblicos não são unânimes quanto
à infalibilidade desse princípio. Provérbios e Sirácida (Eclesiástico)
advogam que a doutrina da retribuição funciona; em contraparti-
da, Jó e Qohélet (Eclesiastes) negam tal doutrina; por sua vez, o
livro da Sabedoria faz uma síntese: ela funciona, mas só na outra
vida. Esquematicamente:
PROVÉRBIOS e SIRÁCIDA SABEDORIA
– a Retribuição funciona; – a Retribuição funciona sim, mas só
– a vida humana tem sentido. depois da morte;
JÓ e QOHÉLET – o sentido da vida humana está na
felicidade ultraterrena.
– a Retribuição não funciona;
– a vida não tem sentido.

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© Introdução à Literatura Sapiencial Bíblica 41

10. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS


Sugerimos, neste tópico, que você procure responder às
questões a seguir, que tratam da temática desenvolvida nesta uni-
dade, bem como que as discuta e as comente.
A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para
testar seu desempenho. Se encontrar dificuldades em responder
a essas questões, procure revisar os conteúdos estudados para
sanar suas dúvidas. Este é o momento ideal para você fazer uma
revisão do estudo desta unidade. Lembre-se de que, na Educação
a Distância, a construção do conhecimento ocorre de forma coo-
perativa e colaborativa. Portanto, compartilhe com seus colegas
de curso as suas descobertas.
Confira, na sequência, as questões propostas para verificar
seu desempenho no estudo desta unidade:
1) Qual a influência da sabedoria do Antigo Oriente Próximo nos textos bíblicos?

2) Como a Bíblia apresenta a Sabedoria?

3) Comente a Teologia da Retribuição e sua influência nas pessoas hoje.

11. CONSIDERAÇÕES
Os livros sapienciais do Antigo Testamento são: Provérbios,
Jó, Eclesiastes (Qohélet), Eclesiástico (Sirácida) e Sabedoria. Esses
cinco livros representam o esforço de gerações de sábios preocu-
pados com a cultura religiosa, social e política de seu povo. Nesse
sentido, escrever foi a forma encontrada para preservar e transmi-
tir valores para as novas gerações.
Como você pôde perceber, nesta apresentação, ficaram de
fora Salmos e Cântico dos Cânticos, pois estes não são propria-
mente livros sapienciais, mas livros de poesia lírica. Todavia, são
estudados com os livros sapienciais propriamente ditos, porque
também estes são em grande parte poéticos. Assim, em nossa dis-
42 © Salmos e Sapienciais

ciplina, iniciaremos com os cinco livros sapienciais e, depois, vere-


mos Salmos e Cântico dos Cânticos.
Na próxima unidade, teremos a oportunidade de iniciar nos-
sos estudos com dois livros: Provérbios e Sirácida.

12. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ALONSO SCHÖKEL, L.; VÍLCHEZ LÍNDEZ, J. Proverbios. Madrid: Cristiandad, 1978. (Nueva
Biblia Española – Sapienciales, 1).
CRB. Sabedoria e poesia do povo de Deus. São Paulo: Loyola, 1993. (Tua Palavra é Vida, 4).
MORLA ASENSIO, V. Livros sapienciais e outros escritos. São Paulo: Ave Maria, 1997.
(Introdução ao estudo da Bíblia, 5).
VÍLCHEZ LÍNDEZ, J. Sabedoria e sábios em Israel. São Paulo: Loyola, 1999. (Bíblica Loyola, 25).

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