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CURRÍCULO, METODOLOGIA E DIDÁTICA NO CONTEXTO

DA INCLUSÃO

1
Sumário
NOSSA HISTÓRIA ...................................................................................................... 2
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 3
O CURRÍCULO: HISTÓRIA, CONCEITOS E SITUAÇÃO ATUAL .......................... 4
Currículo, poder e controle social ................................................................................ 18
Currículo prescrito X currículo real ............................................................................. 27
Futuros do currículo e currículos do futuro: currículo e construção de identidades....... 31
Perspectivas de inclusão no currículo .......................................................................... 39
AS NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS E A ESCOLA INCLUSIVA... 45
A inclusão e o processo histórico ................................................................................ 45
As necessidades educacionais especiais e a legislação referente à inclusão nas escolas
regulares ..................................................................................................................... 54
A escola inclusiva ....................................................................................................... 65
O outro lado da inclusão.............................................................................................. 69
De que inclusão se fala? Que inclusão se pratica? ....................................................... 73
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 75

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NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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INTRODUÇÃO

Esta apostila apresenta uma pesquisa realizada em uma escola de Belo


Horizonte com o objetivo de investigar de que forma o currículo escolar abarca
a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais não vinculadas
às deficiências. O estudo de caso foi a metodologia para a realização da
pesquisa. Empregou-se como coleta de dados a observação sistemática,
questionários com pais e alunos e entrevistas com professores e gestores.

O mais evidente é como a escola reflete a situação real do debate sobre


inclusão: imprecisão do próprio conceito e dificuldades de se identificar que tipo
de aluno demanda atendimento educativo diferenciado.

Os resultados mostram que um currículo inflexível e a falta de ação


escolar gerenciadora do atendimento de alunos que manifestam diferenças
também podem contribuir para a exclusão escolar, além de revelar que a
indisciplina é um fator relevante no impedimento de ações pedagógicas
efetivamente diferenciadas de alunos que têm um tempo diferenciado para a
aprendizagem. É necessária uma formação sobre o tema para os gestores,
professores, pais e toda a comunidade escolar.

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O CURRÍCULO: HISTÓRIA, CONCEITOS E SITUAÇÃO
ATUAL

“Insistir numa definição abrangente de currículo poder-se-á tornar


extemporâneo e negativo, dado que, apesar da recente emergência do
currículo como campo de estudos e como conhecimento especializado, ainda
não existe um acordo totalmente generalizado sobre o que verdadeiramente
significa.”

José Augusto Pacheco

O termo currículo vem do latim currere (correr). Existem ainda os


substantivos cursus (carreira, corrida) e curriculum, que, de maneira conotativa,
significam “carreira”. Dessa forma, surgem expressões como cursus forensis
(carreira do foro), cursus honorum (carreira das honras). O termo cursus, que
era mais comum, passou a ser usado a partir dos séculos XIV e XV no português,
francês e inglês. Mais tarde surge a expressão curriculum nessas línguas.

Segundo Hamilton (1992), apenas mais tarde surgiu a expressão


curriculum no contexto da escola. Ele apresenta comprovações de que o termo
apareceu em 16335 como ordenamento do que se ensina e se aprende na
escola.

O campo do currículo como estudo sistematizado dos saberes escolares


e da organização da escola se configuram na primeira metade do século XX.

Na primeira metade do século XX, pode-se citar como referência ao tema


o livro The curriculum, de Bobbitt, em 1918; a publicação do 26º Anuário da
National Society for the Study of Education; a conferência sobre teoria curricular
na Universidade de Chicago, em 1947, com o intuito de delimitar o campo
curricular e de abordar teoricamente o ensino; e a publicação, em 1949, do livro
‘Princípios Básicos de Currículo e Ensino’ (Basic Principles of curriculum and
instruction), escrito por Ralph Tyler. No entanto, foi o livro de Bobbitt que se
tornou um marco nos estudos do currículo como um campo especializado de

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estudos. A partir desse momento, buscou-se responder questões importantes
relativas ao currículo e à educação, como: quais os objetivos da educação? O
que se devia ensinar: habilidades como escrever, ler e contar ou habilidades
práticas para a profissionalização? Dever-se-ia dar prioridade ao saber
acadêmico ou em experiências subjetivas? As crianças deviam ser ajustadas ao
sistema social, tal como era, ou se devia prepará-las para transformar esse
sistema social?

O primeiro artigo de Ralph W. Tyler, apresentado em 1949, defendia para


a escola o “sistema de pagamento por produção” a ser aplicado para organizar
de forma eficiente o trabalho na escola, numa livre e franca associação com a
organização fabril taylorista. Assim, o modelo burocrático para o planejamento
do currículo surgiu de modo inusitado, os administradores de escolas tomaram
como modelo seus colegas de indústria e se orgulhavam do fato de adaptar o
vocabulário e as técnicas aí empregadas à administração escolar. (GOODSON,
1995).

Assim, foi John Franklin Bobbitt o homem que deu forma à área de
currículo visando à eficiência. Seu primeiro princípio na área da educação foi:
usar toda a área da escola durante todo o tempo disponível. O segundo princípio
foi reduzir o número de trabalhadores, obtendo de cada um o máximo de sua
eficiência. Já o terceiro princípio compreendia na eliminação de gastos
supérfluos e o quarto se referia ao treinamento das pessoas dentro da escola.
(GOODSON, 1995).

Educar o indivíduo segundo suas potencialidades, já que esse princípio


garantiria melhor rendimento ou maior produtividade do sistema escolar, e, por
conseguinte, maior produtividade na idade adulta, no trabalho certo, no lugar
certo, passou a ser a base para a diversificação do currículo e o elaborador de
currículos deveria ser primeiro um analista da natureza humana e dos negócios
humanos.

O planejamento do currículo baseava em encontrar o que as pessoas


deviam fazer e como fazer. Dessa forma, a criança em idade escolar se tornou
algo a ser moldado e manipulado de modo que se encaixasse em seu papel

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social determinado, para isso havia muitos tipos de currículos destinados a
diferentes grupos da população. Havia currículos diversos: clássico, científico,
geral, comercial, de estenografia, de secretariado, artes domésticas, agricultura,
impressão, eletricidade, mecânica, marcenaria, desenho, automobilismo e
carpintaria.

De acordo com Bobbitt, a educação tinha como finalidade a fase adulta e


não a idade infantil, o objetivo era preparar as pessoas para a idade produtiva e
não para os 20 anos de infância e juventude. Nesse contexto, Bobbitt propunha
que a escola funcionasse como uma empresa. Para ele, o sistema educacional
deveria especificar precisamente os objetivos e os métodos para alcançar, com
precisão, esses objetivos almejados. Esse modelo educacional estava altamente
ligado à economia e podia-se dizer que a palavra chave era “eficiência”. Para
Bobbitt, o currículo é todo o leque de experiências vividas na escola visando o
desdobramento das capacidades do indivíduo, e o modelo de organização e
administração escolar deveriam ser espelhados ao modelo industrial de
Frederick Taylor. Nessa perspectiva, o currículo era simplesmente uma
mecânica e deveria seguir padrões.

Um exemplo dado pelo próprio Bobbitt é esclarecedor. Numa oitava


série, ilustra ele, algumas crianças realizam adições “a um ritmo de 35
combinações por minuto”, enquanto outras, “ao lado, adicionam a um
ritmo médio de 105 combinações por minuto”. Para Bobbitt, o
estabelecimento de um padrão permitiria acabar com essa variação.
(SILVA, 2005, p. 24).

Esse modelo de currículo encontrou apoio mais tarde no livro de Tyler,


‘Princípios Básicos de Currículo e Ensino’ (1978). O autor centrava as questões
de currículo na organização e desenvolvimento do que deveria ser feito na
escola. O currículo também continuava sendo uma questão puramente técnica.
Para Tyler, o currículo se resumia em quatro critérios: 1- os objetivos que a
escola deveria atingir, 2- que experiências seriam feitas para que os objetivos
fossem atingidos, 3- como organizar essas experiências, de forma eficiente e 4-
como garantir que os objetivos estariam sendo alcançados. (TYLER, 1978).

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Nessa perspectiva, assim como na empresa havia a linha de produção, a
divisão do trabalho (intelectual, manual), o trabalhador que executava funções
sem tomar parte das decisões, o conhecimento em pedaços e segmentado; nas
escolas havia carteiras enfileiradas, a divisão do planejamento e da execução,
as notas como prêmio para a produtividade, a memorização, a cópia e o
especialista com o conhecimento disciplinar. A racionalização da atividade
industrial transferiu-se para a escola. Nesse modelo, dever-se-ia produzir o
homem certo para lugar certo e a palavra de ordem era “produzir” o máximo
possível. Até mesmo os espaços escolares deveriam ser aproveitados ao
máximo, pois na racionalidade fabril o erro era o desperdício. O currículo nasce
com o objetivo de preparar o homem para o trabalho e não para a formação da
autonomia; nesse sistema, o homem deveria sair da escola qualificado,
competente e eficiente; nada mais, o que explicitou um dos mais importantes
representantes do campo no início dos anos 50.

Este pequeno livro procura desenvolver uma base racional para


considerar, analisar e interpretar o currículo e o programa de ensino de uma
instituição educacional.” (TYLER, 1978, p. 1). Escreveu o autor ao apresentar
sua obra, que permaneceu décadas como referência. Além dessa racionalidade
para abordar a educação, Tyler também desconsidera questões culturais e
sociais:

A partir da década de 60 o currículo toma nova forma, a busca pelos


objetivos educacionais vai perdendo lugar para questionamentos que colocavam
em xeque o pensamento e a estrutura educacional até então.

Como já é sabido, a década de 60 foi marcada por grandes


transformações e mudanças, podem-se citar os protestos contra a guerra do
Vietnã, os protestos estudantis, o movimento feminista, a liberação sexual, no
Brasil as lutas contra a ditadura militar. E assim como em outros setores, o
currículo começa e passar por mudanças, inaugurando-se numa fase de
questionamento do que a escola de fato realizava, ligando-se, portanto, aos
problemas sociais e questões culturais.

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Na Inglaterra, o período dos anos 60 e 70 também foi marcado por
importantes mudanças sociais e culturais, bem como por grandes
transformações no interior da escola. Iniciou-se, então, um debate sobre a
natureza dos conteúdos cognitivos e culturais suscetíveis de serem incorporados
aos programas escolares e sobre a diferenciação possível desses conteúdos em
função das diferentes categorias de público a qual o ensino se dirige. (FORQUIN,
1993).

No final dos anos sessenta e início de setenta, alguns problemas no


âmbito da educação também vieram à tona nos Estados Unidos da América: o
fracasso da educação de filhos de negros e imigrantes, questões sobre a
organização social e transmissão do conhecimento e as relações de poder
envolvidas nesse processo. Consequentemente, o campo da Sociologia da
Educação alargou-se ultrapassando o foco da análise de estatísticas escolares
e teorização funcionalista sobre as possibilidades de que a educação planejada
e orientada poderia alterar situações sociais, assim se acabou por identificar com
a sociologia crítica da escola e com o conhecimento escolar.

Nem toda a Sociologia da Educação se limitava aos estudos de


desigualdade entre grupos sociais, mas não deixava de ser verdade que a
desigualdade de acesso à educação, seus mecanismos geradores e seus efeitos
sobre os processos de estratificação social, a partir da década de sessenta,
ocupava um lugar de destaque na Sociologia da Educação. (FORQUIN, 1995)
“A Sociologia da Educação assumiu assim, uma função desmistificadora,
problematizando categorias como currículo, conhecimento, inteligência,
habilidade, ensino, metodologia e avaliação.” (MOREIRA, 1990, p.75).

A questão da seleção dos conteúdos de ensino e de sua incorporação


nos programas institucionalizados permaneceu por muito tempo um ponto cego
para a Sociologia da Educação. Foram através de amplas enquetes sobre os
fluxos de escolarização e das relações entre estes fluxos e certas características
estruturais da sociedade que a Sociologia da Educação conquistou, a partir dos
anos 60, sua “carta de nobreza” científica e, pela realização de uma descrição
metódica dos conhecimentos escolares e das salas de aula, que essa ciência

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encontrou caminhos privilegiados para o seu desenvolvimento, renovação e
colaboração à educação. (FORQUIN, 1993).

Foi nesse contexto dos estudos sociológicos de situações e processos


inerentes à vida escolar que surgiram, no campo da Sociologia da Educação,
alguns estudos e contribuições que acabam por modelar uma “sociologia do
currículo”. Sociologia essa, que passa a se dedicar ao conhecimento escolar,
mostrando que esse por sua vez, não é neutro, pois ele carrega consigo relações
de poder. E sobre essas relações de poder dentro das instituições de ensino,
desenvolve-se nos anos 70, na Inglaterra, a NSE (Nova Sociologia da
Educação), uma nova reflexão sociológica.

A Nova Sociologia da Educação (NSE), iniciada por Michael Young, na


Inglaterra, nos primeiros anos da década de setenta, constitui-se na
primeira corrente sociológica voltada para a discussão do currículo. O
grande marco de seu surgimento foi a obra Knowledge and control:
new directions for the Sociology of Education, editada por Young
(1971), na qual encontramos alguns artigos hoje considerados
clássicos. (MOREIRA, 1990, p.72).

A NSE foi associada tanto à crítica do currículo acadêmico como forma


de dominação quanto ao apoio das formas não-hierárquicas de pedagogia, ao
aprendizado centrado no estudante, em vez de centrado nas matérias, e à
derrubada das barreiras entre o saber escolar e o não-escolar. (YOUNG, 2000).

O cerne da NSE é a análise dos processos de seleção e organização dos


conhecimentos veiculados pela escola. As hipóteses que norteiam o trabalho se
voltam para a investigação da relação entre poder, ideologia, controle social e a
forma como os conhecimentos são selecionados, organizados e tratados pela
escola. A NSE tem como pressuposto que os conteúdos escolares, expressos
nos livros didáticos, guias curriculares ou outros materiais pedagógicos e na
prática escolar contribuem para a manutenção das desigualdades sociais. Dessa
forma, a NSE definiu-se como uma forma de investigação crítica, mais
concentrada nos processos do que em resultados e estatísticas escolares.

Foi o livro Knowledge and control: new directions for the Sociology of
Education, publicado por Michael Young, em 1971, que marcou o início de uma

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nova abordagem sociológica, a “Nova Sociologia da Educação” (NSE). Michael
Young fica reconhecido como o líder desse “movimento”, que reunia também
outros autores, ligados à Universidade de Londres e que, mesmo fora da
Inglaterra, tiveram artigos publicados no livro; como Pierre Bourdieu, que
enfatizava a legitimação de culturas dominantes pela escola. Outro
representante inglês da NSE é Basil Bernstein, que defendia a idéia de que o
currículo é um dos mecanismos que viabilizam a realização do controle social
dos comportamentos individuais.

A grande diferença entre a NSE e as tendências até então dominantes


era que a Sociologia da Educação se concentrava nos resultados de testes
escolares, sucesso ou fracasso escolar, classe social, renda e situação familiar,
deixando de problematizar o que ocorria dentro desses processos, como se o
dado obtido fosse imutável. Já a NSE se preocupou em questionar a natureza
do conhecimento escolar, o papel do currículo na produção das desigualdades
e o processamento das pessoas e não apenas do conhecimento. “Enquanto a
tradição anterior enfatizava relações macroestruturais, a NSE focalizou
contextos interacionais e seus conteúdos, discutindo o que era transmitido nas
escolas e examinando a base social do conhecimento escolar”. (MOREIRA,
1990, p.75).

Uma das maiores contribuições da NSE foi fazer do processo de seleção


e exclusão dos conhecimentos escolares o tópico central da discussão da
Sociologia da Educação. A ideia de que os processos de seleção e de
organização dos saberes incluíam relações de poder presentes na sociedade foi
um marco diferencial.

Assim, a NSE tinha como questões básicas de pesquisa a desigualdade


educacional, a prioridade dada ao currículo como tópico da Sociologia da
Educação e a ênfase dada aos professores e aos educadores de professores
como agentes de mudança progressista. Ela se concentrou no currículo escolar
na busca de uma explicação para o fracasso escolar da classe operária. Via-se
que os aspectos seletivos do currículo eram fatores determinantes de uma
distribuição desigual da educação e, também, devido às disciplinas hierárquicas

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e a desvalorização do saber não escolar, a NSE entendia o currículo como
instrumento de poder para a exclusão da classe social. (YOUNG, 2000).

Young criticou, na introdução do livro Knowledge and control, a tendência


de aceitar como definitivo as categorias curriculares e os índices de fracasso
escolar. O desafio da NSE era então colocar essas questões “em jogo”,
desnaturalizá-las e mostrar seu caráter social e histórico. Para a NSE, segundo
Young, o importante não é saber qual conhecimento é mais importante que o
outro, mas como essa seleção era feita.

A NSE, no breve programa traçado por Young na introdução do livro


Knowledge and control, deveria começar por ver o conhecimento
escolar e o currículo existentes como invenções sociais, como o
resultado de um processo envolvendo conflitos e disputas em torno de
quais conhecimentos deviam fazer parte do currículo, [...] e quais os
valores e os interesses sociais envolvidos nesse processo seletivo.
(SILVA, 2005, p.67).

De forma geral, a NSE buscou investigar as ligações entre a seleção,


organização e distribuição dos saberes escolares e a distribuição dos recursos
econômicos, focando as relações de poder envolvidas nesse processo.

De acordo com Young, o ideal para uma escola democrática seria um


currículo menos estratificado, não-hierárquico, com maior interação entre aluno
e professor e uma avaliação mais justa. Para ele, o currículo hierarquizado é
decorrente da divisão do trabalho, dessa forma, um currículo que valorizasse as
mais diversas culturas e conhecimentos incluiria a diversidade de alunos
acolhidos pelas escolas e, a partir dessa mudança de paradigma, outras
mudanças mais significativas poderiam ser vistas na sociedade como um todo.
Young sugere que se abandone a dicotomização acadêmico X vocacional,
propondo novas mudanças e novos currículos, mais centrados na cultura do
aluno, organizado a partir de experiências; contudo reconhece a importância das
disciplinas para a sistematização da aprendizagem. Para ele, não basta
aumentar o acesso à educação, é preciso avaliar que tipo de educação se deve
dar mais acesso. (MOREIRA, 1990).

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A partir de 1976, Young inicia um novo estágio de pensamento e modifica
a imagem que tem do professor como transformador da sociedade. Ele passa
então a sugerir que os professores progressistas, juntamente com outros setores
da sociedade, e não mais sozinhos, lutem para a construção de uma ordem
social mais justa. Nesse novo estágio, Young reconhece que o saber acadêmico
contraria interesses das camadas populares. Depois passou a ver que currículo
acadêmico nem sempre oferece esse papel. Dessa forma, supera-se o caráter
pessimista das teorias da reprodução, como também da crença demais otimista
no poder da educação, enfatizadas no início da NSE.

A relação educação-sociedade é, então, reexaminada pelos dois


autores (Young e Whitty), que rejeitam, nesse momento, tanto a visão
de que a educação determina a sociedade, como a visão de que a
sociedade determina a educação. (MOREIRA, 1990, p.79).

No entanto, Young também recebeu críticas em seu trabalho. O fato de


ele não oferecer uma discussão mais profunda sobre a sociedade, que é lugar
onde a escola se situa; o fato de ignorar a questão do trabalho e do processo de
produção e ignorar o papel do Estado na participação da seleção dos saberes é
questionado. Há bastantes evidências sobre os seus ideais de currículo, mas
faltam indicações mais precisas em sua obra sobre que tipo de sociedade e
programa político ele quer desenvolver. (MOREIRA,1990).

Com isso, a NSE teve uma vida breve, por um lado, por suas limitações
teóricas e, por outro, devido às mudanças nas circunstâncias políticas e
econômicas mais amplas.

O prestígio e a influência da NSE, que tinham sido excepcionalmente


grandes até o início da década de oitenta, diminuiu bastante a partir
daí. Por um lado, o programa mais “forte” de uma “pura” sociologia do
currículo cedeu lugar a perspectivas mais ecléticas que misturavam
análises sociológicas com teorizações mais propriamente
pedagógicas. Por outro, a teorização crítica da educação que nesse
momento se concentrava em torno da NSE iria se dissolver numa
variedade de perspectivas analíticas e teóricas: feminismo; estudos
sobre gênero, raça e etnia; estudos culturais; pós-modernismo; pós-
estruturalismo. Além disso, o contexto social de reforma educacional e
de democratização da educação que tinha constituído a inspiração da
NSE transformava-se radicalmente, com o triunfo das políticas
neoliberais de Ronald Reagan, nos Estados Unidos, e de Margareth
Thatcher, na Inglaterra. (SILVA, 2005, p.70).

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Assim, a NSE “fez uma carreira curta enquanto corrente de pensamento
autônoma” (FORQUIN, 1995, p.190), em grande parte, devido às diversas
referências teóricas e, em parte incompatíveis, levando assim, a um relativismo
muito intenso, o que desvalorizou a teoria. No entanto, ela permanece hoje tão
importante, como há 26 anos, já que ainda se debate e pesquisa as relações de
poder na seleção e distribuição dos conteúdos e saberes escolares. Ainda é
atual e necessária a tendência de “levantar alguns problemas fundamentais que
foram âmago da questão do que é a educação.” (YOUNG, 2000, p. 72). Com a
contribuição da NSE

os currículos hoje não são mais vistos como mecanicamente definidos


pelos que detêm o poder; apesar de incorporarem valores e interesses
dominantes, representam os resultados de lutas específicas por
autoridade cultural, por liderança intelectual e moral da sociedade.
(MOREIRA, 1990, p. 81).

A NSE fornece uma interessante contribuição para o entendimento do


passado, do presente (e por que não do futuro?) da educação contemporânea.
Ela pode esclarecer vários aspectos da realidade, sobretudo aos planejadores
dos currículos e oferecer mais condições de reflexão nos momentos de seleção
de conteúdos e desejos de uma educação mais justa e solidária.

Como pôde ser visto, A NSE foi realmente um divisor entre uma visão
mais ingênua e tradicional do currículo e uma visão mais crítica. A partir daí,
surgem conceitos diferenciados de currículo, porém conceitos que se interagem,
se penetram e se completam.

Para a visão técnica de Bobbitt e Tyler, o currículo significa o conjunto de


todas as experiências planificadas na escola, relacionando-se a aprendizagem
a planos de instrução que predeterminam os resultados. Já para uma visão mais
crítica, o currículo pode ser definido como um projeto que resulta não só do plano
das intenções, bem como o plano da sua realização no centro de uma
organização específica. (PACHECO, 2005).

Para Nóvoa, “ele deve ser visto como parte dos jogos de interesses que
definem o trabalho acadêmico e os processos de legitimação das diversas
correntes científicas” (NÓVOA, 1999, p. 14). Nessa mesma perspectiva, Costa

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(2001) define o currículo como lugar de representação simbólica, transgressão,
jogo de poder multicultural, lugar de escolhas, inclusões e exclusões, produto de
uma ‘lógica clandestina’, que nem sempre é a expressão da vontade de um
sujeito, mas imposição do próprio ato discursivo.

Carvalho (MARIA, 2005), em dissertação de mestrado pela PUC-MG, com


bases nas ideias de Forquin (1993) declara que um currículo é a significação
particular de uma escola visando estabelecer contatos diretos com a cultura,
promovendo possibilidades de acesso de seus alunos ao conhecimento.
Carvalho ainda reforça esse conceito assumido por ela, demonstrando como
outros autores também o entenderam:

 Currículo é um campo de trabalho, que tem todo um conjunto de


práticas sociais; é um espaço onde se definem coisas, onde vão ocorrendo
ações, ou seja, onde vai acontecendo o próprio currículo. (ELIZABETH
MACEDO apud CARVALHO, 2005, p.107).
 Currículo é um ambiente simbólico, material e humano que é
constantemente reconstruído. Este processo de planejamento envolve não
apenas o técnico, mas o estético, o ético e o político. (MICHAEL APLLE apud
CARVALHO, 2005, p.107)
 Currículo é entendido e trabalhado como o conjunto de
aprendizagens vivenciadas pelos alunos, planejadas ou não pela escola, dentro
ou fora da aula e da escola, masob a responsabilidade desta, ao longo de sua
trajetória escolar. (CORINTA GERALDI apud CARVALHO, 2005, p.107).
 O currículo é fruto de uma seleção da cultura e é um campo
conflituoso de construção de cultura, de embate entre sujeitos, concepções de
conhecimento, formas de entender e construir o mundo. (ALICE CASIMIRO
LOPES apud CARVALHO, 2005, p.107).

De acordo com o afirmado no texto dos PCN, em 1997, até dezembro de


1996 o ensino esteve legalmente estruturado nos termos previstos pela Lei
Federal n. 5.692, de 11 de agosto de 1971 e um dos objetivos do currículo até
então era:

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(...) proporcionar aos educandos a formação necessária ao
desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-
realização, preparação para o trabalho e para o exercício consciente
da cidadania. (PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS, 1997,
p. 14).

Semelhante orientação, de âmbito nacional, é oferecida pelos Parâmetros


Curriculares Nacionais (PCN), que, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional nº 9394/96, determina a construção dos currículos, no
Ensino Fundamental e Médio, tendo como o seu atual objetivo “(...) assegurar
a todos a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e
fornecer-lhes meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores.”
(PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS, 1997, p. 15). Trazendo ainda
em seu complemento:

(...) o currículo, tanto para o ensino fundamental quanto para o ensino


médio, deve obrigatoriamente propiciar oportunidades para o estudo
da língua portuguesa, da matemática, do mundo físico e natural e da
realidade social e política, enfatizandose o conhecimento do Brasil.
Também são áreas obrigatórias o ensino da Arte e da Educação Física
(...) O ensino de pelo menos uma língua estrangeira moderna passa a
se constituir um componente curricular obrigatório (...) Quanto ao
ensino religioso, (...) é de matrícula facultativa, respeitadas as
preferências manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis.
(PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS, 1997, p. 16).

Como uma novidade até então, os PCN indicaram a necessidade do


tratamento das questões sociais na escola, porém sem restringi-las em uma
única área. Dessa forma “as problemáticas sociais são integradas na proposta
educacional dos Parâmetros Curriculares Nacionais como Temas Transversais.”
(PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS, 1997, p. 64).
A transversalidade pressupõe um tratamento integrado das áreas e um
compromisso das relações interpessoais e sociais escolares com as questões
que estão envolvidas nos temas, a fim de que haja uma coerência entre os
valores experimentados na vivência que a escola propicia aos alunos e o contato
intelectual com tais valores. (PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS,
1997, p. 64).
Vê-se que é um avanço a construção dos PCN, levando em conta a
abertura do tema e a flexibilidade apresentada, uma vez que são levadas em
consideração: adaptações da Secretaria ou da escola,a proposta da
estruturação escolar por ciclos, tornando possível a distribuição de conteúdos de

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forma mais adequada à natureza do processo de aprendizagem; a valorização
das diversas culturas regionais e religiosas, reconhecendo a diversidade cultural
brasileira.
Contudo, Macedo (1998) faz críticas aos PCN e aos seus Temas
Transversais. Ela expõe vários questionamentos em relação à reafirmação que
o documento faz às disciplinas clássicas deixando lacunas sobre esses temas.
Também questiona o limite das disciplinas clássicas e tradicionais a ponto de ter
que ser criado Temas Transversais, ou seja, as disciplinas tradicionais não se
mostram suficientes para abordar todas as áreas do conhecimento. Questiona
ainda a forma de apresentação dos Temas Transversais pelo documento,
quando ele não explica de forma clara como eles serão trabalhados, já que
devem ser integrados e perpassados em todas as disciplinas; critica a base dos
PCN, assentada em autores conteudistas e, por fim, questiona o lugar de
importância das disciplinas e dos Temas Transversais, uma vez que os temas
importantes da vida em sociedade são tratados fora das disciplinas clássicas.

Para entender essa proposta do MEC, julgamos ser fundamental


problematizar algumas questões: a idéia de currículo disciplinar, sua
suposta incapacidade de dar conta da realidade pluridimensional, a
necessidade de criação de mecanismos integradores das diferentes
disciplinas ou a própria superação desse tipo de estruturação
curricular. (MACEDO, 2002, p.45).

Qualquer tentativa de definir e precisar o currículo converte-se numa


tarefa árdua e conflituosa. Porém, pode-se concluir que, se de um lado abordam-
se participação social, política e construção de conteúdos e, por outro lado,
abordam-se cultura, valores e identidades; um currículo é uma construção
histórica social e com isso depende de inúmeros interesses e condições.
Se o currículo não é somente um plano, mas um todo organizado em
função de propósitos educativos e de saberes, atitudes, crenças e valores
(PACHECO, 2005), ou se é a expressão da função socializadora da escola
(GIMENO SACRISTÁN, 1998), não há como decidir, pois ele depende do
contexto em que se situa e das pessoas que nele intervêm e, além das intenções
existem os interesses e as forças que se movem à sua volta.
Apesar da polissemia do termo e dos vários sentidos e significados que o
currículo pode ter no sistema escolar, o currículo é um instrumento de formação
e, assim como uma moeda, tem duas faces; uma das intenções e das relações

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de poder, e a outra da naturalidade das coisas, como um resultado acrítico das
ações cotidianas.
Portanto, o caminho percorrido até aqui direciona a uma atitude em que a
prioridade sobre o tema deixa de ser a definição do currículo e passa a ser a
compreensão das suas intenções. Dessa forma, algumas questões vêm à tona:
o que se deve ensinar? Quem deve controlar a seleção e distribuição do
conhecimento? O que deve ser considerado como conhecimento? Como medir
a importância de um conhecimento em detrimento de outro? Como o controle do
conhecimento é ligado ao poder de uns e não de outros? Como se pode colocar
o conhecimento curricular ao alcance dos alunos?
A prioridade é no momento, não o consenso do significado de currículo,
mas como e por quem ele é organizado. É possível considerar como currículo
os programas escolares, os planos de curso, as disciplinas, seus conteúdos;
tudo o que é supostamente aprendido e ensinado, como valores, atitudes,
relações interpessoais, mesmo que de maneira inconsciente. E é justamente a
falta da consciência com que muitos ensinamentos são transmitidos que reforça
a análise do currículo. A transmissão de qualquer saber pode ser inconsciente,
mas sempre intencional, pois as intenções são muitas vezes inerentes às
pessoas, já que cada um leva consigo uma bagagem adquirida ao longo da vida,
referente às aprendizagens formais e informais. Nessa bagagem, estão
presentes os valores, os costumes, a cultura e as crenças de cada um. Nesse
sentido, não há ação sem intenção, e consequentemente, não há currículo
ingênuo.

17
Currículo, poder e controle social

A história do currículo está diretamente ligada ao controle social. Sabe-se


que o currículo não é algo neutro e sem intenções, mas um instrumento de
controle da sociedade e confirmação das hierarquias sociais. A escola, portanto,
é um desses lugares de ensino de valores culturais e econômicos
compartilhados por todos para garantir um controle e uniformidade de classes.
“As escolas não foram necessariamente construídas para ampliar ou preservar
o capital cultural de classes ou comunidades que não fossem as dos segmentos
mais poderosos da população”. (APPLE, 2002, p. 101).

O currículo, portanto, revela as relações de poder e escolhas, pois ao se


fazer uma seleção do que deve ser ensinado e transmitido, exercita-se o poder,
conteúdos, valores e crenças são escolhidos em detrimento de outros. Ao fazer
a escolha, inclusões e exclusões são feitas objetivando muitas vezes um controle
social. O que deve ser ensinado? Para quem e para quê? Com qual objetivo um
conteúdo ou valor é transmitido no lugar de outro? Enquanto o currículo é
instrumento de seleção cultural, ele exercita controle social. (FORQUIN, 1993).

O conhecimento que chegava às escolas desde o século XIX e que chega


até mesmo hoje não é aleatório, mas sim escolhido conforme uma série de
fatores e princípios visando ao comportamento das pessoas, comportamento
esse desigual, correspondendo às condições desiguais de grupos sociais,
produzidas estruturalmente. Determinadas estruturas econômicas e políticas

18
educacionais contribuem para essa prática da desigualdade em que o
conhecimento adquirido na escola não seja ameaçador para o domínio de
poucos.

Essa forma de controle é transmitida tanto pelas disciplinas e conteúdos,


como por comportamentos do dia-a-dia, valores, regras e ações rotineiras. As
escolas não apenas controlam as pessoas, elas também ajudam a controlar o
significado. Pelo fato de preservarem e distribuírem o que se percebem como
“conhecimento legítimo” – o conhecimento que “todos devemos ter” (APPLE,
2002, p. 103) -, as escolas conferem legitimidade cultural ao conhecimento de
determinados grupos. “Uma disciplina é tanto um campo de estudo quanto um
sistema de controle; aqui controle refere-se tanto ao controle sobre os saberes
quanto ao controle sobre os próprios corpos, em sua mais concreta
materialidade” (VEIGA-NETO, 2001, p. 236).

A história da educação na sociedade norte americana exemplifica como


o objetivo de controlar os saberes da sociedade foi reafirmado. A partir do
momento em que houve um aumento da população e consequentemente o
aumento de problemas sociais, além do aumento de imigrantes nos Estados
Unidos; na segunda metade do século XIX, a escola foi vista como a solução
desses problemas, pois através dela, poderia ser conquistada uma uniformidade
de mentes e comportamentos e, consequentemente, a continuidade do controle
e homogeneidade de condutas sociais consideradas adequadas à mentalidade
e ao padrão de vida social almejados.

No início do século XX, os imigrantes eram realmente uma ameaça aos


valores da sociedade, pois eles poderiam impor um novo funcionamento social,
já que tinham tradições políticas culturais e religiosas diferentes. Para lidar com
essa nova ameaça, os intelectuais uniram-se a um movimento crescente que
fazia restrições à imigração. Contudo, para ter efeito à imigração já concretizada,
perceberam a importância da influência da escola como protagonista no controle
social, através de inculcação de padrões de comportamento, ideias e ideais.
Dessa forma, o currículo poderia restabelecer o que estava sendo perdido.
(APPLE, 2002).

19
De acordo com Apple (2002), Finney (1922), um dos primeiros sociólogos
da educação nos Estados Unidos da América, insistia que a classe média era a
mais afetada. Era afetada pela classe mais abastada, de capitalistas industriais
e pela classe baixa, já que havia, com a imigração, muita mão-de-obra barata.
Para fazer com que o problema se resolvesse era necessário uma conduta
harmônica e homogênea entre a população. Assim, a escola é posta como
protagonista nesta tarefa: fazer com que as pessoas pensem da mesma forma,
tenham os mesmos valores e não se tornem problemas ou ameaças futuras na
desterritorização do poder. O currículo escolar poderia criar um consenso de
valores que representasse a meta de suas políticas econômicas e sociais. Uma
dessas respostas para a época seria o ensino médio universal.

A característica principal do currículo para o período é que os indivíduos


deveriam ser preparados conforme sua inteligência e capacidade para exercer
funções sociais na vida adulta. Os teóricos do currículo acreditavam que deveria
existir uma educação para a liderança e outra para os que eram chamados de
“acompanhamento”, ou seja, tinham uma inteligência menor. Dessa forma, os
que detinham maior inteligência deviam ser educados para liderar a nação e os
outros para aceitar crenças e ordens, concordando ou não com elas. “Como
Finney (1928) dizia: em vez de tentarem ensinar simplórios a pensar por si
mesmos, os lideres intelectuais devem pensar por eles, repetir os resultados pela
memorização em suas sinapses”. (FINNEY apud APPLE, 2002, p. 115).

Embora falassem em diferenciar o currículo por capacidade de


inteligência, tanto Bobbitt (1971) quanto Snedden (1922), dois importantes
teóricos do currículo nessa fase, sugeriram que a diferenciação poderia ser
também por classe social e de etnia. Dessa forma, o homem inteligente
certamente seria encontrado na classe social mais favorecida. Assim
“controlando-se e diferenciando-se os currículos escolares, as pessoas e as
classes também poderiam ser controladas e diferenciadas.” (APPLE, 2002, p.
116).

Na primeira metade do século XX, a área de currículo dedicou-se ao


planejamento de programas de ensino. Predominava a busca ao método
eficiente de elaboração do currículo e uma falta de reflexão sobre a maneira de

20
perceber a escola, não se questionava quais saberes e a origem dos saberes
que seriam transmitidos nas escolas e o que isso significaria para a sociedade.

Como foi tratado no tópico anterior, a tendência de planejar a escola para


torná-la produtiva, respondia também a essa outra dimensão. O tipo de escola e
o que se ensinava nela, para conseguir eficiência, deveria ser adequada à
pessoa: seu suposto potencial cognitivo e sua classe social.

O terceiro quartel do século XX consolidou, em alguns setores de


educação essa tendência, reforçando formas de conseguir eficiência de sistema
escolar, mas produziu também vertentes críticas à escola, como as Teorias de
Reprodução e a crítica ao currículo dentro da Nova Sociologia da Educação. A
partir dos anos 80, desenvolve-se e consolida a tendência que ainda predomina
o desvendamento do que ocorre na escola.

Hoje, um dos problemas a serem enfrentados é compreender a forma


como os conhecimentos e tradições dominantes reforçam a desigualdade e
reproduzem os sistemas de dominação. É preciso saber que a escola não é
somente uma ferramenta para a reprodução. Primeiro porque os alunos não são
passivos a tal ponto em que tudo o que escutam e aprendem se torne verdade
absoluta. Segundo, porque há contradições dentro da própria escola, quando,
por exemplo, ela deve formar cidadãos críticos, mas esses mesmos cidadãos,
quando críticos podem desafiar questões sociais. (APPLE, 2002).

Outro fator importante é conscientizar-se de que instituições como a


escola, mesmo com sua grande dependência estrutural da ordem política e
econômica instalada na sociedade, têm um grau relativo de autonomia. As
escolas exercem funções vitais de reprodução, porém essas funções não são
impostas, elas acontecem como um “pano de fundo”. O que Apple questiona é:
como, concretamente, este conhecimento oficial representa os interesses
dominantes e como a escola os representa levando a acreditar que são verdades
incontestáveis?

De acordo com Apple (1989) as escolas certamente reafirmam valores e


conhecimentos ideológicos, a escola, além de ser um lugar de reprodução, é um
lugar de produção do conhecimento. Ela produz um conhecimento necessário

21
para expandir mercados, controlar o trabalho e a pessoas. Esse saber é utilizado
para servir aos interesses das classes dominantes da sociedade. Como ele
mesmo afirma, “embora tudo isso pareça demasiado abstrato, as suas raízes
estavam e estão em algo muito mais concreto.” (APPLE, 1989, p. 38).

A reprodução é obtida pela aceitação das ideologias hegemônicas como


pelas resistências. As resistências podem ser entendidas como processos de
contestações contraditórios, em que, por vezes, ao se opor a uma cultura
dominante, cria-se outra cultura, que pode ser vista como inferior e assim,
reafirmar a ideologia dominante. A ideologia não é algo livremente transversal,
ela é antes de tudo, vinculada ao Estado. Este mesmo Estado é local de conflito
entre classes, gênero e raça, por isso ele tenta “forçar” as pessoas a pensar de
forma semelhante. Relacionado a isso, estão os interesses econômicos, a
educação (o que é ensinado nas escolas), entre outros. Este pensar hegemônico
tem como um dos objetivos a diminuição dos conflitos, mas, no discurso, ele é
visto como um dos responsáveis por agir em favor do interesse de todos.

Nessa perspectiva, a ideologia serve os interesses das classes


dominantes. É nesse sentido que Althusser (1970) afirma que as instituições
(família, igreja, escola) são aparelhos ideológicos e repressivos do Estado.

Na perspectiva de Althusser, a função social da ideologia consiste em


garantir as ligações que relacionam os indivíduos com as suas tarefas. A
ideologia pode ser pensada como sendo um programa, porém vai mais além.
Ela significa que existe sempre uma dimensão ideológica em todas as ações
sociais. Pode-se entender por ideologia as formas de existência social e de
exercícios das lutas sociais no domínio dos processos sociais de produção de
significados, assim como meio para designar as relações de poder ou as práticas
que socialmente contribuem para a formação de crenças e rituais, isto é, um
sistema de representações coletivamente compartilhado.

Com efeito, para que sejam favorecidos os mais favorecidos e


desfavorecidos os mais desfavorecidos, é necessário e suficiente que
a escola ignore, no âmbito dos conteúdos do ensino que transmite, dos
métodos e técnicas de transmissão e dos critérios de avaliação, as
desigualdades culturais entre as crianças das diferentes classes
sociais. (BOURDIEU, 1998, p.53).

22
Nesse sentido de entendimento da escola, o currículo é um projeto
cultural, social e político. Ele está construído em bases ideológicas, mergulhado
no sistema de ideias, valores, atitudes e crenças compartilhadas por um grupo
de pessoas com um peso significativo em sua criação e elaboração.

Assim o currículo deve ser entendido “como um instrumento de poder que


diferencia e legitima socialmente através de estruturação do conhecimento
escolar por disciplinas.” (PACHECO, 2005, p.59-60). E ainda, nenhum currículo
é elaborado no vazio, nem tão pouco se organiza de forma arbitrária, tudo é
pensado e programado visando a um determinado objetivo dentro de uma lógica
e de uma cultura. Assim o currículo pode ser entendido como “a seleção cultural
estruturada sob condições psicopedagógicas dessa cultura que se oferece como
projeto para a instituição escolar.” ( GIMENO SACRISTÁN, 1998, p. 42).

Estudos no campo da Sociologia da Educação mostram que a educação


faz seleções no interior da cultura e reelabora conteúdos e saberes com o intuito
de torná-los transmissíveis à ‘clientela escolar’. Contudo, no interior dessa
cultura, a escola acaba por trabalhar com uma parcela pequena de experiências
humanas previamente determinadas. Com isso, os conhecimentos, valores,
experiências, atitudes e conteúdos passam a constituir uma versão autorizada,
legitimada, verdadeira e única da cultura.

Isso significa que a cultura de diversos grupos sociais fica


marginalizada do processo de escolarização e, mais do que isso, é
vista como algo a ser eliminado pela escola, devendo ser substituída
pela cultura hegemônica, que está presente em todas as esferas do
sistema de ensino. De fato, a escola assumiu historicamente o papel
de homogeneização e assimilação cultural. (MOREIRA, 2006, p.36).

Segundo Lopes (1997), os pesquisadores do currículo parecem estar de


acordo em relação ao fato de a cultura ser o conteúdo primordial do processo
educativo e de que o currículo é o instrumento de perpetuação dessa cultura.
Dessa forma, através do currículo, como parte do processo educacional, a

23
cultura é mantida. O que importa, no entanto, é qual conceito de cultura e qual
cultura vem sendo perpetuada a partir de então.

Em uma visão tradicional de currículo, a cultura de uma sociedade é


homogênea, universal e única. Nessa perspectiva, não há do que se
problematizar, nem visualizar conflitos no processo educacional. Já numa visão
crítica de currículo, ele é percebido como um terreno conflituoso e de criação
simbólica, em que os conhecimentos são construídos e desconstruídos a todo o
momento. Portanto, nessa perspectiva, o currículo, segundo Forquin (1993),
pode ser definido como um conjunto de saberes, crenças e valores no interior de
uma determinada cultura. Assim, a educação e o currículo são agentes ativos de
construção de sentidos, de saberes e acima de tudo, de sujeitos; já que os
sujeitos, no processo educativo são formados, e para essa formação, eles são
mergulhados em determinados valores culturais de uma dada sociedade.

A teoria crítica de currículo leva a pensar em novas questões como, por


exemplo, que os conhecimentos e a cultura são considerados importantes, a
ponto de serem escolhidos em detrimento de outros. Com isso, a teoria crítica
faz do campo curricular um terreno de embates e cria novos problemas a serem
examinados.

Em uma sociedade como a que vivemos, dividida em classes e em


dicotomias, percebe-se diferentes culturas existentes como: cultura erudita e
cultura popular. Nessa realidade, a cultura erudita é tida como a cultura
dominante e superior à cultura popular, já que a cultura popular é vista como
uma cultura operária e a cultura erudita como uma cultura burguesa. “É uma
cultura aristocrática e, sobretudo, uma relação aristocrática com essa cultura,
que o sistema de ensino transmite e exige.” (BOURDIEU, 1998, p.55). “...o
sistema escolar é levado a dar sua sanção às desigualdades iniciais diante da
cultura.” ( BOURDIEU, 1998, p.53).

A cultura erudita é retratada como uma cultura que tem mais valor,
reafirmando a ideia de que as elites possuem o que há de melhor em uma
sociedade e a cultura popular, corresponde a uma cultura produzida pelo povo,
cotidianamente.

24
No entanto, é importante ressaltar que uma cultura de classe dominante,
ou seja, a cultura burguesa não é sempre opressora e nem a cultura popular é
sempre libertadora. Há cultura popular, do senso comum, que muitas vezes
oprime e cria preconceitos, como é o caso de se achar que o índio é preguiçoso.
Com isso, é possível perceber que há momentos em que determinada cultura
liberta e oprime, seja ela erudita ou popular. Portanto, nem sempre a cultura
burguesa será a dominante e nem sempre a cultura operária será a dominada.

O que se precisa debater então, não é qual cultura é dominante ou


dominada, já que esses papéis podem ser trocados a cada momento, mas sim,
que afirmação está sendo definida como verdade absoluta e por qual razão isso
acontece. É preciso descortinar o processo que faz de alguns conceitos e
culturas únicas, verdadeiras e válidas.

A cultura escolar é também responsável pela formação dos indivíduos,


pois confere a eles uma bagagem de conhecimentos que os faz agir e pensar de
uma determinada forma, e a relação que o indivíduo tem com seus
conhecimentos, suas tradições, crenças, valores, cultura e verdades está
diretamente relacionada com o modo como ele a adquiriu. “Ou seja, a relação
que um indivíduo mantém com sua cultura depende, fundamentalmente, das
condições nas quais ele a adquiriu. Isso inclui a natureza propriamente dita
desses conteúdos, bem como o modo de aquisição dos mesmos.” (LOPES,
1997, p. 105).

É nesse sentido que a ação pedagógica escolar tem um papel


preponderante, pois é na escola, que muitas vezes o indivíduo aprende e
consolida seus valores. É preciso entender, portanto, como e por que a escola
escolhe alguns saberes e conhecimentos e exclui outros.

O entendimento desse processo de seleção nos permite conceber que


o conhecimento escolar não se trata apenas da reconstrução de
conhecimentos científicos/ eruditos. Trata-se de um conjunto de
conhecimentos múltiplos, de origens diversas, fruto de construções
diversas. Conjunto esse que é transmitido como se fosse o que há de
mais fundamental na cultura humana. (LOPES, 1997, p.106).

25
Lopes chama a atenção sobre como a escola “repassa” seus saberes
escolhidos como melhores e mais significativos. É necessário mais cautela ao
observar, analisar e compreender o que e como os livros didáticos ilustram e
omitem certos saberes. A ação dos professores também precisa ser examinada
e observada com mais atenção, pois quando eles se esforçam para explicar
certos conteúdos de uma maneira mais objetiva e simples para seus alunos,
novas construções e significações são feitas, o que às vezes pode significar
novos conceitos.

Sendo assim, é preciso que muitas pesquisas continuem sendo feitas com
o intuito de esclarecer como os conhecimentos são escolhidos e se esses
conhecimentos passam uma idéia de verdade absoluta em relação à cultura de
que fazem parte: erudita ou popular e que, sobretudo, não há hierarquias quando
o assunto é cultura, mas sim uma diversidade; e esse é o papel da escola “admitir
uma diversidade de conhecimentos sem hierarquizações absolutas” para fazer
da escola “um campo de expressão dos embates entre diferentes saberes.”
(LOPES, 1997, p. 110).

De acordo com Forquin (1993), a escola seleciona saberes de uma cultura


e reorganiza-os num novo contexto, produzindo modalidades próprias para o
âmbito escolar, configurando como uma cultura escolar original. Para ele, esse
é o objetivo maior da educação, reproduzir culturas existentes, como sendo
legítimas. Sabendo que a cultura não é imutável, mas apresenta formas e
aparências variadas, ela é interpretada diferentemente por cada indivíduo, de
forma que se faz parecer um movimento de construção de sujeitos ativos,
quando na verdade o que se tem é uma reprodução de saberes e culturas.

Educar, ensinar é colocar alguém em presença de certos elementos da


cultura a fim de que deles se neutra, que ele os incorpore à sua
substância, que ele construa sua identidade intelectual e pessoal em
função deles. Ora tal projeto repousa necessariamente, num momento
ou noutro, sobre uma concepção seletiva e normativa da cultura.
(FORQUIN, 1993, p. 168).

Conclui-se que o currículo é instrumento de exercício de poder e controle


social, pelo fato de legitimar determinados conhecimentos, ainda que esses

26
conhecimentos sejam contestados e nem sempre ingenuinamente aceitos. O
desafio da escola, portanto, é estar atenta ao que é perpassado e transmitido,
mesmo que de forma velada e implícita. “...o pensamento pedagógico
contemporâneo não pode se esquivar de uma reflexão sobre a questão da
cultura e dos elementos culturais dos diferentes tipos de escolhas educativas,
sob pena de cair na superficialidade.” (FORQUIN, 1993, p. 10).

Currículo prescrito X currículo real


Não há como pensar nas formas veladas e implícitas de praticar a seleção
e transmissão cultural na escola sem considerar o currículo real e oculto
presentes nas salas de aula. Sabe-se que os currículos prescritos podem ser
entendidos como os planos curriculares, os programas, os conteúdos, objetivos,
competências, atividades, avaliações e orientações, e que eles se apresentam
através de manuais, documentos, livros de texto, projetos políticopedagógicos,
leis, parâmetros curriculares e etc. Já o currículo oculto é constituído por todos
aqueles aspectos do ambiente escolar que, sem fazer parte do currículo oficial e
explícito, contribuem de forma implícita e velada para as aprendizagens sociais.
(PACHECO, 2005).

O desenvolvimento do currículo inicia-se por uma proposta formal e


documentada denominada currículo prescrito, currículo oficial ou currículo
escrito. Esse currículo é construído em instâncias de Administração central ou
nos contextos escolares por suas equipes pedagógicas com ou sem participação
dos professores. Os textos curriculares oriundos de uma Administração central
são documentos que veiculam o discurso oficial do Estado, já os produzidos nos
contextos escolares são representados por escolas e especialistas de ensino.
Dessa forma, havendo políticas centralizadas em alguns aspectos (Estado) e
descentralizadas em outros (decisões escolares), existem estruturas de poder e
redes informais de decisões e práticas discursivas que intervêm de modo ativo
na decisão e construção curricular.

Assim, o currículo é construído pela luta de diferentes fronteiras que


delimitam terrenos de participação e âmbitos de decisão. Não se
poderá, contudo, aceitar que o currículo seja a expressão de uma única

27
lógica, na medida em que as lógicas de Estado, de mercado, do actor
e cultural são peças de um puzzle, que adquire sentido pelas fronteiras
conquistadas em momentos diferentes. (PACHECO, 2005, p.111).

Por conseguinte, tem-se o currículo real ou currículo em ação como


aquele que se refere ao contexto de ensino e corresponde a um currículo
operacional, ou seja, ao currículo que acontece verdadeiramente na realidade
da sala de aula, aula após aula, dia após dia. O oficial indica o que está
determinado no plano formal e o real denota o que se faz na prática e que é
vivenciado por alunos e professores no cotidiano da escola.

Nem sempre o currículo realizado corresponde ao oficial e explícito, ele


faz parte da ampla gama de experiências de formação dos sujeitos. O currículo
oculto está presente no currículo real e significa o que está escondido, latente,
tácito, implícito e contém aquilo que os alunos aprendem com a experiência
social da escola. Sobre esse currículo oculto, podem-se identificar quatro
características principais: expectativas não oficiais, resultados de aprendizagens
não previstas, mensagens implícitas presentes na estrutura escolar e
intervenção dos alunos. (PACHECO, 2005).

Assim, entende-se por currículo real a aceitação de diferentes


interpretações do texto curricular, quando os autores dos manuais e professores
fazem sua própria interpretação do programa, moldando os conteúdos e criando
novas situações de ensino, embutidos também de decisões ideológicas. O
currículo oculto é tudo aquilo que está presente nesse processo, que os alunos
também realizam no âmbito da educação.

Para uma visão crítica, o que se aprende no currículo oculto são


fundamentalmente atitudes, comportamentos, valores e orientações que
permitem crianças e jovens a se ajustarem “de forma mais conveniente às
estruturas e às pautas de funcionamento consideradas injustas e
antidemocráticas e, portanto, indesejáveis, da sociedade capitalista.”

(SILVA, 2005, p. 79). Em outras palavras, o currículo oculto ensina,


geralmente, as formas de submissão, conformismo, individualismo e aceitação
da fragmentação social, de forma que crianças de classes menos favorecidas
aprendam atitudes próprias de um papel de subordinação. Em contra partida,

28
crianças de classes abastadas aprendem maneiras de dominação a traços
sociais relacionados à posição de ordem.

O currículo oculto, encontrado no currículo real ensina através de rituais,


regras, regulamentos e normas as diversas divisões e categorizações como
diferenças entre o mais e menos capaz, meninos e meninas, currículo
acadêmico e currículo profissional. Assim, as questões de gênero, raça,
sexualidade, como ser homem ou mulher, como ser heterossexual ou
homossexual, como manifestar ou identificar uma determinada raça, etnia,
diferença, necessidades especiais, entre outras, são aprendidas no currículo
oculto.

Não basta simplesmente conceituar as diversas esferas de currículo, é


preciso ir além, compreender quais são os elementos que, no ambiente escolar,
contribuem para essas aprendizagens. É preciso investigar como a organização
e os usos do tempo e do espaço ensinam certos comportamentos sociais. É
necessário descortinar as relações entre professores e alunos, entre a
administração e alunos e entre os próprios alunos, ou seja, é imprescindível
desocultar o currículo oculto.

É importante ressaltar que os estudos sobre o currículo oculto cumpriram


um importante papel para o entendimento do que acontecia dentro das salas de
aula, descrevendo processos sociais que moldam as subjetividades e os
conhecimentos e processos ‘invisíveis’. O desafio agora é entender como as
relações são construídas e através de quais meios esses tipos de
comportamentos podem ser desvelados, favorecendo a uma educação menos
articulada negativamente e mais aberta ao debate claro e transparente de
questões sociais. As discussões de gêneros, raça, divisões sociais e outras
precisam é ser debatidas claramente dentro das paredes da escola e não
transmitidas de maneira implícita de acordo com uma dada cultura tida como
verdadeira. É para essa empreitada que são importantes os estudos e pesquisas
que procuram desvendar essas relações dentro da escola, acompanhando
experiências concretas de escolarização, procurando desvendar como o
currículo, em todas as suas dimensões (o oficial, o real e o oculto), se materializa
na escola. (SALGADO e VILELA, 2006).

29
Levando em conta o papel regulador da escola e do currículo, o currículo
real e com ele o oculto, tornam-se palco principal para a efetivação do controle
social, já que a manutenção dos privilégios de grupos dominantes e a cultura
dita como verdadeira encontrano currículo oculto seu terreno para a sua
concretização e efetivação. Mas, o currículo real abre também o espaço e as
possibilidades de entrada na sala de aula de experiências significativas para os
alunos, que povoam seu mundo real e, com os alunos, adentram a escola.

Ainda que acentuando, em suas primeiras teorizações, o papel


reprodutor da escola e do currículo, a ideia do currículo oculto vem a
ampliar-se e passa a significar não só o terreno por excelência de
controle social, mas também o espaço no qual se travam lutas
ideológicas e políticas, passível, portanto, de abrigar intervenções que
visem a mudanças sociais. (MOREIRA, 2006. p.14).

Desvendar o currículo oculto é também criar possibilidades de mudar o


processo de inculcação inerente à educação reprodutora, é buscar outras
práticas menos controladoras e mais formativas. “Um espaço rigidamente
organizado da sala de aula tradicional ensina certas coisas; o espaço
frouxamente estruturado da sala de aula mais aberta ensina outro tipo de
coisas.” (SILVA, 2005, p. 79).

Desocultar o currículo oculto implica em torná-lo menos eficaz, ou mesmo


deixar de ter seus efeitos simplesmente pelo fato de ser oculto. “Tornar-se
consciente do currículo oculto significa, de alguma forma, desarmá-lo.” (SILVA,
2005, p.80).

30
Futuros do currículo e currículos do futuro: currículo e
construção de identidades

O currículo foi visto até então relacionado ao poder, ao controle social e à


seleção e transmissão de cultura. No entanto, a cultura transmitida pelo currículo
até aqui sempre foi uma cultura tida como dominante, superior e verdadeira,
excluindo assim outras culturas, além de não tratá-las como diferentes, sem
hierarquias; mas sim como se houvesse uma cultura melhor do que a outra. As
teorias críticas, que surgiram conjuntamente com a NSE tiveram um papel
relevante para desmascarar as formas curriculares de alienação dos sujeitos.
Para as teorias críticas, alguns temas foram preponderantes como: reprodução
cultural e social, poder, capitalismo, classe social, currículo oculto e resistências.
Como já foi dito, a construção do currículo no último quartel do século XX foi
associada ao questionamento e a problematizações de forma a reconhecer os
modos pelos quais os espaços estavam impregnados por questões de poder.

Sendo o currículo relacionado a tudo isso, conclui-se que ele é um


instrumento poderoso na construção das identidades. Por outro lado, a
sociedade, como um todo, também vive um período em que as identidades estão
sendo debatidas e questionadas. Dessa forma, esse debate adentrou o campo
do currículo e este passou a ser entendido como um território de construção de
identidades.

(...) o pós-modernismo assinala uma mudança em direção a um


conjunto de condições sociais que estão reconstituindo os mapas
social, cultural e geográfico do mundo e produzindo, ao mesmo tempo,
novas formas de crítica cultural. Analisam-se as questões de
significado, identidade e política sob novo prisma (...). Dentre tais
objetos inclui-se o currículo, passível de ser concebido e interpretado
como um todo significativo, como um texto, como um instrumento

31
privilegiado de construção de identidades e subjetividades. (
MOREIRA, 2006, p. 15).

Com esse novo paradigma social, surgem as teorias pós-críticas e nelas


a identidade, a alteridade, a diferença, a subjetividade, a significação e o
discurso. A cultura, o multiculturalismo e as questões de gênero, raça, etnia e
sexualidade tomam conta desse novo espaço de debates e questionamentos em
diferentes espaços sociais, dentre eles, a escola e o currículo.

O que se questiona no momento é a ideia de que o currículo precisa dar


voz às culturas que foram sistematicamente excluídas pela escola e vistas como
inferiores, como a cultura indígena, negra, infanto-juvenil, rural, de classes
trabalhadoras e todas as culturas negadas até então. Essa nova posição frente
às diferenças culturais afirma a necessidade de um currículo multicultural,
favorecendo assim a expressão das culturas silenciadas pela escola,
favorecendo a cultura do aluno e criando uma convivência democrática dos
diferentes grupos culturais. (SANTOMÉ, 1998), (SANTOS e PARAÍSO, 1996).

A influência do pensamento pós-moderno tem se acentuado nos últimos


anos no discurso curricular contemporâneo, tanto no Brasil, como em outros
países. Assim, algumas características do pós-modernismo começam a se
apropriar dos textos curriculares. O abandono das metanarrativas, a descrença
em uma consciência unitária, homogênea e centrada; a rejeição de ideias
utópicas, a preocupação com a linguagem e a subjetividade e a celebração da
diferença inauguram uma nova tendência do debate sobre o papel do currículo,
abrindo novas possibilidades de entendimento do jogo de exercício e controle do
poder, que até então dominaram o campo. (MOREIRA, 2006).

No debate pós-crítico do currículo, o ponto de partida é que nas salas de


aula nem todas as vozes são igualmente válidas, daí a defesa de que o diálogo
entre as diferenças precisa ser incentivado. Entretanto, o diálogo não é voltado
para acordos e conformidades, mas sim para a compreensão e o respeito às
diferenças, de forma que elas sejam mantidas e não eliminadas.

As velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundo social,


estão em declínio, fazendo surgir novas identidades e fragmentando o indivíduo

32
moderno, até aqui visto como um sujeito unificado. As identidades modernas
estão sendo “descentradas”, isto é, deslocadas ou fragmentadas,
consequentemente, a opinião dentro da comunidade sociológica está ainda
profundamente dividida quanto a esses assuntos, pois as tendências são
recentes e ambíguas. O próprio conceito “identidade” é complexo, muito pouco
desenvolvido e muito pouco compreendido na ciência social contemporânea.
(HALL, 2005).

Um tipo diferente de mudança estrutural está transformado as sociedades


modernas desde o final do século XX. Estas transformações estão mudando as
identidades pessoais, abalando a ideia que se tem das pessoas como sujeitos
integrados. Esta perda de um “sentido de si”, estável é chamada de
deslocamento ou descentração do sujeito. Esse duplo deslocamento de seu
lugar no mundo social e cultural quanto de si mesmos, constitui uma “crise de
identidade” para o indivíduo. Um outro aspecto desta questão da identidade está
relacionado à “globalização” e seu impacto sobre a identidade cultural.

Segundo Hall (2005), a “globalização” se refere àqueles processos,


atuantes numa escala global, que atravessam fronteiras nacionais, integrando e
conectando comunidades e organizações em novas combinações de espaço-
tempo, tornando o mundo, em realidade e em experiência, mais interconectado.
Implica um movimento de distanciamento de ideia sociológica clássica da
“sociedade” como um sistema bem delimitado.

Sente-se que o mundo é menor e as distâncias mais curtas, que os


eventos em um determinado lugar têm um impacto imediato sobre pessoas e
lugares situados a uma grande distância. Observa-se a separação entre espaço
e lugar. O “lugar” é específico, concreto, conhecido, familiar, delimitado. Os
lugares permanecem fixos; é neles que se criam “raízes”. Entretanto, o espaço
pode ser “cruzado” num piscar de olhos – por avião a jato, por fax ou por satélite.
Harvey (1989)12 chama isso de “destruição do espaço através do tempo”.
(HALL, 2005).

A tendência em direção a uma maior interdependência global está


levando ao colapso de todas as identidades culturais fortes e está

33
produzindo aquela fragmentação de códigos cultuais, aquela
multiplicidade de estilos, aquela ênfase no efêmero, no flutuante, no
impermanente e na diferença e no pluralismo cultural. (HALL, 2005, p.
73-74).

Quanto mais a vida social se torna mediada pelo mercado global de


estilos, lugares e imagens pelas viagens internacionais, pelas imagens da mídia
e pelos sistemas de comunicação globalmente interligados, mais as identidades
se tornam desvinculadas – desalojadas – de tempos, lugares, histórias e
tradições específicos e parecem “flutuar livremente”. É-se confrontado por uma
gama de diferentes identidades, dentre as quais parece possível fazer uma
escolha. As diferenças e as distinções culturais, que até então definiam a
identidade, ficam reduzidas a uma espécie de língua franca internacional ou de
moeda global, em termos das quais todas as tradições específicas e todas as
diferentes identidades podem ser traduzidas. Este fenômeno é conhecido com
“homogeneização cultural”.

A homogeneização cultural é o grito angustiado daqueles que estão


convencidos de que a globalização ameaça solapar as identidades e a “unidade”
das culturas nacionais. Entretanto, como visão do futuro das identidades num
mundo pós-moderno, este quadro, da forma como é colocado, é muito simplista,
exagerado e unilateral. Ao lado da tendência em direção à homogeneização
global, há também numa fascinação com a diferença e com a mercantilização
da etnia e da “alteridade”. Há, juntamente com o impacto do “global”, num novo
interesse pelo “local”. Parece improvável que a globalização vá simplesmente
destruir as identidades nacionais. É mais provável que ela vá produzir,
simultaneamente, novas identificações “globais” e novas identificações “locais”.
(HALL, 2005).

O argumento sobre a homogeneização global das identidades é que a


globalização é muito desigualmente distribuída ao redor do globo. Uma vez que
a direção do fluxo é desequilibrada, e que continuam a existir relações desiguais
de poder cultural entre “o Ocidente” e “o Resto”. Pode parecer que a globalização
– embora seja, por definição, algo que afeta o globo inteiro – seja essencialmente
um fenômeno ocidental.

34
Entretanto, imersos a esse movimento globalizante, as consequências
aparecem, Hall (2005) cita três consequências da globalização, isto é, a
homogeneização das identidades globais: reafirmação das identidades locais;
existência de uma própria “geometria de poder” e retenção de alguns aspectos
da dominação global ocidental. Talvez o exemplo mais real do terceiro aspecto
seja o fenômeno da migração.

Portanto, vê-se que a globalização é um fator importante para a


descentração e, ao mesmo tempo, construção das identidades pós-modernas. E
que ela não irá, como muitas vezes se imagina, destruir raízes culturais.

A importância desse processo para a educação, é que a globalização


criou, a partir de então, a luta no campo educacional e inclui a abertura de
espaços para que as culturas dos grupos excluídos do currículo escolar tenham
condições de se tornar representadas, possibilitando o tão desejado diálogo
entre as diferenças. (MOREIRA, 2003), (SANTOMÉ, 1998), (LOPES, 1999).

Essas diferenças culturais, no entanto, são relacionadas às relações de


poder. Isso, pois as minorias, sejam em relação à etnia, sexualidade, cor, gênero,
religião, situação econômica, idade, linguagem e etc, têm sido demonstradas
com inferioridade perante outras formas de identidade.

Vê-se necessário, portanto, uma política da diferença, e não de igualdade,


como há muito tempo já foi defendida. Política da diferença, pois aceitando as
diferenças, deixa-se de achar que há somente um modelo para cada categoria,
e, dessa forma, as diferenças serão aceitas e respeitadas verdadeiramente.

Segundo Moreira (2002), é o multiculturalismo que indica o caráter plural


das sociedades ocidentais contemporâneas. Isso porque a cultura tem adquirido
importância crescente nos fenômenos sociais atuais e faz-se cada vez mais
necessário um reconhecimento das diversidades culturais, ou seja, das diversas
identidades culturais existentes, fortalecidas pelo fenômeno da globalização. A
perspectiva hoje é para o reconhecimento da multiculturalidade como
constituinte da vida social, como o é também a necessidade do desenvolvimento
de relações sociais e inter-culturais.

35
Agora, numa perspectiva intercultural não basta reconhecer a
diferença, é preciso estabelecer uma relação, a inter-relação entre
pessoas de culturas diferentes para justamente permitir um
entendimento recíproco, de tal forma que essa relação implique um
desafio à reelaboração de cada um. (MOREIRA, 2002, p.7).

É preciso reconhecer também que não há uma monocultura escolar, ou


seja, os alunos não devem ser compreendidos como sujeitos de uma única
cultura. Para isso, a lógica do heterossexualismo, do masculino, católico, cristão,
branco e do eurocêntrismo precisa ser desafiada. É função do multiculturalismo
levar ao reconhecimento das identidades dos grupos, principalmente àquelas
compreendidas como inferiores.

Algo reforçador nesse embate é o diálogo. O diálogo como instrumento


de ensino e de mediação entre as diferenças e criador de consensos culturais e
cognitivos. Com o diálogo, não se trata de chegar a um acordo, ou a uma única
leitura ou resposta, mas trata de um ponto de partida para o debate, a abertura
de espaço para diferentes vozes e produção de diferenças. “O diálogo propicia
compreensões parciais, ainda que não o acordo, em meio às diferenças”
(MOREIRA, 2002, p.14).

Tem-se assistido a debates em torno da necessidade de reconhecimento


das múltiplas etnias, culturas, preferências sexuais, linguagens e outros
determinantes presentes nas sociedades contemporâneas. Ao mesmo tempo, a
radicalização de grupos étnicos e culturais marginalizados economicamente tem
desembocado, não raro, em conflitos armados de proporções gigantescas. Em
meio a essas tensões, ganha força o multiculturalismo – como movimento teórico
e político que busca respostas para os desafios da pluralidade cultural nos
campos do saber, incluindo não só a educação como também outras áreas.
(CANEN, 2002).

O multiculturalismo busca respostas plurais para incorporar a diversidade


cultural e o desafio a preconceitos, procura pensar caminhos que possam
construir uma ciência mais aberta a vozes de grupos culturais e étnicos plurais.

36
O campo do currículo, hoje, desconfia de discursos que se apresentem
como meramente técnicos, buscando perceber neles vozes autorizadas e vozes
silenciadas. Cobram-se da educação e do currículo, medidas para a formação
de cidadãos abertos ao mundo, tolerantes e democráticos. “O que caracteriza
propriamente os seres humanos não é uma similaridade, mas a própria
diferença.” (MOREIRA, 2002, p.14).

Ainda que o determinante de classes sociais permaneça na análise


curricular, a necessidade de se compreender o currículo como uma seleção
cultural impregnada por uma visão de mundo branca, masculina, heterossexual
e eurocêntrica passa a ser central em estudos curriculares, que buscam pensar
em currículos alternativos, multiculturais. No entanto, os sentidos diversos de
multiculturalismo precisam ser analisados, de forma que práticas curriculares
que se pretendam multiculturais não acabem por perpetuar a construção de
diferenças e dos preconceitos que tanto desejam combater. Tem-se como
exemplo: o multiculturalismo reparador, que tenta reparar injustiças passadas; o
folclorismo, que reduz o multiculturalismo à valorização de crenças e costumes;
o reducionismo identitário, que reforça as diferenças dentro das diferenças e a
guetização cultural, que é o grupo que estuda seus próprios padrões culturais.
(LOPES, 2004).

Alguns caminhos possíveis se apresentam para a construção de práticas


curriculares multiculturais: dinâmicas de sensibilização de identidades, a
compreensão de identidade como construção, sempre provisória; a associação
de discursos de diferentes campos, para efeitos anti-racistas e
antidiscriminatórios e a avaliação diagnóstica/multicultural que implica no
acompanhamento contínuo das atividades desenvolvidas no currículo em ação.

Não se pode ignorar a verdadeira função do ensino. No trabalho de


formação de pessoas solidárias, ativas e críticas, é necessário estar atento aos
conteúdos culturais, assim como estratégias de ensino, aprendizagem e
avaliação. Educar é ação ética e política e o êxito de intervenções educacionais
está relacionado a um compromisso consciente e cuidadoso com a comunidade
a que se pretende trabalhar. (SANTOMÉ, 1998).

37
Os caminhos possíveis, sugeridos acima, estão longe dos currículos que
deformam ou tratam de forma superficial as comunidades marginalizadas e
silenciadas, chamados por Santomé (1998) de “currículo de turistas”, cujas
temáticas são citadas esporadicamente e contempladas de uma perspectiva
distante, como algo que não tem a ver com cada uma das pessoas na sala de
aula. Alguns exemplos desse tipo de currículo são: a) a trivialização, quando
grupos são tratados de forma banal, lembrados apenas por seus folclores,
comidas típicas, rituais festivos, vestimentas e etc; b) a recordação, é quando se
faz uso de objetos e fatos isolados para registrar lembranças de determinado
grupo, como por exemplo, uma única boneca negra, recordando valores; c) “o
dia de”, acontece quando instituições escolares enfrentam a diversidade
comemorando datas simbólicas, como o Dia do Índio, em que muitas escolas
pintam os rostos dos alunos na tentativa de representá-los; d) a estereotipia,
como ato para perpetuar situações de opressão e marginalização; e) a
tergiversação, que significa o ocultamento e a deformação de histórias e origens,
na tentativa de justificar tais preconceitos, como inferioridade genética, maldade
inata e outros.

Esse tipo de filtro nas escolas, usado para selecionar apenas fragmentos
da realidade, contribui para negar e ocultar verdadeiras realidades e, com efeito,
não ajuda meninos e meninas a compreender o mundo que os rodeia. “Doutrinar
é impedir o surgimento de determinadas realidades que possam transformar-se
[sic] em objeto de análise e reflexão.” (SANTOMÉ, 1998, p. 151).

É preciso envolver os alunos em debates sobre a construção do


conhecimento, as interpretações conflituosas e ambíguas. Quando isso
acontecer e quando os alunos compreenderem como os conhecimentos são
elaborados e difundidos, será possível uma revisão dos conhecimentos e
culturas que circulam em vários contextos.

Por fim, as pesquisas indicam que o projeto multicultural é possível e que


o multiculturalismo requer criticidade em relação aos discursos, além de desejar
que se trabalhe com o plural, o diverso, nas dinâmicas de sala de aula e nas
traduções de diretrizes curriculares para o currículo em ação. Estar atento a essa

38
análise e reflexão pode ser uma boa maneira de participar dessa luta política por
uma sociedade mais inclusiva.

Perspectivas de inclusão no currículo

Com o multiculturalismo, tornou-se logo necessário abordar outras


desigualdades, ultrapassando as diferenças de classe social. Através dele, as
questões de gênero, raça e sexualidade vieram à tona no âmbito educacional.
Segundo Silva (2005), o termo gênero refere-se aos aspectos socialmente
construídos do processo de identificação sexual. A crítica em relação ao gênero
surge com a indagação de que certas disciplinas e materiais didáticos eram
considerados masculinizados, enquanto outros naturalmente feminilizados. Até
mesmo a postura de professores era diferenciada às meninas e meninos, assim
como alguns conteúdos, exigência de comportamentos e determinação de
futuras carreiras.

Um livro didático que sistematicamente apresentasse as mulheres


como enfermeiras e os homens como médicos, por exemplo, estava
claramente contribuindo para reforçar esse estereótipo e,
consequentemente, dificultando que as mulheres chegassem às
faculdades de Medicina. (SILVA, 2005, p.92).

A intenção não é que haja uma inversão, mas um equilíbrio entre


experiências masculinas e femininas, abrindo portas na escola, desde cedo, para
comportamentos e oportunidades desarmadas sexualmente, de forma que não
haja cores, esportes, disciplinas, leituras e aprendizagens divididas por sexo ou
gênero. Além de práticas mais desmascaradas e menos rígidas quanto ao

39
embate entre os sexos é importante que surjam questões para se compreender
como a visão e o comportamento masculino são formados e mantidos na escola
e na sociedade como um todo. Necessita-se conhecer como o currículo produz
a masculinidade e como a formação masculina está ligada à posição privilegiada
de poder que os homens apresentam na sociedade.

Assim como se despertou a questão do gênero no âmbito escolar, as


dinâmicas sobre raça e etnia também se tornaram alvo para a questão curricular.
A primeira questão se baseou ao consistente fracasso de estudantes
pertencentes a grupos éticos e raciais minoritários. No entanto, sobre os termos
raça e etnia há ainda muitas divergências entre seus conceitos. Levando em
conta as dificuldades de distinção entre um termo e outro, nesse trabalho eles
serão usados de forma equivalente.

Voltando à história, já se observa as relações de poder estreitamente


ligadas à raça, quando o homem branco europeu simbolizava o poder frente aos
colonizados. No caso da raça e etnia, o que se questiona não é a exclusão
dessas vozes na escola, já que é comum haver comemorações e referências a
outras raças e etnias em documentos curriculares e materiais didáticos. A
problemática se encontra na forma como essas vozes são abordadas: como
mitos, de forma estereotipada, folclórica, exótica e deformada, anulando as
possibilidades de reação desses grupos e firmando o privilégio das identidades
dominantes.

É possível detectar manifestações de racismo em livros-textos,


principalmente quando se descreve e qualifica as invasões coloniais, a
escravidão, a exploração e o domínio, caracterizando esses povos como
bárbaros ou primitivos. É comum encontrar também abundantes ações como a
conversão religiosa desses povos e o silêncio aos seus direitos perdidos e suas
características comunitárias. Com tal deformidade de dados presentes em
documentos escolares é fácil encontrar leitores culpando membros desses
povos até mesmo os tratando de maneira hostil. (SANTOMÉ, 1998).

Em termos de representação racial, o texto curricular conserva, de


forma evidente, as marcas da herança colonial. O currículo é, sem
dúvida, entre outras coisas, um texto racial. A questão da raça e da

40
etnia não é simplesmente um ‘tema transversal”: ela é uma questão
central de conhecimento, poder e identidade. (SILVA, 2005, p.102).

Santomé (1998) lembra ainda a cultura homossexual, e ressalta que ela


não é uma questão individual, mas social, pois é associada às relações humanas
e dessa forma também precisa ter seu espaço na escola. Há uma tendência a
transformar esses grupos em bodes expiatórios para todo tipo de mal social,
como a AIDS; além de serem identificados com drogas e marginalidade. Admitir
a existência da homossexualidade na escola é imprescindível para que alunos
que convivam com casais homossexuais e que sexualmente optaram por uma
identidade homossexual não se sintam estranhos e marginalizados. É importante
enfraquecer o conceito de desvio ou doença em relação ao homossexualismo,
já superada através da negação do estado de desenvolvimento das pesquisas
médicas e sociológicas.

Nesse novo contexto educacional, devem-se analisar as conexões entre


currículo e multiculturalismo, mas sem separar as questões culturais das
questões de poder. Isso porque as diferenças não podem ter uma relação
hierárquica. “Não é possível estabelecer nenhum critério transcendente pelo qual
uma determinada cultura pode ser julgada superior a outra.” (SILVA, 2005, p.
86). Nessa nova visão, os diferentes grupos culturais se tornariam igualados por
uma comum humanidade. Lembrando, porém, que comum humanidade não é
uma pedagogia que simplesmente estimule uma atitude de respeito ou
tolerância, pois isso significaria um estímulo a uma abordagem terapêutica e de
piedade quanto à diferença do outro, reforçando ainda mais a resistência às
diferenças. “Apesar do seu impulso aparentemente generoso, a ideia de
tolerância, implica também uma certa superioridade por parte de quem mostra
tolerância.” (SILVA, 2005, p. 88).

As relações de poder se fortificam ainda mais quando se trata de


diferenças e multiculturalismo, pois só há como perceber a diferença se
comparando com o outro. A identidade é sempre uma relação, só se define uma
identidade em comparação a uma não identidade, ou seja, a definição da
identidade está diretamente ligada a identidade do outro. Se há o diferente é
porque também há um ‘não-diferente’, com isso surge uma hierarquia entre ‘não-

41
diferentes’ e diferentes. “Não se pode ser “diferente” de forma absoluta; é-se
diferente relativamente a uma outra coisa, considerada precisamente como “não-
diferente”. Mas essa “outra coisa” (...), o “não-diferente”, também só faz sentido,
só existe, na “relação de diferença” que se opõe ao “diferente.” (SILVA, 2005, p.
87).

A proposta para o currículo multicultural não se trata de adicionar


identidades diferentes, mas de buscar caminhos para lidar com as questões
históricas e políticas que as tornaram excluídas.

Além das identidades abordadas anteriormente, existem muitas outras


silenciadas pela escola. Pode-se citar a cultura infantil e juvenil, com o
desconhecimento dos deveres e direitos desse grupo, e a visão paradisíaca que
se tem da infância, cegando os olhos para as infâncias mais “reais” como a
infância pobre, a criança que sofre violência física, moral e sexual. As crianças
vítimas do tráfico de órgãos e de drogas, além da desvalorização da cultura
jovem na escola, como o rap, o rock n’ roll, o grafite, os videoclipes e etc.

Os alunos devem adquirir consciência destas tristes realidades e


comprometer-se com essa infância maltratada, na medida de suas
possibilidades e forças. Uma forma de preparar as novas gerações
para a vida a para “sobreviver” é informando as claramente sobre as
peculiaridades do mundo no qual vivam. (SANTOMÉ, 1998, p. 134-
135).

Podem ser citadas, ainda, como culturas excluídas do discurso escolar a


classe trabalhadora e o mundo das pessoas pobres. A pobreza é o resultado de
políticas e modelos de economia e não fruto de decisões individuais. O
fenômeno da pobreza precisa ser tratado não na ótica da caridade, mas com
intervenções nas esferas econômicas e sociais buscando as circunstâncias que
as produzem. “As reflexões sobre as condições de vida dos distintos grupos de
trabalhadores e trabalhadoras, seus êxitos e modos de obtê-los e, em suma, sua
cultura, é algo que geralmente tampouco consta nas tarefas escolares.”
(SANTOMÉ, 1998, p. 142).

O mundo rural e ribeirinho costuma ser apresentado pelos livros didáticos


como uma vida no reino da natureza, sem dificuldades, onde as pessoas lidam

42
sempre com a agricultura e pesca, e ainda como “uma roça”, em que nada de
importante acontece, sugerindo uma realidade inferior à da vida urbana. A
distorção desses contextos é comum assim como das pessoas que vivem do
mar. A realidade da vida rural e da vida litorânea não aparece nos livros. Não é
comum debater sobre as dificuldades inerentes à agricultura, os altos custos da
criação, os desastres causados por variações climáticas, as pragas que atacam
plantações inteiras, a falta de rede de esgoto e água tratada, as deficiências nas
telecomunicações, assim como a vida dos pesadores em alto mar, as
dificuldades e os benefícios da pesca.

Tais posturas de silenciamento nos conteúdos escolares são comuns


também quando se trata das pessoas com deficiência, dos idosos, das vozes do
Terceiro Mundo e dos alunos com necessidades educacionais especiais, entre
outros.

Com frequência, os povos do Terceiro Mundo são vistos como selvagens,


exóticos, sensuais, sem grandes problemas cotidianos e incapazes de produzir
conhecimento científico.

O grupo dos idosos tem tido uma atenção nos últimos anos, ainda que
pequena, devido ao crescimento desse grupo, afetando assim as economias dos
países, fazendo-os tornar uma grande massa de consumidores. Dessa forma,
de um lado os idosos tornam-se problemas para o caixa dos Estados e de outro
criam e resgatam um mercado próprio para esse setor, possibilitando
crescimento econômico. Mas por sua vez, essas relações de rentabilidade e as
condições de vida desse grupo ainda são omitidas pelo currículo.

Em muitos casos as pessoas portadoras de algum tipo de deficiência


são contempladas como merecedoras de intervenções e caridade. A
palavra justiça, direito, etc., raramente aparecem nas linhas de
argumentação básica em uma sociedade classista que ainda continua
tratando de ocultar e segregar este grupo de pessoas, pois não estão
de acordo com seus parâmetros de produtividades dominantes.
(SANTOMÉ, 1998, p. 146).

É notória a importância desse debate sobre as diferenças no campo do


currículo, na atualidade. Entretanto, essa é ainda uma dimensão parcial. Essa

43
ampliação de perspectiva para o debate, acerca da função social da escola na
direção da educação multicultural, tem implicações no debate acerca de
educação inclusiva. Esse debate, ao ter colocado para a escola o desafio de
reconhecer a existência de identidades diferenciadas, particulares, cria as
possibilidades e a exigência de experiências escolares que possam não apenas
tolerar, mas reconhecer as demandas específicas daquelas pessoas que
apresentam situações que lhes são inalienáveis.

O que se observa é que o debate no campo do currículo na atualidade,


ao se remeter à inclusão, demonstra uma perspectiva centrada no tratamento
das diferenças culturais (SILVA, 2004), (SILVA, 2005), (VEIGA-NETO, 2001),
(PACHECO, 2005) ou com ênfases na deficiência (SECRETARIA DE
EDUCAÇÃO ESPECIAL, 2002), (CARVALHO, Rosita 2006), (GUIMARAES,
2002), (MANTOAN, 1997). O debate amplo, envolvendo outras diferenças, não
só vinculadas às deficiências, às dificuldades de aprendizagens e às questões
de gênero e raça, é periférico. A discussão ainda é limitada e não é fácil
encontrar bibliografia que tratem de forma clara, direta e ampla tantas outras
diferenças existentes e que vão além das perspectivas citadas acima.

De modo que, ao entender que o currículo abarca diferenças, o debate é


limitado, e, por vezes, multiconceitual e ambíguo. Ao mesmo tempo que se
debate diferenças, não se aprofunda em questões pertinentes e necessárias.

44
AS NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS E A
ESCOLA INCLUSIVA

“Não existiu antes de nós alguém que experimentou um Brasil


democrático para nos ensinar o que é democracia. Estamos tentando construir
algo que não existiu antes de nós. Nosso país tem quinhentos anos de história
de negação da democracia. O máximo que a nossa geração pode fazer é
preparar a geração que vai construí-la e, no bojo desse processo de construção,
está a educação inclusiva”.

Agamenon José Siqueira

Agora, o tema necessidades educacionais especiais (NEE) será


abordado, procurando explicitar as questões entre a inclusão dos alunos com
NEE e a escola regular na atualidade. De um modo geral, o conceito de
educação inclusiva é abordado, inicialmente, na sua forma abrangente.

A discussão que será desenvolvida pretende desvendar as


particularidades existentes dentro do debate da questão, no Brasil.

A inclusão e o processo histórico


Levantando o histórico da educação no Brasil, constata-se que
anteriormente ao século XX todos os portadores de necessidades educacionais
especiais eram excluídos das escolas, ora isentados da frequência à escola
devido à uma suposta incapacidade, ora confinados em instituições

45
consideradas adequadas às suas limitações. Na história da humanidade, os
indivíduos com deficiência eram vistos como “doentes” e incapazes e sempre
estiveram em situação de maior desvantagem, ocupando no imaginário coletivo
a posição de alvos da caridade popular e da assistência social e não de sujeitos
de direitos sociais, entre os quais se inclui o direito à educação.

As raízes históricas e culturais acerca do fenômeno da deficiência,


sempre foram marcadas por forte rejeição, discriminação e
preconceito. A literatura da Roma Antiga relata que as crianças com
deficiência, nascidas até o princípio da era cristã, eram afogadas por
serem consideradas anormais ou débeis. Na Grécia antiga, Platão
relata em seu livro “A República” que as crianças mal constituídas ou
deficientes eram sacrificadas ou escondidas pelo poder público.
(SECRETARIA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL, 2002, p. 7).

O documento da Secretaria de Educação Especial13 (2002) lembra


também que na Idade Média, os deficientes mentais, os loucos e os criminosos
eram considerados, muitas vezes, possuídos pelo demônio. Aos cegos e surdos
eram atribuídos dons e poderes sobrenaturais, assim, a crença oscilava entre a
culpa e a expiação de pecados no pensamento dos filósofos. Já a neurologia
afirma que as pessoas que apresentavam convulsões tinham suas cabeças
perfuradas, na esperança de que os espíritos maus se desapropriassem do
corpo do indivíduo. (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL, 2002).

Essas situações geravam ambivalência de sentimentos e atitudes que iam


da extrema rejeição, piedade, comiseração e super proteção, surgindo assim,
hospitais, prisões e abrigos, além de ações de cunho social e religioso. No
entanto, esses locais estavam voltados para o controle do que para alguma
aprendizagem, seria uma espécie de controle dos indesejáveis. A ideia de que
essas pessoas poderiam ser reajustadas em ambientes segregados, alijadas do
resto da sociedade, fortaleceram os estigmas e a rejeição.

Entre 1900 e 1930, disseminou-se generalizadamente a ideia de que


as pessoas com deficiência tinham tendências criminosas e eram a
mais séria ameaça à civilização, devido a sua composição genética.
Esta percepção foi acrescentada à disposição de muitos educadores e
do público em geral para permitir a segregação e outras práticas, tais
como a esterilização. (STAINBACK e STAINBACK, 2006, p. 38).

46
Segundo Mazzota (2001), no Brasil, somente no final dos anos cinquenta
começaram a surgir iniciativas oficiais de âmbito nacional voltadas para a
educação de pessoas com deficiência. E conclui: “A defesa da cidadania e do
direito à educação das pessoas portadoras de deficiência é muito recente em
nossa sociedade.” (MAZZOTA, 2001, p.15).

Espelhando também nessa época, a situação geral, em diferentes


sociedades, da pessoa com deficiência continuava, até o início do século XX,
com um tratamento de pessoa doente.

No século XX, surgiram as classes ou escolas especiais que até a década


de 70 eram os lugares abertos a esse público específico. Este tipo de educação
recebeu o nome de “educação especial”, onde as atividades da educação eram
desenvolvidas em salas ou escolas separadas.

Nos anos 90, o movimento da inclusão propõe um único sistema


educacional de qualidade para todos, sendo o alunado composto por estudantes
com ou sem deficiência ou outros tipos de condição atípica. Esta concepção foi
consolidada no Brasil de forma legal na Lei nº 9.394/9615- Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDBEN), em que a modalidade de educação
escolar deve ser oferecida preferencialmente16 na rede regular; e confirmada
com a Resolução nº 2, de 11/09/0117, do Conselho Nacional de Educação, que
explicita que a educação especial é uma modalidade que visa complementar os
serviços educacionais comuns.

A ideia da lei é que as pessoas com necessidades especiais recebam


uma educação complementar de acordo com seu quadro particular de
necessidade: se se precisa de atendimento especializado, esse deve ser
assegurado paralelamente à jornada escolar regular

Sassaki (2003) aponta o caminho para que uma escola comum se torne
inclusiva, dizendo que ela deve se reestruturar para atender à diversidade do
novo alunado, sendo este visualizado não só em termos de necessidades
especiais decorrentes de deficiência física, mental, visual, auditiva ou múltipla,
como também aquelas resultantes de outras condições atípicas; em termos de
estilos e habilidades de aprendizagem dos alunos e em todos os outros

47
requisitos do princípio da inclusão, conforme estabelecidos no documento ‘A
Declaração de Salamanca’ e o ‘Plano de Ação para a Educação de
Necessidades Especiais’ pois, todas as pessoas devem ser incluídas.

A Declaração de Salamanca (Espanha), datada de 10 de junho de 1994,


registra o que os representantes dos países membros da Organização das
Nações Unidas (ONU) postularam acerca da educação inclusiva. Conforme
discutido, as escolas regulares são os meios mais eficazes para criar
comunidades acolhedoras, a fim de que se construa uma sociedade inclusiva,
alcançando a educação para todos.

Ao longo do processo de transição do total isolamento dos portadores de


necessidades especiais em asilos, passando à existência das classes especiais
na fase denominada de integração à existência da escola inclusiva, paradigmas
tiveram que ser quebrados incluindo a visão de que à escola caberia a função
de tratamento:

A educação das pessoas com deficiência física, mental e sensorial


esteve um grande período da história sob a responsabilidade dos
profissionais da área médica. Ainda hoje, é comum os profissionais da
educação sentirem-se sem condições de atuar com estes educandos
sem a presença e orientação dos profissionais médicos, psicólogos,
terapeutas. Em muitas instituições especializadas, são estes
profissionais que comandam todo o processo escolar, como se a
educação especializada fosse mais um processo de tratamento do que
um processo educacional. (PINTO, 2000, p. 235).

Portanto, foi deixado um desafio à escola: a inclusão, que constitui em


eliminar devidamente o caráter segregacionista, de modo que se trabalhe as
diversidades na tentativa de construir um novo processo ensino-aprendizagem
em que se inclua todos aqueles que dele, por direito são sujeitos.

A visão de Mantoan (1997), acerca da proposta assumida pela nova LDB


e sua repercussão, é de que a implementação de ciclos seja uma solução justa
embora ainda não esteja sendo devidamente compreendida pelos professores e
pais por ser uma novidade e por estar sendo distorcida e mal aplicada nas redes
de ensino. Acredita-se que, ao eliminar a seriação e a reprovação nas passagens
de um ano para outro, estar-se-ia dando mais tempo para que os alunos

48
aprendam, e assim será possível adequar o processo de aprendizagem ao ritmo
e às condições de desenvolvimento de cada aprendiz, um dos princípios da
escola de qualidade para todos. Portanto, a escola não deveria ser formatada
com um processo em que as crianças “passem sem aprender”, que passem a
frequentar os ciclos seguintes sem o devido desenvolvimento das habilidades
previstas para o ciclo anterior. A estrutura de ciclos foi pensada para atender à
criança e não para resolver estatísticas de retenção e repetência. Infelizmente,
em muitas escolas, isso se tem confirmado como tendência. (GLÓRIA, 2002).

Quanto à avaliação escolar na escola inclusiva, diz-se que nessa nova


visão se abre uma gama de situações relevantes e significativas para a vida
cotidiana do aluno, das quais são extraídos dados relevantes para uma avaliação
de aprendizagem. Segue-se ainda um princípio de nunca comparar os alunos
entre si, mas sempre comparar os resultados atuais com os respectivos
desempenhos anteriores de cada um. Assim, a avaliação da aprendizagem pode
servir menos para mostrar as falhas do aluno e mais para mostrar em que o
ensino precisa melhorar; em que o professor precisa mudar suas abordagens
educativas e em que a escola deve se reestruturar melhor. (SASSAKI, 2003).

Guimarães (2002) discute as adaptações escolares que devem ser


efetuadas na escola inclusiva, redimensionando toda uma visão sobre a quem
caberia todo o conjunto de ações que devem ocorrer no interior desta nova
escola, antes, delegado ao próprio aluno que deveria estar se adaptando à
mesma. Agora, a escola é quem deve modificar seu funcionamento para atender
às particularidades do seu alunado, buscando respostas individuais para as
necessidades especiais e culturais de cada um através de uma ação pedagógica
centrada no aluno.

A escola deve assegurar aos alunos uma educação de qualidade,


mediante currículos apropriados, mudanças organizacionais, estratégias de
ensino, uso de recursos financeiros com pessoal qualificado e avanços
tecnológicos, além de parcerias com a comunidade. Desta forma, o modelo
institucional é que deve se adaptar às necessidades dos alunos e não o inverso.
Isso só será possível num modelo que veja seus alunos como tendo diferentes
interesses e capacidades.

49
Sem conhecer os seus alunos e os que estão à sua margem, não é
possível à escola elaborar um currículo que reflita o meio social e
cultural em que se insere. A integração entre áreas do conhecimento e
a concepção transversal das novas propostas de organização
curricular consideram as disciplinas acadêmicas como meios e não fins
em si mesmas e partem do respeito à realidade do aluno, de suas
experiências de vida cotidiana, para chegar à sistematização do saber.
(MANTOAN, 2001, p.114).

O que se observou até agora foi que muitas pessoas com deficiência
evadiram das escolas, na forma como lhes foram apresentadas. Não seria então
a evasão escolar ocasionada como consequência de uma política educativa que
não está voltada para atingir a todos, gerando a desistência dos que não se
adaptam ao modelo? Assim a culpa recai sobre as próprias vítimas. Ao entender
que se deve empenhar pelo desenvolvimento da sociedade, no sentido de que
se transfiram os problemas dos encargos dos indivíduos para a esfera do
planejamento social, compreende-se que as escolas devem garantir a
permanência das crianças, renovando e ampliando sua filosofia, propostas e
práticas curriculares.

As portas escolares são abertas diariamente propiciando interação social.


Justamente nesta convivência é que se darão as trocas de conhecimento que
serão absorvidas por cada um deles a seu tempo e de acordo com a sua
demanda. “A aprendizagem só é possível em interação com os outros, cabendo,
portanto à escola promover atividades cooperativas, rejeitando qualquer forma
de segregação.” (GUIMARÃES, 2002, p.53).

A meta nacional, ao longo do século XX, era que todas as crianças


estivessem matriculadas na escola. Está clara a importância da vida escolar no
período da infância. Se o aluno com necessidades especiais for privado desse
ambiente e do convívio social, obtem-se o mesmo resultado que qualquer outra
criança submetida às mesmas condições apresentaria: a sua estagnação. Se ao
contrário, o convívio social for estimulado, verificam-se grandes avanços no seu
quadro, proporcionando-lhe maior independência social e, portanto, uma
condição de vida melhor. É importante ressaltar que a universalização do acesso
à escola é um desafio que já está praticamente vencido.

50
A luta que mobilizou os educadores brasileiros ao longo do século
passado, na qual destaco Anísio Teixeira como um símbolo, foi pela
universalização do acesso à escola. Esta está praticamente vencida.
Hoje já podemos dizer que quase a totalidade das crianças brasileiras
tem vaga na escola. A luta do século que se inicia, é pelo direito de
permanecer na escola, o direito de não ser excluído do processo
educacional. (GUIMARÃES, 2002, p.10-11)

A escola desempenha um papel fundamental na promoção dessas


condições, pois a inclusão social implica na conquista do espaço social a partir
de interações que se estabelecem no interior dos grupos sociais, numa
participação real das pessoas como membros ativos e produtivos da sociedade.
Portanto, sua importância consiste tanto no que se refere à formação dessas
pessoas através da apropriação do saber, quanto na criação de um espaço que
ofereça um maior fortalecimento e o enriquecimento da identidade sócio-cultural,
em que, direitos da pessoa com deficiência e de todos os cidadãos sejam
realmente cumpridos como um direito constitucional.

O reconhecimento do Estado sobre a importância da inclusão, gerou uma


participação ativa nessa luta. Costa (JULIANA, 2000) analisa os tempos em que
cabia ao próprio portador de necessidades especiais buscar se integrar na
sociedade: “...um movimento no qual o ônus é unilateral, ou seja, o sujeito
portador de deficiência caminha sozinho para sua adaptação em sociedade.
Trata-se, aqui, de integração e não de inclusão.” (COSTA, Juliana, 2000, p.51).

O dicionário Silveira Bueno (1985) pode aqui enriquecer a discussão


sobre o papel da escola. Assim ele define a palavra “integrar” como reunir,
incorporar, tornar parte integrante, tornar inteiro, e “incluir” como sinônimo de
compreender, abranger, inserir, fazer parte. Tomando a ideia trazida pelo
dicionário, que ao definir integrar, sugere a ideia de “tornar inteiro”, só é possível
tornar inteiro aquilo que é visto como faltoso. Porém, o aluno, às vezes, é
encarado como aquele que precisa ser restituído de algo que perdeu. Sendo o
aluno com necessidades especiais visto por esse prisma, verifica-se que, por
trás desse pensamento ainda presente na sociedade, está a noção de adaptação
do indivíduo à sociedade para que ele se encaixe dentro do padrão.

No modelo da inclusão, a escola deve saber quando responder às


demandas do aluno, saber também deixar que o próprio aluno demande, e

51
possa, desenvolvendo a sua criatividade, buscar respostas aos seus interesses
e dúvidas, sendo assim verdadeiramente compreendido. Não há necessidade
de que as minorias percam suas características mais peculiares para se
tornarem parecidas e se assemelharem a uma virtual maioria, mas, de um
processo inverso: a aceitação da diferença como mais um exemplo da
diversidade humana, para a construção de um verdadeiro processo educativo.

O aprendizado escolar dito normal é medido pela faixa etária e seriação,


e é por este prisma que se dividem os programas curriculares, porém se sabe
que a criança com necessidades educacionais especiais, por vezes, desenvolve
habilidades em um período maior de tempo.

As boas práticas pedagógicas são apropriadas a todos os alunos, uma


vez que todos os alunos têm aspectos fortes e estilos de aprendizagem
individuais. Isso se aplica a alunos com necessidades educativas especiais e
aos outros. Cada vez há uma maior evidência de que não necessitam de um
número significativo de estratégias pedagógicas distintas. Podem precisar de
mais tempo, de mais prática ou de uma abordagem com variações
individualizadas, mas não de uma estratégia explicitamente diferente da que é
utilizada com os outros alunos. (PORTER, 1997, p.45).

“Incluir não é negar as diferenças, mas desvendá-las no processo social,


como diferentes do padrão, compreendendo esse padrão como uma referência
construída pelos homens nas relações sociais.” (COSTA, Juliana, 2000, p.54)
Para ela, ao definir uma criança com NEE, não em função da patologia, mas em
relação com os meios de aquisição escolar próprios à sua idade, permite então
afirmar que, o problema de aprendizagem nasce do fracasso escolar, ficando a
responsabilidade sobre a criança e não para a escola. Assim, evidenciou-se o
papel que a escola desempenha de reveladora social das diferenças. Mas,
sabendo que todo comportamento tem um sentido na história de um sujeito, essa
diferença é o reconhecimento dificultoso e aleatório de duas demandas: a do
sujeito social e a do social em si. Logo, proporcionar que a criança atribua um
sentido à sua diferença, já pode facilitar ao sujeito sua inclusão.

52
Analisando assim o processo histórico, pode-se verificar que o isolamento
das pessoas diagnosticadas como pessoa com deficiência foi muitas vezes
pautado por justificativas legais, como também, pelas autoridades médicas.
Sabe-se que os testes psicológicos foram amplamente utilizados
desempenhando um papel muito importante no processo de exclusão escolar.
Não é o caso de se renunciar às medidas psicométricas nem às classificações
nosológicas, mas devolver à criança com dificuldade, sua dignidade de aprendiz
do saber. O diagnóstico deve ser usado, portanto, não para rotular esta criança
ou ainda para servir como uma barreira insuperável que traça um destino
derradeiro, mas sim, sendo reconhecido o acometimento, possibilitar que a
escola planeje a melhor forma de incluí-lo no modelo institucional.

Os temores da inclusão não devem ser tomados como limites


intransponíveis, mas como desafios para novas propostas de soluções. “O
constante desequilíbrio nas trocas entre os alunos e a permanente
reorganização do conhecimento, constituem o meio adequado para que o aluno
avance na construção de ideias, sentimentos e valores.” (MANTOAN, 2001,
p.59).

Guimarães resume bem o que se viu até aqui:

Historicamente, o aluno com, necessidades educacionais especiais


tem sido alvo de discriminação social, sendo-lhe negados direitos
básicos necessários à sua cidadania. Faz-se necessário ampliar a
discussão coletiva na busca de alternativas, considerando as
dificuldades, potencialidades, direitos e deveres desses cidadãos.(...)
A qualidade da educação resulta de respostas educativas aos objetivos
individuais e necessidades de cada aluno, numa perspectiva de
prepará-lo para o exercício da cidadania e sua inserção no mercado de
trabalho, os quais constituem a finalidade da educação (GUIMARÃES,
2002, p.38).

Como pôde ser visto, no âmbito da educação inclusiva, evidencia-se a


questão da pessoa com deficiência e as diversas manifestações das
necessidades especiais, porém, ainda vinculadas às limitações físicas,
sensoriais e cognitivas. A literatura que aborda a história do movimento de
inclusão se mostra limitada quando se refere às várias diferenças existentes na

53
sala de aula. Dessa forma, a fala de Guimarães (2002) sobre a ampliação do
debate e a busca de novas alternativas se faz relevante.

As necessidades educacionais especiais e a legislação


referente à inclusão nas escolas regulares
Como se colocou anteriormente, a história da inclusão é diretamente
associada à deficiência. Isso coloca em questão que as pessoas com
necessidades educacionais especiais eram vistas como pessoas com
deficiências e, consequentemente excluídas, aumentando a parcela dos que
eram privados do processo educativo. Tanto na literatura da história da inclusão
como na literatura da inclusão na atualidade se percebe um vazio no
aprofundamento do que possa ser incluído no conceito de necessidade
educacional especial, sem necessariamente ser concebido como deficiência. As
referências de inclusão ainda estão muito acorrentadas ao sentido da
deficiência, faltando ainda a transposição do sentido da inclusão para as
diversas diferenças que se manifestam na escola, inclusive as abordadas no
debate no campo do currículo.

O portador de necessidades educativas especiais, de acordo com as


Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (Resolução
CNE/CEB nº2) é aquele que durante o processo educacional, por tempo limitado
ou ilimitado, apresenta:

dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo


de desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades
curriculares (as relacionadas a condições, disfunções, limitações ou
deficiências e as não vinculadas a uma causa orgânica específica),
dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais
alunos, demandando a utilização de linguagens e códigos aplicáveis,
e altas habilidades ou superdotação, grande facilidade de
aprendizagem que leve estes alunos a dominar rapidamente conceitos,
procedimentos e atitudes (art. 5º, incisos I, II, III). Além das
necessidades educacionais especiais, a nova escola leva em
consideração “a identidade própria de cada educando, o
reconhecimento e a valorização das suas diferenças e potencialidades,
como base para a constituição e ampliação de valores, atitudes,
conhecimentos, habilidades e competências” (art. 4°, inciso II).

54
Segundo esses documentos oficiais, não é o aluno com NEE que deve se
adequar à escola, mas sim a escola que deve se adequar a ele. Seja qual for a
limitação, que dificulte o acompanhamento das atividades curriculares, essa é
considerada uma necessidade educativa especial. De acordo com o conceito
acima, desmistificou-se o conceito de que um aluno com NEE, para ser
considerado como tal, precisa ter uma deficiência física ou mental. Muitas
limitações existentes não se encaixam com um perfil de dificuldade física ou
sensorial e, mesmo assim, são consideradas necessidades educativas
especiais.

O quadro que coloca alunos em situação de dificuldades de


aprendizagem é amplo: há déficit de atenção, transtornos emocionais
temporários, e, a isso se acrescem uma outra gama de situações que
recomendam atenção diferenciada. Podemos citar um aluno epiléptico, ou gago,
ou diabético e outras limitações ou doenças; eles não apresentam deficiência
física, nem sensorial e nem dificuldades para aprender pelo fato de ter essas
limitações, mas apresentam necessidades educativas especiais, pois
necessitam de acompanhamento diferenciado. E até mesmo um aluno, que por
um período limitado tem sua perna engessada, torna-se uma pessoa com
necessidades educacionais especiais (PNEE), pois necessitará de um
acompanhamento diferenciado; nesse caso, a escola precisará se adequar às
necessidades desse aluno, seja um olhar mais cuidadoso nos horários de recreio
e intervalo, seja no trajeto até à sala pelas escadas e outros.

Para alguns autores, a terminologia NEE é adotada para distinguir os


indivíduos em suas singularidades, temporárias ou não. Portanto, inclui todos
que apresentam limitações físicas, motoras, sensoriais, cognitivas, linguísticas,
condutas desviantes, altas habilidades, síndromes e diferenças de outras
naturezas.

...devemos levar em conta a diferença e a variedade de pessoas e


opiniões (...) assumindo que as pessoas são diferentes e a sociedade
é formada pelo conjunto dessas pessoas. Essas diferenças garantem
a sua individualidade e todos os envolvidos devem ser levados em
conta, estabelecendo tratamentos sem distinção de qualquer natureza
(etnia, ideologia, religião, raça/cor, sexo/gênero, origem social,

55
deficiência, posição econômica, condição de saúde, idade,
nacionalidade, naturalidade, etc). (GUIMARÃES, 2002, p. 22).

Na percepção de Guimarães (2002), os alunos que muitas vezes não são


lembrados pela literatura ou pelas leis e decretos, mas são vistos com frequência
na prática escolar devem ter atenção especial na escola. Sua compreensão da
inclusão extrapola, portanto, a condição de limitação orgânica ou física e se
aproxima da concepção defendida no campo do currículo: incluir as pessoas,
com todas as suas singularidades. Mas, na maior parte da literatura, assim como
na prática escolar, é raro um aluno cigano ou artista de circo ser caracterizado
como aluno com NEE. Num levantamento realizado pela autora desta
dissertação sobre crianças artistas de circo como PNEE18, ela registrou
dificuldades e preconceitos vividos por essas crianças. Em uma entrevista feita
com a mãe de uma criança do Circo Estoril, em passagem por Belo Horizonte,
esta relata que em um ano seu filho passou por quarenta escolas, devido à
rotatividade da atividade circense; já em entrevista com uma outra mãe do Circo
Imperial, também em passagem por Belo Horizonte, esta relatou a dificuldade
na aceitação de muitas escolas em matricular crianças circenses. Por vezes é
necessário a intervenção do sindicato dos artistas de circo. Outro ponto quanto
à escolarização desses alunos é a não distribuição dos livros didáticos pela
escola que, segundo a mãe, o recado vindo da escola por sua filha é de que as
pessoas do circo não devolvem os livros; com isso as crianças ficam privadas
de uma série de atividades, incluindo também as tarefas de casa. Assim, uma
situação evidente de atendimento especial, a criança é simplesmente posta à
margem do processo regular de ensino.

Um outro exemplo dessa situação foi evidenciado na monografia de


especialização19, também da autora desta dissertação, que investigou a
situação de alunos diabéticos. Primeiramente, a pesquisa comprovou que
grande parte das escolas indica como PNEE apenas os alunos com deficiência
física, mental, visual e auditiva, o superdotado, o mudo e o autista. O diabético,
que foi o foco da pesquisa, foi um dos perfis sub-representados pelas escolas
na indicação de quem eram os seus alunos considerados PNEE. De acordo com
os dados levantados, confirma-se, entretanto, que o diabético é um perfil habitual
de crianças matriculadas nas escolas e mesmo com suas necessidades devido

56
à doença, que é crônica, grave e incurável, não é reconhecido como um aluno
que mereça um olhar especial.

Nessa pesquisa, a pesquisadora lidou com duas informações que


possibilitaram essa conclusão. Primeiro, a indicação da escola sobre a existência
de alunos diabéticos. Em segundo lugar, o tipo de aluno com NEE existentes na
escola e que tipo de diferença ela considera como NEE.

Quando as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação


Básica (Resolução CNE/CEB nº2) conceitua o portador de necessidades
educacionais especiais como aquele que apresenta dificuldades no
acompanhamento das atividades curriculares sejam elas as relacionadas a
condições, disfunções, limitações ou deficiências e as não vinculadas a uma
causa orgânica específica, é possível dizer que perfis como o do cigano, o do
artista de circo, o do diabético e outros tantos se encaixam como PNEE,
considerando o entendimento dado por Guimarães (2002).

Não há dúvidas: as escolas precisam adaptar-se aos alunos e não o


inverso. Crianças, adolescentes e também os adultos não podem mais
continuar sendo sacrificados e levando uma vida de baixa qualidade
por causa da nossa incapacidade de responder aos estilos de
aprendizagem e às múltiplas inteligências de cada um deles.
(SASSAKI in GUIMARÃES, 2002, p. 24).

Ainda assim fica a angústia das lacunas e generalizações apresentadas


em leis como o “preferencialmente” da LDB/96 e o “no que for possível” da
LDB/61. A utilização dessas nomenclaturas oferece margens a vários
entendimentos, o que consequentemente pode gerar dúvidas e até mesmo
exclusões.

O’Regan (2007) no ‘Sobrevivendo e vencendo com necessidades


educacionais especiais’ lista e explica um leque de perfis, alguns também
conceituados como transtornos e deficiências, porém outros não: alunos com
dificuldades nas interações sociais, pouca concentração, baixo auto-estima,
hiperatividade, dificuldades de leitura, escrita, ortografia ou manipulação de
números, memória curta, baixa percepção espacial (dislexia, discalculia e
dispraxia encaixam-se nos 6 últimos perfis); dificuldades com o tom a e qualidade

57
da voz, gagueira, atrasos no desenvolvimento, crianças superdotadas e também
deficiências como paralisia cerebral, doenças cardíacas, hidrocefalia e outras.
Embora também ampliada, a concepção desse autor não é a mesma que a de
Guimarães. O autor não aborda questões de ordem cultural.

Mas a PNEE pode ser considerada em um segmento que representa uma


minoria na sociedade, a partir do momento em que a sociedade exclui sua
condição de diferente e o reconhecimento de que necessita de atendimentos
especiais. Assim, como a PNEE necessita de atenção e acompanhamento
diferenciado na escola, ela automaticamente necessita de acompanhamento
diferenciado na sociedade, até porque:

“historicamente, o aluno com necessidades educacionais especiais


tem sido alvo de discriminação social, sendo-lhe negados direitos
básicos necessários à sua cidadania. Faz-se necessário ampliar a
discussão coletiva na busca de alternativas, considerando as
dificuldades, potencialidades, direitos e deveres desses cidadãos.”
(GUIMARÃES, 2002, p.38).

Apesar dessa ambiguidade, a expressão necessidades especiais tornou-


se bastante conhecida no meio acadêmico, no sistema escolar, nos discursos
oficiais e mesmo no senso comum, desde que a expressão excepcionais foi
substituída por necessidades educacionais especiais, ratificada
internacionalmente na Declaração de Salamanca. A tendência atual é empregar
termos menos estigmatizantes, mais gentis e menos carregados
emocionalmente, em substituição aos mais antigos, que adquiriram conotações
de desamparo e desesperança.

No Brasil, em 1986, o MEC já adotava tal designação, que passou a


figurar como portadores de necessidades educacionais especiais –
PNEE na Política Nacional de Educação Especial (SEESP/MEC/1994),
na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, Lei n.
9.394/96) e, finalmente, nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Especial (MEC/2001). Portanto, a nomenclatura está
oficialmente consagrada até que seja destituída pela hegemonia de
uma nova concepção. (DICIONÁRIO DO PROFESSOR, 2001, p. 36).

De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais para a educação


especial (SEESP/MEC/01), essa expressão pode ser utilizada para referir-se a

58
um leque de manifestações, de natureza orgânica ou não, de caráter temporário
ou permanente, cujas consequências incidem no processo educacional. “Mas as
ressalvas e sutilezas continuam, pois o termo “portadores de” caiu na armadilha
do léxico que aprisiona o sujeito ao desconforto de portar ou carregar
deficiências, necessidades ou direitos.”(DICIONÁRIO DO PROFESSOR, 2001,
p. 37).

Todo esse discurso abarca a questão da diferença, da igualdade e da


desigualdade. “Mas afinal, todos são iguais ou são diferentes? As pessoas
querem ser iguais ou querem ser diferentes?”(FERREIRA e GUIMARÃES, 2003,
p. 35).

Durante um longo tempo, a resposta a essa pergunta seria simples: todos


queriam ser iguais e exigiam ser tratados iguais. Porém, a partir da década de
70, após uma nova atmosfera cultural e ideológica, “as novas diferenças”
começaram a se impor, tanto no âmbito coletivo quanto no aspecto individual.
Assim, hoje, a palavra de ordem é “respeito” e consideração às diferenças. É
preciso, viver a igualdade na diferença e fazer com que ela deva ser considerada
e reconhecida como legítima fonte de direitos específicos. “Em vez de exigirem
mais equidade entre os seres humanos e lutarem por mais igualdade, de
insistirem na demanda de cidadania igual para todos, essas minorias querem
respeito e o direito a ser diferentes”. (FERREIRA e GUIMARÃES, 2003, p. 35).

O movimento atual de inclusão escolar visa reverter o percurso de


exclusão de qualquer natureza e ampliar as possibilidades de inserção de
crianças, jovens e adultos em escolas regulares. O movimento mundial por uma
educação para todos vem se fortalecendo, sobretudo, a partir das últimas
décadas. Uma decorrência desse movimento é a aprovação e ratificação de
recomendações e princípios proclamados, internacionalmente, em convenções,
conferências e documentos dos quais o Brasil é signatário. Lembrando também
que são um dos deveres básicos do Estado Democrático transmitir a todos os
cidadãos, informações honestas e transparentes sobre seus direitos e a forma
de como garanti-los na prática.

59
Em 1948, a Declaração dos Direitos Humanos vem assegurar o direito de
todos à Educação pública e gratuita, oportunidades sociais iguais para todos
contribuindo para a criação dos serviços de educação especial e classes
especiais em escolas públicas do Brasil. Mais adiante, surge a política Nacional
de Educação, LDB nº 4021/61 com a recomendação de integrar no sistema geral
de ensino a educação de excepcionais, como eram chamadas as pessoas com
necessidades educacionais especiais. Nesse documento, a educação especial
foi colocada no Titulo X, arts. nº 88 e 8920, separadamente da educação geral,
tida até então como “normal”. No entanto, de forma contraditória, a educação
especial deveria, no que fosse possível, enquadrar-se no sistema geral da
educação. Entretanto, o Estado não atribuía a si nenhuma responsabilidade e
não mencionava seu dever, ficando restrito apenas a um direito de todos. É bom
lembrar que antes desse panorama em que a educação especial foi destacada
na legislação brasileira; no século XIX, a escolaridade elementar não era
obrigatória para crianças não vacinadas, com doenças contagiosas, escravos, a
população residente num espaço geográfico longe da escola e, menores de 5
anos e maiores de 15. (Não obrigatoriedade da educação, 21-)

Nesse sentido, a educação como direito e sua efetivação em práticas


sociais converte-se em instrumento de luta pela redução progressiva
das desigualdades e extinção das discriminações e possibilita uma
aproximação pacifica entre os povos do mundo. (CURY, 2005, p. 22).

Apenas a partir de 1980 se iniciou um reconhecimento legal do direito à


diferença. Pode-se citar a Constituição Federal de 1988, que veio incorporar em
seu preâmbulo, entre outros princípios, o de assegurar ao Brasil uma sociedade
mais pluralista, ressaltando o artigo 206, do capítulo voltado para a educação,
que se refere aos currículos como documentos que devem respeitar os valores
culturais, artísticos, nacionais e regionais.

A década de 90 iniciou com a aceitação política da Proposta de Educação


para Todos, produzida em Jomtien, Tailândia, na Conferência Mundial da
Unesco. Nesse contexto, em 1994, realizou-se a Conferência Mundial de
Educação Especial que deu origem a Declaração de Salamanca, que propõe a
escola inclusiva, isto é, uma escola aberta às diferenças, na qual crianças, jovens

60
e adultos devem aprender juntos, independentemente de suas características,
origens, condições físicas, sensoriais, intelectuais, linguísticas ou emocionais,
econômicas ou socioculturais.

A Declaração de Salamanca é um importante instrumento para a


consolidação da inclusão escolar, ela representa um marco diferencial no
movimento da escola inclusiva, até mesmo porque foi elaborada com a
participação de 88 governos e 25 organizações internacionais. Ainda assim, vale
lembrar que mesmo a Declaração expondo que todos devem ser incluídos,
independente das diferenças, ela reforça as deficiências como desafio da
educação.

“O princípio que orienta esta Estrutura é o de que escolas deveriam


acomodar todas as crianças independentemente de suas condições
físicas, intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outras.
Aquelas deveriam incluir crianças deficientes e super-dotadas,
crianças de rua e que trabalham, crianças de origem remota ou de
população nômade, crianças pertencentes a minorias linguísticas,
étnicas ou culturais, e crianças de outros grupos desavantajados ou
marginalizados.” (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994, p. 1).
(...) legislação deveria reconhecer o princípio de igualdade de
oportunidade para crianças, jovens e adultos com deficiências na
educação primária, secundária e terciária, sempre que possível em
ambientes integrados. (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994, p. 7).

Ainda que várias diferenças sejam lembradas, a deficiência mostra ser o


foco da inclusão escolar. Na introdução dessa declaração, há trechos que
evidenciam o direcionamento da inclusão escolar para as pessoas com
deficiência: “...os Estados assegurem que a educação de pessoas com
deficiências seja parte integrante do sistema educacional.” e “...organizações de
pessoas com deficiências, na busca pela melhoria do acesso à educação.” Pode-
se perceber que a Declaração de Salamanca é importante para o debate da
inclusão, porém também trata as diversas necessidades educacionais especiais
de forma periférica.

No contexto desta Estrutura, o termo "necessidades educacionais


especiais" refere-se a todas aquelas crianças ou jovens cujas
necessidades educacionais especiais se originam em função de
deficiências ou dificuldades de aprendizagem. (DECLARAÇÃO DE
SALAMANCA, 1994, p. 3).

61
Posteriormente, um encontro ibero-americano resultou na Convenção da
Guatemala, que aboliu toda forma de discriminação, na sociedade e na escola.
O documento resultante dessa Convenção foi aprovado pelo Congresso
Nacional e incorporado à legislação brasileira, em 2001, por meio do Decreto
Presidencial nº 3956 de 8/10/2001.

Ao assumir tal compromisso, o Brasil também se determinou à profunda


transformação do sistema educacional brasileiro, de forma a poder acolher
todos, indiscriminadamente, com qualidade e igualdade de condições.

No final da década de 90, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Lei


nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, foi a primeira lei no campo educacional
no Brasil a dedicar um capítulo exclusivo à Educação Especial, reafirmando a
necessidade e a importância da matrícula das crianças com necessidades
especiais na escola comum e o rompimento com o modelo assistencial e
terapêutico operante, até então, no que diz respeito ao tratamento dispensado a
educandos com deficiências e necessidades educativas especiais.

De acordo com o artigo 59 da LDBEN, os sistemas de ensino devem


assegurar aos educandos com necessidades especiais: currículos, métodos e
técnicas, recursos educativos e organização específica para atender às suas
necessidades, criação de classes específicas somente quando não for possível
a integração desses alunos às classes comuns do ensino regular, promover
especialização adequada aos professores de classes especiais e de classes
regulares que atenderão, também, alunos com necessidades especiais e
estender a esses alunos todos os benefícios sociais suplementares, adotados
para os alunos de ensino regular.

A Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação, em 2002


produziu um documento que recebeu o nome de ‘Estratégias e Orientações para
a Educação de Alunos com Dificuldades Acentuadas de Aprendizagem
Associadas às Condutas Típicas’, nele há um tópico sobre o atendimento aos
alunos com NEEs em classes comuns. Cita-se que é necessário que a escola
preveja: professores capacitados, e quando necessário, professor especializado;
distribuição dos alunos com necessidades educacionais especiais em diferentes

62
classes, de modo a se beneficiarem das diferenças e que ampliem positivamente
as experiências de todos os alunos, considerando os princípios da educação
para a diversidade; flexibilizações e adaptações curriculares, que considerem o
significado prático e instrumental dos conteúdos básicos; metodologias de
ensino e recursos didáticos diferenciados, bem como processos de avaliação
contextualizada que envolvem todas as variáveis intrínsecas ao processo ensino
e aprendizagem. E ainda: serviços de apoio pedagógicos especializados, sejam
em classes comuns; avaliação pedagógica processual para a identificação das
necessidades educacionais especiais e indicação dos apoios pedagógicos
adequados; temporalidade flexível do ano letivo, de forma que o aluno possa
concluir em tempo maior o currículo previsto para a série ou etapa escolar na
qual está inserido, quando necessário; condições para a reflexão, ação e
elaboração teórica da educação inclusiva na prática pedagógica, colaborando
com instituições de ensino superior e pesquisa; uma rede de apoio inter-
institucional que envolva profissionais das áreas de saúde, assistência social e
de trabalho, por meio de convênios com organizações públicas ou privadas, para
garantir o sucesso da aprendizagem e a sustentabilidade do processo inclusivo
mediante o trabalho da equipe escolar com a participação da família e da
comunidade.

Como ideias para o professor, o documento sugere: desenvolver a


capacidade de observação de modo a perceber com clareza os indicadores de
um comportamento inadaptado; estruturar o ambiente para envolver e motivar
os alunos, envolvendo alunos para serem auxiliares do dia e fazendo serviços
de monitoria, de forma que sejam colaboradores e co-responsáveis pelas
atividades desenvolvidas em sala e uma avaliação funcional com pais,
estudantes e outros profissionais, para os quais serão questionados os aspectos
de ambiente físico, interações sociais, ambiente educacional e fatores não
acadêmicos.

O documento traz também passos para o planejamento de um programa


de inclusão, como: identificação dos membros necessários da equipe
educacional, identificação das habilidades, competências e das necessidades
educacionais especiais do aluno; identificação do suportes e serviços
necessários, análise descritiva do programa educacional desse alunado,

63
identificação e descrição de prováveis classes onde ele possa melhor se
beneficiar, desenvolvimento de um programa de atividades que contemple o
período de adaptação, estabelecimento do sistema de apoio necessário, oferta
de apoio técnico ao desenvolvimento do programa, capacitação dos professores
quanto às necessidades educacionais em sala de aula, envolvimento contínuo
dos pais no programa escolar e acompanhamento do progresso do aluno e sua
modificação, sempre que necessário.

Para o estado de Minas Gerais, tem-se como importante passo para a


inclusão escolar o 2º Fórum Mineiro de Educação, realizado nos meses de junho
a outubro de 2001, com o objetivo de traçar metas para a educação do Estado
até 2012, denominando-se Plano Decenal. Algumas dessas metas são:
equidade na educação, igualdade nas condições de acesso e permanência na
escola, educação para a diversidade, respeito às diferenças individuais das
crianças e garantia de cuidados essenciais ao desenvolvimento de sua
identidade, inclusão em cinco anos, de 80% dos portadores de necessidades
especiais no ensino regular; concessão de programas de aceleração aos
superdotados, desenvolvimento de programas de ensino e pesquisa para a
educação escolar indígena, ações para estimular e manter as escolas família
agrícola, em zonas rurais; e, entre outros, elevar os investimentos em educação
de 25% para 35% da receita resultante de impostos.

É importante lembrar que muito embora o artigo 5º, inciso I da


Constituição da República de 1988 cite que todos são iguais perante a lei, a
melhor interpretação jurídica doutrinária e dos Tribunais Superiores é que se
devem tratar os desiguais na medida das suas desigualdades, a fim de equilibrar
as diferenças existentes. Porém, ainda assim, a existência de leis que amparem
a diferença não quer dizer, automaticamente, que ela aconteça verdadeiramente
na realidade.

A igualdade de direitos proclamada em documentos oficiais não gera


por si só a igualdade de oportunidades e de condições. Se -como diz
Aristóteles – o justo é o que é conforme à lei e a igualdade, então, o
governo da lei e a igualdade perante a lei representam uma proteção
fundamental contra o arbítrio do governo dos homens. (CURY, 2005,
p. 74).

64
Mais uma vez, evidencia-se a direção do debate de inclusão para o foco
das deficiências. No entanto, considera-se importante ratificar que quando os
documentos se referem à equidade na educação, igualdade nas condições de
acesso e permanência na escola, educação para a diversidade, respeito às
diferenças individuais das crianças e garantia de cuidados essenciais ao
desenvolvimento de sua identidade, consequentemente, eles incluem todas as
categorias de NEE, abarcando todas as situações de minorias e diferenças.

A escola inclusiva
Como foi assinalado, não há uma conceituação única para a educação
inclusiva. Entretanto, o debate colocado permite concluir que a inclusão não visa
apenas à inserção do aluno ou o acesso à escola, mas sim a inserção escolar
de forma completa e sistemática, não deixando ninguém no exterior do ensino
regular, desde o início da idade definida como “escolar”. É essa perspectiva que
defende o campo curricular no movimento de “direito às diferenças”, como
também aqueles que amparam a educação de PNEE.

A escola inclusiva implica, portanto, em uma mudança de perspectiva


educacional, pois abarca não só os alunos com deficiência e os que apresentam
dificuldades de aprender, mas todos os demais, atendendo a todas as diferenças
e necessidades individuais de um alunado que reflete a diversidade humana
presente numa sociedade plural. Assim, fala-se de uma escola para todos.

Se o que pretendemos é que a escola seja inclusiva, é urgente que


seus planos se redefinam para a educação voltada para a cidadania
global, plena, livre de preconceitos, que reconheça e valorize as
diferenças. Chegamos a um impasse: para reformar a instituição,
temos de reformar as mentes, mas não há como reformar as mentes
sem uma previa reforma das instituições. (MANTOAN, 2006, p.16-17).

A escola inclusiva desconstrói o sistema atual de significação escolar


excludente, normativo e elitista, marcado até então no Brasil pelo fracasso,
evasão, privações constantes e baixa auto-estima resultantes das exclusões
escolar e social. Mas a inclusão é produto de uma educação democrática e
transgressora e o aluno de uma escola inclusiva não é um aluno de uma

65
identidade fixada em modelos ideais, dentro de uma ordem dicotômica de bonito
e feio, normal e anormal, produtivo e improdutivo, forte e fraco, útil e inútil ou
igual e diferente. É um aluno que é sujeito, que pertence a diferentes culturas,
que apresenta diferenças sociais, econômicas, raciais, físicas, mas que não os
inferiorizam. “Há diferenças e há igualdades – nem tudo deve ser igual, assim
como nem tudo deve se diferente. É preciso que tenhamos o direito de sermos
diferentes quando a igualdade nos descaracteriza e o direito de sermos iguais
quando a diferença nos inferioriza.” (MANTOAN, 2006, p. 24-25), (SANTOS,
1995)

Numa escola inclusiva, a educação deve contemplar os objetivos


individuais de cada aluno, contrariamente à proposta tradicional segundo a qual
todos devem atingir os mesmos objetivos. Isso pressupõe uma ressignificação
da escola para que ela ofereça respostas educativas de qualidade para todos. É
um novo paradigma de pensamento e de ação, pois o que antes cabia ao aluno
se adequar a escola, agora é ela quem deve modificar seu funcionamento para
atender ao pluralismo de seu alunado. O ideal de uma escola inclusiva é uma
sociedade em que a diversidade seja considerada um atributo de particularidade
e não uma exceção.

Não é difícil constatar que a escola está cristalizada e institucionalizada


para lidar apenas com a homogeneidade. Trabalhar com o igual é mais fácil e
simples, pois os desafios são sempre os mesmos e as formas de resolvê-los
também é a mesma. Com um alunado sem diferenças dentro da escola não se
corre riscos e não se coloca em xeque suas práticas, valores, hábitos e
verdades. Mas a partir do momento que a escola resolve e precisa ser inclusiva,
é necessário repensar suas práticas, a formação de seus educadores,
modificando as abordagens de ensino para satisfazer as necessidades deles.

Pode parecer utópica a ideia da escola inclusiva, mas não é, porque


também não é utópica e nem irreal as diferenças dos alunos. Os alunos são
reais, de carne e osso, assim como suas diferenças, portanto a escola também
precisa ser real onde caibam todos os alunos e não só os que se encaixam em
padrões e modelos estereotipados. O olhar sobre o fracasso escolar e suas
possíveis causas precisa voltar para dentro das escolas e suas práticas. Até

66
então, essa questão estava sempre ligada aos alunos. Uma escola inclusiva
pressupõe uma série de mudanças: flexibilidade no uso do tempo, do espaço e
das formas de agrupamento, revisão das estratégias educacionais e os
fundamentos que as sustentam, avaliação crítica dos resultados do seu fazer
pedagógico, assumindo responsavelmente e fazendo correções da prática,
quando necessário.

Para a implementação de uma escola inclusiva e o primeiro passo nessa


nova esfera, algumas questões precisam ser levantadas pela escola: O que
existe hoje para apoiar a educação inclusiva? Quais são as atuais barreiras e
soluções relativas a sua implementação? O que a escola pretende fazer na
preparação de seus educadores? Como os alunos serão incluídos? Qual é o
papel da família? De que precisa a escola e o professor para o desenvolvimento
educacional dos seus alunos? Quem são os alunos atendidos pela escola? Que
tipo de necessidade cada aluno apresenta? (GUIMARÃES, 2002).

Sabe-se que a escola inclusiva ainda sofre resistência por vários grupos:
pais, professores, gestores e os próprios alunos. Usam-se argumentos como:
“esses alunos aqui conosco vão nos desviar do nosso propósito real e destruir
nossa rotina”. Isso porque esses alunos são os gagos, epiléticos, ciganos,
explorados sexualmente, hiperativos, diabéticos, artistas de circo, pobres, de
outras religiões, desnutridos, superdotados, homossexuais, sem apoio da
família, com déficit de atenção e muitos outros que estão sendo alijados do
sistema escolar regular. “Se desejamos uma sociedade inclusiva em que todas
as pessoas sejam consideradas com direitos iguais, a segregação nas escolas
não pode ser justificada.” (STAINBACK e STAINBACK, 2006, p. 433).

A segregação vem sendo praticada há séculos, e há atitudes, leis,


política e estruturas educacionais entrincheiradas que trabalham
contra a inclusão incondicional de todos os alunos. Além disso, devido
ao fato de um segundo sistema de educação (isto é, a educação
“especial”) ter funcionado durante tanto tempo, muitas escolas
infelizmente não sabem, no momento, como planejar e modificar os
currículos e os programas de ensino para satisfazer às diferentes
necessidades dos alunos. (...) Entretanto, o objetivo se deter escolas
inclusivas onde todos estejam inseridos e tenham amigos e onde
sejam utilizados programas e apoios educacionais adequados é
importante demais para não se aceitar o desafio. (STAINBACK e
STAINBACK, 2006, p. 434-435).

67
Para se construir uma escola inclusiva não há regras e nem receitas, cada
escola é uma e recebe alunos diferentes umas das outras. Cada escola precisa
construir com sua equipe um projeto e pensar novas posturas frente à
diversidade. Como se viu no item 3.2 deste trabalho, a política de inclusão é algo
recente em nossa sociedade, ainda não se tem muitos modelos e práticas de
inclusão. O mais importante no momento é saber que a largada já foi dada e que
não há tempo a perder. O debate existe e as práticas precisam ser reconstruídas.

Um dos maiores desafios da escola inclusiva é a formação dos


educadores, tantos os professores quanto os gestores foram formados e
preparados para um único modelo de aluno, e, além disso, um modelo
idealizado, em padrão estereotipado para reger a busca e produção do
homogêneo. E com isso “muitos professores acostumam-se a usar uma
abordagem “tamanho único”, para o ensino” (STAINBACK e STAINBACK, 2006,
p. 81), não só os professores, mas os gestores também. O debate da formação
do professor inclusivo também é recente. Questiona-se que os professores não
estão preparados para escola inclusiva, mas quando estarão? O que os farão
‘prontos’ para a inclusão? Uma especialização? Um curso de extensão? O que
diferencia um professor inclusivo de um não inclusivo? Por que se espera tanto
essa formação que pode não se ter dessa forma tão ‘quadradinha’? É possível
se ter currículos para formação de professores inclusivos? Quem está pronto
para construir esses currículos, então?

Tem se questionado quanto a essa formação tão almejada. Em setembro


de 2007, no IX Congresso Estadual Paulista sobre Formação de Educadores21,
pesquisadores e educadores de grande importância no cenário brasileiro de
educação inclusiva como Anna Augusta Sampaio de Oliveira22 e Maria Teresa
Eglér Mantoan23, debateram a formação do professor para a educação
inclusiva. Nesse seminário, ficou evidente que a formação do professor precisa
ser realmente reestruturada. Mantoan argumentou que “os casos que a escola
regular não dão conta, não quer dizer que a escola especial também daria”.
(Informação verbal)24 Isso revela que aquele professor especial e herói, com
características únicas, que não tem dúvidas e incertezas, que as pessoas
esperam para a educação inclusiva não existe na realidade.

68
Outro debate semelhante aconteceu no V Colóquio de Pesquisa em
Educação, em outubro de 200725. O debate sobre a formação dos professores
girou em torno de uma formação específica para cada diferença ou uma
formação genérica de inclusão e, a partir do surgimento das diferenças em sala
de aula o professor se aprofundaria no assunto. Vê-se que as dúvidas são
maiores que as certezas, porém, vê-se que o debate está em jogo e que precisa
continuar.

Mesmo com essas dificuldades, a construção da escola inclusiva precisa


ser feita já. Como foi dito, não há argumentos concisos que convençam a não
construção da inclusão. É preciso respeitar as diferenças, aceitar o outro como
é e “se realmente queremos que alguém faça parte das nossas vidas, faremos o
que for preciso para receber bem essa pessoa e acomodar suas necessidades”
( FOREST apud STAINBACK e STAINBACK, 2006, p. 250).

Mantoan (2006) define bem o que não é inclusão: “quando há uma classe
de inclusão, quando há uma escola de inclusão, quando há uma professora de
inclusão, quando há as crianças de inclusão”, (MANTOAN, 2006, p.42), ou seja,
quando há segregação, não há inclusão. E mais, quando os livros didáticos são
usados como ferramenta exclusiva da orientação do currículo, quando se serve
de matrizes para que todos os alunos preencham ao mesmo tempo, as mesmas
perguntas, com as mesmas respostas; quando os projetos são desvinculados
das experiências e do interesse dos alunos, quando se considera a prova final
decisiva na avaliação do rendimento escolar dos alunos e outros, é também
prova de que não houve inclusão.

Ensinar significa atender às diferenças dos alunos, mas sem


diferenciar o ensino para cada um, o que depende, entre outras
condições, de se abandonar um ensino transmissivo e adotar uma
pedagogia ativa, dialógica, interativa, integradora, que se contrapõe a
toda e qualquer visão unidirecional, de transferência unitária,
individualizada e hierárquica do saber. (MANTOAN, 2006, p. 49).

O outro lado da inclusão


Apesar da ideia e da proposta de inclusão não serem passíveis de
resistência, tendo em vista o momento social, ela merece um olhar crítico em

69
relação à sua origem e significado, assim como foi feito com o currículo a partir
da década de 70. Da mesma forma que o currículo foi desvelado e teve um olhar
mais crítico quanto à sua ingenuidade e naturalidade, a proposta de inclusão
escolar também merece um foco nesse sentido. Até mesmo para que sua
construção seja eficaz, sem rótulos e sem inocência.

Já se sabe que a inclusão pode ser benéfica para que os estudantes com
NEE tenham acesso a uma gama bem mais ampla de papéis sociais; percam o
medo e o preconceito em relação ao diferente, desenvolvam a cooperação e a
tolerância; adquiram senso de responsabilidade e melhorem o rendimento
escolar; e sejam melhores preparados para a vida adulta porque desde cedo
assimilam que as pessoas, as famílias e os espaços sociais não são
homogêneos e que as diferenças são enriquecedoras para o ser humano. Além
disso, também podem ser citadas ações como: aceitação e celebração das
diferenças sociais; valorização de cada pessoa (o direito de pertencer);
convivência dentro da diversidade humana, ou seja, igual importância às
minorias; aprendizagem através da cooperação (solidariedade humanitária); e
cidadania com qualidade de vida.

No entanto, há o outro lado da inclusão em que ela pode ser vista como
espaço de poder, poder para o controle e a regulação social. De forma que, a
partir do momento em que o “excluído” se torna “incluído”, ele perde
características singulares de sua diferença para se homogeneizar ao todo.

Seria uma política de “Incluir para normalizar: estratégias de


poder.”(LUNARDI, 21-). Dessa forma, a inclusão precisa ser vista também como
uma estratégia de poder para a normalização. De forma que, com a educação
regular e todos os alunos sendo atendidos por ela, tem-se uma massa mais
uniforme e sem “diferenças”, já que todos foram incluídos num único sistema
educacional. Não que essa atitude questione a inclusão de todos os alunos, mas
questiona o que pode estar por trás de uma suposta integração, que é o
agrupamento, não sendo, portanto, uma verdadeira inclusão.

O olhar crítico precisa ser em relação da inclusão como forma de


normalização, pois, com uma intenção de se incluir para normalizar e igualar,

70
domina-se e regula-se toda uma massa que antes era caracterizada por suas
diferenças. O que é mais sério do que o controle do grupo, é o controle de cada
um, ou seja, o autogoverno. Com a inclusão, ou uma suposta inclusão, o sujeito
se torna mais um dentro do “todos”, se autogovernando a todo o momento para
não ser diferente e continuar “sendo incluído”.

A inclusão enquanto processo de normalização é uma forma de


dominação, de controle e de governo. Governo que não é só dos
outros, mas governo de si. Ou seja, a inclusão não controla somente a
população, o próprio excluído/incluído se autogoverna. Para Foucault,
a questão do governo está fortemente imbricada com a questão do
autogoverno. (LUNARDI, 21-).

Portanto, aquilo que deve ser posto em discussão não é o caráter binário
das políticas de inclusão/exclusão, mas os argumentos, as condições de
possibilidades que fundamentam essas políticas, como também quais os
significados e representações que se produzem e reproduzem nessas
propostas. Assim, a inclusão deve ser concebida nos seus contornos teóricos e
práticos para permitir uma visão crítica dessa prática social e não somente de
seu discurso que, gradualmente, está se tornando hegemônico.

A metáfora do pastor pode ser utilizada para entender o processo de


inclusão/exclusão, pois ambos já se consolidam sem o controle e a
vigilância do Estado, isto é, o rebanho não necessita mais do controle,
do olhar vigilante do pastor, pois tanto o sujeito quanto a população já
estão regulados por esse olhar dentro de si. Eles não necessitam mais
do olhar cuidadoso do pastor, já o incorporaram tanto na sua forma
individualizante (cada um) quanto totalizante (população). Nesse
contexto, o próprio excluído é pastor de si, ou seja, ele mesmo se
controla, se regula, através dos processos de subjetivação. (LUNARDI,
21-).

Sobre a inclusão é necessário pensá-la, desnudá-la em todos os seus


sentidos. Certamente não é possível perceber todos os sentidos que essa
expressão contém. Mas, cooperativamente, pode-se reconstruí-la com base nas
práticas, re-significando-as permanentemente. Aí sim, tem-se a Educação
transformadora, formadora de cidadãos livres, conscientes e incluídos
socialmente, como é justo e desejável.

71
Pensando no outro lado da inclusão e em seu descortinamento, não é só
o controle social que pode significar o outro lado da moeda, mas a contenção de
gastos, por parte do governo também é um fator que incentiva à inclusão. Com
o fim das escolas especiais e com os alunos no sistema regular de ensino, tem-
se claro que há uma diminuição dos gastos, uma vez que a educação especial
demanda gastos especiais e atendimento de especialistas. Muitas vezes, alunos,
alguns com deficiência, precisam de um suporte educacional, além do horário
previsto no sistema regular e que, por vezes, com o fim das escolas especiais
esse suporte nem sempre tem acontecido.

Até onde a inclusão não pode ser vista como contenção de gastos e dessa
forma tão incentivada pelos poderes públicos?

A inclusão não é, e não deve se tornar, uma maneira conveniente de


justificar cortes orçamentários que podem pôr em risco a provisão de
serviços essenciais. (...) Em outras palavras, o principal objetivo do
ensino inclusivo não é economizar dinheiro: é servir adequadamente a
todos os alunos. (STAINBACK e STAINBACK, 2006, p. 30).

Urge outros olhares para a inclusão, até porque não somente a regulação
social, como a diminuição de gastos, mas também a onda de modismo, quanto
ao termo e a prática da inclusão podem ser denominados como ‘outro lado da
moeda’. Há um movimento em que todos devem ser inclusivos e todas as
escolas também devem ser inclusivas, porém na maioria das vezes o discurso
não é reflexo da realidade. Com uma tendência grande a um discurso vazio de
inclusão, em que para ser politicamente correto todos incluem; a verdadeira
inclusão pode ser prejudicada. Pois qualquer movimento e qualquer atitude é
grandiosamente valorizada como forma de incluir, resultando na minimização da
inclusão verdadeira. “Transformou-se em verdadeiro modismo e lugar comum
falar/defender e pregar a inclusão.” (FERREIRA, 21-) Portanto, incluir é preciso,
mas manter os olhos abertos para qual inclusão tem acontecido também se faz
necessário.

72
De que inclusão se fala? Que inclusão se pratica?
Chegando ao término de uma visão teórica sobre os temas currículo e
educação inclusiva, que foram discutidos nos capítulos 2 e 3, tem-se um
parâmetro global da situação atual. Ao conhecer perspectivas, tendências,
conceitos e históricos de cada assunto, pode-se observar que ambos os temas
são abrangentes e complexos e, por vezes, genéricos.

Falando de currículo e inclusão, as discussões e literaturas mostram


alguns espaços em aberto quando o debate se faz de maneira periférica. Ora os
conceitos e perspectivas são abrangentes, ora limitados.

O debate de currículo hoje tem girado em torno da multiculturalidade e


das várias identidades que precisam ser debatidas e respeitadas na escola. Isso
é relevante e inédito, uma vez que até então esse olhar não se fazia tão presente
para o âmbito curricular. Mesmo assim, há lacunas e esse é o novo debate
proposto neste tópico. Ainda que os estudos curriculares debatam sobre
questões relativas às diferenças, identidades, gênero, raça, sexualidade,
existem outros perfis que não se apresentam de forma clara nesse discurso. O
que se vê é uma ampla discussão curricular com enfoque na cultura e,
consequentemente, nas diferenças. No entanto, “outras diferenças”, que não são
somente de âmbito cultural têm sido abordadas de maneira superficial.

Passando para o contexto da inclusão, não parece muito diferente o que


se nota a respeito. A tendência ainda é relacionar a inclusão escolar com a
deficiência. É comum encontrar autores, educadores e material que discutam a
inclusão escolar, porém não é frequente que esse debate amplie os limites que
abordam a deficiência. Encontram-se na literatura artigos e livros com o título
necessidades educacionais especiais e, por vezes, esses materiais abordam as
múltiplas diferenças do alunado, contudo, os temas que comumente são
aprofundados estão relacionados com a deficiência. Dessa forma, também se
observa na área da inclusão uma lacuna. As NEE não relacionadas às
deficiências, com frequência, são debatidas de forma periférica e pouco sólida,
dando a falsa impressão de que NEE tem, sempre, ligação direta com a
deficiência.

73
No início deste capítulo, pôde-se ver que muitas podem ser as NEE dos
alunos e que nem todas estão relacionadas às questões culturais, cognitivas,
físicas, de raça, gênero e outras já citadas neste trabalho, como é o exemplo do
diabético. Nesse sentido, pode-se dizer que há ambiguidade no tratamento das
questões curriculares e inclusivas e que, por vezes, o conceito é ampliado,
porém tratado de forma superficial, na sua maioria, ele é restrito àqueles que
apresentam déficits de ordem física e cognitiva.

Observando essa ambiguidade existente nas literaturas sobre currículo e


inclusão escolar, a pesquisa buscou também verificar como essa situação
acontece numa escola real. Levando em conta que as literaturas que abordam o
currículo e a inclusão apresentam lacunas, conceitos genéricos e ambiguidades,
vê-se que se torna importante conhecer como a escola lida com essa conjuntura.

74
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77

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