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Arroba pontinho com

Ivan Lessa

Neste domingo, como era primavera em Londres, choveu, ventou e fez frio.

Por isso, fiquei em casa.

Vendo jogo de futebol na televisão, vendo documentário sobre arte na televisão, vendo
Arquivos Secretos na televisão.

Como puderam notar, eu tenho televisão em casa.

Televisão a cabo, vídeo, controle remoto, tudo que a tecnologia pertinente me dá


direito.

Não tenho — sou obrigado a confessá-lo, com uma certa vergonha —, não tenho
computador em casa. Ou micro. Ou PC.

Nem sei direito como chamá-lo, tão distante estou da tecnologia que, para mim, não
pode ser mais de ponta.

Mas tenho a intenção de me informatizar agora mesmo, em maio, e leio tudo que
posso sobre o assunto.

Na BBC, sei — mal e porcamente, feito se dizia — dar uma chegada aos jornais
brasileiros, entrar na parte do correio eletrônico, bater um papo com os amigos
distantes, todos eles muito, mas muito mais por dentro do que eu.

Na verdade, quem não tem arroba no título vai de pontinho com.

Nessa história de cibermilionários, conheço pelo menos duas pessoas que estão —
mais uma vez usarei gíria antiga — estão "numa boa".

Os dois vão montar, se é esse o verbo, um website.

Os dois já me convidaram a participar com minha modesta colaboração.

O dinheiro? Também não pode ser mais modesto. É a título especulativo.

Deve dar um dinheirão, dizem — mas primeiro a gente tem que investir e encontrar
patrocinador. Conheço esse problema.

Desde meus tempos de publicitário e jornalista, o problema era esse: o homem do


dinheiro, o anunciante, o patrocinador.

Agora, em Seattle, estão decidindo algo importantíssimo, garantem-me.


Algo a ver com monopólio, Bill Gates, Microsoft.

Até sexta-feira, deverá sair uma decisão.

Ficarei sabendo pela Net, numa de minhas internatações.

Ou não deverei ficar sabendo.

Pelo seguinte: um desses meus dois amigos, futuro milionário, precisava falar comigo
semana passada.

Recebi, aqui, em local de trabalho, um bilhete eletrônico pedindo para eu responder


nele mesmo dando o endereço de minha residência em Londres.

É que, na revista em que ele trabalha e dirige, os computadores pifaram e, em sua


casa, em seu bairro, não havia luz, não havia energia.

Ele queria falar comigo urgente sobre minha colaboração eletrônica.

Não é que eu seja pessimista, mas, cá entre nós, dá para se desconfiar?

Ivan Lessa fez parte do grupo que colaborou e que, durante muito tempo, fez
sucesso no jornal "O Pasquim". Carioca, filho de Orígines Lessa e Elsie Lessa, escreve
com sucesso, valendo-se de um humor cheio de ironias. Auto-asilado na Inglaterra,
segundo ele por ter-se desencantado com o Brasil, trabalha na BBC de Londres. O
texto acima foi extraído de sua página naquela empresa, publicado em 31-03-2000.

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