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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 2ª.

VARA CÍVEL DA COMARCA DE SOROCABA—SP.

MUNICÍPIO DE SOROCABA, pessoa jurídica de


direito público interno, a ser citada na pessoa de seu representante
legal no Palácio dos Tropeiros, Alto da Boa Vista, neste Município e
Comarca AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com pedido de LIMINAR, pelo
procedimento ordinário, que ora promove o MINISTÉRIO PÚBLICO ,
figurando como ré a SOCIEDADE DE MELHORAMENTOS DO
JARDIM GRANJA OLGA I, já qualificada, vem à presença de V.Exa.
para apresentar CONTESTAÇÃO, pelos fatos e fundamentos a seguir
expostos:

I – SINTESE DA INICIAL:

O MINISTÉRIO PÚBLICO promove a presente Ação Civil Pública


contra a SOCIEDADE DE MELHORAMENTOS DO JARDIM GRANJA OLGA I
e contra o MUNICÍPIO DE SOROCABA, requerendo, em síntese:

a) declarar a invalidade da permissão de uso de bem público objeto dos


Decretos Municipais n° 11.236/98 e 11.993/00 feita pela
Prefeitura Municipal de Sorocaba à Sociedade de Melhoramentos do
Jardim Granja Olga I;

b)condenar a Sociedade de Melhoramentos do Jardim Granja Olga I a


cessar o uso do bem público mencionado no item anterior, sob pena de
multa diária em valor que se sugere seja de R$ 5.000,00 (cinco mil reais),
devida por qualquer ato praticado em desacordo com a ordem judicial, e
destinado a recolhimento ao Fundo Estadual de Reparação de Interesses
Difusos Lesados (Decreto Estadual no. 27.070/87; art. 13 da Lei no.
7.347/85), na conta-corrente no. 13.00074-5, da agência 0935-1, do banco
"Nossa Caixa Nosso Banco S/A";

c)condenar a Sociedade de Melhoramentos do Jardim Granja Olga I a


demolir as obras de construção irregularmente executadas no local,
repondo o status quo ante, fixando-se, para tanto, multa diária em caso de
descumprimento do preceito;

d)condenar a Sociedade de Melhoramentos do Jardim Granja Olga I a


indenizar, em sua plenitude e na forma da lei (Código de Defesa do
Consumidor, arts. 95 e 117, c.c. Lei de Ação Civil Pública, art. 21), o valor
integral de seu enriquecimento ilícito, assim como os prejuízos que causou,
em especial os danos urbanísticos e ambientais sofridos por toda
sociedade, bem como ao patrimônio público municipal, pela utilização ilegal
do bem público em questão, durante todo o tempo em que isso ocorreu, em
montante a ser apurado em liquidação, e destinado a recolhimento ao
Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados (Decreto
Estadual no. 27.070/87; art. 13 da Lei no. 7.347/85), na conta-corrente no.
13.00074-5, da agência 0935-1, do banco "Nossa Caixa Nosso Banco S/A";

e)condenar o Município de Sorocaba a não mais conceder ou permitir o


uso do imóvel objeto da presente ação, sem que observe, para tanto, as
disposições legais pertinentes, em especial a Lei Federal n° 6.766/79 e a
Constituição Estadual, sob pena de multa diária no valor que se sugere seja
o mesmo acima estipulado, devida por qualquer ato praticado em
desacordo à ordem judicial, e destinado a recolhimento ao Fundo Estadual
de Reparação de Interesses Difusos Lesados (Decreto Estadual no.
27.070/87; art. 13 da Lei no. 7.347/85), na conta-corrente no. 13.00074-5,
da agência 0935-1, do banco "Nossa Caixa Nosso Banco S/A", isso sem
prejuízo da apuração de responsabilidade criminal e por improbidade
administrativa;

f)condenar as rés ao pagamento das custas e demais despesas


processuais, caso existentes.

g)aconcessão de MEDIDA LIMINAR, para determinar à ré Sociedade de


Melhoramentos do Jardim Granja Olga que cesse imediatamente o uso
do bem público em questão, paralisando, inclusive, as obras de
construção que ali vem realizando, sob pena de multa diária em valor
que se sugere seja de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), devida por qualquer ato
praticado em desacordo com a ordem judicial, e destinado a recolhimento
ao Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados (Decreto
Estadual no. 27.070/87; art. 13 da Lei no. 7.347/85), na conta-corrente no.
13.00074-5, da agência 0935-1, do banco "Nossa Caixa Nosso Banco S/A",

h)dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros encargos (Lei n°


7.347/85, art. 18, Código de Defesa do Consumidor, art. 87);

i)requer-se,ainda, seja proferida sentença, julgando procedente a


presente demanda

j)a produção de todo tipo de prova admissível no ordenamento jurídico


(testemunhai, documental, pericial, vistoria, inspeção, etc).

Propõe o MP a presente ação


com base no Inquérito Civil n° 058/2005, em trâmite pela Promotoria de
Justiça Cível de Sorocaba - Núcleo de Defesa dos Direitos Difusos e
Coletivos, instaurado mediante representação do cidadão Antônio Fábio
Beldi, cujos autos encontram-se anexosa inicial.

Segundo o que se apurou no referido inquérito, afirma o


MP que a Prefeitura Municipal de Sorocaba, por meio do Decreto n°
11.236, de 21 de outubro de 1998, permitiu por um ano, a título precário, à ré
Sociedade de Melhoramentos do Jardim Granja Olga I, o uso de bens
públicos consistentes nas áreas de lazer, institucional e vias públicas do
loteamento fechado Jardim Granja Olga. Em seguida, pelo Decreto n° 11.993,
de 03 de março de 2000, essa permissão de uso foi prorrogada por tempo
indeterminado.

Tal permissão, assim como a sua prorrogação, não foi


precedida de qualquer tipo de licitação, a qual foi simplesmente ignorada
pela Municipalidade, sem que houvesse qualquer justificativa para tal
procedimento. Além disso, não se vislumbra nos decretos municipais que
formalizaram a permissão, a alusão a qualquer interesse público que
justificasse a entrega de área pública para o usufruto particular e exclusivo de
uma associação de moradores de um bairro de luxo.

Ademais, verificou-se que uma das áreas institucionais


objeto de permissão, medindo 7.959,82 metros quadrados, está sendo
utilizada como um clube exclusivo dos moradores do referido
loteamento, sendo objeto de reforma para a construção de quadras
esportivas e quiosques para lazer e alimentação. E isso sem que qualquer
contrapartida econômica tenha sido concedida em favor da Municipalidade.
Pelo contrário, a área é usufruída graciosamente e com exclusividade pelos
moradores desse loteamento, vedando-se o acesso de qualquer pessoa
estranha.

Não obstante a verificação de que permissionária vem


explorando área pública municipal em benefício particular e sem que
qualquer tipo de contrapartida econômica ou social, a Municipalidade nada
fez de concreto para coibir essa injustificável privatização do espaço
público, ensejando, assim, a propositura desta demanda, em defesa do
patrimônio público e social e dos padrões urbanísticos.

II. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

1. Da Ausência de Interesse Público

A gratuidade da permissão não se justifica, ainda


mais por beneficiar parcela inexpressiva e de alto poder aquisitivo da
população, considerada privilegiada em relação à maioria de carentes deste
Município, os quais têm seu acesso às áreas públicas utilizadas pela ré
negado por força da permissão segregacionista havida. Em momento algum o
Município foi capaz de definir qual o interesse público que justifique a
utilização exclusiva e gratuita de quase oito mil metros quadrados de área
municipal pela requerida. Isso não obstante ser disposição expressa da Lei
Orgânica do Município que "o uso de bens públicos municipais por terceiros
poderá ser feito mediante concessão, permissão ou autorização, conforme o
caso e o interesse público exigir" (art. 113 - grifei).

Em suma, evidente se revela a inexistência de


interesse público na manutenção da permissão gratuita de uso da área
pública à associação-ré. Interesse público este que deve permear todo e
qualquer ato administrativo, como ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

"Ainda que a lei não use expressamente a


expressão interesse público, sabe-se que, em toda a atividade

3
administrativa, deve ele ser observado."

No mesmo sentido, Celso Antônio Bandeira de Mello


é bastante enfático ao afirmar:

"(...) o princípio da supremacia do interesse público


sobre o interesse privado é principio geral de Direito inerente a
qualquer sociedade. É a própria condição de sua existência. Assim,
não se radica em dispositivo específico algum da Constituição,
ainda que inúmeros aludam ou impliquem manifestações concretas
dele, como, por exemplo, os princípios da função social da
propriedade, da defesa do consumidor ou do meio ambiente (art.
170, III, V e VI), ou outros tantos. Afinal, o princípio em causa é um
pressuposto lógico do convívio social".2

Especificamente em relação à permissão de uso de


bem municipal, assim se manifesta o insuperável Hely Lopes Mirelles:

"Qualquer bem municipal admite permissão de uso


especial a particular, desde que a utilização seja também de
interesse da coletividade que irá fruir de certas vantagens
desse uso, que se assemelha a um serviço de utilidade pública,
tal como ocorre com as bancas de jornais em praças, os
vestiários em praias e outras instalações particulares
convenientes em logradouros públicos".3

Portanto, a permissão de uso de um bem de uso


comum somente se justifica se embasado em relevante interesse
1
Discricionariedade Administrativa na Constituição de 1988, São Paulo: Atlas. 1991, p. 169. "
Curso de Direito Administrativo, Malheiros, São Paulo, 12a ed., 2.000, p. 67.
" Direito municipal brasileiro, Malheiros, 12a. ed., p. 290.
público. Interesse público este, vale frisar, que não é pressuposto apenas do
momento da outorga inicial da concessão, mas deve persistir por todo o
tempo de sua duração, sob pena de dever ser o mesmo revogado.

Pois bem, cabe então a pergunta: onde o interesse


público na permissão de uso de um bem de uso comum, consistente numa
área institucional de um loteamento, ainda mais sendo este fechado, com
acesso restrito ao público? Evidente que tal interesse não existe na
permissão em questão.

Não estando evidenciado o interesse público, a


permissão de uso da área haveria que ser revogada pelo Município,
conforme ensina a Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

"(...) De modo que a Administração, ao outorgar o uso


privativo, o faz atenta ao interesse público; enquanto este perdurar,
pela compatibilidade da ocupação com o destino principal a que o
bem está afetado, não há por que revogá-la, ainda que outorgada
precariamente. Donde se conclui que mesmo nos usos
privativos precários é sempre o interesse publico que deve
motivar tanto o ato de outorga como sua revogação".4

Não tendo sido observada, até o presente momento,


a disposição da Administração Municipal de revogar - como deveria - a
permissão havida, cabe ao Judiciário restituir a situação de legalidade
violada.

4
Cf. Maria Sylvia Zanella Di Pietro, em sua obra "Uso Privatio de Bem Público por Particular", RT,
1983,p.28(g.n.).
2. Da Inocorrência de Licitação Prévia

Outra ilegalidade de que padece a permissão de uso


de bens públicos aqui analisada é a ausência de prévia licitação.

O art. 22, XXVII, da Constituição da República


impõe aos Municípios a observância do regramento federal relacionado com
licitação:

Art. 22. Compete privativamente à união legislar sobre: (...)


XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as
modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas
e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios,
obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas
e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, par. 1°,
III.

A União, em observância à competência federal para


legislar sobre licitação, editou a Lei Federal no. 8.666/93, a qual estabelece
normas gerais sobre licitações no âmbito dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, exigindo licitação para
permissão de uso de bens públicos, conforme o que dispõem o art. 2o, par.
único, e o par. 2o do art. 17:

Art. 2o- As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras,


alienações, concessões, permissões e locações da Administração
Pública, quando contratadas com terceiros, serão
necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as
hipóteses previstas nesta Lei.

Parágrafo Único - Para os fins desta Lei, considera-se contrato


todo e qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração
Pública e particulares, em que haja um acordo de vontades para a
formação de vínculo e a estipulação de

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obrigações recíprocas, seja qual for a denominação utilizada.

Conforme o observado acima, pode-se afirmar que a


Administração não é onipotente, gestora plenipotenciária dos assuntos
públicos. O princípio da legalidade que rege seus atos impede que a
Municipalidade opte, arbitrariamente, pela dispensa de realizar a licitação de
bens públicos quando os deseje ceder a terceiros, licitação esta imposta
como meio de realizar o princípio da impessoalidade previsto pela
Constituição Federal (art. 37, "caput"). A Administração Pública gerencia
interesses públicos. Seu relacionamento com os particulares deve sempre se
pautar pela impessoalidade. Vale dizer, assim, que jamais pode a
Administração agir com o fito de beneficiar pessoas determinadas, escolhidas
por critérios particulares, políticos, escusos ou arbitrários, como o que se nota
no caso concreto.

Outro princípio constitucional, no caso o da


isonomia, impede que a Administração dê tratamento desigual a particulares.
Os órgãos da Administração não estão autorizados a escolher o beneficiado
"X" ou "Y" para receber concessões e permissões conforme seu próprio
arbítrio. A falta de licitação possibilita favorecimentos pessoais, com violação
ao princípio da isonomia, pelo qual todos têm direito de participar de
competição por determinado benefício.

Quando o uso de bem público se destina a entidade


privada, é absolutamente indispensável a licitação, procedimento que "visa a
alcançar duplo objetivo: proporcionar às entidades governamentais
possibilidades de realizarem o negócio mais vantajoso (pois a instauração de
competição entre ofertantes preordena-se a isto) e assegurar aos
administrados ensejo de disputarem a participação nos negócios que as
pessoas governamentais pretendam
realizar com os particulares".5

No presente caso, é evidente a possibilidade de que


haja interesse de diversas pessoas, físicas ou jurídicas, concorrerem para
obter a concessão de uso dos imóveis. Mais ainda: é possível a competição
entre elas, com a finalidade de estabelecer a condição mais vantajosa para a
Administração e, conseqüentemente, para os munícipes, no que toca à justa
contrapartida a ser imposta.

Desta forma, através da presente demanda, objetiva-


se, igualmente, que se possibilite o cumprimento das disposições
constitucionais e legais acima reproduzidas, as quais exigem o respeito aos
princípios da legalidade e da impessoalidade, assegurando-se o concurso
entre os interessados na utilização do bem de modo a que a mais vantajosa
oferta - não para o ofertante, mas para o interesse público - prevaleça.

3. Da afronta à Lei Federal n° 6.766/79 e à Constituição Estadual

Não bastassem as ilegalidades e


inconstitucionalidades acima apontadas, a permissão de uso de bens
públicos, outorgada pela Administração Municipal à associação de moradores
do loteamento Granja Olga, fere frontalmente dispositivos

3
CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO. Curso de Direito Administrativo, Malheiros, 12a ed., 2.000, p.456. Na Lei
Federal n° 9.636/98, que dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de
domínio da União, foram fixados parâmetros bastante rígidos para a cessão de bens:
"Art. 18 - A critério do Poder Executivo poderão ser cedidos, gratuitamente ou em condições especiais, sob qualquer
dos regimes previstos no Decreto-Lei n° 9.760, de 1946, imóveis da União a:
"I - Estados, Municípios e entidades, sem fins lucrativos, de caráter educacional, cultural ou de assistência social;
"II - pessoas tísicas ou jurídicas, em se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de
interesse nacional, que mereça tal favor."
Mesmo este dispositivo impõe a necessidade de licitação em seu § 5o:
"§ 5o - A cessão, quando destinada à execução de empreendimento de fim lucrativo, será onerosa e, sempre que
houver condições de competitividade, deverão ser observados os procedimentos licitatórios previstos em lei."

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específicos da lei federal que regula loteamentos e da Constituição paulista.

Com efeito, o art. 17 da Lei de Loteamentos


determina que "as áreas livres de uso comum, as vias e praças, as áreas
destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, não podem
ter a sua destinação alterada, seja pelo loteador, seja pela Administração
Pública".

No mesmo sentido, a Constituição Estadual, em seu


art. 180, inciso VII, estabelece que "as áreas verdes ou institucionais não
poderão, em qualquer hipótese, ter a sua destinação, fim e objetivos
originalmente estabelecidos, alterados".

Ora, no caso em tela trata-se de uma área


institucional de loteamento, ou seja, de uma área pública, um bem de uso
comum do povo, sendo utilizada como um clube particular e
exclusivo por moradores de um loteamento de alto padrão, alterando, pois, a
sua destinação, que deveria ser pública, ou seja, em benefício de toda a
população, e não de uma parcela ínfima e privilegiada dessa mesma
população.

Não há dúvida, portanto, quanto ao direito de


retomada do imóvel em favor da coletividade de munícipes, espaço público
este que deve ter seu acesso livre a todos e ser utilizado para o atendimento
do real interesse público e social, ampliando o número de beneficiados com o
seu uso. Nem, por igual, cabe discussão quanto ao enriquecimento ilícito
decorrente da manutenção do uso ilegal em desfavor desta mesma
comunidade, desatendida em seus interesses.

III. DA MEDIDA LIMINAR

Além do poder geral cautelar que a lei processual lhe


confere (CPC, arts. 798 e 799), a Lei da Ação Civil Pública, em seu

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,

art. 12, permite ao juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação
prévia. E o Código de Defesa do Consumidor, dispensando pedido do autor e
excepcionando, assim, o princípio dispositivo, autoriza o Magistrado a
antecipar o provimento final, liminarmente, e a determinar de imediato
medidas satisfativas ou que assegurem o resultado prático da obrigação
a ser cumprida (art. 84).

Essa regra é aplicável a qualquer ação civil pública


que tenha por objeto a defesa de interesse difuso, coletivo ou individual
homogêneo (art. 21, da Lei de Ação Civil Pública, com a redação dada pelo
art. 117, do Código de Defesa do Consumidor).

No presente caso, é imperiosa a concessão de


medida liminar, por estarem perfeitamente caracterizados os seus
pressupostos, consistentes no fumus boni júris e no periculum in mora.

Com efeito, a plausibilidade do direito,


caracterizando a presença do primeiro requisito, é manifesta. Decorre dos
argumentos fáticos e de Direito supra evidenciados.

No que pertine ao risco na demora, não é razoável


sujeitar toda comunidade sorocabana, até o provimento jurisdicional
definitivo, aos efeitos deletérios já mencionados, dos quais decorrem sérios
riscos quantos aos resultados úteis da presente demanda. Ainda que
futuramente a r. sentença restitua os espaços públicos à utilização de seus
verdadeiros detentores, nada trará de volta a utilização que vem sendo
impedida há anos. O quanto antes tal injustiça for corrigida, melhor.

Ademais, enquanto as áreas não forem devolvidas,


lesão ao interesse público ocorrerá, por não se receberem os valores
mensais cabíveis a título de contrapartida econômica, e por se ver a
Municipalidade impedida de realizar a licitação entre um universo maior de
interessados no uso do espaço, o que trará, pela concorrência, maiores
vantagens ao erário e ao desenvolvimento urbano desta urbe.
Por fim, registre-se que estão sendo
realizadas obras no local, obras essas que poderão, caso a
demanda tenha sucesso, ser objeto de demolição, sendo,
portanto, medida de prudência que tais obras seja imediatamente
paralisadas até que o Poder Judiciário se pronuncie
definitivamente sobre a demanda.

CONTESTAÇÃO – COMEÇA AQUI

Cuida-se de área de uso institucional, destinada a


compor o sistema viário, implantação de equipamentos urbanos e
recreação, no loteamento ( fls. 44/46,162/164, 212 ).
Sem dúvida que se insere na competência do
Município a atribuição de legislar sobre direito urbanístico ( JOSÉ
AFONSO, "Curso de Direito Constitucional Positivo", Malheiros
Editora, 14a edição, pág. 593 ), "assunto de interesse local",
"ordenamento territorial" ( artigo 30 da Constituição Federal).

A organização político-administrativa da
República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios, "todos autônomos nos termos da
Constituição" ( artigo 18 da Constituição Federal).

Essa autonomia há de ser respeitada.

Escreve o prof. JOSÉ AFONSO DA SILVA que


as Constituições até agora outorgavam aos Municípios só "governo
próprio" e a "competência exclusiva", que correspondem ao mínimo
para que uma entidade territorial tenha autonomia constitucional.
Agora foi-lhes reconhecido o poder de auto-organização ao lado do
"governo próprio" e de "competências exclusivas", e, ainda com
ampliação destas, de sorte que a Constituição criou verdadeiramente
uma nova instituição municipal no Brasil" ( "Curso de
Direito Constitucional Positivo", Malheiros Editores, 14a
edição, pág. 590 ).
Assenta-se a mencionada autonomia
municipal na capacidade de auto-organização, capacidade de
auto-governo, capacidade normativa própria, capacidade
de auto-administração (idem, ob. cit, pág 591 ).

Estabelecem tais lineamentos em


especial os artigos 29 e 30 da Constituição Federal e artigo
144 da Constituição Paulista.

Não se vislumbra na atividade


municipal verberada afronta aos princípios da legalidade
e probidade administrativa ( artigo 37 da Constituição
Federal), desconsideração à proteção de áreas verdes ou
institucionais de loteamento (artigo 17 da Lei 6.766/79 e
artigo 180, VII da Constituição Paulista).
I A propósito de ato discricionário, é bom
lembrar o magistério de Maria Sylvia Zanella di Pietro:
"Com relação aos atos discricionários, o
controle judicial é possível mas terá que respeitar a
discricionariedade administrativa nos limites em que ela é
assegurada à Administração Pública pela lei.
Isto ocorre precisamente pelo fato de ser a
discricionariedade um poder delimitado previamente pelo
legislador; este, ao definir determinado ato,
intencionalmente deixa um espaço para livre decisão da
Administração Pública, legitimando previamente a sua
opção; qualquer delas será legal. Daí que por que não pode
o Poder Judiciário invadir-se esse espaço reservado, pela
lei, ao administrador, pois, caso contrário, estaria
substituindo por seus próprios critérios de escolha, a opção
legítima feita pela autoridade competente com base em
razões de oportunidade e conveniência que ela, melhor do
que ninguém, pode decidir diante de cada caso concreto"
(Direito Administrativo, Atlas, 4a edição, 1994, pág. 180).
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Conseqüentemente, no vazio deixado


pelo legislador federal, podia o Município
regular este tipo de loteamento, por se
ratar de matéria de interesse local.

Os Decretos ns 6538/93 e 6557/87,


porseuturno, podiam autorizar o uso das
áreas institucionais, internas aos muros, em
favor daqueles que vieram a adquirir os
lotes, pois não seria concebível falar-se em
loteamento fechado sem uma certa privacidade
dessas áreas.

6.- O Município realmente quis


permitir a constituição do loteamento fechado
(Lei Municipal n° 3.369/87). E podia assim
querer. Não há impedimento, no princípio da
igualdade, constante da Constituição Federal
(CF, art. 5°,"caput").

A distinção entre as formas de uso


da propriedade urbana, inclusive com amparo à
vedação de freqüência indiscriminada, pode ser
realizada pela lei municipal. O zoneamento o
demonstra; da mesma forma a distribuição dos
requisitos para concessões de uso de áreas
públicas.

Tanto é assim que os loteamentos


fechados são
realidade evidente nas cidades atuais, com
amparo
tranqüilo em doutrina e jurisprudência.

Não impressiona o argumento da inviabilidade


do ingresso. Os loteamentos fechados podem
realmente impedir o ingresso descontrolado. São
eles área de acesso regulamentado, não
escapando desse controle nem mesmo os próprios
moradores, tanto que a primeira das restrições
que experimentam é no "seu direito de acesso
ao lote adquirido, o qual é controlado em uma
portaria ou portão de ingresso ao
loteamento"(ELVINO DA SILVA FILHO, "Loteamento
Fechado e Condomínio Deitado", em "Questões de
Condomínio no Registro de Imóveis", S. Paulo,
Malheiros, 1999, p. 70) .

Mesmo ocupantes de cargos públicos


não se isentam desse controle, ressalvado,
apenas, o ingresso em regular atividade
administrativa ou policial.

7.- Não se vê relevância no fato


de o
loteamento fechado constituir-se segundo a Lei
Federal
n° 6.766, de 19.12, 1979, que realmente não
prevê a
modalidade de loteamento, ou por aplicação
da regra
geral do art. 8o da Lei n° 4.591, de
16.12.1964. O que
importa, verdadeiramente, é ver a natureza
jurídica
das ruas praças e demais áreas livres, para
verificar
se o acesso a elas passa ao patrimônio
particular ou
permanecem no patrimônio público, porque
esse foi o ponto preciso em que se baseou o
acionamento, mormente via ação popular, que tem
admissibilidade restrita aos casos de lesão ao
patrimônio público {Lei n° 4.717, de
29.6.1965, art. Io).

Responde à questão ELVINO DA SILVA


FILHO: "Inegavelmente, as vias, praças e
espaços livres do loteamento fechado são bens
do domínio do Município, desde a data do
registro do loteamento (art. 22 da Lei
6.766/79) ou desde a aprovação do projeto, como
afirma o douto Prof. HELY LOPES MEIRELLES" (ob.
cit., p. 72).

Se ruas, praças e áreas livres no


loteamento fechado são de propriedade
municipal, patenteia-se a ausência de
requisito essencial à viabilidade da ação
popular, que é a lesividade ao patrimônio
público.

8.- Também não impressiona o fato da


concessão. O mesmo ELVINO SILVA FILHO
explica: "Entendemos, assim, que, por lei, o
Município pode autorizar o loteamento fechado
e, conseqüentemente, o uso das vias de
circulação e praças dentro dele exclusivamente
aos seus proprietários, através de dois
institutos de direito administrativo: a
permissão de uso ou a concessão de uso" (ob.
loc. cit.).

No loteamento fechado, não são, é


certo, as

ruas, praças e áreas livres, consideradas


bens públicos de uso comum do povo, como bem
salienta HELY LOPES MEIRELLES ("Direito
Municipal Brasileiro", 3a ed., p. 643-644). São
bens públicos de uso especial (ELVINO SILVA
FILHO, ob. cit., p. 74). Mas inequivocamente
são bens públicos, patrimoniais do Município.

9.- Não era necessária concorrência


pública, para a permissão de uso em causa,
autorizada pela Lei Municipal n° 3.369/87, que
disciplinou os loteamento fechados (arts, 28 a
31) , fornecendo a base legal municipal para
os Decretos ns. 6557/87 e 6538/93.

A concorrência pública é necessária


para assegurar a livre competitividade,
exteriorização do principio da imparcialidade
na administração pública. Como, entretanto,
imaginar livre competição para a instalação de
condomínio em meio a terras pertencentes a um
só proprietário? A imaginada concorrência
pública torna-se inexigível ao só fato da
constatação da impossibilidade de que outros
concorrentes viessem a disputar áreas situadas
em meio a loteamento de um só proprietário,
tornadas propriedade pública exclusivamente
em virtude da teoria do concurso voluntário,
incidente na constituição do loteamento.

11.- Não há desobediência ao art. 180,


VII, da Constituição Estadual. Veja-se como
está escrito o dispositivo: "As áreas
definidas em projeto de loteamento como áreas
verdes ou institucionais não poderão, em
qualquer hipótese, ter sua destinação, fim e
objetivos originariamente estabelecimentos
alterados",
Admita-se que essa norma vincule o
Município -
- matéria discutível. Mesmo assim não há
infringência
a ela, no caso. O que o dispositivo veda
é a
utilização de áreas verdes ou
institucionais com
outros fins, como a construção de
prédios e
equipamentos outros. No caso, com o
loteamento
fechado, continuam essas áreas com a mesma
destinação

de uso com que constituídas, conquanto sob


permissão de uso autorizada pela Lei Municipal
e Decretos a ela
complementares.

Não está dito no dispositivo


constitucional do Estado que a utilização
dessas áreas apenas se faça como bens de uso
comum do povo, nem está vedada a permissão de
uso. Apenas está resguardada a mesma
modalidade de uso — basicamente para
preservação ambiental. Isso está preservado
no loteamento em causa.

AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO ERÁRIO PÚBLICO

Com efeito, o referido decreto municipal segue preceito

contido na Lei Municipal, de forma direta, lei que regulamentou a

instituição dos chamados "loteamentos fechados", tendo em vista a


inexistência de legislação superior específica para tal questão, nos

termos, aliás, do disposto no art. Ioda Lei Fed. 6.766/79. Portanto,

nada impedia a edição da legislação municipal regulando, deforma

supletiva, tal espécie de loteamento, como autorizado pelo art. 29,

inc. VIII, da Constituição Federal e pelo Dec. Lei Fed. 271/67, art. 7°

Aliás, hoje, várias cidades "possuem legislação municipal

regulamentando a matéria". O decreto, portanto, não violou

preceito legal algum ou causou prejuízo ao erário público. No que se

refere às áreas comuns existentes dentro do condomínio, trazem à

colação ensinamento de Hely Lopes Meirelles: "...os

denominados "loteamentos fechados", "loteamentos integrados",

"loteamentos em condomínio", com ingresso só permitido aos

moradores e pessoas por ele autorizadas e com equipamentos e

serviços urbanos próprios, para auto-suficiência da comunidade (...)

merecem prosperar.

Todavia, impõe-se um regramento legal prévio para

disciplinar o sistema de vias internas (que, em tais

casos não são bens públicos de uso comum do povo) e os encargos

de segurança, higiene e conservação das áreas comuns e dos

equipamentos de uso coletivo dos moradores, que tanto podem ficar

com a Prefeitura como com os dirigentes do núcleo, mediante

convenção contratual e remuneração dos serviços por preço ou taxa,

conforme o caso.

E foi nesse contexto que se editou o referido decreto, que concedeu

permissão para o uso das áreas públicas, sem olvidar que foi

mantida a destinação original das áreas verdes e institucionais

existentes, implantadas "aquém muros", atendendo a própria lei

municipal".

Segundo apurado pela prova pericial, "além muros"

existe uma área de 11.006,79 m~ de área reservada ao sistema de


lazer, o qual se pode denominar "área verde ", segundo a Lei Mun.

1.417/66. E a área institucional existente "além dos muros" do

loteamento perfaz a área de 6.938,10 m , segundo a mesma prova

pericial. Dessa forma, restou demonstrado que o condomínio

"reservou" quase 18.000 m~ de área pública à população que tiver

interesse em utilizá-la. Existe, ainda, junto à área verde e institucional

reservada, uma faixa de preservação ambiental, consistente nas

margens do Córrego da Água Vermelha que margeia o loteamento.

Depois, o condomínio não se deu em local onde anteriormente

estivesse constituído alguma via, estando, assim,

integrado a malha viária, fato esse, inclusive, vedado pela Lei Mun.

4.438/93. Foi ele implantado em propriedade privada, que não integra

qualquer malha viária. Não há que se dizer que a instituição

do "loteamento fechado" causou, pois, prejuízo aos vizinhos lindeiros

a essa propriedade. E a Municipalidade providenciou "passagem"

aos moradores da localidade vizinha, de forma que a

instituição do loteamento não os deixou "encravados". Bem por isso,

a Promotoria Pública manifestou-se: "Diferente, entretanto, é

o caso de um loteamento surgido de gleba não integrada à

malha urbana. Seu fechamento ou não será indiferente à realidade

já existente. Basta imaginar que o proprietário da gleba poderia não

loteá-la, mantendo-a com uma chácara fechada, ou construir ali um

hipermercado, um conjunto de prédios de apartamentos ou um

clube. Em todos esses casos a gleba continuaria fechada, sem

qualquer prejuízo à comunidade. É esse o caso do loteamento em

tela, que, conforme se verifica de fls. 777, localiza-se na periferia da

cidade, sendo de se observar que o problema com a antiga

passagem dos moradores do Jardim Santa Fé já foi contornado pela

Prefeitura, conforme constatado pelo Ministério Público (fls. 409).

Por outro lado, pode-se mesmo considerar que o fechamento do

loteamento isolado da malha urbana traz até vantagens à

Administração, pois o cuidado com as vias e praças fica a cargo dos


moradores, o que, além de economia com a limpeza pública é uma

garantia de que as áreas verdes vão ser efetivamente implantadas e

cuidadas, fato que não ocorre nos demais loteamentos, nos quais a tônica

é a existência de áreas verdes abandonadas, servindo de depósito de

entulho e invadias por "sem tetos ". Por fim, contestam a afirmação de

"apropriação" de áreas públicas, bastando verificar que "no projeto

aprovado na Prefeitura consta uma área de 30.217,63 m~, enquanto no

levantamento topográfico efetuado pelo perito judicial encontrou-se uma

área real de 32.308,91 m". Não existe e nunca houve a aludida "invasão a

áreas públicas". Ao reverso, as "áreas públicas" são maiores que as

constantes do projeto. Cita, quando à observância da legalidade pelo

decreto, o disposto no art. T da Lei Mun. 4.717/65:" Fica o Poder

Executivo autorizado a permitir, por decreto, e a conceder, mediante lei

especifica o uso dos bens públicos que passarem ao domínio púbico por

força do artigo 22, da lei Federal n. 6.766/79, ao loteador ou sucessor"

(grifamos).

Sustenta, em tais termos, que o decreto atacado "nada mais fez que

cumprir a lei municipal", SOB PENA DE contrariedade e negativa de

vigência ao artigo 180, inciso Vil", da Constituição Estadual, ao art.

8, da Lei Fed. 4.561/64, ao art. Io, § único, da Lei 6.766/79, ao art. 7o, do

Dec. Lei 271/67, ao art. í\ da lei Mun. 4.438/93,

ao art. 22 da leifed. n. 6.766/79 e ao art. 7o, da Lei Mun. 4.438/93, ao art.

Io, da Lei 4.717/65 (posto não demonstrado lesividade ao patrimônio

público), ao art. 5o, inciso LXXÍI, da CF/88 (posto que o apelante agiu com

má-fé ao propor a ação, devendo, portanto, suportar os ônus da

sucumbência (fls. 1110/1120)).


Pelos termos do referido decreto verifica-se, no entanto,

que a permissão deferida pela Municipalidade não desafetou as áreas

verdes ou institucionais e as vias do loteamento, como também esses

bens não perderam ou tiveram alterado suas finalidades tão só pela

razão de passarem a ser usado, de modo privativo, pela comunidade

dos moradores do loteamento,.

Transcrevendo o que dispôs a Lei Mun. n. 4.438, de 16 de

novembro de 1993, que autorizou a constituição de loteamentos fechados

no Município, afirmou sua constitucionalidade. Assinalou que o art. 24,

inciso I, a Carta Magna estabeleceu competência concorrente para que

União, Estados e Distrito Federal legislem sobre Normas Gerais de

Direito Urbanístico, nas quais enquadra-se a competência para legislar

sobre o parcelamento do solo. Mas, no art. 30, a Constituição

outorgou ao Município competência para legislar sobre assuntos de

interesse local ou, em certas hipóteses específicas, se a matéria for

exclusivamente de interesse local (inciso I), ainda que de direito

urbanístico. Ainda, estabeleceu competir ao Município

suplementar a legislação federal e a estadual, no que couber (inciso II).

E, no que cabe ao Município, em matéria relativa ao parcelamento do

solo, diante do que estabeleceu o §i°, do art. 24 da Constituição (que

atribuiu competência concorrente ao Estado e ao Distrito Federal, e não ao

Município para legislar sobre direito urbanístico), há de se

considerar, entretanto, que a Lei Fed. 6.766/79, como também os


decretos anteriores n. 58, de 10.3.37 e o Dec-lei n. 271/67, constituem

normas gerais que não impediram o Município de dispor sobre questões

não contempladas no direito urbanístico legislado pela União ou pelo

Estado. Nesse ponto, bem lembrada a lição de JOSÉ AFONSO DA SILVA,

dentre outros autores citados, no sentido de que "deve ser atribuído ao

Município o "condomínio urbanístico", desde que observadas as normas

gerais do direito urbanístico legislado pela União ou pelo Estado (CF, art.

24, I). Assim, consoante ensinamento de Elvino Silva Filho, por lei, o

Município pode autorizar o loteamento fechado, e, conseqüentemente,

o uso de vias de circulação e praças dentro dele, exclusivamente aos

seus proprietários, através de dois institutos de Direito Administrativo: a

permissão de uso ou a concessão de uso".

Concluiu, destarte, pela validade da Lei Mim. 4.438/93,

porque todos os seus pressupostos foram cumpridos, de sorte que as

áreas transferidas ao Município de Sorocaba por força do art. 22 da Lei

6.766/79, não perderam sua natureza de bens públicos municipais com a

permissão de uso deferida aos moradores do loteamento, , apenas tornou

o bem municipal com destinação especial.

Nessa ótica, o município não cometeu, quer por ação ou

omissão, qualquer ato passível de correção. Limitou-se a cumprir a Lei

Municipal que possibilitou a criação de loteamento fechado e por Decreto

concedeu a permissão de uso aos proprietários dos lotes, os únicos que

poderiam deter tal permissão, implementando a lei. Alem disso, o laudo

pericial anexado ao processo deixou claro não ter havido, como sublinhou

a sentença, invasão de área de proteção ambiental pelo loteamento.

Assim, também não se poderá falar em beneficiários de atos ilegais.


Realmente, afirmada a validade da lei municipal 4.438/93,

esta dispôs no seu art. 7°

Art. 7". Fica o Poder Executivo autorizado a permitir,

por decreto, e a conceder, mediante lei específica, o uso de bens

públicos que passarem ao domínio público por força do artigo 22, da Lei

Federal n. 6.766/79, ao loteador ou sucessor.

Os termos da lei são claros: para permitir, ao loteador

ou sucessor, o uso dos bens públicos afetados na forma do art. 22 da Lei

6.766/79, basta simples decreto municipal, atendendo as disposições da

lei a respeito.

Permissão de uso ensina Hely Lopes Meirelles, "é ato

negociai, unilateral, discricionário e precário através do qual a

Administração faculta ao particular a utilização individual de

determinado bem público. Como ato negociai pode ser com ou sem

condições, gratuito ou remunerado, por tempo certo ou indeterminado,

conforme estabelecido no termo próprio, mas sempre modificável e

revogável unüateralmente pela Administração, quando o interesse

público o exigir, dados sua natureza precária e o poder discricionário do

permitente para consentir e retirar o uso especial do bem público (...). A

permissão, enquanto vigente, assegura ao permissionário o uso especial

e individual do bem público, conforme fixado pela

Administração, e geram direitos subjetivos defensáveis pelas vias

judiciais, inclusive ações possessórias para proteger a utilização na forma

permitida. Via de regra, a permissão não confere exclusividade de uso,

que é apanágio da concessão, mas, excepcionalmente, pode ser


deferida" com privatividade sobre outros interessados, desde que tal

privilégio conste de cláusula expressa e encontre justificativa legal.

QUALQUER BEM PÚBLICO admite permissão de uso especial a

particular, desde que a utilização seja também de interesse da

coletividade que irá fruir certas vantagens desse uso, que se

assemelha a um serviço de utilidade pública. Se não houver

interesse para a comunidade, mas tão-somente para o particular, o

uso especial não deve ser permitido nem concedido, mas

simplesmente autorizado, em caráter precaríssimo. Vê-se, portanto,

que a permissão de uso é um meio-termo entre a informal

autorização e a contratual concessão, pois é menos precária que

aquela, sem atingir a estabilidade desta (Direito Administrativo

Brasileiro, 26" ed., Malheiros Editores, pág. 486).

Em suma, afirmada a competência legislativa municipal

para editar lei sobre questão não regulamentada pelo direito urbanístico

legislado pela União ou pelo Estado (vale dizer, sobre "loteamentos

fechados"), consoante a fundamentação acima, conclui-se pela sua

legitimidade e, conseqüentemente, também, do decreto editado com base

no referido permissivo da lei municipal.

A conclusão, portanto, é a de que não há a ilegalidade ou

ilegitimidade afirmada pelo autor popular, nem a violação do preceito da

Carta Paulista invocado, na medida em que se cuida de

mera permissão fundada em lei municipal cuja legitimidade, diante do

ordenamento constitucional vigente, se reconhece.


Por conseguinte,deve ser decretada a improcedência da ação

Nem se argumente que o município estaria


sendo lesado com tal proceder, porque o
loteamento foi realizado em terreno particular,
daí resultando as áreas institucionais
necessárias à implantação do empreendimento, que,
assim, nada custou aos cofres públicos.

Além disso, o muro erigido não impede o


exercício da propriedade das áreas institucionais
pelo município, pois não é forma de aquisição nem
de perda da propriedade imóvel, muito menos da
propriedade pública.

A respeito dessa modalidade, ensina HELY LOPES


MEIRELLES: "Loteamentos especiais estão surgindo principalmente
nos arredores das grandes cidades, visando descongestionar as
metrópoles. Para esses loteamentos não há, ainda, legislação
superior específica que oriente a sua formação, mas nada impede
que os Municípios editem normas urbanísticas locais adequadas a
essas urbanizações. E tais são os denominados "loteamentos
fechados", "loteamentos integrados", "loteamentos em condomínio",
com ingresso só permitido aos moradores e pessoas por eles
autorizadas e com equipamentos e serviços urbanos próprios, para
auto-sufíciência da comunidade. Essas modalidades merecem
prosperar. Todavia, impõe-se um regramento legal prévio para
disciplinar o sistema de vias internas que em tais casos não são bens
públicos de uso comum do povo) e os encargos de segurança,
higiene e conservação das áreas comuns e dos equipamentos de
uso coletivo dos moradores, que tanto podem ficar com a Prefeitura
como com os dirigentes do núcleo, mediante convenção contratual e
remuneração dos serviços por preço ou taxa, conforme o caso"
("Direito Municipal Brasileiro", 3a ed., págs. 643 e 644) (sublinha-se).

Pois bem. A lei que vem sendo aplicada a tais loteamentos


fechados, formados sem a transferência de espaços ao domínio
público do Município, é, repita-se, a de n° 4.591/64. Já os
loteamentos convencionais ou regulares, nos quais ocorre a
transmudação de parcela da propriedade privada para o domínio
público, continuam a obedecer o disposto na Lei n° 6.766/79. E esta,
não é demais insistir, nada dispõe sobre os loteamentos fechados ou
condotniniais.

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O resultado estaria tranqüilo não


fosse a discordância veemente do Parecer do Ministério Público, fls.
1.143 e ss., citando ADIN desta Corte, em que se enuncia a
inadmissibilidade de desafetação de bens públicos (ruas, praças,
etc) para loteamentos, referentes ao Município de Mairiporã, e, na
esteira da pretensão básica do autor popular, qual seja registrado o
loteamento, com a transferência dos espaços livres obrigatórios
para o Município, quedaram-se esses como bens públicos
municipais de uso comum do povo, e, em conseqüência com sua
destinação inalterável, o que impediria o fechamento do loteamento
e uso exclusivo dos condôminos (no resumo do Parecer da i.
Professora Lúcia Valle Fiqueiredo, p. 1.166).

Mais adiante, a i. parecerista agrega:


Em breve síntese: a inscrição do plano de loteamento, aprovado
pela Prefeitura, no Registro de Imóveis transfere, por esse só fato, à
Municipalidade os espaços livres, destinados a ruas e praças,
constituindo-se estes em bens públicos inalienáveis, por terem
destinação específica, estão ligados àquele loteamento (g. da A.
à p. 1.179).

Por óbvio, não se trata aqui de discutir


inconstitucionalidade da lei municipal que autorizou o loteamento
fechado ou de sua aprovação, o que o autor popular pretende
discutir, com apoio no Parecer do Ministério Público de 2o. Grau, é
se houve mudança de finalidade, conforme dispõe, neste sentido, o
art. 17, da Lei n. 6.766/79: Os espaços livres de uso comum, as
vias e praças, as áreas destinadas a edifícios públicos e outros
equipamentos urbanos, constantes do projeto e do memorial
descritivo, não poderão ter sua destinação alterada pelo loteador,
desde a aprovação do loteamento, salvo as hipóteses de
caducidade da licença ou desistência do loteador, sendo, neste
caso, observadas as exigências do art. 23 desta lei,

Ainda que se pretendesse não estar a


Municipalidade autorizada a modificar a natureza do loteamento
para 'fechado', nada impede que o faça, visto que a partir do
registro as áreas de uso comum, ruas, praças etc, só por se
incluírem em espaço delimitado não perdem aquela característica,
mas, como afirma a i. parecerista: apenas torna

o bem municipal com destinação especial, mas não o torna passível de alienação
ou transformação (f. 1.189), e completa-se, quando, ai sim, haveria ilegalidade. A
destinação especial pode ser extraída, como no antigo, do novo Código Civil, em
seu art. 99, II, em interpretação extensiva, ante a ausência de legal previsão. Por
outro lado, a interpretação do art. 180, VIÍ, da Carta Paulista, não tendo sido objeto
de manifestação expressa, nem por isto teria o condão de impedir que uma
atividade largamente admitida, qual seja, o loteamento fechado, seja considerada
ilegal, eis que se não fere o interesse da coletividade, acaba por servir ao anseio de
muitos de maior segurança, diante da incapacidade do Estado.

Cabe, por derradeiro, menção ao julgado do C. Órgão


Especial desta Corte, Relator o e. Des. Luiz Elias Tâmbara, ao analisar lei
semelhante do Município de Campinas, em ADIN interposta pelo Ministério Público
e que, inclusive afasta eventual inconstitucionalidade, aqui sequer alegada, julgada
por maioria de votos:

ADIN. Lei n. 8.736, de 09/01/96, do Município de


Campinas. Confere poderes ao Prefeito para autorizar o fechamento do tráfego dos
veículos nas ruas, através de decreto, e trespassar àqueles que se beneficiarem
com a adoção dessa medida a responsabilidade pela construção de portarias,
limpeza e conservação das ruas e realização serviços de coleta de lixo,
regulamentando as condições de acesso, fiscalizando o uso do solo, além de
permitir a desafetação de áreas verdes e institucionais. Alegada violação do
disposto nos artigos 5o e seu § Io, 19, incisos IV, V e VII, e 180, inciso VE, da
Constituição do Estado de São Paulo. Inexistência de afronta aos indigitados
dispositivos. Pedido julgado improcedente. (ADIN n. 065.051-5/8-00).

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