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RECREAÇÃO E LAZER

CURSOS DE GRADUAÇÃO – EAD


Recreação e Lazer – Prof. Ms. Robson Amaral da Silva

Olá! Meu nome é Robson Amaral da Silva. Sou licenciado em


Educação Física pela Universidade Federal de São Carlos (CEF/
UFSCar – 2006), especialista em Lazer pela Universidade Federal
de Minas Gerais (UFMG – 2008) e mestre em Educação pela
UFSCar (PPGE/UFSCar – 2010). Atualmente, sou professor do
Claretiano – Centro Universitário de Batatais nos cursos de
Bacharelado (presencial e a distância) e Licenciatura (presencial
e a distância). Sou pesquisador da Sociedade de Pesquisa
Qualitativa em Motricidade Humana, membro do Núcleo de
Estudos de Fenomenologia em Educação Física (Nefef/UFSCar),
pesquisador da linha Práticas Sociais e Processos Educativos e
Estudos Socioculturais do Lazer. Ultimamente, também tenho me debruçado sobre
questões afetas ao lazer e à recreação, publicando artigos científicos em periódicos
nacionais e internacionais, além de capítulos de livros relacionados a essa temática.
E-mail: robsonsilva@claretiano.edu.br

Fazemos parte do Claretiano - Rede de Educação


Robson Amaral da Silva

RECREAÇÃO E LAZER

Batatais
Claretiano
2014
© Ação Educacional Claretiana, 2012 – Batatais (SP)
Versão: dez./2014

790.1 S583r

Silva, Robson Amaral da


Recreação e lazer / Robson Amaral da Silva – Batatais, SP : Claretiano, 2014.
174 p.

ISBN: 978-85-8377-238-5

1. Lazer. 2. Ludicidade. 3. Educação. 4. Recreação. 5. Políticas do lazer.


I. Recreação e lazer.

CDD 790.1

Corpo Técnico Editorial do Material Didático Mediacional


Coordenador de Material Didático Mediacional: J. Alves

Preparação Revisão
Aline de Fátima Guedes Cecília Beatriz Alves Teixeira
Camila Maria Nardi Matos Eduardo Henrique Marinheiro
Felipe Aleixo
Carolina de Andrade Baviera Filipi Andrade de Deus Silveira
Cátia Aparecida Ribeiro Juliana Biggi
Dandara Louise Vieira Matavelli Paulo Roberto F. M. Sposati Ortiz
Elaine Aparecida de Lima Moraes Rafael Antonio Morotti
Josiane Marchiori Martins Rodrigo Ferreira Daverni
Sônia Galindo Melo
Lidiane Maria Magalini Talita Cristina Bartolomeu
Luciana A. Mani Adami Vanessa Vergani Machado
Luciana dos Santos Sançana de Melo
Patrícia Alves Veronez Montera Projeto gráfico, diagramação e capa
Raquel Baptista Meneses Frata Eduardo de Oliveira Azevedo
Joice Cristina Micai CDD 658.151
Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli
Lúcia Maria de Sousa Ferrão
Simone Rodrigues de Oliveira Luis Antônio Guimarães Toloi
Raphael Fantacini de Oliveira
Bibliotecária Tamires Botta Murakami de Souza
Ana Carolina Guimarães – CRB7: 64/11 Wagner Segato dos Santos

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autor e da Ação Educacional Claretiana.

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Rua Dom Bosco, 466 - Bairro: Castelo – Batatais SP – CEP 14.300-000
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SUMÁRIO

CADERNO DE REFERÊNCIA DE CONTEÚDO


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................... 7
2 ORIENTAÇÕES PARA ESTUDO........................................................................... 9
3 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 19

Unidade 1 – RECREAÇÃO E LAZER: APONTAMENTOS HISTÓRICOS E


CONCEITUAIS NO CAMPO DA EDUCAÇÃO FÍSICA
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 21
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 21
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 22
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 23
5 RECREAÇÃO E LAZER: VÍNCULOS HISTÓRICOS............................................... 24
6 LAZER: ASPECTOS CONCEITUAIS..................................................................... 66
7 RECREAÇÃO: (BREVES) APONTAMENTOS CONCEITUAIS............................... 75
8 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 77
9 CONSIDERAÇÕES............................................................................................... 78
10 E-REFERÊNCIAS................................................................................................. 79
11 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 79

Unidade 2 – DIMENSÕES POLÍTICAS DO LAZER


1 OBJETIVOS......................................................................................................... 83
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 83
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 84
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 84
5 O LAZER COMO DIREITO SOCIAL..................................................................... 85
6 O PROCESSO HISTÓRICO DE POLÍTICAS DE LAZER NO BRASIL...................... 95
7 POLÍTICAS: UNIVERSAIS OU FOCALIZADAS?................................................... 109
8 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 114
9 CONSIDERAÇÕES............................................................................................... 114
10 E-REFERÊNCIAS................................................................................................. 115
11 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 117

Unidade 3 – INTERFACES ENTRE O LAZER E A EDUCAÇÃO


1 OBJETIVOS......................................................................................................... 119
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 119
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 120
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 120
5 A EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE...................................................... 121
6 RECONHECENDO O CAMPO DE ESTUDOS DO LAZER..................................... 127
7 ARTICULAÇÕES ENTRE O LAZER E A EDUCAÇÃO............................................ 130
8 ARTICULAÇÕES ENTRE A EDUCAÇÃO E O LAZER............................................ 138
9 OS CONTEÚDOS CULTURAIS DO LAZER........................................................... 140
10 Q UESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 144
11 C ONSIDERAÇÕES............................................................................................... 145
12 E-REFERÊNCIAS................................................................................................. 145
13 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 145

Unidade 4 – LAZER: FORMAÇÃO E ATUAÇÃO PROFISSIONAL


1 OBJETIVOS......................................................................................................... 149
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 149
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 150
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 151
5 CONHECENDO OS PROFISSIONAIS DO LAZER................................................ 151
6 A ANIMAÇÃO CULTURAL.................................................................................. 155
7 PADRÕES DE ORGANIZAÇÃO DA CULTURA..................................................... 158
8 POSSIBILIDADES DE INTERVENÇÃO................................................................. 164
9 COMENTANDO UM EXEMPLO DE ATUAÇÃO NO CAMPO DO LAZER............ 169
10 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS........................................................................ 172
11 C ONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 172
12 E-REFERÊNCIAS................................................................................................. 173
13 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 173
Caderno de
Referência de
Conteúdo

CRC

Conteúdo ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Introdução aos estudos do lazer e da recreação. Lazer, ludicidade e educação.
Formação e atuação profissional no campo do lazer e da recreação. Políticas
(públicas) de lazer. Pesquisa aplicada ao lazer.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

1. INTRODUÇÃO
Caro aluno, seja muito bem-vindo!
Agora iniciaremos os estudos de Recreação e Lazer, que
compõe os cursos de Graduação na modalidade EaD.
No Caderno de Referência de Conteúdo, você encontrará as
quatro unidades básicas que compõem o material, preparadas es-
pecialmente para que você possa realizar seus estudos relativos a
esta obra. Com isto, esperamos que você tenha contato com con-
hecimentos que irão contribuir para seu processo de formação e
atuação profissional no campo da Educação Física, em especial no
que se refere à área de recreação e lazer.
8 © Recreação e Lazer

Na Unidade 1, trazemos à baila uma discussão sobre a ocor-


rência histórica do lazer e da recreação.
O lazer e a recreação percorreram trajetórias diferentes, mas
são fenômenos que apresentam interfaces diretas. Ainda na pri-
meira unidade, apresentamos e discutimos os conceitos veicula-
dos por estudiosos nesses campos, com o propósito de superar o
senso comum, muitas vezes presente na abordagem dos temas.
O lazer e a política são as temáticas que perpassam a Uni-
dade 2. Para discussão desses aspectos, o lazer foi compreendido
como um direito social, e, para isso, percorreu um processo históri-
co-social que envolveu necessariamente a reflexão em torno de
temas como cidadania, participação popular e reivindicações so-
ciais – que o levaram a ser visto como uma das dimensões da vida
humana que pode contribuir para a superação das desigualdades
sociais.
A Unidade 3 trata da relação entre lazer e educação. Seu
principal objetivo é apresentar a vocês as interfaces que o campo
do lazer vem construindo em sua articulação com a educação (e
vice-versa).
Como ponto de partida, tornou-se necessário discutir o con-
ceito de "campo". Há um reconhecimento do lazer como um pro-
cesso educativo, cuja reflexão e vivência precisam ser sistematiza-
das em vários âmbitos, atingindo especialmente o contexto da
educação não formal, pois caracteriza um locus importante para
a intervenção dos profissionais da Educação Física que trabalham
com o lazer.
Os desafios postos para a sociedade e os educadores neste
século 21 também são abordados, bem como a questão dos con-
teúdos culturais do lazer, o que representa uma rica possibilidade
para o desenvolvimento da educação em uma perspectiva lúdica.
"Lazer: formação e atuação profissional" é o título da quarta
unidade. Nela, são abordadas questões afetas ao processo forma-
© Caderno de Referência de Conteúdo 9

tivo dos profissionais que irão trabalhar neste campo e os possíveis


espaços que por ele podem ser ocupados.
A perspectiva da animação cultural é tomada como elemen-
to central na busca da construção de uma intervenção significativa
no âmbito da cultura, seja ela erudita, popular ou de massa.
De posse desses breves comentários, você pode construir
um pequeno esboço dos assuntos que serão tratados, podendo,
dessa forma, se preparar de maneira adequada para este "jogo do
saber".
Uma vez realizado este contato inicial, por meio da exposição
das principais temáticas a serem desenvolvidas, apresentaremos,
a seguir, no tópico Orientações para estudo, algumas orientações
de cunho motivacional, dicas e estratégias que o auxiliarão em
seus estudos.

2. ORIENTAÇÕES PARA ESTUDO

Abordagem geral

Prof. Ms. Robson Amaral da Silva


Aqui, você entrará em contato com os assuntos principais
deste conteúdo de forma breve e geral e terá a oportunidade de
aprofundar essas questões no estudo de cada unidade. Desse
modo, essa Abordagem Geral visa fornecer-lhe o conhecimento
básico necessário a partir do qual você possa construir um refe-
rencial teórico com base sólida – científica e cultural – para que, no
futuro exercício de sua profissão, você a exerça com competência
cognitiva, ética e responsabilidade social.
A proposta deste estudo está pautado em duas premissas
básicas: a primeira consiste no reconhecimento de que, conforme
nos ensinou o grande educador Paulo Freire, educar é um ato po-
lítico-pedagógico: político por ser carregado de intencionalidades,
sejam elas para reproduzir o sistema vigente ou para transformá-

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10 © Recreação e Lazer

-lo, e pedagógico no sentido de abarcar métodos e processos de


ensino e de aprendizagem, envolvendo tanto aqueles que ensinam
quanto aqueles que aprendem.
A segunda premissa que sustenta as reflexões contidas neste
material articula-se com a primeira, pois considera o lazer e a rec-
reação como ações socioeducativas, cujas intencionalidades bus-
cam contribuir no processo de humanização dos indivíduos, com
vistas à construção de uma sociedade mais justa, digna e solidária,
por meio de seus processos metodológicos.
O profissional da Educação Física que atua no campo do lazer
e da recreação é também um educador. Daí vem a necessidade de
aprofundar conhecimentos sobre questões que alimentam a área
da educação na atualidade, buscando articulações com o campo
de estudos do lazer e da recreação. Afinal, um simples "par ou ím-
par" – recurso geralmente usado para "selecionar" os jogadores de
uma equipe –, por exemplo, carrega, em sua essência, uma inten-
ção político-pedagógica pouco problematizada pelos profissionais
que atuam na área.
Sendo assim, este material didático tem como desafio maior
compreender a inter-relação dessas duas dimensões da vida hu-
mana – a educação e o lazer – com outras que também estão pre-
sentes (como a política e a economia, por exemplo), fornecendo
subsídios para que você possa atuar significativamente no campo
da recreação e do lazer.
Essas dimensões se relacionam de forma direta e mútua
quando se pensa, de um lado, nas possibilidades que a educação
encontra para atingir seus propósitos, tendo o lazer e a recrea-
ção como aliados, e, de outro, nas possibilidades que a recreação
e o lazer encontram na educação, para que os sujeitos possam
aprender a vivenciá-los de maneira crítica e criativa. Dito de outro
modo, é o que chamamos de "duplo aspecto educativo do lazer"
(e que será detidamente abordado ao longo dos nossos estudos),
tal como destacado por autores como Requixa (1979, 1980) e Mar-
© Caderno de Referência de Conteúdo 11

cellino (2010), que o entendem como instrumento e fim, veículo e


objeto de educação.
Para aprofundar o entendimento dessa perspectiva de edu-
cação, consideramos fundamental compreender o conceito de
"lúdico", elemento muito presente nas pesquisas e nas interven-
ções que articulam o recreação/lazer e a educação. A partir daí,
sugerimos a análise de possibilidades de trabalho para que o edu-
cador possa desenvolver habilidades na perspectiva de uma edu-
cação comprometida com o lazer.
Na esteira desse pensamento, a perspectiva da animação
cultural tem muito a acrescentar no campo do lazer/recreação. A
partir dela, poderemos identificar o papel do profissional de lazer
no sentido de potencializar o alcance dos cidadãos aos mais dife-
rentes bens culturais que se apresentam em ruas, bairros e mu-
nicípios, entendendo a importância política de sua atuação. Para
tanto, é necessário identificar a animação cultural como uma tec-
nologia educacional de intervenção e uma poderosa ferramenta
pedagógica que permite nortear nossas ações.
Ao tomarmos a relação lazer/recreação, educação e animação
cultural como temas fundamentais, ampliamos o entendimento cor-
rente de que o lazer seria uma mera mercadoria a ser consumida, e
passamos a dimensioná-lo na esfera dos direitos sociais. Aqui cabe
uma "parada" para refletirmos sobre o pensamento de Linhales
(1998, p. 78), ao pensar o lazer nesta condição (de direito social):
O que hoje consideramos como direitos sociais pressupõe a ga-
rantia e a provisão, por parte do Estado, de políticas capazes de
dar suporte ao bem-estar de todos os cidadãos. Os conteúdos ou
áreas sociais implicados na promoção do bem-estar constituem di-
reitos mínimos e universais conquistados historicamente. Devem
ser compreendidos como uma construção decorrente dos múlti-
plos conflitos e interesses que legitimam as chamadas democracias
capitalistas contemporâneas.

Dando continuidade à discussão sobre o lazer como direito


social, é importante incluir um novo componente no debate que
relaciona Estado e sociedade: mercado e estratégias de indução

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12 © Recreação e Lazer

ao consumismo. É preciso considerar que o lazer não pode ser um


momento exclusivo do consumo nem estar a serviço do consumo.
Isso pode impedir o indivíduo ou os grupos sociais de diversificar
formas alternativas e próprias de lazer.
Os meios de comunicação de massa a serviço da indústria
cultural mobilizam como uma avalanche sensorial o psiquismo dos
ouvintes com mensagens de nível medíocre (qualitativamente fa-
lando), empobrecendo a comunicação concreta do homem com
seu meio, com os outros e reduzindo as dimensões emancipató-
rias do lazer.
Como afirma Gomes (2008, p. 76-77),
Uma sociedade dominada pela lógica da produção e do consumo
(alienado) de bens e de serviços é, precisamente, uma sociedade
que se apresenta como a única habilitada a produzir o lazer, en-
quanto uma de suas valiosas mercadorias – ao passo que deveria
representar uma condição fundamental para a promoção da quali-
dade de vida dos sujeitos, enquanto cidadãos que buscam momen-
tos lúdicos e enriquecedores no seu dia a dia. Não há preocupação
com uma análise mais consistente sobre o significado sociocultural
e político na vida das pessoas, bem como sobre as contradições
que o permeiam em nosso contexto. Concebido apenas pela lógica
do mercado, ao lazer restaria promover o entretenimento e a dis-
tração alienantes, algo para se matar o tempo e para escapar do
tédio.

O lazer/recreação necessita de ser visto e efetivado como


um momento de crescimento da pessoa em vista de uma melhor
qualidade de vida. Como prática sociocultural em permanente
construção, se configura em formas de conhecimento, saberes en-
raizados na cultura, manifestação da linguagem, forma de signifi-
cação coletiva do mundo e possibilidades éticas e estéticas que
contribuam para o processo de humanização dos indivíduos por
meio de experiências educativas (ISAYAMA; LINHALES, 2006).
Nesse sentido, o lazer merece ser efetivado como descanso e
não apenas para recuperar a força de trabalho em vista do próprio
trabalho. Ele deve incluir a dimensão da distração como relaxa-
mento, diversão e, sobretudo, deve ser o motor do desenvolvim-
© Caderno de Referência de Conteúdo 13

ento humano pela dimensão lúdica da vida, pelo conhecimento de


novas culturas, pela apreciação da beleza, pela produção estética
e pelo desenvolvimento das próprias potencialidades.
Munidos dessas argumentações, iniciamos nossos estudos.
Esperamos que esta caminhada seja um prazer (elemento funda-
mental para o entendimento tanto da recreação como do lazer),
ainda que por vezes seja árdua, pois trata-se do ato de estudar.
Você está preparado para este desafio? Então, vamos lá!
Desejo bons estudos a todos!

Glossário de Conceitos
O Glossário de Conceitos permite a você uma consulta rá-
pida e precisa das definições conceituais, possibilitando-lhe um
bom domínio dos termos técnico-científicos utilizados na área de
conhecimento dos temas tratados em Recreação e Lazer. Veja, a
seguir, a definição dos principais conceitos:
1) Cultura: de acordo com Chauí (1994), "é a maneira pela
qual os humanos se humanizam por meio de práticas
que criam existência social, econômica, política, reli-
giosa e artística" (p. 295). Daolio (2008) afirma que as
definições contemporâneas para esse termo têm consi-
derado, além da produção material e externa aos seres
humanos, as maneiras de compreender a cultura, que
também incorporam os processos contínuos e dinâmi-
cos de orientação e significação empreendidos pelos ho-
mens, ou seja, um processo de manipulação simbólica.
O autor nos alerta para o fato de que os profissionais da
Educação Física não atuam diretamente sobre o corpo
ou sobre os movimentos em si, mas, sim, tratam dos se-
res humanos em suas manifestações culturais, relacio-
nadas ao corpo e ao movimento humano.
2) Indústria cultural: expressão que aparece pela primeira
vez no livro Dialética do Esclarecimento, de Max Horkhei-
mer e Theodor W. Adorno, e que foi cunhada para substi-
tuir, com maior precisão, o termo cultura de massa. Com

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14 © Recreação e Lazer

essa mudança, os autores visavam não confundir uma


cultura produzida popularmente com o processo de pro-
dução conforme os princípios da indústria. Os autores
percebiam que produções ligadas ao rádio, ao cinema,
às revistas ilustradas, entre outras, eram adaptadas ao
consumo das massas, baseando-se no princípio de sua
comercialização, e não em seu próprio conteúdo e confi-
guração (BASSANI; VAZ, 2008).
3) Lúdico: para Gomes (2004), o lúdico pode ser entendido
como uma "expressão humana de significados da/na cul-
tura referenciada no brincar consigo, com o outro e com
o contexto. Por essa razão o lúdico reflete as tradições,
os valores, os costumes e as contradições presentes em
nossa sociedade. Assim, é construído culturalmente e
cerceado por vários fatores: normas políticas e sociais,
princípios morais, regras educacionais, condições con-
cretas de existência" (p. 145, grifos da autora).

Esquema dos Conceitos-chave


Para que você tenha uma visão geral dos conceitos mais
importantes deste estudo, apresentamos, a seguir (Figura 1), um
Esquema dos Conceitos-chave. O mais aconselhável é que você
mesmo faça o seu esquema de conceitos-chave ou até mesmo o
seu mapa mental. Esse exercício é uma forma de você construir o
seu conhecimento, ressignificando as informações a partir de suas
próprias percepções.
É importante ressaltar que o propósito desse Esquema dos
Conceitos-chave é representar, de maneira gráfica, as relações entre
os conceitos por meio de palavras-chave, partindo dos mais com-
plexos para os mais simples. Esse recurso pode auxiliar você na or-
denação e na sequenciação hierarquizada dos conteúdos de ensino.
Com base na teoria de aprendizagem significativa, entende-se
que, por meio da organização das ideias e dos princípios em esque-
mas e mapas mentais, o indivíduo pode construir o seu conhecimen-
to de maneira mais produtiva e obter, assim, ganhos pedagógicos
significativos no seu processo de ensino e aprendizagem.
© Caderno de Referência de Conteúdo 15

Aplicado a diversas áreas do ensino e da aprendizagem es-


colar (tais como planejamentos de currículo, sistemas e pesquisas
em Educação), o Esquema dos Conceitos-chave baseia-se, ainda,
na ideia fundamental da Psicologia Cognitiva de Ausubel, que es-
tabelece que a aprendizagem ocorre pela assimilação de novos
conceitos e de proposições na estrutura cognitiva do aluno. Assim,
novas ideias e informações são aprendidas, uma vez que existem
pontos de ancoragem.
Tem-se de destacar que "aprendizagem" não significa, ape-
nas, realizar acréscimos na estrutura cognitiva do aluno; é preci-
so, sobretudo, estabelecer modificações para que ela se configure
como uma aprendizagem significativa. Para isso, é importante con-
siderar as entradas de conhecimento e organizar bem os materiais
de aprendizagem. Além disso, as novas ideias e os novos concei-
tos devem ser potencialmente significativos para o aluno, uma vez
que, ao fixar esses conceitos nas suas já existentes estruturas cog-
nitivas, outros serão também relembrados.
Nessa perspectiva, partindo-se do pressuposto de que é você
o principal agente da construção do próprio conhecimento, por
meio de sua predisposição afetiva e de suas motivações internas
e externas, o Esquema dos Conceitos-chave tem por objetivo tor-
nar significativa a sua aprendizagem, transformando o seu conhe-
cimento sistematizado em conteúdo curricular, ou seja, estabele-
cendo uma relação entre aquilo que você acabou de conhecer com
o que já fazia parte do seu conhecimento de mundo (adaptado do
site disponível em: <http://penta2.ufrgs.br/edutools/mapascon-
ceituais/utilizamapasconceituais.html>. Acesso em: 11 mar. 2010).

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16 © Recreação e Lazer

Figura 1 Esquema dos Conceitos-chave de Recreação e Lazer.

Como pode observar, esse Esquema dá a você, como dis-


semos anteriormente, uma visão geral dos conceitos mais im-
portantes deste estudo. Ao segui-lo, você poderá transitar entre
um e outro conceito e descobrir o caminho para construir o seu
processo de ensino-aprendizagem. Por exemplo, de acordo com
o esquema, lazer/recreação são fenômenos que não podem ser
entendidos isoladamente; devem ser relacionados aos aspectos
históricos, econômicos, políticos, culturais e sociais.
Ao desconsiderarmos essas relações, estaremos esvaziando
a compreensão desses fenômenos, favorecendo, dessa forma, a
utilização destes como mercadoria, e não como uma prática social
que pode contribuir para o processo de edificação de uma socie-
dade mais justa, digna e solidária.
O Esquema dos Conceitos-chave é mais um dos recursos de
aprendizagem que vem se somar àqueles disponíveis no ambien-
te virtual, por meio de suas ferramentas interativas, bem como
àqueles relacionados às atividades didático-pedagógicas realiza-
das presencialmente no polo. Lembre-se de que você, aluno EaD,
© Caderno de Referência de Conteúdo 17

deve valer-se da sua autonomia na construção de seu próprio con-


hecimento.

Questões autoavaliativas
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados, as quais podem ser
de múltipla escolha, abertas objetivas ou abertas dissertativas.
Responder, discutir e comentar essas questões, bem como
relacioná-las com a prática do ensino de Recreação e Lazer, pode
ser uma forma de você avaliar o seu conhecimento. Assim, medi-
ante a resolução de questões pertinentes ao assunto tratado, você
estará se preparando para a avaliação final, que será dissertativa.
Além disso, essa é uma maneira privilegiada de você testar seus
conhecimentos e adquirir uma formação sólida para a sua prática
profissional.

As questões de múltipla escolha são as que têm como respos-


ta apenas uma alternativa correta. Por sua vez, entendem-se por
questões abertas objetivas as que se referem aos conteúdos
matemáticos ou àqueles que exigem uma resposta determinada,
inalterada. Já as questões abertas dissertativas obtêm por res-
posta uma interpretação pessoal sobre o tema tratado; por isso,
normalmente, não há nada relacionado a elas no item Gabarito.
Você pode comentar suas respostas com o seu tutor ou com seus
colegas de turma.

Bibliografia Básica
É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus
estudos, mas não se prenda só a ela. Consulte, também, as biblio-
grafias complementares.

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18 © Recreação e Lazer

Figuras (ilustrações, quadros...)


Neste material instrucional, as ilustrações fazem parte inte-
grante dos conteúdos, ou seja, elas não são meramente ilustra-
tivas, pois esquematizam e resumem conteúdos explicitados no
texto. Não deixe de observar a relação dessas figuras com os con-
teúdos, pois relacionar aquilo que está no campo visual com o con-
ceitual faz parte de uma boa formação intelectual.

Dicas (motivacionais)
Este estudo convida você a olhar, de forma mais apurada,
a Educação como processo de emancipação do ser humano. É
importante que você se atente às explicações teóricas, práticas e
científicas que estão presentes nos meios de comunicação, bem
como partilhe suas descobertas com seus colegas, pois, ao com-
partilhar com outras pessoas aquilo que você observa, permite-se
descobrir algo que ainda não se conhece, aprendendo a ver e a
notar o que não havia sido percebido antes. Observar é, portanto,
uma capacidade que nos impele à maturidade.
Você, aluno na modalidade EaD, necessita de uma forma-
ção conceitual sólida e consistente. Para isso, você contará com
a ajuda do tutor a distância, do tutor presencial e, sobretudo, da
interação com seus colegas. Sugerimos, pois, que organize bem o
seu tempo e realize as atividades nas datas estipuladas.
É importante, ainda, que você anote as suas reflexões em
seu caderno ou no Bloco de Anotações, pois, no futuro, elas pode-
rão ser utilizadas na elaboração de sua monografia ou de produ-
ções científicas.
Leia os livros da bibliografia indicada, para que você amplie
seus horizontes teóricos. Coteje-os com o material didático, discuta
a unidade com seus colegas e com o tutor e assista às videoaulas.
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas, que são importantes para a sua análise sobre os
© Caderno de Referência de Conteúdo 19

conteúdos desenvolvidos e para saber se estes foram significativos


para sua formação. Indague, reflita, conteste e construa resenhas,
pois esses procedimentos serão importantes para o seu amadure-
cimento intelectual.
Lembre-se de que o segredo do sucesso em um curso na
modalidade a distância é participar, ou seja, interagir, procurando
sempre cooperar e colaborar com seus colegas e tutores.
Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a
esta obra, entre em contato com seu tutor. Ele estará pronto para
ajudar você.

3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BASSANI, Jaison José; VAZ, Alexandre Fernadez. Indústria Cultural. In: GONZÁLEZ,
Fernando Jaime; FENSTERSEIFER, Paulo Evaldo (Org.). Dicionário crítico de Educação
Física. 2. ed. Ijuí: Editora Unijuí, 2008.
CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 1994.
DAOLIO, Jocimar. Cultura. In: GONZÁLEZ, Fernando Jaime; FENSTERSEIFER, Paulo Evaldo
(Org.). Dicionário crítico de Educação Física. 2. ed. Ijuí: Editora Unijuí, 2008.
GOMES, Christianne Luce. Lúdico. In: ______. (Org.). Dicionário crítico do lazer. Belo
Horizonte: Autêntica, 2004. p. 141-146.
______. Lazer, trabalho e educação: relações históricas, questões contemporâneas. 2.
ed. rev. ampl. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.
ISAYAMA, Helder Ferreira; LINHALES, Meily Assbú. Introdução. In: ______ (Org.). Sobre
lazer e política: maneiras de ver, maneiras de fazer. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006.
p. 7-15.
LINHALES, Meily Assbú São as políticas públicas para a Educação Física/Esportes e Lazer,
efetivamente, políticas sociais? Motrivivência, Florianópolis, v. 10, n. 11, p. 71-81, 1998.
MARCELLINO, Nelson Carvalho Lazer e educação. 15. ed. Campinas: Papirus, 2010.
REQUIXA, Renato. As dimensões do lazer. Revista Brasileira de Educação Física e
Desportos, Brasília, n. 45, p. 54-76, 1980.
______. Conceito de lazer. Revista Brasileira de Educação Física e Desportos, Brasília, n.
4, p. 11-21, 1979.

Claretiano - Centro Universitário


Claretiano - Centro Universitário
EAD
Recreação e Lazer:
Apontamentos Históricos
e Conceituais no
Campo da Educação
Física 1
1. OBJETIVOS
• Conhecer questões pertinentes ao campo de estudos so-
bre o lazer e a recreação.
• Aprofundar conhecimentos sobre concepções e funda-
mentos do lazer e da recreação, reconhecendo-os como
objeto de estudos sistematizados.
• Compreender o processo de constituição histórica do
lazer e da recreação em nossa sociedade, identificando
características que permaneceram ou sofreram modifica-
ções ao longo dos tempos.
• Discutir, conceitualmente, aspectos relacionados ao lazer
e à recreação.

2. CONTEÚDOS
• Recreação e lazer: vínculos históricos.
22 © Recreação e Lazer

• Aspectos históricos da recreação.


• Ocorrência histórica do lazer.
• Sociedade greco-romana.
• Sociedade medieval.
• Sociedade urbano-industrial.
• Sociedade contemporânea.
• Lazer: aspectos conceituais.
• Recreação: (breves) apontamentos conceituais.

3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE


Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que
você leia as orientações a seguir:
1) Tenha em mãos o Glossário para que você consulte os
conceitos relativos a esta unidade, assim como o Esque-
ma dos Conceitos-chave. Essas ferramentas irão facilitar
seu estudo.
2) Por se tratar de uma unidade que trata de fatos históri-
cos relacionados à recreação e ao lazer, faça uma leitura
atenta deste conteúdo e acesse outras informações rela-
cionadas à temática a fim de comprovar ou reelaborar o
conteúdo tratado.
3) Durante a leitura tente apreender o movimento histórico
e todo o contexto que o envolve. Lembre-se, a recreação
e o lazer não estão isentos do contexto político, social,
econômico e cultural das diferentes etapas históricas.
4) Faça uma consulta à bibliografia indicada no tópico Re-
ferências Bibliográficas, ao final desta unidade, visando
aprofundar os principais conceitos abordados.
5) Para um enriquecimento de seu estudo, navegue nos si-
tes indicados no tópico E-Referências, ao final da unida-
de, favorecendo, dessa forma, o seu processo educativo.
6) Tenha empenho e dedicação em seus estudos. Sempre
que tiver alguma dúvida, entre em contato com profes-
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 23

sores e tutores do Centro Universitário Claretiano para


saná-las.
7) Recomendamos o filme Gladiador (EUA, 2000), dirigido
por Ridley Scott, que retrata de maneira adequada as
manifestações em Roma no período histórico estudado.
8) Assista ao filme O nome da rosa (Alemanha, 1986), diri-
gido por Jean-Jacques Annaud, baseado no livro com o
mesmo título, de autoria de Umberto Eco. Ele fornece
um exemplo de como era um mosteiro medieval e das
contradições nele presentes.

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
No cotidiano de muitas pessoas, é comum a menção aos
vocábulos "lazer" e "recreação". Se sairmos às ruas perguntando
o significado de ambos os termos, veremos que dificilmente uma
pessoa não saberá anunciar um entendimento para essas ex-
pressões.
Às vezes, a referência a esses termos se dá de forma sepa-
rada, ou seja, há a utilização de apenas uma das palavras (recrea-
ção ou lazer), e, em outras ocasiões, a associação entre ambas é
recorrente, indicando, dessa forma, a possibilidade de um vínculo
relacional.
A associação entre a recreação e o lazer pode ser verificada
em algumas áreas do conhecimento, o que gera dúvidas no que
se refere aos significados, à especificidade e à abrangência desses
termos.
De acordo com Gomes (2003), é possível identificar diversas
interpretações sobre os significados e as relações historicamente
construídas entre recreação e lazer. Para a autora, poderá ha-
ver uma identificação entre os termos (ambos compartilhando o
mesmo significado), um entendimento que considera a recreação
como uma função do lazer ou uma compreensão que aponta para
a existência de significados distintos para a recreação e o lazer.

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24 © Recreação e Lazer

Nesta unidade, iremos realizar um passeio pela história da


recreação e do lazer, buscando compreender os caminhos percor-
ridos por esses fenômenos, a fim de entender a relação destes
entre si e, posteriormente, com o campo de estudos e a atuação
profissional da Educação Física.
Além dessa incursão histórica, teremos a oportunidade de
compreender os sentidos dos termos "recreação" e "lazer" medi-
ante o contato com autores que se dedicaram a essa discussão.
É sobre essas questões que nos debruçaremos neste pri-
meiro momento.
Bons estudos a todos!

5. RECREAÇÃO E LAZER: VÍNCULOS HISTÓRICOS


Diante da breve exposição introdutória desta unidade, uma
pergunta pode ser feita como ponto de partida para nossas re-
flexões: por que é comum a associação entre recreação e lazer nos
estudos e vivências no cotidiano de nosso país?
Essa relação muitas vezes é recorrente em nossa área, e a
prova disso são os estudos de Bramante (2011), Bruhns (1997),
Gomes (2003), Isayama (2002) Pimentel (2003) e Pinto (2001), só
para citar alguns autores. Entretanto, em muitos casos, essa inter-
face não é encontrada em outros campos do conhecimento, como
podemos observar nas publicações de Magnani (2000), Freitas
(1999), Teixeira (1999) e Oliveira (2001), autores ligados a áreas
como Antropologia, Economia, Psicologia Social e Comunicação
Social.
Dessa forma, para responder à indagação formulada e estim-
ular você a pensar sobre essa relação tão usual em nossa área e no
cotidiano de muitas pessoas, buscaremos referências na história,
no sentido de elucidar os vínculos que, ao longo dos tempos, fo-
ram construídos entre a recreação e o lazer.
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 25

De antemão, já teríamos condições de apontar um elemento


interessante, mas não suficiente, que serve de indicativo para o
entendimento dessa relação. De acordo com Werneck (2003, p.
17-18), "essa aproximação entre a recreação e o lazer é uma res-
posta histórica à forma como a Educação Física vem lidando com
esses saberes na formação profissional e no mercado de trabalho
em nosso país".
Diante dessa afirmação, devemos procurar entender como
a Educação Física lidou com os saberes que emanavam dos cam-
pos da recreação e do lazer, ao mesmo tempo que incorporava es-
ses conhecimentos à formação de seus agentes. Certamente, esse
processo possuía implicações diretas na sociedade da época, for-
jando indivíduos alinhados com o projeto societário que se alme-
java, e contando, para isto, com o auxílio dos profissionais que se
formavam.
Autores como Gomes (2008) e Melo (2003) apontam que o
desenvolvimento de práticas recreativas foi responsável pela cria-
ção dos cursos de formação profissional em Educação Física em
nosso país.

Aspectos históricos da recreação


A história da recreação no Brasil está atrelada à instituição
escolar e, poderíamos dizer, à própria história da Educação, com
destaque para o ensino público primário (educação infantil).
A sua ocorrência ao longo do século 19 aparece como instru-
mento educativo a serviço do projeto médico-higienista que visava
disseminar ideias e programas relacionados à saúde, à aquisição de
hábitos higiênicos, à atenção sobre a infância e ao bem-estar físico
e moral por meio do controle corporal da população brasileira. Tais
ações deveriam culminar na modificação de comportamentos e
modos de vida herdados do período colonial (MARCASSA, 2004).

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26 © Recreação e Lazer

Esse modelo que se pretendia ver edificado procurava atuar


na saúde biológica e social da população, possuindo ingerência no
cotidiano dos indivíduos. Buscava-se uma reformulação das con-
sciências e dos saberes sobre o corpo e seus cuidados, sobre as
práticas corporais e sua importância para a época. Nesse sentido,
as atribuições da escola se modificam, e essa instituição adquire
uma nova responsabilidade em face do ideário de progresso social
que norteia as ações pedagógicas que ali se desenvolvem (MAR-
CASSA, 2004).
Não obstante, o controle corporal que se impõe à população
brasileira vê na recreação um instrumento pedagógico de grande
valor e cuja orientação era disciplinar as práticas corporais desfru-
tadas no tempo livre, para que elas não se flexibilizassem com a
preguiça. A recreação torna-se, então, uma estratégia de controle
dos tempos, espaços e práticas realizadas na escola, sobretudo nos
interstícios entre as atividades obrigatórias (MARCASSA, 2004).
A tão temida lassidão não combinava com os pensamentos
e atitudes que os idealizadores desse projeto societário tentavam
propagar. A ociosidade poderia levar os indivíduos à vagabunda-
gem, à capoeiragem (também vista como algo negativo) e aos ví-
cios que seriam prejudiciais ao desenvolvimento físico e moral das
pessoas. Diante desse quadro, a recreação atua decisivamente no
sentido de propor atividades "sadias", capazes de distinguir afir-
mativamente o corpo higienizado e o relapso corpo herdado da
tradição colonial (MARCASSA, 2004).
As reconhecidas atividades "sadias" seriam possibilitadas
mediante um programa escolar que incluísse a vivência de jogos,
brincadeiras e exercícios ginásticos rigorosamente planejados e
capazes de desenvolver os comportamentos e atitudes esperados
para a época, sem desperdício de tempo.
Para Marcassa (2004, p. 197), essas atividades deveriam
seguir "um ritmo lógico de funcionamento, desde a duração e a
freqüência do regime alimentar, as horas de sono, as atividades
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 27

intelectuais e até mesmo o recreio". Como podemos observar, o


tempo destinado para as atividades escolares deveria ser rigoro-
samente disciplinado.
É por meio das atividades recreativas que os limites entre
tempo de trabalho e tempo livre são constituídos e assimilados
desde as etapas iniciais do processo de escolarização das crianças
(educação infantil), respondendo a interesses político-ideológicos.
Dessa forma, forja-se, no interior da sociedade, um sistema de re-
compensa ao esforço empreendido no trabalho (e aqui incluímos
o trabalho escolar), essencial às exigências do mundo do trabalho
e da sociedade liberal e capitalista que se desenvolvia (MARCASSA,
2002).
De forma sintética, Marcassa (2004, p. 198) se expressa para
apontar o papel da recreação nesse período histórico:
[...] sob os preceitos da ordem, da disciplina e do comportamento
saudável incorporados à escola, a recreação manifesta-se como co-
adjuvante do processo educativo para o alcance da melhor forma
de recuperação das forças para o retorno ao trabalho, incluso aí o
trabalho escolar, a diminuição da delinqüência e a ocupação ad-
equada do tempo livre, fazendo-se protagonista da construção da
harmonia e do progresso. E tamanho era o "dever civilizador" das
atividades escolares que ele acaba justificando não só a efervescên-
cia de movimentos políticos e sociais pela instrução da população
brasileira, como também reforçando, cada vez mais, a prática da
recreação como estratégia de controle do tempo livre, tanto dentro,
como fora da escola (Grifos nossos).

Diante dessas primeiras palavras acerca da trajetória históri-


ca da recreação em nosso país, podemos perceber que ela par-
ticipa da história da educação na condição de um vigoroso recurso
disciplinar, inicialmente destinado à educação infantil, mas à qual
a ela não se restringe, alcançando também o processo formativo,
moral e cívico de jovens e adultos.
Com o passar do tempo, mais precisamente das três pri-
meiras décadas do século 20, assistimos, no cenário educacional
brasileiro, à emergência de novas concepções político-pedagógi-
cas, sintetizadas no que podemos chamar de "escolanovismo" ou,
simplesmente, "Escola Nova".

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28 © Recreação e Lazer

Para uma análise crítica dessa nova concepção político-ped-


agógica, leia a obra Escola e democracia, de Saviani (2002).
As mudanças advindas da difusão desse ideário pedagógico
acenam para a edificação de uma escola renovada, capaz de superar
a pedagogia tradicional. Nos dizeres de Saviani (2002, p. 7),
A pedagogia nova começa, pois, por efetuar a crítica da pedagogia
tradicional, esboçando uma nova maneira de interpretar a edu-
cação e ensaiando implantá-la, primeiro, através de experiências
restritas; depois, advogando sua generalização no âmbito dos sis-
temas escolares.

No interior dessas transformações, passam a ter centrali-


dade alguns aspectos que não figuravam como (tão) essenciais
para a educação até então, tais como: qualidade de ensino, ênfase
nos métodos e processos pedagógicos e processo de ensino e de
aprendizagem centrado no aluno, para citar apenas alguns.
Muito embora possamos perceber que mudanças ocorreram
no interior da escola (principalmente no que se refere aos méto-
dos de ensino e de aprendizagem), a importância dos jogos, das
brincadeiras e da ginástica "para a formação da personalidade,
da civilidade, da disciplina e da liberdade" (MARCASSA, 2004, p.
199) foi reafirmada no combate à fadiga e à degradação física e
moral dos indivíduos. Temos, dessa forma, a continuidade de uma
perspectiva funcionalista e utilitária para a recreação no contexto
escolar e extraescolar.
Apesar do destaque conferido aos três conteúdos (jogos,
brincadeiras e ginástica), no interior do movimento escolanovista
um embate se estabelece visando salientar à qual deles caberia
uma maior eficácia na consolidação da ordem burguesa e capitalis-
ta em curso. Enquanto Fernando de Azevedo defendia a utilização
da Ginástica Sueca como forma ideal para o emprego do tempo
livre e ocupação útil do corpo e da mente, Anísio Teixeira busca-
va destacar o papel dos jogos e brincadeiras no amoldamento do
caráter e da personalidade infantil, afirmando que esses conteú-
dos responderiam melhor aos anseios das crianças (MARCASSA,
2004).
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 29

De acordo com Werneck (2003, p. 25), o fato é que estamos


diante de um contexto em que, por meio das atividades recreati-
vas, "o controle é dissimulado em um suposto clima de ‘esponta-
neidade’ e ‘liberdade’ proporcionado pela vivência do jogo que,
como uma ‘receita’, colabora com o processo de reprodução cul-
tural".
Dessa forma, os jogos (com regras, de recreio ou envolvendo
outras atividades corporais) realizados nos diferentes espaços con-
tribuem para o amoldamento das personalidades e condutas de
toda a comunidade (seja escolar ou não escolar), no sentido de
adaptar os sujeitos às novas relações de trabalho que eram gesta-
das no processo de consolidação da ordem burguesa e capitalista.
Vimos afirmando que a história da recreação não se circun-
screve somente ao âmbito escolar, sendo utilizada em outros tem-
pos e espaços sociais.
A partir da década de 1920, em nosso país, encontramos
os primeiros equipamentos públicos de lazer, os chamados Cen-
tros de Recreio, que utilizam a prática da recreação com o obje-
tivo de proporcionar uma ocupação adequada do tempo de lazer
e diversão. Esses espaços foram criados paralelamente aos proje-
tos de urbanização e modernização dos grandes centros urbanos
brasileiros (MARCASSA, 2004).
A experiência pioneira com a estruturação de programas
de recreação surgiria em Porto Alegre, por iniciativa de Frederico
Gaelzer, em fins da década de 1920, logo se propagando para out-
ras cidades do Rio Grande do Sul (MELO, 2003).
De acordo com Gaelzer, o Serviço de Recreação Pública tinha
como objetivo evitar que os jovens se sujeitassem à delinquência
e à ociosidade, contando para isso com a ocupação adequada das
horas de lazer (MARCASSA, 2004).
Essa experiência na capital gaúcha se torna diferenciada para
a época, pois os locais públicos deveriam possibilitar a prática de

Claretiano - Centro Universitário


30 © Recreação e Lazer

atividades físicas e recreativas direcionadas, o que constitui uma


experiência educativa inovadora no referido período em nosso
país. Para isso, era imprescindível que houvesse equipamentos e
serviços especializados a fim de orientar e educar os frequenta-
dores desses espaços, a exemplo do trabalho que vinha sendo de-
senvolvido com êxito em vários países, especialmente os Estados
Unidos (GOMES, 2008).
Outra iniciativa de destaque no cenário nacional ocorreu em
1935, em São Paulo, com a criação do Serviço Municipal de Jogos
e Recreio, coordenado por Nicanor Miranda. Para ele, de acordo
com Marcassa (2004, p. 200):
[...] os centros de recreio, além de equacionar o problema
higiênico, recreativo e educacional, eram necessários à ordem so-
cial e municipal, uma vez que a recreação era capaz de promover
a saúde física e mental do cidadão exausto nas metrópoles devido
aos múltiplos contratempos provocados pela vida moderna.

Durante a gestão de Miranda, são criados os Parques de Jo-


gos, que abrigavam os programas de Parques Infantis, e os Clubes
de Menores Operários. No que se refere a essa última iniciativa,
a preocupação central das ações desenvolvidas em seu contexto
visavam contribuir para a preparação e a integração da força jo-
vem de trabalho ao mercado cada vez mais competitivo e industri-
alizado (MARCASSA, 2004).
É a partir dessa ação (a instituição dos Clubes de Menores
Operários) que, no ano de 1943, foi criado o Serviço de Recreação
Operária (SRO) do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio
com o mesmo propósito.
O marco legal (Portaria de nº 52, publicada no Diário Oficial
da União em 21 de setembro) que institui o SRO foi assinado pelo
Ministro Alexandre Marcondes Filho, e teve como primeiro ges-
tor e presidente Arnaldo Lopes Sussekind. O SRO era um órgão
incumbido de difundir e coordenar atividades nos setores cultural,
desportivo e de escotismo (RODRIGUES, 2006; WERNECK, 2003).
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 31

Werneck (2003) nos aponta que, nesse contexto (estávamos


vivendo os anos finais da fase ditatorial do governo de Getúlio Var-
gas), o usufruto "adequado" das horas de lazer dos trabalhadores,
bem como de sua família, tornava-se uma condição sem a qual os
repousos assegurados pela legislação, ao se firmarem os contratos
de trabalho, não poderiam atingir seus objetivos. A eliminação da
fadiga gerada pelo trabalho era o principal fundamento da pro-
posta desenvolvida.
Nas experiências destacadas anteriormente, a utilização de
atividades físicas (jogos, esportes, ginásticas, caminhadas, tor-
neios, dança etc.) eram estimuladas e destacadas em relação a
outras manifestações, como as de cunho artístico, por exemplo
(MELO, 2003).
Muito embora a não ocupação ou a utilização inadequada
das horas de lazer continuasse se configurando como um prob-
lema social que poderia colocar em risco a lógica capitalista, pas-
samos a observar uma mudança no significado e na utilização da
recreação no contexto histórico em questão.
Diferentemente dos ideários médico-higienistas (como mero
recurso disciplinador e gerador de corpos e mentes saudáveis) e
escolanovistas (como uma atividade útil para organização e em-
prego apropriado do tempo livre do trabalho), o sentido atribuído
à recreação incide sobre os anseios da sociedade do capital, ou
seja, do controle de todas as dimensões da vida humana, seja den-
tro ou fora do trabalho. Sendo assim, conforme Marcassa (2004, p.
200), a recreação responde
[...] como um conjunto de atividades operacionais, como conteúdo
a ser desenvolvido no tempo/espaço de lazer, à necessidade de re-
posição, manutenção e preparação da força de trabalho, ou mel-
hor, como fenômeno submetido à lógica da política e da economia
do trabalho.

Como se vê, a recreação passa a ser um instrumento orga-


nizador dos lazeres dos indivíduos. Muito além de um conjunto
de atividades que visam proporcionar prazer àqueles que desfru-

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32 © Recreação e Lazer

tam de seus conteúdos, em um suposto clima de espontaneidade


e liberdade, ou de uma "bem-intencionada" formação moral e
física, a recreação atende a interesses hegemônicos, forja subje-
tividades, reproduz valores e princípios necessários à manutenção
e à reprodução da organização societária capitalista.
Após percorrer as trilhas da história da recreação em nosso
país, passaremos, agora, a realizar uma incursão sobre a história
do lazer.

Ocorrência histórica do lazer


Após realizarmos um estudo introdutório sobre a ocorrência
histórica da recreação, é importante discutir, também, as distintas
abordagens que tratam da emergência histórica do lazer em nossa
sociedade. É uma tarefa difícil de ser realizada, pois, como salien-
ta Marcellino (1996), situar o lazer historicamente é um trabalho
controverso no meio acadêmico. Entretanto, trata-se de um em-
preendimento a que devemos nos dedicar com grande satisfação,
especialmente em se tratando de uma disciplina que se propõe a
discutir aspectos relacionados à recreação e ao lazer. Vamos lá!
Basicamente, podemos distinguir dois posicionamentos
distintos quanto à emergência histórica do lazer. De um lado, en-
contramos autores que defendem a tese de que o lazer sempre
existiu, afirmando que se o homem sempre trabalhou, também
deveria dispor de momentos de "não trabalho", períodos que se-
riam preenchidos com atividades de repouso e divertimento.
Como esses momentos não eram vistos como frações isola-
das na dinâmica social, acredita-se que trabalho e lazer se entrela-
çavam. O "tempo natural" (estações do ano, períodos chuvosos ou
não, luminosidade natural) balizava as ações cotidianas dos indi-
víduos, e as manifestações culturais vivenciadas nesse período es-
tavam intimamente ligadas ao trabalho produtivo. Por essa razão,
os adeptos dessa corrente acreditam que o surgimento do lazer
antecede a era moderna, apresentando-se de maneiras distintas
ao longo dos tempos.
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 33

Essa visão é alvo de controvérsias. Muitos autores questio-


nam os apontamentos sobre o lazer antes do estabelecimento das
modernas sociedades urbano-industriais, pois, nesse contexto,
afirmam eles, o lazer ainda não se constituía em um fenômeno
com características próprias, conforme podemos observar nos
dias atuais.
Representantes dessa tendência consideram que o lazer
surge em conformidade com o sistema capitalista nos centros ur-
banos-industrializados, período no qual passamos a observar uma
clara cisão entre "tempo de trabalho" e de "não trabalho", fruto
das transformações decorrentes da Revolução Industrial.
Nesse momento histórico, a organização temporal das ativ-
idades cotidianas não está mais submetida ao "tempo natural",
expressando-se na forma de "tempo mecânico".
Essa polêmica sobre a ocorrência histórica do lazer em nossa
sociedade representa uma ótima oportunidade para problema-
tizarmos a questão, para que você possa refletir sobre o tema a
partir dos argumentos e objeções elaborados pelos adeptos das
duas correntes de pensamento que debatem o assunto.
Seguidores da tese de que o lazer sempre existiu, que sem-
pre fez parte do cotidiano das pessoas, tais como De Grazia (1966),
Medeiros (1975) e Munné (1980), situam a origem desse fenô-
meno nas fases mais remotas da história humana. Para alguns, o
ponto de partida da gênese do lazer pode ser localizado nas socie-
dades arcaicas, para outros, remonta à Antiguidade grega.
De acordo com Ethel Bauzer Medeiros (1975, p. 1), o lazer
"corresponde a uma das necessidades básicas do ser humano",
não sendo, portanto, preocupação característica das sociedades
industriais. A autora parte da literatura para indicar o que alguns
poetas já diziam, ao longo dos tempos, sobre o lazer, bem como
sobre uma das formas mais tradicionais de ocupá-lo: a recreação.

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34 © Recreação e Lazer

Esse tipo de manifestação (o lazer) poderia ser expresso por


meio de uma série de atividades recreativas, como: jogos, danças
campestres, banquetes, músicas, pescarias, contos de poesia, fol-
guedos populares, bailes e festas, feiras e romarias.
Para De Grazia (1966), outro adepto dessa primeira corrente,
os povos primitivos e as civilizações do Oriente, do Egito ou da Pér-
sia, que antecederam a Antiguidade grega, não tinham lazer.
Em sua visão, falar das origens do lazer significa reportarmo-
nos às ideias constituídas na antiga Grécia, notadamente marcada
pela vida social dos filósofos, cujo esplendor ocorreu por volta do
século 5º antes de Cristo. Gomes (2008) afirma que o pensamento
grego é utilizado como ponto de partida devido a sua potenciali-
dade em fornecer elementos que auxiliem na elucidação dos va-
lores associados ao lazer.
Outro autor que pode ser citado é Frederic Munné (1980),
também partidário da tendência de que o lazer antecede à Mod-
ernidade e se situa na Antiguidade. De acordo com esse estudioso,
o "cio" é um modo típico de nos comportarmos no tempo, o qual
se estrutura em quatro áreas de atividade:
1) tempo psicobiológico: destinado a necessidades fisioló-
gicas e psíquicas;
2) tempo socioeconômico: fundamentalmente relativo ao
trabalho;
3) tempo sociocultural: em que nos dedicamos à vida em
sociedade;
4) tempo de "ócio": ou seja, de lazer, destinado a ativida-
des de desfrute pessoal e coletivo (MUNNÉ; CODINA,
2002).
A partir desse pensamento, poderíamos concluir que o lazer
sempre fez parte da vida dos indivíduos.
A tese de que a ocorrência histórica do lazer antecede às
sociedades pré-industriais é contestada por alguns autores como:
Dumazedier (1979), Marcellino (1983), Melo e Alves Junior (2003)
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 35

e Mascarenhas (2005). As críticas endereçadas ao pensamento


que advoga pela existência do lazer desde os tempos arcaicos são
marcadas fortemente pelo pensamento de Dumazedier.
O autor salienta que, nas sociedades do período arcaico, tra-
balho e jogo, embora diferentes, possuíam significações de mesma
natureza na vida da comunidade. Como trabalho e jogo se mes-
clavam, apresentando oposição mínima (ou inexistente), o autor
considera o lazer um conceito inadequado para o período arcaico.
Dumazedier (1979) não acredita que a ociosidade dos filóso-
fos da antiga Grécia ou da aristocracia medieval possa ser chama-
da de lazer. Para ele, esses privilegiados, cultos ou não, sustenta-
vam sua ociosidade com o suor do trabalho alheio. Tal ociosidade
não se define em relação ao trabalho, não o complementa nem o
compensa, apenas o substitui. Para o autor, o lazer pressupõe o
trabalho.
O autor reconhece que o tempo fora do trabalho é tão antigo
quanto o próprio trabalho, mas defende de forma enfática a ideia
de que o lazer possui traços específicos, característicos da civiliza-
ção nascida da Revolução Industrial.
Recentemente, Melo e Alves Junior (2003, p. 2) apresenta-
ram suas contribuições para a defesa desse modo de compreender
a ocorrência histórica do lazer, afirmando que:
A contínua busca de formas de diversão não significa ter sempre
existido o que hoje chamamos por lazer, na medida em que tais
formas de diversão guardam especificidades condizentes com cada
época, que devem ser analisadas com cuidado. Por certo, existem
similaridades com o que foi vivido em momentos anteriores – e
mesmo por isso devemos conhecê-los –, mas o que hoje enten-
demos como lazer guarda peculiaridades que somente podem ser
compreendidas em sua existência concreta atual. O fato de haver
equivalências não significa que os fenômenos sejam os mesmos.

E, continuando com as reflexões acerca da emergência his-


tórica sobre o lazer, Melo e Alves Junior (2003, p. 2) apontam que
[...] somente a partir de determinado momento da história que se
começa a utilizar a palavra lazer para definir um fenômeno social;

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36 © Recreação e Lazer

antes, outras palavras denominavam outros fenômenos, similares


mas não iguais.

Esse momento pode ser apontado como a Revolução Indus-


trial, conforme vimos anteriormente.
Continuando nessa linha, também podemos situar as contri-
buições de Mascarenhas (2005, p. 230), quando este afirma:
A ruptura com o ritmo "natural" de trabalho, uma imposição pecu-
liar ao capitalismo industrial, como não poderia ser diferente, im-
plicou numa verdadeira revolução do tempo social, opondo tempo
livre e tempo de trabalho. A possibilidade de alternância contínua
dos momentos de trabalho e não-trabalho começa aí a ser suplan-
tada. Nesta direção, a produtividade expressa pela nova disciplina
do relógio torna-se a grande inimiga do ócio, invadindo a esfera
do tempo livre e buscando conciliá-lo ao trabalho. É então neste
movimento de administração do tempo livre, de peleja contra os
valores, hábitos e comportamentos inerentes ao ócio, que pode-
mos localizar o aparecimento do lazer, fenômeno condizente com a
ideologia da sociedade industrial.

Sintetizando o que discutimos até então, as questões po-


dem ser colocadas nos seguintes termos: de um lado, temos os
estudiosos que conferem a existência do lazer, já desde os primór-
dios da humanidade, não havendo a necessidade de reconhecer
a Revolução Industrial e as suas transformações como ponto de
partida para o surgimento do lazer; do outro, um grupo de autores
que se baseia nesse período histórico para defender que, a partir
das tensões e transformações sociais promovidas por esse evento
histórico, teríamos a gênese do lazer.
Os argumentos elaborados por Dumazedier, um dos defen-
sores da segunda perspectiva, conforme pudemos observar, tam-
bém são alvo de questionamentos.
Uma leitura cuidadosa da obra Lazer: necessidade ou novi-
dade?, de Ethel Medeiros (1975), indica que a autora se empenha
em mostrar que o lazer sempre existiu, refutando, dessa maneira,
a tese oposta.
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 37

Medeiros (1975, p. 1) traz em seu texto as seguintes indaga-


ções:
Será o lazer, como querem alguns, preocupação característica da
sociedade industrial, que a ele recorre para contrabalançar a me-
canização, a rotina e a impessoalidade da linha de fabricação em
série? Ou corresponde a uma das necessidades básicas do ser hu-
mano, apenas mais aguçada nos nossos dias pelo ritmo veloz, ten-
sões e insegurança do mundo moderno?

Considerando as provocações apontadas anteriormente por


Medeiros (1975), ao longo do texto, a autora transcreve trechos
de poemas para mostrar o porquê de ser adepta da posição que
advoga ser o lazer um fenômeno presente nas sociedades arcaicas.
Munné (1980), ponderando sobre os argumentos de Du-
mazedier, considera equivocada a conclusão do sociólogo francês
de que o lazer seja um produto da civilização moderna. De acordo
com seu ponto de vista, Dumazedier reduz, por definição, qual-
quer possível manifestação histórica do lazer à mera desocupação
ou ociosidade, o que não seria procedente.
Os argumentos elaborados por Dumazedier, especialmente
no que diz respeito à consideração do lazer como típico da civiliza-
ção industrial, revelam seu esforço por conferir à chamada "socio-
logia do lazer" o estatuto de ciência (GOMES, 2004b).

Um dos expoentes da sociologia do lazer foi o inglês Stanley Parker.


Para um maior detalhamento de seu pensamento, recomendamos
a leitura da obra Sociologia do Lazer (PARKER, 1978).

Esse aspecto, geralmente negligenciado pelos autores da


área, mostra que o autor precisava defender esse pressuposto
para que o lazer fosse reconhecido como uma parte especializada
da teoria sociológica. Atitude curiosa não é? Vejamos o porquê
disso.
Para Dumazedier (1979), toda teoria sociológica precisa
apresentar três propriedades: ser deduzida de uma teoria mais ge-

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38 © Recreação e Lazer

ral; possuir uma coerência lógico-dedutiva e demonstrar que ne-


nhum fato importante está em contradição com ela.
Para a sociologia do lazer ser reconhecida como um ramo
especializado da sociologia, os pesquisadores do lazer deveriam,
entre outros procedimentos:
1) fazer um recorte do objeto estudado;
2) elaborar hipóteses e verificá-las;
3) utilizar estratégias metodológicas tidas como confiáveis;
4) formular quadros de referência;
5) apontar categorias de análise.
Os encaminhamentos anteriores seriam imprescindíveis
para se distinguir a sociologia do lazer dos outros ramos já esta-
belecidos na área: sociologia do trabalho, sociologia da família,
sociologia da religião, dentre outros. Caso não houvesse essa dife-
renciação, os estudos sobre o lazer acabariam penetrando em out-
ros campos, pois as manifestações culturais vivenciadas antes da
Revolução Industrial se mesclavam com as outras dimensões da
cultura.
Seguindo esse raciocínio, se as pessoas associassem o lazer
com as ações religiosas, por exemplo, as pesquisas sobre o tema
poderiam se encaixar perfeitamente na sociologia da religião, não
sendo necessária uma sociologia do lazer.
Tomando a mesma linha de pensamento, para exemplificar,
verifica-se que a integração entre lazer e religião é muito comum
em nosso meio, uma vez que é muito difícil separar o lazer de de-
terminados ritos e festejos religiosos.
Reconhecer a coerência e o mérito do arcabouço teórico for-
mulado por Dumazedier não significa que tenhamos de acatar todas
as suas ideias. As evidências revelam que o lazer não é um fenôme-
no observável apenas nas civilizações industriais avançadas.
O fato de essa ideia ser comumente aceita mostra que faltam
aprofundamentos e análises consistentes sobre a produção teóri-
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 39

ca de Dumazedier, um dos primeiros a defender essa proposição.


Evidentemente, a era Moderna foi fundamental para que o lazer se
estabelecesse como um fenômeno autônomo, normativo e orga-
nizado, configurando-se na forma como o conhecemos hoje. Esse
período também foi palco para o estabelecimento de importantes
reivindicações operárias, o que ressalta o valor desse movimento
histórico e social para o lazer (GOMES, 2004b).
Ao mesmo tempo que há diferenças marcantes entre o pas-
sado e o presente, também há correlações importantes a serem
avaliadas. Conhecer e considerar as peculiaridades de outras reali-
dades que compõem a nossa história pode fornecer contribuições
significativas para apreendermos o processo de constituição do
lazer.
A vivência das manifestações e das tradições culturais da hu-
manidade também pode nos auxiliar a compreender os significa-
dos comumente atribuídos ao lazer. Mesmo que algumas ideias
devam ser repensadas e revistas, esse é um lado da questão que
ressalta a importância das pesquisas dos autores que afirmam não
ser o lazer um fenômeno recente (GOMES, 2004b). Tal suposição
convida-nos a recuar na nossa história com o intuito de investigar
e compreender alguns dos princípios que influenciaram a consti-
tuição do lazer.
Neste instante, é importante possuirmos em nossos horizon-
tes o alerta realizado por Gomes (2004b, p. 138), ao nos colocar
que "é demasiado arriscado definir, com exatidão, o momento
histórico em que o lazer se configura na sociedade ocidental" e
sugerir que "conhecer e considerar as peculiaridades [...] de outras
realidades que compõe a nossa história pode fornecer expressivas
contribuições para apreendermos o processo de constituição do
lazer".
Nesse movimento, torna-se relevante considerar as contri-
buições daqueles que se debruçaram sobre os tempos antigos,
sobre a época medieval e também sobre a Modernidade, identi-

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40 © Recreação e Lazer

ficando elementos que nos auxiliem a compreender o processo


de constituição histórica do lazer em nossa sociedade, procurando
entendê-lo em relação ao trabalho.
Dessa forma, no próximo tópico, realizaremos um recuo ao
passado, em uma tentativa de conhecer algumas características
que possam nos auxiliar na compreensão do processo de consti-
tuição histórica do lazer em nosso meio.
Diversos caminhos poderiam ter sido seguidos, porém, pela
riqueza de elementos, três contextos devem ser privilegiados: a
sociedade greco-romana da Antiguidade; a feudal, da Idade Mé-
dia; e a urbano-industrial, da Modernidade.

Sociedade greco-romana
Foi aproximadamente no século 5º a. C. que ocorreu o "flo-
rescimento cultural do mundo grego", como o denominam os his-
toriadores. Essa época é conhecida como a fase clássica da Grécia,
representada pelo apogeu de Atenas: capital das artes, da ciência,
da filosofia e da política, fervilhante de novas ideias.
Os atenienses demonstravam paixão pela perfeição. Suas
construções eram imponentes, a arquitetura e o artesanato prima-
vam pela riqueza de detalhes; os jogos olímpicos eram motivados
pela busca da excelência.
Os jogos aconteciam no monte Olimpo e eram, antes de
tudo, um evento de cunho religioso, no qual deveriam ser ofereci-
dos sacrifícios e orações a Zeus.
Além de Zeus, muitos outros deuses eram cultuados pelos
gregos. Acredita-se que o teatro, a tragédia, a comédia e a decla-
mação da poesia tiveram origem nos rituais realizados pelas se-
guidoras de Dionísio, o deus do vinho. A Grécia clássica abrigava
uma centena de anfiteatros, e neles se encenavam muitas peças
sobre vários temas.
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 41

Em geral, quando as heranças gregas são consideradas nas


discussões sobre o lazer, os autores que debatem o assunto não
se debruçam sobre os significados das práticas culturais, como as
citadas anteriormente. Na maioria das vezes, são estabelecidas re-
flexões sobre o ócio, o que nos remete ao termo grego skholé, que
também é de grande valor para a compreensão do processo de
constituição histórica do lazer (GOMES, 2008).
Apesar de seu caráter contemplativo e reflexivo, skholé não
significava passividade, mas um exercício em forma elevada, atribuí-
do à alma racional. Implicava, necessariamente, as condições de
paz, reflexão, prosperidade e liberdade em face das necessidades
da vida de trabalho. Como dependia de certas condições educa-
cionais, políticas e socioeconômicas, representava um privilégio
reservado a uma pequena parcela da sociedade (GOMES, 2008).
A palavra skholé era um termo que, no uso comum, signifi-
cava um tempo desocupado, um tempo para si mesmo que gerava
prazer intrínseco. Entre os filósofos gregos, quem mais empregou
essa palavra foi Aristóteles; para ele, o lazer era um estado filosó-
fico no qual se cultivava a mente por meio da música e da contem-
plação (DE GRAZIA, 1966).
Esse estado seria alcançado apenas por aqueles que con-
seguiam libertar-se da necessidade de trabalhar, pois o trabalho
produtivo era visto como indigno. O ideal clássico de lazer indi-
cava, portanto, distinção social, liberdade, qualidade ética, relação
com as artes liberais e busca do conhecimento.
Skholé era associado à vida contemplativa, exercício nobre
ao qual somente poucos poderiam se entregar. Para Aristóteles
(s.d), nem todos poderiam se entregar ao ócio, pois a maioria se
ocupava com a produção do que era necessário e útil e com o ex-
ercício da guerra – como os artesãos, os lavradores e os guerreiros.
Mas, para esse filósofo, valia muito mais gozar da paz e do repouso
proporcionados pelo ócio, que era o inverso da vida ativa.

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42 © Recreação e Lazer

Para você, o que a expressão "vida ativa" representava


naquela época?
A expressão vita activa designava três atividades humanas
fundamentais. A primeira delas é o labor, atividade que correspon-
dia ao processo biológico do corpo humano, relacionada às neces-
sidades vitais, assegurando a sobrevivência do indivíduo e a per-
petuação da espécie. Poiesis designava a obra do homo faber, ser
humano que maneja instrumentos, capaz de produzir e fabricar
um mundo artificial de objetos, nitidamente distinto de qualquer
ambiente natural. A praxis, por sua vez, era a única atividade que
era exercida diretamente entre os homens sem a mediação dos
objetos ou da matéria. O recurso que predominava era o discurso,
a palavra. Tratava-se da ação no campo ético e político, como sub-
linha Arendt (1993) (GOMES, 2008).
Aristóteles foi aluno de Platão. De acordo com a filosofia
platônica, tal como expresso em suas Leis, um verdadeiro cidadão
não deveria trabalhar, e sim dedicar-se integralmente à vida con-
templativa. De fato, acreditava-se que um cidadão virtuoso não
"trabalhava". Quando este destinava um tempo às suas tarefas
políticas (caso desempenhasse algum cargo público), ou a seus af-
azeres econômicos (como administrar seus domínios, cultivados
pelos escravos), não estava "trabalhando", apenas zelando pela
vida habitual do espaço público e do privado, como pontua Veyne
(2002).
Tamanho era o desprezo pelo trabalho que, de acordo com
Platão, uma cidade bem feita seria aquela na qual os cidadãos fos-
sem alimentados pelo trabalho rural de seus escravos, e os ofícios
fossem relegados às pessoas "comuns". Uma vida virtuosa deveria
ser ociosa. Para Aristóteles, os escravos, os camponeses e os com-
erciantes não poderiam ter uma vida virtuosa, próspera e cheia de
nobreza: podem-no somente aqueles que dispõem dos meios para
organizar a própria existência, fixando para si mesmos um objetivo
ideal (VEYNE, 2002).
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 43

Dessa maneira, apenas os ociosos correspondiam, moral-


mente, ao ideal humano, merecendo ser reconhecidos como ci-
dadãos. Acreditava-se que os trabalhadores não saberiam gov-
ernar a cidade, não podiam, não deviam, não mereciam e nem
pensavam em fazê-lo: era impossível praticar a virtude levando-se
uma vida servil ou de trabalho braçal. A pobreza era naturalizada
por Platão, não sendo compreendida como uma decorrência de
relações sociais marcadas pela desigualdade.
Essas foram algumas das ideias que marcaram a sociedade
clássica grega. No entanto, com as conquistas de Alexandre da
Macedônia, imortalizado como "o Grande", passou-se da idade
grega para a helenística. Alexandre estendeu o império da Grécia
às fronteiras da Índia, mas acabou sucumbindo diante da dificul-
dade de controlar o vasto território conquistado a partir de um
ponto situado na periferia.
Roma foi bastante influenciada pela cultura helênica. A civi-
lização, a literatura, a arte e a própria religião provieram quase
inteiramente dos gregos. Para Veyne (2002), o Império Romano
foi a civilização helenística nas mãos brutais de um aparelho de Es-
tado − constituído por imperador e Senado ─ de origem latina. Por
essa razão, diz-se que Roma foi um império fundado na violência
e protegido por ela.
Roma estabeleceu-se como núcleo militar e legislativo, local-
izado no centro do cruzamento de fios que constituíam a enorme
teia do Império. A supremacia de Roma assentava-se em sua força
militar, e os povos conquistados eram defendidos pelos soldados
romanos.
Administrar a grande área conquistada pelos romanos não
foi uma tarefa simples. Roma determinou uma moeda única e pavi-
mentou estradas, possibilitando ao seu exército agir rapidamente
diante de ataques inimigos. Apenas um cônsul poderia comandar
um exército, sendo grande a corrupção e a incompetência. Embora
o latim fosse a língua oficial, cerca de uma dúzia de línguas circu-

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44 © Recreação e Lazer

lava nas ruas e nas praças romanas. As construções públicas eram


sempre grandiosas, para que o cidadão comum pudesse participar
da vida romana.
Como esclarece Veyne (2002, p. 41), em Roma, "todo homem
público fazia carreira pelo pão e pelo circo". O pão era a base da
alimentação de Roma, geralmente produzido em casa, pelas mul-
heres.
O império cresceu à custa do pão: os romanos construíram
com maestria aquedutos e cisternas, com os quais aproveitavam a
água das chuvas, transformando tudo em produtividade e riqueza.
Entretanto, a queda de Roma deveu-se igualmente ao pão, ou mel-
hor, à falta de pão para o povo.
Da mesma maneira que em terra grega, os concursos atléti-
cos e os jogos foram grandes acontecimentos em Roma, e em to-
das as cidades do império foram os grandes espetáculos públicos:
tratava-se do circo, representado por algumas das práticas cult-
urais que marcaram esta civilização (GOMES, 2008).
Banhos públicos, banquetes e festas; representações teatrais,
corridas de carros no circo e combates de gladiadores na arena do
Coliseu eram muito apreciados. Os notáveis eram os responsáveis
pelo financiamento dos espetáculos públicos que anualmente ale-
gravam a cidade. Quem fosse nomeado pretor ou cônsul deveria,
de espontânea vontade, desembolsar grandes quantias para pro-
porcionar esses divertimentos ao povo romano (GOMES, 2008).
Os espetáculos típicos de Roma espalhavam-se pelos anfite-
atros do império, e o povo era fascinado pela morte e pela violên-
cia. Na luta de gladiadores, o interesse central da arena repousava
na morte de um dos combatentes. Para o vencedor, a glória, para
o derrotado, a morte – ou a piedade, caso sua vida fosse poupada.
Veyne (2002) ressalta que a decisão de vida ou morte era tomada
pelo mecenas que proporcionava o espetáculo e pelo público.
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 45

As lutas de gladiadores eram paixões que despertavam o


interesse de todos, inclusive de senadores e pensadores, como
Sêneca, que dizia ir ao anfiteatro para se alegrar. Roma vivia do ím-
peto conquistador, e os gladiadores tinham o mérito de fortalecer
a coragem dos espectadores (GOMES, 2008).
Os banquetes, as festas e as orgias romanas eram famosos,
mas essas vivências também encontraram censores, que as con-
sideravam futilidades desprezíveis. Cícero, por exemplo, aproveit-
ava os dias de espetáculos para escrever seus livros (VEYNE, 2002).
Como destaca Munné, para Cícero, o otium era estratificado
socialmente: estava associado, no caso das elites intelectuais, à
meditação. Era o otium com dignidade. Essa qualidade não era
uma virtude de respeitabilidade, mas um ideal aristocrático de
glória, pois era possível adquirir dignidade, aumentá-la e perdê-la.
Entretanto, no que concerne às pessoas comuns, otium significava
descanso e divertimento proporcionados pelos grandes espetácu-
los. Essa estratégia tinha como finalidade "despolitizar" o povo,
reduzido à condição de mero espectador (GOMES, 2008).
Com isso, no contexto romano, o sentido que prevalece é o
de diversão, e não o de desocupação, como entre os gregos. Para
as incursões sobre lazer e trabalho, a síntese que os romanos fiz-
eram entre o otium e o negotium é de grande valor.
De acordo com Veyne (2002), no que se refere a esse segun-
do ponto, o pensamento romano era contraditório. Um notável
que negociava não era classificado como negociante, era um no-
tável. Ele não era definido pelo que fazia, não importando o que
fosse. Para ser apenas ele mesmo, um romano deveria possuir pat-
rimônio.
Profissionais liberais, escritores, filósofos, retóricos, gramá-
ticos e músicos não "trabalhavam". No máximo, dizia-se que exer-
ciam uma profissão verdadeiramente digna de um homem livre,
ou que eram "amigos" do senhor que os solicitava, justificando,
dessa maneira, um pagamento pela dedicação. Um pobre, em con-

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46 © Recreação e Lazer

trapartida, era sempre classificado conforme seu ofício, como sa-


pateiro ou operário diarista.
Ao lado do ideal de "ócio e política", que caracterizava a so-
ciedade antiga, uma ideia mais positiva do trabalho transparece
em documentos de origem popular. Muitos se orgulhavam de seus
ofícios, e alguns deles chegavam a pertencer ao Senado municipal
de sua cidade; várias pessoas fizeram fortuna com seu trabalho.
Ricos comerciantes, artesãos ou grandes agricultores menciona-
vam sua profissão no seu epitáfio, informando que "trabalharam
laboriosamente" (VEYNE, 2002).
O destino de quase toda a população romana era uma luta
ardorosa pela sobrevivência. Ou seja, eles trabalhavam muito.
Com a disseminação do cristianismo, muitos aderiram ao princípio
de que quem não trabalhava não teria o que comer. Era, simulta-
neamente, uma lição dada a si mesmo e uma advertência ao pre-
guiçoso que pretendia partilhar do pão obtido pelo suor alheio.
À primeira vista, a convivência entre cristianismo e pagan-
ismo não foi pacífica no império. "O paganismo era uma religião de
festas: o culto não passava de uma festa, com a qual os deuses se
divertiam, pois nela encontravam o mesmo prazer que os homens"
(VEYNE, 2002, p. 189). O calendário religioso diferia de uma cidade
para outra, mas periodicamente restaurava festas religiosas, vistas
como feriados. A religião determinava a distribuição irregular dos
dias de descanso ao longo do ano.
O império entrou em decadência ao final do século 3º, como
consequência de vários fatores: constantes corrupções das classes
altas, revoltas populares, invasão das fronteiras imperiais e fre-
quentes derrotas nas batalhas. Os bárbaros foram recebidos com
entusiasmo pelo próprio povo romano, há muito assolado pela
fome e pela miséria. Nem mesmo a adoção do cristianismo como
religião oficial de Roma foi capaz de refrear o inevitável declínio
do império, cuja degradação foi evidenciada nos primórdios do
período medieval (GOMES, 2008).
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 47

Sociedade medieval
A fase conhecida como Idade Média abrange um período
muito extenso, com características profundamente distintas ao
longo dos séculos. Essa etapa revelou-se heterogênea em termos
de tempos, lugares, formas de agir e categorias sociais.
Como será evidenciado neste tópico, muitas dessas variáveis
influenciaram a constituição do lazer e do trabalho em nosso meio,
especialmente considerando a vida social das pessoas comuns.
No século 5º, começa a se formar um sistema social, político
e econômico conhecido como feudalismo, cuja origem está rela-
cionada ao declínio do Império Romano do Ocidente, conforme
tratamos no tópico anterior.
Com a queda de Roma, muitos senhores abandonaram as
cidades e foram morar no campo, em suas propriedades. Em bus-
ca de trabalho e proteção, os cidadãos de poucas posses acom-
panharam os grandes senhores, ocasionando o esvaziamento das
cidades e a completa fixação da população no campo. Surgem,
então, os feudos medievais.
Com as invasões na Península Ibérica e na Europa Oriental, a
navegação e o comércio no mar Mediterrâneo foram bloqueados.
Isolada dos outros continentes, restou à Europa efetuar a simples
troca de mercadorias, sendo a agricultura praticamente a única
atividade econômica desenvolvida. Essas condições foram decisi-
vas para o estabelecimento dos feudos.
O feudo era o domínio de um senhor feudal, a unidade de
produção do feudalismo. Compreendia uma ou mais aldeias, as
terras cultivadas pelos camponeses, a terra da Igreja, a casa do
senhor (situada na parte mais fértil da propriedade), as pastagens,
os prados e os bosques comuns.
No feudalismo, as relações sociais podiam ser resumidas nas
relações entre servos e senhores. Enquanto os senhores tinham a
posse legal das terras e exerciam o poder político, militar, jurídico e

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48 © Recreação e Lazer

religioso (quando também assumiam as funções eclesiásticas), os


servos estavam presos a obrigações devidas ao senhor e à Igreja.
Essas obrigações podiam ser pagas com bens, serviços, presentes
ou dinheiro.
Os servos camponeses suportavam muitas injustiças e so-
frimento, e essa exploração era justificada pela própria Igreja,
a grande "senhora feudal". Alguns mosteiros medievais eram
enormes feudos, com numerosos servos que executavam os tra-
balhos mais pesados, enquanto os religiosos se entregavam às
orações, aos cantos sacros, às meditações e aos exercícios intelec-
tuais.
Diferentemente dos tempos mais remotos de Roma, quando
a religião cristã era uma opção entre várias outras, a Igreja unificou
a Europa e congregou um número cada vez maior de adeptos. Sua
organização ficava sob responsabilidade primordial do papa e dos
bispos, estruturando-se como um verdadeiro Estado − por vezes,
mais poderoso que os próprios reinos medievais.
A Igreja pregava o desapego aos bens materiais e a moral-
ização do trabalho, cujo sentido pode ser encontrado no Antigo
Testamento, no qual o trabalho é associado ao sacrifício, por rep-
resentar um castigo de Deus em decorrência do pecado original.
Sendo um pecador, o ser humano deveria aceitar esse des-
tino e dedicar-se inteiramente ao árduo trabalho. E quando não
estivesse trabalhando, deveria buscar a paz e a purificação do es-
pírito, evitando todo tipo de tentação causada pelos prazeres da
carne. Todos sabiam que Deus julgava e que as sentenças seriam
pronunciadas no último dia. Somente se afastando das armadilhas
do pecado seria possível alcançar um lugar entre os "eleitos de
Deus".
Alguns membros do clero estudavam a filosofia clássica
grega e romana com o intuito de adaptar esse importante legado
aos princípios cristãos. Essa orientação pode ser identificada no
pensamento de Santo Agostinho (que no século 6º retomou os es-
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 49

tudos de Platão) e de São Tomás de Aquino (que deu novo vigor


à obra de Aristóteles no século 19, enfatizando a noção de ócio
como contemplação).
Desde o despertar da Idade Média, os líderes religiosos fa-
ziam valer a premissa de que "conhecimento é poder", e a exer-
ciam perante os outros membros da sociedade, pois quase toda
a população pobre era analfabeta. Essa era uma das razões pelas
quais os camponeses deveriam exercer o trabalho árduo, uma vez
impossibilitados de desempenhar outras atribuições mais ilustres
(GOMES, 2008).
Fome, miséria e trabalhos forçados eram elementos con-
stantes no cotidiano servil. Tudo isso era aceito com resignação,
pois a glorificação da pobreza significava uma condição necessária
à salvação da alma, reforçando a noção do trabalho como sacrifí-
cio, moralmente necessário para o alcance desse propósito.
A época medieval foi marcada por muitos feriados religio-
sos, dias de descanso nos quais se deveria reforçar a devoção a
Deus. No entanto, nesses feriados eram realizados jogos, cantos,
festas e comemorações, colocando em evidência o contraste entre
o sagrado (sério e oficial) e o profano (cômico e risonho) (GOMES,
2008).
Desde o cristianismo primitivo, o riso foi condenado e af-
astado da cultura oficial, pois o bom cristão deveria ser constante-
mente sério e temente a Deus, conservando o arrependimento e
a dor em expiação de seus pecados. Enquanto contenção e sofri-
mento eram associados com a redenção, o riso denunciava sucum-
bência às tentações de inspiração demoníaca. Mas nem por isso as
formas cômicas deixaram de subsistir ao lado das canônicas. Por
ser jocoso e alegre, o riso continha um aspecto regenerador, fun-
damentado no folguedo, na alegria e no cômico (GOMES, 2008).
Na Idade Média, o riso era dirigido especialmente contra os
estratos superiores. Construía seu próprio mundo contra a Igreja e
o Estado oficial, elegia reis e bispos, celebrava sua própria liturgia,

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50 © Recreação e Lazer

professava sua fé, cumpria rituais fúnebres, redigia epitáfios. O riso


não era uma sensação subjetiva, biológica e individual, mas social
e universal (BAKHTIN, 1999). Misturado à multidão do carnaval na
praça pública, por exemplo, o homem sentia-se membro de uma
comunidade em perpétuo estado de crescimento e renovação, na
qual seu corpo estava em contato com os das pessoas de todas as
idades e condições.
O riso gozava de poderoso encanto que, por vezes, alcançava
todos os graus da jovem hierarquia feudal, inclusive a eclesiástica.
Bakhtin (1999) considera que esse alcance pode ser explicado por
vários fatores, tais como:
a) as tradições romanas, como as saturnais e outras formas
de riso popular legalizadas em Roma, ainda estavam
muito vivas no início da época medieval;
b) a cultura popular era muito forte nesse período, de ma-
neira que o sistema feudal em constituição a considera-
va, aproveitando seus elementos com interesses sociais
e políticos específicos;
c) a Igreja procurava coincidir as festas pagãs e cristãs locais
a fim de cristianizar os cultos cômicos (GOMES, 2008).
As formas e as manifestações do riso medieval eram com-
postas por ritos e cultos cômicos; presença de bobos e bufões;
atuação de gigantes, anões, monstros e palhaços; literatura paró-
dica, obras cômicas e teatro popular (especialmente de marione-
tes), representado por artistas de feira nas praças públicas, bem
como nas festas carnavalescas. Todas essas manifestações do riso,
chamadas "grotescas", contrapunham-se à cultura oficial, ao tom
sério, religioso e feudal da época. Nas cerimônias de entrega do di-
reito de vassalagem ou iniciação de novos cavaleiros, por exemplo,
era comum a presença de bufões e bobos, que parodiavam os atos
formais das autoridades e do público presente (GOMES, 2008).
O carnaval era uma prática comum, vivida por todos, e, nas
grandes cidades, chegava a durar três meses por ano, no total.
Como sublinha Bakhtin (1999), o carnaval era a expressão mais
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 51

autêntica da cultura cômica popular da época. Os espectadores


não assistiam ao carnaval, eles o viviam intensamente. Essa festa
representava uma fuga provisória dos moldes da vida ordinária, e,
enquanto durasse, não se conhecia outra vida.
Para Bakhtin (1999, p.7),"O carnaval é a segunda vida do
povo, baseada no princípio do riso. É a sua vida festiva. A festa é a
propriedade fundamental de todas as formas de ritos e espetácu-
los cômicos da Idade Média".
Inspirado nas saturnais romanas da Antiguidade, o carnaval
acontecia nos espaços coletivos e populares e propiciava uma lib-
eração temporária da verdade dominante e do regime vigente, ab-
olindo provisoriamente todas as relações hierárquicas, privilégios,
regras e tabus.
Enquanto as festas oficiais consagravam a desigualdade, no
carnaval todos eram "iguais", reinando um contato livre e familiar
entre indivíduos normalmente separados na vida cotidiana pelas
barreiras intransponíveis de sua condição social, posses, idade e
situação familiar.
Era comum o uso de máscaras, que traduziam a alegria das
alternâncias, das metamorfoses e das reencarnações que reco-
briam a natureza inesgotável da vida com suas múltiplas faces.
A máscara carregava o sentido da cultura popular e carnavalesca
medieval, não sendo utilizada para enganar, encobrir ou dissimu-
lar, mas para revelar a alegre negação da identidade e do sentido
único. O complexo simbolismo das máscaras é inesgotável. Basta
lembrar que manifestações como a paródia, a caricatura, a careta,
as contorções e as "macaquices" são derivadas da máscara. É na
máscara que se revela com clareza a essência profunda do gro-
tesco (GOMES, 2008).
O grotesco, uma das peculiaridades da sociedade medieval,
favoreceu a relação essencial do riso festivo com o tempo, sendo
este caracterizado pela alternância das estações, pelas fases so-
lares e lunares, pela sucessão dos ciclos agrícolas. Sendo assim, o

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52 © Recreação e Lazer

lado cômico e popular da festa concretizava a esperança em um


futuro melhor, em um regime social e econômico mais justo, em
uma nova verdade que enfatizava a mudança e a renovação.
Até certo ponto, os rituais cômicos das festas, os folguedos
das feiras, os carnavais, as procissões e os ritos estavam legaliza-
dos. Evidentemente, essa permissão legal era forçada e alternava-
se com as interdições. A vitória efêmera do riso só durava o perío-
do da festa, sendo logo seguida por dias ordinários de medo e
opressão. Ao contrário do riso, a seriedade medieval impregnava-
se de elementos de temor, repressão, fraqueza, docilidade, resig-
nação, hipocrisia, proibições, violência e ameaças (GOMES, 2008).
Sob os imperativos do regime feudal, a relação da festa com
os fins superiores da existência humana (a ressurreição e a renova-
ção) somente poderia alcançar plenitude no carnaval e em outros
festejos populares e públicos. Bakhtin salienta que, nessa circun-
stância, a festa convertia-se em uma segunda vida para o povo,
temporariamente marcada pelos ideais de liberdade, igualdade,
universalidade e abundância (GOMES, 2008).
Paradoxalmente, as festas oficiais da Igreja e do Estado me-
dieval contribuíam para sancionar o regime em vigor com o intuito
de fortalecê-lo. As festas oficiais consagravam a desigualdade, a
imutabilidade e a durabilidade das hierarquias, das normas e dos
tabus religiosos, políticos e morais. O tom da festa oficial era o da
seriedade, e o princípio cômico lhe era estranho. De acordo com
Bakhtin, o homem da Idade Média era perfeitamente capaz de
conciliar a assistência piedosa à missa oficial e a paródia do culto
oficial na praça pública. A confiança de que gozava a verdade bur-
lesca, a do "mundo às avessas", era compatível com uma sincera
lealdade (GOMES, 2008).
As festas celebradas nos feriados, como a "festa dos lou-
cos", eram, no início da Idade Média, comemoradas nas igrejas e
consideradas perfeitamente legais, mas, em seguida, tornaram-se
controversas, até que, no final desse período, foram consideradas
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 53

ilegais. Mesmo proibidas, continuavam a ser celebradas nas ruas


e nas tavernas, incorporando-se aos folguedos populares (GOMES,
2008).
O controle por parte da Igreja tornou-se mais evidente duran-
te o período da Inquisição, no século 13. A Igreja procurou reforçar
seu poder e sua unidade religiosa a partir da repressão, condenan-
do à fogueira os praticantes de heresias – como festas profanas,
carnavais, jogos, saraus e serões, entre outros divertimentos que
poderiam ocasionar o vício e as armadilhas do pecado. O historia-
dor Roger Chartier salienta que os serões camponeses atestados
nas condenações eclesiásticas eram sempre mencionados como
lugar do trabalho em comum, do jogo e da dança, do riso e da di-
versão, dos contos e das canções, da confidência e dos mexericos.
Como essas reuniões eram consideradas sórdidas e pecaminosas,
deveriam ser evitadas (GOMES, 2008).
Como visto, a Idade Média caracterizou-se por uma econo-
mia predominantemente agrícola e por uma sociedade fechada
entre os proprietários de terra e os camponeses que viviam em
estado servil, uma vez subordinados aos interesses hegemônicos.
Compreender a sociedade medieval significa ir além desse aspec-
to, procurando entender o papel que as festas, fossem elas ofici-
ais ou não, ocupavam na vida habitual; significa discutir os valores
que essas e outras práticas culturais reforçavam, bem como as per-
spectivas que abriam (GOMES, 2008).
Ao colocar em relevo o papel da Igreja e do Estado medi-
eval, muitos consideram esse período como a "idade das trevas",
ignorando muitas vezes a esplendorosa cultura popular que prev-
aleceu no medievo, como resistência aos princípios dominantes.
O período conhecido como "Renascimento" alcançou seu
apogeu por volta do século 16 e representa uma fase de tran-
sição entre as idades Medieval e Moderna. Trata-se de uma época
conturbada, permeada por conflitos entre a Igreja e o Estado e
caracterizada por uma efervescência epistemológica, intelectual

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54 © Recreação e Lazer

e artística, acentuada pelo desejo de empreender novas desco-


bertas quanto à natureza e ao homem, demolindo tudo quanto
viera do passado e redescobrindo o saber greco-romano livre da
tradição cristã (GOMES, 2008).
Conforme Guimarães, o Renascimento valorizou ainda mais
a cultura erudita da Antiguidade clássica, aliada às notáveis desco-
bertas científicas da época, à consolidação de códigos de conduta
e ao refinamento do gosto – observados pelo clero, pela nobreza
e também pela burguesia emergente –, e provocou um lamentável
desprezo pela cultura popular medieval, tomada como ignorante,
provinciana, rústica e folclórica (GOMES, 2008).
Algumas dessas premissas permaneceram, outras sucumbi-
ram diante dos valores prevalecentes nas modernas sociedades
urbano-industriais, que fornecem mais alguns elementos para a
discussão sobre lazer e trabalho.
Vamos, passar, então, para um delineamento histórico des-
sas sociedades urbano-industriais.

Sociedades urbano-industriais
O projeto da Modernidade primou, entre outros aspectos,
pela fragmentação dos tempos e dos espaços sociais, aspecto de-
terminante para o redimensionamento da sociedade urbana e in-
dustrial. Essa nova orientação provocou um maior distanciamento
entre público e privado, entre ciência e religião, entre trabalho e
lazer.
O objetivo deste tópico é compreender alguns dos elemen-
tos que impulsionaram o processo de institucionalização do lazer
no contexto da moderna sociedade urbana e industrial, conside-
rando, em especial, as influências advindas do mundo do trabalho.
Por mais conceituadas que fossem as cidades, antes da era
Moderna, as áreas rurais eram as grandes produtoras de riqueza. À
medida que o padrão social de riqueza se alterou da posse de terra
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 55

para o montante de dinheiro acumulado, a classe burguesa viu-


se em situação privilegiada. Afinal, os substanciais valores gerados
pelo comércio garantiram à burguesia um progressivo acúmulo de
capital.
A atuação da burguesia foi decisiva para o término do feu-
dalismo e para a consolidação dos Estados Nacionais. Ao defender
o direito à propriedade privada, a burguesia investiu maciçamente
no desenvolvimento industrial, alterando os antigos laços de sub-
ordinação à terra e ao senhor. Nesse contexto, os pequenos pro-
prietários, artesãos e "jornaleiros" (contratados para desenvolver
determinada jornada de trabalho) foram transformados em trab-
alhadores livres — "livres" para vender a força produtiva às classes
burguesas, detentoras do capital e dos meios de produção, seja
no campo ou nos grandes centros urbano-industriais (GOMES,
2004b).
É importante esclarecer que o processo de industrialização
sempre existiu, desde as épocas mais antigas, pois representa a
transformação de matéria-prima, preparando-a para o uso. A
produção em pequena escala é conhecida como artesanal, dife-
rentemente da manufatureira, que apresenta maior complexi-
dade, amplitude e diversificação. A produção industrial requer uti-
lização de utensílios e máquinas capazes de substituir o trabalho
pesado do homem e não começou somente com o uso sistemático
do vapor em meados do século 18, mas, sem dúvida, o salto deci-
sivo da indústria ocorreu nesse período, ganhando dinamismo nos
séculos seguintes, como consequência do avanço científico-tec-
nológico gerado com o advento mundialmente conhecido como
Revolução Industrial (GOMES, 2008).
Queiroz pontua que o progresso industrial possibilitou que
as sociedades urbanas se afirmassem como centros produtores no
setor econômico, inaugurando, na Europa, uma nova forma de vida
social. A mecanização do trabalho, a especialização das tarefas e a
organização racional das atividades representam os primeiros in-

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56 © Recreação e Lazer

dícios de transformação do trabalho urbano, que, posteriormente,


se estenderam também ao agrário (GOMES, 2008).
Como observa a autora recém-mencionada, a mecanização
da lavoura dispensou um amplo contingente de mão de obra, que
se dirigiu às cidades em busca de novas oportunidades de trabal-
ho. A progressiva inovação tecnológica, associada à organização da
produção em massa, permitiu à cidade se estabelecer como polo
produtor de riqueza. Por essa razão, do ponto de vista numérico,
a população urbana rapidamente superou a rural (GOMES, 2008).
As cidades desenvolveram-se ao redor das fábricas, e o acel-
erado e desordenado crescimento dos centros urbanos gerou
problemas diversos. Aqueles que não conseguiam trabalho eram
classificados como "desocupados", cuja ociosidade era vista como
uma ameaça constante para a ordem social. De acordo com Cho-
ay, foi a expressão de desordem típica dos centros urbanos que
evocou a necessidade de promover sua antítese, ou seja, a ordem
(GOMES, 2008).
Para promover a ordem, seria necessário desenvolver uma
série de procedimentos: racionalizar as vias de tráfego e criar es-
tações para acelerar os transportes; preparar a especialização dos
setores urbanos, por meio do estabelecimento de áreas de negó-
cios, agrupados nas capitais em torno da "nova igreja" (bolsa de
valores); criar bairros residenciais destinados aos privilegiados,
inaugurar grandes lojas, hotéis, cafés e prédios para alugar, inicia-
tivas que alteraram profundamente o aspecto da cidade. Com a
implantação da fábrica nas adjacências, o operariado deslocou-se
para os subúrbios, e a cidade deixou de ser uma entidade espacial
tão delimitada como era na época medieval. Essa rigorosa seg-
mentação do espaço urbano instalou em locais distintos o hábitat,
o trabalho e o lazer (GOMES, 2008).
A segmentação do espaço estabeleceu correlações com
a fragmentação do tempo nas sociedades urbano-industriais,
que passaram a ser regidas pelo relógio. Trata-se da vigência do
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 57

tempo mecânico, artificial, não mais regulado pela natureza. Para


Sant'anna (1994), a divisão dos períodos em tempo de trabalho,
tempo de estudo e tempo livre foi criada pelo desenvolvimento
técnico e industrial da Modernidade, pelo ritmo das metrópoles e
pelos preceitos do sistema capitalista.
Nesse âmbito, o tempo no espaço urbano e industrial da
Modernidade passou a ser compreendido e vivenciado conforme
uma nova divisão historicamente concebida, na qual há uma
grande demarcação entre o tempo de trabalho e o tempo livre.
Para compreender a organização do tempo livre, é impre-
scindível entender a divisão social do trabalho, as relações de
produção e o desenvolvimento da racionalidade técnica, ou seja,
a lógica do capitalismo. É importante lembrar que o capitalismo
não foi constituído como um sistema rígido, apresentando grande
capacidade de adaptação e flexibilidade, o que vem propiciando
sua permanência ao longo dos tempos (GOMES, 2008). Contudo,
a situação de desigualdade social decorrente da Revolução Indus-
trial é um dos seus graves problemas, repercutindo intensamente
nas relações estabelecidas entre o tempo de trabalho e o tempo
livre.
Aparentemente, trabalho e tempo livre são esferas opostas,
pois o primeiro é apresentado como o reino da necessidade, en-
quanto o segundo é visto como a esfera da liberdade, da gratui-
dade e da desobrigação, como sugere a própria expressão "livre".
Entretanto, no interior do sistema capitalista, o tempo livre é uma
extensão do tempo de trabalho, estando de acordo com a lógica
da produtividade. Seguindo essa linha de raciocínio, quando o laz-
er é visto como válvula de escape para as tensões, funciona como
um mecanismo que reforça a alienação engendrada, pela lógica do
capital, até mesmo no tempo reservado aos momentos de "não
trabalho" (GOMES, 2004b).
No decorrer do século 19, difunde-se rapidamente a ideia de
que o trabalho, categoria que passa a ser a referência determinan-

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58 © Recreação e Lazer

te da vida em sociedade, é o que permite aumentar a riqueza das


nações (GOMES, 2004b).
Esse novo pensamento desenvolveu-se a partir do avanço
capitalista e da exploração de mão de obra assalariada, comprom-
etendo a noção elaborada por Marx, na qual o trabalho ─ concebi-
do como possibilidade de transformação dos objetos e do mundo
− é o que diferencia, fundamentalmente, o homem do animal.
De acordo com Thompson (1991), a disciplina imposta pelo
capitalismo industrial exigiu uma nova postura da mão de obra as-
salariada, pautada no aproveitamento produtivo do tempo, agora
concebido como dinheiro. Nessa perspectiva, aos operários foi ga-
rantido apenas o repouso necessário para sua reprodução como
força de trabalho.
Aqueles que conseguiam emprego trabalhavam para garan-
tir a sobrevivência enfrentando jornadas exaustivas nos sete dias
da semana, não sobrando tempo para o descanso e tampouco
para a diversão. Todo o tempo dos proletários era voltado para as
atividades laborais e para as atividades indispensáveis à manuten-
ção de sua capacidade produtiva.
Além disso, era grande o medo de perder o posto de trabal-
ho ocupado. O patrão poderia, por exemplo, intensificar o período
diário de trabalho nas fábricas e abolir o descanso semanal, porque
sabia que os operários acabariam aceitando essas condições. Os
festejos, que no decorrer da Idade Média duravam dias, semanas
ou meses, foram completamente banidos da vida do operariado.
As exaustivas jornadas de trabalho, ao lado das necessidades de
higiene, alimentação e transporte, ocupavam todo o tempo em
função do ritmo e das relações estabelecidas no interior do pro-
cesso produtivo (GOMES, 2004b).
Nesse contexto, são válidas as palavras de Paul Lafargue
(1999), que combateu a economia capitalista com o panfleto O di-
reito à preguiça, publicado originalmente em 1880. Nessa obra,
o autor critica a moral cristã e a ética do trabalho, esboçando um
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 59

painel da sociedade burguesa e focalizando a questão da consciên-


cia de classe que faltava ao proletariado.
De acordo com Lafargue (1999), à medida que a máquina era
aperfeiçoada, suprimindo o trabalho humano, o operário parecia
multiplicar seu empenho, como se quisesse concorrer com o eq-
uipamento, o que para esse autor representava um contrassenso.
O proletariado precisava entender que a máquina deveria redimir
a humanidade, resgatando o homem do trabalho assalariado para
conceder-lhe "os lazeres e a liberdade".
Sendo assim, Lafargue instigou a classe proletária a mobili-
zar-se para instaurar uma lei que proibisse o trabalho além de três
horas diárias. Conforme sua visão, a preguiça era mil vezes mais
nobre e mais sagrada que os "direitos do homem" proclamados
pela burguesia. Tal argumentação ecoou como um verdadeiro ul-
traje à lógica da produtividade. Entretanto, fiéis a essa lógica, os
proletários acreditavam que aqueles que não trabalhavam eram
inúteis e não tinham o direito de comer, muito menos de descan-
sar e de se divertir (GOMES, 2008).
O discurso de Lafargue coincidiu com as históricas reivindi-
cações operárias pelo estabelecimento de leis referentes à limita-
ção da jornada de trabalho, ao descanso semanal e às férias re-
muneradas. A observância dessas leis garantiria ao operariado um
aumento do tempo livre. Surge, em alternância com o tempo do
trabalho, o tempo de lazer, visto como necessidade e reivindicado
como direito (GOMES, 2008).
Era muito comum os desempregados e o proletariado se
entregarem ao alcoolismo e à prostituição, entre outros vícios e
"desvios morais" encarregados de aliviar as duras condições a que
eram submetidos. Ademais, o ócio, antes concebido como exer-
cício nobre e elevado, foi tomado como "pai de todos os vícios",
hábito degenerativo que afrontava os preceitos morais da civiliza-
ção moderna.

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60 © Recreação e Lazer

A racionalidade técnica em ascensão nas sociedades urbano-


-industriais passou a repudiar o ócio porque este não correspon-
deu à produtividade preconizada pelo capital. Quem não exercia
nenhuma atividade útil ou produtiva era classificado como vadio e
criminoso, devendo ser encarcerado (GOMES, 2004b).
O lazer institucionaliza-se em consonância com esses valo-
res, sendo entendido como tempo/espaço destinado à vivência de
atividades lúdicas, consideradas pela burguesia "lícitas, saudáveis
e produtivas" ─ como praticar ginástica e esportes ao ar livre.
O lazer é, então, uma dimensão da cultura construída con-
forme as peculiaridades do contexto histórico e social no qual é
desenvolvido. Nas sociedades modernas, passa a ser reconhecido
como uma esfera própria, como um campo autônomo, distinto do
trabalho, mas a ele relacionado.
Além da complexidade que engendra essa trama social, cabe
destacar que o lazer foi constituído como um tempo/espaço sub-
traído do trabalho; como um campo propício para fugir da rotina,
compensar frustrações, proporcionar descanso ou divertimento
no tempo supostamente "livre" das mazelas do trabalho produti-
vo. Por essa razão, como uma prática social dialeticamente vincu-
lada ao trabalho, mesmo passível de direcionamento, o lazer pode
ser visto como um direito jurídico e legalmente reivindicado pelos
trabalhadores no final do século 19.
Em suma, à medida que a burguesia procurou exercer con-
trole sobre o tempo livre, revertendo-o em benefício do pró-
prio tempo de trabalho, o ócio foi encarado como um desvio, e
o lazer − normativo, controlado, regulado − passou a ser a regra
(SANT’ANNA, 1998).
O processo de institucionalização do lazer no contexto da so-
ciedade moderna foi impulsionado por vários fatores, tais como a
urbanização, o avanço tecnológico e industrial, a difusão da noção
de tempo mecânico, o desenvolvimento do modo de produção ca-
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 61

pitalista e a concretização de projetos sociais, políticos e pedagó-


gicos condizentes com os valores hegemônicos em cada momento
histórico. O capitalismo não vem se constituindo como um sistema
rígido, perpetuando-se graças à sua grande capacidade de adap-
tação e flexibilidade. Contudo, a história construída em nossa so-
ciedade revela sua "fratura exposta": a exploração proveniente da
Revolução Industrial (GOMES, 2008; GOMES, 2004b).
Esses elementos foram essenciais não apenas para orientar
os novos rumos seguidos pelo trabalho, mas também para o lazer,
com profundos impactos na sociedade contemporânea.
Após realizar essa incursão histórica pela Idade Moderna,
passaremos a nos deter na discussão da relação lazer-trabalho na
sociedade contemporânea.

Sociedade contemporânea
Geralmente, o trabalho é concebido como uma obrigação,
e não como uma autêntica possibilidade de realização humana.
Para Padilha (2004), como o trabalho é colocado em situação de
oposição à liberdade, esta só poderia ser vivenciada pelo trabal-
hador no tempo fora do ato produtivo. Sendo assim, o tempo livre
surge como um suposto tempo de liberdade, de liberação das am-
arras, das obrigações e das contradições presentes no mundo do
trabalho.
É necessário lembrar que as sociedades humanas sempre se
organizaram em "tempos sociais", ou seja, em momentos determi-
nados pelas atividades sociais neles desenvolvidas: o tempo para o
trabalho, para a educação, para a religiosidade, para a família, para
o descanso etc. A vida coletiva é regida pela articulação desses
momentos. A compreensão do tempo livre, que representa um
tempo social, sempre esteve vinculada aos significados do trabal-
ho e do tempo de trabalho. Em decorrência, seu principal sentido
prevalece como o de um tempo de não trabalho (PADILHA, 2004).

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62 © Recreação e Lazer

Como explica a autora, a lógica do capital rege não apenas o


tempo de trabalho, mas também o tempo fora dele. No entanto,
para Padilha (2004, p. 221),
[...] o tempo livre pode ser um tempo de alienação e consumismo,
mas também pode ser um tempo de reflexão e práxis. [...] Numa
abordagem crítica da sociedade ela é apreendida como contra-
ditória, o que faz com que o tempo livre, como um fenômeno so-
cial, também seja cheio de contradições.

Essa opinião é compartilhada por muitos estudiosos, como


Souza Júnior (2000), para quem o tempo livre deveria constituir
o momento em que cada ser social poderia dispor de si mesmo
livremente, sem se submeter ao imperativo de ter de trabalhar
para viver. Porém, no contexto da sociedade regida pelo capital
o tempo livre se encontra distanciado do ideal de estar consigo
mesmo de maneira liberta, se configurando em um momento para
reprodução da força de trabalho.
Além disso, o autor acredita que o desenvolvimento das for-
ças produtivas deveria levar a humanidade a despender cada vez
menos tempo no trabalho, dispondo cada vez mais de tempo livre
no qual possa desenvolver sua potencialidade (SOUZA JÚNIOR,
2000). Será que a humanidade está caminhando para um aumen-
to do tempo livre?
As reflexões sobre a progressiva ampliação do tempo livre,
bem como suas articulações com o trabalho e o lazer, foram esta-
belecidas ao longo do século 20. Essa questão não representa um
assunto "novo" para quem acompanha os estudos sobre o lazer,
mas foi retomada recentemente por alguns autores, tais como De
Masi (2000).
De acordo com o pensamento desse sociólogo italiano, nos-
sos antepassados viviam aproximadamente 300 mil horas, das
quais 120 mil eram dedicadas ao trabalho. Hoje, com o aumento
da expectativa de vida, podemos viver muito mais (cerca de 700
mil horas) e, mesmo cumprindo jornadas diárias de oito horas dos
vinte aos sessenta anos de idade, trabalharemos no máximo 80 mil
horas (DE MASI, 2000).
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 63

O autor argumenta que, enquanto nossos ancestrais trabal-


havam quase a metade de suas vidas, na sociedade "pós-industrial"
de hoje trabalhamos apenas um décimo de nossa existência. Dessa
forma, uma pessoa de quarenta anos de idade deverá viver, ainda,
350 mil horas. Desse total, prevê que 40 mil horas serão dedicadas
ao trabalho e, aproximadamente, 180 mil ao tempo livre.
Para De Masi (2000), o tempo livre corresponde a 9/10 da
vida humana, sendo facilitado pelas novas tecnologias. Ao tecer
elogios ao avanço tecnológico, o autor parece considerá-lo como
redentor da humanidade. Com isso, o telefone e o avião permitem-
nos "economizar" o tempo, que também pode ser "enriquecido"
com o rádio, "programado" com as agendas eletrônicas e "esto-
cado" com as secretárias eletrônicas. Para o autor, essa tecnolo-
gia, altamente sofisticada, acaba colaborando com a ampliação do
tempo livre.
Santos (2000) observa que as contínuas evoluções tecnológi-
cas prometeram não somente uma liberação do esforço no trab-
alho, acenando também com mais tempo livre para todos, mais
informação, mais comunicação, mais política e mais desenvolvi-
mento humano. Em outras palavras, um mundo melhor. Contudo,
lamentavelmente, a realidade vem mostrando que o tempo livre
não vem sendo ampliado, mas, sim, reduzido em larga escala,
especialmente por causa das condições sociais de existência da
maioria das pessoas.
A explicação elaborada por De Masi (2000), embora dota-
da de uma lógica própria, desconsidera questões sociais que são
fundamentais a um entendimento mais amplo e consistente do
trabalho e do lazer. Em várias regiões do mundo continuam pre-
dominando as jornadas de trabalho extremamente longas dos
primórdios do capitalismo e, mesmo nas metrópoles ocidentais,
a jornada real de trabalho foi reduzida apenas em certa medida.
Consequentemente, cada vez mais as pessoas procuram, deses-
peradamente, o tal "tempo livre", como pondera Kurz (2000).

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64 © Recreação e Lazer

O trabalhador contemporâneo, que desenvolve uma ativi-


dade altamente complexa e cumpre uma jornada diária de sete/
oito horas, trabalha, na verdade, muito mais tempo real do que
alguém de outra época, mesmo que este estivesse sujeito a um
turno de 14 h diárias de trabalho com baixo grau de complexidade
(ANTUNES, 2004).
Sendo assim, percebe-se, na contemporaneidade, que as ex-
igências de desempenho profissional crescem consideravelmente.
Há um novo paradigma produtivo exigindo esforço redobrado,
que, quando não prolonga as jornadas, acaba provocando uma
grande intensificação durante o tempo de trabalho.
Muitas corporações aderiram à redução de pessoal, optan-
do por estratégias que parecem gerar melhores resultados para
as empresas. Logo, aqueles que permaneceram empregados
passaram a trabalhar muito mais: tanto para dar conta de cum-
prir todas as tarefas como para não correr o risco de demissão.
Os trabalhadores informais também acabam trabalhando muito,
pois enfrentam jornadas extensas para tentar manter sua antiga
condição de renda (WERNECK; STOPPA; ISAYAMA, 2001).
Além de trabalhar muito, o trabalhador fica vulnerável aos
imperativos do mercado, que provocam uma gradativa deteriora-
ção das relações de trabalho.
Com isso, cresce em proporções impressionantes o núme-
ro de trabalhadores informais contratados em regime de tempo
parcial ou por períodos temporários, especialmente no setor de
prestação de serviços. Além de ser o setor que mais cresce em
todo o mundo, não se esqueça de que é ele quem engloba o mer-
cado de trabalho no campo do lazer.
O crescimento do setor de serviços vincula-se com os novos
hábitos de vida apreciados atualmente, com uma evidente valo-
rização do lazer. Além disso, relaciona-se com a substituição, em
larga escala, de antigos empregos formais pela contratação de ser-
viços terceirizados. Alegando que essa medida é uma resposta à
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 65

pressão do mercado, empresas argumentam que a inevitável saída


é comprar por um preço menor, no mercado concorrencial, mui-
tos dos produtos e dos serviços disponíveis (WERNECK; STOPPA;
ISAYAMA, 2001).
No setor de prestação de serviços, desde a década de 1980, o
número de empregados informais ultrapassa os formais em vários
países do mundo, sendo o quadro traduzido simplesmente como
redução geral do emprego.
Tal situação não está circunscrita ao chamado Primeiro
Mundo, atingindo também os países em desenvolvimento. Além
disso, abrange tanto a exclusão de uma crescente massa de tra-
balhadores do gozo de seus direitos legais como a consolidação
de um ponderável exército de reserva e o agravamento de suas
condições.
Diante dessa realidade, certamente o acesso da população
brasileira ao lazer fica comprometido. Enquanto muitos se veem
obrigados a prolongar sua jornada de trabalho, outros se encon-
tram à margem dos meios e dos recursos para vivenciar os direitos
sociais — dentre os quais o lazer — com dignidade.
Existem infinitas possibilidades de desfrute pessoal e coleti-
vo, e a mídia explora todo esse potencial de lazer como se os bens
e os serviços ofertados fossem acessíveis a todos.
Fazer uma viagem de férias em família para um resort em
um local aprazível, por exemplo, pode ser uma experiência gratifi-
cante, mas, além de demandar disponibilidade de tempo, é alta-
mente dispendiosa. Além disso, como em cada núcleo familiar ex-
istem várias necessidades a ser preenchidas, muitas vezes, o parco
tempo destinado ao lazer acaba circunscrito ao espaço doméstico.
O lazer, na contemporaneidade, não pode ser encarado
como uma categoria em oposição ao trabalho. Antunes (2000, p.
143) nos chama a atenção para este fato quando afirma que:
Se o trabalho se torna [...] autônomo e livre, e por isso dotado de
sentido, será também (e decisivamente) por meio da arte, da poe-

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66 © Recreação e Lazer

sia, da pintura, da literatura, da música, do uso autônomo do tem-


po livre e da liberdade que o ser social poderá se humanizar e se
emancipar em seu sentido mais profundo.

Como trabalho e lazer estabelecem relações dialéticas, po-


dem colaborar com a emancipação social. Para isso, o lazer não
pode ser visto como um remédio para a problemática social, cujo
objetivo seja simplesmente aliviar as tensões ou compensar os di-
lemas que marcam profundamente o mundo do trabalho.
Como bem disse Riesman (1971), o lazer não é capaz de sal-
var o trabalho, fracassando juntamente com ele, e só será signi-
ficativo para as pessoas se o trabalho o for também. Dessa for-
ma, as qualidades por nós desejadas no lazer ─ como satisfação,
realização, reconhecimento, autonomia, liberdade, criatividade e
criticidade − terão maiores chances de se concretizar no trabalho
a partir do momento em que travarmos a batalha em uma única
frente: a do "trabalho-e-lazer".
Com esse pensamento, deixamos para você o desafio de con-
tinuar repensando as interfaces entre lazer e trabalho em nosso
contexto, pois o assunto é inesgotável. Sendo assim, você poderá
prosseguir em seu processo de aprofundamento de conhecimen-
tos, e quem sabe encontrar novas arestas para que as questões
que perpassam lazer e trabalho possam colaborar na construção
de um projeto de sociedade comprometido com a emancipação
do ser social e com a concretização de suas utopias.
Avançando em nossos estudos, passaremos, agora, a nos
ater à discussão conceitual em relação ao lazer. Vamos lá!

6. LAZER: ASPECTOS CONCEITUAIS


Após um breve passeio pela história da recreação e do lazer,
neste tópico daremos continuidade à busca de respostas sistem-
atizadas (cientificamente falando) para a questão apresentada:
afinal, o que significa lazer? o que é recreação?
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 67

Inicialmente, nossa intenção foi mostrar que o lazer e a rec-


reação fazem parte das nossas experiências da vida cotidiana, rep-
resentando um ponto de partida para que o assunto seja tratado
com mais profundidade, como um objeto de estudos.
Nosso próximo desafio neste instante é discutir conceitual-
mente o significado das expressões lazer e recreação. Para isso,
serão consideradas as opiniões emitidas por alguns dos autores
que produziram conhecimentos sobre o assunto.
No plano conceitual, não há um consenso entre os estudio-
sos do lazer e da recreação quanto aos seus significados. Esse fato
já é de se esperar, uma vez que, os autores, para realizarem suas
formulações, partem de referenciais teóricos distintos. Isso pode
ser ilustrado a partir dos estudos de Dias (2010), Rodrigues, Lemos
e Gonçalves Junior (2010), Peixoto, Pereira e Freitas (2010), Pimen-
tel (2010) e Uvinha (2010), que apresentam bases epistemológi-
cas diferenciadas, e consequentemente, o significado atribuído ao
lazer e à recreação também se diferencia. Ainda hoje, o conceito
formulado na década de 1960 por Dumazedier (1973) representa
uma grande referência para o campo do lazer em diversos países,
e não apenas no Brasil.
Conforme Camargo (1998), foi a partir das contribuições de
Dumazedier que o lazer deixou de ser apenas uma idealização teó-
rica e passou a ser tratado como um fato empiricamente delimitá-
vel e observável, instigando novas pesquisas sobre o tema.
Na opinião de Dumazedier (1973, p. 34), o lazer pode ser
compreendido como:
[...] um conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entre-
gar-se de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se,
recrear-se e entreter-se ou ainda para desenvolver sua formação
desinteressada, sua participação social voluntária, ou sua livre ca-
pacidade criadora, após livrar-se ou desembaraçar-se das obriga-
ções profissionais, familiares e sociais.

O entendimento do lazer como "um conjunto de ocupações",


tem sido alvo de críticas por parte de diversos autores. Além de

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68 © Recreação e Lazer

restringir o lazer à prática de determinadas atividades, supõe que


o indivíduo deve estar sempre ocupado com algo, não havendo
possibilidades para o "nada fazer".
Na época em que Dumazedier elaborou essa definição, o
lazer era colocado em oposição ao conjunto das necessidades e
das obrigações da vida cotidiana, especialmente do trabalho pro-
fissional. Dessa forma, o lazer era definido em contraponto à lib-
eração das obrigações institucionais, e não apenas do trabalho.
As necessidades humanas (descanso, divertimento, recrea-
ção e desenvolvimento da personalidade) apresentadas em sua
definição são influenciadas pela dinâmica social, e o sociólogo não
considera essa questão em sua elaboração.
Faleiros, citada por Padilha (2002), ao criticar o conceito de
lazer emitido por Dumazedier (1973), parte do princípio marxista
de que as necessidades humanas são geradas em uma dada reali-
dade social e estão vinculadas ao processo histórico e às transfor-
mações da civilização.
A partir dos resultados das pesquisas empíricas desenvolvi-
das na França nas décadas de 1950 e 1960, Dumazedier (1979)
indicou um sistema de características constituintes do lazer:
1) caráter liberatório: o lazer é liberação de obrigações ins-
titucionais (profissionais, familiares, socioespirituais e
sociopolíticas) e resulta de uma livre escolha;
2) caráter desinteressado: o lazer não está, fundamental-
mente, submetido a nenhum fim, seja lucrativo, profis-
sional, utilitário, ideológico, material, social, político, so-
cioespiritual;
3) caráter hedonístico: o lazer é marcado pela busca de
um estado de satisfação: "isso me interessa". Essa busca
pelo prazer, pela felicidade, pela alegria ou pela fruição
é de natureza hedonística e representa a condição pri-
meira do lazer;
4) caráter pessoal: as funções do lazer (descanso, diver-
timento e desenvolvimento da personalidade) respon-
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 69

dem às necessidades do indivíduo em face das obriga-


ções primárias impostas pela sociedade.
Além destas características, Dumazedier (1973) contribui
com este campo de estudos apontando que o lazer atenderia, ba-
sicamente, a três funções: descanso, divertimento e desenvolvim-
ento.
A função descanso tem como função liberar-se da fadiga.
Nesse sentido, o lazer "é um reparador das deteriorações físicas e
nervosas provocadas pela tensões resultantes das obrigações co-
tidianas e, particularmente, do trabalho" (DUMAZEDIER, 1973, p.
32). Já o divertimento está ligado à busca de atividades compen-
satórias que provoquem satisfação e prazer. Por fim, a função de-
senvolvimento "cria novas formas de aprendizagem voluntária [...]
no indivíduo libertado de suas obrigações profissionais", visando
"o completo desenvolvimento da personalidade dentro de um es-
tilo de vida pessoal e social" (DUMAZEDIER, 1973, p. 34). De acor-
do com o autor, essas funções são solidárias entre si.
O pensamento de Dumazedier influenciou as concepções de
lazer dos autores brasileiros, dentre os quais Marcellino (2010).
Melo e Alves Júnior (2003) e Gomes (2008), entre outros estudio-
sos, reconhecem que Marcellino é um dos autores mais citados
nos estudos sobre o lazer em nosso país. Por essa razão, serão fei-
tas, a seguir, algumas correlações entre o pensamento de Marcel-
lino e o de Dumazedier.
Em seu livro Lazer e humanização, Marcellino (1983) confere
notável destaque às ideias de Dumazedier. Nessa obra, também é
possível identificar o pensamento de Antônio Gramsci, pois Mar-
cellino assume a perspectiva marxista como pano de fundo para
subsidiar suas análises. Contudo, a influência de Gramsci é mais
expressiva na obra Lazer e educação (1987), na qual não são fei-
tas muitas menções a Dumazedier, embora suas ideias continuem
presentes no texto (GOMES, 2004a).

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70 © Recreação e Lazer

No livro Sociologia empírica do lazer, Dumazedier (1979) jus-


tifica sua opção por adotar a expressão "tempo livre", como desig-
nação para o tempo liberado do trabalho, e não necessariamente
o tempo de lazer.
Dumazedier explica que o lazer não pode instaurar o reinado
da liberdade absoluta, tampouco ser anulado sob o peso dos de-
terminismos e condicionamentos sociais. Dessa forma, a liberdade
de escolha dentro do tempo de lazer poderia ser considerada uma
realidade, mesmo que fosse limitada e, em parte, ilusória.
Para Camargo (1986, p. 97), que também fora influenciado
pelo pensamento do sociólogo francês, o lazer se configura em:
[...] um conjunto de atividades gratuitas, prazerosas, voluntárias e
liberatórias, centradas em interesses culturais, físicos, manuais, in-
telectuais, artísticos e associativos, realizadas num tempo roubado
ou conquistado historicamente sobre a jornada de trabalho profis-
sional e doméstico e que interferem no desenvolvimento pessoal e
social dos indivíduos.

Para Marcassa (2003, n. p.8) o lazer se apresenta como:


[...] prática social historicamente situada que se funda a partir das
relações que estabelece com o trabalho, o tempo, a práxis, o es-
paço, a cultura e a educação. (...) Estou convencida de que o la-
zer se configura como uma instituição que envolve um conjunto
de práticas cujas normas e características internas lhe conferem
um estatuto próprio de funcionamento, atribuindo-lhe qualidades
que assumem um caráter indissociável da sua própria experiência e
compreensão. Nessa perspectiva, o lazer agrega, num mesmo tem-
po e espaço, a realização de inúmeras práticas corporais e lúdicas,
diferentes formas de divertimento e descontração consideradas
lícitas, mas que têm um caráter espontâneo, porque partem dos
desejos, ainda que induzidos, dos indivíduos e grupos, e um arranjo
planejado frente à vida cotidiana moderna e racionalizada, abar-
cando inúmeras experiências de contato e recriação do universo
cultural que acontecem em locais determinados e que promovem
valores, saberes e significados articulados às possibilidades e con-
dições postas às diferentes classes sociais. Portanto, o lazer só pode
ser entendido como um fenômeno social moderno, que cria códi-
gos e funções muito importantes para a sua realidade contextual,
constituindo-a e revelando-a, tanto no sentido da manutenção,
como da transformação.
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 71

Marcellino (2010) enfatiza que o lazer pode ser compreen-


dido a partir da combinação dos aspectos "tempo" e "atitude".
A atitude diz respeito à relação estabelecida entre o sujeito e a
experiência vivida, fruto de uma escolha pessoal e prazerosa. O
tempo refere-se ao tempo disponível, obtido pelo indivíduo após
se desvencilhar não apenas das obrigações profissionais, mas
também das obrigações familiares, sociais e religiosas, ou seja, o
tempo da não obrigatoriedade. Nesse ponto, o autor também se
aproxima de Dumazedier.
Ao considerar que o lazer pressupõe uma combinação entre
os aspectos tempo e atitude, Marcellino segue a tradição de al-
guns autores brasileiros, como Lenea Gaelzer (1979), que também
se fundamenta em Dumazedier.
Essa estudiosa realizou um levantamento da bibliografia so-
bre o lazer e chegou à conclusão de que a maioria dos autores ad-
mitia os conceitos de lazer como tempo, atitude (tendência mais
recente na época) e também atividade (ocupação). Para a autora,
esses três elementos são interdependentes, pois, separadamente,
não preenchem as condições necessárias ao lazer.
Um ponto marcante do pensamento de Marcellino (2010)
relaciona-se com as chamadas "abordagens funcionalistas" do
lazer, conforme denomina o autor. Essas visões, no seu entender,
visam à manutenção do status quo, procurando ajustar o indivíduo
de forma acrítica ao contexto em que vive, incentivando o con-
sumismo em relação ao lazer.
A sociedade, nesse tipo de abordagem, é vista de maneira
equilibrada, harmônica, na qual o lazer é divertimento para todos,
sendo a função primordial deste manter uma suposta "paz social".
Dessa forma, se as obrigações diárias impostas aos indivíduos
cansam, fatigam, alienam, o lazer recupera, descansa, compensa.
O lazer é algo sempre bom, maravilhoso e divertido. Essa é a abor-
dagem funcionalista do lazer.

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72 © Recreação e Lazer

Relacionadas a essa visão funcionalista do lazer, estão quatro


abordagens elencadas por Marcellino (1996):
1) compensatória: sob esta óptica, o lazer compensa a in-
satisfação e alienação produzidas no trabalho e em ou-
tras esferas de atuação humana;
2) moralista: vê nas atividades de lazer um espaço propício
para a efetivação de comportamentos negativos, perigo-
sos, destrutivos e de valores suspeitos gerados na socie-
dade moderna, mas que podem ser substituídas por vi-
vências de atividades socialmente aceitas e moralmente
corretas;
3) romântica: a ênfase é dada nos valores da sociedade tra-
dicional e na nostalgia do passado;
4) utilitarista: o lazer é entendido como recuperador da
força de trabalho ou como instrumento privilegiado para
o desenvolvimento.
Na obra de Marcellino (1983), pode-se verificar que "anti-
lazer" foi uma expressão cunhada por Godbey e, posteriormente,
utilizada por Dumazedier (1973) e vários outros autores. Marcelli-
no utiliza o termo para as atividades vistas como simples consumo
que alimenta a alienação nessa esfera da vida. Ele é autor de um
dos conceitos de lazer que mais circulam entre os brasileiros que
estudam o tema nos dias de hoje.
Para Marcellino (2010, p. 29), o lazer é entendido:
[...] como a cultura ─ compreendida em seu sentido mais amplo
− vivenciada (praticada ou fruída) no "tempo disponível". O im-
portante, como traço definidor, é o caráter "desinteressado" dessa
vivência. Não se busca, pelo menos fundamentalmente, outra rec-
ompensa além da satisfação provocada pela situação. A "disponibi-
lidade de tempo" significa possibilidade de opção pela atividade
prática ou contemplativa.

Essa concepção de lazer amplia o entendimento enunciado


anteriormente pelo próprio autor (MARCELLINO, 1983), no qual la-
zer e ócio eram colocados em campos opostos. Além disso, a com-
preensão de lazer como cultura supera o seu entendimento como
"conjunto de ocupações", embora algumas características do sis-
tema elaborado por Dumazedier possam ser aqui identificadas.
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 73

Marcellino afirma que a palavra "cultura" ainda é consid-


erada por muitos em seu sentido restrito, como se o significado
desse termo se resumisse a artes e espetáculos (o que se configura
em entendimento errôneo) – e, nessas manifestações, estaria en-
volvida uma série de manifestações do lazer. Esse fato ocorre es-
pecialmente no trato com as políticas públicas de lazer. Com algu-
mas exceções, uma ação bastante comum é a oferta de atividades
esporádicas para os sujeitos, o que reforça a concepção de lazer
como um mero produto a ser oferecido.
Alves (2003) ressalta a necessidade de se superar o entendi-
mento de lazer como cultura. Associar o lazer com a cultura res-
salta a importância de aprofundarmos conhecimentos sobre esta
última.
Constituído conforme as peculiaridades do contexto históri-
co e sociocultural no qual se desenvolve, o lazer implica "produção"
de cultura — no sentido da reprodução, da construção e da trans-
formação de diversos conteúdos culturais usufruídos por pessoas,
grupos e instituições (GOMES, 2008). Essas ações são construídas
em um tempo/espaço de produção humana; dialogam e sofrem in-
terferências das demais esferas da vida em sociedade e permitem-
nos ressignificar, continuamente, a cultura.
O diferencial do lazer perante outras práticas sociais e cult-
urais de nossa sociedade é o fato de os elementos que o caracter-
izam — tempo, espaço-lugar, ações/atitude e manifestações cult-
urais — serem enraizados no lúdico, e, mesmo passíveis de pressão
e interferência do contexto, não adquirirem caráter de obrigação,
não sendo vistos como um conjunto de tarefas a serem cumpridas.
Esses elementos expressam um exercício coletivamente construí-
do, no qual os sujeitos se envolvem porque dessa forma o desejam
(GOMES, 2004a).
Ainda conforme Gomes (2004a, p. 125), é possível com-
preender o lazer:

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74 © Recreação e Lazer

[...] como uma dimensão da cultura constituída por meio da vi-


vência lúdica de manifestações culturais em um tempo/espaço
conquistado pelo sujeito ou grupo social, estabelecendo relações
dialéticas com as necessidades, os deveres e as obrigações, espe-
cialmente com o trabalho produtivo.

Para a autora, o lazer é uma dimensão da cultura construí-


da socialmente, em nosso contexto, a partir de quatro elementos
inter-relacionados:
1) tempo: corresponde ao usufruto presente e não se limi-
ta aos períodos institucionalizados para o lazer (final de
semana, férias, entre outros);
2) espaço-lugar: estende-se muito além de um espaço físi-
co do qual os sujeitos se apropriam para exercer o conví-
vio social ou local do encontro do lazer;
3) manifestações culturais: conteúdos vivenciados como
o fluir da cultura, seja como possibilidade de diversão,
descanso ou desenvolvimento;
4) ações (ou atitude): estabelecem suas bases no lúdico.
O lúdico pode ser destacado como a essência que integra a
concepção de lazer de Leila Pinto (2003). Entendendo o lazer como
disponibilidade de tempos e lugares para vivências da cultura lúdi-
ca, a autora ressalta a construção de interações prazerosas cen-
tradas no sujeito, em determinado contexto, constituídas a partir
de sua curiosidade, de seus desejos, de suas descobertas críticas
e criativas.
Para a autora, essas experiências são construídas, sobretudo,
pela liberdade do sujeito na ressignificação desses tempos e lugar-
es, na recriação de objetos, materiais e atividades. Na sua visão,
lazer implica sonhos, gerenciamento de conflitos e anúncios; im-
plica relações humanizadas e transformação de tempos e espaços
educativos (formais e não formais) em experiências lúdicas.
Nesse sentido, a alegria é possível como fruto da conquista
da liberdade ao lidar com atitudes, espaços, tempos e atividades
que busquem superar os muitos dilemas sociais colocados como
limites às conquistas desejadas. A autora considera enganoso pen-
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 75

sar que o lazer não está relacionado com a problemática atual e


apresenta perspectivas que levam o sujeito a ter consciência das
contradições de nossa sociedade e da humanização de nossas re-
lações (PINTO, 2000).
Para Antonio Carlos Bramante (1998), a ludicidade, como
principal eixo da experiência de lazer, é uma das poucas unanimi-
dades entre os estudiosos que teorizam o tema. Conforme o autor,
o lazer é constituído por três elementos: tempo, espaço e atitude.
De acordo com Bramante (1998, p. 9):
O lazer se traduz por uma dimensão privilegiada da expressão hu-
mana dentro de um tempo conquistado, materializada através de
uma experiência pessoal criativa, de prazer e que não se repete no
tempo/espaço, cujo eixo principal é a ludicidade. Ela é enriquecida
pelo seu potencial socializador e determinada, predominantemen-
te, por uma grande motivação intrínseca e realizada dentro de um
contexto marcado pela percepção de liberdade. É feita por amor,
pode transcender a existência e, muitas vezes, chega a aproximar-
-se de um ato de fé.

Para esse autor, a vivência do lazer relaciona-se com as


oportunidades de acesso aos bens culturais — determinadas, ger-
almente, por fatores sociopolíticos e econômicos e influenciadas
por fatores ambientais.
A partir das reflexões aqui desenvolvidas, observa-se que
existem várias concepções de lazer, e cada uma delas indica a pers-
pectiva de análise construída pelos autores.

7. RECREAÇÃO: (BREVES) APONTAMENTOS CONCEI-


TUAIS
Apesar de haver um movimento em busca de uma reflexão
conceitual em torno da expressão "recreação", não há um debate
aprofundado neste campo sobre seu sentido/significado, diferen-
temente do que pudemos visualizar com o termo "lazer". Sendo
assim, apresentaremos breves considerações acerca da dimensão
conceitual desse fenômeno.

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76 © Recreação e Lazer

De acordo com as ponderações de Bramante (1998), ao lon-


go do tempo o lazer vem sendo conceitualmente confundido com
outros derivados, como "recreação" e "jogo". Para ele, o lazer sig-
nifica um amplo e interdisciplinar campo de estudos, pesquisas e
aplicação. A recreação, por sua vez, é atrelada ao conceito de "ativ-
idade" – por exemplo, a um "programa de atividades recreativas
para pré-escolares" (BRAMANTE, 1998, p. 11). Em outro trabalho,
o autor reforça esse entendimento: "Em última análise, recreação
pode ser considerada como produto, isto é, atividade/experiência,
que ocorre dentro do lazer" (BRAMANTE, 1997, p. 123).
A concepção de recreação como conjunto das atividades de-
senvolvidas no lazer também é defendida por Bruhns (1997). O
lazer, por sua vez, pode ser entendido como expressão da cultura,
constituindo um elemento de conformismo ou de resistência à or-
dem social estabelecida. A recreação (ou atividade de lazer) aprox-
ima-se do lúdico e, "às vezes, ocorre certa confusão de termos e
objetivos, sendo o jogo visualizado como recreação" (BRUHNS,
1997, p. 39). Dependendo do contexto, o jogo não pode ser con-
siderado uma atividade de lazer.
Para outro grupo de estudiosos, a exemplo de Pinto (1992, p.
291), "a recreação e/ou lazer sendo considerados espaços privile-
giados para a vivência do lúdico". Nesses termos, ao compartilhar
a essência lúdica, recreação e lazer poderiam ser concebidos com
o mesmo sentido conceitual.
Camargo (1998, n. p.33) corrobora a concepção anterior,
trazendo outros dados para a discussão. Conforme suas consid-
erações, "os conceitos de lazer e recreação em nada se diferen-
ciam do ponto de vista da dinâmica sociocultural que produziu o
divertir-se moderno".
A utilização dessas duas expressões surgiu em decorrência
de um problema linguístico, pois nem todas as línguas moder-
nas dispõem de termos correspondentes às palavras recreação e
lazer. Muitos países, como Espanha, Itália e Alemanha, adotaram
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 77

vocábulos cuja raiz tem sentido igual ao de recreação, com a mes-


ma finalidade e praticamente com o mesmo sentido de lazer.

8. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Sugerimos que você procure responder, discutir e comentar
as questões a seguir que tratam da temática desenvolvida nesta
unidade, qual seja a abordagem histórica do lazer e da recreação,
assim como da apropriação conceitual destes fenômenos.
A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para
você testar o seu desempenho. Se você encontrar dificuldades em
responder a essas questões, procure revisar os conteúdos estuda-
dos para sanar as suas dúvidas. Esse é o momento ideal para que
você faça uma revisão desta unidade.
Lembre-se de que, na Educação a Distância, a construção do
conhecimento ocorre de forma cooperativa e colaborativa; com-
partilhe, portanto, as suas descobertas com os seus colegas.
Confira, a seguir, as questões propostas para verificar o seu
desempenho no estudo desta unidade:
1) No decorrer desta unidade, estudamos a trajetória histórica da recreação
em nosso país. Sendo assim, aponte os principais elementos que influencia-
ram o entendimento dessa prática social nos diferentes contextos históricos.

2) A ocorrência histórica do lazer é alvo de polêmicas, como pudemos obser-


var nos estudos realizados nesta primeira unidade. Diante dessa afirmação,
indique:
a) quais são os posicionamentos existentes entre os estudiosos do lazer em
relação a esse embate;
b) quais são os autores representativos de cada uma dessas correntes;
c) quais são os argumentos que sustentam essas diferentes visões.
3) Partindo do aspecto histórico do lazer, indique as principais manifestações
culturais vivenciadas nos seguintes períodos:
a) sociedade greco-romana;
b) sociedade medieval;
c) sociedades urbano-industriais;
d) sociedade contemporânea.

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78 © Recreação e Lazer

4) A abordagem conceitual do lazer e da recreação constitui uma das tarefas


realizadas pelos estudiosos dessas temáticas. Sendo assim, diante dos con-
ceitos de lazer apresentados nesta unidade, identifique os principais aspec-
tos que norteiam a definição dos autores estudados.

5) Explique as características constituintes do conceito de lazer, a partir do pen-


samento de Dumazedier (1979). Ao realizar essa tarefa, busque apresentar
exemplos práticos para cada um dos aspectos debatidos.

9. CONSIDERAÇÕES
Conforme pudemos observar, a recreação e o lazer percor-
reram trajetórias históricas diferentes, embora a ligação entre am-
bos os fenômenos seja estreita.
Esta unidade apresentou algumas considerações sobre o
lazer, a recreação e o trabalho em seus aspectos histórico-con-
ceituais, e teve como principal objetivo situar você no campo de
estudos sobre lazer/recreação, privilegiando o enfoque desse as-
sunto a partir de discussões relacionadas ao trabalho.
Não pretendemos esgotar o tema, mas tão-somente for-
necer elementos para que possamos iniciar um diálogo sobre essa
questão, cuja importância é, há muito tempo, reconhecida entre
os estudiosos e os profissionais engajados na área de lazer/rec-
reação.
Este debate é fundamental para um curso de graduação
em Educação Física, pois permite que você tenha contato com
questões básicas para essa área. Além disso, poderá fornecer sub-
sídios que poderão auxiliá-lo, independentemente do fato de você
estar ainda iniciando suas pesquisas sobre lazer/recreação, em seu
processo de formação profissional.
Esperamos que tenha um bom proveito nas próximas re-
flexões!
© U1 - Recreação e Lazer: Apontamentos Históricos e Conceituais no Campo da Educação Física 79

10. E-REFERÊNCIAS

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