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Nota: esse capítulo extra faz parte de uma coletânea de POV’s da MICA EARTHBORN retirados do Livro 7 de TBATE.

Outros capítulos extras sairão conforme os dias.


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TÚNEIS OBSCUROS (parte 1)


Tradutor: Lockard
Revisão: A ser feita

MICA EARTHBORN

O segurança, um anão musculoso e tonificado vestindo uma túnica dois números menores
que seu tamanho, que realçava seu peitoral e seus bíceps, fechou a expressão assim que
me aproximei. O bar era em um profundo e distante túnel, bem longe das cavernas centrais
movimentadas e eu via apenas os piores tipos entrando e saindo, durante dois dias de
observação. Muitos soldados Alacryanos, sobreviventes da Batalha de Slore ou agentes
deixados dentro de Vildoral, a capital de Darv, ainda escondidos nos túneis, auxiliados e
incitados por um grupo de anões rebeldes. Eu tinha certeza de que muitos haviam ficado
aqui, apesar de não os ter visto ir e vir.

Dando um passo à frente e segurando uma das mãos, o segurança disse, “desculpe
senhorita, acredito que você esteja no lugar errado. É melhor se virar e —” Sangue espirrou
de sua boca e seu maxilar foi forçado a fechar, mordendo sua própria língua. Seus joelhos
se dobraram e ele colapsou.

Ele caiu de uma maneira bizarra no chão, seus membros tortos em ângulos sinistros, como
se fosse um inseto e um enorme pé o estava esmagando no chão. Seus olhos arregalados
me encararam em pânico.

“Em oito segundos, dez se for mais resistente do que parece, você vai desmaiar. Mica irá
liberar seu feitiço Gravity Hammer e não vai morrer. Quando acordar—” Eu parei de falar.
O segurança estava inconsciente. Liberando o feitiço, eu entrei em um bar pouco iluminado
e esfumaçado, que agora estava sem guarda.

Constrangedor. O salão possuía um formato grosseiramente circular com um teto


abobadado. Mesmo na pouca iluminação e através da fumaça desagradável, era óbvio o
quão pouco detalhado aquele local era. O balcão e as cadeiras pareciam ter sido criados
através de magia, como era comum na maioria das habitações dos anões, mas nesse caso,
havia sido mal feito.

Esse lugar é igual a um provérbio do antigo testamento: Até um anão consegue cavar tão
fundo e viver tanto tempo no escuro.
Três homens anões sentados em uma mesa escura, perto da parede, suas cabeças curvadas
em direção às suas cervejas, mas sua conversa apressada terminou assim que me
perceberam parada na entrada.

O barman, um anão velho com uma barba cinza presa em seu cinto e seu cabelo preso em
um coque, me encarou. “Saia daqui, criança,” ele resmungou. “Esse não é um lugar para
tipos como o seu.”

Sem falar nada, eu me dirigi ao balcão, me sentei em um banco de pedra com três pernas
desiguais, e balancei o dedo em direção ao barba cinza. Quando ele não se aproximou de
imediato, eu revirei meus olhos e apontei mais energicamente. De má vontade, o barman
se aproximou, apoiando-se levemente no balcão.

“Se mais um homem dizer à Mica onde ela deve estar, ela irá destruir essa pocilga
deprimente e procurar pelos restos da minha presa dentro dos destroços.” Lancei um
sorriso animado para o barman, quando sua cabeça de repente desabou, batendo no
balcão com força suficiente para quebrar a pedra dura. “Agora, a menos que você ache que
sua cabeça é mais dura que essa pedra — que, para ser honesta, pode ser — vai evitar
insultar Mica mais uma vez e ao invés disso, fazer seu melhor para ajudar na localização de
um punhado de magos alacryanos que Mica acredita estarem se escondendo em algum
lugar por aqui.”

“S-saia já daqui!” o barman gritou enquanto limpava o sangue escorrendo de seu rosto até
sua barba. Antes que eu pudesse responder, minha atenção foi atraída pelo arrastar de
bancos de pedra através do chão duro do bar.

Assisti entretida, enquanto os três homens parrudos andavam vagarosamente em minha


direção. Eles tinham uma expressão severa e fizeram uma ótima cena ao arregaçarem as
mangar enquanto se aproximavam. Eu esperei que eles fizessem o primeiro movimento.

O líder anão, mais alto que o normal com um cabelo negro-azulado presos em tranças até a
altura de seu cinto, me olhou nos olhos e cuspiu no chão aos meus pés. “Você parece ter
cometido um erro. Deve ter acreditado que esse era o tipo de estabelecimento onde
pseudo-anões puxa-sacos de humanos poderiam entrar usando suas roupas chiques e com
sua atitude superior, achando que pode fazer qualquer coisa. No processo, você parece ter
machucado meu amigo. Agora, vou pedir gentilmente que você ofereça desculpas ao Ludo
aqui, por sua grosseria e então pode seguir seu caminho.”
Olhei para o anão surpresa. Mesmo em Darv, onde um terço da população odiava a mim e
a tudo o que eu representava como uma Lança, ninguém nunca ousou falar assim comigo.
Pseudo-anão, de fato!

Quando os antigos rei e a rainha Graysunders traíram o Conselho e tentaram se aliar aos
alacryanos, muitos anões os apoiaram. Havia simpatizantes dos alacryanos por toda Darv e
eles viam minha obediência ao Conselho como uma traição.

“A toupeira comeu sua língua, garota?” o líder anão zombou, me retirando de meus
pensamentos. “Foi isso o que eu pensei. Vocês são todos iguais. Sabem um pouco de magia
e acham que isso os faz especiais. O que isso faz, além de assediar um velho dono de bar,
hein? O Ludo ainda está esperando por suas desculpas.”

Eu deslizei de meu banco frágil, me virei para o barman e acenei. “Mica pede desculpas
pelo que fez, barba cinza. Claramente, Mica estava batendo no homem errado.”

Me voltando ao anão de cabelo preto, que me encarava bravo, com o dedo tamborilando
no punhal da faca em seu cinto, eu disse, “Mica tem certeza de que um bando de
alacryanos sobreviventes estão por aqui e você parece mais do que estúpido para ser um
apoiador. Onde eles estão se escondendo?”

Grunhindo um “Tentei te avisar”, ou algo do tipo, o anão sacou uma faca dentada de seu
cinto e investiu em minha direção, mana justa ao redor do seu corpo. A faca avançou
rapidamente contra minha garganta e então meu agressor recuou em uma posição
defensiva, sorrindo presunçosamente confiante. Ansiosa para ver a expressão em sua cara
achatada ao perceber, eu simplesmente esperei.

O sorriso vitorioso se transformou em confusão e então finalmente em uma expressão de


medo. Os anões encararam a faca na mão dele, a qual a lâmina havia se achatado ao se
chocar com minha camada protetiva de mana.

Antes que os anões pudessem fazer algo além de ficarem encarando, eu conjurei duas
mãos massivas de pedra. Elas os alcançaram através do chão, preenchendo o pequeno
espaço entre eles com sons de arrastar e despedaçar, então elas agarraram os segundo e o
terceiro anões, que até aquele ponto estiveram satisfeitos lá no fundo, apenas rosnando e
fazendo caretas de maneira intimidante, enquanto seu líder conduzia a conversa. Os
infelizes gritaram em terror, cegamente tentando se desgarrar dos punhos massivos, mas
sem sucesso.
O líder deles, talvez percebendo que havia cometido um erro terrível, correu para a porta
do lado mais distante do bar. Com cada passo, porém, ele ficou cada vez mais lento, até
que chegou um ponto em que parecia nem conseguir levantar um pé.

Ele caiu de joelhos e depois de bruços, enquanto eu aumentava a pressão da gravidade


pesando sobre ele.

O barman, Ludo, pegou algo debaixo do balcão e levantou: uma besta, já carregada. A
contração tiniu e um virote com ponta de aço voou pelo ar, mas eu a redirecionei com um
pensamento. Ao invés de voar diretamente até mim, o virote se curvou para baixo
dramaticamente, se enterrando no chão de terra. Um momento depois, Ludo flutuou no ar
de ponta cabeça até bater no teto.

Sorrindo, eu me ajoelhei e puxei o virote de onde havia caído no chão. “Onde os Alacryanos
estão se escondendo?” Eu perguntei novamente. “Vamos lá, Mica sabe que vocês ainda
podem falar. Digam a ela e ela irá levar a luta até eles. Ou poderá fazer vocês ficarem em
silêncio — para sempre.”

De onde estava pressionado contra o teto, Ludo grunhiu, “Liberdade — para os — anões.
Você não é nada além de — uma cadela — para humanos e elfos.”

Com um movimento de meu punho, joguei o virote para trás do balcão, sendo pego pela
corrente gravitacional com a ponta para cima e se alojando no peito do anão. Olhando para
baixo, ele encontrou meus olhos e tentou cuspir, porém seu cuspe espirrou em seu próprio
rosto e barba. Logo depois, ele estava morto.

Sangue começou a se agrupar no teto, respingando pelos vértices da parede malfeita.


Quando chegou na borda da gravidade reversa, começou a pingar do teto para o chão.
Liberei o feitiço e seu corpo caiu com um grande baque atrás do balcão.

“Por favor!” gritou um dos anões presos. Ele era jovem, sua barba com cor de lama mal
passava de seu peito. Seus olhos esbugalhados e molhados estavam lacrimejando de medo.
“Por favor, eu posso te falar. Eles não estão aqui, mas—”

“Cale sua boca, Oberle,” o líder gritou de onde estava no chão. Pressionei ele no chão com
o Gravity Hammer, tirando o ar de seus pulmões, o silenciando.

“Oberle, é isso? Bem, pelos menos um de vocês tem bom-senso. Então, se os invasores não
estão aqui, Oberle, onde estão?”
Com um olhar para seu companheiro, que estava arranhando o chão em desespero, Oberle
começou a falar apressadamente. “o bar do Ludo faz parte de uma rede de zonas seguras
para Alacryanos restantes, onde eles podem descansar ou se esconder — às vezes eles se
encontram com anões, aqueles que estão cansados do favoritismo de Triunion em relação
aos elfos e humanos, aqueles que não se esqueceram do assassinato dos Greysunders.

“Não vi nenhum soldado entrar ou sair daqui há uns dias, mas sei onde alguns deles têm
ficado. Torple...” — seus olhos se concentraram no anão achatado no chão — “me levou
uma vez para uma entrega. Tem uma gruta subterrânea há alguns dias de viagem a pé
daqui — realmente isolado — havia talvez trinta soldados lá.”

“Oh, maravilha, Oberle!” Bati palmas de felicidade e o punho de pedra que agarrava Oberle
o soltou, então se despedaçou em pó aos seus pés. “Mica está tão feliz de ter você como o
guia dela. Por favor, me siga. Essa informação precisa chegar ao resto do time e você ficará
com a Mica até que a infestação de Alacryanos seja exterminada.”

“Os vigias da cidade vão coletá-los. Talvez, assim que essa guerra acabar, poderá haver um
lugar para eles em Vildoral. Isso não é algo para a Mica decidir.”

***

Foi uma longa caminhada de volta pelos túneis externos de Vildorial até as cavernas
centrais. Eu gostaria de ter voado de volta, mas estava fazendo o meu melhor para me
manter discreta. Muitos daqueles que moravam nas cavernas altas ou nos túneis profundos
não me reconheciam apenas pela aparência, mas por que o reconheceriam? As Lanças
passaram muito pouco tempo em Darv desde que foram nomeadas cavaleiros, e eu não era
uma vigia da cidade para ser vista patrulhando os túneis escuros.

Sal de fogo. O fedor disso está por toda parte aqui embaixo. Mica odeia o cheiro de sal de
fogo.

Ainda assim, a guerra, a traição dos Greysunders, a remoção de Rahdeas do Conselho... eu


conseguia ver o preço que os anões haviam pagado por isso. Embora a nobreza tenha
resistido a esses eventos com o estoicismo daqueles que já haviam conquistado uma vida
estável, nos túneis profundos — onde os trabalhadores, mineiros e anos sem magia viviam
e trabalhavam — eu via perguntas em todos os rostos.
Esses anões, não por culpa deles, ficaram presos em uma guerra civil, divididos entre a
lealdade a Dicathen e a lealdade a Triunion e a aliança de seus líderes com as forças
Alacryanas.

Muitas dessas pessoas ficariam felizes em deixar os dois lados se destruírem, se isso
significasse que eles poderiam voltar aos negócios diários de sobrevivência em Darv, difícil
o suficiente sem a ameaça de se envolver em uma guerra que eles não entendiam e não
queriam.

“Mica gostaria de ouvir mais sobre você, Oberle. Falta mais uma hora de caminhada para
chegar ao nosso destino, então conversando vai passar mais rápido.

“Hum...” Oberle passou os dedos pela barba nervosamente. — “O que... o que você quer
saber?”

“Anões sempre têm tanto medo de serem introspectivos. Mica tinha esquecido como é ter
que conversar com outros anões. Exceto por Olfred e...” Eu parei com o pensamento de
meu amigo, mentor e rival. Olfred Warend, o outro anão Lança, fez parte do golpe de
Rahdeas e tentou assassinar os generais Aya e Arthur, uma batalha que terminou em sua
morte.

“E-eu suponho que posso… sou do clã Lastfire, mas duvido que você já tenha ouvido falar
de nós. Mineiros, principalmente. Acostumados a minerar, trabalhando para qualquer um
que estivesse pagando, mas antes de eu nascer, meu tio-avô entrou em um veio de sal de
fogo, então todo o clã tem trabalhado com isso nos últimos cem anos ou mais.”

Eu funguei, percebendo que ele fedia a sal de fogo. Que nojo. “Todos os membros do seu
clã são traidores de Dicathen, ou apenas você?” Oberle parou de andar e me encarou com
firmeza. “O que foi? Você talvez discorde da avaliação de Mica sobre suas escolhas de vida?
Por favor, explique então — e continue andando.”

Oberle fez o que eu disse, mas uma nuvem escura parecia ter o encoberto. “Eu não sou um
traidor, e nem os membros do meu clã. Talvez as coisas pareçam diferentes da alta posição
em que você vive, mas fora das grandes cavernas as coisas não são ótimas. Primeiro,
ouvimos sussurros de guerra e então nosso rei e rainha reúnem toda a sua corte e se
mudam para algum castelo no céu, enquanto se juntam a este Triunion e alinham os anões
com elfos e humanos.”

“A próxima coisa que ficamos sabendo é que os Greysunders estão mortos e o Conselheiro
Rahdeas se tornou a única voz para os anões em Dicathen, e ele, ao que parece, também
está aliado aos invasores. Nosso rei, rainha e voz no Conselho acabaram por estar em
aliança com Alacrya. O que isso significa para os anões nos túneis? Somos aliados dos
Alacryanos? Ainda estamos sendo representados no Conselho? Podemos esperar que Sapin
e Elenoir enviem seus exércitos marchando para nossas casas? Muitas foram as perguntas,
poucas as respostas.”

Eu não disse nada. Esta tinha sido uma desculpa comum para a situação atual dentro de
Darv.

“Meu pai disse ao clã para nos mantermos fora disso”, continuou Oberle. “‘Não é da nossa
conta’, ele nos disse. ‘Não quando há sal de fogo para ser minerado.’ Até onde eu sei, sou o
único que não escutou, e mesmo isso não foi de propósito.”

“Oh? Então você acidentalmente se tornou cúmplice do ato criminoso de abrigar fugitivos
de guerra?” Passei a mão teatralmente pelo meu cabelo. “Isso parece uma história e tanto.
Mica está morrendo de vontade de ouvir!”

Oberle balançou a cabeça com raiva, torcendo a barba com as mãos enquanto respondia.
“Eroc é um velho amigo da família. Nós bebemos no Ludo's desde muito antes do Conselho
ser formado e a guerra anunciada. Eu nunca quis me envolver, mas Ludo, Torple, Eroc —
tudo o que eles falavam era construir um mundo melhor para os anões, recuperar a honra
de nossos ancestrais, tirar nosso povo da sujeira... Era tudo só conversa, ou assim eu
pensava. Então os Alacryanos vieram e eu fiquei apavorado. Não sou ativista. Eu estava
apenas... meio que lá.”

“Você já chegou a conhecer os Greysunders? Ou o Conselheiro Rahdeas?” Eu perguntei


séria.

“Não.”

“Mica estava ligada a eles, ficava de guarda ao lado de suas camas enquanto dormiam,
ouvia seus momentos mais íntimos, sabia de todos os seus segredos — quase todos os
segredos. E você sabe o que Mica descobriu?

Com curiosidade genuína demonstrada em seu rosto, Oberle respondeu: “Não. O quê?”

“O rei e a rainha eram cães egoístas. Eles constantemente conspiravam, não para melhorar
Darv ou reivindicar nossos direitos como uma nação igualitária, mas para seu próprio bem-
estar e a queda daqueles que os haviam traído pessoalmente. Mais do que isso, eles eram
fracos. Rahdeas, por outro lado, amava demais Darv e procurou elevar os anões, escalando
uma montanha de mortos. Ambos não corresponderam às expectativas.”
Oberle desviou o olhar. Seus olhos caíram sobre uma garotinha dançando atrás de nós,
atrás de dois anões sujos e de aparência cansada. A garota, percebendo o olhar de Oberle,
tirou algo do bolso do vestido descolorido e jogou no ar. Uma nuvem de poeira cintilante
subiu ao redor dela, cintilando em azul, vermelho e prata. A garota riu e Oberle sorriu.

Minha declaração sobre os líderes anões foi recebida com silêncio. Talvez isso tenha dado
ao jovem anão algo a se pensar. Isso é bom. Nós anões, precisamos passar mais tempo
pensando.

O Instituto Earthborn, onde minha equipe e eu estávamos hospedados, não estava tão
longe naquele momento. Com o tráfego cada vez mais denso perto das cavernas centrais
de Vildorial, eu sabia que o silêncio seria melhor perto de tantos ouvidos. Quais desses
anões são simpatizantes de Alacrya? Quem deles colocaria um machado no crânio desse
garoto, para impedi-lo de entregar o local do esconderijo dos Alacryanos?

“O que os Alacryanos querem?” Oberle perguntou de repente.

“Apenas a escravização de todos os humanos, elfos e anões em Dicathen — e todos os


recursos sob, na superfície e acima de Dicathen também — para promover a continuação
de uma guerra mais antiga que toda a nossa nação.”

Oberle apenas assentiu.

TÚNEIS OBSCUROS (parte 2)


Tradutor: Lockard

MICA EARTHBORN

Se algum aspecto de Vildorial parecia inalterado, eram os magos correndo pelo Instituto
Earthborn como se o mundo estivesse pegando fogo e só eles pudessem apagá-lo. Não é
como se isto estivesse muito longe de acontecer agora, talvez. No entanto, os guardas não
costumavam olhar as pessoas com tanta suspeita, nem tamborilavam seus machados e
espadas tão nervosamente.

“Não se preocupem, bravos soldados, este pequeno anão está com Mica e não causará
nenhum sofrimento.” Um dos guardas fez uma pausa e forneceu uma escolta, mas eu o
enxotei. “Esses salões são bem conhecidos por Mica, e ela não precisa de um guia para
encontrar sua equipe!”
Com as bochechas vermelhas sob a barba avermelhada, o guarda parou e gaguejou um
pedido de desculpas antes de retornar ao seu posto.

Se você perguntasse a qualquer anão, o Instituto Earthborn era a melhor escola de magia
de Dicathen. Foi fundado pelo clã Earthborn centenas de anos atrás e desde então
administrado pelos Earthborns.

Passei meus anos de formação naqueles salões de mármore irritando minha família e
aterrorizando meus professores. Mesmo entre os Earthborns, que eram considerados
extraordinariamente talentosos em magia entre os anões, eu sempre fui considerada um
gênio. Poucos anões poderiam manipular a gravidade, e nenhum poderia fazê-lo com meu
nível de proficiência. É uma maravilha que você tenha permanecido tão humilde, querida
Mica.

Os corredores estavam quietos, já era tarde e a maioria dos alunos e funcionários já haviam
se retirado para seus quartos, mas eu sabia que a equipe estaria esperando para ouvir
sobre a caçada da noite. Oberle, seguindo de perto, parecia ficar mais quieto e nervoso,
quanto mais fundo no terreno da escola eu o conduzia. O caipira do túnel está mais
assustado aqui do que no bar. Que estranho.

Ouvi a equipe antes mesmo de abrir a porta de ferro que levava aos nossos aposentos
compartilhados. Parecia que eles estavam discutindo, embora eu não conseguisse entender
as palavras. Revirando os olhos, abri a porta, agarrei Oberle pelo colarinho e o arrastei para
dentro.

“—...esquecido por que fomos enviados aqui, Sr. Gideon—”

“—...eu faço com meu próprio tempo enquanto não ajudo diretamente no esforço de
guerra não é da sua maldita conta—”

“—...operação é essencial para evitar que o exército Alacryano faça desta uma guerra de
três frentes—”

“—...fiz tudo o que me foi pedido, e continuarei a fazê-lo, mas eu sou um inventor,
caramba, não um diplomata, e eu—”

“Calados!” Um anão de rosto vermelho, sua barba loira estremecendo de irritação,


pisoteou entre uma mulher élfica de meia-idade e um humano de cabelos grisalhos. "Já
chega! Pelas pedras, se vocês dois não pararem de brigar, eu enterro vocês dois, que se
danem as consequências!
Os ocupantes da sala caíram em um silêncio, chocados. O velho estava furioso, muito
indignado até mesmo para responder. Os olhos multicoloridos da elfa desceram ao chão,
mas eu podia sentir sua mana fervendo por dentro. De um assento próximo, um jovem
humano de cabelos encaracolados estava espiando por entre seus dedos. Encostado na
parede oposta, um segundo anão loiro, idêntico ao primeiro, parecia ter dificuldade em não
cair na gargalhada.

“Fico feliz em ver todos se dando tão bem,” eu gorjeei, arrastando Oberle para dentro da
sala e empurrando-o para uma cadeira vazia. Houve uma breve pausa quando todos
perceberam que eu tinha me juntado a eles, então cada um explodiu em uma explicação
rápida, falando um sobre o outro e tornando impossível ouvir qualquer um deles.

“General, devo protestar contra as atividades extracurriculares do Sr. Gideon—”

“Sua assistente parece pensar que é ela quem está encarregada desta investigação—”

“Prima, é melhor você ter nos trazido notícias dignas de ação, porque meu machado não
vai ficar embainhado por muito mais tempo—”

Um por um, eles cortaram suas explicações. Dei a eles minha expressão mais doce e
inocente, que dizia a eles que, se não parassem de falar imediatamente, algo
desconfortável provavelmente aconteceria.

“Obrigada a todos por esperarem. Caro primo, Mica realmente traz 'notícias dignas de
ação'. Pessoal, esse aqui é Oberle.” Acenei para o mineiro, que parecia ter perdido a
capacidade de se mover e ficou sentado, congelado, olhando para todos eles. “Oberle é um
mineiro de sal de fogo que se envolveu na insurgência Alacryana inteiramente por acidente,
e ele concordou em nos levar para um acampamento Alacryano ao qual recentemente
entregou mercadorias, para reparar seus erros passados.”

Isso chamou a atenção deles.

“Oberle, este humano enrugado aqui é o Artífice Gideon, mestre inventor e diretor de
ciências do próprio Conselho.”

O velho deu um passo à frente animado. “Sal de fogo, você diz? Ora, acontece que uma via
da minha pesquisa aqui em Darv—

“E esta,” eu disse, falando por cima do humano, “é minha assistente, Alanis Emeria.” A elfa
curvou-se respeitosamente.
“Esses anões lindos e brutos são meus primos, Hornfels e Skarn Earthborn.” O anão risonho
junto à parede acenou alegremente, mas seu gêmeo apenas olhou para Oberle.

“E que Mica não esqueça da criancinha, que por algum motivo Gideon insistiu em colocar
em perigo, ao trazê-la junto, Emily Watsken, anteriormente da Academia de Xyrus.”

“Eu não sou uma criança!” Emily declarou emburrada.

Movendo-se de seu posto junto à parede, Hornfels saltou sobre o encosto do sofá e se
acomodou ao lado de Emily. “Então o que você descobriu, prima? Como disse Skarn, nossos
machados estão ansiosos para ver alguma ação. Estamos nos espreitando pelas ruas há
semanas.”

A promessa de progresso focou o grupo. Skarn deu a volta no sofá para ficar atrás de seu
irmão, enquanto Gideon se sentava ao lado do fogo fumegante e Alanis se movia para o
lado, ficando desconfortavelmente imóvel e ereta.

Comecei a explicar minhas descobertas, deixando Oberle preencher os detalhes quando


necessário. O grupo então discutiu o plano para se mover até o acampamento Alacryano.

“Está claro que Emily e eu fomos trazidos por nossa capacidade intelectual, não por nossas
proezas de combate. Seríamos nada mais que um risco, estando nos túneis, um objeto que
você deve proteger. De qualquer forma, já comuniquei os desejos do Conselho à Guilda dos
Earthmovers, e Emily compartilhou seu projeto para o monitoramento do fluxo de mana
com o Instituto Earthborn.”

“Agora,” Gideon fez uma pausa e lançou um olhar sombrio para Alanis, “vou passar o
tempo que vocês estiverem fora, pesquisando os sais de fogo extraídos de Vildorial.
Acredito que pode haver várias aplicações de combate para este mineral, além de seu uso
em forjas anãs e para aquecer os túneis profundos.”

“General Mica,” Alanis disse imediatamente, “acredito ser imperativo que o Artífice Gideon
e sua aprendiz supervisionem o trabalho na Guilda dos Earthmovers. O planejamento ali é
essencial para a defesa da Sapin, o Conselho deixou isso bem claro. Gideon—”

“Será um risco para a guilda, tanto quanto é um ativo importante,” eu interrompi. “O


famoso Gideon pode ser, mas os Earthmovers são orgulhosos e só serão insultados se um
humano estiver sobre seus ombros, tentando microgerenciá-los. Contanto que eles estejam
totalmente cientes de sua tarefa — e entendam sua urgência —, então Mica está bem com
Gideon perseguindo seu projeto de estimação enquanto estamos fora. Para Gideon,
acrescentei: “O Clã Lastfire pode ser útil, e você pode explicar a eles por que o filho mais
novo deles desapareceu enquanto você está nisso”.

“Então o que devo fazer enquanto você estiver fora, general?” Alanis perguntou
rigidamente.

“Mica gostaria que a força-tarefa do conselheiro Buhnd nos ajudasse no ataque. Embora
improvável, é possível que enfrentemos um retentor, talvez até um ceifador. Sabe-se do
relatório original do General Arthur sobre os movimentos das forças Alacryanas através de
Darv que uma foice atravessou o portal, embora essa foice nunca tenha aparecido no
campo de batalha. Assim, a criatura deve ser considerada ainda em liberdade. Se
encontrarmos essa foice, Mica lidará com isso, mas seria melhor ter mais soldados para
lidar com as forças alacryanas. Então, por favor, envie um pergaminho para o Conselho,
explicando o que Mica encontrou.”

"Vou cuidar disso imediatamente, general." Alanis curvou-se profundamente, seu rabo de
cavalo loiro derramando sobre seu rosto, então saiu da sala em uma caminhada rápida.

“Nós iremos com você.” O tom de Skarn fez disso uma declaração de fato.

“Sim, primo. Oberle liderará Mica, Hornfels, Skarn e quem quer que a força-tarefa de
Buhnd possa poupar nos túneis profundos até esta gruta escondida.”

A voz de Oberle estava embargada e rouca quando quebrou o silêncio, dizendo: “Você...
você quer que eu vá com você? Eu... hum... eu tinha entendido que estaria apenas... apenas
dando instruções a vocês. Ou alguma coisa assim."

“Ah, não, amigo Oberle, você é o guia de Mica agora e não vai sair do lado de Mica.” Eu
sorri docemente para o jovem anão e pisquei os olhos, enquanto liberava apenas o
suficiente do meu poder para fazê-lo se contorcer em seu assento.

"Bem, então, eu preciso do meu sono da beleza, se formos matar Alacryanos amanhã",
disse Hornfels, levantando seu corpo atarracado do sofá.

“É preciso mais do que um sono para torná-lo uma beleza, irmão”, rosnou Skarn.

“Olha quem está falando”, brincou Hornfels de volta.

TÚNEIS OBSCUROS (parte 3)


Tradutor: Lockard
MICA EARTHBORN

“Por lá?” Skarn ecoou, sua voz subindo nervosamente.

“Sim”, respondeu Oberle, que acabara de nos direcionar para uma fenda
desconfortavelmente alta e estreita.

Fazia três dias desde que deixamos o Instituto Earthborn. Oberle nos levou para baixo e
através dos túneis profundos até que deixamos Vildorial completamente para trás. Não
vimos sinal dos Alacryanos, embora nosso guia tenha nos assegurado que estávamos no
caminho certo.

“Mica vai primeiro. Mantenha seus olhos para cima. Este seria um bom lugar para uma
emboscada.”

Eu escorreguei na brecha. Dos meus dois lados, paredes altas de vidro vulcânico se erguiam
na escuridão acima. Atrás de mim, Oberle carregava um artefato iluminador, que lançava
uma luz prateada na obsidiana ondulante.

Hornfels e Skarn vieram em seguida, seus machados em punho. Os soldados do Ancião


Buhnd seguiam atrás deles.

Todos os três, eu resmunguei para mim mesma.

Quando Alanis voltou, cansada e frustrada, ela trouxe três magos e a notícia de que a
maioria dos anões sob o comando de Buhnd já estava perseguindo uma pista que os havia
levado para longe de Vildorial. Esses três eram toda a assistência que a força-tarefa podia
nos oferecer.

Eles não eram inúteis: dois ampliadores de núcleo amarelo escuro e um conjurador de
núcleo amarelo sólido. Os ampliadores, Kobel e Jasper — ambos veteranos robustos —
seguiram atrás de meus primos. Tetra Satinspar, a Conjuradora, veio na retaguarda. Ela
segurava um segundo artefato iluminador, que fazia sua pele branca como giz e cabelos
brancos puros brilharem.

Apesar de nos movermos devagar, o espaço estreito amplificava nosso barulho, e parecia
que cem anões marchavam conosco. Excelente. A cada passo, estamos basicamente
tocando o sino do jantar para quaisquer bestas de mana que se escondem nesta fenda.
Em poucos minutos, Skarn começou a interrogar nosso guia em um sussurro rouco e
urgente.

“Até onde isso vai?”

“Não muito longe”, respondeu Oberle.

“E você tem certeza que este é o caminho?”

“Sim.”

“Você viu alguma criatura da última vez que você passou?”

“Não.”

“Silêncio”, eu sussurrei. “Mantenha seus olhos e ouvidos abertos e sua boca fechada,
primo.”

Apesar das garantias de Oberle, a fissura parecia durar muito tempo e começou a pregar
peças em meus sentidos. As paredes pareciam se mover, ondulando como a superfície de
um lago, e um som sedoso de raspagem ecoou de cima, quase inaudível sobre nossos
próprios pés arrastados.

Então começou o clique. Era sutil e consistente, como se alguém tivesse uma pedra presa
na bota. Eu estava totalmente focada no barulho, tentando determinar de onde vinha,
quando Oberle tropeçou no chão irregular e se derramou para frente com um grunhido.

O globo luminoso que ele carregava caiu de suas mãos, ricocheteou no chão duro com um
estalo agudo que ecoou pela ravina e rolou entre meus pés, fazendo as paredes dançarem
loucamente ao nosso redor.

“Eu pensei que você fosse um mineiro, garoto.” Skarn sussurrou. “Essas suas pernas estão
de enfeite?” A voz de Skarn engasgou de repente. Lancei-lhe um olhar preocupado, mas ele
era apenas uma silhueta contra a luz de Tetra. Quando abri minha boca para falar, sua
forma escura foi levantada no ar.

Hornfels gritou e saltou para cima, agarrando seu irmão pelos tornozelos. Por um único
momento eles pareciam flutuar no ar, então as botas de Skarn escorregaram de seus pés e
Hornfels caiu de volta no chão. O machado de Skarn ricocheteou no chão de pedra um
segundo depois.
“Skarn!” Eu gritei quando ele foi arrastado para fora de vista bem acima de nós.

Reunindo mana ambiente, levantei-me do chão e voei para a escuridão atrás de Skarn.
Mesmo para um anão, era difícil ver na escuridão total dentro desta fenda, mas uma vez
que estava no ar, eu podia ouvir as formas se movendo no escuro claramente: Clique.
Clique clique clique. Clique clique.

Algo como uma corda grossa, molhada e pegajosa de repente se enrolou no meu pescoço,
me empurrando para fora do curso, me batendo na parede. Estendendo a mão, agarrei a
corda, enrolei-a em volta do meu pulso e puxei. Ao mesmo tempo, aumentei várias vezes a
força da gravidade no meu corpo.

De cima, uma criatura peluda ligeiramente maior que um anão passou por mim, suas oito
patas arranhando as paredes de vidro. Houve um estalo úmido quando chegou ao fundo.

“Aranhas da forca!” Eu gritei para meus companheiros abaixo. “Luz!”

Um momento depois, uma bolha de luz laranja brilhante formou um arco no ar; Tetra havia
jogado uma bola de magma puro no alto da escuridão, revelando um rio instável e trêmulo
de aranhas enormes correndo de cabeça para baixo ao longo do teto da fenda. Longos fios
de teias pendiam ao meu redor, suas pontas emaranhadas, parecidas com laços, armadas
como armadilhas para pegar presas descuidadas.

“Skarn!” Gritei de novo, procurando meu primo entre a massa de aranhas, que começaram
a assobiar e estalar alto na presença da luz.

Algo pesado me atingiu por trás e várias pernas duras e cabeludas me envolveram. Virei-me
para ver o rosto sem olhos da aranha a apenas alguns centímetros do meu, suas quatro
presas, cada uma longa e afiada como uma faca de filetagem, pronta para me abrir e me
encher de veneno.

Girando para evitar as presas, conjurei uma pequena lâmina de granito em minha mão
esquerda e girei para cima e para fora, cortando duas das pernas da aranha. Com outro
movimento, o abdômen da aranha caiu, seguido rapidamente pelo resto.

A lava que escorria pela parede da ravina já estava desaparecendo, levando consigo o
brilho alaranjado. Voltei para a tarefa de encontrar Skarn, quando um rugido opressivo
como uma avalanche encheu o ar. A seis metros de distância, quatro espinhos de pedra
irromperam das paredes, espetando uma multidão de aranhas e revelando Skarn, agarrado
por sua vida a um fio de teia.
Seguindo a sugestão do meu primo inteligente, moldei uma pedra — um metro de largura
— das paredes de obsidiana, depois reverti a força da gravidade sobre ela, fazendo-a voar
no ar e colidir com o teto. A pedra preta começou a rolar por ele, esmagando as aranhas e
destruindo suas teias.

Concentrei-me na pedra até vê-la passar por cima de Skarn, quebrando a corda à qual ele
se agarrava. Com uma maldição, ele começou a cair, mas eu estava ao lado dele antes que
ele caísse três metros, agarrando-o pelo peito e facilitando sua descida.

No chão, nossos companheiros foram forçados a se proteger de uma chuva de partes de


aranha.

“Pelas pedras e raízes, essa é a coisa mais nojenta que eu já vi”, resmungou Hornfels,
limpando um pedaço de lodo verde da barba.

“Isso fede!” Oberle gemeu, abrigando-se sob uma laje de pedra que Jasper havia criado.

Para garantir, rolei a pedra de volta pelo teto, certificando-me de que as aranhas da forca
estavam completamente mortas, depois deixei que se fundisse de volta nas paredes.

“Bem, isso foi certamente emocionante”, eu disse alegremente, puxando um pouco de


seda de aranha do cabelo de Skarn. “Mica está feliz que você não seja comida de aranha,
primo.”

“Igualmente,” rosnou Skarn, esfregando a queimadura vermelha em seu pescoço, onde a


armadilha da Aranha da Forca o pegou. “Agora, onde diabos estão minhas botas?”

***

À noite, estávamos todos sentados em torno de um monte de sal de fogo brilhante em


meio ao nosso acampamento improvisado, que havíamos montado no meio de uma seção
longa e reta do túnel, permitindo-nos visibilidade decente em ambas as direções. Mergulhei
um pedaço de bolacha na minha cerveja para amolecer, enquanto ouvia Oberle discutir
sobre o esconderijo do inimigo.

“A gruta está no fundo de uma fissura natural. A água desce até uma poça dentro de uma
caverna com talvez cem metros de largura. Todas as barracas e coisas deles devem ter sido
transportadas, porque não vi nenhuma estrutura que parecesse construída ou conjurada.”
“Parece que eles não têm os meios”, acrescentou Tetra, que estava ouvindo com atenção e
concordando com a cabeça. “Não encontramos nenhum Alacryano treinado nesse tipo de
magia. Seu uso de mana parece muito específico.”

“É”, acrescentei. “Mica não acha que eles trouxeram seus padeiros e carpinteiros para
Dicathen para a guerra. Seus soldados se concentram em apenas uma coisa: matar nossos
soldados.”

“E a que distância você disse que essa fissura está, mesmo?” perguntou Kobel. Ele era um
anão velho e grisalho; sua orelha esquerda havia sido mastigada por alguma coisa e sua
barba era irregular naquele lado devido a uma rede de cicatrizes que percorriam seu rosto.

“Por volta de quatro horas, talvez cinco”, disse Oberle com um encolher de ombros evasivo.
“Só estive aqui uma vez e não pensei que voltaria. Os túneis são todos muito fáceis no resto
do caminho, no entanto.”

Tetra se inclinou para frente e olhou para Oberle. A fraca luz vermelha do sal de fogo
refletiu em seus olhos rosados, fazendo-os brilhar como carvões em brasa. “Havia algum
batedor, algum posto de guarda fora da gruta?”

“Eu nunca vi nenhum, senhora, e estava procurando”, Oberle nos assegurou. “A verdade é
que fiquei petrificado depois de quase quatro dias rastejando pelos túneis, apenas eu e
Torple. Eu olhei em cada canto e recanto para ter certeza de que algum bicho não estava
esperando para me pegar das sombras.

“Que sorte que essas aranhas da forca não estavam lá quando você cruzou a fenda”,
resmungou Skarn, olhando o menino com desconfiança.

“Talvez estivessem”, disse Oberle, dando de ombros novamente. “Nós percorremos todo o
caminho no escuro, no entanto. Torple insistiu.”

“Ah, bem, isso não teria nos ajudado em nada”, disse Hornfels seriamente. “Pelo tanto de
barulho que Skarn faz quando anda, eles o teriam encontrado de qualquer maneira.” O
grupo caiu na gargalhada, todos exceto Skarn, que olhou seu gêmeo perigosamente e
brandiu seu machado.

“Ei! Você não é melhor do que—”

“Calados!” Eu sussurrei, virando meu ouvido para o túnel escuro atrás de mim. Tetra
ergueu seu artefato de iluminação e concentrou-se no túnel. Os pelos da minha nuca se
arrepiaram, apesar do túnel parecer vazio.
“O que é—” Skarn começou a perguntar, mas eu fiz sinal para ficar quieto.

Concentrando mana em meus olhos, procurei no túnel por qualquer sinal de movimento.
Lá! O feixe de luz revelou as partículas individuais de poeira flutuando no ar e, em um
ponto de dez metros abaixo do túnel, algo as estava empurrando.

“Eles estão protegidos!” Eu gritei, jogando uma parede de pedra do outro lado do túnel.
Um instante depois, algo bateu nele com a força de um aríete. Atrás de mim, um coro de
maldições saiu de meus companheiros enquanto cada um deles pulava e se preparava para
se defender.

Uma segunda explosão causou a formação de uma teia de aranha de rachaduras na parede.
Não sobreviveria a uma terceira, mas estava tudo bem por mim.

Entre minhas mãos, condensei a mana da terra em uma pedra áspera de um pé e meio de
largura. Continuei pressionando, forçando mais mana na pedra, mas não permitindo que
ela crescesse, até que ela pesasse tanto quanto um touro auroque.

Quando a parede de pedra desmoronou sob a força de uma terceira explosão, eu lancei o
Meteor Strike, mirando o chão doze metros à frente. A pedra densa começou a brilhar
enquanto se dirigia para onde eu pensava que o inimigo estava se escondendo. Quando o
meteoro encontrou a barreira invisível, houve um som como vidro se estilhaçando e o
escudo caiu, revelando brevemente três homens muito surpresos.

Um dos Alacryanos estava no caminho do meteoro. Ele quase foi vaporizado em contato. A
pedra veloz atingiu o chão atrás dos dois restantes, explodindo com força suficiente para
arremessá-los a dez metros de nosso acampamento, onde eles caíram em pilhas
amassadas, ambos completamente imóveis.

Atrás de mim, Hornfels baixou o machado. “Por que estamos aqui mesmo?”

Eu estava curvada sobre o Alacryano mais próximo, minha mão pressionada contra seu
peito. “Entretenimento”, eu disse a ele. Eu então verifiquei o segundo homem. “Mortos, os
dois. Mica bateu neles com muita força.”

Eu me endireitei e olhei para meus companheiros, refletindo sobre a situação. “Se Mica
estivesse em seus lugares, Mica teria enviado o corredor mais rápido de volta para avisar
sobre soldados inimigos próximos. O elemento surpresa provavelmente está perdido.”
“Você poderia voar atrás deles, ver se consegue alcançá-los antes que eles cheguem à
gruta”, sugeriu Hornfels.

“Mica teria que deixar vocês aqui sozinhos, para fazer isso, e não sabemos quanto tempo
esses três esperaram antes de atacar. Não. Alto risco, talvez sem recompensa. Mas não
vamos dar aos Alacryanos mais tempo para se prepararem do que o necessário. O tempo
de pausa acabou. Peguem seus equipamentos.”

***

Corremos até a fissura que descia para a gruta escondida onde nosso inimigo estava
acampado, o que levou pouco menos de duas horas. Não havia sinal do batedor que
presumi ter ido avisar os Alacryanos de nossa presença.

Uma série de rachaduras nas paredes e no teto pingava constantemente, alimentando um


riacho que serpenteava pela fissura. Ao redor do riacho cresciam cogumelos brilhantes, que
enchiam a fissura com uma fraca luz verde-azulada.

“Que bonito”, eu sussurrei, me abaixando para olhar mais de perto os fungos. “Também
mortal, pensa Mica.”

“Fomos avisados para não os tocar”, disse Oberle com medo, atrás de mim. “Quando eu
estava aqui com Torple. A gruta fica bem no fundo, talvez trezentos metros.

Dei vários passos cuidadosos na fissura, tentando ver o que estava à frente, mas o caminho
natural era muito irregular para ver longe. Uma vibração de algo semelhante ao medo
passou por mim, arrepiando meus braços e pescoço. Não seja covarde, pensei comigo
mesma.

Virando-me, olhei para o resto do meu grupo: Oberle pálido e aterrorizado; Skarn
carrancudo; Hornfels, uma sobrancelha levemente arqueada enquanto esperava pela
minha palavra; o cicatrizado Kobel e o silencioso Jasper; e Tetra, brilhando como um inseto
de fogo com seu artefato de luz erguido.

“Talvez Mica devesse entrar sozinha”, sugeri, minha voz quase inaudível. Se houver uma
Foice lá embaixo...

Skarn cuspiu no riacho e Hornfels bufou. “Não é provável.”


“Fomos encarregados pelo próprio Conselheiro Buhndemog de rastrear cada último
Alacryano em Darv, General Mica”, acrescentou Tetra. “Seria equivalente a deserção se nos
afastássemos agora.”

“Oberle,” eu disse, tomando uma decisão. Ele me olhou nervoso. “Você, pelo menos, vai
voltar para Vildorial. Vá para o Instituto Earthborn e informe a assistente de Mica, Alanis,
que você nos entregou ao esconderijo Alacryano como prometido. Se Mica não retornar
dentro de dois dias da sua chegada em Vildorial, assuma o pior. Alanis deveria pedir ajuda
ao Conselho. Se Mica morrer, isso significa que uma Foice ainda está em Darv.”

A determinação de Oberle pareceu ruir e seus ombros começaram a tremer. “Obrigado.


Eles... eles disseram que se Torple ou eu voltássemos para o acampamento deles, cairíamos
mortos e eu — eu estava com tanto medo, eu tinha certeza...” — Ele parou quando as
lágrimas começaram a escorrer por sua barba.

“Silêncio agora, você se saiu muito bem como guia de Mica.” Eu sorri no que eu esperava
que fosse uma forma reconfortante.

Oberle entrou na fissura, movendo-se cuidadosamente sobre os cogumelos, e me envolveu


em um abraço apertado. Sem saber como responder, eu congelei, olhando impotente por
cima do ombro para os outros. Hornfels sorriu e piscou para mim. Então a luz verde-azulada
ao nosso redor mudou sutilmente, assumindo um tom ametista.

“O que—” começou Skarn, mas foi interrompido por um grunhido de dor de Oberle.

O mineiro de sal de fogo deu um passo para trás de mim, olhando para seu peito. Um brilho
opaco e arroxeado irradiava através de sua túnica pesada.

Dando um passo à frente, rasguei o tecido grosso, revelando seu peito de barril. Algo
dentro de seu esterno estava brilhando através de sua pele e ficando mais brilhante a cada
segundo.

Oberle abriu a boca para gritar, mas em vez disso saiu uma luz roxa escura.

Ele é uma bomba!

Sem tempo para sequer gritar um aviso, usei o Black Diamond Vault. Uma estrutura de
cristal cintilante apareceu ao meu redor, depois cresceu rapidamente para fora, até
encapsular eu e Oberle dentro de uma camada impenetrável de diamante negro.
Assim que Oberle foi contido, empurrei em todas as direções com uma explosão de
antigravidade, esperando que desse modo, os outros deslizassem para longe da prisão
mineral que continha a bomba. Eu não conseguia ver ou ouvir nada fora dos efeitos do
feitiço, no entanto. Sem como saber o quão forte seria a explosão, esperei, envolta nos
cristais negros.

Está tão escuro, estou vendo manchas, pensei. Então percebi que os pontos de luz eram
buracos que apareciam no diamante negro enquanto a bomba de mana detonava,
corroendo a substância mais dura conhecida pelo homem ou anão, como um ácido através
de um pergaminho.

Incapaz de escapar, coloquei mana em camadas sobre meu corpo, empurrando tudo o que
tinha para uma barreira protetora. Em todos os lugares que o brilho tocava, eu podia sentir
meu poder sendo queimado.

Então, em um flash de luz brilhante, o mundo virou de cabeça para baixo.

TÚNEIS OBSCUROS (parte 4)


Tradutor: Lockard

MICA EARTHBORN

Meus sentidos voltaram para mim em etapas. Minha audição voltou primeiro quando os
sons de detritos caindo e água borbulhando encontraram meus ouvidos. Então o cheiro
pesado de poeira e pedra queimada encheu meu nariz e meus pulmões, fazendo com que
eu tivesse um acesso de tosse. Enquanto eu tremia de tosse, senti os escombros me
pressionando, me segurando tão firme quanto o Black Diamond Vault.

Foi também quando senti a dor. A dor é boa, eu disse a mim mesma. Dor significa que ainda
não estou morta.

Minha boca estava cheia do gosto metálico do meu próprio sangue. Eu não tinha certeza se
meus olhos estavam abertos ou não, então eu os fechei. Abrindo-os novamente, encontrei
o mundo ao meu redor ainda inteiramente negro. Reunindo minha mana, fiquei
agradavelmente surpresa ao descobrir que estava esgotada, mas não completamente.
Meu núcleo de mana doeu quando conjurei Null Gravity. Levou um momento para que os
efeitos fossem sentidos, mas pouco a pouco, o espaço se abriu ao meu redor e eu pude me
mover um pouco, enquanto as pedras flutuavam, não mais presas pela força da gravidade.

À medida que o espaço foi criado dentro do monte de rocha demolida, senti a sensação
fresca de água escorrendo pelo meu braço. Uma luz verde fraca iluminou um pequeno
pedaço de detritos flutuantes, quando um cogumelo brilhante se tornou visível.

Eu empurrei o chão abaixo de mim, forçando meu caminho até a nuvem de pedras. Elas
ainda estavam muito densas para que eu pudesse manuseá-las facilmente, mas à medida
que continuavam a se espalhar, afastando-se cada vez mais uma da outra, consegui
redirecioná-las e criar uma espécie de caminho.

Como não sabia qual direção seguir, segui o som da água. A cratera cheia de rocha
pulverizada era inacreditavelmente grande, mas eventualmente cheguei à sua borda e
encontrei uma pedra sólida. Deve ter sido perto de onde o riacho corria originalmente,
porque havia uma pequena cachoeira caindo pela parede escarpada e entrando na cratera.

Eu empurrei o chão, deixando-me flutuar para cima, sob os efeitos da Null Gravity,
finalmente me libertando do nimbo de detritos. O suficiente dos cogumelos brilhantes
sobreviveu à explosão para eu conseguir enxergar. A explosão havia rasgado o Black
Diamond Vault e as paredes do túnel, deixando um buraco aproximadamente esférico com
quase dez metros de diâmetro. Do outro lado da cratera eu mal conseguia distinguir a
fissura que descia para o acampamento Alacryano.

Eu liberei o feitiço e estremeci com o estrondo cacofônico causado pela avalanche de


pedras caindo de volta na cratera.

Que legal, Mica. Vamos apenas anunciar ao mundo que sobrevivemos, que tal?

Voando para uma saliência de pedra, que pensei que deveria ser o túnel pelo qual
havíamos chegado, pousei em pé e tentei suportar todo o meu peso. Eu imediatamente tive
que reforçar minhas pernas e costas com mana para não desmoronar em uma pilha
trêmula. Inclinando-me contra a parede fria do túnel, deslizei para o meu traseiro e liberei a
mana de reforço.

“Então,” eu disse em voz alta com uma voz tão grave quanto o poço ao meu lado, “Mica
deveria fazer um balanço, sim.” Eu levantei um dedo e olhei para ele. Minha mão inteira
estava preta de poeira e sangue. “Mica está viva.” Eu levantei um segundo dedo. “Oberle
certamente está morto, coitado. O grupo de Mica também não pode ser contabilizado.
Uma quantidade desconhecida de tempo se passou, embora com base na sensação de
desidratação já tenha passado algum tempo. É improvável que o inimigo não tenha notado
nossa aproximação.” Eu tinha levantado um terceiro, quarto e quinto dedo enquanto
recitava cada item.

O que diabos aconteceu? Eu me perguntei.

Esse era um tópico interessante para minha mente cansada, então fiquei sentada por um
longo tempo e considerei as últimas palavras de Oberle, a explosão e o que a havia
desencadeado. As Lanças foram todas informadas sobre o interrogatório daquela mulher,
Goodsky, e a maldição sob a qual ela foi colocada, então eu sabia que os Alacryanos
possuíam tais capacidades.

A luz corruptora, no entanto, era diferente de tudo que eu já havia experienciado antes. O
que poderia ser forte o suficiente para demolir o Black Diamond Vault com um único
feitiço? Eu balancei minha cabeça, imediatamente me arrependendo quando a dor
irrompeu atrás dos meus olhos.

Eu me empurrei para uma posição sentada de pernas cruzadas, forçando minhas costas
retas, e comecei a refinar mana dentro do meu núcleo. Eu me senti melhor imediatamente,
quando a atividade familiar acalmou meus nervos e tirou minha mente da minha situação
atual.

***

"O que é isso?" uma voz feminina fria perguntou em um sussurro, me tirando da minha
meditação.

“Isso é uma pessoa? Um guarda, talvez...” uma voz masculina rouca respondeu.

“Bem,” eu disse, abrindo meus olhos e me levantando, “você estaria em apuros se Mica
fosse um vigia Alacryano, não estaria? Você ainda não foi apresentado ao conceito tático de
uma abordagem furtiva?”

“Olha só quem fala”, respondeu Hornfels, sorrindo para mim. “Aquele barulho que você fez
ecoou por uma milha no túnel. Esperávamos encontrar todos os Alacryanos restantes em
Darv esperando por nós.
Olhando para o grupo, percebi o quão cansados e desgastados pela batalha eles pareciam.
Todos estavam cobertos de sujeira, seus rostos pálidos com anéis grossos e escuros sob os
olhos. Dois estavam faltando. Oberle, é claro, deve ter se desintegrado na explosão, mas o
silencioso Jasper também estava ausente.

Percebendo meu olhar, Tetra balançou a cabeça. “Todos nós sobrevivemos à explosão,
graças a você. Apenas saímos rolando pela caverna. Ela encontrou meus olhos e sorriu
tristemente. “Obrigada, de verdade.”

"O que aconteceu então?" Eu perguntei, querendo preencher a lacuna enquanto estava
inconsciente sob várias toneladas de pedra explodida.

Skarn falou, sua voz mais profunda do que o habitual, quase como se estivesse chorando.
“Levamos um minuto para nos recompor, então corremos de volta para ver se poderíamos
encontrá-la. Nós nem tivemos tempo de começar a remover os escombros, antes que os
primeiros Alacryanos aparecessem. Devia ter guardas no fundo da fissura. Caímos de volta
nos túneis, lutando enquanto avançávamos, nos movendo para não sermos mortos.”

“Esses grupos de batalha em que eles lutam são difíceis de quebrar”, acrescentou Hornfels,
“mas tivemos a vantagem de estar em casa nos túneis. Alguns de seus feitiços não pareciam
ser feitos para lutar aqui e nós os estávamos eliminando um por um.”

“Um de seus feiticeiros estava lançando esses ciscos de energia elétrica azul em nós”, disse
Tetra, olhando para trás no túnel, “que voavam pelo ar como beija-flores, evitando os
obstáculos que estávamos conjurando para desacelerar a perseguição. Jasper estava sendo
atingido por eles — um deve ter quebrado sua mana protetora — e ele caiu.

“Mas eu peguei o maldito,” rosnou Kobel. “Derrubou meia montanha em toda a sua
maldita equipe.”

“Quanto tempo desde a explosão?” Eu perguntei quando os outros ficaram em silêncio.

“Quase dois dias”, respondeu Skarn.

Dois dias! Muito tempo para os Alacryanos terem feito as malas e saído, ou eles podem ter
passado o tempo fortalecendo sua posição e se preparando para nós. Não saberíamos se
não descêssemos até a gruta.

“Quantos soldados deles vocês mataram?”


“Pelo menos doze”, respondeu Tetra. “Talvez quinze. Então eles pararam de perseguir e
recuaram.”

“Do ponto de vista de Mica, pode haver outros quinze ou mais magos esperando por nós no
fundo daquela fissura” — apontei para trás, através da cratera para a fenda na parede,
claramente delineada agora pelo brilho verde-azulado lá dentro — “talvez apoiados por
uma Foice. Supondo que o inimigo não tenha recuado desta posição, eles certamente
estarão esperando por nós. Pessoalmente, Mica acabou de tirar uma soneca de dois dias e
se sente maravilhosamente preparada, mas vocês...

“Estão prontos”, disseram Hornfels e Skarn juntos.

“Sim”, acrescentou Kobel. Tetra apenas assentiu, sua expressão era de determinação.

Ah, isso que é uma verdadeira coragem de anão, pensei com um sorriso.

Sem perder tempo, atravessamos a zona de explosão e rastejamos de volta para o outro
lado e para a rachadura na parede, tomando cuidado para evitar os fungos luminosos
crescendo por toda parte. Como Oberle havia dito, era cerca de trezentos metros até o
fundo.

No final da fissura, encontramos uma posição fortificada como um posto de guarda, mas
não havia ninguém cuidando dela. Saímos do túnel com cuidado, usando o posto de guarda
e as colunas naturais que sustentavam o teto alto como cobertura.

A caverna tinha quase cem metros de comprimento e talvez oitenta metros de largura.
Uma lagoa preenchia quase um terço desse espaço, no entanto. Barracas e fogueiras foram
montadas do outro lado da caverna, enquanto a extremidade mais próxima de nós
continha fileiras de caixotes e barris. O teto da caverna tinha quinze metros de altura e era
inteiramente coberto por estalactites.

Trinta soldados Alacryanos estavam em posição de sentido perto do centro da caverna,


claramente organizados em grupos de batalha de três. Eles ficaram parados como estátuas,
de frente para o nosso lado da caverna. No entanto, não deram nenhum sinal de que nos
viram entrar.

Olhando para o teto de novo — em particular as centenas de estalactites que o cobriam —


pensei em enviar um tremor pela gruta para derrubá-las, derramando uma chuva de pedras
sobre os soldados desatentos. Porém, algo segurou minha mão.
Por que eles desistiram de sua busca? Por que eles não me tiraram dos escombros e
acabaram comigo? Senti que estava faltando algo importante.

“Qual é o plano aqui, Mica?” Skarn sussurrou em meu ouvido. Os outros estavam todos
olhando para mim com expectativa.

"Fiquem aqui. Se alguém atacar, matem todos. Se a Foice aparecer, deixe-a comigo.”

Eu rastejei para frente o mais perto que pude, mantendo a cobertura, então saí para o
campo aberto. No momento em que fiz isso, os soldados entraram em movimento. Um
mago em cada grupo conjurou um grande escudo retangular, separando-me da linha de
soldados. Os outros prepararam seus feitiços, mas os seguraram, sem atacar.

“Eu aplaudo sua contenção,” a voz de uma mulher soou de algum lugar nas sombras à
minha direita.

A pessoa que falava era uma garota com longos cabelos cor de ametista e dois chifres
negros em espiral saindo de seu crânio, afastou-se da parede da caverna e caminhou
calmamente para ficar diante da fileira de magos.

“Dada sua recente experiência de quase morte, não posso dizer que ficaria tão calma se
estivesse no seu lugar. Agora,” ela disse, seu rosto vazio tornando-se sério, “você está
interrompendo uma operação essencial. Como você ainda não causou nenhum dano de
consequência real, estou disposta a deixá-la simplesmente sair. Vou realocar minhas forças
e continuaremos nossos trabalhos.”

“Quase-morte?” Eu disse, fingindo uma leve surpresa. “Mica aprecia o aquecimento, mas
garante que ela está em perfeita forma de luta — e ao contrário de você, seja lá quem
diabos você seja, Mica não está preparada para ser tão magnânima.”

A garota inclinou a cabeça ligeiramente para o lado, olhando para mim com interesse. “A
guerra está acontecendo longe daqui, general. Você não deveria estar em Etistin, repelindo
o ataque lá ao lado das outras Lanças?

Dando um sorriso alegre para a criatura com chifres de demônio, eu disse: “Mica vai lutar
contra vocês, magos Alacryanos, onde quer que estejam. As outras Lanças cuidarão de sua
invasão em Etistin.

“Ah, temo que isso não seja provável. Mas vejo que você está determinada a lutar. Uma
lâmina negra de mana pura cresceu de sua mão, irradiando uma luz roxa escura. “Eu vou
deixar você escolher as regras da batalha. Devemos pedir às nossas tropas — do jeito que
estão — que se retirem e nós prosseguiremos com um duelo, ou você prefere uma batalha
grupal? A vantagem dos números está comigo, acredito.”

“Enquanto Mica adoraria lutar contra você em um duelo, seus companheiros nunca a
perdoariam por excluí-los do que certamente será uma batalha gloriosa.” Quando terminei
de falar, concentrei-me nas estalactites acima da linha inimiga, aumentando seu peso até
que começaram a rachar e se libertar do teto da caverna, caindo sobre os Alacryanos como
flechas de balista.

Uma esfera de energia translúcida apareceu ao redor da Foice. As estalactites que


atingiram a barreira se desintegraram ao contato.

Os magos reposicionaram seus escudos, em alguns casos colocando vários escudos um


sobre o outro. Os mísseis de pedra perfuraram alguns dos escudos, espetando vários
soldados, mas o resto resistiu.

Com um movimento do meu pulso, três grandes paredes de pedra cresceram do chão da
caverna para me proteger da chuva de feitiços que voou em minha direção um momento
depois. À medida que os ataques dos inimigos impactavam as paredes, senti feitiços
começarem a voar por trás de mim em direção aos Alacryanos; meus aliados lançaram uma
saraivada própria.

Um feixe de luz negra atravessou a pedra e eu me abaixei bem a tempo de evitá-lo,


enquanto a cortava da esquerda para a direita, passando logo acima da minha cabeça. As
paredes de pedra se separaram e caíram no chão com um estrondo. Um instante depois, os
três blocos pesados avançaram em direção à Foice enquanto eu mudava a gravidade em
torno deles.

O primeiro atingiu sua barreira protetora diretamente e foi quase inteiramente


desintegrado, mas o segundo e o terceiro apenas resvalaram na esfera, passando por ela
para atravessar a linha de soldados, achatando dois grupos de batalha.

Um orbe de mana pura estava se formando na ponta da espada da Foice, mas ela parecia
estar mirando além de mim e em direção ao meu time. Sabendo que não tinha muito
tempo, comecei a condensar a gravidade em um pequeno ponto três metros à frente dela.
O suor escorria na minha testa e havia uma pontada de dor no meu núcleo de mana,
enquanto eu lutava para conter a força crescendo dentro daquele espaço. Assim que ela
lançou o orbe destrutivo, eu completei a conjuração da Singularity.

Um poço de gravidade maciça apareceu no ar na forma de um buraco negro no tecido da


realidade. O orbe passou pela Singularidade, mas o efeito gravitacional foi forte o suficiente
para tirá-lo significativamente do alvo, então, quando colidiu contra a parede mais distante
da caverna, florescendo em um campo de desintegração de três metros de largura, estava
longe de Hornfels e os outros.

Várias das tendas se soltaram de suas amarras e foram arrastadas para o poço de
gravidade. A água começou a subir da superfície do lago e rodopiar em torno do feitiço,
enquanto atrás de mim caixotes deslizavam pelo chão em direção ao buraco negro.

A Foice parecia estar resistindo amplamente ao efeito. Atrás dela, os magos lutaram para se
manter no lugar. Três falharam e seus pés cederam, então foram puxados para a
Singularity, onde foram esmagados.

O campo translúcido de mana ao redor da Foice deslizou dela, movendo-se para conter o
buraco negro. O escudo se contraiu até ficar do mesmo tamanho e formato do meu feitiço,
então desapareceu, levando a Singularity com ele. Ela de alguma forma anulou minha
magia.

Passos estrondosos atrás de mim chamaram minha atenção para uma investida de meus
aliados. Dois golens, cada um com três metros de altura e empunhando um enorme
machado de pedra, avançavam em direção à linha inimiga. Entre eles, uma cobra de seis
metros de comprimento feita inteiramente de lava, ondulava para frente e para trás para
se impulsionar a uma velocidade surpreendente.

Minúsculo ao lado dos golens imponentes, Kobel seguiu o ataque. Ele havia se envolto
inteiramente em placas brilhantes de vidro vulcânico, e ao seu redor havia uma nuvem
rodopiante de lâminas finas e afiadas.

Uma lança de gelo estilhaçou-se contra um golem, enquanto uma bola de relâmpagos
crepitantes colidiu inofensivamente contra o outro. Várias balas de mana negra perfuraram
a cobra de magma, mas a lava simplesmente fluiu de volta ao lugar enquanto avançava.

Vários dos Alacryanos restantes, todos com feitiços de combate físico semelhantes aos de
um ampliador, avançaram para enfrentar nosso avanço. Eu me preparei para deixá-los de
joelhos com o Gravity Hammer, mas fui forçada a desviar de uma flecha negra de mana
projetada pela espada da Foice.

As duas forças colidiram. A cobra de magma atingiu, engolfando um mago Alacryano. Outro
Alacryano, cuja pele adquirira um brilho vermelho como o ferro retirado da forja, usou as
mãos nuas para perfurar a perna de um golem. A pedra derreteu onde ele a tocou e o
golem desmoronou. O segundo golem se jogou contra a foice, mas sua lâmina de mana o
cortou sem esforço.
Três magos inimigos cercaram Kobel, rosnando e silvando como bestas. O ampliador nem
sequer diminuiu a velocidade enquanto passava por eles, suas facas girando cortando-os
em tiras. Quatro escudos translúcidos apareceram ao seu redor como uma jaula,
impedindo-o de alcançar a retaguarda inimiga.

Vendo a Foice se virar para ele, conjurei duas mãos gigantes de pedra, uma do chão sob
seus pés, a outra do teto. Ela foi erguida no ar, mas antes que as mãos pudessem esmagá-la
entre elas, sua barreira esférica reapareceu e as mãos se desintegraram onde as tocou,
deixando-a flutuando no ar.

O Alacryano de pele brilhante se jogou contra a cobra de magma. Ele parecia imune ao
calor da lava, mas não podia causar nenhum dano real ao construto de Tetra, pois ela fluía
de volta mais rápido do que ele conseguia separá-la.

Kobel estava martelando os escudos que o seguravam no lugar, Skarn e Hornfels estavam
tentando reconstruir seus golens — eu podia ver as peças se encaixando enquanto os
golens se esforçavam para se levantar — e Tetra estava atacando a Foice com sua cobra de
magma, que ficou menor a cada ataque, à medida que a barreira destrutiva desintegrava o
construto pouco a pouco.

A espada de mana da Foice cresceu, alongando-se e dividindo-se em vários feixes


individuais e se transformando em um chicote de muitas caudas de energia negra. Ela
atacou o construto, que se dissipou onde o chicote o tocou. No mesmo movimento, ela
balançou o chicote em um arco em direção ao nosso lado da caverna.

Cada cauda do chicote se endireitou e se tornou uma lança. As lanças, cada uma um raio
brilhante de luz negra viva com fogo roxo, voaram para longe dela em um padrão de hélice,
perfurando qualquer obstrução, até mesmo as paredes da caverna.

Eu rolei para fora do caminho de uma lança e conjurei uma cortina de gravidade
aumentada entre a Foice e minha equipe, esperando forçar as lanças para fora do curso.
Observei com horror enquanto elas passavam pela cortina sem diminuir a velocidade,
depois os perdi de vista enquanto perfuravam os caixotes e colunas onde os outros haviam
se abrigado.

Diante de mim, a cobra de magma, agora com apenas metade de seu tamanho original,
perdeu sua forma, tornando-se nada mais do que uma poça de lava esfriando. O Alacryano
brilhante uivou em vitória.
Girando a gravidade em torno dele, virei a sala de lado. Seus pés escorregaram e ele
deslizou pelo chão áspero, procurando um apoio para as mãos, até mergulhar no lago. A
água assobiou e estalou quando sua carne superaquecida foi submersa.

Os golens de Hornfels e Skarn avançaram em direção aos Alacryanos restantes. Um


esmagou o lançador de raios com um punho enorme e chutou um segundo. A mulher caiu e
um dos escudos que seguravam Kobel se desmaterializou. O segundo golem balançou seu
machado no mago atirando balas de energia negra, mas um escudo apareceu sobre ele,
desviando o ataque.

O golem deslizou seu machado ao longo do painel de mana, transformando o golpe aéreo
em um corte cruzado que dividiu o conjurador de escudos. Várias balas negras perfuraram
o golem enquanto o mago sobrevivente se arrastava para trás, mas não foi suficiente para
impedir que o machado caísse sobre ele uma segunda vez. Nenhum escudo apareceu para
salvá-lo.

Embora eu não a tenha visto fazer isso, a Foice havia reformado sua espada de mana. Ela
apontou para cada golem e lançou dois raios de luz negra. Onde os raios impactaram os
golens, eles explodiram em esferas de um metro e meio de energia roxa escura que
desintegrou tudo o que eles tocaram, obliterando ambas as construções.

Vendo seu terceiro alvo, gritei: “Kobel! Abaixa!" e voei em direção à Foice, formando um
enorme martelo de granito em uma das mãos. Kobel, que acabara de despachar o mago da
lança de gelo, pulou para o lado, mas era tarde demais.

O raio negro o atingiu bem no peito, mas, ao contrário dos golens, o raio resvalou,
explodindo a três metros de distância e matando os dois últimos soldados Alacryanos.

Mal tive tempo de registrar a sobrevivência de Kobel quando me aproximei da Foice,


enfiando meu martelo de granito, que eu tinha envolto em mana, em sua barreira
protetora. Senti o escudo brilhante corroendo minha mana. Ainda assim, eu ataquei de
novo e de novo e de novo, cada vez sentindo meu núcleo de mana sendo drenado.

Kobel apareceu atrás dela, jogando suas lâminas de vidro vulcânico em suas costas. Elas se
desintegraram em contato com a barreira. Skarn e Hornfels atacaram com construções de
pedra semelhantes a javalis gigantes e entraram na barreira com lanças de granito.

A foice nos deu tempo suficiente para deixar claro que nossos ataques eram ineficazes,
então acenou com a mão. Seu escudo se partiu em dezenas de partículas de energia negra
e roxa. Os ciscos caíram sobre Kobel, Hornfels e Skarn como neve, depois flutuaram dentro
de cada um deles. Todos os três desmoronaram, sua magia se transformando em pó,
deixando-os inteiramente expostos.

O demônio com chifres sorriu para mim e sua arma desapareceu. Incerta, voei vários
metros para trás, pairando no ar. Ela acenou em direção ao chão e então flutuou para baixo
até que ela estava novamente no chão. Fiz o mesmo, embora não tivesse abaixado minha
arma.

"Basta", disse a Foice com naturalidade. “Nós terminamos aqui por enquanto. Você ficou
sem tempo.”

“O que você fez com os outros?” Eu exigi, recusando-me a morder sua isca.

“A batalha em Etistin está indo mal. Mesmo agora pode ser tarde demais para você
intervir.” Ela me olhou com tristeza. “Essa luta acabou.”

“Mica pode fazer isso o dia todo, senhora. O que você fez com eles?”

A foice franziu a testa para mim, a maior emoção que eu vi em seu rosto desde que a
batalha começou. “Amaldiçoei eles, como eu amaldiçoei o garoto que trouxe vocês aqui.”

Gritando como uma besta de mana, eu pulei para frente, mirando meu martelo em seu
crânio. Sua lâmina de mana brilhou, cortando o cabo do meu martelo. Usando o Gravity
Hammer, tentei esmagá-la no chão, mas ela conjurou uma névoa de energia escura ao seu
redor, anulando meu feitiço novamente.

Desesperada, eu segui com um soco direto em seu nariz. Talvez ela não estivesse preparada
para um ataque tão mundano, porque o soco acertou, jogando sua cabeça para trás.
Rosnando, ela empurrou e a névoa ferveu através de mim, minando minhas forças.

Com meu peito arfando, eu caí de joelhos. “Trapaceira.”

Limpando um fio fino de sangue de seu nariz, a Foice me olhou, mais uma vez calma.
“Deixei mana suficiente para você e seus amigos voarem para fora daqui. Se eles não
estiverem a mais de trinta quilômetros de distância na próxima hora, a maldição será
ativada e eles explodirão. Se eles chegarem a trinta quilômetros deste lugar na próxima
semana, a maldição será ativada e eles explodirão. Depois de uma semana, a maldição
desaparecerá. Agora vá. Seus amigos precisam de você.”

Sem outra escolha, arrastei as formas caídas de meus companheiros para uma das paredes
de pedra que conjurei antes, amarrei-os com cordas de uma das tendas destruídas e
levantei a maca improvisada usando uma pequena quantidade de mana para aliviar o
fardo.

"Por quê?" Eu perguntei simplesmente.

A foice, que tinha visto isso acontecer com um ar de leve curiosidade, balançou a cabeça,
seu longo cabelo cor de ametista fluindo ao redor dela. “Cada um de nós tem sua parte a
desempenhar no conflito que está por vir, mesmo que ainda não saibamos qual será.”

Franzindo a testa, virei-me e voei para a fissura, passando pela forma caída de Tetra. Então
usei uma parte da minha mana restante para criar um sarcófago de pedra ao redor dela.
Sinto muito, Tetra, Jasper, Oberle. Eu falhei com vocês.

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