Você está na página 1de 5

Um Conto de Korgoth, O Indomável em:

“Os Espectros do Castelo Rubro”

Capítulo I — Os Espectros do Castelo Rubro

São inúmeros os bandos de saqueadores que assolam as cidades situadas no

chamado “Triângulo Árido”, o deserto que faz fronteira com Alasya, ao sul,

Abbashan ao leste e as cidades de Zuth ao norte. Uma dessas infelizes fortalezas é

conhecida como Tal'Alak. E em meio as espadas manchadas de sangue e os gritos

de agonia de homens, mulheres, crianças e velhos, seus habitantes sabem que

poucos são aqueles que sobreviverão até a chegada do próximo amanhecer, que

parece ainda distante.

A cidade agoniza como um moribundo em seu leito de morte, por conta

disto, não há quem preste atenção em um homem selvagem, bárbaro, de pele

morena e marcada, que atravessa lentamente os portões ainda em chamas que

tremeluziam inquietas. Todavia, se a sua presença fosse notada, um calafrio

percorreria a espinha dos invasores ao fitarem seus olhos assumirem um intenso

brilho de ímpeto assassino, este mais penetrante que o fio de uma navalha recém

afiada.

“Venha cá, cão indolente! pensou que iria se esconder de mim?”, grasnou

assim o homem com a cimitarra acima da altura dos ombros, com o fio já cego de
tanto a esfacelar a carne de outros mais infelizes.

“Por favor, tende clemência, Senhor! Sou homem velho, e logo morrerei!”,

disse o outro homem anoso com as últimas lágrimas que lhe restavam aos olhos,

balbuciando entre suspiros de piedade e frases inaudíveis, e juntando de forma

errática as duas mãos.

“Sim! É velho demais para viver!”, disse o homem com sorriso amarelado ao

cortar assim a garganta do tão idoso homem como se nada fosse. “E já que não

precisa mais de seus anéis e nem dos dedos gordos onde foram colocados,

agradeça à Ishvala por estar passando suas quinquilharias à um homem de

valor.”, completou assim.

“Você fala demais, cão maldito.”, e, por mero instante, o corpo do saqueador

é trespassado pelo frio aço do bárbaro que sorrateiro observava o um, e agora

dois, mortos. É desmontando do cavalo, o bárbaro apanha das mãos, agora

inertes e manchadas de sangue, e encontra nelas quatro anéis de brilhantes. E, já

que o velho homem e tampouco o bandoleiro precisarão deles, agora os anéis

serviriam para encher sua algibeira há muitas luas, bastante vazias.

Neste momento, não distante dali, um obeso mercador corre, este mais

velozmente do que suas pernas eram capazes. “Zulenka! em nome dos deuses,

onde estará você?!”, pergunta o homem com a voz tremulante.

“Aqui estou, Mestre!” assim respondeu a escrava. Esta, mulher de cabelo


longo e corpo delgado e de pele acobreada, coberta de sujeira e sangue. “O que

está a acontecer?”, perguntou ela, ainda aflita com os repentinos acontecimentos.

“Feche a porta da frente, e tendo-a fechado, proteja-a com a própria vida

enquanto eu fujo para os fundos!”, respondeu o mercador, ainda nervoso e

hesitante. “Não é um pedido, mas sim uma ordem!”, completou.

“Mas o que será de mim, ó Mestre? Que fim terei eu ao esperar que estes

homens cheguem à cá de casa?”, perguntou a mulher com lágrimas nos olhos e a

gaguejar inconscientemente de pavor.

“A mim não interessa! Pois minha vida é mais ainda valiosa.”, retrucou, “E

quer você saiba o que estes homens farão se virem a me encontrar?, perguntou. É

no mesmo instante que, a porta é obstruída, dando entrada a mais um dos

saqueadores.

“Não, porco encardido. O que nós faremos com você?” Perguntou o homem

assim ao apontar o aço rente ao mercador. Seu olhar assumia uma implacável

malícia. O saqueador sequer se dá ao luxo de responder aos constantes pedidos de

vã misericórdia, onde agarra o mercador e lhes perfura o peito, atravessando sua

lâmina ao rir. É erguendo-se entre os despojos do que outrora foi um homem, o

assassino fala: “Pelos deuses a quem somos tolos e mortais. Você é bela demais

para ser uma simples escrava. Esteja certa que eu irei me divertir muito antes de

degolá-la lentamente.”
Tal afirmação paralisa Zulenka, fazendo com que a mulher empalideça em

segundos, o corpo não mais responda e o próprio peito comece a bater de forma

errática. « Grite, mulher! implore pela misericórdia que neguei à seu mestre! Fale,

meretriz; porque detesto falar com gente muda! » dizia assim o mercenário a fitá-

la com a lâmina rente ao estômago, já perfurando com a ponta e fazendo assim

um pouco de sangue se esvair.

“Por que não corta a própria língua e dá de alimento aos chacais, maldito?”

disse então o homem bárbaro há poucos passos da porta. Surpreso, o rato do

deserto mal tem tempo de erguer a própria lâmina, antes do forasteiro saltar

sobre ele afastando a espada afiada e quebrando com uma única torsão a mão do

bandoleiro, ao mesmo tempo em que sua outra mão se prende firmemente ao

pescoço de seu algoz; no seguinte instante, um esmurrar pesado como o golpear

de uma clava fratura o crânio do saqueador, que desfalece ao chão

desajeitadamente aos pés do bárbaro. “Qual o seu nome?” Pergunta assim o

bárbaro a roubar as peças de ouro e prata do morto. « Zulenka, Mestre. »

responde a escrava ainda com voz parva, já imaginando o que viria a seguir.

Contudo, um estranho brilho entre os olhos acinzentados como os de uma lâmina

atraem sua atenção « Eu não o agradei, Mestre? » sem maior hesitação, a mulher é

agarrada pelo bárbaro com apenas um braço, colocada sobre seus ombros largos.

Ao lado de fora, os últimos sobreviventes são eliminados pelos impiedosos


sabres e cimitarras de homens que desconhecem a culpa ou sequer o peso da

misericórdia; eis que de súbito, um deles se interessa pela serva, avançando

diretamente em direção ao bárbaro. Pela primeira vez, Zulenka sente uma onda

de calor percorrer seu corpo ao notar que o guerreiro tenta protegê-la. Contudo,

novamente o horror se faz presente uma vez mais: é quando o impiedoso bárbaro

separa a cabeça do restante do corpo de seu inimigo como se cortasse a carne sem

o peso nas mãos. Outrora, como todas as moças de sua pouca idade, a jovem

sonhara em ser levada à cavalo por um príncipe encantado, todavia, seus trajes

agora não eram de uma princesa, mas de uma escrava; e os sons que escutava ao

longe não eram das graciosas harpas, mas rangidos de dor e agonia; e seu raptor

não era o príncipe idealizados de seus sonhos de infância, mas um criminoso

forasteiro tão selvagem quanto qualquer guerreiro das terras do norte.

Você também pode gostar